UNIVERSIDADE METODISTA DE SÃO PAULO
FACULDADE DA SAÚDE
CURSO DE MEDICINA VETERINÁRIA
ANA PAULA LEANDRO BONIOL
INQUÉRITO SOROLÓGICO PARA Rickettsia spp. EM CÃES
RESIDENTES DE ÁREAS ENDÊMICAS PARA FEBRE
MACULOSA BRASILEIRA NA CIDADE DE DIADEMA-SP
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2011
ANA PAULA LEANDRO BONIOL
INQUÉRITO SOROLÓGICO PARA Rickettsia spp. EM CÃES
RESIDENTES DE ÁREAS ENDÊMICAS PARA FEBRE
MACULOSA BRASILEIRA NA CIDADE DE DIADEMA-SP
Monografia apresentada no curso de graduação à
Universidade Metodista de São Paulo, Faculdade da
Saúde, Curso de Medicina Veterinária para conclusão
do curso de Medicina Veterinária.
Área de concentração: Doenças Infecciosas e
Zoonoses.
Orientação: Prof° Ms. Paulo Sérgio Salzo
Co-orientadora: M. V. Michelle Macedo Soares
SÃO BERNARDO DO CAMPO
2011
FICHA CATALOGRÁFICA
B641i
Boniol, Ana Paula Leandro
Inquérito sorológico Rickettsia spp. em cães residentes de
áreas endêmicas para febre maculosa brasileira na cidade de
Diadema - SP/ Ana Paula Leandro Boniol. 2011.
38 f.
Monografia (Medicina Veterinária) -- Faculdade da Saúde
da Universidade Metodista de São Paulo, São Bernardo do
Campo, 2011.
Orientação: Paulo Sérgio Salzo.
Co-orientadora: Michelle Macedo Soares.
1. Rickettsia spp 2. Febre maculosa 3. Amblyomma sp
4.Cães I. Título
CDD 636.08944
ANA PAULA LEANDRO BONIOL
INQUÉRITO SOROLÓGICO PARA Rickettsia spp. EM CÃES RESIDENTES DE ÁREAS
ENDÊMICAS PARA FEBRE MACULOSA BRASILEIRA NA CIDADE DE DIADEMA-
SP
Monografia apresentada no curso de graduação à
Universidade Metodista de São Paulo, Faculdade
da Saúde, para conclusão do curso de Medicina
Veterinária.
Área de concentração: Doenças infecciosas e Zoonoses.
Data de defesa:
Resultado: _____________________________.
BANCA EXAMINADORA
Nome: ___________________________________________________________.
Nome: ___________________________________________________________.
Nome: ___________________________________________________________.
Dedico esse trabalho em especial a minha mãe Maria do Carmo, exemplo de mulher, que
sempre me apoiou, acreditou em mim e proporcionou a realização desse sonho, mesmo com
todas as dificuldades.
A minha irmã Renata, pelo apoio, por ser uma amiga maravilhosa e sempre me mostrar à
direção nos momentos de dúvida.
Ao meu namorado Márcio, pelo companheirismo, amor e carinho, apoio e compreensão.
A minha madrinha Lucíula, exemplo de bondade, pela preocupação e atenção de sempre, por
confiar e acreditar em mim.
As minhas avós, Apparecida e Leonildes, pelo carinho de sempre.
A minha tia avó Francisca, exemplo de caráter, luta e dignidade, por mostrar a mim e a todos
sempre o caminho a ser seguido.
A toda minha família e amigos pelo apoio e incentivo.
A todos que de alguma forma, contribuíram e me apoiaram para a realização desse trabalho.
E a todos dizer obrigada seria pouco, prefiro dizer: Eu amo vocês !!!!
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus, por tantas bênçãos concedidas e por me dar força e sabedoria para a
realização desse trabalho.
Ao Professor Paulo Sérgio Salzo, pela ajuda e orientação nesse trabalho.
A Michelle Macedo Soares, pela amizade, ajuda nas coletas, dúvidas, revisão do trabalho e
ajuda na idéia do tema.
A Milena Camara, por todos os artigos enviados, atenção e ajuda também com o tema.
Ao Adriano Pinter, que muito contribuiu com a sua inestimável boa vontade em realizar os
exames laboratoriais, pelas fotos e repostas das minhas dúvidas.
Aos funcionários e amigos do Centro de Controle de Zoonoses de Diadema Lucinete,
Marcelo e em especial Camila pela ajuda com as coletas.
Ao Sandro Corumba pela ajuda e por permitir o uso dos materiais para a realização da
pesquisa.
A Neide Satie pela ajuda com alguns dados do CCZ.
Aos moradores dos bairros estudados, que muito colaboraram permitindo a colheita de
sangue de seus cães.
As minhas primas Letícia e Juliana pela amizade e apoio sempre.
As minhas amigas de faculdade Camila e Karina, pelo apoio, momentos felizes e de muitas
risadas nesses cinco anos de curso.
“O destino não é uma questão de sorte, é uma
questão de escolha. Não é algo a se esperar, á
algo a se conquistar”.
Willian Jennings Bryan
RESUMO
A febre maculosa brasileira (FMB), causada pela Rickettsia rickettsii, é uma zoonose
altamente letal para os humanos, transmitida por carrapatos da espécie Amblyomma. O
município de Diadema possui casos registrados da doença em humanos desde 2003
associados ao carrapato Amblyomma aureolatum e possui dois bairros endêmicos para a
doença. O cão assume um importante papel de animal sentinela para circulação da bactéria e
por ser o hospedeiro primário da forma adulta do vetor. O presente trabalho objetivou
pesquisar a presença de anticorpos anti rickettsia em cães provenientes de três bairros da
cidade, sendo eles: Eldorado, Campanário e Real. Para representar a população canina desses
bairros, foram coletadas 69 amostras e testadas pela reação de imunofluorescência indireta
(RIFI), e os animais foram considerados positivos quando as amostras de soro apresentaram
título ≥ 64. Do total de 69 soros, 9 (13,04%) foram positivos e provenientes dos três bairros,
sendo 4/40 (10,01%) em Eldorado, 4/18 (22,21%) do Campanário e 1/11 (9,09%) do Real. Os
resultados obtidos demonstram uma alta porcentagem de animais reagentes, demonstrando o
risco de transmissão da doença nas áreas estudadas e a necessidade de se manter uma
continuidade no sistema de vigilância epidemiológica, e também de serem feitos novos
trabalhos soroepidemiológicos para monitoramento dessas áreas.
Palavras-chave: Rickettsia ssp, febre maculosa, Amblyomma sp, cães.
ABSTRACT
Brazilian spotted fever (BSF), caused by Rickettsia rickettsii, is a zoonosis highly lethal to
humans, transmitted by ticks of the species Amblyomma spp. The Municipality of Diadema
has recorded cases of the disease in humans since 2003 associated with the tick Amblyomma
aureolatum and has two neighborhoods endemic for the disease. The dog plays an important
role as environmental sentinels for movement of bacteria and to be the primary host of the
adult form of the vector. This study aimed to investigate the presence of antibodies to
Rickettsia spp in dogs from three neighborhoods of the city, namely: Eldorado, Campanário
and Real. To represent the canine population of these neighborhoods, 69 sera were collected
and tested by immunofluorescence indiretra (IFA), and the animals were considered positive
when the sera samples had titres ≥ 64. Of the total of 69 sera, 9 (13.04%) were positive and
from the three neighborhoods, of which 4 / 40 (10,01%) in Eldorado, 4 / 18 (22,21%) of the
Campanário and 1 / 11 (9,09%) of the Real. The results show a high percentage of reacting
animals, demonstrating the risk of disease transmission in the study areas and the need to
maintain continuity in epidemiological surveillance system, and also further work be
undertaken to monitor these areas seroepidemiological.
Keywords: Rickettsia ssp, spotted fever, Amblyomma sp, dogs.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................... 12
2 REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................. 13
2.1 HISTÓRICO.............................................................................................................. 13
2.2 EPIDEMIOLOGIA................................................................................................... 14
2.3 ETIOLOGIA.............................................................................................................. 16
2.4 TRASMISSÃO E PATOGENIA.............................................................................. 17
2.5 VETORES E RESERVATÓRIOS............................................................................ 19
2.5.1 Ciclo Biológico....................................................................................................... 23
2.6 SINTOMATOLOGIA CLÍNICA.............................................................................. 24
2.7 DIAGNÓSTICO........................................................................................................ 26
2.7.1 Diagnóstico Diferencial.......................................................................................... 27
2.8 TRATAMENTO........................................................................................................ 28
2.9 PREVENÇÃO E CONTROLE................................................................................. 28
2.9.1 Humanos................................................................................................................. 28
2.9.2 Cães........................................................................................................................ 29
3 MATERIAL E MÉTODO......................................................................................... 31
3.1 Definição da área de estudo....................................................................................... 31
3.2 Colheita de sangue..................................................................................................... 31
3.3 Reação de imunofluorescência indireta (RIFI).......................................................... 32
4 RESULTADOS........................................................................................................... 33
4.1 Prevalência geral e por bairro para anticorpos anti-Ricketssia spp. encontrados
nos cães............................................................................................................................
33
4.2 Descrição dos cães positivos à RIFI.......................................................................... 33
5 DISCUSSÃO............................................................................................................... 35
6 CONCLUSÃO............................................................................................................. 37
REFERÊNCIAS............................................................................................................ 38
12
1 INTRODUÇÃO
A Febre Maculosa Brasileira (FMB) é uma doença infecciosa, febril e aguda, sendo a
Rickettsia Ricketsii, o principal agente etiológico. Esta bactéria pertence à família
Rickettsiaceae, é Gram-negativa e de vida intracelular obrigatória, e a transmissão ocorre após
a picada de carrapatos do gênero Amblyomma spp. .
O município de Diadema, situado na Grande São Paulo tem uma população estimada de
386.039 habitantes, e tem registrado casos humanos de FMB desde 2003 associados à
ocorrência do Amblyomma aureolatum em duas áreas consideradas de risco devido à presença
de habitat desse vetor (áreas de Mata Atlântica) cujo tamanho das populações humanas e
caninas expostas ao risco ainda é desconhecido. Uma dessas áreas situa-se na região norte da
cidade (bairro Campanário), sendo próxima ao Parque do Estado de São Paulo onde ocorre a
maioria dos casos, a outra área fica ao sul (bairro Eldorado) próximo à Represa Billings, onde
o primeiro caso humano foi registrado em 2008. Todos os casos humanos aconteceram em
residentes de áreas próximas de mata, exceto um caso confirmado de uma moradora da região
centro-sul (bairro Real), local totalmente urbanizado.
Este trabalho objetiva definir a extensão das áreas de risco, conhecer a epidemiologia da
doença nessas três áreas e principalmente verificar a soroprevalência para anticorpos anti-
Rickettsia spp. nos cães, que são considerados animais sentinelas para a doença, pois a febre
maculosa brasileira é uma doença de grande importância à saúde pública devido aos altos
índices de mortalidade e difícil controle.
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2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 HISTÓRICO
A importância dos carrapatos na transmissão de doenças foi primeiramente
reconhecida na área da veterinária por Theobald Smith em 1886 nos EUA, quando descreveu
a Texas Catlle Fever, hoje conhecida como Babesiose. Alguns anos depois, em 1889 e 1890,
Smith e Frederick Kilborne, demostraram que a doença era transmitida por carrapatos
(VIEIRA et al., 2004).
A Febre Maculosa Brasileira (FMB) foi relatada pela primeira vez em humanos em
1899 por Eduard E. Maxey também nos EUA, na sua região montanhosa localizada no
noroeste do país, sendo denominada Febre Maculosa das Montanhas Rochosas (FMMR). No
início do século XX, foi estabelecido o papel do carrapato Dermacentor andersoni por
Howard T. Ricketts na transmissão da doença, quando isolou pela primeira vez a bactéria que
recebeu o nome de Rickettsia em sua homenagem (FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011).
No Brasil, os primeiros casos em seres humanos datam de 1929 e foram descritos por
José de Toledo Piza e era conhecida como Tifo exantemático de São Paulo (TESP)
(VRANJAC, 2002) e estudos realizados posteriormente na década de 30 verificaram que a
doença no Brasil era parecida com a norte americana e assim passou a ser considerada como
Febre Maculosa Brasileira (MONTEIRO; RODRIGUES; GUEDES, 2006).
O Brasil apresenta histórico de doença riquetsial desde a década de 20, sendo a FMB a
mais severa das já descritas. Em Minas Gerais têm ocorrido casos desde a década de 80, além
de que nas áreas rurais e peri-urbanas vem se mostrando na forma de epidemias (CARDOSO
et al., 2006) como Vale do rio Doce, Mucuri e Jequitinhonha (GALVÃO et al., 2002;
CARDOSO et al., 2006) e em outros locais como Campinas, Pedreira, Valinhos, Amparo,
Hortolândia, Jaguariúna, Santo Antônio de Posse, Arthur Nogueira, Lindóia e Paulínia
(VRANJAC, 2002; LIMA et al., 2003). Mais recentemente, entre os anos de 2002 a 2006,
foram relatados os primeiros casos de febre maculosa nos estados de Santa Catarina, Paraná e
Rio grande do Sul (SILVA, 2007).
Devido ao grande número de casos, óbitos e municípios apresentando a doença, a
partir de 2002 a FMB começou a ser considerada doença de notificação compulsória no
estado de São Paulo, seguindo orientação do Ministério da Saúde (VRANJAC, 2002).
14
2.2 EPIDEMIOLOGIA
A Febre Maculosa Brasileira vem sendo relatada na região sudeste desde a década de
20, nos estados de São Paulo e Minas Gerais especialmente e transmitida por carrapatos do
gênero Amblyomma sp., o mais numeroso no Brasil e de maior importância médica e
principalmente o A. aureolatum e o A. cajennense vem sendo citados na epidemiologia da
doença no Brasil (VIEIRA et al, 2004).
A Rickettsia rickettsii circula em áreas de mata, tendo como reservatórios várias
espécies de animais silvestres e mamíferos (LABRUNA; PEREIRA, 1998).
Normalmente os focos de infestação por carrapatos, estão relacionados com ambientes
rurais, vegetação rasteira ou arbustiva, lavouras rudimentares e presença de animais como
cães e equinos, sendo essas áreas o maior potencial e risco para transmissão da doença
(MASSARD; FONSECA, 2004).
No Brasil o A. cajennense é muito encontrado em todos os estados das regiões Sudeste
e Centro oeste, e com distribuição limitada nas outras regiões, como mostra a figura 1. Por
ano, o A. cajennense completa apenas uma geração, com três estágios parasitários (larva, ninfa
e adulto) e são bem delimitados, onde as larvas predominam nos meses de Abril a Julho, as
ninfas de Julho a Outubro e os adultos de Outubro a Março (VIEIRA et al, 2004).
Já o A. aureolatum, é encontrado especialmente nas áreas de Mata Atlântica das
regiões Sul e Sudeste (figura 2). Para esse carrapato, não há uma dinâmica populacional bem
definida como o A. cajennense, (VIEIRA et al, 2004).
No estudo feito por Pinter (2003) foi observado que em condições de laboratório, o A.
aureolatum pode completar até duas gerações e que a fase adulta ocorre durante todo o ano.
15
Figura 1: Distribuição do Amblyomma cajennense nos estados brasileiros.
Fonte: Vieira et al., 2004.
Figura 2: Distribuição do Amblyomma aureolatum nos estados brasileiros.
Fonte: Vieira et al., 2004.
16
2.3 ETIOLOGIA
A FMB é uma zoonose, doença febril aguda causada pela Rickettsia rickettsii, família
Rickettsiaceae, ordem Rickettisiales, uma bactéria gram-negativa de vida intracelular
obrigatória, pleomórfica e pequena, com cerca de 0,3 a 0,5µm por 0,8 a 2,0µm (figura 3)
(FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011). Ela sobrevive muito pouco fora do hospedeiro e é
o mesmo agente causador da Febre Maculosa das Montanhas Rochosas (FMMR), a
riquetsiose dos EUA (GREENE; BREITSCHWERDT, 2006).
As espécies de Rickettsia são classificadas em três grupos, de acordo com padrões
morfológicos, antigênicos, moleculares e ecológicos: o Grupo do Tifo (GT) que compõem as
espécies R. prowazekii e R. typhi, associadas com piolhos e pulgas, respectivamente. O Grupo
Ancestral (GA) que compreende as espécies R. canadensis, R. bellii, associadas a carrapatos e
o Grupo da Febre Maculosa (GFM), que é composto por mais de 20 espécies estando a grande
maioria associada ao carrapato, sendo que pelo menos nove causam doenças ao homem como
R. rickettsii, R. conorii, R. africae, R. australis, R. honei, R. sibirica, R. japônica, R. akari e
R. felis, com exceção das duas últimas que estão associadas a ácaros e pulgas,
respectivamente e outras várias espécies do GFM são consideradas de baixa ou nenhuma
patogenicidade para o homem (PINTER, 2003; SILVA, 2007).
Nos vertebrados, infecta primariamente células endoteliais, onde se multiplica nos
vasos de pequeno e médio calibre causando vasculite disseminada (GREENE;
BREITSCHWERDT, 2006; VRANJAC, 2003).
Nos carrapatos, a bactéria causa infecção disseminada, e se multiplica em células do
intestino, glândulas salivares, túbulos de malpighi, ovários e hemolinfa (SILVA, 2007).
Figura 3: Hemolinfa de A. aureolatum infectadas por R. rickettsii, coradas pela coloração de Gimenez.
Fonte: Pinter, 2011.
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2.4 TRASMISSÃO E PATOGENIA
Os carrapatos se alimentam por hematofagia, principalmente de sangue, mas também
de linfa e restos tissulares que estão presentes na pele do hospedeiro. Eles possuem peças
bucais especificas e adaptadas para perfurarem a pele, ficando fixada a mesma por horas, dias
ou até semanas, pois possuem na saliva substâncias vasoativas que causam vasodilatação local
e impede a coagulação sanguínea e ação de defesas do organismo no local da picada (VIEIRA
et al, 2004). Além dessas substâncias, também há quinases que catalisam a bradicinina, isso
explica a ausência de dor e as prostaglandinas inibem a produção de interleucina 1 e a
migração de macrófagos para o local da picada (MASSARD; FONSECA, 2004).
No ato da alimentação, os carrapatos fazem sucção alternando com regurgitação da
saliva, sendo esse volume eliminado, maior no final do processo (VRANJAC, 2003).
A transmissão da bactéria por carrapatos adultos é menos comum, pois a picada é mais
dolorosa e mais perceptível o que não ocorre com as larvas e ninfas, que por serem jovens e
pequenas, têm a picada menos dolorosa sendo mais difícil de percebê-las. O carrapato deve
permanecer fixado à pele por um período de 4 a 20 horas na pele do hospedeiro, tempo
necessário para a reativação da bactéria na sua glândula salivar (QUINN et al., 2005;
MONTEIRO; RODRIGUES; GUEDES, 2006). Essa transmissão também pode ser através de
lesões na pele por esmagamento do carrapato, remoção manual, escoriação na pele e acidentes
laboratoriais não podem ser descartados (VRANJAC, 2002; FORTES; BIONDO;
MOLENTO, 2011).
Os carrapatos permanecem infectados por toda sua vida, ou seja, de 18 a 36 meses.
Uma vez que um carrapato se infecta, outros podem se infectar por meio da transmissão
vertical (transovariana), transmissão estádio-estádio (transestadial) ou transmissão pela
cópula, além da possibilidade de alimentação com carrapatos infectados e não infectados em
animais com riquetsemia (BRASIL, 2010).
Uma vez que a bactéria entra em contato com o organismo, ocorrem vários
acontecimentos cutâneos e vasculares, que em geral são: edema, hemorragia, necroses focais
(MONTEIRO; RODRIGUES; GUEDES, 2006; TIRIBA, 2002), aumento de permeabilidade
vascular determinando oligúria, anemia, anúria, hipertensão, hiponatremia e hipovolemia,
diminuição da perfusão sanguínea dos tecidos e distúrbios tissulares (VRANJAC, 2002;
GREENE; BREITSCHWEARDT, 2006).
18
Porém a intensidade de lesões pode variar de acordo com a susceptibilidade do
hospedeiro. Naqueles sensíveis ou não previamente expostos, o processo inflamatório resulta
em vasodilatação, ruptura de vasos, hemorragia e concomitante a derme se torna fibrosa
devido à proliferação de fibroblastos. Já nos hospedeiros resistentes a lesão é mais severa e
consiste em edemas na epiderme e derme, necrose de células e tecidos, infiltração eosinofílica
e basofílica que com a degradação dos mesmos, há liberação de histamina, serotonina e
heparina que dificultam ou impedem o ingurgitamento (MASSARD; FOENSECA, 2004;
SAMUELSON, 2000), como mostra a figura 4.
Figura 4: Lesão de fixação dos carrapatos e mecanismo de reação dos hospedeiros
sensíveis ou não previamente expostos e hospedeiros resistentes.
Fonte: Massard; Fonseca, 2003.
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2.5 VETORES E RESERVATÓRIOS
Os carrapatos da espécie Amblyoma spp, são os vetores biológicos da FMB, além de
atuarem como reservatórios, sendo o A. cajennense e o A. aureolatum os principais vetores.
Os reservatórios naturais da bactéria são roedores e pequenos mamíferos silvestres (BRASIL,
2009).
As rickétsias se multiplicam nos tecidos dos carrapatos, ocorrendo a transmissão
transovariana (para ovos e larvas) e a transestadial (a partir das larvas, para ninfas e destas
para adultos), portanto, uma vez que todas as fases do carrapato no ambiente forem capazes
de permanecer meses ou anos infectados, eles são capazes de garantir um foco endêmico
prolongado (PEREIRA; LABRUNA, 1998). Mesmo assim, apenas esse mecanismo não seria
suficiente para mantê-la ativa ao longo do tempo, uma vez que já foi provado que a bactéria
também é patogênica para o vetor, portanto o efeito amplificador que algumas espécies
silvestres possuem, garante a manutenção da bactéria na natureza por manterem níveis altos
da mesma em sua corrente sanguínea por dias ou semanas, permitindo que novos carrapatos
se infectem amplificando a infecção na população dos mesmos (SILVA, 2007).
Portanto, para que uma espécie de vertebrado seja considerada um bom hospedeiro e
que possa amplificar a R. rickettsii na natureza, ela precisa ser abundante na área endêmica
para FMB, ser susceptível à infecção pela bactéria, ter uma alta renovação populacional e
manter níveis plasmáticos suficientes para infectar carrapatos que se alimentam neles e ser um
bom hospedeiro do carrapato vetor em condições naturais (PEREZ et al., 2008).
O A. cajennense (figura 5) parasita diversas espécies de mamíferos, inclusive o
homem, e tanto as formas imaturas, quanto os adultos têm baixa especificidade parasitária.
Seus hospedeiros primários são eqüinos, principalmente na região Sudeste, antas e capivaras,
mas também podem parasitar bovinos, veados, cachorros-do-mato, porcos-do-mato, carneiros,
coelhos, cabras, gambás, quatis, tatus e ratões-do-banhado e os hospedeiros secundários são
dezenas de espécies da mastofauna e avifauna (BRASIL, 2009; LABRUNA et al, 2004).
Também podem ser encontrados em aves domésticas e silvestres, sendo elas galinhas, perus e
seriemas, respectivamente, além de animais de sangue frio, como os ofídios (VRANJAC,
2002).
Já os canídeos, inclusive os cães domésticos, são os principais hospedeiros do A.
aureolatum (figura 6) na forma adulta, principalmente em ambientes próximos a
remanescentes de floresta tropical (FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011), as larvas e
20
ninfas estão associadas a roedores e aves silvestres, e também existem registros de infestação
em outros hospedeiros, como cabra, boi, veado, gambá e o homem (RIBEIRO et al., 1997;
MULLER et al., 2005). Sabe-se que cães podem permanecer infestados por adultos por todo
ano, sem um pico de infestação definido (VIEIRA et al., 2004). O estudo realizado por
Martins et al. (2010) registra o encontro de A. aureolatum em um gato maracajá (Leopardus
wiedii), na região metropolitana de Porto Alegre, ampliando assim a distribuição de
hopedeiros.
O Amblyoma dubitatum (=A. Cooperi) (figura 7), o carrapato que normalmente infesta
capivaras, já foi encontrado infectado por rickettsias, inclusive do grupo da febre maculosa
(GFM), o que nos leva a refletir sobre a importância dessa espécie na epidemiologia da
doença (TOLEDO et al., 2008). Sabe-se que a capivara atua como hospedeiro primário desse
carrapato em todas as suas formas, e sua forma adulta tem alta capacidade de ingurgitamento
nesse roedor (PEREZ et al., 2008). Pacheco et al. (2009), de um estudo realizado com 3.545
carrapatos, encontraram 364 A.dubitatum infectados por rickettsia bellii, que participa do
GFM.
O Rhipicephalus sanguineus (figura 8), conhecido como “carrapato marrom do cão”,
que parasita cães em áreas urbanas, já teve a participação na epidemiologia da doença, apesar
de raramente parasitar humanos (MORAES-FILHO et al., 2009a). No estudo feito por Cunha
et al. (2009), foi reportado pela primeira vez, a infecção natural por R. rickettsii em R.
sanguineus em uma região rural do Rio de Janeiro com casos anteriores de febre maculosa,
confirmando que esta espécie pode ter importante papel na transmissão da doença para cães e
humanos.
O homem é hospedeiro acidental, quando passa a integrar o ciclo rickettsia-carrapato-
reservatório silvestre, e dentre os animais domésticos apenas os cães apresentam alguma
susceptibilidade à doença. Assim, uma vez infectados, suas concentrações de rickétsias são
baixas, sendo insuficientes para transformá-los em reservatórios (PEREIRA; LABRUNA,
1998).
21
Figura 5: Vista dorsal de fêmea e macho, respectivamente, do carrapato Amblyomma cajennense.
Fonte: Acervo pessoal
Figura 6: Vista dorsal de fêmea e macho, respectivamente, do carrapato Amblyomma aureolatum.
Fonte: Acervo pessoal.
22
Figura 7: Vista dorsal de fêmea e macho, respectivamente, do carrapato Amblyomma cooperi.
Fonte: Acervo pessoal.
Figura 8: Vista dorsal de fêmea e macho, respectivamente, do carrapato Rhipicephalus sanguineus.
Fonte: Acervo pessoal.
23
2.5.1 Ciclo Biológico
Os carrapatos do gênero Amblyomma spp. são da família Ixodidae e passam por quatro
estágios em seu ciclo biológico: ovo, larva, ninfa e adulto. Eles precisam necessariamente de
três hospedeiros distintos para completar suas fases parasitárias (VIEIRA et al., 2004).
O A. cajennense completa esse ciclo bem marcadamente ao longo do ano (PEREIRA;
LABRUNA, 1998) e já o A. aureolatum, embora um estudo feito por Pinter (2003) mostrou
que em condições de laboratório, pode completar até 2 gerações por ano e que a fase adulta
também ocorreu por todo o ano, não se sabe bem como ocorre em condições naturais.
O ciclo do Amblyomma se inicia com a fêmea adulta, que após a fecundação e
ingurgitamento, desprende-se do hospedeiro e no solo com temperatura fresca e alta umidade
embaixo de coberturas vegetais, ou em frestas, faz a ovipostura de aproximadamente 5.000 a
8.000 ovos, morrendo após esse processo (VRANJAC, 2002). Então após 30 dias, os ovos
eclodem dando origem as larvas (micuins) que ficam à espera do hospedeiro nas gramas e
arbustos e podem sobreviver no solo por até 6 meses sem alimento. No hospedeiro fazem a
sucção por cerca de 3 a 6 dias, se desprendem e no solo ocorre a ecdise para ninfas
(vermelhinhos) em 18 a 23 dias, e estas podem sobreviver sem alimento por até um ano e no
hospedeiro fazem a sucção por 6 dias, se desprendendo novamente (VIEIRA et al.; 2004). No
solo sofrem outra ecdise em aproximadamente 23 a 25 dias, se transformando em adultos
(carrapato estrela, rodoleiro) e se diferenciam em macho e fêmea (de modo geral são metade
para cada sexo), podendo permanecer à espera de um novo hospedeiro por até 24 meses sem
alimento e quando encontram, fazem o repasto sanguíneo e tissular, ocorrendo o acasalamento
e se inicia o ingurgitamento por aproximadamente 10 dias, se desprendendo e as fêmeas
iniciam uma nova geração (PEREIRA; LABRUNA, 1998; BRASIL, 2009), (figura 9).
De modo geral, as larvas ocorrem entre os meses de Março a Julho, as ninfas de Julho
a Novembro e os adultos de Novembro a Março.
24
Figura 9: Ciclo biológico do carrapato Amblyomma ssp.
Fonte: Vieira et al., 2004.
2.6 SINTOMATOLOGIA CLÍNICA
Após a transmissão do agente pelo carrapato, a doença se inicia em 3 a 14 dias, sendo
em média 7 dias e varia de acordo com a dose infectante com casos ologossintomáticos, até
casos de extrema gravidade (PEREIRA; LABRUNA, 1998).
O inicio é súbito, com sintomas inicialmente inespecíficos, que incluem febre
moderada a alta, cefaléia, mialgia intensa, mal estar generalizado, náuseas, vômitos, diarréia e
no decorrer dos dias com a evolução da doença surge o exantema maculopapular (BRASIL,
2010). A febre dura em media 2 a 3 semanas, a cefaléia é intensa e a mialgia é devido à
rabdomiólise e necrose focal múltipla (SILVA, 2007).
O exantema que é um sinal sugestivo da doença surge entre o 3° e 5° dia nas palmas
das mãos e plantas dos pés, evoluindo para os membros até alcançar o tórax e abdome (figuras
10 e 11), mas quando atinge essa magnitude, o caso já é bem grave, tornando um prognóstico
de reservado a ruim, (VRANJAC, 2002).
25
Figura 10: exantema petequial em paciente com FMB. Figura 11: Sufusões hemorrágicas em paciente com
Fonte: São Paulo, 2011. FMB.
Fonte: São Paulo, 2011.
A doença se não for precocemente tratada, afeta os rins, SNC e pulmões, causando
sintomas diversos como desidratação com hipovolemia, insuficiência renal aguda, oligúria,
azotemia, em casos graves pode causar necrose tubular aguda causando edema generalizado
(membros inferiores, peri palpebral e infecção conjuntival), confusão mental, convulsões,
coma, meningite, pneumonia intersticial, infiltrado alveolar, derrame pleural e outras
manifestações pulmonares como tosse (figuras 12 e 13) (TIRIBA, 2002; BRASIL, 2010).
Também é comum em alguns casos graves hepatoesplenomegalia com necrose focal
de hepatócitos, aumento de enzimas hepáticas (com icterícia em 8 a 9% dos casos), lesões
pancreáticas, sangramentos devido às vasculites e lesões no trato gastrointestinal (BRASIL,
2009).
Os cães geralmente são menos sensíveis à febre maculosa clínica, porém alguns
podem desenvolver casos graves podendo vir a óbito. As raças puras são mais predispostas,
como o Pastor Alemão que é bem sensível a forma clínica da doença (PEREIRA;
LABRUNA, 1998).
O período de incubação e os sinais clínicos são bem parecidos ao homem, com
algumas particularidades como letargia, anorexia, depressão, equimoses cutâneas, epistaxe e
conjuntivite nas mucosas oral, ocular e genital. Sinais comuns também incluem perda de peso,
desidratação, tosse, dispnéia e aumento dos sons bronco-vesiculares (GRENNE;
BREITSCHWERDT, 2006).
26
O envolvimento do SNC também acontece, provocando parestesia, ataxia, rigidez no
pescoço, convulsões, síndrome vestibular, dor abdominal e diarréia, poliartrite e mialgia. As
alterações hematológicas incluem anemia, leucopenia ou leucocitose e trombocitopenia
(FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011) e as bioquímicas são hipoalbuminemia,
hiponatremia e aumento das enzimas hepáticas. Quando há morte na doença severa,
normalmente é resultado de lesões cardiovasculares, neurológicas ou renais (QUINN et al.,
2005).
Figura 12: Necrose cutânea e gangrena de Figura 13: Edema pulmonar em paciente com FMB
extremidade em paciente com FMB. Fonte: São Paulo, 2011.
Fonte: São Paulo, 2011.
2.7 DIAGNÓSTICO
Em geral, o diagnóstico da Febre Maculosa Brasileira baseia-se em sinais e sintomas
clínicos característicos, mas também requer confirmação laboratorial necessária para distinção
de outras doenças que se encaixam como diagnósticos diferenciais (SILVA, 2007). Exames
como PCR, imunohistoquímica, cultura com isolamento da Richettsia (BRASIL, 2010),
cultivo em células vero associados ou não à técnica de “Shell vial” (MELLES; COLOMBO;
LEMOS, 1999), técnica de Weil-Félix, fixação do complemento, microaglutinação, ELISA
(GREENE; BREITSCHWERDT, 2006), hemaglutinação indireta, aglutinação de látex,
microaglutinação e imunofluorescência indireta (RIFI) (SILVA, 2007).
27
A imunofluorescência indireta é o teste mais usado na rotina de sorologia de muitas
doenças inclusive para a febre maculosa, pois é sensível (94 a 100%), específico (100%),
reprodutível, de padronização e execução simples, sendo bastante utilizada em estudos soro-
epidemiológicos, onde são recomendados testes com alta especificidade para evitar falsos
positivos, diagnóstico precoce de riquetisioses e diferenciação de isolados de Rickettsias
(SANCHEZ, 2001). Além das vantagens citadas, também é um teste simples e econômico que
detecta anticorpos IgM e IgG em amostras pareadas de soro, tanto na fase aguda, como na
convalescença da doença (FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011).
Os resultados podem não ser muito confiáveis quando não é usado o antígeno
especifico, pois pode haver reação cruzada com outras rickettsias não patogênicas ou do
grupo da febre maculosa (GFM), porém quando as amostras são testadas contra o antígeno
específico, a titulação resultante é mais elevada (SILVA, 2007).
A RIFI é a técnica de referência usada em muitos laboratórios de Saúde Pública e no
Centers for Disease Control and Prevention (CDC) e também é recomendada pela OMS
(Organização Mundial de Saúde) como inquérito padrão para ser utilizado no diagnóstico das
riquetsioses (MONTEIRO; RODRIGUES; GUEDES, 2006).
2.7.1 Diagnóstico Diferencial
O diagnóstico precoce da FMB é muito difícil, principalmente no início da doença
quando as manifestações clínicas podem também sugerir leptospirose e dengue
principalmente, febre amarela, meningococcemia, sarampo, febre tifóide, febre purpúrica
brasileira (BRASIL, 2009), doença de Lyme, toxoplasmose, rubéola, septicemias por outros
agentes (TIRIBA, 2002), infecções acusadas por enterovírus e arbovírus, outras riquettsioses
(em especial o tifo murino) e reações a drogas (VRANJAC, 2002).
Já nos cães é bem difícil o diagnóstico, devido à inespecificidade dos sinais clínicos,
além de ocorrer infecções subclínicas. A doença pode ser confundida com erliquiose
monocítica canina, babesiose, doença de Lyme, leishmaniose, anaplasmose e qualquer outra
doença febril inespecífica (FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011; LABRUNA et al., 2009).
28
2.8 TRATAMENTO
O tratamento da febre maculosa brasileira é simples e realizado com antibióticos, e
quando feito no estágio inicial da doença raramente evolui para óbito, caso contrario pode
chegar num índice de letalidade de 80% se houver demora no diagnóstico ou início do
tratamento (MONTEIRO; RODRIGUES; GUEDES, 2006).
A antibioticoterapia deve ser introduzida em tempo hábil antes mesmo da
confirmação laboratorial, determinando assim a recuperação do doente. Os principais
antibióticos usados no tratamento são as Tetraciclinas (Tetraciclina e Doxiciclina) e o
Cloranfenicol (BRASIL, 2002). Breitschwerdt et al. (1991), também demonstraram eficácia
no uso da Enrofloxacina em cães experimentalmente infectados em laboratório, comparado ao
Cloranfenicol e Tetracilcina, mais deve ser evitada em cães jovens por causar lesões em
cartilagens. A Tetraciclina e o Cloranfenicol também podem ser usados no tratamento em
cães (FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011). Labruna et al. (2009) descreveram dois casos
de FMB em cães, onde o tratamento foi realizado com Doxiciclina, o qual obteve-se um ótimo
resultado.
O tratamento deve ser continuado por pelo menos sete dias, ou por até dois dias após o
término da febre (BRASIL, 2002), e além dos antibióticos os cuidados de enfermagem como
fluidoterapia entre outros, devem ser realizados para evitar possíveis complicações renais,
cardíacas, pulmonares e neurológicas (GREENE; BREITSCHWERDT, 2006).
2.9 PREVENÇÃO E CONTROLE
2.9.1 Humanos
Nas áreas endêmicas para FMB e onde há circulação do carrapato vetor, devem ser
tomadas algumas medidas profiláticas, tais como evitar caminhar em área rural e silvestre
infestadas pelos mesmos nas áreas de risco, em parques públicos ou praças onde já se
evidenciou a presença do vetor ou ocorrência da doença; vistoriar o corpo a cada 3 horas, pois
quanto mais rápido o carrapato for retirado, menor o risco de contrair a doença além de
29
colocação de placas informativas e avisos em locais estratégicos, uso de botas, calça com a
parte inferior por dentro das botas e a parte superior lacrada com fita adesiva dupla face;
utilização de roupas claras para melhor visualização de carrapatos; não esmagar os mesmos
com as unhas, pois pode haver a liberação da bactéria que pode penetrar por microlesões na
pele, ou seja, devem ser retirados com calma e leve torção (FORTES; BIONDO; MOLENTO,
2011).
O setor de vigilância do local deve orientar a comunidade para procurar serviço
médico aos principais sinais clínicos da doença (febre, cefaléia, mialgias). Nas áreas de
pastos, deve ser feito um rodízio de capina, trazendo alguns resultados no controle de
carrapatos e o uso de carrapaticidas deve ser feito continuamente nos animais dessas áreas
(BRASIL, 2010).
O treinamento de médicos para o diagnóstico e tratamento precoce da febre maculosa
é importante para controlar e prevenir a doença, visando assim minimizar a sua ocorrência
(FORTES; BIONDO; MOLENTO, 2011).
2.9.2 Cães
Nas áreas endêmicas onde o carrapato vetor é o Amblyomma aureolatum e os cães
domésticos são os principais hospedeiros primários do estágio adulto, o controle e prevenção
baseiam-se na aplicação contínua de carrapaticidas (Quadro 1) que podem ser da seguinte
forma:
Quadros 1 – Principais carrapaticidas utilizados em cães
Princípio Ativo Forma de aplicação Efeito Período
Amitras e
Piretróides Banho Curativo
Regularmente, a
cada 7 ou 14 dias
Piretróide
(permetrim e
Flumethrim) e
Selamectina
Pour-on Curativo e
preventivo
Mensais ou por 3 a
6 meses
Fipronil Pulverização Curativo e
preventivo
Sempre que
necessário
Flumethrim/Amitraz Coleira Curativo e
preventivo
Sempre que
necessário Fonte: Vieira et al., 2004; Labruna; Pereira, 2001.
30
A intensidade do tratamento deve ser realizada de acordo com a endemicidade do
local, ou seja, a área não tem casos da doença ou os cães não tem acesso à mata, o tratamento
deve ser feito quando houver infestação por carrapatos (VIEIRA et al., 2004). Já os cães que
tem acesso à mata, devem ser usados produtos de longa ação, uma vez que eles asumem
importante papel no transporte de carrapatos infectados para a proximidade do homem
(PEREIRA; LABRUNA, 2001).
31
3 MATERIAL E MÉTODO
3.1 DEFINIÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO
O município de Diadema, situado na grande São Paulo e inserido no Grande ABCD,
possui uma população de aproximadamente 386.039 habitantes, uma área geográfica de
30,7km2, onde predomina um clima ameno em torno de 25°C. E segundo o censo do Instituto
Pasteur, a população canina do município é de 44.588 cães.
O presente estudo avaliou soros de 69 cães provenientes de três bairros da cidade,
assim distribuídos: 40 do Eldorado, 18 do Campanário e 11 do Real. Foi coletado sangue de
animais de cinco meses a dez anos, domiciliados, semi-domiciliados e errantes, nascidos no
local e que tinham acesso à mata.
Os critérios usados para escolha dos locais para a colheita das amostras foram: o fato
de já ter ocorrido à doença e óbitos em humanos, ter a presença dos carrapatos Amblyomma
aureolatum no local e ter fragmentos de Mata Atlântica próximos às residências.
3.2 COLHEITA DE SANGUE
As 69 amostras de sangue foram coletadas do dia 15 de Agosto a 5 de Setembro de
2011, após o projeto ser submetido e aprovado pelo Comitê de ética para o uso de animais
(CEUA) da Universidade Metodista de São Paulo. Foi realizada punção venosa, cerca de 3 ml
com agulhas e seringas estéreis e descartáveis e a região preparada assepticamente com
desinfecção por algodão embebido em álcool. O sangue foi colocado em tubos seco e
refrigerados em caixa térmica com gelóx, até o laboratório que fica na própria cidade,
centrifugadas por rotação de 3.800 rpm por 4 minutos, então o soro foi separado e colocado
em outro tubo de vidro seco, anteriormente identificado de C1 a C69 e congelado a -20°C
para posterior análise.
Os soros foram encaminhados para o laboratório da SUCEN (Superintendência de
controle de Endemias) para a realização da pesquisa de anticorpos anti-Rickettsia rickettsii
através da técnica de Imunofluorescência Indireta (RIFI).
32
3.3 REAÇÃO DE IMUNOFLUORESCÊNCIA INDIRETA (RIFI)
Os soros foram testados pela RIFI da seguinte maneira: Células Vero infectadas por R.
rickettsii (cepa Taiaçu) foram cultivadas por 3 dias a 28°C, centrifugadas (12.000 g por 30
minutos) em tubos de 50ml e suspensas em salina tamponada com fosfato 0,1 M (PBS)
contendo 0,2% de azida sódica. Dez microlitros dessa suspensão foram aplicadas a cada
orifício das lâminas para antígenos, os quais foram secos ao ar, fixados em acetona por 10
minutos e estocados a -20oC até o momento do uso. Os soros dos cães foram analisados
inicialmente numa diluição de 1/64 com PBS/BSA a 1%. Dez microlitros do soro diluído
foram adicionados a cada orifício da lâmina com o antígeno específico, o qual foi incubada
por 30 minutos à 37o C em câmara úmida. As lâminas foram então submergidas para lavagem
em PBS pH 7,1 por 10 minutos, duas vezes. O passo seguinte foi a aplicação do conjugado
anti-anticorpo de cão marcado com o agente fluorescente FITC, que foi deixado para
incubação em estufa a 37o C por 30 minutos, quando as lâminas foram lavadas sendo
submergidas em PBS pH 7,1 + Azul de Evans por 10 minutos e então deixadas para secar em
câmara escura. As lâminas foram montadas com duas gotas de glicerina tamponada e cobertas
por lamínula, para serem lidas em microscópio de fluorescência sob luz ultravioleta com
objetiva para aumento de 40 vezes. Nesta reação, títulos iguais ou superiores a 1/64 são
considerados positivos.
33
4 RESULTADOS
4.1 PREVALÊNCIA GERAL E POR BAIRRO PARA ANTICORPOS ANTI-RICKETTSIA
SSP ENCONTRADA NOS CÃES
Dos 69 soros testados, 9 reagiram positivamente (>64) para Rickettsia spp. Desta
forma, diante da amostragem do presente trabalho, a prevalência geral de títulos foi de
13,04%.
E separando os positivos por bairros foram: 4/40 (10,0%) em Eldorado, 4/18 (22,2%)
no Campanário e 1/11 (9,09%) no Real (Tab. 1).
Tabela 1 – Distribuição dos cães positivos à RIFI por bairro
Bairros Quantidade
de amostra N° de positivos
Porcentagem
%
Eldorado 40 4 10,0%
Campanário 18 4 22,2%
Real 11 1 9,09%
Geral 69 9 13,04%
4.2 DESCRIÇÃO DOS CÃES POSITIVOS À RIFI
Os cães foram identificados de C1 a C69. Os animais positivos foram: C4, C19, C20,
C21, C28, C29, C30, C48 e C40, provenientes dos três bairros (Tab. 2). Todos eram
domiciliados com acesso à rua diariamente, segundo os proprietários. Vale ressaltar que C20 e
C21 eram de uma mesma proprietária do Eldorado, o C28, C29 e C30 também eram de um
mesmo proprietário e residiam praticamente dentro do Parque do Estado de São Paulo, o C49
residia em uma casa com fundos para parque, no Campanário e o C40 do Real, só passeava
com a dona e presa à corrente.
34
Tabela 2 – Títulos apresentados à RIFI para anticorpos anti Rickettsia ssp e dados dos cães
estudados nos três bairros:
Soro canino Titulação Bairro Sexo Raça Idade
C4 256 Eldorado M SRD 3 anos
C19 512 Eldorado F SRD 4 anos
C20 1024 Eldorado F Pitbull 5 anos
C21 2048 Eldorado F Cocker 6 anos
C28 512 Campanário F SRD 6 anos
C29 128 Campanário M SRD 5 anos
C30 256 Campanário M SRD 6 anos
C48 256 Campanário M SRD 5 anos
C40 256 Real F SRD 3 anos
35
5 DISCUSSÃO
Os resultados obtidos demonstram uma alta porcentagem de animais reagentes pela
RIFI (13,04%) em pelo menos dois bairros estudados, provavelmente pela Rickettsia rickettsii
causadora da doença em humanos. É importante dizer que mesmo que a cepa usada no exame
foi da R. rickettsii, não podemos afirmar que os resultados reagentes foram para a mesma,
pois pode haver reação cruzada com a outras rickettsias do GFM.
Galvão et al. (2002) encontraram 4,11% (3/73) de cães reagentes também para R.
rickettsii, numa região endêmica para FMB em Minas Gerais.
Em relação à distribuição dos animais reagentes nos bairros, destacam-se o bairro
Campanário com 22,2% (4/18) dos cães positivos, ficando um alerta aos moradores locais em
não deixarem seus animais terem acesso à mata (Parque do Estado de São Paulo).
Cardoso et al. (2006) avaliaram o nível de transmissão de febre maculosa em um foco
silencioso do município de Caratinga (MG) através da RIFI em 73 amostras de cães e 18 de
eqüinos, resultando em todas negativas para os cães e 17% (3/18) positivo para os eqüinos.
Pinter et al. (2008) pesquisaram anticorpos em 35 humanos e 25 cães de um área
endêmica, distrito de Taiaçupeba (SP), também através da RIFI contra quatro antígenos: R.
rickettsii, R. parkeri. R. felis, R. bellii., e encontraram 16 cães reagentes para R. rickettsii e
dentre os positivos 14 (56%), 6 (24%) e 3 (12%) também reagiram para R. parkeri, R. felis e
R. bellii respectivamente, mostrando uma porcentagem alta, comparada ao presente estudo. E
para os humanos, apenas 1 (2,8%) foi positivo para R. rickettsii.
Moraes-Filho et al. (2009b) também encontraram uma porcentagem de 17,6% em um
estudo feito com eqüinos do Centro de Controle de Zoonoses (SP) , no período de 2003 a
2005, também pela técnica da imunofluorescência indireta para R. rickettsii dos quais 64
foram positivos de um total de 363 soros testados, o que comparando com o presente estudo,
o resultado foi maior.
No estudo realizado por Moraes-Filho et al. (2009a) no município de Santo André,
também no Grande ABCD com 23 cães para R. rickettsii, 16 (69,6%) foram reagentes para
RIFI. Amostras de carrapatos também foram coletadas, sendo 54,2% de A. aureolatum e
43,2% para R. saguineus. O local estudado, assim como Diadema, possui fragmentos de Mata
Atlântica, e assim como o vetor associado aos casos da doença em humanos é o A.
aureolatum.
36
Na cidade, os bairros com maior incidência foram o Eldorado com 10,0% (4/40) e o
Campanário com 22,2% (4/18), que são os bairros com presença de mata e também com uma
grande população de cães, que contribuem para a proliferação do vetor (A. aureolatum),
justificando os respectivos resultados. Já o bairro Real, que teve uma incidência de 9,09%
(1/11) não possui fragmentos de mata, porém o vetor é encontrado com freqüência e como os
cães errantes transitam muito de um local para outro, pode ser a justificativa para o encontro
do mesmo nesse bairro.
As titulações encontradas na RIFI foram em sua maioria altas, isso não significa que
os animais estavam doentes no momento da coleta, mais sim demonstram infecções recentes,
ou seja, nos últimos doze meses.
37
6 CONCLUSÃO
De acordo com os resultados obtidos na pesquisa, conclui-se que há circulação da
bactéria R. rickettsii nos três bairros avaliados. Não foi percebido nenhum carrapato nos cães
no momento da coleta, mas devido às titulações terem sido altas na maioria dos resultados,
significa que os cães tiveram contato recentemente com os mesmos, ou seja, nos últimos doze
meses.
Todos os cães eram semi-domiciliados, com exceção de um do bairro Real, o que
mostra a importância dos cães viverem estritamente domiciliados para que não tenham acesso
à rua e/ou mata e nem tenham contato com outros animais que possivelmente estejam com o
parasito, mas é importante ressaltar que o encontro de carrapatos e a possibilidade de pessoas
ficarem doentes não têm relação com a distância da mata, uma vez que houve um caso
positivo autóctone de uma moradora do bairro Real, que não possui fragmentos de mata. É
provável que alguns cães tenham levado o carrapato até o local, e são justamente esses cães de
livre movimentação, que dispersam os carrapatos, provocando novos focos da doença.
Outro fato interessante é que nenhum dos animais reagentes apresentava sinais
clínicos da doença, ou seja, são assintomáticos ou apresentam quadros brandos, o que difere
dos casos em humanos em que os sintomas são severos e a letalidade é alta. A maior
importância dos animais, sobretudo, do cão no ciclo desse carrapato é de atuarem como
carreadores dos mesmos para o ambiente domiciliar.
O presente estudo mostrou também que os cães são importantes sentinelas para a
presença da bactéria R. rickettsii em áreas onde o carrapato A. aureolatum é o principal vetor
da febre maculosa brasileira.
Os resultados obtidos demonstram uma alta porcentagem de animais reagentes,
demonstrando o risco de transmissão da doença nas áreas estudadas e a necessidade de se
manter uma continuidade no sistema de vigilância epidemiológica, e também de serem feitos
novos trabalhos soroepidemiológicos para monitoramento dessas áreas.
38
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