IV Encontro Nacional de Estudos da Imagem I Encontro Internacional de Estudos da Imagem 07 a 10 de maio de 2013 – Londrina-PR
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Fotografia urbana de Cristiano Mascaro:
a cidade reconfigurada
César Bastos de Mattos Vieira1
Resumo
Esta comunicação tem por objetivo apresentar e problematizar as fotografias da cidade
de São Paulo feitas por Cristiano Mascaro e apresentadas em sua Tese de Doutorado de 1994,
em seu livro “A Cidade” e no seu site, na coleção sobre “São Paulo: a Cidade”. Através da
análise destas imagens fotográficas pretende-se propor reflexões sobre como se dá o registro
da “realidade”, o possível distanciamento do referente (ou abstração), procurando entender as
mudanças de visualidade por elas produzidas. Uma vez que estas fotografias apresentam um
ambiente reconstruído pelo olho sensível do fotógrafo e pelo aparato técnico plenamente
explorado, pode-se esperar que fossem capazes de sugerir a seus leitores/receptores imagens
de uma cidade diferente, reconfigurada. Para dar sustentação teórica a esta problematização
serão abordados autores como Walter Benjamin, Vilém Flusser, Susan Sontag, Roland
Barthes e as reflexões teóricas oferecidas pelo próprio fotógrafo em sua tese. Busca-se
fomentar uma discussão sobre o grau de precisão das fotografias feitas por Mascaro, nas quais
se observa um forte cunho autoral e que por este fato busca claramente uma aproximação com
as artes, mas que, por outro lado, é trabalhada por pesquisadores e lida por leitores como
fontes precisas de informação, enfim, como material documental.
Palavras-chave: Fotografia; Arquitetura e Urbanismo; Imaginário
Abstract
This document (communication) aims to discuss and present São Paulo’s city photographs
made by Cristiano Mascaro and presented in his thesis in 1994, in his book “A Cidade” and
in his site, in his collection about the city: “São Paulo: The City. Through this photograph
images analyses is intended to offer reflections on how is the record of “reality” performed,
the eventual detachment of the referent (abstractedness) targeting the understanding of visual
changes produced by them. Since these photographs show a sensitive environment rebuilt by
1 Professor da UFRGS – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Arquitetura. Arquiteto, Doutor.
E-mail: [email protected]
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the eye of the photographer and the technical apparatus fully probed can be expected the
ability of suggesting to its readers images of a different city, reconfigured. To give theoretical
support to this questioning will be approached authors like Walter Benjamin, Vilém Flusser,
Susan Sontag, Roland Barthes and theoretical reflections offered by the photographer in his
thesis. It is intended to foster a discussion about the level of accuracy of the photographs
made by Mascaro, in which it is observed a strong authorial hallmark and that by this fact
clearly seeks an approaching with the arts, but on the other hand, is crafted by researchers and
read by readers as accurate sources of information, in short, as documentary material.
Keys worlds: Photography; Architecture and Urbanism; Imaginary
1. Apresentação
Cristian Alkimin Mascaro – Biografia:
Nasceu em 1944, na cidade paulista de Catanduva, é arquiteto pela Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, onde também obteve o grau de
mestre, com a dissertação O Uso da Fotografia na Interpretação do Espaço Urbano, em
1986, e o de doutor, com a tese Fotografia e Arquitetura, em 1994. Desenvolveu longa
carreira didática, tendo dirigido o Laboratório de Recursos Audiovisuais da Universidade de
São Paulo entre 1974 e 1988; sendo professor de Fotojornalismo da Enfoco Escola de
Fotografia, entre 1972 e 1975, e de Comunicação Visual na Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo de Santos (SP), entre 1976 e 1986. Em 1968, iniciou a carreira fotográfica na
revista Veja, onde permaneceu por quatro anos, passando a atuar, a partir desta data, de forma
independente. É autor dos livros: A Cidade (1979); Cristiano Mascaro: As Melhores
Fotos (1989); Luzes da Cidade (1996); Itinerários Culturales en Brasil (publicado em Buenos
Aires em 1999); São Paulo (2000); O Patrimônio Construído - as 100 mais belas edificações
do Brasil (2003); Imagens do Rio Grande do Sul (2003); Cidades Reveladas (2006). Foi
agraciado com o Prêmio Internacional de Fotografia Eugène Atget (Paris), em 1984; com a
bolsa VITAE de fotografia, em 1989; com o Prêmio Abril de Jornalismo, em 1991; e com o
Prêmio de Melhor Exposição de Fotografia da Associação Paulista de Críticos de Arte, em
1996. (VASQUES, 2013) Pode-se considerar Mascaro como o fotógrafo das cidades, tanto
das formas quanto das pessoas que as habitam.
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São apresentadas, a seguir, as coleções: “A cidade de São Paulo” e “As Casas” obtidas
a partir do site pessoal do fotógrafo (http://www.cristianomascaro.com.br). Optou-se por
apresentar, também, a coleção “As Casas” para repetir a estratégia que Mascaro utilizou em
sua tese e ampliar a avaliação de sua produção. As casas fazem parte das descobertas “ao
caminhar pelas ruas e observar cuidadosamente os edifícios” (MASCARO, 1994, v.3 p.5)
como ele mesmo descreve.
Coleção: A cidade de São Paulo
Figura 001 – Coleção “Cidade de São Paulo” Fonte: http://www.cristianomascaro.com.br/galerias/colecoes. Acessada em 06/04/2013.
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Coleção: As Casas
Figura 002 – Coleção “As Casas” Fonte: http://www.cristianomascaro.com.br/galerias/colecoes. Acessada em 06/04/2013.
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2. Análise reflexiva
Estas coleções recolhidas integralmente do site de Mascaro constituem-se em duas
seleções, cada uma com 20 fotografias, todas em preto&branco, em dois formatos: quadrado,
o que sugere a utilização de câmeras de médio formato (6x6), e retangular, exatamente na
mesma proporção do filme 35 mm, ou seja, 24x36mm, neste caso sugerindo uso de câmeras
para filmes 135. Mascaro, em sua tese, refere que em “seus trabalhos de documentação
urbana, utiliza invariavelmente câmeras Hasselblad” (médio formato) (1994, p.82). Baseado
nesta afirmação, não se pode saber se as imagens em formato retangular foram produzidas em
médio formato e foram resultado de recortes ou se o fotógrafo também utilizou câmeras 135.
Ao observar as fotografias que Mascaro apresenta tanto nas coleções apresentadas
acima, como nas apresentadas em sua tese e em seu livro “A Cidade”, percebe-se que são
fotografias destoantes do senso comum com relação ao que se imagina de São Paulo. As
imagens não estão comprometidas com a representação dos valores mais comuns atribuídos a
uma cidade como São Paulo, cosmopolita, gigante, frenética, com suas casas modernas, seus
prédios altos, lojas coloridas, iluminadas e a massa de gente que não para. Mascaro apresenta
uma São Paulo diferente, diferente da que a maioria das pessoas imagina, diferente da que se
apresenta numa visita presencial direta e muito diferente da apresentada pela mídia impressa e
digital dos dias atuais. É uma cidade reconfigurada por um olhar diferente, sensível e criativo
que gerou imagens não usuais de ambientes e cenas do que se está acostumado a ver em
fotografias dos mesmos temas. Há uma “aura” em suas fotografias que se assemelham às
fotografias dos grandes mestres como Eugène Atget, Henri Cartier-Bresson, Berenice Abbott,
citados em sua tese. Pode-se atribuir esta “aura” a exploração dos ‘recursos antigos’ (ou
tradicionais) da fotografia como o uso do preto&branco, a uma frequente ausência de pessoas
(antes resultado de filmes lentos), uma preferência por imagens com contrastes suaves, a luz
muito bem trabalhada e um cuidado extremo na composição. Pode-se aplicar as qualidades
com que Mascaro descreve o trabalho de Henri Cartier-Bresson para o seu próprio trabalho:
“cenas bem estruturadas, captadas em momentos tão expressivos e todos os seus elementos
ocupando lugares tão bem definidos nos lugares onde se encontravam”. (1994, p. 79)
Não se observa, nestas amostras, a exploração de “imagens espetaculares” conseguidas
pela exploração de perspectivas distorcidas, consequência do uso das modernas lentes
superangulares associadas a pontos de vistas inusitados, nem do uso das cores, muito menos
das possibilidades de pós-edição, como por exemplo, cores alteradas, aplicação de vinhetas,
manipulação das áreas de sombras e altas luzes, grandes contrastes ou o recurso de imagens
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em HDR. Mascaro oferece uma pista de seu comportamento ao afirmar: “A impossibilidade
de se definir um método único de criação na fotografia, dignifica e personaliza o trabalho,
concedendo-lhe uma aura autoral.” (MASCARO, 1994, p.81)
Mascaro não respeita os códigos visuais em voga e busca, nas regras tradicionais dos
primeiros momentos da fotografia, a construção de imagens, que muitas vezes se assemelham
as imagens elaboradas pelos fotógrafos pioneiros. As duas imagens apresentadas na figura 3, a
seguir, evidenciam esta aproximação com o que se pode chamar de um “estilo fotográfico
clássico”. A primeira fotografia é de Eugène Atget, de 1908-1909, “Escalier 34 Rue Des
Bourdonnais (1e)”, e a segunda’ é de Mascaro, sem data informada, “Escada do Edifício
Ramos de Azevedo” , da coleção Cidade de São Paulo. Há uma semelhança inegável entre as
imagens, seja pelo ângulo da tomada, a luz suave, os tons médios bem distribuídos e o jogo
compositivo. Estas semelhanças podem ser observadas em muitas fotografias de Atget que
demonstrava uma paixão pela cidade de Paris, suas casas e prédios que poderia ser
considerada equivalente à paixão que Mascaro têm por São Paulo.
Figura 3 – Comparativo entre fotografia de Eugène Atget, de 1908-09, “Escalier 34 Rue Des Bourdonnais (1e)” – Albumina - 21.6 x 17.4 cm. (trimmed) - Museum Purchase) e fotografia de Mascaro , sem data informada, ”Escada do Edifício Ramos de Azevedo”. Fontes: Eugène Atget, < http://www.geh.org/fm/atget/htmlsrc/m198109500052_ful.html> Acessado em 10/04/2013 e Mascaro, <http://www.cristianomascaro.com.br/galerias/colecoes/sao-paulo-a-cidade> Acessado em 10/04/2013.
Este fenômeno também pode ser observado entre a fotografia de George Brassaï, de
1934, “Avenue de l’Observatoire”, e uma fotografia de Mascaro, sem data informada, “Posto
de gasolina”, de sua coleção Cidade de São Paulo, apresentadas na figura 4, a seguir. As duas
imagens mais do que registrarem um ambiente à noite e sob neblina, apresentam semelhanças
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entre as quais pode-se pontuar o ângulo de tomada, a posição da linha de horizonte (um pouco
mais elevada do que seria do ponto de vista de uma pessoa em pé) e a exploração do efeito da
luz com a neblina criando um clima especial. São imagens de uma parcela da cidade que
graças ao momento, a sensibilidade e perícia do fotógrafo tornaram-se notáveis, dignas de
admiração. Pode-se passar por estes lugares no dia-a-dia sem conseguir reconhecê-los.
Figura 4 – Comparativo entre fotografia de George Brassaï, de 1934, “Avenue de l’Observatoire” e uma fotografia de Cristiano Mascaro, sem data informada, “Posto de gasolina”. Fontes: George Brassaï, < http://onlyoldphotography.tumblr.com/post/38048598562/brassai-avenue-de-lobservatoire-1934 > Acessado em 10/04/2013 e Mascaro, < http://www.cristianomascaro.com.br/galerias/colecoes/sao-paulo-a-cidade > Acessado em 10/04/2013.
Uma vez percebido e estabelecido à relação que há entre as fotografias de Mascaro e
seus referenciais, compreende-se melhor porque algumas fotografias parecem ficar sem um
vínculo forte com a cidade de São Paulo. O uso de uma “linguagem visual” que poderia ser
considerada de “clássica”, de certa maneira, despersonaliza o lugar registrado permitindo ao
leitor imaginar que se trata de cenas registradas em Paris, Nova Iorque, Buenos Aires ou
outras cidades brasileiras.
Mascaro, de uma forma criativa e bela apresenta uma maneira de ver e registrar pela
fotografia que nega os códigos visuais em voga e apimenta a discussão sobre o que a
fotografia deve mostrar ou é capaz de registrar. Este ponto é sobre o qual este trabalho se
debruça e busca problematizar: o registro da “realidade” pode se dar de diversas maneiras e
níveis de aproximação (ou abstração) com seu referente “real”. Pretende-se entender as
mudanças de visualidade por elas produzidas e as possíveis consequências no imaginário do
leitor/espectador.
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3. Discussão teórica
Na fotografia, não se encontra muitos autores interessados em travar reflexões sobre o
fazer. Flusser alerta para esta inconsciência.
Os fotógrafos são inconscientes da sua práxis. A revolução pós-industrial, tal como se manifesta pela primeira vez no aparelho fotográfico, passou despercebida pelos fotógrafos e pela maioria dos críticos de fotografia. (FLUSSER, 2002. p. 75)
Felizardo fala da falta de investigação sobre este tema. “Não é que não se fale; o
problema é que não se pensa” (FELIZARDO, 2000. p. 57). A grande maioria dos livros sobre
fotografia – e em especial aqueles escritos por fotógrafos – trata de equipamentos, estratégias,
“receitas” de como se fazer ou apenas mostra seu trabalho.
Encontram-se referências a autores que se dedicaram à arquitetura como tema; mas os comentários não passam de “usava tal ou qual tipo de equipamento”, “revelou a compreensão da forma arquitetônica”, ou “demonstrou amor pela cidade”. Historiadores e críticos, com exceções que, honestamente, desconheço, mantêm-se a prudente distância das razões que levaram – e continuam levando – tantos fotógrafos a exercitar a transformação do espaço construído em imagem bidimensional. (FELIZARDO, 2000. p. 57)
A escolha da tese de Mascaro como material de pesquisa é porque nela se encontra
material interessante que possibilita uma reflexão rica sobre a capacidade ou não da fotografia
registrar com “precisão” a “realidade” e se ela pode ser uma ferramenta precisa ou uma
“representação livre do universo visível.” (MASCARO, 1994, p.34)
Esta é uma questão que está na origem dupla da fotografia: por um lado a ciência e a
tecnologia que permitiram a construção do aparato tecnológico capaz de captar a luz refletida
pelos objetos e fazer o seu registro através de materiais fotossensíveis. Por outro lado, as artes
que orientam as ações do operador/fotógrafo o qual tem a função de selecionar o que será
registrado a partir de suas aptidões, sensibilidade, cultura e intencionalidades. “A imagem
fotográfica não é apenas uma impressão luminosa, é igualmente uma impressão trabalhada.”
(DUBOIS, 1993, p. 161) Esta dualidade primordial coloca em cheque a real capacidade da
fotografia de ser somente um “documento descritivo” e totalmente preciso de uma cena ou,
em outro extremo, ser apenas uma “representação sensível do universo visível” tão carregada
de subjetividades e imprecisões com relação ao que se poderia chamar de “realidade” e que
nada contribuiria para a sua compreensão. A fotografia trará sempre um pouco de cada
universo. Em todos os usos e aplicações a fotografia traz traços de suas duas origens, como
esclarece o grande fotógrafo Brassaï:
“A fotografia tem um destino duplo... Ela é a filha do mundo aparente, do instante vivido, e como tal guardará sempre algo do documento histórico ou científico sobre ele; mas ela é também filha do retângulo, um produto das belas-artes, o qual requer o preenchimento agradável ou harmonioso do espaço com manchas em preto e
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branco ou cores. Neste sentido, a fotografia terá sempre um pé no campo das artes gráficas e nunca será suscetível de escapar deste fato” (in KOSSOY, 2009a. p.48).
Sontag oferece um registro preciso desta dupla origem.
“A história da fotografia poderia ser recapitulada como a luta entre dois imperativos: embelezamento, que provem das belas-artes, e contar a verdade, que se mede não apenas por uma ideia de verdade isenta de valor, herança das ciências, mas por um ideal moralizado de contar a verdade, adaptado de modelos literários do século XIX e da (então) nova profissão do jornalismo independente.” (SONTAG, 2004, p. 103)
O senso comum acredita na honestidade da fotografia e, sendo assim, em sua
qualidade de documento preciso, entretanto, a fotografia é uma “visão” recortada e trabalhada
e, assim, com certo grau de imprecisão com relação ao seu referente real. Mascaro fomenta
esta problemática ao afirmar:
“Entretanto, ao longo do tempo, seu aperfeiçoamento técnico associado ao olhar sensível de inúmeros fotógrafos pioneiros, fizeram com que aquela nova possibilidade de um registro exato e perfeito da realidade, também se tornasse a invenção de um novo olhar...” (MASCARO, 1994, p.13)
Já Kossoy parece confundir os conceitos de representação subjetiva e documento com
a afirmação:
“O processo de criação do fotógrafo engloba a aventura estética, cultural e técnica que irá originar a representação fotográfica, tornar material a imagem fugaz das coisas do mundo, torná-la, enfim, um documento.” (KOSSOY, 2009b, p.25 e 26) grifo do pesquisador.
Tanto Mascaro como Kossoy tem formação em arquitetura, o que pode estar
contribuindo para um entendimento específico do termo “representação”.
“Em arquitetura o termo “representação” se restringe a seu caráter descritivo das características físicas do ente arquitetônico. Para esta área do conhecimento não importam as questões associadas à representação enquanto simbolismo ou conceituação. Este ente arquitetônico pode existir realmente ou apenas existir na mente de seu criador. Trata-se, então, a representação como qualquer documento gerado com o intuito de tentar apresentar/comunicar/documentar as características físicas do objeto observado ou imaginado.” (VIEIRA, 2012, p.65)
Cattani corrobora com esta definição buscando sua origem etimológica do termo
representar.
Etimologicamente, representar provém do latim repraesentatio, de repraesentare, que significa tornar presente (de presens: presente) algo que está ausente. É estar em lugar de algo, substituir, reproduzir, ou seja, não estar em presença de um original e sim de algo que o substitui e que se parece ou faz referência a ele. Outras definições também podem contribuir para esclarecer este conceito: ser a imagem ou a reprodução de algo; estar em lugar de; substituir; aparecer em outra forma; reproduzir, descrever; simbolizar; expor por palavras ou por escrito; figurar como símbolo; tornar presente; tornar visível; evocar; significar; desempenhar o papel, as atribuições, a função de; figurar como; simular. (CATTANI, 2011. p. 3)
O entendimento ao que se chega, então, é que para uma fotografia ser considerada um
documento descritivo deve ter havido, na sua construção, “a intenção” de ser o mais preciso
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possível tendo que se considerar sempre que se trata de uma parcela da realidade com algum
grau de imprecisão e subjetividade. Para a utilização em arquitetura e urbanismo se propôs
uma “taxonomia da fotografia de arquitetura e urbanismo” (VIEIRA, 2012, p. 276 – 290).
Esta classificação considera a “intenção” no momento do registro e por isso não é uma
classificação rígida, mas se constitui em uma escala onde, em uma ponta, está a intenção de se
fazer um registro descritivo e preciso da arquitetura ou da cidade, construído com método e
assim servir como ferramenta de “representação arquitetônica” e, na outra ponta da escala,
está a intenção de que a fotografia resultante seja a interpretação do universo “segundo o
fotógrafo” (BARTHES, 2008, P. 17) e desta forma uma fotografia classificada como de
“expressão arquitetônica”. Kossoy corrobora com esta segunda classificação ao afirmar:
“O fotógrafo, autor do registro, que motivado por razões de ordem pessoal e/ou profissional, a idealiza e elabora através de um complexo processo cultural/estético/técnico, processo este que configura a expressão fotográfica.” (KOSSOY, 2009b, p.25 e 26) grifo do pesquisador.
Mascaro também se coloca favorável a esta segunda classificação da fotografia de
arquitetura e urbanismo ao afirmar: “... a fotografia nos oferece uma imagem interpretativa do
mundo real, o que a habilita a ser definida como um trabalho de expressão pessoal”
(MASCARO, 1994, p.67) e se posiciona totalmente contrário a “fotografia de representação”
ao afirma que a “técnica dominada e o talento assegurado” ofereceriam aos leitores “imagens
mais significativas da arquitetura mundial. No entanto, por obra e graça das exigências
limitadoras de uma observação fria e explícita das obras arquitetônicas impostas pelas
revistas especializadas” criou-se um fator inibidor, onde o fotógrafo optou por um registro
“puramente descritivo do edifício”. (MASCARO, 1994, p.72, grifo do pesquisador)
Mascaro acredita que a “fotografia de expressão” tem maior capacidade de
entendimento ao afirmar:
“Estas publicações (grandes revistas e livros especializados em arquitetura) deveriam exigir do fotógrafo, além do domínio da técnica, um espírito sensível que lhe possibilitasse a compreensão integral da obra e sua perfeita tradução.” (MASCARO, 1994, p.71)
Este entendimento, porém, suscita alguns questionamentos. Toda a área de
conhecimento conhecida como “representação em arquitetura” tem por objetivo “permitir
uma melhor visualização e, por decorrência, melhor compreensão prévia da obra a ser
construída, em uma correspondência representação/objeto mais apurada” (CATTANI, 2006,
p. 112 e 113) e para tal, como afirma Joly “se é representação, então, necessariamente implica
a utilização de regras de construção” (2008. p. 44) e, portanto, um conhecimento para a sua
leitura – desconstrução. A fotografia de representação de arquitetura, ou seja, uma fotografia
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com valor documental deve estar engajada na pretensão de servir como representação e, como
toda representação, ter sido obtida por meio de uma metodologia que permita a sua
decodificação (CATTANI, 2010. p. 7) ou deciframento (MACHADO, 1994. p. 11).
Mascaro vai além e não acredita na possibilidade da fotografia servir como ferramenta
de representação em arquitetura ao afirmar:
“Esperar da fotografia de uma obra de arquitetura um registro fiel do que ela é ou do que se imagina que ela seja ou ainda do se gostaria que ela fosse é um grande equívoco que em nada contribui para a compreensão de seu verdadeiro valor.” (1994, p. 72)
O que se pode entender desta afirmação de Mascaro é que há uma preocupação com os
valores subjetivos da obra arquitetônica que de fato não são passíveis de registro pelas
ferramentas de representação em arquitetura. Entretanto, não pode ser desconsiderada a
possibilidade de uma fotografia, feita com metodologia, e “know-how para operar
instrumentos e códigos” (MACHADO, 1984, p.26) possa produzir um documento preciso e
que permita uma decodificação por parte de seus leitores, se estes também possuirem os
conhecimentos necessários para tanto. Posto desta maneira a fotografia se aproximaria do
desenho de arquitetura e demandaria da mesma maneira “um ato cognitivo” para sua
compreensão.
“[...] o desenho tem o poder de superar o achatamento de uma superfície bidimensional e representar ideias tridimensionais da arquitetura de uma maneira clara, legível e convincente. Para liberar esse poder, é necessária a capacidade de executar e ler a linguagem gráfica do desenho. O desenho não é simplesmente uma questão de técnica; é também um ato cognitivo que envolve percepção visual, avaliação e raciocínio de dimensões e relacionamentos espaciais” (CHING, 2011. p. vi).
Não parece que se chegará a um consenso e nem é pretensão deste texto consegui-lo,
mas entende-se a necessidade de se promover maior quantidade de reflexões sobre este tema
uma vez que a falta de consciência destas peculiaridades da fotografia podem comprometer a
sua leitura, decifração e uso nas diversas áreas do conhecimento. O texto de Dias torna-se mais
compreensivo com as considerações até agora apresentadas e ilustra de forma brilhante todos os
conflitos entre a fotografia documental e de expressão.
A fotografia "documental" passou a existir (daí o seu encanto) neste estreito esmagamento temporal, entre a felicidade do acontecimento, do ambiente ou da acção a reproduzir e o vislumbrado novo modo de os "enquadrar" (com a assistência da "técnica", que permitirá a melhor abertura face à luz, o melhor "foco", a melhor profundidade de campo). A "Fotografia de Arquitectura" inserindo-se nesta categoria, obrigará, ainda, suplementarmente, a um enorme rigor em qualquer dos níveis considerados. Exigir-se-lhe-á, primeiro, que nos devolva a compreensão do espaço retratado. Tarefa impossível, porquanto o espaço e as suas múltiplas dimensões não se deixam "prender" na bidimensionalidade da convergência perspéctica da reprodução fotográfica; mas uma "aproximação", uma "aproximação" que nos acorde as memórias de outras experiências e que nos sugestione o tipo de espaço, as preocupações do autor, o que sentiu o fotógrafo que o habitou antes de
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no-lo tentar devolver e à pesada leveza do que o envolve. Quanto tempo (dias) aguardará pelo sol? Aquele sol -- daquele dia -- as sombras que provoca? Não para "falsear" na revelação a sua estadia, mas porque sentiu caracterizador (e então uma boa hipótese de sugestão), aquela particular sombra de um dia de Verão. Depois o olhar, o tal quadrado ou quadro que é o interior do enquadramento: como vai o fotógrafo de arquitectura "enquadrar"? O que omitirá? De que cuidados e éticas se rodeará, com a caixa aberta perscrutando o construído? Procurando o real? Revendo o real? Só depois a "técnica", mediando ambas, pedida por ambas. E representar a Arquitectura irá exigir a ilusão de eliminar a distorção perspéctica, encontrando o non troppo herdado da composição renascentista, regressando à alvenaria plasmada em plano que o nosso olhar, educado por séculos de imagens, aprendeu a admitir. Entram as lentes ajustadas e as baterias de máquinas aqui; por vezes, ainda um pouco de photoshop, para anular um prematuro grafitti, uma mancha quase mínima ou uma sombra que só a cuidadosa observação posterior da imagem revelou. Mostrar a arquitectura. Todos os arquitectos se julgam fotógrafos. Vítor Figueiredo especulava sobre o tema. O que levará os arquitectos a sentirem-se tão à vontade por aí, sabendo nós que só de alguns -- poucos --, nos interessarão as fotografias? Os arquitectos emocionam-se com a arquitectura: com a do passado, com a moderna, com a qualidade e com a originalidade do espaço, com o acerto geométrico do espaço que o espaço parecerá conter. E querem guardar essas emoções. Querem (imaginam querer), mais tarde, poder olhar o pedaço de real, recompondo mentalmente esse real. Querem copiar, transportar aquela emoção, refundi-la, eventualmente, noutros contextos, também reais. Muitos tropeçarão, por isso, na armadilha da "objectividade". Outros divagarão sobre o olhar, propondo-nos outros olhares. A poucos sobrará a necessária paciência para, emocionados, aguardarem o acordar da manhã, o primeiro raio de sol ou então o último, a sombra longa estendida, o brilho no cerâmico, a passagem dos bandos de pássaros à hora da algazarra. Na sua actividade solitária, privilegiarão os corredores vazios para melhor poderem, e mais à vontade, experimentar, testar, inventar o olhar. Só quando virem passar ao longe fugaz um aluno, numa escola em férias, compreenderão então, quanto aquele vulto, subitamente, é de tal modo definitivo para a compreensão da dimensão do corredor, para o corte da luz que "rebenta" o fundo, para a inscrição da escala, face à altura do todo. Mas a lenta artilharia técnica não se compadece com a frescura da reportagem que o arquitecto desejaria atenta, acordada e "plástica" face aos acontecimentos. Ali, onde os acontecimentos seriam o espaço parado existente, mexido pela solene passagem do sol, no enfiado preciso com a porta-corredor-tubo, é o arquitecto-fotógrafo que, depois de tudo ajustar, emprestará ainda o seu corpo à imagem do espaço que anteviu, na ausência desse aluno que só verá do espaço a imagem mais tarde (DIAS, 2009.).
Manuel Graça Dias demonstra que há a consciência de que a fotografia de arquitetura
tem uma função documental, de aproximação com o real, com o rigor no registro, mas
também há a consciência das dificuldades no ato de fotografar, de se conseguir o registro
pleno da arquitetura. Entretanto, toda a ação fotográfica é apresentada recoberta de mistérios e
uma “aura artística” da mesma forma como Mascaro também a descreve em sua tese (1994).
É exaltada a mão do artista, a intervenção do artista, do virtuosismo do operador, da
iluminação divina (referência aos textos de Benjamim, 2008, quando fala da capacidade da
fotografia assim como o desenho de conseguir reproduzir com riqueza de detalhas uma
criação divina) e não da técnica, de um rigor científico como forma de resolver os desafios
impostos pelo ambiente para a tão desejada ‘aproximação’ da representação fotográfica do
objeto fotografado. Para Mascaro “A impossibilidade de se definir um método único de
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criação na fotografia, dignifica e personaliza o trabalho, concedendo-lhe uma aura autoral.”
(MASCARO, 1994, p.81)
“Há um olhar, assim como na poesia, que é uma forma de apreensão e absorção da realidade, uma reflexão a respeito dos objetos, espaços, fatos e pessoas que estão à nossa volta, cuja escrita é a fotografia.” (MASCARO, 1994, p. 73)
Mascaro aproxima a sua fotografia da poesia e oportuniza uma replica: A fotografia
não poderia ser tanto poesia quanto narrativa? Na escrita as palavras que são utilizadas para s
dois estilos são as mesmas a maneira como constroem a realidade é que altera tendo na poesia
uma interferência maior do autor construindo situações e enredos ao sabor de suas emoções
ao passo que na narrativa o autor é contido em seu afã de interpretar, julgar e filtrar a
realidade que esta descrevendo.
As ações justificadas pela estética, como soluções mágicas e espetaculares, tem como
consequência um distanciamento do resultado de uma tentativa honesta de representação do
objeto como busca qualquer outra técnica de representação. Embora o texto de Dias fale de
conhecimentos técnicos e de ‘artifícios’ ligados ao profundo conhecimento do ato de
fotografar, em momento nenhum trata da importância de informar o “método”, informar os
recursos utilizados como forma de alertar o leitor/receptor dos ‘feitiços’ usados para obter
aquele registro ou a intenção do fotógrafo de fazer a sua interpretação da realidade. O que
acaba por acontecer é que estas imagens de grande apelo visual, de vistas que ninguém mais
viu, de ângulos pelo menos impensáveis e que são oferecidas a espectadores ingênuos,
deslumbrados, que acreditando se tratarem de reflexos fiéis de uma realidade, acabam por
criar “imaginários deformados” (VIEIRA e CATTANI, 2010). Já no caso das fotografias de
Mascaro, estes artifícios espetaculares não estão presentes uma vez que ele segue os dogmas
de uma fotografia pré-digital ou até mesmo pré-massificação anterior ao lançamento das
câmeras 135, mas que, como as imagens comprovam, já era possível “converter o trivial em
aparições inéditas”. (MACHADO, 1984, p. 151)
A preocupação que norteia este trabalho é justamente as consequências desta
dicotomia – documento x expressão – no leitor/expectador que não tenha conhecimento destas
peculiaridades do registro fotográfico. A tese que se defende é “que esta informação pode
estar “deformada” em relação a “realidade”, construindo, assim, uma nova “realidade
alterada, reconfigurada” no universo imagético destes receptores” (VIEIRA e CATTANI,
2010, p. 6). É necessário, então que o leitor saiba “perscrutar a fotografia para não cair em
suas armadilhas”, ou seja, “que o leitor/espectador tenha conhecimento do processo do ato
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fotográfico e informações detalhadas de que recursos, técnicas e artifícios foram empregados
para a obtenção da fotografia que pretende ler/decifrar”. (VIEIRA e CATTANI, 2012, p. 9)
“A aparência é a base da chamada evidência fotográfica. O objeto pode achar-se registrado tal como se apresentava em sua concretude; personagens podem aparecer sorridentes, introspectivos, cenários podem ser distorcidos, detalhes omitidos, tratarem-se de pura encenação. A evidência não pode deixar de ser questionada.” (KOSSOY, 2007, p. 43, grifo do pesquisador)
Desta maneira Kossoy corrobora com a tese defendida neste trabalho, de que é
necessário perceber o grau de abstração e de precisão no registro fotográfico para que a sua
leitura seja informativa e não deformativa.
A fotografia parece ser de leitura fácil e direta. A fotografia está em todos os lugares e
faz parte da vida cotidiana. A mídia se utiliza dela para comunicar suas mensagens e
conceitos. É do senso comum que fotografias são óbvias e que a sua leitura não demanda
nenhum conhecimento específico, o que configura um engano perigoso. As fotografias de
Mascaro são apresentadas sem nenhum texto auxiliar que descreva processos e comente ou
declare as intencionalidades do seu autor. Nos volumes 2 e 3 de sua tese, onde estão as sua
fotografias da cidade e das casas, não há mais do que um pequeno texto introdutório de
Mascaro e um pequeno poema e depois o leitor é deixado solto sobre as imagens. O que o
autor pretende com esta atitude? Acreditaria Mascaro em uma leitura clara e completa de sua
obra por todos os seus leitores/expectadores?
Barthes diz que “a fotografia pode ser objeto de três práticas (ou de três emoções, ou
de três intenções): fazer, experimentar, olhar” (2008, p. 17) Acrecentáriamos a estas três
práticas a ‘leitura’ entendendo que olhar é uma ação diferente da leitura. É preciso saber ler,
compreender as informações nela contida e suas possíveis abstrações.
Acredita-se que, por se viver rodeado de fotografias, se é capaz de compreendê-las.
Flusser alerta para o risco do “analfabetismo fotográfico”.
De modo geral, todo mundo possui um aparelho fotográfico e fotografa, assim como, praticamente, todo mundo está alfabetizado e produz textos. Quem sabe escrever, sabe ler; logo, quem sabe fotografar sabe decifrar fotografias. Engano. Para captarmos a razão pela qual quem fotografa pode ser analfabeto fotográfico, é preciso considerar a democratização do ato fotográfico. Tal consideração poderá contribuir, de passagem, à nossa compreensão da democracia em seu sentido mais amplo. (2002. p. 53)
Moholy-Nagy, por exemplo, que acredita que a fotografia quase equivale a uma
“transformação psicológica da visão humana” que ao serem oferecidas novas imagens com
qualidade e “absoluta precisão” treinariam a capacidade de observação, elevando a
capacidade de percepção do mundo a uma “nova visão” (2004. p. 192-194). Há fortes indícios
de que Mascaro concorda com crença de Moholy-Nagy de que o leitor elevaria a sua
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capacidade de ver, sua percepção visual, automaticamente, apenas por ter sido exposto a essas
novas imagens, sem treino, nem orientação, e o que parece ser mais perigoso: que todos
alcançariam o mesmo nível de excelência de leitura e interpretação.
“Ler fotografias com profundidade e de forma crítica não é um ato simples e que todos são capazes de fazer. Há diferentes níveis de leitura, e o indivíduo comum, geralmente, tem um baixo nível de acuidade visual e uma percepção superficial das informações oferecidas pelas fotografias.” (VIEIRA e CATTANI, 2012, p. 2)
Achar fotografias bonitas não é o mesmo que ler fotografias. Os atributos estéticos são
mais superficiais e podem estar ligados à organização da imagem, às possibilidades de
decompor suas áreas de tons em corpos geométricos, na utilização de regras compositivas
oriundas das artes como a regra dos terços e a medida áurea. Entretanto, conseguir ler uma
fotografia é conseguir ultrapassar a condição bidimensional da fotografia e, de certa forma,
reconstruir sua tridimensionalidade.
4. Considerações finais
Mascaro atribui para si o titulo de “poeta visual” e mesmo afirmando que faz trabalhos
de “documentação urbana” rejeita o papel de “documentarista”. Suas imagens, de fato, são
pura poesia de grande refinamento. É interessante observar que as imagens oferecem o
registro de objetos, pessoas e parcelas da cidade com altíssima precisão, os objetos estão ali,
nítidos, precisos, entretanto, isto não é suficiente para garantir uma representação “fiel” e, por
consequência, reconhecível de um determinado lugar, objetos, cenários ou acontecimentos por
todos os leitores. Assim como na escrita onde as palavras podem construir tanto um texto
descritivo ou narrativo quanto construir uma ficção ou um poema de um acontecimento, a
fotografia também apresenta estas mesas possibilidades. Se os fotógrafos não deixarem claro
suas intencionalidades, seja de desejarem priorizar a sua expressão e interpretação ou o desejo
documental em sua obra, fica para os leitores um desafio a mais ao fazer a leitura destas
imagens. Caberá ao leitor saber ler as fotografias, identificar suas armadilhas, entender suas
possibilidades de precisão e manipulação do mundo visível.
Pode-se decifrar a história a partir de narrativas, poemas ou ficção, mas cada estilo
literário deve ser interpretado de uma maneira para que o leitor possa “colher” dele
informações daquela determinada realidade. No mesmo sentido, o leitor precisa identificar,
em cada fotografia, qual o grau de subjetividade e objetividade foi empregado na sua
construção para que possa fazer uma interpretação correta.
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