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Poemas Escolhidos(Gregório de Matos)
Que falta nesta cidade? . . .Verdade.Que mais por sua desonra? . . . Honra.
Falta mais que lhe ponha? . . . Vergonha.
O demo a viver se exponha,Por mais que a fama a exalta.
Numa cidade onde falta Verdade, Honra , Vergonha .
Quem a pôs neste rocrócio ? . . . Negócio.
Quem causa tal perdição ? . . . Ambição.E a maior dessa loucura? . . . Usura .
Notável desaventura De um povo néscio e sandeuQuem não sabe que o perdeu
Negócio , Ambição , Usura.
Quem são seus doces objetos ? . . . Pretos.
Tem outros bens mais maciços ? . . . Mestiços .
Quais destes lhe são mais gratos ? . . . Mulatos .
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Dou ao demo os insensatos,Dou ao demo a gente asnal,
Que estima por cabedalPretos, Mestiços, Mulatos.
EQUIPE TÉCNICA
Pesquisa Histórica
Ana Clélia B.Correia Nascimento
Jacionira Coelho Silva
Patrícia Mendes dos Santos
Análise Arquitetônica
Janaina Moura Lima
Patrícia Mendes dos Santos
Levantamento Arquitetônico/ Desenhos
Olavo Pereira da Silva
Fotografias
Acervo IPHAN
Digitação
Clarissa BorgesPatrícia Mendes dos Santos
Revisão
Patrícia Mendes dos Santos
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ÍNDICE
Introdução
1. Identificação do Imóvel
2. Informações sobre o local
3. Histórico
4. Arquitetura
5. Justificativa
6. Plantas
7. Roteiro Fotográfico
8. Bibliografia
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Introdução
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A instrução do presente trabalho tem por finalidade submeter à apreciação do
Conselho Estadual de Cultura a Proposta de Tombamento da Fazenda Serra Negra,
localizada no município de Aroazes – PI.
A Fazenda Serra Negra é um exemplo vivo da arquitetura piauiense, sendo
localizada na divisa de Aroazes e Santa Cruz dos Milagres, à 181 km de Teresina.
O entorno e a própria edificação devem ser preservados a fim de que, as
pessoas sintam, aprendam e conservem a identidade cultural da nossa região.
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Identificação do Imóvel
IDENTIFICAÇÃO DO IMÓVEL
Designação: Fazenda Serra Negra
Município: Aroazes
Estado: Piauí
Data de Construção: Séc. XVIII
Proprietário: Iolanda Queiroz
Área construída: 438,00 m2
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Informações sobre o local
O MUNICÍPIO DE AROAZES
Data de 1730 o início do povoamento, quando os jesuítas fundaram a Missão de
Aroazes, com a finalidade de catequisar os habitantes da região. Ainda hoje, existe no
centro da cidade uma coluna de pedra, construída pelos jesuítas com o auxílio dos
indígenas.
Em 1740, D.Manoel da Cruz, Bispo do Maranhão, criou a Freguesia de Nossa
Senhora da Conceição, com sede no Povoado. Formaram-se três grandes fazendas que
utilizavam escravos para seus serviços, sendo a fazenda Serra Negra a mais
importante.
LOCALIZAÇÃO GEOGRÁFICA
Situado na Mesorregião do Norte Piauiense e na Microrregião de Valença do
Piauí, Aroazes, com área de 1.767km2, é limitado ao norte pelos municípios de Prata
do Piauí e São Miguel do Tapuio; ao sul, pelo de Valença do Piauí; a leste, pelos de
São Félix do Piauí, Elesbão Veloso e Valença do Piauí. A sede municipal, 225m de
altitude, tem sua posição geográfica determinada pelo paralelo de 6º6´42” de latitude
sul em sua interseção com o meridiano de 41º47´12” de longitude oeste.
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HIDROGRAFIA
A rede hidrográfica, de caráter temporário, pertence à bacia do rio Parnaíba. É
constituída pelos rios Sambito e São Nicolau e por uma série de riachos, destacando-se
os das Carnaíbas, Salitre, da Serra Negra e da Tábua, este atravessando a Sede
Municipal.
CLIMA
Tropical megatérmico, muito quente, e semi-árido. As temperaturas são
normalmente elevadas durante todo o ano e os totais pluviométricos anuais são
inferiores às necessidades ambientais. As chuvas são, entretanto, muito mal
distribuídas ao longo do ano e irregulares no decorrer dos anos. A estação chuvosa
inicia-se normalmente em dezembro e se concentra sobretudo de janeiro a abril, com
cerca de 77% do total anual.
VEGETAÇÃO
A fitofisionomia do Município é representada pelo cerrado, nas formas de
campo limpo de cerrado e campo cerrado. Na parte leste, em revelo tabular o campo
cerrado é caracterizado pelos paus-terra, murici e lixeira e a oeste em áreas
aplainadas , ocorrem os campos limpos de cerrado, com elementos arbóreos da
caatinga e do cerrado, destacando-se espécies características como a lixeira e a
carnaúba. A pecuária extensiva, bem como as lavouras, foram responsáveis pela
alteração da cobertura vegetal primitiva.
POPULAÇÃO
Aproximadamente 9.582 hab
DENSIDADE DEMOGRÁFICA
5,42 hab/km2
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Histórico
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Aspectos Naturais e Econômicos
A fazenda Serra Negra, localizada a 181 km de Teresina, ocupa grande extensão
de terra dos municípios de Aroazes, Santa Cruz dos Milagres, Pimenteiras, dentre
outros. No seu terrritório encontramos diversos riachos, o Serra Negra, o Almoço, o
Carnaúbas, Salitre e Tábua, e os rios São Nicolau e Sambito. Estendendo – se pelos
contra – fortes da serra homônima, pertence à zona fisiográfica da Ibiapaba. Seu solo é
formado por rochas sedimentares das Formações Cabeças e Longa, parcialmente
recobertas por sedimentos das Formações Piauí e Itapecuru, respectivamente
sedimentos carboníferos e cretáceos.
A vegetação nativa é constituída por espécies de campo cerrado, bastante
alterada pelas centenas de anos de utilização da terra na criação de gado e cultivo,
resultando na formação vegetal de campo limpo de cerrado. Além da pecuária e da
agricultura, pratica – se na região a extração do tucum, babaçu e carnaúba e na área
da fazenda planta – se o caju em larga escala.
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Aspectos Sociais, Etnográficos e Religiosos
A fazenda Serra Negra era a mais importante das três grandes fazendas que
utilizavam escravos para seus serviços, quando em 31 de março de 1739, o bispo do
Maranhão D. Manoel da Cruz criou a Freguesia de Nossa Senhora da Conceição, com
sede no povoado da Missão dos Aroazes, implantada desde 1730. A sede da Freguesia
criada foi erigida sobre as bases da Capela da Missão estabelecida em data anterior a
1725, pelo padre Gabriel Malagrida. Não é sem motivo , portanto, que a serra onde se
encontram as nascentes do riacho Serra Negra é chamada Serra das Missões.
Reza a tradição que o templo – sede dessa freguesia comportava em torno de
1200 fiéis. Testemunha ocular conta que os vestígios das colunas de sua portada
apresentavam um espaço de 50m, aproximadamente . Esse templo gigantesco ainda
estava por se concluir em 1883.
Em BASTOS (1994) há referência de que os jesuítas construíram à margem
esquerda do riacho Tábua, antes de 1730, “... algumas choupanas de palha e
iniciaram a construção de um gigantesco templo de pedras, do qual restava, em 1952
uma coluna no centro da cidade de Aroazes .” As ruínas do templo foram totalmente
depredadas com a retirada de material para construção de habitações.
Deduz – se que os primeiros habitantes da região – os Aroazes – ainda se
encontravam no local por ocasião da chegada dos primeiros colonos. A convivência
entre as duas etnias durou algumas dezenas de anos, possivelmente uma centena. Em
fins do século XVIII o Ouvidor Durão relata que “... o sítio dos Aroazes onde há a
freguesia ( N. S. da Conceição dos Aroazes ) e donde há um templo de pedra que tem
custado mais de 16 mil cruzados ...” apresentava ótimas condições para se estabelecer
uma grande povoação . No entanto, “... lá já não estavam os índios que lhe deram o
nome ” ( MOTT). Esse abandono deve ter sido o motivo da transferência da sede da
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freguesia para a vila de Valença a 05/09/1936, distante oito léguas. Segundo Durão, os
Aroazes já não eram os senhores da zona central do território piauiense, as Catingas
Gerais.
Vestígios da ocupação dessa região pelo homem pré – histórico são encontrados
às margens do riacho do Almoço, nas esplanadas, nos “pés –de- morro”, nos
boqueirões. No boqueirão do Buriti Grande, em terras da fazenda Serra Negra, por
exemplo, pinturas e gravuras foram realizadas em paredões e abrigo, com técnicas
diferenciadas. Dessas primeiras populações só restam traços, os quais se encontram em
risco de completa destruição.
Quanto às populações atuais, estas têm relações comunitárias reguladas por
atos de fé, crenças e costumes interpenetrados de crendices, lendas e mitos: parte de
um mundo mágico – religioso, no qual, num passado não muito distante, sua
ancestralidade se movia na sua vida cotidiana. O profundo e arraigado sentimento de
religiosidade, que tão bem as caracteriza, abriga lado a lado crenças e crendices,
verdades e mitos, que se confundem, enquanto vão enriquecendo o imaginário que suas
mentes alimentam.
Um dos fenômenos do imaginário do povo das Catingas Gerais é a lenda da
Santa Cruz dos Milagres, uma cruz natural de aroeira, encontrada por um vaqueiro de
uma fazenda local, nos idos de 1876, que a colocou no alto de um morro. Logo depois,
decidiu transferi –lá para um outro lugar, e, por diversas vezes, misteriosamente, a cruz
voltava a aparecer no alto do morro. Assim, construiu – se, primeiramente no local,
uma casa de palha e um cemitério. Na segunda década deste século, elevou – se a
primeira capela, de taipa. Após 1924, foi erigida a igreja atual , onde acontece a maior
manifestação de religiosidade popular do Piauí , com rituais próprios, ditados pela fé
dos devotos, como as procissões que se deslocam por quilômetros, a pé , de distantes
pontos do Estado.
Ressalta – se que a devoção à Santa Cruz, na região, teve início entre o fim do
século XVIII e o início do XIX, na fazenda Jatobá, na margem esquerda do rio São
Nicolau, festejada a 03 de maio.
Outra lenda que povoa a mente dos habitantes locais é a que procura justificar
o nome da fazenda Serra Negra com o ato de serrar uma escrava ao meio, praticado
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por um de seus mais lendários proprietários, Luis Carlos Pereira Abreu Bacelar,
também conhecido como Luis Carlos Ferraz, pelos moradores da região.
Contam ainda os habitantes que Luis Carlos decidira casar – se e encomendou
uma noiva de Portugal, como era de costume na época, de família notadamente
abastada e aristocrática. Para impressioná-la, mandou construir um corredor de prata
ligando o cruzeiro, no pátio da frente da sede da fazenda, até a capelinha no interior do
casarão, a 80 metros. Logo que a donzela chegou, desdenhou do feito, pois segundo
ela, na residência de seus pais, o caminho entre o cruzeiro e a capela, era moldado por
placas de ouro. Cada dia mais triste e infeliz por estar vivendo num local distante e
selvagem, a nova esposa não correspondeu às expectativas do grande proprietário.
Luis Carlos, então, decidiu enviá - la de volta a Portugal, mergulhando na solidão até o
final de seus dias.
A morte desse personagem também está envolta em mistério. Conta – se que
fora assassinado por desafetos, em decorrência de Luis Carlos ter mandado matar um
importante habitante de Oeiras, primeira capital do Piauí, para assumir o poder. Todos
os finais de tardes, o fazendeiro sentava – se numa bancada debruçando – se sobre a
janela para ver o gado entrar no curral. Numa dessas ocasiões, foi alvejado por um
franco atirador situado numa pequena elevação disposta a 150 metros, em frente ao
grande casarão. Como de costume, organizou – se um cortejo fúnebre, composto por
negros, rezadeiras e vaqueiros tendo à frente o morto transladado numa rede. O
destino era a cidade de Valença, no meio do caminho, o cortejo foi abordado por dois
homens muito bem vestidos, assemelhados à ciganos, que se apresentaram como
íntimos amigos do defunto e pediram para seguir o funeral. Alguns quilômetros
andados, os ciganos se prontificaram a transportar o amigo até a sua última morada.
Sem nada desconfiarem, os negros entregaram – lhes a rede. Algumas horas mais,
entre uma vereda e outra, os ciganos sumiram com o morto sem deixar vestígios. Até
hoje não se têm notícias sobre aonde Luis Carlos foi sepultado.
A fazenda Serra Negra não só testemunha as lendas aterrorizantes que embalam
a imaginação de sua população. Um profundo sentimento de fé é externado pelos
habitantes que gravitam em seu território e à sua volta. Na capela de Sant’Ana,
comemora – se festivamente a data a Ela dedicada (27 de julho) com práticas
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religiosas e profanas, ocasião em que se transforma em importante centro religioso da
região.
Aspectos Históricos
Serra Negra é uma das mais antigas fazendas do Piauí . Ao descrever o sertão do
Piauí, em 1697, o Pe. Miguel Carvalho menciona o assentamento de uma fazenda
localizada à margem do rio Negro ( hoje riacho Serra Negra ), afluente do rio São
Nicolau, com um (1) habitante branco e dois (2) negros, cujo vaqueiro encarregado era
Rodrigo da Costa.
Quando Henrique Antônio Galluzze chegou ao Piauí em 1759, comissionado pelo
Governo e com a incumbência de levantar a carta topográfica da Capitania e demarcar
– lhe os limites, não incluiu a fazenda Serra Negra em seu mapa. Essa falha seria
corrigida por César de Meneses que retificou o Mapa de Galluzze em 1809.
Por volta de 1774, o Ouvidor Morais Durão levantou na fazenda Serra Negra,
até dezembro daquele ano, 90 fogos ( habitações ) e 506 almas, das quais 293 eram
homens e 213 mulheres, distribuídas em 14 fazendas e 18 sítios. Seu senhorio habitava
em Pernambuco, na ocasião.
No início do século XIX, a fazenda pertencia a Luis Carlos Pereira Bacelar,
supracitado, a quem a fantasia dos habitantes locais atribuiu o serrilhamento de uma
escrava para justificar o nome que daria à sua fazenda, e que já a possuía no século
XVII, conforme relação do Pe. Miguel Carvalho. Vale a pena lembrar que o
proprietário da Serra Negra foi comandante militar da Vila de Oeiras e, nessa
qualidade, fez parte da junta governativa do Piauí de 13/07/1811 a 10/01/1814.
No “Índice das Cartas de Sesmarias concedidas no Pará”, a fazenda Serra
Negra é descrita da seguinte forma: “... Data com três léguas de comprido e uma de
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largo, extremando pelo nascente com a fazenda Itaboca e pelo poente com o riacho do
Gado. Pelo sul com o lugar denominado Casas de Barro e pelo norte com o lugar
denominado Chapada das Unhas de Gato, sendo seu comprimento de norte a sul e a
largura do nascente ao poente. Concedida em 9 de setembro de 1779 a Manuel Pereira
Lopes e registrada à Folha 68, página 52” ( MOTT ).
Um documento tão tardio em relação ao primeiro assentamento da fazenda
(anterior a 1697 ), só pode significar a ampliação dos limites da fazenda, que já
possuía, no fim do século XVIII, 32 assentamentos, entre fazendas ( criação de gado) e
sítios (agricultura ).
As constantes anexações de novas áreas de terra, provavelmente, deveriam
provocar conflitos entre vizinhos.
MOTT analisando as dimensões das fazendas de gado piauienses atribui uma
distância entre elas de mais de 2 léguas, ficando a maioria entre 6 a 10 léguas. É quase
certo que, à medida que esses espaços fossem sendo ocupados pelo gado de uma
fazenda ou outra, a disputa pela terra fosse ficando acirrada, sobretudo porque ela ia
rareando. A esse respeito, KOSTER asseverava nas primeiras décadas do século XIX,
sobre o interior do nordeste brasileiro, que “A divisão das propriedades no sertão é
extremamente vaga, e pode ser bem imaginada quando se disser que o modo usual de
descrever uma fazenda é computar sua distância em léguas ou, em muitos casos,
informar quantos mil bezerros anuais, sem a menor referência à quantidade das terras
possuídas” (p. 166).
A primeiro de outubro de 1880, Lisbella Josefa Clementino de Sousa, de Oeiras,
proprietária da fazenda Serra Negra, entrou com requerimento de demarcação dessa
fazenda na comarca de Valença, a fim de dirimir dúvidas levantadas por proprietários
de terras vizinhas às suas, compradas anos antes ao Visconde da Parnaíba. Este é um
exemplo do conflito de terras gerado pela indefinição dos limites, sem uma demarcação
precisa. Quanto à imensidão territorial da fazenda Serra Negra, pode ser comprovada
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ainda na metade do século atual, quando o jornal da Capital ( O Piauí, 21/10/45 ) fazia
referência à seca que se abatia sobre o Piauí e estava a causar danos à fazenda no
município de Castelo do Piauí. O articulista não se limitando ao fato que reportava,
registrou que “... as propriedades do Sr. Pires Gaioso no município de Marvão
pertenceram ao lendário Luis Carlos...” construtor “... de obras que, ainda hoje,
desafiam a natureza como os currrais e a casa da fazenda Serra Negra ..” e lembrado
“... pelas práticas de métodos desumanos como eram tratados os infelizes escravos.” E
finalizava : “ As obras de Luis Carlos travam singular duelo com o tempo,
permanecendo perfeitas.”
O crescimento da fazenda Serra Negra entre os séculos XVIII e XIX, com seus
inúmeros assentamentos, deduz – se, está configurado na magnificência que sua sede
deve ter representado para a época e o local onde se situava. Sobre a data precisa de
sua construção não há informação. A única referência existente é a do ano de 1776,
gravado em uma pedra que compõe a fachada posterior da edificação, colocada em
posição invertida, só visível por não haver reboco. Contudo, uma relação cronológica
com a sede da fazenda só pode ser estabelecida após esse ano, coincidindo com a fase
de expansão da fazenda, conforme os dados fornecidos por Morais Durão.
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Justificativa
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A origem e evolução das chamadas fazendas, remontam ao movimento
português de exploração do território brasileiro, pela necessidade de exploração
econômica.
Nos séculos XVIII e XIX, tivemos nosso desenvolvimento econômico
extremamente ligado às fazendas de criação de gado que moldaram social, cultural e
politicamente a população piauiense.
Sua habitação obedecia às necessidades do homem, às condições de clima, aos
materiais peculiares da região – como a carnaúba – num equilíbrio de aproveitamento
das condições do ambiente.
“Na verdade, como tem enfatizado o arquiteto Amos Rapoport, a forma da casa
é definida primordialmente por fatores sócio-culturais tendo os fatores mesológicos e
climáticos, materiais disponíveis etc., um papel permanente, condicionante e limitador,
a ponto de que as casas produzidas por diferentes culturas em condições mesológicas
semelhantes são inteiramente diversas.”
Num processo iniciado por baianos e pernambucanos, que por intermédio de
doações feitas pelo reino, ou por posse indébita, criaram a figura do “sesmeiro”, sem
mencionar as famílias portuguesas que favoreceram a criação de gado em torno de
outras culturas, as fazendas constituíam um feudo, uma economia primitiva baseada na
exportação de gado e compra de mercadorias ce subsistência. O povoamento das terras
desencadeou o extermínio e a escravização do indígena e o aparecimento do negro,
trazido por portugueses e paulistas.
A Fazenda Serra Negra pela fusão das carcacterísticas funcionais que a
moldaram, solução local para o contexto ambiental, é, portanto, um exemplo ímpar das
construções mais antigas do Piauí.
Além dessas características que vieram ressaltar o valor histórico e
arquitetônico dessa sede de fazenda, vem juntar-se ainda o imaginário popular sobre
alguns acontecimentos ocorridos - o sofrimento dos negros e a maldade do senhor da
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fazenda – criando em torno da fazenda um conjunto de lendas e contos passados de
geração em geração naquela região.
A transferência, ao longo dos tempos, das famílias proprietárias do imóvel para
a cidade, onde fixavam residência, propiciou o lento e contínuo estiolamento do prédio.
Visando manter esse contexto material e também imaterial de um importante
monumento histórico do nosso Estado, vimos, através da proteção legal prevista na Lei
4.515, de 09 de novembro de 1992, requerer o tombamento da casa da Fazenda Serra
Negra, bem como seu entorno, de acordo com o Art. 1º, Parágrafo Único e Art. 2º,
Parágrafo 1º da supra-citada Lei.
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OBS: O entorno a ser protegido encontra-se descrito na planta de locação.
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Plantas
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Relatório Fotográfico
Foto 01 – Vista panorâmica da Fazenda Serra Negra.
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Foto 02 – Vista da Fachada lateral da Fazenda, onde observa-se a predominância de telhado baixo.
Foto 03 – Vista em perspectiva da escadaria e muroem pedra da Fazenda.
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Foto 04 - Vista frontal da escadaria em pedra.
Foto 05 - Vista do antigo cercado em madeira .
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Foto 06 - Detalhe da cruz em madeira .
Foto 07 - Observa-se a Casa das Onças, espaço de cerca de 50 metros,cercado de pedras, destinado aos felinos criados em cativeiro.
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Foto 08 – Observa-se a “gamela” onde os felinos comiam.
Foto 09 – Vista interna da Fazenda, observa-se as esquadrias em madeira e a espessura da parede existente.
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Foto 10 – Observa-se na parede em pedra, a datação da antiga fazenda.
Foto 11 – Imagem de Nossa Senhora Santana.
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Bibliografia
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Publicações :
BAPTISTA, João Gabriel. Mapas geohistóricos . Teresina : Prof. Petrônio Portela/
Fund. Cultural do Piauí, 1986, 180 p. il.
BASTOS, Cláudio A. Dicionário histórico e geográfico do Estado do Piauí . Teresina:
Fund. Cultural Monsenhor Chaves, 1994, 600 p.
KOSTER, Henry. Viagens ao Nordeste do Brasil . 2ª ed. Recife: Sec. Educ. e Cult. de
Pernambuco / Dep. Cultural, 1978, 477 p. (Coleção Pernambucana, vol. XVII).
MOTT, Luiz R. B. Piauí Colonial, população, economia e sociedade . Teresina: Prof.
Petrônio Portela / Fund. Cultural do Piauí, 1985, 144 p., il. (Diversos documentos)
NUNES, Odilon. Os primeiros Currais . Teresina: COMEPI,
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A arquitetura rural piauiense é marcada por construções que utilizam
os materiais existentes na região como a carnaúba, usada tanto na estrutura como na
cobertura das edificações, e também a pedra utilizada principalmente na parte
estrutural.
Nesse sentido, a fazenda Serra Negra é um exemplo vivo da
arquitetura piauiense. A Antiga casa possui quatorze cômodos e estruturalmente
apresenta paredes em pedra com largura de 80 cm. Possui também uma cobertura
bastante característica da região com peças em carnaúba – caibros e linhas – e telhas
largas, típicas da época, com plantas de cobertura em quatro águas.
Além destes aspectos essenciais para a arquitetura rural no Piauí,
merece destaque a implantação diferenciada da Antiga Casa, localizada numa parte
alta do terreno com muro de arrimo em pedra trabalhada e acesso através de escadaria
de pedra.
Ainda sobre os aspectos arquitetônicos externos observamos a linha
suave do desenho da cobertura – característica principal das casas de fazenda no Piauí
– o predomínio do cheio sobre o vazio e especialmente da visão de uma mais área de
cobertura do que área de parede.
As aberturas e esquadrias são em madeira fichada e marcação em
pedra.
Interiormente apresenta pé-direito baixo e cumeeira elevada, cômodos
interligados e distribuição dos espaços internos que se adaptam perfeitamente às
nossas condições climáticas e sociais.