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O ESTADO NO DIREITO INTERNACIONAL PBLICO: FORMAO E EXTINO
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Josu Scheer Drebes*
Estado a Nao socialmente organizada.
(Antnio de Oliveira Salazar Poltico portugus).
RESUMO:Os Estados soberanos so os principais sujeitos de Direito Internacional Pblico, tanto do ponto devista histrico quanto do funcional, j que por sua iniciativa que surgem outros sujeitos, como asorganizaes internacionais. O objeto deste ensaio, ento, conceituar o Estado, quais so seuselementos e seu processo de desenvolvimento, com nfase s conseqncias advindas de seu
aparecimento e supresso no cenrio internacional.
PALAVRAS-CHAVE: Formao do Estado; Reconhecimento de Estado; Reconhecimento deGoverno; Classificao dos Estados; Extino dos Estados; Sucesso de Estados.
ABSTRACT:Sovereign states are the main subject of Public International Law, both from the historical point of viewas the functional, as it is on its own initiative that arise other subjects, such as internationalorganizations. The object of this essay, then, is to conceptualize the state, what are its elements andits development process with emphasis on the consequences arising from their appearance andsuppression in the international arena.
KEY-WORDS: State formation; Recognition of State, Government Recognition, Classification ofstates; Extinction of States; Succession of States.
SUMRIO: Introduo 1.Conceito e elementos constitutivos do Estado 2. Formao do Estado 3. Reconhecimento de Estado e de governo 3.1. Reconhecimento de Estado: conceito e natureza
jurdica 3.2. Formas de reconhecimento de Estado 3.3. Reconhecimento de governo 3.4.Reconhecimentos especiais 3.5. Reconhecimento por organismos internacionais 3.6. O Estadono reconhecido 4. A classificao dos Estados 4.1. Estados simples ou unitrios 4.2. Estadoscompostos 4.2.1. Estados compostos por coordenao 4.2.2. Estados compostos porsubordinao 5. Extino dos Estados 6. Sucesso de Estados Concluso Referncias
INTRODUO
O Estado a pessoa de Direito Internacional Pblico que se acha dotada de
capacidade plena, tanto no mbito interno, quanto no externo, recordando-se que
nem as organizaes internacionais e nem a pessoa humana, apesar da importncia
que esta ocupa na atualidade, possuem a totalidade e a extenso dos poderes
inerentes situao jurdica do Estado.
*Advogado. Bacharel em Cincias Jurdicas e Sociais pela Faculdade de Direito da PontifciaUniversidade Catlica do Rio Grande do Sul - PUCRS. E-mail: [email protected]
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Nesse particular, o captulo 1 reporta-se ao estudo dos elementos
constitutivos do Estado perante o Direito Internacional, quais sejam: territrio, povo e
governo, a fim de apresentar um conceito mais preciso do instituto e identificar o
momento em que o Estado adquire sua personalidade jurdica internacional.
Assim como todos os organismos, e os prprios seres humanos, os Estados
tambm possuem o seu processo de desenvolvimento, que inicia com seu
nascimento, passa por sua transformao e pode terminar com sua extino,
todavia, a preocupao do Direito Internacional funda-se exclusivamente nas
conseqncias advindas de seu aparecimento e supresso no cenrio internacional.
Nesse particular, os captulos 2 e 5, tm por escopo a contextualizao do papel do
direito na soluo de conflitos que podem advir destes fenmenos.A partir do momento em que, de fato, um novo Estado surge no mapa
geopoltico mundial, pela integrao de uma sociedade humana, sob a autoridade de
um governo soberano, em dado territrio, emerge consigo a questo do
reconhecimento de Estado, no que tange a insero da nova coletividade
comunidade internacional, tema este a ser abordado no captulo 3.
Os Estados, por sua vez, surgem na sociedade internacional em diferentes
momentos e sob diferentes formas, sendo necessrio classific-los afim de que suascaractersticas prprias sejam destacadas em suas variadas modalidades. Dentro
desse panorama, o captulo 4, busca traar uma exposio acerca da classificao
que pode ser colocada em relao aos Estados, levando em conta a sua estrutura, a
fim de que seus caracteres individuais sejam evidenciados.
Por fim, o captulo 6, expe magistralmente o instituto da sucesso que nada
mais do que a transferncia de direitos, obrigaes, e/ou propriedade de um
Estado anteriormente estabelecido a um novo.A presente pesquisa no pretende esgotar o tema relativo pessoa do
Estado perante o DI, no que diz respeito aos aspectos relacionados sua formao
e extino, mas apresentar um estudo de caso, de modo a contribuir
significativamente bibliografia especfica existente sobre o assunto.
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1. CONCEITO E ELEMENTOS CONSTITUTIVOS DO ESTADO
Na formao da sociedade internacional o primeiro ente a tomar assento na
condio de sujeito de Direito Internacional foi o Estado, tido como nico e absoluto
at o incio do sculo XX. Quando da ecloso da Primeira Guerra Mundial, tal
concepo foi abandonada dada emergncia na ordem poltica internacional das
chamadas Organizaes Internacionais e tambm quando os prprios indivduos
comearam a participar objetivamente de alguns domnios internacionais, at ento
reservados com exclusividade aos Estados.1
O contexto histrico que envolve o surgimento do Estado Moderno encontra
referncia na doutrina de Mello: na Idade Mdia que surge o primeiro Estado moderno, com Frederico II da Subia noreino da Siclia que cria a primeira monarquia absoluta, durante a primeira metade dosculo XIII. Entre suas realizaes esto: a) elabora as constituies de Melfi,codificando o Direito; b) cria uma administrao; c) inicia a secularizao; d) abole ospoderes intermedirios (nobreza); e) os cargos pblicos deixam de ser possudos a ttulopessoal, etc.2
Entretanto, isso no significa que antes deste, no tenham existido
sociedades politicamente organizadas, com elevado grau de desenvolvimento e
autonomia, de que eram exemplos as cidades italianas de Veneza, Pisa, Milo eBolonha, que ficaram conhecidas pela quebra do isolamento caracterstico do
perodo medieval, a partir do instante que passaram a intensificar reciprocamente s
suas atividades de intercmbio, inclusive com outras naes.3
A denominao de Estado tem sua origem do latim status, que significa
estar firme, simbolizando situao permanente de convivncia e ligada sociedade
poltica. Aparece pela primeira vez em O Prncipe, escrito por Nicolau Maquiavel em
1513.De outra banda, o jurista alemo Carl Schmitt, assinala que a personalidade
do Estado soberano impe-se a partir da Paz de Westflia de 1648, que inaugurou o
moderno sistema internacional, ao acatar consensualmente noes e princpios
como o de soberania estatal e o de Estado nao.4Assim, a partir do sculo XVIII, o
1MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 383.2MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 356.3MAZZUOLI, op. cit., p. 383-384.4MELLO, op. cit., p. 363.
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Estado moderno e a Nao moderna fundem-se para constituir o que hoje se
denomina de Estado-nao, que se mostra superior tanto em relao s cidades-
Estado quanto aos herdeiros modernos dos primitivos imprios.5
Na tradio alem, Estado um termo jurdico que se refere, ao mesmo
tempo, Staatsgewalt(um ramo do poder Executivo que garante a soberania interna
e externa), Staatsgebiet (um territrio com limites claramente definidos), e
Staatsvolk(o conjunto total dos cidados que o compe, coordenados abaixo sua
jurisdio).6Accioly define o Estado, em sua concepo jurdica tradicional, como:
uma comunidade poltica independente, estabelecida permanentemente num
territrio determinado, sob um governo e capaz de manter relaes com outras
coletividades da mesma natureza.7
Mello, por sua vez, traz a concepo poltica de Estado de acordo com a
teoria de Max Weber que o qualifica como:
a) uma ordem administrativa e jurdica;b) um aparato administrativo que regulamentada por uma legislao;c) autoridade legal sobre as pessoas;d) autoridade legal sobre pessoas e atos praticados no seu territrio;e) legitimidade para o uso da fora.8
Com isso, percebe-se que o conceito de Estado no Direito Internacional no
o mesmo que lhe atribui a Teoria Geral do Estado, sendo mais restrito e com
particularidades diversas.
De qualquer sorte, os Estados so considerados os principais atores do
Direito Internacional, assim como as pessoas naturais o so para o direito civil.
Embora os Estados no sejam mais os nicos entes da sociedade internacional, por
sua iniciativa, que surgiram outras pessoas jurdicas, como as organizaes
internacionais.
Para Mello, pode-se definir o Estado, em sua concepo jurdica moderna,
como:
O Estado sujeito de DI aquele que rene trs elementos indispensveis para a suaformao: populao (composta de nacionais e estrangeiros), territrio (ele no precisaser completamente definido, sendo que a ONU tem admitido Estados com questes de
5MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 384.6Ibidem.7ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 77.8MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de direito internacional pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 363.
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fronteira, por exemplo, Israel) e governo (deve ser efetivo e estvel). Todavia, o Estadopessoa internacional plena aquele que possui soberania.9
O conceito de Estado exposto acima coloca em evidncia seus elementos
constitutivos: comunidade de indivduos, territrio fixo e determinado e governo
autnomo e independente. Assim, pode-se desmembrar o conceito de Estado da
seguinte forma:
a) Populao. uma associao permanente de homens e mulheres, capaz
de viver com seus prprios recursos. O contingente de sujeitos agregados a este
elemento indeterminado, podendo ser pequeno ou grande, o que no influi
diretamente na idia de igualdade dos Estados no plano jurdico externo.
Relativamente sua composio, a populao poder ser homognea ouheterognea, podendo sujeitos seus pertencerem a uma mesma nao, ou vrias
nacionalidades.10
b) Territrio. A simples associao humana, ainda que organizada, no se
constitura em Estado caso no se fixasse em um determinado territrio, sobre o
qual se exeram habitualmente as atividades administrativas em prol desta
coletividade. O territrio pode ser ou no contnuo, no importando, alis, a sua
extenso, o que permite a existncia de Estados minsculos.11
O territrio estatalno se limita ao domnio terrestre, estendendo-se ao espao areo e determinados
espaos martimos (guas interiores e mar territorial).
c) Governo.A existncia de um Estado pressupe a vontade coletiva de se
constituir como tal, regularmente organizada, sob uma autoridade suprema,
reconhecida como governo, com atribuio de gerir tal aglomerao. A forma
administrativa de gesto pelas instituies polticas pode se diferenciar de um
Estado para outro (governo republicano ou monrquico), mas independentementedisso, deve haver uma fora poltica organizada, que se manifeste por meio de
rgos governamentais, em geral pelos poderes executivo, legislativo e judicirio.12
Alm destes requisitos, pode-se agregar a capacidade de manter relaes
com os demais Estados, conforme dispe a Conveno de Montevidu sobre
direitos e deveres dos Estados, assinada em Montevidu Uruguai, a 26 de
9MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 355.10ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 80.11Ibidem, p. 80-81.12Ibidem, p. 81-82.
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dezembro de 1933, em seu art. 1, considera que o Estado como pessoa de DIP
deve reunir os seguintes requisitos:
a) povoao permanente;
b) territrio determinado;c) governo;d) capacidade de entrar em relaes com os demais Estados.13
Este ltimo critrio da conveno no parece possuir carter obrigatrio, visto
que os Estados tem o utilizado mais sob o prisma poltico do que jurdico, quando da
manifestao de reconhecimento de um novo Estado pela comunidade internacional.
Verhoeven mencionado por Mello acrescenta ainda, a incidncia de uma
tendncia vinculada ao Direito Internacional, de que o Estado seja membro das
Naes Unidas. Para aquele tratadista, adquirir a qualidade de Estado um dos
efeitos de seu ingresso na ONU e no uma condio para ingressar na
organizao.14
Entretanto, Soares tece uma crtica relevante a essa teoria:
A admisso de um Estado como membro pleno numa organizao intergovernamentalmundial, como a ONU, no parece ser condio para seu reconhecimento como Estadoindependente, pois a Sua no membro da ONU, e embora Israel o seja, desde 11 demaio de 1949, at a presente data no reconhecido como Estado pelos Estadosrabes.15
Uma das raras normas codificadas a despeito da constituio do Estado e a
aquisio de sua personalidade jurdica internacional encontra-se no captulo IV
Direitos e Deveres Fundamentais dos Estados, mais precisamente no artigo 13, da
Carta da Organizao dos Estados Americanos, in verbis:
Artigo 13 - A existncia poltica do Estado independente do seu reconhecimento pelosoutros Estados. Mesmo antes de ser reconhecido, o Estado tem o direito de defendersua integridade e independncia, para garantir a sua conservao e prosperidade, e,conseqentemente, a se organizar como lhe aprouver, para legislar sobre os seusinteresses, de administrar os seus servios, e determinar a jurisdio e competncia dosseus tribunais. O exerccio destes direitos s limitado pelo exerccio dos direitos deoutros Estados, em conformidade com o direito internacional.16
13PAN AMERICAN UNION. Montevideo Convention on Rights and Duties of States. (Traduonossa). Disponvel em: .Acesso em: 21 jul. 2011. p. 2.14MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 355.15SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional pblico. 2.ed. So Paulo: Atlas,
2004. p. 249.16ORGANIZATION OF AMERICAN STATES. Charter of the Organization of American States.(Traduo nossa). Disponvel em: . Acesso em: 21
jul. 2011.
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Por ora, verifica-se que o Estado soberano na condio de sujeito de Direito
Internacional, rene trs requisitos clssicos (povo, territrio e governo), descabida a
necessidade objetiva de um ato de reconhecimento, que se desenvolve como mera
conseqncia jurdica, indispensvel para que a nova coletividade se relacione com
os seus pares na sociedade internacional. Portanto, da personalidade internacional
do Estado soberano resultar a sua unidade e permanncia no plano interestatal e,
tambm, o desenvolvimento de sua capacidade, quanto fruio de direitos e a
submisso a obrigaes no plano externo.
2. FORMAO DO ESTADO
Apesar de alguns tratadistas defenderem que o nascimento de um novo
Estado, constitua-se num fato puramente histrico, portanto sem caractersticas
jurdicas, a doutrina dominante admite que na prtica, o nascimento do Estado
apresenta-se como um fenmeno histrico e sociolgico ligado umbilicalmente ao
Direito Internacional, marcado de modo indelvel por precedentes de atos unilaterais
oriundos de Estados soberanos, assim como na conformao de uma prtica deconstante formao e extino de Estados, gerando conseqncias relevantes no
cenrio internacional.
As primeiras teorias pertinentes matria relativa ao nascimento dos
Estados, foram elaboradas pelos Estados europeus, a partir do sculo XVI, em
particular atravs da edio de normas jurdicas relativas legitimidade de sua
posse e do exerccio de sua soberania, em territrios do ento denominado Novo
Mundo.DelOlmo destaca as formas primitivas de emergncia dos Estados:
Na Antiguidade dois eram os modos de nascimento dos pases, o estabelecimento ouocupao e a conquista. A primeira forma foi certamente a ocupao de espaodesabitado: a populao era escassa e os territrios eram imensos, tornando-sedesnecessria qualquer luta para seu estabelecimento. A conquista, atravs da guerra,surgiria aps, com o objetivo de criar o pas em rea ocupada por outro povo, masdotada de recursos naturais ou fatores outros que fossem mais propcios ao modo devida e que oferecessem melhores perspectivas de bem-estar e riqueza. Por muitossculos, a guerra continuou a ser a maneira mais comum de nascimento de um Estado.Como conseqncias delas surgiam novos pases, por diviso ou fuso dos at entoexistentes.17
17DELOLMO, Florisbal de Souza. Curso de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Forense,2006. p. 71.
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A histria recente aponta diversas formas de emergncia dos Estados, tendo
sido mais comuns os seguintes:
a) Fundao direta. Caracteriza-se no estabelecimento permanente de uma
populao em um determinado territrio sem proprietrio, com a instituio de um
governo permanente e organizado. Esta foi a forma de nascimento dos Estados na
Antiguidade clssica e tambm na Idade Mdia. A legitimidade da posse sobre estas
terras era comumente confirmada por uma manifestao papal, a exemplo da bula
Inter Coeterado Papa Alexandre VI, de 4 de maio de 1493, que atribui a Portugal e
Espanha posse das terras da Amrica, que um ano antes haviam sido
descobertas por estes Estados. Como exemplo desse tipo de formao tem-se a
Repblica de Transwaal (1837), ocupada por holandeses que deixaram a Colnia doCabo em 1836, dirigindo-se para interior sul-africano, assentando-se em terras alm
do Rio Vaal. Tem-se tambm o caso da Libria, criada aps entidades americanas
obterem dos chefes nativos locais concesses territoriais na Costa da Guin em
1821, enviando l escravos libertos.18Dada a inexistncia de locais desconhecidos
ou desabitados no planeta, este modo de formao estatal encontra-se obsoleto.
b) Emancipao.Segundo Mazzuoli, tem lugar quando um Estado se liberta
de seu dominante (como no caso das colnias) ou do jugo estrangeiro, seja deforma pacfica, seja em virtude uma rebelio.19 A prtica em tela associa-se
ligeiramente ao exerccio do direito autodeterminao dos povos, evocado em
detrimento de uma nao especfica. Um exemplo clssico de emancipao pacfica
no continente europeu foi independncia da Islndia, conduzida por um plebiscito
que resultou favorvel separao formal da Dinamarca, em 1944. Entretanto, em
muitos casos, a independncia alcanada pelo modo emancipacionista, s pde ser
obtida aps guerra contra a antiga metrpole, tal como ocorreu em 1776, quando asTreze Colnias Britnicas (precursoras dos Estados Unidos da Amrica), declararam
sua independncia, rejeitando a autoridade do Reino Unido.
c) Separao ou desmembramento. Opera-se quando um Estado se separa
ou se desmembra, para dar lugar ao nascimento de outros.20 Nos termos desta
definio, h que se observar que o desmembramento parcial de um Estado em tais
propores, pode originar um ou mais Estados. Podem ser citados os exemplos
18MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 393.19Ibidem, p. 394.20Ibidem.
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clssicos da ustria, da Hungria e Tchecoslovquia, que se originaram a partir do
desmembramento, em 1918, do Imprio Austro-Hngaro. Na Amrica Latina, tem-se
o exemplo da Gr - Colmbia, dissolvida em 1930 para dar lugar ao nascimento da
Repblica de Nova Granada (atual Colmbia), Equador e Venezuela.
Empregasse, ainda, o termo secesso quando se quer designar
desmembramentos incomuns, e que no estejam, necessariamente, ligados a um
processo de descolonizao, tal como ocorreu em 1991, quando a Unio Sovitica
se dissolveu, e desta operao, emergiram 15 novos pases. Neste toar, tem-se
lio precisa de Mazzuoli:
O nascimento do Estado por secesso assemelha-se ao resultante de emancipao,mas no provm propriamente de atos de sublevao popular ou de libertao de um
governo estrangeiro, mas sim do desmembramento de um imprio, ou da separao deum pas que se achava incorporado a outro, ou da dissoluo dos laos de uma UnioReal, ou de uma espcie de Federao, onde as partes federadas reclamamindependncia.21
A secesso foi, portanto, um dos meios mais comuns de extino de pases
confederados, eis que preservavam, constitucionalmente, o direito de secesso.22
Neste sentido, a Iugoslvia foi um modelo tpico dessa situao jurdica, onde a
tentativa de unir pases de etnias, religies e economias diferentes, resultou em
sangrento conflito interno, que culminou com a criao de, pelo menos, cincoEstados no incio dos anos 90. Nada obstante, h que se reconhecer que a nova
situao desses povos, agora estabelecidos com Estados prprios, tornou mais
condizente a realidade e os objetivos de cada um deles.
d) Fuso. Ocorre quando dois ou mais Estados se renem e formam um
terceiro que, em conseqncia, tem nova personalidade internacional.23 Como
exemplo, cabe mencionar o Reino da Itlia que nasceu, no sculo XIX, da unificao
dos ducados de Modena, Parma e Toscana e o Reino de Npoles, incorporados aoPiemonte afim de formar um s Estado em 1860. Da mesma forma, foi a formao
do Imen, a partir da unio do Imen do Norte e do Imen do Sul pelo acordo de
Saana, de 22 de abril de 1990. Tambm pode-se destacar a fuso de Zanzibar e
Tangnica, em 1964 , dando origem a Tanznia.
21MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 395.22MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 377.23MAZZUOLI, op. cit., p. 395.
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Os casos acima expostos referem-se aquelas circunstncias em que os
Estados emergem a partir de situaes fticas, amplamente descritas pela
doutrina, todavia, nada impede que um Estado venha a se formar consoante regras
ditadas por tratados multilaterais, leis internas, ou por deciso de uma organizao
internacional. 1) A respeito da formao de um Estado por meio de tratado, h o
caso paradigmtico da Polnia, que mediante sucessivos desmembramentos
acabou por desaparecer para, em 1918, ressurgir como Estado independente, por
fora do Tratado de Versalhes;24 2) Atravs de lei interna, a Iugoslvia se
transformou no Estado da Srvia e Montenegro em 2003, sendo fixado o prazo de 3
anos para a realizao de um plebiscito para que as duas repblicas se separassem
caso fosse desejado;253)Por deciso de uma organizao internacional, ocorreu acriao do Estado de Israel, a partir do desmembramento da Palestina, mediante
Resoluo da Assemblia Geral das Naes Unidas em 1947.26
A formao do Estado ocorre, portanto, quando seus elementos constitutivos
se integram. Tal integrao leva soberania. Alguns juristas entendem que o
nascimento ou a formao do Estado, um fenmeno histrico e sociolgico, que
foge ao universo das regras jurdicas, todavia, h de se admitir que o Direito
Internacional no tem suas preocupaes exclusivas voltadas para tal evento, senoem relao as conseqncias que advm do seu aparecimento no cenrio
internacional. Como visto nesta seo, o nascimento do Estado, faticamente, pode
ser dar por: a) Fundao direta; b) Emancipao; c) Separao ou
desmembramento, e; d) Fuso. Alm disso, por atos jurdicos, um Estado pode se
formar por: a) uma lei interna; b) um tratado internacional; c) deciso de um
organismo internacional.
3. RECONHECIMENTO DE ESTADO E DE GOVERNO
O nascimento dos Estados, suas transformaes polticas ou territoriais,
sejam pacificas ou litigiosas, constituem em eventos que afetam a estrutura e o
24SOARES, Guido Fernando Silva. Curso de direito internacional pblico. 2.ed. So Paulo: Atlas,2004. p. 245.25MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 375.26MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de direito internacional pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 396.
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funcionamento da sociedade internacional. Assim, emergindo o Estado, investido de
plena soberania, no uso das prerrogativas inerentes a sua personalidade jurdico-
internacional, esta condicionado sua admisso no seio da comunidade internacional,
afim de que possa manter relaes com seus demais pares. Esta admisso do
Estado pelos demais atores da sociedade mundial chamado de reconhecimento de
Estado. Por outro lado, quando verifica-se uma mudana no governo de um Estado
j existente, a partir de uma quebra nas normas constitucionais em vigor, surge a
questo do reconhecimento de governo. O reconhecimento desempenha um papel
capital na dinmica do Estado, como se ver a seguir.
3.1. RECONHECIMENTO DE ESTADO: CONCEITO E NATUREZA JURDICA
Logo aps a emergncia de uma nova coletividade estatal na sociedade
internacial, comum que o governo ento instalado envie correspondncia a todos
os pases do mundo, solicitando seu reconhecimento, em que pese a relutncia de
alguns Estados em considerar legal sua independncia.
De fato, devidamente preenchidos os pressupostos constitutivos de umEstado, o governo da nova entidade dever buscar o seu reconhecimento atravs de
sucessivos atos emanados da comunidade internacional (Estados, Organizaes
Internacionais, etc.), o que, como conseqncia implicar na aplicao ao mesmo
das normas de Direito Internacional.
Segundo Fischer Williams, citado por Mello, a Holanda aps a sua
independncia (sculo XVII), parece ter sido o primeiro caso de um novo Estado
tornar-se membro da sociedade internacional europia, isto , houve oreconhecimento de um Estado novo.27
Conforme leciona Seitenfus:
O reconhecimento o ato unilateral atravs do qual um sujeito de direitointernacional, sobretudo Estado, constando a existncia de um fato novo(Estado, Governo, situao ou tratado), cujo evento de criao no teve suaparticipao, declara, ou admite implicitamente, que o considera comosendo um elemento com quem manter relaes no plano jurdico. Trata-se,portanto, de um ato afirmativo que introduz o fato novo nas relaes
jurdicas entre os sujeitos de DIP.28
27MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 399.28SEITENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introduo ao direito internacional pblico. 3. ed. PortoAlegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 77.
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Na reunio de Bruxelas de 1936, o Instituto de Direito Internacional,tendo por
relator Philip Marshall Brown, aprovou uma importante Resoluo sobre o ato de
reconhecimento de novos Estados e de novos governos, que passou a ser
conceituado na forma do art. 1, como:
(...) um ato livre pelo qual um ou mais Estados reconhecem a existncia, emum territrio determinado, de uma sociedade humana politicamenteorganizada, independente de qualquer outro Estado existente e capaz deobservar as prescries do Direito Internacional.29
Pela referida disposio restou patente que, na forma delimitada pelo DIP, o
Estado como coletividade digna de ser reconhecida, quando preencher trs
requisitos clssicos: a) governo independente de qualquer autoridade estrangeira; b)
que o governo detenha autoridade efetiva sobre o seu territrio e populao,
mostrando-se apto para cumprir com as suas obrigaes internacionais; c) que a
coletividade a ser reconhecida possua um territrio delimitado.
O ato de reconhecimento30 de Estado confere a nova entidade todos os
atributos relativos ao respaldo de sua soberania frente evidncia de que no mais
se pode perquirir sobre sua existncia jurdica.
O jurista francsNguyen Quoc Dinh, identifica duas concepes a cerca do
reconhecimento de Estado:1.A concepo atributiva ou constitutiva. Segundo esta primeira tese, oreconhecimento representa um quarto elemento constitutivo do Estado,
juntamente com uma populao, um territrio e um governo. Semreconhecimento, a formao do Estado permanece incompleta. Comatribuio da qualidade de Estado, este constitui-o, no sentido em quecompleta o seu processo de criao. O seu mbito portanto muito vasto eessencial.2. A concepo declarativa. Admite-se geralmente que o nascimento deum Estado novo um fato cuja existncia no depende das intenes ouapreciaes dos Estados existentes. A concepo declarativa assentanestas premissas.31
A natureza do reconhecimento de Estado um dos temas mais controvertidos
na doutrina, mormente porque se mostra ainda inconclusiva. Para a maioria dos
29MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 384.30 No caso da ex-Iugoslvia, a Comunidade Europia considerou indispensvel que os Estadosoriginados da dissoluo da Federao consagrassem o uti possidetis jris que prevalece sobre odireito de autodeterminao. A entidade considerou que a Iugoslvia aps a sua desintegrao,necessitava de um novo reconhecimento. (MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso deDireito Internacional Pblico. 15.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 403.).31DINH, Nguyen Quoc; DAILLIER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Pblico. Traduo:Vitor Marques Coelho. 2. ed. Lisboa: FCG, 2003. p. 570-571. Ttulo original: Droit InternacionalPublic.
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autores, o ato de reconhecimento de Estado tem efeito declaratrio, mas uma
importante corrente (Escola austraca) que defende a concepo constitutiva de sua
classificao.
Silva baseado nos ensinamentos de D. Anizilotti, expe magistralmente as
razes que sustentam a tese constitutiva:
Assim como toda ordem jurdica determina quais os seus sujeitos,estabelece igualmente o momento em que comeam a existir. E desde queser sujeito jurdico significa ser destinatrio de normas jurdicas, apersonalidade existe quando uma entidade se torna destinatria de normas.As normas jurdicas internacionais se constituem por meio de acordos; ossujeitos da ordem jurdica internacional comeam, portanto a existir nomomento em que se verifica um primeiro acordo: precisamente nesteinstante as entidades entre as quais se verificou tornam-se uma em relao outra, destinatrias das normas resultantes do referido acordo e, portanto,
sujeitos da ordem jurdica de que estas normas fazem parte.32
A corrente constitutiva, neste sentido, defende que a existncia de um novo
Estado deve ser objeto de aceitabilidade pelos Estados que j compe a sociedade
internacional, devendo esta ser expressa pelo ato de reconhecimento.33
Para Mazzuoli, na defesa da tese oposta, o reconhecimento tem efeito
declaratrio, sendo que:
(...) o Estado como tal j existe antes do seu reconhecimento por parte dos
demais atores estatais da sociedade internacional, de modo que suaexistncia (ou seja, a sua personalidade jurdica) no decorre de seureconhecimento (ou seja, aquela no existe em funo deste, que nadamais do que a constatao de um fato), mas, pelo contrrio, o seureconhecimento que se d em virtude da sua anterior existncia.34
Os que apiam a teoria declaratria, afirmam que o reconhecimento de
Estado tem exclusivo alcance declarativo porque o seu nico objeto o de verificar o
preenchimento dos requisitos formais para a existncia do novo Estado, sem lhe
conferir qualquer qualidade jurdica.
32SILVA, Geraldo Eullio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito InternacionalPblico. 15. ed. So Paulo: Saraiva, 2002. p. 98.33 A respeito do reconhecimento e identidade do Estado, temos o fato notrio da Macednia, quedeclarou sua independncia da Iugoslvia em 1991, tendo ingressado na ONU com o nome deAntiga Repblica da Iugoslvia da Macednia. Isto ocorreu porque a Grcia no aceitava queaquele pas usasse simplesmente o nome de Macednia, topnimo tambm utilizado em refernciaao norte do territrio grego, que desde a Idade Antiga foi dominado pela cultura helnica. O pas usaos smbolos da primitiva Macednia, o que repudiado pelos gregos que entendem que um Estadode origem eslava no pode se apropriar da cultura grega. J na Bulgria, a Macednia considerada
um ramo do blgaro. (MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito InternacionalPblico. 15.ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2007. p. 400 e 403.).34MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 398.
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Na prtica, a recusa do reconhecimento no impede a existncia do Estado.
Inversamente, a concesso do reconhecimento no se mostra suficiente para criar
um Estado: se os elementos constitutivos no se verificarem, a entidade
reconhecida no por isso um Estado, razo pela qual a concepo declaratria
aceita pela parte majoritria da doutrina.
A propsito, esta teoria estabelece que o ato de reconhecimento figura
apenas como um anncio (ou sinal) positivo, por parte dos demais atores da ordem
poltica internacional, no sentido de viabilizar suas relaes diplomticas, fato este,
benfico para o desenvolvimento do Estado emergente.
Esta tese, a propsito, teve o privilgio de ser codificada como norma de DIP
atravs do disposto no art. 13 da Carta da Organizao dos Estados Americanos,
quando dispe: O reconhecimento significa que o Estado que o outorga aceita a
personalidade do novo Estado com todos os direitos e deveres que, para um e outro,
determina o direito internacional.35
No que diz respeito obrigatoriedade da emisso de um ato de
reconhecimento, a doutrina se divide em duas correntes distintas.
O Instituto de Direito Internacional, na sesso de Roma, realizada em 1921,
assim se manifestou:Todo o povo, que no territrio por ele ocupado, haja constitudo um governo,capaz de manter a ordem, no interior, e de cooperar, no exterior, naorganizao, cada vez mais desenvolvida, das relaes baseadas nautilidade comum, na justia e na paz, tem direito ao reconhecimento de suanao como Estado.36
J conforme leciona Accioly: o novo Estado tem direito de entrar na
associao internacional dos Estados e ser reconhecido pelas outras potncias,
quando a sua existncia no pode ser posta em dvida e se acha assegurada.37
A doutrina contrria, porm a mais aceita, admitindo a existncia de uma
obrigao puramente moral para o ato de reconhecimento de Estado, desde que o
mesmo se encontre perfeitamente constitudo e apresente condies de vida prpria
e independente podendo, pois, conduzir-se como nao civilizada. Segundo Dinh, o
novo Estado no reconhecido no pode obrigar os outros Estados a reconhec-lo
35ORGANIZATION OF AMERICAN STATES. Charter of the Organization of American States.(Traduo nossa). Disponvel em: . Acesso em: 05
ago. 2011.36ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 131.37Ibidem, p. 130.
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como um igual. A sua prpria soberania autoriza-os a no considerarem oponveis
no seu territrio os atos jurdicos deste Estado novo.38 Por este entendimento,
reconhecimento, no um dever dos demais Estados, to pouco um direito de quem
o recebe.
Dessa forma o ato de reconhecimento de Estado deflui de uma constatao
formal, geralmente municiado pelos meios diplomticos, na qual o novo ente
soberano internacional passa a ter existncia, de forma concreta e independente,
estando apto a manter relaes com os demais membros da sociedade
internacional, alm da fruio de direitos e a submisso a obrigaes no plano
externo. Entretanto existem duas concepes diversas sobre a natureza jurdica do
ato de reconhecimento de Estado: uma constitutiva e outra declarativa. Todavia,admite-se que esta ltima, seja a mais aceita pela doutrina.
3.2. FORMAS DE RECONHECIMENTO DE ESTADO
A diversidade das relaes internacionais autorizam vrias modalidades de
reconhecimento de Estado. O procedimento pode ser: individual ou coletivo, de jureou de facto, expresso ou tcito, incondicionado ou condicionado, aplicado a simples
fatos ou a normas jurdicas. Vejamos cada uma destas formas de reconhecimento
separadamente:
a) individual ou coletivo, assim sendo, realizado por apenas um Estado ou por
vrios fazendo uso do mesmo instrumento diplomtico.39Individualmente, a Turquia
decidiu reconhecer o Kosovo como um Estado independente, consoante nota oficial
expedida pelo ministro dos Negcios Estrangeiros, Ali Babacan, um dia depois de amaioria albanesa ter declarado sua independncia da Srvia.40Diferente da Bulgria,
38DINH, Nguyen Quoc; DAILLIER, Patrick; PELLET, Alain. Direito Internacional Pblico. Traduo:Vitor Marques Coelho. 2. ed. Lisboa: FCG, 2003. p. 572. Ttulo original: Droit Internacional Public.39MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 402.40MESCI, Evren. Turkey to recognize Kosovo independence: Foreign Minister. (Traduo nossa).Reuters [online], London, 05 ago. 2008. News. Disponvel em:. Acesso em: 04 ago. 2011.
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Crocia e Hungria, que atravs de um comunicado conjunto, publicado a 19 de
maro de 2008, anunciaram que iriam reconhecer o novo Estado.41
b) de jure ou de facto no primeiro caso o reconhecimento ocorre de forma
definitiva e irrevogvel, atravs de documento expresso ou de ato positivo que
manifeste objetivamente a inteno de conceder esse reconhecimento. Com relao
ao reconhecimento de fato, este por sua vez, caracteriza-se por ser provisrio e
revogvel. Assim que a Inglaterra que, inicialmente, no reconhecia publicamente
o Imprio do Brasil, mas lhe recebia plenipotencirios e o cnsul britnico exercia
funes plenas de diplomata no Rio de Janeiro. A forma provisria e revogvel seria,
portanto, a principal caracterstica do reconhecimento de facto. Alguns autores se
insurgem contra esta ltima modalidade, entendendo que ela no corresponde arealidade das normas jurdicas, uma vez que o reconhecimento um ato jurdico.42
c) expresso ou tcito o que se define quando o reconhecimento se der por
documento escrito, oriundo do Estado concedente, podendo apresentar-se como
uma nota diplomtica, decreto, tratado, regulamento, entre outros. Quando as
Repblicas Blticas (Estnia, Letnia e Litunia) se declararam independentes da
Unio Sovitica, em setembro de 1991, o Brasil emitiu uma nota reconhecendo a
existncia de cada uma daquelas repblicas. De outra banda, tem-se o Tratado de1825 entre Brasil e Portugal, em que o ltimo reconheceu expressamente a
existncia do Brasil recm-emancipado. J em se tratando da forma tcita, esta se
processar nos casos em que os pases existentes puderem intervir atravs de
prtica ou atitude implcita a vontade de reconhecer a nova entidade estatal.43
Neste caso, temos o exemplo da Srvia que enviou e recebeu agentes diplomticos
em reconhecimento a independncia da Albnia em 1913.44
d) incondicionado ou condicionado conforme dependa ou no decondies impostas para a concesso do reconhecimento. Normalmente o
reconhecimento incondicionado. Existindo condio, o ato pode ser suspenso ou
41ABC, Agency. Bulgaria, Croatia, Hungary recognise Kosovo. (Traduo nossa). ABC News [online],New York, 19 mar. 2008. Stories. Disponvel em:. Acesso em: 04 ago. 2011.42MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 403.43Ibidem, p. 402.44MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 406.
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anulado em definitivo caso o novo Estado no cumpra, todavia, percebe-se que a
prtica contraria a natureza declaratria do instituto.45
A autoridade competente para fazer o reconhecimento, geralmente o rgo
do governo que dirige as relaes exteriores.46Nada mais razovel, por se tratar de
um ato de poltica internacional.
Em tese, no existe regras precisas e absolutas sobre o momento oportuno
para o reconhecimento. A questo da sua oportunidade de apreciao
discricionria, portanto, o Estado utiliza-se dele no momento em que entender ser
oportuno. Entretanto, Silva doutrina que a este respeito podem se admitir trs
princpios:
1) se se tratar de um Estado surgido de um movimento de sublevao, oreconhecimento ser prematuro enquanto no cessar a luta entre a coletividadesublevada e a me-ptria, a menos que esta, aps luta prolongada, se mostre impotentepara dominar a revolta e aquela se apresente perfeitamente organizada como Estado;2) desde que a me-ptria tenha reconhecido o novo Estado, este poder serreconhecido logo que apresente todas as caractersticas de um Estado perfeitamenteorganizado e demonstre, por atos, sua vontade e sua capacidade de observar ospreceitos do direito internacional. 3) se se tratar de um Estado surgido de outra forma,ele poder ser reconhecido logo que apresente todas as caractersticas de um Estadoperfeitamente organizado e demonstre, por atos, sua vontade e sua capacidade deobservar os preceitos do direito internacional.47
Contudo, no se pode descartar a hiptese do reconhecimento prematuro deum Estado, o que pode ser perigoso, devendo ser realizado com extrema cautela,
uma vez que sua prtica poder ser interpretada como ingerncia indevida em
assuntos internos do Estado. Segundo alguns autores o reconhecimento da Crocia
por parte de certos membros da Comunidade Europia, e Sua (ocorrido em 15 de
janeiro de 1992), foi prematuro, eis que a Crocia, a poca, controlava apenas um
tero de seu prprio territrio.48
Como base nestas razes pode-se constatar que o reconhecimento deEstado pode processar-se de diversas maneiras e, paralelamente perceptvel que
o instituto est ligeiramente associado possibilidade de manuteno de relaes
diplomticas e jurdicas em relao aos Estados que o reconheceram. Todavia, em
tese, no existe momento oportuno para o reconhecimento, o que se positiva pelo
45MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 402-404.46ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1933. Tomo 1. p. 136.47SILVA, Geraldo Eullio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito InternacionalPblico. 15. ed. So Paulo: Saraiva, 2002. p. 99.48MAZZUOLI, op. cit., p. 400.
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vnculo discricionrio do Estado concedente, restando doutrina a tarefa de
estipular princpios norteadores quanto a essa questo.
3.3 RECONHECIMENTO DE GOVERNO
O reconhecimento de governo processa-se nos casos em que um Estado
passa por alteraes polticas, a exemplo de mudanas de governo que no alteram
seu suporte fsico to pouco a sua personalidade jurdica.49
Mello menciona os requisitos para que um novo governo seja reconhecido: 1)
efetividade, isto , controle da mquina do Estado e obedincia civil; 2)cumprimentodas obrigaes internacionais do Estado; 3)surgimento do novo governo conforme
as regras do direito internacional: forma de impedir o reconhecimento de um governo
imposto por interveno estrangeira.50
Inicialmente, o DI costuma cumprir o papel de observador, ao invs de
ingerente, nos assuntos internos do Estado. Entretanto, quando pairam duvidas
sobre a legitimidade da autoridade jurdica do Estado, em momentos de instabilidade
poltica, revoluo, golpes de Estado, fraudes em geral, mudanas na ordemconstitucional do Estado, etc., o papel do Direito Internacional se inverte e, este,
passa a ser o regente dessa nova situao jurdica, dada a necessidade dos
governos que ascenderam ao poder por meio de golpe de Estado de serem
reconhecidos pelos demais atores da sociedade internacional.51
Quanto aos efeitos do reconhecimento de governo Mello destaca: 1) o
estabelecimento de relaes diplomticas: embora um Estado possa reconhecer o
governo de outro, mas romper relaes diplomticas, estas tendem a seguir-se aoreconhecimento; 2) imunidade de jurisdio do novo governo perante outros
Estados; 3) legitimidade para ser parte em tribunal estrangeiro; 4) admisso, pelo
Estado que reconhece, da validade dos atos do novo governo.52
A doutrina majoritria faz referncia a duas teorias relativas ao
reconhecimento de governo:
49MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 400.50MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Direito Internacional Pblico. 8.ed. So Paulo: Ed.Freitas Bastos, 1986. Vol. 1. p. 299.51MAZZUOLI, op. cit., p. 407.52MELLO, op. cit., p. 300.
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1) Doutrina Tobar. Instituda pelo Ministro das Relaes Exteriores do
Equador, Carlos Tobar (1853-1920), em 1907, pregava que a nica forma de evitar
golpes de Estado no continente americano seria a comunidade internacional se
recusar a reconhecer os governos golpistas como legtimos, rompendo relaes
diplomticas e apresentando a eles uma declarao de no-reconhecimento, at
que aquele governo fosse confirmado de forma democrtica. Esta tese esteve
presente na Amrica Latina, inclusive na Venezuela, que aplicou-a rompendo
relaes com Estados cujos governos no concordava, inclusive o Brasil.53
2) Doutrina Estrada. Em 1930, o Ministro das Relaes Exteriores do Mxico,
Genaro Estrada (1887-1937), proferiu uma declarao sustentando que o
reconhecimento de uma nova soberania uma prtica afrontosa, e de desrespeito soberania da nao preexistente, pois o reconhecimento um elemento dispensvel
para que o Estado inicie suas atividades.54Em outras palavras, quer dizer que se um
Estado no concorda com determinado governo, basta simplesmente no manter
relaes diplomticas com ele. Mas emitir um juzo de valor seria considerado uma
ofensa. Na prtica percebe-se que esta teoria obteve maior aceitao na Amrica
Latina.
A questo de reconhecer ou no a legitimidade dos governos, parecia tercado em desuso h dcadas. Isso voltou tona com o incidente de Honduras, em
2009. Neste caso, inspirado na doutrina Tobar, considerou-se que o governo interino
de Honduras no era legitimo sob alegao de que no fora constitudo luz do seu
prprio ordenamento jurdico.
Como visto nesta seo, o reconhecimento de governo tem lugar nos casos
de trocas no democrticas de governo, no pelo meio constitucionalmente
institudo, sempre que haja revolues, golpes de Estado, etc., cuja prtica seconsolidou atravs das doutrinas Tobar eEstrada.
53SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Pblico. 3.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 212.54MOREIRA, Luiz Carlos Lopes; LECH, Marcelo Mendes. Manual de Direito Internacional Pblico.Canoas: Editora da Ulbra, 2004. p. 30.
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3.4 RECONHECIMENTOS ESPECIAIS
Podem ocorrer tambm certas situaes que comportam, nas palavras de
Mazzuoli, reconhecimentos especiais por parte dos Estados55. Tais so os casos
de reconhecimento de beligerncia, reconhecimento de insurgncia, reconhecimento
como Nao e reconhecimento de governo. Abaixo far-se- uma anlise dessas
modalidades de reconhecimento especial de maneira individual.
a) Reconhecimento de beligerncia. Ocorre quando parte da populao de
um Estado desencadeia uma revoluo contra o governo, com a finalidade de criar
um novo Estado ou modificar a forma de governo existente. A beligerncia um
estado jurdico precrio, dada a existncia de duas situaes distintas, onde ou ogoverno preexistente retomar ao poder, ou os rebeldes tomaro o poder
definitivamente e instituiro um novel governo, baseado em seus ideais
revolucionrios.56 Como exemplo, cabe mencionar o caso da Bolvia, Colmbia,
Equador, Peru e Venezuela que reconheceram a Frente Nacional de Libertao
Sandinista como beligerante na guerra civil da Nicargua, em junho de 1979.
b) Reconhecimento de insurgncia. A insurgncia (insurgency, em ingls, ou
insurgence em francs), deflagrada no momento em que uma revolta depropores considerveis, mas sem a qualidade de guerra civil, com fins polticos,
comandada por um movimento armado com o fim de impedir a soberania e as
relaes exteriores de um Estado. Esta espcie de reconhecimento faz com que os
atos praticados pelos insurretos deixem de serem de serem qualificados como atos
criminosos, de banditismo, terroristas ou de pura violncia. A base de uma
insurgncia pode ser poltica, econmica, religiosa, tnica, ou uma combinao de
fatores.
57
Podem ser citadas insurgncias histricas, como a Guerra Civil Russa(1918-1921), e a Guerra Civil Angolana (1975-2002).
c) Reconhecimento como Nao. Ocorre quando um ou mais Estados
admitem que determinado grupo rene todos elementos necessrios para ser
considerado como verdadeira Nao.58O termo Nao refere-se a um conjunto de
pessoas que possuem a mesma origem, as mesmas tradies, os mesmos
55MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 405.56Ibidem, p. 405-406.57Ibidem, p. 406-407.58Ibidem, p. 407.
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costumes e aspiraes comuns. Comumente os membros de uma nao falam a
mesma lngua e habitam o mesmo territrio, podendo, entretanto, haver exemplos
em sentido contrrio. O que liga o povo de uma nao um lao puramente moral,
ao passo que no Estado, existe uma relao poltica.59 O reconhecimento como
Nao teve origem na primeira Guerra Mundial, de 1914 a 1918, gerando efeitos
mais polticos do que jurdicos, por tratar-se de uma espcie de promessa de
reconhecimento, quando a respectiva Nao tornar-se formalmente um Estado
soberano, aps reunidos os requisitos que lhe so inerentes.60
Ante o exposto, verifica-se que alm do reconhecimento de Estado e de
governo, o Direito Internacional comporta tambm os chamados reconhecimentos
especiais. Tais atos jurdicos tem lugar a partir da emergncia de situaespeculiares como, por exemplo, um processo revolucionrio, em que parte da
populao se levanta contra o governo com intuito de modificar o poder central ou
at mesmo criar um novo Estado (reconhecimento de beligerncia); quando se
verifica um sublevao de carter eminentemente poltico, no comparada aos atos
de guerra civil (reconhecimento de insurgncia); na situao em que se confere a
determinado povo a qualidade de Nao politicamente organizada (reconhecimento
como Nao). Em verdade, esses reconhecimentos so de suma importncia noapenas para o Direito Internacional como tambm para a Cincia Poltica, uma vez
que seus efeitos alcanam esta disciplina.
3.5 RECONHECIMENTO POR ORGANISMOS INTERNACIONAIS
A questo inicial a respeito do reconhecimento de Estado por organismosinternacionais, consiste em saber se um Estado, ao ser admitido em uma entidade
desta espcie, estaria tacitamente sendo reconhecido pelos demais membros da
organizao.
A esse respeito Mello recorda que:
No tempo da liga considerava-se que a admisso significava um reconhecimento tcitocoletivo (Fauchille), uma vez que os Estados lidavam em conjunto com diversos
59ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 77-78.60MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 407.
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assuntos (ex. oramento), bem como pelo art. 10 eles garantiam mutuamente os seusterritrios e independncia.61
Na atualidade, o tema ainda alvo de opinies conflitantes da doutrina que
at o momento no chegou a um denominador comum. Entretanto, por influncia da
doutrina norte-americana, este fato no tem sido interpretado como ato de
reconhecimento, pois incidiria apenas em relao prpria organizao, que tem
personalidade distinta da dos seus membros. Esta atualmente a posio adota
pela ONU.62
Aguilar Navarro defende que o reconhecimento seria uma necessidade da
prpria organizao internacional63 que se fundamenta na cooperao entre seus
membros. J Denys Simon tem sustentado a qualidade de membro em umaorganizao internacional como tendo valor de reconhecimento internacional.64
De qualquer sorte, percebe-se que sob a tica do Direito Internacional, as
organizaes intergovernamentais no possuem capacidade jurdica para
reconhecer diplomaticamente qualquer Estado, cabendo aos seus Estados-membros
faz-lo individualmente. No entanto, em funo de suas regras internas, as posies
dos seus membros, podem expressar opinies positivas ou negativas em relao s
declaraes de independncia, optando por oferecer ou recusar a adeso de recm-declarado Estado.
A principal questo que envolve o reconhecimento de um novo Estado por
organismos internacionais, esta vinculada, portanto, a hiptese dos demais
membros reconhec-lo de forma tcita. Quanto a isto, a doutrina ainda no chegou a
um consenso. Alguns doutrinadores entendem que esta situao no simboliza
reconhecimento; outros juristas acreditam que este fato tem valor de
reconhecimento internacional. De qualquer sorte, percebe-se que em geral asorganizaes internacionais no possuem o papel de reconhecer um novo Estado
diplomaticamente, repassando esta competncia de maneira individual a seus
membros.
61MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 405.62Ibidem.63 Mello menciona o conceito de organizao internacional descrito por Abdulah El Erian: umaassociao de Estados... estabelecida por tratado, possuindo uma constituio e rgos comuns etendo uma personalidade legal distinta da dos Estados-membros. (Ibidem, p. 602.).64Ibidem, p. 405.
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3.6 O ESTADO NO RECONHECIDO
Do ponto de vista jurdico, no se pode deixar de lado a possibilidade do no-
reconhecimento da nova entidade estatal. O no-reconhecimento do Estado
definido por Seitenfus como:
(...) a recusa expressa ou tcita, de um Estado ou uma organizao internacional, deadmitir como base jurdica de suas relaes internacionais uma nova situao (novoEstado, governo ou anexao de um territrio), pois ele contesta a sua legitimidade ou asua efetividade.65
Todavia, pelo prprio contexto deste conceito, percebe-se que o
reconhecimento uma constatao, e no um julgamento de valor, pois, no
atravs da negao da existncia de um fato desagradvel, e que consideramos
ilcito, que o fato ser suprimido.
A Repblica de Kosovo um exemplo clssico, pois, embora no tenha
recebido o reconhecimento de toda a comunidade internacional, o pas no deixou
de instituir seu prprio Parlamento, exrcito, bandeira, Constituio e hino.
Por outro lado, Silva leciona que:
a doutrina e a prtica indicam que, ao contrrio, um Estado criado emviolao do direito internacional no deve ser reconhecido. Essa doutrina do
no-reconhecimento surgiu a propsito da criao do Estado da Manchriapelo Japo custa da China. A doutrina foi proclamada em janeiro de 1932pelo ento Secretrio de Estado norte-americano, Henry Simpson,
justamente a propsito do conflito sino-japons, iniciado no ano anterior.66
Esta interpretao versa que o no-reconhecimento apenas ter lugar caso o
novo Estado tenha sido criado em total desacordo com as regras do direito das
gentes, resultando de um ato ilcito internacional. Mazzuoli recorda que:
Em 1931 essa doutrina ganhou especial destaque em virtude da notaenviada pelo ento Secretrio de Estado norte-americano Henri Stimson,aos governos da China e Japo, por ocasio do conflito surgido entreambos, ocasionando o no-reconhcecimento, por parte dos Estados Unidosda Amrica, do ento criado Estado da Manchria, poca frao doterritrio chins. Esta tese, contudo, j tinha sido defendida, em 1921, pelobrasileiro Cincinato Braga, delegado brasileiro junto Segunda Assembliada Liga das naes, que formulou naquela ocasio, uma proposta deemenda ao pacto, na qual, de certo modo, se encontrava contida a doutrinado no reconhecimento, sob a forma de bloqueio jurdico universal.67
65SEITENFUS, Ricardo; VENTURA, Deisy. Introduo ao direito internacional pblico. 3. ed. PortoAlegre: Livraria do Advogado, 2003. p. 81.66SILVA, Geraldo Eullio do Nascimento; ACCIOLY, Hildebrando. Manual de Direito InternacionalPblico. 15. ed. So Paulo: Saraiva, 2002. p. 100.67MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 397.
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Com tudo, na atualidade, um dos grandes problemas em relao ao
reconhecimento de Estado a validade dos atos emanados da nova coletividade
estatal antes de ela ser reconhecida. Nesse sentido, Mello resume:
Na prtica, um tribunal, ao ter de julgar um ato emanado de umacoletividade estrangeira, em que h dvida em saber se ela Estado ouno, envia uma consulta ao executivo. Esta prtica tem a finalidade deevitar dentro de um mesmo Estado duas atitudes diferentes.68
Este procedimento adotado pelos tribunais internacionais, apenas refora
nosso entendimento de que o no reconhecimento acaba servindo apenas como
sano e, diga-se de passagem, uma poltica de represlia, pois ao executivo ptrio,
caber o parecer final quanto legitimidade ou no da nova entidade estatal.
Entende-se, portanto, que a prtica internacional tem demonstrado que o no-
reconhecimento ter espao, quando um Estado for criado em total desacordo com
as regras de DIP, ainda que este ato no impea sua existncia, autorizando apenas
possibilidade de veto a manuteno de relaes diplomticas solenes, ao nvel de
embaixadores, com os Estados que no o reconhecem. J quanto o procedimento
dos tribunais ao julgar os atos emanados de coletividades no reconhecidas,
percebe-se que esta prtica obviamente repreensiva, visto a deciso final quanto
legalidade ou ilegalidade do novo Estado caber a outra parte, o que demonstra afalta de eqidade em processos desta espcie.
4. A CLASSIFICAO DOS ESTADOS
So vrias as classificaes que podem ser atribudas aos Estados. Sendo as
mais antigas delas as que levavam em conta a sua estrutura (1) e, o seu grau desoberania (2). Modernamente, a classificao que melhor atende os interesses do
Direito Internacional a primeira delas, pois liga-se aos aspectos polticos e
personalidade dos Estados, que esto ligeiramente associados a sua atuao no
cenrio internacional.
Assim sendo, os Estados podem ser classificados de um ponto de vista puro,
quanto sua estrutura, em Estados simplese Estados compostos, como veremos a
seguir.
68MELLO, Celso Renato Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Riode Janeiro: Renovar, 2007. p. 404-405.
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4.1. ESTADOS SIMPLES OU UNITRIOS
Os chamados Estados simples ou unitrios so Estados soberanos
governados constitucionalmente como uma nica unidade em que o governo central
supremo em relao a quaisquer divises administrativas (unidades subnacionais).
O poder poltico do governo em um Estado unitrio pode ser transferido para nveis
inferiores, como os das assemblias eleitas local ou regionalmente, governadores e
prefeitos, mas o governo central detm o direito principal de retomar tal delegao
de poder. Tal modalidade estatal costuma apresentar uma populao homognea
em seu conjunto e uma disciplina das suas diversas regies que aceitam submeter-
se supremacia do poder central.Neste diapaso, Mello aduz que: Os Estados simples no proporcionam
maiores problemas para o Direito Internacional, vez que apresentam um poder nico
e centralizado.69
A maioria dos pases do mundo formada de Estados unitrios,
principalmente porque muitos deles no possuem uma vasta extenso territorial que
justifique uma separao de poderes em suas divises internas. Como exemplo,
pode-se citar: frica do Sul (frica); Blgica (Europa); Chile (Amrica); Japo (sia);Samoa (Oceania).
Caso o poder central de tais Estados seja exercido com exclusividade, em
todo o territrio nacional, abrangendo as funes administrativas e judicirias do
pas, refere-se a existncia de um Estado unitrio centralizado. No caso de o mesmo
poder ser fracionado pela Constituio do Estado entre suas provncias ou
municpios, fala-se em Estado unitrio descentralizado, o que no lhe retira sua
condio de Estado unitrio. Existem tambm os Estados unitriosdesconcentrados, onde existem divises territoriais dotadas de um representante do
poder central, sendo caracterstico de pases autoritrios.70
Mazzuoli acrescenta que:
Dentro do quadro dos Estados unitrios pode-se tambm inserir os Estados Regionais,que guardam estreita semelhana com os Estados unitrios descentralizados, mas comampliao das competncias destinadas s regies, as quais ultrapassam as questesadministrativas para abranger tambm matrias legislativas ordinrias. Dessa forma,cada regiopassa a ter autonomia poltico administrativa estabelecida por regulamento
69MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 375.70MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 412.
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(ou estatuto) prprio de cada uma. Tem-se como exemplo de Estado Regional atual aItlia, que comporta competncias administrativas (em quatro graus: o Estado nacional,a regio, a provncia e a comuna) e competncias legislativas ordinrias (nos nveisnacional e regional).71
Em suma, entende-se que os Estados simples ou unitrios so aqueles que
detm plena soberania em relao aos negcios externos e inteira ausncia ou
limitada diviso de autonomias no tocante aos internos. A personalidade
internacional uma nica.
4.2. ESTADOS COMPOSTOS
Os Estados compostos so aqueles que renem dentro de si vrios Estados
independentes ou provncias autnomas, sob o manto de um mesmo governo e um
s soberano, que detm os poderes de representao internacional. Este tipo de
Estado tem origem nas unies de Estados e aquele que apresenta divises ou
segmentaes internas dotadas de autonomia plena e poder originrio.
De maneira mais simples, Mello, leciona: Os Estados compostos apresentam
uma estrutura complexa, e a centralizao do poder no to grande.72
So duas as categorias de Estados compostos: a dos Estados compostos por
coordenao e a dos Estados compostos por subordinao. Os primeiros so: o
Estado Federal, a Confederao de Estados, as Unies de Estados e a
Commonwealth. Os segundos: o Estado vassalo, o protetorado internacional, o
Estado cliente, o Estado satlite, o Estado exguo, o territrio sob tutela, o territrio
no-autnomo e o Estado neutro.73
Adiante, far-se- uma anlise individual dessas categorias, uma vez que cadauma delas capaz de formar diferentes modalidades de Estados.
71MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2009. p. 412.72MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 375.73Ibidem.
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4.2.1. Estados compostos por coordenao
Os Estados compostos por coordenao, constituem-se pelo agrupamento de
outros Estados soberanos ou entidades estatais que, em plano de igualdade, gozam
de plena autonomia interna, mas sob o comando externo de um poder central.74
Vejamos cada um deles separadamente:
a) Estado Federal.Tambm chamado de Federaoou Unio Federal, uma
unio perptua de dois ou mais Estados, na qual cada um destes conserva apenas a
autonomia interna e transfere a soberania externa a um organismo central. A
caracterstica mais relevante esta na subordinao de todos os seus membros a um
governo central. Neste caso a personalidade de cada Estado desapareceinteiramente na pessoa do Estado Federal, possuindo inclusive uma nica
nacionalidade, a da Federao.75A nacionalidade, nos Estados Federais, no pode
ser distinta em cada uma das unidades componentes da Federao, sendo uma s
em todo o territrio nacional.
O Brasil um exemplo tpico deste tipo de Estado, vedando a separao de
seus membros, atravs do princpio da indissolubilidade, previsto no Art. 1 da
Constituio Federal de 1988, in verbis: A Repblica Federativa do Brasil, formadapela unio indissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal, constitui-se
em Estado Democrtico de Direito...76Outros exemplos de Estados Federados so:
Mxico e Venezuela (Amrica); ustria e Alemanha (Europa); Rssia (Europa/sia)
etc.
O elemento varivel nas Federaes apenas o nome que se atribui a cada
um dos entes que a compe: o que se chamam no Brasil de estados, na Argentina
se denominam deprovncias, na Alemanha de lnders, na Sua de kantonen, etc.b) Confederao de Estados. Foi um modelo histrico, em que vrios Estados
soberanos se associavam no plano interno e mantinham sua autonomia no externo,
conservando suas prprias personalidades internacionais, em decorrncia de um
pacto, visando a um fim especfico, como a paz entre si, ou a defesa contra inimigos
74MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 413.75ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1933. Tomo 1. p. 97-98.76BRASIL. Constituio da Repblica Federativa do Brasil (1988), promulgada em 5 de outubro de1988. Disponvel em: .Acesso em: 3 jun. 2011.
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externos. Para assegurar isto, criavam um rgo comum, quase sempre chamado
de Dieta77 (uma assemblia constituda de forma colegiada, formada pelos
plenipotencirios dos Estados confederados cujas decises so tomadas pela
maioria absoluta ou qualificada de votos) que tinha a capacidade executar certos
atos.78 Uma caracterstica peculiar Confederao era o direito de secesso dos
Estados que a formavam.79
Segundo Mazzuoli:
Os laos que unem os Estados confederados so extremamente frgeis e simplrios, oque fortalece a tendncia de se criar mecanismos para o fortalecimento do poder deseus rgos centrais. Para isso, e para que as mesmas no se dissolvamdefinitivamente, quase sempre as confederaes se transformavam em federaes.80
Consta como exemplo desta modalidade estatal: 1) Sua (ou Confederao
Helvtica), cujo reconhecimento como Estado independente se deu em 1648,
quando 13 cantes j se encontravam confederados, tendo sido posteriormente (em
1798) transformada em Repblica Helvtica. Por interveno de Napoleo
Bonaparte, ento Imperador dos Franceses, voltou a ser confederada em 1803,
porm, agora, com 19 cantes. Depois do denominado Pacto Federal de 1815
reuniram-se 22 cantes confederados, sob autoridade de uma Dieta, que se reunia
alternadamente em Zurique, Berna e Lucerna, onde cada canto tinha direito a umvoto, regime que perdurou at 1848, quando a Sua converteu-se finalmente em
Estado Federal;81 2) Estados Unidos da Amrica. Aps a independncia de 1777,
suas 13 colnias transformadas em Estados se uniram sob a forma confederada,
cada qual conservando sua autonomia poltica, sua liberdade e independncia,
tendo sido, mais tarde, transformada em Estado Federal.82
c) Unio de Estados. Surgem quando dois ou mais Estados se unem, as
relaes decorrentes se processam ora em termos de dependncia e desigualdade,ora de paridade e independncia. So exemplos deste tipo de Estado a Unio
77MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 415.78ARAJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Ed. Forense,2002. p. 120.79MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 377.80MAZZUOLI, op. cit., p. 416.81ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 119.82MAZZUOLI, op. cit., p. 416.
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Pessoal, a Unio Real e a Unio Incorporada. Vejamos cada um deles
separadamente.
1) Unio Pessoal. uma aliana acidental e temporria de dois ou mais
Estados independentes, que conservam a legislao distinta, governo prprio e
autonomia externa, sob autoridade de um soberano comum.83Conforme Mazzuoli, a
Unio Pessoal se caracteriza por nascer normalmente de uma lei de sucesso
dinstica, com a unio de um lao de sangue derivado do direito sucessrio, sem,
contudo ligar os Estados s mesmas normas jurdicas e s mesmas contingncias.84
Apesar da Unio Pessoal ocorrer mais comumente no regime monrquico,
visto que o chefe de Estado era o nico vnculo entre elas, com todos os efeitos
naturais da decorrentes, a este ela no se restringe. Como exemplo, cabe lembrarque Simon Bolvar foi simultaneamente presidente da Colmbia (1819-1830), ditador
do Peru (1823-1826) e presidente da recm-criada Bolvia (1825).
Na atualidade inexistem exemplos desta modalidade estatal, mas inmeros
so os exemplos histricos, podendo ser citados os seguintes: 1) Polnia e Litunia
(1386-1572), originada do casamento do Gro-Duque Ladislau II, da Litunia, com a
Rainha Edwige, da Polnia; 2) Portugal e Espanha (1580/1640), em conseqncia
da ascenso ao trono portugus do Rei da Espanha, Felipe II, em virtude da mortede Dom Sebastio, Rei de Portugal; 3) Pases Baixos e Luxemburgo (1815/1890),
pela deciso adotada no Congresso de Viena de 1815, com o objetivo de controlar a
Frana, finda com o incio do governo da Holanda pela Rainha Guilhermina, aps a
morte de seu pai Guilherme III; 4) Blgica e Congo (1885/1908), pelo ato do
parlamento belga que autorizou o Rei Leopoldo II a tornar-se soberano do Estado
independente do Congo, fundado pela Associao Internacional do Congo.
2) Unio Real. Resulta da juno de dois Estados, que guardamintegralmente sua autonomia interna, mas que integram uma nica personalidade
internacional, sob autoridade do mesmo monarca ou chefe de Estado.85O exemplo
atual deste tipo de Estado o Reino Unido da Gr-Bretanha e Irlanda do Norte, sob
a jurisdio da Rainha Elizabeth II. Como exemplos mais antigos, podem ser citados
os seguintes: 1) Sucia e Noruega (1814-1905); 2) Dinamarca e Islndia (1918-
83ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1933. Tomo 1. p. 115.84MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 413.85Ibidem.
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1944), extinta pelo fato desta ltima ter decidido, por meio de plebiscito, separar-se,
instaurando a Repblica; 3) ustria e Hungria (1867-1918), ocorrida em razo de um
compromisso assumido a base da sano pragmtica do Imperador Carlos VI e que
findou em virtude de sua abdicao ao trono.
3) Unio Incorporada.Trata-se da unio de vrios Estados com a finalidade
de formar um novo, tal como ocorreu nos antigos reinos da Inglaterra, da Esccia,
do Pas de Gales e da Irlanda do Norte, para formar o Reino Unido da Gr-Bretanha
e Irlanda do Norte.86
d) Commonwealth. A expresso Commonwealth Britnica no se enquadra
em uma forma de Estado propriamente dita, sendo considerada uma formao sui
generis, e abrange, alm do Reino Unido da Gr-Bretanha e Irlanda do Norte, maisde sessenta unidades diferentes, os domnios, colnias autnomas, dependncias
da Coroa, protetorados e territrios sob tutela, cada qual com seu sistema legislativo
e administrativo. O instituto no possui personalidade internacional. Os seus
membros so conhecidos como domnios, que so verdadeiros Estados soberanos
e conservam o direito de secesso da Commonwealth, bem como de se manterem
neutros em tempos de guerra. O Canad e a Austrlia so exemplos importantes da
Commonwealth of Nations.87
Entende-se, portanto, que os Estados compostos por coordenao so
aqueles que, apesar de independentes, sujeitam-se a regncia de outro poder no
plano externo. Os entes tm a mesma estrutura, havendo equilbrio nas foras que
compe esse complexo sistema. Caso a composio coordenada seja pessoal,
eventualmente ter carter temporrio.
4.2.2. Estados compostos por subordinao
Incluem-se nesta categoria aqueles Estados que compreendem, de um lado,
um ente plenamente soberano e, de outro, uma ou mais coletividades estatais ou
semi-estatais que dependem do primeiro, e cujo governo s exerce competncias
86MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 415.87MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio deJaneiro: Renovar, 2007. p. 379-380.
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restritas.88So conhecidos doutrinariamente como Estados semi-soberanos, por no
deterem a soberania (interna e externa) plena, que inibida pela ao de outro
Estado. Os Estados compostos por subordinao so classificados dependendo da
natureza e do grau de subordinao que se apresentam. So estes os exemplos que
se tem desta modalidade de Estado tutelado:
a) Estado Vassalo. Este tipo de Estado gozava de certas prerrogativas no
plano interno, mas os assuntos externos eram de competncia do Estado (suserano)
ao qual estava subordinado. Portanto, o trao peculiar desta modalidade estatal
como bem descreve Mazzuoli:
(...) a limitao de sua soberania externa, alm da privao de vrias de suasliberdades internas, como a interveno do Estado suserano na sua administrao e
legislao internas, a sujeio ao pagamento de tributos peridicos, o impedimento decunhar moedas, etc. O Estado suserano tem, entretanto, a obrigao de dispensarproteo militar ao vassalo.89
Como a absoro de sua personalidade no integral, o Estado vassalo pode
concluir certos atos internacionais e manter determinadas relaes diplomticas
submetidas ao veto do Estado suserano.
A Turquia utilizou-se da vassalagem90 para reconhecer a autonomia de
algumas naes que se emanciparam de seus domnios, sem, contudo, reconhecer
formalmente essa separao, como a Srvia e a Romnia (1856-1878), a Bulgria
(1878-1908) e o Chipre (1878-1914).
Tal conceito, hoje em dia, tem apenas valor histrico (apesar de alguns
autores, como Joaquim da Silva Cunha, considerarem ainda em situao similar
vassalagem Andorra, Liechtenstein, Mnaco e San Marino).91
b) Protetorado Internacional. Um protetorado internacional consiste numa
relao jurdica que se estabelece, por via de um tratado, entre dois Estados, pela
qual um deles, o Estado protetor, se compromete a proteger outro, o Estado
protegido, em princpio contra a agresso ou outras violaes de Direito
88ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 131-132.89MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 420.90A vassalagem constitui relao jurdica geralmente transitria de Direito interno (constitucional)que une dois Estados, colocando um sob o jugo do outro, respeitando certos limites impostos peloDireito Internacional. (Ibidem.).91SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Pblico. 3.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 190.
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Internacional.92Esta foi a frmula adotada na expanso colonial de alguns Estados
europeus no sculo XIX, quando se depararam com populaes j evoludas e
constitudas em Estados.
Segundo Accioly, so basicamente cinco os traos fundamentais do
protetorado:
a) repousa, ordinariamente, num tratado, entre o Estado protetor e o protegido;b) este ltimo conserva, at certo ponto, a qualidade de pessoa internacional;c) os seus nacionais, no adquirem, ipso facto, a nacionalidade do Estado protetor;d) o exerccio da soberania externa transferido ao Estado protetor, bem como o decertos direitos dependentes da soberania interna, tais como o comando militar, aadministrao da justia, etc.;e) o Estado protegido no participa, necessariamente, das guerras do Estado protetor;f) os tratados celebrados por este ltimo no so, ipso facto, aplicveis ao primeiro.93
Historicamente, esse procedimento foi empregado principalmente pela Frana
(Arglia, Marrocos, Tunsia, Vietn, Laos e Camboja) e, em menor grau pelo Reino
Unido (Egito) e pela Espanha (norte de Marrocos). Desse modo, estas frmulas
foram desaparecendo com os processos de descolonizao.94
c) Estado Cliente.Estes Estados confiavam a outros a defesa de alguns de
seus interesses internos (administrao de suas alfndegas), mantendo na ntegra a
sua personalidade jurdica internacional. A terminologia nasceu da interveno
financeira que os Estados Unidos da Amrica, em respeito poltica do big-stickdo
Presidente Theodore Roosevelt, submeteram alguns Estados do continente
americano que se encontravam em situaes a beira da anarquia. Tal ocorreu at
1934 (quando foi revogada a emenda Platt que autorizava o sistema), com Cuba
(1901-1934), Panam (1903), Repblica Dominicana (1907), Haiti (1915), todos em
relao aos Estados Unidos, embora tivesse como fundamento a celebrao de um
tratado internacional entre eles.95
d) Estado Satlite. um termo poltico que se refere a um pas que formalmente independente, mas na prtica se encontra supostamente sujeito ao
controle poltico ou ideolgico de alguma potncia.
No final da II Guerra Mundial, a maior parte dos pases da Europa oriental e
central foram ocupados pela Unio Sovitica (URSS), entretanto, mesmo aps o
92PEREIRA, Andr Gonalves; QUADROS, Fausto de. Manual de Direito Internacional Pblico. 3.ed. Coimbra: Almedina, 1997. p. 348.93ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,
1933. Tomo 1. p. 107-108.94PEREIRA, Andr Gonalves; QUADROS, Fausto de, op. cit., p. 350.95MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 422.
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trmino do conflito, os soviticos acabaram permanecendo na regio. Atravs de
uma srie de governos de coalizo, incluindo partidos comunistas, os chamados
stalinistas ganharam o controle da administrao, polcia, imprensa e rdio nesses
Estados.
Os Estados satlites encontravam-se em situao semelhante aos Estados
clientes, todavia, como visto acima, os primeiros, estavam politicamente
subordinados a antiga Unio Sovitica.96 A Polnia, Romnia, Bulgria e outros,
encontravam-se nesta situao, desaparecendo entre 1989 e 1990 com o fim da
cortina de ferro.
e) Estados Associados. Aqueles que atingiram a independncia, mas, sem
possurem meios para mant-la, encontram-se subordinados a outros Estados,como no caso de Porto Rico (Estados Unidos) e Ilhas Cook (Austrlia).97
f) Estado Exguo. Tambm chamados de microestados, so aqueles que
possuem uma superfcie territorial pequenssima, populao igualmente pequena, e
no tem meios suficientes de defender a sua soberania de modo completo.98
O menor Estado exguo plenamente soberano a Cidade do Vaticano, com
829 cidados em julho de 2010 e uma rea de apenas 0,44 km .
Os microestados no devem ser confundidos com micronaes, que noso reconhecidas como Estados soberanos. Os territrios especiais, sem a plena
soberania, como as dependncias da Coroa Britnica, as regies administrativas
especiais chinesas e os territrios ultramarinos da Dinamarca, Frana, Paises
Baixos, Noruega e Reino Unido, tambm no so consideradas micro.
A ttulo de exemplo de microestados, pode-se citar: o Principado de
Liechtenstein (Europa); Tuvalu (Oceania); So Cristvo e Nevis (Amrica Mar do
Caribe); Maldivas (sia Oceano ndico); Seychelles (frica Oceano ndico).g) Territrio sob tutela. Modernamente, para alguns doutrinadores, como
Mazzuoli, possvel ainda incluir ao gnero de Estados compostos por
subordinao, os territrios sob tutela, destacando que:
O sistema de tutela foi criado pela Carta das Naes Unidas, em substituio ao sistemade mandato criado pela Liga das Naes, que previa a existncia de comunidadessubmetidas a um regime especial, consistente na tutela de outro Estado, que asadministrava na condio de mandatrio e agia em nome da Liga. O sistema de mandato
96MELLO, Celso Duvivier de Albuquerque. Curso de Direito Internacional Pblico. 15.ed. Rio de
Janeiro: Renovar, 2007. p. 384-385.97SILVA, Roberto Luiz. Direito Internacional Pblico. 3.ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 191.
98ACCIOLY, Hildebrando. Tratado de direito internacional pblico. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional,1933. Tomo 1. p. 81.
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(cuja base legal encontrava-se no art. 22 do Pacto da Liga) havia sido institudo paraimpedir que as potncias vencidas da Primeira Guerra (principalmente Alemanha eTurquia) continuassem a exercer domnio sobre os territrios que at ento possuam,submetendo-os a um regime especial de administrao sob a responsabilidade de umEstado mandatrio. A Segunda Guerra mundial e a Organizao das Naes Unidas
criaram, em substituio, o instituto do trusteeshipou sistema internacional de tutela,que serviria para administrar e fiscalizar os territrios que poderiam ser colocados sob talsistema em conseqncia de futuros acordos individuais.99
Os objetivos bsicos do sistema de tutela, de acordo com os propsitos das
Naes Unidas encontram-se enumerados no art. 76 de seu documento constitutivo:
a) Propagar e favorecer a paz e a segurana internacionais; b) Fomentar o
progresso poltico, econmico, social e cultural dos habitantes dos territrios sob
tutela e o seu desenvolvimento evolutivo para alcanar governo prprio ou
independncia como mais convenha s circunstncias particulares de cada territrio
e dos seus habitantes e aos desejos livremente expressos dos povos interessados e
como for previsto nos termos de cada acordo de tutela; c)Fortalecer o respeito pelos
direitos do homem e pelas liberdades fundamentais a todos sem distino de raa
sexo, lngua ou religio, e favorecer o reconhecimento da interdependncia de todos
os povos; d) Garantir a igualdade de tratamento nos setores social, econmico e
comercial a todos os membros das Naes Unidas e seus nacionais e, a estes
ltimos, igual tratamento na administrao da justia.100
Os territrios aos quais poderia ser aplicado o regime de tutela vm descritos
no artigo seguinte do documento constitutivo, que assim normatiza:
Artigo 77.1 - O regime de tutela ser aplicado aos territrios das categorias seguintes que venhama ser colocados sob esse regime por meio de acordos de tutela:a) Territrios atualmente sob mandato;b) Territrios que possam ser separados de Estados inimigos em conseqncia da 2.Guerra Mundial;e) Territrios colocados sob esse regime por Estados responsveis pela sua
administrao;2 - Ser objeto de acordo ulterior a determinao dos territrios das categorias acimamencionadas a serem colocados sob o regime de tutela e das condies em que osero.101
99MAZZUOLI, Valrio de Oliveira. Curso de Direito Internacional Pblico. 3.ed. So Paulo: EditoraRevista dos Tribunais, 2009. p. 425.100UNITED NATIONS. Charter of the United Nations and Statute of the International Court of Justice .(Traduo nossa). Di
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