Download - Miguez, G. Projeto Qualificação (Mestrado) - O Conceito de Informação Simbólica

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO UFRJ ESCOLA DE COMUNICAO - ECO INSTITUTO BRASILEIRO DE INFORMAO EM CINCIA E TECNOLOGIA IBICT PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM CINCIA DA INFORMAO PPGCI GIOVANI MIGUEZ DA SILVA O CONCEITO DE INFORMAO SIMBLICA A Filosofia da Cincia da Informao entre a Realidade e a Idealidade Rio de Janeiro 2015 GIOVANI MIGUEZ DA SILVA O CONCEITO DE INFORMAO SIMBLICA A Filosofia da Cincia da Informao entre a Realidade e a Idealidade ProjetodeDissertaoapresentadocomorequisitoparcialpara obtenodottulode Mestreao ProgramadePs-Graduaoem Cincia da Informao, da Universidade Federal do Rio de Janeiro em parceria com o Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia.LinhadePesquisa:Comunicao,Organizaoe Gesto da Informao e do Conhecimento. Orientador: Prof. Dr. Gustavo Silva Saldanha Co-Orientador: Prof. Dr. Antonio Tadeu Cheriff dos Santos Rio de Janeiro 2015 GIOVANI MIGUEZ DA SILVA O CONCEITO DE INFORMAO SIMBLICA A Filosofia da Cincia da Informao entre a Realidade e a Idealidade ProjetodeDissertaoapresentadocomorequisitoparcialpara obtenodottulode Mestreao ProgramadePs-Graduaoem Cincia da Informao, da Universidade Federal do Rio de Janeiro em parceria com o Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia.LinhadePesquisa:Comunicao,Organizaoe Gesto da Informao e do Conhecimento. Aprovado em 05 de Agosto de 2015. Banca de Qualificao: _____________________________________________ Prof. Dr. Gustavo Silva Saldanha (Orientador) Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia IBICT ______________________________________________ Prof. Dr. Antonio Tadeu Cheriff dos Santos (Co-Orientador) Instituto Nacional de Cncer Jos Alencar Gomes da Silva INCA _________________________________________________ Prof. Dr. Aldo Albuquerque Barreto Instituto Brasileiro de Informao em Cincia e Tecnologia IBICT _________________________________________________ Profa. Dra. Ldia Silva de Freitas Universidade Federal Fluminense UFF _________________________________________________ Prof. Dr. Rodolfo Petrnio da Costa Arajo Universidade Federal Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO Rio de Janeiro 2015 SUMRIO 1 CONSIDERAES INICIAIS ................................................................................... 005 2 A CINCIA DA INFORMAO E SUA FILOSOFIA ............................................... 016 2.1 Aspectos gerais do conceito de informao .......................................................... 016 2.2. Algumas relaes entre informao, linguagem e simbolismo ............................ 020 2.3 Rafael Capurro e a Filosofia da Informao .......................................................... 031 3 FILOSOFIA DA INFORMAO: IDEALIDADE OU REALIDADE .......................... 037 3.1 Simbolismo e Linguagem em Ernst Cassirer ........................................................ 037 3.2 Algumas aporias hermenuticas da filosofia das formas simblicas .................. 042 3.3 Inteligncia e Realidade em Xavier Zubiri ............................................................. 048 4 REFLEXES METODOLGICAS ........................................................................... 057 5 PERSPECTIVAS DA PESQUISA ............................................................................ 063 REFERNCIAS ........................................................................................................... 065 APNDICE: CRONOGRAMA DE EXECUO DA PESQUISA ................................. 071 1CONSIDERAES INICIAIS Umafilosofia,portanto,caracteriza-semaispelaformulaodosseus problemas do que pela soluo que lhes dada. Langer (1971, p.16) Tendoemvistaaconstruodeumaabordagemfilosficacontemporneada informao,demodogeral,edaFilosofiadaCinciadaInformao,mais especificamente,apartirdenomescomoRafaelCapurro,ErnstCassirereXavier Zubiri, oferecemos nesse projeto uma perspectiva investigativa que pretende delimitar o conceito de informao simblica como categoria essencial de uma Filosofia da Cincia daInformao,quesedesdobrarianesseesforoinvestigativoemumaAntropologia Filosfica1;ouseja,deslocandoacentralidadedainformaoparaohomememsua estrutura essencial e como a informao, a linguagem e o smbolo enquanto obras e funes deste se relacionam com ele.Paraessaempreita,partiremosdeCapurro(2014a),quetemseocupadode fundamentararelaoentreCinciadaInformaoeHermenutica;estasendoparte daRetrica,cujaconcepopoderiasersintetizadacomoumasuperaodavirada cognitivistapelaviradapragmtica.Aapreensodainformao,apartirdessa perspectiva, estaria orientada por um processo de interao com o mundo. Ainformao,nessesentido,noseriaumacoisa,masseriaconsideradaum meio(linguagem/smbolo)pelaqualascoisasreaispodemserestudaspelasua dimensosimblica.Ejustamenteessadimensoquenosinteressa,poissendoo homemumanimalsimblico(Cassirer)que,comoveremosadiante,sconsegue entrar em contato com a realidade atravs de formas simblicas, no estaria a realidade comprometidadiantedasinmerasaporiasexistenteemumafilosofiadainformao que parta de uma filosofia das formas simblicas? 2 1 No discutiremos nesse primeiro momento a Antropologia Filosfica. Entretanto, a ttulo de justificativa, achamos necessrio informar que sobre essa questo bebemos na fonte do Doutor Manfredo Arajo de Oliveira, cujo trabalho desenvolve-se a partir da concepo de subjetividade comoquesto fundamental na antropologia filosfica contempornea. Para ele, se podem distinguir trs grandes direes a respeito daproblemticaqueoserhumano.Soelas:(a)ofisicalismo;(b)asfilosofiasdafinitude;e, finalmente, (c) o Pragmatismo.(OLIVEIRA, 2012)2 A perspectiva cassireriana de uma filosofia das formas simblicas e suas respectivas aporias (PORTA, 2010)seroapresentadasnasubseo3.1e3.2,respectivamente,entreaspginasp.37e47,do presente projeto. 6 SeconsiderarmosaCinciadaInformaocomoumcampodaRetrica,ou seja,umaHermenutica,conformeCapurro,aCinciadaInformaopoderiaestar sujeitaaumainfinidadededificuldadesque,nossonossosentender,atransformaria em um palco de subjetividades. Nesse sentido, mesmo preservando, a sua dimenso simblica,acreditamosencontrarnafilosofiadaintelignciaedarealidadezubiriana3 umasadaparaalgumasaporiasdafilosofiadasformassimblicasquecorroboraria paraconfirmaratesedeCapurroouseja,adequeaCinciadaInformaoseria umadisciplinaHermenutica,masquecarecedeelementostericoseprticos, conforme questionamento feito por Matheus (2005, p. 162).4

Discute-senosestudosinformacionais,nocontextoatual,queinformaoo conjunto de dados registrados numa memria qualquer, seja digital ou vegetal, a espera de serem interpretados por algum; a espera de serem significados. Pode ser ainda um conjuntodeconhecimentoserecordaes,alojadasnanossamemria,localizadano nossocrebro,nocontedodeumlivroedetodososlivros,jornais,revistase documentosdetodasasbibliotecas.Ouseja,tudooqueestgravadoemqualquer materialdesdeosmaisprimitivosaosmaisevoludosseriainformao.Sejaela, passivaeinerte,ainformaotemimplicaesqueaconferemumaimportncia extraordinria para a humanidade, pois ela vista por muitos indivduos e corporaes como combustvel da evoluo humana. A existncia da informao parece implicar, com base nas definies at aqui, na existncia matria que a suporte, linguagem queaenrede, energiaquea reproduza e inteligncia que a compreenda. Parece ainda sugerir que a possibilidade de reproduo achaveparaodesenvolvimentohumano,comdesdobramentosfilosficos, sociolgicoseantropolgicospassveisdeprofundareflexo.Afinal,ainformaoque pode ser armazenada num tempo e recuperada noutro possibilita, alm de correo de rumos e mais assertividade nas decises humanas, a construo de toda uma narrativa daespciehumana.Ssabemosdopassadodanossaespciegraasaosrastros informacionais deixados pelas civilizaes que nos precederam. 3 Sintetizamos a perspectiva zubiriana na subseo 3.3, entre as pginas 48 e 56, desse projeto. 4 Conforme citao da pgina 35. 7 Asdefiniesesboadasnosdoispargrafosacimasooriundasdealgum momentodagrandenarrativahumanaeforamesculpidasmuitopossivelmentepor filsofos, cientistas e poetas, mas que no so mais que impulsos intelectuais extrados pornsdeconversasdespretensiosasentreinterlocutorescomformaoculturalbem diversificada sem o compromisso com uma definio cientfica ou filosfica.So,portanto,definiesapoiadasnicaeexclusivamenteemanotaes pessoaissobreespeculaesdosensocomum,pautadasemdesejoseanseiosde quememalgumdiainteressou-sepelosencantosdeummaravilhosomundo informacional e todas as possibilidades de estudo e reflexo por ele suscitado. Essecarterpolissmicodeelaboraoedeinterpretaodoconceitode informaoemsijseriaumagrandejustificativaparatorn-lacomoumobjetode estudo. Mas, como poderemos ver adiante, existem muitas definies de informao e, portanto,aperguntaquesecolocoudurantemuitosmomentosduranteoesforo intelectual para definir o objeto deste trabalho foi: No seria necessria a convergncia das definies e/ou conceitos de informao? Partirmosinicialmentedahipteseque,seohomemconhece,esse conhecimento informao. Se reflete, o faz porque manipula as informaes que tem armazenadas de forma criativa.Se age, e pela ao transforma a si e ao mundo, o faz porque est informado. Assim, esse movimento de conhecer, refletir, agir e transformar sugere um movimento informacional de grande importncia para ns humanos. E essa crenareforaumsentimentoinicial,respaldadoporpelomenosumautordocampo, dequeainformaononecessariamenteumacoisa,mascoisaspodemser estudas como informao (HJRLAND, 2000). Entretanto,mesmodiantedaclaraimportnciadainformao,anossa sociedadevive,deacordocomPozo(2004),umparadoxo:aomesmotempoemque existem tantas pessoas aprendendo tantas coisas ao mesmo tempo, as pessoas cada vez mais apresentam dificuldades para aprender aquilo que a sociedade exige delas. 8 Seporumlado,aquantidadedeinformaesquesurgemsimultaneamente, proporcionouaohomemvriasmaneirasdeadquirireteracessoamltiplostiposde conhecimentos, gerando a necessidade de se desenvolver competncias para que eles consigam olhar de forma crtica para tais informaes. Por outro, toda e qualquer informao tem apenas um sentido em relao a uma situao, aumcontexto"[ese]"aculturageralcomportavaapossibilidadedebuscara contextualizao de toda informao ou ideia, a cultura cientfica e tcnica, por causa de sua caracterstica disciplinar e especializada, separa e compartimenta ossaberes,tornandocadavezmaisdifcilacolocaodestesnumcontexto qualquer (MORIN, 2000, p. 12). NoobstanteaCinciadaInformaoterinterfacesclaraseamplamente investigadas com asCincias da Comunicao,daBiblioteconomia, da Lingustica, da CinciasCognitivasedasCinciasdaComputao(SARACEVIC,1992;PINHEIRO, LOUREIRO,1995)5,ointeressepelopresenteestudonasceuapartirdaleiturade EvoluoemQuatroDimenses:DNA,comportamentoeahistriadevida,obrasobre biologia evolucionista, mas que sugere um olhar diferenciado sobre a temtica. Em sntese, as autoras argumentam que a prpria evoluo humana , em certo sentido,umprocessoemqueinformaessotransmitas,emsereshumanos, simultaneamenteporsistemasdehereditariedadegentica,epigentica(clulascom DNAidnticossocapazesdetransmitirsuascaractersticassclulas-filhas), comportamental (animais transmitem seus comportamentos e suas preferncias atravs do aprendizado social) e simblica (JABLONKA; LAMB, 2011). De acordo com Jablonkae Lamb (2011, p. 14-15), ns, seres humanos, temos umquarto[sistema],porqueumaheranabaseadaemsmbolos,alinguagemem particular desempenha um papel importante na nossa evoluo. Essa quarta dimenso refere-se a como a informao transmitida atravs da linguagem e de outras formas de dimenso simblica.Longedeserumfenmenoneutroedeimportnciaapenasnoscrculos acadmicosecientficos,osinteressessobreainformaosopermeadoscoma 5PinheiroeLoureiro(1995)consideramaCinciadaInformaocomoumacinciainterdisciplinar emergente,masnoconsolidada,naqualatuamprofissionaisdasmaisdiversasformaeseque possuiemsuaconfiguraoestrutural,umcartereminentementeinterdisciplinar,e,aindaquehoje coexistam mltiplas reflexes e pensares. 9 inteno de direcionar as aes humanas (PRADO, 2013). Por isso, antes do problema cientfico,humagamadeproblemasfilosficosaseremcolocadosjque,segundo CapurroeHjrland(2007,p.193),fcilperderaorientaoquandoseestuda informaoe,assim,sugeremquesefaaaseguinteperguntapragmtica:Que diferena faz se usarmos uma ou outra teoria ou conceito de informao? Sendo muitas as possibilidades de descrever o fenmeno informacional e sendo muitososconceitosinseridosemestruturastericasmaisoumenosexplicitas (CAPURRO;HJRLAND,2007,P.193),tantoasuadescrioquantoseuscontextos tmpassadoporinmerasrupturas,sendopossvel,deacordocomGonzlezde Gmez(2006,p.30),identificarparmetrosquepermitamalgumasequivalncias nessas plurais definies que fazem do termo informao uma expresso metafrica de operaes ou domnio de integrao sobre os conhecimentos ou sobre a linguagem e suas inscries. Assim,[...]adistinomaisimportanteinformaocomoobjetooucoisa(por exemplo,nmerodebits)einformaocomoconceitosubjetivo,informao como signo; isto , como dependente da interpretao de um agente cognitivo. Avisointerpretativadeslocaaatenodosatributosdascoisasparaos mecanismosdeliberaoparaosquaisaquelesatributossorelevantes (CAPURRO; HJRLAND, 2007, P. 193). Domesmomodoqueainformao,alinguagempossuicaractersticas interdisciplinaresqueperpassamafilosofia,asociolinguistica,aantropolinguistica,a psicolinguistica, a geolinguistica, a neurolinguistica (FIORIN, 2008. p. 45). Tomada em seu todo, a linguagem multiforme e heterclita; cavalgando sobre diferentes domnios, ao mesmo tempo fsico, fisiolgico e psquico, ela pertence ainda ao domnio individual e ao domnio social; ela no se deixa classificar em nenhumacategoriadosfatoshumanos,eporissoquenosabemoscomo determinar sua unidade (SAUSSURE, 2006, P. 16). SegundoJohnson(1997,p.136),alinguagemummecanismofundamental, poisatravsdela,conseguimoscriarosignificadodaexperincia,dospensamentos, dos sentimentos, da aparncia e do comportamento humano; possuindo diversos usos navidasocial,nospermitindoarmazenar,manipularetransmitirconhecimentoe informao. 10 NoentendimentodeCapurro(2003,apudMATHEUS,2005,p.158),alis,a informao [aproxima-se] da linguagem que por sua vez pode ser expressa atravs da fala, que transmitida atravs deuma mensagem. Fazendo o caminho inverso,a fala podetransmitirumamensagematravsdalinguagem,resultando,ouno,deum significadosemntico,ainformao.Poressemotivo,eleutilizaafundamentao filosfica que sebaseia na fala, a fim de discutir como ahermenutica pode contribuir para os estudos da CI. Considerandoqueanoodeinformaoemergenombitodaao comunicativa,mediadapelalinguagem(GONZLEZDEGMEZ,2009,p.120), impe-se que, na vida em sociedade, [...]oindivduo[tenha]queescolherdiversaspossibilidades,significados, sentidosouinterpretaes,questionandoetentandomostraraogrupoou comunidadeemqueestinseridootipodecomportamentos,deposies,de pontosdevistadeinterpretaesqueeleconsideramaisapropriados,mais corretos ou mesmo inteiramente certos (ILHARCO, 2003, p. 49).Alinguagem,oelementocomunicacionalbasilarnoprocessodeinterao entre o sujeito e o contexto informacional, onde a dimenso semntica da informao um fator estrutural nos atributos das capacidades cognitivas. Tratando-se, assim, de um objeto de discusso e rupturas paradigmticas (PRADO, 2013). Apsessasbrevesconsideraesintrodutrias,nosquestionamos:Sea informaofazparte,comoindicado,daevoluodohomem,eseaCinciada Informaoafirmaseresteoseuobjetoprioritrio,oqueseriaainformaoparaa CinciadaInformao?Ou,ainda,paraqueserviriaessaCinciadaInformao?E, talvez mais pertinentemente, em que bases filosficas se sustentariam uma Filosofia da Cincia da Informao? Umavezqueconformeproporemosmaisfrente,comoescopopossvelpara esseestudo,umapossibilidadede interpretao da linguagem como informaoepor isso,ainformaoassumiriaumadimensosimblica,caberiaaquiumadiscusso sobre a essncia da linguagem? Trata-se de uma pergunta necessria, uma vez que 11 [...]aposiodohomemdesafiadopelaordenanadorealcomoinformao nosmostraquequantomaisopadroinformacionaldevidaseespalhaese absolutizacomonico,maispareceinsustentvelaideiadequealinguagem possasercompreendidacomoumapropriedadehumana(HOEPFNER,2011, P. 170). Anossareflexopartirdopressupostodequeainformaohumanapossui uma dimenso simblica, entre elas a linguagem, passvel de interpretao atravs das muitasformascomoelasemanifestaatravsdotempo.Porisso,geradorade opinies,conceitos,juzosevalorespsicolgicos.Dessemodo,acreditamosqueno existiriainformaonestadimensosimblica,semaintelignciahumana;estacapaz de significar, registrar, reproduzir e utilizar a informao que cada ser humano possui na sua memriaconsciente, expandidae inconsciente. Para isso, servem-seos humanos da linguagem. Essaperspectiva,anossover,pressupeumacertasubstancializaoda linguagemquemereceriaumolharmaisatentoeprofundo.Naesteiradoqueprope Hoepfner (2001,178), a partir de Heidegger, a informao vistaem conexo com a essnciadalinguagem,masalemdissocomoaformabsicaadisposiodiretiva elementar o modo de ser do homem hoje.Diantedoexpostoataqui,otrabalhoquepropomospretendeinvestigaro conceitodeinformaoesuasrelaesfortescomosconceitosdelinguageme smbolocomoobjetodeestudodaCinciadaInformao(CI),emumaperspectiva filosfica,apoiadapelosuportetericooferecidoporRafaelCapurro,emdilogocom doisfilsofossituadosentreoidealismoeorealismoqueconstruramseussistemas filosficos na primeira metade do sculo XX. Essedilogopartir,portanto,dohorizonteoferecidoporCapurro(2014a);ou seja, a possvel relao entre hermenutica e Cincia da Informao com base em uma eventual subordinao da Cincia da Informao Retrica. Mas, o que Capurro quer, exatamente, dizer com isso? Como podem Cincia e Retrica serem equiparados como saberes cientficos? Em linhas gerais, o que acreditamos encontrar em nosso caminho investigativo um espao para discutir a mediao retrica da Cincia da Informao comosabercientficodemodoasustentarapossibilidadedeumaracionalidade 12 retrica,reorientandofilosoficamenteopoderdalinguagem,pararepensaranossa realidade (ROHDEN, 2010, p. 164). A racionalidade retrica equivaleria a razo provisria (CARDOSO E CUNHA, (2005, p. 9), e se prope a ser o que de mais provisrio se apresenta construo de pura racionalidade, pretendida pelo saber cientfico. A noo de uma razo provisria desenvolvidaporCardosoeCunhaencontra-seamparadonoseguinteargumentode Abbagnano: Searazoinfalveleainvestigaohumanapodeserconfiadasregras infalveisemqualquercampo,nohlugarparaaRetrica,queaarteda persuaso.Mas,se,naesferadosaberhumano,apartedoincerto,do provvel,doaproximativomaisoumenosampla,apersuasopodeter alguma funo e a sua arte pode ser cultivada (ABBAGNANO, 2007, p. 57). Desse modo, se podemos entender que os sentidos da informao no passam de mera abstrao atravs de conceitos e da linguagem; conforme o entendimento dos estudiosos da Retrica, a lngua palco da oposio entre diferentes pontos de vista e doconfrontodassubjetividades(MOSCA,2004,p.17).Assim,sendoaretricaesse palcodesubjetividades,noscolocamosaquestionaremquebasealinguagem,a informaoeosmbolosearticulamcomarealidade.Eporessecaminhoquetentaremoscaminharcomdoisfilsofos,aparentementedivergentes,masque,se dialogarem por intermdio de Capurro, nos parecem em certo sentido complementares para a compreenso de um Cincia da Informao enquanto Hermenutica. De um lado, analisaremos a filosofia de Ernst Cassirer (1874-1945), um idealista alemo de origem judaica que pertenceu a Escola de Marburg, sendo o mais destacado representantedochamadoneokantismoeautordeumainteressantefilosofiadas formassimblicas.Dooutro,XavierZubiri(1898-1983),umfilsofoespanholrealista cujapesquisaereflexoseconcentrou,fundamentalmente,noscamposdaTeoriado Conhecimento, da Ontologia e da Gnosiologia, tendo desenvolvido, no nosso entender, uma consistente teoria da realidade e da inteligncia. Para Zubiri (2011b,p. 127), conhecer oqueuma coisa inteligir sua realidade profunda,inteligircomoestatualizadaemseufundamentoprprio,comoest construdanarealidade comoprincipio mensurante.Assim, oconhecimento sem 13 dvidaintelecoporserapreensodorealcomoreal.Nafilosofiazubiriana,o homem constitudo como um animal de realidades. Por outro lado, Cassirer (2012, p.48) afirma que no estando mais num universo meramentefsico,ohomemviveemumuniversosimblico.Fazempartedesse universo,alinguagem,omito,aarte,areligioeacincia.Assim,nafilosofia cassireriana das formas simblicas, o homem deixa de ser um animal racional e passa aserconstitudocomoumanimalsimblico,poisarrebatadopelacrescente complexidade da realidade do mundo, o homem serve-se de um sistema simblico para conhec-la.AcreditamosqueodilogoentreCassirer/CapurroeZubiri/Capurropodernos indicarpistassobreseseriaainformaosimplesmentelinguagem-smboloouuma expresso essencial da realidade. O conceito de realidade tomado com freqncia em oposio ao de idealidade. Nessesentido,humaparentedesencontroentreafilosofiadarealidadeeda inteligncia zubiriana e a filosofia das formas simblicas cassireriana; o que no sugere, entretanto,aimpossibilidadedeseinvestigararecolocaodosconceitosde informao,linguagemesmbolonumeventualdilogoentreessesautoreseRafael Capurro, autor amplamente utilizado pelo campo, em uma perspectiva integradora. Oestudoquepropomos,portanto,temcomoobjetivodiscutirasmargensde definiodeumconceitodeinformaosimblica,dotadonosdeclareza terminolgica,mastambmtilnacolocaodoproblemadarealidadeentreduas perspectivas, umarealista e outra idealista, no mbito de uma Filosofia da Cincia da Informao. Trata-se, portanto, de um problema filosfico e no cientfico que vai alm de definir simplesmente o que Cincia da Informao, mas para que serve a Cincia da Informao atravs de um dilogo entre Cassirer e Zubiri, no entre si, uma vez que talvezessedilogonosejapossvel,mas entreesteseRafaelCapurro,umautorde refernciaparaocampoquenosofereceumaabordagemsatisfatriasobreas perspectivas e horizontes que acreditamos ser possvel para a presente investigao. 14 Coloca-se, nesse nterim, a questo que nortear o presente estudo: Emquebasessearticulamasrelaesconceituaispossveisentre informao, linguagem e smbolo, em um dilogo entre concepes realistas e idealistas, e de que modo esses conceitos podem servir para a construo deumconceitodeinformaosimblicanocontextodeumaFilosofiada Cincia da Informao?Nossahiptese,portanto,baseia-senapossibilidadedainformao,enquanto linguagem-smboloserexpressodarealidadeeumamanifestaoaristotlicana naturezasocialdohomemnologos;e,aCinciadaInformao,enquantouma Cincia Hermenutica estar amparada filosoficamente por uma Filosofia da Cincia da informao enquanto uma Antropologia Filosfica. Nesse sentido, supomos que dilogo entre Ersnt Cassirer e Xavier Zubiri, intermediado de Rafael Capurro, poderia ser til no aprofundamentodaCinciadaInformao,ondeaoconhecimentoexpressar-se-ia comolinguagem-smboloeaCinciadaInformaoseriaumagrandeferramentade interpretao dessa informao simblica. Nossa expectativa clarear e ampliar a viso deCapurroouseja,daCinciadaInformaocomoumaHermenuticada informaoenquantolinguagem-smbolo,oferecendo,entretanto,aperspectiva zubiriana como sada para as eventuais aporias da filosofia das formas simblicas, na construo de um conceito de informao no como coisa, mas como uma expresso darealidade,ouseja,retornandoscoisasmesmasdeslocandoacentralidadeda FilosofiadaCinciadaInformaoparaumareflexosobreohomem,parauma Antropologia Filosfica. Natentativadeconseguirumarespostasatisfatriaparanossapergunta norteadora,propomosqueosseguintesobjetivossejamperseguidospelo empreendimento intelectual proposto no presente estudo: 1.Geral: 15 Investigar de que modo o conceito de informao simblica pode servir como categoria de anlise deuma Filosofia da Cincia da Informao orientada para a interpretao da realidade. 2.Especficos: Descreveroconceitodeinformaoapartirdoquesetemestudado nocampodaCI,demodogeral,enaobradeRafaelCapurro,em especial,apartirdosaspectosfilosficoseparadigmticosque norteiam esse autor; Descreverosconceitosdelinguagemesmboloesuaspossveis relaes,apartirdaperspectivacassireriana,discutindoasrelaes possveis com o conceito de informao. Descrever,soboenfoquezubiriano,osconceitosdeintelignciae realidadeesuasrespectivasrelaesediscutindoaspossveis relaes entre esses conceitos o conceito de informao. Exploraraspossibilidadesdaaplicaodoconceitodeinformao simblica em seus aspectos hermenutico-filosficos na CI a partir do dilogo entre a idealidade e a realidade, a partir das filosofias de Ernst Cassirer e Xavier Zubiri, em contraponto ao horizonte de uma Filosofia da Cincia da Informao em Rafael Capurro. Nossapropostametodolgica,emsntese,sugereaadoodomtodo uma pesquisa terica do tipo exploratria orientada para a recuperao, atravs depesquisabibliogrficadosconceitosdeinformao.Emseguida descreveremososconceitodelinguagem,smbolo,intelignciaerealidade centraisnosfilsofosescolhidos;ouseja,CassirereZubiri.E,finalmente, promoveremos uma anlise explicativa conjugando uma hermenutica em torno dosautoresemdilogocomRafaelCapurroe,finalmente,umaanlise conceitual para a constituio de um mapa do conceito de informao simblica a partir do nosso referencial terico. 16 2 A CINCIA DA INFORMAO E SUA FILOSOFIA A diversidade de conceitos sobre informao nos obriga a um esforo conceitual a fim de buscar uma definio que sirva aos propsitos da investigao que se prope; ouseja,nocasodopresenteestudo,aaproximaoentreinformao,linguageme smbolo,emumaperspectivafilosficacujomaiorproblemarelacionarinformao comlinguagemesmboloemumaperspectivadialgicaentreduasconcepes:uma idealista e outra realista. Nessecaptulo,propomos,emprimeirolugar,resgataralgunsconceitosmais freqentesnaCinciadaInformao,iniciandoporZeman(1970),Belkin(1978), passandoporFarradane(1979),Brookes(1980),Buckland(1991;1999),Rayward (1996),Eugenio,FranaePerez(1996),Bates(1999),HJRLAND(2000),Wilden (2001), Floridi (2002) e, finalmente, desaguando em Capurro (1985, 2000, 2003, 2014a, 2014b).Apsesseresgate,partiremosdeCapurro,quesernossoprincipalaporte tericoparaodesenvolvimentodeumaabordagemfilosficaquesirvaparaa compreenso no do que se proporia ser uma filosofia da cincia da informao. 2.1 Aspectos gerais do conceito de informao Se,conformedisseEinsteinaHeisenberg,verounoumadeterminadacoisa dependedateoriaqueutilizamos,sendoateoriaquedecideoquepodeser observado(apudILHARCO,2003,p.45),anodefiniodeinformaoaceita universalmentefazcomquemuitoscaminhospossveispossamsertomadosquando olhamos para a informao enquanto objeto cientfico. DeacordocomZeman(1970,p.156),ainformao,porumaabordagem filosfica idealista, seria algo criado e ativado pelo pensamento. Por outro lado, em uma abordagem materialista, haveria, atravsdeuma prtica social, a unio entre sujeito e objeto,oqueresolveriaumacontradioentreidiaerealidadeatravsdoato.Para esse autor, informao qualidade da realidade material a ser organizada (qualidade deconservaresseestadoorganizado)esuacapacidadedeorganizar,declassificar em sistema, de criar (capacidade de desenvolver organizao). 17 NoescopodaCinciadaInformao,apartirdeumaleituradeBelkin(1978), destacamosoconceitodeinformaocomoumaespciededescritordeinteraes nofsicasentrehumanos,mquinaseuniversos;umdescritorparaoconhecimento; comoumaspectodacomunicao;comoestruturaqueresultadaorganizaode dadosedeexperincias;ou,ainda,comoumaestruturaodesignos,textosou mensagensorganizadoscomaintenodeafetaraestruturacognitivadequem recebe. NaconcepodeFarradane(1979),informaoseriaumaformafsicade representaodoconhecimentoe/oupensamentousadacomfinalidade comunicacional.Paraqueessarepresentaotenhasentido,necessrio,segundo esseautor,quehajarelaoentrequemproduzequemafetadopelainformao representada.Assim,arepresentaodainformaonecessitaestarconectadaaos fenmenos mentais do indivduo e deve constituir-se de uma comunicao intencional. Brookes(1980),porsuavez,defineinformaocomoumcontedointelectual, existenteapenasnombitocognitivooumentalqueapenaspodeseracessvelans comolinguagem.Paraele,ainda,ainformaorepresentaumelementopara incrementodeconhecimento,onde,umnovoestadodeconhecimentoalcanado quandoumincrementodeconhecimento,adquiridopormeiodeumincrementode informao, acrescentado ao estado de conhecimento pr-existente. Qualquercoisaoudeveserinformativaetudooudeveserinformao, conformeBuckland(1991;1999).Entretanto,comoentidadequeequivaleenergiae radiaodefiniotambmpresenteemBates(1999)-quenosenvolve,a informao necessita de aparelhos e rgos que passam a captar em uma determinada freqncia ou quando nossos sentidos esto preparados para reconhec-la. Para esse autor, ainda, a informao deve ser considerada apenas por conta de sua relao com conhecimento;poresseltimoderivardelaque,emcertosentidoseriaconsiderada comoumprocessocapazdeinformar,comunicare,porsuavez,reduzirincertezas; conceito tambm presente em Eugnio, Frana e Perez (1996). 18 Rayward(1996),recuperandoMackey(1950),defineinformaocomoquase tudo.Paraele,ahistriadouniversoaprpriahistriadoprocessamentoda informao; assim como, em um contexto social, a histria humana tambm. Para este autor,ainda,informaoseriatudoaquiloqueapreendidooudito;ouseja, inteligncia, notcia etc. Na virada do sculo, Hjrland (2000), afirmou que informao no uma coisa, masquecoisaspodemserconsideradascomoinformao.Paraele,oconceitode informaopossuiambigidade,podendoserumaformasubstitutadotermo documento,assimcomoumaunidadeintangveloudadosempotencialcapazesde serem processadas e gerenciadas por um sistema de informao. DeacordocomWilden(2001,p.11),umtericosocialbritnico,ainformao tem dois sentidos: um clssico, ou mtrico, como quantidade; e um outro pertencente a uma abordagem diversa e qualitativa; a organizao da prpria variedade. Para ele, a informao biolgica, tal como a informao social, caracterizada invariavelmente por distines qualitativas, de nveis e tipos de variedade e ordem (p. 26). Enquanto a abordagem mtrica ocupa-se, sobretudo, com uma nica e limitada forma de valor de troca na comunicao; a outra, a abordagem qualitativa, interessa-se por vrios nveis e tipos de e tipos de valores de troca (e.g., o simblico) e tambm peloproblemamuitomaiscomplexodosvaloresdeusonacomunicao(p.12),ou seja, informao para que finalidade e para quem. ParaWilden,oconceitodeinformaofacultauminstrumentoparaexplicar porquerazesocontextonecessrioaosignificado(p.15).Paraesseautor,sem contextonopodehaverinformao,umavezqueainformaospodenascerno mbitodocontextodesistemasfinalizados,tambmcontextualizadosporordemde complexidade. Nombitodafilosofiadainformao,Floridi(2002)defineinformao,emum sentido tcnico forte, como dados bem formados e significativos e, num sentido tcnico fraco, como dados registrados ou documentos. Para ele, pode configurar-se como algo 19 quepoderserdito,ouseja,terumcarterfactual,mastambmserumfenmeno relacional,umprocessocapazdedarformaaalgoquepossaseridentificadoou compreendido e, ainda, um elemento que substitui a coisa que ela representa, ou seja, dados, fatos, eventos ou conhecimento das coisas. Comoarecuperaodealgunsautorespodedemonstrar,umaparentedesafio paraodesenvolvimentodeestudosemCinciadaInformao(CI)afaltadeum consenso sobre o que informao, mesmo dentro do prprio campo.De acordo com Brookes(1980,128),aCIummisturapeculiardelingstica,comunicao,cincia dacomputao,estatstica,mtodosdepesquisa,juntocomalgumastcnicasde biblioteconomia, tais como indexao e classificao.Matheus(2005,p.141)afirmaqueasdificuldadesencontradasnadefiniode umconceitobsicoeainterdisciplinaridadequecaracterizaareaacabamlevando diversos autores a empreender esforos nas experincias interdisciplinares e no prprio conceitodeinformao.Oquefaz,segundoele,conduziraabordagensmutuamente exclusivas, baseadas em disputas paradigmticas, que no ajudam a concentrao de esforos de pesquisa e dilogo na rea (ibidem). A viso desse autor, de certo modo, compartilhada por Dantas (2012, p. 21) que afirma ter uma ntida impresso que cada pesquisadorouestudioso,aodefrontar-secomumasituaoquelheparece relacionada informao, precisando caracteriz-la, conforma-se em lhe sugerir uma definio ad hoc, utilitria, quando no intuitiva. claroque,porserumelementocapazdedirecionarasaeshumanas,a informao no um fenmeno neutro e muito menos circunscrito apenas aos crculos acadmicosecientficos.Assim,naperspectivaabordadaporCapurroeHjrland (2007, p. 193), fcil perder a orientao quando se estuda informao. Afinal, muitas so as possibilidades de descrever o fenmeno informacional e muitos so os conceitos inseridosemestruturastericasmaisoumenosexplicitas;oquenosimpema necessidadedeumaanlisedistanciada,pormampladainformaoedaCI, enquanto campo de estudo dos fenmenos informacionais. 20 A partir dos conceitos levantados at aqui, partiremos para uma breve descrio dosconceitosdelinguagemesmboloapartirdeumreferencialfilosficoquepossa estabelecerconexescomainformaocomessesdoisconceitos.Aseoque iniciaremosprope-se,portanto,aesboarumasriedeconsideraessobrea linguagem e o simbolismo linguistico que, mais a frente, desaguar em Rafael Capurro, com a sua proposta de uma sada hermenutica para os estudos informacionais.2.2 Algumas relaes entre Informao, Linguagem e Simbolismo [...] a linguagem, longe de ser um meio transparente que ele [o filsofo] gostaria deimaginar, ouapriso mtica cujaslimitaesele teme, est emsuas mos para ser transformada (NEF, 1995, p. 163). Uma abordagem filosfica da linguagem pressupe um olhar atento histria da filosofia.Assim,dospr-socrticosaWittgenstein,passandopelaIdadeMdiaepelo Iluminismo, muitos filsofos pensaram a linguagem e, com isso, podemos entender que muitosfilsofosestabeleceramaseuprpriomodoumaFilosofiadaLinguagem (SALDANHA; GRACIOSO, 2014, p. 3). Afilosofiadalinguagemsurgecomopossibilidadeconcretadeanliseda informaoesuarelaocomosprocessosdeaprendizagem,umavezquea linguagem tambm desempenha um papel fundamental na formulao de informaes, realizandoseuprocessamento,seuarmazenamento,suarecuperaoesua organizao(LOGAN,2014,p.80),alinguagemtambmumaferramentaparao desenvolvimento de novos conceitos e idias (VIGOTSKY, 2008). NaesteiradeumaFilosofiadalinguagempragmticaouordinria,oinciodo sculo XX marcado pelo aparecimento de alguns estudos que comearam arebaterasideiasquedefendiamaexistnciadeumalinguagemidealea linguagemcomeaaserentendida,ento,deacordocomsuafuno comunicacional, de modo que a construo de seus sentidos se estabeleceria a partirdastrocassimblicaspraticadasporsujeitosparticipantesdeumaao de comunicao (SALDANHA; GRACIOSO, 2014, p. 21). Assim, o argumento desses autores gira em torno da ideia de que as formas de vidaquecompartilhamoshoje,ouseja,oconjuntodehbitos,crenas, 21 Comportamentosnosonemjogosdelinguagemnemfrutosdeumaevoluo histrica e linear dos acontecimentos. As formas de vida que poderemos vir a compartilhar, os juzos, os consensos a queiremoschegarnosoprevisveisemsuatotalidade,damesmamaneira queosjogosdelinguagemnooso.Emcadapoca,formasdevidaso estabelecidaseoutrasdeixamdeserseguidas,oqueocorretambmcomos jogos.Osignificadodeumaexpressoseriaafunodotipodeusodo simbolismodentrodeumaformadevida(SALDANHA;GRACIOSO,2014,P. 23-24). Desse modo, um olhar sociolingustico do conhecer ganha destaque indo at o solodasprticasdeconstruoedesconstruodainformao.Oquepossibilitaa emergnciadeumpensamentoqueseapianasinstveisestruturasdocotidianoe articula-senainteraodossujeitosqueelaboramconhecimentosedeliberam representaes.Oquedeoutromodo,podemoschamardeconsensossimblicos sedimentadosemmodelosdehabilidadesintticapelosquaisoshomensse comunicam.Assim,alinguagemcolocadacomoamaisrudimentarestruturado cotidianoaserobservada;eprovavelmenteamenosinstvel(SALDANHA; GRACIOSO, 2014, P. 26). ACinciadaInformaoteveemsuaspesquisas,nasltimasdcadas, contribuiesdeteoriasoriundasdediferentescampos.Entreelas,destaca-seum processodereorientaodesuaepistemologia,voltando-separaumametarreflexo focadanalinguagem(SALDANHA;GRACIOSO,2014,p.05).Essedeslocamento filosfico,tambmconhecidocomogirolingusticoseespalhoupordiversas disciplinas.Nessavirada,alinguagemganhacentralidadeetomadacomoobjeto, comopedradetoqueparacompreensodarealidade,estejaelainseridaemum discurso mentalista ou fisicalista (Ibidem).Osargumentos construdos por essesautores (SALDANHA; GRACIOSO,2014, P. 27), a partir de uma leitura da Filosofia da Linguagem e da Cincia da Informao na AmricaLatina,conduzemapossibilidadedeexistnciadeumpragmatismo informacionalqueacontecedentrodeumateoriasimblicadascinciassociaise humanas;oquesugereaarticulaodeatividadeshermenuticaseetnogrficas, baseadas em metodologias qualitativas. 22 Dessemodo,cabedestacarquesendoalinguagemomeioemqueas conversasocorremeomeiopeloqualcompreendemos.Nessesentido,conforme Schmidt (2013, p. 188) sintetizou, a partir de Gadamer, uma disciplina hermenutica do questionamentoedainvestigaopodegarantiraverdadesemsebasearomtodo cientfico. Neff(1995)destacagrandestemasdafilosofiadalinguagem.Soelesa condio metafsica da gramtica; a relao entre lgica e linguagem, entre linguagem epensamento,entrelinguagemerealidadeeaorigemeanaturezadalinguagem. Assim, para ele, necessrio diferenciar o ponto de vista linguistico do ponto de vista filosfico,poisoprimeirotemumadimensocrtica.Afinal,seporumladoa linguisticaseinteressapelasignificao,excluindoasversesradicalmente comportamentalistas; por outro, a filosofia se pem a interrogar sobre as condies da possibilidadedasignificao.E,paradiferenciar,eleargumentaqueparaquehaja umadiscussodotipofilosfico,pelosmenosdoisdostraosqueseseguemdevem estar combinados: Superaodoconceitoempricodelnguaporumconceitogeralde linguagem, passagem da diversidade das lnguas para a unidade da linguagem. Olinguistadescobreuniversaisdalinguagemaofimdeumaanliseformale de uma descrio comparativa; o filsofo prope universais formais. Existnciadeumaproblemticadaorigemdalinguagem,enquantoa lingustica exclui explicitamente essa questo do seu campo. Estabelecimentodeumarelaoentrelinguagemeasoperaesdo esprito,maisprecisamenteentrelinguagemepensamento,aopassoque essa relao afastada da lingustica (e, para esta, liga-se ao psicologismo). Problematizaodaquestodarealidadepelalinguagem,enquantoa lingustica estrutural elimina a realidade do seu campo). Avaliaodalinguagemcomoinstrumentodeaescognitivas(raciocnio, expressodasemoesetc.),podendoiratacrticadalinguagemnatural (NEF, 1995, P. 8-9, grifos nossos). Para ele, a conceituao que, sempre, marca o carter filosfico, e enfim, no sedeveterumaconcepodemasiadaestreitadafilosofiadalinguagem.Edestaca, embora na histria da filosofia, em muitos casos, os cortes so situados em relao emergncia e realizao da razo; no mbito da filosofia da linguagem, o verdadeiro corte se situa no sculo XIV, com o aparecimento do nominalismo radical, e mais tarde pelo aparecimento da lingustica e da lgica formais, no fim do sculo XIX, com Frage (Ibdem). 23 Seguindo a esteira da anlise de Nef (1995, p. 161), conclumos que emergiram aolongodahistriadasteoriasfilosficasdalinguagemmuitostemas.Aquesto metafsicadagramtica,segundoele,estfortementepresentenaquestoda categorizao(diferenasnome-verbo,partesdodiscursoetc)emostrouqueas grandescategoriasgramaticaisesemnticassosolidriasdeumaconceitualizao metafsica.Jnarelaoentrelgicaelinguagem,Neff(1995,p.61)argumentaque houveumaevoluoqueresultouprogressivamenteemumalgicadalinguagem natural,desdeadoutrinadostermos,emPlato,nooquinianadeparfrase.Sendoalgicaumalinguagemenoapenasumclculo,oautorargumentaquea relaoentrelgicaelinguagemnoumarelaodeexterioridade.Dessemodo, essa relao se daria entre dois tipos de linguagem,oprimeirodesprovidodeimprecisoedeambigidade,construdopara exprimirsimbolicamenteoraciocniocorreto,cientficoeprincipalmente matemtico;osegundo,imperfeitoparaexprimiroraciocnio,adaptadoa impreciso da comunicao cotidiana. [...] A procura da essncia da linguagem, da sua significao para a humanidade inseparveldeumaprofundamentodologoscomolgica.Seohomemo animalquesabefalar,tambm,segundoAristteles,oanimalquesabe raciocinarlogicamente,construirnormaslgicasdoseuprprioraciocnio.As atividades que consistem em dizer as coisas, em raciocinar e em refletir sobre o raciocnio correto so todas as atividades lgicas, no sentido de atividades do logoshumano,soaparentadas,eodivrciofundadordeumacinciada linguagemdiantedalgicadeveserreservadohistoriadosmtodos empricos dedescrio das lnguas. (NEF, 1995, P. 162, grifo nosso). Para Nef (ibidem), uma mutao na relao entre lgica e linguagem teria menos avercomumaemancipaodascinciasdalinguagemqueamutaodaprpria lgica.Paraele,comateoriadasdescriesdaFrege,umnovoregimedeestudo lgicodalinguagemestariailuminando,forteedecisivamente,ascapacidadesda linguagem de referir e significar. Parece notvel, para ele, que a teoria das descries tenhainspiraonessalgicarenovadasemdeixardesepreocuparcomumclssico problema da referncia das entidades no existentes. Avanando,Nefafirmaquenarelaoentrelinguagemepensamento,as noesdelinguagemmentalesignificadoproposicionalsocategorias problematizadoras.Dessaforma,deAgostinhoaOccam,averdadeiraquestoda 24 linguagemmental,emsntese,sabersobreoseugraudeparentescocoma linguagem em geral, e em que medida ela admite essa ou aquela forma gramatical.A existnciadalinguagemmental,apartirdareflexodoautor,incontestvel;assim como as proposies de que ela composta referem-se segundo ele a entidades comstatusontolgicoespecfico.Nessesentido,oautorconcluiqueahistria filosficadalinguagememgrandeparteahistriadastransformaese deslocamentosdoconceitodesignificadoproposicional,daquiloquesignificadopor uma proposio (p. 163). No escopo da relao entre linguagem e realidade, Nef argumenta que se trata de uma relao pode ser traduzidaporumaevoluodorealismo,dorealismoplatnicodasideiasatFrege,e pela emergncia de uma teoria da referenciam da teoria desde a suposio at Russell. O nominalismo, que finalmente apenas um realismo do singular, no incompatvel com o realismo interno ou imanente (NEF, 1995, P. 163). Duas questes temticas ainda ganham ateno do autor. Para ele, o problema daorigemdalinguagem,longededesaparecer,comoseacreditou,deslocou-se,da controvrsia entre convencionalismo e nominalismo at a ontognese da referncia. E, finalmente, a natureza da linguagem natural ser convencional e limitada (Ibidem). Feito essebreve passeio por algumas conclusesde Nefa partirda histriada filosofia da linguagem, passaremos agora tentativa de compreender as relaes entre linguagemesimbolismo,apartirdeumaleituraaindasintticadeTodorov(2014a, 2014b)eBakhtin(1997),masquecertamenteserampliadanopercursodesta pesquisa.Posteriormente,tentaremosestabeleceralgumasrelaesentreessesdois conceitos e a informao conforme aplicado por Rafael Capurro. na linguagem que temos o uso livre e consumado do simbolismo, o registro do pensarconceitualarticulado;semalinguagemparecenoexistirnadasemelhanteao pensamento explcito (LANGER,1971, p. 111). Um argumento, alis, que encontra eco emTodorovquepropeumasolidariedadedosimblicoedainterpretao (TODOROV,2014a,p.22).Entretanto,elediferenciasimbolismolinguisticode simbolismotoutcourt,garantindoaoprimeiromaiorimportnciaparaoestudo, amparado na seguinte justificativa: 25 [...] os conhecimentos de que j dispomos sobre simbolismo verbal so de uma riquezaincomparvelemrelaoquelesqueconcernemaoutrasformasde simbolismo.(Conhecimentos,verdade,dispersosemcampostovariados quantoalgicaeapotica,aretricaeahermenutica.)[...]porqueo simbolismo linguistico o mais fcil de manejar (de preferncia palavras sobre umapgina,enoanimaisdecircosoumodosdesociedade),mesmosendo provavelmenteamanifestaomaiscomplexadosimbolismo.Razesento estrategicamente importantes, mas que no devem mascarar a contingncia da juno entre simbolismo e lingustica (TODOROV, 2014a, p. 21). Para Todorov, a defesa de sua crena na existncia dos fatos simblicos deve-se a recusa de dois pontos de vista bem diferentes: sejam empiristas ou dogmticos. O primeiro,adoslingistas,quesegundoele,refere-seaumarecusaporno reconhecimentoaofatodequeoslingistas,demodogeral,contentam-seem assinalarquenoseocuparodecasosmarginaisdousolinguistico;ouseja,a metfora,aironiaouaaluso.Assim,paraessegrupo,sexisteaquiloque perceptvel, aquilo que diretamente oferecido aos sentidos. O que para Todorov so princpiosdeumempirismocaricaturalmentesimplificados(sic)numaprimeira abordagem, e em seguida assimilados sem reserva (p. 16-17). Emsegundolugar,humavisoprovavelmenteadvindadarecusaromntica dashierarquias,estassituadasnoseiodalinguagem.Trata-sedeumaviso nietzscheana de que no h sentido prprio, que tudo metfora s h diferenas de grau,nodenatureza.Umavisoqueafirmaqueaspalavrasjamaiscapturama essnciadascoisas,sasevocamdiretamente.ParaTodorov,setudometfora, nadao.Aorecusaressesdoispontosdevista,Todorovreafirmasuacrenana especificidade e, portanto, na existncia de um simbolismo linguistico (p. 17). A interpretao do smbolo, segundo Bakhtin (1997, p. 402), continua sendo ela mesmasmbolo,apenasumpoucoracionalizada,ouseja,umpoucomaisprximado conceito.Entretanto,paraele,osentidonosolvelnoconceito.Naleitura bakhtiniana,umaexplicaodasestruturassimblicastemdeentranhar-sena infinidade dos sentidos simblicos; por isso no pode tornar-se uma cincia na acepo destapalavraquandosetratadascinciasexatas.Emboraaumainterpretaodos sentidosnopossaserdeordemcientfica,elaconservaseuvalorprofundamente cognitivo.Pode,ainda,servirdiretamenteprticaqueconcernescoisas. preciso, ainda segundo esse autor, citado Averintsev, reconhecer que a simbologia no 26 umaformano-cientficadoconhecimento,masumaformacientfica-diferentedo conhecimento,dotadadesuasprpriasleisinternasedeseuscritriosdeexatido. ParaBakhtin,ossmbolossooselementosmaisestveise,aomesmotempo,os mais emocionais; referem-se forma e no ao contedo (p. 409). Emumcontextohermenutico,porm,ossmbolosdesignamummodo especfico de funcionamento da linguagem (SILVA, 2010, p. 48).O smbolo sempre linguagem e no existe antes do homem que fala, mesmo que o seu poder mergulhe as suas razes em algo mais profundo e anterior linguagem (Ibidem). Nesse sentido, as possibilidades de interpretao da funo significativa da linguagem-smbolo, a partir de PaulRicoeur,soduas,radicalmenteopostas,segundoCeia(2015).Porumlado,a hermenuticadaconfiana,queacreditanopoderprospectivoereveladordos smbolos.Poroutro,ahermenuticadasuspeita,que,porsuavez,acentuaoseu poderdissimuladoreefetuaumainterpretaoredutoraearqueolgicadetodaa simblicahumana.NasperspectivasdeRicoeur,humanecessidadede enfrentamentodacomplexidadedesseconflito,tornandocompreensveladimenso significativaouhermenutico-especulativadaprprialinguagemfaladapeloseaos homens. Assim, a explicitao do n semntico de toda a hermenutica, tarefa em que Ricoeurconcentra,alis,oncleodasuahermenutica,exigeumareflexosobrea ambigidadeouparadoxoconstitutivodaprpriaestruturasignificativada linguagem, que funciona como smbolo. Smbolo, alis, que para Ricoeur (apud Silva, 2010, p. 48) no existe sem interpretao e sactuaquandoasuaestruturainterpretada,pois,comefeito,na interpretaoquesedescortinamosdoisnveisdesignificadoda intencionalidadesimblica;oprprioreconhecimentoenoosentidodo sentidoliteraldosmboloquepermitepercebercomoesteremeteparaoutra dimensosignificativa,semaqualeleprprionadasignifica(SILVA,2010,P. 48). Mas,Porquepossuemoshomenslinguagem?perguntaLanger(1971,p. 146).Aresposta,segundoelamesma,,porquetodososhomenstmamesma naturezapsicolgica,quealcanou,naraahumanainteira,umestgio desenvolvimentoemqueousodesmboloseafeituradesmbolosconstituem atividades dominantes. 27 Na teoria geral do simbolismo, proposta por Langer (p. 147), em vez de restringir aintelignciaformasdiscursivaserelegartodaaoutraconcepoaalgumreino irracionaldesensaoeinstintoelaincorporatodaatividadementalrazo.Opensamentodiscursivo,paraessaautora,daorigemcincia,eumateoriado conhecimento limitada a seus produtos culmina na crtica cincia.Asdiferenasentreasreaesorgnicaseasrespostashumanas,nafilosofia, sorealadasporCassirer(2012,p.48).Paraele,noestandomaisnumuniverso meramente fsico, o homem vive em um universo simblico. A linguagem, o mito, a arte e a religio so partes de universo. H em Ricoeur (apud SILVA, 2010, p.49), entretanto, uma concepo demasiado lata do smbolo, que em Cassirer, acaba por fazer equivaler a funo simblica a uma funogeraldemediaopormeiodaqualaconscinciaconstritodososseus universosdepercepoedediscurso.Paraele,talconcepoaounificartodasas funesdemediao[queoespritorealizaentreohomemeoreal]sobotema simblicodaesteconceitoamesmaextensoqueosconceitosentrederealidadee de cultura. H para Ricoeur um aspecto importante do simblico: Querer dizer algo diferente daquilo que se diz, eis o que constitui, num contexto hermenutico,afunosimblicadalinguagemque,paraalmdadupla dualidade estrutural do signo, a do significante e do significado e da significao edacoisa,lheacrescentaumaoutra:adosentidoaosentido(SILVA,2010,p. 49). Umavezqueainscriodarelaocomunicativanaprpriaraizdosentido queosmboloexprime,asimblicaouseja,umacinciadosmbolo,deveser analisadacomoomeiodeexpressolingusticadeumacomunicaoque simultaneamentedoaodesentidoeiniciativadedecifrao.Destarte,aqueleque compreende o smbolo, compreende a realidade e a linguagem, mas uma linguagem diferentedahabitualqueapreende,emeporummeiodoslimitesdaproposio declarativa(Ibidem).Aligaoentresmbolo,reflexoeinterpretao,segundo Ricoeur, aquesto filosfica fundamental suscitadapelaepistemologiado smbolo;e, nesse sentido, ele afirma que o grande interesse filosfico do smbolo tem, pois, a ver 28 com o tipo de reflexo que ele se encerra (p. 50).Assim, ao meditar sobre o smbolo, elerompecomombitoencantadodafilosofiadareflexoedaconscinciadesie repensaascondiesdoatofilosfico,assumindoqueacondiohermenutica, linguisticoencarnadaeporissomesmointersubjcetivadopensarqueamistura originria de smbolo e interpretao faz meditar (p. 51). Ealinguagemcomobasedacomunicaohumanaquepermitiuaohomem, segundoMessias(2005,p.29),intercambiarsuasidias,emoeseexperincias, promovendoodesenvolvimentodecivilizaesmodernasondetrocaeaquisiode informao um processo constante. Paradoxalmente, a mesma linguagem que atua comoarmazenamentodapercepoecomotransmissordaspercepese experincias de uma pessoa ou de uma gerao para outra ao atuar como tradutora e celeirodaexperinciatambmredutoraedeformadoradessamesmaexperincia (MCLUHAN: 1974, p. 162). No pensamento bergsoniano6 (apud McLuhan, 1974, p. 97-98), a projeo do homemnafalaquepermiteaointelectodestacar-sedavastidoreal.Assim,sema linguagem,aintelignciahumanateriapermanecidototalmenteenvolvidanosobjetos de sua ateno. Para Bergson, a linguagem para a inteligncia o que a roda para os ps, pois lhes permite deslocar-se de uma coisa a outra com desenvoltura e rapidez, envolvendo-se cada vez menos; e, assim, ela projeta e amplia o homem, mas tambm divideassuasfaculdades.afalaqueestende,manifestaeexpetodososnossos sentidos a um s tempo. Assim, a linguagem sempre foi considerada a mais rica forma de arte humana, pois que a distingue da criao animal. Messias(2005,p.29)argumentaquearepresentaodasideiasmediantea utilizaodesmbolosoquecaracterizaalinguagemcomosendoindispensvelao processodecomunicaoetransmissodeinformao.Mas,cabeaquiumapausa paraquestionamento,antesdeprosseguir:seriaalinguagemapenasummeiode 6 Henri Bergson foi um filsofo francs que viveu e escreveu dentro de uma tradio de pensamento que consideravaa lngua como uma tecnologiahumana que debilitoue rebaixouosvalores do inconsciente coletivo.(MacLuhan, 1974, p. 98) 29 transmissodainformao,umaespciedeinformaocompartilhadaouseriaa linguagem a prpria informao? De acordo com o fsico e filsofo C. F. von Weizsaecker7 (apud PEREIRA: 2002, p.347-349),natentativaderesponderperguntasetodaalinguagemsedeixa comutartotalmenteemquantadeinformao,quesesituarianocontextodo conceitoplatnico-aristotlicodeforma,atualizada,segundooautor,sobnovas roupagens.Destarte,eleargumentaqueoconceitodeinformaopressupeporsi mesmoumaespciedelinguagem,quesenopodeconvertereminformao(p. 347). A informao uma forma ou estrutura de um grau superior de abstraco, com o carcter lingustico comum forma da escrita e s sries na corrente de uma mquinadecalcular,masondepredominaaunivocidadedesentidocomono clculo lgico. A linguagem no pode reduzir-se informao nem formalizar-se totalmente, porque toda a reduo e formalizao pressupem sempre o uso da linguagemnaturaloumetalinguagememquesefalasobreoclculoouas linguagensartificiais.Quemfaladeinformao,nopodeesquecerquetal discursospossvelapartirdeumalinguagemnatural,prximadavidae irredutvel a toda a informao unvoca. (PEREIRA: 2002, p.349)A palavra falada foi a primeira tecnologia pela qual o homem pde desvincular-se deseuambientepararetom-lodenovomodo.Aspalavrassoumaespciede recuperaodainformaoquepodeabrangeraaltavelocidade,atotalidadedo ambienteedaexperincia.Aspalavrassosistemascomplexosdemetforase smbolosquetraduzemaexperinciaparaosnossossentidosmanifestosou exteriorizados. Elas constituem uma tecnologia da explicitao (McLuhan, 1974, p. 76-77).ParaAuroux(2009,p.21),oprocessodeaparecimentodaescritaum processodeobjetivaodalinguagem,ou,derepresentaometalingustica considervelesemequivalenteanterior.Aescritateria,segundoesseautor, desempenhado um papel fundamental na origem das tradies lingusticas (p. 22). Em sntese,aobradeAurouxsustentaatesedequeagramatizaorepresentauma revoluotecnolgicaqueteriasidoresponsvelpelatransformaodaecologiada comunicaohumana,favorecendoaoocidenteummeiodeconhecimentoe 7ConfernciaintituladaLinguagemcomoInformaopronunciadapornaAcademiaBvaradeBelas Artes, em 1959. 30 consequente dominao sobre as demais culturas do planeta. Para ele, essa revoluo tecnolgica teria sido to importante quanto a revoluo agrria do perodo Neoltico e a Revoluo Industrial do sculo XIX. ParaLogan(2014,p.67),alinguagemomeiopeloqualainformao simblicaformuladaecomunicada.Esteautordescreveaorigemdalinguageme suas conexes com o pensamento e a informao. Para ele, a linguagem evolui a partir dafala,passandopelaaescrita,pelamatemtica,pelascincias,pelacomputaoe, finalmentepelainternet.Eleprocuracompreenderasrelaesentreinformao, linguagem e cultura e a propagao da organizao na simbolosfera.Para Logan (p. 118), simbolosfera definida como a mente humana, inclusive o pensamentosimblicoabstrato,alinguagemeaculturaeincluitecnologia,cincia, governo e economia. Todos esses elementos representam, para ele, a propagao da organizao.Porsermosanicaespciecapazdeconceituaoesimbolizao, somoscapazesdelidarcomprocessamentodeinformaessobrealgoquenoest presenteaosnossossentidosnoespaoenotempo.Ouseja,somoscapazesde entraremumarelaosemiticacomumsmboloabstrato(p.120-121).A simbolosferaloganianaformadaportrselementos:mente,linguagemecultura(p. 172). PodemosextrairdotrabalhodeLogan(p.253-256),algumasconsideraes interessantes. Primeiro, a informaono um invariante e suadefinio depende do contexto no qual est sendo usada. Segundo, a cultura humana e suas subunidades, a saber: linguagem, tecnologia, cincia e economia so organismos vivos, simbiontes obrigatriosquepropagamsuaorganizaoeestoabertasinformao.E, finalmente,ainformaosimblicadopensamentohumanodiferentementeda informaobitica,contidanoDNA,RNAeprotenasimaterial,umpadrode smbolos.Assim,todasasformasdevidaatualmenteconhecidascontminformao baseadaempercepo,massomenteossereshumanospossueminformao simblica. 31 Ateaquiconceituamosinformaoemseusaspectoscientficosefilosficos. Estabelecemos alguns pontos a nosso ver centrais nas possveis abordagens filosficas sobrealinguagemeumabreveintroduosobrearelaoentrelinguageme simbolismoquepretendemosaprofundarapartirdaleituradeErnstCassirer.Agora, passaremosaumadescriodasnoescapurrianasdeinformao,dacinciada informaoesuafilosofia.RafaelCapurroumautorcentralnonossopercurso,pois serporintermdiodelequetentaremospromoverumdilogohermenutico8entre ErnstCassirereXavierZubiri,dilogoquesedarnodecorrerdenossopercurso investigativo. 2.3 Rafael Capurro e a filosofia da informao NascidoemMontevidu,noUruguai,em1945,RafaelCapurroumfilsofoe professoracadmico uruguaio quedesenvolveu sua carreiraacadmica na Alemanha, maisespecificamentenaEscolaSuperiordeMdiasdeStuttgart(Hochschuleder Medien Stuttgart). Dedica-se aos estudos informacionais, mais precisamente nas reas de Cincia da Informao e tica da Informao. Uma de suas preocupaes tem sido fundamentar a relao entre Hermenutica e Cincia da Informao a partir de uma clara subordinao entre a retrica e a Cincia daInformao.ParaCapurro,aHermenuticapartedaRetrica.Nessesentido,ele entendequeaCinciadaInformaoseriaumaespciedeumasub-disciplinada retrica.(CAPURRO,2014a).Praele,umaconcepohermenuticapoderiaser traduzida como um ser no mundo em relao aos outros. A inteno de Capurro oferecer uma contraposio virada cognitivista em que sepressupunhaumarelaodestitudadecontextoentreosseres.Aalternativa oferecidaporeleseriaasuperaodestaviradaporumaviradapragmticaorientada para a apreenso da informao atravs da nossa interao do homem com o mundo. 8 Segundo Bleicher (2002, p. 359), no escopo da hermenutica contempornea, o dilogo segue a lgica doquestionamento,emqueaquelequequestionaestaaserquestionado(Gadamer);ouainda, desenvolve-se a partir do reconhecimento recproco de sujeitos e, consequentemente, inclui uma relao dialtica entre o geral e o individual (Habermas). 32 No entendimento de Capurro (2014b, p. 111), um dos grandes temas filosficos do sculo XX tem sido a relao entre homem, mundo e linguagem; esta no algo um neutroetransparentequenosfazperceberarealidadecomoela,mascomo possibilidade inevitvel de conhecimento e ao humana. Conformedemonstradoataqui,oconceitodeinformaovemsofrendo,no decorrerdotempo,umprocessonaturaldeevoluoemodificao.Otermo,apesar de ter ganhado mais destaque no sculo XX, onde foi freqentemente confundido com comunicao,dado,instruoeconhecimento,remontaaantiguidade(CARDOSO, 1996,p.71),nosendopossvelafirmarcomprecisoemqueperodootermofoi cunhadopelaprimeiravez.Capurro(1985),entretanto,afirmatersidoSoTomsde Aquinooprimeiroacunharotermoinformatioemlatimimplicandoaelesentidos ontolgicos,epistemolgicos,pedaggicoselingsticos.Capurro,nessesentido, refere-seutilizaoepistemolgica,apontandoaexistnciadeumaestreitaligao entre informao e os conceitos de inteligncia e percepo.Para Capurro, a partir de Aquino,acompreensohumananonempuramenteintelectualnempuramente sensvel, mas uma unidade de ambos.Navisocapurriana,conformeindicadoporseusignificadooriginalemlatim,o termo informatio est muito perto de seu significado para o conceito de representao, que um conceito-chave da cincia cognitiva moderna. Entretanto, o autor levanta trs tipos de problemas a respeito do conceito moderno de representao. So eles: (a) tipo de conhecimento a ser representado; (b) como deve ser representado; e, (c) para quem deve ser representado. A partir de Machlup, em The StudyofInformation9,Capurro afirma que asduas primeirasquestesestoconcentradasnombitodascinciascognitivas.Aterceira, segundoele,estdirecionadaparaumproblemabsico.Asrepresentaesdo conhecimentonopodemserconsideradascomotalporqueessasrepresentaes estorelacionadasaumintrprete.Esseproblemalevantaumaquestosobreo entendimentohumanocomoumprocessodeinterpretao,emespecial,como 9F.MachlupandU.MansfieldEds.:TheStudyofInformation.InterdisciplinaryMessages.NewYork, Wiley 1983 (apud CAPURRO, 1985) 33 interpretao do conhecimento representado. Trata-se, portanto, de uma questo-chave da abordagem hermenutica.Emseuartigode1985,Capurroiniciaumesboodoqueseriaumafundao hermenutica da CI, delimitada no que diz respeito a uma teoria geral de informao e comunicao.Paraele,taisdelimitaesso,geralmentecontroversas,poisocampo dainformaocientficaetcnicaprovousermuitorestritanoquedizrespeito informao da sociedade e para todos os tipos de informao profissional que no so produzidospor centros depesquisa e similares. Nesse sentidoamplo, o autor utiliza o termo informao especializada.OconceitodeinformaoemCI,apartirdeCapurro,incluitrselementos:(a) umacomunidadeprofissionalcompostaporprodutores,intrpreteseusuriosde informaoespecializada;(b)umcampoespecficodeinvestigaooudeaopara qualcontedosobjetivadosdevemsereferirprincipalmente;e,(c)umprocessode comunicao atravs do qual eles so compartilhados pela comunidade de intrpretes. Emsntese,esseseria,segundooautor,oparadigmahermenuticodeumaCincia que,segundoMarthaWilliams(apudCapurro),buscadecompreenderanaturezada informao, a interao do homem com a informao, e o processo de comunicao. O tema da CI seria informao e as comunicaes humanas seriam seu problema. Combasenaretricaaristotlica(CAPURRO,1991,p.9;CAPURRO; HJRLAND,2003,p.365),apresentamtrsdilemasrelativosbuscadeuma unificao do conceito de informao: a)Univocidadeatentativadeusaromesmosignificadodeinformaoem todos os nveis e reas do conhecimento poderia causar a perda de todas as diferenas qualitativas; b)Analogiaconsiderandotodoconceitodeinformaocomoalgosimilar,se deve definir qual o significado original; c)Equivocidadeconsiderandoinformaocomoalgodiferente,comoocorre, por exemplo, com a informao na fsica e na educao. 34 DeacordocomMatheus(2005),oprimeirodilemaimplicariaemperdade informaoqualitativa;osegundo,nadificuldadedeidentificaroconceitobsicoou primrio ao qual as analogias se referem; e, o terceiro, implicaria em enganos, uma vez que os conceitos so diferentes. Para Matheus, O Trilema de Capurro, bem como conseqentes dificuldades oriundas da busca deumadefiniouniversalmenteaceitadotermoinformao,podeserassim sintetizado:aomesmotempoemquenopossvelestabelecerumconceito nicoparainformaoemtodasasreasdoconhecimento,asdiferentes disciplinascientficasbuscamconceitoscompatveisafimdepermitira interdisciplinaridadeeodilogo,oquepodelevarperdadequalidade,a analogias inadequadas e a equvocos (MATHEUS, 2005, p. 154). Emumaperspectivahermenutica,ainformaopodeserentendiacomo processonecessrioformaodoconhecimentohumano,permitindoaoindivduo uma troca dos contedos internos com o mundo exterior, apreendendo os sentidos dos objetos materiais exteriores a ele. Atravs dessa abordagem, o homem na condio de serqueconheceganhariaacapacidadedeinformaromundoqueocercaatribuindo sentidoscoisas,poisainformaoseefetivariaporumamediaoentreamente humanaeosobjetospercebidospelosnossossentidos.Emsntese,acompreenso humanano se darianem puramentepelo intelectonem puramente pelo sentido, mas pelauniodessasduasformasdeperceberarealidadequeseriaapreendidapelos sentidos, representada pela imaginao e finalmente tornada inteligvel pelo intelecto.Assim, para Matheus (2005) a hermenutica seria o nico paradigma disponvel paraarea,sugerindoqueapesquisaemCIdeveseocorreratravsdeprogramas depesquisainterdisciplinares,comabordagensfilosficas,tericaseprticas, agregados em torno de temas, ou problemas. Emumaabordagemhermenutica,conformepropostoporCapurro,Matheus identificaquestesessenciaisemrelaoinformao:anecessidadedeanlisede seuimpactosocial,ainformaoeadesinformaoeaexistnciadediferentes discursos e interesses pessoais e sociais. A necessidade de interpretar a informao (hermenutica);necessidadedecontextoparapermitirainterpretaodainformao; informaocomoumconceitointerdisciplinarsocolocadascomocaractersticas 35 essenciaisdainformao(CAPURRO;HJRLAND,2003,p.356),umavezqueela temsignificadosdiferentesparasujeitosdiferentes,quetmdiferentesinteresses. Nessaperspectiva,considerandoascaractersticasessenciaisdainformao,eno apenasainformaocomocoisa(materializada),possvelavaliarosaspectos pragmticos,ouresultadoseinteressessociais,envolvidosnouso,geraoe disseminao da informao (CAPURRO; HJRLAND, 2003, p. 396-397). De acordo com Matheus,ApropostadetornaraCIumadisciplinadahermenuticaparecedemasiado influenciadapelaformaofilosficadeCapurro,ecolocaimportantes realizaes desta rea do conhecimento em segundo plano. Por outro lado, ele teorizasobretemas,conceitosepesquisadoresessenciaisnaCI,concluindo, ora que a CI uma disciplina da hermenutica, ora que a teoria da mensagem umafundamentaotericaadequadaparaaCI.Noentanto,nodetalha comoseria a prticada pesquisaemCItomando tais abordagens oriundasda filosofiacomobase.Pode-se,assim,concluirqueahermenuticauma possibilidadedefundamentaofilosficaparaaCI,masnoanica,eque faltam elementos tericos e prticos a serem considerados (MATHEUS,2005, p. 162).Seahermenutica,grossomodo,umaartedainterpretao,paraCapurro (2000)qualquerinterpretaopressupeumprocessodetransmissodemensagens, ondeotextoaserinterpretadotemqueserpreviamentetransmitidoecomunicado. Assim,paraoautor,todahermenuticapressupeumaAngeltica;ouseja,uma cinciadasmensagensedosmensageirosqueseocupariatantodofenmenode construo da mensagem como no contexto de ao e compartilhamento da mesma. Smith(2000)afirmaqueapreocupaodeCapurrodecorreriadeuma preocupaoanteriorcomosfundamentosepistemolgicosefilosficosdaCIcomo interesse de unificar a compreenso do papel da informao no cerne da vida humana edasociedadeglobalemumatentativadeumadefiniounificadaparaesclarecera fundamentaodoprprioconceitodeinformao;queseriatomadocomouma mensagemquefazdiferena,sejacomoforma,sejacomoumaespciedeofertade sentido,umateoriaquetantosereportanoogreco-latinadainformaocomo perspectivacomunicacionalmodernaquebuscaria,nalinguagem,apossibilidadede pensaromediadorentreoshomens,oatorque,apartirdareflexoedaprxis informacional, prope solues para os dilemas do mundo (SALDANHA: 2014, 118). 36 Nessa situao, a hermenutica seria uma das perspectivas filosficas para a CI, masnoumparadigmanicoparaarea.Comotrabalhosfuturos,osprogramasde pesquisainterdisciplinaresnaCIdevemserabordadoscommaiorprofundidade.Alm disso,existeapossibilidadedesefazerumestudomaisdetalhadosobrepossveis analogiasediferenasentreateoriamatemticadacomunicao,deShannon,ea teoriadamensagem,deCapurro.TalestudopoderretomarapropostadeWeaver feitaem1949(SHANNON;WEAVER,1949),possivelmenteatravsdeumcaminho capazdeestudarasrelaesentreainformaocomosinalfsico(sintaxe),a informao como significado (semntica) e os efeitos da informao (pragmtica). ApsessasntesedopensamentodeRafaelCapurro,passaremosnocaptulo seguinteaexaminarosoutrosfilsofos(ErnstCassirereXavierZubiri)quesero fundamentaisparaaconstruodosargumentosqueservirodebaseparaa construodonossocaminhotericoe,consequentemente,paraquepossamos alcanar os objetivos da pesquisa que estamos propondo. 37 3. FILOSOFIA DA INFORMAO: IDEALIDADE OU REALIDADE? Seoconceitodeinformaosimblicapossuirelaescomosconceitosde linguagem,smbolo,intelignciaerealidade,eessesconceitosemumaperspectiva dialgica tm relevncia para os questionamentos no mbito da Filosofia da Cincia da Informao, acreditamos que se impe investigar as possveis relaes da Filosofia da Cincia da Informao com o idealismo cassireriano e o realismo zubiriano. Nessecaptulo,apartirdaleituraeinterpretaodessesautores(Zubirie Cassirer),tentaremosestabeleceraproximaescomdeconceitosfundamentaisem cadaumdossistemasfilosficosessesautorescomosuportetericooferecidopela CinciadaInformao,tentandocomissodesfazeroaparentedesencontroentreos pressupostosrealistaseidealistas,apontandoaspossibilidadesderecolocaodos conceitos de informao, linguagem, smbolo com os de inteligncia e realidade dentro as perspectivas filosficas oferecidas por Rafael Capurro.3.1 Smbolo e Linguagem em Cassirer NascidoemBreslau,naAlemanha,em1874,ErnstCassirerdedicou-seaos estudosdodireito,dafilologia,daliteratura,dafilosofiaedamatemtica,emBerlime Marburgo. considerado como um dosgrandes nomes movimento filosficochamado neokantismo,lecionounaUniversidadedeBerlimentre1906e1919eposteriormente migrouparaaUniversidadedeHamburgoondesetornoureitorem1930.Entretanto, com a ascenso de Adolf Hitler e a chegada dos nazistas ao poder, renunciou ao cargo eexilou-seem1933naInglaterra,naSuciae,finalmente,nosEstadosUnidosonde exerceuomagistrionasUniversidadesdeYaleedeColmbiaatsuamorte,em 1945. AoladodeHermannCohen(1854-1918)ePaulNatorp(1854-1924)integroua chamada Escola de Marburgo, conhecida por integrar autores que teriam suas filosofias marcadas por um retorno s idias de Kant, nas reas da filosofia da cincia e da teoria doconhecimento.EmboraostericosdedaEscolaMarburgotenhamforteatuao intelectualnascinciasexatasdanaturezaedamatemtica,Cassirerdesenvolveu 38 afinidadescomneokantistasdaEscoladeBaden,entreelesWilhelmWindelbande Heinrich Rickert. Essa afinidade teria o levado a se interessar, tambm, pelas cincias culturais, histricas e pela teoria dos valores e, portanto, a pesquisar assuntos histrico-culturais (CASSIRER, 1972, p. 10-11).EmEnsaiosobreohomem,ErnstCassirer(2012),sintetizasuafilosofiadas formassimblicasafirmandoquens,humanos,nosdiferenciamosdosanimais,pois enquantoestespercebemomundoinstintivamente,nscriamosumuniversoprprio graas aos significados simblicos atribuem e delineiam nossa percepo de realidade. Esonessesuniversossimblicossesituaalinguagem,almdomito,dareligioe dacincia.Emboraaracionalidadesejaumtraoinerenteatodasasatividades humanas, na perspectiva cassireriana, o homem seria um animal simblico. Noestandomaisnumuniversomeramentefsico,ohomemviveemum universosimblico.Alinguagem,omito,aarteeareligiosopartesdesse universo. So os variados fios que tecem a rede simblica, o emaranhando da experincia humana. Todo o progresso humano empensamento e experincia refinada por essa rede, e a fortalece. O homem no pode mais confrontar-se com a realidade imediatamente; no pode v-la, por assim dizer, frente a frente. A realidade fsica parece recuar em proporo ao avano da atividade simblica dohomem.Emvezdelidarcomasprpriascoisasohomemest,decerto modo, conversando constantemente consigo mesmo.Envolveu-sede tal modo emformaslingsticas,imagensartsticas,smbolosmticosouritoreligiosos quenoconsegueverouconheceralgumacoisaanoserpelainterposio desse meioartificial.Sua situao a mesma tanto na esfera terica como na prtica. Mesmo nesta, o homem no vive em um mundo de fatos nus e crus, ou segundoasuanecessidadededesejosimediatos.Viveantesemmeiosa emoes imaginrias, em esperanas e temores, iluses e desiluses, em suas fantasias e sonhos (CASSIRER, 2012, p. 48-49). Mas, o que , para Cassirer, uma forma simblica? Porta(2011,p.59),Cassirerentendeporformasimblicatodomodode compreenso do mundo, ou seja, a objetivao dos dados sensveis em fenmenos, que obedea a maneiras particulares, especficas e irredutveis de articular um dado e um significado.Em uma definio explicita,[...]nsassimilamosodadosensveloriginrioemdiferentesformas simblicas(enformando-oatravsdelas)quandolheatribumossignificados diferentes. O conceito de forma simblica , pois, um derivado do conceito de enformaosimblica(SymbolischeFormung).Aenformao,isto,a constituio do objeto acontece atravs de um processo de simbolizao, na 39 medida em que consiste outorgar sentido a um dado sensvel (PORTA, 2011, p. 58).10 Sendoafilosofiadasformassimblicasumateoriadadiversidadedas descriesdomundo,suateseprincipalopluralismo,isto,aafirmaodeuma multiplicidadedemodosigualmentelegtimosdedescriodomesmomundo, podemos entend-la, numa perspectiva kantiana, com um idealismo pluralista (p. 60).Para Cassirer,Arealidade,comoemKant,produtodaespontaneidade;pormaocontrrio deste,estaespontaneidadenoconsisteemsntese,masematribuiode sentido,ejustamenteporissoelapodeexercer-sedemodosdiferentes.Ela no conforma o material sensvel de uma nica maneira, mas de vrias; no d lugaraumnicomundofenomnico,masavrioscoexistentes.Aidia fundamentaldeCassirer,pois,queomesmo(oestratosensvelprimitivo) podeserestruturadodemodosdiferentes,aindaqueigualmentevlidosou verdadeiros (PORTA, 2011, P. 60). OconceitocentralparaacompreensodaantropologiafilosficadeCassirer seria,ento,anoodesmbolo,quesegundooautor,certamentenoso[os smbolos]umtipodesignos,aindaquandooinversonovalha,poissignossopara Cassirer momentos de um tipo de smbolos; no representando o smbolo cassireriano em funo de uma correspondncia analgica de nenhum tipo (PORTA, 2011, p. 62). Sobearelaosigno-smbolo,numaperspectivadafilosofiadasformas simblicas,Porta(2011,p.62)observaquesignosnodevemserentendidoscomo unidades de significante e significado. Diferentes dos smbolos que no so somente convencionais,ossignosdevemserentendidoscomosubstratossensveis intersubjetivamente acessveis e convencionais, um caso particular de simbolizao que no se limita nem ao uso nem a produo de signos. Aprprialinguagem,segundoCassirer(2012,p.49),foicomfreqncia identificada razo, ou a prpria fonte da razo. Mas, ao mesmo tempo em que existe umalinguagemconceitual,existeumaoutralinguagememocional;mesmoquando desenvolvemosumalinguagemcientfica,outra,imaginativaepoticautilizadapara representarmosarealidade.Alinguagem,nessaperspectivasimblica,noexprime 10 O autor, em nota de rodap, afirma que o conceito de forma simblica seria equivalente aos conceitos de: 1. manifestaes culturais; 2. formas de esprito; 3. objetivaes; 4. modalidades de conhecimento; 5 compreenso do mundo e 6. modos bsicos de experincia (PORTA, 2011, p. 58). 40 pensamentosouidias,massentimentoseafetos,sendoaconscinciaacausaea condio da funo simblica da linguagem (ALLEAU, 2001, p.183).Entretanto, Cassirer (2012, p. 213-214), argumenta que a filosofia da linguagem enfrenta o mesmo dilema que aparece no estudo de toda forma simblica. Para ele, a maisaltatarefadetodasessasformas,naverdadeanica,uniroshomens.Cassirer argumenta que sem a fala no haveria comunidade dos homens. No entanto, no h obstculo mais srio a essa comunidade que a diversidade de fala. Para Alleau (2001, p. 184), uma sociedade sem smbolos no pode, pois, deixar de descer ao nvel dassociedadesinfra-humanasquandosoagitadasedeterminadasporsinaise estmulos-sinais. Nessa perspectiva, CassirercoincidecomlinhasprogramticasdaFilosofiadaVida:partirda expressolingusticacomodimensobsicadacompreensodemundo, reabilitaromitocomoformapr-cientficadevida,premrelevoopapeldo corpo,analisaracinciacomoformasimblicadacompreensodomundo (PEREIRA, 2002, p. 8). ParaPorta(2011,p.66),afilosofiacassirerianacarecedeumaanlisedo principionicoapartirdoqualsoderivadasasdiversasformassimblicas.Oautor menciona trs funes simblicas: expresso, representao e significado puro. Porfunosimblicadevemosentendermodoscaractersticoseirredutveis deinter-relaoentresentidoedadosensvelouentrerepresentantee representado.Oespecficodaexpressoofatodenodiferenciarosigno dosignificado,odadosensveldeseusentido.estediferenciaroque caracterizaarepresentao.Osignificadopuro,finalmente,oprodutoda autoconscinciadaplenaespontaneidadedefinitriadoesprito(Geist),que nosdistingueoelementosensvelmas,almdisso,implicaa impossibilidade de reconduzir um a outro (PORTA, 2011. P. 66-67) No se deve, entretanto, tomar essa classificao como absoluta e rigorosa, mas apenascomoumaestruturaorientadora.Tomandoduasformassimblicas(mitoe linguagem), como exemplo, no podemos tratar com rigor o fato de que o fenmeno da expressoestejapresentesnomito;ouqueosfenmenosdarepresentaoesteja presenteapenasnalinguagem.Mas,apenasqueumaformaseorientamaisporum fenmeno que por outro (PORTA, 2011, p. 67). Omundodalinguagemomundodavidacotidianaorientadademodo prioritrioporinteressespragmticos.Suaestruturafundamentalaestrutura objeto-propriedade, queatua como ordenadora e reguladoradenossas aes. 41 Eletemumcarteressencialmentesensvel-intuitivo,definindooobjetoda percepo (PORTA, 2011, p. 67-68). Dessemesmomodo,graasaoqueCassirerchamoudeteoriamodaldas categorias, alm da linguagem, em todas as outras formas simblicas ou seja, mito, cincia,arte,religio,tica,tcnicaetcencontram-sepresentesasmesmas categorias, entretanto com um ndice diferente dado pela funo simblica fundamental que define cada uma delas (p. 68). Em sntese, a filosofia das formas simblicas contm quatro teses bsicas que pressupem, por conta de seu pluralismo um problema de objetividade que precisa ser levado em conta j que se o conhecimento fosse compreendido realisticamente como cpia da realidade em si, s poderia haver uma nica descrio vlida do mundo (p. 69). ParaCassirer,(i)todaformadecontatocomorealdependesemprede mediao que, em ltima instncia, (ii) trata-se de uma mediao de natureza simblica que (iii) pode variar em funo da existncia de diferentes formas simblicas, nenhuma delascpiadarealidade,eportanto,(iv)todaspossuemomesmograudevalidezj que so sempre o produto da mediao.SegundoPorta(2011,p.70),afilosofiadasformassimblicascarecedeuma metateoria da objetividade enquanto intersubjetividade se admitirmos que toda forma simblica tem o mesmo grau de objetividade, se por objetividade (como de esperar emumafilosofiatranscendental)entendemosintersubjetividadejquenohna teoriacassirerianaoconceitodeobjetividadenoestlegitimadopeloseuprprio sistema. Algumas questes colocadas pela filosofia das formas simblicas, os conduzem algumasincertezasquemerecemumolharatentoparaquepossamosdesenvolver commaiorcertezanossopropsitonessetrabalho.Porisso,antesdepassarmosa Xavier Zubiri, vamos nos debruar sobre a anlise de Porta (2010) de algumas aporias hermenuticas contidas na filosofia de Ernst Cassirer. 42 3.2 Algumas aporias hermenuticas da filosofia das formas simblicas Natentativadedesenvolverumahermenuticadafilosofiadasformas simblicas,Porta(2011,p.295)apontaumconjuntodequestesaporticase interpretaesdivergentesaosistemafilosficoestabelecidoporCassirer.Oautor colocaasquestesnorespondidasdivididastrsgrandegrupos:a)Oconceitode forma simblica; b) O sistema da filosofia das formas simblicas; e, c) A metafsica das formas simblicas. Discorreremos brevemente sobre cada um desses grupos, mas nosso foco ser nessa ltima, por entendermos serem essas, questes mais prximas ao nosso objeto de estudo. Noprimeirogrupoouseja,sobreoconceitodeformasimblica destacaremosalgumasdasquestesnorespondidas,levantadaspeloautorque,no nosso entender so centrais: a) O que so formas simblicas? b) Qual a relao entre conceitos de forma simblica e signos? c) Existe para cada forma simblica um sistema designoprpriooutosomenteumusoparticulardesistemasdesignosque,em realidade podem ser comuns a vrias?Nosegundogrupo,asquestesdeocupamdeestabeleceroquepoderiavira serumaarquitetnicadasformassimblicas.Trata-sedeumgrupocomquestes maiscomplexasemmaiornmero.Nele,questesrelativasquantidadedeformas simblicasequaisseriamessasformassimblicassocolocadas.Assim,umadas questes interessantes colocadaspor Porta : Existealgo assim comouma deduo metafsicadasformassimblicas,deformatalquesejapossvelestabelec-las medianteumprocedermetdico?Noficaclaro,ainda,nafilosofiadasformas simblicas,segundoPorta(2011,p.299),secadaformasimblicarepresentaum momentododesenvolvimentohumano,sucedendoumasoutras,ouseelasso aspectossimultneosecoexistentesdeumatotalidade.Outraquestoanossover importante no que diz respeito a uma certa superao da fase mtica pela linguagem. Nesse caso, so mito e linguagem duas formas simblicas distintas ou acaso o mito uma primeira fase no desenvolvimento rumo linguagem? Nesse caso no fica claro, segundo oautor, se em Cassirer, possvel falar em mito como uma forma simblica ou to somente como uma fase mtica da linguagem. 43 Sobre isso, especificamente,Cassirer desenvolve expressamente uma lei de trs estgios para a linguagem edistingueumestgiomimtico,umanalgicoeumsimblico.Valeessalei apenasparaalinguagemouparatodasasformassimblicas?Sesim,qual seria a fase mimtica da cincia e qual seriaa fase simblicado mito? [...] Se estaleidedesenvolvimentodevevalerparatodaformasimblica,comodeve valeratesesegundoaqualtodasasformassimblicassurgemdomito? (PORTA, 2011, P. 299-300) Umaoutraquestoaindareferenteaosegundogrupodizrespeitoaseguinte pergunta:Seasformassimblicascoexistemousucedem-seumassoutras,oque issosignificaemrelaopretensodevalidadeouobjetividadedelas?E,ainda: Todasasformassimblicastmumaigualaspiraovalidadeouobjetividade (assim,pois,mitoelinguagemoumitoecincia)?E,nessecaso,seasformas simblicas possussem as mesma aspirao objetividade ou validade, no conduziria esta tese, em ltima instncia, a um relativismo? Seguindo,ainda,osrastrosdeumaaportica,conformesugeridoporPorta colocada pelas questes arquitetnica, colocamos em evidncia a seguinte questo:afilosofiadasformassimblicasumafilosofiatranscendentalouto somenteumateoriaempricadohomem?Oquesignificaofatodeque Cassirerfinalizeseutrabalhosistemticocomumaantropologiafilosfica? DeveCassirersercompreendidocomoummomentonoprocessode reconciliao da filosofia transcendental com a subjetividade concreta, e isto de tal forma que ele culmina abertamente em uma antropologia sem nenhuma pretensotranscendental?Einversamente:secertoque,emltima instncia,Cassireraspiraaumteoriaempricadohomem,acasoelese encontra livre do rastro transcendental? (PORTA, 2011, p. 301, grifo nosso). E, finalmente, chegamos ao terceiro grupo de questes. Esse referente relao entre as formas simblicas e a realidade. O que, para Porta (ibidem) equivaleria a uma relaoentreteoriadasformassimblicaseaontologia.Nessegrupo,oautorafirma existirumempenhodeCassirereprocederdeummodototalmentenometafsico, que e tese colocaria dvidas sobre a sustentabilidade dessa pretenso; uma vez que a Filosofia das Formas Simblicas no seria uma ontologia? Para Porta, se, por um lado, aalternativarelativistanosatisfaz,entoseimpeaperguntapelarelaodas formas simblicas com a realidade: Comodesenvolvimentodasformassimblicasalcanadaumacrescente objetividade(eistonosentidodeumaprofundaacomodaorealidade)? Comodeveser,emgeral,entendidooprocessodedesenvolvimentodas 44 formas simblicas [...] So as formas simblicas meios para o conhecimento do mundoouconstituicadaumadelasseuprpriomundo?(PORTA,(2011,p. 301) A partir dessas aporias hermenuticas, Porta (2011, p. 302), nos conduz a uma viagempelasinterpretaesdafilosofiadasformassimblicas,estabelecendouma reviso crtica dessas interpretaes. UmaprimeiravertenteinterpretativadefinidaapartirdatesedequeCassirer teriaampliadoafilosofiatranscendentalkantianaeneokantianarumoauma antropologia. Na crtica de Porta (2011, p. 308), O problema principal dessa interpretao que ela no consciente de que a ampliao(Erweiterung)nooutracoisaqueumametfora,metforaque sugereumacrscimopuramenteaditivodetemasnovosfilosofia transcendental,masqueperguntadecisivasobreaqualdeveserseu resultado (PORTA, 2011, p. 308).O argumento, em sntese, que Kant teria se limitado cincia, tica e arte porqueunicamenteapenasnessasformaspoderiamserencontradasaspiraes legtimas validade universal, no estendendo, assim, essa reflexo transcendental ao mito ou linguagem (p. 309-310). Portaestuda,ainda,umsegundogrupodeautoresqueafilosofiadasformas simblicasemvnculocomasemitica,enessecaso,comtrsvariantespossveis. Almdeumapossveltransformaodafilosofiatranscendentalnadireoda semitica, Cassirer seria alado ao status de cofundador da semitica como disciplina cientfica com aspirao universal, e nesse caso, ele se situaria no contexto da filosofia alemdosanosde1920.Umaterceiravertente,afirmaqueCassirerteria fundamentadoasemiticacomodisciplinafilosficafundamentale,nessecaso,os intrpretesdessesegundogrupotendemavincularCassireraPierceeao neopragmatismo anglo-saxo. Nesse caso, especialmente, Cassirer seria entendido no contexto da superao do motivo consciencialista a favor do motivo sgnico oucomunicativo,sejasaudandoafilosofiadasformassimblicascomouma teorialinguisticadasubjetividade(Lorenz,Peters),seja,concomitantemente, ressaltando-seaslimitaesdela(Habermas,Apel,Oheler).(PORTA,2011, p. 304). ArevisocrticadePorta(2011,p.3010)consideraqueodefeitofundamental dessainterpretaoconsisteemqueelacomprimeopensamentocassirerianodentro 45 deumaalternativaimposta,umavezqueemCassireromotivosemiticoconvive com o motivo consciencialista. Destarte, ao ressaltar que toda relao com o objeto mediada pelo signo, ao mesmotempoemqueasemiticaartificialseapiaeseconstrisobreuma simbologia natural [...] Cassirer no est pensando aqui propriamente em signo algum, esimnumcarterfundamentaldaprpriaestruturadaconscincia.Enfim,atribui-se, nessecaso,aCassirerumconceitodesmboloquenooseu,umavezquepara ele,smboloesignonosodemodoalgumsinnimos.Anfasenoconceito cassireriano de smbolo se encontra no conceito de sentido (p. 311). Numltimoponto,motivadopelaausnciasobreasrazespelasquaisuma filosofiadasformassimblicasdeveserconsideradacomoumafilosofia transcendental, Porta lana a seguinte questo: acasototalmenteabsurdoeinsustentvelqueateoriadapragnncia simblicacontmumateseempricacomrespeitoaestruturaspercepitivas, umaafirmaodefatoeque,portanto,noemnenhumsentidobvioque sejaporsimesmatranscendental?Comoentender,deoutromodo,as reflexes cassirerianas sobre apraxias e afasias sempre festejadas pela crtica? (PORTA, 2011, p. 312)11 Um dos principais argumentos de Porta apoiados nos estudos de John Michael Kroiz sobreessaquesto resideno fato de que arelao entreCassirereKantno podeserentendidasimplesmentepelaampliaodeumateoriadoconhecimento, umavezqueCassirerfazantecederateoriadoconhecimentopelateoriado significado(Ibdem).Entretanto,aprofundandonaquestopropostaporKroiz,ele pergunta: Que significa propriamente que a teoria do conhecimento (da verdade) deva ser antecedida por uma teoria do significado? Para ele, isto significaria uma das quatro coisas seguintes: a.Que a pergunta pela existncia e pela captao de pensamentos idnticos (Gedanken) ou, eventualmente, pela intersubjetividade do significado deve anteceder a pergunta pela atribuio de valores de verdade intersubjetivos ou a pergunta pela validade universal; 11EmCassirer(2011,p.239),pragnnciasimblicaentendidapelomodocomoumavivncia perceptual, ou vivncia sensvel entranha ao mesmo tempo, um determinado significado no intuitivo querepresentadoconcretaeimediatamenteporela.,assim,acondiodepossibilidadedetoda forma simblica, pois ela evidencia o carter simblico originrio da nossa percepo. 46 b.Queaperguntapelaconstituiodosentidocomoconstituiodeum mundo significativo deve anteceder a pergunta pela deciso de aspiraes devalidadedentro(ounocontexto)destemundodosentidoou significao; DadoqueCassirer,defato,ocupa-secomapluralidadedosmundos significativos, o que foi dito anteriormente pode ser precisado na medida em que se introduz uma ulterior distino, a saber, c.trata-seemCassirerdavalidadeuniversal,ouseja,dapossibilidadede principiodeintersubjetividadedentrodecadauniversosignificativo (Sinnwelt)particular(ouseja,porexemplo,dentrodaarte,domito,da linguagem etc.) d.ou, ademais, da validade universal justamente da pluralidade de universos significativosenquantotais(ouseja,daarte,domito,dalinguagemetc.)? (PORTA, 2011, P. 313-314) Embora a possibilidade de pensamentos intersubjetivos idnticos seja colocada por Cassirer em vrios momentos, ele no toma uma posio definitiva e inequvoca o que sugere duas observaes crticas: Sendo o principal objetivo de Cassirer o item a, PortaafirmaqueatravsdeoutrocaminhoCassirerchegamesmaconstelaode problemasquepreocuparamFregeeHusserle,nessecaso,relacionarCassirercom esses autores no seria uma comparao possvel a menos que se reescreva a histria da filosofia do sculo XX. Por outro lado, se o interesse de fundamental de Cassirer se dirige constituio de uma pluralidade de universos significativos Item b, impe-se colocar uma srie de perguntas ou, pelo menos, acrescentar que a Cassirer interessa a fundamentao de intersubjetividade dentro de cada um dos universos significativos e, ao menos, em relao cincia, isso quedizer queas condies da possibilidade da atribuiodeumvalordeverdadeuniversalantecedidoagorapelotemadas condiesdepossibilidadedaapreensodeumpensamentoidnticoporsujeitos diferentes.Nessecaso,oqueessapremissarepresentaemrelaoaomitoou linguagem.Afinal,nosentidoemqueexisteacincia,noexistealinguagem (PORTA, 2011, p. 314-316). Aindasobreastesesinterpretativas,cabefalardeumaterceira,ouseja,ada interpretaoneokantiana.Nessatese,Cassirerestariasendocolocadoemposio de continuidade filosofia transcendental kantiana e no e contraposio conforme as duasanteriores(asaber:atesedeampliaoeatesedeinterpretaosemitica). Essa tese parte da premissa que o neokantismo no reduziu a filosofia a uma teoria do conhecimento,mastrata-sedeumateoriadavalidadeuniversale,porisso,seu 47 objetivo era a fundamentao da validade de todos os tipos de manifestaes culturais enomeramentedacincia.Nestecaso,Cassirerteriasemantidofielaesse programa original, se diferenciado de Nartop e Cohen, por exemplo, quando insistiu na radicalidade do programa tematizando a cultura de maneira mais rica e abrangente. A nfasedessaterceirainterpretaoestnofatodequetantoaprimeiraquantoa segundateseanulamoutornamaomenosproblemtica(namesmamedida,ainda quando por diferentes motivos), a saber, a dimenso de validade da reflexo proposta pela filosofia de Cassirer (PORTA, 2011, P. 305-306). NarevisocrticaoferecidaporPorta(2011,p.316-317),essatesepossuia vantagem de se basear em uma clara ideia do que foi o neokantismo, muito distante da tesedeampliao,quesegundoele,trata-sedeumagrosseirasimplificao retrospectivanaqualHeidegger[inclusive]deixousuamarca.Assim,a fundamentao transcendental cassireriana consistiria ento no seguinte: um indivduo oualgoparticularseelevaaalgovlidouniversalmenteenquantocategorialmente determinado.EcomoascategoriassomodalizadasporCassirer,omencionado enquadramento,considerandoqueoconceitodeexperinciafoiampliadoecontm agoradiferentestipos(mito,linguagem,cinciaetc.)equeelemodificaconformea istoateoriadascategorias,todoesseenquadramentospodeserencontradono textodeCassireresobreissonopodehaverdiscusso.Permanece,portanto,uma dificuldade sistemtica que imanente ao pensamento cassireriano.Naesteiradopensamentocassireriano,considerandotodasassuasaporias hermenuticas,emespecialarelaoentreafilosofiadasformassimblicasea realidade,pretendemosextrapolarnossareflexosobreinformao,linguageme smbolo, enquanto expresso social do homem no lgos, confrontando-os com conceito de realidade. Desse modo, admitindo que haja na filosofia de Cassirer uma relao com asnoesdesmbolocomasnoesderealidadeedeintuiosensvel,partiremos parauma sntesedopensamento deXavier Zubiri, um filsofoque, a nosso entender, podepreencheressalacuna,umavezqueosimbliconoosparecer, necessariamente, se opor ao real e ao intuitivo. 48 3.3 Inteligncia e Realidade em Zubiri O processo da filosofia governado no por movimentos subjetivos, mas pelo dinamismodarealidade,atualizadanoespritodofilsofo.Arealidade primeira em relao filosofia, e a filosofia primeira em relao ao filsofo: A filosofianoobradofilsofo;ofilsofonoobradafilosofia.12[...]A filosofianopodejamaissetornarumatcnica,nemserformuladaemleis universalmenteaceitveisporqualquerum.[...]Aideiadefilosofia diferente para cada filsofo, pois cada filsofoconstruiusua filosofia. 13 Ofilsofosumfilsofoapartirdopontodevistadafilosofiaqueele construiu, e um filsofo de um tipo particular em funo do carter da filosofia resultantedomovimentodasuaalma.(CAPONIGRI,2014,P.49-49,grifo nosso).Aepgrafede