NÚCLEO ESTADUAL DE JOVENS E ADULTOS-CULTURA POPULAR
CONSTRUINDO UM NOVO MUNDO
APOSTILA DE LITERATURA
ENSINO MÉDIO
PROFª: ELAINE MARIA EITELWEIN
GÊNESIS
No princípio era o verbo. Aí o homem conjugou-o com o predicado e os
complementos para escrever frases, parágrafos e, finalmente, uma história inteira. E o
homem viu que isso era bom. Então, pensou que aquele relato tão precioso poderia
entrar por um ouvido e sair pelo outro do seu interlocutor, perdendo-se para sempre.
Resolveu registrá-lo na pedra. Era muito trabalhoso. Usou então a argila, mas na
primeira chuva seu trabalho foi por água abaixo. Veio o papiro e, logo em seguida, o
papel, mas era uma mão de obra copiar o mesmo texto várias vezes para possibilitar que
chegasse a um número maior de pessoas. Aí o alemão aquele bolou o tipo móvel e ficou
mais fácil de armazenar as letrinhas no seu invólucro perfeito, um bloco de folhas finas
protegido por capas mais grossas, fácil de manusear, fácil de carregar, facílimo de ler.
O homem, então, criou o livro. Soprou a poeira de sua superfície e deu-lhe vida
própria.Estava criado um objeto mágico, capaz de abrigar todo o conhecimento do
universo, todas as emoções humanas, todas as realidades e todos os sonhos, toda a
imaginação e todas as aventuras, todas as crenças e todo o ceticismo.
Tudo pode ser encontrado nessa verdadeira caixinha de surpresas: a origem do
mundo e a origem das espécies, a guerra e a paz, o som e a fúria, o orgulho e o
preconceito, o senhor das moscas e o senhor dos anéis, a ilíada e a odisseia, a divina
comédia e a comédia da vida privada, a interpretação dos sonhos e o sonho eterno, a
matéria escura e a luz de agosto, o homem invisível e o homem que calculava, a idade
da inocência e a idade da razão, o pequeno príncipe e o grande mentecapto, a revolução
dos bichos e a revolução do amor, as mil e uma noites e cem anos de solidão.
É, também, o endereço comum de personagens reais ou fantásticos que em
algum momento cruzaram por nossas vidas: Dom Quixote de La Mancha, Sherazade,
Harry Potter, Ulisses, Lolita, Madame Bovary, Hamlet, Otelo, Frankenstein, Dorian
Gray, Peter Pan, Ed Mort, Sherlock Holmes, James Bond, Robinson Crusoé, Gulliver,
Percy Jackson, Ana Karenina, Capitu, Blimunda, Fausto, Aureliano Buendía e centenas
de outros que habitarão para sempre os nossos corações e mentes.
O livro, essa divina criação humana, esse enigma a ser decifrado, esse manual de
civilidade, esse objeto perfeito que haverá de resistir ao apocalipse digital, espera por
nós entre os jacarandás floridos do jardim do éden gaúcho, que modestamente
chamamos de Praça da Alfândega.
Nilson Souza, Jornal Zero Hora, 02/11/2013. P. 33.
O QUE É LITERATURA?
A literatura é uma das formas de expressão artísticas do ser humano, juntamente
com a música, a pintura, a dança, a escultura, o teatro, etc. Assim como o material da
escultura são as formas e os volumes e o da pintura são as formas e as cores, o material
básico da literatura é a palavra.
Como parte integrante da cultura, a literatura já passou por diferentes formas de
expressão, de acordo com o momento histórico e com a situação de produção. Na
Grécia antiga e na Idade Média, por exemplo, sua transmissão ocorria basicamente de
forma oral, já que pouquíssimas pessoas eram alfabetizadas. Nos dias de hoje, em que
predomina a cultura escrita, os textos literários são escritos para serem lidos
silenciosamente pelos leitores. Contudo, juntamente com o registro escrito da literatura,
publicada em livros e revistas, há outros suportes que levam o texto até o público, como
CD, a internet e inúmeras adaptações feitas para o cinema e a TV.
Estilos de Época: adequação e superação
O ser humano se modifica através dos tempos: muda sua forma de pensar, de
sentir e de ver o mundo. Consequentemente, promove mudança nos valores, nas
ideologias, nas religiões, na moral, nos sentimentos. Por isso é natural que as obras
literárias apresentem características próprias do momento histórico em que são
produzidas. Ao conjunto de textos que apresentam certas características comuns
em determinado momento histórico, chamamos de estilo de época ou movimento
literário.
OS GÊNEROS LITERÁRIOS:
Entre os gêneros discursivos, existem aqueles que são próprios da esfera artística
e cultural e são utilizados com a finalidade estética, artística: os gêneros
literários.Como o escritor tem liberdade para criar e recriar gêneros literários, é difícil
traçar fronteiras entre estes. Há três gêneros literários básicos: o lírico, o épico e o
dramático.
Veja, na tabela abaixo, as características básicas destes gêneros:
Gênero lírico Gênero épico Gênero dramático Gêneros narrativos
modernos
Manifestação de um
“eu lírico” que
expressa no texto o
seu mundo interior.
Há um narradorque
conta uma história
em versos, em longo
poema que ressalta a
figura de um herói e
feitos gloriosos.
Expõe o conflito dos
homens e seu mundo.
São textos para serem
encenados. Ao in de
um narrador a
história e encenada
no palco.
O romance, a novela,
o conto e a crônica.
Por que alguns textos são literários e outros não?
Um texto literário precisa ter versos, rimas, e palavras diferentes das que usamos
no dia-a-dia? Precisa falar de um mundo imaginário, distante da realidade em que
vivemos?
Não, não precisa. Para ser literário, o texto deve apresentar uma linguagem
literária, isto é, uma linguagem em que se encontram recursos expressivos que chamam
a atenção para o modo como ela própria está constituída.
Observe no texto 1 e no texto 2 exemplos de textos com o mesmo tema, mas
escritos com linguagens diferentes:
Texto1: não literário
Texto 2: Literário
A literatura trabalha com texto literário.
A literatura é visão do autor que escreve.
Descuidar do lixo é sujeira
Diariamente, duas horas antes da chegada do caminhão da
prefeitura, a gerência (de uma das filiais do McDonald’s)
deposita na calçada, dezenas de sacos plásticos recheados de
papelão, isopor, retos de sanduíches. Isso acaba proporcionando
um lamentável banquete de mendigos. Dezenas deles vão ali
revirar o material e acabam deixando os restos espalhados pelo
calçadão.Veja. São Paulo, 23/12/92. P. 24.
Revista Veja, Sã o Paulo, 23/12/92.)
O Bicho
(Manuel Bandeira) Vi ontem um bicho, Na imundície do pátio Catando comida entre os detritos.
Quando achava alguma coisa, Não examinava nem cheirava: Engolia com voracidade.
O bicho não era um cão Não era um gato Não era um rato. O bicho, meu Deus! Era um homem.
FIGURAS DE LINGUAGEM:
Aliteração:
A cor a coragem
cora coração
Abecê abecedário
Opera Operário
Pé no pé no chão
( Linha de Montagem. Chico Buarque .Ópera operário)
Observe, nesses versos de Chico Buarque, a repetição de vários fonemas em
diferentes palavras. Ele utilizou um recurso de linguagem chamado aliteração, que é a
repetição intencional de fonemas para produzir os efeitos desejados.
Eufemismo
O eufemismo consiste no emprego de palavras ou expressões suaves no lugar de
expressões rudes, desagradáveis, chocantes.
Comparação
“O chocolate foi se transformando numa massa viscosa e amarga. Engoliu-o
com esforço, como se fosse uma bola de papel”.
Na comparação há sempre dois seres, objetos ou ideias expressas, ligados por
uma palavra comparativa (como, tal, qual, etc.) que estabelece uma relação de
semelhanças entre os dois termos comparados.
Metáfora
Onomatopeia:
(Trecho do poema Noite de S. João, de Jorge de Lima(Poemas, 1927))
“O Rio é um ferido, São Paulo é
uma segunda-feira”
Arnaldo Jabor. Sanduíches da
realidade. Objetiva.
Comparação: O Rio é como um ferido. São
Paulo é como segunda-feira.
Metáfora: “O Rio é um ferido. São Paulo é uma
segunda-feira.”
NOITE DE SÃO JOÃO
Vamos ver quem é que sabe soltar
fogos de são João?
Foguetes, bombas, chuvinhas,
chios,chuveiros,chiando,
chiando,
chovendo
chuvas de fogo!
Chá-bum!
Onomatopeia: é um recurso de linguagem
que consiste em imitar sons e ruídos dos seres
de palavras. Aqui, é comum o uso do ponto de
exclamação.
Chamalotes, checoslavos,
enchem o chão
de chamas rubras.
Chagas de enchofre chineses
Chiam,
Choram,
Cheiram
Hipérbole: consiste no emprego de palavras que expressam uma ideia de exagero de
forma intencional.
Ex: Ela chorou um rio de lágrimas
Antítese: é uma figura de linguagem que consiste no uso de palavras ou ideias de
sentido contrário. (A palavra nasce-me, fere-me, mata-me, ressuscita-me).
Soneto da Separação
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o espanto
(Vinícius de Moraes. Para Viver um grande amor. São Paulo: José Olympío.1984
Prosopeia (Personificação)
A prosopopeia ou personificação se dá quando atribuímos a animais ou seres
inanimados ações e sentimentos próprios do ser humano.
Como um zumbi de mamangava ouve-se o estrondo da cachoeira a vida inteira a
bater bumbo, a bater bumbo, a bater bumbo.
Perífrase:
Observe:
a) O patriarca da independência ( para dizer “Jose Bonifácio”).
b) O rei das selvas (para dizer “leão”).
c) O navio do deserto (para dizer “camelo”).
Perífrase ou circunlocução consiste no emprego de várias palavras para
designar um ser através de alguma de suas qualidades ou atributos.
Na linguagem coloquial, ou seja, na linguagem do dia a dia, usamos as palavras
conforme as situações que nos são apresentadas. Por exemplo, quando alguém diz a
frase: “Isso é um castelo de areia”: Em sentido denotativo, é a construção feita na
areia da praia em forma de castelo; em sentido conotativo, ocorrência incerta, sem
solidez.
Denotação: É o uso do signo em seu sentido real, ou seja, o uso da palavra em seu
sentido original.
Conotação: É o uso do signo em sentido figurado, simbólico, ou seja, o uso da palavra,
dando-lhe outro significado, que não o original; um sentido figurado.
Por exemplo: Ao usarmos a palavra corda com o sentido de, segundo o
Houaiss, feixe alongado de fibras vegetais (sisal, cânhamo, etc.) ou matéria flexível
similar, torcidas em espiral, de grossura e comprimento variáveis, usamo-la no
sentido real, original. Isso é denotação. Eis uma frase:
- A corda era muito fina, por isso não resistiu ao peso dele e se arrebentou.
Ao usarmos a palavra corda com o sentido de, segundo o Houaiss, boa
disposição física e mental; energia, vigor, usamo-la no sentido figurado. Isso é
conotação. Eis uma frase:
- Hoje ele está com a corda toda.
DENOTAÇÃO
Temos denotação quando a palavra
é empregada no seu sentido real,
comum, literal. É usada na
linguagem científica, informativa,
sem preocupação.
CONOTAÇÃO
Temos conotação quando a palavra
assume um sentido fora, um sentido
figurado poético. A conotação é muito
usada na linguagem literária.
A LITERATURA DE CATEQUESE
Os jesuítas vindos ao Brasil com a missão de catequizar os índios
deixaram inúmeras cartas, tratados descritivos, crônicas históricas e poemas.
Naturalmente, toda essa produção está diretamente ligada à intenção catequética de seus
autores, entre os quais se destacam os padres Manuel da Nóbrega, Fernão Cardim e
principalmente, pelas qualidades literárias, José de Anchieta.
José de Anchieta ( 1534 – 1597) nasceu nas ilhas Canárias, Espanha, e
faleceu em Reritiba, atual Anchieta, no estado do Espírito Santo. Veio ao Brasil para
trabalhar com o padre Manuel da Nóbrega e participou da fundação das cidades de São
Paulo e do Rio de Janeiro.
Sua obra representa a parte melhor do Quinhentismo brasileiro. Escreveu poesias
religiosas, além de crônica histórica e uma gramática do tupi. Foi também autor de
peças teatrais, escritas com a finalidade de ajudar na educação espiritual dos colonos e
catequese dos índios.
Os primeiros textos escritos no Brasil geralmente não tinham uma função
propriamente literária, pois atendiam finalidades específicas, tanto os padres e
religiosos, que na aqui aportavam com a finalidade de catequizar os índios,
quanto os navegantes, interessados em descrever e explorar a terra recém-
descoberta.
Entre os religiosos que aqui estivera, destacam-seJose de Anchieta e
Manuel da Nóbrega. Anchieta(1534-1597) escreveu vários tipos de textos com
finalidade pedagógica como poemas, hinos, canções e autos(gênero teatral
originado da Idade Média), além de cartas que informavam sobre o andamento da
catequese no Brasil e de uma gramática da língua tupi.
Indiferente às novidades de conteúdo e forma e formas trazidas pelo
Renascimento, Anchieta seguia os modelos literários medievais, fazendo uso da
medida velha ( redondilhada), como exemplo estes versos:
A SANTA INÊS
Cordeirinha linda,
como folga o povo
porque vossa vinda
lhe dá lume novo!
Cordeirinha santa,
de Iesu querida,
vossa santa vinda
o diabo espanta.
Jose de Anchieta
“De ponta a ponta é toda praia rasa, muito plana e bem formosa. Pelo sertão,
pareceu-nos do mar muito grande, porque a estender a vista não podíamos ver senão terra
e arvoredos, parecendo-nos terra muito longa. Nela, até agora não podemos saber que
haja nem ouro, nem prata, nem nenhuma coisa de metal, nem de ferro; nem as vimos.
Mas, a terra em si é muito boa de ares, tão frios e temperados, como os de Entre-Douro e
Minho, porque neste tempo de agora, assim os achávamos como os de lá. Águas são
muitas e infindas. De tal maneira é graciosa que, querendo aproveitá-la dar-se-á nela tudo
por bem das águas que tem. Mas o melhor fruto que nela se deve lançar, me parece que
será salvar esta gente; e esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza nela deve
lançar.”
(In: Cronistas viajantes: São Paulo: Abril Educação, 1982. P. 12-23. Literatura Comentada.
A feição deles é serem pardos,
quase avermelhados, de rostos
regulares e narizes bem feitos;
andam nus sem nenhuma
cobertura; nem se importam de
cobrir nenhuma coisa, nem de
mostra suas vergonhas. E sobre
isso são tão inocentes, como em
mostra o rosto.
LITERATURA DE INFORMAÇÃO
Os escritores que produziram a Literatura de informação não revelam nenhum
sentimento de apego à terra conquistada, concebida como espécie de extensão da
metrópole, “Um Portugal nos trópicos.” Apesar disso a Literatura de Informação deixou
como herança um conjunto inesgotável de sugestões temáticas ( os índios, as belezas
naturais da terra, nossas origens históricas) exploradas mais tarde por artistas brasileiros
de diferentes linguagens.
Os dois fragmentos, acima citados, pertencem ao primeiro texto escrito
em nosso país: a Carta de Pero Vaz de Caminha. Essa carta e muitos outros textos em
forma de cartas de viagens, diários de navegação e tratados descritivos formam a
chamada literatura de informação.
Embora guardem pouco valor literário, esses escritos têm importância
hoje, principalmente pelo significado como valor histórico, seja como testemunho do
espírito aventureiro da expansão marítima e comercial nos séculos XV e XVI, seja
como registro do choque cultural entre colonizadores e colonizados.
Interterxtualidade: é a relação entre dois ou mais textos caracterizados por um citar o
outro. Observe os textos abaixo, em suas diversas tipologias, e perceba que o assunto
que os une é o descobrimento do Brasil.
Texto 1:
De ponta a ponta é toda praia rasa, muito plana e bem formosa. Pelo sertão pareceu-nos
do mar muito grande, porque a estender a vista não podíamos ver senão terá e
arvoredos, parecendo-nos terá muito longa. Nela, até agora, não pudemos saber que
haja ouro nem prata, nem nenhuma coisa de metal, nem de ferro; nem as vimos. Mas, a
terá em si é muito boa de ares,(...) Mas o melhor fruto que nela se pode fazer, me
parece que será salvar esta gente; e esta deve ser a principal semente que Vossa Alteza
nela deve lançar. Carta dePero Vazde Caminha :fragmentos.
Texto 2:
A descoberta
Seguimos nosso caminho por este
mar longo
Até a oitava de Páscoa
Topamos aves
E houvemos vista de terra
(Pau Brasil, 2. Ed. São Paulo: Globo,
2003. P. 107)
Texto 3:
Há diferentes tipos de intertextualidade. A intertextualidade pode ter uma base
temática, quando os textos apresentam um tema em comum (caso dos exemplos acima),
uma determinada ideologia ou visão de mundo; por exemplo a que ocorre entre a
tragédia grega Medeia, de Eurípedes, e a peça teatral Gota d’água, de Chico
Buarque, uma versão moderna desse texto. Também pode ter uma base estilística,
quando um texto, como, por exemplo, o emprego de palavras, expressões ou estruturas
sintáticas similares.
Entre os diferentes níveis de intertextualidade, há alguns mais sofisticados, em
que a relação entre o texto e o intertexto não é apenas a de uma mera citação.
Leia os versos de dois poetas de épocas diferentes:
Meus oito anos
Oh! Que saudade que tenho
Da aurora da minha vida,
Da minha infância querida
Que os anos não trazem mais
Que amor, que sonhos, que flores
Naquelas tardes fagueiras
À sombra das bananeiras,
Debaixo dos laranjais!
(...)
(Casimiro de Abreu. Poesias Completas de Casimiro de Abreu. Rio de janeiro: Ediouro. P. 19-20)
Meus oito anos
Oh que saudades que eu tenho
Da aurora da minha vida
Das horas
De minha infância querida
Que os anos não trazem mais
Naquele quintal de terra
Da Rua de Santo Antônio
Debaixo da bananeira
Sem nenhum laranjais.
(...) ( Oswald de Andrade. Primeiro caderno do aluno de poesia Oswald de Andrade. 4 ed. São Paulo: Globo; 2006.
P. 52.)
O primeiro texto, de Casimiro de Abreu, foi escrito no século XIX; o segundo,
de Oswald de Andrade, foi escrito no século XX. As semelhanças entre os textos são
evidentes, pois o assunto deles é o mesmo e há versos inteiros que se repetem. Portanto,
o segundo texto cita o primeiro, estabelecendo com ele uma relação intertextual.
Observe que o segundo texto tem uma visão diferente da apresentada pelo
primeiro. Neste, tudo na infância parece ser perfeito. Já, no segundo texto, os elementos
perfeitos são substituídos por um simples:“ quintal de terra”, um espaço comum, sem
idealizações. Além disso, com o verso “sem nenhum laranjais”, Oswald de Andrade
ironiza Casimiro de Abreu, como que dizendo: na minha infância também havia
bananeiras, mas não havia os tais “laranjais”, que Casimiro cita no poema.
Observe que Oswald de Andrade, com seu poema, não apenas cita o poema de
Casimiro de Abreu, ele também critica esse poema, pois considera irreal a visão que
Casimiro tem da infância. Na opinião de Oswald, infância de verdade, no Brasil, se faz
com crianças brincando em quintal de terra, embaixo de bananeiras, e não com crianças
sonhando embaixo de bananeiras.
Nesse tipo de relação estabelecida entre textos, não há apenas intertextualidade.
Há uma relação mais abrangente, que envolve dois discursos poéticos distintos, duas
formas diferentes de ver a infância: a de Casimiro de Abreu, mais delicada e romântica;
e a de Oswald de Andrade, moderna e antissentimental. A esse tipo de relação entre
discursos, quando se evidenciam os elementos da situação de produção – quem faz, para
que, em que momento histórico, com qual finalidade, etc. – chamamos
interdiscursividade.
Interdiscursividade é a relação entre dois discursos caracterizada por um
citar o outro.
O tipo de relação existente entre dois textos também é chamado de paródia.
Paródia é um tipo de relação intertextual em que um texto cita o outro
geralmente com o objetivo de fazer-lhe uma crítica ou inverter ou distorcer suas
ideias.
O BARROCO NO BRASIL (séc. XVII)
O Brasil presenciava o nascer de uma literatura própria, embora ainda frágil e
presa aos modelos lusitanos, ainda restritos a uma elite muito pequena e culta e ainda
sem poder contar com um público consumidor ativo e influente. Mas começavam a
despontar os primeiros escritores nascidos na colônia e, com eles, surgiam as primeiras
manifestações do sentimento nativista, (de valorização da terra natal).
O Barroco brasileiro surgiu nesse contexto. O Brasil era um centro de comercio,
de exploração da cana-de-açúcar; violência, em que se escravizavam os negros e se
perseguia os índios. Aqueles que escreviam encontravam na literatura uma maneira de
denunciar a ganância da mentalidade colonialista ou para moralizar a população com
princípios da religião, ou ainda, para dar vazão aos sentimentos pessoais mais
profundos.
A obra considerada, tradicionalmente o marco inicial do Barroco brasileiro é
Prosopopéia (1601), de Bento Teixeira, poema que procura imitar os lusíadas.
O Barroco no Brasil só ganhou impulso entre 1720 e 1750, quando foram
fundadas várias academias literárias no Brasil.
A descoberta do ouro, em Minas Gerais, possibilitou o desenvolvimento de um
Barroco tardio nas artes plásticas, que resultou na construção de igrejas de estilo barroco
durante todo o século XVIII.
Os escritores que mais se destacaram foram:
Na poesia:
Gregório de Matos; Bento Teixeira ;Botelho de Oliveira; Frei Itaparica
Na prosa:
Pe. Antônio Vieira; Sebastião da Rocha Pita; Nuno Marques Pereira.
Gregório de Matos: adequação e irrelevância
Gregório de Matos (1636-1695) foi o maior poeta barroco brasileiro e um dos
primeiros a criar a poesia lírica e a poesia satírica no país. A lírica-amorosa é
fortemente marcada pelo dualismo amoroso carne/espírito, que leva normalmente a um
sentimento de culpa espiritual. A mulher, muitas vezes, é personificação do próprio
pecado, da perdição espiritual. A lírica-religiosa há frequente presença de temas como
a culpa e o amor a Deus.
Conhecido também como “O Boca do inferno”, em razão de suas sátiras,
Gregório de matos é um dos principais e mais ferinos representantes da literatura
satírica na língua portuguesa. Não poupou ninguém na sua linguagem, nem palavrões
nem críticas a todas as classes da sociedade baiana de seu tempo. Criticava o
governador, o clero, os comerciantes, os negros, os mulatos, etc.
Perceba que no poema amoroso (a lírica), a mulher, inicialmente identificada
com a figura de um anjo (que remete à pureza angelical contida no próprio nome
Ângela) e depois com a grandeza maior, o Sol, é vista como ser superior, dotado de
grandezas absolutas e inacessíveis.
Poema Religioso: Poema Lírico - amoroso:
Poema satírico:
Gregório de Matos nasceu em Salvador, na Bahia, no dia 23 de dezembro de 1636.
Estudou Humanidades no Colégio dos Jesuítas e em seguida foi estudar Direito na
Universidade de Coimbra. Foi curador de órfãos e em seguida nomeado juiz criminal em
Alcácer do Sal. Já ensaiava seus primeiros poemas satíricos.
Em 1681, voltou ao Brasil, recebendo do arcebispo o cargo de vigário geral e
tesoureiro mor., mas sem obedecer às ordens eclesiásticas, foi logo deposto. Devido às suas
sátiras, foi perseguido pelo governador da Bahia.
Depois de se casar com a viúva Maria dos Povos e exercer a função de advogado,
abandonou tudo e saiu pelo Recôncavo como cantador itinerante, dedicando-se às sátiras e aos
poemas eróticos e irônicos, motivo pelo qual foi degredado para a Angola, na África. Voltou
ao Brasil, doente, e impedido de entrar na Bahia, foi para a cidade do Recife, em Pernambuco.
Soneto a Nosso Senhor
Pequei, Senhor, mas não porque hei pecado,
Da vossa alta clemência me despido;
Porque quanto mais tenho delinquido
Vos tem a perdoar mais empenhado.
Se basta a voz irar tanto pecado,
A abrandar-vos sobeja um só gemido:
Que a mesma culpa que vos há ofendido,
Vos tem para o perdão lisonjeado.
Se uma ovelha perdida e já cobrada
Glória tal e prazer tão repentino
Vos deu, como afirmais na sacra história.
Eu sou, Senhor a ovelha desgarrada,
Recobrai-a; e não queirais, pastor divino,
Perder na vossa ovelha a vossa glória.
Não vira em minha formosura,
Ouvia falar dela todo dia,
E ouvida me incitava, e me movia
A querer ver tão bela arquitetura:
Ontem a vi por minha desventura
Na cara, no bom ar, na galhardia
De uma mulher, que em Anjo se mentia;
De um Sol, que se trajava em criatura:
Matem-me, disse eu, vendo abrasar-me,
Se esta a cousa não é, que encarecer-me
Sabia o mundo, e tanto exagerar-me:
Olhos meus, disse então por defender-me,
Se a beleza hei de ver para matar-me,
Antes olhos cegueis, do que eu perde-me
Que falta nesta cidade............. Verdade
Que mais por sua desonra.........Honra
Falta mais do que lhe ponha......Vergonha
O demo a viver se exponha,
Por mais que a fama a exalta,
Numa cidade, onde falta
Verdade, Honra, Vergonha.
( Gregório de Matos. Poesias selecionadas. São Paulo: FTD, 1993. P. 126-7.)
As principais características barrocas são:
Conflito entre visão antropocêntrica e teocêntrica;
Oposição entre fé e razão;
Cristianismo;
Morbidez;
Idealizaçãoamorosas; sensualismo e sentimento de culpa cristão;
Consciência de efemeridade do tempo;
Gosto por raciocínios complexos, intricados, desenvolvidos em parábolas e
narrativas bíblicas;
Diferentemente do Barroco europeu, que se voltou principalmente às exigências
de um público aristocrático, o Barroco brasileiro nasceu e se desenvolveu em condições
bastante diferentes, ganhando características próprias, como as que se veem na poesia
do baiano Gregório de Matos.
A realidade brasileira, à época do Barroco, não era muito diferente da
portuguesa. Tratava-sede um centro de comércio, de exploração da cana - de – açúcar;
de uma realidade de violência, em que se escravizava o negro e se perseguia o índio.
Não se via por aqui o luxo e a pompa da aristocracia europeia, que, como público
consumidor, apreciava e estimulava o refinamento da arte.
ARCADISMO:
O Arcadismo brasileiro originou-se e teve expressão principalmente em Vila
Rica (hoje Ouro Preto), Minas Gerais, e seu aparecimento teve relação direta com o
grande crescimento urbano verificado no século XVIII nas cidades mineiras, cuja vida
econômica girava em torno da extração de ouro.
Os escritores brasileiros desta época comportavam-se em relação ao Arcadismo
importado de Portugal de modo peculiar. Por um lado, procuravam obedecer aos
princípios estabelecidos pelas academias literárias portuguesas ou seja se inspiravam em
certos escritores clássicos consagrados ,como Camões. Por outro lado, porém, acabaram
por apresentar em suas obras outros aspectos como a natureza e a expressão dos
sentimentos é mais espontânea e menos convencional.
Além dessa espécie de adaptação ao modelo europeu a peculiaridades locais, não
se pode esquecer a forte influência barroca exercida no Brasil durante o século XVIII.
PRINCIPAIS POETAS ÁRCADES:
Claudio Manuel da Costa:
Considerado o iniciador do arcadismo no Brasil, com a publicação de “OBRAS”
(1768). Nasceu em 1729 e formou-sebacharel em direito na Universidade de Coimbra.
Estabeleceu-se em Vila Rica (MG). Quando os inconfidentes foram delatados, foi preso
e encontrado enforcado na prisão onde aguardava julgamento. Publicou, ainda, um
poema épico: Vila Rica, de valor histórico que literário.
Tomás Antônio Gonzaga:
Formou-se em Coimbra. Preso como inconfidente, foi deportado para
Moçambique, onde reconstitui a vida. Lá faleceu em 1810. Obras: “Marilia de Dirceu (
reconstituem a paixão do poeta pela jovem Maria Dorotéia de Seixas), Cartas Chilenas (
texto satírico em que os desmandos morais e administrativos do governador da
Capitania de Minas, chamado de Fanfarrão Minésio).”
Basílio da Gama:
Sua mais conhecida obra é o Uruguai, cuja divisão segue a de um poema épico.
O centro narrativo gira em torno da luta travada entre índios que viviam nas Missões
dos Setes Povos (Uruguai) e um exército luso-espanhol, incumbido de transferir tais
terras para os portugueses e a Colônia de Sacramento para os espanhóis, o que dispunha
o Tratado de Madri (1750). O trecho mais conhecido é o episodio em que é narrada a
morte da índia Lindóia
Santa Rita Durão:
Frei de Santa Rita Durão também se dedicou a poesia épica. Celebrizou com a
obra “ O Caramuru”, que desenvolveu história do desconhecido e da conquista da Bahia
por Diogo Correia. Português que naufragou na região.
Principais características do Arcadismo:
Predomínio da razão;
Universalismo;
Objetivismo;
Materialismo, cientificismo;
Universalismo, nativismo;
Respeito às formas fixas;
Sobriedade na adjetivação e na figuração;
Vocabulário e síntese com influencialusitanas;
Gosto pelo decassílabo;
Imitação da cultura clássica grego-latina;
Natureza com pano de fundo para idílios amorosos;
Belo artístico equivalente à imitação perfeita dos modelos clássicos;
Paganismo;
Mulher idealizada, distante abstrata;
Amor convencional, racionalizado; Gosto pela claridade; Conhecimento,
Erudição.
O Arcadismo se caracteriza pelo estilo simples, ordem direta, expressão
clara e inteligível, palavras e expressõesque retomam a Antiguidade Clássica e
exaltação da natureza.
Liria XV ( 2ª parte)
Eu, Marília, não fui nenhum Vaqueiro,
Fui honrado Pastor da tua aldeia;
Vestia finas lãs, e tinha sempre
A minha choça do preciso cheia.
Tiraram-me o casal, e o manso gado,
Nem tenho, a que me encoste, um só cajado.
Tomás Antônio Gonzaga- Marília de Dirceu
O ROMANTISMO NO BRASIL – A POESIA
A história do Romantismo no Brasil confunde-se com a própria história política
brasileira da primeira metade do século passado. Com a invasão de Portugal por
Napoleão, a Coroa portuguesa muda-se para o Brasil em 1808 e eleva a colônia à
categoria de Reino Unido, ao lado de Portugal e Algarves.
As consequências desse fato são inúmeras. A vida brasileira altera-se
profundamente, o que de certa forma contribui para o processo de independência
política da nação. Dentre essas conseqüências, “a proteção ao comércio, à indústria, à
agricultura; as reformas do ensino, criações de escolas de nível superior e até o plano,
que se realizou, de criação de uma universidade; as missões culturais estrangeiras,
convidadas e aceitas pela hospitalidade oficial, no setor das artes e das ciências; as
possibilidades para o comércio do livro; a criação de tipografias, princípios de atividade
editorial e da imprensa periódica; a instalação de biblioteca pública, museus, arquivos; o
cultivo da pela oratória religiosa e das representações cênicas”.
A dinamização da vida cultural da colônia e a criação de um público leitor
(mesmo que, inicialmente, de jornais) criam algumas das condições necessárias para o
florescimento de uma literatura mais consistente e orgânica do que eram as
manifestações literárias dos séculos XVII e XVIII.
Quem deixa o trato pastoril, amado
Pela ingrata, civil correspondência,
Ou desconhece o rosto da violência,
Ou do retiro a paz não tem provado.
Que bem é ver nos campos
transladado
No gênio do pastor, o da inocência!
E que mal é no trato, e na aparência
Ver sempre o cortesão dissimulado!
Ali respira amor sinceridade;
Aqui sempre a traição seu rosto
encobre;
Um só trata a mentira, outro a
verdade.
Ali não há fortuna, que soçobre;
Aqui quanto se observa, é
variedade:
Oh ventura do rico! Oh bem do
Pobre.
CLAUDIO MANUEL DA COSTA (1996)
Trato: (do latintrach):
região também pode
ser entendido como
comportamento
maneiras.
Civil
correspondência:
comportamento
urbano, a cidade;
Traslado:
transportado,
transformado;
Cortesão: homem que
vive na corte, aqui
homem que vive
urbano.
A Independência política, de 1822, desperta na consciência de intelectuais e
artistas nacionais a necessidade de criar uma cultura brasileira identificada com suas
próprias raízes históricas, lingüísticas e culturais.
O Romantismo, além de seu significado primeiro – o de ser uma reação à
tradição clássica -, assume em nossa literatura a conotação de um movimento
anticolonialista e antilusitano, ou seja, de rejeição à literatura produzida na época
colonial, em virtude do apego dessa produção aos modelos culturais portugueses.
Portanto, um dos traços essenciais de nosso Romantismo é o nacionalismo, que
orientará o movimento e lhe abrirá um rico leque de possibilidades a serem exploradas.
Dentre elas se destacam: o indianismo, o regionalismo, a pesquisa histórica,
folclórica e linguística, além da crítica aos problemas nacionais – todas elas posturas
comprometidas com o projeto de construção de uma identidade nacional.
Primeira Geração: a busca nacional
Gonçalves de Magalhães talvez seja considerado o introdutor do Romantismo no
Brasil, mas foi, na verdade, Gonçalves Dias quem implantou e solidificou a poesia
romântica em nossa literatura. Sua obra pode ser considerada a realização de um
verdadeiro projeto de construção da cultura brasileira.
Filho de um português e de uma Cafuza, Gonçalves Dias (1823-1864) fez seus
primeiros estudos no Maranhão, seu Estado Natal e completou-os em Coimbra onde
cursou Direito. De volta ao Brasil,em 1845, já trouxe em sua bagagem boa parte do seus
escultores. Fixou-se no Rio de Janeiro e ali publicou sua primeira obra: Primeiros
Contos(1857) seguidas por outras publicações como Segundos Contos e Sextilhas de
Frei Antão(1848) Últimos Contos(1851) e os Timbiras(1857).
Fez várias viagens pelo país, incluindo a Amazônia, tendo chegado a escrever
um dicionário da língua Tupi.
Poesia nativista:
Intenção de divulgar uma identidade nacional que promovesse o sentimento
de amor à pátria e se libertasse das influências literárias portuguesas.
Resgate do índio e da natureza como símbolos de caráter nacional.
Influência dos textos dos participantes das missões estrangeiras e da
independência política.
Os poetas tinham um olhar idealizado da pátria, pois estavam vivendo no
exterior, o que deu um tom exagerado de saudade à produção literária deste
período.
Exemplo de poema nativista:
O poema abaixo é um exemplo de poema nativista, a natureza e a beleza da nova
nação estão sendo mostradas para que, quem mora no Brasil passe a ter orgulho do país
onde vive e passe a respeitá-lo diante de outros locais.
Canção do Exílio
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá;
As aves, que aqui gorjeiam,
Não gorjeiam como lá.
Nosso céu tem mais estrelas,
Nossas várzeas têm mais flores,
Nossos bosques têm mais vida,
Nossa vida mais amores.
Emcismar, sozinho, à noite,
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Minha terra tem primores,
Que tais não encontro eu cá;
Em cismar sozinho, à noite
Mais prazer eu encontro lá;
Minha terra tem palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Não permita Deus que eu morra,
Sem que eu volte para lá;
Sem que disfrute os primores
Que não encontro por cá;
Sem qu'inda aviste as palmeiras,
Onde canta o Sabiá.
Poesia Indígena:
É sabido que o índio teve papel relevante no romantismo brasileiro. Sabe-se
também que esse mesmo índio dentro da vertente romântica possui atributos de
perfeição, um ser idealizado, cujo comportamento seria reflexo do modelo ideal da
“nobre civilização” branca. Na Europa essa idealização deu-se através da mitificação
dos heróis da Idade Média, tida como uma época de glórias, período pelo qual se
formaram as grandes nações.
Como não houve “Idade Média” no Brasil, elegeu-se o índio para exercer a
função de um nobre e ostentoso cavaleiro medieval. De acordo com o ensaísta Eugênio
Gomes, é especificamente no poema I - Juca Pirama que o índio perde a sua “riqueza”.
Afirma ele: “...é atribuído a tribos dos Timbiras um sentimento que eles não tiveram
jamais: a compaixão”.
Na Literatura brasileira, o papel do herói foi ocupado pelo indígena,
identificado, por seus valores positivos, como o cavaleiro medieval. É o caso de Peri,
personagem de O Guarani. É bom lembrar que, em todas essas obras, a imagem que se
constrói do indígena é idealizada. Na visão romântica de mundo, o indígena se recobre
de valores positivos, heroicos, e vive em um ambiente fabuloso, de beleza paradisíaca e
de grandiosos perigos. Para compor esse retrato, o autor romântico recorre a fortes
doses de fantasia e tenta emocionar os leitores exagerando na expressão dos
sentimentos.
A presença do indígena na Literatura brasileira se mostra inicialmente nos
documentos escritos pelos viajantes europeus, que tinham como principal finalidade
enviar para a Europa informações sobre “a nova terra e a nova gente”. Tempos depois,
já no século XVIII, duas obras do gênero épico em destaque: O Uraguai, de José Basílio
da Gama e Caramuru, de Santa Rita Durão.
O termo a seguir é o canto IV de I- Juca-Pirama. Conforme as tradições
indígenas, o prisioneiro é preparado para um cerimonial antropofágico em que serão
vingados os mortos timbiras. Ao lhe pedirem, como próprio do ritual, que cante seus
feitos de guerra e que se defenda da morte, o prisioneiro responde aos inimigos.
I – Juca Pirama
Meu canto de morte
Guerreiros, ouvi:
Sou filho das selvas,
Nas selvas cresci;
Guerreiros, descendo
Da tribo tupi
Da tribo pujante,
Que agora anda errante
Por fado inconstante,
Guerreiros, nasci:
Sou bravo, sou forte,
Sou filho do Norte;
Meu canto de morte,
Guerreiros, ouvi
Já vi cruas brigas,
De tribos imigas,
E as duras fadigas
Da guerra provei;
Nas ondas mendaces
Senti pelas faces
Os silvos fugaces
Dos ventos que amei.
Andei longes terras
Lidei cruas guerras,
Vaguei pelas serras
Dos vis Aimorés;
Vi lutas de bravos,
Vi fortes - escravos!
De estranhos ignavos
Calcados aos pés.
E os campos talados,
E os arcos quebrados,
E os piagas coitados
Já sem maracás;
E os meigos cantores,
Servindo a senhores,
Que vinham traidores,
Com mostras de paz.
Aos golpes do inimigo,
Meu último amigo,
Sem lar, sem abrigo
Caiu junto a mi!
Com plácido rosto,
Sereno e composto,
O acerbo desgosto
Comigo sofri.
Meu pai a meu lado
Já cego e quebrado,
De penas ralado,
Firmava-se em mi:
Nós
ambos,mesquinhos,
Por ínvios caminhos,
Cobertos d’espinhos
Chegamos aqui!
O velho no entanto
Sofrendo já tanto
De fome e quebranto,
Só qu’ria morrer!
Não mais me contenho,
Nas matas me
embrenho,
Das frechas que tenho
Me quero valer.
Então, forasteiro,
Caí prisioneiro
De um troço guerreiro
Com que me encontrei:
O cru dessossego
Do pai fraco e cego,
Enquanto não chego
Qual seja, - dizei!
Eu era o seu guia
Na noite sombria,
A só alegria
Que Deus lhe deixou:
Em mim se apoiava,
Em mim se firmava,
Em mim descansava,
Que filho lhe sou.
Ao velho coitado
De penas ralado,
Já cego e quebrado,
Que resta? - Morrer.
Enquanto descreve
O giro tão breve
Da vida que teve,
Deixai-me viver!
Não vil, não ignavo,
Mas forte, mas bravo,
Serei vosso escravo:
Aqui virei ter.
Guerreiros, não coro
Do pranto que choro:
Se a vida deploro,
Também sei morrer.
Poemas de Gonçalves Dias. Seleção de Péricles Eugênio da Silva Ramos. Rio de Janeiro: Ediouro, s.d. p.119-
122)
O poema tem esse nome, pois conta a historia de um jovem guerreiro tupi, cuja
tribo havia sido dizimada pelos brancos. Sobreviveram apenas ele e seu pai cego e
doente. Um dia, o jovem cai prisioneiro de uma nação inimiga e antropófaga, os
Timbiras, que acreditam que se alimentar de carne de um bravo inimigo os faz mais
fortes. Por isso, exigem que o prisioneiro diga quem é e morra lutando contra guerreiros
aimorés. No canto IV, o jovem responde aos timbiras quem é, chora e pede para ser
libertado para cuidar do pai, velho e doente. Afirma, no entanto, que voltarás para se
entregar e lutar como guerreiro, assim que o pai falecer.
O jovem é então libertado pelo chefe dos Timbiras e vai ao encontro do pai.
Este, no entanto, percebe que o filho estava sendo preparado para a morte: sente cheiro
de tinta e percebe os ornamentos do ritual de morte. Obriga, então o filho a retornar com
ele à nação inimiga e, lá pede que o ritual se cumpra, que o jovem seja sacrificado. O
chefe dos Timbiras, porém, se nega a atendê-lo, afirmando que o rapaz é fraco e
covarde, pois chorou na presença da morte. (ler cantoVIII).
SEGUNDA GERAÇÃO: O MAL DO SÉCULO
Álvares de Azevedo (maior representante), Junqueira Freire, e Fagundes Varela.
As décadas de 50 e 60 do século XIX, durante o Romantismo, jovens poetas
universitários de São Paulo e Rio de Janeiro reuniram-se em um grupo, dando origem à
poesia romântica brasileira conhecida como Ultrarromantismo. Sem acreditar nas idéias e
valores que levam a revolução Francesa e sem ter nenhum outro projeto no qual se apegasse,
essa segunda geração sentia-se como uma geração perdida, È a forma encontrada para
expressar seu pessimismo e seu sentimento de inadequação á realidade foi, no plano pessoal,
levar uma vida desregrada, dividida entre estudos acadêmicos, o ócio, os casos amorosos e a
leitura de obras como as de Musset e Byron, escritores cujo estilo de vida imitava.
Plano literário - essa geração caracterizava-se pelo espírito do mal do século, uma
onda de pessimismo doentio que se traduzia no apego a certos valores decadentes, como a
bebida e o vício, na atração pela noite e pela morte. Álvares de Azevedo acrescentava a isso
temas macabros e satânicos. Desprezam temas com o nacionalismo e o indianismo.
Acrescentam temas como subjetivismo, o egocentrismo e o sentimentalismo, ampliado
aexperiência de sondagem interior e preparação o terreno para investigação
psicológica que, três décadas mais tarde, iria caracterizar o Realismo.
Álvares Azevedo (1831-1852), fez os estudos básicos no Rio de Janeiro e cursava o
5º ano de Direito em São Paulo sofreu um acidente (queda de cavalo), cujas complicações o
levaram a morte antes de completar 21 anos. Cultivou a poesia, a prosa e o teatro.
A característica intrigante em sua obra reside na articulação do consciente de um projeto
literário baseado na “contradição”. Nela aparece um mundo decadente, povoado de
viciados, bêbados, prostitutas, andarilhos solitários sem vínculo e sem destino.
Observe nos exemplos abaixo
Lira dos Vinte anos
3- TERCEIRA GERAÇÃO:
A POESIA CONDOREIRA: CAS
3ª GERAÇÃO: CONDOREIRA/ SOCIAL.
Castro Alves (1847-1871) é considerado a principal expressão condoreira da
poesia brasileira. Nascido em Muritiba, na Bahia, estudou direito em Recife e em São
Paulo. A sua obra representa, na evolução da poesia romântica brasileira, um momento de
maturidade e de transição. Maturidade em relação a certas atitudes ingênuas das gerações
anteriores, como a idealização amorosa e o nacionalismo ufanista, substituídas por posturas
mais críticas e realistas.
Em seu percurso como escritor e estudante de direito, no Recife e em São Paulo,
castro Alves foi personalidade importante não apenas no cenário literário da época: o poeta
dos escravos participou ativamente de grupos abolicionistas e republicanos, tornando-se uma
espécie de porta-voz da abolição da escravatura.
Soneto
Pálida, à luz da lâmpada sombria,
Sobre o leito de flores reclinada,
Como a lua por noite embalsamada,
Entre as nuvens do amor ela dormia!
Era a virgem do mar! Na escuma fria
Pela maré das águas embalada...
- Era um anjo entre nuvens d'alvorada,
Que em sonhos se banhava e se esquecia!
Era mais bela! o seio palpitando...
Negros olhos, as pálpebras abrindo...
Formas nuas no leito resvalando...
Não te rias de mim, meu anjo lindo!
Por ti - as noites eu velei chorando,
Por ti - nos sonhos morrerei sorrindo!
Álvares de Azeredo (1982)
Quanto ao amor, às obras dos ultra-
românticos apresenta uma visão dualista,
que envolve atração e medo, desejo e
culpa.
Vagabundo
Eu durmo e vivo ao sol como um cigano,
Fumando meu cigarro vaporoso;
Nas noites de verão adoro estrelas;
Sou pobre, sou mendigo e sou ditoso!
Ando roto, sem bolsos nem dinheiro;
Mas tenho na viola uma riqueza:
Canto à lua de noite serenatas,
E quem vive de amor não tem pobreza.
(...)
Tenho por meu palácio as longas ruas;
Passeio a gosto e durmo sem temores;
Quando bebo, sou rei como um poeta,
E o vinho faz sonhar com os amores.
A canção de Gilberto Gil, composta quase um século depois de a escravatura ser
abolida, o que ocorreu em 1888, denuncia o preconceito em relação aos afrodescendentes e a
desigualdade existente em nossa sociedade. Também no século XIX, ainda durante a
escravidão, autores fizeram da literatura um meio para denunciar a situação em que vivia o
escravo no Brasil.
A mão da limpeza ( Gilberto Gil)
O branco inventou que o negro
Quando não suja na entrada
Vai sujar na saída, ê
Imagina só
Vai sujar na saída, ê
Imagina só
Que mentira danada, ê
Na verdade a mão escrava
Passava a vida limpando
O que o branco sujava, ê
Imagina só
O que o branco sujava, ê
Imagina só
O que o negro penava, ê
Mesmo depois de abolida a escravidão
Negra é a mão
De quem faz a limpeza
Lavando a roupa encardida, esfregando o chão
Negra é a mão
É a mão da pureza
Negra é a vida consumida ao pé do fogão
Negra é a mão
Nos preparando a mesa
Limpando as manchas do mundo com água e sabão
Negra é a mão
De imaculada nobreza
Na verdade a mão escrava
Passava a vida limpando
O que o branco sujava, ê
Imagina só
O que o branco sujava, ê
Imagina só
Êta branco sujão.
Vejamos um trecho de seu poema mais conhecido: “O navio negreiro”:
(Tragédia no mar)
IV
Era um sonho dantesco... o tombadilho
Que das luzernas avermelha o brilho.
Em sangue a se banhar.
Tinir de ferros... estalar de açoite...
Legiões de homens negros como a noite,
Horrendos a dançar...
Negras mulheres, suspendendo às tetas
Magras crianças, cujas bocas pretas
Rega o sangue das mães:
Outras moças, mas nuas e espantadas,
No turbilhão de espectros arrastadas,
Em ânsia e mágoa vãs!
E ri-se a orquestra irônica, estridente...
E da ronda fantástica a serpente
Faz doudas espirais ...
Se o velho arqueja, se no chão resvala,
Ouvem-se gritos... o chicote estala.
E voam mais e mais...
Presa nos elos de uma só cadeia,
A multidão faminta cambaleia,
E chora e dança ali!
Um de raiva delira, outro enlouquece,
Outro, que martírios embrutece,
Cantando, geme e ri!
(ALVES, Castro. Espumas flutuantes. in Poesias Completas. São Paulo : Ediouro, s.d)
A poesia lírica
Embora a lírica amorosa de Castro Alves ainda contenha um ou outro vestígio do
amor platônico e de idealização da mulher, de modo geral ela representa um avanço
decisivo.
Castro Alves foi o fundador da poesia social e engajada no Brasil (poesia engajada é
toda aquela que se coloca a serviço de uma causa política ideológica procurando ser uma arte
de contestação e conscientização).No século XX, vários poetas deram continuidade a
suatradição: Carlos Drummond de Andrade, Ferreira Gullar, Thiago de Melo e outros.
A música popular brasileira também cumpriu esse papel nas décadas de 60-70 do século
XX, durante o regime militar, principalmente pela voz de Geraldo Vandré e Chico Buarque de
Holanda.
BOA NOITE!!!
Boa-noite, Maria - Eu vou-me embora.
A lua nas janelas bate em cheio.
Boa-noite, Maria! É tarde... é tarde...
Não me apertes assim contra teu seio.
Boa noite!... E tu dizes - Boa noite.
Mas não digas assim por entre beijos...
Mas não me digas descobrindo o peito,
Mar de amor onde vagam meus desejos. (...)
É noite ainda! Brilha na cambraia (...)
(ALVES, Castro. Espumas flutuantes)
A literatura tem registrado já há algum tempo a presença da cultura afro-brasileira
em nossas vidas e também tem denunciado os preconceitos que permanecem em nossa
sociedade tanto tempo depois da abolição da escravatura. Nos textos acima estudados
observa-se a denúncia do preconceito e das crueldades sofridas por africanos escravizados
em textos de diferentes épocas, principalmente em obras românticas do século XIX
O ROMANCE BRASILEIRO E A IDENTIDADE NACIONAL
Com a independência, em 1822, os artistas e intelectuais brasileiros empenharam-se
em definir uma identidade cultural do país. Afinal, o que era ser brasileiro naquele
momento? Qual a nossa língua, nossa raça, nosso passado histórico, nossos costumes e
tradições?
O romance, muito mais do que a poesia, procurou dar respostas a essas perguntas,
assumindo o papel de principal instrumento de construção da cultura brasileira. assim,
procurando “re-descobrir” o país, o romance brasileiro está radicalmente ligado ao
reconhecimento dos espaços nacionais, identificados como a selva, o campo e a cidade, que
deram origem, respectivamente, ao romance indianista e histórico (a vida primitiva), o
romance regional (a vida rural) e o romance urbano (a vida citadina). José de Alencar, por
exemplo, o maior romancista de nosso romantismo, escreveu obras que enfocaram esses três
espaços, como oguarani, romance histórico-indianista; o gaúcho, romance regional; e
senhora, romance urbano.
As principais características da prosa romântica:
O nome, condoreirismo, associa-se ao
condor ou outras aves, como Baleia,
águia, o falcão e o albatroz, que foram
tomadas como símbolo dessa geração de
poetas com preocupações sociais.
Identificando-se com o condor, ave de vôo
alto e solitário, com capacidade de
enxergar a grande distância, os poetas
condoreiros supunham ser eles também
dotados dessa capacidade e, por isso,
tinham o compromisso, como poetas-
gênios iluminados por Deus, de orientar os
homens comuns para os caminhos da
justiça e da liberdade.
Sentimentalismo;
Impasse amoroso, com final feliz e trágico;
Oposição aos valores sociais;
Peripécia;
Flash back narrativo;
O amor como redenção;
Idealização do herói;
Idealização da mulher;
Personagens planas;
Linguagem metafórica
O ROMANCE INDIANISTA
O indianismo foi uma das principais tendências do romantismo brasileiro. Dele
saíram, tanto na poesia quanto na prosa, algumas das melhores realizações da nossa
literatura romântica. na poesia destacou-se Gonçalves dias e na prosa, José de Alencar.
O prestígio dessa corrente entre o público foi amplo e imediato. Vários fatores
contribuíram para sua implantação e solidificação em nossa cultura, tais como: tradição e
riqueza.
No século XVIII, a épica de Basílio da Gama e a de santa Rita durão deram
continuidade ao tema.
O índio visto como o “bom selvagem” – as ideias do pensador iluminista e pré-
romântico Jean-JacquesRousseau tiveram ampla aceitação entre os românticos brasileiros.
Partindo do princípio de que o homem é originalmente puro, mas se corrompe ao entrar em
contato com a civilização, Rousseau via no homem primitivo, no selvagem, o modelo de ser
humano. Tanto o índio quanto o próprio Brasil passaram a ser vistos como partes de um
“paraíso americano”, a salvo da decadência da civilização.
Observe, no trecho abaixo, um capítulo do livro “O Guarani”:
As principais realizações indianistas em prosa de nossa literatura são três:
romances de Jose de Alencar: O Guarani (1857), Iracema (1865), e Ubirajara
(1874).
O capítulo inicia com a destruição descrita da casa de Dom Antônio de Mariz:
"Quando o sol, erguendo-se no horizonte, iluminou os campos, um montão de ruínas cobria
as margens do Paquequer"[...]"Toda a noite o índio tinha remado sem descansar um
momento; não ignorava que Dom Antônio de Mariz na sua terrível vingança havia
exterminado a tribo dos Aimorés, mas desejava apartar-se do teatro da catástrofe, e
aproximar-se dos seus campos nativos.Não era o sentimento da pátria, sempre tão poderoso
no coração do homem; não era o desejo de ver sua cabana reclinada à beira do rio e abraçar
sua mãe e seus irmãos, que dominava sua alma nesse momento e lhe dava esse ardor.Era sim
a ideia de que ia salvar sua senhora e cumprir o juramento que tinha feito ao velho fidalgo;
era o sentimento de orgulho que se apoderava dele. pensando que bastava a sua coragem e a
sua força para vencer todos os obstáculos, e realizar a missão de que se havia encarregado."
(José de Alencar. O guarani. São Paulo: Ática, 1992.)
O ROMANCE REGIONAL
Coube ao romance regionalista, mais do que aos romances indianistas, histórico e
urbano, a missão nacionalista que o Romantismo, se atribuiu de proporcionar ao país uma
visão de si mesmo.
Sem apoio em modelos europeus, o romance regionalista romântico teve de abrir
sozinhos seus próprios caminhos. Portanto, constituiu em nossa literatura uma experiência
nova, que exigiu dos escritores pesquisa e senso de observação da realidade. Como resultado
desse empenho, os romances regionais românticos deram um passo decisivo no rumo da tão
desejada autonomia cultura européia.
Principais autores:
1) Visconde de Taunay
Alfredo d’Escragnolle (1843-1899), Visconde de Taunay, era carioca e exerceu
acarreira militar, chegando a participar da guerra do Paraguai. Mais tarde abandonou a
Exercito e ingressou na carreira política alcançando o cargo de senador.
Das mudanças que, como militar, realizou pelo país, principalmente pela região de
Mato Grosso.
Principais obras: Inocência (1872), Retirada da Laguna (1871)
INOCÊNCIA: A busca do sertão
Inocênciapode se considerada a obra-prima do romance regionalista de nosso
Romantismo. Inocência é uma história de amor impossível, envolvendo Cirino, prático de
Farmácia que se autopromoveu médico, e Inocência, uma jovem do Sertão de Mato Grosso,
filha de Pereira, pequeno proprietário típico da mentalidade vigente entre os habitantes
daquela região.
A realização amorosa entre os jovens é invisível porque Inocência fora prometida em
casamento pelo pai a Manecão, um rústico vaqueiro da região; e também porque Pereira
exerce for vigilância sobre a filha, pois, de acordo com seus valores, ele tem de garantir a
integridade de Inocência até o dia do casamento.
Ao lado dos acontecimentos, que constituem a trama amorosa, há também o choque
de valores entre Pereira e Meyer, um naturalista alemão que se hospedara na casa de Pereira
à procura de borboletas, evidenciando as contradições entre o meio rural brasileiro e o meio
urbano europeu.
2)Bernardo Guimarães:
Bernardo Joaquim da Silva Guimarães nasceu em Ouro Preto (MG), em 1825, e
faleceu na mesma cidade em 1884. Foi advogado ( formou-se em direito, em São Paulo),
magistrado, jornalista, critico, literário, professor, poeta e romancista.
Obras:
O Ermitão de Muquém; A escrava Isaura; Rosana, a enjeitada; O seminarista;
O garimpeiro; A filha do fazendeiro.
Como romancista, condição que lhe oferece sua devida importância na literatura
brasileira, foi um dos iniciadores do regionalismo romântico, graças a publicação de O
Ermitão de Muquém, em que se encontra o retrato das paisagens, tipos, usos, e costumes do
sertão do Brasil Central, do qual era profundo conhecedor. Por isso, é marcante, em sua obra
narrativa, uma linguagem impregnada, de oralidades, isto é, suas histórias parecem estar
sendo contadas com simplicidade e num tom de conversa.
O SEMINARISTA
Neste livro, o autor aborda o problema do celibato clerical ( os padres, por uma
norma da igreja, não podem ter relações amorosas nem se casar). Eugenio, cumprindo a
vontade dos pais, abandona omundo, o amor de Margarida, para seguir o sacerdócio, Depois
de certo tempo no seminário, não suportando mais viver sem seu grande amor, resolve
abandonar a vida religiosa, mas seus pais o fazem continuar, dando-lhe uma falsa noticia:
Margarida já havia se casado. Sem mais motivos para sair do seminário, Eugenio é ordenado
sacerdote. Entretanto, ao voltar à sua cidade natal, em certa ocasião, é chamado às presas
para atender a uma doente que necessitava de sua ajuda espiritual. Esta doente não é outra
pessoa senão Margarida. Com quem realiza seus sonhos de amor reprimido desde a
juventude.
No final, Margarida morre e Eugênio fica louco.
(Bernardo Guimarães. O Seminarista. São Paulo: Ática.)
ROMANCES URBANOS OU DE COSTUMES
São romances que retratam o Rio do Segundo Reinado, apontando alguns aspectos
negativos da vida urbana e dos costumes burgueses, Giram em torno de intrigas de amor e
desigualdades econômicas, mas tudo com final feliz e a vitoria do amor. São exemplos dessa
modalidade: Cinco minutos ( a moça tuberculosa encontra no amor forças para viver); A
viuvinha( dinheiro e fidelidade); Sonhos d’ouro( Guida Soares esconde sua fortuna para
encontrar o amor desinteressado); Encarnação( Hermano, viúvo de Julieta, a mantém viva na
imaginação, mesmo depois de casado com Amália: vitoria do amor e da dedicação).
A relação se completa com os três perfis de mulher: Lucíola ( a jovem prostituta que
se julga indigna de um verdadeiro amor): Diva ( a luta entre o ódio e o amor, o qual
obviamente vence): Senhora ( o amor puro entre dois jovens; a separação motivada pelo
dinheiro; o caça-dotes; o casamento por vingança; a redenção: o amor vence, acima de tudo).
Senhora: José de Alencar
Aurélia Camargo, filha de uma pobre costureira e órfã de pai, apaixonou-se por
Fernando Seixas – homem ambicioso – a quem namorou. Este, porém, desfez a relação,
movido pela vontade de se casar com uma moça rica. Passado algum tempo, Aurélia, já
órfã, recebe uma grande herança do avô e fica milionária. Passa, pois, a ser figura de
destaque nos eventos da sociedade da época.
Como vingança, manda oferecer a Seixas um dote de cem contos, mas sem que fosse
revelado o nome da noiva, só conhecido no dia do casamento. Seixas aceita e se casam;
porém na noite de núpcias, Aurélia revela seu desprezo. Seixas cai em si e percebe o quanto
fora vil em sua ganância. Vivem como estranhos na mesma casa durante onze meses, mas
socialmente formam um casal perfeito. Ao longo desse período, Seixas trabalha arduamente
até conseguir obter a quantia que recebera como sinal pelo acordo. Devolve os cemmil-réis à
esposa e se despede dela. Nesse momento, porém Aurélia revela –lhe seu amor. Os dois,
agora igualados no amor e na honra, podem desfrutar o casamento, que ainda não havia se
consumado.
( José de Alencar – Senhora)
Lucíola: José de Alencar
Seduzida ainda jovem por um homem devasso em um momento de dificuldades
infortúnio em que precisava de dinheiro para salvar os familiares doentes, Maria é expulsa
de casa pelo próprio pai, trocando então seu nome de Maria da Glória para Lúcia. Lúcia
começa a viver como uma prostitua caprichosa, explorando seus ricos amantes, por quem
manifesta um claro desprezo. Um dia conhece Paulo da Silva, um jovem pernambucano que
chega ao Rio de Janeiro e se apaixona por ela. Esse afeto sincero faz com que a verdadeira
natureza de Lúcia venha à tona. E essa luta entre a força regeneradora do amor puro e uma
vida de pecados e devassidão que José de Alencar focaliza com muito vigor. Dedicando-se
de corpo e alma ao amor de Paulo, que foi capaz de compreender e perdoar seu passado,
Lúcia encontra pela primeira vez na vida a tão almejada paz de espírito. Mas, vitimada por
uma doença fatal, vem a falecer na flor da idade, cercada pelos carinhos de Paulo, a quem
encarrega de cuidar - como pai - de sua irmã mais nova, Ana.
(José de Alencar – Lucíola)
O REALISMO E O NATURALISMO NO BRASIL (1881-1893): PRINCIPAIS
AUTORES E OBRAS
REALISMO:
1) Machado de Assis.:
Romances: Ressurreição, a mão e a luva, Helena, Iaiá Garcia, Memórias póstumas
de Brás Cuba, Quincas Borba, Dom Casmurro, Esaú e Jacó, Memorial de Aires.
Contos: contos fluminenses, histórias da meia-noite, papeis avulsos, histórias sem
data, várias histórias, páginas recolhidas, relíquias da casa velha.
2 )Raul Pompeia:
Romances: Uma Tragédia no Amazonas; O Ateneu; Canções sem Metro.
NATURALISMO:
1)Aluísio Azevedo:
Romances: Casa de Pensão; O Cortiço; O Mulato; O homem, O coruja.
2) Inglês de Souza:
Romances: Cenas da vida amazônica; o coronel sangrado; o missionário;
3)Adolfo Caminha:
Romances: O bom crioulo; a normalista
4) Manuel de Oliveira Paiva
Romances: Dona Guidinha do poço
O REALISMO
O desenvolvimento do movimento realista está ligado às profundas mudanças
ocorridas na Europa durante a segunda metade do século XIX. O capitalismo entra num
novo estágio: de um lado, grande progresso industrial e formação de grandes empresas; de
outro, uma volumosa classe operária fazendo reivindicações sociais.
Essas transformações criam novas tensões sociais e, consequentemente, novas
posições ideológicas. Nesse contexto, a Europa é agitada por novas idéias no campo da
Filosofia e das ciências, o que permite um conhecimento mais amplo do ser humano.
Dos avanço dos ideais abolicionistas e republicanos, à quebra da unificação do
Império e à urbanização cada vez mais acentuada a partir de 1870, surge o Realismo no
Brasil, fortemente influenciado pelo Positivismo de Augusto Comte, pelo Evolucionismo de
Charles Darwin, pelo Socialismo de Marx e Engels, pela teoria determinista de Hipólito
Taine e pelo surgimento das primeiras correntes da Psicologia moderna.
Assinala-se o ano de 1881como o marco inicial do Realismo no Brasil, com a
publicação de Memórias póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, e de O
Mulato, de Aluísio Azevedo.
O Realismo surgiu como uma reação ao subjetivismo, ao individualismo e ao eu
romântico. Em seu lugar surgem o objetivismo e o impessoalidade (que é impessoal) do
artista. A razão, a pesquisa e a ciência vêm ocupar o lugar do sentimentalismo. Os realistas
procuram retratar o homem e a sociedade a partir da observação do ambiente, dos costumes,
das atitudes, dos comportamentos, buscando as causas dos fatos e fenômenos que abordam.
Leia o Capítulo 1, da obra Memórias Póstumas de Brás Cubas:
CAPÍTULO 1
Óbito do Autor
Algum tempo hesitei se devia abrir estas memórias pelo princípio ou pelo fim, isto é, se
poria em primeiro lugar o meu nascimento ou a minha morte. Suposto o uso vulgar seja
começar pelo nascimento, duas considerações me levaram a adotar diferente método: a
primeira é que eu não sou propriamente um autor defunto, mas um defunto autor, para quem
a campa foi outro berço; a segunda é que o escrito ficaria assim mais galante e mais novo.
Moisés, que também contou a sua morte, não a pôs no intróito, mas no cabo; diferença
radical entre este livro e o Pentateuco.
Dito isto, expirei às duas horas da tarde de uma sexta-feira do mês de agosto de 1869, na
minha bela chácara de Catumbi. Tinha uns sessenta e quatro anos, rijos e prósperos, era
solteiro, possuía cerca de trezentos contos e fui acompanhado ao cemitério por onze amigos.
Onze amigos! Verdade é que não houve cartas nem anúncios. Acresce que chovia —
peneirava — uma chuvinha miúda, triste e constante, tão constante e tão triste, que levou um
daqueles fiéis da última hora a intercalar esta engenhosa ideia no discurso que proferiu à
beira de minha cova: — "Vós, que o conhecestes, meus senhores, vós podeis dizer comigo
que a natureza parece estar chorando a perda irreparável de um dos mais belos caracteres
que tem honrado a humanidade. Este ar sombrio, estas gotas do céu, aquelas nuvens escuras
que cobrem o azul como um crepe funéreo, tudo isso é a dor crua e má que lhe rói à natureza
as mais íntimas entranhas; tudo isso é um sublime louvor ao nosso ilustre finado."
Bom e fiel amigo! Não, não me arrependo das vinte apólices que lhe deixei. E foi assim que
cheguei à cláusula dos meus dias; foi assim que me encaminhei para o undiscovered country
de Hamlet, sem as ânsias nem as dúvidas do moço príncipe, mas pausado e trôpego, como
quem se retira tarde do espetáculo. Tarde e aborrecido. Viram-me ir umas nove ou dez
pessoas, entre elas três senhoras, minha irmã Sabina, casada com o Cotrim, — a filha, um
lírio-do-vale, — e... Tenham paciência! daqui a pouco lhes direi quem era a terceira senhora.
Contentem-se de saber que essa anônima, ainda que não parenta, padeceu mais do que as
parentas. É verdade, padeceu mais. Não digo que se carpisse, não digo que se deixasse rolar
pelo chão, convulsa. Nem o meu óbito era coisa altamente dramática... Um solteirão que
expira aos sessenta e quatro anos, não parece que reúna em si todos os elementos de uma
tragédia. E dado que sim, o que menos convinha a essa anônima era aparentá-lo. De pé, à
cabeceira da cama, com os olhos estúpidos, a boca entreaberta, a triste senhora mal podia
crer na minha extinção.
— Morto! morto! dizia consigo.
É a imaginação dela, como as cegonhas que um ilustre viajante viu desferirem o vôo desde o
Ilisso às ribas africanas, sem embargo das ruínas e dos tempos, — a imaginação dessa
senhora também voou por sobre os destroços presentes até às ribas de uma África juvenil...
Deixá-la ir; lá iremos mais tarde; lá iremos quando eu me restituir aos primeiros anos.
Agora, quero morrer tranqüilamente, metodicamente, ouvindo os soluços das damas, as falas
baixas dos homens, a chuva que tamborila nas folhas de tinhorão da chácara, e o som
estrídulo de uma navalha que um amolador está afiando lá fora, à porta de um correeiro.
Juro-lhes que essa orquestra da morte foi muito menos triste do que podia parecer. De certo
ponto em diante chegou a ser deliciosa. A vida estrebuchava-me no peito, com uns ímpetos
de vaga marinha, esvaía-se-me a consciência, eu descia à imobilidade física e moral, e o
corpo fazia-se-me planta, e pedra, e lodo, e coisa nenhuma.
Morri de uma pneumonia; mas se lhe disser que foi menos a pneumonia, do que uma idéia
grandiosa e útil, a causa da minha morte, é possível que o leitor me não creia, e todavia é
verdade. Vou expor-lhe sumariamente o caso. Julgue-o por si mesmo.
(Machado de Assis. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de janeiro: Nova Aguiar, 1994. P. 12-5)
Dom Casmurro: a temática da traição
A temática da traição, presente em Dom Casmurro, é instigante por si só. A traição
conduz o ser humano aos limites da racionalidade e à beira da perda da razão. No entanto, o
traço fundamental da obra é o questionamento da verdade, entendida como um dos edifícios
do realismo a que o próprio escritor pertencia. A intensidade desse diálogo – com o tempo,
com as emoções humanas e com a arte – faz de Dom Casmurro um romance de releituras
sempre proveitosas.
Leia, no trecho abaixo, a parte em que Bentinho desconfia da traição de
Capitulina, sua mulher, com seu amigo ( agora morto) Escobar:
(Machado de Assis. Dom Casmurro. 32 Ed. São Paulo: Ática)
Capítulo CXXIII
Olhos de ressaca
Enfim, chegou a hora da encomendação e da partida. Sancha quis despedir-se do
marido, e o desespero daquele lance consternou a todos. Muitos homens choravam também, as
mulheres todas. Só Capitu, amparando a viúva, parecia vencer-se a si mesma. Consolava a
outra, queria arrancá-la dali. A confusão era geral. No meio dela, Capitu olhou alguns instantes
para o cadáver tão fixa, tão apaixonadamente fixa, que não admira lhe saltassem algumas
lágrimas poucas e caladas...
As minhas cessaram logo. Fiquei a ver as dela; Capitu enxugou-as depressa, olhando a
furto para a gente que estava na sala. Redobrou de carícias para a amiga, e quis levá-la; mas o
cadáver parece que a retinha também. Momento houve em que os olhos de Capitu fitaram o
defunto, quais os da viúva, sem o pranto nem palavras desta, mas grandes e abertos, como a
vaga do mar lá fora, como se quisesse tragar também o nadador da manhã.
Dom Casmurro
O NATURALISMO
Os ideais do Realismo levados às últimas consequências originaram o que se chamou
de Naturalismo, movimento que considera o ser humano como um produto biológico,
profundamente marcado pelo meio ambiente, pela educação, pelas pressões sociais e pela
hereditariedade. Todos esses fatores determinam a sua condição, o seu comportamento. O
escritor naturalista observa, estuda, segue o seu personagem de perto, para entender as
causas desse comportamento e chegar ao Conhecimento objetivo dos fatos e situações.
O Mulato, de Aluísio Azevedo, publicado em 18881, foi o primeiro grande
romance naturalista brasileiro.
Principais personagens de O Mulato:
Raimundo: personagem principal. Filho da escrava Domingas com José Pedro da
Silva. Sua figura idealiza a superioridade física, intelectual e moral.
Ana Rosa: filha de Manuel Pescada, noiva e prima de Raimundo. O pai de Ana Rosa
não concordava com sua relação com Raimundo, que era filho de escrava.
Personagem utilizada para citações literárias, pois gostava de ler Eça de Queirós e
Flaubert.
Manuel Pescada: Pai de Ana Rosa. De origem portuguesa, era um homem com tino
para o comércio, apreciava livros e a leitura de jornais.
A importância de O Mulato para o naturalismo brasileiro pode ser observada nos
seguintes elementos:
Sensualidade: paixão carnal de Ana Rosa em relação a Raimundo
Crítica social: sátira feita com a criação dos tipos que habitavam São Luis. O escritor
criou personagens imorais e grotescos como um comerciante grosseiro e rico, uma
beata odiosa e velha, entre outros.
Anti-clericalismo: um padre assassino e descompromissado com a batina, cônego
Diogo, personagem extremamente hipócrita.
Preconceito perante os negros: em toda a trama de O Mulato, o escritor opõe-se aos
abusos relacionados aos escravos.
Triunfo do mal: o livro termina com a gratificação dos criminosos. O padre Diogo
torna-se cônego e a heroína casa-se com o homem que assassinou Raimundo.
Entre outros aspectos, O Mulato foi um livro publicado em meio à forte campanha a
favor da abolição da escravatura, outro fator que aumentou o escândalo causado pela obra
naquela época. Um grande mérito do livro é a análise da posição do mestiço na sociedade do
Maranhão e os ataques ao preconceito contra os negros.
De acordo com as leis autorais atuais do Brasil, O Mulato encontra-se em domínio público.
Aluísio Azevedo (1853-1913) é a principal expressão da prosa naturalista no Brasil.
O ponto alto nos escritos de Aluísio Azevedo, principalmente em suas obras de maturidade,
O Cortiço (1890) e Casa de Pensão (1894), é a maneira como são retratados ambientes,
paisagens e cenas coletivas.
Veja dois fragmentos de O Cortiço e note as características mencionadas acima: O
Cortiço narra a vida de um grupo de pessoas que habitam o cortiço pertencente ao
imigrante português João Romão, esse livro é o palco dos mais variados tipos
humanos: trabalhadores, prostitutas, malandros, lavadeiras, homossexuais:
Fechou-se um entra-e-sai de marimbondos defronte daquelas cem casinhas ameaçadas pelo
fogo. Homens e mulheres corriam de cá para lá com os tarecos ao ombro, numa balbúrdia
de doidos. O pátio e a rua enchiam-se agora de camas velhas e colchões espocados.
Ninguém se conhecia naquela zumba de gritos sem nexo, e choro de crianças esmagadas, e
pragas arrancadas pela dor e pelo desespero. Da casa do Barão saíam clamores
apopléticos; ouviam-se os guinchos de Zulmira que se espolinhava com um ataque. E
começou a aparecer água. Quem a trouxe? Ninguém sabia dizê-lo; mas viam-se baldes e
baldes que se despejavam sobre as chamas.
Os sinos da vizinhança começaram a badalar.
E tudo era um clamor.
A Bruxa surgiu à janela da sua casa, como à boca de uma fornalha acesa. Estava horrível;
nunca fora tão bruxa. O seu moreno trigueiro, de cabocla velha, reluzia que nem metal em
brasa; a sua crina preta, desgrenhada, escorrida e abundante como as das éguas selvagens,
dava-lhe um caráter fantástico de fúria saída do inferno. E ela ria-se, ébria de satisfação,
sem sentir as queimaduras e as feridas, vitoriosa no meio daquela orgia de fogo, com que
ultimamente vivia a sonhar em segredo a sua alma extravagante de maluca.
Ia atirar-se cá para fora, quando se ouviu estalar o madeiramento da casa incendiada, que
abateu rapidamente, sepultando a louca num montão de brasas.
(Aluísio Azevedo. O cortiço)
Eram cinco horas da manhã e o cortiço acordava, abrindo, não os olhos, mas a sua
infinidade de portas e janelas alinhadas.
Um acordar alegre e farto de quem dormiu de uma assentada, sete horas de chumbo.
[…].
O rumor crescia, condensando-se; o zunzum de todos os dias acentuava-se; já se não
destacavam vozes dispersas, mas um só ruído compacto que enchia todo o cortiço.
Começavam a fazer compras na venda; ensarilhavam-se discussões e rezingas; ouviam-se
gargalhadas e pragas; já se não falava, gritava-se. Sentia-se naquela fermentação
sangüínea, naquela gula viçosa de plantas rasteiras que mergulham os pés vigorosos na
lama preta e nutriente da vida, o prazer animal de existir, a triunfante satisfação de respirar
sobre a terra.
(AZEVEDO, Aluísio. O cortiço. 15. ed. São Paulo: Ática, 1984. p. 28-29.)
Entre outros aspectos, O Mulato foi um livro publicado em meio à forte campanha a favor
da abolição da escravatura, outro fator que aumentou o escândalo causado pela obra naquela
época. Um grande mérito do livro é a análise da posição do mestiço na sociedade do
Maranhão e os ataques ao preconceito contra os negros.
O PARNASIANISMO
O Realismo, na poesia, chamou-se Parnasianismo. Os poetas parnasianos adotam a
teoria de “arte pela arte” e deixam transparecer, em suas obras, uma espécie de
impassividade, de indiferença moral. Muitas vezes pintam uma beleza exterior, arcaica,
exótica. Protestam contra o individualismo e subjetivismo exagerados dos românticos.
Principais Parnasianos: Olavo Bilac, Raimundo Correia e Alberto de Oliveira.
O poema abaixo é um grande exemplo da forma com que os poetas parnasianos
escreviam seus poemas, dando importância total a forma e pronunciam-se contra qualquer
sentimento, principalmente as idealizações produzidas pelo Romantismo.
Este poema foi escrito por Olavo Bilac e tem muitas rimas ricas, objetivo central da
produção parnasiana.
PROFISSÃO DE FÉ
Invejo o ouvires quando escrevo:
Imito o amor
Com que ele, em ouro, o alto relevo
Faz de uma flor,
Por isso, corre, por servi-me.
Sobre o papel
A pena, como em prata firme
Corre o cinzel.
Torce, aprimora, alteia, lima,
A frase; e, enfim,
No verso de ouro engasga a rima,
Como um rubi.
Assim procedo. Minha pena
Segue esta norma,
Por te servir, Deusa serena,
Serena Forma.
(Olavo Bilac – poesias – coleção prestígio – editora Tecnoprint S.A.1978)
SIMBOLISMO (1893-1902):
Contexto Social do Simbolismo no Brasil:
Como afirma Massaud Moisés, “O Simbolismo é, antes de tudo,
antipositivista, antinaturalista e anticientificista”. Tal postura reflete uma atmosfera de
desilusão e frustração que envolveu alguns grupos de intelectuais no final do século
passado, influenciado por correntes contrárias ao pensamento cientifico- mecanicista e
de tendências irracionais.
Principais autores simbolistas:
Cruz e Sousa; Emiliano Perneta; Alphonsus de Guimarães; Augusto dos
Anjos; Raul de Leoni.
Leia os poemas de Cruz e Souza, notando suas características mais marcantes:
desilusão e frustração:
Acrobata da Dor
Gargalha, ri, num riso de tormenta,
como um palhaço, que desengonçado,
nervoso, ri, num riso absurdo, inflado
de uma ironia e de uma dor violenta.
Da gargalhada atroz, sanguinolenta,
agita os guizos, e convulsionado
salta, gavroche, salta clown, varado
pelo estertor dessa agonia lenta ...
Pedem-se bis e um bis não se despreza!
Vamos! retesa os músculos, retesa
nessas macabras piruetas d'aço...
E embora caias sobre o chão, fremente,
afogado em teu sangue estuoso e quente,
ri! Coração, tristíssimo palhaço.
.
O Horror dos Vivos
Ao menos junto dos mortos pode a gente
Crer e esperar n'alguma suavidade:
Crer no doce consolo da saudade
E esperar do descanso eternamente.
Junto aos mortos, por certo, a fé ardente
Não perde a sua viva claridade;
Cantam as aves do céu na intimidade
Do coração o mais indiferente.
Os mortos dão-nos paz imensa à vida,
Não a lembrança vaga, indefinida
Dos seus feitos gentis, nobres, altivos.
Nas lutas vãs do tenebroso mundo
Os mortos são ainda o bem profundo
Que nos faz esquecer o horror dos vivos.
Cruz e Souza
PRÉ-MODERNISMO (1902-1920)
Contexto Histórico Social
Durante a chamada “Republica Velha ( 1889-11930), as oligarquias rurais de
São Paulo e de Minas Gerais dominavam os cenários políticos e econômicos do país,
num esquema conhecido como a política do café-com-leite. Apesar do seu domínio,
essas oligarquias rurais caminhavam em descomposto comas grandes transformações
pelas quais passava a sociedade brasileira. Transformações essas que eram resultados do
acentuado processo de urbanização, da vinda de grandes contingentes de imigrantes e
do deslocamento ou da marginalização dos antigos escravos.
Nas duas primeiras décadas deste século ocorreram varias agitações sociais:
Revolta da Vacina, em 1904; a revolta da chibata, em 1910; os primeiros grandes
movimentos grevistas em são Paulo em 1917. Neste quadro de graves desequilíbrios
sociais, os escritores passaram a expor uma visão critica dos problemas brasileiros,
embora não tenham constituído um movimento literário especifico.
Principais autores do pré-modernismo:
Euclides da Cunha: em sua obra mais importante, o sertão, expõe os problemas
do homem do sertão e a existência de vários brasis ainda não descobertos.
Graça Aranha: em Canaã, exprime sua visão pessimista do homem brasileiro,
abordando os problemas dos imigrantes europeus, especialmente dos alemães.
Lima Barreto: sua obra trata de temas como: a cidade do Rio de janeiro, e seus
operários, o mulato, os moradores do subúrbio, e das favelas, todos visto sob uma óptica
social, carregados de amarga critica, mas com uma tendência humorística.
Seu enredo é simples, o registro, porém, das sensações e reflexão de suas
personagens é profundo, levando-as muitas vezes a tirar conclusões ora satisfatórias,
ora revoltadas, ora pessimistas, como acontece, em recordações do escrivão Isaias
Caminha ou em triste fim de Policarpo Quaresma. Este romance aborda o sonho de
um patriota, exaltado ao mesmo tempo em que apresenta uma sátira impiedosa e bem-
humorada oficial.
Na obra Numa e Ninfa faz uma analise satírica da vida política, enquanto Clara
dos Anjos aborda o preconceito racial.
Monteiro Lobato: preocupado com o progresso do Brasil, faz reflexão sobre os
problemas brasileiros, como a saúde, a instrução, a situação do caboclo, etc. Escreveu
dentre muitas obras, cidades mortas Urupê, o escândalo do petróleo. Deixou-nos
também uma extensa obra infantil, de natureza moralista e nacionalista, cujosenredos se
passam no Sitio do Pica-pau Amarelo.
Outros autores de destaque desse período:
Raul De Leoni; Augusto Dos Anjos; Coelho Neto Afrânio Peixoto; João Simões
LopesNeto; Alcides Maia Afonso Arinos Valdomiro Silveira; Hugo De Carvalho
Ramos; Alberto;
Euclides da Cunha: Os Sertões
Os Sertões têm como núcleo a campanha de Canudos, movida pelas forças da
República contra Antônio Conselheiro, fanático religioso, e seus seguidores, campanha
essa que veio a revelar as violências e erros cometidos pelo então recente governo
republicano.
A obra divide-se em três partes: a terra, o homem, a luta- e é nessa divisão que
o autor deixa claro suas idéias cientificas e filosóficas, tão estimuladas pelo
positivismo.
A terra - descrição minuciosa da Região Nordeste e de seus aspectos
geográficos, físicos e geológicos, como o relevo, o solo, o clima e a vegetação. Euclides
da Cunha registra aqui seu profundo conhecimento das Ciências Naturais.
O homem - estudo sofisticado dos tipos regionais brasileiros,frutos
damiscigenação entre brancos,índio e o negro que deu origem ao sertanejoeao jagunço.
Sua análise volta-se, sobretudo ao jagunço, que considera um produto fabricado pelo
meio em que vive: árido, seco, rústico, perigoso, cheio de misticismos e
superstições,com enfoque especial ao líder Antônio Conselheiro.
A luta - relato do conflito de Canudos, isto é,doscombates entre os jagunços e
asquatroexpedições do Exército. Ficam aqui desmascaradas a crueldade, a violência e a
desigualdade dessas duasforças e,conseqüentemente,a denunciado verdadeiro massacre
cometido pelos militares, que exterminaram Antônio Conselheiro e toda a sua
comunidade.
O cadáver do Conselheiro
Antes, no amanhecer daquele dia, comissão adrede escolhida descobrira o
cadáver de Antônio Conselheiro.
Jazia num dos casebres anexos à latada, e foi encontrado graças à indicação
de um prisioneiro. Removida breve camada de terra, apareceu no triste sudário de um
lençol imundo, em que mãos piedosas havia disparzido algumas flores murchas, e
repousando sobre uma esteira velha, de tábua, o corpo do "famigerado e bárbaro"
agitador. Estava hediondo. Envolto no velho hábito azul de brim americano, mãos
cruzadas ao peito, rosto tumefato, e esquálido, olhos fundos cheios de terra — mal o
reconheceram os que mais de perto o haviam tratado durante a vida.
Desenterraram-no cuidadosamente. Dádiva preciosa — único prêmio, únicos
despojosopimos de tal guerra! — , faziam-se mister os máximos resguardos para que
se não desarticulasse ou deformasse, reduzindo-se a uma massa angulhenta de tecidos
decompostos.
Fotografaram-no depois. E lavrou-se uma ata rigorosa firmando a sua
identidade: importava que o país se convencesse bem de que estava, afinal, extinto
aquele terribilíssimo antagonista.
Restituíram-no à cova. Pensaram, porém, depois, em guardar a sua cabeça tantas
vezes maldita — e, como fora mal-baratar o tempo exumando-o de novo, uma faca
jeitosamente brandida, naquela mesma atitude, cortou-lha; e a face horrenda, empastada
de escaras e de sânie, apareceu ainda uma vez ante aqueles triunfadores...
Trouxeram depois para o litoral, onde deliravam multidões em festa, aquele
crânio. Que a ciência dissesse a última palavra. Ali estavam, no relevo de
circunvoluções expressivas, as linhas essenciais do crime e da loucura...
(Euclides da Cunha .Os Sertões. São Paulo:Círculo do Livro, 1975)
MODERNISMO NO BRASIL: 1922
O início do Modernismo no Brasil é assinalado pela Semana de Arte Moderna, em
São Paulo, em fevereiro de 1922. A Semana de 22,como também conhecida, foi o resultado
de uma série de eventos, que marcaram a vida cultural brasileira nas duas primeiras décadas
deste século. São eles:
1912: O retorno de Oswald de Andrade da Europa, imbuído do Futurismo do italiano
Marionetti. Futurismo é o movimento modernista que se baseia numa vida dinâmica, voltada
para o futuro, que combate o passado, as tradições, o sentimentalismo e que prega formas
novas e nítidas, numa linha positivista e materialista.
1913: A primeira exposição do lituano Lasar Segall no Brasil, com sua pintura
expressionista.
1915: A publicação em O Estado de São Paulo de dois artigos: “Urupês” e “Velha
praga”, de Monteiro Lobato, em que ele condena o regionalismo sentimental e idealista.
1917: A Exposição de Anita Malfatti, em que ela apresenta o cubismo, desprezando a
perspectiva convencional e representando os objetos com formas geométricas. Monteiro
Lobato fez criticas virulentas a essa exposição, em seu artigo “paranóia ou mistificação?”, o
que levou artistas e intelectuais a se unirem em defesa da pintora. Esses artistas e intelectuais
são os mesmos que iriam organizar a Segunda semana de Arte Moderna em 1922.
1920: Apresentação da maquete do Monumento às Bandeiras, de Victor Brecheret.
1921: O retorno de Graça Aranha da Europa e a publicação de “Estética da vida”, em
que ele condena os padrões da época.
Todos esses fatos ocorriam, enquanto o país passava por um período histórico
conturbado, que resultaria no fim da República Velha (1889-1930). O ano de 1922 foi muito
especial nesse contexto. Justamente no centenário da Independência, em meio a crises no
cenário político e militar, intelectuais e artistas, influenciados pelas idéias da vanguarda
européia, organizaram, então, a Semana da Arte Moderna, com vários eventos: sessões,
conferências, manifestos, poemas, músicas, recitais, exposições de artes plásticas, quadros e
esculturas com a participação de: Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Guilherme de
Almeida, Menotti Del Picchia, Graça Aranha, Ronald de Carvalho, Guiomar Novais, Heitor
Villa-Lobos, Paulo Prado, etc. Iniciava-se o Modernismo no Brasil, renovando a
mentalidade nacional e colocando o país na atualidade do mundo.
Modernismo da 1ª fase: 1922-1930
É uma fase de definição de comportamentos e tendências, cheia de publicações de
revistas e manifestos. Também na política, o Brasil passa por momentos de transformações
(fim das oligarquias rurais e da política do “café com leite”), que vão culminar com a
Revolução de 1930, quando Getúlio Vargas sobe ao poder.
É o período mais radical do Modernismo, caracterizado:
Pelo menosprezo e pela destruição de tudo o que havia sido feito anteriormente, isto
é, rompimento total com o passado;
Pelos ideais anárquicos;
Por um nacionalismo exagerado;
Pelo primitivismo, isto é, pela volta às origens.
Os principais autores da primeira fase são:
Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Antônio de Alcântara Machado,
Manuel Bandeira, Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida, Cassiano Ricardo e
Plínio Salgado.
Observe no poema “Pronominais” como Oswaldo de Andrade dá mais importância
ao linguajar coloquial (me dá um cigarro) do que à colocação exigida pela gramática (dê-me
um cigarro).
PRONOMINAIS
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas que bom negro e o bom branco
Da nação brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Ma dá um cigarro.
(Oswaldo de Andrade, poesias reunidas)
Modernismo da 2ª fase: 1930-1945:
Esta foi uma fase de construção, com idéias literárias inovadoras e de muita
produtividade – na prosa e na poesia. Politicamente, os acontecimentos eclodem, tanto fora
do país (depressão econômica, nazismo, Segunda Guerra Mundial) como aqui dentro
(ditadura de Getúlio Vargas e o Estado Novo).
Abrem essa fase: Mário de Andrade com a obra “Macunaíma” e José Américo
de Almeida, com” A bagaceira”.
As características dessa fase são:
Literatura construtiva e com consciência política, que não quer negar as
mudanças dessa época.
Reflexão e posterior amadurecimento das idéias da Semana de 22. A grande
maioria dos autores são os mesmos da primeira fase, além de:
Ficção regional: Érico Veríssimo, Jorge Amado, Graciliano Ramos, José Lins do
Rego, Rachel de Queiroz;
Romance urbano e psicológico: Marques Rebelo, Lúcio Cardoso, Octávio de
Faria, José Geraldo Vieira, Cornélio Pena;
Poesia: Carlos Drummond de Andrade, Cassiano Ricardo, Cecília Meireles,
Augusto Frederico Schmidt, Jorge de Lima, Vinícius de Moraes, etc.
Leia, agora, alguns trechos extraídos de algumas obras mais famosas de: José Lins
do Rêgo, Graciliano Ramos, Rachel de Queiroz e Erico Verissimo.
FOGO MORTO: JOSÉ LINS DO REGO
Fragmentos da obra:“ Capitão Vitorino”
Vitorino Carneiro da Cunha mandava no que era seu, na sua vida. As
feridas que lhe abriam no corpo nada queriam dizer. Não havia força que pudesse com
ele. Os parentes se riam de seus rompantes, de suas franquezas. Eram todos uns pobres
ignorantes, verdadeiros bichos que não sabiam onde tinham as ventas. Quando parava
no engenho, quando conversava com um Manuel Gomes do Riachão, via que era
melhor ser como ele, homem sem um palmo de terra, mas sabendo que era capaz de
viver conforme os seus desejos. Todos tinham medo do governo, todos iam atrás de
José Paulino e de Quinca do Engenho Novo, como se fossem carneiros de rebanho.
Não possuía nada e se sentia como se fosse senhor do mundo. A sua velha Adriana
quisera abandoná-lo para correr atrás do filho. Desistiu para ficar ali como uma pobre.
Podia ter ido. Ele, Vitorino Carneiro da Cunha, não precisava de ninguém para viver.
Se lhe tomassem a casa onde morava, armaria a sua rede por debaixo dum pé de pau.
Não temia a desgraça, não queria a riqueza. Lá se foram os três homens que libertara, a
quem dera toda sua ajuda. O tenente se enfurecera com o seu poder. Nunca pensara que
existisse um homem que fosse capaz de enfrentá-lo como fizera. A sua letra, o papel
que assinara com o seu nome, dera com a força do miserável no chão. Era Vitorino
Carneiro da Cunha. Tudo podia fazer, e nada temia. Um dia tomaria conta do
município. E tudo faria para que aquele calcanhar-de-judas fosse mais alguma coisa.
Então Vitorino se via no dia do seu triunfo. Haveria muita festa, haveria tocata de
música, discurso do Dr. Samuel, e dança na casa da Câmara. Viriam todos os chaleiras
do Pilar falar com ele. Era o chefe, era o mais homem da terra. E não teria as besteiras
de José Paulino, aquela tolerância para com sujeitos safados, que só queriam comer no
cocho da municipalidade. Com Vitorino Carneiro da Cunha não haveria ladrões, fiscais
de feira roubando o povo. Tudo andaria na correta, na decência.
( José Lins do Rêgo. Fogo Morto. 17 ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1977. P.284-5)
VIDAS SECAS : Graciliano Ramos
Trecho extraído da obra: Vidas Secas
"Fabiano ouviu os sonhos da mulher, deslumbrado, relaxou os músculos, e o saco
da comida escorregou-lhe no ombro. Aprumou-se, deu um puxão à carga. A conversa de
Sinhá Vitória servira muito: haviam caminhado léguas quase sem sentir. De repente veio a
fraqueza. Devia ser fome. Fabiano ergueu a cabeça, piscou os olhos por baixo da aba negra
e queimada do chapéu de couro. Meio dia, pouco mais ou menos. Baixou os olhos
encandeados, procurou descobrir na planície uma sombra ou sinal de água. Estava
realmente com um buraco no estômago. Endireitou o saco de novo e, para conservá-lo em
equilíbrio, andou pendido, um ombro alto, outro baixo. O otimismo de Sinhá Vitória já não
lhe fazia mossa. Ela ainda se agarrava a fantasias. Coitada. Armar semelhantes planos,
assim bamba, o peso do baú e da cabaça enterrando-lhe o pescoço no corpo.
Foram descansar sob os garranchos de uma quixabeira, mastigaram punhados de
farinha e pedaços de carne, beberam na cuia uns goles de água. Na testa de Fabiano o suor
secava, misturando-se à poeira que enchia as rugas fundas, embebendo-se na correia do
chapéu. A tontura desaparecera, o estômago sossegara. Quando partissem, a cabaça não
envergaria o espinhaço de Sinhá Vitória. Instintivamente procurou no descampado indício
de fonte. Um friozinho agudo arrepiou-o. Mostrou os dentes sujos num riso infantil. Como
podia ter frio com semelhante calor? Ficou um instante assim besta, olhando os filhos,
olhando os filhos, a mulher e a bagagem pesada. O menino mais velho esbrugava um osso
com apetite. Fabiano lembrou-se da cachorra Baleia, outro arrepio correu-lhe a espinha, o
riso besta esmoreceu.
Se achassem água ali por perto, beberiam muito, sairiam cheios, arrastando os pés.
Fabiano comunicou isto a Sinhá Vitória e indicou uma depressão do terreno. Era um
bebedouro, não era? Sinhá Vitória estirou o beiço, indecisa, e Fabiano afirmou o que havia
perguntado. Então ele não conhecia aquelas paragens? Estava a falar variedades? Se a
mulher tivesse concordado, Fabiano arrefeceria, pois lhe faltava convicção; como Sinhá
Vitória tinha dúvidas, Fabiano exaltava-se, procurava incutir-lhe coragem. Inventava o
bebedouro, descrevia-o, mentia sem saber que estava mentindo. E Sinhá Vitória excitava-
se, transmitia-lhe esperanças. Andavam por lugares conhecidos. Qual era o emprego de
Fabiano? Tratar de bichos, explorar os arredores, no lombo de um cavalo. E ele explorava
tudo. Para lá dos montes afastados havia outro mundo, um mundo temeroso; mas para cá,
na planície, tinha de cor plantas e animais, buracos e pedras.
E andavam para o Sul, metidos naquele sonho. Uma cidade grande, cheia de
pessoas fortes Os meninos em escolas, aprendendo coisas difíceis e necessárias. Eles dois
velhinhos, acabando-se como uns cachorros, inúteis, acabando-se como Baleia. Que iriam
fazer? Retardaram-se temerosos. Chegariam a uma terra desconhecida e civilizada,
ficariam presos nela. E o sertão continuaria a mandar gente para lá. O sertão mandaria para
a cidade homens fortes, brutos, como Fabiano, Sinhá Vitória e os dois meninos."
O QUINZE: Rachel de Queiroz
“Eram duas da tarde.
Cordulina, que vinha quase cambaleando, sentou-se numa pedra e falou,
numa voz quebrada e penosa:
-Chico, eu não posso mais...Acho que vou morrer. Dá-me aquela zoeira na
cabeça!
Chico Bento olhou dolorosamente a mulher. Os cabelos em falripas sujas,
como que gasto, acabado, caía por cima do rosto, envesgando os olhos, roçando na
boca. A pele, empretecida como uma casca, pregueava nos braços e nos peitos, que
o casaco e a camisa rasgada descobriam.
(...)
No colo da mulher, o Duquinha, também só osso e pele, levava, com um
gemido abafado, a mãozinha imunda, de dedos ressequidos, aos pobres olhos
doentes.
E com a outra, tateava o peito da mãe, mas num movimento tão fraco e tão
triste que era mais uma tentativa do que um gesto.
Lentamente o vaqueiro voltou à toa, devagarinho, costeando a margem da
caatinga.
(...)
De repente, um bé!,agudo e longo, estridulou na calma.
E uma cabra ruiva, nambi, de focinho quase preto, estendeu a cabeça por
entre a orla de galhos secos do caminho, aguçando os rudimentos de orelha,
evidentemente procurando ouvir, naquela distensão de sentidos, uma longínqua
resposta a seu apelo.
Chico Bento, olhava-a, com as mãos trêmulas, a garganta áspera. Os olhos
afogueados.
O animal soltou novamente o seu clamor aflito.
Cauteloso, o vaqueiro avançou um passo.
E de súbito em três pancadas secas, rápidas, o seu cacete de jucá zuniu; a
cabra entonteceu, amunhecou, e caiu em cheio por terra.
Chico Bento tirou o cinto da faca, que de tão velha e tão gasta nunca achara
quem lhe desse um tostão por ela.”
(Raquel de Queiroz. O Quinze. Rio de janeiro; Olympio, s.d. p. 72-5)
ERICO VERISSIMO:
Um Certo Capitão Rodrigo
Carlos Drummond de Andrade
Erico Verissimo. Um certo Capitão Rodrigo. São Paulo: Círculo do Livro, 1975. P. 130-1
— Vou te tirar as tripas pra fora, corno!
Empregando toda a sua força, que o ódio aumentava, o capitão conseguiu prender a mão
direita do outro entre suas coxas; e depois, imobilizando com a sinistra o braço que Bento
Amaral tinha livre, com a destra segurou a adaga e aproximou-lhe a ponta da cara do
inimigo, que atirou a cabeça para trás, num pânico, e começou a bufar e a cuspir.
— Te prepara, porco! — gritou Rodrigo. — É agora.
E riscou-lhe verticalmente a face. O sangue brotou do talho. Bento gemia, sacudia a
cabeça e houve um momento em que seu sangue respingou o rosto de Rodrigo e uma
gota lhe entrou no olho direito, cegando-o por um breve segundo.
— Falta a volta do R!
E num golpe rápido fez uma pequena meia-lua, às cegas. Bento cuspiu-lhe no rosto,
frenético, e num repelão safou-se e tombou de costas, deixando cair a adaga.
Rodrigo imaginou que ele ia levantar-se, apanhar de novo a arma e voltar ao ataque. Mas
Bento, sentado no chão, com a mão no rosto, ficou a olhar atarantadamente para todos os
lados. Os sapos continuavam a coaxar. Vaga-lumes passavam entre os dois inimigos.
Uma ave noturna saiu de dentro do cemitério e sobrevoou a coxilha, num seco ruflar de
asas.
— Não vou te matar, miserável — disse Rodrigo. — Mas não costumo deixar serviço
incompleto. Quero terminar esse R. Falta só a perninha...
E caminhou para o adversário, devagarzinho, antegozando a operação, e lamentando que
não fosse noite de lua cheia para ele poder ver bem a cara odiosa de Bento Amaral.
Sinistra: a mão esquerda
Destra: a mão direita
Coxilha: campina de pequena elevação, arredondada, típica do estado gaúcho
Ruflar: agitar, tremular.
POESIAS DA 2ª FASE DO MODERNISMO:
Cecília Meireles, Vinícius de Moraes, Murilo Mendes.
(Obra10)
CANÇÕES
Quando meu rosto contemplo,
O espelho se despedaça: por ver como
passa o tempo
E o meu desgosto não passa.
Amargo campo da vida
Quem te semeou com dureza,
Que os que não se matam de ira
Morrem de pura tristeza?
Cecília Meireles
Motivo
Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.
Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.
Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.
Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada.
Cecília Meireles
Soneto de Separação
Vinicius de Moraes
De repente do riso fez-se o pranto
Silencioso e branco como a bruma
E das bocas unidas fez-se a espuma
E das mãos espalmadas fez-se o
espanto
De repente da calma fez-se o vento
Que dos olhos desfez a última chama
E da paixão fez-se o pressentimento
E do momento imóvel fez-se o drama
De repente não mais que de repente
Fez-se de triste o que se fez amante
E de sozinho o que se fez contente
Fez-se do amigo próximo, distante
Fez-se da vida uma aventura errante
De repente, não mais que de repente.
3ª FASE 1945
(Toda poesia - 1950-1980", Civilização Brasileira, 1980, RJ)
LITERATURA CONTEMPORÂNEA: a prosa dos anos 1940-1950
Clarice Lispector (1926-1977)
Clarice Lispector é um dos três principais nomes da geração de 45 e uma das
principais expressões de ficção brasileira de todos os tempos. Quando publicou
sua primeira obra: Perto do Coração selvagem (1944), a escritora provocou
espanto na crítica e no público. Ela, na verdade, introduzia em nossa literatura
novas técnicas de expressão, que obrigavam a uma revisão de critérios
avaliativos. Sua narrativa quebra a sequência “começo, meio e fim”, assim como
a ordem cronológica, e funde a prosa à poesia ao fazer uso constante de imagens,
metáforas, antíteses, paradoxos, símbolos, sonoridade, etrc.
No Brasil é, o período em que se
encerra a ditadura deGetulio a é, no
cenário mundial, o final da Segunda
Guerra Mundial.
Na literatura, os autores brasileiros
fogem dos excessos iniciais de geração
de 22 e já é possível vislumbrar, na
prosa, uma produção intimista e
introspectiva, sendo Clarice Lispector a
figura mais representativa desse
romance.Ou uma literatura regionalista,
cujo representante magistral foi
Guimarães Rosa, ao registrar a
psicologia, a fala e o mundo do jagunço
do centro do Brasil.
Na poesia, destacam-se: João Cabral
de Melo Nero, Ferreira Gullar, Ledo
Ivo, Mauro mota.
Agosto 1964 Ferreira Gullar
Entre lojas de flores e de sapatos, bares,
mercados, butiques, viajo num ônibus Estrada de
Ferro - Leblon.
Viajo do trabalho, a noite em meio,fatigado de
mentiras.
O ônibus sacoleja. Adeus, Rimbaud,
relógios de lilazes, concretismo, neoconcretismo,
ficções da juventude, adeus, que a vida eu a
compro à vista aos donos do mundo.
Ao peso dos impostos, o verso sufoca,
a poesia agora responde a inquérito
policial-militar.
Digo adeus à ilusão.
Mas não ao mundo. Mas não à vida,
meu reduto e meu reino.
Do salário injusto, da punição injusta,
da humilhação, da tortura, do terror, retiramos
algo e com ele construímos um artefato, um
poema, uma bandeira.
Fragmentos de sua obra:
“A mãe tirou o espelho da bolsa e examinou-se no seu chapéu novo, comprado no
mesmo chapeleiro da filha. Olhava-se compondo um ar excessivamente severo onde não
faltava alguma admiração por si mesma. A filha observava divertida. Ninguém mais pode te
amar senão eu,pensou a mulher rindo pelos olhos: e o peso da responsabilidade deu-lhe à
boca um gosto de sangue. Como ase “mãe e filha” fosse vida e repugnância. Não, não se
podia dizer que amava sua mãe. Sua mãe lhe doía, era isso.”
(O Mistério do Coelho Pensante. Clarice Lispector. São Paulo: Rocco.)
Guimarães Rosa: a linguagem reinventada:
Como escritor, Guimarães Rosa (1908-1967) é uma das principais expressões da literatura
brasileira. A genialidade de sua obra tem deslumbrado as várias tendências da crítica e do
público. A grande novidade linguística introduzida pelo regionalismo de Guimarães Rosa
foide recriar na literatura a fala do sertanejo tanto no plano do vocabulário como no da
sintaxe( a construção de frases) e no da melodia da frase. Dando voz ao homem do sertão
por meio de técnicas como foco narrativo na 1ª pessoa, o discurso direto e o discurso
indireto livre, a língua falada no sertão está presente em toda a obra.
Grande Sertão: Veredas: a obra- prima de Guimarães Rosa, é considerada o mais
importante romance do século XX e uma das melhores obras de ficção da literatura universal
de todos os tempos, Riobaldo, seu narrador-protagonista, um velho e pacato fazendeiro, faz
um relato de sua vida a um interlocutor, um “doutor” que nunca aparece na histórria, mas
cuja fala é sugerida pelas respostas de Riobaldo.
Assim, apesar do diálogo sugerido, a narração é um longo monólogo em que Riobaldo traz à
tona suas lembranças em torno de lutas de lutas sangrentas de jagunços, perseguições e
emboscadas nos sertões de Minas, Goiás e sul da Bahia, bem como suas aventuras amorosas.
Ao mesmo tempo, Riobaldo vai relatando as preocupações metafísicas que sempre
marcaram sua vida. Entre elas, destaca-se a questão da existência ou não do diabo. Pelo que
se depreende da obra, ele provavelmente fizera um pacto com o demônio a fim de vencer
Hermógenes, chefe do bando inimigo. Portanto, desse fator depende a sua salvação, e daí
advêm as inquietações da personagem.
Riobaldo conhece e relata três amores na história: o envolvimento com Otacília, moça
recatada que conheceu numa fazenda; o amor sensual por Nhorinhá, uma prostituta; o amor
ambíguo e envolvente de Diadorim. Desses três, o último é o mais importante e, ao mesmo
tempo, o amor impossível.
Diadorim é o nome íntimo (que só Riobaldo conhece) de Reinaldo, jagunço valente e o
melhor amigo de Riobaldo. Ele entrara na guerra porque queria vingar a morte do pai, chefe
Joca Ramiro. A descoberta do amor por Diadorim surpreende Riobaldo, que nunca tivera
nenhum traço homossexual. Apesar disso, o amor crescia incontrolável:
Mas Diadorim, conforme diante de mim estava parado, reluzia no rosto, com uma beleza
ainda maior, fora do comum. Os olhos – vislumbre meu – que cresciam sem beira, dum
verde dos outros verdes, como o de nenhum pasto. (...) De que jeito eu podia amar um
homem, meu de natureza igual, macho em suas roupas e suas armas, espalhado rústico em
suas ações?! Me fazer. Ele tinha a culpa? Eu tinha culpa?
(João Guimarães Rosa. Grande Sertão: Veredas. Rio de Janeiro: Livraria José Olympio Editora. Lançamento,
1956.)
No término da obra, depois que Diadorim mata Hermógenes é morto por ele no
encontro final, os corpos são recolhidos para serem lavados. Então é que se descobre:
Diadorim era mulher (Diadorina, seu verdadeiro nome), e se disfarça de homem apenas para
ser aceita no bando e vingar a morte do pai. A revelação leva Riobaldo ao desespero: “Uivei,
Diadorim! Diadorim era uma mulher. Diadorim era mulher como o sol não acende a água do
rio Urucaia, como eu solucei meu desespero.”
JOÃO CABRAL DE MELO NETO (1920-1999) é o mais importante poeta da geração
1940-50.
Morte e vida Severina (Auto de natal pernambucano) é a obra mais popular de João
Cabral. Nela, o poeta mantém a tradição dos autos medievais, fazendo uso da musicalidade,
do ritmo e das redondilhas, recursos que agradam o povo. Ela foi encenada pela primeira vez
em 1966 no Teatro da PUC em São Paulo, com música de Chico Buarque. Foi premiada no
Brasil e na França e, a partir daí, vem sendo encenada diversas vezes e até adaptada para a
televisão.
O poema narra à caminhada do retirante Severino, desde o sertão até sua chegada em
Recife e, além das denúncias de certos problemas sociais do Nordeste, constitui uma
reflexão sobre a condição humana.
João Cabral é considerado pelos críticos “não apenas um dos maiores poetas sociais,
mas um renovador consistente, instigante e original da dicção poética antes, durante e depois
dele”.
MORTE E VIDA SERVERINA : João Cabral de Melo Neto
O retirante explica ao leitor quem é e a que vai
O meu nome é Severino,
como não tenho outro de pia.
Como há muitos Severinos,
que é santo de romaria,
deram então de me chamar
Severino de Maria
como há muitos Severinos
com mães chamadas Maria,
fiquei sendo o da Maria
do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco:
há muitos na freguesia,
por causa de um coronel
que se chamou Zacarias
e que foi o mais antigo
senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo
ora a Vossas Senhorias?
Vejamos: é o Severino
da Maria do Zacarias,
lá da serra da Costela,
limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco:
se ao menos mais cinco havia
com nome de Severino
filhos de tantas Marias
mulheres de outros tantos,
já finados, Zacarias,
vivendo na mesma serra
magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos
iguais em tudo na vida:
na mesma cabeça grande
que a custo é que se equilibra,
no mesmo ventre crescido
sobre as mesmas pernas finas
e iguais também porque o sangue,
que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos
iguais em tudo na vida,
morremos de morte igual,
mesma morte severina:
que é a morte de que se morre
de velhice antes dos trinta,
de emboscada antes dos vinte
de fome um pouco por dia
(de fraqueza e de doença
é que a morte severina
ataca em qualquer idade,
e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos
iguais em tudo e na sina:
a de abrandar estas pedras
suando-se muito em cima,
a de tentar despertar
terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar
alguns roçado da cinza.
Mas, para que me conheçam
melhor Vossas Senhorias
e melhor possam seguir
a história de minha vida,
passo a ser o Severino
que em vossa presença emigra.
(João Cabral de Melo Neto. Morte e Vida Severina. Editora Tuca, 1968)
A LITERATURA BRASILEIRA HOJE
As últimas produções literárias brasileiras, da década de 1970 até o final só século
XX, não receberam ainda um estudo mais aprofundado e sistematizado por parte dos
historiadores e críticos literários. Isso se deve a duas razões centrais: de um lado, a falta de
distanciamento histórico, que permita um enfoque mais abrangente e critico; de outro, a
duvida sobre a qualidade dessa produção, em virtude das condições históricas de censura e
repressão cultural em que parte dela foi concebida.
Após a declaração do AI-5, durante o governo Médici, verificou em todo país um
controle rígido sobre os principais meios de comunicação e informação. A censura atuava
diretamente nos jornais, TVs, nos teatros, e nos cinemas. Passou a ser proibida a livre
organização política e a liberdade de expressão torna-se um sonho.
Vários grupos de estudantes e operários que militavam politicamente na década de
80 passaram á clandestinidade, e alguns deles optaram pela guerrilha rural e urbana como
forma de luta. Pairava no ar um clima de depressão. Com partida de Gil, Caetano, Chico
Buarque, Geraldo Vandré e outros, confirmam-se a frase de John Lennon a respeito dos
Beatles e do projeto geração: “o sonho não acabou”.
Conheça mais sobre autores contemporâneos e suas obras:
João Ubaldo Ribeiro
Itaparica (BA) 1941
Obras: Setembro Não Tem Sentido, Sargento Getulio, Vida Real.
João Paulo Paes
Taquaritinga (OS) 1926-1998
Obras: O Aluno, Cúmplices, Os Poetas, Mistério De Casa, Poemas Reunidos,
Anatomia, Palavra, Pavão, Parlenda, Paraíso.
Moacyr Scliar
Porto Alegre (RS) 1937
Obras: Histórias De Medico Em Formação, O Carnaval Dos Animais, A Guerra Do
Bom Fim, O Exercito De Um Homem Só, Os Deuses De Raquel, Os Mistérios De Porto
Alegre, A Balada Do Falso Messias, O Ciclo Das Águas, Mês De Cães Danados, Doutor
Miragem.
Osmar Lins
Vitoria de santo antão (PE) 1924-1978
Obras: O Visitante, Os Gestos, O Fiel E A Pedra, Guerra Sem Testemunho, A
Rainha Dos Cárceres Da Grécia, Problemas Inculturais Brasileiros.
Mario Quintana
Alegrete (RS) 1906-1988
Obras: A Rua dos Cata Ventos, Canções, Sapato Florido, O Aprendizde Feiticeiro,
Espelho Mágico, Antologia Poética, Caderno H, Apontamentos de História Sobrenatural,
Nariz De Vidro.
Ligia Fagundes Teles
São Paulo (SP) 1923
Obras: Praia Viva, O Cacto Vermelho, Ciranda de Pedra, Histórias do Desencontro,
Verão no Aquário, O Jardim Selvagem, As Meninas, O Seminário dos Ratos, Filhos
Prodígios.
DA FELICIDADE
Quantas vezes a gente, em busca da ventura,
Procede tal e qual o avozinho infeliz:
Em vão, por toda parte, os óculos procura
Tendo-os na ponta do nariz!
Mário Quintana
POEMINHA DO CONTRA
Todos estes que aí estão
Atravancando o meu caminho,
Eles passarão.
Eu passarinho!
Mário Quintana
BIBLIOGRAFIA:
Linguagens e Culturas: Linguagem e códigos: ensino médio: educação de jovens e adultos/
Neide Aparecida de Almeida...(et al). 1 ed. São Paulo: Global, 2013.
Português Linguagens: volume 1 / Willian Roberto Cereja, Thereza Cochar Magalhães - 7
ed. Reform. – São Paulo: Saraiva, 2010.
Português: literatura, gramática, produção de texto/ Leila Lauar Sarmento, Douglas Tufano.
– 1 ed. – São Paulo: Moderna, 2010.
Língua e Literatura: vol. 03/ Carlos Emílio Faraco & Francisco Marto Moura. 19 ed.- São
Paulo: Ática, 1998.
Nilson Souza. Jornal Zero Hora, 02 de novembro de 2013. Opinião. P. 23
LISPECTOR, Clarice. O Mistério do Coelho Pensante. São Paulo: Rocco.
NETO, João Cabral de Melo Neto. Morte e Vida Severina. Editora Tuca. 1968.
Poemas escolhidos de Gregório de Matos/ seleção de José Miguel Wisnik. São Paulo:
Companhia das Letras.2011.
ASSIS, Machado de. Memórias Póstumas de Brás Cubas. Rio de Janeiro: Nova Aguiar,
1994.
ROSA, João Guimarães. Grande sertão: veredas. Rio de Janeiro: José Olympio. 1956.
QUEIROZ, Rachel. O Quinze. São Paulo: José Olympio. S. d.
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