9
INTRODUÇÃO
O Direito Processual Civil vem sofrendo modificações ao longo dos anos em
decorrência da evolução da sociedade e não diferente disto, o direito probatório vem se
adequando a essas mudanças.
É sabido que o número que ações que tramita perante o Poder Judiciário é
absurdo, não sendo compatível com o número de servidores disponíveis, causando
assim uma grande demora em se obter a solução dos conflitos.
Para solucionar o problema de acúmulo de processos, além da elaboração de
um novo código, o legislador e a doutrina vêm buscando uma maneira de tornar o
processo mais célere, sem prejudicar a aplicação da justiça.
O direito probatório acompanha essas mudanças, permitindo algumas
flexibilizações em suas regras, porém sem perder a sua essência que é de trazer a
verdade real aos fatos para que o julgador possa formar o seu convencimento e decidir
da melhor maneira possível a lide, aplicando corretamente o direito.
Insta salientar, que toda análise feita no presente trabalho, foi com base
exclusivamente bibliográfica, demonstrando os diversos entendimentos, opiniões e
conclusões dos doutrinadores processualistas sobre o tema.
Ademais, o tema apresentado, não trata de todos os institutos pertinentes do
direito probatório, mas sim em particular do ônus da prova no âmbito do processo civil
brasileiro, a fim de demonstrar como esta regra é seguida na prática processual.
10
Assim, somando os conhecimentos adquiridos com o estudo das regras gerais
sobre as provas ao longo deste trabalho, podemos estudar com mais qualidade e
entender melhor como funciona o ônus da prova na atualidade.
1. ÔNUS
1.1. Conceito e Elementos Constitutivos
A palavra ônus vem do latim ‘onus’ que quer dizer carga, peso. Assim,
segundo Luiz Rodrigues Wambier:
O ônus consiste na atribuição de determinada incumbência a um sujeito no
interesse desse próprio sujeito. Ou seja, prescreve-se ao onerado uma conduta
a adotar, pela qual ele poderá obter vantagem ou impedir-lhe uma situação
que lhe seja desfavorável.1
Deste conceito podemos verificar que ônus não possue o mesmo significado de
dever.
Como leciona novamente Luiz Rodrigues Wambier a respeito:
O ônus difere de dever, pois este pressupõe sanção. Melhor dizendo, sempre
que a norma jurídica impõe um dever a alguém, em verdade está obrigando
ao cumprimento, o que gera ao polo oposto da relação jurídica o direito –
correlato e em sentido contrário – de exigir o comportamento do obrigado.
Nada disso ocorre com o ônus, que implica tão somente, no caso de
descumprimento, em uma consequência processual. Há interesse no
cumprimento do ônus da prova. Com ‘interesse’ se quer dizer que a prática
do ato processual favorece à parte. Há interesse em praticá-lo porque se tirará
algum proveito processual com a atividade.2
Assim, verificamos que o ônus é estabelecido em favor do próprio onerado, e o
seu descumprimento faz o que este apenas perca a oportunidade de se valer de uma
1 WAMBIER, Luiz Rodrigues. Curso Avançado de Processo Civil. v.1 9ªed. Sáo Paulo: Revista dos
Tribunais, 2007. p. 415.
2 Id.ibid. p. 438/439.
11
vantagem. Diferente do dever que se caracteriza por uma conduta descrita na lei para
garantir interesse de outrem, gerando o seu descumprimento a imposição de uma
sanção.
Nesse sentido, Ovídio A. Baptista da Silva:
É necessário distinguir ônus de obrigação. A parte gravada com o ônus não
está obrigada a desincumbir-se do encargo, como se o adversário tivesse
sobre isso um direito correspectivo, pois não faz sentido dizer que alguém
tenha direito a que outrem faça prova no seu próprio interesse.3
Por sua vez, Arruda Alvim assim se manifesta:
(...) Outra distinção importante que cabe fazer entre ônus e obrigação é a
circunstância de que esta última ter um valor e poder, assim, pode ser
convertida em pecúnia, o que não corre no que tange ao ônus.4
Desta forma, verificamos que o ônus possue suas particularidades que devem
ser atentamente observadas para que este não seja confundido com outros institutos
jurídicos dada a sua importância no âmbito processual.
2. DISTRIBUIÇÃO DO ÔNUS DA PROVA
De acordo com o artigo 373 do Código de Processo Civil, a distribuição do
ônus da prova, se dá nos seguintes moldes: cabe ao autor a prova dos fatos constitutivos
3 BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A. Curso de Processo Civil. v.1. t.1. 8ªed. Rio de Janeiro: Forence,
2008. p. 207.
4 ALVIM, Arruda. Manual de Direito Processual Civil. v.2. 11ªed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2007. p. 465.
12
do seu direito e ao réu, a existência de fatos modificativos, impeditivos ou extintivos do
direito do autor.
A doutrina clássica representada por Egas D. Moniz de Aragão e Francisco
Cesar P. Rodrigues prega o entendimento de que as regras dispostas no artigo 373 do
CPC são imutáveis pelo legislador, devendo ser extritamente obedecidas. Entretanto, tal
posição vem mudando, através do entendimento da doutrina moderna, uma vez que tal
rigidez no sistema dificulta a adequação do regime da prova no caso concreto.
Já doutrina moderna, composta por Ovídio A. Baptista da Silva, Cândido
Rangel Dinamarco, Misael Montenegro Filho, etc; vem lutando pela flexibilização
dessas regras de distribuição do ônus da prova, com o objetivo de permitir ao
magistrado, que se encontrando em uma situação de desequilíbrio nas condições
probatórias entre as partes, decida de maneira fundamentada por encaixar a distribuição
do ônus da prova no caso em litígio, a parte que tiver melhor condição de produzir a
prova.
Tal modificação não tem o intuito de revogar o direito positivo disposto no
artigo 373 do CPC, mas de complementá-lo de acordo com os princípios inspirados no
ideal de um processo justo, que busca a verdade real e obedece aos deveres da boa-fé e
lealdade que transformam as partes do litígio em cooperadores do juiz no
aprimoramento da boa prestação da tutela jurisdicional.
De qualquer modo, esse relaxamento da regra do art. 373 do CPC depende de
condições particulares de cada caso concreto, que na evolução do processo, permitam
um juízo de verossimilhança em torno da versão de uma das partes, capaz de sugerir a
13
possibilidade do fato ter ocorrido, tal como afirma a parte detendora do ônus da prova,
mas que, nas atuais circunstâncias, demonstre menos capacidade de explicitá-los por
completo.
Diante disso, excepciona-se a regra, permitindo a distribuição dinâmica do
ônus da prova quando, presentes certas circunstâncias já descritas, uma das partes
estiver em melhor condição de produzir a prova que a outra.
Nesse sentido, escreve Antônio Janyr Dall’Agnol que para esta tese é:
[...] (a) inaceitável o estabelecimento prévio e abstrato do encargo; (b)
ignorável é a posição da parte no processo; e (c) desconsideravél se exibe a
distinção já tradicional entre os fatos constitutivos, extintivos, etc. Releva isto
sim: (a) o caso em sua concretude e (b) a ‘natureza’ do fato a provar –
imputando-se o encargo àquela das partes que, pelas circunstâncias reais, se
encontra em melhor condição de fazê-lo.5
Porém, para que essa excepcional posição adotada pelo magistrado não se torne
arbitrária, é necessáro que a decisão que modifique a regra do art. 373 do CPC, seja
feita de maneira racional: o juiz deverá, ao ordenar a inversão, proferir um julgamento
lógico e capaz de fazer compreender atráves de adequada fundamentação, como formou
a sua convicção e quais os elementos que a determinaram.
A teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova deve obedecer alguns
requisitos, quais sejam: a) a parte que suporta o redirecionamento não fica encarregada
5 DALL’AGNOL JUNIOR, Antônio Janyr. Distribuição dinâmica dos ônus probatórios. Revista dos
Tribunais, São Paulo, 788: 92-107.
14
de provar o fato constitutivo da parte contrária; seu objetivo é de esclarecer o fato
controvertido indicado pelo juiz o qual já deve achar-se indicial ou parcialmente
demostrado nos autos, porém se o novo detentor do ônus da prova não desempenhar
bem a tarefa esclarecedora, sairá vencedor aquele que foi aliviado, pelo magistrado, de
produzir a prova; b) a prova redirecionada deve ser possível; se nenhum dos litigantes
tem condição de provar o fato, não se admite que o juiz aplique a teoria da dinamização
do onus probandi; e c) a redistribuição não pode representar surpresa para a parte; de
modo que a decisão deve ser tomada pelo juiz, com a intimação do novo encarregado do
ônus da prova esclarecedora, a tempo de lhe proporcionar a oportunidade de se
desincumbir a contento do encargo.
Assim, a regra da distribuição do ônus da prova, acolhida pelo nosso
ordamentamento jurídico, vem passando por modificações. Entretanto, tais regras de
distribuição do ônus da prova não devem ser vistas com limitações ao poder instrutório
do magistrado. Ao contrário, essas regras buscam uma atuação mais ativa do juiz no
âmbito da instrução do processo, como objetivo de acabar com eventuais desproporções
na produção de provas em cada caso concreto.
3. ÔNUS DA PROVA
3.1 Conceito
No âmbito processual, cabe ao autor alegar na sua petição inicial o fato, ou os
fatos em que se fundamentam o seu pedido, e o réu, o fato, ou fatos, em que se baseiam
a sua defesa.
15
Cândido Rangel Dinamarco conceitua o ônus da prova como sendo:
Ônus da prova é o encargo, atribuído pela lei a cada uma das partes, de
demonstrar a ocorrência dos fatos de se próprio interesse para as decisões a
serem proferidas no processo.6
Cumpre salientar, que no processo civil o ônus de demonstrar os fatos vem
acompanhado do ônus de provar tais fatos, sob pena de não serem considerados
verdadeiros e assim descartados pelo juiz.
O nosso novo Código de Processo Civil, como no anterior, traz apenas um
dispositivo acerca do ônus da prova, que é o art. 373, onde ocorre a sua distribuição
deste encargo entre as partes do processo.
Dispõe o art. 373 do CPC:
“Art. 373. O ônus da prova incumbe:
I - ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito;
II - ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo
do direito do autor.
§ 1o Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa
relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o
encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do
fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde
que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a
oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.
§ 2o A decisão prevista no § 1o deste artigo não pode gerar situação em que a
desincumbência do encargo pela parte seja impossível ou excessivamente
difícil.
6 Id. Ibid. p.71.
16
§ 3o A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por
convenção das partes, salvo quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
§ 4o A convenção de que trata o § 3o pode ser celebrada antes ou durante o
processo.”
Assim para Giuseppe Chiovenda:
O ônus de afirmar e provar se reparte entre as partes, no sentido de que é
deixado à iniciativa de cada uma delas provas os fatos que desejam serem
considerados pelo juiz, isto é, os fatos que tenham interesse que sejam por
este tidos como verdadeiros.7
Nesse sentido Francesco Carnelutti:
Quando um fato é afirmado, cada uma das partes tem interesse em fornecer a
prova, uma da existência e a outra da inexistência, e por isso o interesse na
prova acerca do fato afirmado é bilateral ou recíproco.8
Deste modo, verificamos que o ônus da prova é de suma importância para o
bom andamento do processo, uma vez que é estabelecido de acordo com o interesse do
próprio onerado.
O ônus da prova no processo civil brasileiro respeita três princípios de ordem
processual, quais sejam: o princípio da indeclinabilidade da jurisdição, o princípio
dispositivo e o princípio da persuasão racional na valoração da prova. O primeiro
princípio proíbe o juiz de deixar de proferir uma decisão de mérito a favor ou contra
7 CHIOVENDA, Guiseppe. Instituições de Direito Processual Civil. v.2. 3ªed. São Paulo: Bookselller,
2002. p.448.
8 CARNELUTTI, Francesco. A Prova Civil. 2ªed. São Paulo: Bookseller, 2002. p.260.
17
uma das partes, seja qual for à complexidade da matéria. Segundo o princípio
dispositivo o julgador tem apenas o papel de complementar as provas, quando
necessário cabendo as partes a iniciativa de sua produção. Por fim, se repete o terceiro
princípío da liberdade que o juiz tem de forma a sua convicção, desde que se atente os
fatos constantes no processo e sempre de maneira racional.
Diantes dessas considerações devem ser estabelecidas regras sobre o encargo
que cada uma das partes possui para promover a prova dos fatos que fundamentam o
litígio.
3.2 Origem e evolução
O ônus da prova vem desde o Direito Romano, onde se aplica a regra “semper
onus probandi ei incumbit qui dicit”, que significa que sempre o ônus da prova recai
sobre aquele que diz.
Desta premissa se funda a teoria clássica onde se verifica, que o ônus da cabe
ao autor, pois é ele que ‘diz’, ou seja, ele que leva a lide ao conhecimento do julgador.
Assim, só caberia ao réu o ônus de prova, quando em sua defesa não fosse apenas
apresentado um fato modificativo, impeditivo ou extintivo do autor, mas sim um fato
novo.
Além desta máxima, o direito romano também nos trazia outras regras relativas
às provas, como explica Vicente Greco Filho:
São do direito romano os brocardos: actore non probante, reus absolvitur (se
o autor não fizer prova, absolve-se o réu); probatio incubit qui dicet, non qui
negat (a prova incumbe a quem afirma e não a quem nega); in excipiendo
18
reus fit actor (apresentando exceção, o réu se torna autor); e negativa non
sunt probanda (os fatos negativos não devem ser provados).9
Tais príncipios foram observados por toda época de vigoração do direito
romano. Após a sua queda, surgiu a supremacia do direito germânico, onde o processo
possuia apenas duas fases: a primeira onde o juiz decidia a quem caiba produzir a prova;
e a outra demonstrava o momento em que a parte onerada iria produzir a prova, tal regra
tinha carater formal absoluto, acarretando na maioria das vezes o prejugalmento do
litígio.
Com o direito romano ressurgido, voltou-se a aplicar os antigos princípios por
este pregados, trazendo, entretanto uma nova regra, que limitava a atividade jurisdicinal.
Tal regra estipulava que o julgador deveria julgar com base no que as partes trouxeram
ao processo.
A teoria clássica teve suas idéias aplicadas pelas Ordenações Filipinas, porém
com certa limitação a regra de que os fatos negativos não devem ser provados. Uma vez
que, as negativas em certos casos específicos e determinados podem ser provadas e
assim se tornarem afirmativas.
Perante todas as controvérsias que surgiram ao longo dos anos sobre o tema,
houve uma evolução no que tange a distribuição do ônus das provas, formando assim as
teorias modernas.
9 GRECO FILHO, Vicente. Direito Processual Civil. v.2. 18ªed. São paulo: Saraiva. 2007. p.201.
19
Das teorias modernas sobre o ônus da prova Giuseppe Chiovenda resolve o
problema sobre a distribuição do ônus da prova dizendo que é por meio do interesse que
cada parte possui em provar determinado fato, para que este seja considerado verdadeiro
pelo juiz.
Já Francesco Carnelutti discorda de Chiovenda, defendendo a posição de que o
ônus da prova deve ser dividido não de acordo com o interesse em provar determinado
fato, que é unilateral, mas sim de acordo com o interesse em produzir a prova que é
bilateral, ou seja, um apresenta a prova e o outro a contraprova.
Assim, verificamos que para os doutrinadores atuais a distribuição do ônus da
prova se baseia nos princípios processuais e basicamente aos interesses das partes em
produzir as provas, para buscar a verdade real.
3.3 Classificação do ônus da prova
3.3.1 Ônus objetivo e ônus subjetivo
O ônus subjetivo esta ligado à necessidade da parte provar para se sair
vitoriosa ou das consequências estipuladas para a parte que deveria provar e não o fez.
No aspecto subjetivo verifica-se a oneração da parte com a prova de um fato. Assim,
podemos verificar uma ligação entre a parte que incumbe à prova e a sua alegação dos
fatos.
Já o ônus objetivo é direcionado ao juiz que deve analisar todas as provas
constantes nos autos, independentemente de quem as tenha produzido. O aspecto
20
objetivo do ônus da prova é importante para determinar a que parte cabe a oneração de
produzir a prova relativamente a um fato determinado.
No mesmo sentido, ao tratar de ônus objetivo e ônus subjetivo, Vicente Greco
Filho:
(...) À parte incumbe o ônus da prova de determinados fatos (ônus subjetivo),
mas ao apreciar a prova produzida não importa mais quem a apresentou,
devendo o juiz levá-la em consideração (ônus objetivo)10
3.3.2 Ônus perfeito e ônus imperfeito
O ônus será perfeito quando for descumprida uma ativade processual e deste
descumprimento se verificar a ocorência de uma consequência jurídica causadora de
dano.
Agora, quando o dano for provável, porém não necessário, como por exemplo,
quando uma das partes perder a oportunidade de realizar a prova, estaremos diante do
ônus imperfeito.
Insta salientar que a ocorrência de revelia, não caracteriza necessariamente um
ônus perfeito, uma vez que o artigo 320 do CPC dispõe sobre as hipóteses em que a
ocorrência da revelia não torna verdadeiros os fatos alegados pelo autor em sua petição
inicial.
10 Id.ibid. p.204
21
3.4 Sistema legal brasileiro do ônus da prova
No direito processual civil brasileiro, as regras gerais sobre o ônus da prova
estão dispostas no art. 373 do Código de Processo Civil, que fiel ao princípio do
dispositivo, o distribui da seguinte maneira: incumbe ao autor à prova de fato
constitutivo de seu direito e ao réu o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do
direito do autor.
Assim, cada parte possui o ônus de provar os pressupostos fáticos do direito que
pretende que sejam aplicados pelo magistrado no julgamento da causa. O autor, na
petição inicial, afirma os fatos constitutivos do seu direito, tais fatos são aqueles que na
maioria das vezes causam algum efeito jurídico. A falta de prova ou dúvida em relação
à veracidade dos fatos constitutivos do autor pode fazer com que o juiz sentencie como
improcendente o pedido do autor.
Já ao réu, fica o encargo de provar à existência de fato impeditivo, modificativo
ou extintivo do direito do autor. Tais alegações do réu podem em determinados casos
fazer com que os fatos do autor se tornem incontroversos e como dispõe o inciso III do
art. 374 do CPC, estes fatos não dependem de prova. Vale ressaltar, que as mesmas
regras quanto à falta de prova ou dúvida em relação à veracidade se aplicam ao réu,
umas vez que no processo civil não se aplica o princípio do ‘in dubio pro reo’.
22
Porém, insta salientar, que mesmo que a responsabilidade pela produção da
prova seja do autor, nada impede que o réu manifeste o seu interesse em produzir uma
contraprova.
Deste modo, a regra do art. 373 do CPC, não deve ser interpretada como
absoluta, uma vez que dependendo do caso concreto o juiz pode determinar a
modificação do ônus da prova para melhor atender à aplicação da justiça.
Destas alegações, podemos estabelecer a função do ônus da prova que é a de
estipular as partes na produção das provas e de ajudar na formação do convencimento
do magistrado que ainda esta em dúvida, trazendo a possibilidade da utilização das
regras de disposição do ônus da prova.
Embora o art. 373 do CPC, estabeleça a distribuição do ônus da prova. Existem
casos em que se pode haver a convenção das partes para distribuir o ônus de maneira
diversa. Entretanto, tal convenção sofre limitações, como nos ensina Moacyr Amaral
dos Santos:
São, portanto, adimissíveis convenções regulando o ônus da prova de
maneira diversa da estabelecida no art. 333, salvo quando: a) versar a lide
sobre direitos indisponíveis, já que não podendo a parte confessar os fatos,
sobre sua prova não poderá dispor; b) tratando-se de convenção que torne
excessivamente difícil o exercício do direito; ao juiz cumprindo resolver caso
por caso, pois a matéria se converte numa questão de fato a ser por ele
apreciada e decidida.11
11 SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de Direito Processual Civil. v.2. 26ªed. São Paulo:
Saraiva, 2010. p.393.
23
No caso do inciso I, do parágrafo único, do art. 373 do CPC, não se admite a
convenção das partes sobre a distribuição do ônus da prova, quando o objeto do litígio
for um bem indísponivel, pois o sujeito não pode dispor dele. No caso do inciso II do
referido artigo, não se pode convenciar, uma vez que tal convenção tornaria difícil o
exercicio do direito pela parte.
Por fim, vale ressaltar a eficácia do princípio da iniciativa oficial do juiz.
Embora o ato de indicar provas pertença às partes, o juiz, pode ordenar de ofício a
produção de novas provas que julgue necessárias para apurar a verdade dos fatos
alegados pelas partes.
4. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA
4.1 Definição
Existem casos que a legislação civil autoriza expressamente a inversão do ônus
da prova, que segundo Cândido Rangel Dinamarco pode ser definido como: “as
alterações de regras legais sobre a distribuição deste, impostas ou autorizadas por lei”.12
A inversão do ônus da prova não caracteriza infração ao princípio da isonomia
processual, pois trata de maneira desigual as pessoas que estão em parâmetros
desaguais. Tal inversão apenas tira o encargo de provar da parte, da qual, a prova
inicialmente caberia.
12 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 5ªed. São Paulo:
Malheiros, 2005.p. 76.
24
Insta salientar, que na legislação vigente a inversão do ônus da prova não é
automática ou aplicada em todas as hipósteses.
É clara a lição de Misael Montenegro Filho: “a inversão sem a demonstração
da hipossuficiência da parte autora ou da verossimilhança da alegação por ela sustentada
é medida manifestamente nula”.13
A comunição da inversão será feita pelo magistrado durante o curso do
processo ou na sentença, devendo sempre fundamentar a sua decisão nos requisitos que
autorizam a inversão.
4.2 Tipos de inversão
4.2.1 Inversão judicial
Para Cândido Rangel Dinamarco: “inversão judicial do ônus da prova é a
alteração do disposto em regras legais responsáveis pela distribuição deste, por decisão
do juiz no momento de proferir a sentença de mérito.”14
13 MONTENEGRO FILHO, Misael. Curso de Direito Processual Civil. v.1. 7ªed. São Paulo: Atlas,
2011. p.455.
14 DINAMARCO, Cândido Rangel. Instituições de Direito Processual Civil. 5ªed. São Paulo:
Malheiros, 2005. p.79.
25
Nessa inversão ocorre uma interferência direta do juiz na regra do ônus da
prova disposta no art. 373 do CPC. A inversão é determinada pela presunção do juiz
criada em seu julgamenteo, sempre nos casos autorizados por lei.
O juiz autoriza a inversão quando presentes os seus requisitos, quais sejam, a
verossimilhança das alegações que é caracterizada pela confrontação com a verdade das
afirmações contidas no processo; e a hipossuficiência que pode se dar através de seus
aspectos técnicos ou econômicos.
A inversão judicial, não pode ser aplicada sem motivo. Deve se observar o
ônus da prova no sentido teleológico da lei consumerista, que não tem o objetivo de
tirar o encargo de provar do consumidor, previsto na lei processual, mas sim de transpor
dificuldades técnicas que o consumidor pode enfrentar ao produzir a sua defesa.
4.2.2 Inversão legal
É também conhecida como inversão ‘ope legis’. Tal inversão encontra
fundamento legal no Código de Defesa do Consumidor, em seu art. 6º, inciso VIII15,
como sendo direito básico do consumidor à inversão do ônus da prova a seu favor,
quando este for verossimil ou hipossuficiente.
Tal inversão decorre de uma norma expressa e não de pronunciamento judicial.
Ou seja, a própria lei traz uma nova regra sobre a disposição do ônus da prova, com o
15 Art. 6ª (...) VIII - a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, à
seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele
hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
26
escopo de facilitar a situação de uma das partes do processo, que neste caso será o
consumidor.
Entende-se essa inversão como sendo uma presunção relativa, pois é atráves do
caso concreto que o juiz irá verificar se estão presentes os requisitos que geram a
aplicação de tal regra. Uma vez que coloca uma das partes em privilégio (consumidor)
fazendo com que a outra parte (fornecedor) arque com toda a responsabilidade sobre a
produção das provas.
4.2.3 Inversão contratual
Neste caso as próprias partes alteram as regras legais, relativas ônus de provar.
Esta modalidade é vedada pelo Código de Defesa do Consumidor, se for em prejuízo do
consumidor.
Duas são as limitações que esta modalidade sofre: i) o efeito da inversão, não
pode criar uma extrema dificuldade na defesa da outra parte ou prejudicar terceiros e; ii)
o bem jurídico envolvido na causa deve ser disponível.
Assim sendo, poderá ser efetuada a inversão contratual no âmbito do próprio
processo ou fora deste, uma vez que a lei é omissa quanto a sua forma. Estabelecida em
cláusula contratual que previna uma possível propositura de ação.
4.3 Momento processual
27
Divergência se encontra na maioria da doutrina em relação ao momento
processual em que deve ser invertido o ônus da prova. Três são as correntes mais
consideráveis sobre o tema.
A Primeira ensina que a inversão deve ocorrer no momento em que juiz
despachar a petição inicial. Segundo esta corrente já é na petição inicial que o juiz deve
verificar a existência dos requisitos para que haja a inversão, para que não prejudique o
processo mais adiante.
A crítica que se faz à esta primeira corrente é que o juiz ao decidir sobre a
inversão logo após o despacho de início do processo estará ofendendo o princípio do
contraditório, uma vez que ao réu não foi concedida a possibilidade de se defender, o
que impossibilida o juiz saber logo de plano quais serão os fatos controvertidos, pois o
réu nem citado este foi ainda.
De acordo com a segunda corrente, o momento certo para que haja a inversão é
na fase de saneamento do processo, onde o juiz corrige todos os erros do processo e
buscar sanar seus vícios quando houver, a fim de deixar o processo pronto para a
instrução e julgamento. Deste modo o principal argumento para se fazer a inversão do
ônus probatório neste momento é o fato de respeitar o princípio do contraditório, uma
vez que é nesta fase que são apresentados os fatos controvertidos.
Desta feita, apresentados os fatos controvertidos cabe ao juiz preparar o processo
e resolver as questões incidentes, sendo uma delas a verificação da presença dos
requisitos para ver se é caso ou não de inversão do ônus da prova.
28
Por fim, a terceira e última corrente sustenta que a inversão deve ser feita no
momento da prolação da sentença. Uma vez que, somente após a instrução do feito, no
momento de valoração das provas é que o magistrado terá a capacidade de analisar se
existe ou não a situação que enseja a inversão do ônus. Além do que, não seria uma
surpresa a parte ré, pois esta hipótese está prevista no art. 6º do Código de Defesa do
Consumidor.
A critica a terceira corrente é toda fundamentada na violação ao princípio do
contraditório e da ampla defesa e também ao princípio do devido processo legal. Além
do que não seria necessário mais a inversão do ônus, uma vez que todas as provas já
foram produzidas.
CONCLUSÃO
Ante todo o exposto no presente trabalho, verifica-se que as provas são, sem
dúvida nenhuma, um dos mais importantes institutos do direito processual civil
brasileiro, pois é atráves delas que se busca demonstrar a veracidade dos fatos alegados,
que são o objeto da prova.
Ademais, não são quaisquer fatos que são objeto de prova. Para se valer o
instituto processual em comento os fatos devem ser relevantes, pertinentes, controversos
e precisos.
Dada a sua importância, o atual Código de Processo Civil, traz um capítulo
inteiro sobre as provas, aonde estipula todas as regras que devem ser seguidas para
desempenhar o bom andamento do processo.
29
Dentre essas regras, estão alguns dos meios de prova admitidos em direito. Tais
meios devem ser licítos e moralmente legítimos, conforme dispõe o art. 369 do CPC.
Uma vez que a finalidade da prova é de formar o convencimento do seu destinátario, ou
seja, do juiz.
Nesse contexto, não há dúvidas de que cabem as partes a produção das provas
no processo. Após serem produzidas as provas são encaminhas para o juiz, que pautado
pelo princípio do livre convencimento motivado irá analisá-las e valorá-las, sempre de
maneira racional e se atendo ao que consta nos autos.
Para que haja a mais justa valoração das provas, o legislador atribui no Código
de Processo Civil, mais precisamente em seu artigo 373, o instituto processual, chamado
de ônus da prova.
O ônus da prova é um encargo atribuído as partes, para que estas comprovem a
veracidade de seus fatos. Ao autor é estipulado o ônus de provar os fatos constitutivos
de seu direito, ou seja, os fatos que geraram o litígio. Já o réu, fica incumbido de provar
a existencia de fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor.
Ao juiz também é guardada uma relação com o ônus da prova, uma vez que ele
é o responsável pela sua distribuição. Embora o Código de Processo Civil disponha
sobre as regras gerais do ônus da prova, nada impede que o juiz, havendo dúvida quanto
à veracidade dos fatos ou nos casos em que as provas existentes nos autos não são
suficientes, estabeleça a produção de novas provas e a faça a distribuição do ônus de
provar.
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De qualquer modo, esse relaxamento da distribuição do ônus da prova,
depende de uma profunda análise do caso concreto, atráves de um juízo de
verossimilhança, com base nos fatos apresentados por uma das partes.
Para que tal distribuição não cause violação aos princípios do contraditório e
ampla defesa e nem ao príncipio do devido processo legal, a lei em alguns casos
autoriza a inversão do ônus da prova.
O ponto mais controvertido em relação a esta inversão é sobre o momento
processual em que ela deva ocorrer, para que esta inversão alcance um resultado mais
útili ao processo, é indispensável à observancia do princípio do contraditório para se
evitar o cerceamento de defesa.
Desse modo, podemos concluir que o insituto do ônus da prova, tem como seu
principal objetivo, fazer com que as partes levem até o julgador todos os seus
fundamentos para que este, preste a tutela jurisdicial de maneira mais justa e efetiva.
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