Instituto de Educação e Psicologia
Laura Bettencourt Tomás Ferreira A Organização Narrativa em Adultos Novembro de 2007
Instituto de Educação e Psicologia
Laura Bettencourt Tomás Ferreira A Organização Narrativa em Adultos Tese de Mestrado em Psicologia / Área de Especialização em Psicologia Clínica Trabalho efectuado sob orientação do Professor Doutor Óscar Gonçalves e co-orientação da Professora Doutora Margarida Henriques Novembro de 2007
ii
DECLARAÇÃO
Laura Bettencourt Tomás Ferreira
BI: 10794492
A Organização Narrativa em Adultos
Orientada pelo Professor Doutor Óscar Gonçalves e pela Professora Doutora Margarida Rangel
Henriques
Novembro, 2007
Dissertação de candidatura ao grau de Mestre em Psicologia, área de especialização em
Psicologia Clínica, do Instituto de Educação e Psicologia da Universidade do Minho
É AUTORIZADA A REPRODUÇÃO INTEGRAL DESTA TESE/TRABALHO APENAS PARA EFEITOS
DE INVESTIGAÇÃO, MEDIANTE DECLARAÇÃO ESCRITA DO INTERESSADO, QUE A TAL SE
COMPROMETE.
Universidade do Minho, Novembro de 2007
iii
AGRADECIMENTOS
Começo por agradecer a todas as pessoas que, contando as suas histórias, possibilitaram
que este projecto passasse do mundo das ideias ao mundo do concreto.
Ao Professor Doutor Óscar Gonçalves, orientador deste trabalho, agradeço toda a
colaboração, apoio e dedicação ao projecto e o carácter inspirador do seu humor, sabedoria,
profissionalismo e prontidão.
À Professora Doutora Margarida Rangel Henriques, co-orientadora deste estudo, um
sincero agradecimento pela forma apaixonada, inteligente, rigorosa e encorajadora como se
envolveu no planeamento e concepção deste trabalho.
À Dr.ª Carla Martins agradeço o precioso auxílio no tratamento estatístico dos dados.
À Marta Jorge, fiel companheira dos estudos, das viagens, do entusiasmo e dos anseios,
agradeço a amizade e a presença ao longo de todo este percurso que percorremos lado a lado.
Eis que chegou o momento.
Às colaboradoras de recolha e transcrição dos dados e às colaboradoras que cotaram as
narrativas, Marta Jorge, Andreia Couceiro, Fidjy Rodrigues, Catarina Gonçalves, Marta Martins,
Ana Pinto, Cátia Lopes, Sónia Monteiro, Eva Fernandes e Cláudia Santos agradeço toda a
colaboração e o esforço.
À amiga Professora Doutora Fátima Feliciano pelo constante incentivo, exemplo de
profissionalismo e de vida.
Ao pai, à mãe, à avó, ao avô e à tia e à irmã obrigada pelo apoio e carinho e por
possibilitarem a minha narrativa de vida.
Ao César pela presença constante e pela admiração incondicional que coloca nos meus
sonhos.
v
A Organização Narrativa em Adultos
RESUMO
A linguagem e a narrativa têm sido alvo de um crescente interesse no estudo dos fenómenos
psicológicos e no desenvolvimento de práticas terapêuticas. Baseando-nos no pressuposto de que
significamos o mundo e a experiência discursivamente, a narrativa funciona como um organizador da
dimensão caótica da experiência. Actualmente, conceptualiza-se que a riqueza narrativa está associada a
níveis de bem-estar psicológico mais elevados e que, ao disfuncionamento psicológico, correspondem
formas mais pobres ou rígidas de produção narrativa. Diversas investigações sobre o desenvolvimento
narrativo têm vincado, ainda, a marcada evolução a que se assiste a este nível desde a infância até à
idade adulta para formas cada vez mais ricas de organização e significação da experiência. Nesse
sentido, acreditamos ser fundamental dar particular atenção à compreensão da organização narrativa,
pelo que, com a presente investigação pretendemos contribuir para a compreensão da produção
narrativa em adultos, como esta evolui desde a infância até à vida adulta e, ainda, de que forma se
distingue das narrativas de sujeitos com perturbação psicológica. Assim, analisámos as narrativas de 126
adultos sem perturbação psicológica, com idades compreendidas entre os 20 e os 45 anos, do sexo
feminino e masculino e com níveis sócio-culturais (NSC) distintos, quanto às suas três dimensões
centrais, Estrutura, Processo e Conteúdo, através da metodologia desenvolvida por Gonçalves, Henriques
e colaboradores. Os objectivos do presente estudo são: a) analisar a organização narrativa de adultos
quanto à coerência Estrutural, complexidade de Processo e diversidade de Conteúdo, bem como a
influência da idade, NSC e sexo; b) analisar de que forma as narrativas destes adultos diferem das
narrativas de adultos com diagnóstico psicopatológico, nomeadamente de agorafobia e de dependência
de opiáceos; c) traçar a tendência evolutiva do desenvolvimento narrativo ao nível da Estrutura, Processo
e Conteúdo desde a infância até à idade adulta. Observámos que os adultos sem psicopatologia
constroem narrativas com uma boa coerência Estrutural e uma boa diversidade de Conteúdo, embora
apresentem uma complexidade de Processo mais pobre. Verificou-se, ainda, que o sexo e a idade não
determinaram qualquer diferença na produção narrativa, embora o número de anos de estudo revele
influenciar positivamente a riqueza narrativa. Quanto à comparação com os sujeitos com diagnóstico
clínico, encontrámos, no geral, narrativas mais ricas para os adultos sem perturbação psicológica. Por
fim, a observação da produção narrativa ao longo da vida sugere uma tendência evolutiva: da diversidade
de Conteúdo sobretudo ao longo da infância, com um ligeiro aumento no final da adolescência; da
complexidade de Processo desde a infância até ao final da adolescência e da coerência Estrutural ao
longo dos 45 anos estudados, mais denunciada até ao início da idade adulta – 20-25 anos – altura a
partir da qual parece haver uma estabilização até aos 45 anos de idade.
vii
Narrative Organization in Adults
ABSTRACT
Language and narrative have been used in the study of psychological phenomena and in the
development of therapeutic practice with increasing interest. Bearing in mind the fact that we mean the
world and experience discursively, narrative works as an organizer of the chaotic dimension of experience.
Currently it is conceptualized that a rich narrative is associated with psychological well-being and that
psychological dysfunction corresponds to poor or rigid forms of narrative production. Several researches
about narrative development point out the marked evolution since infancy until adulthood into richer forms
of experience organization and meaning. Recognising thus the importance of narrative organization, the
present study intends to contribute for its understanding in adults, its development since childhood and
still the distinction between the narratives of a healthy adult and of a psychological disturbed one. For
these purposes, we analyzed the narratives of 126 adults without psychological disturbances, aged
between 20 and 45, from both sexes and from distinctive layers of society in its three central dimensions:
Structure, Process and Content using the methodology developed by Gonçalves, Henriques and
collaborators. Our goals are: a) analyzing adult’s narrative organization as for its structural coherence,
complexity of process and diversity of content as well as the influence of age, sex and social-cultural level;
b) analyzing in which way the narratives of these adults differ from the ones of adults to whom
agoraphobia and opiates dependence has been diagnosed; c) identifying the evolutional tendency of
narrative development in terms of Structure, Process and Content since infancy until adulthood. We were
able to observe that adults without psychological diagnosis construct narratives with good structural
coherence and good diversity of content but weaker complexity of process. Data also shows that sex and
age do not determine different narrative production, but the number of study years can positively influence
narrative act. Compared to subjects with clinical diagnosis, healthy adults tend to show richer narratives.
Finally, the observation of narrative production throughout the life course suggests: a tendency to improve
Content diversity mostly during infancy, with a slight increase towards the end of adolescence; to improve
Process complexity since infancy until the end of adolescence and to improve Structural coherence all
along the 45 studied years, with stronger incidence until the beginning of adulthood – 20-25 years old –
when it seems to stabilize until the age of 45.
ix
ÍNDICE
Introdução 17
Parte I. Enquadramento Teórico 19
1. Narrativa 21
1.1 Narrativa e construção do conhecimento 21
1.2 Narrativa e psicologia 23
1.3 Narrativa, psicoterapia e psicopatologia 26
1.3.1 Estrutura, Processo e Conteúdo como dimensões da matriz narrativa 30
1.3.2 Matriz narrativa em pacientes com diagnóstico de agorafobia e de
dependência de opiáceos 38
2. Desenvolvimento narrativo 39
2.1 Desenvolvimento narrativo ao longo da vida: infância, adolescência e vida adulta 39
2.2 Desenvolvimento da Estrutura, Processo e Conteúdo narrativos na infância e na
adolescência 43
2.3 As variáveis sócio-culturais e demográficas na construção narrativa 45
Parte II. Análise da Organização Narrativa em Adultos: Comparação
com Grupos Clínicos e com Diferentes Etapas do Desenvolvimento 49
1. Introdução 51
2. Método 52
3. Apresentação dos resultados 57
4. Discussão dos resultados 101
Conclusões 113
Referencias Bibliográficas 121
Anexos 127
x
ÍNDICE DE FIGURAS E TABELAS
Tabela 1.
Distribuição da amostra por idade, sexo e nível sócio-cultural 52
Tabela 2.
Médias, desvios-padrão e teste T das notas globais das narrativas autobiográficas 58
Figura 1.
Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas
autobiográficas 59
Tabela 3.
Médias, desvios-padrão e teste de Friedman das sub-dimensões da estrutura das narrativas
autobiográficas 60
Figura 2.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência
estrutural, comprometimento avaliativo e integração das narrativas autobiográficas 60
Tabela 4.
Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões
do processo das narrativas autobiográficas 61
Figura 3.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação
emocional, subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas autobiográficas 62
Tabela 5.
Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do conteúdo
das narrativas autobiográficas 63
Figura 4.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções
e temas das narrativas autobiográficas 63
Tabela 6.
Médias, desvios-padrão e teste T das notas globais das narrativas de ficção 64
xi
Figura 5.
Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção 65
Tabela 7.
Médias e desvios-padrão das sub-dimensões da estrutura das narrativas de ficção 66
Figura 6.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência
estrutural, comprometimento avaliativo e integração das narrativas de ficção 66
Tabela 8.
Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do processo das
narrativas de ficção 67
Figura 7.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação
emocional, subjectivação cognitiva e metaforização, das narrativas de ficção 68
Tabela 9.
Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do conteúdo
das narrativas de ficção 69
Figura 8.
Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções
e temas das narrativas de ficção 69
Figura 9.
Médias das notas globais: estrutura, processo e conteúdo das narrativas autobiográficas e das narrativas
de ficção 70
Tabela 10.
Teste T para as notas globais das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 71
Figura 10.
Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 72
xii
Tabela 11.
Teste de Friedman e Teste de Wilcoxon das notas das sub-dimensões da estrutura das
narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 72
Figura 11.
Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação emocional,
subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 73
Tabela 12.
Teste de Friedman e teste de Wilcoxon das notas das sub-dimensões do processo das
narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 74
Figura 12.
Médias das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das
narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção 75
Tabela 13.
Teste de Friedman e teste de Wilcoxon das notas das sub-dimensões do conteúdo das narrativas
autobiográficas e das narrativas de ficção 75
Tabela 14.
Médias, desvios-padrão e Analise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas
da amostra normativa e da amostra clínica 76
Figura 13.
Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas da amostra normativa e
da amostra clínica 77
Tabela 15.
Médias das sub-dimensões da estrutura da amostra normativa e da amostra clínica 78
Figura 14.
Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica 78
Tabela 16.
Ordem média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões da
estrutura das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica 79
xiii
Tabela 17.
Médias das sub-dimensões do processo da amostra normativa e da amostra clínica 80
Figura 15.
Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação emocional,
subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica 80
Tabela 18.
Ordem Média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do
processo das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica 80
Tabela 19.
Médias das sub-dimensões do conteúdo da amostra normativa e da amostra clínica 81
Figura 16.
Médias das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das
narrativas da amostra normativa e da amostra clínica 82
Tabela 20.
Ordem Média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney para as notas das sub-dimensões
do conteúdo das narrativas autobiográficas da amostra normativa e da amostra clínica 82
Tabela 21.
Médias e desvios-padrão das notas globais das narrativas da amostra normativa, da amostra de
pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes com dependência de opiáceos 83
Figura 17.
Médias das notas globais da estrutura, do processo e do conteúdo das narrativas das amostras
normativa, de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos 84
Tabela 22.
Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das narrativas da amostra normativa, da amostra de
pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes com dependência de opiáceos 84
Tabela 23.
Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas da
amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes
de opiáceos 85
xiv
Figura 18.
Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas da amostra normativa, da amostra de
pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos 86
Tabela 24.
Teste de Mann-Whitney nas notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas das amostras
normativa, de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos 86
Tabela 25.
Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões do processo das narrativas da
amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes
de opiáceos 87
Figura 19. Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação
emocional, subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas da amostra normativa, da amostra
de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos 88
Tabela 26.
Teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do processo nas narrativas da amostra normativa,
da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos 88
Tabela 27.
Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões do conteúdo das narrativas da
amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes
de opiáceos 89
Figura 20.
Médias das notas das sub-dimensões da conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das narrativas
da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes
de opiáceos 90
Tabela 28.
Teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do processo das narrativas da amostra normativa,
da amostra de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos 90
Tabela 29.
Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por grupo etário 92
xv
Figura 21.
Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por grupo etário 92
Tabela 30.
Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por sexo 93
Figura 22.
Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por sexo 93
Tabela 31.
Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por NSC 94
Figura 23.
Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por NSC 95
Tabela 32
Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais por etapa de desenvolvimento 96
Figura 24.
Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das crianças, adolescentes e adultos
das narrativas de ficção 97
Tabela 33.
Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo por grupos etários 98
Figura 25.
Médias das notas globais da estrutura das narrativas de ficção por grupo etário 99
Figura 26.
Médias das notas globais do processo das narrativas de ficção por grupo etário 100
Figura 27.
Médias das notas globais do conteúdo das narrativas de ficção por grupo etário 100
17
INTRODUÇÂO
“Estar vivo é criar uma história entre um princípio que não se
recorda e um final do qual não se conhece nada”.
Excerto do documentário Génesis
Ricoeur (1985) interessou-se por perceber de que forma a construção de uma narrativa
histórica se torna numa representação do funcionamento humano. O autor, contestando uma
visão essencialista da organização do conhecimento, realça a narrativa como sendo aquilo que
confere significado ao mundo e aos acontecimentos. Na psicologia, a conceptualização de uma
abordagem narrativa, teve início com as propostas de Sarbin (1986), Bruner (1986) e
Polkinghorne (1988), servindo de base a um conjunto de trabalhos de investigação e de modelos
de psicoterapia. A narrativa vai ganhando terreno como fenómeno psicológico central e como
organizadora da existência (Gonçalves, 2000) servindo a função humana vital de construção de
significado (Bruner, 1990). Como refere Boltman, (cit. in Freitas, 2005) as crianças surgem
como contadoras de histórias, na tentativa de explicar e compreender a vida, fazendo-o de forma
cada vez mais sofisticada ao longo do tempo. Compreende-se, assim, por que motivo a análise
da narrativa passou a ter um lugar de destaque na compreensão da existência humana
(Freeman, 1993), tornando-se cada vez mais pertinente o estudo desta forma de (co)construção
de conhecimento. Neste contexto, foram surgindo trabalhos que se debruçaram sobre diferentes
patamares de análise. Uns procuraram estabelecer de que forma se pode analisar a matriz
narrativa e, portanto, que elementos a constituem, outros, debruçando-se sobre o
desenvolvimento narrativo, procuraram perceber como este evolui e que funções ocupa na vida
da criança em particular e do ser humano em geral. Uma outra área de investigação é aquela
que se tem debruçado sobre a relação entre a construção narrativa e o bem-estar ou a
perturbação psicológica, apontando para uma diferente conceptualização da psicopatologia e,
ainda, para o enriquecimento dos modelos de intervenção psicoterapêutica. Gonçalves (2000)
propõe um modelo que distingue três dimensões centrais da organização e desenvolvimento da
matriz narrativa, enquadrando diversos trabalhos de investigação que têm emergido neste
domínio. Assim, a Estrutura, o Processo e o Conteúdo surgem como elementos organizadores do
significado e do conhecimento, cuja proposta de análise e de codificação servirá de base ao
18
presente trabalho. Segundo este modelo, o grau de coerência Estrutural, de Complexidade do
Processo e de diversidade de conteúdo surgem como equivalentes do funcionamento ou
disfuncionamento psicológico. Como refere o autor, a psicopatologia surge como manifestação
da dificuldade em construir de forma variada e flexível e, sem prejuízo da coerência, os episódios
múltiplos e contraditórios que caracterizam a nossa experiência.
A primeira parte deste trabalho pretende contextualizar a emergência da psicologia
narrativa, apresentar os seus principais pressupostos e elementos que a definem. Será ainda
explorada a construção narrativa na relação com o bem-estar psicológico e com a psicopatologia,
dando um maior enfoque a essa relação ao nível das três dimensões de análise da matriz
narrativa: Estrutura, Processo e Conteúdo. Ainda na primeira parte iremos apresentar algumas
investigações que nos pareceram mais pertinentes no estudo do desenvolvimento narrativo,
destacando, mais uma vez, àquelas que se debruçaram sobre o desenvolvimento das referidas
dimensões da matriz narrativa, nomeadamente na infância e na adolescência.
A segunda parte do presente estudo será dedicado à investigação empírica, onde iremos
analisar 126 narrativas de adultos sem perturbação psicológica. Um dos objectivos será então o
de analisar a organização da matriz narrativa destes adultos ao nível da Coerência Estrutural, da
Complexidade do Processo e da Diversidade de Conteúdo, tendo ainda em consideração a
influência das variáveis sexo, idade e nível sócio-cultural. Um segundo objectivo desta
investigação prende-se com a natureza normativa da nossa amostra, facto que irá permitir uma
análise comparativa com amostras de sujeitos com diagnóstico clínico (nomeadamente de
agorafobia e de dependência de opiáceos) que foram alvo de estudo em investigações
anteriores. Por fim, com o objectivo de traçar a tendência evolutiva da construção narrativa ao
longo da vida, iremos basear-nos tanto nos resultados obtidos pela nossa amostra de adultos,
como nos resultados obtidos com crianças e com adolescentes em duas recentes investigações
que partilham o mesmo sistema de análise da presente investigação.
Com este estudo pretendemos aumentar o conhecimento sobre a organização e
desenvolvimento narrativo e sobre a sua relevância no bem-estar ou no sofrimento psicológico.
Desta forma, acreditamos contribuir não só para uma melhor compreensão do funcionamento
do ser humano, como para a possibilidade de melhores opções terapêuticas.
21
1. Narrativa
1.1 Narrativa e construção do conhecimento
“Stories are everywhere” (Howard, 1991, p. 188). Desde que nascemos, muito do que
nos é dito, do que vivemos e do que pensamos é-nos apresentado sob a forma de narrativas.
Para Howard (1990) a abordagem narrativa é definida como uma posição filosófica que
posiciona os seres humanos como contadores de histórias, como agentes activos do
conhecimento, como narradores ou autores das suas vidas, onde dar significado à existência
emerge como uma questão central. Ricoeur (1985) chama a atenção para a forma como a
construção da narrativa se torna numa representação do funcionamento humano, deixando de
fazer sentido procurar a história como uma representação do real. Assim, a análise da narrativa
e a descoberta do que a constitui posiciona-se como um passo importante na compreensão da
existência humana (Freeman, 1993). Se as histórias se relacionam intimamente com a forma
como pensamos, nos relacionamos e como construímos conhecimento, parece evidente a
importância de se estudar a narrativa como forma de construção de conhecimento e significado.
Como reconhece Bruner (1990) a psicologia deve centrar-se não naquilo que as pessoas fazem,
mas naquilo que as pessoas dizem, e portanto, na exploração da construção linguística da sua
experiência. Encontramo-nos assim, perante uma nova forma de investigação que serviu de base
a um conjunto de trabalhos promissores e que, a partir da década de 90 tem marcado o seu
cunho nas psicoterapias cognitivas (Gonçalves, 2000). Desde então, a metáfora da narrativa tem
tido um reconhecimento crescente como um organizador central do conhecimento e da
existência do ser humano, sendo já notável a diversidade de autores que se tem dedicado ao seu
estudo no contexto clínico e da investigação (Gonçalves, Neimeyer & Mahoney, Neimeyer,
Russel, White & Epston, Mandler, Angus et. al, cit. in Henriques, 2000).
Mas a importância das histórias narradas assim como do acto de narrar nem sempre teve
o reconhecimento da psicologia enquanto área de estudo, nem da ciência em geral. A evolução
científica de cariz objectivista, positivista e empiricista há muito que liderou a prática e a
investigação na psicologia, fazendo do seu objecto de estudo as estruturas e funções da
consciência desde finais do século XIX, o comportamento no início do século XX e, mais
recentemente, a cognição e o pensamento (Gonçalves, 1996, 2000). Citando Gonçalves (1996)
“o mito do indivíduo isolado e culturalmente autonomizado tem sido uma tónica dominante das
22
concepções e praticas psicológicas” (p.11). A compreensão da proposta narrativa em psicologia
exige, assim, uma revisão das principais questões introduzidas pelo movimento que tem sido
designado de pós-modernismo. Se por um lado, o modernismo tem sido descrito como a crença
no conhecimento racional, objectivo e científico com vista ao progresso e à aproximação cada
vez maior da verdade, por outro, o questionamento desta concepção de conhecimento encontra-
se no centro das críticas elaboradas pelos pensadores que têm vindo a ser posicionados no pós-
modernismo. Esta corrente, inicialmente instigada por filósofos franceses como Derrida, Foucault
e Lyotard, surge como uma visão do mundo que questiona os valores absolutos do positivismo
lógico, da realidade objectiva e das generalizações científicas que vão para além do tempo, do
espaço e da cultura, reivindicando, em seu lugar, a temporaneidade do conhecimento e a
impossibilidade do conhecimento absoluto e universal (Kwee, 2003). Kvale (cit. in Gonçalves, M.,
1994) identifica duas características centrais do pensamento pós-moderno: por um lado, a ideia
de que a realidade não é independente do observador, enfatizando-se, assim, a natureza
proactiva do conhecimento e, por outro, a ideia de que a linguagem é constitutiva do mundo. De
acordo com a abordagem construtivista, a narrativa resulta da necessidade individual de
significar a experiência e, portanto, da construção de conhecimento de si próprio e do mundo.
De acordo com a abordagem do construcionismo social, a narrativa surge antes como uma
forma de construção social da experiência, sendo que o significado corresponde sempre a um
significado partilhado, e o discurso sobre o mundo a um artefacto da interacção comum
(Gonçalves 2000). Assim, não obstante os desencontros entre as abordagens, construtivistas e
construcionistas sociais adoptam a perspectiva de que não existe uma realidade objectiva a
encontrar, mas que é na e pela linguagem que essa realidade é construída (Mahoney, 1991;
Gergen, 1985). O papel da linguagem manifesta-se, então, como central na construção da
ciência e do conhecimento científico, concebidos como um processo de construção individual
e/ou social que não podem ser dissociados dos indivíduos e/ou das suas práticas sociais.
Porque se partilha uma linguagem comum, existe a possibilidade de expressão de ideias
consensuais, dentro de uma mesma comunidade. Estas posições que contrariam a existência de
uma realidade objectiva e global que possa ser aplicada à experiência humana introduziram
alterações na visão e na prática clínica. Assim, as metáforas tornam-se no artefacto linguístico
que procura objectivar o mundo e a experiência, passando a linguagem, a ocupar um lugar de
excelência na construção e significado dos diferentes conceitos e conhecimentos. Como defende
Gonçalves (2000) “a linguagem nasce não como um espelho da realidade mas sim como uma
23
forma de proporcionar múltiplas imagens da realidade” (p.42). Como consequência,
compreender o conhecimento passa por compreender os sistemas interpretativos da experiência
que a organização simbólica da linguagem nos permite e a narrativa assumem-se como o
principal objecto de estudo e de compreensão dos fenómenos psicológicos.
1.2 Narrativa e psicologia
A terapia narrativa manifesta-se como um exponente psicoterapêutico do pós-modernismo.
As propostas da abordagem narrativa em psicologia têm início com os trabalhos de Sarbin
(1986), Gergen e Gergen (1986), Polkinghore (1988) e Bruner (1990). Sarbin (1986), propondo
a metáfora narrativa, define-a como “um relato simbólico das acções dos seres humanos que
possui uma dimensão temporal. A história tem um princípio, um meio e o fim” (p. 3). Para o
autor, a dimensão temporal é o aspecto central da narrativa, pelo que a construção de
significados implica conceptualizar narrativamente as experiências passadas, presentes e
futuras. Polkinghorne (1988) não só sublinha a dimensão de temporalidade, como acentua a
noção da narrativa como um organizador central da cognição através da qual os indivíduos ligam
num todo os elementos dispersos da experiência, conferindo-lhe significado. De acordo com a
proposta do autor, a narrativa consiste numa “estrutura de significado que organiza os
acontecimentos e a acção humana numa totalidade, deste modo atribuindo significado às
acções e acontecimentos individuais de acordo com o seu efeito na totalidade” (p. 18). Gergen e
Gergen (1986) enfatizam dois aspectos centrais referidos pelos autores anteriormente citados, a
totalidade e a temporalidade, realçando as noções de direcção e de movimento, definindo a
narrativa como a “capacidade para estruturar acontecimentos de modo a demonstrar, primeiro,
a sua conexão ou coerência e, em segundo, o sentido de movimento e direcção no tempo” (p.
25). Estes autores consideraram como elementos essenciais da construção de uma narrativa a
existência de um objectivo ou finalidade e os acontecimentos que concretizem esse mesmo
objectivo. Assim, distinguem as narrativas progressivas (que se orientam no sentido do objectivo)
das narrativas regressivas (que se distanciam do objectivo) e das narrativas estáveis (quando
parece não haver alterações em relação ao objectivo, embora a história contenha diversos
episódios e incidentes). Bruner (1990), que introduziu a noção de pensamento narrativo como
basilar na construção de significados múltiplos da existência, reconhece a vertente cultural da
24
narrativa e a sua função na interacção social, caracterizando quatro elementos centrais: a
sequencialidade, a comunicação da subjectividade, a originalidade e a ambiguidade. De acordo
com estas características, podemos dizer que a narrativa permite a partilha da experiência
subjectiva organizada numa sequência temporal, bem como a justificação dos estados de
originalidade e de ambiguidade em relação ao culturalmente previsto.
Progressivamente, foram surgindo novas propostas de autores que partilhavam já as ideias
do construtivismo e/ou do construcionismo social. Harré e Gillet (1994) contribuíram,
igualmente, para a definição da formulação narrativa em psicologia, com o termo psicologia
discursiva, considerando o discurso e a sua análise como um aspecto central de construção do
conhecimento e não como forma de expressão e de acesso à realidade. Esta influência levou os
autores a falar de uma “segunda revolução cognitiva”, perante a qual, como defende Gonçalves
(1994, 2000) a linguagem constitui um elemento fundamental da experiência, devendo ser
considerada um fenómeno psicológico de primeira ordem e não uma mera representação do
mundo real. Desta nova forma de pensar, surgiram igualmente novas formulações e práticas
clínicas de que são exemplo os trabalhos de Withe e Epston (1990), Hermans e Hermans-Jansen
(1995), Gonçalves (1995, 2000) e Neimeyer (2000).
Gonçalves (2000) inspirando-se nas principais contribuições de Sarbin (1986), Gergen e
Gergen (1986), Polkinghore (1988) e Bruner (1990), bem como de outros modelos no domínio
das narrativas, delineou sete aspectos fundacionais e definidores daquilo que designa de matriz
narrativa, graças à qual organizamos o conhecimento da nossa experiência. Como a experiência
tem uma natureza caótica, o indivíduo, na busca da coerência, necessita de organizar o
conhecimento narrativamente (Gonçalves, Korman & Angus, 2000). Na sua definição de
narrativa, o autor distingue, assim, a natureza analógica, temporal, contextual, gestáltica,
significadora, criativa e cultural da narrativa. Tendo em conta que a presente investigação se
enquadra na abordagem teórica deste autor, a apresentação destes elementos será aqui mais
detalhada:
- a natureza analógica da narrativa que se define pela organização analógica da experiência,
remete-nos para a distinção de Bruner (1986) entre o modo paradigmático e o modo narrativo
de conhecimento. Se o primeiro pressupõe o domínio lógico-proposicional e matemático do
conhecimento, estabelecendo relações causais e lei gerais, o segundo procura compreender os
casos particulares. Sendo a experiência organizada analogicamente passa a ser construída com
um sentido múltiplo e potencial, na medida em que admite múltiplas significações e novas e
25
infindáveis experiências (Gonçalves, 2000). Assim, para o autor, o ser humano é dotado de
“múltiplas racionalidades que co-existem como organizadores paralelos do seu funcionamento”
(p.47);
- a natureza temporal da narrativa pressupõe que esta se constitui como elemento
organizador do conhecimento e da experiência conferindo-lhe uma estrutura temporal.
Narrativamente, os diferentes momentos da vida e a dimensão caótica da experiência poderão
ser sequenciados e organizados de forma a conferir à existência uma dimensão temporal e
rítmica.
- a natureza contextual da narrativa pressupõe que todo o conhecimento é localizado
histórica e culturalmente. Falamos não de uma verdade universal, mas de uma verdade
contextual, pois a narrativa só pode ser compreendida apenas no seu contexto, situado
historicamente.
- a natureza gestáltica da narrativa diz-nos que a organização da diversidade e multiplicidade
da experiência, impõe um processo de coerência numa totalidade significadora. Assim, através
da conexão dos diferentes fenómenos da experiência (da natureza caótica e dispersa dos
espaços, dos tempos, dos estímulos sensoriais externos e internos), emerge uma matriz
narrativa passível de ser compartilhada numa linguagem comum. Neste sentido, Gonçalves
(ibidem) acrescenta que a narrativa cumpre a dupla função de organizar simultaneamente a
experiência individual e a experiência social.
- a natureza significadora da narrativa permite a organização da diversidade da experiência,
atribuindo-lhe um sentido. A atribuição de um sentido para a experiência, como enfatiza Frankl,
(cit. in Gonçalves, ibidem) constitui-se como uma forma básica de sobrevivência humana. Dada
a natureza múltipla da experiência cruzamo-nos com a possibilidade de múltiplas significações.
Gonçalves aponta, ainda, a dupla função social do processo de significação: se por um lado,
recorre a uma linguagem convencionada socialmente, por outro, constitui-se como um modo de
dar existência social à experiência.
- A natureza cultural da narrativa foca a narrativa como uma produção discursiva de natureza
interpessoal e localizada culturalmente retirando-lhe, assim a possibilidade dum estatuto
essencialista e rejeitando-a como esquema mental ou como acto individual. A narrativa surge
assim, como uma conversação co-construida por múltiplas realidades discursivas, possibilitando,
desta forma, a diferenciação individual numa narrativa múltipla, flexível, adaptada e inserida
culturalmente.
26
- Por ultimo, a natureza criativa da narrativa no sentido em que “cria simultaneamente o
individuo e a sua rede social” (Gonçalves, 2000, p. 59). Assim, o narrador surge como
construtor da experiência, na medida em que a sua narrativa não surge como reflexo de uma
realidade pré-existente mas como a criação da própria existência. A existência ganha lugar no
encontro com a narrativa e liberta-se na multiplicidade que a narrativa lhe possibilita.
1.3 Narrativa, psicoterapia e psicopatologia
Os sistemas dominantes da psiquiatria e da psicologia, na pretensão de compreenderem
os comportamentos humanos e os desvios à norma (ou ao socialmente aceite), têm vindo a
definir um conjunto de conceitos e explicações essencialistas, ora de ordem biológica ora de
ordem mentalista (Gonçalves, 2000). O questionamento da realidade dos conceitos
essencialistas, do seu uso pelos especialistas, bem como do estatuto de poder que dai advém,
seja ao nível da sociedade em geral, seja ao nível da relação terapeuta/cliente, (onde o primeiro
impõe a sua visão sobre o que está a acontecer com o segundo), constituiu-se como um
contraponto à visão reificada da psicopatologia. Estas questões encontraram-se na base do
movimento anti-psiquiatria impulsionado por Thomaz Szasz (1988) e por Ronald Laing (1991) e
no centro das críticas elaboradas por alguns autores da psicologia que podemos enquadrar no
movimento pós-moderno (Gergen, 1990; Mahoney, 1991). Tais ideias que, como já referimos,
contrariam a existência de uma realidade objectiva e global que possa ser aplicada à experiência
humana, vieram introduzir alterações profundas na visão sobre a psicologia em geral, e sobre a
intervenção clínica e os diagnósticos psicopatológicos em particular.
Já na tradição fenomenológica da psiquiatria, as classificações nosológicas em
psicopatologia são enquadradas como metáforas e como organizadoras de significado
(Gonçalves, 2000), passando o discurso de um mero instrumento de acesso às essências
psicopatológicas, ao próprio fenómeno psicológico (Harré & Gillet, 1994) e ao processo central
na construção do conhecimento (Bruner, 1990). Nesta perspectiva, a psicopatologia será
apresentada como um sistema de significação que se organiza numa matriz narrativa
(Gonçalves, 2000) e diagnosticar impõe-se como um olhar para e não através da narrativa
(Capps & Ochs, 1995). Guidano (cit. in Gonçalves, 2000) faz notar que, ao referenciarmos
diagnósticos de perturbação mental, estamos a falar de configurações prototípicas de
27
organização de significados. Nesta mesma linha de pensamento, Neimeyer (2000) incentiva a
investigação da narrativa ao nível da psicopatologia e Russel e Wandrei (cit. in Henriques, 2000)
sublinham a possibilidade de diferenciar clientes com base na linguagem narrativa, o que poderá
contribuir para novas compreensões sobre a psicopatologia e sobre as práticas clínicas. Não
obstante o relevo que a metáfora narrativa foi ganhando, Neimeyer e Raskin (cit. in Henriques,
2000) alertam para o facto de que explorar a psicopatologia no âmbito da narrativa sugere um
certo paradoxo: as teorias narrativas tendem a evitar as implicações da estigmatização do
diagnóstico psicológico, no entanto, as psicoterapias que delas derivam regulam-se através de
alguma conceptualização, mais ou menos explicita, do sofrimento psicológico. Como forma de
ultrapassar este conflito, Gonçalves (2000) adverte que se trata, antes de mais, de conceber a
psicopatologia como uma produção social e não como correspondendo a essências indicadoras
de perturbação mental. Com efeito, para o autor diagnosticar implica construir formas
específicas de significação da psicopatologia e, portanto, implica a análise da própria matriz
narrativa.
Diferentes autores têm-se já debruçado sobre o estudo do processo de construção da
trama narrativa, construindo propostas de avaliação da mesma. Faremos uma breve revisão de
alguns sistemas de análise de narrativas e respectivos resultados. Posteriormente, e uma vez
que serão as dimensões e os instrumentos a utilizar na parte empírica da presente investigação,
daremos maior enfoque às três dimensões da narrativa propostas por Gonçalves (2000) -
Estrutura, Processo e Conteúdo -, bem como aos manuais elaborados no sentido de as avaliar.
A Estrutura e coerência das histórias tem sido a dimensão mais estudada e caracterizada
por diferentes autores que optaram por distintos sistemas de avaliação, de que são exemplo o
pioneiro sistema de análise de Labov e Waletzky (1967) e o sistema de análise episódica de
Stein e Glenn, (cit. in Baerger e McAdams, 1999). Lavob e Waletzky (1967), ao aplicarem os
métodos de análise linguística a narrativas elicitadas, reportaram-se às unidades da história e às
conexões entre as mais pequenas unidades de expressão linguística, através de uma relação de
ordem temporal, que evidencia proposições sequenciais que correspondem à ordem dos factos
adoptados. Desde então, um crescente corpo de investigadores tem convencionado os indivíduos
como seres narrativos, relacionando a saúde mental com narrativas adaptadas, integradas ou
coerentes (Anderson & Goolishian, Flax, Hoffman, Schafer, cit. in Baerger e McAdams, ibidem).
Por exemplo, há estudos que indicam que indivíduos mais satisfeitos com a vida, tendem a
organizar as suas histórias autobiográficas de uma forma significativamente diferente dos menos
28
satisfeitos, demonstrando os primeiros, uma maior habilidade na recordação de eventos de vida
mais variados e mais complexos (McAdams, Lensky, Daple & Allen, cit. in Baerger e McAdams,
1999). Parece, assim, que uma narrativa bem integrada providencia o indivíduo de uma
identidade, onde a informação é integrada num todo comunicando o significado daquela
experiência, dentro do contexto alargado da história de vida (McAdams, cit. in Baerger e
McAdams, ibidem). Baerger e McAdams (ibidem) com o objectivo de estudar a possibilidade de
conceptualizar um sistema de codificação da coerência das narrativas de vida e examinar a
relação entre esta e a saúde psicológica, propuseram a caracterização da coerência através de
quatro segmentos interrelacionados: orientação, estrutura, afecto e integração. De acordo com
os autores, uma narrativa autobiográfica é coerente, na medida em que, “(1) situa a narrativa
num contexto temporal, social e pessoal específico, descrevendo as circunstâncias habituais que
servem de parâmetros para a acção da história; (2) apresenta os elementos estruturais de um
episódio (i.é., um acontecimento inicial, uma resposta interna, um objectivo e uma
consequência); (3) fornece referências avaliativas acerca do narrador, de modo a atribuir
significado emocional à história; (4) comunica a informação de um modo integrado”. O mesmo
estudo visou, ainda, avaliar a existência de uma associação significativa entre o grau de
coerência das histórias autobiográficas de uma população não clínica e várias medidas de bem-
estar psicológico, confirmando a hipótese de diferentes terapeutas narrativos, de que a saúde
mental está intimamente relacionada com a capacidade individual para construir e manter uma
história autobiográfica integrada e coesa. Mais especificamente, os dados do estudo sugerem
que a coerência autobiográfica está associada ao bem-estar psicológico: as histórias do
participantes com níveis mais elevados de depressão revelaram-se menos integradas e menos
coerentes no contexto de vida, enquanto que, os episódios relatados por aqueles cujos níveis de
depressão eram menores, coincidiam com os que revelaram maior coerência e eram os que
transmitiam os eventos como tendo um maior significado no especifico momento em que
aconteceram e no contexto alargado das suas experiências de vida, permitindo um sentido de
pertença e de continuidade na vida. Embora com níveis mais modestos de correlação, neste
mesmo estudo encontraram-se relações entre a coerência da história de vida e as medidas
felicidade e satisfação de vida. Russel e Wandrei (cit. in Henriques, 2000) referem, igualmente,
estudos junto de populações clínicas cujos resultados revelam a relação entre a estruturação
narrativa e o grau de gravidade psicopatológica, sendo que às situações severas correspondiam
níveis baixos de coerência narrativa. Pennebaker (cit. in Henriques, ibidem) evidenciando um dos
29
resultados mais consistentes do seu programa de investigação, refere haver relação entre a
evolução dos sujeitos em psicoterapia e as narrativas que evoluíram no sentido de uma maior
coerência estrutural.
Como referem Mancuso e Sarbin (cit. in Pennebaker e Seagal, 1999), as pessoas
aprendem e organizam histórias desde cedo na infância, sendo esta uma tarefa crítica que ajuda
ao desenvolvimento de uma vida emocional coerente. Se esta capacidade se revelar deficiente
poderão coexistir consequências ao nível da saúde. Em estudos que pretenderam investigar de
que forma as pessoas lidam com os efeitos negativos da dor, da doença e dos acontecimentos
traumáticos que ameaçam a vida do individuo pelo seu carácter de incoerência, descontinuidade
e dissociação, Crossley (2000) reflecte sobre a importância da narrativa no que respeita à
sucessiva necessidade do ser humano de repor a ordem e o significado e de retomar o sentido
de continuidade e de identidade, através de processos de conexão e coerência. De acordo com o
autor, face a experiências altamente dissociadas, este sentido de coerência pode ser posto em
causa. Em todo o caso, mesmo perante a incoerência de experiências altamente adversas, a
narrativa assume um papel preponderante de reconstrução (Crossley, 2000) e, embora esta
tarefa possa revelar-se mais difícil para algumas pessoas, os estudos indicam que temos uma
tendência para atribuir um significado ao meio e aos acontecimentos (Pennebaker e Seagal,
ibidem). Pennebaker e Seagal (ibidem) em estudos cujo foco foram os processos subjacentes às
alterações positivas favorecidas pelo acto de escrever ou falar sobre experiências emocionais
verificaram que a expressividade emocional, quando completada com a sua tradução escrita
para a linguagem, resulta em benefícios a longo prazo. Os autores propõem que, ao integrarmos
emoções e pensamentos, construímos mais facilmente uma narrativa coerente da experiência e
que, uma vez formado, o evento pode ser sumariado, arquivado ou esquecido de forma mais
eficiente. Por outro lado, postulam que eventos dolorosos que não estão estruturados num
formato narrativo podem contribuir para a continuidade de pensamentos e sentimentos
negativos. Por outras palavras, temos necessidade de construir um significado para os
acontecimentos de vida, tentando encontrar causas e consequências. Narrativamente, podemos
integrar um conjunto de alterações e acontecimentos nas nossas vidas organizadas lógica e
hierarquicamente num todo coerente e compreensível. A coerência linguística, segundo os
autores, implica diversas características, desde a estrutura ao uso de explicações causais,
repetição de temas, bem como uma apreciação da perspectiva do ouvinte. Em conclusão, os
autores consideram que, elaborar uma história sobre as experiências de vida (de forma escrita
30
ou oral) parecer estar associado a benefícios na saúde física e mental em diferentes amostras e
pontuam o valor de uma narrativa coerente e organizada como forma de atribuir significado a
um evento e lidar com as emoções a ele associado. Assim, usar a narrativa assemelhar-se-ia ao
acto de “fechar tarefa”, permitindo “esquecê-la”. Estes resultados são consistentes com a visão
actual da narrativa e da psicoterapia que sustentam a importância do cliente construir uma
história que explique e dê uma compreensão aos eventos de vida passados e actuais, seja uma
narrativa auto ou hetero-biográfica que deverá envolver a integração dos acontecimentos de vida
significativos numa história que os irá explicar e organizar num todo. Assim sendo, os autores
consideram que a psicoterapia poderá ser vista como um meio formal de integrar uma história.
1.3.1 Estrutura, Processo e Conteúdo como dimensões da matriz narrativa
Como acabámos de verificar, maior parte dos autores têm centrado as suas investigações
em torno da Estrutura e coerência narrativa. A proposta de Gonçalves, por sua vez, apresenta-se,
a nosso ver, mais completa e complexa com a configuração de três organizadores centrais do
processo de significação: Estrutura, Processo e Conteúdo (Gonçalves, 1998; Gonçalves, Korman
& Angus, 2000; Gonçalves, 2000), dando conta, respectivamente, da coerência, complexidade e
diversidade narrativas. Segundo Gonçalves (2000) a análise destas dimensões irá permitir
entender os processos de construção de significado do indivíduo e articula-se com a existência
ou não de bem-estar psicológico.
A Estrutura refere-se ao processo pelo qual os diferentes aspectos da narrativa se
interligam de forma a proporcionar um sentido coerente e de articulação dentro de cada
narração e entre as diferentes narrativas de vida, conferindo-lhe, assim um fio condutor. Desta
forma, integrando num todo coerente as tão diversas experiências, o indivíduo ganha um sentido
de autoria da sua própria vida. Por seu turno, na ausência de uma coerência narrativa, isto é, de
uma organização sequencial e integrada da experiência, o indivíduo perderá o sentido de autoria
e a possibilidade dum sentido compartilhado da experiência.
De forma a avaliar a coerência narrativa, Gonçalves e Henriques (2000a) desenvolveram
um manual que foi sofrendo revisões (Gonçalves, Henriques e Cardoso, 2001, 2006), a partir de
sistemas de codificação previamente desenvolvidos por Ferreira-Alves e Gonçalves (1999), do
31
sistema de Braeger e McAdams (1999) e inspirado no modelo sugerido por Lavob e Waletsky
(1967) já referidos anteriormente.
No referido manual (Gonçalves e Henriques, 2000a; Gonçalves, Henriques e Cardoso,
2001, 2006), os autores consideram quatro sub-dimensões ou parâmetros na avaliação da
Estrutura e Coerência narrativa: a Orientação, a Sequência Estrutural, o Comprometimento
Avaliativo e a Integração cujos graus de presença e diversidade são codificadas através de uma
escala de Likert de cinco pontos.
A Orientação informa sobre as personagens, o contexto social, espacio-temporal e pessoal
onde decorrem os seus comportamentos, sendo descritas as circunstâncias que rodeiam o
episódio. Podem ser incluídos elementos passados relevantes que conduziram ao momento em
causa ou acontecimentos posteriores a este. Uma boa Orientação torna compreensível a
narrativa e, em contraste, uma Orientação fraca isola a narrativa dos parâmetros temporais e
sociais que a enquadram e a influenciam. Uma narrativa com alto nível de índice de orientação
permite responder às questões "Quem?" "Quando?", "Onde?", “Em que circunstâncias
pessoais?” e “Para que é que o episódio está a ser contado?”. Pelo contrário, uma narrativa com
baixo índice de Orientação é uma narrativa em que a ausência de um ou vários destes
elementos, transmite ao interlocutor a sensação de não haver um enquadramento narrativo. O
acontecimento surge como que isolado, solto e desenraizado, dificultando a sua inteira
compreensão.
A Sequência Estrutural é composta por uma série de acontecimentos que definem a
sequência temporal de uma experiência tal como ela foi percebida, permitindo ao interlocutor
responder à questão "então o que aconteceu?" É constituída por uma série de subcomponentes
que se sequencializam numa estrutura temporal, independentemente da ordem em que
surgem: (1) um acontecimento inicial; (2) uma resposta interna a este acontecimento (i.e.,
objectivos, planos, pensamentos ou sentimentos); (3) uma acção; e, finalmente, (4) as
respectivas consequências. No caso da narrativa incluir múltiplos episódios, eles também
devem ser apresentados de modo ordenado e organizados de forma temporal ou sequencial. Se
a narrativa apresenta um elevado índice de Sequência Estrutural todos os elementos estão
presentes e se organizam numa sequência temporal e causal do ponto de vista explicativo.
O Comprometimento Avaliativo refere-se aos aspectos emocionais do narrador,
remetendo para o envolvimento dramático com a narrativa, para os seus estados de ânimo, a
tonalidade emocional do seu relato e o seu comprometimento volitivo durante a própria
32
produção narrativa, permitindo valorizar “até que ponto é que o narrador se envolve na história
que está a contar?” e “como é que o narrador avalia o significado da história que nos relata”?
Sem tonalidade afectiva consistente para organizar e atribuir sentido emocional aos
acontecimentos relatados uma narrativa não se revela coerente. Uma narrativa com alto nível de
Comprometimento Avaliativo permite revelar algo acerca do narrador ou do significado que o
episódio descrito tem no contexto da sua vida, isto é, à forma como utiliza explicitamente a
emoção, os adjectivos e advérbios, os risos, as lágrimas, os apartes, as hesitações, a
pontuação, como recorre à tensão, ao drama e ao humor para comunicar e dar vida à sua
narração. Uma narrativa com um baixo Comprometimento Avaliativo revela um fraco
envolvimento afectivo com o acontecimento narrado e não transmite o significado emocional dos
acontecimentos descritos, revelando, antes, distanciamento, frieza e vazio de expressão.
A Integração permite avaliar em que medida os vários elementos da história que, embora
apresentados de um modo disperso, acabam por se integrar num sentido comum, num gestalt
final. Mesmo quando surgem narrativas dentro de narrativas, o narrador poderá estar capaz de
lhes dar um sentido integrado, através de um regressar à trama central da narrativa conferindo-
lhe um fio condutor. Assim, a questão de base que se coloca é “o fio condutor do discurso é
claro?”, constituindo-se este, como uma noção central do próprio conceito de coerência
narrativa e como antípoda da dissociação. Uma narrativa com elevado índice de Integração é
uma narrativa em que os diversos elementos de complexidade, ambiguidade e diferenciação
usados, se conciliam uns com os outros numa história una. Para além da narrativa sintetizar os
vários elementos narrativos numa mesma história, é igualmente capaz de relacionar os detalhes
de um relato autobiográfico individual com temas de vida mais vastos. Por outro lado, baixos
índices de Integração são correlativos de inúmeros descarrilamentos e saltos de assunto na
produção narrativa sem que o próprio, ou o interlocutor, encontre entre eles um fio condutor
narrativo, com pobre resolução das contradições ou ambiguidades inerentes ou o
enquadramento da experiência no contexto de vida.
Gonçalves (2000) defende que, em termos da Estrutura, a perturbação emocional se
associa:
à dificuldade de estabelecer uma conexão coerente, fazendo emergir
sentimentos de estranheza e desfazamento em relação ao próprio e aos outros. Esta
dificuldade face a experiências passadas ou presentes conduz o sujeito a evitar novos
desafios experienciais, os quais possa não conseguir integrar numa determinada
33
coerência já estabelecida. Em consequência, gera-se um processo cíclico de
rigidificação dessa coerência predefinida que estará na base da sua impossibilidade
de expansão. A análise estrutural da matriz narrativa dum paciente poderá, assim,
permitir o diagnóstico de disfunções de autoria, constituindo indicadores discursivos
de incoerência, tais como o discurso superficial ou tangencial, a sobreinclusividade ou
excessiva abstracção, circunstancialismo ou desconexão; apresentação
desorganizada; ausências ou amnésias electivas (pp.76-77).
O Processo narrativo é caracterizado como constituindo-se pelos mecanismos estilísticos
através dos quais o indivíduo confere complexidade e profundidade à narrativa, diferenciando-a.
É ao nível desta Dimensão que se reflecte a abertura à pluralidade da experiência pela
capacidade de construção de uma narrativa complexa e diversa. A qualidade narrativa, do ponto
de vista processual, estará associada à diferenciação da experiência sensorial, emocional,
cognitiva e de significações.
Angus e colaboradores desenvolveram um Sistema de Codificação do Processo Narrativo
(Angus, Hardtke & Levitt, 1996; Angus, Levitt & Hardtke, 1999) que dá conta do nível de
complexidade da produção narrativa, através de três modos narrativos: externo (que consiste na
descrição de um assunto em termos dos detalhes contextuais físicos ou sociais, temporais ou
espaciais (sejam reais ou imaginados, passados, presentes ou futuros), interno (que diz respeito
à descrição de toda a experiência subjectiva em termos emocionais do próprio ou das
personagens da narrativa) e reflexivo (incluindo a análise interpretativa dos acontecimentos
externos e da experiência subjectiva, dirigidos para a significação da experiência). Os resultados
com base neste sistema de avaliação (Angus, Levitt e Hardtke, 1999) são consistentes com os
de Pennebaker (cit. in Henriques, 2000), onde a evolução dos pacientes em psicoterapia se
associou a uma diferenciação do processo narrativo, deslocando-se de modo narrativo externo,
para uma maior complexidade ao nível do modo interno e do modo reflexivo.
Gonçalves e Henriques (2000b) inspirados neste modelo, desenvolveram um Manual de
Avaliação do Processo e Complexidade Narrativa que pretende aumentar o grau de
discriminação da complexidade e riqueza dentro de cada um dos modos narrativos. Sugerem,
assim, quatro sub-dimensões de adjectivação da experiência que consistem na Objectivação,
Subjectivação Emocional, Subjectivação Cognitiva e Metaforização, cada um deles cotado de
34
acordo com o grau de presença (diversidade e/ou elaboração), através de uma escala de Likert
de cinco pontos.
A Objectivação consiste na descrição de aspectos externos da experiência e exploração da
multiplicidade do mundo sensorial. Refere-se à descrição detalhada do episódio, e do cenário
sensorial, fornecendo elementos ao nível da visão, da audição, do olfacto, do paladar e das
sensações físicas que caracterizaram a sua experiência. Uma narrativa com alto nível de
Objectivação permite enquadrar sensorialmente o acontecimento, através de uma descrição
detalhada e diversificada de várias dimensões sensoriais da experiência. Pelo contrário, uma
narrativa com baixo índice de Objectivação dificulta a captação do acontecimento, das suas
particularidades e do respectivo cenário.
A Subjectivação Emocional consiste na exploração da multiplicidade da experiência
interna ao nível de emoções e de sentimentos, através da descrição de estados emocionais
associados ao acontecimento. Uma narrativa com elevado índice de Subjectivação Emocional
contempla tanto uma grande quantidade como diversidade de discurso sobre os estados
afectivos associados à experiência. Um baixo índice de Subjectivação Emocional revela parca
referência a estados emocionais ou mera repetição de uma ou outra emoção, não aprofundando
a diversidade e clara diferenciação da experiência a este nível.
A Subjectivação Cognitiva corresponde aos pensamentos do sujeito vivenciados no
decurso da experiência e que explicita o discurso interno do narrador, como as cognições,
ideias, pensamentos ou planos experienciados pelo sujeito. Uma narrativa com um índice
elevado de Subjectivação Cognitiva supõe uma apresentação detalhada e diversificada dos
pensamentos do narrador, enquanto que uma narrativa com um índice baixo nesta Sub-
dimensão é reveladora de uma pobreza de detalhes, de variedade e de especificidade a este
nível.
A Metaforização define-se pela construção de significados a partir da experiência,
expressa, frequentemente, através de metáforas que condensam os significados. O sujeito
distancia-se da experiência, partilhando as suas reflexões e significados. Nem sempre esta Sub-
dimensão surge como um momento de grande conclusão a evidenciar-se no discurso, mas
antes como momentos dispersos ao longo da narrativa que nos conduzem a uma ideia do(s)
significado(s) que a situação descrita teve para o sujeito. Uma narrativa com elevado índice de
Metaforização apresenta uma reflexão elaborada e pessoal da vivência, contrastando com uma
35
narrativa com baixo índice em que não fica claro para o leitor o significado pessoal do episódio
que viveu.
Ao nível do Processo, a pobreza de discurso evidenciar-se-á, assim, numa pobre
diferenciação dos significados da experiência, na escassez de abertura à exploração da vivência
em termos sensoriais, emocionais, cognitivos e de significados. Nesse caso, encontra-se uma
focalização quase exclusiva num dos domínios da sensorialidade ou uma exploração superficial
de qualquer um destes domínios ou, ainda, a ausência de referências a este nível com o
evitamento da experiência emocional e cognitiva através de um discurso evasivo, deslocado,
excessivamente abstracto ou circunstancial. No fundo, a pluralidade da experiência fica assim
reduzida à singularidade limitada do conhecimento, situação que se relaciona mais
frequentemente com a psicopatologia. Consoante o tipo de perturbações ou problemáticas
apresentadas, a indiferenciação da experiência ou o foco numa das diferentes vertentes
sensoriais, emocionais, cognitivas ou de significados pode diferir. A título de exemplo, sujeitos
com Perturbação de Pânico tendem a limitar a diversidade da experiência sensorial a uma
sobrevalorização das impressões cenestésicas, em detrimento da multiplicidade visual, auditiva,
olfactiva ou gustativa da experiência. Nos indivíduos com fobia, por sua vez, a inibição da
complexidade da experiência revela-se pelo foco excessivo em torno das emoções, pensamentos
e significados relacionados com o perigo (Henriques, 2000).
O Conteúdo narrativo assume-se pela temática do discurso que se pode encontrar mais ou
menos diversificada, mais ou menos monótona, quanto aos seus temas, sequência de
acontecimentos, número de personagens e diversidade de contextos.
A fim de codificar o Conteúdo, Gonçalves e Henriques (2000c) desenvolveram o Manual
de Avaliação do Conteúdo e Diversidade Narrativa, posteriormente revisto (Gonçalves, Henriques,
Soares & Monteiro, 20001, 2006) que dá conta do grau de presença (através de uma escala de
Likert de cinco pontos) das quatro Sub.dimensões, Temas, Acções, Personagens e Cenários.
Uma narrativa apresenta geralmente um ou mais personagens que se posicionam em diversos
contextos ou cenários, numa sequência de acontecimentos e temas. Uma existência mais
funcional e criativa correlacionar-se-á com uma narrativa com multiplicidade de Conteúdo, onde
surgem diversas temáticas, interagem várias personagens, numa variedade de contextos e
diversidade de acções. Por outro lado, a redundância dos elementos do Conteúdo apontará para
uma narrativa previsível e monótona, incapaz de dar conta de versões diversificadas da
36
experiência, configurando a possibilidade de um discurso limitado, passível de ser enquadrada
em tipologias ou protótipos patológicos. Como refere Gonçalves (2000) “o protótipo é sinónimo
de uma autoria narrativa inflexível, uma identidade fechada que dissocia ou restringe todas as
experiências que não se enquadram no molde prototípico” (p.92). Nesta dimensão, a
psicopatologia caracteriza-se, assim, como uma dificuldade em desenvolver uma perspectiva
multifacetada da experiência, caracterizando-se pela utilização de protótipos narrativos que
emergem da redundância temática, configurando-se como guiões de significação das
experiências passadas, presentes e futuras (Gonçalves, 1998, 2000). O sentimento de
previsibilidade do discurso criado por esta redundância apela para a classificação das narrativas
em tipologias discursivas, considerando-se a possibilidade de que a psicopatologias distintas
correspondam narrativas protótipo específicas. Com o objectivo de permitir a elaboração de uma
narrativa prototípica a partir das convergências das temáticas de um conjunto de narrativas
significativas de diversos sujeitos, foi ainda elaborado um Método de Construção de Protótipos
Narrativos (Gonçalves, Alves, Soares, Duarte Henriques & Maia, 1996) na sequência do qual,
algumas investigações procuraram analisar em que medida diferentes tipos de psicopatologia
podem tipificar formas prototípicas de significação narrativa: dependência de opiáceos,
alcoolismo e anorexia (Gonçalves, Alves, Soares & Duarte, 1996) e agorafobia (Henriques,
2000). O conjunto destes resultados evidenciou que, pelo menos no que diz respeito ao
Conteúdo narrativo, a organização discursiva de diferentes tipos de psicopatologia corresponde a
diferentes organizações prototípicas (Gonçalves, Maia, Alves, Duarte & Henriques cit. in
Gonçalves, 2000).
Resumindo, Gonçalves (2000) defende que a construção de uma narrativa estruturada e
coerente para o próprio e no contexto da sua comunidade discursiva, reforça o sentido de autoria
e permite enfrentar a diversidade experiêncial; que a complexificação do conhecimento que
envolve a variedade das experiências sensoriais, emocionais, cognitivas e de significado, produz
uma narrativa rica, proporcionadora de uma existência proactiva e flexível e, finalmente, que a
multiplicidade e diversidade de conteúdo, imprevisível, idiossincrática, multifacetada e flexível é
inibidora da prototipia típica da psicopatologia. Da incapacidade do sujeito em construir a sua
experiência de forma múltipla e criativa, emerge a perturbação psicológica, que impede o sujeito
de partilhar construções discursivas suficientemente flexíveis e adaptadas. Como refere o autor,
as dificuldades de um sujeito com determinada perturbação emocional podem situar-se mais
37
numa ou noutra das Dimensões da matriz narrativa ou abranger todas com graus distintos, sem
que se defina um perfil regular de configuração da psicopatologia.
O propósito da análise de narrativas passa, seguramente, por consolidar ou construir
novos caminhos na intervenção clínica e, independentemente do modo como cada autor
explicita o seu modelo, podemos dizer que o objectivo central de qualquer psicoterapia narrativa
se refere à expansão do significado da experiência. Por esse motivo, consideramos que não
poderíamos deixar de fazer referência, ainda que muito sumariamente, ao modelo que decorre
das concepções de narrativa e de psicopatologia delimitadas por Gonçalves que acabámos de
descrever, até porque, com o presente estudo, esperamos contribuir para a amplificação da sua
aplicação.
A Psicoterapia Cognitiva Narrativa (Gonçalves, 1998, 2000) procura a desconstrução do
discurso sintomático do paciente, criando condições para o aumento da coerência,
complexidade e multiplicidade da construção discursiva do paciente, processo esse que se
desenvolve ao longo de três fases: a recordação, a adjectivação e a projecção das narrativas. A
recordação inicia-se com o acto de narrar episódios significativos do trajecto de vida, com a
posterior identificação de uma narrativa protótipo que servirá de ferramenta de trabalho no
decurso da terapia e visa, precisamente, promover no individuo uma maior diferenciação e
flexibilização da Estrutura e coerência narrativa e da organização da experiência. Posteriormente,
através da adjectivação das sensações, das emoções, dos pensamentos e das significações,
procura-se aumentar a diversidade sensorial da narrativa escolhida, a sua multiplicidade
emocional e cognitiva, bem como a metaforização da experiência como forma de alcançar uma
nova metáfora e significado para a narrativa protótipo, potenciando, assim, a diversidade do
Processo. Por fim, a projecção de narrativas, surge como a fase que mais intencionalmente lida
com os aspectos do Conteúdo da narrativa. Esta fase perspectiva-se como potenciadora da
exploração de novos conteúdos narrativos, através da organização da experiência “numa grande
variedade de temáticas de vida, rica de acontecimentos em múltiplos contextos e com uma
grande variedade de personagens” (Gonçalves, 2000, p.156).
Cada fase implica, ainda, dois tipos de tarefas: uma ao nível sincrónico que se foca nas
experiências correntes do cliente ou nas micronarrativas de vida e outra ao nível diacrónico que
consiste em tarefas direccionadas para as experiências e temas centrais ao longo da vida, para
as macronarrativas.
38
O grande objectivo deste modelo de psicoterapia será pois, o de criar condições para a
flexibilização, complexificação e diversidade das narrativas, deixando em aberto a possibilidade
de múltiplas e criativas significações da experiência.
1.3.2 Matriz narrativa em pacientes com diagnóstico de agorafobia e de
dependência de opiáceos
Com base no modelo e na metodologia de classificação das narrativas que acabámos de
expor, têm sido recentemente desenvolvidos estudos com populações com diagnóstico
clínico/grupos de risco e populações sem diagnóstico psicopatológico, entre eles, podemos
destacar: pacientes com diagnóstico principal de agorafobia (Gonçalves, Henriques, Alves &
Soares, 2002); dependentes de opiáceos (Gonçalves, Henriques, Alves & Soares, 2003); sujeitos
em situação de confronto com a seropositividade para o VIH (Cardoso, 2004); sujeitos
diagnosticados com Síndrome de Williams (Gonçalves, Pérez, Henriques, Prieto, Lima, Siebert &
Sousa, 2004); jovens institucionalizados vítimas de maus tratos (Soares, 2004); adolescentes
adoptados (para o estudo da coerência narrativa, Ramalho, 2005); crianças (Freitas, 2005) e
adolescentes (Rocha, 2005) com trajectórias de desenvolvimento normal.
Uma vez que a amostra da presente investigação é constituída por adultos sem
diagnóstico clínico, surge a possibilidade de um grupo de controlo. Por esse motivo,
apresentaremos um breve resumo dos resultados dos dois estudos que serão alvo de
comparação com os resultados dos adultos sem psicopatologia que serão apresentados na parte
empírica deste trabalho. Tanto nos sujeitos com diagnóstico de agorafobia (Gonçalves,
Henriques, col., 2002) como de dependência de opiáceos (Gonçalves, Henriques, col. 2003),
encontraram-se valores mais elevados ao nível da Estrutura, sendo a Sub-dimensão
Comprometimento Avaliativo a mais elevada (com valores moderados) e a Sub-dimensão
Orientação aquela que apresenta os valores mais pobres (com valores abaixo do moderado). Em
segundo lugar revelou-se o Conteúdo e o Processo foi a dimensão que apresenta os valores mais
baixos, sendo que, em todas as Sub-dimensões os valores se encontraram abaixo do moderado.
Embora com valores semelhantes, observou-se que os sujeitos com diagnóstico de
agorafobia detinham valores mais elevados do que os sujeitos dependentes de opiáceos ao nível
das três Dimensões (Gonçalves, Henriques e col., 2003), sendo essa diferença apenas
39
estatisticamente significativa ao nível da Subjectivação Emocional do Processo. É ainda de notar
que, embora as diferenças ao nível da Estrutura não se tenham revelado significativas, a análise
focada nas Sub-dimensões realçou que o eram, ao nível do Comprometimento Avaliativo. A
excepção ao padrão de valores mais elevados para os pacientes com diagnostico de agorafobia
encontra-se nos Temas (uma das Sub-dimensões do Conteúdo), embora sem qualquer
relevância estatística.
2. Desenvolvimento narrativo
As observações em contexto clínico conduziram à hipótese de existirem diferenças quanto
à organização da matriz narrativa entre sujeitos com diferentes diagnósticos psicopatológicos e
entre estes e sujeitos sem diagnóstico. Em virtude dessas observações, os estudos ao nível da
produção narrativa iniciaram-se junto de amostras clínicas. Consequentemente, como forma de
concretizar a existência dessas diferenças, impôs-se a necessidade de analisar a organização
narrativa em sujeitos com trajectórias de desenvolvimento normal.
De seguida iremos apresentar alguns estudos referentes ao desenvolvimento narrativo ao
longo da vida, enfatizando aqueles que se desenvolveram tendo em conta a metodologia
desenvolvida por Gonçalves e Henriques (2000a, 2000b, 2000c).
2.1 Desenvolvimento narrativo ao longo da vida: infância, adolescência e vida
adulta
Um dos objectivos do presente estudo é dar conta da evolução narrativa ao longo da vida,
mais especificamente da meninice até à vida adulta, no que diz respeito às três dimensões da
matriz narrativa propostas por Gonçalves (2000): Estrutura, Processo e Conteúdo. Interessa-nos
compreender como se processa, no ser humano, o desenvolvimento do acto de narrar ou, por
outras palavras, como se constrói a narratividade durante a infância, como se consolida na
adolescência e na vida adulta. Por esse motivo, faremos uma pequena exposição de caminhos
que têm sido percorridos nesta linha de investigação, através de diferentes modelos de avaliação
das narrativas.
40
O estudo do desenvolvimento narrativo tem-se dedicado essencialmente às crianças,
sobretudo no que diz respeito à análise da estrutura narrativa (Sun, cit. in Rocha, 2005) e às
perturbações da estrutura narrativa (Kemper et al., 1990) e contamos já com alguns estudos em
torno do desenvolvimento narrativo na adolescência. A vida adulta parece ser, ainda, a faixa
etária onde se encontram menos estudos sobre o desenvolvimento narrativo (Kemper e tal.,
1990).
Numa análise sobre o contributo de diversos estudiosos da construção narrativa na
infância, Boltman (cit. in Freitas, 2005) afirma que as crianças, na tentativa de explicar e
compreender a vida, surgem como contadoras de histórias, fazendo-o de forma cada vez mais
sofisticada ao longo do tempo. As histórias surgem, assim, como condição para a criança
compreender, comunicar, partilhar e construir a sua forma de ver o Mundo (Siegel, cit. in
Freitas, ibidem). Pelos 2 anos de idade, a criança parece já começar a sequenciar
temporalmente acontecimentos passados (Liles, cit. in Freitas, ibidem; McKeough & Generou,
2003) e ser capaz de construir com um adulto uma história (McKeough & Generou, 2003). Este
momento parece marcar o início de uma comunicação entre a criança e o adulto onde a
narrativa assume lugar de destaque. Pelo terceiro ano de vida, as crianças demonstram
consciência do papel que as relações referenciais, temporais e causais têm na obtenção da
coerência da narrativa (Russel & Van der Broek, cit. in Freitas, 2005), parecendo emergir uma
função narrativa que permite à criança a criação de histórias acerca dos acontecimentos com os
quais se vai confrontando, embora consistam ainda em simples descrições sequenciais de
pessoas e acontecimentos, dando sentido aos acontecimentos e experiências internas das
personagens (Reilly et al., 1998). Pelos 4 anos de idade parece iniciar-se um maior domínio
gramático (McKeough & Generoux, 2003), o inicio da utilização de componentes da estrutura da
narrativa, pela utilização de mais dados acerca do contexto do que das personagens (Peterson &
McCabe, cit. in Freitas, 2005), e por dados mais completos quanto à expressão dos afectos
(Reilly et al., ibidem). Segundo Reilly e colaboradores (1998), pelos 5 e os 6 anos as crianças
começam a elaborar frases que fornecem mais informação orientadora e as histórias organizam--
-se em torno de uma progressão de acontecimentos. Aos 6 anos a criança constrói narrativas
estruturadas e completas (Liles, cit. in Freitas, ibidem), dominando finalmente o esquema do
conto entre os 6 e os 7 anos (Larrea, 1994). McKeough & Generoux (2003) referem que até aos
8 anos, as crianças alcançam a mestria do esquema estrutural para um episódio narrativo
41
básico, sendo aproximadamente aos 10 anos que as crianças estão capazes de construir
histórias mais complexas do que o episódio narrativo básico.
Rocha (2005) revendo algumas das investigações na área do desenvolvimento narrativo na
adolescência, refere que, depois dos 10 anos, este tema tem sido menos explorado existindo, no
entanto já alguns estudos. Numa revisão da literatura, Kemper e colaboradores (1990) referem
estudos que revelam alterações marcantes na estrutura narrativa durante a primeira década de
vida, sendo pelos 10 anos de idade que as crianças se encontra capazes de produzir narrativas
mais elaboradas, com frases complexas e de utilizar uma variedade de planos linguísticos de
forma a estabelecerem e a manterem a narrativa coesa. Autores que estudam as mudanças que
se produzem nos esquemas dos contos em diferentes idades, defendem a existência de uma
evolução narrativa, sendo sobretudo a partir dos 11 (Marchesi, cit. in Freitas, 2005) e dos 12
anos de idade que essa forma de organizar as histórias assume uma maior expressão (Stein &
Glenn, cit. in Freitas, ibidem). Como refere Rosenthal (cit. in Rocha, 2005) enquanto que
crianças com 7 anos de idade não foram capazes de ligar várias memórias da sua história de
vida, adolescentes com 12 e 13 anos conseguiram relacionar acontecimentos biográficos tais
como o nascimento e transições de vida importantes. Estudos sobre o desenvolvimento da
coerência em narrativas de vida com adolescentes com 12, 15 e 18 anos de idade (Habermans
& Paha, cit. in Rocha, 2005), apontam para um aumento da coerência, com um maior número
de ligações causais nas narrativas ao longo da adolescência. Outros autores (MacKeough;
Yussen & Ozcan, cit. in Rocha, ibidem) referem que pelos 12 anos de idade, ocorre uma
mudança no foco e estrutura da história: da focalização em intenções e estados mentais
imediatos (típico aos 10 anos de idade) passa a haver uma interpretação destes estados em
termos permanentes e transitórios. Aos 12 anos, verifica-se uma maior referência a traços ou
experiências sociais anteriores, indicando que o pensamento narrativo apresenta uma maior
dimensão estrutural: são capazes de integrar duas ou mais experiências que ocorrem em
tempos diferentes ou em diferentes situações e dai extrair uma unidade mais elevada de
construção de significado; aos 14 anos de idade entram em acção traços e estados
permanentes adicionais, sendo os adolescentes capazes de construir narrativas com tendências
contrárias no mesmo personagem criando a existência de um conflito interno para além dos
conflitos externos da história. Aos 18 anos, os jovens parecem ser finalmente capazes de criar
uma dialéctica de lutas internas e externas dos protagonistas e lidar com o conflito de uma
forma coerente e coordenada.
42
McKeough e Genereux (2003) defendem que ao longo da adolescência se verificam
alterações narrativas quer ao nível do desenvolvimento da complexidade Estrutural quer ao nível
do desenvolvimento do Conteúdo do pensamento narrativo. Num estudo que realizaram com
crianças entre os 10, 12, 14 e 17 anos de idade, indicam duas tendências narrativas
desenvolvimentais: por um lado, o aumento na capacidade estrutural narrativa no sentido de
maior competência para construir narrativas que envolvem múltiplas dimensões e sub-histórias,
por outro, um salto na compreensão sócio-psicológica narrativa, passando da compreensão
intencional para uma maior compreensão interpretativa. Os adolescentes de 17 anos, por sua
vez, parecem apresentar uma maior facilidade do que adolescentes de 14 anos, em adoptar
uma meta-posição da experiência humana de forma consciente e deliberada. De uma forma
geral, e no que respeita à complexidade estrutural, os resultados indicam que entre os 10 e os
17 anos acontecem mudanças óbvias tanto no enredo estrutural como na capacidade para
construir hierarquicamente histórias dentro de histórias.
Resumindo um pouco algumas das ideias apresentadas, podemos referir o estudo
realizado por Mackeough (cit. in Rocha, 2005) no qual analisou histórias construídas por
crianças e adolescentes dos 4 aos 18 anos, e distinguiu três grandes estádios de
desenvolvimento da compreensão narrativa: até aos 4 anos de idade as narrativas das crianças
manifestam um conhecimento da experiência humana em termos de acontecimentos físicos
ligados numa sequência simples de acção; entre os 6 e os 10 anos de idade, as crianças
começam a expressar uma compreensão da acção humana que inclui sentimentos,
pensamentos e objectivos imediatos; a partir dos 12 anos as crianças demonstram uma
compreensão de natureza mais interpretativa das acções e intenções dos personagens.
Em suma, de uma forma geral, os dados são indicadores de que as crianças são
contadoras de histórias que se vão tornando, ao longo do seu desenvolvimento, cada vez mais
sofisticados, construindo narrativas de cada vez maior complexidade. Embora as competências
narrativas nas crianças se encontrem em desenvolvimento, aumentando sempre em número de
episódios até meados da adolescência, parece que, ao longo da vida adulta o contar de histórias
poderá ou não continuar em desenvolvimento, havendo culturas no seio das quais a
probabilidade de complexificação será maior entre aqueles onde o conto ocupa um lugar
privilegiado (Reilly e colaboradores, 1998). A existência de poucos estudos que se debruçam
sobre a análise da construção da narrativa na vida adulta, talvez seja reflexo desta ideia
43
generalizada de que a partir dos 18 anos de idade, o sujeitos parecem reunir as condições
necessárias para uma organização narrativa complexa, sem que se prevejam grandes alterações
na sua construção. Como já mencionámos, os estudos nesta área parecem centrar-se mais
sobre a relação entre a organização narrativa e diversas dimensões do bem-estar, tema já
abordado no ponto anterior.
2.2 Desenvolvimento da Estrutura, Processo e Conteúdo narrativos na infância
e na adolescência
De seguida iremos apresentar dois estudos que analisaram a produção de narrativas
através de um livro de imagens “Frog, where are you?” (Mayer, 1979) efectuados com 122
crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 10 anos de idade (Freitas, 2005) e com
126 adolescentes entre os 11 e os 18 anos de idade (Rocha, 2005). Tais estudos partilham o
mesmo enquadramento teórico e a mesma metodologia de análise e classificação das
componentes da matriz narrativa que utilizaremos na parte empírica do presente estudo com
adultos, pelo que servirão de base comparativa com os nossos dados, na análise da evolução
narrativa ao longo da vida.
No estudo com crianças dos 3 aos 10 anos de idade (Freitas, ibidem) a dimensão mais
elevada mostrou-se o Conteúdo, seguindo-se a Estrutura e finalmente o Processo. Quanto à
Estrutura, verificou-se uma progressão significativa entre os três grupos etários (3-4, 6-7 e 9-10
anos de idade), sendo as crianças entre os 9 e 10 anos as que apresentam as narrativas mais
coerentes. No que respeita ao Processo e ao Conteúdo existe progressão do grupo das crianças
entre os 3-4 anos para as de 6-7 e 9-10 anos que funcionam como um grupo homogéneo. As
Sub-dimensões da Estrutura, do Processo e do Conteúdo, apresentam-se em todos os grupos
etários com valores inferiores ao moderado. Assinala-se apenas uma excepção para as
Personagens que se apresentam, aos 6-7 anos com um valor moderado e, aos 9-10 anos acima
do moderado. O facto do Conteúdo ter sido a dimensão com valores mais elevados (de certa
forma representado por estes valores elevados ao nível das Personagens) não é surpreendente à
luz da ideia de que as crianças inicialmente enumeram o que vêm, descrevem e, só mais tarde
introduzem os aspectos motivacionais emocionais e metacognitivos dos acontecimentos
(Peterson & McCabe; Umiker-Sebeok, cit. in Freitas, ibidem). Os valores mais baixos encontrados
44
no Processo, revelam-se consistentes com os dados que alertam para uma maior dificuldade das
crianças mais pequenas em expressar variáveis internas, em envolveram-se emocional e
cognitivamente nas histórias que narram e a construírem significado a partir da experiência
narrada, dificuldade esta que pode prende-se, também, com o parco conhecimento do mundo
(Freitas, 2005). A partir dos 10-11, passando pelos 14-15 e até aos 17-18 anos de idade, o
estudo de Rocha (2005) evidencia uma grande mudança, seguindo a tendência natural já
descrita anteriormente por outros autores: a Estrutura ganha outro relevo, passando, a partir dos
11-12 anos de idade a ser a dimensão com o valor mais elevado. Segue-se o Conteúdo e por fim
o Processo. Os resultados desta análise indicam que os dois primeiros grupos funcionam como
um grupo homogéneo progredindo ao nível das três dimensões até aos 17-18 anos. Neste último
grupo etário, todas as Sub-dimensões da Estrutura encontram-se no nível moderado, o que não
acontece nas anteriores faixas etárias. Assim, nos adolescentes mais velhos parece emergir uma
maior coerência estrutural: mostram-se capazes de exprimir uma sequência de elementos bem
ordenados temporalmente permitindo compreender de forma clara a questão “o que
aconteceu”?; oferecem uma boa orientação ao clarificar o contexto, as personagens e o espaço
em que os acontecimentos decorrem, envolvendo-se afectivamente no acto de narrar e sendo
fácil captar a atenção da audiência. Finalmente, são capazes de integrar a informação de forma
a reflectirem um todo coerente e facilitando a percepção de um sentido comum. No que diz
respeito ao Processo, as maiores diferenças situam-se entre o grupo dos adolescentes mais
novos (11-12 anos) e os adolescentes mais velhos (17-18 anos) ao nível das Sub-dimensões
Subjectivação Emocional, Subjectivação Cognitiva e Metaforização, revelando que estes últimos
parecem capazes de expressar, de forma mais elaborada, a experiência interna ao nível das
emoções e dos sentimentos, aparentam uma maior complexificação dos pensamentos e uma
maior atitude reflexiva que lhes permite aceder a múltiplos significados da experiência, muito
embora os valores se situem entre o baixo e o moderado. O Conteúdo foi a dimensão onde as
evidências de progressão apenas se tornam significativas para as Sub-dimensões dos Cenários e
Acontecimentos, sendo que, uma vez mais, as mudanças são mais evidentes entre os
adolescentes mais novos e os adolescentes mais velhos. Tal como para as crianças, as
Personagens correspondem à Sub-dimensão que ganha um maior destaque, apresentando
valores entre o moderado (para os dois primeiros grupos de adolescentes) e acima do moderado
(nos adolescentes mais velhos). Os Acontecimentos também se destacam com valores
moderados, mas apenas para os adolescentes de 17-18 anos.
45
2.3 As variáveis sócio-culturais e demográficas na construção narrativa
Os efeitos de variáveis tais como o sexo e a escolaridade têm sido alvos de estudo quanto
ao desenvolvimento narrativo em diferentes fases de vida.
Os resultados da investigação com crianças anteriormente citada (Freitas, 2005) revelam
não existirem diferenças significativas nas dimensões da matriz narrativa entre os diferentes
níveis sócio-culturais (NSC), baixo, médio e elevado, determinados pela escolaridade dos pais
das crianças. Quanto aos adolescentes, as diferenças encontradas foram praticamente
inexistentes, apenas se verificando uma média significativamente mais elevada ao nível da
Metaforização no NSC alto quando comparado com o NSC médio (Rocha, 2005). Tais resultados
são consistentes com a hipótese de que a escolarização desempenha pouca importância no
desenvolvimento da construção narrativa. Por outro lado, há autores que se referem às
competências narrativas das crianças ao nível do pré-escolar como excelentes preditores do
futuro sucesso escolar (Peterson, Josso, e McCabe, cit. in Freitas, 2005).
Spinillo e Martins (cit. in Fabíola Gonçalves & Dias, 2003) num estudo com crianças entre
os 6 e os 7 anos de idade, de nível sócio-economico médio mas com distintos níveis de
alfabetização (crianças em fase pré-escolar sem alfabetização; crianças em fase de aquisição da
leitura e da escrita e crianças alfabetizadas), pretenderam examinar o efeito da escolaridade ao
nível da coerência das histórias orais produzidas pelas crianças, através de um sistema de
análise elaborado pelos próprios autores. Os resultados revelaram que a maior dificuldade
encontrada nas crianças consistiu em relacionar e integrar o desfecho da história com os
eventos anteriormente narrados, no entanto, esta dificuldade revelou ser menos evidente nas
crianças alfabetizadas. Fabíola Gonçalves e Dias (2003), utilizando o mesmo sistema de análise,
estenderam o estudo a uma amostra de jovens e adultos com idades compreendidas entre os
15 e os 45 anos de idade e com dois níveis de alfabetização distintos: um grupo cujos
participantes se encontravam a iniciar o processo de alfabetização, com pouco ou nenhum
domínio da leitura e da escrita e outro grupo de alunos alfabetizados que já haviam adquirido as
habilidades da leitura e da escrita. No geral, os resultados apontam no sentido de que os jovens
e adultos em processo de iniciação da alfabetização apresentam mais dificuldades do que o
grupo alfabetizado pelo que as autoras colocam a hipótese da escolarização formal e
sistemática, especialmente no que diz respeito à aquisição da leitura e da escrita, permitir que o
aluno desenvolva a habilidade de produzir oralmente textos mais coerentes. As autoras realçam,
46
ainda, o facto de a maior dificuldade encontrada por aqueles que apresentavam menor
escolarização ter sido, à semelhança das crianças, o relacionamento do desfecho da história
com o evento principal e com os episódios narrados ao longo da história. Não obstante estes
resultados, as autoras ressaltam o facto das narrativas orais dos jovens e adultos sem
escolarização se situarem em níveis mais elaborados de coerência do que as narrativas orais das
crianças, mesmo as com níveis de escolaridade superior, o que parece indicar que, para além
da escolaridade, possivelmente, outros factores são pertinentes, como sugerem as autoras, o
conhecimento do mundo, o conhecimento partilhado, factores pragmáticos, etc., influenciando a
produção de histórias mais coerentes.
Num outro estudo realizado com adultos por Kemper e colaboradores (1999), foram
igualmente encontradas diferenças nos sujeitos com maior número de anos de educação formal
e com mais vocabulário no que respeita à produção de frases maiores e narrativas com um
maior número de ideias integradas. Uma outra investigação com adultos entre os 35 e os 65
anos de idade revelou que o nível de educação se encontrava modestamente correlacionado
com a coerência da história de vida, embora não se correlacione com o nível de satisfação com
a vida (Breager & McAdams, 1999). Neste mesmo estudo, a variável idade não se revelou
significativa na observação de diferenças quanto à estrutura.
Quanto ao papel da variável sexo, os estudos com adultos realizados por Kemper e
colaboradores (1999) e por Breager & McAdams (1999) não encontraram diferenças
significativas entre o sexo feminino e masculino quanto à estrutura das narrativas. Nos dois
estudos que analisam as dimensões da matriz narrativa anteriormente citados, com crianças
(Freitas, 2005) e adolescentes (Rocha, 2005) apresentam-se valores mais elevados para as
raparigas do que para os rapazes, embora essas diferenças apenas se revelem significativas
para os adolescentes. Mais especificamente, nos adolescentes, essa diferença é mais evidente
ao nível da Estrutura, uma vez que está presente em todas as Sub-dimensões. No que toca ao
Processo, as diferenças colocam-se apenas ao nível da Objectivação e da Subjectivação
Cognitiva, e quanto ao Conteúdo, apenas se verificam diferenças significativas para as Acções.
Em todo o caso, alguns autores defendem que estas diferenças encontradas em diversas
investigações poderão estar associadas ao facto dos pais tenderem a contar histórias acerca de
acontecimentos passados a crianças do sexo feminino e do sexo masculino de formas distintas
(Fivush, 1994; Mackeough e Generaux, 2003), sendo que os pais tenderiam a contar às
47
raparigas, mais do que aos rapazes, histórias com maior conteúdo emocional (Fivush, 1994;
Chance e Fiese, cit. Rocha, 2005;) e com mais informação acerca de significados pessoais
(Fivush, 1994).
Em suma, os resultados parecem ser modestos embora apontem para que a
escolarização poderá ser um dos factores que contribui para a produção de narrativas mais ricas
ou, mais especificamente, mais coerentes. Por outro lado, crianças cujas narrativas são mais
ricas parecem ter maior probabilidade de obterem melhores resultados escolares. No que toca
ao sexo, os estudos parecem ser indicadores de as diferenças, com vantagem para o sexo
feminino, se iniciarem na infância, embora só se acentuem de forma significativa durante a
adolescência. Na idade adulta as investigações apontam para que as diferenças por sexo não
tenham relevância na produção narrativa.
No próximo capítulo iremos apresentar e discutir a investigação empírica do presente
estudo com uma amostra de adultos entre os 20 e os 45 anos de idade, do sexo feminino e
masculino e com distintos níveis sócio-culturais. Os resultados serão sujeitos a uma posterior
comparação com os dados obtidos pelos já citados estudos que recorreram ao mesmo sistema
de codificação na análise de narrativas de crianças e de adolescentes, por um lado, e de sujeitos
com diagnóstico psicopatológico, por outro.
Parte II
Análise da Organização Narrativa em Adultos
Comparação com Grupos Clínicos e com Diferentes Etapas do Desenvolvimento
51
1. Introdução
A presente investigação oferece a possibilidade de explorar a matriz narrativa dos adultos
ao nível das três dimensões Estrutura, Processo e Conteúdo e analisar em que medida as
variáveis sexo, idade e nível sócio-cultural influenciam a organização narrativa.
Tendo em conta a natureza normativa da amostra do presente estudo, temos condições
de a apresentar como grupo de controlo de amostras de sujeitos com diagnóstico clínico. Assim,
propomos a comparação da amostra normativa com dois grupos clínicos analisados em dois
estudos distintos quanto à sua organização narrativa, nomeadamente, com sujeitos
diagnosticados com agorafobia e com sujeitos diagnosticados com dependência de opiáceos. De
acordo com a perspectiva de que a psicopatologia surge como manifestação da dificuldade em
construir de forma variada e flexível e, sem prejuízo da coerência, os episódios múltiplos e
contraditórios que caracterizam a nossa experiência (Gonçalves, 2000), espera-se uma maior
riqueza nas narrativas produzidas pelo grupo normativo comparativamente com as narrativas
produzidas pelos referidos grupos clínicos.
Por último, e atendendo ao facto de que estudos semelhantes foram anteriormente
produzidos com crianças (Freitas, 2005) e adolescentes (Rocha, 2005), teremos ainda
oportunidade de aumentar o conhecimento da organização narrativa numa perspectiva
desenvolvimental, ao compararmos os resultados obtidos com as amostras de crianças, de
adolescentes e de adultos sem problemas de desenvolvimento ou perturbação psicológica. Tal
análise traz a possibilidade de explorar como evolui a produção narrativa ao longo das diferentes
faixas etárias e, ainda, de verificar em que medida as variáveis sexo e nível sócio-cultural
exercem um efeito distinto consoante a etapa de desenvolvimento em que se apresentam. Com
base em estudos anteriores sobre o desenvolvimento narrativo, esperamos encontrar diferenças
evolutivas, especialmente até ao início da idade adulta, interessando-nos, sobretudo perceber, de
que forma tal evolução se manifesta ao nível das três dimensões da matriz narrativa Estrutura,
Processo e Conteúdo.
52
2. Método
2.1 Participantes
A amostra da presente investigação é constituída por 126 adultos, 63 do sexo masculino
(50%) e 63 do sexo feminino (50%) com idades compreendidas entre os 20 e os 45 anos (M =
29,75; DP = 6,75), sem história de psicopatologia passada ou actual. Os sujeitos estão
distribuídos equitativamente por três Grupos Etários (20-25; 26-30; 35-45) e por três Níveis
Sócio-culturais (NSC). O NSC foi definido tendo em conta o grau de escolaridade dos sujeitos da
seguinte forma: NSC Baixo (grau de escolaridade até ao 9º ano inclusive); NSC Médio (grau de
escolaridade entre o 10º e o 12º ano) e NSC Alto (ensino superior, a frequentar ou concluído).
A tabela 1 apresenta uma síntese da amostra por Grupo Etário, por NSC e por Sexo.
Tabela 1. Distribuição da amostra por idade, sexo e nível sócio-cultural. Grupo Etário NSC Baixo NSC Médio NSC Alto
20 – 25 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F
26 – 30 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F
35 – 45 7 M e 7 F 7 M e 7 F 7 M e 7 F
M= Masculino; F= Feminino
A selecção dos sujeitos decorreu em diferentes locais: numa Escola Superior de
Enfermagem de Coimbra1, onde foi realizado um pedido de colaboração formal ao então
Presidente do Concelho Directivo (anexo 1), numa Escola de Formação Profissional, em
Coimbra2, onde foi realizado um pedido de colaboração informal à Presidente da Escola e, por
último, através de um sistema de rede de amigos e conhecidos que indicaram outros sujeitos
(na zona de Coimbra, Esposende, Vila do Conde, Évora, Viseu e Setúbal).
1 Escola Superior de Enfermagem Dr. Ângelo da Fonseca 2 ABC do Cabeleireiro e da Estética. Escola Profissional de Cabeleireiros e Estética, Lda.
53
2.2 Instrumentos
2.2.1 Instrumentos de recolha de dados relativos aos sujeitos
O primeiro contacto com os sujeitos foi realizado pessoal ou telefonicamente, servindo
para aferir dados como o sexo, a idade, a disponibilidade e interesse em participar no estudo e,
quando possível nesta primeira fase, para despistar a existência de psicopatologia prévia ou
actual, uma vez que esta constituiu um factor de exclusão de participação no estudo. O segundo
contacto foi efectuado em horário e local previamente combinado (em casa do participante, em
consultório do entrevistador ou em local público) onde o sujeito preencheu o Protocolo de
Participação Voluntária (anexo 2) e, posteriormente, a Ficha de Identificação e de Despiste de
Psicopatologia (anexo 3). Esta última, para além de integrar questões relativamente aos dados
demográficos e sócio-culturais do sujeito, inclui as seguintes questões de forma a complementar
o despiste da existência de perturbação emocional: a) Já recorreu a ajuda psicológica ou
psiquiátrica? b) Actualmente, encontra-se em acompanhamento psiquiátrico ou psicológico? c)
Actualmente está a fazer tratamento com medicação psiquiátrica?
Os sujeitos que, após o preenchimento da Ficha de Identificação e de Despiste de
Psicopatologia não corresponderem aos critérios definidos, não passaram à fase de
administração dos instrumentos ou, se o fizeram, os seus dados não foram incluídos no estudo.
Os sujeitos que revelaram critérios adequados ao estudo submeteram-se às tarefas de recolha
de narrativas, através dos dois instrumentos explicitados no ponto que se segue.
2.2.2 Instrumentos de recolha das narrativas
A recolha das narrativas dos sujeitos foi realizada através de duas tarefas, pela seguinte
ordem:
a) Indução de narrativa espontânea de questão única, sendo a narrativa áudio gravada na
presença do entrevistador. Este procedimento baseia-se no modelo de Entrevista de Elicitação de
Narrativas Autobiográficas proposto por O. Gonçalves e Henriques e composto por um total de
54
três questões (acontecimento de vida; acontecimento de vida positivo; acontecimento de vida
negativo). No presente estudo recorreu-se apenas à primeira questão, uma vez que não se
registaram diferenças nas características das narrativas associadas a acontecimentos positivos e
de narrativas de acontecimentos negativos.
A questão foi lida inicialmente pelo entrevistador e, posteriormente, facultada ao
entrevistado por escrito. Passamos a transcrever a questão:
Pedimos-lhe que procure recordar-se de um acontecimento da sua vida. Pode
ser um acontecimento qualquer. Tanto pode ser algo que aconteceu há pouco
tempo, como algo que já tenha acontecido há muito tempo. E tanto pode ser um
acontecimento que não gosta de recordar, como pode ser um que gosta de
recordar. É à sua escolha. Depois de o recordar, pedimos-lhe que o conte para o
gravador. Pode usar as palavras que quiser e levar o tempo que precisar.
b) Utilização do livro “Frog, where are you” (Mayer, 1979), constituído apenas por
imagens, para indução de narrativa de ficção.
Este instrumento, inicialmente usado por Bamberg (1986), tem sido utilizado em vários
estudos de competência linguística dada a multiplicidade de processos, conteúdos, e elementos
estruturais sugeridos pelas imagens. (e.g., Reilly, Bates, & Marchman, 1998). O livro “Frog,
where are you?”, de 24 páginas, refere-se à história de uma rapaz, um cão e um sapo e está
idealmente estruturado tendo em conta aquilo que as crianças e os adultos consideram ser uma
história. De acordo com Wigglestworth (1997) o número de imagens permite ao participante
envolver-se com a história, não sendo extenso a ponto de provocar cansaço e aborrecimento.
A sequência do procedimento utilizado obedeceu à seguinte instrução: “gostaria que
folheasse o livro, visualizando todas as figuras. Quando terminar, conte a história do livro, à
medida que visualiza de novo as imagens”.
2.2.3 Instrumentos de análise das narrativas
Com vista à análise das narrativas posteriormente transcritas, foram usados os seguintes
sistemas de codificação:
55
- Sistema de Codificação da Coerência Estrutural Narrativa (Gonçalves, Henriques &
Cardoso 2001; 2006).
Este sistema de Codificação baseia-se no modelo de estrutura narrativa de Labov &
Walesky (1967) e inspirado na formulação de Baerger e McAdam’s (1999) de avaliação da
coerência de histórias de vida. Estudos anteriores relataram níveis elevados de fidelidade inter-
observadores (i.e., 96%) e de consistência interna (valores Alpha entre.79 e.92) (Gonçalves,
Henriques, Alves e Soares, 2002). A avaliação da Estrutura e Coerência Narrativa será feita
relativamente a quatro Parâmetros ou Sub-dimensões: Orientação, Sequência Estrutural,
Comprometimento Avaliativo e Integração, descritas anteriormente no enquadramento teórico.
- Sistema de Codificação da Complexidade do Processo Narrativo (Gonçalves, Henriques,
Alves & Rocha, 2001, 2006).
Este sistema de codificação, inspirado na proposta de Lynne Angus e colaboradores
(1996), permite a avaliação do grau de complexidade do Processo narrativo através da cotação
da diversidade da experiência sensorial, da complexidade dos estados subjectivos (emocionais e
cognitivos) e da multiplicidade dos significados revelados pelo sujeito ao produzir as suas
narrativas. Para tal, a avaliação é igualmente feita nos quatro Parâmetros anteriormente
descritos: Objectivação, Subjectivação Emocional, Subjectivação Cognitiva e Metaforização. Para
este instrumento encontraram-se elevados níveis de fidelidade inter-observadores (i.e., 89%) e de
consistência interna (valores de Alpha entre .66 e .87) (Gonçalves, Henriques, Alves e Soares,
2002).
- Sistema de Codificação da Diversidade do Conteúdo Narrativo (Gonçalves, Henriques,
Soares & Monteiro, 2001, 2006)
Este sistema de codificação procura avaliar a diversidade do Conteúdo narrativo, sendo
operacionalizado através da cotação dos quatro parâmetros que constituem o Conteúdo e
diversidade narrativa e descritos no enquadramento teórico da presente investigação: diversidade
de Personagens, diversidade de Cenários, diversidade de Acontecimentos e diversidade de
Temas. A escala apresenta bons níveis de fidelidade inter-observadores (i.e., 94%) e de
consistência interna (valores de Alpha entre .86 e .90) (Gonçalves, Henriques, Alves e Soares,
2002).
56
Os Sistemas de Codificação das Narrativas apresentados são cotados de acordo com um
conjunto de critérios comuns, mediante seis leituras de cada narrativa a cotar. A primeira leitura
visa estabelecer um contacto inicial global com o discurso do sujeito, avaliando-se, na segunda
leitura, a existência ou não de uma narrativa, de acordo com o critério proposto por Labov &
Waletsky (1967) que postula a ligação de duas unidades de discurso no tempo. As quatro
restantes leituras têm como objectivo a codificação dos quatro parâmetros de cada uma das
Dimensões de análise, de acordo com o grau de presença na narrativa em causa, avaliado
através de uma escala de Likert de cinco pontos: 1 – nada ou muito pouco; 2 – pouco; 3 –
moderado; 4 – elevado; 5 – muito elevado. Este sistema de avaliação permite ainda um score
global, (que varia entre 0 e 80) como resultado da soma de cada um dos índices para os
respectivos desvios.
2.3 Procedimentos
Os participantes no estudo procederam a duas tarefas de elicitação de narrativas (uma de
narrativa autobiográfica e outra de narrativa de ficção), tal como explicitado anteriormente. Os
entrevistadores neste processo foram quatro licenciados em psicologia, treinados para
procederem à recolha de dados de identificação, à indução das duas tarefas de recolha das
narrativas e à posterior transcrição das mesmas. As histórias narradas foram áudio gravadas,
transcritas (todas as narrativas e transcrições correspondentes foram revistas pela autora do
estudo de forma a uniformizar o mais possível os critérios de transcrição) e posteriormente
codificadas e analisadas nas três dimensões narrativas Estrutura e Coerência narrativa, Processo
e Complexidade narrativa e Conteúdo e Diversidade narrativa. Os Juízes responsáveis pela
codificação das narrativas foram constituídos por nove psicólogos treinados no uso dos sistemas
de codificação referidos e ingénuos quanto aos dados de identificação dos sujeitos (sexo, idade e
nível sócio-cultural). Os Juízes foram distribuídos da seguinte forma: 2 pares para a cotação do
Processo narrativo; 2 pares para a cotação da Estrutura narrativa e 1 par para a cotação do
Conteúdo narrativo. O cálculo do acordo inter-observadores foi efectuado sobre as narrativas
cotadas por cada par, através do cálculo do coeficiente de correlação intra-classes para variáveis
ordinais (Everitt & Hay, 1992). Os valores de acordo obtidos fixaram-se entre os 70% e os 100%
para as Sub-dimensões analisadas.
57
3. Apresentação dos Resultados
Os resultados obtidos na presente investigação serão sujeitos a uma análise intra-amostra
e, posteriormente, a uma análise inter-amostras, onde serão comparados com os resultados
obtidos em outras investigações já referenciadas no capítulo anterior.
Assim, a apresentação dos resultados será realizada em três grandes momentos distintos:
1) Caracterização e comparação das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção
da amostra estudada.
Neste primeiro momento, iniciaremos pelo estudo dos perfis das narrativas
autobiográficas, seguido do estudo dos perfis das narrativas de ficção, sendo que a apresentação
de ambos obedece à seguinte ordem: apresentação das Notas Globais da Estrutura, Processo e
Conteúdo, seguida da análise das respectivas Sub-dimensões. Posteriormente, os resultados das
narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção serão comparados entre si pela mesma
ordem: análise das Notas Globais, seguida da análise das notas das Sub-dimensões.
2) Comparação dos resultados das narrativas autobiográficas da amostra normativa de
adultos, recolhida na presente investigação, com os resultados das narrativas autobiográficas de
amostras clínicas (amostra de sujeitos diagnosticados com agorafobia e amostra de sujeitos
diagnosticados como dependentes de opiáceos), recolhidas em dois estudos anteriores.
Esta análise será apresentada da seguinte forma: comparação das Notas Globais e das
notas das Sub-dimensões da amostra normativa com os respectivos resultados da amostra
clínica (resultados dos pacientes com agorafobia e dos pacientes com dependência de opiáceos,
como um todo); comparação das Notas Globais e das respectivas Sub-dimensões entre a
amostra normativa, a amostra de pacientes com agorafobia e a amostra de pacientes
dependentes de opiáceos.
3) Comparação das médias das Notas Globais obtidas nas narrativas de ficção recolhidas
na presente investigação, com as médias das Notas Globais das narrativas de ficção de uma
amostra normativa de crianças com idades compreendidas entre os 3 e os 10 anos e outra de
58
adolescentes com idades compreendidas entre os 11 e os 18 anos, recolhidas em investigação
anteriores.
A apresentação destes resultados será iniciada pela comparação dos resultados de cada
uma das Etapas de Desenvolvimento (3-10, 11-18 e 25-45 anos de idade). Posteriormente,
serão tidos em conta os resultados dos distintos Grupos Etários existentes dentro de cada uma
dessas fases (para as crianças: 3-4, 6-7 e 9-10 anos de idade; para os adolescentes: 11-12, 14-
15 e 17-18 anos de idade; para ao adultos: 20-25, 26-30 e 35-45 anos de idade), mas apenas
para ilustrar a tendência evolutiva da produção narrativa, uma vez que o número de sujeitos das
amostras não é suficiente para realizar análises estatísticas válidas com tantos sub-grupos de
sujeitos.
3.1 Caracterização e comparação das narrativas autobiográficas e das
narrativas de ficção da amostra normativa de adultos
3.1.1 Caracterização dos perfis das narrativas autobiográficas
a) Apresentação das Notas Globais da Estrutura, do Processo e do Conteúdo
A tabela 2 apresenta as medidas descritivas (médias e desvios-padrão) das Notas Globais
das narrativas autobiográficas, igualmente ilustradas na figura 1. Verificamos que a média mais
elevada corresponde à Estrutura (M = 52,27; DP = 14,30), seguida do Conteúdo (M = 37,97; DP
= 19,32) e do Processo (M = 21,81; DP = 14,11).
Tabela 2. Médias, desvios-padrão e teste T das notas globais das narrativas autobiográficas. Estrutura Processo Conteúdo
Máximo
Mínimo
Média
Desvio-padrão
80
12
52,27
14,30
64
0
21,81
14,11
74
0
37,97
19,32
Pares t
Estrutura/Processo
Estrutura/Conteúdo
Processo/Conteúdo
21,32***
8,95***
-9,19***
*** p < .001
59
52,27
21,81
37,97
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Figura 1. Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas
autobiográficas.
Para comparar as Notas Globais entre si, foi usado um Teste T e encontraram-se
diferenças estatisticamente significativas entre os três pares de Dimensões Estrutura/Processo (t
= 21,32, p < 0,001), Estrutura/Conteúdo (t = 8,95, p < 0,001), Processo/Conteúdo (t = -9,19,
p < 0,001).
b) Apresentação da Notas das Sub-dimensões da Estrutura
No que respeita à Estrutura e Coerência narrativa, a tabela 3 apresenta, para cada uma
das Sub-dimensões, as médias e os desvios-padrão, igualmente ilustrados na figura 2.
Apresenta, ainda, os valores encontrados no teste de Friedman.
60
Tabela 3. Médias, desvios-padrão e teste de Friedman das sub-dimensões da estrutura das narrativas autobiográficas.
Orientação Sequência
Estrutural
Comprometimento
Avaliativo
Integração
Média
Desvio-padrão
3,74
0,87
3,57
0,96
3,67
0,94
3,73
0,97
X2
5,28 n.s.
n.s. = não significativa
3,743,57
3,67 3,73
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Orientação Seq. Estrutural Comp. Av. Integração
Figura 2. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas autobiográficas.
Constata-se que, em todos os parâmetros ou Sub-dimensões, as médias atribuídas às
narrativas se encontram acima do valor moderado. A média mais elevada encontra-se na
Orientação (M = 3,74; DP = 0.87), seguida da média da Integração com valores muito
aproximados (M = 3.73; DP = 0.97); em terceiro encontra-se o Comprometimento Avaliativo (M
= 3,67; DP = 0,94) e, por fim, a Sequência Estrutural (M = 3,57; DP = 0,96).
A fim de analisar a existência de diferenças significativas entre as Sub-dimensões, foi
usado um teste de Friedman, revelador da não existência de diferenças significativas.
61
c) Apresentação das Notas das Sub-dimensões do Processo
No que respeita ao Processo e Complexidade narrativa, a tabela 4 apresenta, para cada
uma das Sub-dimensões, as médias e os desvios-padrão, igualmente ilustradas na figura 3.
Verificamos que, em todos os parâmetros, as médias atribuídas às narrativas encontram-
se abaixo do nível moderado. A Objectivação é o parâmetro com média mais elevada (M = 2,65;
DP = 0,96), seguindo-se a Subjectivação Cognitiva (M = 2,11; DP = 0,99), a Metaforização (M =
1,73 DP = 1,05) e, finalmente, a Subjectivação Emocional com o valor médio mais baixo (M =
1,63; DP =0,90).
Tabela 4. Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do processo das narrativas autobiográficas.
Objectivação Subjectivação
Emocional
Subjectivação
Cognitiva
Metaforização
Média
Desvio-padrão
2,65
0,96
1,63
0,90
2,11
0,99
1,73
1,05
Wilcoxon
Friedman
Obj.
S. Em.
Obj.
S. Cog.
Obj.
Metaf.
S. Em.
S. Cog.
S. Em.
Metaf.
S. Cog.
Metaf.
X2
107,99***
Z
-7,72***
-4,84***
-6,32***
-4,66***
-0,77n.s.
-4,74***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .008 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
62
2,65
1,63
2,11
1,73
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Objectivação Sub Emocional Sub Cognitiva Metaforização
Figura 3. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação
emocional, subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas autobiográficas.
Na tabela 4 encontram-se, igualmente, os resultados obtidos no teste de Friedman, que
demonstram existirem diferenças significativas entre as médias das Sub-dimensões do Processo
(X2(2) = 107,99; p < 0,001), seguidos dos resultados do Teste de Wilcoxon para determinar em
que pares das Sub-dimensões se localizam as diferenças encontradas. Encontramos diferenças
significativas entre todos os pares: Objectivação e Subjectivação Emocional (z = -7,72; p <
0,001), Objectivação e Subjectivação Cognitiva (z = -4,84; p < 0,001), Objectivação e
Metaforização (z = -6,32; p < 0,001), Subjectivação Emocional e Subjectivação Cognitiva (z = -
4,66; p < 0,001) e Subjectivação Cognitiva e Metaforização (z = -4,74; p < 0,001), com
excepção do par Subjectivação Emocional e Metaforização cujas diferenças não se revelam
significativas.
d) Apresentação das Notas da Sub-dimensões do Conteúdo
No que respeita ao Conteúdo e Complexidade narrativa, a tabela 5 apresenta, para cada
uma das Sub-dimensões, as médias e os desvios-padrão, igualmente ilustradas na figura 4.
Podemos observar que as médias atribuídas às narrativas das Sub-dimensões do
Conteúdo se encontram dispostas pela seguinte ordem decrescente: Personagens (M = 3,52; DP
63
= 1,25), Acções (M = 3,24; DP = 1,42), Cenários (M = 2,87; DP = 1,57) e Temas com o valor
médio mais baixo (M = 1,83; DP = 0,76).
Tabela 5. Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do conteúdo das narrativas autobiográficas.
Personagens Cenários Acções Temas
Média
Desvio-padrão
3,52
1,25
2,87
1,57
3,24
1,42
1,83
0,76
Wilcoxon
Friedman
Person.
Cenários
Person.
Acções
Pers.
Temas
Cenários
Acções
Cenários
Temas
Acções
Temas
X2
158,03***
Z
-4,30***
-2,02 n.s.
-9,00***
-2,87**
-7,11***
-8,78***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .008 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
3,52
2,87
3,24
1,83
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Personagens Cenários Acções Temas
Figura 4. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e
temas das narrativas autobiográficas.
Na tabela 5 observamos os resultados do Teste de Friedman que revelam a existência de
diferenças significativas entre as médias das Sub-dimensões do Conteúdo (X2(3) = 158,03; p <
64
0,001). Os resultados do Teste de Wilcoxon determinam a existência de diferenças significativas
entre todos os pares, à excepção do par Personagens e Acções: Personagens e Cenários (z = -
4,30; p < 0,001), Personagens e Temas (z = -9,00; p < 0,001); Cenários e Acções (z = -2,87; p
< 0,008); Cenários e Temas (z = -7,11; p < 0,001) e Acções e Temas (z = -8,78; p < 0,001).
3.2.1 Caracterização dos perfis das narrativas de ficção
a) Apresentação das Notas Globais da Estrutura, Processo e Conteúdo
A tabela 6 apresenta as medidas descritivas (médias e desvios-padrão) relativas às Notas
Globais das narrativas de ficção, igualmente ilustradas na figura 5, revelando uma média mais
elevada ao nível da Estrutura (M = 54,94; DP = 13,64), seguida do Conteúdo (M = 37,57; DP =
14,49) e do Processo (M = 22,75; DP =12,99). Apresenta, ainda, os resultados do teste T para
determinar as diferenças existentes entre as Notas Globais das narrativas de ficção.
Tabela 6. Médias, desvios-padrão e teste T das notas globais das narrativas de ficção. Estrutura Processo Conteúdo
Máximo
Mínimo
Média
Desvio-padrão
80
6
54,94
13,64
74
0
22,75
12,99
74
0
37,57
14,49
Pares t
Estrutura/Processo
Estrutura/Conteúdo
Processo/Conteúdo
29,12***
15,77***
-12,43***
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
65
54,94
22,75
37,57
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Figura 5. Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção.
O Teste T revela a existência de diferenças estatisticamente significativas entre os três
pares das notas Globais: Estrutura/Processo (t = 29,12; p < 0,001), Estrutura/Conteúdo (t =
15,77; p < 0,001) e Processo/Conteúdo (t = -12,43; p < 0,001).
b) Apresentação da Notas das Sub-dimensões da Estrutura
As médias e desvios-padrão das notas obtidas para as sub-dimensões da Estrutura e
coerência narrativa encontram-se descritos na tabela 7 e ilustradas na figura 6.
Verificamos que, em todos os parâmetros, as médias atribuídas às narrativas se
encontram entre o valor moderado e elevado. A média mais elevada corresponde à Integração
(M = 4,03; DP = 0,87), seguida, com valores muito aproximados, da média da Orientação (M =
3,90; DP = 0.77). Em seguida e também com valores muito aproximados entre si, encontram-se
o Comprometimento Avaliativo (M = 3,70; DP = 0,91) e a Sequência Estrutural (M = 3,69; DP =
0,82).
66
Tabela 7. Médias e desvios-padrão das sub-dimensões da estrutura das narrativas de ficção. Orientação Sequência
Estrutural
Comprometimento
Avaliativo
Integração
Média
Desvio-padrão
3,90
0,77
3,69
0,82
3,70
0,91
4,03
0,87
Wilcoxon
Friedman
Orient.
S. Estrt.
Orient.
C. Aval.
Orient.
Integ.
S. Estrt.
C. Aval.
S. Estrt.
Integ.
C. Aval.
Integ.
X2
33,50***
Z
-3,41**
-3,20**
-2,10n.s.
-0,14n.s.
-4,51***
-4,05***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .008 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
3,9
3,69 3,7
4,03
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Orientação Seq. Estrutural Comp. Av. Integração
Figura 6. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas de ficção.
Na tabela 7 encontram-se os resultados do Teste de Friedman, revelando existirem
diferenças significativas entre as médias das Sub-dimensões da Estrutura das narrativas de
ficção (X2(3) = 33,50; p < 0,001) e os resultados do Teste de Wilcoxon, cujos valores
determinam existirem diferenças significativas em quatro pares de Sub-dimensões: Orientação e
67
Sequência Estrutural (z = -3,41; p < 0,008), Orientação e Comprometimento Avaliativo (z = -
3,20; p < 0,008), Sequência Estrutural e Integração (z = -4,51; p < 0,001) e Comprometimento
Avaliativo e Integração (z = -4,05; p < 0,001).
c) Apresentação das Notas das Sub-dimensões do Processo
No que respeita ao Processo e Complexidade das narrativas de ficção, a tabela 8 e a figura
7 apresentam, para cada uma das Sub-dimensões, as médias e os desvios-padrão.
Com excepção da média da Objectivação (M = 3,29; DP = 0,86) que se encontra dentro
do valor moderado, todas as restantes Sub-dimensões se encontram abaixo do nível moderado,
pela seguinte ordem decrescente: Subjectivação Emocional (M = 2,07; DP = 1,07),
Subjectivação Cognitiva (M =1,76; DP =0,83) e Metaforização (M = 1,23 DP =0,62).
Tabela 8. Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do processo das narrativas de ficção.
Objectivação Subjectivação
Emocional
Subjectivação
Cognitiva
Metaforização
Média
Desvio-padrão
3,29
0,86
2,07
1,07
1,76
0,83
1,23
0,62
Wilcoxon
Friedman
Obj.
S. Em.
Obj.
S. Cog.
Obj.
Metaf.
S. Em.
S. Cog.
S. Em.
Metaf.
S. Cog.
Metaf.
X2
248,82***
Z
-8,61***
-9,35***
-9,65***
-3,23***
-6,64***
-6,61***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .008 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
68
3,29
2,07
1,76
1,23
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Objectivação Sub Emocional Sub Cognitiva Metaforização
Figura 7. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação
emocional, subjectivação cognitiva e metaforização, das narrativas de ficção.
Na tabela 8 encontram-se descritos os resultados dos testes de significância realizados
para comparar as Sub-dimensões do Processo nas narrativas de ficção. De acordo com o Teste
de Friedman, encontram-se diferenças significativa entre as Sub-dimensões do Processo (X2 (3) =
248,82; p < 0,001) e, de acordo com o teste de Wilcoxon, encontram-se diferenças significativas
entre todos os pares de Sub-dimensões: Objectivação e Subjectivação Emocional (z = -8,61; p <
0,001), Objectivação e Subjectivação Cognitiva (z = -9,35; p < 0,001), Objectivação e
Metaforização (z = -9,65; p < 0,001), Subjectivação Emocional e Subjectivação Cognitiva (z = -
3,23; p < 0,001), Subjectivação Emocional e Metaforização (z = -6,64; p < 0,001) e
Subjectivação Cognitiva e Metaforização (z = -6,61; p < 0,001).
d) Apresentação das Notas das Sub-dimensões do Conteúdo
No que respeita ao Conteúdo e Complexidade narrativa, a tabela 9 e a figura 8
apresentam, para cada uma das Sub-dimensões, as médias e os desvios-padrão.
As médias atribuídas às narrativas em todas as Sub-dimensões do Conteúdo encontram-se
dentro dos valores moderados, à excepção dos Temas que apresentam o valor médio mais baixo
(M = 1,94; DP = 0,60). As restantes três Sub-dimensões revelam uma média muito aproximada,
69
encontrando-se o valor mais elevado nas Acções (M = 3,17; DP = 0,94), seguido dos Cenários
(M = 3,13; DP = 1,08) e das Personagens (M = 3,12; DP = 1,04).
Tabela 9. Médias, desvios-padrão, teste de Friedman e teste de Wilcoxon das sub-dimensões do conteúdo das narrativas de ficção.
Personagens Cenários Acções Temas
Média
Desvio-padrão
3,12
1,04
3,13
1,08
3,17
0,94
1,94
0,60
Wilcoxon
Friedman
Personagens
Cenários
Personagens
Acções
Personagens
Temas
Cenários
Acções
Cenários
Temas
Acções
Temas
Z 208,21***
Z
-0,25 n.s.
-0,53 n.s
-8,96***
-0,27 n.s.
-9,00***
-9,40***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .008 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
3,12 3,13 3,17
1,94
0
0,5
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Personagens Cenários Acções Temas
Figura 8. Médias e desvios-padrão das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e
temas das narrativas de ficção
70
Na tabela 9 observamos os resultados do Teste Friedman que revelam a existência de
diferenças significativas entre as médias das Sub-dimensões do Conteúdo (X2(3) = 208,21; p <
0,001), bem como os resultados do Teste de Wilcoxon, através dos quais identificamos que
essas diferenças se aplicam apenas quando comparamos cada um dos parâmetros com os
temas: Personagens e Temas (z = -8,96; p < 0,001); Cenários e Temas (z = -9,00; p < 0,001) e
Acções e Temas (z = -9,40; p < 0,001).
3.1.3 Comparação dos perfis das narrativas autobiográficas com os perfis
das narrativas de ficção
a) Comparação das Notas Globais da Estrutura, do Processo e do Conteúdo entre as
narrativas autobiográficas e as narrativas de ficção
52,27
21,81
37,97
54,94
22,75
37,57
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Média Nr. AutobiográficasMédia Nr. Ficção
Figura 9. Médias das notas globais: estrutura, processo e conteúdo das narrativas autobiográficas e das narrativas
de ficção
De acordo com a Figura 9, verificamos que as médias das narrativas autobiográficas se
apresentam ligeiramente abaixo das médias das narrativas de ficção nas Dimensões Estrutura
(M = 52,27; M = 54,94; narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente) e Processo (M
71
= 21,81; M = 22,75, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente). A excepção
encontra-se no Conteúdo cuja média das narrativas autobiográficas se encontra ligeiramente
acima da média das narrativas de ficção (M = 37,97; M =37,57, narrativas autobiográficas e de
ficção, respectivamente). Apesar das diferenças, os resultados do Teste T revelam não existirem
diferenças significativas entre as Notas Globais das narrativas autobiográficas e das narrativas de
ficção, como podemos verificar na tabela 10.
Tabela 10. Teste T para as notas globais das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção. Dimensões t
Estrutura
Processo
Conteúdo
- 1,77 n.s.
-0,69 n.s.
3,84 n.s
n.s. = não signifcativo
b) Comparação das Notas das Sub-dimensões da Estrutura entre as narrativas
autobiográficas e as narrativas de ficção
A figura 10 dá-nos conta das médias das Sub-dimensões da Estrutura das narrativas
autobiográficas em contraste com as médias das correspondentes Sub-dimensões das narrativas
de ficção (já apresentadas separadamente nas tabelas 3 e 7, respectivamente).
Podemos verificar que, em todas as Sub-dimensões, as médias das narrativas
autobiográficas se encontram ligeiramente abaixo das médias das narrativas de ficção:
Orientação (M = 3,74; M = 3,90, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente),
Sequência Estrutural (M = 3,57; M = 3,69, narrativas autobiográficas e de ficção,
respectivamente), Comprometimento Avaliativo (M = 3,67; M = 3,70, narrativas autobiográficas
e de ficção, respectivamente) e Integração (M = 3,73; M = 4,03, narrativas autobiográficas e de
ficção, respectivamente).
72
3,743,57
3,67 3,733,9
3,69 3,7
4,03
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Orientação Seq. Estrutural Comp. Av. Integração
Média Nr. AutobiográficasMédia Nr. Ficção
Figura 10. Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
Através de um Teste de Friedman, cujos resultados se encontram apresentados na tabela
11, verificou-se a existência de diferenças significativas entre os pares das Sub-dimensões da
Estrutura das narrativas autobiográficas com as correspondentes Sub-dimensões da Estrutura
das narrativas de ficção (X2(7) = 33,85; p < 0,001). Os resultados do Teste de Wilcoxon,
representados na mesma tabela, permitem discriminar em quais dos pares de Sub-dimensões
se revelaram diferenças significativas, verificando-se que a diferença se regista apenas ao nível
da Integração (z = -2,63; p < 0,008).
Tabela 11. Teste de Friedman e Teste de Wilcoxon das notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção.
Wilcoxon
Friedman Orientação Sq. Estrutural Comp. Avaliativo Integração
X2 33,85***
Z
-1,79 n.s.
-1,17 n.s.
-0,57 n.s
-2,63**
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .013 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
73
c) Comparação das Notas das Sub-dimensões do Processo entre as narrativas
autobiográficas e as narrativas de ficção
2,65
1,63
2,11
1,73
3,29
2,07
1,76
1,23
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Objectivação Sub Emocional Sub Cognitiva Metaforização
Média Nr. AutobiográficasMédia Nr. Ficção
Figura 11. Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação emocional,
subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção. As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
As médias das Sub-dimensões do Processo das narrativas autobiográficas e das narrativas
de ficção encontram-se já descritas nas tabelas 4 e 8, respectivamente. Observando agora a
figura 11, verificamos que em duas Sub-dimensões do Processo, as notas das narrativas
autobiográficas se encontram abaixo das notas das narrativas de ficção, nomeadamente a
Objectivação (M = 2,65; M = 3,29, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente) e a
Subjectivação Emocional (M = 1,63; M = 2,07, narrativas autobiográficas e de ficção,
respectivamente). Para as restantes Sub-dimensões a relação inverte-se, sendo que as notas das
narrativas autobiográficas se encontram acima das notas das narrativas de ficção: Subjectivação
Cognitiva (M = 2,11; M = 1,76, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente) e
Metaforização (M = 1,73; M = 1,23, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente).
Os resultados apresentados na tabela 12 revelam, de acordo com o Teste de Friedman, a
existência de diferenças significativas ao nível das Sub-dimensões da Estrutura entre as
74
narrativas autobiográficas e as narrativas de ficção (X2(7) = 381,81; p < 0,001) e, de acordo com
o Teste de Wilcoxon, que tais diferenças se manifestam ao nível das quatro Sub-dimensões:
Objectivação (z = -6,04; p < 0,001), Subjectivação Emocional (z = -3,53; p < 0,001),
Subjectivação Cognitiva (z = -3,85; p < 0,001) e Metaforização (z = -4,70; p < 0,001).
Tabela 12. Teste de Friedman e teste de Wilcoxon das notas das sub-dimensões do processo das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção.
Wilcoxon
Friedman
Objectivação Sub. Emocional
Sub. Cognitiva Metaforização
X2 381,81***
Z
-6,04***
-3,53***
-3,85***
-4,70***
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .013 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
d) Comparação da Notas da Sub-dimensões do Conteúdo entre as narrativas
autobiográficas e as narrativas de ficção
As médias das Sub-dimensões do Conteúdo das narrativas autobiográficas e das narrativas
de ficção encontram-se já descritas nas tabelas 5 e 9, respectivamente. Através da figura 12
verifica-se que em duas das Sub-dimensões, as notas das narrativas autobiográficas se
encontram acima das notas das narrativas de ficção, nomeadamente nas Personagens (M =
3,52; M = 3,12, narrativas autobiográficas e de ficção respectivamente) e nas Acções (M = 3,24;
M = 3,17, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente), situação que se inverte para
os Cenários (M = 2,87; M = 3,13, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente) e para
os Temas (M = 1,83; M = 1,94, narrativas autobiográficas e de ficção, respectivamente).
75
3,52
2,87
3,24
1,83
3,12 3,13 3,17
1,94
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Personagens Cenários Acções Temas
Média Nr. Autobiográficas
Média Nr. Ficção
Figura 12. Médias das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das
narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
A tabela 13 dá-nos conta dos resultados obtidos no Teste de Friedman, reveladores da
existência de diferenças significativas ao nível das Sub-dimensões do Conteúdo das narrativas
autobiográficas quando comparadas com as respectivas Sub-dimensões das narrativas de ficção
(X2 (7) = 317,73; p < 0,001), bem como dos resultados do Teste de Wilcoxon que revelam que
tais diferenças se manifestam exclusivamente ao nível da Sub-dimensão Personagens (z = -
3,20; p < 0,008).
Tabela 13. Teste de Friedman e teste de Wilcoxon para as notas das sub-dimensões do conteúdo das narrativas autobiográficas e das narrativas de ficção
Wilcoxon
Friedman
Personagens
Cenários Acções Temas
X2 317,73***
Z
-3,20**
-1,66 n.s.
-0,63 n.s.
-1,77 n.s.
**p < .008; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .013 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni.
76
3.2 Comparação das narrativas autobiográficas da amostra normativa com as
narrativas autobiográficas das amostras clínicas
3.2.1 Comparação da amostra normativa com a amostra clínica
Iremos agora proceder à análise comparativa dos resultados das narrativas autobiográficas
dos adultos entrevistados para a presente investigação, com os resultados das narrativas
autobiográficas de dois estudos com sujeitos com diagnósticos de perturbação psicológica,
agorafobia e dependência de opiáceos, respectivamente.
Como já referimos, os dados da nossa amostra correspondem a um total de 126 sujeitos,
distribuídos por 63 mulheres (50%) e 63 homens (50%), com idades compreendidas entre os 20
e os 45 anos (M = 29,75; D.P = 6,75) e sem diagnóstico de perturbação psicológica prévio ou
actual. O número da amostra dos estudos com sujeitos diagnosticados com agorafobia
(Gonçalves, Henriques & col., 2002) e com sujeitos diagnosticados com dependência de
opiáceos (Gonçalves, Henriques, & col., 2003) é de 104 e de 67, respectivamente.
a) Comparação das Notas Globais da Estrutura, do Processo e do Conteúdo da amostra
normativa com as Notas Globais da amostra clínica
Tabela 14. Médias, desvios-padrão e Analise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica.
Amostra Estrutura Processo Conteúdo
Normativa Média
Desvio-padrão
52,27
14,30
21,81
14,11
37,97
19,32
Média 38,04 16,89 23,48 Clínica
Desvio-padrão 14,72 14,20 13,89
F
61,77***
7,77**
47,99***
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
77
52,27
21,81
37,9738,04
16,89
23,48
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Amostra NormativaAmostra Clínica
Figura 13. Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas da amostra normativa e da
amostra clínica. As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
Os resultados registados na tabela 14 e ilustrados na figura 13, revelam que as médias
das Notas Globais da amostra normativa se encontram acima da média das Notas Globais da
amostra clínica em todas as Dimensões: Estrutura (M = 52,27; M = 38,04, amostras normativa
e clínica, respectivamente); Processo (M = 21,81; M = 16,89, amostras normativa e clínica,
respectivamente) e Conteúdo (M = 37,97; M = 23,48, amostras normativa e clínica,
respectivamente). Tal como já verificámos anteriormente para a amostra normativa, as médias
das Notas Globais da amostra clínica, apresentam-se pela mesma ordem decrescente: Estrutura
(M = 38,04), Conteúdo (M = 23,48) e Processo (M = 16,89).
De forma a comparar as Notas Globais das narrativas da amostra normativa com as Notas
Globais das narrativas da amostra clínica utilizámos uma Análise da Variância Multivariada
(MANOVA), seguida do teste Wilks-Lambda para determinar as diferenças significativas entre as
amostras. Os resultados da Análise da Variância Multivariada (MANOVA) (Wilks Lambda = .77,
F(3,253) = 25,71; p < 0,001), revelam que existem diferenças significativas entre a amostra
normativa e a amostra clínica. De acordo com a tabela 14, podemos verificar que essas
diferenças são significativas para as três dimensões: Estrutura (F = 61,77; p < 0,001); Processo
(F = 7,77; p < 0,01) e Conteúdo (F = 47,99; p < 0,001).
78
b) Comparação das Notas das Sub-dimensões da Estrutura entre as narrativas da amostra
normativa e as narrativas da amostra clínica
Os resultados da tabela 15 e da figura 14 são reveladores de que a média das notas das
Sub-dimensões da Estrutura da amostra normativa se encontra acima da média das notas da
amostra clínica: Orientação (M = 3,74; M = 2,53, amostras normativa e clínica,
respectivamente); Sequência Estrutural (M = 3,57; M = 2,87, amostras normativa e clínica,
respectivamente), Comprometimento Avaliativo (M = 3,67; M = 3,46, amostras normativa e
clínica, respectivamente), Integração (M = 3,73; M = 3,03, amostras normativa e clínica,
respectivamente).
Tabela 15. Médias das sub-dimensões da estrutura da amostra normativa e da amostra clínica. Amostra Orientação Sequência
Estrutural
Comprometimento
Avaliativo
Integração
Normativa
Clínica
Média 3,74
2,53
3,57
2,87
3,67
3,46
3,73
3,03
3,743,57
3,67 3,73
2,53
2,87
3,46
3,03
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Orientação Seq. Estrutural Comp. Av. Integração
Amostra NormativaAmostra Clínica
Figura 14. Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica. As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
79
Tabela 16. Ordem média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica.
Kruskal-Wallis Mann-Whitney
Sub-dimensões Amostra Normativa
Ordem Média
Amostra Clínica
Ordem Média
X2(1)
Z
Orientação 167,56 91,92 40,96*** -8,424***
Seq. Estrutural 151,79 107,08 25,16*** -5,02***
Comp. Avaliativo 136,69 121,60 2,97n.s. -1,72n.s.
Integração 153,75 105,20 29,95*** -5,46***
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
Os resultados do teste de Mann-Whitney descritos na tabela 16 relativamente às Sub-
dimensões da Estrutura para a amostra clínica e para a amostra normativa revelam a existência
de diferenças significativas ao nível da Orientação (Z = -8,424, p < 0,001), da Sequência
Estrutural (Z = -5,02, p <0,001) e da Integração (Z = -5,46, p < 0,001), apenas não se
encontrado diferenças significativas entre as amostras para o Comprometimento Avaliativo.
c) Comparação das Notas das Sub-dimensões do Processo entre as narrativas da amostra
normativa e as narrativas da amostra clínica
De acordo com os valores apresentados na tabela 17 e na figura 15, verificamos que em
duas das Sub-dimensões do Processo a amostra normativa se encontra acima da média da
amostra clínica, nomeadamente na Objectivação (M = 2,65; M = 1,72, amostras normativa e
clínica, respectivamente) e na Subjectivação Cognitiva (M = 2,11; M = 2,01, amostras normativa
e clínica, respectivamente). Verifica-se o inverso, isto é, uma média mais baixa na amostra
normativa relativamente à amostra clínica para a Subjectivação Emocional (M = 1,63; M = 1,73,
amostras normativa e clínica, respectivamente) e para a Metaforização (M = 1,73; M = 1,77,
amostras normativa e clínica, respectivamente).
80
Tabela 17. Médias das sub-dimensões do processo da amostra normativa e da amostra clínica. Amostra Objectivação Subjectivação
Emocional
Subjectivação
Cognitiva
Metaforização
Normativa
Clínica
Média 2,65
1,72
1,63
1,73
2,11
2,01
1,73
1,77
2,65
1,63
2,11
1,731,72 1,73
2,01
1,77
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Objectivação Sub Emocional Sub Cognitiva Metaforização
Amostra NormativaAmostra Clínica
Figura 15. Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação emocional,
subjectivação cognitiva e metaforização das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas
Tabela 18. Ordem Média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do processo das narrativas da amostra normativa e da amostra clínica.
Kruskal-Wallis Mann-Whitney
Amostra Não Clínica
Ordem Média
Amostra Clínica
Ordem Média
X2(1)
Z
Objectivação 163,78 95,55 59,38*** -7,71***
Sub. Emocional 126,50 131,40 0,35ns.. -0,59n.s.
Sub. Cognitiva 134,65 123,57 1,57n.s. -1,25n.s.
Metaforização 128,50 129,48 0,01n.s. -0,12n.s.
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
81
Na tabela 18 encontram-se descritos os valores da ordem média obtida para as Sub-
dimensões do Processo tanto para a amostra normativa como para a amostra clínica e, ainda, a
sinalização das diferenças significativas encontradas entre ambas as amostra, para cada uma
das Sub-dimensões. De acordo com os referidos resultados podemos verificar a existência de
diferenças significativas apenas ao nível da Objectivação (Z = -7,71, p < 0,001).
d) Comparação das Notas das Sub-dimensões do Conteúdo entre as narrativas da amostra
normativa e as narrativas da amostra clínica
Os dados apresentados na tabela 19 e na figura 16 demonstram que, à excepção dos
Temas cuja média da amostra normativa se encontram ligeiramente abaixo da média da
amostra clínica (M = 1,83; M = 1,86, amostras normativa e clínica, respectivamente), todas as
outras Sub-dimensões apresentam uma média mais elevada para a amostra normativa quando
comparadas com a amostra clínica: Personagens (M = 3,52; M = 2,56, amostras normativa e
clínica, respectivamente), Cenários (M = 2,87; M = 1,78, amostras normativa e clínica,
respectivamente), Acções (M = 3,24, M = 2,27, amostras normativa e clínica, respectivamente).
Tabela 19. Médias das sub-dimensões do conteúdo da amostra normativa e da amostra clínica. Amostras Personagens Cenários Acções
Temas
Normativa
Clínica
Média 3,52
2,56
2,87
1,78
3,24
2,27
1,83
1,86
82
3,52
2,87
3,24
1,83
2,56
1,78
2,27
1,86
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Personagens Cenários Acções Temas
Amostra NormativaAmostra Clínica
Figura 16. Médias das notas das sub-dimensões do conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das
narrativas da amostra normativa e da amostra clínica. As setas representam os pares onde foram encontradas diferenças significativas.
Na tabela 20 encontramos os valores da ordem média obtida para as Sub-dimensões do
Conteúdo da amostra normativa e da amostra clínica. Figuram, ainda, as diferenças significativas
encontradas para cada uma das Sub-dimensões entre cada uma das amostras.
Tabela 20. Ordem Média, teste de Kruskal-Wallis e teste de Mann-Whitney para as notas das sub-dimensões do conteúdo das narrativas autobiográficas da amostra normativa e da amostra clínica.
Kruskal-Wallis Mann-Whitney
Sub-dimensões Amostra Não Clínica
Ordem Média
Amostra Clínica
Ordem Média
X2((1)
Z
Personagens 157,43 101,66 38,60*** -6,21***
Cenários 155,00 103,99 33,01*** -5,75***
Acções 154,46 104,51 32,40*** -5,69***
Temas 126,31 131,58 0,42n.s. -0,65n.s.
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
Os resultados da tabela 20 revelam que se encontram diferenças significativas ao nível das
Personagens (Z = -6,21, p < 0,001), dos Cenários (Z = -5,75, p < 0,001) e das Acções (Z = -
5,69, p < 0,001), não se encontrando diferenças significativas ao nível dos Temas.
83
3.2.2) Comparações entre a amostra normativa, a amostra de pacientes
diagnosticados com agorafobia e a amostra de pacientes diagnosticados como
dependentes de opiáceos
a) Comparação das Notas Globais da Estrutura, do Processo e do Conteúdo entre a
amostra normativa, a amostra de pacientes com agorafobia e a amostra de pacientes
dependentes de opiáceos
Tabela 21. Médias e desvios-padrão das notas globais das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes com dependência de opiáceos.
Amostras Estrutura Processo Conteúdo
Normativa Média
Desvio-padrão
52,27
14,30
21,81
14,11
37,97
19,32
Média 38,43 18,63 23,62 Pacientes com
Agorafobia Desvio-padrão 15,84 14,65 15,27
Pacientes com Média 36,52 10,15 22,96
Toxicodependência Desvio-padrão 9,28 9,94 6,38
Os dados apresentados na tabela 21 e ilustrados na figura 17, revelam que, para as três
amostras, a média mais elevada é a da Estrutura, seguida do Conteúdo e do Processo. No que
respeita à comparação das três amostras entre si, verificamos que, em todas as Dimensões, as
médias mais elevadas se situam ao nível da amostra normativa, seguida da amostra de
pacientes com agorafobia e, por último da amostra de pacientes dependentes de opiáceos:
Estrutura (M = 52,27; M = 38,43; M = 36,52, amostras normativa, de pacientes com agorafobia
e de pacientes dependentes de opiáceos, respectivamente), Processo (M = 21,81; M = 18,63; M
= 10,15, amostras normativa, de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de
opiáceos, respectivamente); Conteúdo (M = 37,97; M = 23,62; M = 22,96, amostras normativa,
de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos, respectivamente).
84
52,27
21,81
37,9738,43
18,63
23,62
36,52
10,15
22,96
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Amostra Normativa
Amostra P. Agorafobia
Amostra P. Dep. Opiáceos
Figura 17. Médias das notas globais da estrutura, do processo e do conteúdo das narrativas das amostras
normativa, de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos. As setas representam o sentido das diferenças estatisticamente significativas
Tabela 22. Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes com dependência de opiáceos.
Scheffe
F(2,123)
Normativa
Vs
P. Agorafobia
Normativa
vs
P. Toxicodependência
P. Agorafobia
vs
P. Toxicodependência
Estrutura 30,99*** *** *** n.s
Processo 7,95*** n.s ** *
Conteúdo 23,89*** *** *** n.s.
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
De acordo com os resultados da Analise da Variância Multivariada (MANOVA),
encontramos diferenças significativas entre as três amostras no que respeita às Notas Globais
(Wilks Lambda = .740 (6,504) F = 13,64; p < 0,001). De acordo com a tabela 22, percebemos
que essas diferenças são estatisticamente significativas nas três dimensões: Estrutura (F =
30,99; p < 0,001); Processo (F = 7,95; p < 0,001) e Conteúdo (F = 23,89; p < 0,001).
Com o objectivo de distinguirmos os pares cujas diferenças se revelam estatisticamente
significativas, realizámos um teste Post Hoc (Scheffè), cujos resultados apresentados na mesma
tabela revelam o seguinte: na Estrutura, a amostra normativa revela diferenças significativas
85
tanto com a amostra de pacientes com agorafobia como com a amostra de pacientes
dependentes de opiáceos, o mesmo não se verificando quando se comparam as duas amostras
clínicas. Para o Processo, verificamos que se encontram diferenças significativas entre a amostra
normativa e a amostra de pacientes diagnosticados como dependentes de opiáceos e entre as
duas amostras clínicas, no entanto não foram encontradas diferenças estatisticamente
significativas entre a amostra normativa e a amostra de pacientes com agorafobia. Quanto ao
Conteúdo, repete-se o padrão encontrado para a Estrutura: a amostra normativa revela
diferenças significativas quando comparada com as duas amostra clínicas, enquanto que, entre
estas duas não se verificam diferenças significativas.
a) Comparação das Notas das Sub-dimensões da Estrutura entre as narrativas da amostra
normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de
opiáceos
Tabela 23. Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
Kruskal-Wallis
Sub-dimensões Amostra Normativa
Ordem Média
Amostra Agorafobia
Ordem Média
Amostra Dep. Opiáceos
Ordem Média
X2 (2)
Orientação 167,56 94,29 82,78 71,51***
Seq. Estrutural 151,79 108,59 101,30 25,39***
Comp. Avaliativo 136,69 129,26 92,11 8,99*
Integração 153,75 109,35 89,22 31,57***
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
86
3,743,57
3,67 3,73
2,55
2,88
3,55
3,08
2,44
2,81
3,11
2,85
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Orientação Seq. Estrutural Comp. Av. Integração
Amostra Normativa
Amostra P. Agorafobia
Amostra P. Dep. Opiáceos
Figura 18. Médias das notas das sub-dimensões da estrutura: orientação, sequência estrutural,
comprometimento avaliativo e integração das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
As setas representam o sentido das diferenças estatisticamente significativas
Na tabela 23 encontramos descritos os valores da ordem média e os resultados obtidos no
Teste de Kruskal-Wallis para as Sub-dimensões da Estrutura para as amostras normativa,
pacientes com agorafobia e pacientes dependentes de opiáceos. Verificamos a existência de
diferenças significativas em todas as sub-dimensões: Orientação (X2(2) = 71,51, p < 0,001);
Sequência Estrutural (X2(2) = 25,39, p < 0,001); Comprometimento Avaliativo (X2(2) = 8,99, p <
.05); e Integração (X2(1) = 31,57, p < 0,001).
Tabela 24. Teste de Mann-Whitney nas notas das sub-dimensões da estrutura das narrativas das amostras normativa, de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos.
Mann-Whitney
Sub-dimensões Amostra Normativa
vs
Amostra Agorafobia
Amostra Normativa
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Amostra Agorafobia
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Orientação -7,55*** -6,02*** -0,31n.s.
Seq. Estrutural -4, 56*** -3,37** -0,44n.s.
Comp. Avaliativo -0,83n.s. -2,92** -2,55*
Integração -4,68*** -4,37*** -1,22n.s.
*p < .017; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .017 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni
87
Visualizando a figura 18 e os resultados do Teste de Mann-Whitney descritos na tabela 24,
verificamos que as notas da amostra normativa são significativamente mais elevadas do que as
notas da amostra de dependentes de opiáceos em todas as Sub-dimensões (Orientação: z = -
6,02, p < 0,001; Sequencia Estrutural: z = 3,37 p < 0,01; Comprometimento Avaliativo: z = -
2,92, p < 0,01; Integração: z = -4,37 , p < 0,001) e mais elevadas do que as notas dos
pacientes com agorafobia, sendo a diferença significativa em todas as Sub-dimensões à
excepção do Comprometimento Avaliativo (Orientação: z = -7,55, p < 0,001; Sequencia
Estrutural: z = -4,56, p < 0,001; Integração: z = -4,68, p < 0,001). É precisamente ao nível do
Comprometimento Avaliativo que as duas amostras clínicas revelam a existência de diferenças
significativas entre si, com valores mais elevados para a amostra de pacientes com agorafobia
(Comprometimento Avaliativo: z = -2,55, p < 0,017).
b) Comparação das Notas das Sub-dimensões do Processo entre as narrativas da amostra
normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de
opiáceos
Tabela 25. Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões do processo das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
Kruskal-Wallis
Sub-dimensões Amostra Normativa
Ordem Média
Amostra Agorafobia
Ordem Média
Amostra Dep. Opiáceos
Ordem Média
X2 (2)
Objectivação 163,78 86,44 97,91 59,94***
Sub. Emocional 126,50 139,97 98,43 8,73*
Sub. Cognitiva 134,65 129,79 99,61 5,47n.s.
Metaforização 128,50 136,17 103,72 5,12n.s.
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
88
2,65
1,63
2,11
1,731,751,85
2,11
1,88
1,59
1,3
1,63
1,33
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Objectivação Sub Emocional Sub Cognitiva Metaforização
Amostra Normativa
Amostra P. Agorafobia
Amostra P. Dep. Opiáceos
Figura 19. Médias das notas das sub-dimensões do processo: objectivação, subjectivação emocional, subjectivação
cognitiva e metaforização das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
As setas representam o sentido das diferenças estatisticamente significativas.
Na tabela 25 encontramos descritos os valores da ordem média e os resultados obtidos no
Teste de Kruskal-Wallis para as sub-dimensões do Processo para as amostras normativa, de
pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos. Verificamos a existência de
diferenças significativas nas Sub-dimensões Objectivação (X2(2) = 59,94, p < 0,001) e
Subjectivação Emocional (X2(2) = 8,73, p < 0,05). O mesmo não se verifica para a Subjectivação
Cognitiva, nem para a Metaforização.
Tabela 26. Teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do processo nas narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
Mann-Whitney
Sub-dimensões Amostra Normativa
vs
Amostra Agorafobia
Amostra Normativa
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Amostra Agorafobia
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Objectivação -6,92*** -5,31*** -0,58n.s.
Sub. Emocional -1,52n.s. -2,10n.s. -2,83**
Sub. Cognitiva -0,48n.s. -2,43* -1,88n.s.
Metaforização -0,87n.s. -1,81n.s. -2,23n.s.
*p < .017; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .017 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni
89
Como podemos verificar na tabela 26, os resultados do Teste de Mann-Whitney distinguem
os pares de amostras onde se verificam as referidas diferenças. Tendo em conta estes valores,
os da ordem média apresentados na tabela 25 e os valores das médias ilustrados na figura 19,
verificamos que, entre a amostra normativa e a amostra de pacientes com agorafobia, apenas se
registam diferenças significativas ao nível da Objectivação (z = -6,92, p < 0,001), com os valores
mais elevados para a primeira amostra. Quando comparamos a amostra normativa com a
amostra de pacientes dependentes de opiáceos verificamos que, para além das diferenças
encontradas ao nível da Objectivação (z = -5,31, p < 0,001) encontramos ainda diferenças
significativas ao nível das Subjectivação Cognitiva (z = -2,43, p < 0,017), com valores mais
elevados para a amostra normativa em ambas as situações. No que toca ao par que compara as
duas amostras clínicas, verificamos que não existem diferenças significativas entre as Sub-
dimensões, com excepção para a Subjectivação Emocional cujos valores da amostra de
pacientes agorafóbicos revela ser significativamente superior em relação à amostra de pacientes
dependentes de opiáceos (z = - 2,83, p < 0,01).
c) Comparação das Notas das Sub-dimensões do Conteúdo das narrativas da amostra
normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de
opiáceos
Tabela 27. Ordem Média e teste de Kruskal-Wallis das notas das sub-dimensões do conteúdo das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
Kruskal-Wallis
Sub-dimensões Amostra Normativa
Ordem Média
Amostra Agorafobia
Ordem Média
Amostra Dep. Opiáceos
Ordem Média
X2 (2)
Personagens 157,43 106,19 84,19 40,61***
Cenários 155,00 103,74 104,96 33,02***
Acções 154,46 106,82 95,61 32,94***
Temas 126,31 128,21 144,59 1,758n.s.
*p < .05; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa
90
3,52
2,87
3,24
1,83
2,63
1,79
2,32
1,85
2,26
1,74
2,11
1,93
1
1,5
2
2,5
3
3,5
4
4,5
5
Personagens Cenários Acções Temas
Amostra Normativa
Amostra P. Agorafobia
Amostra P. Dep. Opiáceos
Figura 20. Médias das notas das sub-dimensões da conteúdo: personagens, cenários, acções e temas das
narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e da amostra de pacientes dependentes de opiáceos.
As setas representam o sentido das diferenças estatisticamente significativas.
Na tabela 27 apresentamos os valores da ordem média e os resultados obtidos no Teste
de Kruskal-Wallis para as sub-dimensões do Conteúdo para as amostras normativa, pacientes
com agorafobia e pacientes dependentes de opiáceos. Verificamos que existem diferenças
significativas ao nível das Personagens (X2(2) = 40,61, p < 0,001), dos Cenários (X2(2) = 33,02,
p < 0,001) e das Acções (X2(2) = 32,94, p < 0,001), não se verificando diferenças significativas
quanto aos Temas.
Tabela 28. Teste de Mann-Whitney das notas das sub-dimensões do processo das narrativas da amostra normativa, da amostra de pacientes com agorafobia e de pacientes dependentes de opiáceos.
Mann-Whitney
Sub-dimensões Amostra Normativa
vs
Amostra Agorafobia
Amostra Normativa
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Amostra Agorafobia
vs
Amostra Dep. Opiáceos
Personagens -5,32*** -4,85*** -1,38n.s.
Cenários -5,38*** -3,37*** -0,21ns.
Acções -5,04*** -3,87*** -0,81n.s.
Temas -0,24n.s. -1,24n.s. -1,32n.s.
*p < .017; **p < .01; ***p < .001; n.s. = não significativa Nota: no teste de Wilcoxon, o valor a partir do qual se considera a existência de diferença significativa é p < .017 uma vez que se realizou a correcção de Bonferroni
91
A fim de determinarmos os pares com diferenças significativos, realizou-se um Teste de
Mann-Whitney cujos valores estão descritos na tabela 28. De acordo com estes resultados e
analisando os valores da ordem média apresentados na tabela 27 ou os valores médios na figura
20, verificamos que a amostra normativa se apresenta com valores significativamente mais
elevados em três das Sub-dimensões, tanto quando comparada com amostra de pacientes com
agorafobia (Personagens: z = -5,32, p < 0,001; Cenários: z = -5,38, p < 0,001; e Acções: z = -
5,04, p < 0,001) como quando comparada com a amostra de pacientes dependentes de
opiáceos (Personagens: z = -4,85, p < 0,001; Cenários: z = -3,37, p < 0,001; e Acções: z = -
3,87, p < 0,001). Quanto à sub-dimensão Temas, embora os toxicodependentes apresentem os
valores mais elevados, seguido da amostra de pacientes com agorafobia e, por fim da amostra
normativa, as diferenças não são significativas.
No que diz respeito ao par de amostras clínicas, embora os valores das Sub-dimensões do
Conteúdo dos pacientes com agorafobia sejam ligeiramente mais elevados do que os valores dos
pacientes com dependência de opiáceos, não se verificam diferenças significativas.
3.3 Caracterização do desenvolvimento narrativo
O estudo do perfil das narrativas de ficção em adultos sem psicopatologia surgiu da
possibilidade de comparação com o perfil das narrativas de ficção de crianças e adolescentes,
descrito em estudos anteriores por Alexandra Freitas (2005) e Carla Rocha (2005),
respectivamente. Seguindo a mesma linha de análise dos estudos acima citados, iremos
proceder à caracterização das narrativas de ficção dos adultos da nossa amostra, por Grupo
Etário, por Sexo e por NSC, antes de procedermos à comparação entre as amostras das
crianças, adolescentes e adultos.
3.3.1 Caracterização das Notas Globais das narrativas de ficção dos adultos
por Grupo Etário
Para comparar as Notas Globais das narrativas de ficção por Grupo Etário (20-25 anos;
26-30 anos; 35-45 anos) utilizámos uma Análise da Variância Multivariada (MANOVA), seguida
do teste Wilks-Lambda para determinar as diferenças significativas entre os grupos.
92
Tabela 29. Média, desvios-padrão e Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por grupo etário.
Grupo Etário
Média (dp)
20-25 26-30 35-45 F(2, 123)
Estrutura 54,14 (13,77) 54,57 (13,21) 56,10 (14,18) ,24n.s.
Processo 21,48 (11,19) 22,29 (13,29) 24,48 (14,41) ,60n.s.
Conteúdo 36,43 (14,73) 36,33 (13,72) 39,95 (15,04) , 85n.s.
n.s. = não significativa
54,14 54,5756,1
36,43 36,33 39,95
21,48 22,29 24,48
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
20-25 26-30 35-45
Processo
Conteúdo
Estrutura
Figura 21. Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por grupo etário.
De acordo com os dados apresentados na tabela 29 verificamos que, para os três Grupos
Etários dos adultos na produção das narrativas de ficção, a média da Nota Global da Estrutura
se apresenta a mais elevada, seguida da média da Nota Global do Conteúdo e da média da Nota
Global do Processo: Grupo 20-25 (Estrutura, M = 54,14; Conteúdo, M = 36,33; Processo, M =
21,48); Grupo 26-30 (Estrutura, M = 54,57; Conteúdo, M = 36,33; Processo, M = 22,29); Grupo
35-45 (Estrutura, M = 56,10; Conteúdo, M = 39,95; Processo, M = 24,48). Verificamos, ainda,
que os Grupos Etários mais elevados apresentam as Notas Globais mais elevadas quanto à
93
Estrutura (20-25 anos, M = 54,14; 26-30 anos, M = 54,57; 35-45 anos, M = 56,1) e ao
Processo (20-25 anos, M = 21,48; 26-30 anos, M = 22,29; 35-45- anos, M = 24,48); com uma
pequena excepção no Conteúdo cujos sujeitos entre os 26 e 30 anos revelam um valor
ligeiramente inferior aos sujeitos entre os 20 e 25 anos, embora os sujeitos mais velhos sejam
os que apresentem os valores mais elevados (20-25 anos, M = 36,43; 26-30 anos, M = 36,33;
35-45 anos M = 39,95). Não obstante este padrão, a Análise da Variância Multivariada
(MANOVA) revelou que as diferenças das Notas Globais por Grupo Etário não são significativas.
3.3.2 Caracterização das Notas Globais das narrativas de ficção por Sexo
Tabela 30. Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por sexo.
Sexo
Média (dp)
Feminino Masculino F(1, 124)
Estrutura 53,30 (15,14) 56,57 (11,85) 1,82n.s.
Processo 22,92 (14,11) 22,57 (11,88) ,02n.s.
Conteúdo 36,44 (13,92) 37,70 (15,08) ,76n.s.
n.s. = não significativa
53,3 56,57
36,44 37,7
22,92 22,57
05
101520253035404550556065707580
Femenino Masculino
Processo
Conteúdo
Estrutura
Figura 22. Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por sexo.
94
Os valores apresentados na tabela 30 revelam que, para o sexo feminino e masculino,
uma média mais elevada para a Estrutura, seguida da média do Conteúdo e, por último, da
média do Processo. Verificamos que, à excepção do Processo, cuja média do Sexo Feminino (M
= 22,92, DP = 14,11) se encontra ligeiramente acima da média do Sexo Masculino (M = 22,57,
DP = 11,88), nas restantes Dimensões, as médias do Sexo Masculino se encontram ligeiramente
acima das médias do Sexo Feminino: Estrutura (M = 56,57; DP = 11,85; M=53,30, DP = 15,14,
Sexo Masculino e Sexo Feminino, respectivamente); Conteúdo (M = 37,70; DP = 15,08; M =
36,44; DP = 13,92, Sexo Masculino e Sexo Feminino, respectivamente). No entanto, os
resultados da Análise da Variância Multivariada (MANOVA) demonstram que as diferenças não se
revelam significativas.
3.3.3 Caracterização das Notas Globais das narrativas de ficção por NSC
Tabela 31. Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais das narrativas de ficção por NSC. NSC
Média (dp)
Scheffe
Baixo
(4º - 9º)
Médio
(10º-12º)
Alto
(+12º)
F(2,123)
Baixo
vs
Médio
Médio
vs
Alto
Alto
vs
Baixo
Estrutura 46,71 (14,93) 57,52 (11,17) 60,57 (10,52) 14,57*** ** n.s ***
Processo 16,00 (9,74) 22,48 (10,23) 29,76 (14,75) 14,32*** * * ***
Conteúdo 28,71 (12,63) 39,62 (14,25) 44,38 (12,07) 15,99*** ** n.s ***
*p<.05; **p<.01; ***p<.001; n.s. = não significativa
95
29,76
44,38
60,57
22,48
39,62
57,52
16
28,71
46,71
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Processo Conteúdo Estrutura
Baixo
Médio
Alto
Figura 23. Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das narrativas de ficção por NSC.
As setas representam as diferenças significativas.
A tabela 31 representa os resultados obtidos na Análise da Variância Multivariada
(MANOVA) para comparação das notas Globais entre os diferentes Níveis Sócio-Culturais (Baixo,
Médio e Alto) da amostra e os resultados do teste de Scheffè para determinar em quais dos
pares se encontram as diferenças significativas.
Os resultados demonstram que, em todas as dimensões, os resultados superiores
correspondem ao NSC Alto, seguido do NSC Médio e, por fim, com valores inferiores, o NSC
Baixo: Estrutura (M = 46,71; M = 57,52; M = 60,57; Baixo, Médio e Alto, respectivamente),
seguida da média do Conteúdo (M = 28,71; M = 39,62; M = 44,38; Baixo, Médio e Alto,
respectivamente) e da média do Processo (M = 16,00; M = 22,48; M = 29,76; Baixo, Médio e
Alto, respectivamente). Tais diferenças revelam-se estatisticamente significativas, como podemos
verificar através dos resultados da Análise da Variância Multvariada (MANOVA) (Wilks-Lambda =
.71, F(6,242) = 7,49, p < 0,001), verificando-se, através de Testes Univariados, que as
diferenças se encontram ao nível das três dimensões: Estrutura (F (2,123) = 14,57; p < 0,001);
Processo (F(2,123) = 14,32; p < 0,001) e Conteúdo (F(2,123) = 15,99; p < 0,001). A fim de
discriminar quais os pares em que se encontram tais diferenças, realizou-se um Teste de Scheffè
cujos resultados são os seguintes: encontramos diferenças significativas em todas as Dimensões
quando comparamos o NSC Baixo com o NSC Alto e com o NSC Médio, funcionando estes
últimos como um grupo homogéneo, à excepção do Processo, no qual se encontram diferenças
significativas também para este par.
96
Traçada a caracterização das narrativas de ficção dos adultos, por idade, sexo e NSC
passemos à comparação das narrativas de ficção dos adultos com as narrativas de ficção das
crianças e adolescentes.
a) Comparação das Notas Globais das narrativas de ficção por Etapa de Desenvolvimento
(crianças, adolescentes e de adultos)
A fim de comparar as Notas Globais das narrativas de ficção de amostras que
representam três Etapas de Desenvolvimento diferentes (crianças dos 3 ao 10 anos de idade,
adolescentes dos 11 aos 17 anos de idade e adultos dos 20 aos 45 anos de idade), utilizámos
uma Análise da Variância Multivariada (MANOVA), seguida do teste Wilks-Lambda para
determinar as diferenças significativas entre os grupos e um Post Hoc (Scheffè) para determinar
entre quais dos grupos se situam as diferenças.
Tabela 32. Análise da Variância Multivariada (MANOVA) das notas globais por etapa de desenvolvimento Etapa do Desenvolvimento
Média (dp)
Scheffe
Crianças
3-10 anos
Adolescentes
11-18 anos
Adultos
20-45 anos
F(2,364) Crianças
vs
Adolesc.
Adolesc.
vs
Adultos
Adultos
vs
Crianças
Estrutura 19,48 (16,99) 40,90 (15,75) 54,94 (13,64) 159,30*** *** *** ***
Processo 4,85 (4,85) 16,52 (12,87) 22,75 (12,99) 80,59*** *** *** ***
Conteúdo 29,98 (14,09) 36,17 (10,20) 37,57 (14,49) 11,39*** ** n.s. ***
n.s. = não significativa; *p<.05; **p<.01; ***p<.001
97
19,48
40,9
54,94
4,85
16,52
22,75
29,98
36,17 37,57
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
Estrutura Processo Conteúdo
Crianças Adolescentes Adultos Crianças Adolescentes Adultos Crianças Adolescentes Adultos
Figura 24. Médias das notas globais da estrutura, processo e conteúdo das crianças, adolescentes e adultos
das narrativas de ficção. As setas representam as diferenças significativas.
Tal como verificámos anteriormente para a amostra de adultos, os resultados que figuram
na tabela 32 revelam que, nos adolescentes a média mais elevada se situa ao nível da Estrutura
(M = 40,90; DP = 15,75); seguida do Conteúdo (M = 36,17; DP = 10,20) e, por fim, do
Processo (M = 16,52; DP = 12,87). O mesmo não se verifica na amostra das crianças, cuja
média mais elevada se situa ao nível do Conteúdo (M = 29,98; DP = 14,09), seguida da média
da Estrutura (M = 19,48; DP = 16,99) e, por fim, da média do Processo (M = 4,85; DP = 16,52).
Verificamos, ainda, que as médias das Notas Globais das Crianças são sempre as mais baixas,
seguindo-se as médias das Notas Globais dos Adolescentes e, por último, com valores mais
elevados, as médias das Notas Globais dos Adultos: Estrutura (M = 19,48; DP = 16,99; M =
40,90; DP = 15,75; M = 54,94; DP = 13,64; crianças, adolescentes e adultos respectivamente);
Processo (M = 4,85; DP = 4,85; M = 16,52; DP = 12,87; M = 22,75; DP = 12,99; crianças,
adolescentes e adultos respectivamente); Conteúdo (M = 29,98; DP = 14,09; M = 36,17; DP =
10,20; M = 37,57; DP = 14,49; crianças, adolescentes e adultos respectivamente).
A Análise da Variância Multivariada (MANOVA) revelou que as diferenças encontradas são
significativas (Wilks-Lambda = .44, F(6,724) = 59,85; p < 0,001) e Testes Univariados
demonstram que as diferenças se encontram ao nível das três dimensões: Estrutura (F(2,364) =
159,30; p < 0,001); Processo (F(2,364) = 80,59; p < 0,001) e Conteúdo (F(2,364) = 11,39; p <
98
0,001). De acordo com o Teste de Scheffè, verificamos que tais diferenças são significativas em
todos os pares (Crianças/Adolescentes; Adolescentes/Adultos; Adultos/Crianças), à excepção do
par Adolescentes/Adultos para o Conteúdo.
b) Caracterização da tendência evolutiva das Notas Globais das narrativas de ficção por
Grupo Etário
A fim de caracterizar o desenvolvimento narrativo de uma forma mais detalhada, iremos
proceder à apresentação das Notas Globais das narrativas de ficção tendo em conta os três
Grupos Etários dentro de cada das amostras de crianças, de adolescentes e de adultos, (3-4, 6-
7, 9-10; 11-12, 14-15, 17-18; 20-25, 26-30, 35-45, respectivamente). No entanto, não será
possível efectuar testes estatísticos acerca da diferença de médias entre os nove Grupos Etários,
dado que o número de sujeitos por célula assim distribuídos é insuficiente para os comparar. Por
esse motivo, apresentaremos, apenas, a evolução tendencial dos resultados.
Tabela 33. Médias e desvios-padrão das notas globais da estrutura, processo e conteúdo por grupos etários. Crianças
Adolescentes
Adultos
3-4 6-7 9-10 11-12 14-15 17-18 20-25 26-30 35-45
Estrutura
1,93
(3,40)
21,70
(15,38)
31,36
(13,14)
35,19
(10,19)
37,67
(15,65)
49,90
(15,75)
54,14
(13,77)
54,57
(13,21)
56,10
(14,18)
Processo
0,72
(1,98)
5,85
(5,33)
7,17
(3,84)
10,95
(6,92)
14,71
(11,86)
23,90
(15,03)
21,48
(11,19)
22,29
(13,29)
24,48
(14,41)
Conteúdo
16,42
(9,36)
33,36
(13,10)
37,51
(10,11)
34,81
(7,39)
33,71
(11,45)
40,00
(10,40)
36,43
(14,73)
36,33
(13,72)
39,95
(15,05)
Os resultados que figuram na tabela 33 revelam que, os Grupos Etários mais baixo
correspondem aos valores mais baixos obtidos nas Notas Globais no que respeita à Estrutura e
ao Processo, embora neste último se encontre uma excepção para o Grupo dos 17 aos 18 anos,
cuja média é mais elevada do que a média dos dois Grupos Etários seguintes dos adultos (20-25
e 26-30 anos). No que respeita ao Conteúdo verificamos que existe um aumento da média das
99
Notas Globais em todos os Grupos Etários dentro da amostra das crianças (3-4, 6-7, 9-10), mas
o mesmo não acontece nos outros Grupos Etários. O valor mais baixo situa-se no Grupo Etário
dos 3 aos 4 anos (M = 16,42; DP = 9,36), seguido do valor do Grupo Etário dos 6 aos 7 anos (M
= 33,36; DP = 13,10). A partir deste Grupo Etário deixamos de encontrar uma progressão
através da idade, sendo que, o valor da Nota Global do Conteúdo das crianças dos 9 aos 10 (M
= 37,51; DP = 19,11) revela-se superior aos valores encontrados para os adolescentes dos 11
aos 12 (M = 34,81; DP = 7,39), dos 14 aos 15 anos (M = 33,71; DP = 11,45), para os adultos
dos 20 aos 25 (M = 36,43; DP = 14,73) e dos 26 aos 30 anos (M = 36,33; DP = 13,72). Por
outro lado, esse mesmo grupo dos 9 aos 10 anos, revela valores inferiores aos apresentados
pelos adultos dos 35 aos 45 (M = 39,95; DP = 15,05) e dos adolescentes dos 17 aos 18 (M =
40,00; DP = 10,40), sendo este último Grupo Etário o que apresenta o valor mais elevado na
Nota Global do Conteúdo.
Os gráficos que se seguem apresentam, para a Estrutura, Processo e Conteúdo, a
tendência evolutiva das narrativas para cada Etapa de Desenvolvimento e para cada um dos
Grupos Etários anteriormente descritos.
1,93
21,7
31,36
35,1937,67
49,9
54,14 54,5756,1
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
3-4 anos 6-7 anos 9-10 anos 11-12 anos 14-15 anos 17-18 anos 20-25 anos 26-30 anos 35-45 anos
Figura 25. Médias das notas globais da estrutura das narrativas de ficção pelos nove grupos etários.
100
0,72
5,85 7,17
10,95
14,71
23,921,48 22,29
24,48
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
3-4 anos 6-7 anos 9-10 anos 11-12 anos 14-15 anos 17-18 anos 20-25 anos 26-30 anos 35-45 anos
Figura 26. Médias das notas globais do processo das narrativas de ficção pelos nove grupos etários.
16,42
33,36
37,5134,81 33,71
40
36,43 36,33
39,95
0
5
10
15
20
25
30
35
40
45
50
55
60
65
70
75
80
3-4 anos 6-7 anos 9-10 anos 11-12 anos 14-15 anos 17-18 anos 20-25 anos 26-30 anos 35-45 anos
Figura 27 Médias das notas globais do conteúdo das narrativas de ficção por grupo etário.
101
4. Discussão dos resultados
Após a apresentação dos resultados passemos então à sua discussão, dando-lhes um
sentido e tentando dar resposta às questões levantadas pela presente investigação.
Seguindo os passos da apresentação dos resultados, iniciaremos esta discussão
caracterizando o perfil narrativo de adultos sem psicopatologia através das narrativas auto-
biográficas e das narrativas de ficção, passando, de seguida, à comparação entre ambas.
Posteriormente, importará estabelecer de que forma o perfil das narrativas autobiográficas se
distingue dos resultados obtidos em estudos anteriores realizados com adultos com diagnóstico
psicopatológico, de agorafobia e de dependência de opiáceos, respectivamente. Por último, com
o objectivo de aumentar o conhecimento quanto à evolução e desenvolvimento da matriz
narrativa (com base nas narrativas de ficção), teremos oportunidade de nos debruçar sobre os
resultados dos adultos obtidos nesta investigação na sua relação com os resultados de crianças
e de adolescentes, recolhidas em estudos anteriores, já descritos na parte teórica deste estudo.
Tendo em conta esses dados, será ainda possível perceber de que forma as mesmas variáveis
sócio-demográficas (Sexo e Nível Sócio-cultural) se manifestam nas diferentes etapas de
desenvolvimento.
4.1 O perfil narrativo de adultos
Iremos introduzir esta discussão com a análise dos perfis narrativos do discurso
autobiográfico e de ficção de 126 adultos sem perturbação psicológica. O facto dos resultados
das duas tarefas narrativas serem semelhantes, permite-nos fazer uma análise conjunta.
Os resultados indicam-nos que a Estrutura é a dimensão caracterizada por uma maior
riqueza, revelando que a capacidade de narrar histórias coerentes e organizadoras é uma
característica importante na matriz narrativa destes adultos. Em ambas as narrativas, os quatro
parâmetros da Estrutura (Orientação, Sequência Estrutural, Comprometimento Avaliativo e
Integração) revelam-se superiores ao nível moderado, permitindo afirmar que estes adultos
demonstram: uma boa capacidade de orientação e clarificação do contexto em que as
personagens se movem e do espaço em que ocorrem os acontecimentos, permitindo uma boa
102
compreensão da narrativa; uma boa capacidade de sequenciar temporalmente os
acontecimentos; uma riqueza quanto à forma como se envolvem emocionalmente ao narrarem
os factos, dando um cunho afectivo à narrativa e uma boa capacidade de integração da
informação, dotando a narrativa de um fio condutor que permite aos ouvintes partilharem um
sentido comum.
Na análise comparativa entre as duas tarefas narrativas, percebemos que o valor da
Integração nas narrativas de ficção revelou ser significativamente mais elevado do que o valor da
Integração nas narrativas autobiográficas, facto que pode ter sido facilitado pela visualização do
livro no momento de narrar, contribuindo para aumentar a capacidade de integrar a narrativa
num todo coerente.
O Conteúdo apresenta-se como a segunda Dimensão mais elevada onde as Personagens e
os Acontecimentos se apresentam acima do nível moderado nas duas narrativas e ainda os
Cenários nas narrativas de ficção, conotando com diversidade de conteúdos as experiências
narradas. Quanto ao parâmetro Temas, o facto de se situar abaixo do nível moderado em ambas
as narrativas, parece poder ser bem explicado devido às tarefas de elicitação de narrativas
propostas, puderem condicionar o sujeito a limitar-se a um ou dois temas centrais. Apenas as
Personagens revelam diferenças estatisticamente significativas com um valor mais elevado para
as narrativas autobiográficas. Tal resultado pode parecer surpreendente tendo em conta que o
número de personagens existentes no livro que serviu de instrumento à tarefa de indução das
narrativas de ficção ser elevado. No entanto, por esse mesmo motivo, a cotação do Conteúdo
nas narrativas de ficção foi definida por critérios qualitativos, em contraste com os critérios
quantitativos de cotação do Conteúdo das narrativas autobiográficas, de forma a evitar uma
grande disparidade na cotação das Sub-dimensões devido às características inerentes à própria
tarefa. Ou seja, os critérios que definiram a pontuação das Personagens das narrativas de ficção
(que se estabeleceram mais pela riqueza e relevância atribuída à personagem dentro da história,
sendo que a mera nomeação da personagem não seria suficiente para lhe atribuir um ponto)
poderão ter beneficiado a cotação das personagens nas narrativas autobiográficas cuja
nomeação seria tida em conta, desde que a personagem se mostrasse relevante para a história,
não significando, este resultado, que as narrativas autobiográficas tenham o número de
personagens literalmente superior às outras.
103
Por fim, situa-se o Processo, com valores sempre abaixo do nível moderado, à excepção
da Objectivação nas narrativas de ficção que se encontra ligeiramente acima do nível moderado.
Podemos assim perceber que os elementos de expressão das variáveis internas ao nível
sensorial, mas principalmente, ao nível das emoções e dos sentimentos, ao nível da atitude
reflexiva e ao nível da significação da experiência serão aqueles que, embora existentes, serão
menos representativos ou menos expressos na matriz narrativa. Embora a Nota Global do
Processo das duas tarefas narrativas não revele diferenças estatisticamente significativas,
podemos perceber, através de uma análise mais fina, que existem diferenças em todos os pares
das Sub-dimensões, sendo que, o grau de Metaforização e de Subjectivação Cognitiva é mais
elevado nas narrativas autobiográficas e que o contrário sucede para a Subjectivação Emocional
e para a Objectivação. Assim, parece-nos que estes sujeitos quando narram acontecimentos que
experienciaram, apresentam uma maior tendência ou facilidade em narrar aspectos e detalhes
do discurso interno, tais como pensamentos, ideias, desejos, sonhos, hipóteses interpretativas e
em atribuir um significado ao episódio de vida em causa. Por outro lado, encontrou-se uma
maior facilidade na diferenciação de aspectos sensoriais e emocionais nas narrativas de ficção, o
que talvez se possa atribuir ao facto de esses elementos se encontrarem bem representados nas
imagens do livro.
4.2 Comparação das narrativas dos adultos sem psicopatologia e dos adultos
com diagnóstico de perturbação psicológica
Os resultados das narrativas dos adultos sem psicopatologia recolhidas pela presente
investigação foram comparados com dois grupos clínicos, primeiramente, tidos como se de um
só grupo clínico se tratasse e, num segundo momento, tidos como dois grupos com diagnóstico
distinto, nomeadamente, agorafobia e dependência de opiáceos. Para ambas as situações foram
analisadas as Notas Globais e as notas das Sub-dimensões.
Os resultados que decorreram das comparações revelam um padrão equivalente nas três
amostras que reflecte uma maior riqueza da Estrutura, seguida do Conteúdo e, por fim do
Processo. Não obstante a correspondência a nível deste padrão, podemos verificar que os
sujeitos sem perturbação clínica apresentam uma maior riqueza narrativa, distinguindo-se na
104
forma como dão coerência à Estrutura narrativa, como diversificam os Conteúdos narrativos e
como complexificam o Processo narrativo. Este resultado vem ao encontro da nossa expectativa
baseada no pressuposto de que a autoria se encontra inibida quando existe perturbação
emocional. Também de acordo com o esperado, tais diferenças verificam-se tanto quando os
grupos clínicos são comparados como um todo, como quando são tidos como amostras
distintas. Neste caso, como já tivemos oportunidade de ver, os valores dos sujeitos sem
psicopatologia são os mais elevados, seguindo-lhes os sujeitos diagnosticados com agorafobia e,
por fim, os sujeitos com dependência de opiáceos. Ainda assim, verifica-se que as diferenças ao
nível das duas amostras clínicas só têm relevância estatística quanto ao Processo, sendo
precisamente esta a Dimensão a única em que não encontramos diferenças significativas entre o
grupo normativo e o grupo de pacientes com agorafobia. Por este motivo, parece claro que, ao
nível da Estrutura e do Conteúdo as duas amostras clínicas parecem aproximar-se e que, ao
nível do Processo a amostra de sujeitos com agorafobia parece aproximar-se da amostra dos
sujeitos sem psicopatologia que, por sua vez, revela uma maior distância entre a amostra de
sujeitos dependentes de opiáceos.
Vejamos agora com mais detalhe, como esses resultados se traduziram ao nível das Sub-
dimensões.
Ao nível da Estrutura, as diferenças encontradas entre as Sub-dimensões do grupo
normativo e do grupo clínico tido como um todo, são sempre significativas, à excepção do
Comprometimento Avaliativo. Assim sendo, parece claro que os sujeitos diagnosticados com
perturbação clínica apresentaram maior dificuldade em organizar a experiência de forma
coerente, organizada e integrada, embora não difiram dos sujeitos sem psicopatologia, na forma
como se envolvem na narrativa que escolheram para narrar, fazendo adivinhar que esta
capacidade não se encontra comprometida no grupo clínico. Note-se, ainda, que para o grupo
clínico, a Sub-dimensão mais elevada foi precisamente o Comprometimento Avaliativo, enquanto
que no grupo normativo, ainda que as diferenças não tenham relevância estatística, as Sub-
dimensões mais elevadas foram a Orientação e a Integração.
Quanto ao Processo, uma análise mais fina pelas Sub-dimensões, permite-nos verificar
que é apenas ao nível da Objectivação que as narrativas se revelam significativamente mais ricas
para os sujeitos sem psicopatologia. Tal resultado pode revelar uma maior dificuldade dos
105
sujeitos com perturbação clínica em explorar de forma diversificada o mundo sensorial. É ainda
de notar que, ao nível da Subjectivação Emocional e da Metaforização, as notas do grupo clínico
se revelaram superiores às notas do grupo normativo, ainda que sem relevância estatística. Esta
superioridade parece dever-se particularmente ao grupo de sujeitos com agorafobia já que,
quando comparados os três grupos esta amostra é mais elevada dos que as outras amostras no
que toca à Metaforização e à Subjectivação Emocional e é semelhante ao grupo normativo
quanto à Subjectivação Cognitiva. Embora estes valores mais elevados na amostra de pacientes
agorafóbicos possa parecer uma contradição, é importante ter em conta que tais diferenças não
são significativas, enquanto que, a Objectivação se revela significativamente mais elevada na
amostra normativa em relação às duas amostras clínicas e a Subjectivação Cognitiva se revela
significativamente mais elevada na amostra normativa em relação aos sujeitos dependentes de
opiáceos. Ainda que, de uma forma geral, os resultados das várias amostras ao nível do
Processo sejam pobres, os resultados ao nível da Objectivação, sugerem uma maior dificuldade
dos sujeitos com estes diagnósticos clínicos em descrever aspectos externos da experiência e
em explorar a multiplicidade do mundo sensorial e dos sujeitos com diagnóstico de dependência
de opiáceos em apresentarem uma acentuada pobreza, quanto à exploração de pensamentos,
ideias e planos pessoais (Subjectivação Cognitiva).
No que toca à comparação entre as duas amostras clínicas, verificamos que as diferenças
significativas se situam apenas ao nível da Subjectivação Emocional, com valores mais elevados
para os sujeitos com diagnóstico de agorafobia.
Pela análise mais detalhada do Conteúdo, verificamos que os sujeitos com perturbação
clínica revelam uma menor riqueza quanto à diversidade de Personagens, Cenários e Acções,
com valores sempre abaixo do moderado, do que grupo normativo cujos valores se situam no
nível moderado. Quanto à Sub-dimensão Temas, qualquer uma das amostras revela valores
muito abaixo do nível moderado. Tal facto poderá ser justificado pela natureza da tarefa de
Elicitação de Narrativa Autobiográfica utilizada nas três amostras que, ao convidar à narração de
um episódio de vida, parece condicionar o sujeito a limitar-se a um ou dois temas centrais.
Em resumo, podemos afirmar que se verificou uma tendência para uma maior riqueza
narrativa no grupo sem psicopatologia, seguido do grupo dos sujeitos com diagnóstico de
agorafobia e, por fim, o grupo dos sujeitos diagnosticados como dependentes de opiáceos,
106
revelando as narrativas mais pobres em todas as Dimensões. Detalhando essas diferenças
percebemos que é precisamente ao nível das Dimensões cuja riqueza da amostra normativa é
maior, isto é, ao nível da Estrutura e do Conteúdo, que se encontra um maior distanciamento
relativamente às amostras clínicas. Quanto ao Processo que revelou ser a Dimensão cujos
valores foram mais pobres nas três amostras, as diferenças foram menos acentuadas.
O facto de aumentarmos o conhecimento quanto às especificidades de cada uma das
amostras clínicas poderá ser útil na tomada de decisão do terapeuta que adopte como medida
de intervenção a exploração da riqueza das Sub-dimensões da matriz narrativa.
4.3 Análise do desenvolvimento narrativo
A análise do desenvolvimento narrativo teve em conta as diferenças encontradas ao nível
da Estrutura, do Processo e do Conteúdo nas narrativas de ficção em diferentes Etapas de
Desenvolvimento, a infância, a adolescência e a idade adulta, bem como a avaliação da
tendência evolutiva ao longo dos diversos Grupos Etários dentro de cada uma dessas Etapas.
Verificamos uma diferença essencial no que toca aos resultados encontrados entre as
crianças, os adolescentes e os adultos: enquanto que, para os adolescente e adultos a dimensão
mais elevada corresponde à Estrutura, seguida do Conteúdo e por fim do Processo, para as
crianças, a Dimensão com valores mais elevados corresponde ao Conteúdo, seguido da
Estrutura e, por fim, do Processo, este com valores francamente baixos. Isto poderá indicar que,
pelos 11-12 anos de idade o perfil narrativo começa a assemelhar-se ao perfil narrativo dos
adultos, embora ainda com diferenças quanto à sua riqueza, como veremos de seguida. O facto
das crianças até aos 10 anos de idade obterem resultados mais elevados para a Dimensão
Conteúdo coincide com a ideia de que as crianças começam por enumerar e descrever o que
vêem e, só mais tarde, se debruçam sobre os aspectos emocionais e metacognitivos dos
acontecimentos (Peterson & McCabe; Umiker-Sebeok cit. in Freitas, 2005). Poderemos ainda
acrescentar que só mais tarde alcançam mestria nos aspectos organizadores e integradores dos
mesmos, questão igualmente referida pelos autores que assumem que a expressão da evolução
estrutural se encontram essencialmente a partir dos 11 anos de idade (Marchesi; Stein e Glenn,
cit. in Freitas, 2005).
107
Debrucemo-nos, agora, sobre cada uma das Dimensões por Etapa de Desenvolvimento e
por Grupo Etário. Para isso, teremos em conta os resultados obtidos neste estudo, bem como os
resultados obtidos nas já referidas investigações de Alexandra Freitas (2005) com crianças e de
Carla Rocha (2005) com adolescentes.
Relativamente à Estrutura, verificamos uma nítida evolução das narrativas das crianças
para as narrativas dos adolescentes e uma evolução, embora menor, destes para os adultos que
apresentam a pontuação mais elevada. Ao nos debruçarmos sobre os valores de cada um dos
Grupos Etários, observamos que, é esta a Dimensão cuja evolução desde as crianças mais
novas aos adultos mais velhos é maior, bem como uma evolução a par com Grupo Etário
estudado. Embora não tenhamos tido condições para fazer uma análise válida estatisticamente
para os nove Grupos Etários, se relembrarmos os resultados obtidos para as crianças (Freitas,
ibidem), para os adolescentes (Rocha, ibidem) e para os adultos, poderemos tecer as seguintes
considerações: nas crianças existe uma progressão significativa ao nível da Estrutura entre todos
os Grupos Etários (dos 3-4 aos 9-10 anos de idade); nos adolescentes entre os 11-12 e os 14-15
anos existe evolução embora não significativa, passando a sê-lo quando estes são comparados
com os jovens de 17-18 anos; quanto aos adultos, as ligeiras diferenças entre os Grupos Etários
(no sentido ascendente) não são significativas; os valores dos jovens de 17-18 anos não se
apresentam muito distantes dos valores dos adultos de 20-25 anos. Estes dois últimos dados
levam-nos a crer que, ou a partir dos 17-18 ou dos 20-25, pelo menos até aos 45 anos de idade,
as características ao nível da Estrutura não sofrerão grandes alterações. Ainda assim, ao nível
das Sub-dimensões, os adolescentes mais velhos (Rocha, ibidem) revelam valores moderados e
os adultos, como amostra global, valores entre o moderado e o elevado.
No geral, estes dados parecem coincidir com os resultados de estudiosos que indicam
que, pelo terceiro ano de vida parece já emergir uma função narrativa (Russel & Van der Broek;
Reilly e colaboradores, cit. in Freitas, ibidem), que permite à criança a criação de histórias
acerca dos acontecimentos com que se vai confrontando, ainda que a sua coerência estrutural
seja menor do que a de um adulto ou de um adolescente (McKeough & Generaux, 2003;
Berman cit. in Freitas, 2005). Na mesma linha, encontram-se os estudos que indicam que ao
longo da adolescência a coerência narrativa emerge com um maior número de ligações causais
nas narrativas (Habermans & Paha cit. in Rocha, 2005) e com uma maior capacidade para
108
construir narrativas que envolvem múltiplas dimensões e sub-histórias (McKeough & Genereux,
2003).
No que diz respeito ao Processo encontramos, tal como para a Estrutura, uma nítida
evolução das narrativas das crianças para as narrativas dos adolescentes. Em relação a estes
últimos, encontraram-se valores bem distintos quando os jovens de 11-12 e 14-15 são
comparados com os adolescentes mais velhos que, por sua vez, revelam valores quase idênticos
aos apresentados por todos os Grupos Etários dos adultos e, no caso dos adultos, embora os
valores progridam ligeiramente entre si, os de 20-25 e os de 26-30 anos apresentam valores até
ligeiramente abaixo dos valores dos adolescentes mais velhos. Desta forma, parece que, a
evolução nesta Dimensão se faz sentir até ao final da adolescência, momento a partir do qual
parece estabilizar-se. Assim sendo, a diferença estatisticamente significativa entre os
adolescentes e os adultos, para o Processo, parece ser melhor explicada pelos valores mais
baixos apresentados pelos adolescentes mais novos. Tal como referem MacKeough e Generoux
(2003) entre os 10, 12, 14 e 17 anos de idade percebe-se um salto na compreensão sócio-
psicológica narrativa, passando da compreensão intencional para uma maior compreensão
interpretativa, nomeadamente, os adolescentes de 17 anos apresentam maior facilidade em
adoptar uma meta-posição da experiência humana de forma consciente e deliberada, mais do
que adolescentes de 14 anos.
Quanto ao Conteúdo, a análise comparativa entre as três Etapas de Desenvolvimento
mostra que as crianças se distanciam significativamente dos adolescentes e dos adultos que,
por sua vez, funcionam como um grupo homogéneo. Esta é a Dimensão que mais se distingue
das outras duas pela tendência evolutiva parecer ser, por um lado, menos linear em relação aos
Grupos Etários e, por outro, menos evidente, devido à menor variabilidade entre as notas. Por
exemplo, as notas das crianças de 6-7 anos, não revelam uma grande distância entre as notas
dos adolescentes e as dos adultos. Assim, sabemos existir uma progressão significativa entre as
crianças de 3-4 e as de 6-7 anos, mas o mesmo não acontece destas para as de 9-10 anos,
onde os valores aumentam mas sem relevância estatística (Freitas, 2005). Por outro lado, os
valores dos adolescentes de 11-12 e 14-15 anos são muito semelhantes aos valores das
crianças de 6-7 anos e até ligeiramente inferiores aos das crianças de 9-10 anos. Por esse
motivo, pensamos não existir progressão dos 6-7 aos 14-15 anos. Os adolescentes de 11-12
anos revelam um valor ligeiramente superior do que os de 14-15 anos, verificando-se apenas
uma ligeira evolução significativa entre estes dois grupos e o de 17-18 anos de idade, embora as
109
diferenças com os de 11-12 sejam apenas marginalmente significativas (Rocha, 2005). Os
resultados dos adultos apresentam-se ligeiramente inferiores aos dos adolescentes mais velhos,
embora algo aproximados, sendo os adolescentes mais velhos e os adultos mais velhos, os que
apresentam um valor global mais elevado e muito aproximado. Os adolescentes de 17-18 anos
apresentam valores das Sub-dimensões entre o baixo, o moderado e elevado (Freitas, 2005) e os
adultos no geral, situam-se nos valores moderados, à excepção dos Temas para ambas as
Etapas de Desenvolvimento, que apresentam valores baixos, provavelmente pelos motivos já
expostos. Assim, temos condições para supor que existe uma tendência evolutiva dos 3-4 aos 6-
7 anos, que se estabilizará até aos 14-15 e uma nova progressão até aos 17-18 anos, sem
grandes alterações até aos 45 anos de idade.
Ainda a propósito das diferenças na matriz narrativa ao longo do desenvolvimento, importa
referir a influência das variáveis sócio-demográficas Sexo e NSC (nível sócio-cultural). O Sexo
parece não determinar a riqueza das narrativas nas crianças (Freitas, ibidem), embora os valores
mais elevados nas raparigas, adivinhem já as diferenças que passam a ser um factor de
influência significativa na riqueza narrativa dos adolescente (Rocha, ibidem), sendo mais
evidente ao nível da Estrutura, onde todas as Sub-dimensões são estatisticamente superiores
nas raparigas. Como defendem alguns autores, estas diferenças entre os sexos poderão estar
mais associadas ao facto dos pais tenderem a contar histórias acerca de acontecimentos
passados a crianças do sexo feminino e do sexo masculino de formas distintas (Fivush, 1994;
Mackeough e Generaux, 2003), sendo que os pais tenderiam a contar às raparigas, mais do que
aos rapazes, histórias com maior conteúdo emocional (Fivush, 1994; Chance e Fiese, cit. in
Rocha, ibidem;) e com mais informação acerca de significados pessoais (Fivush, 1994).
Quanto aos adultos, verificamos valores masculinos ligeiramente superiores aos femininos,
no entanto sem qualquer relevância estatística. Este resultado parece consistente com alguns
estudos com adultos onde a influência da variável sexo não se manifestou significativa,
nomeadamente ao nível da estrutura e coerência (Kemper e colaboradores, 1999; Breager e
McAdams, 1999).
Quanto à variável NSC (medida pelo número de anos de estudo dos pais), revelou não ser
determinante na produção narrativa nas crianças (Freitas, 2005) e nos adolescentes (Rocha,
2005). No entanto, o NSC (medido pelo número de anos de estudos dos próprios) manifestou
110
ter um efeito na determinação das narrativas dos adultos, onde os resultados foram indicadores
de que na Estrutura e no Conteúdo, o NSC Médio e Alto funcionam como um grupo homogéneo
(embora o NSC Alto detenha os valores mais elevados) traduzindo-se em narrativas mais ricas do
que as narrativas dos sujeitos de NSC Baixo. Quanto ao Processo existem diferenças
significativas em todos os grupos sendo que, aos NSC mais elevados correspondem valores
superiores de complexidade narrativa. Da mesma forma, num estudo realizado com adultos por
Kemper e colaboradores (1999), os sujeitos com maior número de anos de educação formal e
com mais vocabulário produziram frases maiores e narrativas com um maior número de ideias
integradas. Num outro estudo realizado por Breager e McAdams (1999) com adultos, os
resultados revelaram que o nível de educação se encontrava modestamente correlacionado com
a coerência da história de vida. Spinillo e Martins (cit. in Fabíola Gonçalves & Dias, 2003) ao
analisarem narrativas de crianças entre os 6 e os 7 anos de idade, de nível socio-económico
médio mas com distintos níveis de alfabetização revelaram que a dificuldade encontrada em
todas as crianças em relacionar e integrar o desfecho da história com os eventos anteriormente
narrados, foi menos evidente nas crianças alfabetizadas. Fabíola Gonçalves e Dias (2003)
através do mesmo sistema de análise do estudo anterior, verificaram, numa amostra de jovens e
adultos com dois níveis de alfabetização distintos, que os resultados eram consistentes com a
ideia de que a escolarização formal e sistemática (especialmente no que diz respeito à aquisição
da leitura e da escrita), permite o desenvolvimento da habilidade de produzir oralmente textos
mais coerentes. As autoras realçam, ainda, o facto de, tanto os adultos que apresentavam
menor escolarização, como as crianças de uma forma geral, mas especialmente as menos
escolarizadas, terem apresentado como maior dificuldade o relacionamento do desfecho da
história com o evento principal e com os episódios narrados ao longo da história. Não obstante
estes resultados, as autoras ressaltam o facto de as narrativas orais dos jovens e adultos sem
escolarização se situarem em níveis mais elaborados de coerência do que as narrativas orais das
crianças, mesmo as com níveis de escolaridade superior, supondo que, para além da
escolaridade, outros factores, de que são exemplo, o conhecimento do mundo, o conhecimento
partilhado, factores pragmáticos, etc., influenciam a produção de histórias mais coerentes.
É ainda se salientar que alguns autores referem as competências narrativas das crianças
ao nível do pré-escolar como excelentes preditores do futuro sucesso escolar (Peterson, Josso, e
McCabe, cit. in Freitas, 2005). Por estes motivos, permitimo-nos colocar a hipótese de que os
resultados da presente investigação que apontam no sentido de que o número de anos de
111
estudo contribuiu para uma maior riqueza da matriz narrativa, poderá ser reflexo de duas
influências distintas, mas que podem interferir dialecticamente: 1) que um maior número de
anos de estudo influencia positivamente a expressão narrativa e/ou 2) que sujeitos cuja riqueza
narrativa é mais acentuada, tenderão a ter mais sucesso escolar, aumentando assim a
probabilidade de prosseguirem os estudos.
Passemos agora a resumir os resultados, dando destaque àqueles que nos parecem mais
pertinentes no quadro da presente investigação.
Ao nível da organização narrativa dos adultos o perfil encontrado tanto nas narrativas
autobiográficas como nas narrativas de ficção evidenciou a Estrutura como a dimensão mais
elevada, (e com valores das Sub-dimensões acima do moderado), seguindo-se o Conteúdo e por
fim o Processo. Ao nível da comparação com adultos com diagnósticos clínicos, nomeadamente
de agorafobia e de dependência de opiáceos, verificou-se, de acordo com o esperado, que,
embora o referido perfil seja idêntico, a amostra normativa apresenta valores significativamente
mais elevados nas três dimensões. Encontra-se uma excepção no Processo quando
comparamos a amostra normativa com a amostra de sujeitos com agorafobia, pois, embora os
valores da primeira sejam mais elevados, a diferença não se revelou significativa.
Sobre o desenvolvimento da matriz narrativa, podemos dizer que este estudo será,
provavelmente, o único que, até ao momento, permite verificar a tendência evolutiva da
organização narrativa desde a infância até à vida adulta. Assim, verificou-se que o perfil
encontrado para os adultos ao nível das Dimensões dá continuidade ao encontrado nas
narrativas de ficção dos adolescentes (Rocha, 2005) e se distingue do encontrado nas crianças
(Freitas, 2005), nas quais o Conteúdo é a dimensão mais elevada, seguida da Estrutura e, por
fim do Processo. Ao compararmos as três Etapas de Desenvolvimento, podemos afirmar que, de
uma forma geral, existe uma progressão significativa ao nível da Estrutura e do Processo, sendo
que, ao nível do Conteúdo, a progressão significativa se verificou apenas entre as crianças e os
outros dois grupos, adolescentes e adultos. Na análise da tendência evolutiva ao nível dos nove
Grupos Etários estudados, verificamos que, na Estrutura os valores mais elevados correspondem
aos Grupos Etários mais elevados. Por outro lado, sabemos que, entre os três Grupos Etários
dos adultos essa progressão não é significativa ao nível das três Dimensões, indo ao encontro de
estudos anteriores que apontam para a não existência de variações da produção narrativa em
112
adultos, em função da idade (e.g., Breager e McAdams, 1999). Já ao nível do Processo e do
Conteúdo narrativos a tendência evolutiva parece finalizar pelos 17-18 anos.
Quanto à influência de outras variáveis, no que toca ao sexo, os estudos parecem ser
indicadores de as diferenças com vantagem para o sexo feminino se iniciarem na infância
(Freitas, 2005), acentuarem na adolescência (Rocha, 2005) e se esbaterem na idade adulta. No
que diz respeito ao NSC, este revelou-se sem influência em amostras de crianças (Freitas, 2005)
e adolescentes (Rocha, 2005) quando é tido em conta o nível de escolaridade dos pais, embora
se tenha revelado significativo nos adultos, mostrando que o seu grau de escolarização poderá
ter como efeito a produção de narrativas mais ricas.
115
CONCLUSÕES
Um mestre (…) é alguém que vê o dia como uma oportunidade no tempo para criar
avenidas de realidade, emoções que ainda não surgiram, realidades que ainda não
nasceram, de modo tal que o dia se converta numa fecundação de infinitas manhãs.
Excerto do documentário
What the Bleep Down the Rabbit Hole do We Know?
Terminado mais um percurso na investigação e no desejo de que tudo o que foi dito se
enquadrará, um dia, noutros percursos vindouros, cabe agora tecer algumas conclusões e traçar
outras considerações que deitem um olhar sobre o futuro.
Pretendemos com a presente investigação conhecer de que forma os adultos organizam
narrativamente a sua experiência ao nível das três Dimensões centrais da narrativa, propostas
por Gonçalves (2000), Estrutura, Processo e Conteúdo. Propusemo-nos, ainda, a distinguir estes
sujeitos daqueles que revelam um diagnóstico clínico, tentando perceber de que forma as
diferenças esperadas se faziam sentir. Por fim, considerámos a necessidade de desenhar a
tendência evolutiva da organização narrativa ao longo de diferentes idades, mais
especificamente, desde a infância até à vida adulta, sem esquecer de que forma variáveis como
o Sexo e o Nível Sócio-cultural (NSC) exerceram uma influência diferente de acordo com a faixa
etária estudada.
Os dados obtidos pela análise de adultos entre os 20 e os 45 anos de idade que se
submeteram às tarefas de Elicitação de Narrativa Autobiográfica e de Indução de Narrativa de
Ficção, indicam-nos que o seu perfil narrativo se caracteriza por uma maior riqueza ao nível da
Estrutura, dotando-a de elementos que revelam uma boa orientação e clarificação do contexto
em que as personagens se movem e do espaço em que ocorrem os acontecimentos, uma boa
capacidade para sequenciar temporalmente os acontecimentos, uma riqueza quanto ao cunho e
envolvimento afectivo no acto de narrar e, por fim, uma boa capacidade de integrar os diferentes
episódios que compõe a narrativa num todo coerente. O Conteúdo mostrou-se a segunda
dimensão mais elevada, revelando riqueza na diversidade de Personagens, de Acontecimentos e
de Cenários narrados. O facto dos Temas terem sido excepção a esta regra, parece-nos prender-
116
se com questões metodológicas relacionadas com as tarefas de elicitação e de indução
narrativas que, como já referimos, parecem restringir a diversidade temática. O Processo
revelou-se a dimensão com valores mais pobres ao nível da organização da matriz narrativa,
deixando adivinhar que os elementos de expressão das variáveis internas (sensações, emoções,
pensamentos e significação da experiência) serão aqueles que, embora existentes, se encontram
menos representados.
Consideramos que a utilidade da análise da organização do discurso ao nível das
narrativas autobiográficas em adultos sem psicopatologia, se prende com a possibilidade de
comparação com grupos clínicos. Neste contexto efectuámos comparações com sujeitos com
diagnóstico de agorafobia e com sujeitos com diagnóstico de dependência de opiáceos. Embora
nas três amostras a Estrutura se apresente como a Dimensão mais rica, seguida do Conteúdo e
do Processo, foi possível verificar diferenças consideráveis entre a amostra normativa e as
amostras clínicas. Assim, indo ao encontro da teoria preconizada por Gonçalves (2000) que
defende que da incapacidade do sujeito para construir a sua experiência de uma forma múltipla
e criativa, emerge a perturbação psicológica, podemos dizer que:
- de uma forma geral, os adultos sem perturbação psicológica distinguiram-se pela forma
mais rica como dão coerência à Estrutura narrativa, como diversificam os Conteúdos narrativos e
como complexificam o Processo narrativo. É de referir que as duas amostras clínicas parecem
aproximar-se substancialmente no que toca à Estrutura e ao Conteúdo, enquanto que, no que diz
respeito ao Processo, estes dois grupos distanciam-se de forma significativa. Por outro lado, o
grupo normativo não se chega a diferenciar significativamente dos valores dos pacientes com
agorafobia ao nível do Processo;
- especificamente, no que toca à Estrutura, os sujeitos diagnosticados com as referidas
perturbações clínicas apresentaram maior dificuldade em organizar a experiência de forma
coerente, organizada e integrada. Curiosamente, verificámos que, no que toca à sub-dimensão
Comprometimento Avaliativo os sujeitos com psicopatologia parecem não diferir dos adultos sem
perturbação psicológica na forma como se envolvem na produção narrativa;
- ao nível do Processo, a análise das Sub-dimensões revela que a amostra normativa
obteve valores de Objectivação mais elevados do que as duas amostras clínicas e que a
Subjectivação Cognitiva se manifestou mais elevada em relação aos sujeitos dependentes de
opiáceos. Embora de uma forma geral, os resultados da amostra normativa ao nível do Processo
117
se tenham revelado pobres, estas diferenças encontradas ao nível das Sub-dimensões
transparecem uma maior dificuldade dos sujeitos com estes diagnósticos clínicos em descrever
aspectos externos da experiência e em explorar a multiplicidade do mundo sensorial e, ainda,
uma maior dificuldade dos sujeitos com diagnóstico de dependência de opiáceos em explorar
pensamentos, ideias e planos pessoais;
- por fim, a análise mais detalhada do Conteúdo diz-nos que os sujeitos com perturbações
clínicas revelaram uma menor riqueza quanto à diversidade de Personagens, Cenários e Acções
do que o grupo normativo, o mesmo não se verificando quanto aos Temas, provavelmente pelo
motivo já explicitado, de que a tarefa de elicitação de um episódio de vida, condicione a narrativa
a uma ou duas temáticas. Estes resultados reforçam a ideia de que, da dificuldade ou da
incapacidade de construir narrativas dotadas de diversidade de Conteúdo emergem narrativas
menos flexíveis e menos adaptadas, conferindo-lhe a prototipia típica da perturbação psicológica
(Gonçalves, 2000).
No futuro, grupos de sujeitos com diferentes diagnósticos poderão ser alvo de comparação
com os resultados dos adultos sem diagnóstico clínico, possibilitando perceber, igualmente, o
que os distingue ao nível das Dimensões e Sub-dimensões da matriz narrativa. O facto de
aumentarmos o conhecimento quanto às especificidades de cada uma das amostras clínicas
poderá ajudar o terapeuta que adopte como medida de intervenção a exploração da riqueza da
matriz narrativa. Outra possibilidade de análise futura poderá prende-se com o estudo da relação
entre os valores das dimensões da matriz narrativa com medidas de satisfação e bem-estar
psicológico, tal como foi já realizado noutras investigações, embora com sistemas de análise
narrativa diferente, nomeadamente ao nível da coerência narrativa (e.g., McAdams, Lensky,
Daple & Allen, cit. in Baerger e McAdams, 1999; Baerger e McAdams, 1999; Russel e Wandrei,
cit. in Henriques, 2000). Seria ainda interessante estudar em que medida a estimulação das
diferentes Dimensões em distintas formas de prototipia narrativa contribui para uma melhoria do
estado emocional.
Uma segunda utilidade da análise da organização narrativa dos adultos, prende-se com o
facto de permitir traçar de que forma evoluímos quanto ao modo de significar a experiência ao
longo da vida. Como sabemos, vários autores apontam a tendência evolutiva do acto de narrar,
sugerindo que, pelo três anos de idade emerge uma função narrativa que se complexifica e
enriquece até ao final da adolescência (e.g., Reilly et al., 1998; McKeough & Generoux, 2003)
118
Embora pareça existir quase um vazio quanto ao estudo da organização narrativa em adultos,
alguns autores salientam que o contar de histórias não sofre variações ao longo da vida adulta
(Breager e McAdams, 1999). Da mesma forma, o nosso estudo revelou que, entre os três
Grupos Etários estudados nos adultos (20-25, 26-30, 35-45 anos de idade) não se encontraram
diferenças significativas na matriz narrativa.
A análise das narrativas de ficção de adultos permitiu procedermos à comparação com as
narrativas de ficção de crianças e de adolescentes cujos resultados se encontram apresentados
nos estudos de Alexandra Freitas (2005) e de Carla Rocha (2005), respectivamente. Desta
forma, foi possível traçar a tendência evolutiva das três Dimensões da matriz narrativa em
crianças desde os 3-4 anos de idade até adultos entre os 35-45 anos de idade. Globalmente, os
dados apontam no sentido de uma tendência de evolução positiva na forma como a coerência da
Estrutura, a complexidade do Processo e a multiplicidade do Conteúdo são articuladas desde os
três anos de idade até à idade adulta, muito embora o Conteúdo pareça não se distinguir na sua
riqueza quando comparamos os adolescentes com os adultos, sendo a dimensão cuja evolução
ao longo do desenvolvimento parece ser menos vincada. Mais especificamente, a Estrutura
parece ser a dimensão cuja evolução é mais evidente: se até aos 10-11 anos esta dimensão se
apresenta em segundo lugar de destaque, com vantagem para o Conteúdo, (Freitas, 2005), a
partir dos 11-12 anos de idade, tanto adolescentes (Freitas, 2005) como adultos apresentam
valores mais elevados ao nível da Estrutura, seguida do Conteúdo e por fim do Processo. Os
valores obtidos por cada um dos nove Grupos Etários revelam que a coerência da Estrutura
obtém valores superiores a par com a idade, que os valores da complexidade do Processo vão
aumentando até aos 17-18 anos e de novo aos 35-45 anos e que, a diversidade do Conteúdo
parece aumentar durante a infância e, posteriormente, aos 17-18 anos de idade. Uma vez que o
número de sujeitos das amostras não possibilitou a realização de análises estatísticas válidas
para tantos sub-grupos de sujeitos, esperamos que, outros estudos que se debrucem na
comparação entre os nove grupos etários estudados, por alargamento das respectivas amostras
e ainda, numa análise mais detalhada das diferenças apresentadas ao nível das Sub-dimensões,
possam elucidar quanto à melhor forma de conceptualizar essa tendência. Seria ainda
interessante alargar o estudo das três dimensões centrais da matriz narrativa a uma amostra de
sujeitos com mais de 45 anos, verificando de que forma difere a organização narrativa em
adultos mais velhos.
119
Por fim, importa salientar outros aspectos que foram alvo de análise e que poderão,
igualmente, trazer novas perspectivas de investigação. A análise de variáveis como o Sexo e o
Nível Sócio-cultural nas crianças, adolescentes e adultos permitiu-nos considerar os seguintes
aspectos: a riqueza das narrativas das crianças não parece variar em função do sexo (Freitas,
2005) embora valores mais elevados nas raparigas, adivinhem as diferenças significativas que
se vêm a encontrar entre rapazes e raparigas na adolescência (Rocha, 2005), com maior
destaque para a Estrutura. Já nos adultos, verificámos valores dos homens ligeiramente
superiores aos das mulheres, embora sem qualquer relevância estatística. Estes resultados vão
ao encontro das investigações que realçam as diferenças encontradas por sexo, na produção
narrativa de crianças e de adolescentes e que tendem a ser explicadas como resultado da
tendência dos pais para contarem as histórias do passado de forma distinta consoante o façam
a crianças do sexo feminino ou do sexo masculino (e.g., Fivush, 1994; Mackeough e Generaux,
2003) e, ainda, de outras que referem que a variável sexo não determina diferenças na
organização narrativa dos adultos, nomeadamente ao nível da coerência (e.g., Kemper e
colaboradores, 1999; Breager e McAdams, 1999). Estudos ulteriores talvez nos permitam
perceber o que conduz a que esta tendência se acentue na adolescência e se esbata na vida
adulta.
Quanto à outra variável estudada, NSC, os resultados também não foram consistentes ao
longo do desenvolvimento e parece encontrar-se mais do que uma tendência nas investigações.
O NSC revelou não produzir um efeito significativo na produção das dimensões da matriz
narrativa das crianças (Freitas, 2005) e dos adolescentes (Rocha, 2005), no entanto, manifestou
influenciar a produção narrativa dos adultos, sendo que, no geral, os sujeitos dos níveis médio e
alto revelaram narrativas mais ricas do os de nível baixo. Outros estudos que tiveram em conta o
número de anos de estudos dos adultos encontraram relações entre um maior número de anos
de educação formal e de maior riqueza de vocabulário com a produção de frases maiores e de
narrativas com um maior número de ideias integradas (Kemper e colaboradores, 1999) e, ainda,
com uma maior coerência da história de vida (Breager e McAdams, 1999). Neste ponto, importa
referir que, o facto de alguns estudos, nomeadamente os que acabámos de referir realizados
com crianças e adolescentes operacionalizarem o NSC através da escolaridade dos pais,
enquanto que outros, nomeadamente na nossa amostra de adultos, o fazerem através do nível
de escolaridade ou anos de estudo dos próprios sujeitos, poderá determinar resultados
diferentes dos encontrados para aquelas faixas etárias. Por outro lado, o facto de ser difícil
120
encontrar crianças da mesma idade com níveis de escolaridade distintas sem que entrem em
jogo outro tipo de variáveis (tais como dificuldades de aprendizagem, deficiência mental, ou
outras que adivinhem trajectórias de desenvolvimento difíceis) dificulta perceber se as diferenças
se devem ou não à forma como a variável NSC foi operacionalizada. Ainda assim, estudos que
avaliaram a produção narrativa em crianças entre os 6-7 anos de idade (Spinillo e Martins, cit. in
Fabíola Gonçalves & Dias, 2003) e em adultos (Fabíola Gonçalves e Dias, 2003) com níveis de
escolarização distinta, corroboram a ideia de que os sujeitos menos alfabetizados revelaram
maior dificuldade em relacionar e integrar o desfecho da história com os eventos anteriormente
narrados. No entanto, como defendem as autoras, o facto de as narrativas orais dos jovens e
adultos sem escolarização se situarem em níveis mais elaborados de coerência do que as
narrativas orais das crianças, mesmo as mais escolarizadas, parece indicar que, para além da
escolaridade, outros factores, como o conhecimento do mundo, o conhecimento partilhado,
factores pragmáticos, etc., influenciam a produção de narrativas mais coerentes. Para além
disso, é ainda de salientar o facto das competências narrativas das crianças ao nível do pré-
escolar serem excelentes preditores do futuro sucesso escolar (Peterson, Josso, e McCabe, cit.
in Freitas, 2005) facto que poderá, em parte, condicionar o ingresso em níveis de escolarização
média ou superior daqueles sujeitos que apresentam, à partida, uma maior riqueza narrativa.
Desta forma, consideramos a influência da escolarização na organização narrativa ainda um
tema ambíguo, almejando que futuros estudos possibilitem novas conceptualizações.
Em conclusão, esperamos que, ao aumentarmos o conhecimento sobre a tendência
evolutiva da organização narrativa ao longo da vida e sobre a influência protagonizada por conta
de diferentes variáveis, estejamos a contribuir para a identificação do que é esperado em
determinada idade ao nível da produção narrativa. Por outro lado, na medida em que
possibilitámos a existência de um grupo de controlo e, em consequência disso, o conhecimento
do que distingue o acto narrativo de sujeitos com e sem psicopatologia, esperamos ter dado um
passo na compreensão da psicopatologia e na selecção de melhores opções terapêuticas. Nesta
linha de raciocínio, antevemos a possibilidade futura de se estabelecerem medidas cada vez
mais adequadas a sujeitos cujas diferenças na matriz narrativa, sugerem distintas formas de
disfuncionamento psicológico ou prototipia.
121
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Organização Narrativa em Adultos
Óscar Gonçalves & Laura Bettencourt Universidade do Minho
& Margarida Rangel Henriques
Universidade do Porto
Exmo. Sr.
Presidente do Conselho Directivo da
Escola Superior de Enfermagem Dr. Ângelo da Fonseca
Professor Doutor António Couto
Vimos por este meio solicitar a Vossa colaboração num projecto de investigação que está a ser desenvolvido
no âmbito do grupo de estudos “3N Project: Nurturing Nature with Narrative” coordenado pelo Professor Doutor
Óscar Gonçalves da Universidade do Minho e pela Professora Doutora Margarida Rangel Henriques da Universidade
do Porto, o qual se tem dedicado à compreensão do desenvolvimento narrativo e das suas perturbações. Mais
especificamente, trata-se de um estudo a ser desenvolvido pela licenciada Laura Bettencourt Ferreira, cujo objectivo
é estudar a forma como os adultos contam histórias e experiências da sua vida em diferentes faixas etárias.
A realização do estudo implica o recrutamento de sujeitos com idade compreendida entre os 20 e 45 anos,
para que lhes seja realizada uma entrevista de recolha de narrativas (com a duração aproximada de 30 minutos), a
qual será audio-gravada. Todos os dados recolhidos são de carácter confidencial e apenas serão divulgados os
resultados globais por grupos de indivíduos.
Assim, solicitamos a V. Ex.a, autorização para o recrutamento de sujeitos na ESEAF, através de um contacto
directo com funcionários da escola ou alunos, bem como, do contacto com grupos de alunos no início das sessões
lectivas, a fim de recolhermos o consentimento de participação voluntária no estudo e os dados sócio-demográficos
dos participantes. Solicitamos, ainda, a utilização das V. Instalações para a aplicação das referidas tarefas, em data
e hora a combinar, de acordo com a disponibilidade dos sujeitos e sem prejuízo do bom funcionamento da Escola.
Atenciosamente,
P’la Equipa de Investigação O Presidente do Conselho Directivo
___________________________ ___________________________
Coimbra, ____ de ____________ de 2006
Organização Narrativa em Adultos
Óscar Gonçalves & Laura Bettencourt
Universidade do Minho &
Margarida Rangel Henriques Universidade do Porto
Declaração de Participação Voluntária
Um grupo de investigadores do Instituto de Psicologia e Educação da Universidade do Minho encontra-se a
realizar uma investigação sob coordenação do Prof. Doutor Óscar Gonçalves e da Professora Doutora Margarida
Rangel Henriques, cujo objectivo é estudar a forma como os adultos contam histórias e experiências da sua vida em
diferentes faixas etárias.
Vimos solicitar a sua colaboração para a administração de tarefas de elicitação de narrativas (que serão
audio-gravadas), com a duração aproximada de 30 minutos.
Todos os dados recolhidos são de carácter confidencial pelo que, apenas serão divulgados os resultados
globais por grupos de indivíduos. A participação é de carácter voluntário, pelo que poderá retirar-se do estudo a
qualquer momento, se o desejar.
Agradecemos desde já a sua disponibilidade,
Atenciosamente,
P’la equipa de investigação O/A Voluntário(a)
_________________________ ________________________
_____________, __ de ____________ de ____
n.º ____ ____
Ficha de Identificação
Nome: _____________________________________________________________
Morada: ______________________________________________________________
Telefone: _______________________ Telemóvel: _______________________
Data de Nascimento (dia/mês/ano): ___ / ___ / ______ Idade _______
Naturalidade: _________________________________________________________
Estado Civil: __________________________________________________________
Profissão: ____________________________________________________________
Situação Actual: estudante desempregado
empregado à procura de emprego
Habilitações Literárias: _________________________________________________
Por favor, responda às seguintes questões, colocando uma cruz (X)
1. Já recorreu a ajuda psicológica ou psiquiátrica?
Sim Não
2. Actualmente, encontra-se em acompanhamento psiquiátrico ou psicológico?
Sim Não
3. Actualmente está a fazer tratamento com medicação psiquiátrica?
Sim Não
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