LUIS FERNANDO ZULIETTI
NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS –
SP (1994 – 2004)
Pontifícia Universidade Católica São Paulo – 2006
ii
LUIS FERNANDO ZULIETTI
NAS ASAS DA EMBRAER: URBANIZAÇÃO, CRISE E MUDANÇAS EM SÃO JOSÉ DOS CAMPOS –
SP (1994 – 2004)
Tese apresentada à Banca
Examinadora da pontifica Universidade
Católica – PUC-SP, como exigência
parcial para a obtenção do título de
DOUTOR em Ciências Sócias, sob a
orientação da Prof.ª Drª. Lucia Maria
Machado Bógus.
Pontifícia Universidade Católica São Paulo - 2006
iii
iv
SUMÁRIO
Lista de Tabelas
Lista de Figuras
Lista de Gráficos
INTRODUÇÃO CAPÍTULO 1 – SÃO JOSÈ DOS CAMPOS: DO NASCIMENTO AO CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA AERNÁUTICA NACIONAL 26
1.1 – Evolução histórica da cidade de São José dos Campos 26
1.2 - A primeira fase do processo de industrialização do município
de São José dos Campos 30
1.2.1 - O modelo de desenvolvimento industrial e tecnológico
nacional 31
1.3 - A segunda fase do processo de industrialização do município
de São José dos Campos 33
1.3.1 – O processo de industrialização 34
1.3.2 - Políticas desenvolvimentistas 47
1.4 – O desenvolvimento da indústria aeronáutica nacional 52
1.4.1 – Os primórdios da indústria aeronáutica brasileira 54
1.4.2 – A criação do CTA e do ITA 60
1.5 – Embraer: o nascimento 64
1.5.1 - Políticas de desenvolvimento econômico nos anos setenta 66
1.6 – Embraer: segunda fase: o desenvolvimento 69
1.6.1– A presença do estado 73
1.6.2 - Desenvolvimento tecnológico 77
v
CAPÍTULO 2 – DA CRISE À PRIVATZAÇÃO DA EMBRAER 87 2.1 - O declínio 88
2.1.1 – Abertura Econômica, suprimento e transferência de
tecnologia 88
2.1.2 – As dificuldades da sobrevivência no ramo aeronáutico 97
2.1.3 - A mudança da economia e do ambiente político-institucional
no final da década de oitenta e início de noventa 102
2.2 – O processo de preparação para privatização 116
CAPÍTULO 3 – UM NOVO CAMINHO PARA A EMBRAER (1994-1998) 126
3.1-Tempo de mudança 126
3.1.1 - Privatização e transformação 128
3.1.2 - Perfil dos controladores 129
3.1.3 – Uma nova administração profissional 131
3.1.4 – Estratégia financeira 133
3.2. – Plano de ação 136
3.2.1 - Processo organizacional 140
3.2.2 - Processos de trabalho 141
3.3 - O modelo de gestão de desenvolvimento do produto 142
3.3.1 – Projeto de transformação 144
3.3.2 – Plano de cargos, salários e carreira 148
3.3.3 - Desenvolvimento profissional e educação 156
3.4 - Plano de reestruturação (1994 - 1998) 160
3.4.1 - Da síndrome dos sobreviventes à síndrome da insegurança no
emprego 169
3.5 - A Embraer na atualidade 175
3.5.1 - Nova estrutura da Embraer 194
vi
CAPÍTULO 4 – PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS – LÓCUS DA PESQUISA: “O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS FUNCINÁRIOS DA EMBRAER NO PERÍODO QUE ANTECEDE E LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÃO 199
4.1- O impacto sobre os demitidos 201
4.1.1. Caracterização dos funcionários demitidos 201
4.1.2. As mudanças ocorridas na vida dos funcionários demitidos 203
4.2- O impacto ocorrido na vida dos que permaneceram e dos novos
funcionários contratados pela embraer logo após sua privatização 219
4.3 – A visão dos funcionários que permaneceram a respeito das
mudanças na empresa 228
CONSIDERAÇÔES FINAIS 237
REFERÊNCIAS 247 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 256 ANEXO 1 – QUESTIONÁRIOS / ENTREVISTAS 259
ANEXO 2 – FOTOS DAS AERONAVES 267
ANEXO 3 - FOTO E MAPA DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP 275
ANEXO 4 - BAIRROS E FAVELAS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP. 277
vii
ÍNDICE DE TABELAS Tabela 1 – Região administrativa do Vale do Paraíba 27
Tabela 2 –Evolução das indústrias em São José dos Campos 37
Tabela 3 – Distribuição da população por local de nascimento 37
Tabela 4 – Distribuição da população do município nascida em outros estados 38
Tabela 5 - Indústrias conforme porte industrial em São José dos Campos –
2000 39
Tabela 6 – Indústrias conforme porte industrial em São José dos Campos –
2004 40
Tabela 7 – Evolução do comércio em São José dos Campos 40
Tabela 8 – Riqueza do Estado 41
Tabela 9 – Riqueza do País 41
Tabela 10 – Volume de exportações em São José dos Campos (em US$) 42
Tabela 11 – Volume de exportações da Embraer (em US$) 42
Tabela 12 – ICMS arrecadado na indústria 43
Tabela 13 – Empresas industriais 44
Tabela 14 – Empregos na indústria 44
Tabela 15 – Dados econômicos de São José dos Campos 46
Tabela 16 - Aeronaves Construídas ou montadas no Brasil na fase pré Embraer 59
Tabela 17 – Indicadores de desempenho econômico-financeiro da Embraer
valores em US$ milhões) 108
Tabela 18 – Indicadores de desempenho econômico financeiro da Embraer
( US$ milhões) 135
Tabela 19 – Média de horas de treinamento por empregado 158
Tabela 20 – Entregas de aeronaves (1996-2001)
166
Tabela 21 – Salário médio do total de trabalhadores, dos mensalistas e dos
horistas (em US$) 167
Tabela 22 – Salário médio da indústria aeronáutica por hora/pessoal/produção
por país (US$) 169
viii
Tabela 23 – Pesquisa de ambiente organizacional da Embraer 173
Tabela 24 – Número de empresas subcontratadas, suas localizações regionais
e distância da Embraer medida em kilômetros (1999) 182
Tabela 25 – Fornecedores de primeiro nível do Programa ERJ – 145/140/135 183
Tabela 26 – Fornecedores de primeiro nível do Programa ERJ – 170/190 185
Tabela 27 – Total de jatos entregues (1996-2005) 189
Tabela 28 – Balança comercial brasileira em 2004 190
Tabela 29 – Cidade de origem dos ex-funcionários demitidos da Embraer 201
Tabela 30 - Distribuição da população residente no município de São José dos
Campos, por local de nascimento – 2000 202
Tabela 31 – Escolaridade dos ex-funcionários 202
Tabela 32 – Ex-funcionários que trabalham atualmente 203
Tabela 33 - Renda atual dos ex-funcionários 203
Tabela 34 – Tempo de retorno dos ex-funcionários ao mercado de trabalho 204
Tabela 35 – Motivo principal da mudança da família por bairro, considerando o
total de famílias do município que mudaram de residência 206
Tabela 36 – Motivo principal da mudança da família de bairro considerando
todas as regiões de São José dos Campos 207
Tabela 37 – Mudou de residência depois da demissão 209
Tabela 38 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos
ex-funcionários 210
Tabela 39 – Endereço atual dos ex-funcionários da Embraer 211
Tabela 40 – Número de habitantes por região de São José dos Campos 216
Tabela 41 – Faixa etária dos ex-funcionários 219
Tabela 42 – Faixa etária dos novos contratados 220
Tabela 43 – Número de ex-funcionários demitidos por sexo 220
Tabela 44 - Número de funcionários contratados por sexo 220
Tabela 45 – Está satisfeito com a empresa 221
Tabela 46 – Cidade de origem dos novos contratados 222
Tabela 47 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos novos
ix
Funcionários 224
Tabela 48 – Situação atual (Moradia) 225
Tabela 49 – Mudou de endereço logo após a sua contratação 225
Tabela 50 – Endereço anterior dos novos contratados que morram na cidade de
São José dos Campos 226
Tabela 51 – Endereço atual de todos os novos contratados na cidade de São José
dos Campos 226
x
ÍNDICE DE FIGURAS Figura 1 – Mapas São Paulo e São José dos Campos 28
Figura 2 – Cidade do Vale do Paraíba 29
Figura 3 – Estrutura organizacional do Ministério da Aeronáutica 71
Figura 4 – Plano de Ação 137
Figura 5 – Organograma da embraer pós-privatização 140
Figura 6 – Processos Empresariais 142
Figura 7 – Fases do desenvolvimento do produto 144
Figura 8 – Remuneração global 151
Figura 9 – Perfil / indicadores – Instrumento de gestão 156
Figura 10 – Distritos de São José dos Campos 212
Figura 11 – Mapas das Regiões de São José dos Campos 213
Figura 12 – Mapa dos bairros de São José dos Campos 214
Figura 13 – Limites de Zona e número de habitantes por zona de São José dos
Campos 215
xi
INDICE DE GRÁFICOS
Gráfico 1 – Evolução do Faturamento, 1970-1994 89
Gráfico 2 – Produção, exportação e importação, 1970-1994 89
Gráfico 3 – Evolução do nível de emprego total da Embraer 90
Gráfico 4 – Grau de abertura comercial empresarial, 1970-1994 94
Gráfico 5 – Evolução dos gastos com P&D, 1970-1994 95
Gráfico 6 – Evolução do nível de emprego da Embraer, 1980-1994 119
Gráfico 7 – Composição do faturamento em 1994 122
Gráfico 8 – Composição da receita bruta por produto entre 1989 e 1994 123
Gráfico 9 – Evolução do nível de emprego da Embraer – 1990-1998,
Números absolutos 161
Gráfico 10 – Receita por empregado em milhões de dólares 165
Gráfico 11 – Evolução do número de empregos (1995 à 1999) 178
Gráfico 12 – Evolução do número de empregado (2000 à 2005) 178
Gráfico 13 – Receita líquida (R$ milhões) 187
Gráfico 14 – Ebitda (R$ milhões) 187
Gráfico 15 – Evolução do volume de jatos entregues pela Embraer 188
Gráfico 16 – Lucro líquido (R$ milhares) 190
Gráfico 17 – Pedidos em carteira (US$ bilhões) 191
Gráfico 18 – Gráficos de Dívidas 192
Gráfico 19 – Qualificação e treinamento (R$ milhões investidos) 193
xii
AGRADECIMENTOS
A realização deste trabalho contou com a colaboração, esforço e afeto de
várias pessoas, às quais gostaria de manifestar meus sinceros agradecimentos.
Correndo o risco de deixar de citar algumas, desde já me desculpo.
Em primeiro lugar, quero agradecer e ressaltar o privilégio de ter recebido
contribuições e sugestões preciosas da orientadora professora Drª. Lucia Maria
Machado Bógus na maior parte do percurso.
Meu muito obrigado à professora Ive Ramos que me ajudou na realização
desse trabalho e ás professoras Leila Maria da Silva Blass e Noêmia Lazzareschi
pelas importantes contribuições dadas no exame de qualificação.
Agradeço à minha esposa Ana Paula T. Veneziani que teve paciência, aos
meus filhos que também contribuíram para que eu pudesse concluir o trabalho.
Agradeço também a disponibilidade e generosidade dos Srs. Horácio
Forjaz, e Arthur Santacreu funcionários da Embraer, que abriram as portas da
empresa e forneceram as informações Almejadas desde o início da pesquisa.
A todos, muito obrigado!
xiii
RESUMO O presente trabalho tem como temática central o impacto social sofrido
pelos funcionários demitidos e os novos funcionários admitidos, durante e logo
após a privatização da Embraer, incluindo uma análise da mobilidade espacial
dessas pessoas na cidade de São José dos Campos – SP, como uma decorrência
de sua situação frente à empresa. Buscou-se também compreender e analisar o
desenvolvimento, crise e recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB),
representada pela Embraer S.A.
O percurso metodológico foi construído a partir das informações
bibliográficas, das experiências de vida dos ex-funcionários e dos novos
funcionários, além de depoimentos da nova direção da Embraer, com relação ao
processo de privatização da empresa. Nesse percurso, além de levantamentos
quantitativos e qualitativos, a linha de pesquisa adotada abordou os aspectos
histórico-sociológicos, com o propósito de analisar os impactos vivenciados pelos
trabalhadores envolvidos no processo. Através das entrevistas, pudemos
identificar e caracterizar a mobilidade espacial durante o período das demissões e
contratações de novos funcionários pela Embraer no Município de São José dos
Campos - SP, devido a motivos profissionais, preço dos imóveis, acesso a infra-
estrutura e serviços, segurança e qualidade de vida.
xiv
ABSTRACT The main theme of this paper is the social impact on the employees who
were dismissed and on the new ones hired during and soon after the privatization
of Embraer, including an analysis of how this process affected the spatial
distribution of these people within the city of São José dos Campos – SP. The
objective is also to understand and analyze the development, crisis and recovery of
the Brazilian Aeronautics Industry (IAB), represented by Embraer S.A.
The methodological path was built from the bibliographical research, the life
experiences of the former and new employees, and statements given by the new
direction of Embraer, regarding the process of privatization of the company. In this
process, added to the quantitative and qualitative surveys, the adopted line of
research approached historical and sociological aspects, with the purpose of
analyzing the impacts on the life of the workers involved in the experience.
Through the interviews, we were able to identify and characterize the spatial
changes that occurred during the period of the dismissals and hirings of employees
by Embraer in the City of São José dos Campos – SP, due to professional
reasons, cost of property, access to infrastructure and services, security and
quality of life.
INTRODUÇÃO O presente estudo busca analisar, a partir da privatização da empresa
Embraer, em 1994, as mudanças ocorridas com os funcionários demitidos, os que se
mantiveram empregados e o perfil dos novos funcionários contratados, bem como os
impactos dessas mudanças nas vidas dos envolvidos no processo. Dentre esses
impactos destaca-se a queda no poder aquisitivo dos demitidos, o que os obrigou,
por vezes, a residir em áreas da cidade de São José dos Campos, diferentes
daquelas onde residiam anteriormente. Essa mobilidade espacial intra-urbana e seus
impactos sobre a cidade, também são objeto de nossa análise. Além disso,
buscaremos, também, compreender e analisar o desenvolvimento, crise e
recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB), representada pela ex-estatal
Embraer S.A, enfatizando os fatores críticos de instalação de uma indústria de alta
tecnologia, tendo em vista as condições estruturais de uma economia de
industrialização tardia e periférica, como é o caso da brasileira. Assim serão
analisadas as condicionantes para o sucesso industrial da Embraer nas décadas de
setenta e oitenta, sua posterior crise, deflagrada no final dos anos oitenta e
aprofundada nos anos noventa, culminando na sua privatização em 1994. A partir de
então, inaugura-se uma fase de transição rumo a um novo modelo de gestão
empresarial, com a profissionalização dos seus quadros diretivos, com uma nova
configuração na gestão tecnológica e a análise das condições futuras de
recuperação e sustentabilidade da competitividade da empresa.
A opção por esse campo temático deveu-se, sobretudo, às particularidades e
à complexidade do processo de constituição e desenvolvimento tecnológico dessa
indústria no Brasil, aos condicionantes que contribuíram para seu êxito,
posteriormente sua crise e mais recentemente sua recuperação apoiada no
programa de parcerias de risco para o desenvolvimento do avião ERJ-145 e
atualmente dos novos aviões Embraer 170/190 e Legacy Executivo/Shuttle.
A indústria aeronáutica configura um caso singular e atípico, por ser
representada por uma única empresa, a Embraer – Empresa Brasileira de
Aeronáutica. Foi criada por iniciativa do governo federal no dia 19 de agosto de 1969
e fundada em 2 de janeiro de 1970, como sociedade de economia mista de capital
aberto, controlada pela União e vinculada ao Maer (Ministério da Aeronáutica), tendo
seus fundadores recebido a missão de criar e disseminar a indústria aeronáutica no
16
país. É importante considerar que desde o início a empresa contou com generoso e
continuado apoio do Estado, sem precedentes na história do desenvolvimento
tecnológico e industrial brasileiro, seja mediante incentivos fiscais e benefícios,
políticas governamentais de compra, para o estímulo da formação de recursos
humanos de alto nível, seja no fomento para a execução de pesquisa básica e
aplicada. Em grande medida, essa experiência foi viabilizada também graças ao
apoio de institutos cativos de excelência como o Centro Tecnológico da Aeronáutica
– CTA e o Instituto Tecnológico da Aeronáutica – ITA. Dessa forma, delineou-se uma
trajetória de autonomia e inovação tecnológica de sucesso, nucleada basicamente
no aprendizado seletivo de tecnologias-chave para a sua estratégia de manufatura e
na conquista planejada de nichos do mercado doméstico e mundial de aeronaves de
médio porte.
A adição de outros fatores vinculados à própria estratégia seguida quando da
instalação dessa indústria, teve influência significativa no êxito alcançado.
Diferentemente da instalação da indústria automobilística (em que corporações
transnacionais ocuparam o nível mais elevado da atividade industrial), a Embraer foi
concebida como uma estatal e como uma montadora final, que se dedicaria
exclusivamente à montagem de aviões por meio da materialização de um projeto
aeronáutico endogenamente concebido (DAGNINO, 1994).
Houve uma consistente capacitação de pesquisa com a formação dos
recursos humanos capazes de se apropriarem de soluções tecnológicas específicas,
objeto de consultorias e acordos de cooperação, caminho privilegiado para aumentar
o potencial inovador da empresa.
Foi também com base na capacitação em projeto aeronáutico (em especial na
área aerodinâmica) que foi possível assimilar as demais capacitações não
propriamente tecnológicas pela associação com parceiros externos, viabilizadas em
grande medida por meio da atuação governamental. Apoiada por um programa
governamental, a empresa criou extensa rede de fornecedores, promovendo
esquemas interativos de desenvolvimento tecnológico especialmente na área de
eletrônica. Tendo alto grau de interação com universidades, centros e institutos de
pesquisa em geral, pode-se afirmar que possui uma escola e um centro de
tecnologia cativas – ITA e CTA.
A Embraer conquistou o mercado de transporte aéreo regional internacional
com a linha do EMB-110 Bandeirante, para dezenove passageiros, e o EMB-120
17
Brasília, de trinta assentos. Os dois aviões garantiram à empresa, no passado, a
liderança de vendas na categoria turboélices para os Estados Unidos, o maior
mercado de aviões e maior cliente da companhia no mundo. Desde a fundação até
2005, a Embraer consolidou-se como uma empresa que projetou, construiu e
comercializou aproximadamente 8.700 aviões que voam em mais de 63 países.
Foram produzidos 21 modelos de aviões nestes 36 anos.
Em 7 de dezembro de 1994, a empresa foi transferida para a iniciativa
privada. Atualmente, a Embraer – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. – é uma
sociedade anônima de capital aberto, situada próxima ao quilômetro 146 da Via
Dutra, na região de São José dos Campos, estado de São Paulo. Hoje é controlada
por um consórcio de empresas e fundos de pensão liderados pelo Grupo Bozano
Simonsen, um dos principais conglomerados brasileiros, com atuação nas áreas
financeira, mineral, imobiliária, agrícola e industrial.
Nos últimos anos, a Embraer conquistou o prêmio de melhor empresa com
Estratégia corporativa da Indústria Aeroespacial Mundial promovido pela revista
especializada Flight 2.
Ao que tudo indica, fatores críticos eleitos como virtuosos e recomendados
por numerosos estudos sobre competitividade, tendo como referência experiências
empresariais paradigmáticas, tais como a elevada qualificação de seu quadro
técnico de engenheiros, o avançado estágio de autonomia e capacitação
tecnológica, investimentos pesados em P&D (Pesquisa e Desenvolvimento), o apoio
governamental irrestrito, parecem não ter sido suficientes para garantir o sucesso do
2 Em 1996, a empresa foi premiada na categoria Destaque Tecnológico. Em 21 de novembro de 1997, recebeu o
prêmio Destaque de Comércio Exterior na categoria Exportador, concedido pelo Ministério da Indústria, do
Comércio e do Turismo. Foi certificada em julho de 1997 pela ISO 9001. Desde 1995, ano seguinte à
privatização, a Embraer exportou US$ 17 bilhões em produtos e serviços, tendo sido a maior exportadora
brasileira entre 1999 e 2001. Contribuiu, ao longo desses dez anos, com US$ 6,6 bilhões para o saldo da balança
comercial do país. Desta forma, as exportações da Embraer em 2004 totalizaram US$ 3,699 bilhões, um recorde
que marca a segunda posição de maior exportadora brasileira, com um contribuição líquida na balança comercial
de 2004 de 4% do saldo. Em 2005 totalizou US$ 3,478 bilhões, sendo o quarto setor em exportação do país.
Atualmente, a Embraer é líder no mercado de jatos comerciais de até 110 assentos. A partir de 2004, entrou em
operação o Embraer 170, primeira das quatro aeronaves da nova família de jatos comerciais Embraer 170/190,
programas nos quais vêm sendo investidos cerca de US$ 1 bilhão.
18
empreendimento e a estabilidade de emprego dos seus funcionários (BERNARDES,
2000). A partir desse quadro, esse estudo procura abordar as seguintes questões:
- Por que a crise no setor?
- Quais as principais mudanças ocorridas com o processo de privatização?
- Quais foram as mudanças ocorridas com os funcionários demitidos em 1994?
- Quais foram as mudanças ocorridas com os funcionários que se mantiveram
empregados logo após a privatização em 1994?
- Qual o perfil dos novos funcionários contratados logo após a privatização?
- Quais foram os impactos ocorridos em relação à mobilidade espacial dos
funcionários demitidos e dos novos admitidos no Município de São José dos
Campos após a privatização da Embraer?
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A questão que se inscreve como objeto deste estudo refere-se ao impacto
sócio-econômico da privatização da Embraer sobre os funcionários demitidos e os
novos funcionários da Embraer durante e logo após o processo de privatização, bem
como a mobilidade espacial desses funcionários, no contexto da cidade de São José
dos Campos. Busca–se, também, compreender e analisar as condicionantes para o
sucesso industrial da Embraer, nas décadas de setenta e oitenta, sua posterior crise
deflagrada no final dos anos oitenta e aprofundada nos anos noventa, culminando
na sua privatização em 1994.
Essa investigação pretende captar a configuração social de cada realidade
estudada, de forma a possibilitar a compreensão. Se, de um lado, os dados
estatísticos dão uma primeira aproximação à investigação, de outro, têm seu alcance
analítico ampliado, quando complementados com outras informações.
Assim sendo, foram utilizadas as seguintes fontes de informação:
1. Entrevistas com os ex-funcionários, funcionários que permaneceram e novos
funcionários da Embraer.
2. Relatos de experiências e depoimentos dos ex-funcionários, funcionários que
permaneceram e novos funcionários da Embraer.
3. Depoimentos dos diretores e gerentes da Embraer.
4. Histórias de vida com alguns ex-funcionários, direção e novos funcionários da
Embraer.
19
Neste levantamento de campo foram obtidas informações sobre os aspectos
sócio-econômicos, psicológicos, educacionais, profissionais, além de informações
sobre a mobilidade espacial desses indivíduos em função das alterações ocorridas
na empresa.
O PROCESSO DA APROXIMAÇÃO DO OBJETO DE ESTUDO
A escolha do tema partiu das lacunas existentes no conhecimento acerca dos
impactos observados entre funcionários que permaneceram, ex-funcionários, novos
funcionários e nova direção da Embraer e o impacto da mobilidade espacial com dos
mesmos sobre o Município de São José dos Campos – SP.
A aproximação do objeto de estudo iniciou-se com o cotejo de bibliografias
sobre a Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB) e, principalmente, sobre a Embraer
sob diversos aspectos.
A produção acadêmico–científica, como dissertações, teses e livros sobre o
tema, da história da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB), muito contribuíram para o
entendimento da Embraer.
Também foram considerados textos e artigos que tratam da temática Embraer
e dos problemas ligados a ex-funcionários, novos funcionários, e suas vidas na
cidade: jornais, mapas, cadernos especializados e sites da Aeronáutica e Embraer.
O interesse pela temática surgiu a partir de duas grandes paixões que se
interpuseram ao longo da minha experiência de vida: a paixão pela arte da aviação e
a paixão pela cidade de São José dos Campos. A primeira das paixões surgiu na
infância, quando tive o primeiro contato com os aviões, mais especificamente,
quando meu pai que era Engenheiro Mecânico Aeronáutico (ex-funcionário do CTA)
me levou para conhecer o local onde ele trabalhava.
A segunda paixão começou a ser esboçada a partir da minha dissertação de
mestrado em Planejamento Urbano Regional, quando tive contato com minha cidade
e minhas raízes, passando pela experiência de pesquisa com o crescimento
populacional da cidade e culminando com a atual experiência de pesquisa no qual
as duas paixões se encontraram: isso despertou em mim alguns questionamentos
acerca dos conflitos, impasses ou dilemas que se interpõem na construção do objeto
de estudo.
20
Estes questionamentos foram colocados ao longo dessa proposta no
processo de construção do objeto de pesquisa.
O conhecimento real do objeto de estudo também incluiu visitas à Embraer
com a orientadora desse estudo, Dra. Lucia Maria Machado Bógus e com a Dra.
Leila Maria da Silva Blass, professora do PEPGCS.
CENÁRIO DO ESTUDO O processo metodológico concebido a partir das informações, das
experiências de vida dos ex-funcionários, dos novos funcionários e nova direção nas
entrevistas realizadas, com relação ao processo de privatização da Embraer no
Município de São José dos Campos - SP, dentro e fora do espaço operacional da
mesma, ao longo de sua existência, associados à sociedade local.
Nessa busca, a linha de pesquisa adotada, com abordagem histórico-
sociológica, tem como propósito analisar a experiência de constituição,
desenvolvimento, crise e recuperação da Indústria Aeronáutica Brasileira (IAB),
representada pela ex-estatal Embraer S.A e o impacto sócio-econômico, bem como
a mobilidade espacial ocorridos com os mesmo no Município de São José dos
Campos.
O resgate histórico será registrado não apenas seguindo o relato, a
memória e o sentimento individuais, mas tem como objetivos somar a esses
registros os momentos sociais, institucionais e coletivos, cristalizados nas vivências
com o lugar e com os grupos de referência das pessoas entrevistadas (BOSI, 2001).
LEVANTAMENTOS DE CAMPO
Como será explicitado no capítulo 4, nos procedimentos metodológicos, foram
utilizados levantamento de campo quantitativos e qualitativos. A presente pesquisa
foi realizada mediante um levantamento de campo que incluiu:
1) um questionário contendo quarenta e oito perguntas aplicadas a oitenta e
uma pessoas demitidas e entrevistas qualitativas com sete pessoas, também
demitidas da Embraer nos períodos anterior e posterior à sua privatização;
21
2) um questionário contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito
pessoas admitidas e entrevistas qualitativas com seis pessoas, também admitidas
logo após a privatização da Embraer;
3) entrevistas em profundidade realizadas com duas pessoas que trabalham
na Embraer desde a sua formação;
4) Foram realizadas ainda, duas entrevista em profundidade com AN, 44
anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato e MB, 64 anos, casado,
dois filhos, Engenheiro Mecânico, onde tem ocupado posições de chefia.
As Entrevistas foram realizadas a partir de roteiro estruturado, tendo as
perguntas sido feitas oralmente, utilizando – se o gravador para registro das
respostas.
O registro das entrevistas multiplica as oportunidades de melhor entender o
entrevistado, considerando-se que a subjetividade e o valor do assunto criam
espaço para discussão e confronto de informações.
A experiência das entrevistas com os ex-funcionários, novos funcionários,
gerência e nova direção da Embraer é preciosa e singular.
Trata-se de uma pesquisa de caráter exploratório porque, embora a
Embraer seja uma empresa mundialmente conhecida pela sua história vitoriosa e
objeto de vários estudos acadêmicos, trata-se de uma realidade multifacetada, que
ainda comporta muitas interpretações. Este trabalho pretende agregar informação
que possibilitem ampliar o conhecimento dos processos ocorridos na empresa e de
seus impactos sobre a vida da cidade de São José dos Campos.
22
REALIZAÇÃO DE ENTREVISTAS EXPLORATÓRIAS COM INFORMANTES QUALIFICADOS Foram realizadas entrevistas com: - LF, ex-Ilustrador Técnico, 44 anos, casado, que trabalhou por 18 anos na Embraer
demitido na crise de 1994.
- MJF, 53 anos, casado, três filhos, ex-Controlador de Qualidade, foi um dos
demitidos da Embraer na crise de 1994.
- PRA, 53 anos, casado, dois filhos, Supervisor de Assistência Técnica, foi um dos
demitidos da Embraer na crise de 1994.
- RTR, 55 anos, casado, três filhos, Supervisor Administrativo, logo após completar
23 anos de trabalho na Embraer foi demitido.
- PG, 45 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Aeronáutico, ex- supervisor de
projetos, foi demitido logo após privatização.
- AFM, 47 anos, casado, três filhos, Chapeador, foi demitido na crise de 1994.
- PRB, Engenheiro, 51 anos, casado, dois filho, trabalhou 25 anos na Embraer
demitido logo após a privatização.
- ACMS, 45 anos, casado, cinco filhos, Engenheiro Mecânico Aeronáutico, há 22
anos trabalha na Embraer.
- HAF, 54 anos, divorciado, dois filhos, Engenheiro Mecânico Eletrônico, há 28 anos
trabalha na Embraer.
- MPM, 31 anos, solteira, Técnico de Logística, há 6 anos trabalha na Embraer.
- ERF, 27 anos, separada, dois filhos, Técnica de Informática, há 3 anos trabalha na
Embraer.
- DL, 54 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico, há 12 anos trabalha na
empresa.
- CEEL, 26 anos, solteiro, Técnico em Eletrônica, há 5 anos trabalha na Embraer.
- MB, 64 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico trabalha na Embraer desde
1994, onde tem ocupado posições de chefia.
- CC, 32anos, Solteira, Técnica em Gestão Empresarial, contratada em 2000.
- CJP, 42 anos, casado, um filho,Técnico Eletrônico, há 6 anos na Embraer.
- AN, 44 anos, Assistente Social e ex-Diretora do Sindicato dos Metalúrgicos.
23
As entrevistas realizadas foram selecionadas de forma não intencional,
direcionadas para os benefícios ou conflitos ocasionados pela privatização da
Embraer e a mobilidade espacial ocorrida com os ex-funcionários e novos
funcionários na cidade de São José dos Campos – SP.
VISITAS ÀS INSTALAÇÕES As visitas realizadas aos setores de produção, logística, recursos humanos
e qualidade, possibilitaram perceber a Embraer e suas várias faces, vivenciar a
realidade e confrontá-la com as referências bibliográficas.
Assim, o estudo e análise das fontes secundárias foram articulados ao
levantamento de campo empírico, através do conhecimento dos espaços fora da
Embraer , o que permitiu traçar o quadro no qual o objeto se situa, buscando
elementos e contribuições teóricas, por diferentes ângulos do problema, com vistas a
definições, conexões e mediações para demonstrar as expressões e manifestações
da realidade em que se inscreve o problema, sem se limitar, no entanto, a simples
exibição de dados, mas compreender através deles, a questão da Embraer, ex-
funcionários, novos funcionários, nova direção e suas variáveis estruturais e sociais.
A pesquisa “não visa o futuro mas captar um campo de constrangimento e de
possibilidades, bem como os desafios que esse campo define”(QUIVY, 1998, p. 28).
A identificação e o levantamento de campo foram estruturadas a partir da
importância da presença da Embraer no Município de São José dos Campos - SP. A
pesquisa bibliográfica e as entrevistas exploratórias muito contribuíram para a
elaboração deste estudo. A coleta de registros proporcionou revelações
substantivas, que ampliaram o conhecimento sobre as relações entre a Embraer,
seus ex-funcionários, novos funcionários, nova direção e sobre a mobilidade
espacial observada no Município, durante e após o processo de privatização da
empresa.
24
Assim, os resultados obtidos da somatória dos instrumentos aplicados, dos
estudos bibliográficos aos registros e anotações em levantamento de campo,
constituíram a base para as análises realizadas.
OBJETIVOS
Em face do tema exposto, foram definidos como os principais pontos a serem
desenvolvidos e integrados ao escopo temático da investigação:
1. Analisar a gênese, evolução, crise e recuperação da indústria aeronáutica em
São José dos Campos, SP.
2. Realizar uma análise do processo de mudança de gestão organizacional, dos
processos de aprendizagem e inovação tecnológica e das formas de
integração e organização do trabalho na Embraer.
3. Analisar o impacto ocorrido com os demitidos e os novos admitidos pela
Embraer, durante e logo após a sua privatização e a mobilidade espacial dos
mesmos, no município de São José dos Campos.
SUBJACENTES A ESSES OBJETIVOS, ESTÃO AS SEGUINTES QUESTÕES: a) Como a nova política de reestruturação societária da Embraer irá garantir
a sobrevivência da empresa?
b) Será necessária uma nova e decisiva participação e incentivo do Estado
nacional para o desenvolvimento da Embraer?
c) Se esta nova reestruturação não atrair investimentos para futuros projetos,
como possibilitar a manutenção e geração de novos empregos?
d) Como esta nova fase de desenvolvimento e retomada de crescimento
podem afetar a mobilidade espacial com a vinda de novas pessoas para São José
dos Campos - SP?
e) Se uma nova crise ocorrer, quais poderão ser os impactos sobre a cidade
de São José dos Campos?
Para atingir os objetivos expostos, estruturamos o trabalho da seguinte
maneira:
25
No capítulo I, apontamos os aspectos considerados relevantes para o
presente trabalho, a evolução histórica de São José dos Campos – SP, o
nascimento da indústria aeronáutica e o padrão de desenvolvimento industrial, o
estilo de intervenção governamental, o papel decisivo dos militares na montagem do
sistema científico e tecnológico nacional entre as décadas de cinqüenta a setenta.
Serão analisadas as fases de consolidação da Embraer descrevendo as trajetórias
de lançamento e desenvolvimento dos seus principais produtos, sua participação no
mercado mundial de aviões e os sucessos e fracassos comerciais.
No capítulo II, serão analisados os motivos que conduziram a empresa à sua
crise no final da década de oitenta e posteriormente ao processo de privatização em
1994. Neste capítulo, será descrito e analisado o desenho das estratégias de
transformação na filosofia de gestão empresarial e moldura institucional da Embraer,
que priorizavam sintonizá-la ao atual ambiente de competição mundial de mercado,
mediante a instituição de uma administração de resultados, um plano de ação para
restauração e reestruturação da empresa, com o lançamento de novos produtos e
uma nova política de contratos, celebração de parcerias e alianças estratégicas.
No capítulo III, serão analisadas as estratégias de transformação na filosofia
de gestão empresarial e moldura institucional da Embraer, que prioriza sintonizá-la
ao atual ambiente competitivo internacional, mediante a uma administração de
resultados, um plano de ação para restauração e reestruturação da empresa. Em
seguida, a Nova Embraer no mercado atual.
No capítulo IV, passamos a analisar o impacto ocorrido com os funcionários
demitidos o perfil dos novos admitidos da Embraer no período que antecede e logo
após sua privatização em 1994, as mudanças ocorridas com os funcionários que se
mantiveram empregados e o impacto ocorrido na mobilidade espacial do município
de São José dos Campos – SP, após a privatização da Embraer, com relação aos
funcionários demitidos e os novos admitidos.
Por fim, apresentamos, nas considerações finais, nosso entendimento do
processo em andamento das políticas de competitividade e inovação para o futuro
da Embraer e do município de São José dos Campos - SP, a partir de depoimentos
obtidos e das análises realizados.
26
CAPÍTULO 1 - SÃO JOSÉ DOS CAMPOS: DO NASCIMENTO AO CRESCIMENTO DA INDÚSTRIA BRASILEIRA AERONÁUTICA 1.1 – EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA CIDADE DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
São José dos Campos é um município de 1.142 quilômetros quadrados, 594
metros de altitude, localizado a 85 quilômetros a nordeste da capital paulista. Integra
uma das 15 regiões administrativas do Estado, criadas a partir de um decreto
estadual de 1990.
Com 600.049 habitantes, São José dos Campos é o maior em
população entre os oito municípios que compõem a denominada região de governo
de São José dos Campos (Caçapava, Igaratá, Jacareí, Jambeiro, Monteiro Lobato,
Paraibuna, Santa Branca e a própria São José). Atrás de São José estão Jacareí e
Caçapava (IBGE, 2004), conforme Tabela 1 e como mostram as Figuras 1 e 2:
Sua população está distribuída em dois distritos (São Francisco Xavier e
Eugênio de Melo), dois subdistritos (Santana e o Centro) e 318 bairros urbanos, 77
bairros rurais, 94 loteamentos clandestinos e 22 favelas (em anexo).
27
TABELA 1 – Região Administrativa do Vale do Paraíba
Cidade População Cidade População
Aparecida 35.942 Natividade da Serra 7.261
Arapeí 2.821 Paraibuna 18.336
Areias 3.798 Pindamonhagaba 141.039
Bananal 10.113 Piquete 15.483
Caçapava 82.440 Potim 16.020
Cachoeira Paulista
29.770 Queluz 9.990
Campos do Jordão
48.711 Redenção da Serra 4.071
Canas 4.049 Roseira 10.056
Caraguatatuba 95.237 Santa Branca 14.704
Cruzeiro 76.530 Santo Antonio do Pinhal
6.938
Cunha 22.857 São Bento do Sapucaí 11.395
Guaratinguetá 111.673 São João do Barreiro 4.275
Igaratá 9.545 São José dos Campos 600.049
Ilhabela 25.408 São Luis do Paraitinga 10.747
Jacareí 208.471 São Sebastião 73.167
Jambeiro 4.435 Silveiras 5.669
Lagoinha 5.159 Taubaté 267.471
Lavrinhas 6.844 Tremembé 39.366
Lorena 82.854 Ubatuba 79.055
Monteiro Lobato 3.762 TOTAL 2.205.448
Fonte: IBGE, 2004.
28
FIGURA 1 – Mapas São Paulo - São José dos Campos
Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.
São Paulo - Município de São José dos Campos. Svg (1215KB, tipo MIME:
image/svg).
29
FIGURA 2 – Cidades do Vale do Paraíba
Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004. Ao longo de sua história, São José dos Campos tem vivido em constante
transformação, passando de pequena aldeia a um dos maiores pólos industriais e
tecnológicos do país (SINDUSCON,1994).
A povoação teve várias denominações:
• Vila Nova de São José
• Vila de São José do Sul
• Vila de São José do Paraíba, tendo este último os foros da cidade. Em
atenção à topografia do seu sítio, pela lei provincial n° 47, de 2 de abril de
1871, passou a se chamar São José dos Campos.
Em sua evolução o município passou por quatro distintas fases, a saber:
• Ciclo do algodão
• Ciclo do café
• A fase sanatorial (Estância Climática e Hidromineral)
• A fase industrial.
30
1.2 - A PRIMEIRA FASE DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
Segundo estudiosos, São José dos Campos foi uma cidade-laboratório graças
a estímulos externos. Assim foi com a fase sanatorial (primeira metade do século
XX).
De acordo com o Centro de Informações e Referências Culturais – (CIRC,
1996), a cidade era um depósito de balões de ensaio de instituições paulistanas,
como a Santa Casa de Misericórdia, depois a implementação do CTA, da Dutra, dos
investimentos multinacionais e militares. São José descaracteriza-se totalmente. É
quando se processa a transformação vertiginosa de cidade-sanatório para cidade-
indústria bélica e multinacional.
A cidade-indústria tinha como panorama político nacional um período
conturbado, com eficazes interferências na vida política do município. A visível
presença do Estado na vida da população do município mostrava a importância que
este adquiria para o desenvolvimento da indústria brasileira.
No período de 1889 a 1984, ou seja, em quase 100 anos de República, a
cidade teve apenas quatro prefeitos eleitos.
A arquitetura moderna e o urbanismo entraram em cena e passaram a
representar o cartão postal que atestava um novo tempo. Um dos destaques de São
José dos Campos era a passagem da Dutra, arte significativa da história do Estado
Nacional (DIAS, 2000).
Após a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, no mês de janeiro de 1951,
não só São José dos Campos, mas todo o Vale do Paraíba tiveram um grande
impulso no seu desenvolvimento, com a instalação, às suas margens, de grandes
indústrias multinacionais. São José dos Campos foi beneficiada pelas condições
sociais e culturais de que era dotada:
• Possuía bons terrenos industriais, planos e baratos;
• Estava próximo dos grandes centros consumidores e distribuidores, São
Paulo e Rio de Janeiro;
• Situava-se perto dos centros fornecedores de matérias-primas, como
Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro;
• Apresentava clima seco, o que favorecia o ramo de telefonia;
31
• Estava ligada à rede elétrica;
• Dispunha de mão-de-obra barata;
• Situava-se próxima do parque industrial paulistano, que, necessitando
expandir-se, procurou implantar subsidiárias próximas as suas sedes;
• Possuía um centro de pesquisas e de capacitação profissional de alto
nível como o Centro Técnico Aeroespacial (CTA);
• Oferecia incentivo fiscal.
A partir desta década, o papel do Estado como força motriz foi fator
determinante para a industrialização tardia, caracterizando São José dos Campos
como cidade industrial, tendo sido de grande importância também a implantação do
CTA para seu desenvolvimento.
1.2.1 - O MODELO DE DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL E TECNOLÓGICO NACIONAL
Um dos traços marcantes do desenvolvimento do capitalismo no Brasil,
identificado por alguns autores pela sua natureza tardia3 (Cardoso de Mello, 1992a),
está relacionado ao papel do Estado como a força motriz ou fator determinante ao
impulso à industrialização4. Esse papel foi exercido não só por intermédio das
funções fiscais e monetárias e de controle do mercado de trabalho ou de sua função
de provedor dos chamados bens públicos, mas sobretudo pela definição, articulação
3 Os estudos sobre a formação e o padrão de industrialização brasileira realizados por Cardoso de Mello (1992ª) e Carlos Alonso de Oliveira (1977) identificavam certos padrões industriais que se encontravam na base do conceito de capitalismo tardio, a saber: as industrializações originárias; as industrializações atrasadas (que se realizavam no momento da etapa concorrencial e têm um passado feudal), e as industrializações tardias (de passado colonial e de economias exportadoras nacionais, realizadas na etapa monopolista do capitalismo internacional). Cardoso de Mello estabelece uma periodização para entender o processo de formação e desenvolvimento da economia brasileira: economia colonial, economia mercantil escravista nacional e economia exportadora capitalista retardatária. A ´´ultima subdividida em três fases: nascimento e consolidação da grande indústria, “industrialização restringida” e “industrialização pesada”. Conforme a periodização adotada, a “industrialização restringida”, 1930 e 1955, seria caracterizada por um movimento endógeno de acumulação, cuja dinâmica seria dada pela acumulação industrial com a reprodução da força de trabalho e parte crescente do capital constante, porém sem as bases técnicas e financeiras suficientes para que se instalasse de um só golpe o núcleo fundamental da indústria de bens de produção que permitiria á capacidade produtiva crescer à frente da demanda. Por sua vez, “industrialização pesada” seria introduzida por um bloco de investimentos concentrados, entre 1955 e 1961, que teria alterado a estrutura do sistema produtivo, moldando um novo padrão de acumulação caracterizado pelo crescimento acelerado, à frente de seus mercados, dos setores de bens de população e duráveis de consumo (CARDOSO de MELLO, 1992a). 4 Concebemos como processo de industrialização “a constituição de uma estrutura industrial que progressivamente emancipa o processo de acumulação das restrições impostas pela base técnica e do bloqueio estabelecido pela divisão internacional do trabalho” (CARNEIRO, 1992, p. 145).
32
e sustentação financeira dos grandes blocos de investimento que conduziram às
principais modificações estruturais da economia no pós-guerra e na criação da infra-
estrutura e produção direta de insumos intermediários indispensáveis à fase de
industrialização pesada (CASSIOLATO, 1994).
O desenvolvimento econômico e industrial no Brasil durante o pós-guerra tem
sido sempre relacionado à presença do chamado Estado desenvolvimentista5, ou,
em outras palavras, a intervenção estatal se constituiu na força motriz que permitiu a
criação e a dinamização do capitalismo no Brasil. “Em grandes linhas, a literatura
sobre história política e econômica brasileira classifica três grandes períodos que
foram cruciais na ação estatal no processo de industrialização. De modo geral, essa
linha interpreta que o processo de industrialização brasileiro passa a ser dirigido de
forma deliberada pelo Estado, no segundo governo de Getúlio Vargas, vai ser
moldado durante a industrialização pesada com o Plano de Metas, no governo de
Juscelino Kubstichek, apoiado na formação de tríplice aliança entre a empresa
estatal, a grande multinacional e a empresa privada nacional, e finalizado na década
de setenta pelo II PND (Plano Nacional de Desenvolvimento), quando é
complementada a sua matriz de relações interindustriais. Nesse modelo político e
econômico o Estado cumpriu função ativa na estruturação e consolidação do
desenvolvimento da indústria nacional, viabilizando as condições necessárias para a
formação de uma economia industrial relativamente integrada, com participação
extensa do capital privado internacional e dos capitais nacionais privados e públicos,
e uma expressiva participação no comércio mundial. A partir da consecução de uma
estratégia de grandes blocos de inversões estatais, ampla e permanente proteção,
promoção e regulação, a estrutura industrial brasileira tinha alcançado, em 1980, alto
grau de regulação e integração intersetorial e diversificação da produção,
5 Bielschowsky (1988) identifica o período 1930-45 – sobretudo os anos do Estado Novo, como um início para um salto qualitativo na ideologia industrializante. O período é considerado pelo autor como a fase de origem do “ciclo ideológico do desenvolvimentismo”, conceitualmente entendido como um projeto de industrialização planejada e apoiada pelo Estado. O desenvolvimentismo, isto é, “a ideologia de superação do subdesenvolvimento nacional com base numa estratégia de acumulação de capital na indústria”, só viria a tornar-se hegemônico na segunda metade dos anos cinqüenta. Mas foi na segunda metade da década de 1950, até o início dos anos sessenta, que a industrialização brasileira sofreu transformações decisivas. Com a edição do Plano de Metas, no governo Juscelino Kubstichek (1956-1960), houve a primeira experiência efetiva de planejamento do desenvolvimento industrial como elemento central de uma estratégia abrangente de desenvolvimento econômico. Com o Plano de Metas, o Estado conseguiu pôr em marcha o processo de industrialização pesada, coordenando a formação de uma tríplice aliança entre a empresa estatal, a grande multinacional e a empresa privada nacional; a última, considerada a parte mais frágil do tripé, criando um sistema de proteção à indústria do mercado interno, fomentou o desenvolvimento industrial e investiu pesadamente em infra-estrutura e indústria de base.
33
apresentando um dinamismo exportador de manufaturados bastante satisfatório. O
esforço tecnológico acumulado ao longo do processo de desenvolvimento
econômico conhecido como MODELO DE SUBSTITUIÇÃO DE IMPORTAÇÕES6
limitou-se ao necessário à produção industrial stricto sensu. Essa foi a base que
estruturou o capitalismo brasileiro, desde a década de 1950 até o início dos anos
noventa” (CASSIOLATO, 1994).
1.3 - A SEGUNDA FASE DO PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÃO DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS
A segunda fase do processo de industrialização do município de São José dos
Campos teve seu início a partir da década de 50.
Os principais atores responsáveis pela motivação da industrialização e
urbanização do município foram:
• a implantação da Rodovia Presidente Dutra (1950);
• a posição geográfica do município, situado entre as duas principais
regiões metropolitanas do país (São Paulo e Rio de Janeiro);
• a instalação do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (1950) – ITA, órgão
vinculado ao Centro Técnico Aeroespacial (1947) – CTA;
• a Política de Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado de São
Paulo.
Conseqüentemente, instalaram-se no município de São José dos Campos
indústrias de grande porte como General Motors, Johnson & Johnson, Eaton,
Kanebo, Embraer, entre outras.
Com a instalação destas indústrias cresceu a oferta de trabalho no município,
ocasionando, assim, uma transformação na organização da população, que deixou
de ser predominante rural para se tornar predominantemente urbana (ARAÚJO,
2001).
6 A âncora de tal modelo de desenvolvimento estava assentada nas seguintes bases: na ampliação do mercado interno; em práticas protecionistas; nos investimentos públicos em infra-estrutura; nos investimentos públicos de longo prazo; nos subsídios e incentivos fiscais e nos investimentos e financiamento externos. O padrão de desenvolvimento era induzido pela liderança das indústrias metalmecânicas e químicas, que alavancavam os setores fornecedores de insumos (CONCEIÇÃO TAVARES, 1976).
34
1.3.1 – O PROCESSO DE INDUSTRIALIZAÇÂO Em 1925 é instalada a Tecelagem Parahyba, especializada em brim, que
depois se transformou em fábrica de cobertores. No final da década de 40, com o
reerguimento econômico do Vale do Paraíba, o município passa por um processo
acelerado de mudanças no sistema urbano. Destaca-se a instalação do Instituto
Tecnológico de Aeronáutica em 1947, inspirado no modelo americano do MIT
(Instituto de Tecnologia de Massachussets), projetado pelo arquiteto Oscar
Niemeyer, e a inauguração da Rodovia “Eurico Gaspar Dutra”, em 19 de janeiro de
1951 (BONDESAN, 1996).
O advento da Rodovia, que encurtava o percurso entre Rio-São Paulo, e o
desenvolvimento de pesquisas tecnológicas possibilitaram a intensificação da
industrialização nas décadas de 1960/1970, quando indústrias de grande porte
vieram ocupar grandes áreas de expansão urbana e ao longo da Via Dutra. A partir da década de 50, com a inauguração da Rodovia Presidente Dutra, a
cidade passou a sediar uma industrialização mais moderna e intensa. A própria
rodovia tornou-se o primeiro parque industrial joseense, surgindo espontaneamente
na medida em que as fábricas passaram a instalar-se às suas margens.
Os campos de São José de vegetação arbustiva e topografia regular, foram
transformados em enormes canteiros de obras: um após outro, todos com suas
respectivas placas de sinalização indicando a procedência da indústria a ser
instalada e informando prazos, os terrenos industriais passavam pela ocupação.
Tal como as indústrias, os loteamentos também foram surgindo em toda
parte, sem que a Prefeitura Municipal tivesse pessoal técnico para acompanhamento
das inaugurações relâmpagos e vendas simultâneas. Inúmeros loteamentos foram
vendidos em um único final de semana.
O surgimento apressado de indústrias e loteamentos se acentuou no início da
década de 60, dando origem a um crescimento desordenado, não permitindo que os
poderes públicos municipais conseguissem legislar e direcionar o crescimento
através de um zoneamento urbano – fabril (TEIXEIRA, 2000).
Inúmeras tentativas disciplinares foram tomadas pela Prefeitura Municipal,
inclusive a contratação de escritórios especializados em estudos e planos diretores.
Nada foi seguido: a Prefeitura Municipal mal teve tempo de cobrar os impostos, em
decorrência das mudanças bruscas verificadas na cidade durante a década de 60.
35
Enquanto isso, São José dos Campos começava a receber um fluxo cada vez
maior de imigrantes, decênio após decênio.
Juntamente com a industrialização há o aprimoramento da educação. Esse
processo praticamente se inicia no ano de 1954 com a inauguração da Faculdade de
Direito, que foi a 5ª do Estado e a 3ª do interior, originando a Fundação
Valeparaibana de Ensino, hoje Universidade do Vale do Paraíba (UNIVAP), seguida
em 1960 pela instalação da faculdade de Odontologia (UNESP). Em 1961 é criado o
Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e instituído o curso de Mestrado no
Instituto Técnico Aeroespacial (ITA), consolidando São José dos Campos como um
pólo científico-tecnológico e viabilizando a instalação de empresas nacionais de
base tecnológica (Embraer, Avibrás e outras) nos ramos aeroespacial, bélico e
eletrônico.
Além dos fatores descritos, o que muito contribuiu para essa intensificação no
processo de industrialização foi a interiorização das indústrias.
Na década de 70, houve um conjunto de investimentos públicos e federais
que contribuíram para a promoção da desconcentração regional de capital industrial
produtivo, tendo sido o Estado de São Paulo o maior beneficiado, assim como os
seus municípios.
Entre as políticas que ajudaram no processo de interiorização do
desenvolvimento econômico do Estado de São Paulo, encontramos:
• Plano rodoviário de interiorização de desenvolvimento, facilitando o
escoamento de produto para outros estados e cidades;
• Política de incentivos às exportações, que beneficiaria São José dos Campos,
devido às indústrias bélica e aeronáutica instaladas na cidade;
• Criação dos escritórios regionais de planejamento (ERPLAN’S), como
instrumento de ação e elaboração de diagnóstico sócio-econômico regional.
Na segunda metade dos anos 70, o Governo Estadual, com o apoio do
Governo Federal, procurou implantar o que se denominou Política de
Desenvolvimento Urbano e Regional do Estado de São Paulo, mediante a
introdução de alguns programas como “cidade média”, “macro-eixo”, entre outros.
Com essas medidas, houve um grande fluxo de recursos públicos destinados
ao interior do Estado para melhoria de infra-estrutura urbana, principalmente viária:
com isso houve a construção das rodovias dos Bandeirantes, Airton Senna e dos
Imigrantes.
36
Essa descentralização teve o objetivo de aliviar o “caos urbano” da cidade de
São Paulo, pois o governo não havia sido capaz de resolver as questões urbanas,
que também seriam passadas de herança para o interior.
Devido a essas medidas São José dos Campos se tornou uma cidade
hospedeira tanto para migração de pessoas como para a instalação de novas
indústrias, conforme as Tabelas 2, 3 e 4. Nas últimas décadas, São José dos
Campos tem se destacado como um dos maiores pólos de pesquisa e produção
científica e tecnológica do país. Atualmente a Embraer é a quarta maior indústria
aeronáutica do mundo e a primeira da América do Sul7. Com uma economia
crescente, sua produção abrange os setores automobilístico, farmacêutico,
eletrodoméstico, além do aeronáutico, espacial e de telecomunicações. Este
desenvolvimento tem se refletido nas atividades de comércio e de prestação de
serviços.
7 A Embraer nasceu a 19 de agosto de 1969, como empresa de economia mista na qual a União detinha, por exigência legal, pelo menos 51% do capital votante, os quais deveriam ficar sob controle do governo por meio do Ministério da Aeronáutica.
37
TABELA 2 - Evolução das Indústrias em São José dos Campos EVOLUÇÃO DAS INDÚSTRIAS JOSEENSES
Anos 1950 1960 1970 1980 1990 2000 2003 2004
N° de Estabelecimentos
65 72 284 390 628 999 682 693
Pessoas Ocupadas 3515 6003 17866 49917 61532 47499 42098 49720
Fonte: 1950 – Divisão de pesquisa sócio-econômica – Ano 1976 1960 a 2000 – Cadastro Industrial São José dos Campos – Ano 2001 - 2004 – IBGE, 2004. TABELA 3 – Distribuição da população por local de nascimento em São José
dos Campos
Descrição População % Município de São José dos Campos 256.924 49,83 Outro município do Vale do Paraíba 42.405 8,23 Outro município do Estado de São Paulo
66.396 12,88
Outro Estado 145.229 28,17 Outro País 3.794 0,74 Não Informa 805 0,16 TOTAL 515.553 100,00
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos
Campos, 2000.
38
TABELA 4 - Distribuição da população do município nascida em outros estados brasileiros
Descrição População % REGIÃO NORTE 1.744 1,20 Acre 153 0,10 Amazonas 211 0,15 Amapá 38 0,03 Pará 652 0,45 Rondônia 96 0,07 Roraima 441 0,30 Tocantins 153 0,10 REGIÃO NORDESTE 35.335 24,33 Alagoas 2.491 1,71 Bahia 7.741 5,33 Ceará 3.832 2,64 Maranhão 1.246 0,86 Paraíba 3.583 2,47 Pernambuco 9.754 6,72 Piauí 3.967 2,73 Rio Grande do Norte 1.974 1,36 Sergipe 747 0,51 REGIÃO SUDESTE 85.175 58,65 Espírito Santos 1.342 0,92 Minas Gerais 71.052 48,92 Rio de Janeiro 12.871 8,81 REGIÃO SUL 20.484 14,10 Paraná 18.453 12,71 Rio Grande do Sul 1.227 0,84 Santa Catarina 804 0,55 REGIÃO CENTRO-OESTE 2.491 1,72 Distrito Federal 364 0,25 Goiás 862 0,50 Mato Grosso do Sul 767 0,53 Mato Grosso 498 0,34 TOTAL 145.229 100,00
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos
Campos, 2000.
Como podemos verificar na Tabela 3, a metade das famílias atualmente
residindo no município de São José dos Campos não é natural do município. A
Tabela 4 mostra que a maioria dos “imigrantes” é originária da própria Região
Sudeste. Na Tabela 2, podemos ver o grande crescimento das indústrias e o maior
número de pessoal ocupado em 1990, com 61.532 pessoas, tendo em vista que
nesta década o município tornou-se o maior pólo industrial do Estado, com 628
39
indústrias. Para o ano de 2000, houve um crescimento em números de indústrias,
mas o número de pessoas ocupadas diminuiu, devido à automação das indústrias e
à internacionalização econômica.
Conforme mostram as Tabelas 5 e 6, o parque industrial do município de São
José dos Campos, segundo os dados da Secretaria de Planejamento e Meio
Ambiente em 2000, era composto por 999 indústrias, sendo que em 2003 (Tabela 2)
houve uma redução para 682 indústrias e a diminuição das pessoas ocupadas para
42.098. Em 2004 o número de indústrias volta a crescer para 693 e aumenta o
número de pessoas ocupadas para 49.720.
TABELA 5 - Indústrias Conforme Porte Industrial em São José dos Campos - 2000
INDÚSTRIAS CONFORME PORTE INDUSTRIAL
PORTE INDUSTRIAL INDÚSTRIAS PESSOAL OCUPADO
Classificação N° % N° %
Micro/Pequenas 946 94,7 9.500 20,0
Médio 37 3,7 7.126 15,0
Grande 16 1,6 30.878 65,0
TOTAL 999 100,0 47.504 100,0
Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2000.
Micro / Pequena 0 – 99
Média 100 – 499
Grande 500 e mais.
40
TABELA 6 - Indústrias Conforme Porte Industrial em São José dos Campos- 2004
INDÚSTRIAS CONFORME PORTE INDUSTRIAL
PORTE INDUSTRIAL INDÚSTRIAS PESSOAL OCUPADO
Classificação N° % N° %
Micro/Pequenas 658 94,94 9.447 19,0
Médio 28 4,0 8.452 17,0
Grande 7 1,0 31.821 64,0
TOTAL 693 100,0 49.720 100,0
Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004.
Micro / Pequena 0 – 99
Média 100 – 499
Grande 500 e mais.
Fonte: Ano de 1950 a 1975 – Divisão de pesquisa sócio econômica – Ano 1976, IBGE, 2004
TABELA 7 – Evolução do Comércio em São José dos Campos EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO JOSEENSE
Anos 1950 1960 1970 1975 1990 2000 2003 2004
N° de Estabelecimentos
222 357 1.020 1.240 7.340 11.270 20.581 20.890
Pessoas Ocupadas 597 977 3.243 5.800 13.720 27.440 50.112 52.780
Fonte: Ano de 1950 a 1975 – Divisão de pesquisa sócio econômica – Ano 1976, IBGE, 2004.
Analisando as Tabelas 2 e 7, podemos ver que São José dos Campos
apresenta um cenário diferente do país até 2000, em 2004 isso mudou, 51,9% das
vagas de trabalho se encontram nos serviços, 19,8% na indústria, 16% no comércio,
9% nos serviços domésticos e 2,8% na construção, segundo dados do IBGE. Em
São José dos Campos, 31.821 pessoas, ou seja, 64% das pessoas empregadas na
indústria joseense estão na grande indústria, sendo 14.466 pessoas empregadas na
Embraer. Isso representa 29% das 49.720 pessoas que estão empregadas na
indústria em São José dos Campos.
41
Atualmente São José dos Campos é a terceira cidade mais rica do
estado e a nona cidade mais rica do país, segundo pesquisa divulgada pelo IBGE
em 2004, com um PIB de 13,6 bilhões de reais, que representa 1,08% de toda
riqueza produzida no Brasil, conforme Tabelas 8 e 9.
TABELA 8 – Riqueza no Estado As dez cidades com maior PIB do Estado (2004) Posição/cidade R$ 1º) São Paulo 140 bilhões 2º) Guarulhos 13,9 bilhões 3º) São José dos Campos 13,6 bilhões 4º) São Bernardo 11,3 bilhões 5º) Campinas 10,8 bilhões 6º) Santo André 7,7 bilhões 7º) Barueri 7,5 bilhões 8º) Jundiaí 6 bilhões 9º) Osasco 5,6 bilhões 10º) Sorocaba 4,8 bilhões
Fonte: IBGE 2004.
TABELA 9 – Riqueza no País As nove cidades com maior PIB do Brasil (%)
Posição/cidade 1999 2004 1º) São Paulo 11,6 10,4 2º) Rio de Janeiro 5,6 4,7 3º) Brasília 2,3 2,7 4º) Manaus 1,3 1,5 5º) Belo Horizonte 1,5 1,4 6º) Duque de Caxias (RJ) 0,8 1 7º) Curitiba 1,3 1 8º) Guarulhos 1,1 1 9º) São José dos Campos 1 1
Fonte: IBGE 1999/2004. O principal fator que coloca São José dos Campos entre as de maior poder
econômico do país é o grande volume de exportações conforme a Tabela 10. Uma
das principais empresas exportadoras e gerado de empregos diretos na cidade é a
Embraer, que exportou em 2003, R$ 2.007 bilhões , em 2004 R$ 3.348 bilhões e em
2005 R$ 3.267 Como mostra a Tabela 11 e gráfico 15 abaixo:
42
TABELA 10 - Volume de Exportações em São José dos Campos (em US$)
2001 3.891,634
2002 4.221,553
2003 3.326,881
2004 3.974,488
2005 4.724,816
Fonte: Secretaria de Desenvolvimento Econômico de São José dos Campos, 2005.
TABELA 11- Volume de Exportações da Embraer (em US$)
2001 2.897,765
2002 2.396,431
2003 2.007,076
2004 3.348,985
2005 3.267,976
Fonte: Embraer 2005.
Segundo o IBGE, São José dos Campos em 2002 apresentou uma renda per
capita de R$ 23.982, média acima da registrada no Estado de São Paulo, que foi de
R$ 11.363. Isso se deve às grandes empresas e institutos de pesquisas na cidade,
como Embraer, General Motors, Johnson & Johnson, ITA, INPE, entre outros.
São José dos Campos vivenciou a ascensão e queda do setor industrial nos
últimos 20 anos. Este segmento foi o principal responsável pela projeção da cidade,
além de ter sido decisivo na expansão e no desenvolvimento, sendo causa do
crescimento e da mobilidade espacial e da renda municipal.
Mais de dois terços da riqueza de São José dos Campos estão concentrados
nos recursos gerados por três empresas: Revap, General Motors e Embraer. O
Imposto Sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS)
arrecadado pelo município em 2000 foi de R$ 824 milhões, sendo aproximadamente
R$ 713 milhões provenientes do setor industrial. Em 2002 o valor total foi de R$
43
509,5 milhões, cabendo R$ 412,4 milhões ao setor industrial. Em 2004 o valor total
foi de R$ 620,2 milhões, um aumento de 11,7%, sendo R$ 460,2 milhões providos
pelo setor industrial, conforme Tabela 12.
TABELA 12 – ICMS Arrecadado na Indústria
Ano Valores (R$) 2000 713.905.855 2001 594.434.225 2002 412.426.245 2004 460.212.213
ICMS total
1985 279.966.569 1990 738.050.414 1995 730.139.815 2000 824.113.946 2002 509.507.982 2004 620.220.412
Fonte: Fundação Seade 2005.
Esses números levam à constatação que o setor industrial tem registrado
perda de arrecadação, por outro lado continua sendo o principal responsável pelo
recolhimento de ICMS na cidade.
Nos últimos 15 anos, o setor vem sofrendo com o fechamento e transferência
de indústrias da cidade, influenciados pela abertura de mercado e pela chamada
“guerra fiscal” dos municípios.
Dados da Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) apontam
que em 1995 a cidade contava com 880 estabelecimentos industriais, sendo que em
2001 este número atingiu sua máxima com 1.073 indústrias; já em 2002 a tendência
de queda se confirmou com a diminuição para 675 estabelecimentos. Em 2003
houve um pequeno aumento, para 682 estabelecimentos e em 2004, para 693,
dados já citados na Tabela 2 - Cadastro Industrial de São José dos Campos. A
Tabela 13.
44
TABELA 13- Empresas Industriais
Ano Estabelecimentos 1995 880 1996 910 1997 952 1998 963 1999 994 2000 999 2001 1.073 2002 675 2003 682 2004 693
Fonte: Fundação Seade – 2005.
O número de trabalhadores no setor industrial foi imediatamente atingido,
passando de 50.119 em 1991, para seu número mais baixo, 40.515, em 2002, uma
queda de quase 24% no emprego local. A partir desse ano podemos notar alguma
recuperação; já em 2004, com relação a 2003, houve um aumento de 22% no
emprego local, conforme Tabela 14 dados já citados na Tabela - Cadastro Industrial
de São José dos Campos):
TABELA 14 – Empregos na Indústria
Ano Vagas 1991 50.119 1995 45.268 1996 44.996 1997 40.644 1998 43.098 1999 41.939 2000 47.499 2001 47.504 2002 40.515 2003 42.098 2004 49.720
Fonte: Fundação Seade 2005.
Mesmo assim, logo após a reestrutração industrial que houve na década de
90, a indústria continua absorvendo o maior número de empregados.
Entre os 123.239 trabalhadores com carteira assinada em São José dos
Campos, 22.961 recebem mais que 10 salários mínimos. O percentual, de 18,6% do
45
total da mão-de-obra no município, é um dos maiores do país, só comparável no
Estado de São Paulo com a renda dos empregados em São Bernardo do Campo -
SP.
O setor industrial é que eleva a renda dos trabalhadores nesses municípios.
Enquanto boa parte das cidades no Estado de São Paulo tem no setor de serviços a
principal força de trabalho, em São José dos Campos, a força motriz está na
indústria de transformação, com 39.892 vagas, seguida pelos serviços com 39.241
vagas.
A cidade de São José dos Campos tem a maior concentração de
trabalhadores nas grandes empresas, como no caso da Embraer, com 16.953
trabalhadores em 2005.
Essas indústrias atraem, para a cidade, profissionais com boa escolaridade.
Cerca de metade desses profissionais possuem o ensino médio completo. A
porcentagem de pessoas que recebem menos de 3 salários mínimos fica abaixo de
50% em São José dos Campos, ou seja, 53.096 pessoas; 20.090 ganham entre 3 e
5 salários mínimos e 26.867 entre 5 e 10 salários mínimos. As pessoas que recebem
mais de 10 salários são 22.961, como mostra a Tabela 15 abaixo:
46
TABELA 15 – Dados Econômicos de São José dos Campos
Renda do Trabalhador • Total de trabalhadores formais (homens e mulheres):
123.239 • Total de mulheres: 40.914 • 1 salário mínimo: 2.024 • 1 a 3 salários: 51.074 • 3 a 5 salários: 20.090 • 5 a 10 salários: 26.867 • Mais de 10 salários: 22.961
Escolaridade • Analfabeto: 249 • 4ª série incompleta: 3.099 • 4ª série completa: 5.502 • 8ª série incompleta: 12.6195 • 8ª série completa: 20.848 • Ensino médio incompleto: 10.568 • Ensino médio completo: 45.566 • Superior incompleto: 5.599 • Superior completo: 9.613
Por Setores (homens e mulheres) • Extração mineral: 114 • Indústria de transformação: 39.892 • Serviços industriais de utilidade pública: 2.092 • Construção civil: 4.180 • Comércio: 24.066 • Serviços: 39.241 • Administração Pública: 12.946 • Agropecuária: 12.946
Por Setores (mulheres) • Extração mineral: 17 • Indústria de transformação: 6.420 • Serviços industriais de utilidade pública: 444 • Construção civil: 226 • Comércio: 9.249 • Serviços: 17.475 • Administração Pública: 6.964 • Agropecuária: 119
Fonte: Sesi (dados de 2004).
Esta pesquisa mostra que o trabalhador, em São José dos Campos, é bem
remunerado, principalmente se analisarmos o restante do país. Segundo a pesquisa
do SESI (Serviço Social da Indústria), apenas 2 milhões de pessoas no Brasil
ganham acima de 10 salários mínimos. Entre elas, 60% estão na Região Sudeste.
Mais de 40% do total, 813.117, estão no Estado de São Paulo.
47
Podemos observar a grande importância da Embraer, que é o objeto de
estudo a ser analisado, no desenvolvimento e na geração de empregos na cidade de
São José dos Campos.
Podemos dividir a história da Embraer em duas fases: os anos como empresa
estatal, herança desenvolvimentista, que começam com sua fundação em 1969; e o
seu crescimento e consolidação quando se inicia a segunda fase, após sua
privatização em 1994, trazendo novos ciclos de investimentos e crescimento
econômico para a Embraer e a cidade de São José dos Campos.
1.3.2 - POLÍTICAS DESENVOLVIMENTISTAS As características do Estado brasileiro são singulares, pois ele nunca evoluiu
plenamente para um estado de bem-estar, tal como o construído nas sociedades
afluentes européias, mas também não chegou a concluir um sistema produtivo
industrial e de relações de trabalho do tipo fordista maduro8. Segundo Fiori (1993,
p.21) “analisando as características da industrialização brasileira, entre 1930 e 1980,
a fragilidade política do Estado impeliu o país a uma fuga para frente e pelos
8 O desenvolvimento industrial brasileiro, no início da década de cinqüenta, caracterizou-se pelo reduzido grau de aprimoramento tecnológico e pela simples importação de tecnologia, sobretudo incorporada ao setor de bens de capital. No decorrer da metade dos anos cinqüenta, com a crescente proteção do mercado mundial às importações, começaram a ser introduzidos no país os segmentos produtores de bens de consumo duráveis cuja base técnica, no cenário mundial, já se encontrava em adiantado grau de maturação. A estratégia industrial seguida deu-se basicamente por meio do investimento direto de empresas estrangeiras, nomeadamente no segmento de duráveis, e do investimento estatal nos segmentos de maior prazo de maturação e maiores requerimentos de capital. Assim como no Japão e na Coréia, a ação governamental foi crucial na montagem da estrutura industrial; uma característica distinta, segundo observaram Fleury; Fleury (1995), “foi a presença das multinacionais que, no Brasil, revelaram-se mais significativas”. De modo geral, ao longo do processo de substituição de importações, ocorreu a incorporação e a difusão de tecnologias estrangeiras por um número relativamente reduzido de empresas líderes. Enquanto se intensificou um movimento de importação de tecnologia e serviços tecnológicos, não se verificou, de forma sistemática, tal esforço interno na compra, transferência e adaptação de tecnologia externa (COUTINHO; FERRAZ, 1994). As reflexões elaboradas enfatizam bem esse argumento. Em seu estudo sobre o setor automotivo, tendo como objeto de análise as plantas da Ford do Brasil e da Inglaterra, Silva notava que a racionalidade e as práticas de gestão e organização do trabalho na indústria brasileira tinham sido mais determinadas pelo poder de um Estado de configuração militar do que pela lógica do paradigma clássico de produção taylorista-fordista. Silva acredita “que foi o caráter autoritário do Estado que moldou o fordismo no Brasil, da forma peculiar observada durante o período do «milagre econômico» [...]. A ditadura constitui importante condição específica da evolução do fordismo no Brasil. Durante mais de vinte anos, os militares determinaram as condições para o desenvolvimento econômico. Embora estas tenham disso estabelecidas nos moldes de algumas das condições institucionais anteriormente existentes, o caráter autoritário das relações em diferentes níveis – local de trabalho, repressão aos sindicatos, arrocho salarial, tribunais trabalhistas e Estado – aumentou enormemente, num processo de realimentação recíproca”.
48
caminhos de menor resistência, criando uma estrutura industrial altamente
desenvolvida, porém sem auto-sustentação financeira e tecnológica”. Uma
industrialização que avançou e acomodou-se a um ambiente macroeconômico volátil
e permanente inflacionário. O Estado brasileiro não reproduziu a performance dos
Estados desenvolvimentistas asiáticos, tampouco foi keysiano e, evidentemente, em
nenhum momento foi social democrata. Com relação ao keynesianismo, Segundo
Fiori (1993, p.3) “seu recurso ao déficit público não visou ao pleno emprego ou à
sustentação do consumo ou a sustentação da economia”.
Para Fiori, o país percorreu, na mesma época do fordismo ou do capitalismo
administrado ocorrido em alguns países de velha industrialização, um ciclo
desenvolvimentista que se encerrou com a crise dos anos oitenta. Foi um ciclo
orientado pelo paradigma tecnológico industrial norte-americano, mas que não
logrou articular os seus mercados e sua institucionalidade sociopolítica segundo o
modo de regulação fordista. Ao mesmo tempo, não foi uma industrialização liberal do
tipo anglo-saxão, nem de tipo nacional, como a européia ou japonesa. Para Fiori, no
Brasil, ao contrário das industrializações tardias asiáticas, houve uma
industrialização baseada em uma estratégia baseada na tríplice aliança entre o
capital privado, internacional e o Estado, mas em que o investimento direto externo e
a instalação das grandes corporações num mercado interno protegido eram uma
marca decisiva e própria. De tal forma que, completado o ciclo de industrialização,
cerca de 40% do produto industrial já era produzido pelas grandes corporações
multinacionais que lideravam a produção de quase todos os setores mais dinâmicos
da economia brasileira. No Brasil, a industrialização se realizou de forma distante de
um estilo que se queira chamar de via prussiana, mas por um processo que
poderíamos denominar de via associada (FIORI, 1997, p.173)9.
No Brasil, até a década de oitenta, o setor público era a principal fonte de
recursos para a Ciência e Tecnologia (C&T), responsável por cerca de 80% do
dispêndio na área. Com o desequilíbrio financeiro do setor público, observa-se
paulatina redução dos orçamentos para C&T e progressivo enfraquecimento político
da infra-estrutura para a pesquisa científica e tecnológica montada nos anos setenta.
A crise externa e interna, nas últimas décadas, expôs a fragilidade de grande parte
9 Via de desenvolvimento da agricultura própria da Prússia Ocidental, durante o século XIX. Era caracterizada por uma aliança dos grandes proprietários de terras (Nobreza) e os grandes capitalistas urbanos, em especial os capitalistas financeiros, em detrimento do campesinato, sendo o Estado um co-financiador do processo.
49
dos esforços privados em Pesquisa e Desenvolvimento (P&D) e C&T, e a
dependência do sistema de conseqüências negativas da dicotomia institucional entre
os órgãos encarregados de formular a política científica e tecnológica estrutural do
país ficou mais nítida ante das dificuldades de internalizar e gerar capacidade de
inovação no complexo eletrônico10 (LAPLANE, 1997).
Com as políticas de corte desenvolvimentista alterou-se profundamente a
estrutura da indústria e de suas relações com o exterior, estabelecendo um padrão
mais próximo dos países centrais. Contudo, a manutenção do modelo de
desenvolvimento econômico apoiado no tripé não encontrava mais sustentação. As
incertezas geradas pelas mudanças no mercado financeiro internacional, o aumento
da participação do Estado e, em menor medida, do capital multinacional na
composição do PIB (Produto Interno Bruto), estimulavam o processo disruptivo do
tripé. No plano interno, a adversidade do quadro macroeconômico da década de
oitenta, aliado a uma desarticulação do padrão institucional do Estado
desenvolvimentista, e, de outro ângulo, no front externo, as mutações impostas pela
internacionalização da economia mundial e os novos padrões de competição
empresariais, surtiram efeitos nefastos sobre os fatores político-institucionais ou as
determinantes sistêmicas que regiam a competitividade da economia brasileira. A
herança da crise foi a perda progressiva da capacidade tanto da intervenção estatal
na aplicação das políticas fiscais, industriais e tecnológicas ativas, quanto de
ordenar e operar as políticas nas quais seu papel é mais passivo e de caráter
regulatório11.
10 Cassiolato (1994) apresenta informações que atestam que “desde os anos setenta, os pagamentos relativos à importação de tecnologia entraram em queda acentuada, atingindo níveis bastante baixos. Se medirmos essa queda com base nos pagamentos pelos contratos registrados no INPI (Instituto Nacional de Propriedade Industrial), a redução foi de U$ 321 milhões, em 1980, para 174 milhões, em 1987. A porcentagem de pagamentos de contratos de transferência de tecnologia como porcentagem do PIB, que chegou a 0,35% em 1972, caiu firmemente, para 0,24% em 1980 e 0,07% em 1987. O colapso nos pagamentos por tecnologia importada reflete a quase total desvinculação da indústria brasileira em termos de uma importante fonte de conhecimentos para a sua competitividade internacional”. (Fleury, A; Fleury, M. T. L., 1995, p. 137). 11 Os esforços ou tentativas para “definir uma política industrial, entre 1985 e 1988, fracassaram por falta de respaldo político ou foram apenas parcialmente implementadas (como a Nova Política Industrial do governo Sarney, em 1988). Sobreviveram apenas algumas políticas e programas setoriais, tais como a Política Nacional de Informática, mal implementada (inclusive devido à falta de apoio dos ministros da área econômica) e fortemente contestada por interesses contrariados, e programas de investimentos em setores exportadores, geralmente com financiamento do BNDES” (SUZIGAN, 1996, p. 15).
50
Com a crise política e econômica do Estado12 declinaram os investimentos
públicos no sistema infra-estrutural (energia, transporte e telecomunicações). Por
outro lado, a crise impactou de forma também desfavorável os determinantes sociais
de competitividade, sobretudo na qualidade e na magnitude das variáveis relativas à
educação, à qualificação da mão-de-obra e aos padrões de vida dos trabalhadores e
de consumo da sociedade. Sob grande incerteza em face da ameaça recorrente de
hiperinflação e regressão do sistema de financiamento e desagregação do Estado, a
estrutura empresarial brasileira não pôde crescer e se concentrar em grandes
grupos privados. O estreitamento da fronteira de oportunidades de acumulação
produtiva de capitais direcionou as estratégias para objetivos rentistas e para a
busca de ganhos patrimoniais, relegando a segundo plano a inovação industrial e
tecnológica. Enquanto algumas economias do Leste Asiático (notadamente a Coréia
do Sul) puderam saltar para frente, constituindo grandes grupos econômicos com
crescente capacitação técnica e com afirmação de marcas mundiais, o sistema
privado brasileiro foi obrigado a marcar passo (COUTINHO, 1996).
A principal fragilidade da indústria brasileira revelou-se não exclusivamente na
defasagem em relação às novas máquinas e equipamentos, mas, sobretudo, na
ausência de eficiência dinâmica; em outras palavras, a deficiência estrutural de
capacitação e inovação tecnológica. Esse baixo grau de desenvolvimento e de
aquisição de potencialidade tecnológica refletia a inexpressividade do setor industrial
no que se refere ao lançamento de novos processos e produtos que impliquem
ganhos significativos de produtividade e competitividade. Isso resulta, notadamente,
de práticas empresariais conservadoras de organização e gestão do trabalho, que
não só não estimulam como inviabilizam a incorporação da força de trabalho no
processo de aprendizagem e inovação técnica.
Na visão oficial do Governo o Brasil, desde o início da década de noventa,
ocorre uma transição de paradigmas, mudando-se de um modelo empresarial
12 A crise econômica no início dos anos oitenta encerra uma época de extraordinário sucesso do processo de industrialização. A característica do ajuste nos anos oitenta é que ele foi promovido pela política econômica que: “1 – provocou queda do salário real; 2 – permitiu ao setor privado transferir para o Estado sua dívida externa; 3 – promoveu fortes desvalorizações cambiais; 4 – aceitou a subida das margens de lucro; 5 – elevou as taxas de juros. A crise financeira do Estado se dá por três razões básicas: 1 – pelos efeitos das desvalorizações cambiais sobre a dívida externa; 2 – pelas conseqüências da recessão e da aceleração da inflação sobre a arrecadação fiscal e sobre as receitas das empresas estatais; 3 – pelo impacto das altas taxas de juros sobre a dívida mobiliária e bancária. Outro elemento decisivo é o aumento do poder econômico da grande empresa frente ao Estado” (CARDOSO de MELLO, 1992, pp. 61-62).
51
familiar, comandado pelo Estado, de economia fechada, de baixa contestabilidade e
cultura inflacionária, para um modelo de economia internacionalizada, mais
“plugada” às correntes e tendências do livre comércio e aos fluxos tecnológicos
internacionais (MENDONÇA de BARROS; GOLDENSTEIN, 1997). A economia
brasileira, segundo alguns analistas, tem atravessado simultaneamente quatro
diferentes processos – abertura e internacionalização da economia, estabilização e
privatização, que vem provocando profundas transformações no seu funcionamento.
Por sua vez, o processo de privatização tira de cena, ou reduz muito, o papel de
uma das principais pernas do tripé, a empresa estatal. Essa ampla redefinição do
papel do Estado na economia, por meio da abertura comercial, da privatização das
empresas estatais e da desregulamentação de algumas atividades econômicas, vem
sendo conduzida sob a égide de reformas estruturais de inspiração neoliberal. Como
conseqüência, o modelo de desenvolvimento econômico e tecnológico tem sofrido
profundas mudanças. Um dos traços principais da estratégia de desenvolvimento
adotada no país foi a criação de empresas estatais, que tiveram a atribuição de
explorar recursos considerados prioritários, servindo para fornecer insumos básicos
ao setor privado. Nesse contexto, os órgãos públicos e as empresas estatais
tornaram-se os instrumentos efetivos da política industrial. O Estado, além de
assegurar a infra-estrutura básica, ocupava o papel empresarial nos segmentos da
indústria pesada e de alta tecnologia que o grande capital internacional não tinha
interesse e o nacional não tinha condições de se inserir em razão do alto custo de
entrada ou do risco de retorno dos investimentos. A base produtivo-tecnológica, ao
longo do processo de industrialização, fundou-se em investimentos de grande porte
e longo prazo e na aquisição de tecnologia estrangeira, exigindo participação ativa
do Estado na liderança no desenvolvimento econômico13.
13 Parece haver um certo consenso entre um conjunto de autores quanto ao papel desempenhado pelo empresariado diante do processo de industrialização brasileiro ou a ausência de articulação de coalizões industrializantes que alavancassem o processo de modernização nacional de forma dinâmica, tal como o visto em países retardatários bem-sucedidos. Nos estudos clássicos de Bresser Pereira, “Origens étnicas e sociais do empresário Paulista” (1964), de F.H. Cardoso, “Empresário industrial e desenvolvimento econômico” (1964), e de Eli Diniz, “Empresário, Estado e capitalismo no Brasil” (1978), os autores buscavam desvendar as razões que explicariam a fragilidade ou a aversão ao risco do empresário nacional e da burguesia industrial, ou, ainda, os fatores que inibiram a formação de uma força hegemônica capaz de conduzir o processo brasileiro de modernização econômica, técnico-produtiva e social. Nesses estudos observou-se que os empresários industriais no Brasil não chegaram alçar-se à posição de uma classe com ramificações e interesses econômicos e políticos em escala nacional. A rigor, os empresários indústriais avançadas (Esse trecho não faz sentido)– nas quais as camadas ou “elites” industrializantes se propunham mediante transformações radicais da estrutura econômica, mesmo do setor primário, a estabelecer um mercado nacional amplo
52
Nessa direção, é possível identificar um número significativo de experiências
bem-sucedidas em áreas específicas, demonstrando as potencialidades das
estratégias tecnológicas autônomas sob certas condições. Tais casos salientam
especialmente a importância da existência de segmentos industriais que,
percebendo as oportunidades apresentadas por investimentos em tecnologia como
fator de aumento de competitividade, desenvolveram estratégias comprometidas, a
longo prazo, com P&D e que foram efetivamente capazes de explorar mercados
“customizados”, em que as relações fonecedores/produtores/usuários são
fundamentais. Entre esses casos, investigaremos a experiência estatal na indústria
aeronáutica. O estudo sobre a indústria aeronáutica brasileira insere-se neste novo
cenário de dramática e rápida mudança, no qual as oportunidades de entrada ou a
própria sobrevivência para os segmentos de alta tecnologia são cada vez mais
restritas (Ibidem).
Na seqüência vamos demonstrar o nascimento da indústria aeronáutica no
Brasil, a importância da política desenvolvimentista e a reestruturação produtiva na
indústria aeronáutica através do aprendizado e inovação científica e tecnológica.
Com o nascimento e instalação da Embraer, cresceu a oferta de trabalho no
município de São José dos Campos, ocasionando assim uma transformação na
organização da população: o município tornou-se um dos maiores pólos industriais
do Estado.
1.4 – O DESENVOLVIMENTO DA INDÚSTRIA AERONÁUTICA NACIONAL A indústria aeronáutica caracteriza-se por ser um setor em que dispêndios em
P&D e os esforços em aquisição tecnológica são bastante elevados. O uso de
e integrado, faltou aos empresários a visão necessária, a consciência ou qualidade e atributos indispensáveis á ação transformadora, para liderar o avanço da industrialização e impor sua hegemonia política no processo de desenvolvimento econômico. Nesse sentido, os comentários de Sônia Draibe sobre este tema são bastante elucidativos e sintetizam de forma abrangente estas análises. Para a autora, “a industrialização não se fez sob o comando de um empresariado inovador, capaz de cumprir as tarefas impostas ao desenvolvimento do capitalismo em condições como as nossas. Mas também demonstraram que o processo de industrialização brasileiro esteve longe de se desenvolver a partir do desdobramento «natural» de uma estrutura industrial, que se teria diferenciado gradativamente sob os impactos dinâmicos de sucessivos estrangulamentos externos. Já na etapa de industrialização restringida o crescimento econômico requereu não somente uma forte coordenação estatal, mas também uma ação do Estado inclusive como empresário, capaz de estender e levar até os seus limites os horizontes estreitos do setor privado. A fase de industrialização restringida implicou um avanço significativo das forças produtivas e da divisão social do trabalho, avanço que certamente foi precondição para a industrialização pesada” ( DRAIBE, 1985).
53
produtos de alta densidade tecnológica, a manipulação de novos materiais,
equipamentos e máquinas de última geração, componentes aviônicos, engenharia
de sistemas, inovações de design e uma força de trabalho de altíssima qualificação
sugerem que países pobres em capital humano e em tecnologia devem enfrentar
grandes barreiras de entrada para a instalação e o desenvolvimento aeronáuticos
nacionais. O sucesso da Embraer no mercado internacional e a capacidade dessa
empresa para desenvolver projetos próprios não podem ser adequadamente
compreendidos sem serem considerados os esforços e investimentos em tecnologia
que o país (governos e alguns empresários privados) efetuou a partir dos anos trinta
(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, p.147).
Em toda a experiência histórica de formação da Indústria Aeronáutica
Brasileira (IAB), tal como o padrão histórico de instalação do sistema produtivo
industrial nacional, é patente o papel exercido pelo Estado no processo de evolução
tecnológica dessa indústria. Seja por meio do treinamento propiciado a engenheiros
brasileiros no exterior (em sua quase totalidade, oficiais das forças armadas
brasileiras)14, seja por meio de contratos de cessão de tecnologia com empresas
estrangeiras, seja por meio do fomento e manutenção de centros de P&D, ou ainda
convidando professores e técnicos estrangeiros, em todas essas formas o Estado
brasileiro buscava estimular o domínio da tecnologia aeronáutica. Contudo, os
esforços com tais objetivos não lograram apresentar grandes progressos
(BERNARDES, 2000, p.148).
Apesar de um brasileiro (Santos Dumont) ser considerado um dos pais da
invenção do avião, pelo projeto do 14 Bis, uma indústria aeronáutica nativa, no
Brasil, só iria surgir nos anos setenta. Entre as décadas de trinta e quarenta, no
entanto, houve algumas iniciativas de produção nacional sob licença e até alguns
projetos locais. Nesse período ocorre também crescente conscientização a respeito
do impacto estratégico das aeronaves no âmbito das Forças Armadas. Foram estas
Para (DAGNINO, 1987) “iniciativas fracassadas que conscientizaram os militares das
limitações e do despreparo industrial e tecnológico do Brasil em atender as
exigências da indústria moderna mundial, particularmente na questão da mão-de-
obra especializada”. No início dos anos cinqüenta, apesar dos esforços iniciados nas
14 O “primeiro engenheiro-aeronáutico brasileiro foi o coronel-aviador Raymundo Vasconcelos Aboim, que se graduou no Imperial College of Science and Technology (Londres) em 1924”. O M-6 havia sido projetado pelo major-aviador engenheiro Antonio Guedes Muniz, que fora formado em 1930 pela École Nationale Supérieure d´Aéronautique de Paris.
54
décadas anteriores, a IAB não passava de uma promessa, sendo a Fábrica do
Galeão a única unidade operacional em funcionamento dessa indústria. A explicação
para tal descompasso residiria na falta de vontade política coordenada e na
debilidade da infra-estrutura industrial/tecnológica (DAGNINO, 1987, p. 219). Por
sua vez, tal fracasso deveria ser associado à ausência de uma política industrial
explícita para a IAB, somente aplicada na década de setenta com o surgimento da
Embraer, que privilegiasse o setor de forma continuada levando tais
empreendimentos a ficarem à mercê dos interesses conjunturais. Todavia, a
experiência de manufatura e o aprendizado de engenharia acumulado por essas
iniciativas serão cruciais na fase de consolidação da indústria aeronáutica brasileira
(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, p.148).
1.4.1 – OS PRIMÓRDIOS DA INDÚSTRIA AERONÁUTICA BRASILEIRA A história da produção seriada de aviões no Brasil remonta à década de trinta.
Nesse período, foi projetado e produzido um número significativo de aviões de
pequeno porte, civis e militares. Em função dos limites do mercado interno, o
governo (por intermédio dos ministérios militares e de uma política de compras)
constituiu a única fonte de demanda capaz de viabilizar um empreendimento
aeronáutico no país.
A Companhia Nacional de Navegação Costeira, de propriedade do armador
Henrique Lage, foi a primeira empresa a produzir aviões em escala comercial, com o
incentivo do presidente Getúlio Vargas, em 1935. O projeto escolhido para a
produção foi o Muniz M-6. A concepção estrutural do M-6 serviu de inspiração ao
segundo projeto desenvolvido na fábrica de Henrique Lage: o M-7, um biplano de
treinamento, que se trasformou no primeiro avião a ser construído em série no
Brasil. Em 1940, Henrique Lage envolve-se na tarefa de projetar um monomotor de
asa alta tendo como modelo o protótipo EAY-201 Ypiranga, que havia sido
desenvolvido em São Paulo. Esse avião voaria pela primeira vez em 193515. Apesar
de terem sido construídos apenas cinco exemplares do Ypiranga, o seu projeto
inspirou o desenvolvimento de dois dos maiores sucessos da história da IAB: o HL-1
15 Esse avião foi resultado dos esforços de Orthon W. Hoover (piloto americano radicado no Brasil), Fritz Roesler e Henrique Santos Dumont, que organizaram a Empresa Aeronáutica Ypiranga em São Paulo em 1931 (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 2 apud BERNARDES, 2000, p. 148).
55
e o CAP-4 (o Paulistinha). Esses aviões foram construídos pela Companhia Nacional
de Navegação Área (CNNA), também organizada por Henrique Lage. Ressalve-se
que nenhum desses aviões apresentava condições de competição em preço ou
qualidade com os aviões norte-americanos, em especial o Fairchild PT-19, que
passou a ser importado em meio à Segunda Guerra Mundial. Com a morte de
Henrique Lage em 1942 e o início das montagens de aviões PT-19 (concorrente
direto dos aviões produzidos por Lage) na fábrica do Galeão, o grupo Lage encerra
suas atividades da divisão aeronáutica em 1948 (CABRAL; BRAGA, 1986 apud
BERNARDES, 2000, pp.149-150).
A Fábrica do Galeão é um episódio importante na história da IAB, antes da
criação do Ministério da Aeronáutica em 1941, mediante acordo entre o Exército e a
Marinha e a firma alemã Focke Wulf Flugzeugbau Gmb. Tendo em vista a resolução
dos problemas de manutenção dos aviões das forças armadas, a Marinha brasileira
compromete-se a construir os pavilhões industriais do Galeão e a Focke Wulf se
encarregaria de fornecer os equipamentos e o ferramental. Em 1939, embarca para
o Brasil um grupo de técnicos alemães, chefiado pelo engenheiro Friedrich Stein
para treinar os operários brasileiros. Os programas desenvolvidos na Fábrica do
Galeão foram muito valiosos para a formação de mão-de-obra especializada e para
a acumulação de um estoque de conhecimentos cruciais para a consolidação futura
da IAB. Os aviões que aí foram produzidos ou montados eram superiores
tecnologicamente aos fabricados pelo grupo Lage. Finda a guerra e terminado do
contrato com a Fairchild, a Fabrica do Galeão realizou esforços para o
desenvolvimento de outros projetos sem muito sucesso, tais como uma aeronave de
treinamento com base em modificações no modelo PT-19 ou desenvolvimento de
um helicóptero experimental, monoplace, que foi abandonado em 1953. A realização
mais importante do período foi a produção em série, entre 1952 a 1953, do Niess 1-
80, um monomotor, monoplano de asa alta, biplace lado a lado com duplo comando
(Ibidem).
As experiências do Grupo Lage e da Fábrica do Galeão, cujas origens
estiveram associadas às necessidades da aviação militar, não foram as únicas. Na
área da aviação civil existiram investimentos, dentre eles destacando-se a
Companhia Aeronáutica Paulista (CAP), criada em 1942 por Francisco Pignatari.
Nessa experiência, como notaram Cabral & Braga, “pela primeira vez no Brasil uma
empresa aeronáutica utilizou-se dos serviços de um centro de pesquisa e
56
desenvolvimento exógeno a sua estrutura: o Instituto de Pesquisas Tecnológicas
(IPT) da Universidade de São Paulo” (CABRAL; BRAGA, 1986, p.6 apud
BERNARDES, 2000, pp.150-151). O IPT será uma das peças importantes para a
criação da IAB. Este instituto nasce do Laboratório de Ensaio de Matérias da Escola
Politécnica da Universidade de São Paulo. Em 1934, o IPT transforma-se em
instituto independente, dedicado à prestação de serviços tecnológicos à indústria
nacional. Tais descobertas impulsionaram a formação de um grupo ativo de
pesquisadores voltados para as questões aeronáuticas dentro do IPT16. Por fim, em
1938 surge a Seção Aeronáutica, que desenvolveu uma série de projetos de
planadores e de aviões.
Na CAP – Companhia Aeronáutica Paulista, foram produzidos dois
planadores, um dos quais o Saracura, projetado pela equipe do IPT. O primeiro
avião da CAP foi o Planalto, um monomotor de treinamento, construído em madeira
nacional e que fora desenvolvido no IPT – onde recebera a sigla IPT-4. O maior
sucesso comercial da CAP foi o Paulistinha (CAP-4). Monomotor de asa delta e linha
clássica (como o HL-1 de Henrique Lage, ou o Pipper J-3 do Taylor Cub), o
Paulistinha abasteceu a FAB e os aeroclubes e ainda era exportado para Uruguai,
Paraguai, Argentina, Chile, Estados Unidos, Portugal e Itália. O sucesso do projeto
deveu-se não apenas às suas próprias qualidades, mas também ao
desencadeamento da Campanha Nacional de Aviação em 1941, lançada pelo
presidente Getúlio Vargas e apoiada pelos Diários Associados de Assis
Chateaubriand; transformar-se-ia num dos maiores sucessos comerciais da indústria
brasileira. Essa campanha, que visava a acelerar o processo de formação de pilotos
mediante a disseminação de aeronaves de treinamento pelos aeroclubes brasileiros,
forneceu a demanda necessária para a elevada cadência de produção da CAP-4.
Todavia, eventos originados pelo final da Segunda Guerra, desaceleração da
Campanha Nacional de Aviação e a retomada das importações de aviões civis
estimuladas pela crescente preferência por aviões de maior capacidade, em parte
motivados pela saturação de mercado para aviões tipo biplace, provocaram rápida
deterioração das condições de sobrevivência da empresa. Excetuando-se o CAP-9,
16 As pesquisas conduzidas nesse instituto eram dedicadas à identificação de madeiras nacionais apropriadas para a construção aeronáutica; dentre elas se destacava o freijó, que era importado em larga escala pelo Japão antes da Segunda Guerra Mundial para ser empregado na produção do caça Zero.
57
nenhum desses modelos apresentava condições de competitividade com os
similares importados na época (Ibidem).
Houve ainda duas experiências significativas que fracassaram. Uma diz
respeito à criação, em 1943, da Fábrica Nacional de Motores (FNM) na Baixada
Fluminense (RJ). A FNM, que ficou conhecida historicamente como fabricante de
caminhões, inicialmente foi idealizada com o intuito de produzir motores para
aviação. A história da FNM está relacionada ao projeto de desenvolvimento nacional
forjado durante o Estado Novo, no contexto da Segunda Guerra Mundial. As
empresas estatais eram consideradas peças-chave na estratégia do Estado
brasileiro de dotar o país de uma infra-estrutura industrial visando novas formas de
acumulação (RAMALHO, 1997, p. 159). A conjuntura histórica mundial foi decisiva
na criação da fábrica. Foi o próprio presidente Getúlio Vargas, por um processo de
negociação com as forças “aliadas” (especialmente com o governo norte-
americano), que conseguiu os recursos para a montagem da fábrica, tendo como
contrapartida o envolvimento direto do Brasil na guerra. A montagem de motores de
aviação asseguraria uma reserva de mercado estratégica de produção fora da
Europa e do Oriente. A escolha de localização da fábrica nos contrafortes da serra
de Petrópolis, no Estado do Rio de Janeiro, se deu por fatores políticos internos e a
segurança proporcionada pela geografia da região, que a deixava a salvo de
bombardeios aéreos inimigos (VALLE, 1983, p. 5). Problemas relacionados à
instalação do projeto (em particular, a questão do fornecimento das máquinas
importadas em meio à guerra) atrasaram o início de suas operações resultando no
abandono dos planos originais. Além disso, com o fim da guerra e a queda de
Vargas houve interrupção das atividades produtivas da FNM.
A outra experiência refere-se à Fábrica de Lagoa Santa, originada também do
entusiasmo de Getúlio Vargas com a primeira travessia comercial do Atlântico Sul
por um trimotor francês em 1933. Segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 9 apud
BERNARDES, 2000, p.152) “o projetista deste avião, o engenheiro René Couzinet,
foi convidado por Vargas a estabelecer as bases de uma indústria aeronáutica no
Brasil. Em 1935, Couzinet e uma comissão organizada pelo Ministério da Viação e
Obras Públicas escolheram Lagoa Santa a cerca de cinqüenta quilômetros de Belo
Horizonte como local para instalação da fábrica. A razão para tal escolha,
certamente inadequada do ponto de vista econômico, foi determinada por um
raciocínio estratégico: o desejo de manter a fábrica a salvo de ataques”. Ao erro
58
locacional somaram-se a morosidade da burocracia governamental e o desinteresse
de grupos privados nacionais e estrangeiros em particular pelo empreendimento. A
conjuração de problemas relativos à aquisição de equipamento, dificuldades
administrativas, ineficiência na burocracia estatal não familiarizada com os trâmites
legais para importação de peças acabaram por inviabilizar os cumprimentos dos
prazos estabelecidos com os contratos, tornando a empresa inviável. Contudo,
conforme demonstrado na Tabela 16, o balanço das experiências pioneiras exprime
como saldo um número significativo de aviões de pequeno porte, civis e militares
(CABRAL; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000, pp apud BERNARDES, 2000,
pp.152-153).
59
TABELA 16 – Aeronaves Construídas ou Montadas no Brasil na Fase Pré-Embraer
Período Modelo Produção Fabricante Protótipo
Henrique Lage e Muniz 1936 M-7 26 Fábrica Brasileira de Aviões 1
1937 M-9 40 Fábrica Brasileira de Aviões 1 1940-41 HL-1 108 Cia. Nacional de
Naveg.Aérea 1
1942-48 HL-6 60 Cia. Nacional de Naveg.Aérea
1
Grupo Pignatari 1942-43 CAP-1
Planalto 9 CAP 1
1945 CAP-3 8 CAP 1 1943-48 CAP-4 777 CAP 1 Neiva e Aerotec 1945-58 Neiva-B2* 20 Neiva 1 1952-56 Neiva-B1* 4 Neiva 1 1956-66 Paulistinha-
56 280 Neiva 1
1961-66 Regente 80 Neiva 1 1968-71 Regente-Elo 40 Neiva 1 1965-79 T-25 160 Neiva 1 1965-77 T-23 150 Aerotec 1 Fábrica do Galeão 1940-42 1 FG
2 FG 40 25
Fábrica do Galeão Fase alemã (Focke-Wulf)
1944-47 3 FG 220 Fábrica do Galeão
1947-53 5 FG 80 Fase americana (Faichild)
1953-59 Gloster Meteor TF-7 S-11(T-21) S-12 (T-22)
70 10 100 35
Fábrica do Galeão Fase holandesa Fase holandesa
Fonte: Dados reunidos por (Cabral; Braga 1986)
* Planadores
As empresas privadas e estatais surgidas nessa fase não desfrutaram dos
fatores estruturais que favoreciam o desenvolvimento do setor, em virtude das
limitações do mercado brasileiro; com isso o governo brasileiro constituía-se na
única fonte de demanda capaz de viabilizar um empreendimento de tal envergadura.
Segundo Bernardes (2000, pp.154-155) “dois traços marcantes dos primeiros vinte
60
anos da IAB: a) a falta de continuidade, ou seja, nenhuma das fábricas ou das
iniciativas privadas e estatais que surgiram no período sobreviveu até a fundação da
Embraer;
b) o caráter restrito do processo de desenvolvimento tecnológico do setor. Os
projetos nacionais que eram desenvolvidos até então dependeram de esforços
individuais, personificados na figura de alguns poucos nomes como Muniz,
Vandaele, Niess, etc”. Em linhas gerais, nas etapas críticas do processo de
aquisição de tecnologia, a experiência da IAB não era estruturalmente propícia à
disseminação dos conhecimentos necessários para um desenvolvimento tecnológico
alicerçado em uma dinâmica endógena.
1.4.2 –A CRIAÇÃO DO CTA E DO ITA O início do processo que culminará no surgimento da Embraer dá-se com a
criação do Centro Tecnológico de Aeronáutica (CTA) em 1945, por iniciativa do
tenente Coronel Casimiro Montenegro Filho, quatro anos após a criação da FAB –
Força Aérea Brasileira. O primeiro instituto do CTA foi a escola idealizada por
Montenegro: o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA)17. Após quatro anos de
operação em caráter provisório no Rio de Janeiro, na praia Vermelha, o ITA é
transferido definitivamente, em 1950, para São José dos Campos18. O instituto foi
viabilizado pela cooperação do MIT – Massachusetts Institute of Technology
(E.U.A.). A criação do CTA funcionou como um divisor de águas na história da IAB.
Com o CTA, o Estado demonstrava a sua intenção de viabilizar o surgimento e a
manutenção de uma massa crítica de cientistas devotados ao desenvolvimento e/ou
absorção da tecnologia aeronáutica (CABRAL & BRAGA, 1986 apud BERNARDES,
2000, p.155). O primeiro reitor do ITA foi Richard H. Smith, que era professor do MIT
e veio, a convite de Montenegro, organizar o instituto. Os vetores básicos que
caracterizavam o plano de Smith para o CTA previam uma estratégia de longo
17 Na verdade, a primeira inspiração para o ITA surgiu quando Montenegro visitou o Centro de Pesquisas de Wright Field, no ano de 1943 (LOPES, 1994). Montenegro faleceu em fevereiro de 2000. 18 No final dos anos cinqüenta, São José dos Campos, situada no interior de São Paulo, na região do Vale do Paraíba, era uma cidade de cerca de 25.000 habitantes, muito procurada pelas suas virtudes climáticas. Em menos de trinta anos, essa cidade está transformada em um dos pólos tecnológicos mais desenvolvidos do estado de São Paulo, com uma mudança do perfil local dos recursos humanos assim como na formação de uma estrutura produtiva altamente avançada composta por segmentos do setor bélico, aeroespacial e eletrônico.
61
prazo. A idéia-força do plano consistia na centralidade que o CTA ocuparia nas
atividades aeronáuticas desenvolvidas doravante no Brasil. Foram ainda criados
institutos associados, dedicados ao ensino de graduação e pós-graduação,
pesquisas, qualificação de fornecedores e atividades aeroespaciais. Embora o
enfoque central na formação dos estudantes do ITA fossem na área de projeto e
construção aeronáutica, poucos profissionais recém-formados poderiam alimentar
sonhos quanto ao uso de sua qualificação, uma vez que o segmento industrial
aeronáutico era incipiente, dirigido para a fabricação de aeronaves leves. A atitude
de poder fazer em pesquisa tecnológica com base científica implementada pelo ITA,
por pesquisadores treinados no MIT, foi responsável por alguns dos grandes
programas tecnológicos perseguidos ao longo das décadas de 60 e 70 (aeronáutica,
informática, microeletrônica e espacial) (CABRAL; BRAGA, 1986 apud
BERNARDES, 2000, p.155).
Ao fim da Segunda Guerra, é posto em marcha o processo de reconstrução
de uma nova ordem política e econômica mundial. O coronel Montenegro viu, nesse
momento, a oportunidade de atrair grandes pesquisadores do cenário científico para
o Brasil. A fama do engenheiro alemão Henrich Focke, um dos fundadores da fábrica
Focke Wulf de aviões, atraiu as atenções do coronel Montenegro, que prontamente
o convidou com sua equipe para dar o impulso inicial das atividades aeronáuticas no
CTA. Segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p.11 apud BERNARDES, 2000, p.155) “o
professor Focke impôs algumas condições para sua vinda ao Brasil – ele aceitaria o
convite, desde que lhe permitissem dar prosseguimento e fornecessem toda a infra-
estrutura necessária para o desenvolvimento do seu ambicioso projeto denominado
Heliconair, um avião de decolagem vertical. “A fama do professor Focke, a audácia
do projeto e a possibilidade de importar uma equipe completa de técnicos altamente
capacitados atraíram a atenção dos responsáveis pelo CTA. Em 1951, o coronel-
engenheiro Aldo Weber Vieira da Rosa entrou em contato com o professor Focke e
após uma visita deste às instalações do CTA foi acertada sua transferência (e de
sua equipe com cerca de vinte técnicos) para o Brasil. Em torno do projeto reuniu-se
uma equipe com cerca de quarenta integrantes (a equipe original dispunha de uma
série de técnicos brasileiros e estrangeiros radicados no país, tais como Joseph
Kovacs19), que trabalhou intensamente ao longo de 1952 e 1953”.
19 Como relatam Cabral; Braga (1986, p.11 apud BERNARDES, 2000, p. 155), “Kovacs era um projetista húngaro radicado no Brasil após a II Guerra. Antes de trabalhar como o grupo Focke,
62
Com efeito, o primeiro grande projeto foi também um grande fracasso. Em
1954, era posto em curso o ambicioso projeto do Convertiplano, um avião com hélice
de decolagem vertical como helicóptero e a trajetória de vôo na horizontal como de
um avião convencional. Ele deparou-se com a precariedade do parque
metalmecânico nacional e a própria complexidade do projeto; após dispêndios da
ordem de 7 a 8 milhões de dólares, seu desenvolvimento foi interrompido, em 1955.
Todavia, afora o seu fracasso, o projeto constitui-se num processo de aprendizado
inestimável para toda a equipe técnica envolvida, assim como para os avanços
tecnológicos dos programas aeronáuticos elaborados posteriormente. Em termos
práticos segundo (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 12 apud BERNARDES, 2000, p.156),
“o único resultado desse projeto foi o protótipo BF-1 – o Beija-flor, um helicóptero
biplace – desenvolvido por Hans Swoboda (um integrante da equipe Focke, que
permaneceu no Brasil) e que viria a ser testado em vôo já nos anos 60”. O Instituto
de Pesquisa e Desenvolvimento (IPD) foi criado em 1954, com a finalidade de
realização de pesquisas nas áreas fundamentais de aplicação aeronáutica (projeto
de aeronaves, eletrônica, materiais, ensaios em vôo e motores). O aprimoramento
de motores pulso-jato pelo Departamento de Motores do IPD foi uma das principais
atividades do CTA na segunda metade dos anos cinqüenta. Desse instituto viriam
posteriormente os que seriam os primeiros produtos da Embraer.
Um evento significativo nessa fase é a consolidação da sociedade
Construtora Aeronáutica Neiva Ltda., ocorrida na década de 1950, tendo-se tornado
a maior empresa privada do setor, instalada em Botucatu, no estado de São Paulo.
Com as compras efetuadas pelo governo, a Neiva seria capaz de expandir as suas
instalações e atrair os melhores técnicos do setor nos anos sessenta. Nessa década,
a Neiva desenvolveu alguns aviões que se consagram na história da aviação
nacional, como o Regente (a primeira aeronave inteiramente produzida de metal e
em escala no Brasil) e o Universal (um monoplano de treinamento avançado). A
Neiva, posteriormente, transferiria sua divisão de Projetos para São José dos
Campos, e tornar-se-ia um dos principais centros de P&D em aeronáutica no país.
Para (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 13 apud BERNARDES, 2000, p.157) “A
dependência quase total da Neiva em relação ao Ministério da Aeronáutica (para
Kovacs esteve no IPT e após a experiência frustrada do Convertiplano, trabalhou na Neiva (1961-73), transferindo-se para a Embraer em 1973. Kovacs é um dos projetistas mais férteis da história da indústria aeronáutica brasileira, tendo sido o principal responsável pelo projeto do T-25 Universal da Neiva e pela concepção do Tucano T-27 da Embraer”.
63
quem a quase totalidade de sua produção era vendida) acabaria, no entanto, por
determinar sua absorção pela Embraer em 1980” (CABRAL; BRAGA, 1986, p. 13).
Atualmente, a empresa (Indústria Aeronáutica S.A.) é uma subsidiária da Embraer
dedicada à produção de aviões leves da linha Piper.
Na segunda metade dos anos sessenta, o IPD concentrou esforços em um
projeto: um avião turboélice bimotor, denominado originalmente IPD-6504. Mais
precisamente, em 1965, o então ministro da Aeronáutica, brigadeiro Eduardo
Gomes, aprovou o início do projeto IPD-6504, referente ao desenvolvimento desse
avião, de asa baixa e trem de pouso escamoteável. O Departamento de Aeronaves
(PAR) do IPD era chefiado pelo então tenente-coronel-aviador Ozires Silva,
graduado pelo ITA em 1962. Posteriormente, Ozires Silva estará entre os
fundadores da Embraer e será o principal executivo da empresa por dezesseis anos
consecutivos. E, em 1967, com o objetivo de atuar como órgão de homologação e
certificação de todos os aviões nacionais e estrangeiros que voassem no território
nacional, é inaugurado o IFI – Instituto de Fomento e Coordenação Industrial.
Posteriormente, atuará também como órgão qualificador das empresas fornecedoras
da Embraer. O IFI tinha por missão institucional atuar como interface entre os
institutos do CTA e a indústria e como órgão de certificação – (CABRAL; BRAGA,
1986 apud BERNARDES, 2000, p.157).
Com o aparecimento do CTA, inaugura-se nova fase, com o delineamento de
uma política setorial de longo prazo para a formação de recursos humanos e as
atividades de P&D. Nesse quadro, os instrumentos de incentivos perderam sua
natureza conjuntural. Os engenheiros egressos do ITA viriam a dar conotação
claramente nacionalista aos debates sobre a questão tecnológica na IAB. As
soluções nacionalistas, no entanto, deparavam-se com a capacidade financeira
limitada dos empresários brasileiros ou com a aversão e desinteresse aos seus
riscos. De outro ângulo, as empresas privadas nacionais (Neiva, Aerotec, etc) eram
“prisioneiras” do dilema imposto pelo descompasso e assincronia das políticas
governamentais. Uma vez que o mercado interno de aeronaves leves não era
protegido contra produtores estrangeiros, essas empresas tinham no próprio
governo a única fonte de demanda com capacidade de alavancá-las
economicamente. No final dos anos sessenta, com a IAB ainda incipiente, já haviam
sido fabricadas 2.000 aeronaves (em sua quase totalidade, monomotores) e o país
contava com dois centros de pesquisa (o IPT e o IPD do CTA) nos quais projetos
64
aeronáuticos eram elaborados e onde havia uma escola de engenharia aeronáutica
(ITA) de excelente qualidade. A existência dessa infra-estrutura e científica e de um
estoque de recursos humanos, em grande medida concentrados no CTA, será fator
determinante para o sucesso futuro da Embraer (CABRAL; BRAGA,1986 apud
BERNARDES, 2000, p.158).
1.5 – EMBRAER: O NASCIMENTO Do mesmo modo que o CTA significou uma nova etapa na história da
indústria aeronáutica, a Embraer vai inaugurar o que podemos designar como a fase
moderna, como arranjo produtivo, econômico e comercial na fabricação de
aeronaves nacionais. Ozires Silva, que chefiava a equipe do PAR do IPD – sob o
comando técnico do francês Max Holste – havia convencido o Ministério da
Aeronáutica a autorizar uma alocação específica de recursos para o
desenvolvimento do IPD-6504. Segundo Ozires Silva, “o valor estimado do custo
deste projeto foi de US$ 70 milhões”. Os vários anos de estudos contínuos no
ITA/CTA (algo como três anos, da concepção à produção do protótipo desse projeto)
frutificaram no projeto do avião bimotor IPD-6504, batizado posteriormente como
BEM-110-Bandeirante, cujo primeiro protótipo voou em 36 de outubro de 1968. Vale
realçar que foi o próprio Ozires Silva quem conduziu o primeiro vôo do Bandeirante
até Brasília, quando o presidente Costa e Silva e alguns ministros de Estados
tiveram oportunidade de conhecer tal protótipo20. Nesse período o PAR-IPD também
desenvolveu outros dois projetos: um monomotor agrícola (o Ipanema) e um
planador de alto desempenho (o Urupema) (BERNARDES, 2000, p.159).
No final dos anos sessenta, o parque industrial brasileiro já havia
amadurecido razoavelmente. A indústria automobilística havia propiciado o
desenvolvimento de amplo e complexo parque de apoio, o que, ao menos em parte,
removia um dos obstáculos estruturais à produção doméstica para o fornecimento de
materiais e componentes para a produção de aeronaves. Nesse momento, tal
projeto passou a ser apoiado politicamente pelo regime militar, que interpretava ser
20 Conforme relata o próprio Ozires silva, em entrevista a Dagnimo, “este projeto além de contar com muita competência contou também com muita sorte, pois no retorno a São Paulo, logo após o vôo inaugural do Bandeirante, em Brasília, do qual o presidente Costa e Silva e seus acompanhantes haviam participado, o avião enfrentou uma pane elétrica que o fez navegar sem os instrumentos elétricos até a primeira escala em Minas Gerais”.
65
chegada à hora da instalação de uma fábrica pioneira que, entre outros projetos
futuros, se dedicaria à produção do Bandeirante. O passo seguinte foi desencadear
intenso trabalho de convencimento e mobilização da iniciativa privada com objetivo
de atrair investimentos para a realização de tal empreendimento. Segundo Ozires
Silva, “desde o início os objetivos e os esforços foram realizados para que a
empresa fosse de capital e gestão privados”. Os militares buscaram o apoio dos civis
ou mais precisamente do capital nacional privado para a realização de uma empresa
civil21 (DAGNINO, 1987, p. 221).
Diante do desinteresse e aversão ao risco do setor privado em injetar
recursos em uma empresa aeronáutica desse porte, sem garantia concreta de
investimentos governamentais, como última alternativa utilizou-se o argumento de
que somente o governo poderia viabilizar tal empreendimento.
Coube, então, ao brigadeiro Paulo Victor, na época diretor do CTA, pressionar
o governo federal para a tomada de decisão sobre o futuro do empreendimento.
Após uma seqüência de reuniões com vários ministros, sob a liderança do ministro
da Aeronáutica, foi elaborada a primeira minuta do decreto-lei de criação da
Empresa Brasileira de Aeronáutica, uma indústria nova, destinada à fabricação
seriada do Bandeirante. Como recorda Ozires Silva, “o ministro da Fazenda, Dr.
Delfim Netto, propôs uma dedução de até 3% nas taxas devidas ao Imposto de
Renda para todas as empresas que investissem na Embraer. Esse incentivo, afinal,
foi fixado em 1%. Na realidade, eu próprio não acreditava que depois de tanto
esforço o nosso velho sonho fosse, finalmente, se transformar em realidade. Ao
término da reunião, quando fui me despedir do ministro Delfim, este referiu-se a
minha pessoa: até logo, Santos Dumont!” (Ibidem).
A Embraer nasceu a 19 de agosto de 1969, como empresa de economia
mista na qual a União detinha, por exigência legal, pelo menos 51% do capital
votante, os quais deveriam ficar sob controle do governo por meio do Ministério da
21 A previsão inicial estimava que seriam necessários investimentos da ordem de US$50 milhões para o início das operações da Embraer. “As razões para tal desinteresse eram basicamente as seguintes: a) as principais empresas privadas existentes na época, a Neiva e a Aerotec (fundadas em São José dos Campos em 1962), encontravam-se envolvidas com seus próprios projetos (o universal T-25 no caso da Neiva e o uirapuru T-23 (um monomotor de treinamento básico) no caso da Aerotec, e não tinham nenhum incentivo para investir recursos em um projeto de alto risco; b) empresários externos à indústria aeronáutica encaravam com reservas o seu potencial econômico e guardavam na memória os fracassos de iniciativas anteriores (Muniz, Pignatari, Lagoa Santa, Fokker...); c) as condições de transferência de tecnologia não chegaram a ser explicitadas, tornando difícil a avaliação do retorno ou dos riscos dos investimentos” (CABRAL ;BRAGA, 1986, p. 15 apud BERNARDES,2000, p. 159).
66
Aeronáutica. Um arranjo de incentivo fiscal – pessoas jurídicas poderiam investir
anualmente até 1% do imposto de renda devido em ações da empresa sem direito a
voto, deduzindo tal quantia do pagamento de Imposto de Renda Pessoa Jurídica
(IRPJ) (Decreto-Lei nº 770.8/69), foi criado como forma de capitalizar a empresa
mediante investimentos privados. Com base nesse sistema de capitalização, a
demanda garantida pelo governo, que financiaria novos programas de P&D da
empresa e a qualidade de seus produtos, transformaria a Embraer no centro
dinâmico da IAB (Ibidem).
1.5.1 - POLÍTICAS DE DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO NOS ANOS SETENTA
É necessário não desconsiderar o ambiente econômico, o contexto político e
a ideologia nacionalista militar que governavam a estratégia de desenvolvimento do
país, e de certa forma influenciaram a criação e formação empresarial e tecnológica
da Embraer. Ozires Silva, em seu livro sobre a criação da Embraer, descreve muito
bem essa passagem: “Em 1969, o Presidente Costa e Silva, vítima de um enfarte,
viria a falecer lançando o país em uma crise institucional superada pelo triunvirato –
constituído pelos Ministros Militares, do Exército, da Aeronáutica e da Marinha, e os
quais assinaram os estatutos da empresa em novembro de 1969” (SILVA, 1985
apud BERNARDES, 2000, p.161).
Já no início da década de setenta, sob gestão do governo Médici, seria
implementado o I Plano Nacional de Desenvolvimento, correspondendo ao período
de 1972 a 1974. Esse plano priorizava como principais objetivos a serem
alcançados: incluir o Brasil, no espaço de uma geração, na categoria das nações
desenvolvidas; duplicar até 1980 a renda per capita, e, no período de vigência do
Plano, conquistar uma taxa de crescimento do PIB da ordem de 8 a 10%,
associando-a ao aumento da taxa de expansão do emprego, à redução da taxa de
inflação e uma política econômica internacional que acelerasse o desenvolvimento
econômico. Para a estratégia industrial, o I PND destacava como diretrizes
principais, além do fortalecimento do poder de competição da indústria nacional, o
fortalecimento da empresa privada nacional, equiparando as condições em que
operava às da empresa estrangeira, e a ampliação do papel da indústria como
instrumento de transformação tecnológica dos demais setores. A política científica e
tecnológica almejava o fortalecimento do poder de competição nacional em setores
67
prioritários, especialmente em indústrias de alta densidade tecnológica. O setor de
bens de capital seria altamente estratégico, pois funcionaria como instrumento de
difusão de novas tecnologias. Havia preocupação com a modernização das
indústrias tradicionais e a expansão das exportações de manufaturados e dos
produtos de alta densidade tecnológica22.
Para Tapia (1995, p. 35 apud BERNARDES, 2000, pp.161-162) “a utopia de o
Brasil vir ser a grande potência em meados do século XXI alimentava as
expectativas dos setores militares e integrava a conclusão de um argumento
geopolítico, cujas premissas se apoiavam em evidências geográficas e em alguns
indicadores significativos do perfil do país (espaço e posição)”. Os pressupostos
baseavam-se na dimensão do espaço geopolítico interno, a massa demográfica, os
recursos naturais e a posição geoestratégica do Brasil, que reforçava sua condição
de maior potência sul-americana, de primazia entre os países em desenvolvimento,
de maior produtor de armamentos do Terceiro Mundo e de oitava economia do
mundo ocidental. Mas, “O aspecto novo desse nacionalismo reside na importância
do desenvolvimento científico e tecnológico para a construção do Brasil-Potência. A
autonomia e a soberania nacionais dependem da criação de uma capacitação
interna em termos científicos e tecnológicos. Orientação esta, que já vinha desde o
governo Costa e Silva com o Programa Estratégico de Desenvolvimento (PED)”
(TAPIA, 1995, p. 35 apud BERNARDES, 2000, pp.161-162). Havia convergência
entre o nacionalismo militar enraizado na doutrina da Segurança Nacional e o das
elites civis – burocráticas e científicas – associado à idéia do desenvolvimento
científico e tecnológico como fator de soberania para a autonomia (TAPIA, 1995
apud BERNARDES, 2000, p.156).
Como resposta ou “ajuste face ao primeiro choque energético”, nos anos
1970, o governo Geisel (1974-1978) adotará ambicioso programa destinado a
completar a industrialização pesada e redirecionar a economia brasileira para as
exportações. Com a implementação do II PND – Plano Nacional de
Desenvolvimento, nos anos 1970, conhecido como o período do milagre
22 O programa de ciência e tecnologia previsto para o triênio 1972 a 1974 previa acelerar a ação do governo mediante a operação do sistema financeiro de apoio ao desenvolvimento tecnológico e a coordenação da atuação das principais instituições governamentais por meio de um primeiro Plano Básico de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (PBDCT); desenvolver áreas tecnológicas prioritárias (energia nuclear, pesquisa espacial, oceanografia, indústrias intensivas em tecnologia, tecnologia de infra-estrutura e pesquisa agrícola), fortalecimento da infra-estrutura tecnológica e a capacidade de inovação da empresa nacional, privada e pública; acelerar a transferência de tecnologia; e integrar indústria-pesquisa-universidade.
68
econômico23, ocorre nova experiência efetiva de planejamento do desenvolvimento
industrial no âmbito de um plano de investimentos. No governo Geisel foi arquitetado
um projeto de desenvolvimento ambicioso com o objetivo de inserir o país no grupo
das nações desenvolvidas. No II PND consubstanciou-se um projeto cujo núcleo
central estava integrado por duas diretrizes interligadas: a montagem de um novo
padrão de industrialização e o fortalecimento da empresa privada nacional (LESSA,
1978). Além disso, a ambição implícita e de longo prazo do II PND de fazer da
empresa nacional hegemônica no tripé (Estado, Capital estrangeiro, Capital
nacional) – uma recuperação com base em uma visão autoritária, de enunciados
estratégicos da década de 1950 – certamente reforçava as convergências entre
esses nacionalismos de vários matizes (TAPIA, 1995 apud BERNARDES, 2000,
p.161). Sob a égide do nacional-desenvolvimentismo, o II PND partia do pressuposto
da centralidade que a ciência e a tecnologia representavam para o progresso e a
modernização social e econômica do país24. Nesse quadro foram desenhadas as
diretrizes de PCT no II PND e no II PBDCT que abrangiam os setores de fronteira
tecnológica (nuclear, aeronáutico, etc), indústrias básicas de alto conteúdo
tecnológico (eletrônica e computadores) bens de capital, petroquímica e química,
telecomunicações, etc.25
23 O período compreendido entre 1967 e 1973, denominado de “milagre econômico brasileiro”, será caracterizado por um novo ciclo de expansão econômica, puxado pela indústria pesada e crescente importância do financiamento externo na economia. 24 Grande parte dos institutos de pesquisa e centros de P&D industrial de caráter público no Brasil foram instalados no período 1966-80 e, a partir de 1967, criou-se a maioria dos centros de pesquisa das empresas estatais. O período militar foi caracterizado pela edificação de um sistema de planejamento e desenvolvimento de instituições ou suportes institucionais direcionadas para a Ciência e a Tecnologia, uma vez que essas variáveis eram percebidas pelas forças armadas como elementos estratégicos para o poderio militar e para a segurança nacional. A ação governamental foi formalmente organizada na primeira metade dos anos 1970, em um Sistema Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico – SNDCT. Desde então foram, “elaborados três PNDs – Planos de Desenvolvimento, e dois PBDCTs – Programas de Desenvolvimento Científico e tecnológico”. “O principal mecanismo utilizado pelo PBDCTs era o de incentivos fiscais para as atividades de P&D elaborados pelas empresas individualmente. Parecia haver uma premissa implícita de que a criação de capacitação para a inovação seria uma decorrência natural de atividades executadas em laboratórios” (FLEURY ;FLEURY, 1995, p.126 apud BERNARDES, 2000). A política científica e tecnológica do país, desde o início, foi marcada por forte intervenção do Estado, tendo como característica o distanciamento do setor produtivo, e a formação de “coalizão de interesses entre cientistas e militares” (GUIMARÃRES, ARAÚJO Jr.; ERBER, 1985 apud BERNARDES 2000). 25 Nesse contexto, a política científica e tecnológica formulada pelo governo Geisel foi consubstanciada no II PBDCT, que previa uma ação governamental voltada para o apoio à engenharia de projeto nacional e às empresas de consultoria; incentivo à instalação de centros de pesquisa nas empresas de maior porte ou através da associação de empresários; e a difusão no sistema produtivo dos resultados das pesquisas realizadas por instituições governamentais. Nesse período, como salienta Erber (1990, p.34 apud BERNARDES, 2000), são adotadas medidas para gerar no país uma norma de inovação interna e setores motores do progresso técnico, sob controle nacional, com as experiências das indústrias de informática, equipamentos de telecomunicações,
69
É importante observar que o nacionalismo, que então nutria o II PND,
almejava conciliar o projeto político de Grande-Potência com uma sociedade
industrial moderna e socialmente justa e um maior grau de interdependência na
economia mundial (LESSA, 1978). O projeto “Brasil Potência” tornou-se também
conhecido como projeto de “construção da grande potência”, concebido pelos
militares ainda antes do golpe de 31 de março de 1964. Na visão militar, grande
potência é a configuração futura do Estado desejável, do Estado com capacidade
para conduzir qualquer guerra, em qualquer lugar, a qualquer momento e sob
quaisquer circunstâncias, para garantir interesses vitais do Brasil, no contexto das
relações internacionais. A partir do início da década de 1970, o conceito de grande
potência passou a ser considerado um dos principais vetores teóricos do
pensamento militar brasileiro (Ibidem).
1.6 – EMBRAER: SEGUNDA FASE: O DESENVOLVIMENTO Como demonstrado, a onipresença do Estado sob a orientação de uma
racionalidade estratégico-militar foi, sem dúvida, fundamental para a formação dos
fatores críticos de competitividade, mas, para o sucesso comercial e tecnológico, a
Embraer precisou voar além da posição confortável e segura do “céu de brigadeiro”
proporcionado pelas políticas de apoio governamentais ou do protecionismo de
mercado. Revelou-se imperativo para sua existência voar nas zonas turbulentas de
um mercado altamente competitivo, no qual a estratégia do plano de vôo se
materializou por uma coerente e consistente estratégia de capacitação tecnológica
pautada pela constante atualização e renovação técnico-produtiva, pelos
investimentos vigorosos em bens tangíveis e intangíveis, pela excelência na
formação dos seus funcionários, e, sobretudo, por não evitar em nenhum momento a
exposição à concorrência internacional. Conquistando e sustentando uma posição
armamentos, energia nuclear e aeronáutica. A política de inovação, segundo Erber, desdobrou-se em duas frentes – “de um lado, o Estado estruturava o setor de pós-graduação e pesquisa científica, dando-lhe nova dimensão e lançado os fundamentos dos serviços de tecnologia básica, de uso generalizado – normalização, metrologia (através do Conmetro – Conselho para Metrologia, Normalização e Controle e Qualidade), propriedade intelectual (reguladas pelo INPI – Instituto Nacional de Propriedade e Direito Industrial). De outro lado, fez uma política de fomento às atividades de inovações das empresas nacionais, através das empresas estatais – nelas montando centros de pesquisa e procurando combinar a política de compras com financiamentos à pesquisa e produção para capacitar tecnologicamente os fornecedores”. As políticas para os setores motores da inovação caracterizam-se pelo objetivo de buscar o controle nacional sobre a produção e a capacitação tecnológica.
70
de destaque no mercado mundial de fabricantes de aeronaves, a Embraer
assegurou as economias de escalas necessárias para sua sobrevivência. Segundo
Panhoca (1995, p. 137) “a evolução de seus produtos foi um processo de
aprendizado tecnológico, de capacitação industrial e dos recursos humanos. O
sucesso da Embraer é o resultado desse aprendizado e capacitação tecnológica”
A indústria aeronáutica brasileira superou grande parte dos obstáculos
descritos acima com a criação da empresa estatal Embraer, em 1969, mediante a
assinatura do Decreto-Lei nº 770, pelo presidente Artur da Costa e Silva.
Efetivamente, a Embraer iniciou as atividades fabris em janeiro de 1970, tendo à
frente como o seu primeiro superintendente geral o coronel Ozires Silva, que
exerceria essa função por mais quase duas décadas. A Embraer iniciou as
operações com um quadro efetivo de 150 funcionários (todos provenientes do CTA)
num terreno estimado em 700.000m². Os primeiros operários que viriam a trabalhar
na linha de produção seriam recrutados, posteriormente, nos estratos superiores da
indústria automobilística. O capital inicial que foi subscrito pela União Federal era da
ordem de CR$ 5 milhões (cerca de US$ 1 milhão).
Segundo Fleury (1989 apud BERNARDES, 2000, p.166) os propósitos e
diretrizes que norteariam a produção de aeronaves no Brasil, assim como a função
que essa estatal ocuparia no desenvolvimento industrial do setor, são bem
classificados na ata de fundação da empresa, na qual se sobressaíam como
objetivos:
1. “promover o desenvolvimento da indústria aeronáutica brasileira e atividades
correlatas; projetar, construir e comercializar aeronaves e respectivos
acessórios, componentes e equipamentos”;
2. “promover ou executar atividades técnicas vinculadas à produção e
manutenção do material aeronáutico, de acordo com programas e projetos
aprovados pelo Poder Executivos”;
3. “contribuir para a formação de pessoal técnico necessário à indústria
aeronáutica e preparação de operários qualificados, podendo, para isso,
organizar cursos, conceder auxílios a estabelecimentos de ensino do país,
bolsas de estudo e, ainda, assinar convênio com entidades públicas ou
privadas para a formação de técnicos especializados”.
Para a compreensão da estratégia tecnológica e empresarial adotada
pela empresa é necessário verificar seu status de autonomia no arcabouço político e
71
Instituições de Administração Direta
Fonte: Fleury (1989)
institucional do Estado desde a sua criação (ver Figura 3). Apesar de desfrutar de
elevado grau de autonomia no que tange a sua administração e no gerenciamento
interno de suas atividades operacionais, a Embraer era considerada uma instituição
de administração indireta vinculada diretamente ao Ministério da Aeronáutica. As
relações institucionais, de suporte e as atividades complementares entre a Embraer
e o CTA eram desenvolvidas pelo Ministério da Aeronáutica (FLEURY, 1989, p. 211
apud BERNARDES, 2000, p.168).
FIGURA 3 –Estrutura Organizacional do Ministério da Aeronáutica
O perfil dos principais
Funcionários do CTA que ajudaram a fundar a empresa nos propiciam uma
boa compreensão do grau de coesão e compromisso deste grupo de funcionários
MAER Ministério da Aeronáutica
Departamento de Pesquisa e Desenvolvimento
CTA Centro Tecnológico
Aeroespacial
IFI Instituto de Fomento
Industrial
IPD Instituto para Pesquisa
e Desenvolvimento
ITA Instituto de Tecnologia
Aeronáutica
INPE Instituto de Pesquisa
Espaciais
EMBRAER
Instituições de Administração Indireta
72
com o desenvolvimento dessa indústria. Esse perfil foi traçado em um estudo
realizado por (SBRAGIA; TERRA, 1989 apud BERNARDES, 2000, p.168). Segundo
Sbragia & Terra, este grupo oriundo do CTA era bastante jovem; na época, o mais
velho tinha 37 anos, mas eram pessoas com elevada capacidade técnica. Dos 35
engenheiros transferidos do CTA para Embraer, 33 ainda estavam na empresa em
1990, e muitos se tornaram diretores. “A Embraer foi fundada por companheiros de
escola, com alguma experiência trabalhando no CTA e alguns estágios realizados
no exterior (todos os diretores da Embraer fizeram estágios ou cursos no exterior)”
(SBRAGIA; TERRA, 1989, p. 29 apud BERNARDES, 2000, p.168).
Esses dirigentes que iniciaram a empresa e ficaram nela até antes da sua
privatização em 1994, como Ozires Silva e Ozílio Silva, dentre outros, “foram
pessoas que tiveram, então, a oportunidade de crescer junto com a empresa e
interagir no início, com profissionais estrangeiros altamente qualificados. A
criatividade, a coragem de inovar e a capacidade de auto-aprendizado, portanto,
podem ser destacadas como características importantes desse grupo de pessoas”
(Ibidem). Com relação a esse grupo podemos acentuar sua coesão. “A confiança
mútua e a informalidade nas relações pessoais sempre foram características desta
equipe” (SBRAGIA; TERRA, 1989, p. 290 apud BERNARDES, 2000, p.168).
A Embraer desde o início de suas operações dedicou-se ao projeto e
fabricação de produtos simples e adaptados às necessidades e condições do país.
Os primeiros produtos fabricados pela empresa foram justamente os desenvolvidos
pelo IPD do CTA, ou seja, o EMB-110 Bandeirantes (IP-6404), o planador Urupema
(EMB-400), o EMB-201 Ipanema (IPD-6909) e o EMB-326 Xavante. A estratégia
impediu que a empresa internalizasse os altos custos de desenvolvimento, uma vez
que todos eles foram integralmente desenvolvidos no CTA e, no caso da BEM-326,
na empresa italiana Aermacchi.
Com razoável sucesso, a empresa evoluiu gradualmente, pela escolha
tecnológica adotada baseada na geração de uma capacitação técnico-produtiva,
pela oferta de mão-de-obra fornecida pelo ITA26, pelo suporte irrestrito da ação
26 Como já notamos, a única escola de engenharia plena do Brasil é o Instituto Tecnológico de Aeronátuica – ITA. O ITA gradua também engenheiros-mecânicos-aeronáuticos, eletrônicos, de infra-estrutura aeronáutica e de computação. Desde 1950, mais de 8 mil engenheiros foram aí graduados. A pós-graduação, com a realização de cursos formais de mestrado e doutorado, foi organizada a partir de 1968, e no Inpe – Instituto Nacional de Pesquisa Espaciais, a partir de 1968. Esses institutos, com sede em São José dos Campos, desenvolvem trabalhos em diferentes áreas de especialização do setor aeroespacial. O ITA dispõe de programas de pós-graduação em Engenharia
73
governamental, pela relativa liberdade de ação dos executivos da empresa na
gestão dos negócios, e, em parte, pela forma como se desenvolveu, na época, a
demanda por aviões da Embraer (Ibidem).
1.6.1– A PRESENÇA DO ESTADO Desde sua fundação, a Embraer, ao longo de sua história, desfrutou de um
conjunto amplo e irrestrito de benefícios, isenções fiscais e tributárias, reserva de
mercado, encomendas governamentais, aliado ao inconteste apoio político
orquestrado ao empreendimento, até então inédito, de política industrial e
tecnológica no Brasil (PAULA, 1991 apud BERNARDES, 2000, p.170). O governo
concedeu um amplo terreno de 1.150.000m², em São José dos Campos (região
situada no Vale do Paraíba a oitenta quilômetros do município de São Paulo),
situado próximo ao quilômetro 146 da via Dutra, estrategicamente localizado ao lado
das instalações do CTA, assim como prédio, equipamentos, máquinas, pessoal
técnico e administrativo do IPD e os projetos desenvolvidos por esses institutos sem
ônus algum para a empresa. Suas instalações foram interligadas a um aeroporto,
que serve como pista de teste, vôos e preparação dos aviões para entrega. Segundo
Dagnino (1987, p. 222) “isto significou a continuidade, dentro da Embraer das
equipes de projeto, e da política dos militares, que haviam se envolvido com esta
indústria desde os anos 50 [...] assegurando um alto grau de coesão e coordenação
de todos os escalões superiores de administração e engenharia, assim como o
compromisso com os ideais de construção de uma indústria aeronáutica nacional”.
Assim sendo, a empresa pôde assumir de imediato a capacitação técnica necessária
na fase de projeto27.
Aeronáutica e Mecânica, eletrônica e Computação, infra-Estrutura Aeroespacial, engenharia e Organização Industrial e Física, além de cursos de extensão. O Inpe foi criado em 1961. É um instituto de pesquisa federal subordinado ao Ministério da Ciência e Tecnologia – MCT, que tem como objetivo realizar pesquisas e desenvolvimentos nas áreas de Ciências Espaciais e da Atmosfera e Aplicações Espaciais; as atividades concentram-se em satélites e seus sub-sistemas, incluindo integração testes, rastreio e controle. O Inpe possui cursos de pós-graduação em Meteorologia, Sensoriamento Remoto, Engenharia e Tecnologia Espaciais, Computação Aplicada, Geofísica Espacial e Astrofísica. 27 Após a criação da empresa, houve um processo de distanciamento entre a Embraer e o CTA, quanto a investimentos em P&D (pesquisa básica e pura e aplicada), pois os projetos posteriores de tecnologia avançada foram realizados sem participação dos institutos de pesquisa. “Entre os motivos que levaram a esse distanciamento podem ser associados a forma como se deu a transferência da tecnologia desenvolvida pelo IPD para a Embraer, que provocou um esvaziamento do instituto, tornando-o incapaz de desenvolver outros projetos. O governo passou a investir diretamente na
74
Em janeiro de 1970, foi promulgada a Lei nº 7.714, que permitia a dedução
de um por cento do Imposto de Renda de qualquer empresa sediada no país desde
que adquirissem ações da Embraer28. Esse engenhoso arranjo fiscal, arquitetado
pelo coronel Ozires Silva e pelo presidente Costa e Silva para a resolução do
problema de capitalização da empresa29, permitiu que desde a fundação até o ano
de 1985 a empresa captasse cerca de 500 milhões de dólares (DAGNINO, 1993, p.
51). Essa lei de incentivo, fundamental na fase inicial da empresa, foi extinta em
29/12/1988, portanto, vigorou por dezoito anos. Sem dúvida, a extinção do incentivo
contribuirá para a crise financeira que se abaterá posteriormente sobre a empresa.
Já no primeiro ano de vida da Embraer, em 1970, o governo, por intermédio
do Ministério da Aeronáutica, utilizou seu poder de compra encomendando oitenta
Bandeirantes e planejou a produção, sob licença, de 112 Xavantes (Aermachi 326).
Em seguida, o Ministério da Agricultura fez um pedido de cinqüenta aviões leves.
Essas encomendas correspondiam a aproximadamente oito anos de produção da
Embraer, a uma cadência de produção de duas unidades por mês. Essa encomenda
inicial correspondia, em valores de 1993, a US$ 600 milhões. O mercado inicial da
Embraer foi o mercado doméstico garantido pela política governamental. O uso do
poder de compra, especialmente nos cinco primeiros anos de existência da
empresa, revelou-se uma das grandes contribuições, quando a necessidade de
capital era intensa e o mercado interno era suprido pelas importações. Vale lembrar
que até a primeira metade da década de setenta o Brasil era um dos maiores
importadores de aeronaves americanas pequenas (monomotores e bimotores de até
dez lugares) (BECKER, 1986).
Em 31 de dezembro de 1974, pelo Decreto-Lei nº 1.386, a Embraer foi
isentada da tributação do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI),
contemplando produtos aeronáuticos saídos de estabelecimento industrial
homologado pelo Ministério da Aeronáutica, bem como aparelhos e instrumentos
destinados a emprego em aeronaves, equipamento de segurança de vôo e
empresa, no desenvolvimento de aeronaves e capacitação da empresa passaram a ser custeados pelo Ministério da Aeronáutica. Com isso, o ITA passou a ser mero fornecedor de engenheiros, não havendo mais nenhum acordo para pesquisas relacionadas a área de construção de aviões” (BECKER, 1986, p. 49). 28 Foi então encetada uma grande campanha para estimular os empresários a comprar ações da empresa sob o slogan: “um país que voa vai longe: aplique 1% de seu imposto de renda na compra das ações da Embraer” (LOPES, 1994, p.165). 29 Pelo menos 95% do capital da Embraer era na época possuído por mais de 200.000 empresas. Até então nenhum outro setor da indústria tinha se beneficiado de um incentivo dessa magnitude.
75
treinamento e, ainda, máquinas, equipamentos, ferramentas e gabaritos utilizados
pela indústria aeronáutica. Assegurou-se, de outra parte, manutenção e utilização do
crédito de IPI sobre insumos. Fixou-se em 10% a alíquota do IPI sobre aeronaves
em geral. Posteriormente, em 1976, a empresa foi beneficiada com isenções do
Imposto sobre Circulação de Mercadorias (ICM). Conforme Dagnino (1987, p. 223)
“estes subsídios eram bastante consideráveis, pois representavam quase 2/3 do
preço de venda dos produtos como automóveis, por exemplo”.
A solução fiscal, na realidade, retirou as restrições de ordem tributária que
impediam a existência da atividade da indústria aeronáutica no país, haja vista a
importância não somente do mercado, mas também do domínio tecnológico
vinculado a esse segmento da produção; os concorrentes, sediados no exterior,
atuavam em condições reconhecidamente mais favoráveis, amparados de diferentes
formas para promover o desenvolvimento de produtos, o que lhes permitia ofertar
diferentes tipos de aeronaves e equipamentos de preços altamente competitivos,
contando ainda com o esforço de eficientes e diversificados esquemas de
financiamento. Isso a despeito do entendimento de que o Decreto-Lei nº 1.386/74
continua atualmente a beneficiar a indústria aeronáutica nacional.
Em 1975, mediante o Decreto 76.590, de 12 de novembro, foi estabelecido
o Sistema Integrado de Transportes Aéreos Regionais (Sitar). Esse decreto dividiu o
país em cinco regiões distintas, cada uma a ser operada por uma empresa de
transporte aéreo, criada especialmente para servir a área que lhe fosse destinada.
Segundo Dagnino (1987, p. 223) o objetivo da criação dos Sitars foi servir
localidades com razoável, porém não suficientemente grande, número de
passageiros para demandas de aeronaves modernas e maiores, por isso mesmo
abandonadas pelas empresas que operavam as linhas-tronco, e atender ao novo
mercado proveniente do crescimento econômico de algumas cidades, criando dessa
maneira um tráfego regular. Surgiram assim quatro empresas:
- “Taba (Transporte aéreo da Bacia Amazônica S.A.), responsável pela
operação de transporte na região Norte-Oeste, Acre, Amazônica, Pará, Mato
Grosso, Roraima, Rondônia”;
- “Nordeste (Linhas aéreas Regionais S.A.), operando na região Nordeste-
Leste: Piauí, Ceará, rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco, Maranhão, Espírito
Santo, estabelecendo conexões com o Rio de Janeiro, São Paulo e Brasília”;
76
- “TAM (Transportes Aéreos Regionais S.A.), operando na região Centro-
Oeste: parte dos estados de São Paulo, Mato Grosso com conexões para o Paraná
e o Rio de Janeiro”;
- “Rio-Sul (Serviços aéreos Regionais S.A.), operando na região Sul, Rio
Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná, Rio de Janeiro, São Paulo e Espírito Santo”.
O papel do governo nessa área foi crucial, pois é o Departamento de
Aviação Civil que ratifica a aquisição de equipamentos, além de controlar as rotas e
tarifas. No caso, foram concedidas às empresas linhas de financiamento para
aquisição das aeronaves Bandeirantes que se adaptavam perfeitamente a esse tipo
de transporte. Como resultado dessas medidas, as empresas adquiriram 52
aeronaves (DAGNINO, 1993, p.51). Outras políticas destinadas ao setor foram,
segundo Dagnino (1993, p.51): direção de recursos governamentais por intermédio
das agências de fomento à pesquisa e ao desenvolvimento industrial, mediante a
compra de ações da empresa; a virtual reserva de mercado estabelecida para os
produtos de emprego não estritamente militar; créditos e subsídios especiais à
exportação; empréstimos liberados em condições favoráveis pelo governo; forte
apoio da diplomacia brasileira à exportação de aeronaves de emprego militar;
celebração de associações estratégicas com parceiros externos, que se revelaram
fundamentais para o desenvolvimento da empresa. Em 1987, na gestão do
presidente Sarney, o primeiro governo civil eleito após o golpe militar de 1964, houve
concessão de 100 milhões de dólares provenientes do fundo Nacional de
Desenvolvimento Social, para o programa de desenvolvimento do caça a jato AMX
(DAGNINO, 1987, p. 353). Neste período o mercado civil de aeronaves respondia,
por 59% do faturamento da empresa, e a área militar por 41% das vendas.
Para Dagnino, presenciou-se no setor uma sincronia sem paralelo na
experiência de instalação e desenvolvimento industrial no país, entre a política
científica e tecnológica explícita, visando ao estabelecimento de mecanismos de
fomento à capacitação tecnológica, e políticas implícitas que as potencializavam.
Chamava a atenção para o grau de sintonia identificado no setor que não havia
“nem mesmo ocorrido em setores, como das telecomunicações, da informática e do
petróleo, onde se materializavam o que pode ser caracterizado como ‘subsistemas’
que levaram à implementação, de forma atípica em relação ao conjunto do sistema
de desenvolvimento científico e tecnológico nacional, de políticas de capacitação
77
tecnológica convergentes com as políticas mais abrangentes adotadas no campo
econômico e industrial (DAGNINO, 1993, p. 52).
1.6.2 - DESENVOLVIMENTO TECNOLÓGICO O processo inicial de transferência e aquisição de tecnologia pela Embraer
deu-se de forma excepcional e inédita na história da indústria nacional; além da
absorção de toda a tecnologia desenvolvida pelo IPD nos projetos das aeronaves
(Bandeirantes, Urupema e Ipanema), houve a cessão de todo o corpo técnico,
pessoal de administração e de quase a totalidade de sua Divisão de Aeronaves e
parcelas menores de outras divisões do Instituto, proporcionando à nova empresa a
imediata capacidade técnica e organizacional na fase de projeto, permitindo que
assumisse de pronto sua posição como organização produtiva e pudesse queimar
etapas como centro de consolidação da indústria aeronáutica nacional. A Embraer
passou a atrair a mão-de-obra com as melhores qualificações disponíveis no
mercado (CTA, IPT e empresas privadas), em virtude das condições e das
perspectivas favoráveis de trabalho e remuneração oferecidas pela empresa30.
Para compreender melhor a estratégia tecnológica eleita pela Embraer, vale
retroceder um pouco na história e lembrar a experiência das corporações
transnacionais do ramo automobilístico, que se instalaram no Brasil no final dos anos
cinqüenta, no governo de Juscelino Kubitschek (JK); elas controlaram e se
ocuparam do nível mais elevado da atividade produtiva industrial, a montagem
final31. Tal estratégia permitiu que as montadoras fossem capazes de controlar
plenamente o desenvolvimento do complexo produtivo e, assim, dirigir a cadeia de
fornecedores em toda a sua extensão. Essas lições foram bem apreendidas pelos
militares que almejam a soberania tecnológica e administrativa da indústria
aeronáutica. Nessa perspectiva, a Embraer foi então concebida como uma
montadora final, que se dedicaria exclusivamente à montagem de aeronaves. Para
não verticalizar desnecessariamente a produção de componentes e onerar a
30 Ressalte-se que a aquisição pela Embraer do que “havia de importante no IPD em termo de fonte de conhecimento tecnológico gerou como conseqüência o total esvaziamento deste instituto. Praticamente, duas décadas transcorreriam entre o término dos projetos desenvolvidos nos anos sessenta e o início de uma nova pesquisa de conteúdo tecnológico significativo no IPD: o desenvolvimento de uma aeronave não-tripulada (a Acauã)” (CABRAL ; BRAGA, 1986 apud BERNARDES, 2000p. 172). 31 Os detalhes de todo o processo de instalação da indústria automobilística estão bem documentadas em ARBIX; ZILBOVICIUS, (1997).
78
estrutura de custos da Embraer, decidiu-se que o fornecimento de componentes
seria efetuado por outras empresas nacionais ou estrangeiras. A Embraer foi
concebida como uma estatal e como uma montadora final, que se dedicaria
exclusivamente á montagem de aviões pela materialização de um projeto
aeronáutico endogenamente concebido, tendo assim condições de determinar com
autonomia, em função da posição que ocupava e da estratégia de capacitação
tecnológica que adotou, o desenvolvimento do setor (DAGNINO, 1987, p. 224).
Uma analogia entre a indústria automobilística e a indústria aeronáutica
brasileira, no início dos anos setenta, pode ajudar a entender as discrepâncias
produtivas que as separavam. Enquanto as montadoras de automóveis produziam
cerca de 12.000 ou mais unidades a cada trinta dias, a cadência de produção da
Embraer era de quatro aeronaves por mês. Na produção de automóveis um
empregado trabalha em média cerca de vinte segundos por veículo produzido;
enquanto isso, na linha do Bandeirante (considerando a produção de quatro
unidades no mês), o tempo de trabalho é de quarenta horas por avião fabricado
(SILVA, 1985 apud BERNARDES, 2000, p.175).
A Embraer centrou seus esforços nas tecnologias-chave que determinam o
avião como produto final, renunciando aos sonhos dos anos trinta e quarenta de
construir um avião, com motores, componentes, peças e aviônicos totalmente
nacionalizados. A empresa estrategicamente privilegiou o domínio e a capacitação
tecnológica nas áreas de aerodinâmica, fuselagem e integração de projeto. Os
esforços foram dirigidos para a capacitação na área de projetos de aviões e na
integração do mix de componentes que não tinham condições de serem fabricados
pela Embraer, por inúmeras razões–escala, mercado, confiabilidade, tecnologia, etc.
A conquista de competência e capacitação na área de fuselagem da aeronave foi
considerada estratégica para o futuro competitivo da empresa.
A competência no projeto da fuselagem “era a única área-chave na qual o
conhecimento necessário não poderia ser obtido satisfatoriamente fora das fronteiras
brasileiras”. Esta era uma condição essencial para a definição autônoma do seu
produto e afirmação da empresa como montadora final de aeronaves. Conforme a
experiência demonstrará, tal enfoque provou-se indispensável ao controle e à
autonomia da indústria aeronáutica e da correspondente tecnologia, capacitando a
Embraer a gerir seu próprio negócio, e a criar as oportunidades de mercado.
Segundo Dagnino (1987, p.225) “ela foi mais importante para o sucesso comercial
79
dos aviões da empresa do que o controle sobre as mais sofisticadas e numerosas
tecnologias que a produção de uma aeronave requer e dos outros militares de itens
que a compõem”.
Desde o início a Embraer tem investido na qualificação de seus recursos de
engenharia em aerodinâmica, estruturas, projeto, fabricação e integração de
componentes através de uma sólida competência na área de engenharia de
sistemas (entendida basicamente com a capacidade de combinar e integrar
componentes aviônicos, peças, sistemas eletroeletrônicos, mecânicos, materiais e
softwares de distintas procedências com a fuselagem fabricada localmente).
Saliente-se, tendo em vista as características de alta densidade tecnologia do setor,
que a autonomia tecnológica não é traduzida necessariamente na intensidade da
nacionalização das peças e componentes utilizados na produção de uma aeronave.
Na estratégia delineada para essa empresa, o controle de tecnologia por meio da
capacidade de integração de sistemas foi interpretado como uma meta mais crucial
que o aumento do índice de nacionalização 32.
A percepção singular sobre o conceito de produção, isto é, a noção de que
algumas tecnologias reproduzem pequenas variantes ou avanços tecnológicos
cumulativos e incrementais (“filhotes tecnológicos”) constitui-se como uma estratégia
vital e prioritária para a Embraer. Para Bernardes (2000, p. 176) “essa consciência
permitiu que a empresa identificasse dois tipos de “tecnologias-chave”, que deveria
atentar cada vez galgado um degrau da escada tecnológica”. São as que
apresentam um futuro promissor, como por exemplo, os novos materiais, cujo
potencial tecnológico e comercial é altamente estratégico. E, de outro lado, as
tecnologias que apresentam baixo nível de complexidade, mas que são essenciais,
pois asseguram a liberdade de ajuste na fabricação de demandas específicas de
projeto, de modo que permita a concepção autônoma de projetos (Ibidem).
Por outro lado, a descoberta das vantagens existentes no desenvolvimento
de versões derivadas de modelos básicos, provenientes de custos mais reduzidos e
rapidez no ciclo de produção, acabou por conduzir a Embraer a adotar o conceito de
32 Se as autoridades do setor aeronáutico tivessem perseguido a “miragem do índice de nacionalização, nos anos noventa ela poderia ter chegado próximo aos 50%, mas este fator teria implicado na adoção de uma estratégia tecnológica completamente diferente. Os custos seriam talvez até mesmo proibitivos e o tempo de entrada no mercado seguramente maior, pois tal estratégia implicaria a reprodução de todo o ciclo de desenvolvimento dos países centrais. Basta lembrar, por exemplo, que o número de pauses que fabricam motores aeronáuticos com tecnologia própria não é superior a cinco” (DAGNINO, 1993, p. 59).
80
“família” usado tanto pela Boeing como pela Airbus em suas linhas de grandes jatos
comerciais. A “família” oferece a vantagem de comunalidade entre os aviões, o que
significa menor custo de infra-estrutura de manutenção, menores custos de
treinamento de pilotos e pessoal técnico. Ou seja, menores custos e mais rápida
disponibilidade dos aviões operadores. Além de reduzir o tempo nas decisões de
marketing, permitindo ao fabricante entrar com o seu produto no mercado em menor
espaço de tempo, cerca de dois ou três anos, metade dos cinco ou seis que leva
normalmente um projeto novo. Esse conceito foi aplicado no desenvolvimento de
vários aviões como no caso do Bandeirante, do Xingu, do Brasília, do CBA-123 e do
ERJ-145.
Segundo Dagnino (1987, p.238) “esses três enfoques – o conceito de
“família”, que permite a vantagem da comunalidade, associado às trajetórias de
cumulatividade no aprendizado organizacional e tecnológico de alta complexidade33;
o que permite identificar as tecnologias-chave críticas que permitem seu
aperfeiçoamento e sua apropriação; e a estratégia de investimentos vigorosos na
capacitação dos recursos humanos se cristalizaram na coluna central na busca pela
autonomia tecnológica pela Embraer”.
O processo de aprendizagem e formação da capacitação tecnológica é
especialmente estratégico para os países e empresas que pretendam competir nos
mercados avançados, tratando-se de uma questão de alcançar os concorrentes,
além de manter-se competitivo. Por sua vez, fazem uma distinção importante entre a
capacitação produtiva e a capacitação tecnológica de uma empresa. Segundo
Fleury; Fleury (1995 apud BERNARDES, 2000, p.179) “a capacitação produtiva
estaria relacionada à capacidade de implementar os componentes de um dado
33 É importante mencionar que a concepção de aprendizado está relacionada a um “fenômeno social pelo qual os indivíduos, a partir de capacitações acumuladas e ao interagirem em um contexto institucional específico, atuam de modo a gerar novas idéias, habilidades, conhecimentos e artefatos” e sustenta que as atividades inovativas são o resultado de vários processos de aprendizado. Esses processos de aprendizado se caracterizam por elevada incerteza quanto aos seus resultados” (PONDÉ, 1993). Os trabalhos de Nelson; Winters (1977 e 1982) evidenciaram que no uso e nas aplicações de tecnologia, existe em maior ou menor grau um conteúdo de conhecimentos tácitos e específicos (“idiossincráticos”), cuja transmissão e compartilhamento não se materializarão por meio de uma linguagem formal e codificada por manuais, pois estão intimamente incorporados às pessoas ou às rotinas de operação da firma, e, portanto, não podem ser inteiramente difundidos, tanto sob a forma de informação pública quanto de propriedade privada. Exigindo também relações interpessoais duradouras, acumulação de experiências compartilhadas e aquisição de capacitações pela demonstração efetiva” e pela abrangência e complexidade das capacitações necessárias à geração de novos produtos e processos. Um dos condicionantes da intensidade e da eficácia do aprendizado e das atividades inovadoras está nas suas relações sociais estabelecidas entre os agentes direta ou indiretamente responsáveis por sua geração. Em outras palavras, “a conduta interativa de vários agentes é responsável pelos processos de aprendizado e inovação” (PONDÉ, 1993, p. 72).
81
sistema de produção, ao passo que a capacidade tecnológica envolveria os recursos
necessários para gerar e gerenciar a mudança técnica”.
Diante das definições apresentadas, a Embraer configura-se como empresa
que vem delineando uma trajetória dinâmica quanto aos processos de capacitação e
inovação tecnológica. Nesse sentido, o apoio governamental consistente e
continuado oferecido ao longo de sua história à Embraer diferiu das experiências
presenciadas por outros países periféricos, que utilizaram o que se denomina na
literatura como “estratégia de aprendizagem”34 Devemos acrescentar também que,
no caso da Embraer, verificou-se a importância das formas de aprendizado por
contratação, que possibilitou a apropriação de conhecimentos e habilidades
mediante a contratação de empresas ou pessoas. Esse aprendizado foi possível
pela associação com parceiros externos e viabilizado em grande medida pela
atuação governamental do Ministério da Aeronáutica. A produção industrial,
mediante acordo com a Aermacchi, para a produção do avião militar Xavante, é um
bom exemplo. Com a decisão do Ministério da Aeronáutica de equipar a FAB com os
aviões Aermacchi-236, não como produtos acabados, mas como um projeto de
fabricação licenciado por meio da Embraer, tornou-se imprescindível a vinda para a
empresa de especialistas italianos, que vieram auxiliar pessoalmente a produção
local, transferindo tecnologia e repassando o conhecimento “homem-a-homem”
(DAGNINO, 1987, p. 227). Nesse plano, destacam-se, ainda, o aprendizado
adquirido com a comercialização, mediante acordo com a Piper viabilizado pela
virtual reserva de mercado estabelecida pelo governo; assistência técnica e
manutenção de aeronaves (acordos de venda com companhias aéreas operadoras);
fabricação de componentes complexos sob encomenda (subcontratação com a
34 Os principais processos de aprendizagem podem ser identificados pelos mecanismos de: learning by doing, que “consiste em uma forma de aprendizado que ocorre no processo de manufatura, após as atividades de P&D terem se completado, materializando-se no desenvolvimento de uma habilidade crescente na produção, que reduz os custos com mão-de-obra por unidade de produto, ou ainda diminui a incidência de problemas de qualidade”; o learning by using “que ocorre com o uso do produto por seu usuário final, podendo resultar tanto em práticas de operação e manutenção mais eficazes quanto em informações que, repassadas para a firma produtora, repercutem na adoção de melhorias incrementais no produto (Pondé, 1993, p. 71); e o learning by interacting, que decorre da interação entre parceiros ligados por fluxos de bens e serviços que se originam da produção sendo um pré-requisito para as relações entre usuários e produtores sejam duradouras (LUNDVALL, 1988, p. 362). Para Kline; Rosenberg (1986, p. 382 apud BRNARDES, 2000, p.181), as inovações não devem ser exclusivamente associadas às rotinas de P&D, uma vez que os processos de aprendizagem tecnológicos têm demonstrado que “estas requerem a junção das esferas técnica e econômica de uma maneira que possa ser desempenhada pela organização ao mesmo tempo em que atenda também às necessidades do mercado, o que implica a fusão e cooperação entre muitas atividades nas áreas funcionais de marketing P&D e produção”.
82
Douglas e a Boeing). O acordo do Ministério da Aeronáutica com a empresa norte-
americana Northrup Grumman, de quem o Brasil havia adquirido os F-5, beneficiou a
Embraer na aquisição de alguma capacitação tecnológica na engenharia, nas áreas
de soldagem metal-metal, materiais compostos e no uso de máquinas de controle
numérico (DAGNINO, 1993, p. 52).
A Embraer também se tornou conhecida no mercado mundial por ser
usuária de equipamento e softwares extremamente qualificados, não se contentando
simplesmente em saber operar os serviços ou a tecnologia que comprava. Ela vem,
sobretudo, buscando, com base no conhecimento operacional, modificar a
tecnologia para adequá-la às suas necessidades e, em muitos casos, aperfeiçoando,
corrigindo defeitos, ou, até mesmo, abrindo novas oportunidades de mercado para o
produto, fazendo a alegria dos fabricantes fornecedores. Nesse aspecto a Embraer
deve ser considerada uma usuária ativa e altamente qualificada de tecnologia.
Desse modo, a empresa tem conquistado consideráveis avanços no aprendizado por
mudança.
Saliente-se ainda que a Embraer sempre se distinguiu, em relação ao setor
produtivo brasileiro, pela percepção estratégica quanto aos programas de
qualificação e formação profissional dos seus funcionários no plano geral. Na
construção de sua escalada tecnológica, a excelência nos recursos humanos
sempre foi considerada como fator crítico de sucesso. E, nesse sentido,
identificamos também a importância e o enfoque estratégico que a empresa conferiu
ao longo de sua existência às formas de aprendizado pelo treinamento. Nos anos
iniciais da empresa, durante o processo de transferência da tecnologia de fabricação
do programa Xavante, cerca de setenta funcionários da empresa foram treinados na
Itália. Desse modo, a empresa pôde rapidamente passar da operação de montagem
à operação de fabricação nacional do avião. Especialmente relevantes foram as
parcerias para o treinamento da mão-de-obra desenvolvidas nos programas AMX e,
posteriormente, nos anos noventa, no ERJ-145 (SBRAGIA; TERRA, 1993, p. 25
apud BERNARDES, 2000, p.182). A empresa investiu, ao longo de sua história,
cerca de 3% do seu faturamento em treinamento, seja com recursos próprios, seja
com a complementação do governo brasileiro. O apoio do governo com bolsas do
CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento científico e Tecnológico, por
intermédio do programa RHAE – Recursos Humanos em Áreas Estratégicas, voltado
especificamente para a concessão de diversos tipos de bolsas, abrangendo desde o
83
nível técnico até o nível especializado, com mecanismos de atração de retenção de
profissionais, foi fundamental para a consolidação e maturação da estratégia
tecnológica adotada pela empresa. A Embraer habitualmente enviava vários
engenheiros para o exterior para fazerem cursos de doutoramento e especialização
nas melhores escolas americanos, alemãs, japonesas, inglesas e francesas. Essa
conduta em relação aos investimentos de qualificação e formação profissionais, só
será alterada após a privatização da empresa, em 1994, quando os gastos
destinados a esse tipo de atividade serão reduzidos (cerca de 1% em relação ao
faturamento da empresa) e mais bem equalizados (Ibidem).
A coerência, cumulatividade e continuidade de uma trajetória tecnológica
fomentada de forma consistente pelas políticas governamentais de curto e longo
prazo e endogenamente cristalizada na empresa, além da intensa interação entre os
vários institutos do CTA, permitiram à Embraer a obtenção de uma capacitação
tecnológica e uma posição competitiva bastante incomuns em relação aos países
em desenvolvimento. Segundo Cabral (1989, p. 27) “planejadas ou não, as decisões
foram sendo tomadas dentro de uma seqüência bastante lógica quanto ao processo
de desenvolvimento tecnológico. Em primeiro lugar, a empresa adquire capacitação
em projetos em função da forma de transferência de tecnologia ocorrida.
Simultaneamente, faz-se um contrato de produção sob licença com o qual se ganha
muita tecnologia de fabricação (programa Xavante). Em seguida, celebra-se um
acordo com a Piper onde os benefícios se prendem mais aos aspectos de
comercialização e assistência técnica, completando, em linhas gerais, o processo de
desenvolvimento e aprendizado tecnológico”.
Por fim, é interessante notar que, embora esta fase seja caracterizada por
uma estratégia de desenvolvimento, aprendizado e capacitação tecnológica
consistente, coerente e bem sucedida, na qual se identificam formas ativas de
aprendizado tecnológico, devemos sublinhar que um sistema de análise do
desempenho não consistia uma das preocupações centrais desta estratégia. A
análise por desempenho é um tipo de aprendizagem dependente de mecanismos
formalizados e institucionalizados para gerar, registrar, analisar e interpretar
informações sobre o desempenho da produção. A escolha dos indicadores a partir
dos quais fazer a análise crítica do desempenho deve refletir a estratégia competitiva
da empresa. Genericamente falando, as informações mais importantes talvez sejam
as de custos. Um erro na identificação das variáveis críticas pode trazer sérios
84
prejuízos para as empresas (FLEURY; FLEURY, 1995, p. 65 apud BERNARDES,
2000, p.182).
A constituição de uma visão de longo prazo, e o aprendizado fornecido pelas
experiências mal sucedidas na produção de aeronaves no passado permitiram a
conscientização de que esse setor só seria viável se houvesse boa oferta de mão-
de-obra qualificada e centros de pesquisa que organizassem e estimulassem o
desenvolvimento e a difusão dos conhecimentos aeroespaciais e aeronáuticos. Com
efeito, a criação do CTA e do ITA foi fundamental para o surgimento e o posterior
sucesso da Embraer. Por sua vez, a própria criação da Embraer foi um fato crucial
para o sucesso dessa indústria, uma vez que permitiu a centralização das
informações técnicas, produtivas e comerciais, possibilitando o acúmulo do
conhecimento tecnológico necessário para ao processo de inovação e
competitividade no plano mundial
A sincronia e consistência das políticas governamentais fiscais e tributárias,
industrial e tecnológica de corte direcionada ao setor, associadas à robusta infra-
estrutura tecnológica criada na região de São José dos Campos gerou economia de
aprendizados e externalidades importantes, que beneficiaram tanto a região como a
própria empresa. A Embraer também foi beneficiada por poderosos sistemas fiscais
que isentavam as importações de peças e componentes e linhas de crédito que
financiavam suas exportações. É digno de menção que a Embraer não usufruiu de
dispositivo institucional que impedisse a concorrência interna, ou seja, de nenhum
monopólio ou de reserva de mercado, de que desfrutava a Petrobrás ou que
protegeu as firmas nacionais de computadores da concorrência estrangeira.
Para Bernardes (2000, p.290), “a empresa contou também com uma
conjuntura externa favorável. O ajuste energético na década de setenta configurou
um ambiente internacional propício para as vendas do Bandeirante, a primeira
aeronave a ser vendida no exterior e que atendia às singularidades do mercado,
naquele momento, quanto à economia de consumo, desempenho e preço”. No plano
nacional, o Brasil da década de setenta atravessava um dos seus períodos históricos
mais fúnebres e sangrentos, como o governo ditatorial dos presidentes militares
Médici e Geisel. Nesse período, o Congresso Nacional foi fechado, houve a
perseguição a opositores do regime, inúmeros desaparecimentos, torturas e
assassinatos foram realizados pelos órgãos de repressão, os meios de comunicação
sofreram censura total, entre outros feitos repugnáveis e tristes dessa fase. Nesse
85
quadro, os militares mantinham total controle político do país, e, portanto, não havia
o compromisso de submeter os gastos ou subsídios destinados a essa indústria à
aprovação da sociedade política ou civil, para conferir legitimidade quanto à
finalidade ou ao retorno social e econômico dos benefícios gerados por essas
atividades (Ibidem).
Podemos também relacionar o sucesso da Embraer à arquitetura de uma
estratégia empresarial dotada de uma racionalidade endogenamente determinante.
Uma gestão ativa quanto ao aprendizado e à coerência na trajetória tecnológica, a
excelência na qualificação dos recursos humanos com investimentos vultosos nos
ativos tangíveis e intangíveis, procurando acompanhar o “avanço” no setor e a
capacidade de identificar nichos de mercado mundial a serem explorados,
demonstraram-se estratégias sensatas. No entanto, tal como consta nos enunciados
descritos na ata de criação da Embraer, o objetivo do projeto militar era a instalação
e o desenvolvimento de uma capacidade tecnológica autônoma na produção
aeronáutica, e não a necessidade de gerar lucros. Talvez pela segurança e a
certeza que a fonte de onde provinham os recursos não se esgotasse tão cedo, a
empresa não dedicou tanta importância aos critérios de gestão de desempenho
financeiro, de custos de produção e de financiamento, sobretudo os relacionados ao
setor militar, como destinou à modernização das atividades tecnológicas (Ibidem).
Nesse aspecto, o descuido na análise de mercado no lançamento de alguns
produtos, a ênfase excessiva na tecnologia (como no caso das aeronaves Xingu e
do CBA-Vector) e o fator preço como reflexo de uma estrutura de custos e de
financiamento pouco adequada à realidade já apresentavam indícios dos problemas
que estariam por vir no final da década de oitenta. A cultura da empresa era
fortemente movida e influenciada pelos valores técnicos, corporativos e
nacionalistas. Se por um lado esses valores garantiam alto grau de união e
idealismo aos funcionários da empresa, por outro, eles certamente dificultaram o
desenvolvimento gerencial da empresa em direção a uma gestão mais competitiva
dos fatores de produção e dos recursos financeiros. Esses fatores já despontavam
na segunda metade da década de oitenta como elemento preocupante e
potencialmente desestabilizador na estratégia de gestão da empresa.
Esse ponto levantado por Bernardes (2000, p. 209) “é crucial para a
compreensão da crise que se abaterá sobre a Embraer nos anos noventa. Os
prejuízos que essa empresa acumulará e a vulnerabilidade de sua posição
86
competitiva podem ser relacionados, em grande parte, a um sistema de análise de
desempenho bastante deficiente e, sobretudo, totalmente inadequado à realidade
política e econômica da segunda metade da década de oitenta em diante, quando os
arranjos fiscais e isenções tributárias que financiavam e sustentavam as operações
da empresa serão extintos, e o cenário de competição global será outro”.
87
CAPÍTULO 2 – DA CRISE À PRIVATIZAÇÃO DA EMBRAER
A Embraer, tal como descrevemos, consagrou-se como um caso atípico de
autonomia e capacitação tecnológica no cenário produtivo nacional. Todavia, mesmo
essas vantagens competitivas consideradas virtuosas e paradigmáticas para uma
companhia de classe mundial, tais como a elevada qualificação de seu quadro
técnico de engenheiros, o avançado estágio de autonomia e capacitação
tecnológica, investimentos pesados em P&D, apoio governamental irrestrito, elas
revelaram-se não ser, por si próprias, precondições suficientes para impedir que a
empresa enfrentasse grave crise. A empresa desenvolveu fortes vínculos de
dependência em relação às políticas governamentais, seja para o financiamento
para a produção e atividades de P&D, seja para as vendas de seus produtos.
Dessa ótica segundo Bernardes (2000, p. 213-214), “alguns aspectos são
importantes, como a crise e a transição do modelo político e econômico de
desenvolvimento nacional experimentadas durante a década de oitenta e aguçadas
a partir da sua segunda metade”. O avanço do processo de democratização política
e o fortalecimento da sociedade civil, com a eleição indireta de um presidente civil,
marcado pelo advento da Nova República em 1986 e a eleição direta para a
presidência em 1990, com a adoção de vários planos de estabilização da economia,
nesses períodos, caracterizam-se como fatos relevantes para o entendimento da
crise da Embraer, visto que nesses períodos serão extintos os incentivos fiscais que
subsidiavam a empresa e serão gerados novos mecanismos de controle social do
gasto público.
Por outro lado, houve a modelagem de um novo marco político-institucional e
econômico, criado com a edição do Plano Collor, no início dos anos noventa, pela
aplicação de um conjunto de diretrizes políticas e econômicas que defendiam a
abertura e desregulamentação da economia com a reformulação ampla das políticas
industrial e de comércio exterior, além da adoção de um programa de privatização
das empresas públicas. A recessão do mercado aeronáutico mundial, o fim da
Guerra Fria, o desarmamento das nações, entre outros eventos importantes, iriam
contribuir para a agudização desse quadro adverso, obrigando a empresa a iniciar
um processo de ajuste profundo que culminará na sua privatização (Ibidem).
88
2.1 - O DECLÍNIO
Como podemos entender que uma empresa tão capacitada tecnologicamente,
com bom desempenho de vendas e gerando empregos de alta qualificação, ao
longo de sua existência, considerada o “braço industrial - tecnológico” do ministério
da Aeronáutica, pudesse entrar em colapso no início dos anos noventa, atolada em
dívidas e tendo de dispensar mais de 50% do seu quadro de funcionários? Segundo
Bernardes (2000, p. 215) “a Embraer até o final da gestão de Ozires Silva, no início
de 1986, era considerada uma empresa estatal emblemática, administrada por
gestão profissional, na qual a direção desfrutava de elevado grau de autonomia e
ampla liberdade de contratação e demissão dos seus empregados, destoando
claramente, por isso, do perfil clássico de outras empresas públicas nacionais,
caracterizadas pelo empreguismo, ineficiência, dependência financeira e burocracia”.
Na atual realidade, é importante analisarmos, inicialmente, alguns dos
argumentos virtuosos de competitividade em relação à Embraer com o objetivo de
tentar elucidar os fatores que motivaram sua crise. A princípio podemos identificar
dois argumentos bem definidos, que já haviam sido ressaltados por Dagnino (1987)
em seu estudo sobre o setor armamentista, que incluía o segmento aeronáutico, e
que imputavam ao desequilíbrio financeiro da empresa a razão de sua crise. Por sua
vez, a situação de desequilíbrio financeiro devia-se basicamente a dois fatores: o
alto custo dos componentes importados das aeronaves brasileiras e a baixa
prioridade dada a um enunciado primário que é considerado básico para a existência
de qualquer empresa capitalista, ou seja, toda a empresa que deseja sobreviver no
ramo aeronáutico tem de obter lucro ao vender seus aviões (DAGNINO, 1987, p.
56).
2.1.1 – ABERTURA ECONÔMICA, SUPRIMENTO E TRANSFERÊNCIA DE TECNOLOGIA
Em relação ao argumento da importância que a empresa exercia nos efeitos
de rápida rotação para o setor produtivo nacional e o alto custo do valor das
importações na participação do valor da produção da Embraer, podemos verificar
inicialmente, observando os Gráficos 1 e 4, algumas dinâmicas importantes. Em
89
primeiro lugar, analisando a evolução dos indicadores de produção, exportação e
faturamento, notamos a demarcação de quatro fases: a inicial, que se estende de
1975 (ano em que começam as exportações da empresa) a 1979, caracterizada por
um crescimento modesto; a segunda, que principia em 1979 e avança até 1984,
marcada por uma estabilidade relativa; uma terceira fase de intenso crescimento
entre 1985 e 1990; e, por fim, uma quarta fase de queda vertiginosa, entre 1990 e
1994, ano da privatização da empresa.
GRÁFICO 1 – Evolução do Faturamento, 1970-1994
US$ Milhões
0100200300400500600700800
70 74 76 78 80 82 84 86 88 90 92 94
Fonte: Embraer (1996).
GRÁFICO 2 – Produção, Exportação e Importação, 1970-1994
0100200300400500600700800
75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94
Valor da Produção Exportação Importação
Fonte: Embraer (1996).
90
No que tange a evolução do indicador de emprego, verificamos pela
expressão plástica do Gráfico 3, o delineamento de três fases, que poderíamos
associar às fases de gestão e direção da empresa. Segundo Dagnino (1993) “na
primeira, que abrange o período entre 1970 e 1985, caracterizada pela direção de
Ozires Silva, notamos uma trajetória moderada e sustentada de crescimento do
emprego. Numa segunda que principia em 1986, com a posse do comando da
empresa por Ozílio Silva, e termina em 1989, identificamos um período de
crescimento intenso e estabilização em um patamar elevado do emprego”. A partir
de 1990, verificamos nova fase marcada pela queda vertiginosa do nível do
emprego, caracterizada pelas gestões de João Cunha e o regresso de Ozires Silva,
que conduzirá a empresa até sua privatização. Ressalve-se que será sobre o
período de gestão de Ozires Silva que a Embraer sofrerá o processo de
racionalização da mão-de-obra mais profundo, para posteriormente ser privatizada.
Pela análise do Gráfico 3, notamos também que a performance da produção é
notadamente condicionada pelo desempenho das exportações. As exportações da
empresa iniciam-se em 1975. Nesse ano, as exportações representavam cerca de
5% do faturamento da empresa.
GRÁFICO 3 – Evolução do Nível de Emprego Total da Embraer
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
70 73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94
Fonte: Embraer (1996).
Já em 1980 as exportações eram responsáveis por 53% desse valor. E, no
período de 1985 a 1994, passavam a responder por mais de 60% do faturamento da
91
empresa, sendo os 40% restantes destinados ao mercado nacional, caracterizados
pelas vendas dos aviões leves da linha Piper e o atendimento à demanda da Força
Aérea Brasileira (FAB). Em relação à performance das importações, chama a
atenção a alta participação que elas apresentam em relação à produção da
empresa: entre 40% a 50% dos insumos e 60% e 70% da produção. No início dos
anos noventa, a Embraer registrava cerca de quatrocentos fornecedores, fabricando
ampla gama de produtos, com graus diferenciados de complexidade tecnológica.
Entre os principais países fornecedores de insumos da Embraer, encontravam-se
E.U.A.: kits de aviões leves (Piper), placas de alumínio aeronáutico (Alcan, Alcoa),
conectores, placas de inox e outras ligas, parafusos e porcas, válvula, aviônicos,
motores; Grã-Bretanha: motores; França: peças e componentes aviônicos; Itália: kits
de aviões militares, peças e componentes; Canadá: motores, entre outros
(DAGNINO, 1993, pp. 57-58).
Os altos níveis das exportações e importações, que podem ser observados no
Gráfico 5, na verdade fazem parte da tendência mundial do setor, e por isso não
devem ser considerados tão surpreendentes; no entanto, pode-se considerar
preocupante a participação relativa que assumiam as importações em relação à
produção, dadas as características do baixo nível de capacitação tecnológica dos
fornecedores locais. Esse fato indicava que a alta proporção das importações no
valor da produção já seria suficiente para questionar o argumento da importância do
setor no comércio exterior brasileiro, uma vez que mesmo os fornecedores nacionais
importariam boa parte dos subsistemas utilizados pela Embraer (DAGNINO, 1993).
No entanto, a alta dependência em relação à importação não caracterizava,
por si própria, situação de dependência tecnológica. Para Dagnino (1993, p. 59) “a
autonomia tecnológica não se reflete necessariamente no índice de nacionalização.
Principalmente neste setor onde a alta densidade tecnológica e a estratégia de
desenvolvimento foi caracterizada mais pelo controle nacional de tecnologia do que
pelo aumento do índice de nacionalização”. Nos casos em que não há um controle
nacional do empreendimento e quando se parte de uma fronteira tecnológica
conhecida pela empresa estrangeira instalada no País, mas que não domina
localmente, a estratégia do aumento do índice de nacionalização mostra-se atrativa.
Pois nestes casos, uma das formas de aumentar o ganho do país é estipular índices
crescentes de nacionalização e, assim, cotas de produção local cada vez maiores. O
domínio por empresas nacionais, neste caso, não é um resultado a buscar; seja
92
porque não interessa ao país obtê-lo, seja porque ele é inacessível. Quando o
controle do empreendimento está desde o começo assegurado, a estratégia não tem
por que ser de aumento do índice de nacionalização. O leque de opções que se abre
aos responsáveis pelo empreendimento é, neste último caso, muito maior. O
resultado de uma estratégia de aumento puro e simples do índice de nacionalização
faria com que se pudesse estar hoje produzindo no país aviões totalmente
nacionais. Estes, porém, poderiam demonstrar ser inadequados para a satisfação
das necessidades civis do pequeno mercado nacional e, principalmente, daqueles
visualizados pelos segmentos militares” (DAGNINO, 1993). No caso da Embraer,
como já foi anotado, em virtude da alta razão entre as importações e o valor da
produção, questionavam-se os efeitos de rápida rotação que a Embraer exercia
sobre a indústria nacional.
Cálculos realizados por Dagnino estimavam que no ano de 1989, quando o
valor de produção era de aproximadamente US$ 700 milhões e a importação de 350
milhões, o total da folha de salários e encargos teria alcançado quase US$ 300
milhões, o que corresponderia a um gasto com o custo de mão-de-obra da ordem de
50%, o que seria um fato coerente com a experiência internacional do setor. No
entanto, “supondo que a empresa tivesse apresentado uma receita líquida nula
naquele ano, então cerca de US$ 50 milhões teriam sido alocados para efetuar
todos os outros gastos no país” (DAGNINO, 1993, p.61). Assim, o autor concluía que
os efeitos econômicos de rápida rotação gerados pela empresa, se não eram
desprezíveis, no mínimo eram bem menos positivos do que os responsáveis pelo
setor costumavam divulgar (DAGNINO, 1993, p. 62).
Em relação às proposições elaboradas por Dagnino, embora considerando
corretas as afirmações do autor, devemos desenvolver melhor e relativizar alguns
comentários. Segundo Bernardes (2000, p. 219) “atualmente, em uma economia
internacionalizada, marcada pela atuação de grandes grupos econômicos atuando
em escala mundial, o grau de abertura econômica setorial ou mesmo dessas
empresas, assim como os fluxos comerciais intra e extra-empresariais têm-se
demonstrado bastantes intensos”. Assim sendo, o indicador calculado a partir da
razão entre as importações e a produção não deve ser utilizado inapropriadamente
como um indicador de dependência tecnológica, uma vez que as estratégias
empresariais contemporâneas têm procurado a otimização e a redução dos custos
dos fatores da produção, através da internacionalização do fornecimento dos
93
insumos e componentes ou do que poderíamos denominar de “financeirização da
produção”.
A internacionalização da produção e do fornecimento de materiais, peças e
componentes é uma tendência da indústria mundial e também do segmento
aeronáutico internacional. A Boeing, por exemplo, tem internacionalizado a
produção, ao mesmo tempo que se utiliza de uma rede colossal de fornecedores
dentro e fora dos Estados Unidos. Portanto, o fato de a Embraer comprar insumos,
peças, componentes ou eletrônica embarcada não constitui demérito algum, nem
configura um caso de dependência tecnológica. A fabricação de motores, peças ou
aviônicos, seja pela Embraer, seja por fornecedores locais, exigiria o aporte de
investimentos altíssimos, de escala de produção, tradição de mercado e outras
variáveis que assegurassem o sucesso do empreendimento, além de que o custo do
produto deveria ser competitivo no mercado mundial, o que certamente seria inviável
economicamente (Ibidem).
A nova natureza da economia internacional é dada pela alta intensidade do
“conhecimento” nas atividades de produção de bens e serviços. O que dinamiza a
agregação de valor é a produção intelectual, o trabalho de inteligência baseado em
capital intelectual. Os atuais condicionantes que regem as estratégias de competição
virtuosas indicam que, para uma indústria hoje, a excelência no design de produto (a
capacidade de inovar), no marketing, uma logística bem planejada para distribuição
e comercialização do produto, uma infra-estrutura tecnológica integrada e dinâmica,
a coordenação da cadeia produtiva, são variáveis muito mais importantes do que a
verticalização ou o domínio do ciclo completo de fabricação de um produto ou
mesmo de determinadas partes dele. Segundo Fleury, (1998, p. 65 apud
BERNARDES, 2000, p. 220) “as montadoras de automóveis são o exemplo mais
evidente disso: hoje, as atividades que mais lhes interessam são o marketing, as
finanças (os bancos associados às montadoras são extremamente lucrativos), o
projeto do produto e a organização da cadeia produtiva. Paradoxalmente, o que
menos interessa é o trabalho manual, repetitivo, de montagem, que é terceirizado”35
.
35 Fleury prossegue citando o livro de Robert Reixh, O Trabalho das Nações. Segundo o autor, essa lógica pode ser aplicada para a dinâmica concorrencial e a divisão internacional do trabalho entre as nações. Na nova economia são identificadas três categorias de trabalho: “o trabalho rotineiro de produção (que não interessa aos EUA e pode ser exportado); o trabalho rotineiro de serviços (que também não interessa, mas não pode ser exportado); e o trabalho intelectual (ou, como ele
94
Fleury (1998, p. 65 apud BERNARDES, 2000, p. 220) quer dizer, “com isso,
que o fato de a Embraer não fabricar alguns dos subsistemas principais, sejam
motores, aviônicos, ou poltronas, é menos importante. Na verdade, o que deve ser
enfatizado é que a Embraer domina a atividade mais nobre e a mais complexa que é
o design, o que possibilita a coordenação da rede de parcerias de risco. Acrescente-
se, ainda, que a empresa focalizou suas atividades na fase de agregação de valor,
ou seja, é uma integradora de sistemas, e domina completamente as diversas
especificidades de projeto”. O avião quem projeta e monta é a Embraer. Lembremo-
nos que sem o projeto essas partes e componentes, isoladamente, “não saem
voando por aí”. Além do mais, quem vende e provê a assistência técnica e suporte
aos clientes é a própria empresa. A variável estratégica nesse setor são os
investimentos em P&D, a capacidade de desenvolver novos projetos e a capacitação
em determinadas tecnologias críticas. E esse é um dos pontos fortes da Embraer.
Pela apreciação do Gráfico 5 é possível notar que a Embraer, ao longo de sua
história, tem realizado investimentos significativos em P&D, especialmente ao longo
da década de oitenta, quando se intensificam os gastos, somente declinando
acentuadamente no período pré-privatização, quando há o aprofundamento da crise
da empresa, recuperando-se, logo em seguida entre 1993 e 1994, em razão do
desenvolvimento do programa ERJ-145. (ver Gráfico 4).
GRÁFICO 4 – Grau de Abertura Comercial Empresarial, 1970-1994
0102030405060708090
75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 86 87 88 89 90 91 92 93 94
(PROD/EXP) (PROD/IMP)
Fonte: Embraer (1996).
denominou, «os analistas simbólicos», que interessa e deve ser cada vez mais incentivado)” – ver Fleury, A. O mistério do ministério. Folha de S.Paulo, Opinião Econômica, 23/12/1998.
95
GRÁFICO 5 – Evolução dos Gastos com P&D, 1970-1994
US$ Milhões
020406080
100120140
73 74 75 76 77 78 79 80 81 82 83 84 85 89 90 91 92 93 94
Fonte: Embraer (1996).
Ressalte-se que, ao contrário das experiências internacionais, o setor
aeronáutico nacional apresenta baixa integração com o complexo eletrônico e
metalmecânico e fracos efeitos de encadeamento tecnológico. Devemos acrescentar
que, embora a Embraer possa ter configurado um tipo de “enclave econômico”, pelo
fato de serem constatados baixa integração com o setor produtivo nacional e alto
direcionamento de sua produção ao mercado externo, a empresa tem cumprido
papel importante na indústria nacional na formação de quadros profissionais e na
oferta de uma mão-de-obra de altíssima qualificação para vários setores econômicos
e entidades relacionadas à difusão da boa prática produtiva e do conhecimento
científico e tecnológico, que não pode ser desconsiderado. O fato de ser uma
empresa pouco integrada ao sistema técnico-produtivo talvez deva ser associado à
ausência de uma política industrial e tecnológica dinâmica que estimulasse a
execução de programas civis e relações mais intensas e extrovertidas entre a
Embraer, o CTA e a indústria nacional. É ilustrativo o caso do CTA (DAGNINO,
1987, p.62).
O CTA, atualmente, é composto de quatro institutos. Além do ITA, fazem
parte do Centro o Instituto de Aeronáutica e Espaço – IAE, o Instituto de Estudos
Avançados – IEAV – e o IFI – Instituto de Fomento Industrial. Cerca de dois mil e
cem funcionários aí pesquisam, executam projetos e desenvolvem produtos de
interesse dos Sistemas Aeronáutico, Espacial e Bélico. Trabalhos de base são
96
realizados nas áreas de materiais, ciências atmosféricas, física, química,
aeronáutica, mecânica, eletrônica e computação. Esses trabalhos envolvem e são
complementados por simulações computacionais, ensaios em túneis de vento,
ensaios e integração no solo e ensaios em vôo. A transferência dos resultados das
pesquisas requer ainda o tratamento, no CTA, de questões sobre homologação,
normalização, metrologia, qualidade, confiabilidade e gerenciamento em C&T. O
modelo institucional público, mantenedor das atividades aeroespaciais no país, o
impede de vender serviços de forma lucrativa para o mercado, assim como dificulta
o repasse do conhecimento e a tecnologia gerada internamente por meio de
desenvolvimento de relações mais dinâmicas ou de um intercâmbio mais integrado
com o mercado. Esse modelo institucional foi se deteriorando cada vez mais com a
crise do Estado nas décadas de oitenta e noventa e, atualmente, carece de uma
reestruturação profunda para responder aos desafios contemporâneos.
A conformação desse quadro acabou por desestimular o corpo técnico dos
institutos, que tem sofrido perdas irreparáveis com a saída e demissão de vários
técnicos qualificados e professores, muitos com doutoramento no exterior, em
virtude dos baixos salários e das condições precárias de trabalho. O CTA, por
exemplo, já chegou a ter seis mil funcionários, mas atualmente conta com apenas
dois mil e cem. Vários pesquisadores brasileiros têm migrado para países que vêm
valorizando e considerando estratégico o desenvolvimento das atividades
aeroespaciais, notadamente Canadá, Alemanha, Espanha, Portugal, Indonésia e
Estados Unidos, entre outros. O parque tecnológico encontra-se desatualizado, e as
pesquisas sofreram cortes com o processo de contenção de gastos governamentais.
Esse é, aliás, um fator preocupante quanto ao futuro do setor aeronáutico nacional,
uma vez que as pesquisas e a formação da mão-de-obra no CTA foram e continuam
sendo fundamentais para a consolidação do setor no Brasil e a manutenção da sua
competitividade no mercado mundial (BERNARDES, 2000, p. 223).
Todavia, não resta dúvida quanto ao fato de os custos elevados das compras
de insumos e componentes no exterior e os custos internos de produção terem
obrigado a Embraer a gastar suas preciosas divisas, auferidas com as vendas de
suas aeronaves no mercado externo, pressionando a estrutura de custos internos e
deteriorando sua saúde financeira. Esse fato não passou despercebido pela direção
da empresa. Em 1982, a Embraer, com apoio da Avibrás, promoveu no Instituto de
Engenharia de São Paulo uma série de palestras destinadas a despertar o interesse
97
da iniciativa privada pelo campo aeroespacial, captando mais empresas nacionais no
elenco de fornecedores da Embraer e da Avibrás, visando a reduzir o dispêndio
dessas duas companhias com a importação de itens não produzidos no Brasil. O
próprio diretor superintendente da Embraer, Ozires Silva, conduziu o evento que não
logrou êxito algum (LOPES, 1994, pp. 168-169).
Justificando-se pela necessidade de importar materiais e equipamentos em
lotes econômicos, a política de compras da empresa prosseguiu de forma pouco
realista com o volume de recursos investidos em seus estoques. Como resultado, os
giros de estoque eram muito vagarosos, mesmo levando em consideração que a
empresa tinha um ciclo produtivo-financeiro longo. Em 1993, por exemplo, o volume
de estoque equivalia a quase um ano de faturamento. Esses problemas agravaram-
se nos anos noventa com a crise da Embraer, em virtude dos atrasos constantes dos
pagamentos a fornecedores, que passaram a encarecer seus preços de venda, para
se prevenirem da insegurança quanto ao recebimento das faturas no prazo
estabelecido.
2.1.2 – AS DIFICULDADES DA SOBREVIVÊNCIA NO RAMO AERONÁUTICO
O segundo eixo explicativo para a crise da Embraer já havia sido também
apontado e previsto. Portanto, numa situação em que as vendas da empresa se
encontravam em crescimento, o nível de endividamento e, sobretudo a sua
composição (baseada em créditos de curto prazo) tornavam o seu futuro
problemático. Segundo Dagnino (1993, p. 77) “nos anos oitenta se reconhecia que a
política de endividamento que está sendo seguida tinha de ser revista através de
novo aporte de capital e isto não ocorreu. Apesar de ter conseguido levantar US$
185 milhões em 1989, nada ocorreu até 1991, quando a injeção de capital por parte
do governo de centenas de milhões de dólares permitiu um relativo equilíbrio entre
seu endividamento de curto e longo prazo [...] as despesas financeiras líquidas
alcançaram naquele ano US$ 122 milhões de dólares, ou seja, 30% da receita bruta
da empresa”.
Na verdade, as deficiências na gestão administrativo-financeira e o elevado
nível de endividamento acumulado pela empresa ao longo dos anos despontavam
como componentes desestabilizadores do seu desempenho. A raiz desse
comportamento deve ser buscada na forma como a Embraer foi concebida, no status
98
conferido à empresa sob a ótica da estratégia tecnológica militar, na condução dos
programas, na estratégia de financiamento, no próprio modelo político institucional
vigente naquele período histórico. Segundo Suzigan; Villela (1997, pp. 28-29 apud
BERNARDES, 2000, p. 225) A opção do uso recorrente dos endividamentos de curto
prazo devia-se a algumas razões:
- “eram poucas as instituições financeiras privadas que concediam crédito de
longo prazo, e quando concediam, exigiam juros muito elevados”;
- “a Embraer, como era empresa estatal, tinha de submeter os financiamentos
à aprovação do Congresso Nacional. O processo era longo, incerto e, muitas vezes,
a autorização de captação de recursos não era aprovada. Dessa forma, recorria-se
aos empréstimos de curto prazo concedidos pelas agências ou bancos
governamentais ou estrangeiros”;
- “as modalidades de financiamento, como o “suprimento de crédito de longo
prazo para o investimento e o financiamento do desenvolvimento tecnológico,
particularmente gastos em P&D, dificilmente eram atendidas exclusivamente pelo
sistema privado”. No Brasil, as duas modalidades tornaram-se, por razões
conhecidas, totalmente dependentes de agentes financeiros do setor público:
BNDES (e a subsidiária Finame36) para créditos de longo prazo para investimento e
aquisição de bens de capital, e Finep para financiamento do desenvolvimento
científico e tecnológico. Por razões que já descrevemos, “houve forte contração da
disponibilidade de recursos nos anos oitenta e na primeira metade dos anos
noventa” (SUZIGAN; VILLELA, 1997, pp. 28-29 apud BERNARDES, 2000, p. 225).
Em relação à condução dos programas e às formas de vendas das
aeronaves, consideravam-se muito importantes as vendas externas, mesmo que
implicassem algum prejuízo financeiro para a empresa e, conseqüentemente, aos
cofres públicos. É ilustrativo dessa prática o episódio da concorrência para o
36 O Finame é uma agência especial de financiamento industrial, subsidiária do BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Para o setor industrial são disponibilizadas linhas de financiamento por meio do Finame Automático, que financia a aquisição de máquinas e equipamentos novos fabricados no país, sem limite de valor; e o Finame Especial, que se destina ao financiamento, para todos os setores, exceto o de comércio e serviços, de máquinas adequadas para a sua viabilização. Existe, ainda, uma linha do Finame Especial para concorrência internacional que permite à indústria nacional melhorar as condições de competição com as estratégias nas licitações. Atualmente, o custo dessa linha é fornecido pela correção cambial, mais o Libor, mais o spread do BNDES de 5% a.a, mais o del credere do agente de 2% a.a. O prazo máximo de amortização é de dez anos e a participação do Finame do financiamento é de 80%. Se o fabricante do equipamento tiver ISSO-9001 e 9002 e suas máquinas estiverem registradas no “Cadastro Tecnológico” do Finame, as condições de participação sobem para 88%.
99
fornecimento, em co-produção com Short Brothers, em 1985, de aviões de
treinamento militar Tucano para a RAF inglesa, durante a gestão de Ozires Silva, de
1970 a 15 de julho de 1986. O contrato previa tantas alterações de componentes,
que os funcionários apelidaram o avião de Super-Tucano. O único detalhe, porém,
foi que essas modificações provocaram aumento significativo no custo de produção
da aeronave, que foi só parcialmente repassado ao seu preço final. Segundo
Dagnino (1987, pp. 235-236) “esta disposição refletia a disposição da Embraer em
desenvolver variantes que serviriam para atender à demanda dos consumidores e
que possibilitaram o aumento das suas próprias capacidades tecnológicas, mesmo
sob pena de algum prejuízo financeiro momentâneo”. Na visão dos militares de
acordo com Lopes (1994, p. 226 ) “esse era o preço que a nação deveria pagar para
ter uma indústria de valor estratégico como a Embraer”. Na realidade, no entanto, foi
demonstrado que esses prejuízos não eram transitórios e nem momentâneos, ao
contrário, eram estruturais e cumulativos.
Com a saída de Ozires Silva do cargo que ocupara durante quase dezessete
anos na Embraer37, assume, em 16 de julho de 1986, o novo diretor
superintendente, Ozílio Silva. Em 1987, sob novo comando, foram anunciados
investimentos ambiciosos para os cinco anos seguintes, da ordem de US$ 350
milhões em novos projetos – quatro vezes e meia os US$ 77 milhões gastos em
P&D entre 1982 e 1986. A percepção da nova direção entendia que para manter
competitiva a empresa deveriam ser realizados investimentos em novas instalações
físicas, a renovação do ferramental, e, sobretudo, o apoio do Maer (LOPES, 1994, p.
280).
O programa AMX, iniciado em 1979, já havia consumido até 1987 cerca de
US$ 1,8 bilhão. Segundo a visão do Maer, “mesmo sendo um investimento custoso,
o projeto AMX era visto como um programa que traria retorno tecnológico para o
país”. Na verdade, a execução e o desenvolvimento do programa AMX revelou-se
um empreendimento maior que a Embraer e a própria FAB juntas. Nesse ano, o
jornalista Gilberto Dimenstein apurou, pela Folha de S.Paulo, que os recursos
arrecadados mediante taxações compulsórias, sobre mercadorias como
combustíveis e automóveis – dinheiro oficialmente destinado ao financiamento de
programas de desenvolvimento econômico e social – estavam na verdade sendo
37 Ozires Silva afastou-se da Embraer para assumir a presidência da Petrobrás, em 1986. Posteriormente, assumiria o cargo de ministro da Infra-Estrutura durante o governo Collor.
100
desviados para o “saco sem fundo” do programa, argumentado que o dinheiro gasto
pelo governo brasileiro no programa AMX permitiria ao ministério montar a mais
poderosa aviação militar do continente. Quando comparado aos caças supersônicos
de última geração, como os F-16 Falcon, norte-americanos, e os Mirage 2000,
franceses, o AMX era considerado lento, pouco manobrável em grande altitude e
custava caro demais, podendo alcançar custos próximos ao F-16. Para atender as
modificações requisitadas pela FAB o avião teve seu custo unitário elevado de US$
8 para US$ 18 milhões de dólares, e, de acordo com os armamentos e uma série de
opcionais, seu valor poderia ascender aos US$ 21 milhões, diminuindo
consideravelmente as possibilidades de retorno do investimento realizado no
programa. O então diretor superintendente da Embraer, Ozílio Silva, em resposta às
críticas, argumentava “que o governo não havia investido no AMX para ter retorno
financeiro, havia investido para ter o avião” (LOPES, 1994, p. 340).
A situação começou a agravar-se no final da década de oitenta e início de
noventa, com a crise financeira que atingiu o Estado brasileiro, enfraquecendo os
orçamentos destinados aos fabricantes da área militar e aos fornecedores do
governo. A previsão inicial “era de uma produção anual entre 48 a 60 aviões,
destinada a atender o plano de defesa italiano e europeu, além do brasileiro. [...]
Com o final da guerra-fria, o programa AMX teve uma redução de 40% nas suas
entregas” (TÁPIA, 1993, p. 61 apud BERNARDES, 2000, p. 227). Para a Embraer,
por ter presença consolidada na área comercial, os cortes orçamentários nos gastos
de defesa não tiveram impacto imediato nos programas militares, mas o programa
AMX passou a consumir um terço do faturamento da empresa, acelerando seu
processo de degradação e decadência. Com a instauração de um governo civil,
cortaram-se os orçamentos militares, por intermédio do Itamaraty, e o Maer não mais
repassou os recursos para o desenvolvimento do programa. Outro dado que
comprometeu a saúde financeira da empresa foi o fato de a Embraer ter honrado até
o final o compromisso firmado entre o governo brasileiro e o italiano, com seus
próprios recursos, o que foi uma atitude muito digna, mas que custou caro à
empresa.
A crise financeira da Embraer começou a se tornar pública com o fracasso do
projeto CBA-123 Vector, avião turboélice pressurizado para dezenove passageiros
desenvolvido em conjunto com a empresa Argentina FMA (Fábrica Militar de
Aviões), iniciado em 1989. O programa CBA Vector partiu de acordo binacional
101
decorrente de uma iniciativa política do presidente Sarney com o governo da
Argentina, que teve sua origem na chamada “Declaração de Iguaçu”, visando ao
estreitamento dos laços e a dinamização do Mercosul38. A Embraer desenvolveu o
CBA-123 para substituir o Bandeirante no mercado externo. O acordo entre os dois
países estabelecia que o Brasil seria responsável por 70% do avião e a Argentina
pelos 30% restantes. O contrato previa ainda a compra de quarenta unidades pelo
governo brasileiro e de vinte unidades pelo governo argentino. Os dois países não
cumpriram o acordo.
Segundo Bernardes (2000, p. 228) “as críticas a esse programa, feitas por
dirigentes da Embraer, alegavam o uso político da empresa pelo governo brasileiro e
a falta de tino comercial. Ozires Silva, no entanto, contesta essa visão. Em sua
opinião, ocorreu justamente o contrário. Naquele momento a Embraer entendia que,
envolvendo a Argentina, ganharia respaldo político para que o projeto fosse
considerado pelas autoridades brasileiras”. De qualquer modo, o fato é que o
programa carecia de estudo detalhado de mercado e esquecia-se do principal, ou
seja, de identificar qual seria o usuário e se ele estaria disposto a comprá-lo,
sobretudo tendo em vista a tecnologia avançada e o preço mais elevado em relação
aos concorrentes.
A empresa investiu US$ 220 milhões e a FMA Argentina US$ 60 milhões no
desenvolvimento do avião, que nunca chegou a ser produzido em série por falta de
mercado. Sob a ótica técnica o CBA-123 foi um sucesso, o avião incorporava o que
havia de mais moderno na engenharia aeronáutica em aeronaves de sua classe,
operava em grandes velocidades e altitudes (680 km/h e 12.000 metros) e exibia
conforto interno com baixo ruído e vibração na cabine de passageiros. Porém,
apesar de ser avançado, o avião, que custava cerca de US$ 6 milhões, apresentava
preço muito superior ao de mercado. Análises de mercado na época já emitiam
sinais de redução no segmento regional na categoria de dez a vinte lugares. Além
disso, estudos demonstravam que seu preço real não poderia ultrapassar a faixa de
US$ 4,5 milhões. Os modelos americanos Beech 1900 e Jetstream apresentavam a
mesma performance que o CBA-123 por custos operacionais muito menores, até
38 Recorde-se que as primeiras iniciativas para a formação do Mercosul são tomadas em 1986, pelos governos brasileiro e argentino, consubstanciadas na assinatura dos primeiros convênios de integração comercial entre os dois países. Em 1989, são assinados vários protocolos de natureza geral e setorial com o objetivo de facilitar as trocas de bens e serviços (COMIN, 1996, p. 20 apud Bernardes, 2000, p. 228).
102
45%, custando entre US$ 3,5 e US$ 4,5 milhões (BERNARDES, 2000, p. 229). Além
de uma visão excessivamente tecnológica, a absoluta falta de uma avaliação
criteriosa de mercado e o estabelecimento de metas inatingíveis condenaram o
programa ao fracasso e aceleram a degradação financeira da empresa. Outro fato
inusitado que não constava das previsões foi o aquecimento dos mercados de
aviões usados, nos anos noventa, na faixa de dezenove lugares. A Embraer chegou
a fabricar dois protótipos do CBA-123. Seu vôo inaugural deu-se em julho de 1990 e
teve sua apresentação internacional em Farnborough (Inglaterra) em setembro do
mesmo ano. O CBA-123 chegou a contar com 157 opções de compra, mas
nenhuma venda firme. Para a entrada em linha do CBA-123 seriam necessários
mais US$ 140 milhões, recursos que não puderam ser viabilizados pela Embraer (
BERNARDES, 2000, p. 229) .
Na parte de gestão financeira da empresa os problemas relativos à estrutura
de financiamento revelaram-se inadequados. O volume de capital de risco que
ingressou na Embraer demonstrou-se insuficiente diante do fluxo de investimentos
efetivados. Entre 1970 e 1993, foram investidos cerca de US$ 750 milhões, para a
entrada, no mesmo período, de US$ 270 milhões, ou seja, havia um déficit de US$
480 milhões. Considerando-se que a geração interna de recursos não pôde cobrir
essa diferença, a Embraer teve de se financiar com recursos de terceiros. Todavia,
projetos de maturação de médio e longo prazo exigem linhas de financiamento
compatíveis, em prazos e taxas, o que não se verificou na empresa (Ibidem).
2.1.3 - A MUDANÇA DA ECONOMIA E DO AMBIENTE POLÍTICO-INSTITUCIONAL NO FINAL DA DÉCADA DE OITENTA E INÍCIO DE NOVENTA
É importante resgatar o período histórico em que se desenvolve a crise da
Embraer, para melhor situarmos o processo de mudança institucional que sofrerá a
empresa. No final da década de oitenta e início da década de noventa, a situação da
Embraer ficou mais complicada por causa das transformações que se processaram
na economia mundial e no cenário político e econômico brasileiro. No ambiente
externo desenhou-se um cenário francamente desfavorável em decorrência da
recessão mundial do mercado aeronáutico civil e o arrefecimento da demanda por
aeronaves militares em virtude do final de Guerra Fria.
103
Para Ozires Silva, a gestão da Embraer começou a sofrer pressões do
governo para controlar as estatais, a partir de 197939. Na década de oitenta,
segundo ele, as autoridades públicas já não diferenciavam a administração indireta
(as empresas) da direta (as repartições públicas). Os decretos que regulavam os
órgãos do governo passaram a incluir também as empresas, sociedades anônimas
de economia mista e todos os órgãos da administração indireta da União Federal.
Para Ozires, “o preço pago foi alto. O resultado foi uma grande perda de agilidade
das empresas estatais que nitidamente começaram a mostrar deterioração. Ao invés
de procurar corrigir melhorando os padrões básicos organizacionais, a resposta da
burocracia foi no sentido de apertar os controles. [...]. As posturas governamentais
foram claras. As regras para uma grande siderúrgica passaram a ser as mesmas
aplicáveis a uma indústria aeronáutica como a Embraer, ou a um hotel em Santa
Catarina que por estranho que pareça era também uma estatal. Isto afetou muito a
Embraer” (SILVA, 1985 apud BERNARDES, 2000, pp. 230-231).
No plano do marco regulatório institucional interno, o Brasil começa a sofrer
transformações políticas e econômicas profundas. Em 1985 iniciou-se a etapa final
do processo de transição do regime militar à democracia, com gradual substituição
no comando da política econômica de quadros oriundos do antigo regime por outros
identificados com a oposição. Após as eleições de novembro de 1986, ascende ao
poder, em eleição indireta, uma aliança civil de centro-esquerda, tendo à frente,
como candidato à Presidência da República, o senador Tancredo Neves, com o
compromisso popular de democratizar o Estado e mudar os rumos da economia do
39 Neste ano, referente ao início do governo Figueiredo, são adotadas medidas ostensivas para reduzir a participação das estatais na economia, com a criação do Programa Nacional de Desburocratização e da Secretaria Especial de Controle das Empresas Estatais (Sest). O ponto central de discussão nesse momento era a ineficiência do setor público empresarial de inibir a expansão do setor produtivo estatal, pois havia percepção do governo de que estatais tinham escapado do controle orçamentário das autoridades federais. Pinheiro (1999 p. 156 apud BERNARDES, 2000, p. 230)“não se tratava de uma guinada ideológica quanto ao papel do desenvolvimento do Estado, mas antes uma mudança na ênfase da política econômica, imposta por transformações até certo ponto fora do controle governamental. A prioridade não era mais o crescimento e a suspensão da crise cambial. [...] Sendo as estatais responsáveis por parcela considerável dos investimentos e do consumo doméstico, seria quase impossível estabilizar a economia sem alguma forma de controle sobre elas. Imperativos de ordem macroeconômica – a crise cambial, em particular – afetaram as estatais de duas maneiras. Antes da crise da dívida externa (1982), as estatais foram levadas a contrair empréstimos no exterior além de suas necessidades, de forma a financiar os crescentes déficits em conta corrente no país. Com débitos bastante ampliados essas empresas veriam suas despesas crescerem rapidamente, com o aumento das taxas de juros internacionais a partir de 1979 e a significativa desvalorização cambial depois de 1981. Assim o uso dessas empresas como instrumento de política macroeconômica apresentou seus limites em relação ao investimento, aumento de endividamento, redução do valor real de preços e tarifas e a própria perda de foco nos objetivos empresariais”.
104
país, até então governado, desde o golpe de 1964, por presidentes militares. Com o
falecimento do presidente Tancredo Neves, assume seu lugar o vice, José Sarney,
com a obrigação de manter e aplicar os compromissos celebrados pela aliança
democrática.
Diante da crise fiscal e econômica do Estado, com o governo da Nova
República, são realizados esforços para disciplinar o gasto público e estabilizar a
economia nacional.
Com o equilíbrio financeiro do setor público, cujas necessidades de
financiamento chegavam a perto de 10% do PIB em 1985 e a escalada inflacionária
da economia, o governo foi obrigado a adotar medidas enérgicas, alterando o
comando da economia e implementando, em 1986, o Plano Cruzado, um programa
de estabilização que tinha por objetivo combater a inflação inercial mediante a
adoção de uma nova moeda (reforma monetária) e do congelamento geral de
preços. No plano estrutural, o governo não deu prosseguimento às reformas
institucionais no âmbito tributário e financeiro, com a meta de reduzir o problema da
dívida interna e externa40. Segundo Eber; Vermulm (1993, pp. 21-32 apud
BERNARDES, 2000, p. 232) “sem lograr a implementação de reformas profundas,
utilizando-se da reforma monetária e do congelamento, o plano Cruzado era muito
limitado sob o ponto de vista industrial e, embora o sucesso relativo do plano tivesse
aumentado a credibilidade do governo, este foi incapaz de avançar em qualquer
política industrial efetiva para o país. [...] Posteriormente, com o insucesso do
programa de estabilização, a credibilidade do governo e do próprio Estado
desmoronam e os aparatos públicos se deterioram”41 .
No governo Sarney, houve a declaração de uma Nova Política Industrial:
“apesar do comprometimento formal do governo e do apoio que recolhia no
empresariado industrial [...] tal agenda de intenções nunca chegou a se traduzir em
medidas efetivas de maior alcance. Enquanto esteve em vigor, ela consistiu quase
40 A privatização avançou no governo Sarney em ritmo semelhante ao de seu antecessor, apesar da retórica mais agressiva, como refletido na série de decretos presidenciais e projetos de lei reestruturando e ampliando o programa de privatização. No total, dezoito empresas, avaliadas em US$ 533 milhões, foram vendidas, com igual número sendo transferido para os governos estaduais, duas incorporadas a outras instituições federais e quatro desativadas. Na maior parte eram de empresas de pequeno porte. 41 Em 1988 é aprovada nova Carta Constitucional, alterando a distribuição dos recursos tributários e conferindo maior autonomia às unidades da Federação; o governo reduz a participação nas receitas do setor público de 17% do PIB em 1980 para 13% em 1989 (ERBER; VERMULM, 1993 apud BERNARDES, 2000, p. 232).
105
exclusivamente em promessas, pretensão, discursos... sua existência não foi muito
longa. Desde então, a receita oficial para assegurar a modernização e o dinamismo
do parque industrial brasileiro passava a privilegiar a ampliação do grau de abertura
da economia, a supressão dos entraves burocráticos à atividade empresarial e o
tratamento mais flexível para o capital estrangeiro” (EBER; VERMULM,1993 apud
BERNARDES, 2000, p. 232).
A paralisia de decisão e a incapacidade de administração dos conflitos pelo
Estado, aliados à crise financeira profunda e econômica, impossibilitaram a
implementação de forma integrada da Nova Política Industrial, tornando-a
incompatível com as políticas econômicas de curto prazo. Todavia, nesse quadro,
são criados mecanismos de controle orçamentário e os primeiros passos para o
processo de abertura da economia que terão impactos substantivos na gestão
financeira da Embraer42. Em 1988, por exemplo, a empresa sofre um golpe profundo
com a extinção do Decreto-Lei nº 7.708/69, que garantia à Embraer a atração de
recursos proporcionados pelo investimento de pessoas jurídicas que podiam investir
até um por cento do imposto de renda devido em ações da empresa sem direito a
voto, deduzindo tal quantia do Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ). A
legislação do incentivo de um por cento foi extinta com a Lei nº 7.714, de 29 de
dezembro de 1988.
Depois de trinta anos de vigência da chamada Lei das Tarifas, em 1988 é
realizado o processo de reforma da estrutura tarifária brasileira. A estrutura tarifária
vigente na economia brasileira no final da década de oitenta havia sido concebida à
luz da lógica do Modelo de Substituição das Importações e orientava-se na Lei de
Tarifas de 1957. As principais características foram apontadas por Simões de
Almeida (1996, p. 85 ): “a) tarifas altas e redundantes; b) abundância de regimes
especiais; c) proliferação de controles quantitativos de importação; d) existência de
tributos adicionais”. De outro lado, “o governo estabeleceu diversas barreiras não
tarifárias com o intuito de atingir dois objetivos. Primeiro, em face da abundante
concessão de regimes especiais ou de eclosão de choques exógenos afetando a
economia brasileira (como a crise do petróleo), buscava-se obter certo saldo
comercial para evitar déficit no balanço de pagamentos. Segundo, devido à
42 Na verdade, a preocupação e os esforços para disciplinar gasto público já haviam levado o governo brasileiro a criar em 1979 a Sest – Secretaria Especial das Estatais, cuja finalidade era limitar e controlar a complementação dos programas de investimentos das estatais, restringindo-lhes crédito e monitorando os preços.
106
exagerada concessão de regimes especiais de importação, lançava-se mão de
estabelecer barreiras não tarifárias para fornecer proteção à indústria. Tais controles
quantitativos das importações significaram um reforço dos níveis de proteção
tarifários e contribuíram para a eliminação das fontes de contestabilidade,
proporcionadas pela entrada de bens importados e o posterior ingresso da empresa
exportadora do exterior, motivados pelas importações pretéritas” (SIMÕES DE
ALMEIDA, 1996, p. 91).
Segundo Simões de Almeida ( 1996, p. 93) resumindo, “a estrutura tarifária
brasileira e a política comercial no final dos anos oitenta apresentavam traços
evidentes de irracionalidade, inadequabilidade sistêmica, instabilidade e
discricionariedade. A irracionalidade ficava com a existência da redundância tarifária
e enorme renúncia fiscal. A inadequabilidade sistêmica surgia também por causa da
renúncia fiscal, da estrutura tarifária que era uma fonte de crises de Balanço de
pagamentos e do estímulo para o comportamento competitivo dos empresários. A
característica de discricionariedade nas regras impunha outro estímulo para o
comportamento por parte dos produtores domésticos, tanto aqueles que se
esforçavam por pleitear o enquadramento dos seus insumos necessários a seu
processo produtivo em regimes especiais quanto aos que pressionavam o governo
para levantar barreiras não tarifárias de importação para seus produtos no mercado,
assim como impunham dificuldades (incertezas e riscos) no horizonte de
planejamento para a empresa”. A saída para tal impasse, que havia proporcionado
uma proteção demasiadamente grande ao mercado nacional, foi a proposição de
uma reforma tarifária que restaurasse novamente a racionalidade à estrutura do
comércio exterior e rompesse com os elos da estrutura antiga de proteção e
estimulasse a competitividade das empresas brasileiras (Ibidem).
Nesse contexto, é elaborada entre 1986-87, submetida ao Congresso em
novembro de 1987 e aplicada efetivamente em 1988, a Reforma Tarifária, como
parte integrante de uma Nova Política Industrial, na qual se previa redução
significativa das alíquotas de importação. Porém a Reforma Tarifária não conseguiu
avançar na eliminação dos regimes especiais de importação e nem na redundância,
sendo incapaz de assumir uma “natureza liberalizante”, como viria a ser a Reforma
de 1990, no governo Collor (SUZIGAN; VILLELA, 1997; SIMÕES DE ALMEIDA,
1996). Nesse novo ambiente, em 19 de maio de 1988, é aprovado o Decreto-Lei nº
2.434, pelo qual se reduziu em oitenta por cento o imposto de importação sobre
107
aeronaves, dentre outras, por empresas concessionárias de linhas regulares de
transporte aéreo. Este decreto-lei será revogado pela Lei nº 8.032, de 12 de abril de
1990, e em seu lugar será editado, já na gestão do presidente Collor, o Decreto nº
99.694, de 16 de dezembro de 1990, reduzindo a zero alíquota do Imposto sobre
Produtos Industrializados (IPI) sobre aeronaves em geral, exceto aviões a jato de
pequeno e médio porte. Tal redução objetivava a redução do ônus tributário sobre os
preços de aviões, estimulando a renovação das frotas das empresas nacionais
concessionárias de linhas regulares de transporte aéreo, sob o imperativo de
segurança de vôo, economia e capacidade competitiva das mesmas.
Essa situação acabou prejudicando a Embraer e a Neiva, uma vez que um
avião como o EMB-120 Brasília apresentava carga tributária de 19,2% do seu preço,
ao passo que a importação de um avião estrangeiro, mesmo sendo usado,
desfrutava de uma alíquota de IPI de zero por cento. Com isso, para a Embraer
vender um avião para o mercado doméstico, tinha de exportá-lo para depois
revendê-lo ao cliente nacional. Segundo Bernardes (2000, p. 235) “a União, é bom
lembrar, era detentora de 97% das ações de controle da Embraer, e uma vez que
essas medidas dificultavam as vendas das aeronaves dessa empresa, oneravam
também as finanças do governo”.
O conjunto dessas medidas aplicadas no âmbito governamental, a crise fiscal
e a desestruturação do Estado com a perda de capacidade da aplicação das
políticas industriais e tecnológicas, no decorrer da década de oitenta, somado ainda
aos problemas internos atravessados pela Embraer, acabaram por eclodir no
colapso financeiro da empresa em 1989. Sua situação começou então a ficar
insustentável. Em 1990, por exemplo, os prejuízos somavam cerca de US$ 241
milhões, o patrimônio líquido apresentava queda de 30,3%, o faturamento declinava
de US$ 700milhões, em 1989, para US$ 500 milhões, o endividamento geral da
empresa registrava US$ 620 milhões, sendo US$ 502 milhões em dívidas de curto
prazo (ver Tabela 17).
108
TABELA 17 – Indicadores de Desempenho Econômico-Financeiro da Embraer (valores em US$ milhões)
1989 1990 1991 1992 1993 1994
Faturamento
Vendas
Mercado externo (%)
Mercado interno (%)
Ativo total
Patrimônio líquido
Prejuízo
Investimentos em P&D
% P&D/faturamento
Endividamento
Geral
Curto prazo
Longo prazo
700
36
64
1.145
416
89
107
15,8
-
-
-
582
37
63
1.092
126
(265)
128
22,0
620
502
118
402
32
68
1.435
324
(241)
48
11,9
804
241
563
333
32
68
1.227
86
(258)
24
7,2
877
309
568
261
38
62
1.125
156
(116)
35
13,4
758
394
364
177
40
60
1.067
281
(310)
55
31,0
410
221
189
Fonte: Embraer (1996).
A deterioração do ambiente empresarial interno da Embraer foi magnificado
com os desdobramentos do processo de desgaste e evolução do quadro político e
econômico nacional. Recorde-se que a fase final da Nova República foi
estigmatizada pelo imobilismo do governo Sarney, erodido por amplo descrédito na
sociedade civil e pela defesa de privilégios setoriais no meio empresarial.
Concomitantemente, começou a disseminar-se como idéia-força, tanto nas esferas
governamentais como empresariais e intelectuais, a crença no esgotamento da
estratégia clássica de industrialização, com a irrupção de uma crise do nacionalismo
tecnológico e a necessidade de se redefinir a concepção global de desenvolvimento
junto com as práticas de políticas setoriais (TÁPIA, 1995, p. 285 apud BERNARDES,
2000, p. 236).
Em 1990, quando é eleito para a Presidência da República o candidato
Fernando Collor de Mello, duas questões estavam consensualmente impostas na
agenda nacional: a redefinição da estratégia industrial global do Brasil e a
reestruturação da política de reserva de mercado. O governo Collor estava pautado
109
por uma agenda liberal que pregava reformas políticas radicais como a
desregulamentação e abertura da economia, assim como um programa de
privatização das empresas públicas e revisão geral das políticas industriais e de
comércio exterior. O governo Collor iniciou sua gestão com a implementação de um
programa de estabilização, tendo em vista interromper o processo hiperinflacionário
(a taxa de inflação chegava a 81% ao mês) e criar condições de estabilidade para a
retomada do crescimento. Depois de uma década de crise política e instabilidade
macroeconômica, expressa tanto no comportamento errático da economia, quanto
na ausência de modificações estruturais no sistema produtivo industrial, o processo
recessivo instaurado com a edição do Plano Collor, combinado à abertura da
economia promovida pela reformulação das políticas industrial e de comércio
exterior, acabaram por modelar um novo marco político-institucional e econômico no
país (Ibidem).
As diretrizes de ação governamental foram estruturadas e norteadas pelo
trinômio liberalização/desregulamentação/privatização e pela implementação de uma
Nova Política Industrial e de Comércio Exterior (Pice) do governo Collor, que foi
consubstanciada em quatro documentos básicos: Diretrizes Gerais para a Política
Industrial e de Comércio Exterior, de 26 de junho de 1990, nas quais se
encontravam formalizados os objetivos e as linhas gerais do projeto governamental
para a área industrial; o Programa de Apoio à Capacitação Tecnológica da Indústria
Brasileira (Pacti), de 12 de setembro de 1990; o Programa Brasileiro de Qualidade e
Produtividade (PBQP), de 7 de novembro de 1990 e o Programa de Competitividade
Industrial (PCI), de 27 de fevereiro de 199143.
No plano geral, a Pice partia do diagnóstico que o padrão de industrialização
anterior (modelo de substituição às importações) havia se esgotado como fator
dinâmico do desenvolvimento econômico. Associou-se à grave crise da capacidade
de financiamento do Estado, que levou ao longo dos anos oitenta a uma crescente
43 É importante considerar que as críticas feitas a esse conjunto de medidas advertiam que, embora a nova política industrial e de comércio exterior priorizasse o progresso técnico, beneficiando os setores dinâmicos da indústria, na prática, confirmou-se a predominância de preceitos liberais, ao se optar pelo ajuste produtivo orientado pelo mercado e pela inserção passiva da economia no comércio internacional, não instrumentalizando o Estado com mecanismos que permitissem a defesa da indústria nacional contra práticas desleais de comércio ou que estimulassem um processo de reestruturação industrial competitiva. Tanto o PCI, um dos alicerces da Política Industrial e de Comércio Exterior (Pice), como a PBQP, tinham como objetivo a capacitação para a produção de bens e serviços competitivos, mas ignoravam o papel central da inovação não seria necessária para países de industrialização tardia (ERBER, 1990; ERBER e VERMULM, 1993 apud BERNARDES, 2000, p.236).
110
instabilidade macroeconômica, cuja principal expressão foi a tendência à aceleração
inflacionária (FURTADO et al, 1994). Os objetivos nucleares da Pice consagravam-
se em “deslocar a prioridade da política industrial da internalização da produção
local, com um objetivo em si mesmo, para a busca do desenvolvimento industrial,
fundamentado em ganhos crescentes de produtividade e na melhora da qualidade
dos produtos e serviços. A estratégia seria a revisão da inserção do país na
economia internacional, a partir de maior competitividade dos produtos brasileiros”
(FURTADO et al, 1994, p.75).
Esse programa deveria ser contextualizado ainda na redefinição dos papéis
do Estado, do capital nacional no modelo proposto pelo governo Collor, nos
seguintes termos: “A principal responsabilidade do Estado nesta fase do
desenvolvimento industrial brasileiro é garantir a estabilização macroeconômica e a
reconstrução de um ambiente favorável aos investimentos em geral, com o
esclarecimento de regras claras e estáveis para a vida econômica” (BAPTISTA,
1993, p. 241). Devido exclusivamente a suas funções básicas e recuperada a sua
capacidade nacional, abre espaço para que o capital privado exerça plenamente seu
papel de principal agente no processo produtivo (Ibidem).
Erber (1991, p. 345 apud BERNARDES, 2000, p. 238) identificava na nova
política industrial as seguintes proposições:
- “redefinição dos papéis desempenhados pelos setores público e privado na
dinâmica industrial, retirando-se do Estado a sua função produtiva e de
planejamento”;
- “eliminar a discriminação em favor do capital privado nacional frente ao
capital estrangeiro, conferindo a este último papel central na retomada do
desenvolvimento”;
- “reduzir substancialmente o nível de proteção à indústria local ao restringi-la
à proteção tarifária, cujos níveis são rebaixados”;
- “o grau de discriminação setorial da política tarifária é restringido ao se
reduzir substancialmente a dispersão das tarifas”.
As razões da baixa competitividade da indústria brasileira eram explicadas
pelo fato segundo Quadros Carvalho; Bernardes (1998, pp. 7-8) que a “política
industrial da fase anterior, com seu corte para dentro e pouca consideração dos
critérios de eficiência estática e dinâmica, fora capaz de lograr a constituição de um
parque industrial complexo e relativamente integrado, mas acumulou deficiências
111
estruturais significativas. Entre elas, destacavam-se o baixo crescimento da
produtividade, a limitada capacitação tecnológica e a dependência de um padrão de
exploração de recursos humanos. Estes fatores, associados ao custo fiscal dos
programas de fomento industrial e regional vigentes, contribuíram para alimentar a
espiral inflacionária, reduzir o horizonte dos negócios e provocar a retração dos
investimentos. A combinação da proteção comercial excessiva com a concessão
ilimitada de incentivos fiscais generosos e crédito público subsidiado acabou por
conduzir a um comportamento empresarial conservador, contrário ao risco e a
inovação”.
Com base nesse diagnóstico Quadros Carvalho; Bernardes (1998, pp. 7-8) “a
implementação da Pice pretendia introduzir uma estratégia no conceito de
integração internacional e aumento da competitividade (integração competitiva).
Segundo esta estratégia, o governo deveria aumentar a pressão competitiva sobre
os agentes econômicos a fim de impulsioná-los a buscarem eficiência produtiva e
qualidade como maneira de enfrentar a concorrência. Tal pressão seria
conseqüência da revisão das barreiras protecionistas às importações.
Complementariamente, o governo buscou introduzir um mecanismo regulador da
concorrência mais adequado às novas condições de mercado (lei de concorrência).
Aos agentes dispostos a modernizar-se, o governo daria apoio através de programas
de reestruturação e de apoio a capacitação tecnológica e a produtividade e a
qualidade”.
Na prática, no entanto, segundo Quadros Carvalho; Bernardes (1998, p.9) “a
contradição entre as metas de restrição ao gasto público, determinadas pela gestão
de curto prazo imposta pela racionalidade da política de estabilização econômica,
terminou por tornar inviável qualquer ação governamental significativa em relação às
políticas de reestruturação e competitividade [...]. Durante esta primeira fase, elas
funcionaram mais como slogans ou símbolos, que como programas efetivos”.
Além disso, a falta de “discussão da reestruturação do papel do Estado na
industrialização brasileira na Pice” foi enfatizada por Furtado (1994). Para o autor
(1994, p.81), “a Pice assumia uma fé desmedida na capacidade dos investimentos
privados virem a substituir integralmente o papel do Estado nos anos vindouros [...].
O discurso e a prática da Pice terminaram por resvalar numa fé pouco fundamentada
em que a iniciativa privada no Brasil possa assumir, repentinamente, setores mais
112
ou menos estratégicos, cujos investimentos, ao longo de várias décadas de
industrialização, estiveram a cargo do Estado”.
Por sua vez, descreviam a Pice como uma estratégia de “pinça” formada pela
política de concorrência (cujo eixo estrutural seria a abertura da economia) e pela
política de competitividade. Para os autores haveria um descompasso na aplicação e
no gerenciamento entre as políticas de competitividade que teriam um período de
maturação de longo prazo. Esse desequilíbrio estrutural entre as duas pernas da
pinça, em que as políticas de competição são mais fortes que as de competitividade,
faria com que a resultante do campo de força pendesse decisivamente para o lado
das primeiras. Ademais, alertavam para os impactos distintos provocados pela
abertura das fronteiras comerciais nos setores da indústria, e para o fato de a Pice
não dispor de mecanismos adequados de monitoramento e políticas setoriais
específicas para os setores mais atingidos por tal processo44 (ERBER; VERMULUM,
1993, p. 58 apud BERNARDES, 2000, p. 240). Por exemplo, reconhecia a
existência de descompassos, no processo de implementação da Pice, entre a
desmontagem dos instrumentos, da política industrial protecionista e a construção de
novo arcabouço institucional implicando o aumento do grau de instabilidade para o
cálculo estratégico das empresas.
Por outro ângulo, com a inauguração do programa brasileiro de privatizações,
pretendia-se a redução do papel do Estado na economia, revelando-se também
instrumento adicional da política de abertura da economia ao capital estrangeiro
(BAPTISTA, 1994, p. 241). O tratamento ao capital estrangeiro na Lei nº 8.301, de
12 de abril de 1990, passava a definir a estrutura do Plano Nacional de
Desestatização: “O PND tratava o capital estrangeiro de forma mais liberal que os
processos anteriores e mesmo que as privatizações em países como a Espanha, a
Itália, a França e, mais recentemente, Portugal. [...] O capital estrangeiro poderia
comprar até 40% do capital votante (ações ordinárias) e até 100% do capital não
44 No campo das relações entre capital e trabalho, as negociações celebradas no âmbito da Câmara setorial do complexo automotivo pareceram despontar como um caminho promissor para a formulação de políticas de intervenção governamental para a área industrial. Nesse sentido, a nova experiência pode ser vista como um avanço das formas de negociação entre os sindicatos e as empresas, assim como para os rumos e desdobramentos futuros que o processo de reestruturação produtiva pudesse vir a ter. Contudo a nova experiência não foi consolidada e não obteve o mesmo êxito nos demais segmentos da indústria. Ver Guimarães, I.G.R. Câmaras setoriais – notas sobre sua constituição, quadro atual e perspectivas. Série Seminários nº 22/94. Rio de Janeiro: Ipea, dez. 1994. Arbix, G.A.T. A câmara setorial na indústria automobilística no Brasil. Tese de doutorado. São Paulo: Departamento de Sociologia, FFLCH/USP, 1995.
113
votante (ações preferenciais). Três anos após a privatização, caem quaisquer
restrições à transferência de controle dessas empresas ao capital estrangeiro”
(BAPTISTA, 1994, p.243). Recorde-se que o plano de privatização das empresas
públicas só se iniciou realmente no quarto trimestre de 1991, com o leilão de uma
importante siderúrgica: a Usiminas.
As críticas ao PND foram bem elaboradas por Furtado: o autor notava a “total
desarticulação entre a política de privatização e a Pice, a ausência de uma política
de reestruturação das estatais e a inexistência de alternativas para o financiamento
de investimentos em infra-estrutura [...] o programa de privatização não tinha
desenvolvido qualquer instância ou mecanismo de articulação com a nova política
industrial. A definição dos procedimentos e critérios de privatização não levaram em
consideração nenhum aspecto relativo à necessidade de preservar / ampliar a
competitividade e a capacitação tecnológica dos setores envolvidos [...]. O Programa
de Privatização do governo Collor operou exclusivamente dentro de critérios
financeiros, a fim de atender metas de redução do passivo do setor público [...] não
se condenam os objetivos fiscais do programa, mas a ausência de mecanismos, em
sua operacionalização, que previssem e viabilizassem investimentos para a
reestruturação e a ampliação da competitividade dos setores privatizados. Para além
da troca de propriedade de ativos, o programa de privatização poderia e deveria
comportar um conjunto de metas e mecanismos para a modernização produtiva e a
preservação / ampliação da capacitação tecnológica das empresas privatizadas”
(FURTADO, 1994, pp. 81-82).
Nesse período, devem ser considerados eventos importantes a nova reforma
tarifária de 1991 e os esforços de integração hemisférica com os países do cone Sul
consagrados na formação de um mercado comum45 (Mercosul).Conforme Comin
(1996b, p. 20 apud BERNARDES, 2000, p. 241) “o movimento em direção a um
padrão mais aberto de comércio exterior no Brasil tem início com a reforma tarifária,
a abertura assume a dinâmica que caracterizaria os anos noventa: velocidade e
profundidade muito intensas, sem paralelo no histórico de outros países”. A redução
da tarifa média de importação é acelerada passando de 41% em 1988 para 13,5%
45 O tratado do Mercosul, que conforma sua atual estrutura, foi assinado em 1991. No documento, os quatro países – Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai – comprometeram-se a reduzir suas tarifas aduaneiras de forma gradual até atingir, em 1º de janeiro de 1995; a condição de livre circulação de mercadorias e serviços entre eles. Recentemente o bloco recebeu a adesão do Chile e da Bolívia (COMIN, 1996b,p.20 apud Bernardes, 2000, p. 241).
114
em 1994. A reforma tarifária de 1991, “além de ter tido caráter racionalizante,
apresentou um fator liberalizante no ambiente econômico, sinalizando aos agentes
econômicos uma grande mudança – profunda e irreversível – da estrutura de
proteção à indústria brasileira. Seu papel ultrapassou os limites de uma mera
interferência no regime de comércio exterior e pôs em movimento expectativas com
relação a um novo momento da economia. Além disso, constituiu-se em um fator
mutagênico fundamental na profunda modificação dos condicionantes do ambiente
econômico brasileiro (SIMÕES DE ALMEIDA, 1995, p. 101).
Do ponto de vista da reestruturação empresarial, a introdução de novas
regras na orientação da economia irradiou modificações radicais e estruturais na
dinâmica concorrencial do mercado interno e nas estratégias de ajustes das firmas46.
Por um lado, o forte ciclo recessivo, provocado pela política monetária e fiscal
restritiva, produziu um impacto negativo no nível de atividade industrial e,
conseqüentemente, reduziu as escalas de produção das empresas. Esse
componente recessivo induziu as unidades industriais a promover um ajuste de
caráter nitidamente defensivo Coutinho; Ferraz, (1994, pp. 55-54 apud
BERNARDES, 2000, p. 242), especialmente as que mantinham no mercado interno
seu principal espaço de atuação, e, em muitas delas, adquiriu caráter predatório,
limitando-se a mudanças organizacionais que visavam a simplesmente reduzir o
contingente de empregados e racionalizar os fatores de produção47. De outro
ângulo, a percepção da irreversibilidade do processo de abertura comercial pelos
agentes econômicos e a contestação das posições de mercado geraram pressões
para que algumas empresas buscassem soluções sistêmicas48. Essas estratégias de
46 Como observou Souza, “o sentido amplo desse movimento – que associou reestruturação e a internacionalização, no âmbito internacional, e abertura comercial e recessão, no mercado interno -, se analisado à luz das esferas de decisões das empresas e de suas relações nas áreas de concorrência, pode ser também apreendido por alguns fatores básicos: crise de estruturas aparentemente sólidas e «bem protegidas»; aumento da instabilidade e contestabilidade dos mercados; internacionalização dos mercados de fornecedores e de compradores; novas exigências de clientes e consumidores finais” (1993, p. 35 apud BERNARDES,2000,p.242). 47 Na economia, a constituição de um verdadeiro “choque de concorrência”, com o aumento repentino da exposição à competição internacional, pela diminuição da proteção cambial e tarifária aliado às expectativas de integração hemisférica (pelas oportunidades abertas com o Mercosul), desencadeou um ajuste microeconômico racionalizante (Bielschowsky, 1992), incidindo diretamente na grande empresa industrial e obrigando, por sua vez, também as pequenas e médias a se reorganizarem em busca de eficiência e competitividade, de modo que assegurem espaço e a própria sobrevivência num mercado em que as exigências de consumo e as rivalidades competitivas se acentuaram significativamente. 48 Fleury (1988 apud BERNARDES,2000, p. 242) definiu uma estratégia industrial de modernização sistêmica como a busca da integração, da flexibilização e da produtividade, mediante a introdução das novas tecnologias de organização da produção, podendo haver ou não o uso de equipamentos
115
reestruturação envolveram desde a refocalização do negócio com a especialização
em produtos mais competitivos até a externalização dos serviços com a flexibilização
das relações e dos contratos de trabalho. Em alguns setores mais avançados, foram
disseminadas novas tecnologias organizacionais, redução no volume médio de
estoques, simplificação dos níveis hierárquicos, diminuição dos índices de defeitos,
disseminação de programas de controle de qualidade, renovação e atualização dos
modelos, com a informatização e a racionalização dos fluxos de produção, aplicando
técnicas de produção “just-in time” (a peça certa, no lugar certo, no momento certo)
difundindo processos de integração informacional entre fornecedores e
distribuidores, resultando em ganhos de eficiência (COUTINHO; FERRAZ, 1994, pp.
55-54 apud BERNARDES, 2000, p. 242).
Reconhecendo os limites de análises muito generalizantes, dada a
heterogeneidade que marca a indústria nacional, poderíamos dizer que o ajuste
estrutural, nessa fase, delineou trajetórias de decadência nas estruturas
organizacionais, administrativas e dos processos produtivos nas empresas, seguidas
de degradação da produção industrial.
Esse ajuste em determinados setores ou empresas implicou o aumento das
importações de insumos, sobretudo os de maior conteúdo tecnológico – reduzindo
coeficientes de nacionalização de produtos em substituição à antiga produção local.
É o caso de setores da informática, mecânica, entre outros. Em alguns ramos
industriais, especialmente nos setores de alta tecnologia, como em segmentos da
eletrônica e de química fina, pode ser identificado um tipo perverso de
“especialização regressiva”, com o fechamento de plantas e linhas produtivas, a
desativação de laboratórios de P&D, a substituição da fabricação de produtos mais
nobres e de atividades intensivas em tecnologia pela redução dos índices médios de
nacionalização de peças e componentes. Esse movimento resultou na destruição de
postos de trabalho com perfis mais elevados de qualificação e no abandono da
microeletrônicos. Identificam-se, nestas estratégias de reestruturação mais abrangentes, formas de adaptação global que compreendem ações direcionadas para a busca de novos padrões de produtividade e competência, sustentadas em mudanças profundas, envolvendo desde aspectos operativos (TQC, JIT, kanban, CEP) até fatores culturais internos à empresa. Não impedem, porém, que muitas dessas empresas adotem expedientes conservadores ou predatórios para algumas funções, tais como índices elevados de turn-over, trabalho temporário, empregos part-time, informalização. Contudo, uma pesquisa realizada por Fleury; Humphrey (1993 Apud BERNARDES, 2000, p.242) revelou que o padrão de difusão dessas inovações era bastante desigual inter e intra-setores e que algumas das mais raras e “sistêmicas” experiências de modernização se contrapunham a mudanças pontuais em um grande número de firmas.
116
fabricação de produtos com maior densidade tecnológica, substituídos pela
importação ou comercialização de produtos e componentes similares. Esse padrão
de especialização levou à regressão de trajetórias empresariais de promoção da
tecnologia, interrompendo processos de aprendizagem, o que por sua natureza
cumulativa significou perdas substanciais na capacitação tecnológica local.
Conforme Bernardes (2000, p. 244) “em linhas gerais, o processo de ajuste e
de reestruturação produtiva caracterizou-se pela ausência de coordenação
governamental federal e dos estados quanto às diretrizes que deveriam orientar as
estratégias concorrenciais no médio e longo prazo para o setor industrial”.
2.2 – O PROCESSO DE PREPARAÇÂO PARA PRIVATIZAÇÂO
Tal como descrevemos, as mudanças ocorridas no ambiente político-
institucional e econômico brasileiro e a revisão do regime de política industrial no
início da década de noventa, evidentemente, repercutiram de modo contundente nos
rumos traçados pela Embraer. A empresa chegava ao final da década de oitenta em
uma condição crítica no tocante à sua capacidade de financiamento e gestão
financeira, de desatualização do seu parque tecnológico, além de seu prestígio
começar a ser questionado. Segundo Lopes (1994, p. 364) “com o intuito de
economizar US$ 109 milhões e “salvar a empresa”, seu diretor presidente Ozílio
Silva ordenou a redução dos 12.607 funcionários que a empresa contratava, em
1989, para 8.353 trabalhadores em 1990, ou seja, eliminou 4.254 vagas. Essa
medida controvertida lhe custou a própria demissão”.
Com o agravamento da crise da Embraer, no início de 1990, é indicado um
novo diretor presidente, João Cunha, homem de confiança do presidente Collor, que
vinha com a missão de sanear e restaurar a empresa. Um dos seus primeiros atos
diante das pressões exercidas pelo vencimento das dívidas de curto prazo foi
requisitar ao Banco Central a aprovação de um reempréstimo de US$ 600 milhões e
determinar a demissão de mais 3.100 funcionários. É digno de menção que em
1991, pela primeira vez em catorze anos, a Embraer não montava o seu estande na
Feira de Le Bourget, por absoluta falta de dinheiro. Passados alguns meses, mesmo
com a aprovação da operação do reempréstimo pelo então presidente Collor, João
Cunha não resistiu às pressões internas e renunciou ao cargo da empresa (LOPES,
1994, p. 346). O reempréstimo que foi concedido pelo Banco do Brasil, mediante
117
operação concretizada pela agência do banco no paraíso fiscal das ilhas Cayman,
pode ser considerado o último grande apoio do governo, uma vez que o Tesouro
deu aval a essa operação, que visava a consolidar diversas dívidas bancárias e com
fornecedores.
Com a saída de Cunha, em junho de 1991, regressa novamente para a
Embraer, para ocupar o cargo de diretor presidente, Ozires Silva, com a missão de
recuperá-la, conduzindo a empresa até a etapa final de privatização, em 1994. Na
visão de Ozires Silva, quando reassumiu o comando da Embraer, “a empresa tinha
se transformado quase numa repartição pública: estava burocratizada, o governo
não lhe repassava recursos, seus produtos estavam desatualizados. Tinha dívidas
de curto e médio prazos no total de US$ 600 milhões. A ficar na mão do Estado, vi
que iria desaparecer, o que seria uma perda irreparável para o Brasil, porque foi a
única empresa do país que criou uma marca internacional”49.
A partir desse momento, em consonância com a conjuntura interna e externa
adversa (recessão do mercado mundial de aviões), a Embraer procedeu a uma série
de ajustes internos que visavam a modelar sua atividade produtiva à nova realidade
de mercado. A primeira grande alteração foi na política de comercialização, a qual
no seu segmento civil levou à transferência das atividades de marketing e vendas
para a subsidiária integral da Embraer nos Estados Unidos da América, a EAC –
Embraer Aircraft Corporation. Nessa linha, vinculou-se à EAC a Embraer Aviation
Internacional localizada na França, com o propósito de reforçar uma política
coerente e integrada de busca e conquista de mercados (LOPES, 1994, p. 346).
No plano microempresarial, foi instaurado um extenso programa de prestação
de serviços e fabricação de produtos, não só para indústrias nacionais, como
internacionais, cobrindo as áreas de usinagem, materiais compostos, informática e
laboratório de aferição e testes, entre outras. Contudo, o pesado endividamento – o
vencimento das dívidas registravam US$ 241,5 milhões, em 1992 – aliado à redução
das vendas, acarretaram a suspensão da entrega de materiais, com reflexos
negativos para as linhas de produção (Brasília, AMX, flaps do MD-11, etc.), abalando
o prestígio, a credibilidade e a imagem da empresa no exterior. De outro lado, a
Embraer, por ser empresa estatal, não dispunha de acesso a fontes tradicionais de
financiamento, como o BNDES. A ausência de linhas de crédito à exportação a partir
49 Entrevista à revista Rumos do Desenvolvimento, 22 (41). Rio de Janeiro, outubro de 1997.
118
de outubro de 1990, quando foram suspensas as linhas de financiamento do Finex,
somente retomadas em 1991, com a criação do programa de Financiamento à
Exportação – Proex, prejudicou muito a competitividade da empresa (Ibidem).
Essa situação foi bem percebida quando se criticava a falta de sincronia entre
o processo de abertura comercial e o gerenciamento da política governamental.
Essa falta de articulação, ou mesmo de visão, acabava por prejudicar a
competitividade das empresas. Para Furtado “à medida que caíram os incentivos
fiscais às empresas exportadoras, estas se viram numa posição difícil, não apenas
devido aos problemas de competitividade, como também devido ao fato de que
muitos vieses anti-exportadores, ainda vigentes na economia brasileira, não haviam
sido superados ou revistos. Os três vieses principais são: a oneração de impostos
federais e estaduais incidentes sobre insumos e produtos industrializados
destinados à exportação; a ausência de mecanismos de financiamento pré e pós-
embarque, afetando sobretudo o setor de bens de capital; e a obsolescência e
excesso de regulamentação da estrutura portuária no Brasil, agravando sobre-
maneira a exportação de manufaturados” (FURTADO, 1994, p. 80). É necessário
assinalar que as aeronaves produzidas pela Embraer, para efeito da legislação
tributária, são classificadas no item referente aos bens de capital e, portanto, a
empresa foi também afetada por essas medidas.
Nesse novo contexto, a privatização da empresa passa a ser concebida
seriamente como a única alternativa para o resgate das condições de
competitividade e a própria sobrevivência da Embraer. Em janeiro de 1992 ela foi
incluída no Programa Nacional de Desestatização do governo brasileiro. Entre 1991
e 1994, a empresa apresentou níveis elevados de prejuízo e de endividamento, além
de forte queda do seu faturamento, perdendo em média US$ 235 milhões por ano.
Os anos que precederam o processo de privatização foram seguidos por vigorosa
política de saneamento e de racionalização da mão-de-obra. Entre 1989 e 1994,
foram eliminados 7.354 postos de trabalho, provocando uma redução global do nível
de emprego (ver Gráfico 6). Segundo Sbrigia; Terra (1993, p.26 apud BERNARDES,
2000, p. 247) ” tal processo de racionalização demonstrou-se traumático, causando
impacto negativo no conjunto de funcionários. Houve perda de quadros qualificados
e estratégicos para a empresa, muitos com longa e sólida trajetória de formação
profissional, alguns que haviam custado milhares de dólares para o Estado brasileiro
com cursos de especialização e doutoramento no exterior. O processo de ajuste e
119
desestruturação empresarial acabou por gerar sérias dúvidas no mercado
internacional quanto à viabilidade e às condições reais da Embraer de honrar os
seus compromissos”.
GRÁFICO 6 – Evolução do Nível de Emprego da Embraer, 1980-1994
02000400060008000
100001200014000
80 85 89 90 91 92 93 94
Emprego TotalNúmero de pessoas ligadas à produçãoNúmero de pessoas não ligadas à produção
Fonte: Embraer (1996)
Em virtude de tal legislação, a Embraer provisionava em seus balanços antes
da privatização uma dívida de U$ 56 milhões por conta de ações trabalhistas
diversas. Note-se, no entanto, que embora tenha ocorrido “a perda de quadros de
funcionários de alta competência e qualificação, o Departamento Técnico,
considerado o coração da empresa, foi preservado, sendo, em 1993, somente 10%
informes àquele existente antes da primeira onda de demissões” (SBRIGIA &
TERRA, 1993, p. 26 apud BERNARDES, 2000, p. 247).
Por fim, após três anos de um processo desgastante de cortes e saneamento
da empresa, a Embraer, por meio de leilão na Bovespa (Bolsa de Valores de São
Paulo) realizado em 7 de dezembro de 1994, foi transferida para a iniciativa privada.
O leilão foi adiado seis vezes até essa data. Na época, representantes dos
sindicatos locais questionavam a venda de uma estatal do porte da Embraer. Os
argumentos defendidos pelos representantes dos trabalhadores e das entidades que
se manifestavam contra a privatização foram expressos em um documento
apresentado à direção da empresa, sem sucesso, que basicamente se resumia em
dois pontos” (SBRIGIA; TERRA, 1993 apud BERNARDES, 2000, p. 248): 1. “a privatização representaria um risco de perda de investimentos em
tecnologia e treinamento de mão-de-obra especializada, obtidos ao longo de
24 anos com sacrifício de outros programas prioritários para o país”;
120
2. “a privatização poderia levar a Embraer à condição de mera montadora de
aeronaves, com a desativação da área de projetos, com transferência de
tecnologia nacional à concorrência internacional e com geração de demissões
em massa de pessoal altamente qualificado”.
Quando foi privatizada, a Embraer continuava a enfrentar uma situação
delicada quanto a sua gestão interna, sua condição no mercado mundial de
aeronaves e seu conflito com o sindicato local. Conforme relata: AN, 44 anos,
casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato
“a saída de Ozílio Silva da Embraer marca o fim de um ciclo político da
empresa e da indústria nacional. Representa o fim de um domínio ativo da cúpula da
Aeronáutica, derrotada pelo Ministério da Economia, que imobilizou a empresa
dando continuidade à política de Collor para as estatais.
A Embraer é mais do que um local de disputa de áreas do governo, é a prova
viva da possibilidade econômica e tecnológica da empresa nacional. É uma pedra no
sapato dos que querem entregar as estatais e o mercado interno em troca da dívida.
A construção de base tecnológica eficiente, independente dos objetivos
militares que a conduziram, fornece ao país uma tecnologia de ponta, para além da
indústria bélica e da própria indústria aeronáutica, capaz de criar empregos e
melhores condições de vida. As dificuldades colocadas pelo governo americano para
liberar a compra do supercomputador, dá uma idéia de quanto é dolorido para o
imperialismo este desenvolvimento. Esta eficiente empresa já é a maior fornecedora
de aviões para a aviação regional dos Estados Unidos.
Isto demonstra que a Embraer é uma empresa que pode ser lucrativa se bem
administrada. Mas o maior lucro que a Embraer pode dar é o desenvolvimento de
tecnologia independente. A Embraer é uma empresa eficiente. Os críticos do seu
“inchaço”, que acusam a empresa de passar de 7,7 mil trabalhadores em 1985 para
12 mil em 1988, não revelam que a receita bruta por trabalhador aumentou de US$
28 mil em 1985 para US$ 43 mil em 1988. Esses números representam à passagem
de uma empresa média para uma grande empresa, de importância internacional.
Demonstram que agora seria a hora de dar um salto de qualidade de todo
investimento de capital humano, revertendo em benefícios para a população. É neste
momento que o governo tenta vendê-la para o capital estrangeiro.
Por trás do discurso neoliberal, de abrir fronteiras, de liberdade de
investimento, de liberdade de capital e para os trabalhadores, o que existe, o que é
posto em prática, é a política de favorecimento dos grandes monopólios
121
internacionais, a desarticulação do movimento sindical e o desprezo pela
representação política, pela organização independente da sociedade.
A saída oferecida pelo neoliberalismo à Embraer é a privatização. É uma
privatização que visa a destruir tanto a organização dos trabalhadores quanto a
resistência dos militares que querem a manutenção dos privilégios, tanto quanto dos
que pretendem a independência tecnológica da aviação.
A privatização começa com a demissão de 4 mil trabalhadores – incluindo
gente que estava na empresa desde a sua fundação há 20 anos – de projetistas,
operários especializados, e ganha corpo com a quebra da organização dos
trabalhadores, demissão de cipeiros e afastamento de diretores do sindicato e
repressão à ação sindical no interior da fábrica.
É neste contexto que chega o novo presidente João Cunha, uma cara nova,
nem parecendo que foi excluído do Ministério da Economia e que ganhou o cargo
para fazer o papel sujo de entregar a empresa para o capital privado. Ele vem para
“acertar a contabilidade”, na intenção de acelerar o processo de privatização.
Mas o processo de privatização é bem mais do que isso. A gestão de Cunha
vai continuar a política de demissões em nome do “enxugamento”, vai continuar sem
reajustar salários, concedendo abonos aqui e ali, colocando sempre os trabalhadores
na defensiva. Uma gestão sem garantia de emprego, sem garantia de trabalho.
Transformar a Embraer em uma montadora de aviões, com salários baixos e sem
pesquisa, este é o projeto de privatização.
Os empresários tecem pequenas lamúrias de suas perdas, o prefeito amigo
de Collor faz promessas de ajuda, enquanto os trabalhadores e o povo de São José
dos Campos sofrem na pele as conseqüências da política do governo. Enquanto
isso, os “amigos” da Embraer põem em ação o sucateamento da empresa, primeiro
passo para a desmontagem de uma indústria nacional de ponta”.
Neste período, o programa ERJ-145 encontrava-se em desenvolvimento e a
principal fonte do faturamento da empresa provinha em grande parte dos programas
Brasília e AMX (ver Gráfico 7).
Por sua vez, a venda das aeronaves EMB-120 Brasília havia declinado com a
recessão mundial (Gráfico 8). Apesar de ser um produto notável, o preço do Brasília
era considerado alto, em parte por causa da tecnologia de ponta de alguns de seus
sistemas, mas sobretudo pelos altos preços que eram cobrados pelos fornecedores
estrangeiros ao fabricante brasileiro. As dificuldades por que passou a Embraer no
período pré-privatização contribuíram para o aumento dos custos financeiros, com
impactos diretos na formação do preço do avião, no início da fase final do seu ciclo
122
de vida, uma vez que o mercado aeronáutico já demonstrava claros sinais da
preferência pelos aviões movidos a jato. A dificuldade de financiamento ao
comprador, pela ausência de linhas competitivas de crédito para exportação, no
período entre o término do programa Finex e a entrada em vigor do seu substituto
Proex (1991/1992), foi outro fator negativo de impacto nas vendas do avião
(BERNARDES, 2000, p. 249).
O programa AMX, por sua vez, padecia das dificuldades da FAB em honrar
seus compromissos. O programa ERJ-145, jato de cinqüenta lugares, destinado ao
transporte aéreo regional, achava-se na fase de conclusão do protótipo. A empresa
encontrava-se desatualizada e necessitava de grandes investimentos para fazer
crescer o seu parque tecnológico. Em linhas gerais, isso significava dizer que os
desafios a serem superados pelos atuais donos da Embraer não eram pequenas e
nada triviais.
GRÁFICO 7 – Composição do Faturamento em 1994
5%
6%
8%
15%
32%
34%
0% 5% 10% 15% 20% 25% 30% 35% 40%
Outros
MD-11
EMB-312 - Tucano
Peças e componentes
AMX
EMB-120 Brasília
Fonte: Embraer (1996).
123
GRÁFICO 8 – Composição da Receita Bruta por Produto entre 1989 e 1994, em US$ milhões
0
50
100
150
200
250
300
89 90 91 92 93 94
EMB-120AMXEMB-312Aviões LevesMD-11BandeirantesOutrosPeças e Partes
Fonte: Embraer (1996).
Por fim, é importante observar que a privatização da Embraer era inevitável,
por todos os motivos que já apresentamos neste estudo. Todavia a questão que
problematizamos é um ponto que já havia sido notado, ou seja, o programa de
privatização a partir do governo Collor não contemplou, desde a sua concepção e
execução, a construção estratégica de mecanismos ou estruturas de gestão
institucionais que previssem e viabilizassem investimentos para a reestruturação e a
ampliação da competitividade das empresas privatizadas (FURTADO, 1994, p.81).
No caso da Embraer, esse fato é crucial, pois repercutiu negativamente nas
negociações de privatização e venda da empresa. A indefinição quanto aos objetivos
e metas destinados para a Embraer, qual o lugar que ela ocuparia em uma
perspectiva de estratégia de desenvolvimento industrial e tecnológico, produziu
incertezas quanto ao futuro da empresa e à capacidade de ela responder aos
desafios que lhe eram reservados, abalando o prestígio e os negócios da empresa.
Nesse quadro, muitos não acreditavam na recuperação da Embraer e a
consideravam praticamente falida.
Podemos concluir que o desequilíbrio financeiro, em alguns momentos
o uso político da empresa pelo governo, a falta de acesso a linhas de financiamento
de longo prazo para o desenvolvimento dos programas, a ausência de uma
124
consciência de custos na gestão empresarial e de uma visão negocial; e, além disso,
uma abordagem e cultura empresariais excessivamente voltadas para a tecnologia,
são os pontos críticos que explicam a decadência e a crise da empresa,
especialmente a partir da segunda metade dos anos oitenta.
As causas que produziram o desequilíbrio econômico-financeiro como
descrevemos foram diversas, destacando-se entre as principais:
- grandes projetos sem estrutura adequada de financiamento;
- desenvolvimento de projetos sem verificação prévia das condições do
mercado e das necessidades de clientes potenciais;
- não-cumprimento de encomendas pelo governo;
- mercado externo civil e militar em recessão;
- falta de competitividade nos mercados interno e externo no que tange à
oferta de financiamento aos clientes;
- apesar da história de excelência tecnológica da Embraer, sua gestão era
excessivamente mecânica, ou seja, muito orientada para a técnica e pouco para os
resultados financeiros;
- perda de competitividade no mercado interno por causa da carga de
impostos;
- redução do apoio financeiro governamental, como acionista, emprestador,
avalista e regulador de crédito a empresas estatais;
- relações precárias e dissociamento gerencial com as subsidiárias sediadas
no exterior (Embraer Aircraft – EAC e Embraer Aviation Interancional – EAI) que
afetaram negativamente os negócios da Empresa, tanto comercial quanto
financeiramente.
No entanto, é necessário considerar ainda, o seu modelo institucional, como
uma empresa estatal, a falta de flexibilidade empresarial para a captação de
recursos, o engessamento institucional da empresa e, por isso, a pouca liberdade
para a celebração de parcerias estratégicas, a falta de consciência de custos, os
problemas e as ingerências internas da empresa e, em determinados momentos,
seu uso político pelo governo e pelas forças armadas, que estariam na raiz de sua
crise.
De outro ângulo, não podemos deixar de considerar que a deterioração das
condições macroinstitucionais do ambiente político e econômico do país, a falta de
sincronia entre as políticas industrial, tecnológica e de privatização, as questões
125
relacionadas ao chamado custo Brasil (deficiências na infra-estrutura física e
tecnológica, a legislação tributária, mesmo considerando os altos incentivos e
isenções fiscais), a falta de linhas de créditos mais competitivas para o
financiamento das exportações e vendas internas, a recessão mundial no mercado
de aviões, todos esses condicionantes afetaram negativamente a performance da
empresa, agudizando, ainda mais, sua frágil situação econômica. Esse fato é
importante também para explicar, em parte, a dificuldade para a Embraer encontrar
ou formar fornecedores de alta tecnologia no Brasil.
Nos anos setenta, os militares constituíram-se nos protagonistas centrais para
a gênese e formação da Embraer. Eles atuaram de modo que se garantisse a
aplicação continuada e coerente de políticas industriais e tecnológicas e a
concessão de benefícios à empresa. Com a conclusão nos anos oitenta do processo
de transição no comando da política econômica de quadros oriundos do antigo
regime por outros comprometidos com a democratização do Estado brasileiro, sai de
cena, ou pelo menos é reduzido significativamente, o poder de pressão dos militares
nas decisões e nos rumos do desenvolvimento econômico do país. Com efeito, a
Embraer acaba por perder também importante suporte político para seus
empreendimentos. Esse conjunto de fatores, aliado ao esgotamento do modelo
político e institucional de desenvolvimento tecnológico e econômico e a falta de
coesão sistêmica entre as políticas industrial e tecnológica na década de oitenta e
na primeira metade da de noventa, também constituíram óbices que dificultaram a
recuperação da empresa, após a finalização do processo de privatização, ajuste e
mudança que a Embraer enfrentará posteriormente.
126
CAPÍTULO 3 – UM NOVO CAMINHO PARA A EMBRAER (1994 - 1998) 3.1-TEMPO DE MUDANÇA
A Embraer foi privatizada em dezembro de 1994, no mesmo ano da adoção
do Plano Real, sob gestão de Itamar Franco, que assume a Presidência logo após o
impeachment de Fernando Collor de Mello, motivado pelos fracassos das suas
sucessivas tentativas de estabilização da economia e pelas denúncias de corrupção
generalizada no aparelho público. Com o êxito relativo do Plano Real, consagrado
na estabilização da economia e na expansão do consumo doméstico, na fase inicial
do programa, Fernando Henrique Cardoso, então ministro da Economia, será
conduzido à Presidência da República. Assim, a nova visão do processo de
desenvolvimento econômico e industrial nacional, fundamentada nos princípios de
abertura, desregulamentação e integração regional da economia, instituída
efetivamente no governo Collor, é aprofundada no governo Cardoso. Segundo
Bernardes (2000, p. 253) “se no governo anterior as reformas políticas e econômicas
transcorriam num quadro recessivo e de crise institucional e de governabilidade, no
governo Cardoso tais reformas ocorrerão em ambiente de estabilidade
macroeconômica interna, na sua fase inicial, e posteriormente, de agravamento e
instabilidade da conjuntura financeira internacional, ocorrendo novidades e rupturas
com relação às tendências verificadas ao longo dos anos oitenta e início dos
noventa”.
O aspecto central desta fase, que se estende de 1994 ao primeiro semestre
de 1997, será o relativo êxito da política de estabilização lograda pelo Plano Real,
amparado na adoção de uma "âncora cambial" e no aprofundamento da abertura
comercial - redução das tarifas nominais e efetivas e eliminação de barreiras não
tarifárias, contribuindo para uma estrutura de proteção menor ao mercado doméstico
e promovendo crescente pressão das importações, o que resultou em grandes
déficits na balança comercial. Em agosto de 1994, após a edição do Plano Real, o
governo ensaiou uma mudança política, deixando a taxa de câmbio flutuar e
abandonando os esforços de preservar a taxa de câmbio real. Tal mudança,
associada a uma nova ampliação dos diferenciais de juros internos e externos por
razões de política monetária, levou a uma apreciação nominal do câmbio e, por
conseguinte, a um aprofundamento da tendência à valorização da taxa de câmbio
127
real. Em março de 1995, sob impacto da crise do México e pressionado pela
deterioração da balança comercial, o governo brasileiro promoveu uma
desvalorização nominal de 5,2%, adotando novo regime cambial cujo principal
objetivo seria uma desvalorização gradual do real com relação ao dólar, mas sem
dar ao mercado nenhum sinal quanto à velocidade e a intensidade dessas
desvalorizações. (MOREIRA; CORRÊA, 1997, p. 71 apud BERNARDES, 2000, p.
254).
Na dimensão econômica, essa fase será caracterizada pela vulnerabilidade
econômica provocada pela combinação destruidora de sobrevalorização do câmbio
e juros elevados, abertura pouco criteriosa, altas taxas de desemprego e fé cega no
aporte dos investimentos estrangeiros no país. No plano político, essa fase pode ser
interpretada como uma grande mobilização governamental para a implementação
das reformas econômicas e constitucionais de natureza neoliberal, orientadas para
as mudanças estruturais (reforma econômica, tributária, administrativa e da
previdência social, relações de trabalho, entre outras), consideradas essenciais para
a consolidação da estabilidade, e para a continuidade do programa de privatizações
das empresas públicas como condição básica para garantir a estabilidade da
economia, cobrindo o déficit nas contas públicas, gerada, diga-se de passagem, pela
própria política econômica governamental e a criação de um ambiente mais
favorável para atração dos investimentos diretos estrangeiros (IDE) (Ibidem).
Nesse quadro de transição do modelo de desenvolvimento econômico, de
incertezas e indefinição quanto à direção das políticas industriais e tecnológicas, e
sob a gestão de um novo plano de estabilização da economia, a Embraer será
privatizada e submetida a um novo processo de ajuste econômico-financeiro,
mudança radical de seus valores e do seu modelo de competição. Sob comando dos
novos controladores da empresa, lançará o seu novo avião o ERJ-145 que será um
sucesso de venda no mercado mundial.
128
3.1.1 - PRIVATIZAÇÃO E TRANSFORMAÇÃO
Os elevados e contínuos prejuízos, num quadro de crise fiscal e institucional
do Estado, no início dos anos noventa, acabaram por inviabilizar qualquer tentativa
governamental para a resolução do impasse financeiro sofrido pela empresa,
tornando-se impraticável a manutenção de subsídios ou sua capitalização. As
dívidas da estatal alcançaram cerca de US$1 bilhão, em 1994. O governo federal
realizou um programa de saneamento financeiro, mediante uma operação de
capitalização, injetando recursos da ordem de R$350 milhões, sendo R$202 milhões
relativos a uma parte da dívida com o Banco do Brasil, R$68 milhões de uma dívida
com debêntures e R$125 milhões de um débito com a empresa canadense EDC.
Mais R$23 milhões de debêntures foram convertidas em ações. O governo assumiu
cerca de US$700 milhões da dívida da empresa, reduzindo o endividamento para
algo na ordem de US$350 milhões. Além disso, dois meses antes do leilão, o Banco
do Brasil fez um empréstimo para a Embraer no valor R$30 milhões, utilizados para
manter a empresa em funcionamento (MENDONÇA, 1997, p.14).
O leilão de privatização foi postergado por seis vezes, em virtude das
interrupções provocadas pelas manifestações e questionamentos dos sindicatos
locais (em especial, o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos). No
leilão que ocorreu no dia 7 de dezembro de 1994, foram ofertados 6,2 milhões de
ações ou 55,4% do capital votante, ao valor mínimo de RS$153,75 milhões. O preço
mínimo do lote de mil ações foi definido em R$48,32, o que significou um deságio de
20% em relação ao valor patrimonial do lote de mil ações (R$60,00). O edital de
privatização exigiu que os novos acionistas capitalizassem a empresa em curto
prazo, numa proporção de cerca de 170 ações para cada lote de mil, o que se
estimou à época que corresponderia a um total de R$30 milhões (MENDONÇA,
1997, p.5 ).
A empresa foi arrematada por R$154,1 milhões, 0,3% acima do preço mínimo
fixado para o leilão, pagos integralmente em títulos da dívida de estatais “moedas
podres”( sendo o seu valor de mercado bem inferior). Foram vendidos 3.074 lotes de
mil ações, sendo 2.295 ao preço mínimo, totalizando R$114,750 milhões; e 779
lotes, a R$49, somando R$39.408 milhões. Esse valor foi pago integralmente com
títulos da dívida pública, o que significou um deságio médio de 50% sobre o valor
pago. O principal investidor individual foi o banco de investimentos Wasserstein
129
Perella, um dos maiores dos Estados Unidos, sócio da maior corretora do mundo, a
Nomura Securities, que detinha participação de 20% no capital do banco. O
Wasserstein Perella passou a controlar 19,09% das ações ordinárias da Embraer,
investindo cerca de R$58 milhoes na aquisição. O consórcio liderado pelo grupo
Bozano Simonsen adquiriu cerca de 40% das ações com direito a voto da empresa.
Entre os principais investidores do consórcio estavam: o Bozano Simonsen Limited
(13,65%), o Sistel (10,42%), a Previ (10,40%), o Bozano Leasing (3,63%) e a
Fundação Cesp (1,9%). Considerando os 10% reservados aos funcionários da
empresa, a Embraer foi privatizada por R$265 milhões. Na privatização estava
incluída também a Embraer Aircraft Corporation, a Embraer Aviation International e a
Neiva, fabricante de aviões leves (MEDONÇA, 1997, p.5). Após o processo de
privatização, foi criada uma classe especial de ações, as Golden Share, conferindo à
União o direito de veto em matérias relativas à atuação da Embraer em programas
militares, mudança do objeto social e transferência do controle acionário.
3.1.2 - PERFIL DOS CONTROLADORES
O acordo de acionistas firmado em 7 de dezembro de 1994, no processo de
privatização da Embraer, garantia aos seus signatários o controle da companhia. A
composição acionária da Embraer, desde essa data, sofreu alterações com a saída
de alguns acionistas. Segundo Bernardes (2000, p. 257) atualmente, a empresa é
controlada por um consórcio constituído por:
- “Grupo Bozano Simonsen: uns dos principais conglomerados brasileiros,
com atuação nas áreas financeira, mineral, imobiliária, agrícola e industrial. O grupo
participa de 41 empresas dentre controladas direta ou indiretamente e coligadas.
Começou a existir há 34 anos, criado por Julio Bozano e Mario Henrique Simonsen.
Desde os anos setenta, vem diversificando seu patrimônio fora da área financeira,
participando da gestão das empresas do grupo. A obrigatoriedade da carta-patente
para a expansão no setor financeiro foi uma das causas da adoção dessa estratégia
da atuação do banco há duas décadas. Como banco atacadista, não precisava
realizar pesados investimentos na manutenção ou expansão de rede de agências.
Os seus lucros auferidos foram investidos primeiro no setor agrícola (café e laranja),
depois na mineração em sociedade com o grupo anglo-americano da África do Sul
(ouro, ferro, níquel e ferro-nióbio). Além dos empreendimentos imobiliários (shopping
130
centers), atuava até 1992 nos setores industriais de fertilizantes, aglomerados de
madeira e produtos serrados. No biênio 1992/93, a participação nas privatizações
permitiu à instituição ampliar sua participação na área industrial – setor siderúrgico
(Usiminas, Cosipa, Companhia Siderúrgica de Tubarão). O grupo Bozano Simonsen
ficou conhecido também por participar dos processos de privatizações, com o
objetivo de saneamento das contas ativas e passivas, tornar as empresas rentáveis,
valorizar seus ativos e posteriormente revendê-las, auferindo, assim, sua margem de
lucro dessas operações”.
- “Previ - Caixa de Previdência Privada do Banco do Brasil: instituição pioneira
e o maior fundo de pensão do Brasil com 145.000 associados e reservas de US$12
bilhões, o que corresponde a um quarto de todo o sistema de seguridade social
brasileiro. Sua carteira de investimentos reúne mais de noventa empresas, das
áreas de mineração, bancos, telecomunicações, siderurgia e de imóveis. A Previ foi
criada há 81 anos, muito antes da instituição de seguridade oficial do país”.
- “Sistel – Fundação Telebrás de Seguridade Social: segundo maior fundo de
pensão do Brasil, com cerca de 300.000 participantes e capital de mais de US$2,7
bilhões. A maior parte dos investimentos da Sistel é dirigida aos setores de
telecomunicações, metalurgia, eletricidade, mineração, aviação, alimentação,
imóveis e shopping centers”.
- “Clube de Investimento dos Empregados da Embraer (Ciemb) – Clube
formado por empregados da empresa. O Ciemb foi criado em 4 de abril de 1994,
durante o processo de privatização da Embraer, e tem como objetivo obter a maior
participação acionária possível dos empregados no capital da Embraer”.
Conforme Bernardes (2000, p. 259) “alguns comentários sobre a estratégia e
o histórico de atuação do grupo Bozano Simonsen, líder do consórcio de empresas
que administram a Embraer, fazem-se necessários, pois tiveram e ainda têm
repercussão importante na rotina operacional da empresa, mesmo com o processo
de recuperação econômica da empresa alavancado pelas vendas do ERJ-145 no
mercado mundial”. Tal como descrevemos, este grupo tem um histórico mais voltado
às atividades de especulação financeira do que propriamente vocação produtiva
industrial, especialmente em áreas de alta tecnologia, como no caso do segmento
aeronáutico, caracterizado por elevados custos de desenvolvimento e alto risco
quanto ao retorno dos investimentos. Esse histórico de atuação do grupo gerou e
ainda tem gerado grande insegurança quanto ao futuro da empresa, uma vez que,
131
com a saída do grupo Bozano Simonsen, e o eventual desinteresse de compra por
outro grupo nacional, seria aberta a retaguarda para que outra empresa concorrente
internacional adquirisse o controle acionário da Embraer e desativasse suas
atividades de projeto.
De acordo com Bernardes (2000, p.259) “esse temor ainda existe, apesar de
o governo brasileiro poder lançar mão das Golden shares, conferindo à União o
direito de veto em matérias relativas à atuação da Embraer em programas militares,
capacitação de terceiros em tecnologia para programas militares, mudança de
objetivo social e transferência do controle acionário”.Considerando a hipótese de
eventual saída do grupo Bozano Simonsen e o desinteresse de grupos nacionais,
considerando a já conhecida aversão ao risco do empresariado nacional e a falta de
estrutura de financiamento de longo prazo adequado às atividades tecnológicas de
risco e, de outro ângulo, a falta de objetividade e clareza quanto às contrapartidas e
ao interesse do governo no tocante ao estímulo de tais atividades produtivas high
tech, teríamos uma combinação de fatores desagregadores, que poderiam culminar
em um processo de desestabilização da trajetória de recuperação da empresa. Esse
é um problema ou uma questão importante, ainda a ser equacionada pela empresa
em relação ao seu futuro. Contudo, um aspecto importante da abordagem adotada
pelos novos controladores foi a continuidade da tradição e a preservação da
identidade de excelência tecnológica que caracterizou a Embraer quando estatal. A
nova diretoria executiva soube transformar e refinar esses valores adaptando-os
uma nova realidade concorrencial de mercado (Ibidem).
3.1.3 – UMA NOVA ADMINSTRAÇÃO PROFISSIONAL
Os novos controladores acionistas, liderados pelo Banco Bozano Simonsen,
preocupados em constituir uma nova administração profissional com a missão de
recuperar a empresa, elegem para o cargo de diretor-presidente Maurício Botelho,
engenheiro mecânico formado pela Escola Nacional de Engenharia, no Rio de
Janeiro, executivo que trazia em sua bagagem profissional passagem pelo grupo
Odebrecht e o cargo de diretor executivo do Bozano Simonsen. Se tentássemos
compilar a expressão que traduzisse mais fielmente o perfil desse novo corpo
administrativo, composto por executivos e profissionais de mercado e antigos
funcionários de carreira da Embraer, sem dúvida, seria o estabelecimento de um
132
novo ciclo de negócios expresso no compromisso de uma administração empresarial
voltada para os resultados econômicos e a satisfação dos clientes.
Para Bernardes (2000, p. 260) “uma visão negocial pragmática e mais
objetiva, além de uma escala de valores pessoais menos romântica ou idealista: a
missão negocial da Embraer é construir aviões!”.
Do ponto de vista da estratégia de mercado, é o reconhecimento que a
sobrevivência e o desenvolvimento de novos projetos da empresa se realizarão
mediante parcerias institucionais ou empresariais e celebração de alianças
estratégicas que agreguem valor e fortaleçam economicamente a Embraer. Uma das
primeiras tomadas de decisão quanto à arquitetura de uma estratégia de mercado foi
a mudança de enfoque de mercado e a execução de um plano de reestruturação
profunda na Embraer. Foi uma mudança em relação à abordagem tradicional da
empresa, historicamente marcada pela excelência tecnológica do produto e dirigida
pela engenharia.
Para a nova direção, essa abordagem deveria ser radicalmente transformada:
se na gestão estatal o principal foco era o produto, a atenção de agora em diante
deveria ser o cliente e todas as ações deveriam ser orientadas para satisfazê-lo.
Além disso, havia agora a preocupação em demonstrar também resultados para os
acionistas da empresa. Esse fato não quer dizer que a Embraer, quando estatal, não
supria as necessidades do cliente, mas esse esforço, segundo dirigentes da
empresa, era muito mais intuitivo do que propriamente desenhado e elaborado em
uma estratégia racional e formal de mercado. Um exemplo desse argumento foi,
como já descrevemos, o programa CBA-123 Vector. Pela nova filosofia de
focalização em atividades de alta tecnologia, a empresa Neiva, depois de amargar
sucessivos prejuízos, foi posta à venda, sem sucesso.
Segundo Bernardes (2000, p. 261) a nova administração centrou sua
estratégia em quatro vetores básicos:
-“Formalização de um compromisso com uma administração de resultados
mediante uma estratégia de Reengenharia Financeira, Reestruturação Patrimonial,
Organização e Produtiva”.
-“Reconstrução das relações com os clientes e fornecedores mediante uma
política de busca incessante e focalização dos esforços da empresa para satisfação
ao cliente”.
133
-“Plano de Ação com a identificação da missão da empresa, nova estratégia
de mercado e um plano de reestruturação organizacional e produtiva”.
-“Prioridade para a viabilização do programa ERJ-145”.
3.1.4 – ESTRATÉGIA FINANCEIRA
Durante os últimos anos, após a privatização da Embraer, foram
desenvolvidas estratégias financeiras destinadas a prover a empresa de uma
estrutura de capitalização compatível com suas operações, mediante alongamento
do perfil de endividamento e redução das despesas financeiras. A estratégia
delineada para a Embraer previa um plano de recuperação da empresa, que se
daria com o lançamento, certificação e vendas do projeto ERJ-145. Para auxiliar no
cumprimento dessa etapa, os novos acionistas injetaram US$500 milhões, em
capital e debêntures, entre janeiro de 1995 e agosto de 1996.
Com objetivo de suportar as atividades de comercialização e de
financiamento das operações da Embraer e suas controladas, além de agilizar a
compra de materiais necessários à fabricação de produtos da empresa, é constituída
no segundo semestre de 1995, como subsidiária integral, a EFL – Embraer Finance
Ltda., sediada em George Town Cayman, ilhas Cayman. Em 1995, a Embraer
obteve a aprovação de uma linha de financiamento do BNDES – Banco Nacional de
Desenvolvimento Econômico e Social, no montante de US$120 milhões, com prazo
de dez anos e três de carência. Segundo Bernardes (2000, p.262) “tais recursos
destinavam-se exclusivamente ao término do desenvolvimento do projeto ERJ-145 e
do programa de fornecimento de peças e equipamentos que integrarão o projeto do
helicóptero S-92 Helibus. Depois de tal evento, a empresa passa a desenvolver
relações mais coordenadas com o BNDES, em busca de financiamento para as
vendas externas dos seus produtos e serviços. Serão utilizados os recursos do
Proex (Programa de Financiamento às Exportações), gerenciado pelo Banco do
Brasil, Ministério da Fazenda e Ministério da Indústria, Comércio e Turismo, bem
como os financiamentos com recursos da Agência Especial de Financiamento
Industrial – Finame, por meio do programa Finamex – Financiamento à Exportação
de Máquinas e Equipamentos, gerenciado pelo BNDES”. Ressalte-se que esses
programas de incentivos às exportações são semelhantes aos existentes em outros
países, como o Eximbank nos Estados Unidos e Japão, Coface na França e Hermes
134
na Alemanha, e evidenciam a confiança dos respectivos governos nos produtos
fabricados por eles. A ação do BNDES por meio dos programas de financiamento,
tanto o Proex como o Finamex, revelaram-se cruciais para a recuperação econômica
e competitiva da Embraer, como demonstraremos à frente. Após a privatização, a
empresa procurou estabelecer um adequado suporte à comercialização de suas
aeronaves comercias, instituindo a operação de compra e venda de aviões usados,
aplicáveis como pagamento parcial de aeronaves novas. Esse procedimento,
denominado comércio interno, objetivava atender a uma antiga exigência do
mercado doméstico e internacional para compra de aeronaves (BERNARDES, 2000,
p. 262).
. Segundo Bernardes (2000, p 263), “nos anos que se seguiram à privatização,
com o processo de reestruturação financeira e organizacional, a empresa começou a
apresentar melhora gradual do seu quadro econômico. Embora tenha auferido
faturamento de US$380 milhões em 1996, apresentando crescimento de 46,6%,
quando comparada a 1994 e o prejuízo tenha sido reduzido a US$42 milhões, o
endividamento da empresa ainda era significativamente alto – cerca de US$530
milhões” (ver Tabela 18).
135
TABELA 18 – Indicadores de Desempenho Econômico-Financeiro da Embraer (valores em US$ milhões)
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998
Receita Bruta
Vendas
Mercado
externo (%)
Mercado
interno (%)
Ativo total
Patrimônio
líquido
Prejuízo
Endividamento
Geral (%)
Geral
Curto prazo
Longo prazo
582
37
63
1.092
126
(265)
88,3
620
502
118
402
32
68
1.435
324
(241)
77,2
804
241
563
333
32
68
1.227
86
(258)
93,6
877
309
568
261
38
62
1.125
156
(116)
86,2
758
394
364
177
40
60
1.067
281
(310)
73,6
410
221
189
295
39
61
1.107
188
(253)
82,2
470
226
244
380
35
65
1.221
281
(123)
71,2
535
214
321
833
84
16
1.424
-
(33)
45,8
382
251
131
1.581
89
11
-
-
86,7
51,5
815
665
150
Fonte: Embraer (2000).
Para Bernardes (2000, pp.263-264) “esse resultado devia-se, sobretudo, às
despesas financeiras decorrentes do período de pré-privatização e do volume
reduzido de produção que resultou em estoques excessivamente elevados”. O
mesmo ocorreu com excedente de mão-de-obra e de capacidade instalada, cujos
valores não utilizados na produção resultavam em despesas operacionais elevadas.
O quadro começará a ser revertido com o lançamento do projeto ERJ-145, que
alavancará as vendas da empresa, em virtude do reaquecimento do mercado
internacional de aviação regional e dos ganhos obtidos com a redução de custos
com o plano de reestruturação organizacional da empresa, com a redução de 11%
do quadro funcional acompanhado de um processo de modernização e
informatização das linhas de produção, que resultarão em níveis crescentes de
eficiência e qualidade dos ciclos de trabalho. As estratégias de reestruturação
produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do faturamento, uma valorização
do patrimônio e o resgate do prestígio e da credibilidade da Embraer (Ibidem).
136
3.2. – PLANO DE AÇÃO
Até sua privatização, a Embraer nunca dispusera de planejamento estratégico
ou plano de ação de longo prazo nos quais estivessem previstas metas a serem
atingidas, um sistema de indicadores de análise de desempenho e, sobretudo,
cobrança efetiva quanto ao cumprimento dos resultados da empresa.
Um sistema de planejamento com as projeções de metas de curto e longo
prazo, elaborado por todas as áreas da empresa, foi realizado pela primeira vez em
1996. Segundo Bernardes (2000, p. 267), “conforme afirmaram técnicos da empresa,
tal procedimento de planejamento e, sobretudo, a formalização de indicadores de
análise crítica de desempenho (Produtivo-Industrial, Financeiro, Recursos Humanos
e de Suporte aos Clientes) nunca haviam sido realizados antes, e no novo plano de
ação, passam a ser considerados o dínamo vital para a sobrevivência da empresa.
Esse Plano de Ação (PA) consistiu-se um instrumento central do novo modelo de
planejamento, acompanhamento, avaliação e julgamento, em que estão impressos
os compromissos da empresa com seus clientes, empregados e acionistas”. O plano
projeta uma visão de cinco anos, sendo acompanhado e avaliado mensalmente, e
revisto anualmente ou se alterando em decorrência de algum evento relevante que
modifique o cenário no qual a Embraer está inserida. O Plano de Ação e os
Programas de Ação baseiam-se nos seguintes princípios que objetivam atingir os
propósitos de Sobrevivência, Crescimento e Perpetuidade do Negócio: Satisfação do
Cliente; Descentralização das Ações; Planejamento; Delegação Planejada e
Parceria; e Retorno aos Acionistas. Os acionistas passam a ser considerados tão
importantes quanto os clientes e empregados, pelo fato de que deles provém o
capital para as atividades da empresa.
As estruturas do Plano e dos Programas de Ação da Embraer foram
constituídas segundo Bernardes (2000, pp. 267-268) “a partir dos seguintes pontos:
cenários socioeconômicos, políticos, industriais e mercadológicos; negócio e missão,
em que foram definidas a responsabilidade e a estratégia de ação do ponto de vista
político, mercadológico e empresarial; objetivos estratégicos; prioridades e
concentrações; as estratégias para se alcançar determinadas metas; os resultados
desejados; fatores críticos e apoios requeridos; a estrutura organizacional;
orçamento; e, por fim, a remuneração variável de acordo com o desempenho e os
objetivos atingidos” (ver figura 4).
137
FIGURA 4 – Plano de Ação
Fonte: Embraer (2000). 1 Nacional e internacional, político, econômico, tecnológico, análise de mercado (regional, militar, etc), análise de competitividade (concorrência). 2 Produtos, instalações, recursos humanos, recursos financeiros, processos e tecnologia, estrutura organizacional, produtividade.
No mercado aeronáutico os compradores estão situados em um mercado
ofertante e com várias opções de escolha. Os compradores são poucos e a
GERÊNCIAS
DIRETORIA
Cenário Interno2
Diretrizes de Acionistas
Cenário Externo1
Integração dos resultados
EMPRESA
Análise Ambiental SWOT
Monitoramento
Verificação, adequação e Análise Funcional (Visão)
Plano de Ação EMBRAER
Prioridades e Concentrações Globais
Fatores Críticos
Diretrizes Globais • Cenário e Tendências • Negócio • Missão • Posicionamento e
Objetivos Estratégicos • Políticas Funcionais Hipóteses de Planejamento
Objetivos e Metas Globais • Vendas • Entregas • Produção • Dês. Programas • Projetos Corporativos
Políticas e Estratégias de Atuação Funcional
Negociação e Elaboração de diretrizes e objetivos específicos: • Negócio • Prioridades e Concentrações • Estratégias • Fatores Críticos
Diretrizes, Metas e Objetivos Específicos
Análise, Negociação e Adequação
• Negócio • Prioridades e Contratações • Táticas • Resultados Desejados • Orçamento • Organização • Fatores Críticos
Programas de Ação dos Gerentes
Programa de Ação dos Diretores
Elaboração PMS’s
Integração dos resultados
138
concentração de compra é grande. O custo de mudança do comprador é
relativamente baixo. O comprador possui informações precisas sobre os
fornecedores. Esse mercado caracteriza-se como “pull”, ou seja, os grandes
compradores influenciam na decisão de compra dos menores. A qualidade dos
produtos oferecidos é semelhante e os “trade off” (possibilidade de realização de
negócio com outras empresas) é alto e existe a possibilidade de realizar “Leilão na
Compra”. Portanto, toda atenção vem sendo dada às expectativas e necessidades
das operadoras de transporte aéreo.
Conforme Bernardes (2000, pp.269-270) a estratégia e o plano global são
desenvolvidos com o foco voltado para o ambiente externo, analisando Cliente,
Fornecedores e Concorrentes. Na estratégia e no ambiente competitivo da Embraer
existem três categorias de risco:
1. “Risco de Liderança. É o risco ao qual a Embraer está sujeita em virtude da
ação dos concorrentes. A principal característica que compromete a liderança de um
participante desse mercado é a mudança tecnológica. Em razão do longo ciclo de
vida do produto e das características da fabricação, a mudança de um determinado
patamar tecnológico necessita de grandes investimentos. Os produtos que surgem
posteriormente no mercado e que incorporam novas tecnologias de engenharia e
produção podem ser elaborados com um custo menor. Dessa forma, a liderança
conquistada anteriormente fica comprometida”.
2. “Risco de Diferenciação. É o risco de que os produtos concorrentes
lançados no mercado incorporem maior valor agregado para o cliente. Novos
lançamentos tendem a incorporar as últimas solicitações do mercado, tanto em
evolução como em custos. A empresa líder que lançou seus produtos quando da
identificação de um nicho de mercado sofre as conseqüências desse pioneirismo”.
3. “Risco da Estratégia de Lucro. É o risco de os compromissos e as
estimativas adotadas na fase de estudo e concepção de um novo produto não
poderem ser cumpridos. A demanda prevista inicialmente pode, por motivos
econômicos e de mercado, não ser atingida. Devem ser considerados aqui também
os riscos financeiros, políticos e sociais”.
Anteriormente, a estratégia competitiva da empresa era articulada mediante
estudos prospectivos sobre a demanda de aeronaves encomendadas para
empresas de consultoria externa, e a metodologia era um atributo desses
consultores. A partir de 1998, foi criada uma área denominada de “Inteligência de
139
Mercado”, em que a metodologia desses estudos prospectivos sobre o
conhecimento do mercado passou a ser endogeneizada na cultura e estratégia
competitiva Embraer, ou seja, a empresa começou a realizar seus próprios estudos
de mercado. Basicamente, os estudos incorporam as tendências de mercado pela
quantificação da demanda global de aeronaves mediante uma técnica de análise
chamada top down (de cima para baixo), que consiste em avaliar elementos como:
frota, quantidade de aviões em operação e condição da frota, evolução das vendas,
backlog (carteira de pedidos), unidades vendidas e não entregues, previsão de
vendas. A outra metodologia para quantificação é chamada bottom-up (de baixo
para cima) e consiste em abordagem direta com os clientes, sondando a
quantificação e o real interesse pelo novo produto. Para o ERJ-145 foram realizadas,
em 1997, por duas equipes, entrevistas diretas com 24 operadores norte-americanos
e europeus, apoiados por um estudo técnico e comercial, que representava 30% do
total de passageiros transportados no mercado da aviação regional. No caso do
ERJ-145 foram visitadas cerca de 50 empresas, avaliando-se requisitos como preço,
conforto operacional e técnico, entre outros (BERNARDES, 2000, p.269-270).
Para a elaboração dos estudos de Cenários e Tendências, de natureza
qualitativa, são consideradas as principais zonas de transporte mundiais como a
América do Norte, a Europa, a América do Sul e Central, o Oriente Médio, a África e
a Austrália. Nesses estudos são examinados critérios como: o número de assentos /
passageiros, distâncias típicas percorridas, tipos de motores (turboélices ou jatos),
custos de operação, requisitos homologadores e de clientes, projeções de
crescimento de PIB, custo do petróleo, distribuição da renda per capita, expansão e
abertura de novas rotas aéreas, entre outros. Em suma, em relação à estratégia
competitiva estatal, constatamos que hoje a Embraer dispõe de instrumentos de
análise bem mais refinados e sintonizados com os sinais de mercado, podendo
antecipar as tendências que, para esse setor sujeito a turbulências, pode significar a
própria vida da empresa. (Ibidem).
140
3.2.1 - PROCESSO ORGANIZACIONAL
A partir da cristalização desse novo enfoque, iniciou-se amplo processo de
reorganização da empresa segundo uma visão integrada. A nova diretoria promoveu
uma mudança radical na organização interna da empresa. Foram criadas três vice-
presidências, todas integradas ao único objetivo estratégico de atender à
necessidade do cliente: industrial, financeira; e de planejamento organizacional e
qualidade. O processo de tomada de decisões passa a transcorrer em um novo
circuito de poder hierárquico. Na vice-presidência de planejamento, as ações
nascem a partir das demandas de mercado e dos clientes. Segundo Bernardes
(2000, p. 271) “nela são organizadas e institucionalizadas as consultas e as
demandas aos clientes, que resultarão no planejamento estratégico da empresa. A
vice-presidência financeira tem por diretriz de ação não somente exercer a função de
controladoria fiscal, tributária ou tesouraria, mas servir como ferramenta na
atividade-fim, provendo recursos para o desenvolvimento tecnológico e as vendas de
aviões e fazendo a intermediação financeira, que envolve desde a fabricação até a
venda do produto” (ver Figura 5).
FIGURA 5 – Organograma da Embraer Pós-Privatização
Fonte: Embraer (2000)
Diretor vice-
presidente Industrial
Satoshi Yokota
Conselho de Administração
Diretor presidente
Maurício Novis Botelho
Diretor vice-presidente de
Planejamento e Desenvolvimento Organizacional
Frederico Fleury Curado
Diretor vice-presidente
Financeiro e de Relações com o
Mercado
Antonio Luis F. Manso
Diretor vice-presidente
Comercial para Mercado Militar
Romualdo M. de Barros
Embraer Aircraft Corporation
Samuel D. Hill Presidente
141
Foram também organizadas duas áreas de mercado distintas, tendo em vista
a natureza dos clientes e o foco de atuação de cada uma delas. A vice-presidência
civil comercial para mercado regional responde por 80% do faturamento da empresa,
e visa a atender ao mercado mundial de aviação de transporte regional. E, por fim, a
vice-presidência comercial para mercado militar, que responde por 20% do
faturamento da empresa. O produto militar é basicamente por encomendas,
atendendo às especificações minuciosas feitas pelo cliente e desenvolvendo o
produto em conjunto com ele. Nesse caso, o principal cliente da Embraer é a Força
Aérea Brasileira (FAB), mas os demais clientes também são considerados
importantes. Ressalve-se que 60% das aeronaves em uso pela FAB foram
fabricadas pela Embraer. (Ibidem).
3.2.2 - PROCESSOS DE TRABALHO
O processo de trabalho e gerenciamento da Embraer, quando estatal, era
considerado, tanto pelos funcionários quanto pela nova diretoria, departamentalizado
e hierarquizado. Com o objetivo de alterar tal sistema, a empresa iniciou em julho de
1996 um projeto denominado Redesenho de Processo de Negócio. De acordo com
Bernardes (2000, p.272) “o projeto foi dividido em cinco etapas distintas: diagnóstico
do ambiente, direcionamento, especificação, implantação e operação. Foi prevista,
em todas as etapas, notadamente na etapa de operação, a implementação de
melhoras contínuas nos processos por meio da Gestão da Qualidade Total”. A
construção do ambiente de negócio da Embraer baseou-se na missão da empresa,
seus produtos, volumes, características, metas de curto e médio prazos, fatores
críticos de sucesso, pontos fortes e fracos, unidades operacionais. Posteriormente,
foram modelados e formalizados os processos empresariais (oito ao todo), criando-
se o conceito de cadeia de valores da empresa, no centro da qual se encontram os
processos que são chamados de básicos, acima o processo que gera as diretrizes
do negócio e abaixo os que suportam os básicos, todos criando valor para o cliente
(BERNARDES, 2000, p. 272) (ver figura 6).
142
FIGURA 6 – Processos Empresariais
Fonte: Embraer (2000)
Foram identificados também os macroprocessos (53 ao todo) que detalham
os processos empresariais. Para cada macroprocesso e processo prioritários foram
concebidos os principais atributos, tais como: missão, entradas e saídas,
funcionalidades, proprietários e diretrizes. Nesse estágio os principais instrumentos
para o gerenciamento das informações na empresa, como já descrevemos, são os
Planos e Programas de Ação. Na dimensão dos processos empresariais será
iniciada a gestão por indicadores e medidores, que irá monitorar o desenvolvimento
dos projetos e a análise de desempenho da empresa (Ibidem).
3.3 - O MODELO DE GESTÃO DE DESENVOLVIMENTO DO PRODUTO
O atual processo de Gestão de Desenvolvimento do Produto, quando
comprado ao modelo adotado na gestão estatal, implicou avanço considerável,
tornando-se muito mais integrado, eficiente e interativo, e por isso mais
interdependente dos times de inovação e dos departamentos, pois passou a ter
estreito relacionamento com todos os demais macroprocessos, encontrando-se mais
sincronizado com a Estratégia Geral da Empresa. Segundo Mendonça (1997, p. 29)
o objetivo desse macroprocesso é desenvolver produtos novos e/ou modificados
voltados para o mercado com preços e qualidade assegurados por meio de
processos bem definidos, recursos adequados com metas arrojadas de custo e
prazos que satisfaçam clientes, fornecedores, parceiros, acionistas, empregados. O
Produção
Suporte Empresarial
Gestão do Relacionamento com o mercado
Gestão do Desenvolvimento
do produto
Gestão do Material
Gestão de serviços ao
cliente
Gestão do Negócio
Gestão Econômico Financeiro
VALOR
VALOR
143
modelo Gestão de Desenvolvimento de Produto, em relação ao modelo anterior,
considerado linear e pouco comunicante, é muito mais integrado, flexível e orientado
para um modelo arquitetural em rede de informações, interagindo com as diversas
áreas, e valendo-se de avanços importantes decorrentes das inovações
organizações e técnicas participativas implementadas no período, e por isso
demonstrou ser mais capacitado para responder em tempo real às soluções
demandadas. No plano da gestão empresarial da competitividade e dos processos
de aprendizagem e inovação tecnológica, o novo padrão de organização industrial,
fundado na integração, flexibilidade e na gestão de redes de empresa, demonstrou-
se um padrão superior quando comparado ao modelo anterior adotado pela Embraer
quando empresa estatal (Ibidem).
Todavia, o modelo de gestão empresarial e tecnológico da Embraer ainda
precisa avançar muito nos padrões de integração informacional interempresarial
para que possamos denominá-lo uma arquitetura plena de networking ou compará-lo
a ela. Mas tudo indica que a estratégia competitiva instituída pela empresa caminha
nessa direção, iniciando os seus primeiros passos na formalização de um modelo de
gestão baseado em conhecimento, organizado em rede e on-line com suas
parceiras. Das atuais empresas que participam dos programas ERJ-145 e ERJ-135
da Embraer, são poucas as que dispõem de capacitação tecnológica na operação
de softwares poderosos, que permitam a conexão direta e harmonizada no envio
dos desenhos industriais de peças e partes da aeronave, no mesmo padrão de
linguagem informática, sem que a Embraer tenha de retrabalhar e reconverter tais
imagens ao padrão de uso da empresa, caracterizadas pelos sistemas Intergraph e
Catia. Conforme Bernardes (2000, p. 274) atualmente a empresa investe pesado na
modernização e integração informática com os seus parceiros, pois, quanto maior a
integração, maior será a flexibilidade, a agilidade de respostas ao mercado e o
incremento da produtividade. Esse processo busca atingir o seguinte patamar:
-“Clientes e parceiros são envolvidos ao longo do ciclo desse processo”.
-“A organização é predominante formada por times multidisciplinares,
divididos por segmentos da aeronave”.
- “Os custos passam a ser permanentemente monitorados”.
-“Todos os planos de execução são agora interligados pelo sistema
corporativo”.
144
-“A organização das informações é reunida em uma base única, garantindo
informações atualizadas e assegurando a sua disponibilização para toda a
empresa”.
Os processos são definidos, documentados, conhecidos, controlados e
atualizados. A Figura 7 apresenta as diversas fases do macroprocesso de Gestão de
Desenvolvimento do Produto.
FIGURA 7 – Fases do Desenvolvimento do Produto
Fonte: Embraer (2000).
3.3.1 – PROJETO DE TRANSFORMAÇÃO
A Embraer, durante sua existência como empresa estatal, ligada diretamente
ao governo federal, conviveu com uma estrutura organizacional de nível funcional
bastante verticalizada e rígida. Quando à organização e gestão das atividades e
processos dos trabalhos, a estrutura era compatível com a realidade da empresa
como uma estatal. No plano da diretoria, a Embraer basicamente conviveu com a
seguinte composição: uma superintendência e sete diretorias (industrial, técnica,
produção, comercial, programas militares, financeira e administrativa). Essa
composição decorria de sua condição de empresa Estatal, uma vez que havia a
proibição legal de se adotar uma estrutura mais flexível e compatível com suas
necessidades. Em contrapartida, chegou-se a ter dez posições funcionais (diretoria,
assessor de diretoria, gerente de divisão, assistente de gerente, assessor de
gerente, chefe de seção, subchefe de seção, supervisor, encarregado e líder)
(MEDONÇA, 1997). Essa estrutura era considerada, segundo a visão da nova
diretoria, além de rígida e conservadora, bastante centralizadora, não permitindo
liberdade de iniciativa a seus funcionários, provocando demora nas ações e/ou
respostas exigidas pelo mercado e mesmo internamente em atividades que
Estudos Preliminare Concepção Desenvolvimento Seriação Phase-Out
145
demandavam urgência, culminando com uma comunicação deficiente e distante
entre as lideranças (chefias) e seus colaboradores (funcionários). Segundo
Bernardes (2000, p. 279) “a gerência, os recursos humanos eram caracterizados por
uma gestão voltada para os aspectos legais, em que a valorização das pessoas
como fator estratégico na obtenção dos resultados empresariais era frágil; o
desenvolvimento dos trabalhadores não tinha foco estratégico; o processo de
comunicação era deficiente e destacava-se uma baixa relação nas interfaces entre
as áreas de recursos humanos, impossibilitando uma gestão integrada e que de fato
interagisse com o ambiente de negócio”. O novo modelo organizacional a ser
instituído partia de uma concepção de configuração mista, matricial e funcional. Esse
modelo introduziu uma nova lógica de trabalho, migrando de uma organização
hierarquicamente orientada para uma modalidade de operação em times ou equipes
multifuncionais. Essa abordagem conceitual exigia na prática a formação de
comportamentos empreendedores de novos gestores, na acepção da gerência de
RH da Embraer. A grande âncora do programa de gerenciamento da mudança
esteve atrelada à formação de gestores de transformação na Embraer50 .
Em 1996, teve início um processo de transformação organizacional, com o
PROJETO TRANSFORMAÇÃO (TOR) que tinha como meta a melhoria do
relacionamento entre os funcionários, da imagem da empresa e da comunicação
entre os empregados e a focalização em atingir os objetivos e metas da empresa. O
projeto TOR teve como eixo principal a instalação do software SAP, e gradualmente
passou a integrar todos os processos produtivos e controle da empresa: compras,
vendas, produção, engenharia e desenvolvimento, etc. A gerência de recursos
humanos tornou-se o setor responsável pelos times de transformação e pela
implementação dos projetos que efetivamente poderiam impactar o processo de
transformação. Segundo Bernardes (2000, p. 280), “foram criados grupos
multidisciplinares com a missão de desenvolver projetos visando a trabalhar esses
pontos, alinhados com o conceito de times de trabalho”. Foram instituídos os
seguintes times:
50 Nesse programa foram investidos R$ 186.000,00 em 1997 e R$ 154.000,00 em 1998.
146
Nome do Projeto Missão do projeto
É Time
Disseminar e incentivar a cultura de times multifuncionais voltados para os resultados da Embraer
Rádio Avião
Melhorar a comunicação entre liderança e liderado, empresa e empregados.
Gente é Comigo
Promoção da descentralização da gestão de RH na empresa, mediante a formação de lideranças gestoras de seus recursos humanos.
Saúde
Prevenir acidentes de trabalho e melhorar o bem-estar dos empregados.
Boa Idéia Implementar o programa de participação em nível corporativo. Foco no Alvo Implementar o sistema de gestão baseado em plano de ação. Empresa Modelo
Construir uma imagem positiva da Embraer entre clientes, fornecedores, parceiros, instituições financeiras, governo, mercado, imprensa, comunidade e funcionários.
Olho Vivo Assegurar o acesso e manuseio das informações sensíveis e tecnologias de empresa somente a pessoas autorizadas.
A implementação desses projetos buscou alcançar níveis mais elevados de
flexibilidade, interação e autonomia das ações empresariais. As metas e estratégias
têm sido elaboradas em conjunto com seus integrantes, o que vem proporcionando
redução significativa do tempo de trabalho para a conquista dos resultados
estabelecidos. Tal esforço consistiu na formação de uma cultura organizacional mais
voltada para a criatividade e inovação, favorecendo a aprendizagem organizacional,
uma vez que a troca de informações e o estabelecimento de compromissos para a
cooperação entre as pessoas consiste no eixo estratégico desse projeto.
Um primeiro resultado dessa nova forma de atuação, que procura a adesão
do funcionário à missão da empresa, foi o Projeto Boa Idéia, parte integrante do
programa de qualidade da Embraer, que num primeiro momento foi restrito somente
ao pessoal da produção, e que pretendia acolher sugestões para a redução de
custos e melhoria na produção. Entre 1995, e fevereiro de 1997, a Embraer investiu
nesse projeto RS$185 mil e já havia conseguido economizar cerca de US$1 milhão
com projetos idealizados pelos funcionários. Nos dois primeiros anos de
funcionamento do programa, foram enviadas 3.823 sugestões e delas, 1.264 foram
adotadas. O sistema de sugestões chamado Projeto Boa Idéia (chamado
147
anteriormente de Programa Participação) tem como base a filosofia kaizen
(melhoramento, através da solução de problemas, em dois pontos de vista nas
empresas / organizações). São aceitas sugestões de todas as áreas, voltadas para
qualidade do produto ou qualidade de vida. Um exemplo interessante foi o processo
de limpeza das chapas das aeronaves (MEDONÇA, 1997). O antigo sistema
utilizava metil (produto altamente tóxico e inflamável) na remoção da camada de AZ
(que protege as chapas). A operação era realizada por até dez pessoas e consumia
de quatro a cinco horas de trabalho. Por sugestão de funcionários, a área de
produção passou a utilizar o produto ridoline, aplicado com jato de água quente.
Com esse sistema, são necessários apenas dois homens e duas horas de trabalho.
O ridoline não é inflamável nem tóxico51 (Ibidem).
Até sua privatização a Embraer jamais havia promovido uma pesquisa
completa de medição de seu Clima Organizacional, com o objetivo de diagnosticar e
implementar as ações cujos resultados viessem a apoiar o projeto de mudança
organizacional e cultural sob foco de um novo modelo de administração da empresa.
Tendo diagnosticado o clima motivacional interno da empresa, a nova direção, com
base na elaboração de uma nova estratégia e sem as restrições impostas pelo
governo federal, criou uma estrutura organizacional voltada para os princípios e
missão empresarial estabelecidos pela nova administração, com definição clara dos
resultados a serem atingidos pelo corpo de funcionários. Para agilizar as ações e a
comunicação aos seus clientes, parceiros, fornecedores, funcionários e público em
geral, sua estrutura organizacional foi reduzida a apenas quatro posições funcionais
(diretoria, gerente de divisão, gerente de seção e supervisor). Essa estrutura
comporta um grau de flexibilidade que respeita as características de cada área
(MENDONÇA, 1997).
Existem áreas, por exemplo, com apenas duas posições (diretoria e gerência
de divisão); outras com três posições (diretoria, gerência de divisão e supervisão).
Além disso, foi adotado na empresa um modelo de liderança matricial, no qual o
ocupante não possui uma denominação de cargo atrelada à estrutura organizacional
e nem mesmo tem posição identificada na estrutura, pois normalmente lidera a
execução de um trabalho, com prazo previsto para seu resultado, contando com
funcionários das diversas áreas formalmente constituídas. Sua atuação é como
51 Os participantes do programa não recebem gratificações pelas sugestões. Apenas participam de um sorteio de prêmios (videocassetes, bicicletas, microondas).
148
consultor e facilitador em todo o processo de trabalho. Para cada missão, seja o
desenvolvimento de um novo produto, seja o aperfeiçoamento de produtos
existentes, seja a melhoria de um processo ou de um sistema, as equipes são
formadas com a participação de profissionais de todas as áreas funcionais
envolvidas: técnica, produção, suporte ao cliente, suprimento, etc. (Ibidem).
3.3.2 – PLANO DE CARGOS, SALÁRIOS E CARREIRA
Os recursos humanos sempre foram considerados fatores críticos de
competitividade para a Embraer. Entretanto, por ser empresa de economia mista,
subordinada ao governo federal, sempre teve dificuldade de adotar e pôr em prática,
seguidamente, as políticas e práticas definidas, não pela vontade de seu corpo
diretivo, mas, sim, por obediência às leis, decretos-leis, medidas provisórias. Como
empresa estatal, não podia conceder aumento aos funcionários, então se
promoviam as pessoas, e toda a massa de empregados viu-se acumulada nas faixas
de salários mais elevados. Com isso, acabaram-se as promoções, as carreiras, os
estímulos de baixo para cima.
Terminando o ciclo de privatização da empresa, quando ocorreram dispensas
de funcionários em massa, de acordo com Bernardes (2000, p. 283) “o clima na
empresa era de desmotivação, o retrato organizacional encontrava-se
desorganizado e o sentimento do quadro funcional era de descrédito e insegurança
quanto ao futuro da empresa, sentimento que ficou conhecido para os trabalhadores
que permaneceram na Embraer como síndrome dos sobreviventes às demissões”. A
percepção da nova gerência de RH entendia que o quadro funcional era muito
apegado aos modelos tradicionais de atuação e encontrava dificuldades em romper
com os antigos paradigmas de gestão empresarial. A maioria dos empregados, por
ter construído suas carreiras na empresa, valorizava muito o status e o salário,
deixando para um segundo plano o “’valor” do know-how adquirido (Ibidem).
Apesar de as singularidades tecnológicas de trabalho requererem nível de
especialização acima da média, a estrutura organizacional era essencialmente
funcional, favorecendo o aprofundamento da especialização, e dificultando a
formação de profissionais polivalentes, multifuncionais. Como conseqüência,
formavam-se profissionais com pouca mobilidade e com certa acomodação interna.
149
Nessa nova fase a área de Recursos Humanos foi revitalizada e reorganizou sua
estratégia na busca de resultados que revertessem esse quadro.
Para alcançar as metas desejadas, centrou-se a atenção em dois pontos
fundamentais: o desenvolvimento de um Plano de Cargos, Remuneração e
Carreiras; e a mudança do perfil de recrutamento dos novos funcionários. Esses dois
enfoques acabaram por impactar diretamente a formação de uma nova cultura
organizacional e os valores da empresa. Em relação ao perfil de recrutamento,
passaram a ser selecionados novos funcionários egressos de outros centros e
universidades, sem necessariamente privilegiar os profissionais oriundos do ITA.
Essa medida causou e vem proporcionando grande modificação na cultura e nos
valores da organização (Ibidem).
De forma positiva, criou-se uma cultura propensa à diversidade, criativa e
inovativa.
Segundo Bernardes (2000, pp. 284-285) “o novo plano de cargos, salários e
carreiras, denominado de avaliação e capacitação graduada, foi desenvolvido pela
área de recursos humanos. O sistema adotado privilegia um novo sistema de
remuneração para estimular o aperfeiçoamento do funcionário e a competitividade”.
Esse sistema adotado pela Embraer é baseado nas habilidades dos empregados.
Nos termos de Zarifian (2001, p.58), poderíamos denominá-lo de modelo de gestão
baseado nas competências dos empregados. Os princípios centrais aplicados foram:
- “criação de um modelo de gestão integrado que enfatizasse a evolução e a
potencialização do desenvolvimento das qualificações, competências e
habilidades diversificadas dos funcionários, voltados para os resultados
empresariais”;
- “obtenção de um instrumento de gestão de carreiras, sucessão,
recrutamento, seleção, treinamento e desenvolvimento profissional”;
- “estabelecimento claro do controle de carreiras – horizontal e vertical na
empresa”;
- “remuneração fixa baseada no crescimento das qualificações,
competências e habilidades, demonstradas por aplicações de avaliações”;
- “favorecimento da melhoria da comunicação entre as lideranças e seus
liderados”;
- “promoção da conscientização de que o funcionário é o principal
responsável pelo seu crescimento profissional”.
150
Com o auxílio de uma consultoria e extensa pesquisa de mercado, a Embraer
iniciou a implementação deste plano em duas fases. Na primeira, que compreende o
período de 1995 a julho de 1996, foi desenvolvida a definição/estruturação do Plano
de Cargos, cujas medidas mais importantes consistiram em:
- “elaboração dos perfis de cargos e funções, em uma metodologia de maior
abrangência de atividades, com redução de 1.298 para 277 cargos”;
- “estruturação do Plano de Cargos em seis grupos ocupacionais:
operacionais, administrativos, técnicos de nível médio, profissionais,
engenheiros e lideranças”;
- “montagem da estrutura salarial”.
A definição da Composição da Remuneração foi dividida em dois níveis:
- “remuneração fixa, tendo por base o valor relativo interno dos cargos que
compõem o plano; estrutura salarial compatível com o mercado; e,
finalmente, a capacitação demonstrada pelos empregados no crescimento
de suas qualificações, competências e habilidades”;
- “remuneração variável, associada aos resultados alcançados pela
empresa, equipes e indivíduos e alinhada aos Programas de Ação e
Planos de Metas Setoriais negociadas e avaliados”.
Na Figura 8 – Remuneração Global – a seguir, vê-se como a definição de
estrutura das trajetórias de carreiras foi repartida em dois planos:
151
FIGURA 8 – Remuneração Global
Fonte: Embraer (2000).
- “carreira horizontal: indicação de agregação de novas qualificações,
competências e habilidades para a evolução profissional/salarial no
mesmo cargo”;
- “carreira vertical: indicação de agregação de novas qualificações, novas
competências e novas habilidades para o acesso a outros cargos,
podendo ser na própria área de atuação ou em outras áreas da empresa”.
A segunda etapa foi iniciada em agosto de 1996 e concluída em julho de
1997. Nessa fase foram desenvolvidos:
- “definição do plano de carreiras”;
- “definição do modelo de um instrumento que agregasse os indicadores de
qualificações, competências e habilidades requeridos pelos cargos e
funções”;
- “treinamento das lideranças para o levantamento dos indicadores de
qualificações, competências e habilidades”;
REMUNERAÇÃO GLOBAL
REMUNERAÇÃO FIXA
COMPARAÇÃO COM O MERCADO
VALOR RELATIVO INTERNO DOS CARGOS
QUALIFICAÇÕES, COMPETÊNCIAS E
HABILIDADES
REMUNERAÇÃO VARIÁVEL
ASSOCIADA A RESULTADOS
ALINHADA COM OS “PROGRAMAS DE AÇÃO” E
OS “PLANOS DE METAS SETORIAIS”
152
- “elaboração das especificações dos indicadores de qualificações,
competências e habilidades dos módulos de cada cargo e função”;
- “montagem das carreiras dos cargos e funções”.
Conforme Bernardes (2000, pp.286-288) “considera-se que os levantamentos
dos indicadores de qualificações, competências e habilidades trouxeram maior
conhecimento da complexidade do conteúdo das atividades e dos requisitos exigidos
pelos cargos/funções e a necessidade de dotar a empresa de uma estrutura salarial
mais competitiva, notadamente para os cargos voltados para a tecnologia
aeronáutica, compatibilizando-a a sua realidade interna e aos parâmetros do
mercado, também internacionalmente”. Vejamos o Mapa de Movimentação de
Carreiras apresentado a seguir:
IMPLANTAÇÃO DO PLANO:
- “Aprovação pela Diretoria Executiva e Conselho de Administração”.
- “Promoção dos Enquadramentos Funcionais”.
- “Promoção dos Enquadramentos Salariais no mínimo das novas faixas
salariais estabelecidas, abrangendo 189 funcionários, com impacto de
2,6% sobre a folha nominal de salários”.
153
ETAPAS DA PRIMEIRA FASE
- “Treinamento das Lideranças para o levantamento dos Indicadores de
Qualificações, Competências e Habilidades”.
- “Elaboração das especificações dos Indicadores de Qualificação,
Competências e Habilidades dos Módulos de cada cargo/ função”.
- “Montagem das carreiras dos cargos/função com impacto de 6,5% sobre a
folha nominal de salários”.
LEVANTAMENTO POSTOS DE TRABALHO
PERFIL DOS CARGOS
ENQUADRAMENTO PESSOAL ABAIXO MÍNIMO CARGO
PLANO DE CARGOS E REMUNERAÇÃO
AVALIAÇÃO DOS CARGOS
PESQUISA SALARIAL
TABELA SALARIAL
154
ETAPAS DA SEGUNDA FASE
Período realizado: de agosto de 1996 a julho de 1997.
Etapas de trabalho desenvolvidas:
1. “Definição/Estruturação do Plano de Carreiras:
- Estudos/Definição do modelo de um Instrumento que agregasse os
Indicadores de Qualificações, Competências e Habilidades requeridos
pelos cargos e funções”.
2. Definição do Instrumento de Avaliação e Aplicação aos funcionários:
- “Estudos/Definição do Instrumento de Avaliação/Certificação de
Capacitação dos funcionários”.
- “Treinamento das Lideranças/Avaliadores na aplicação do Instrumento de
Avaliação”.
- “Avaliação dos funcionários e indicação do grau de maturidade no
cargo/módulo de Qualificações, Competências e Habilidades e das
necessidades de desenvolvimento pessoal e profissional”.
Treinamento para levantamento indicadores qual., compet. e
habilidades
Elaboração dos indicadores qual., compet. e habilidades
Definição do instrumento de avaliação e treinamento dos
avaliadores
Avaliação dos funcionários
Feed-Back Avaliador / funcionários
Indicadores de
Desenvolvimento
Plano de Treinamento & Desenvolvimento
Carreira
Atualização da Pesquisa Salarial
Indicação do grau de Q., C. e H. dos funcionários
Avaliação dos Cargos
Estrutura de Cargos e Remuneração
Enquadramento Funcional e Salarial
155
3.Revisão do Plano de Cargos e Remuneração implementado na primeira fase:
- “Tendo em vista que os levantamentos dos Indicadores de Qualificações,
Competências e Habilidades trouxeram um maior conhecimento da
complexidade do conteúdo das atividades e dos requisitos exigidos pelos
cargos/funções e a necessidade de dotar a empresa de uma estrutura
salarial mais competitiva, notadamente para os cargos voltados para
tecnologia aeronáutica, a Embraer promoveu uma revisão da estrutura do
Plano de Cargos e Remuneração, compatibilizando-o à sua realidade
interna e aos parâmetros do mercado, também internacionalmente”.
Implementação do Plano:
- “Levantamento/Análise dos custos de enquadramento salariais”.
Promoção dos enquadramentos funcionais e salariais dos funcionários nos
módulos e níveis salariais, abrangendo 53% do efetivo elegível (ver figura 9).
156
FIGURA 9 – Perfil/ Indicadores – Instrumento de Gestão
Fonte: Embraer (2000).
3.3.3 - DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL E EDUCAÇÃO Desde 1988, a Embraer já dispunha de um programa de alfabetização.
Contudo, com a introdução do Programa de Qualidade Total em 1989, verificou-se a
necessidade de se atrelar um programa de educação básica para assegurar o
sucesso do programa de qualidade. Com base em uma pesquisa de escolaridade na
empresa, constatou-se que 20% dos empregados da área produtiva eram carentes
de educação básica. Com intuito de criar as condições para o desenvolvimento da
competência de gestão, no início dos anos noventa instituiu-se o programa de
suplência de primeiro e segundo grau. O programa de educação básica, tido como
fundamento para o programa da qualidade total, prosseguiu com parcerias nas
escolas particulares para fornecimento de cursos técnicos voltados para as
atividades da empresa. As aulas eram ministradas em salas no centro de
treinamento da Embraer (BERNARDES, 2000, p. 289).
Em 12 de dezembro de 1997, a empresa conseguiu um feito memorável.
Cerca de 150 empregados de diversas áreas receberam o diploma de segundo grau
completo. Essa foi a última turma do supletivo e, a partir de então, todos os
PERFIL
DO
CARGO
E
INDICADORES
DE
Q, C, e H
AVALIAÇÃO DOS CARGOS
PESQUISA SALARIAL
RECRUTAMENTO E SELEÇÃO
MEDICINA, HIGIENE E SEGURANÇA
AUTO-ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL
PLANO TREINAMENTO E
DESENVOLVIMENTO
ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO
PLANO DE CARGOS E
REMUNERAÇÃO
ADMINISTRAÇÃO DE CARREIRAS
MAPEAMENTO DE CARREIRAS
EVOLUÇÃO SALARIAL
PROMOÇÃO
PLANEJ. DE SUCESSO
RODÍZIO
APROVEITAMENTO INTERNO / TRANSFERÊNCIA
157
empregados da empresa passaram a ter nível de escolaridade mínima do segundo
grau. Desde sua implementação o curso de suplência no segundo grau formou cerca
de setecentos alunos. O curso foi ministrado em conjunto com o Centro Educacional
São Paulo e com a prefeitura de São José dos Campos. O supletivo também foi
oferecido aos empregados de empresas prestadoras de serviços da Embraer
(Ibidem).
O setor de treinamento, embora considerado estratégico para a empresa,
passou por um processo radical de ajuste do quadro de funcionários, nos anos que
antecederam a privatização e prosseguiu após ela. Em 1996, restavam apenas três
analistas dos 107 funcionários da área de treinamento existentes em 1990.
Atualmente, essa atividade foi terceirizada e, segundo técnicos, com tal
procedimento ganhou-se muito em qualidade e economia de custos, uma vez que
para a realização de qualquer curso é feita uma pesquisa que obedece a alguns
critérios que avaliam a oferta, a qualidade e o preço dos cursos disponíveis no
mercado. Em 1996, foi operada uma mudança na área de treinamento, que implicou
melhora significativa na comunicação com os empregados da fábrica. O setor de
treinamento, que ficava a oitocentos metros da fábrica, hoje se situa bem em frente a
ela (Ibidem).
Em 1998, por exemplo, foram destinadas 63 horas de treinamento ao ano por
funcionário na Embraer. Evidentemente, esse indicador é uma proximidade do
esforço da empresa nas atividades de treinamento e, portanto, deve ser relativizado
pois, certamente, há funcionários que concentram muito mais horas de treinamento
por ano, que variará de acordo com o grau de importância de sua função ou das
atividades que exerce. Segundo Bernardes (2000, p. 290) pela análise da Tabela 19,
é possível notar a partir de 2001 a tendência decrescente da média global de horas
destinadas ao treinamento por empregado, sobretudo após o período de
privatização. A explicação para esse comportamento está em dois aspectos:
1. “a redução dos gastos ou verbas com o treinamento, que hoje se situam
na faixa de um por cento do faturamento da empresa”;
2. “a melhor equalização e focalização dos cursos que agreguem valor e
estejam sintonizados com a atual estratégia da empresa”.
158
TABELA 19 – Média de Horas de Treinamento por Empregado
Ano Número de horas de treinamento
Média de horas de treinamento por empregado
1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
420.000 300.000 300.000 204.000 204.000 132.000 92.600 48.953 393.854 346.854 398.521 560.000 402.000 265.584 377.769 454.437
33 33 33 34 34 38 29 20 63 47 46 61 40 25 32 36
Fonte: Embraer (2006).
Tendo em vista o atual ambiente de competição global caracterizado pelas
rápidas mudanças na fronteira tecnológica e o quadro interno da Embraer descrito
acima, a empresa tem investido em programas de treinamento e qualificação
profissional com o objetivo de transformação de valores. A qualificação das
lideranças, com visão estratégica, de mercado, de negócio e desenvolvimento
humano passou a ser considerado fator-chave para o processo de transformação e
competitividade da empresa. Essas novas diretrizes são mais nítidas nos programas
de formação de lideranças e gestores da empresa. Para isso, foi feito um convênio
com uma escola de pós-graduação (Instituto Nacional de Pós-Graduação – INPG), e
os funcionários interessados assistem aos cursos nas instalações da empresa, com
bolsa parcial (Ibidem).
Conforme Mendonça (1997, p.34) “os aperfeiçoamentos disponíveis são para
as áreas de gerenciamento industrial, administração de recursos humanos,
marketing e comércio exterior e administração. Foi elaborado, na Fundação Dom
Cabral, tendo em vista as singularidades da Embraer, um curso para o
desenvolvimento e transformação dos valores dos gestores da empresa”. Além
disso, vem sendo enfatizado o treinamento de vendedores, para torná-los aptos a
atender os clientes e, ao mesmo tempo, conhecerem detalhadamente a empresa.
159
A empresa mantém convênio com o RHAE (Programa de Capacitação de
Recursos Humanos para Atividades Estratégicas). As bolsas são concedidas para
áreas prioritárias em tecnologia, quais sejam: engenharia industrial, de precisão e de
materiais; normalização; ensaios e certificação; gestão tecnológica e da qualidade e
produtividade; e modernização industrial. Para a preparação de técnicos
aeronáuticos, a empresa tem enviado engenheiros para o exterior financiados pelo
programa RHAE. Nos últimos anos, com a queda do orçamento federal, diminuiu o
número de engenheiros que usufruem deste programa na empresa. Como descrito
anteriormente, os produtos são de alta tecnologia, necessitando de treinamentos
específicos voltados para alto desempenho. O alto desempenho é traduzido em
desempenho do produto, desempenho de processos, desempenho dos serviços dos
clientes. A Embraer possui cadastrados aproximadamente novecentos cursos que
abrangem as mais diversas áreas: técnico-operacional, de gestão executiva, de
informática, de idiomas, entre outras (MENDONÇA 1997, p.34).
Os treinamentos podem ser realizados internamente ou por intermédio de
empresas contratadas e são ministrados em salas, oficinas e laboratórios da
empresa. Após o treinamento teórico nos processos especiais de fabricação (por
exemplo, tratamento térmico, tratamento de superfície) existe o acompanhamento de
um funcionário mais experiente, denominado “padrinho”, que acompanha o recém-
treinado por um período predeterminado, avalia o seu trabalho, e, ao seu término, a
Auditoria da Qualidade e Chefia imediata formalizam a sua qualificação. O
treinamento para os novos empregados inicia-se na integração. Para os engenheiros
novos são realizados cursos específicos sobre engenharia aeronáutica. Para
operacionais, os cursos são voltados às atividades de produção, atendimento aos
requisitos do sistema da qualidade, educação básica, atendimento a alguns
requisitos aeronáuticos dos órgãos homologadores. (Ibidem).
160
3.4 - PLANO DE REESTRUTURAÇÃO (1994 - 1998) Após a privatização da empresa, a nova direção encontrou uma série de
dificuldades para levar a cabo o plano de reestruturação. Uma decisão do
Congresso Nacional impossibilitou qualquer corte no quadro funcional por seis
meses. A empresa tinha na época cerca de 5.600 funcionários e uma folha de
pagamento de US$10 milhões. A nova administração optou pelo caminho da
demissão de pessoal para tornar mais ágil a organização e reduzir os custos de
demissão dos trabalhadores e do processo de reestruturação administrativa, que na
sua fase mais dramática, no período que antecedeu a privatização da Embraer, foi
assumido pelo Estado brasileiro, entregando para a iniciativa privada uma empresa
já relativamente preparada para a nova fase que estaria por vir (BERNARDES, 2000,
p. 292).
Com o objetivo de incrementar a produtividade e a rentabilidade da empresa,
iniciou-se, em junho de 1995, profunda reestruturação administrativa e operacional
em suas unidades, reduzindo o efetivo e compactando atividades. Em junho de
1995, a empresa demitiu 1.700 funcionários, sendo 1.200 do setor administrativo
(chefias, compras, contabilidade, etc.) – entre eles 212 cargos de Chefia, entre
gerentes, chefes de seção, supervisores e encarregados – e quinhentos na área de
atividades produtivas (engenharia, engenharia de produção e ferramental). A
empresa reduziu em 17% o número de engenheiros, de um total de setecentos que
trabalhavam na empresa. Nas subsidiárias, Neiva e EDE, foram demitidos 250 de
um total de seiscentos funcionários. Entre 1995 e 1996, foram dispensados mais de
1.900 empregados, eliminando-se 275 cargos de chefias, totalizando 9.254
demissões do início do processo até depois da privatização. Os demitidos sofreram
um grande impacto sócio-econômico, que será analisado no Capítulo 4, tomando
como indicador a mobilidade espacial ocorrida com os ex-funcionários na cidade de
São José dos Campos.
Em abril de 1996, os dirigentes da Embraer reuniram-se com cerca de dez
representantes sindicais e propuseram reduzir uma nova rodada de demissões pela
metade em troca de uma diminuição de 10% na jornada de trabalho e nos salários e
a formação de um banco de horas. Em votação direta os funcionários aceitaram o
acordo, com a condição de que os executivos também reduzissem seus salários na
mesma medida. Já em 1997, com o impulso das vendas do ERJ-145, foram gerados
161
624 novos postos de trabalho. Com isso, houve alteração na relação entre emprego
indireto e direto na produção.
Em 1994, 50% dos funcionários eram considerados mão-de-obra direta e 50%
de mão-de-obra indireta. Após a privatização essa proporção passou a ser de 67%
de mão-de-obra direta e 33% de mão-de-obra indireta, além de ter ocorrido uma
redução do nível do salário médio global da empresa da ordem de 25% (ver Gráfico
9)
GRAFICO 9 – Evolução do Nível de Emprego da Embraer, 1990-1998
Números Absolutos
0
2000
4000
6000
8000
10000
90 91 92 93 94 95 96 97 98
Emprego TotalNúmero de pessoas ligadas à produçãoNúmero de pessoas não ligadas à produção
Fonte: Embraer (2000).
A distribuição dos funcionários segundo a alocação nas atividades produtivas,
em 1997, encontrava-se assim: a linha de produção do Tucano empregava
cinqüenta pessoas; a do Brasília, oitocentos trabalhadores, e a linha do ERJ-145 já
empregava em torno de duzentos funcionários. Do quadro total de funcionários, que
somavam 4.494 pessoas em 1997, cerca de seiscentos postos de trabalho são
ocupados por engenheiros. Recorreu-se também a expedientes de demissão para o
rebaixamento dos salários da mão-de-obra. Foi o caso, por exemplo, dos 378
operários da linha de produção do EMB-120 Brasília e do EMB-312-Tucano, que
foram demitidos em 1997, em razão da queda de vendas dessa aeronave e,
conseqüentemente, pela ociosidade da capacidade instalada. Em 1998, com o
sucesso das vendas para o mercado externo dos jatos ERJ-145 e 135, foram
162
contratados cerca de 2.243 funcionários. Isso gerou um grande número de
mudanças na empresa, processo que será analisado no Capítulo 4.
Segundo Bernardes (2000, p. 294) “estudos internos da Embraer sugeriam
que os salários médios dos operários de produção encontravam-se em níveis mais
elevados proporcionalmente aos de sua categoria. Aproveitando o período de
arrefecimento da demanda dessas aeronaves, a empresa demitiu esse contingente
para posteriormente contratar novos funcionários”. Por seu turno, os novos
funcionários apresentavam perfil etário mais jovem, eram menos resistentes às
políticas de produção e organização do trabalho e conseqüentemente tinham pouca
tradição e cultura sindical. O fato de essa mão-de-obra dispensada apresentar perfil
elevado de qualificação não se constituiu em constrangimento para o expediente de
demissão, pois o estoque de desempregados que dispõe dos mesmos atributos é
elevado em São José dos Campos. Segundo técnicos da empresa, quando há a
retomada da produção pelo aumento das encomendas, um mês de treinamento do
tipo em serviço já é o suficiente para que o operário esteja apto a desempenhar tais
funções. Ressalte-se que os procedimentos deliberados de rebaixamento do custo
da força de trabalho por demissão não é uma estratégia exclusiva da Embraer, mas
prática predatória de gestão da mão-de-obra, historicamente comum no setor
empresarial brasileiro (Ibidem).
Em relação às estratégias de exteriorização da mão-de-obra, foram
terceirizados os serviços de limpeza, segurança, uma parte de informática, de
alimentação, o centro de treinamento de pilotos, o treinamento de funcionários, os
transportes e alguns serviços associados a design. Segundo Bernardes (2000,
p.295) “os procedimentos de terceirização das atividades indiretas proporcionam
economia de aproximadamente US$80 milhões. Um fato interessante e que ilustra
bem o espírito de administração da empresa, quando estatal, é que a Embraer
dispunha de quatro restaurantes internos, cada um destinado a um tipo de status da
hierarquia funcional da empresa”. Diziam até mesmo que o melhor e mais requintado
restaurante de São José dos Campos era o que servia aos seus diretores e oficiais
militares. Estima-se que com o uso dos expedientes de terceirização a empresa
economizou cerca de US$5 milhões. Atualmente, existem dois restaurantes que
atendem a todos os funcionários sem discriminação de patente ou nível funcional da
empresa. Estimativas fornecidas por técnicos da empresa calculam que cerca de
1.100 pessoas trabalham na empresa mediante regime de subcontratação de
163
terceiros. Evidentemente, técnicos e engenheiros que foram demitidos e,
posteriormente, foram recontratados como autônomos, encontram-se em situação
mais instável e precária, pois uma parte dos contratos é por tempo determinado.
Esse tipo de flexibilização numérica ou quantitativa do trabalho permite transformar
os custos fixos em variáveis, acabando por criar um segmento de trabalhadores de
“segunda classe” no espaço fabril, excluídos do acesso aos direitos sociais
(MENDONÇA, 1997, p.34).
Do ponto de vista da organização do trabalho, a Embraer ascendeu a
modalidades de flexibilidade funcional do trabalho mediante grandes inovações na
gestão operacional dos processos de produção com adoção de técnicas como o
“trade studies”, que consiste em grupos interdisciplinares de melhora contínua de
produtividade e qualidade (kaizen). Outra técnica que mudou radicalmente os
processos de trabalho e de produção foi a adoção do sistema “liason engineering”,
um sistema de interligação entre as diversas áreas da empresa, que auxilia as
tomadas de decisões e eventuais resoluções de problemas de um time de trabalho,
alocado full time para essa atividade, e que presta suporte ao produto na fase de
sua montagem ou fabricação. Com a adoção do “liason engineering” houve redução
de 50% do ciclo de trabalho na fase de produção das aeronaves EMB-120 e ERJ-
145 (BERNARDES, 2000, p. 295).
Com o aumento das vendas do jato ERJ-145, o ritmo de trabalho na linha de
produção, desde a etapa de corte das primeiras peças até a fase de montagem final
dos aviões, foi intensificado, alterando os planos de produção da empresa. Com
isso, a empresa está sendo obrigada a realizar uma ampla revisão dos métodos e
processos de trabalho, não só da Embraer, mas de todos os parceiros e
fornecedores envolvidos na fabricação do ERJ-145. A mudança de cultura no modo
de administrar a Embraer, a partir de sua privatização, também modificou a
mentalidade proeminentemente masculina da empresa. Desde 1997, a empresa
passou a introduzir a figura feminina em operações industriais até então só
exercidas por homens. Nesse período, cinqüenta novas funcionárias passaram a
trabalhar na empresa, nas instalações fabris. Com idade entre 18 e 27 anos, essas
mulheres desenvolvem atividades diferenciadas nas áreas de materiais compostos,
elétrica e de montagem final dos aviões. Seu trabalho está restrito aos processos
menos agressivos e que envolvam peças de menor porte. O nível dos salários das
164
funcionárias é o mesmo dos postos masculinos. Um dos fatores que contam para a
contratação das mulheres na produção é sua formação em boas escolas
profissionalizantes (Ibidem).
Para Bernardes (2000, p.296) “o processo de reestruturação organizacional
dos processos produtivos também acabou por atingir os quadros de recursos
humanos mais qualificados. Embora o DTE, considerado o núcleo estratégico da
empresa, tenha sido preservado, muitos engenheiros e técnicos de alta qualificação
foram demitidos, e, com eles, o conhecimento armazenado durante anos foi perdido.
Em razão do alto custo e do tempo de reciclagem profissional de um engenheiro
aeronáutico, para que possa atuar em outros segmentos, o reemprego imediato não
é tão simples, é necessário algum tempo de adaptação para realocação
profissional”. Tendo em vista toda a crise que afetou a economia brasileira nos anos
noventa e as baixas atividades destinadas a P&D na indústria brasileira, muitos
engenheiros tiveram grande dificuldade em conseguir o reemprego, sobretudo nas
ocupações em que estavam habituados a trabalhar. Com efeito, muitos as
abandonaram ou mudaram de ocupação, passando a atuar como vendedores,
donos de bancas de jornais, alguns conseguiram a realocação para outros setores
da indústria ou dos serviços produtivos, outros foram recrutados por empresas
estrangeiras do ramo aeronáutico, sediadas em outros países. Conforme lócus da
pesquisa realizada com os ex-funcionários da Embraer, que será demonstrada no
capítulo 4, os engenheiros da Embraer ainda desfrutam de prestígio no mercado de
trabalho nacional e internacional. Com a recente recuperação do setor, alguns
engenheiros e técnicos têm retornado à Embraer. É importante mencionar que a
empresa tem um plano de realocação profissional e assistência social aos
funcionários demitidos, que tem sido aplicado com relativo êxito.
Os resultados do processo de reestruturação da empresa podem ser
apreciados pelos ganhos de produtividade que passaram de US$75 mil por
funcionário em 1995 para US$101 mil em 1996. Em 1997, a produtividade alcançou
a marca de US$172 mil de receita por funcionário, em 1998, US$242 mil da receita
por empregado e em 2005 a receita por funcionário é de US$ 243 mil. (ver Gráfico
10).
165
GRÁFICO 10 – Receita por Empregado em Milhões de Dólares
75101
172
242 247
307
254227
172
243
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004
Fonte: Embraer (2005).
Com relação às entregas de aeronaves, em 1996 foram um total de 60
aeronaves e em 1999 um total de 123, e 163 aeronaves entregues em 2001,
conforme mostra a Tabela 20 abaixo:
166
TABELA 20 – Total de jatos Entregues (1996 – 2001)
1996 1997 1998 1999 2000 2001
Aviação Comercial 18 10 13 103 157 155
Aviação Executiva 0 0 0 0 3 8
Defesa 18 5 17 3 2 0
Aviação Leve 24 24 26 17 17 0
TOTAL DE JATOS 60 39 56 123 179 163
Fonte: Embraer (2002).
No âmbito de remuneração, observa-se na Embraer uma queda dos salários
para os níveis operacionais. O piso da categoria estipulado em acordo coletivo em
1998 era de R$ 952 e em 2003 de R$564, conforme Tabela 21.
167
TABELA 21 – Salário Médio do Total de Trabalhadores, dos Trabalhadores Mensalistas e dos Trabalhadores
Mensalistas em reais
Fonte: Pesquisa de Emprego e Salário Médio – Embraer (2005). Obs.: somente trabalhadores da Embraer (exclusive EDE, Neiva e Escritórios Internacionais)
1987 1988 1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003
Horistas 665 687 778 863 757 630 740 952 1374 1460 1285 981 578 635 560 529 564
Mensalistas 1305 1348 1527 1694 1486 1237 1265 1341 1978 2271 2458 2235 1390 1577 1381 1262 1358
Total 1024 1057 1198 328 1165 980 1037 1191 1703 1872 1892 1601 976 1118 1039 992 1082
168
Conforme Mendonça (1997, p.37), com relação à remuneração dos
profissionais de produção e de nível de gerência e executivos, foram feitas correções
para equiparar seus salários51 aos da sua categoria equivalente no mercado
nacional, mas ainda muito abaixo do valor pago nas grandes empresas mundiais
concorrentes no setor (ver Tabela 25).
Um estudo produzido pela subseção do Dieese, no Sindicato dos Metalúrgicos
de São José dos Campos, demonstrou que a massa salarial média no faturamento
da empresa, após a privatização, teve tendência decrescente. Segundo esse estudo,
a partir de meados de 1992, identifica-se uma tendência de recuperação dos salários
reais, que persiste até novembro de 1997. A reversão na linha de tendência passa a
ocorrer a partir dessa data, primeiro ano de privatização da Embraer, perdurando até
2003, conforme tabela 24. O processo de erosão do salário real foi verificado tanto
para os trabalhadores mensalistas como para os horistas. A identificação da queda
dos salários coincidiu com o movimento de contratação de novos trabalhadores,
motivada pela reativação da produção das aeronaves ERJ-145. Se tomado como
base o mês de abril de 1987, o salário dos horistas, em 1998, situa-se em um
patamar inferior ao nível salarial praticado em 1995. O estudo conclui que a queda
salário real, nos dois casos, foi provocada mais por uma política deliberada de
rebaixamento salarial do que pelo fator inflação. Como já descrevemos, de uma das
estratégias do plano de ação constava a redução global dos salários médios da
empresa.
Para Bernardes (2000, pp. 300-301) “quando analisamos o custo salarial da
mão-de-obra convertido em dólares, que na prática constitui um indicador de
competitividade internacional, observamos que o Brasil, se por um lado desfruta de
grande vantagem competitiva em ralação às nações fabricantes de aeronaves, por
outro tem o custo salarial francamente inferior a essas, motivado pelos baixos
salários pagos aos seus funcionários, havendo ampla margem para negociação dos
ganhos de produtividade com os trabalhadores”. Conforme Tabela 22.
51 A correção dos valores salariais para a média e alta gerência provocou a reação indignada pelo sindicato dos metalúrgicos de São José dos Campos, que já reivindicava reposição de perdas salariais, proporcionais aos ganhos consideráveis de produtividade auferidos com o processo de racionalização obtido com a privatização e pagamento de dívidas trabalhistas acumuladas desde o período estatal.
169
TABELA 22 – Salário Médio da Indústria Aeronáutica por Hora/Pessoal/Produção por país (em US$)
Alemanha Austrália Bélgica Canadá E.U.A. Espanha França Inglaterra Otália Japão Suécia Romênia Índia Brasil*
23,44 12,41 14,81 18,33 17,79 10,84 12,75 12,48 12,56 12,96 13,54 1,20 0,77 4,15
Fonte: Dieese, Seção São José dos Campos * Dados de setembro de 2004.
3.4.1 - DA SÍNDROME DOS SOBREVIVENTES À SÍNDROME DA INSEGURANÇA NO EMPREGO
Na ótica dos funcionários da empresa, a privatização foi considerada
favorável, tendo em vista a quebra de determinados feudos – o exemplo dos grupos
de poder formado pelos egressos do ITA ou militares exemplifica bem a situação –
com gestação de uma cultura organizacional mais profissional, aberta, criativa e
baseada na competência dos funcionários.
Os valores e a dimensão ética do trabalho ou a própria identificação dos
funcionários com a empresa têm-se fortalecido muito com a recuperação da
Embraer. Os trabalhadores, sempre que têm oportunidade, exprimem um sentimento
de orgulho por trabalharem em uma empresa de alta tecnologia nacional. A adoção
de métodos de gestão mais participativos e com participação nos lucros tem sido
considerada benéfica na visão dos trabalhadores, embora todos admitam que
atualmente trabalhem muito mais do que na fase em que a empresa era uma estatal,
incluindo nesse contingente tanto os funcionários administrativos como os
relacionados às áreas de projeto e produção. Segundo Bernardes (2000, p. 302) “é
importante mencionar que a empresa remunera as horas extras trabalhadas apenas
170
ao pessoal envolvido diretamente na linha de produção, sendo prática comum dos
funcionários ligados às tarefas executivas administrativo-financeiras, de
planejamento e desenvolvimento técnico ultrapassarem o limite da jornada de
trabalho legal, mas por vontade própria”.
Embora o padrão de condições de trabalho e de relações industriais possa
ser considerado bem acima da média observada na indústria brasileira e o fato de
que a nova direção venha procurando desenvolver relações mais democráticas com
o sindicato local, os dirigentes sindicais queixam-se de que a implementação desses
novos programas organizacionais e sistemas de gestão da força de trabalho tenha
implicado o engajamento individual dos funcionários, rompendo com os laços de
solidariedade e sociabilidade da categoria, tanto dos engenheiros como dos
metalúrgicos, diminuindo o poder de pressão do sindicato na condução das
negociações trabalhistas, fato que vinha ocorrendo antes e após a privatização da
Embraer. Para Rodrigues (1999, p. 290), os sindicatos perderam o poder de
negociação, pois “com a realidade industrial, social, política e cultural dos tempos de
globalização [...] as empresas estão numa posição confortável para enfrentar as
organizações sindicais, o que significa dizer que uma estratégia sindical não vem
apenas da vontade dos sindicatos, mas depende também do tipo de política adotada
pelas empresas, as quais, nessas últimas décadas, têm tido a iniciativa das
mudanças”. Outro motivo da perda do poder sindical local são os conflitos internos
entre seus dirigentes, que culminaram na criação do Sindicato dos Trabalhadores do
setor aeroespacial em 2006 (SindiAeroespacial). As categorias ocupacionais que
mais perderam com tal processo foram os funcionários menos qualificados –
faxineiros, segurança, copeiros, entre outros – que tinham o piso salarial nivelado
pela faixa salarial dos metalúrgicos. Essas ocupações foram completamente
terceirizadas. Algumas ocupações de engenharia, como manutenção, assistência
técnica e projetos passaram a ser terceirizadas e algumas a ser realizadas pela
contratação eventual de consultores, recrutados entre antigos funcionários
demitidos.
Desse modo, a análise sobre o processo de privatização e adoção de novas
políticas de gestão do trabalho nos conduz a algumas questões que merecem ser
mais bem problematizadas à luz crítica de uma perspectiva da sociologia do
trabalho. Na ótica do padrão de relações industriais da Embraer, não notamos que
tais novidades institucionais adotadas pela empresa possam ser consideradas como
171
componentes de uma nova democracia industrial ou um modelo de co-participação
entre sindicatos e empresa. Ao contrário, segundo a visão dos dirigentes sindicais, o
processo de mudança foi implementado a partir de um re-projeto organizacional
presidido por uma lógica orientada para os resultados financeiros da organização e
prestação de contas aos acionistas, e nesse aspecto não se verificou um processo
de “reestruturação negociada” ou uma participação ativa dos sindicatos locais52.
Conforme relato: AN, 44 anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de
Sindicato “o programa de participação de lucros e resultados da Embraer foi imposto de cima
para baixo, sem a devida negociação e transparências quanto às informações e ao
desempenho financeiro da empresa. As inovações tecnológicas também não têm
sido objeto de processos de negociação ou discussão com o sindicato local”. Um fato importante que não pode ser negligenciado é que, no caso da
Embraer, em contraste latente com as outras experiências de privatização na
década de noventa, 10% das ações da empresa foram reservadas aos seus
funcionários. Além disso, ao contrário de muitas empresas nacionais, a Embraer tem
gerado novos empregos, sobretudo de alta qualificação profissional.
As práticas de gestão da produção e de trabalho parecem ter plasmado um
regime fabril de consentimento e engajamento da mão-de-obra a partir da aplicação
pela empresa de uma política de “cooperação estimulada ou incitada53, para o
alcance da flexibilidade interna e a aquiescência dos trabalhadores em relação aos
novos métodos de organização e gestão dos processos produtivos, “buscando uma
52 Conforme demonstram os estudos de Maria Hermínia Tavares de Almeida (1999), no “caso das privatizações os sindicatos não tiveram participação alguma na elaboração da Lei nº8.031/90, que fixou o marco institucional do processo, definindo seus procedimentos e normas básicas, as agências responsáveis, as empresas a serem privatizadas e as formas e moedas de pagamento...quando se iniciaram as privatizações, os sindicatos, que a elas se opunham, tentaram bloqueá-las mediante recursos ao Supremo Tribunal Federal, e sobretudo, com mobilizações de massas de demonstrações públicas...A fim de romper a mobilização sindical, o governo concedeu os 10% das ações aos trabalhadores e estimulou a organização de clubes de acionistas dentro das empresas”. 53 Para Coriat (1991, p. 109) a expressão “engajamento incitado ou estimulado” traduz um regime de regulação social do trabalho em que os novos critérios de produtividade, quantidade e inovação são almejados mediante práticas de flexibilização interna do trabalho, obtidas por meio de contratualização, compromissados a partir de determinadas regras essenciais de condicionalidades e contrapartidas, ampliando as dimensões geralmente pouco cobertas (mercados internos...) das relações profissionais. A ambivalência neste tipo de relação é caracterizada, por um lado, por ela se apresentar como um modelo “moderno” de organização valorizando de modo sistemático o saber-fazer individual por meio de padrões de organização do trabalho inovadores, que asseguram uma gestão internalizada da qualidade e das estratégias fundadas na determinação do produto. Por outro lado, em relação ao grau e ao nível da contratualização das relações de trabalho, revelam-se como especialmente arcaicas e conservadoras. Em contraste com os exemplos de engajamento obtidos mediante compromissos explicitamente negociados, em que a flexibilidade interna é buscada entre as partes por formas contratualizadas de negociação entre capital e trabalho.
172
nova postura profissional mais colaborativa ou, em termos de formação técnica,
possibilitando a construção de “novos mapas da versatilidade” dos recursos
humanos” (BRESCIANI, 1997, p. 89). E, nesse sentido, a herança, ainda viva, na
memória dos trabalhadores, de um ambiente fabril estigmatizado por um desgaste
profundo experimentado na fase pré e pós-privatização e, conseqüentemente, uma
situação de desemprego, deve ter contribuído para esse tipo de engajamento dos
trabalhadores no projeto empresarial da Embraer. Nesse contexto, o sentimento de
“síndrome dos sobreviventes às demissões” expresso pelos funcionários, ou seja, os
que não se adaptassem ou se submetessem às novas regras seriam naturalmente
excluídos e substituídos, poderia explicar em parte a rápida adaptação e introjeção
dos novos valores e compromissos difundidos pela nova direção. Recorde-se que as
taxas de desemprego aberto e oculto pelo trabalho precário e a oferta de
metalúrgicos na região são elevadas em virtude do fechamento, da desmobilização
e/ou da migração de empresas de São José dos Campos para outras regiões do
país ou do interior do estado de São Paulo. Nesse contexto, haveria prevalecido a
esperança de que, com a recuperação da empresa, haveria a concretização de um
horizonte no qual o bom desempenho dela resultaria na preservação e melhoria da
qualidade dos postos de trabalho.
Do ponto de vista das relações de trabalho, refletindo à luz da experiência de
transição organizacional e institucional da Embraer, seria plausível identificar a
emergência de novas esferas de regulação, como assinalaram Castro; Comim
(1998), expressas nos contornos de um “novo regime fabril ou de um novo padrão
de microrregulação que estariam acompanhados por novas formas institucionais de
canalização de interesses, produção de consenso e regulação de conflitos”.
Segundo Castro; Comim, “essas novas práticas de formação de consenso sobre o
processo técnico, introjetadas nos discursos empresariais de legitimação para o
esforço coletivo pela qualidade, produtividade e competitividade, fundados nos
princípio de “equidade cognitiva”, valorizando os conhecimentos formais e tácitos no
processo produtivo e inovativo, tendem a contaminar progressivamente as demais
negociações das relações sociais no trabalho, abrindo canais de representação de
interesses e identidade coletiva, que contornam e competem com os sindicatos
(CASTRO; COMIM, 1998, pp. 50-51 apud BERNARDES, 2000, p. 305).
A Tabela 23 apresenta os resultados da pesquisa de clima organizacional
realizada em 1995 e 1996 pela Embraer. Pelos resultados, podemos verificar que os
173
níveis de satisfação dos funcionários em relação ao ambiente organizacional, apesar
de apresentar melhora em relação ao ano de 1995, não acompanharam o mesmo
ritmo dos esforços de crescimento da produtividade global obtida pela empresa. A
pontuação mais baixa entre os funcionários continuava sendo a das questões
relacionadas ao plano de cargos, remuneração e carreira da empresa. Como
demonstramos, o novo plano de cargos, remuneração e carreira, que entrou em
vigor no final de 1997, tenta reverter à situação, ocupando um lugar central na
estratégia concorrencial da nova administração da Embraer até hoje.
TABELA 23 – Pesquisa do Ambiente Organizacional da Embraer
Médias Assuntos 1995 1996
1. Planejamento, organização e controle 2. Liderança 3. Clima/ motivação 4. Perspectiva profissional 5. Relacionamento/ comunicação 6. Plano de cargos, remuneração e carreira 7. Benefícios 8. Administração de recursos humanos
52 45 46 66 44 43 45 54
65 56 66 66 55 50 62 68
Fonte: Embraer (1997).
No levantamento de campo realizado com os novos contratados e os que
permaneceram na Embraer que será mostrado no capítulo 4, 85% dos trabalhadores
apontava como principais virtudes ou vantagens da empresa a política de salários e
benefícios, a oportunidade de carreira e o orgulho de trabalhar na empresa. A
principal fragilidade apontada era a insegurança dos trabalhadores devido às
reestruturações feitas após a privatização, que geraram desconfiança em relação à
gestão da Embraer até hoje. Se refletíssemos a experiência da Embraer adotando a
tipologia proposta por Standing (2000, p. 77 apud BERNARDES, 2000, p. 306), para
o qual o processo de expansão da insegurança do trabalho se desenvolve em várias
instâncias, poderíamos identificar pelo menos cinco dimensões da insegurança em
relação ao trabalho:
Insegurança no emprego. Embora predominantemente a forma de
contratação seja o assalariamento formal, observa-se que a maior fragmentação e
dispersão da mão-de-obra se dão pela subcontratação de trabalhadores temporários
eventuais, em tempo parcial, trainees, aprendizes, estagiários, etc., contratados em
174
condições precárias, sem seguridade social, assistência médica, aposentadoria, etc.
Enquanto aumenta a precarização de parcela da força de trabalho, ampliam-se e
consolidam-se mercados de trabalhos “internos” e “externos” das firmas. Dada a
crescente sobreposição de formas produtivas heterogêneas, as grandes e modernas
empresas tendem a reforçar a “precarização”, quando optam pela subcontratação de
partes de sua força de trabalho de pequenas empresas que, na maioria, participam
de uma economia informal.
Insegurança de renda. Devido à contratação em condições de eventualidade
de uma parcela dos trabalhadores e à deterioração do mercado de trabalho, os
rendimentos tornam-se variáveis, instáveis ou sem garantia. Nota-se distanciamento
entre o poder aquisitivo dos assalariados e o avanço da produtividade, com o efetivo
rompimento da relação salário/produtividade até recentemente vigente. Mesmo entre
os trabalhadores estáveis, essa relação é alterada. Seu rendimento é maior que o
dos demais – para assegurar sua responsabilidade, integração e identificação com a
empresa – mas não guarda relação com a produtividade.
Insegurança no posto de trabalho: por causa do movimento tendencial da
negociação e da regulação do trabalho em direção a formas individualistas e
promocionais, em contraposição às anteriores de proteção coletiva. O salário, por
exemplo, tende a reduzir sua participação, ao passo que crescem os ganhos ou os
prêmios relativos à qualidade, à participação, gerando formas de contratação cada
vez mais individualistas (STANDING, 2000, p.78 apud BERNARDES, 2000, p. 307).
Esse movimento manifesta-se diferentemente segundo os contextos sociais e
econômicos, o nível de participação dos trabalhadores, a sindicalização e a
capacidade das organizações sindicais de enfrentarem os desafios da flexibilização.
No entanto, sinaliza um problema crescente: a negociação coletiva defronta-se com
o desafio da expansão dos trabalhadores precários e subcontratados e,
conseqüentemente, existe risco de exposição jurídica do contrato coletivo de
trabalho.
Insegurança na organização sindical. Essas tendências anteriores acentuam
a fragmentação dos trabalhadores, pondo suas organizações na defensiva,
enfraquecendo suas práticas reivindicatórias de conflito e negociação e reduzindo
seus níveis de sindicalização. Esses fatores terminam por diminuir a importância dos
sindicatos na vida dos trabalhadores.
175
3.5 - A EMBRAER NA ATUALIDADE A Embraer, desde o início, destacou-se como um exemplo de excelência de
capacitação e inovação tecnológica no cenário produtivo nacional. Conquistou o
mercado de transporte aéreo regional internacional com a linha do EMB-110
Bandeirante, para dezenove passageiros e o EMB-129 Brasília, de trinta assentos;
os dois aviões garantiam à empresa, no passado, a liderança de vendas na
categoria turboélices para os Estados Unidos, o maior mercado de aviões e clientes
da companhia no mundo.
A Embraer possui um parque industrial de 1,5 milhões de metros quadrados,
com 233.500 metros quadrados de área construída com modernas instalações e
equipamentos, como um avançado parque de usinagem e instalações para a
fabricação de peças em material composto. Suas instalações estão interligadas a um
aeroporto, que serve como pista de teste, vôos e preparação dos aviões para
entrega. A empresa possui uma Divisão de projetos, Fabricação e Assistência Pós-
Venda para trem de pouso e componentes eletrônicos de precisão para toda a linha
de aeronaves, fundada em 1969, com uma área construída de 11.100 m², como já
descrito no capítulo 1.
Os principais produtos da Embraer são:
1- AVIÕES COMERCIAIS:
• EMB110- Bandeirantes: Primeiro avião produzido pela Embraer. Avião
turboélice de passageiros para 19 lugares com aproximadamente 500
unidades vendidas.
• EMB121 – Xingu: Avião turboélice executivo de passageiros com
aproximadamente 100 unidades vendidas.
• EMB120 – Brasília: Avião turboélice de 30 lugares com mais de 400
unidades vendidas. Seu principal mercado são os Estados Unidos. Líder de
vendas na categoria por muitos anos é utilizado por 26 empresas em 14
países, tendo atingido mais de 3 milhões de horas de vôo.
• ERJ 135: jato regional para 37 passageiros.
176
• ERJ 140: novo jato regional para 44 passageiros, seguindo o conceito de
“famílias de jatos” iniciado com o ERJ-145, oferecendo alto grau de
comunalidade como benefícios operacionais e de manutenção, incluindo a
mesma certificação para os pilotos. O desenvolvimento desta aeronave
exigirá investimentos da ordem de US$ 45 milhões.
• ERJ 145: Avião a jato de 50 lugares. Destinado ao mercado regional, possui
119 unidades com vendas confirmadas. Produto recente da empresa, objetiva
alcançar custos de aquisição e operação semelhantes ao dos turboélice.
• ERJ 170: Avião a jato de 70 lugares. Nova plataforma que servirá de base
para o ERJ 190.
• ERJ 190-100/200: Avião a jato. Versão alongada de ERJ-170, pela adição de
secções de fuselagem, motores mais potentes, asas de maior envergadura e
trem de pouso reforçado. Os investimentos previstos para os dois novos
projetos são da ordem de US$ 750 milhões. Está sendo projetado em duas
versões de 98 (ERJ-192-100) e 108 (ERJ-200) assentos.
• Legacy 600/ Shuttle/ Phenom 100/300 e Lineage 1000: jatos destinados ao
mercado executivo.
• Aviões Leves fabricados pela Neiva: EMB201 Ipanema, EMB400 Urupema,
EMB710 Minuano, EMB721 Sertanejo, EMB810 Seneca.
2 - AVIÕES MILITARES:
• Tucano: Avião de treinamento militar e líder de mercado, destaca-se pela sua
facilidade de pilotagem, baixo custo de manutenção e grande capacidade de
execução de manobras. Foram vendidas mais de 640 unidades em diversas
versões: Versão Básica; Versão Tucano França; Super Tucano.
• ALX – Super Tucano: Avião militar turboélice de nova geração, desenvolvido
a partir da experiência adquirida com o Tucano, em duas versões –
Operacional e de Treinamento. Esta aeronave possui um cockpit semelhante
ao de um caça, com avançada aviônica fornecida pela Elbit, de Israel.
• AMX: Avião tático militar foi concebido e está sendo fabricado por um
consórcio: Aeritália, Aermacchi e Embraer. Foram fabricadas 35 unidades.
• SIVAM – (Sistema Integrado de Vigilância da Amazônia): desenvolvimento
do ERJ-145 RS, versão de sensoriamento remoto baseado no jato regional
177
ERJ-145SA AEW%C, aeronave de alerta aéreo antecipado. O programa de
Cooperação Internacional para o Governo Brasileiro com a participação da
Embraer visa a proteção e o desenvolvimento sustentável da Região
Amazônica, pretende garantir o controle ambiental, monitoramento da
ocupação territorial, a vigilância da região e o controle do tráfego aéreo. Esta
aeronave está equipada com um grande radar Ericsson Erieye e sistema de
comando e controle.
3 - FORNECIMENTOS DE SEGMENTOS E SUBCONTRATADOS AERONÁUTICOS
• Flap do MD11 – McDonell Douglas: Certificada pelo sistema de Qualidade
Douglas, a empresa fabrica os flaps para o avião MD11. • Segmentos para o Boeing 777: Certificados pela D1900 – Advanced Quality
System for Supplier, a empresa fabrica o Dorsal Fin e o Wing Tip para os
aviões 777 da Boeing.
• Parceria com a Sikorsky: Certificados pelo sistema de Qualidade de
Sikorsky – S2000, a empresa possui um acordo de parceria com a empresa
Sikorsky para a fabricação do helicóptero S92.
Atualmente, a Empresa Brasileira de Aeronáutica S/A (Embraer) é uma
sociedade anônima de capital aberto, com 16.953 empregados em 2005, mas que já
sofreu várias alterações desde sua privatização, como já foi visto (ver Gráficos 11 e
12):
178
GRÁFICO 11 – Evolução do Número de Empregados (1995 a 1999)
4.319 3.849
6.737
8.302
4.494*
1995 1996 1997 1998 1999
* Em abril/97 o número de empregados atingiu 3.200, o menor
desde a privatização Fonte: Embraer (2000).
GRÁFICO 12 – Evolução do Número de Empregados (2000 a 2005)
10.334 11.04812.227 12.941
1465816.953
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2005).
Nos dias atuais, a Embraer é a 4ª maior indústria aeronáutica do Ocidente,
atrás somente da Boeing, do consórcio Airbus e do Grupo Bombardier (seu
concorrente direto) e líder em todo o Hemisfério Sul. No final de 1998, com o
sucesso de vendas do programa ERJ-145 (50 lugares) e ERJ-135 (35 lugares), a
Embraer se tornou líder mundial de jatos regionais.
O grupo Embraer mantém suas atividades de engenharia, desenvolvimento e
fabricação no Brasil, com quatro unidades industriais, localizadas em São José dos
Campos, Eugênio de Melo, Botucatu e Gavião Peixoto, todas no Estado de São
Paulo. Possui também um fábrica em Harbin, China, em associação com a empresa
chinesa AVICII. Para dar suporte às operações de pós-venda, conta com centros de
179
serviços e vendas de peças de reposição próprias em São José dos Campos, em
Fort Lauderdale – Flórida e Nashville – Tennesse, EUA, e em Villepinte – França,
além de redes autorizadas especializadas no mundo.
O suporte às atividades de comercialização, marketing e promoção é
realizado pelos escritórios localizados em São José dos Campos – SP, em Fort
Lauderdale – Flórida, EUA, em Villepinte – França, bem com os escritórios de
Beyjing – China e de Cingapura.
Além destas unidades, estrategicamente distribuídas pelo mundo, a Embraer
mantém uma joint venture com a empresa suíça Liebherr, denominada ELEB –
Embraer Liebherr Equipamentos do Brasil, da qual detém 60% do capital, localizada
em São José dos Campos – SP. Esta unidade é responsável pelo desenvolvimento
e manufatura dos trens de pouso das aeronaves da Embraer e de outros fabricantes,
além de fabricação de peças mecânicas e conjuntos hidrelétricos. Outra expansão
na rede de serviços está situada na Europa através da aquisição da OGMA –
Indústria Aeronáutica de Portugal, uma empresa portuguesa de manutenção e
produção aeronáutica, da qual a Embraer, em composição com European
Aerospace and Defense Group (EADG), adquiriu 65% do capital.
Durante os últimos anos, após a privatização da Embraer, foram
desenvolvidas estratégias financeiras destinadas a prover a empresa de uma
estrutura de capitalização compatível com suas operações, através do alongamento
do perfil de endividamento e com a redução das despesas financeiras. A estratégia
delineada para a Embraer previa um plano de recuperação da empresa, que se deu
através do lançamento, certificado e das vendas do projeto ERJ-145.
Conforme já mencionados no item 3.2.1, p.151, até a sua privatização a
Embraer nunca dispôs de um planejamento estratégico ou plano de ação de longo
prazo onde se previam as metas a serem atingidas, um sistema de indicadores de
análise de desempenho e, sobretudo, uma cobrança efetiva quanto ao cumprimento
dos resultados da empresa. A inexistência de um sistema formal e de
institucionalização de análise do desempenho constituía-se em um componente
desagregador de uma estratégia empresarial e competitiva dinâmica e consistente.
Um sistema de planejamento com as projeções de metas de curto e longo prazo,
elaborada por todas as áreas da empresa, é realizado pela primeira vez em 1996.
Conforme os técnicos da empresa, tal procedimento do planejamento e
sobretudo, a formalização de indicadores de análise crítica de desempenho
180
(produtivo-industrial, financeiro, recursos humanos e de suporte aos clientes) nunca
havia sido realizada antes, e dentro do novo plano de ação passa a ser considerada
o dínamo vital para a sobrevivência da empresa. Este plano de ação (PA) constitui-
se um instrumento central do novo modelo de planejamento, em que estão
impressos os compromissos da empresa com os seus clientes, empregados e
acionistas.
A partir da cristalização desse novo enfoque para a empresa, iniciou-se nesta
fase um amplo processo de reorganização da empresa, segundo uma visão
integrada. A nova diretoria promoveu uma radical alteração na organização interna
da empresa.
O processo de reestruturação e modernização da Embraer, sem dúvida, foi
crucial para a etapa de recuperação e implementação da nova estratégia de
competição da empresa no sentido de assegurar sua posição no mercado mundial e,
ao mesmo tempo, possibilitou uma organização mais integrada e flexível para
responder aos desafios da nova realidade concorrencial. Por outro lado, a política de
celebração de alianças ou parcerias de riscos tem se revelado uma estratégica
realista e crucial para a viabilização de projetos futuros, com aprendizados
tecnológicos importantes, especialmente, na redução dos custos de produção.
Na verdade, a estratégia de reestruturação e modernização, aliada à
estratégia de formação de alianças, acaba interagindo de forma positiva e recíproca
com a arquitetura empresarial dinâmica de competição atual.
O modelo de organização industrial presenciado no arranjo produtivo
aeronáutico pode ser melhor compreendido pela concepção de uma configuração
arquitetural de redes centralizada: um conjunto formado por cerca de 46 empresas
de médio e pequeno porte está organizado em torno da economia gerada por uma
empresa, a Embraer, que desenvolve a engenharia de projetos das aeronaves,
realizando a integração e montagem dos sistemas, estruturas, fuselagem e
componentes, desempenhando a função de coordenadora da rede global de
parceiras de riscos, fornecedoras mundiais e subcontratos locais, compra das firmas
satélites desta região insumos industrializados, serviços de usinagem, tratamento
térmico, aviônicos, serviços de engenharia de projetos, de softwares, entre outros.
As relações interfirmas desenvolvidas na região apresentam níveis diferenciados de
integração de propriedade, fluxos de transação comercial e tecnológico, mas com
um alto grau de integração de coordenação. Trata-se de uma organização industrial
181
interempresas hierarquizador na sua essência; um tipo de “sistema solar”: “empresa-
mãe” e suas satélites subcontratadas fundadas em um intercâmbio particular entre
fornecedores e prestadores de serviços de engenharia, administrativos e produtivos,
formados por pequenas e médias empresas.
Conforme Bernardes (1999, p.35), várias dessas empresas nasceram de
empreendimentos de ex-funcionários e de iniciativas da própria Embraer (de 20 a 40
funcionários) criando diretamente 1.850 postos de serviços, e com um faturamento
mensal que oscila entre R$ 15 mil e R$ 350 mil. Situando-se num raio de 180 km da
empresa, estas pequenas e médias empresas, que se localizam na região, estão
distribuídas espacialmente da seguinte forma: 46% das empresas na região do Vale
do Paraíba, e 54%, em outras regiões de São Paulo, particularmente na região
metropolitana de São Paulo e de Campinas. O restante, em outros Estados da
federação, é dependente dos centros tecnológicos e institutos de pesquisa locais,
participando da cadeia aeronáutica através de um regime de subcontratação direto
com a Embraer, como a Cenic Akros, Digicom, Elebra, Eleb, ETA, Mectron, Neuron
– eletrônica, Fibra Forte, Aeroserv, Qualitas, N&N, Tectelcom, Altec, entre outras.
Entretanto, existem algumas empresas que integram a cadeia produtiva, fornecendo
peças, componentes e serviços técnicos, que estão localizadas em outras regiões
como a GE/Celma (Petrópolis/RJ), Aeromot e Aeroeletrônica (Porto Alegre – Rio
Grande do Sul), a Rolls Royce (São Bernardo do Campo – SP) e a NEIVA,
pertencente a Embraer (Botucatu – SP), (ver Tabela 24).
182
TABELA 24 - Número de Empresas Subcontratadas, suas localizações regionais e distância da Embraer medida em kilômetros – 1999
Número de empresas subcontratadas, suas localizações regionais e
distância da Embraer medida em kilômetros – 1999 Nº de Empresas
Cidade / Região Distância Física da Sede em São José dos Campos
22 São José dos Campos 10km 11 Grande São Paulo 130km 1 Mogi das Cruzes 70km 5 Campinas 180km 1 Petrópolis – Rio de
Janeiro 390km
2 Piracicaba 230km 3 Taubaté/Caçapava 40km 1 Joinville – Santa Catarina 650km
Fonte: Embraer (1999).
Destes fornecedores, nenhum deles domina tecnologia de ponta. Nesse
segmento, a área mais promissora é a de usinagem convencional e ferramental,
uma vez que a Embraer não tem interesse em realizar investimentos vultosos na
aquisição de novos equipamentos. Os subcontratos são classificados em três
classes: simples, que realizam os trabalhos em tornos convencionais, com um
grande número de empresas; complexas, que utilizam tornos com controle numérico,
com poucas empresas; e muito complexas, centro de usinagem com controle
numérico com três eixos e, às vezes, um opcional, com poucas empresas. A
localização da ampla maioria dos fornecedores é no exterior (95%), principalmente
nos programas ERJ- 145/140/135 e ERJ-170/190. Os países da cadeia de
suprimentos da Embraer estão: 53% nos EUA, 27% na Europa, 8% no Japão e 8%
em outros países (ver Tabela 25 e 26):
183
TABELA 25 - Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ -145/140/135
Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ -145/140/135 Classe e Fornecedoras (Distribuição %)
Componente Fornecido País
Hardware (4%) Elétricos
E.G. &G. Rotron Compartimento Eletrônico e Ventilador de Refrigeração
EUA
Matrix Conectores EUA Mechanical Products Disjuntores EUA Raychen Fios e Cabos EUA Vickers Bombas Hidráulicas EUA Eaton-MSC Botões EUA ECE Contactores e fusíveis EUA ABG Semca Pressurização França Allied Signal GPWS/ Detector de Tesoura de Vento,
Partida Pneumática e CVR/FDR EUA
Mecânicos B.F.Goodrich Rodas e Freios EUA Goodyear Pneus EUA EDE Trem de Pouso Principal Brasil Liebherr Trem de Pouso Auxiliar e Controle dos Flapes Aleman
ha Mason Manete de Freio Aerodinâmico EUA Aviac “Stick Pusher”. Atuador do Ajuste de Pedais e
Válvula Corte de Fogo França
Crane-hydro Aire Controles dos freios EUA Matéria-Prima (2%) Alcoa Alumínio Aeronáutico EUA Equipamentos (60%)
EUA
Allinson Motor AE 3007 EUA Lord Montante do motor EUA Eros Oxigênio para Tripulação França Rosemount Detector de Gelo e Proteção contra Estol EUA Sextant Altímetro e Indicador de Velocidade França Sicma Assentos para Pilotos França Sierracin Pára-brisa e Janela de Mau Tempo Eua Struthers Dunn Relê EUA Systron Donner Detector de Fogo Eua Technofan Ventilador França Vibro-Meter Computador Central de Manutenção e
Monitoração de Vibração do Motor Suíça
Parker Hannifin Sistemas Hidráulico e de Combustível e Comando de Voô
EUA
Eldec Sensor de Proximidade EUA
184
(continuação)Grimes Unidades de Advertência e Alarme e
Iluminação EUA
Hamilton Standard Sistema de Ar Condicionado e Sistema Pneumático
EUA
Honeywell Aviônicos EUA Jet Electronic Indicador de Altitude e Bateria de Emergência EUA Lucas Aerospace Geração Elétrica EUA Marathon Power Technologies
Baterias EUA
Pacific Scientific Extintor de incêndio EUA Avtech Comunicação de Passageiros EUA Estruturas Metálicas (34%)
Gamesa Asas, naceles do motor, carenagens da junção portas do trem de pouso principal
Espanha
Enaer Empenagem horizontal/profundor e a empenagem vertical
Chile
Sonaca Portas de bagagem, serviço e principal, seção dianteira e pilones
Bélgica
Sundstrand/Labinal APU, APIC EUA/França
Norton Radome EUA Fonte: Embraer (1999).
185
TABELA 26 - Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ – 170/190 Fornecedores de 1º Nível do Programa ERJ – 170/190 Classe e Fornecedoras (Distribuição %)
Componente Fornecido
País
Hardware (4%) Elétricos
BFGoodrich Smart Probe EUA BFGoodrich Stick Shaker EUA BFGoodrich TAT EUA BFGoodrich Windshield wiper EUA Hamilton Sundstrand Electric System EUA Raychem Wires & Cables EUA Eaton Push Buttons EUA Mecânicos Liebherr Landing Gear Alemanha Barber Colman Windshield Heater EUA Parker Flight Controls EUA Pacific Scientific Fire Protection System EUA GEAE – GE Aerospace Powerplant (Engine &
Nacelles) EUA
Air Industries Mechanical Hardware EUA AHG Mechanicaç Hardware França Fairchild Mechanical Hardware EUA Pentacon Mechanical Hardeware EUA Textron Mechanical Hardeware EUA Equipamentos (60%)
Parker Fuel System EUA Hamilton Sundstrand Air Management System EUA Chelton Static Discharger Inglaterra AVTECH Passenger Address França Haneywell Avionics EUA Chelton Antenas VHF Inglaterra Sensor Antenas VOR/ILS EUA Allied Signal EGPWS EUA Allied Signal SSCVR/FDR EUA Air Precision Clock Frnaça Parker Hydraulics Hydraulic System EUA Vibrometer EVM Suíça Hexcel Composite Material EUA Pilkington Aerospace Pax Window
Transparencies EUA
PPG Industries, Inc. Windshield Transparencies
EUA
Honeywll (Grimes) Exterior and Cockpit Lighting
EUA
186
(continuação)IDD Lighted Acrylic Panel EUA Matéria-Prima (2%)
Alcoa Mill Products Aluminum Plates & Sheets
EUA
Corus Aluminum Plates & CTS Alemanha VSMPO Titanium Plates &
Sheets Rússia
Alexco Aluminum Extruded Shapes
EUA
Pechiney Aviatube Aluminum Extruded Sahpes
França
Alcoa Forged Products Aluminum Forged Parts EUA Otto Fuchs Aluminum Forged Parts Alemanha Neuvant Aluminum Forged Parts EUA Estruturas (34%) Kawasaki Wing Stub Japão Kawasaki Fixed Leading Edge Japão Kawasaki Fixed Trailing Edge Japão Kawasaki Pylon Japão Kawasaki Control Surfaces Japão Latecoere Center Fuselage I França Latecoere Center Fuselage III França Latecoere Doors França C & D Interior EUA Sicma Pilot/Co-pilot Seats França Gamesa Rear Fuselage Espanha Gamesa Horizontal Empennage Espanha Gamesa Vertical Empenage Espanha Akaer CFII / Wing Fus Fairing
Project Brasil
Kaiser Throttle / Authrottle EUA Sonaca Center Fuselage II Bélgica Sonaca Slats Bélgica NMF Wing Skins EUA
Saint Gobain Radome EUA Hamilton Sundstrand APU /Tail Cone EUA Serviços de Projetos e Fabricação de Ferramentais Dynamic Solutions Projeto de Ferramenta Brasil Matrinor S.L. Ferramentais de
Carenagens Espanha
(Several Companies) Fabricação de Ferramental
Brasil
Fonte: Embraer (1999).
187
A despeito das dificuldades vivenciadas pelo mercado de transporte aéreo em
todo o mundo, ainda incapaz de se reerguer como um todo e com muitas empresas
aéreas enfrentando condições adversas e lutando diariamente pela sua
sobrevivência, dentre as quais importantes clientes da Embraer, o ano de 2004, em
que a empresa comemorou 35 anos de existência, foi positivo para a Embraer.
Houve um crescimento superior a 47% na quantidade de aeronaves entregues, num
total de 231 aviões comerciais e executivos em 2004 e 197 aviões em 2005, com
reflexos significativos em suas receitas e lucros, em 2004 o mercado civil respondia
por 70% do faturamento da empresa, e a área militar por 30% das vendas, em 2005
o mercado civil respondia por 88% do faturamento, e a área militar por 12% (ver
Gráficos 13, 14 e 15 e Tabela 27):
GRÁFICO 13 – Receita Líquida (R$ Milhares)
5.099
6.8917.748
6.571
10.2319.133
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2006).
GRÁFICO 14 – EBITDA (R$ Milhares)
1.096
2.0972.359
1.403
1.962
1.071
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2006).
188
GRÁFICO 15 – Evolução do Volume de Jatos Entregues pela Embraer
6039
56
123
179163
130
100
231
197
1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2006).
189
TABELA 27 – Entregas de Aeronaves (1996-2005)
Fonte: Embraer (2006).
Desta forma o ano de 2004 representa um marco nos 35 anos de vida da
Embraer, atingindo recordes históricos de faturamento e lucro. Com maior
quantidade de aeronaves entregues, associada à boa performance dos segmentos
de Defesa, Aviação Corporativa e Serviços ao Cliente, a receita líquida da Empresa
atingiu R$ 10,231 bilhões, 55,7% superior ao exercício anterior e em 2005 – R$
9.133 bilhões. O lucro líquido mais que dobrou em relação ao ano de 2003, atingindo
R$ 1.256 bilhão em 2004 e R$ 709 milhões em 2005. (ver Gráfico 16 e Tabela 28):
ENTREGAS DE AERONAVES2005 2004 2003 2002 2001 2000 1999 1998 1997 1996 1995 1994 1993 1992
AVIAÇÃO COMERCIAL 120 134 87 121 155 157 103 13 10 18 0 0 0 0EMB 110 - - - - - - - - - 1 - - - -EMB 120 - - 2 - 7 13 10 17 - - - -ERJ 135 2 1 14 3 27 45 16 - - - - - - -ERJ 140 - - 16 36 22 - - - - - - - - -ERJ 145 46 87 57 82 104 112 80 - - - - - - -EMBRAER 170 46 46 - - - - - - - - - - - -EMBRAER 175 14 - - - - - - - - - - - - -EMBRAER 190 12 - - - - - - - - - - - - -AVIAÇÃO EXECUTIVA 14 13 13 9 8 3 0 0 0 0 0 0 0 0Legacy Executivo/Shuttle 14 13 13 9 8 3Legacy Shuttle -DEFESA 32 14 0 0 0 2 3 17 5 18 0 0 0 0EMB 120 - - 1Legacy India/ Nigéria 6 - 1EMB 145 1 1EMBRAER 170 - -EMB 145 ACS - -EMB 145 MP - -EMB 145 AEW&C Outros - -EMB 145 AEW&C/MP MEX - 3EMB 145 AEW&C GRECIA 1 3EMB 145 SIVAM (SJC) - -AL-X 24 7Tucano - - 6 - 15 - - - -Super Tucano - -AM-X - - 1 3 10 5 3P-X - -MARINHA (A04) - -F5 BR - -AVIAÇÃO LEVE 31 70 17 17 26 24 24TOTAL 197 231 100 130 163 179 123 56 39 60 0 0 0 0
190
GRÁFICO 16 – Lucro Líquido (R$ Milhares)
645
1.1011.178
587
1.256
709
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2005).
TABELA 28 – Balança Comercial Brasileira em 2005
2002 2003 2004 2005 Receita Bruta Deduções Receita Líquida Custo dos Produtos Vendidos Lucro Bruto Margem Bruta Despesas Operacionais e PLR Lucro Antes dos Juros e Impostos – EBIT Margem EBIT Depreciação e Amortização EBITIDA Margem EBITIDA Lucro Líquido Margem Líquida Lucro por Ação Quantidade de Ações
7.836,9 88,7 7.748,2 4.293,7 3.454,5 46,6% 1.287,1 2.167,4 28,0% 191,3 2.358,7 30,4% 1.179,2 15,2% 1,65 712.974.355
6.599,1 28,5 6.570,6 4.219,8 2.350,8 35,8% 1.108,0 1.242,8 18,9% 160,5 1.403,3 21,4% 587,7 8,9% 0,82 716.045.583
10.252,7 21,5 10.231,2 6.822,8 3.408,4 33,3% 1.668,1 1.740,3 17,0% 221,6 1.961,9 19,2% 1.255,8 12,3% 1,75 718.341.868
9.140,5 7,2 9.133,3 6.966,8 2.166,5 23,7% 1.379,3 787,2 8,6% 284,1 1.071,3 11,7% 708,9 7,8% 0,98 721.832.057
Fonte: Embraer (2006).
191
Da mesma forma, é muito relevante destacar que, a par do significativo
crescimento das receitas, foi mantido o excelente nível de contratos em carteira,
cerca de US$ 10,1 bilhões de ordens firmes que, juntadas às opções, totalizam US$
27,6 bilhões em 2004. Em 2005, foram cerca de US$ 10,4 bilhões de ordens firmes
que, somadas às opções, totalizam US$ 24 bilhões, importante indicador potencial
de crescimento da empresa (ver Gráfico 17):
GRÁFICO 17 – Pedidos em Carteira (US$ Bilhões)
12,7 12,713,2
17,5 17,513,6
10,410,110,6910,711,4
2000 2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2005).
O grande fator responsável por esta inflexão positiva e vigorosa foi a entrada
em serviço do EMBRAER 170, o primeiro membro da nova família de aeronaves
EMBRAER 170/190, que desde o mês de março de 2004 opera com sucesso nos
EUA e na Europa. E aqui vale ressaltar a eficácia industrial demonstrada pela
Empresa ao atender ao ousado plano de entrega desta nova aeronave.
A Embraer continua alinhada com a política econômica brasileira de promover
um saldo expressivo da balança comercial do país. Desta forma, as exportações da
Embraer em 2004 totalizaram US$ 3,348 bilhões, e mais uma vez se constituem
recordes e marcam a posição da Empresa como a segunda maior exportadora
brasileira, com uma contribuição líquida na balança comercial de 4% do saldo. Em
2005 o volume de exportações foi de US$ 3.267 bilhões. Nos 11 anos após sua
privatização, a Embraer exportou mais de US$ 20 bilhões, contribuindo para o saldo
da balança comercial do país em mais de US$ 8 bilhões. (ver Gráfico 18):
192
GRÁFICO 18 – Geração de Dividas
2.8972.396
2.007
3.348 3.267
1.7371.992
1.3021.2201.843
1.5291.356705
1.1761.054
2001 2002 2003 2004 2005
Exportações Importações Geração de Divisas
Fonte: Embraer (2006).
A Embraer não tem medido esforços para atrair empresas internacionais para
investirem no Brasil. O empenho em trazer para o Brasil volumes maiores de
atividades realizadas por parceiros e fornecedores, bem como subcontratação no
país de serviços até então realizados no exterior tem como objetivo o crescimento
consistente do conteúdo nacional, além da geração de novos postos de trabalho no
país.
No mês de fevereiro de 2004, foi efetivado o rollout do EMBRAER 190,
terceiro membro da família EMBRAER 170/190.
No mês de dezembro de 2004, foi realizado o primeiro vôo do EMBRAER
195, quarto e último membro da família EMBRAER 170/190, e a certificação do
EMBRAER 175.
Ao mesmo tempo a Embraer vem estimulando o auto-desenvolvimento dos
empregados e investindo no seu treinamento, com resultados mais que satisfatórios
na qualidade e na produtividade. Foram investidos 60 milhões em treinamento em
2004, e em 2005 foram investidos 62 milhões, conforme o Gráfico 19. Em 2004, a
Embraer graduou 462 Mestres no seu PEE – Programa de Especialização de
Engenharia, a “Universidade Embraer”. Em 2005 a Embraer abriu inscrição para
novas turmas na área de mecânica, eletrônica, mecatrônica, civil, materiais e
computação.
193
GRÁFICO 19 – Qualificação e Treinamento (R$ milhões investidos)
5853
42
60 62
2001 2002 2003 2004 2005
Fonte: Embraer (2006).
Consciente de sua responsabilidade social, direcionadas ao desenvolvimento
sustentado, diversas ações vêm sendo tomadas no sentido da preservação do
ambiente, da saúde e segurança no trabalho, além da contribuição e integração à
sociedade. Essas medidas compreendem ações no trato dos efluentes e resíduos
industriais, nos cuidados com o ambiente de trabalho, nas políticas de qualidade de
vida voltadas para seus empregados e seus dependentes. Assim o quadro de
empregados tem crescido de forma ininterrupta desde 1997, conforme o Gráfico 11 e
12 mostrado anteriormente, ignorando crises seguidas vividas pelo segmento
aeronáutico.
194
3.5.1 - NOVA ESTRUTURA DA EMBRAER Para continuar suas atividades operacionais, a Embraer realizou uma
reestruturação que propiciará a criação de bases para a sustentação, crescimento e
perpetuidade dos negócios e atividades da empresa, uma vez que sua implantação
lhe assegurará o acesso adequado ao mercado de capitais e a ampliação de sua
capacidade de financiamento e desenvolvimento de seus programas de expansão.
Com a aprovação da incorporação, a Nova Embraer passa a adotar a
denominação de EMBRAER – Empresa Brasileira de Aeronáutica S.A. Na qualidade
de sucessora universal da Embraer, a Nova Embraer requererá seu registro de
companhia aberta perante a Comissão de Valores Mobiliários – CVM, a listagem de
suas ações no Novo Mercado da Bolsa de Valores de São Paulo – BOVESPA e a
listagem de seu American Depositary Shares – ADS na New York stock Exchange –
NYSE - 194.
A mudança de capital vai atrair investimentos para os próximos projetos;
desse modo a Nova Embraer garante emprego e sobrevivência no mercado. Em 31
de março de 2006, os acionistas detentores de ações ordinárias e preferenciais da
Embraer, reunidos em Assembléia Geral Extraordinária, aprovaram a transformação
da Embraer na primeira companhia brasileira de porte com capital totalmente
pulverizado. Esta é a mudança mais importante para a Embraer desde a sua
privatização, pois permite a criação das bases para o crescimento sustentado e a
perpetuidade da empresa, ao capacitá-la para o livre acesso aos mercados de
capitais mundiais, ampliando sua capacidade de obtenção de recursos para que
possa suportar o desenvolvimento de programas de expansão. Ao mesmo tempo,
foram mantidos e preservados os direitos estratégicos da União inerentes à Ação de
Classe Especial (Golden Shares), além de adotar mecanismos especiais de
proteção, visando à manutenção da pulverização das ações, o comando da empresa
em mãos brasileiras e a proteção em relações a “take overs” hostis ou consecutivos.
Assim a Embraer espera melhores condições de financiamento, ou seja, a
obtenção da classificação de risco “Investment Grade” de duas maiores e mais
conceituadas agências de classificação de risco do mundo, a Moody’s Investor
Service (Baa3), em dezembro de 2005, e a Standard & Poor’s (BBB), em janeiro de
2006. Essa classificação de risco contribuirá para a redução dos custos de
195
financiamento e, portanto, a criação de valor para o acionista a longo prazo é o que
espera a empresa54.
Consolidando presença e conquistando novos mercados, a certificação do
Embraer 190 e a realização de importantes vendas da família Embraer 170/190
foram decisivas para a sua consolidação nas Américas e na Europa, e para a
abertura dos mercados do Oriente Médio, Índia e da China.
Atualmente são mais de 120 aviões desta nova família voando pelo mundo,
para 11 companhias aéreas. Foi ultrapassada a marca de 900 aeronaves da família
ERJ 145 entregues no mercado. Em 2005 a Aviação Executiva foi confirmada como
área estratégica de crescimento da empresa; foram lançados os novos jatos
executivos Phenom 100 e Phenom 300 e ocorreu a entrega das primeiras unidades
do F-5BR e de 24 aviões Super Tucano à Força Aérea Brasileira; a Embraer ampliou
os investimentos na área de serviços com a aquisição da empresa OGMA (Indústria
Aeronáutica de Portugal) e houve a expansão das operações de manutenção da
unidade de Nashville, nos Estados Unidos.
Assim as ações empreendidas e os resultados obtidos em 2005 pela Embraer
permitem a ela afirmar que a empresa caminha a passos firmes rumo ao futuro.
Tecnologia e conhecimento são preocupações constantes da empresa e o objeto de
um investimento permanente.
Nas mãos de profissionais competentes, esses aportes viabilizam a criação
de produtos voltados à satisfação de seus clientes. O que leva a empresa a se
comprometer com o crescimento sustentado, implantando ações relevantes voltadas
para a preservação do meio ambiente, saída e qualidade de vida para os
empregados e suas famílias, e o desenvolvimento das comunidades inseridas nas
suas instalações em São José dos Campos – SP.
Segundo MB em entrevista, “a reestruturação societária da Embraer (Empresa
Brasileira de Aeronáutica), em São José dos Campos, irá garantir a sobrevivência da
empresa, investimentos superiores a US$ 2,3 bilhões e a geração de empregos”.
Conforme MB, “a Embraer enfrenta dificuldades para garantir os investimentos
necessários aos novos projetos, entre eles o desenvolvimento das versões executivas dos
jatos comerciais Embraer 170 e Embraer 190.
54 Estes dados foram levantados em entrevista feita na própria Embraer com, MB, no dia
08/06/2006.
196
“Para os empregados não muda nada, o plano vai possibilitar a manutenção e
a geração de empregos”.
Desde 1995, foram investidos US$ 2,3 bilhões na empresa, dos quais 70% no
desenvolvimento de produtos e 30% em capacitação industrial. Os acionistas
contribuíram com uma parte e o restante foi captado no mercado de capitais.
Segundo MB,“Os próximos projetos demandam investimentos ainda maiores e hoje não há
nenhuma operação em desenvolvimento para esse fim, não temos a expectativa de
lançamentos de ações, mas no futuro isso será possível com a nova estrutura”. Os fundos de pensão Previ e Sistel têm limitações previstas na legislação
para fazer investimentos e ambos já esgotaram tal capacidade, segundo MB “Não há
no Brasil uma política de apoio à indústria aeronáutica como ocorre no Canadá com a
Canadair Bombardier”.
MB lembrou,“que cerca de 20 fábricas de aviões estão atualmente consolidadas em
quatro grupos, disputando um mercado estimado em US$ 140 bilhões em dez anos”. Ainda segundo MB,” no novo modelo societário, as ações da empresa servirão
como moeda de troca em possíveis aquisições no exterior.
Um novo conselho de administração será formado e terá 11 representantes, dos
quais 8 serão membros independentes, além de 2 representantes dos empregados
(acionistas e não-acionistas) e um representante da União.
O conselho atual reúne 13 membros – 1 representante da União, 2 representantes
dos empregados, 6 dos controladores, 2 representantes do grupo de empresas francesas, 1
escolhido pelos controladores por indicação da União e o diretor-residente da empresa”.
Para MB,”a pulverização do controle societário torna mais rigoroso o mecanismo
para garantir que o controle da empresa não irá para empresas estrangeiras. “Quem vier
será bem-vindo, mas terá as limitações do novo estatuto”.
No estatuto atual, o acordo de acionistas foi o que garantiu essa situação,
uma vez que na privatização o limite de participação estrangeira foi fixado em 40%
do capital ordinário, com direito a voto.
Assim para MB, “a pulverização do controle societário da Embraer (Empresa
Brasileira de Aeronáutica), que elimina a “figura do dono” da empresa e dilui o poder entre a
totalidade dos acionistas, será bem recebida pelo mercado, na avaliação de MB”.
Podemos concluir que o processo de privatização implicou uma
transformação radical nas formas de gestão, organização industrial e institucional,
cultura empresarial e, sobretudo, na visão negocial da Embraer. A elaboração e a
formalização de um planejamento estratégico e a realização de análises de mercado
197
mais precisas, baseadas em indicadores de monitoramento interno e externo por
intermédio de uma nova área recém-criada denominada “Inteligência de Mercado”,
são uma etapa fundamental dessa nova fase da Embraer. As estratégias de
reestruturação produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do faturamento e
uma valorização do patrimônio e do prestígio da Embraer.
Ressalve-se que a estratégia e a excelência na abordagem na tecnologia
sempre foram o ponto forte da Embraer. O programa ERJ-145, por exemplo, que
permitiu a recuperação da empresa e sustentará as vendas futuras, havia sido
projetado em 1989, quando a empresa era ainda uma estatal. Contudo, só foi
possível a sua viabilização pela solução criativa das parcerias de risco e pela
agilidade e flexibilidade empresariais conquistadas após a privatização da empresa.
É importante deixar claro que a Embraer conseguiu atrair parceiros no mercado
mundial que apostassem e investissem no projeto ERJ-145, porque a empresa
detinha o design e a tecnologia que outras empresas não possuíam. Certamente, se
a empresa não desfrutasse de uma posição estratégica no mercado, como geradora
de tecnologia, as possibilidades de celebrar alianças não seriam tão promissoras. No
futuro, para manter sua posição competitiva, a empresa deverá celebrar novas
parcerias e alianças que agreguem valor, tecnologia e mercados dinâmicos.
Em relação à política governamental, provavelmente os processos de
privatização e de recuperação da empresa teriam sido menos dolorosos, lentos e
arriscados, caso houvesse sido estabelecida uma política de investimentos,
reestruturação e competitividade para a empresa ou mesmo um projeto de longo
prazo que a inserisse na estratégia de desenvolvimento tecnológico nacional. A
inexistência de agências ou instituições regulamentadoras e financiadoras permitiu a
perda de concorrências importantes, assim como o desperdício de considerável
estoque de recursos humanos extremamente qualificados. Portanto, uma política de
competitividade mais ampla continua sendo uma grande lacuna para o setor.
Apesar disso a Embraer superou a crise e conseguiu aumentar seus lucros,
se reestruturou e criou uma Nova Embraer para ampliar sua capacidade
financiamento e desenvolvimento, absorvendo uma pequena parte da mão-de-obra
que foi demitida antes e após sua privatização, e contratando novos profissionais.
Devido às constantes reestruturações econômicas internas e externas e às crises
políticas, mesmo ela tendo o monopólio do setor aeronáutico regional atual, é
impossível prever os rumos da nova Embraer que, a partir de 2007, deixará de
198
produzir o jato ERJ-145, considerado um dos pilares da recuperação da empresa.
No final do ano de 2005, a Canadair Bombardier55 suspendeu a produção do CRJ
200, o modelo concorrente do ERJ-145, pelo motivo de falta de mercado para a
aeronave, que já está no final do seu ciclo de vida56. Segundo MB, “os funcionários
da linha de montagem do ERJ-145 serão remanejados para outros setores, devido à
necessidade crescente de pessoas nas outras linhas, assim a empresa não pensa
em demissões”. No Capítulo 4 veremos o impacto que a privatização da Embraer causou na
vida dos ex-funcionários, dos que permaneceram e dos novos funcionários.
55 O grupo Bombardier, fundado em 1942, atua em diversas áreas: faz trens, carros elétricos, veículos para neve, serviços financeiros e imobiliários, além de aviões. Na área de aviões adquiriu as empresas Canadair, Learjet, da De Havilland e da Shorts Brothers. Após essa fase de aquisições tornou-se a terceira maior fabricante de aviões do mundo, depois da Boeing e da airbus, apresentando faturamento médio anual de US$ 9 bilhões. Em 1996, a Canadair Bombardier operou um processo de reestruturação interna, sendo organizada em cinco grupos: o Grupo Aeronáutico, o Grupo de Transporte, o Grupo de Produtos de Consumo Motorizados, o Grupo Bombardier Capital e o Grupo de Serviços, empregando cerca de 51.000 funcionários espalhados por onze países. 56Essa disputa entre a Embraer e a Canadair Bombardier não se restringiu às pistas de aeroportos. Em 1997 Canadair Bombardier acusou o governo brasileiro de subsidiar a fabricação de aviões e apresentou queixa à Organização Mundial do Comércio (OMC) a respeito da modalidade de equalização de taxas de juros dos financiamentos concedidos pelo Proex (Programa de Financiamento a Exportação) do Banco do Brasil. Por sua vez, o Itamaraty devolveu as acusações alegando que a Canadair Bombardier e o governo canadense são sócios em uma empresa que foi criada especialmente para conceder financiamentos para a própria empresa. Diante de tais argumentos, a OMC acabou por não interferir, entendendo que as duas empresas teriam de resolver entre si suas questões. A concorrência chegou a ponto de a Canadair Bombardier tentar recrutar funcionários da Embraer mediante anúncios em jornais e diretamente aos engenheiros, dentro da própria empresa em São José dos Campos. Na Embraer, um engenheiro em início de carreira ganha cerca de R$1.500 por mês, um engenheiro com dez anos de experiência, pós-graduado e com estágio no exterior recebe uma média de R$4.000 por mês. A Canadair Bombardier chegou a oferecer salários de US$6.000 por mês, além de vários benefícios. Dos seiscentos engenheiros da empresa, oito foram recrutados pela Canadair Bombardier, em contrapartida, a Embraer trouxe três profissionais da Canadair Bombardier e mais três da falida Fokker. Para atender ao novo contrato da American Eagle, a Embraer teve de reprogramar sua escala de produção e, possivelmente, ampliar seu quadro de pessoal, contratando mais 1.400 funcionários. A Canadair Bombardier fabrica seis aviões por mês. Para enfrentar a concorrência, a Embraer, que fabricam quatro aviões por mês, pretendiam passar a produzir seis a partir de 1998 e atualmente produz seis por mês,devido a entrada da nova família 170/175/190, Legacy 600, Phenom 100, phenom 300 e Linege 100.
199
CAPÍTULO 4 - PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS – LÓCUS DA PESQUISA: “O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS FUNCIONÁRIOS DA EMBRAER ANTES E DEPOIS DE SUA PRIVATIZAÇÃO” A problematização inicial de uma investigação social passa por um
conjunto de perguntas que devem orientar a produção do conhecimento social –
algumas de caráter genérico e outras que levam à especificação de situações
determinadas. O máximo que podemos é, segundo Pais (2000, pp.185-201),
“auscultar realidades longínquas, enigmáticas, que muitas vezes exprimem o
contrário do que aparentemente significam: a ambivalência da realidade social leva à
interrogação, à surpresa e à desconfiança”.
Esta investigação pretende captar a configuração social da realidade
estudada, de forma a possibilitar a compreensão e a explicação dos mecanismos
vitais de funcionamento e reprodução dos grupos e segmentos sociais envolvidos
(ex-funcionários, os que permaneceram e os novos funcionários da Embraer). Se, de
um lado, os dados estatísticos fornecem uma primeira aproximação à investigação,
de outro, têm sua capacidade analítica ampliada, quando complementados com o
conhecimento empírico.
O levantamento de dados secundários, apresentado nos capítulos anteriores,
consistiu em um inventário atualizado dos dados, através de revisão da literatura
específica, de publicações em revistas, jornais e outros meios de comunicação de
domínio público, tendo em vista uma primeira aproximação do universo em estudo.
A aplicação de um questionário com perguntas fechadas e abertas (em
anexo) aos ex-funcionários e novos funcionários da Embraer possibilitou a
caracterização dos entrevistados.
Para realização das entrevistas, foi preparado um roteiro visando facilitar e
aprofundar a comunicação, sem perder de vista os objetivos da pesquisa e os nexos
entre as dimensões do vivido, do percebido e do imaginado. Conscientes de que o
roteiro constituía-se mais num guia de orientação da “conversa dirigida”, por não
poder prever todas as situações, ficamos sempre abertos às necessárias
adaptações.
A descrição, classificação e análise dos dados coletados serviram para
orientar o delineamento dos tipos de informantes, conforme especificidade e
200
qualificação das características sócio-econômicas e políticas, em articulação com as
visões e representações das mudanças ocorridas.
A observação assistemática foi útil para estabelecimento dos contatos iniciais,
para apresentação dos propósitos da pesquisa e obtenção de autorização, mesmo
que de caráter informal, para a coleta sistemática dos dados e a realização das
entrevistas. Além disso, as visitas à empresa permitiram uma avaliação informal do
contexto e das possíveis dificuldades a serem enfrentadas.
A partir da atitude de abertura, flexibilidade, capacidade de observação e de
interação com os informantes envolvidos, a investigação qualitativa veio a requerer,
ao longo do processo, correção e readaptação do instrumento utilizado.
Através da postura dos indivíduos estudados, inteiramo-nos do mundo
simbólico daqueles ex-funcionários e novos funcionários da Embraer, procurando
interpretar a vida social conforme as significações apresentadas pelos informantes,
com suas ambigüidades, contradições e paradoxos.
Assim a presente pesquisa foi realizada mediante um levantamento de campo
que incluiu:
1) um questionário contendo quarenta e oito perguntas aplicadas a oitenta e
uma pessoas demitidas e entrevistas qualitativas com sete pessoas, também
demitidas da Embraer nos períodos anterior e posterior à sua privatização;
2) um questionário contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito
pessoas admitidas e entrevistas qualitativas com seis pessoas, também admitidas
logo após a privatização da Embraer;
3) entrevistas em profundidade realizadas com duas pessoas que trabalham
na Embraer desde a sua formação;
4) Foi realizada ainda, uma entrevista em profundidade com AN, 44 anos,
casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato.
O objetivo é mostrar o impacto sócio-econômico das demissões sobre a vida
dessas pessoas e o impacto das mudanças sobre novos contratados durante e logo
após o processo de privatização da Embraer.
201
4.1. O IMPACTO SOBRE OS DEMITIDOS A análise das respostas dadas às perguntas do questionário e às perguntas
abertas nos permitiu caracterizar os funcionários demitidos e verificar as mudanças
ocorridas em suas vidas após a demissão.
4.1.1. CARACTERIZAÇÃO DOS FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS
• Origem Em relação aos demitidos da Embraer entre 1990 e 2000, 48% são da cidade
de São José dos Campos; 22% da cidade de Jacareí-SP; 8% da capital São Paulo;
8% de Santa Branca – SP; 4% de Taubaté-SP; 4% de Sorocaba-SP; 1% de São
Sebastião-SP; 4% do Estado de Minas Gerais e 1% da cidade do Rio de Janeiro
(vide Tabela 29). Esses dados coincidem com a distribuição da população do
município por local de nascimento, onde aproximadamente a metade da população,
ou seja, 49,83% nasceram no próprio município.
TABELA 29 – Cidade de origem dos ex-funcionários demitidos da Embraer
CIDADE DE ORIGEM
QUANTIDADE %
São José dos Campos
39 48
São Paulo 7 08 Jacareí 18 22 Santa Branca 6 08 Taubaté 3 04 Sorocaba 3 04 Minas Gerais 3 04 Rio de Janeiro 1 01 São Sebastião 1 01 TOTAL 81 100
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -
2004/2005.
202
Em relação à população residente em São José dos Campos, nascida em
outros estados brasileiros, a região Sudeste é predominante, representada por
58,65%, conforme Tabela 30. Deste total, 28,17% é de outros Estados.
TABELA 30 – Distribuição da população residente no Município de São José dos Campos, por local de nascimento, 2000.
Local de nascimento População % Município de São José dos Campos 256.924 49,83 Outro município do Vale do Paraíba 42.405 8,23 Outro município do Estado de São Paulo
66.396 12,88
Outro Estado 145.229 28,17 Outro País 3.794 0,74 Não Informa 805 0,16 TOTAL 515.553 100,00
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,
2000.
• Escolaridade
Podemos observar na Tabela 31 que 4% dos ex-funcionários entrevistados
possuem o primeiro grau completo, 55% o 2º grau completo, incluindo cursos
técnicos, 15% o superior incompleto, 7% o superior completo e apenas 4% possuem
pós-graduação.
TABELA 31 – Escolaridade dos ex-funcionários da Embraer
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários
2004/2005.
ESCOLARIDADE QUANTIDADE % 1º Grau incompleto 0 0 1º Grau completo 3 04 2º Grau incompleto 12 15 2º Grau completo 45 55 Superior incompleto 12 15 Superior completo 6 07 Pós-Graduação 3 04
203
4.1.2. AS MUDANÇAS OCORRIDAS NA VIDA DOS FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS
• O trabalho
Em relação aos demitidos da Embraer no período estudado, 96% estão
trabalhando atualmente e apenas 4% estão desempregados. Dos que estão
trabalhando, 55% tem rendimento menor e qualificação inferior do que quando
trabalhavam na Embraer, 30% têm renda maior e 15% continuam com o mesmo
rendimento e qualificação.
Das pessoas demitidas que foram entrevistadas, 11% encontraram emprego
de imediato, 22% só encontraram emprego no período de 6 meses a 1 ano, outros
22% demoraram de 1 a 2 anos e 11% demoraram de 3 a 5 anos, ou seja, 56% dos
demitidos demoraram de 6 meses a 1 ano para retornarem ao mercado de trabalho
conforme Tabelas 32,33 e 34 e relato :
TABELA 32 – Ex-funcionários que trabalham atualmente
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,
2004/2005.
TABELA 33 – Renda atual dos ex-funcionários
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,
2004/2005.
TRABALHAM ATUALMENTE
QUANTIDADE %
Sim 78 96 Não 3 4
RENDA MENSAL ATUAL
QUANTIDADE %
Menor 45 55 Maior 24 30 Igual 12 15
204
TABELA 34–Tempo de retorno dos ex-funcionários ao mercado de trabalho
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,
2004/2005.
Segundo PG, 45 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Aeronáutico, ex-
supervisor de projetos, foi demitido logo após privatização. “Para mim, foi muito difícil aceitar minha demissão, pois sou Engenheiro
Aeronáutico formado no ITA e sempre trabalhei na Embraer desde minha
graduação. Na época, fiquei sem rumo, passei muitas dificuldades,
principalmente para arrumar outro emprego na minha área de atuação. Foram 2
anos procurando emprego em minha área, durante esse período, passei a dar
aulas particulares de Matemática em casa. Logo depois, fui trabalhar como
gerente de uma loja de material de construção, fiz de tudo um pouco. Hoje tenho
uma franquia de café no shopping da cidade, que esta em crescimento. Mas na
verdade ainda espero trabalhar novamente na Embraer, pois gostaria de voltar
na minha atividade de formação”.
A maioria dos demitidos, 63%, está empregada no mercado com carteira
assinada, 33% estão no mercado sem carteira assinada, alguns são profissionais
liberais e outros trabalham por conta própria conforme relato:
RETORNO AO TRABALHO
QUANTIDADE %
Imediato 9 11 De 1 a 3 meses 9 11 De 4 a 6 meses 10 12 De 6 meses a 1 ano 18 22 De 1 a 2 anos 18 22 De 3 a 5 anos 9 11 Mais de 5 anos 3 04 Não retornou 3 04 Não respondeu 2 03 TOTAL 81 100
205
RTR, 55 anos, casado, três filhos, cujo antigo cargo na Embraer era de
Supervisor Administrativo, demitido em 1994 quando iria completar 23 anos de
empresa, relata: “Com minha demissão tive que fazer várias mudanças, pois minha renda baixou
muito; uma delas foi vender um dos carros que tinha, diminuí as despesas com
viagens, mudei para uma residência de menor valor da Zona Leste para Zona Sul.
Para ajudar nas despesas meus filhos começaram a trabalhar e minha filha mais
nova mudou para uma escola pública. Após 1 ano desempregado, retornei ao
mercado de trabalho em uma empresa de segurança e depois de 4 anos, mudei para
uma empresa que presta serviços para a Embraer, que é uma empresa que ministra
cursos de treinamento e palestras para funcionários da Embraer. A Embraer sempre
foi uma empresa que oferece muitos benefícios e bom salário, ainda sonho em voltar
a trabalhar na Embraer”.
De acordo com as informações obtidas no levantamento de campo, logo após
a demissão, os integrantes de cada família tiveram um papel fundamental no
orçamento familiar, auxiliando nas despesas. Em 54% das famílias, 1 pessoa ajudou
nas despesas; em 13% das famílias, 2 pessoas ajudaram; em 25% das famílias, 3
pessoas ajudaram e em 8% das famílias; 4 pessoas ajudaram nas despesas
conforme relato:
AFM, 47 anos, casado, três filhos, que trabalhou na Embraer como
Chapeador e foi demitido na crise de 1994, relata sua experiência.
“Só retornei ao mercado de trabalho após 2 anos, trabalhando como
motorista, entregando compras de supermercado. Devido a isso passei por
muitas dificuldades, pois minha renda diminuiu, tive que vender minha casa
própria na Zona Norte e comprei uma de menor valor na Zona Sul, minha
esposa e meus filhos começaram a trabalhar para ajudar nas despesas, mas
mesmo assim os meus filhos tiveram que mudar para uma escola pública à
noite. Eu ainda sonho com uma recontratação na Embraer, esperança que
está no coração de muitos ex-funcionários”.
Conforme as entrevistas, podemos identificar e caracterizar a mobilidade
espacial ocorrida durante o período em que ocorreram as demissões e contratações
de novos funcionários pela Embraer. Comparando essas informações com as
206
fornecidas pela pesquisa realizada no Relatório Final Sócio-Econômico do Município
de São José dos Campos entre 1990 e 2000, logo após o período de privatização da
Embraer, podemos analisar a mobilidade espacial no município de São José dos
Campos – SP sob o motivo principal da última mudança das famílias por bairros.
As Tabelas: 35 e 36 apresentam os dados da mobilidade espacial no
município:
TABELA 35 – Motivo principal da mudança da família por bairro, considerando o total de famílias do Município que mudaram de residência
REGIÕES Zona Norte
Zona Leste
Zona Sul
Zona Oeste
Centro /Sudeste
Nº de famílias * 8.536 19.363 20.890 9.574 8.165 Motivos das Mundanças
% % % % %
Profissionais
30,46 28,53 26,90 34,97 27,47
Familiares
12,71 15,73 9,30 13,67 17,45
Acesso à Infra-estrut. e serv.
6,18 6,50 6,90 13,69 14,48
Preço mais baixo do imóvel
35,40 44,03 54,70 32,24 29,18
Segurança e Qualidade de vida
4,43 2,61 1,60 5,43 8,28
Não informa
10,82 2,60 0,60 - 3,14
* Mudança de um bairro/região para outro bairro/região de São José dos Campos
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos, 2000.
207
TABELA 36 – Motivo principal da mudança da família de bairro, considerando todas as regiões de São José dos Campos
TODAS REGIÕES Número de famílias / 66.528
MOTIVOS DA MUDANÇA %
Profissionais 29,66
Familiares 13,18
Acesso à infra-estrut. e serv. 9,55
Preço mais baixo do imóvel 39,11
Segurança e Qualid. de vida 4,47
Não informa 3,43
TOTAL 100,00
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,
2000.
Conforme os resultados do relatório, 29,66% das famílias que mudaram para
outros bairros foram motivadas por razões profissionais. Destacam-se a Zona
Oeste 34,97%, Zona Norte 30,46%, que apresentam percentagens iguais aos ex-
funcionários da Embraer conforme Tabela 38.
Relação familiar foi o terceiro motivo para a mudança das famílias para
outros bairros, representando uma média de 14%. Destaca-se a Zona Sul com
9,30%, apresentam percentagens iguais aos ex-funcionários e novos funcionários
conforme tabelas 38 e 47.
Acesso à infra-estrutura e serviços foi o quarto fator mais importante de
atração da mobilidade espacial para o Município de São José dos Campos,
representando uma média de 9,55%. Destacam-se as Zonas Oeste, Norte, Leste,
Sul e Centro/Sudeste, que apresentam percentagens iguais às tabelas 38 e 47.
Segurança e qualidade de vida foi apontado pelas famílias joseenses como o
quinto fator de atração de mudança de bairro no Município, representando em média
3,43%. Esse motivo de mudança das famílias para outros bairros teve destaque na
Zona Leste, com 2,61 %, onde estão bairros mais distantes do centro do Município,
208
cuja proporção é bem menor do que a média. Zona Oeste e Zona Norte, que ficam
mais próximas do centro do Município.
O fator de maior importância para mudança da população para os bairros do
Município, em relação aos demais apontados acima, foi preço mais baixo do imóvel, que contribui com 39,11%. Destacam-se, entretanto a Zona Sul 54,70%, considerada a região mais populosa e heterogênea, onde reúne os contrastes de
uma cidade grande, boa parte dos seus bairros usufrui de boa infra-estrutura, outra
ainda sofre com a falta de infra-estrutura, tornando o preço do aluguel e do imóvel
mais acessível. De acordo com o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José
dos Campos e o levantamento de campo realizado com os ex-funcionários, os que
permaneceram e os novos funcionários, podemos concluir que no primeiro momento
a crise econômica da década de 90 e a privatização da Embraer geraram
desemprego e queda no padrão de vida dos ex-funcionários. No segundo momento,
logo após a privatização, houve um aumento de emprego e na qualidade de vida dos
novos contratados, o que ocasionou diretamente uma grande mobilidade espacial
dentro do Município.
• A moradia Com relação ao impacto nas condições de moradia dos demitidos, concluiu-
se que 56% das famílias dos ex-funcionários da Embraer que vieram de outras
cidades e residem no município de São José dos Campos a princípio vieram para cá
por razões profissionais e mesmo após as demissões, tais famílias continuaram
morando na cidade, porém mudaram de bairro em busca de um imóvel com o preço
mais acessível.
Podemos identificar e caracterizar a mobilidade espacial e as
mudanças ocorridas com as famílias dos ex-funcionários da Embraer no município:
77% das famílias mudaram de residência logo após a demissão, 23% mudaram para
Zona Sul, 19% para Zona Leste, 7% para Zona Norte, 4% para Oeste, ocasionando
um deslocamento da Zona Oeste para Zona Sul considerada a região mais populosa
e heterogênea, que reúne todos os contrastes de uma grande cidade, Enquanto
parte do bairro usufrui de uma boa infra-estrutura, outra ainda sofre com a falta de
infra-estrutura, em relação ao endereço anterior pode notar que 7% moravam na
Zona Sul, 13% na Zona Leste, 9% na Zona Norte, 5% no Centro, 25% na Zona
209
Oeste onde se concentram bairros com alta qualidade de vida e infra-estrutura
conforme Tabela 37 e como podemos ver no depoimento a seguir.
TABELA 37 – Mudou de residência depois da demissão
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários.
2004/2005.
MJF, 53 anos, casado, ex-Controlador de Qualidade, que trabalhou 15 anos
na Embraer, foi um dos demitidos na crise de 1994 e atualmente tem seu próprio
comércio, revela em seu depoimento: “Passei durante 3 anos muitas dificuldades para retornar ao mercado de trabalho, em
conseqüência disso, minha qualidade de vida diminuiu, a renda não é a mesma de
quando trabalhava na Embraer. Meu objetivo era de voltar a trabalhar na Embraer,
pois me especializei profissionalmente para atender à Embraer. Assim ao longo dos
anos precisei mudar de endereço várias vezes, vendi meu apartamento na Zona
Oeste e comprei outro de menor valor na Zona Sul; no período em que fiquei
desempregado, o meu filho teve que mudar de uma escola particular para uma
escola de ensino público, isso me levou a pensar em mudar de cidade, mas ainda
tenho esperança de algum dia voltar a trabalhar na Embraer”.
Conforme foi dito, 77% dos ex-funcionários da Embraer mudaram de
residência após a demissão; desses, 44% mudaram de bairro devido ao preço mais
baixo do imóvel, 30% devido a problemas profissionais, 10% por melhor acesso à
infra-estrutura e serviço e 6% por segurança e qualidade de vida, conforme podemos
ver na Tabela 38 e relato:
Mudou de residência depois
da demissão
QUANTIDADE %
Sim 63 77 Não 18 23
210
TABELA 38 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos ex-funcionários
TODAS AS REGIÕES Número de pessoas / 81
MOTIVOS DA MUDANÇA %
Profissionais 30
Familiares 10
Acesso à infra-estrut. e serv. 10
Preço mais baixo do imóvel 44
Segurança e Qualidade de vida
06
Não informa -
TOTAL 100 Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -
2004/2005.
Conforme PRA, 53 anos, casado, dois filhos, cuja antiga função na Embraer
era de Supervisor de Assistência Técnica relata: “Logo após a minha demissão não consegui voltar a trabalhar na mesma atividade,
atualmente sou corretor de imóveis. Em minha vida, houve várias tentativas
fracassadas profissionalmente na busca de novos empregos, o que acarretou na
queda das minhas condições de vida, o que afetou financeiramente e
emocionalmente a mim e minha família. Quando trabalhava na Embraer era um
tempo mágico. A crise da Embraer ocorreu, é claro, fortemente influenciada pela
grave crise externa e interna do Brasil e foi impulsionada pela má administração
militar daquele período, quando a empresa estava com excesso de empregados.
Mesmo assim, decidi continuar em São José dos Campos na esperança de
conseguir um bom emprego, sem mudanças drásticas, amenizando assim a
frustração da demissão e também evitando a desestabilização familiar que vinha
ocorrendo. Assim algumas medidas eu tomei, me mudei da Zona Oeste em que era
locatário e passei a locar outro imóvel na Zona Sul, mais barato. Com relação aos
filhos, todos tiveram que sair da escola particular para uma pública, um drama
psicológico muito grande para toda a família”.
211
Observa-se que a maioria dos ex-funcionários, 62%, ainda moram na cidade;
38% moram em cidades vizinhas. Com respeito às regiões de São José dos
Campos, a maioria mora na Zona Sul 23%,na Zona Leste 19%, com 7% na Zona
Norte, 4% na Zona Oeste e 7%no Centro, conforme Tabela 39.
TABELA 39 – Endereço atual dos ex-funcionários da Embraer
ENDEREÇO ATUAL QUANTIDADE %
São José dos Campos
Zona Sul 19 23
Zona Leste 15 19
Zona Norte 06 07
Zona Oeste 03 04
Centro 05 07
Sudeste 2 02
CIDADE DE JACAREÍ 13 16
Caçapava 9 11
Taubaté 9 11
TOTAL 81 100
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários -
2004/2005.
Dentro dessa amostra, no que diz respeito às condição da moradia, 82% dos
demitidos têm residência própria, 11% alugada e 7% cedida por parentes.
Passaremos a seguir a analisar as mudanças ocorridas dentro da própria
cidade de São José dos Campos, caracterizando cada Zona da cidade para poder
melhor demonstrar o impacto dessas mudanças na vida dos ex-funcionários. Como já mencionado no Capítulo 1, a população de São José dos Campos
está distribuída em dois distritos (São Francisco Xavier e Eugênio de Melo), dois
subdistritos (Santana e o Centro) em 6 regiões urbanas, Zona Norte, Zona Sul, Zona
Leste, Zona Oeste, Sudeste, Centro, 318 bairros urbanos, 77 bairros rurais, 94
212
loteamentos clandestinos e 22 favelas (em anexo). As Figuras e Tabelas a seguir
dão uma visão geral da cidade.
FIGURA 10 – Distritos de São José dos Campos
Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.
213
FIGURA 11 – Mapa das regiões de São José dos Campos
Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2003.
214
FIGURA 12 – Mapa dos Bairros de São José dos Campos
Fonte: Secretária de Planejamento e Meio Ambiente, São José dos Campos, 2004.
215
FIGURA 13 – Limites de Zonas e Número de Habitantes por Zona de São José dos Campos
Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano de São José dos Campos, 2000.
ZONA NORTE 61.504
ZONA LESTE 136.118
ZONA SUL 199.913
SUDESTE 38.761
ZONA OESTE 25.182h
CENTRO 70 863
216
TABELA 40 – Número de Habitantes por Região de São José dos Campos
Fonte: Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos Campos,
2000.
Do total dos demitidos que mudaram de residência, temos a seguinte
distribuição:
• 38% mudaram para a Zona Sul. Considerada a região mais populosa e
heterogênea de São José dos Campos, a Zona Sul reúne todos os contrastes de
uma cidade grande e, apesar de ter um núcleo mais antigo, constituído nos anos 70
(o Jardim Satélite) teve sua grande expansão nos anos 1990.
Enquanto parte dos seus 199.913 habitantes em 2000 usufrui de uma boa
infra-estrutura, outra ainda sofre com a falta de infra-estrutura.
A área nobre da região Sul atrai investimentos no setor imobiliário e
comercial, onde se encontram os bairros Jardim Satélite, Bosque dos Eucaliptos e
Floradas de São José, que têm seu metro quadrado cada vez mais valorizado na
região. Mas, apesar do considerável crescimento, bairros como o Morumbi, Jardim
Imperial e Dom Pedro estão longe de se tornarem pólos comerciais. E bairro como
Rio Comprido, na divisa com a cidade de Jacareí, não conta nem com saneamento
básico. Podemos também encontrar loteamentos clandestinos, em contraponto há
localidades onde quase não existe infra-estrutura, como os bairros Martins
Guimarães e outros com sérios problemas como os bairros Bosque dos Eucaliptos e
REGIÃO 2000
Zona Norte 61.504
Zona Sul 199.913
Zona Leste 136.180
Zona Oeste 25.182
Centro 70.863
Sudeste 38.761
Total de Habitantes* 530.403*
217
Torrão de Ouro, que cresceram sem um Plano Diretor adequado. Atualmente estes
bairros se encontram muito próximos do aterro sanitário da cidade, gerando
reclamações e queixas dos moradores devido ao mau cheiro e proliferação de
insetos e bichos.
• 8% para a Zona Oeste, onde se concentram bairros com alta
qualidade de vida e infra-estrutura, como Urbanova, Jardim Aquarius, Colinas,
Esplanda II e Jd. Apolo. A região tem cerca 25.183 habitantes. Conforme censo de
2000, a Zona Oeste possui o metro quadrado residencial mais caro da cidade.
Segundo Relatório da Associação das Construtoras do Vale do Paraíba (Aconvap)
de 2000. O crescimento se concentra nos novos bairros de alto padrão, como
Aquarius e Sunset Park.
• 30% para a Zona Leste, onde estão localizados os bairros Vila
Industrial, Jardim Maracanã, Jardim Olímpia, Jardim Valparaíba. A Zona Leste é a
que mais cresce em São José dos Campos. Segundo o Departamento de
Planejamento Urbano e Regional da Univap, a região cresceu cerca de 70% entre
1997 e 2000. A região têm 136.118 habitantes.
• 4% para Sudeste. Na região sudeste de São José dos Campos está
concentrada a maioria dos centros e institutos de pesquisa e tecnologia da cidade,
um dos principais pólos tecnológicos do país. Nesta área que estão localizados CTA,
o INPE, o ITA e a Embraer.
Criada legalmente em 1993, a região Sudeste abrigava 38.761 pessoas em
2000. Entre os bairros localizados nesta área estão o Jardim da Granja, Vila São
Benedito, São Judas Tadeu, Jardim Santa Fé e Jardim Souto. Antes de 1993, esses
bairros “pertenciam” às regiões Sul e Leste.
Segundo o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José dos
Campos da Univap entre 1990 e 2000, a região Sudeste se desenvolveu para dar
suporte às empresas locais.
O Jardim da Granja é um exemplo. O bairro se desenvolveu por causa do
grande impulso da economia. Muitos trabalhadores se mudaram para perto de seu
emprego neste período a região teve uma valorização imobiliária.
• 12% para a Zona Norte. Sendo o bairro de Santana o mais antigo da
cidade, podemos também destacar os bairros rurais São Francisco Xavier, Miranda-
Chácaras, Florindo-Chácara, Buquirinha I e II, Vila Paiva, Vila Cândida, Vila Dirce,
Freitas e loteamentos cladestinos onde predomina uma população de renda baixa. A
218
Zona Norte é a região onde se localizam imóveis de baixo valor de mercado e uma
população de 61.504 habitantes.
• 12% para o Centro, que abriga uma população de 70.863 mil
habitantes, que estão espalhados entre o “centro velho”, onde estão concentrados
os bairros Vila Maria e Jardim Bela Vista e ruas mais antigas da cidade, como
Humaitá, 15 de Novembro e Coronel José Monteiro e o“ centro expandido” que
abrange parte do comércio da cidade como os bairros Jardim Maringá, Vila Ema,
Jardim Apolo e Esplanada, onde os imóveis tem alto valor agregado.
Em relação à mudança de imóvel, 92% das pessoas entrevistadas não
mudaram de cidade após a demissão, na expectativa de retornarem ao emprego ou
encontrar um emprego melhor. A maioria dessas pessoas teve uma grande queda
na qualidade de vida, cerca de 50%, enquanto que 27% mantiveram as condições
inalteradas após a demissão e 27% dos entrevistados conseguiram melhorar as
condições financeiras e a qualidade de vida.
Muitos desses ex-funcionários ainda sonham voltar a trabalhar na Embraer,
na expectativa de conseguir voltar ao antigo padrão de vida: 69% dos demitidos
gostariam de ser recontratados, mas somente 11% estão na expectativa e na
esperança de ser recontratado novamente e 20% não gostariam de voltar a trabalhar
na Embraer. Um dos principais motivos para voltar a trabalhar na empresa são os
benefícios que ela oferece. Assim 80% das pessoas demitidas não pensam em
mudar de cidade na expectativa de retornarem ao emprego ou na esperança de um
emprego melhor.
Essas mudanças e conseqüentes perdas refletem na vida dos ex-funcionários
de um modo drástico e são reveladas nas entrevistas. Podemos destacar o
depoimento de LF, ex-Ilustrador Técnico, 44 anos, casado, que trabalhou por 18
anos na Embraer:
“Hoje, mesmo tendo o meu negócio próprio, ainda sonho em voltar a trabalhar na
Embraer. Quando trabalhava na empresa me sentia feliz, pois sabia que a empresa
me oferecia grandes possibilidades de crescimento dentro da empresa além de todos
os benefícios e assistências”.
219
Outro relato importante é de PRB, Engenheiro, 51 anos, casado, dois filhos,
trabalhou 25 anos na Embraer:
“A minha demissão foi muito dolorosa, fui demitido por carta, sinceramente eu não
esperava depois de 25 anos de dedicação e amor pela Embraer, mas mesmo assim
ainda sonho em voltar para minha antiga profissão, sei que a Embraer está dentro de
mim”.
4.2 – O IMPACTO OCORRIDO NA VIDA DOS NOVOS FUNCIONÁRIOS CONTRATADOS PELA EMBRAER LOGO APÓS SUA PRIVATIZAÇÃO Esta pesquisa foi realizada mediante um levantamento de campo quantitativo
contendo trinta e duas perguntas aplicadas a cento e oito pessoas. Foram realizadas
entrevistas em profundidade com seis pessoas selecionadas entre as admitidas pela
Embraer logo após a privatização.
A partir dos dados coletados podemos observar que os novos contratados
têm entre 18 e 29 anos, 63% entre 30 e 39 anos e apenas 26%, 11% acima de 40
anos. Em relação à pesquisa feita com os funcionários demitidos na crise, a faixa
etária é bem menor atualmente. A maioria é do sexo masculino 69% contra 31% do
sexo feminino, sendo que muitos desses funcionários foram contratados para a área
de produção. (Vide Tabelas 41, 42, 43 e 44.)
TABELA 41 – Faixa etária dos ex-funcionários
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,
2004/2005.
FAIXA ETÁRIA
QUANTIDADE %
20 a 29 anos 19 24 30 a 39 anos 25 30 40 a 49 anos 33 41
50 anos acima 04 05
220
TABELA 42 – Faixa etária dos novos contratados
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
TABELA 43 – Número de ex-funcionários demitidos por sexo
SEXO QUANTIDADE % Feminino 20 25 Masculino 61 75
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos ex-funcionários,
2004/2005.
TABELA 44 – Número de funcionários contratados por sexo
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
Com relação à escolaridade dos novos funcionários, comparada à dos
funcionários demitidos, melhorou muito, pois atualmente 48% têm o 2º grau
completo, 26% têm o curso superior incompleto, 20% têm curso superior completo e
6% tem pós-graduação. Pode-se notar que não houve contratação de pessoas com
escolaridade inferior ao 2º grau, isso mostra que houve maior exigência na
qualificação dos novos contratados, tanto os novos como os que se mantiveram têm
possibilidade de “fazer carreira” na empresa, conforme relatos:
CC, 32anos, Solteira, Técnica em Gestão Empresarial, contratada em 2000,
relata que: “Quando passei pelo processo seletivo, para ingressar na empresa, tinha como
requisito básico para ocupar a vaga a qual eu estava concorrendo, a fluência na
língua inglesa e também que eu tivesse cursando uma Faculdade na região.
Requisito esse que não era necessário no meu emprego anteiror”.
FAIXA ETÁRIA QUANTIDADE % 18 a 29 anos 68 63 30 a 39 anos 28 26
40 anos acima 12 11
SEXO QUANTIDADE % Feminino 34 31 Masculino 74 69
221
CJP, 42 anos, casado, um filho, Técnico Eletrônico, há 6 anos na empresa,
relata que:
“Quando fui contratado em 1999, iniciei meu trabalho na linha de montagem do ERJ-
145, logo após 2 anos a empresa me possibilitou um curso de aperfeiçoamento na
área de sistemas. Em 2004 iniciei a Faculdade de Engenharia Eletrônica, onde a
empresa me ajuda com uma bolsa de estudo. Hoje me sinto feliz e posso dizer que
estou cursando uma Faculdade e tenho uma casa na Zona Sul graças a Embraer,
onde tenho orgulho de fazer parte dessa empresa”.
A Tabela 45 apresenta os resultados do levantamento de campo em relação
à satisfação dos novos funcionários. Pelos resultados, podemos verificar que
os níveis de satisfação dos novos funcionários em relação ao ambiente
organizacional é bom, 85% dos trabalhadores aponta como principais virtudes
ou vantagens da empresa a política de salários e benefícios, a oportunidade
de carreira e o orgulho de trabalhar na empresa conforme tabela e relato:
TABELA 45– Está satisfeito com a empresa
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
DL, 54 anos, casado, dois filhos, Engenheiro Mecânico, conta com muita
emoção sua trajetória:
Nascido na cidade de Pedreira, interior de São Paulo, conta que recebeu o
convite para trabalhar na Embraer. “Quando cheguei em São José dos Campos,
fui morar em uma pensão próxima ao Parque Santos Dumont, bairro Maringá, e logo
após cursei Engenharia. Hoje ocupo um cargo de chefia. A minha vida passou por
Está satisfeito com a empresa
QUANTIDADE %
Sim 92 85
Não 16 15
222
alterações. Concluí a Faculdade, fiz pós-graduações com a ajuda da Embraer e
viajei a trabalho para os Estados Unidos, Europa e China. Também troquei de casa
na Vista Verde, Zona Leste, por um apartamento na Zona Sul, Hoje tenho um filho
formado em Engenharia Eletrônica e uma filha formada em Terapia Ocupacional.
Atualmente vivo um novo momento, me sinto feliz e grato por tudo que a Embraer
proporciona em minha vida.”
Quanto ao local de origem desses novos contratados, 39% São de São José
dos Campos, o restante veio de outras cidades: 9% de São Paulo – capital, 11% de
Jacareí, 15% de outras cidades do Vale do Paraíba, 7% do restante do interior de
São Paulo, 2% do litoral Sul de São Paulo e 17% de outros Estados do país,
conforme Tabela 46.
TABELA 46 – Cidade de origem dos novos contratados
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
Assim o número de pessoas que trabalham atualmente na Embraer e que
vieram de outras cidades e Estados aumentou 17% em relação aos ex-funcionários
CIDADE DE ORIGEM
QUANTIDADE %
São José dos
Campos
42 39
São Paulo 10 09
Jacareí 12 11
Vale do Paraíba 16 15
Interior de São
Paulo
08 07
Litoral Sul de SP 02 02
Outros Estados 18 17
TOTAL 108 100
223
demitidos naquele período. 12% foi a diminuição de contratação de pessoas que
moram na cidade de São José dos Campos.
Outro aspecto importante é quanto ao estado civil, pois a maioria dos
entrevistados é solteira, aproximadamente 54% dos novos contratados, já entre os
ex-funcionários, 70% são casados, sendo que 68% não têm filhos.
A maioria dos novos contratados, que mora em São José dos Campos,
aproximadamente 23% na Zona Sul, 20% na Zona Leste, 4% na Zona Norte, 21%
na Zona Oeste, 6% no Centro; 26% moram em outras cidades. Com relação à
mobilidade social, houve um aumento significativo de moradores na Zona Oeste, de
15%, comparando com o os ex-funcionários que moravam na Zona Oeste, que
totalizavam 4%. A Zona Oeste é a região em que se concentram os grupos sociais
de maior renda e os imóveis mais valorizados de São José dos Campos.
Conforme identificado pelo levantamento de campo, 39% dos novos
contratados que já moravam em São José dos Campos e 61% dos que vieram de
outras regiões mudaram de bairro depois que foram contratados 42% por razões
profissionais, 21% em busca de segurança e qualidade de vida, 20% devido ao
preço mais baixo do imóvel, 9% pelo acesso à infra-estrutura e serviços e 8% por
motivos familiares, conforme Tabela 47 e relato:
224
TABELA 47 – Motivo principal da mudança da família de bairro dos novos funcionários
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
ERF, 27 anos, separada, dois filhos, Técnica de Informática ,contratada em
2003, diz em entrevista que: “Eu me sinto muito privilegiada pelos benefícios que tenho dentro da empresa, gosto
muito de trabalhar na Embraer. Em relação aos incentivos que a empresa oferece,
são muito bons, tem a bolsa estudo que eu tenho de 30%, mas que só é válida se for
bem na Faculdade, pois é por nota que você recebe o desconto, e também tem
cursos e palestras e o aproveitamento interno dentro da empresa. A Embraer oferece
uma perspectiva muito grande em relação ao crescimento profissional do funcionário,
por isso estou fazendo faculdade para que eu possa ter mais oportunidades. Hoje eu
posso dizer que minha vida mudou para melhor depois que comecei a trabalhar na
Embraer: consegui comprar meu apartamento na Zona Oeste da cidade e dois
carros”.
Conforme tabela 48, 75% dos novos contratados moram em casas próprias,
17% alugadas e apenas 6% financiadas. Mesmo depois da contratação dos novos
funcionários, somente 35% mudaram para outra residência, sendo que deste total
TODAS AS REGIÕES
Número de pessoas / 108
MOTIVOS DA MUDANÇA %
Profissionais 42
Familiares 08
Acesso à infra-estrut. e serv. 09
Preço mais baixo do imóvel 20
Segurança e Qualidade de vida
21
Não informa -
TOTAL 100
225
20% mudaram para a Zona Leste e 23% para a Zona Sul, 21% para Zona Oeste, 6%
para o Centro, com relação ao endereço anterior, 30% moravam na Zona Leste,
30% na região Sudeste, 21%, na Zona Sul, 11% na Zona Norte, 4% no Centro e 4%
na Zona Oeste. Essa mobilidade espacial ocorreu devido ao aumento do poder de
renda dos novos contratados que migraram da Zona Leste, Norte e Sul para a Zona
Oeste conforme Tabelas 49, 50, 51 e relato:
TABELA 48 – Situação atual (MORADIA)
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
TABELA 49 – Mudou de endereço logo após a sua contratação
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
SITUAÇÃO DA CASA ATUAL
QUANTIDADE %
Própria 82 75
Alugada 18 17
Cedida 02 02
Financiada 06 06
Mudou de endereço após a contratação na Embraer
QUANTIDADE %
Sim 38 35
Não 70 65
226
TABELA 50 – Endereço anterior dos novos contratados que moram na cidade de São José dos Campos
ENDEREÇO ANTERIOR
QUANTIDADE %
São José dos Campos
Zona Sul 09 21
Zona Leste 12 30
Zona Norte 05 11
Zona Oeste 02 04
Centro 02 04
Sudeste 12 30
TOTAL 42 100
Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
TABELA 51 – Endereço atual de todos os novos contratados na cidade de São
José dos Campos Fonte: Levantamento de campo: Questionário aplicado aos novos funcionários,
2004/2005.
MPM, 31 anos, solteira, Técnico em Eletrônica, há 6 anos trabalhando na
Embraer, contratada no período em que a Embraer estava retomando o seu
crescimento, relata:
São José dos Campos
Zona Sul 28 23
Zona Leste 26 20
Zona Norte 04 04
Zona Oeste 16 21
Centro 06 06
Outras Cidades 28 26
TOTAL 108 100
227
“Desde o início recebi todo o suporte dentro da empresa e todo treinamento de
qualificação para área de logística que eu atuo. É uma empresa que motiva muito o
funcionário e eu me sinto muito feliz de estar trabalhando na Embraer. Hoje eu
recebo a bolsa estudo de 30% para pagar minha Faculdade e também a empresa dá
todo incentivo para as pessoas estudarem, além dos convênios com as Faculdades,
a Embraer tem também convênio com escolas de inglês e francês, eu hoje possuo
um apartamento na Zona Oeste graças a estar trabalhando na Embraer, que vem
investindo no meu crescimento profissional”.
Dos novos contratados, 89% dizem que a renda aumentou após a
contratação, ao contrário do que ocorreu com os demitidos, 55% dos quais tiveram a
renda diminuída. Para os novos contratados cuja renda aumentou,
conseqüentemente a qualidade de vida melhorou, ou seja, 85% desses novos
contratados estão satisfeitos em trabalhar na Embraer e com o plano de
aperfeiçoamento contínuo oferecido pela empresa; apenas 15% dos novos
contratados não estão satisfeitos com a empresa, mas mesmo assim não gostariam
de sair, devido à insegurança do mercado.
CEEL, 26 anos, solteiro, Técnico em Eletrônica, cursando o nível superior em
Administração de Empresas, desde 1999 contratado pela Embraer, argumenta: “A Embraer é uma empresa que me dá segurança, me estimula a continuar
estudando para que eu possa crescer e sempre estimula o funcionário a se
desenvolver profissionalmente. A empresa dá apoio para a especialização dos
funcionários e promove o aproveitamento interno em outras áreas, adequando o
funcionário para uma melhor função que ele possa exercer. Em relação ao
crescimento profissional dos funcionários na empresa, existem oportunidades temos
que estar sempre alerta para os momentos que surgirão. Com relação as minhas
conquistas materiais consegui comprar meu apartamento na Zona Leste, um terreno
e um carro. Devo isso a estar empregado na Embraer, por isso me sinto feliz em
fazer parte dessa empresa”.
Dos 85% que se dizem satisfeitos, 38% dos novos contratados estão
totalmente satisfeitos e até mesmo gostariam de sair de São José dos Campos para
trabalhar no exterior em outras sedes da Embraer.
228
4.3. A VISÃO DOS FUNCIONÁRIOS QUE PERMANECERAM A RESPEITO DAS MUDANÇAS NA EMPRESA
O processo de privatização implicou uma transformação radical nas formas de
gestão, organização industrial e institucional, cultural, empresarial e na visão de
negócios da Embraer, como podemos ver no depoimento:
HAF, 54 anos, separado, Engenheiro Eletrônico, há 28 anos trabalha na
Embraer: “A Embraer, desde seu início, em 1969, até sua crise em 1994 e sua privatização,
tinha como visão implantar uma infra-estrutura industrial no setor aeronáutico do
país, essa era a primeira visão e dentro dessa visão a Embraer se comportou
perfeitamente bem, ela foi criada em 1969 e em 2 ou 3 anos já estava entregando
produtos seriados, e a partir de 1975 ela se tornou uma empresa exportadora e seus
produtos foram muito bem aceitos; seja no país, seja no exterior, como empresa
estatal. A Embraer foi privatizada em dezembro de 1994, um período de prolongada
crise que começou em 1990, essa crise não terminou com a privatização da
Embraer, na verdade a privatização foi o começo da reviravolta, da ‘virada de mesa’.
As principais diferenças entre a empresa estatal e a empresa privatizada é que a
empresa privatizada podia ter a flexibilidade, a agilidade e agressividade que uma
empresa estatal, por ser amarrada a muitas obrigações de caráter legal, está
impedida, essa é a principal diferença. A empresa estatal se notabilizou pela sua
excelência tecnológica e industrial e a empresa privada agregou essa excelência,
essa competência tecnológica e industrial, novas competências no setor
administrativo, financeiro e empresarial que foram muito importantes para que a
Embraer iniciasse sua reviravolta, a partir de dezembro de 1996, quase dois anos,
portanto, após ter sido privatizada. A Embraer dos ‘sonhos’ continua presente em
cada funcionário, porque esse é um dos motivos que move o principal pilar que é a
Embraer. Isso torna a empresa muito competitiva, ou seja, são as pessoas
dedicadas, motivadas, competentes e que fazem com que a empresa exista, este é
um elo emocional muito forte, porque qualquer visitante vindo do exterior,
principalmente, nota esse envolvimento emocional ao visitar a empresa, que sempre
existiu desde sua criação em 1969 e continua presente nos dias de hoje. A Embraer
em 1969 foi fruto das pessoas que com grande visão e determinação, a criaram.
Em 2005, a Embraer é a 4ª maior empresa aérea comercial, fabricante de aeronaves
comerciais do mundo, fruto da vontade, da competência, do talento de pessoas e do
229
sonho que elas acalentam A Embraer começou a sua prolongada crise em 1990,
nessa época tinha 12.600 empregados e de uma tacada só em novembro de 1990,
foram demitidos 4.000, então ela caiu de 12.600 para 8.600 empregados.
Posteriormente, em 1994, um pouco antes de ser privatizada, ela demitiu mais 2.000
empregados e foi perdendo mais alguns. De fato, quando a Embraer foi privatizada,
tinha um pouco mais de 4.300 empregados. No período que foi de 1995, já uma
empresa privatizada até seu início de recuperação, início de 1996, a Embraer ainda
demitiu cerca de mais 1.500 empregados, e em abril de 1997 a empresa estava com
o menor número de empregados da sua história, com 3.200 empregados. Fechou o
ano de 1997 com 4.494 empregados e em 2005 temos 16.953 empregados no
primeiro trimestre. Desse contingente que foi demitido sucessivamente entre 1994 e
1996, uma parte se perdeu na medida em que mudou de cidade e passou a se
dedicar a outras atividades, no entanto uma parte deles foi reaproveitada, inclusive
quando a empresa ainda estava se reestruturando. Alguns desses empregados
foram reaproveitados pela Embraer e outros pela GAMESA, uma empresa
espanhola. A partir de seu crescimento até sua reviravolta em 1996/1997, alguns
foram reincorporados à empresa, outros passaram a se dedicar a empresas de
transporte aéreo, como Varig, Vasp, Transbrasil, e alguns passaram a se dedicar a
empresas no exterior, alguns se tornaram empregados da Boeing e da Canadair
Bomdardier e de outras empresas na Europa. Não tenho uma estatística correta de
quantos foram reaproveitados pela Embraer, acredito que dos 6.000 empregados
que saíram talvez 1.500 retornaram à empresa mas já com outro pensamento;
desses funcionários mais de 90% deixaram de ser sindicalizados. O CTA e o ITA
estão perdendo grandes professores, que estão indo para o exterior ou entrando em
empresas privadas, devido aos baixos salários, e isto afetará em alguma parte a
Embraer no futuro, de não ter uma mão-de-obra tão qualificada como antes, mas em
primeiro lugar é importante dizer que da mesma forma que a Embraer era como uma
empresa estatal, dificilmente teria o desempenho que ela pode ter como empresa
privada pelas questões que já abordei, como agressividade, flexibilidade, capacidade
de agir rápido, agressividade comercial. O fato é que a Embraer jamais teria existido
se não houvesse por trás dela o CTA e o ITA, e por trás do CTA e do ITA, a decisão
do governo brasileiro no final da década de 40, de desenvolver esta estratégia, que é
de longo prazo, que é fundamentada na educação de alto nível (o ITA), mas que
demonstrou ser afetada. Hoje são pouquíssimos os países que tenham uma indústria
de aeronáutica completa, como existe no Brasil e certamente nenhum país abaixo da
linha do Equador, que tenha essa competência, mesmo a Austrália que é um país de
1º mundo, não tem uma indústria de aeronáutica completa. Indústria de aeronáutica
230
completa significa a capacidade de conceber, projetar, desenvolver, testar, certificar,
fabricar industrialmente e apoiar os produtos aeronáuticos que são muito
sofisticados. A manutenção do CTA e do ITA é de uma importância estratégica, o ITA
gera profissionais de altíssima qualificação que são utilizados não só pela Embraer,
como fabricante de aeronaves, mas também pelo próprio CTA, nas suas pesquisas.
Não se pode nunca esquecer o papel do CTA como entidade homologadora, o CTA
que através de um trabalho muito sofisticado, certifica os aviões, certificações que
são aceitas pelas entidades homologadoras dos EUA e Europa, de modo que essa
competência do CTA e do ITA, se for perdida e hoje ela está ameaçada pela falta de
renovação, pelas dificuldades em contratar professores, profissionais que o CTA não
consegue deter, porque vão procurar melhores condições de remuneração fora, o
Brasil vai ser muito penalizado e não só a Embraer. Hoje a Embraer emprega
engenheiros egressos do ITA e também de outras escolas de engenharia, algumas
com curso aeronáutico ou de especialização aeronáutica, como a Universidade de
Engenharia de São Carlos - SP, a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade
Federal de Minas Gerais (UFMG). A Embraer também criou um curso de
especialização em engenharia aeronáutica em nível de mestrado num convênio com
o próprio ITA. Hoje a Embraer tem outras fontes de suprimento de mão-de-obra
qualificada em face do crescimento da demanda, mas o ITA sempre foi e sempre
será de uma importância fundamental para a Embraer.”
Em relação à Embraer até 1994 e a atual que se tornou uma montadora, isso pode
prejudicar o futuro da Embraer ou abrir novas concorrências no futuro? “A Embraer
desenvolveu de início o programa ERJ-145 e depois aprofundou o programa da
família Embraer 170/190, uma arquitetura industrial que chamamos de parceria a
risco, que é a Embraer somar-se a grandes fabricantes do mundo inteiro, ou seja,
empresas renomadas do setor aeroespacial e fazer com que essas empresas
invistam e participem do programa de risco. Isso significa que a Embraer não corre o
risco sozinha, essas empresas parceiras investem no programa e se o programa for
bem sucedido, como os estudos indicam, essas empresas serão muito beneficiadas
por ocasião da produção, caso o programa não seja tão sucedido, elas irão dividir as
perdas com a Embraer. Esse processo de parcerias com outras empresas
(fornecedoras de peças) foi na realidade fundamental no caso do ERJ-145, porque a
Embraer não tinha condições de investir na produção total de peças, era uma
empresa estatal com uma dívida de US$ 1 bilhão e que não dispunha de US$ 100
milhões, por exemplo, para investir no projeto e na serialização da nova asa
adquirida pelo avião; foi um processo tão bem sucedido que no caso do programa
Embraer 170/190 foi ainda mais aprofundado. Hoje é um processo que encontra
231
algumas similaridades com as grandes montadoras do setor automotivo, podemos
dizer que a Embraer se transformou numa grande montadora do setor aeronáutico.
O que significa então ser uma montadora? O que está por trás desse termo,
‘montadora’? Caracterizaria da seguinte maneira, a Embraer, em primeiro lugar,
antes de tudo, detém o projeto (design); a família Embraer 170/190 tem aquelas
características que refletem um estilo de projeto e um entendimento de como deva
ser o avião da Embraer. A Bombardier (concorrente direta da Embraer) faz de uma
maneira diferente da Embraer, que se conceitua a mais adequada no mercado.
Então a empresa detém o projeto, a arquitetura industrial, que faz com que parceiros
se somem nessa direção e detém a base de clientes, e isso é uma coisa que está
sob o domínio da Embraer. Ao se ‘parceirizar’ com grandes empresas e portanto ter
um sistema mais horizontalizado, há ganhos e perdas. Os ganhos são facilmente
identificados: em primeiro lugar o investimento necessário para desenvolver a nova
família de aviões é dividido, não é todo da Embraer, no caso da família 170/190, de
US$ 1bilhão necessários para desenvolver a nova família, cerca de US$ 300 milhões
vieram de investimentos de parceiros no desenvolvimento da asa, um segmento da
fuselagem, um motor adequado para o avião, cerca de US$ 240 milhões vieram de
contribuições de nossos parceiros, dinheiro que eles tiraram do bolso e colocaram
em cima da mesa para poder participar do programa e o restante foi levantado pela
Embraer através da geração de caixa e soluções de mercado, ou seja, a Embraer
não precisou depender de investimentos governamentais e de apoio governamental,
bancou o desenvolvimento funcional da família de aviões com soluções de mercado;
então isso é uma vantagem significativa que no passado não existia. Em segundo
lugar, ao se apoiar em parceiros no mundo todo, a Embraer também tem em cada
um desses parceiros, parceiros interessados em que os aviões sejam vendidos em
seus países de origem, porque vendendo avião no Japão, Europa, etc., também a
Embraer estará gerando empregos nesses países, então existe um interesse
redobrado por parte dessas empresas no sucesso do programa.”
O que a empresa perde com isso?
“Pode-se imaginar que ao subdividir o avião em vários segmentos e compartilhá-los
com parceiros que são em sua maioria de outros países, a empresa perca um pouco
de flexibilidade, porque não é apenas ela para tomar decisões, a Embraer precisa
negociar em alguns casos e se apoiar nesses parceiros. Então se perde,
evidentemente, toda vez que você se associa a sócios, perde-se um pouco de
flexibilidade, embora aumente sua força. Poderia dizer que também a Embraer gera
menos empregos, essa é uma ponderação válida na teoria, na prática o fato é que a
Embraer, ao desenvolver dessa forma seus aviões, desenvolveu produtos de
232
sucesso e dos 3.849 empregados que a empresa tinha em abril de 1996, hoje a
Embraer tem 16.953 empregados, ou seja, geramos uma quantidade de empregos
significativa, multiplicamos praticamente por cinco, no prazo de 10 anos, o número
de empregados da Embraer. Com isso, na prática, o sucesso e a riqueza
proporcionada pela empresa com um empreendimento vencedor são fatores
consecutivos reais e não teóricos.”
Se houver outra crise de reestruturação, global, regional, nacional ou outro atentado
como o 11 de setembro, a Embraer está preparada para essa nova crise?
“A crise dos anos 90 teve vários contribuintes, ela resultou de um movimento de
transformação da indústria aeroespacial em todo mundo. Até 1987, o mundo vivia a
Guerra Fria e conseqüentemente se investia muito em programas de defesa, o Brasil
não participava diretamente da Guerra Fria, mas era um país alinhado com uma das
potências e conseqüentemente seguia o mesmo modelo e a Embraer sentiu a
ausência de programas governamentais. Um outro componente é o fato de que o
governo brasileiro, que viveu aquele período de 20 anos de autoritarismo apoiado
num modelo econômico de substituição das importações, também era um governo
que demonstrava exaustão, não tinha mais como apoiar essas empresas estatais.
Um outro componente é a própria Embraer, que depois de muitos anos de empresa
estatal, já tinha adquirido alguns vícios administrativos, já havia ‘inchado’ muito o seu
quadro de empregados sem a correspondente eficiência produtiva de projeto, que
são fatores que contribuíram para a crise da Embraer. Outro fator significativo foi que
no início dos anos 90, deu-se a 1ª Guerra do Golfo e logo após, ou como
conseqüência da guerra, houve uma retratação no transporte aéreo e
conseqüentemente os fabricantes de aeronaves sentiam muito isso, e a Embraer
também, a piora das condições de mercado no início dos anos 90. Essa foi uma crise
que quase derrubou a Embraer. O atentado de 11 setembro de 2001 foi uma crise
que encontrou a empresa forte, a empresa tinha muito dinheiro em caixa, uma
situação econômica muito forte, de grande solidez, empresa completamente
saneada, estabelecida no mercado com produtos de sucesso. Essa foi uma crise,
porém muito mais intensa, mais prolongada e de conseqüências muito mais
dramáticas para a indústria de transporte aéreo, que a crise vivida no início dos anos
90, tanto é que essa crise ainda não foi completamente superada e nos EUA,
principalmente, com grandes empresas aéreas como a American, a Delta, a
Continental, ainda continuam todas com o futuro incerto, provavelmente algumas
empresas ainda irão falir ou se fundir a outras para poder sobreviver. A despeito
disso, a Embraer soube enfrentar essa crise, soube ultrapassar essa crise e
continuou em 2002, 2003, em 2004 gerando lucro, crescendo o número de
233
empregados, a despeito de o mercado estar passando por uma das suas piores
crises na história. Nesse período uma empresa concorrente da Embraer, porém não
tão sólida, não tão bem estabelecida, acabou desaparecendo, que foi a Fairchild
Dornier, empresa americano-alemã, fabricante do avião Dornier 328, jato regional
para 30 passageiros, e que se encontrava em avançado estágio de desenvolvimento
dos jatos Dornier 728 (70 passageiros) e Dornier 928 (90 passageiros), uma família
de aviões parecidos com os da família Embraer 170/190, mas não tiveram condições
econômicas de suportar os efeitos da crise e acabaram falindo e saindo de mercado
em julho de 2002. Eu diria que a Embraer já demonstrou estar preparada para
enfrentar outro momento de crise, na verdade a Embraer está atravessando por uma
crise que ainda não está completamente terminada, sendo a pior crise do transporte
aéreo em todo mundo.”
Já para ACMS, 45 anos, Engenheiro Mecânico Aeronáutico, há 22 anos
trabalha na Embraer, relata que o processo de mudanças foi essencial para
empresa: “Do início de 1969 até a crise e sua privatização, a Embraer era uma empresa com
foco muito grande em tecnologia, com produtos desenvolvidos em função das
prioridades do Ministério da Aeronáutica, trabalhando em projetos onde ela pudesse
adquirir tecnologia e promover produtos e serviços para o Ministério da Aeronáutica,
desenvolvendo-se nesta fase o Tucano, o AMX em conjunto com a Itália, fazendo
peças para o projeto F5, e o Bandeirante que foi uma iniciativa dentro do Ministério
da Aeronáutica e logo veio o Xingu que foi o precursor do Brasília, mas sempre
voltado a desenvolver tecnologia. Assim a Embraer sempre buscou entrar em
programas internacionais onde ela pudesse adquirir tecnologia e exportar produtos
de alto conteúdo tecnológico, ‘focada em alta tecnologia’.”
No livro de Ozires Silva, ele diz que a Embraer era uma “fábrica de sonhos”, de
pessoas idealistas do setor militar.
“Na época que iniciei, o “sonho” já estava materializado, nós estávamos na fase de
produzir mesmo, o sonho já era realidade, as pessoas que estavam lá tinham uma
experiência para transformar sonho em produtos, de 1983 em diante, já era um
sonho concretizado em produtos. Com relação à privatização em 1994, a mudança
essencial que houve na Embraer até a data de hoje, foi um redirecionamento do
foco; o foco não era mais só desenvolvimento de tecnologias, mas aplicar essa
tecnologia de uma forma otimizada para obter retorno, concentrar o conhecimento
tecnológico, a capacidade instalada nas atividades que iam dar retorno efetivo em
234
função do mercado, era olhar o que a Embraer tinha de capacidade tecnológica, e o
que o mercado tinha de potencial e juntar essas duas coisas, ou seja, aplicar toda
aquela tecnologia adquirida na forma que o mercado estava desejando. A entrada do
grupo Bozano Simonsen na estrutura da Embraer, em termos de crescimento de
mercado, com os departamentos de vendas lá fora e a integração com um bom
produto aqui, trouxe uma nova administração, o que uma empresa aeronáutica não
tinha, que era área financeira, área econômica. A agilidade de encontrar soluções
econômicas para viabilizar negócios uniu a tecnologia da Embraer de produzir aviões
com uma nova tecnologia, que é a tecnologia econômica de criar soluções para
viabilizar negócios (marketing). Hoje a Embraer está presente na América do Norte,
Ásia, Europa e na América do sul, com unidades independentes para vendas e
contratos e uma área de inteligência de mercado em São José dos Campos. A
Embraer hoje na verdade é uma empresa reestruturada, preparada para o mercado
externo, ainda com pessoas da época da sua fundação, com uma experiência e
conhecimento técnico muito grande, e com novas pessoas de ampla visão de
mercado (marketing), o que torna a empresa extremamente competitiva.”
O governo Lula vem anunciando em algumas entrevistas, que gostaria que muitas
peças que são trazidas de fora, fossem fabricadas aqui no Brasil, gerando mais
empregos.
“Isso na verdade está acontecendo, os principais parceiros da Embraer estão
montando suas unidades aqui no Brasil. Não estão fazendo isso só porque o
governo quer, estão fazendo isso porque vão ganhar dinheiro com isso, porque
conseguem produzir aqui o mesmo produto que produzem lá fora, com ganho de
economia de escala, ficando mais barato produzir aqui. Os exemplos são as micro,
pequenas, médias empresas (MPMEs) da indústria aeronáutica. As perspectivas da
Embraer para o futuro são grandes, por ela ter passado por crises como,
recentemente o 11 de Setembro, ela está preparada para enfrentar uma crise. Por
ter produtos de alta tecnologia, a Embraer vem buscando novos mercados , mas a
Embraer está num setor que é sujeito à crise.
Do total de novos contratados, apenas 10% é sindicalizado, devido à
instabilidade do mercado e a perda da força sindical nos últimos anos conforme
relata:
AN, 44 anos, casada, Assistente Social e ex-diretora de Sindicato, no seu
depoimento, têm uma visão crítica:
235
“O impacto da crise de 1994, vivida pela Embraer, gerou em São José dos
Campos uma fase muito difícil. Dos muitos funcionários que foram demitidos na
época, alguns voltaram para sua cidade de origem e outros ficaram, temos como
exemplo FF que era o número quatro da Embraer, o quarto trabalhador registrado, e
que ocupava o cargo de chefe em um setor importante, recebeu o comunicado de
sua demissão através de uma carta. O rompimento com a Embraer foi muito drástico
e inesperado e abalou totalmente a estrutura dessas pessoas, pois a paixão pela
mesma era muito grande. Hoje, os sentimentos mudaram até porque ela se
modernizou, aumentou e tem outra relação com o trabalhador e a cidade. A
construção e o crescimento da Embraer até 1994 era de sonho e paixão e por isso, a
forma da demissão foi muito traumática. Algumas medidas foram adotadas pela
câmara e a prefeitura para amenizar as demissões da Embraer como: o ‘Levanta
Vôo São José’, que teve como base a discussão da privatização: foi criado um
Comitê formado por vereadores, sindicatos e prefeitura para discutir com a cidade de
São José dos Campos e o Estado de São Paulo a importância da Embraer e sua
privatização ou não, com várias ações na Assembléia Legislativa e no Congresso
Nacional. Hoje a Embraer é um sucesso como era antes, mas a relação depois do
processo de privatização e demissões não tem mais aquele vínculo afetivo com a
cidade, isso mudou, a Embraer hoje é uma das maiores exportadoras do país, tem
trabalhos sociais, mas não tem mais aquela paixão, o vínculo e a relação que tinha
com as pessoas foi cortado depois do processo de privatização. Em função da crise
gerada com as demissões, a saída que a prefeitura e a câmara encontraram para
amenizar este impacto na sociedade foi investir na área de serviços. Houve incentivo
para a abertura do Shopping Vale Sul, que na época foi um investimento grande,
neste período tivemos a inauguração do Carrefour e assim São José dos Campos
começou se afirmar no setor de serviços, que é um setor forte. O setor aeronáutico
teve um crescimento significativo em São José dos Campos devido aos conflitos e
guerras que torneiam o mundo. A definição da Embraer para essa nova família de
aviões cresceu e continua crescendo, principalmente as indústrias voltadas para o
setor aeroespacial as micro, pequenas, médias empresas (MPMEs). Várias pessoas
que saíram da Embraer montaram microempresas com as experiências acumuladas,
porém tiveram altos e baixos, pois com a retomada do crescimento novos
prestadores de serviços surgiram. Esse período da demissão até a retomada, que foi
de 3 a 4 anos, foi muito duro, foi um processo doloroso para as pessoas da cidade. A
Embraer retomou seu crescimento com uma nova visão empresarial. A relação é
mais fria com a cidade, as pessoas ainda se orgulham de trabalhar na Embraer, mas
a empresa deixou de ser o símbolo da cidade. Algumas leis foram modificadas após
236
esses fatos para a reestruturação ou melhoria das pessoas demitidas, a câmara
aprovou uma lei de investimento, a ‘Lei de Incentivos Fiscais’, que foi feita até para
as empresas entrarem e produzirem. A privatização desenvolveu um outro tipo de
relação com a cidade, uma relação industrial, de produção, com alguns trabalhos
sociais, mas tudo vinculado às perspectivas empresariais, sem ter vínculos como
tinham antes da privatização. A privatização mudou a relação com a cidade, ficou
mais formal e outro aspecto é o salário que abaixou muito após a privatização, hoje a
maioria dos novos contratados não é filiada ao sindicato local. Os trabalhadores que
estavam empregados antes de 1994, eram funcionários sindicalizados com 10, 15,
20 anos de casa, as demissões foram de pessoas que a construíram. Com o
crescimento da Embraer, a maioria das novas tecnologias é comprada, o material
composto na época vinha da Espanha, então muitas máquinas, investimentos foram
construídos por esses trabalhadores. Hoje a Embraer é uma montadora. Com essa
forma de produção da Embraer, o ramo das terceirizadas é bastante grande e a
Embraer tem um gerenciamento de controle bastante diferente de como era antes;
por exemplo, se houver crises, os investimentos de grande porte estão garantidos
pelo BNDES. Não é o que ocorre com as empresas que prestam serviços, pois
acabam fechando. Portanto é sempre traumático o processo que ela acaba gerando.
O governo brasileiro está mudando, forçando a Embraer a nacionalizar uma parte
das peças utilizadas na construção dos aviões”.
Como mostra o levantamento de campo, os novos funcionários estão
satisfeitos com o apoio que a Embraer dá para seu crescimento profissional, por
exemplo, auxiliando com cursos, palestras, bolsas de estudos, entre outros
benefícios. Um dos fatores primordiais para o sucesso da Embraer no futuro é a
parceria que têm com o ITA que fornece aos funcionários da empresa o curso de
Mestrado na área aeronáutica dentro da empresa, pois à precarização das
condições de funcionamento do CTA e do ITA, que no passado eram à base do
corpo técnico da Embraer, atualmente não recebem investimentos suficientes do
governo.
237
CONSIDERAÇÕES FINAIS
• O PRESENTE E O FUTURO DA EMBRAER E DO MUNICÍPIO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS Os processos de privatização e estruturação simplicaram uma
transformação radical nas formas de gestão, organização industrial e institucional,
cultura empresarial e, sobretudo, na visão de negócios da Embraer. A elaboração e
a formalização de um planejamento estratégico e a realização de análises de
mercado mais precisas, baseadas em indicadores de monitoramento interno e
externo por intermédio de uma nova área recém criada denominada “Inteligência de
Mercado”, representaram uma etapa fundamental dessa nova fase da empresa. As
estratégias de reestruturação produtiva e financeira possibilitaram o crescimento do
faturamento e uma valorização do patrimônio e prestígio da Embraer. Ressalve-se
que a estratégia e a excelência na abordagem da tecnologia sempre foram os
pontos fortes da Embraer. O programa ERJ-145, por exemplo, que permitiu a
recuperação da empresa e sustentará as vendas futuras, havia sido projetado em
1989, enquanto a empresa era ainda uma estatal. Contudo, só foi possível a sua
viabilização pela solução criativa das parcerias de risco e pela agilidade e
flexibilidade empresarial conquistadas após a privatização da empresa.
Para Bernardes (2000, p. 369) “é importante deixar claro que a Embraer
conseguiu atrair parceiros no mercado mundial que apostassem e investissem no
projeto ERJ-145, ERJ-170 e ERJ-190, porque a empresa detinha o design e a
tecnologia que as outras empresas não possuíam”. Certamente, se a empresa não
desfrutasse de uma posição estratégica no mercado, enquanto geradora de
tecnologia, as possibilidades de celebrar alianças não seriam tão promissoras. No
futuro, para manter sua posição competitiva, a empresa deverá celebrar parcerias e
alianças que agreguem valor, tecnologia e mercados dinâmicos.
Esta fase de transição do modelo organizacional e institucional de
Estatal para privado é marcada também por um conflito entre uma visão financista
dos novos controladores e enfoque tecnológico dos antigos diretores da empresa.
Apesar disso, os novos controladores souberam preservar a liderança e a identidade
de excelência tecnológica da empresa, preservando o departamento de engenharia
e, portanto, a sua capacidade de design, dando continuidade à tradição da Embraer,
238
adaptando e transformando esses valores de acordo com a nova filosofia desenhada
para uma moderna organização empresarial (Ibidem).
Na visão dos militares o processo de privatização não foi a melhor
solução para a empresa, muitos se manifestaram contra. Conforme relato de Silva
Segundo Bernardes (2000), “até hoje ele recebe declarações inconformadas de
setores militares quanto ao processo de venda da Embraer para a iniciativa privada.
Recorde-se que o próprio Ozires, desde a fundação da empresa, insistiu com o
Ministério da Aeronáutica que o empreendimento deveria ser viabilizado pelo setor
privado. Mas, todo o esforço de sensibilização e mobilização para atrair a iniciativa
privada foi em vão, restando ao Estado brasileiro levar a cabo tal empreendimento”.
O processo de privatização da empresa também implicou um
movimento de reestruturação organizacional e redução dos processos produtivos
que acabou por atingir os quadros de recursos humanos mais qualificados. Embora
o Departamento Tecnológico de Engenharia (DTE), considerando o núcleo
estratégico da empresa, tenha sido preservado, muitos engenheiros e técnicos de
alta qualificação foram demitidos e com eles o conhecimento armazenado durante
anos foi perdido. Por causa do alto custo e do tempo de reciclagem profissional de
um engenheiro aeronáutico, para que este possa atuar em outros segmentos, o
reemprego imediato não é tão simples, sendo necessário algum tempo de
adaptação para a realocação profissional. Tendo em vista a crise que afetou toda a
economia brasileira nos anos 90 e as baixas atividades destinadas a P&D, muitos
engenheiros tiveram grande dificuldade em conseguir o reemprego, sobretudo nas
ocupações em que estavam habituados a trabalhar. Com efeito, muitos
abandonaram ou mudaram de ocupação, conforme levantamento de campo
realizado, passando a atuar como vendedores, donos de bancas de jornal; alguns
conseguiram a realocação para outros setores da indústria ou dos serviços
produtivos e outros foram recrutados por empresas estrangeiras do ramo
aeronáutico, sediados em outros países. Na ótica dos funcionários que
permaneceram e dos novos funcionários da empresa, por um lado, a privatização foi
favorável, tendo em vista a quebra de determinados feudos, com a formação de
cultura organizacional mais profissional e baseada na competência dos funcionários;
de outro, a adoção de novos programas organizacionais e sistemas de gestão da
força de trabalho tem implicado o engajamento individual dos funcionários,
rompendo com os laços de categoria, tanto dos engenheiros como dos metalúrgicos,
239
diminuindo o poder de pressão do sindicato nas negociações trabalhistas. Esta é,
aliás, uma tendência internacional verificada em muitas empresas e setores da
atividade econômica, mas, com a recente recuperação do setor, alguns engenheiros
e técnicos têm retornado à Embraer. É importante mencionar que a empresa tem um
plano de realocação profissional e assistência social aos funcionários demitidos, que
tem sido aplicado com algum êxito (BERNARDES, 2000, p. 370).
Ressalva-se que a estratégia e a excelência na abordagem da tecnologia
sempre foi o ponto forte da Embraer. Com a celebração das parcerias de risco do
Programa ERJ-145, ERJ 170, ERJ 190 e Legacy Executivo/Shuttle, a Embraer
transferiu tecnologia e possivelmente sofrerá concorrência dessas empresas no
futuro, em determinadas áreas em que as parceiras já adquiriram tecnologia. Na
verdade, o grande aprendizado no projeto para a Embraer foi na gestão dos
contratos interempresariais, e não propriamente ganhos relacionados a tecnologias.
Outro grande aprendizado foi na redução de custos dos processos produtivos
subcontratados. Com o processo de desverticalização da produção, a Embraer criou
condições para a redução do preço do produto final, ou seja, a estratégia que
norteou o programa de parcerias tem claramente enfoque de custos e engenharia
financeira. Segundo relata HAF:
“Este tipo de arranjo interempresarial traz consigo muitas vantagens para o atual
quadro de concorrência e transferência tecnológica. O argumento, no entanto, é que se
a Embraer mantiver sua capacidade de dar prosseguimento a uma política de
investimentos em P&D e desenvolvimento tecnológico vigorosa, sedimentada em
estrutura financeira adequada, provavelmente conseguirá manter-se competitiva no
mercado ou celebrar novas parcerias estratégicas dessa natureza. O novo Programa
ERJ-170, ERJ-190 e Legacy Executivo/Shuttle., já esta concebido com um enfoque
diferenciado em relação ao Programa ERJ-145; trata-se de uma nova plataforma. O
novo programa será desenvolvido em uma concepção de parcerias estratégicas mais
integradas e complexas; o projeto das aeronaves, por exemplo, será feito em co-design
com as empresas parceiras. A Embraer tem 45% de participação nos projetos e é
responsável pela integração de todos os sistemas, estrutura e parte técnica final da
montagem. Outro aspecto importante é que os requisitos técnicos de seleção dos
novos parceiros estratégicos foram estabelecidos antes do início do projeto da
aeronave desse programa. As novas alianças estratégicas estão sendo articuladas com
grandes empresas multinacionais visando à agregação de mercados, aquisição de
240
conhecimento negocial, infra-estrutura comercial e logística, tecnologias críticas nas
áreas civil e militar, aumento da capacidade instalada e escalas técnicas. Na ótica
tecnológica, acredita-se que o grande salto para a Embraer será a aquisição da
tecnologia supersônica.
A estratégia de identificação e captura de nichos de mercado, apesar de
bem-sucedida, não assegura uma trajetória tranqüila ao horizonte da empresa. As
alianças estratégicas são condições necessárias para a Embraer enfrentar a
concorrência internacional, dominada por estruturas de mercado caracterizada por
haver um número pequeno de compradores com grande capacidade de investimento
e poder de mercado. Todavia, as alianças que porventura venham a ser efetuadas
devem considerar como pontos críticos capacidade de aporte de capital,
transferência e desenvolvimento de novas tecnologias, participação e agregação de
mercado, conhecimento negocial, logística, entre outros. O grande desafio em
relação ao futuro da Embraer será a gestão institucional e a celebração das alianças
com as grandes fabricantes mundiais, com grande capacidade financeira e
tecnológica, sem incorrer no risco de ser absorvida por elas”.
Os programas de cooperação continuam sendo uma das principais
características da indústria aeronáutica, e nesse plano as políticas tecnológicas têm
desempenhado uma função vital para o sucesso dos empreendimentos. Na ótica
dos trabalhadores, os aspectos mais positivos dos programas de cooperação são a
manutenção dos níveis de emprego na indústria e as possibilidades de
enriquecimento das qualificações dos trabalhadores em face da adoção de novas
tecnologias e intercâmbio entre as empresas localizadas em outros países. No
entanto, a participação dos sindicatos locais no processo de negociação tem sido
bastante limitada.
Segundo Bernardes (2000, p. 372) “a ausência de um projeto de longo prazo
para as empresas nacionais privatizadas, somada à ausência de políticas industriais
e tecnológicas para o setor dificultou o restabelecimento competitivo da empresa. A
Embraer, por ser empresa estatal, não dispunha de acesso a fontes tradicionais de
financiamento, como o BNDES. A ausência de linhas de crédito à exportação a partir
de outubro de 1990, quando foram suspensas as linhas de financiamento do Finep,
somente retomadas em 1991, com a criação do Programa de Financiamento à
Exportação (Proex), prejudicou muito a competitividade da empresa. Nesse sentido,
o auxílio do BNDES, por meio do Proex e do Finamex, foi fundamental para a
realização das vendas das aeronaves ERJ-145 no setor externo. Os recursos
241
dirigidos pela Finep para o desenvolvimento tecnológico da Embraer também foram
e serão fundamentais”.
O BNDES demonstrou ser um instrumento-chave para a política de
competitividade, atuando como um Exibank. As linhas de financiamento ao
comprador praticadas pelo BNDES (“buyer credit”), equalizando a taxa de juros em
bases internacionais e oferecendo-a a clientes da indústria aeronáutica brasileira,
são um exemplo de eficiência e inteligência na ação governamental. Uma das muitas
lições que podemos aprender de tal processo resume-se no seguinte argumento:
não basta ter o melhor produto, a melhor tecnologia e, em determinados casos, até o
melhor preço, se a empresa não dispõe de mecanismos de financiamento para seus
produtos, especialmente para vendê-los no mercado externo. Mas – é necessário
dizer – somente esses instrumentos de financiamentos também não são suficientes
para assegurar o futuro da empresa e não substituem a necessidade de formação
de visões e aplicação de políticas mais amplos e duradouros para essa indústria
(Ibidem).
Outro aspecto-chave refere-se ao modelo institucional do CTA. Essa
instituição foi se deteriorando cada vez mais com a crise do Estado na década de
oitenta e noventa e, atualmente, carece de uma reestruturação profunda para
responder aos desafios contemporâneos. A precarização das condições de
funcionamento do CTA e do ITA acabou por desestimular o corpo técnico dos
institutos, que têm sofrido perdas irreparáveis com a saída e demissão de vários
técnicos qualificados e professores, muitos com doutoramento no exterior, em
virtude dos baixos salários e das condições precárias de trabalho. Vários
pesquisadores brasileiros têm migrado para países que vêm valorizando e
considerando estratégico o desenvolvimento das atividades aeroespaciais,
notadamente Canadá, Alemanha, Espanha, Portugal, Indonésia e Estados Unidos,
entre outros. O parque tecnológico encontra-se desatualizado e as pesquisas
sofreram cortes com o processo de contenção de gastos governamentais. Esse é,
aliás, um fator preocupante quanto ao futuro do setor aeronáutico nacional, uma vez
que as pesquisas e a formação da mão-de-obra no CTA foram e continuam sendo
fundamentais para a consolidação do setor no Brasil e para a manutenção da sua
competitividade no mercado mundial. Segundo relato HAF:
“a alternativa que a Embraer encontrou foi criar um Programa de
Especialização em Engenharia (PEE) com mestrado em Engenharia Aeronáutica em
242
parceria com o ITA para 462 engenheiros. O programa tem duração de 18 meses em
tempo integral, a carga horária do curso é de 2.600 horas, buscando assegurar seu
quadro técnico e sua competitividade no mercado aeronáutico”
É importante sublinhar que atualmente, com o processo de privatização da
Embraer, houve o ingresso de novos controladores no jogo político. O que significa
dizer que a tomada de decisão quanto aos rumos das empresas passa agora,
sobretudo, pelos novos controladores e acionistas da Embraer, e para esses
dirigentes os reais interesses são o resultado econômico e financeiro e não os ideais
almejados pelos antigos dirigentes da Embraer, que eram o desenvolvimento e a
capacitação da tecnologia nacional. Segundo relato MB: “a reestruturação societária da Embraer, irá garantir a sobrevivência da empresa,
investimentos superiores a US$ 2,3 bilhões e a geração de empregos”.
Desde 1995, foram investidos US$ 2,3 bilhões na empresa, dos quais 70% no
desenvolvimento de produtos e 30% em capacitação industrial. Os acionistas
contribuíram com uma parte e o restante foi captado no mercado de capitais.
Os fundos de pensão Previ e Sistel têm limitações previstas na legislação para fazer
investimentos e ambos já esgotaram tal capacidade, segundo relato MB: “Não há no Brasil uma política de apoio à indústria aeronáutica como ocorre no
Canadá com a Canadair Bombardier. No futuro, para manter sua posição
competitiva, a empresa deverá celebrar novas parcerias e alianças que agreguem
valor, tecnologia e mercados dinâmicos”.
Com relação à política governamental, provavelmente os processos de
privatização e de recuperação da empresa teriam sido menos dolorosos, lentos e
arriscados, caso houvesse sido estabelecida uma política de investimentos,
reestruturação e competitividade para a empresa ou mesmo um projeto de longo
prazo que a inserisse na estratégia de desenvolvimento tecnológico nacional.
Conforme relato MB:
“a inexistência de agências ou instituições regulamentadoras e financiadoras permitiu a
perda de concorrências importantes, assim como o desperdício de considerável estoque de
recursos humanos extremamente qualificados. Portanto, uma política de competitividade
mais ampla continua sendo uma grande lacuna para o setor. Apesar disso a Embraer
superou a crise e conseguiu aumentar seus lucros, se reestruturou e criou uma Nova
Embraer para ampliar sua capacidade financiamento e desenvolvimento, absorvendo uma
pequena parte da mão-de-obra que foi demitida antes e após sua privatização, e
contratando novos profissionais”. Devido às constantes reestruturações econômicas
243
internas e externas e às crises políticas, mesmo ela tendo o monopólio do setor
aeronáutico regional atual, é impossível prever os rumos da nova Embraer que, a
partir de 2007, deixará de produzir o jato ERJ-145, considerado um dos pilares da
recuperação da empresa.
Outro aspecto do processo de privatização da empresa foram os
impactos que as demissões e as novas contratações tiveram diretamente
sobre a mobilidade espacial no Município devido a razões profissionais, preço
dos imóveis, acesso a infra-estrutura e serviços e segurança e qualidade de
vida. Foram demitidos 9.254 funcionários e contratados 7.134 funcionários
totalizando 16.388 pessoas envolvidas nesse processo diretamente e
indiretamente 65.555 pessoas entre 1990 a 2000. De acordo com o Relatório Final Sócio-Econômico do Município de São José
dos Campos no período antes e logo após a privatização da Embraer, concluir-se
que houve uma mobilidade espacial devido à procura por imóveis de menor preço
(39,11%), razões profissionais (29,66%), acesso a infra-estrutura e serviços (9,55%)
e segurança e qualidade de vida (4,43%).
Considerando o levantamento de campo realizado, quase metade das
famílias dos ex-funcionários da Embraer, (44%) mudaram de bairro devido ao preço
mais baixo do imóvel, (30%) mudaram devido aos problemas profissionais, (10%)
por melhor acesso à infra-estrutura e serviço e 6% por segurança e qualidade de
vida. Com relação aos novos funcionários da Embraer , (39%) residem no Município
de São José dos Campos e (61%) dos que vieram de outras regiões, (42%)
mudaram de bairros por razões profissionais, (21%) por segurança e qualidade de
vida, (20%) em relação ao preço mais baixo do imóvel, (9%) acesso à infra-estrutura
e serviços e (8%) por razões familiares e preço mais baixo do imóvel. Podemos
concluir que no primeiro momento a crise econômica da década de 90 e a
privatização da Embraer geraram desemprego e queda no padrão de vida dos ex-
funcionários. No segundo momento, logo após a privatização, houve um aumento de
empregos e da qualidade de vida dos novos contratados, isso ocasionou
diretamente uma grande mobilidade espacial dentro do Município.
A tese principal de Lefèbvre, aceita por Harvey, é de que a “ revolução
urbana” é fase decisiva do mundo contemporâneo, impondo-se à discussão em
ampla escala mundial. No entanto, a realidade urbana modifica as relações de
244
produção sem ser suficiente para transforma-las: “ O urbanismo torna-se força na
produção, do mesmo modo que a ciência. O espaço e a organização política do
espaço expressam as relações sociais, mas também reagem de volta sobre elas”.
(Lefèbvre, apud HARVEY, 1980) Lefèbvre diz, então, que a cidade industrial apenas
prepara o caminho para o urbanismo.
O urbanismo se torna, pois, cada vez menos homogêneo; crescem e se
modificam estruturas, pois a ocupação do espaço se torna cada vez mais
diferenciada (heterogeneidade cultural, segregação). O espaço criado substitui o
espaço efetivo como princípio dominante de organização geográfica. A
industrialização alterou as diferenciações ecológicas, antes plasmadas na simbiose
de atividades sociais com a natureza. A força do mercado mundial e a divisão
internacional do trabalho eliminam estilos de vida regionais e objetos produzidos
deixam de ter uso local. Os recursos urbanos envolvem estruturação e diferenciação
do espaço por meio da distribuição de investimentos fixos de capital, e, quanto mais
estes são importantes para a vida, mais a estruturação do espaço também se torna
vital. Em termos marxistas, “o espaço criado passa a dominar o espaço efetivo como
conseqüência da mudança de composição orgânica do capital” (HARVEY, 1980, p.
267).
Harvey separa-se da tese de Lefèbvre quando este concebe o urbanismo
dominado a sociedade industrial, pois acredita que a estrutura urbana é dotada de
uma dinâmica própria, embora medida pela interação e contradição com outras
estruturas. Além disso, em aspectos vitais, a sociedade industrial continua a dominar
a vida urbana, porque:
- o espaço criado é moldado pelo desenvolvimento do capital fixo; a mudança
da composição orgânica do capital e o volume crescente de investimentos de capital
constante ainda comandam o processo;
- a urbanização oferece oportunidades para o capital industrial dispor dos
produtos que cria e por isso é impulsionada por ele, pois a criação de necessidades
e a manutenção da demanda efetiva são produzidas pelo capitalismo industrial;
- produção, apropriação e circulação da mais-valia não se tornaram
subordinadas à dinâmica interna do urbanismo, este sim é que se adequou às
exigências do capital industrial; os circuitos de circulação da mais-valia e
especulação da propriedade predominam (HARVEY, 1980, pp. 270-271).
245
O Município de São José dos Campos conforme já demonstrado no Capítulo
1 apresenta aspectos diferentes em relação a outros centros urbanos do país. Na
década de 90, onde a maior concentração de pessoas ocupadas desse Município
estáva na indústria e não no comércio, principalmente no período que antecede e
logo após a privatização da Embraer. Em 1990 o número de pessoas ocupadas na
indústria era de 62.532 pessoas e no comércio 13.720 pessoas. Logo após a crise e
privatização da empresa. Em 2000 este número caiu para 47.504 na indústria,
crescendo no comércio para 27.440, conforme Tabelas 2 e 7, o que vem
demonstrar o grande impacto da privatização na estrutura de empregos, no
Município de São José dos Campos.
Com relação ao Município de São José dos Campos, caso ocorra outra crise
na Embraer, São José dos Campos ficará à deriva com a constante mudança nos
ciclos econômicos, pois cria-se um hiato de crescimento, tornando impossível
equacionar os problemas gerados com a expansão urbana.
Dos finais da década de 80 até os dias de hoje, novos desafios são postos
pelo contexto da internacinalização da economia. Nos países de capitalismo
avançado, a “desindustrialização”, o desemprego em massa e a alta do preço da
terra provocaram fenômenos de degradação de áreas e a mobilidade espacial
urbana, além do aumento da miséria e dos desabrigados, fenômenos então já bem
conhecidos nos países das chamadas economias em desenvolvimento.
Acredita-se que, através da leitura de um bairro, pode-se identificar e
reconstruir a própria história da cidade, como parte de um todo, pois a cidade
compreende os seus “pedaços” que, conforme Véras (1991, p.146) apresentam-se
da seguinte forma:
"O bairro é um pedaço da cidade, um momento, um setor da forma e a
sua natureza, constituída por parte e a sua imagem: uma unidade morfológica.
Os bairros situam-se na metrópole com alguma autonomia e alguma
dependência do todo e essa dupla realidade é sua característica fundamental,
o jogo dialético da parte e do todo, da unidade na diversidade”.
Esse caso vem ocorrendo no Município de São José dos Campos devido
ao deslocamento populacional ocorrido pela crise e privatização da Embraer na
década de 90, principalmente na Zona Sul, considerada a região mais populosa e
heterogênea, que reúne todos os contrastes de uma cidade grande.
246
Enquanto parte dos seus 199.913 habitantes, usufrui de uma boa infra-
estrutura, outra ainda sofre com a falta de infra-estrutura. A área nobre da região Sul
atrai investimentos no setor imobiliário e comercial, onde se encontram os bairros
Jardim Satélite, Bosque dos Eucaliptos e Floradas de São José, que têm seu metro
quadrado cada vez mais valorizado na cidade.
Mas, apesar do considerável crescimento, bairros como o Morumbi, Jardim
Imperial e Dom Pedro estão longe de tornarem se pólos comerciais. E bairro como
Rio Comprido, na divisa com a cidade de Jacareí, não conta nem com saneamento
básico.
Podemos também encontrar loteamentos clandestinos como os bairros
Jardim Juliana e Torrão de Ouro, que cresceram sem um Plano Diretor adequado.
Hoje estes bairros se encontram muito próximos do aterro sanitário da cidade,
gerando reclamações e queixas dos moradores devido ao mau cheiro e proliferação
de insetos e bichos. “A cidade contemporânea é algo enigmático, que ainda está
para ser decifrado do ponto de vista material e subjetivo. A cidade, no mundo
moderno, constitui-se de muitos significados, que produzem e reproduzem a
realidade econômica, a vida social, a cultura, as subjetividades, a comunicação da
era do computador e das relações virtuais, a questão do território e da alteridade”
(VÉRAS, 2000, p. 9).
247
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258
ANEXO 1
QUESTIONÁRIOS/ ENTREVISTAS
259
1. QUESTIONÁRIOS APLICADO A FUNCIONÁRIOS DA EMBRAER DEMITIDOS ANTES E LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÂO
1. Nome completo:
2. Idade:
3. Sexo: ( ) Feminino () Masculino
4. Endereço atual (rua, número, bairro, zona e cidade):
5. Endereço anterior (rua, número, bairro, zona e cidade):
6. Cidade de origem:
7. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( ) viúvo
8. Nome do Cônjuge:
9. Idade: Profissão:
10. Qual sua profissão atual?
11. Em relação à sua profissão atual ela é : Com registro em carteira ( ) Sem registro em carteira ( )
12. E sua profissão quando trabalhava na Embraer?
13. Qual o setor em que você atuava na Embraer?
14. Você foi demitido ou fez acordo para sair do seu emprego na Embraer?
15. Quanto tempo você demorou para retornar ao mercado de trabalho?
16. Atualmente você atua no mesmo setor em que trabalhava na época da sua demissão?
( ) Sim ( ) Não
17. Qual o setor de atuação no momento:
( ) primário ( ) secundário ( ) terciário
(agricultura) (indústria) (comércio/ serviços)
18. Qual é a sua atividade?
260
19. Sua renda mensal atual é: ( ) maior ( ) igual ou ( ) menor
20. Você tem filhos? ( ) Sim ( ) Não Quantos?
21. Qual a idade de cada filho?
22. Seus filhos estudam? ( ) Sim ( ) Não
23. Eles freqüentam ou freqüentaram escola: ( ) pública ( ) particular ( ) ambas
24. Qual é o grau de instrução de seus filhos (coloque a quantidade de filhos em cada grau de instrução): ( ) 1º grau completo ( ) 1º grau incompleto ( ) 2º grau completo
( ) 2º grau incompleto ( ) 3º grau completo ( ) 3º grau incompleto
Pós-Graduação: ( ) cursando ( ) completo
25. Qual o estado civil de cada filho (coloque a quantidade de filho em cada situação):
( )solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) outros
26. Quantos moram com você?
27. Algum dos filhos trabalha? ( ) Sim ( ) Não Quantos
28. Se trabalha, atua em qual mercado? ( ) formal ( ) informal
29. O que faz cada um?
30. Quantas pessoas residem em seu endereço atual?
31. Quantas ajudam nas despesas da casa?
32. Sua imóvel atual é: ( ) própria ( ) alugada ( ) cedida ( ) financiada
33. A imóvel que você reside hoje é a mesma imóvel de quando estava trabalhando na Embraer?
( ) Sim ( ) Não
34. Qual o motivo principal de sua mudança de bairro?
( ) profissional ( ) familiar ( ) acesso à infra-estrutura ( ) custo mais baixo do imóvel (
) segurança e qualidade de vida ( ) não informa
261
35. Você pensou em mudar de cidade após a demissão? ( ) Sim ( ) Não ( ) Não sabe
36. Caso sim, qual o motivo que o levou a não mudar de cidade logo após a sua demissão?
37. Se mudou, qual o motivo de mudar de cidade?
38. E que motivo o fez a retornar à cidade?
39. Sua qualidade de vida mudou depois de sua demissão? ( ) Sim ( ) Não
40. Por que?
41. Você gostaria de voltar a trabalhar na Embraer novamente? ( ) Sim ( ) Não
42. Por que?
43. Hoje, pela sua condição de vida na cidade de São José dos Campos, você ficaria ou se mudaria para outra cidade? ( ) Sim ( ) Não
44. Por que?
45. Para onde?
46. O que ainda te motiva a continuar na cidade de São José dos Campos?
47. Você pretende continuar morando no mesmo bairro? ( ) Sim ( ) Não
48. Por que?
262
2 . QUESTIONÁRIO APLICADO A FUNCIONÁRIOS QUE FORAM ADMITIDOS LOGO APÓS A PRIVATIZAÇÃO
1. Idade
2. Sexo: ( ) Feminino ( ) Masculino
3. Cidade de origem
4. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( ) viúvo
5.Onde mora atualmente? (rua, número, bairro, zona e cidade):
6. Você tem filhos? ( ) Sim ( ) Não Quantos?
7. Qual a idade de cada filho
8. Seus filhos estudam? ( ) Sim ( ) Não
9. Eles freqüentam ou freqüentaram escola: ( ) pública ( ) particular ( ) ambas
10. Qual é o grau de instrução de seus filhos (coloque a quantidade de filhos em
cada grau de instrução): ( ) 1º grau completo ( ) 1º grau incompleto ( ) 2º grau
incompleto ( ) 2º grau completo ( ) 3º grau incompleto ( ) 3º grau completo
Pós-Graduação: ( ) cursando ( ) completo
11. Qual o estado civil de cada filho (coloque a quantidade de filho em cada
situação): ( )solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) outros
12. Quantos moram com você?
263
13. Algum dos filhos trabalha? ( ) Sim ( ) Não Quantos?
14. Se trabalha, atua em qual mercado? Com registro em carteira ( ) Sem registro em carteira ( )
15. Você mudou de endereço após a sua contratação na Embraer? ( ) Sim ( ) Não
16. Se sim, qual era (rua, número, bairro, zona e cidade) do antigo endereço?
17. Qual o motivo principal de sua mudança de bairro?
( ) profissional ( ) familiar ( ) acesso à infra-estrutura ( ) custo mais baixo do imóvel (
) segurança e qualidade de vida ( ) não informa
18. Quantas pessoas residem em seu endereço atual?
19. Quantas ajudam nas despesas da casa?
20. Sua imóvel atual é: ( ) própria ( ) alugada ( ) cedida ( ) financiada
21. Em que ano você foi contratado pela Embraer?
22. Qual sua profissão atual na Embraer?
23. Qual o setor em que você atua na Embraer?
24. Se você foi contratado antes de 1994, quais as mudanças que ocorreram na
empresa após a privatização?
25. Se não, como você se sente trabalhando na Embraer após a privatização?
264
26. Sua renda mensal aumentou após ter sido contratado pela Embraer? ( ) Sim ( )
Não
27. Houve melhorias em sua qualidade de vida após a contratação? ( ) Sim ( ) Não
28. Qual a sua expectativa profissional dentro da Embraer?
29. A Embraer oferece incentivos de aperfeiçoamento profissional, como cursos,
treinamentos e outros, para sua especialização? ( ) Sim ( )Não
30. Você está satisfeito com a empresa? ( ) Sim ( ) Não
31. Por que?
32. Mesmo satisfeito você gostaria de mudar de emprego? ( ) Sim ( ) Não, Por
que?
265
3 . ENTREVISTA ABERTA REALIZADA COM FUNCIONÁRIOS DEMITIDOS, NOVOS CONTRATADOS E OS QUE PERMANECERAM NA EMBRAER
1. Nome:
2. Idade:
3. Estado Civil: ( ) solteiro ( ) casado ( ) separado ( ) divorciado ( )
viúvo
4. Profissão:
5. Em que ano você foi contratado pela Embraer?
6. Qual o setor em que você atua na Embraer?
7. RELATO:
266
ANEXO 2
FOTOS DAS AERONAVES
267
Os principais produtos da EMBRAER são: 1. AVIÕES COMERCIAIS:
• EMB110- Bandeirantes: Primeiro avião produzido pela Embraer. Avião
turbélice de passageiros para 19 lugares com aproximadamente 500 unidades
vendidas.
Fonte: Embraer (2005).
• EMB121 – Xingu: Avião turboélice executivo de passageiros com
aproximadamente 100 unidades vendidas.
Fonte: Embraer (2005).
268
• EMB120 – Brasília: Avião turboélice de 30 lugares com mais de 400
unidades vendidas. Seu principal mercado são os Estados Unidos. Líder de
vendas na categoria por muitos anos, é utilizado por 26 empresas em 14
países, tendo atingido mais de 3 milhões de horas de vôo.
Fonte: Embraer (2005).
• ERJ145: Avião a jato de 50 lugares. Destinado ao mercado regional, possui
119 unidades com vendas confirmadas. Produto recente da empresa, objetiva
alcançar custos de aquisição e operação semelhantes ao dos turboélice.
Fonte: Embraer (2005).
269
• ERJ 135: jato regional para 37 passageiros.
Fonte: Embraer (2005).
• ERJ 140: novo jato regional para 44 passageiros, seguindo o conceito de
“famílias de jatos” iniciado com o ERJ-145, oferecendo alto grau de
comunalidade como benefícios operacionais e de manutenção, incluindo a
mesma certificação para os pilotos. O desenvolvimento desta aeronave
exigirá investimentos da ordem de US$ 45 milhões.
Fonte: Embraer (2005).
270
• ERJ190-100/200: Avião a jato. Versão alongada de ERJ-170, pela adição de
secções de fuselagem, motores mais potentes, asas de maior envergadura e
trem de pouso reforçado. Os investimentos previstos para os dois novos
projetos são da ordem de US$ 750 milhões. Está sendo projetado em duas
versões, de 98 (ERJ-192-100) e 108 (ERJ-200) assentos.
Fonte: Embraer (2005).
• ERJ170: Avião a jato de 70 lugares. Nova plataforma que servirá de base
para o ERJ-190.
Fonte: Embraer (2005).
271
• Aviões Leves fabricados pela Neiva: EMB201 Ipanema, EMB400 Urupema, EMB710 Minuano, EMB721 Sertanejo, EMB810 Seneca.
Fonte: Embraer (2005).
2. AVIÕES MILITARES:
• Tucano: Avião de treinamento militar e líder de mercado, destaca-se pela sua
facilidade de pilotagem, baixo custo de manutenção e grande capacidade de
execução de manobras. Foram vendidas mais de 640 unidades em diversas
versões: Versão Básica; Versão Tucano França; Super Tucano
Fonte: Embraer (2005).
272
• ALX – Super Tucano: Avião militar turboélice de nova geração, desenvolvido
a partir da experiência adquirida com o Tucano, em duas versões –
Operacional e de Treinamento. Esta aeronave possui um cockpit semelhante
ao de uma caça, com avançada aviônica fornecida pela Elbit, de Israel
Fonte: Embraer (2005).
• AMX: Avião tático militar foi concebido e sendo fabricado por um consórcio
Aeritália, Aermacchi e Embraer. Foram fabricadas 35 unidades.
Fonte: Embraer (2005).
273
• SIVAM – (Sistema Integrado de Vigilância da Amazônia): desenvolvimento do ERJ-145 RS, versão de sensoriamento remoto baseado no jato regional ERJ-145SA AEW%C, aeronave de alerta aéreo antecipado. O programa de Cooperação Internacional para o Governo Brasileiro com a participação da Embraer visa à proteção e ao desenvolvimento sustentável da Região Amazônica, pretende garantir o controle ambiental, monitoramento da ocupação territorial, a vigilância da região e o controle do tráfego aéreo. Esta aeronave está equipada com um grande radar Ericsson Erieye e sistema de comando e controle.
ERJ 145 AEW&C
Fonte: Embraer (2005).
ERJ 145 RS
Fonte: Embraer (2005).
274
ANEXO 3
FOTO DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP.
275
CIDADE DE SÂO JOSÉ DOS CAMPOS
Fonte: http://www.sjc.sp.gov.br.
276
ANEXO 4
BAIRROS E FAVELAS DE SÃO JOSÉ DOS CAMPOS-SP.
277
TABELA – A População por bairros S.J.Campos -SP Região Pessoas residentes Bairros/Loteamentos
123 Vila São Paulo, Vila Abel 2.633 Jardim Bela Vista, Vila Mascarenhas
Ferraz, Vila Santa Helena, Vila Viaduto 7.700 Vila Santos, Vila Maria, Vila Nova São
José, Vila Tupi, Vila Guarani, Vila Terezinha, Vila Nova Guarani; Favela Vl. Guarani
6.322 Centro, Vila Paganini; Vila Santa Cruz II 1.009 Jardim Matarazzo, Vila Santa Luzia 1.124 Jardim Santos Dumont, Jardim Vale
Paraíso (parte) 718 Vila Santa Cruz I 0 Banhado
610 Vila Abel 719 Vila Nova Esperança 777 Conj. Res. Monte Castelo, Vila Lúcia
7.297 Monte Castelo, Jardim Frei Leopoldo, Vila Progresso; Vila Santa Cruz III
3.733 Vila Guarani; Vila Kennedy; Jardim Jussara; Residencial Martins Pereira; Jardim Corinthians
1.902 Vila São Pedro 2.088 Jardim São José - centro 1.562 Jardim Augusta 556 Jardim Oswaldo Cruz
3.763 Jardim Vale Paraíso (parte), Vila Piratininga, Jardim Topázio, Jardim Bandeirantes, Vila Cardoso, Vila Ipiranga
1.324 Jardim Paulista 1.956 Vila Nove de Julho, Vila Igualdade, Vila
Higienópolis, Vila Paulo Setubal 1.810 Vila Ady’Ana 3.532 Jardim São Dimas, Jardim Aparecida 761 Vila Sanches, Vila Rubi, Jardim Azevedo
1.795 Vila Betânia, Vila Zelfa 2.910 Jardim Maringá, Jardim Nossa Sª
Fátima, Jardim Margareth, Jardim Renata, Jardim Santa Madalena, Vila Luzia, Vila Guaianazes
4.075 Vila Icaraí, Vila Jaci
Centro
1.823 Chácara dos Eucaliptos, Serimbura - Bairro, Bairro dos Pinheiros, Residencial Esplanada do Sol
278
4.772 Jardim Esplanada, Jardim Esplanada II, Jardim Nova América, Jardim Nova Europa, Jardim Nova Anchieta, Vila Santa Rita, Conj. Hab. Vale dos Pinheiros
641 Jardim Apolo 2.361 Vila Ema 467 Jardim Apolo II 350 Residencial Vista Linda
5.111 Vila Industrial 8.938 Jardim Ismênia, Jardim Maracanã,
Jardim Olímpia; Rua Caparaó 8.514 Jardim Copacabana, Jardim Brasília,
Jardim Universo, Vila São Jorge, Vila Ester, Vila Tesouro, Chácara dos Eucaliptos
2.951 Jardim Valparaíba 4.252 Vila Tatetuba 1.515 Conj. Res. Parque das Américas 1.435 Conj. Hab. Intervale 972 Conj. Hab. Vila Tatetuba 719 Conj. Res. Planalto
2.460 Conj. Integração 905 Vila Nova Tatetuba 489 Martins Guimarães - Bairro, Fazenda
Pilão Arcado; Sol Nascente - Chácaras; Favela Renascer I; Favela Renascer II
2.147 Conj. Res. Jardim das Flores, Fazenda Taira (parte), Fazenda Honda (parte), Fazenda Takanashi (parte)
2.382 Eugênio de Melo, Jardim Ipê, Fazenda Nossa Sra. da Conceição (parte), Fazenda Vila Franca (parte), Fazenda Toninho Ferreira (parte)
1.214 Jardim Itapuã 10.659 Residencial Galo Branco
172 Fazenda Taira (parte), Fazenda Honda (parte), Fazenda Takanashi (parte), Fazenda Nossa Sra. da Conceição (parte), Fazenda Vila Franca (parte), Fazenda Toninho Ferreira (parte)
3.054 Jardim São Vicente 3.016 Jardim Nova Detroit
Leste
3.964 Jardim Pararangaba
279
3.413 Jardim Santa Inês II 3.169 Jardim Americano, Jardim Rodolfo,
Jardim Três José, Jardim Nova Florida; Águas da Prata - Chácaras
5.459 Campos de São José 715 Cajurú - Bairrom (parte), Jardim Mariana,
Jardim do Allah 1.327 Pousada do Vale - Chácara 661 Nova Detroit
1.135 Jardim Diamante 3.223 Jardim Motorama 9.403 Cidade Vista Verde, Condomínio
Floresta 779 Conj. Res. JK, Pq. Res. Villaggio
D'Antonini 5.577 Jardim Santa Inês I; S/ denominação,
Estrada do Capão Grosso (SJC 449), 1.921 Jardim São José - Leste, Jardim Santa
Inês III, Jardim São José - Oliveira Germano; S/ denominação, quadra do Jardim Coqueiro; Coqueiros - Condomínio dos
7.255 Jardim Castanheiras, Jardim Paraíso do Sol, Jardim Nova Michigan; Chácara Araújo
366 Cajurú - Bairro (parte), Residencial Dom Bosco; Chácaras Santa Helena
547 Mato Dentro - Bairro (parte); S/ denominação, Av. Tancredo Neves, lado do Jd. Cerejeiras; S/ denominação, Estr. do Mato Dentro, lado do Jd. Cerejeiras
12.130 Parque Novo Horizonte, Jardim Cerejeiras
1.926 Parque Nova Esperança 1.727 Capão Grosso - Bairro; S/ denominação,
Estrada do Capão Grosso (SJC 449); S/ denominação, Estrada da Piedade (SJC 250) n. 3.500; Morada do Fenix - Chácara; Bica d' Água - Chácaras; Castanheira II - Chácaras; Santa Maria - Chácaras; Capão Grosso I
3.533 Bom Retiro - Bairro (parte); Jardim Ebenezer - Condomínio; Benedito David; Portal do Céu - Chácara; Primavera II - Chácaras; Santa Lucia - Chácara;
280
Cambucá/Sitio Bom Retiro; Capão Grosso II; Sítio Bom Retiro; Majestic - Chácara; Santa Rita - Condomínio
5.076 Mato Dentro - Bairro, Bairrinho - Bairro, Nossa Sra do Bom Retiro - Bairro, Bom Retiro - Bairro (parte); Sítio Encantado / Mato Dentro; Vila Matilde; Santa Hermínia; Boa Esperança - Chácara; Primavera I - Chácaras; Fazenda Bom Retiro
1.220 Ressaca - Bairro; Santa Cecília I; Santa Cecília II (São José); S/ denominação, Estr. do Cajurú (SJC 120)
400 Serrote - Bairro; Recanto do Vale 1.177 Buquirinha - Bairro (parte); Condomínio
Walter Ferling 4.004 Vila Paiva, Jd. Boa Vista; Rua José
Bonifácio de Arantes, desmembramento Urbavale; S/ denominação, SP 50, em frente a Vila Paiva
1.455 Jardim Santa Matilde, Vila Cândida 2.287 Vila São Geraldo, Recanto Caetê 3.590 Jardim Maritéia, Vila Leonídia, Vila
Nossa Sª das Graças, Vila Veneziani, Alto da Ponte - Bairro; São Sebastião
4.611 Vila Santarém, Vila Sinhá, Jardim Guimarães, Vila Leila, Vila Monte Alegre; Vila Leila II; Favela Vl. Sinhá
1.122 Vila Unidos; Jd. Guimarães (remanescente); Chácaras das Oliveiras, Estr. do Bonsucesso
1.251 Vila Dirce 15.006 Jardim Altos de Santana, Jardim
Telespark 934 Vila Machado; Favela Vl. Machado
4.202 Vila Alexandrina (parte), Vila do Carmo, Vila Dona, Vila Esmeralda, Vila Simone; Vila do Pena
1.728 Santana - Bairro, Jardim Anchieta, Jardim Nova Paulicéia
Norte
3.782 Vila Cristina, Conj. Res. Nova Cristina, Jardim Jaci, Vila Rangel, Vila Chiquinha, Jardim Ouro Preto
281
793 Vila Pasto Alto 1.968 Vila Alexandrina (parte), Vila César 2.881 Vila Rossi, Vila Zizinha 653 Travessa Miguel Eras; Miguel Eras II 523 Vila Rhodia
1.037 São Francisco Xavier; Bairro dos Ferreiras; Rio do Peixe-Estrada p/ Joanópolis
127 Costinha - Bairro; Costinha - Chácaras do
1.366 Freitas - Bairro (parte); Recreio Boa Vista; José B. de Oliveira - Zeca Pinto; Vilage Alpino; S/ denominação, Estrada dos Freitas (SJC 335), Quarta Travessa; Bairro dos Freitas - Joaquim O. Silva
879 Buquirinha - Bairro (parte); Mirantes do Buquirinha
1.343 Freitas - Bairro (parte); Fazendão; Santa Luzia / Bairro dos Freitas; Cachoeirinha - Chácaras
275 Caete - Bairro, Vila Raquel, Jaguari - Bairro (parte); Altos do Caetê; Miranda - Chácaras; S/ denominação, Estr. Córrego Novo Destino (SJC 446)
1.340 Vargem Grande - Bairro (parte), Florindo - Bairro; Pedra D'água - Chácaras; Buquirinha I; Buquirinha II; Florindo - Chácara; Recanto do Buquirinha; Cachoeirinha - Chácaras
2.481 Vargem Grande - Bairro (parte), Fazenda Pingo D'Água, Fazenda Santa Rita; Águas do Canindú; Hawaí - Chácaras; Estr. do Sertãozinho, próximo a Pedra d’Agua 2 (SJC 149); S/ denominação, SP 050, ao lado da Vila Cândida
597 Vargem Grande - Bairro (parte), Fazenda Jataí; S/ denominação, Estrada Vargem Grande (SJC 020)
92 Jaguariuna - Bairro (parte) 11.798 Jardim das Indústrias; Favela Jd. das
Indústrias 1.971 Jardim Alvorada
Oeste
2.700 Jardim Por do Sol, Limoeiro - Bairro; S/ denominação, Rua da Palha (parte)
282
102 Limoeiro - Bairro (abaixo curva de nível 555); S/ denominação, Rua da Palha (parte)
2.413 Jardim Colinas 1.478 Jardim Aquarius, Bosque Imperial
47 Residencial Sunset Park 1.957 Parque Residencial Aquarius, Jardim
Altos do Esplanada, Jardim Cassiano Ricardo
2.715 Urbanova, Jaguariuna - Bairro (parte); Beira Rio
3.147 Vila São Benedito, Jardim Souto, Residencial Cambuí
8.675 Jardim da Granja, Parque Santa Rita, Chácaras São José
2.442 Jardim Uirá 2.877 Jardim Colorado, Parque Martim Cererê,
Residencial Flamboyant; Sítio Bom Jesus; Sitio Bom Jesus, ao lado do Jd. Uirá
834 Residencial São Francisco; Condomínio Augusto Magalhães
4.001 C.T.A. 544 Jardim Santa Luzia; Recanto dos
Eucaliptos - Chácara 561 Pernambucana de Cima - Bairro (parte),
Parque Santos Dumont 1.909 Jardim do Lago, Bairro do Putim 1.466 Jardim São Leopoldo 3.867 Jardim Santa Fé, Jardim Santo Onofre,
Vila Iracema, Vila Rica 3.976 Jardim São Judas Tadeu 1.222 Conj. Hab. Polícia Militar 1.146 Residencial Jatobá, Residencial Juritis 878 Conj. Res. Nosso Teto; Condomínio
Campo Floresta
Sudeste
1.216 Pernambucana de Cima - Bairro (parte), Parque Santos Dumont; Recanto dos Nobres - Chácara
Sul 7.141 Granja Itambi, Parque Interlagos, Pernambucana de Baixo - Bairro, Veraneio Torrão de Ouro; Jardim Mesquita; Condomínio Terrinha; Torrão de Ouro - Chácara; R. Pinheirinho; Continuação da R. Pinheirinho); Caramujo
283
16.425 Campo dos Alemães, Parque dos Ipês 7.333 Conj. Hab. Dom Pedro II 8.225 Conj. Hab. Dom Pedro I 4.135 Conj. Hab. Elmano F. Veloso 8.514 Jardim Colonial, Jardim Imperial 1.366 Capitingal - Bairro, Jardim República,
Jardim Nova República, Vila das Flôres 2.016 Jardim Cruzeiro do Sul
26.952 Bosque dos Eucaliptos 418 Quinta das Flores
1.231 Jardim Estoril, Jardim Madureira 2.442 Jardim Del Rey, Jardim Portugal 2.075 Residencial Primavera - Cj. Res. 602 Salinas
22.973 Jardim Satélite, Residencial Jardins; Rua Aleixo da Silva
635 Floradas de São José 2.117 Conj. Res. Cidade Jardim 833 Jardim Anhembi
3.067 Jardim América 2.283 Jardim Paraíso 1.392 Jardim Oriental 1.675 Jardim do Céu, Jardim Rosário 3.473 Jardim Oriente, Conj. Res. Sol Nascente 2.335 Jardim Terras do Sul, Jardim Sul,
Bosque dos Ipês, Residencial Gazzo 22.441 Cidade Morumbi, Conj. Res. Morumbi 5.268 Parque Residencial União, Jardim
Juliana 22.004 Parque Industrial, Conj. Res. Morada do
Sol, Conj. Res. Recanto Eucaliptos, Conj. Res. 31 de Março, Jardim das Azaléias, Jardim Petrópolis, Jardim Veneza, Parque Independência, Conj. Res. Recanto Pinheiros
3.167 Palmeiras de São José 3.952 Jardim Vale do Sol 2.787 Chácaras Reunidas 2.047 Rio Comprido 728 Praça Basiléia
4.511 Vila Nova Conceição, Jardim Aeroporto, Vila das Acácias, Vila Letônia, Vila Nair
3.035 Vila São Bento, Vila Luchetti; Jesus de Nazaré
316 Projeto Torrão de Ouro Fonte: Secretaria de Planejamento Urbano – (2003).
284
TABELA B – Quadro de 2000 e 2004Localização das Favelas de São José dos Campos – SP
Fonte: Secretária Municipal de Habitação e Obras (2000/2004).
Nº de Moradias Nº de Moradores º Favelas Região Endereço 2000 2004 2000 2004
1. Vila Santa Cruz I Centro I Av. Teotônio Vilela 254 279 1080 1188 2. Vila Santa Cruz II Centro I Av. Teotônio Vilela 78 85 322 354 3. Vila Santa Cruz III Centro I Av. Teotônio Vilela 84 92 341 375 4. Jd. Nova Esperança Centro I Av. São José (Banhado) 283 311 1302 1432 5. Jd. Das Indústrias Centro I Av. Corifeu de Azevedo Marques 56 61 235 258 6. Vila Abel Centro I Travessa Ozamã 29 31 128 140 7. Vila Guarani Centro II Ao lado da Vila Guarani 26 28 140 154 8. Caramujo Centro II Prox. Rod. Tamoios 11 12 68 74 9. Chácaras Reunidas Sul Rua Miracema 127 139 702 772 10. Recanto Verde Sul Av. Salinas 69 76 281 309 11. Rio Comprido Sul Avenida I 371 408 1661 1827 12. Antônio Aleixo Sul R. Antonio Aleixo da Silva 24 26 104 114 13. Praça Natal Sul Praça Natal 17 19 61 67 14. Vila Rhodia Norte Av. Pedro Rachid-Santana 117 129 541 595 15. Vila Sinhá Norte Av. Conde Francisco Matarazzo 48 53 220 242 16. Vila São Geraldo Norte Estrada Vargem Grande 50 55 250 275 17. Vila Machado Norte Av. Rui Barbosa (ao lado da ponte 17 19 75 82 18. Vila do Pena Norte Final da Av. Rui Barbosa 59 65 277 305 19. Jd. Nova Detroit Leste R. 15 Av. Marginal 123 135 503 553 20. Vila Nova Tatetuba Leste Av. Juscelino Kubsticheck 170 187 686 754 21. Jd. Olímpia Leste Rua Caparão 24 26 87 96 22. Vila Nova Renascer Leste Estr. Martins Guimarães 40 44 166 183
TOTAL 2077 2284 9230 10153
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