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FACULDADE DE DIREITO DE PRESIDENTE PRUDENTE
CARLOS ALBERTO TORO
ANTNIO CARLOS HORTNCIO COELHO
MIGUEL FRANCISCO DE OLIVEIRA FLRA
DA USUCAPIO EM TERRAS DEVOLUTAS
Presidente Prudente (SP)
1997
7
CARLOS ALBERTO TORO
ANTNIO CARLOS HORTNCIO COELHO
MIGUEL FRANCISCO DE OLIVEIRA FLRA
DA USUCAPIO EM TERRAS DEVOLUTAS
Monografia apresentada ao curso de Ps-graduao em
Direito Civil e Processual Civil da Faculdade de Direito de
Presidente Prudente, como requisito da disciplina de Di-
reito Civil, sob a orientao da professora Dra. Jussara
Suzi Assis Borges Nasser Ferreira.
Presidente Prudente (SP)
1997
8
COMISSO EXAMINADORA
Presidente Prudente, ____ de _________ de 199__
9
Agradecimentos,
Nossa gratido a todos aqueles que colaboraram,
de forma gentil e espontnea, para a realizao
deste trabalho.
10
S U M R I O
1 Resumo ............................................................................................. 6
2 Origem histrica da usucapio........................................................... 8
3 Conceito ............................................................................................ 10
4 Requisitos para a aquisio .............................................................. 11
5 Espcie de aquisio ........................................................................ 14
6 Das terras devolutas ......................................................................... 17
7 Da usucapio em terras devolutas .................................................... 19
8 Conceito de terras devolutas ............................................................ 23
9 A legitimao da posse perante a Lei n 601 de 1850 ...................... 25
10 Da usucapio .................................................................................... 26
11 Da prescritibilidade aquisitiva dos bens pblicos ............................. 34
12 Da prescrio da ao reivindicatria ............................................... 36
13 Concluso ......................................................................................... 38
Bibliografia ................................................................................................. 41
1 RESUMO
O objetivo deste trabalho estudar o usucapio em terras devolutas,
em razo das diversas demandas judiciais existentes na regio do Pontal do Parana-
panema, Estado de So Paulo.
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Naquela regio, que est dividida por permetros, conforme figura a
seguir, existe demandas em curso h mais de 50 (cinqenta) anos, onde a Fazenda
do Estado de So Paulo props aes discriminatrias, sendo que alguns permetros
j foram declarados como terras devolutas, outros foram considerados particulares e
outros tiveram as aes arquivadas sem que o Estado propusesse nova ao.
Diante desse quadro, o trabalho busca esclarecer os diversos aspectos
do usucapio nas terras devolutas, especialmente no Pontal do Paranapanema, no Es-
tado de So Paulo e naquelas reas em que o Estado no possui ao discriminatria.
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PONTAL DO PARANAPANEMA,
ESTADO DE SO PAULO. (situao jurdica das reas no Pontal do Paranapanema)
1
rea devoluta: 2O. PP, 3
O. PP,
4O. PP, 5
O. PP e 11
O. MP
rea devoluta legitimada (total ou parcial): 2.
O TP, 5.
O DR, 6.
O
DR, 7.O DR, 9.
O PAC, 3.
O PV,
4.O PV, 19.
O SA, 12.
O MP, 2.
O
TS e NANTES.
rea em discriminao: 16O.
PV, 14O. TS e 15
O. TS.
rea particulares: 20O. SA e
13O. MP
Discriminatria paralisada: 18O.
DR, 10O. PP, 22
O. SA, 12
O. PV
e 8O. PP
Desistncia da ao: 11O. PV e
1O. PP
1 Mapa do setor de Servio de Engenharia e Cadastro Imobilirio da Procuradoria do Estado de So Paulo.
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2 ORIGEM HISTRICA DA USUCAPIO
Em tempos remotos, mais precisamente, no direito romano, a usucapi-
o j era considerado como um modo aquisitivo do domnio. A prpria etimologia da
palavra indica tais fundamentos: capio significa tomar e usu quer dizer pelo uso, ou
seja tomar pelo uso.
A sua primeira manifestao caracterizava-se pela posse prolongada
durante o tempo exigido pela Lei das XII Tbuas, que exigia 02 (dois) anos para os i-
mveis e 01 (um) ano para os mveis e as mulheres, isto porque, o usus tambm foi
uma das formas do matrimnio na antiga Roma.
Mais tarde, o prazo para bens imveis prolongou-se para 10 (dez) anos
entre os presentes e 20 (vinte) anos entre os ausentes. Com o passar do tempo, no
direito quiritrio passou-se a exigir, alm do tempo, que a posse deveria estar apoiada
num justo ttulo e na boa f, mas no se podia aplicar o instituto aos imveis provinci-
ais, nem aos peregrinos, havendo posteriormente, necessidade de se defender a pos-
se desses indivduos, da o edito estabeleceu o processo praescriptio longi temporis.
Assim, a designao praescriptio longi temporis no passou de um
processo destinado a suprir uma lacuna do direito civil. Com Justiniano, naquela po-
ca, fundiram as regras da longi temporis praescriptio com as da usucapio, sendo que
estas preponderavam sobre aquelas, mesmo assim, a longi temporis praescriptio no
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deixou de exercer sua influncia, vez que o instituto legal da usucapio designava a
aquisio da propriedade desde que preenchido o lapso temporal exigido por lei.
No bastasse isso, o Imperador Teodsio inovou este instituto, quanto
a extensibilidade da prescrio, no mais como uma forma aquisitiva da propriedade,
mas como meio extintivo das aes, designando essa nova instituio como praescrip-
tio longissimi temporis.
A partir da, comeou a surgir no direito romano, sob o mesmo vocbu-
lo, duas instituies jurdicas: a primeira de carter geral destinada a extinguir todas as
aes e a segunda um modo de adquirir a propriedade.
Os juristas medievais, procuraram estabelecer uma teoria de conjunto,
estabelecendo a prescrio como sendo a maneira de adquirir e perder o direito de
propriedade de uma coisa ou de um direito pelo decurso do tempo. Teoria esta adota-
da pelo Cdigo Civil Francs, que exerceu influncia no direito contemporneo, embo-
ra haja legislaes e juristas que defendem o prisma daulista, considerando assim, a
prescrio como meio extintivo da ao e o meio de adquirir o domnio.
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3 CONCEITO
Usucapio um modo de adquirir a propriedade e de outros direitos
reais pela posse continuada, decorrido um certo lapso de tempo, com os requisitos es-
tabelecidos em lei.
A palavra usucapio, embora muitos consignam como palavra mascu-
lina, feminina, seguindo os juristas romanistas no Corpus Juris Civilis.
Trata-se a usucapio de um modo aquisitivo da propriedade a ttulo o-
riginrio, cujo fundamento reside na necessidade de tornar certa e estvel a proprieda-
de, e na utilidade de transformar uma situao de fato numa situao de direito, a favor
de quem mantm e exerce ininterruptamente, a gesto econmica da coisa, face a i-
nrcia do proprietrio.
Tendo por objetivo garantir a estabilidade e segurana da propriedade,
fixando um prazo alm do qual no se pode mais levantar dvidas ou contestaes a
respeito, conseqentemente sanando os vcios intrnsecos do ttulo, caso haja algum.
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4 REQUISITOS PARA AQUISIO
O nosso cdigo civil segue a tradio romanista, estabelecendo como
requisito essencial para sua obteno, o quanto segue:
A. Coisa hbil;
B. Posse tranqila;
C. Animus domini;
D. Boa f;
E. Lapso temporal.
Coisa habil tudo aquilo que pode ser objeto de comrcio ou de uma
relao de direito, ou seja coisa que esteja no comrcio, que seja suscetvel de aliena-
o.
A posse ad usucapionem ter que ser exercida com o animus domini,
ser mansa e pacfica, contnua e pblica, obedecendo o lapso temporal estabelecido
por lei.
Posse o poder fsico sobre uma coisa, poder de quem se encontra no
exerccio de fato ou exterior de direito sobre a coisa determinada. Considerando, as-
sim, possuidor todo aquele que tem de fato exerccio pleno ou no, de alguns dos po-
deres inerentes ao domnio ou propriedade, alm desta posse ser mansa e pacfica,
deve ser clara e justa, sem resqucios de violncia ou oposio.
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Animus domini trata-se de um requisito psquico que se integra a pos-
se, o possuidor deve ter o nimo de dono, inteno e vontade de ter a coisa como sua,
conduta ou atuao de modo a no deixar dvidas que detm a coisa como sua.
Boa f a crena que tem o adquirente de que o alienante era real-
mente proprietrio da coisa que lhe entregou, ignorando o vcio ou o obstculo que im-
pedem de aquisio do bem ou do direito possudo.
Justo ttulo o ato jurdico que legitima a tomada da posse, com a
permisso da lei, o titulo deve ser justo, segundo as formas de direito.
A boa f e o justo ttulo no se confundem. A boa f presume-se e o
justo ttulo prova-se.
Com o advento da Constituio Federal, promulgada em 05 de outubro
de 1988, instituiu-se o usucapio especial ou social, englobando os imveis urbanos e
rurais.
Nos imveis urbanos, para o tamanho de at 250 (duzentos e cinqen-
ta metros quadrados), utilizados como moradia do usucapiente ou seus familiares,
desde que no sejam proprietrios de outro imvel urbano ou rural. Nos imveis rurais,
o tamanho no pode ser superior a 50 (cinqenta) hectares, e deve tornar o imvel
produtivo, com o prprio trabalho ou de sua famlia. Alm de no possuir outro imvel
urbano ou rural.
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19
5 ESPCIE DE AQUISIO
A ao de usucapio compete ao possuidor que satisfaa os requisitos
legais para a aquisio de imveis de domnio particular ou servido predial. Sendo
que o ttulo hbil para a transcrio do registro no Cartrio de Registro de Imveis ser
a sentena.
O Cdigo Civil estabelece 02 (duas) modalidades de usucapio: extra-
ordinrio e o ordinrio.
Elenca o artigo 550 do Cdigo que:
Aquele que, por vinte anos sem interrupo, nem oposio, possuir como seu um imvel, adquirir-lhe- o domnio, independentemente de ttulo e boa-f que, em tal caso, se presume, podendo requerer ao juiz que assim o declare por sentena, a qual lhe servir de ttulo para a transcrio no registro de imveis.
Determinando assim os seguintes requisitos: posse mansa e pacfica;
ininterrupta; exercida como o animus domini; o decurso do prazo de 20 (vinte) anos in-
dependente de justo ttulo e boa-f; e sentena judicial declaratria da aquisio do
domnio por usucapio.
Assim, aquele que estiver na posse do imvel necessita provar somen-
te o tempo da posse, vez que na usucapio extraordinrio prescinde-se tanto de ttulo
como de boa-f, presume-se tais elementos jure et de jure, considerando o possuidor
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todo aquele que tem o efetivo exerccio, pleno ou no, de alguns dos poderes ineren-
tes ao domnio ou propriedade.
A usucapio ordinrio est disposto no caput do artigo 551 do Cdigo
Civil, ao dispor: Adquire tambm o domnio do imvel aquele que, por dez anos entre
presentes, ou quinze entre ausentes, o possuir como seu, contnua e incontestada-
mente, com justo ttulo e boa-f.
Devendo aqui, a posse ser mansa, pacfica e ininterrupta; exercida
com a inteno de dono; o decurso do prazo de 10 (dez) anos entre presentes e 15
(quinze) anos entre os ausentes; justo ttulo e depende de boa f do usucapiente; e por
fim, sentena judicial declaratria da aquisio do domnio por usucapio.
A usucapio especial repousa-se na Constituio Federal e divide-se
em duas subespcies: Urbano ou Pro Moradia e o Pro Labore.
Para atender aos reclamos de uma poltica urbana, a Constituio Fe-
deral em seu artigo 183, pargrafos 1 e 3, contempla a usucapio urbano. No funda-
mento de que o solo urbano no deve ficar sem aproveitamento adequado, desde que
preenchido certos requisitos: depende do tamanho do imvel, que tenha dimenso at
250 (duzentos e cinqenta metros quadrados); animus domini; destinado para sua mo-
radia ou de sua famlia; a posse ininterrupta durante 5 (cinco) anos; no ser propriet-
rio de nenhum imvel urbano ou rural; e h uma presuno juris et de jure de boa-f,
no se exigindo prova de justo ttulo.
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O artigo 191 da Carta Magna elenca a usucapio pro labore, aplica-se
a este caso os requisitos contidos no pargrafo anterior, acrescentando-se o item da
produtividade pr labore do proprietrio ou de sua famlia, a rea que se pretende usu-
capir no pode ser superior a 50 (cinqenta) hectares.
Pretendeu o constituinte, proteger o pequeno trabalhador rural, servin-
do de alerta aos grandes proprietrios que deixam abandonadas suas terras, visando
somente valorizao do imvel, em prejuzo de toda a coletividade.
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6 DAS TERRAS DEVOLUTAS
Em 1.500 todo o solo brasileiro pertencia Coroa Portuguesa, com in-
tuito de torn-las ao domnio particular, permitindo assim, sua explorao, foto este
manifestado com a concesso das Capitanias Hereditrias que fracassou, substituda
pela sesmarias, esta igualmente caiu ao fracasso, sem qualquer sucesso.
As sesmarias eram concedidas pela Coroa e pelos Capites-mor,
constitudo por grandes reas, dificilmente suscetveis de uma explorao pelo sesmei-
ros. Nesse passo, constantemente, haviam as ocupaes por terceiros, que faziam das
terras ocupadas sua habitao e explorao, embora, no tinham ttulo.
Em outra oportunidade, a Lei 601 de 1.850, veio por termo ao sistema
de sesmarias e disciplinar a questo de propriedade territorial ao Brasil, legitimando a
deteno de quem tivesse no solo brasileiro cultura efetiva e moradia habitual, ainda
que ttulo dominial no tivesse, devoluto seria tudo o mais, desde que no incorporado
ao patrimnio pblico ou privado.
Com efeito, o artigo 5 da referida lei legitimava as posses mansas e
pacficas, adquiridas por ocupao primria ou havidas do primeiro ocupante, desde
que se encontrassem cultivadas ou em princpio de cultura e morada habitual do res-
pectivo posseiro.
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Devido a tais requisitos, muitas terras das antigas sesmarias, incultas e
desabitadas foram devolvidas ao domnio da unio, para constiturem uma nova esp-
cie de bens dominiais, para serem aplicadas nas diversas finalidades de interesse so-
cial, pois o Estado ao discriminar terras devolutas, no pretendiam aumentar o acervo
pblico, mais para regularizar a situao dos posseiros que se encontravam nas terras.
Na poca da Repblica, o artigo 6 da Constituio de 1891 transferiu
para o domnio dos Estados, as terras devolutas de sua propriedade, excludas aque-
las de fronteiras etc., que remanesceram no acervo da Unio.
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7 DA USUCAPIO EM TERRAS DEVOLUTAS
Por ter sido descoberto e ocupado pelos portugueses, na poca ten-
deu-se a reproduzir no Brasil instituies como a sesmaria, cuja obteno da posse
pelo posseiro s seria possvel pelo aproveitamento da terra, pela moradia e finalmente
pela demarcao, os trs requisitos bsicos.
Contudo, referido procedimento gerou muitas dvidas dominiais, no
s pela dificuldade da verificao do preenchimento das condies estabelecidas, co-
mo tambm, pelo fato de localizarem em regies pioneiras, nas quais predominavam
as atividades extrativas.
No incio foram utilizados nesse processo todas as formas de abuso,
no qual prevalecia o imprio da posse, sem qualquer norma reguladora da aquisio
de terras, at que surgiu a primeira norma jurdica definindo o que eram terras devolu-
tas e disciplinando o processo da posse, sem contudo, eliminar certas dvidas regula-
dora da posse.
Com o Estatuto da Terra em 1964, veio enfatizar a funo social da
propriedade fundiria, criando instrumentos para melhor ao governamental. Ao longo
dos anos, veio-se confirmando a posse como geradora de um potencial de direitos,
concernente a terras devolutas, morada habitual e explorao agropecuria por um pe-
rodo, geraram as condies de regularizao pelas autoridades, como pela usucapio.
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Por outro lado, sustenta o Cdigo Civil que os bens pblicos, de qual-
quer natureza, no podem ser usucapidos. Com o advento da Constituio de 1.988,
em dois casos especiais tambm afirmou esta impossibilidade.
No primeiro caso, aplicado ao usucapio de pequenos imveis, o par-
grafo 3o.,do artigo 183, explicita que os imveis pblicos no sero adquiridos por usu-
capio; no artigo 191, ao tratar da usucapio pr-labore, ou seja do pequeno imvel
rural, tambm afirma que os bens pblicos no sero adquiridos por usucapio.
O caput do artigo 188 da Constituio Federal, abalou referida regra
ao afirmar que destinao das terras pblicas e das devolutas ser compatibilizada
com a poltica agrcola e com o plano nacional de reforma agrria.
Com isso, o Legislador Constituinte distinguiu as terras pblicas das
devolutas, determinando que sua destinao ser compatibilizada com sua poltica a-
grcola.
A poltica agrcola do Brasil foi sempre desde as capitanias heredit-
rias, a de privatizar as terras pblicas dominicais, para que as mesmas fossem ocupa-
das, colonizadas e cultivadas, a lei 601/1850 teve uma preocupao constante nesse
sentido.
Conforme o artigo 188 da Constituio Federal, distinguindo as terras
pblicas da terras devolutas, conduz idia de que o Legislador Constituinte criou uma
nova espcie de bens pblicos, ou seja as terras devolutas.
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A preocupao do Estado no de aumentar o seu patrimnio, e sim,
de regularizar a situao dos posseiros, que fizeram as terras produzir e onde fixaram
suas moradias. Levando-se, em considerao, que o povoamento e cultura do solo so
o primeiro elemento da prosperidade de uma Nao, as terras incultas so peso morto
ao errio pblico.
O Instituto de legitimao de posse, nada mais do que a transfern-
cia do domnio de terras devolutas verificadas pelo poder pblico, ao particular, com a
finalidade de atender o interesse social.
Assim, a usucapio uma forma de aquisio de propriedade que mui-
to se assemelha da legitimao de posse para o posseiro, pois em ambos, a lei per-
mite ao possuidor, que ocupava pacificamente a terra por perodo de tempo nela fixa-
do, a prerrogativa de ser dono, encontra-se a, o elemento tempo, permitindo que de-
terminada situao de fato, que sem ser molestada, se alongou por um intervalo de
tempo determinado em lei, se transforme em situao de direito.
As terras devolutas no esto vinculas a um fim pblico, permanecem
como sendo um estoque de terras ainda no transpassado aos particulares ou tendo
um dia estado em suas mos, devendo, portanto, estarem sujeitas ao usucapio, no
estando contido na expresso imveis pblicos. Ao passo que, a atual constituio
faz meno s terras pblicas, ficando claras que, se as terras devolutas fossem p-
blicas, no haveria necessidade sua referncia.
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28
8 CONCEITO DE TERRAS DEVOLUTAS
A lei n 601 de 18.09.1850, definiu em seu artigo 3, o que fosse terras
devolutas, seno vejamos:
Art. 3 So terras devolutas: Pargrafo 1 - As que no se acharem aplicadas a algum uso pblico nacional, provincial, ou municipal. Pargrafo 2 - As que no se acharem no domnio particular por qual-quer ttulo legtimo, nem forem havidas por sesmarias ou outras con-cesses do Governo Geral ou provincial, no incursas em comisso for falta de cumprimento das condies de medio, confirmao e cultu-ra. Pargrafo 3 - As que no se acharem dadas por sesmarias ou outras concesses do governo, que apesar de incursas em comisso, forem revalidadas por esta lei. Pargrafo 4 - As que no se acharem ocupadas com posses, apesar de no se fundarem em ttulo legal.
A Constituio Federal de 1988 em seu artigo 2, inciso II, elenca que:
Art. 2 - So bens da Unio: I- ... II- as terras devolutas indispensveis defesa das fronteiras, das forti-ficaes e construes militares, das vias federais de comunicao e preservao ambiental, definidas em lei.
Doutrina Messias Junqueire que:
Segundo a lei n 601, de 18 de setembro de 1850, pode-se formular a seguinte definio: Terras devolutas so as que no esto incorpora-das ao patrimnio pblico, como prprias, ou aplicadas ao uso pblico, nem constituem objeto de domnio ou de posse particular, manifestada esta em cultura efetiva e morada habitual.
2
2 Apud Stefanini, L. Lima, ob. Cit., pg. 63;
29
Segundo Clvis Bevilqua, enunciou como sendo devolutas as terras
desocupadas, sem dono.3
Em seu livro de Direito Agrrio e Reforma Agrria, Fernando Pereira Sodero doutrina que as terras dadas em sesmarias e posteriormente abandonadas pelo concessionrio, evidentemente que entrevam outra vez massa dos bens nacionais, pelo no cumprimento das exigncias legais. Eram as terras devolutas, devolvidas Coroa, devolvidas Nao (ob. Cit., pg. 226). E, mais adiante, cita o autor Gumercindo Bressa, declarando que este, definindo as terras devolutas, o fez pela negativa: So aquelas que se formam por processo de eliminao, isto , so um resto, so as que no acham no domnio particular; as que no foram concedidas por sesmarias; as que no se aplicam ao servio pblico; as que no esto ocupadas por posses anteriores data de uma lei geral ou especial e os antigos aldeamentos dos ndios.
4
3 Apud Stefanini, L. Lima, ob. Cit., pg. 63;
4 Apud Stefanini, L. Lima, ob. Cit., pg. 64;
30
9 A LEGITIMAO DA POSSE PERANTE A LEI N 601, DE 1850.
A legitimao da posse era um meio utilizado para a transladao do
patrimnio para o domnio particular. A maior dessas ocupaes se deram aps a ex-
tino do regime de concesses de sesmarias, fora um fenmeno natural e sobretu-
do incontrolvel.
No entanto, a maioria dessas ocupaes se deram nas reas tidas
como terra da marinha.
Diante as ocupaes, no era de bom alvitre que retomassem draco-
namente estas terras, assim nasceu a necessidade da legitimao.
A lei em seu artigo 5 reza: Sero legitimadas as posses mansas e
pacficas dos ocupantes de terras pblicas que nelas tenham cultura e moradia.... E
mais: no artigo 4 da mesma lei trata-se da revalidao dos ttulos de sesmarias.
Porm, para a legitimao desta posse era necessrio o preenchimen-
to de dois requisitos, quais sejam: o cultivo ou princpio de cultura e a moradia habitual
do posseiro (art. 5). Assim, preenchidos tais requisitos, passavam-se a demarcao,
concludos estes trabalhos topogrficos os posseiros eram obrigados a tirar os ttulos
dos terrenos que lhe ficaram pertencendo por efeito desta lei.
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10 DA USUCAPIO
Antes de analisarmos as duas fases distintas no que tange possibili-
dade ou no de usucapio em bens pblicos no Direito Civil Ptrio: aquisio anterior a
vigncia do Cdigo Civil e a posterior ao diploma legal; faz necessrio segundo a Lei n
4.504 de 1.964 estatuir o que sejam terras devolutas e as demais variantes das terras
pblicas, seno vejamos:
Terras Pblicas;
- Stricto Sensu {
Patrimoniais.
Terras Pblicas {
Uso Comum;
- Lato Sensu {
Devolutas.
Terras devolutas so espcies de terras pblicas lato sensu, e repre-sentam todas as terras, no integradas ao patrimnio particular, que se acham inapuradas juridicamente, indiscriminadas, inseparadas dentro do patrimnio pblico, no sendo, outrossim, formalmente arroladas entre os bens patrimoniais dos Estados, dos Municpios ou da Unio.
5
Desde tempos remotos, o problema que se discute tem sido o de saber
se os bens pblicos e, em especial, as terras devolutas so susceptveis de aquisio
por usucapio.
5 Apud Stefanini, L. Lima, A Propriedade no Direito Agrrio, Ed. RT, 1.978, pg. 143;
32
Quando do surgimento da primeira lei regulamentando e definindo as
terras devolutas, Lei 601/50, comearam a surgir discusses sobre a matria, apare-
cendo opinies divergentes e contraditrias.
Posteriormente, com o advento de novas leis sobre o assunto, foi com-
plicando ainda mais, dando nascimento as grandes questes doutrinrias e jurispru-
dnciais e, que se persiste at os dias de hoje, apesar da vastssima legislao sobre
o assunto.
At a promulgao da primeira lei, nenhuma dvida existia ou tenha
chegado a existir quanto admisso da prescritibilidade dos bens pblicos patrimoni-
ais anteriormente a lei de 1850, haja visto o artigo 1 da referida lei deu nfase a ques-
to da prescritibilidade ou no das terras devolutas, a saber:
Ficam proibidas as aquisies de terras devolutas por outro ttulo que no seja o de compra. Excetuam-se as terras situadas nos limites do Imprio com pases estrangeiros em uma zona de dez lguas, as quais podero ser concedidas gratuitamente.
Contudo, a mesma lei em seus artigos 4 e 5, veio a reconhecer o
princpio da prescritibilidade das terras devolutas, ao declarar:
Art. 4 - So revalidadas as sesmarias, ou outras concesses do Go-verno Geral ou Provincial, que se acharem cultivadas, ou com princ-pios de cultura, e morada habitual do respectivo sesmeiro, embora no tenha sido cumprida qualquer das condies, com que foram concedi-das. Art. 5 - Sero legitimadas as posses mansas e pacficas adquiridas por ocupao primria, ou havidos do primeiro ocupante, que se acha-
33
rem cultivadas ou com princpio de cultura, e morada habitual do res-pectivo posseiro ou de quem o represente etc..
A par disso, no se poder negar a aquisio das terras pela usucapi-
o. E de salientar-se que esse usucapio se consumava at o prazo curtssimo de cin-
co ou dez anos.
No art. 8 da mesma lei v-se que o domnio da terra era adquirido pelo
posseiro, independentemente de legitimao de posse, assim rezava:
Os possuidores que deixarem de proceder medio no prazo mar-cado pelo Governo sero reputados cados em comisso, e perdero por isso o direito que tenham a serem preenchidos das terras concedi-das por seus ttulos, ou por fora da presente lei, conservando somen-te para serem mantidos na posse de terras que ocuparem com efetiva cultura, havendo por devoluto o que se achar inculto.
ainda de salientar-se que, no h qualquer contradio nos artigos
4, 5 e 8 acima citados, com o artigo 1 da mesma lei, porque referido artigo quis a-
penas impedir que se fizessem doaes de terras como na legislao anterior, quando
predominava o sistema de concesses de sesmarias, pondo um paradeiro as conces-
ses gratuitas de terras, dizendo que o Estado somente poderia vend-las e nunca do-
-las, como se fazia anteriormente.
O eminente Clvis Bevilacqua com preciso enunciou sobre o assunto:
Alguns contestaram a possibilidade de se usucapiarem essas terras, desde a Lei n 601 de 18 de setembro de 1850, cujo Art. 1 - prescre-via - Ficam proibidas as aquisies de terras devolutas por outro ttulo que no seja o de compra, mas esse preceito tinha por fim vedar o Govrno de fazer concesses gratuitas, exceto nas fronteiras como em
34
seguida o mesmo artigo declarava, e no impedir que pudesse ser ob-jeto de usucapio (Solues Prticas de Direito, 1930, III, pg. 107, Apud Assis Moura, terras devolutas, pg. 71).
6
Clvis Bevilacqua em parecer que se acha publicado na Revista dos
Tribunais, vol. 79, sustenta que:
No pretendeu (a lei 601) com ste ultimo dispositivo seno prescre-ver as concesses gratuitas de terras pelo Poder Pblico, exceto nas fronteiras com pases estrangeiros (cit. Art. 1, 2 alnea). Para a defe-sa das terras devolutas estabeleceu o legislador as providncias de despejo, quando invadidas, perda de benfeitorias, priso e multa (art. 2). Estes meios de defesa, porm, se no empregados, no poderiam impedir as instalaes possessrias. E o direito anterior admitia o usu-capio de terras pblicas, tranqilamente possudas por mais de 40 anos. (Apud. Assis Moura, Op. Cit. pg. 71).
7
LAFAYETE sustenta que esto fora do comrcio e no se adquire por
prescrio:
As coisas do domnio pblico, como os lagos, rios navegveis, as ru-as, praas e estradas pblicas, os ptios e baldios dos municpios e parquias; as que so diretamente empregadas pelo Estado em servi-o de utilidade geral, como as fortalezas e as praas de guerra. No entram nesta classe e podem ser prescritas as coisas do domnio do Estado, isto , aquelas acrca das quais o Estado considerado como simples proprietrio: tais como as terras devolutas, as ilhas for-madas nos mares territoriais, os bens em que sucede na falta de her-deiros legais do defunto. (Direito das Coisas, pargrafo 62, n II).
8
Como se v, as terras devolutas no regime das ordenaes sempre foi
reconhecida e admitida a usucapio, haja visto no ser as terras devolutas inalien-
veis, pois a Lei 601 autorizava que fossem elas vendidas, sendo que a nica exigncia
era a posse por mais de 40 anos.
6 Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
35
Com a vigncia do Cdigo Civil foi que surgiram as grandes discusses
sobre o assunto, tendo em vista o grande nmero de doutrinadores vieram afirmar que
o novo diploma legal abolira a usucapio dos bens pblicos qualquer que fosse a sua
natureza.
A, surgiram duas correntes que divisam-se claramente entre os que
sustenta a tese da imprescritibilidade dos bens pblicos patrimoniais perante o cdigo
civil e os que sustentam a prescrio dos bens pblicos.
A primeira corrente estriba-se na alegao de que, sendo os bens p-
blicos inalienveis, por fora da disposio contida no artigo 67 do Cdigo Civil, no
podem ser adquiridos por usucapio e a segunda corrente reconhecendo a falta de
apoio legal na falada inalienabilidade dos bens pblicos patrimoniais, erige no funda-
mento da negativa do interesse de ordem pblico que deve gravar os bens do Estado.
Dentre os seguidores da primeira corrente situa-se o insigne Clovis Be-
vilacqua, que em seus comentrios ao artigo 67 do Cdigo Civil escreveu:
Os bens pblicos, em face do que prescreve o Art. 67, so isentos de usucapio, porque no podem sair do patrimnio da pessoa jurdica de direito pblico, seno pela forma que a lei prescreve e o usucapio pressupe um bem capaz de ser, livremente, alienado. (Cd. Civil Comentado, Vol. 1)
9.
7 Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
8 Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
9 Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
36
Para contestar opinio contrria de SPENCER VAMPR, arremata o
ilustre Clvis Bevilacqua:
Tenho por irrecusvel, no obstante o que alega o egrgio professor, que, em face deste dispositivo, no sendo o usucapio forma prescrita em lei, para alienao dos bens pblicos, no sendo sse um caso es-pecialmente previsto para a perda da inalienabilidade dos bens pbli-cos, esto les isentos de usucapio. Poder no ser a melhor doutri-na, mas da lei.
10
A tese esposada por Clvis Bevilacqua quanto a inalienabilidade dos
bens pblicos, fora contrariado por AZEVEDO MARQUES, quando abordou o assunto:
No h texto algum em nosso direito dizendo que os bens pblicos so absolutamente inalienveis. Ao contrrio, o Art. 67 do Cdigo Civil foi escrito para dizer que les so alienveis, nos casos de formas que as leis ordinrias prescrevem. No h na Constituio qualquer princ-pio criador da inalienabilidade dos bens pblicos. O Cdigo diz: Art. 67 - Os bens de que trata o artigo antecedente s perdero a inalienabili-dade que lhes peculiar, nos casos e forma que a lei prescrever. Ora, isso exprime, a no deixar dvidas, que quando as lei ordinrias julgarem conveniente podero alienar quaisquer dos bens pblicos, os quais, portanto, so alienveis. Por outra: A nao, exercendo sua so-berania (autoridade irresistvel que, dentro de seu territrio pode tudo), alienar quando quiser os bens pblicos. A inalienabilidade peculiar, de que fala o Art. 67, relativa e transitria, significa somente que os po-deres administrativos da coletividade no podem, por si ss, deliberar e consumar alienaes; dependem de lei permissiva, tal como os tutores, curadores e representantes legais, que no podem alienar bens dos representados sem licena judicial. (Revista dos Tribunais, Vol. 162, pgs. 23 e seguintes).
11
E mais: estudando o significado da palavra peculiar inserida no artigo
67 do Cdigo Civil, diz:
10
Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964; 11
Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
37
Peculiar no significa: imutvel, irrevogvel; exprime uma qualidade, como diz Planiel, no atinge coisa como pessoa do proprietrio; uma proibio a ste mais do que uma qualidade da coisa. Note-se, a inalienabilidade s peculiar, isto , prpria dos bens de uso comum, pois so os nicos naturalmente fora do comrcio. FORA DO COMRCIO expresso legal do Art. 69 do Cdigo Civil, a qual deve ser bem compreendida para evitar erros. Fora do comrcio significa - 1 - as coisas que no podem, por sua na-tureza, ser objeto da propriedade privada, isto , que no podem nor-malmente circular por transmisses arbitrrias e individuais, e so: as de uso inexaurvel como o ar, a luz e o mar alto; 2 - as coisas pblicas de uso comum do povo, como bem especifica Bevilacqua, sem incluir as de uso especial nem as dominicais (Obs. ao Art. 69, na 2 ed.) e 3 - as coisas legalmente inalienveis, isto , as que em virtude de lei ex-pressa no podem normal e livremente, mudar de dono, como: os bens clausulados (Arts. 1.677 e 1.723). Dizemos normal e livremente por-que a inalienabilidade dos bens fora do comrcio no absoluta, irre-dutvel, como s vezes tem-se dito entre ns; podem ser alienados mediante cautelas estabelecidas nas leis, qual se pratica nas sub-rogaes, permutas etc. Diz HAURIOU, Dir. Adm. pg. 664: - A Linverse, les dependences du domaine public redeviennent instanta-neamente alienables et prescriptibles du jour de la desaffectation; leur mise hors du commerce de la vie priv dure, donc, juste autant que leur autant affectation. (Rev. dos Tribunais, Vol. 62, pgs. 23 e seguin-tes).
12
Dentre os vrios seguidores de ambas correntes, para elucidar com
sua autoridade CARVALHO SANTOS, em comentrio ao artigo 67 do Cdigo Civil, es-
crevendo sobre Os bens pblicos e a prescrio aquisitiva diz:
O usucapio um modo de aquisio, regulado pela teoria da posse e da propriedade; no tem base na alienabilidade e no h razo para tornar uma e outra coisa basicamente correlatadas (Rev. dos Tribunais, Vol. 24 pg. 385). preciso no esquecer, por outro lado, que o Estado no pode ser pri-vilegiado no tratamento, no que diz respeito s questes patrimoniais, para que se fechassem olhos sua negligncia, sua renncia, ou ao seu descaso, que, afinal de contas, uma das causas do usucapio, mxime se tiver em vista que o Estado leva at vantagem sbre os par-ticulares em tudo que respeita aos meios mais eficientes de defesa e preveno de que pode dispor.
12
Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
38
Entendemos, por isso, que os bens pblicos patrimoniais - e os bens pblicos de uso especial esto sujeitos prescrio aquisitiva. Quanto
a stes ltimos, fcil justificar a razo: porque se tais bens j es-
to na posse de um terceiro h mais de trinta anos, claro est que j no esto les servindo ao uso especial, mas, sim, so meros bens pblicos patrimoniais. Exemplo: uma casa destinada para es-cola ou cadeia. Se outrem nela est residindo h mais de trinta anos, evidente se torna que j no est em casa servindo ao uso especial de servir de escola ou cadeia. Passou a ser, desde ento, um prdio de propriedade do Estado, como qualquer outro bem de seu patrimnio, que no tenha destinao especial. (grifo nosso)
E mais:
Claro est, portanto, que somente no esto sujeitos prescrio a-quisitiva os bens pblicos de uso comum do povo. Afirmando isso, po-rm, ns o fazemos no porque sejam inalienveis tais bens, mas por-que o uso comum do povo exclui a possibilidade de uma posse capaz de gerar usucapio. (Cd. Civ. Bras. Interp., Vol. II, pg. 147/149).
13
Assim, todo e aquele que provar ter posse superior a 30 anos, sobre
terras devolutas at 1933, pode obter o domnio por meio de ao de usucapio, aten-
dendo-se, unicamente, aos requisitos estatudos no art. 550 do Cdigo Civil.
13
Apud Junqueira, Messias, As Terras Devolutas na Reforma Agrria, Ed. RT, 1.964;
39
11 DA PRESCRITIBILIDADE AQUISITIVA DOS BENS PBLICOS
Quanto a prescrio aquisitiva dos bens pblicos, podemos partir do
disposto no artigo 67 do Cdigo Civil Brasileiro, relacionado ao artigo 66 do mesmo es-
tatuto, que trata dos bens pblicos, que diz.
Art. 67 - Os bens de que trata o artigo antecedente s perdero a ina-lienabilidade, que lhes peculiar, nos casos e forma que a lei prescre-ver.
O artigo citado, fala respeito de alienao por mtuo consenso, ou
melhor, da altenao feita pela vontade do proprietrio. No instituto da prescrio, a
perda do domnio se efetua independente ou contra essa vontade. Inmeros tratadis-
tas nos ensinaram que certos bens, apesar de inalienveis, so prescritveis.
Mas, o importante em tais casos saber se tais bens podem ou no
ser apossados individualmente. Se o forem, estaro passveis a prescrio. Obviamen-
te no se concorda com prescrio de bens de uso comum do povo, quais sejam: ruas,
praas, parques infantis, estradas, etc., ou ainda queles de uso especial, edifcios p-
blicos, estabelecimentos, sejam federais, estaduais ou municipais, mas os que se situ-
am e so nominados no inciso III, do artigo 66, do Cdigo Civil Brasileiro, no so im-
pedidos de que sejam apossados por particulares e, conseqentemente, estes adqui-
ram a prescrio aquisitiva por usucapio.
40
No h como confundir alienao, que requer um ato voluntrio, por
parte do senhor, com a perda do imvel que se d contra a vontade do dono. Bens p-
blicos que no podem ser alienados, esto, entretanto, sujeitos prescrio.
O princpio da Imprescritibilidade deriva do princpio da Inalienabilida-
de. Desde que se torna o domnio do Estado alienvel, fica prescritvel em certas con-
dies e sob certas modificaes. Assim, desde que se torne alienveis, em virtude de
lei, que nos termos do artigo 67, autorize a sua alienao, perdem obviamente, a sua
inalienabilidade ficando susceptveis de usucapio.
O objetivo do artigo 67, impedir que o Poder Executivo, por s s,
possa alienar os bens pblicos, da exigir a interveno do legislativo em cada caso
concreto. Ora, as terras devolutas sempre foram alienveis; sucessivas leis de terras
autorizam o Executivo a alien-las.
Por outro lado, o Estado no possui privilgio no que diz respeito s
questes patrimoniais, assim, entende-se por isso, que os bens pblicos, de uso espe-
cial esto sujeitos prescrio aquisitiva. Quanto a esses ltimos, fcil justificar a ra-
zo; porque se tais bens j esto na posse de um terceiro a mais de trinta anos, claro
est que j no esto eles servindo a um uso especial, mas sim, so meros bens pa-
trimoniais.
41
12 DA PRESCRIO DA AO REIVINDICATRIA
No tocante ao direito do Estado de reivindicar as terras devolutas, atra-
vs de ao prpria, necessrio analisar a questo da prescrio.
Prescrio (neste caso extintiva), no conceito geral a perda da ao
atribuda a um direito, que fica juridicamente desprotegido, em consequncia do no
uso dele durante um determinado tempo. Especificamente, em especial no conceito de
Clovis Bevilqua a perda das aes atribuda a um direito e de toda a sua capacida-
de defensiva em consequncia do no uso deles, durante o espao determinado tem-
po, fixado na lei.14
Diante de tal conceito podemos concluir que o direito do Estado de
possuir as terras devolutas no prescreve, no entanto o seu direito de ao prescrit-
vel. No sendo exercido por longo tempo a busca do direito com a tutela jurisdicional, o
titular se conforma com a situao de fato decorrente, e o ordenamento jurdico, ansio-
so por estabelecer condies de segurana e harmonia na vida social, permite que tal
situao se perpetue, aplicando-se o adgio latino dormientibus non succurrit jus, in-
clusive para o Estado.
No caso especifico das terras devolutas, se o Estado no exerce o seu
direito de reivindicar o que lhe pertence, deixando passar lapso de tempo inerte, o or-
denamento jurdico confere quele que detm a posse o direito de usucapio, em es-
42
pecial naquelas terras que no tem uso comum ou do povo, posto que h o interesse
social em no permitir que as pendncias fiquem sempre em aberto, e a incerteza rei-
ne em todos os campos, contra todos os ocupantes da terra declarada devoluta.
O artigo 177 do Cdigo Civil determina que: As aes pessoais pres-
crevem ordinariamente em vinte anos, as reais em dez entre presentes e, entre ausen-
tes, em quinze, contados da data em poderiam ter sido propostos.
Nesta citao verifica-se que a lei no faz nenhuma restrio quanto
aos bens pblicos e particulares, de sorte que a prescrio extintiva abrange e ameaa
tanto aes que protegem direitos reais, como as que protegem direitos pessoais.
14
Bevilqua, Clvis, Comentrios ao Cdigo Civil, obs.1 ao art. 161
43
13 CONCLUSO
Diante da evoluo histrica da legislao brasileira e com as normas
em vigor, podemos concluir que o atual ciclo de demandas nas terras consideradas
devolutas, mas com destinao ao uso particular, o Estado no tem amparo legal para
revindic-las, em especial para fazer o assentamento para o fim de reforma agrria.
Os Estados em suas leis sempre admitiram que os particulares entras-
sem na posse de suas terras. Tanto verdade, que os Estados arrecadavam dos pos-
seiros um tributo especial pela ocupao e mais: desde os primrdios do direito brasi-
leiro, as terras devolutas foram alienveis e a Lei 601 de 1850 estatua normas para a
venda de referidas terras.
O Cdigo reconhece trs tipos de bens pblicos, os de uso comum do
povo, os de uso especial e os dominicais. Assim, quanto as duas primeiras classes de
bens, nenhuma dvida paira estejam fora do comrcio. No que se refere aos bens pa-
trimoniais, igualmente, dvida no h, de que no so absolutamente inalienveis, vez
que o prprio cdigo prev as hipteses de sua alienao, entregando o problema
soluo de leis permissivas.
Referidos bens foram sempre alienveis, a Lei 601 de 1.850 estipulou
os casos de alienao dessas terras. A unio sempre obedeceu essa lei e, quando as
terras passaram a integrar o patrimnio dos Estados Membros, por fora da disposio
contida no artigo 64 da Constituio de 1.891 passaram a alienar, primeiramente, se-
44
guindo os ditames da Lei 601 e, posteriormente, cada Estado se guiando por sua pr-
pria legislao.
A verdade uma s, sempre em todas s pocas, as terras devolutas
foram alienveis, no podendo assim, estar sujeitas s proibies do artigo 67 do C-
digo Civil.
Portanto, no estando as terras devolutas fora do comrcio, porque
so legalmente alienveis, de se ver que sobre elas podem exercer atos possess-
rios.
Por outro lado, com a promulgao da Constituio Federal de 1.988
em seu artigo 188, passou admitir, indiretamente, a usucapio de terras devolutas.
Neste enfoque, o possuidor que est na terra pode adquirir a proprie-
dade pela usucapio, especialmente das terras devolutas que no so de uso pblico
e sim de uso particular.
No caso especfico das terras do Pontal do Paranapanema, no Estado
de So Paulo, desde a Constituio de 1988, as reas encontram-se suscetveis de
usucapio, posto que seus possuidores exploram as mesmas h mais de cinqenta
anos.
Para caracterizar este fato, est inclusive o desenvolvimento do pro-
cesso de assentamento dos trabalhadores rurais sem-terra, onde o Estado vem pro-
45
pondo aes reivindicatrias, indenizando as benfeitorias para os autuais possuidores,
e em seguida alienando aos trabalhadores sem-terra, excluindo os que vem explo-
rando as reas h mais de cinqenta anos. O recente Decreto Estadual n 42.041, de
1o. de agosto de 1997, o Estado de So Paulo busca a regularizao das reas, carac-
terizando, ainda mais a possibilidade de alienao das terras devolutas que no so de
uso do povo.
Ora, se as terras so de uso particular, as mesmas so suscetveis do
usucapio, e veja que no caso especfico do Estado de So Paulo, a rea no est
sendo utilizada para a finalidade do uso comum do povo, mas para o assentamento
para o fim da reforma agrria, onde a propriedade dividida e esta rea menor passa
a ser de uma nica pessoa e no de uso comum.
De outra banda, o Estado suscetvel da aplicao da prescrio para
propor ao, seja discriminatria ou reivindicatria, posto que este seu direito est
prescrito, em razo da posse existente h mais de cinqenta anos.
46
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48
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pblico, jurisprudncia. Braslia: Ministrio Extraordinrio para Assuntos Fundirios, 1983.
Trabalho de concluso do MBA Direito Empresarial FGV/TRECSON
Grupo:
Marco Antonio de Almeida Prado Gazzetti
Miguel de Oliveira Flora
Valmir da Silva Pinto
Tema: A interveno estatal com afastamento do pacta sunt servanda atravs do estudo de ca-
so. Contratos bancrios. Contratos rurais.
Agradecimentos: Mister se faz registrar nossa fraternal gratido pelos colegas da Gazzetti e Pinto
Advogados Associados (advogados e estagirios) e ao amigo Francisco Coutinho Bandeira de
Almeida Prado, seguramente uma das maiores autoridades em crdito rural.
INTRODUO
O presente trabalho visa abordar a idia do Estado intervencionista, sob o prisma da interveno
econmica e do afastamento do que chamamos do imprio do pacta sunt servanda. Temos que
o Estado contemporneo assume um novo papel, devendo ser um verdadeiro gestor das ativida-
des econmicas desenvolvidas no pas, alm de suas funes tradicionais. Neste panorama, as
atividades econmicas devem ento encontrar ambiente prprio e factvel para o seu regular de-
senvolvimento. Tal abordagem ser apresentada via o estudo de um caso concreto. Sobre este
caso concreto, procuraremos ter tambm uma viso jurisprudencial, favorvel e contrria ao
nosso entendimento.
Na anlise do caso, tentaremos demonstrar o alto grau de interveno econmica do Estado, e
para tal teremos como foco o crdito rural. Mais especificamente em relao ao que at ento era
considerada rea livre e exclusiva do direito privado, ou seja, num contrato Bancrio assinado
livremente por dois entes de direito privado. Trata-se de um contrato entre um produtor rural,
atividade essencial para a economia do pas e o Banco do Brasil S/A, principal agente financeiro
financiador da referida atividade. Para uma correta visualizao da questo econmica, utiliza-
49
mos a demonstrao financeira do impacto positivo que a interveno estatal gerou com a impo-
sio da modificao nas bases do contrato. Para tal desiderato, apresentamos os valores devidos
pelo produtor com base no contrato originalmente pactuado e os valores apurados com a aplica-
o das novas normas incidentes ao referido pacto. Ver-se- ento, que as alteraes de valores
so de grandes magnitudes.
Vemos no presente caso que praticamente todas as bases do referido contrato (Cdula de Crdito
Rural) foram alteradas por fora de ato do Banco Central, ao depois ratificado por lei ordinria.
Entenda-se aqui como modificao do pacto a alterao de: data de vencimento dos dbitos; in-
dexador; juros; saldo devedor e at mesmo das garantias anteriormente ofertadas, entre outras
que sero explicitadas abaixo.
A controvrsia surgida foi em torno da obrigatoriedade ou no da instituio financeira em acei-
tar esta ampla e total modificao no pacto firmado com o produtor rural.
Gerado o conflito entre o muturio e mutuante, este foi objeto de anlise por parte do poder judi-
cirio, culminando em deciso da questo atravs do STJ que acabou por entender pela obrigato-
riedade da instituio financeira em sujeitar-se referida interveno do estado. Decidiu-se in-
clusive no sentido de que tal normativo teria carter de norma de ordem pblica, que mesmo
que aditada posteriormente ao pacto, o afastou quase que por completo o princpio do
pacta sunt servanda. Este afastamento denominado no caso concreto como o direito securiti-
zao.
Como resultado desta interveno, tivemos a repactuao do dbito com bases totalmente altera-
das. Diga-se, para o Setor Sulcroalcooleiro brasileiro foi a nica maneira dos produtores de cana,
acar e lcool retomarem suas atividades mantendo uma condio de adimplemento de seus d-
bitos. claro que tal atividade mais restrita ao Estado de So Paulo (onde se encontram a gran-
de maioria destas unidades) e algumas outras poucas unidades em outros Estados. Todavia, o
impacto na economia brasileira visvel e direto.
DA FUNO SOCIAL DOS CONTRATOS E DO INTERVENCIONISMO ESTATAL
No h dvidas de que com a edio do novo cdigo civil, o imprio do pacta sunt servanda,
sofre um ltimo e definitivo golpe no que se refere ao direito brasileiro positivado. Evidentemen-
te no estamos mais diante de um Estado Liberal, da supremacia da liberdade e igualdade.
Como sabemos, o direito vem a reboque dos fatos. tranqilo nos dias atuais afirmarmos que
para chegarmos chamada funo social do contrato, percorremos um caminho e um caminho
histrico/econmico.
Se observarmos uma diviso histrica e econmica em confronto com a evoluo do direito, ve-
remos claramente que no somente o contrato, mas sim todo o direito, tem um impulso eco-
nmico para as suas evolues e transformaes (as ideologias que influenciam a interpretao e
aplicao do direito e conseqentemente do contrato, se formam no tempo, conforme as diferen-
tes fases econmico/sociais).
50
Neste contexto podemos afirmar que o contrato teve e tem sim uma evoluo histrica em muito
decorrente das diversas situaes econmicas e sociais vividas pelo homem.
No que tange uma viso e diviso histrica, oportuna a lio do mestre Waldirio Bulgarelli (Di-
reito Comercial Waldrio Bulgarelli Editora Atlas 13 Edio, 1.998). Na diviso abaixo
(que na obra citada busca a demonstrao da evoluo do direito empresarial) podemos perceber
claramente o referido impulso econmico social para a conformao atual do contrato, seno se-
jamos:
O perodo do corporativismo - Sculo XII ao XVI;
O perodo do mercantilismo Sculo XVII ao XVIII;
O perodo do liberalismo Sculo XIX e
O perodo do intervencionismo estatal, a partir da guerra de 1.914-1918.
Numa viso prtica sobre o assunto, iremos nos ater mais passagem do perodo do liberalismo
para o perodo do intervencionismo estatal e suas respectivas implicaes sobre o direito ptrio,
mais especificamente sobre o contrato.
Sabemos que o tanto o Cdigo Comercial Brasileiro de 1850, como o cdigo civil de 1.916, fo-
ram edificados em bases do liberalismo, com predominncia liberdade de contratar, portanto,
ao imprio do pacta sunt servanda. Veremos ento que a edio do novo cdigo civil brasileiro
mesmo um marco para uma viso mais clara da chamada funo social do contrato.
indubitvel que o direito e sua interpretao so dinmicos. Igualmente inevitvel que o di-
reito e sua interpretao decorrem dos interesses e valores morais e sociais de determinada poca.
Assim, partindo da idia de que o contrato tornou-se instrumento fundamental para a ideologia
surgida com o apogeu da Burguesia, na idia de afastamento da interveno do estado e do con-
ceito de liberdade e igualdade (e teoria da vontade), temos que o contrato e suas mutaes decor-
rem de um fato econmico e social. Todavia, sabe-se tambm que este imprio do pacta sunt
servanda, tornou-se falido diante das novas situaes econmicas e sociais que se firmam nos
dias atuais. Se num primeiro momento tivemos o progresso, a gerao e a circulao de riquezas
tendo o contrato um determinante no desenvolvimento econmico, atualmente podemos afirmar,
sem maiores riscos, que o contrato concebido nos pilares da liberdade e igualdade (formais) gera
um domnio do homem pelo prprio homem. Na verdade com o desenvolvimento das relaes
econmicas, passamos a perceber uma profunda diferena (desigualdade) entre os homens li-
vres. Com um super desenvolvimento econmico percebido principalmente no mundo ociden-
tal, surgem os monoplios em relao a importantes mercados, grandes grupos econmicos e
consequentemente surge uma acentuada desigualdade entre o homens.
Em outras palavras, aquela igualmente que inspirou toda a base do liberalismo napolenico que
entre outras coisas culminou com a revoluo industrial, passa ser por fora de uma nova ordem
econmica, a desigualdade que permite a total e ilimitada explorao do homem pelo homem.
51
Inexoravelmente o tempo mostra que a economia no se ajusta por suas prprias regras (a mo
invisvel de Adam Smith), mas sim gera distores sociais catastrficas.
Apenas para ilustrar a nossa assertiva no sentido de que no existe no mundo atual qualquer pos-
sibilidade de igualdade entre os homens (igualdade diante da teoria da vontade e da liberdade de
contratar), basta o fato de que juntos EUA, CANADA e MXICO, tm um PIB de 10 trilhes de
dlares, ao passo que juntos os 200 maiores especuladores (capital voltil) movimentam a suma
de 9 trilhes de dlares. Assim, capitais volteis, e portanto despatriados, podem determinar cri-
ses e at mesmo a quebra de um pas ou de um grupo de pases. Como exemplo, cite-se ao
menos a crise na Rssia, no Mxico, Argentina etc.
Na realidade pensamos que o Estado nos dias atuais passa a ter uma nova funo. O Estado no
mais ator direto nas atividades econmicas (sentido amplo da expresso), mas sim um organi-
zador. O Estado deve ser um grande gestor, e em nosso caso, o grande organizador do ambiente
no qual as atividades empresariais devem se desenvolver, sem que isso ocorra s custas de um
massacre social. Sem que o enriquecimento de determinados grupos, ensejem a aniquilao eco-
nmica de populaes inteiras.
Ainda a ttulo de ilustrao, podemos olhar para o prprio Brasil, onde setores organizados
(bancos e grandes corretoras) chegam a negociar diariamente no chamado mercado futuro, um
volume de dinheiro na ordem de 35 a 50 bilhes de reais. Basta dizer que a BM & F a stima
maior bolsa do mundo. Todavia, paralelo a isso temos o fato de que nossa populao uma das
mais pobres e miserveis do planeta.
Assim, o contrato contemporneo no pode mesmo se basear no pacta sunt servanda. Em ou-
tras palavras, no h como pensar em igualdade entre homens economicamente absolutamente
desiguais. No h como pensar o contrato diante da supremacia da vontade, quando contratantes
so na verdade dependentes e poderosos.
Temos sem dvida uma falncia do liberalismo e com ela do contrato como um instrumento per-
feito para o desenvolvimento do homem.
Sobre o tema, perfeita a explicao da professora, Carla C. Marshall:
Os fisiocratas, a partir de seu iderio onde o Estado se mantinha fora das relaes con-
tratuais gerou um Estado denominado minimalista, deixando que as leis do mercado se
estabelecessem e equilibrassem os eventuais desconfortos entre as partes convenentes.
Ressalte-se o fato de que o pano de fundo de todo o sistema consistia no capi-
talismo, que se mostrou feroz e abusivo, fazendo com que o pretenso equilbrio se
transformasse em total desequilbrio, gerador de ruptura na ordem jurdica estabelecida.
A crise do liberalismo, diante deste quadro, foi inevitvel significando uma
ruptura com a concepo inicial. O fato mais relevante, se que se pode falar desta
forma, foi a questo social, de natureza bastante aflitiva, por conduzir abusos irrepa-
rveis do homem sobre o homem, sendo absolutamente necessria a interveno do Es-
tado, com o intuito de restabelecer o equilbrio de foras, inegavelmente desproporcio-
nais, existentes no seio da sociedade e que impediam a realizao do desenvolvimento
econmico das naes.
52
O Estado passa a assumir uma nova funo. No caso brasileiro, passamos a ter com a CF/88, de-
finitivamente um estado intervencionista, principalmente atravs de uma interveno econmica.
Neste sentido a emenda constitucional 19 de 1998 tem um papel importante na consolidao des-
te Estado Intervencionista.
Como dito na introduo deste trabalho, evidente que o prprio Estado, no ter somente a fun-
o econmica. Evidentemente caber sim e fortemente ao Estado cuidar de questes relevantes
como sade, educao, segurana etc.
Todavia, inegvel nos dias de hoje, que o principal caminho para a realizao destes objetivos
ser exatamente a busca de recursos para o cumprimento destas obrigaes. Com isso, queremos
lembrar que um Estado que se mantenha como um grande gestor (exemplo dos EUA) certamente
ter em seu territrio o desenvolvimento de atividades econmicas capazes de gerarem as rique-
zas necessrias para estes recursos cheguem aos seus cofres. Portanto, alm de uma atuao pol-
tica forte no sentido acima exposto, dever sim, o Estado ter uma fidedigna atuao econmica, e
deve faze-lo em muito, atravs da interveno econmica. Enfim a atuao do prprio Estado
deve se pautar por uma viso econmica/social.
Conseqentemente os principais institutos jurdicos ou no, existentes numa determinada organi-
zao social, devem sim obedecer esta viso econmica e social. Portanto, a propriedade, a em-
presa e consequentemente o contrato passam a ter uma funo social. Temos que o direito eco-
nmico (como ramo autnomo do direito) ter atravs da interveno estatal uma influncia dire-
ta sobre os contratos.
Sobre o tema econmico social, urge finalmente salientar que o contrato como algo decorrente do
pacta sunt servanda decorreu evidentemente de uma ideologia capitalista, uma ideologia que ao
mesmo tempo distorcia e escancarava uma realidade, qual seja, o completo desiquilbrio econ-
mico entre os homens.
Surge ento uma nova ideologia que prega a observncia a uma funo social ao contrato. Cabe
ao jurista dar uma aplicao adequada a esta ideologia, no permitindo que seja ela fator de dis-
farce da realidade, gerando a manuteno das distores econmicas instrumentalizadas atravs
do contrato.
Finalmente para fins ilustrativos, vemos que as bases do contrato, ou seja, liberdade de contratar
e o contrato fazendo lei entre as partes, esto to abaladas atualmente que em vrias situaes o
Estado brasileiro numa ntida postura intervencionista, alterou drasticamente clusulas funda-
mentais de contratos de mtuo.
Como exemplo temos os contratos rurais, onde os agentes financeiros foram obrigados e rever
prazos, taxas e at mesmo saldo devedor destes contratos. Assim, dvidas que calculadas em
condio de normalidade (taxas contratadas) chegavam a R$ 3.120.328,06 (trs milhes, cento e
vinte mil, trezentos e vinte e oito reais e seis centavos), muitas vezes por uma interferncia direta
do Estado, atravs do Banco Central com resolues e do Poder Legislativo com a edio de
normas de ordem pblica, passaram a valores bem mais baixos, ou seja, para R$ 1.540.934,02
(Hum milho, quinhentos e quarenta mil, novecentos e trinta e quatro reais e dois centavos).
53
Enfim, percebemos claramente que o contrato est ligado intimamente com a ordem econmica e
social vigente em determinado momento histrico e que neste momento o contrato tem todas as
suas clssicas bases edificadas no liberalismo totalmente abaladas e revistas. Observe-se ainda
no se fundamenta a questo econmica das partes simplesmente, mas sim numa viso macro da
economia como motor da prpria evoluo do direito.
Como dito, para anlise de caso, escolhemos contratos de mtuos com destinao rural, posto
que estes so por excelncia contratos com ntida funo social. Mais que isso, so contratos de-
correntes de atividades essenciais para o desenvolvimento de um pas como o Brasil.
Neste sentido firme doutrina especializada seno vejamos:
NOES GERAIS SOBRE O CRDITO RURAL
1. O Crdito Rural se constitui num dos meios de fomento e fortalecimento da produ-
o rural, enumerados no art. 73 da Lei n 4.504, de 30 de novembro de 1964, e se acha
sistematizado e institucionalizado pela Lei n. 4.829, de 05 de novembro de 1965, e re-
gulamentada pelo Decreto-lei n 167, de 14 de fevereiro de 1967.
2. Segundo disposio dos arts. 2 e 3 da mencionada Lei n 4.829/65, considera-se
Crdito Rural o suprimento de recursos financeiros, prestados por entidades pblicas e
estabelecimentos de crdito particulares a produtores rurais e suas cooperativas, para
aplicao exclusiva em atividades que se enquadrem nos seguintes especficos:
a) estimular o incremento ordenado dos investimentos rurais, inclusive para armazena-
mento, beneficiamento e industrializao dos produtos agropecurios, quando efetuados
por cooperativas ou pelo produtor na sua propriedade rural;
b) favorecer o custeio oportuno e adequado da produo e da comercializao de produ-
tos agropecurios;
c) possibilitar o fortalecimento econmico dos produtores rurais, notadamente pequenos
e mdios;
d) incentivar a introduo de mtodos racionais de produo, visando ao aumento da
produtividade, melhoria do padro de vida das populaes rurais e adequada defesa
do solo.
3. O Crdito Rural ostenta caractersticas e objetivos prprios, uma vez que s pode ser
concedido sob determinados pressupostos e parmetros e com a finalidade exclusiva-
mente scio-desenvolvimentista, circunstanciadamente definida num oramento, e sob
prazos e formas de reposio determinados pelos resultados da atividade assistida, pe-
culiaridades estas que o diferenciam, sobremodo, das operaes bancrias comuns.
4. Sendo um financiamento especializado e regido por uma lei de ordem pblica, sua
concesso subordina-se s seguintes exigncias fundamentais:
a) idoneidade do proponente;
b) apresentao de oramento de aplicao nas atividades especficas;
54
c) oportunidade, suficincia e adequao dos recursos emprestados;
d) obedincia a cronograma de utilizao de crdito e de reembolso do dbito;
e) fiscalizao pelo financiador.
5. Face, ainda, a essa peculiaridade, no constitui funo do Crdito Rural:
a) subsidiar atividades deficitrias ou antieconmicas;
b) financiar o pagamento de dvidas contradas ates da apresentao da proposta;
c) possibilitar a recuperao do capital investido;
d) favorecer a reteno especulativa de bens.
6. Por razes econmicas e sociais, o Crdito Rural institucional e promocional e
sempre deve ser aplicado sob as taxas de juros favorecidas. Dinheiro posto na agrope-
curia servio pblico, obra do Governo, como os gastos da educao e sade, se-
gundo consta no notvel Parecer proferido pelo Deputado Ulysses Guimares em
02.09.65, na Comisso de Constituio e Justia da Cmara, sob o Projeto de Lei n
3.125/65, transformado na Lei n 4.829/65, (pg. 38).
7. Anlise retrospectiva e histrica do desenvolvimento rural brasileiro revela que o
Crdito Rural quase que sozinho foi capaz de fomentar todo o avano de nossa agricul-
tura, inobstante a carncia de infra-estrutura fsica e de apoio tcnico-agronmico, alm
do descanso permanente do Governo, para com o setor.
REFERNCIA BIBLIOGRFICA:
SILVA, Antnio Ferreira lvares da. A Correo Monetria e o Crdito Rural. Bras-
lia: Unio Democrtica Ruralista UDR, 1989, 29/30.
RESPONSABILIDADES E CONTRIBUIES DA AGRICULTURA BRASILEIRA
Um dos aspectos que mais chama a ateno na discusso quanto assistncia creditcia
agricultura discusso retomada nos ltimos anos e que alcanou o pice no decorrer
de 1980/81- a frieza com que os responsveis pela poltica monetria tratam da ques-
to, subordinando um complexo mundo real e enfoques onde a primazia dada a vari-
veis abstratas, tais como meios de pagamento, base monetria, oramento monetrio,
etc. o triunfo do mundo monetrio sobre o mundo real. A subordinao do concreto
ao abstrato.
No que seja importante o estabelecimento de metas desejveis de expanso monetria.
No que se deva rediscutir a intervalos de escalas de prioridades para tratamento mais
favorvel a determinados setores da economia. Tambm no se pode desconhecer as di-
ficuldades do governo para manter largo diferencial entre taxas de juros e taxas de in-
flao, face a necessidade de recompor os fundos para atender a novos emprstimos.
O que se pretende colocar que a procura de solues para problemas monetrios no
deve envolver o risco da criao de problemas ainda maiores, que, uma vez provoca-
dos, possam gerar conseqncias irreversveis no curto e mdio prazos, como inevit-
55
veis reflexos econmicos e sociais. Podendo inclusive sacrificar metas de absoluta prio-
ridade, como seria o caso do objetivo de gerao de divisas para o pas.
Tem-se se atentar, portanto, para as peculiaridades da economia agrcola, e principal-
mente para a fragilidade do pequeno e mdio produtor, impotentes para influenciar po-
lticas de salvaguarda. Da serem sensveis mudanas nas diretrizes governamentais,
na medida em que estas introduzam incertezas ao produtor quanto a capacidade de as
receitas futuras cobrirem os compromissos a serem assumidos para o fim de produzir.
essa expectativa que pode colocar o produtor diante da deciso de plantar, e assim ar-
riscar o seu patrimnio, a garantia do sustento da famlia, os frutos dos trabalhos de tal-
vez muitas geraes ou ento no plantar (ou pouco plantar), e desse modo, parado-
xalmente, procurar resguardar o seu futuro.
O dilema do agricultor pode reverter muitos produtores a uma economia prxima de
subsistncia, desequilibrando o mercado, e comprometendo a gerao de excedentes
exportveis, alm do risco de exigir importaes compensatrias. o que precisa ser
evitado, mediante uma avaliao ampla das responsabilidades da agricultura, e da con-
tribuio do setor economia brasileira.15
Somente a partir da torna-se possvel a for-
mulao de propostas de polticas de apoio agricultura no subordinadas simplesmen-
te a dogmas monetrios. Mas sim lastreadas na anlise de custo-benefcio, sob critrios
abrangentes, j que esse, afinal, um mtodo racional de orientar decises econmicas.
1. O Papel Relevante da Agricultura Brasileira
A agricultura brasileira, dando trabalho a aproximadamente 20,0 milhes de pessoas,
tem a responsabilidade de alimentar mais de 120,0 milhes; desse total, 40,0 milhes
vivendo a rea rural e 82,0 milhes de habitantes urbanos, estes apenas consumidores
de produtos agrcolas Tabela V.1. E apenas nos ltimos 10 anos a sobrecarga do setor
urbano sobre o rural significou um acrscimo de 30,0 milhes de pessoas nas cidades, e
a serem alimentadas. E no se pode dizer que a agricultura tenha falhado em alcanar
tal objetivo.16
A agricultura fornece insumos indstria de produtos alimentcios e produz matrias-
primas no alimentares que suprem necessidades de setores industriais, tais como o tx-
til, calados, madeira, fumo, bebidas, qumica, etc., minimizando a necessidade de im-
portaes, e fazendo da economia brasileira uma das mais auto-suficientes do mundo.
15
Sobre o papel desempenhado pela agricultura na gerao de excedentes, e sua importncia para o global da economia, v. Mueller Charles C., Agricultura e Desenvolvimento Econmico Uma Abordagem Multissetorial. Braslia, UNB/Departamento de Economia, Texto para Discusso n. 070, fevereiro de 1981. 16
Se um fato a existncia de milhes de pessoas subnutridas, isso se deve no incapacidade do se-tor rural em gerar alimentos, mas antes a toda uma poltica econmica e social global, que tem moldado um modelo perverso, altamente concentrador de renda. Nesse contexto que, por exemplo, mais de 10,0 milhes de empregados, no campo e nas cidades, em todos os setores de atividades, no possuem nem mesmo carteira profissional assinada. Assim no surpresa que no ano de 1980 havia excesso de arroz no mercado, como agora acontece com carne e leite, dentre outros produtos, enquanto um largo contingente populacional no tem renda para adquirir o mnimo para o sustento prprio e da famlia.
56
A agricultura adquire o setor urbano de bens e servios que, apenas considerados aque-
les utilizados no esforo produtivo (consumo intermedirio), so estimados para 1980
em US$ 16,5 bilhes (diferena entre renda interna do setor e o valor da produo), ge-
rando uma renda superior a US$ 20,0 bilhes no prprio setor rural, a qual se transfere
para o setor urbano via aquisio de bens de consumo das famlias ou de bens de inves-
timentos, alm de eventual poupana residual.
a demanda oriunda da agricultura que responde por ampla margem do mercado de
bens industriais mais o processamento e comercializao de produtos agrcolas na -
rea urbana, que d base e econmica vida de todo o inteiro do pas, com aproximada-
mente quatro mil municpios e mais de oito mil distritos, e uma populao total de 47,5
milhes de pessoas, que a populao urbana residindo fora das reas metropolitanas.17
E a agricultura respondeu, direta ou indiretamente em 1980, pela gerao de divisas es-
trangeiras no valor de US$ 10,0 bilhes equivalente a aproximadamente Cr$ 550,0 bi-
lhes a maior parte ligada exportao de produtos in natura. Esse resultado pra-
ticamente igual ao total das importaes brasileiras de combustveis e lubrificantes no
mesmo ano, observando-se ainda que a agricultura brasileira viabiliza receitas de ex-
portao superiores venda de petrleo de muitos pases membros da OPEP.
REFERNCIA BIBLIOGRFICA:
MUNHOZ, Drcio Garcia. Economia Agrcola Agricultura Uma Defesa dos Subs-
dios. Petrpolis: Editora Vozes Ltda; 1982, p. 64/66.
DOS CONTRATOS (CASOS REAIS) A SEREM ANALISADOS
A) Cdula Rural Pignoratcia e Hipotecria n. 91/00063-7, emitida em 08.04.91, no valor
de Cr$ 37.718.264,04, com o objetivo de financiamento de custeio de lavoura de cana de
acar, com vencimento originrio em 30 de novembro de 1992, re-ratificada em
30.11.93;
B) Escritura Pblica de Confisso de Dvidas, lavrada em 30.04.92, livro 70, fls. 47/51, no
valor de Cr$ 376.291.791,67, oriunda das dvidas rurais: Cdula Rural Pignoratcia e
Hipotecria, n. 91/00063-7 e da Cdula Rural Pignoratcia n. 90/00137-0, com venci-
mento previsto inicialmente para 30/11/95, escritura re-ratificada em 20 de setembro de
1994 ;
C) Cdula Rural Pignoratcia e Hipotecria n. 93/00098-7, emitida em 14.07.93, no valor
de CR$ 3.819.580.812,00, com o objetivo de financiamento de custeio agrcola de la-
vouras de cana de acar, com vencimento originrio em 10 de julho de 1994, aditivada
em 18.04.94 e prorrogada para 10.01.95;
17
Essa produo cresceu, entre 1970 e 1980, em 63,2%, muito acima do crescimento observado nas reas metropolitanas, que foi de 45,0% no mesmo perodo.
57
D) Cdula Rural Pignoratcia e Hipotecria n. 93/00159-2, emitida em 01/08/93, no valor
de CR$ 3.900.000,00, com o objetivo de financiamento de investimento agrcola para
renovar 100,00 hectare de lavouras de cana de acar, com vencimento em 22 de no-
vembro de 1996;
E) Contrato de Abertura de Crdito Fixo com Garantia Real, n. 93/00162-2, emitido em
27.10.93, no valor de CR$ 3.990.000,00, com vencimento em 15.12.96, origem: Pro-
grama Agrcola Simplificado II Anual FINAME; gestor BNDES, o qual teve como ob-
jetivo o financiamento de 01 (um) trator agrcola novo, marca Massey Fergusson, mode-
lo MF-292/4, srie 5260.405.131, no valor de CR$ 5.700.000,00;
F) Cdula Rural Pignoratcia, n. 94/00023-9, emitida em 22.02.94, no valor de CR$
18.519.960,00, com o objetivo de custeio das exploraes pastoris de Bovino Produo
de Carne, com vencimento em 21 de fevereiro de 1995;
G) Contrato de Abertura de Crdito Fixo, n. 94/00074-3, emitido em 27.06.94, no valor de
CR$ 40.550.400,00, com vencimento em 15.12.96, origem: FINAME; crdito rural des-
tinado a complementao de operao realizada com recursos FINAME convnio
Valmet, relativamente aquisio de 01 (um) trator agrcola novo, marca Valmet, srie
15804R09429,no valor de CR$ 135.168.000,00;
H) Escritura Pblica de Abertura de Crdito Fixo com Garantia Real, n. 94/00108-1, lavra-
da em 15.08.94, livro 101, fls. 364/369, no valor de R$ 12.584,08 registrada sob os n.
R-24, na matr. 2.151 e R-23, na matr. 2.152, ambas no CRI de Fernandpolis, com ven-
cimento para 15.05.97, credito destinado a complementao de operao realizada com
recursos do FINAME, relativamente aquisio de 02 (dois) tratores agrcolas novos,
marca Massey-Ferguson, modelo MF-275, srie 2160062490 e 2160062491, no valor
de R$ 20.973,46 cada;
I) Contrato de Abertura de Crdito Fixo Com Garantia Real, n. 94/00107-3, emitido em
15.08.94, no valor de R$ 29.362,46, com vencimento em 15.09.99, origem: Programa
Agrcola Simplificado FINAME, gestor BNDES, o qual teve como objetivo o financi-
amento de 02 (dois) tratores agrcolas novos, marca Massey-Ferguson, modelo MF-275,
srie 2160062490 e 2160062491, no valor de R$ 20.973,46 cada;
J) Contrato de Abertura de Crdito Fixo com Garantia Real, n. 94/00073-5, emitido em
27.06.94, no valor de CR$ 94.617.600,00, com vencimento em 15.07.99, origem: Pro-
grama Agrcola Simplificado II Anual FINAME; gestor BNDES, o qual teve como ob-
jetivo o financiamento de 01 (um) trator agrcola novo, marca Valmet, srie 1580
4R09429,no valor de CR$ 135.168.000,00;
DO DIREITO A SECURITIZAO.
A discusso acerca da possibilidade ou no de enquadramen-
to da dvida em discusso no programa de alongamento preconizado na Lei n. 9.138/95, e regu-
lamentaes sucessivas atravs de Resolues do Banco Central do Brasil (a chamada securiti-
58
zao das dvidas rurais) centra-se, pois em trs pontos, sendo: a) se o credor integrante do
Sistema Nacional de Crdito Rural; b) se a dvida preenche os requisitos necessrios para enqua-
dramento no alongamento da dvida; c) e qual a metodologia de apurao do valor principal a ser
securitizado (alterao do pacto de mtuo).
Demonstrar-se-, com toda a fundamentao a seguir, que de
fato a dvida rural no caso analisado deve ter afastado o chamado pacta sunt servanda, em ra-
zo da interveno estatal, que para casos tais obriga o credor a alterar praticamente todo o pacto
livremente ajustado. Para tal, dever ser efetivada pelo devedor a aquisio dos necessrios Ttu-
los do Tesouro Nacional (TTN), com intermediao do credor sob o manto da Lei n 9.138/95 e
Resolues do Bacen, que implantaram a poltica econmica de fomento e planejamento para o
setor agrcola (dirigismo contratual e intervencionismo estatal).
No caso em questo, inegvel que h uma dvida rural, at
mesmo porque a finalidade de suprimento de recursos para aplicao e desenvolvimento de ati-
vidade agropecuria est comprovadamente descrita no bojo de cada contrato (docs. anexos e
descritos acima). Inegvel tambm o reconhecimento da funo social do contrato (contrato ru-
ral).
Resta, pois, demonstrar que a dvida securitizvel, ou seja,
se h no caso em questo a possibilidade de alterao das bases contratuais por fora de norma de
ordem pblica posterior ao pacto. Diga-se, norma de ordem pblica que altera praticamente todas
estas bases do contrato de mtuo em questo. o que se passa a expor.
A Lei n 9.138, de 29 de novembro de 1995, que disps sobre
o crdito rural, criou uma obrigao s instituies financeiras e a todos os agentes financeiros de
proceder chamada securitizao da dvida agrcola, desde que, evidentemente, preenchidos os
requisitos legais exigidos em seu artigo 5 e pargrafos, verbis:
Art. 5 - So as instituies e os agentes financeiros do Sis-
tema Nacional de Crdito Rural, institudo pela Lei 4.829, de
5 de novembro de 1965, autorizados a proceder ao alonga-
mento de dvidas originrias de crdito rural, contradas por
produtores rurais, suas associaes, cooperativas e condom-
nios, inclusive as j renegociadas, relativas s seguintes ope-
raes, realizadas at 20 de junho de 1995:
(...)
Pargrafo 2 - Nas operaes de alongamento referidas no ca-
put, o saldo devedor ser apurado segundo normas fixadas
pelo Conselho Monetrio Nacional.
Pargrafo 3o Sero objeto do alongamento a que se refere o
caput as operaes contratadas por produtores rurais, suas as-
sociaes, condomnios e cooperativas de produtores rurais,
inclusive a de crdito rural, comprovadamente destinadas
conduo de atividades produtivas, lastreadas com recursos
de qualquer fonte, ....
59
(Grifou-se)
Assim, a Lei n 9.138, de 29 de novembro de 1995, tanto cri-
ou um direito pblico subjetivo dos devedores (rurais) em terem os seus dbitos rurais, para com
as instituies financeiras ou outros agentes financeiros, securitizados.
Veja-se que o primeiro artigo da Lei n 9.138/95, j defi-
ne quem est obrigado a realizar o alongamento de dvidas originrias de crdito rural, isto ,
as instituies e os agentes financeiros do Sistema Nacional de Crdito Rural, institudo pela
Lei 4.829, de 5 de novembro de 1965.
Por sua vez, por fora do artigo 7o, 1, inciso II, letra
e, da Lei acima mencionada n 4.829/65 - so integrantes do Sistema Financeiro de Cr-
dito Rural. Confira-se, in verbis:
Lei 4.829/65:
Art. 7o Integraro, basicamente, o sistema nacional de cr-
dito rural...
1 - ...
II - como rgos auxiliares, desde que operem em crdito ru-
ral dentro das diretrizes fixadas nesta lei:...
e) Cooperativas autorizadas a operar em crdito rural.
Corroborando, o Decreto Lei n 167/67, que dispe sobre
ttulos de crdito rural, no seu artigo 1o, autoriza as Cooperativas a concederem o financia-
mento rural aos seus cooperados, como de fato ocorreu no presente caso:
Decreto 167/67:
Art. 1o O financiamento rural concedido pelos rgos in-
tegrantes do sistema nacional de crdito rural a pessoa fsica
ou jurdica poder efetuar-se por meio das cdulas de crdito
rural previstas neste Decreto-Lei.
Pargrafo nico Faculta-se a utilizao das cdulas para os
financiamentos da mesma natureza concedidos pelas coope-
rativas rurais a seus associados ou s suas filiadas.
(grifo do Autor)
Portanto, no paira nenhuma dvida quanto ao alcance da
Lei n 9.138, de 29 de novembro de 1995, e de suas regulamentaes (que sero vistas adian-
60
te), e que ora se demonstrar determinando-se a obrigatoriedade da securitiza-
o/alongamento das dvidas agrcolas dos associados pelas Cooperativas.
Veja-se, a seguir, o enquadramento da dvida rural nas regu-
lamentaes da Lei n 9.138/95, ocorridas atravs de Resolues expedidas pelo BACEN, Banco
Central do Brasil, rgo executor de poltica pblica monetria e financeira.
Em 06 de dezembro de 1995, atravs da Resoluo n 2.220,
o BACEN, dispondo a respeito de renegociaes de dvidas originrias de crdito rural (justa-
mente as previstas no artigo 5 acima transcrito), disps que o Beneficirio deveria solicitar for-
malmente o alongamento de suas dvidas, at 31.01.96, e o respectivo instrumento de crdito de-
veria ser formalizado at 30.06.96 (estes prazos foram prorrogados at 30 de junho de 2002, a-
travs da Resoluo n 2.904).
Contudo, o que ocorreu, em desobedincia aos comandos le-
gais, foi o ajuizamento da ao de execuo pela Cooperativa, em 15 de janeiro de 1996, antes
mesmo da fluncia daquele prazo.
Novamente, em 31.01.96, regulando a mesma Lei n
9.138/95, o Banco Central do Brasil editou a Resoluo n 2.238, a qual tambm mais expressa-
mente incluiu a dvida em questo como passvel de ser securitizada:
Art. 1 Estabelecer as seguintes condies e procedimen-
tos a serem observadas na formalizao das operaes de a-
longamento de dvidas originrias de crdito rural, de que tra-
ta a Lei n 9.138, de 29.11.95:
I consideram-se dvidas originrias de crdito rural as ope-
raes em ser de custeio, investimento ou comercializao
contratadas at 20.06.95, inclusive as inscritas em crdito
em liquidao, compensadas como prejuzo ou renegocia-
das, desde que:
a) formalizadas com base na legislao e regulamentao a-
plicvel ao crdito rural, excetuando os Emprstimos do Go-
verno Federal, com Opo de Venda (EGF/COV),....
(grifo nosso)
Nesta mesma Resoluo estabeleceu-se inclusive o modo de
clculo dos encargos financeiros para as operaes j vencidas e para aquelas ainda em curso
normal (inciso VI, do artigo 1o), exatamente como se encontrava a situao do devedor e prorro-
gou-se o prazo para solicitao da securitizao para 29.02.96 (outras prorrogaes sucederam,
estendendo o prazo at 30/06/2002 - Resoluo n 2.904/02).
61
A Resoluo n 2.322, de 15 de outubro de 1996, tornou pos-
svel a securitizao das dvidas rurais vencidas ou vincendas at 31 de dezembro de 1996 (ante-
riormente possvel apenas para aquelas formalizadas at 20 de junho de 1995): Veja-se, in verbis:
Art. 1. Autorizar a concesso de prazo, at 02.01.97, para as
operaes de crdito rural contratadas at 20.06.95 e vencidas
ou vincendas at dezembro de 1996. (...)"
Vrias outras Resolues se sucederam, mas em especial, va-
le invocar a Resoluo n 2.471, de 26 de fevereiro de 1998, do BACEN que, resolveu determi-
nar a renegociao de dvidas dessa natureza, ampliando a abrangncia das dvidas passveis de
alongamento, matria que j havia sido tratada nas Resolues BACEN n 2.220, de 06 de de-
zembro de 1995, n 2.238, de 31 de janeiro de 1996, e n 2.322, de 15 de outubro de 1996 (cpias
das resolues em anexo).
Importante esclarecer que a Resoluo BACEN n 2.471/98
que regulamentou de forma mais ampla a securitizao das dvidas rurais, uma vez que as anteri-
ores (2.220, 2.238 e 2.322) haviam tratado da matria, mas no haviam disciplinado de forma
satisfatria e abrangente a securitizao dos dbitos de natureza rural, agora permitido at o ex-
cedente do anterior limite de R$ 200.000,00 (duzentos mil reais) previstos inicialmente na Lei
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