Download - Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

Transcript
Page 1: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Urbanity in Brasilia’s superblocks

Urbanidade nas superquadras de Brasília

20CADERNOS

Page 2: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

12

CADERNOS

20

Manuela souza ribeiro Graduada em Arquitetura e

Urbanismo pela Universidade Federal de Pernambuco

e mestre em Planejamento e Projeto Urbano pelo Pro-

grama de Pesquisa e Pós-Graduação da Faculdade de

Arquitetura e Urbanismo da Universidade de Brasília

(2013). E-mail: [email protected].

Frederico de Holanda Arquiteto, PhD em Arquitetura

pela Universidade de Londres (1997), Professor Colabo-

rador da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Uni-

versidade de Brasília. É Pesquisador do CNPq, do qual

também já foi membro do Comitê de assessoramento

da subárea Arquitetura e Urbanismo (2007-2010). Pu-

blicou diversos trabalhos científicos, muitos dos quais

agraciados com prêmios e menções. Coordena o Grupo

de Pesquisa Dimensões Morfológicas do Processo de Ur-

banização. E-mail: [email protected].

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 3: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

13

CADERNOS

20

resuMo

A literatura sobre Brasília é quase consensual ao afirmar que as áreas residenciais

são monótonas e desertas. Contudo, um olhar mais atento é capaz de perceber

variações em termos de configuração dos espaços públicos e nos padrões de

copresença. A hipótese deste artigo é que tais variações de comportamento estão

atreladas às variações espaciais que sucederam no decorrer da implantação da

cidade. A pesquisa corrobora estudos recorrentes na área de arquitetura e urbanismo

que investigam as relações existentes entre espaço e comportamento humano. O

desempenho sociológico está simultaneamente associado a atributos específicos

dos lugares e atributos advindos de sua relação com o contexto. Importam relações

de acessibilidade entre os espaços públicos; quantidade de portas e janelas que

se abrem para eles; permeabilidade visual entre espaços abertos; dimensão

dos espaços; quantidade, tipos e distribuição de atividades e variedade de tipos

edificados. A análise parte da comparação entre padrões espaciais e sistemas de

encontro relativos a oito superquadras distribuídas pelo Plano Piloto da cidade. Para

análise dos atributos físicos foram utilizadas ferramentas da Sintaxe Espacial e feito

levantamento das atividades e equipamentos disponíveis em cada quadra. A análise

dos aspectos sociais partiu de observações programadas dos sujeitos e atividades

nos espaços públicos. A análise final resulta do cruzamento das informações

levantadas, utilizando a ferramenta estatística Pincipal Components Analysis (PCA)

para validação dos atributos espaciais e sociais relacionados.

palavras-chave: Brasília. Configuração. Comportamento social. Espaço público.

Superquadra.

ABSTRACT

The literature about Brasilia is almost consensual stating that the residential areas (superblocks)

are monotonous and deserted. But a closer look can perceive variations in the configuration of its

public spaces and patterns of copresence. In the hypothesis presented here, the sociological per-

formance is simultaneously associated to specifi attributes of the place and other characteristics

stemming from the insertion in its context. Various aspects concern this: accessibility relations

between public spaces; number of doors that open to them; visual permeability between open

spaces, and between public and private space; size of the spaces; number, type and distribution of

activities; availability of shaded areas and places to sit. The analysis starts with the comparison

between spatial patterns and encounters systems of eight superblocks distributed by Pilot Plan

of the Brazilian capital that have different configurations and appropriations. To analyze the

spatial patterns, Space Syntax tools were used and a field work depicting activities and facilities

in each superblock was carried out. Data is processed by the statistical tool Principal Components

Analysis (PCA) for validation of the relations among spatial and social attributes’ variables.

Keywords: Brasilia. Public space. Setting. Social behavior. Superblock. Introdução

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 4: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

14

CADERNOS

20

Introdução

Diversos autores acreditam na influência dos espaços no comportamento

humano (JACOBS, 2007; GEHL, 2006; WHYTE, 2009; HILLIER e HANSON,

2003; AUTOR, 2002; TENORIO, 2012 etc.). Essa corrente de pesquisa busca com-

preender como as características espaciais podem favorecer ou não a presença

e a interação das pessoas nos espaços públicos. Partindo do princípio de que a

cidade tem como funções primordiais a reunião de pessoas e as trocas, o bom

desempenho espacial é aquele que propicia tais relações.

Grande parte dos estudos nessa área surgiu a partir da revelação dos problemas

detectados em projetos modernos implantados: a experiência concreta

facultou a revisão dos princípios do urbanismo moderno na concepção das

cidades. Para muitos pesquisadores, o zoneamento de atividades, o isolamento

entre edifícios e a abundância de áreas verdes implicaram em aumento nas

distâncias a serem percorridas, diminuição da diversidade de atividades numa

mesma área, monotonia e consequente “morte da rua” (HOLSTON, 1993) – as

possibilidades de encontro e permanência nos espaços públicos nesse contexto

seriam reduzidas.

Brasília, a cidade símbolo internacional do Movimento Moderno, tem sido alvo

da crítica àquele modelo de urbanização: “Em Brasília, o público urbano dos

espaços abertos em outras cidades brasileiras simplesmente desapareceu”

(HOLSTON, 1993, p. 312); “a cidade é uma catástrofe no nível do observador.

[...] Se você não estiver em um avião ou helicóptero ou carro – e a maioria

das pessoas que vive em Brasília não está – não há muito com que se alegrar”

(GEHL, 2010, p. 197).

Estudos mais recentes revelam que a cidade apresenta diversos aspectos

positivos que a tornam um bom lugar para viver. Segundo Branco (2006) os

moradores se identificam com a cidade, reconhecem sua beleza e apreciam

os aspectos naturais. Ao contrário da completa desertificação que a literatura

crítica descreve, Brasília apresenta urbanidades espalhadas em seu território

(HOLANDA, 2010), ainda que de forma peculiar, comparativamente à cidade

pré-moderna.

Nos setores residenciais do Plano Piloto de configuração mais fiel aos princípios

modernos, a utilização dos espaços públicos não se restringe apenas às áreas

comerciais, mas também ocorre em seu interior. Apesar de as superquadras

apresentarem certa homogeneidade quanto à configuração é possível perceber

algumas variações: nas atividades existentes nos edifícios e espaços abertos no

interior e entorno da quadra; na implantação dos prédios; nos tipos edificados;

na presença de barreiras ao movimento; na distribuição dos equipamentos de

lazer e esporte.

Este trabalho parte do pressuposto de que existe relação entre as variações de

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 5: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

15

CADERNOS

20

uso e as características espaciais de cada superquadra e tem como objetivo

identificá-las. Para desenvolvimento da análise foram selecionadas oito

superquadras situadas no Plano Piloto: 109S; 207S; 308S, 412S; 113N, 209N, 315N

e 408N. A escolha da amostra teve como critérios: diversidade de usos e de

padrões espaciais; superquadras localizadas nos dois bairros (Asa Sul e Asa

Norte) e em cada faixa (“200” e “400”, a leste e “100” e “300”, a oeste).

O texto está divido em três partes: problema, método e resultados. A primeira

compreende uma breve caracterização de Brasília e superquadras, enfatizando

aspectos da concepção espacial. A segunda apresenta o método utilizado, que

compreende a avaliação em dois níveis: atributos físicos e sociais. E a terceira

contempla os resultados e a validação das variáveis por meio da ferramenta

estatística “Análise de Componentes Principais (PCA)”.

Problema

Brasília, a capital brasileira, foi concebida em 1957, por Lucio Costa. A cidade

planejada para 500 mil habitantes atualmente possui 2,5 milhões (IBGE, 2010) e

é composta por uma grande variedade de assentamentos, dos mais vernáculos

aos genuinamente modernos (AUTOR, 2002). O núcleo original denominado de

Plano Piloto (PP) corresponde a apenas uma das 30 regiões administrativas que

integram a metrópole.

O PP foi previsto margeando o Lago Paranoá, estruturado a partir de dois

eixos em cruz, inseridos num triângulo equilátero (COSTA, 1991). O eixo

maior – Rodoviário – corresponde à área residencial e o eixo transversal –

Monumental – aos centros cívico e administrativo. No cruzamento deles foi

situada a Plataforma Rodoviária e o centro de diversões em suas proximidades.

A distribuição das áreas residenciais e do Centro Urbano se deu de forma

simétrica em relação ao Eixo Monumental, compondo os bairros denominados

de Asa Norte e Asa Sul.

Costa (1991) estabeleceu quatro tipos morfológicos – residencial, monumental,

gregário e bucólico. O residencial é composto por edifícios de até seis pavimentos

e os demais com edifícios até dezesseis. O monumental se destaca dos demais

pelo maior afastamento entre os edifícios, enquanto o gregário é mais adensado,

com edifícios mais altos e mais próximos. O bucólico corresponde à parte de

ocupação rarefeita que envolve a cidade, situada às margens do Lago Paranoá,

mas também às onipresentes áreas verdes que permeiam o tecido residencial.

A trama da cidade foi composta por um sistema viário hierarquizado, com vias

mais lentas no interior dos setores habitacionais (sistema viário tipo cul de

sac) e as de maior velocidade fora deles. O intuito era evitar fluxos indesejados

de veículos no interior das áreas residenciais e permitir o trânsito livre de

pedestres nos espaços públicos e por baixo dos edifícios através do pilotis.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 6: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

16

CADERNOS

20

As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão de

240 x 240m, com edifícios residenciais, escola primária e jardim de infância

no interior. Uma faixa externa é destinada a edifícios comerciais e, na

confluência de quatro quadras, existiriam equipamentos comunitários (escolas

secundárias, cinemas, igrejas e áreas de lazer). Atualmente, grande parte dos

terrenos destinados a estes últimos equipamentos está vazia.

A proposta do comércio local previa um bloco linear de lojas geminadas,

disposto às margens do sistema viário. As portas do comércio abririam para o

interior da quadra, enquanto a face voltada para a via seria destinada ao acesso

de serviço e área de estacionamento. Essa configuração sofreu alterações, na

medida em que a cidade foi sendo construída. Na Asa Sul, os blocos passaram

a ter a frente voltada para a via de serviço e na Asa Norte, foram construídos

blocos menores, separados e com aberturas para todas as faces.

A proposta dos setores residencais se assemelha à Unidade de Vizinhaça

(PERRY, 1929), contudo, em Brasília os equipamentos de uso coletivo não

estão no interior das superquadras, mas paralelos ao sistema viário que as

articula. “Essa interface promove um intercâmbio que transcende as relações

de vizinhança ao criar espaços de mediação entre o domínio do morador e o

domínio do cidadão” (FERREIRA e GOROVITZ, 2009, p. 22).

Na organização interna das superquadras, Costa (1991) permitiu que a

implantação dos edifícios fosse livre e variada, mas estabeleceu alguns

princípios básicos a serem seguidos: gabarito máximo uniforme, até seis

pavimentos com pilotis; faixa periférica arborizada com 20m de largura; e

separação do tráfego de pedestres e veículos. Essas características permitiram

que os setores residenciais apresentassem uma estrutura uniforme mesmo

com as variações de forma e tamanho dos edifícios, implantação dos blocos e

materiais de acabamento utilizados.

Embora o tecido das áreas residenciais seja bastante homogêneo, existem

variações no uso dos seus espaços públicos. Há superquadras que permanecem

vazias ou com poucas pessoas em tais espaços em grande parte do tempo (p.

ex: 109S, 207S, 408N e 412S); outras possuem uma utilização mais intensa tanto

nas bordas quanto no miolo (p. ex: 308S, 209N, 315N e 113N).

Espacialmente, as superquadras variam quanto à implantação dos edifícios,

ao tratamento de desníveis, à composição das aberturas nas fachadas, ao grau

de permeabilidade visual e de movimento no nível do solo etc. A liberdade de

implantação dos blocos residenciais e as alterações que ocorreram ao longo do

processo de implantação da cidade permitiram a formação de espaços públicos

com configurações diversas, ora mais propícios à circulação e à permanência,

ora menos.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 7: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

17

CADERNOS

20

Método

O método desenvolvido para análise das superquadras partiu de algumas

premissas abordadas na literatura sobre relações espaço x comportamento

humano. Normalmente, os espaços públicos considerados de qualidade

são aqueles que permitem que as pessoas com características diferentes,

isoladas ou em grupo, desenvolvam diversas atividades, de circulação ou de

permanência.

São diversas as especulações sobre os atributos espaciais responsáveis pela

copresença. Hillier e Hanson (2003) chamam atenção para a acessibilidade,

considerando que espaços mais “integrados” (isto é, acessíveis) potencializam

a circulação de pessoas. Outros autores enfatizam a tendência de espaços

menores e com limites mais bem definidos serem mais acolhedores e mais

propícios à concentração de pessoas e às atividades de permanência (AUTOR,

2002; TENORIO, 2012).

Em outros casos, a permeabilidade visual entre os espaços é considerada um

fator primordial à segurança e ao incentivo à circulação entre os lugares. Para

Jacobs (2007), a sensação de segurança decorre da possibilidade de contato

entre pessoas que estão dentro e fora dos edifícios. Segundo Gehl (2006), esse

contato é viável até o 5° pavimento, o que em geral é aplicável às superquadras

cujos gabaritos não ultrapassam seis pavimentos.

Whyte (2009) acredita que os espaços públicos devem possuir atividades que

atraiam as pessoas e oferecer condições para que elas permaneçam neles.

Atividades variadas, concentradas numa mesma área, implicam maior presença

de pessoas do que se estiverem dispersas porque a diversidade de usos em uma

mesma área atrairá um público mais amplo e com necessidades e expectativas

diferentes (JACOBS, 2007; WHYTE, 2009; HOLANDA, 2002; TENORIO, 2012).

Outro aspecto importante é a presença de tipos edilícios variados em uma

mesma área urbana (JACOBS, 2007; HOLANDA, 2010). Enquanto Jacobs (2007)

se refere à idade dos edifícios, Holanda (2010) trata de outros atributos da

forma edilícia (altura, ter ou não pilotis, elevadores ou garagens subterrâneas,

tamanho dos lotes e da área construída etc.). Nos dois casos, as variações

edilícias são encaradas como fatores que interferem no valor do imóvel e no

público em potencial. Quanto mais variadas são as características edilícias

(idade, número de pavimentos, tamanho das unidades, tipo de circulação

vertical, tipo de estacionamento etc.), mais diverso é o público.

Muitos dos atributos espaciais mencionados estão presentes em mais de

um discurso, embora com ênfases distintas. A Teoria da Sintaxe Espacial

(HILLIER e HANSON, 2003), por exemplo, considera o sistema de barreiras e

permeabilidades ao movimento como principal fator responsável pela maneira

como as pessoas circulam nos lugares. Contudo, há evidências de que diversos

atributos são responsáveis pela vitalidade urbana.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 8: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

18

CADERNOS

20

Trabalhos mais recentes utilizam outras variáveis analíticas associadas à Sintaxe

Espacial. Holanda (2002) divide a análise do espaço em três níveis: padrões

espaciais, sistemas de encontro e categorias socioeconômicas a-espaciais. Na

interpretação dos padrões espaciais ele se vale não só de aspectos topológicos

recorrentes nos estudos sintáticos (integração, predictibilidade e convexidade),

mas também de atributos geométricos (quantidade e tamanho das áreas

livres). Tenorio (2012), por sua vez, alarga o conjunto de variáveis analíticas

incorporando aspectos funcionais, bioclimáticos, estéticos e econômicos à

análise espacial.

Nesse trabalho elegemos 13 variáveis para análise das superquadras. A

avaliação é dividida em dois dos três níveis sugeridos por Holanda (2002):

padrões espaciais e sistemas de encontro. Cada nível é composto por variáveis

que decorrem dos atributos espaciais que por hipótese favorecem a presença de

pessoas nos espaços públicos e sociais que representam a vitalidade daqueles

espaços (Figura 1). Nesse caso, os atributos sociais são utilizados para validar a

“comunidade virtual”, isto é parte da ocupação intrinsecamente relacionada à

configuração do lugar (HILLIER et al., 1987).

Os padrões espaciais são mensurados a partir de técnicas analíticas procedentes

da SE e outros estudos urbanos. A acessibilidade é avaliada pela medida de

integração global (Rn, que mede a cessibilidade das vias considerado o contexto

geral da cidade) e local (R3, que mede a acessibilidade considerada apenas a

vizinhança) obtidas a partir dos mapas axiais (HILLIER e HANSON, 2003) do

sistema viário de automóveis e de pedestres das superquadras. A quantidade e

dimensão dos espaços livres são obtidas no mapa de cheios e vazios e mapa de

Figura 1

Lista de variáveis e categorias analíticas utilizadas para avaliar as

superquadras.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 9: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

19

CADERNOS

20

convexidade (HILLIER e HANSON, 2003). A quantidade de espaço público com

tratamento, bem como, a variedade e distribuição das atividades são obtidas no

mapa de uso do solo. A conexão visual entre espaços públicos é avaliada pela

medida de integração visual (TURNER, 2004) e a conexão visual entre espaço

público e privado, pela extenção das janelas nas fachadas e pela quantidade

delas por espaço convexo (HOLANDA, 2002). Os tipos edilícios são avaliados

a partir da combinação de outras variáveis: idade dos edifícios; número de

cômodos das unidades; tipo de circulação vertical e estacionamento.

Os sistemas de encontro compreendem a análise dos sujeitos e atividades.

Os atributos são avaliados em termos de quantidade, variedade e distribuição

no tempo e no espaço, a partir de levantamentos de campo representados

em mapas comportamentais e de fluxos. O primeiro contempla as pessoas e

respectivas atividades de permanência e o segundo compreende a contagem

do tráfego de pedestres e as principais rotas de passagem. As atividades de

permanência são consideradas de acordo com a classificação de Gehl (2006):

1) Necessárias: envolvem obrigações, trabalho ou tarefas que dependem menos

das condições do espaço e do tempo para se realizarem. Exemplos: comprar,

vender, cuidar de alguém, esperar pelo ônibus, esperar por alguém, lavar o

carro.

2) Opcionais: dependem diretamente da vontade das pessoas e das condições

que os espaços públicos propiciam. Exemplos: praticar atividade física, observar

alguém ou algum evento, comer, beber, fumar, ler, passear, usar celular.

3) Sociais: são aquelas que envolvem interações entre as pessoas e também

dependem das condições que os espaços públicos propiciam. Exemplos:

brincadeiras, conversas, jogos, namoro.

O levantamento de pessoas e respectivas atividades de permanência foi

realizado ao longo de um dia de semana (terça-feira a quinta-feira) e em um

dia de sábado, em seis turnos entre 8h e 18h. O levantamento do tráfego de

pessoas foi realizado apenas durante a semana, em um dos períodos de maior

movimento (7h30 as 9h). Em cada superquadra, foram escolhidos seis pontos

para registro dos fluxos, durante 15min consecutivos.

Os dados serão comparados por meio da ferramenta estatística Análise de

Componentes Principais (PCA)1 (JOLLIFFE, 2002). A PCA permite uma melhor

visualização das diferenças existentes em uma amostra, pois sintetiza

uma extensa base de dados em apenas alguns componentes principais. Os

componentes são ortogonais entre si e formados por uma combinação linear

das variáveis. Os dois primeiros componentes são os mais utilizados para

obtenção dos gráficos por terem maior percentual de representatividade na

diferenciação dos objetos de análise.

1. Principal Component Analysis. Procedimento matemático inventado por Pearson (1901) e desenvolvido por Hotelling (1933).

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 10: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

20

CADERNOS

20

A PCA também pode ser utilizada para avaliar a pertinência das variáveis

analíticas, uma vez que cada uma agrega um determinado peso na formação

de cada componente. Quanto maior o coeficiente, maior a representatividade

da variável em relação às demais.

Resultados

Análise dos padrões espaciais

Acessibilidade

acessibilidade para o veículo

Em relação ao mapa axial do Distrito Federal (DF) (Figura 2), as superquadras

localizadas na Asa Norte possuem valores mais altos de integração global (Rn)

portanto, maior potencial de circulação de automóveis do que as da Asa Sul. No

mapa axial do Plano Piloto, os valores de integração global e local (R3) são maiores

na faixa de quadras 400 e a acessibilidade é quase simétrica nas duas asas.

Nos setores residenciais, o sistema viário “em árvore” implica pouca

acessibilidade ao conjunto urbano. As vias mais integradas sempre são as

da entrada da superquadra e a partir desse ponto, a acessibilidade para os

automóveis só diminui. A mobilidade e a apreensão do sistema viário pelas

pessoas em veículos são mais fáceis no contexto do PP como um todo do que

no interior das superquadras (HOLANDA, 2010).

acessibilidade para o pedestre

Em todas as superquadras é grande o número de rotas possíveis para o tráfego

de pedestres. Contudo, há variações na quantidade de eixos e nos valores de

integração, em função do tamanho dos espaços abertos e do número e extensão

dos obstáculos que as quadras apresentam. Em boa parte delas os eixos mais

integrados estão concentrados em uma determinada área, normalmente no

centro (Figura 2). Essas são as áreas mais acessíveis e com maior potencial de

presença de pessoas.

As superquadras 209N, 408N e 315N possuem maior quantidade de rotas

possíveis. A 412S embora possua diversos edifícios sem pilotis, também

apresenta muitos eixos. Isso se deve ao tamanho das áreas abertas e da

existência de blocos curtos. Na 109S, 207S, 308S e 113N, o pequeno número de

eixos é resultado de muitos desníveis entre os blocos e os espaços públicos.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 11: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

21

CADERNOS

20

Espaço livre público

Quantidade de espaço livre público

As quadras analisadas apresentam grande quantidade de espaços abertos. Os

percentuais de área construída variam de 12% (412S) a 20% (308S) da área total.

dimensão (espaço convexo médio)

Os espaços convexos (unidades espaciais obtidas por técnica de decomposição

proveniente da SE) das superquadras possuem em média dimensões

semelhantes, isso decorre da utilização frequente de plantas retangulares

dispostas paralelas às laterais das quadras (Figura 3) . Os casos mais particulares

correspondem à 109S com espaços abertos muito grandes, com valor médio de

3.174m², e à 207S, com valor médio de 1.342m². A 207S, apesar de ter o menor

valor de espaço convexo médio, possui um dos espaços muito grande em

Figura 2

Mapas axiais - Distrito Federal, integração global

(Rn); Plano Piloto, integração global (Rn) e local (R3); e

superquadras, integração global (Rn).

Fonte: Mapas do DF e PP - Grupo DIMPU/ UnB.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 12: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

22

CADERNOS

20

relação aos demais, como ocorre na 109S. Nas duas quadras, os blocos ocupam

as bordas e deixam livre a área central.

Figura 3

Mapas de espaços convexos das superquadras.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Espaço livre público com tratamento

As superquadras apresentam grande quantidade de espaços livres, contudo

apenas uma pequena parcela possui infraestrutura de apoio às práticas

desportivas ou sociais (Figura 4). O percentual de espaços com tratamento varia

de 2,1% (408N) a 19,4% (308S), o restante corresponde às áreas pavimentadas e

às áreas verdes.

Figura 4

Edifícios (em preto); espaços livres com solo permeável (em verde); espaços livres de circulação (em cinza);

e os espaços livres com tratamento (em amarelo).

Fonte: RIBEIRO, 2013

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 13: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

23

CADERNOS

20

Conexão visual entre espaços públicos

Em boa parte das quadras, o pilotis dos edifícios são espaços mais segregados

(Figura 5). Isso decorre da quantidade de barreiras existentes no nível térreo

(torre de escada/elevador, portaria, salão de festa e desníveis). Comparando o

mapa de visibilidade com o de espaços livres, notamos que grande parte dos

equipamentos de lazer e esporte está situada em áreas mais integradas.

Figura 5

Mapas de visibilidade das superquadras, com medidas

de “integração visual”: quanto mais “quentes” as cores (mais próximas do

vermelho), mais visíveis são os espaços, e vice-versa.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Os maiores valores de integração visual média correspondem às superquadras

408N e 412S e os menores à 109S e 207S. A 412S embora possua valor médio

de integração visual alto tem muitos espaços segregados, como as áreas de

estacionamento situadas entre os edifícios sem pilotis. Na 109S e 207S há

grande quantidade de desníveis entre pilotis e espaços livres.

Conexão visual entre espaço público e privado

extensão de janelas

As superquadras 308S e 412S têm edifícios com janelas em apenas uma das

fachadas (Figura 6). Na 109S, 113N, 315N e 408N predominam os edifícios com

janelas em duas faces dos blocos. Já na 209N e 207S existem prédios com janelas

em quase todas as fachadas.

Em geral, a quantidade e o comprimento de fachadas com janelas são maiores

nas quadras da Asa Norte do que na Asa Sul. Isso se deve as diferenças de

plantas adotadas nos edifícios residenciais e comerciais dos dois bairros. Na

Asa Sul os edifícios possuem maior quantidade de fachadas cegas, que resultam

em mais espaços públicos desconectados visualmente do interior dos edifícios.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 14: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

24

CADERNOS

20

Janelas por espaço convexo

A superquadra 207S se destaca pela maior proporção de fachadas com janelas

por espaço convexo, cerca de quatro fachadas, nas demais, essa proporção cai

para cerca de uma ou duas.

Atividades dentro dos limites e nos arredores

Variedade

Existe pouca variação nos tipos de usos existentes (residencial, comercial,

de serviço, religioso, de ensino, misto, de lazer e esporte) no interior de cada

superquadra e em seu entorno imediato (até 100m do limite) (Figura 7). Todas

elas apresentam de 6 a 8 tipos de atividades, contudo, a quantidade de parcelas

(lotes e blocos de edifício) é bastante distinta entre elas.

Na 308S o número de parcelas supera todas as outras quadras. Isso ocorre

porque sua vizinhança é formada não apenas por superquadras, mas também

por pequenos lotes com residências unifamiliares e edifícios comerciais.

O uso comercial e o misto – Asa Sul e Norte, respectivamente – ocupam segundo

lugar de importância na composição de uso do solo. Nas entrequadras da Asa

Norte, o uso misto decorre da coexistência de lojas comerciais e residências

adaptadas nos pavimentos superiores dos mesmos edifícios.

Figura 6

Mapas de fachadas das superquadras, com

indicação (em preto) das fachadas sem janelas.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 15: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

25

CADERNOS

20

distribuição no espaço

Em geral, a distribuição das atividades nas superquadras segue a lógica da

Unidade de Vizinhança: o miolo é residencial e eventualmente possui escolas

e creches; e a periferia abriga os comércios locais e demais usos. A 109S, 207S,

113N e 209N não apresentam atividades em um dos seus lados, já a 308S, 412S,

315N e 408N possuem atividades em todos os seus limites.

Tipos edilícios

Existem 12 tipos edilícios nas superquadras avaliadas, contudo, as variações

são pequenas. Predominam os edifícios mais antigos, com estacionamento

fechado, elevador e apartamentos de três quartos. Na 113N e 315N todos os

edifícios possuem o mesmo padrão; na 109S, 207S, 412S e 408N há dois ou três

tipos edilícios; e na 308S e 209N há quatro e seis, respectivamente. As variações

mais significativas decorrem do número de quartos por unidade.

Para as superquadras 400, Costa (1991) idealizou um padrão edilício mais

econômico, contudo, os tipos adotados não se diferenciaram tanto dos demais.

A 412S apesar de possuir tipos edilícios mais simples (apartamentos pequenos,

sem elevador e sem estacionemento coberto) também possui diversos edifícios

sobre pilotis e com apartamentos maiores. A 408N embora não possua as

mesmas comodidades das outras faixas (elevador e garagem) também possui

apartamentos grandes.

Figura 7

Mapas de uso do solo das superquadras e entorno

imediato. Em amarelo: espaços de lazer e esporte;

em rosa: edifícios religiosos; em vermelho: comércio; em azul: instituições de ensino;

em rosa escuro: serviços; em roxo: uso misto; em bege:

residências; em verde: áreas de vegetação.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 16: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

26

CADERNOS

20

Análise dos sistemas de encontro – Superquadras Quantidade de pessoas

Considerando o somatório de pessoas, em todos os horários dos dois dias

observados, a superquadra que apresentou em seus espaços públicos o maior

número de pessoas foi a 113N, seguida pela 308S, 209N e 315N. Já a 207S, 109S,

408S e 412S apresentaram os menores índices de copresença.

Variedade de pessoas

por gênero

A 113N e a 315N são as superquadras com maior equilíbrio entre gêneros,

tanto entre o número de homens e mulheres quanto em relação ao número de

crianças. Elas apresentam as maiores médias de pessoas por gênero (221 e 198

pessoas, respectivamente). Nas demais a média varia entre 90 e 160 pessoas,

aproximadamente.

por faixa etária

A distribuição de pessoas por faixa etária é bastante desequilibrada. Em todas

as superquadras é grande a presença de adultos, enquanto a quantidade de

idosos e crianças é menor. As maiores médias e os menores coeficientes de

variação correspondem à 113N e 308S.

Distribuição de pessoas no tempo

A quantidade de pessoas ao longo do dia também não é uniforme. Três das oito

superquadras apresentaram maior número de pessoas durante a semana do

que no dia de sábado (308S, 209N e 408N). Em boa parte delas há uma maior

incidência de pessoas por volta das 18 h dos dois dias observados. A 308S, 113N,

e 315N possuem maiores médias e menores coeficientes de variação.

Distribuição de pessoas no espaço

Todas as quadras apresentaram maior número de pessoas nos espaços públicos

do que no piso térreo dos edifícios (Figura 8), entretanto, em algumas delas o

percentual de uso dos pilotis é considerável: a 113N possui 39% e a 207S, 32%.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 17: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

27

CADERNOS

20

Essas quadras apresentam desníveis significativos entre áreas livres e pilotis,

deixando-os mais resguardados dos tráfegos de passagem.

A distribuição espacial de pessoas embora seja bastante diversificada, possui

algumas semelhanças. Normalmente os lugares mais utilizados estão situados

junto aos comércios, às escolas e aos pontos de ônibus ou são espaços de lazer e

esporte, locais sombreados e com bancos. Os extensos gramados sem mobiliário

urbano, os estacionamentos e as áreas próximas aos blocos comerciais com

poucas portas e janelas, em geral, são pouco frequentados.

Figura 8

Mapas comportamentais com distribuição de pessoas

num dia de semana e de sábado. Em azul: homens;

em rosa: mulheres; e em verde: crianças.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Atividades de passagem

As atividades de passagem ocorrem com maior frequência nas quadras 100

e 300 e no sentido leste-oeste (Figura 9). Portanto, o potencial de movimento

sugerido pelos mapas axiais (DF e PP) não foi confirmado: maior integração

nas quadras da Asa Norte e nas fileiras 400. As principais rotas de passagem

normalmente estão situadas nas calçadas externas, contrariando, também,

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 18: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

28

CADERNOS

20

o potencial de movimento sugerido no mapa axial para pedestres: maior

integração no interior das quadras.

Em grande parte das superquadras, os fluxos têm como origem ou destino os

pontos de ônibus, as estações de metrô (apenas na Asa Sul) e as entradas das

passagens subterrâneas que cortam o Eixo Rodoviário. Nas quadras com escolas

(308S, 113N e 408N), os fluxos também são fomentados por estes equipamentos.

Figura 9

Mapas de fluxos das superquadras em um dia da semana, no período de 7:00 às 9:00h. A intensidade dos

fluxos está representada pela variação cromática das linhas azuis (menos

intensos) para as vermelhas (mais intensos).

Fonte: RIBEIRO, 2013

Atividades de permanência

Quantidade de atividades

As quadras 308S, 113N, 315N e 412S apresentaram a maior variedade de atividades.

tipo de atividade (necessária, opcional e social)

A quantidade de atividades por tipo variam entre 19 e 28 (opcionais) e entre 8

e 12 (sociais e necessárias). A 113N possui a maior quantidade de atividades

opcionais, a 315N de atividades sociais e a 412S de atividades necessárias.

ocorrência

As quadras 113N, 308S, 315N e 209N apresentaram a maior ocorrência de

atividades considerando os três tipos juntos. Tendo em vista que, as atividades

sociais e opcionais são as que melhor representam a presença e o uso dos

espaços das superquadras, associamos os dois valores. Assim, a ordem das

quadras em funcão do desempenho (do maior para o menor) é: 308S, 113N,

315N, 412S, 109S, 209N, 408N e 207S.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 19: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

29

CADERNOS

20

distribuição de atividades no tempo

A maior parte das atividades ocorre no sábado na maioria das superquadras

(109S, 207S, 412S, 113N e 315N), apenas três delas (308S, 209N e 408N) possuem

mais atividades durante a semana. A quantidade de atividades ao longo dos

dias não é uniforme, contudo, há uma incidência maior de atividades as 16 e

18 horas, em boa parte das quadras. As atividades sociais ocorrem mais às 18h,

as necessárias às 10h e 18h, e as opcionais às 8h. Os melhores desempenhos

correspondem à 113N e 308S, que apresentam simultaneamente grandes

médias e pequenos coeficientes de variação.

distribuição de atividades no espaço

As atividades necessárias mais frequentes (comércio de comida e objetos)

ocorrem normalmente junto aos blocos comerciais, nos pontos de ônibus e

próximas à entrada das superquadras. As atividades opcionais mais comuns

(passear com cachorro e praticar exercícios) ocorrem nas calçadas externas e

equipamentos de esporte. As atividades sociais acontecem normalmente nos

espaços de lazer e esporte, no pilotis dos prédios junto às entradas, próximas

a banca de revistas, entrada das quadras, áreas sombreadas e com bancos. Os

espaços de lazer e esporte são os lugares que apresentam maior variedade de

atividades, sobretudo, aqueles que concentram diversos equipamentos (315N),

estão situados próximos às áreas de comércio (209N e 308S).

Análise de Componentes Principais: configuração versus apropriação

Os componentes principais 1 e 2 obtidos a partir da transformação das variáveis

tiveram bons percentuais de representatividade: 60% e 83%, respectivamente.

Na avaliação dos padrões espaciais das superquadras os tipos edilícios, o

percentual e o tamanho dos espaços livres foram os atributos de menor

coeficiente. Por outro lado, a conexão visual e a acessibilidade foram os

atributos de maior peso para diferenciação das superquadras. Nos sistemas de

encontro, os atributos de maior importância são os valores globais e médios da

variedade, quantidade e distribuição de pessoas no espaço e no tempo, bem

como da ocorrência e distribuição de atividade. Os atributos sociais medidos

pelos coeficientes de variação tiveram menor relevância.

Os valores positivos do PC1 estão relacionados às variáveis que possuem uma

relação de quanto maior o valor, melhor o desempenho espacial ou social,

assim, as superquadras com maiores valores nos gráficos (a, b) (Figura 10)

possuem melhor desempenho.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 20: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

30

CADERNOS

20

As quadras 113N, 315N, 209N e 412S agrupadas no centro do gráfico (a) (Figura

10) são mais parecidas espacialmente. A 408N está isolada do grupo, por ter os

maiores valores positivos e, portanto, o melhor desempenho espacial. A 207S,

109S e 308S se isolam do grupo, por apresentam padrões espaciais diferentes

dos demais. A 207S e a 109S, além de estarem mais afastadas, têm valores mais

negativos no PC1, que correspondem a piores desempenhos espaciais.

No gráfico (b) (Figura 10) as superquadras estão mais dispersas do que no gráfico

anterior, ou seja, elas apresentam maiores diferenças quanto à apropriação

social. A 207S, 109S, 315N e 209N conservaram-se em posição semelhante em

relação ao PC1. A 207S e a 109S possuem os piores desempenhos espacial e

social, enquanto que a 209N e 315N apresentaram bons desempenhos nos

dois níveis analíticos. Nesses casos, houve correlação entre os desempenhos

espaciais e sociais, enquanto nas quadras 308S, 113N, 412S e 408N houve uma

inversão.

Diversos fatores podem estar atrelados à falta de correlação entre os atributos

espaciais e sociais daquelas quadras. No caso da 308S, apesar de apresentar

atributos espaciais semelhantes a 109S e 207S, ela se diferencia muito em

relação à quantidade de atividades distribuídas nas suas proximidades. A

113N, por sua vez, apesar de possuir um conjunto de atributos espaciais menos

favoráveis à apropriação social, possui grande quantidade de famílias com

crianças morando na quadra. A 412S e 408N se destacam espacialmente pelos

altos índices de acessibilidade e conexão visual, porém possuem menores

densidades populacionais.

Esses casos revelam a necessidade de revisar algumas variáveis utilizadas e

incorporar outras a-espaciais, como a densidade populacional das quadras. Das

variáveis da SE as medidas de integração visual demostraram mais reveladoras

que as medidas de acessibilidade (integração física).

Figura 10

(a) Dois componentes principais dos padrões

espaciais e (b) dos sistemas de encontros das superquadras. Em

vermelho, quadras com valores negativos que não

mudaram nos dois gráficos, em relação ao primeiro

componente. Em amarelo, quadras que inverteram

posições. Em azul, quadras com valores positivos nos

dois gráficos.

Fonte: RIBEIRO, 2013

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 21: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

31

CADERNOS

20

Considerações Finais

O objetivo principal desta pesquisa foi descobrir e elucidar atributos espaciais

que favorecem, ou não, os diferentes fenômenos sociais encontrados nos

espaços públicos nas áreas residenciais do Plano Piloto de Brasília. Ao contrário

do que a crítica generalista prega sobre a cidade, o artigo demonstra que há

presença de “urbanidades” nas superquadras, ainda que pontuais.

A análise dos sujeitos e atividades demostrou que não existe uma distribuição

uniforme no tempo e no espaço, mesmo nas superquadras mais movimentadas.

Segundo a literatura, essa realidade é própria dos locais poucos favoráveis à

vida pública, contudo, as diversas formas de apropriação social que acontecem

nas quadras comprovam a correlação existente entre configuração espacial e

comportamento humano.

Algumas premissas foram comprovadas nessa pesquisa: maior disponibilidade

de equipamentos urbanos favorece as práticas sociais em espaços públicos; a

conexão visual entre espaços convida à passagem e estimula à permanência;

a diversidade e concentração de atividades atrai um público maior para os

espaços públicos. Por outro lado, para avaliar o desempenho sociológico das

superquadras algumas características são pouco relevantes: acessibilidade;

quantidade e tamanho dos espaços livres; e variedade de tipos edilícios.

Os resultados corroboraram muitas hipóteses e suscitaram outras perguntas.

Pouco foi explorado sobre as motivações reais que atraiam, ou não, as pessoas

para aqueles espaços. Uma pesquisa futura pode incluir outros atributos

espaciais (p.ex. densidades residenciais líquidas e brutas) e outros atributos

a-espaciais (p.ex. o perfil socioeconômico dos usuários).

Ao “inventar” as superquadras, Costa (1991) propôs edifícios soltos em

abundantes áreas verdes e setorizou as atividades. Hoje existem diversas

pessoas morando sobre os edifícios comerciais; atividades de serviço e comércio

informal proliferam no interior das quadras; pessoas preferem caminhar nas

calçadas externas a cruzar o pilotis dos edifícios. O espaço condicionou certas

práticas e as práticas também mudaram os espaços. Sobreviveram algumas

qualidades espaciais e outras oportunidades de melhorá-las foram perdidas,

ou ainda não aproveitadas.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda

Page 22: Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda …...Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda 16 CADERNOS 20 As áreas residenciais são compostas por superquadras com dimensão

32

CADERNOS

20

Referências

BRANCO, M. C. C. C. brasília: narrativas urbanas. Dissertação (Mestrado) –

Programa de Pós-Graduação em Sociologia, Instituto de Ciências Sociais.

Universidade de Brasília – UnB. Brasília, 2006. 142 p.COSTA, L. relatório do plano

piloto de brasília. Brasília: GDF, 1991.

FERREIRA, M. M; GOROVITZ, M. a invenção da superquadra: o conceito da

Unidade de Vizinhança em Brasília. Brasília: IPHAN / Superintendência do

IPHAN no Distrito Federal, 2009.

GEHL, J. life between buildings: using public space. Copenhagen: The Danish

Architectural Press, 2006.

_____. cities for people. Washington: Island Press, 2010.

HILLIER, B.; HANSON, J. the social logic of space. Cambridge: Cambridge

University Press, 2003.

_____ ; BURDETT, J.; PEPONIS, J.; PENN, A. Creating life: Or, does architecture

determine anything?. architecture et comportement/architecture and

behaviour, v. 3, n.3, pp. 233-250, 1987.

HOLANDA, F. o espaço de exceção. Brasília: Editora Universidade de Brasília, 2002.

_______. brasília: cidade moderna, cidade eterna. Brasília: FAU/UnB, 2010.

HOLSTON, J. a cidade modernista: uma crítica de Brasília e sua utopia. São

Paulo: Companhia das Letras, 1993.

IBGE. sinopse por setores. censo 2010. Disponível em: <www.censo2010.ibge.

gov.br/sinopseporsetores/?nivel=st>. Acesso em: 16 dez. 2012.

JACOBS, J. Morte e vida de grandes cidades. São Paulo: Martins Fontes, 2007.

JOLLIFFE, I. T. principal component analysis. Second edition, New York:

Springer-Verlag New York, Inc., 2002.

RIBEIRO, Manuela Souza. Habitar, trabalhar, recrear e circular: possibilidades e

limitações nas superquadras de brasília. 2013. 221 p. Dissertação (Mestrado em

Arquitetura e Urbanismo) – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, Universidade

de Brasília, Brasília, 2013. Disponível em: http://www.fredericodeholanda.com.br/

TENORIO, G. ao desocupado em cima da ponte: Brasília, arquitetura e vida

pública. Tese (Doutorado) – Programa de Pesquisa e Pós-Graduação em

Arquitetura e Urbanismo, Faculdade de Arquitetura e Urbanismo. Universidade

de Brasília – UnB, Brasília, 2012. 391p.

TURNER, A. depthmap 4. Londres: Bartlett School of Built Environment, 2004.

WHYTE, W. H. the social life of small urban spaces. Nova York: Project for

Public Spaces, 2009.

Urbanidade nas superquadras de BrasíliaUrbanity in Brasilia’s superblocks

Manuela souza ribeiro e Frederico de Holanda