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Nem casa, nem escritório. Ou melhor, os dois, em um só lugar. Seria mais um projeto multifuncional de arquitetura, não fosse por um detalhe: trata-se do novo veleiro da família Schurmann. A embarca-ção está em construção em Itajaí, cidade escolhida para a partida da família de navegadores rumo à sua terceira volta ao mundo, batizada de Expedi-ção Oriente.
A grande diferença entre construir, organizar e ambientar uma residência e um veleiro está na di-nâmica, que é muito maior no barco. O veleiro Kat com 80 pés, o equivalente a 24 metros de compri-mento, está sendo trabalhado em aço carbono no casco e, em aço inox no deck e em algumas peças no seu interior. Segundo a arquiteta responsável pelo projeto do barco, Jeane A. de Busana Bian-chi, do Studio Ohmini Arquitetura e Engenharia, de Itajaí, o maior desafio deste projeto é conhecer os materiais adaptáveis para a realidade do barco, sabendo por onde ele irá navegar e o nível de re-
sistência necessária. “O aço, por ser altamente re-sistente, é a melhor solução para uma embarcação que irá enfrentar longas travessias por mares que não anunciam de antemão qual será o tamanho de sua força ou calmaria”, comenta.
Garantir a forma e a função, com a mesma beleza e conforto de uma casa, porém, com materiais adap-tados, com pesos específicos menores e flexibili-dade para a dinâmica de um barco em movimento. Eis a questão! O projeto do veleiro Kat tem exigido da arquiteta um olhar apuradíssimo para os deta-lhes técnicos da vida a bordo durante uma expe-dição. Nem todo dia é dia de mar de almirante na rotina da tripulação, o trabalho é árduo, com direi-to a tempestades e ventos furiosos. “Tudo no barco precisa ser acessível, prático, compacto e seguro. Trabalhamos as questões de ergonomia interna, elas foram pautadas pela medida áurea, que é a medida do corpo humano. Com os braços abertos o morador tripulante do Kat terá tudo ao seu alcan-
ArquiteturaUma obra para o marPor Andrea Scussel
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Tudo no barco precisa ser acessível, prático, compacto e seguro
ce, sem ter que projetar o corpo para pegar alguma coisa. Materiais não muito comuns em obras fixas estão sendo aplicados no interior do barco. O poli-propileno e a fibra de vidro, utilizada nas pranchas de surf, permitem moldar os espaços em forma de armários, nichos e bancadas com acabamentos ar-redondados, o que seria mais difícil conseguir com marcenaria. Descobrimos que até o isopor, produ-zido por material reciclável, pode ser utilizado no preenchimento de espaços, e deixá-los muito mais leves”, explica Jeane. Os materiais aplicados são todos de fornecedores nacionais e a mão de obra é local. Santo de casa faz um barco, sim!
A diretriz do projeto é a funcionalidade, com os espaços privativos e de circulação respeitados, já que em muitos momentos da navegação o barco irá abrigar até dezesseis pessoas durante longas travessias. Longe do supermercado, da farmácia e da lavanderia a “casa flutuante” da família Schur-mann tem todos os seus espaços de uso previstos no projeto. Armários para armazenagem de manti-mentos, uma pequena lavanderia e até uma horta para o cultivo dos temperos com gostinho caseiro. A iluminação em LED é toda automatizada, o sis-tema touch screen compõe cenários distintos às necessidades das pessoas a bordo e da navegação.
Foto
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A família de exploradores está se preparando para a expedição Oriente
a bordo da embarcação Kat.
A arquiteta Jeane A. de Busana Bianchi, respon-
sável pela construção da embarcação Kat.
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Assim como uma casa tem sua identidade, o lar flu-tuante dos Schurmann também tem suas peculia-ridades. O constante movimento, embalado pelo balanço do mar é a principal delas, e nele a arqui-tetura não pode interferir, é obra da natureza. Mas pode fazer de cada espaço um bom lugar para se vi-ver. A arquiteta Jeane deu uma atenção especial às áreas de trabalho, social, e lazer do veleiro. Sim, o Kat terá uma praça, e por que não? “ A área externa será bem maior do que a do veleiro anterior, o Aysso. Isso porque a necessidade das pessoas de terem um lu-gar para respirar, para conviver, ou até para ficarem sozinhas por uns instantes tem que ser respeitada. Imagine pessoas de vários países, com cultura e há-bitos diferentes convivendo em um espaço restrito de 100 m! que é a área do barco, elas precisam de momentos de integração, e de privacidade também”, argumenta a arquiteta. E é isso o que vai acontecer nesta expedição, além da família, outros ocupantes estarão a bordo em algumas pernas da viagem. E para manter a forma e o pique, nada melhor do que uma academia particular. Duas bicicletas ergométri-cas instaladas no deck do veleiro irão gerar energia. Cada vez que um tripulante se exercitar estará con-tribuindo para manter as baterias que alimentam os sistemas de tratamento de resíduos carregadas.
Mar, doce lar!A linha mestra na construção do veleiro Kat é tão clara como uma noite de lua cheia em alto mar. Por determinação do capitão Vilfredo Schurmann, comandante da Expedição Oriente, sustentabilida-de é palavra de ordem a bordo. “ O mar é o nos-so quintal, não jogamos nada nele. Todo resíduo gerado no barco deve ser tratado, reutilizado ou diminuído o seu volume para descarte em local apropriado em terra, durante as paradas”, afirma Schurmann.
Os processos para a compostagem do lixo, a filtra-gem dos óleos, reutilização da água da lavanderia e sanitários estão sendo desenvolvidos pela em-presa brasileira Solví.
InterioresO fio que conduz o projeto de interiores do veleiro não podia ter outro tom que não fosse o azul. Antes de iniciá-lo, Jeane teve o cuidado de resgatar fotos antigas de viagens anteriores e lá estava ele, azul da cor do mar. A arquiteta buscou um equilíbrio com o o" white e pontuou alguns pequenos deta-lhes em verde. “Esta é a nossa grande linha de tra-balho, tudo muito claro, muito prático, preparado
para a vida no mar. Há uma simplicidade elegante na decoração. Os revestimentos serão feitos com tecidos apropriados de fácil manutenção e limpe-za, as louças, roupas de cama e banho personali-zadas, porém com requinte. Afinal uma história como esta precisa ser coroada com um toque de glamour “, finaliza Jeane. Não só coroada como comemorada! Até uma bela cristaleira para aco-modar as taças usadas para o brinde das chegadas já foi projetada pela arquiteta. E quando outubro chegar, é hora de fazer o teste de mar, faça chuva ou faça sol, o veleiro Kat estará pronto para partir. Bons ventos então!
A Expedição OrienteA Expedição Oriente zarpa no dia 24 de novembro a bordo do novo veleiro, o Kat. Dessa vez, o casal Vilfredo e Heloísa, os filhos e um neto seguirão a rota dos chineses que, de acordo com polêmicas teorias, foram os primeiros a contornar o globo. O novo projeto envolve inovação, tecnologia e sus-tentabilidade. Ações importantes, de cunho edu-cacional e ambiental serão executadas. Uma série televisiva e um documentário de longa metragem serão produzidos durante a viagem.
Sustentabilidade. É lei!
Imagem 3D: Ohmini Arquitetura e Engenharia
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