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Texto Contexto Enferm, Florianópolis, 2006; 15(1): 162-3.

Teixeira E

HALL S. A IDENTIDADE CULTURAL NA PÓS-MODERNIDADE. 10a ED. RIODE JANEIRO: DP&A; 2005.

Resenha de: Elisabeth Teixeira1

1 Doutora em Ciências Sócio-Ambientais pela Universidade Federal do Pará (UFPA). Pós-Doutorado em Sociologia pela Universidadede Coimbra. Professora Adjunto IV da Universidade do Estado do Pará (UEPA). Docente do Curso de Mestrado em Educação daUEPA. Coordenadora da Rede de Extensão e Pesquisa em/de Práticas Educativas em Saúde e Cuidado na Amazônia (REPPESCAMA).

Endereço: Elizabeth TeixeiraR. Municipalidade 949, Ed. Júpiter, Ap. 110466.050-350 - Umarizal, Belém, PA.E-mail: [email protected]

Artigo original: ResenhaRecebido em: 13 de agosto de 2005Aprovação final: 17 de fevereiro de 2006

A relevância do debate sobre cultura para o cam-po da saúde e enfermagem é inegável. Nesse sentido,o livro de Stuart Hall é extremamente pertinente, poisrepresenta (e apresenta) um avanço na discussão dasidentidades culturais na pós-modernidade. As velhasidentidades que por tanto tempo estabilizaram o mun-do social estão em declínio. Novas identidades estãosurgindo, deixando o indivíduo moderno fragmenta-do. O propósito do livro é explorar algumas das ques-tões sobre a identidade cultural na modernidade tardiae avaliar se existe uma crise de identidade, em que con-siste essa crise e em que direção ela está indo. Ao de-senvolver seus argumentos, o autor introduz certascomplexidades e examina alguns aspectos contraditó-rios que a noção de “descentração do sujeito”, em suaforma mais simplificada, desconsidera.

Stuart Hall é professor da Open University, In-glaterra. Foi um dos fundadores do Centre forContemporary Cultural Studies, da Universidade deBirmingham, Inglaterra, tendo sido seu diretor de 1970a 1979.

Estruturou a organização do livro em seis par-tes. A primeira parte “A identidade em questão” tratade três concepções de identidade: a do sujeito iluminista(individualista); a do sujeito sociológico (interacionista);a do sujeito pós-moderno (que efetiva a “celebração

móvel”, nas palavras do autor). Nesta parte do livro oautor nos faz refletir sobre a questão: o que muda deum extremo a outro? A resposta indica que a condiçãode permanência, a certeza e a continuidade, são condi-ções que se desmancham no ar nestes tempos pós-modernos.

Na segunda parte “Nascimento e morte do su-jeito moderno” emerge o conceito de descentração dosujeito. O autor está tratando da morte do sujeitocartesiano e indica algumas obras e autores que con-tribuíram para esse processo na modernidade tardia,como por exemplo, a releitura de Marx nos anos 60(os homens fazem a história [...] sob as condições quelhe são dadas); também os significados mutantes daspalavras de Saussure e ainda os estudos de Foucaultsobre o poder dos regimes disciplinares, dentre ou-tros. Obras e autores que abalaram as estruturas dosujeito moderno e constituíram e permitiram instituir,como destaca o autor, os descentramentos, pois suasidéias descrevem deslocamentos do sujeito através deuma série de rupturas nos discursos do conhecimentomoderno. Nas palavras do autor: “[...] o sujeito doiluminismo, visto como tendo uma identidade fixa eestável, foi descentrado, resultando nas identidadesabertas, contraditórias, inacabadas, fragmentadas, dosujeito pós-moderno” (p.46).

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A identidade cultural na pós-modernidade.

Avançando no debate, na terceira parte “As cul-turas nacionais como comunidades imaginadas” o au-tor questiona: o que está acontecendo à identidadecultural na modernidade tardia? Como as identidadesculturais nacionais estão sendo afetadas ou deslocadaspelo processo de globalização? O autor destaca que asnações são como comunidades imaginadas, que sãoperpetuadas pela memória do passado, pelo desejo deviver em conjunto e pela perpetuação da herança. Nadesconstrução da idéia de cultura nacional como iden-tidade unificadora, o autor refere que as culturas naci-onais, na verdade, “são atravessadas por profundasdivisões e diferenças internas, sendo unificadas ape-nas através do exercício de diferentes formas de podercultural” (p.62). Neste sentido, para o autor, as naçõesmodernas são verdadeiros “híbridos culturais”.

Na quarta parte “Globalização” o autor afirmaque a globalização enquanto um complexo de forçasde mudança está poderosamente deslocando as identi-dades culturais nacionais, dando continuidade, assim,ao debate iniciado na terceira parte do livro. O autordestaca nesta parte três impactos importantes desseprocesso de globalização sobre as identidades cultu-rais: a desintegração; o reforço pela resistência; a mu-tação (novas identidades-híbridas-estão tomando seulugar). Nas palavras do autor, para alguns teóricos: “Oefeito geral desses processos globais tem sido o deenfraquecer ou solapar formas nacionais de identida-de cultural. Eles argumentam que existem evidênciasde um afrouxamento de fortes identificações com acultura nacional, e um reforçamento de outros laços elealdades culturais, acima e abaixo do nível do estado-nação” (p.73).

Na quinta parte do livro – “O global, o local e oretorno da etnia” - há um instigante debate sobre onovo interesse pelo local e a nova articulação entre oglobal e o local, uma verdadeira dialética das identida-des: entre novas identidades globais e novas identida-des locais. Aqui o autor defende que a globalizaçãotem um efeito contestador e deslocador das identida-des centradas e fechadas de uma cultura nacional. Esseefeito verdadeiramente pluralizante altera as identida-des fixas, tornando-as menos fixas, plurais, mais polí-ticas e diversas. Esse movimento pode produzir doisefeitos, e o autor refere que Kevis Robins1 chama o

primeiro efeito de “Tradição”, quando as nações ten-tam “recuperar sua pureza anterior e recobrir as uni-dades e certezas que são sentidas como tendo sidoperdidas” (p.87). O outro efeito desse processo nasnações é denominado de “Tradução” quando as na-ções “aceitam que as identidades estão sujeitas ao pla-no da história, da política, da representação e da dife-rença” (p.87). Assim, as nações estariam gravitandoentre manter (a tradição) e transformar (a tradução), oque afeta diretamente as novas (ou velhas) formas deidentidade cultural. É nesse movimento/deslocamen-to que emerge a concepção de culturas híbridas (entrea tradição e a tradução) como um dos diversos tiposde identidades destes tempos de modernidade tardia.

Na sexta e última parte do livro“Fundamentalismo, Diáspora e Hibridismo” o autorfaz uma análise do descentramento do Ocidente. Naspalavras do autor: “a globalização não parece estarproduzindo nem o triunfo do global nem a persistên-cia, em sua velha forma nacionalista, do local. Os des-locamentos ou os desvios da globalização mostram-se, afinal, mais variados e mais contraditórios do quesugerem seus protagonistas ou seus oponentes” (p.97).

Este livro é a tentativa de debater o movimen-to/deslocamento produzido pela globalização nas iden-tidades culturais na modernidade tardia/pós-modernidade. Neste sentido, a concepção“descentramento do sujeito” ganha sentido, pois dian-te desses intensos fluxos produzidos/introduzidos naspaisagens culturais, estas se fragmentam/pluralizam ecom elas e a partir delas também o sujeito. O debate éde extrema relevância para os estudos culturais no cam-po da saúde e enfermagem. A noção de híbridos cul-turais pode em muito contribuir com os estudos nes-tes campos, tornando-os mais abertos aos fenômenosplurais e diversos que se manifestam nos respectivossaberes/fazeres dos sujeitos individuais e coletivos. Olivro nos brinda e ao mesmo tempo nos estimula arever nossos scripts culturais e nossa capacidade de in-terpretação do mundo pós-moderno.REFERÊNCIA1 Robins K. Tradition and translation: national culture in its global

context. In: Corner J, Harvey S, organizers. Enterprise andheritage: crosscurrents of national culture. Londres: Routledge;1991.