PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL
FACULDADE DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
ALINA ANTUNES DA CUNHA
O GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM NO SEGMENTO MUSICAL NO
BRASIL E NOS ESTADOS UNIDOS:
ESTUDO DOS CASOS WILSON SIMONAL E MICHAEL JACKSON
Porto Alegre
2014
ALINA ANTUNES DA CUNHA
O GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM NO SEGMENTO MUSICAL NO
BRASIL E NOS ESTADOS UNIDOS:
ESTUDO DOS CASOS WILSON SIMONAL E MICHAEL JACKSON
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas pela Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Orientadora: Prof. Me. Glafira Furtado
Porto Alegre
2014
ALINA CUNHA
O GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM NO SEGMENTO MUSICAL NO
BRASIL E NOS ESTADOS UNIDOS:
ESTUDO DOS CASOS WILSON SIMONAL E MICHAEL JACKSON
Monografia apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Comunicação Social com habilitação em Relações Públicas pela Faculdade de Comunicação Social da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
Aprovada em _____ de ___________________ de ________.
BANCA EXAMINADORA:
Prof. Me. Glafira Furtado
__________________________________
__________________________________
__________________________________
Porto Alegre
2014
Dedico esta monografia aos
profissionais de relações públicas que
trabalham diariamente buscando
ultrapassar barreiras e atuar nos mais
improváveis ambientes.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à minha orientadora, Prof. Me. Glafira Furtado, pela confiança no
meu trabalho e pelo contínuo incentivo. Agradeço por sua parceria e amizade, por
seu grande envolvimento nesta monografia e por estar sempre disponível a me
ajudar.
Agradeço ao Max de Castro, filho de Simonal, e ao Lua Lafaiette, que me
colocou em contato com ele. A entrevista foi essencial para a singularidade deste
trabalho e sou muito grata por ter tido esta oportunidade e pela disposição do Max
de Castro em colaborar com este estudo.
Gostaria de agradecer também à minha família, que me aguentou reclamando
diariamente da minha falta de tempo. Mais especificamente: ao meu pai pela ideia
de estudar Wilson Simonal, artista que fiquei muito feliz em poder conhecer melhor e
que com certeza colaborou para o meu conhecimento musical e cultural; à minha
mãe, que sempre incentivou os meus estudos; e às minhas irmãs, que aguentaram
as minhas reclamações não só dentro de casa, mas também enquanto
trabalhávamos!
Agradeço também a todos os integrantes da minha banda pela compreensão
quando eu precisei trabalhar na minha monografia e até me ausentar em alguns
momentos e por me ouvirem, empolgada, contando a história de cada um dos
cantores que estudei enquanto lia suas biografias. Em especial ao meu namorado,
que, além disso, também foi muito compreensivo com o meu tempo limitado e que
se envolveu diretamente no meu estudo, pesquisando e conversando comigo sobre
os assuntos.
Why are they never satisfied with
all you give?
You give them your all
They‟re watching you fall
And they eat your soul like a
vegetable
Michael Jackson (Monster)
RESUMO
O presente estudo tem como objetivo analisar a contribuição das Relações
Públicas no gerenciamento de crise de imagem no segmento musical por meio do
estudo de dois casos: no Brasil, Wilson Simonal e nos Estados Unidos, Michael
Jackson. Ele também busca fazer uma breve comparação entre o desenvolvimento
das Relações Públicas nos dois países. Para isto, mostra-se adequado um resgate
dos conceitos básicos de identidade, imagem, reputação e opinião pública, assim
como a apresentação de conteúdos relacionados ao gerenciamento de crise de
imagem, gestão de marca pessoal, assessoria de imprensa, media training e
celebridades. O trabalho aponta alguns aspectos de cunho biográfico a respeito dos
cantores estudados e aponta as diferenças e semelhanças entre as duas crises de
imagem. São apresentadas, então, sugestões exemplificando a contribuição que as
Relações Públicas poderiam fazer em ambos os casos, levando em consideração o
contexto de cada um. Percebe-se uma grande discrepância entre as duas culturas
frente ao gerenciamento de crise de imagem no segmento musical e uma
oportunidade de crescimento, no Brasil, para as Relações Públicas nesta área.
Palavras-chave: Relações Públicas. Crise de imagem. Gerenciamento de crise.
Michael Jackson. Wilson Simonal.
ABSTRACT
The aim of this study is to analyze the contribution of the Public Relations in
the crisis management in the music business by studying two cases: in Brazil, Wilson
Simonal and in the United States, Michael Jackson. It also intends to make a brief
comparison of the development of Public Relations in both countries. For that, it is
adequate to review the basic concepts of identity, image, reputation and public
opinion, as well as presenting contents related to crisis management, personal
branding, press agency, media training and celebrities. This paper highlights some
biographical aspects concerning the singers that were studied and shows the
differences and similarities between the two crisis. Suggestions are, then, presented
exemplifying the contribution that the Public Relations could make in both cases,
considering their contexts. It is noticed a large discrepancy between the two cultures
when concerning the crisis management in the music business and also an evolution
opportunity, in Brazil, for the Public Relations in this field.
Palavras-chave: Public Relations. Crisis. Crisis management. Michael Jackson.
Wilson Simonal.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................... 9
2 GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM E GESTÃO DE MARCA
PESSOAL ........................................................................................................ 12
2.1 IDENTIDADE, IMAGEM E REPUTAÇÃO ......................................................... 12
2.2 OPINIÃO PÚBLICA .......................................................................................... 15
2.3 GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM .................................................. 19
2.4 GESTÃO DE MARCA PESSOAL ..................................................................... 22
3 ASSESSORIA DE IMPRENSA, MÍDIA E CELEBRIDADE .............................. 28
3.1 ASSESSORIA DE IMPRENSA ......................................................................... 28
3.2 MEDIA TRAINING ............................................................................................ 35
3.3 MÍDIA E CELEBRIDADE .................................................................................. 39
4 WILSON SIMONAL, MICHAEL JACKSON E AS RELAÇÕES PÚBLICAS ... 44
4.1 WILSON SIMONAL .......................................................................................... 44
4.2 MICHAEL JACKSON........................................................................................ 53
4.3 A CONTRIBUIÇÃO DAS RELAÇÕES PÚBLICAS NOS CASOS WILSON
SIMONAL E MICHAEL JACKSON ................................................................... 59
5 CONCLUSÃO .................................................................................................. 65
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 69
APÊNDICE A ................................................................................................... 75
9
1 INTRODUÇÃO
De acordo com a autora brasileira Kunsch (1997), a atividade de Relações
Públicas tem se tornado cada vez mais fundamental nas organizações modernas do
país, graças ao aumento da preocupação referente às relações sociais por parte
delas. Simões (2007, p. 17), também desta nacionalidade, explica as Relações
Públicas como uma “função organizacional, implicando, portanto em gestão, quer
seja da comunicação organizacional ou da relação de poder entre organização e
seus públicos”.
Por outro lado, o autor estadunidense Cameron (2014) descreve as Relações
Públicas como a prática de gerenciar o fluxo de informações entre um indivíduo ou
uma organização e seus públicos, com o objetivo de persuadi-los a possuir um certo
ponto de vista a respeito do assessorado.
A curiosidade em relação à existência de uma dissonância entre Brasil e
Estados Unidos em seu uso das atividades de Relações Públicas, especialmente
para o assessoramento de pessoas, levou a autora a escolher este tema. Devido à
sua proximidade com o segmento musical e ao seu interesse na área de gestão de
crises, ela escolheu estudar especificamente o gerenciamento de crise de imagem
no segmento musical.
Por meio deste trabalho, busca-se: Analisar a interferência do trabalho de
Relações Públicas na construção da imagem pessoal; Analisar o processo de
gerenciamento de crise de imagem a partir de Forni (2013) e Dornelles (2012);
Compreender o trabalho de media training a partir de Lucas (2007), Assad e
Passadori (2009) e Barbeiro (2011); Analisar o processo de gerenciamento de
imagem de Wilson Simonal e Michael Jackson; Comparar Wilson Simonal e Michael
Jackson frente à mídia em momentos de crise.
Para ser possível realizar-se uma comparação, entre nações, relativa ao tema
a ser pesquisado, selecionou-se um caso polêmico ocorrido com um músico do
Brasil e um, com um músico dos Estados Unidos. Os artistas escolhidos foram
Michael Jackson, estadunidense com acusações de pedofilia, e Wilson Simonal,
brasileiro considerado apoiador da ditadura em um momento delicado na política
nacional.
Ainda que seja difícil fazer uma relação entre os casos, dada a diferença do
desenvolvimento das Relações Públicas nos dois países nas épocas estudadas e o
10
momento singular em que ocorreu o caso brasileiro (durante o governo militar),
acredita-se que há algumas semelhanças relevantes entre as duas crises, a serem
analisadas neste trabalho, que acabam colaborando para o estudo.
Realizou-se uma entrevista despadronizada com Max de Castro, filho de
Wilson Simonal, no dia 17 de novembro de 2014, com duração aproximada de uma
hora e 30 minutos. Buscou-se obter a visão do cantor a respeito do caso ocorrido
com seu pai, visto seu envolvimento direto com o assunto e, também, o fato de ele
estar inserido no mercado musical. Ela foi realizada via Skype, já que Max de Castro
se encontrava no estúdio Na Cena em São Paulo/SP, local onde trabalha com
publicidade. Este tipo de entrevista se caracteriza por perguntas genéricas ou
abertas realizadas em uma conversa de cunho informal para que o entrevistado
tenha mais liberdade em suas respostas (BASTOS, 2009).
Os métodos de pesquisa utilizados neste estudo são variados. A autora faz
pesquisas bibliográficas e documentais para a obtenção da opinião de diferentes
autores brasileiros e estadunidenses sobre o tema escolhido, principalmente em
relação ao tema “celebridades”, já possibilitando uma análise das visões dos
estudiosos em ambas as culturas. Beuren, citado por Lopes (2006) aponta que a
técnica de pesquisa “baseia-se em materiais que ainda não receberam um
tratamento analítico ou que podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da
pesquisa” (BEUREN, 2003, p. 89 apud LOPES, 2006, p. 220). Já em relação à
pesquisa bibliográfica, Tozoni-Reis (2010, p. 42) ainda explica que “vamos buscar,
nos autores e obras selecionados, os dados para a produção do conhecimento
pretendido”, realizando um debate entre estas fontes, sem a busca de dados
primários.
Para realizar a comparação entre as crises de imagem analisadas, além do
estudo da biografia dos artistas, a autora se vale, também, da técnica de análise
fílmica de um documentário sobre Wilson Simonal. A ideia “É despedaçar [...]
materiais que não se percebem isoladamente „a olho nu‟, uma vez que o filme é
tomado pela totalidade”, explicam Goliot-Lété e Vanoye (1994, p. 15).
Autores como Forni (2013), Dornelles (2012), Levine (2003) e Lucas (2004)
sustentam as discussões sobre gestão de crise de imagem. Na área de media
training, recorre-se a Lucas (2007), Passadori (2009), Rau (2010) e Walker e
Todtfeld (2008). No que se refere a celebridades, Rüdiger (2008), Turner (2014) e
Herschmann e Pereira (2003) subsidiam as referências teóricas.
11
A presente monografia é desenvolvida em três capítulos. O primeiro capítulo
aborda o gerenciamento de crise de imagem e a gestão de marca pessoal. No
segundo capítulo, busca-se analisar o trabalho de assessoria de imprensa e media
training, assim como a relação da mídia com as celebridades. No terceiro capítulo, a
ênfase é dada ao gerenciamento de crise de imagem artística e aos casos Wilson
Simonal e Michael Jackson, discorrendo-se sobre a colaboração das Relações
Públicas nos casos citados.
Devido a pouca quantidade de conteúdo produzido no Brasil relacionado à
gestão de imagem pessoal e/ou artística, acredita-se que este estudo é capaz de
colaborar com futuras pesquisas sobre o assunto. O tema escolhido é visto como
inovador, capaz de trazer à tona uma lacuna existente na atuação dos profissionais
de Relações Públicas no país e de gerar novas reflexões por parte do mercado
brasileiro de Comunicação.
12
2 GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM E GESTÃO DE MARCA PESSOAL
O presente capítulo discorre a respeito dos conceitos de identidade, imagem
e reputação segundo diversos autores. Ele também busca definições de opinião
pública e apresenta o processo de formação desta. Apresenta-se como executar o
gerenciamento de uma crise de imagem e também a gestão de marcas pessoais.
2.1 IDENTIDADE, IMAGEM E REPUTAÇÃO
Para compreendermos o conceito de imagem e reputação de marcas,
devemos também conhecer o significado de uma identidade. De acordo com Kotler
(2000, apud VÁSQUEZ, 2007, p. 219): “A identidade está relacionada com a
maneira como uma empresa visa identificar e posicionar a si mesma e seus
produtos”. Ela é a base a partir da qual a marca será construída, é o seu
direcionamento e posicionamento. A identidade de uma marca é quem define seus
objetivos e define quais as ações deverão ser tomadas para que a marca signifique
um conceito (VÁSQUEZ, 2007). Para a autora (2007), a identidade deve possuir
algumas características para que efetivamente cumpra o seu papel, conforme tabela
abaixo.
Tabela 1 – Princípios para que a identidade cumpra seus propósitos.
Princípio: Descrição:
Única e intransferível.
Toda identidade pertence a uma marca
específica. Não existem duas marcas com a
mesma identidade. Um produto pode ser copiado,
mas é muito difícil copiar sua identidade.
Atemporal e constante.
A identidade não tem tempo nem limite de
validade. No entanto, ela deve ser constante no
tempo. Marlboro sempre representou
individualidade, força e masculinidade por meio
do personagem do caubói.
Consistente e coerente.
A identidade deve ser sólida em seus elementos
constitutivos, ao mesmo tempo em que deve
existir correlação entre eles, sendo congruentes e
compatíveis entre si.
13
Objetiva e adaptável.
A identidade deve ser direta em seus propósitos e
sua comunicação adaptada de acordo com seu
público-alvo.
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir de Vásquez (2007).
Mais objetivamente, podemos caracterizar a identidade de uma organização
como sendo uma manifestação de diversos fatores, tais como:
[...] nome, logomarca, slogan/lema, pessoas, produtos, serviços, instalações, folheteria, uniformes e demais peças que lhe dão visibilidade e que são por ela criadas e comunicadas a diversos públicos. (MACHADO, 2007, p. 48).
Tajada (1994, apud VÁSQUEZ, 2007) já aponta a identidade de uma marca
como parte essencial da comunicação, uma vez que as atividades desta área irão
ter como base aquele fator. Segundo ele, a comunicação, elemento transmissor,
teria o papel de codificar esta identidade para que houvesse, então, uma distribuição
para os públicos-alvo. A finalidade disto seria a construção de uma imagem
condizente com esta identidade.
Seguindo um pensamento afim, Iasbeck (2007) percebe a identidade como
proveniente do processo de comunicação, em que há alguém responsável por enviar
um discurso e seu receptor. Desta maneira, deve-se administrá-la, mantendo o
controle deste discurso, sempre tendo em vista dados de pesquisas de imagem.
Assim, Tajada (1994, apud VÁSQUEZ, 2007) destaca ser de causa e efeito a
relação entre identidade e imagem. A identidade seria a causa, que, comunicada,
resultaria em um efeito, neste caso, a imagem percebida:
A identidade é a concepção que a marca tem de si mesma; a imagem é a maneira pela qual o público concebe a marca. A identidade se constrói internamente; e a imagem, externamente. A identidade é objetiva; a imagem é subjetiva e simbólica. A imagem se configura com base na identidade; a identidade precede a imagem. A identidade e a imagem de marca diferem em forma e conteúdo, porém, o vínculo entre elas é a comunicação (TAJADA, 1994, apud VÁSQUEZ, 2007, p. 209).
A partir disto, haveria, então, duas possibilidades para o resultado do
processo de comunicação dessa identidade: uma imagem que coincide com a
identidade da marca (chamada comunicação ideal) ou uma que não atinge este
resultado (comunicação distorcida) (TAJADA, 1994, apud VÁSQUEZ, 2007).
14
A imagem, diferentemente da identidade, depende da percepção dos
públicos. Ela pode variar de acordo com cada um deles, com sua maneira de
interpretar a mensagem recebida, e deverá refletir a identidade organizacional
(MACHADO, 2007). Carvalho (2008, p. 379) explica: “Podemos entender imagem
como a percepção, a imaginação da compreensão sobre determinada pessoa ou
organização. É o simbólico, conjunto de experiências, impressões, crenças,
sentimentos e conhecimentos”. O desafio se encontra, assim, em buscar o
alinhamento entre aquilo que a organização é e aquilo que ela representa para cada
um de seus públicos, criando, preservando e realizando a manutenção desta
imagem (MACHADO, 2007).
Para Iasbeck (2007), a fim de que se constitua uma imagem é preciso haver
uma relação comunicativa entre aquele que percebe e a marca em si. É a partir disto
que ocorrerá a criação de uma elaboração mental: a interpretação da junção das
informações que se tem a respeito da organização com os dados já existentes no
imaginário do receptor.
Porém Machado (2007) afirma que, mesmo sem haver uma interação entre os
públicos e a organização, as percepções a respeito dela já existem. Isto porque as
pessoas podem receber estímulos relativos a esta organização por meio de leituras,
de conhecidos que tiveram contato com a marca e de símbolos visuais. Ainda assim,
a autora explica que esta impressão pode se modificar após uma efetiva relação
com a organização.
Quando esta imagem é percebida de forma negativa, a reputação da
empresa/organização/pessoa é prejudicada. Isto recebe grande relevância uma vez
que o que se vende são as associações ligadas àquela marca, e não um simples
produto. Uma crise de imagem acaba por afetar diretamente a credibilidade e a
confiança dos públicos na marca (VÁSQUEZ, 2007).
A reputação vai além da imagem, da identidade e da comunicação de marca
de uma organização, que definem como se é visto, quem se é e o que se projeta de
si. Ela é construída em longo prazo, buscando-se cumprir e confirmar os
compromissos que são propostos em sua marca (ALMEIDA; BRITTO, 2012).
Ainda analisando a reputação frente à imagem, Jablin (2001 apud IASBECK,
2007) e Flynn (2007 apud IASBECK, 2007, p. 91) defendem a ideia de que “a
reputação é formada por juízos de caráter lógico e alicerçada em argumentos,
opiniões e até mesmo convicções, crenças consolidadas”. Já a imagem, para
15
Iasbeck (1998 apud IASBECK, 2007) e Costa (1999 apud IASBECK, 2007) se forma
a partir de sensações e estímulos. Logo, a reputação pode ser vista como o “indício
formado que a imagem projetou” (CARVALHO, 2008, p. 379).
No subcapítulo a seguir, explora-se o conceito de opinião pública, uma
consequência dos aspectos recém-abordados de identidade, imagem e reputação.
2.2 OPINIÃO PÚBLICA
A opinião pública é um fenômeno em constante movimento. Ela se adapta ao
tempo, aos valores e à ética vigentes. De acordo com a evolução da história, ela
pode se moldar e mudar de direção, modificar conceitos e preconceitos.
Torquato (2002) aponta que a mobilidade, a heterogeneidade e a dispersão
no espaço, característicos da sociedade de massas, constituem a opinião pública.
De acordo com Blumer (1978), a massa está fisicamente separada e não é capaz de
discutir e tomar decisões de forma integrada, possui uma organização frágil. Suas
características, segundo o autor são:
Em primeiro lugar, seus participantes são originários de quaisquer profissões e de qualquer categoria social, podendo incluir pessoas com diferentes situações de classe, vocações diversas, múltiplas vinculações culturais e diferentes níveis de riqueza material. [...] Em segundo lugar, a massa é um grupo anônimo, ou melhor, é composta por indivíduos anônimos. Em terceiro lugar, existe pouca interação ou troca de experiência entre os membros da massa. (BLUMER, 1978, p. 177-178).
Devido a pouca interação entre seus membros, os integrantes da massa
acabam por agir em resposta àquilo que recebem de informação a respeito do objeto
em questão. Estas pessoas desenvolvem mais o seu senso crítico e autoconsciência
pois não recebem estímulos diretos provenientes da interação com outros
(BLUMER, 1978). Porém, eles podem ser influenciados por, por exemplo, artistas
com capacidade de compreensão a respeito destas pessoas e com o poder de
expressar estes sentimentos captados.
Mas, para que haja um objeto em vista, ele precisa estar em evidência.
McCombs (2009) afirma que nossas percepções são influenciadas diariamente pelas
notícias selecionadas pelos editores e diretores. O autor diz que o que o público
sabe é a partir de uma realidade de segunda-mão, estruturada pela agenda pública
e criada a partir dos relatos dos jornalistas. Desta maneira, explica Lippmann (1922,
16
apud MCCOMBS, 2009), a opinião pública não se forma do ambiente em si, mas sim
de um pseudoambiente formulado pelos veículos de comunicação.
Chegamos, assim, ao conceito da Teoria da Agenda, que defende que as
notícias veiculadas pela mídia acabam sendo vistas como mais importantes pela
audiência (MCCOMBS, 2009):
Figura 1 – A definição da agenda pelos veículos de comunicação de massa –
Agenda-setting.
Fonte: Figura elaborada pela autora a partir de McCombs (2009).
Torquato (2002, p. 68) acompanha o pensamento da Teoria da Agenda
quando afirma que “[...] a opinião pública inexistiria se não houvesse uma tuba de
ressonância a propagar as ondas de pensamento. Portanto, a grande base de
lançamento da opinião pública é a estrutura da indústria da comunicação [...]”.
Segundo o autor, os meios de comunicação se tornam responsáveis por difundir os
fatos ambientais, que, ao chegarem ao conhecimento público, refletem-se em
cadeias de opinião.
Por outro lado, Wey (1986) acredita que a audiência dos veículos de
comunicação de massa recebe de forma quase passiva as informações e opiniões
divulgadas. Para ela:
A ação individual se traduz em escolhas que se fazem em resposta a impulsos e sentimentos vagos, despertados pelo objeto de seu interesse, característica das massas; por isso, pode ser influenciada pelas sugestões persuasivas dos meios de comunicação. (WEY, 1986, p. 25).
17
A psicologia e a história das pessoas, suas crenças, princípios, valores e
estereótipos vão definir a maneira como elas percebem e julgam os acontecimentos.
E isso é o que vai acabar determinando a opinião pública (TORQUATO, 2002).
A formação da opinião pública se dá em quatro fases (CESCA, 2006). Na
primeira, surge uma controvérsia, que gera certo incômodo nas pessoas e as faz
sentir a necessidade de uma discussão. Na segunda, são usados os meios de
comunicação para se realizar estes debates públicos, buscando definir esta
controvérsia.
Em um terceiro momento, surge uma opinião comum, criada a fim de
representar todas as opiniões expressadas na discussão pública, mas que não
representa, necessariamente, a opinião da maioria. Por fim, há uma ação conjugada
(CESCA, 2006).
Figura 2 – O processo de formação da opinião pública.
Fonte: Figura elaborada pela autora a partir de material disponibilizado na disciplina de Teorias de
Opinião Pública em 2012/2.
Cesca (2006) explica que para que ocorra a discussão pública é necessário
que não haja posições muito rígidas das pessoas em relação ao assunto, como no
caso de fanatismo. Blumer (1978) se aproxima da visão de Cesca (2006) a respeito
18
do resultado do debate quando afirma que a opinião pública é um produto coletivo.
Ela é representada pela tendência central entre forças antagônicas:
Como tal, não constitui uma opinião unânime com a qual cada membro do público está de acordo, não sendo também forçadamente a opinião da maioria. Ao se constituir em termos de opinião coletiva, pode ser (e em geral é isso que ocorre) diferente da opinião de qualquer dos grupos do público (BLUMER, 1978, p. 184).
O autor ainda acrescenta que a opinião pública está sempre no caminho para
uma decisão. Porém ela nunca chega a ser unânime.
A importância da opinião pública para uma empresa se dá a partir do
momento em que há um trabalho de relações públicas para conhecer estas
necessidades dos públicos e atendê-las. Estas atividades serão capazes de prever
as tendências dos públicos, colaborando para o gerenciamento da personalidade do
assessorado visando tanto seus próprios objetivos quanto a satisfação das
expectativas dos públicos (WEY, 1986).
A atividade de Relações Públicas, segundo Simões (1995, p. 96-97), recebeu
uma definição geral no chamado Acordo do México de 1978. Ele buscou explicá-la
de forma a estar de acordo com todas as associações de relações públicas. Assim,
a atividade de Relações Públicas seria responsável por algumas funções,
enumeradas na tabela a seguir.
Tabela 2 – Em que consiste a atividade de Relações Públicas.
1) Analisar as tendências da organização em relação às expectativas de interesses dos
públicos, no contexto da conjuntura em que ambos estão inseridos;
2) predizer a resultante do entrechoque da ação organizacional ante as expectativas
dos públicos no âmbito da evolução da conjuntura;
3) assessorar os líderes da organização, prevenindo-os das possíveis ocorrências de
conflito e suas causas, apresentando sugestões de políticas e procedimentos que
evitem e/ou resolvam o impasse;
4) implementar programas e projetos planejados de comunicação para com os vários
públicos.
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir de Simões (1995).
Grunig (2009, p. 82) define público como sendo “sempre um grupo
especializado e cujos membros têm interesse específico nas atividades e
comportamentos de organizações”. Além disso, o público é um grupo que se une
19
espontânea e naturalmente, tendo como sua marca a existência de uma questão,
que será discutida, gerando uma opinião coletiva (TORQUATO, 2002).
É preciso estar atento para a divulgação de informações para os públicos.
Quando eles não possuem os dados necessários para conseguirem fazer o seu
julgamento, a tendência é que se crie uma imagem negativa do objeto em questão.
Quem não se preocupa em criar, projetar e manter uma manutenção de uma
imagem favorável estará mais sujeito ao fracasso frente à opinião pública quando
surgirem situações adversas (WEY, 1986).
Com uma opinião pública desfavorável, pode-se enfrentar uma crise de
imagem. No subcapítulo a seguir analisa-se o conceito e o gerenciamento destas
crises.
2.3 GERENCIAMENTO DE CRISE DE IMAGEM
As crises podem surgir dos simples altos e baixos de uma organização e
normalmente estão relacionadas à imagem e à reputação. Segundo Forni (2013, p.
8), crise é “uma ruptura na normalidade da organização; uma ameaça real ao
negócio, à reputação e ao futuro de uma corporação ou de um governo”. Por isso, se
torna imprescindível que seja construída uma boa reputação para a marca ao longo
de sua existência, a fim de se consolidar uma boa imagem. Para que isto se
concretize, é preciso se tornar relevante para os seus públicos, cativando seus
sentimentos. Esta atividade, de construção de uma reputação, é chamada Reputting:
o processo de criar/reforçar os laços de confiança entre a organização e seus
stakeholders.
Podemos compreender “organização” como sendo “[...] um sistema aberto,
pelo que é influenciada e influencia o ambiente externo no qual se situa. Pertencem
a esse ambiente os públicos e todas as dimensões conjunturais da sociedade maior”
(SIMÕES, 1995, p. 54-55). Ela possui objetivos específicos e funciona com pessoas
desempenhando papeis determinados.
Já os stakeholders são “[...] as categorias gerais de pessoas que são afetadas
por consequências reais ou potenciais das decisões organizacionais estratégicas”
(GRUNIG, 2009, p. 84). Ou, ainda, como pessoas que possuem algum interesse na
organização (CARROLL, 1989, apud GRUNIG, 2009).
20
Atualmente a comunicação entre os públicos de uma organização pode ser
considerada como uma teia, em que as informações reverberam por meio de linhas
invisíveis. Caso se esteja buscando um bom índice de credibilidade ou a prevenção
de crises, é importante que se calcule esta reverberação (LUCAS, 2004). De acordo
com Lucas (2004), não basta ser uma marca de peso no mercado para garantir a
ausência de momentos ruins para os negócios da organização, é preciso se criar
uma postura empresarial, o hábito de evitar que acontecimentos internos ou
externos interfiram na imagem desta marca.
Com a nova mídia, porém, o risco é cada vez maior. A imprensa têm
demostrado interesse em vigiar empresas e autoridades e tornar público aquilo que
antes era por poucos conhecido (FORNI, 2013).
Quanto mais visíveis se tornam as pessoas públicas – e as empresas – mais vulneráveis também ficam. Mais interesse da mídia, da opinião pública, da sociedade. Quanto mais você se expõe, mais olhares para julgar seu comportamento. (FORNI, 2013, p. 49).
É o que acontece com celebridades, por exemplo. A exposição excessiva
pode, por um lado, colaborar para o seu sucesso, mas, por outro, tornar grande a
possibilidade de um erro vir à tona e manchar sua biografia. A área da comunicação,
neste caso, se torna responsável por fazer o equilíbrio entre essa grande exposição
e a diminuição das aparições de seu assessorado (FORNI, 2013).
Dornelles (2012) afirma que é comum encontrarmos casos de má gestão de
crises de imagem hoje em dia, ainda que a existência delas seja reconhecida pelos
diferentes tipos de organizações. De acordo com a autora (2012), há
comportamentos comuns às empresas que cometem tais erros, descritos na tabela a
seguir.
Tabela 3 – Comportamentos comuns às empresas que fazem má gestão de crises
de imagem.
O elemento surpresa.
A falta de hábito de lidar com a mídia.
A carência de informações destinadas aos diferentes públicos envolvidos.
A forma negativa como seus impactos se propagam.
A incomum curiosidade da mídia acerca de episódios das mais diferentes características.
21
A mobilização da opinião pública e dos governantes.
A perda de controle das iniciativas em relação ao fluxo de informações.
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir de Dornelles (2012).
Ao encontro disto, Forni (2013) afirma que a prevenção é parte do processo
de gestão de crise, e não um ato isolado. Para o autor (2013, p. 66), todo este
processo conta com momentos por ele determinados como “a prevenção, a
preparação, o desenvolvimento do fato negativo, seguido da resposta à crise
(comunicação) e da recuperação ou pós crise”. Ele definiu os elementos básicos
para uma boa gestão de crise e definiu-os como sendo:
[...] um plano de crise simples e flexível; a necessidade de liderança; um porta-voz preparado; a identificação e a necessidade de estabelecer relação com os diversos stakeholders, principalmente os envolvidos na crise; o timing da resposta, que não comporta alternativa, a não ser a rapidez; finalmente, o plano de comunicação, levando em conta, prioritariamente, a comunicação interna e a relação com a mídia (FORNI, 2013, p. 109-110).
Toda empresa precisa saber identificar potenciais crises e necessita realizar
um levantamento de suas fraquezas e seus riscos. Isto tem de ser introduzido na
cultura das organizações para que, assim, a partir das informações levantadas, elas
sejam capazes de definir a atitude correta a ser tomada caso algumas destas
vulnerabilidades se torne o fator de uma crise (FORNI, 2013).
Dornelles (2012) acredita, por sua vez, que a gestão de crise é composta por
três fases, denominadas: planejamento, gerenciamento e retomada. No primeiro
momento, antes de a situação sair da esfera privada, é preciso estar atento à
opinião do público a respeito da organização, realizando um levantamento e
planejando os rumos da comunicação organizacional e das ações de relacionamento
com o público. Quando chega o momento em que a informação se torna pública, o
momento da crise de imagem, o foco da área de comunicação deve estar no correto
posicionamento da organização frente ao ocorrido e na busca de uma recuperação
para seus stakeholders. Por fim, chega a fase de retomada, em que a empresa
deverá buscar conhecer novamente a situação da opinião pública em relação a ela e
criar ações estratégicas de comunicação com todos os diferentes públicos.
Para se administrar uma crise é preciso saber tudo aquilo que é falado a
respeito da organização. Assim, é importante que se realize um clipping, composto
por todas as publicações presentes na mídia (impressa ou eletrônica) que façam
22
referência à marca. Estes materiais devem ser catalogados e analisados na primeira
hora do dia para que, no início da manhã, sejam discutidos no comitê de crise
(FORNI, 2013).
Além disto, é necessária também a realização de um mapeamento de
públicos. Deve-se definir qual o público é prioritário e com quais também será feito o
contato, em um segundo ou terceiro momento. Segundo Dornelles (2012), cada
cenário pode exigir um mapeamento diferente, com uma sequência diferente.
O principal papel da comunicação de crise acaba sendo a elaboração de uma
versão oficial para ser comunicada para a população em geral. Forni (2013) explica
que esta mensagem deve ser transparente, mas, principalmente, não deve deixar
brechas para que a imprensa faça interpretações equivocadas ou desconstruções.
É preciso tomar cuidado com a subestimação da imprensa. Ignorá-la ou não
dar a ela a devida importância durante um período de crise pode piorar o quadro e
causar danos quase irreversíveis. Em momentos de entrevista, pressa, mentiras,
fuga de perguntas mais difíceis e respostas mal-educadas não irão colaborar para
ajudar a reerguer a imagem da organização (FORNI, 2013).
Aprofundando mais o presente estudo, discorre-se, no subcapítulo a seguir, a
respeito da gestão de marca pessoal.
2.4 GESTÃO DE MARCA PESSOAL
Uma marca pessoal é a imagem que surge na mente das pessoas quando
pensam a respeito de alguém. Ela se caracteriza por refletir as qualidades, os
valores, a personalidade e os diferentes fatores que fazem a pessoa a quem dizem
respeito ser singular (MONTOYA; VANDEHEY, 2010).
De acordo com Montoya e Vandehey (2010) as pessoas criam expectativas a
respeito do outro quando conhecem a sua marca pessoal. Ela representa a sua
reputação, o reflexo do seu caráter (CHRITTON, 2014). Chritton vai ao encontro dos
autores anteriormente citados quando vê a marca pessoal como um elemento que
mostra a autenticidade de quem ela diz respeito. A autora afirma que esta marca vai
ser definida também pela maneira como os outros se lembram desse profissional,
por meio de suas ações e de como as pessoas se conectaram emocionalmente com
ele.
23
A marca pessoal dá ao profissional a oportunidade de conhecer e mostrar o
seu valor único. Por meio dela ele será capaz de se destacar no seu trabalho e
frente ao seu público (CHRITTON, 2014). Sendo bem utilizadas, as marcas pessoais
possuem o poder de trazer sucesso profissional (MONTOYA; VANDEHEY, 2010).
De acordo com os autores, ela é capaz de assimilar o seu nome a um produto, com
uma imagem diferenciada e qualidades únicas. Por meio da marca pessoal é
possível atrair públicos mais elitizados e mantê-los consigo mesmo em momentos de
baixa no mercado.
Para conhecer, posicionar e gerenciar uma marca pessoal (personal
branding), é preciso seguir diversas etapas. De acordo com Chritton (2014), o
primeiro passo a ser seguido é definir quem se é. O segundo, também citado por
Bender (2009), é conhecer seus principais públicos, para que suas ações estejam de
acordo com as expectativas deles. Chritton (2014) também diz que é necessário ter-
se conhecimento acerca da concorrência e, depois de tudo isso, definir um perfil
para a marca pessoal, que aponte a sua promessa de valor única.
Bender (2009) também discorre sobre o fator diferenciação:
Ser diferente e ter valor, representar um conceito, uma palavra na mente dos que estão à sua volta, é o maior desafio. [...] Um adjetivo que resume todos os seus esforços, toda a sua „batalha‟, toda a sua dedicação e seus anos de estudo (BENDER, 2009, p. 54).
Para o autor, ter foco no trabalho de construção de marca pessoal é encontrar
este atributo, este conceito que traga visibilidade e diferenciação ao profissional.
Segundo ele, esta é a principal meta do trabalho de gerenciamento de marca
pessoal.
O comportamento, as interações sociais, a aparência, emitem sinais a
respeito de si todo o tempo. As roupas e acessórios são exemplos de fatores de
formação de imagem da marca. De acordo com Bender (2009, p. 58), elas causam
fortes impressões a respeito de quem as veste, comunicando que a pessoa é “um
sujeito moderno, um sujeito clássico, um cara que curte a vida ao ar livre”, por
exemplo.
As roupas fazem parte do “ecossistema de marca”, segundo Chritton (2014).
Ele é constituído por todo elemento capaz de gerar uma percepção do público que
se tem como alvo a respeito da marca pessoal. Além do vestuário, também fazem
24
parte deste “ecossistema” a aparência de todo material relacionado à marca (cartão
de visita, site, etc.), o momento de carreira em que a pessoa se encontra, sua rede
de relacionamentos e como é a sua performance em sua atual atividade/local de
trabalho.
Bender (2009) explica que a imagem que deve ser transmitida precisa ser
condizente àquilo que se é. Sabendo o que se deseja transmitir, tem-se de ser
coerente e se sentir bem com a decisão.
Nesse território, uma gestão eficaz de marca pessoal, que saiba controlar os sinais certos e acionar os mecanismos corretos, fará toda a diferença entre vencedores e perdedores, entre estrelas do segmento e anônimos que morrerão profissionalmente, invisíveis. (BENDER, 2009, p. 53).
Para que haja uma boa comunicação desta marca, Chritton (2014) pontua
alguns fatores a serem trabalhados. Em primeiro lugar, precisa-se escrever a história
desta pessoa, então, expressar a sua marca pessoal em todos os seus meios de
comunicação tradicionais. Depois se deve, também, fazer uma comunicação de
marca nos meios digitais, na internet. Por último, torna-se importante ter um plano
de comunicação para esta marca.
Para se começar um trabalho de gestão de marca pessoal, a definição de
objetivos é um dos primeiros e mais importantes passos (BENDER, 2009). Precisa-
se fazer questionamentos continuamente a fim de se filtrar decisões e de se
visualizar um rumo para as ações, escolhendo os caminhos mais adequados. Caso
contrário, se está trilhando uma história com tentativas e erros, sem garantias, e
causando nos outros a impressão de que se está completamente perdido.
Na elaboração dos objetivos, é ideal que estipulemos prazos e metas bem
específicas. Desta maneira, criamos certo compromisso e urgência. Obrigamo-nos a
adaptar o nosso dia-a-dia de maneira que trabalhemos para atingir o que desejamos
(BENDER, 2009).
Bender (2009) defende que, para a gestão de marca pessoal, deve-se
comportar como empresa.
O investimento estratégico é avaliar suas forças e fraquezas. É observar os sinais que a sua marca está emitindo na sua rede de relações. É adotar uma postura crítica sobre os seus movimentos e as suas atitudes diárias. É pensar como uma empresa. É pensar no curto prazo e também no futuro da sua marca pessoal. É pensar em sustentabilidade. É pensar como as grandes marcas: em perpetuação de valor. (BENDER, 2009, p. 92).
25
Atualmente as marcas se encontram em um momento de conformismo,
tornando-se muito similares umas às outras. Este aspecto é visto como uma
oportunidade de se destacar determinada marca, criando uma relação diferenciada
com o próprio segmento e com a sociedade (BENDER, 2012). Tanto para marcas
pessoais quanto para corporativas, para se atingir o sucesso deve-se trazer algo
novo ao mercado. Assim, cria-se valor. Desta maneira, os profissionais que se
sobressaem são aqueles que encontram uma lacuna em seu segmento e buscam
preenchê-la. Para isto, reforça Bender (2009), precisa-se escolher um atributo que
represente esta pessoa.
Esta qualidade deve ser única e serve para aumentar o valor da diferença.
Marcas pessoais com esta força de DNA são vistas, por exemplo, nos grandes
astros, que se apegam a um de seus atributos e o mantêm presente em todo
trabalho que fazem, fazendo-o trabalhar a seu favor (BENDER, 2009). Apropriando-
se desta diferença, o profissional alcança uma posição inatingível, um domínio desta
imagem de marca.
É importante que se aprenda com os momentos difíceis e que se mantenha o
foco. Bender (2009) afirma que os profissionais, tanto em momento de estabilidade
quanto de sucesso momentâneo, tendem a esquecer de realizar uma autoavaliação
e, consequentemente, de manter um trabalho junto à sua marca pessoal. Situações
de fracasso, comenta o autor, mostram-se como grandes oportunidades para se
revisitar a imagem da sua marca pessoal e se repensar suas ações.
A partir disto, a marca criada, juntamente com o negócio, terá um significado
ainda maior do que os dois isoladamente, indo além do segmento em que se atua.
Este trabalho de construção de marca, quando realizado com persistência, obtém
uma coerência e uma consistência, atrelando à mente das pessoas aquele
significado até o momento em que ele passa a pertencer a elas, não dependendo
mais de quem a criou (BENDER, 2012).
A respeito de celebridades, Bender (2009) afirma que elas investigam seus
atributos e seu valor percebidos por parte de seus públicos. A partir destas
pesquisas, será possível encontrar a posição da celebridade frente a concorrentes e
obter subsídios para vender sua imagem. Além disso, com uma análise das
informações coletadas, pode-se corrigir sua imagem pública criando uma estratégia
de marca.
26
Pode-se entender esta estratégia como a forma de se ir do ponto em que se
está até onde se quer chegar. Ela está relacionada às forças que serão utilizadas
para isto, ao tempo que se leva e ao lugar. O que irá diferenciar a estratégia das
táticas a serem utilizadas é que estas estão relacionadas ao curto prazo, enquanto
aquela, ao longo (BENDER, 2009).
Bender (2009) também ressalta a importância dos relacionamentos para o
trabalho de gerenciamento de marca pessoal. Segundo o autor, o sucesso desta
marca depende, cada vez mais, da capacidade do profissional de gerar confiança
nos outros. A rede de relações é interdependente com marcas capazes de fortalecer
ou danificar umas às outras.
Bender (2009, p. 241-261) sugere, assim, dez leis relativas aos fatores mais
importantes para um trabalho de gestão de marca pessoal.
Tabela 4 – Dez leis que determinam a vida ou a morte para uma marca
pessoal.
Lei Descrição
1. O valor está na diferença Se você se diferencia, ganha valor; se você
se iguala, vira mediano.
2. Ser tudo é não ser nada Você precisa representar alguma coisa na
mente da audiência.
3. Cultive um defeito Ao contrário das marcas corporativas, em que
seria impossível cultivar um aspecto negativo
do produto, nas marcas pessoais isso torna a
marca mais próxima de todos nós.
4. Construa uma história Essas histórias embalam nossos sonhos
pessoais, dão colorido à relação que temos
com a marca e estabelecem laços mais
fortes, além do mero consumo.
5. A imagem pessoal é apenas uma
parte do processo
Nenhum produto no mundo vende somente
pela embalagem. Você precisa saber
comunicar sua diferença, sua promessa de
valor, e também como chegar lá.
6. Entenda a lógica do seu mercado Compreender a lógica que envolve sua
audiência e descobrir quem são seus
públicos.
27
7. Sinergia é vital em personal branding Os produtos se vão, os serviços terminam,
mas as experiências perduram para sempre
na mente do consumidor.
8. Jamais subestime a audiência Você jamais vai conseguir enganar todo
mundo durante muito tempo. Sempre tome
como parâmetro a ética e a verdade,
respeitando seus princípios e valores.
9. Crie uma defesa como a do porco-
espinho
Os porcos-espinhos simplificam um mundo
complexo e o transformam numa única ideia
organizadora, um princípio básico ou um
conceito que unifica e orienta tudo.
10. Faça alguma coisa da qual se orgulhe
no futuro
Fazer alguma coisa da qual nos orgulhemos
no futuro talvez seja a mola propulsora mais
influente para qualquer virada na carreira.
Fonte: Tabela elaborada pela autora a partir de Bender (2009).
Com a apropriação dos conceitos de identidade, imagem, reputação e opinião
pública e tendo-se abordado a gestão de crises de imagem e de imagem pessoal,
apresenta-se, no capítulo a seguir, uma revisão teórica acerca da assessoria de
imprensa e, mais especificamente do media training, discorrendo-se, ao final, a
respeito da relação entre mídia e celebridades.
28
3 ASSESSORIA DE IMPRENSA, MÍDIA E CELEBRIDADE
O presente capítulo discorre a respeito dos conceitos, atribuições e aplicação
da assessoria de imprensa e do media training. Ele também faz um resgate breve da
história das Relações Públicas e da assessoria de imprensa. Por fim, procurou-se
discorrer a respeito da mídia a partir de conceitos como espetáculo e sociedade de
massa e se relacionou os meios de comunicação com a celebridade, também a
conceituando.
3.1 ASSESSORIA DE IMPRENSA
Podemos compreender a atividade de assessoria de imprensa como sendo
responsável pelas informações que circulam entre fontes de informação e imprensa,
assim como pela gestão do relacionamento entre os dois. A função do assessor de
imprensa é suprir as demandas existentes de informações sobre uma fonte ou
organização (DUARTE, 2010). De maneira simplificada, ela representa a ligação
entre uma empresa/entidade/organização e os veículos de comunicação
(EID;VIVEIROS, 2007).
Kopplin e Ferrareto (2009, apud LOPES, 2003, p. 11) citam duas
características básicas da assessoria de imprensa: “a necessidade de divulgar
opiniões e realizações de um indivíduo ou grupo de pessoas e a existência de um
conjunto de instituições conhecido como meios de comunicação”. Hoje percebemos
esta dependência uma vez que, para legitimarmos um acontecimento, é muito
importante que o tornemos público por meio da mídia, obtendo a aprovação da
sociedade e o tornando real para audiência, para a opinião pública (MONTEIRO,
2010).
É importante que, para manter a legitimidade de uma assessoria de imprensa
como representantes de uma empresa ou organização, ela sempre trabalhe com
foco em sua credibilidade. Do contrário, estará rompendo com um relevante valor
em relação ao seu papel frente à sociedade (EID; VIVEIROS, 2007).
A assessoria de imprensa pode ajudar a empresa ou instituição a reconhecer
ameaças e instabilidades no segmento antecipadamente, permitindo que o
assessorado estabeleça um planejamento estratégico que esteja de acordo com as
expectativas de seus públicos. Para exercer sua função, a assessoria de imprensa
29
pode funcionar de três diferentes maneiras. Ela pode ser instalada dentro da
organização, tendo seu espaço bem definido no organograma; ser contratada de
forma terceirizada; ou ainda funcionar de maneira mista, em que parte de suas
atividades é realizada dentro da organização, parte fora (LOPES, 2003).
Duarte (2010) lista os diversos produtos e serviços de uma assessoria de
imprensa, de acordo com a figura a seguir.
Figura 3 – Produtos e serviços de uma assessoria de imprensa.
Acompanhamento de
Entrevistas
Administração da AI
(Assessoria de Imprensa)
Análise do Noticiário
Apoio a Eventos
Apoio a outras áreas
Arquivo de Material
Jornalístico
Artigos
Atendimento à Imprensa
Estar próximo durante a entrevista, ajudar a verificar o desempenho da fonte, os interesses do jornalista, resolver algum problema ou dúvida e evitar armadilhas do entrevistador ou erros do entrevistado.
Ter habilidades, conhecimentos e postura de gerente em alguns momentos para administrar toda a Assessoria de Imprensa.
Avaliar sistematicamente as informações veiculadas nas diferentes mídias.
Ajudar no planejamento tendo em vista as possibilidades e interesses dos veículos de comunicação.
Colaborar na integração dos trabalhos das diferentes áreas dentro da organização.
Ter informações consolidadas e de acesso fácil.
Elaboração de artigos para a organização, visto que tais têm boa aceitação nos veículos de comunicação.
Garantir um atendimento adequado e a manutenção de uma convivência cordial com os jornalistas.
30
Auditoria de Mídia
Avaliação dos Resultados
Briefing
Brindes
Capacitação de Jornalistas
Clipping e Análise
de Noticiário
Concursos
Contatos estratégicos
Entrevistas coletivas
Caracterizar com precisão e profundidade em determinado momento específico o posicionamento da imprensa com relação à organização e suas fontes ou temas.
Caracterizar a atuação e resultados obtidos no relacionamento entre organização e imprensa em determinado período.
Elaborar documento de síntese e orientação sobre um tema para ajudar a fonte a se preparar para uma entrevista ou situação específica.
Selecionar e administrar de forma cuidadosa os brindes. Às vezes a oferta pode ser entendida como uma tentativa de ”comprar” a boa vontade.
Treinar jornalistas a respeito de uma área específica.
Identificar sistemática e rotineiramente na imprensa as citações sobre a organização ou temas previamente determinados, organizá-las, avaliá-las e encaminhar ou deixar à disposição para conhecimento dos interessados.
Instituir concursos para premiação de jornalistas promovendo, indiretamente, a aproximação com a imprensa e a organização.
Manter uma rotina de contatos regulares com as redações, evitando basear a ligação no envio de releases, produto cada vez mais desgastado.
Convocar jornalistas de diferentes órgãos em momentos específicos em que há um assunto de real interesse. As redações normalmente buscam por exclusividade.
31
Fotos
Jornal Mural
Mailing ou
Cadastro de Jornalistas
Manuais
Monitoramento
Pauta
Planejamento
Press Kit
Publieditorial
Contratar fotógrafo ou tirar fotos para acompanharem materiais como releases, publicações institucionais, relatórios, etc.
Criar jornais murais com políticas de uso bem estabelecidas para informação do público interno.
Listar e-mails de jornalistas e veículos de interesse da assessoria.
Elaborar manuais para uniformizar procedimentos da equipe.
Acompanhar sistematicamente as informações veiculadas sobre a organização, fontes e temas de interesse.
Sugerir assuntos a um ou mais jornalistas com a intenção de que se transforme em notícia.
Identificar posições, objetivos e interesses (públicos e reservados), estabelecer metas e planejar formas de atingi-las.
Reunir materiais que serão entregues como apoio a jornalistas durante uma cobertura, lançamento, coletiva, visita, buscando informar sobre determinado assunto.
Produzir material pago para ser veiculado sob a forma de matéria jornalística.
32
Fonte: figura elaborada pela autora a partir de Duarte (2010).
Segundo Chaparro (2010), a atividade de assessoria de imprensa foi criada
nos Estados Unidos em 1906 pelo jornalista Ivy Lee, responsável por fundar, junto
disto, as Relações Públicas:
Com um bem-sucedido projeto profissional de relações com a imprensa, a serviço de um cliente poderoso, Ivy Lee conquistou, por direito e mérito, na história moderna da comunicação social, o título de fundador das relações
Relatórios
Release
Site
Textos em Geral
Treinamento de Fontes (media
training)
Veículos Jornalísticos
Visitas Dirigidas
Produzir relatórios para a avaliação permanente da atuação e demonstração dos resultados obtidos da Assessoria de Imprensa.
Elaborar material informativo com formato jornalístico produzido especificamente para servir de pauta ou informação à imprensa.
Manter o site atualizado como fonte de consulta para a imprensa, com materiais fotográficos, vídeos, informações, gráficos e outros.
Colaborar na elaboração de textos para o assessorado como palestras, relatórios e folhetos.
Capacitar a fonte para compreender e atender às necessidades do jornalista e aproveitar melhor as oportunidades de exposição.
Participar no projeto editorial e gráfico e acompanhar a produção dos veículos institucionais.
Realizar visitas a fim de aproximar os jornalistas da organização.
Produzir material pago para ser veiculado sob a forma de matéria jornalística.
Produzir relatórios para a avaliação permanente da atuação e demonstração dos resultados obtidos da Assessoria de Imprensa.
Elaborar material informativo com formato jornalístico produzido especificamente para servir de pauta ou informação à imprensa.
Manter o site atualizado como fonte de consulta para a imprensa, com materiais fotográficos, vídeos, informações, gráficos e outros.
Colaborar na elaboração de textos para o assessorado como palestras, relatórios e folhetos.
Capacitar a fonte para compreender e atender às necessidades do jornalista e aproveitar melhor as oportunidades de exposição.
Participar no projeto editorial e gráfico e acompanhar a produção dos veículos institucionais.
Realizar visitas a fim de aproximar os jornalistas da organização.
33
públicas, berço da assessoria de imprensa. Ou vice-versa. (CHAPARRO, 2010, p. 4).
Amaral (2010) explica que, ao longo do tempo, os americanos foram se
tornando verdadeiramente obcecados por propaganda, relações públicas e
assessoria de imprensa. De acordo com o autor, todos procuram especialistas para
orientá-los, desde empresas e produtos até políticos e artistas (iniciantes ou
consagrados). Os profissionais destas áreas os orientam em seu comportamento em
geral: nas vestes, naquilo que falam, na forma como apresentam os produtos.
No Brasil, alguns acontecimentos históricos interferiram no desenvolvimento
da atividade de assessoria de imprensa. O governo Vargas, em 1938, foi o pioneiro
estabelecendo um serviço de atendimento à imprensa (LOPES, 2003). Em 1964, as
Relações Públicas entraram em desenvolvimento no país e, junto delas, as
atividades de assessoria de imprensa (CHAPARRO, 2010). Porém este momento
colidiu com o golpe militar de 1964, que estabeleceu um regime ditatorial no Brasil,
fato que acabou afetando diretamente este crescimento (EID; VIVEIROS, 2007).
Durante a ditadura, o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) se
encarregava de garantir que a mídia estivesse sempre enaltecendo a figura de
Vargas. Desta maneira, os profissionais que trabalhavam em repartições públicas
buscavam esconder fatos da imprensa e viam os jornalistas como inimigos. Por
causa disto, até hoje ainda há empresas que demonstram desconfiança quando
procuradas por jornalistas, afetadas pelo histórico do país (LOPES, 2003).
Tendo sido danificado o desenvolvimento de suas atividades no Brasil por
causa da ditadura, a assessoria de imprensa passou a fazer parte de um
reposicionamento de governos, empresas e instituições a partir da
redemocratização, em meados dos anos 80 (EID; VIVEIROS, 2007). Neste
momento, os jornalistas passaram a defendê-la na Fenaj (Federação Nacional dos
Jornalistas) e nos sindicatos (BRANDÃO; CARVALHO, 2010).
Dado o histórico, podemos considerar as assessorias de imprensa como algo
relativamente novo no Brasil. Martinez (2010) afirma que a sociedade ainda está
tomando consciência da importância de uma imagem bem construída a partir de
pesquisa, informação, comunicação e ações coordenadas: “ainda há grande
incompreensão em relação ao trabalho das assessorias de imprensa, tanto por parte
de quem contrata como de quem é contratado” (MARTINEZ, 2010, p. 195).
34
No Brasil, os jornalistas foram estimulados a entrar no mercado de trabalho
das assessorias, uma vez que criticavam a competência dos relações públicas para
exercer tal atividade. Duarte (2010) aponta que repórteres e editores preferem
trabalhar com profissionais que compreendam suas necessidades e defende que
apenas quem teve experiência em redação entende o pensamento de um editor e
como é fechar uma matéria, podendo manter relacionamentos mais eficientes e
duradouros com estas equipes. Ele explica que os jornalistas conquistaram este
espaço com facilidade, pois sabiam quais eram os interesses da imprensa e
dominavam seu funcionamento. O autor, no entanto, afirma que, mesmo que o
mercado das assessorias de imprensa esteja representado, em sua maioria, por
jornalistas, não significa que apenas estes profissionais tenham competência ou que
não haja jornalistas com dificuldade em exercer esta atividade.
Lopes (2003) também acredita que os jornalistas estejam mais preparados
em alguns aspectos para a realização de um trabalho de assessoria de imprensa.
Segundo o autor, é preciso que se tenha amplo conhecimento do comportamento da
programação de televisão e rádio e das editorias dos jornais, assim como boas
técnicas de redação empresarial, para que se prepare um release, por exemplo.
Brandão e Carvalho (2010, p. 179) apresentam outra visão a respeito da
execução da atividade de assessoria de imprensa. Eles dizem que representa uma
“distorção ética e a perda da dimensão política e social da profissão de jornalista”
afirmar que esta função só possa ser exercida por jornalistas:
Assessor de comunicação ou de imprensa não é “coleguinha” e, quer tenha formação em jornalismo, relações públicas, marketing, publicidade ou física quântica, quando está na empresa exerce as funções de relações públicas. (BRANDÃO;CARVALHO, 2010, p. 179).
França (2004) complementa que a única habilitação da comunicação que
tenha em mente um planejamento estratégico do relacionamento de uma
organização com todos os seus públicos, tendo objetivos claros de curto, médio e
longo prazos e que vise resultados premeditados são a de relações públicas. O
autor explica que a atividade de Relações Públicas se diferencia da mídia transitória
uma vez que:
[...] essa pode dar visibilidade efêmera à organização, enquanto a comunicação de relações públicas carrega consigo mensagens que visam
35
formar racionalmente o conceito positivo sustentável da organização e criar um clima favorável de negócios. (FRANÇA, 2004, p. 195).
No próximo item analisa-se mais profundamente um dos aspectos citados
neste: o media training, sua importância e seu uso adequado.
3.2 MEDIA TRAINING
Como parte do trabalho de assessoria de comunicação, o media training
prepara o entrevistado para lidar com a mídia. A partir deste treinamento, a pessoa
deverá saber se comportar diante de jornalistas e ser capaz de conduzir uma
entrevista. Serão realizados exercícios que estimulem o aperfeiçoamento da
articulação do discurso e o assessorado será preparado para, por exemplo, falar
com objetividade e saber para onde olhar enquanto ocorre uma filmagem. Estas
instruções irão diminuir as possibilidades de erros e de constrangimentos por parte
do entrevistado (ASSAD; PASSADORI, 2009).
De acordo com Assad e Pasadori (2009), a assessoria de comunicação vai
além da assessoria de imprensa. Ela trabalha com a administração de informações
para todos os públicos do assessorado, e não apenas para a imprensa.
Eid e Viveiros (2007) afirmam que o media training esclarece aos executivos
as características de cada uma das mídias, como jornal, revista, rádio e televisão, e
mostra como lidar com cada uma delas por meio de treinamentos práticos. Ele deve
ser feito em um primeiro momento, não apenas na necessidade de uma crise. Desta
maneira, a empresa passa a possuir um programa de segurança. Esta qualificação
ajuda a desenvolver a relação com os diferentes públicos e com a própria opinião
pública (ASSAD; PASSADORI, 2009).
Investir em um bom relacionamento com a mídia ajuda em momentos de
crises, em emergências de comunicação e no combate aos boatos:
A divulgação sistemática dos fatos relevantes da vida da empresa e suas marcas não só permite que a opinião pública e os jornalistas a conheçam – podendo, assim, construir uma muralha de credibilidade capaz de impedir que acreditem em qualquer boato pernicioso -, como também cria uma interface permanente com a imprensa, facilitando o diálogo e os esclarecimentos necessários. (NOGUEIRA, 2007, p. 24).
36
Boatos são informações, verídicas ou não, que buscam convencer e
que têm uma propagação em cadeia. Eles normalmente estão relacionados a
acontecimentos recentes e se baseiam em alguma verdade (KAPFERER, 1993).
Segundo Nogueira (2007), a mídia pode ser considerada um “público-meio”,
uma vez que representa uma intermediação entre alguém e seus públicos, tendo a
capacidade de influenciar fortemente a opinião pública. Por causa deste poder, ter
uma relação fluente com a mídia se torna de uma importância vital para qualquer
companhia. Barbeiro (2011) acrescenta que a imprensa, por causa desta influência
que exerce, é capaz de construir uma admirabilidade em relação a uma marca,
contribuindo para a credibilidade dela.
Falta às empresas um preparo estratégico para se comunicarem em
diferentes cenários e para todos os públicos. Esta capacidade, a interação com a
sociedade e a transparência têm se mostrado importantes já há algum tempo. As
corporações precisam alinhar seus interesses com as demandas da sociedade por
meio de um relacionamento estratégico com a mídia (ASSAD; PASSADORI, 2009).
Esta falta de preparo acaba refletindo em momentos como calar-se quando
é necessário um pronunciamento, o maior pecado na relação com a imprensa. Por
isto, é recomendado que seja feito um treinamento com o porta-voz antes de
momentos de crise. Desta forma, se obtém uma vantagem, com a confiança dos
jornalistas e a abertura de espaços na mídia para explicações (ASSAD;
PASSADORI, 2009).
De acordo com Nogueira (2007), quando uma empresa ignora essa
necessidade de interagir com a imprensa ela pode estar perdendo visibilidade para a
concorrência, além de não ter a oportunidade de divulgar os fatos que deseja ou
explicá-los, deixando os veículos propagarem suas próprias versões. Schiavoni
(2007, p. 47-48) enfatiza: “A relação entre as empresas e a opinião pública deixou
de ser um gesto magnânimo. Trata-se de uma obrigação. Nunca deixe sem resposta
questionamentos de jornalistas”.
Barbeiro (2011) afirma que os negócios e a mídia se encontram atrelados um
ao outro, atualmente, fato que mostra que quem não quiser se mostrar, vai acabar
sendo exposto de qualquer maneira por outros meios. Não existe mais uma
informação que seja reservada apenas para uma elite, que seja escassa.
Segundo Assad e Passadori (2009), o atual media training deve criar porta-
vozes com determinada capacidades, conforme a tabela a seguir.
37
Tabela 5 – Atributos dos porta-vozes treinados com o Media Training do Terceiro
Milênio.
Responder com clareza e objetividade;
Fornecer informações com precisão;
Atender à imprensa com disponibilidade de dados;
Conhecer o assunto abordado;
Compreender o que é notícia;
Comunicar com segurança, sem medo e desconforto;
Identificar o que é importante para a matéria do veículo de comunicação;
Demonstrar espontaneidade diante dos jornalistas e públicos;
Dosar o que pode e o que não pode ser dito;
Estar à disposição da imprensa e cumprir os horários e eventos marcados com os jornalistas;
Conhecer as características e a dinâmica da empresa de comunicação em questão;
Excluir a hipótese de utilizar a assessoria de imprensa como escudo;
Atender a públicos e jornalistas com todos os atributos mencionados também nos momentos
de crise.
Tabela criada pela autora a partir de Assad e Passadori (2009).
Tojal (2007) acredita que se estando preparado para falar com os públicos e
sabendo-se relacionar com a imprensa, é possível evitar crises e também utilizar
estas capacidades para aprimorar-se a própria carreira e projetos de vida. Segundo
Assad e Passadori (2009), é recomendado que qualquer pessoa que vá fazer um
treinamento de mídia avalie se é capaz de elaborar conteúdos com início, meio e fim
para apresentar e de atrair e manter a atenção da sua audiência. Também se indica
que esta pessoa tenha criatividade e um bom vocabulário que seja, ao mesmo
tempo, compreensível para aqueles que irão escutá-lo. Schiavoni (2007, p. 48)
completa: “Em suma, o perfil da fonte ideal contempla qualidades como objetividade,
consistência, assertividade e didática”.
Assad e Passadori (2009) citam mais alguns atributos que se tornam
necessários quando se vai falar na mídia, estando presentes nos treinamentos. Um
deles é a boa aparência, que colabora para a aceitação de quem será entrevistado e
faz parte de sua apresentação. As expressões e gestos também influenciam na
percepção que se tem a respeito de alguém, eles são indicadores de sua
personalidade e estado de espírito. Quando se vai falar, é muito importante que
também se escute o entrevistador. Aqueles que interrompem perguntas não são
38
respeitados, da mesma forma, quando têm a palavra. Além disso, o entrevistado
deve compreender que fala “com o jornalista” e não “para o jornalista”, o foco do seu
discurso deve estar no público, podendo ser utilizada a dimensão emocional para
promover empatia.
Thielmann (2007) afirma que gestos podem atrapalhar a entrevista se forem
muito insistentes, desviando a atenção do telespectador. De acordo com a autora, é
preciso ter-se cuidado com os sinais dados pelo corpo, ele também faz parte da
comunicação na televisão. Eles podem desmentir aquilo que se está dizendo.
Barbeiro (2011) complementa que imagem e fala devem estar integrados, visto que
muitas vezes aquela transmite mais mensagens do que esta.
As roupas também merecem certa atenção quando se vai fazer uma aparição
na televisão. Cores muito claras podem refletir a luz e acabar mostrando mais
marcas no rosto daquele que fala. Já o marrom tende a deixar aquele que o veste
com feições abatidas. O ideal é a utilização de cores mais escuras (THIELMANN,
2007). É preciso atenção também com estampas. Listras finas ou xadrez não devem
fazer parte da vestimenta para televisão uma vez que podem ativar uma vibração
visual que atrapalha o vídeo. Barbeiro (2011) também pede atenção em relação a
acessórios muito chamativos, que possam desvirtuar o foco da audiência.
O tom de voz é mais um aspecto a ser trabalhado em um media training.
Segundo Assad e Passadori (2009), um porta-voz precisa utilizar sua voz de
maneira leve, sempre pronunciando corretamente cada palavra. A forma influencia
no conteúdo que está sendo dito. Para Barbeiro (2011), deve-se relaxar a voz e
manter boas postura e respiração, estas estratégias ajudam a voz a ser externada
da maneira correta. O autor enfatiza que há um tom para ser utilizado em cada
situação e que o microfone amplifica os defeitos da fala, não se deve esperar
colaboração dele. Caso necessário, correções podem ser feitas com exercícios ou
ainda com tratamento fonoaudiólogo. Há programas de televisão que deixam de
convidar algumas pessoas devido à sua dificuldade.
Na entrevista, afirma Tojal (2007), há, muitas vezes, uma diferença de
interesses entre o repórter e o entrevistado. Enquanto este pode querer divulgar
informações que o repórter entende como não sendo relevante para o público do
veículo, aquele deseja obter declarações que o outro não pode ou não quer revelar.
Barbeiro (2011, p. 68) vai ao encontro desta ideia, caracterizando a entrevista como
39
“[...] um duelo intelectual entre o entrevistado e o jornalista. Este quer que aquele
fale o que não quer falar”.
Por outra ótica, Assad e Passadori (2009) não acreditam que a entrevista
deva ser vista como uma parte no ataque e outra na defesa. Para eles:
Diferentemente do que se pensa, uma entrevista não é um duelo travado entre o jornalista e a fonte. Mas não pense que repórter e fonte têm liberdade para tratamentos puramente amistosos, como se fossem amigos de infância. Os dois são aliados apenas na determinada circunstância do intercâmbio de informações de interesse público. (ASSAD; PASSADORI, 2009, p. 61-62).
Os momentos de crise são aqueles em que o entrevistado mais precisa focar
a sua mensagem. Lucas (2007) sugere que se tente fixar o primordial, as
informações a respeito do que está sendo feito e das soluções em curso, buscando
falar nisso desde o primeiro questionamento e repetindo a mensagem algumas
vezes ao longo da conversa. Schiavoni (2007) explica que estas seriam as key
messages: três a cinco pontos relevantes em que o entrevistado deseja se
aprofundar, por ele eleitos antes da entrevista.
A pessoa que dará a entrevista deverá treinar as key messages com sua
assessoria de imprensa para se preparar. Para Barbeiro (2011), obtém-se sucesso
quanto mais key messages são reproduzidas na reportagem.
De acordo com Lucas (2007), a maneira como se posiciona nas primeiras
horas após a crise poderá definir a reação da opinião pública e o destaque que a
imprensa dará ao fato. Por isso é importante que se esteja preparado para agir
imediatamente e transparecer esta preocupação para a opinião pública. Barbeiro
(2011) afirma que não se deve aceitar condenações por parte da mídia caso esteja
ocorrendo um processo, todos são inocentes até que a Justiça se posicione. Para
Lucas (2007), o que é possível ser feito é uma otimização da opinião pública por
meio da comunicação, revertendo efeitos da crise.
A seguir, observam-se mais aspectos a respeito da mídia e da relação das
celebridades com os meios de comunicação.
3.3 MÍDIA E CELEBRIDADE
O lazer como parte de uma cultura que prioriza o bem-estar e as
necessidades da vida privada em detrimento dos problemas de trabalho, da política
40
e da religião não é um fator que surge nos dias atuais. Ele já está em discussão há
muitos anos quando se fala em cultura de massa, uma cultura que segue os padrões
industriais, propagando-se de forma ampla para uma grande massa social (MORIN,
1997).
Dentro desta cultura, há um conceito de voyeurismo, que o caracteriza como
sendo um “[...]interesse intenso no que o outro, enquanto indivíduo suposto igual a
mim, faz e como o faz, diz e como o diz[...]” (CARNEIRO; CAMPOS; CORDEIRO,
2005, p. 4). Este prazer em observar a vida do outro inclui até seus sofrimentos, o
que causaria certo alívio no espectador em relação a suas próprias dores, uma vez
que ele toma conhecimento de frustrações alheias que são como as suas, ou até
piores (CRAVEIRO, [20-?]).
Morin (1997), afirma que na cultura de massa este voyeurismo se expande, o
espectador passa, então, a acompanhar fofocas e revelações a respeito da vida
privada de celebridades. Ele participa deste espetáculo, porém sempre de maneira
indireta, ele está muito próximo daquilo que vê, mas não pode tocar.
Este espetáculo se associa ao simulacro. O simulacro é uma representação
do real que acaba por tomar o seu lugar e por ser visto como tal. O espetáculo, por
sua vez, é este simulacro sendo criado para ser exposto, visando sua exibição para
o público. Estes dois fatores acabam por criar uma nova realidade:
A última consequência do mundo produzido como simulacro é a produção da própria consciência e identidade subjetivas como uma realidade virtual e fictícia: o Eu como drama da pessoa, a história como espetáculo midialmente concertado, o espírito subjetivo como irrealidade de uma ficção cenográfica. A reprodução do mundo como simulacro pressupõe o fim do sujeito e da história, o esvaziamento consumado da existência na ordem indiferenciada da cultura, concebida como segunda natureza ou natureza programada. (SUBIRATS, 1989, p. 66).
Herschmann e Pereira (2005) afirmam que as narrativas biográficas têm se
tornado um grande espetáculo graças à sua difusão nos meios de comunicação.
Este material se torna importante para os espectadores porque ele alimenta a
formação de comunidades, criando uma sensação de coletividade.
Aqueles que conseguem obter sucesso e tornam-se celebridades acabam
por, automaticamente, deixar sua privacidade e seu anonimato para trás. Segundo
Rojek (2001), a vida particular da celebridade acaba sendo, na cultura em que
vivemos, um domínio público, e é irônico o fato de estas pessoas dependerem do
41
reconhecimento público enquanto, ao mesmo tempo, suas principais reclamações
estão, muitas vezes, relacionadas à falta de respeito pela privacidade por parte da
sociedade. Para o autor, o público vê a criação da celebridade como algo que não
pertence a ela, uma vez que ela precisa da legitimação daquele.
Por meio da mídia, os espectadores passam a acompanhar a vida das
celebridades – assunto que será abordado no item quatro deste trabalho – de forma
a chegarem a acreditar que os conhecem. De maneira inconsciente, as pessoas
absorvem aquilo que veem e começam a encarar a celebridade como se fosse sua
amiga. Elas dividem suas vidas com ela, seus segredos e seus sonhos. Se, por um
lado, se está consciente de que, para o famoso, se é um completo desconhecido,
por outro, cria-se uma intimidade que elimina a timidez no momento do contato com
ele, algo que não ocorre quando se lida com outras pessoas que não se conhece e
não se tem esta intimidade (SCHICKEL, 2000).
As celebridades surgem graças à estrutura dos meios de comunicação, que
são responsáveis pela grande divulgação destas personalidades. A mídia utiliza
seus recursos para reforçar a imagem e fatos relacionados a elas (NERVO, 2008).
Segundo Turner (2014), a televisão, hoje, tem demonstrado, inclusive, o poder de
criar celebridades do nada, sem que se tenha nenhuma habilidade ou característica
extraordinária que seja capaz de atrair a atração do público.
Rüdiger (2008) afirma que o desenvolvimento dos meios de comunicação
ocorrido entre as duas Guerras colaborou para o surgimento da celebridade como
um fenômeno cultural. A celebridade moderna é vista como um produto da mídia,
seguindo, assim, seus repertórios e padrões (TURNER, 2014). Rojek (2001) aponta
que a maneira como se vê as celebridades nos meios de comunicação é uma
encenação e, por isso, elas são percebidas como mágicas, sobre-humanas.
Para Rüdiger (2008), o momento em que o famoso se torna celebridade é
quando a indústria cultural passa a explorar esta impressão com suas engrenagens
coletivas. Turner (2014) complementa explicando que uma figura pública vem a ser
uma celebridade quando o interesse da mídia começa a ser transferido do relato de
seu papel público para o de sua vida privada.
Esta observação do outro existe há muitos anos, faz parte da vida em
comunidade. Rüdiger (2008) comenta que o aprimoramento das comunicações
amplificou este fenômeno, mas não é o responsável pelo seu surgimento. Isto
42
acabou abrindo portas para uma massificação desta observação e para a utilização
dela para fins mercadológicos.
Pode-se observar a utilização das celebridades como marcas e de suas
imagens como produtos. Segundo Matta (2009), é preciso que se associe a
celebridade a bons atributos que devem ser lembrados pelo público no momento da
compra de CDs, DVDs e ingressos para shows, por exemplo. Assim como certos
produtos, algumas delas inclusive acabam sendo vistas como efêmeras e
perecíveis.
A celebridade precisa ser, em algum nível, comum. Ter raízes humildes, por
exemplo, cria algumas similaridades com a audiência e a faz identificar-se com
aquela (KRIEKEN, 2012). Esta personalidade não possui poder institucional, ela
mesma é uma criação da indústria cultural, mas também participa de um processo
de consumo uma vez que compartilha dos problemas da sociedade, aparentando
uma certa banalidade e acessibilidade (RÜDIGER, 2008).
A celebridade de hoje se diferencia dos heróis que antes se destacavam em
meio a uma sociedade. Rüdiger explica:
Os chamados heróis assim o eram porque, em tese ao menos, faziam-se por conta própria. As celebridades parecem ser, ao invés, criação da mídia. Aqueles se tornavam famosos por serem pessoas extraordinárias, essas por serem nomes da moda ou em evidência publicitária. Os primeiros faziam-se a si mesmos, ao menos em parte; as segundas são feitas e desfeitas, sobretudo, pelo negócio das comunicações. Os heróis eram extraordinários; as celebridades são cotidianas e banais [...]. (RÜDIGER, 2008, p. 6-7).
Turner (2014), porém, afirma que a imprensa, a televisão, mostram a
celebridade como uma qualidade inata, como se apenas alguns indivíduos especiais
a possuíssem e elas fossem descobertas pela indústria de caça-talentos. Por outro
lado, a literatura acadêmica vê as celebridades como o produto de diversos
processos culturais e econômicos. Para estes estudiosos, há uma indústria de
celebridade responsável por promovê-las e divulgá-las, fazendo parte da forma
como a mídia funciona atualmente. O autor ainda cita Marshall (1997 apud
TURNER, 2014), que percebe a celebridade como um mecanismo que conecta
consumidor, capitalismo, democracia e individualismo.
Boorstin (1971 apud TURNER, 2014) afirma que a celebridade é o
equivalente humano de um pseudo-evento. Ela é fabricada pela mídia e sua
43
efetividade é avaliada de acordo com sua visibilidade na mídia. Uma aparição
pública desta pessoa se torna menos glamorosa e memorável se não há os flashes
dos fotógrafos, ainda que estes profissionais estejam cobrindo momentos comuns
como a saída ou chegada para um dia de trabalho.
Esta presença dos chamados paparazzi e suas fotos mostram o quanto estas
fotos das celebridades em sua vida cotidiana estão sem contexto ou, no mínimo,
criando um contexto próprio. Os tabloides criaram a demanda por este tipo de
cobertura midiática, mas hoje ela se expandiu para além deles. Mesmo que estes
jornais não estejam mais em evidência, o número de paparazzi apenas aumenta,
mostrando que a alma dos tabloides hoje está presente em todo o jornalismo
(SCHICKEL, 2000).
Da Matta (1979 apud HERSCHMANN; PEREIRA, 2005) aponta algumas
diferenças entre celebridades no Brasil e nos Estados Unidos. Enquanto os
americanos veem o sucesso apenas de maneira positiva, o brasileiro, com sua
cultura católica, o encara com maior dificuldade, sentindo-se até culpado. Além
disso:
Se, nos EUA, o culto às celebridades instaura uma hierarquia social numa sociedade de iguais, em países como o Brasil, marcados pelas desigualdades e exclusão social, a possibilidade de se tornar famoso (mesmo que de forma efêmera) representa, para as camadas menos privilegiadas da população, a obtenção, mesmo que temporária, da condição de cidadão. (HERSCHMANN; PEREIRA, 2005, p. 12-13).
No capítulo a seguir observa-se um caso dos Estados Unidos e um do Brasil
de crise de imagem no meio artístico, ambos envolvendo, de alguma forma, a
relação entre uma celebridade e a mídia.
44
4 WILSON SIMONAL, MICHAEL JACKSON E AS RELAÇÕES PÚBLICAS
O presente capítulo apresenta as biografias de Wilson Simonal a partir de
Alexandre (2009) e de Michael Jackson a partir de Porter (2007), com livre tradução
da autora. O capítulo também apresenta trechos da entrevista realizada pela autora
desta monografia com Max de Castro, filho de Simonal (APÊNDICE A) e discorre
sobre as crises de imagem ocorridas com os cantores e suas consequências.
Analisam-se as crises frente ao desenvolvimento das Relações Públicas no Brasil e
nos Estados Unidos e sugere-se uma possível contribuição desta atividade em
ambos os casos.
4.1 WILSON SIMONAL
Wilson Simonal foi um cantor brasileiro de muito sucesso nos anos 60 no
Brasil. Sua fama era comparável à de Roberto Carlos e o artista chegou a ser
elogiado por grandes nomes internacionais como Quincy Jones. Resumindo, no final
dos anos 60, Wilson Simonal, um negro, era o homem que todo mundo queria ser,
mesmo que o racismo ainda se fizesse muito presente na cultura brasileira. Porém,
uma sequência de episódios acabou mudando para sempre este cenário e o cantor
se tornou um fantasma na história musical do país, como se sua contribuição para a
música brasileira não existisse (ALEXANDRE, 2009).
Simonal nasceu no dia 23 de fevereiro de 1938 no Rio de Janeiro. Sua mãe
trabalhava como cozinheira na capital, para onde havia ido em busca de uma vida
melhor. Maria Silva de Castro era analfabeta e havia crescido em uma fazenda em
Minas Gerais. Seu pai, Lúcio Pereira de Castro, também vindo de Minas Gerais para
o Rio de Janeiro, trabalhava como radiotécnico. Era alfabetizado e tinha um perfil
mulherengo.
Segundo sua biografia escrita por Alexandre (2009), Maria precisou criar os
dois filhos sozinha, trabalhando como cozinheira em casas de famílias com maior
poder aquisitivo. Ela passava por muitas dificuldades, inclusive para conseguir
emprego, visto que alguns patrões não aceitavam empregados com filhos. Mesmo
assim, preferia que seus filhos crescessem convivendo com os filhos das famílias
ricas e naquele ambiente do que da maneira que ela foi criada.
45
Simonal abandonou os estudos na década de 50 para ajudar no orçamento
da família trabalhando. Trabalhou como “micropolícia” e também como mensageiro
de uma empresa de telégrafos. Até que um dia, cantando em uma atração de um
parque de diversões montado na praça Antero de Quental, ele conheceu Marcos
Moran e Edson Bastos. Este último era o filho de uma importante pianista, Alda Pinto
Bastos, que o ensinou a tocar violão e piano. Os três garotos começaram a pensar
em formar um grupo e a ensaiar juntos. Porém, nesta época, Simonal e Marcos
Moran foram chamados para o serviço militar.
Foi no exército que Wilson Simonal se descobriu como cantor. De acordo com
a ex-patroa de Maria, Bárbara Heliodora (SIMONAL..., 2009), o garoto tinha o desejo
de ser cantor, mas sua mãe não apoiava pois acreditava que a carreira no exército
era muito mais concreta, garantida.
Simonal montou o grupo com seus amigos Marcos Moran e Edson Bastos e
em maio de 1960 acabou deixando a carreira militar por conta do racismo que sofria
e se viu direcionado ao seu futuro musical. O grupo Dry Boys começou a aparecer
em programas de novatos e em algumas rádios e TVs do Rio de Janeiro. Porém,
com brigas constantes e frustrados com a dificuldade em obter sucesso, em 1961 o
grupo se dissolveu e Simonal iniciou sua carreira solo com o apoio de Carlos
Imperial, que comandava programas de rádio e televisão, era músico e trabalhava
com agenciamento artístico, com uma grande rede de contatos (ALEXANDRE,
2009).
Com a ajuda de Imperial, Simonal conseguiu assinar o seu primeiro contrato
com uma gravadora em 1961. Wilson Simonal já tocava nas boates cariocas quando
a gravadora Odeon lançou sua música Terezinha nas rádios populares. A música
havia sido escrita por Carlos Imperial com inspiração na sua namorada Tereza,
branca, filha de uma família de classe média. Tereza acabou se tornando, pouco
tempo depois, a namorada de Simonal.
Em 1963, Simonal começou a tocar em um dos principais pontos musicais do
Rio de Janeiro, o Beco das Garrafas, frequentado por jornalistas e pessoas
influentes:
[...] Wilson Simonal [...], quando surgiu no Beco, em 1963, provocou uma sensação que é hoje indescritível e talvez inacreditável. Ele era apenas o máximo para seu tempo: grande voz, um senso de divisão igual ao dos melhores cantores americanos e uma capacidade de fazer gato-sapato do
46
ritmo, sem se afastar da melodia nem apelar para os scats fáceis que eram a especialidade de Leny Andrade. (CASTRO, 2008, p. 362).
De acordo com a biografia do cantor (ALEXANDRE, 2009), neste mesmo ano,
Tereza engravidou. Os dois, então, casaram-se e, no ano seguinte, no dia seis de
abril, nasceu Wilson Simonal Pugliesi de Castro, “Simoninha”. O casal conseguiu
comprar um imóvel no Leblon e a família mudou-se para lá.
Em 1965, Simonal, Tereza e Simoninha foram viver em São Paulo por conta
de um convite da TV Tupi para o artista estrelar um programa. Já em 1966, o cantor
assinou um contrato com a TV Record. Ele estreou na emissora participando de um
programa chamado “O Fino da Bossa”, mas, ainda neste ano, a Record lançou o
programa “Show em Si...monal”, em que Wilson Simonal era a estrela principal e
onde ele conheceu o trio que o acompanharia por muitos anos: o Som Três
(ALEXANDRE, 2009).
1967 foi um ano de muito crescimento para a carreira de Wilson Simonal. Seu
programa na TV Record foi relançado com o nome “Vamos s‟imbora” e sua música
“Nem vem que não tem” o levou direto para o sucesso. O cantor já estava tão rico
quanto Imperial e tornara-se um ícone que todos queriam copiar. Ele se orgulhava e
fazia questão de mostrar que estava sempre bem-vestido, dirigia os melhores carros,
bebia os melhores uísques e namorava as louras mais desejáveis (ALEXANDRE,
2009).
No ano seguinte, nasceu a segunda criança do casal: Patrícia Pugliesi de
Castro. A imprensa aproveitou o fato para fazer as primeiras fotos públicas da
esposa de Simonal, com sua filha no colo. O cantor buscava não expor sua família
para poupá-la, porém, às vezes, seus esforços eram vencidos pelo assédio.
Alexandre (2009), afirma que a maneira como Simonal se portava e a forma
como ele chamava a atenção para sua ostentação colaboravam para sua fama,
mas, ao mesmo tempo, tiravam a atenção do público daquilo que era para ser o
motivo de tudo isso: a música.
Enquanto outros artistas, em 1968, eram presos e usavam a sua arte para
protestar contra o regime militar, Simonal zombava deste envolvimento dos cantores
com a política e não demonstrava se importar com os rumos da civilização:
1968 foi um ano terrível para Gil, Caetano e Chico, mas para Wilson Simonal e sua pilantragem foi triunfal. Um hit atrás do outro, cada vez maiores. Mais que um cantor, Simonal se afirmava como entertainer, que
47
divertia a plateia e a fazia cantar com ele, que contava com piadas entre uma música e outra. (MOTTA, 2000, p. 186).
Simonal mantinha uma agenda lotada, conforme afirma seu filho, Simoninha,
no documentário Ninguém Sabe o Duro que Dei: “Trezentos e vinte shows, ou
trezentos e quarenta shows, num ano. E isso eu estou falando 67, 68. Quer dizer, é
uma loucura” (SIMONAL..., 2009).
Um dos maiores feitos de Simonal ocorreu quando o cantor realizou o show
de abertura para Sergio Mendes no Maracanãzinho em 1969 para 30 mil pessoas.
Ele dominou o palco e o público, e houve pedido de bis mais de uma vez. A plateia
foi à loucura quando Simonal foi chamado ao palco durante o show principal da noite
e o que ficou marcado daquele dia foi que as pessoas que estavam no
Maracanãzinho ficaram mais empolgadas durante o show de abertura do que no
show de Sergio Mendes, já consagrado internacionalmente (ALEXANDRE, 2009).
Após o feito, Simonal assinou um contrato com a empresa Shell e o fato virou
notícia em diversos veículos. Foi considerado, na época, um dos maiores contratos
de publicidade já feitos no país. Por causa da grande quantidade de trabalho e de
circulação de dinheiro, o cantor criou, então, a Simonal Produções Artísticas, sua
empresa individual (ALEXANDRE, 2009). Em entrevista1 dada à autora deste
trabalho, Max de Castro, filho de Simonal, comenta sobre a Simonal Produções
Artísticas:
[...] era uma festa, todo mundo ia lá e pegava dinheiro, vales, e muitas pessoas ganharam dinheiro, assim, davam voltas nele, dizendo assim “ah, quanto é que custou o negócio?” “o negócio custou 200”, e na realidade tinha custado 80, era assim. As pessoas se aproveitavam muito dele e o ambiente desse escritório era essa coisa meio confusa e tal [...]. (Max de Castro, 2014).
E acrescenta, a respeito das pessoas na equipe que cercava Simonal:
Com certeza era o pior tipo delas [...]. Ele com certeza se juntou com pessoas que não eram as pessoas mais preparadas, com pessoas de confiança muito questionável [...]. (Max de Castro, 2014).
De acordo com Alexandre (2009), em 1969 Simonal lançou a música de maior
sucesso de toda a sua carreira no Brasil: País Tropical. Neste ano, o cantor estava
1 CASTRO, Max de. Sobre Simonal [17 nov. 2014]. Entrevistador: Alina Antunes da Cunha. Porto Alegre.
Entrevista realizada via Skype.
48
tão em alta que chegou a vender mais discos que Roberto Carlos. Sua segunda
apresentação no Maracanãzinho, desta vez encerrando o Festival Internacional da
Canção, deixou o público eufórico e aos gritos, Tony Tornado (cantor e ator)
comenta: “O Simonal não concorreu nesse festival, aliás. Ele fez o espetáculo no
meio do festival e arrasou. Foi aí que ele arrasou. Foi aí que ele causou a tal da
inveja. Foi aí que começou a bronca.” (SIMONAL..., 2009).
A revista O Cruzeiro, naquele tempo, chegou a fazer uma reportagem
inusitada criticando um aspecto presente na mídia: mesmo que Simonal fizesse
shows beneficentes e ajudasse crianças carentes, falava-se muito sobre a vida
privada e a prosperidade do cantor, mas praticamente nada a respeito de seus atos
de bondade. Até suas brigas com Tereza e saídas com outras mulheres iam parar
nas colunas de fofoca. Na realidade, a maior parte do que se falava na mídia a
respeito de Simonal não tinha relação com sua música, o cantor estava sofrendo de
uma superexposição (ALEXANDRE, 2009).
Para Artur da Távola, jornalista, o sucesso de Simonal não era visto com bom
olhos naquela época em que o preconceito ainda era muito presente: “Ele era como
aquele sujeito que se meteu a branco para os brancos da classe dominante, o que
era imperdoável.” (SIMONAL...,2009). Tony Tornado também percebeu movimentos
racistas: “Diziam que ele era um crioulo de nariz empinado e tal, pô, é porque ele
não aceitava um „sim senhor‟, „não senhor‟, né. Porque ele era autossuficiente ele
não precisava aceitar um „sim senhor‟, „não senhor‟” e completa: “ [...] o Simonal
tinha três Mercedes. Era demais pra um negão” (SIMONAL..., 2009).
Agora com sua empresa, Simonal continuava a ostentar carros e adquirir
imóveis e tudo ia para a contabilidade da Simonal Produções. O cantor estava em
um ótimo momento de sua carreira, então, em 1970, foi convidado para viajar com a
Seleção brasileira para a Copa do Mundo a ser realizada no México. Com sucesso
também no país da Copa, Simonal volta ao Brasil com grande sucesso, começando
a se distanciar dos músicos que o acompanhavam e a andar com pessoas antes
desconhecidas (ALEXANDRE, 2009).
Ainda segundo sua biografia (ALEXANDRE, 2009), após uma coletiva sobre
seu sucesso no México, Simonal foi ao escritório de sua empresa e encontrou
diversas cobranças e dívidas atrasadas. O cantor percebeu que a situação estava
fora de controle, demitiu alguns funcionários e contratou um novo contador para
49
organizar as finanças. Simonal nunca imaginou que pudesse empobrecer, visto que
tinha diversas fontes de receita. Mas Max de Castro, em entrevista, observa:
[...] no começo dos anos 70, 71, um show do Simonal tinha que ter umas orquestras um ballet, uma coisa assim, era um show de um grande astro da música e essas coisas custam caro, precisam ser bem administradas. Essas decisões artísticas têm que ser muito bem balanceadas com as decisões financeiras e administrativas, e isso era uma coisa que não havia. Não havia esse planejamento, as coisas foram sendo feitas, assim, meio ao sabor do tempo. (Max de Castro, 2014).
A partir deste momento o cantor começou a se incomodar. Acabou se
encrencando com os diretores da Globo por insistir em um contrato de acordo com
os seus desejos, perdeu os músicos que o acompanhavam por tratá-los mal, acabou
dispensando todos os funcionários da Simonal Produções por desconfiança e lançou
músicas e cantou em eventos nacionalistas, o que, naquela época, não era bem
visto: “Se o cara não protestasse contra, o cara automaticamente era um defensor
da causa e concordava com tudo que estava acontecendo.” (SIMONAL..., 2009),
afirma Max de Castro, filho de Simonal.
Raphael Viviani, seu novo contador que havia se mudado com a família de
São Paulo para o Rio de Janeiro para trabalhar na Simonal Produções, se viu sem
perspectiva de trabalho e entrou com um processo trabalhista contra Simonal
(ALEXANDRE, 2009).
Muito se falou a respeito do que ocorreu depois disto, mas ninguém sabe ao
certo. Segundo a biografia Nem Vem Que Não Tem (ALEXANDRE, 2009), Simonal
ficou com muita raiva de Viviani pelo processo e comentou o ocorrido com alguns
amigos seus do Departamento de Ordem Política e Social (DOPS - órgão de
repressão política da época da ditadura).
Na terça-feira à noite, 24 de agosto, dois policiais surgiram na casa de
Raphael Viviani, levados pelo motorista de Simonal, pedindo que o contador os
acompanhasse até o escritório para alguns esclarecimentos. Simonal os aguardava,
e lá os policiais pressionaram o contador para que ele assumisse ter desviado
dinheiro da empresa. Frente à negativa, os agentes levaram o acusado até a sede
do DOPS, entrando por uma porta lateral, não pela porta principal. Raphael Viviani
foi colocado em uma sala e espancado, até torturado com choques. Quando os
policiais ameaçaram ir buscar a família do contador, ele aceitou assinar um
documento de confissão (ALEXANDRE, 2009).
50
Dois dias depois, afirma Alexandre (2009), Raphael Viviani registrou uma
queixa contra Simonal e a notícia se espalhou, com a imprensa informando o
envolvimento do cantor em um crime relacionado ao DOPS. Simonal foi depor e
confirmou a história relatada em um documento assinado por ele e pelos policiais:
ele suspeitava que o contador fosse um terrorista que o estava ameaçando por
telefone e esta informação era recebida com credibilidade por parte dos agentes
porque Simonal já teria colaborado com o governo repassando informações a
respeito de movimentos subversivos no meio artístico: “E o Simonal foi mais ingênuo
ainda, e soberbo, e em vez de pedir desculpas disse à imprensa „é isso mesmo, eu
estou com os homens mesmo e todo mundo me adora...‟” (SIMONAL..., 2009), conta
Luiz Carlos Miele, produtor musical.
No início apenas os veículos mais alternativos focavam suas reportagens na
imagem de Simonal como informante. Os jornais normalmente exploravam a
afirmação do cantor a respeito de apoiar a direita (ALEXANDRE, 2009).
Entrevistado, Max de Castro explica o interesse de alguns em prejudicar a imagem
de Simonal, interesse este que ia além deste episódio pontual:
E aí isso tudo temperado com os ânimos quentes da época, temperado também com uma grande inveja e também um certo bode que algumas pessoas tinham dele na época, assim, dele ser um cara meio petulante, essa coisa do cara negro que anda bem vestido, de nariz empinado e que só anda de Mercedes, com loira, isso gerava um certo mal-estar. Então essa situação acabou sendo um prato cheio pra que essas pessoas que não simpatizavam com ele, que tinham esse pé atrás com ele, pudessem se ver livres da figura dele. (Max de Castro, 2014).
No dia 7 de setembro chegou às bancas uma edição de O Pasquim com uma
imagem de meia página de um dedo negro. A ideia de que Simonal seria um “dedo-
duro” começou a correr, a crescer, até, finalmente, tornar-se fato (ALEXANDRE,
2009). Artur da Távola, jornalista, comenta:
Isso traz à tona um problema que ocorre com a imprensa no Brasil e no mundo, hoje em dia, não é só no Brasil, não. É tomar o sintoma por indício, tomar o indício por fato, o fato por julgamento, o julgamento por condenação e a condenação por linchamento. (SIMONAL..., 2009).
Max de Castro, em entrevista à autora desta monografia, comentou sobre as
primeiras publicações do jornal O Pasquim:
51
A princípio O Pasquim, [...] era uma mídia alternativa [...] mas tinha um papel de formação de opinião muito importante e era onde o Simonal tinha uma grande antipatia. As pessoas, os jornalistas que trabalhavam no Pasquim, não simpatizavam com o Simonal porque ele representava muito o contrário dos ideais, era um jornal de esquerda [...] e eles viam no Simonal um cara vendido ao sistema, um cara que, ao invés de usar o sucesso dele, a popularidade dele, pra falar coisas importantes, ele era um cara que talvez estivesse usando isso pra fazer uma música comercial, e ele também não tinha uma posição muito clara se ele estava a favor ou contra naquela situação [...]. (Max de Castro, 2014).
De acordo com a biografia escrita por Alexandre (2009), entre os anos de
1971 e 1972 a música brasileira estava em um momento de mudanças e Simonal
também quis se reposicionar. Com o fim do contrato com a Odeon, ele assinou com
a gravadora Philips, mas o lançamento de seu primeiro disco com ela ocorreu
praticamente ao mesmo tempo em que um policial depôs reafirmando que Simonal
era informante do DOPS e trazendo à tona novamente a pauta na imprensa, o que
provavelmente foi uma das razões pelas quais não houve muitas vendas do álbum.
Ainda em 1972, nasceu seu terceiro filho, Maximiliano Simonal Pugliesi de
Castro. Dois anos mais tarde a família começou a ter problemas mais sérios.
Simonal e Tereza brigavam com mais frequência e ela precisou ser internada
diversas vezes por sofrer de transtorno bipolar (ALEXANDRE, 2009).
Simonal se lançou como cantor de samba em 1974 e ainda tinha um cachê
alto. No entanto quando uma música de seu novo álbum começou a ter uma boa
execução nas rádios, o cantor foi preso e levado ao Rio de Janeiro. O caso recebeu
grande repercussão na mídia e a prisão de Simonal foi acompanhada por diversos
veículos de comunicação. Ele foi solto apenas nove dias depois com a imagem de
delator ainda mais explorada e com a carreira em decadência (ALEXANDRE, 2009).
Em entrevista para este trabalho, Max de Castro afirma acreditar ter sido este o
momento crucial na crise de Simonal:
Aí que nego começou a boicotar mesmo, nego que trabalhava em rádio, em televisão. Ele começou a sofrer um boicote, a ser velado, a própria classe artística não simpatizava, assim, de estar envolvido em projetos que ele estava envolvido também e daí pra frente ele começou a ter sérios problemas, e aí que eu acho que mudou muito. (Max de Castro, 2014).
Alexandre (2009) afirma que Simonal possuía alguns amigos fiéis que o
defenderam ao longo dos anos. Mas mesmo que se tentasse provar na mídia a
inocência do cantor em relação às acusações de delator, estes depoimentos e
52
provas nunca tinham uma repercussão tão grande quanto a anterior. Colocar-se
contra Simonal havia ido além da esfera pessoal, já tinha se tornado uma atitude de
combate à ditadura: “A imprensa era quem menos se interessava em fazer isso,
porque isso pra imprensa era um prato.” (SIMONAL..., 2009), afirma Chico Anysio,
humorista. Aos poucos, seu nome começou a ser deixado de lado na mídia,
conforme explica o entrevistado Max de Castro:
A princípio, o cara não fala porque o cara não quer citar um cara que ele acha mau caráter, porque o cara é informante dos militares. Mas dali a cinco anos, como ele está há cinco anos sem falar nesse cara, passa a ser normal não falar dele. (Max de Castro, 2014).
Seu último single de sucesso foi lançado em 1976. O disco que veio a seguir
não teve boas vendas e em 1980 Simonal assinou com uma pequena gravadora,
lançando mais dois discos. Em 1984 o cantor lançou um compacto, que seria o
último material novo do artista por 10 anos (ALEXANDRE, 2009). Seus discos
antigos já haviam saído de catálogo e ele não era mais assunto nos jornais, revistas
e televisão: “Virou um tabu, [...] as pessoas foram muito covardes [...]” (SIMONAL...,
2009), explica Nelson Motta (jornalista) no documentário sobre o cantor.
Simonal, na realidade, não parou de fazer shows. O que ocorreu é que o
circuito que ele costumava fazer mudou e sua imagem não mais aparecia na mídia.
De grandes teatros das capitais, o cantor passou a se apresentar em feiras e
eventos em outras cidades pelo país, porém ainda para públicos grandes
(ALEXANDRE, 2009).
Segundo Alexandre (2009), nos anos 80 Wilson Simonal aumentou o seu
consumo de bebidas. Por causa do álcool, ele começou a perder a voz e, por perder
a voz, ele passou a evitar os palcos. Sem ter muito trabalho, suas dívidas
aumentaram. Sua segunda esposa, Sandra Cerqueira comentou sobre a dificuldade
de Simonal para trabalhar nesta época: “Até que acontecem os primeiros problemas.
Começavam assim, as respostas: „o release dele é maravilhoso só que a figura dele
ainda está vinculada à ditadura.‟” (SIMONAL..., 2009).
Max de Castro, comentando sobre o documentário de Simonal feito por
Cláudio Manoel, mostra que no ano de 2001, quando o ator/diretor surgiu com a
ideia, o assunto ainda era tratado como tabu:
53
E ele [Cláudio Manoel] contou pra gente que ele foi até o patrocinador, levou o projeto do filme que ele tinha feito e tal, com sinopse, com tudo, com material que ele tinha levantado de pesquisa, coisas de jornal... Levou pro cara e o cara chegou, olhou, deu uma folheada, virou pra ele e falou assim: “cara, não se mete com isso, não, cara, esse pessoal aí, essa gente é muito poderosa” [...] “você vai se dar mal, sai dessa”. (Max de Castro, 2014).
Diagnosticado com uma cirrose hepática, Wilson Simonal faleceu aos 62 anos
no dia 25 de junho de 2000 em São Paulo no Hospital Sírio-Libanês. Internado lá
desde o dia 4 de abril do mesmo ano, o principal assunto do cantor em seu leito de
morte ainda era em relação à busca das provas de sua inocência e ao seu
sofrimento, causado pelas acusações (ALEXANDRE, 2009).
No subcapítulo a seguir, estuda-se mais um caso de crise de imagem no
segmento musical, porém, desta vez, de um artista dos Estados Unidos, ocorrido
duas décadas depois da crise de Simonal.
4.2 MICHAEL JACKSON
Michael Jackson foi um artista americano com uma carreira mundial, com seu
ápice no início dos anos 80, lançando o álbum mais vendido de todos os tempos:
Thriller. Sua vida era muito comentada na mídia e sua fama não se deu apenas por
suas músicas, mas também (e, em algum momento, até mais) por sua
excentricidade física e comportamental. Sua frequente “amizade” com crianças
acabou resultando em especulações e até em processos contra Michael, que
acabaram por prejudicar diretamente sua carreira (PORTER, 2007).
Michael Jackson nasceu no dia 29 de agosto de 1958, sétimo filho dos nove
que teriam Katherine e Joseph Jackson, um casal afro-americano. Sua mãe
trabalhava como balconista em uma loja de departamento e seu pai, músico
frustrado, era operador de guindaste. Quando percebeu que os filhos tinham talento
para a música, Joe começou a ensaiar com eles e deixou a banda da qual fazia
parte. Aos cinco anos de idade, Michael entrou para o grupo musical masculino de
seus quatro irmãos mais velhos (então chamado Ripples and Waves) como vocalista
principal, começando a participar dos ensaios (PORTER, 2007).
Segundo Porter (2007), Joseph, que havia sido criado com duras punições e
com brutalidade, aplicou o mesmo método com seus filhos. Quando um deles errava
54
um passo de dança ou desafinava, apanhava com chibata ou cinto. O pai planejava
usar o dinheiro vindo do trabalho de seus filhos para sustentar a família.
O quinteto começou a participar de concursos amadores e a realizar a
abertura de alguns shows. Eles ensaiavam diariamente e incansavelmente,
deixando passar a sua infância. Eles começaram a fazer alguns shows fora de Gary
(cidade no estado de Indiana onde eles viviam) e em 1968 conseguiram, finalmente,
uma audição para a Motown. A gravadora, muito famosa por trabalhar com os
maiores artistas negros dos Estados Unidos, assinou um contrato com o grupo em
1969, aos 10 anos de Michael (PORTER, 2007).
Porter (2007) afirma que o The Jackson 5 teve seu disco de estreia como um
sucesso de vendas e em 1970 uma de suas músicas já era a primeira nas paradas
de sucesso, superando as vendas de Let It Be, dos Beatles. O sucesso deles
acabou obrigando-os a estudar em escolas particulares (o que não é comum nos
Estados Unidos), uma vez que suas fãs invadiam suas salas de aula e gritavam fora
de suas escolas.
Michael, que, para muitos, se destacava em relação aos seus irmãos, lançou
sua primeira música solo em 1970, e seu primeiro disco em 1972, com vendas não
muito expressivas. Com o grande sucesso do The Jackson 5, os irmãos saíam em
turnê por todo o mundo, mas, mesmo com muitos fãs, as vendas de seus discos
começaram a cair. Seu álbum solo lançado em 1975 também não apresentou
grande número de vendas (PORTER, 2007).
Ao contrário de seus irmãos, que se aproveitavam da fama para se relacionar
com o maior número de garotas possível, Michael não demonstrava interesse em
levar fãs para seu quarto de hotel. Com seu jeito afeminado, começou a haver
muitas especulações a respeito de sua sexualidade. O cantor começou, então, a sair
com algumas meninas para desmentir os boatos, fato que não modificou muito a
vinculação de sua imagem à homossexualidade (PORTER, 2007).
Em 1979, mesmo ano em que o The Jackson 5 entrava em turnê mundial,
Michael lançou seu primeiro disco de sucesso: Off The Wall, vendendo mais de 8
milhões de cópias. Porém o grande estouro de sua carreira foi a partir de 1982, com
o lançamento do álbum mais vendido até hoje, Thriller, produzido pelo renomado
Quincy Jones. Nesta época o cantor já havia se desvinculado de seu pai como
produtor e seus clipes começaram a ser veiculados no canal musical de televisão
MTV, que não contava com artistas negros em sua programação (PORTER, 2007).
55
De acordo com Porter (2007), os anos 80 também foram marcados como o
início das mudanças de visual do artista. Michael, que quando criança era
amplamente xingado por seu pai por (de acordo com Joe) ser feio, também teve
problemas com sua aparência na adolescência por ter muitas espinhas e, por isso,
começou a se submeter a diversas cirurgias plásticas e, não se sabe como, a
aparentar ter a pele cada vez mais clara.
Em 1984 Michael Jackson quebrou mais um recorde: venceu em oito
categorias do Grammy (premiação musical comparada ao Oscar) daquele ano. Este
também foi o ano em que ele realizou sua última turnê com seus irmãos e em que
ele estrelou no comercial da Pepsi, peça publicitária de tanto sucesso que era
veiculada de graça em diversos canais (PORTER, 2007).
Ainda morando com sua família, Michael começou a fazer amizade com
meninos que ainda estavam na idade infantil. Ele convidava os garotos para passar
a noite na sua casa (em seu quarto) e alguns chegavam a passar um mês com o
cantor, recebendo diversos presentes e contando com altas quantias em dinheiro
enviadas às suas famílias (PORTER, 2007).
Tendo lançado o seu álbum Bad em 1987, segundo disco mais vendido
mundialmente até aquele momento (perdendo apenas para Thriller, do mesmo
cantor), Michael entrou em uma turnê mundial, levando consigo um de seus
“amigos”, um garoto de nove anos, e seus pais. Falou-se tanto sobre esta nova
companhia de Michael e espalharam-se tantos boatos que o artista precisou mandar
o menino e sua família de volta para casa.
Durante a turnê Bad, o jornalista Paul Voth resumiu exatamente a reação da mídia em relação a Michael: “Mesmo que ele estivesse triunfando em sua turnê mundial, os jornais de onde ele vivia e do exterior começaram um ataque a Michael que duraria anos. Especulações a respeito de seu nariz, sua pele, sua sexualidade – lentamente, mas definitivamente desenvolvendo uma tendência. A mídia se concentrava cada vez menos nas contribuições musicais de Michael a favor do assunto muito mais rentável que era retratá-lo como um homem esquisito com ideias e hábitos estranhos.”. (PORTER, 2007, p. 272, tradução nossa).
Incomodado também com a intromissão de sua família em sua vida particular,
Michael Jackson comprou um rancho na Califórnia, nomeado Neverland, onde
construiu sua casa e seu próprio parque de diversões e zoológico, em 1988
(PORTER, 2007).
56
De acordo com a biografia escrita por Porter (2007), Michael convidava
algumas crianças para se divertirem no seu parque e escolhia um garoto por vez
(quase exclusivamente brancos) para passar alguns dias com ele em Neverland.
Normalmente o menino ficava na casa junto do cantor (dormindo com ele em sua
cama) e sua família ficava em uma casa de hóspedes dentro do terreno. Michael
dava inúmeros presentes e quantias em dinheiro a cada um desses “amigos” e suas
famílias. Ele costumava levar a criança escolhida para alguns compromissos, como
premiações, para passear no shopping e também em suas turnês. O que Michael
alegava é que ele se sentia como uma criança e gostava muito delas, por seus
corações puros e sua honestidade. Porém os boatos que circulavam pelo país e pelo
mundo eram muito negativos, duvidando das boas intenções do cantor.
Em 1992 Michael começou uma nova “amizade” com um garoto chamado
Jordie Chandler, de 12 anos. Até o ano de 1993, Jordie, sua mãe e sua irmã caçula
iam frequentemente, aos finais de semana, visitar Michael em Neverland. O cantor
os levava também em suas viagens e os enchia de presentes caros. A mãe, que
inicialmente não concordava que Jordie dormisse na mesma cama que o artista,
passou a aceitar o fato, deixando que Michael dormisse com o garoto também nos
dias em que visitou a casa da família Chandler (PORTER, 2007).
Evan Chandler, pai de Jordie, divorciado da mãe do menino, não concordou
com a estranha amizade entre Michael e seu filho, mas disse aceitar porque tirava
muito proveito deste relacionamento, recebendo presentes e dinheiro. Porém,
chegou um momento em que ele resolveu agir. Evan conseguiu a confissão de
Jordie, afirmando ter sido abusado, quando o garoto estava anestesiado na cadeira
em que o pai, dentista, faria a extração de um de seus dentes (PORTER, 2007).
Porter (2007) afirma que Jordie foi encaminhado a um psiquiatra, a quem
contou detalhes de sua relação com Michael. Afirmou, em depoimento, que Michael
o beijava na boca, praticava masturbação no garoto e tomava banho com ele,
pedindo que estes momentos fossem mantidos em segredo, além de tentar
persuadi-lo a odiar seus pais.
Em setembro de 1993, o advogado da família Chandler entrou com uma ação
civil contra Michael com sete acusações relacionadas a abuso sexual, sedução,
fraude, negligência, entre outros. No início, a maioria do público acreditava que este
era mais um caso de extorsão, mas aos poucos Michael começou a ser xingado em
alguns locais públicos aonde ia. Com o momento de turbulência, o cantor passou a
57
tomar mais remédios (havia começado a tomar remédios para dor após um acidente
em que seu cabelo pegara fogo), a comer pouco e a passar mal, o que o
impossibilitou de realizar alguns shows marcados (PORTER, 2007).
Após feita uma busca em Neverland e com a descrição e o desenho de Jordie
das genitálias e nádegas de Michael, a justiça ordenou que fossem tiradas fotos
destas regiões do corpo do cantor para que fosse averiguada a verossimilhança das
ilustrações, que apontavam diversas manchas na pele de Jackson. Todas as
tentativas do artista de não atender a este pedido não funcionaram e ele teve de se
submeter a um exame e a fotografias o que, segundo Michael, foi o momento mais
humilhante de sua vida (PORTER, 2007).
Segundo Porter (2007), em janeiro de 1994, seguindo as instruções de seus
advogados e de seus conselheiros, Michael aceitou fazer um acordo com a família
Chandler, dando a eles uma alta quantia em dinheiro que, adicionada aos valores
gastos devido ao processo e aos shows cancelados, somava mais de 100 milhões
de dólares, em troca da retirada das acusações. Apesar de todos os problemas
causados pelo ocorrido, Michael não parou de “fazer amizade” com crianças, nem
de convidá-las a irem à sua casa. O artista continuava desfilando ao lado de jovens
meninos em suas turnês e em passeios em público pelo mundo.
Em maio do mesmo ano, Michael Jackson se casou com a filha de Elvis
Presley, Lisa Marie. Neste ano algumas pessoas já falavam que isto seria uma ação
de relações públicas para o lançamento de seu novo álbum ou para desmentir as
acusações de pedofilia e homossexualidade (PORTER, 2007). Porém a visão da
mídia sobre o acontecido era, em sua maioria, humorística e irônica, o que não foi
contradito pelo rápido divórcio, em 1996.
Seu disco HIStory, lançado em 1995, teve 18 milhões de cópias vendidas,
muito longe do sucesso de Thriller, desapontando Michael, que ainda buscava bater
seu próprio recorde (PORTER, 2007). Em entrevista, Max de Castro comenta:
O mercado americano é supercompetitivo [...] é uma concorrência, [...] coisa muito selvagem. E o Michael Jackson, assim, embora ele fosse um artista que tivesse um grande prestígio, as pessoas amassem ele, tivesse uma fanbase [base de fãs] extraordinária, ele não conseguiria manter a popularidade e o sucesso dele da época do Thriller, era uma coisa que era impossível de ser mantida. Devido a esse mau gerenciamento administrativo da carreira dele, isso fazia com que ele tomasse atitudes, também, erradas [...], acabasse, às vezes, lançando discos em épocas desnecessárias [...] o custo das produções, os clipes e tal, isso gerava a
58
demanda de um retorno de lucro, a base era muito alta [...]. (Max de Castro, 2014).
No desejo de ter filhos e após o fracasso de seu primeiro casamento, Jackson
se casou, em 1996, com Debbie Rowe, uma dermatologista que há muitos anos
estava em sua equipe de médicos. O casal teve dois filhos (Prince Michael Jackson
e Paris-Michael Katherine Jackson) que, por mais que ambos afirmassem que
fossem biologicamente de Michael, aparentemente tinham pai desconhecido, vindos
de uma inseminação artificial, visto que não tinham nenhuma semelhança física com
o cantor, com pele e traços de caucasiano. Rowe afirmou, mais tarde, ter recebido
três milhões de dólares de Michael por seus “serviços”, seus filhos nunca a
conheceriam como mãe (PORTER, 2007).
Porter (2007) afirma que o casal se divorciou em 1999 gerando muitos custos
a Michael que, vivendo uma vida de bilionário, precisou pegar 140 milhões de
dólares emprestados de uma corporação para cobrir estas despesas. O gasto anual
do cantor estava supostamente entre 20 e 30 milhões de dólares, mais do que ele
recebia na época. Até o final de sua vida, as finanças do artista continuariam em
desordem.
Seu disco Invincible, lançado em 2001, confirmaria a decadência do cantor,
vendendo seis milhões de cópias. Em 2002 Michael teve mais um filho, desta vez de
mãe desconhecida. As frequentes acusações judiciais, relacionadas a abuso sexual
e, principalmente, a dívidas, levariam Michael Jackson a ser considerado o artista
mais frequentemente processado na história do entretenimento. Em 2003, uma
delas, de uma menino de 12 anos que afirmava ter sido molestado pelo cantor, o
levou à prisão (PORTER, 2007).
Em liberdade, Michael começou a ser ignorado por muitos outros artistas que
eram, supostamente, seus amigos. As celebridades, na maioria das vezes,
buscavam não opinar quando perguntados a respeito da inocência ou não do cantor.
Processado mais uma vez por abuso sexual em 2004, Michael conseguiu ser
inocentado de todas as acusações. Tendo limpado o seu nome na justiça, Jackson
resolveu se mudar dos Estados Unidos para uma ilha no Golfo Pérsico, não tendo a
intenção de voltar (PORTER, 2007).
Segundo Porter (2007), ainda que longe do país, Michael continuava sendo
um dos principais assuntos comentados do entretenimento e acusações
continuavam sendo feitas na justiça contra ele. O cantor vendeu Neverland e buscou
59
reiniciar sua carreira com um novo produtor em 2006, voltando a fazer aparições
públicas, primeiramente em Londres. No mesmo ano, mais um jovem o acusaria de
abuso sexual, tortura, plágio, entre outros.
Em 2008, Michael Jackson relançou seu álbum de sucesso Thriller e voltou ao
estúdio para gravar novas músicas. Ele anunciou, em Londres, que faria a última
turnê de sua carreira em 2009. Havia um milhão de ingressos para este show e eles
se esgotaram nas primeiras cinco horas de vendas (PORTER, 2007).
No dia 25 de junho de 2009 (exatos nove anos após a morte de Simonal),
antes da estreia de sua nova turnê, em época de ensaios, Michael Jackson foi
encontrado morto em sua cama por seu médico, Dr. Murray. Ele teria tido uma
parada cardíaca devido ao grande e indevido uso de remédios, o que acarretaria em
mais um grande estardalhaço da mídia e em mais um questionamento a respeito do
cantor sem uma resposta definitiva, como ocorreu durante toda sua vida (PORTER,
2007).
No item a seguir, analisam-se os casos Wilson Simonal e Michael Jackson a
partir da visão das Relações Públicas, relacionando-se as crises de imagem com
uma possível contribuição da atividade.
4.3 A CONTRIBUIÇÃO DAS RELAÇÕES PÚBLICAS NOS CASOS WILSON
SIMONAL E MICHAEL JACKSON
No presente subcapítulo se apresenta sugestões da possível colaboração da
atividade de Relações Públicas para o melhor gerenciamento das crises de imagem
estudadas. Para se analisar o caso brasileiro e o caso americano de crise de
imagem no segmento musical frente a esta atividade, deve-se contextualizá-la nos
dois países nas referidas épocas.
De acordo com Humberg (1997), foi só a partir da década de 80 que as
atividades de Relações Públicas e Comunicação se desenvolveram no Brasil. O
autor afirma que o fim do regime militar possibilitou e até obrigou organizações a
trabalharem o seu diálogo com a sociedade e a sua transparência. Entende-se,
então, que no momento do início da crise de imagem do cantor Wilson Simonal
(anos 70), “ninguém sentia necessidade dos profissionais de relações públicas”
(NOGUEIRA, 1997, p. 140). Segundo Nogueira (1997), não era comum se importar
com a opinião pública durante o período de ditadura no Brasil, o que realmente
60
importava, na época, era ser amigo de algum ministro importante ou do próprio
presidente. Por isso, afirma o autor, as Relações Públicas ainda estavam pouco
desenvolvidas no país em 1997 quando comparadas ao jornalismo ou à
propaganda.
Já nos Estados Unidos, segundo Wey (1986), começou-se a falar em
Relações Públicas no ano de 1900, aproximadamente. A autora afirma que entre
1917 e 1919, durante a I Guerra Mundial, estas atividades eram usadas para
desenvolver o sentimento de patriotismo. A partir de 1945 as Relações Públicas se
desenvolveriam amplamente no país, sofisticando técnicas e atividades: “[...]
atualmente todas as grandes empresas e entidades têm seus departamentos de
relações públicas ou utilizam os serviços de assessorias externas, que oferecem
serviços especializados a seus clientes.” (WEY, 1986, p. 32). Destaca-se que este
texto é datado de 1983. Desta forma, compreende-se o fato de as Relações Públicas
já serem citadas durante a crise de Michael Jackson (anos 90), conforme sua
biografia escrita por Porter (2007).
Segundo Ferreira (1997):
[...] relações públicas são os procedimentos da administração, sistematicamente estruturados, que se destinam a manter, promover, orientar e estimular a formação de públicos, por meio da comunicação dirigida, a fim de tornar possível a coexistência dos interesses visados. (FERREIRA, 1997, p. 75).
A comunicação dirigida, de acordo com Kunsch (2003), possibilita uma
eficiência. Por meio dela, uma mensagem é enviada em um código (linguagem)
especificamente adequado a um público por um emissor. Desta maneira, há uma
transmissão, uma compreensão e um retorno apropriados. Este tipo de comunicação
requer uma escolha do meio de comunicação a ser utilizado e busca produzir
determinado efeito no público (FERREIRA, 1997).
Tanto no caso Wilson Simonal quanto no caso Michael Jackson foi apontado
que os profissionais da mesma classe dos artistas se distanciaram dos dois durante
suas crises de imagem. Conforme relatado, poucas celebridades se posicionavam
frente à mídia a favor de algum deles. Neste aspecto, a comunicação dirigida
poderia ter sido aplicada frente aos outros artistas, assessorando Simonal e Michael.
Segundo Fortes (2003), ela é capaz de colaborar para a fixação de relacionamentos
61
articulando o direito de manifestação de diferentes opiniões relativas a um tópico de
interesse privado ou público.
Ao encontro disto, Farias (2009) afirma que as Relações Públicas possibilitam
o diálogo:
As Relações Públicas apresentam, assim, uma função dialógica, por meio da qual criam campo de pensamento que permite o equilíbrio entre interesses por meio de interpretação de significados e da ação pontual ou permanente de integração entre acontecimentos e as suas teias de representações nos espaços simbólicos de disputa e de conflito e, possivelmente, de encontro e diálogo. (FARIAS, 2009, p. 145).
As Relações Públicas também atuam na comunicação massiva. Por meio
dela, elas conseguem exercer grande influência, porém seu grau de dispersão em
relação a grupos específicos deve ser levado em conta (FORTES, 2003). A
comunicação de massa é caracterizada por se voltar para um grande número de
pessoas usando, necessariamente, veículos como televisão, rádio, jornais, revistas,
cinema e outdoors (KUNSCH, 2003).
Este tipo de comunicação é mais apontado nas biografias dos cantores
Michael Jackson e Wilson Simonal. Segundo Porter (2007), Michael dava entrevistas
e teve até sua vida acompanhada por alguns dias e documentada na televisão. Já
Simonal começou sua carreira em rádios e foi apresentador de televisão por alguns
anos (ALEXANDRE, 2009). Porém a mídia também influenciou nos momentos de
crise. Conforme descrito nos subcapítulos anteriores, Simonal foi sendo deixado de
lado pelos veículos de massa a partir da sua crise e Michael Jackson foi
amplamente comentado (de forma pejorativa) pela mídia quando recebeu acusações
de abuso sexual, assim como ao longo de sua carreira por causa de seu
comportamento e sua aparência.
França (1997) afirma que as Relações Públicas se utilizam dos critérios da
comunicação dirigida para estabelecer o relacionamento com a mídia. Portanto, é
preciso estabelecer os canais e frequências adequados. Em busca de resultados
programados, as Relações Públicas acompanham as mudanças e características da
mídia e dos diferentes públicos para equacionar corretamente esta interação. Para o
autor:
Uma das características diferenciadoras do profissional de relações públicas é possuir esse know-how de conhecimento do público e do tratamento a ser
62
dado à mídia adequada a este público, de forma consciente e planejada. (FRANÇA, 1997, p. 15).
Segundo Matos (1997), a atividade de Relações Públicas preocupa-se com os
formadores de opinião e entre eles está a mídia. As Relações Públicas são capazes
de englobar a função de assessoria de imprensa, apurando informações a serem
divulgadas, conhecendo os meios adequados de divulgá-las, segmentando-as,
diversificando as informações a serem passadas à imprensa e acompanhando as
publicações.
Visto que ambos os cantores sofreram em certo momento de superexposição
na mídia, as Relações Públicas poderiam colaborar para selecionar as aparições
mais adequadas (quando dependia do artista), assim como os veículos e assuntos.
Max de Castro, em entrevista, compara as duas crises de imagem:
[Simonal e Michal Jackson] Não deixam de ter vários pontos em comum [...] o Michael Jackson sendo acusado daquela coisa de pedofilia, o Simonal sendo acusado... sempre tendo uma coisa muito pesada associada. Ao mesmo tempo que o cara é grande, que é uma coisa artisticamente quase imbatível, inalcançável, tem um outro lado que é uma coisa, trevas [...]. (Max de Castro, 2014).
Na biografia de Michael Jackson, Porter (2007) cita alguns comentários da
época que já utilizavam o termo “relações públicas”. Porém, eles eram a respeito
dos casamentos de Michael, muito divulgados na mídia, citando-os como ações para
ajudar a melhorar a imagem do cantor ou para promover seu trabalho.
As Relações Públicas, porém, não se limitam ao relacionamento com a mídia.
Conforme França e Freitas (1997):
Definir a mídia que será utilizada em um programa de comunicação é apenas parte de sua aplicação e não o papel principal de relações públicas, que se situa em patamar muito mais alto – o do planejamento estratégico da comunicação – do que simplesmente fazer publicações e eventos [...] (FRANÇA; FREITAS, 1997, p. 86).
De acordo com Kunsch (2003), alguns aspectos devem ser observados a
respeito das Relações Públicas como atividade profissional, conforme tabela abaixo.
Tabela 6 – aspectos das Relações Públicas como atividade profissional.
Identificam os públicos, suas reações, percepções, e pensam em estratégias comunicacionais
63
de relacionamentos de acordo com as demandas sociais e o ambiente organizacional.
Supervisionam e coordenam programas de comunicação com públicos – grupos de pessoas
que se auto organizam quando uma organização os afeta ou vice-versa.
Preveem e gerenciam conflitos e crises que porventura passam as organizações e podem
despontar dentro de muitas categorias: empregados, consumidores, governos, sindicatos,
grupos de pressão etc.
Fonte: tabela elaborada pela autora a partir de Kunsch (2003).
O planejamento também é um aspecto presente nas atividades de relações
públicas. Ele está relacionado à função administrativa, definindo objetivos e as
ações a serem tomadas para que seja possível alcançá-los, em interação com o
ambiente (KUNSCH, 2003). Esta função administrativa é citada por Max de Castro
na entrevista concedida à autora desta monografia, apontando-a como uma falha em
comum nas carreiras dos dois cantores. De acordo com o filho de Simonal, a
comparação das crises faz sentido uma vez que ambos sofreram de uma crise
financeira devido à falta de planejamento e de boa administração de suas carreiras,
tomando decisões equivocadas para determinados momentos e, além disso, no
caso de Michael, oferecendo produtos/serviços com investimentos tão pesados, que
demandavam um lucro alto demais.
O planejamento colabora para se evitar crises, visto que ele parte da análise
das oportunidades e ameaças existentes para, a partir disto, elaborar as decisões
estratégicas, diminuindo a incerteza e os riscos (KUNSCH, 1997). Em síntese: “A
função de planejamento impede que as atividades de Relações Públicas sejam
improvisadas.” (FORTES, 2003, p. 186).
Conforme descrito no subcapítulo a respeito de Simonal, quando perguntado
sobre o caso de delação, Simonal confirmou com orgulho, mesmo que, talvez, não
fosse verdade. Já Michael Jackson, afirma Porter (2007), em entrevistas apenas
negava e dizia ser um absurdo as acusações de abuso sexual. As Relações
Públicas, de acordo com Carvas Junior (1997), são capazes de contribuir nestes
momentos de crise, tornando-se essenciais:
A atividade de relações públicas é de extrema importância para o enfrentamento de crises, pois é ela que deve assumir a responsabilidade pela coleta de informações e pela organização dos contatos com a imprensa e com os públicos de interesse. (CARVAS JUNIOR, 1997, p. 205).
64
O autor completa explicando que a imprensa e os públicos de interesse não
devem receber informações erradas, incompletas ou sem fundamento. Não se deve,
também, omitir em respostas. Pode haver outras fontes repassando dados
inverídicos, que só irão complicar o momento de crise.
Fortes (2003) ainda cita a função de assessoramento praticada pelas relações
públicas. De acordo com o autor, esta função está relacionada ao planejamento, à
proposição de alternativas, ao aconselhamento e à sugestão de reformulação de
políticas, entre outros. Enquanto no caso Michael Jackson Porter (2007) cita
conselheiros do cantor, a biografia de Simonal não aponta nenhuma figura
exercendo este papel (ALEXANDRE, 2009).
65
5 CONCLUSÃO
Toda organização possui uma identidade, uma imagem e uma reputação
frente à opinião pública. Com artistas e celebridades não é diferente. Este trabalho
buscou inserir estes conceitos, além das questões de crise de imagem, de
assessoria de imprensa e de relação da mídia com as celebridades em casos de
crise de imagem ocorridos com cantores. A finalidade foi apresentar um ponto de
vista academicamente pouco explorado das Relações Públicas, com vistas para a
imagem pessoal no segmento musical, não organizacional, além de uma análise das
atividades de Relações Públicas neste meio no Brasil e nos Estados Unidos.
A partir da revisão teórica pode-se compreender a influência direta do reflexo
da identidade, imagem e reputação nos negócios. Quando a opinião pública é
afetada negativamente em relação a uma marca (seja pessoal ou de uma
organização) as consequências desta crise podem definir o seu futuro. É importante
que se perceba que o que é consumido pelo público é mais do que um simples
serviço ou produto, é uma identificação, uma relação emocional.
Quando se fala em imagem pessoal, então, todos estes aspectos estão
reduzidos a uma só pessoa. Sua imagem precisa ser trabalhada de forma que reflita
a sua personalidade (identidade) e que cative os outros. Uma marca pessoal está
emitindo sinais o tempo todo por meio do próprio profissional e por isso a fala e as
vestimentas são fatores importantes a serem levados em conta. Esta pessoa precisa
demonstrar ter um diferencial, é necessário encontrar esta característica e trabalhá-
la frente ao mercado, para que o profissional seja único, o que no meio artístico é
essencial. Por tudo isto, o media training é essencial. Ele irá ensinar, por exemplo, o
cantor a se portar frente às câmeras, a se vestir e a falar em público, fatores que irão
construir sua imagem e reputação frente à opinião pública.
A mídia apresenta um papel importante tanto na construção de uma
reputação quanto nos momentos de crise de imagem. McCombs (2009) ressalta que
a imprensa é capaz de realizar o agendamento da opinião pública, ditando quais os
assuntos são relevantes no momento. Por isso ela não pode ser ignorada ou
subestimada. Tanto organizações quanto artistas precisam manter um bom
relacionamento com a mídia, pois ambos precisam trabalhar sua imagem frente à
população e irão utilizar esta confiança construída a seu favor em momentos de
crise.
66
Ainda hoje, há muitas discussões no Brasil a respeito do segmento da
Comunicação responsável por este relacionamento, pela chamada assessoria de
imprensa. Acredita-se em uma integração das diferentes áreas, visto que cada uma
(Relações Públicas e Jornalismo) possui maiores conhecimentos em algumas
atividades específicas. Porém, conforme defendido pelos autores estudados, não há
como se realizar uma assessoria de imprensa apropriada sem o know-how de
relações públicas. Isto porque o relacionamento com a mídia não se dá
simplesmente pelo envio de matérias e releases, ele precisa ser planejado e seus
resultados analisados, atividades pertencentes ao leque de conhecimentos das
relações públicas.
Os casos aqui estudados foram o de Wilson Simonal, brasileiro, e o de
Michael Jackson, estadunidense. Em suas biografias foi possível perceber o quanto
as relações públicas estavam intrínsecas ou não na cultura artística de cada país em
cada época. Dado o histórico brasileiro, percebeu-se uma grande ausência desta
atividade e do pensamento ligando ela à crise de imagem estudada no caso
Simonal. Nota-se que na época esta atividade ainda não era reconhecida e
encarada como importante, tanto para a construção de uma carreira, quanto para
momentos de crises organizacionais no Brasil. Isto porque, além de os Estados
Unidos serem reconhecidos como o berço das Relações Públicas, o Brasil teve um
recesso no desenvolvimento desta área durante a ditadura, tempo estudado neste
trabalho. No caso de Wilson Simonal, conforme observado por Max de Castro,
entrevistado pela autora desta monografia, houve uma grande carência de
planejamento em relação às ações que eram tomadas e de um bom gerenciamento
de carreira, aspectos que poderiam ter sido explorados por um profissional de
relações públicas.
Já nos Estados Unidos, durante os anos 90, a situação era outra. Em
depoimentos e entrevistas da época relacionados à crise de Michael encontra-se o
termo “relações públicas”. O próprio artista afirmou conversar com seus advogados e
conselheiros para tomar algumas atitudes, uma das atividades exercidas nas
Relações Públicas. O próprio histórico desta área de conhecimento nos Estados
Unidos favorece o país: ela começou a se desenvolver no país logo no início do
século XX, diferente da realidade brasileira. Conforme apontado na revisão teórica,
nos anos 80 as Relações Públicas já haviam se tornado um “vício” das empresas,
utilizadas para os mais diversos objetivos e encaradas como de grande importância.
67
Em relação aos casos estudados, a opinião de Max de Castro, dada em
entrevista para este trabalho, deixa clara a associação que pode ser feita: ambas as
carreiras estavam sendo mal administradas, o que incluiria a ausência da atividade
de Relações Públicas bem planejada e executada. Mesmo que um dos cantores
tenha contado com o apoio desta área durante a sua crise e o outro não, ainda
haveria pontos a serem melhor trabalhados nos dois casos.
Neste momento, percebe-se uma semelhança entre eles, que pode ser levada
em conta no momento em que se for assessorar um artista: por mais aconselhado
que ele seja, suas ações ainda irão depender, acima de tudo, de sua personalidade,
de sua vontade. Lidando com artistas, o ego é um fator muito presente e acredita-se
que nos dois casos ele interferiu. Wilson Simonal foi prepotente acreditando que era
amado por todos e que um simples boato ligando ele ao governo militar não iria
prejudicar a sua carreira e não buscou se redimir ou se explicar com urgência. Já
Michael Jackson, mesmo depois de ser acusado de abuso sexual de menores e de o
fato estar sendo amplamente veiculado na mídia, continuou por muito tempo
fazendo amizades com meninos e convidando-os para dormir em sua casa, como se
isso não fosse piorar sua imagem já comprometida.
No caso de celebridades, as relações públicas precisariam ter liberdade para
aconselhar e interferir diretamente em sua vida pessoal. Muito mais do que
empresários, por exemplo, artistas são perseguidos todos os dias e suas vidas são
contadas como novelas nos jornais e tabloides. É necessário que estes
profissionais, como os músicos estudados, compreendam o impacto de suas
atitudes, mesmo que em momentos privados, em suas carreiras e aceitem o fato de
que quem trabalha na indústria do entretenimento precisa calcular muito mais cada
ação que toma e possui restrições que as outras pessoas não têm.
Torna-se quase impossível uma comparação direta entre os dois casos, visto
que o brasileiro ocorreu em um momento tão singular da política, em que a imprensa
era censurada. Ainda que as Relações Públicas já estivessem consolidadas no
Brasil na época, seria muito difícil um profissional exercer a atividade de assessoria
de imprensa, por exemplo. Mesmo assim, percebe-se que as Relações Públicas,
hoje, ainda estão menos desenvolvidas no Brasil do que nos Estados Unidos, o que
revela muitas oportunidades de crescimento para a área no nosso país.
Por fim, em relação ao gerenciamento de crise de imagem no segmento
musical, conclui-se que o Brasil ainda precisa se aprimorar. O próprio tamanho e
68
importância da indústria musical dos Estados Unidos, que é mundial, deve ter
acabado por exigir esta visão de negócios que eles possuem frente aos seus
artistas/produtos. É importante também que se leve em conta a pouca literatura
existente no Brasil relacionada tanto às relações públicas para profissionais
individuais quanto para o segmento musical. Percebe-se, então, neste estudo, uma
contribuição para a área de relações públicas no sentido de instigar a fuga da visão
comum destas atividades como voltadas apenas para o âmbito
organizacional/empresarial e a busca de oportunidades de seu desenvolvimento
junto ao mercado musical e artístico.
69
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75
APÊNDICE A – Entrevista com Max de Castro
Alina: Eu sei que você nasceu depois que tinham acontecido as acusações com o
Simonal, mas eu queria saber qual a imagem que você tem dele antes de tudo isso
acontecer.
Max: O negócio começou, sei lá, eu cresci sem entender muito bem, assim, o que
tinha realmente acontecido, foi sempre uma coisa meio complicada porque,
exatamente como você disse, como eu nasci depois, eu nasci no meio de um
processo, isso envolvia várias questões, tipo, sei lá, quando eu era criança, eu sabia
que o meu pai era artista, que ele cantava, que ele fazia shows, gravava discos, mas
os meus amigos, né, que estudavam na minha classe, assim, as crianças, as
pessoas mais jovens, ninguém conhecia ele, entendeu? Porque ele estava um
pouco afastado, assim, né, da mídia convencional e tal, então só conheciam o
trabalho dele, geralmente, os pais dos meus amigos, assim, todo mundo que sabia,
né, que eu era filho do Simonal sempre me falava assim “nossa, você é filho do
Simonal”, seu pai... era como ser filho de uma lenda, assim, todo mundo... de uma
lenda viva, né, porque todo mundo falava assim “nossa, seu pai fez isso, fez aquilo,
não sei o que lá, bom artista, como ele ninguém nunca foi” e aí já era um período
assim, meio de... comercialmente, ainda não era um período de decadência artística,
mas comercialmente ele já não tinha mais um status que ele teve no passado que,
né, eu não conheci, e que na época que eu comecei a me deparar e me inteirar
sobre o que ele fazia profissionalmente, ele já não tinha mais esse status de grande
estrela, né, que ele um dia já tinha tido. E aí, com o tempo, eu fui tentando, né,
descobrir, porque era um assunto muito delicado, essas coisas todas que
aconteceram com ele geraram muitos problemas pra minha família, entendeu, a
minha mãe teve muitos problemas de saúde em relação a isso, ele também, né. Isso
atrapalhou muito a dinâmica da nossa família, assim, quando eu era criança, menos,
até, e, na medida que eu fui crescendo, que eu fui conhecendo um pouco das coisas
que tinham acontecido, eu fui procurando entender, porque é uma situação cheia de
versões e de coisas misteriosas e cada pessoa fala uma coisa, então era uma coisa
confusa, assim, pra você, como filho, criança, você conseguir entender exatamente
o que tinha acontecido. Então eu só fui realmente entender, assim, esse processo
todo já quando eu era adulto, assim, já nos anos 90, assim, quando ele já estava
76
bem doente e também até depois que ele morreu que eu fui ter acesso, assim, a
todas as versões da história e tal, pra poder entender, inclusive, coisas da vida
artística dele e tal que eu só fui conhecer, realmente, depois que ele morreu que eu
tive acesso, né, me tornei um artista, uma pessoa, né, fui trabalhar na mesma
profissão dele, então acabei tendo acesso ao material. Vídeo de shows, coisas que
ele tinha feito, escutado, coisas que eu nunca tinha ouvido, e aí pude ter uma
dimensão melhor, né, do trabalho dele, da grandeza do trabalho dele.
Alina: Ele não falava sobre o passado do trabalho dele, sobre como ele tinha sido
um ícone nacional?
Max: Ele falava pouco, ele, apesar de ser um artista que ficou conhecido, né, como
um showman, um cara que se comunicava com a plateia, um cara que fazia e
acontecia, em casa ele era uma pessoa normal, até uma pessoa meio tímida, assim,
introvertida. Ele falava pouco e durante muitos anos, também, não tinha os discos...
quando eu era criança nem todos os discos dele tinha, assim, em casa, era um ou
outro, mais os discos atuais, sei lá em... 79 tinha um disco lá que ele lançou em 79,
mas eu fui descobrindo aos poucos, comprando os discos, né, eu, o meu irmão, a
gente foi tendo contato, assim, descobrindo a obra, também, dele, aos poucos.
Alina: Eu queria te perguntar, porque tem muitas versões. Eu vi o documentário e li a
biografia do Simonal e parece que tem duas versões. No documentário tu e o
Simoninha dão a entender que acreditam que o Simonal mesmo bateu no Raphael
Viviani, enquanto na biografia diz que o Simonal teria mandado os policiais do DOPS
torturarem ele. Qual é a história que tu sabe de como aconteceu tudo isso?
Max: Na realidade, a história, exatamente como aconteceu, só as pessoas que
participaram, que estavam envolvidas, vão saber exatamente o que aconteceu, né.
Assim, o Simonal, a vida toda dele... por essa questão de a minha vó ter sido
empregada doméstica, né, era cozinheira, e ele ser criado só pela mãe, a mãe
solteira, né, a questão do negro, né, o preconceito, né, racial no brasil... então ele
sempre... uma coisa que guiou, no comecinho do documentário tem uma frase que
ele fala num programa, que ele fala meio em tom de brincadeira, e tal, que ele conta
uma piada dizendo que o anjo da guarda dele perguntou pra ele se ele ia ser alguém
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na vida ou se ele ia morrer crioulo mesmo, entendeu? Esse é o tipo de coisa que ele
falou num tom de brincadeira e tal, mas eu acredito que foi uma coisa que guiou a
vida dele, ele fez de tudo pra não morrer crioulo mesmo. Pra ser alguém na vida, pra
ser respeitado, né, isso é uma questão muito latente, assim, no processo de tudo
que aconteceu na vida dele, como ele construiu a vida dele. Então, ele, desde o
início da carreira dele, ele sendo a passagem, né, ele quando serviu o exercito,
quando era adolescente, né, 17 pra 18 anos, ali, ele logo ficou amigo, através do
jeito dele, da simpatia, do carisma dele, conseguiu uma maneira de ser querido
pelas pessoas e conseguir de alguma maneira usufruir, ali, de uma proximidade dos
caras que tavam acima né, dos oficiais, conseguir algum tipo de beneficio, assim,
pra não pegarem no pé dele. Depois ele sai do exército, vai cantar na noite, ele fica
amigo dos donos das boates. Ele sempre teve uma relação, assim, de um cara que
tinha relação com o poder, seja ele em que esfera que fosse, entendeu, em todas as
fases da vida dele. E acho, assim, que nessa época, da ditadura, dele ter essa
facilidade de lidar entendeu, no momento em que existia uma grande censura no
país e uma barra muito pesada, ele, pessoalmente, tinha um jeito de lidar com isso,
de ter um jeito de conseguir resolver qualquer tipo de situação que ele se
encontrasse através desse poder que ele tinha de conquistar as pessoas, de
envolver as pessoas. E esse episódio que aconteceu com o contador me parece ser
mais um exemplo disso, entendeu. A gente tem que ver é que esse momento da
vida dele, que aconteceu essa coisa, ele estava passando por um momento, assim,
ele tinha um momento ali que ele estava deixando de ser um artista, um cara que
recebe, ali, aquelas ordens de um empresário e tal, passando a ser, inaugurando
uma coisa que era praticamente inédita no Brasil, né, um artista, além de ter um
cachê alto, então, ele poder tomar conta da sua própria carreira, ser seu próprio
empresário, tomar conta dos seus próprios negócios. Isso era uma coisa muito
avançada, né, hoje em dia qualquer artista é capaz de fazer isso, mas no Brasil,
naquela época, isso era uma coisa muito rara e sendo ele, ainda, né, um artista
negro, sendo pioneiro nisso, então era um jogo de poder, era uma coisa, assim,
muito forte e ele tinha uma relação muito grande com a rede globo, ele tinha o
contrato, né, com a Shell, que a Shell patrocinava ele, então era uma coisa, assim,
muito dinheiro, poder, né, uma roda. E ele, além de tudo isso, tinha que pensar na
coisa artística, né, entendeu, nos discos, nos shows, nos próximos desafios
artísticos, então ele tinha todas essas questões que, talvez, ele não estivesse
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preparado, ainda, entendeu, pra... talvez ele não tivesse essa capacidade de
administrar todas essas coisas ao mesmo tempo. E isso ficou claro até no próprio
funcionamento do escritório, como era, entendeu, era uma festa, todo mundo ia lá e,
né, pegava dinheiro, vales, e muitas pessoas ganharam dinheiro, assim, davam
voltas nele, assim, entendeu, dizendo assim „ah, quanto é que custou o negócio?‟ „o
negócio custou 200‟, e na realidade tinha custado 80, era assim. As pessoas se
aproveitavam muito dele e o ambiente desse escritório era essa coisa meio confusa
e tal e esse rapaz que trabalhava no escritório dele, o Raphael Viviani, que até é
chamado de contador, né, assim, pelas pessoas, que na realidade ele não é
contador porque ele nunca fez nenhuma escola de contabilidade, né, então ele não
poderia nem ser considerado um contador, né, ele trabalhava num banco e um dos
sócios desse escritório do meu pai, ele indicou o Raphael Viviani pra trabalhar no
escritório do Simonal e tal. E aí no meio desse turbilhão todo, desse jogo de poder
todo, teve essa questão financeira no escritório e tal e meu pai, Simonal, ficou muito,
obviamente, muito irritado com toda essa situação e tal e quis tomar satisfação com
o cara que tava sendo responsável, né, pelas contas do escritório, né. Na realidade,
a história é muito mais complicada do que parece porque é muito... coisas
administrativas do escritório, impostos atrasados, era uma coisa faraônica, assim,
né, que, além do fato de ele achar que o cara estava passando a perna nele, tinham
coisas, assim, do trabalho diário, assim, que não tinham sido feitas e que, né, virou
uma bola de neve, dívidas e complicações... e talvez pelo fato de ele não ter esse
preparo pra poder, né, ele também não tinha uma formação, assim, né, de
administração de empresas, né. Ele era um cantor, né, que resolveu dar esse salto
aí e tal, administrar sua própria carreira. E aí acabou tendo essa confusão aí com o
contador, que é uma coisa polêmica, que algumas pessoas falam que ele mandou,
tem gente que fala que ele não mandou, que os caras, os policiais, quiseram fazer
tipo uma média com ele e deram uma exagerada, entendeu? O fato é que isso
acabou gerando um problema muito grande porque a partir do momento que as
pessoas achavam que isso aí não fosse dar em nada, que isso aí ia ser uma coisa
que, né... ainda mais porque esses caras que sequestraram, aí, sequestraram não é
bem a palavra, que extorquiram, né, o Raphael Viviani, eram pessoas que
trabalhavam no DOPS e tal, que era um órgão do governo que era temido pelas
pessoas, né, era, sei lá, como se fosse o BOPE hoje em dia, né, tropa de elite, era
uma coisa, assim, meio, né, conhecida por serem pessoas que trabalham de uma
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maneira truculenta sem estar muito amparado em leis, em mandados, né, essas
coisas todas. Então, assim, as pessoas não imaginavam que ninguém ia ter
coragem, né, de acusar o DOPS de nada e tal, que a coisa ia passar meio em
branco, Só que o que aconteceu é que o cara foi numa delegacia e prestou uma
queixa contra o Simonal, entendeu, na polícia civil, e aí isso virou um grande
problema porque, nessa época, exatamente nesse época, existe uma matéria na
revista Veja, na capa duma revista Veja, que é famosa que era uma entrevista, né,
com o Médici, que era o presidente do Brasil na época, dizendo que o presidente
não admite tortura, né, o presidente do país dizia que não havia tortura no Brasil,
assim. Era uma coisa, o presidente dando a palavra, né, na revista Veja, né, que era
a revista mais importante do Brasil, dizendo que isso não existia, que isso aí era
inventado e tal. E de repente jornais publicam que um ex-funcionário de um artista
famoso, né, de um „popstar‟ foi torturado numa delegacia a mando desse artista.
Isso acaba causando um mal-estar muito grande, acaba gerando um problema
seríssimo, inclusive até pro órgão de segurança, pro próprio DOPS. Eles tiveram que
dar explicações, né. E aí gerou uma confusão muito grande, entendeu. E aí que eu
acho que surgiu essa série de confusões, foi aí que nasceu essa confusão toda. E o
Simonal, pra piorar essa situação, quando ele for chamado pra depor na delegacia
por esse delegado, ao invés, sei lá, dele chegar e falar, sei lá, né, ou falar o que
tinha acontecido, ou tentar resolver isso de uma maneira, sei lá, dizer que, poxa,
houve um excesso, sei lá, tentar resolver isso de uma maneira mais tranquila, ele,
ainda acreditando nesse poder que ele tinha de resolver as coisas nesse poder do
carisma dele e tal, ele ainda, tipo, tentou impressionar o delegado, assim, tentou
exercer algum tipo de pressão dizendo pro delegado assim: „olha, o senhor tá
falando com o Wilson Simonal‟, entendeu, „você não tá falando com qualquer
pessoa, se você levar isso adiante você vai se dar muito mal, assim, porque eu sou
uma pessoa ligada ao governo‟, entendeu, assim, isso num excesso de bravata,
acredito eu, entendeu e, assim, qualquer pessoa que conhece o Simonal, que
conheceu o Simonal, que conviveu com o Simonal, acha isso totalmente plausível.
Isso era uma coisa que combinava muito com a personalidade dele, ele chegar pra
esse cara e falar uma coisa dessa, entendeu, tentar exercer um tipo de pressão e
poder no cara a ponto do cara ficar meio com medo, ficar „não, então vamos arquivar
isso aqui‟, tal, só que, assim, ao contrário, o delegado não se sentiu nem um pouco
pressionado e resolveu levar o processo, resolveu investigar, e aí as coisas foram só
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piorando, entendeu, porque aí ia precisar de uma justificativa, porque o grande
problema, em relação a essa história, assim, que se o Simonal quisesse se vingar,
por exemplo, desse ex-funcionário dele, ali, ele poderia ter chegado pros caras e
falado assim: „ó, o negócio é o seguinte, o cara mora na rua tal, no endereço tal,
esse cara é um pilantra, um não sei o que, vocês dão um sumiço nesse cara‟ os
policiais poderiam ter feito isso, entendeu, se a questão fosse, assim, dar uma coça
no cara, bater no cara, isso poderia ter sido duma maneira muito mais na moita,
entendeu. Na realidade não sei por que ele quis, acho que, com esse episódio com
o cara, de alguma maneira, demonstrar que ele tinha algum tipo de poder. Tanto
que, assim, no dia que os policiais foram prender o cara, os caras foram no carro do
Simonal com o motorista do Simonal, assim, entendeu, não existia uma
preocupação em ser uma coisa... era como se ele quisesse ser reconhecido no
sentido de “ó, eu quero que as pessoas que tão me roubando, esses caras que tão
tentando me passar a perna, eu quero que eles vejam com quem eles tão se
metendo”, entendeu, com que tipo de pessoa que eles tão de metendo, era mais
uma coisa, assim, uma demonstração de poder que, na realidade, ele não tinha
porque, se ele tivesse, aí ele teria se dado bem, uma coisa ilusória, assim, né, na
cabeça dele, que, se ele fosse essa pessoa que, realmente, tivesse todas essas
conexões e ligações ele não teria sido… Tanto que o processo acabou sendo levado
adiante e a única pessoa que foi condenada e processada e que foi presa foi ele.
Nem os policias que torturaram o cara foram se quer presos, entendeu, e ele acabou
sendo processado como um mandante desse episódio e acabou sendo o único
penalizado tanto judicialmente quanto moralmente, isso acabou tendo um reflexo
definitivo na continuidade da carreira dele e ai isso tudo, temperado com os ânimos
quentes da época, temperado também com uma grande inveja e um certo bode que
as pessoas tinham dele na época, dele ser um cara meio petulante, essa coisa do
cara negro que anda bem vestido de nariz empinado, que anda de mercedes com
louras, isso gerava um certo mal estar. Então essa situação acabou sendo um prato
cheio pra essas pessoas que não simpatizavam com ele, que tinham esse pé atrás
com ele, pudessem se ver livre da figura dele, entendeu. Então, eu acho que isso
também ajudou muito essa fama de delator, informante, ela acabou sendo muito
bem aceita e bem sucedida, porque havia esse pântano, esse mal estar, entendeu,
essa situação toda, isso acabou servindo de alicerce. Como a historia também era
uma historia que ninguém falava dessas coisas muito claramente na época, existe
81
um medo, as pessoas têm uma insegurança total de tocar em certos assuntos, então
o simples fato de ter uma dúvida e tal isso já é suficiente pra se construir uma coisa
que, com os anos, foi se consolidando até chegar o ponto de as pessoas acharem e
terem certeza absoluta disso.
Alina: E qual o papel que você acha que a mídia teve nesse momento?
Max de Castro: Eu acho que a coisa foi uma coisa meio crescente, assim, a princípio
O Pasquim, que era um jornal que fazia muito sucesso na época, que era uma mídia
alternativa, que era uma coisa quase de humor, mas que tinha um papel de
formação de opinião muito importante, e era aonde o Simonal tinha uma grande
antipatia. As pessoas, os jornalistas que trabalham no Pasquim, não simpatizavam
com o Simonal porque ele representava muito o contrário dos ideais, era um jornal
de esquerda, pessoas que combatiam diariamente a ditadura e eles tinham um
papel quase que de guerrilha mesmo, né, cultural, né. E eles viam no Simonal um
cara vendido ao sistema, um cara que, ao invés de usar o sucesso dele, a
popularidade dele, pra falar coisas importantes, ele era um cara que talvez estivesse
usando isso pra fazer uma música comercial. E ele também não tinha uma posição
muito clara, entendeu, se ele estava a favor ou contra naquela situação. E quando
teve esse episódio do contador que vazou pras páginas policiais e tal, O Pasquim,
foi um prato cheio, usou isso de uma maneira exaustiva, assim, e O Pasquim foi
meio que, ele desenhou essa expressão até, essa coisa de associar o nome do
Simonal com o dedo-duro, porque eles fizeram uma charge que a legenda da charge
era o dedo ereto de Simonal, e ai eles inauguraram isso dai e começou num nível
muito de boataria ainda, as pessoas comentavam isso, mas as pessoas não
achavam que isso era uma coisa… eu acredito que nem eles, embora eles tenham
sido muito covardes e cruéis com o Simonal, mas acredito que inicialmente assim
nem eles achavam que isso ia tomar a proporção que tomou, entendeu. Era uma
coisa assim que as pessoas comentavam, então, mas o Simonal, até então, era um
artista famoso que estava… tanto que, assim, ele logo após os primeiros
depoimentos, assim, das coisas da delegacia, quando começou o processo, ele
mudou de gravadora e todo mundo achava: “isso é uma coisa passageira”, “ele vai
gravar um disco novo”, entendeu, “isso não vai dar em nada”, “o Simonal vai superar
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isso aí”, “isso aí é besteira” e tal. Só que a coisa foi tomando uma proporção maior
do que todo mundo esperava e coincidentemente a carreira artística do Simonal
também não se manteve no mesmo passo que vinha antes disso, entendeu. Ele
continuou uma pessoa conhecida de sucesso, gravando discos e tal, mas os discos
não foram fazendo tanto sucesso quanto os outros que ele tinha lançado
anteriormente e ai, inversamente proporcional, essa história ia crescendo, entendeu,
e a coisa artística ia descendo. Até chegar num ponto, que foi em 74, quando ele foi
condenado, porque o processado foi de 71 a 74, a sentença… o processo só
foi finalizado e ele só foi condenado em 74. Quando ele foi condenado, em 74, a
condenação dele foi uma coisa meio estranha porque as pessoas não lembravam do
fato por que que ele estava sendo condenado, entendeu. Que na realidade, assim,
mesmo que ele tenha sido informante do DOPS ou de qualquer órgão de segurança
naquela época, você ser informante, isso não é crime, entendeu. Isso aí não é crime
nenhum, hoje em dia tem isso, dique denuncia e tal, você pode julgar moralmente o
que você acha certo, o que você acha errado, mas de fato isso não representa um…
dentro da constituição isso aí é uma coisa completamente, tá fora de qualquer
atitude criminosa. E, na realidade, foi condenado pelo fato de ser mandante dessa
suposta extorsão do Raphael Viviani, né, só que as pessoas… já fazia quatro anos,
as pessoas nem lembravam mais essa historia do contador, entendeu. Então ficou
uma coisa, assim, isso foi como se fosse uma confirmação, entendeu, “ah então
quer dizer ele era informante”. Ele foi condenado e, na época, existia uma assim…
talvez também foi o caso do momento político da ditadura e tal, as informações,
assim, elas não tinham... a guerra política é uma guerra muito suja, as informações e
contrainformações, elas são usadas pra confundir. Não havia uma clareza, assim,
nas coisas, então as pessoas não estavam sendo... não tinham ao certo, não
sabiam porque ele estava sendo condenado. E a pena do juiz foi uma pena muito
dura, porque ele foi condenado a quatro anos e, acho que quatro anos e meio de
prisão, e o réu primário, existia uma lei, né, acho que é, se não me engano é “lei do
falcão”, que é uma lei que diz assim: que a pessoa que é réu primária, ela tem o
direito, quando ela é condenada, seja pelo crime que for – a não ser que ela, que
seja em... que ela seja presa em flagrante –, ela tem o direito de... porque, assim, o
advogado, quando ele foi condenado, o advogado dele pediu recurso, né, pediu…
ele recorreu da sentença do juiz e, por essa “lei falcão”, se a pessoa é ré primária
ela tem direito de esperar esse recurso do… da pena em… enquanto ele não for
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julgado novamente numa estância superior, ele tem direito... qualquer réu primário
tem direito a esperar em liberdade por esse recurso. E o juiz, quando condenou ele,
falou assim: “devido à alta periculosidade dele”, ele revogou essa possibilidade de
esperar, ele teria que esperar esse recurso preso, no presídio, entendeu, então foi
uma coisa, assim, que o juiz... esse juiz, o Menna Barreto, é um juiz superligado... a
família dele, a linha, porque, assim, a árvore genealógica, lá, dos militares, vem de
várias né… esse juiz era ligado aos juízes do golpe de 64, então eram juízes “super”
do exército, assim, mesmo, do governo, entendeu, e isso também acabou sendo até
uma espécie de... não de prova, mas, assim, se ele tivesse realmente algum tipo de
ligação efetiva com o governo e com os militares, esse juiz jamais condenaria,
assim… Além dele ser condenado, ele foi condenado com rigor, o maio rigor que
pudesse ter sido, com adendo ainda que o juiz, sem precisar, o juiz ainda
acrescentou na sentença que, assim, que o fato dele ser, assim… ele ainda
acrescentou que ele, confirmou que ele realmente era informante na sentença, o que
é uma coisa muito... o que é uma coisa muito cruel, assim. Primeiro, porque isso não
faria diferença, porque, como a gente já falou, a pessoa ser informante não é uma
atitude criminosa e, segundo, que a gente sabe, dentro dos códigos dos presos, os
informantes né, os… o cara que é dedo-duro, o cara que é “cagueta”, ele sofre um
tipo de penalização dentro da cadeia, entendeu. Então além do juiz ter pesado na
mão na sentença de… ele ainda colocou isso na sentença, que é uma coisa que
poderia até, sei lá, ele poderia ter sofrido algum tipo de retaliação pelos próprios
presos, entendeu. Porque dentro do código da bandidagem eles não admitem cara
que mata a mãe, cara que violenta criança, que abusa de criança, e dedo-duro não é
aceito. Dentro do código de honra dos bandidos, isso é uma coisa inaceitável. Então
tem todas essas questões, entendeu, que é… e aí, a partir desse momento, criou-se
uma … que aí…. criou-se quase uma confirmação dele, e acho que a partir daí pra
frente que ele realmente... quando começou a ter problemas na carreira diretamente,
porque ele já não vinha duma fase, assim, comercial, artística muito boa, e aí, a
partir disso… aí que nego começou a boicotar mesmo, nego que trabalhava em
rádio, em televisão, entendeu, ele começou a sofrer um boicote, a ser velado, a
própria classe artística não simpatizava assim… de estar envolvido… em projeto que
ele estava envolvido também, entendeu? E dali pra frente ele começou a ter sérios
problemas e… e aí que acho que mudou muito, porque, assim, até ali ele era
atacado pela imprensa, entendeu, ele era um cara combatido e tal. A partir desse
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momento, a imprensa resolve dar um gelo nele, assim… ele passou a ser uma
pessoa que é… como se houvesse uma combinação, assim, uma pessoa que não
deveria… é… uma pessoa no qual não se deve falar, assim, entendeu? Então isso,
na medida que o tempo foi passando, isso aí foi muito cruel, porque a pessoa estava
tendo o nome apagado da história, entendeu? Então, assim, a princípio o cara não
fala, porque o cara não quer citar um cara que ele acha mau caráter, porque o cara
é informante, entendeu, informante dos militares, mas dali a cinco anos, como ele
está há cinco anos sem falar nesse cara, ele… passa a ser normal não falar desse
cara, entendeu? Então o cara vai falar assim, não… aí sei lá… por volta do começo
dos anos 80 as pessoas falam assim: “na época da bossa nova”, falavam o nome de
todo mundo e não falavam no nome dele, “na época da Record”, falavam o nome de
todo mundo e não falavam no nome dele, e aí, com o tempo, ele foi esquecido,
entendeu, porque as pessoas realmente estavam há anos sem falar nele, ele
acabou virando uma… uma pessoa… ele acabou sendo apagado de dentro da
história a ponto de… de pessoas escreverem livros, né, fazerem programas e tal,
representando uma determinada época, e que o nome dele não aparecia.
Alina: E você sabe se, naquela época, o Simonal chegou a aparecer na mídia se
explicando? Se ele teve esse espaço?
Max de Castro: É, exatamente... e com o tempo também ele foi ficando… porque,
assim, a coisa ia tomando uma proporção, assim, muito, assim… cada coisa que era
falada virava... entendeu, virava uma bola de neve, virava mil… acabava se
transformando em outra história, né. Tem essa coisa, você fala, você dá uma
entrevista e fala uma frase, e dá uma opinião num determinado contexto. Quando
isso é tirado desse contexto, acaba virando uma outra coisa completamente…. e aí
isso passou a ser uma coisa constante, assim, entendeu, a ponto que ele…
resolveu… é… acho que chegou um momento que nem ele mais sabia, entendeu, a
origem dessa confusão toda, da onde começou , onde… que, assim, eram tantas
histórias, eram tantas versões, eram tantas opiniões, eram tantas… que nem ele
mesmo sabia como desarmar essa bomba mais, devido ao… né… ficou um nó tão
embaraçado que realmente era assim… só o tempo mesmo, né, só o tempo e só
uma… a chegada de uma nova geração completamente livre de qualquer ranço
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ideológico e que pudesse pegar esse assunto de uma maneira fresca, assim, e
pudesse se debruçar nisso. Por exemplo, isso que você está fazendo hoje em dia,
agora, o seu trabalho de conclusão de curso, há 20 anos atrás isso seria impossível,
entendeu. Se você chegasse pra sua professora e falasse assim: “ó eu quero fazer
um trabalho sobre o Simonal”, aí, assim, de duas uma… ou ela não ia ter ideia de
quem era o Simonal, ou ela falava assim: “cara, não se mete com isso, pelo amor
de Deus, isso aí é...”, entendeu? Virou... a coisa acabou ganhando status de tabu
assim, entendeu, até recentemente, né. Até recentemente era um assunto, assim...
que é… assim, que te gerava um desconforto muito grande, assim, às vezes
aparecia um jornalista, falava assim: “não, pô, Simonal, eu tenho que fazer uma
matéria com você, pô, tem que contar essa história, eu quero fazer uma entrevista
com você pra você dar a sua versão, não sei o quê”, aí ele ficava todo animado e tal,
não sei o quê, aí o jornalista ligava pra ele e fala assim ó: “a reunião de pauta aqui
do jornal, cara… infelizmente caiu a pauta, não dá pra…” entendeu, era uma coisa
impossível, cara , entendeu. Chegou… chegou a ponto de ser uma coisa é…
assim… impossível e… e aí isso é ruim porque, por exemplo, o lado musical, através
desses anos todos, a gente teve uma série de artistas que tiveram resgate… né?
Tipo, sei lá… o Jorge Ben ficou durante os anos 80 meio sumido… e ali, no final dos
anos 80, quando ele grava “W Brasil”, a garotada, através do sucesso do “W Brasil”,
conhece o Jorge Ben e, através do sucesso dessa música, pode… pô, recuperar o
“Mas Que Nada”, o “Fio Maravilha”, as músicas antigas dele, entendeu. Isso se deu
um processo de redescoberta e o cara conseguiu… renascer de novo e voltou a ser
um, né… teve a obra dele… novamente revalorizada. Com o Simonal isso era
impossível porque, assim… é… qualquer pessoa que fosse gravar uma música do
Simonal, ou que fosse falar do Simonal, ia ter que entrar nesse assunto “mas, pera
aí, o cara”… entendeu, aí, assim... era uma coisa, assim... que era…. dava tanta dor
de cabeça que a pessoa…. Sabe, “então vou gravar um disco do Tim Maia, que é
mais fácil”, entendeu? Então gerou um… que a coisa parecia ser impossível,
entendeu, de ser quebrada. E aí, por exemplo, nos anos 90, né... a gente teve… o
Nelsinho Motta escreveu o livro chamado “Noites Tropicais”, né, que ele contava
várias passagens da vida dele e tal... e o Nelsinho Motta, por ser um cara… assim…
muito querido e, assim, um cara que tem entrada em vários tipos, né… o cara é
parceiro do Lulu Santos e ao mesmo tempo é amigo do Zuenir Ventura e é querido
pelo Millôr Fernandes, né… o cara, assim… e é amigo do Boni, da Globo, né… um
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cara, assim… que as pessoas têm… ele tem entrada em, né… em vários setores.
Ele escreveu, ali, dois capítulos sobre o Simonal naquele livro que foi, assim… eu
posso chamar de o “big bang”, né… momento zero do processo de redescoberta do
Simonal ali… porque ele, como era um cara que não tinha rabo preso com ninguém,
ele falou: “ah, cara, eu vou escrever o que eu acho e doa a quem doer”, assim,
entendeu. E aí, lentamente, foi quebrando, né… essas amarras, esse assunto foi
deixando de ser é…. um tabu, assim…. mas foi uma coisa muito lenta, assim. A
ponto que, em 2001, o Cláudio Manoel, né... do Casseta e Planeta, ele me procurou
e procurou o meu irmão dizendo, falou assim: “olha, eu li o livro do Nelson Motta, lá,
fiquei muito, é… fascinado pela história do Simonal e, pô, cara, eu gostaria de fazer
um documentário sobre a vida dele, vocês autorizam… vocês me autorizam a
pesquisar, a pesquisar e tal?”. Eu falei: “pô, claro, vai em frente” eu falei assim:
“sinceramente, acho que você não vai conseguir fazer, acho que é impossível, mas
pô…” assim…. “o apoio que você precisar da gente, né… tanto eu quanto o meu
irmão, você vai ter e tal”. Ele ficou superfeliz e aí ele …. isso foi em 2001, em agosto
de 2001, e ele falou assim: “não, semana que vem eu tenho uma reunião com...”,
né… naquela época o Casseta e Planeta estava no auge, né… eles tinham o
programa na Globo ainda…. e eles estavam vindo duma temporada super bem
sucedida, assim…. eles estavam começando a fazer o primeiro longa, o primeiro
filme. Casseta e Planeta estava bombando e ele falou assim: “Ó, eu vou pedir… eu
vou falar com o meu patrocinador aqui, que é o cara que patrocina o Casseta... uma
empresa…” ele nunca quis dizer quem era…. pra gente ele falou assim: “pô, mas
acredito que… tá entendendo… a gente não vai ter problema pra fazer esse filme,
os caras vão bancar, pô… vai ser demais e tal….”. Aí, beleza, na semana seguinte
ele chamou a gente… ele chamou de novo eu e o meu irmão pra gente almoçar lá
na casa dele… e aí ele já estava com um semblante completamente diferente de
que ele estava na semana passada, que ele estava todo empolgado, feliz da vida,
ele estava meio, assim… meio cabisbaixo…. e aí ele contou pra gente que ele foi
até o… patrocinador, levou projeto, né… do filme, né…. que ele tinha feito e tal….
com a sinopse, com tudo… com o material que ele tinha levantado de pesquisa,
coisa de jornal…. levou pro cara e o cara chegou , olhou assim… tipo… deu uma
folheada, assim, e virou pra ele e falou assim: “cara… não se mete com isso, não,
cara …. esse pessoal aí, essa gente é muito poderosa, não sei o que… vc vai se
dar mal… sai dessa…" entendeu? Aí ele… foi aí que ele, saindo dessa reunião com
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o patrocinador, que ele viu, assim, “cara, aí tem…. nessa história tem alguma coisa”,
entendeu, então ele falou assim: “agora… tipo, assim, eu estava com vontade de
fazer, a partir de agora virou, tipo, uma missão de vida”, entendeu. Aí ele chegou pra
mulher dele e falou que ia vender uma …. ele tinha um…. um imóvel… né, que eles
alugavam, lá, que eles não estavam usando ele falou assim: “vou vender aquele
apartamento pra fazer esse filme” e a mulher dele falou assim: “vai em frente, tal, te
dou o maior apoio” e aí foi assim que ele fez o filme. Isso foi em 2001, o filme
estreou em setembro de 2009, foram oito anos pra fazer um documentário, então
você imagina assim o… realmente o trabalho né... e o quanto... entendeu. E a partir
do momento que eu… é…. que a gente teve, né… acesso a essas imagens né…
porque o filme, além de esclarecer é…. de tentar contar, pelo menos, depois de
muitos anos né…. essa história, o que aconteceu, o que não aconteceu, né…. tem
uma entrevista com o Raphael Viviani no filme e tal…. além de tudo isso, foi a
primeira chance em muitos anos…. em 30 anos... do cara ver uma imagem do
Simonal cantando, entendeu? então isso também teve um poder... inesperado
assim… porque, a princípio… os caras, né…. se achava, assim, que o mais
importante do filme era saber se o cara tinha sido dedo-duro ou não… mas, no final
das contas, as pessoas ficaram encantadas com o artista, entendeu? E aí o drama
da vida dele e o... né…. as coisas que ele…. as atitudes que ele teve, que
ele cometeu durante a vida, passaram a ser... ter um julgamento, assim… uma
coisa humana… um julgamento que todo mundo erra e todo mundo... pelo menos
está suscetível a errar, né…. as pessoas não são perfeitas e tal. Mas um artista, tipo
assim… a pessoa ver assim... um cara cantando e fala assim: “pô, bicho, como é
que eu tenho 35 anos e nunca soube que no Brasil existia um artista desse”,
entendeu, um cantor, assim, que pudesse cantar pau a pau com a Sarah Vaughan,
entendeu? O cara, assim, uma pessoa de 35 anos não saber que existiu no Brasil
é…. entendeu, é a mesma coisa, sei lá…. se você me mostrar um vídeo, hoje em
dia, e eu falo assim: “cara, não sabia que existia o Ray Charles”, entendeu, como é
que eu vivi todos esses anos sem saber que, pô, nos Estados Unidos tinha um
cantor como o Ray Charles... é uma coisa até meio inconcebível, assim… e aí,
através disso…. coincidiu também com…. pelo fato de eu e o meu irmão, a gente
também ingressar na carreira musical, e aí as pessoas foram obrigadas a falar do
Simonal de uma maneira ou de outra, porque não tinha como não falar, né….. e isso
foi uma coisa, também, que ajudou no início… eu me lembro que, quando eu lancei
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o meu primeiro disco, era muito comum, é…. assim…. bem na matéria, assim, tipo
assim, né…. “Max de Castro lança Samba Raro” aí tinha uma foto minha, o texto,
né…. a crítica do disco e sempre, assim, embaixo um “boxinho” assim: “quem foi
Simonal?” Porque o cara botava, assim, ah, “filho do Simonal”, mas, assim, era
engraçado, porque tem dessa coisa de filho de artista, né…. da geração de filho de
artista, mas no nosso caso, na realidade, a gente era…. o Simonal era o pai do Max
e do Simoninha, não a gente que era filho né…. naquela época, porque as pessoas
não sabiam, não tinham ideia. E aí começou um grande processo de redescoberta,
os discos dele foram relançados, as música começaram a tocar de novo, né…. e aí,
assim, misteriosamente, é muito engraçado, porque você vê essas correções do
tempo, né…. o nome dele começou…. o nome duma pessoa voltar pra historia é
uma coisa muito engraçada, porque aí, assim, morre é…. Paulo Machado de
Carvalho né…. aí você vê na Folha assim, aí assim: “Paulo Machado de Carvalho
foi…. a pessoa importante que fundou a tevê Record, não sei o quê, emissora que
revelou Elis Regina, Simonal...”. Aí ele passou a ser uma referência de novo,
entendeu, porque as pessoas…. passaram a ter o contato com a obra dele de novo,
então a gente… aquele espaço, que ele tinha sumido da historia, voltou a ocupar...
então…. então são essas coisas que… aí vem um processo de você…. muitos
trabalhos, entendeu... de conclusão de curso com o Simonal, sei lá, você deve ser a
décima, décima primeira que eu tenho conhecimento, fora os que eu não…. que eu
não vi ainda, muitos deles foram feitos. Que é uma historia que, realmente, as
pessoas…. quando se deparam, têm um interesse porque é uma história muito
interessante. Você ainda está fazendo um corte…. mais interessante ainda, que é
uma associação, né…. com a…. ainda faz uma relação com o Michael Jackson, né,
que é…. eles têm até um coincidência interessante, que eles morreram no mesmo
dia, tanto o Simonal quanto o Michael Jackson… então… não deixam de ter… acho
que, assim,. vários pontos em comum, ali … essa trajetória deles, essa coisa toda,
né…e, né, o Michael Jackson, ali, sendo acusado de…. aquela coisa de pedofilia…
o Simonal sendo acusado de… né…. sempre tendo uma coisa muito pesada, assim
né…. associada…. ao mesmo tempo, assim, que o cara é grande, que o cara é …
né…. que é uma coisa artisticamente quase imbatível e inalcançável, tem um outro
lado assim… que é uma coisa, né… trevas, assim, né…. engraçado isso…é…. essa
relação né… no caso dos dois, ali…. então, é…. mas é isso.
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Alina: A gente comentou sobre a empresa dele, né. Você sabe quem o Simonal tinha
trabalhando com ele? Que tipos de profissionais?
Max de Castro: Olha… com certeza, era o pior tipo delas, das mais é…. das mais,
como diria, assim….das mais, eu acho, assim, que essa…. que esse lado, assim,
dos negócios, assim, foram…. a visão dele, a intenção dele era muito boa, assim,
entendeu. Ele vinha numa ascensão artística, assim, muito interessante, ele, pô…. o
cara começou a cantar em... ele cantava em boate, era crooner, né… cantava na
orquestra que tocava no… na boate pros casais dançarem, aí ele, de lá… ele é
convidado pra cantar no Beco das Garrafas que, poxa... era o celeiro da criação
artística, assim. Mesmo ele sabendo que, assim… lá na boate que ele cantava era
uma coisa garantida, ali, ele tinha um salário né…. do … do dono da boate e indo
pro Beco das Garrafas ele estava a mercê ali, tipo, se hoje teve gente, o cara
ganhou se amanhã não tem ninguém, ele não ganhou nada, entendeu? Mas ali ele
deixou de ser um, né…. um músico qualquer e passou a ser um artista, né… ele
ganhou um status de né… de …. ganhou um status de pô,.. né… “hoje: Wilson
Simonal”, tipo, a pessoa saiu de casa pra assistir ele cantar, então isso... depois ele
descobriu a televisão é…. depois é…. o negócio foi crescendo, os shows e tal e os
empresários são é…. conhecidos né... tem a historia do Tim Maia, né, que durante
anos ele teve um gavião, né… de estimação, um gavião, um pássaro, gavião
mesmo, o Tim Maia, que ele só comia filé mignon, o gavião, e o nome do gavião era
Empresário: “preciso dar a carne pro Empresário, aqui [imitando Tim Maia]” porque,
assim… essas histórias são assim…. Assim, há incansáveis casos né…. do…
desse… do empresário que rouba o artista, que explora, que é… e justamente pra o
Simonal, ter essa dessa coisa de querer ser alguém na vida, de querer mostrar que,
“pô, eu vim de baixo, mas, pô, eu me dei bem e…” entendeu? “Ninguém vai me
tratar como...” né…. “como uma pessoa qualquer cara tem que me respeitar”. Então
dentro da filosofia dele, dentro projeto de vida dele, era um caminho muito certo ,
é…. a escolha que ele fez, entendeu, dele…. ele mesmo gerenciar a carreira dele,
ele tem que lidar, só que ele, com certeza, se juntou com pessoas é…. que não
eram as pessoas mais preparadas, com pessoas que é…. que assim... que é…. de
confiança muito questionável, assim, entendeu? Pessoas, assim, com perfil muito...
aproveitadoras mesmo, entendeu? E aí, ao invés dele melhorar a condição dele,
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né… a partir do momento que ele deixa de ser é…. sei lá…. deixa de ser
empresariado por um empresário pra ter controle maior do que ele vai ganhar e dos
gastos tudo…. acabou sendo uma coisa muito pior, porque o dinheiro
acabou… Muitas pessoas ali é…. se utilizando do dinheiro dele, dos investimentos
dele, acabou sendo uma coisa muito mal gerenciada, entendeu? Inclusive o Michael
Jackson também, o Michael Jackson sofria esse problema com o dinheiro que ele
ganhou, por exemplo, com os Jackson Five, ele…. se ele quisesse viver de renda a
vida inteira, ele poderia ter vivido, mas o pai dele sempre explorou os meninos
todos. Depois ele…. teve problemas é…. né…. com essa coisa do dinheiro e…. e no
final da carreira dele também assim…pela quantidade de dívidas que o Michael
Jackson tinha e o estado de calamidade administrativa que era a vida dele, né….
Pô, o cara morava num rancho, sei lá, que tinha uma roda gigante! Imagina só você
manter uma roda gigante, imagina que isso seja um... entendeu…. o
custo….imagina a empresa que ele tinha pra organizar só os custos pessoais dele,
era uma coisa faraônica, né…. e ele não tinha é…. o Michael Jackson era um
homem de 50 anos, né…. era um senhor, praticamente, ele não tinha mais um….
ainda mais num mercado como o americano, que é supercompetitivo, assim…. pô….
a Whitney Houston, que talvez seja uma das maiores cantoras de todos os tempos,
morreu afogada numa banheira, tinha bebido, sei lá, 15 latinhas de cerveja,
entendeu? é o fim do mundo, assim, quando você vê, assim, qualquer cantora,
Mariah Carey…. dessa geração mais nova, qualquer uma, todas imitaram a Whitney
Houston e ela não conseguiu se manter porque é uma concorrência…. é um
mercado muito... árduo, assim, uma coisa, né…. muito selvagem, e o Michael
Jackson, ele, assim, embora ele fosse um artista que tivesse…. um grande prestígio,
as pessoas amassem ele, tivessem né… uma “fanbase” extraordinária, ele não
conseguiria ficar… manter a popularidade dele, o sucesso dele na época do Thriller
entendeu. Era uma coisa que era impossível de ser mantida e, pra ele, devido a
essa má…. esse mau gerenciamento administrativo da carreira dele, isso fazia com
que ele tomasse atitudes também erradas, desconcertadas, acabasse fazendo,
entendeu, às vezes lançando discos em épocas desnecessárias, onde ele não
precisasse lançar discos, entendeu? Talvez a expectativa, o custo das produções e
dos clipes e tal, isso gerava um custo muito alto, que a demanda de um retorno né…
de lucro, a base era muito alta né. Então assim…. Pra um artista médio, se o
Michael Jackson vendesse, sei lá, é…. uma coisa que pra qualquer artista médio
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seria é…. uma vendagem 5 milhões, 6 milhões de discos, pra um artista como o
Michael Jackson era um prejuízo, entendeu? Se não fosse acima de 15 milhões, 20
milhões, não pagava a conta. Então acho que faz muito sentido essa comparação
com o Simonal, que ele acabou entrando num…. numa coisa comparativa nesse
sentido. Ali no final dos anos 70, no começo dos anos 70, né…. 71, um show do
Simonal tinha que ter umas orquestras um ballet, era uma coisa, assim, era um show
de um grande astro da música, de uma grande... entendeu. E essas coisas custam
caro, tem que ser muito bem administradas, entendeu? Essas …. essas decisões
artísticas tem que ser muito bem…. balanceadas com as decisões financeiras e
administrativas, entendeu, isso é uma coisa que não havia…. não havia esse
planejamento, as coisas foram sendo feitas assim, meio... entendeu, ao sabor do
vento, ao sabor do tempo.
Alina: Se você estivesse no lugar dele, teria feito alguma coisa diferente?
Max de Castro: Olha, difícil de responder essa pergunta, né… Acho, assim, difícil
porque a situação, ela molda muitas atitudes que as pessoas tem né… E, assim, de
alguma maneira a gente teve que aprender né... Eu digo a gente, a minha família. A
gente passou por isso né... Com ele né… Assim, de cada um do seu jeito, porque
isso acabou tendo desdobramentos definitivos né… Na história da minha família
né… Em diversos aspectos estruturais e então é difícil de saber, porque eu também
não saberia te dizer se eu seria essa pessoa que eu sou hoje se não tivesse tido
essa experiência toda que eu tive né…. Se não tivesse passado por tudo que eu
passei até hoje, então é difícil… Uma coisa difícil de imaginar entendeu? E ele
também… É de imaginar, ele é…. Sei lá se ele pudesse agir de uma outra maneira e
tal porque é uma coisa né…. São muitos elementos ligados né... Muita coisa
envolvida, então é difícil de ter esse tipo de imaginação. Eu posso te dizer aqui o
que eu tentaria né... Se fosse comigo, eu tentaria resolver a coisa da maneira mais
tranquila e clara, mas é, assim, é apenas uma suposição, assim, muito mal,
entendeu? Como eu posso dizer... mal, né… Sem muito fundo de realidade
entendeu? Porque... Agora, é realmente… A gente vive… Isso que é a coisa que é
importante que a gente estava dizendo né… Num momento atrás, o fato da gente ter
essa geração, pessoas como... Eu digo o fato de ter surgido uma nova geração de
possoas que tem uma cabeça diferente, que tem essa coisa sabe… Não tem um
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ranço ideológico, sabe, a gente vive num mundo que poxa, uma pessoa que era
guerrilheira na época da ditadura, é presidente do Brasil entendeu? Então… Esse
tipo de mudança de mentalidade também é muito responsável pelo fato do Simonal
ter sido redescoberto e poder estar vivo hoje em dia na cabeça das pessoas, na vida
das pessoas, entendeu? Porque foi preciso mesmo ter essa mudança, esse… O
tempo realmente… Porque as pessoas falam assim: Ah o tempo é o melhor
remédio, mas nesse caso realmente o tempo foi fundamental”, entendeu? Porque a
sociedade brasileira tem uma relação muito… E principalmente por causa dessa
relação com a ditadura, porque a sociedade brasileira tem uma relação não
resolvida com a ditadura, assim, as pessoas, acho que viveram aquela época,
tendem a ter uma relação com o passado diferente do que elas tiveram, entendeu?
Muitas pessoas hoje em dia falam assim: “ Ah naquela época eu fazia isso, fazia
aquilo”, mas na realidade, elas não faziam nada, entendeu? Eram coniventes ou
eram completamente a parte do que estava acontecendo, entendeu? Ou eram
alienadas ou se faziam de surdas e mudas, entendeu? Então, quando você mexe
com o passado, essa historia do Simonal... Acho que durou tanto também, porque
mexia com esse passado incômodo das pessoas, entendeu? A pessoa… Por isso
que essa coisa da teoria do "bode expiatório" no caso do Simonal, funcionou muito
bem porque você tem uma pessoa que pague por todos os males, entendeu? De
uma determinada época, assim, de um determinado momento. Isso acaba sendo
positivo pra todas as pessoas, entendeu? Não me lembro agora se em 78 ou em
79, tiveram eleições pra deputados né… Estaduais e federais, você pergunta pra
uma pessoa da geração do seu pai em quem que você votou? É um festival, assim,
tipo: “ah não lembro, não sei o que”, entendeu? Só tinha ou você votou no Arena ou
você votou no MDB, entendeu? Só tinham dois partidos naquela época, então,
assim, as pessoas querem também esquecer essa relação com o passado e se
tratando ainda do caso da classe artística, é pior ainda, porque o combate à ditadura
acabou servindo uma espécie de valorização artística, entendeu? você vê "fulano de
tal” pô, o cara ainda na minha época, as minhas músicas eram censuradas e eu, pô,
era contra a ditadura, entendeu? Hoje em dia é visto com o, assim, pô, esse artista é
um cara legal, entendeu? Porque tem um não tomando partido de nada, assim, mas
existe uma espécie de fetiche, assim, tipo essa coisa… Hoje em dia a pessoa ao se
declarar sendo de esquerda, tanto que é impossível uma pessoa hoje em dia falar,
assim: “Não, eu sou de direita”, aí eu sou uma pessoa... Até se bobear, aquele cara,
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aquele maluco lá... Aquele deputado que é homofóbico e tal... Que eu esqueci o
nome dele... É Feliciano, sei lá… Se bobear até ele fala: “Não, eu sou de esquerda”.
Tem umas, assim, a pessoa ser de esquerda é uma coisa chique, né... uma coisa,
entendeu? Então, tem todo esse lado também que é… A minha geração ainda
sofreu um pouco com esse ranço, mas a geração que veio depois de mim, já veio
completamente livre disso daí com a cabeça, entendeu? Com vontade de entender a
história, diz: “Espera aí, vamos ver o que aconteceu mesmo e tal… Uma coisa é
uma coisa e outra coisa é outra coisa pô… Ah, isso aqui é legal, isso aqui não é
legal. Pô, essa música aqui eu gosto, porque que eu não posso escutar essa
música?”, entendeu? Não tem mais essa né… Que, assim, a MPB pra você ter uma
ideia, MPB a sigla quer dizer música popular brasileira, mas a MPB virou um gênero
de música. MPB, o que que é MPB? A MPB é a música do Chico Buarque, do
Caetano Veloso, do Gilberto Gil, da Gal Costa. Quando na realidade, a MPB é tudo,
Luiz Gonzaga é MPB, Odair José é MPB, porque Odair José é música, não é
teatro... É brasileira, porque não é americana, é popular, porque não é erudito, até
onde eu sei. Então, assim, criou-se uma coisa, assim, né... Essa coisa da MPB é
uma música, assim, tipo... Não é boa música popular, entendeu? É música que você
que tem uma cabeça, é uma pessoa inteligente, uma pessoa que tem um nível
social, um bom nível social e intelectual, você ouve MPB, entendeu? Isso é uma
coisa que hoje em dia não tem mais. As pessoas ouvem forró, ouvem Techno
Brega, ouvem Chico, Caetano, ouvem Simonal, não tem mais essa separação,
porque isso foi criado pra criar esse racha social, entendeu? Tipo assim... a patroa
ouve MPB e a empregada ouve Sidney Magal, entendeu? Era um coisa, assim,
tipo... A minha empregada não pode ouvir a mesma música que eu
ouço, porque nós pertencemos a classes sociais diferentes, entendeu? Eu sou uma
pessoa intelectualizada, então eu ouço Chico Buarque, ele ouve Sidney Magal e
hoje em dia isso tudo caiu por terra. Essas definições... Isso aí virou uma bobagem,
então esse terreno novo, essa nova maneira de pensar, isso foi muito bom pro
Simonal e o fato da música dele ficar sem ser ouvida tantos anos, assim, por um
lado foi triste por ele, porque ele passou 20 anos assim, entendeu? Sendo uma
espécie de fantasma e não teve essa chance de poder ver as pessoas né… A
garotada hoje em dia, as pessoas cantando a música dele, não teve essa chance de
rever isso, mas por outro lado essas pessoas que tiveram contato com a música
dele, agora tem uma relação, assim, tipo assim, de pegar um negócio... Parece que
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ficou como se tivesse ficado congelado, né? E foi descongelado, agora a coisa é
“fresh” né... Tem um sabor de novidade, porque o negócio ficou ali fora de
circulação, então as pessoas tem um contato pela primeira vez, então é como se
fosse uma música nova. O cara ouve "Nem Vem Que Não Tem" no filme “Cidade de
Deus”... Ele fala assim: “Pô, é Marcelo D2? É Seu Jorge? Quem que canta isso?”.
Pro cara é uma coisa nova, entendeu? O cara não ouve aquilo como: “Putz... É uma
música de 40 anos atrás." Então isso, por um lado, é uma coisa bacana também,
entendeu? Que é uma coisa também que tem a relação… Por exemplo, eu tenho
dois filhos, um tem 7 anos e outro tem 11, quando o Michael Jackson morreu, foi
aquela comoção nacional, todo mundo assim… Jornal Nacional: “Morre Michael
Jackson”. Os meus filhos não sabiam quem era Michael Jackson, mas virou
assunto: “Pô morreu o Michael Jackson" em todos os jornais, todas as capas de
revistas e aí eu fui mostrar os discos, a música do Michael Jackson pra eles… E eles
assim, de cara se apaixonaram pelas músicas do Michael Jackson, ficaram assim
tipo completamente fascinados, o que foi uma coisa bacana também, porque o
Michael Jackson por exemplo é um artista que é muito fruto dessa coisa da… do
poder da indústria, do sistema, da indústria cultural americana, a música americana
imperialista, não sei o quê… Quando os meus filhos ouviram “Thriller" pela primeira
vez ali não tinha Empire, não era revista Veja, não era Sony Music , não era… Eles
ouviram uma música pela primeira vez e se encantaram, então isso é a prova
também que a obra artística, ela tem um… Ela pode ser obviamente ancorada por
essas estruturas de mercado e pelo dinheiro e pela mídia, mas a música, em si, ela
tem uma força , a obra de arte ela tem um né… Porque que a Mona Lisa é a Mona
Lisa e… Imagina quantos autorretratos… Então é uma força, é um poder muito
grande também e os meus filhos super animados e fãs do Michael Jackson e aí eu
lembrei que, além da música, tem os clipes, tem imagem e eles são de uma geração
que assim, o meu filho só ouve música no Youtube, pra ele o “escutar música” é
uma coisa que praticamente… Pra ele e pros amigos dele é uma coisa que não
existe, assim…. Essa experiência de ouvir música. Música é só… É uma coisa que
você ouve quando você está vendo uma imagem junto, e aí quando eles viram os
clipes do Michael Jackson, eles viram o clipe do “Thriller”, aí é uma coisa que não
tem explicação e é essa coisa assim…. Um clipe como o “Thriller" que é feito em 82
imagina, tipo… Que era uma época do videotape, do VHS e é um negócio que tem
um frescor, assim…. Poucos vídeos que a gente pode assistir hoje que a gente vai
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ter um impacto tão grande que nem a gente tem com ele, então isso é uma coisa
muito importante, essa mudança de mentalidade, essa mudança de contexto…. O
contexto é tudo, isso é uma coisa que a gente nunca pode esquecer… E seja o que
for, seja a disciplina que for, seja no mundo das artes, da política, da historia e da
ciência… O contexto é tudo… Então, essa mudança de mentalidade e esse espírito
novo, foi fundamental tanto pra redescoberta do Michael Jackson quanto do
Simonal.
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