Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
Morfologia e sintaxe
Professora: Mônica Piza
Aluno: Rafael Andrade
Resumo do texto “Morfologia”
Ao analisarmos o poema Catar feijão, de João Cabral de Melo Neto, deparamo-
nos com uma característica morfológica interessante: a capacidade dos morfemas de se
encaixarem e se desencaixarem nas palavras1.
Para se analisar um morfema é necessário primeiro isolá-lo do vocábulo a que
pertence, uma vez que o morfema é a menor unidade dotada de significado, mas que
nem sempre uma palavra – que é a unidade significativa que o falante tem consciência,
ou seja, usa quando lê, escreve ou fala – é formada de um só morfema.
Assim, na estrutura do vocábulo existem determinados pontos de articulação que são os
locais exatos onde podemos separar as partes. É necessário, no entanto, esclarecer
alguns conceitos para que a técnica de decomposição do vocábulo seja executada
corretamente.
Além de uma unidade mínima gramatical, o morfema também é concebido como
uma unidade mínima significativa, que por sua vez se combina com outras unidades
para realizar outras possibilidades de significação. Dessa forma, nós temos uma
dualidade abstrato-concreta no morfema que é a noção de significante e significado. É
por causa dessa natureza dual que se fez necessário criar o conceito de morfe, que diz
respeito ao aspecto concreto (significante) do morfema (que é realizado através de sons
– fonemas).
Quando um morfema não se realiza em nenhum ponto do vocábulo – como, por
exemplo, nos nomes em singular, no português – nem por isso ele deixa de existir. Para
designar esse conjunto vazio foi necessário criar o conceito de morfema zero – em
oposição ao morfema –s, ocupado no plural.
1 As palavras do poema em questão são fluviante e flutual, que tiveram os seus sufixos trocados – flutuante e fluvial.
Outro procedimento de que as línguas podem se valer, fora da cadeia
sintagmática, é variação entonacional de intensidade e altura. No português, a variação
de intensidade tem valor gramatical e é o elemento diferenciador entre duas palavras –
por exemplo, as palavras fábrica e fabrica. Enquanto que à variação de altura cabe a
responsabilidade de diferenciar asserção e interrogação – exemplo, “Isto é uma
asserção.” e “Isto é uma asserção?”. Apesar de não ser um segmento entre outros, essas
variações possuem sim um significado gramatical, e sendo assim também constituem
um morfema – denominado morfema suprassegmental.
Nas ocasiões em que nos depararmos com formas verbais diferentes, mas que
carregam os mesmo valores de pessoa e de número, teremos uma amostra de alomorfia.
A alomorfia ocorre quando o morfe de um morfema muda devido à determinada
situação a que ele é submetido. Por exemplo, a flexão do verbo –des só ocorre após o
fonema /r/. Assim, a flexão de fazerdes (-des) é alomorfe de fazeis (-is) – pois
considerasse o morfe menos comum como sendo o alomorfe.
Tanto o vocábulo quanto a frase são constituídos de unidades articuladas – ou
seja, a cadeia sintagmática – que são o ponto de partida para a compreensão dos
morfemas da língua – ou seja, a sua distribuição e delimitação.
Dentro da cadeia sintagmática existem determinados pontos – que constituem
um paradigma – que ajudarão na depreensão do morfema. Para determinar que pontos
são esses utilizamos a técnica da comutação.
Na comutação, cada segmento do plano da expressão – significante – trocado
resulta em uma alteração no plano do conteúdo – significado. As diferentes unidades
que puderem ocupar o mesmo ponto na cadeia sintagmática pertencem, portanto, ao
mesmo paradigma.
A noção que devemos ter sempre em mente no momento da comutação é a de
procurar palavras que tenham algo igual e algo diferente. Dessa forma poderemos
segmentar, no caso de verbos e suas flexões, por exemplo, os morfemas que envolvem
modo e tempo, depois – ou seja, em outro ponto do vocábulo – os morfemas de número
e pessoa, e por fim os morfemas que implicam a troca de noção lexical – o radical da
palavra. Estes últimos – os morfemas lexicais – pertencem a um inventário aberto – pois
são constituídos de um número ilimitado de morfemas que pode ser sempre acrescido –,
enquanto os outros constituem um inventário fechado – pois fazem parte de um
paradigma restrito e estável.
Há situações em que um único morfema contém dois valores e a esses casos dá-
se o nome de cumulação. Por exemplo, o morfema –s, da forma verbal amas, contém
valores de pessoa e número, mas se trocarmos –s por –is, mudaremos apenas o valor de
número; se retirarmos –s teremos o mesmo número, mas outra pessoa.
Já no fenômeno da amálgama é possível, através da comutação de um dos dois
morfemas fundidos em um só, recuperar os dois morfes. Assim, em português, as
contrações de artigo com preposição configura um amálgama – na comutação de ao (a +
o) recupera-se “a ele” e “com o”.
O conceito de forma presa e forma livre, de Bloomfield (1933), é útil para
ampliarmos o nosso conhecimento do comportamento dos morfemas. Entende-se por
formas livres aquelas que constituem por si só um enunciado suficiente para a
comunicação, enquanto que as formas presas não. As formas livres mínimas
correspondem a um único vocábulo que será realmente uma forma livre apenas se seus
constituintes não o forem – exemplo, a palavra lealdade é uma forma livre, pois leal
pode até ser também, mas –dade não é; já a palavra beija-flor é uma forma presa, pois
ambos seus constituintes são formas livres.
Mattoso Câmara Jr. (1970, p. 60) ainda propõe o conceito de formas
dependentes, pois isoladas não constituem um enunciado (não são livres), mas também
são separáveis como vocábulo formais (não são presas) – os clíticos, dessa forma,
passam a ser considerados palavras.
Por fim, é interessante para a compreensão do comportamento dos morfemas,
analisar a sua relação com as palavras. Os lexemas, que dizem respeito ao radical da
palavra, podem ser tanto formas livres quanto presas. E os gramemas, como formas
gramaticais, podem ser endofóricos (se voltam para o elemento principal do sintagma a
que pertencem) ou exofóricos (estabelecem relação com um elemento externo ao
conjunto do sintagma central); e enquanto formas presas formam prefixos e sufixos, ou
ainda desinências.
Top Related