O presente, essa grande mentira social:a mais valia na reciprocidade
Ensaio antropológico de sociologia económica
por Raúl IturraPublicado por : Porto: Edições Afrontamento ; ISBN: 9723609010
O Avarento, Molière, 1668, lucra com juros de moeda que empresta e não pagando as suas
contas, transferindo a dívida aos mais pobres
Pequena nota introdutória: Escrevi este livro em 2004. Foi
publicado em 2008, pela Editora Afrontamento. Na Europa
estamos todos indignados, temos sido atropelados pelos
financistas, mal guardados pelo governo, este e os
anteriores, a nossa soberania é quase inexistente, mas tudo
tem uma explicação
O livro que a seguir apresento, dividido em troços, parece-
me ter essa explicação. Eis o texto e imagens explicativas.
O presente, essa grande mentira social*
A mais-valia na reciprocidade.
Ensaio Antropológico de Sociologia Económica.
1
Para a nossa neta Maira, filha de Cristan van Emden e Paula (née Iturra), e para o nosso amigo
Pierre Bourdieu
Parede, Dia de S. Valentim de 2004
Capítulo I: Reciprocidade. 2
Capítulo II: Reciprocidade Comercial. 33
Capítulo III: A Mais-Valia. 48
Capitulo IV: Socialismo Heterogéneo. 58
Capitulo V: Sociologia Económica. 95
Conclusões: A reacção de Durkheim e Mauss.
Bibliografia Comentada
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Capítulo PrimeiroReciprocidade
1. Introdução.
Há um comportamento humano, observado através da história, que é a procura da igualdade
na interacção social. Interacção entre seres humanos e entre estes e os bens que lhes
permitem, como habitualmente gosto de frisar, permanecer dentro da História. Comportamento
que pode causar o efeito contrário ao procurado, ao envolver hierarquias sociais e relações de
posse de recursos ou na sua falta.
Não existe grupo social que não queira que todos os seus membros sejam equivalentes,
insubstituíveis, doem o melhor de si para os outros ou retirem o melhor dos outros para si
próprio. Faz parte de uma longa tradição, dessas milenárias, o facto de se ser semelhante; até
a palavra que usamos para falar do outro, é esse substantivo semelhante. Milenar, porque
estava já escrito no texto denominado Bíblia, no Livro Êxodo, Capítulo 21, versículos 7 a 12,
bem como no Livro Deuteronomio, Capítulo 5, versículos 2 e seguintes[1]. Estes textos que
invoco, referidos e analisados no meu anterior livro[2], configuram o Decálogo ou Dez Palavras,
denominados pelo Ocidente Cristão como Antigo Testamento, os Livros de Moisés, e Novo
Testamento, o Evangelho de Mateus[3]. Este acaba com uma frase interessante: Amarás al
Señor, tu Dios, con toda tu alma y com toda tu mente. Éste es el más grande y el primer
mandamiento. El segundo, semejante a éste, es: Amarás al prójimo como a ti mismo. De estos
dos preceptos penden toda la Ley y los Profetas.[4] E é nestes textos, que a maior parte da
população ocidental procura essa igualdade. Ao que parece, como vamos ver, nunca
encontrada.
2
É John Locke que, a partir destes textos, concebe, em 1690, ideias que seriam de seguida
usadas pela Declaração da Independência das Colónias Inglesas na América, ou Estados
Unidos de América, e, mais tarde, pela Constituição Francesa. De facto, John Locke é a base
do movimento denominado Enciclopédia (base, porque começa a transferir os denominados
Textos Sagrados, para textos laicos ou civis, servindo-se de textos da mitologia ocidental que
orientam a conduta e o comportamento social). É no livro de 1695, que estabelece os princípios
que orientam a sua adesão ao movimento enciclopédico[5]: “The little fatisfaction and
confiftency that is to be found, in moft of the fyftems od divinity I have met with, made me
betake mufelf to the fole reading of the Scriptures (to which they all appeal) for the uderf the
Criftian Religion… I have received, Reader, here I deliver to thee”[6]
Mas, o que é que nos entrega, como ele diz? Um argumento de trezentas páginas, baseado
nas Escrituras Sagradas Ocidentais, que justifica a procura da igualdade perdida entre os
homens por causa do mito denominado a Desobediência de Adão, apesar da redenção da
Humanidade pelo dito filho de Deus, Jesus Cristo. No fundo, Locke estava a justificar dois
textos prévios, publicados anonimamente, tal e qual os já citados, sobre o Governo Civil e
sobre a Tolerância.[7] O mais interessante deste conjunto de ideias, é a frase “all human being
were equal and free to pursue life, health, liberty and possessions”[8]. Porque eram todos os
seres humanos nascidos livres e iguais? Eram, porque Adão se tinha virado contra a Lei Divina,
donde a liberdade e a igualdade haviam sido perdidas. Locke constrói um argumento, para
criticar o estado das relações entre senhores e plebeus. Não apenas ele, mas todo o
denominado Enlightment[9] e a Enciclopédia[10] de Diderot e D’Alembert, experimentam mudar
as formas de tratamento das pessoas, procuram a liberdade, buscam igualdade e retiram da
História factos positivos que possam delimitar as formas teológicas de entender o real, definir a
Lei e delimitar assim o poder das Monarquias Absolutas desse tempo. É dentro deste espírito,
que origina duas revoluções, que Locke é um Percursor e sabe usar a Teologia para definir o
ser humano como natureza. Não é em vão que influencia David Hume, professor de Adam
Smith, o qual se interroga sobre qual o estado da natureza humana[11]. Correntes e ideias que,
no nosso tempo, denominamos liberais, passando a ser desprezíveis e passíveis de combate
pelo seu conservadorismo. Teorias que experimentam a aquisição de riqueza para poucos, na
base do trabalho assalariado de muitos. E no entanto, possibilitaram a libertação do estado
anterior: a servidão. No Ocidente, as pessoas estavam submetidas às hierarquias aristocratas,
ao tipo de contrato existente, como na enfiteuse, ou subordinados aos possuidores de bens. Os
liberais, dos quais os economistas são uma amostra, souberam ensinar ao povo a sua
capacidade de opção. Capacidade desconhecida para os que tinham que servir, sem pensarem
por eles próprios, mas por meio da autoridade da lei, da hierarquia e da sua própria pobreza.
Estas teorias constituíram o tormento intelectual dos autores dos Séculos XIX e XX. E ainda
mais do presente Século. Locke dá o pontapé de saída:“1. Habiendo demostrado en el discurso
anterior [refere ao primeiro Treatise on Civil Goverment, arguido mais tarde no texto Teológico-
Civil de 1695, já referido]: 1) Que Adán no tuvo, ni por derecho natural de paternidad, ni por don
de Dios, una tal autoridad [de mandar e escravizar] sobre sus hijos o un domínio sobre el
mundo como los que se há pretendido asignarle. 2) Que si lo tuvo, sus herederos no poseyeron
un derecho así. 3) Que si sus herederos lo tuvieron, como no hay ley de naturaleza ni ley
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positiva de Dios que determine cuál es el heredero legítimo en todos los casos que puedan
darse, el derecho de su sucesión y, consecuentemente, el de asumir el gobierno no pudieron
ser determinados con certeza. 4) Que incluso si hubieran sido determinados, el conocimiento
de cuál es la línea más antigua de la descendencia de Adán se perdió hace tantísimo tiempo,
que en las razas de la humanidad y en las familias del mundo no queda ya ninguna que tenga
preeminencia sobre otra y que pueda reclamar ser la más antigua y poseer el derecho
hereditario…no estará demás que yo establezca lo que entiendo por poder político…henos de
considerar cuál es el estado que el hombre se halla por naturaleza. Y es éste un estado de
perfecta libertad para que cada uno ordene sus acciones y disponga de posesiones y personas
como juzgue oportuno, dentro de los límites de la ley de la naturaleza, sin pedir permiso ni
depender de la voluntad de ningún otro hombre. Es también un estado de igualdad, en el que
todo poder y jurisdicción son recíprocos, y en donde ninguno los disfruta en mayor medida que
los demás. Es evidente que… criaturas de la misma especie y rango, hayan de ser también
iguales entre sí…”.[12] Por outras palavras, John Locke, a partir do seu saber Teológico-
Filosófico, inicia um debate sobre a natureza da política com a qual um Estado é governado. E,
como é natural, usa as palavras entendidas na sua época. Não é possível esquecer que este
debate intelectual é, ele próprio, resultado de um debate anterior entre aqueles que retiram
autoridade a um poder, até ao Século XV, central para o Ocidente e as suas Colónias: o ebate
da autoridade do Vaticano. sobre o mundo, para ela conquistado por Carlos Magno[13]. A
igualdade procurada estava longe de ser uma igualdade entre seres humanos, nascidos livres
e iguais.
Apesar disso, as teorias de John Locke influenciaram dois textos de grande importância para o
Ocidente. O primeiro, a Declaração da Independência de Inglaterra, das suas Colónias
Americanas, ou Estados Unidos[14]. Thomas Jefferson, sob as ideias de Locke, redigiu essa
acta fundada na ideia de que o ideal de Governo está baseado na teoria dos Direitos Naturais
dos seres humanos: “Article 1: Men are born and live free and equal under the law. Article 2:
Men are created equal and have inalienable rights of freedom, of speech, of
defence…”[15] Direitos Naturais, retirados do autor invocado, que definem a igualdade dos
seres humanos, ao nascerem livre e iguais, mas com uma condição: “…on grounds of common
utility”. Para assegurar essa igualdade e liberdade, existe toda uma Lei, a Constituição do
Estado, garante a liberdade de expressão, mas de livre acesso aos bens para utilidade comum
[não apenas possuir, mas lucrar], de não testemunhar contra si próprio, de ser submetido a
julgamento pelos seus iguais, entre outras das 9 cláusulas originais ou Amendments que
constituem a base do Direito dos EUA:[16]. O segundo, em França, a seguir à declaração do
fim da Monarquia Absoluta e da crença no Monarca como representante de Deus na Terra, La
Convention General ou Governo dos Estados Gerais, é redigida a Declaração dos Direitos dos
Cidadãos[17]: “Tout citoyen est livre d’employer ses bras, son industrie et ses capitaux comme
il jugue bom et utile a lui-même…il peu fabriquer ce qui le plaît et comme il le plaît…L’exercise
des droits naturales de chaque homme n’a des bornes que celles ci qui assurent aux autres
membres de la société la jouisance des mêmes droits” A importância reside no reconhecimento
da igualdade entre todos os seres humanos, da Soberania do Estado, e dos Inalienáveis
Direitos dos Indivíduos à Liberdade, Prosperidade e Segurança.
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Por outras palavras, é a partir das ideias do denominado Direito Natural, definido na Sorbonne
em 1226, que é estruturado um contexto ideológico e social, na procura da ideia de igualdade.
Uma igualdade prometida, mas nunca atingida. Uma igualdade que reconhece direitos aos
possuidores de bens, de intelecto, de saberes. E, no entanto, um passo em frente, na História
Universal, ao falar de igualdade para todos os seres humanos, conquanto não conquistada. E
as teorias começam a aparecer. E as acções revolucionárias. Mas, nem pela participação nas
guerras de Conquista do Poder do Vaticano, ou da Libertação das Colónias Inglesas, ou da
Revolução Francesa, a igualdade parece sorrir para todos. Há os Direitos de Liberdade,
Fraternidade, Igualdade, declarados na França do Século XVII e referendados no ano de 1946,
aquando da organização das Nações Unidas. A não prevalência de elementos da Lei, do
Direito e da Economia, leva a que a realidade do ser humano perante o conceito permaneça
heterogénea, persistindo, todos eles – os iguais a si próprios e os menos iguais –, perante os
bens produtivos e reprodutivos, para que a intelectualidade e o povo se comecem a insurgir,
cada grupo à sua maneira. Ou, como diz George Orwell: “Todos somos iguais, mas há uns
mais iguais que os outros…”[18].
2. Insurreição.
De facto, na base do Direito dos Estados e das Nações, estão dois conceitos que o auto-
limitam: o de Indivíduo e o de Propriedade. As revoluções já acima referidas, cuja tradução
resulta nas Actas ou Convenções de Independência já citadas, mais não constituem do que
uma transferência de bens e direitos da sociedade aristocrática governante, para o grupo social
que ostenta o bem mais cobiçado nesses tempos – o Dinheiro. A indústria nasce, a
manufactura passa das mãos dos tecelões para as fábricas de tecido, o poder do vapor e do
carvão são capazes de impulsionar máquinas, fabricadas a partir da capacidade do
conhecimento humano para converter as tecnologias artesanais em novas formas de trabalho.
Estas requerem pessoal ou mão-de-obra abundante, paga em salário ou remuneração
escassa, face ao tempo empregue no trabalho e às necessidades de alimentação a partir
desse ordenado. É o que denominamos a passagem do Regime Feudal ao Regime Industrial
noutros textos[19], ou transição ao capitalismo, estudado por um dos nossos grupos, num
Seminário patrocinado pela UNESCO em França, Espanha, Portugal e América Latina, que
resultou na publicação de um livro[20]. Livro que analisa o dia de hoje, mas pouco remete para
os antecedentes dos séculos que deram nascimento ao que Hobsbawm denomina The Age of
Capital-1848-1875[21] Porque, como este autor analisa mais tarde[22], a Era das Revoluções é
uma via de afirmação do denominado liberalismo económico, base da obra de Adam Smith,
que se interroga sobre a forma como as nações enriquecem[23], obra que já analisámos
anteriormente[24]. Porque é a era do Capital assinalada por Hobsbawm entre 1848 e 1875, e
não na época da obra de Smith, Século XVIII? Porque, de facto, toda a promessa de igualdade
parece desaparecer entre as datas referidas. Em 1776, tinha acontecido a separação das
Colónias Britânicas e a organização de uma Confederação de Estados na América. Em 1789,
em França, tinha acabado a ideia da Monarquia Absoluta e da Divindade do Rei. Como La
Convention define, o Rei já não o é “pela graça da Deus, Rei de França e de Navarra”, mas
sim“Rei, pela graça de Deus e da Lei Constitucional do Estado, do Reino da França” porque “a
fonte de toda soberania reside essencialmente na Nação…”[25] A ideia de Nação tinha
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nascido, olhando apenas para o seu hexágono original e não para as terras espalhadas além
fronteiras. Tal como tinha acontecido com a Grã-Bretanha, cujas colónias eram governadas
pelas suas próprias leis e não pelas britânicas. Na terra da igualdade, a Monarquia tinha sido
restaurada, mas, em 1848, Luís Napoleão Bonaparte cria a Segunda República, sendo
Presidente, até se declarar Imperador em 1852. Este Império dura até ao ataque da Prússia,
em 1870, e à declaração de cessação da existência da Comuna de Paris, criada para governar
a cidade em 1792. A Comuna procurava reformas económicas e era composta por
republicanos radicais (ou em procura de reformas de benefício social para assistir aos que já
eram denominados “trabalhadores pobres” [the working poor]), socialistas, anarquistas e
marxistas, todos eles aniquilados em 1871, pelo Presidente da Terceira República, Adolphe
Thiers. As estatísticas de todo o historiador, a enciclopédia, o dicionário, ou os romances, como
o de Victor Hugo, Les Misérables, de 1862, remetem para a pobreza que tinha causado a
entrada das relações de capital entre o povo francês e narra as lutas dos Communers, 17.000
mortos calculados por todos eles. É por esta altura que Karl Marx[26] escreve três importantes
textos para a luta sindical na França, que o socialista Jules Guesdes introduz em Paris como
colectivismo e usa para a luta sindical, ou Guildes da França, bem como para a formação da
“Fédération de Travallaireurs Socialistes de France”, que passa a ser, em 1879, Le Parti
Ouvrier Français como é reconhecido por Émile Durkheim[27]. Pelo que, os anos de 1848 a
1870 são anos de reformas burguesas, visando a obtenção do lucro. Mas, ao mesmo tempo e
por igual [eis uma igualdade contraditória], a luta sindical organizada por George Owen na Grã-
Bretanha, fundador da “General Union”, precursora dos Sindicatos e dos Politécnicos para a
elevação académica dos operários e da pequena burguesia, como o foram, em França, Les
Écoles Politechniques. Owen formula o conceito e actividade da Brotherhood ou Carbonari ou
“primos”, como se denominam no resto da Europa, especialmente na Itália, na radical Rússia –
Dezembrista, e no pré-republicano Portugal, com a Voz do Operário e os Grupos Carbonários,
enquanto na Espanha e nos Países Baixos se agita, principalmente, o movimento anarquista. A
consciência social operária começa a emergir e e organizar, ainda debaixo das ideias liberais
de grupos revolucionários radicais opostos ao capital. Em 1820, com a liderança da França e
dos seus Communers, o conceito Socialista é cunhado pelo operariado. Esta tomada de
consciência dos trabalhadores é apoiada em Itália pela Casa de Saboia, e em 1848, pelo Papa
Pio IX, que tenta mobilizar os católicos em prol de igualdade e da justiça social, mas na base
do liberalismo, i.e., propriedade privada, obrigação de trabalhar, direito ao salário, obrigação de
aceitar o que é pago – pouco ou muito, é igual para o Vaticano – e reparar com consciência e
responsabilidade nas capacidades individuais a serem empregues na produção. Sinistro
programa! É a época em que a economia, nos países da Europa, começa a ser organizada
pelo Estado e é retirada das mãos dos particulares. É a época das Revoluções Europeias, da
unificação da Itália, da Prússia e dos Países Saxónicos num Império Alemão, da Primeira
República Espanhola, da Constituição Portuguesa para limitar a Monarquia, da consolidação
das fronteiras da Bélgica e a divisão dos Países Baixos. O movimento de assalariados vai
nascendo. O Socialismo começava por vários atalhos, como veremos mais à frente. Entretanto,
ser liberal era ser radical e revolucionário, era tomar parte na luta do operariado e definir novas
classes sociais, tal e qual Marx tinha proposto, e que Durkheim e Mauss mais tarde tratarão, ao
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fundarem uma ciência para pensar o Socialismo: a Sociologia[28]. A consciência social do
operariado começava a insurgir-se e a organizar-se. A prometida igualdade não aparecia.
Antes, aparecia o trabalhador pobre, acrescido da necessidade do trabalho da sua família
como forma de contribuição para o sustento da mesma. O liberalismo tinha completado a sua
tarefa de pôr termo ao conservadorismo das monarquias e da classe aristocrata. Um novo
movimento nascia, apesar das ideias organizadas pelos economistas durante o século XVIII e
as suas crenças de existir uma guerra permanente entre produtores e proprietários dos meios
de produção. Essa classificação, como veremos, seria introduzida, mais tarde, por Karl Marx.
3. Os Economistas.
François Quesnay, como membro da Enciclopédia Francesa escreve, em 1758, todo um
tratado procurando convencer os seus compatriotas de que a riqueza vinha da terra e não da
indústria. A terra não precisava de investimentos; podia ser arrendada a meias ou podia ser
entregue em enfiteuse a famílias, por longas épocas cronológicas, e dessa mesma terra
sairíam os bens para reinvestir. A ideia de Quesnay era antecipar-se a uma crise social. Toda a
Enciclopédia tinha escrito sobre as leis, o governo do Estado, a República, os limites do
Príncipe e os seus deveres. A questão da Natureza Humana parecia estar já ultrapassada. A
Enciclopédia procurava explicação científica, positiva, dos factos. Sem dar por isso, a
Enciclopédia, incluindo Quesnay, forma um movimento racional para organizar a produção, o
trabalho, as relações entre proprietários e operários. A obra de Quesnay baseia-se no seu
conhecimento anatómico e, partindo da classificação do corpo, classifica a actividade operária
e a dos proprietários. A terra tinha sido usada conforme entendiam os proprietários, que a não
habitavam, nem sabiam como funcionava a reprodução, quer animal, quer vegetal.
Como tenho já comentado, François Quesnay introduz não apenas a ideia de que a indústria é
uma actividade estéril, bem como a noção de que a terra tem as suas leis, que devem ser
conhecidas e respeitadas, para que elas possam render como esperado. Além do mais,
classifica os tipos de contratos para escolher o mais sensato e mais profícuo, o da já
mencionada enfiteuse – a família que trabalha a terra aparece como a sua proprietária, pelo
que se comporta como tal. A enfiteuse, definida na lei romana no Código de Justiniano, e, anos
mais tarde, pelo Código de Napoleão, diz que a terra é entregue a um grupo trabalhador, capaz
de produzir bens e de ter uma descendência que tome conta desses bens, ao aprender a
trabalhar pelo hábito de ver, ouvir e fazer como os seus ancestrais fazem. Além do mais, a
terra pode ser dividida entre os vários descendentes, que devem provar a sua capacidade de
trabalho através da criação de um novo ramo da árvore da vida da família. Os que conseguem
demonstrar estas aptidões recebem bens para trabalhar, sabedoria e colaboração dos seus
parentes consanguíneos.
No domínio da Economia, Quesnay e a sua Escola, denominada de Fisiocracia, estão na
origem da ideia do laissez-faire. Esta define a Contabilidade para ordenar os investimentos, as
vendas e explorar os mercados mais convenientes, quer para as vendas, quer para comprar
produtos para reproduzir a produção ou investimentos em forma de animais, sementes e
adubos –, esta contabilidade é espalhada dentro do grupo de trabalhadores para a procriação
de mais trabalhadores. Apesar de não serem estes os termos utilizados, na acção a partir de
ideias cristãs católicas, o objectivo de uma família é o Sacramento do Matrimónio ou
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Casamento, que serve para manter o desejo sexual calmo e não interferir com grupos sociais
que nada têm a ver com o seu. É a ideia que, mais tarde, Émile Durkheim definirá como básica
da estrutura dum Grupo Social, objecto de investigação Sociológica[29].
A ideia central de Quesnay, como bom conhecedor do comportamento humano e bom
conhecedor da fisiologia, era controlar a população produtora, tomando vantagem das
crendices religiosas de um povo em desespero pela pobreza do Século XVIII, que os levará
mais tarde a uma revolução fracassada, por terem perdido terras e propriedades entregues em
“métayage” por genealogias. A Revolução Francesa acabou com a exploração da terra e fez
dos servos operários. Daí o germe da ideia do socialismo em França, como se verá mais à
frente, pela traição de um objectivo revolucionário – o da igualdade. Para os caseiros, como
para todos os trabalhadores da terra, a época da abundância e dos altos preços fixados pela
aristocracia, para criar uma riqueza na base do trabalho rural, desaparecem com a Monarquia.
A liberalidade de exportação, sem impostos, e a liberdade de semear o que melhor ficava para
o proprietário, acabaram pela concorrência da indústria. Ao subir a burguesia ao poder, o seu
único objectivo era lucrar em concorrência com os outros países, através da indústria. Os
“métayers” passam a operários, ou pelo menos parte das suas família. Outros, mais tarde,
graças às Écoles Polytechniques, podem, como o fez o próprio Quesnay, por sua conta,
estudar e serem ou artesãos especializados ou profissionais das novas indústrias de química,
carros/automóvel, têxteis. No entanto, a herança da fisiocracia não acabou na Revolução, com
a indústria; apenas passou a ser uma forma de trabalhar a terra, conforme o saber agrícola
adquirido pela pesquisa académica e pelos produtores. A França passou a usar a economia de
Quesnay de forma “industrial”, com trabalhadores assalariados e uma propriedade privada de
grandes extensões de terra adquiridas durante a era das revoluções, que se prolongará até
finais do Século XIX. E o Século XX ainda trará o sofrimento de duas grandes guerras. O maior
investimento no saber foi feito nas Universidades, como já vinha de antigamente, na Sorbonne,
criando cursos especializados em Agronomia, Engenharia Florestal, Escolas de Veterinária e
pesquisa na melhor produção de beterrabas para a produção industrial do açúcar, trigo de
exportação e experimentando, ou melhor dizendo, combinando o saber científico com a
produção agro-pecuária. Cada vez que os produtores rurais param, a França treme. O sindicato
é dos mais fortes, como herança do Século XIX e das análises sociológicas de Durkheim e a
sua escola sobre o operariado.
Este exemplo de Quesnay foi seguido pela Grã-Bretanha. Não é em vão que a primeira obra
conhecida de Durkheim, é a que deriva da análise de Adam Smith sobre a divisão do trabalho,
e que Durkheim denomina divisão social do trabalho. Apesar de associada ao autor francês, a
autoria do conceito é de Adam Smith[30]. No seu texto referido anteriormente, Smith começa
por se interrogar sobre quais as causas e os motivos do enriquecimento das nações. A
resposta encontra-a na sua ideia de inclinação do ser humano para trabalhar. Ideia que não é
empírica, antes retirada das suas crenças religiosas, como já tenho analisado. O que interessa
agora é saber porque é que Smith apostara nesse conceito como base da dita riqueza. Uma
riqueza que, queiramos ou não, contempla também a colaboração e a ajuda mútua, que mais
tarde seriam denominadas por outros, de actividade recíproca. Apenas que, para Smith, não
havia uma dádiva gratuita nem uma devolução que não fosse obrigatória, empenhando quem a
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recebia a trabalhar para o doador. Em Smith tudo é trabalho, é a partir do conceito de trabalho
que organiza a sua teoria. Adam Smith define o valor dos bens a partir do trabalho investido na
sua fabricação, desde que os bens sejam úteis e passíveis de troca. O conceito mais
importante é o da divisão do trabalho.
Para a época em que o autor escreve, definir que o trabalho se encontra dividido, é uma
inovação no pensamento. O que se pensava, era que as pessoas que não tinham bens, ou
trabalhavam em grupo para proprietários de terra ou para manufacturas que começavam a
nascer, principalmente a construção de barcos para a exploração das novas terras e a
obtenção de bens exóticos, como as especiarias e o tabaco, mais tarde o chá e o café, o trigo e
a batata, exportando, em troca, seres humanos que tomavam conta das novas plantações
destes produtos, o que incrementou a vida dos habitantes do Continente Europeu. A Grã-
Bretanha de Adam Smith, era a dos têxteis, do ferro, do aço, das minas de prata, de carvão, e
outros bens naturais que eram manufacturados, como a criação de animais para fabricar pano
e assim criar bens a serem trocados dentro do país e entre outros países. O denominado
Continente, ou o resto da Europa para além da Inglaterra, de Gales, da anexada Irlanda, ou do
Reino da Escócia controlado, através do Governo, desde o Século XVII em diante. É a partir
deste facto, mais o comércio ou trade, como era denominado, que Adam Smith começa a
pesquisar sobre a natureza da riqueza das nações, e examina, tal como os outros economistas,
as actividades do seu próprio país, concluindo, muito claramente, que é o trabalho humano que
produz riqueza, por essa inclinação natural que o ser humano tem para trabalhar. Esta base do
trabalho deve ter sido retirada da sua formação presbiteriana, desde jovem. Adam Smith não
era apenas um ser humano crente; tinha sido formado dentro dessas ideias na Igreja Escocesa
Presbiteriana. A sua questão central é explicar que o comércio existe e causa riqueza, porque
os homens trabalham ou têm poder e capacidade para trabalhar. A frase que abre o seu livro,
de quase 800 páginas, sobre uma ideia jamais escrita ou sem antecedentes eruditos prévios, é
definidora e definitiva: “The greatest improvement in the productive powers of labour, and the
greater skill, dexterity, and judgement with which it is anywhere directed or applied, seem to
have been the effects of the division of labour. The effects of the division of labour, in the
general business of society, will be more easily understood, by considering in what manner it
operates in some particular manufactures”[31]. Se analisarmos as palavras, seremos capazes
de entender o seu objectivo: a riqueza não provém da terra, como tinha referido o seu mestre
francês, François Quesnay, mas antes da força de trabalho e da inteligência humana aplicada à
mesma. Por outras palavras, transfere a causa da riqueza das Nações e das pessoas, para os
recursos naturais transformados em bens comerciais, sujeitos a troca, para incluir um outro
conceito dentro da causa da riqueza, esse mais tarde denominado força de trabalho ou
“labourers”, operariado ou trabalhadores, essa actividade exercida por pessoas que, no tempo
de Adam Smith, a Inglaterra e os países anexados dentro das Ilhas Britânicas, tinham aos
milhares. Aliás, a ideia não é apenas ser trabalhador, bem como ter a capacidade – dexterity –
ou a especialidade -skill – ou especialização – ability – para agir dentro de um ramo da
manufactura na qual se trabalha. Mais ainda, refere-se à lógica, bom raciocínio e capacidade
de julgar ou de optar, para configurar a imagem de um operário. Nos tempos de Adam Smith, o
operário não é uma pessoa qualquer, deve ser uma pessoa conhecedora, habilitada ao
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entendimento do que faz. Se assim não fora, não podia trabalhar, nem podia existir o atributo
que dinamiza a riqueza e o seu valor, essa divisão do trabalho, possível pela capacidade de
julgamento e lógica de quem emprega não apenas a sua capacidade física, bem como, a sua
capacidade de raciocinar. A lógica aparece como a base da criação da riqueza dentro de uma
Nação. E digo dentro, porque a maior parte das pessoas trabalhadoras nasciam, cresciam e
morriam dentro da sua freguesia – parish ou localidade, considerando-se o resto do mundo
apenas um comentário, ou uma referência de comerciantes ou um desenho em livros de texto,
para as eventuais aulas dos que podiam frequentar alguma escola[32]. A classe operária nunca
teve, nem os meios, nem a oportunidade, de abandonar a sua paróquia ou freguesia.
Pertenciam-lhe, como ao proprietário, ou ao gestor das propriedades em nome da Monarquia,
Ducado ou Condado ou outros títulos, que designavam a posse do sítio no qual as pessoas
nasciam, cresciam e trabalhavam, até a morte.
Mas, a divisão do trabalho, ela própria, tem um outro princípio, também atribuído ao ser
humano: “This division of labour, from which so many advantages are derived, is not originally
the effect of any human wisdom, which foresees and intends that general opulence to which it
gives occasion. It is the necessary, though very slow and gradual, consequence of a certain
propensity in human nature which has in view no such extensive utility; the propensity to truck,
barter, and exchange one thing from another… as seems more probably, it be the necessary
consequence of the faculties of reason and speech…”[33]. E, apesar de retirar esta análise do
seu livro, mais uma vez fica a base do que se espera do operariado, ou ainda mais, da vida
social em geral. Porque Smith, neste livro, não analisa pessoas, apenas as suas actividades e
capacidades de procurar recursos ou bens, que não conseguem eles próprios fabricar.
Pesquisa realizada pela primeira vez, no campo da vida económica, tendo por base as suas
inquietações filosóficas, esse desejo de saber qual a base da riqueza, para fazer das nações
estados cunhados com a felicidade do dinheiro[34]. E, ainda que remeta o leitor para a análise
que vai realizar a seguir, do Truck ou permuta de bens iguais; do Barter ou troca de bens por
outro bem útil para quem o não produziu; e do Exchange, ou troca de um bem por dinheiro, que
tenho denominado intercâmbio, ao longo da sua obra, Adam Smith refere a falta de tempo de
uma pessoa para produzir todos os bens necessários para a sua subsistência ou, como eu
diria, para continuar dentro da História: “In civilized society, he stands at all times in need of the
co-operation and assistance of great multitudes, while his whole life is scarce sufficient to gain
the friendship of a few people…Give me that which I want, and you shall have this which you
want; and it is in this manner that we obtain from one another the far greater part of those good
offices which we stand in need of….The greater part of occasional wants are supplied in the
same manner as those of other people, by treaty, by barter, by purchase…”.[35]
O discurso de Adam Smith nada deixa fora do comércio e das formas contratuais de produzir.
Mas Smith engana-se ao referir a vida como actividade comercial, o que é impossível para todo
o ser humano: organizar uma actividade própria para o seu sustento, ou usar o seu tempo para
si próprio. Concebe um regulador do tempo, ao referir a inclinação natural – propinquity diz – do
ser humano para trabalhar e manufacturar a natureza; Adam Smith dá um salto dentro da
realidade visível e aparente – todos trabalham – e não repara no elo central que tenho
destacado desde o começo – a propriedade dos meios de produção e do resultado do trabalho,
10
a moeda, que beneficia a quem possui e não a quem trabalha, como dirão mais tarde Karl Marx
e Émile Durkheim[36] –, e atribui a falta de tempo das pessoas, para fabricarem tudo o que é
necessário para a subsistência, ao trabalho dedicado às fábricas, às manufacturas, às
indústrias e outras actividades, pelas quais se recebe uma remuneração. Remuneração que
hierarquiza os seres humanos, como debate no Capítulo X do Livro I.
O aporte desta obra à nossa preocupação pela igualdade, é a classificação das
pessoas na base da sua capacidade para activar interacções entre iguais, ou entre seres de
diferente estatuto, pela posse de bens produtivos e reprodutivos ou falta dos mesmos. Há os
que podem contratar, os que são capazes de trocar e guardar o lucro, ou os que realizam
intercâmbio de bens semelhantes por outros bens ou a sua representação em moeda. Os três
conceitos definidos mais acima, referem-se ao facto de que nada acontece fora do mercado; e
o mercado é a relação social definida pela procura de bens que não possuímos e precisamos,
e a oferta dos mesmos, por outros que os criam ou fabricam. Não há actividade nenhuma que
não seja realizada por meio de moeda, usando Smith a pretensa desculpa de não existir
colaboração entre pessoas, mas apenas cooperação para o trabalho, o que decorre das
pessoas não terem tempo para organizarem relações de amizade, apenas relações comerciais
em concorrência e procura de ganhos, vantagens em dinheiro ou de hierarquia social. Na teoria
liberal, toda a relação tem um objectivo económico, nada é gratuito ou estético, tudo depende
das transacções do mercado. A possibilidade de se relacionar com outros seres humanos é
praticamente impossível, pelas especialidades, ou habilitações para o trabalho, configurarem
uma lógica diferente entre todos os seres humanos. O operariado britânico, como todo o país, é
o mais estratificado e organizado por classes, antes, durante e depois do Século XVIII[37]. As
pessoas reúnem apenas com seres humanos da sua mesma natureza, lógica, prática e, o que
é mais importante, income ou entrada de recursos monetários pela produção e aquisição de
bens. A ideia de dar e receber não aparece nas análises referidas, deste nosso autor, ou das
outras por mim referidas em nota de rodapé, ou noutras obras. O conceito de dar para receber
e devolver, é uma relação de cooperação, ao estruturar um processo que orienta pelo menos
uma actividade económica, a de truck ou permuta – uma das muitas que os seres humanos
realizam para viver e continuar dentro da História. Na relação de permuta, os bens passam de
mão em mão, com a ideia de serem devolvidos em igual quantidade e qualidade, como o
próprio Adam Smith refere com as palavras de barter e de trade [38], conceito que levaria mais
tarde Marcel Mauss (como Émile Durkheim) a criar uma teoria denominada Sociologia
Económica, na qual barter é reciprocidade (já para Durkheim é solidariedade e ritual, o que
analisaremos mais adiante). A obra de Adam Smith e a dos seus seguidores, bem como dos
seus contraditores, apenas analisa as formas de trabalho, produção e circulação de bens. O
próprio Jeremy Bentham, em 1789,[39] opina que cada indivíduo equivale a outro, e que, a
felicidade de todos traz a felicidade de cada indivíduo. E essa felicidade é procurar a utilidade
do trabalho, minimizando a dedicação do tempo ao que não se gosta e maximizando o fazer ou
trabalhar no que se sabe e dá prazer.
Como é esta actividade possível? Pela lógica, diz um outro utilitarista, John Stuart Mill, no seu
livro sobre lógica indutiva e dedutiva, bem como no seu ensaio sobre a liberdade do ser
humano[40]. Todas as pessoas são capazes de entender o real e retirar, das leis universais,
11
princípios que os orientem, ou retirar da realidade princípios orientadores. Esta liberdade,
maximizada, acaba por ser a utilidade do trabalho. Todos desejam a riqueza, que é definida por
este ramo da economia – o utilitarismo –, como tudo o que não se possui, mas que, visto nos
outros, se quer ter e, uma vez obtido, é um bem a mais, que serve de tesouro ou bem para um
eventual investimento ou consumo de luxo ou sumptuário. De acordo com esta linha de
argumentação, não é a mão invisível do mercado referida por Adam Smith, a que orienta o ser
humano para o trabalho, mas a felicidade de ter bens úteis para a subsistência, ou, melhor
ainda, para o prazer de viver de forma folgada. O valor, para estes economistas, é ultrapassar
um conjunto de dificuldades que a vida real depara, com o intuito de obter riqueza. Por causa
desta lógica, é necessário entender um conceito: a realidade. Porque, sem o entender, é
impossível enriquecer, objectivo de todo o mundo social. Ora bem, a realidade como já referi
noutro texto, é heterogénea e complexa. “Realidade é um conceito que reflecte o ser humano
na sua dupla dimensão de pensar e manipular o seu contexto. Bem como define o contexto não
animado como um olhar de recurso a ser transformado para o belo prazer da humanidade, ou
para essa humanidade que não tem belo prazer de recursos, seja capaz de transferir a sua
virtualidade da manipulação das ideias dos outros para a sua própria realidade e assim termos
uma capacidade de sobreviver com serenidade”[41].
É preciso referir essa ultrapassagem do real, visando o enriquecimento como objectivo utópico.
Mas, objectivo de quem? Ao que parece, não dos operários, os quais, por não serem educados
dentro dos princípios económicos, acabam por não poder acumular bens. Não é em vão que
Émile Durkheim retoma a ideia da divisão do trabalho e comenta-a de forma desenvolvida, no
que seria a sua tese de doutoramento em Paris.[42]. O trabalho social não está dividido entre
seres humanos que procuram riqueza no trabalho para outros. É preciso distinguir entre o
Direito e a Lei ou Solidariedade Orgânica, que existe em todos os povos, e separar da
Solidariedade Mecânica, ou memória social do inconsciente colectivo que se atribui aos povos
primitivos. Na sua obra, critica duramente o conceito de divisão do trabalho de Adam Smith,
pelo facto das sociedades estarem divididas em classes e pela desigualdade dos seres
humanos em concorrência perante os bens do mercado. O liberalismo clássico crê que as
sociedades são um conjunto de indivíduos a agirem conforme a sua maneira de entender. A
realidade é bem diferente. É, como refere Marx, um conjunto de grupos reunidos em torno, ou
da capacidade de trabalhar para criar bens para todos, ou na falta de entendimento dessa
capacidade. Quer Durkheim, quer Marx, advogam pela participação do Estado na gestão dos
bens e na criação de sindicatos ou Guildes. O operariado está unido apenas pela falta de
meios de produção[43], enquanto lutam contra os proprietários denominados burgueses ou
classe burguesa. Esta classe é a que orienta o trabalho dos que nada possuem excepto a sua
capacidade de trabalho. Ideias que Karl Marx desenvolve largamente na sua obra O Capital
escrita entre 1864 e 1867, publicada integralmente em 1894, e base do comentário de
Durkheim contra o individualismo liberal, como vamos tratar mais à frente.
A desigualdade está mais do que provada pelas revoluções do Século XIX e pela organização
de Sindicatos para defender o operariado do valor a mais retirado, pelo proprietário dos meios
de produção, do seu trabalho. O próprio Durkheim no seu texto de 1920[44], expandido em
1925, por Marcel Mauss, com outros dos seus inúmeros trabalhos inéditos, refere que: “the
12
existence of social classes, characterized by significants inequalities, in principle makes it
impossible for… «just» … contracts to be negotiated. This system of stratification, constrains to
an unequal exchange of goods and services, thereby offending the moral expectations of
people of industrial societies. The exploitation rendered possible by notable disparities of power
among the contradicting parties encourages a sense of injustice which has socially unstabilizing
consequences”[45]. Este é apenas um comentário, derivado como o autor diz, da obra de Marx.
Continua…..
* Frase de Marcel Mauss no seu texto de 1922-1923 : «L’essai sur le don. Formes et raison de
l’echange dans les societées archaïques», Année Sociologique, Nouvelle Série, Vol. I
[1] The Bible, Livros atribuídos a Moisés, (1300? -1200? AC) 1971: Êxodohttp://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=B%C3%ADbli+%C3%89xodo&btnG=Pesquisar&meta= e Deuteronomio.http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=B%C3%ADbli+Deuteron%C3%B3mio&btnG=Pesquisar&meta=; en suporte de papel, em: The British & Foreign Bible Society, páginas 63 e seguintes, Grã-Bretanha. Bem como Mateus,http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Evangelho+de+S%C3%A3o+Mateus&spell= 1, Capítulo 22, versículo 37, Catecismo da Igreja Católica 1992, páginas 451 a 433, artigos 2083 a 2758, editado em Português pela Imprensa Gráfica de Coimbra, 1993; Website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Catecismo+da+Igreja+Cat%C3%B3lica+&btnG=Pesquisar&meta=[2] Iturra, Raúl, 2002: A economia deriva da religião. Ensaio de Antropologia do Económico, Afrontamento, Porto. Website para debate e comentários: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Raul+Iturra+A+economia+deriva+da+religi%C3%A3o.+Ensaio+de+Antropologia+do+Econ%C3%B3mico&btnG=Pesquisar&meta=[3] Mateus, Evangelho. Website com texto[4] Mateus, obra citada, Capitulo 22, versículos 34 a 40, da versão castelhana BAC, Madrid, 1953. Website nota 2[5] Locke, John, (1695) 1997: The reasonableness of Christianity as delivered in the Scriptures, Theme Pres, and Bristol, U.K. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=John+Locke+%281695%29+1997%3A+The+reasonableness+of+Christianity+as+delivered+in+the+Scriptures&btnG=Pesquisar&meta=[6] Locke, John, página 3 da obra citada em suporte de papel. O inglês, como é evidente, é do Século XVII, diferente do actual.[7] Locke, John, (1690) 1990: Essay concerning human understanding, e Two Treatises on Civil Goverment, Alianza Editorial, Madrid. Website para o primeiro: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=John+Locke+%281690%29+1990%3A+Essay+concerning+human+understanding&btnG=Pesquisar&meta=; e para o segundo: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=John+Locke+%281690%29+1990%3A+Two+Treatises+on+Civil+Goverment&btnG=Pesquisar&meta=[8] Locke, Jonh, (1690) 1999 Second Treatise on Civil Government. Website com texto: www.constitution.org/jl/2ndtreat.htm –, Capítulo 2, retirado da edição castelhana, Alianza Editorial, (minha tradução ao inglês).[9] Enlighment ou debate entre académicos e intelectuais sobre o estado do governo, das finanzas e da nação, entre os quais: William Skakespeare, Cristopher Marlowe, David Hume, John Knox, Adam Smith, entre outros.[10] Diderot, Denis, organizador dos textos que, ao longo dos anos de1751a 1766, reúne escritos de Voltaire, Monsteqieu, Quesnay, Rousseau, Hume, Benjamin Franklin, Thomas Jefferson, entre outros. Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Denis+Diderot+L%27Encyclop%C3%A9die&btnG=Pesquisar&meta=[11] Hume, David, (1734) 2001: Tratado da Natureza Humana, Gulbenkian, Lisboa. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=David+Hume+Treatise+on+Human+Nature&spell=1[12] Locke, John, obra citada, excertos dos Capítulos 1 e 2. Tenho destacado dois conceitos: dom e reciprocidade, conceitos centrais de este meu texto. Eram já a base da problemática que leva autores da Sociologia e da Antropologia, a não saber o que fazer para os entender.[13] Carlos Magno ou Carlos I (742-814), restaurou para o Papado Vaticano – Leão III era o Papa despojado de poder- a autoridade do denominado Sacro Império Romano, que governou Europa e as suas colónias mais tarde, até o Século XVI, época em que Luther, Calvino, Swindle, Knox, Henry VIII, Elizabeth I, James I , se retiraram da união desse Império para formarem as suas próprias Nações e Estados autónomos, bem como outras Nações nasciam do despojo do Sacro Império Romano. Aí, nem todos os seres humanos eram livres e iguais….[14] Declaration of Independence, Julio 4 de 1776. Biografia e textos: Website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=CharleMagne&spell=1[15] Jefferson, Thomas, Declaration of Independence of EUA, 1787, ou Bill of Rights, artigo 1. http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Thomas+Jefferson+1787+ou+Bill+of+Rights&btnG=Pesquisar&meta=[16] A Constituição começou por ser da Confederação de Colónias, assinada em Filadélfia em 1787. Apesar de de reconhecer que “todos os seres humanos são livres e iguais”, é, apenas em 1865, abolida a escravatura, e em 1965, são reconhecidos e aceite os direitos dos Afro-Americanos, a seguir as mortes de Malcolm X e Martin Luther King. Website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Malcolm+X&btnG=Pesquisar&meta=, biografia e textos; Martin Luther King, biografia e textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Martin+Luther+King&btnG=Pesquisar&meta=[17] Declaration des Droits des Citoyens, redigida em 1789 pelo Abade Emmanuel Sieyés. Website biográfico e textohttp://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Emmanuel+Siey%C3%A9s+Declaration+des+Droits+des+Citoyens&btnG=Pesquisar&meta=
13
[18] Orwell, George, 1946: Animal Farm ou O triunfo dos porcos, várias edições em várias línguas. Website biográfico, comentários e texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=George+Orwell+Animal+Farm&btnG=Pesquisar&meta=[19] Iturra, Raúl, (1991) 2001: A Religião como teoria de reprodução social, Fim de Século, Lisboa. Website para comentários, debate e recensões: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Ra%C3%BAl+Iturra+A+religi%C3%A3o+como+teoria+da+reprodu%C3%A7%C3%A3o+social&btnG=Pesquisar&meta=[20] Godelier, Iturra, Ferreira de Almeida, Villaverde Cabral e outros, 1991: Transitions et subordinations au capitalisme, MSH/Cambridge. Website:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Maurice+Godelier++Transitions+et+subordination+au+capitalisme+.&btnG=Pesquisar&meta=[21] Hobsbawm, Eric, 1975: The age of capital-1848-1875, Abacus, Londres. Website para debate e troços de texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Erick+Hobsbawm+The+age+of+capital&btnG=Pesquisar&meta=[22] Hobsbawm, Eric, 1977: The age of revolution, Abacus, Londres. Website para debate, recensão e troços de texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Eric+Hobsbawm+The+age+of+revolution&btnG=Pesquisar&meta=[23] Smith, Adam, 1776: An inquire into the reasons and causes of the wealth of Nations, Routledge and Kegan Paul, Londres. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Adam+Smith+An+inquiry+into+the+causes+and+reasons+of+the+wealth+of+Nations&spell=1Texto:http://socserv.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/smith/wealth/index.html[24] Iturra, Raúl, 2002: A economia deriva da religião. Ensaio de Antropologia do Económico, Afrontamento, Porto. Website para debate, recensões e comentários:http://socserv.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/smith/wealth/index.html[25] Déclaration des droits de Citoyen, 1789, já referida. Website texto original: http://www.droitsenfant.com/droitshomme.htm [26] Marx, Karl, Friedrich Engels, 1845: The holy family; 1848: Communist Manifesto; 1851: The Eighteenth Brumaire of Louis Bonaparte. Website com textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+The+Holy+Family&btnG=Pesquisar&meta=;http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx%2C+Friedrich+Engels+Communist+Manifesto&btnG=Pesquisar&meta= ; http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+Friedrich+Engels+The+Eighteenth+Brumaire+of+Louis+Bonaparte.+&btnG=Pesquisar&meta=[27] Durkheim, Émile, 1895: “Les principes de 1789 et la sociologie”, in Revue International de l’Enseignement, N. XIX; 1928 : Le socialisme, PUF, (1888) 1928. Website com texto : http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+Les+principes+de+1789+et+la+sociologie&btnG=Pesquisar&meta=; Texto de Le socialisme www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/le_socialisme/le_socialisme.html[28]Durkheim Émile, 1885 : “Propriété Sociale et démocratie” in Revue Philosophique, XIX, Paris : Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/ classiques/Durkheim_emile/durkheim.html - 1893 : “Sur la définition du socialisme” in Revue Philosophique, XXXVI, Paris.Website com texto : www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_2_07/definition_socialisme.html ; (1888) 1928: Le Socialisme, PUF, Paris. Website com texto nota 26 ; Mauss, Marcel, 1923-24: “L’essai sur le don. Formes et raison de l’echange dans les societées archaïques”, Année Sociologique, Nouvelle Série, Vol. I. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/mauss_marcel/ socio_et_anthropo/2_essai_sur_le_don/essai_sur_le_don.html[29] A obra de François Quesnay está exposta nos seus textos de 1756: “Métayer”, de 1777 “Les Moisons” e de 1758 Tableau Économique, in 1888 : Oeuvres de Quesnay, Oncken, Paris., website com a obra completa:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=+Oeuvres+economiques+et+philosophiques+de+F+Quesnay&btnG=Pesquisar&meta= e analisados por mim em Iturra, 2002 : A economia deriva da religião, já referida. A obra de Durkheim referida é: 1893:De la division du traval social, Félix Alcan, Paris, 1895 : Les règles de la méthode sociologique, Félix Alcan, Paris, entre outras a falarem sobre desejo, emotividade e necessidades sociais. Website com textos: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/division_du_travail/division_travail.html ; www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/regles_methode/regles_methode.html[30] Adam Smith escreveu dois livros, um em 1759: Theory of moral sentiments. Define que, para obterem os seus objectivos, os seres humanos têm que ser agradáveis e simpáticos, saber estabelecer uma relação emotiva agradável. O segundo é o mais conhecido: An inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations, em 1776. Ambos têm sido analisados por mim no meu livro já referido de 2002. Website com textos:http://socserv2.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/smith/moral.html ; para a denominada Riqueza das Nações, ver nota 22.[31] Smith, Adam, obra citada de 1776, Livro 1 da versão inglesa de 1884, Murray, Londres. Website nota anterior.[32] A lei de obrigatoriedade escolar foi aprovada – passed – em Inglaterra de 1870 e Adam Smith era do Século anterior.http://socserv2.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/smith/moral.html[33] Smith, Adam, obra citada, Capitulo II do Livro I, da referida edição. Website nota 22.[34] John Hales tinha esperimentado no seu texto de 1581: A discourse of this common weal of this realm of England, Elizabeth Lamond, Cambidge, UK, mas é apenas um conjunto de diálogos filosóficos entre um Académico, um Licenciado e um Senhor da Casa, sobre como é que seria criar riqueza e circular moeda. Website com texto:http://www.google.pt/search?q=John+Hales+A+discourse+of+this+common+weal+of+this+realm+of+England&hl=pt-PT&lr=&start=10&sa=N ; ou, Antoine de Montchrestien na França dos Valois de 1615, ao recomendar numa Epitre au Roy et à la Reyne Mère du Roy,ou Traicté de l’Oeconomie Politique de se importarem com “Commerce, Tant dedans que dehors le Royaume”,pg.277 e ss. Website com texto: http://visualiseur.bnf.fr/Visualiseur?Destination=Gallica&O=NUMM-89132[35] Smith, obra citada, página 11 do Capítulo II. Website nota 22.[36] O primeiro no seu texto Grundisse, escrito em 1857 e publicado apenas em 1939; e o segundo, ao longo do cumprido texto de Durkheim de 1893, que debate as teses de Smith: De la division du travail social, Félix Alcan, Paris, dedicado todo ele à crítica do liberalismo Smithoniano: ao engano a que é remetido o leitor, na base da tese da riqueza ser de todos e não apenas dos propritários que contratam os que não têm posses, a maior parte da população francesa e europeia do Século XIX, como Smith defende no seu texto. Eu próprio trato da matéria no meu livro de 1990: O Insucesso Escolar. Memória e Aprendizagem em Vila Ruiva, Escher, Lisboa. Website com texto em línguas diversas:http://www.google.pt/search?q=Karl+Marx+Grundrisse&hl=pt-PT&lr=&start=10&sa=N Os dois volumes das Grundrisse são denominados em inglês A contribution to the critique of Political Economy, website com texto: http://www.google.pt/search?q=Karl+Marx+Grundrisse&hl=pt-PT&lr=&start=10&sa=N[37] Vide Hoggart, Richard, (1988) 1991: Newport 33, Le Seuil, Gallimard, Paris ; Benson, Susan , 1981 : Ambiguous Ethnicity, CUP, UK, pgs 95 e ss ; e Giddens, Anthony, 2000 : The third way an dits critics, Polity Press, Cambridge, pgs
14
55 e seguintes, entre outros, especialmente Hobsbawm, The Age of Capital, 1975,Abacus, London, pgs. 113 e seguintes, e Age of Extremes.The short Twentieth Century-1914-1991, páginas 115 e seguintes. Websites para debate, recensão, crítica, pela ordem dos textos: Hoggart para debate, outros textos e literacia:http://www.google.pt/search?q=Karl+Marx+Grundrisse&hl=pt-PT&lr=&start=10&sa=N ; Benson, para debate e literacia nos bairros iletrados: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Susan+Benson+Ambiguous+ethnicity&btnG=Pesquisar&meta=; Giddens: debate, recensões, críticas http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Anthony+Giddens+The+Third+Way+and+its+Critics&btnG=Pesquisar&meta=[38] Smith, Adam, obra citada, páginas 11 e seguintes e 237 e seguintes da edição original de 1776, website nota 22 de este texto.[39] Bentham, Jeremy, (1759) 1962: Introduction to the principles of morals and legislation, William Collins & Sons, Ltd, Londres. Website biografia, debate, principios, pesquisa, teoria e texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Jeremy+Bentham+1759+Introduction+to+the+principles+of+morals+and+legislation&btnG=Pesquisar&meta=[40] Stuart Mill, John, (1859) 1962: On Liberty, William Collins & Sons, Londres; e 1843: The science of logic, Book 7 da obra original, Colin, Londres.Website com os 8 textos da obra: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=John+Stuart+Mill+The+science+of+logic&btnG=Pesquisar&meta=: Texto On Liberty, website: http://www.bartleby.com/130/[41] Iturra, Raúl, 2000 : “O que é realidade ?” in Trabalhos de Antropologia e Etnologia, Vol. 40 (3-4), Porto. Website de debate recensão, críticas e teoria http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Raul+Iturra+O+que+%C3%A9+realidade%3F+Trabalhos+de+Antropologia+e+Etnologia&btnG=Pesquisar&meta=[42] Durkheim, Émile, 1893: De la division du travail social: étude sur l’organisation des sociétés supérieures, Félix Alcan, Paris. Website nota 26.[43] Marx, Karl, 1848: Manifesto Comunista, publicado em Bruxelas. Ver versão de 1977, Oxford University Press. Website nota 25.[44] Durkheim Émile, 1920: “Introduction a la morale”, Revue Pilosophique, XC, Paris, reimpresso no seu livro póstumo, 1925 : L’éducation morale, Félix Alcan. Há versão inglesa da Free Press, usada por mim em este texto e no anterior já citado de 2002, Afrontamento. Websites com texto e debate: Durkheim e livro original sobre ética e texto re escrito: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+Introduction+%C3%A0+la+morale&btnG=Pesquisar&meta= e texto www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/education_morale/education_morale.html[45] Durkheim, obra citada, versão inglesa, páginas 204 e seguintes. Ver nota 43.
4. Reciprocidade?
Apenas um esquema de iniciação. Porque sobre reciprocidade tenho escrito bastante, em
vários textos publicados[1]. No entanto, o conceito deve ser esclarecido, para além da
excelente tentativa de Alvin Gouldner[2]no seu texto clássico, citado neste livro e que tem
orientado a minha análise. Mas, antes de entrar pelos comentários de Gouldner, é preciso
lembrar outras distinções e definições, normalmente pouco referidas em textos.
Diz Vernon Robbins, da Emory University[1], que reciprocidade é “ the informal principle on
which a dyadic contract is based, reciprocity is an implicit, non-legal contractual obligation,
unenforceable by any authority apart from one’s sense of honour and shame. The principle of
reciprocity is the most significant form of social interaction in the limited-good world of the first
century. The reciprocity in dyadic contracts is either symmetrical or asymmetrical. There are
also several kinds of reciprocity in the distribution system of the pre-industrial-agrarian based
economy: balanced, full, weak, negative. Asymmetrical reciprocity, a feature of thepatron-client
contract, is between partners that are not social equals and make no pretence to equality.
Balanced reciprocity occurs where distant tribal kin were involved, the element of watchful
calculation grew greater, and the time within which the counter gift would have to be made grew
less. Full reciprocity occurs among members of a family, goods and services were freely given.
Negative reciprocity occurs outside the tribe mutuality ends–like morality, it only holds good for
tribesmen. An outsider was fair game for clever dealing in an exchange: one could haggle,
cheat and lie. Symmetrical reciprocity, a feature of a colleague contract, is between closely
located persons of the same social status. Weak reciprocity occurs among members of a cadet
15
line within a clan, gifts would be given; but an eye would be kept on the balanced return-flow of
counter gifts.”
Trata-se, a meu ver, da definição mais clássica que existe sobre o conceito, aquela a que
normalmente as pessoas se referem ao falar de dar, de aceitar, de receber, de devolver, na
base da palavra empenhada ou dada, um contrato oral, não escrito, que obriga a uma
continuidade na relação. Esta ideia é retirada das teorias religiosas que são estudadas e
professadas na Universidade em causa. Nesta, para mim, romântica forma de entender o real,
falta a noção de que o que se dá é um bem, que tem preço, valor económico, e é resultado de
trabalho humano, como se não houvera mercado para trocar…
Outra definição é proporcionada por Hegel, ao dizer que reciprocidade é: “the completion
of the division of Actuality which proves to be the Notion. Reciprocity is the grasping of the thing
at the point where cause and effect, action and reaction, possibility and necessity have
completely merged with one another. Reciprocity is sometimes called “interaction”, the
conception of a complex system as a network of interacting causes and effects, but yet lacking
a “notion” or concept of the underlying unifying system to “make sense” of these
interactions”[2] Por outras palavras, e se lembrarmos o objetivo da Filosofia Hegeliana, sem
reciprocidade o ser humano está incompleto, se não o estava já, ao não ser parte da Ideia
Absoluta ou Divindade. Não é em vão que Hegel menciona o processo de interacção, tão
usado por mim próprio em textos e palestras, ao conceber a vida social como resultado de uma
atitude cultural, baseada no reconhecimento da existência de um Ideal Absoluto que orienta as
nossas acções, incluindo a razão, e que esse Ideal faz de nós seres incompletos enquanto não
tratamos quer com a Divindade, quer com nós próprios e os nossos semelhantes. Pelo que, ao
sermos entidades em permanente criação, não somos o que somos, somos a negação de nós
próprios, negação que construímos em parceria com os outros: eu sou uma tese, os outros são
a minha antítese, em conjunto aprendemos e somos uma síntese. Eis a base da sua dialéctica,
que o fez afirmar, nos seus textos, que os seres são completos enquanto co-existem dentro de
um mesmo espaço, entendem a sua História e partilham as mesmas ideias: se assim não fora,
haveria um conflito de culturas que faria da vida um campo minado, dentro do qual apenas a
política aplicada ao Estado e aos indivíduos por eles próprios poderia pacificar. É esta a base
da sua ideia de reciprocidade, uma forma de interacção social necessária para se viver bem,
em paz, em submissão ao Absoluto Ideal ou Divindade; ou, por outras palavras ainda, a
reciprocidade define a interacção necessária para a vida social. Esta é a ideia que leva a Karl
Marx a falar de reciprocidade.
No entanto, há mais ainda a entender, para definir a reciprocidade e a maleabilidade desse
conceito central para a Antropologia, como o entendimento que têm teólogos como Martinho
Lutero, que a ele se refere enquanto como forma de salvação e conquista do Céu, escapando à
condenação do Inferno, assunto que no seu tempo preocupava imenso os seres humanos.
[3] “…the structure of reciprocity is not as strongly articulated as in the Treaty on Christian
Freedom. The main model seems to be one in which everything is received from God and
passed on to a neighbour. The presentation moves from sinful man to God’s forgiveness. In the
sermons the view from above plays an equally important role, and follows here the movement of
the incarnation. This is the reason for Lutero’s placing of the Kingdom of God in actions.
16
However, it is wrong to understand these variations in an absolute way. Both perspectives could
be found in both writings, because Lutero’s understanding of Christian man is basically
structured by a Chalcedonian Christology.”[4]
Parece evidente a necessidade de um comentário. Porque estamos a falar da raiz da cultura, o
que eu denomino a sua lógica em vários dos meus textos[5]. De facto, através da minha
observação, ou de membros da minha equipa, em vários sítios de pesquisa da Europa,
América Latina e África, as primeiras ideias que as pessoas aprendem em pequenas, com
palavras e ideias retiradas dos seus adultos, são as da existência de uma divindade que
determina o facto de sermos solidários e caridosos uns com os outros. O rito de Eufuko,
analisado por Rosa Maria Melo, da Etnia Handa de Angola, assim testemunha[6]. Bem como o
texto de Ângela Nunes sobre as crianças A’Uwe-Xavante do Brasil[7]. Ou, ainda, o texto que
organizamos com Manuela Ferreira[8], devotado todo ele ao entendimento das formas de
aprendizagem dos mais novos do grupo social. Estes textos que refiro, ensaiam o
entendimento da interacção entre duas culturas, a do adulto e a da criança, enquanto analisam
as formas de aprendizagem das primeiras ideias que derivam das crenças na Divindade. Os
Mandamentos da Igreja Romana estão presentes no processo de ensino e aprendizagem. É
isto que preocupa Martinho Lutero, ao escrever os seus textos, especialmente os referidos e o
seu Catecismo: todo o ser humano está predestinado a viver uma vida de intenso trabalho
dentro de vida histórica, para atingir uma vida melhor além História ou na visão da Divindade
(definida como Deus Pai; o seu Filho Sacrificado pelos denominados pecados do mundo; e as
ideias inculcadas em nós pela terceira pessoa que é parte da Unidade da qual Hegel falara,
como Luterano, o Ideal Absoluto: o Espírito Santo a definir a racionalidade da raça humana).
Não apenas dos membros da teoria religiosa organizada, a partir da Bíblia traduzida para as
línguas faladas pelos membros das Igrejas, por Lutero e Calvino, e mais tarde por Pio V, Papa
dos cristãos romanos em 1563. É esta a preocupação demonstrada por Lutero, o facto de que
a salvação apenas é possível se existe colaboração entre as pessoas ou actividades
recíprocas. É necessário advertir que Lutero, como Calvino nos seus textos referidos a seguir,
enfatizam a ideia de ser a Divindade a implantar racionalidade e objeto de trabalho entre as
pessoas, desde a Infância, ideia expressa pelo autor sempre por mim citado, Thomas Aquinas,
ou Tomás de Aquino, quer no seu texto sobre Economia ou Summa Theologica, quer do
seu Catecismo da Summa Theologica de 1260, reeditado e modernizado pelo Papa Benedetto
XV, em 1875[9]. Este conjunto de análises etnográficas fundamenta essa preocupação de
Lutero que, por sua vez, é uma preocupação universal: como referido por Ludwig Feurebach
em 1841 e 1848-49, a preocupação central do ser humano é a morte e de como a vida pode
ser continuada[10]. Estes textos são ensaios histórico-filosóficos que defendem a hipótese de
que o ser humano vive alienado pela sua preocupação com a morte e atribui as suas
qualidades a uma Divindade que o substitui, adormecendo-o para a realidade como se de ópio
se tratasse. Ideia que não se encontra em Lutero, ou Calvino, ou no Catecismo de Aquino, ou
do Pio V, cuja base é uma solidariedade entre seres humanos, que Feuerbach reconhece como
reciprocidade que colabora na ultrapassagem dos dissabores de uma vida, que, de certeza,
deve acabar um dia, na Visão da Divindade ou nas chamas do Inferno. É o que Lutero
denominou vocação para se salvar do inferno e Max Weber analisou no seu tempo, em 1905.
17
É assim que reciprocidade é, no meu ver, um conceito social derivado da lógica religiosa,
apesar de Temple e Chabal[11], bem como Godelier[12], fazerem uma outra leitura. Uma
leitura que começa por remeter a Claude Lévi-Strauss e à sua hipótese de 1948, de ser a
reciprocidade uma ligação única entre natureza e cultura, que Marcel Mauss teria criado. E a
análise dos textos passa pelas ideias, que pensam eles, Marcel Mauss teria avançado no seu
texto, hoje livro, L’Essai sur le don. No entanto, estes três autores colocam uma questão
fundamental, que estava já no texto de Mauss e que Lévi-Strauss não considerou: a mais valia,
ou moeda retirada aos seres humanos que recebem dádivas ou presentes, que, como refere o
próprio Mauss, acaba por ser uma mentira social, por haver Mercado.Temple e Chabal
começam por referir que a dádiva é uma gratuitidade, mas rapidamente passam para a
existência de dinheiro na circulação das gratuitidades e na fabricação dos bens oferecidos. Tal
e qual refere Godelier, ao falar da subordinação de quem recebe face a quem oferece. Por
outras palavras, materializam um conceito que tinha sido usado como dogma dentro da teoria
religiosa e ainda é usado pelos Antropólogos como uma actividade sem mercado, donde,
Temple e Chabal referirem as ideias de Marshall Sahlins[13] e de Karl Polanyi[14], autores
muito considerados para entender uma invenção da Ciência da Antropologia: as sociedades
sem mercado e a sua economia, que Malinowski estuda e conclui que não existem, como
refere ao falar no Capítulo VI, parágrafos IV a VII[15], referido em detalhe mais à frente.
É o que eu denomino a Lenda Negra da Antropologia ou a mentira antropológica. Porque, da
análise de Temple e Chabal, pode inferir-se a ideia de ser a reciprocidade a base de valores
humanos, como é provado profusamente nas 1ª e 2ª parte do livro, dedicado a desenvolver
uma hipótese certa e bem desenhada: entre quem recebe e aceita, aparece um outro,
denominado “Tiers…Le mana, c’est concept vide, n’exprime-t-il pas alors la plénitude du sens,
donnée d’emblé à l’homme, ou plutôt crée par lui dès qu’il entre dans un relationm
réciproque? Le mana c’est la valeur de la réciprocité, un Tiers entre les hommes, qui n’est pas
dejà là, mais à naitre, un fruit, un fils, le Verbe que circule, qui donne à chacun son nom d’être
humaine, et sa raison à l’universe.”[16] Para acrescentarem, mais à frente ao falarem
do Tiers, ou do Outro como nós diríamos, mas um Outro que não tem existência física, uma
ideia à Hagel: “Selon notre thèse, dans la structure binaire, le hau ou le mana naît individis de
la parité avec autrui…Le Tiers et le produit même de le réciprocité”[17]. Resulta, em
consequência, nada estranho que o tratamento de Marshall Sahlins et Malinowski seja pouco
certo, sem mencionar outros autores críticos de Marcel Mauss e das suas ideias
sobre hau e mana, conceitos que este autor apenas analisara para entender o funcionamento
da economia da França do seu tempo, e que os autores citados ignoram. Tal como foi ignorada
por Claude Lévi-Strauss a referência clara que Marcel Mauss faz, no começo da sua obra e
que diz que procura saber qual é a regra de Direito em sociedades arcaicas, que obriga a
devolver um bem emprestado a outrem. A questão estava resolvida já por Malinowski, nas
páginas referidas do texto citado: não há dádiva, não há mana e o hau não é esse engano que
refere Remo Guideri no seu texto, quando ao analisar as ideias de Marcel Mauss, propõe que o
autor se teria enganado ao interpretar a história do Maori Tamati Ranapiri, ao dizer
que hau não é nem uma coisa nem o vento que passa pelos ramos de uma árvore, mas sim,
18
a alma da coisaemprestada ou doada que iria atrás do ser que aceita ou solicita esse
empréstimo[18].
A análise de Temple e Chabal é poética, é certa, segue as ideias e teorias criadas por Claude
Lévi-Strauss e o livro é um prazer de leitura: é um processo de aprendizagem. No entanto – e
esta minha frase não é uma crítica, apenas uma ideia que segue no decorrer do meu
pensamento –, Marshall Sahlins e Malinowski não podem entrar na sua análise, na forma
estrutural que ela toma. Malinowski, no texto invocado, fala claramente de que existe comércio,
troca e intercâmbio nas sociedades não ocidentais (no seu caso, entre os Massim da Kiriwina)
e acrescenta que há obrigações sociais a serem cumpridas, como oferecer bens no caso do
parentesco matrilinear, ou entre marido e mulher, relações de parentesco político, e outros[19].
O estudo dos autores invocados é um processo de interacção, da forma mais sociológica
possível, conceito que não é usado por Temple e Chabal. Mais, Marcel Mauss, no seu
importante ensaio sobre a dádiva, com o qual continua as ideias de Direito, Estado, Ritual, Lei
e Economia, do seu Mestre Émile Durkheim, pergunta-se qual é a lei que orienta os contratos
nas sociedades arcaicas, aparentemente sem Estado, sem Mercado e sem Escrita. E
acrescenta, logo a seguir, dentro da sua definição de programa de pesquisa: “…Há aqui todo
um enorme conjunto de factos. E eles próprios são muito complexos…fenómenos sociais
“totais”…religiosos, jurídicos, morais e conomicos…queremos destacar apenas o carácter
voluntário…aparentemente livre e gratuito, e todavia forçado e interessado por estas
prestações… [em] forma de presente, da prenda oferecida generosamente, mesmo quando,
nesse gesto que acompanha a transacção, não há senão ficção, formalismo e mentira social…
e obrigação e interesse económico.”[20] É esta parte do texto que acabo por não entender
como pode não ter sido lida ou referida, nem por Lévi-Strauss nem pelos autores em causa. Tal
como não entendo, que a análise de todos eles se concentre na classificação de bens e
prestações e não no Capítulo V, páginas 185 a 208, as bases da Sociologia Económica. O
texto de Marcel Maus é importante ao comparar trabalhos de campo de outras culturas, com os
acontecimentos actuais do povo francês, referidos nas eternamente omitidas páginas. Tal como
não entendo, também, a omissão dos textos políticos de Marcel Mauss, especialmente os
textos sobre socialismo e sobre a participação de um cientista na vida pública do seu país[21],
tal e qual tinha feito Émile Durkheim ao colaborar na Educação francesa durante o Governo
socialista de Gambetta. As obras de Mauss, como a maior parte das de Durkheim,
especialmente as que incidem sobre socialismo e materialismo histórico, parece terem sido
banidas do reprrtório científico da Ciência Social, pelo que, no final, acrescentarei a lista das
publicações. Para, como gosto de referir, “lavar a cara” destes nossos autores fundamentais e
limpar as autorias dos Antropólogos.
Como é o caso de Marshall Sahlins, muito criticado por distinguir quando a teoria da Ciência da
Economia deve ser usada e quando não deve, para entender e explicar a vida doméstica dos
Bosquímanos e de outras economias denominadas de subsistência. Para se explicar, concebe
o conceito de Modo de Produção Doméstico[22]. Ideia que passo a referir. Sahlins afirma no
seu texto, que é possível apreciar as formas da caça e colheita de alimentos, apenas quando
se tem necessidade e passar o resto do tempo no que ele denomina uma estrutura de carência
ou de baixa produtividade. [23] E investe bastante na defesa de uma forma de produção
19
doméstica que não precisa de continuidade no trabalho, nem de indústrias, nem de mercado. É
preciso entender e comparar os capítulos 1 e 2, para perceber que o autor experimenta
distinguir entre analisar o comportamento social como recíproco e de entreajuda, e o
comportamento pela ciência que ele denomina burguesa – não para analisar classe social, mas
para analisar a possibilidade de empregar os conceitos de Economia a povos como os
Bosquímanos de Kalahari, os Aborígenes Australianos, e outros da América Latina, cuja
economia é a de trabalhar quando é preciso guardar bens de consumo, para descansar ou usar
o tempo em entretenimentos e rituais ou a ensinar crianças e jovens. Por outras palavras, o
conceito de reciprocidade usado por Sahlins, tem mais a ver com o comportamento social que
com o económico, por não existirem ideias sobre mais-valia, lucro, maximização, conceitos
todos usados nas economias com tecnologias, que satisfazem as necessidades humanas de
forma rápida e facilitada[24]. Conceitos para analisar noutro capítulo. Entretanto, era
necessário entender que, o comportamento social de grupos que baseiam o seu processo
reprodutivo na colheita e na caça, entram em contradição com um elemento principal da
economia de lucro: a falta de propriedade, porque para quem subsiste de forma nómada, a
propriedade seria um laço contraditório para o seu “hand-labour”[25]. A denominada
propriedade, em sociedades não industriais, está atribuida à Autoridade do grupo, que distribui
os sítios de procura de alimento e sítios de caça, enquanto que na sociedade com indústrias,
esta propriedade é individual, como refere no Capítulo 2, páginas 92 a 94. É a partir desta
ideia, que refere reciprocidade e o que denomina “sharing”, ou partilhar os frutos do trabalho,
se este faltar aos parentes ou pessoas relacionadas[26], quer na produção e colaboração, quer
ainda na distribuição dos meios de trabalho ou objectos de recolha e caça, para acabar com o
que ele denomina “a Lei de Chayanov que diz: “in the community of domestic producing group,
the greater the relative working capacity of the house-hold, the less its members Works”. Ideia
que Anton Vladimir Chayanov tinha desenvolvido ao estudar o trabalho nas
denominadas unidades económicas camponesas[27], ou MIR, onde os camponeses russos, na
época feudal, suplementavam a sua economia por não ser suficiente o trabalho nas terras do
Senhor, a quem deviam entregar grande parte da colheita[28]. De facto, Sahlins usa as ideias
de Chayanov apenas uma vez, para sustentar a sua ideia de Modo Doméstico de Produção e
atingir a sua definição de reciprocidade, diferente da proporcionada por Marcel Mauss, que ele
cita no seu texto[29]. O que interessa a Sahlins, é teorizar sobre o impossível: o “pooling” que
evita a anarquia e dispersão referidas pelo autor, caso não haja uma redistribuição de bens
entre parentes e amigos, que transcenda o que ele denomina redistribuição de “funções” ou
trabalho recíproco, especialmente entre homem e mulher, ideia retirada de Malinowski, mas
sem citar o autor desta interacção que Malinowski denomina comercial e sem a mínima relação
de reciprocidade. Ideia, enfim, que fez Lévi-Strauss usar o conceito para falar do parentesco,
como base de toda reciprocidade.
Como dizem Temple e Chabal na obra referida, a frase maori que refere Reciprocidade, é
normalmente tomada como intercâmbio: a procura de um Outro não existe, esse Tiers ou
terceira pesoa que refere Tamati Ranapiri, é um ciclo de dádivas. Existem duas pessoas; quem
entrega um bem, quem oferece, quem aceita ou não. E esta atitude é tomada como
intercâmbio por Sahlins: “ Il croit, comme Mauss que le troisème personage du cycle
20
èconomique évoqué par Ranapiri est un artífice pour rendre visible quelque chose ; il conteste
que cette chose soit le mana du donnateur”[30] . « Le Tiers est l’obligation de rendre », como
definem os autores no título de um parágrafo do Capítulo 2, página 61. Por outras palavras, a
reciprocidade Maori existe entre quem doa e quem recebe e torna a doar, e apenas para um
tipo de bens, os taonga ou um nome que representa palavras, pinturas da cara ou do corpo,
colares, braceletes e outros semelhantes. Entre nós, Ocidentais, parece não existir este tipo de
bens e, no entanto, o conceito é usado: “Cês reflets de la gloire, cês miroirs du nom ont une
importance particulière dès les moment où il peuvent être aussitôt confiés à otroui ou même
donnés. La distinction fait par Mauss entre deux sortes de richesses et dons et s’éclaire : les
uns engendrent du nom, les autres les représentent. Les seconds symbolisent l’autorité acquise
par la redistribution des premieres.Ils sont de la renommée gravé, du prestige sculpté, de l’âme
thésesaurisées.Les indigènes, on l’a vu, , font eux – mêmes cette distinction….Cette capacité
des objets précieux d’incarner la valeur de renoméeacquise para le don des objets d’usage, est
peut-etre ce qui conduit Mauss à croire à croire que les indigènes prêtaaint systematiquement
de l’âme aux choses.Il observe en effet surtout le transport d’objets auxquels sont délibérément
associées des valeurs spirituelles : trésors, talisman, blasons, nattes et idoles sacrées qui
représentent de l’âme »[31].
Por outras palavras. Temple e Chabal isolam a sua própria cultura, o seu etnocentrismo,
relativizam as suas vidas, usam o seu saber clássico, para entender o que o sábio Maori quis
dizer e que o próprio Mauss não tinha entendido. E, não tinha entendido, por ser a sua análise
apenas um ponto de comparação entre a sua sociedade, tal e qual tinha feito o seu Mestre
Durkheim, que investigara no Ocidente antes de ir pelas avenidas dos Aborígenes Australianos.
O próprio Mauss retoma textos Massim e Kwakiutl, e apenas um trecho que lhe tinha sido
proporcionado por Robert Hertz, para estudar o hau, conceito que se viu impossibilitado de
debater em seguida, por Hertz ter morrido na Grande Guerra do Século XX. Dominique Temple
e Mireille Chabal vivem com os Maori e é assim que os entendem, como fazemos todos nós,
antropólogos de terreno. Tentam ultrapassar a falta de entendimento do conceito citando Sir
Raymond Firth, ele próprio filho de Maori e com trabalho de campo feito entre eles, mas que,
como bom nativo, renega as suas origens, donde, nada é demonstrado[32]. Firth sabe imenso
de reciprocidade familiar, entende as formas de ensino e aprendizagem, fala da correlação
entre matrimónio, herança e circulação de pessoas dentro dos Hapu, ou grupos domésticos,
mas não refere reciprocidade; ou, por outras palavras, refere, à maneira de Malinowski,
comércio e modernidade.
O que experimenta fazer Sahlins? Estudar “formas arcaicas”, mas a sua cultura atraiçoa-o,
acabando por aplicar a economia ocidental, como Mauss, enquanto estes nossos autores
centram a sua análise no interior da cultura Maori e, se escrevem em francês e vão passando
pelos vários autores, isso deve-se à necessidade de explicar Etnologia a Antropólogos,
Etnógrafos, Formalistas, Substantivistas ou Estruturalistas. Recorrem aos autores que falam de
sociedades sem mercado, para ajudar no entendimento de um comportamento que existe no
meio de um outro: há dádiva dentro da realidade da troca mercantil. Tenho observado entre os
Mapuche Rauco do Sul do Chile, entre os Mapuche Picunche do Centro, ouvi do meu colega e
amigo Roger Dale da Universidade de Auckland[33], como todos estes nativos, fora da sua
21
terra natal, resistem a falar na sua língua e fazem por esquecer a sua procedência. Caso
diferente em Temple e Chaball, eles passam pelos Maori, não são Maori. Caso diferente de
Polanyi, Sahlins, o próprio Marcel Mauss e, no seu minuto, Émile Durkheim e Sigmund
Freud[34]: o estudo feito é de seres humanos distantes, incógnitos. Marcel Mauss teve
Hubert[35], Hertz[36]e Durkheim filho, para essa essencial parte da Antropologia: o trabalho de
campo com residência continuada. Mas como desapareceram, e a análise antropológica
passou a ser uma semiologia, ainda em vida de Mauss, o entendimento de reciprocidade ficou
sob a interpretação de Malinowski, Firth e, especialmente em França, origem dos dados para o
conceito, de Claude Lévi-Strauss e a sua escola, como será referido em breve.
Acaba por ser um problema falar de reciprocidade, usando o conceito entre tantas actividades
diferentes e diferentes culturas. Mauss aplica-o para entender a mais valia no seu país,
conceito que não tenho visto ser analisado por nenhum autor, por enquanto. Os economistas
referem a desigualdade na base da lógica cultural diferenciada entre proprietários e não
proprietários, da natural servidão do operariado. Mas, como a minha ideia é entrar pela mais-
valia nesse conceito tão usado em Antropologia, não posso deixar de acrescentar as seguintes
palavras, a partir do texto já citado de Durkheim e do desenvolvimento estruturado por Marcel
Mauss (mas usado de forma tão diferente por toda a Ciência Social, como provam os autores
referidos mais acima, e os que vou referir a seguir).
Reciprocidade não é um conceito fácil de analisar. Há quem fale danorma de reciprocidade, há
quem fale do princípio de reciprocidade. Para entender a diferença, é preciso entender a
relação que existe na correlação entre ética, lei, direito, costume e objectivo do conceito. O
primeiro que parece ter falado da ideia de reciprocidade, foi Cicero, c.60 BC. Diz: “There is no
duty more indispensable than that of returning a kindness. All men distrust one forgetful of a
benefit”[37] Há poucos conceitos usados para definir a palavra reciprocidade. Um deles é de
Samuel Becker, que diz: “I do not propose to furnish any definition of reciprocity; if you produce
one, they will be your own achievement”[38]Hobhouse diz que “reciprocity…is the vital principle
of society, a key intervening variable through which shared social rules are enabled to yield
social stability” [39]. Richard Thurnwald, na sua ideia, muito da escola alemã, constata que “the
principle of reciprocity is almost a primordial imperative which pervades every relation of
primitive life”[40]. Há as duas ideias, a do princípio e a da norma. Como princípio, tratam do
conceito Malinowski[41], Mauss[42], Durkheim[43]. De uma outra maneira, há os autores que
pensam o conceito como uma norma e não como um princípio ético, orientado pelo direito
costumeiro ou pela lei escrita. Entre estas, ao mesmo tempo que Durkheim fala de princípio,
fala também de direito à maneira aprendida do seu mestre Ferdinand Tönnies, ao referir que há
uma solidariedade mecânica ou comunitáriaGemeinschalft, ou uma orgânica ou associativa ou
de trocas, separada pelo intercâmbio ou Société denominada por Tönnies Gessenchalft, que
pode levar a uma anomia ou falta de dinâmica social. Donde a troca/dádiva é impossível. Mas o
que interessa nesta parte, é entender que Durkheim, ao debater a divisão do trabalho de Adam
Smith, refere a existência do apoio que os seres humanos procuram para a produção dos seus
bens. Essa que Marcel Mauss, ao procurar o princípio de reciprocidade, nem denomina como
tal, apenas entende que há três movimentos para estabelecer um convénio económico entre os
seres humanos: dar, receber, devolver. E começa logo com uma pergunta, que é parte da sua
22
hipótese, ao dizer: “Desde há anos que a nossa atenção se debruça ao mesmo tempo sobre o
regime de direito contratual e sobre o sistema das prestações económicas entre as diversas
secções ou subgrupos de que se compõem as sociedades ditas primitivas e também aquelas
que poderíamos dizer arcaicas…que exprimem ao mesmo tempo e de uma só vez todas as
espécies de instituições: religiosas, jurídicas e morais – e estas políticas e familiares ao mesmo
tempo; económicas – e estas supõem formas particulares de produção e do consumo, ou
antes, da prestação e da distribuição….queremos considerar um dos aspectos apenas,
profundo mais isolado: o carácter voluntário, por assim dizer, aparentemente livre e gratuito, e
todavia forçado e interessado dessas prestações…onde há senão ficção, formalismo e mentira
social, quando há no fundo, obrigação e interesse económico.”[44]
A questão que lhe interessa passa de imediato a ser exposta como hipótese: “Qual a regra de
direito e de interesse que, nas sociedades de tipo atrasado ou arcaico, faz com que o presente
recebido seja obrigatoriamente retribuído?…há fenómenos de troca e de contrato nessa
sociedades que não estão privadas de mercado económicos como se pretendeu – porque o
mercado é um fenómeno humano, que, em nossa opinião, não é estranho a nenhuma
sociedade conhecida…mas cujo regime de troca é diferente à nossa. Veremos aí o mercado
antes da sua principal invenção, os mercadores e antes da sua principal invenção, a moeda
propriamente dita”[45]. E, ao longo de quase duzentas páginas, analisa a sociedade romana do
contrato, a grega, a hindu e as dopotlatch e do kula, nas quais analisa os
conceitos mana e hau. Para concluir, nas páginas 192 a 209, que existe uma noção de valor
que é semelhante à nossa, capitalista, embora esteja permeada ou apareça como uma forma
diferente à utilitária. No entanto – é a sua conclusão – há procura de lucro, bem como há
procura de mais-valia tal como no sistema capitalista. O donatário empresta pelo interesse de
ver uma outra pessoa ou grupo, vergado à necessidade de restituir, o que, pelo seu carácter
religioso ou sagrado, aparece como uma actividade pela qual há castigo e punição pelo
incumprimento. Mauss fala de oferta e dádiva, mas nunca fala de reciprocidade. Apenas de três
momentos da actividade de trocar, que é, para todos os efeitos, utilitária, procura lucro e mais-
valia. Não fala de reciprocidade, apenas fala de obrigatoriedade de retribuir, para não perder a
abundância que um povo tem, perante a escassez de um outro. E vai retirando casos,
especialmente de hierarquia, que explicitam as formas de comércio por si encontradas, e,
especialmente, como diz, por Malinowski que, após ter feito um sério esforço de entender a
dádiva pura, apenas a encontra nos esposos ou na troca para a reprodução de seres humanos.
É neste tipo de análise em que é preciso trabalhar, porque dádiva e reciprocidade são factos
diferentes. Gouldner, no trabalho citado, encontra poucos cientistas que entendam ou tentem
definir reciprocidade. E passa para a análise da reciprocidade feita por Durkheim na sua obra
póstuma, bem como a de Marx[46]. No seu texto Le Socialisme[47], analisado mais adiante
neste meu texto, quer Gouldner, quer Mauss no seu Prefácio, reconhecem terem retirado ideias
de Marx, bem como de Saint-Simon e de Proudhoum, ou a por ele denominada “Escola
Socialista” da sua época. O conceito usado é o de exploitation ou exploração, resultado de uma
relação social na qual é “possível apreciar a desigualdade no intercâmbio, por causa de
investimentos não ganhos por pessoas que apenas possuem a propriedade dos meios de
produção, acabam por receber o lucro dos operários ou a mais valia de quem trabalhou já o
23
necessário para produzir o seu valor de uso ou consumo próprio, para produzir um valor extra
ou não merecido, pelo proprietário”[48]. É a partir destas ideias que Thorstein Veblen trabalha o
conceito útil para entender reciprocidade, o de institutionalized explotation[49] O autor noruego-
americano entende que existe umVested Interest ou um interesse de investir, que caracteriza
como o direito a coisas após nada ter sido feito pelo investidor. É a partir desta ideia que é
possível pensar que a reciprocidade tem apenas um interesse, o de lucrar na base do trabalho
de outro, enquanto se faz o trabalhador pensar que existe solidariedade social, na medida da
segurança social e assistência a quem não trabalha. E é destas ideias do Capital, usadas por
Thorstein Veblen nos anos 30 na Sociologia Americana, que Mauss e Durkheim usam, para
dizer nos textos dos anos 20 ou póstumos e prefaciados por Mauss, que “a existência de
classes sociais, caracterizadas pela importante desigualdade de quem tem e de quem apenas
possui a sua capacidade de produção como força de trabalho, faz impossível que contratos
justos sejam negociados entre um possuidor e um não possuidor de meios de produção. O
sistema de estratificação social existente constrange (constrains) ou impinge uma desigual
troca de bens e serviços, ofendendo assim às expectativas dos povos das sociedades
industriais. A exploração impossibilita, por causa da disparidade de poder entre as partes
contratantes, uma igualdade necessária para exprimir a vontade, o que coloca à sociedade em
risco de extinção ou subversão” [50] Durkheim acrescenta uma ideia que Marx não tinha
analisado, essa de ferir os valores das pessoas com a atitude anti-ética dos proprietários do
Capital.
Malinowski, no entanto, não abandona a procura da ideia de reciprocidade e aí, onde Durkheim
adverte que a sociedade é instável pela sua falta de solidariedade ou a existência
de anomia nas relações sociais, a Gemande de Tönnies, professor de Durkheim, o nosso
polaco adverte que há várias formas de reciprocidade[51] Na primeira das obras citadas,
Malinowski acaba por dizer que tudo o que tem encontrado é apenas uma forma de
comercializar o que é ritual, da qual um grupo social extrai utilidade de um outro, em bens e
tempo de trabalho. Na segunda, muda para o campo de psicologia, abandona a economia e
decide qualificar a Reciprocidade, com uma primeira questão “Why is it that rules of conduct in
a primitive society are observed, even though they are hard and irksome?…” [52]
A conformidade às regras, diz Malinowski, é base da reciprocidade pela coesão mecânica que
produz. Uma outra é o facto das pessoas deverem, entre elas, direitos e obrigações nascidas
ou da interacção social ou do trabalho em conjunto. A reciprocidade teria lugar fora da esfera
económica, por ser um complemento e preenchimento da divisão do trabalho, necessária como
ela é para povos sem tecnologia avançada.“Reciprocity, therefore, is a mutually gratifying
pattern of exchanging goods and services” [53]
Quer Malinowski, quer Lévi-Strauss, vão encontrar relações sociais recíprocas na estrutura do
parentesco. O primeiro, ao analisar a psicologia primitiva; o segundo, ao estudar as relações
sociais. E, como eles, muitos autores. Porque a prometida igualdade parecia estar na troca-
dádiva, denominada reciprocidade.
É destas ideias que Lévi-Strauss retira as suas, para definir a reciprocidade como o que é
oposto à natureza e é fabricado pelo homem, embora a natureza seja também humana[54].
24
É no entanto possível perceber que, na sociedade do intercâmbio, nada é gratuito. Não é em
vão que Adam Smith fala de permuta, troca e intercâmbio, dentro do mercado. E, como ele,
toda a escola liberal, contra a qual se insurgem as teorias radicais de Marx, Proudhon, Saint-
Simon, Durkheim, Mauss. Estes últimos, tentam, tal e qual Malinowski[55], comparar
sociedades para procurar uma troca-dádiva, que aparece inexistente enquanto gratuidade. Eis
porque Durkheim tem que distinguir entre uma sociedade mecânica ou comunitária, na qual a
religião traz, de forma simbólica e ritual, uma forma de colaboração sempre paga pelo
donatário; e uma de solidariedade orgânica, na qual a lei é a base de todo contrato, excepto
quando é celebrado entre quem nada tem e o proprietário, como diz na obra
citada L’éducation e outras, invocadas nestas páginas. A troca-dádiva tão procurada parece
ser apenas uma permuta, com mais-valia, à maneira definida por Marx em 1862 e 1863[56].
Troca que é comercial, como estimo provar no capítulo seguinte.
[1] Robbins, Vernon, 1996: Exploring the texture of texts, Vallet Forge, Trinity Press International, http://www.cyberclass.net/reciprocity.htm[2] Hegel, Friederick, 1812-1816: Science of Logic, on-line. Há versão portugues pela Guimarães Editora. Website para pesquisa:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Friedrich+Hegel+Science+of+logic+&meta=[3] Luther, Martin, (1529) 1991: “Small” Cathecism, Concórdia Publishing House, St Louis, USA; (1517) 1989: The Ninety-Five Thesis; (1522) 1989:Eight Sermons at Wittenberg, Ausburgs Fortress, USA. Website com texto: http://www.ccel.org/l/luther/small_cat/small_cat.txt[4] Retirado da sintese dos textos de Martin Luther, especificamente dos Sermões de Wittenberg de 1522, por Bo Kristian Holm, e referidos em 1999, no texto: Life and Law. Martin Luther Understands of Christian Existence and the Challenge from the “New Perspective on Paul”, texto on line: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Kristian+Holm+Life+and+Law+Martin+Luther&btnG=Pesquisar&meta=. Website com textos de Wittenberg: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Martin+Luther+Serm%C3%B5es+de+Wittenberg&btnG=Pesquisar&meta=[5] Iturra, Raúl, 2003: “A religião é a lógica da cultura” entregue a Editora Afrontamento para um livro do Seminário sobre Religião, realizado na Universidade da Beira Interior em 2003. Bem como no meu texto de 2002:A economia deriva da religião, Afrontamento, Porto, e o referido de Protohistória: “O conceito de reciprodocidade”. Ver nota 45.[6] Melo, Rosa Maria, 2001: O rito do Eufuko entre os Handa de Angola, tese de Doutoramento, ISCTE, policopeado.[7] Nunes, Ângela, 2000: A sociedade das crianças A’Uwe-Xavante do Brasil. Por uma Antropologia da criança, IIE, Lisboa. Bem como a sua tese de Doutoramento de 2003: Brincando de ser criança, ISCTE, policopiado.[8] Ferreira, Manuela (org): “Crescer e aparecer ou para uma sociologia da infância”, in Educação Sociedade e Culturas, Afrontamento, Porto, Nº17.[9] Comentários sobre estes textos, vide Iturra 2001 e 2003, livros sobre teoria religiosa, bem como os comentários de outros capítulos do presente texto.[10] Feuerbach, Ludwig, 1841: Das Wesen des Christentums ou A Essência do Cristianismo, Papirus, Brasil, 1988; Website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Ludwig+Feuerbach+1841+A+Ess%C3%AAncia+do+Cristianismo&btnG=Pesquisar&meta=; e 1848-49: Vorlesunger über das wesen der religion ou A Essência da Religião, Papirus, Brasil, 1989. Website biográfico e analítico da obra:http://www.pucsp.br/~filopuc/verbete/feuerba.htm [11] Temple, Dominique, e Chabal, Mireille, 1995: La réciprocité et la naisance des valeurs humaines, L’Harmattan, Paris ouhttp://dominique.temple.chez.tiscali.fr/structures.htm1[12] Godelier, Maurice, 1996 : L’Enigme du don, Fayard, Paris. Website publicitário e debate: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Maurice+Godelier+L%27+Enigme+du+don&btnG=Pesquisar&meta=[13] Sahlins, Marshall, 1974: Stone Age Economics, Tavistock Publications, Londres. Website para debate http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Marshall+Sahlins+Stone+Age+Economics&spell=1 [14] Polanyi, Karl, 1944: The Great Transformation. The political and economic origins of our time, Beacon Press, USA. Website debate e pesquisa: cepa.newschool.edu/het/profiles/polanyi.htm
25
[15] Malinowski, Bronislaw, 1922: Argonauts of the Western Pacific, Routledge and Kegan Paul, Londres. Uso a versão castelhana de Eidiones Península, Barcelona, 1973, páginas 173 a 198. Website debate, teoria, etnografia: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Bronislaw+Malinowski+The+argonauts+of+the+Western+Pacific&spell=1[16] Temple et Chabal, ob.cit. página 15. Website nota 57.[17] Temple et Chabal, página 68 da obra referida. Esta análise nasce do comentário feito ao começo do livro sobre o que Lévi-Strauss pensa do conceito de reciprocidade, acima referido, na sua obra de 1948: Les strcutures élémentaires de la parénté, PUF, Paris. Website para debate, informação, base teórica: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Claude+L%C3%A9vi-Strauss+Les+structures+elementaires+de+la+parent%C3%A9&spell=1[18] Guideri, Remo, 1984: L’abondance des pauvres, Seuil, Paris, citação in pasim. No entanto, diz na página 40 da sua obra: “ Le mystère de la reciprocité, à suposser toujours qu’elle existe, rédide entièrement dans cette idée d’ « equivalance » d’une chose que je donne avec un chose que je reçoi…” Website para debate: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Remo+Guideri+&btnG=Pesquisar&meta=[19] Nas páginas 196 e 198 do texto que uso, em formato de papel, o autor refere 8 interacções entre pesoas relacionadas a actividades económicas. Aliás, o parágrafo VII referido nesta linha, é denominado pelo autor “obligaciones económicas” que bascem de relações sociais e, comforme Durkheim, essas relações são as mais fortes dentro de um grupo. Não consigo entender como Temple e Chabal descuraram esta parte do texto em análise por eles próprios. É verdade que Malinowski esquematiza a interacção sem mercado, mas é também verdade que repete inúmera vezes que “deve suspender a análise do Kula para voltar às relações de comércio”. Malinowski 1922 obra referida, in passim em todo o livro.[20] Mauss, Marcel, obra referida, versão portuguesa de 1988, Edições 70, Lisboa. A edição de 2002 é bem mais certa e esclarecida. As minhas reticências e parêntese.Website com texto, ver nota 27[21] Mauss, Marcel, textos entre 1896 a 1942, 1997: Marcel Mauss – Écrits Politiques. Textes réunis et présentés par Marcel Fournier, Fayard, Paris. Website sobre textos políticos do autor, partes de textos, cartas e debatehttp://www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/classiques/mauss_marcel/ecrits_politiques/ecrits_politiques.html[22] Sahlins, Marshall, 1974: Stone Age Economics, Tavistock Publications, Londres. Website nota 59.[23] Sahlins, obra citada, página 42 e seguintes do texto usado, Tavistock e Net.[24] Sahlins, obra citada, páginas 44 e seguintes, em contraste com página 1 e seguintes. A frase que ele usa é “an affluent society is one in wich all the people’s material wants are easily satisfied”, página 1. E acrescenta a seguir, uma frase que estimo genial: “to assert that the huntres are affluent is to deny then that human condition is an ordained tragedy, with man the prisoner at hard labour of a perpetual disoarity between his unlimited wants and his insufficient menas”. Páginas 1, 4 e 6, especificamente. Nota e Website nº 59[25] O que em português denominamos força de trabalho.[26] Sahlins sintetiza o seu argumento na frase da página 86: “In brief, by this characteristich of Domestic Mode of Production – that is a production of use values –…entertains limited economic goals…” páginas 86 e seguintes. Website nota 59.[27] Chayanov, op. cit. Pág. 47 e seguintes (versão castelhana de 1974). Website debate e teoria: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=A.V.+Chayanov+La+organizaci%C3%B3n+de+la+unidad+econ%C3%B3mica+campesina&btnG=Pesquisar&meta[28] A análise de Sahlins, está contida nas páginas 94 e seguintes; as de Chayanov, no seu texto citado por Theodor Shanin, The theory of Peasant Economy, 1966, American Economic Association. O que eu tenho ussado para referir este entendimento do “pooling”, “sharing” e reciprocidade como defininido por Chayanov, é de 1905-data da escrita-, edditado pela Nueva Visón de Buenos Aires en 1976. Há outros textos editados nos anos 80 do Século XX por Theodor Shanin, especialmente no seu The awkward class-Russia 1910.1925, texto dedicado às análises de Chayanov sobre a Rúsia Rural, fonte não usada por Marshall Sahlins, apesar de Alexander Chayanov ser referido dentro do Ocidente no texto citado, por Theodor Shanin, discípulo de Chayanov ao definir o conceito de reciprocidade que Sahlins omite. Website para debate, teoria e pesquisa: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Theodor+Shanin+The+awkward+class&btnG=Pesquisar&meta=[29] Sahlins, obre em referência, páginas 150 e seguintes, com o mesmo erro de não entender a comparação mausiana das sociedades sem contratato e com contrato, parta definir a Sociologia Económica, que Sahlins ignora.[30] Temple et Chabal, obra citada, páginas 52 a 60. Website nota 57 ehttp://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Dominique+Temple+Mireille+Chabal+La+reciprocit%C3%A9+et+la+naissance&btnG=Pesquisar&meta=[31] Temple et Chabal, página 44, texto em formato de papel. Tenho transcito esta extensa passagem do texto, porque ajuda ao entendimento da reciprocidade maori, que é, como bem sabemos, diferente à nossa. Os autores fizeram um reestudo, que nem Sahlins nem Guidéri tinham feito, para entender o conceito original, que Lévi-Strauss não precissou de fazer por ter sido não apenas estudante de Mauss, mas porque analiza o real a través de símbolos. Em caso nenhum, é a autoridade de outros semelhante a esta para entender reciprocidade.
26
[32] Firth, Raymond, 1929: Primitive Economy of the New Zealand Maori, Routledge and Kegan, Londres. Website para debate e teoria etnográfica:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Raymond+Firth+Primitive+Economy+of+the+New+Zealand+Maori&btnG=Pesquisar&meta=[33] Dale, Roger, 1994 : « A promoção do mercado educacional e a polarização da educação” in Educação, Sociedade e Culturas, nº 2, Afrontamento. A informação foi-me transmitida pessoalmente. Website de síntese: http://www.fpce.up.pt/~ciie/revistaesc/pagina2.htm[34] Durkheim, Émile, entre outros, 1912 ou Les formes élémentaires de la vie religieuse, Felix Alcan, Paris. Website www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/formes_vie_religieuse/formes_vie_religieuse.html – ; ou 1914 :«L’avenir de la religion », troisiéme entretien , pp 97-105 , 1906 : «Determination du fait moral », ulletin de la Société française de Philosophie, 1906 »Internationalisme et lutte des classes », Libre Entretiens, 2è série, 1906 : « Organisation sociale Masai », 1903, com Marcel Mauss : De quelques formes primitives de classification », Année Sociologique VI, «Communauté et societé selon Tönnies », Revue philosophique, 27, 1898 : »Représentations individuelles et représentations collectives », Revue de Métaphisique et de Morale, VI, Nº Maio. Website para todos estes ensaios, com textos:http://www.geocites.com/areqchicoutimi_valin; para Freud, com texto: ouhttp://www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/index-html. Em suporte de papel: (1913-Viena) 1919:Totem and taboo, Routledge and Kegan Sons, Londres.[35] Hubert, Henri et Mauss, Marcel, 1906: « Mélanges d’histoire des religions ou Introduction à l’analyse des quelques phénomènes religieux » Revue d’histoire des religions, 58, Classiques_des_sciences_socieles/index1.[36] Hertz, Robert, póstumo, 1928 : Sociologie religieuse et folklore.Recueil des textes publiés entre 1907-1917, PUF, Paris ouhttp://www.uqac.uquebec.ca/zone 30/Classiques_des_sciences_sociales/index.html[37] Cicero, c.65 BC, Oratio against Catiline, citado por Alvin Gouldner no seu texto essencial para entender este conceito, “The norm of reciprocity: A preliminary statement” in American Sociological Review Volume 25. Nº2, April 1960, University of St Louis, Washington.Website nota 46[38] Becker, Howard, 1956: Man in reciprocity, Prager, New York, page 1. Website teoria e pesquisa: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Howard+Becker+1956+Man+in+reciprocity&btnG=Pesquisar&meta=[39] Hobhouse, Leonard Trelawny, 1906: Morals en evolution: A study case in comparative ethics, Chapman and Hall, página 12. Website para debate e textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Hobhouse+LT+1906+Morals+en+evolution+A+study+case+in+comparative+ethics&btnG=Pesquisar&meta=[40] Thurnwald, Richard, 1932: Economics in primitive communities, Oxford University Press, página 106 do texto em suporte de papel. Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Richard+Thurnwald+1932+Economics+in+primitive+communities&btnG=Pesquisar&meta=[41] Malinowski, Bronislaw, 1926, Crime and custom in primitive society, Routledge and Kegan Paul, Londres. Website em francês, texto completo:http://www.google.pt/search?hl=pt- O texto em francés está datado em 1936. PT&q=Bronislaw+Malinowski+Moeurs+et+coutume+dans+les+societes+primitives&btnG=Pesquisar&meta=[42] Mauss, Marcel, 1923-24 : « Essai sur le don. Formes et raison de l’Exchange dans les sociétés archaïques » in L’Année Sociologique, Nouvelle Série, Félix Alcan Paris, Vol I.Website com texto, nota 27.[43] Durkheim, Émile, 1925: L’éducation morale, Félix Alcan, Paris. Website com texto, nota 43.[44] Mauss, obra citada, versão portuguesa tratada por mim, páginas 53 e 54.[45] Mauss, obra citada, página 54 da versão de 200, Edições 70, em formato de papel. Website, nota 27.[46] Marx, Karl, (1867) 1946: El Capital, Vol. I, FCE, México. Website com texto dos três volumes: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+Capital&btnG=Pesquisar&meta=[47] Durkheim, Émile, (1888) 1928:Le socialisme, PUF, Paris, prefaciado por Marcel Mauss. Website com texto, nota 26.[48] Marx, obra citada, in passim, a minha tradução. Website nota 92.[49] Veblen, Thorstein, 1934: The theory of the leisure class, Modern Library, New York, página 246. Website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Thorstein+Veblen+1934+The+theory+of+the+leisure+class&btnG=Pesquisar&meta=[50] Durkheim, Émile, escrita em 1888, publicada como obra póstuma em 1928, PUF, Paris, com Prefácio de Mauss. Mauss faz notar o desgosto de Durkheim pela guerra, a revolução e a luta de classes. Esta ideia está defendida na sua crítica à economia utilitária e clássica, no seu texto de 1893 e nos seus comentários à obra de Marx na Revue Philosophique de Dezembro de 1897, Paris. Website nota 26. Website e texto obra 1893, nota 106.[51] Malinowski, Bronislaw, 1922: The Argonauts of Western Pacific, páginas 1172 1 226 da versão Catalana de Península; e 1926: Crime and custom in primitive societies, Routledge and Kegan Paul, Londres. Website para debate, teoria e etnografia, nota 61 para Argonautas; e nota 87 paraCrime e Costume.[52] Malinowski, 1926, página 21 de I Parte da versão Castelhana de Ariel. Há versão francesa Web, nota 87, e em suporte de papel pela editora inglesa Routledge & Kegan Paul.[53] Malinowski, Crime and Custom página 55. Ver nota anterior.[54] Lévi-Strauss, Claude, 1949, Les forme élémentaires de la parenté, Mouton, Paris. Website nota 63.
27
[55] Nas páginas 196 e 198 do texto que uso de Malinowski, em formato de papel, o autor refere 8 interacções entre pesoas relacionadas a actividades económicas. Aliás, o parágrafo VII referido nesta linha, é denominado pelo autor “obligaciones económicas” que bascem de relações sociais e, comforme Durkheim, essas relações são as mais fortes dentro de um grupo. Não consigo entender como Temple e Chabal descuraram esta parte do texto em análise por eles próprios. É verdade que Malinowski esquematiza a interacção sem mercado, mas é também verdade que repete inúmera vezes que “deve suspender a análise do Kula para voltar às relações de comércio”. Malinowski 1922 obra referida,in passim em todo o livro.[56] Marx, Karl, 1862, e 1863 (1977): Theories of Surplus Value, Oxford University Press. Website, texto e comentários:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+1862+1863+%281977%29+Theories+of+Surplus+Value&btnG=Pesquisar&meta=
[1] Iturra, Raúl, 1988: Antropologia Económica de la Galicia Rural, Edições Xunta de Galiza, Compostela: website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Ra%C3%BAl+Iturra+Antropologia+Econ%C3%B3mica+de+la+Galicia+Rural&btnG=Pesquisar&meta=;O crescimento das crianças, Profedições, Porto, website para debate:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Ra%C3%BAl+Iturra+Como+era+quando+n%C3%A3o+era+o+que+sou.+O+crescimento+das+crian%C3%A7as&btnG=Pesquisar&meta=;A Economia deriva da religião, Afrontamento, 2000, website nota 2; “O conceito de reciprocidade”, Seminário da Universidade de Múrcia, Espanha, em Protohistória, Buenos Aires, Argentina.http://www.prohistoria.com.ar/seminariomurcia/ponencias/ponenia _iturra_texto.htm [2] Gouldner, Alvin, 1960: “The norm of reciprocity: a preliminary statement” in American Sociological Review, April 1968, Vol 25, Nº 2. Website com textohttp://www.garfield.library.upenn.edu/classics1979/A1979HT60900001.pdf
Capítulo Segundo
Reciprocidade Comercial
1. Nascimento da ideia de Reciprocidade.
O título até parece mercantilista. Mas não é por causa da teoria mercantilista que está
colocado. A teoria mercantilista faz de tudo o que existe um comércio, de todo o bem que é
fabricado, uma mercadoria a ser convertida em dinheiro, em investimento, em lucro para o
proprietário dos meios
em lucro para o proprietário dos meios de produção.[1] Mercadoria é todo o bem que é trocado
por moeda ou transferido a outro, por contrato ou pagamento. Ou, mercadoria é a capacidade
que tem um indivíduo para fabricar bens dos quais vive, pelo que Marx denominou a força de
trabalho das pessoas não possuidoras de meios técnicos ou propriedades, como
mercadoria[2]. O conceito de mercadoria é revelador da impossível igualdade, como foi referido
no Capítulo I. Mercadoria é entendida como o valor retirado do trabalho operário, quando Marx
fala de valor de uso e valor de câmbio. Valor de uso tem todo o bem fabricado com o objectivo
de ficar dentro de casa e ser partilhado pela família e consumido pelos fabricantes. É
característico da alienação, ou valor de câmbio ou de troca, retirar não apenas o bem, que
passa a pertencer ao proprietário dos meios de produção, da indústria, voir, da actividade do
operário e do seu horário de trabalho e da sua propriedade, um bem transformado que, ainda
que produzido pela pessoa, é propriedade não do artesão, mas do proprietário do capital
investido para possibilitar o fabrico.
Foi o problema colocado perante o entendimento de Émile Durkheim e da sua equipa,
especialmente de Marcel Mauss. A ideia é simples. A tese que eles encontram na sociedade
em que moram e da qual fazem parte, é a de uma sociedade de trabalho alienado, baseada
numa relação social presidida pelo capital, pelos investidores[3]. Durkheim acrescenta ao que
28
Marx tinha definido, a ideia de que a troca ou câmbio desiguais de bens, são socialmente
disjuntivas, ou, por outras palavras, desmembram a vida social e do grupo social, ao
introduzir valores disjuntivos da interacção social, usados pelos grupos para a sua coesão e
para a sua acção pragmática.[4] Por esta realidade, Durkheim escreve De la division du travail
social[5] e defende a antítese de que há solidariedade orgânica ou de direito nas sociedades
ocidentais que devem dar protecção ao operariado. Era o dilema de Durkheim: socialismo ou
sociologia? Dilema retomado por Marcel Mauss, que procura uma síntese para as duas teses:
capital versus produção não remunerada. Começa por procurar antecedentes numa ideia que
nasce ao rever as etnografias de Franz Boas e Bronislaw Malinowski, por ele citadas
em L’essai sur le don, já livro em 1956[6].
O objectivo de Mauss é simples: retirar da etnografia as actividades que existem nas
sociedades denominadas arcaicas ou primitivas, nas que parece não haver troca de bens em
dinheiro, quando se pergunta qual é a norma de direito que orienta as trocas e o intercâmbio
em sociedades que aparentemente, não têm lei nem códigos. Que, como bem sabemos, são
sociedades sem escrita, de costume ou costumeiras. Para entender esta noção de valor social
disjuntivo, começa por comparar o Direito mais antigo da Europa, o Escandinavo, e acaba por
explicar que entre grupos sociais como os Kwakiutl do Canadá e os Kiriwina da Melanésia,
existe uma relação ritual de troca de bens e pessoas, que Mauss denominafacto social total, no
qual existem três actividades que analisa: doar,aceitar e retribuir. Estes três actos rituais seriam
entendidos, mais tarde, como o único conceito de reciprocidade, do qual Mauss teria falado.
Conceito usado por Malinowski com a palavra Massim de mana ou o espírito ou magia das
coisas que explicam a troca, câmbio, intercâmbio e permuta, que, mais tarde, é reconvertida ao
conceito de reciprocidadepelo comércio que Malinowski descobre na acção ritual da troca
económica, o que provoca cem furiosas páginas no seu texto, em que sustenta que não há
outra troca, câmbio, intercâmbio ou permuta, que não seja comercial. É a partir destas dúvidas
que Mauss faz uma análise sobre o conceito de dádiva ou dom, ideia, norma ou conceito,
usado na Antropologia para explicar toda a movimentação de pessoas e de bens, como se fora
uma ideia romântica.
O meu desejo era ir directamente à etnografia. Mas, no início deste capítulo, falei de tese,
antítese e síntese, conceitos que estimo devam ser explicados, para falarmos da reciprocidade
comercial ou interacção dita recíproca nas relações sociais, presididas pelo comportamento
denominado capital. Comportamento que produz escassez dentro das sociedades, pela
alienação dos bens, que são retirados para alimentar a abundância de outros membros do
grupo social. Essas relações que Émile Durkheim denominou de, como eu percebo,
valores sociais disjuntivos da interacção social dos indivíduos em grupos. Porque, há os muito
ricos, por reterem lucro da mais valia retirada da força de trabalho dos que nada têm e os muito
pobres, que apenas têm a sua força de trabalho para vender ou alienar, denominados
proletários: possuem só a prole, ou família consanguínea, para ganhar a vida económica.
Definido por Marx, este conceito é defendido por Durkheim e Mauss, na base da ideia dos
operários não serem iguais às pessoas de posse, ainda que por cultura e lei devessem ser, o
que faz destes contratos actos ilícitos e juridicamente inválidos. Faço especial referência ao
debate de Durkheim, de 1908, “Débat sur l´ économie politique et les sciences sociales”[7], no
29
qual defende os factos económicos como base da análise da sociedade: “l’économie politique
occupe, dans l’ensemble des sciences sociologiques, une situation particulière. Elle est la seule
des ces sciences qui soit actuellment constituée comme un ensemble systématisé, la seule que
dispose d’un stock sufficient d’observations pour permettre la constructions de lois…C’est elle
qui doit servir de foyer et en quelque sort de mère pour les autres sciences sociologiques… [por
causa de]. D’autres lois économiques qui interviennent sont la loi d l’offre et la demande, la loi
du capital”[8]. Bem sabemos que Émile Durkheim criticou duramente a individualidade da oferta
e da procura, e debateu contra Adam Smith, na base dos textos de Karl Marx, da sua própria
pesquisa, e das ideias de Tönnies, no seu texto de 1893, De la division du travail social.
Durkheim e Mauss experimentaram dinamizar a Sociologia, para procurar a igualdade das
pessoas em grupo. O seu objectivo era organizar uma sociedade dentro do novo conceito de
socialismo, que, como já sabemos, aparece no Século XIX, para poder lutar em prol dos
direitos dos trabalhadores. No texto de Durkheim, de 1906, “Internationalisme et lutte de
classes”[9] , “l’antipatriotisme est nécessaire a la lutte des classes…n’est que la conséquence
particulière d’une idée plus générale, de l’idée que la société ne pourrait se reconstituer que par
la destruction des nations actuelles : la société actuelle forme deus blocs, il faut que l’un
détruise l’autre. C’est là une forme relativement récente du socialisme…D’abord, on a dit que
c’était l’avènement de la grande industrie qui condamnait à une destruction nécessaire des
sociétés actuelles. Mais pour cela il faudrait admettre que les sociétés modernes ne contenaient
pas normalement dans leurs flancs cette forme économique, qui serait le produit d’une véritable
maladie dus corps social. Dans ces cas, il serait légitime de soutenir que nos sociétés réalisent
une contradiction, qu’elles ne sauraient par elles-mêmes se mettre en harmonie avec se
système industriel qui est étranger a sa nature…l’ouvrier est exclusivement un producteur”[10]
Durkheim defende a ideia de igualdade, ideia na qual introduz o conceito de contradição que
tinha aprendido de Marcel Mauss e em Leipzig, em 1888, ao ler o livro O Capital de Marx. É
necessário dizer, no entanto, que no texto citado, Durkheim lembra que o operário não é
apenas um trabalhador, mas também um intelectual que, contudo, é incapaz de sonhar com o
futuro, porque o não tem. A ideia de igualdade procurada no conceito de solidariedade,
especialmente orgânica, que defende no texto que acabo de comentar, – Lei, Direito, Contrato
–, é uma ilusão de Durkheim, causada pelas incidências da guerra que tinha morto o seu filho e
os seus discípulos, bem como pelos feitos da Commune de Paris e da guerra Franco-Prusiana,
com a rendição de França e a matança dos Comunnards. Durkheim viveu todos estes factos e
com muita tristeza, como refere Mauss no Année Sociologique de 1925: In Memoriam,
reproduzido nas Oevreus Compléts de Mauss (Vol. III, página 434 e seguintes).
Em 1928, Mauss comenta que estes factos tinham feito de Durkheim um socialista que
duvidava imenso das lutas, donde, a sua diferença com Marx, tal e qual Durkheim a exprime, é
a análise da luta de classes. “Souffrant intensément des maux qui affligent la société actuelle, il
la croit pour cette raison, mauvaise et, pour dire, manquée et il étend naturellement ce jugement
à toutes les sociétés qui l’ont immédiatement précédée dans l´histoire, et qui peuvent en être
considérées comme l’ébauche. Il souhaiterait les voir toutes radiées de l’histoire…Cette
conception trouve précisément…un accueil favorable dans certes milieux
révolutionnaires…”[11]. O comentador acrescenta que a ideia é contrária a Marx, por este
30
pensar que o desenvolvimento é a forma superior da História das Sociedades. No entanto,
Durkheim diz: “Voyez même l’œuvre la plus forte, la plus systématique, la plus riche en idées
qu’ait produit l’Ecole [Socialiste] Le Capital de Marx…”[12] . Estas citações parecem-me
necessárias para entendermos dois conceitos: o das ideias do método contraditório usado em
Sociologia, e a procura da igualdade em sociedades primitivas e não em sociedades históricas,
como Marx fez. A procura da dádiva é a procura de sociedades sem comércio, das quais se
encontra… rien! Como vamos tentar apreciar. Até porque, se Marx não soube de Durkheim, o
contrário não é o caso.
2.Dádiva,empréstimo,escassez,abundância. Bases da reciprocidade.
Cada palavra do título deste momento do texto é um conceito. Mas conceitos que estão
“acasalados”, são um ou dois pares em oposição dialéctica, como vamos analisar. O
pensamento dialéctico tem origem nos textos de Friedrich Hegel[13]. E o par que tenho
escolhido tem a sua origem na seguinte citação de Hegel: “Todo pensamento lógico verdadeiro
ou real tem três aspectos. Em primeiro lugar, o aspecto abstracto ou compreensível. Em
segundo lugar, a sua negação dialéctica, que diz o que ele não é. Em, terceiro lugar, o aspecto
especulativo que é a compreensão concreta: A é ao mesmo tempo aquilo que não é. Estes três
aspectos não constituem os três aspectos da lógica; são, sim, momentos de tudo o que é
realidade e verdadeiras lógicas. Fazem parte de qualquer aspecto filosófico. Qualquer conceito
é racional, é uma abstracção que se opõe a outra, e é compreendida pela unidade pelo seu
oposto. Esta é a definição da dialéctica” [14].
Marx retoma este conceito e aplica-o à sua análise da história, de forma materialista: vai de
imediato à propriedade, às relações entre pessoas, propriedade e salários. “The political State
cannot exist without the natural basis of the family and the artificial basis of civil society…human
beings is a mass.”[15] Esta crítica de Marx é retirada das obras citadas de Hegel e utilizadas
para escrever o seu The Communist Manifesto. É a partir deste texto que Marx expande a sua
metodologia materialista dialéctica, ao analisar a correlação propriedade
privada/salário/colectivismo de bens e da produção, temida pela classe burguesa do seu
tempo. Refere Henry de Saint-Simon, como economista e filósofo socialista francês e as suas
teorias colectivas, e como as trocas, ou são privadas, com mais-valia para o proprietário, ou
colectivas, com uma repartição igual de recursos entre produtores, todos eles proprietários dos
meios de recursos e de bens, resultante desses recursos. Acrescenta que a aristocracia
europeia está a tremer e vê com pavor a passagem de bens das mãos privadas, para mãos
colectivas, que o Marques de Saint-Simon defende, desde o seu lugar social privilegiado. Saint-
Simon fustiga a aristocracia por não se aperceber que a classe burguesa cobiça os seus bens,
permitindo o seu levantamento, bem como o empobrecimento das classes operárias. Com base
nesta análise, propõe formas económicas de acção em prol dos despojados, referindo, nos
seus textos, os factos que permitem entender a necessidade de solidariedade, do colectivismo,
bem como os seus contrários: a escassez e o aparecimento da necessidade do empréstimo.
Somas crescentes de dinheiro são retiradas dos bancos pelas indústrias, pagas com juros que
revertem a favor da burguesia. Estes factos dinamizam e originam um novo comportamento
31
entre os despojados de propriedade: areciprocidade ou ajuda mútua entre os pobres do
operariado francês. Saint-Simon advoga o colectivismo e a solidariedade entre as denominadas
massas de produtores empobrecidos, desnecessariamente, pela indústria e pela falta de
cuidado do Estado, apesar de Louis XIV ter dito, anos antes,“L’Êtat c’est moi”. E a cabeça do
seu neto rolou na guilhotina…
Saint-Simon defende as suas teorias em dois textos, memórias do período e contexto do que
viria a ser a análise da dupla por mim referida: dádiva-empréstimo; escassez-abundância[16] É
o que Émile Durkheim analisa no seu livro de 1928, publicado e prefaciado por Marcel
Mauss[17]. É nesse texto que, quer Mauss, quer Durkheim, estabelecem uma luta para o
entendimento do socialismo e da propriedade colectiva, que leva ao estudo da solidariedade
em Durkheim e das formas arcaicas de produção em Mauss, por meio do método comparativo
de culturas e conceitos: o quê e como, nas etnias, o quê e como, na Europa. Texto no qual
Durkheim diz, como já fiz referencia, no número 1 deste Capítulo Segundo, logo de
entrada: “Voyez même l’oeuvre la plus forte, la plus systématique, la plus riche en idées qu’ait
produit L’Ecole ( [socialiste]): Le Capital de Marx.[18] Donde, dádiva – empréstimo, é a primeira
dupla; o par contraditório é escassez -abundância. [19] Contraditório apenas pelo método que
uso para os explicar, a lógica de tese, antítese e síntese, que Hegel e Marx e Feurebach
definiram. Estes conceitos parecem não estar relacionados e, no entanto, há uma derivação
que permite a introdução a um conceito a partir do outro. Isto, por um comentário que Marcel
Mauss produz no seu texto de 1923-24[20], que trata de um conceito que passou a ser
fundamental para a análise antropológica, o da dádiva a par e passo com o comércio. Análise
produzida por Durkheim, Mauss e Malinowski, que passo a expor para entender os conceitos-
pares, necessários para entender as relações sociais capitalistas desse tempo e de hoje, por
meio do método comparativo, e que acaba nos textos de Pierre Bourdieu, referidos no fim
destas páginas. Mauss começa por definir a circulação de bens entre grupos sociais, que
parecem não ter mercado nem moeda. É o que o autor denomina dádiva e é referido nas
formas de Contrato e de Direito, que analisa logo no começo do seu texto: “Na civilização
escandinava e em bom número de outras, as trocas fazem-se sob a forma de presentes, em
teoria voluntários, na realidade[21]obrigatoriamente dados e retribuídos”. E o debate a que o
conceito dá lugar no seu tempo, é logo citado em notas de rodapé. Mas, no texto central,
adverte o leitor de que esta pesquisa está dentro de um estudo mais amplo, que tem a ver com
o direito contratual e com o sistema de trocas económicas. O estudo de Mauss é uma
continuação do que o seu mestre Émile Durkheim tinha feito em 1893 e em 1912, sobre a
solidariedade. Mauss refere que a temática da troca-dádiva “é muito complexa por envolver
instituições religiosas, jurídicas e morais – e estas políticas e familiares ao mesmo tempo;
económicas – e estas supõem formas particulares da produção e do consumo, ou antes, da
prestação e da distribuição…”[22]. Por outras palavras, está, não apenas a definir conteúdos,
bem como a delimitar a área de estudo que, por ser extremamente “larga” e entrosar muitas
matérias, acaba por reduzi-la apenas ao que denomina o carácter “voluntário…, aparentemente
livre e gratuito, e todavia forçado e interessado por essa prestações”[23]. É assim que vai,
lentamente, entrando na definição do que é a dádiva ou o dom, como denomina este
comportamento: “Elas revestiram quase sempre a forma do presente, da prenda oferecida
32
generosamente mesmo quando, nesse gesto que acompanha a transacção, não há senão
ficção, formalismo e mentira social, e quando há no fundo, obrigação e interesse
económico”[24]. O objectivo do autor é o aprofundamento do conceito da divisão social do
trabalho, como diz a seguir, porque procura a regra de direito na qual se pode basear a troca, a
dádiva e a obrigação quer de dar, quer de receber, quer ainda, de restituir. E a sua pesquisa
vai endereçada para as denominadas sociedades arcaicas ou primitivas. Por outras palavras,
experimenta retirar das formas antigas da vida social, uma explicação do que é a preocupação
da época: a existência ou não, de solidariedade social: “qual é a regra de direito e de interesse
que, nas sociedades de tipo atrasado ou arcaico, faz com que o presente recebido seja
obrigatoriamente retribuído? Que força existe na coisa que se dá que faz que o donatário a
retribua? E vai analisando o comportamento de várias etnias, especialmente as analisadas por
Boas e Malinowski, até concluir que estes tinham definido uma economia natural, sem moeda e
sem mercado. Mas o que identifica como economia de troca – dádiva está longe de entrar nos
quadros da economia denominada utilitária, que era a teoria económica da sua época, ou da
época dentro da qual Durkheim, Mauss, e Malinowski antes de Mauss e Boas desenvolveram
os seus trabalhos. Especificamente, Mauss chama a nossa atenção para o facto de Malinowski
analisar de forma detalhada no texto de 1922, sobre os Argonautas, a existência de trocas que
são ofertas, e ofertas ou dádivas que são comércio. De facto, Malinowski categoriza as trocas
até atribuir a classificação de intercâmbio ou comércio a várias delas[25]. A ideia para a qual
Mauss chama a nossa atenção é a da página 195, da versão castelhana: “Es fácil ver que casi
todas las categorías de regalos que yo he clasificado según principios económicos, se basan
también en relaciones sociológicas.”[26]. E é Maurice Godelier que chama a nossa atenção
para o facto de Mauss ter entrado numa espécie de enigma, ao falar que existe a obrigação de
doar, aceitar, e retribuir a mesma coisa doada, quando diz“…Avec les sociétés capitalistes
modernes nous sommes ao pôle opposé des sociétés que Mauss analyse dans son Essai sur
le don. On peut dire sens forcer que nos sociétés sont marquées en profondeur par « une
économie et une morale de marché et de profit » et qu’à l’opposé les sociétés qui figurent
dans L’Essai sur le don apparaissaient à Mauss comme profondément marquées par une
« économie et une morale du don » . Cela ne veut pas dire que les sociétés caractérisées par le
don ignoraient les échanges marchands, ni que les sociétés marchandes d’aujourd’hui ont
cessé de pratiquer le don. Le problème est de voir dans chaque cas quel le principe domine
l’autre dans la société et pourquoi”[27]. Como é habitual, Godelier está a analisar o
pensamento de Mauss a partir da lógica contraditória do materialismo histórico. O mesmo que
usa Mauss para analisar as sociedades denominadas primitivas ou arcaicas, que o próprio diz
ser uma Arqueologia de ideias, esta procura de uma explicação das formas de mercado, antes
de existir uma teoria ocidental da economia. E acaba por sintetizar toda a sua análise sob o
título convincente de Sociologia Económica, na qual diz directamente: “a noção de valor
funciona nestas sociedades; excedentes muito elevados, de uma maneira geral, são
acumulados; frequentemente são gastos inutilmente, com um luxo enorme e que nada tem de
mercantil; há marcas de riqueza, espécies de moedas, que são trocadas. Mas, toda esta
economia, riquíssima, está ainda impregnada de elementos religiosos: a moeda ainda tem o
seu poder mágico e ainda está ligada ao clã ou ao indivíduo….” [28].
33
Este argumento é o que tenho usado no meu texto referido de 2002 A economia deriva da
religião. Aliás, não sou apenas eu a ter este tipo de hipótese. Se repararmos na análise de
Marx, vamos encontrar na sua epistemologia ideias que derivam da reciprocidade. A primeira
ideia a reter em Marx, é a de racionalidade. Tudo começa, quando Marx critica David Ricardo,
na sua formulação da sua teoria do valor, na base do tempo necessário de um indivíduo para
produzir um bem, por não especificar o que fazer, depois de esse bem ter sido fabricado[29]. O
tempo é para o operário, ou para o empresário? Ricardo critica Adam Smith na sua ideia do
valor – trabalho, e Marx critica Ricardo porque, ao experimentar defender os operários, Ricardo
cria com o seu conceito de valor, uma desigualdade: o tempo que resta na fábrica é mais-valia
ou lucro puro, apropriado pelo proprietário[30]. É a noção de valor de uso e valor de câmbio:
todo o ser humano precisa de apenas poucas horas diárias de trabalho para satisfazer as suas
necessidades básicas, como comer, agasalhar-se, etc. E que as horas a mais que um ser
humano trabalha, constituem a mais-valia que lhe é retirada pelo proprietário da fábrica ou
indústria ou artesanato onde trabalha. Aliás, o capital acumulado pelos proprietários acaba por
ser uma relação social, que hierarquiza seres humanos entre os que podem mandar por terem
posses e bens, e outros que têm apenas a sua capacidade de trabalhar que é vendida aos
proprietários de bens produtivos, passando assim, a serem uma mercadoria. Conceito de
mercadoria que define para pessoas e coisas que são trocadas no mercado.
O que procurava Marcel Mauss, bem como Malinowski, era o que não é utilitário nas
transacções entre os seres humanos. E a descoberta de Malinowski, que muito fez para
distinguir entre comércio e dádiva, era que toda a reciprocidade envolvia uma dádiva de troca,
por outras palavras, de mercadoria. E mercadoria é definida como conceito por Marx, da
seguinte forma: “The wealth of those societies in which the capitalist mode of production
prevails itself as “an immense accumulation of commodities” its unit being a single
commodity”[31]. É preciso deixar ou definir de imediato o conceito de capital usado por Marx,
que, no seuFoundations of the critique of Political Economy, ou Grundisse, textoescrito ao
longo de 1864, achado em 1941 e publicado apenas em 1951, diz apenas, que “capitalism,
economic system characterized by the private ownership of property and its means of
production. Generally the capitalist, or private enterprise, system embodies the concept of
individual initiative, competition, supply and demand, and the profit motive”[32]. Nenhuma
destas características são encontradas na análise feita por Mauss ou por Malinowski, entre
povos que experimentam remediar a escassez com a dádiva ou reciprocidade. A “abundância”
dos grupos de trabalho acaba por ser a união que existe entre todos eles, que trabalham ao
longo de laços de parentesco e de hierarquia. O próprio Godelier, no texto citado, diz: “Pour
expliquer pourquoi on donne, Mauss avançait une hypothèse un peu moins “spirituelle”, et ce
qui est explicite dans ses analyses du potlatch. C’est l’hypothèse que ce qui oblige à donner
est précisément que donner oblige. Donner, c’est transférer volontairement quelque chose
qui vous appartient á quelqu’un dont on pense qu’il ne peut pas l’accepter. Le donateur peut
être un groupe, ou un individu, qui agit seul ou au nom d’un groupe. De même, le donataire
peut être un individu, ou un groupe, ou une personne qui reçoit le don au nom du groupe qu’il
représente…Donner semble instituer un double rapport entre celui qui donne et celui qui
reçoit. Un rapport de solidarité, puisque celui qui donne partage ce qu’il a, voir c’est qu’il est,
34
avec celui á qu’il donne, et un rapport de supériorité, puisque celui qui reçoit le don et l’accepte
se met en dette vis-á-vis de celui qui lui a donné”[33]. Em conjunto com a citação anterior, o
tipo de sistema definidor da relação depende de se saber se a troca é de mercadoria ou de
dádiva. Dentro da mesma sociedade, pode haver os dois tipos de troca. Já assim estava
classificado por Malinowski e por Mauss, nos parágrafos citados.
Se a relação é entre uma pessoa que é proprietária dos meios de produção e outra que não
tem mais do que a sua habilidade e capacidade de trabalho, a relação para quem entrega força
de trabalho e recebe um salário é de inferioridade, não é de abundância, é de escassez. Se da
outra parte há um indivíduo que é proprietário dos bens reprodutivos, a relação é de
superioridade e de obtenção de lucro. O lucro é a mercadoria que se adquire pela capacidade
de possuir propriedade dos meios de produção e fixar as normas e leis por meios das quais
estes meios serão usados. O proprietário não oferece, não doa, arrenda ou possui a força de
trabalho e a capacidade de produção dos que não têm outro bem que a sua força de trabalho e
a da sua família. Entre os grupos denominados arcaicos, primitivos ou anteriores a nós, esses
que Guideri denomina de forma enganada, “fora da História”[34] , a relação é de solidariedade
ou dádiva enquanto não houver uma relação de interesse ou subordinação entre o doador e
quem recebe. A relação pode ser de cima para baixo, hierárquica, mas se é a maneira de
subsistir dessa hierarquia, como acontece com a circulação de bens entre os Quechua – os
antigos Inca –, ou entre os Picunche, ou entre os Baruya como Godelier analisa em duas das
suas obras, então a relação poderia ser de dádiva, como se pretende que Mauss tenha
definido. A abundância e a escassez são auxiliadas entre grupos sociais que têm apenas a
solidariedade orgânica para se defenderem, da forma que Émile Durkheim definia no seu texto
invocado de 1893, dedicado às formas de divisão social do trabalho, em que Smith se baseara
para entender a produção.
A relação de oferta e procura é uma relação mercantil ou de comércio que, às tantas, pode
estar dentro das relações de dádiva, como o próprio Malinowski explica. Há relações
empreendidas ou tratadas no Kula que passam a ser de comércio, quando se cria uma relação
de subordinação, pela qual quem recebe deve trabalhar para quem oferece. O que resulta mais
evidente quando as sociedades usam a moeda, o papel-moeda e o crédito, para as suas
relações de interacção. A moeda acaba por ser uma mercadoria, da forma que Marx define nas
obras citadas. Mercadoria que começa quando as relações sociais mudam da pessoa para as
entidades que emitem mercadoria moeda. O trabalho é aí uma relação de uso para o operário,
enquanto é de troca dentro do mercado que procura trabalho.
Era possível pensar que os grupos arcaicos ou primitivos estão a dar mais-valia aos grupos
que colonizaram as suas terras. Mas, aí, é preciso distinguir entre a relação do grupo dominado
com o dominador, e a relação dentro de cada um de esses grupos. Dádiva e exploração podem
acontecer ao mesmo tempo, entre indivíduos não autónomos e proprietários autónomos. O que
faz a autonomia de um ser humano é a posse ou desaparição do seu produto. O que
caracteriza uma relação de escassez é a alienação do produto, esse conceito cunhado por
Feurebach[35] em 1841 e que Marx e outros autores viriam a usar mais tarde, ao definirem a
relação entre o produtor e a sua obra. A História mostra que o ser humano, em grupo ou
individualmente, é capaz de produzir um bem, seja para consumo próprio ou para a troca,
35
decidida conforme as formas do costume dentro do seu povo ou a sua cultura. A alienação do
produto acontece de duas maneiras: o produtor não apenas fica sem a obra feita ou sem saber
o seu destino, bem como a remuneração do trabalho é mais baixa do que o preço que a sua
obra adquire, como bem, no mercado. Aliás, o produtor perde a habilidade de entender as
relações de mercado, de oferta e procura, bem como a de organizar um sistema produtivo, do
qual ele é apenas uma parte.
Diferente é o que acontece entre as relações de dádiva. A divisão do trabalho é organizada na
base da hierarquia, da estrutura de clã, do parentesco e das trocas efectivadas entre grupos
que recebem pessoas e bens e grupos que doam pessoas e bens. Para entender as formas de
troca – dádiva ou mercadorias –, é preciso conhecer as linhas orientadoras do grupo. Não é em
vão que Durkheim distingue entre solidariedade orgânica e mecânica. A primeira, ajusta-se ao
direito normalmente definido nos grupos do capital, pela parte que domina, enquanto que a
segunda, consiste apenas nas relações de parentesco e chefia, incrustadas nos mitos e ritos,
que definem a dádiva, a escassez, a abundância e a reciprocidade para ultrapassar os
momentos históricos de déficit alimentar, de produção e de reprodução. É o que
Bourdieu[36]denomina o habitus, essas relações de dádiva, ou de salários, capital social, que
começa na literacia.
3. Reciprocidade Comercial.
A análise da troca-dádiva, quando tentamos entender o conceito de reciprocidade na base das
etnografias usadas pelo autor, não passa de uma desculpa para entender e dar a entender que
não há reciprocidade gratuita na sua sociedade. Não é em vão que Mauss afirma que o Estado
Francês não premeia nem recompensa, de forma igualitária, os trabalhadores. Nem é em vão
que define toda uma Sociologia Económica, uma análise do real na base das relações de
mercadoria. Essas que, conforme o próprio Durkheim diz[37], classificam e hierarquizam os
seres humanos entre operários, iguais entre eles, e proprietários, hierarquicamente por cima do
operariado. Um facto que é base da teoria de Merton[38] e Parsons[39], autores que continuam
a Sociologia Económica de Marcel Mauss, Maurice Halbawchs, Paul Lapie e outros membros
da equipa de Durkheim de L’Année Sociologique.
O problema de a reciprocidade ser um conceito que refere formas contratuais de circulação de
bens equivalentes, fica para mim, esclarecido. Mas o assunto que queria tratar, é o de termos
usado a reciprocidade como conceito que tudo encobre e nada explica. Temos utilizado o
conceito como norma, como acção e como definidor de acções. Usamos reciprocidade cada
vez que falamos de ajuda mútua ou troca de trabalho. Foi na minha própria pesquisa da Galiza
nos anos 60,70 e 90 do Século XX, que referi o conceito como forma gratuita. Não tinha
reparado que esta troca de ajuda familiar é uma forma de economia que substitui os
investimentos de capital. Ou, por outro lado, que a força de trabalho investida, é o capital que
usa o ser humano que não tem ou não possui a parte essencial do capital: moeda para investir
e criar mais moeda, a fórmula usada por Marx nos seus textos de Surplus Value ou Mais-Valia,
já referidos e que serão objecto de análise no capítulo seguinte. A mais-valia do pobre, como
36
referi no meu texto de 1988[40], é a maximização dos seus recursos. A ideia não é minha,
deriva da análise de Marx e os seus conceitos de valor de uso e valor do câmbio[41], donde a
produção de valores de uso, é subordinada à produção de valores de câmbio. Esta ideia é
fundamental para entender a movimentação da produção e para entender que a reciprocidade
é um conceito económico da Sociologia, transferido para a Antropologia e usado para entender
grupos sociais de outras culturas. Outras culturas, ou Outros como nós denominamos, que
trabalham, produzem e reproduzem de forma diferente da nossa forma de fazer economia. Ou,
pelo menos, isso é o que parece. Mas, esse tipo de análise leva a esquecer o que eu tinha já
advertido na Galiza: a única forma de responder ao mercado do capital, é o uso de formas,
ditas antigas, primitivas ou arcaicas, pelos autores usados neste e em outros textos. O capital é
uma relação social que arrebita e mantém vivas, as maneiras mais “saloias” ou, como diriam os
Galegos, mais “enxebres”, mais castizas, mais costumeiras, de trabalhar. É verdade o que diz
Karl Polanyi[42]: “los dos últimos siglos han producido en Europa Occidental y Norte América,
una organización del modo de vida humano a la que resultaron especialmente aplicables las
reglas de optar. Esta forma de economía consistió en un sistema de mercados creadores de
precios. Como los actos de intercambio, tal como se practican bajo un sistema de estas
características, implican a los participantes en opciones inducidas por una insuficiencia de
medios, el sistema productivo pudo ser reducido a un modelo que se prestó a la aplicación de
métodos basados en el significado formal de lo económico”[43]. Por outras palavras, a
aplicação das formas teóricas da Economia Política, tal e qual Durkheim tinha já alertado, eram
uma necessidade para entender a produção entre grupos sociais que, aparentemente, estavam
a realizar actividades muito distantes da denominada teoria económica. Se é bem verdade que
Durkheim constrói um argumento contra o Homo Economicus, montado por Adam Smith e John
Stuart Mill, na verdade, é esse o saber que funciona, ainda que não se conheça nem o ponto
do i. O Homo Economicus criou, na Antropologia, toda uma teoria alternativa que procurou a
economia dentro das instituições ou teoria substantiva da economia, à qual aderiram muitos
autores, entre os quais o próprio Malinowski que, sem dar por isso, criou a teoria formal, dentro
da qual não tinha cabimento a análise do parentesco e da vizinhança. Este é o motivo que o
levou a mudar para a Psicologia. Marcel Mauss soube reconhecer, embora não tenha sido
explícito na sua formulação da Sociologia Económica, que a troca-dádiva era apenas defesa
face à falta de meios para optar. Porque a teoria económica ocidental, tem por fundamento a
ideia de todos saberem preços, valores das mercadorias, montante dos investimentos,
quantidade de lucro a obter pela aplicação de uma importância que, normalmente, um
assalariado não imagina. Do que se trata, normalmente, é de assegurar que ninguém saiba
teoria económica, para evitar a concorrência que possa prejudicar um investidor que organiza a
sua empresa para lucrar.
A teoria à qual Durkheim aderiu e que tinha sido elaborada por Karl Marx, era: “A chacun selon
ses oeuvres” ou “A chacun selon son mérite”[44]. A procura de igualdade estava na base do
conceito de troca-dádiva, bem como no de solidariedade, especificamente na mecânica. Mas a
História tem provado a falácia filosófica do conceito ou das frases. Porque a obra procurada, é
a capacidade de optar entre bens mais baratos para investir e vender mais caro os produtos
requeridos. Esta ideia de Adam Smith, Bentham, Mill e outros liberais, tem levado ao engano
37
todos os teóricos da ideia substantiva da Economia. Não é em vão que Edmund Leach escreve
em desafio aos estudantes do primeiro ano do curso de Antropologia de Cambridge, para
descobrirem, se puderem, quem não é racionalista e é orientado pelas suas emoções no seu
comportamento económico[45]. A ideia de optar, uma realidade no mundo dentro do qual
vivemos, acaba por ser um factor real na vida social. E, ainda que Durkheim, no seu Le suicide.
Etude sociologique[46]não consiga ver que o suicídio anômico tem por causa a falta de meios e
ideias para optar, a opção ou falta dela, faz do indivíduo um pária do seu grupo social, ou um
incompetente, ou “excluído”, o conceito de hoje.
Eu próprio, no meu regresso à Galiza em 1997, tive a infelicidade de constatar, não apenas a
falta de colaboração ou entre – ajuda familiar, bem como a morte de seis adultos e dois jovens,
os filhos de dois suicidas, que morreram por não saber o que fazer perante as mudanças que o
Governo da União Europeia tinha introduzido no seu país: de valores de uso, passou-se
rapidamente a organizar valores de troca[47].
Aliás, a maior parte dos economistas, dos sociólogos ou dos antropólogos, têm-se virado para
a teoria formal da economia, especialmente por causa da teoria da globalização, na qual todos
os Outros parecem andar envolvidos. O próprio Raymond Firth, que em 1929 fez uma tese de
Antropologia Económica[48], baseada nas ideias de Karl Marx, muda de análise para os
símbolos e para a teoria formal, nas obras a seguir. Marcel Mauss descobriu que a dádiva era
comercial e organizou a Sociologia Económica. Durkheim, esse, ficou apenas lembrado pelas
suas ideias de solidariedade.
[1] Marx, Karl, 1862 e 1863, Theories of surplus value, já citadas nota 101; Hales, John (1549) 1987: A discourse of the common weal of this realm of England, Universidade de Dijon. Website nota 33; More, Sir Thomas, (1516) 1985: De optimo reipublicae statu deque nova isula Utopia, Bâle, Antwerp, edição portuguesa de Guimarães Editora, Lisboa, e outros. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=+Thomas+More++Utopia&btnG=Pesquisar&meta=[2] Marx tinha elaborado o conceito nos seus escritos filosóficos de 1848, especialmente em Alienated labour, conceito retirado da obra de Ludwig Feuerbach, A essência do cristianismo, (1841) 1994, Gulbenkian, Lisboa; e no Capital, Vol. I, 1862. Ver versão Inglesa de ambos os textos, Oxford University Press. Website para Feuerbach, nota 51; para Marx, com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+Alienated+Labour&btnG=Pesquisar&meta=[3] Durkheim, Émile, 1925: Le socialisme, PUF, Paris, bem como no seu texto de 1893 – ver nota106 – e nos seus comentários à obra de Marx naRevue Philosophique de Dezembro de 1897, Paris, já citados no capítulo I deste texto, nota 26. Bem como Durkheim Émile, 1885 : “Propriété Sociale et démocratie” in Revue Philosophique, XIX, Paris : Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/ classiques/Durkheim_emile/durkheim.html - 1893 : “Sur la définition du socialisme” in Revue Philosophique, XXXVI, Paris.Website com texto : www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_2_07/definition_socialisme.html ; (1888) 1928:Le Socialisme, PUF, Paris. Website com texto nota 26 ; Mauss, Marcel, 1923-24: “L’essai sur le don. Formes et raison de l’echange dans les societées archaïques”, Année Sociologique, Nouvelle Série, Vol. I. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/mauss_marcel/ socio_et_anthropo/2_essai_sur_le_don/essai_sur_le_don.html[4]Durkheim, Émile, textos citados na nota anterior.[5] Durkheim, Émile, 1893 : De la division du travail social, Félix Alcan, Paris. Há versão portuguesa da Editora Presença, 1977. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/division_du_travail/division_travail.html[6] Mauss, Marcel, 1956, L’essai sur le don, Payot, Paris. Há versão portuguesa de 1988 e 2002, Edições 70, Lisboa. Website, título completo e texto: nota 27, Capítulo 1 de este texto.[7] Durkheim Émile, 1908: Bulletin de la société d’économie politique, Paris. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/ Durkheim_emile/textes_1/textes_1_10/ec_pol_socio.html[8] Durkheim, Émile, texto citado, reproduzido em 1975: Textes, apresentados por Victor Karadi, Vol. I, páginas 218 e seguintes, Editions de Minuit, Paris. A ideia entre[ ], é minha, para enlaçar a frase e a ideia.
38
[9] Durkheim, Émile, 1906 a: Livre entretiennes, 2é séries, Ier Entretienne, Paris, Bureaux, Des livres entretiens. Website com textos :http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim++Des+livres+entretiens+&spell=1[10] Durkheim, Émile, texto citado, reproduzido em 1970: La science sociale et l’action, PUF, Paris, páginas 282 a 292. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/ classiques/Durkheim_emile/durkheim.html[11] Durkheim, Émile, (1895) 1975: Textes, Vol. I, páginas 73 e seguintes, reprodução do comentário da Revista Italiana La riforma sociale, 2, vol. 3. Website com textos, para pesquisa e debate:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+Textes+La+riforma+social&btnG=Pesquisar&meta=[12] Durkheim, Émile, (1888) 1928: Le Socialisme, PUF, Paris, páginas 87 e seguintes. A obra começou a ser escrita esse ano, acabou por ser um curso sobre Socialismo de 1886-87 na Faculdade de Letra da Universidade de Bordeaux, e editada por Mauss na data indicada.Website nota 26, Capítulo 1.[13] Hegel, Friedrich, (1821) 1964 : Princípios da Filosofia do Direito, Guimarães, Lisboa, e a obra póstuma de 1837, publicada em Portugal 1989: Enciclopédia das ciências filosóficas em epítome, Edições 70, Lisboa. Website para debate: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Friedrich+Hegel++Princ%C3%ADpios+da+Filosofia+do+Direito&btnG=Pesquisar&meta=[14] Hegel, Enciclopédia das ciências filosóficas, já referida, páginas 82 e seguintes do primeiro volume da edição portuguesa. Website para debate: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Friedrich+Hegel++Enciclop%C3%A9dia+das+ci%C3%AAncias+filos%C3%B3ficas&btnG=Pesquisar&meta=[15] Marx, Karl, (1843) 1977: Critique o Hegel’s Philosophy of Right”,Clarendon, Oxford, páginas 26 e seguintes. Website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=+Karl+Marx+Critique+o+Hegel%27s+Philosophy+of+Right&spell=1[16] Saint-Simon, Henry de, (1808) 1981 : Sobre a ciência do homem ; e (1823) 1981: O catecismo dos industriais, Edições 70, 1981, Rio de Janeiro. Websites com texto: para o primeiro, http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Henry+de+Saint-Simon+Sobre+a+ci%C3%AAncia+do+homem+&btnG=Pesquisar&meta=; o segundo http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Henry+de+Saint-Simon++O+catecismo+dos+industriais&btnG=Pesquisar&meta=[17] Durkheim, Émile, 1928: Le socialisme, PUF, Paris. Website nota 26 do Capítulo 1.[18] Durkheim, obra citada, página 36 e 37 do original. A seguir, é tudo análise da Saint-Simon e defessa do socialismo, embora Mauss comente que Durkheim não estava tão calmo quanto a luta de classes (Página 28 do texto citado). Website nota 26, Capítulo 1.[19] Marx, Karl, (1848) 1977: Communist Manifesto, Clarendon, páginas 22 e seguintes. Website nota 25, Capítulo 1.[20] Mauss, Marcel, 1924.25: “Essai sur le don. Forme et raison de l’échange dans les sociétés archaïques” in L’Année Sociologique, Nouvelle Série, Félix Alcan, Vol. I, Paris. Há versão portuguesa de 1988 e 2002, Edições 70, Lisboa. Website com texto, nota 27, Capítulo 1[21] Mauss, página 53 da obra referida, versão portuguesa de 1988. Website nota 27.[22] Mauss, obra citada, página 53. Website nota anterior.[23] Mauss, mesma obra, mesma página. Website referido nota anterior e seguinte.[24] Mauss, mesma obra, mesma página.[25] Malinowski, Bronislaw, 1922: The Argonauts of Western Pacific, Routledge and Kegan, Londres, versão castelhana de Península, 1973, Barcelona. Website nota 61, Capítulo 1.[26] Malinowski, obra citada, página 195 e seguintes. Website nota anterior.[27] Godelier, Maurice, 1996: L’énigme du don, Fayard, Paris, página 24 e seguintes. Website nota134, Capítulo 1.[28] Mauss, obra citada, páginas 192 e seguintes da versão portuguesa de 1988. Ver nota 217 mais em frente.[29] Ricardo, David, (1817) 1983:Princípios de economia política e de tributação, Gulbenkian, Lisboa. Website 227.[30] Marx, Karl, (1862 e 1863) 1977: Theories of surplus value, Oxford University Press. Website nota 51.[31] Marx, Karl, (1867) 1977: Capital, página 421 da versão inglesa de MacLellan, Oxford University Press, suporte de papel. Website para todos os volumes, com texto, nota 49, Capítulo 1.[32] Retirado in passim dos textos de Marx Grundrisse e Capital. Websites nota 35 para o primeiro, como a nota anterior para o segundo.[33] Godelier, obra citada, páginas 20 e seguintes. O argumento é em debate com Lèvi-Strauss. Website nota 134.[34] Guideri, Remo, 1984: L’abondance de pauvres, Seuil, Paris, páginas 129 e seguintes. Website nota 64, Capítulo 1.[35] Feuerbach, Ludwig, (1841) 1994: A essência do cristianismo, Gulbenkian. Website nota 51.[36] Bourdieu, Pierre, 1970: La reproduction, Minuit, Paris. Website para debate e notas: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Pierre+Bourdieu+La+Reproduction&btnG=Pesquisar&meta=; e 1989 : La noblesse d´Etat, Minuit, Paris. Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Pierre+Bourdieu+La+Noblesse+d%27Etat&btnG=Pesquisar&meta=
39
[37] Durkheim, Émile, 1900: “La sociologia e il suo dominio scientifico”, inRivista italiana di sociologia, 4, pgs. 127-148, reimpresso em Textes, “Genèse d’une théorie sociale”, Minuit, 1975, pgs. 11 à 37. Websites com vários textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+Gen%C3%A8se+d%E2%80%99une+th%C3%A9orie+sociale&btnG=Pesquisar&meta= Também no texto póstumo: L’éducation morale, 1925, Alcan, Paris. Website nota 43.[38] Merton, Robert, 1957: Social theory and social structure, Free Press, Glencoe. Website com textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Robert+Merton+Social+theory+and+social+structure&btnG=Pesquisar&meta=[39] Parsons, Talcott: 1952: The social system, Tavistock, Londres. Website com textos: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Talcott+Parsons+The+social+system&btnG=Pesquisar&meta=[40] Iturra, Raúl, 1988: Antropologia Económica de la Galicia Rural, Xunta de Galiza, Compostela. Website nota 45.[41] Iturra, Raúl, obra citada, páginas 62 e seguintes. Website nota 45.[42] Polanyi, Karl, 1957: “The economy as an instituted process”, in Polanyi, Arensberg e Pearson (orgs) Trade and market in the early empires, the Free Pres, Nova Iorque: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Polanyi+The+economy+as+an+instituted+process&btnG=Pesquisar&meta= .; ou Ponlanyi, Karl, nota 60.1944: The Great transformation, the political and economic origins of our times, Beacon Press, EUA. Website[43] Polanyi, Karl, 1957, a minha tradução.[44] Marx, Karl, 1848: Communist Manifesto, já citado, -website com texto: nota 25-, e referido no Vol. I do Capital, -website com textos: nota 49-,também citado. Durkheim escolheu este texto para debater«Contribution à la discussion de «La notion d’égalité sociale» no Bulletin de la société française de philosophie, 1910, reimpresso em 1975, Textes, Vol. II, Minuit, Paris. Website com textos: www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/ classiques/Durkheim_emile/durkheim.html[45] Leach, Sir Edmund, 1976: Culture and communication, C.U.P, Grã-bretanha. Há versão portuguesa, Edições 70, Lisboa. Website da versão inglesa: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Edmund+Leach+Culture+and+Communication&btnG=Pesquisar&meta=[46] Durkheim, Émile, 1897: Le suicide, Félix Alcan, Paris. Há versão portuguesa, Editorial Presença, 1982. Website com texto: www.uqac.uquebec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/ classiques/Durkheim_emile/suicide/suicide.html[47] Iturra, Raúl, 1998: Como era quando não era o que sou. O crescimento das crianças, Profedições, Porto. Website com vários textos:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Ra%C3%BAl+Iturra.+Como+era+quando+n%C3%A3o+era+o+que+sou.+O+crescimento+das+crian%C3%A7as&btnG=Pesquisar&meta=[48] Firth, Sir Raymond, 1928: The New Zealand Maori, George Routledge & Son, Londres. Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Raymond+Firth+The+New+Zealand+Maori&btnG=Pesquisar&meta=
Capítulo Terceiro
A Mais-Valia
Para se manter dentro da História, todo ser humano precisa de consumir bens, sejam estes de
agasalho, de abrigo, ou de alimentação. Para poder consumir, é necessário produzir esses
bens de diversa qualidade e em diversas quantidades. Todo o ser humano sabe,
especialmente os economistas ou os cientistas sociais.
Este consumo é de bens produzidos pela própria pessoa, ou por outros, por causa do tempo
necessário para investir na sua produção, apuramento, colheita e distribuição. A consequência
é simples: todo ser humano precisa de viver em interacção e ter meios para adquirir os bens
que consome e não produz, bem como de uma entrada, em moeda, para adquirir os que outros
fazem e ele precisa. Normalmente, nas sociedades industriais, é o operariado que se habilita a
esta produção, usando meios que não são da sua propriedade ou não inventados por si.
Porque a produção não é apenas de bens materiais, é também de ideias que orientem essa
40
produção ou processo educativo, quer entre iguais, quer em instituições. Esta aprendizagem,
prévia à produção, é organizada pelos Estados que decidem o que é preciso saber para se ter
uma população dentro da distribuição social do trabalho. A produção começa com a
alimentação da criança, continua pela sua formação, e passa pela sua habilitação para
determinados trabalhos. Estes trabalhos são remunerados conforme as horas aplicadas à
transformação da natureza em ideias e em bens económicos. Normalmente, os bens têm um
tempo de trabalho necessário para a sua produção, mas o produtor trabalha mais horas do que
as necessárias para criar bens em quantidade necessária para satisfazer as necessidades de
consumo de uma população, e devolver o capital adiantado pelo proprietário dos instrumentos
de trabalhos, ou das patentes das invenções de ideias para produzir melhor, de forma mais
competente e em concorrência com outros produtores. Da mesma linha, ou de linhas diferentes
de fabrico de bens para o consumo, mas que usam o mesmo mercado para colocar os seus
produtos. Essas horas a mais são a mais-valia de que se fala. Os que não trabalham nesta
linha vivem da mais-valia produzida pelos produtores, ou mão-de-obra, de uma Nação, País,
União de Países, ou grupo social que partilha o mesmo espaço geográfico e a mesma cultura,
o que é dizer, a mesma necessidade de consumo. É desta mais-valia que vive toda a
população e que dá lucros ao possuidor, por Lei, das técnicas de fabrico de recursos para se
estar dentro da História.
É destas ideias que tratam os autores centrais para este capítulo: Karl Marx, que define o
conceito de mais-valia, enquanto critica os economistas da sua época, especialmente Adam
Smith e François Quesnay; o problema é que o conceito não se define apenas num texto. Ele é
o resultado de um longo argumento sobre o valor do trabalho, que define como o tempo gasto
no fabrico de um bem por um indivíduo, ou a qualificação para ensinar, ou, ainda, o tempo
investido e a energia gasta ou valor denominado abstracto.[1] A ideia de associar a teoria do
valor e a mais-valia retirada, começa cedo no pensamento do autor. Especialmente associada
à alienação do produto do trabalho por lhe ser retirada a confecção do bem, recebendo, em
troca, um salário inferior à quantidade de bens que prepara[2]. De facto, as definições dos
escritos económicos e filosóficos são mais tarde usados nos textos indicados em nota de
rodapé: Contribuição à Crítica da Economia Política ou Grundisse, e no Vol 1 do Capital.
Os conceitos de valor e de alienação são centrais para entender o contributo de Marcel Mauss
que, baseado nas teorias de Karl Marx, analisa como esta produção acontece em sítios onde
não há Direito escrito, e em sítios onde o Direito é parte da sabedoria de vários. Especialmente
a análise feita nos ensaios de Rubin, que distingue entre valor concreto e valor abstracto ou
uma forma de retirar mais valia quer da fisiologia, quer da ingenuidade do productor: “when
Marx ascertained that changes in the magnitude of value of commodities depended on changes
in the quantity of labor expended on their production, he did not have in mind the individual
labour which was factually expended by a given producer on the production of the given
commodity, but on the average quantity of labour necessary for the production of the given
product, at a given level of development of productive forces. The labour-time socially
necessary is that required to produce an article under the normal conditions of production, and
with the average degree of skill and intensity prevalent at the time. The introduction of power-
looms into England probably reduced by one-half the labor required to weave a given quantity of
41
yarn into cloth. The hand-loom weavers, as a matter of fact, continued to require the same time
as before; but for all that, the product of one hour of their labor represented after the change
only half an hour’s social labor, and consequently fell to one-half its former value” (C, I, p. 39).
Com esta citação, Marx experimenta pôr fim às especulações sobre como se vivia dentro da
sociedade do Capital, ou como esta estava definida pela relação central do capital, conceito
que define uma hierarquia entre os seres humanos, entre proprietários e não proprietários de
meios de produção, ou receptores de salários e receptores de lucro. Essa relação é
desmontada pelo autor com todo o cuidado, especialmente no seu manuscrito de 1861 e 1863,
denominado Teorias da Mais-Valia orTheories of Surplus-Value, editado por Karl Kautsky em
1905, e retirado dos apontamentos redigidos enquanto escrevia o Capital (também denominado
como IV Volume do Capital ou Contribuição à Crítica da Economia Política[3]). Com a sua
linguagem irónica de sábio que está certo do que diz, analisa a pente fino todas as teorias
definidas sobre a Mais-Valia, análise para que remeto o leitor por lá se encontrar já a História
do conceito organizada e muito bem-feita. O que interessa é saber o que é o valor e as suas
diversas confusões com lucro, salário, capital variável, renda e outros conceitos que apenas um
economista pode distinguir. A primeira ideia que é publicamente analisada por Marx é a de
mercadoria, que define no seu texto de 1859[4] – mas já referida no seu texto de 1844[5]:
“Wages are determined through the antagonistic struggle between capitalist and worker. Victory
goes necessarily to the capitalist. The capitalist can live longer without the worker than can the
worker without the capitalist. Combination among the capitalists is customary and effective;
workers’ combination is prohibited and painful in its consequences for them. Besides, the
landowner and the capitalist can make use of industrial advantages to augment their revenues;
the worker has neither rent nor interest on capital to supplement his industrial income. Hence
the intensity of the competition among the workers. Thus only for the workers is the separation
of capital, landed property, and labour an inevitable, essential and detrimental separation.
Capital and landed property need not remain fixed in this abstraction, as must the labour of the
workers.[6]
Falta dizer que esta primeira preocupação e observação de Marx, que escrevia no seu
jornal Rheinische Zeitung, em Bruxelas, deixaram em fúria o Imperador da Prússia e levou-o ao
exílio em Paris. Aqui conhece Friedrich Engels e os Bauvessianos, com os quais redige
o Manifesto da Liga dos Comunistas, denominado depois Manifesto Comunista[7], texto no qual
já refere qual o valor dos que não têm capital: essa mercadoria denominada força de trabalho,
quer do Pater Famílias, quer da sua proleou proletariado. Esta ideia percorre todo o Manifesto
e define na Parte 1, o sistema de classes sociais divididas pela propriedade de bens, ou da sua
força de trabalho, que Marx, em inglês, denomina labour-power. Ideias desenvolvidas no
texto Private Property and Communism, dos seus escritos de 1844[8]. No conjunto destes
textos, Marx denomina a força de trabalho mercadoria necessariamente transacionável no
mercado. Esta mercadoria é definida a partir de conceitos económicos que Marx dominava, o
que o levou a definir a noção de valor, explicando, no texto referido, como um trabalhador não
consegue viver sem um proprietário de dinheiro ou recursos que representem moeda como a
renda da terra, ou os juros que rende o capital possuído pelos burgueses, reinvestidos em
fábricas e indústrias oferecem benefícios económicos. Capital fixo ou investimento em bens
42
industriais, manufacturas e posse de bens que o proprietário pode ou não usar, ou capital
variável ou operariado que pode ser dispensado do trabalho ou ver aumentado o seu salário,
ou, simplesmente, ficar sem salário, porque o investidor decide fechar esse ramo do seu
negócio, ou toda a operação. Problemática económica do produtor, que ele não consegue
controlar se não for detentor do poder político que até lhe permite provocar entre os
trabalhadores uma luta competitiva e eventualmente fraticida, porque quem pede menos é
quem é contratado, e quem solicita mais salário corre o risco de não ter trabalho. No entanto,
nos seus manuscritos de 1861-63, como no primeiro Volume do Capital, Marx refere que, na
determinação do valor do fabrico de bens, a capacidade específica de um tipo de trabalho
acaba por ser um prémio para quem a possui, sendo contratado ou alugado como mercadoria
especializada[9]. Quanto à medida do valor, ela está na circulação de mercadorias que tenham
valor de uso, é dizer, que sejam procuradas pelo mercado para o seu consumo: “1. Measure of
value –The first phase of circulation is, as it were, a theoretical phase preparatory to real
circulation. Commodities, which exist as use-values, must first of all assume a form in which
they appear to one another nominally as exchange-values, as definite quantities of
materialised universal labour-time. The first necessary move in this process is, as we have
seen, that the commodities set apart a specific commodity, say, gold, which becomes the direct
reification of universal labour-time or the universal equivalent”[10].
E refere uma unidade de comparação para entendermos o trabalho como mercadoria: o ouro, é
dizer, uma mercadoria com valor de uso, como é o trabalho, que tem em si um valor de troca
ou intercâmbio, que reifica a consideração do valor da força de trabalho. É por meio do valor de
troca, que a força de trabalho é definida e acordado um salário. Eis porque, nos manuscritos,
Marx acrescenta: “The demand for men necessarily governs the production of men, as of every
other commodity. Should supply greatly exceed demand, a section of the workers sinks into
beggary or starvation? The worker’s existence is thus brought under the same condition as the
existence of every other commodity. The worker has become a commodity, and it is a bit of luck
for him if he can find a buyer. And the demand, on which the life of the worker depends,
depends on the whim of the rich and the capitalists. Should supply exceed demand, then one of
the constituent parts of the price — profit, rent or wages — is paid below its rate, [a part of
these] factors is therefore withdrawn from this application, and thus the market price gravitates
[towards the] natural price as the centre-point.” [11]
Não é um exagero o que Karl Marx diz no texto. De facto, a História comprova que, na medida
de que a indústria cresce, a procura de seres humanos diminui e a própria população toma
medidas para controlar o seu crescimento. Na conjuntura histórica de Marx, quanto mais prole
havia, mais fácil o desenvolvimento do trabalho. O dinheiro ganho era trazido para casa e
poupado para os gastos de todos. Esta é também a razão dos raros e tardios casamentos. As
pessoas deviam antes aprender um ofício ou ter uma habilitação, para poder tratar de si e da
prole que nasceria. A mão-de-obra é a resposta à procura que faz o proprietário dos meios de
produção, para satisfazer as necessidades que o seu capital requer, é dizer, a capacidade de
criar um bem que tenha valor de uso – que seja passível de ser consumido – como valor de
câmbio ou de troca, ou, como tenho referido, de intercâmbio. A diferença entre estes três
conceitos está estabelecida no meu texto de 2002[12]. No entanto, é preciso insistir nos
43
conceitos usados por Marx. O primeiro, é o de valor de uso, é dizer, um bem que tem valor pela
sua capacidade de satisfazer uma necessidade. Valor de uso, que, pela sua vez, tem várias
acepções, por serem as necessidades humanas de diversas magnitudes e de diferente tipo de
procura.
No seu Volume I do Capital, diz Marx: “The wealth of those societies in which the capitalist
mode of production prevails [domina, prevalece, minha tradução] presents itself an inmense
accumulation of commodities, its unit being a single commodity”[13].
Começa logo pela definição de mercadoria como um objecto externo a nós, uma coisa que,
pelas suas qualidades, satisfaz as necessidades humanas de qualquer espécie[14]. Ao falar de
mercadorias, o autor está particularmente preocupado com as propriedades físicas do objecto,
que associa logo ao conceito de valor de uso. Mas, acrescenta a seguir que quem cria bens
com o seu próprio trabalho para satisfazer as suas necesidades, cria um valor de uso, mas não
necessariamente uma mercadoria. Para que o bem criado seja mercadoria, é necessário que
tenha valor de troca, de câmbio ou de intercâmbio, é dizer, um valor de uso que seja social,
que seja útil também para outros ou valor de uso social. As mercadorias têm, pois um duplo
significado: bem natural e bem de valor[15] Ora bem, poder-se-ia perguntar o leitor, porquê tanta
preocupação em definir mercadoria e o seu uso? É simples: a definição do ser humano nas
sociedades de capital passa pela sua habilidade de criar bens e de interagir com eles no
mercado. Não se é pessoa se não se produz e se a produção do bem não é socialmente útil.
Pessoalmente, vivo no delírio e constante interrogação de ser a minha profissão de
Antropólogo de utilidade social e sobre qual é essa utilidade. Explicar um outro aos eus,
desenhar o contexto dentro do qual vivem? Para quê, se não consigo fazer desses seres
humanos pessoas mais felizes e mais inseridos no seu grupo social, que acontece estarem a
viver uma conjuntura histórica pouco airosa para a maior parte, aqueles que vivem de
ordenados ou wages, como referia Marx, especialmente nos seus escritos filosóficos de 1844,
1848 e 1861 a 63. Quer Marx, quer eu, quer outros, sabemos não sermos deuses, nem
omnipotentes para podermos mudar as formas de vida das pessoas. Tentamos, pelo menos,
entender esse contexto para explicar e abrir as cabeças a um real que aparece contrário à
maioria. É isto que é valor, a criação de comportamentos ou o uso dos mesmos, para a
solidariedade social, sem espera de recompensa. Mas, Marx era muito realista e sabia que
havia, desde a Revolução francessa, como refere no Manifesto Comunista, pessoas que se
tinham apoderado dos bens dos outros e do poder da classe derrotada na Revolução, a classe
estéril como ele denomina. É destes factos – Marx não trabalhava sem argumentos, sem dados
– que retira a sua ideia de mais-valia ou, como se diz em inglês e as vezes usamos em
português, surplus, conceito diferente de lucro. Como definido no Capital e na Crítica à
Economia Política, lucro é o “wage of capital” ou o salário do capital, enquanto que mais-valia é
o salário do capital adiantado para o investimento ou financiamento de um empreendimento
para produzir[16], para continuar com as operações de produção e oferecer trabalho aos não
proprietários: “The capitalist system is so complex and has so many aspects to it that to try to
develop an explanation…is near impossible. So, to simplyfie, everyday each worker goês to
work and produces 200 widgets. Every day the workers get a daily pay packet containihg
enough money to purchase one widget. The workers much spend their pay because they have
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no excess to save, so they buy their widget and their family consumes this single widget, living
day-to-day in simple poverty. Every day there is a surplus of widgest left over, 100 to be exact,
that accrusse to the boss as his “profit”, his surplus – value”[17].
O exemplo é do tempo de Dickens, mas simplifica a explicação que em Marx é complexa.
Muito embora defina Valor de várias formas, a primeira, retirada do “Prefácio” ao seu texto de
1859, A Contribuição à Crítica da Economia Política, diz: “….na Economia Política os salários
aparecem como a parte proporcional do produto resultado do trabalho. Os salários e lucros do
capital aparecem como uma amigável, mutuamente favorável, a mais razoável e humana
aparência da relação social resultante de fazer um bem em conjunto….mais tarde aparece
como uma relação hostil, por causa da proporção inversa da participação nas vendas do
produto para cada parte…o valor é determinado ao começo pelo custo de produção e a
utilidade social do produto…para passar a ser o valor o resultado das pressões do mercado às
quais o capitalista obedece e o trabalhador deve aceitar.”[18] O Valor tem a ver com a alienação
das mercadorias ou a retirada das mesmas das mãos do operário e com o não pagamento
proporcional das horas investidas na produção de tanto bem social que o mercado procura e
que o investidor sabe calcular. Esta é a luta de Marx e Engels, Kautsky e Babeuf, Bachounin e
Lenin, um valor que seja resultado do tempo retirado ao trabalhador e não remunerado, para
fabricar mais bens do que os necessários para ele, mas procurados pelo investidor para
acumular moeda – Acumulação Capitalista -, outra definição de valor que Marx analisa no
Capital, parte II do Volume I, Capítulo 17.
É o que leva Isaak Rubin a dizer:’’The magnitude of socially necessary labor-time is determined
by the level of development of productive forces, which is understood in a broad sense as the
totality of material and human factors of production. Socially-necessary labour-time changes in
relation not only to changes in the “conditions of production,” i.e., of material-technical and
organizational factors, but also in relation to changes in the labour force, in the “ability and
intensity of labour.”[19]
Esta análise de Rubin parece o melhor esclarecimento do elo da análise de Marx e dos seus
discípulos. A sua preocupação estava centrada na explicação das formas de trabalho do
Século XVIII em frente, ao operariado e à burguesia. Estas, tinham mudado de tal maneira, que
já não existiam pessoas para trabalhar a terra, o campesinato tinha acabado, o
desenvolvimento da indústria tinha retirado pessoas da produção rural. De facto, a burguesia
alugava mão-de-obra para trabalhar primeiro nos seus teares, e depois nas máquinas, de tal
forma que não havia outro trabalho que não fosse o das fábricas, o que acabava por reduzir as
pessoas a formas de vida pobre, como explica no seu texto de 1965[20] (que teria lido na
primeira reunião internacional socialista, mas um desgosto e desacordo com o Anarquista
Russo Bakounin, levou à sua ausência e ao envio do texto, lido então pela sua filha Eleanor
Marx Aveling).
O centro da teoria do valor para Marx, está não apenas no salário mal pago aos trabalhadores,
bem como no lucro crescente da concentração do capital em mãos de poucas pessoas. É por
isso que no seu Livro I do Volume I do Capital, diz: “o valor é de uso e de troca ou intercâmbio
O valor de troca aparece, num primeiro momento, como uma relação quantitativa justa ao se
intercâmbiar um bem outro semelhante na sua confecção, mas é também [como a História
45
demonstra} uma relação social que muda permanentemente, conforme o sítio e o lugar em que
a troca ou intercâmbio acontece. Porém, o valor de intercâmbio é um simples acidente e
altamente relativo na sua igualdade de manufactura, por ser ele próprio uma
mercadoria”[21]Para acrescentar que o valor do trabalho e o valor de um bem, são semelhantes
porque estão subsumidos a um conceito semelhante: o salário, que para o trabalhador é o
dinheiro pago pela obra e para o proprietário, é o lucro[22].
A Mais-Valia é um processo complexo. As definições de Marx, no seu texto para o Congresso
que preparava a Primeira Internacional, mostram claramente a relação mais importante dentro
da nossa sociedade, a relação salários, trabalho e valor: “Reduced to their simplest theoretical
expression, all our friend’s arguments resolve themselves into this one dogma: “The prices of
commodities are determined or regulated by wages.” Para logo dizer: “In point of fact, he has
never formulated it. He said, on the contrary, that profit and rent also form constituent parts of
the prices of commodities, because it is out of the prices of commodities that not only the
working man’s wages, but also the capitalist’s profits and the landlord’s rents must be paid. But
how in his idea are prices formed? First by wages. Then an additional percentage is joined to
the price on behalf of the capitalist, and another additional percentage on behalf of the landlord.
Suppose the wages of the labour employed in the production of a commodity to be ten. If the
rate of profit was 100 per cent, to the wages advanced the capitalist would add ten, and if the
rate of rent was also 100 per cent upon the wages, there would be added ten more, and the
aggregate price of the commodity would amount to thirty. But such a determination of prices
would be simply their determination by wages. If wages in the above case rose to twenty, the
price of the commodity would rise to sixty, and so forth. Consequently all the superannuated
writers on political economy, who propounded the dogma that wages regulate prices, have tried
to prove it by treating profit and rent as mere additional percentages upon wages.”[23]
Tenta dizer que não é apenas o trabalho, ou a procura e a oferta, ou a mais-valia, ou ainda o
lucro, que fazem os salários subir ou descer, é preciso lembrar a renda do proprietário rural,
bem como o lucro do industrial, e o salário é apenas a primeira parte do capital que fixa os
preços, para concluir que: “In buying the labouring power of the workman, and paying its value,
the capitalist, like every other purchaser, has acquired the right to consume or use the
commodity bought. You consume or use the labouring power of a man by making him work, as
you consume or use a machine by making it run. By buying the daily or weekly value of the
labouring power of the workman, the capitalist has, therefore, acquired the right to use or make
that labouring power during the whole day or week. The working day or the working week has,
of course, certain limits…”[24]
É a forma encontrada para expressar as suas descobertas, de que um ser humano é
mercadoria e que, ao comprar-se o seu tempo de trabalho, está a comprar-se a liberdade da
pessoa. De facto, todo ser humano vive dependente da sua economia, de manter o seu posto
de trabalho, de poupar se for possível, ou de cooperar de forma recíproca, como debate no
Capítulo 13, da Parte IV do primeiro volume do Capital, já referido, e que diz: “Reciprocity is the
grasping of the thing at the point where cause and effect, action and reaction, possibility and
necessity have completely merged with one another.Reciprocity is sometimes called
“interaction”, the conception of a complex system as a network of interacting causes and
46
effects, but yet lacking a “notion” or concept of the underlying unifying system to “make sense”
of these interactions”[25]. É o que tenho visto pessoas fazerem quando carecem de bens para se
reproduzirem e que Marcel Mauss soube evidenciar, dentro das suas ideias socialistas, para
escrever o seu texto de Sociologia Económica denominado L’Essai sur le don. Mauss continua
a fórmula que Marx definira no seu “Prefácio”.
[1] Marx, Karl, 1867: Capital, Website http://csf.edu/psn/marx/Arcive/1867-C1/Part0/p1.htm bem como no texto prévio de 1859: A Contribution to the Critique to the Criqiue f Political Economy emhttp://www.marxists.org/archive/marx/works/1859/critique-pol-economy/index.htm , e na correspodência com Engels:http://www.marxists.org/archive/marx/works/1858/letters/58_04_02.htm. A melhor análise é Rubin, Isaak Illich, 1972: Essays on Marx’s Theory of Value, em http://www.marvist.org/subject/economy/rubin/[2] Marx, Karl, 1844: Economic and philosophical manuscripts, analizados por Mészáros, István, 1970:Marx’s Theory of Alienation emhttp://www.marxists.org/archive/meszaros/works/alien/[3] Marx, Karl, (1861-1863) (1905) 2002:Theories of Surplus-Value, no Websitehttp://www.marxists.org/archive/marx/works/1863/theories-surplus-value/index.htm[4] Marx, Karl, 1859: A Contribution to the Critique of Political Economy, Websitehttp://www.marxists.org/archive/marx/works/1859/critique-pol-economy/index.htm[5] Marx, Karl, 1844: Economic and Philosophical Manuscripts of 1844, publicado em 1932, Websitehttp://www.marxists.org/archive/marx/works/1844/manuscripts/preface.htm[6] Marx, Karl, 1844, obra citada, página 1 do Manuscrito Web.[7] Marx, Karl, Engels, Friedrich, 1848, Communist Manifesto, Website http://www.hartford-hwp.com/archives/26/176.htm1[8] Marx, Karl, obra e website citados na nota 272, especificamente parágrafo Private Property and Communism.[9] Marx, Karl, 1859, obre e site referidos, Capítulo 2, Nº1: “Measure of value”[10] Marx, Karl, obra e site referidos, na nota 271.[11] Marx, Karl, 1848, texto citado. Insisto na ideia, porque é precisso lembrar a relação capital, a força trabalho é a mercadoria que é vendida. Donde, o ser humano que trabalha, é ele prórpio um ser alienado de humanidade.[12] Iturra, Raúl, 2002: A economia deriva da religião. Ensaio de Antropologia do Económico, Afrontamento, Porto. Lamento que não esteja on-line, mas a lei do Direito de Autor, também pentecente à Editora, que não o permite.[13] Marx, Karl, 1867, Capital, Vol I, Parte I, Capítulo I, Website http://csf.colorado.edu/psn/marx/Archive/1867-C1/Part0/p1.htm[14] A minha tradução. No texto original diz: “an external object, a thing which through its qualities satisfies human needs of whatever kind”. Página 125 da edição Web que uso.[15] A verssão do capital que uso, retirada da Web, diz: “In order to produce the latter [commodities] he must not only produce use-values, but use-values for others, social use-values”, página 138 da versão que uso do Capital.[16] Marx, Karl, 1844, Economic and Philosophical Manuscripts, já referido, Capitulo 2 da obra on-line. Website nota 49.[17] Retirado de Steve Salomon,http://www.soilandhelth.org/05steve’sfolder/0501steveswritings/050107surplus value [18] Marx, Karl: 1859, obra citada, Prefácio. A minha tradução e síntese. Website nota 49. Site do texto: www.marxists.org/portugues/marx/1859/contcriteconpoli/prefacio.htm[19] Rubin, Isaak, 1970, obra citada, páginas 20 em frente. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Isaak+Rubin+A+teoria+marxista+do+valor&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_pt[20] Marx, Karl, 1965: Value, Price and Profit emhttp://csf.colorado.edu/psn/marx/Archive/1864-IWMA/1865-VPP/[21] Marx, Capital, já citado, página 2 da versão que uso. A tradução é minha. Website nota 49.[22] Marx, Capital, Vol I, Capítulo XIX do website referido na citação 271[23] Marx, Karl, 1963: Value, price and profit, referido na nota 287, página 11 da versão que uso da Web[24] Marx, obra referida notas 287 e 290, página 19 da Web.[25] Marx, Karl, retirado de Hegel, C. XII do Capital:http://csf.colorado.edu/psn/Marx/Archive/1867-C1/Índex-1.htm
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Capítulo Quarto.
Socialismo Heterogéneo.
Falar de socialismo, é referir um conjunto de alternativas para entender o que está dentro do
conceito. A primeira ideia, é a de ser um movimento de inconformismo, como refiro no primeiro
capítulo, que despertou no meio da população operária, e não só, a aparição da relação social
denominada capital. E digo não só, porque aparecem uma série de intelectuais a lutar pela
igualdade das pessoas, e outros que fazem do objectivo socialismo, um objectivo de vida para
quem assim pensa.
Mas pense assim como? A ideia central de socialismo é a antítese do controlo de bens e
tecnologias produtivas e reprodutivas em mão privadas. A ideia central é a dos meios de
produção serem controlados pelos produtores e os seus aliados no poder ou nas ideias. O
mercado controlado pelo Estado. Ideia que define uma relação social central no Século XVIII e
seguintes da nossa Era e no nosso Ocidente.[1]. A ideia central é sobre o ser humano: este não
existe, é apenas uma relação entre o proprietário dos bens produtivos e a sua alienação. Nem
proprietário nem operário: o intercâmbio é o conceito central da análise socialista, a luta pelo
controlo do Terceiro, esse conceito de intercâmbio, como referem Temple e Chaball.
Intercâmbio, essa gestão de recursos e pessoas, é o elo heterogéneo das formas socialistas de
pensar. Não é em vão que “socialism is a general term for the political and economic theory that
advocates collective or government ownership and management of the means of production
and distribution of goods. It arose in the late 18th century and the early 19th century, as a
reaction to the hardships caused by capitalism and industrial revolution”[2].
Há vários conceitos que devem ser esclarecidos, nesta entrada que define socialismo.Para
começar, fala-se de conceito geral e no de teoria ou movimento. Durkheim tinha já dito: “On
appelle socialiste toute doctrine qui réclame le rattachement des toutes les fonctions
économiques, ou des certains d’entre elles qui sont actuellement diffuses, aux centres
directeurs et conscients de la société.”[3]. Esta definição é proporcionada por Durkheim, após
estudar várias propostas de outros autores, entre os quais Karl Marx. E é ao chegar às análises
de Marx, que o fundador da ciência da sociedade questiona as investigações dos sociólogos ou
investigadores da ciência da sociedade em geral, que denominava Ciências Sociais. E diz o
que deve ser investigado: os factos. Marx, acrescenta Durkheim, estudou factos para, em
poucas palavras, definir uma teoria do valor. E acrescenta na sua lição inaugural do curso: “La
vérité, c’est que les faits et les observations ainsi réunies par les théoriciens sociaux de
documenter leurs affirmations ne sont guère là que pour faire figure d’arguments. Les
recherches qu’ils on faites on été entreprises pour établir la doctrine dont ils avaient eu
antérieurement l’idée, bien loin que la doctrine soit résultée de la recherche. Presque tous
avaient leur siége fait avant de demander à la science l’appui qu’elle pouvait leur prêter. C’est la
passion qui a été l’inspiratrice de tous ces systèmes ; ce qui leur a donné naissance et ce qui
fait leur force, c’est la soif d’une justice plus parfaite, c’est la pitié pour la misère des classes
laborieuses, c’est un vague sentiment du trouble qui travaille les sociétés contemporaines, etc.
Le socialisme n’est pas une science, une sociologie en miniature, c’est un crie de douleur et,
48
parfois, de colère, poussée par les hommes qui sentent les plus vivement notre malaise
collectif…étudier le socialisme…c’est étudier un fait social…il est objet de science”[4].
Não podia deixar de citar esta parte do curso de Durkheim, dado que, na capa do livro, há uma
definição de socialismo fora de contexto. E, sem contexto, poder-se-ia entender que, para
Durkheim, parecia que socialismo era apenas um doutrina e não uma luta contra o capitalismo.
O que mais interessa é o contexto dentro do qual nasceu a ideia de socialismo e as suas teses,
que Durkheim comenta a partir de Marx. Porque a ideia de Durkheim é analisar o socialismo
como uma realidade, que é bem melhor que pensar que ele próprio é uma ciência. O
socialismo tem objectivos de luta, tem hipóteses de origem da ideia e do conceito, há uma
metodologia criada, a partir de Hegel, por Marx, análise do materialismo histórico ou, por outras
palavras, das formas de produzir, distribuir, reproduzir e organizar o social na base da
propriedade dos recursos e do seu destino político e económico. O argumento para a análise é
entender o contexto dentro do qual a luta dos trabalhadores nasce e, também, a dos
proprietários. O materialismo histórico não analisa apenas o trabalhador, analisa a relação
social criada entre os possuidores e os despojados de propriedade que habitam o mundo. E,
para o estudar como um facto, é necessário definir primeiro o conceito, dentro do seu contexto.
E este contexto é histórico.
Quis começar logo pela relação reciprocidade e socialismo, apenas para estabelecer o elo
analítico da heterogeneidade mencionada. Porque, de facto, é preciso pensar primeiro no
fundador das ideias de gestão de pessoas e bens, ou da necessidade de subsumir o
intercâmbio sob o controlo de todos os seres humanos por igual. E seria impossível avançar
dentro dessa análise que continua além Marx, Durkheim e Mauss, sem referir outra tríade:
Gracchus Babeuf, Sylvian Marèchal e Filippo Buonarroti. É a época dos Manifestos[5] como
resultado da Revolução Francesa e dos novos Direitos do Cidadão, pelo que tantos, plebeus e
aristocratas, tinham lutado. Qual o elo central do debate?
Não é em vão que começo esta parte do meu texto, ao referir e coordenar reciprocidade com
materialismo histórico e com a orientação de Temple e Chaball.De facto, e muito embora estes
antropólogos não recorram à História para referir o seu uso das teorias de Marx para falar de
reciprocidade, acontece que Karl Marx é resultado de um debate que começa muito cedo nas
ideias de Voltaire e o seu Tratado sobre a Tolerância, quase um derivado do texto do mesmo
título de John Locke,Ensayo y Carta sobre a Tolerância[6]. Esta última, resultando por sua vez,
das ideias filosóficas sobre como seres humanos que acreditavam na divindade, deviam viver
em paz e não se aborrecer nem cometer crimes sobre outros que se tinham separado do elo
central – a Igreja Romana desses tempos – na Reforma de 1495, iniciada por Martinho Lutero,
Jean Calvin, John Knox na Escócia e Henrique Tudor ou VIII, da Inglaterra. A tolerância de
Locke, notável pedagogo, é diversa da proposta por Voltaire, que se interroga no Capítulo VI do
seu texto, “si l’intolerance est de doit naturel et de droit humain”, e define intolerância como a
incapacidade de aceitar ideias diferentes que outros possam ter na interacção, acabando por
questionar: “le droit naturel est celui que la nature indique à tous les hommes. Vous avez élevé
votre enfant, il vous doit du respect comme à son père, de la raiconnaisence comme à son
bienfaiteur. Vous avez droit aux productions de la terre que vous avez cultivée par vous mains.
49
Vous avez donée et reçu une promesse, elle doit être tenue. Le droit humain ne peut être fondé
en aucun cas que sur ce droit de nature. »[7]
É a partir da ideia do Direito Natural, muito apreciado na baixa e alta Idade Média e no
Renascimento, que debate sobre o entendimento que sobre os outros, têm tido povos como os
Palestinianos, os Romanos, Gregos, Chineses, para concluir, no tempo de grandes injustiças,
contra as quais debatia, que a intolorância não era cristã: “Il ne fait pas un grand art, une
éloquence bien recherchée, pour prouver que les crétiennes doivent se tolerer les uns les
autres:…il faut regarder tous les hommes comme son fréres…”[8]. Nesta carta, assume a defesa
de Jean Calas. Este fora injustamente condenado em tribunal, por um assassínio não cometido
por ele, por ser de origem protestante, é dizer, separado da Igreja Romana e, naturalmente,
para os culturalmente cristãos romanos, culpabilizável de toda a malfeitoria possível na
vizinhança. O texto de Voltaire é louvado, o julgamento reaberto na corte e os juízes declaram
Calas inocente… mas tinha já sido justiciado por enforcamento…
O texto acabou por constituir a base para ideias de igualdade entre os seres humanos, apesar
das ameaças que o próprio autor recebera durante todo o processo. Passou a definir a
interacção como uma solidariedade entre todos os seres humanos, aceite em breve pela maior
parte dos seus compatriotas, não antes de ter sido banido para Inglaterra, onde escreve um
segundo tratado sobre tolerância, invulgar no Século XVII, mas que fez jurisprudência nos
tribunais, tendo mudado a vida a muitas pessoas. E é a base do que Charles Louis de
Secondat, baron de la Bède e do Montesquieu, escreveria em oito volumes, para estar certo e
seguro de não existirem mais julgamentos de seres humanos por causa da sua liberdade de
opinião e de comportamento, sempre dentro da ética e da cultura, como escreveria noutra
obra[9], para satirizar ou ironizar as formas de vida autocratas do seu país absolutista.
Mas o texto mais famoso é dedicado a uma obra bem mais importante: definir democracia, a
separação do poder entre legislativo, executivo e judicial, autónomos entre eles e não
designados pela coroa dos países ocidentais, mas sim pelo voto dos cidadãos[10]. Com o
entendimento do seu tempo, começa por distinguir entre leis da natureza que ninguém pode
mudar, e as leis positivas ou organizadas pelo poder eleito de especialistas no comportamento
humano. Define um conceito praticamente clássico, retirado das suas leituras da Grécia Antiga
e do Digesto de Justiniano do ano 543 em frente: democratia ou democracia[11]. Apesar de
estarmos habituados às ideias de democracia, é-me irresistível citar ideias desenvolvidas
dentro do absolutismo, quando as ideias de Louis Capet ou XIV da França eram ainda vivas,
quando, apenas cem anos antes, Cromwell havia organizado um Parlamento dos sem títulos
ou Commoners na Inglaterra, quando, hoje, com a denominada terceira via ou Globalização, as
ideias de Monstequieu parecem desaparecer. No Capítulo II do Livro 2, diz: « Lorsque, dans la
republique, le peuple en corps a la souverainne puissance, cést une démocracie. Lorsque le
souveraine puissance est entre les mains d’une partie du peuple, cella s’apelle une aristocratie.
Le peuple, dans la democratie, est, à certains égards, le monarque ; à certains autres, il est le
sujet. Il ne peut être monarque que par ses suffrages qui son ses volontés… »[12]. No meu
entender, é um texto delicioso, atrevido, destemido. Como Repúblicas, havia apenas a de
Zürich, terra de Rousseau – hoje Suiça –, e as Repúblicas Unidas Sem Terra ou Nederlands –
hoje Holanda, composta, no seu tempo, por parte do Plateau da Bélgica (Flandres, Brabante) e
50
Elba Norte, hoje, da Alemanha. Ele não apenas define a separação de poderes, define que a
Soberania reside essencialmente na Nação e emana do povo que vota pelos seus
representantes ao Parlamento, com sufrágios públicos, excepto o Senado, cuja eleição define
no texto como secreta, por haver aristocratas a votar para controlar o movimento livre da Nação
– ideias, diria eu, de transição, ou retiradas da forma que Cromwell organizou o Parlamento
Inglês ou das formas de Governo da Grécia Clássica com uma Câmara do Povo e outra dos
Arcantes ou Eruditos, ou o Senado Romano, parte eleita por voto público, como define
Justiniano, parte indigitada pelo Imperador, excepto na Roma Republicana. Distante já do
Código de Direito Romano e do Digesto de Justiniano, referidos mais em frente ou no meu
texto de 2002[13].
O mais simpático deste texto, é a defesa que faz das mulheres, da luta que estabelecem pelos
seus direitos e o reconhecimento da paternidade ao qual têm direito as mães solteiras – um
verdadeiro alarido à cultura do seu tempo, como define no Capítulo 6 do livro XXIII. E a
legislação sobre a usura, a avareza, os limites dos juros nos empréstimos, ou a defesa da
liberdade humana ao propor leis que considerem a ausência da escravidão. Thomas Jefferson
estava em Paris aquando da redacção da obra e levou estas ideias ao voltar para as antigas
Colónias da Inglaterra, onde ajudou a declarar a sua liberdade, elaborando o texto da
Declaração da Independência. Como em França, essa Declaração de 1776, reconhece no
parágrafo segundo: “We hold these truths to be self-evident, that all men are created equal, that
they are endowed by their Creator with certain unalienable rights that among these are life,
liberty and the pursuit” [14]. Esta frase, que aparece no artigo 1 da Déclaration des droits de
l’Homme et du citoyen, de 26 de Agosto de 1789, em França, tinha sido redigida numa carta do
Abade Francês Emmanuel Sieyés a Benjamin Franklin e, este, pela sua vez, a Thomas
Jefferson e diz: “Les hommes naissent et demeurent librés et égaux en droits. Les distinctions
sociales ne peuvent être fondées que sur l’utilité commune”[15]. Entre as obras de Sieyès,
devem referir-se Preliminaire de la Constitution françaisede 1789 e Qu’est-ce le Tiers –
Etát? escritas a partir de 1780 e publicadas em 1799; Essai sur les privilèges, de 1788; bem
como carta entre Washington e Sièyes até Junho de 1790[16].
Este é o conjunto de ideias, entre outras, que “enformam” o pensamento de Babeuf e Marechal.
Buonarroti já trazia, desde a sua terra, Itália, as ideias da denominada Carbonária, que Filippo
Mazzei tinha feito chegar a Thomas Jefferson, especialmente sobre liberdade, igualdade,
ausência de escravidão nas plantações dos americanos no Sul do País. Este Florentino teve
sucesso com Jefferson, mas não conseguiu ver a liberdade pela qual lutou, tal e qual é o caso
de Babeuf e outros que delinharam formas de governo, como a Communne de Paris, que os
seus colegas jacobinos não queriam aceitar.
É, diria eu, a base do socialismo heterogéneo, que começa com os manifestos franceses e
continua com o Manifesto de Karl Marx, escrito a pedido dos Beubesiannes em 1848, após
cinco anos de debate na Bélgica e na França. O socialismo nasce do engano da Revolução
francesa que, ao trair a sua própria Constituição, acabou dentro de uma grande anarquia.
Anarquia transferida para o movimento socialista de Henry de Saint Simon e Charles Fourier,
em França, e Robert Owen em Inglaterra, que apenas pretendiam colaboração de trabalho e
capital em cooperativas de indivíduos supostos iguais. Pelo menos, Saint-Simon formou escola,
51
que a seguir se afastou dele, como fizera Auguste Comte enquanto formava uma escola para
analizar as actividades sociais como interacção e não os movimentos políticos gerados pelos
operários e os intelectuais que os apoiavam. Comte conseguiu criar uma Ciência denominada
Sociologia, que seria, junto com as suas ideias socialistas, o berço do reorganizador das ideias
socialistas e sociológicas, Émile Durkheim.
Mas, o que diz Babeuf e onde? Antes, talvez seja preciso dizer que, com Babeuf, começa uma
outra via para o socialismo, a dos operários ou, como definiria mais tarde Karl Marx, a do
proletariado.
Porque Babeuf, nascido na Picardia Francesa, em 1760, vai para Paris, funda o jornal La
Tribune du Peuple ou La Défenseur des Droits de l’Homme[17] e colabora noutros, citados por
Jean Soublin, referido em nota de rodapé. Pode dizer-se, para sintetizar os objectivos de
Babeuf, que a sua procura era a Igualdade prometida na Revolução Francesa, para a qual era
preciso destruir a propriedade privada, objectivo de todo o socialista a seguir a Babeuf:
“Francois Babeuf, the first modern communist, created a Society of Equals dedicated to the
abolition of private property and the destruction of all those who held property”[18]. Esta citação
fala de Babeuf como comunista, a nova palavra para socialista, mas há também outras
designações, como anarquista: “…terme anarchiste apparaît sous l’Ancien Régime avec le
sens négatif de désordre, de chaos – Babeuf n’a-t-il pas traité… Louis XVI et Lafayette d’…
anarchistes, ce qui pour lui était une insulte quasi suprême! –, sens qu’il conserve sous la
Révolution – Jacques Roux fut accusé de vouloir instauré… l’anarchie -, sa première utilisation
avec un sens positif est sans doute due à Joseph Proudhon qui, en 1840, exposant la forme de
gouvernement auquel il aspirait, s’est dit républicain anarchiste. Cependant, ce n’est que plus
tard que le terme d’anarchistes sera couramment utilisé pour désigner au sein de
l’Internationale les partisans du collectivisme qui, avec, notamment, Bakounine, s’opposaient
au communisme autoritaire de Karl Marx. Et ce n’est qu’en 1877 que le terme anarchisme est
employé au sens qu’on lui reconnaît aujourd’hui par James Guillaume dans le Bulletin de la
fédération jurassienne ». [19] Mas não é apenas esta a terminologia aplicada aos grupos que
procuravam a igualdade. Há também outras ideias: « L’anarchisme est un mouvement d’idées
et d’action qui, en rejetant toute contrainte extérieure à l’homme, se propose de reconstruire la
vie en commun sur la base de la volonté individuelle autonome…. La Révolution française
institue un divorce radical entre l’État, qui repose sur les principes éternels de la liberté, de
l’égalité et de la fraternité, et la société qui est dominée par l’esclavage économique, l’inégalité
sociale et la lutte des classes. Cette contradiction semble d’autant plus insupportable que la
Révolution française proclame en même temps que l’individu est une fin en soi et que toutes les
institutions politiques et sociales doivent servir à son plein et entier épanouissement. La liberté
politique paraît illusoire, voire néfaste, à ceux qui, en vertu même de ces principes, subissent
une servitude sociale et économique. La première réaction “antiétatiste” est sans doute la
“conspiration des Égaux” dirigée par Gracchus Babeuf et visant à substituer à l’égalité politique
l’”égalité réelle”. “Disparaissez, lit-on dans son Manifeste, révoltantes distinctions de riches et
de pauvres, de grands et de petits, de maîtres et de valets, de gouvernement et de gouvernés.“
Por outras palavras, a transição entre o Antigo Regime e as novas formas de entender e
legislar, são caracterizadas pela procura dos Direitos do Cidadão. Babeuf escreve um texto,
52
denominado Le Cadastre Perpetuel, ou O Cadastro, em 1789, cujo subtítulo é “Démonstrations
des procédés convenables à la formation de cet important ouvrage pour assurer les príncipes
de l’Assiette et de la Répartition justes et permanentes et de la perception facile d’une
Contribution Unique tant sur les possessions territoriales que sur les revenues personneles.’’
Uma referência é necessária para definir a ideia de que Babeuf não queria apenas partilhar
bens, bem como evitar qualquer tipo de actividade que prejudicasse a igualdade entre os seres
humanos, entre as quais as medidas da Reforma Agrária que fazem de trabalhadores do
campo pequenos proprietários e, em consequência, “seres superiores” aos seus procurados
iguais. Pelo que Babeuf, Maréchal e Buanarroti desistem da ideia de communards para definir
o movimento por eles criado como des égaux ou dos iguais: «Les idées qui y étaient émises
paraissaient alors utopiques: Babeuf proposait ainsi un système de partage de toutes les
propriétés à raison de onze arpents par ménage. Semblable proposition, reflet de la loi agraire
poussée à sa dernière limite, vint refroidir l’intérêt général que l’on portait au cadastre. Mais au
lendemain de la prise de la Bastille, ces idées apparaîssent à Babeuf comme l’aboutissement
du mouvement révolutionnaire. »[20]. O que pretendiam Babeuf e os seus colaboradores, era
saber quem era proprietário, porque o Cadastro é uma instituição francesa que define os
cruzamentos de caminho entre bens, pessoas e os que nada têm. Assim, o conhecimento de
quem possue e quem não, permite o objectivo do grupo: uma comunidade de Iguais, não
apenas perante o direito a lei e o governo, mas dentro dos bens.
Uma outra entidade que se dedicou ao assunto, em ordem a melhor poder governar foi
Napoleão[21]. O Cadastro permitiu ao Imperador controlar as classes sociais, em seu benefício,
destruindo-as, mudando-as, pervertendo assim o objectivo do Cadastro de Babeuf e do seu
grupo. Em Babeuf, esta actividade foi denominada “A Conspiração dos Iguais” ou La
conspiration des Égaux, cujo objectivo era assegurar a felicidade, a liberdade e a igualdade
para todos e a base para viver em liberdade: “ la Révolution doit assurer entre tous les citoyens
l’égalité des jouissances.Mais la propriété privée introduisant nécessairement l’inégalité, et la loi
agraire, c’est-à-dire le partage égal des propriétés, ne pouvant « durer qu’un jour » (« dès le
lendemain de son établissement, l’inégalité se remontrerait »), le seul moyen d’arriver à l’égalité
de fait et « d’assurer à chacun et à sa postérité, telle nombreuse qu’elle soit, la suffisance mais
rien que la suffisance », est « d’établir l’administration commune, de supprimer la propriété
particulière, d’attacher chaque homme au talent, à l’industrie qu’il connaît, de l’obliger à en
déposer le fruit en nature au magasin commun, et d’établir une simple administration de
distribution, une administration des substances qui, tenant registre de tous les individus et de
toutes les choses, fera répartir ces dernières dans la plus scrupuleuse égalité »[22].
A conspiração dos iguais é tratada por Alain Mailard[23], que sintetiza a ideia dos Égaux numa
frase: “as organizações republicanas devem ser transformadas em organizações operárias e
comunistas” (minha síntese e tradução). Ou, como refere Maillard no seu texto, para Babeuf e
os seus seguidores, o que se esperava da Revoluição era: «1 La nature a donné à chaque
homme un droit égal à la jouissance de tous les biens. 2. Le but de la société est de défendre
cette égalité, souvent attaquée par le fort et le méchant dans l’état de nature, et d’augmenter,
par le concours de tous, les jouissances communes. 3. La nature a imposé à chacun l’obligation
de travailler ; nul n’a pu, sans crime, se soustraire au travail. 4. Les travaux et les jouissances
53
doivent être communs. 5. Il y a oppression quand l’un s’épuise par le travail et manque de tout,
tandis que l’autre nage dans l’abondance sans rien faire. 6. Nul n’a pu, sans crime, s’approprier
exclusivement les biens de la terre ou de l’industrie. 7. Dans une véritable société, il ne doit y
avoir ni riches ni pauvres. 8. Les riches qui ne veulent pas renoncer au superflu en faveur des
indigents sont les ennemis du peuple. 10. Le but de la révolution est de détruire l’inégalité et de
rétablir le bonheur commun. 11. La révolution n’est pas finie, parce que les riches absorbent
tous les biens et commandent exclusivement, tandis que les pauvres travaillent en véritables
esclaves, languissent dans la misère et ne sont rien dans l’état. 12. La Constitution de 1793 est
la véritable loi des Français, parce que le peuple l’a solennellement acceptée… »
Quer no citado texto de Maillard, quer no livro já referido do mesmo Autor, é possível apreciar o
uso que faz Babeuf das ideias da Revolução, já existentes entre grupos da população,
especialmente na Encyclopédie, ou em “misteriosos” Abades como Morelly e o seu Code de la
Nature[24], que Babeuf invoca durante o seu julgamento por ser o texto base do tratado das leis
que o Directório que regia a França da Revolução devia ter organizado e publicado. O
interessante desta denominada conspiração dos Iguais, era que, como refere Maillard no texto
citado, Babeuf não estava certo se o movimento que encabeçava devia denominar-se
“communautiste” por pôr os bens ao dispor de todos por igual, ou “égaux”, para marcar as
diferenças ideológicas com os Jacobinos comandados por Robespierre que queriam acabar
com a propriedade privada, o que era pouco para os já denominados bauvistas ou
bovessianos, por desejarem a abolição total de todo tipo de propriedade, como referi antes,
incluindo os direitos de propriedade intelectual. Como comenta Maillard: “il choisit en définitive
“Égaux”, sans doute pour ménager les différences doctrinales (les robespierristes souhaitaient
seulement limiter le droit de propriété, lui, voulait l’abolir et instaurer ce qu’il appelait la
communauté des biens, des travaux et des jouissances. Babeuf entendait rassembler dans un
front commun toutes les forces qui refusaient la Constitution de l’an III (adoptée par la
Convention thermidorienne) et qui réclamaient le retour à celle de 1793 : la Constitution de l’an
I, dont l’article premier de la Déclaration des droits proclamait que “le but de la société est le
bonheur commun”. Les Égaux ont ainsi mis en œuvre dans les quartiers populaires de Paris et
dans les régions de France où ils comptaient des partisans, des abonnés (Nord, Pas-de-Calais,
Champagne, région lyonnaise, Midi…) une propagande politique en diffusant des libelles, des
journaux (Le Tribun du peuple) et des chansons, en placardant des affiches (Analyse de la
doctrine de Babeuf), en tenant des réunions… Parallèlement, un Comité secret préparait,
politiquement et militairement, l’insurrection pour renverser le Directoire et lui substituer une
“autorité révolutionnaire et provisoire, constituée de manière à soustraire le peuple à l’influence
des ennemis naturels de l’égalité, et à lui rendre l’unité de volonté nécessaire pour l’adoption
des institutions républicaines” : bref une dictature révolutionnaire temporaire (le temps de mater
l’aristocratie) et un régime de transition qui mènerait le peuple de France et les autres nations à
ce qui n’est pas encore nommé le communisme, mais la communauté »[25].
A citação é, mais uma vez, extensa, mas justificada para explicitar o meu título de
heterogeneidade do socialismo. Sem dúvida que todos os participantes da Revolução
Francesa, eram pessoas que desejavam acabar com os privilégios para indivíduos e classes
sociais; sem dúvida tiveram que lutar forte com Necker, Quesnay e os fisiocratas, membros não
54
apenas da aristocracia, bem como da Enciclopédie de Diderot e D’Alembert, como tenho
referido, pessoas muito diferentes de Volaire e Montesquieu ou, ainda, de Rousseau. Estes
ilustres membros de Encyclopédie, defendiam o povo e os seus direitos, como temos
observado nos seus textos e na herança que deixaram à Humanidade, especialmente esse
tratado sobre a Tolerância. Mas, todos eles estavam ainda longe de serem pessoas que
abdicassem de ideias pelas quais nunca tinham passado: a falta de bens. É verdade que há um
Conde de Saint – Simon[26], fundador do movimento socialista francês e além França, que
pensava que toda sociedade devia ser orientada pelos cientistas e que todo investigador devia
estar ao serviço do grupo social; um Conde que partilha a sua riqueza com o operariado que
trabalha para ele, no entendimento de que o que ele ganhava, todos deviam ganhar. Apenas
não tinha reparado no motor económico da denominada mais-valia, que Marx viria a definir
mais em frente (um Marx, como Comte, discípulo de Saint-Simon, seguidor das suas ideias,
especialmente das políticas, a advogar pela divisão do trabalho e do Governo entre industriais
a partilharem lucros com os seus empregados, para se viver em harmonia). O texto mais
conhecido de Saint-Simon é o de 1825, The New Cristhianity, em conjunto com cartas escritas
ao Rei, ao longo de muitos anos, desafiando-o a tratar os seres humanos dentro da lei e com
Magistrados eleitos e não designados – por outras palavras, sujeitos a critica e não sujeitos ao
lucro que podia render uma sentença bem passada para o queixoso[27]. Este era o socialismo
de Saint-Simon, dos seus seguidores, entre os quais um jovem Marx, luterano, o que levara a
Auguste Comte ao abandonar e fundar o seu próprio socialismo, a Sociologia, da qual Émile
Durkheim beberia até ao fim da sua vida.[28]
É possível apreciar que Babeuf está rodeado de figuras e ideias
ditas letradas, eruditas, bem informadas. O Socialismo do operariado começa apenas com ele.
Os membros da Encyclopédie partilhavam ideias avançadas na economia, mas ainda estavam
ao pé da História e, à excepção de Montesquieu, ninguém advoga a sério sobre o facto de se
ter uma República, eleitores e representantes do povo. O texto de 1513 de Niccola di
Maquiavello, Il Príncipe[29], não deixa de ser um texto sobre a ciência da política, como tenho
comentado noutros textos, tal como a resposta, quase duzentos anos depois, de Frederico de
Prússia, O Anti-Maquiavelo[30] de 1786, escrito com a colaboração de Voltaire. Tomás Moro, em
1516, pensa uma República, denominadaUtopia[31], que foi parte do julgamento a que foi
submetido e causou a sua morte perante uma Inquisição ainda viva, no reinado de Henrique
Tudor. Deve ser esse o motivo que levará Karl Marx a escrever uma tese de Doutoramento
denominada The Difference Between the Democritean and Epicurean Philosophy of Nature[32].
O que Babeuf era capaz de escrever está nas suas obras, normalmente textos de jornais,
manifestos e ensaios contra as formas de Governo do Directório de 1794, no qual participava
Robespierre. Babeuf baseia-se na natureza e no denominado Direito Natural, ele via o que
acontecia com plantas, animais, seres humanos, para retirar dessas observações as suas
ideias políticas. Diz nos seus textos, baseado na sua observação de interacção humana: La
suppression de la propriété semble donc avoir, pour l’essentiel, une fonction instrumentale et
politique, et non la valeur d’un principe intangible (même s’il peut arriver qu’on la lui attribue).
C’est d’ailleurs pour cela que les utopies présentent sur ce plan des différences considérables,
sans pour autant cesser de relever d’une seule et même catégorie. Certaines d’entre elles, en
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effet, prônent l’abolition radicale de la propriété, comme de toute différenciation. “ Tout ce que
possèdent ceux qui ont au-delà de leur quote-part individuelle dans les biens de la société est
vol et usurpation ”, proclame en 1795 le Manifeste des plébéiens de Gracchus Babeuf. “ Il faut
[…] supprimer la propriété particulière ”, faire “ disparaître les bornes, les haies, les murs, les
serrures aux portes ” (in Le Tribun du peuple, no 35, an IV, p. 101 n.), si l’on veut supprimer le
mal qui résulte, intégralement et nécessairement, de l’inégalité.
D’autres utopies, moins radicales, se contentent de limiter la propriété, ou
de la réglementer, jugeant que seules les disparités excessives, le luxe et la misère, risquent de
déstabiliser la cité ou d’altérer sa cohérence. Parmi elles, certaines tiennent en outre à interdire
la propriété aux magistrats, considérant que leurs fonctions impliquent un renoncement absolu
au monde et un dévouement sans partage à l’intérêt public.
Ce qui néanmoins réunit ces différentes utopies, c’est qu’en toute
hypothèse, la propriété y fait l’objet d’un contrôle étroit et d’une réglementation minutieuse.
Même tolérée, la propriété, tout comme les libertés privées qu’elle supporte, doit être
considérée avec méfiance et maniée avec précaution.[33] »
O que Babeuf debate, é a sua descoberta desse Terceiro – o Tiers de Temple e Chabal,
modelo de análise extremamente útil para entender que, muito embora haja duas pessoas a
intercambiar, existe um terceiro invisível, a atitude de comércio ou aceitar para devolver –
poder que intermedeia os seres humanos, a mais-valia que ele denomina apenas propriedade
individual. Na sua ideia desponta o conceito de lucro que não é mencionado nos escritos, mas
que percebe existir entre um e outro ser humano, quando a moeda corre. É o que Marx
denominará o dinheiro retirado a outros ou mais-valia, com a sua fórmula das Grundrisse: M-C-
M1,ou Money, Commodity – Plus Money ou o pagamento do capital investido em toda empresa
que rende lucros e que emprega operariado.
Tipo de atitude que faz sofrer Robert Owen na Grã-Bretanha do seu tempo,
e que passamos a observar, dentro deste ponto comparativo permanente que tenho usado
para falar de heterogeneidade: a Revolução Francesa e as ideias de Babeuf, e dos seus
colegas de luta Cabot, Marèchal e Buonarroti, a serem referidos em breve. Entretanto, queria
comentar apenas esta descoberta feita por Babeuf e desenvolvida por Karl Marx e outros
socialistas, antes de se denominarem comunistas, a seguir à 1ª Internacional convocada por
Michel Bakounine, em Maio de 1871, quando refere: “Deux faits historiques, deux révolutions
mémorables avaient constitué ce que nous appelons le monde moderne, le monde de la
civilisation bourgeoise.L’une, connu sous le nom de Réformation, au commencement du
seizième siècle, avait brisé la clef de voûte de l’édifice féodal, la toute-puissance de l’Église ; en
détruisant cette puissance, elle prépara la ruine du pouvoir indépendant et quasi absolu des
seigneurs féodaux, qui, bénis et protégés par l’Église, comme les rois et souvent même contre
les rois, faisaient procéder leurs droits directement de la grâce divine ; et par là même elle
donna un essor nouveau à l’émancipation de la classe bourgeoise, lentement préparée, à son
tour, pendant les deux siècles qui avaient précédé cette révolution religieuse, par le
développement successif des libertés communales, et par celui du commerce et de l’industrie
qui en avait été en même temps la condition et la conséquence nécessaire.
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De cette révolution sortit une nouvelle puissance, non encore celle de la bourgeoisie, mais celle
de l’État, monarchique, constitutionnel et aristocratique en Angleterre, monarchique, absolu,
nobiliaire, militaire et bureaucratique sur tout le continent de l’Europe, moins deux petites
républiques, la Suisse et les Pays-Bas »[34]
É esta transição de povos subordinados ao sistema feudal e ao contrato
de enfiteuse (que contribuía para a sua probreza, por ser necessário pagar grande parte da
colheita ao proprietário da raiz do bem), que é o elo da Primeira Reunião Socialista
Internacional. A maior parte do operariado não sabia o que fazer perante a possibilidade de ver
cumpridas as promessas de fraternidade, liberdade e igualdade, pelo que estavam à espera
das instruções dos seus dirigentes. Estes, pela sua parte, ainda não estavam preparados para
organizar as actividades de trabalho. Não é em vão, que no seu discurso, Karl Marx refere
apenas ideias abstractas: VALUE, PRICE AND PROFIT, Addressed to Working Men[35], no
Congresso de preparação da primeira reunião do operariado internacional ou 1ª Internacional,
reunião na qual já não participará por discordar com a interpretação do materialismo histórico
de Michel Bakounine[36].
As três conferências de Bakounine são dedicadas à crítica das instituições existentes e à
participação dos trabalhadores dentro destas actividades. Karl Marx tenta definir o problema
que existe na interacção pessoal, ao falar de valor ou o investimento do tempo de uma pessoa
para ser apropriada por outra, o preço de venda das mercadorias, normalmente para serem
recebidas pelos proprietários, pela lei que define a divisão do denominado Direito Natural, entre
pessoas que podem adquirir esses bens por terem lucro das suas actividades. Lucro que não é
partilhado com os fabricantes dos bens.
A tendência do desenvolvimento do capital, é analisada à luz de salários, tempo de trabalho e
lucro, que leva a um movimento dentro do mercado, que Marx sintetiza assim:
“I shall conclude by proposing the following resolutions:
Firstly. A general rise in the rate of wages would result in a fall of the general rate of profit, but,
broadly speaking, not affect the prices of commodities.
Secondly. The general tendency of capitalist production is not to raise, but to sink the average
standard of wages.
Thirdly. Trades Unions work well as centers of resistance against the encroachments of capital.
They fail partially from an injudicious use of their power. The faily generally from limiting
themselves to a guerilla war against the effects of the existing system, instead of simultaneously
trying to change it, instead of using their organized forces as a lever for the final emancipation of
the working class that is to say the ultimate abolition of the wages system.”
Esta análise define a tendência do Mercado, orientado como está pela venda de bens que são
baratos na sua produção: os preços seriam aumentados na venda ao público se os salários
fossem incrementados por solicitação dos sindicatos, porque o objectivo da produção
capitalista é afundar os salários. Ao menor salário, corresponde um maior lucro, especialmente
se os preços dos produtos são aumentados para prevenir qualquer petição dos sindicatos.
É o que denomino socialismo heterogéneo: enquanto Bakounin e Marx experimentam instruir o
operariado e os seus apoiantes, com ideias para debater com motivação, estatísticas, fórmulas
com os proprietários do capital – do qual os próprios operários são parte como Capital variável
57
ou assalariados –, o operariado, ele próprio, apenas deseja controlar a propriedade que
aparece como esse Terceiro que interfere com os comportamentos naturais de trabalhar para
produzir para si próprio e família, e o comportamento que a lei define como de pertença ao
proprietário. A análise da propriedade e a sua interferência entre seres humanos e bem-estar, é
organizada por Babeuf e desenvolvida por Marx e Engels no Manifesto dos Communards ou
dos Égeaux, que passaria, finalmente, a ser denominado Manifesto Comunista para honrar a
memória de Gracchus Babeuf, o fundador da ideia de controlar a relação social denominada
propriedade (causadora dos problemas da população proletária, isto é, dos cidadãos de uma
Nação que reserva e acautela esse direito para quem herda ou para quem está no poder e
pode dispensar tempo e decretos para possuir). Mas também para acabar com um debate que
existia entre os intelectuais: como denominar o grupo socialista, que começou por ser Liga dos
Comunistas, como refere Engels.[37]
A definição de propriedade de Marx, é muito específica: “Private property is the right
of an individual to exclude others use of an object, and predates the rupture of society
into classes. In its undeveloped form private property is the simple relation of the individual to
the natural world in which their individuality finds objective expression. Private property is
essentially the denial of the private property of others and finds its ultimate expression only in
the relation of wage-labour andcapital. The antithesis between lack of property and property, so
long as it is not comprehended as the antithesis of labour and capital, still remains an indifferent
antithesis, not grasped in its active connection, in itsinternal relation, not yet grasped as
a contradiction. It can find expression in this first form even without the advanced development
of private property (as in ancient Rome, Turkey, etc.). It does not yet appear as having been
established by private property itself. But labour, the subjective essence of private property as
exclusion of property, and capital, objective labour as exclusion of labour, constitute private
property as its developed state of contradiction – hence a dynamic relationship driving towards
resolution. Private property has made us so stupid and one-sided that an object is
only ours when we have it – when it exists for us as capital, or when it is directly possessed,
eaten, drunk, worn, inhabited, etc., – in short, when it is used by us. Although private property
itself again conceives all these direct realisations of possession only as means of life, and the
life which they serve as means is the life of private property – labour and conversion into capital.
In the place of all physical and mental senses there has therefore come the sheer estrangement
of all these senses, the sense of having. The human being had to be reduced to this absolute
poverty in order that he might yield his inner wealth to the outer world[38]
Quis manter esta longa referência, para incorporar todos os conceitos que na análise
de Marx, bem como no meu próprio entender, são importantes para o desenvolvimento dos
seres humanos dentro da História e da sua conjuntura. Marx salienta o facto de que a falta de
propriedade acaba por ser uma alienação, que faz do ser humano um “procurador” de salário,
levando-o a ignorar a relação mais importante, que é a sua capacidade de trabalhar. De facto,
a propriedade privada que Babeuf queria suprimir, era um objectivo para libertar o ser humano
da sua alienação de não considerar a sua obra como sua, de entregar o que é dele para o
mundo exterior, expresso no proprietário do capital, no seu proprietário. O terceiro na relação
proprietário-proletário, como dizem Temple e Chabal e analisa Marcel Mauss, é esta falta de
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entendimento do seu verdadeiro valor ao construir uma obra. É assim que, ao oferecer um
objecto, damos um nome ao Outro e a nós próprios, por estar fora da relação propriedade
privada e entrar dentro do campo da interacção social. Processo mínimo para se entender que
não é a propriedade o problema da interacção social, mas a falta de entendimento da
capacidade de criar uma obra.
Mauss estaria a comparar essa habilidade, a contrastar o trabalho que dá mais valia ao
proprietário privado, ao falar de mana e hau. É dessas tragédias históricas que os dois não
tenham debatido estas ideias, mas para isso aqui estamos nós, para colocar no conceito de
mais-valia, essa ideia inocente de pensar que a propriedade privada é central no sistema
económico e não a oferta de trabalho conforme as capacidades de cada qual, devolvida em
salário ou remuneração, ou em dádivas, conforme fôr o resultado da habilidade para pensar e
capacidade para operar. Ideia normalmente derrotada pela falta de conhecimento do trabalho
como elo central da sociedade e de todo e cada indivíduo, conforme os seus objectivos de vida.
É evidente que esta análise é retirada por Mauss das ideias de Marx, como se pode apreciar
neste texto, bem como nos seus textos políticos. A terceira “pessoa” da relação de intercâmbio
é o facto mesmo de trocar. Eis o hau de Mauss, a mais-valia na reciprocidade. Uma mais-valia
real, material, com valor de uso – o que eu posso consumir – e um valor de câmbio – o que eu
posso trocar na base da minha produção, um conceito derivado de uma contradição entre a
ideia de propriedade privada ou exclusão de outro do uso de bens que são meus, e da falta de
conhecimento do que Marx, nos textos citados, denomina contradição.
Contradição ou antítese social entre trabalho e capital. Trabalho, acaba por ser a aplicação da
força humana, habilidades, habilitações e inteligência, para a transformação da natureza
material em recursos ou bens económicos para vender ou mercadorias. Normalmente, o preço
destes bens no mercado do capital, corresponde a uma outra lei que nem Babeuf nem Marx
tinham definido, mas sim Adam Smith[39]: a da procura e oferta ou da regulação do mercado
pela mão invisível da interacção. No capítulo VIII do livro I, Smith fala de uma “recompensa
natural ou salário de trabalho” para a confecção de mercadorias – que ele denomina produto do
trabalho. Não fala de mercadorias ou bens do mercado como define Marx: uma mercadoria é
um bem fabricado pelo trabalhador e vendido pelo proprietário dos meios de produção, que,
dada a propriedade privada, exclue o fabricante da propriedade do seu produto e do seu
resultado em moeda, ou capital de lucro, ou trabalho alienado. Alienado por ser entregue a
outro sem o conhecimento do fabricante que empregou a sua energia, habilidade e inteligência,
na confecção de um bem que desconhece e que vê no mercado como mais um de vários
recursos, a serem adquiridos por ele para poder usar ou consumir. Não é em vão que os
Socialistas, após a leitura dos textos de Marx, começam a atacar a ideia de propriedade
privada, interposta entre quem fabrica e quem adquire, esse Terceiro de Mauss [40], invocado
por Temple e Chabal. O que fica quer para o Maori, ou o Massim, quer para o operariado
europeu, é a necessidade de pensar com cuidado o que é preciso gastar por ser necessário
consumir, ou esse valor de uso definido por Marx, nas citações referidas. A ideia de maximizar
passa a ser um silogismo central, parte da subsistência.
Não é sem motivo que o filósofo socialista, John Stuart Mill, dedica o Livro II da sua obra sobre
a lógica, ao racíocinio e afirma que existe em todo o silogismo, un princípio que o orienta, é
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dizer a cultura orienta o pensamento e não o arguto sentido de entender[41]. O debate serve
para explicar que os seres humanos não sabem retirar dos factos as necessárias conclusões.
Como no caso em que se eu trabalho um número de horas por um salário mínimo, e a minha
obra é vendida, por causa da propriedade privada, por um valor de troca maior do que o meu
salário, eu sou explorado, como comenta Marx nas passagens citadas mais acima. E isto é
parte do que eu denomino a mente cultural – sentir-se comprador e não produtor de bens. A
sociedade ocidental é composta por indivíduos que desejam retirar o máximo beneficío das
suas obras, com o mínimo de tempo possível investido no trabalho. Não é em vão que a escola
francesa da Fisiocracia trabalha nas ideias do laisser-faire[42], que influenciaram profundamente
as ideias de Adam Smith, o economista que cria a ideia da opção, desmistificada por Marx, e
criticada em profundidade pelo sociólogo socialista saint-simoniano e materialista, Émile
Durkheim, que dedica uma obra à crítica não apenas de Adam Smith, mas de toda a ideia
do laisser-faire[43] por ter organizado um empreendimento de trabalho rural, baseado no
contrato de enfiteuse, com o objectivo de organizar a economia de França, bem como de
outros lugares sob domínio francês.
Durkheim, como bom cidadão e fundador do pensamento sociológico, comemora as ideias de
Montesquieu, que foi capaz de esclarecer a divisão dos poderes e produzir um tratado sobre as
leis, bem como dispensar um duro tratamento à denominada Escola Clássica da Economia,
cujo intuito era a liberdade de comportamento para as trocas mercantis, sem se lembrar, diz
Durkheim, da existência do Direito Associativo ou Solidariedade Orgânica, e da Associação
livre entre iguais, unidos por ideias partilhadas dentro da cultura da sua sociedade ou lógica
social, que denomina, na lógica de Ferdinand Tönnies, solidariedade mecânica ou união por
meio das formas de pensar e de acreditar. Sobre este tema, tenho já feito vastas referências
noutros pontos deste texto, como em textos anteriores.
O que me interessa salientar, é a ideia de Durkheim de que os cidadãos devem ser controlados
pelo Estado, para não cair em comportamentos anómicos que destruam a interacção, razão de
ser do comportamento social. A igualdade procurada por Durkheim, advêm do seu Mestre na
Alemanha, Ferdinand Tönnies[44], Socialista Materialista, leitor e contemporâneo de Karl Marx,
que define como racionalista o pensamento que entende o que acontece em torno de si, quer
falemos de parentes, vizinhos, amigos ou sociedades de pequena escala, mas que mal
entende o que é a ideia política de governar. Donde, a racionalidade humana está obnubilada
pelas manipulações políticas dos proprietários do poder e, em consequência, do capital. Ideia
retirada dos textos de Karl Marx de 1848, ou Escritos filosóficos, e dos de 1861, ou o Capital,
bem como da Crítica da Economia Política de 1859, e, especialmente, das críticas também
endereçadas a James Mill, tal e qual tinha feito Marx nos seus escritos filsóficos, ao rebater a
ideia mercantilista do empréstimo a juros altos que Mill defendia, bem ao contrário do seu filho
John Stuart Mill.
O debate socialista é todo sobre a economia, definida como base da interacção social já desde
os tempos do economista clássico francês, Jean Baptiste Say[45]ao defender, em longas
páginas de 86 livros, a ideia de que existe a lei de que a oferta cria a sua própria demanda, em
consequência, é preciso criar muitas mercadorias para exportar e “equilibrar” o comércio com
mais exportações que importações, como Smith tinha aconselhado no texto citado, e como a
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Escola Fisiocrata tinha experimentado fazer. Apenas que os produtos a exportar devem ser
industriais ou manufacturados, enquanto que a manutenção da população dependia da
produção rural nacional, tal e qual tinha desenhado Quesnay em todas as suas obras,
especialmente nas publicadas na já referida Encyclopédie de Diderot e D’Alembert.
É contra este tipo de ideias económicas que se insurgem Babeuf, Marèchal, Tönnies, Marx,
Engels e Durkheim. Durkheim, em 1884[46]. Ainda à procura de uma alternativa para entender e
descrever o real, o nosso fundador ou refundador talvez, se pensarmos no Système de
Politique Positive ou Traité de Sociologie, no Chatéchisme Positiviste, e noCours de
Philosophie Positive de Auguste Comte, entre outros, ao transferir o pensamento religioso que
dominava a lógica e a pesquisa científica, para uma apreciação sociológica, é dizer, de
interacção entre pessoas que possuem, ou não, bens que são parte da natureza, como eles
próprios o são, bem como ao sistematizar o discurso dos sacerdotes dentro de uma teoria de
existência social que a religião resgata para ela, como se fora a criadora das relações de
ascendência e descendência, ou do poder político. Ideias que o levaram a afastar-se do
socialista Henry de Saint-Simon, católico ele, mas apreciador das novas formas de entender o
real que Comte apresentava, na base de uma lógica assente em documentos, estatísticas e
debates com o poder religioso e político[47].
A sua tendência era escatológica demais, ao acreditar na passagem da teologia a uma
teleologia baseada numa denominada “religion universelle du monde”, o que, no entanto, lhe
permitiu assentar bases para essa nova forma de olhar a realidade, baseada em provas que
Émile Durkheim debate na base dos seus estudos com Wundt e Tönnies e quase não refere na
sua obra. Ao contrário, em 1906, entre outras obras[48], na Livre Entretienes, 2ème série, diz em
resposta ao debate sobre luta de classes: «M. Paul DESJARDINS. — C’est la fameuse « Lutte
de classes » que nous avons tous dans l’idée. Il s’agit de savoir s’il y a vraiment aujourd’hui des
« classes », deux et non pas trois ni trente, mais deux, nettement tranchées, nécessairement
antagonistes, et aujourd’hui plus que jamais : il s’agit de savoir ensuite si cet antagonisme, que
les prolétaires doivent, non pas laisser amortir, mais pousser à son terme, éliminera
nécessairement l’antagonisme historique des nations et substituera aux sentiments que cet
antagonisme entretient des sentiments nouveaux : il s’agit enfin de savoir si la « conscience de
classe » vaudrait, comme stimulant d’énergies dévouées, le patriotisme national auquel on
prétend qu’elle va succéder…», é a questão lançada no debate, ao qual Durkheim responde :
«l’antipatriotisme n’est que la conséquence particulière d’une idée plus générale, de l’idée que
la société ne pourrait se reconstituer que par la destruction des nations actuelles : la société
actuelle forme deux blocs, il faut que l’un détruise l’autre. C’est là une forme relativement
récente du socialisme. C’est cette notion qu’il faut discuter; il faut examiner si socialisme et
révolution destructive s’impliquent nécessairement; c’est cette notion d’une destruction
nécessaire qui me paraît fausse; elle est contraire à tout ce que je connais de faits», ideias que
define já no curso de Filosofia do Liceu de Sens, e que mais tarde iria desenvolver no seu livro
escrito em 1889, mas publicado postumamente em 1924, Le Socialisme, PUF, ao falar das
ideias com as quais Karl Marx analisa a realidade, especialmente salientando a sua pesquisa
em documentos e estatísticas, que ele próprio emprega no seu texto sobre o suicídio.
61
E, na Livre Entrétiene referida, sintetiza:« Je résume ce que je viens de dire : 1o Pour vouloir
détruire la société actuelle, il faut croire que la grande industrie représente un développement
économique anormal ; 2oL’antagonisme des classes repose sur cette idée que l’ouvrier n’existe
que comme producteur. Pourquoi ne considère-t-on en lui que ce côté ? 3o Je conçois qu’on
puisse se demander : à quelle nationalité voulons-nous appartenir ? Nous n’avons pas le droit
d’empêcher un homme de se dénationaliser, — une fois acquittées ses dettes envers sa patrie
natale. — Mais que nous voulions vivre sans société, dans l’intérim qui suivra la destruction de
la société actuelle, c’est comme si l’on me disait que nous voulons vivre hors de l’atmosphère,
car la société est l’atmosphère morale de l’homme, de l’ouvrier comme des autres.
É desta forma que Durkheim defende as ideias socialistas e salienta a forma de se estar em
sociedade: o operário é um ser humano como os outros, embora não seja assim considerado
pela população e pelo estado. Aliás, é na publicação Revue de Philosophie de 1906, do mês de
Dezembro, em Paris, que Durkheim estuda as ideias materialistas ao recensear o livro de
António Labriola: Essais sur la conception matérialiste de l’Histoire, para concluir que estas
ideias são as que têm morto a teologia e permitem uma análise objectiva da realidade,
especialmente porque o que Labriola defende é a igualdade e uma economia mais certa para o
operariado, causa que o fundador da Sociologia nunca abandonou desde que presenciara a
destruição de la Comunne de Paris e o resultado da guerra Franco-Prussiana nos anos 70 do
Século XIX. Aliás, já pensador socialista como ele era, dedica todo um número da sua
Revista L’Année Sociologique à análise do materialismo histórico. O próprio discípulo de
Durkheim, Rudolph Lapie, escreve um texto a salientar na primeira frase: «La conception
materialiste de l’histoire est en faveur: à chaque page de l’Année Sociologique on en aura la
preuve, car il s’est trouvé, dans chaque branche de la science, desécrivains preocupées
de’etudier au point de vue économique les autres éléments des sociétés….»[49]
Não me parece nada estranho que esta seja a posição de um intelectual que soube investigar
sem enganar ninguém, com a honestidade de quem está consciente de formar um olhar social
que Comte tinha experimentado, assentando bases filosóficas para uma pesquisa positiva e
não teológica. O próprio Durkheim tinha uma ideia agnóstica sobre o real, melhor, ateia, o que
lhe permitia um certo distanciamento dos factos e das crenças que acabam por falsificar a
realidade. Não é em vão, que anos mais tarde, Pierre Bourdieu se debruça sobre a pesquisa
sociológica e definirá a mesma como um olhar distanciado do que está junto a nós, propondo o
método comparativo, como exprime na sua vasta obra, especialmente em dois dos seus textos,
ao sugerir que um investigador não se pode enquadrar dentro de uma teoria, se quer dar conta
do real[50].
Entre os economistas socialistas, que estamos a rever, aparece uma novidade: François Marie
Charles Fourier, que, no seu texto de 1820, critica a estrutura da sociedade francesa,
especialmente confrontando as promessas feitas pelos filósofos Iluministas com a realidade
com a qual se debate, quer a burguesia francesa – miséria material e moral –, quer a dos
operários, sendo que a sua opção passa pela criação de cooperativas nas quais os operários
teriam uma parte dos lucros. No entanto, não é apenas uma análise da sociedade francesa que
ele faz, bem como uma História da sociedade e o seu desenvolvimento, com o objectivo de
rever a participação económica dos indivíduos dentro de cada uma das actividades. Concebe
62
estágios de desenvolvimento, divisões em selvagens, bárbaros, patriarcado e civilização. Esta
última corresponderia à sociedade civilizada burguesa do seu tempo, mas com a ironia de
afirmar que o estágio civilizado desenvolve todo tipo de vícios praticados no barbarismo.
Forma de existência ambígua, heterogénea, desencontrados os princípios uns com os outros,
de forma hipócrita, porque estes estágios de desenvolvimento é um círculo reiterado de
desenvolvimento, um círculo vicioso no qual está presente a barbárie, o selvagismo, o
patriarcado e a denominada civilização. É evidente que Fourier usa o método dialéctico de
Hegel, e conclui com duas ideias muito bem conhecidas: que o ser humano, dentro deste
círculo vicioso denominado civilização, tem como ponto de chegada o seu oposto, a pobreza
que nasce da superabundância das classes possuidoras de capital; e uma segunda ideia é que
a História é a destruição da Sociedade, como aconteceu em França, onde a Revolução
Francesa acarretou caos e desvantagens para todos, porque os capitalistas vão à falência ao
dividirem-se as indústrias em diferentes manufacturas que não permitem uma verdadeira
acumulação, impingindo à pequena burguesia um tipo de trabalho artesanal para sobreviver às
crises económicas do seu tempo, sendo a maior parte de população conduzida para um estado
extremo de pobreza. Donde, as cooperativas seriam a salvação ao unir dentro dos lucros, os
proprietários e os produtores, essa outra parte do capital, em que o fixo é o dinheiro e o
variável, o trabalhador[51].
Em síntese, o que Fourier procura é uma harmonia universal, salientando os problemas
históricos, para serem ultrapassados com base num tipo de associação que denomina Phalanx,
ou unidade económica para partilhar os lucros, ultrapassar obstáculos e dividir o trabalho,
conforme as inclinações naturais de cada um. Muitas cooperativas foram organizadas no seu
tempo, o que ajudou a ultrapassar a crise económica de uma França revoltada entre
Revolução, Directórios, Consulados, Império, Monarquia, República, Segundo Império e a
guerra Franco-Prussiana de 1870. Engels, no seu texto de 1888, chama a Fourier socialista
utópico: «Si nous trouvons chez Saint-Simon une largeur de vues géniales qui fait que presque
toutes les idées non strictement économiques des socialistes postérieures sont contenues en
germe chez lui…Fourier prende au mot la bourgeoisie, ses prophétes enthousiastes d’avant la
Revolution et ses flagorneurs intéressés d’après[52]..»
É este o mesmo texto que refere Owen e as suas utopias. Robert Owen denominado o
fundador do Partido Socialista Británico, cujos princípios, como Fourier, descansavam na
fundação de cooperativas de auto-suficiência, para viver em comum, trabalhar e exportar. As
ideias de Owen sobre as cooperativas eram de dois tipos: as criadas para exportar bens
manufacturados pelos cooperantes; e as de produção quer para o auto-consumo, quer para a
venda. As ideias socialistas de Owen não continham ideias de Karl Marx, bem ao contrário, ele
não aderiu à luta de classes e definiu os trabalhadores como os produtores de cooperativas
comuns ou dos commoners, todos os que trabalhavam e não tinham um título da aristocracia
que governava Grã-Bretanha, integravam cooperativas sociais que define nos seus ensaios[53].
O objectivo de Owen era a fundação de uma grande Central Sindical, capaz de derrotar o
Capital, sonho que não foi possível, apesar da colaboração de David Ricardo, que legislou
especialmente para taxar os mais ricos e eximir os mais pobres ou assalariados, em 1917[54].
63
Frederich Engels não podia deixar de opinar sobre o romantismo e cristianismo que orientavam
as ideias socialistas de Owen, e diz ao falar da luta pelos mais despojados: « Mais, à côté de
l’opposition entre la noblesse féodale et la bourgeoisie qui se donnait pour le représentant de
tout le reste de la société, existait l’opposition universelle contre exploiteurs et exploités, riches
oisifs et pauvres laborieux. Et c’est justement celle circonstance qui permit aux représentants
de la bourgeoisie de se poser en représentants non pas d’une classe particulière, mais de toute
l’humanité souffrante. Il y a plus. Dès sa naissance, la bourgeoisie était grevée de son contraire:
les capitalistes ne peuvent pas exister sans salariés et à mesure que le bourgeois des
corporations du moyen âge devenait le bourgeois moderne, dans la même mesure le
compagnon des corporations et le journalier libre devenaient le prolétaire. Et même si dans
l’ensemble, la bourgeoisie pouvait prétendre représenter également, dans la lutte contre la
noblesse, les intérêts des diverses classes laborieuses de ce temps, on vit cependant, à
chaque grand mouvement bourgeois, se faire jour des mouvements indépendants de la classe
qui était la devancière plus ou moins développée du prolétariat moderne. Ainsi, au temps de la
Réforme et de la guerre des Paysans en Allemagne, les anabaptistes et Thomas Münzer; dans
la grande Révolution anglaise, les niveleurs; dans la Révolution française, Babeuf. A ces levées
de boucliers révolutionnaires d’une classe encore embryonnaire, correspondaient des
manifestations théoriques; au XVIe et au XVIIe siècle, des peintures utopiques d’une société
idéale; au XIIIe, des théories déjà franchement communistes (Morelly et Mably). La
revendication de l’égalité ne se limitait plus aux droits politiques, elle devait s’étendre aussi à la
situation sociale des individus; ce n’étaient plus seulement les privilèges de classes qu’on
devait supprimer, mais les différences de classes elles mêmes. Le premier visage de la
nouvelle doctrine fut ainsi un communisme aseptique se rattachant à Sparte, interdisant toute
joie de l’existence. Puis vinrent les trois grands utopistes: Saint-Simon, chez qui la tendance
bourgeoise garde encore un certain poids à côté de l’orientation prolétarienne; Fourier et Owen:
ce dernier, dans le pays de la production capitaliste la plus évoluée et sous l’impression des
contradictions qu’elle engendre, développa systématiquement ses propositions d’abolition des
différences de classes, en se rattachant directement au matérialisme français». [55]
Mais uma vez, foi-me impossível resistir a uma longa citação. É mais do que compreensível. É
este o texto que explica o socialismo francês, os seus participantes e a decadência do
socialismo inglês. A primeira ideia desta citação que acabo de reproduzir (da página 2 do
prefácio para a Edição inglesa), é que Engels usa o seu prefácio como uma verdadeira homília
para tentar introduzir o socialismo marxista na Grã-Bretanha. O Prefácio à versão francesa,
anterior ao 88 ou escrito na data da apresentação do texto em alemão – língua natal de Engels
– em 1880, é bem mais curto, até porque os franceses estão a viver uma situação miserável, a
combater e a criar um sistema de revolução que se espalha pelo mundo todo, excepto na Grã-
Bretanha, que já ultrapassara, como referi, a época das revoluções sociais e tinha ficado
impermeável a qualquer sugestão do que puder acontecer no campo das mudanças de
hierarquias (é preciso lembrar que a Grã-Bretanha não era terra de materialismo histórico e, em
consequência, pouco se importava com o facto de um Karl Marx estar a residir no país e a
pesquisar na Biblioteca do British Museum ao longo de 20 anos, após ter sido expulso do seu
país, Prússia, da França Imperial I e da França da Monarquia Capeto Restaurada).
64
[1] Vide Mészáros, István 1970: “Marx´s Theory of Alienation” in Marxist Internet Archives ou http://www.marxists.org/archive/marx/works. “As we can see, here we have a dialectical reciprocity… between all three members of this relationship which means that “man” is not only the creator of industry but also its product. Talking about this process of reciprocal interaction, Marx calls it the “genesis of human society”(Manuscripts of 1844) A análise do autor do ensaio é directa e simples: o homem está dividido entre a propriedade privada do proprietário e o salário” página 11, a minha tradução e síntese.[2] O conceito de socialismo varia dentro dos contextos da ideia e conceito, os tempos, os costumes, e os autores. Pelo que, procurei uma definição mais neutra na entrada socialism da Enciclopédia Britânica, editada pela Penguin Books, Grã-bretanha, em Associação com o Pessoal Académico da Columbia University, USA, página 784.[3] Durkheim Émile, (1888) 1928: Le socialism, Presses Universitaires de France, Paris, página 49.Lições 1 e 2, páginas 35 a 57, em formato de papel. A citação é uma síntese que exprime uma ideia a seguir várias definições que Durkheim experimenta no seu curso sobre Socialisme, Universidade de Bordeaux, 1886-1887.Durkheim relaciona o conceito com a economia e a situação social dos trabalhadores do seu tempo. Website nota 26.[4] Durkheim, obra citada, páginas 37 a 39. A síntese é minha.[5] Babeuf, Grachus, 1795, Manifeste de plebéienshttp://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Gracchus+Babeuf+Le+manifeste+de+pl%C3%A9b%C3%A9iens&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_pt ; Marèchal, Sylvain, Le manifeste dês égeaux, 1796 :http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Sylvain+Mar%C3%A8chal+Le+manif%C3%A9ste+des+%C3%89gaux&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_pt Os textos destes manifestos estão impressos em Histoire de la conspiration de Babeuf, 1828, de Philippo Buonarroti, website:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Philipo+Buonarroti+&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_pt e Pages Choisis de Babeuf, Maurice Dommanget, 1835, website:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Maurice+Dommanget+Pages+Choisis+de+Babeuf&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_pt; Marx, Karl e Engels, Friedrich : Le manifeste communiste. 1848. Website nota 25. Estes três nascem um do outro, até ao ponto de serem referidos como os Manifestos do Manifesto.[6] Voltaire, Jean Marie Arouet, 1763 : Traité sur la Tolerance,http://un2sg4.unique.ch/athena/voltaire/volt_tol.html ; Locke, John, 1666: Websitehttp://www.socsi.kun.nl/ped/histeducIlocke/index.html Texto complementarLocke, John, 1666: Website: http://www.socsi.kun.nl/ped/histeducIlocke/index.html ou http://dspace.dial.pipex.com/town/terrace/adw03/peel/owen.htm Site web http://www.uqac.uquebec.ca/zone 30/Classiques _des_sciences_sociales/index.html[7] Voltaire, obra referida, página 16 da Web de 82 páginas. Website, nota anterior.[8] Voltaire, obra em análise, páginas 51 e seguintes da Web Site, nota 180[9] Montesquieu, 1721: Lettres persanes, Website:http://www.uqc.quebec.ca/index.htm[10] Montesquieu, 1748-1751: De l’esprit des lois, 31 volumes, Site Webhttp://pages.infinit.net/sociojmt eDéfense de l’esprit des lois, 1750,Site web http://www.uqac.uquebec.ca/zone 30/Classiques _des_sciences_sociales/index.html[11] Montesquieu, obra em análise, Livro II, Capitulo 2, páginas 39 e seguintes. Website nota 184[12] Montesquieu, mesmo livro, mesma página 39.[13] Iturra, Raúl, 2002: A economia deriva da religião. Ensaio de Antropologia do Económico, Afrontamento, Porto. Website nota 2.[14] The Unanimous Declaration of the Thirteen Unites States of America, July 4, 1776, Site Web http://odur.let.rug.nl/-usa/D/1776-1800/independnece/doi.htm[15] Déclaration dês droits de l’Homme et de citoyen-26 août 1789, Site Web http://www.justice.gouv.fr/trxtfond/ddhc.htm[16] Sieyès, Emanuel: Texto todos no Site Webhttp://gallica.bnf.fr/Catalogue/Notices/imp/N047520.htm[17] Sobre vida e obra de Grachus Babeuf, ver Pages Choisis de Babeuf, 1935, por Maurice Dommangent, Librairie Armand Colin, Paris; Babeuf,Écrits présntés por Claude Mauzauriac, 1988, Messidor, Paris; Soublin, Jean, 2001: J t’écris au dujet de Gracchus Babeuf, Essai, Atelier du Guê, Paris – é o meu correspondente sobre este tema-; Riviale, Philippe, 2001:L’impacience du bonheur. Apologie de Gracchus Babeuf, Éditions Payot, Paris; Schiappa, Jean-Marc, 1991: Gracchus Babeuf avec les égaux, Les Éditions Ouvriers, Paris ; Maillard, Alain, 1999 : La communauté des égaux, Klimé, Paris ; e, finalmente, pela sua importância como testemunha de vida, Buonarroti, Filippo, 1850 : Histoire de la Conspiration pour l’Égalité dite de Babeuf, Chez Charavay Jeune, Paris. Bem comohttp://www.gracchus-babeuf.com/index.htm[18] Em American and French Revolution Revised, sem autor nem data, página Web referida na nota anterior.[19] Em Férre, Léo, Les anarchistes, Site Web Source:http://jllhomepage.multimania.com/1024/frame2.html[20] Babeuf, François Nöel, dite Gracchus, 1789: Le Cadastre Perpetuel, editado em ÀVersailles, Chez Blezot, Librairie. Fonte : Biliothéque National de France, Web Site referido, Motor de Pesquisa Gallica. Website:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Gracchus+Babeuf+Le+Cadastre+Perpetuel&spell=1
65
[21] O Cadastro de Napoleão, que não tinha por nome “perpetuel” está em http://www.napoleon.orp[22] Babeuf, François Nöel, 1975: Le manifeste de plébiénshttp://www.chez.com./durru/babeuf/babeuf.htm[23] Maillard, Alain, Gracchus Babeuf (1760-1797) et le communisme. Suicide : Soublin Jean : [Extraits de] Je t’écris au sujet de Gracchus Babeuf. Suivi de : François-Noël Babeuf dit Grachus Babeuf-Documento on line :http://ssevillano.free.fr/annexe_3/gracchus_babeuf.doc[24] Morelly, 1755, Code de la nature ou de le véritable esprit des ses lois, Raymond Clavreuil, Paris, ouhttp://www.taieb.net/auteurs/Morelly/tab4.html[25] Maillard, obra citada ut supra. Website 197.[26] Saint-Simon, Claude Henry de Rouvroy, 1760-1825, autor, com a colaboração de Auguste Comte, do Tratado Du Système Industriel, de 1821, Chez Antoine-Augustine Renouard, Paris, texto on-line, Website: Biliotéque de France, Motor Gallica. Website nota 117.[27] Os textos de Saint-Simon estão ao dispor dos leitores na Bibliotéque National de Paris, por meio do motor Gallica; bem como em Saint – Simon,Oeuvres, Gallimard, 1966 em frente, Paris. Marx entrou ao Socialismo pela mão do seu professor, do seu Pai e do seu sogro, todos eles seguidores das ideias do Conde, que Engels denominaria mais tarde como Socialista Utópico, no seu texto de 1888 Socialisme Utopique et Socialisme Scientifique, emhttp://www.marxist.org/français/marx/80-utopi/utopi-1.htm. O texto não as desqualifica, apenas reorganiza a participação das pessoas dentro das ideias definidas como controladas pelo Estado, como as economias de cada cidadão.[28] Filloux, Jean Claude, in Perspectives: revue trimestrielle d’éducation comparée, vol. XXIII, nº 1-2, 1993, Paris, UNESCO. Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Jean+Claude+Filloux+Perspectives+revue+trimestrielle+d%E2%80%99%C3%A9ducation+compar%C3%A9e&btnG=Pesquisar&meta= . Textos: agora.qc.ca/mot.nsf/Dossiers/Emile_Durkheim[29] Macchiavello, Nicola di, (1513) 1983: El Príncipe, Planeta, Barcelona. Website com texto http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Nicola+di+Machiavelli+Il+Principe&btnG=Pesquisar&meta=[30] Frederico de Prússia, (1786) 2000: O Anti-Maquiavel, Guimarães, Lisboa. Website para pesquisa http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Frederico+de+Pr%C3%BAssia&btnG=Pesquisar&meta=[31] Morus, Thomas, (1516) 1989: A Utopia (título original Utopy), Guimarães, Lisboa. Website com texto http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Thomas+Morus+Utopia&spell=1[32] Marx Karl, 1841: The difference between the Democritean and Epicurean Philosophy of Nature, emhttp://www.marxists.org/archive/marx/works.1841/dr-theses/index.htm[33] Babeuf, Gracchus, retirado do site referido, denominado Penseurs sociaux, recontre du 10 de Octobre, 2002. Por outras palavras, Babeuf é lembrado e comemorado e as suas palavras e atitudes, persistem vivas nas mentes baivistas da França e fora do País.[34] Bakounine, Michel, 1871, uma de três conferências proferidas. Fonte: Canevas Éditeur, Saint-Imier, 1990, Bibliothéque National de Paris, motor de pesquisa Gallica.[35] Marx, Karl, 1861: Value, Price and Profit.Addresed to workinf men. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+Value%2C+Price+and+Profit+Addressed+to+Working+Men&btnG=Pesquisar&meta= [36] Marx, Karl, 1861: 1st International Internet Archive, discurso do autor ao Congresso que prepara a reunião internacional. Website para pesquisa e texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Karl+Marx+1st+International+Internet+Archive&btnG=Pesquisar&meta= [37] Engels, Fredrerich, 1885: On the History of the Communist League, em Website:http://www.marxists.org/archive/marx/works/1847/communist-league/1885hist.htm[38] Marx, Karl, 1848 e 1861;Economic and Philosophical Manuscripts 1848;The Communist Manifesto; e Capital, Vol. 1, no Website:http://www.marxists.org/glossary/terms/p/r.htm ehttp://www.marxists.org/archive/marx/1844/manuscripts/comm.htm [39] Smith, Adam, 1776: An inquiry into the nature and causes of the wealth of Nations, site web com textohttp://geolib.com/smith.adam/won1-08.htm1[40] Mauss, Marcel, 1923-24: «Essai sur le don. Forme et raison de l’echange dans les sociétés archaïques» em L’Année Sociologique, Nouvelle Série, Nº1, páginas 30 a 186.http://gallica.bnf.fr/Fonds_Tables/009/M0093915.htm ouhttp://www.uqac.uquec.ca/zone30/Classiques_des_sciences_sociales/index.htm1Ou nota 27 do Capítulo 1.[41] Mill, John Stuart, (1843) 1866: Système de logique déductive et inductive-Livre II Du Raisonnement, páginas 30 e seguintes.http://pages.infinit.net/sociojmt[42] Necker, Jacques ; Quesnay, François ; Dupont de Nemours, Jacques de Turgot, http://gallica.bnf.fr/Fonds_Tables/000/M0005448.htm ouhttp://psteger.free.fr/Quesnay.htm[43] Durkheim, Èmile, 1893: De la division du travail social, já referido, nota 26http://gallica.bnf.fr/Catalogues/Notices/txt/N088267.htm , bem como «La contribution de Montesquieu à la constitution de la science sociale», 1892, site web http://pages.infinit.net/sociojmt[44] Tönnies, Ferdinand, 1887, Gemeinschaft und Gesselchaft, emhttp://www.cambridge.com[45] Say, Jean Baptiste, 1841:Traité d’Economie Politique,http://www.ecolib.org[46] Durkheim, Émile, 1883-4, Cours de philosophie fait au Lycée de Sens, em http://pages.infinit.net/sociojmt
66
[47] Comte, Auguste, 1830-42, Cours de Philosophie Positive, emhttp://pages.inginit.net/sociojmt ouhttp://gallica.bnf.fr/Catalogue/Notices/imp/N07621.htm; Formation du Positivisme, 1936-1941, emhttp://www.terravista.pt/PortoSanto/1139%SHIP%203%20comte.htm ; 1842 : Discours sur l’esprit positif, emhttp://bibliotheque.uqac.uquebec.ca/index.htm1852: Catéchisme Positiviste, emhttp://bibliotheque.uqac.uquebec.ca/index.htn [48] Durkheim, Émile. 1906, em http://www.uqac.uquebec.ca/zone 30/Classiques_des_sciences_sociales/index.htm1, aparece o texto «Internationalisme et lutte des classes».[49] Lapie, Rudolfe, 1898, em /metacata.idq?Mod=&BGC=&Cirestriction=@_Titre(ANNEE%20SOCIOLOGIQUE[50] Bourdieu, Pierre, 1987, Choses Dites, Minuit, Paris; 2000 : Les structures sociales de l’économie, Seuil, Paris.http://www.art.man.ac.uk.SPANISH/Writings/capital.html ouhttp://www.iwp.uno-linz.ac.at/lxe/sektktf/bb/hyperbourdieuAppendix.html[51] Fourier, François Marie Charles, 1820: Théorie de l’organization social; e 1847 : Égarement de la raison, emhttp://www.marxists.org/reference/bio/fourier.htm A minha sítese e a minha tradução[52] Engels, Friedrich, 1888: Socialisme Utopique et Socialisme Scientifique, em http://www.marxists.org/français/marx/80-utopi-1.htm[53] Owen, Robert, 1813-1816: A new view of society or Essays on the Principle of formation of the Human Character, emhttp://socserv2.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/owen/newview.txtou http://dspace.dial.pipex.com/town/terrace/adw03/peel/owen.htm[54] Ricardo, David (1817) 1983: Princípios de economia politica e de tributação, em formato de papel, Gulbenkian, Lisboa. O original é da Editora Everyman’s Library e está on-line http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=David+Ricardo.+Principles+of+political+economy+and+taxation&btnG=Pesquisa+Google&meta= apesar de ser um texto usado para ensinar economia, ou texto comercial.[55] Engels, Fredrerich, 1888: Socialisme utopique, socialisme scientifique, no Websitehttp://www.marxists.org/français/marx/80-utopi/
Engels, homem de posse, tinha ideias para colaborar com a melhoria de vida do povo inglês.
Ele não ignorava os esforços de David Ricardo – que, infelizmente, na apresentação do autor
que faz a Gulbenkian, é denominado como filho de Holandeses, sendo, de facto, filho de
portugueses fugidos para Amesterdão, terra de acolhimento de judeus – o caso exacto da sua
família.
Este Ricardo tinha definido o valor do trabalho de forma diferente de Adam Smith e Marx. Este,
em conjunto com Engels, teve o trabalho de transferir para o materialismo histórico, a frase da
definição de Ricardo e usar a ideia para definir a mais-valia das empresas, inglesas, francesas
ou, já na altura do texto, da Alemanha.
A frase abre o livro de Ricardo, na edição de Lisboa, e diz: “….a utilidade não serve de medidas
de valor de troca [como definira Adam Smith no texto citado de 1776] (o parêntese é meu),
embora lhe seja essencial. Se um bem fosse destituído de utilidade – por outras palavras, se
não pudesse, de modo algum, contribuir para o nosso bem-estar – não possuiria valor de troca
independentemente da sua escassez ou da quantidade de trabalho necessária para o produzir.
Os bens que possuem utilidade vão buscar o valor de troca a duas fontes: à sua escassez e à
quantidade de trabalho necessário para a sua obtenção”[1]Engels sabia disto, porque sabia das
actividades socialistas de David Ricardo.
[1] Ricardo, David, 1817, obra citada, páginas 31 e 32 da edição em formato de papel, Gulbenkian,
Lisboa.
Capítulo Quinto
67
Sociologia Económica
1. Antecedentes.
Espera-se que um Antropólogo da Economia fale, apenas, da etnografia de povos além da sua
cultura e não da interacção social da economia que orienta a sua própria cultura. Mas, se
queremos entender esse processo, é preciso entendermos o que é a Sociologia Económica.
Uma temática que tem a ver com três conceitos: o de opção e o de maximização outeoria da
acção sociale, principalmente, o que o Année Sociologique[1] procurava: a teoria do valor. Esta,
através da análise da teoria liberal da economia, não do utilitarismo, como referido por Marcel
Mauss ao falar da economia de troca-dádiva, como diferente da economia utilitarista[2].
Diz Mauss no texto referido: “Vimos repetidamente quanto esta economia de troca-dádiva
estava longe de entrar nos quadros da economia supostamente natural do utilitarismo”[3] A
definição de sociologia económica usada por Marcel Mauss, é apenas uma introdução à
matéria, no Prefácio da Secção Quinta da Année Sociologique em referência.
É conceptual a questão levantada neste parágrafo. Quer Mauss no seuEssai sur le don, quer
Durkheim na sua tese de doutoramento de 1893, publicada nesse mesmo ano, sob o título De
la division du travail social, debatem o conceito que orientava a vida social e económica, o
princípio ético de utilidade, que já na Ética a Nicomaco, Aristóteles tinha avançado[4], e é mais
tarde usada por Jeremy Bentham[5] e por John Stuart Mill[6]. A questão é simples e mais
filosófica e de princípios morais, que de economia, como fiz referência no Capitulo I, nº 3 deste
texto. Na base da ideia de ser gentil, civilizado, aberto e debater as ideias, retirando-as da
prática, mas elaborando ideias a partir do seu confronto com teorias prévias, Aristóteles
organiza um sistema de pensamento, reflectido não apenas na Ética a Nicómaco, bem como
em toda a sua obra: Economia ou interacção do lar com a vida pública, Política ou conselhos
para o bom governo do povo, Metafisica ou de como as ideias são formadas.
É destes textos, que, no fim da época denominada liberal, quando a História traz outra vez
formas de Governo Imperial e Aristocrata; quando a declaração dos Direitos do Homem
começa a ficar esquecida, pelo objectivo do lucro que todo o indivíduo procura, que a
Economia passa a ser uma forma de vida que Bentham resume numa frase, no seu livro já
citado: “By the principle [or foundation, or approbation, or feelings, a minha interpolação] of
utility, is meant that principle which aproves or disapproves of every action wahtsoever,
according to the tendency which it appears to have to augment or diminish the happiness of the
party whose interest is in question. Or to promote or to oppose that happiness. I say of every
action whatsoever; and therefore not only of every action of a private individual, but of every
measure of government. By utility is meant the property of any object, whereby it tends to
produce benefit, advantage, pleasure, good, or happiness…or to prevent the happening of
mischief, pain, evil, or unhappiness to the party whose interest is considered…”[7]
Acrescenta John Stuart Mill[8] que a felicidade pode ser apreciada nas obras das pessoas, que
as pessoas felizes produzem obras boas e as infelizes, obras más. A lógica a ser usada é
empírica e é desse empirismo que deriva a ideia central da Economia. O que nem Durkheim
nem Mauss parecem entender. Eles discutem as ideias económicas de Stuart Mill e lutam
68
contra as ideias utilitárias, por terem percebido que não há felicidade nos seres humanos por
causa da diferença social: há os patrões e há os operários, duas classes opostas. Opostas, por
serem os primeiros proprietários das tecnologias reprodutivas e produtivas, os segundos por
viverem de um salário raro e pobre.
As ideias económicas de Stuart Mill estão expressas no seu texto de 1848 [9]. Distingue entre a
produção e a distribuição das riquezas; a distribuição tem duas formas: a propriedade privada e
a propriedade comum, desiquilibradas, por haver mais propriedade privada que comum, e pelo
comportamento concorrencial dos indivíduos: “É duvidoso que todas as intervenções
mecânicas feitas até hoje tenham diminuído a fadiga quotidiana de um único ser humano.
Permitiram a um maior número de homens levar a mesma vida de reclusão e de trabalhos
penosos e a um maior número de manufactureiros e outros fazer grandes fortunas; mas elas
não começaram ainda a operar no destino da humanidade as grandes mudanças que está na
sua natureza realizar”[10].
O que debate é um modo de vida e na altura das revoluções que se seguiram a dois factos
determinantes: a Revolução Francesa, cuja estabilidade apenas foi conseguida em 1870; e a
implantação das ideias liberais na Grã-Bretanha, terra do nosso autor. Em desespero, como
humanista, defende a igualdade das mulheres perante os homens e advoga pelo controle dos
nascimentos, para melhorar o nível de vida da população. Stuart Mill acolhe o debate de três
autores: Sismonde de Sismondi, James Mill e Karl Marx[11].
Karl Marx, que escreve especialmente o seu Prefácio à Crítica da Economia Política – único
texto das Grundrisse a aparecer durante a vida de Marx[12] no seu livro O Capital, Volume I,
contradiz Stuart Mill, apenas porque diz para um público mais amplo: “My investigation led me
to the result that legal relations as well as forms of State are to be grasped neither from
themselves nor for the so-called general development of the human mind, but rather have their
roots in the materials conditions of life, the sum total of which Hegel, following the examples of
the Englishmen and Frenchmen of the eighteenth century, combines under the name of “civil
society”…the anatomy of civil society is to be sought in political economy: …in the social
production of their life, men enter into definite relations that are indispensable and independent
of their will, relations of production which correspond which correspond to a definite stage of
development of their material productive forces. The sum total of these relations of production,
constitutes the economic structures of society, the real foundation, on which rises a legal and
political superstructure and to which corresponds definite forms of social consciousness…It is
not the consciousness of men that determines their being, but, on the contrary, their social
being that determines their consciousness… [until] a social revolution begins”[13].
A boa vontade não é suficiente para viver, nem as causas cívicas a que dedicava o seu tempo
e ideias o autor em questão. Na época de Stuart Mill a assistência aos pobres ao domicílio foi
revogada em 1834, as leis do trigo passaram do controlo estatal de impostos previsto por David
Ricardo em 1818,[14] ao livre comércio em 1844 e revogadas em 1846, as novas terras para
69
produzir foram abertas à concorrência, o que eleva o custo da subsistência, na medida em que
a população cresce sem ter outros meios de trabalho ou salários que condicentes com os
preços dos bens rurais, classificados por Ricardo em terras de primeira qualidade, segunda e
terceira, conforme a sua proximidade ao mercado e o potencial de criação de postos de
trabalho ou lugares para obter um salário. Em consequência, as formas de pensar a economia
não podiam já ser morais, a vida desses seres humanos estava em perigo, a fome existia e foi
a época mais pobre da História da Europa. O programa da economia liberal tencionava
desenvolver ideias de produção e de empresa, de capital acumulado para e pelas pessoas.
Não é em vão que Marx, perante estes factos e perante as leituras das leis e das teorias,
escreve que são as condições de vida que determinam a consciência do ser humano.
Normalmente, as ideias de um Bentham ou de um Stuart Mill eram uma forma de vida reflectida
nas obras feitas pelas pessoas. Aliás, havia toda uma ideologia religiosa que já foi invocada, e
que pode ser sintetizada pela frase evangélica de que “pelas vossas obras sereis conhecidos”.
Marx, na sua educação como Rabino e na sua intervenção na questão judaica da França de
1849, entendeu que os seres humanos tinham sérias limitações materiais para poderem viver e
que a prometida liberdade que as máquinas tinham trazido ao trabalho, não existia por causa
da propriedade privada das mesmas. Os Utilitaristas tentaram fazer da denominada Lei Natural,
uma teoria económica. Essa lei natural era a capacidade para trabalhar e para enriquecer,
desde que se pensasse de forma pragmática. Pragmatismo impossível pelas bases dos seus
princípios: a propriedade privada dos bens de produção, a apropriação privada do resultado do
trabalho de outros seres humanos pelos poucos que, como Stuart Mill diz muito bem na citação
anterior, passam para a nova era como donos da indústria que nasce.
O operariado estava em revolta, as manifestações e as greves eram alargadas, não apenas na
Grã-Bretanha, como em todo o mundo industrial. As leis de repressão e de encarceramento
eram uma nova criação dos Estados e Nações que detinham o poder nas suas mãos. Aliás,
como é possível analisar pelos historiadores, as classes dominantes eram as classes
proprietárias, e de entre esses proprietários, se escolhia um Governo através do voto nas
urnas. Não é em vão que o próprio Stuart Mill começa a militar no partido de Owen, o
sindicalista inglês que, como sabemos dos capítulos anteriores, organizou a resistência ao
capital e à classe proprietária, ao qual aderiu Stuart Mill. Marx tinha escrito textos sobre o
desenvolvimento da pobreza por causa da indústria, no seu Manifesto Comunista, e é a partir
daí que Stuart Mill escreve a citação extensa que fiz antes: é a declaração do socialismo inglês,
uma manifestação distante das primeiras ideias do Utilitarismo que ele produzira em escritos
anteriores, já citados. No seu texto de 1848, acrescenta que a exportação de capitais para
trabalhar e produzir em sítios mais baratos, bem como a importação de géneros estrangeiros
para manufacturar na Grã-Bretanha, levaria a descer a taxa de lucro dos capitalistas que
estavam a causar a pobreza da Nação. E diz, em síntese, de que “o melhor estado para a
natureza humana é aquele em que ninguém é rico, ninguém aspira a tornar-se mais rico e não
teme ser derrubado pelos esforços que os outros fazem para se precipitarem para diante”[15].
Por outras palavras, estas são ideias de um bom samaritano, que não tem mais do que o seu
saber filosófico, moral ou ético, para entender uma realidade que não investiga, como fazem
Marx e Durkheim. A cura social para a indução/dedução das ideias acaba por não ser a forma
70
de remediar a acumulação de bens em poucas mãos, facto reconhecido na citação anterior. A
escola liberal triunfa na economia e na política, e é contra este tipo de factos, que Durkheim e
Mauss se agitam. Especialmente, pela ideia de maximização ou Homo Economicus que define
o padrão social do comportamento dos indivíduos e os seus grupos. Não é em vão que
Durkheim escreve o texto de 1890:”Propriété social et démocratie”[16]: “La propriété individuelle
ne se recommande pas seulement par de raisons d’intérêt bien entendu; elle a as base
rationnelle…Mais une propriété absolue, sens réserve et sens restriction, ne se trouve pas pour
cela justifiée; car, avec nos seules forces, nous ne pouvons rien créer…. Ainsi, dan toute
propriété, outre le part de l’individu, il y a celle de la nature et celle de la nation. L’économie
orthodoxe a le tort de méconnaître cette collaboration….Comment pourrait-il [l’État] adapter la
production aux mille nuances de la demande ? …La puissance politique constitue une sorte de
fonds social, dont il faut régler la répartition… La société est composée des individus libres : le
suffrage universel permet la vie en commun, sans toucher à cette liberté. La société est une
association. Mais, ce l’État qui doit prendre soin de l’individu qui appartient a une société
organique…Le socialisme lui aussi sera volontaire et conscient[17]”
Neste texto Durkheim debate entre a iniciativa individual e a iniciativa de grupo, entre o
individualismo, que sempre criticou, contra um possível socialismo que estruture a sociedade
como um processo absoluto comandado pelo Estado. Vive-se a época republicana na França
de Durkheim, que é prévia à sua leitura de Marx e dos socialistas utópicos, que apenas lê a
seguir à sua viagem à Alemanha, em 1888. O que me interessa em todo este debate e
citações, é estabelecer que a sociologia económica nasce a partir de um contexto sem
conceitos nem decisões bem estabelecidas. O mundo social acaba de sair de uma estrutura
histórica de servidão, da qual não está ainda muito certo, enquanto Continente, de se ter
libertado. É um Continente que não apenas ainda tem Colónias, usadas para produzir as
matérias-primas (como recomenda Stuart Mill), bem como um Continente com experiências
diversas. Na França, a Revolução tinha acontecido antes e depois da data da sua
comemoração. Durkheim, Marx, Stuart Mill, sabem das revoltas de 1848 por todo o continente,
das unificações de países, do “arrecadar” para a indústria dos seres humanos denominados
cidadãos, com direito a voto, governar e escolher os seus governantes.
A Sociologia Económica tem um começo polémico, de luta de classes, como Marx e Durkheim
analisam, da desigualdade dos seres humanos perante a lei, por causa das riquezas ou da falta
das mesmas. Um Continente que vive uma ideia, a da libertação dos proprietários, não apenas
das suas terras, bem como das suas pessoas.
A Sociologia Económica nasce para se entender uma anedota: qual é agora, a hierarquia
social? Esta parece residir no que já denominei de lógica de maximização ou de Homo
Economicus. Porque o debate dos sociólogos é com os economistas que apenas entendem de
fórmulas para progredir no lucro, para concentrar uma relação social baseada no capital – i.e.,
a propriedade concentrada dos meios de produção nas mãos do pequeno grupo que refere
Stuart Mill, os poderosos do seu País e partilhá-los, na base da lei, como Durkheim argumenta
em La division du travail social, com os citoyens criados pela declaração já referida no Capítulo
71
1.
O contrato e a lei, pareciam ser a base da igualdade, mas, e a lógica, para a definir? Vamos
analisar esse conceito de maximização como segundo ponto, para, a seguir, analisar as ideias
sociológicas sobre a estrutura social.
2. Maximizar ou Homo Economicus.
É a ideia que analisam, em primeiro lugar, mas com reticências, autores como Thorstein
Veblen[18] e Talcott Parsons[19], e, de forma mais aprofundada, os teóricos Max Weber[20] e
Pierre Bourdieu[21], entre outros, bem como a reacção de Émile Durkheim e Marcel Mauss.
A teoria liberal tinha conseguido, com a liberalização dos mercados e com a não intervenção do
Estado em matéria de fluxo de mercadorias, que a população tivesse que se defender da livre
empresa que procurava compradores para colocar os seus produtos. A livre empresa, ou o livre
mercado, consiste em fixar preços na base dos custos antecipados pelo proprietário do dinheiro
(ou investidor), que permitam recuperar o investimento e, além do mais, lucrar. Lucrar, ou
ganhar dinheiro com o dinheiro investido. É o dinheiro investido que se tenta recuperar,
ganhando de permeio um valor semelhante ao investido e recuperado, para lucrar. É o que
Marx denomina como a Mais-Valia ou valor a mais, ouvalor acrescentado[22]. Não é apenas o
investimento, bem como as horas extras de trabalho do denominado capital variável ou
operariado, que deve estar sempre presente e disponível para transformar as matérias em
bens a colocar no mercado. Todo o investidor para lucrar, ou pelo menos, para vender os bens
que fabrica, faz o que se denomina uma prospecção do mercado, tentando saber qual é o bem
mais necessário e de que maneira é procurado, para satisfazer o capital fixo ou dinheiro
adiantado em moeda, tecnologia, edifícios, matéria-prima ou não convertida em bem para
oferecer. As leis formuladas por Adam Smith funcionam de forma perfeita num sistema de livre
mercado, dentro do qual há pessoas que não conseguem criar todos os bens que precisam
para o seu uso e devem adquirir ou comprar outros bens de uso que passam assim a ser bens
de troca ou de intercâmbio.
A lógica do liberalismo baseia-se no facto da divisão do trabalho ocupar todo e cada um
membro do grupo social, indivíduos sempre ocupados a trabalhar na confecção de um bem,
sem terem tempo para dedicar horas do seu dia de trabalho, à confecção de bens de uso ou
bens que precisam para a sua subsistência. É o denominado bem de consumo[23], que, uma
vez usado, desaparece e deve ser substituído, mais e mais uma vez, por bens semelhantes. O
exemplo mais típico é a alimentação; outro, o vestuário; outro ainda o abrigo ou agasalho de
uma casa ou lar. Se pensarmos nos tempos actuais, os investidores estão muito atentos, de
olhos abertos, para ver como criar uma necessidade para passar a ser esta nova procura,
como organizar mais uma forma de vender produtos.
O exemplo mais característico e vulgar, é o do uso dos telefones móveis ou telemóveis, como
são denominados. Adam Smith não estava nada perdido no dia que escreveu o seu livro e
distinguia entre dois conceitos:needs e wants. Um need ou necessidade, é o conceito que
exprime tudo o que não fazemos, mas é necessário para nós sobrevivermos (é, gostaria de
72
dizer, para nós sermos entidades sociais semelhantes às outras ou seres humanos que
usamos os mesmos bens). O liberalismo desenvolveu uma concorrência forte entre todas as
pessoas, quase como o que acontece entre os gestores de fábricas, indústrias, produtores em
geral, ou investidores. A necessidade de colocar o produto no mercado, acaba por ser o
incentivo para a propaganda, para a transformação de bens naturais em bens de mercado ao
mais baixo investimento possível, em consequência, com um preço mais económico para quem
o adquire. O mesmo tipo de bem, pode ter diferentes preços decorrendo dos materiais
empregues e da mão-de-obra utilizada; um colar de pérolas, é um need social, ou, como é
também definido, um bem de luxo. Este bem de luxo é concorrencial, ajuda a vender a pessoa
que o usa, a ser objecto de atenção social, a impor nos que a rodeiam um respeito que pode ou
não condizer com o valor dos bens que fabrica, inventa ou cria.
Exemplos típicos são também os perfumes e a moda: a forma extravagante de viver e de vestir
de Coco Channel, fez dela uma empresária a criar um need no meio das pessoas que, tenham
a capacidade económica ou não, possam ou não (aqui há que ressalvar essa outra estratégia
de oferta e procura que passa pela contrafacção), é dizer, tenham ou não a “estética
necessária” para usar perfume ou roupa Channel, acabam por ser consideradas como seres
de valor social. Estamos aí no domínio do que se denomina “a moda”, formas de agir às quais
é dedicada publicidade, respeito, hierarquia social, a passar sempre à frente dos outros. Por
outras palavras, os indivíduos devem, conforme a legislação actual em Portugal e a maneira
liberal de Smith, fazer a sua própria empresa: a própria pessoa ou empresário em nome
individual, a quem se solicita produtividade, sem mais. Uma necessidade existe no meio social,
quando é para ser consumida. Mas, a denominada Lei de Mercado, vai criando outras tão
importantes, que até podem passar sem procurar o que é preciso para a sua subsistência, para
poder brilhar entre os parentes, vizinhos e amigos, ou ainda, na relação patrão-operário: um
operário bem alimentado, bem vestido, como maneiras eruditas de falar para o seu nível, em
conjunto com a sua destreza para fabricar o bem de mercado para o qual é requerido
e alugado – os seres humanos têm também um mercado, do qual se está consciente. Exemplo
de escravatura no seu tempo, brutal ou não, é o que define este mercado de seres humanos:
às vezes não é necessário saber, as vezes é necessário ser visto como um ser humano que
sabe dominar as suas emoções e pode agir conforme a sua racionalidade. Há necessidades
primárias e necessidades criadas pelo mercado. Uma das quais, é a de nunca causar conflitos
ou falar dos seus problemas: a lei de mercado impõe silêncio entre os seres humanos.
Assim, podemos falar de um want, esse outro conceito de Adam Smith, que passou para a
posteridade como o que eu desejo adquirir além das minhas necessidades. Um want é
importante para o investidor, por permitir definir o possível investimento que uma pessoa faz
dentro dos seus recursos. Want é desejar bens sem os quais podemos sobreviver. Um need é
parte das vendas do ser humano no mercado. Um want é um querer consumir, para o qual o
mercado deve estar mais do que atento, à espera do satisfazer porque é aí onde faz o seu
investimento e o seu lucro. É aí onde começamos a lidar com o conceito de maximizar ou
optimizar as nossas possibilidades económicas. Adam Smith fala de want, usando o
conceito need como uma forma de exprimir ou exteriorizar o seu discurso. Para ele, há o que
deseja a Raça Humana, a extensão do fenómeno para poder investir no mesmo, e para poder
73
medir qual a extensão do fenómeno de querer ou desejar, para calcular o tipo de pessoas a
serem alugadas por um salário, quantos, quando e onde.[24]No texto, o autor define want como
um need humano que, ao ser satisfeito, traz lucros ao mercado. E diz: “after food, clothing and
lodging are the two great wants of mankind”[25].
Mas, não é apenas o que tenho citado em nota de rodapé que é importante saber, para
configurar a defesa que faz o Homo Economicusna criação de uma lógica para se defender de
um mercado que o persegue de forma impiedosa para satisfazer a sua urgência de vender e
recuperar os investimentos. Para o Mercado, o ser humano não é pessoa, é apenas um
potencial comprador ou consumidor de bens produzidos por outros, ou um potencial indutor de
ideias de consumo espalhadas e criadas pelo mercado. “In that rude state of society in which
there is no division of labour, in which exchanges are very seldom made, and in which every
man provides everything for himself, it is not necessary that any stock [reserva, provimento]
should me accumulated or stored up beforehand, in order to carry on the business of society
[reservado, previsto]. Every man endeavours to supply by his own industry his own occasional
wants as they may occur. When he is hungry, he goes to the forest to hunt; when his coat or
worn out, he clothes himself with the skin of the fist large animal he kills…But when the division
of labour has once been thoroughly introduced, the produce of man ‘s own labour can supply
but a very small part of his occasional wants. The far greatest parts of them are supplied by the
produce of other men’s labour, which he purchases with the produce, or, what is the same thing,
with the price of the produce of his own”[26]. Mais esta comprida citação que se deve ao facto do
autor remeter o que se deseja ou se quer, para um estado de comércio, ao comparar as formas
de intercâmbio com as que pensava existirem quando a actividade era de auto-suficiência ou,
talvez, de permuta. Este facto por ele delineado, esquece que na divisão do trabalho, como
Durkheim[27] depois rebate, tem valor social, ou seja, não existe apenas para dinamizar a
capacidade produtiva dos seres humanos, objectivo do trabalho de Adam Smith, bem como
para criar justiça entre seres humanos que vivem dentro de uma estrutura com processos de
solidariedade orgânica, em grupos. De forma que cabe a Durkheim comentar a ideia de Karl
Marx, expressa no Capital, Vol. I e antes, no Manifesto Comunista: “A chacun selon ses
œuvres” devia ser, para sermos justos, diz Durkheim, “a chacun selon son mérites”[28], é dizer,
conforme o valor de cada pessoa e não uma forma absolutista de não medir o mérito. É o que
Durkheim mais tarde iria denominar de “Socialismo Absolutista”[29].
O que interessa, por agora, é a lógica derivada do liberalismo e de como o criador da Economia
Clássica, define os seres humanos como operários, sem reparar que ao falar de Divisão do
Trabalho e dizer que as pessoas podem, com o seu dinheiro, comprar a outros aquilo que for
preciso, esquece o que define em outros Capítulos do seu livro, isto é, que os seres humanos
vivem em divisão de trabalho, conforme as indústrias, manufacturas e empresas nas quais
trabalhem, e que ou trabalham no campo ou na cidade. Aliás, prevenindo a falta de riqueza
pessoal, fala da Commonwealth, ou o fundo de reservas que pode apoiar os que não tenham
dinheiro. A maior parte do livro é dedicada a esta política de formar um fundo comum, ou, como
denomina The revenue of the sovereign, bem como ao comércio e às Colónias. Não há
impostos em causa, apenas toda uma argumentação sobre a gestão livre e autónoma das
formas de produção.
74
É evidente, como já referi, que esta produção tem por resultado uma forma de pensamento que
é bem simples de lembrar: todo ser humano precisa de observar com todo cuidado os preços
dos produtos que necessita, distinguir entre o que deseja mas pode dispensar, e resolver se
gasta ou não a sua moeda. É o mesmo tipo de julgamento que faz o investidor, antes de decidir
qual o ramo de actividade para produzir e vender. É este comportamento dos proprietários que
é imitado, conscientemente ou não, pela população. A estrutura social, a hierarquia, o objeto
sociológico da ciência, é o comportamento social conforme as formas de pensar de forma
económica.
Economizar (economizing), é um conceito cunhado pela atitude dos produtores e os seus
trabalhadores. Não é em vão que Talccott Parsons e Neill Smelser dizem: “…the economics
aspects of society which are principally distinguished by their maximising of available means to
want-satisfactions…”[30] Todo o indivíduo, porque é de indivíduos a pensar do que se trata em
Sociologia Económica, vê-se confrontado com a necessidade de comprar, por lhe faltar tempo
para criar bens necessários para a sua subsistência. O ordenado ou salário com que é pago, é
pouco em relação à imensidão de recursos que deve consumir. O mercado conta já com esta
ideia, joga com ela e usa-a para o seu próprio proveito.
Maximizar ou optimizar, como diz Karl Marx no Capital, é, para as pessoas de escassos
recursos, que precisam de usar a sua lógica para reparar no bem que procuram, e procurar
adquiri-lo onde ele é mais barato, ou alternativamente, não o adquirir, ou, ainda, pela venda
ética da sua estética. De facto, a produção de valores de uso está subordinada à produção de
valores de câmbio, orientada pelo proprietário, que por sua vez, se orienta pelo mercado. A
lógica do consumidor, a maior parte da população de uma Nação, deve usar estratégias para
poder consumir ou gastar o seu dinheiro. A lógica do mercado foi criada pelas empresas e para
empresários, entendendo-se que cada indivíduo seria uma empresa individual ou a este
comportamento ficar obrigado. Foi assim que tratei deste assunto em dois textos meus, ao
falar in extensi das estratégias para maximizar[31]. A explicação é dada por Polanyi: “The last
two centuries produced in Western Europe and North America an organization of man’s
livelihood to which the rules of choice happened to be singularly applicable. This form of the
economy consisted in a price-making markets…”[32]. A formação dos preços resulta da falta de
proteccionismo estatal e da liberalização do intercâmbio: quem vende mais barato um bom
produto, ganha e lucra e atrai uma clientela importante, formando-se uma corrente de opinião
favorável à empresa que assim lucra. A produção dos bens é o que interessa, não a sua
circulação. Smith concentra-se na circulação, ignorando a produção, pelo que define valor de
um bem como o preço que adquire um produto pela quantidade de trabalho investido na
produção, especialmente se a divisão do trabalho para elaborar esse bem, é de grandes
proporções e envolve muitas pessoas. Teoria refutada por David Ricardo e Karl Marx.
Entretanto, é preciso saber o que diz Thorstein Veblen[33], em relação a esta temática, tal e qual
já foi analisado no Capítulo I. Sobre a realidade capitalista, Veblen diz calmamente: “All classes
are in a measure engaged in the pecuniary struggle, and in all classes the possession of the
pecuniary traits counts towards the success abd survival of the individual.Wherever the
pecuniary culture prevails, the selective process by which men’s habits of thought are shaped,
and by which the survival of rival lines of descent is decided, proceeds proximately on the basis
75
of fitness for acquisition. Consequently, if it were not for the fact that pecuniary efficiency is on
the whole incompatible with industrial efficiency, the selective action of all occupations would
tend to the unmitigated dominance of the pecuniary temperament. The result would be the
installation of what has been known as «economic man», as the normal and definitive type of
human nature. But the «economic man», whose only interest is the self-regarding one and
whose only human trait is prudence, is useless for the purpose of modern industry”[34]. Para
Tholstein a exploração dos seres humanos está institucionalizada no consumo conspícuo ou
notável para além do investimento em produção. A classe possidente tem tempo livre para
poder ditar o que tem valor, definir as normas de urbanidade, classificar os seres humanos pelo
tempo empregue, através de gerações, na educação da sua família em recreações que o
libertam da opressão causada pelo trabalho industrial. Ao longo do seu livro, este autor faz uma
análise dura e déspota dos senhores do mundo. Ou, por outras palavras, analisa o que Adam
Smith e Karl Marx não tiveram tempo de fazer: o primeiro ocupado com a sua ideia de
construção de uma teoria económica organizadora dos investimentos e dinamizadora da
produtividade dos seres humanos, pobres ou ricos; o segundo, em defender a classe social
mais despojada de bens, é dizer, os proletários, para o que dedica o seu tempo ao estudo dos
investimentos de capital e compara épocas históricas. Veblen tem tempo suficiente para
analisar o investimento do tempo de ócio da classe social que têm para si os meios de
produção. Porque, não é possível pensar apenas na mais-valia, quando se pensa na classe
dominante. A classe dominante tem outros meios para exercer essa dominação e eles residem
nos gostos, nas formalidades, nas formas de usar o corpo, os usos das alianças matrimoniais,
as formas de ocupar o tempo e de estabelecer, por exemplo, como deve ser um corpo de
mulher.
Veblen analisa ainda o uso da religião como uma maneira de estabelecer formas de vida e fala
das formas austeras de vida que estes cânones de vida impõem nas pessoas. Diz: “If any
element of comfort is admitted in the fittings of the sanctuary, it should at least be scrupulously
screened and masked under ostensibly austerity. In the most reputable latter-day houses of
worship, where not expense is spared, the principle of austerity is carried to the length of
making the fittings of the place a means of mortifying the flesh, specially in appearance…This
canon of devout austerity is based on the pecuniary reputability of conspicuously wasteful
consumption, backed by the principle that vicarious consumption should conspicuously not
conduce to the comfort of the vicarious consumer”[35].
O consumo excêntrico analisado por Veblen, faz pensar nos elementos que são usados pelas
classes exploradoras e reproduzidos pelas classes exploradas, que desejam ou manter o seu
trabalho ou pensar-se a si próprios como parte desse grupo, ao qual apenas têm acesso pelo
trabalho e pelo salário. No entanto, e como Max Weber [36] analisa no seu Capítulo IX do texto
referido, há formas de dominar com estrutura e funcionamento a partir do Governo, que
passam pelo recato nas formas de viver e pela austeridade, acabando por ser exemplos de
estratégias de poupança. “Poupança” que reverte em favor do proprietário ou da classe com
tempo livre, por não ter que gastar em ordenados ou salários que compensem o trabalho ou a
escolha de gosto e de alimentos que os proprietários usam. É como se estivéssemos a visitar o
76
livro do Conde de Lampedusa[37], O Leopardo, na época da reunificação italiana, quando
diz que tudo deve mudar para que tudo continue a ser o mesmo.
De facto, uma vista de olhos à sociedade actual, denominada globalizada, faz pensar que a
análise evolutiva das classes sociais, usada de forma dialéctica por Marx e por Veblen, é uma
realidade. A Sociologia Económica exibe-nos grupos sociais a usarem valores antigamente
dedicados ao uso e a poupança reservada para o uso, caso um dia os valores faltassem, hoje
em dia transformados em moeda de troca, de intercâmbio, utilizada para viajar, comprar os
melhores instrumentos electrónicos, seleccionar uma biblioteca nunca lida mas sim exibida
para, como dizemos em Portugal, “inglês ver”. As classes assalariadas passaram ao gasto
sumptuário ou conspícuo, como analisado por Veblen no seu tempo. Quanto mais rica a classe
operária, mais semelhante à classe dominante e mais dominadora ela própria dos seus
semelhantes que tenham a desgraça de trabalhar para eles. O operariado imita estes
comportamentos; os sindicatos têm formado escolas para crianças e adultos, as suas
reivindicações passam por salas de leitura, clubes, música e outros bens que, no Século XIX,
eram apenas atributo das classes ociosas, como Marx as denominou e Veblen usou como
conceito, para entender o outro lado da moeda: não há classe operária se não houver classe
proprietária.
Quanto ao investimento dentro de toda esta análise, ele é também exercido pelo operariado. O
que se define por produtividade, hoje em dia, não é apenas a força de trabalho, bem como o
funcionamento em empresa privada ou, ainda melhor, individual e autónoma. O conceito que
Durkheim mais contestara, era esse do individualismo, usado pela primeira vez nas
declarações de Independência referidas, nos Direitos do Cidadão da Revolução francesa, e
pelo liberalismo que consegue pôr ordem no caos da passagem da servidão à livre empresa,
com operários a lutarem com os seus sindicatos, até abandonarem os mesmos para ter a sua
indústria. A individualidade definida por Milton Friedman[38] e a escolha livre, são parte da vida
actual, reformulados os conceitos, ou amplificados os conceitos de classe social, tal e qual
Veblen analisa nos seus vários livros e Anthony Giddens no de 1998, sobre a social-
democracia. Giddens[39] é capaz de ver que o mundo da Social-democracia avança para o
sonho de Durkheim e Mauss, de todos sermos iguais sem luta de classes nem guerras nem
revoluções.
Não queria dizer com isto, que o conceito de exploração institucionalizada, usado por Thorstein
Veblen, me tenha arrebatado o julgamento da realidade. A luta de classes é uma realidade,
apenas que os membros das classes mudaram, como acontece normalmente na História. A
Aristocracia Bourbon em França muda para o Bonapartismo, que consiste afinal na compra de
títulos de Conde, Duque ou outros. Veblen diz claramente: “The constituency of the leisure
class is kept up by a continual selective process, whereby the individuals and lines of descent
that are eminently fitted for an aggressive pecuniary competition are withdrawn from the lower
classes. In order to reach the upper levels the aspirant must have, not only a faire average
complement of the pecuniary aptitudes, but he must have these gifts in such an eminent degree
as to overcome very material difficulties that stand in the way of his ascent. Barring accidents,
the nouveaux arrivés are a picked body… a process that has always been going on ever since
the institution of the leisure class was first installed…”[40]
77
De facto, Karl Marx tem razão quando diz que as relações de capital vão destruir o mundo, por
se querer ser dos nouvaux arrivés, análise que apenas faz no seu texto de 1847, The poverty
of philosophy. De resto, Marx tem os dados certos para explicar a luta de classes e Veblen usa
esses dados apenas para analisar as mudanças de indivíduos dentro dos mesmos papéis
sociais de exploração institucionalizada, conceito que enriquece a análise materialista
dialéctica.
[1] Année Sociologique Nº1, 1896-97, página 457,fascículo 1. Website com texto, bem como Motor de pesquisa Gallica.[2] Mauss, Marcel, (1923-24) 2001: Ensaio sobre a dádiva, Edições 70, Lisboa. Website nota 27.[3] Mauss, Marcel, obra citada, página 183 e seguintes.[4] Aristóles (323) 1992: Étique à Nicomaque, Encyclopedy on-line l’Agora, Les Classiques, Paris, ou website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Arist%C3%B3teles+%C3%89tique+a+Nicomaque&btnG=Pesquisar&meta=lr%3Dlang_ptcomentado no meu texto de 2002 : A economia deriva da religião, Afrontamento, Porto. Ver também Aquinas, Thomas, c.1270:Commentaires de l’Ethique à Nicomaque, Paris, Sorbonne, manuscrito on line.Website: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Tomas+de+Aquino+Commentaires+de+l%E2%80%99Ethique+%C3%A0+Nicomaque&btnG=Pesquisar&meta=[5] Bentham, Jeremy, (1768, publicação anónima, 1789 edição pública, William Collins Sons, Ltd, Glasgow)) 1962: An introduction to the principles of morals and legislation, Collins Fontana, Glasgow. Website com o texto original:http://socserv2.socsci.mcmaster.ca/~econ/ugcm/3ll3/bentham/morals.pdf[6] Mill, John Stuart, (1863) 1962: Utilitarianism, William Collins Ltd, Glasgow, em suporte de papel. Website com texto: http://www.utilitarianism.com/jsmill.htm[7] Bentham, Jeremy (1879) 1975: An Introduction to the Principles of Morals and Legislation, William Collins and Son, Ltd, Glasgow. Páginas 34 e seguintes. Website com texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Jeremy+Bentham++An+Introduction+to+the+Principles+of+Morals+and+Legislation&btnG=Pesquisar&meta=[8] Stuart Mill, John, 1859 e 1960: On Liberty, e Utilitarianism, Collins and Sons, Glasgow. Website nota 39 para o primeiro, website para o Segundo:http://www.google.pt/search?hl=pt-, com texto.PT&q=John+Stuart+Mill+Utilitarianism&btnG=Pesquisar&meta= As duas citações são com texto.[9] Stuart Mill, John, 1848: Principles of Political Economy¸ Collins, Glasgow. Website com texto http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=John+Stuart+Mill+Principles+of+Political+Economy&btnG=Pesquisar&meta=[10] Stuart Mill, John, obra citada, páginas 307 e 308, tradução de Borges Coelho para Livros Horizonte, 1987. Website nota anterior.[11] Sismonde de Sismondi, Jean Charles Leonard, 1819: Nouveaux Principes de Économie Politique, Paris. Website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Jean+Charles+Leonard+Sismonde+de+Sismondi+Nouveaux+Principes+de+%C3%89conomie+Politique&btnG=Pesquisar&meta= Mill, James, Elements of Political Economy, 1821. Website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=James+Mill+Elements+of+Political+Economy&btnG=Pesquisar&meta=[12] Marx, Karl, (1859) 1977: Preface to a Critique of Political Economy, Oxford Press, Grã-Bretanha. Website com texto: www.marxists.org/archive/marx/ works/1859/critique-pol-economy/preface.htm[13] Marx, Karl, obra citada, páginas 388 a 391, sintetizadas por mim.[14] Ricardo, David, (1918) 1983: Princípios económicos e de tributação, Gulbenkian, Lisboa. Website nota 227.[15] Stuart Mill, John, obra citada, páginas 304 a 305. A síntese é minha. Website nota 252.[16] Durkheim, Émile, 1885 :“Alfred Fouillé, La propriété sociale et la démocratie” in Revue Philosophique XIX, Paris. Website com texto www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_2_04/propriete_soc.html[17] Durkheim texto citado, páginas 170 a 183 em suporte de papel. . A mina síntese.Website nota 26.[18] Veblen, Thorstein, (1899) 1998: The theory of the leisure class, Prometheus Books, Nova Iorque. Website nota 95.[19] Parsons, Talcott, Neill, Smelser, 1968: Economy and Society, Routledge and Kegan Paul, Londres. Website para pesquisa e textos sintetizados:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Talcott+Parsons+Smelser+Neil+Economy+and+Society%2C+&btnG=Pesquisar&meta=[20] Weber, Max, 1956, obra póstuma: Economía y Sociedad, FCE, México e Madrid. Website para debate, teoria e textos comentados:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Max+Weber+Economia+e+Sociedade&spell=1[21] Bourdieu, Pierre, 1977: Algérie 60. Structures économiques et structures temporelles, Minuit, Paris ; e 2000 : Les structures sociales de l´économie, Seuil, Paris. Website para debate e
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teoria:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Pierre+Bourdieu+Alg%C3%A9rie+60.+Structures+%C3%A9conomiques+et+structures+temporelles&btnG=Pesquisar&meta=[22] Marx, Karl, 1862 e 1863, Theories of Surplus Value, ao todo, dois textos escritos em anos diferentes, do que vamos tratar no Capitulo V de este texto. Website nota 50.[23] Karl Marx, textos citados.[24] Smith, Adam, obra citada do texto original, define wants ao começo do seu livro, Capítulo I. Enquanto need é o que forçosamente deve ser feito, o que tem que ser, want é a carência, a falta de, deficiência, privação, penúria. Este determinismo natural é usado pelo autor para formular o seu objectivo: melhorar a produtividade do trabalho de todo indivíduo e da massa de trabalhadores. Website nota 22[25] Smith, Adam, página 130, Capítulo XI, Parte II, define o conceitowants como a extensão do mercado de necessidades que, ao serem satisfeitas, são importantes para a oferta de produtos, em consequência, para o mercado de capital. Website nota 22[26] Smith, Adam, obra citada, Livro II, página 207 da versão inglesa original que uso. Website com texto: nota 22.[27] Durkheim argumenta de forma cumprida que a divisão do trabalho é social, não apenas por ser dividida entre todos os seres humanos, bem como porque há lei e contrato, apenas que o contrato é desigual por causa da existência de classes sociais, como já foi referido.[28] Durkheim, Émile, 1910b): “La notion d’égalité sociale” in Bulletin de la Société française de philosophie, Nº 10, Paris. Website com texto:http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+La+notion+d%E2%80%99%C3%A9galit%C3%A9+sociale+&btnG=Pesquisar&meta= Marx tinha exprimido a ideia ao dizer “De cada um conforme as suas capacidades, a cada um conforme as suas necessidades”, Communist Manifesto, versão de 1870.[29] Durkheim, Émile, 1904: L’élite intellectuelle et la démocratie, já citado. Website: www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_3_11/elite_intellectuelle.html[30] Parsons, Talcott, e Smelser, Neill, 1956: Economy and Society, Routledge and Kegan Paul, Londres, página 20. Website nota 261.[31] Iturra, Raúl, (1977) 1988: Antropologia Económica de la Galicia Rural, especialmente Capítulo II, Xunta de Galiza, Compostela. O original em inglês, CUP, trata especificamente de maximização. Website nota 45.[32] Polanyi, Karl, 1957: “The economy as an instituted process” in Polanyi, Arensberg e Pearson, Trade and market in the early empires, The Free Press, Nova Iorque. Website nota 60[33] Veblen, Thorstein, (1889) 1998: The theory of the leisure class, Prometheus Books, Nova Iorque. Website nota 95[34] Obra citada, página 241.[35] Veblen, Thorstein, obra citada, páginas 115 a 166, sintetizadas por mim ao reproduzir frases das páginas 121 e 122 do texto em formato de papel[36] Weber, Max, (1922) 1993: Wirtschaft und Gesellschaft. Grudisse der Verstcheunder Soziologie, traduzido como Economia y Sociedad, FCE, México. A cobra mais difundida de Weber é a de 1904, A ética do Protestantismo, editado pela Presença em 1986 em Portugal, útil também para entender a austeridade que faz os ricos: Beruf mas que por ultra conhecido, ponho de parte nesta analise. Website nota 262[37] Di Lampedusa, Giuseppe Tomassi, 1889: Il Gattopardo, várias edições, entre as quais a portuguesa da Europa-América e a de Luchino Visconti, de 1968, a minha preferida. Website para debate e informação: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Giuseppe+Tomasi+Di+Lampedusa+Il+Gattopardo&spell=1[38] Friedman, Milton, 111962: Capitalism and freedom, the University of Chicago Press, EUA… Website para debate http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Milton+Friedman+Capitalism+and+freedom&btnG=Pesquisar&meta=[39] Giddens, Anthony, 1988: The third way and its critics, Polity Press, Cambridge, Grã Bretanha. Website nota 36[40] Veblen Thorstein, obra citada, Capítulo IX, “The conservation of Archaics Texts”, sintetizado nas palavras do autor, páginas 236 e 237, em suporte de papel. Website nota 95.
Conclusões. A reacção de Durkheim e Mauss
Era o começo. Era a incerteza. Diz Maurice Halbwachs[1], colaborador e discípulo de Durkheim,
da equipa do Année Sociologique, que, enquanto andavam um dia por Paris, passaram em
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frente da catedral de Notre Dame e diz Durkheim, “é disso que eu preciso, um púlpito para
falar”. Apesar de não ser religioso e confessar o seu ateísmo, a formação judaica nunca
abandonará Émile Durkheim. E é por isso, dizem seus biógrafos, que consagraram a sua vida à
Pedagogia e ao Socialismo. Trata-se apenas de uma anedota para aligeirar as análises
anteriores. Porque Durkheim estava preocupado e interessado pela economia.
[1] Halbwachs, Maurice, 1938: “Introdução” à Obra póstuma de DurkheimL’evolution pedagogique en France, Presse Universitaire de France, Paris. Há versão em Castelhano, La Piqueta, Madrid. Website para pesuisa e texto: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Maurice+Halbwachs+Introdu%C3%A7%C3%A3o+%C3%A0+Durkheim&btnG=Pesquisar&meta= Texto da Introução de Halbwachs www. l ivre-rare-book.com/Matieres/gd/1478p.htm l
Tal e qual estava Marcel Mauss, da forma que tenho referido. Mas porquê este interesse?
Durkheim analisa em 1883 e em 1897, o conceito de anomia ou falta de vontade para agir ou a
divisão do ser, que para ele tinha duas naturezas: a social e a individual, do que trata em
1914[1]. Os factos económicos aparecem-lhe como factores de divisão social, não da união
solidária dos grupos, como defende na sua tese De la division du travail sociale, já referido.
São factores de divisão e não de integração porque “ils engagent les hommes dans des
rapports qui le laissent en dehors les uns des autres, est c’est à leur niveau que l’amorphisme,
l’anomie sont les plus graves…le facteur religieux et non point le facteur économique joue un
rôle primordial dans les devenir des sociétés[2]No entanto, se as relações económicas colocam
tantos problemas às relações sociais, isso significa que são um facto social, um facto social a
estudar, quer para o entender, quer para melhorar a relação entre os seres humanos e fazer da
economia um factor de integração social nas sociedades industriais, nas quais existe a ameaça
de luta, como Karl Marx tinha já advertido.[3]
Se a economia ameaça a integração da vida social, é necessário estudar o facto. E define um
tipo de estudo e de análise que incorpora na Année Sociologique como a sua constante secção
V. A Sociologia Económica é para estudar as instituições económicas e o comportamento das
pessoas dentro delas. É a proposta que faz de entrada no primeiro número da revista por ele
fundada, em conjunto com a sua equipa. Diz, por intermédio do seu colaborador François
Simiand, ao começo da primeira aparição da Secção V ou Sociologie Économique: “Il ne serait
pas possible, ni du reste convenable au dessin de ce livre, de passer en revue ici toute la très
abondante littérature économique actuelle. Pour toutes les études techniques sur des questions
spéciales, telles qu’en ce moment le métallisme monétaire ou le protectionnisme ou l’agrarisme,
pour touts les travaux plus concrets qui concernent la législation économique, projets, résultats,
statistiques, monographies, etc., accumulation méthodique de matériaux pour la science de
demain, on ne peut que renvoyer aux publications appropriées. Mais, les problèmes généraux
de l’économie, la portée d’ensemble, la méthode, intéressent la science sociale tout entière et
on peut-être beaucoup à tirer d’elle…Quel est l’état présent de la théorie ou des théories de la
valeur ? Qu’y a-t-il d’acquis, qu’y q-t-il à rechercher encore et peut être indéfiniment, touchant la
nature et touchant la mesure de la valeur ? En quel sens et dans quelle et dans quelle mesure
la science économique actuelle peut-elle fonder des systèmes pratiques tels que sont les
systèmes socialistes?[4].
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Esta longa citação serve apenas para estabelecer e definir o que preocupa os sociólogos, à
data do seu nascimento, sobre a economia. Para começar, a escola fundada por Durkheim,
descarta os projectos específicos para se concentrar apenas na teoria que orienta a produção e
o consumo, é dizer, os actos económicos que dizem respeito às relações humanas.
Especialmente, dois pontos são interessantes para a equipa: a teoria do valor, e a teoria do
socialismo. Ambas aparecem em comentários de livros sobre a matéria, ou como textos, entre
a data da fundação do texto, até 1903.
Como tenho referido, Maurice Lapie, no próprio N.º 1 da Revista, diz: “La théorie matérialiste de
l’histoire est en faveur: á chaque page de l’Année Sociologique on en aura la preuve, car s’il est
trouvé, dans chaque branche de la science, des écrivains préoccupés d’étudier au point de vue
économique les autres éléments des sociétés. Or, expliquer le droit, la politique, la famille, la
science, l’art, la religion, la morale par l’état de l’agriculture, de l’industrie et du commerce, voilà
ce que, suivant l’opinion courante, Karl Marx nommait de matérialisme historique.”[5]
O que indica o segundo ponto em que estavam interessados os sociólogos da “primeira leva”: o
socialismo. O que interessa nestas páginas, é entender qual era a opinião e o objectivo
sociológico na economia. O interesse é explicar a interacção, o comportamento social.
Durkheim já o tinha apurado no seu livro sobre a divisão do trabalho, onde acaba por definir
uma organização do trabalho socialmente dividida, conforme as capacidades e saber de cada
pessoa. A frase já comentada de “De todos conforme a sua capacidade, para todos conforme
as suas necessidades”, é para Durkheim a ideia do mérito das pessoas para receber conforme
o seu comportamento, em sociedade e em grupo. Porque o grande dilema de Durkheim, o seu
problema com a economia era como colocar, como coordenar, a dinâmica do indivíduo e o seu
trabalho em grupo. Se a economia é interessante como facto social, é porque a vida em grupo
começa por ser um campo de acção ou actividades, para continuar, num segundo momento,
pela produção:“L’association ne peut produire ses effets qu’en vertu de ses processus
reciproque. Par effect de ses relations que se nouent ainsi, se créent spontanément des idées,
des sentiments, que partagent les individues associées, production collective donc”[6].
A base moral, essa outra natureza da pessoa, é a base do Direito, do Contrato e da Produção,
que se aprende desde a infância. São os preceitos da lei que permitem um contrato para
trabalhar e produzir, como debate em De la division social du travail. E, para que o trabalho
produtivo possa acontecer, a classe capitalista deve ser destruída como meio intermediário
inútil entre o produto e o produtor como diz Marx, e Durkheim critica com base nas suas
próprias leituras de Marx[7]. Ora bem, se é assim que Marx pensa, como vai então desaparecer
o capital, que é a relação social que coloca os operários em situação de desespero e mau
pagamento?
“Dans le socialisme marxiste, le capital ne disparaît pas, il est seulement administré par la
société et non par des particuliers”[8]. É a crítica de um socialista a outro socialista, que deseja
que os bens sejam distribuídos de forma igual entre todas as pessoas.
A reacção de Mauss é conhecida, como tenho analisado nos Capítulos anteriores. É conhecida
também, pelo posicionamento que toma no Prefácio do livro de Durkheim, Le socialisme. Mas é
interessante notar a forma e conteúdo da sua reacção à ideia de relações sociais orientadas
pela economia. Aí onde Durkheim se bate em prol do operariado e defende que o capital como
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economia seja repartido entre todos, por todos sermos iguais, como o defendera no seu texto
de 1890[9], Mauss faz uma análise das formas denominadas arcaicas da economia e analisa a
economia denominada troca-dádiva, na qual adverte para a existência de excedentes
acumulados, já criticada por Marx, no seu texto de 1859[10], do lazer permitido pelo capital e
pela produção e apropriação de valores de troca, essa exploração institucionalizada analisada
por Veblen e denominada o prazer do ócio. Ócio que é também analisado por Marcel Mauss,
mas não como uma crítica, mas como um louvor, um prazer, para as pessoas que trabalham e
que são capazes de descansar a seguir ao trabalho. Trabalho que, salienta Mauss, está
organizado por rituais e formas de comportamento festivas, cerimónias, respeito às formas
religiosas, isto é, as formas de representação do grupo, de ver-se a si próprio e aceitar a lei e o
direito, não para deles fugir, antes aceitando-os e respeitando os direitos alheios. Com estes
elementos, vai, sem o dizer, definindo o conceito de Sociologia Económica. Conceitos
deprenda, dádiva, oferta, dádiva aos quais opõe, por não serem exactos para definir a política
económica dos povos estudados, os que considera mais verdadeiros e adequados, como a
lista que começa por liberdade e obrigação, liberalidade, generosidade, luxo, e economia,
interesse, utilidade. Mauss propõe que estes são os conceitos que, na verdade, deviam ser
utilizados para entender a estrutura social, a interacção e a conduta do grupo. A conclusão de
Mauss, embora pareça constituir um acréscimo ao referido por Malinowski em 1922 – de que
os povos primitivos têm economia denominada comercial, tal e qual o Ocidente –, é, na
verdade, um contributo que, pela forma da escrita de Mauss, pode passar despercebido, se
não centramos a nossa atenção em toda a obra, de equipa e individual, do grupo Durkheim.
Mauss fala de híbrido para se referir ao comportamento de povos por ele definidos como
arcaicos e primitivos. Esse comportamento, híbrido, conjuntural, heterogéneo, é definido pelo
autor, antes do conceito, ao referir que:“É ainda uma noção complexa a que inspira todos os
actos económicos que descrevemos; e esta noção não é nem a da prestação puramente livre e
gratuita, nem a da produção e da troca puramente interessada, do útil[11].”
A conclusão de Mauss é que estas trocas de produtos nem são livres nem desinteressadas.
São trocas interessadas para manter uma aliança ou para trabalhar, ou para distribuir bens que
um grupo não consegue fazer e entende-se com outro capaz de o fazer, por ter tempo,
disponibilidade e sabedoria. Trocas cimentadas pela aliança matrimonial de pessoas de diverso
conhecimento, mas da mesma categoria. Este facto de pertença à mesma categoria, que
acrescenta mais um elemento à noção de Sociologia Económica, é um pacto de hierarquias,
representadas por pessoas designadas com antecedência. Tal como acontece no Ocidente.
Compara as associações entre Kwakiutl e Kiriwina, com as realizadas com os sindicatos, pelos
patrões ou proprietários do capital. O que se segue foi já referido no Capítulo I, nº3, sobre
reciprocidade comercial. Não devo esquecer-me de acrescentar uma frase muito importante,
que Mauss refere na página 188 do texto que uso. Ao referir as civilizações arcaicas,
acrescenta uma frase que não se sabe bem se fala das arcaicas ou das Ocidentais: “Aforra-se,
mas para gastar, para «obrigar», para ter «homens enfeudados»…Restitui-se com usura, mas
para humilhar o primeiro doador ou cambista e não apenas para compensar pela perda que lhe
causa «um consumo diferido». Há lucro, mas este é apenas semelhante àquele que, diga-se,
nos guia”[12].
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As restantes conclusões são conhecidas e foram já por mim referidas ao longo do texto.
Porque tudo o que Marcel Mauss faz, é aplicar os conceitos da economia ocidental para
entender o que acontece nas economias ditas primitivas. Pensa que, com esta análise, a
questão colocada por Durkheim, de que economia e valor eram factos ligados à religião, fica
respondida. Mas, é o próprio Durkheim que nas conclusões do texto Les formes élémentaires
de la vie religieuse. Le système Totémique en Australie lhe responde já, ao afirmar, na página
429 da minha versão inglesa, que: “Having left religion, science tends to substitute itself for this
latter in all that which concerns the cognitive and intellectual functions”[13].
Associado aos textos de 1900 e de 1908, mais ao texto de 1928, a resposta de que a economia
é quem orienta o comportamento, já está estabelecida.
Mauss parece não ter lido tudo o que o seu mestre tinha produzido para definir os objetos da
Sociologia, um dos quais é a Sociologia Económica.
Eis porque Bourdieu escreve o seu derradeiro livro de 2000[14], cujo elo é o Estado e o
Mercado, o mesmo de Émile Durkheim…
[1] Durkheim, Émile, 1914: “Le dualisme de la nature humaine et ses conditions sociales” em Scientia, XV, Paris. Website : www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_4_15/dualisme_nature_hum.html[2] Durkheim Émile, 1897: “La conception matérialiste de l’Histoire”, emRevue Philosophique XLIV, Paris. Website com texto www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_2_09/conception_materialiste.html[3] Esta ideia está no seu texto de 1893, no que estamos a comentar, e no póstumo de 1928, escrito em 1888, após a sua leitura da obra de Marx.[4] Simiand, François, 1896, “Théories Économiques”, Année SociologiqueNº 1, Cinquième Section, Sociologie Économique, Félix Alcan, Paris. O texto foi retirado, com todos os volumes, da Página Web correspondente, que a Biblioteca de Paris facilita on-line. Estes textos não se encontram em Portugal, a exepção da Biblioteca de Direito de Universidade de Lisboa e na minha pessoal e na Página Web da Bibliotéque National de Paris. Website com texto www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/simiand_francois/ methode/methode_20/revololution_industrielle.pdf[5] Lapie, Maurice, 1986: “Antonio Labriola. Essais sur la conception matérialiste de l’histoire” in Année Sociologique, Nº 1, página 270 e seguintes. Website para pesquisa: http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Maurice+Lapie+La+conception+materialiste+de+l%27+Histoire&btnG=Pesquisar&meta[6] Durkheim, Émile, 1925: L’education morale, Félix Alcan, Paris. Website 43[7] Durkheim, que sabia ler Alemão, baseia o seu argumento nas suas leituras do Manifesto Comunista (1848), do Volume 1 do Capital (1867), A guerra civil na França (1871), O 18 Brumário de Louis Bonaparte (1852), A luta de classes na França (1850). Retirado de Jean – Claude Filloux, do seu texto em suporte de papel: Durkheim et le socialisme, Livrairie Droz-Genéve-Paris. Website agora.qc.ca/mot.nsf/Dossiers/Emile_Durkheim.[8] Durkheim, Émile, (1888 e 1898) 1928: Le socialisme, PUF, Paris. Website nota 26[9] Durkheim, Émile, 1890: “Les principes de 1789 et la sociologie”in Revue internationale de l’enseignement, XIX.Website com texto www.uqac.uquebec.ca/…/classiques/Durkheim_emile/ sc_soc_et_action/texte_2_06/principes_1789.html[10] Marx, Karl, 1859: Preface to a Critique of Political Economy, já referido. Website www.marxists.org/archive/marx/ works/1859/critique-pol-economy/preface.htm[11] Mauss, Marcel, (1922-23) 2001: Ensaio sobre a dádiva, Edições 70, Lisboa, páginas 198 e ss, em suporte de papel. Website nota 27.[12] Mauss, Marcel, obra e editora citada, página 188. É pena a tradução do texto editorial ser tão pobre.[13] Durkheim, Émile (1912) 11915: The elementary forms of religious life, George Allen and Unwin Ltd, Londres. Websitehttp://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=%C3%89mile+Durkheim+The+elementary+forms+of+religious+life&btnG=Pesquisar&meta=[14] Bourdieu, Pierre: Les structures sociales de l’économie, Seuil, Paris. Website http://www.google.pt/search?hl=pt-PT&q=Bourdieu%2C+Pierre%3A+Les+structures+sociales+de+l%E2%80%99
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