1 INTRODUÇÃO
Este estudo analisa geograficamente as formas de lutas desenvolvidas pelas famílias
camponesas no Ceará com ênfase no Movimento Sindical de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais
(MSTTR), temática que carece de estudos para que haja o resgate da memória coletiva dessa classe
excluída historicamente dos discursos oficiais do Estado. Um dos resultados deste projeto é o livro
feito em parceria com a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras na Agricultura do Estado do
Ceará (FETRAECE) e intitulado “O Pulsar da vida no Campo: FETRAECE 50 anos”.
2 METODOLOGIA
Realizou-se levantamento bibliográfico sobre o campesinato, tendo em vista os modos de
conceber essa categoria no âmbito do pensamento geográfico, histórico, sociológico e antropológico;
pesquisa documental; entrevistas com camponeses, ex-dirigentes sindicais e lideranças partidárias e
religiosas que participaram desse processo no Ceará a partir da década de 1950, além do uso da
cartografia temática para espacialização do MSTTR no Ceará.
3 RESULTADOS E DISCUSSÕES
O Decreto 7.038 de 1934 foi o instrumento legal que permitiu a criação dos primeiros
Sindicatos de Trabalhadores Rurais (STRs) no Ceará no início dos anos de 1960. Sobre a importância
desse marco legal, o advogado Amadeu Arraes (2006) relata que “foi como uma carta de alforria para
os trabalhadores. [...] Foi esse documento que deu realmente as delimitações à caracterização
específica de trabalhador rural”.
Antes disso foi preciso que essa classe se organizasse em associações para pressionar o
Estado a avançar no processo de fundação dos primeiros STRs. Leandro (1989) dá conta de 29
associações rurais de 1950 a 1961 criadas em sua maioria pelo PCB que se propunham a lutar em
defesa da classe, por Reforma Agrária, melhores salários para assalariados, financiamento e tudo que
necessitavam (LEANDRO, 1989, p. 49).
De 1962 a 1969 foram criados 83 STRs no Ceará, isso significou que 60% dos municípios
contavam com uma entidade que representava a “classe camponesa” nesse período. Nessa década
também, foi registrado o surgimento de instituições estaduais e nacionais que se articularam para dar
unicidade ao movimento, como a FETRAECE e a Confederação Nacional dos Trabalhadores na
Agricultura (CONTAG) ambas fundadas em 1963. Com a Ditadura Militar, em 1964, o movimento
sofreu rupturas, pois, os STRs fundados com a orientação do PCB foram alvos de intervenção.
PRÁTICAS E VIVÊNCIAS POLÍTICAS, SOCIAIS E CULTURAIS DO CAMPONÊS NO CEARÁ
Helaine Saraiva Matos¹, Juliana Rodrigues Alves¹, Dr. Francisco Amaro Gomes de Alencar².
1. Bolsistas de iniciação científica e alunas do curso de Geografia da Universidade Federal do Ceará.
2. Professor do curso de Geografia da Universidade Federal do Ceará e orientador desta pesquisa.
* Trabalho apresentado no XXXIII Encontro de Iniciação Científica, Universidade Federal do Ceará, 24 de outubro de 2014.
Figura 1: Mapa de fundação dos Sindicatos de Trabalhadores Rurais no Ceará. Fonte: FETRAECE (2013).
4 LIVRO “ O PULSAR DA VIDA NO CAMPO: FETRAECE 50 ANOS”
É fruto deste estudo, uma parceria do Laboratório de Estudos Agrários e Territoriais (LEAT)
vinculado ao curso de Geografia da UFC com a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais do
Ceará (FETRAECE) e narra a resistência dos camponeses e a luta pelo direito à terra. A obra é a primeira
a reunir através de textos, fotografias e documentos a história da FETRAECE da década de 1960 quando
foi fundada até os anos 2000. O lançamento do livro aconteceu no dia 29 de novembro de 2013, no
município de Beberibe, durante o 7° Congresso Estadual de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais e
contou com um público aproximado de mil pessoas, entre sindicalistas e representantes da classe
camponesa dos 184 municípios cearenses, políticos e diretores de órgãos públicos.
A obra teve distribuição gratuita e destinada em sua maioria aos Sindicatos de Trabalhadores e
Trabalhadoras Rurais e órgãos ligados à categoria no Estado do Ceará, mas também, encontra-se
disponível para download através do endereço eletrônico:
http://www.mediafire.com/download/lxr17x6l9zdazt6/LIVRO O PULSAR DA VIDA NO CAMPO.pdf.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Atualmente o MSTTR encontra-se territorializado em todos os municípios cearenses. Os
avanços e recuos do movimento, passando pelas retomadas das ações de ocupações de terras, os embates
por uma política de Reforma Agrária conseguiram transformá-lo, não somente numa "categoria social"
reconhecida, mas em sujeito político, que muitos já consideravam extinto.
O resgate da memória camponesa trouxe a tona o debate teórico em torno do campesinato
cearense, onde o MSTTR foi objeto de estudo. Nesses 50 anos de construção e resistência do MSTTR
destacamos o visível crescimento e fortalecimento do movimento no estado do Ceará, bem como a
melhoria de vida da categoria, por meio do acesso às políticas públicas conquistadas e das mobilizações,
ações de massa coordenadas pela FETRAECE.
As reivindicações desses 50 anos não saíram das pautas de negociações do MSTTR. Dentre elas
estão: a luta pela terra, com uma Reforma Agrária ampla, massiva e de qualidade; linhas de crédito
oficiais diferenciadas para o desenvolvimento da agricultura familiar camponesa; assistência técnica;
politicas de convivência com o semiárido; equidade de gênero, juventude, raça e etnia; acesso à saúde e
educação com qualidade e os direitos previdenciários.
REFERÊNCIAS
ABRÃO, J.A.; SANTOS, R.A. Sindicalismo rural em Francisco Beltrão: a inserção do Trabalho das
mulheres nos espaços políticos Administrativos do sindicato dos trabalhadores rurais. In: Fazendo Gênero
9: Diásporas, Diversidades, Deslocamentos. Anais... Curitiba: UNIOESTE, 2010. p. 1- 10.
ANDRADE, Manuel C. de; Lutas camponesas no nordeste. 2ª. Ed. São Paulo: Editora Ática, 1989.
BARREIRA, César. Trilhas e atalhos do poder: conflitos sociais no sertão: Rio de Janeiro: Rio Fundo
Ed., 1992.
CARVALHO, Horácio M. de; (Org.). O campesinato no século XXI: possibilidades e condicionantes do
desenvolvimento no Brasil. Petrópolis; RJ: Vozes, 2005.
GRZYBOWSKI, Cândido; Caminhos e descaminhos dos movimentos sociais no campo. Petrópolis:
Vozes/Fase, 1987.
LEANDRO, José; Depoimentos: minha vida, a sindicalização rural e as lutas camponesas no Brasil.
Fortaleza: IOCE, 1988.
MARTINS, Jose de S; Os camponeses e a política no Brasil: as lutas sociais no campo e seu lugar no
processo político. 3ª. Ed. Petrópolis; RJ: Vozes, 1983.
MEDEIROS, Leonildo S. de; História dos movimentos sociais no campo. Rio de Janeiro: Fase, 1989.
MELUCCI, A. Um objetivo para os movimentos sociais?. Lua Nova, n.17, jun. 1989.
Figura 5: João de Sales, ex-sindicalista, e sua esposa (à esquerda)
segurando o livro produto deste estudo e que conta em um de seus
capítulos sua participação no movimento sindical.
Fonte: Matos (2014).
Figura 2: Capa do livro “O Pulsar da vida
no Campo: FETRAECE 50 anos”.
Fonte: Costa (2013).
Figura 3: Cerimônia de lançamento do livro. Fonte: Matos (2013).
Figura 4: Público presente durante o lançamento do livro.
Fonte: Matos (2013).
Em 1970 aumentaram as lutas por terra travadas pelos STRs com apoio das Comunidades
Eclesiais de Base que protagonizavam as lutas em favor da Reforma Agrária e da renda paga aos
trabalhadores (as). Nessa década foram fundados mais 58 sindicatos. Ao final dessa década existiam
140 STRs.
O período de 1971 a 1975 foi marcado pelo surgimento do sindicalismo-assistencialista com
a instalação de gabinetes odontológicos e ambulatórios médicos por meio de programas como o
FUNRURAL e pela Lei complementar 11/71 que criou o Fundo de Assistência e Previdência do
Trabalhador Rural.
Na década de 1980 foram criados 33 municípios no Ceará e em decorrência desse fato
ocorreu a fundação de 26 STRs. O movimento estava presente em 171 municípios dos 178.
De 1990 a 1999 foram criados mais 15 STRs, esses novos sindicatos foram distribuídos nas
várias regiões do Estado e o movimento volta a estar presente em todos os municípios cearenses.
Nessa década os investimentos do governo ficaram centrados nas áreas do turismo, transporte e
construção de grandes obras favorecendo aos grandes empresários. O descaso do Estado com a
Agricultura Familiar e com a Reforma Agrária gerou insatisfações no campo, desencadeando uma
série de conflitos.
Nos anos 2000, a FETRAECE fez-se presente nos 184 municípios do Estado através dos
STTRs. Nesse período a FETRAECE exerce um papel político importante na conjuntura nacional
tendo um representante do estado na direção nacional da CONTAG, participando efetivamente da
agenda deliberada pelo sistema confederativo. É verificado também o envolvimento do movimento
nas eleições municipais, estaduais e nacionais com o objetivo de conquistar espaços nas câmaras
municipais, Assembleia Legislativa e Congresso Nacional, a exemplo dos 50 vereadores e vereadoras
eleitos na última eleição, oriundos do movimento sindical.
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