OS CONTRATOS BANCÁRIOS E A
JURISPRUDÊNCIA
DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Ruy Rosado de Aguiar Júnior
OS CONTRATOS BANCÁRIOS E A JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
SUMÁRIO
PRIMEIRA PARTE
INTRODUÇÃO
1. Objeto da relação obrigacional bancária. Conceito de contrato bancário. Crédito. Operações ativas e passivas. 2. Características do contrato bancário. 3. Espécies, em especial o mútuo.
SEGUNDA PARTE
PRECEDENTES DO STJ SOBRE CONTRATOS BANCÁRIOS
4. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. 5. Operações passivas. Correção monetária. Legitimidade de parte. Aplicação em CDB e RDB. 6. Operações ativas. 6.1. Correção monetária em crédito agrícola. 6.2/3 SFH. 6.4/5. Liquidação judicial. 6.6. TR. 6.7. Caderneta de poupança. 6.8. TBF. 6.9. Depósito de coisa fungível em garantia. 6.10. Alienação fiduciária. 6.11. Alienação fiduciária e a MP 2160/25, de 2001. 6.12/13. Honorários advocatícios. 6.14/15. Multa. 6.16. Comissão de permanência. 6.17. Preço do produto. 6.18. Desvio de finalidade. 6.19. Revisão judicial de contratos bancários. 6.20. Cláusula-mandato. 6.21. Aval. 6.22/23. Leasing. 6.24. Factoring. 6.25. Responsabilidade civil. 6.26/27. Ação civil pública. 6.28. Cartão de crédito.
TERCEIRA PARTE
JUROS
7. Juros. Conceito. Espécies. Termo inicial. Juros e perdas e danos. Taxa de juros. 8. Precedentes do STJ. Súmula 596/STF. Juros de títulos regulados em legislação especial (DL 413/69. DL 167/67. Lei 6840/80). Taxa divulgada pela Anbid. Capitalização. Revisão judicial do contrato. Taxa de juros. Autorização do CMN. Juros moratórios. Comissão de permanência. Revisão judicial da taxa de juros.
QUARTA PARTE
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CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO
9. Cédula de crédito bancário. Características. 10. Cláusulas que podem ser contratadas. 11. Garantias. 12. Precedentes do STJ sobre as questões reguladas no novo diploma.
QUINTA PARTE
EXECUÇÃO
13. Simultaneidade entre ação de cobrança ou de execução e ação do devedor. 14. Honorários advocatícios. 15. Inexistência de bens. 16. Ação consignatória. 17. Lei 8009/90 (bem de família). 18. Revisão de contratos sucessivos. 19. Proagro. 20. Impenhorabilidade de bem dado em garantia. 21. Contrato de abertura de crédito. 22. Cálculo dos encargos financeiros. 23. Contratos de dívida. 24. Ofício ao Banco Central. 25. Âmbito da defesa na ação de reintegração de posse ( leasing). 26. Ineficácia da hipoteca. 27. Prisão civil do depositário: princípio da proporcionalidade. 28. Ação monitória.
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SUMÁRIOAPRESENTAÇÃO..................................................................................9
PRIMEIRA PARTE
INTRODUÇÃO.......................................................................................13
1. Objeto da relação obrigacional bancária. Conceito de contrato bancário. Crédito. Operações ativas e passivas...........13
2. Características do contrato bancário.........................................183. Espécies ...................................................................................24
SEGUNDA PARTE
PRECEDENTES DO STJ SOBRE CONTRATOS BANCÁRIOS.................31
4. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor......................315. Operações passivas. Correção monetária.
Legitimidade de parte. Aplicação em CDB e RDB..................326. Operações ativas........................................................................34
6.1. Correção monetária em crédito agrícola.........................346.2/3. SFH.................................................................................34/436.4/5. Liquidação judicial.........................................................436.6. TR...................................................................................446.7. Caderneta de poupança...................................................446.8. TBF.................................................................................446.9. Depósito de coisa fungível em garantia..........................466.10. Alienação fiduciária........................................................466.11. Alienação fiduciária e a MP no 2.160/25, de 2001.........556.12/13. Honorários advocatícios..............................................556.14/15. Multa...........................................................................566.16. Comissão de permanência................................................566.17. Preço do produto..............................................................566.18. Desvio de finalidade.........................................................566.19. Revisão judicial de contratos bancários...........................596.20. Cláusula-mandato.............................................................616.21. Aval..................................................................................61
6.22/23. Leasing............................................................................61/626.24. Factoring..........................................................................666.25. Responsabilidade civil.....................................................676.26/27. Ação civil pública.......................................................73
4
6.28. Cartão de crédito..............................................................73
TERCEIRA PARTE
JUROS.............................................................................................77
7. Juros. Conceito. Espécies. Termo inicial. Juros e perdas e danos. Taxa de juros...................................................77
8. Precedentes do STJ. Súmula 596/STF......................................82 Juros de títulos regulados em legislação especial (DL no 413/69. DL no 167/67. Lei no 6.840/80). Taxa divulgada pela Anbid. Capitalização. Revisão judicial do contrato. Taxa de juros............................................83 Juros remuneratórios, moratórios e comissão de permanência....................................................84
QUARTA PARTE
CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO....................................................95
9. Cédula de crédito bancário. Características............................9510. Cláusulas que podem ser contratadas......................................9611. Garantias..................................................................................9712. Precedentes do STJ sobre as questões reguladas
no novo diploma......................................................................98
QUINTA PARTE
EXECUÇÃO......................................................................................103
13. Simultaneidade entre ação de cobrança ou de execução e ação do devedor....................................................103
14. Honorários advocatícios..........................................................10615. Inexistência de bens................................................................11116. Ação consignatória..................................................................11217. Lei no 8.009/90 (bem de família).............................................11218. Revisão de contratos sucessivos..............................................11919. Proagro....................................................................................11920. Impenhorabilidade de bem dado em garantia.........................12021. Contrato de abertura de crédito...............................................12022. Cálculo dos encargos financeiros............................................12223. Contratos de dívida..................................................................12224. Ofício ao Banco Central..........................................................123
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25. Âmbito da defesa na açãode reintegração de posse (leasing)..........................................123
26. Ineficácia da hipoteca..............................................................12427. Prisão civil do depositário: princípio da proporcionalidade....12828. Ação monitória........................................................................129
BIBLIOGRAFIA 135
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PRIMEIRA PARTE
INTRODUÇÃO
1. Objeto da relação obrigacional bancária. Conceito de contrato bancário. Crédito. Operações ativas e passivas. 2. Características do contrato bancário. 3. Espécies de contratos bancários. Mútuo.
1. Nesta primeira parte, proponho-me a examinar o
contrato bancário a partir do seu objeto.
A relação obrigacional se estabelece entre um
sujeito ativo (credor) e um sujeito passivo (devedor) e tem por
objeto imediato uma certa prestação, que é sempre uma
conduta a ser cumprida pelo obrigado; o objeto mediato da
relação obrigacional é a coisa ou o fato prestados (Almeida
Costa, Direito das Obrigações, p. 131). De sua vez, a prestação
tem como objeto imediato a coisa ou o fato sobre que recai ou
em que se expressa a prestação. Já o contrato tem como objeto
imediato o conteúdo querido pelas partes (Espínola, Dos
contratos nominados, p. 12), isto é, a regulação dos seus
interesses pelos próprios contratantes, e como sujeito a pessoa
que se vincula contratualmente (Darcy Bessone, Do contrato,
pp. 116 e 145).
Assim, pode-se dizer que: o objeto imediato da
obrigação é a prestação (conduta); o objeto imediato da
prestação é a coisa sobre que recai, ou o fato em que se
expressa a prestação; o objeto imediato do contrato é o
conteúdo querido pelas partes. O objeto mediato da relação
obrigacional é a coisa ou o fato prestados; o objeto mediato da
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prestação é a satisfação da obrigação; o objeto mediato do
contrato é a prestação.
Para estabelecer a natureza do contrato bancário,
na perspectiva que nos interessa, deve-se precisar alguns
pontos a partir do seu objeto.
Em primeiro lugar, está a propalada dualidade entre
contratos bancários e operações bancárias. Costuma-se dizer
que estas têm abrangência maior que o contrato, pois
compreendem também atos praticados pelos bancos que não se
formalizam no contrato, como ocorre com o simples
cumprimento de ordens do cliente, e têm um sentido mais
dinâmico, sendo o conjunto de atos que se desenvolvem para
alcançar um resultado econômico, enquanto o termo contrato
nos leva mais precisamente ao acordo de vontades (Bolaffio, "Il
Codice di Commercio Commentato", I/282/283). No entanto, se
entendermos a obrigação como processo, visualizada na sua
totalidade e integrada de diversas fases, seguindo a lição de
Clovis do Couto e Silva ("A obrigação, vista como processo,
compõe-se, em sentido largo, do conjunto de atividades
necessárias à satisfação do interesse do credor", em "A
obrigação como processo", São Paulo, José Bushatsky, p. 10),
logo se conclui que as diversas condutas praticadas pelos
participantes das operações bancárias integram um processo
obrigacional que se formaliza no contrato, sejam atos
preparatórios, executivos, principais ou acessórios. Por isso,
justifica-se o uso das expressões operações bancárias e
contratos bancários como sinônimas, o que se dá tanto na
prática do mercado como na nossa doutrina e jurisprudência.
Para a classificação do contrato bancário, são
conhecidas as posições que levam em conta o elemento
subjetivo (é bancário o contrato realizado por um banco, ou,
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mais precisamente, no caso do Brasil, pelas instituições
financeiras) ou o objetivo (é bancário o contrato que realiza a
finalidade específica do banco, de intermediar o crédito
indireto).
Banco é a empresa que, com fundos próprios ou de
terceiros, faz da negociação de crédito sua atividade principal
(Nelson Abrão, Direito Bancário, p. 17). No Brasil, devemos
considerar as instituições financeiras mencionadas na Lei
4.595/94.
Não basta, porém, que participe da relação um
banco, pois, como sujeito, a empresa bancária pode firmar
contratos alheios à sua atividade principal; nem por isso deixa
de ser banco, nem o contrato pode ser incluído na espécie dos
contratos bancários. Na verdade, é preciso reunir os dois
aspectos assinalados pelas correntes antagônicas (objetivistas e
subjetivistas) para concluir que o contrato bancário se distingue
dos demais porque tem como sujeito um banco, em sentido
amplo (banco comercial ou instituição financeira, assim como
definido no artigo 7º da Lei nº 4595, i.e., caixa econômica,
cooperativa de crédito, sociedade de crédito, banco de
investimento, companhia financeira, etc.), e como objeto a
regulação da intermediação de crédito.
Crédito é um conceito que reúne dois fatores: o
tempo e a confiança. Pressupõe uma décalage entre as duas
prestações, uma atual, prestada pelo credor, e outra futura, a
ser cumprida pelo devedor. A confiança é um ato calculado e
contém também um risco (Rives-Lange et Contamine-Raynaud,
"Droit Bancaire", Paris, 1995, 6ª ed., Dalloz, p. 375). Crédito
está aqui empregado na acepção econômica: "Toda a operação
de troca na qual se realiza uma prestação pecuniária presente
contra uma prestação futura de igual natureza, ou, como
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sinteticamente diz Charles Gide, é a troca de uma riqueza
presente por uma riqueza futura. O que caracteriza o crédito,
pois, é disposição efetiva e imediata de um bem econômico em
vista de uma contraprestação futura" (Sérgio Carlos Covello,
"Notas sobre os contratos bancários", Revista de Direito Civil,
45/110).
Os negócios de crédito podem ser de moeda, de
mercadorias, etc., mas o que aqui nos interessa é o negócio de
crédito que tenha por objeto a moeda, isto é, em que a entrega
e a restituição sejam contratadas em moeda (Alcaro, "Soggetto
e contratto nell´attività bancaria", Giuffrè, p. 22 e seguintes),
que é a operação fundamental do banco, a atuar principalmente
na interposição lucrativa do crédito. O negócio bancário é uma
espécie do gênero negócio de crédito.
Há crédito direto e indireto. Para distingui-los, vale
lembrar a lição de La Lumia: "Para que o crédito possa
desenvolver-se, é indispensável que o que tem capitais
disponíveis e o que necessita deles, se ponham em relação; de
onde surge uma categoria de pessoas que se constituem
precisamente em intermediários de operações de crédito, e
desenvolvam sua atividade de duplo modo: a) às vezes, limitam-
se a aproximar o credor ao devedor, sem intervir depois no ato
estipulado por eles e realizando assim uma mera função de
mediadores: nesse caso se fala de intermediários de crédito
direto; b) mas, ordinariamente, com uma primeira operação,
tomam a crédito as somas disponíveis, constituindo-se
devedores, e com uma operação ulterior, juridicamente bem
distinta, dão a crédito as somas assim obtidas, assumindo o
papel de credores: então, são qualificados de intermediários de
crédito indireto" ("Materia bancaria e diritto bancario", Riv. Dir.
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Com., I/123). Os bancos atuam na intermediação do crédito
indireto.
Aramy Dornelles da Luz, depois de registrar que a
esmagadora maioria admite como função principal dos bancos a
intermediação no crédito, como se fossem meras corretoras de
aproximação das partes, afirma que isso definitivamente não
acontece, pois os depositantes não entregam recursos para o
fim de serem emprestados a terceiros, mas por motivos de
segurança, confiança e praticidade e distingue entre o crédito
emergente de um depósito e o que advém de financiamento
bancário: "O crédito deferido pelo banco a seu cliente
(financiado) é normalmente um crédito de mobilização, onde a
rapidez da movimentação do dinheiro produz utilidade marginal,
que é apenas potencial na moeda conservada parada e fora de
circulação. Enquanto o cliente não exercer seus direitos de
saque tem a seu favor mera disponibilidade. Já o crédito
decorrente do depósito é um crédito de provisão. Ambos são
créditos, em sentido amplo, porque contêm direito a
determinada prestação. Mas em sentido mais restrito são
créditos com diferentes características. O do depositante é
crédito a pagamento e o do contraente de empréstimo é crédito
a recebimento. Contraprestação um e prestação o outro"
("Negócios jurídicos bancários", RT, ed. 1996, pp. 43/44). Estou
de acordo com essas observações e ainda acrescento outro
aspecto que parece relevante. O banco não se limita a conceder
crédito depois de haver recebido o depósito, mas sim que o
transforma, como a indústria transforma a matéria prima, "uma
indústria especial caracterizada pela interposição do crédito
indireto" (Vicente Santos, "El contrato bancario", Universidad de
Bilbao, 1972, pp. 97/980), tanto assim que pode conceder
financiamento sem limitação ou vinculação direta às operações
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de depósito, atendidos os critérios de segurança ditados pela
autoridade financeira. O banco não apenas se interpõe no
crédito indireto, como cria o crédito: "Dando a crédito moeda
bancária, o banco pode conceder maior crédito do que recebe"
(idem, p. 140).
Na atividade das instituições financeiras, existem
operações ativas, em que a entidade fornece crédito e figura
como credora, e passivas, nas quais recebe numerário de
terceiros e assume obrigações.
Nesse ponto, retorno ao propósito inicial, que era o
de definir o contrato bancário a partir do seu objeto.
Nas operações ativas, a obrigação do banqueiro
tem por objeto imediato da relação a intermediação do crédito
(conduta), e o objeto mediato é o crédito em si, com a
disponibilização de numerário (a simples disponibilidade é um
bem econômico) ou a entrega da moeda. A prestação pode ter
por objeto imediato um fato, isto é, a intermediação do crédito
(nas obrigações de fazer, como acontece no contrato em que o
banco se obriga a conceder um financiamento ou uma garantia,
nos termos contratados) ou uma coisa, ou seja, o numerário
transferido ao mutuário. Já o contrato bancário tem o seu objeto
imediato na regulação da intermediação, e o mediato é o
crédito, com a disponibilidade ou a entrega do numerário.
Nas operações ativas, em que o banco é o credor, a
obrigação do cliente do banco consiste na obrigação de dar
(pagar os juros, tipo de prestação periódica ou de trato
sucessivo, os acessórios e o principal) e, excepcionalmente, na
obrigação de fazer (cumprir determinados programas nos
financiamentos vinculados, como acontece nos concedidos pelos
bancos de investimento).
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Nas operações passivas, como no contrato de
depósito ou de aplicações em títulos bancários (CDB, RDB, etc.),
há a especificidade de ser do banqueiro a conduta esperada
quanto ao pagamento de juros, acessórios e restituição do
capital.
Como se vê, nas relações obrigacionais bancárias, o
crédito não é o objeto imediato do contrato bancário (regulação
dos interesses), nem o é da obrigação bancária (prestação de
uma conduta), embora seja o crédito, no sentido econômico
acima referido, o cerne das operações do banco e o fator
determinante da realização dos contratos. O contrato bancário,
pelo qual o banco (empresa) exerce sua atividade fundamental
na intermediação do crédito indireto, serve como esquema
jurídico para a formalização desses negócios. A assunção das
obrigações se dá com a elaboração do contrato e a emissão de
documentos de crédito, que são os títulos cambiais da lei
comum, ou os previstos na legislação específica, como os títulos
de crédito rural, comercial ou industrial, os certificados de
depósito bancário, etc.
2. O contrato bancário apresenta algumas
características:
- É contrato comutativo. Embora o risco seja
imanente ao crédito, "praticamente inseparável deste, a ponto
de afirmar-se que em princípio não existe crédito sem risco"
(Covello, op. loc. cit.), consistindo a atividade bancária
fundamentalmente na intermediação do crédito (portanto,
atividade de risco), o contrato bancário não é um contrato
aleatório, ou de risco (para as espécies de contratos aleatórios,
ver arts. 1118/1121 do Código Civil de 1917; arts. 458/461 do
Código Civil de 2002), mas comutativo, no sentido de que as
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partes, no momento da celebração, têm conhecimento da
vantagem e do sacrifício que o negócio comporta,
diferentemente do contrato aleatório, no qual não se conhece a
quantidade da prestação e não se sabe do sacrifício que se terá
ou não de sofrer, na dependência de acontecimento futuro.
Mesmo nos contratos de financiamento da safra
agrícola, para produção e colheita de bens que poderão existir
no futuro, a obrigação do mutuário não depende da álea que a
safra representa, pois sua prestação deve ser cumprida
independentemente do resultado da colheita; o Proagro, que é o
seguro agrícola instituído pelo governo e gerenciado pelo Banco
do Brasil, é firmado entre o produtor e o segurador, sendo,
portanto, relação que não se confunde com o contrato bancário
de financiamento.
- Pode envolver operações passivas ou ativas. Como
já se viu, no desempenho de sua atividade, o banco realiza
operações em que ele é o devedor (quando o banco recebe
fundos, de que é exemplo típico o depósito), ou em que figura
como credor (mediante a alocação de recursos, de que é
exemplo mais comum o mútuo). Além disso, efetua operações
acessórias, que não significam direta intermediação de crédito,
mas sim prestação de serviços, como a cobrança de títulos,
função hoje também exercida pelas sociedades de faturização.
- As obrigações assumidas de parte a parte são
obrigações de dar, de restituir ou de fazer. A obrigação de
restituir, em que o devedor se compromete a devolver ao dono
da coisa a própria coisa ou o seu equivalente, está presente na
operação passiva de depósito, na qual o banco figura como
devedor. Corresponde ao depósito irregular de coisas fungíveis.
A obrigação de fazer surge nos contratos em que o banco tem o
compromisso de praticar atos, como o de conceder aval, fiança
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e outras garantias, a exemplo do que o art. 19, I, c, da Lei
4595/64 atribui ao Banco do Brasil. A obrigação de dar, o banco
a assume quando contrata abertura de crédito e se compromete
a efetuar pagamentos a crédito do cliente (esse contrato é
bilateral, sendo do banco a obrigação de fornecer o numerário
com ou sem fim determinado de aplicação pelo financiado, e
deste é a obrigação de pagar o valor equivalente, mais as taxas;
por isso tal contrato pode ser objeto de ação de adimplemento
ou de resolução por incumprimento, promovida por qualquer das
partes, inclusive pelo financiado).
- Prova do contrato. Os contratos bancários são
contabilizados, pois "(...) têm por objeto valores e, por isso
mesmo, exigem a realização de certos atos que permitam a
comprovação imediata da operação realizada" (Covello, op. loc.
cit.). Essa característica deve ser vista à luz do princípio de que
o direito processual atual superou o dogma probatório das
cargas estáticas para inclinar-se decididamente pela aceitação
da denominada teoria da carga dinâmica: a prova incumbe
àquele a quem é mais fácil demonstrar o fato, ou a quem, por
sua profissão, conta com os elementos para fazer essa prova, ou
a quem se prejudica com as presunções extraídas dos fatos
(Jorge Mosset Iturraspe, "Responsabilidad civil contractual o
extracontractual: ?unidad o separación?", Anais do Congresso
Internacional de Responsabilidade Civil, Blumenau/SC,
out./nov./95, p. 125). Com essa observação, conclui-se que os
bancos, sempre que solicitados, devem fornecer ao juiz os
elementos já registrados em sua contabilidade a respeito da
relação bancária litigiosa estabelecida entre o banco e seu
cliente, pois é ele, banco, quem tem melhores condições de
fazer a prova do negócio.
15
- Contrato de adesão. Muito raramente, os contratos
bancários são negociados. Na grande maioria das vezes,
celebram-se mediante a adesão do cliente (aderente) às
condições gerais do negócio, estipuladas pelo estabelecimento
financeiro. A massividade da atuação do banco, a obediência a
instruções e regulamentos governamentais, as condições
próprias do mercado financeiro, a exigir tratamento equivalente
entre as operações ativas e passivas, tudo leva à adoção de
contrato padrão para os diversos tipos de negócio, que não se
distinguem muito de um para outro estabelecimento. Para o
conceito de contrato de adesão, características, efeitos e
critérios interpretativos, remeto aos estudos especializados
(Motta Pinto, Contratos de Adesão, Revista Forense, v. 257 p.
33; Orlando Gomes, Contrato de Adesão, RT 1972; Paulo Luiz
Netto Lobo, "Condições Gerais dos Contratos e Cláusulas
Abusivas", Saraiva, 1991) e ao art. 54 do Código de Defesa do
Consumidor e seus comentadores. A posição do fornecedor do
crédito, prestador do dinheiro, é mais forte do que a do
prestatário, sendo aquele o sólido detentor do capital e do
crédito, mola mestra da atividade econômica, e este o que
necessita, com intensidade e urgência, da obtenção do crédito e
da disponibilidade do numerário. Normalmente, essa posição de
supremacia se reflete no conteúdo do contrato. Por isso, deve
ser reconhecida a preponderância da parte que estipula as
condições a serem aceitas pela outra sem discussão. A história
do prêt d'argent dos países civilizados é marcada pela vontade
constante de proteger o prestatário contra o abuso do prestador
(Dutilleul et Delebecque, "Contrats Civils et Commerciaux", p.
587). Depois de observar que deixar o banco agir livremente,
como se pretendeu no liberalismo econômico, é o mesmo que
permitir a exploração do mais fraco, concluiu Covello: é para
16
evitar esse estado de coisas que o Estado interfere na
contratação bancária por meio do BC, que emite resoluções e
circulares para disciplinar o crédito. Tenho que esse controle
administrativo das cláusulas contratuais parece ser de todos o
mais eficiente por atuar preventivamente e estender-se ao
maior número de casos. Já o controle judicial tem a
inconveniência de atuar só repressivamente e com eficácia
restrita. Aplica-se ao Brasil a observação feita por Frederic
Mahus a respeito da Alemanha: a jurisprudência dos tribunais
tem pouco impacto no uso das cláusulas gerais dos negócios
porque o ordenamento jurídico não adota o princípio do stare
decisis, não servindo as decisões da Corte como precedente
jurisprudencial, de sorte que apenas as decisões do
Bundesgerichtshof têm alguma influência, mas não substancial
("German Bank Contracts Conditions", in: The George
Washington Journal International Law and Economics, v. 20, p.
189). Isso realmente é assim e basta ver que entre as centenas
de milhares de operações bancárias realizadas diariamente no
país, apenas reduzidíssimo número é objeto de litígio judicial, e a
decisão nele proferida tem efeito de coisa julgada somente entre
as partes e para aquele negócio. Ainda são escassas as ações
coletivas previstas na lei da ação civil pública (Lei nº 7347, de 24
de julho de 1985) e no Código de Defesa do Consumidor (Lei
8078/90), mas o STJ tem afirmado a legitimidade ativa do
Ministério Público e de associações, como o IDEC, para o
ajuizamento de demandas sobre a nulidade de cláusulas abusivas
de contratos bancários (REsp 292.636/RJ, 4ª Turma, rel. o Min.
Barros Monteiro). No mesmo sentido: REsp 168.859/RJ; REsp
177.965/PR; REsp 105.215/DF. Deixo aqui registrada a decisiva
importância que devem exercer as agências administrativas no
controle do conteúdo dos contratos bancários, para garantir que
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nos milhões mensalmente celebrados e cumpridos não existam
cláusulas abusivas ou ilegais, uma vez que as reclamações
administrativas ou judiciais se contam nos dedos.
- Sigilo. O contrato bancário está fundado numa
operação de confiança entre banco e cliente, com a garantia do
sigilo: "As instituições financeiras conservam sigilo em suas
operações ativas e passivas e serviços prestados" (art. 38 da Lei
4595/64; art. 1º da Lei Complementar nº 105, de 10.1.2001).
Informações e esclarecimentos sobre tais registros somente
serão fornecidos por ordem do Poder Judiciário (art. 88, § 1º, da
Lei 4595/64 e art. 3º da Lei Complementar 105/2001) ou de
comissão parlamentar de inquérito, que tem poderes de
investigação próprios das autoridades judiciais (art. 58, § 3º, da
Constituição da República). Esse poder de investigação foi
negado ao Ministério Público em decisão do Supremo Tribunal
Federal (RECR 215.301/CE, DJ de 28.05.99).
3. Contrato bancário é aquele concluído por um
banco na sua atividade profissional e para a consecução dos
seus fins econômicos, que são crédito e serviços. A mais
importante de suas funções é a creditícia.
Na extensa gama da atividade bancária, cabe
identificar os principais contratos, que podem ser assim
classificados (tipos de contratos): contrato de moeda e crédito,
depósito e financiamento; contrato misto, de crédito e serviços
(intermediação bancária); contrato de serviços (garantia,
custódia, cofre, etc).
O contrato de depósito é o mais comum e consiste
na entrega de valores mobiliários a um banco, que se obriga a
restituir quando solicitado, pagando juros (ou interesses). É um
contrato próprio, típico, e guarda similitude com o depósito
18
irregular, mas com este não se confunde: "o depósito irregular
tem por objeto coisas fungíveis e o depositário se obriga a
restituir um bem do mesmo gênero, qualidade e quantidade do
custodiado (como acontece nos armazéns gerais, regulados pelo
Dec. nº 1102, de 21.11.1903). Esses elementos, por evidente,
podem verificar-se na relação entre o depositante de recursos
monetários e o banco, mas a instituição financeira, a partir do
contrato de depósito bancário, passa a titularizar a propriedade
dos valores depositados e não a exercer a simples custódia,
como ocorre em relação ao depositário no depósito irregular. A
relação entre o cliente e o banco, nesse contrato, é de
verdadeira fidúcia" (Fábio Ulhoa Coelho, "Manual de Direito
Comercial", p. 431). Corrente divergente sustenta ser do
depositante a propriedade do numerário, de que o banco apenas
tem a posse, mas tal entendimento não merece aplauso. Na
verdade, trata-se de duplo poder de disposição: do cliente,
sobre a parte que deposita, e do banco, sobre o total dos
depósitos de terceiros. Em época normal, o banco efetua “o
trabalho técnico com a média de disponibilidade possível”
(Pontes de Miranda, Tratado, vol. 42, págs. 372/374), o que lhe
permite girar com o numerário depositado, sem retirar do
cliente o direito à restituição imediata.
O depósito pode ser à vista, com ou sem pré-aviso,
ou a prazo fixo, remunerado ou não. Caracteriza-se por ser um
contrato real (somente se concretiza com a entrega do
numerário ao depositário), regulado pelas normas do mútuo
(art. 1280 do Código Civil de 1917; art. 645 do Código Civil de
2002).
O contrato de conta corrente é o contrato pelo qual
o banco recebe numerário do correntista ou de terceiros e se
obriga a efetuar pagamentos por ordem do cliente, pela
19
utilização daqueles recursos, com ou sem limite de crédito. Ao
contrário do contrato de depósito, que é real, o contrato de
conta corrente, que se estabelece mediante o simples acordo de
vontade, é contrato consensual.
O contrato de abertura de crédito (que Nelson
Abrão considera um contrato sui generis) é aquele pelo qual o
banqueiro (creditador) põe à disposição do cliente dinheiro,
bens ou serviços pelo tempo convencionado. Não é real, é
consensual, pois pode não haver a entrega. Segundo a maioria,
e com isso concordo, é contrato bilateral, com a fixação de
obrigações para ambas as partes, estipuladas umas em função
das outras. Pontes de Miranda, no entanto, insiste em que tal
contrato é unilateral: pela avença, o creditador obriga-se a pôr
à disposição do creditado uma certa importância, por certo
tempo, mediante remuneração. Enquanto o creditado dela não
usa, é só credor do banco. No caso de inadimplemento pelo
banco, apenas cabe indenização, pois não se pode transformar a
obrigação de fazer em obrigação de dar.
O contrato de aplicação financeira consiste na
autorização dada ao banco para que os recursos nele
depositados sejam aplicados no mercado de capitais (compra de
ações, de títulos da dívida pública, etc.), o que é feito de acordo
com a escolha do banco, no que se distingue do mandato ou da
corretagem. Contratos comuns de aplicação financeira são os
feitos para a aquisição de CDB ou de RDB (certificados ou
recibos de depósito bancário), com o direito de o aplicador
receber do banco certa remuneração, pré ou pós-fixada.
Nas operações ativas, o banco realiza diversos
negócios, sendo o mais comum o mútuo bancário, que é o
empréstimo de certa soma em dinheiro, para receber no
vencimento o capital e o juro; o desconto bancário, pelo qual o
20
banco antecipa o valor do crédito do cliente com terceiro,
recebendo o título representativo dessa dívida por endosso ou
cessão; o contrato de abertura de crédito, que consiste na
alocação de certa quantia de dinheiro à disposição do cliente
para possível utilização futura, e o cheque especial, espécie de
contrato de abertura de crédito.
Fábio Ulhoa Coelho arrola como contratos bancários
impróprios: a alienação fiduciária (o proprietário de um bem –
fiduciante - aliena em confiança a outrem, que se obriga a
devolvê-lo se ocorrerem certas condições, contrato regulado
pela Lei nº 4728/65, art. 66, hoje com a redação do Decreto-Lei
nº 911/69 e o acréscimo da MP 2.160-25, de 23.8.2001.
Caracteriza-se por permitir a alienação extrajudicial do bem e a
prisão civil do fiduciante, equiparado ao depositário infiel); o
leasing (arrendamento mercantil, com a possibilidade de o
locatário optar pela compra do bem locado; Lei 6099, de
12.9.74; Regulamento anexo à Res. 2309, de 28.8.96); o cartão
de crédito, em que a administradora emite o cartão e se obriga
a pagar o débito do titular do cartão junto ao fornecedor da
mercadoria ou do serviço, podendo o titular obter financiamento
para o pagamento à administradora, situação em que se
caracteriza uma operação bancária.
De todos esses contratos, desejo realçar apenas o
contrato de mútuo ou empréstimo bancário, seja pela
importância que tem na vida econômica de todas as pessoas,
seja porque na grande maioria dos contratos bancários existe no
fundo uma relação de mútuo.
Empréstimo é o contrato pelo qual uma pessoa
entrega a outra alguma coisa sua para que a esta sirva durante
certo tempo.
21
Empréstimo que tem por objeto coisas fungíveis
denomina-se mútuo. O empréstimo de coisas infungíveis é
comodato ("o que é dado para o cômodo e proveito do que
recebe a cousa", como estava nas Ordenações Filipinas).
As coisas fungíveis são restituídas pelo equivalente.
O empréstimo é contrato real: depende da entrega
da coisa (mútuo, depósito, comodato).
Já a promessa de emprestar não é mútuo. É um
contrato consensual, espécie de pactum de contrahendo, que é
promessa de contratar. Também no contrato de abertura de
crédito há uma promessa de fornecer numerário, mas nele já há
a disponibilidade do crédito, pelo que não é só uma promessa
de contratar.
No mútuo, a propriedade passa ao mutuário; no
comodato, não. (No depósito civil, a propriedade fica com o
depositante, apenas a posse é do depositário, e o depositante
fica com o direito de devolução).
O art. 1256 do Código Civil (art. 586 do Código Civil
de 2002) dá a definição de mútuo: "O mútuo é o empréstimo de
coisas fungíveis. O mutuário é obrigado a restituir ao mutuante
o que dele recebeu em coisa do mesmo gênero, qualidade e
quantidade". Coisas fungíveis são os móveis que podem
substituir-se por outros da mesma espécie, qualidade e
quantidade, na forma do art. 50 do Código Civil (art. 85 do
Código Civil de 2002). O mútuo bancário (prêt d'argent) é
contratado por um banco e tem por objeto a prestação de certa
soma, isto é, de certa quantidade de moeda. É um contrato real,
porque somente existe com a entrega da coisa; é unilateral,
porque apenas o mutuário assume obrigações, uma vez que o
mutuante já prestou, e suas demais obrigações são restritas a
não cobrar antes do vencimento (que é obrigação comum a
22
todos os credores e pode ser excepcionada quando for caso de
vencimento antecipado) e a eventualmente fiscalizar a aplicação
do financiamento quando isso constar do contrato celebrado
para fim específico, como acontece no sistema financeiro da
habitação, nos créditos para investimentos de interesse social,
no crédito agrícola ou industrial, etc. É oneroso, pois supõe o
pagamento de juros (ou interesses).
No mútuo, a propriedade do bem se transfere ao
mutuário, correndo por sua conta o risco da coisa. Sendo assim,
o que depois é entregue ao mutuante não é o bem dele
recebido, mas outro, o seu equivalente.
Há várias modalidades de empréstimos bancários.
Os pessoais, concedidos em função do crédito ao cliente,
normalmente para fim de consumo; os comerciais, concedidos
para a atividade de intermediação da empresa e ordinariamente
para a formação do seu capital de giro; os industriais, para o fim
de investimento ou aquisição de matéria prima ou outras
despesas próprias da atividade industrial; os agrícolas, para a
atividade agropecuária. Entre estes, distinguem-se os contratos
celebrados mediante a criação de cédulas e notas de crédito
comercial, industrial e agrícola, que podem ser pignoratícias ou
hipotecárias, reguladas pelos Decretos-Leis 167/67 e 413/69 e
pela Lei 6840/80, em que estão definidos como títulos
executivos extrajudiciais. Na cédula pignoratícia é constituído
um penhor, permanecendo os bens móveis na posse do devedor,
como depositário; na cédula hipotecária institui-se hipoteca
sobre bens imóveis. São contratos celebrados para fins
específicos, cujo cumprimento deve ser fiscalizado pelo banco
financiador. Admitem a capitalização dos juros e independem de
registro para valer entre as partes. O penhor pode incidir sobre
os bens descritos nos arts. 55 e 56 do Decreto-Lei 167/67. Os
23
bens dados em garantia não poderão ser penhorados para a
cobrança de outras dívidas enquanto não se vencer o contrato
(art. 69 do Decreto-Lei nº 167/67).
A doutrina francesa põe em relevo a necessidade
de informação ao cliente quanto aos riscos da operação e sobre
as condições do contrato (Dutilleul e Dellebecque, op. cit., p.
593). Na verdade, o consentimento informado ou esclarecido do
aderente é requisito para a validade do contrato celebrado entre
o estipulante, que tudo sabe a respeito do seu negócio, e o
cliente, que depende dessas informações para se determinar.
O mútuo atribui ao emprestador o direito ao
recebimento de juros remuneratórios. O Código Civil de 1917, no
seu art. 1262, determinou: "É permitido, mas só por cláusula
expressa, fixar juros ao empréstimo de dinheiro ou de outras
coisas fungíveis. Esses juros podem fixar-se abaixo ou acima da
taxa legal (art. 1062), com ou sem capitalização". O referido art.
1062 dispôs sobre os juros moratórios: "A taxa de juros
moratórios, quando não convencionados (art. 1262), será de 6%
ao ano". Comentando o Código de 1917 logo depois de sua
edição, assim se expressou Lacerda de Almeida: "É o Código dos
argentários, o Código da usura, o qual escancara as portas por
modo revoltante às mais reprovadas extorsões de onzenário
(veja-se o art. 1262)" (Dos Effeitos das Obrigações, ed. Freitas
Bastos, Rio, 1934, p. 8). Sobreveio o Dec.Lei 22.626/33, que
estabeleceu limites e proibiu a cobrança de "taxas de juros
superiores ao dobro da taxa legal", isto é, não podem
ultrapassar a taxa de 12% ao ano. A Constituição da República,
no art. 192, § 3º, dispôs sobre o limite de 12% ao ano para o
juro real, mas o egrégio Supremo Tribunal Federal decidiu que a
norma depende de regulamentação, de sorte que, na atividade
bancária, prevalece o enunciado da Lei nº 4595/64, cujo art. 4º,
24
IX, atribui ao Conselho Monetário Nacional a competência para
fixar a taxa de juros, as comissões e o custo dos serviços
bancários (Súmula 596/STF).
O Código Civil de 2002 tem duas disposições
principais sobre juros. No art. 591, ao dispor sobre os
remuneratórios, inverte a regra de presunção e os tem como
devidos sempre que o contrato tiver finalidade econômica, mas
os limita à taxa enunciada no art. 406, verbis: "Destinando-se o
mútuo a fins econômicos, presumem-se devidos os juros, os
quais, sob pena de redução, não poderão exceder a taxa a que
se refere o art. 406, permitida a capitalização anual". Ao versar
sobre os juros moratórios, reza o art. 406 do Código Civil de
2002: "Quando os juros moratórios não forem convencionados,
ou o forem sem taxa estipulada, ou quando provierem de
determinação da lei, serão fixados segundo a taxa que estiver
em vigor para a mora do pagamento de impostos devidos à
Fazenda Nacional". O novo diploma, portanto, permite a
convenção de juros moratórios sem definir limites, e determina
para os remuneratórios a aplicação da taxa para a mora dos
impostos devidos à Fazenda Nacional.
Em princípio, é proibida a capitalização dos juros
(anatocismo, cobrança de juros sobre juros): "É proibido contar
juros dos juros" (art. 4º do Decreto nº 22.626; Súmula 121/STF,
que continua sendo aplicada pelo STJ), permitida a capitalização
anual dos juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente
(art. 4º, segunda parte). O Código Civil de 2002 defere
capitalização anual (art. 591, última parte). De um modo geral,
é o que também ocorre em outros países. Na França, por
exemplo, é permitida a cobrança de juros sobre juros apenas
com capitalização anual, desde que exista convenção especial.
A uma taxa de 5% ao ano, o capital sem juros compostos dobra
25
ao término do prazo de vinte anos, enquanto com a
capitalização anual, bastam 14 anos. A respeito do que acontece
nos EEUU, assim discorreu o Prof. Peter Ashton: "O direito
americano não encara com benevolência, não favorece, a
cobrança de juros compostos. Há muitas decisões nesse sentido.
A regra geral adotada é no sentido de que na ausência de pacto
contratual expresso ou implícito, ou de lei expressa que autorize
a sua cobrança, juros compostos não devem ser permitidos ou
serem acrescidos no cálculo de uma dívida" ("Juros,
Especialmente Compostos", in: Direito & Justiça, Revista da Fac.
Dir/PUC/RS, vol. 12, ano X, pp. 56-63). Na Alemanha, o contrato
de anatocismo é, por regra geral, nulo (Medicus, Dieter, Tratado
de las obligaciones, vol I, p. 91; § 248, I, do BGB).
A legislação sobre crédito agrícola, industrial e
comercial admite a capitalização, o que foi reconhecido na
Súmula nº 93/STJ.
26
SEGUNDA PARTE
PRECEDENTES DO STJ SOBRE CONTRATOS BANCÁRIOS
4. Aplicação do Código de Defesa do Consumidor. 5. Operações passivas. Correção monetária. Legitimidade de parte. Aplicação em CDB e RDB. 6. Operações ativas. 6.1. Correção monetária em crédito agrícola. 6.2/3 SFH. 6.4/5. Liquidação judicial. 6.6. TR. 6.7. Caderneta de poupança. 6.8. TBF. 6.9. Depósito de coisa fungível em garantia. 6.10. Alienação fiduciária. 6.11. Alienação fiduciária e a MP 2160/25, de 2001. 6.12/13. Honorários advocatícios. 6.14/15. Multa. 6.16. Comissão de permanência. 6.17. Preço do produto. 6.18. Desvio de finalidade. 6.19. Revisão judicial de contratos bancários. 6.20. Cláusula-mandato. 6.21. Aval. 6.22/23. Leasing. 6.24. Factoring. 6.25. Responsabilidade civil. 6.26/27. Ação civil pública. 6.28. Cartão de crédito.
Refiro a jurisprudência do STJ a respeito das
questões sobre contratos bancários, naquilo que parece mais
relevante.
4. Em primeiro lugar, ficou definido que as
operações bancárias estão submetidas ao Código de Defesa do
Consumidor. De acordo com a nomenclatura usada no CDC, o
banco, por expressa disposição, é um fornecedor de serviços, e
estes consistem exatamente na intermediação do crédito. O
produto que ele oferece nessas operações é o crédito, e a coisa
que dá ou restitui é o dinheiro. A atividade bancária encontra-se
no âmbito do CDC, seja por força do que dispõe o art. 2º (a
atividade bancária é um serviço), seja por aplicação da regra
extensiva do art. 29 (o CDC regula as relações das pessoas
expostas às práticas comerciais nele previstas). Sobre isso, ver
artigo do Prof. Newton de Lucca nos Anais do Congresso
27
Internacional sobre Responsabilidade Civil, Blumenau, "A
responsabilidade das instituições financeiras nas operações de
crédito ao consumidor". O mutuário é um consumidor, não no
sentido do consumo natural, que implica o aproveitamento da
coisa com a sua destruição (alimentos), mas no conceito de
consumo civil, que compreende a utilização de coisas
destinadas a entrar em circulação (moeda). Como bem afirmou
a professora Claudia Lima Marques ("Os contratos de crédito na
legislação brasileira de proteção ao consumidor", Revista de
Direito do Consumidor, v. 17, p. 36), o mutuário é um
consumidor, regulando-se o contrato de que participa pelas
disposições do Código, seja quanto às práticas, seja quanto às
cláusulas contratuais. Também é relação de consumo a que se
estabelece entre o depositante e o depositário, quando o banco
presta serviços ao cliente e é remunerado pelo benefício que
obtém na aplicação dos recursos depositados. Nesse sentido
decidiu a Seção de Direito Privado do STJ: "- O Código de Defesa
do Consumidor (Lei 8.078/90) é aplicável aos contratos firmados
entre as instituições financeiras e seus clientes referentes à
caderneta de poupança". (REsp 106888/PR, 2ª Seção, Rel. o Min.
César Asfor Rocha)
Tramita no Supremo Tribunal Federal e já se iniciou
o julgamento da Adin em que as instituições financeiras
sustentam a inconstitucionalidade da incidência do CDC sobre
as relações bancárias.
5. Operações passivas do banco.
No tema relacionado com a correção monetária das
cadernetas de poupança em julho de 1987 (Plano Cruzado),
janeiro de 1989 (Plano Verão) e março/abril de 1990 (Plano
28
Collor), decidiu-se que a nova legislação (Decreto-Lei nº
2.335/87 e Lei nº 7730/89), ao reduzir os índices de correção em
desfavor do poupador, não incidiu sobre os contratos com data-
base anterior à vigência da nova lei, ainda que a data de
"aniversário" fosse posterior. Isto é, a remuneração
correspondente ao trintídio já iniciado na vigência da lei velha
deve ser calculada de acordo com os critérios nela
estabelecidos (REsp 281.666/RJ, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir
Passarinho Junior, DJ 16.11.2000; EDREsp 162.344/SP, 2ª Seção,
rel. a Min. Nancy Andrighi, DJ 19.03.2001).
O índice de correção em janeiro de 1989 é de
42,72%, aplicando-se o IPC (REsp 43.055/SP, Corte Especial, rel.
o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Reduzido o percentual de
70,28% para 42,72%, o credor tem o direito de corrigir, no mês
de fevereiro de 1989, pelo índice de 10,14%.
A legitimidade para responder à ação de cobrança
dessa diferença é do banco comercial, em todos os casos (REsp
299.432/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Jr), exceção
feita ao Plano Collor, quando houve a transferência dos saldos
bloqueados para o Banco Central. Nessa última hipótese, a
Segunda Seção entendeu que a legitimidade passiva não é do
banco comercial, e sim do Banco Central, para onde transferidos
os recursos. (REsp 40.516/SP, 2ª Seção, rel. o Min. Cláudio
Santos).
A questão retornou recentemente à Corte Especial,
confirmando-se o entendimento de que a responsabilidade pelo
pagamento da remuneração e da correção monetária dos saldos
das cadernetas de poupança, depois de transferidos ao Bacen
por força da Lei 8.024/90, é do Banco Central (EREsp
185.738/SP, julgamento concluído em 23.05.2002: "A Corte
Especial, por maioria, conheceu dos embargos de divergência e
29
reconheceu a legitimidade do Banco Central do Brasil para o
caso concreto"). Votei vencido, como já o fizera antes, por
entender que a transferência foi meramente escritural,
continuando os recursos a ser utilizados pelas instituições
comerciais.
A correção desses saldos foi feita, quando do
primeiro "aniversário" depois do Plano Collor, até 13 de abril de
1990, pelos bancos comerciais (onde ainda se encontravam os
recursos, já bloqueados), aplicado o IPC. Nesse momento, os
recursos da poupança foram transferidos escrituralmente ao BC,
e no segundo "aniversário", fato ocorrido a partir de 13 de abril
de 1990, a correção de responsabilidade do Bacen deve ser feita
pelo BTN, conforme decisão recente do STF (RE 206048/RS),
orientação também seguida pelas Turmas de Direito Público do
STJ (1ª Seção) e, mais recentemente, pela Corte Especial (EREsp
168.599/PR, sessão de 19.06.2002).
A denunciação da lide à União não tem sido
admitida em nenhuma dessas hipóteses, nem ao Bacen, quando
a responsabilidade é do banco comercial (REsp 41.601/SP, 3ª
Turma, rel. p/ac. o Min. Costa Leite; REsps 189.014/SP e
299.432/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Júnior).
Nas aplicações em CDB e RDB, usa-se o deflator nos
contratos com correção pré-fixada (REsp 86.282/SP, 4ª Turma,
rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira), mas não é aplicado
aos com correção pós-fixada, porquanto, após a implantação
desses planos econômicos, a inflação retornou e deve ser
considerada quando do resgate (REsp 80658/RJ, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 02.09.1996: "CDB. Correção pós-fixada.
Tablita.- Não se aplica o deflator previsto na Lei 7730/89 para
os contratos de aplicação em CDBs, com correção pós-fixada.
30
Precedente da Segunda Seção. Atualização, em janeiro de 1989,
pelo IPC de 42,72%. Recurso provido em parte").
6. Quanto às operações ativas:
6.1- O crédito agrícola, em março de 1990, por
efeito do Plano Collor (Lei nº 8024/90), deve ser corrigido pela
variação do BTN (41,28%), e não pelo IPC (84,32%), porque
estava vinculado à caderneta de poupança, que os bancos
remuneraram pelo BTNF (REsp 131.515/RS, 4ª Turma, rel. o Min.
Cesar Asfor Rocha; REsp 79.214/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Barros
Monteiro; REsp 128.938/RS, 2ª Seção, de minha relatoria).
6.2 - Na correção do saldo de financiamento para
aquisição da casa própria pelo Sistema Financeiro da Habitação,
com contratos vinculados à remuneração da caderneta de
poupança, a Segunda Seção deferiu o índice de 84,32%, porque
esse o percentual que teria sido pago pelos bancos nas
cadernetas de poupança e nos depósitos do FGTS
(REsp122.504/ES, 2ª Seção, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha). Votei
no sentido de que o reajuste das prestações dos mutuários do
SFH, na segunda quinzena de março e na primeira quinzena de
abril de 1990, deveria ser feito pelo IPC, mas o das vencidas na
segunda quinzena de abril somente poderia sê-lo de acordo com
o BTNF, pois foi esse o índice usado para a correção dos saldos
das contas de poupança transferidos ao Banco Central, recursos
que serviram para o financiamento da casa própria cuja
prestação venceu na segunda quinzena. Estando a prestação
vinculada à remuneração da caderneta de poupança, nada
justifica que os recursos usados para o financiamento concedido
antes de março de 1990 sejam remunerados pelo BTNF,
31
enquanto a prestação do SFH é corrigida pelo IPC, verdadeiro
enriquecimento sem causa.
6.3 - O tema retornou ao exame da Corte Especial,
onde se decidiu, na sessão de 1º de julho de 2002, EREsp nº
123.660/PR, por 9 a 7 votos, manter o IPC. No EREsp nº
196.841/SP, na mesma sessão, mas já alterada a composição do
órgão julgador, decidiu-se pelo BTNf, por 10 a 7 votos. Na
sessão de 4 de setembro de 2002, firmou-se o entendimento de
que se aplica o BTNf para a correção dos financiamentos
concedidos pelo SFH, no período (EREsp 268.707/RS).
Novamente, em 6 de novembro de 2002, a Corte Especial voltou
ao tema, prosseguindo o julgamento nos dias 05 e 19 de
fevereiro e 10 de abri l de 2003, quando a maioria absoluta
atribuiu aos bancos o direito de corrigirem os financiamentos
imobil iários pelo IPC de 84,32%. Votei vencido, pelos
fundamentos acima expostos, por entender que de nenhum
modo estavam superados. Com essa decisão, os bancos, que
foram desonerados da obrigação de remunerar os saldos das
cadernetas de poupança transferidos ao Bacen, saldos esses
que serviram aos financiamentos imobil iários concedidos até
aquela data, f icaram autorizados a cobrar dos mutuários o
elevado percentual do IPC, que praticamente significou a
duplicação da dívida (EREsp nº 218.426/SP).
6.4 - A correção monetária de débitos apurados em
liquidação judicial deve ser calculada pelo IPC depois da
vigência da Lei n. 8024/90 até a Lei n. 8177, de 1º.3.91, a partir
da qual aplica-se o INPC, apurado pelo IBGE, como previsto no
art. 4º da Lei 8.177 (REsp 229.632/SP, 4ª Turma).
6.5. - Admite-se a correção monetária dos débitos
(Súmula 16/STJ) como exigência do princípio da equivalência
entre as obrigações, ainda quando eventualmente se possa
32
entender que deixou de existir qualquer índice (REsp 93.479/SP,
3ª Turma, rel. o Min. Ari Pargendler).
6.6 - A TR, instituída pelo art. 1º da Lei 8.177, de
1º.3.91, quando prevista em contrato celebrado depois da
vigência dessa Lei, tem sido aplicada para a correção dos
contratos (REsp 237.302/RS, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo
Teixeira); também se permite a TR quando o contrato tiver sua
correção vinculada à remuneração da caderneta de poupança
(REsp 256.001/PR, 3ª Turma, rel. o Min. Eduardo Ribeiro; REsp
200.267/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
Não sendo esse o caso, usa-se o IPC, até a Lei 8.177/91, e o
INPC, depois disso (EDREsp 255857/PE, 1ª Turma, rel. o Min.
Milton Luiz Pereira; REsp 182354/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio
de Figueiredo Teixeira).
Sempre votei vencido ou com ressalva, pois não me
parece cabível a aplicação da TR como índice de correção, uma
vez que “a TR é reflexo do custo do dinheiro e não indicativo da
inflação, tanto que legalmente somente pode ser usada como
‘remuneração’ do capital, não para a atualização da dívida”
(REsp 249.649/RS). Se usada a TR, que embute juros, não
poderia ser aplicada nova taxa de juros, sob pena de dupla
incidência do mesmo fator.
6.7 - Os depósitos de cadernetas de poupança
devem ser corrigidos monetariamente de acordo com a TR, nos
meses de julho e agosto de 1994 (REsp 332.590/SP, 3 ª Turma,
rel. a Min. Nancy Andrighi), nos termos dos arts. 7 o da Lei 8860,
de 28 de maio de 1993, e 4 o da Lei 8880/94 (REsp 256105/SP, 3 ª
Turma, rel. o Min. Castro Filho), pois este último dispositivo não
alterou a regra de remuneração prevista no art. 7 o da Lei
8860/93 (REsp 175.676/SP, 4 ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
33
Figueiredo Teixeira). Ver, sobre isso, a Lei 8692, de 28 de julho
de 1993.
6.8 - A TBF é o novo indicador que está servindo à
atualização dos contratos bancários (Lei nº 10.192, de
14.2.2001), mas a Quarta Turma decidiu pela sua
inaplicabilidade como índice de correção, pois que prevista para
a remuneração de capital: "TBF é taxa de remuneração, não de
correção" (REsp 293794/RS, 4ª Turma, de minha relatoria). O
voto está assim fundamentado: "(...) A TBF é um índice que
indica o custo do dinheiro e por isso não pode ser usado para a
atualização dos débitos. Somar a diferença obtida com a TBF
aos juros significa anatocismo. A Taxa Básica Financeira foi
instituída pela MP 1053, de 30.06.95, cujo art. 5º assim dispôs:
'Fica instituída a TBF para ser utilizada exclusivamente como
base de remuneração de operações realizadas no mercado
financeiro, de prazo de duração igual ou superior a sessenta
(60) dias'. A mesma norma veio a ser repetida na MP 1.950, de
26.07.2000. Como se vê, é uma taxa para remunerar operações
financeiras. Tratando de regular a sua aplicação, o CMN adotou
a Resolução 2172, de 30.06.95, na qual ficou bem explícito que
servia ao cálculo da remuneração de depósitos bancários: 'Art.
2º. Os depósitos a prazo de reaplicação automática terão por
remuneração a Taxa Básica Financeira – TBF divulgada pelo
Banco Central do Brasil. Parágrafo 1º. Os depósitos poderão
receber prêmio, em função de seu prazo de permanência na
conta, na forma acordada entre as partes. Parágrafo 2º. Os
depósitos terão como aniversário o dia de abertura da conta.
Parágrafo 3º. Os depósitos farão jus a remuneração a cada
intervalo de 3 (três) meses.' E isso porque a TBF é definida a
partir da remuneração mensal das operações passivas dos
bancos: 'Art. 2º - A TBF será calculada a partir da remuneração
34
mensal média dos certificados e recibos do depósito bancário
(CDB/RDB) emitidos a taxas de mercado prefixadas, com prazo
entre 30 (trinta) e 35 (trinta e cinco) dias, inclusive.' (Res. nº
2171/CMN, de 30.06.95). Portanto, o Banco que queira cobrar a
TBF sobre suas operações ativas deve dispensar os juros. A
cobrança cumulativa, penso eu, é indevida.' "
No EDREsp 213982/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Antônio
de Pádua Ribeiro, DJ 30/04/2001, ficou decidido que "A TBF foi
instituída para ser utilizada exclusivamente como base de
remuneração e não como encargo moratório". Colhe-se do voto
do Relator: "Quanto à matéria atinente à TBF, incabível a
pretensão do agravante, na medida em que confunde
remuneração do capital com a atualização do débito. De fato, é
indubitável a existência regular da TBF, entretanto o recorrente
traz legislação (MP nº 1.053/95) que manda a taxa ser 'utilizada
exclusivamente como base de remuneração de operações
realizadas no mercado financeiro' (grifo). Sabe-se que aquilo
auferido por correção monetária não é fruto de remuneração
alguma, mas sim da própria recomposição do capital depreciado
no decurso do tempo. Assim, invocar legislação que autorize a
aplicação da TBF exclusivamente sob auspícios remuneratórios
não legitima seu uso com vistas à correção de débito."
6.9 - A questão do contrato de depósito de bens
fungíveis. Os bens fungíveis somente podem ser dados em
depósito irregular, e este se rege pelas disposições do mútuo
(art. 1280 do CCivil de 1917; art. 645 do Código Civil de 2002).
Logo, não cabe ação de depósito, nem prisão civil, quando
forem dados bens fungíveis em garantia de financiamento
bancário descumprido (REsp 287.776/DF, 4ª Turma, rel. o Min.
Barros Monteiro; RHC 11.077/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Barros
Monteiro; REsp 68.024/PR, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
35
Figueiredo Teixeira). Essa regra não se aplica aos casos em que
houver contrato de depósito - ainda que de bens fungíveis -
celebrado com armazém geral, situação regulada no Dec.
1102/1903 (AgrAG 196654/MG, REsp 50.830/PR, 4ª Turma, rel. o
Min. Cesar Asfor Rocha). No HC 14.935/MS e no REsp
432.212/RS, fiz distinções entre as diversas hipóteses, para
demonstrar que quando a coisa fungível é entregue para a
guarda como uma fase da operação de compra e venda, incide o
art. 1280 do CCivil/17 (art. 645 do CC/02).
6.10 – Julgados do STJ sobre alienação fiduciária:
6.10.1 - A prisão civil de alienante fiduciário não
tem sido admitida no STJ (EREsp 149.518/GO, Corte Especial, de
minha relatoria) porque, à luz da legislação infraconstitucional,
não se caracteriza o depósito no negócio de alienação fiduciária
em garantia;
Em alguns casos, tal o exagero dos juros cobrados,
a prisão atenta contra o princípio da dignidade da pessoa
humana, como se viu no HC nº 12.547/DF, em que a financiada
deveria passar o restante da vida transferindo toda a sua
remuneração ao credor, para pagamento dos juros do
financiamento de um táxi: “Habeas corpus. Prisão civil.
Alienação fiduciária em garantia. Princípio constitucional da
dignidade da pessoa humana. Direitos fundamentais de
igualdade e liberdade. Cláusula geral dos bons costumes e regra
de interpretação da lei segundo seus fins sociais. Decreto de
prisão civil da devedora que deixou de pagar dívida bancária
assumida com a compra de um automóvel-táxi, que se elevou,
em menos de 24 meses, de R$ 18.700,00 para R$ 86.858,24, a
exigir que o total da remuneração da devedora, pelo resto do
36
tempo provável de vida, seja consumido com o pagamento dos
juros. Ofensa ao princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana, aos direitos de liberdade de locomoção e de igualdade
contratual e aos dispositivos da LICC sobre o fim social da
aplicação da lei e obediência aos bons costumes. Arts. 1º, III, 3 º,
I, e 5º, caput, da CR. Arts. 5 º e 17 da LICC. DL 911/67. Ordem
deferida” (HC nº 12.547/DF, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ
12/02/2001).
6.10.2 - Permite-se a alienação fiduciária em
garantia de bem que já pertence ao devedor (Súmula 28/STJ);
6.10.3 - No contrato de alienação fiduciária, a mora
é ex-re (decorre do vencimento da obrigação), mas a
propositura da ação de busca depende de prévia notificação do
devedor ou do protesto com intimação regular (REsp
303.060/DF, 4ª Turma);
6.10.4 - Da notificação não é necessário conste o
valor da dívida (REsp 113.060/SP, 2ª Seção, rel. o Min. Ari
Pargendler);
6.10.5 - A entrega de correspondência com AR no
endereço fornecido pelo devedor é suficiente para ter-se por
cumprida a formalidade da cientificação (REsp 215.489/SP, 3ª
Turma, rel. o Min. Waldemar Zveiter; REsp 145.703/SP, 4ª
Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha; REsp 167356/SP, 4ª
Turma, de minha relatoria);
6.10.6 - A venda extrajudicial do bem desonera o
fiador (EREsp 49.086/MG, 2ª Seção, de minha relatoria; REsp
254.408/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro);
6.10.7 - "A venda extrajudicial do bem,
independentemente de prévia avaliação e de anuência do
devedor quanto ao preço, retira ao eventual crédito
remanescente a característica de liquidez e ao título dele
37
representativo, em conseqüência, a qualidade de título
executivo" (REsp 254.408/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Barros
Monteiro; REsp 63.392/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira; EREsp 49.086/MG, de minha relatoria);
6.10.8 - "A concessão de medida liminar em ação de
busca e apreensão de veículo automotor não se justifica se
conexamente tramita ação de consignação em pagamento
movida pelo devedor à credora, em que são depositadas as
prestações do mútuo" (REsp 166.363/PE, 4ª Turma, rel. o Min.
Aldir Passarinho Júnior);
6.10.9 - A mora somente pode ser purgada se
integralizado 40% do preço (EREsp 129.732/RJ, 2ª Seção, rel.
p/ac o Min. Ari Pargendler; REsp 193.056/RJ, 3ª Turma, rel. o
Min. Carlos Alberto Direito; REsp 264.616/PR, 4ª Turma, rel. o
Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
No julgamento daqueles embargos de divergência
(EREsp nº 129.732/RJ, votei vencido com a seguinte
fundamentação: “Um dos modos mais eficazes para evitar o
dano que decorre do descumprimento de um contrato é a purga
da mora. É ato socialmente útil, pois por ele se concretiza o
contrato; o devedor cumpre com a sua prestação e, assim,
atende ao que dele se esperava; o credor vê satisfeita a sua
pretensão assim como programada, e, para ele, nada melhor do
que isso. Para o devedor, é o meio que a lei lhe faculta de
liberar-se dos efeitos danosos que decorrem da inadimplência,
que o sujeitariam à execução forçada, multas, sanções
administrativas e bancárias, divulgação do seu nome em banco
de dados de devedores, restrição ao crédito, etc. Portanto, a
regra do art. 3º, par. 1º, do DL 911/69, exigindo o pagamento de
40% do preço financiado (ao qual se há de somar o que já foi
pago à vista e não foi financiado), constitui grave obstáculo à
38
prática de um ato que, sendo socialmente útil e conveniente
também para o credor, possibilita ao devedor liberar-se dos
danos que necessariamente decorrem do rompimento do
contrato. No caso, a perda do bem em ação de busca e
apreensão e possibilidade de conversão em ação de depósito.
Nos termos do art. 6º, inc. VI, do CDC, é direito básico do
consumidor a efetiva prevenção de danos patrimoniais e morais.
Tenho para mim que a proibição da purga da mora é causa certa
de danos decorrentes da inadimplência, de ordem patrimonial e
moral. Prevenir esses danos é um princípio do CDC, porquanto
não há nenhuma vantagem social em forçar a inadimplência e
impedir que ela seja superada. Logo, há conflito entre o
princípio que dificulta sobremaneira a posição do devedor,
impedindo-o de superar a situação de inadimplência, e o
enunciado que procura evitar e prevenir os danos que decorrem
da frustração do contrato. Além disso, o art. 53 do CDC
considera nulas as cláusulas que estabeleçam a perda total das
prestações pagas em contrato de alienação fiduciária. No caso
de persistir a mora, cuja purgação o art. 3º, par. 2º, do DL
911/69 proíbe, o bem alienado será vendido no mercado,
inexistindo previsão no art. 3º sobre a devolução das prestações
pagas. Isso significa que o devedor, impedido de purgar apenas
porque ainda não pagou 40% do preço financiado, corre o risco
de não receber as prestações pagas, embora resolvido o
negócio. Por isso, com respeitosa vênia, tenho que os acórdãos
estão em confronto e, pelo meu voto, prevalece o julgado
paradigma, que tem a seguinte ementa: ‘A exigência imposta
pelo par. 1º do art. 3º do DL 911/69 (pagamento no mínimo de
40% do preço financiado) está afastada pelas disposições
contidas nos arts. 6º, VI, e 53, caput, do CDC (Lei 8078/90)’ ”
(EREsp nº 129.732/RJ, 2ª Seção, DJ 01/08/2000);
39
6.10.10 - Na ação de busca e apreensão, pode o réu
alegar em sua defesa contrariedade à lei ou ao contrato (REsp
185.812/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha);
6.10.11 - "Não se caracteriza a mora do devedor,
para efeito de ajuizamento da ação de busca e apreensão de
bem alienado fiduciariamente, se o montante do débito e a
própria ocorrência da mora são objeto de discussão em juízo,
com o prévio aforamento de ação revisional" (REsp 227.547/RS,
4ª Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha);
6.10.12 - É possível a alienação fiduciária de bens
imóveis por acessão intelectual (REsp 255.499/MA, 3ª Turma,
rel. o Min. Carlos Alberto Direito);
6.10.13 - O adimplemento substancial do contrato
de financiamento (faltava apenas a última prestação) não
autoriza o credor a lançar mão da ação de busca e apreensão
(REsp 272.739/MG, 4ª Turma, de minha relatoria);
6.10.14 - Aplica-se o Código de Defesa do
Consumidor ao contrato de alienação fiduciária em garantia
(REsp 201.195/SP, 4ª Turma, de minha relatoria);
6.10.15 - É nula a cláusula de eleição de foro em
contrato de adesão com alienação fiduciária em garantia que
dificulta a defesa do réu, podendo ser reconhecida de ofício pelo
Juiz a sua incompetência (REsp 201.195/SP, 4ª Turma, de minha
relatoria);
6.10.16 - O equivalente a que se refere a lei (arts.
902, I, e 904 do CPC) corresponde ao valor da coisa, ou ao valor
da dívida, se este for menor (REsp 239.739/DF, 2ª Seção, de
minha relatoria; REsp 264.187/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir
Passarinho Júnior; REsp 270.235/SP, 3ª Turma, rel. a Min. Nancy
Andrighi);
40
6.10.17 - Na ação de busca, a perda da posse de
bem indispensável à atividade do devedor tem sido relegada
para o final do processo. É que a posse dos bens alienados
fiduciariamente em garantia é do alienante-devedor, que
somente a perde com a ação de busca e apreensão. Nesse caso,
permite-se a permanência desses bens com o devedor quando
indispensáveis à atividade produtiva, como máquinas
industriais, veículos de transporte coletivo, etc. (Agr/AG
225.784/RS, 3ª Turma, rel. a Min. Nancy Andrighi; REsp
228.791/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito; REsp
89.588/RS; REsp 88.941/RS; ROMS 5038/PR);
6.10.18 - A venda do bem deve ser comunicada ao
devedor (REsp 235.410/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira). No REsp 209.410/MG, 4ª Turma, de minha
relatoria, constou do voto: “Dois são os valores a ponderar: de
um lado, o interesse na pronta apuração do numerário para
pagamento do débito e a melhor oportunidade para o negócio,
que a facilidade da venda extrajudicial garante; de outro, o
interesse do devedor de que a venda seja realizada pelo melhor
preço, em operação que ele possa acompanhar e fiscalizar, o
que somente obteria na venda judicializada. Todos sabemos
que a execução judicial, com a obrigação de o juiz transformar
em dinheiro o bem a ser alienado, é um procedimento
burocratizado, oneroso e ineficiente, que descontenta a todos:
o credor, pelos custos, demora e insignificância dos valores
apurados, estando o procedimento sujeito a recursos e
impugnações de toda a ordem; o devedor, porque se vê privado
da posse e administração do bem durante longo período,
assistindo de modo passivo a sua oferta em ato de venda que
normalmente não apura metade do seu real valor. Por isso,
41
trazer para o âmbito do Judiciário a alienação dos bens dados
em garantia não assegurará melhor efeito prático, de ordem
econômica, ao devedor, pois a experiência mostra que os
valores alcançados na venda realizada no foro são muito
inferiores aos que seriam obtidos na venda direta aos possíveis
interessados, ao mesmo tempo em que prejudicaria a ação do
credor e o seu mais imediato reembolso. Aceito o pressuposto
de que a venda extrajudicial é mais eficaz, resta ponderar o
inconveniente que dela resulta, pois afasta o devedor do
acompanhamento do ato de venda que o credor realizará,
dificultando sensivelmente a defesa de seus direitos. Sabe-se
que a nova legislação do Código de Defesa do Consumidor
introduziu no nosso ordenamento princípios asseguradores da
igualdade entre as partes e da equivalência das prestações,
permitindo ao consumidor a defesa efetiva do seu interesse, em
juízo ou fora dele. O contrato de alienação fiduciária tem
diversas disposições que colocam o devedor em situação
extremamente desfavorável, como a regra que impede a
purgação da mora se não pago o equivalente a 40% do débito (o
que contraria o interesse social do cumprimento das avenças e
proíbe a uma das partes a continuidade do pagamento), a que
dá ao credor a possibilidade de, ao menor descumprimento, dar
por extinta a relação, e aquela outra que permite ao devedor
apenas a defesa fundada no pagamento, situação raramente
vista, pois é da falta do pagamento que decorre a ação. Nesse
contexto, tenho que o inconveniente da falta de fiscalização e
de acompanhamento seria eliminado se realizada a venda de
modo que pudesse ser observada pelo devedor. Ato assim
realizado seria proveitoso ao credor e asseguraria o
cumprimento do disposto no art. 6º, VII, do CDC. Posto isso,
conheço do recurso do Banco Fiat S/A, por ofensa ao disposto no
42
art. 2o, § 3º, do Decreto-Lei nº 911/69, uma vez que a venda do
bem pode ser feita por sua iniciativa e extrajudicialmente, mas
o devedor deverá ser previamente comunicado das condições do
negócio, a fim de que possa exercer, querendo, a defesa de
seus interesses perante o juiz da causa”;
6.10.19 - Não se admite alienação fiduciária em
garantia no contrato de leasing, pois "o não-dono (arrendatário)
não pode alienar fiduciariamente o bem ao que já é o dono
(arrendador)" (REsp 331.787/RS, 4ª Turma, de minha relatoria);
6.10.20 - O credor pode promover a ação de busca
e apreensão, convertida depois em depósito, e prosseguir no
mesmo processo com a execução do saldo; também pode
escolher, desde logo, o processo executivo. Mas não pode
promover, simultaneamente, em razão do mesmo débito, a ação
de busca e apreensão e o processo de execução da nota
promissória dada em garantia. (Edcl. no REsp 316.047/SP, 4ª
Turma, de minha relatoria);
6.11 - A MP 2.160-25, de 23 de agosto de 2001,
alterou o disposto na Lei 4.728, de 14 de julho de 1966, para
incluir novo artigo (art. 66-A), a fim de permitir a alienação
fiduciária em garantia de coisa fungível (art. 66-A, I) e excluir
qualquer medida judicial ou extrajudicial para a venda do bem a
terceiros (art. 66-A, § 1º). São duas regras na exata
contrariedade aos precedentes do STJ sobre dois dos temas
acima referidos.
6.12 - A cláusula sobre honorários advocatícios não
vincula o juiz, que pode estabelecer outros índices que não os
43
contratados, uma vez que a sua fixação deve atender aos
parâmetros legais.
6.13 - É abusiva a cláusula de contrato de adesão
que impõe ao aderente pagar honorários advocatícios
independentemente do ajuizamento de ação judicial (REsp
364.140/MG, 4ª Turma, de minha relatoria).
6.14 - É permitida a cobrança da multa pelo
inadimplemento (agora reduzida para 2%, por força da Lei 9298,
de 1º.8.96, que alterou o Código de Defesa do Consumidor, e
aplicável para os contratos celebrados depois de sua vigência –
REsp 261.191/PR, 4ª Turma, de minha relatoria, e REsp
235.380/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Júnior),
cumulada com a verba honorária (REsp 123.150/RS, 4ª Turma,
rel. o Min. Ari Pargendler).
6.15 - Mas a multa pela inadimplência não pode ser
cobrada quando o credor exige quantia superior à devida. No
nosso sistema, a mora só existe como ato imputável ao devedor
(REsp 82.560/SP, 4ª Turma, de minha relatoria); se este não
paga porque está sendo cobrado de valores indevidos, a
responsabilidade pela falta de pagamento deve ser imputada ao
credor; inexistindo a mora do devedor, não cabe a multa
moratória (Agr/AG 45.082/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Eduardo
Ribeiro); no crédito rural, cabe a multa, se pactuada (REsp
198.243/RS, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
6.16 - São inacumuláveis a correção monetária e a
comissão de permanência (Súmula 30/STJ).
44
6.17 - Inexistindo lei, não se admite a correção da
dívida agrícola pelo mesmo índice de alteração do preço do
produto (REsp 61.787, 3ª Turma, rel. o Min. Eduardo Ribeiro;
REsp 200.267/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo
Teixeira).
6.18 - Não há nulidade por desvio de finalidade
quando a cédula de crédito rural destina-se a renovar crédito da
mesma natureza (operação "mata-mata") (REsp 132.730/RS, 3ª
Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito).
No REsp 46.601/RS, votei em sentido contrário, mas
a posição ficou vencida: “A cédula rural pignoratícia e
hipotecária não é um titulo comum de mútuo, mas documento
que expressa negócio bancário com características especiais,
assim como previstas no Dec. Lei 167/67, entre elas se
destacando a possibilidade de cobrança de taxas e comissões da
fiscalização (art. 80); multa pela demora (art. 71); o
inadimplemento importa o vencimento não só da cédula rural
como de todos os demais financiamentos concedidos pelo credor
(art. 11); podem ser objeto de penhor os bens elencados no
artigo 56; os bens objeto de penhor ou hipoteca não poderão ser
penhorados, arrestados ou seqüestrados por outras dívidas (art.
69): é permitida a capitalização mensal de juros (Súmula
93/STJ). O financiador que se utiliza desta cédula de crédito
para finalidade diversa do financiamento da atividade rural não
está participando de uma simulação inocente, mas obtendo do
devedor um documento de crédito de especial eficácia, pelo
qual passa a desfrutar de situação mais forte e privilegiada em
relação ao contrato comum de financiamento. Diz-se que se
trata apenas de novação de dívida preexistente. Mas a
abstração do título assim obtido não me permite conhecer a
45
natureza e o montante dos negócios anteriores, excluindo da
fiscalização judicial o exame dessa operação e das condições
impostas para a renovação do negócio. Sendo um contrato
contrato de adesão, e já caracterizada a inadimplência do
devedor, é fácil concluir pela reduzida capacidade de
negociação de que dispõe o financiado, e são conhecidos os
índices de taxas e comissões normalmente impostas em tais
situações. Com isso quero dizer que a cédula rural resultante
desse desvio é um negócio feito exclusivamente para a
satisfação do interesse do financiador, garantindo-o não só da
dívida vencida e ora renovada, - pois esta, se também
resultante de cédula rural tinha as mesmas garantias,- mas lhe
permitindo embutir no novo negócio as suas comissões, de tal
sorte que não se pode afirmar, diante do documento
apresentado com a inicial, quanto daquele valor foi
efetivamente aplicado na atividade produtiva, e quanto
representa o interesse do financiador. Mas, ao fim e ao cabo,
tudo passa a gozar das mesmas garantias do Dec. Lei 167/67,
graças à ‘simulação inocente’. Reconhecido lisamente que a
cédula em execução serviu à novação de dívida anterior, mas
que foi criada como se vinculada a uma operação de compra de
gado para criação, não posso deixar de concluir estar diante de
um documento falso. Não creio que os princípios de moralidade
e transparência que presidem o ordenamento jurídico permitam
que tais negócios sejam celebrados livremente, deixando o
Banco de lado os muitos instrumentos de que já dispõe para
garantia de sua atividade, passando a usar confessadamente de
um documento falso, onde embutiu os acréscimos resultantes do
inadimplemento anterior. É certo que o devedor também
participou do embuste, mas é irrecusável a situação de
inferioridade em que se encontrava quanto à escolha do modo
46
de pagamento da dívida vencida. O comum é que aceite o que
lhe é apresentado, pois o seu âmbito de escolha é quase
nenhum. Não estou negando o dever de pagar, mas não
consinto ao credor o uso de documentos criados falsamente
para melhor se garantir do seu crédito” (4ª Turma, DJ 17/10/94).
Questão assemelhada tem sido proposta com títulos
emitidos pelos associados para financiamento de aquisição de
quotas de cooperativas, com o que se transfere para o
agricultor o débito da entidade: “2. No mérito, examinando os
fatos da causa, muito especialmente as circunstâncias que
cercaram a emissão dos títulos em cobrança, o r. acórdão, de
lavra do em. Juiz Franco de Godoi, bem destrinçou a demanda:
‘Demonstrou-se, nos autos, concludentemente, que a Nota de
Crédito Rural destinou-se a financiar o executado para
integralizar sua cota-parte de capital para o saneamento
financeiro da Cooperativa Agrícola Mista da Colônia
Riograndense da qual fazia parte (fl. 35). Fato que o Banco do
Brasil confirma, demonstrando a validade da emissão da cártula,
juntando aos autos a Circular nº 1.307, de 30.03.88, do Banco
Central (fl. 116). Na verdade o que ocorreu foi a emissão da
Nota de Crédito Rural para o empréstimo feito pelo exeqüente à
Cooperativa, desviando-se totalmente dos fins do Decreto-lei nº
167/67. Amador Paes de Almeida preleciona que: 'De âmbito
restrito, como já se acentuou, os títulos de crédito rural obrigam
o emitente a comprovar sua efetiva aplicação no financiamento
e exploração de propriedades rurais' (Teoria e Prática dos
Títulos de Crédito - 16ª ed. nº 82 e segs. - Saraiva - 1997 - São
Paulo). É demonstração clara e evidente que tais títulos,
denominados de investimento, destinam-se exclusivamente ao
financiamento de atividades rurais, objetivando suprir de
recursos os produtores. Trata, o caso sub iudice, do que a
47
jurisprudência gaúcha denomina de 'financiamento rural
fictício', destinado a caucionar dívida de cooperativa ou
obtenção de recursos para tirá-la de situação ruinosa,
caracterizando desvio de finalidade do título. A jurisprudência
colacionada pelo executado tem plena adequação ao caso
concreto! O próprio título traz em si a eiva da nulidade ao
explicitar a finalidade para o qual foi emitido! Agiu, pois, com
acerto o MM. Juiz a quo ao nulificá-lo! Deverá a entidade
bancária buscar no ordenamento jurídico o remédio adequado à
sua pretensão. A indigitada circular do Banco Central não tem a
força suficiente para revogar o disposto no Decreto-lei nº
167/67, pelo princípio da hierarquia das leis’ (fl. 157). 3. Este é
mais um dos muitos recursos que têm chegado a este Tribunal
em que se observa o desvio de finalidade do crédito rural, feito
a título de aquisição de quotas de cooperativas, mas na verdade
servindo para transferir aos cooperativados as dívidas da
entidade junto ao banco ora recorrente. O expediente é
contrário à lei, não presta homenagem à moral e é causa de
grave dano aos pequenos produtores rurais, que assumem uma
dívida bancária que não é sua, com todos os ônus daí
decorrentes. A melhor doutrina afasta a legalidade do uso do
crédito rural para aquisição de quotas de cooperativas:
‘Especificamente quanto aos títulos de crédito rural, possuem
eles uma finalidade demarcada: a utilização do dinheiro nas
atividades agrárias. Pensar que adquirir quotas de uma
cooperativa é investir em atividades rurais significa desvirtuar o
espírito de toda a legislação elaborada. Os dispositivos da
regulamentação própria são feridos, como o art. 2º do Dec.
58.380, de 1996, ao ordenar que 'o emitente da cédula fica
obrigado a aplicar o financiamento nos fins ajustados, devendo
comprovar essa aplicação no prazo e na forma exigidos pela
48
instituição financeira'. O parágrafo único, letra b, do art. 14
afasta da função do crédito 'financiar pagamento de dívidas
contraídas antes da apresentação da proposta' (Arnaldo
Rizzardo, Contratos de Crédito Bancário, p. 287)’ (fl. 215).
Porém, ainda que assim fosse permitido, na verdade a operação
retratada nos autos destinou-se a caucionar a dívida da
cooperativa (acórdão, fl. 157), ou, como bem explicaram os
recorridos: ‘Em realidade, o cooperado, agora recorrido, limitou-
se apenas a assinar a nota de crédito rural (inclusive, em
branco, sem preenchimento dos valores), na condição de que a
cooperativa aumentasse o seu capital social através da
subscrição de quotas. Porém, tratava-se de uma 'armação,' uma
fraude (o que era escondido pela Diretoria, mas, o
banco/recorrente sabia disto). Assim, se estas condições não se
realizam, a nota de crédito rural não se perfaz. Se não há
aumento de capital (pois, a destinação, ou melhor a finalidade
de o empréstimo era saldar dívida da cooperativa, junto ao
recorrente) e, como de fato não chegou a ocorrer a subscrição
de quotas e muito ao menos efetivou-se a sua integralização,
não se consuma a causa da obrigação cartular, pelos diversos
vícios de ilegalidade absoluta’ (fl. 218). O acórdão ficou assim
ementado: “Crédito rural. Cooperativas. Quotas. Financiamento.
Desvio de finalidade. Constitui desvio de finalidade a criação de
títulos de crédito rural para a aquisição de quotas de
cooperativas. No caso, segundo reconhecido no r. acórdão,
tratava-se de expediente para pagamento de crédito do banco
exeqüente junto à cooperativa” (REsp nº 363613/SP, 4ª Turma,
de minha relatoria, julgado em 12/11/2002).
49
6.19 - Revisão judicial dos contratos: o devedor que
pagou o débito pode pedir a revisão das cláusulas consideradas
abusivas.
Assim consta da fundamentação do voto que proferi
no REsp 293.778/RS, 4ª Turma, julgado em 29.5.2001: "Não é
pelo fato de cumprir com a sua prestação prevista em contrato
de adesão que o obrigado fica proibido de discutir a legalidade
da exigência que lhe foi feita e que ele, diante das
circunstâncias que avaliou, julgou mais conveniente e prudente
cumprir, para depois vir a Juízo discutir a legalidade da
exigência. Se não for assim, estará sendo instituída uma nova
condição da ação no direito contratual: ser inadimplente. O
princípio, se aceito, seria um incentivo ao descumprimento dos
contratos, condição de acesso ao Judiciário. Além disso,
submeteria o devedor à alternativa de pagar e perder qualquer
possibilidade de revisão, ou não pagar e se submeter a todas as
dificuldades que decorrem da inadimplência. Especificamente,
em se tratando de cumprimento de obrigações bancárias em
geral, previstas em contrato de adesão com garantias e
sanções, entre as quais se incluem a prisão civil, a expropriação
forçada de bens dados em garantia e a inscrição em bancos de
dados de inadimplentes, é muito comum e até recomendável
que o devedor efetue o pagamento da sua prestação, para
evitar os males conhecidos e que não são poucos, mas isso não
poderá significar a perda do direito de discutir a validade da
exigência feita." (Ver, também, o AG. 389312/RS, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 30.10.2001).
No mesmo sentido o REsp 337.361/RS, 4ª Turma,
rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 13.11.2001: (...)
"Não fosse por isso, o cumprimento de contrato bancário não
50
afasta a possibilidade de discussão judicial de eventuais
ilegalidades. Conforme assinalado no REsp 230.559-RS (DJ
17.11.99), 'o direito a declaração de invalidade de cláusula
contratual não se extingue com a prestação nele prevista, pois
muitas vezes o obrigado cumpre a sua parte exatamente para
poder submeter a causa a juízo, ou, o que é mais freqüente,
para evitar o dano decorrente da inadimplência, com protestos,
registros no SPC, SERASA e outros efeitos. Por isso, não há
razão para limitar o exercício jurisdicional na revisão de
contratos, especialmente quando a dívida, que é no último
reconhecida, ou que serve de ponto de partida para o cálculo do
débito, resulta da aplicação de cláusulas previstas em contratos
anteriores, em um encadeamento negocial que não pode ser
visto isoladamente, apenas no último contrato. Portanto, não
tem razão o banco quando pretende estreitar o âmbito da
revisão judicial.' "
A eventual repetição do que foi pago a mais não
depende de prova de que houve erro, pois a regra do art. 965
do Código Civil somente se aplica quando o pagamento a maior
consistiu em consciente liberalidade do devedor feita ao credor,
o que não acontece nesse tipo de relação (REsp 184.237/RS, 4ª
Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha; REsp 187.717/RS, 3ª
Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito; REsp 200.267/RS, 4ª
Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; REsp
176.459/RS, 4ª Turma, de minha relatoria).
Os contratos já findos podem ser revisados,
especialmente quando integrantes de uma sucessão de
contratos celebrados para a renovação do débito (renegociação,
termo de confissão de dívida), de tal forma que o saldo cobrado
é o resultante de sucessivas renovações, com inserção de
cláusulas que podem ser abusivas (REsp 132.565/RS, 4ª Turma,
51
rel. o Min. Aldir Passarinho Jr.; REsp 294.444/RS, 4ª Turma, de
minha relatoria);
A novação não elimina a nulidade de cláusula
abusiva usada para calcular o débito (REsp 132.565/RS, 4ª
Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Júnior; REsp 250.111/SP, 4ª
Turma, de minha relatoria).
6.20 - A cláusula-mandato, pela qual o credor fica
com poderes para criar documento de dívida contra o devedor
sem que este tenha condições de definir o valor da dívida, é
considerada nula (Súmula 60/STJ).
6.21 - "O aval é garantia que se constitui em título
cambial, não em contrato bancário; neste, a garantia pode ser a
fiança, não o aval" (REsp 255.139/PR, 4ª Turma, de minha
relatoria).
6.22 - Leasing é novo tipo de contrato pelo qual
quem pretende se utilizar de determinado bem fora do seu
patrimônio consegue que uma instituição financeira o adquira
para arrendar ao interessado por certo tempo, com a
possibilidade de o arrendatário, findo o prazo, optar pela
devolução do bem, pela aquisição do bem, mediante o
pagamento de um preço residual previamente fixado, ou por
renovar o contrato. Pressupõe um vendedor (ou fabricante), um
adquirente (que é o financiador) e o interessado (arrendatário).
O preço do arrendamento compreende o custo da compra, o
custo do financiamento, o lucro do financiador e a correção
monetária a partir do vencimento da prestação. Possui três
modalidades: o operacional, em que o propósito é só arrendar,
com a vontade de reaver; o financeiro, cujo propósito principal é
52
o de financiar, não o de receber de volta - é o que mais tem sido
praticado no mercado, para o financiamento de máquinas,
equipamentos e veículos (automóveis e ônibus), e o leasing
back, em que o proprietário aliena o bem à companhia de
leasing e permanece com a posse, na condição de arrendatário.
A matéria é regulada na Lei 6.099/74 e na Res. CMN 2309/96.
6.23. Precedentes do STJ sobre o leasing:
6.23.1 - VRG. A antecipação do VRG descaracteriza
o contrato de leasing, que deve ser considerado como de
compra e venda, sendo incabível a ação de reintegração de
posse (Agr. nos EDREsp 230.239/RS, 2ª Seção, rel. a Min. Nancy
Andrighi; REsp 243.764/RS, 3ª Turma, rel. a Min. Nancy
Andrighi; REsp 296.997/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir
Passarinho Júnior; REsp 189.412/GO, 4ª Turma, rel. o Min. Cesar
Asfor Rocha; Agr. 286.332/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira; REsps 218.041/RS, 234.437/RS e
243.213/RS, 4ª Turma, de minha relatoria; Lei 6.099, de
12.9.74; Lei 7.132, de 26.10.83).
Súmula 263, da 2 ª Seção: “A cobrança antecipada
do valor residual (VRG) descaracteriza o contrato de
arrendamento mercantil, transformando-o em compra e venda a
prestação.”
No REsp 188.145/RS, assim fundamentei o voto: “2.
O leasing financeiro, modalidade de que se trata, ‘consiste no
negócio jurídico bilateral pelo qual uma das partes,
necessitando utilizar um determinado bem, procura uma
instituição financeira para que promova a compra do mesmo
para si e, posteriormente, lhe entregue em locação, mediante
uma remuneração periódica, em geral, no seu somatório,
53
superior a seu preço de aquisição. Ao final do prazo contratual,
via de regra, surgem três opções para o locatário: a de tornar-se
proprietário mediante o pagamento de uma quantia, a de
renovar a locação por um valor inferior ao primeiro período
locativo ou a de devolver a coisa locada.’ (BENJÓ, Celso. O
leasing na sistemática jurídica nacional e internacional. In
Revista Forense, abril – maio – junho de 1981, p. 15) 3. A opção
de compra tem sido definida como ‘um fator de máxima
importância na caracterização do leasing financeiro’ (op. cit. p.
17). Isso porque, esclareceu o il. Prof. Penalva Santos, ‘com boa
razão, no parágrafo único do art. 10, a Resolução (nº 351/75)
capitulou que o exercício da opção, em desacordo com o
disposto no caput do artigo, ou seja, antes do término da
vigência do contrato (rectius: da opção) será considerado como
de compra e venda a prestação. A ratio de tal dispositivo tem
por finalidade evitar a prática de expediente como uma simples
compra e venda mascarada de arrendamento mercantil.’
(SANTOS, J. A. Penalva. Leasing. In Revista Forense, abril – maio
– junho de 1975. p. 48) 4. A Lei nº 6.099, de 12.09.74, alterada
pela Lei nº 7.132, de 26.10.83, dispondo sobre o leasing,
estabelece no seu art. 5º que os contratos de arrendamento
mercantil conterão, entre outras disposições, a cláusula de
‘opção de compra ou renovação de contrato, como faculdade do
arrendatário’. No art. 11, § 1º, a lei dispõe que ‘a aquisição pelo
arrendatário de bens arrendados em desacordo com as
disposições desta Lei será considerada operação de compra e
venda a prestação’. 5. Além das razões de ordem fiscal que
levaram o legislador a manter a opção de compra, com o
pagamento do valor residual, como uma das características do
contrato de leasing operacional, existem outras duas a
considerar: (a) O negócio do leasing fica sem causa, isto é,
54
desaparece a razão do negócio se o arrendatário paga
integralmente o preço do bem no curso da execução do
contrato, uma vez que a finalidade básica do leasing financeiro
é ‘sempre o financiamento de investimentos produtivos’ (Fabio
Konder Comparato, Contrato de Leasing, Forense, 250/10) e não
a compra e venda, sendo que a existência de uma promessa
unilateral de venda por parte da instituição financeira serve
para diferenciá-lo da locação e da compra e venda a crédito
(idem); (b) O arrendatário perde com a inclusão na prestação
mensal da parcela correspondente ao valor residual, pois
desembolsa antecipadamente aquilo que pagaria apenas no
caso de exercer uma das três opções que a lei lhe reserva, ao
final do contrato. E isso lhe pode ser ainda mais prejudicial na
medida em que tal parcela serve para compor o valor da
prestação mensal, sobre o qual incidirão juros e outros
acréscimos. E a inadimplência, que resulta do não-pagamento
da prestação mensal assim composta, terá graves reflexos na
economia do contrato, com possibilidade de perda da posse do
bem, embora uma parte do valor impago constitua cobrança
antecipada do que somente seria exigível a final. Uma
conseqüência dessa cobrança antecipada é que se elimina a
opção de compra, pois essa é a única alternativa que resta a
quem já pagou antecipadamente o preço. O em. Ministro José
Augusto Delgado, ao considerar a hipótese de ser imposta ao
arrendatário a obrigação de aquisição, com eliminação da
opção, assim se manifestou: ‘Tenho a cláusula que impõe
obrigatoriedade do exercício de tal manifestação (compra) como
leonina. Não se pode deixar de considerar que essa opção deve
ser entendida como em harmonia com os interesses negociais
do arrendatário, inclusive de suas condições financeiras. A
imposição do arrendador viola o princípio da livre manifestação
55
e o da razoabilidade negocial’ (Leasing, Doutrina e
Jurisprudência, Juruá, 1997, p.128). Disso tudo extraio a
conclusão de que estava acertada a sentença ao julgar
desfigurado o contrato de leasing, nos termos do art. 11 da lei
especial” (4ª Turma, DJ 02/08/99).
A questão foi depois submetida à Corte Especial,
uma vez estabelecida a divergência com julgados das Turmas da
Primeira Seção, que apreciam a questão fiscal e entendem
persistir a figura do leasing ainda quando houver o pagamento
antecipado do VRG. Por maioria, decidiu-se que a antecipação
do VRG não descaracteriza o contrato de leasing. Com isso,
f icou implicitamente revogada a Súmula nº 263/STJ (EREsp nº
286.649/RS, rel. originário o Min. Milton Luiz Pereira; rel. para o
acórdão o Min. César Asfor Rocha).
6.23.2 - Correção cambial. A Terceira Turma
decidiu, no julgamento do REsp 268.661/RJ, rel. a Min. Nancy
Andrighi, que o valor da dívida não pode ser corrigido pela
variação cambial depois da desvalorização da moeda ocorrida
em janeiro de 1999, devendo ser aplicado índice interno de
correção, segundo a teoria da imprevisão. Na Quarta Turma,
decidiu-se que os prejuízos decorrentes da súbita
desvalorização da moeda, por decisão governamental, devem
ser repartidos igualmente entre as duas partes, acolhendo-se,
assim, o posicionamento do Ministro Ari Pargendler, que ficara
vencido na Terceira Turma. Foi o seguinte o voto que proferi:
“Sr. Presidente, a 3ª Turma tem examinado essas questões -
havendo uma certa divergência quanto às soluções encontradas
- e proferido diversos julgamentos em sentido diverso desse que
V. Exa. está propondo. Pondero que, naquele momento, havia a
garantia oficial de que a taxa de câmbio tinha estabilidade. Em
função disso, as pessoas estavam sendo levadas a contratar em
56
dólar. A mudança da política governamental, alterando a taxa,
colheu de surpresa o mercado, muito mais o leigo do que
propriamente a instituição financeira que atua e tem
conhecimento das peculiaridades e dos riscos desse mercado.
Daí por que o fato novo, que consistiu na mudança da taxa de
câmbio, deve influir na interpretação do contrato, e não me
parece justo que as conseqüências caiam por inteiro sobre uma
das partes, nem sobre o banco financiador, nem sobre o
financiado. Na doutrina, existe uma teoria que explica situação
como essa, a sustentar que, diante de fato novo que atinge a
todos - uma força maior proveniente de alteração da política
governamental, por exemplo -, deve-se repartir entre os
contratantes os ônus dessa incidência, da qual não podem fugir.
Por isso, penso que é mais razoável e mais justo, diante da
novidade do desequilíbrio da balança e da brusca elevação da
taxa cambial, onerando excessivamente a prestação, que se
deva repartir meio a meio o custo dessa mudança. Nesse ponto,
estou acompanhando o voto que proferiu na 3ª Turma o Sr.
Ministro Ari Pargendler. Conheço do recurso e dou-lhe parcial
provimento nesses termos, data venia” (Voto no REsp nº
401021/ES, 4ª Turma). Depois disso, seguiram-se os seguintes
esclarecimentos: “Sr. Presidente, não estou examinando, porque
não foi proposto, o tema relacionado com a existência da prova
da obtenção dos recursos no exterior. E também não estou
examinando a questão de ter sido ou não realizado um contrato
de hedge para proteção do banco que trouxe o recurso do
exterior, porque, se estivessem presentes essas duas situações,
votaria de modo diverso. Gostaria, ainda, de fazer a seguinte
ressalva: embora seja inerente ao contrato de leasing com
recursos no exterior, que esses recursos tenham vindo do
exterior, não é inerente ao contrato de leasing que ele seja feito
57
com recursos externos, ou seja, é possível um contrato de
leasing atrelado a qualquer índice, inclusive à variação cambial.
Se houver a captação de recurso no exterior, muito bem. Se não
houver, a correção deve ser por índice interno. E isso é
facilmente comprovável, porque o Banco Central dispõe desses
dados. São estas duas ressalvas que gostaria de fazer: 1) é
indispensável a comprovação da aplicação de recursos obtidos
no exterior; 2) havendo hedge, nesse caso não seria de se
deferir a correção cambial, porque significaria obter o banco,
dos dois lados, a mesma vantagem. No mais, mantenho o meu
entendimento” (REsp nº 401021/ES, 4ª Turma).
No que diz com a exigência de prova de aplicação
de recursos externos para o financiamento do contrato de
arrendamento mercantil, entende-se que “...cabe à arrendadora
o ônus da prova de captação específica de recursos
provenientes de empréstimo em moeda estrangeira, quando
impugnada a validade da cláusula de correção pela variação
cambial. Precedentes: REsp 370598-RS, REsp 343.617-GO, AG
430.393-RJ” (Decisão no AG nº 474.341/MT, DJ 04/12/2002).
6.23.3 - "A execução do inadimplemento do leasing
deve ser feita sobre o patrimônio do devedor e não por via de
ação penal por apropriação indébita" (RHC 7913/SP, 6ª Turma,
rel. o Min. Fernando Gonçalves).
6.23.4 - "A ausência de interpelação prévia ao
devedor, para a sua constituição em mora, nos contratos de
arrendamento mercantil (leasing), enseja a impossibilidade
jurídica do pedido de reintegração de posse do bem" (REsp
261.903/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
6.23.5 - "Como acolhido em inúmeros precedentes
da Corte, deferida a liminar, as máquinas apreendidas em ação
de busca podem permanecer na posse da arrendatária,
58
'enquanto tramita o processo, até o momento da alienação
definitiva' " (REsp 228.202/PR, 3ª Turma, rel. o Min. Carlos
Alberto Direito).
6.23.6 - Não se admite a capitalização dos juros no
leasing (REsp 258647/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro).
6.23.7 - "A jurisprudência do STJ é no sentido de
que a cláusula de depósito é inadmissível no arrendamento
mercantil, o que traz como conseqüência o incabimento da ação
de depósito nele fundada" (REsp 259.750/SP, 4ª Turma, rel. o
Min. Aldir Passarinho Júnior).
6.23.8 - Com a devolução do bem, as prestações a
serem pagas são apenas as vencidas (REsp 253.717/ES, 3ª
Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito), não as vincendas
(REsp 236.699/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Waldemar Zveiter).
6.23.9 - Aplicam-se ao contrato de leasing as
disposições do Código de Defesa do Consumidor (REsp
293.440/RJ, 4ª Turma, de minha relatoria).
6.23.10 - O tribunal pode conhecer de ofício, nos
embargos de declaração ao julgamento da apelação, da questão
sobre a carência da ação de reintegração de posse, ao
fundamento de que a antecipação do VRG descaracteriza o
contrato de leasing (REsp 426.273/SP, Quarta Turma, rel. o Min.
Sálvio Figueiredo Teixeira).
6.23.11 - Aplica-se, na ação fundada em contrato de
leasing, a regra da inversão do ônus da prova prevista no CDC
(REsp 383.276/RJ, 4ª Turma, de minha relatoria).
6.23.12 – Sobre a ação de reintegração de posse,
ver adiante, 5ª Parte, nº 25.
6.24 - A empresa de factoring não é instituição
financeira e por isso não pode cobrar juros acima da taxa
59
legalmente permitida (REsp 119.705/RS, 3ª Turma, rel. o Min.
Waldemar Zveiter). Na verdade, embora não indicado na lei
como instituição financeira, "o factoring significa uma espécie
de concessão de crédito", como assinala Medicus ("Tratado de
las Relaciones Obligacionales", I/654). Nele, uma parte (o
factor) recebe créditos (normalmente ainda não vencidos) da
outra parte (cliente) e os paga imediatamente, e assim
proporciona liquidez ao cliente. Há o factoring genuíno, quando
o factor recebe definitivamente o crédito, ainda que depois se
mostre incobrável, e o factoring impróprio, em que há simples
antecipação, pois, se o crédito não for cobrado, o cliente deverá
reembolsar.
6.25 - Dos casos de responsabilidade civil do banco
pela celebração de contrato bancário (responsabilidade
contratual) ou pelo desempenho de sua atividade, ainda que
independentemente de contrato (responsabilidade
extracontratual), são mais freqüentes os seguintes:
6.25.1 - "O banco endossatário, que recebeu por
endosso traslativo duplicata sem causa e a levou a protesto,
posteriormente sustado em ações promovidas pela empresa
sacada, responde pelos encargos da sucumbência juntamente
com o endossante" (AGA 142.225/SP, Quarta Turma, rel. o Min.
Barros Monteiro). No mesmo sentido: "O banco que recebe por
endosso duplicata sem causa e a leva a protesto responde pelo
dano ao indicado devedor e pelas despesas processuais com as
ações que o terceiro foi obrigado a promover, ressalvado o
direito do banco de agir contra o seu cliente " (REsp 327.828/MG,
Quarta Turma, de minha relatoria).
60
6.25.2 - "O banco que recebe em operação de
desconto duplicatas sem causa age com negligência e corre o
risco do seu negócio, sendo por isso parte legítima na ação de
cancelamento do protesto movida pelo sacado, perante quem
responde solidariamente com o emitente ou endossante, pelos
danos, custas e honorários, ressalvado seu direito de regresso ."
(REsp 263.541/PR, Quarta Turma, de minha relatoria).
6.25.3 - "Em que pese a existência de precedentes
da Corte em outra direção, a Terceira Turma consolidou
entendimento de que se o banco não se cercou das devidas
cautelas ao remeter a protesto duplicata sem causa, deve
responder pelos ônus da sucumbência" (AGREsp 242.346/SP,
Terceira Turma, rel. o Min. Waldemar Zveiter). No mesmo
sentido: AGA 235.041/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Menezes Direito).
6.25.4 - "O banco que recebe por mandato a
incumbência de efetuar a cobrança de duplicatas sem causa, se
não demonstrar ter recebido ordem do emitente para levar o
título a protesto, responde pelo dano que daí resulta para o
terceiro" (REsp 333.913/SP).
6.25.5 - Em alguns julgados, há referência ao fato
de o banco ter sido previamente avisado da inexistência de
causa, da falta de entrega da mercadoria ou da prestação do
serviço, da falsidade do documento ou do desfazimento do
negócio a que se refere a duplicata levada a protesto ou a
registro em banco de dados de devedores inadimplentes
(EdREsp 185.269/SP; REsp 56.554/RS; REsp 178.424/RS). Não
me parece, porém, que esse conhecimento prévio seja
indispensável à procedência da ação de indenização ajuizada
por terceiro, alheio ao negócio, que tem o direito de ser
reparado do dano que lhe decorreu do equívoco da atividade
bancária, pelo qual responde quem a exerce. O risco do negócio
61
de quem recebe sem o devido cuidado duplicata sem causa não
pode ser transferido a terceiro, que sozinho sofre os efeitos da
indevida criação do título. Também não impressiona a
necessidade de proteção do direito de regresso do endossatário,
porquanto tal exigência somente se põe quando se tratar de
duplicata, e duplicata sem causa não é duplicata, na lição de
Waldemar Ferreira transcrita no voto que proferi no REsp
331.359/MG: “2. Tocante à condenação do Banco a indenizar o
recorrido pelo indevido protesto de título, tenho como
incensurável a tese acolhida pelo egrégio Tribunal de Alçada de
Minas Gerais. Na verdade, há de se reconhecer a
responsabilidade da instituição bancária que recebe para
desconto duplicata sem causa e a leva a protesto contra a
pessoa que nenhuma relação tem com a sacadora. Quem assim
age, sem verificar suficientemente a legitimidade da operação,
corre o risco da sua atividade e deve reparar o prejuízo que
causa a terceiros. A alegação de que são milhares as operações
realizadas diariamente não exime o banco, pois o dano da
pessoa atingida continua existindo; a informação, no entanto,
serve para mostrar a quantidade de ofensas que são assim
praticadas diariamente, a maioria impune. Também não
prevalece a escusa de que tinha o banco a necessidade de
resguardar seus direitos, porquanto isso não pode se dar à
conta e às custas de terceiro que não participa da relação; ele
apenas deve ter ressalvados esses direitos contra o endossante.
O entendimento que lança todo o dano sobre o terceiro - alheio
ao negócio, que nada ganha com o exercício da atividade
bancária – sob o fundamento de que o endossatário tem o
direito de protestar o título, desconhece a realidade do prejuízo
causado a essa pessoa e apenas se preocupa com a proteção
do interesse do banco no exercício da sua lucrativa atividade, a
62
qual foi exercida sem o elementar cuidado de certificar-se da
legitimidade da operação. Se isso é difícil de ser efetivado,
quem tem de correr o risco é o banqueiro, que lucra com o
desconto, não o terceiro. Cito os julgados: ‘O banco que recebe
por endosso, em operação de desconto, duplicata sem causa,
responde pela ação de sustação de protesto e deve indenizar o
dano dele decorrente, ressalvado seu direito contra a
endossante. A pessoa jurídica pode sofrer dano moral pela
ofensa à sua honra objetiva’. (REsp 195.842/SP, de minha
relatoria, DJ 29/03/1999)” ....”3. Vale lembrar a lição de
Waldemar Ferreira: ‘Deverá a duplicata, em rigor, circular
acompanhada da respectiva fatura, até ser aceita e assinada
pelo comprador. Não cause estranheza o asserto. Não se
espante ninguém com ele. Não se espante porque o Código
Penal, no art. 172, houve como crime de duplicata simulada,
expedir duplicata que não corresponda à venda efetiva de
mercadoria, entregue real ou simbolicamente, com a fatura
respectiva. Ora, duplicata simulada não é duplicata, e não é
precisamente porque é simulada. Logo, não se aplicam à
duplicata que não é duplicata de fatura de mercadoria
efetivamente vendida e realmente entregue com a respectiva
fatura, que é a única de que cuida a Lei... Moeda falsa é moeda
simulada. Duplicata sem causa é duplicata falsa. Eis por que
emissão desta se capitula entre os crimes de estelionato’
(Instituições de Direito Comercial, 3/2/448). Portanto, não se
aplica à duplicata sem causa o disposto no art. 15 da Lei das
Duplicatas, que autoriza o banco a protestar o título exatamente
porque essa previsão é para as duplicatas com causa, não para
os títulos falsos, cuja emissão é crime descrito no Código Penal.
Quem negocia com títulos falsos, simulados, objeto material de
crime, não pode causar dano a terceiro, que nenhuma relação
63
teve com tal negócio, sob a alegação de que está a proteger os
seus interesses, uma vez que os interesses protegidos na lei são
apenas os legítimos, isto é, os que decorrem de título causal
que corresponda à duplicata de uma efetiva operação de
compra e venda ou prestação de serviço. O dano do banco deve
ser reparado por quem lhe causou o prejuízo, o emitente do
título falso, mas sem causar novo dano ao terceiro alheio ao
fato, porque em relação a este não há interesse legítimo do
banco a resguardar. 4. Ainda convém referir certa prática, que
permite às empresas emitir boletos como se fossem títulos, ou
como se fossem avisos do banco, enviados aos supostos
devedores e depois aos cartórios de protesto, sem que exista
uma causa real. A situação tem cada vez maior importância na
medida em que se massifica, como descrita por Ermínio
Amarildo Darold, em “Protesto Cambial”, Juruá, págs. 26/28”.
6.25.6 - SPC. Serasa. "Responsabilidade civil.
Banco. Dano moral. A indevida inscrição do devedor, pelo
banco, nos cadastros do SPC ou da Serasa, acarreta indenização
por dano moral." (REsp 242.181/PB. 3ª Turma, rel. o Min. Pádua
Ribeiro).
Porém, a falta de comunicação ao devedor, de
inscrição no SPC de dívida existente, deve ser atribuída a quem
administra o banco de dados, não ao banco comercial (REsp
442.483/RS, 4ª Turma, Min. Barros Monteiro).
6.25.7 - Cheque. "A restituição indevida de cheque
sem fundos acarreta a responsabilidade de indenizar
razoavelmente o dano moral correspondente, que prescinde da
prova de prejuízo (REsp 53.729-MA)" (REsp 251.713/BA, Quarta
Turma, rel. o Min. Barros Monteiro).
6.25.8 - Talão. "O banco é responsável pela entrega
do talonário de cheques ao correntista de forma eficaz e segura,
64
de modo que se opta, como atração à captação da clientela,
pelo seu fornecimento diretamente no domicílio, pelo correio,
atrai para si os ônus da imperfeição do serviço, quando o
documento é desviado por terceiro antes de chegar às mãos do
destinatário e utilizado por fraudadores que utilizaram a cártula
para aquisição de bens junto ao comércio, que, não pago,
apresentou os títulos a protesto contra o nome do correntista"
(REsp 332.106/SP, Quarta Turma, Min. Aldir Passarinho Júnior).
6.25.9 – Cheque em cobrança. "Extraviada a cédula
(cheque) por culpa do banco encarregado da cobrança, é devida
a indenização" (REsp 94.754/DF, 3ª Turma, rel. o Min. Costa
Leite).
6.25.10 - Talão. "O banco agiu com negligência ao
entregar os talonários de cheques a pessoa indevida e, ainda,
ao efetuar o desbloqueio dos talões desviados, facilitando o
pagamento de cheques falsamente emitidos" (AGA 268.459/SP,
3ª Turma, Rel. o Min. Menezes Direito). No mesmo sentido:
"Reconhecida no acórdão a culpa do estabelecimento bancário
pela abertura de conta e fornecimento de talonário de cheques
a quem se apresentava com identidade falsa, o que veio a
causar prejuízos ao titular, responde o banco pelos prejuízos
materiais e morais daí decorrentes" (REsp 77.117/SP, 4ª Turma,
de minha relatoria).
6.25.11 - Talão. Pagamento de mercadoria. "Falta
de diligência do banco na abertura de contas e entrega de
talonário a pessoa que se apresentava com documentos de
identidade de terceiros, perdidos ou extraviados. Reconhecida a
culpa do estabelecimento bancário, responde ele pelo prejuízo
causado ao comerciante, pela utilização dos cheques para
pagamento de mercadoria" (REsp 47.335/SP, 4ª Turma, de
minha relatoria).
65
6.25.12 - Talão. "Pode a instituição financeira
responder pelos danos sofridos por comerciante, quando esse,
tomando todas as precauções, recebe cheque como forma de
pagamento, posteriormente devolvido pela instituição financeira
por ser de talonário furtado de dentro de uma de suas agências"
(REsp 56.502/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio Figueiredo
Teixeira).
Reconheceu-se culpa concorrente entre o banco e o
comerciante quando este, sem os cuidados recomendados,
recebeu cheque de talão furtado de dentro do estabelecimento
bancário (REsp 435.230/RJ, 4 ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira).
6.25.13 - Cartão magnético. "Saque que teria sido
feito com cartão enviado pelo banco e extraviado pelo correio.
Falta de prova de que o saque fora efetuado pelo correntista
com o segundo cartão por ele recebido. Responsabilidade do
banco reconhecida com base em matéria de fato" (REsp
210.371/AP, Quarta Turma, de minha relatoria).
6.25.14 - Cartão magnético. Retirada em caixa
eletrônico, mediante utilização de cartão magnético e da senha
pessoal, ambos em poder do cliente. Para se eximir da
responsabilidade, basta ao banco provar que o saque foi feito
com o uso daquele cartão, e não que o cliente, pessoalmente,
efetuou o saque. (REsp 417.835/AL, 4ª Turma, rel o Min. Aldir
Passarinho Júnior).
6.25.15 - "Cartão de crédito. Clonagem. A
administradora de cartões de crédito responde pela falta de
segurança dos serviços que presta" (AGR 277191/RJ, 4ª Turma,
rel. o Min. Ari Pargendler).
66
6.25.16 – Cartão de crédito. É cabível ação de
prestação de contas contra administradora de cartão de crédito:
"A administradora deve prestar contas sobre o modo pelo qual
exerce o mandato que lhe concedeu o usuário para obter
financiamento no mercado a fim de financiar as vendas a
prazo." (REsp nº 387.581/RS, 4º Turma, de minha relatoria).
6.25.17 - Caixa 24 Horas. "O banco é parte legítima
para responder pelo pedido de indenização decorrente de ato
ilícito praticado em uma de suas dependências. Se é procedente
ou não o pedido, vai depender de exame de circunstâncias
concretas dos autos" (REsp 286.176/SP, 3ª Turma, rel. o Min.
Menezes Direito).
6.25.18 - Cofre. "Os bancos depositários são, em
tese, responsáveis pelo ressarcimento dos danos materiais e
morais causados em decorrência do furto ou roubo dos bens
colocados sob sua custódia em cofres de segurança alugados
aos seus clientes, independentemente da prévia discriminação
dos objetos guardados nos mesmos. A comprovação do efetivo
depósito dos bens alegadamente roubados, bem como da
ocorrência de dano moral ao lesado deverão, em todas as
hipóteses específicas, ser objeto de apreciação nas instâncias
ordinárias, em conformidade com as peculiaridades fáticas de
cada caso. Danos material e moral tidos por comprovados pelo
Tribunal de origem" (REsp 333.211/RJ, 4ª Turma, rel. o Min.
César Asfor Rocha).
6.25.19 - Cofre. "Ao alugar cofres, o banco se
compromete a propiciar segurança, mesmo em relação a roubo.
Hipótese em que, entretanto, teve-se como não demonstrado
que a cliente tivesse guardado os objetos que mencionou" (REsp
151.060/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Eduardo Ribeiro).
67
6.25.20 - Há responsabilidade civil do banco pelo
não-cumprimento de contrato de financiamento (REsp
107.313/PR, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ 17.03.1997).
Assim votei, na parte que interessa: "Acertada, portanto, a
conclusão a que chegou a instância ordinária, quanto à dispensa
de prova sobre a existência de descumprimento do contrato e
do dano dali resultante, fatos não contestados pelo réu... Além
disso, requereu a condenação do réu nos danos que especificou
na inicial, cuja existência foi admitida, cabendo estabelecer, em
liquidação de sentença, o seu valor".
6.26 - O Ministério Público pode promover ação civil
pública tendo por objeto a nulidade de cláusulas de contratos
bancários (REsp 175.645/RS, 4ª Turma, de minha relatoria). No
mesmo sentido, com fundamentação exaustiva, o REsp
292.636/RJ, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro. No REsp
440.617/SP, consta levantamento dos precedentes sobre a
legimitimidade do MP para a ação civil pública.
6.27 - "A instauração de investigação preliminar
para apurar as práticas abusivas dos estabelecimentos
bancários, principalmente no que diz respeito com juros
abusivos, não afeta a garantia do sigilo bancário " (REsp
207.310/DF, 6ª Turma, rel. o Min. Vicente Leal).
6.28. Cartão de crédito. A egrégia Terceira Turma
não tem deferido taxa de juros superior a 12% em favor de
companhia administradora de cartão de crédito, por não ser
instituição financeira. Reproduzo, parcialmente, três ementas de
acórdãos relatados pelo Min. Menezes Direito (I) “ ... 1.
Considerando o acórdão recorrido que a administradora de
68
cartão de crédito não é instituição financeira, fundamento
suficiente para mantê-lo íntegro, não cuidou a recorrente de
prequestionar os dispositivos que apontou violados...” (REsp nº
325297/RS, DJ 01/04/2002). (II) “... 1. Estando o acórdão
recorrido amparado na abusividade dos juros e na falta de prova
da equivalência entre os juros praticados e aqueles da captação,
a parte recorrente somente poderia ter êxito se os dois
fundamentos estivessem especificamente enfrentados no
especial, o que não ocorre neste feito...” (REsp nº 355401/RS, DJ
02/09/2002). (III) “... 1. Mesmo que se admita a configuração da
empresa administradora de cartão de crédito como instituição
financeira, o que não é o pensamento do Relator, no caso, o
especial não pode ser conhecido porque permaneceu intacta a
fundamentação do Acórdão recorrido sobre a nulidade da
cláusula-mandato, sobre a ausência de prova das fontes e
índices de captação dos aportes utilizados no financiamento, e,
principalmente, sobre o desconhecimento do usuário das
condições do negócio. ...” (REsp nº 399353/RS, DJ 02/09/2002).
Como na Quarta Turma há decisões divergentes
(REsp 202.373/RJ, rel. o Min. Barros Monteiro), o tema
atualmente está sendo julgado na Seção de Direito Privado
(REsp nº 450.453/RS).
Prestação de contas. A administradora, como
mandatária do titular do cartão, deve prestar contas do modo
pelo qual exerceu o mandato e obteve financiamento para
despesas diferidas: “No contrato celebrado pelo titular do cartão
de crédito com a sua administradora, recebe esta um mandato
para obter no mercado o financiamento das aquisições feitas
com pagamento diferido ou para suportar eventual
inadimplência do devedor. Portanto, o mandante e usuário do
cartão pode pretender conhecer de que modo foram cumpridos
69
os poderes outorgados ao mandatário para a obtenção do
financiamento, uma vez que esse custo lhe será repassado. Não
sendo a administradora uma instituição financeira, não pode ela
cobrar juros além da taxa legal. Logo, é indispensável o
conhecimento do que ela pagou às instituições financeiras a
título de juros, para que se saiba quais as parcelas que integram
o débito lançado à conta do usuário: o que é remuneração de
serviço da administradora e o que corresponde a juros pagos a
terceiros. No caso dos autos, o autor está pretendendo a
prestação de contas exatamente sobre essa questão, direito que
tem diante da administradora, sua mandatária, de acordo com a
legislação civil. Ainda que não fosse por esse fundamento, teria
o usuário o direito de ser informado, nos termos do Código de
Defesa do Consumidor, sobre os termos em que está sendo
executado o seu contrato, e muito especialmente dos custos que
lhe estão sendo repassados, valores e origem. Segundo o CDC, é
direito básico do consumidor ser adequadamente informado
sobre o serviço, característica, composição, qualidade e preço
(art. 6º, III). Além disso, deve ser facilitada a defesa dos seus
direitos (inc. VIII), o que somente pode exercer eficazmente se
receber prestação de contas da administradora” (REsp
387.581/RS, 4ª Turma, de minha relatoria).
Parcelas incluídas na conta cobrada pela
administradora. Recentemente, foi iniciado o julgamento de
recurso especial em que se examinava a segunda fase da
ação de prestação de contas feita pela administradora, cuja
instrução permitiu conhecer o modo pelo qual é calculado o
débito do usuário, com a cumulação de três parcelas, que,
somadas, elevam a prestação mensal em mais de 10%. Assim
votei: “1. Na segunda fase da prestação de contas, f icou
comprovado que a administradora cobra do seu cl iente as
70
seguintes parcelas: a) juros, correspondentes ao
financiamento obtido no mercado, a taxas variáveis de 2% a
3% ao mês, conforme contratos que trouxe aos autos por
valores globais (não específicos para cada um dos usuários,
mas que serviram para o financiamento dos cartões de
crédito), sendo de observar que a taxa cobrada do usuário é
ordinariamente superior (em média, 1%) ao que foi
contratado pela administradora; b) taxa pelo serviço de
financiamento, de 4%, depois elevada para 4,15%, sobre o
valor do débito; c) taxa de 4% pela garantia do pagamento,
depois elevada para 4,15%, cobrada pela administradora
porque assumira, com o banco, o compromisso de resgatar o
f inanciamento. A cláusula contratual que interessa para o
nosso caso tem a seguinte redação: .. . ‘10.5 - A CREDICARD
informará, mensalmente e sempre que necessário, através
da FATURA MENSAL,o percentual máximo dos ENCARGOS
CONTRATUAIS a ser cobrado do TITULAR, os quais se
compõem de parte fixa e determinada pela CREDICARD
(remuneração pela garantia prestada e pelos serviços de
administração do financiamento) e parte variável
representada pelo CUSTO DO FINANCIAMENTO’. Isso fica bem
explicitado com a reprodução da planilha de fl . 58:
PRESTAÇÃO MERCANTIL
Custo de captação Custo Aval Serviço de captação
71
DATA % R$ R$ % R$ % R$
05/10/97 2,41 50,81 11,76 4,0 19,53 4 19,53
05/11/97 2,53 41,23 9,91 4,0 15,66 4 15,66
05/12/97 2,48 22,26 5,12 4,15 8,57 4,15 8,57
05/01/98 3,11 27,23 7,42 4,15 9,91 4,15 9,91
05/02/98 3,66 33,62 10,29 4,15 11,67 4,15 11,67
05/03/98 3,11 31,76 8,66 4,15 11,55 4,15 11,55
05/04/98 3,67 51,78 15,88 4,15 17,95 4,15 17,95
72
2. Como se vê, a questão de saber se a companhia
administradora de cartão de crédito é instituição financeira,
e por isso autorizada a cobrar juros sem limites, ou se não o
é, e por isso devem os juros por ela cobrados manter-se no
l imite de 12%, é uma falsa questão, ou melhor, é questão
irrelevante para o julgamento dos l it ígios entre os titulares
de cartão de crédito e a administradora, quanto aos
percentuais cobrados. Isso porque ela não cobra juros,
apenas os repassa, e exige, isto sim, comissões de oito ou
mais por cento, o que eleva o seu crédito aos níveis
conhecidos. 3. A administradora, para o caso de pagamento
parcelado do valor da compra, pode ser autorizada pelo
usuário a celebrar contratos de financiamento com as
instituições bancárias. Não vejo nessa cláusula nenhuma
abusividade, porquanto é uma alternativa úti l ao interesse
das duas partes. Poderá ser abusivo o seu uso, se a
administradora repassar mais do que paga, ou se contratar
com os bancos taxas mais elevadas do que as praticadas no
mercado; mantendo-se nesse l imite, pode usar do mandato
para contratar o f inanciamento. Esses juros não são
cobrados pela administradora a seu benefício, senão apenas
repassados ao usuário. Logo, o repasse é legítimo, desde
que se mantenha no l imite do contratado com os bancos.
Também não há necessidade de um contrato específico para
o financiamento de cada titular de cartão: é de admitir-se
que a administradora tenha contratos com valores globais, a
servirem de guarda-chuva para os financiamentos
individualizados. 4. A primeira questão está em saber se a
administradora pode legitimamente cobrar comissões de
4.15%, a título de garantia, e de mais 4,15%, pelos serviços
de financiamento, num total de 8,30%, previstas na cláusula
73
10.5, acima transcrita. Tenho que a falta de indicação do
quantitativo no contrato, estipulação que fica ao exclusivo
arbítrio da administradora, constitui cláusula potestativa,
cuja nulidade está prevista no art. 115 do CC/17,
reproduzida no art. 122 do atual Código Civil , uma vez que
‘sujeita o negócio jurídico ao puro arbítrio de uma das
partes.’ Também observo que a administradora em nenhum
momento comunicou ao seu cl iente a composição das
parcelas embutidas na cobrança mensal, tanto que apenas
com a prestação de contas judicial é que tais aspectos
ficaram esclarecidos. Violou-se aí o dever de informação
imposto ao fornecedor de serviço, que deveria ter revelado
ao consumidor o modo pelo qual compôs a dívida cobrada. 5.
Disso tudo concluo ser l ícito à administradora repassar ao
cl iente o valor das taxas dos juros por ela contratados com
instituições financeiras para o financiamento das obrigações
com pagamento diferido, no l imite das taxas médias
constantes dos contratos de financiamento globais. Porém,
não me parece esteja legitimada a cobrar comissões por
serviços nos quantitativos que ficaram ao seu puro arbítrio,
em valores e critérios não estipulados no contrato e sem a
devida informação ao cl iente” (REsp nº 486.011/RS, de
minha relatoria).
74
TERCEIRA PARTE
JUROS
7. Juros. Conceito. Espécies. Termo inicial. Juros e perdas e danos. Taxa de juros. 8. Precedentes do STJ. Súmula 596/STF. Juros de títulos regulados em legislação especial (DL 413/69. DL 167/67. Lei 6840/80). Taxa divulgada pela Anbid. Capitalização. Revisão judicial do contrato. Taxa de juros. Juros remuneratórios, moratórios e comissão de permanência.
7. Deixei para apreciar em separado a questão dos
juros.
Juro é o fruto do dinheiro. É o que o credor recebe
do devedor, além da importância da dívida. "Entende-se por
juros o que o credor pode exigir pelo fato de ter prestado ou de
não ter recebido o que se lhe devia prestar" (Pontes de Miranda,
Tratado, 25/15).
Hoje, porém, não significa apenas o fruto civil do
capital, pois passou a ser importante instrumento de política
monetária, juntamente com o câmbio, o comércio exterior e a
regulação da moeda e do crédito, servindo para controlar o
fluxo financeiro.
Para o cálculo dos juros, considera-se o custo de
captação do dinheiro, a sobretaxa do banqueiro, a
desvalorização da moeda e, por fim, os riscos operacionais,
pois, quanto maior a possibilidade de inadimplência, maior o
risco. "O crédito de juros nasce a determinado momento,
periodicamente, como se pingasse da quantia devida, sem a
diminuir" (Pontes, op. loc. cit.). No Brasil de hoje, com as taxas
praticadas, o pingo se torna maior que o balde após alguns
meses de juros capitalizados. “De acordo com o relatório ‘Juros
75
e Spread Bancário no Brasil’, elaborado pelo BC, o spread está
composto por: 16% pela inadimplência; 19% por despesas
administrativas; 29% por impostos; 36% pela margem líquida do
banco. Margens de lucro tão elevadas garantem os lucros
astronômicos dos bancos brasileiros, muito acima da média
mundial” (editorial da Folha de São Paulo, 6.2.2003, A/2). Como
se vê, a alegação corrente de que o spread é elevado por causa
da inadimplência não procede, pois a sua maior parcela, quase
o triplo, corresponde ao lucro; reduzido o quantitativo deste,
certamente seria menor o índice de inadimplência. Nos países
em que é menor o índice de inadimplência, é significativamente
menor o percentual do lucro.
Os juros restauratórios são os devidos pelo dano
emergente e pelo lucro cessante. É o que o mutuante recebe por
ser privado do dinheiro. É o caso do que vende o que tem para
obter capital e emprestar. Nesse ato, surge para o titular do
capital um dano emergente (a perda da disponibilidade do bem
imóvel). Se o prédio rendia aluguel, sofre ainda a perda do lucro
cessante.
Juros compensatórios, remuneratórios ou lucrativos
são devidos em razão do empréstimo mesmo, e não do dano
emergente ou do lucro cessante. Este é o que figura no contrato
bancário.
Juros moratórios – ou punitivos – correspondem à
pena pela morosidade ou tardança no pagamento do principal.
Pode não haver juros compensatórios e pactuarem-se
moratórios.
A cobrança dos juros quando proibida, ou a sua
exigência em excesso, caracteriza a usura. Pecunia non parit
pecuniam, diziam os romanos, pois o dinheiro é estéril. Assim,
se há transferência da propriedade do capital, não poderia
76
haver pagamento pelo seu uso. Porém, na verdade, há o
trespasse de propriedade, e esse é o fato econômico que gera o
direito ao juro. O juro não foi incentivado por Cristo: emprestai,
sem esperar por isso nada, o que levou a Igreja a ser contra a
sua cobrança (Encíclica de 1745: juro é ilícito, somente poderia
ser recebido como decorrência de pacto adjeto). Com mais rigor
foi atacado o anatocismo: Roma o proibia, sob o argumento de
que, se o credor não cobrou os juros, não poderia capitalizar.
Em muitos países, pode-se capitalizar de ano em ano; em
outros, em períodos semestrais. Na Espanha antiga, permitia-se
no prazo de um ano.
Os juros remuneratórios são devidos desde o
trespasse; os moratórios - que correspondem à indenização pela
inadimplência nas obrigações de dar (ou pagar), por ato
imputável ao devedor - fluem a partir do momento em que se
caracteriza a mora. Importante, pois, definir em que momento
ela ocorre.
O nosso direito tem regras bem específicas: na
obrigação positiva e líquida, a falta de pagamento no termo
constitui em mora o devedor; não havendo termo, a mora se
constitui mediante interpelação (art. 960 do CC/17; art. 397 e
seu § único do CC/2002). De acordo com o art. 1533 do CC/17
(disposição que não se repete no CC/2002, mas serve
igualmente para a formulação do conceito), “Considera-se
líquida a obrigação certa, quanto à sua existência, e
determinada, quanto ao seu objeto”. Na obrigação negativa -
que pouco interessa ao nosso exame -, a mora se dá quando é
praticado o ato. Na obrigação ilíquida, decorrente do
descumprimento do contrato, a citação válida constitui em mora
o devedor (art. 219 do CPC). Na obrigação por ato ilícito
absoluto (art. 159 do CC/17; art. 186 do CC/2002), considera-se
77
o devedor em mora desde o fato (art. 962 do CC/17; art. 398 do
CC/2002), isto é, o valor da indenização pode ser apurado a
final, mas a mora é desde antes.
Quanto aos juros pela mora, são eles contados
desde o vencimento, na obrigação positiva e líquida, com termo
certo, ou desde a interpelação, sem termo; desde o fato ilícito
absoluto, na indenização pelos danos (Súmula 54/STJ); desde a
citação inicial, nos demais casos (art. 1536, § 2 o, do CC/17; art.
405 do CC/2002), na ação principal ou na cautelar preparatória.
O CC/17 tinha regra para a hipótese de ilícito
absoluto, para determinar que os juros a serem pagos pelo autor
do fato (apenas por ele, não por seu preponente ou empregador,
Súmula 186/STJ) não são apenas lineares, mas capitalizados
anualmente (juros compostos) (art. 1544 do CC/17, sem
correspondente no CC/2002).
No sistema brasileiro, as perdas e danos, nas
obrigações de pagamento em dinheiro, consistem nos juros da
mora e custas (art. 1061 do Código Civil). O Código Civil de
2002 permite a cobrança de mais uma parcela, a título de
perdas e danos, quando insuficiente a verba dos juros (art. 404,
parágrafo único). A Quarta Turma já deferiu perdas e danos,
além dos juros moratórios, contra seguradora que deixou de
pagar em tempo a indenização do seguro, causando dano ao
segurado, que ficou impossibilitado de retomar suas atividades.
É o caso do REsp 285.702/RS, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ
20.08.2001, assim ementado: "Seguro. Inadimplemento da
seguradora. Lucros cessantes. Cabimento. - A seguradora é
obrigada ao pagamento da indenização dos danos provocados
por sinistro contemplado na apólice, nas condições contratadas.
Porém, se do descumprimento do contrato pela seguradora
surgem danos ao segurado, que por isso fica impossibilitado de
78
retomar suas atividades normais, por esse dano provocado pelo
seu inadimplemento responde a seguradora. Deferimento de
parcela que, nas instâncias ordinárias, foi definida como sendo
de lucros cessantes. Recurso não conhecido."
Portanto, pela obrigação de dar, cabíveis os juros;
pelo descumprimento do contrato, a indenização por perdas e
danos. Também se concedeu indenização pelo dano moral
decorrente de constrangimento imposto ao segurado pela
demora no pagamento (REsp 257.036/RJ, 4ª Turma, de minha
relatoria).
Segundo o Código Civil de 2002, para os juros
moratórios convencionados, não há limitação legal; quando não
convencionados, ou convencionados sem taxa, ou provenientes
da lei, “serão fixados segundo a taxa que estiver em vigor para
a mora no pagamento dos impostos devidos à Fazenda
Nacional” (art. 406). Os juros remuneratórios, ainda que
convencionados, não podem exceder esse limite (art. 591 do
Código Civil de 2002).
Já o Dec. 22.626, de 7.4.1933, vedara estipulação
de juros em taxas superiores ao dobro da taxa legal, que era de
0,6%, ao tempo (art. 1º). Pelo mesmo diploma, proibiu-se contar
juros de juros. Essa proibição não compreende a acumulação de
juros vencidos aos saldos líquidos em conta corrente de ano a
ano (art. 4º). Há quem faça uma distinção: juro de juro é o juro
do juro ainda não vencido; capitalização é a incorporação do
juro vencido ao capital, e esta seria permitida. Não me parece
que a regra do art. 4º, referindo-se a juros de juros, tenha
adotado tal tese, pois apenas ressalvou os juros vencidos na
conta corrente de ano a ano, pelo que se entende que os outros
vencidos não podem ser incluídos no capital para o cálculo dos
juros. Pela mora, a Lei de Usura admite que os juros contratados
79
sejam elevados de 1% e não mais (art. 5º). A Lei 4.595/64
delegou ao Conselho Monetário Nacional a fixação dos limites
dos juros (sobre esse ponto e o disposto no CC/2002, ver acima:
Primeira Parte, n. 3).
O Código Civil em vigor não mais limita os juros
legais em 6% a. a. (como estava no art. 1062 do CC/17), e
remete à taxa em vigor para a mora do pagamento dos impostos
federais (art. 406/CC 2002). Portanto, hoje em dia, à falta de
outro índice deferido pelo CMN, a taxa legal passou a ser a
prevista no art. 406 do CCivil. Tem sido lembrada para esse fim
a Selic, que serve à remuneração dos títulos do Tesouro, fixada
periodicamente pelo Copom. Na Jornada de Direito Civil,
promovida pelo Conselho da Justiça Federal, Brasília, 11 a 13 de
setembro de 2002, foi aprovado enunciado em sentido contrário:
“A taxa de juros remuneratórios a que se refere o art. 406 é a
do art. 161, § 1o, do CTN, ou seja, 1% ao mês (‘§ 1º - Se a lei
não dispuser de modo diverso, os juros de mora são calculados
à taxa de 1% ao mês’). A utilização da taxa Selic como índice de
apuração dos juros legais não é juridicamente segura, porque
impede o prévio conhecimento dos juros; não é operacional,
porque seu uso será inviável sempre que se calcularem somente
juros ou correção monetária; é incompatível com a regra do art.
591 do novo CC, que permite apenas a capitalização anual dos
juros, e pode ser incompatível com o art. 192, § 3 o, da CF, se
resultar em juros reais superiores a 12%” (enunciado
apresentado pelo Des. Francisco Moesch). Não há manifestação
do STJ sobre o novo tema.
8. Os precedentes do STJ sobre juros podem ser
assim resumidos:
80
8.1 - Os juros bancários ficam sempre subordinados
ao determinado pelo CMN, órgão competente para, nos termos
da Lei 4.595/64, limitar os juros cobrados pelas instituições
financeiras (Súmula 596/STF).
8.2 - Os encargos financeiros do mutuário não
podem ser calculados por índices indicados pelo próprio credor
ou por entidade de sua classe. Por isso, afasta-se a taxa
divulgada pela Anbid, nos termos da Súmula 176/STJ, fundada
no art. 115 do Código Civil: "É nula a cláusula contratual que
sujeita o devedor à taxa de juros divulgada pela ANBID/CETIP"
(REsp 167.904/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Costa Leite).
8.3 - Nas operações reguladas em legislação
especial, que se reporta à manifestação do CMN sobre a taxa de
juros acima da taxa legal, a falta dessa determinação faz com
que os juros de tais contratos não possam ultrapassar o limite
constante da lei. Assim, a cédula de crédito industrial somente
poderia conter cláusula de juros acima de 12% se houvesse
autorização do CMN. Como não existe, não cabia cobrar juros
acima de 12%. DL. 413/69. (REsp 207.231/MG, rel. o Min. Cesar
Asfor Rocha; REsp 223.807/RS, de minha relatoria; REsp
225.266/RS, rel. o Min. Eduardo Ribeiro. Idem, quanto ao crédito
rural: Dec.Lei 167/67, REsp 111.881/ES, 2ª Seção, rel. o Min.
Carlos Alberto Direito; REsp 152.119/RS, rel. o Min. Barros
Monteiro (à falta de autorização, não cabe cobrar juros acima de
12%); REsp 198.243/RS – Sálvio de Figueiredo Teixeira; REsp
131.515/RS). Idem, quanto à cédula de crédito comercial – Lei
6840/80. Agr 226.618/RS, rel. o Min. Carlos Alberto Direito (o
credor deve provar); REsp 120.186/RS, rel. o Min. Aldir
81
Passarinho Jr.; REsp 223.746/SP, de minha relatoria (para os
moratórios, apenas mais 1% ao ano).
Como o Código Civil em vigor não mais indica
quantitativo certo para os juros legais, essa jurisprudência
deverá ser adequada ao novo diploma (art. 406 do CCivil) (Ver
nº 7, in fine).
8.4 - A questão relacionada com a exigência de
prova da autorização do CMN, depois de inicial divergência, foi
resolvida no sentido de que cabe ao credor provar a existência
da autorização (REsp 196.253/RS, rel. o Min. Barros Monteiro;
REsp 207.456/RS, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha; REsp
223.746/SP, de minha relatoria). Faltando essa prova, os juros
ficam limitados ao previsto na lei.
8.5 - A Res. 1064 do CMN não contém autorização
para cobrança de taxas acima de 12% (REsp 93.214/RS, rel. o
Min. Eduardo Ribeiro).
8.6 - Os juros moratórios, nos contratos regulados
na legislação especial acima referida, só podem ser elevados de
mais 1% ao ano, na forma do Decreto-Lei 167/67, art. 5º,
parágrafo único, do Decreto-Lei 413/69 e da Lei nº 6.840/80.
8.7 - A capitalização anual é permitida sobre o
saldo apurado nos contratos de conta corrente; admite-se nos
contratos de crédito rural, industrial e comercial, regulados em
leis especiais (DL 167/67 (rural); Dec.Lei 413/69 (industrial) e
Lei 6840/80 (comercial), que autorizam a capitalização
semestral, trimestral ou mensal, desde que pactuada (Súmula
93/STJ). Para os contratos de financiamento em geral, entre eles
82
os resultantes de contratos de abertura de crédito, não se
defere a capitalização, incidindo o disposto na Súmula 121/STF,
uma vez que a lei ordinária não permite a capitalização para
casos tais (Dec. 22.626/33, art. 4º: "É proibido contar juros dos
juros, salvo dos juros dos saldos líquidos das contas correntes,
de ano a ano"). O Código Civil de 2002 admite a capitalização
anual para o contrato de mútuo (art. 591).
Precedentes sobre capitalização: só é permitida nos
casos previstos em legislação especial, e quando pactuada
(REsps 79.214/RS; 174.849/RS); não cabe no contrato de
abertura de crédito (REsp 187.717/RS, rel. o Min. Carlos Alberto
Direito); não cabe no contrato de leasing (REsp 213.850/RS, de
minha relatoria, REsp 234.437/RS e REsp 198.293/RS); no de
cheque especial (REsp 172.248/RS, de minha relatoria); nem na
alienação fiduciária (REsp 196.328/PR, de minha relatoria); a
capitalização em período inferior a seis meses depende de
autorização do CMN (REsp 186.613/RS, de minha relatoria);
Ainda sobre capitalização: ver acima, 1ª Parte, nº 3,
in fine;
8.8 - Autorizada a revisão judicial, como acima foi
visto, menciono os precedentes que a admitiram: é possível a
revisão de contrato de abertura de crédito e de contrato de
empréstimo, com emissão de nota promissória (REsp
208.672/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito); a
existência de renegociação não afasta a revisão (REsp
237.302/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira,
REsps 214.883/RS e 205.532/RS, 4ª Turma, de minha relatoria);
nos embargos à execução de sentença homologatória de acordo,
é possível a revisão (REsp 207.456/RS).
83
8.9 - Precedentes sobre limite de juros: o limite
legal não se aplica ao mútuo bancário em geral (Súmula
596/STF; REsp 187.717/RS, rel. o Min. Carlos Alberto Direito); no
leasing, não se aplica a limitação de 12% (REsp 172.432/RS, rel.
o Min. Cesar Asfor Rocha); podem ser cobrados nos limites do
CMN (REsp 181.931/RS, de minha relatoria); no leasing, não se
pode acrescentar juros iguais à taxa de remuneração do CDB, no
vencimento de cada prestação (0,5 % a.m. + taxas do CDB)
(REsp 236.775/RJ, de minha relatoria); no cartão de crédito, não
se aplica o limite de 12% (REsp 202.373/RJ, rel. o Min. Barros
Monteiro. Esse tema ainda está para ser definido na Segunda
Seção, em razão de julgados da Terceira Turma); na conta
corrente, não há limite legal de juros a obedecer (REsp
221.942/RS, rel. o Min. Nilson Naves).
8.10 – Na sessão de 12 de março de 2003, a
Segunda Seção julgou a questão relacionada com a alteração
judicial da taxa fixada, quando abusiva, seja para os juros
remuneratórios, vencidos na vigência do contrato, seja para os
juros moratórios, ou juros da inadimplência, quando são
comumente alteradas as taxas, com cobrança de comissão de
permanência pelos mais altos índices do mercado ou praticados
pelo credor, cumulada com multas e outros encargos. As
alternativas eram muitas: permitir ao banco escolher a taxa a
cobrar, tendo como limite a mais alta do mercado, conforme
precedentes do Tribunal; deferir a taxa Selic, como já decidido
em precedente da Quarta Turma; autorizar a cobrança de juros
conforme a Selic, como taxa básica, e mais um percentual a
título de spread.
O primeiro feito a ser julgado foi o REsp nº
271.214/RS, no qual proferi voto-vista na sessão de 26.06.2002,
84
transcrito em parte a seguir, sustentando que as taxas abusivas
estipuladas a título de comissão de permanência ou encargos
moratórios devem ser revisadas pelo juiz, à falta de qualquer
controle administrativo. A necessidade dessa intervenção se
mostra evidente nos muitos casos que chegam ao Tribunal,
alguns deles referidos no voto: “Peço vênia, porém, para
dissentir da assertiva de que, após a inadimplência, deve ser
paga comissão de permanência calculada segundo a taxa média
do mercado, corrigido o débito assim como determinado no
acórdão recorrido (IGPM). Em primeiro lugar, porque é da nossa
jurisprudência indeferir a cumulação da correção monetária com
a comissão de permanência (Súmula 30/STJ). Entro nesse
assunto porque o acórdão autorizou a correção monetária pelo
IGP-M. Em segundo, porque nem mesmo o Banco Central admite
a cobrança cumulada de comissão de permanência com multa,
como foi deferido (Resolução do CMN nº 1129, de 15/05/1986;
REsp nº 5636/SP). Em terceiro, porque o deferimento de
comissão de permanência segundo a taxa média do mercado é a
causa da formação dos débitos impagáveis, como seguidamente
evidenciam os autos dos processos que nos chegam. A
permanência dessas taxas altíssimas após o advento da mora -
quando deveriam ser pagos apenas os juros de mora - permite,
por exemplo, transformar uma dívida: - de US$ 3.077.428,00,
em R$ 247.000.000,00 (valores de dois anos atrás) (REsp nº
260.172/SP); - de CR$ 50.000.000,00, de uma distribuidora de
flores do interior de São Paulo, em junho de 1992, quando o
salário era de CR$ 230.000,00 (mais ou menos 200 s.m; débito
que seria equivalente, hoje, a aproximadamente R$ 50.000,00),
em uma dívida executada de R$ 4.332.835,15 (REsp nº
347.898/SP). Repito: quatro milhões e trezentos mil reais; - de
R$ 18.000,00 - financiamento obtido por um pequeno agricultor
85
para uma safra de arroz - em mais de R$ 500.000,00, valor
muito superior ao que ele poderia perceber como lucro líquido
na exploração de sua gleba de 38 hectares, durante toda a sua
vida útil; muito além do valor da própria terra, e isso pelo
financiamento de uma safra de arroz. Quer dizer, o capital
emprestado para o custeio de uma safra rende mais do que o
valor da terra e mais que a renda durante toda a vida de um
pequeno agricultor (AR 805/RS); - de US$ 26.000,00, a que foi
condenado certo banco, que deveria devolver o capital do seu
cliente acrescido das taxas do mercado financeiro por ele
praticadas nas suas operações ativas, em US$
2.000.000.000,00, conforme alegado no seu arrazoado,
condenação que só foi reduzida para patamares aceitáveis
quando substituídas pelas taxas das operações passivas (REsp
nº 98.134/RJ); - de R$ 15.252,85, em 30.08.95, em R$
202.659,76, em 22.01.99 (REsp nº 223746/SP); - de R$ 7.989.55,
em 30.08.95, em R$ 106.154,31, em 22.01.99 (REsp nº
223.746/SP); - permite compor o saldo devedor com as
seguintes parcelas: TRD + 9% a.a. + ANBID + 4% a.a. + multa ,
conforme consta do extrato fornecido pelo banco (REsp nº
204.859/SP); - admite o pedido de prisão da devedora que
obteve o financiamento de metade de um automóvel Kadet, de
R$ 6.000,00, em março/1995 e estava sendo cobrada no valor
de R$ 90.365,27, em novembro/1996, sob pena de perda da
liberdade (HC 14.333/DF e HC 12.547/DF). - em recente caso
julgado na Quarta Turma, um devedor de R$ 45.000,00, em
1996, pagou no semestre aproximadamente R$ 35.000,00; foi
executado pelo saldo, perdeu o imóvel dado em garantia, que
na época estava avaliado pelo dobro desta; a execução continua
pelo saldo, que estava há mais de dois anos em R$ 440.000,00,
e hoje passa de um milhão de reais, pelas taxas que estão
86
sendo aplicadas. Isto é, uma pessoa sai de um débito inicial de
aproximadamente cinqüenta mil reais, paga substancialmente a
dívida no primeiro semestre, e hoje deve a pequena fortuna de
um milhão de reais, depois de ter entregue o imóvel de 3 ha de
área urbana. É razoável? - permite utilizar taxas médias anuais,
em 2000, segundo a Anefac, quando a inflação esteve ao redor
de 10%: de 247% no cartão de crédito; 225% no cheque
especial; 293% no empréstimo pessoal, financeiras. Na última
publicação do COAF (Conselho de Controle de Atividades
Financeiras), apresentada pela sua Presidente, Dra. Adrienne
Gianetti Nelson de Senna, consta o relato de casos investigados
pelas autoridades de diversos países, entre eles o de um certo
Keneth, que atuou em país da Europa Central, pessoa que
despertou a atenção por garantir rendimentos anuais de 100 a
200 por cento, considerados excepcionais ("Prevenção e
combate à lavagem de dinheiro", 2001, p. 33). No Brasil, como
se vê, tais rendimentos não causariam nenhum espanto, pois
estão bem abaixo do que é normalmente praticado nos negócios
bancários. E qual a razão para que essas taxas sejam assim tão
elevadas? É que fica ao critério dos bancos a sua estipulação,
que assim definem a "taxa média de mercado". Respondendo a
consulta formulada pelo em. Min. Antonio de Pádua Ribeiro,
assim informou o Banco Central: ‘Com relação à taxa média de
mercado, lembramos que o tema já foi alvo de consulta do
também Ministro dessa Corte Sálvio de Figueiredo Teixeira,
ocasião em que este Departamento, no expediente Denor-
2001/00787, de 22 de maio de 2001, manifestou o entendimento
de que se trata da taxa praticada pela própria instituição em
operações de mesmas características’ (Of.
2001/04653/DEJUR/GABIN, de 11.10.2001). No Brasil, adotou-se
a política de que os juros são livremente pactuados. Na medida
87
em que nenhum limite é estabelecido na lei ou pelas agências
públicas incumbidas de regular e fiscalizar o mercado, é
possível que existam abusos. Pergunto, então, pode o juiz
interferir nessa relação, para eliminar o abuso? Ora, na Europa,
desde o Tratado de Roma, a determinação das taxas de juros
pelo próprios agentes econômicos é radicalmente proscrita (Jean
Pardon, "Les dispositions des Communautés européennes
régissant les opérations de crédit", p. 6). Na França, permite-se
a atuação dos tribunais para eliminar parcelas indevidas (Droit
Bancaire, Jean Louis Rives-Lange e Monique Contamine
Raynaud, p. 432) e também nos EEUU ("Não existindo
determinação legal estadual quanto à taxa de juros, os tribunais
podem determiná-la de acordo com princípios e regras", decisão
do Tribunal de Nova York, citada em "Juros, Especialmente
Compostos", Prof. Peter Ashton, Direito & Justiça, v. 12, p. 68).
Em outros países, o juro está limitado na lei, como acontece na
Alemanha, com taxas de 4% ao consumidor (Tratado de las
relaciones obligacionales, Dieter Medicus, I/188). Nessa mesma
Alemanha, a Corte Constitucional tem reconhecido a
inconstitucionalidade de contratos abusivos, que imponham
condições insuportáveis para os obrigados, conforme ficou
referido nos HC acima mencionados. Portanto, não digo
nenhuma novidade ao afirmar que a taxa de juros pode ter
limites, ou na lei, ou na decisão judicial. É certo que não cabe
ao juiz interferir genericamente no mercado para estabelecer
taxas, mas é seu dever intervir no contrato que está julgando,
para reconhecer quando o princípio do equilíbrio contratual foi
violado, a fim de preservar o equivalência entre a prestação
oferecida pelo financiador e a contraprestação que está sendo
exigida do mutuário. É função dele aplicar o dispositivo legal
que proíbe cláusulas potestativas; é função dele verificar se no
88
modo de execução do contrato não há perda substancial de
justiça, com imposição de obrigação exagerada ou
desproporcionada com a realidade econômica do contrato. Para
isso, sequer necessita invocar o disposto no Código de Defesa
do Consumidor, uma vez que o sistema do nosso Direito Civil é
suficiente para permitir a devida adequação. O crédito tem sido
objeto de constante regulação, porque todo o mundo sabe, e é
fato histórico que qualquer manual sobre direito bancário
revela, que a necessidade do dinheiro e a natural desigualdade
entre as partes pode ensejar o estabelecimento de regras que
favoreçam o fornecedor. Quando tudo é permitido e liberado,
quando todos praticam as taxas elevadas que conhecemos - os
exemplos acima são apenas exemplos e não os mais
significativos -, não há para o necessitado do dinheiro sequer a
liberdade de escolha. Daí a exigência de um controle judicial
nos casos que são objeto de processo. Por isso, não me parece
adequado dizer que a inadimplência permite a cobrança de juros
pela taxa média de mercado, estipulação potestativa que leva a
resultados que não podem ser defendidos por ninguém. No
mercado, hoje, segundo o "Informe Oboé", de maio de 2002, a
renda em CDB é de 16,03 em 12 meses, a caderneta de
poupança rendeu 8,60%, a taxa Selic é de 19,94%. No artigo
que o Prof. Delfim Neto publicou na Folha de São Paulo de 10 de
abril de 2002, o juro real no Brasil, em meados de março de
2002, é de 12,9% a.a. A taxa Selic foi usada na 4ª Turma, no
REsp nº 260.172/SP, para substituir as taxas contratadas para o
caso de inadimplência. Por isso, acredito que, para o caso dos
autos, depois da inadimplência, deve ser substituída a comissão
de permanência calculada pela taxa de mercado, pela Taxa
Selic, já aí embutida a correção monetária”.
89
O Ministro Carlos Alberto Menezes Direito votou
pela legalidade da cobrança da taxa segundo a variação do
mercado: “Seguindo essa linha de raciocínio, não se pode dizer
abusiva a taxa de juros só com base na estabilidade econômica
do país, desconsiderando todos os demais aspectos que
compõem o sistema financeiro e o preço do empréstimo. A
política de juros altos, por outro lado, ao menos no Brasil, tem
servido como mecanismo de contenção do consumo e da
inflação. Não o inverso. Assim, ao contrário do que diz o
Acórdão, a inflação baixa no Brasil decorre, também, de uma
política econômica de juros mais elevados. Em uma palavra, a
taxa de juros, do ponto de vista de política pública significa
também um meio para estabilizar a moeda no tempo, com suas
evidentes repercussões no mercado, do sistema produtivo ao
ponto final do consumo. Com efeito, a limitação da taxa de juros
em face de suposta abusividade somente teria razão diante de
uma demonstração cabal da excessividade do lucro da
intermediação financeira, da margem do banco, um dos
componentes do spread bancário, ou de desequilíbrio
contratual. A manutenção da taxa de juros prevista no contrato
até o vencimento da dívida, portanto, à luz da realidade da
época da celebração do mesmo, em princípio, não merece
alterada à conta do conceito de abusividade. Somente poderia
ser afastada mediante comprovação de lucros excessivos e
desequilíbrio contratual, o que, no caso, não ocorreu.” (...) “Por
outro lado, após o vencimento do contrato, a cobrança da
comissão de permanência subordinada à mesma taxa de juros
prevista neste não mais se justifica, presente que a realidade
econômica desse período poderá não mais ser a mesma da
época em que celebrado o contrato. Nesse caso, a cobrança da
comissão de permanência considerando a taxa média de
90
mercado, no período da inadimplência, apresenta-se, a meu
sentir, como melhor solução.” (...) Concluiu: “Assim, como já
assinalei antes, entendo deva a comissão de permanência
considerar a taxa média do mercado, segundo a espécie de
operação, apurada pelo Banco Central do Brasil, nos termos do
procedimento previsto na Circular da Diretoria n° 2.957, de 28
de dezembro de 1999, à semelhança do que ocorre com os juros
remuneratórios após o vencimento, nos termos do que foi
decidido no julgamento do REsp n° 139.343/RS, pela 2ª Seção,
Relator o Senhor Ministro Ari Pargendler, DJ de 10/6/02” (REsp
nº 271.214/RS).
Foi o voto que prevaleceu, tendo sido publicada
a seguinte tira de julgamento: “A Seção, por unanimidade,
conheceu em parte do recurso, e, por maioria, deu-lhe
parcial provimento para autorizar a uti l ização da TR como
índice de correção monetária até o vencimento do contrato,
a majoração da multa para 10%, a cobrança dos juros
remuneratórios às taxas fixadas no contrato até o
vencimento deste, e da comissão de permanência para o
período da inadimplência, não cumulada com correção
monetária, nos termos da Súmula nº. 30, calculada à taxa
média dos juros de mercado apurada pelo Banco Central do
Brasil”.
Na mesma data foi julgado o REsp. nº
407.097/RS, que decidiu pela validade da cláusula de juros
remuneratórios de 10,90% ao mês, com o seguinte resultado:
“A Seção, por maioria, conheceu do recurso e deu-lhe
provimento para manter a cláusula contratual de juros
remuneratórios de 10,90% ao mês. Vencidos, na conclusão,
os Srs. Ministros Antônio de Pádua Ribeiro, Relator, e Sálvio
de Figueiredo Teixeira, que substituíram a taxa de 10,90%
91
ao mês pela taxa SELIC, mais 6% ao ano. Os Srs. Ministros
Fernando Gonçalves e Aldir Passarinho Junior acompanharam
o voto do Sr. Ministro Barros Monteiro, mantendo a taxa
contratual que não pode ser reexaminada em juízo. Os Srs.
Ministros Ari Pargendler, Carlos Alberto Menezes Direito,
Nancy Andrighi e Castro Fi lho votaram no sentido de que a
revisão judicial somente pode acontecer quando reconhecida
a abusividade, o que não aconteceu no caso”.
Com esses dois julgamentos, a Seção de Direito
Privado do STJ l iberou a cobrança em juízo das taxas de
juros remuneratórios, durante a vigência do contrato, e da
comissão de permanência, após a inadimplência, que podem
ser exigidas de acordo com as taxas praticadas no mercado,
no l imite do contrato, só permitida a revisão judicial no caso
de o devedor demonstrar que o banco cobrou juros menores
em situação similar.
Atendendo a essas decisões, em julgamento
posterior, no REsp nº 466.979/RS, assim me manifestei: “O
entendimento que hoje predomina na Segunda Seção é
francamente favorável à cobrança dos juros de acordo com
os índices fixados pelos bancos, sem outro l imite senão a
taxa média de mercado e sem possibil idade de sua revisão
pelo juiz, salvo quando o mutuário comprovar que o banco
está cobrando dele mais do que cobra de outro, em situação
similar. Como difici lmente ocorrerá tal hipótese (e, caso
ocorra, implica indevida transferência ao mutuário da carga
da prova do abuso, a ser feita possivelmente em perícia de
dif íci l e onerosa realização), o resultado prático daquele
julgamento é a l iberação dos juros, sejam remuneratórios,
sejam moratórios, sem nenhum controle efetivo. Controle
administrativo não existe, pois não se conhece l imite
92
imposto pela autoridade administrativa, e o controle judicial
f ica agora condicionado a uma prova irrealizável ou de dif íci l
realização. Todos sabemos que as taxas praticadas no Brasil
chegam a resultados muitas vezes absolutamente
inaceitáveis do ponto de vista ético. É certo que a Escola de
Chicago prega a ‘ interpretação econômica do contrato’, tudo
submetido ao interesse do mercado, mas é inaceitável
proibir ao juiz corrigir o evidente excesso presente no caso
submetido a seu julgamento, apenas porque se trata de um
abuso praticado massivamente contra todos. As taxas de
mercado podem ser aceitas para os negócios em geral,
quando houver efetiva concorrência, adequadamente
fiscalizada pelo Estado, além da possibil idade real de
escolha, o que de nenhum modo acontece. Quais as opções e
o poder de negociar as cláusulas de contrato bancário que se
permitem ao nosso pequeno agricultor, ou ao
microempresário? Se o Estado l ibera os juros e o Tribunal se
recusa a afastar o abuso, algumas situações podem causar
perplexidade”.
8.11 - O julgamento anterior da Quarta Turma, que
decidira pela substituição dos juros contratados pela Taxa Selic,
consta do REsp 260.172/SP, de minha relatoria, assim
ementado: "Juros. Maior taxa de mercado praticada pelo credor.
Cláusula potestativa. Art. 115 do Código Civil. É potestativa a
cláusula de juros que deixa ao critério do credor a estipulação
da taxa mensal, a ser por ele fixada de acordo com a mais alta
que praticar no mercado financeiro. Art. 115 do CCivil.
Deferimento da Taxa Selic, em substituição aos juros
contratados, atendendo às peculiaridades do caso e ao disposto
no contrato. Embargos de devedor. Falta de título executivo.
93
Cerceamento de defesa. Perícia. Características de título
executivo no instrumento pelo qual os beneficiários do contrato
de fiança assumem a obrigação de reembolsar o fiador do que
despender honrando a garantia. A necessidade de cálculo de
parcelas acessórias não retira a executividade do título.
Desnecessidade de realização de perícia para conhecimento dos
critérios adotados para a apuração do saldo devedor. Primeiro
recurso não conhecido. Segundo recurso conhecido em parte e
nessa parte parcialmente provido".
8.12 - Precedentes sobre comissão de permanência:
- os juros e acessórios devidos depois do
inadimplemento: no crédito industrial, aumenta-se de mais 1%
a.a. (DL. 413/69), e nele não cabe comissão de permanência -
REsp 207.231/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha, DJ
25.10.1999, assim ementado: "O art. 5º, do Decreto-lei nº
413/69, posterior à Lei nº 4.595/64 e específico para as cédulas
de crédito industrial, confere ao Conselho Monetário Nacional o
dever de fixar os juros a serem praticados. Ante a eventual
omissão desse órgão governamental, incide a limitação de 12%
ao ano prevista na Lei de Usura (Decreto nº 22.626/33), não
alcançando a cédula de crédito industrial o entendimento
jurisprudencial consolidado na Súmula nº 596 - STF. - Este
egrégio Tribunal fixou o entendimento de que cláusula acerca
de inadimplemento de nota de crédito industrial deve observar o
Decreto-lei nº 413/69, que prevê a incidência, no máximo, de
juros moratórios à taxa de 1% a.a. (art. 5º, § único), sendo ilegal
a previsão de aplicação de qualquer outra taxa, comissão de
permanência ou encargo, tendente a burlar o referido diploma
94
legal. - Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa
extensão, provido";
- no crédito rural não cabe comissão de
permanência porque não prevista no Decreto-Lei 167/67 (REsps
182.322/MG; 205.532/RS; 79.214/RS, de minha relatoria; REsp
67.699/RS, rel. o Min. Aldir Passarinho Junior; REsp
101.039/RS, rel. o Min. Nilson Naves (não se altera a taxa pela
inadimplência); após o vencimento, são devidos os juros
moratórios, nos limites da lei, mais 1% (REsp 218.485/RS, de
minha relatoria);
- são inacumuláveis multa + comissão de
permanência, nos termos da Resolução 1129/CMN (REsps
200.252/SP e 139.607/SP, de minha relatoria); são
inacumuláveis correção monetária e comissão de permanência
(Súmula 30/STJ);
- tenho que, além de potestativa a cláusula que
autoriza o cálculo da comissão de permanência de acordo com
as taxas praticadas pelo credor, como dito acima, deixar a
definição do débito à vontade exclusiva do estipulante
desqualifica o contrato como título executivo, pois nem o credor
sabe qual a importância que irá cobrar;
- sobre a cumulação da comissão de permanência
com outras parcelas, a Seção de Direito Privado decidiu
excluir a correção monetária (Súmula 30/STJ), mas permitir a
cobrança cumulativa da comissão de permanência com juros
moratórios, isto é, juros + juros: “A Seção, por unanimidade,
conheceu do recurso e deu-lhe parcial provimento para
deferir a cobrança de juros remuneratórios conforme o
contrato, que permanecerão depois do vencimento à taxa
média de mercado, observado o l imite do contratado,
cumulados, então, esses juros remuneratórios com os juros
95
moratórios de 1% ao mês, porque assim convencionado e no
l imite da lei”. A possibil idade da cumulação da comissão de
permanência com a multa enfrenta o óbice da Res.
1129/CMN.
96
QUARTA PARTE
CÉDULA DE CRÉDITO BANCÁRIO
9. Cédula de crédito bancário. Características. 10. Cláusulas que podem ser contratadas. 11. Garantias. 12. Precedentes do STJ sobre as questões reguladas no novo diploma.
9. Examinarei a cédula de crédito bancário
instituída pela Medida Provisória nº 1925/99, que contrariou em
muitos pontos a orientação jurisprudencial do STJ. O texto do
novo diploma se consolidou depois da Emenda Constitucional nº
32, de 11.9.2001, que regulou a edição de medidas provisórias e
teve por aprovadas as até então editadas, entre elas a MP
2.160-25, de 23 de agosto de 2001, que dispôs sobre a cédula
de crédito bancário e acresceu dispositivo à Lei 4.728/65.
A cédula de crédito bancário é um título de crédito
emitido em favor de instituição financeira ou entidade
equiparada, que pode ser de duas modalidades: ou indica a
soma devida (cédula de crédito com valor predeterminado), ou
refere-se apenas ao saldo a ser apurado no vencimento (cédula
de crédito com valor indeterminado), embora o título seja
emitido pelo valor total do crédito posto à disposição do
emitente, espécie que corresponde ao contrato de abertura de
crédito.
A apuração do "valor exato da obrigação", na
primeira modalidade de cédula, será normalmente necessária,
pois o débito total não fica circunscrito ao que no título está
expresso, uma vez que a cédula conterá pactos sobre
capitalização, amortização, índices de correção, despesas,
97
honorários, etc. Isso significa que, nessa modalidade, o principal
já está definido, devendo ser calculado o valor dos acréscimos
que integrarão o pedido a ser apresentado em juízo.
A apuração "do saldo devedor" na segunda
modalidade de cédula de crédito, correspondente ao contrato de
abertura de crédito, dependerá, sempre, tanto para o principal
como para os acessórios, de prévio cálculo. Conquanto emitida a
cédula em valor certo, correspondente ao do crédito posto à
disposição do emitente, a pretensão em juízo será equivalente
ao saldo devedor, a ser apurado no momento da cobrança. Essa
conta será feita pelo credor considerando o que foi estabelecido
na cédula, e deverá atender ao disposto no § 2º, I e II, do art. 3º
da MP 2.160-25. São requisitos: cálculos claros, de fácil
entendimento, indicando valor principal, encargos, despesas,
juros e critérios de incidência, correção monetária, multas,
outras penalidades, despesas com cobrança, honorários
advocatícios. Essas exigências correspondem àquelas que eram
feitas pela 4ª Turma quando admitia a executividade dos
contratos de abertura de crédito. A demonstração deverá ser
feita em planilhas apresentadas pelo credor, ou em extratos de
contas, ou em ambos. Será sempre execução de quantia
definida unilateralmente pelo credor.
10. Entre as cláusulas que podem ser pactuadas
(art. 3º, § 1º), o novo diploma - que se apregoou vinha para
reduzir os juros praticados no mercado e aumentar a defesa do
consumidor - permitiu expressamente sejam fixados (a) os
critérios de incidência dos juros; (b) a capitalização para esse
tipo de contrato, o que a jurisprudência pacificada no STF e no
STJ proibia, e sua periodicidade, a ser estabelecida na cédula,
sem limitá-la (será diária ?); (c) a fixação de critérios de
98
atualização monetária; (d) as situações em que ocorrerá a mora;
(e) as multas e outras penalidades contratuais; (f) as despesas
com a cobrança e (g) os honorários advocatícios.
Essas parcelas todas, desde que enumeradas na
planilha, passam a integrar o título de crédito com força
executiva, o qual pode ser protegido por garantia fidejussória ou
real, inclusive com alienação fiduciária em garantia, dada pelo
emitente ou por terceiros, todos sujeitos a prisão.
Certamente não se encontrará nos países
ocidentais, no âmbito das instituições financeiras, um diploma
que conceda mais poderes ao credor estipulante de contrato de
adesão, sem limites para taxas, comissões e multas; para
completar, faltaria apenas excluí-lo do controle judicial.
11. As garantias podem ser de qualquer bem, móvel
ou imóvel, material ou imaterial (o direito de autor pode servir
de garantia), presente ou futuro, fungível ou infungível,
consumível ou não.
Os bens em garantia pignoratícia ou dados em
alienação fiduciária somente permanecerão na posse do
emitente ou do terceiro prestador da garantia se com isso
concordar o credor (art. 10). Essa regra altera de modo
substancial o regime da alienação fiduciária, que pressupõe
fique com o devedor e alienante a posse direta do bem. Além
disso, admite como regra a oferta em garantia de bem que já
pertença ao devedor, e não do que tiver sido adquirido com o
financiamento, finalidade para a qual foi instituída a alienação
fiduciária em garantia. Esse, aliás, já era o entendimento
predominante no STJ.
Até a liquidação da dívida, os bens da garantia
somente poderão ser deslocados, alterados, retirados ou
99
destruídos com prévia autorização escrita do credor (art. 9º, §
2º), e a remoção de veículos apenas acontecerá se esse
deslocamento for inerente à atividade do emitente ou do
terceiro que forneceu a garantia. A Medida Provisória chega a
permitir ao credor proibir o trânsito de veículo dado em
garantia, se a sua utilização não for inerente à atividade do
devedor ou de seu garante. Assim, o particular que tem uma
casa de moradia e um automóvel poderá oferecer como garantia
o veículo (pois a casa é impenhorável), mas a partir de então
somente poderá usar o automóvel se e enquanto autorizado
pelo credor...
O credor poderá exigir a substituição da garantia ou
o seu reforço, e o desatendimento da notificação em 15 dias
implicará o vencimento antecipado da dívida.
É dispensado o protesto para a ação regressiva
contra endossantes, avalistas e terceiros garantidores (art. 20).
A cédula poderá ser objeto de endosso (nas
primeiras edições, admitia-se a cessão), não se exigindo que o
endossatário seja instituição financeira, podendo ele cobrar os
juros e demais encargos estipulados na cédula (art. 4º, § 1º).
Logo, as condições especiais concedidas nos contratos
bancários em favor das instituições financeiras serão
transferidas e exercidas pelos particulares que receberem os
novos títulos, o que significa que (nos termos da lei e para os
casos em que se admite tal sanção) a prisão civil poderá ser
requerida por qualquer pessoa (endossatária) contra o devedor.
12. Sobre as questões agora abrangidas pela
Medida Provisória, além daquela relativa à executividade do
contrato de abertura de crédito, muitas vezes já se pronunciou o
STJ:
100
- o disposto no art. 3º, § 1º, I, sobre pactuação de
juros e capitalização, não faz referência a outras disposições
legais, mas os contratos devem ser celebrados e interpretados
com o auxílio do que consta da Lei 4.595/64;
- tem sido admitida a TR como índice de correção
monetária, desde que prevista no contrato (embora a TR reflita
o custo do dinheiro, e não apenas a inflação do período
passado);
- sobre a posse dos bens dados em garantia, pela
nova lei, a do emitente somente existirá se o credor anuir, o
que se ajusta ao sistema legal do penhor mercantil, no qual o
credor que recebe o bem fica como depositário dele, para todos
os fins (arts. 271 e seguintes do CComercial), porém, não se
acomoda ao sistema legal da alienação fiduciária, em que a
posse fica com o devedor;
- contrato que tem como garantia bens fungíveis
dados em depósito é regulado pelas regras do mútuo; por isso,
em relação a ele, não se admite a ação de depósito, mesmo
porque aquele contrato é incompatível com o dever de custódia
(REsp 182.183/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio Figueiredo
Teixeira). Essa jurisprudência não se altera diante da Medida
Provisória, que admite garantia real de bens fungíveis e
consumíveis. Se eles não mais existirem no momento da
execução, a garantia pode ser transferida a outros bens da
mesma natureza (ou qualidade) (REsp 169.963/SP). Inexistentes
outros que admitam essa substituição, desaparece a garantia
real, cabendo no processo de execução a penhora de bens do
devedor, de acordo com a enumeração do CPC. Se o devedor
estiver em concordata, com o desaparecimento da garantia, o
crédito torna-se quirografário e como tal deve ser habilitado
(REsp 230.997/SP, de minha relatoria: "Dados em garantia bens
101
consumíveis e destinados à venda, na atividade comercial do
devedor, há de se entender que o devedor estava autorizado a
isso, mas a sua alienação não extingue a garantia, que se
transfere para outros da mesma natureza e destinação,
existentes no momento da penhora. Porém, não se admite a
extensão para bens de outra natureza, tais como os móveis que
guarnecem o escritório da devedora." Idem: REsp 201.885/SP).
Esclareço ser diferente a situação em que os bens fungíveis não
são dados em garantia, mas sim objeto de verdadeiro contrato
de depósito, como já acima foi dito (n. 6.9);
- a garantia real tem como pressuposto a existência
da coisa dada em garantia, razão pela qual não se concebe o
depósito de coisas futuras (Agr/Ag 35.177, 3ª Turma, rel. o Min.
Waldemar Zveiter; REsp 47.027/RS, 4ª Turma, de minha
relatoria);
- nunca se permitiu a outras pessoas, que não às
instituições financeiras ou equiparadas, cobrassem juros acima
da taxa legal. Nesses casos, muitas vezes têm sido considerados
fraudulentos os negócios que encobrem juros onzenários, como
venda com cláusula de retrovenda, ou outros expedientes
diversos que a argúcia humana descobre para burlar a lei, como
o contrato da "vaca papel", comum nos Estados do centro do
país.
A Medida Provisória 2172-32, de 23/08/2001, veio
dispor sobre as sanções a serem aplicadas aos particulares que
praticarem a usura, ato nulo que será apurado em juízo com
inversão do ônus da prova.
No entanto, a Medida Provisória 2.160-25, de
23/08/2001, art. 4º, § 1º, autoriza tal cobrança aos particulares
que tiverem recebido em cessão as cédulas de crédito bancário:
"Art. 4º. (...) § 1º A Cédula de Crédito Bancário será transferível
102
mediante endosso em preto, ao qual se aplicarão, no que
couberem, as normas do direito cambiário, caso em que o
endossatário, mesmo não sendo instituição financeira ou
entidade a ela equiparada, poderá exercer todos os direitos por
ela conferidos, inclusive cobrar os juros e demais encargos na
forma pactuada na Cédula."
A Res. 2843/2001 do CMN dispôs sobre negociação
de cédula de crédito bancário e sobre a emissão de certificado
representativo dessas cédulas.
Não há precedente do STJ sobre cédula de crédito
bancário, instrumento que tende a ser o mais utilizado para a
formalização do mútuo. Também nada se decidiu sobre letras e
cédulas de crédito imobiliário, a que se refere a MP 2.223, de 4
de setembro de 2001.
103
QUINTA PARTE
EXECUÇÃO
13. Simultaneidade entre ação de cobrança ou de execução e ação do devedor. 14. Honorários advocatícios. 15. Inexistência de bens. 16. Ação consignatória. 17. Lei 8009/90 (bem de família). 18. Revisão de contratos sucessivos. 19. Proagro. 20. Impenhorabilidade de bem dado em garantia. 21. Contrato de abertura de crédito. 22. Cálculo dos encargos financeiros. 23. Contratos de dívida. 24. Ofício ao Banco Central. 25. Âmbito da defesa na ação de reintegração de posse ( leasing). 26. Ineficácia da hipoteca. 27. Prisão civil do depositário: princípio da proporcionalidade. 28. Ação monitória.
Passo a tratar de alguns temas que surgem quando
da execução de títulos bancários.
13. É questão muito ocorrente a da simultaneidade
entre o processo de execução de título extrajudicial e diversos
tipos de ações ordinárias, envolvendo o mesmo débito, na forma
de ação de revisão de cláusula contratual, ou de anulação do
título, ou de consignação em pagamento.
O art. 585, § 1º, do CPC estabelece que "a
propositura de qualquer ação relativa ao débito constante do
título executivo não inibe o credor de promover-lhe a
execução". De outra parte, sabe-se que o processo de execução
é suspenso com o recebimento dos embargos do devedor (art.
791, I, CPC).
Quando o devedor já ajuizou ação questionando a
validade, a existência ou o valor da dívida e seus componentes,
o credor não fica inibido de promover a sua execução. Se os
fundamentos da ação anulatória ou revisional são os mesmos
104
que ele suscita nos embargos, é recomendável a reunião da
ação ordinária à dos embargos, pela conexão, a fim de que
tenham um único julgamento.
Oferecidos embargos do devedor e ajuizada ação
ordinária contra o título, é possível a suspensão do processo dos
embargos: "Havendo continência e prejudicialidade entre os
embargos do devedor e a ação revisional de contrato, não tendo
sido reunidos os feitos oportunamente para julgamento
conjunto, cabível é a suspensão dos embargos, nos termos do
265, IV, ‘a’, do CPC" (REsp 184.185/RS, 4ª Turma, rel. o Min.
Barros Monteiro). - "Ante a evidência de prejudicialidade de
questão posta em ação declaratória, admite-se a suspensão do
processo incidental de embargos do devedor, em execução por
titulo extrajudicial, com aplicação do art. 265, IV, ‘a’, do CPC "
(REsp 35.814/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Dias Trindade). - "O
ajuizamento de ação buscando invalidar cláusulas de contratos
com eficácia de título executivo, não impede que a respectiva
ação de execução seja proposta e tenha curso normal. Opostos
e recebidos embargos de devedor, e assim suspenso o processo
da execução (CPC, art. 791, I), poder-se-á cogitar da relação de
conexão entre a ação de conhecimento e a ação incidental ao
processo executório, com a reunião dos processos de ambas as
ações, para instrução e julgamento conjuntos, no juízo
prevalecente" (REsp 8859/RS, 4ª Turma, Min. Athos Carneiro).
Ver, ainda: REsp 193.766/SP e REsp 404.597/SP, 4ª Turma, de
minha relatoria; REsp160.026 e REsp 201.489/SP, 3ª Turma, rel.
o Min. Menezes Direito.
Se o devedor não ofereceu embargos, mas antes
promovera ação de revisão ou a anulatória, os dois processos (o
da execução e o da ação ordinária) têm normal tramitação uma
vez que, para a suspensão da execução, seria indispensável
105
embargá-la: "O ajuizamento de ação de conhecimento buscando
invalidar o título executivo, sem o oferecimento de embargos,
não tem o condão de suspender a execução"; depois de opostos
os embargos, cogitar-se-á da reunião dos processos pela
conexão” (REsp 95.079/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira). Porém, se os fundamentos para os
embargos já estão na ação ordinária, tenho que esta deve ser
julgada com anterioridade, previamente à realização do ato de
alienação do bem do devedor.
O devedor que não embargou pode promover ação
contra o título depois de instaurada a execução. É
suficientemente explicativa a ementa do REsp 135.355/SP, 3 ª
Turma, Rel. o Min. Eduardo Ribeiro: “Em curso processo de
execução, não há impedimento a que seja ajuizada ação,
tendente a descontituir o título em que aquela se fundamenta.
Inexistência de preclusão, que essa opera dentro do processo,
não atingindo outros que possam ser instaurados, o que é
próprio da coisa julgada material. Carecendo a ação da eficácia
própria dos embargos, a execução prosseguirá, salvo se, em
cautelar, for outorgado efeito suspensivo. Julgada procedente a
ação, extingue-se a execução. Se a sentença sobrevier ao
exaurimento da execução, abrir-se-á ao executado a
possibilidade de, mediante ação condenatória, reaver o que
houver pago indevidamente.”
Recentemente, foi apreciado caso em que o
executado veio alegar a falsidade do título (REsp 234.809/RJ).
Admitiu-se a iniciativa, uma vez que era uma das hipóteses em
que se permite a exceção de pré-executividade, expediente pelo
qual o devedor, no próprio processo de execução, tenha ou não
embargado, vem suscitar alguma questão que ataca a própria
executividade do título, como acontece com o título sem
106
assinatura do devedor, ou com assinatura falsa. Também se
admite, independentemente de embargos, a alegação de ser
insubsistente o ato de penhora, como ocorre nos casos da Lei
8009/90, sobre o bem de família. Também foi aceita ação para
revisão de cláusula abusiva proposta depois da execução, por
devedor que não embargou. No REsp 333.302/SP, proferi o
seguinte voto: "A falta do oferecimento dos embargos à
execução de título extrajudicial não inibe o direito de o devedor
vir a juízo, pela via da ação ordinária, pleitear a nulidade do
título ou a modificação da avença, especialmente quando
contém cláusulas que seriam abusivas. O que não se pode é
atribuir à ação ordinária o efeito de impedir o processo de
execução (art. 585, § 1º, do CPC), ou tratar a ação ordinária
como se embargos fosse, suspendendo o processo executivo. De
outra parte, não existindo sentença a ser proferida na execução,
não é apropriado determinar-se o apensamento dos dois
processos, para julgamento simultâneo (REsp 11.620/SP). A
continuidade da execução, com os danos que daí possam
decorrer, é risco assumido pelo credor, que sustenta seu crédito
em contrato que permitiu a multiplicação da dívida por dois, em
menos de seis meses, com juros de 325,680% ao ano, mais
capitalização mensal, mais comissão de permanência, mais
multa de 10%, mais juros moratórios, conforme o documento de
fl. 10, e mais honorários. O Tribunal tem deferido, para certos
casos, a continuidade da execução até o momento da alienação,
quando desta possa advir dano irreparável, o que é matéria a
ser eventualmente examinada pelo juiz da causa. Posto isso,
conheço em parte do recurso e lhe dou provimento, para que
não sejam apensados os processos de execução e da ação
ordinária".
107
14. A respeito de honorários, são muitos os
precedentes.
- A fixação da verba honorária no limiar da
execução é uma praxe aceita, servindo como orientação no
caso de pagamento imediato. Mas, se houver embargos,
pode ser substituída pelo arbitramento ao final, na sentença dos
embargos. De acordo com entendimento da Corte EspeciaI
(EREsp 97.466/RJ), improcedentes os embargos, permanece uma
única sucumbência, pois a questão é única (REsp 202.681/RJ,
rel. o Min. Barros Monteiro). Tenho para mim que, nesse juízo
eqüitativo, deverá o juiz considerar o fato de que dois foram os
processos (o de execução e o dos embargos), e estipular verba
que não exceda a 20% do valor do débito. (Ver adiante, quando
se trata da sucumbência parcial e, depois, do reexame em
recurso especial).
- Na execução judicial, fixados os honorários na
sentença proferida no processo de conhecimento, cabem novos
honorários no processo de execução; havendo embargos, os
honorários serão fixados, para a execução e para os embargos,
apenas na sentença dos embargos (REsp 162.707/PR, 4ª Turma,
rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
- Na execução contra a Fazenda Pública, se ela não
embarga, não há razão para fixação de novos honorários, uma
vez que o procedimento que se instaurou é exigência legal. No
entanto, a Corte Especial dirimiu a divergência que havia entre
as Turmas do STJ e decidiu que, "No processo de execução,
contra o Estado, o credor tem direito a honorários de
sucumbência, mesmo que o devedor não tenha oposto
embargos" (EREsp 158.884/RS. No mesmo sentido: EREsp
186.518/RS; EREsp 162.001/RS; EREsp 189.602/RS). O último
julgamento aconteceu na sessão de 18.09.2002, no EREsp
108
217.883, rel. o Min. José Arnaldo da Fonseca, quando a
orientação foi mantida com voto de desempate.
- Os honorários podem ser executados pelo
advogado, pois é um seu direito autônomo, como está no
Estatuto da Ordem; mas também podem ser executados pela
parte, como é muito comum, especialmente quando é o mesmo
advogado quem ingressa com a execução em nome da parte,
incluindo a parcela de honorários (REsp 171.148/SP).
- Se há a execução judicial e não há embargos,
cabe a verba honorária pela execução. É a mesma regra da
execução extrajudicial (REsp 177.759/RS, 3ª Turma, rel. o Min.
Carlos Alberto Direito; REsp 159.845/RS, 3ª Turma, rel. o Min.
Costa Leite).
No incidente de pré-executividade julgado
procedente, cabe atribuir honorários aos executados (REsp
195.351/MS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
- Embora o direito aos honorários seja autônomo
(Lei 8906/94), é possível a compensação entre os honorários, no
caso de sucumbência parcial. (REsps 164.368/RS e 164.249/RS,
rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; REsp 151.093/RS, 4ª
Turma, rel. o Min. Barros Monteiro; REsp 186.613/RS, de minha
relatoria). Nesse ponto, havia divergência entre as duas Turmas
da Segunda Seção, porquanto na Terceira Turma julgava-se que
cada parte responde pelos honorários a que foi condenada,
inadmitida a compensação (REsps 145.665/SP, 143.073/SP,
177.637/RS e 205.044/RS, rel. o Min. Direito). A questão foi
submetida à Seção de Direito Privado, onde se decidiu pela
possibilidade da compensação judicial (REsp 155.135/MG, 2ª
Seção, rel. o Min. Nilson Naves, DJ 08.10.2001): "1. O Cód. de
Pr. Civil, no art. 21, ordena se aplique a regra da compensação,
109
enquanto a Lei nº 8.906/94, no art. 23, estabelece que os
honorários pertencem ao advogado, tendo ele direito autônomo
para executar. 2. Sucede, no entanto, que tais normas não são
incompatíveis entre si, sendo lícito entender-se que uma não
incomoda a outra, convivendo ambas perfeitamente no mundo
jurídico. 3. Em caso de sucumbência recíproca, admite-se, por
conseguinte, a compensação, ao ver de precedentes da 4ª
Turma, entre outros, os REsps 149.147 e 186.613, cuja
orientação foi, no presente caso, acolhida pela 2ª Seção, por
maioria de votos. Improcedência da alegação de ofensa a texto
de lei federal".
- Na sucumbência parcial, nos embargos do
devedor, não é fixada uma verba honorária em favor do
embargante, sobre o que ele conseguir abater da dívida
executada, e outra, em benefício do credor, calculada sobre
a dívida remanescente, compensadas até onde se igualarem,
mas sim uma única verba em favor do credor-exeqüente,
arbitrada com base no valor remanescente do débito, em
percentual reduzido, diante da sucumbência recíproca, que
vale para a ação de embargos e para a execução. Assim, por
exemplo, se o credor executa 100, e o devedor, nos
embargos, consegue diminuir para 30, defere-se uma única
verba de 5% em favor do credor, calculada sobre a dívida
remanescente (30), para os dois processos, embargos e
execução. É o que ficou decidido na Segunda Seção em
28.5.2003, nos EDC/REsp 139.343/RS. Em certas situações,
porém, tal seja a disparidade entre o valor cobrado e o
efetivamente devido, acredito deva ser deferida a verba
honorária em favor do advogado do embargante, em juízo
eqüitativo.
110
- No caso de advogado de partido: sem contrato, os
honorários são da parte; com contrato, são do advogado; se a
parte já pagou ao advogado, pode cobrar a verba (REsp
95.003/RJ, 4ª Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha).
- A multa moratória pode ser cumulada com
honorários (REsp 88.398/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Waldemar
Zveiter; REsp 164.546/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de
Figueiredo Teixeira).
- Na desistência da execução, porque o credor
desistiu da execução antes de tomar conhecimento dos
embargos oferecidos pelo executado, a Quarta Turma não impôs
honorários ao exeqüente, conforme se vê do REsp 75.057/MG,
de minha relatoria, DJ 13.05.1996: "Execução. Desistência.
Extinção do processo. Embargos do devedor. Honorários
advocatícios. 1. O credor pode desistir do processo de execução
em qualquer caso, independentemente da concordância do
executado. O parágrafo único introduzido pela Lei 8.953/94
apenas dispôs sobre os efeitos da desistência em relação à ação
de embargos, mas manteve íntegro o princípio de que a
execução existe para satisfação do direito do credor. 2. A
questão dos honorários advocatícios no processo de execução e
na ação de embargos tem sido assim predominantemente
resolvida: a) existindo apenas o processo de execução, a sua
extinção a requerimento do credor não enseja a condenação do
exeqüente em honorários, salvo se o executado provocou a
desistência; b) na ação de embargos, considerada autônoma, é
possível a imposição da verba, além da deferida na execução; c)
nesse caso, o quantitativo total, que se recomendava ficasse no
limite dos 20%, hoje será fixado segundo apreciação eqüitativa
do juiz (art. 20, parágrafo 4º, com a nova redação), devendo ser
evitada a excessiva oneração da parte; d) extinta a execução,
111
por desistência do exeqüente, mas prosseguindo a ação dos
embargos, a requerimento do devedor (art. 569, parágrafo
único, alínea ‘b’), o credor será condenado a honorários na
execução quando a desistência decorrer de provocação do
devedor, fixada a verba honorária por juízo de eqüidade.
Precedentes do STJ. 3. No caso dos autos, o credor desistiu da
execução antes de tomar conhecimento da ação de embargos,
pelo que o seu comportamento processual não decorreu de
provocação do devedor, sendo por isso indevida a condenação
na verba honorária. Art. 20, parágrafo 4º, e art. 569, parágrafo
único, do CPC. Recurso conhecido e provido."
No entanto, esse mesmo processo foi levado por
embargos de divergência ao julgamento da Corte Especial
(EREsp 75057, rel. o Min. Peçanha Martins, DJ 04.11.1998), que
definiu o entendimento do Tribunal em sentido contrário:
"Processual. Embargos de divergência. Execução. Execução
embargada. Desistência do exeqüente. Verba honorária. 1.
Operada a desistência da execução após a oposição dos
embargos pelo devedor, tanto mais quando provido o recurso
adesivo deste último, no Tribunal a quo, sobre o tema, os ônus
da sucumbência recaem sobre o exeqüente, inclusive,
honorários advocatícios. 2. Embargos de divergência recebidos,
para fazer prevalecer a tese do aresto paradigma concorde com
entendimento das Turmas integrantes da Primeira Seção,
condenando o exeqüente na verba honorária, como estabelecido
na sentença."
- Assim, o exeqüente que desiste paga honorários,
ainda que não tenha sido intimado dos embargos. Também no
caso de o devedor ingressar nos autos, indicando bens (REsp
134.749/SC, 3ª Turma, rel. o Min. Waldemar Zveiter).
112
- Nos embargos de terceiro, se estes "atacam
penhora levada a efeito em execução, o valor da causa não
pode exceder o do bem sujeito à constrição, nem o do débito"
(EREsp 187.429/DF, 2ª Seção, rel. o Min. Ari Pargendler).
- O valor dos honorários dos embargantes que
atacaram apenas uma parte da execução e saíram vitoriosos,
deve ser fixado tendo em vista esse quantitativo, e não o total
da execução (REsp 120.895/CE).
- Nos embargos de terceiro contra penhora de bem
objeto de contrato de promessa de compra e venda não
registrada no RI, julgados procedentes os embargos, o
exeqüente vencido pagará honorários somente quando resistir à
pretensão do terceiro. Se desde logo concorda com a exclusão
do bem e o cancelamento da penhora, não se lhe pode impor a
obrigação de pagar os honorários do patrono do embargante
uma vez que o equívoco da prática do ato de constrição não
pode ser atribuído ao exeqüente, que não sabia nem poderia
saber da existência daquela promessa não registrada, e sim ao
embargante e ao devedor. Consta da ementa do REsp
291.595/RJ: "Não responde pelos honorários do patrono do
embargante o credor que de pronto concorda com o pedido
formulado nos embargos de terceiro para excluir da penhora
bem objeto de promessa de compra e venda não registrada".
Precedente citado: REsp 264.930/PR.
- Para promover a execução do seu crédito, o banco
muitas vezes deve se resguardar com o protesto. Quando se
trata de protestar duplicata sem causa, recebida por endosso, o
banco que a leva a protesto correu o risco do negócio e deve
pagar os honorários do advogado da parte que nada deve e foi
forçada a vir a juízo requerer a sustação ou o cancelamento do
protesto, ou a anulação do título (REsp 193.635/MG, de minha
113
relatoria). Se estiver na causa o emitente da duplicata, deve ser
repartida com este, e em maior quantitativo, mas
solidariamente, a responsabilidade pelos ônus da sucumbência
(REsp 147.585/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro; REsp
193.635/MG, 4ª Turma, de minha relatoria). Esse entendimento
não é pacífico, havendo julgados que excluem o banco de tal
pagamento, sob o fundamento de que faltaria causalidade a
justificar a sucumbência (REsp 173.451/PR, 3ª Turma, rel. o Min.
Carlos Alberto Direito), ou porque o banco estaria apenas
exercendo o seu direito de protesto contra o endossante. (Sobre
responsabilidade do banco por protesto de duplicata sem causa,
ver acima, Segunda Parte, nº 6.25, itens I a V).
- A estipulação dos honorários e a escolha dos seus
percentuais, dentro dos limites da lei, tem sido considerada
matéria de fato, excluída do âmbito do recurso especial.
Contudo, quando a verba é exagerada ou irrisória, o recurso
pode ser conhecido para a definição de novos parâmetros (REsp
153.208/RS, 3ª Turma, rel. o Min. Nilson Naves - 1%). Haveria
ofensa ao juízo eqüitativo (REsp 47.843/RJ, 3ª Turma, rel. o Min.
Eduardo Ribeiro; REsp 194.867/MG). Nos embargos
improcedentes ou na execução não embargada, não há
exigência para a aplicação do percentual entre 10% e 20% sobre
o valor do débito ou sobre o valor da causa.
Nesse ponto, deve ser transcrita a tira de
julgamento do REsp 450.163/MT, Segunda Seção, em
9.4.2003, quando se decidiu sobre a verba honorária
deferida l iminarmente pelo juiz ao despachar a petição do
processo de execução: se não paga a dívida e não
embargada a execução, sua estipulação é definitiva, mas
pode ser revista no recurso especial: “A Seção, por maioria,
decidiu que pode examinar, em recurso especial, a
114
quantif icação da verba honorária f ixada pelo juiz ao
despachar a petição inicial de processo de execução para os
casos de pronto pagamento ou na falta de embargos,
vencidos os Srs. Ministros Relator e Fernando Gonçalves.
Prosseguindo no julgamento, a Seção decidiu que a verba
honorária, assim fixada, não efetuado o pagamento e não
opostos embargos do devedor, é definitiva, vencidos os Srs.
Ministros Antônio de Pádua Ribeiro e Sálvio de Figueiredo
Teixeira, que a entendiam provisória. Por f im, a Seção
decidiu que a verba, assim como estipulada neste processo,
é adequada, vencidos os Srs. Ministros Antônio de Pádua
Ribeiro, Sálvio de Figueiredo Teixeira e Barros Monteiro”.
15. A suspensão do processo de execução se dá
também pela inexistência de bens penhoráveis (art. 791, I, do
CPC).
A lei que dispõe sobre execução fiscal tem regra
que dispõe sobre a interrupção da prescrição em caso tal. Na
execução de título extrajudicial, mesmo silenciando o credor
durante prazo superior ao da prescrição do título (às vezes
transcorrem muitos anos), a jurisprudência predominante no STJ
entende que não flui a prescrição, "que supõe diligência a cargo
do credor", isto é, o crédito somente poderia ser atingido pela
passagem do tempo se essa demora decorresse de omissão
imputável ao credor, o que não acontece quando a dificuldade
resulta da falta de bens (REsp 70.395/PR, 3ª Turma, rel. o Min.
Nilson Naves).
Estou hoje convencido de não ser esse o melhor
entendimento. No voto-vencido no REsp 223.619/RJ, assim me
pronunciei: “Ocorre que essa orientação (a predominante, aceita
no REsp 70.395/PR e em outros: 38.399/PR; 34.035/PR ) é
115
consequência da aplicação da regra de direito processual (sem
bens penhoráreis, suspende-se o processo) ao problema da
contagem do tempo da prescrição, que é tema de direito
material, e neste não se encontra norma estabelecendo que a
suspensão do processo é causa de suspensão da prescrição. O
direito privado não tem regra semelhante à do art. 40 da Lei nº
6.830/80, sobre a execução fiscal, que dispõe, expressamente,
sobre a suspensão do curso do prazo prescricional enquanto
suspensa a execução por não encontrados bens a penhorar. O
ponto já foi referido no REsp nº 52.178/PR, Rel. o em. Min.
Eduardo Ribeiro: ‘Não vulnera o art. 791, III, do CPC, a decisão
que entendeu correr o prazo da prescrição enquanto suspenso o
processo de execução por falta de bens a penhorar’. O
entendimento aceito pelos precedentes acima mencionados,
para os quais já emprestei minha solidariedade, pode levar à
estranha situação de imprescritibilidade do crédito, pois permite
que se prossiga na execução ainda que passados mais de 20
anos, desde que só então sejam encontrados bens do
executado. Nos autos, temos bom exemplo disso: a citação no
processo executivo aconteceu em 1975 e somente em 1993 foi
retomada a execução, reiniciando-se a tramitação do feito não
com a indicação dos bens que seriam penhoráveis, mas com o
requerimento de diligências para localização de tais bens,
diligências essas que poderiam ter sido tomadas já em 1975.
Aplicável aqui a ponderação feita pelo em. Ministro Eduardo
Ribeiro, ao votar vencido no REsp nº 34.035/PR: ‘No caso, deu-
se a paralisação do feito, por não se encontrarem bens a
penhorar. Não se trata de hipótese em que a lei preveja a
suspensão da prescrição. Nem seria recomendável admitir-se
permanecesse indefinidamente o débito, mesmo à míngua de
qualquer diligência do credor.’ Considero que a perpetuidade do
116
crédito bancário não está de acordo com o sistema. Esse
avalista, que deu um aval há 30 anos, poderá ter agora os seus
bens penhorados; mas se fosse autor de homicídio do gerente,
ou de roubo do numerário, não seria mais perseguido pelo
Estado, porque teria ocorrido a prescrição extintiva. À luz do
direito civil, em cinco anos teria ele adquirido a propriedade das
moedas de que se apropriasse, pela prescrição aquisitiva (art.
619, CC). Só o que não prescreve é o crédito do banco, que
permaneceu 13 anos inerte” (Voto vencido no REsp 223.619/RJ).
16. O crédito apurado em ação consignatória será
executado nesse mesmo processo, mediante requerimento da
parte em favor da qual foi verificado saldo credor. Isso significa
que a ação consignatória, embora insuficiente o depósito,
poderá ser julgada procedente em parte, liberado o autor do
que depositou, ficando definido o saldo, com executividade,
para o credor prosseguir no processo com a execução do débito
(REsp 94.425/SP, 4ª Turma, de minha relatoria).
17. A Lei 8.009/90 declarou a impenhorabilidade do
bem imóvel que serve à residência da família do devedor,
incluindo móveis e instrumentos de trabalho.
Os precedentes tratam de diversas situações.
17.1 - O imóvel residencial locado, sendo o único da
família, pode ser considerado impenhorável. Esse o
entendimento acolhido na Quarta Turma (REsp 159.213/ES, rel.
o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira; REsp 98.958/DF, de minha
relatoria) e também na Primeira Turma (REsp 183.042/AL, rel. o
Min. Humberto Gomes de Barros). Mas acórdão recente da
Terceira Turma é em sentido contrário (REsp 232821/MS, rel. o
Min. Eduardo Ribeiro).
117
17.2 - O imóvel que parcialmente serve de moradia
e parcialmente ao comércio do devedor, considera-se
impenhorável (REsp 285.622/SP, 4ª Turma, de minha relatoria).
17.3 - O pátio e o jardim são impenhoráveis. Mas se
a casa está situada sobre mais de um lote, sendo possível a
divisão, o lote sem edificação pode ser penhorado (REsp
188.706/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira).
17.4 - Dos móveis da casa, são impenhoráveis o
aparelho de som e a televisão. O aparelho de vídeo cassete já
foi considerado penhorável (REsp 102.271/MG, 4ª Turma, de
minha relatoria), mas depois foi excluído, porque instalado para
uso educativo. São também impenhoráveis o forno de
microondas e o computador (REsp 150.02/MG, 3ª Turma, rel. o
Min. Waldemar Zveiter; REsp 284.616/RJ, 4ª Turma, rel. o Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira). A linha telefônica é insuscetível
de penhora (REsp 39.970/RJ, 4ª Turma, rel. o Min. Aldir
Passarinho Júnior; REsp 262.900/RJ, 5ª Turma, rel. o Min. Edson
Vidigal). O televisor não é penhorável (REsp 161.262/RS, 4ª
Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Júnior). São impenhoráveis o
computador, o microondas, as máquinas de lavar e secar e o
congelador (REsp 243.761/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Carlos
Alberto Direito).
17.5 - Com a separação do casal, o imóvel onde foi
residir a mulher com a filha é também impenhorável (REsp
112.665/RJ, 4ª Turma).
17.6 - "Com a separação judicial, cada ex-cônjuge
constitui uma nova entidade familiar, passando a ser sujeito da
proteção jurídica prevista na Lei nº 8.009, de 29.03.90" (REsp
218.377/ES, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro, DJ
20.06.2000).
118
17.7 - "O conceito de entidade familiar, deduzido
dos arts. 1º da Lei 8.009/90 e 226, § 4º, da CF/88, agasalha,
segundo a aplicação da interpretação teleológica, a pessoa que,
como na hipótese, é separada e vive sozinha, devendo o manto
da impenhorabilidade, dessarte, proteger os bens móveis
guarnecedores de sua residência. 2 - Recurso especial
conhecido e provido" (REsp 205.170/SP, 5ª Turma, rel. o Min.
Gilson Dipp, DJ 07.12.1999).
17.8 - A residência do viúvo é impenhorável (REsps
253.854/SP e 276.004/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Carlos Alberto
Direito).
Deve ser referido o REsp 182.223/SP, da relatoria
do Min. Vicente Cernicchiaro, 6ª Turma: "A Lei nº 8.009/90, o
art. 1º precisa ser interpretada consoante o sentido social do
texto. Estabelece limitação à regra draconiana de o patrimônio
do devedor responder por suas obrigações patrimoniais. O
incentivo à casa própria busca proteger as pessoas, garantindo-
lhes o lugar para morar. Família, no contexto, significa
instituição social de pessoas que se agrupam, normalmente por
laços de casamento, união estável, ou descendência. Não se
olvidem ainda os ascendentes. Seja o parentesco civil, ou
natural. Compreende ainda a família substitutiva. Nessa linha,
conservada a teleologia da norma, o solteiro deve receber o
mesmo tratamento. Também o celibatário é digno dessa
proteção. E mais. Também o viúvo, ainda que seus
descendentes hajam constituído outras famílias, e como,
normalmente acontece, passam a residir em outras casas. 'Data
venia', a Lei nº 8.009/90 não está dirigida a número de pessoas.
Ao contrário - à pessoa. Solteira, casada, viúva, desquitada,
divorciada, pouco importa. O sentido social da norma busca
garantir um teto para cada pessoa. Só essa finalidade, 'data
119
venia', põe sobre a mesa a exata extensão da lei. Caso
contrário, sacrificar-se-á a interpretação teleológica para
prevalecer insuficiente interpretação literal." (REsp nº 182.223-
SP, DJ de 10.05.99.
No REsp nº 434.856/PR, 4 ª Turma, rel. o Min. Barros
Monteiro, admitiu-se que a viúva, parte no processo executivo,
viesse com embargos de terceiro para defender a sua
propriedade com base na Lei 8.009/90.
17.9 - A residência da mãe e da avó no único imóvel
da família o coloca sob o abrigo da lei, garantindo-lhe a
impenhorabilidade: "Civil. Bem de família. O prédio habitado
pela mãe e pela avó do proprietário, cujas dimensões (48,00
m2) são insuficientes para também abrigar sua pequena família
(ele, a mulher e os filhos), que reside em imóvel alugado, é
impenhorável nos termos da Lei nº 8.009, de 1990. Recurso
especial conhecido e provido" (REsp 186.210, 3ª Turma, rel. o
Min. Ari Pargendler, DJ 20.09.2001).
17.10 - Quanto à penhora da residência de pessoa
solteira, existiam dois entendimentos neste STJ: (I) a Lei
8.009/90 protege o imóvel residencial da família, não o bem que
serve de residência ao devedor solteiro: "A Lei nº 8.009/90
destina-se a proteger, não o devedor, mas a sua família. Assim,
a impenhorabilidade nela prevista abrange o imóvel residencial
do casal ou da entidade familiar, não alcançando o devedor
solteiro, que reside solitário. Recurso especial conhecido e
provido parcialmente" (REsps 169.239/SP, 174.345 e 67.112/RJ,
4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro, DJ 19.03.2001,
31.05.1999 e 23.10.1995); (II) a lei protege a moradia, seja de
uma ou de mais pessoas, viúva, separada, ou de irmãos
solteiros: REsp 159.851/SP, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ
22.06.1998: "Os irmãos solteiros que residem no imóvel comum
120
constituem uma entidade familiar e por isso o apartamento onde
moram goza da proteção de impenhorabilidade, prevista na Lei
8009/90, não podendo ser penhorado na execução de dívida
assumida por um deles. Recurso conhecido e provido "; REsp
57.606/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Fontes de Alencar, DJ
15.05.1995: "Ao imóvel que serve de morada às embargantes,
irmãs e solteiras, estende-se a impenhorabilidade de que trata a
Lei 8.009/90".
No REsp 226.101, 4ª Turma, assim me manifestei:
"2. A eg. Câmara afastou a incidência da Lei 8.009/90 pelo único
fundamento de que residem no imóvel os filhos do executado
‘que, no entanto, com eles não reside. Sendo assim, não se
encaixam no conceito de entidade familiar preconizada pela
Constituição da República para fins de proteção pelo Estado’.
Contudo, no REsp 159.851-SP, apontado como divergente, ficou
reconhecido por esta Quarta Turma que os irmãos solteiros
podem alegar a impenhorabilidade do imóvel onde residem,
atingido na execução movida contra um deles. Com muito mais
razão, então, se o imóvel pertencia ao pai, ora falecido, e aos
filhos, por herança da mãe, falecida anteriormente, embora por
ocasião do julgamento o executado não coabitasse com os
filhos. Ocorre que o v. acórdão apegou-se à literalidade da lei e
denegou a pretensão dos embargantes, pois não formam um
‘casal’, o que pressupõe a existência de marido e mulher;
tampouco uma ‘entidade familiar’, constitucionalmente definida
como a união estável entre homem e mulher. Penso, no entanto,
que a proteção estendida pela Lei n° 8.009/90 à entidade
familiar não se limita à união estável, assim como referido na
Constituição para o fim do direito de família, nem à comunidade
formada por qualquer dos pais e seus descendentes, como está
no direito de família, mas se estende também aos filhos
121
solteiros que continuam residindo no mesmo imóvel que antes
ocupavam com os pais. Estes filhos são os remanescentes da
família, esta entendida como o grupo formado por pais e filhos,
e constituem eles mesmos uma entidade familiar, pois para eles
não encontro outra designação mais adequada no nosso
ordenamento jurídico. Se os três irmãos são proprietários de
parte do apartamento, herdado pelo falecimento da mãe, e
agora também do pai, e ali residem, esse bem está protegido
pela impenhorabilidade, pois sua alienação forçada significará a
perda da moradia familiar (...)".
O tema foi finalmente levado ao julgamento da
Corte Especial nos Embargos de Divergência em REsp 182.223-
SP. O embargante insurgia-se contra acórdão da Sexta Turma,
relatado pelo Ministro Vicente Cernicchiaro, que impedira a
penhora de bem imóvel que servia de residência a devedor
solteiro. O credor trouxe a confronto o REsp 67.112/RJ, 4 ª
Turma, da relatoria do Ministro Barros Monteiro (DJ 23/10/95), e
sustentou que a pessoa solteira não constitui uma "família", a
qual pressupõe "associação", lembrando que a extensão do
benefício da impenhorabilidade, nesse caso, favoreceria os
maus pagadores. A Corte Especial, na sessão de 6 de fevereiro
de 2002, relator para o acórdão o Ministro Humberto Gomes de
Barros, decidiu que o imóvel residencial do devedor solteiro é
imune à penhora, pacificando, assim, o entendimento do STJ
quanto ao tema (Informativo do STJ nº 122).
17.11 - Havendo necessidade de transferência de
domicílio por motivo de serviço, o imóvel que ficou locado
continua impenhorável: REsp 314.142/PR, 4ª Turma, de minha
relatoria, DJ 27.08.2001: "A transferência de domicílio por
necessidade de serviço, com a locação do imóvel residencial e
aluguel de outro na nova cidade, não descaracteriza o primeiro
122
como bem de família, que continua sendo a garantia da casa
própria. Recurso conhecido pela divergência, mas desprovido" .
17.12 - O imóvel residencial é penhorável na
execução por dívida de quotas condominiais (dívida propter
rem) (REsp 160.693/SP, 3ª Turma, rel. o Min. Ari Pargendler).
17.13 - O imóvel residencial é penhorável para
garantir débitos decorrentes de fiança locatícia, nos termos do
art. 82 da Lei 8.245/91, que excluiu o fiador do benefício da
impenhorabilidade do bem de família (REsp 302.603/SP, Quinta
Turma, rel. o Min. Gilson Dipp).
17.14 - Quanto à fiança, tem sido limitado o efeito
da garantia: "É assente neste Tribunal o entendimento de que o
instituto da fiança não comporta interpretação extensiva,
obedecendo, assim, disposição expressa do artigo 1.483 do
Código Civil. Na fiança, o garante só pode ser responsabilizado
pelos valores previstos no contrato a que se vinculou, sendo
irrelevante, na hipótese, para se delimitar a duração da
garantia, cláusula contratual prevendo a obrigação do fiador até
a entrega das chaves" (REsp 306163/MG, 5ª Turma, Rel. o Min.
Felix Fischer, DJ 07.05.2001.
17.15 - A responsabilidade dos fiadores em
contratos com prazo determinado, prorrogado sem a sua
anuência, não se estende até a entrega das chaves, mesmo que
haja cláusula expressa nesse sentido. Aplicação da Súmula 214
do STJ: "O fiador na locação não responde por obrigações
resultantes de aditamento ao qual não anuiu."
Vide os seguintes acórdãos: "É firme o
entendimento deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de
que o contrato acessório de fiança deve ser interpretado de
forma restritiva e benéfica, vale dizer, a responsabilidade do
fiador fica delimitada a encargos do pacto locatício
123
originariamente estabelecido. A prorrogação do contrato sem a
anuência dos fiadores não os vincula, sendo irrelevante,
acrescente-se, a existência de cláusula de duração da
responsabilidade do fiador até a efetiva entrega das chaves,
bem como aquela que pretenda afastar a disposição inserta no
art. 1.500 do Código Civil. Precedentes" (EREsp 255.392/GO, 3ª
Seção, rel. o Min. Hamilton Carvalhido, DJ 17.09.2001). "Se os
fiadores anuíram a contrato de locação por tempo determinado,
a sua responsabilidade vai até o termo final da avença,
notadamente se a prorrogação deu-se, tacitamente, sem a
expressa concordância deles. Nesse caso fica afastada a regra
do art. 39, da Lei nº 8.245/91, apta a estender a
responsabilidade decorrente da fiança até a entrega das chaves
do imóvel. Precedentes desta Corte. 2 - Recurso especial
conhecido em parte e, nesta extensão, provido" (REsp
331593/SP, 6ª Turma, rel. o Min. Fernando Gonçalves, DJ
12.11.2001). No mesmo sentido: REsp 299154/MG, 6ª Turma,
rel. o Min. Vicente Leal, DJ 15.10.2001; REsp 331531/SP, 5ª
Turma, rel. o Min. Felix Fischer, DJ 08.10.2001.
17.16 - Havendo transação entre o locador e o
locatário, sem a anuência do fiador, este não responde pelas
obrigações do pacto adicional. Aplicação da Súmula 214 do STJ.
Vide: "Nos termos dos arts. 1.031, § 1º, e 1.503, I do Código
Civil, havendo transação e moratória, sem a anuência dos
fiadores, não respondem estes por obrigações resultantes de
pacto adicional firmado entre locador e locatário, ainda que
exista cláusula estendendo suas obrigações até a entrega das
chaves, disposição esta que não prevalece. Precedentes do STJ".
(REsp 303541/MS, 6ª Turma, rel. o Min. Fernando Gonçalves, DJ
08.10.2001).
124
17.17 - O fato de o devedor ter indicado o bem à
penhora não o inibe de alegar posteriormente a sua
impenhorabilidade (REsp 172.058/MG, 4ª Turma, rel. o Min.
Barros Monteiro).
17.18 - "A circunstância de já ter sido beneficiado o
devedor, com a exclusão da penhora sobre bem que acabou por
ficar no patrimônio do ex-cônjuge, não lhe retira o direito de
invocar a proteção legal quando um novo lar é constituído"
(REsp 121.797/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo
Teixeira).
17.19 - A possibilidade de penhora de bem de
família dado em hipoteca (art. 3º, V, da Lei 8.009/90) limita-se à
hipótese de dívida constituída em favor da família, não se
aplicando em caso de fiança concedida em favor de terceiros
(REsp 268.690/SP, 4ª Turma, de minha relatoria).
17.20 - Não se aplica a Lei 8.009/90 quando o
executado, depois de se desfazer do seu patrimônio, transfere
residência para o imóvel penhorado (REsp 252.824/RJ, 4ª Turma,
de minha relatoria).
17.21 - A Lei 8.009/90 aplica-se à penhora realizada
antes de sua vigência. Súmula 205/STJ: "Civil. Processual civil.
Locação. Penhora. Bem familiar. Lei nº 8.009/90. Natureza
processual. Aplicação imediata. É firme o entendimento
consagrado no âmbito deste Superior Tribunal de Justiça no
sentido de que a regra consagrada no bojo da Lei nº 8.009/90,
ao considerar impenhoráveis os bens patrimoniais residenciais,
em face de sua natureza processual, possui eficácia geral e
imediata, atingindo os processos judiciais em andamento,
motivo pelo qual deve-se cancelar a penhora efetuada antes de
sua vigência" (REsp 63.866/SP, 6ª Turma, rel. o Min. Vicente
Leal, DJ 18.06.2001).
125
17.22 - Na execução de nota de crédito comercial, é
impenhorável o imóvel que serve de moradia à família do
executado; nula a penhora, também é nula a arrematação
efetuada pela CEF, credora hipotecária, que havia financiado a
aquisição do imóvel, uma vez que não se tratava de execução
da hipoteca. Não incide, no caso, a regra do art. 3 o, II e V, da Lei
9009/90 (REsp 412.834/RS, 4 ª Turma, minha relatoria).
17.23 - O imóvel em construção que se destina à
residência da família do devedor é impenhorável (REsp
96.046/SP, 2ª Turma, rel. o Min. Francisco Peçanha Martins. No
mesmo sentido: AG 447.740/PR, de minha relatoria).
17.24 – A garagem, embora com matrícula
própria, não pode ser penhorada (REsp 222.012/SP, 3ª
Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Direito). Em sentido
contrário: REsp 32.284/RS; AGA 453.085/SP, 3ª Turma, rel. o
Min. Ari Pargendler).
18. Tem sido permitida na Quarta Turma a revisão
dos contratos sucessivos celebrados entre as partes, um sendo
a renovação do outro, com novos valores ou novas cláusulas.
Entende-se que há aí uma renegociação da mesma dívida. Caso
se pretenda discutir o saldo devedor, impende que tudo seja
revisto. Não há novação propriamente dita, mas, se houvesse, a
novação não validaria cláusulas inválidas (art. 1.007 do CCivil).
O fato de já ter sido efetuado o pagamento não elimina a
possibilidade da revisão, pois o pagamento extingue a dívida,
mas não o direito de discutir judicialmente aquilo que foi
exigido. É bom ter presente que muitas vezes o devedor paga
para se livrar dos inconvenientes da mora, como inscrição na
Serasa, ou SPC, ou em outros registros, além do protesto, mas
isso não significa renúncia ao direito de discutir o valor do
126
débito (REsps 293.778/RS e 218.701/RS, 4ª Turma, de minha
relatoria). "A renegociação de contratos bancários não afasta a
possibilidade de discussão judicial de eventuais ilegalidades"
(REsp 237.302/RS, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo).
19. Na execução de crédito agrícola, na qual se
inclui também o pedido de pagamento do devido ao Proagro,
entende-se que o executado pode opor ao banco-exeqüente a
defesa que tiver contra a cobrança do Proagro. Essa defesa
pode versar sobre os percentuais e sua incidência mais de uma
vez ("A contribuição devida ao Proagro pode ser cobrada uma
vez" - REsp 128.938/RS, 4ª Turma, de minha relatoria). Tal
legitimidade é admitida porque, quando o Banco do Brasil cobra
o valor do seguro agrícola (Proagro), é ele parte legítima para
responder aos embargos opostos pelo devedor (REsp 79214/RS,
4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro), mas é parte ilegítima
para responder pela ação de cobrança do seguro, administrado
pelo Banco Central.
20. A impenhorabilidade dos bens dados em
garantia de crédito rural (Decreto-Lei 167/67) ou industrial
permanece durante a vigência do contrato, mas não se estende
para depois do contrato vencido, segundo jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal (RE 140.437/SP): "Execução. Penhora.
Hipoteca. Cédula rural. Impenhorabilidade (art. 69 do Del. 167,
de 14.02.1967). Limite. Os bens dados para garantia hipotecária
em cédula rural são impenhoráveis (art. 69 do Del. 167, de
14.02.1967), mas tal restrição perdura apenas durante o
período de vigência do contrato. Precedentes do STF e da 4ª
Turma" (REsp 35643/MG, 4ª Turma, Rel. o Min. Barros Monteiro,
127
DJ 10.11.1997). No mesmo sentido: REsp 83648/ES, 4ª Turma,
de minha relatoria, DJ 27.05.1996.
21. O contrato de abertura de crédito não é título
executivo, mas é hábil para a propositura da ação monitória: "O
contrato de abertura de crédito em conta corrente bancária não
é título executivo, mas nada impede que este seja obtido por
meio da ação monitória" (REsp 229027/PR, 3ª Turma, Rel. o Min.
Ari Pargendler, DJ 10.09.2001). "O contrato de abertura de
crédito em conta corrente constitui prova escrita hábil ao
ajuizamento da ação monitória" (REsp 215796/MG, 4ª Turma,
Rel. o Min. Barros Monteiro, DJ 21.08.2000)". Colhe-se do voto
do eminente Relator: "Após longos debates, a Segunda Seção
desta Corte, em decisão proferida nos autos dos Embargos de
Divergência no Recurso Especial nº 108.259-RS, firmou o
entendimento no sentido de que o contrato de abertura de
crédito, mesmo subscrito por quem é indicado em débito e
assinado por duas testemunhas, não constitui título executivo,
ainda quando a execução seja instruída com extratos e que os
lançamentos fiquem devidamente esclarecidos, com explicitação
dos cálculos, dos índices e dos critérios adotados para a
definição do débito, por constituírem documentos unilaterais de
cuja formação não participou o eventual devedor. E há pouco, tal
orientação jurisprudencial cristalizou-se no enunciado da Súmula
nº 23 desta Casa: 'O contrato de abertura de crédito, ainda que
acompanhado de extrato da conta-corrente, não é título
executivo'. Nessas condições, perfeitamente compreensível que
a instituição financeira optasse pela ação monitória para não
correr o risco de deparar-se com a construção pretoriana que
nega àquele contrato a qualidade de título executivo
extrajudicial. Ao depois, sabe-se que nem sempre o banco está
128
em condições de apresentar um completo demonstrativo
contábil, de modo a evidenciar de modo cabal e pleno a evolução
do débito exigido. Continua presente aí o risco de ver indeferido
o processo de execução. Considero, pois, que o Acórdão
recorrido, desatendendo aos princípios da economia processual,
celeridade e instrumentalidade das formas, vulnerou o art.
1.102a do Código de Processo Civil. De outro lado, esta Colenda
Quarta Turma já decidiu que, 'não se prestando à via executiva e
constituindo-se de documento particular, assinado pelos
devedores, bastante a comprovar a existência do débito, o
contrato de abertura de crédito mostra-se hábil à utilização do
procedimento monitório, no qual, insurgindo-se a parte ré, abre-
se a via do contraditório amplo, pelos embargos' (REsp nº
218.459-RS, Rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira). Confiram-
se ainda, entre outros, os REsps 146.511-MG, de minha relatoria,
e 234.563-RS, Rel. o Min. Cesar Asfor Rocha. Igual a diretriz
esposada pela C. Terceira Turma (REsp nº 178.373-MG, Rel. o Min.
Waldemar Zveiter, e REsp nº 203.768-RS, Rel. o Min. Carlos
Alberto Menezes Direito). Assim, o simples fato de ser
necessário o acertamento de parcelas acessórias ao débito
principal não inibe o emprego do processo monitório."
Assim como o contrato de abertura de crédito não
serve para a propositura da execução, assim também a nota
promissória a ele vinculada, criada para lhe dar garantia: "I -
Contrato de abertura de crédito não constitui título executivo,
ainda que subscrito pelo devedor e por duas testemunhas e
acompanhado dos demonstrativos de evolução do débito.
Precedentes da Segunda Seção. II - A nota promissória vinculada
ao contrato de abertura de crédito não goza de autonomia, em
face da própria iliqüidez do título que a originou" (AEREsp
129
197090/RS, 2ª Seção, Rel. o Min. Waldemar Zveiter, DJ
10.04.2000). "I - A Segunda Seção desta Corte firmou a
orientação de que o contrato de abertura de crédito, ainda que
acompanhado do extrato e da movimentação bancária e
assinado por duas testemunhas, não constitui título executivo
(EREsp 108.259-RS, DJ 20/9/99). II – A nota promissória
vinculada ao contrato de abertura de crédito perde a autonomia,
descaracterizando-se como título de crédito hábil a instruir, por
si só, a execução" (REsp 158039/MG, 4ª Turma, Rel. o Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 03.04.2000).
O contrato de abertura de crédito fixo, quando uma
quantia determinada é desde logo posta à disposição do
mutuário, é título executivo para a cobrança desse valor, com
os acréscimos legais: "O contrato de abertura de crédito fixo
constitui título executivo extrajudicial. Precedentes" (REsp
300711/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro, DJ
01.10.2001). No mesmo sentido: REsp 298416/SP, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 20.08.2001; REsp 308753/SC, 3ª Turma, rel.
o Min. Antônio de Pádua Ribeiro, DJ 11.06.2001.
22. Também se tem reiteradamente afirmado que a
necessidade de cálculo dos encargos financeiros e da
atualização monetária não retira a executividade do título:
"Quando o título requer, apenas, a elaboração de cálculos
aritméticos, não há falar em falta de liquidez, sendo certo que
tal se aplica para a conversão de moeda estrangeira pela taxa
vigente na data do pagamento" (REsp 270674/RS, 3ª Turma, rel.
o Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 20.08.2001). "A
necessidade de cálculo de parcelas acessórias não retira a
executividade do título" (REsp 260172/SP, 4ª Turma, de minha
relatoria, DJ 30.04.2001). "No tocante à carência de ação, não
130
está caracterizada, tendo em vista que a necessidade de
simples cálculos aritméticos para retirar os excessos não retira
dos títulos a liquidez e a executividade" (REsp 177637/RS, 3ª
Turma, rel. o Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ
23.10.2000).
23. O credor pode instruir o seu pedido de execução
com o contrato (quando se reveste dos requisitos da lei para os
títulos executivos) ou com a nota promissória criada em
garantia do débito, ou com ambos. O que figura no contrato
como devedor solidário responde pelo débito; o que ali consta
como "avalista", avalista não é, pois não existe aval em
contrato que não seja cambial, e por isso não responde
solidariamente. Tratando-se de execução da nota promissória,
mas nela não figurando o que assinou o contrato como garante,
este não pode ser executado pela nota.
Não há necessidade de serem legíveis as
assinaturas das testemunhas do contrato bancário, desde que
sobre a autenticidade do documento não se suscite dúvida
fundada; nem se exige que estejam assinadas todas as folhas do
contrato: "Título de crédito. Testemunhas. Assinatura ilegível ou
sem identificação. A exigência de identificação das testemunhas
que assinaram o contrato de abertura de crédito, cuja falta o
descaracterizaria como título executivo, somente pode ser
acolhida quando houver dúvida razoável a justificar tal
esclarecimento. Art. 585, II, do CPC. Recurso conhecido e
provido" (REsp 295355/MG, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ
22.03.2001). "Cédula rural hipotecária. Não se anula o
documento apenas por falta de assinatura dos devedores e
garantes em todas as folhas, se não há dúvida sobre a sua
131
autenticidade" (REsp 232723/SP, 4ª Turma, de minha relatoria,
DJ 20.03.2000).
24. O requerimento de expedição de ofício ao Banco
Central para a localização de contas bancárias em nome do
devedor não tem sido deferido, cabendo à parte diligenciar para
a obtenção desses dados (REsp 207.450/RS).
25. No leasing, a ação de reintegração de posse é a
via pela qual pode o devedor discutir as cláusulas do contrato:
"A ação de reintegração de posse é a via processual que a lei
concede ao credor para o desfazimento do contrato de ‘leasing’
pelo descumprimento do devedor. A procedência da ação
depende da existência da mora e da sua gravidade a ponto de
justificar a extinção do contrato. Tendo o devedor alegado que
as prestações mensais estão sendo calculadas abusivamente,
deve o juiz examinar essa defesa. Pois a reintegratória é a via
própria para isso" (REsp 150099/MG, 4ª Turma, de minha
relatoria, DJ 08.06.1998). Constou do voto: "(...) Mora somente
existe quando o atraso resultar de fato imputável ao devedor
(art. 963 do Código Civil). Se a exigência do credor é abusiva, e
portanto ilegítima, o devedor que não paga o que lhe está sendo
indevidamente cobrado não incide em mora, pois pode reter o
pagamento enquanto não lhe for dada quitação regular. O
melhor comportamento do devedor é, em tal caso, promover a
ação cabível para definir o valor exato do débito. Da sua
omissão, porém, não resulta a perda do direito de propor as
questões sobre os valores devidos, sobre a validade das
cláusulas contratuais referentes à sua prestação e sobre a
regularidade na composição do débito mensal, o que pode ser
feito não apenas em ação própria mas também quando da
132
reintegratória promovida pelo arrendante, ação que corresponde
à de resolução do contrato bilateral em geral, e que é a cena
adequada para o debate dos temas que envolvem o exato
cumprimento do contrato e o exame da legalidade de suas
cláusulas. Deixando de examinar a alegada abusividade da
avença, matéria de ordem pública a ser conhecida até de ofício
pelo juiz, nos termos do art. 51 do CDC, a eg. Câmara causou
ofensa a tal dispositivo legal." E ainda: "Comercial e Processual
Civil. Ação de reintegração de posse. Contrato de arrendamento
mercantil. Âmbito da defesa do réu....II. Possível a discussão
pelo réu, em ação de reintegração de posse decorrente de
contrato de arrendamento mercantil, da validade das cláusulas
geradoras do débito que deu ensejo à demanda" (REsp 263522,
4º Turma, rel. o Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 12.02.2001).
26. A hipoteca constituída pelo construtor sobre o
imóvel construído e alienado a terceiro, dentro do SFH, não é
eficaz em relação aos adquirentes (REsps 171.241/SP e
205.607/SP, de minha relatoria).
27. Admitida a prisão civil do depositário judicial
infiel, a sua decretação fica sujeita ao princípio da
proporcionalidade: “2. Foram penhorados um automóvel Fiat,
uma linha telefônica e mais alguns móveis. O credor recebeu o
veículo e o telefone, faltando a entrega dos demais bens,
avaliados inicialmente em R$ 1.250,00, que hoje não valeriam,
segundo alegado nos autos, mais do que R$ 350,00, por serem
aparelhos de escritório há muito fora de linha . Assim
desenvolvido o processo de execução da dívida, não me parece
que se deva impor a prisão civil por um ano ao devedor que
substancialmente cumpriu com a obrigação de transferir os bens
133
ao credor, o que fez relativamente aos de algum valor. Um ano
de prisão pela falta de entrega daqueles bens (R$ 350,00)
significaria que um dia de liberdade da pessoa equivale a R$
1,00. Pelo princípio da insignificância, sequer se pune crime
contra o patrimônio que produza dano assim pequeno. Não me
parece razoável seja aplicada pena de prisão por um ano ao
depositário que não consegue entregar pequena parcela dos
bens recebidos em depósito. Há evidente ofensa ao princípio da
proporcionalidade, com a aplicação da mais severa das sanções,
inclusive na órbita penal, para forçar o depositário a entregar
bens móveis de valor irrisório, que não chega a 20% de um
salário mínimo. A idéia da proporcionalidade, diz o Prof. Willis
Santiago Guerra Filho, um dos primeiros a tratar do tema entre
nós, traduz-se em um importante princípio jurídico porque
viabiliza a dinâmica da acomodação dos princípios e funciona
como verdadeiro ‘topos’ argumentativo, útil para equacionar
questões práticas (‘O Princípio Constitucional da
Proporcionalidade’). É nesse aspecto que serve ao juiz quando
colocado diante da possibilidade de aplicar ou deixar de aplicar
regras de direito material ou processual que imponham sanções,
restringindo alguns bens fundamentais, como a liberdade e a
igualdade. Cumpre-lhe atentar para a finalidade a ser atingida e
o valor que se quer preservar, a vantagem que daí possa
decorrer e a desvantagem no âmbito pessoal ou social. Se a
ofensa a ser causada pela sanção for desproporcional ao
proveito, deve o juiz deixar de fazer a aplicação judicial da
medida, que a lei autoriza, ainda que adequada (eficaz) ou
exigível (necessária). Isso é o que explica o uso do princípio da
bagatela, no Direito Penal, para afastar a condenação; o
princípio do adimplemento substancial, no Direito das
Obrigações, para impedir a resolução do contrato; o princípio da
134
insignificância para rejeitar a deserção do recurso que veio com
preparo insuficiente, e serve como argumento útil para não se
impor a pena de prisão civil a quem cumpriu substancialmente
com a sua obrigação de depositário, como no caso do autos, em
que se faz incidir imediatamente aquele princípio - que decorre
implicitamente do sistema constitucional vigente - para regular
uma situação processual. E assim deve ser porque, segundo
máxima do Tribunal Constitucional alemão, ‘quanto mais a
intervenção afeta formas de expressão elementar da liberdade
de ação do homem, tanto mais cuidadosamente devem ser
ponderados os fundamentos justificativos de uma ação cometida
contra as exigências fundamentais da liberdade do cidadão’
(Curso de Direito Constitucional, Paulo Bonavides, 12ª ed.,
Malheiros Editores, p. 372)” (ROHC 12.878/SP, 4 ª Turma, minha
relatoria, DJ 11/11/2002).
28. Sobre a ação monitória:
28.1 - Cheque prescrito. Tem sido admitida a
propositura da ação mediante a simples apresentação do
cheque cuja ação cambiária esteja prescrita, sendo dispensável
a indicação da causa. (REsp nº 419477/RS, 4ª Turma, rel. o Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 02/09/2002).
No REsp 419.477/RS votei vencido e, nos demais,
ressalvei posição contrária à dispensa de indicação da causa do
débito, pois o cheque é título abstrato enquanto não prescrita a
ação cambial. Depois disso, é um documento de dívida que,
para ser objeto de ação de ressarcimento ou monitória, deve ter
sua causa indicada a fim de permitir a defesa do devedor.
Mesmo porque é documento ordinariamente presente em
negócios usurários, sancionados pela MP 2172-32, de 23 de
135
agosto de 2001, que inverte o ônus da prova, isto é, o credor
deve comprovar a origem lícita do seu crédito, e não constitui
nenhum exagero pedir ao autor que informe a origem da dívida
(REsp nº 412053/MG, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ
16/09/2002). Era assim que também votava o em. Min. Eduardo
Ribeiro: “Ação Monitória - Cheque prescrito – Endossante. A
simples alegação de que o réu endossou cheque que não foi
pago, não viabiliza a ação monitória. É essencial que seja
informado a origem do débito cujo pagamento se pretende. A
prescrição é da pretensão de cobrar o cheque e não, apenas, do
direito à execução” (REsp nº 146441/DF, 3ª Turma, rel. o Min.
Eduardo Ribeiro, DJ 15/05/2000).
28.2 - “O contrato de abertura de crédito em conta-
corrente, acompanhado do demonstrativo de débito, constitui
documento hábil para o ajuizamento da ação monitória”. Súmula
247/STJ.
28.3 - Citação por edital. “É possível a citação por
edital do réu em ação monitória; sendo ele revel, nomear-se-á
curador especial para exercer a sua defesa através de embargos
(art. 1.102 do CPC)”. (REsp nº 175090/MS, 4ª Turma, de minha
relatoria, DJ 28/02/2000). No mesmo sentido: REsp nº
297413/MG, 3ª Turma, rel. a Min. Nancy Andrighi, DJ
28/05/2001.
28.4 - Título executivo. “Havendo dúvida sobre a
exeqüibilidade do contrato, pode o credor valer-se da ação
monitória, em vez da execução, com vista a obter a certeza de
seu direito pela via do título judicial” (REsp nº 248293/SP, 4ª
Turma, rel. o Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, DJ 07/08/2000).
136
28.5 - “Documentos sem qualquer valor probatório,
por serem cópias sem autenticação, redigidos em língua
estrangeira e desacompanhados da devida tradução não enseja
o ajuizamento da demanda de cunho monitório”. (Apelação Cível
19/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Cesar Asfor Rocha, DJ 02/10/2000).
28.6 - Fatura de serviços. “A fatura mensal emitida
pela credora, que enumera serviços médicos e laboratoriais os
mais diversos, e apenas indica a sua quantidade e valor, não é
suficiente para a propositura de ação monitória. Art. 1102-A do
CPC. Recurso não conhecido” (REsp nº 264060/PI, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 12/02/2001).
28.7 - Ensino. Contrato de prestação de serviços
educacionais. “O contrato de prestação de serviços educacionais
pode ensejar a propositura de ação monitória, reservando-se
aos embargos a matéria relacionada com a invalidade de
cláusulas convencionadas.” (REsp nº 286036/MG, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 26/03/2001).
28.8 - "Romaneio". Litisconsórcio. “A ação monitória
pode ser proposta por vários produtores rurais, credores da
mesma empresa comercializadora da safra de café, uma vez que
se trata de litisconsórcio facultativo, formado com base no art.
46, IV, do CPC. - O "romaneio", documento fornecido pelo
comprador do produto agrícola quando do recebimento da
mercadoria, é documento hábil para o ajuizamento da ação
monitória”. (REsp nº 324656/ES, 4ª Turma, de minha relatoria,
DJ 18/02/2002)
137
28.9 - Cartão de crédito. “A petição inicial de ação
monitória para cobrança de dívida oriunda de cartão de crédito
deve vir acompanhada, além da prova do contrato, de
demonstrativo esclarecedor da formação do débito, com
indicação de critérios, índices e taxas utilizadas, desde o seu
início, a fim de que o devedor possa se defender pelos
embargos. - A falta pode ser declarada, de ofício, em segundo
grau.- O autor, porém, tem o direito de supri-la, nos termos do
art. 284 do CPC. Recurso conhecido em parte e provido” (REsp
nº 319044/SP, 4ª Turma, de minha relatoria, DJ 18/02/2002).
28.10 - Prova. Cerceamento de defesa. “O réu da
ação monitória tem o direito de provar tudo o que de relevante
alegar um sua defesa, inclusive a prática de usura por parte do
autor. Nesse ponto, prevalece o disposto na MP 2172, de
28.06.2001, que inverteu o ônus da prova. Recurso não
conhecido” (REsp nº 336434/DF, 4ª Turma, de minha relatoria,
DJ 06/05/2002).
28.11 - Telefone. “Para a propositura da ação
monitória é indispensável a prova da existência da dívida e do
seu valor. Sem a especificação dos serviços fornecidos pela
companhia telefônica (TELEMIG) e do seu valor, a simples
emissão de duplicata sem aceite não é suficiente. A presunção
que decorre da falta de impugnação do protesto deve estar
amparada no restante da prova” (REsp nº 329922/MG, 4ª Turma,
de minha relatoria, DJ 20/05/2002).
28.12 - Procedência dos embargos. “Nada impede
que o juiz, a despeito de ter processado a ação monitória, julgue
mais tarde, por ocasião dos embargos, insuficiente a prova que
138
a instruiu. Recurso especial não conhecido” (REsp nº 250640/SE,
3ª Turma, rel. o Min. Ari Pargendler, DJ 05/08/2002).
28.13 - Prova escrita. “Para a propositura da ação
monitória, não é preciso que o autor disponha de prova literal
do quantum. A ‘prova escrita’ é todo e qualquer documento que
autorize o Juiz a entender que há direito à cobrança de
determinada dívida. ...” (REsp nº 437638/RS, 4ª Turma, rel. o
Min. Barros Monteiro, DJ 28/10/2002).
28.14 - Duplicata sem aceite. Protesto. “O protesto
sem impugnação faz presumir a concordância do devedor
quanto à existência da dívida, razão pela qual a duplicata sem
aceite e protestada pode servir à instauração do procedimento
monitório”. (REsp nº 247342/MG, 4ª Turma, de minha relatoria,
DJ 22/05/2000). No mesmo sentido: REsp nº 204894/MG, 3ª
Turma, rel. o Min. Waldemar Zveiter, DJ 02/04/2001.
28.15 - Duplicata. “Constitui documentação hábil ao
ajuizamento de ação monitória a instrução da inicial com
‘borderô de desconto de duplicata’, assinado pelos devedores,
acompanhado de demonstrativo do saldo, de cópia do título e da
prova do creditamento do valor correspondente na conta
corrente do 1º recorrido”. (REsp nº 195972/MG, 4ª Turma, rel. o
Min. Aldir Passarinho Junior, DJ 13/08/2001). Assim também para
as triplicatas: “As triplicatas sem aceite, acompanhadas das
respectivas notas fiscais e dos instrumentos de protesto, sem
impugnação, servem como títulos hábeis para o ajuizamento da
ação monitória.” (REsp nº 281284/RJ, 3ª Turma, rel. o Min.
Carlos Alberto Menezes Direito, DJ 27/08/2001).
139
28.16 - Extratos bancários, ficha cadastral e cartão
de assinaturas: “...I - O procedimento monitório, também
conhecido como injuntivo, introduzido no atual processo civil
brasileiro, largamente difundido e utilizado na Europa, com
amplo sucesso, tem por objetivo abreviar a formação do título
executivo, encurtando a via procedimental do processo de
conhecimento. II - A ação monitória tem a natureza de processo
cognitivo sumário e a finalidade de agilizar a prestação
jurisdicional, sendo facultada a sua utilização, em nosso
sistema, ao credor que possuir prova escrita do débito, sem
força de título executivo, nos termos do art. 1.102a, CPC. III - Se
os extratos bancários, a ficha cadastral e o cartão de
assinaturas demonstram a presença da relação jurídica entre
credor e devedor e denotam indícios da existência do débito,
mostram-se hábeis a instruir a ação monitória. IV - Em relação à
liquidez do débito e à oportunidade de o devedor discutir os
valores, a forma de cálculo e a própria legitimidade da dívida,
assegura-lhe a lei a via dos embargos, previstos no art. 1102c,
que instauram amplo contraditório e levam a causa para o
procedimento ordinário. V - Uma vez opostos embargos ao
mandado monitório, instaura-se a via ampla do contraditório,
através do procedimento ordinário, de modo que a sentença que
acolhe esses embargos passa a constituir título executivo
judicial, nos termos do art. 584, I, CPC, incumbindo ao credor
ajuizar a execução, após encerrado o processo de
conhecimento” (REsp nº 220887/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Sálvio
de Figueiredo Teixeira, DJ 03/11/99).
28.17 - Documentos. “Evidenciando os documentos
que instruem a peça exordial a presença de relação jurídica
entre credor e devedor, bem como indícios da existência de
140
débito, de modo a serem tidos como ‘prova escrita sem eficácia
de título executivo’, cabível é a ação monitória. Precedente do
STJ. ... ” (REsp nº 331367/MG, 4ª Turma, rel. o Min. Barros
Monteiro, DJ 04/03/2002).
28.18 - Extratos. Juntada posterior . “Embora o
Banco não tenha exibido os extratos de conta-corrente desde o
início do período contratual, nada obsta que, diante da
impugnação ofertada pelo réu, supra a deficiência durante a
instrução processual. Recurso especial não conhecido” (REsp nº
417016/SP, 4ª Turma, rel. o Min. Barros Monteiro, DJ
16/09/2002).
28.19 - Extratos. Falta. Suprimento. “A petição
inicial da ação monitória fundada em contrato de abertura de
crédito deve vir acompanhada de documentos que expliquem a
formação da dívida cobrada, desde a sua origem, com indicação
dos encargos e seus percentuais, a fim de que possa o réu
apresentar os seus embargos. No caso dos autos, a falta ficou
sanada com a atividade do perito, que trouxe aos autos,
juntamente com o seu laudo, cópia dos extratos desde o início
da execução do contrato” (REsp nº 399568/MG, 4ª Turma, de
minha relatoria, DJ 21/10/2002).
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O texto corresponde à publicação do Centro de Estudos Judiciários – CJE do CJF, série Pesquisas do CEJ nº 11, e da Revista dos Tribunais, ano 92, maio de
2003, vol. 811, pp. 99-141.
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