7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 1/17
2013
Tradução técnica:Gustavo RazzeraFotógrafo e Artista Gráfico
Bacharel em Filosofia pela UFRGS
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 2/17
Reservados todos os direitos de publicação, em língua portuguesa, àBOOKMAN EDITORA LTDA., uma empresa do GRUPO A EDUCAÇÃO S.A.Av. Jerônimo de Ornelas, 670 – Santana90040-340 – Porto Alegre – RSFone: (51) 3027-7000 Fax: (51) 3027-7070
É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquerformas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribuição na Webe outros), sem permissão expressa da Editora.
Unidade São PauloAv. Embaixador Macedo Soares, 10.735 – Pavilhão 5 – Cond. Espace CenterVila Anastácio – 05095-035 – São Paulo – SPFone: (11) 3665-1100 Fax: (11) 3667-1333
SAC 0800 703-3444 – www.grupoa.com.br
IMPRESSO NA CHINAPRINTED IN CHINA
Obra originalmente publicada sob o títuloThe Photographer’s Vision: Understanding and Appreciating Great Photography ISBN 978-0-240-81518-3
Copyright © 2011, The Ilex Press Ltd. Todos os direitos reservados.
Gerente editorial: Arysinha Jacques Affonso
Colaboraram nesta edição:
Editora: Mariana Belloli
Capa: VS Digital, arte sobre capa original
Leitura final: Mirella Nascimento
Editoração eletrônica: Techbooks
Catalogação na publicação: Natascha Helena Franz Hoppen, CRB10/2150
F855v Freeman, Michael.
A visão do fotógrafo : entendendo e apreciando grandes fotografias / Michael Freeman ; tradução técnica: Gustavo Razzera. – Porto Alegre : Bookman, 2013. 192 p. : il. color. ; 23,5 x 25,5 cm.
ISBN 978-85-65837-64-4
1. Fotografia. I. Título.
CDU 77
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 3/17
3. HABILIDADES DO FOTÓGRAFO 126 Surpreenda-me 128
Veja diferente 129
Contraste inesperado 131
Retarde 133
Faça conexões 135
A habilidade de capturar 137
Mãos à obra 138
Perfeito imperfeito 140 Reação 144
Timing 146
Intervenção 152
Habilidades de composição 156
Assuntos assertivos 159
Saiba o que funciona 160
Estilos de composição 162
Suspeite da composição 166 Cor e não cor 168
O problema dos críticos de arte com a cor 171
A dinâmica do preto e branco 176
Iluminação 181
Índice 186
Créditos das Fotos 190
Bibliografia 192
INTRODUÇÃO 6
1. UMA ARTE MOMENTÂNEA 8 O que uma fotografia é... e o que não é 10
Em que consiste um boa fotografia 13
As qualidades de uma boa fotografia 14
O público importa? 24
Como o fotografar acontece 26
Fotografia global 30
Como ler fotografias 34
2. ENTENDENDO O PROPÓSITO 38 Os gêneros da fotografia 40
Paisagem 40
Arquitetura 44
Retrato 46
Fotojornalismo 50
Vida selvagem e natureza 59 Esporte 60
Natureza-morta 61
Moda 65
Científica 67
Para quê? 68
A imagem isolada 69
A exposição com curadoria 75
A imagem publicada isolada 77 O ensaio fotográfico 78
O livro fotográfico 89
O slideshow 92
Sites e e-books 96
Da captura ao conceito 98
Modernismo e surrealismo 98
Vidas diferentes das nossas 103
Polêmica 106
Midiático 109
Exploração 110
Invenção 116
Trapaça 118
Conceito 120
SUMÁRIO
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 4/176 A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O
Pittsburg, Estados Unidos, c. 1979–1980,por Lee Friedlander
No entanto, uma questão de identidade agora
afeta a fotografia. Ela vem se instalando, e ficando
mais forte, ao longo das últimas três décadas. Oque está em jogo é o caso de a fotografia estar
fundada na captura ou na criação de imagens
fabulosas, independentemente de elas virem da
realidade ou da imaginação. A captura é a habilidade
natural da fotografia ou, se você preferir, seu
modo padrão, tendo eventos, pessoas e cenas por
sua matéria-prima, tudo acontecendo mais ou
menos sem a interferência do fotógrafo. Esse é o
fotógrafo enquanto testemunha, observador. Mesmo
assim, ao longo da história da fotografia, houve
tentativas de fazer as imagens acontecerem por
construção, direção, criação. Quadros narrando uma
história; experimentos surrealistas com processos,
colagens, elucubrações de estúdio, arranjos de
naturezas-mortas. Por que deveria ser diferente?
O que mudou foi o entendimento de que a
fotografia seja apenas uma coisa ou outra. O que
aconteceu em frente à câmera realmente foi o que
parece ser, ou trata-se de outro tipo de fotografiaem que as coisas são fabricadas? O processo da
fotografia em grande parte manteve essas duas
maneiras separadas, com exceção de engenhosas,
porém raras, tentativas de alterar a realidade. Mas
essa distinção, para muitas pessoas, talvez até para
a maioria, desapareceu. Os agentes da mudança
foram a tecnologia digital, a promoção e a aceitação
do conceito como direção válida para a fotografia.
Havia sinais disso no início do século XX, mas foi só
nos anos 1970 que a fotografia conceitual engrenou.
A primazia do conceito sobre a atualidade deu
aos fotógrafos a permissão de usar técnicas que
alteram a substância das imagens. Essas técnicas
INTRODUÇÃO
Afotografia passou por muita coisa nos últimos
anos. Isso fica evidente no modo como ela é
praticada – isto é, digitalmente, cobrindo mais davida e das vivências do que antes era possível ou
mesmo desejável –, mas talvez não tão evidente
no modo como é apreciada. Desde os anos 1970, a
fotografia passou a ser aceita como forma de arte
amadurecida. Isso causou um efeito dominó, na
medida em que o tipo de fotografia que nunca fora
concebida como arte – a maioria – hoje é exibido,
colecionado e apreciado do mesmo modo que outras
artes. Mais e mais pessoas adotaram a fotografia
seriamente, para fins de expressão criativa em vez de
apenas para fotos da família e de amigos. Isso deixa
a fotografia, mais que qualquer outra arte, sujeita a
reações do tipo “eu poderia fazer isso”.
Seria de se pensar que, com a ampla adoção da
fotografia por todos, nós seríamos ensinados desde
cedo a acompanhá-la, como se fosse uma versão
visual da alfabetização, certo? Longe disso. Embora eu
não possa reparar tudo isso aqui e agora, vale a pena
dar uma olhada em todo o espectro da fotografiapara mostrar o quanto ela pode ser enriquecedora.
Mesmo assim, raramente ela é tratada como um todo.
Escrever sobre fotografia tende a ser partidarista. A
fotografia fine-art geralmente é tratada em separado,
assim como o fotojornalismo, a publicidade e
assim vai. Pessoalmente, não vejo por que deva ser
assim, especialmente agora que os vários gêneros
de fotografia parecem estar migrando. Os museus
fazem coleções de fotografia de moda, a publicidade
emprega fotojornalismo, a fotografia de paisagem
mexe em questões sociais. Como um número cada
vez maior de pessoas, prefiro pensar na fotografia
como uma coisa só.
– digitais – continuam a evoluir, mas já são tão
sofisticadas ao ponto de não serem detectáveis
quando em mãos habilidosas. Talvez a mudançamais importante de todas seja que, na maior parte
do tempo, essas técnicas não operam no contexto da
detecção. Para muitas pessoas, não é importante se
uma fotografia é real ou não. O que conta mais é se
a fotografia é inteligente e atraente. Isso não agrada
a todos, é claro, mas é a realidade da fotografia
contemporânea e demanda explicação. Ou pelo
menos uma tentativa de integrar a “fotografia
enquanto ilustração” com a “fotografia enquanto
registro”. Esse é um dos meus objetivos aqui, no
âmbito da capacidade de ler, apreciar e ter opiniões
sobre fotografias, seja qual for a forma que elas
se apresentem.
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 5/17
7I N T R O D U Ç Ã O
© L e eF
r i e d l a n d er , c or t e s i a F r a enk el G a l l er y ,
S a nF r a n c i s c o
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 6/17
PARTE 1
UMA ARTEMOMENTÂNEA
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 7/17
9U M A A R T E M O M E N T Â N E A
Agora que as fotografias digitais
podem ser processadas e alteradas
para se parecerem com ilustrações, que
a arte contemporânea está livre para
usar a fotografia como ponto de partida
em vez de apenas ser um produto final,
pode ser útil ter claro o que é singular
com respeito a uma fotografia. E, logo de
início, vale tratar da já familiar questão
sobre o que pode ser feito digitalmente
a uma fotografia, em pós-produção, para
alterá-la. Um problema para muitas
pessoas é que a fotografia possa perder
sua legitimidade. Outro é que talvez ela
possa, de certo modo, não ser mais uma
fotografia, mas uma forma diferente de
imagem. Esse é um grande debate, mas,
para os propósitos deste livro, eu adoto a
seguinte visão, possivelmente simplista:
não há nada inerentemente errado com
a otimização e a manipulação digital de
uma fotografia – desde que ninguém
fique fingindo que ela não está sendo
usada.
De modo simples, uma fotografia...
Toma diretamente da vida real
É rápida e fácil
Pode ser tirada por qualquer um
Tem um visual específico
Essas são as diferenças evidentes,
claras, entre a fotografia e as outras
artes visuais, mas surgem implicações
interessantes quando começamos a
cavar mais fundo, que revelam por que a
fotografia agora é o meio de expressão
criativa mais popular em todo o mundo.
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 8/17
10 A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O
TOMA DIRETAMENTE DA VIDA REALEmbora a câmera possa ser usada para construir
imagens, particularmente no trabalho em estúdio,a maior força da fotografia está no fato de o mundo
a nossa volta ser a fonte de material. Isso eleva a
importância do assunto, o evento; e o relatar disso
é algo em que a fotografia se destaca. Ao mesmo
tempo, essa facilidade de captura reduz o valor da
representação fiel, porque ela virou lugar comum
– bem diferente daquela visão mais antiga da
pintura, quando Leonardo da Vinci escreveu em seus
cadernos que “mais valorosa é a pintura que seja
mais semelhante à coisa representada.” Em vez disso,
o modo como os fotógrafos documentam – o estilo e
o tratamento – torna-se mais significativo.
Em um nível mais profundo, há um paradoxo
inerente entre representar a realidade e ainda assim
ser algo à parte enquanto imagem autônoma.
Outras artes, como a pintura, a poesia e a música,
claramente são construtos. Na cabeça de ninguém
há confusão quanto a um poema ou uma música
terem origem em outro lugar que não na mente de
seu criador e que a experiência de vida a que eles
se referem foi filtrada por uma imaginação e de
que isso levou algum tempo para ser feito. Nesse
respeito, as fotografias criam confusão. A imagem é,
na maioria dos casos, tão claramente uma imagem
de uma cena real, objeto ou pessoa, mas ainda assim
continua a ser apenas uma imagem que pode ser
vista em diferentes circunstâncias. Ela é da vida
real e ao mesmo tempo separada. Essa contradiçãodá muitas possibilidades para exploração. Uma
quantidade considerável da fotografia fine-art
contemporânea faz exatamente isso, inclusive
construções para imitar conteúdo da vida real.
É RÁPIDA E FÁCILA fotografia pode explorar e capturar todos os
aspectos da vida – e cada vez mais, à medida que
o equipamento melhora. Um exemplo disso é
a melhor sensibilidade à luz dos sensores, que
possibilitou a criação de imagens noturnas e em
pouca luz. Essa é uma poderosa força motriz
por trás da imensa popularidade da fotografia.
É preciso pouco ou nenhum preparo para
capturar uma imagem, o que quer dizer que
existem muitas possibilidades para expressãocriativa. Com as câmeras digitais facilitando e
tecnicamente tornando isso mais preciso, elas
também concentram mais e mais a atenção sobre
a composição e na visão particular de cada pessoa.
Ou pelo menos deveriam, contanto que não nos
deixemos levar pelo lado do “brinquedo novinho
em folha” da fotografia. “A fotografia é a mais fácil
das artes”, escreveu a fotógrafa Lisette Model, “o que
talvez faça dela a mais difícil.” É inquestionável que
a fotografia demande menos mão de obra técnica
no sentido de tempo e esforço físico necessários
a outras artes visuais, algo que deixa muitos
profissionais na defensiva. Mas, em seu lugar, o ato
de criação é estendido e levado adiante na avaliação
e seleção de imagens já capturadas. Além da edição,
como é chamada essa etapa, o processamento
e impressão das imagens é também uma parte
posterior e importante do processo.
PODE SER TIRADA POR QUALQUER UMIsso nunca acontecera nas artes. A fotografia é
agora praticada quase universalmente, não apenas
para registrar momentos familiares. Não é mais
uma questão de artistas e profissionais de um
lado e público do outro. As câmeras digitais, o
compartilhamento pela Internet e o declínio da
mídia impressa tradicional deixou a fotografia
ao alcance de quase qualquer um como meio deexpressão criativa. E não é o caso que esses milhares
de fotógrafos se sintam atrelados à opinião de uns
poucos. Muitos estão perfeitamente felizes com
as opiniões de seus iguais, já que o público e os
fotógrafos são as mesmas pessoas. Tudo isso amplia
o alcance da fotografia contemporânea e a torna
mais complexa, com padrões e valores diferentes e
concorrentes. Criar boas fotografias não depende
de um plano de carreira, o que uma boa notícia
para todos, exceto os profissionais. O pior é que um
número grande de imagens tendem a confundir
qualquer julgamento de excelência, lembrando que a
Internet está inundada de imagens.
O QUE UMA FOTOGRAFIA É... E O QUE NÃO É
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 9/17
11U M A A R T E M O M E N T Â N E A
Cena do desmoronamento de um prédio,Xi’an, Shanxi, 2000, por Xie HaitaoEsta é uma primeira imagem difícil para o livro,mas ela ilustra de modo descomprometido o que afotografia faz que nenhuma outra arte pode fazer(exceto o vídeo). Ela pode relatar exatamente o queestava em frente à câmera naquele lugar, naquele diae naquele momento na história. Podemos não gostar
do que vemos, mas essa é a natureza do contratoespecial entre o fotógrafo e o espectador. Imagenssem retoques, capturadas da vida, constituiam aforma original da fotografia, e muitos dirão que essaé a sua forma mais legítima.
“ H um a n
i s m on a C h i n a : R e gi s t r o C on t em p or â n e o d a F o t o gr a f i a ” X i eH a i t a o / F O T O E / www .f o t o e . c om / i m a g e / 1 0 1 2 6 1 4 9
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 10/17
12 A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O
Da série Four Seasons in One Day , 2007,por Laura El-Tantawy
Uma tarde quente agracia o centro de Londresenquanto os transeuntes se refrescam com
casquinhas de sorvete. O foco incomum e até
um pouco de borrado de movimento, com a
suavidade da gama tonal, faz desta uma imagem
muito “fotográfica”, apesar do modo como a
fotógrafa joga com a ilusão e a justaposição. Ela
se apresenta como captura do mundo real, e não
uma ilustração manipulada, e isso permite que
El-Tantawy experimente e intrigue com seu modo
distinto de olhar.
TEM UM VISUAL ESPECÍFICOSeja qual for a escolha de papel, textura e
acabamento que você faça para uma impressão,a imagem em si é desprovida de uma terceira
dimensão. O quadro é uma janela, e isso separa a
fotografia da pintura e de qualquer tipo de imagem
criada à mão. De muitas formas, essa falta de
presença física faz da exibição em tela um meio
perfeito, e é assim que um número cada vez maior
de imagens está sendo vista.
Em termos de seu visual, a fotografia começa
com a expectativa do espectador de que os
conteúdos sejam “reais” – tomados da vida real. De
fato, nós associamos a aparência de uma fotografia
a duas coisas: como nós mesmos vemos e como
nós aprendemos a aceitar que seja o visual de uma
fotografia. Somos muito sensíveis ao naturalismo
e ao “realismo” de uma fotografia. Quanto
mais uma fotografia afasta a imagem disso, viaprocessamentos complicados ou técnicas incomuns
de pós-produção, menos a imagem é fotográfica.
Isso não é uma crítica, apenas uma declaração de
um fato óbvio. O visual fotográfico básico se funda
na suposição de que muito pouco foi feito à imagem
desde o momento que foi capturada. A fotografia
também tem seu próprio vocabulário de imagens,
não encontrado em outro lugar. Esse vocabulário
inclui coisas como o foco diferencial, um alcance
dinâmico limitado, borrado de movimento, artefatos
de chamuscamento, cores não completamente
saturadas e a possibilidade de deixar a imagem em
preto e branco.
L a ur a E l - T a n t a
w y
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 11/17
13U M A A R T E M O M E N T Â N E A
EM QUE CONSISTE UMA BOA FOTOGRAFIA
“Bom” pode soar vago para uma generalização,
mas representa algo útil para cada um
de nós. E, é claro, bom significa estar acima domedíocre ou mesmo do comum. Por definição, a
maioria das fotografias não é boa. Isso não desce
bem para muitas pessoas, porque todos querem
que os outros gostem de si, e a crítica é cada vez
mais vista como deseducada e desnecessária. Isso é
bobagem, é claro, e eu não vou avalizar uma coisa
dessas aqui. A excelência resulta da destreza, da
habilidade e (normalmente) do trabalho duro. E é
isso que faz valer a pena escrever sobre o assunto:
descobrir o que compõe a melhor fotografia e por
que ela se destaca.
A facilidade de fotografar garante que sempre
haverá uma enorme maioria de fotografias
ordinárias, sem graça. Usar a câmera para
algo além do clique semiautomatizado requer
atentar para o que uma fotografia pode ser. O
fotógrafo norte-americano Walker Evans, que era
notavelmente articulado, resumiu a boa fotografia
assim: “distanciamento, falta de sentimentalismo,
originalidade, um monte de coisas que soam
um tanto vazias. Eu sei o que eles querem dizer.
Digamos, ‘impacto visual’ pode não dizer
muita coisa para ninguém. Apesar de eu poder
identificá-lo. Eu quero dizer que é uma qualidade
que algo tem ou não tem. Coerência. Bem, algumas
coisas são fracas, algumas são fortes.”
Todos nós temos ideias diferentes quanto a
o que “bom” queira dizer dentro do contexto dafotografia. Essa variedade de opiniões é importante.
Aqui, exploraremos o que sejam esses significados
e, mais importante, como os fotógrafos os colocam
em uso para fazer do bom, melhor. Eu tenho minhas
próprias ideias e naturalmente eu quero infectá-lo
com elas. Mas durante o processo de reuni-las aqui,
eu me vali de uma gama de opiniões de outras
pessoas sobre o assunto, por isso o que se segue não
é apenas pessoal.
Os aspectos listados a seguir são as qualidades
que eu acredito que definam uma boa fotografia.
Em cada uma, como veremos, há um mundo de
ideias, métodos e contradições a explorar. Você pode
objetar que eu não tenha incluído o termo “original”,
mas é porque essa é uma palavra muito carregada,
que deve ser usada com extremo cuidado. Vejo-a
passar de um para outro pela Internet sem muitas
restrições, na maior parte das vezes ignorantemente.
A menos que você deforme o sentido de “original”,pouquíssimos trabalhos criativos o são. A maioria
das ideias, mesmo em fotografia, desenvolve-se a
partir de outras. A verdadeira originalidade é rara.
Kant a entendia como qualidade da genialidade,
e eu temo que não estejamos mirando assim tão
alto. Ou então isso, de Arthur Koestler: “A medida
da originalidade de um artista é a medida que sua
ênfase seletiva se desvia da norma convencional e
estabelece novos padrões de relevância.” Reclamar
originalidade é perigoso. Pode ser que alguém tenha
feito o mesmo antes, mas o reclamante não foi
capaz de perceber.
O que faz uma fotografia ser boa é uma
questão completamente diferente. O julgamento de
grandiosidade transcende o bom e o muito bom,
quase sempre havendo conflito de opiniões. O
grandioso precisa passar no teste do tempo, como
em qualquer arte, e no início pode ser uma voz
solitária. Creio que várias das fotografias que temos
neste livro são grandes fotografias, mas não vou
estragar a brincadeira listando todas. Você terá suas
próprias opiniões e, se fiz meu trabalho a contento,
essas podem mudar quando você tiver terminado o
livro.
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 12/17
14 A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O
1. É HABILIDOSAMENTE MONTADAExiste uma longa lista de qualidades consideradas
técnica e conceitualmente corretas. Elas incluem,
por exemplo, foco nítido no assunto principal, uma
exposição média que cubra o alcance dinâmico,
uma composição satisfatória e até mesmo uma
escolha de assunto que pareça valer a pena. Essas e
muitas outras são habilidades fotográficas básicas,
que não devem ser desprezadas, e há fortes motivos
para dominar todas elas. Se a imagem precisar
delas, então lá devem estar. Mas uma boa fotografia
pode dispensar muitas delas – com um motivo.
Há uma grande diferença entre estragar o foco
por ignorância ou por engano e desfocá-lo para
AS QUALIDADES DE UMA BOA FOTOGRAFIA
G u e or g u
i P i nk h a s s ov / M a gn um P h o t o s
obtenção de um efeito. O que conta é saber como a
composição, a iluminação e tudo o mais funciona.
Os fotógrafos que as dominam podem jogar
com elas.
Parte disso se deve a um processo habilidoso,
ou você poderia chamar de artesanal. Isso tende
a ficar mais evidente nas impressões e exibições.
Tudo que seja bem feito atrai a admiração por esse
simples fato. Isso vale não só para a fotografia,
mas para qualquer outra arte. Pode ser que nem
todas as etapas do processo sejam vistas na imagem
final, talvez sendo necessário outro fotógrafo para
apreciar o que esteve envolvido em sua feitura
mas, normalmente, e para a maioria das pessoas,
fica a sensação da habilidade que esteve envolvida.
Os tradicionalistas não apenas enaltecem essa
característica, como fazem disso algo essencial.
Fotógrafos mais experimentais podem subvertê-lo,
mas ninguém ignora isso de verdade.
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 13/17
15U M A A R T E M O M E N T Â N E A
George Town, Penang, 1990,por Gueorgui PinkhassovEsta é uma imagem complexa que valeuma boa olhada. O trompe l’oeuil dos murospintados se estende na própria imagem, alémde o enquadramento preciso colaborar com asegmentação. O real e o i lustrado entrecruzados.Pinkhassov escreve: “A única coisa que conta éa curiosidade.”
Da série Dream/Life, Sydney, 1998,por Trent ParkeChuva de verão. Um homem acomodado sob umtoldo na esquina das ruas George e Market, suagravata lançada sobre o ombro após correr em umatempestade em Sydney. A habilidade na composiçãodesta fotografia reside na sensibilidade de Parkerà luz – em particular, a luz de alto-contraste – e noenquadramento que aumenta a distância entre asfiguras, as equilibra e ainda deixa que o olho repousenas cintilantes gotas de chuva saltitando no meio.
T r en t P a
r k e / M a gn um P h o t o s
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 14/17
A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O16
Felix, Gladys e Rover, Nova York, 1974,por Elliott ErwittTodas as artes precisam tocar seu público. Existemmuitos tons, e Erwitt geralmente escolhe o humor.Em particular, ele gosta de cachorros e acha queas relações com seus donos é um rico filão a serexplorado. “Se você vai tirar fotos, é bom encontrarlugares onde tenha situações divertidas. Um camponudista é um deles, cachorros é outro, praias maisoutro. Eu disse que cachorros são pessoas com mais
cabelo. Eu disse isso. Eu disse outras coisas estúpidas.Cachorros são universais, eles não pedem licença deuso de imagem e geralmente são bem amistosos”,diz Erwitt.
E l l i o t t E r wi t t / M a gn um P h o t o s
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 15/17
17U M A A R T E M O M E N T Â N E A
2. PROVOCA UMA REAÇÃOAcima de tudo, uma boa fotografia é visualmente
estimulante, por isso recebe uma reação interessadade seu público. Talvez não de todo mundo, mas
de pessoas suficientes para mostrar que a imagem
está prendendo a atenção. Se nossa reação imediata
é “já vi isso tudo antes”, ela é um fracasso. Esse
pode ser um julgamento brutal, mas também pode
não importar nada em muitos tipos de trabalhos
de fotografia comercial, em que uma foto de
embalagem é uma foto de embalagem e um resort
em uma praia tropical precisa provar apenas que
fica em uma praia com palmeiras e céu azul. Mas
se estamos falando de “boa”, os padrões precisam
estar acima do ordinário. Os fotógrafos querem que
suas imagens sejam vistas, recebam atenção, sejam
debatidas. Isso vai acontecer apenas se a imagem
persuadir seu público, der ao espectador algo sobre
o que pensar.
Para a fotografia que pretende ser criativa, os
problemas começam quando tentamos antecipar
o público. Se preocupar muito com o modo comooutras pessoas possivelmente responderão a
uma fotografia pode levar a um caminho estéril,
resultando em imagens muito calculadas, que tentam
descaradamente agradar. Uma das últimas coisas que
quero quando mostro uma de minhas fotografias
a alguém é que pensem que ela tenta agradar seu
gosto, porque isso me faz parecer um vendedor.
Todas as artes têm isso em comum, e isso levanta
uma discussão já muito batida sobre o que faz de umtrabalho uma obra de arte – a intenção do artista ou
o julgamento do público. O público da fotografia
quer, entre outras coisas, ver algo de um jeito novo
por meio do olhar imaginativo de um fotógrafo. A
maioria das pessoas se sente traída se suspeita que o
fotógrafo está apenas tentando agradá-la.
3. OFERECE MAIS DE UMA CAMADA DEEXPERIENCIAÇÃO
Uma boa fotografia dá ao espectador mais do que aimagem imediata, evidente. Ela funciona em mais
de um nível. Tomemos como exemplo a imagem
na página 54, um impactante preto e branco de
Romano Cagnoni, de recrutas Ibo na Nigéria. Os
elementos gráficos são imediatamente poderosos –
uma massa de rostos brilhantes e dorsos conectados
com uma linha de figuras humanas de perfil acima.
Há uma riqueza de textura da impressão (apesar de
o original ser em cores). Ela também é opticamente
incomum, assim nos damos conta de uma
compressão extrema – de fato, ela foi fotografada
com um comprimento focal bem longo e de um
ponto de observação elevado. Descendo mais uma
camada, e há muito a ser descoberto, diversas
expressões em cada rosto. Veja, por exemplo, o rosto
mais pálido na extrema esquerda próximo ao final
do grupo principal, virado para fora e meio baixo,
boca aberta. Em que este jovem está pensando?
Isso nos leva ainda mais fundo nas camadas decontexto – o que está acontecendo aqui? Este é um
recrutamento de soldados durante a guerra de Biafra
e, enquanto tal, um rico documento histórico.
Em outras palavras, olhar para uma fotografia
é uma experiência em camadas. Entre as artes, a
fotografia tem de fato uma vantagem quanto a
isso, porque ela contém um paradoxo implicado
relacionado à realidade. A fotografia é retrato da
vida e também divorciada dela, ao mesmo tempo.De um ponto de vista criativo, isso oferece um bom
potencial a qualquer fotógrafo que se dispuser a
fazer uso dele. Já temos dois quadros de referência
aguardando serem exibidos e explorados. Mas
precisam ser trabalhados; precisam ser reconhecidos.
Arthur Koestler, cujo livro de 1964 The Act of
Creation foi uma investigação aprofundada dos
mecanismos da criatividade, cunhou a palavra
bissociativo para falar do trabalho em mais de um
plano, que ele considerava central ao processo, fosse
da ciência ou da arte. Na arte, ele significa justapor
dois ou mais planos de percepção, unindo mais de
um quadro de referência para produzir um modo
de ver, uma experiência, que a maioria das pessoas
nunca havia pensado – e que é tocante mesmo
assim. Por exemplo, W. Eugene Smith, trabalhando a
maior parte do tempo para a revista Life, combinou
fotojornalismo pesado com um estilo lírico, às vezesheroico, de iluminação, composição e escolha do
momento. Na época, isso pareceu contraditório,
mas Smith os reuniu com grande efeito em imagens
como Tomoko Uemura em seu banho e em seus
ensaios sobre Albert Schweitzer, um instituto
psiquiátrico no Haiti e Pittsburgh.
Tocar o espectador é fundamental. Nós
adoramos descobrir e queremos ser estimulados.
Nossas mentes têm prazer por encontrar conexões
e reparar em coisas que não eram imediatamente
óbvias. Ser muito óbvio em uma imagem é um
pecado muito maior do que ser obscuro, porque
insulta nossa inteligência. Uma imagem nua em
pelo, autoevidente, que não tem nada para oferecer
além da primeira olhada, dificilmente vale o tempo
de olharmos para ela, e certamente não é coisa de
ser apreciada. Finalmente, entre todas essas camadas
de experienciação e visualização, está o inesperado
e o imprevisto. Caso tudo isso dê a impressãode que todas as fotografias bem-sucedidas são
bem planejadas desde o início, muitas das mais
estimulantes fotografias contêm um pouquinho de
mágica. Pode ser até algo que o próprio fotógrafo
não estivesse ciente no início. Olhando as folhas
de contato posteriormente – ou o catálogo em tela
hoje com o digital – o fotógrafo pode descobrir
algo sobre um quadro que surpreenda, que o torne
especial, que é o caso na página 18 com a imagem deSeamus Murphy.
Que uma fotografia possa ter essas várias
camadas nem sempre depende de o fotógrafo estar
ciente dessa complexidade. Isso pode ocorrer depois,
na visualização. Mas neste caso, Murphy estava
afundado em questões afegãs e conhecia o contexto.
A coincidência gráfica é discutida mais adiante no
livro, em “Faça conexões” na página 135.
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 16/17
A V I S Ã O D O F O T Ó G R A F O18
Imagem da série Darkness Visible: Bamiyan,Província de Bamiyan, junho de 2003,por Seamus MurphyUma imagem forte que se lê em vários níveis.
Há pelo menos três camadas de experienciação,
dependendo de quão a fundo o espectador queira
ir. Não necessariamente na ordem de visualização,
primeiro há a imagem mostrando a consequência
da guerra, a guerra no Afeganistão. A vítima
mutilada segue seu caminho solitário pela dura
paisagem afegã. Depois, há a notável coincidência
de forma e momento. Vemos a correspondência
lembrarmos das notícias do jornal, percebemos
que ali é onde estavam os antigos Budas de
Bamiyan, antes de serem reduzidos a cascalho
pelo Talibã em 2001. Isso acrescenta outra camada,
de perda e intolerância. E de conflito religioso. A
intolerância religiosa destruiu os Budas. Uma guerra
com insinuações religiosas que começou com a
destruição das Torres Gêmeas destruiu a perna
do homem e ele, como explica o fotógrafo, é uma
vítima dos Hazara. Os Hazara, sendo muçulmanos
shia, padeceram particularmente sob a tirania do
Talibã. Portanto, uma equação de sofrimento.
S e a m u s
M ur ph y / V I I N e t w or k
entre o homem, ligeiramente inclinado para
frente neste momento de seu estranho caminhar,
e a sombra profunda na rocha ao fundo. Esta
é uma correspondência tão maravilhosa que o
primeiro pensamento que ocorre a quem quer que
se imagine na posição do fotógrafo é como ele
conseguiu isso. Fica claro que isso não é algo que
possa dirigir. Depois, em nossa hipotética jornada
pela fotografia, olhamos com mais atenção a
sombra na face da rocha. O que aconteceu lá? Ela
foi entalhada, mas está vazia. Se sabemos alguma
coisa sobre a história recente do Afeganistão, e
7/23/2019 FREEMAN. a Visão Do Fotógrafo
http://slidepdf.com/reader/full/freeman-a-visao-do-fotografo 17/17
19U M A A R T E M O M E N T Â N E A
Ingressos para o teatro, Nova York, 1955, porWilliam KleinUma imagem enquadrada na tradição dafotografia de rua, uma forma muito específica defotojornalismo em que o fotógrafo anda e procura omomento não planejado, a coincidência com pessoas,ações ou formas, esperando o inesperado. E tambémesperando conseguir reconhecer esse momentorapidamente quando acontecer, para entãocapturá-lo. O homem aponta, este é o momento para
Klein. Mas, igualmente, ele está na posição certa eé capaz de entender e enquadrar a foto de maneiraelegante e simples.
© Wi l l i a m
K l ei n , C or t e s i a H ow a r d G r e en b er g G
a l l er y , C i d a d e d eN ov a Y or k