Uma pUblicação do institUto nacional de tráUmato-ortopedia • VolUme 3 • JUnHo • 2006
D i s c u s s õ e s & C o m p l i c a ç õ e s&Orto Trauma
www.ortoetrauma.com.br
manejo das complicações das feridas operatóriasno tratamento cirúrgico do pé diabético
Valor diagnóstico do exame físico do ombrona doença do manguito rotador
complicações do tratamento do hálux valgo
&Sumário
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Diretor-GeralSérgio Côrtes
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Coordenador de Ensino e PesquisaSérgio Vianna
Uma publicação
E D I T O R A®
Uma pUblicação do institUto nacional de tráUmato-ortopedia • VolUme 3 • abril • 2006
D i s c u s s õ e s & C o m p l i c a ç õ e s
Orto Trauma
Editorial 4
rElato dE Casosmanejo das complicações das feridas operatórias
no tratamento cirúrgico do pé diabético 5
sEmiótiCa do manguito rotadorvalor diagnóstico do exame físico do ombro
na doença do manguito rotador 9
dEformidadEs do antEPÉComplicações do tratamento do hálux valgo 16
medicina desportivaLuiz Antonio Vieira
microcirurgiaPedro Bijos
ombroGeraldo Motta Filho
ortopedia infantilStelio Galvão
PéVerônica Vianna
QuadrilFernando Pina Cabral
traumaJoão Matheus
tumores musculoesqueléticosWalter Meohas
secretária-Executiva
Luciana Simo Soares
CoNSelHo
eDitorial
Coluna
Luiz Claudio Schettino
Crânio-maxilo-facial
Ricardo Cruz
fixador Externo
Fernando Adolphsson
Joelho
Lais Turqueto Veiga
mão
Anderson Vieira Monteiro
instituto nacional de tráumato-ortopedia (into)Rua Washington Luiz 47 • Centro • Cep 22350-200 • Rio de Janeiro-RJTel.: (21) 3852-7772 • Fax: (21) 3854-8858
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 �
editorial
Dr. Sérgio Vianna
Coordenador de Ensino e Pesquisa do Instituto Nacional de Tráumato-Ortopedia (INTO); chefe do Grupo de Pé e Tornozelo do INTO, Rio de Janeiro
Joanetes
Moça bonita,não fossem seus pés.Sapato deformado,apertado.Joanetes queimando,... pés inflamados.
Não suporta mais.Sofrimento maior.Retira o calçado.Zonas vermelhas denunciamjoanetes, infernal sacrifício.
Rabo de olho, na praia,vejo apressados joanetesmergulhando na areia.Moça bonitaescondendo seu grande pecado.
Joanetes, hálux valgo: grande pecado
Uma das deformidades mais freqüentes
no pé é o joanete. Compromete, em sua
esmagadora maioria, o sexo feminino, es-
tando associado, em grande parte, ao uso
de calçado inadequado: salto alto, fôrma
estreita para o antepé.
Dizemos que existe joanete quando
observamos qualquer aumento de volume
ao nível do aspecto medial da articulação
metatarsofalangiana do hálux. No hálux
valgo ocorre a associação de joanete com
acentuação do ângulo formado entre os
eixos da falange proximal do hálux e o
primeiro metatarsiano (superior a 15o).
Constitui, por
vezes, o pecado
mortal da mu-
lher, condenada
a esconder o seu
grande pecado.
� Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
rEsumo
Ao levar em consideração a gravidade e as possí-veis complicações pós-operatórias do pé diabético, os autores enfatizam a necessidade da abordagem multidis-ciplinar, com profissionais capacitados para o manejo dessa condição, a partir do relato de dois casos com resposta satisfatória à terapêutica tópica com sulfa-diazina de prata e nitrato de cério.
introduÇÃo
Segundo o Consenso Internacional sobre Pé Dia-bético(3), a prevalência global de diabetes em 1996 era de 120 milhões de pessoas, mas com previsão de al-cançar 250 milhões em 2025. As úlceras nos pés e as amputações dos membros inferiores são complica-ções graves e de alto custo que acometem a popula-ção de diabéticos, e estão associadas à alta mortalida-de e a elevadas taxas de recorrência(12).
Além dos custos pessoais inestimáveis relaciona-dos à amputação, devemos adicionar os custos previ-denciários e os gastos com a saúde. Os custos anuais totais da neuropatia diabética periférica e suas com-plicações nos EUA foram estimados entre 4,6 e 13,7 bilhões de dólares(10).
Embora a fisiopatologia das ulcerações no pé dia-bético seja complexa, em 80% dos pacientes diabéti-cos a polineuropatia parece ser o principal fator cau-sal de úlceras nos pés, eventualmente associando-se à doença vascular(8).
manejo das complicações das feridas operatórias
no tratamento cirúrgico do pé diabético
dr. fábio BatistaMédico da disciplina de Ortopedia do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (DOT-UNIFESP/EPM); chefe do Setor de Tratamento do Pé Diabético, de Feridas e de Amputados da Clínica de Ortopedia do Hospital Municipal do Tatuapé Carmino Caricchio (HMTCC); research scholar (Loyola University Chicago and Jackson Memorial Hospital at University of Miami, Diabetic Foot and Amputee Clinic)
augusto César monteiroChefe da Clínica de Ortopedia do HMTCC
Paula dadalti-granjaDoutora em Dermatologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); médica do Serviço de Dermatologia do Hospital Central Aristarcho Pessoa (HCAP)
fabíola BatistaEnfermeira especializada no tratamento de feridas crônicas
relato de Casos
As intervenções devem ser dirigidas para infecção, isquemia periférica, síndrome compressiva provocada por neuropatia periférica, bem como para limitação da mobilidade articular(12).
A cirurgia reconstrutiva do pé diabético tem como objetivos reduzir a possibilidade de ulceração, infec-ção e amputação, aprimorar a função e, muitas vezes, permitir que o pé se mantenha estável e passível de ser calçado.
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 6
relato de Casos
As complicações com a ferida operatória são uma preo-cupação constante para o cirurgião. Seus índices variam, em média, entre 5% e 10%, contudo, quando ocorrem, geram importante frustração na equipe de saúde e principalmente no paciente. Portanto merecem atenção especial, além de cuidados apropriados de profissionais bem treinados.
Em relação ao tratamento tópico existem inúmeras propostas, que variam desde antimicrobianos e cicatri-zantes até o uso de fatores de crescimento e substitu-tos biológicos de pele.
O uso tópico de antimicrobianos deve levar em conta princípios como baixa toxicidade, tanto em re-
lação ao potencial de provocar dermatite de contato quanto toxicidade sistêmica, além de ter baixos ín-dices de resistência bacteriana. Por outro lado, não deve causar prejuízos ao processo de cicatrização.
Estudos anteriores ressaltaram o baixo potencial sensibilizante da sulfadiazina de prata(5), aliado ao seu amplo efeito antimicrobiano(11, 15), e relatos apenas es-porádicos de resistência microbiana(11) e seus efeitos cicatrizantes(9, 13), mesmo sobre úlceras não-infecta-das(1).
A associação sulfadiazina de prata + nitrato de cério agrega aos efeitos comentados uma proprieda-
Figura 1 • Paciente diabético com mal perfurante plantar e osteomielite submetido a amputação parcial do pé. após a complicação pós-operatória foi tratado com sulfadiazina de prata + nitrato de cério, evoluindo com cicatrização após 80 dias
� Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
relato de Casos
de única conhecida como calcifilaxia, relacionada ao deslocamento da ligação do cálcio aos sais de piro-fosfato, permitindo que o mesmo precipite e forme uma membrana facilitadora do processo de cicatriza-ção(2). Adicionalmente, a presença do nitrato de cério é capaz de reduzir, na área lesada, os níveis de fator de necrose tumoral alfa (TNF-alfa)(7), presente em altos níveis no fluido colhido de úlceras crônicas, e também diminuir a capacidade de proliferação de fi-broblastos(14). Tais efeitos, aliados a relatos anteriores de aceleração do processo de cicatrização de úlceras venosas e mal perfurante plantar, com a associação sulfadiazina de prata + nitrato de cério(4, 6), motivaram
Figura 2 • Paciente diabético e com osteomielite submetido à ressecção de raio. Evolução com deiscência de sutura tratada com sulfadiazina de prata + nitrato de cério, com cicatrização após quatro semanas de tratamento
a utilização desse creme em dois pacientes com deis-cência pós-operatória da ferida cirúrgica.
O objetivo deste trabalho é apresentar, de manei-ra sistemática, formas de abordagem multiprofissional consideradas adequadas diante de complicações das feridas operatórias no tratamento cirúrgico do pé diabético. Para exemplificar tais abordagens são rela-tados dois casos acompanhados pelo nosso serviço.
mEtodologia
São apresentados dois casos de portadores de diabetes com feridas e infecção óssea crônica subme-
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 �
tidos a tratamento operatório (amputação parcial do pé e ressecção de raio, respectivamente), que evoluí-ram com deiscência de sutura.
Embora diversos tratamentos tópicos estejam disponíveis, foi utilizada a associação sulfadiazina de prata a 1% + nitrato de cério a 0,4% (Dermacerium creme®) como opção de cobertura no momento em que as feridas reuniam características clínicas compa-tíveis com essa escolha.
rEsultados
A evolução das lesões até a reparação das úlce-ras, incluindo pós-operatório, pode ser observada nas figuras 1 e 2.
ConClusÕEs
As feridas operatórias complicadas do pé diabéti-co requerem uma abordagem interdisciplinar que seja realizada por equipe treinada e familiarizada com esse procedimento.
Bom controle metabólico do diabetes, cuidados lo-cais por meio de técnicas avançadas de tratamento da ferida, proteção e descarga, novas intervenções cirúrgicas e eventual administração de antimicrobianos específicos devem fazer parte do arsenal terapêutico global, visando à recuperação anatomofuncional do seguimento operado.
Os resultados favoráveis encontrados são atribuídos, pelos autores, a um conjunto de ações baseadas na aborda-gem multidisciplinar e numa visão holística do paciente.
relato de Casos
rEfErÊnCias
1. BISHOP, J. B. et al. A prospective randomized evaluator-blinded
trial of two potential wound healing agents for the treatment
of venous stasis ulcers. J Vasc Surg, v. 16, n. 2, p. 251-7, 1992.
2. BOECKX, W. et al. Effect of cerium nitrate-silver sulphadiazine
on deep dermal burns: a histological hypothesis. Burns, v. 18, n.
6, p. 456-62, 1992.
3. CONSENSO INTERNACIONAL DE PÉ DIABÉTICO (1999).
4. DADALTI, P.; ABDALLA, S. Uso da sulfadiazina de prata associada
ao nitrato de cério em úlceras venosas: relato de dois casos. An
Bras Dermatol, v. 78, n. 2, p. 227-33, 2003.
5. DEGREEF, H.; DOOMS-GOOSSENS, A. patch testing with silver
sulfadiazine cream. Cont Derm, v. 12, p. 33-7, 1985.
6. DESIDÉRIO, V. L.; AGUIRRE, R. L.; DADALTI, P. Estudo evolutivo
de úlceras venosas e mal perfurante plantar após uso tópico da
associação de sulfadiazina de prata e nitrato de cério. Rev Bras
Angiol Cir Vasc, v. 10, p. 4, 2001.
7. DEVECI, M. et al. Effects of cerium nitrate bathing and prompt
burn wound excision on IL-6 and TNF-α levels in burned rats.
Burns, v. 26, p. 41-5, 2000.
8. EDMONDS, M. E. et al. Improved survival of the diabetic foot: the
role of a specialized foot clinic. O J Med, v. 60, p. 763-71, 1996.
9. GERONEMOUS, R. G.; MERTZ, P. N. EAGLSTEIN, W. H. Wound
healing the effects of topical antimicrobial agents. Arch Derm,
v. 115, p. 1311-14, 1979.
10. GORDOIS, A. et al. The health care costs of diabetic peripheral
neuropathy in the US. Diabetes Care, v. 26, n. 6, p. 1790-5, 2003.
11. HAMILTON MILLER, J. M. T.; SHAH, S.; SMITH, C. Silver
sulphadiazine: a comprehensive in vitro reassement. Chemoth,
v. 39, p. 405-9, 1993.
12. JEFFCOATE, W. J.; HARDING, K. G. Diabetic foot ulcers. Lancet,
v. 3, n. 361(9368), p. 1545-51, 2003.
13. LANSDOWN, A. B. G. et al. Silver aids healing in the sterile skin
wound: experimental studies in the laboratory rat. Br J Dermatol,
v. 137, p. 728-35, 1997.
14. MENDEZ, M. V. et al. The proliferative capacity of neonatal skin
fibroblasts after exposure to venous ulcer fluid: a potential
mechanism for senescence in venous ulcer, J Vasc Surg, v. 30, n.
4, p. 734-43, 1999.
15. NANGIA, A. K.; HUNG C. T.; LIM, J. K. C. Silver sulfadiazine in the
management of burns: an update. Drugs of Today, v. 23, p. 21-30, 1987.
� Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
Semiótica do manguito rotador
rEsumo
A lesão do manguito rotador (MR) é freqüente, sen-do a causa mais comum de indicação cirúrgica entre as doenças que acometem o ombro. As manobras do exa-me físico do ombro realizado para o MR são uma im-portante etapa para o diagnóstico e o tratamento. Vários testes semiológicos estão descritos para essa condição, porém seu valor estatístico ainda não está bem deter-minado, principalmente quando separamos as lesões do MR em três grupos: tendinite, lesão parcial e lesão com-pleta. Através da comparação de resultados do exame físico com achados cirúrgicos de 30 pacientes tratados de forma cruenta para patologia do MR, este estudo foi capaz de determinar o valor da sensibilidade e suas va-riações de seis testes clínicos descritos para avaliação do ombro: sinal de Neer, testes de Hawkins-Kennedy, de Jobe, do infra-espinal, de Gerber e da adução forçada. O cálculo da sensibilidade foi realizado para cada teste independente do tipo de lesão do MR e individualmente, de acordo com o acometimento tendinoso (tendinite, lesão parcial ou lesão completa).
introduÇÃo
Síndrome do impacto e lesão do manguito rotador (MR) são causas comuns de dor no ombro, sendo quei-xas freqüentes no ambulatório de ortopedia.
A história clínica apresentada pelo paciente poderá sugerir uma hipótese diagnóstica, mas somente após o
Valor diagnóstico do exame físico do ombro
na doença do manguito rotador
dr. geraldo rocha motta filhoChefe do Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo do Instituto Nacional de Tráumato-Ortopedia (INTO)
dr. marcio theo CohenMédico-residente do quarto ano do Grupo de Cirurgia de Ombro e Cotovelo do INTO
exame físico conseguimos confirmá-la e, assim, justificar a necessidade de exames complementares.
Na semiologia do ombro, vários testes e sinais carac-terizados como especiais são utilizados para os diagnós-ticos da síndrome do impacto e da lesão do MR. Em-bora Jarjavay(1) tenha descrito a bursite subacromial há 130 anos, o conhecimento das doenças que afetam o MR se tornou mais claro através de Neer e, mais tarde, de Hawkins. Eles descreveram testes específicos para o diag-nóstico clínico da síndrome do impacto com seus res-pectivos nomes(2, 3). Outras manobras semiológicas foram descritas para avaliar os músculos que compõem o MR (supra-espinal, infra-espinal, redondo menor e subescapu-lar), como os testes de Jobe, Gerber e do infra-espinal(4, 5). Embora estes sejam utilizados rotineiramente na prática clínica, existem poucos trabalhos que apresentam sua va-lidade estatística para o diagnóstico das patologias rela-cionadas ao MR, como a síndrome do impacto e a lesão
Arquivo: fqm078d2006_anuncio medico.cdr
OS: 10849 - Cliente: SCALLA
Operador: Alexandre - PC: DELL
Data: 07/03/06 - Hora: 20:10h - 42x28 cm
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Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 12
Semiótica do manguito rotador
específica de cada tendão. Realizamos, então, um estudo prospectivo com o objetivo de avaliar a sensibilidade dos testes de exame físico que avaliam o MR, através da com-paração do resultado do exame físico do ombro realiza-do em consulta ambulatorial com os achados cirúrgicos do MR nos pacientes tratados de forma cruenta.
matErial E mÉtodos
Entre setembro de 2005 e janeiro de 2006 foram tra-tados cirurgicamente no Instituto Nacional de Tráumato-Ortopedia (INTO-HTO) 30 pacientes com patologia do MR. Foram excluídos do trabalho aqueles que apre-sentavam, além da lesão do MR, artrose glenoumeral ou acromioclavicular e instabilidade do ombro. A média de idade dos pacientes foi 52 anos, variando de 35 a 72 anos. Quatorze pacientes eram do sexo masculino e 16, do feminino. Todos foram avaliados de forma prospectiva pré-operatoriamente pelo mesmo examinador, através de um protocolo de exame físico que incluiu os seguintes testes semiológicos: Neer, Hawkins-Kennedy, Jobe, Ger-ber, do infra-espinal e da adução forçada. Além do exame físico, foi realizado um estudo radiográfico que incluiu as seguintes incidências para o ombro acometido: ântero-posterior verdadeiro, perfil de escápula com inclinação caudal de 10 graus, axilar, incidência de Rockwood e Zan-ca. Através do estudo radiográfico foi determinado o tipo de acrômio de acordo com a classificação de Bigliani(6). Após o procedimento cirúrgico foi preenchido um ques-tionário em que se determinou a presença ou não de lesão ou inflamação do MR. Nos casos em que existia lesão do MR foi especificado se a lesão era parcial ou completa. Dessa forma, os pacientes foram divididos em três grupos: grupo 1 – pacientes com diagnóstico cirúr-gico de tendinite do MR; grupo 2 – pacientes com lesão parcial do MR; grupo 3 – pacientes com lesão completa do MR independente do número de tendões envolvidos ou do tamanho da lesão. Através de análise estatística foi determinada a sensibilidade de cada teste realizado pré-operatoriamente.
O primeiro teste foi o sinal do impacto descrito por Neer, no qual há flexão passiva do ombro com o cotovelo estendido enquanto o examinador estabiliza a escápula com a outra mão. O teste foi considerado positivo quan-
do havia queixa de dor na região anterior ou lateral do ombro com a flexão entre 90 e 140 graus(2).
O segundo teste foi o sinal de impacto descrito por Hawkins-Kennedy, no qual o braço é elevado passivamen-te para 90 graus de flexão; com o cotovelo em 90 graus de flexão se faz rotação interna máxima do ombro. O teste foi considerado positivo quando existiu dor durante a realização da manobra(3).
O terceiro teste realizado foi o da avaliação do mús-culo supra-espinal descrito por Jobe e Moynes(4). Nele realiza-se resistência aplicada pelo examinador contra elevação de um membro superior colocado em 90 graus de flexão no plano da escápula e em rotação interna má-xima. Foi considerado positivo quando existiu diminuição da força durante a realização da manobra.
O quarto teste, ou teste de força do infra-espinal, foi feito através da avaliação da rotação externa do ombro contra resistência, colocando-se o braço junto ao corpo e o cotovelo a 90 graus de flexão. Foi considerado positivo se identificada perda de força de rotação externa(5).
O quinto teste foi o descrito por Gerber para avalia-ção do músculo subescapular. Foi executado trazendo-se o braço passivamente em rotação interna máxima atrás do corpo do paciente, no nível da quarta e da quinta vértebra lombar, e então solicitando-se ao paciente afastar a mão do corpo. O teste foi considerado positivo se determinada a incapacidade de realização da manobra(5).
O último teste realizado foi o descrito para a ava-liação da articulação acromioclavicular, ou teste da adu-ção forçada. Foi executado através da adução forçada do membro superior com 90 graus de flexão do ombro, sen-do positivo com a presença de dor(5).
rEsultados
Foram tratados cirurgicamente 30 pacientes. A maior parte deles apresentou lesão completa do MR (grupo 3), com 18 casos. Dos demais pacientes, seis apresentaram lesão parcial do MR (grupo 2) e seis, apenas tendinite (grupo 1) (tabela 1). A média de idade foi maior no grupo 3 (tabela 2). A sensibilidade dos testes diagnósti-cos foi calculada considerando todos os pacientes, inde-pendente do grupo, ou seja, da lesão (tabela 3), e calcu-lada individualmente para cada grupo (tabela 4).
13 Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
Semiótica do manguito rotador
Quando considerados todos os grupos juntos, o teste que apresentou maior sensibilidade foi o de Neer (73,3%). Individualmente, a sensibilidade de cada tes-te se alterou dependendo da patologia do MR, sendo que, no grupo 1, tanto o teste de Neer quanto o de Hawkins apresentaram a mesma sensibilidade (83,3%), enquanto nos grupos 2 e 3 o teste de Neer se mostrou mais sensível (83,3% contra 66,6%).
Em relação ao teste de Jobe, sua positividade foi maior no grupo com lesão completa do MR (61,1%), enquanto nos grupos 1 e 2 a sensibilidade era de 33,3% e 50%, respectivamente. As sensibilidades dos demais testes estão resumidas nas Tabelas 3 e 4. Em relação ao formato do acrômio, dos 30 pacientes cinco apresen-tavam acrômio do tipo plano (16%), 15 do tipo curvo (50%) e dez do tipo ganchoso (33%). Nos três grupos a forma mais freqüente do acrômio foi o curvo. A pre-sença do acrômio do tipo ganchoso foi mais freqüente no grupo com lesão completa do manguito rotador (tabela 5).
tabela 1 – distribuição dos pacientes segundo a lesão do manguito rotador
Lesão do MR Número de pacientes
Grupo 1 (tendinite) 6
Grupo 2 (lesão parcial) 6
Grupo 3 (lesão completa) 18
tabela 2 – média de idade dos pacientes de acordo com o tipo de lesão
Tipo de lesão Média de idade (anos)
Tendinite 46
Lesão parcial 53
Lesão completa 58
disCussÃo
O tratamento bem-sucedido de qualquer doença do ombro exige boa acurácia diagnóstica por meio da histó-ria clínica e do exame físico. Isso ocorre principalmente nas lesões do MR, visto que até 34% de pessoas assinto-máticas podem apresentar uma lesão tendinosa diagnos-ticada através da ressonância magnética(7). Assim, a anam-nese e o exame físico detalhados são fundamentais para determinar com exatidão o estado do MR antes da indi-cação de qualquer tratamento. Neer descreveu um sinal do exame físico que ele afirmava não ser específico para a patologia do MR, mas auxiliar no diagnóstico do impacto subacromial(2). Vários outros testes do exame físico são utilizados rotineiramente para o diagnóstico dessa sín-drome e da lesão tendinosa do manguito: de Hawkins-Kennedy, Jobe, Gerber e o do infra-espinal(3-5). A literatura contém poucos trabalhos que avaliam estatisticamente os testes clínicos realizados para o diagnóstico das patolo-gias relacionadas aos tendões do MR. Assim, um estudo prospectivo que se proponha a relacionar o resultado do exame físico do ombro com achados cirúrgicos das pato-logias do MR é importante para que possamos confirmar a necessidade da realização dos mesmos pré-operato-riamente. Nosso estudo apresenta resultados parecidos com os da literatura em relação à sensibilidade dos testes avaliados(8-11). Entre as limitações deste trabalho citamos a falta de um grupo-controle incluído na metodologia e a não-realização de todos os testes descritos na literatura para a avaliação do MR.
McDonald et al.(8) estudaram 85 pacientes e avaliaram o valor diagnóstico dos testes de Neer e de Hawkins-Kennedy para bursite subacromial e para a lesão do MR, comparando o exame físico com achados através de ar-troscopia do ombro. A sensibilidade dos testes de Neer e
tabela 3 – valor da sensibilidade dos seis testes clínicos, independente do tipo de lesão no
manguito rotador
Independente da lesão Sensibilidade (%)
Neer 73,3
Hawkins-Kennedy 66,6
Jobe 53,3
Teste do infra-espinal 30
Gerber 16,6
Adução forçada 43,3
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 1�
Hawkins para bursite subacromial foi de 75% e 92%, res-pectivamente, enquanto no caso de lesão do MR corres-pondeu a 85% e 88%. A conclusão do autor foi que tanto o sinal de Neer quanto o de Hawkins eram sensíveis para a bursite e a lesão tendinosa.
Murrel e Walton(9) estudaram prospectivamente 400 pacientes com e sem lesão do MR submetidos a artros-copia de ombro e concluíram que os testes com maior valor diagnóstico para doença do MR eram fraqueza em rotação externa, fraqueza em abdução e sinal de Neer e Hawkins positivo. Quando os pacientes examinados apre-sentavam esses testes positivos ou apenas dois deles e mais de 60 anos de idade, havia 98% de chance de lesão parcial ou completa do MR.
Leroux et al.(10) calcularam a sensibilidade dos testes de Neer, Hawkins e Yocum para o impacto subacromial, e os seus valores foram, respectivamente, 89%, 87% e 78%.
Recentemente Park et al.(11) apresentaram trabalho em que 359 pacientes foram tratados com doença do MR. Fo-ram calculados sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo de oito testes diagnósti-cos. A sensibilidade desses testes foi calculada dividindo-se os pacientes em três grupos, como no nosso trabalho, ou seja, pacientes com bursite ou tendinite apenas, com lesão parcial e com lesão completa do MR. Uma das conclusões do autor foi que a maioria dos testes do exame físico do ombro apresenta sensibilidade maior que especificidade, isto é, muitos testes podem ser positivos na presença de outras patologias que não a do MR. Em seus resultados Park observou que nos pacientes com apenas tendinite o teste de Neer foi o mais sensível (85,7%), com maior valor preditivo positivo (20,9%) e maior valor preditivo negativo (95,7%). Nos pacientes com lesão parcial, ambos os testes, de Neer e Hawkins, obtiveram sensibilidade de 75,4%, e especificidade de 48% e 44% apenas. Nos casos de lesão completa o teste com maior sensibilidade foi o sinal do arco doloroso do MR, no qual o paciente queixa-se de dor no arco de 60 graus a 120 graus após elevação ativa do membro superior no plano da escápula. Esse teste não foi avaliado em nosso estudo. Assim como o trabalho de Park e diferentemente da maioria dos estudos publicados, sepa-ramos os pacientes com lesão do MR em três grupos, isto é, aqueles com apenas tendinite, os com lesão parcial e os que apresentavam lesão completa. Acreditamos que essa divisão seja importante, uma vez que a sensibilidade dos testes avaliados em nosso estudo variou nesses grupos.
tabela 4 – valor da sensibilidade dos seis testes clínicos de acordocom o tipo de lesão do manguito rotador (%)
Tendinite Lesão parcial Lesão completa
Neer 83,3 83,3 66,6
Hawkins-Kennedy 83,3 66,6 61,1
Jobe 33,3 50 61,1
Teste do infra-espinal 16,6 33,3 33,3
Gerber 16,6 0 22,2
Adução forçada 66,6 16,6 38,8
tabela 5 – Classificação do tipo de acrômio entre os três grupos
Tipo de acrômio Plano Curvo Ganchoso
Todos os pacientes 5 15 10
Grupo 1 1 3 2
Grupo 2 1 3 2
Grupo 3 3 9 6
Semiótica do manguito rotador
1� Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
tabela 6 – Comparação dos valores da sensibilidade dos testes de neer ehawkins-Kennedy entre diferentes estudos
Testes clínicos Sensibilidade (%)
Leroux, 1995 McDonald, 2000 Park, 2005 Motta Filho; Cohen, 2006
Grupo 1 (tendinite do MR)
Neer 89 75 85,7 83,3
Hawkins-Kennedy 87 91,7 75,7 83,3
Grupo 2 (lesão parcial do MR)
Neer NR* 83,3 75,4 83,3
Hawkins-Kennedy NR* 87,5 75,4 66,6
Grupo 3 (lesão completa do MR)
Neer NR* 77 59,3 66,6
Hawkins-Kennedy NR* 88,9 68,7 61,1
NR = cálculo não-realizado; MR = manguito rotador.
A comparação das sensibilidades dos testes de Neer e Ha-wkins-Kennedy com os estudos citados encontra-se espe-cificada na tabela 6.
ConClusÃo
Os testes de exame físico estudados em nosso traba-lho, e que são descritos para o diagnóstico da síndrome do impacto e para lesão do MR, apresentam sensibilidade variada de acordo com o acometimento tendinoso. Nos-sos resultados são semelhantes aos de alguns estudos da literatura.
rEfErÊnCias
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Semiótica do manguito rotador
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 16
Deformidades do antepé
complicações do tratamento do hálux valgo
sergio viannaChefe do Grupo de Cirurgia de Pé e Tornozelo do Instituto de Tráumato-Ortopedia (INTO)
verônica viannaOrtopedista do Grupo de Cirurgia de Pé e Tornozelo do INTO
isnar Castro JúniorOrtopedista do Grupo de Cirurgia de Pé e Tornozelo do INTO
As complicações após cirurgia de hálux valgo cons-tituem, na maioria das vezes, verdadeiras iatrogenias(2). Entre elas a mais desconcertante, para médico e pacien-te, é o hálux varo.
Muitas complicações poderiam ser evitadas se cada pé fosse analisado detidamente (figuras 1 e 2) e, então, calcado nos parâmetros identificados, sendo escolhida a
técnica operatória mais adequada ao caso em questão. Ainda como fator impediente de complicações está o pós-operatório bem conduzido.
Esse artigo será dividido em duas partes. Em ambas localizaremos as complicações com base em aspectos definidos de deformidades e restrições funcionais, sinto-matologia e alteração patológica. Não nos deteremos em abordagem geral como infecção, pseudartrose e retardo de consolidação nas osteotomias ou deiscência de sutura. Serão discutidas na primeira parte as seguintes compli-cações: correção insuficiente e hálux varo. E na segunda: metatarsalgia, necrose avascular, limitação da mobilidade da metatarsofalangiana do hálux e hálux balante (cock-up).
CorrEÇÃo insufiCiEntE
Pode ser demonstrada imediatamente após a cirurgia ou se fazer presente algumas semanas ou meses após. Está relacionada a uma incompleta liberação lateral da
(1a parte)
Figura 1 • Hálux valgo Figura 2 • Hálux valgo, medida dos ângulos aos raios-x
1� Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006
Deformidades do antepé
metatarsofalangiana do hálux e/ou plicatura capsular me-dial não-efetiva. Pode estar associada à existência de res-tos da lâmina medial. Ou, quem sabe, ser conseqüente à persistência de um ângulo intermetatarsiano elevado. Nesses casos, em que só a metatarsofalangiana do hálux é corrigida, geralmente persiste, no pós-operatório ime-diato, um espaço desgracioso entre o hálux e o segundo dedo. Um aspecto que deve ser lembrado é a presença de hálux valgo interfalangiano. Quando não é identificado e o paciente não é alertado de sua presença, fica difícil ex-plicar, em parte, a perpetuação da deformidade em valgo do hálux. Diante da correção insuficiente, cabe a revisão do realinhamento da metatarsofalangiana do hálux, pro-movendo ampla liberação lateral e retensionamento me-dial, excisando o restante da lâmina medial residual. Nos pacientes com hálux valgo interfalangiano é importante esclarecer a propósito da sua existência e de sua inclusão ou não no planejamento operatório. A técnica de Akin (ressecção de cunha de base medial da falange proximal do hálux) geralmente é a indicada (figura 3).
Nos pacientes com persistência do ângulo interme-tatarsiano aumentado, o procedimento de revisão deve incluir uma osteotomia do primeiro metatarsiano.
hálux varo
Não raramente o aparecimento dessa complicação sela o fim de uma relação médico/paciente amistosa. Pode estar ligada a um tensionamento capsular medial excessivo e liberação lateral metatarsofalangiana do hálux muito ampla. Somem-se a tais fatores a diminuição do ângulo intermetatarsiano a valor abaixo do normal (9o) ou a ressecção exagerada da lâmina medial, trans-formando a cabeça do primeiro metatarsiano muitas ve-zes numa ponta de lápis (figura 4) sobre a qual se equi-libra a falange proximal do hálux. A decisão do tipo de tratamento a ser utilizado no paciente com hálux varo, pós-cirurgia para hálux valgo, depende das condições da metatarsofalangiana do hálux.
Estando ela estável e sem alterações degenerati-vas, ao se efetuar a correção passiva do varo indica-se a sua liberação medial associada à cirurgia de Kenneth Johnson (figura 5) ou à de Kenneth Johnson modifica-da por Roger Mann.
A técnica de Kenneth Johnson consiste em transfe-rir o extensor longo do hálux, sob o ligamento trans-verso intermetatarsiano, para a borda lateral da falange
Figura 3 • Técnica de akin Figura 4 • Cabeça do primeiro metatarsiano em ponta de lápis
Orto & Trauma: Discussões e Complicações • Junho 2006 1�
rEfErÊnCias
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Figura 5 • Cirurgia de Kenneth Johnson Figura 6 • artrodese interfalangiana do hálux
proximal do hálux, tendo-se feito previamente a libera-ção medial da articulação metatarsofalangiana do hálux. Faz parte da técnica a artrodese interfalangiana do hálux (figura 6). A modificação dessa técnica, desenvolvida por Roger Mann, em tudo semelhante à anterior, vale-se da metade do tendão do extensor do hálux para realizar a mesma transferência. Nesse caso não se requer a ar-
trodese da interfalagiana, sendo, entretanto, necessário o retensionamento da metade do tendão remanescente. Nos casos onde existe processo degenerativo franco da metatarsofalangiana, ou quando a articulação é muito instável, indica-se a artrodese metatarsofalangiana, utili-zando-se enxerto ósseo quando necessário (articulação instável, com metatarsiano em ponta de lápis).
Deformidades do antepé
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