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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ
LUCIMAR CONHAQUI BERTOTTI
GESTAÇÃO POR OUTREM NO BRASIL
Tijucas
2008
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LUCIMAR CONHAQUI BERTOTTI
GESTAÇÃO POR OUTREM NO BRASIL
Monografia apresentada como requisito parcial para a obtenção do título de Bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas. Orientadora: MSc. Maria Helena machado
Tijucas
2008
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LUCIMAR CONHAQUI BERTOTTI
GESTAÇÃO POR OUTREM NO BRASIL
Esta Monografia foi julgada adequada para obtenção do título de Bacharel em Direito e
aprovada pelo Curso de Direito do Centro de Ciências Sociais e Jurídicas, campus de Tijucas.
Área de Concentração/Linha de Pesquisa: Direito Público
Tijucas, 4 de dezembro de 2008.
Profª. MSc. Maria Helena Machado
Orientadora
Prof. MSc. Marcos Alberto Carvalho de Freitas
Responsável pelo Núcleo de Prática Jurídica
4
A meu querido marido Arlindo pelos momentos em que esteve ao meu
lado, apoiando e entendendo o tempo que estive ausente em razão da
presente pesquisa, e sempre me incentivando nos momentos mais
difíceis do curso.
Aos meus filhos Rodrigo, Vitor Hugo e Isabella que tanto amo, e
fazem a minha vida ficar mais colorida com cada sorriso transmitido
por eles me davam ânimo para continuar a jornada.acadêmica.
A minha mãe pelos ensinamentos e experiências de amor e carinho
transmitidos durante toda a vida.
Ao meu pai, que hoje se encontra ao lado do Pai celestial, mas, sinto
também que sempre esteve torcendo por mim.
5
A Deus, fonte suprema de todo saber.
À minha família, pela confiança que depositaram em mim.
Á Professora Orientadora, Maria Helena Machado, norte seguro na orientação deste trabalho.
Aos Professores do Curso de Direito da Universidade do Vale do Itajaí, campus Tijucas, que
muito contribuíram para a minha formação jurídica.
Aos que colaboraram com suas críticas e sugestões para a realização deste trabalho.
Aos colegas de classe, pelos momentos que passamos juntos e pelas experiências trocadas.
A todos que, direita ou indiretamente, contribuíram para a realização desta pesquisa.
6
O abuso não pode eliminar o uso. A possibilidade de um uso
eticamente inaceitável de uma técnica, fruto do saber humano, não
pode eliminar o seu uso se ela é de benefício para os demais membros
dessa sociedade. O que procede é seu estrito regulamento no marco do
bem comum. Este marco é a Lei.
Aristóteles
7
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do Itajaí -
UNIVALI, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de toda
e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Tijucas, 4 de dezembro de 2008.
Lucimar Conhaqui Bertotti
Graduanda
8
RESUMO
O presente trabalho trata sobre a maternidade substituta no Brasil e suas conseqüências jurídicas. Em primeiro momento sintetiza o histórico da Bioética, fala sobre sua iniciativa no Brasil, conceitua o termo Bioética com posicionamentos de vários autores, evidenciando também os princípios bioéticos. Em segundo momento analisa a fecundação artificial humana bem como seu conceito, explicando sobre o que seria infertilidade e esterilidade, analisando seus aspectos técnicos das diversas formas de fecundação, expondo-se sobre as posições das religiões, principalmente a Católica. E por último trata da fecundação por outrem, diferencia identificação da mãe na gestação por terceiro, suas formas e denominações, nessa fase discorre sobre o conceito de Maternidade no Direito Civil traz a Legislação Brasileira, Primeiramente os princípios constitucionais depois alguns autores tratam a fecundação artificial humana com base no Código Civil evidenciando a lacuna do legislador referente à utilização da técnica.
Palavras-chave: Bioética. Fecundação. Maternidade. Legislação
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ABSTRACT
This paper deals with surrogate motherhood in Brazil and its legal consequences. In the first moment summarizes the history of bioethics, speaking on his own initiative in Brazil, conceptualized the term placements for Bioethics with various authors, also highlighting the bioethical principles. In analyzing the second time artificial insemination human as well as its concept, explaining on what is infertility and sterility, analyzing the technical aspects of the various forms of fertilization, exposing themselves on the positions of religions, mainly Catholic. And finally comes to fertilization by others, unlike identification of the mother during pregnancy by a third party, its forms and names at that stage talks about the concept of Parenting in the Civil Law brings to Brazilian legislation, the first constitutional principles after some authors treat the artificial insemination human-based Civil Code highlighting the weakness of the legislature concerning the use of the technique. Keywords: Bioethics. Fertilization. Parenting. Legislation
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
Art. Artigo
CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
CFM Conselho Federal de medicina
CRFB/1988 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
GIFT Transferência Intratubária de Gametas
IA Inseminação Artificial
n. Número
p. Pagina
RA Reprodução Assistida
v. volume
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LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS
Lista de categorias1 que o autor considera estratégicas à compreensão do seu trabalho, com
seus respectivos conceitos operacionais2.
Bioética
Ética das ciências da vida e da saúde.
Esterilidade
A impossibilidade temporária de procriar, mesmo sem uso de contraceptivos e mantendo uma vida sexual normal3.
Fecundação in vivo
Consiste na introdução dos gametas masculinos dentro da vagina, em volta do colo, dentro do colo, dentro do útero, ou dentro do abdômen, onde a fecundação ocorrerá4.
Fertilização in vitro
Técnica capaz de reproduzir artificialmente o ambiente da trompa de Falópio, onde a fertilização ocorre naturalmente e a clivagem prossegue até o estágio em que o embrião é transferido para o útero5.
Fecundação Homóloga
Processo pela qual a criança que vier a ser gerada por qualquer das técnicas de reprodução assistida for fecundada com a utilização dos gametas masculino e feminino provenientes de um casal, casado ou vivendo em união estável, que assumirá a paternidade e a maternidade daquela criança6.
1 Denomina-se “categoria” a palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou expressão de uma idéia. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito. 8. ed. Florianópolis: OAB Editora, 2003, p. 31. 2 Denomina-se “Conceito Operacional” a definição ou sentindo estabelecido para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias expostas ao longo do presente trabalho. Cf. PASOLD, Cesar Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito, p. 43. 3 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995, p. 31. 4 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução Assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões. Florianópolis SC: Diploma Legal, 2000, p. 41. 5 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações Artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 31. 6 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução Assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões, p. 55.
12
Fecundação Heteróloga
Um ou ambos tipos de gametas do casal não são viáveis e se recorre a um doador de espermatozóide ou/e de óvulos, fora do casal7.
Genitrix
Doadora do material genético8.
Gestatrix
A mulher concebedora, a que leva a termo a gestação9.
Infertilidade
Incapacidade completa de gerar descendentes10.
Mãe
Provém do latin mater, que significa fêmea que deu á luz, origem da vida11.
Reprodução Assistida
É necessariamente o modo de procriar de forma a não se utilizar de maneira natural.
7 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética. 5. ed. São Paulo. Loyola. 2000, p. 221. 8 LIMA NETO, Francisco Vieira. Ciência da vida, os novos desafios: a maternidade de substituição e o contrato de gestação por outrem. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p. 120. 9 LIMA NETO, Francisco Vieira. Ciência da vida, os novos desafios: a maternidade de substituição e o contrato de gestação por outrem, p. 129-130. 10 LIMA NETO, Francisco Vieira. Procriações Artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 31. 11 LIMA NETO, Francisco Vieira. Ciência da vida, os novos desafios: a maternidade de substituição e o contrato de gestação por outrem, p. 127.
13
SUMÁRIO
RESUMO................................................................................................................................. 08 ABSTRACT ............................................................................................................................ 09 LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS ........................................................................... 10 LISTA DE CATEGORIAS E SEUS CONCEITOS OPERACIONAIS.. .......................... 11 1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 14 2 SÍNTESE HISTÓRICA DA BIOÉTICA........................................................................... 16 2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO.................................................................................................. 16 2.2 BIOÉTICA NO BRASIL ................................................................................................... 18 2.3 CONCEITO DE BIOÉTICA.............................................................................................. 20 2.4 PRINCÍPIOS DE BIOÉTICA ............................................................................................ 22 2.4.1 Princípio da autonomia....................................................................................................23 2.4.2 Princípio da beneficiência ...............................................................................................25 2.4.3 Principio da justiça ..........................................................................................................26
3 FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA ..................... ................................................. 29 3.1 CONCEITO DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA........................................... 29 3.2 INFERTILIDADE E ESTERILIDADE ............................................................................. 30 3.3 FORMAS DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA.2 Fidelidade Partidária ......... 31 3.3.1 Homóloga ........................................................................................................................ 31 3.3.2 Heteróloga ....................................................................................................................... 33 3.4 TIPOS DE TÉCNICAS DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA ......................... 34 3.5 ASPECTOS RELIGIOSOS................................................................................................ 36
4 FECUNDAÇÃO POR OUTREM ...................................................................................... 40 4.1 IDENTIFICAÇÃO DA MÃE NA GESTAÇÃO POR TERCEIRO .................................. 43 4.1.1 Mãe portadora.................................................................................................................. 44 4.1.2 Mãe biológica .................................................................................................................. 45 4.1.3 Mãe social........................................................................................................................ 46 4.2 MATERNIDADE NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO................................................... 47 4.3 FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO ........... 48 4.4 DIREITO CONSTITUCIONAL DO NASCIDO............................................................... 53 4.5 NECESSIDADE DE UMA LEGISLAÇÃO PARA IDENTIFICAÇÃO DAS VALIDADES DOS CONTRATOS ......................................................................................... 55
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS.............................................................................................. 59 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 61
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1 INTRODUÇÃO
A pesquisa sobre o tema escolhido tem por objeto12 os aspectos jurídicos da
maternidade substituta. A importância deste tema reside na reunião do maior volume de
conhecimentos técnicos e jurídicos do Brasil, sobre a reprodução assistida e mais
especificamente, a fecundação por outrem, para que os pesquisadores do Direito possam
basear seus estudos e ter um direcionamento bibliográfico.
O Capítulo Primeiro tratará do resumo histórico da bioética passando-se para a sua
constituição, evidenciando os cursos de graduação existente na área biomédica, bem como o
conceito de bioética e os princípios bioéticos pautados no tripé quais sejam; autonomia,
beneficência e justiça, que servem como parâmetros de investigação e diretrizes necessário
aos biopesquisadores.
No Capítulo Segundo será feita uma análise das possibilidades fecundação artificial
humana identificando-se as muitas formas de técnica bem como estabelecendo diferenças
entre esterilidade e infertilidade, sua causa e conseqüência, em segundo momento trata das
formas de fecundação artificial humana tanto homóloga como heteróloga, analisando o
desenvolvimento dessas técnicas de reprodução medicamente assistida.
No Capítulo Terceiro serão tratadas as formas de fecundação por outrem, identificando
os vários tipos de mães, como a mãe portadora, biológica e social concluindo-se pela
necessidade de uma normatização para a proibição, desta técnica que se mostra não benéfica
para a sociedade,
O objetivo institucional da presente Monografia é a obtenção do Título de Bacharel
em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí, Centro de Ciências Sociais e Jurídicas,
campus de Tijucas.
Para o desenvolvimento da presente pesquisa foi levantada a seguinte hipótese:
12 Nesta Introdução cumpre-se o previsto em PASOLD, Cesar Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito, p. 170-181.
15
No Brasil não existe legislação específica para regular a prática da reprodução
assistida e da fecundação por outrem sendo essa prática norteada pelos princípios bioéticos
O relatório final da pesquisa foi estruturado em três capítulos, podendo-se, inclusive,
delineá-los como três molduras distintas, mas conexas: a primeira, atinente a Síntese Histórica
da Bioética, a segunda, Fecundação Artificial Humana; e, por derradeiro, Fecundação por
Outrem.
Quanto à metodologia empregada, registra-se que, na fase de investigação foi utilizado
o método indutivo; na Fase de tratamento de Dados o Método Cartesiano13, E, o Relatório dos
Resultados expressos na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva14
Os acordos semânticos que procuram resguardar a linha lógica do relatório da pesquisa
e respectivas categorias, por opção metodológica, estão apresentados na Lista de Categorias e
seus Conceitos Operacionais, muito embora algumas delas tenham seus conceitos mais
aprofundados no corpo da pesquisa. A estrutura metodológica e as técnicas aplicadas nesta
monografia estão em conformidade com o padrão normativo da Associação Brasileira de
Normas Técnicas (ABNT) e com as regras apresentadas no Caderno de Ensino: formação
continuada, Ano 2, número 4; assim como nas obras de Cezar Luiz Pasold, Prática da
pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis ao pesquisador do Direito e Valdir Francisco
Colzani, Guia para redação do trabalho científico.
A presente monografia se encerra com as Considerações Finais, nas quais são
apresentados pontos conclusivos destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos
estudos e das reflexões sobre a fecundação por outrem no Brasil.
13 “[...] base lógico-comportamental proposta por Descartes, muito apropriada para a fase de Tratamento dos Dados Colhidos, e que pode ser sintetizada em quatro regras:1.duvidar; 2.decompor; 3.ordenar; 4.classificar e revisar. Em seguida, realizar o juízo de valor”. Cf. PASOLD, César Luiz. Prática da Pesquisa Jurídica: idéias e ferramentas úteis para o pesquisador do direito p. 237. 14 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral: este é o denominado Método Indutivo”, Cf. PASOLD, César Luiz. Prática da pesquisa jurídica: idéias e ferramentas úteis para a pesquisa do direito. p. 87.
16
2 SÍNTESE HISTÓRICA DA BIOÉTICA
2.1 ORIGEM E EVOLUÇÃO
Todo conhecimento novo, seja ele científico, filosófico, jurídico ou social, gera grande
discussão. Geralmente busca-se na fonte geradora desses conflitos, a sua origem. Portanto,
com a Bioética, as coisas não aconteceram de modo diferente, por isso que é importante
contextualizar de forma breve mais precisa seu nascimento
Conforme Álvaro M. L.Valls15 no século XX, após a Segunda Guerra Mundial,
experiências marcantes abalaram a confiança da imagem dos médicos perante a sociedade, ou
seja:
Devido a tamanhas atrocidades cometidas por esses médicos como; experiências criminosas com prisioneiros de campos de concentração foram esses médicos foram julgados e condenados, inclusive à morte. Além dessas atrocidades, usaram sua política de manipulação de seres humanos em sádicas experiências, sem nenhuma utilidade e significado científico. Mas se veio, a saber, que no interior do estado de Alabama, na localidade de Tuskegee, um grupo de negros foram usados como cobaias, a maioria com sífilis e proibidos pelos médicos de usar penicilina ou qualquer outro tipo de medicamento que combatesse a doença, com o objetivo de ver até onde esses negros resistiriam. Esses médicos alemães nazistas faziam várias experiências criminosas.
Rodrigo Rezende16 relata que:
[...] outra forma em que os nazistas faziam experimentos consistia em manter pessoas dentro de um tanque de água gelada por várias horas até que ficassem entre a vida e a morte. Neste ponto, eram reanimadas e novamente imersas até que a agonia fosse aliviada pelo advento da morte. Acredita-se que mais de trezentas pessoas foram usadas nesse experimento para entender como o corpo humano reage à hipotermia.
Foi devido a esses acontecimentos que a Bioética surgiu e ganhou força. Sobre a sua
eclosão, José Roque Junges17 relata que “com base nesses desafios, foi que surgiram 15 VALLS, Álvaro L. M. Da ética à Bioética. Petrópolis RJ: Vozes, 2004, p. 137. 16 REZENDE, Rodrigo. Doutores da agonia. Edição 234. Dezembro 2006. Super/abril. Disponível em: <http://super.abril.com.br/superarquivo/2006/conteudo_480635.shtml>. Acesso em: 06. jul. 2008.
17
iniciativas que se desenvolveram lentamente na Bioética”. Portanto compreende-se que seu
surgimento e desenvolvimento estejam ligados, a desafios e problemas característicos do
ambiente anglo-saxão americano.
Devidos a esses acontecimentos foi necessária uma regulamentação a essas condutas
científicas de tamanha covardia e insensatez. Nesse sentido expõe Rodrigo Rezende18 que:
Foi dentro desse clima de indignação que foram lançadas as sementes que propiciaram as conquistas que embasaram as teses democráticas do Estado de Direito que se tem hoje, contexto esse, que interessa destacar, é a oportunidade de regulamentação que passaram a ter os experimentos em seres humanos, cujas cicatrizes, deixadas pela II Guerra Mundial, pelo menos naquele momento, provocaram uma comoção mundial, o que pode ser chamado de crise de consciência.
A primeira Comissão de Ética em pesquisa aconteceu em 1946, como forma de
regulamentação desses experimentos e foi criado o Código de Nuremberg, é o comentário de
Pessini e Barchifontaine19:
O Código de Nuremberg estabelecia que o consentimento voluntário do sujeito da pesquisa é absolutamente indispensável. Restringem suas recomendações às pessoas capazes de dar seu consentimento, não abordando situações especiais como pesquisas em crianças ou em situações de vulnerabilidade (por exemplo, deficientes mentais).
Como se pode constatar eram feitas ao longo desse século experiências sádicas em
seres humanos sem fundamento e significado algum. Mas foi precisamente em 1992 que o
nascimento da Bioética teve seu espaço. Assim, definem Pessini e Barchifontaine20 que:
[...] em 23 e 24 de setembro de 1992, na Universidade de Washington, Seattle, aconteceu uma conferência sobre o ‘nascimento da Bioética’, ocasião em que se reuniram muitos ‘pioneiros’ da nova ética da medicina para rever sua história e projetar o futuro.
Esse foi um lado positivo a se destacar o impulso que tomaram os movimentos sociais,
ao se colocar em discussão igualdade e reconhecimento das diferenças, proporcionando a
reflexão e a fiscalização e a participação social no desenvolvimento da Ciência.
17 JUNGES, José Roque, Bioética, perspectivas e desafios. São Leopoldo: UNISINOS, 1999, p. 19. 18 REZENDE, Rodrigo. Doutores da agonia. Edição 234. Dezembro 2006. Super/abril. Disponível em: <http://super.abril.com.br/superarquivo/2006/conteudo_480635.shtml>. Acesso em: 06. jul. 2008. 19 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 19-20. 20 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 19-20.
18
Mas, foi em 1970, nos Estados Unidos, que o termo Bioética surgiu. Na lição de
Álvaro L. M. Valls21:
[...] foi nos anos 70 que o oncologista Van Rensellaer Potter, utilizou o termo ‘Bioética’ em título a um artigo lançado com a idéia de uma ‘ponte entre a ciência e a vida, estudo e valores, era relação entre a questão ecológica planetária e a próprio cuidado com a saúde.
Importante mencionar que a visão de Potter, foi focalizada na questão em um
compromisso global frente á preservação da relação dos seres humanos com o ecossistema e a
própria vida do planeta
2.2 BIOÉTICA NO BRASIL
No Brasil a Bioética teve sua iniciativa oficialmente constituída no dia 18 de fevereiro
de 1995, é o que define Pessine e Barchifontaine22:
No caso do Brasil, temos a Sociedade Brasileira de Bioética, oficialmente constituída em 18 de fevereiro de 1995, [...]. Esta associação tem as seguintes finalidades: 1) reunir pessoas de diferentes formações científicas ou humanísticas interessadas em fomentar o progresso e a difusão da Bioética; 2) estimular a produção cultural de seus associados e divulgar os propósitos da Bioética; 3) assessorar, quando solicitada, projetos e atividades na área da Bioética; 4) apoiar movimentos e atividades que visem à valorização da Bioética e deles participar.
Percebe-se que, a Bioética no Brasil caminhou a passos lentos, mas veio com o intuito
de crescer e ficar, sujeitando-se vários pesquisadores interessados na área a constituírem os
Comitês de Ética em Pesquisa. É o que comentam José Eduardo Siqueira; Lourenço
Zancanaro e Leonardo Prota23:
Os Comitês de Ética em Pesquisa no Brasil constituem-se em colegiados interdisciplinar e independente, de caráter consultivo, deliberativo e educativo, criados para defender os interesses dos sujeitos da pesquisa em sua integridade e dignidade e, também para contribuir no desenvolvimento da pesquisa dentro de padrões éticos.
21 VALLS, Álvaro L. M. Da ética à Bioética. Petrópolis RJ: Vozes, 2004, p. 20. 22 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 19-20. 23 SIQUEIRA, José Eduardo; PROTA, Leonardo; ZANCANARO, Lorenço. Bioética: estudos e reflexões. Londrina PR: EDUEL Universidade Estadual de Londrina, 2000, p. 237.
19
Além desses comitês, existem outras iniciativas pessoais, institucionais e pontos de
centros de estudos de Bioética em distintos pontos do país é o que apresentam Pessini e
Barchifontaine24:
Núcleo de Estudos da Universidade Católica de Belo Horizonte, Conselho Federal de Medicina (Brasília- DF), Abradem Associação Brasileira de Ética Médica. Centro de Estudos do Instituto Oscar Freire – Departamento de medicina Legal, Ética Médica e Medicina Social e do trabalho Instituto Camiliano de Pastoral da Saúde e Bioética, Núcleo de estudos na Universidade de Brasília. Núcleo de Estudos do Pontífice Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Porto Alegre).
Cabe, portanto, ressaltar que no Brasil a Bioética vem trazendo iniciativas
interessantes e significativas, tendo em vista que vem sendo difundida em cursos de
graduação em medicina, obtendo dessa forma dados conclusivos, merecendo destaque é o que
Sérgio Ibiapina Ferreira Costa; Gabriel Oseka e Volnei Garrafa25 apontam:
No Brasil, merece destaque a Resolução CNS nº 1, de 13 de junho de 1988, do Conselho Nacional de Saúde é o primeiro documento oficial brasileiro que procurou regulamentar as normas da pesquisa da saúde, [...]. Em 1995, sete anos após a aplicação da Resolução CNS nº 1/88, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) decidiu pela revisão da mesma, com o objetivo de atualizá-la e preencher lacunas geradas pelo desenvolvimento científico.
Eis o enfoque trazido por Eduardo de Oliveira Leite26 pela Resolução CMF n.
1.358/92, do conselho Federal de medicina, Art. 1º, Inciso VII Sobre a Gestação de
Substituição (Doação temporária do Útero), in verbis:
Art. 1º Adotar as Normas Éticas para a Utilização das Técnicas de Reprodução Assistida, anexas á presente Resolução, como dispositivo deontológico a ser seguido pelos médicos. [...]. VII - SOBRE A GESTAÇÃO DE SUBSTITUIÇÃO (DOAÇÃO TEMPORÁRIA DO ÚTERO) As Clínicas, Centros ou Serviços de Reprodução Humana podem usar técnicas de RA para criarem a situação identificada como gestação de substituição, desde que exista um problema médico que impeça ou contra-indique a gestação na doadora genética. 1 - As doadoras temporárias do útero devem pertencer à família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos à autorização do Conselho Regional de Medicina. 2 - A doação temporária do útero não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.
24 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 23-24. 25 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética. In: Iniciação à Bioética. Brasília-DF: Conselho Federal de Medicina, 1998, p. 196. 26 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 429.
20
Portanto a Resolução do Conselho Federal de Medicina trouxe mais ênfase à aplicação
da mesma, devendo sempre que necessário ser analisada e aprimorada conforme irão surgindo
lacunas.
Seria uma utopia dizer que a Resolução do Conselho Federal de Medicina resolve
totalmente os problemas concernentes a Reprodução Assistida, mas, pelo menos ameniza,
principalmente no que diz respeito á ética médica. Assim esses profissionais da saúde têm
algo em que se pautar no que pode ou não pode ser feito, quanto a ética da vida.
Porém diante disto a Bioética traz consigo características que limitam ainda mais a
ação dos médicos que agem na biomedicina, sintetizam Pessini e Barchifontaine27:
As principais características da Bioética são: ser uma ciência da qual o homem é sujeito e não somente objeto; ter como critérios: beneficência, a autonomia e a justiça – chamada ‘trindade Bioética’ – cuja articulação assenta-se no tripé, nem sempre harmonioso: médico (pela beneficência), paciente (pela autonomia) e a sociedade (pela justiça), o que exige constantemente haja critérios de decisão, ser notadamente protetora da vida, frente à exerbação técnico- científica; não se pretender nunca acabada, mas aberta aos novos problemas emergentes continuadamente da biologia, da genética, da engenharia genética e das outras ciências [...].
Portanto, a Bioética teve seu início no Brasil reunindo essas características e
finalidades e conseqüentemente objetivando a construção de uma cultura ética respeitando
acima de tudo o ser humano.
Em virtude de tudo que se foi abordado sobre a Bioética é de suma importância
ressaltar que sua tarefa principal ou primordial é de assegurar aos seres humanos que os
direito de quarta geração sejam preservados, respeitando sempre um único princípio, que
engloba todos, ou seja, o princípio da dignidade humana.
2.3 CONCEITO DE BIOÉTICA
Entende-se que, a Bioética é a ética da vida, como ensinam Pessini e Barchifontaine28
“A Bioética é o estudo sistemático da conduta humana no âmbito das ciências da vida e da
saúde, enquanto essa conduta é examinada à luz de valores e princípios morais [...]”. A
Bioética abarca a ética médica, em seu sentido tradicional, trata dos problemas relacionados
27 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 23-24. 28 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 32.
21
com valores surgidos da relação entre médico e paciente. Assim, constitui um conceito mais
amplo, com aspectos importantes.
A ética, porém está intimamente ligada a Bioética, é a definição de José Roque
Junges29:
A Luz das origens, a Bioética é melhor definida, no seu sentido global, como ética das ciências da vida e da saúde. Portanto, ela vai além das questões éticas relativas à medicina para incluir os temas de saúde pública, problemas populacionais, genética, saúde ambiental, políticas e tecnologias reprodutivas, saúde e bem-estar animal, e assim por diante.
A Bioética está, portanto, presente em todos os ramos de conhecimento que envolvem
direta ou indiretamente, a vida.
Emerson Ike Coan30 traz um conceito claro de Bioética que etimologicamente
significa “diálogo entre a vida e a ética (bios=vida, étike=ética), apresentando-a como uma
ramificação da ética, preocupada em manter os valores morais, questionando sobre a
dignidade humana as voltas com o progresso da ciência”.
A Bioética é sem dúvida, a valoração da vida, dos valores morais, a dignidade
humana, porém surgiu com o objetivo de medir os limites dos pesquisadores que agem na
biomedicina.
Volnei Ivo Carlin31 entende a Bioética, como sendo “no âmbito das práticas
medicinais uma regulamentadora de novas práticas biomedicais, envolvendo três categorias,
sendo deontológica, jurídicas e éticas, que exigem comportamento ético com a Medicina e o
Direito”.
Portanto em sentido único a Bioética está efetivamente voltada à vida. É também a
definição de Tycho Brahe Fernandes32:
A Bioética está efetivamente voltada para todas as dimensões que se dá a vida, seja ela animal no sentido do ser humano, seja animal dos seres tidos por inferiores e vegetal. Assim, não se pode reduzir a Bioética a uma mera ética médica e nem pretende ser ela una.
29 JUNGES, José Roque, Bioética, perspectivas e desafios, p. 19. 30 COAN, Emerson Ilke. Biodireito : ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2001, p. 249. 31 CARLIN, Volnei Ivo. Os fundamentos da Bioética e o Direito. Florianópolis: Terceiro Milênio, 1998, p. 17. 32 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões, p. 35.
22
Tendo em vista esses conceitos bioéticos pode-se afirmar que o homem como objeto
de manipulação e exploração da ciência está se procurando tratar como sujeito de direito.
A Bioética é, sem dúvida, direcionador das ações tomadas pelos biopesquisadores e
profissionais da saúde, juntamente com seus objetivos: Segundo Juliana Fronzel de
Camargo33:
A Bioética analisa os problemas éticos dos pacientes, de médicos e de todos os envolvidos na assistência médica e pesquisas científicas relacionadas com o início, a continuação e o fim da vida, com as técnicas de reprodução humana assistida, a engenharia genética, os transplantes de órgãos, as técnicas para alteração de sexo, prolongamento artificial da vida, os direitos dos pacientes terminais, a morte encefálica, a eutanásia, dentre outros fenômenos. Enfim, visa a analisar as implicações morais e sociais das técnicas resultantes dos avanços nas ciências, dos quais o ser humano é simultaneamente ator e espectador.
Depois, de discorrer sobre o conceito de Bioética e analisar os problemas éticos, dessa
análise técnica é preciso direcioná-la, com o intuito de aprimorar sua utilização através de
princípios.
2.4 PRINCÍPIOS BIOÉTICOS
A Bioética, porém é um dilema que envolve pesquisadores e médicos. Afinal não se
pode deixar de ir além, fazendo novas descobertas, encontrar a cura para doenças se, a cada
dia mais, elas estão ao alcance das mãos.
Devido a todos aqueles escândalos demonstrados no início do primeiro capítulo, foi
necessário uma reflexão científica, é com base nessa reflexão de esses mesmos autores
comentam sobre o relatório de Belmont34:
Reagindo a esses escândalos, em 1974 o governo nort-americano constitui, via Congresso, a National Comission for the Protection of Humano Subjetcts of and Bahavioral Research (comissão nacional para proteção dos seres da pesquisa biomédica e comportamental), com o objetivo de “levar a cabo uma pesquisa e estudo completo que indenficasse os princípios éticos básicos que deveriam nortear a experimentação em seres humanos [...]. O Congresso solicitou também
33 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito. Campinas: EDICAMP, 2003, p. 31. 34 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética. In: Iniciação à Bioética, p. 44.
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que a Comissão elaborasse, num prazo de quatro meses, um relatório de pesquisa envolvendo fetos humanos [...]. Após quatro anos de trabalho, a Comissão propôs um método complementar, baseado na aceitação de que “três princípios éticos mais globais deveriam prover as bases sobre os quais formular, criticar e interpretar algumas regras específicas”.
Os princípios identificados pelo relatório de Belmont, foram os seguintes: autonomia,
beneficência e justiça, e foi por esses princípios que seus seguidores deveriam guiar-se,
levando assim a caminhos direcionados numa busca constante do querer, saber e poder fazer,
portanto é sobre eles que trata o próximo item.
2.4.1 Princípio da autonomia
A ciência tem como fundamento a busca constante da verdade, e para que sua função
seja desempenhada de forma correta, e que não venha ferir os princípios sociais, é necessário
estabelecer algumas ‘qualidades morais’. Diante disto, destacam-se frente aos avanços
científicos, três dos princípios da Bioética, quais sejam: o primeiro aqui nomeado refere-se ao
respeito do médico com o paciente.
O primeiro princípio é o da autonomia, ou seja, visa proteger a liberdade de escolha,
sem qualquer influência externa. Nesse sentido, Pessini e Barchifontaine35 ensinam que:
[...] o princípio da autonomia visa estabelecer que o profissional da saúde respeite a vontade do paciente, ou de seu representante, levando em consideração, certa cautela, obedecendo a seus valores morais e crenças religiosas. Tem conhecimento do domínio que o paciente tem sobre sua própria vida, ou seja, domínio sobre seu corpo e mente, e respeito á sua intimidade, com a devida restrição que, com isso, a intervenção alheia no mundo daquele que está sendo submetido a um tratamento.
Considerando sempre que o paciente é um ser capaz, de fazer suas opções e agir sob a
orientação dessas decisões tomadas, devendo, por isso receber um tratamento adequado pela
sua autonomia.
Juliana Fronzel Camargo36 dentro do seu entendimento reafirma que:
[...] com o princípio da autonomia, o ser humano (paciente) tem o direito de ser responsável por seus atos, de exercer seu direito de escolha (autodeterminação), respeitando-se sua vontade, valores e crenças,
35 PESSINI, Léo; BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul. Problemas atuais da Bioética, p. 35. 36 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito, p. 66.
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reconhecendo-se seu domínio pela própria vida e o respeito à sua intimidade.
Sérgio Ibiapina F. Costa, Gabriel Oseka e Volnei Garrafa37 conceituam a autonomia da seguinte forma:
Autonomia é um termo derivado do grego ‘auto’ (próprio) e ‘nomos’ (lei, regra, norma), Significa autogoverno, autodeerminação da pessoa de tomar decisões que afetam sua vida, sua saúde, sua integridade físico-psíquica, suas relações sociais. Refere-se à capacidade de o ser humano decidir o que é ‘bom’, ou o que é seu ‘bem-estar’. A pessoa autônoma é aquela que tem liberdade de pensamento, é livre de coações internas ou externas para escolher entre as alternativas que lhe são apresentadas.
Dentro deste mesmo contexto é o entendimento de Tom L. Beuchamp e James F.
Childress38, compreendendo que “a palavra autonomia deriva do grego, que tem como
significado autos (próprio) e nomos (regra, governo, lei). Portanto, foi empregada como
referência à autogestão, ou autogoverno cidades-estados gregas que eram independentes”.
Tendo por base o que foi abordado, entende-se que o princípio da autonomia é um
princípio fundamental, comenta Guy Durant39 que “justifica-se pela própria natureza porque
se liga á dignidade da pessoa humana. Essa mesma pessoa humana não é uma coisa, nem um
objeto para o qual, se determina um comportamento, mas é livre para assumir o seu destino”.
Portanto, cabe ressaltar que, esse é o princípio da autodeterminação, sendo, portanto
primordial, pois o ser humano tem a autonomia baseada na liberdade, sendo este necessário
para a existência dos outros dois princípios que a frente irão ser comentados.
Considera-se, todavia que deve haver um equilíbrio entre médico, paciente e a
sociedade.
Daury César Fabriz40 conceitua o princípio da autonomia como sendo o “respeito às
pessoas e suas vontades, costumes e convicções, onde todos devem ser responsáveis por suas
escolhas”. Tal princípio está relacionado com a liberdade do paciente, sendo que desde que
não confronte com a autonomia ou que não coloque em risco a vida de outrem, sua decisão
deve ser priorizada.
37 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética. In: Iniciação à Bioética, p. 57. 38 BEAUCHAMP, Tom L; CHILDRESS, James F. Princípios da ética biomédica. São Paulo: Loyola, 2002, p. 137. 39 DURAND, Guy, A Bioética: natureza, princípios, objetivos. São Paulo: Paulus, 1995, p. 33. 40 FABRIZ, Daury César. Bioética e direitos fundamentais: a bioconstituição como paradigma ao biodireito. Belo Horizonte: Mandamentos, 2003, p. 109.
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André Marcelo Soares e Valter Esteves Piñeiro41 afirmam ainda que, “o fundamento
do princípio da autonomia, é a razão”.
Em conformidade com o entendimento antes exposto, Geilza F. C. Diniz42 assevera
que “o respeito a pessoa deve ser interpretado concomitantemente com a aptidão desta de
participar das pesquisas médicas”.
Portanto, observa-se a autonomia como base da razão e no respeito às vontades e
crenças dos seres humanos.
2.4.2 Princípio da beneficência
Os princípios da autonomia e da beneficência estão intimamente ligados, pois médicos
e pacientes estão inseridos em uma relação muito próxima. O direito de um está onde termina
o dever do outro, como numa cadeia de causa e conseqüência.
Juliana Fronzel Camargo43 nomeia os três princípios bioéticos de:
Trindade Bioética’ e coloca como personagens principais o médico, o paciente e a sociedade, ou seja, a autora comenta que o princípio da beneficência ou da não maleficência está ligado à obrigatoriedade do médico em colaborar para o bem-estar do paciente, e com a função de fazer o bem, e conseqüentemente passar confiança não causando dano.
Para Costa, Garrafa e Oselka44 , o princípio da beneficência deve ser entendido de
acordo com o Relatório Belmont com duas obrigações, “uma de não causar dano e outra de
aumentar o número de possíveis benefícios e amenizar os prejuízos”.
José Roque Junges45 também entende dessa maneira observando que:
A atitude positiva de beneficência refere-se principalmente a enfermos fragilizados e dependentes, necessitados de uma assistência contínua. Ela inclui remover e prover benefícios. A beneficência é um dever para o profissional da saúde, quando crianças excepcionais estão envolvidas em pesquisas e exames biomédicos. Nestes casos, evitar efeitos indesejáveis e danosos é um dever mais forte do que produzir efeitos
41 SOARES, André Marcelo M.; PIÑEIRO, Walter Esteves. Bioética e biodireito uma introdução. São Paulo: Loyola. 2002, p. 32. 42 DINIZ. Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos: análise e perspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais. São Paulo: Juruá, 2003, p. 65. 43CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução humana: ética e direito, p. 66. 44 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética, p. 45. 45 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 47.
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bons. Comparando, pode-se dizer que, em igualdade de condições, remover males é mais imperioso do que prover benefícios.
Portanto, entende-se que o princípio da beneficência está voltado para os médicos,
para que este aja visando apenas o bem estar do paciente, inclusive preterindo prováveis
avanços tecnológicos que possam causar algum mal, tanto físico quanto psicológico ao
doente.
Maria Helena Diniz46 assevera que:
O princípio da beneficência requer o atendimento por parte do médico ou do geneticista aos mais importantes interesses das pessoas envolvidas nas práticas biomédicas ou médicas, para atingir seu bem-estar, evitando, na medida do possível, quaisquer danos. Baseia-se na tradição hipocrática de que o profissional da saúde, em particular o médico, só pode usar o tratamento para o bem do enfermo, segundo sua capacidade e juízo, e nunca para fazer o mal ou praticar a injustiça.
Tais princípios vêm enraizados de valores que decorrem das necessidades individuais,
norteando a experimentação de seres humanos nas ciências do comportamento e na
biomedicina.
2.4.3 Princípio da justiça
Segundo José Roque Junges47, o terceiro princípio foi o último a ser incluído no
contexto da Bioética porque existe uma certa resistência a ele. É o princípio da justiça:
O princípio da justiça diz respeito ao terceiro elemento do elo da saúde, a sociedade. Refere-se às exigências éticas das instituições sanitárias e ao orçamento público da saúde. Esta entidade ético-jurídica é constituída pela comunidade dos sujeitos que merecem igual respeito e consideração na reivindicação do direito à vida e a saúde quanto na distribuição eqüitativa dos recursos.
Este princípio conforme relata Junges48:
[...] é de extrema importância, para a existência dos dois primeiros, pois justamente na sociedade que médico e paciente estão inseridos e onde realmente acontecem seus relacionamentos. Os recursos a serem distribuídos também são fundamentais para a existência de ambos.
46 DINIZ, Maria Helena. O Estado atual do Biodireito. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 15-16. 47 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 54-55. 48 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 55.
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Soares e Piñeiro49 fazem uma reflexão acerca do assunto textualizando que:
[...] a ciência deve estar interligada com o princípio da justiça, em cujo qual se deve levar em conta não só “as conseqüências sociais”, mas também no que e para que as descobertas e novas tecnologias serão utilizadas e com qual objetivo, se para beneficío ou para uso indevido, uma vez que a ciência deve preocupar-se com o destino empregando suas criações e descobertas.
Elio Sgreccia50 trata do princípio da justiça como uma obrigação de igualdade,
demonstrando que:
O princípio da justiça se refere à obrigação de igualdade de tratamento e, em relação ao Estado, de justa distribuição das verbas para a saúde, para a pesquisa etc. Isto, se não quer dizer, certamente, tratar de todos do mesmo modo, pois são diferentes as situações clínicas e sociais, deveriam comportar, todavia, a adesão a alguns dados objetivos, como por exemplo, o valor da vida e o respeito a uma proporcionalidade das intervenções.
Soares e Piñeiro51 relacionam este princípio aos direitos, sendo estes garantidos a
todos indistintivamente, principalmente em relação ao direito de autonomia do paciente.
José Roque Junges52 coloca o Estado devedor dessas garantias afirmando que “o
Estado tem o dever de garantir condições para que este princípio seja respeitado assegurando
que não haverá discriminação quanto ao atendimento principalmente das pessoas com classe
social mais baixa, já que apregoa a igualdade e o respeito”.
Geiza Fátima C. Diniz53 concorda que “tem-se que os benefícios referentes ao
exercício da medicina devem ser igualitários, principalmente na disposição dos riscos e
benefícios”.
O princípio da justiça exige uma relação entre benefícios, riscos e encargos,
proporcionados pelos serviços de saúde ao paciente, é o que define Cloclet54:
O princípio da justiça requer a imparcialidade na distribuição dos riscos e benefícios, no que atina à prática médica pelos profissionais da saúde,
49 SOARES, André Marcelo M.; PIÑEIRO, Walter Esteves. Bioética e biodireito uma introdução, p. 39-40. 50 SCRECCIA, Elio. Manual de Bioética: fundamentos e ética biomédica. São Paulo: Laoyola, 1996, p. 167. 51 SOARES, André Marcelo M.; PIÑEIRO, Walter Esteves. Bioética e biodireito uma introdução, p. 40. 52 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 56. 53 DINIZ, Geilza Fátima Cavalcanti. Clonagem reprodutiva de seres humanos: análise e perspectivas jurídico-filosóficas à luz dos direitos humanos fundamentais, p. 65. 54 CLOCLET, Joaquim. Porquê Bioética. São Paulo: Loyola,1996, p. 17
28
pois os iguais deverão ser tratados igualmente. Pode ser também postulado, através dos meios de comunicação, por terceiros ou instituições que defendem a vida ou por grupos de apoio à prevenção da AIDS, cujas atividades exercem influência na opinião pública, para que não haja discriminação.
Conclui-se dessa forma, que todos esses princípios visam proteger o ser humano
garantindo-lhes o direito à vida, bem como o respeito, a justiça e a dignidade, sendo que cada
um não deve ser analisado isoladamente e sim como um todo, vez que eles estão diretamente
ligados entre si, e sua análise individual pode levar a equívocos podendo causar contradições.
Esses princípios surgiram em decorrência dos fatos mencionados no início desse
mesmo capítulo, que devido as barbáries cometidas no período da segunda guerra mundial é
que levaram a necessidade de uma reflexão ética, e que fossem proibidas por ferirem o padrão
ético socialmente aceito em relação à importância da proteção do ser humano.
Realizado todo o texto introdutório acerca da origem e evolução da Bioética,
juntamente com conceito e princípios que a norteiam, cabe agora se proceder ao entendimento
do fenômeno de fecundação artificial humana que o próximo capítulo procura trazer, com o
objetivo de pesquisa no tocante à técnica da fecundação artificial humana com todos os seus
elementos e formas.
É fundamentado nesses princípios que devem estar demonstrados as possibilidades e
conseqüências no tocante á técnica da fecundação artificial humana, baseados em todas as
formas de fecundação é o que apresentará o próximo item.
29
3 FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA
Tendo em vista que a falta de meios não naturais para procriação não é empecilho para
se deixar de ter filhos, segue-se à análise de barreiras éticas e culturais que podem influenciar
as pessoas a não aderirem às técnicas de fecundação artificial humana.
Todavia, pode-se dizer que, ao longo dos tempos, a biotecnologia trouxe novas
perspectivas e, principalmente, esperança àqueles que, das mais diversas formas, dependem
dela, seja para alcançar a cura de uma doença seja para realizar o sonho de ter um filho.
Todas as pessoas que recorrem às possibilidades biotecnológicas estão de alguma
maneira, privadas de efetivarem seus desejos naturalmente e buscam ajuda e respostas para
suas indagações nas pesquisas científicas.
Contudo, na visão de Pessini e Barchifontaine55 é importante observar que, essas
técnicas acabam por determinar situações filosóficas e éticas fundamentais para dignidade da
pessoa humana, ou seja, numa constante busca do saber que tipo de ser humano irá ser
planejado para o futuro, devendo dessa forma impor limites para a ciência, observando
sempre a unidade e estabilidade da família e respeitando a realidade científica e tecnológica
da sociedade em que se vive.
3.1 CONCEITO DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA
Para melhor entendimento, antes de abordar sobre a fecundação artificial humana, é
preciso entender o que é fecundação, e para colaborar, Maria Helena Machado diz que:“A
fecundação, que significa procriação de um novo ser, ou um novo indivíduo, quando ocorre
com o homem, é sinônimo de procriação”.56.
Portanto, no entendimento da referida autora57 fecundação é o mesmo que procriar um
novo ser.
55 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética, p. 194. 56 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 17. 57 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 17.
30
Roberto Senise Lisboa58 traz um conceito de fecundação artificial humana, qual
também chama de fertilização humana assistida, que especifica bastante a sua finalidade:
Fertilização humana assistida é o procedimento de introdução e provocada de sêmem em um ovo, para a formação da célula zigoto59. As técnicas de fertilização60 se desenvolveram como uma alternativa à esterilidade, propiciando-se uma esperança para os casais desalentados pelo fato de que não poderiam conceber uma prole, em face de problemas orgânicos de um deles ou de ambos.
Não há um posicionamento rígido entre os autores que traga conceitos de fecundação
artificial humana de forma única. Alguns exploram mais o conceito técnico, outros trazem
mais o lado humano e social, evidenciando a necessidade e a realização dos casais de terem
filhos.
O importante é ressaltar que, a reprodução assistida é necessariamente uma forma de
procriação humana de forma a não se utilizar da maneira convencional, ou natural.
Ao tratar do assunto Tycho Brahe Fernandes61 esclarece que “As técnicas de
reprodução assistidas são avanços biotecnológicos que tanto permitem contornar os
problemas de esterilidade quando solucionar alguns de infertilidade”.
Sendo de relevante importância para a análise do estudo, o próximo item apresenta
algumas conceituações.
3.2 INFERTITLIDADE E ESTERILIDADE
Preleciona Maria Helena Machado62 explicando sobre a utilização dos referidos
termos:
Muito embora não seja correto, os termos esterilidade e infertilidade são usados indistintivamente, para designar a incapacidade de reprodução. A
58 LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de Direito Civil: Direito de Família e das Sucessões, p. 194. 59 Célula Zigoto: É a célula formada pela fusão de duas células sexuais. Célula que resulta da fecundação de um gameta feminino por um gameta masculino da mesma espécie, tendo a potencialidade de gerar outro indivíduo dessa espécie. Cf. REY, Luís. Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 823. 60 Técnica de Fertilização: Dar-se quando o espermatozóide for depositado através da cópula ou artificialmente no canal vaginal, penetrar o útero e quando encontrar o óvulo. Cf. FRANÇA, Genival. Medicina Legal. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Kooagan, 1991, p. 207. 61 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução Assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões, p. 52. 62 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 17.
31
esterilidade se caracteriza pela impossibilidade de ocorrer a fecundação numa situação irreversível. É a incapacidade definitiva para conceber. [...]. A infertilidade é a capacidade de ter filhos vivos, sendo possível a fecundação e o desenvolvimento do embrião ou feto equivalente à hipofertilidade.
Portanto, pode-se constatar que alguns problemas de infertilidades podem ser
solucionados e os outros problemas de esterilidade podem ser contornados.
Sobre a infertilidade Pessini e Barchifontaine63 explicam sua causa:
A preservação da infertilidade é sem dúvida preferível às tentativas de superação; fatores ambientais como a poluição, fumo, estresse, contraceptivos, práticas de abortos clandestinos, doenças sexualmente transmissíveis e fatores emocionais. A título de exemplo, no Brasil, há uma situação de infertilidade decorrente do uso distorcido de esterilização mulheres esterilizadas com ou sem prévio consentimento e desejosas de uma gravidez[...].
No entanto, para essas mulheres que buscam uma forma de engravidar acabam por não
saber, usando métodos pouco adequados que por si só prejudicam ainda mais o seu sonho de
ser mãe.
3.3 FORMAS DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA
Para melhor entendimento acerca do tema, é preciso esclarecer que há muitas maneiras
através das quais a fecundação artificial humana pode ocorrer e que podem ser através de
reprodução homóloga e heteróloga.
3.3.1 Homóloga
Segundo Eduardo de Oliveira Leite64, a primeira reprodução homóloga ocorreu na
Idade Média, quando um médico de reis e papas, teria obtido sucesso com a inseminação
artificial com o esperma do marido na esposa de Henrique IV de Castela.
Contudo, a inseminação artificial é uma das técnicas mais antiga, mas ao longo dos
tempos vem avançando trazendo novas perspectivas e desafios para a ciência.
63 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética, p. 195. 64 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 30.
32
Pessini e Barchifontaine65 exemplificam quando dizem: “a reprodução assistida
homóloga ocorre quando usado o espermatozóides e óvulos são provenientes do casal”.
Mas que circunstâncias levam um casal a adotar esse tipo de reprodução?
Para José Roque Junges66:
[...] a explicação quanto ao motivo que leva os casais a procurarem esse tipo de reprodução é quando, “no caso da reprodução assistida homóloga, a infertilidade é causada exclusivamente pela falta do ambiente ideal para a fecundação, pois os elementos genéticos estão presentes.
No mesmo entendimento Tycho Brahe Fernandes67:
Pode-se afirmar que se entende por fecundação homóloga o processo pelo qual a criança a ser gerada por qualquer das técnicas de reprodução assistida for fecundada com a utilização dos gametas masculinos e femininos provenientes de um casal casado ou vivendo em união estável, que assumirá a paternidade e a maternidade daquela criança.
Sobre o tema Maria Helena Machado68 também ressalta a questão ética na Fecundação
Homóloga:
No campo ético, a inseminação homóloga, em si, não gera maiores questionamentos, visto tratar-se simplesmente da forma de reunir as células germinais da mulher ou companheira ao do marido ou companheiro a fim de possibilitar a fecundação. Trata-se de uma indicação médica aos casais que se encontram impossibilitados de gerar pelas vias naturais.Não se justificam as alegações de que a inseminação homóloga configura um desvio do processo natural do relacionamento sexual, quando se tem conhecimento que a vontade e o desejo maior do casal impossibilitado de procriar pelos meios naturais do relacionamento sexual é de ter seu próprio filho.
Portanto, no que diz respeito a fecundação homóloga não trazem maiores problemas
seja éticas ou sociais, somente desvia o processo natural de procriação, utilizando as células
germinais do marido e mulher, visto sob o prisma da vontade e o desejo do casal,
possibilitando dessa forma a fecundação.
65 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética, p. 221. 66 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 150. 67 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões, p. 52. 68 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 110.
33
3.3.2 Heteróloga
Diferentemente da homóloga, a segunda forma de fecundação artificial humana
heteróloga, pode-se entender que se utiliza do material genético de terceiros, além do casal.
É o entendimento de Eduardo de Oliveira Leite69 afirmando que, “a inseminação
artificial heteróloga depende diretamente da ocorrência de um terceiro sujeito, ou seja, do
doador”.
Para ratificar a explicação Roberto Senise Lisboa70 afirma que:
[...] a reprodução assistida heteróloga é aquela que, utiliza material genético de pessoa estranha aos cônjuges e coloca ainda que esse tipo de reprodução introduz no seio familiar uma criança que não possui patrimônio genético do cônjuge varão. Indica a reprodução assistida heteróloga, em casos de completa esterilidade masculina, ou em caso de probabilidade de doenças hereditárias.
Pessini e Barchifontaine71 adotam posição diferenciada quanto á doação de material
genético: “Um ou ambos tipos de gametas do casal não são viáveis e se recorre a um doador
de espermatozóides ou/e de óvulos, fora do casal. A Reprodução medicamente assistida
denomina-se heteróloga”.
Leite72 afirma que:
[...] há diferenças a serem consideradas uma vez que a inseminação artificial homóloga é quando realizada com sêmem proveniente do próprio casal, marido, e heteróloga, quando feita em mulher casada com sêmem originário de terceira pessoa ou, ainda, quando a mulher não é casada.
Depois de analisar as formas de fecundação, é o momento de se verificar as técnicas
específicas utilizadas para a fecundação, as quais serão implementadas conforme a
necessidade de cada situação vivida pelo casal.
69 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 41. 70 LISBOA, Roberto Senise. Manual elementar de Direito Civil: Direito de Família e das Sucessões, p. 194-195. 71 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética, p. 221. 72 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 32.
34
3.4 TIPOS DE TÉCNICAS DE FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA
Os casais que não podem ter uma maneira natural de procriar submetem-se a
tratamentos rigorosos, e quando por esse meio também não encontram solução, recorrem as
técnicas de reprodução assistida.
Pessini e Barchifontaine73 apontam quatro principais técnicas de fecundação artificial
humana, também conhecida como reprodução assistida. São a seguir:
A Inseminação Artificial (AI) que consiste na transferência mecânica de espermatozóides, que foram recolhidos e tratados, para o interior do aparelho genital feminino. A Transferência Intratubária de Gametas (GIFT) é a técnica pela qual os dois tipos de gametas (espermatozóides e ovócitos74previamente isolados) são transferidos para o interior das trompas uterinas de modo a que só aí se dá a sua fusão. A fecundação se dará in vivo.Na Transferência Intratubária de Zigotos (ZIFT) ambos os tipos de gametas são colocados in vitro em condições apropriadas para a sua fusão. O zigoto ou zigotos resultantes são transferidos para as trompas uterinas. No caso da Fecundação in vitro a Transferência de Embriões75 (FIVETE) os zigotos continuam a ser incubados in vitro, ou seja, no mesmo meio em que surgiram, até que se dê a segmentação. O embrião ou embriões resultantes serão transferidos para o útero ou para as trompas. Este tipo de fecundação gera o bebê de proveta.
Entende-se que as referidas técnicas de fecundação artificial humana demonstradas por
Pessini e Barchifontaine foram as primeiras que se desenvolveram, porém, hoje, a medicina
tem a oportunidade de combinar essas técnicas, aumentando as possibilidades de sucesso e
procriação.
José Roque Junges76 ressalta a importância dessas técnicas aliadas á manipulação de
gametas:
Hoje, existem técnicas que combinam as vantagens da FIVETE e da GIFT. Depois da fecundação in vitro, transfere-se o embrião em diversos estágios de desenvolvimentos para as trompas de falópio e não para o útero como era de costume, pois as trompas são o lugar natural das primeiras segmentações e dos primeiros dias de gravidez [...]. Foram criadas também técnicas mais sofisticadas de manipulação dos gametas, especialmente no caso de esterilidade masculina. Trata-se de injetar
73 PESSINI, Léo, BARCHIFONTAINE, Cristian de Paul, Problemas atuais da Bioética, p. 220. 74 Ovócitos são as células reprodutoras femininas, antes da maturação, pois quando madura passa a chamar-se óvulo. Cf. REY, Luís. Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde, p. 557. 75 O embrião é um estágio de desenvolvimento dos organismos em que os órgãos e sistemas estão ainda em formação e crescimento. Cf. REY, Luís. Dicionário de termos técnicos de medicina e saúde, p. 257. 76 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 150.
35
diretamente o espermatozóide no óvulo abrindo um sulco na sua membrana de envoltura (ICSI: injeção intracitoplasmática de espermatozóide)
Juliana Fronzel Camargo77, observa mais uma forma de Fecundação Artificial
Humana, também chamada de Reprodução Assistida Mista:
É entendida como uma vertente da fecundação heteróloga e consiste na realização da fecundação de uma mulher com sêmem provenientes de vários homens, entre os quais se encontra incluído o de seu parceiro; bem como a fecundação realizada com óvulos de distintas mulheres, misturados aos óvulos da parceira do casal que deseja ter filhos. É uma técnica criticada, tendo em vista a possibilidade de alterações genéticas, já que o material genético de várias pessoas são misturados.
Juliana Fronzel Camargo78 ainda explica que o objetivo desse tipo de fertilização é
causar efeito psicológico nos pais intencionais, para consolidar a sua paternidade ou
maternidade, a vista de que os materiais genéticos foram misturados, podem realmente
acreditar que são os pais biológicos do bebê que está por chegar.
Maria Helena Machado79 destaca outra modalidade de Fecundação Artificial Humana
também chamada de Inseminação Artificial Intraconjugal (IA). Explica que são realizadas
diretamente no aparelho reprodutor feminino:
a) (IA) Inseminação Artificial Intrauterina – os espermatozóides são depositados diretamente dentro da cavidade uterina. b) (IA) Inseminação Artificial Intravaginal – é injetado o esperma fresco no fundo da vagina através de uma seringa plástica. c) (IA) Inseminação Artificial Intracervical – se constitui no depósito de pequena quantidade de esperma contido em um capilar, no interior do colo do útero. O capilar é retirado do azoto líquido um pouco antes da inseminação e reaquecido rapidamente. O restante do esperma é aplicado através de um “tampão cervical” que é retirado posteriormente. d) (IIP) Inseminação Artificial Intraperitonial – os espermatozóides são introduzidos diretamente no líquido intraperitonial através de uma injeção aplicada na cavidade abdominal para que as próprias trompas captem os espermatozóides fazendo-os seguirem um caminho inverso ao natural, chegando as trompas de Falópio diretamente.
Diante de toda a explanação sobre as possibilidades que a medicina oferece para as
pessoas, independentes de serem casais ou não pelo fato de não poderem reproduzir por meios
naturais, podem recorrer às técnicas de reprodução assistida.
77 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito, p. 31. 78 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito, p. 31. 79 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 36-37.
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Todavia, a evolução tecnológica trouxe a chance de principalmente os casais
desenvolverem uma família, porém é uma questão reflexiva a luz das origens, crenças e
tradições e é por esse prisma que o próximo item vem mostrando a visão das religiões no
contexto da Reprodução Artificial Humana.
3.5 ASPECTOS RELIGIOSOS
Pesquisas científicas e psicológicas nunca comprovaram que a fé tem realmente o
poder de curar. Pode-se, porém, tomar esse aspecto como discutível, pois inúmeras pessoas
alegam terem sido abençoadas pelas benesses religiosas. Mas o fato é que, a influência das
igrejas no cotidiano das comunidades já foi muito maior em outros tempos, e na atual
realidade, pouco se atribui a feitos religiosos, assim como as pessoas se importam quanto ao
que as igrejas tomam como correto ou não.
Porém, houve muita dificuldade em eliminar o que se pode chamar de vício, trazido
pelas religiões, traduzido na idéia de que só Deus tem o poder de conceder ou destituir a vida
e que jamais esta faculdade poderia ser transferida para as mãos do homem.
Todavia, este cenário foi, por muito tempo, um entrave para o desenvolvimento das
técnicas científicas de reprodução assistida.
As palavras de José Roque Junges vem colaborar com essa idéia de que “trata-se
apenas de superar a visão da pessoa como mera administradora e entendê-la como
protagonista da vida. O próprio deus delega o governo da vida à autoderminação do ser
humano e isso não fere a sua autonomia80”
É estranho perceber que a própria Bíblia no livro de Samuel81 traz a idéia de
infertilidade como uma espécie de maldição, de carga ruim trazida pela mulher para o interior
dos lares.
A Bílblia coloca aqueles que podem ter filhos como abençoados por Deus, nos
Salmos82. Por que então não permitir que aqueles que não conseguem reproduzir sejam
agraciados de outra forma, com a reprodução assistida?
80 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 114. 81 E fez um voto, dizendo: SENHOR dos Exércitos, se benegnamente atentares para a aflição da tua serva, e de mim te lembrares, e da tua serva te não esqueceres, e lhe deres um filho varão, ao SENHOR o darei por todos os dias da sua vida, e sobre a sua cabeça não passará navalha. Cf. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada: livro de Samuel, p. 282.
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Eduardo de Oliveira Leite83 transmite exatamente o posicionamento da igreja Católica
quanto a reprodução assistida:
Se a procriação de uma nova idéia só pode ser fruto do casamento, a fecundação artificial – fora do casamento – é pura e simplesmente condenada como imoral. Em decorrência, a condenação da inseminação artificial fora da união conjugal. Não existe possibilidade de divergência de opiniões entre católicos: a criança concebida nestas condições é ilegítima.
A igreja católica, ao longo dos tempos, sempre se posicionou contrária às técnicas de
reprodução assistida. Qualquer método que altere o percurso da vida desde a Inseminação
artificial até a Barriga de Aluguel será reprovado pela Igreja.
A CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil84, em sessão plenária da
Congregação para Doutrina na Fé, através do qual Papa Bento XVI, fala sobre o valor e a
inviolabilidade da vida humana, bem como a condenação da fecundação artificial e destruição
de embriões:
Segundo Bento XVI, a fecundação extracorpórea levou a uma série de problemas ligados à congelação de embriões humanos, a redução embrional, ao diagnóstico pré-implantatório, à pesquisa com células estaminais embrionárias e às tentativas de clonagem humana.
É claro que ocupar a posição de que a vida possa ser manipulada e desvalorizada de
forma arbitrária não será adotada pelos biopesquisadores e é justamente por isso que aí esta a
bioética. Sempre que se falar em vida, falar-se-á de ética..
Partindo-se do ponto de que as crianças geradas através de reprodução assistida vieram
ao mundo com o consentimento dos pais, pressupondo que estes terão condições sociais para
criá-la, e ainda dentro dos parâmetros da ética e da moral, considerando-se que a Igreja não
deveria considerá-la ilegítima, afinal, nasceu e irá crescer como todas as demais crianças.
82 Herança do SENHOR são os filhos; o fruto do ventre, seu galardão. Como flechas na mão do guerreiro, assim os filhos da mocidade. Feliz o homem que enche deles a sua aljava; não será envergonhado, quando pleitear com os inimigos à porta. Bíblia. Português. Cf. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada, p. 625. 83 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 74. 84 CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Papa Bento XVI Condena Fecundação Artificial e Destruição de embriões. Blog da Sagrada Família Disponível em: <http://www.blogdasagradafamilia.blogspot.com/>. Acesso em: 29. jun. 2008.
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José Roque Junges85, reforça dizendo que: “todo tipo de discriminação é uma forma
velada de desvalorização da vida, porque afirma que a vida de uns vale mais que a de outros”.
A própria Igreja prega a unidade entre corpo e espírito. Desta forma, defende que cada
ser humano é único. A reprodução assistida, porém não chega para tirar essa faculdade do ser,
pois da mesma forma, as técnicas permitem que cada ser seja único. A diferença é a maneira
de que foi gerado.
Lopes86 destaca que outras religiões, como o judaísmo e o islamismo, permitem que se
utilizem as técnicas de reprodução assistida, mas apenas a forma homóloga.
Há dois tipos diferentes de inseminação artificial - o sêmen pode vir do cônjuge ou de um homem desconhecido. No primeiro caso, a maioria dos rabinos encara a criança como descendente legítima do pai, ainda que alguns rabinos afirmem que o pai não cumpriu com suas obrigações de procriar. Ao problema do doador ser desconhecido a maioria dos rabinos se opõe muito abertamente pois, apesar de não haver a transgressão da proibição do adultério, isto nos leva a problemas acerca da herança - pois tecnicamente a criança não é considerada descendente do marido da mãe e portanto, sem direitos - e da possibilidade de incesto - ao não saber a identidade do pai, a criança poderia casar-se com um(a) meio(a) irmão(ã). Ainda, há a preocupação com a manutenção da unidade familiar e questões são levantadas acerca da posição emocional de uma criança feita por "produção independente" da mãe.
A Igreja Protestante apresenta um pensamento mais liberal, é o que comentam Sérgio
Ibiapina F. Costa, Gabriel Oseka e Volnei Garrafa87:
Finalmente a Igreja Protestante, apresenta um pensamento mais liberal a respeito das técnicas de reprodução assistida (RA). O pastor André Dumas assim manifestou-se sobre o assunto: “Eu sou favorável a inseminação artificial humana, mesmo com esperma do doador, pois é uma possibilidade permitida pela ciência, de superar a esterilidade, mas ela deve ser praticada com a concordância do marido e da mulher.[...].
Analisando o exposto, vê-se que inclusive religiões consideradas arcaicas e
preconceituosas já aceitam ás técnicas de reprodução assistida.
Contudo pode-se constatar que somente a Igreja Católica, numa visão dogmática
coloca empecilhos, objetivando a questão do amor, do sexo e da reprodução, e que através do
85 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 115. 86 LOPES, Nelly de Souza. Bioérica medicina e o judaísmo. 18. set. 2006. abíblia.org. Disponível em: <http://www.abiblia.org/artigosview.asp?id=52>. Acesso em: 28. jun. 2008. 87 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética. In: Iniciação à Bioética, p. 125.
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matrimônio, o homem e a mulher têm como objetivo único a reprodução, não importando se
são férteis ou não.
Portanto foi visto o quanto as religiões podem influenciar ou não na prática das
técnicas de reprodução assistida, o aspecto religioso na presente monografia tiveram por
finalidade apenas de exemplificar e mostrar as posições de cada entidade religiosa perante a
Fecundação Artificial Humana.
Depois de fazer uma análise sobre o entendimento e aceitação de cada religião sobre a
fecundação artificial humana, a partir desse momento, passará a ser analisado os aspectos
ligados a necessidade de uma normatização para a regularização da prática referente á técnica
da Fecundação Artificial Humana.
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4 FECUNDAÇÃO POR OUTREM
A reprodução, para o casal é uma coisa instintiva, ou seja, quando a reprodução tão
desejada não tem sucesso, a ciência e as novas técnicas entram em cena, interferindo
diretamente tornando possível a realização do sonho.
A fecundação por outrem, é uma prática antiga. O primeiro registro está na Bíblia88,
“quando Raquel, esposa de Jacó, ao ter certeza de que não poderia dar filhos ao marido, pede
a este que mantenha relações com uma escrava para posteriormente criar o filho como seu”.
Dessa forma poderá entender-se que, a fecundação por outrem nada mais é do que a
sub-rogação de útero, ou seja, consiste em uma mulher ceder o seu útero para dar à luz a uma
criança e entregá-la a um casal que não pode ter filhos por meios naturais.
Para Eduardo de Oliveira Leite89, a técnica consiste em:
[...] apelar a uma terceira pessoa para assegurar a gestação quando o útero materno não possibilita o desenvolvimento adequado do bebê ou ainda quando esta gestação oferece riscos à vida da própria mãe. Segundo o autor acima citado, os primeiros casos clínicos relacionados a empréstimo de úteros ocorreram no Japão, 1963, e posteriormente nos Estados Unidos, em 1975, inclusive com a criação de uma associação de mães de substituição em 1988.
Mães de substituição podem existir até três, mas para melhor entendimento, é preciso
separar cada conceito. Primeiro é importante destacar que também poderá haver mãe sem que
haja a presença da figura masculina.
Nesse sentido Machado, Silva e Lapa90 trazem uma argumentação lógica conceituando
as formas de mães uma das técnicas como “transferência nuclear quando vislumbram-se nos
88 Vendo Raquel que não dava filhos a Jacó, teve ciúmes de sua irmã e disse a Jacó: Dá-me filhos, senão morrerei. Então, Jacó se irou contra Raquel e disse: Acaso estou eu em lugar de Deus que ao teu ventre impediu frutificar? Respondeu ela: Eis aqui Bila, minha serva; coabita com ela, para que dê à luz, e eu traga filhos a meu colo, por meio dela. Assim, lhe deu a Bila, sua serva, por mulher; e Jacó a possuiu. Bila concebeu e deu à luz um filho a Jacó. Então, disse Raquel: deus me julgou, e também me ouviu a voz, e me deu um filho; portanto, lhe chamou de Dã. Cf. BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada, p. 36. LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 66.
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meios científicos a possibilidade da fecundação de um óvulo através de célula que pode ser
feminina, pelo procedimento da FIVETE - Técnica de Fertilização in vitro com Transferência
de Embrião”.
Prosseguem os autores91 afirmando que:
[...] com a utilização dessa técnica para fecundação de seres humanos, cujos experimentos foram concluídos recentemente na Austrália, automaticamente, torna-se dispensável a figura masculina na procriação. Os nascidos através dessa técnica não terão pai. Nesse caso um casal homossexual (feminino) que desejar ter um filho com o produto genético das duas parceiras, poderá recolher o óvulo maduro de uma das mulheres onde deverá ser injetada célula de outra mulher in vitro, da mesma forma que um óvulo se funde com o espermatozóide.
Os conceitos para identificar as posições ocupadas por cada mulher na relação de sub-
rogação de útero é fundamental para entender melhor o vínculo que se estabelece a partir do
acordo realizado entre as mães e qual o papel de cada uma na situação.
Lima Neto92 estabelece dois conceitos identificadores das mães participantes da
relação de sub-rogação de útero, quais sejam a genitrix – doadora do material genético e a
gestatrix - que é a mulher concebedora, a que leva a termo a gestação. Tal denominação,
segundo o autor, tem origem na legislação francesa.
Existe como já foi mencionado anteriormente da fecundação apenas por gametas
femininos através da FIVETE, é no entanto a chance de a criança possuir até três mães, é o
exemplo citado por Silva e Lapa93 quando referem-se a tal possibilidade em que “o material
genético vem das duas mulheres e os gametas fecundados por esse material podem ser
implantados em uma delas ou em uma terceira mulher, na modalidade de sub-rogação de
útero”.
Considera-se importante destacar a maternidade no que envolve questões jurídicas
com a seguinte pergunta: Depois do envolvimento de tantas pessoas até o nascimento do bebê,
quem efetivamente assume o lugar de mãe da criança?
90 MACHADO, Maria Helena. SILVA Reinaldo Pereira e. LAPA, Fernanda Brandão. Orgs. Bioética e Direitos Humanos, p. 172. 91 MACHADO, Maria Helena. SILVA Reinaldo Pereira e. LAPA, Fernanda Brandão. Orgs. Bioética e Direitos Humanos, p. 172. 92 LIMA NETO, Francisco Vieira. Ciência da vida, os novos desafios: a maternidade de substituição e o contrato de gestação por outrem, p. 98. 93 SILVA, Reinaldo Pereira; LAPA, Fernanda Brandão. Bioética e Direitos Humanos, p. 173..
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Por enquanto é uma incógnita, mas há posicionamentos quanto às questões decorrentes
da reprodução assistida e maternidade substituta.
Maria Helena Diniz94 apresenta sua posição contextualizando:
Enfim, o que teria mais valor; o conteúdo genético transmitido ao filho ou o vínculo afetivo criado entre a gestante e o feto? Mereceria o repúldio aquela que enfrentou o ônus físico e psicológico da gestação e do parto? Julgamos que deverá o legislador optar pela prevalência da presunção da paternidade e da maternidade em prol do casal que idealizou o nascimento; o filho, aos olhos da lei, dele será, mesmo que o material genético não seja seu, pouco importando que tenha sido ou não gerado no útero da esposa ou se ela forneceu o óvulo, fecundado pelo sêmem do marido ou de terceiro e gestado no ventre de outra mulher. O filho deverá ser, portanto, daqueles que decidiram e quiseram o seu nascimento, por ser deles a vontade procriacional.
Eduardo de Oliveira Leite95 observa que sempre que se refere á maternidade por
outrem constitui sempre em objeto de discussão a matéria relativa á importância dos
problemas éticos, social psicológicos, jurídicos e financeiros, mas quanto á nível médico, não
comporta maiores indagações, e acrescenta:
A nível ético, a entrega da criança após o parto constitui inevitavelmente um momento difícil de ser vivido pela mãe de substituição. A gravidez é vivida – pela maioria das mulheres – como um período de feliz plenitude. Imagine-se as sensações vivenciadas pela mãe de substituição durante 9 meses sabendo que o término da gravidez terá de enfrentar o doloroso momento da entrega de um ser que, naturalmente, lhe pertence. Até que ponto é justificável a entrega desta criança? E o cônjuge e os filhos da mãe de substituição, como acreditar que eles aceitam bem esta gravidez que lhes é estrangeira? Como convencê-los a encarar com naturalidade que ela carrega um bebê que será abandonado a outro casal, ao fim de 9 meses?
O importante é ressaltar que estas discussões estão fundamentadas, de uma enorme
vontade de uma mulher, de ser mãe, ou seja, quando uma mulher sujeita-se á deixar que seu
filho seja carregado no ventre de outra durante nove meses como se aquele estivesse dentro
de si, sonha e faz planos de vida para o bebê, pressupõe-se que nessa mulher haja uma
vontade muito grande de ter filhos e de ser mãe, no melhor sentido da palavra. E que a mãe de
substituição deverá vivenciar esta gravidez convicta de que será apenas a portadora desse
sonho.
94 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito, p. 496. 95 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 68.
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Outra discussão abordada é sobre essas crianças ovuladas e geradas por outrem, no
futuro acarretarão algum tipo de problema psicológico? Eduardo de Oliveira Leite96 comenta
que:
Por falta de dados estatísticos quais os reais efeitos sobre a psique da criança integral com a mãe que lhe gerou e a passagem, igualmente brusca, para a mãe que lhe deseja ardentemente, mas que, certamente, não a gerou nem carregou, nem alimentou, nem estabeleceu contatos de ordem psico-afetiva.. Eis alguns terrenos de intensa sombra, sobre os quais nem os progressos da ciência médica, nem as pesquisas psicológicas conseguiram lançar luzes suficientes capazes de esclarecer esses mistérios.
Portanto os problemas concernentes à fecundação por outrem pode ou não acarretar
problemas psicológicos na criança, ou no seu desenvolvimento emocional, Todavia, hoje,
comenta-se muito também sobre o acompanhamento do pai na gravidez, e no caso de uma
sub-rogação de útero o pai não vai poder estar presente o tempo da gravidez junto da mãe
portadora.Outros questionamentos também são passíveis de rever principalmente no que diz
respeito a identificações dessa mãe substituta.
4.1 IDENTIFICAÇÃO DA MÃE NA GESTAÇÃO POR TERCEIRO
Com o passar dos anos a ciências inovou suas técnicas de fecundação, ficando cada
vez mais difícil sua regulamentação visto que, as leis vão surgindo conforme as necessidades
de uma sociedade para que ela possa ter seu livre arbítrio sem maiores complicações, é não é
o que está acontecendo, os problemas vão surgindo e crescendo num emaranhado de
discussão.
Bem, já se passou o tempo em que usava-se o princípio romano da mater semper cert
est, a inovação trazida pelo progresso da ciência, fez surgir preocupações no campo jurídico e
social. Regina Fiuza Sauwen97, traz essa idéia quanto à dúvida da maternidade:
Inversamente ao que ocorre como a paternidade, o desenvolvimento das técnicas de Procriação Assistida (fertilização in vitro, congelamento de embriões etc) e o uso do “útero de aluguel” colocaram em dúvida o princípio da maternidade certa Mater semper certa est! Quem é a mãe: a
96 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 189-190. 97 SAUWEN, Regina Fiuza. HRYNIEWICZ, Severo. O Direito “in vitro”: da Bioética ao Direito, p. 87.
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que cedeu o óvulo, a que gestou a criança ou a que a encomendou e se propõe a educá-la?
Considera-se a mais importante e decisiva para as questões jurídicas, a pergunta que se
refere á determinação da maternidade. Depois do envolvimento de tantas pessoas até o
nascimento do bebê, quem efetivamente assume o lugar de mãe da criança? É, portanto, o que
deveria ser considerado o que vai se tratar a seguir.
Machado, Silva e Lapa98 citam três situações em que a criança pode ser filho de várias
mães, podendo existir nessa relação até três ‘mães’, é o que explica:
Pode-se ter: a mulher que cedeu o óvulo; a mulher a quem o nascido se destina; a terceira mulher, que surge como portadora, e, ainda, a possibilidade de existir uma quarta mulher, como no caso de transferência de gametas alheios fertilizados e o embrião retirado, para ser gestado pela mãe portadora. Portanto mãe substituta, além de ser gestante, é também genitora. No caso da mãe substituta, a situação diverge da mãe portadora e de aluguel, porque, além de emprestar o seu útero, também doará os seus óvulos. Na segunda hipótese, teríamos a “mãe portadora”, aquela que somente poderá emprestar o útero. O embrião fecundado in vitro e implantado na mãe portadora e, geneticamente, do casal interessado. No terceiro caso, considerado o de maior complexidade, o embrião é implantado em terceira mulher, ou seja, o óvulo de uma mulher, fecundado pelo espermatozóide do marido ou companheiro da mãe social e implantado em outra para gestação.
Portanto com a fecundação artificial e a sub-rogação de útero surgiram várias ‘mães’
então dessa forma o que pode-se conceituar de mãe portadora, biológica e social, o próximo
item traz evidenciando o papel primordial de cada uma dessas mulheres nessa relação de sub-
rogação de útero.
4.1.1 Mãe portadora
Machado, Silva e Lapa99 comentam sobre o que seria a chamada ‘mãe portadora’:
[...] aquela que somente poderá emprestar o útero. O embrião fecundado in vitro e implantado na mãe portadora e, geneticamente do casal interessado. A gestante é somente portadora do embrião fecundado em laboratório, com espermatozóide e óvulo do casal solicitante.
98 MACHADO, Maria Helena. SILVA Reinaldo Pereira e. LAPA, Fernanda Brandão. Orgs. Bioética e Direitos Humanos, p. 175. 99 MACHADO, Maria Helena. SILVA Reinaldo Pereira e. LAPA, Fernanda Brandão. Orgs. Bioética e Direitos Humanos, p. 176.
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Juliana Fronzel Camargo100 apresenta conceitos das duas possibilidades de mães
portadoras que integram a relação de sub-rogação de útero:
Portadora sub-rogada: seu uso está indicado quando os ovários de uma mulher têm a capacidade para produzir óvulos normalmente, mas são incapazes de levar a termo a gestação, por problemas uterinos, malformações etc. Nestes casos, o óvulo desta mulher é fertilizado com os espermatozóides do marido e o embrião é transferido para a portadora sub-rogada. Mãe sub-rogada: ocorre quando há uma mulher incapaz de produzir óvulos funcionais e também de gestar, é o caso, por exemplo, de mulheres que tiveram que retirar seu útero ou ovário. Neste caso, pode-se até recorrer a uma doadora de óvulos e, depois, a uma barriga de aluguel portadora sub-rogada, ou seja, utilizar mulheres diferentes.
Portanto no caso da mãe portadora, a mulher cede o útero que apenas irá gestar o bebê,
ou seja, o material genético tanto do pai quanto da mãe serão fecundados em laboratório e
implantados no útero da mãe portadora e esta manterá o bebê até o nascimento. Este tipo de
reprodução se dará in vitro.
4.1.2 Mãe biológica
Uma mulher que empresta seu útero, às vezes chega até doar seus óvulos ficaria difícil
imaginar a entrega do bebê gerado por essa ‘mãe’ de substituição, esta é a mãe biológica
Eduardo de Oliveira Leite101 expõe o problema:
A mãe de substituição além de “emprestar” seu útero, dá igualmente seus óvulos. Trata-se de uma mulher fértil que será inseminada com o esperma do marido da mulher que não pode conceber. Se ela engravidar, ela garantirá a gravidez de uma criança que é, geneticamente sua, e, após o parto, a dará ao casal. Ou seja, no caso da mãe de substituição, a mãe é, ao mesmo tempo, genitora e gestante [...]. A entrega da criança após ao parto constitui inevitalvelmente um momento difícil de ser vivido pela mãe de substituição. A gravidez é vivida - pela maioria das mulheres como um período de feliz plenitude.
Maria Helena Machado102 também ratifica na sua obra explicando sobre a
possibilidade da mãe biológica que consiste“no caso da mulher que deseja ter um filho ser
estéril procura a mãe substituta e esta com o compromisso de além de doar seu óvulo para ser
inseminado com o espermatozóide do marido da mulher estéril, desenvolver a gravidez no seu
100 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito, p. 123. 101 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 68. 102 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 53.
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ventre”. Ainda acrescenta a autora que “no caso da mãe substituta, a situação diverge da mãe
portadora e de aluguel, porque, além de emprestar o seu útero, também doará o seu óvulo. a
criança é filha do seu óvulo e do útero”.
4.1.3 Mãe social
Maria Helena Machado103 também traz um exemplo de mãe social:
No terceiro caso, considerado de maior complexidade, o embrião é implantado em terceira mulher, ou seja, o óvulo de uma mulher, fecundado pelo espermatozóide do marido ou companheiro da mãe social e implantado em outra para gestação [...]. Com o uso desta técnica de procriação, teríamos três categorias de mães: a mãe genética, que é a mãe que produz os óvulos (biológica); a mãe portadora ou gestora, que carrega a criança no ventre até o nascimento, e mãe que ficará com a criança.
Portanto, torna-se cada vez mais complicado entender o papel de cada uma dessas
pessoas como mãe, seja ela portadora, biológica ou social. Pois se pode entender que a mãe
portadora apenas gesta o bebê, a mãe biológica doará seus óvulos para se implantados na mãe
portadora e a mãe social, o seu único papel nessa relação é ficar com a criança, com o dever
de educá-la e criá-la, sem ter atribuído para a maternidade.
A dúvida paira no cenário jurídico uma vez que fica indeterminado nessa relação de
técnica de procriação assistida, ao avaliar qual a maternidade que poder-se-ia considerar
certa.
Regina Fiuza Sauwen104 traz esse questionamento, colocando alguns problemas de
natureza jurídica:
Novamente se reacende a polêmica sobre o sentido da maternidade, com uma série de dúvidas de ordem ética, de caráter psicológico e de natureza jurídica. Eis algumas: No caso de mulheres que contratam um útero por motivos estéticos, que tipo de tratamento deve ser lhes dado? Que efeitos psicológicos o “útero de aluguel” pode produzir-se na criança? Se a dona do “útero de aluguel” vier a sofrer algum dano físico ou falecer por causa da gestação, o “locatário” terá algum tipo de responsabilidade? Apesar do sigilo e dos acordos que normalmente envolvem a doação do esperma, o cedente poderá reclamar a paternidade?A receptora do esperma poderá reclamar alimentos?
103 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 176. 104 SAUWEN, Regina Fiuza. HRYNIEWICZ, Severo. O Direito “in vitro”: da Bioética ao Direito, p. 87.
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Haja vista que, dentro desse contexto apresentado aparecerão novos e cruciantes
problemas, tornando-se cada vez mais urgente uma legislação de defina os parâmetros de cada
questão envolvida nessa relação em que essas pessoas estão inseridas,e que também, embora
a lei não defina, tem cada uma dessas pessoas um papel importante e complexo nesta relação
seja de fecundação artificial humana ou sub-rogação de útero.
4.2 MATERNIDADE NO DIREITO CIVIL BRASILEIRO
É necessário, antes de conceituar o que seria maternidade no Direito Civil Brasileiro,
conceituar a palavra mãe, pois estão diretamente vinculadas.
Francisco Vieira Lima Neto105 traz conceituações advindas do latim, do termo mãe,
informando que “importante buscar a origem da palavra mãe, a qual provém do latim mater,
que significa fêmea que deu à luz, origem da vida [...]”. Prossegue o autor trazendo outra
definição que vem acrescentar mais ainda à conceituação “Chegou ao português pela palavra
latina mamma, que quer dizer mama, teta. Fica claro, portanto, que mãe é quem deu à luz,
pois é a gestante que tem seu corpo preparado pela natureza para alimentar o bebê logo após o
nascimento”.
A maternidade substituta possui várias denominações. É também chamada de sub-
rogação de útero, maternidade sub-rogada ou, ainda, a popularmente conhecida como barriga
de aluguel.
A maternidade substituta é a mais antiga das formas de procriação não convencional.
Ela até pode se utilizar de meios naturais, quando o gameta da mãe substituta é fecundado
pelo gameta do biológico e sociológico afetivo, mas não é a maneira convencional, pois mãe
não é efetivamente aquela que criará a criança.
Diante de todo o contexto histórico, ainda se continua a utilizar esse método de
maternidade substituta agora com uma técnica mais avançada, tendo em vista o avanço da
ciência. Para reforçar o conceito de Maternidade, a Legislação Brasileira, mais precisamente
Código Civil expõe no art. 2º106, que “os direitos estão a salvo e a partir do momento que a
família considera o embrião parte dela, entende-se garantido o direito da dignidade da pessoa
humana para o nascituro concebido via sub-rogação de útero”. 105 LIMA NETO, Francisco Vieira. Ciência da vida, os novos desafios: a maternidade de substituição e o contrato de gestação por outrem, p. 127. 106 ANGHER, Anne Joyce. Vadem Mecum acadêmico de Direito. 4. ed. São Paulo: Rideel, 2007, p. 199.
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José Roque Junges107, reforçando essa idéia expõe que:
O embrião não é ainda pessoa humana em plenitude, mas pertence á espécie humana e tem todas as potencialidades para tornar-se pessoa. Neste sentido, ele é ascrito à humanidade e merece a solidariedade ontológica por sua proximidade e identificação com a espécie humana e, por isso, atribui-se a ele a dignidade pessoal. Qualquer redução do embrião a meio para outros fins é um desrespeito a sua dignidade.
Porém, correntes doutrinárias não consideram o nascituro como sujeito de direitos,
Jussara Maria de Leal Meirelles108 explica que, tradicionalmente, a teoria prevalecente no
cenário jurídico do Brasil é natalista, ou seja, baseia-se na idéia de que apenas há sujeito de
direitos a partir do nascimento com vida. A observação da autora é pertinente, pois, esses
direitos não são meras expectativas de direitos do nascituro e sim, estão garantidos através da
adoção da curatela e do reconhecimento filial.
Portanto, o Código Civil até então trabalhava com a idéia de que mãe é sempre certa e
que a condição do pai era presumida, mas agora o cenário social alterou trazendo mudanças
que também deviam pertencer ao cenário jurídico. Todavia o Direito Civil está ligado á
Reprodução Assistida, mas fica a desejar, principalmente no que diz respeito às suas
conseqüências e utilizações.
4.3 FECUNDAÇÃO ARTIFICIAL HUMANA NO CÓDIGO CIVIL BRASILEIRO.
Filiação Matrimonial conceitua-se como a que se origina na constância do casamento
dos pais, ainda que anulado ou nulo conforme o Código Civil arts. 1561 e 1617109:
Dentro deste contexto Maria Helena Diniz110 entende que:
Assim, o casamento dos genitores deve ser anterior não só ao nascimento como também à sua própria concepção; logo, em princípio, o momento determinante de sua filiação matrimonial é o de sua concepção. Todavia pode ocorrer que o filho seja concebido antes e nascido depois da celebração do casamento, sem que por isso deixe a filiação de ser matrimonial.
107 JUNGES, José Roque. Bioética, perspectivas e desafios, p. 136-137. 108 MEIRELLES, Jussara Maria Leal de. A vida humana embrionária e sua proteção jurídica. São Paulo: Renovar, 2000, p. 59. 109 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum acadêmico de Direito, p. 276-279. 110 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil brasileiro, Direito de Família. v. 5. 20. ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 430.
49
Quando se fala dos reflexos da Fecundação Humana no cenário jurídico brasileiro,
inúmeras são as dificuldades que se apresentam, uma vez que, em razão de todas as
possibilidades colocadas á disposição pelas inovações tecnológicas, nunca tanto quanto hoje,
discute-se a questão da delimitação da maternidade e da paternidade.
Essas discussões esbarram no silêncio quase que total do sistema nacional, que ainda
não se conscientizou sobre a necessidade da delimitação de normas que ordenem as práticas
relacionadas à Reprodução Assistida.
O Código Civil de 1916 apenas trazia duas possibilidades de presunção de
paternidade, elencadas em seu art. 338111 conforme abaixo:
Art. 338 - Presumem-se concebidos na constância do casamento: I - os filhos nascidos 180 dias, pelo menos, depois de estabelecida a convivência conjugal; II - os nascidos dentro nos 300 dias subseqüentes à dissolução da sociedade conjugal por morte, desquite, ou anulação.
Portanto, entende-se uma nova a idéia das três diferentes possibilidades de presunção
de paternidade trazidas pelo Código Civil de 2002 em seu art. 1597, além dos incisos I e II112
foram acrescentados os incisos III, IV e V, conforme a seguir:
Art. 1597 - Presumem-se concebidos na constância do casamento os filhos: III havidos por fecundação artificial homóloga, mesmo que falecido o marido; IV – havidos, a qualquer tempo, quando se tratar de embriões excedentários, decorrentes de concepção artificial homóloga; V – havidos por inseminação artificial heteróloga, desde que tenha prévia autorização do marido.
O Código Civil autoriza, mas não regulariza, esse tipo de técnica, Flávio Augusto
Monteiro de Barros113, faz um comentário sobre cada inciso do referido artigo:
Diz-se homóloga a inseminação artificial realizada com sêmem e óvulo dos próprios cônjuges. Neste caso, a inseminação é introduzida no útero materno, quando o marido ainda encontrava-se vivo; [...] Embriões excedentários são aqueles ainda não introduzidos no útero materno. Anote-se que a presunção de paternidade independe da prévia autorização do marido; [...] Heteróloga é a inseminação artificial em que o material genético, masculino ou feminino, ou ambos, é oriundo de um
111 OLIVEIRA, Juarez. Org. textos. Código Civil. 45. ed. São Paulo: Saraiva, 1994, p. 71. 112 ANGHER, Anne Joyce. Vade Mecum acadêmico de Direito, p. 278. 113 BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Manual de Direito Civil: Família e Sucessões. v. 4. São Paulo: Método, 2006, p. 109.
50
terceiro. Neste caso, a presunção de paternidade depende da prévia autorização do marido.
Todavia vale aqui mencionar que a questão da reprodução assistida ter sido incluída
no Código Civil de 2002, não quer dizer que tenha sido uma solução, mas sim uma verdadeira
problemática, no que concerne aos meios jurídicos advindos da reprodução assistida,
conforme cita Sílvio de Salvo Venosa114.
Advirta-se, de plano, que o Código de 2002 não autoriza nem regulamenta a reprodução assistida, mas apenas constata a lacunosidade a existência da problemática e procura dar solução ao aspecto da paternidade. Toda essa matéria, que é cada vez mais ampla e complexa, deve ser regulada por lei específica, por um estatuto ou microssistema.
Portanto, nota-se que há uma necessidade em se adotar uma lei para regular essas
práticas que se confronta com essa dificuldade de esclarecimento.
Maria Helena Machado115 assevera acerca do problema:
A inseminação artificial, além dos novos e cruciantes problemas, criou um vocábulo próprio. Fala-se com a maior naturalidade em doadores de sêmem e de óvulos, bancos de embriões, mãe de aluguel, substituta ou gestora, embriões congelados, excedentários, criopreservados, fecundação post mortem, além de outros termos não menos surpreendentes, deixando perceber como ficam profundamente alterados os conceitos de paternidade e maternidade.
Apesar de não estar sendo devidamente codificado, o tema de Reprodução Assistida
vem sendo pauta de inúmeros Projetos de Lei. Estes projetos têm sido, de certa forma,
permissivos, principalmente no que se refere a quem pode ter acesso a Reprodução Assistida.
O termo casais inférteis, conforme coloca o Projeto de Lei n. 2.855/97, por exemplo, é muito
abrangente e atende às necessidades dos mais variados tipos de casais, como reforça Miriam
Pillar Grossi116:
O que vemos a respeito da forma como o debate está se encaminhando no Brasil é que enquanto não houver legislação pertinente às novas tecnologias de reprodução, fica mais ou menos “livre” o mercado e as diferentes formas que indivíduos ou casais buscam as novas tecnologias reprodutivas. De alguma formar, vejo que a ausência de legislação específica pode ser benéfica para as mulheres que não se enquadram na “normalidade” de um casamento heterossexual.
114 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2007, p. 216. 115 MACHADO, Maria Helena. Reprodução humana assistida: aspectos Éticos & Jurídicos, p. 112. 116 GROSSI, Miriam Pillar. Bioética e Direitos Humanos. Florianópolis. OAB/SC, 2002, p. 131.
51
Portanto os Projetos de Lei estão cada vez mais se aprofundando na matéria referente a
legislação pertinente aderindo assim as novas tecnologias de reprodução assistida,
preocupando-se em colocar regras, para que não vire um mercado livre.
Enquanto a Lei regulamentadora está apenas em projeto, é preocupante os casos de
inseminação, principalmente a homóloga, é o que comenta Fernando Araújo117:
No caso de uma inseminação artificial homóloga, isto é se o doador de esperma for o marido, os casos mais complicados que podem surgir são: a) o da inseminação depois da morte do doador, o que pode suscitar dificuldades de direito sucessório, devendo notar-se que simples proibição da inseminação post mortem, em absoluto ou decorrido um prazo, ou por falta de autorização do doador, não resolve o problema, pois a haver uma inseminação apesar da proibição continua a suscitar-se o problema da paternidade, com todas as suas conseqüências; b) a inseminação depois do divórcio e depois de passado o período de presunção legal de paternidade (os 300 dias do artigo 1597 do Código Civil), se aquela inseminação não foi, ou deixou de ser consentida.
Quanto aos problemas decorrentes á inseminação artificial post mortem, surgem no
campo jurídico algumas dúvidas no que tange à filiação, visto que, a esposa será inseminada
com os gametas do marido já falecido.
Portanto lacunas forma deixadas pelo legislador, à esse consentimento é ou não
passível de revogação. A Resolução 1358/92 do Conselho Federal de Medicina prevê inciso
V, item 3118: “no momento da criopreservação, os cônjuges devem expressar sua vontade, por
escrito, quanto ao destino que será dado aos pré-embriões em caso de divórcio, doenças
graves ou de falecimento de uma deles ou de ambos, e quando desejam doá-los”.
Portanto, o que se deve levar em conta são os problemas relacionados aos direitos
sucessório, decorrente da inseminação post mortem, e no caso da inseminação heteróloga o
problema da paternidade de inseminação não consentida?
Fernando Araújo119 também faz algumas indagações a respeito de que se o marido não
pedir o divórcio, faz presumir a paternidade, ou será que “ao invés, de pedir o divórcio, afasta
esse presunção, e quanto ao direito da criança a alimentos e em relação aos direito sucessórios
desta”.
117 ARAÚJO, Fernandes. A procriação assistida e o problema da santidade da vida. São Paulo: Almedina, 1999, p. 23. 118 RESOLUÇÃO CONSELHO FEDERAL DE MEDICINA N. 1.358, DE 1992. ghenteorg. Disponível em: <http://www.ghente.org/doc_juridicos/resol1358.htm>. Acesso em: 01 out. 2008. 119 ARAÚJO, Fernandes. A procriação assistida e o problema da santidade da vida, p. 25.
52
Ademais os problemas concernentes a Fecundação artificial humana, no Direito Civil
existem, e os legisladores não podem fechar os olhos, ficando a sociedade a mercê de
perguntas de sem obtenção de resposta, pois as leis devem se adequar conforme a necessidade
dessa sociedade que luta pela realização de seu sonho.
Sérgio Ibiapina F. Costa, Volnei Garrafa e Gabriel Oseka120, entendem que as novas
tecnologias ligadas a ciência devem ser limitadas quando dizem:
A curiosidade científica e a busca incansável de novas descobertas nas ciências da saúde sempre preocuparam a humanidade. Daí, a necessidade de estabelecer limites precisos no desenvolvimento da ciência biomédica. O conhecimento biomédico, acumulado ao longo do tempo, buscou essencialmente o benefício da espécie humana. No entanto, em nome desse desenvolvimento, regras básicas de comportamento ético foram desrespeitadas. Cabe a sociedade, portanto, controlar a ciência, evitando desvio.
Portanto também é do entendimento desses membros do Conselho Federal de
Medicina, que tendem haver legislação reguladora pertinente a matéria, para controlar a
ciência.
Contudo cabe ressaltar a importância de uma lei vigente nos pais, em vista de muitos
equívocos provocados pela inseminação artificial humana no que tange aos direitos dos
menores. Esbarrando também no direito sucessório, ou outros problemas como embriões
destruídos, inseminação pos mortem, problemas hereditários, enfim, desencadeando
problemas que se não existir uma legislação específica esses problemas só irão crescer, em
vez de serem resolvidos.
Todavia, a ciência é sabedora, e vai além almejando sempre o melhor no
desenvolvimento da humanidade, o que está faltando são regras, ou seja, normas
regulamentadoras, que possam dar uma direção, pois, todavia vai estar sempre gerando
conflitos ético-jurídicos trazendo implicações na sociedade afetando a família, a paternidade e
a maternidade, surgindo assim a presença do Direito.
Este pode ser considerado um avanço razoável no que diz respeito à filiação sócio-
afetiva. Demonstra claramente, que no Direito tem evoluído no sentido de incluir em si uma
nova categoria amor, e não estar apenas constituído de ordenamentos materiais.
120 COSTA, Sergio Ibiapina Ferreira; GARRAFA, Volnei; OSELKA, Gabriel. Apresentando a Bioética, p. 145.
53
4.4 DIREITO CONSTITUCIONAL DO NASCIDO
Quando se falar em normatização da Reprodução Assistida, há de se destacar que na
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, não existem parâmetros específicos
para direcionar os estudos sobre a Reprodução Assistida, assim como explica Paulo Marcio
Cruz121:
Já os ditos direitos de quarta dimensão, que se referem á informática e á manipulação genética lato sensu, ou biodireito, encontram-se todavia em estágio ainda embrionário, quando analisados sob o prisma do constitucionalismo contemporâneo. A preocupação, presente já em muitas discussões técnicas e políticas, é relativa a como se poderá controlar e regular estas atividades.
Portanto, enquanto não se tem uma legislação concreta, onde possa-se efetivamente
pautar, é necessário aliar os interesses da Engenharia Genética aos princípios constitucionais
brasileiros. Conforme Ivo Dantas122, os princípios constitucionais quando incorporados aos
valores morais refletem a própria estrutura ideológica do Estado, é o que explica:
[...] quando incorporados a um sistema lógico-jurídico-positivo, eles refletem a própria estrutura ideológica do Estado, a qual se diz presente em todo o conteúdo (conceito material) da Lei Maior. Esta, por sua vez, reflete o momento histórico-cultura através dos denominados valores sociais, que incorporados ao ordenamento jurídico constitucional determinam o rumo e a diretriz de todo o sistema infraconstitucional.
Contudo o que deve ser destacado é que o texto constitucional traz princípios e estes
devem ser seguidos em todos os ramos do Direito e, ainda mais, no que diz respeito a
assuntos para os quais não há legislação específica ou definida. Os princípios constitucionais
serão sempre os ditames em que se deverá pautar qualquer legislação que venha a surgir face
á sub-rogação de útero.
Há de se destacar três dentre todos os princípios constitucionais: o artigo 1º inciso III,
art. 3º inciso IV, art. 5º e 6º123, in verbis:
Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união, indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se
121 CRUZ, Paulo Marcio. Fundamentos do Direito Constitucional. Curitiba: Juruá, 2005, p. 164. 122 DANTAS, Ivo. Instituições de Direito Constitucional Brasileiro. Curitiba: Juruá, 2004, p. 331. 123 BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 17-19.
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em Estado democrático de Direito e tem como fundamentos: III – a dignidade da pessoa humana;
Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil: IV – promover o bem de todos, sem preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.
Art. 5º Todos são iguais perante a lei sem distinção de qualquer natureza, garantido-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito á vida, á liberdade, á igualdade, á segurança e á propriedade, nos termos seguintes;
Art. 6º São direitos sociais [...], a saúde, [...] a proteção á maternidade e a infância na forma desta Constituição.
O art. 1º inciso III, trata da dignidade humana, é justamente neste princípio que está
colocada toda a proteção da própria existência humana relacionada ás atividades que o Estado
lhe proporciona.
O art. 3º, em seu inciso IV, diz que é o objetivo fundamental da República Federativa
do Brasil, promover o bem de todos sem discriminação, ora se esse é o objetivo do Estado,
privar um homem ou mulher de ter filhos, não seria uma forma de discriminá-los, já que suas
limitações advém justamente de uma falha genética?
Já o art. 5º, é claro em suas definições trazendo no caput, a garantia do direito à vida aí
está, mais uma vez, a certeza da possibilidade de tutela por parte do Estado em relação ás
crianças advindas da maternidade substituta.
E por fim o art. 6º, que traz também outros direitos garantidos ás pessoas que buscam
a reprodução assistida. Todavia a saúde é o primeiro direito garantido no referido artigo que
pode ser aplicado à técnica ora abordada. A saúde depende do bem-estar da pessoa enquanto
incluída na sociedade, ou seja, a saúde psicológica.
O segundo direito tutelado pelo art. 6º é o da proteção á maternidade, Maria Helena
Diniz124 leciona sobre o assunto:
As normas de tutela á maternidade, que é um direito social garantido constitucionalmente, são imprescindíveis em atenção á função biológica e á perpetuação da espécie humana, de modo a que a mulher possa ter condições favoráveis para tanto e para não perder os efeitos de sua faculdade procriadora [...].
124 DINIZ, Maria Helena. O Estado Atual do Biodireito, p. 128.
55
Importante destacar que nenhum dos art. da CRFB/88 veda a reprodução assistida e,
como é de conhecimento de todos que atuam no âmbito jurídico, se não há vedação, não há de
se falar em proibição, é o que relata Juliana Fronzel Camargo125.
Assim, o estado não pode negar ás pessoas que se beneficiem dos avanços advindos de áreas a que ele mesmo dá especial atenção. Não bastassem as previsões legais, tomando-se como base os princípios da legalidade e da anterioridade, vigentes no sistema jurídico pátrio, conclui-se que a procriação artificial e, de fato uma atividade lícita, pois no nosso ordenamento, tudo o que não é proibido, a princípio, é permitido, assim, não havendo uma proibição legal expressa e específica, nem uma tipificação de crime, são válidas as técnicas de procriação artificial na tentativa de solucionar a infertilidade humana.
Portanto é claro e notório que são vários ditames constitucionais que podem respaldar
a Reprodução Assistida e nela inclui-se a Maternidade Substituta. E é com base nesse estudo
dos princípios constitucionais que é aplicado em todos os ramos do direito sendo também
necessária uma análise de como está inserido o termo Maternidade no Código Civil.
4.5 NECESSIDADE DE UMA LEGISLAÇÃO PARA IDENTIFICAÇÃO DAS
VALIDADES DOS CONTRATOS.
Ao se falar sobre a normatização da Reprodução Assistida, há de se destacar na
Constituição da República federativa do Brasil de 1988, não existem parâmetros específicos
para direcionar os estudos sobre a Reprodução Assistida, como explica Paulo Márcio Cruz126:
Já os ditos direitos de quarta dimensão, que se referem á informática e á manipulação genética lato sensu, ou biodireito, encontram-se todavia em estágio ainda embrionário, quando analisado sob o prisma do constitucionalismo contemporâneo. A preocupação, presente já em muitas discussões técnicas e políticas, é relativa a como se poderá controlar e regular estas atividades.
São inúmeras as discussões jurídicas que envolvem o Direito da quarta geração, que
sejam ligados a biotecnologia, mas enquanto não se tem uma regulamentação, quando poderia
se pautar, se faz necessário aliar os interesses da engenharia genética aos princípios
constitucionais brasileiro.
125 CAMARGO, Juliana Frozel de. Reprodução Humana: ética e direito, p. 143. 126 CRUZ, Paulo Marcio. Fundamentos do Direito Constitucional, p. 164.
56
Nos casos de maternidade substituta, é normal que o casal faça um acordo com a
mulher gestora e inclusive faça questão de formalizar esse acordo, através de um contrato.
Portanto é aqui que a legislação civil entraria em cena, através dos Direito de Obrigações.
Eduardo de Oliveira Leite127 coloca o seguinte questionamento;
A primeira questão que suscita a prática da “mãe de substituição” é a de saber se a lei do contrato pode ou não ser aplicada á espécie quando a transação envolve uma gravidez, um parto, a entrega de um bebê. Ou melhor, seria possível assimilar a noção de contrato comercial _que envolve troca de serviços comerciais por exemplo – ao “contrato” de aluguel, que envolve a gestação de uma criança com posterior entrega?
Vale, portanto, mencionar que, toda obrigação tem por si um objeto, qual seria o
objeto deste contrato, um empréstimo ou locação de útero, ou gestação com posterior entrega
de um bebê, que poderia então ser considerado o produto final? Essa questão é difícil de ser
respondida, mas alguns aspectos podem e devem ser analisados.
No Brasil, a hipótese de um contrato, não está descartada, mas o Conselho Federal de
Medicina só autoriza a realização da sub-rogação para pessoas que tenham parentesco até
segundo grau, é o entendimento de Eduardo de Oliveira Leite128:
No Brasil esta é a forma de mãe de substituição prevista no artigo 1º da seção VII (sobre a gestação de substituição - - doação temporária do útero) da Res. N. 1358/92, que assim se manifestou sobre a possibilidade: As doadoras temporárias do útero devem pertencer á família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau, sendo os demais casos sujeitos á autorização do Conselho Regional de Medicina.
É também o entendimento de Maria Celeste dos Santos129 que “não há norma de cunho
penal tipificando a atividade de intermediação de pessoas para firmarem contrato ou de firmar
o pacto em si”
Portanto há necessidade de uma Lei vigente no Brasil, pois somente existem
parâmetros na Resolução que apenas informa de que forma e em quais situações podem haver
a aplicação da técnica, é o que comenta Tycho Brahe Fernades130:
127 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 403. 128 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 185. 129 SANTOS, Maria Celeste Cordeiro Leite. Biodireito : ciência da vida, os novos desafios. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001, p. 140.
57
Para regular a matéria, o Conselho federal de Medicina editou a Resolução n. 1.358, de 11 de novembro de 1992, que, em seu inciso VII, trata da gestação de substituição (doação temporária de útero). Segundo estabelece a primeira parte do dispositivo, sua utilização somente ocorrer “desde que exista um problema médico que impeça ou contra-indique a gestação na doadora genética”. [...] e no item 2, a referida substituição não poderá ter caráter lucrativo ou comercial.
Tratando do assunto, afirma Thereza Cristina Bastos de Menezes131 que:
[...] qualquer contrato que envolvesse a locação de útero seria inaceitável dentro do sistema vigente, asseverando que o art. 199, parágrafo 4º, da Constituição da República, veda a comercialização de órgãos, tecidos e substâncias humanas e que o óvulo é uma substância humana e o embrião um ser humano.
Ademais não existe norma legal que ampare a sub-rogação de útero, nem que proíba a
não ser a citada resolução que vincula os médicos e as clínicas, mas não ‘as mães’. Por isso a
prática vem cercada de dúvidas e questionamentos que geram profunda perplexidade no meio
social e grande cautela entre os juristas.
Importante mencionar que a Resolução do Conselho Federal de Medicina Lei n.
1.358/92, veda a comercialização ou caráter lucrativo da doação temporária de útero. Fique
claro que o contrato não está vedado, mas sim a remuneração pelo feito.
Segundo Luiz Edson Fachin132:
[...] a engenharia genética surpreendeu o direito. Somente agora os juristas começam suas viagens sobre os territórios da Bioética e do biodireito, parecendo bombeiros atrás de um incêndio, transitado no paradoxo que pode haver entre instrumentos de liberdade e artefatos da mercancia.
Em síntese a a regra no Brasil é que o ‘aluguel de útero’ não poderá ter caráter
lucrativo ou comercial, e que a idéia de contrato da mãe de substituição deve ser rejeitada,
pois pessoas não pode ser objeto de contrato.
Todavia no cenário jurídico brasileiro já existem casos que se basearam na Resolução
do Conselho Federal de Medicina apresentada no primeiro capítulo onde existe a permissão 130 FERNANDES, Tycho Brahe. A Reprodução assistida em face da Bioética e do Biodireito: aspectos do direito de família e do direito das sucessões, p. 103. 131 MENEZES, Thereza Cristina Bastos de. Novas técnicas de reprodução humana: o útero de aluguel. v. 79. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, p. 103. 132 FACHIN, Luiz Edson. Direito de Família: elementos críticos à luz no novo código civil brasileiro. 2 ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2003, p. 250-251.
58
de sub-rogação de útero, inciso VII, n. 1133 – expõe: “as doadoras temporárias do útero devem
pertencer á família da doadora genética, num parentesco até o segundo grau [...]”.
Porém o Jornal Folha de São Paulo134 noticiou em 1º de junho de 2004, o nascimento
de um bebê gestado pela avó paterna em Minas Gerais. A avó possuía 53 anos à época da
gravidez e houve não maiores problemas em relação a gestação a maior problemática surgiu
quando o pai do bebê e, por mais estranho que pareça, filho da mãe biológica do mesmo bebê,
foi ao cartório de registro civil da cidade de nova lima, onde a família morava, para realizar o
registro de nascimento da criança. Apesar de apresentar a documentação fornecida pelo
Conselho Regional de Medicina, o pai não conseguiu realizar o assento, pois o tabelião
informou que precisava da declaração do hospital que fornecia o nome da avó como mãe
biológica da criança. O Fórum local então foi consultado e o Ministério Público pediu o
exame de DNA do bebê, onde foi comprovada a maternidade e desta forma foi expedida a
autorização do registro. Relatado o fato, vê-se que além da própria falta de legislação
pertinente, alia-se a isso o desconhecimento por parte das pessoas ligadas á questão. Todo
procedimento realizado pelos pais do bebê mineiro foi correto e mesmo assim estes
encontraram dificuldades de ordem prática para a efetiva regularização da situação
Diante do exposto, tem-se que se faz urgente a regulamentação da aplicação das
técnicas de Reprodução Assistida no Brasil, em especial, da sub-rogação de útero, pois, a cada
avanço biotecnológico ocorrido, novas situações que implicam interferência do Direito irão
surgir e é certo que ele não está preparado. Enquanto uma legislação específica não for criada,
os operadores jurídicos brasileiros continuarão a dispor do amparo dos princípios
constitucionais, dos esparsos artigos do Código Civil, tendo por base somente a Resolução do
Conselho Federal de Medicina.
133 LEITE, Eduardo de Oliveira. Procriações artificiais e o Direito: aspectos médicos, religiosos, psicológicos, éticos e jurídicos, p. 432. 134 REPRODUÇÃO ASSISTIDA. Buscafolhauol. São Paulo. 01 jun. 2004. Disponível em: <http:/busca.folha.uol.com.br/search?q=reprod%E7%e30+assistida+av%F3&site=online>. Acesso em: 15 out. 2008.
59
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maternidade constitui-se em um dos mais belos dons da vida, mas nem todas as
mulheres são agraciadas com ele. O homem, porém em sua eterna busca por aquilo que lhe é
privado, desenvolveu, através da biotecnologia, métodos capazes de romper a barreira da
infertilidade, dando, a mulheres que não podem ter filhos, a chance de poder fazer prosperar a
maternidade através dos laços de afetividade.
O Direito brasileiro, não pode acompanhar este progresso biotecnológico, e com falta
de legislação, fez surgir aspectos discutíveis no cenário jurídico, a partir de situações advindas
da Reprodução Assistida e, conseqüentemente, a sub-rogação de útero e que forma objeto
desta monografia.
As hipóteses levantadas no início do trabalho, todas restaram comprovadas conforme
se demonstrar a seguir:
O aspecto religioso influencia muito na prática direta das técnicas de reprodução
assistida, em especial, na prática da sub-rogação de útero, pois a sociedade os têm como
parâmetros a serem seguidos no dia-a-dia e não e não permitem que tal prática vá contra
princípios estabelecidos.
As formas de estabelecer a maternidade são basicamente duas: aquela que se dará pelo
parto, baseado no princípio romano mater semper cert est, onde a mãe é exclusivamente a que
dá a luz ao bebê; a segunda forma é aquela que se dará pelos laços afetivos estabelecidos entre
a mãe e a criança. Neste caso, a maternidade se definirá pela convivência entre os dois e o
amor nascido dela. Na atualidade, este último é o meio mais admitido para a determinação da
maternidade.
No Brasil não existe legislação específica para regular a prática da reprodução
assistida e da maternidade substituta, sendo estas norteadas pelos princípios constitucionais
presentes na República Federativa do Brasil. Não há legislação específica sobre a matéria,
além da Resolução 1.358/92, do Conselho Federal de Medicina, que apenas estabelecem
60
regras éticas de conduta para a condução da atividade médica, nas situações advindas da
Reprodução Assistida, em especial a Maternidade Substituta.
A partir do estudo feito, conclui-se que inúmeras são as dificuldades para a
determinação da maternidade quando se trata de uma criança gerada através de sub-rogação
de útero. Esta dificuldade advém da falta de legislação a respeito da matéria o que limita o
posicionamento dos autores, e, conseqüentemente, dos pesquisadores.
Entende-se que, em razão deste fato, se faz urgente uma legislação específica
determinando limites quanto á técnica de sub-rogação de útero, ou seja, a maternidade
substituta no Brasil.
61
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