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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE GOIÁS
UNIDADE UNIVERSITÁRIA DE JUSSARA
LICENCIATURA EM MATEMÁTICA
DIONY SOARES FELINTO
MATEMÁTICA E REALIDADE NO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO
JUSSARA – GO
2009
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DIONY SOARES FELINTO
MATEMÁTICA E REALIDADE NO ENSINO FUNDAMENTAL E MÉDIO
Trabalho de autoria de Diony Soares Felinto, acadêmico
do 4° ano do curso de Licenciatura em Matemática, da
Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária
de Jussara, sob a orientação do professor/orientador
Helias Assunção Freitas, Licenciado em matemática e
especialista em matemática pura e aplicada pela
Universidade Estadual de Goiás, com a finalidade de
concluir o curso de Licenciatura em Matemática da
Universidade Estadual de Goiás, Unidade Universitária
de Jussara.
JUSSARA – GO
2009
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RESUMO
Este trabalho foi realizado com o objetivo de promover uma reflexão entorno da situação
atual do ensino brasileiro, principalmente no que diz respeito ao ensino da matemática, e
conscientizar os professores em relação a necessidade de apresentar aos seus alunos
conteúdos matemáticos contextualizados com o meio sociocultural de qual fazem parte,
visando a redução do nível de abstração nas aulas de matemática. Para alcançar tal objetivo
foram produzidos três capítulos fundamentados em teorias de autores como Ubiratan
D´Ambrósio e Elon Loges Lima.
PALAVRAS – CHAVE: Ensino. Matemática. Realidade. Aplicações. Contextualizar.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 4
RESUMO E PALAVRAS-CHAVE 7
CAPITULO 1 A HISTÓRIA DE EDUCAÇÃO BRASILEIRA 8
1.1 Período jesuítico 8
1.2 A educação brasileira de 1759 a 1889 11
1.3 Primeira república e revolução de 30 12
1.4 A escola nova 13
1.5 Estado novo e república populista 14
CAPITULO 2 A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DA MATEMÁTICA APLICADA NA
REALIDADE 17
2.1 A matemática nas escolas brasileiras 17
2.2 A matemática no cotidiano 19
2.3 Matemática aplicada 22
CAPITULO 3 COMO UNIR MATEMÁTICA E REALIDADE 26
3.1 O ato de planejar 26
3.2 A matemática concreta no ensino fundamental 28
3.3 A matemática concreta no ensino médio 35
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 38
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INTRODUÇÃO
A matemática é vista por muitas pessoas como uma disciplina difícil de ser entendida
e normalmente o argumento é a complexidade e o nível de abstração de seus conteúdos. Mas,
por outro lado, apesar de não se identificarem com a matéria a maioria destas pessoas
concordam que a matemática está presente em várias situações do seu dia-a-dia, onde é
trabalhada naturalmente sem encontrar muita dificuldade, um exemplo desta realidade são as
crianças que para ajudarem os pais no sustento da casa ou para benéfico próprio, trabalham no
mercado informal, em seu trabalho constantemente realizam cálculos diversos que envolvem
conceitos matemáticos como as quatro operações e as idéias de razão e proporção, mas se
esses mesmos cálculos forem cobrados pelo professor na escola em forma de uma expressão
numérica, por exemplo, essas crianças não conseguem resolver. Outro exemplo mais comum
é uma criança qualquer que na escola não consegue calcular 3 x 1,5 mas se mandá-la ao
supermercado comprar três bolachas de R$ 1,50, ela sabe exatamente quanto vai gastar. Estas
situações deixam explícita a necessidade de tornar a matemática ensinada nas salas de aula
mais próxima da realidade dos alunos e, através de uma mudança na metodologia de ensino
familiarizá-los com a matéria, formando assim pessoas capazes de utilizá-la para resolver
problemas reais.
E somos então levados a atacar diretamente a estrutura de todo o ensino, em
particular a estrutura do ensino de matemática, mudando completamente a
ênfase do conteúdo e da quantidade de conhecimento que a criança adquira,
para uma ênfase na metodologia que desenvolva atitude, que desenvolva
capacidade de matematizar situações reais. (D'AMBRÓSIO, 1986, p.14).
Este trabalho esta focado nos ensinos fundamental e médio, pois nestas fases se forma
a base educacional de um indivíduo, preparando-o para viver na sociedade, podendo disputar
em igualdade, com os demais, uma vaga no concorrido mercado de trabalho, que está cada
vez mais exigente, em um processo seletivo como o vestibular, e até mesmo montar o próprio
negócio. Para realizar qualquer um destes feitos é necessária uma boa formação escolar,
principalmente, em matemática e língua portuguesa, onde vemos a importância que um ensino
de qualidade tem na formação de um cidadão. “O direito à educação é um direito social de
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cidadania genuíno, porque o objetivo da educação, durante a infância, é moldar o adulto em
perspectiva” (FERREIRA, 1993, p. 14).
Este trabalho tem como objetivos conhecer a educação brasileira num quadro geral a
partir de sua história, procurando entender como o sistema educacional chegou à forma atual,
em seguida, fazer uma reflexão em torno da importância de unir a matemática abstrata da
escola com a matemática existente nas atividades diárias dos alunos. Principalmente através
de aplicações e, para finalizar, apresentar teorias e métodos que mostram como relacionar
matemática e realidade.
As pesquisas feitas para a realização deste trabalho foram de caráter bibliográfico,
sendo os dados coletados em livros e na Internet, o embasamento teórico será a partir das
obras de autores como Ubiratam D'Ambrósio, que critica o ensino da matemática
desvinculado da realidade dos alunos, por tornar a matéria muito abstrata; Eduardo Sebastiani
Ferreira que relacionou cidadania e educação matemática, discutindo como a educação
influencia na formação de um cidadão, abordando também a característica que o ensino da
matemática, quando mal trabalhado, tem de excluir as pessoas da participação da cidadania;
David William Carraher, Terezinha Nunes Carraher e Analúcia Schliemann que abordam a
facilidade que as pessoas têm em realizar cálculos e utilizar outras ferramentas matemáticas
como a idéia de razão, por exemplo, no seu cotidiano e em contraste a dificuldade que essas
pessoas encontram ao realizar os mesmos cálculos e utilizar as mesmas ferramentas na escola;
Lorenzo Luzuriaga e Moacir Godotti que apresentam a história da educação, da pedagogia e
das idéias pedagógicas ajudando-nos a entender as mudanças ocorridas na educação; Elon
Lages Lima que fala sobre a matemática e ensino ressaltando os objetivos da educação e
como formar pessoas capacitadas para o mercado de trabalho.
A partir dos dados coletados na pesquisa foram produzidos três capítulos distribuídos
de forma que o leitor possa se situar em relação ao problema abordado, compreendendo sua
existência e as possíveis soluções que serão propostas. No primeiro capítulo, intitulado “A
história da educação brasileira”, são expostas as fases históricas da educação no Brasil que
nos ajudam a entender como o ensino em nosso país atingiu a forma atual. Foi feita também
uma análise dessas fases com o objetivo de identificar os fatores que contribuíram para o
prevalecimento do ensino da matemática mecânica, abstrata e não-contextualizada nas escolas
brasileiras. “Realmente, o que de conteúdo se ensina é de pouca importância no nosso
contexto sócioeconômico-cultural” (D'AMBRÓSIO, 1986, p.14).
O segundo capítulo com o título “A importância do ensino da matemática aplicada na
realidade”, abordará através de reflexões e exposições de teorias a necessidade de trabalhar
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nas escolas os conteúdos matemáticos aplicando-os na realidade dos alunos através de aulas
dinâmicas e exercícios voltados para situações rotineiras da vida dos mesmos ou explorando
características típicas do ambiente e da cultura local, o que torna mais fácil para o aluno a
visualização da situação proposta podendo se concentrar apenas na matematização do
problema. “As aplicações são a parte auxiliar da matemática. São a conexão entre a abstração
e a realidade. Para um grande número de alunos, são o lado mais atraente das aulas, o
despertador que os acorda, o estímulo que os incita a pensar.” (LIMA, 2001, p.184).
Um dos temas abordados neste capítulo é a etnomatemática que segundo Ubiratan
D‟Ambrósio é um programa com a proposta de partir da realidade e chegar, de maneira
natural com forte fundamentação cultural, à ação pedagógica. Esta relacionada também ao
ensino regional, da cultura organizacional de uma comunidade ou sociedade buscando formas
de utilizar os elementos socioculturais para construir as atividades matemáticas nas escolas,
portanto está diretamente ligada ao tema proposto neste trabalho.
Através do conceito de etnomatemática chama-se a atenção para o fato de
que a matemática, com suas técnicas e verdades, constitui um produto
natural, salienta-se, que cada povo, cada cultura e cada subcultura
desenvolve a sua própria matemática, em certa medida específica
(FERREIRA, 1993, P.17).
No último capítulo, “Como unir matemática e realidade”, são apresentados alguns
métodos e cuidados necessários para trabalhar a matemática contextualizada nas salas de aula,
pois essa não é uma tarefa fácil, devem-se levar em conta vários fatores como o meio em que
os alunos estão inseridos, a cultura predominante e até mesmo a linguagem adequada pra cada
turma. Outro problema está em encontrar aplicações dos conteúdos matemáticos na realidade
de uma determinada região, portanto um professor deve também ser um pesquisador para
poder buscar métodos além dos que estão nos livros didáticos. “O professor deve considerar
como parte integrante e essencial de sua tarefa o desafio, a preocupação de encontrar
aplicações interessantes para a matemática que está apresentando” (LIMA, 2001, p.184).
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CAPITULO 1 A HISTÓRIA DE EDUCAÇÃO BRASILEIRA
Quando analisamos a história da humanidade, notamos claramente que a sociedade,
desde seus primórdios, passa por varias transformações, que podem trazer benefícios a uma
nação, como a primeira revolução industrial (1760-1860) onde a indústria na Inglaterra
prosperou produzindo grande riqueza; ou proporcionar imensos prejuízos, como a macabra
Segunda Guerra Mundial que deixou o saldo de 46 milhões de mortos. Na história da
educação não é diferente, sempre ocorreram varias mudanças que moldaram os sistemas
educacionais em todo o mundo. Neste capítulo serão abordas algumas fases que possuem
relações com o tema deste trabalho.
1.1 Período jesuítico
A história da Educação Brasileira é muito curta comparada com a de outros países,
como a Inglaterra e Espanha, isto se ignorarmos os métodos educacionais dos indígenas que
já habitavam estas terras a milhares de anos antes da chegada dos portugueses, que trouxeram
um padrão educacional europeu caracterizado por um sistema repressivo, diferente do sistema
indígena cuja base é a liberdade, e o aprendizado se dá através do convívio, onde os jovens
observam os mais velhos em suas tarefas diárias que são divididas segundo o gênero e a idade
dos membros da tribo. Mesmo tendo uma história relativamente curta a educação brasileira já
passou por várias transformações promovidas por reformas educacionais ou acontecimentos
sociais que contribuíram para a evolução do nosso sistema de ensino.
O primeiro modelo educacional a vigorar no Brasil foi a implantado pelos Jesuítas que
exerceram grande influência em quase todo o mundo. A ordem dos jesuítas denominada
Companhia de Jesus, foi fundada em 1534 pelo militar espanhol Inácio de Loyola (1491-
1556) visando a educação de jovens católicos, portanto era contrário a pregação religiosa
protestante.
Os Jesuítas chegaram ao território brasileiro em março de 1549, comandados pelo
Padre Manoel de Nóbrega. Ao se depararem com os indígenas que possuíam uma cultura
própria de costumes e crenças, inclusive religiosas, muito diferentes da cultura do “mundo
civilizado”, os Jesuítas perceberam que não seria possível converter os índios à fé católica e
catequiza-los sem que eles aprendessem a ler e a escrever. A primeira escola brasileira foi
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fundada em Salvador quinze dias após terem chegado, o mestre designado para ministrar as
aulas foi o Irmão Vicente Rodrigues, um jovem de 21 anos que se tornou o primeiro professor
nos moldes europeus a lecionar em nosso país, trabalho que realizou junto com a pregação da
fé católica durante mais de 50 anos. Com o passar dos anos a obra Jesuítica de Salvador se
estendeu para o sul e, em 1570, já existiam cinco escolas de instrução elementar implantadas
nas cidades de Porto Seguro, Ilhéus, São Vicente, Espírito Santo e São Paulo de Piratininga,
além de três colégios no Rio de Janeiro, Pernambuco e Bahia. “A educação do Jesuíta era
naturalmente a formação do homem cristão dentro das doutrinas da Igreja católica.”
(LUZURIAGA, 2001, P.120).
A filosofia e todos os métodos de ensino dos Jesuítas eram determinados pelo Ratio
Studiorum que era um documento escrito pelo próprio Inácio de Loyola e representa o
primeiro sistema organizado de educação católica, foi ordenado lei na doutrina Jesuítica em
1599 depois de um período de elaboração e experimentação.
Além do ensino elementar onde se aprendia a ler e escrever, os Jesuítas mantinham
cursos secundários de letras e filosofia e o curso de Teologia e Ciências Sagradas,
considerado de nível superior e voltado para a formação de sacerdotes. No curso de letras se
estudava gramática latina, grego e retórica, e no curso de filosofia se estudava lógica,
metafísica, moral, matemática e ciências físicas e naturais. Somente os membros das elites
burguesas tinham acesso à educação, as classes populares eram apenas catequizadas e
doutrinadas com o intuito de serem mantidas sob controle, os jovens burgueses eram
preparados para exercer a hegemonia cultural e política tornando-se bons dirigentes.
O método educacional dos Jesuítas prevaleceu no Brasil durante 210 anos no período
de 1549 a 1759, quando Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês de Pombal, expulsou
os Jesuítas que já tinham se espalhado pelo país 25 residências, 36 missões e 17 colégios e
seminários, além de seminários menores e escolas de ensino primário instalados nas cidades
onde existiam casas da Companhia de Jesus. Com este acontecimento 509 Jesuítas saíram das
terras brasileiras, sendo 124 na Bahia, 53 em Pernambuco, 199 do Rio de Janeiro e 133 do
Pará (BELLO, 1998). A causa da expulsão foram os conflitos ideológicos com a corte
portuguesa, os métodos educacionais Jesuíticos não contribuíram para alcançar os objetivos
do estado, cujo principal deles era recuperar o status, pois Portugal estava decadente diante
das outras potências européias da época, portanto os interesses estavam totalmente voltados
para o comércio onde se pretendia acumular capital suficiente para reerguer o estado
português, e como a educação dos Jesuítas era voltada para a pregação religiosa e a mera
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transmissão de conhecimento, se viu necessária a criação de um novo sistema educacional que
servisse como ferramenta para o desenvolvimento de nossos colonizadores.
Como já foi dito, os métodos educacionais das escolas jesuítas seguiam as diretrizes
do Ratio Studiorum que pregava o culto da obediência através de uma rígida disciplina. As
aulas eram ministradas de forma verbal, onde o conteúdo era assimilado a partir da repetição e
memorização. Existia também um grande estímulo à competição que se dava com a prática de
premiações aos que se saíam bem durante as aulas, e castigos aos que não obtinham bons
resultados.
Ao fazer um paralelo comparando métodos pedagógicos dos Jesuítas com o que é feito
nas escolas brasileiras atualmente fica evidente a grande influência que o período jesuítico
exerce em grande parte do nosso sistema de ensino. Os métodos educacionais utilizados em
nossas salas de aula são muito semelhantes aos praticados pelos membros da Companhia de
Jesus. Apesar das aulas, hoje em dia, não serem mais estritamente verbais, das novas
tendências e das poucas mudanças ocorridas na forma de pensar dos nossos educadores, na
prática ainda nos prendemos aos livros e a exposição de conteúdos no quadro-negro a
repetição e a memorização são muito utilizadas no ensino de todas as disciplinas,
principalmente quando diz respeito ao aprendizado de regras e fórmulas, o que atinge
diretamente o ensino da matemática, onde normalmente um dos primeiros contatos com os
alunos se dá através da tabuada, cujo conteúdo é insistentemente cobrado; os prêmios e os
castigos presentes na educação jesuíta estão representados hoje pelo nosso sistema de
avaliação, que por meio de aplicações de provas que medem o aprendizado a partir das notas
alcançadas.
Os jesuítas nos legaram um ensino de caráter verbalista, retórico, livresco,
memorístico e repetitivo, que estimulava a competição através de prêmios e
castigos. Discriminatório e preconceituosos, os jesuítas dedicaram-se à
formação das elites coloniais e difundiram nas classes populares a religião da
subserviência, da dependência e do paternalismo, características marcantes
de nossa cultura ainda hoje (GADOTTI, 2003, p. 231).
Na citação acima Moacir Gadotti, além dos legados já comentados, aponta outra
característica comum entre a cultura educacional dos jesuítas e a nossa, que é o tratamento
diferenciado entre as classes sociais. Claro que tivemos uma grande evolução, hoje tanto a
elite quanto as classes populares tem acesso a educação que é um direito de todo cidadão
previsto por lei, mas a diferença está no nível do ensino que está ao alcance de cada classe,
sendo que muitas crianças e jovens em idade escolar, menos favorecidos financeiramente,
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nem mesmo tem acesso a escola por morar em áreas isoladas ou por precisarem trabalhar para
ajudar os pais na despesa da casa, já os que conseguem estudar se deparam com escolas em
um estado de conservação ruim ou com deficiência de recursos como salas de informática e
bibliotecas, além de professores pouco estimulados pelo descaso das autoridades
governamentais com a classe, realidade muito diferente das escolas particulares que são
privilégio das classes com maior poder financeiro. Toda esta herança cultural e pedagógica
mostra que os jesuítas exercem grande influência na educação brasileira.
1.2 A educação brasileira de 1759 a 1889
Após o alvará de 28 de junho de 1759, através do qual o marquês de Pombal e
primeiro-ministro de Portugal suprimiu as escolas jesuíticas de todos os domínios
portugueses, o Brasil entrou no período pombalino, onde a proposta era criar um sistema
educacional útil aos fins do Estado, mas nenhum sistema foi implantado, ouve apenas a
criação de aulas régias de disciplinas isoladas ministradas por professores de baixo nível. Este
período representou um grande retrocesso para a educação brasileira, que se tornou um
verdadeiro caos. “(...), o ensino brasileiro, ao iniciar-se o século XIX, estava reduzido a pouco
mais que nada, em parte como consequência do desmantelamento do sistema jesuítico, sem
que nada de similar fosse organizado em seu lugar.” (PILETTI, 1995, p. 37).
Com a chegada da Família Real portuguesa ao Brasil em 1808 e a proclamação da
Independência (1822), teve início o período imperial onde a educação continuava elitista
visando a formação de dirigentes para o país. Nesta época, já existia a liberdade de ensino e a
intenção de instrução primária gratuita a todos os cidadãos, mas uma emenda a constituição (o
ato adicional de 1834), descentraliza o ensino atribuindo à coroa a responsabilidade pelo
ensino superior, e deixando a cargo das províncias os ensinos primários e secundário. O
resultado desta mudança, segundo Nelson Piletti, foi que em 1867 somente 10% da população
em idade escolar se encontrava matriculada nas escolas primárias e a taxa de analfabetismo
atingiu 67,2% em 1890.
Os períodos pombalino e imperial nos legaram uma cultura de divisão de classes, onde
a qualidade do ensino a que cada pessoa tem acesso é proporcional a suas condições
financeiras. Além disso, o descaso com o ensino primário resultou na transformação do Brasil
em um país de maioria analfabeta, sendo que até 1920, já no período republicano, a taxa de
analfabetismo ainda era de 60,1% da população.
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1.3 Primeira república e revolução de 30
Ao iniciar-se a República, a educação brasileira estava em estado precário, existiam
apenas algumas escolas isoladas de ensino secundário e superior, e poucas escolas de ensino
primário. A falta de um sistema articulado de educação pública provocou vários debates e
reformas principalmente na década de 20, quando o modelo educacional imperialista que
privilegiava a formação da elite foi posto em cheque. A nova proposta era a criação de um
sistema nacional de educação priorizava o ensino básico, mas interligando todos os níveis do
primário ao superior.
Apesar de todo o entusiasmo nesta década, o que se teve de concreto foram as
reformas estaduais voltadas aos ensinos primário e o técnico-profissional, sendo que a mais
importante delas ocorreu no Distrito Federal (Rio de Janeiro) em 1928. Seguindo os seguintes
princípios: extensão do ensino, articulação dos níveis escolares e adaptação ao meio social; o
primário foi reduzido de sete para cinco anos, criaram-se os cursos complementares, de dois
anos de duração, de caráter vocacional, cujo término dava acesso ao técnico-profissional de
quatro anos; as escolas ofereciam cursos adaptados ao meio em que eram implantadas (meio
urbano, rural e marítimo).
As reformas estaduais, por falta de recursos, acabaram não contribuindo muito para
uma melhora no quadro educacional brasileiro, o que só veio acontecer com a Revolução de
30, cuja primeira iniciativa foi a criação do Ministério da Educação e das Secretarias de
Educação dos Estados, ampliando a participação do governo no desenvolvimento da educação
nacional. Outro marco importante foi a Constituição de 1934 onde, pela primeira vez, teve um
capítulo destinado a educação, que garantia direitos como o acesso ao ensino primário
gratuito e a assistência aos alunos carentes, além de determinar a obrigatoriedade da escola
primária integral.
O Brasil na década de 30 foi palco de muitas discussões e em meio a elas foi
publicado pelas escolanovistas o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova (1932),
liderados por Fernando Azevedo, 26 educadores assinaram o documento que defende a
educação obrigatória, gratuita, laica e pública como dever do estado que deve criar um tema
unificado, onde todos os níveis de ensino estejam articulados.
A herança deixada pelo período da Primeira República foi considerável, apesar das
conquistas na área educacional terem começado apenas após a Revolução de 30, as mudanças
foram muito importantes: o Brasil passou a ter um sistema educacional articulado; a
Constituição de 1934 incluiu um capítulo sobre a educação; foi fundada a Universidade de
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São Paulo em 1934, o que mudou uma realidade vergonhosa, pois o Brasil e o Paraguai eram
os únicos países da América Latina que não possuíam uma universidade; dividiu-se o ensino
secundário em fundamental e complementar que tinham como objetivo a formação geral e a
preparação para o ensino superior, o que lembra o ensino básico e médio das escolas atuais.
1.4 A escola nova
O movimento escolanivista é caracterizado pela oposição à escola tradicional, seus
métodos educacionais valorizam a auto formação onde o aluno, que é visto como o centro de
todo o processo educacional (paidoentrismo), aprende através de atividades espontâneas em
um meio devidamente preparado o que exige dos educadores muita criatividade para criação
de métodos ativos e eficientes que passam a desenvolver ao máximo o intelecto da criança,
fazendo com que a educação se confunda com o próprio processo de viver, como defendia o
educador norte-americano John Dewey (1859-1952) que acreditava que a vida nos apresenta
problemas que a educação poderia ajudar a resolver. Ele dividiu o ato de pensar em cinco
estágios, que ocorrem diante de algum problema. São eles:
1°) Uma necessidade sentida;
2°) as análises da dificuldade;
3°) as alternativas de solução do problema;
4°) a experimentação de várias soluções, até que o teste mental aprove uma delas;
5°) a ação como prova final para a solução proposta, que deve ser verificada de
maneira científica.
Outra grande contribuição da Escola Nova foram os métodos e materiais pedagógicos
desenvolvidos pela médica italiana Maria Montessori (1870-1952), que inicialmente dedicou-
se a recuperação de crianças deficientes e depois adaptou seus métodos às crianças “normais”.
Na casa dei banbini (casa de crianças), pela primeira vez na história da educação foi criado
um ambiente escolar com pequenos objetos que possibilitavam a interação da criança com o
meio. Montessori explorava os sentidos através de jogos e materiais concretos, que ela mesma
construía e ainda são utilizados em milhares de pré-escolas.
O maior legado da Escola Nova ao sistema educacional moderno são seus métodos,
que evoluíram e se aperfeiçoaram levando para as salas de aula, além de jogos e materiais
tradicionais, aparelhos eletrônicos como a televisão, o vídeo e o computador.
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A influência do pensamento pedagógico escola-novista tem sido enorme.
Muitas são as escolas que, sob diferentes nomes, refletem a mesma filosofia
educacional: as „classes nouvelles‟ francesas que geram origem, na década
de 60, no Brasil, aos ginásios vocacionais, às escolas ativas, às escolas
experimentais, aos colégios de aplicação das universidades, as escolas piloto,
às escolas livres, às escolas comunitárias, aos lares-escolas, às escolas
individualistas, às escolas do trabalho, às escolas não-diretivas e outras.
(GADOTTI, 2003, p.147)
Realmente o movimento escolanovista influenciou consideravelmente o ensino
brasileiro, principalmente no que diz respeito a educação pré-escolar, onde os métodos de
Maria Montessori são muito utilizados, e no despertar da consciência de alguns educadores
em relação a importância de aproximar a escola do cotidiano dos alunos, com o objetivo de
tornar as aulas menos tradicionais, principalmente as de matemática que a muito tempo vem
sendo alvo de críticas pela forma que são ministradas nas escolas brasileiras. Esta
conscientização pode ser vista na reforma do ensino médio proposta pelo Ministério da
Educação neste ano, acontecimento que ainda será abordado neste capítulo.
1.5 Estado novo e república populista
Com o golpe do Estado Novo, que deu a Getúlio Vargas plenos poderes, vieram
algumas mudanças no quadro educacional brasileiro, todos de caráter dominador, repressivo
ou discriminatório. O direito de todos à educação deixou de estar explícito na constituição; o
primeiro dever do estado passou a ser o ensino pré-vocacional e profissional, que serviam
apenas para a formação de mão-de-obra para o mercado de trabalho e não era necessário para
ingressar no ensino-superior, portanto se destinava claramente as classes populares; o ensino
secundário, ainda destinado às elites dirigentes, teve o acréscimo de matérias como História e
Geografia do Brasil, segundo Nelson Piletti, talvez visando o desenvolvimento da
“consciência patriótica”; o ensino normal visando a formação de regentes de ensino e
professores primários.
No período da república populista que vai de 1945 a 1964 houve um certo
desenvolvimento dos movimentos populares, que refletiu diretamente na educação brasileira.
A constituição de 1946, responsável pelo restabelecimento do regime democrático no país
reintroduziu alguns importantes princípios que dizem respeito a educação, como a escola
primária obrigatória e a educação como direito de todos. Mas o grande marco das mudanças
na legislação educacional foi a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) em 1961, após ser discutida durante treze anos no Congresso Nacional. Foi a
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primeira lei brasileira a estabelecer as diretrizes e as bases, em todos os níveis, do pré-
primário ao superior.
A lei nº. 4021/61 (L.D.B.) implantou uma estrutura organizacional que é no que diz
respeito à duração de cada nível, a base do que temos hoje, também foram definidos os novos
currículos que deixaram de ser rigidamente padronizados, sendo obrigatórias apenas, em nível
nacional, às disciplinas indicadas pelo Conselho Federal de Educação (Português, Historia,
Geografia, Matemática, Ciências e Educação Física), e em nível estadual disciplinas fixadas
pelos Conselhos de Educação dos Estados que, além disto, elaborava uma lista de disciplinas
que poderiam ser escolhidas por cada estabelecimento de acordo com as necessidades de seus
alunos, essas disciplinas atualmente são conhecidas como “optativas”.
No período de 1964 a 1985 o Brasil vive a fase da Ditadura Militar, cujas reformas
refletiram negativamente na educação brasileira, como podemos ver nas seguintes palavras de
Nelson Piletti:
A partir de 1964, a educação brasileira, da mesma forma que os outros
setores da vida nacional, passou a ser vitima do autoritarismo que se instalou
no País. Reformas foram efetuadas em todos os níveis de ensino, impostos
de cima para baixo, sem a participação dos maiores interessados – alunos,
professores e outros setores da sociedade. Os resultados são os que vemos
em quase todas as nossas escolas: elevados índices de repetência e evasão
escolar, escolas com deficiência de recursos materiais e humanos,
professores pessimamente remunerados e sem motivação para trabalhar,
elevadas taxas de analfabetismo. (PILETTI 1995, p.114).
A educação brasileira foi atingida em todos os níveis: No ensino superior foram
proibidos todos os movimentos estudantis e implantados exames Vestibulares unificados
comuns a estudantes de diversos cursos; o antigo Primário e o Ginásio foram unificados num
único curso com duração de oito anos (Curso de 1º grau) dedicado a educação geral; o Ensino
de 2º grau passou a ser inteiramente profissionalizante e todos os estabelecimentos forma
obrigados a implantar habilitações profissionais, mesmo os que não tinham as mínimas
condições para isto, o resultado foi que algumas escolas elaboravam um currículo para a
fiscalização e aplicavam matérias diferentes para os alunos ou implantavam habilitações mais
baratas sem se importarem com a existência de mercado para os profissionais que ali eram
formados.
No decorrer deste capítulo foram apresentadas algumas fases da historia da educação
brasileira que, em maior ou menor grau, influenciaram na formação da educação como a
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conhecemos hoje, dando foco ao ensino da matemática, cuja prática contextualizada será
abordada nos próximos capítulos.
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CAPITULO 2 A IMPORTÂNCIA DO ENSINO DA MATEMÁTICA APLICADA NA
REALIDADE
2.1 A matemática nas escolas brasileiras
O Brasil tem mais de 500 anos da historia como já foi dito no capitulo anterior, é um
tempo curto se comparamos com alguns países europeus, mas levando em conta a quantidade
de acontecimentos que ocorreram desde a chegada dos portugueses em nossas terras, vemos
que apesar de ainda ser muito jovem nosso país possui uma rica história, cheia de altos e
baixos provocados por mudanças sociais, revoluções e golpes. Vimos também que a educação
não ficou a parte dessas mudanças, aconteceram discussões, leis foram criadas e a escola está
se modernizando, mesmo que a passos lentos, portanto não podemos dizer que a educação
brasileira permaneceu inerte, mas é visível que esta longe do ideal apesar do índice de
analfabetismo ter diminuído de 60,1% em 1920 (como vimos anteriormente) para 11,1% em
2007, o que ainda é um valor muito alto, tanto que o Brasil ficou na nona posição entre os
países com maior número de analfabetos da América Latina e do Caribe (SPITZ,folha online).
Não podemos apontar um único fator responsável pelo baixo rendimento dos alunos
nas escolas brasileiras, que é um tema muito mais complexo do que aparenta ser, pois estamos
falando de um país de terceiro mundo com dimensões continentais que cresceu
economicamente nos últimos anos, mas ainda possui muitos problemas sociais. Como
vivemos em uma sociedade capitalista, tudo depende de recursos econômicos inclusive as
instituições de ensino que, como seus profissionais, não são valorizados como deveriam.
Apesar de ser um grande problema, o fator econômico não deve ser tomado como o
grande vilão da educação brasileira, mas sim o próprio sistema de ensino e nossas práticas
pedagógicas, ambos de caráter tradicional, característica que como vimos herdamos dos
Jesuítas que foram expulsos de nosso território a mais de 250 anos, isto mostra que, no que
diz respeito aos nossos métodos de ensino não evoluímos muito, pois a nossa forma de
ensinar lembra o que era feito nas primeiras escolas implantadas no Brasil. Além do
tradicionalismo outros problemas fazem parte de nosso contexto educacional, como lembrou
o professor Arnaldo Niskier em seu livro Filosofia da Educação: “A fragilidade de sistema
educacional manifesta-se também na insuficiência de professores adequadamente preparados,
19
na defasagem de técnicas usadas, no desrespeito as diferenças individuais e as diferentes
culturas apresentadas pelo País”. (NISKIER 1992, p.212)
Realmente a maioria dos nossos professores não estão preparados para atender as
necessidades do aluno moderno, pois apesar de terem domínio de sua matéria, lhes faltam
habilidades como uma visão critica dos conteúdos programáticos que permita sua adequação a
realidade de seus alunos, o que nos leva a outro problema citado por Niskier, o desrespeito as
diferenças individuais e culturais, que não vem apenas dos educadores mas de todo o sistema
educacional, pois a escola não possui total liberdade na montagem de seu currículo que é
padronizado para todo o país, dando abertura apenas para a escolha de algumas matérias
chamadas optativas, que como vimos surgiram em 1961 com a L.D.B. e se limitam a uma
lista criada pelo estado. Estes fatos revelam um sistema criador de alunos passivos
acostumados a decorar conteúdos sem a preocupação em entendê-los.
A matemática, talvez seja a matéria onde às características tradicionalistas ficam mais
evidentes, nossos educadores ainda utilizam métodos de ensino ultrapassados, os recursos
predominantes são o quadro negro, o giz e o livro didático, ou seja, normalmente não se
trabalha com nada do ambiente extraclasse, o que da aos educandos a impressão de que a
matemática é puramente abstrata e só pode ser aprendida através da memorização de
fórmulas, símbolos e métodos de resolução de problemas, tornando-se assim meras maquinas
que armazenam informações e as reproduzem ao resolver atividades onde às formulas ou os
métodos para resolvê-las são escolhidos pelas características de cada problema proposto, pois
é comum que o professor após expor a parte teórica do conteúdo, resolve alguns exercícios
que servem como exemplos a serem seguidos pelos alunos, assim se for apresentado um
problema cujo enunciado seja muito diferente dos exemplos apresentados, mesmo que a
forma de resolvê-lo seja a mesma, será notável a dificuldade ao solucioná-lo. Esta situação se
deve a dificuldade na interpretação, o que é resultado de uma cultura onde pouco se lê.
Nas escolas a matemática normalmente é vista como a matéria mais complexa do
currículo, independente da série, esta opinião é comum entre grande parte dos alunos e
professores, até mesmo alguns que trabalham com a matéria. Neste caso eles não acham que
ela seja difícil por falta de domínio do conteúdo, mas acreditam que fazem parte de um seleto
grupo de pessoas que, ao contrario das outras, tem a capacidade de desenvolver
conhecimentos matemáticos e da mesma forma vêem seus alunos dividindo-os em mais ou
menos “especiais”.
20
Ainda há matemáticos e mesmo educadores matemáticos que vêem a
matemática como uma forma privilegiada de conhecimento, acessível apenas
a alguns especialmente dotados, e cujo ensino deve ser estruturado levando
em conta que apenas certas mentes, de alguma maneira “especiais”, podem
assimilar e apreciar a Matemática, em sua plenitude. (D‟AMBRÓSIO, 1986,
p. 09).
Este tipo de educador pode diminuir a auto-estima do aluno ao menosprezar sua
capacidade de aprendizado, fazendo-o acreditar que não é capaz de adquirir conhecimentos na
área da matemática. Agindo desta forma o professor contribui diretamente para o crescimento
da crença popular de que a matemática é uma matéria muito difícil de ser compreendida,
pensamento que normalmente é formado desde o inicio da vida escolar, pois no Brasil do
primeiro ao quinto ano do ensino fundamental os professores são, normalmente, pessoas
formadas em pedagogia que lecionam todas as matérias, ou seja, na fase inicial de seus
estudos as crianças não têm professores especializados por área de ensino. Assim o aluno nem
sempre é motivados como deveriam, pois muitos destes educadores compartilham da idéia de
que a matemática é muito complexa e abstrata, desta forma se o professor não gosta do que
está ensinando será muito difícil fazer com que seu aluno goste, mas como mudar a opinião
das pessoas em relação a esta matéria que é tão mal compreendida?
Seria utópico acreditar que a educação é capaz de mudar a forma de pensar de toda
uma nação em um curto espaço de tempo, pois seu raio de ação é limitado ao corpo discente,
que é formado, em sua maioria, por jovens e crianças. Sendo assim, a educação tem a
capacidade de moldar o cidadão do futuro, o que é uma grande responsabilidade. Voltando a
pergunta acima, se o problema está em uma opinião errônea formada pela população, o mais
sensato seria mostrar aos educandos todas as faces da matemática, dando foco a sua relação
com a realidade, quebrando assim a impressão de abstração proveniente dos símbolos e
fórmulas.
2.2 A matemática no cotidiano:
Um atributo marcante e fascinante da matemática é sua onipresença no meio natural,
ela está presente nas formas das plantas e dos animais, nos fenômenos químicos e físicos, nos
movimentos dos astros, etc., esta característica ficou explicita na famosa frase de Pitágoras:
“os números regem o universo”. Outro meio onde a matemática está cada vez mais presente e
possui grande importância é o meio social, nele ela se apresenta por meio do comercio, da
tecnologia, de dados estatísticos e em grande parte do sistema organizacional da sociedade,
21
pois o homem moderno tem sua vida controlada por horários, símbolos e relações de ordem
como respeitar a hierarquia no trabalho ou uma simples fila no banco. Portanto a matemática
está diretamente ligada a nossa vida, seja pelo meio natural ou social.
Apesar do contato das pessoas com a matemática em sua rotina ser muito comum, a
maioria delas, principalmente as crianças não consegue relacionar os acontecimentos do seu
dia com os conteúdos ensinados na escola, o que deixa claro a carência de significações
concreta. Outro fato notável é a facilidade que algumas crianças têm em fazer cálculos e
resolver problemas quando estes lhes são apresentados fora da escola em situações rotineiras,
às vezes utilizando técnicas ensinadas por algum familiar ou amigo que possui pouca
formação escolar. Esta realidade foi exposta no livro Na vida dez, na escola zero de Terezinha
Carraher, David Carraher e Analúcia Schliemann, esta obra foi resultado de um programa de
pesquisa realizado durante quase dez anos. Neste livro os autores tomam como exemplo
crianças e adolescente que fazem parte do marcado informal, foi observado que no seu
ambiente de trabalho eles resolviam inúmeros problemas matemáticos sem o auxilio de lápis e
papel. Os problemas envolvem as quatro operações, em situações do tipo: se 1 coco custa X
então 4 cocos custam 4 X (multiplicação), o preço de 4 cocos mais o preço de 12
limões(soma) ou R$10,00 menos o preço de 2 cocos, para encontrar o troco (subtrações). A
divisão ocorre em menor freqüência em situações mais complexas como ao calcular o valor
de um quilo e meio de feijão que tem o quilo vendido por x reais. Quando a divisão não é
exata costuma-se usar uma tática onde o preço do produto varia de acordo com a quantidade,
por exemplo: o preço de cinco maçãs é R$4,00; mas uma maçã custa R$1,00.
No estudo feito para a realização deste trabalho os autores aplicaram dois testes um
informal com 63 questões e outro formal com 99 questões, o primeiro era realizado no
ambiente de trabalho dos participantes. O entrevistador propunha questões sobre transações
realizadas naquele tipo de comércio em que o entrevistado trabalhava, sendo que em alguns
dos casos eram questionados a cerca dos métodos utilizados na resolução do problema
proposto, já em outros o examinador se apresentava como freguês.
O teste formal foi montado a partir dos cálculos realizados pelas crianças e
adolescentes no teste informal, ou seja, o que eles responderam verbalmente foi representado
matematicamente, por exemplo: um entrevistado respondeu no texto informal que 10
refrigerante que custam R$1,50 cada, vão custar R$15,00, no teste formal foi proposta a
operação 10 × 1,5 ou um problema que fosse resolvido com este cálculo. O resultado foi que
no teste informal 98,2% dos problemas apresentados foram resolvidos corretamente, já no
teste formal, o mesmo ocorreu apenas em 36, 8% das operações e 73, 7% dos problemas.
22
Esses dados mostram que as crianças e adolescentes entrevistados têm muito mais
facilidade em resolver questões relacionadas a situações reais, e mesmo no teste formal
tiveram maior aproveitamento na resolução de problemas o que, segundo os autores, parece
confrontar a idéia aceita na escola de que, devem-se ensinar primeiro as operações aritméticas
isoladas de qualquer contexto, para depois apresentá-las em forma de problemas.
Podemos supor, à vista desses resultados, que a análise lógica implicada na
solução de um problema facilita a realização da operação, por inseri-la num
sistema de significados bem compreendidos, ao invés de constituir uma
habilidade isolada que é executada numa sequência de passos, os quais
levariam à solução. (CARRAHER, SCHLIEMANN, CARRAHER, 2001, p.
35).
Portanto a apresentação de problemas bem elaborados, abordando temas familiares aos
alunos proporciona um nível melhor de aprendizagem comparado com exercícios diretos do
tipo “calcule as somas” que desenvolve o costume de decorar e reproduzir procedimentos de
resolução.
A necessidade de se trabalhar nas escolas a matemática contextualizada em relação a
realidade de sua região levando em conta a cultura e o conhecimento matemático de seu povo
é um tema que vem sendo muito discutido nos últimos anos e foi pensando principalmente em
entender o saber matemático de culturas marginalizadas que surgiu o programa
Etnomatemática, encabeçado por Ubiratan D´Ambrosio que decidiu pesquisar a história e a
filosofia da matemática em diferentes culturas.
A historia nos mostra que vários países, inclusive o Brasil, sofreram grande influencia
de povos colonizadores que impuseram nas colônias seus costumes, religiosos, línguas e
conhecimentos que seguiam o padrão europeu. Ainda hoje sofremos grande influência de
outros países em nosso modo de vestir, em nossa música, em nosso modo de vida em geral e
também em nossa educação, por este motivo a etnomatemática propõe um processo de
“descolonização”. Segundo D´Ambrósio reconhecer e respeitar as raízes de um povo não
significa ignorar as raízes do outro, mas sim reforçar suas próprias raízes, ou seja, para
descolonizar nossa educação não é preciso descartar o modelo atual e criar um novo, basta
valorizar nossa cultura, através de sua inclusão, não só nas aulas, como em todo o ambiente
escolar, respeitando as características de cada região.
A cultura, que é o conjunto de comportamentos compatibilizados e de
conhecimentos compartilhados, inclui valores. Numa mesma cultura, os
indivíduos dão as mesmas explicações e utilizam os mesmos instrumentos
materiais e intelectuais no seu dia-a-dia. O conjunto desses instrumentos de
23
manifesta nas maneiras, nos modos, nas habilidades, nas artes, nas técnicas,
nas ticas de lidar com o ambiente, de entender e explicar fatos e fenômenos,
de ensinar e compartilhar tudo isso, que é o matema próprio ao grupo, à
comunidade, ao etno. O conjunto de ticas de matema num determinado etno
e o que chamo etnomatemátematica.(D´AMBRÓSIO,
vello.sites.uol.com.br/ubi.htm).
D´Ambrósio afirma que podem existir diferentes tipos de saberes matemáticos em um
mesmo país, devido a existência de diferentes culturas, um criança que vive na região sul do
Brasil pode resolver uma mesma situação problema de forma diferente de outra criança que
vive na região sudeste. Portanto no planejamento escolar o ponto de partida deve ser o aluno,
levando em consideração sua cultura e seu conhecimento, para se criar um ambiente mais
agradável, oferecer aulas interessantes e produtivas e fortalecer nossas raízes culturais.
2.3 Matemática aplicada
A matemática apresenta uma característica muito interessante, que é representar
situações e resolver problemas reais através de simbologias e procedimentos que formam um
vasto arsenal de teoremas, postulados e fórmulas. Esta característica fez com que o ensino da
matemática ande sobre uma alinha tênue entre o concreto-abstrato e o puramente abstrato, que
infelizmente é dominante em nossas escolas. O professor como fonte de conhecimento e
formador de opinião é a chave para mudar este quadro, pois cabe a ele o papel de apresentar
em suas aulas a matemática em sua plenitude, relacionando seus conteúdos com a realidade
dos alunos, que só assim poderão tirar conclusões reais sobre a matéria.
Elon Lages Lima propõe o ensino da matemática dividido em três componentes
básicos: conceituação, manipulação e aplicações.
Na sua visão a conceituação compreende principalmente a formulação correta e
objetiva das definições matemáticas, o emprego bem dosado do raciocínio dedutivo e o
entendimento e a percepção de que algumas noções e certas proposições podem ser
reformuladas ou interpretadas de diferentes formas ou em diferentes termos.
A habilidade na manipulação de equações, fórmulas e operações matemáticas,
segundo Lages, permite que o aluno economize tempo e energia ao se concentrar nos pontos
realmente essenciais.
As aplicações são consideradas por ele a conexão entre a abstração e a realidade,
sendo fonte de estimulo para os alunos e dever do professor a sua apresentação nas aulas.
24
A dosagem adequada dessas três componentes é o fator de equilíbrio do
processo de aprendizagem. Elas contribuirão para despertar o interesse dos
alunos e aumentar a capacidade que terão no futuro de empregar, não apenas
as técnicas aprendidas nas aulas, mas, sobretudo a capacidade de análise, o
espírito critico, agudo e bem fundamentado, a clareza das idéias, a disciplina
mental que consiste em raciocinar e agir ordenadamente. (LIMA, 2003, p.
177).
Das três componentes propostas por Elon Lages, a última está diretamente relacionada
ao ensino da matemática ligado a realidade, pois as aplicações formam uma peça fundamental
neste tipo de ensino, pelo fato de esclarecerem dúvidas, despertar a curiosidade e estimular a
visão analítica dos alunos a ponto de serem capazes de perceber a matemática agindo ao seu
redor.
Nossos alunos realmente são carentes em relação à significação concreta dos
conteúdos matemáticos, quem nunca ouviu um questionamento relacionado à matemática do
tipo: “Onde vou utilizar isto na minha vida”. Normalmente as pessoas conseguem associar as
situações reais a conteúdos mais simples como as operações fundamentais em uma compra no
supermercado ou frações na preparação da massa de um bolo, mas basta aumentar um pouco
o nível para que o conteúdo seja tido como puramente abstrato, portanto as pesquisas dos
professores devem ser direcionadas para buscar aplicações ainda desconhecidas pelos seus
alunos e não se prenderem apenas em exemplos relacionados a situações de compra, saldo de
contra bancária ou divisão de balas entre crianças fictícias que são comuns nos livros
didáticos e não representam nenhuma novidade para os educandos.
Infelizmente os livros didáticos no Brasil não são adaptados para as diferentes regiões
onde são adotados, é comum livros na região centro-oeste apresentarem exercícios
relacionados com praias ou livros no litoral nordestino possuírem problemas cujo enunciado
fala sobre as geleiras do Ártico, que é algo totalmente fora da realidade dos alunos. Portanto o
professor não deve tomar o livro didático como único recurso em suas aulas, mas sim buscar
novas metodologias e aplicações que as dinamizem, sabemos que não são todos os conteúdos
que permitem este tipo de aula e que a maioria dos professores são desvalorizados e alguns
trabalham nos três períodos não tendo muito tempo para pesquisar, mas se este profissional
conseguir dar uma aula diferente por mês e apresentar, pelo menos, uma aplicação por semana
já estará realizando algum progresso.
Um educador ao utilizar aplicações como ferramentas de apoio no processo de ensino-
aprendizagem, além de dinamizar suas aulas, conseguem despertar o interesse de seus alunos.
25
As aplicações constituem a principal razão pela qual o ensino da Matemática
é tão difundido e necessário, desde os primórdios da civilização até os dias
de hoje e certamente cada vez mais no futuro. Como as entendemos, as
aplicações do conhecimento matemático incluem a resolução de problemas,
essa arte intrigante que, por meio de desafios, desenvolve a criatividade,
nutre a auto-estima, estimula a imaginação e recompensa o esforço de
aprender. (LIMA, 2003, p. 141).
No trecho acima, Elon Lages Lima afirma que as aplicações, representam a principal
razão da necessidade de se ensinar matemática. De fato, a matemática foi criada para servir ao
homem, ajudando na resolução de problemas, sejam eles provindos de situações do dia-a-dia
ou relacionados a áreas científicas, tecnológicas e até mesmo sociais. Portanto a
aplicabilidade dos conteúdos matemáticos nos abre um leque de opções de áreas para serem
exploradas em sala de aula, principalmente no que diz respeito aos conteúdos do Ensino
Fundamental que por apresentarem níveis menores de abstração, comparados com os do
Ensino Médio, possuem uma grande quantidade de aplicações em situações e brincadeiras
simples. Em relação aos conteúdos do Ensino Médio as opções de aplicações concretas são
um pouco mais reduzidas, sendo que alguns deles não possibilitam a relação com o meio real
em exemplos de fácil compreensão. Portanto o professor não conseguirá apresentar aplicações
em todas as suas aulas, mas deve fazê-lo sempre que possível, para que o ensino não se dê de
forma puramente teórica e abstrata, pois deste modo estaria ignorando a razão da existência da
matemática que é facilitar a vida do homem. “Encontrar aplicações significativas para a
matéria que está expondo é um desafio e deveria ser uma preocupação constante do
professor.” (LIMA, 2003, p.144)
Além das aplicações dos conteúdos escolares na realidade, o professor dispõe de
outros recursos para tornar a matemática mais concreta e significativa, visando este objetivo o
educador pode utilizar dinâmicas de grupo ou jogos, que devidamente planejados
descontraem o ambiente escolar e desenvolvem conceitos de forma natural sem a necessidade
de decorar, o professor pode, por exemplo, antes de trabalhar equações introduzir o conceito
de equilíbrio de grandezas utilizando balanças para que os alunos possam comparar os pesos
de vários objetos e assim com o direcionamento dado pelo educador desenvolvem noções
necessárias para entender o que realmente acontece ao se manipular os termos de uma
equação.
Existe uma grande quantidade de jogos que podem ser utilizados no ensino da
matemática, sendo que alguns deles podem desenvolver várias habilidades ao mesmo tempo,
como o xadrez que desenvolve o raciocínio lógico, a noção de coordenadas, o nível de
26
concentração, o formato de seu tabuleiro permite trabalhar áreas de figuras geométricas
compostas por quadrados, quadrados perfeitos e outros conteúdos dependendo da criatividade
do professor.
Além dos jogos com materiais concretos o professor pode utilizar em suas aulas jogos
especulativos, que no caso da matemática, são normalmente chamados de “desafios” por
apresentarem enunciados instigantes e pela necessidade de muita dedicação para resolvê-los,
o que ajuda no desenvolvimento do raciocínio matemático “o jogo é uma oportunidade para
desenvolver um grande número de competências ou habilidades transversais. Participar de um
jogo leva a realizar escolhas, a tomar decisões, a organizar estratégias”. (CERQUETTI-
ABERKANE, BERDONNEAU, 1997, p. 44)
27
CAPITULO 3 COMO UNIR MATEMÁTICA E REALIDADE
3.1 O ato de planejar
No capitulo anterior foram feitas algumas reflexões em relações a importância de se
trabalhar nas escolas, os conteúdos matemáticos relacionando-os com a realidade dos alunos,
principalmente através de aplicações, dinâmicas e jogos, que quando bem trabalhados
produzem bons resultados. Infelizmente a boa intenção do professor ao utilizar estas
ferramentas de ensino (aplicações, jogos e dinâmicas) em suas aulas não é suficiente para
garantir um bom aprendizado, pois uma aula não tradicional exige muita dedicação ao ser
arquitetada, como já vimos, devem ser considerados a cultura da região em que o aluno está
inserido, o nível e o tipo de conhecimento que ele possui, sendo que em uma mesma turma
podem existir vários tipos diferente de conhecimento que são formados, no caso da
matemática, por informações e técnicas adquirida em seus estudos nas séries anteriores ou em
experiências extra-classe como os ensinamentos de um familiar ou os métodos desenvolvidos
para resolver problemas em seu ambiente de trabalho (no caso das crianças e adolescentes
inseridas no mercado informal), sendo assim, é necessário um planejamento minucioso para
que a aula tenha maior eficiência. Mas como deve ser um bom planejamento?
O ato de planejar é natural para o homem, fazemos vários planejamentos em um
mesmo dia, a partir da hora em que acordamos, começamos a pensar em como executar
nossas atividades diárias de forma que possamos atingir alguns objetivos num determinado
tempo. Neste cronograma que montamos para organizar nossa vida, planejamos desde as
coisas mais simples como o que comeremos no almoço até ações mais complexas como
pensar na melhor forma de realizar nosso trabalho. “planejar é uma exigência do ser humano;
é um ato de pensar sobre um possível e viável fazer.(...) A sua necessidade é a sua própria
evidencia e justificativa”. (MENEGOLLA, SANT´ANNA, 2002 p. 17).
No livro Por que Planejar? Como Planejar? Maximiliano Menegolla e Ilza Martins
Sant´Anna dividem o planejamento em quatro elementos básicos:
1- Processo de prever necessidades: prever necessidades é pensar em ações
necessárias numa situação presente ou futura, para sanar problemas existentes ou evitar que
28
eles surjam futuramente. Para isto deve-se fazer uma “sondagem” sobre a realidade a fim de
perceber o que realmente é possível para resolver uma situação.
Na pratica docente ao elaborar um plano de aula, o professor de prever necessidades
compreender o estudo da realidade dos alunos onde são identificados o nível de conhecimento
e as carências das turmas, para que se possa escolher os métodos de ensino adequados a cada
caso.
2- processo de racionalização dos meios e dos recursos humanos e materiais: o ato
de planejar requer um conhecimento acerca da realidade dos meios e recursos disponíveis,
além disto, é preciso sabedoria para fazer uma previsão racional de como utilizá-los nas
diferentes etapas do planejamento para que se possa atingir os objetivos desejados. Além de
quantificados os meios e os recursos devem ser qualificados, para que os melhores e mais
eficazes sejam selecionados e organizados segundo os objetivos que se pretende alcançar.
Em um plano de aula esta é a etapa onde se deve analisar os métodos (meios) que
serão utilizados na aula e os recursos disponíveis na escola. Estes dois itens estão diretamente
ligados, pois é a partir dos recursos que o educador cai desenvolver um método, por exemplo,
se a escola possui um laboratório de informática, é possível preparar uma aula onde os alunos
interajam com o conteúdo através de um programa de computador.
3- o processo de planejamento visa o alcance de objetivos em prazos e etapas
definidas: após conhecer a realidade é necessário traçar objetivos para mudá-la. Esses
objetivos representam a parte mais importante do planejamento, eles são responsáveis pela
orientação de todas as outras etapas. O ato de planejar requer que se pense em prazos
determinando a hora do inicio de execução e o tempo disponível para finalizá-la. Por sua
importância no processo de planejamento os objetivos devem ser apresentados de forma clara
e concreta expressando exatamente o que se pretende alcançar.
Toda aula possui um tempo limitado que deve ser levado em conta durante o
planejamento, o professor deve saber quantas aulas serão necessárias para apresentar um
conteúdo até que ponto iria chegar em cada aula de forma que se atinja seus objetivos. Se o
professor conhecer bem as características de seus alunos, será mais fácil de prever o tempo
aproximado que levarão para assimilar o conteúdo e conseguirá escolher melhor a
metodologia a ser utilizada.
4- O professor de planejamento requer conhecimento e avaliação cientifica da
situação original: para se evitar falhas, o professor de planejamento deve passar por
avaliações constantes de forma cientifica e criteriosa, com o objetivo de observar a existência
de algum erro e corrigi-lo antes de executar a ação planejada.
29
Portanto ao planejar uma aula o professor deve avaliar os alunos, no sentido conhecê-
los; a dinâmica que será utilizada, para ter certeza que é a mais adequada ao perfil dos alunos
e aos objetivos traçados e por fim avaliar os próprios objetivos verificando se estão claros e
condizentes com as outras partes do planejamento.
Seria desnecessário justificar a importância e a necessidade do planejamento
de ensino para a escola, professores e alunos. Mas o que se quer ressaltar é
que o primeiro e mais importante objetivo do planejamento das disciplinas,
para uma situação de ensino, serve para que os professores e alunos
desenvolvam uma ação eficaz de ensino e aprendizagem. (MENEGOLLA,
SANT´ANNA, 2002, p. 45)
Por tudo que foi apresentado, pode-se afirmar que uma aula, como qualquer outra ação
precisa ser planejada e pelo fato de envolver outras pessoas, além do planejamento necessita
de muita atenção para que se possa eliminar possíveis erros e aumentar sua eficiência,
lembrando sempre que o aluno deve representar o foco principal de todo o processo, sendo
assim, um plano de aula precisa estar diretamente ligado a realidade cultural, social e
intelectual dos educandos.
3.2 A matemática concreta no ensino fundamental
O ato de planejar antecede uma ação, então após ser feito o planejamento é preciso
colocá-lo em prática, portanto de nada serve um plano de aula bem elaborado se não for bem
executado. Este fato nos faz refletir sobre a prática docente levando a um importante
questionamento: “como ensinar matemática?”
Ubiratan D´Ambrosio (1986, p. 63) propõe que o professor deve encontrar a resposta
para esta questão dentro de um contexto sociocultural, procurando situar o aluno no ambiente
de que ele é parte, dando-lhe instrumentos para ser um individuo atuante e guiado pelo
momento sociocultural que ele está vivendo. Esta é uma proposta na concepção da
etnomatemática que, como já foi dito, prega ensino da matemática diretamente ligada a
realidade do aluno, vamos analisar então como isto pode ser feito começando pela educação
infantil.
Nas séries iniciais, por se trabalhar com crianças, existe uma grande quantidade de
brincadeiras, matérias e jogos que podem ser utilizados no ensino da matemática, pois tudo
isto faz parte do universo do aluno nesta fase de sua vida. As crianças têm como característica
natural a vontade de entender o mundo ao seu redor, isto as tornam curiosas em relação aos
30
objetos que compõe o ambiente em que estão inseridas, por isto o ambiente escolar deve ser
preparado para favorecer o aprendizado, contendo matérias estrategicamente escolhidos de
acordo com a idade dos alunos e os objetivos que se quer alcançar.
As primeiras experiências do aluno em uma instituição de ensino ocorrem na pré-
escola. Nesta fase a criança ainda está desenvolvendo seus sentidos, por isto deve ser o ponto
mais explorado pelos educadores, de forma que se possa usar esta característica para
desenvolver habilidade e conhecimento.
Segundo Françoise Carquetti Aberkane e Catherini Berdonneau no livro o ensino da
matemática na educação infantil, uma sala de pré-escola deve conter cartazes, álbuns e jogos.
Eles afirmam que os cartazes da área da matemática servem como referencias para enriquecer
as imagens mentais dos alunos e ajudá-los a memorizar, pode-se usar por exemplo, cartazes
representando os algarismos de forma animada para chamar a atenção das crianças, mas é
necessário evitar que sejam afixados com excesso e que contenham informações em demasia,
pois isto dificulta a memorização de seu conteúdo. O cartaz deve ser visível, claro e
compreensível para todos, ou seja, deve ser escrito com letras grandes, não conter erros de
ortografia e, além disto, não se deve sobrecarregá-lo com elementos inúteis, ou acrescentados
exclusivamente por razões estéticas.
Os álbuns, na visão dos autores, assim como os cartazes, podem contribuir como um
complemento para a educação matemática nas classes de pré-escola. Eles podem ser
utilizados em descobertas coletivas ou semicoletivas a partir das ilustrações e depois ser
colocado no espaço de leitura ou no da matemática a disposição de todos. Precisa-se evitar
livros nos quais os conceitos de algarismo e número se confundem, ou que apresentam
imagens muito pobres das formas geométricas, isto é, as figuras são mostradas sempre na
mesma posição, nunca aparecem equilibradas sobre um dos vértices, os triângulos são sempre
equiláteros..., estes apegos à particularidades acabam limitando a visão espacial das crianças
em relação as figuras geométricas.
Em relação aos jogos, os autores afirmam que devem ser compostos de elementos
fabricados com um material resistente, não devem representar qualquer perigo aos jogadores e
o tamanho de suas partes deve ser compatível com a idade das crianças. Um jogo pode ser
trabalhado de forma individual com os alunos, mas para conseguir melhores resultados é
necessário o trabalho em grupos, ou seja, a formação de um atelier de jogos. “A atividade na
qual diversas crianças contribuem juntas para uma produção comum constitui um atelier”.
(CERQUETTI-ABERKANE, BERDONNEAU, 1997, p. 6).
Os jogos praticados em ateliers apresentam as seguintes características:
31
São jogos com regras;
Constituem uma atividade de grupo;
Apresenta uma aposta explicita e introduzem a competição.
Para que o professor possa variar os jogos sobre relacioná-los com a habilidade que se
pretende desenvolver é necessário que sejam classificados de acordo com diversos critérios:
Modo de funcionamento: jogos de habilidade (de botão, de acertar o alvo...),
jogos de azar (utilizando dado, ou baseado em escolhas aleatórias...), jogos de estratégias,
jogos de conhecimento;
Conteúdo cognitivo (domínio dos números, combinações, lógica,
reconhecimento de formas...).
Trabalhar jogos em grupos não significa juntar muitas crianças em torno de um
mesmo jogo, é mais proveitoso subdividir o atelier, de forma que não tenham mais de quatro
crianças em volta de um mesmo jogo. Após a divisão do atelier de jogos, vem a fase de
apropriação, onde o professor disponibiliza algum tempo para que os alunos possam observar
e explorar, através de seus sentidos, o material que será utilizado no jogo. Em seguida tem
inicio a fase de formular de hipóteses, que ocorre a partir da intervenção do educador,
questionando a classe sobre o que se pode fazer com o material que eles têm em mãos, com as
opiniões dadas vão se formando as regras e só então se inicia o jogo, ainda sobre observação
para ver se todos entenderam a maneira de jogar.
Todo jogo aplicado em sala de aula deve ter um objetivo didático, sendo assim, ao
perceber que todos se adaptaram às regras e à maneira de jogar. Durante a partida professor
intervém antes de uma jogada para fazer com que as crianças prevejam as diversas
possibilidades, verbalizem o procedimento adotado e definam a estratégia adotada. Segundo
os autores é somente assim que o jogo adquire toda a sua dimensão de conduta consciente, e
que a criança ultrapassa afetivamente uma fase atividades que são principalmente aleatórias e
intuitivas.
Os jogos realmente representam uma grande ferramenta no desenvolvimento de
crianças na fase pré-escolar, pois transmitem valores morais como a cooperação, o ato de
compartilhar e o saber perder, que serão muito importantes para um bom convívio social no
futuro. E ao mesmo tempo em que absorvem estes valores, as crianças estão aprendendo o
conteúdo matemático necessário para a sua série. Mas deve-se lembrar que os jogos não
produzem resultados, para a educação das crianças, sem a participação do professor, sozinhos
eles são apenas formas de entretenimento. “Contrariamente ao que imaginam alguns
32
professores iniciantes, o atelier de jogos não “funciona por si”: ele necessita de uma
intervenção importante do professor, antes, durante e após o momento do jogo.”
(CERQUETTI-ABERKANE, BERDONNEAU, 1997, p.41)
A vida de uma criança não se resume a jogos e brincadeiras, por isso os autores
ressaltam a necessidade de propor aos alunos desde o maternal, problemas que fazem parte de
sua rotina no meio social ou em sua casa. Com o auxilio do professor as crianças devem
identificar os elementos principais do problema e sozinhas produzirão a condição da solução
por elas encontrada. Nesta fase os problemas devem ser relativamente simples, ou seja, conter
enunciados de fácil compreensão que possibilite ao aluno sua interpretação e resolução com o
mínimo de intervenção por parte do professor.
Normalmente o foco em jogos e brincadeiras para o ensino da matemática concreta é
comum até o quinto ano do ensino fundamental, porque a partir do sexto ano as crianças
vivem a fase da pré-adolescência e parte da adolescência onde seus interesses são ampliados,
além das brincadeiras e jogos (adaptados suas idades), coisas como moda, música, esporte e
internet, passam a ter grande influência sobre o modo de vida e a mente delas. Outro fator que
sofre mudanças é o modo de ver o meio social em que estão inseridos, pois nesta fase a
criança começa a se tornar, cada vez mais, independente e por possuir novos interesses, passa
a observar coisas que antes passavam despercebidas, proporcionando uma maior visão de seu
universo.
Todas essas mudanças devem ser levadas em consideração, pelos professores ao
planejar suas aulas. Os elementos contidos na nova realidade dos alunos, segundo as teorias já
apresentadas, podem e devem ser utilizadas no ensino da matemática, com o intuito de tornar
as aulas mais interessantes e significativas.
Para esta fase, as reflexões entorno das metodologias de ensino da matemática
contextualizada estarão focalizadas em duas ferramentas que o meu ver, por serem indicadas
em várias obras de autores como Ubiratan D‟Ambrósio e Elon Lages Lima, são de maior
importância para o ensino na forma proposta neste trabalho, são elas: os jogos e as aplicações.
Nesta fase os brinquedos e jogos vão, com o passar dos anos, perdendo espaço na vida
dos alunos, por isso o simples fato de utilizar um jogo durante a aula não é garantia de
eficiência, pois será necessário algum atrativo para torná-la interessante. Os jogos tradicionais
(baralho, xadrez, dominó, etc.) ainda podem ser utilizados, mas apenas para aprimorar
habilidades específicas como efetuar operações e desenvolver o raciocínio lógico matemático.
Quando o objetivo é relacionar o conteúdo com a realidade do aluno, o professor precisará
utilizar sua criatividade para criar novos jogos ou adaptar os já existentes, de acordo como as
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características sociais e culturais, a faixa etária e o nível de conhecimento dos educandos, que
por sinal é cada vez maior, pois o conhecimento não diz respeito apenas às matérias
lecionadas nas escolas, mas está relacionada a tudo que o indivíduo aprendeu, não só dentro
como fora da sala de aula e hoje, principalmente pela evolução dos meios de comunicação, os
jovens e as crianças possuem uma grande quantidade de informações armazenadas em suas
mentes.
(...) O fato inconteste é que hoje em dia uma criança chega à escola com uma
experiência, vivência e mesmo conhecimentos que a tornam absolutamente
diferente das crianças da geração anterior. E o ensino não aproveita essa
diferença, sobretudo habilidades, motivações e conhecimentos científicos
que são hoje bagagem de toda criança e jovem. (D‟AMBRÓSIO, 1986, P.92)
Portanto o professor deve aproveitar ao máximo o conhecimento de seus alunos, não
só na construção de jogos, mas em toda sua prática de ensino.
Constance Kanii e Sally Jones Livingston (1995) analisam o uso de jogos no ensino da
matemática segundo a teoria construtivista de Jean Piaget, que acredita no jogo educativo
como auxiliar no desenvolvimento da autonomia dos alunos por envolver regras, além de ser
melhores que folhas de exercícios porque são motivadores e cada criança tem a possibilidade
de acompanhar o trabalho de seus colegas e aprender a ser critica e confiante em si mesma.
Em relação à forma de se trabalhar os jogos em sala de aula são definidos três princípios
específicos:
1. O professor precisa jogar com os alunos;
2. É aconselhável para o professor pedir a todos os pequenos grupos (no máximo
quatro alunos) no final do jogo para dizerem quantos pontos cada jogador fez;
3. É aconselhável que cada criança mantenha registros cumulativos de todos os
companheiros de seu grupo.
Ao participar do jogo o professor mostra que a atividade deve ser levada a sério,
evitando que os alunos a vejam como uma simples brincadeira ou uma forma de “matar aula”.
Além disto, jogando, o professor pode avaliar melhor o desempenho de cada aluno e saber se
seus objetivos estão sendo atingidos. No final do jogo, como uma segunda maneira de
motivação, deve ser reservado um tempo para uma sessão de relatos, pedindo a cada grupo
para contar quem ganhou, por quantos pontos e quantos pontos os outros integrantes
conseguiram. Isto faz como que os alunos tornem-se responsáveis perante a classe, também é
a hora para discutir problemas sociais que surgiram e trocar sugestões sobre como resolver
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esses conflitos, o que ajuda no desenvolvimento de valores morais importantes na vida em
sociedade.
No capítulo anterior foi feita uma reflexão em relação à importância de se apresentar
nas aulas aplicações dos conteúdos matemáticos na realidade dos alunos. Agora o foco estará
em como trabalhar com aplicações de forma eficaz.
Ora, destacamos assim elementos essenciais na evolução da Matemática e no
seu ensino, o que a coloca fortemente arraigada a fatores socioculturais. Isto
nos conduz a atribuir à Matemática o caráter de uma atividade inerente ao
ser humano, praticada com plena espontaneidade, resultante de seu ambiente
sociocultural e conseqüentemente determinada pela realidade material na
qual o indivíduo está inserido.” (D‟AMBRÓSIO, 1986, P. 36)
Na citação acima D‟Ambrósio fala sobre a forte ligação entre a matemática e o ser
humano, relacionando esta ciência com o meio sociocultural e a realidade de cada pessoa.
Além disto, ele ressalta a forma espontânea com que ela é praticada pelo homem.
É dever do professor despertar os alunos para esta realidade, para que eles tenham uma
visão global a respeito da matemática e sua influência em todo meio físico e social. Uma
grande ferramenta para ajudar nesta missão são as aplicações, que consistem em procurar
formas de relacionar os conteúdos ensinados nas aulas com situações familiares aos alunos.
Uma forma eficiente de se trabalhar aplicações nas aulas de matemática é através da
apresentação de problemas contextualizados e atraentes. O professor poderia apenas citar
exemplos de utilização da matemática em situações concretas, fazendo simples comentários
do tipo: “as áreas das figuras planas são utilizadas na elaboração da planta de uma casa”, mas
neste caso, o aluno participaria apenas com espectador, o que seria um desperdício da
aplicação, pois o professor poderia utilizá-la melhor através de um problema que propõe a
criação da planta de uma casa envolvendo o cálculo de áreas, o que possibilita, até mesmo,o
complemento da atividade com a construção de uma maquete, que seria uma forma do aluno
presenciar e participar do processo de concretização da matemática.
Em relação à resolução de problemas, Sally Jones Livingston propõe a utilização de
três ou quatro das cinco aulas de matemática semanais. O problema dever ser proposto para a
classe toda e inicialmente é necessário que os alunos o resolva individualmente, com a
finalidade de que cada um desenvolva suas idéias. Ao chegar a uma resposta devem ter a
liberdade de comparar seus métodos com os dos seus colegas, esta liberdade deve existir por
três razões:
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1. Os alunos que já terminaram ficam muito intranqüilos se forem obrigados a
ficar sentados e esperar até que todos terminem;
2. O tempo dos alunos deve ser usado para a troca de idéias, a fim de socializar a
turma evitando o pensamento e atitudes egoístas;
3. Os alunos sentem-se mais seguros durante as discussões com toda a classe se
souberem o que os outros fizeram.
Após todos os alunos chegarem a alguma solução para o problema proposto, todos
devem assumir seus lugares para ter início as discussões, que tem como objetivo principal
desenvolver um importante sentimento de comunidade, Quando todo grupo trabalha sobre um
mesmo problema. Outro beneficio é a oportunidade que os alunos menos avançados ouçam as
explicações dos mais avançados.
Livingston, assim como outros autores já citados, é a favor do ensino da matemática
contextualizada, portanto propõe que, antes de ser apresentado aos alunos, o problema seja
relacionado com suas experiências. Enquanto o problema está sendo resolvido
individualmente o professor deve circular pela classe para que possa interagir com cada aluno
individualmente, desta forma o professor tem condições de aprender muito sobre a natureza
do raciocínio de seus alunos.
A partir de sua experiência como professora, Livingston agrupou os problemas que os
alunos mais gostam nas seguintes categorias: situações cotidianas escolares ou não, a vida
pessoal do professor, problemas bolados por eles mesmos e situações que emergem de outras
áreas de currículo.
Começando pelos problemas derivados do dia-a-dia na escola, ela propõe que o
professor aproveite ao máximo as situações que ocorrem na escola envolvendo conteúdos
matemáticos, como por exemplo, se a classe vai participar de uma excursão é possível reunir
os alunos para fazer um planejamento onde eles vão definir qual será o custo total do passeio,
quanto cada um irá gastar o tempo gasto em cada atividade a ser realizada. Desta forma o
professor pode trabalhar a matemática de uma forma tão natural que os alunos talvez nem
percebam que estão resolvendo exercícios matemáticos.
Problemas relacionados a situações cotidianas de fora da escola: a autora destaca o ato
de comprar, colocando-o como fonte inspiradora para problemas matemáticos, principalmente
em época de feriados quando o comércio apela para o espírito consumista das crianças. Assim
quando os alunos estiverem “tomados pelo espírito de natal”, o professor pode propor um
problema envolvendo os gastos com presentes. Este tipo de atividade e interessante para o
aluno por se relacionar com o momento que ele esta vivendo, portanto um problema sobre o
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natal não terá nada de especial se for apresentado em qualquer outro mês que não seja
dezembro.
Problema baseado na vida pessoal do professor: os alunos adoram ouvir sobre a vida
pessoal de seu professor e este fato pode ser utilizado a favor do ensino, através de problemas
do tipo: “meu cachorro Rex consome 10 kg de ração por semana e um pacote com 20kg custa
R$ 30,00 quanto gasto com ração todo mês?” para que este problema assuma um caráter
realmente concreto é necessário que o cachorro exista e seja conhecido pelos alunos ou, pelo
menos, por alguns deles.
Problemas criados pelos alunos: existem muitas formas de propor aos alunos que eles
elaborem um problema matemático, o professor pode, por exemplo, escrever na lousa uma
expressão como “(5+3)7” e em seguida pedir para que cada aluno crie uma situação –
problema que a represente. Outra forma é fornecer alguns dados e pedir que façam problemas
usando-os. O professor pode até mesmo permitir a criação de um problema com tema livre
desde que o aluno saiba resolvê-lo e provar que acertou. Segundo Livingston, as crianças
aprendem a “lógico – arimetizar” contextos não apenas resolvendo problemas como também
os inventando.
Problemas relacionados a outras matérias do currículo: é possível relacionar a
matemática com muitas matérias escolares, explorando, por exemplo, as formas geométricas
presentes em uma pintura famosa, as datas de acontecimentos históricos, sistemas de
coordenadas em geografia ou, até mesmo, ao número de silabas de algumas palavras.
Aos professores que hesitam em livrar-se dos livros didáticos, devemos dizer
que o entusiasmo das crianças com nossos problemas “caseiros” faz valer a
pena correr o risco. No começo pode ser difícil imaginar todos os dias novos
problemas, mas a matemática está realmente em torno de nós. As crianças
permitem-nos saber o que elas gostam e o que não gosta e ajudam-nos a ser
melhores professores. (KAMII, LIVINGSTON, 1995, p.145).
Realmente os benefícios que a utilização de problemas contextualizados nas aulas de
matemática são enormes, sendo que um dos mais importantes é o despertar do gosto pela
matéria nos alunos.
3.3 A matemática concreta no ensino médio
No ensino médio os alunos têm idades entorno de quinze e dezessete anos, portanto
estão em uma fase muito importante para sua vida, que é a transição da adolescência para a
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fase adulta. Neste período a tendência é que o individuo assuma uma postura mais
responsável, pelo fato de começarem a pensar em seu próprio futuro, principalmente em
ingressar numa faculdade, arranjar um emprego ou nos dois ao mesmo tempo, sendo que
alguns já começam a trabalhar antes de concluir o ensino médio.
Os jovens também, normalmente, se caracterizam pelo gosto por música, festas,
esportes, informações, moda e tecnologia. Portanto além das novas responsabilidades
presentes nesta fase muitos elementos ligados ao lazer ainda fazem parte do universo dos
jovens e tudo isto, como já foi dito anteriormente, deve ser analisado e utilizado pelo
professor para aproximar a matemática da realidade dos alunos.
Pelo fato de o lúdico não estar muito presente na realidade dos alunos nesta faixa
etária, os jogos acabam perdendo seu caráter “concretizador” da matemática, mas ainda
podem ser utilizados como dinamizadores das aulas. Para contextualizar a matemática com a
realidade de seus alunos o professor deve, segundo Ubiratan D´Ambrósio (1986, p. 63),
encarar a realidade como um todo e a partir daí começar uma análise de detalhes, usando as
linguagens convencionadas das ciências e seus refinamentos, que são as disciplinas e
especialidades, pois esta atitude servirá de exemplo para seus alunos que, se devidamente
influenciados, também se tornarão pessoas capazes de analisar matematicamente uma
situação.
D´Ambrósio também propõe uma esquematização para o processo de capacitação do
aluno para análise de toda sua realidade e definição de estratégias de ação, ela funciona da
seguinte forma: a partir de seu conhecimento acumulado, o aluno deve fazer uma análise da
situação real proposta pelo professor, primeiramente ele precisa formular o problema em
linguagem convencional, em seguida convertê-lo para uma linguagem matemática e analisá-lo
novamente procurando encontrar uma solução em termos matemáticos e, por fim, expressar
esta solução em linguagem convencional, que demonstra o real entendimento do resultado
encontrado.
Para exemplificar ele utilizou uma situação motivada por uma noticia de jornal, em
que um salva-vidas, numa praia, deve socorrer uma pessoa que está se afogando. Para resolver
este problema o salva-vidas deve elaborar uma estratégia com o objetivo de chegar o mais
rápido possível ao ponto na água onde a pessoa em apuro se encontra. O primeiro passo do
processo é traduzir a situação real num problema formulado em linguagem matemática. O
professor deve, antes de tudo, mostrar a proximidade entre a formulação em linguagem
matemática e a situação real, eliminando as dificuldades nela existentes. Segundo
D´Ambrósio, a linguagem matemática permite uma simulação da realidade tornando-a mais
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simples, além disto, possibilita destacar detalhes que seriam quase impossíveis de serem
destacados numa linguagem convencional.
Voltando ao problema proposto acima, uma formulação em linguagem matemática
seria: qual o tempo mínimo para que o salva-vidas vá do ponto A ao ponto B? Esta
formulação se deve ao fato de que o tempo é o fator mais importante nesta situação. O
próximo passo consiste em delinear a fronteira entre praia e água, pois são dois meios
diferentes onde em um deles o salva-vidas irá correr e no outro o percurso será feito a nado,
portanto devem ser levantadas algumas hipóteses do tipo: o salva-vidas desenvolve uma
velocidade constante V1 na praia e velocidade V2 na água. As hipóteses desempenham o
papel de simplificar a situação real, é importante que o aluno perceba a importância deste
processo que torna possível a formulação do problema em linguagem matemática, o que
representa o próximo passo.
No exemplo, e necessário encontrar um ponto P tal que AP/V1 + PB/V2, represente o
tempo gasto para que o salva-vidas alcance o banhista, logo após, a fim de solucionar o
problema, o aluno deve tentar adivinhar o resultado de forma intuitiva analisando
cuidadosamente a situação, que neste caso pode ser esboçado em uma figura. Depois dos
alunos terem tirado suas conclusões, o professor deve atribuir valores para algumas variáveis
que possibilitem equacionar o problema de forma que possa ser resolvido.
D´Ambrósio defende a utilização de calculadora neste processo, pois ele acredita que
os cálculos com números grandes, é parte integrante do desenvolvimento da matemática e que
o aluno em sua vida profissional precisará saber manejar este equipamento.
Esta esquematização proposta por Ubiratan D´Ambrósio visa, principalmente, o
desenvolvimento nos alunos da capacidade de analisar uma situação real, identificar o
problema nela contido, matematizá-lo e solucioná-lo.
Além de desenvolver conhecimentos matemáticos, todo este processo ajuda na
formação de cidadãos preparados para superar obstáculos encontrados no decorrer de sua
vida, através de escolhas bem planejadas e objetivas.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Por tudo que foi apresentado, fica claro que os métodos de ensino, em nossas escolas,
são ultrapassados, pois lembram muito os métodos tradicionalistas dos Jesuítas que foram
expulsos do Brasil a mais de 250 anos. Apesar de terem ocorrido muitas mudanças na
educação brasileira, principalmente no que diz respeito a organização e aos direitos dos
estudantes, nossos alunos ainda são tratados como meros espectadores durante as aulas, onde
a matemática é apresentada somente em sua forma abstrata, através do insistente uso de
fórmulas e métodos prontos, que são decorados e aplicados de forma mecânica sem que o
aluno entenda o significado real que está sendo feito.
Esta falta de significação dos conteúdos matemáticos ensinados nas escolas brasileiras
evidencia a necessidade de um ensino contextualizado com a realidade social e cultural dos
alunos, de forma que eles percebam a matemática agindo ao seu redor, sendo assim capazes
de solucionar as mais variadas situações – problema que venham a encontrar em suas
atividades diárias.
A partir das teorias e exemplos apresentados podemos concluir que a melhor forma de
se trabalhar a matemática ligada à realidade dos alunos é através de aulas dinâmicas, onde o
professor deve utilizar, principalmente, jogos e aplicações, que devem ser cuidadosamente
planejados a fim de adequá-los às características dos alunos, proporcionando assim um
melhor aprendizado.
Não quero neste trabalho atribuir ao professor toda a culpa pelas deficiências de
aprendizado de nossos alunos, nem tomá-lo como um super herói capaz de resolver todos os
problemas da educação brasileira, mas sim mostrar que o educador através de ações simples
como a apresentação de aplicações dos conteúdos em sala ou a utilização dos mesmos em
dinâmicas e jogos, pode revelar ao aluno uma realidade totalmente nova em relação à
matemática, despertando o prazer em aprender e formando, assim, cidadãos críticos e
esclarecidos.
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