Formulação geométrica da anisotropia Aplicação aos meios não magnéticos uniaxiais e biaxiais
Francisco David Mourão de Carvalho
Dissertação para obtenção do Grau de Mestre em
Engenharia Electrotécnica e de Computadores
Júri Presidente: Prof. Doutor José Manuel Bioucas Dias Orientador: Prof. Doutor António Luís Campos da Silva Topa Co-Orientador: Prof. Doutor Carlos Manuel dos Reis Paiva Vogal: Prof. Doutora Maria Herminia Costa Marçal
Outubro 2011
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Agradecimentos
Em primeiro lugar, gostaria de agradecer a ambos os coordenadores António Luís Campos da
Silva Topa e Carlos Manuel dos Reis Paiva por terem-me dado a oportunidade de realizar esta
dissertação. Ao longo dos ultimos meses, ambos os Professores mostraram muita disponibilidade e
paciência, o que ajudou muito para a realização deste trabalho.
Também gostaria de agradecer aos meus pais e irmã pelos bons conselhos e ajuda quando lidei com
grandes desafios e ao seu suporte mesmo nos momentos mais difíceis.
Aos meus amigos por me proporcionarem bons valores humanos, muitos momentos de diversão e a
sua disponibilidade quando necessário.
Um grande agradecimento à Maria pela sua ajuda nas decisões difíceis e suporte nos momentos mais
difíceis. A sua presença na minha vida ajudou-me bastante, proporcinando-me tranquilidade e paciência
para ultrapassar vários obstáculos.
Finalmente, quero agradecer aos meus colegas, em particular durante estes anos que passei nesta
universidade.
iv
Resumo
Nesta dissertação é apresentado um estudo da aplicação da álgebra geométrica a meios
anisotrópicos, em particular estuda-se a anisotropia eléctrica nos cristais uniaxiais e biaxiais com recurso
à álgebra geométrica e estudam-se algumas aplicações.
No inicio é efectuada uma abordagem aos conceitos chave da álgebra geométrica Euclidiana.
Introduz-se o conceito de produto geométrico e destaca-se especialmente a importância deste produto
para que se obtenha os variados objectos introduzidos por esta mesma álgebra, surgindo deste modo os
objectos bivector e trivector e conceitos importantes como as contracções e rotores.
Após introduzir-se o conceito de anisotropia é efectuada a aplicação da álgebra geométrica aos
cristais anisotrópicos uniaxias e biaxiais. É realçado em especial o conjunto de vantagens ao utilizar-se
um sistema de coordenadas livre, introduzido pela álgebra geométrica, para obter as ondas características
e as relações constitutivas dos cristais.
A formulação teórica da álgebra geométrica reforça o facto desta álgebra poder vir a tornar-se numa
linguagem unificada da Física moderna.
Palavras-chave: Álgebra geométrica, produto exterior, produto geométrico, meios anisotrópicos,
cristais uniaxiais e cristais biaxiais
v
Abstract
This dissertation presents a study of the application of geometric algebra to anisotropic mediums, in
particular the electrical anisotropy in uniaxial and biaxial crystals using the geometric algebra are studied
It is made an approach to key concepts of Euclidean geometric algebra. The concept of geometric
product are introduced and stands out in particular the importance of this product in order to obtain the
various objects introduced by the same algebra, coming this way new objects, such as bivectors and
trivectors and important concepts such as contractions and rotors.
After introducing the concept of anisotropy is made the application of geometric algebra to
uniaxial and biaxial anisotropic crystals. It is highlighted in particular the set of advantages when using a
system of free coordinates, introduced by geometric algebra to obtain the wave characteristics and the
constitutive relations of crystals.
The theoretical formulation of geometric algebra reinforces the fact that this algebra can become in
a unified language of modern physics.
Keywords: Geometric algebra, exterior product, geometric product, anisotropic mediums, uniaxial
crystals and biaxial crystals
vi
vii
Índice
Símbolos .....................................................................................................................................................ix
Lista de Figuras...........................................................................................................................................xi
Lista de Tabelas ........................................................................................................................................ xii
Capítulo 1: Introdução .................................................................................................................................1
1.1 - História ..........................................................................................................................................1
1.1.1 - Euclides e o principio da álgebra ..........................................................................................1
1.1.2 - Hamilton, quaterniões...........................................................................................................1
1.1.3 - Maxwell, electromagnetismo ................................................................................................2
1.1.4 - Grassman, álgebra extensiva ................................................................................................2
1.1.5 - Gibbs, cálculo vectorial ........................................................................................................3
1.1.6 - Clifford, álgebra de Clifford..................................................................................................3
1.1.7 - Albert Einstein......................................................................................................................3
1.1.8 - Cartan, Dirac e Pauli, spins.................................................................................................3
1.1.9 - David Hestenes, álgebra geométrica moderna ......................................................................4
1.2 - Estado de arte.................................................................................................................................4
1.3 - Objectivos......................................................................................................................................5
1.4 - Estrutura e organização..................................................................................................................5
1.5 - Contribuições originais ..................................................................................................................6
Capítulo 2: Álgebra Geométrica do Plano ...................................................................................................7
2.1 - Espaço linear..................................................................................................................................7
2.2 - Funções lineares.............................................................................................................................8
2.3 - Álgebra e estruturas quadráticas ....................................................................................................9
2.4 - Produto geométrico e bivectores..................................................................................................10
2.5 - Álgebra geométrica 2Cl ..............................................................................................................12
2.6 - Produto exterior ...........................................................................................................................13
2.7 - Álgebra geométrica e os números complexos..............................................................................14
2.8 - Reflexões e rotações ....................................................................................................................18
2.9 - Conclusão ....................................................................................................................................21
Capítulo 3: Álgebra Geométrica do Espaço...............................................................................................23
3.1 - Produto externo e produto exterior ..............................................................................................23
3.2 - Bivector .......................................................................................................................................25
3.3 - Trivector .......................................................................................................................................26
3.4 - Dual de Hodge.............................................................................................................................27
3.5 - Álgebra exterior de Grassman.....................................................................................................29
3.6 - Álgebra geométrica de Clifford ...................................................................................................30
3.7 - Produto geométrico......................................................................................................................32
3.8 - Involução .....................................................................................................................................36
3.9 - Contracção (à direita e à esquerda)..............................................................................................37
viii
3.10 - Reflexão.....................................................................................................................................39
3.11 - Rotação ......................................................................................................................................40
3.12 - Conclusão ..................................................................................................................................42
Capítulo 4: Meios Anisotrópicos ...............................................................................................................43
4.1 - Equações de Maxwell...................................................................................................................43
4.2 - Equações de Maxwell-Boffi.........................................................................................................45
4.3 - Anisotropia em álgebra geométrica .............................................................................................47
4.3.1 - Anisotropia eléctrica ...........................................................................................................47
4.3.2 - Propagação de ondas electromagnéticas em meios anisotrópicos.......................................57
4.3.2.1 - Cristais uniaxiais........................................................................................................58
4.3.2.2 - Cristais biaxiais..........................................................................................................63
4.4 - Conclusão ....................................................................................................................................65
Capítulo 5: Aplicações dos meios anisotrópicos........................................................................................67
5.1 - Placas retardadoras ......................................................................................................................67
5.2 - Placa de meia onda ......................................................................................................................69
5.3 - Placa de quarto de onda ...............................................................................................................70
5.4 - Placas de ordem múltipla.............................................................................................................71
5.5 - Interface: meio isotrópico/cristal uniaxial....................................................................................72
5.6 - Conclusão ....................................................................................................................................74
Capítulo 6: Conclusão................................................................................................................................77
6.1 - Conclusão final ............................................................................................................................77
6.2 - Perspectivas de trabalhos futuros.................................................................................................78
Referências.................................................................................................................................................79
Apêndice A: Algumas relações envolvendo o operador nabla em 3Cl ......................................................81
ix
Símbolos
ℜ Espaço linear uni-dimensional
2ℜ Espaço linear bi-dimensional
3ℜ Espaço linear tri-dimensional
2Cl Álgebra de Clifford do plano
3Cl Álgebra de Clifford do espaço
1 2,e e Vectores unitários da álgebra geométrica do plano
1 2 3, ,e e e Vectores unitários da álgebra geométrica do espaço
ijδ Delta de Kronecker
F Bivector
�F Bivector unitário
V Trivector
( ) Produto geométrico
( )⋅ Produto interno
( )× Produto externo
( )∧ Produto exterior
22∧ℜ Sub-espaço dos bivectores no plano
23∧ℜ Sub-espaço dos bivectores no espaço
23∧ℜ Sub-espaço dos trivectores no espaço
u Conjugação
ɵu Involução de grau
ɶu Reversão
−Cl Parte ímpar de uma álgebra de Clifford
+Cl Parte par de uma álgebra de Clifford
R Rotor
''''rrrr Reflexão do vector r
''''''''rrrr Reflexão dupla do vector r
( )� Componente paralela de um vector
( )⊥ Componente perpendicular de um vector
� Contracção à direita
� Contracção à esquerda
E Campo eléctrico
B Campo magnético
x
H Campo de magnetização
D Campo de deslocamento eléctrico
M Vector magnetização
P Vector polarização eléctrica
∇ Operador nabla
Densidade de carga eléctrica
p Densidade de carga associada à polarização
t Densidade total de carga eléctrica
J Densidade de corrente
mJ Densidade de corrente associada à magnetização
tJ Densidade de corrente total de carga
pJ Densidade de corrente associada à polarização
ε Permitividade eléctrica
rε Permitividade eléctrica relativa
0ε Permitividade eléctrica do vácuo
µ Permeabilidade magnética
rµ Permeabilidade magnética relativa
0µ Permeabilidade magnética do vácuo
c Velocidade da luz
0η Impedância do vácuo
E 0 Campo eléctrico numa região sem fontes
B 0 Campo magnético numa região sem fontes
H 0 Excitação magnética numa região sem fontes
D 0 Excitação eléctrica numa região sem fontes
t Tempo
ω Frequência angular
k Constante de propagação
0k Constante de propagação do vácuo
K Vector cujo módulo é a constante de propagação
n Índice de refracção
n Vector índice de refracção
ηηηη Função de impermeabilidade
eυ Velocidade da onda extraordinária
0υ Velocidade da onda ordinária
B Base ortonormada de um espaço
xi
Lista de Figuras
Figura 2.1: Bivector: Área do plano .........................................................................................................11
Figura 2.2: Norma do produto geométrico: Área do paralelogramo.........................................................14
Figura 2.3: Representação de um vector...................................................................................................16
Figura 2.4: Representação de um número complexo................................................................................16
Figura 2.5: Propriedade comutativa..........................................................................................................18
Figura 2.6: Reflexão r ´ do vector r em relação ao vector a......................................................................18
Figura 2.7: Rotação...................................................................................................................................19
Figura 3.1: Produto externo vs Produto exterior.......................................................................................24
Figura 3.2: Áreas e direcção dos bivectores .............................................................................................25
Figura 3.3: O produto exterior é anti-simétrico ........................................................................................25
Figura 3.4: Componentes do bivector.......................................................................................................26
Figura 3.5: Dual de Hodge........................................................................................................................28
Figura 3.6: Produto geométrico ................................................................................................................33
Figura 3.7: Contracção à esquerda............................................................................................................38
Figura 3.8: Reflexão do vector r em relação ao plano..............................................................................39
Figura 3.9: Rotação a` do vector a em torno do eixo 123= −u Be .............................................................40
Figura 4.1: Anisotropia eléctrica caracterizada através do bivector = ∧F E D .......................................48
Figura 4.2: Vectores 1d e 2d que definem o operador linear εεεε como sendo um operador biaxial.........50
Figura 4.3: Vectores 1d e 2d que caracterizam εεεε e 1c e 2c que caracterizam ηηηη num meio biaxial .....55
Figura 4.4: Índices de refracção correspondentes às ondas características de um cristal uniaxial positivo,
com ε ε⊥ < � ...............................................................................................................................................59
Figura 4.5: Índices de refracção correspondentes as ondas características de um cristal uniaxial negativo,
com ε ε⊥ > � ...............................................................................................................................................59
Figura 4.6: Índices de refracção das ondas características num cristal biaxial .........................................65
Figura 5.1: Placa retardadora de material anisotrópico transparente: incidência e transmissão de onda
polarizada...................................................................................................................................................67
Figura 5.2: Polarização à entrada (2 0x = ) e à saída (2x d= ) de uma placa de meia onda ....................69
Figura 5.3: Rotação de polarização numa placa de meia onda .................................................................70
Figura 5.4: Interface entre um meio a, isotrópico e um meio b, cristal uniaxial positivo .........................73
xii
Lista de Tabelas
Tabela I: Base do espaço 2Cl ...................................................................................................................12
Tabela II: Tabela multiplicativa ...............................................................................................................12
Tabela III: Componentes do multivector..................................................................................................15
Tabela IV: Operações de 2Cl ...................................................................................................................15
Tabela V: Elementos da álgebra exterior de Grassman............................................................................29
Tabela VI: Bases de 3Λℜ e 3Cl ..............................................................................................................31
Tabela VII: Elementos do multivector u .................................................................................................35
Tabela VIII: Involuções em 3Cl ..............................................................................................................36
Tabela IX: Grandezas electromagnéticas..................................................................................................44
Tabela X: Equações de Maxwell-Boffi em 3Cl .........................................................................................46
Tabela XI: Cristais uniaxiais ....................................................................................................................58
Tabela XII: Materiais ...............................................................................................................................71
1
Capítulo 1
Introdução
A álgebra geométrica é uma linguagem matemática que associa uma interpretação geométrica a
cada operação, abrangendo o produto exterior de Grassman e os quaterniões de Hamilton. Através desta
álgebra é permitido que se defina operações de contracção e rotação que auxiliam os cálculos e que seja
dada uma nova dimensão ao electromagnetismo, particularmente possibilita que se defina a função
dieléctrica inversa de um meio com anisotropia eléctrica através dos eixos ópticos, no caso dos cristais
biaxiais.
Nesta dissertação estuda-se através de que forma a álgebra geométrica é aplicada no estudo dos
meios anisotrópicos. Através da álgebra geométrica do espaço 3Cl é possível fazer uma abordagem livre
de um sistema específico de coordenadas, no estudo da propagação de ondas electromagnéticas nos meios
anisotrópicos, em particular no estudo da propagação deste tipo de ondas em meios uniaxiais e biaxiais. É
dada atenção especial ao estudo da anisotropia eléctrica.
Por fim, faz-se um estudo de aplicações da álgebra geométrica em meios anisotrópicos,
nomeadamente em placas retardadoras e uma interface.
1.1 - História
Como não é possível citar todos os físicos, cientistas e matemáticos que contribuíram para a
evolução da álgebra desde a sua origem até aos dias de hoje, apenas serão citadas as personalidades
cruciais.
1.1.1 – Euclides e o principio da álgebra
A álgebra surgiu como uma das mais importantes matemáticas de todos os tempos. Euclides de
Alexandria como era conhecido, viveu no período 330BC a 260BC. Nasceu na Síria, estudou em Atenas e
mais tarde foi viver para Alexandria, onde deu aulas de matemática numa escola conhecida como
“museu”, criada por Ptolomeu Soter, que viveu no período 306BC a 283BC. Ele ganhou grande prestígio
devido ao seu brilhante caminho no ensino de geometria e álgebra. No seu livro Elements, ele apresentou
um sólido e consistente quadro, que hoje em dia mantém-se como a base da matemática. Esta álgebra é
geralmente conhecida como álgebra geométrica Euclideana, para se diferenciar das geometrias não-
Euclideanas, que foram descobertas no século XIX.
1.1.2 – Hamilton, quaterniões
O Sr. William Rowan Hamilton, viveu no período de 1805 a 1865, foi o percussor dos quaterniões.
A sua intenção foi expandir os números complexos que podem ser vistos num plano. Ele tentou a
2
aplicação no espaço tridimensional, contudo foi provado ser impossível. Portanto, ele teve que usar a sua
teoria com quatro dimensões. Em 13 de Novembro de 1843, ele apresentou um paper que contém a sua
teoria dos quaterniões. As regras de multiplicação foram criadas, podendo ser directamente comparadas,
sendo consideradas uma extensão dos números complexos. Ele representou um vector por um quaternião
puro e escreveu o resultado do produto de dois quaterniões puros como a soma de uma parte escalar com
uma parte vectorial.
1.1.3 – Maxwell, electromagnetismo
James Clerk Maxwell viveu no período de 13 Junho de 1831 a 5 de Novembro de 1879, sendo
responsável pelo desenvolvimento da teoria do electromagnetismo clássico, unindo teorias separadas para
o electromagnetismo, óptica e electricidade. Ele demonstrou que os campos electromagnéticos viajam
através do espaço na forma de ondas à velocidade da luz constante. Ele sugeriu também que a luz consiste
em ondulações no mesmo meio, que é o resultado de efeitos eléctricos e magnéticos. As oito equações de
Maxwell iniciais foram também apresentadas, sendo o electromagnetismo o resultado de uma teoria
unificada de vários séculos de experiências.
Em meados do século XIX, graças aos investigadores Ampère e Faraday, a relação entre
electricidade e magnetismo já era conhecida. Porém, uma teoria que faltava e que pôde juntar-se a estas
teorias (existindo várias propostas, entre elas as de Maxwell e Webber, prevalecendo o primeiro nessas
teorias, graças a vários factores) como o reconhecimento que os efeitos ópticos são de natureza magnética
e eléctrica. As aplicações que podem estar relacionadas com este tópico são incontáveis, como
telemóveis, TV, GPS (global positioning system), etc. No livro de Maxwell, as suas próprias equações são
apresentadas na forma escalar, que foi claramente influenciado pela teoria dos quaterniões de Hamilton.
Contudo foi graças a Gibbs e Heaviside a utilização de uma notação mais moderna, que permite escrever
as mesmas equações com escalares.
1.1.4 – Grassman, álgebra extensiva
Herman Grassman, viveu no período 1809 a 1877, ensinou matemáticos na Alemanha no Stettin
Gymnasium. Em 1844 ele apresentou o seu famoso tratado Die Lineale Ausdehnungslehre, onde foram
apresentadas teorias inovadoras. Apesar de ser pioneira, a sua publicação não obteve muita atenção
devido à maneira como o seu conteúdo foi exposto, tendo uma linguagem muito filosófica. Em 1862 ele
publicou uma segunda edição, que recebeu melhores críticas e contribuiu para o progresso da álgebra de
Clifford, entre outras formas diferentes, como a álgebra linear e a análise vectorial. As entidades
algébricas residentes na teoria da extensão são denominadas quantidades extensivas. Entre os vários
elementos introduzidos nesta álgebra, Grassman criou o produto interno para vectores para definir uma
forma quadrática num espaço vectorial sobre o espaço dos números reais, bem como o produto exterior
para formar os diversos tipos de multivectores, que serão estudados mais tarde. Então, pode-se afirmar
que Grassman foi o primeiro descobridor da álgebra geométrica.
3
1.1.5 – Gibbs, cálculo vectorial
Josiah Willard Gibbs viveu de 1839 a 1903, sendo um físico teórico americano, matemático e
químico, que inventou a análise vectorial, sendo um “re-make” dos quaterniões de Oliver Heaviside
(viveu de 1850 a 1925). Teve vantagem no facto de que os fundamentos da álgebra geométrica foram
estabelecidos no século XIX bem como pela morte prematura de Clifford, para criar a linguagem
geométrica do século XX. Esta linguagem foi utilizada para reescrever as equações de Maxwell,
adicionando algum requinte. Uma forma de aplicar física aos objectos geométricos com os quaterniões,
motivou Gibbs a construir uma análise vectorial tridimensional baseada no trabalho de Hamilton. Por
exemplo o produto cruzado foi substituído pelo produto exterior e os vectores axiais por bivectores. Em
relação aos vectores axiais, foi possível efectuar esta substituição desde que ambos os elementos sejam
equivalentes, de um ponto de vista geométrico, sabendo que a direcção e magnitude representam a área
orientada formada por um bivector. Gibbs também criou as diádicas, sendo inspiradas no produto
tensorial de Grassman, anteriormente chamado produto indeterminado.
1.1.6 – Clifford, álgebra de Clifford
William Kingdon Clifford viveu de 1845 a 1879, foi um geómetro e filósofo que também ensinou
matemática na universidade de Londres.
Em 1876 ele escreveu o abstract para um paper, que permaneceu inacabado devido aos seus
problemas de saúde. Ele estava a reformular os produtos que foram criados previamente por Grassman
tendo em 1878 Clifford unificado as descobertas de Grassman e Hamilton numa única estrutura algébrica,
que deu origem à álgebra geométrica. Além desta realização, ele foi também a primeira pessoa a sugerir
que a gravitação pode ser a demonstração de uma geometria subjacente.
1.1.7 – Albert Einstein
No inicio do século XX, Einstein publicou a teoria da relatividade restrita em 1905, passando a ser
necessário trabalhar a quatro dimensões, sendo três espaciais e uma temporal, começando a pôr-se em
causa a validade do produto externo de Gibbs para esta nova métrica e consequentemente começa-se a
pensar na utilidade dos trabalhos que foram desenvolvidos por Grassman e mais especificamente por
Clifford.
1.1.8 – Cartan, Dirac e Pauli, spins
Os Spinors foram inventados por Élie Cartan em 1913. Eles são bastante importantes em
matemática e física relativa à teoria dos grupos ortogonais, como as rotações ou as transformadas de
Lorentz. Eles são essenciais porque a estrutura das rotações em certa dimensão requerem mais dimensões
para serem totalmente caracterizados. Usando Clifford ou outra álgebra, é possível obter spins a partir de
um espaço Euclidiano ou de Minkowski. Os criados spins Cartan foram adoptados para aplicações
4
particulares e são ainda utilizados nos dias de hoje. Os spins de Dirac são necessários para descrever o
estado das partículas relativistas. Em 1926, Pauli descreveu a interacção do spin electrónico com um
campo magnético externo.
1.1.9 – David Hestenes, álgebra geométrica moderna
David Hestenes nasceu em 1933. É um físico que é actualmente um dos mais importantes
investigadores a nível mundial, sendo responsável pela evolução da álgebra geométrica no século XX, tal
como outras álgebras, com o intuito de formalizar a física teórica, tendo em 1960 no seu trabalho
relacionado com a mecânica quântica, concluido que a álgebra geométrica consiste numa ferramenta
matemática poderosa que permitiu unificar todas as áreas da mecânica quântica.
A álgebra geométrica é cada vez mais hoje objecto de investigação e estudo por um crescente
número de pessoas, principalmente nos últimos anos, com destaque para os trabalhos de Chris Doran,
Anthony Lasenby, Pertti Lounesto, Leo Dorst, Stephen Mann e Daniel Fontijne.
1.2 – Estado de arte
Os meios anisotrópicos, usualmente designados cristais ópticos, são utilizados em vários
dispositivos. No seu estudo normalmente recorre-se ao cálculo diádico, porém, tal como será verificado
através da abordagem feita nesta dissertação a esses meios, através da utilização da álgebra geométrica do
espaço, esta última abordagem é mais elegante pela simplificação matemática que introduz.
A constituição de um cristal consiste em estruturas elementares (estruturas cristalinas). A
propagação de ondas electromagnéticas é influenciada pela simetria da estrutura. Através da definição do
vector polarização, é mais fácil compreender o modo através do qual as disposições das cargas, numa
estrutura cristalina assimétrica, podem conduzir a deslocamentos eléctricos, não necessariamente
paralelos ao campo eléctrico.
Ao se trabalhar com as Equações de Maxwell, com o objectivo de se obter uma equação de
dispersão, existem duas soluções possíveis de propagação para a mesma direcção com a polarização
linear original. Estas mesmas duas ondas vão propagar-se com velocidades de fase diferentes. Existindo
no entanto, direcções em que as soluções são iguais. Sendo essas direcções os eixos ópticos. Essa
característica conduz a que quando uma onda despolarizada incide num material deste género, origina a
geração de duas ondas refractadas com direcções de propagação diferentes, mantendo a mesma
polarização. A esta característica dá-se o nome de birefringência. Se um meio for birefringente e
conservar a polarização linear, diz-se que esse meio apresenta birefringência linear.
Os cristais com anisotropia eléctrica são de dois tipos: uniaxiais e biaxiais. Os cristais uniaxias
caracterizam-se por apresentarem um eixo óptico e os cristais biaxiais por apresentarem dois eixos
ópticos.
5
1.3 – Objectivos
Existem várias aplicações para a álgebra geométrica, tal com já indicado anteriormente, esses
estudos são relativamente recentes sendo actualmente uma ferramenta pouco divulgada entre a
comunidade científica.
O objectivo principal da realização desta dissertação de mestrado consiste no estudo da aplicação
da álgebra geométrica aos meios anisotrópicos, em particular nos cristais uniaxiais e biaxiais, sendo feita
uma abordagem à formulação teórica desta nova álgebra e estudando-se as principais vantagens da
álgebra geométrica como uma linguagem unificada da Física moderna.
Ao se efectuar este estudo tem-se a intenção de contribuir para que se possa demonstrar a utilidade
da álgebra geométrica como uma ferramenta matemática.
O principal objectivo desta dissertação é a obtenção do grau de mestre em engenharia
electrotécnica e de computadores na área de especialização de telecomunicações.
1.4 – Estrutura e organização
A presente dissertação consiste em seis capítulos. No primeiro capítulo encontra-se a introdução,
sendo feita um enquadramento histórico em relação à álgebra geométrica, seguindo-se os objectivos da
dissertação e as abordagens efectuadas na mesma ao se estudar os meios anisotrópicos através da álgebra
geométrica.
A álgebra geométrica é formalmente apresentada nos capítulos dois e três, em particular a álgebra
Euclidiana e a introdução desta mesma à álgebra do plano e espaço. No capítulo dois faz-se a definição
essencial em álgebra geométrica, o produto geométrico, tratando-se o caso geral para o produto
geométrico de dois vectores e a soma do produto interno de dois vectores com o produto exterior desses
vectores. Por seu lado o produto exterior de Grassman introduz novas noções, nomeadamente o plano
orientado ou bivector e o volume orientado ou trivector tratado no capítulo três. No fim do capítulo três é
dado destaque a dois operadores nomeadamente as contracções e os rotores, sendo importantes na
aplicação da álgebra geométrica à anisotropia.
A aplicação da álgebra geométrica do espaço ao estudo dos meios anisotrópicos é feita no capítulo
quatro. Em particular são estudados os cristais uniaxiais e biaxiais e a forma como através da álgebra
geométrica do espaço é possível determinar a função dieléctrica e através da mesma é possível relacionar
os eixos ópticos de cada cristal com o índice de refracção.
As aplicações concretas dos cristais uniaxiais nas placas retardadoras e a uma interface são
estudados no capítulo cinco.
No capítulo seis é feita a conclusão, sendo dados a conhecer os principais resultados e conclusões
desta dissertação. Também se refere algumas perspectivas de trabalho futuro no caso geral da aplicação
da álgebra geométrica em variadas áreas, incluindo os meios anisotrópicos.
6
1.5 – Contribuições originais
Em literatura especializada habitualmente recorre-se ao cálculo diádico ou tensorial para descrever
a anisotropia. Verifica-se que a álgebra geométrica introduzida nesta dissertação é uma ferramenta mais
elegante do ponto de vista do formalismo matemático do que o cálculo diádico ao se trabalhar com
tensores, visto que é feita uma abordagem livre de um sistema de coordenadas, simplificando o estudo da
anisotropia eléctrica. Nesta dissertação faz-se uma abordagem à anisotropia eléctrica através da álgebra
geométrica do espaço, potenciando assim o recurso a um sistema de coordenadas livre para analisar
nestes meios a propagação de ondas electromagnéticas.
7
Capítulo 2
Álgebra Geométrica do Plano
Neste capítulo é introduzida a álgebra geométrica 2Cl . Várias definições importantes na aplicação
desta álgebra aos meios anisotrópicos são introduzidas, tais como as funções lineares. É introduzido o
produto geométrico, sendo a definição mais importante da álgebra geométrica. São apresentadas
operações tais como as reflexões e as rotações.
2.1 - Espaço linear
O espaço linear ou espaço vector V é definido pelo corpo ℜ . Os elementos do espaço linear V são
chamados vectores. No espaço linear, os vectores podem ser adicionados a vectores e podem ser
multiplicados por números reais, ou seja:
( ), V+ ∈֏a b a b para , V∈a b (2.1)
( ), Vλ ∈֏a b a para ,λ ∈ℜ , V∈a b (2.2)
Por outro lado, verifica-se os seguintes axiomas:
• Axioma da adição de vectores:
+ = +a b b a (2.3)
( ) ( ) + + = + +a b c a b c (2.4)
0+ =a a (2.5)
( ) 0+ − =a a (2.6)
• Axioma para multiplicação de vectores:
( )λ λ λ+ = +a b a b (2.7)
( )λ µ λ µ+ = +a a a (2.8)
8
( ) ( )λµ λ µ=a a (2.9)
1=a a (2.10)
Estes dois axiomas definem uma estrutura linear em V. Um exemplo de um espaço linear é o
espaço 2ℜ que é um espaço linear definido pelo corpo ℜ .
( ){ }2 , ,x yℜ = ℜ×ℜ = ∈ℜx y (2.11)
2.2 - Funções lineares
Um subconjunto U de um espaço linear V é chamado sub-espaço de V desde que seja fechado, em
relação às operações anteriores,
U+ ∈a b para , U∈a b (2.12)
Vλ ∈a para ,λ ∈ℜ U∈a (2.13)
Por exemplo, 2ℜ é um sub-espaço de 3ℜ .
Uma aplicação :L U V→ entre dois espaços lineares U e V, é chamada uma função linear desde
que se tenha λ ∈ℜ e , U∈a b ,
( ) ( ) ( ) ,L L L+ = +a b a b ( ) ( )L Lλ λ=a a (2.14)
Verifica-se as seguintes propriedades:
• Uma função linear V V→ é uma transformação linear ou um endomorfismo.
• Uma função linear invertível U V→ é um isomorfismo linear e pode ser escrito U V≈
Um vector V∈b é uma combinação linear de vectores 1 2, ,..., k V∈a a a se é possível escrever,
1 1 2 2 ... ,k kλ λ λ= + + +b a a a 1 2, ,..., kλ λ λ ∈ℜ (2.15)
9
Um conjunto de vectores { }1 2, ,..., ka a a é linearmente independente se nenhum deles puder ser
escrito como uma combinação dos outros,
1 1 2 2 ... 0,k kλ λ λ+ + + =a a a 1 2 ... 0kλ λ λ= = = (2.16)
Numa combinação linear 1 1 2 2 ... ,k kλ λ λ= + + +b a a a 1 2,λ λ ,..., ∈ℜkλ com o conjunto
{ }1 2, ,..., ka a a linearmente independente, os números 1 2, ,..., kλ λ λ são únicos e são chamados
coordenadas do vector b. As combinações lineares de { }1 2, ,..., k V⊂a a a originam o sub-espaço de V
conhecido como o sub-espaço originado por { }1 2, ,..., ka a a . Um conjunto linearmente independente
{ }1 2, ,..., k V⊂a a a que dá origem a V é uma base de V. Todas as bases de V, têm o mesmo número de
elementos, sendo chamados de dimensão de V.
2.3 - Álgebra e estruturas quadráticas
Uma função :B U U V× → é bilinear ( ) ( ), , = ∈֏ ⊙B Va b a b a b , mas necessita de ser uma
função linear para ambos os argumentos,
( ) ( ) ( )( ) ( ) ( )
1 1 2 2 1 1 2 2
1 1 2 2 1 1 2 2
, , ,
, , ,
B B B
B B B
λ λ λ λµ µ µ µ
+ = + + = +
a a b a b a b
a b b a b a b (2.17)
( ) ( )
( ) ( ) ( ) ( )1 1 2 2 1 1 2 2
1 1 1 1 1 2 1 2 2 1 2 1 2 2 2 2
+ +
= + + +
⊙
⊙ ⊙ ⊙ ⊙
λ λ µ µλ µ λ µ λ µ λ µa a b b
a b a b a b a b (2.18)
Os conceitos de distância e ângulo são estranhos ao conceito de espaço linear. A estrutura linear
permite comparar o comprimento de vectores paralelos mas não permite comparar o comprimento de
vectores não paralelos.
À estrutura quadrática é inerente o conceito de métrica que fornece o produto interno. O produto
interno entre dois vectores ( ), ⋅֏a b a b com , V∈a b e ,⋅ ∈ ℜa b é descrito da seguinte forma
( )
( ) ( )λ λ+ ⋅ = ⋅ + ⋅
⋅ = ⋅a b c a c b c
a b a b (2.19)
⋅ = ⋅a b b a (2.20)
0⋅ >a a para 0≠a (2.21)
10
Considere o espaço 3ℜ com a base { }1 2 3, ,e e e , então o produto interno entre os vectores
31 1 2 2 3 3a a a= + + ∈ℜa e e e e 3
1 1 2 2 3 3 ,b b b= + + ∈ℜb e e e é da seguinte forma
( )1 1 2 2 3 3
cos
a b a b a b
θ⋅ = + +
⋅ =a b
a b a b (2.22)
Se 0 180θ≤ ≤ � , sendo θ o ângulo entre a e b, tem-se:
2 2 21 2 3 ,a a a= ⋅ = + +a a a ( )cos θ ⋅= a b
a b (2.23)
2.4 - Produto geométrico e bivectores
Os bivectores representam um plano. Eles têm uma orientação intrínseca, dada pela circulação no
plano e o tamanho é dado pela área. Os bivectores usam-se em Física sob varias formas: como áreas,
planos e geradores de reflexões e rotações.
Considerando o espaço linear 2ℜ com a base { }1 2,e e , então
1,
0,i j ijδ ⋅ = =
e e
i j
i j
=≠
(2.24)
Em que ijδ é o delta de Kronecker. O tamanho do vector 2∈ℜr , com 1 2x y= +r e e , é 2 2x y= +r .
Introduzindo um produto que é o produto de r com r , ou seja 2 =r rr , sendo o quadrado do seu
próprio comprimento.
22 =r r (2.25)
Em termos de coordenadas, isso significa,
( )221 2
2 2 2
2 2
x y
x y
= += +
=
r e e
r
r r
(2.26)
Não considerando que o produto é comutativo, mas apenas distributivo, tem-se,
( )
( )
221 2
2 2 2 2 21 2 1 2 2 1
2 2 2
x y
x y xy
x y
= += + + +
= +
r e e
r e e e e e e
r
(2.27)
11
Com isto pode-se concluir que os vectores { }1 2,e e são ortogonais, tendo-se
2 21 2
1 2 2 1
1= == −
e e
e e e e (2.28)
Mas se considerar-se o produto associativo tem-se
( ) ( )( )( ) ( )
( ) ( )( )
( )
2
1 2 1 2 1 2
2
1 2 1 2 1 2
2
1 2 1 1 2 2
2 2 21 2 1 2
2
1 2 1
=
=
= −
= −
= −
e e e e e e
e e e e e e
e e e e e e
e e e e
e e
(2.29)
Uma vez que o quadrado de 1 2e e é negativo (raiz quadrada imaginária), 1 2e e não é um vector, nem
é um escalar, então é chamado bivector, sendo a área orientada num plano.
Para ilustrar esta conclusão, pode-se ver na Figura 2.1 que a área da raiz quadrada de 1 2e e
corresponde a uma área orientada. Para uma análise posterior e para uma interpretação mais simples faz-
se 12 1 2=e e e .
y
x1e
2e
12 1 2=e e e
Figura 2.1: Bivector - área do plano.
O produto geométrico entre dois vectores é, em geral, a soma de um escalar com um bivector.
( ) 12, α β= +֏a b ab e (2.30)
1 1 2 2,a b a bα = + (2.31)
1 2 2 1,= −a b a bβ (2.32)
12
Com
1 1 2 2a a= +a e e (2.33)
e
1 1 2 2b b= +b e e (2.34)
2.5 - Álgebra geométrica 2Cl
A álgebra geométrica do plano é chamada 2Cl . A base desta álgebra é constituída por quatro
elementos ( )22 4 .=
Tabela I: Base do espaço 2Cl .
1
2Cl
1 2,e e
12 1 2=e e e
O multivector 2u Cl∈
0 1 1 2 2 12 12 2u u u u u Cl= + + + ∈e e e (2.35)
é uma soma com dimensão ( )2dim 4Cl = ,
20 1 2u u u u Cl= + + ∈ (2.36)
Esta álgebra segue as regras da seguinte tabela multiplicativa:
Tabela II: Tabela multiplicativa.
1
-1
- 1
1e
1e
2e
12e
2e 12e
12e
12−e
2−e
2e
1e
1−e
13
As propriedades da álgebra geométrica permitem a possibilidade de separar os objectos em
diferentes tipos: escalares, vectores e bivectores.
2.6 - Produto exterior
Tendo-se um espaço linear 2ℜ , considerando dois vectores daquele espaço, 21 1 2 2a a= + ∈ℜa e e e
21 1 2 2b b= + ∈ ℜb e e , define-se o produto geométrico ( ) 2, Cl∈֏a b ab , da seguinte forma:
= ⋅ + ∧ab a b a b
(2.37)
com 0,⋅ =a b ab
2∧ =a b ab
1 1 2 2a b a bα⋅ = = +a b
( )12 1 2 2 1 12a b a bβ∧ = = −a b e e
Como pode ser visto abaixo um novo produto entre vectores foi introduzido, o produto exterior.
( ) ( )1 2 2 1 12, a b a b∧ = −֏a b a b e (2.38)
O bivector 12e é o oposto de 21e ( )12 21= −e e , concluindo-se que o produto exterior é anti-
simétrico (sendo oposto ao produto interno), ficando ∧ = − ∧a b b a , então:
= ⋅ + ∧ab a b a b (2.39)
= ⋅ + ∧ba a b a b (2.40)
obtém-se
( )1
2⋅ = +a b ab ba (2.41)
( )1
2∧ = −a b ab ba (2.42)
com
0→ ∧ =�a b a b (2.43)
0∧ = → = ⋅ = ⋅ =a b ab a b b a ba (2.44)
e
0⊥ → ⋅ =a b a b (2.45)
0⋅ = → = ∧ = − ∧ = −a b ab a b b a ba (2.46)
tem-se
12 1 2=e e e (2.47)
14
1 2 1 2 1 2 1 2= ⋅ + ∧ = ∧e e e e e e e e (2.48)
1 2 2 1 2 1 21∧ = − ∧ = − = −e e e e e e e (2.49)
12 21∴ = −e e (2.50)
Para ilustrar este cálculo para uma aproximação mais simples do problema, o produto exterior é a
área do paralelogramo, como pode ser verificado na Figura 2.2,
Y
X
a
b 1 2 2 1A a b a b= −
Figura 2.2: A norma do produto exterior é a área do paralelogramo.
O produto exterior é o produto anti-simétrico de dois vectores, introduzido por Grassman. O
produto exterior é anti-comutativo, então não pode conter um componente escalar, denominando-se
bivector.
2.7 - Álgebra geométrica e os números complexos
Existe uma relação entre a álgebra geométrica e os números complexos. Considere-se as seguintes
operações:
( ) ( ) ( )1 1 2 2 1 2 1 2, , ,x y x y x x y y+ = + + (2.51)
( )( ) ( )1 1 2 2 1 2 1 2 1 2 2 1, , ,x y x y x x y y x y x y= − + (2.52)
Por exemplo ( )0,1i = e ( )22 0,1i = ( )1,0= − 1= − .
15
A álgebra geométrica 2Cl é a soma directa,
2
2 22Cl = ℜ ⊕ ℜ ⊕ Λ ℜ (2.53)
Da mesma forma que o multivector é 0 1 1 2 2 12 12 2u u u u u Cl= + + + ∈e e e verifica-se que 0u u= + +a B ,
0u ∈ℜ , 2∈ ℜa , 2
2∈ ΛℜB A Tabela III descreve os componentes do multivector.
Tabela III: Componentes do multivector
00u u= → Escalar
1 1 2 21u u u= = + →a e e Vector
22
12 122u = = ∈ Λ ℜ →B u e Bivector
Ainda é possível escrever:
ímpar: 22Cl− = ℜ
2 2 2Cl Cl Cl+ −= ⊕ → (2.54)
par: 2
22Cl+ = ℜ ⊕ Λ ℜ
Note-se que o membro ímpar é um sub-espaço e o membro par é uma sub-álgebra. Porque
212 1= −e , então há um isomorfismo 2
+ ≈ ℂCl .
Para 2Cl existem mais operações para 20 1 2u u u u Cl= + + ∈ . Na tabela seguinte (IV) estão
descritas as operações para u em 2Cl
Tabela IV: Operações de 2Cl
Involução de grau: 0 1 2
u u u u= − +
Reversão: 0 1 2
u u u u= + −ɶ
Conjunção de Clifford: 0 1 2
u u u u= − −
A norma de u é:
2 2 2
0 0 1 2u uu u u u= = + −ɶ (2.55)
Reduzindo o número complexo à norma:
2 212 12:x y z x y x y= + = − = +ɶ ֏z e e z (2.56)
16
Nas figuras 2.3 e 2.4 representam-se um vector e um número complexo.
y
x
1 2x y= +r e e
2e
22Cl−ℜ =
1e
Fig. 2.3: Representação de um vector.
1
ℑ
ℜ
12 i=e
2Cl+=C
x iy= +z
Fig. 2.4: Representação de um número complexo.
Sabendo que
( )12 12exp cos sinθ θ θ= +e e (2.57)
a fórmula de Euler:
12x y= +z e (2.58)
( )12expr θ=z e (2.59)
( )12 12exp cos sinr r rθ θ θ= +e e (2.60)
cosx r θ= (2.61)
17
siny r θ= (2.62)
Existe uma grande diferença entre o escalar 1i = − e o bivector 12e , tendo-se 212 1= −e , para um
vector 1 2x y= +r e e , temos i i=r r para o bivector 12 12= −re e r como pode-se verificar,
( )12 1 2 12x y= +re e e e
= 1 12 2 12x y+e e e e (2.63)
com
( )12 12 1 2x y= +e r e e e
12 1 12 2x y= +e e e e (2.64)
portanto
1 12 1 1 2=e e e e e 1 2 1= −e e e 12 1= −e e (2.65)
e
2 12 2 1 2=e e e e e 1 2 2= −e e e 12 2= −e e (2.66)
obtém-se
12 12= −re e r (2.67)
com
( )12 1 2 12x y= +re e e e
2 1x y= −e e (2.68)
vem
( ) ( ) ( )12 1 2 2 1x y x y⋅ = + ⋅ −r re e e e e
( )12 0⋅ =r re (2.69)
resulta
( ) ( ) ( )12 1 2 2 1x y x y∧ = + ∧ −r re e e e e
2 212 21x y= −e e (2.70)
( )2 212x y= + e
18
A propriedade comutativa é representada na Figura 2.5.
12re r
12 12= −e r re
Fig. 2.5: Propriedade comutativa.
2.8 - Reflexões e rotações
Analisa-se agora a reflexão ´r do vector r em relação ao vector a , conforme representada na Fígura 2.6.
r
⊥r
r �
´r
a
Fig. 2.6: Reflexão r ´ do vector r em relação ao vector a.
Assim, tem-se
( ) 1−= ⋅�r r a a (2.71)
12
− = aa
a (2.72)
e
⊥ = − �r r r
( ) 1−= − ⋅ra r a a (2.73)
( ) 1−= ∧r a a
19
tem-se o seguinte resultado,
´r = ⊥−�r r
=( ) 1−⋅ − ∧r a r a a (2.74)
=( ) 1−⋅ + ∧a r a r a
= 1−ara
Na Figura 2.7 é representada a rotação.
Fig. 2.7: Rotação.
Tem-se:
r ֏ 1 1− −′ ′′ ′= =֏r ara r br b (2.75)
e
( ) ( ) ( ) 11 1 −− −′′ = =r b ara b ba r ba (2.76)
Uma rotação pode ser considerada a composição de duas reflexões. O vector OP′′ ′′=
r é a rotação
de OP=
r com ( )cos 2 2α β′′ ′′⋅ = +r r r r . Note-se que ( )cos 2α′ ′⋅ =r r r r e ( )cos 2β′ ′′ ′ ′′⋅ =r r r r ,
com OP′ ′=
r .
Conclui-se que a composição de duas reflexões, primeiro em relação ao vector a e seguidamente
em relação ao vector b , é igual à rotação de um ângulo que é o dobro dos ângulos entre os vectores a e
b . É simples verificar que cos2
θ ⋅ =
a b a b e,
( )cos θ′′ ′′⋅ =r r r r , 2 2θ α β= + (2.77)
com
1−= ⇒ =u ba a b u (2.78)
20
1−=b ua (2.79)
obtém-se
( )( )1 1 1 11− − − −= ⇒ =u ua b u ua b (2.80)
( ) 1 1 1− − −⇒ =ba a b
No caso particular em que 2 2 1= =a b e tendo-se 1− =a a e 1− =b b , tem-se ( ) 1 1 1− − −= =ba a b ab,
resumindo,
2 2 1= =a b (2.81)
1− =a a (2.82)
1− =b b (2.83)
( ) 1 1 1− − −= =ba a b ab (2.84)
tem-se
cos2
θ ⋅ =
a b (2.85)
12 sin2
θ ∧ =
a b e (2.86)
e
R = ba 12exp2
θ = −
e 12cos sin2 2
θ θ = −
e (2.87)
�R = ab 12exp2
θ =
e 12cos sin2 2
θ θ = +
e (2.88)
com
RR=ɶ baab
2 2= a b (2.89)
1=
obtém-se
12 12 R R= − ⇒ = ɶre e r r r (2.90)
verifica-se
′′֏r r
R R′′ = ɶr r 2R= r (2.91)
resulta
( )212expR θ= − e (2.92)
21
Pode verificar-se que uma das principais vantagens do uso da álgebra geométrica é a forma como
se lida com as reflexões e rotações. Pode verificar-se isto com mais detalhe na álgebra geométrica a três
dimensões.
2.9 – Conclusão
A definição chave na álgebra geométrica consiste no produto geométrico ser associativo e não
comutativo, no caso geral. O produto geométrico permite definir um objecto totalmente novo, o bivector
ou plano orientado (considerando apenas 2Cl ). O multivector é um elemento genérico na álgebra
geométrica, sendo a soma graduada de vários objectos diferentes, podendo em 2Cl ser a soma de
escalares, vectores e bivectores.
As rotações são operadores muito importantes na álgebra geométrica, permitem que se efectuem
rotações planares de vectores.
22
23
Capítulo 3
Álgebra Geométrica do Espaço
Neste capítulo é introduzida a álgebra geométrica 3Cl . Vários elementos desta álgebra são
introduzidos, como por exemplo os trivectores. É dada especial atenção ao produto geométrico, sendo a
definição mais importante da álgebra geométrica, tal como já referido anteriormente e a operações tais
como as contracções e as rotações.
3.1 - Produto externo e produto exterior
Nesta secção vai explicar-se a diferença entre o produto externo e exterior. Para dois vectores
3, ∈ℜa b , tem-se:
3= × ∈ℜ →c a b vector
(3.1)
2
3= ∧ ∈ Λℜ →B a b bivector
Tem-se para o produto exterior,
( )( ) ( )( ) ( )( )1 2 2 1 1 2 1 3 3 1 1 3 2 3 3 2 2 3a b a b a b a b a b a b∧ = − ∧ + − ∧ + − ∧a b e e e e e e (3.2)
(3.3)
e para o produto externo
1 2 3
1 2 3
1 2 3
a a a
b b b
× =e e e
a b (3.4)
( ) ( ) ( )2 3 3 2 1 3 1 1 3 2 1 2 2 1 3a b a b a b a b a b a b× = − + − + −a b e e e (3.5)
Mas tem-se ( )sin∧ = × = θa b a b a b com ( ),θ = ∠ a b . Na Figura 3.1 ilustra-se o produto
exterior e o produto externo.
2 3 3 1 1 2
1 2 3
1 2 3
a a a
b b b
∧ ∧ ∧∧ =
e e e e e e
a b
24
= ×c a b
= ∧B a b
Fig. 3.1: Produto exterior vs. produto externo.
As propriedades destes produtos são as seguintes:
• Lineariedade:
• Anti-simetria:
• Zero, quando idêntico:
0∧ =a a
0× =a a
• Associatividade:
Então o produto exterior ∧a b é uma representação orientada do plano e o produto externo ×a b é
perpendicular ao plano.
( )+ ∧ = ∧ + ∧a b c a c b c
( )+ × = × + ×a b c a c b c
( )∧ + = ∧ + ∧a b c a b a c
( )× + = × + ×a b c a b a c
( )∧ = − ∧a b b a
( )× = − ×a b b a
( ) ( )∧ ∧ = ∧ ∧a b c a b c
( ) ( )× × ≠ × ×a b c a b c
25
3.2 – Bivector
Num espaço linear a três dimensões 3ℜ , podem existir vectores e bivectores. Os vectores são
definidos por letras minúsculas e os bivectores por letras maiúsculas. Dois bivectores são iguais se
tiverem a mesma direcção e magnitude:
= ⇔ =A B A B e ↑↑A B (3.6)
Isto significa que a forma é irrelevante, por isso eles podem ser representados por um círculo ou um
quadrado desde que tenham a mesma área e direcção, tal como ilustrado na Figura 3.2.
A
A
−A
Fig. 3.2: Áreas e direcção de bivectores.
Um bivector pode ser expresso pelo produto exterior de dois vectores = ∧A a b . O produto
exterior é anti-simétrico ∧ = − ∧a b b a , ver Figura 3.3. Por outro lado, tem-se 0∧ =a a .
a
b − = ∧A b a
b= ∧A a b
a
Fig. 3.3: O produto exterior é anti-simétrico.
26
Os bivectores podem ser adicionados e multiplicados por escalares, criando um espaço linear
23Λ ℜ . Considerando { }1 2 3, ,e e e uma base ortonormal de 3ℜ , então uma base para o espaço linear dos
bivectores é,
1 2∧e e , 2 3∧e e , 1 3∧e e (3.7)
O bivector pode ser decomposto nas suas componentes base (representadas na Figura 3.4),
12 1 2 23 2 3 13 1 3B B B= ∧ + ∧ + ∧B e e e e e e (3.8)
1e
2e
1 2∧e e
2 3∧e e
3e
Fig. 3.4: Componentes do bivector.
Os bivectores têm uma magnitude e uma orientação, não têm uma forma definida. Podem ser um
paralelogramo ou um círculo ou qualquer outra forma. Exemplos de bivectores são os que incluem
momento angular e quaisquer outros objectos que são tipicamente representados como um vector axial.
3.3 - Trivector
O produto exterior de três vectores é um trivector.
= ∧ ∧V a b c
( )1 2 3
1 2 3 1 2 3
1 2 3
a a a
b b b
c c c
= ∧ ∧e e e (3.9)
27
têm-se,
1 1 2 2 3 3
1 1 2 2 3 3
1 1 2 2 3 3
a a a
b b b
c c c
= + += + += + +
a e e e
b e e e
c e e e
⇒ V (3.10)
sendo
1 2 3β= ∧ ∧V e e e (3.11)
O trivector representa um volume orientado que corresponde ao volume do paralelepípedo
resultante dos três vectores.
O espaço linear dos trivectores tem dimensão 1.
3
3dim 1 Λℜ =
(3.12)
A base dos trivectores é,
1 2 3∧ ∧e e e (3.13)
Sabendo que o produto exterior é associativo e anti-simétrico, tendo-se três vectores 3, , ∈ℜa b c ,
( ) ( )∧ ∧ = ∧ ∧a b c a b c (3.14)
e
∧ ∧ = ∧ ∧a b c b c a
= ∧ ∧c a b
= − ∧ ∧c b a (3.15)
= − ∧ ∧a c b
= − ∧ ∧b a c
Os trivectores têm simplesmente uma orientação e uma magnitude. A orientação indica se os
vectores do produto na forma ∧ ∧a b c são um triedro esquerdo ou direito. Exemplos incluem o produto
escalar triplo ( )⋅ ×a b c e mais geralmente tensores alternados.
3.4 – Dual de Hodge
Dois espaços com dimensão finita que têm a mesma dimensão são isomórficos. Então
( ) 2 23 3 3 3dim dim 3 ℜ Λ ℜ = ⇒ℜ ≈ Λ ℜ
(3.16)
28
O espaço linear dos vectores é isomórfico em relação ao espaço dos bivectores. Isto pode ser
verificado através do dual de Hodge,
2
3 3∈ℜ = ∗ ∈ Λ ℜ֏a A a (3.17)
( ) ( ) 1 2 3,∧ ∗ = ⋅ ∧ ∧b a b a e e e 3∀ ∈ℜb (3.18)
e
1 1 2 2 3 3a a a= + +a e e e ֏ 1 2 3 2 3 1 3 1 2a a a= ∗ = ∧ + ∧ + ∧A a e e e e e e (3.19)
então
1 2 3∗ = ∧e e e
2 3 1∗ = ∧e e e (3.20)
3 1 2∗ = ∧e e e
que pode verificar-se na Figura 3.5,
a
= ∗A a
Fig. 3.5: Dual de Hodge.
No modo inverso, também é possível estabelecer a demonstração,
2
3 3∈Λℜ = ∗ ∈ℜ֏A a A (3.21)
( ) 1 2 3, ,∧ ∗ = ∧ ∧B A B A e e e 2
3∀ ∈ Λ ℜB (3.22)
e
12 1 2 13 1 3 23 2 3A A A= ∧ + ∧ + ∧A e e e e e e ֏ 23 1 13 2 12 3A A A= ∗ = − +a A e e e (3.23)
então
( )1 2 3∗ ∧ =e e e
( )1 3 2∗ ∧ = −e e e (3.24)
( )2 3 1∗ ∧ =e e e
29
finalmente
( )( )
× = ∗ ∧∧ = ∗ ×
a b a b
a b a b (3.25)
O dual de Hodge dá-nos as relações com a álgebra de Gibbs e a álgebra geométrica. O produto
externo ×a b é o dual de Hodge de um bivector ∧a b e o produto escalar triplo ( )⋅ ×a b c é o dual de
Hodge de um trivector ∧ ∧a b c.
3.5 – Álgebra exterior de Grassman
A álgebra exterior de Grassman é conhecida por 3Λℜ e é a soma directa de,
2 3
3 3 3 3Λℜ = ℜ ⊕ ℜ ⊕ Λ ℜ ⊕ Λℜ (3.26)
Pelo que é constituída pelos elementos da Tabela V.
Tabela V: Elementos da álgebra exterior de Grassman
Escalar 1 ℜ
Vector 1 2 3, ,e e e 3ℜ
Bivector 1 2 1 3 2 3, ,∧ ∧ ∧e e e e e e 2
3Λ ℜ
Trivector 1 2 3∧ ∧e e e 3
3Λ ℜ
Para a base { }1 2 3, ,e e e de 3ℜ , tem-se
,i j j i∧ = − ∧e e e e i j≠ (3.27)
0i j⇔ ∧ =e e
Sabendo que 0
3,ℜ = Λ ℜ 1
3 3ℜ = Λℜ , então:
3
3 3
0
i
i =Λℜ = ∑ Λ ℜ (3.28)
3 3 3,j i ji +
∈ Λ ℜ ∈ Λℜ ⇒ ∧ = Λ ℜa b a b (3.29)
Então o produto exterior está disponível para qualquer dimensão, sendo uma das principais
vantagens na relação com o produto exterior.
30
3.6 – Álgebra geométrica de Clifford
A álgebra geométrica de Clifford é conhecida por 3Cl e é a soma graduada directa de:
2 3
3 3 33Cl = ℜ ⊕ ℜ ⊕ Λ ℜ ⊕ Λℜ (3.30)
Tendo-se 3, ∈ℜa b então, o produto geométrico
( ), ֏a b ab (3.31)
e o produto exterior
( ), ∧֏a b a b (3.32)
Para definir o produto geométrico de dois vectores considera-se um vector,
31 2 3x y z= + + ∈ℜr e e e (3.33)
Então vai ser definido o produto do vector por ele próprio
2 =r rr
2= r (3.34)
2 2 2 0x y z= + + ≥
considerando a base { }1 2 3, ,e e e , em que
i j⋅e e = ijδ (3.35)
=0,
1,
i j
i j
≠=
Não vai ser incluída a propriedade comutativa neste novo produto de vectores, pelo que
2r = rr
=( )( )1 2 3 1 2 3x y z x y z+ + + +e e e e e e
= ( ) ( ) ( )2 2 2 2 2 21 2 3 1 2 2 1 2 3 3 2 1 3 3 1x y z xy yz xz+ + + + + + + +e e e e e e e e e e e e e e e (3.36)
=2 2 2x y z+ +
=2
r
31
Então vai ser necessário considerar-se:
i ie e = 2ie (3.37)
=1
,i j j i= −e e e e i j≠ (3.38)
Pelo que as bases de 3Λℜ e 3Cl se encontram na Tabela VI.
Tabela VI: Bases de 3Λℜ e 3Cl
3Λℜ 1 1 2 3, ,e e e 1 2 2 3 1 3, ,∧ ∧ ∧e e e e e e 1 2 3∧ ∧e e e
3Cl 1 1 2 3, ,e e e 12 1 2 23 2 3 13 1 3, ,= = =e e e e e e e e e 123 1 2 3=e e e e
Considerando dois vectores,
31 1 2 2 3 3a a a= + + ∈ℜa e e e (3.39)
e
31 1 2 2 3 3b b b= + + ∈ℜb e e e (3.40)
Com as regras estabelecidas anteriormente, obtém-se
ab= ( )( )1 1 2 2 3 3 1 1 2 2 3 3a a a b b b+ + + +e e e e e e
=( ) ( ) ( ) ( )1 1 2 2 3 3 1 2 2 1 12 2 3 3 2 23 1 3 3 1 13a b a b a b a b a b a b a b a b a b+ + + − + − + −e e e (3.41)
= 12 12 23 23 13 13α β β β+ + +e e e
=α + B
em que
12 12 23 23 13 13β β β= + +B e e e (3.42)
Por outro lado, tem-se
ije = i je e
=i j i j⋅ + ∧e e e e
= ij i jδ + ∧e e (3.43)
=2 1
,i
i j
= ∧
e
e e i j≠
Em geral
α = ⋅a b (3.44)
32
e
B = ∧a b (3.45)
=12 12 23 23 13 13β β β+ +e e e
com
= ⋅ + ∧ab a b a b (3.46)
O elemento 3u Cl= ∈ab não é um escalar nem um bivector, mas sim a soma graduada de um
escalar com um bivector, sendo este o nome para um multivector.
3.7 - Produto geométrico
O produto geométrico de dois vectores é um multivector e o produto exterior de dois vectores é
um bivector. Em geral, qualquer elemento 3u Cl∈ é um multivector. Com 3, ∈ℜa b tem-se
= ⋅ + ∧
= ⋅ − ∧
ab a b a b
ba a b a b (3.47)
pelo que
( )
( )
1
21
2
⋅ = + ∧ = −
a b ab ba
a b ab ba (3.48)
Se
=ab ba
tem-se
→ �a b → 0∧ =a b (3.49)
→ = ⋅ab a b
Se
= −ab ba
tem-se
→ ⊥a b → 0⋅ =a b (3.50)
→ = ∧ab a b
e
3 1 3−∈ ℜ ∈ℜ֏a a (3.51)
12
1− =a aa
(3.52)
33
Na Figura 3.6 representa-se um bivector = ∧B a b .
a
( )sin θb
θ
( )cos θb
= ∧B a b
Fig. 3.6: Representação de um bivector = ∧B a b .
Tem-se as seguintes expressões que resultam da Figura 3.6,
( )cos θ⋅ =a b a b (3.53)
( )sin θ∧ =a b a b (3.54)
2 2 2 2⋅ + ∧ =a b a b a b (3.55)
∧ ≤a b a b (3.56)
=ab a b (3.57)
tendo-se
( ) ( )( )2∧ = − ⋅ ⋅ −a b ab a b a b ba (3.58)
( ) ( ) ( ) ( )2 2∧ = ⋅ − − ⋅ + ⋅a b a b ab abba a b a b ba (3.59)
( ) ( )( )( )
( )2
2 22 2
⋅
∧ = ⋅ + − − ⋅� �a b
a b a b ab ba a b a b (3.60)
( ) ( )2 2 2 2∧ = ⋅ −a b a b a b (3.61)
( ) ( )2 2 2 2 2 2cos θ∧ = −a b a b a b (3.62)
( ) ( )2 2 2 22 2cos θ∧ = −a b a b a b (3.63)
34
( ) ( )2 22 2sin 0θ∧ = − ≤a b a b (3.64)
com
1 2 3 1 3 2= −e e e e e e 3 1 2= e e e 3 2 1= −e e e (3.65)
e
( )22123 1 2 3=e e e e ( )( )1 2 3 1 2 3= e e e e e e ( )( )1 2 3 3 2 1= − e e e e e e 2 2 2
1 2 3= −e e e 1= − (3.66)
verificando-se
2 2 21 2 3 1= = =e e e (3.67)
2 2 212 13 23 1= = = −e e e (3.68)
2123 1= −e (3.69)
tendo-se
1 123 23
2 123 31
3 123 12
= = =
e e e
e e e
e e e
(3.70)
e
12 123 3
31 123 2
23 123 1
= − = − = −
e e e
e e e
e e e
(3.71)
( )( )
( )( )
123
123
× = ∗ ∧ = − ∧
⇒ ∧ = ∗ ×
= ×
a b a b
a b e
a b a b
a b e
(3.72)
com
123
233
123
23
1233
123
=
= ∈ Λ ℜ∈ℜ⇒
∈ Λ ℜ=
= ∈ℜ
A ae
e aa
Aa Ae
e A
(3.73)
sendo a dimensão de
( ) ( )33dim dimCl = Λℜ (3.74)
32 8= =
tem-se
30 1 2 3u u u u u Cl= + + + ∈ (3.75)
35
123 123u α β= + + +a be e , ,α β ∈ℜ e 3, ∈ℜa b (3.76)
A Tabela VII descreve os elementos do multivector u .
Tabela VII: Elementos do multivector u
Escalar 0
u α= ∈ℜ
Vector 3
1u = ∈ℜa
Bivector 23
1232u = = ∈ Λ ℜB be
Trivector ou pseudoescalar 33
1233u β= = ∈ Λ ℜV e
com
2
3u = 2V
=2 2123β e (3.77)
= 0β− ≤
O produto geométrico tem as seguintes propriedades, para todos os multivectores 3, ,u v z Cl∈ :
• Fecho:
Para quaisquer u e v 3∈ℜ , a soma u v+ 3∈ℜ .
• Distributividade, por exemplo na adição de multivectores:
( )u v z uz vz+ = + (3.78)
( )u v z uv uz+ = + (3.79)
• Associabilidade
• Elemento unidade (escalar):
1u u= (3.80)
• Tensor contracção:
Para qualquer “vector” (um elemento de grau) u , 2u é um escalar (numero real)
36
• Comutatividade do produto por um escalar:
u uα α= (3.81)
3.8 - Involução
Considerando um multivector genérico:
0 1 2 3
u u u u u= + + + (3.82)
3Clα= + + + ∈u B V
Existem três involuções em 3Cl , que estão representadas na Tabela VII.
TABELA VIII: Involuções em 3Cl
Conjunção de Clifford 0 1 2 3
= − − +u u u u u
Involução de grau ɵ0 1 2 3
= − + −u u u u u
Reversão ɶ0 1 2 3
= + − −u u u u u
Utilizando reversão
3, ∈ℜa b → ɶu u= ⇒ =ab ba (3.83)
é possível determinar a magnitude de qualquer vector.
0 1 1 2 2 3 3 12 12 13 13 23 23 123 123u u u u u u u u u= + + + + + + +e e e e e e e (3.84)
2 2 2 2 2 2 2 2 2
0 1 2 3 12 13 23 123u u u u u u u u u= + + + + + + + (3.85)
3,u v Cl∈ ⇒ 2uv u v≤ (3.86)
Usando a conjunção de Clifford ɶu , é possível determinar o inverso de qualquer multivector tal
como 3u Cl∈ e 0uu ≠ ,
uu uu= ⇒ 1 uu
uu− = (3.87)
37
3.9 - Contracção (à direita e à esquerda)
Para 3∈ℜa e 2
3∈ ΛℜB , tendo-se = ∧B b c e considerando a associabilidade do produto externo,
define-se um trivector
= ∧V a B (3.88)
= ∧B a
Sendo uma operação que eleva o grau. Para a contracção à direita tem-se
( )1123 123−= ∧ u v e e u v� (3.89)
Para a contracção à esquerda, representada na Figura 3.7, o grau é mais baixo 3,u v Cl∈ ,
( ) 1123 123
−= ∧ u v u ve e� (3.90)
Para o caso particular, 3∈ℜa e 2
3∈ ΛℜB , tem-se
= −a B B a� � (3.91)
e
⊥= +�aB a B a B (3.92)
com
12
− = BB
B (3.93)
obtém-se
= + ∧
= − − ∧aB a B a B
Ba a B a B
�
� ⇒
( )
( )
1
21
2
= −
∧ = +
a B aB Ba
a B aB Ba
�
(3.94)
38
Fig. 3.7: Contracção à esquerda.
tendo-se as seguintes expressões que resultam da figura anterior,
( ) 1−=�a a B B� (3.95)
( ) 1−⊥ = ∧a a B B (3.96)
e
12
− = �
�
�
aa
a (3.97)
com
1−= �B a b (3.98)
1−= ∧�a b
verifica-se
3
3
∈ℜ → = + ∧ ∈u u u
u Cl
aa a a� (3.99)
Quando tem-se 3r
u∈ Λ ℜ ,
( )
( )
13
13
11
21
12
rr
rr
u u u
u u u
−
+
= − − ∈ Λ ℜ
∧ = + − ∈ Λ ℜ
a a a
a a a
�
(3.100)
39
3.10 - Reflexão
Considerando a reflexão 'r do vector r em relação ao vector a, representada na Figura 3.8.
= ⋅ + ∧ab a b a b (3.101)
⊥= +�a b a b
a
�
123=A ae
1' −=r ara r
1'' −= −r ara
Fig. 3.8: Reflexão do vector r em relação ao plano.
Tem-se
= ⋅�a b a b → ( ) 1−= ⋅�a a b b (3.102)
com
⊥ = ∧a b a b → ( ) 1−⊥ = ∧a a b b (3.103)
obtendo-se
⊥= +�r r r ֏ ' ⊥= −�r r r (3.104)
sabendo que
( ) 1−= ⋅�r r a a (3.105)
e
⊥r = − �r r
( ) 1−= − ⋅ra r a a (3.106)
( ) 1−= ∧r a a
vem
( ) 1' −= ⋅ + ∧r r a r a a ⇒ 1' −=r ara (3.107)
Tendo-se a reflexão do mesmo vector r mas agora em relação ao plano bivector 123=A ae , que é
dual do vector a , é possível obter um novo vector ''r .
'' '= −r r (3.108)
⊥= − +�r r
40
então
1'' −= −r ara (3.109)
sendo a um vector unitário, tem-se
2 1=a ⇒ ' =r ara , ''= −r ara (3.110)
Se o produto geométrico não estiver presente, a fórmula terá a seguinte forma
'' 2= − ⋅r r r aa (3.111)
então o uso do produto geométrico permite manipular num modo muito simples, a composição das
reflexões.
3.11 - Rotação
Considerando-se agora a rotação 'a do vector a em torno do eixo
123= −u Be (3.112)
que é representado pelo bivector unitário B , como se pode verificar na Figura 3.9, com 2ˆ 1:= − →B a ''''aaaa:
a
θ
123= −u Be
'a
a� 'a�
Fig. 3.9: Rotação 'a do vector a em torno do eixo 123= −u Be .
41
Tem-se
12
ˆ− = = −B B
BBB
⇒
( )( )
( )( )
1
1
ˆ ˆ
ˆ ˆ
−⊥
−
= ∧
= − ∧ = = −
�
a a B B
a B B
a a B B
a B B
�
�
(3.113)
e
2 2=m n (3.114)
1=
com
cos2
θ ⋅ =
m n (3.115)
e
ˆ sin2
∧ =
θm n B (3.116)
têm-se
R = mn
= ⋅ + ∧m n m n (3.117)
ˆcos sin2 2
= −
θ θB
ficando
ˆexp2
= −
Rθ
B (3.118)
obtém-se
( )2 ˆexp= −R θB ⇒ � ˆexp2
= =
Rθ
mn B ⇒ � 1RR= (3.119)
Sendo R um rotor, tem-se
ˆexp2
= = −
Rθ
mn B →
R R
R R⊥ ⊥ ⊥ ⊥
= − ⇒ = −
= ⇒ =
� � � �a B Ba a a
a B Ba a a
(3.120)
com
⊥= +�a a a ֏ ' '' ⊥= +�a a a (3.121)
verifica-se
'
' 2R
⊥ ⊥=
=� �
a a
a a
⇒ ' 2R ⊥= +�a a a (3.122)
42
tendo-se
� �' R R R R⊥= +�a a a ⇒ �' R R=a a (3.123)
Qualquer rotação pode ser obtida através da composição de duas reflexões. O plano de rotação é
definido pelos dois vectores que originam a reflexão e com o ângulo de rotação, que é o dobro do ângulo
criado por estes dois vectores.
A transformação �' R R=a a permite um caminho muito geral para manipular as rotações. Ao
derivar-se esta transformação a dimensionalidade do espaço dos vectores não foi em nenhum ponto
especificada. Como resultado, a lei da transformação funciona para todos os espaços, qualquer que seja a
dimensão. Além disso funciona para todos os tipos de objecto, qualquer que seja o seu grau. De facto, a
representação de uma rotação por Euler é precisamente como as rotações são representadas na álgebra de
quaterniões, sendo muito útil em três dimensões.
A utilidade dos rotores permite uma grande justificação para a soma dos termos de diferentes graus,
quando R é escrito da seguinte forma
ˆexp2
= −
Rθ
B (3.124)
No entanto, o bivector B tem um significado geométrico claro, tendo o vector criado através de
�R Ra também um significado claro. Isto ilustra uma das principais características da álgebra geométrica,
que consiste em, que ambos os objectos geometricamente significativos (vectores, planos, …) e os
elementos que actuam sobre eles (rotores) são representados na mesma álgebra.
3.12 - Conclusão
O produto geométrico permite definir um objecto totalmente novo, considerando apenas 3Cl , o
trivector ou volume orientado. Tal como referido anteriormente o multivector é um elemento genérico na
álgebra geométrica, sendo a soma graduada de vários objectos diferentes, podendo em 3Cl ser a soma de
escalares, vectores, bivectores e trivectores.
As contracções e as rotações são operadores muito importantes na álgebra geométrica, porque
permitem a definição do produto geométrico de vectores por bivectores e vice-versa. As rotações
permitem que se efectuem rotações planares e espaciais de vectores.
43
Capítulo 4
Meios Anisotrópicos
A maior parte dos estudos sobre meios anisotropicos são efectuados recorrendo ao cálculo diádico
ou tensorial. Porém, para se caracterizar um tensor dieléctrico será necessário, num tipo de abordagem
desse género, usar um sistema de coordenadas utilizando matrizes, para obter, por exemplo, o elipsóide de
índices, em inglês index-ellipsoid. Este diagrama reproduz a orientação e a magnitude relativa dos índices
de refracção num cristal. Uma abordagem deste tipo não explora claramente o sistema de coordenadas
livre, que é inerente ao significado da própria anisotropia. Neste capítulo será feita uma abordagem à
anisotropia com recurso à álgebra geométrica do espaço. Potenciando o uso de um sistema de
coordenadas livre para a análise da propagação de ondas electromagnéticas nestes meios.
4.1 – Equações de Maxwell
É necessário escrever as equações de Maxwell e as equações de Maxwell-Boffi em 3Cl antes de se
caracterizar a anisotropia utilizando a álgebra geométrica do espaço.
Recorde-se que as equações de Maxwell contêm não apenas os campos de grandeza intensiva (E,B)
mas também os campos de grandeza extensiva (D,H). De seguida, tem-se as equações de Maxwell
escritas na linguagem vectorial comum no espaço linear 3ℜ utilizando o produto externo de Gibbs:
Conservação do fluxo magnético:
Equação de :
Lei de magnética :
0
Maxwell Faraday
t
Gauss
− ∂ ∇ × = −
∂ ∇ ⋅ =
BE
B
(4.1)
Conservação da carga eléctrica:
Equação de :
Lei de :
Maxwell Ampère
t
Gauss
− ∂ ∇× = +
∂ ∇ ⋅ =
DH J
D
(4.2)
44
Considerando-se coordenadas cartesianas rectangulares numa base ortonormada
{ } 31 2 3, ,= ∈ℜe e eB , ao operador nabla corresponde a seguinte expressão
1 2 31 2 3x x x
∂ ∂ ∂∇ = + +∂ ∂ ∂
e e e (4.3)
Em anexo (Apêndice A), estão representadas algumas relações envolvendo o operador nabla em
3Cl que irão ser utilizadas posteriormente.
Antes de se escreverem as equações de Maxwell no âmbito da álgebra geométrica 3Cl apresentam-
se algumas grandezas na Tabela IX.
TABELA IX: Grandezas electromagnéticas
Intensidade do campo magnético: 3∈ℜB
Intensidade do campo eléctrico: 3∈ℜE
Magnetização: 3∈ℜM
Polarização: 3∈ ℜP
Densidade total de corrente: � �
3t p m
t=∇×∂= ∂
= + + ∈ℜMP
J J J J
Densidade total de carga eléctrica: �t p
=−∇⋅
= + ∈ℜP
Velocidade da luz no vácuo: 0 0
1cε µ
=
Excitação eléctrica: 0ε= +D E P
Excitação magnética: 0/ µ= −H B M
A expressão da velocidade da luz no vácuo, da tabela anterior, representa a integração da óptica no
electromagnetismo. Tendo em conta as expressões anteriores, pode-se escrever as Equações de Maxwell
através da álgebra geométrica 3Cl . Verificam-se as seguintes expressões:
( )123
Equação de :
0
Lei de magnética :
0
Maxwell Faraday
t
Gauss
− ∂ + ∇ × =
∂ ∇ ⋅ =
Be E
B
(4.4)
45
( )123
Equação de :
Lei de :
Maxwell Ampère
t
Gauss
− ∂ + ∇ = −
∂ ∇ ⋅ =
DHe J
D
�
(4.5)
Deve-se completar as equações de Maxwell com as relações constitutivas dos meios materiais que
se estão a estudar.
Considerando-se o caso particular de regiões sem fontes, tem-se:
0
0
= =J
(4.6)
Considerando ondas planas e monocromáticas, os campos apresentam a seguinte variação:
( ) { }
0
, ( )exp( )
( ) exp[ ( )])
t i t
i
ω∞
∞
= ℜ − = ⋅
E r E r
E r E k r (4.7)
Pelas relações anteriores, as equações de Maxwell ficam na seguinte forma algébrica:
( )( )
0 0 123
0 0 123
0
0
0
0
ωω
∧ = ∧ = − ⋅ = ⋅ =
k E B e
k H D e
k D
k B
(4.8)
As equações obtidas anteriormente são válidas apenas para ondas planas e monocromáticas. Para
simplificar, vai-se omitir o índice zero das equações (4.7).
4.2 - Equações de Maxwell-Boffi
Vamos agora considerar as quatro equações de Maxwell-Boffi. Vai-se mostrar que estas equações
podem ser resumidas numa única equação em 3Cl . A denominação de equações de Maxwell-Boffi surge
porque elas apenas contêm os campos 3∈ℜE e 3∈ℜB , sendo grandezas intensivas, descrevendo a
intensidade do campo electromagnético. Nas equações de Maxwell-Boffi não existe referência aos campos
D e H, sendo grandezas extensivas, descrevendo a quantidade de excitação de um determinado meio
material.
46
A seguir estão descritas as equações de Maxwell-Boffi escritas com linguagem vectorial:
0 2
0
0
1t
t
t
tcµ
ε
∂ ∇ × = − ∂
∇ ⋅ = ∂ ∇ × = + ∂ ∇ ⋅ =
BE
B
EB J
E
(4.9)
Nas equações anteriormente descritas, a primeira expressão é a equação de Maxwell-Faraday, a
segunda equação é relativa à lei de Gauss magnética, a terceira equação corresponde à equação de
Maxwell-Ampère e, finalmente, a quarta equação é a da lei de Gauss. Em relação às equações anteriores,
pode-se ainda referir que a primeira e a segunda equação consistem na conservação do fluxo magnético e
que a terceira e quarta equação consistem na conservação da carga-corrente.
Sabendo que o objectivo é reescrever as equações de Maxwel-Boffi (4.9) através da álgebra
geométrica 3Cl , efectuam-se as substituições seguintes, nas equações (4.9),
( ) 123∇ ∧ = ∇×E E e (4.10.1)
( )123∇ = −∇ ×Be B� (4.10.2)
Obtendo-se deste modo as equações de Maxwell-Boffi em 3Cl , que se apresentam na Tabela X.
Tabela X: Equações de Maxwell-Boffi em 3Cl
Equação Grau
0
1tc
η ∇ ⋅ =
E 0
( )123 0
1 1tc t c
µ∂ + ∇ = − ∂ E Be J�
1
( )123
1 10
c t c
∂ + ∇ ∧ = ∂ Be E
2
( )123 0∇ ∧ =Be 3
47
Ao efectuar-se a soma graduada das quatro equações da Tabela X, tendo em conta as seguintes
expressões:
( ) ( ) ( )
( )123 123 123
123 123
1 1
c c
∇ = ∇ ⋅ + ∇ ∧∇ = ∇ + ∇ ∧
∇ + = ∇ + ∇
E E E
Be Be Be
E Be E Be
� (4.11)
obtém-se a equação de Maxwell-Boffi em 3Cl , que se apresenta a seguir,
123 0
1 1 1t tc t c c
η∂ + ∇ + = − ∂ E Be J (4.12)
4.3 – Anisotropia em álgebra geométrica
O significado de anisotropia é que a magnitude de uma propriedade pode ser apenas definida ao
longo de uma determinada direcção. Ou seja, se um meio for electricamente anisotrópico, existe um
ângulo entre os vectores campo eléctrico (E) e deslocamento eléctrico (D) que depende da direcção no
espaço (euclidiano) 3ℜ ao longo do qual o campo E é aplicado. Então, em anisotropia não é possível
escrever-se 0ε ε=D E , sendo 0ε a permitividade eléctrica do vácuo e ε é a permitividade eléctrica
relativa do meio. A solução típica que se apresenta é a definição de um tensor permitividade eléctrica
num dado sistema de coordenadas através de matrizes 3 3× .
Através de álgebra geométrica do espaço 3Cl , pode escrever-se simplesmente ( )0ε=D Eεεεε , sendo
( )Eεεεε uma função linear 3 3ℜ → ℜε :ε :ε :ε : que mapeia vectores em vectores. A função dieléctrica εεεε
caracteriza totalmente a propriedade do meio acima referida, podendo ser definida apenas ao longo de
uma determinada direcção.
4.3.1 – Anisotropia eléctrica
Daqui para a frente vai considerar-se que os meios em estudo são não-magnéticos, lineares, sem
perdas e ilimitados.
Tem-se nos meios não magnéticos 0=M , sendo a relação entre B e H a mesma que a do vácuo,
ou seja,
0 µ=B H (4.13)
48
Tratando-se de anisotropia eléctrica a relação entre E e D é determinada precisamente por essa
característica que o meio apresenta. Então deve-se analisar o comportamento dos vectores E e D
consoante a variação do ângulo θ formado entre eles (ver Fig. 4.1).
= ∧F E DD
E
( )ˆ sin θ∧ =s t F
s
t
s
rF
θ
D⊥
D�
s
( )ε s
sε
Fig. 4.1: Anisotropia eléctrica caracterizada através do bivector = ∧F E D .
Um meio é anisotrópico quando o ângulo θ varia com a direcção s do campo eléctrico aplicado,
como pode ser verificado na Fig. 4.1. Nessa figura, assume-se que os vectores 3, , ∈ℜr s t são unitários,
sendo
2 2=r s 2= t (4.14)
1=
Tendo em conta a Fig. 4.1, quando é aplicado um campo eléctrico =E E s na direcção que é
caracterizada pelo vector unitário s , o meio vai responder com um vector excitação eléctrica =D D t
com � ( )sin θ∧ =s t F e ( )cos θ⋅ =s t . Portanto estão reunidas as condições para se caracterizar o meio
electricamente, então
( )
( )
cos
sin
D
D
θ
θ⊥
= ⋅=
= ⋅=
� s D
D
r D
D
⇒ �( )sin θ
∧= = s tF sr (4.15)
⇒ = ∧F E D (4.16)
�= F F
com
( )0
0 sD
εε ε
= = �
D s
E
εεεε (4.17)
e
49
( )sε = ⋅s sεεεε (4.18)
( ) ( )cos θ= sεεεε
É introduzida desta forma na equação anterior (4.18) a constante dieléctrica (permitividade) relativa
sε segundo a direcção s .
Da Fig. 4.1 podem-se obter mais algumas expressões, tais como,
σ = E D (4.19)
e
F = ∧E D
= ∧E D s t (4.20)
� ( )sinσ θ= F
∴ = ⋅ + ∧ED E D E D
σ= st
( )σ= ⋅ + ∧s t s t (4.21)
( ) � ( )cos sinσ θ θ = +
F
A expressão anterior (4.21) pode ser escrita doutra forma, considerando
�F = sr (4.22)
= ∧s r
e a fórmula de Euler em 3Cl , fica
�( )expσ θ=ED F (4.23)
O meio é caracterizado pelo produto geométrico da expressão anterior (4.23). Apenas quando o
meio considerado é isotrópico simples, qualquer que seja a direcção s tem-se
= ⇔ �ED DE E D
0⇔ ∧ =E D (4.24)
⇔ = ⋅ED E D
50
Num meio anisotrópico, a cada direcção s do espaço corresponde um escalar ( )sε = ⋅s sεεεε . Quando
o meio é isotrópico, que corresponde ao caso particular dos meios anisotrópicos, tem-se ( )sε = ⋅s sεεεε , que
é uma constante iε , não dependendo da direcção s considerada.
Para apresentar de uma forma mais clara o conceito de constante dieléctrica relativa num meio
anisotrópico, considera-se o seguinte exemplo, assumindo que o operador linear 3 3ℜ → ℜε :ε :ε :ε : tem três
valores próprios distintos e reais 1 2 3ε ε ε< < e considerando-se, para facilitar em cálculos posteriores,
2 23 1 1γ γ+ = →
21 1
22
3 3
2
2
ε α βγε α
ε α βγ
= + = = +
(4.25)
→
21 2 1
3 12
3 2 3
2
2
2
ε ε βγε ε β
ε ε βγ
− = − − = − =
Considerando a base ortonormada de 3ℜ , { }1 2 3, ,= e e eB , que consiste nos vectores próprios do
operador que foi considerado, resulta
( )( )( )
1 1 1
2 2 2
3 3 3
εεε
= = =
e e
e e
e e
εεεεεεεεεεεε
→→→
eixo
eixo
eixo
1
2
3
X
X
X
(4.26)
Os eixos considerados são os da Fig. 4.2,
×1d 2d
3γ
1γ1γ−1X
2X
3X
φ
Fig. 4.2: Vectores 1d e 2d que definem o operador linear εεεε como sendo um operador biaxial.
Através da Fig. 4.2 obtém-se
2 1 1 3 3
1 1 1 3 3
γ γγ γ
d = e + e
d = - e + e (4.27)
51
Por outro lado, tem-se 1 sin2
φγ =
e 3 cos2
φγ =
. Assim, resulta a seguinte relação entre 1d e 2d ,
2 1R Rφ φɶd = d (4.28)
É fácil observar que através da expressão anterior (4.28), que 2d é a rotação de 1d em 3Cl , sendo
Rφ um rotor dado por
31exp2
Rφφ =
e
31cos sin2 2
φ φ = +
e (4.29)
É possível agora escrever o operador linear em termos dos dois vectores que estão definidos na
expressão (4.27). Então, considerando-se um vector 3∈ℜa genérico, verifica-se que,
( ) ( ) ( )1 2 2 1α β= ⋅ + ⋅ a a + a d d a d dεεεε
3∈ℜ= b (4.30)
O operador linear 3 3ℜ → ℜε :ε :ε :ε : (apresentado no exemplo), tendo os seus três valores reais positivos
distintos, é apresentado em termos dos vectores unitários 1d e 2d (que não são paralelos) através da
expressão (4.30). Por esse motivo, é referido que o operador em causa é biaxial. De seguida efectua-se a
demonstração, através da qual se pode obter a equação anterior (4.30). Observando a Fig. 4.2 verifica-se
que
( )1 2 cos φ⋅ =d d
2 2
cos sin2 2
φ φ = −
(4.31)
2 23 1γ γ= −
1 2 3
3 1
2ε ε εε ε− +
=−
ficando
( )
( )
3 2
3 1
2 1
3 1
11 cos
2
11 cos
2
ε εφε ε
ε εφε ε
− + = − − − =
−
(4.32)
52
Admitindo-se que 1 2 3ε ε ε< < e tendo-se
1 cos
cos2 2
φ φ+ =
(4.33)
e
1 cos
sin2 2
φ φ− =
(4.34)
obtêm-se as seguintes expressões
2 11
3 1
3 23
3 1
ε εγε ε
ε εγε ε
−= −
− = −
(4.35)
Considerando um vector 31 1 2 2 3 3+ +a a a ∈ℜa = e e e genérico, a aplicação do operador 3 3ℜ → ℜε :ε :ε :ε :
linear sobre aquele vector resulta na seguinte expressão
( ) 1 1 1 2 2 2 3 3 3+ +a a aε ε εa = e e eεεεε (4.36)
podendo ainda se escrever
( ) ( ) ( )1 2 1 1 2 3 2 3 3+ +a aε ε ε ε ε− −a = e a eεεεε (4.37)
De seguida vão ser reescritos os termos 1 1a e e 3 3a e em função de 1, a d e 2d . Então verifica-se
que,
1 21
1
1 23
3
2
2
γ
γ
= =
d -de
d + de
⇒
( ) ( )
( ) ( )
1 21 1 1 22
1
1 23 3 1 22
3
4
4
a
a
γ
γ
⋅
⋅
a d - de = d - d
a d + de = d + d
(4.38)
( )
( )
1 21
1
1 23
3
2
2
a
a
γ
γ
⋅=
⋅ =
d - d a
d + d a
53
Ao substituir-se as expressões obtidas em (4.38) na expressão (4.37) e considerando que
( )
2
3 1
1
2
α ε
β ε ε
= = −
(4.39)
obtém-se a seguinte expressão,
( ) ( ) ( ) ( ) ( ){ }1 2 1 2 1 2 1 22
βα + ⋅ + + − ⋅ a = a a d d d d a d - d d - dεεεε (4.40)
∴ ( ) ( ) ( )1 2 2 1α β+ ⋅ + ⋅ a = a a d d a d dεεεε (4.41)
Considere-se a base { }1 2 3, ,= e e eB para a caracterização do meio biaxial (tal como foi feito
anteriormente), sendo constituída pelos eixos dieléctricos principais e considere-se o referencial dos
vectores próprios do operador biaxial.
Um caso particular do aqui estudado é o caso do operador uniaxial. Desta forma, se for considerado
no mesmo exemplo anterior 1 2ε ε= e mais particularmente
1 2ε ε ε⊥= = (4.42)
e
3ε ε= � (4.43)
então tem-se
( )1 2=cos φ⋅d d
1ε εε ε
⊥
⊥
−= =
−�
�
⇒ 0φ = ⇒ 1 2=d d (4.44)
= c
∴ ( ) ( )( )ε ε ε⊥ ⊥= + − ⋅�a a c a cεεεε (4.45)
Na expressão (4.45), ε� é considerado o valor próprio não degenerado, correspondendo ao vector
próprio c. ε⊥ é o valor próprio duplamente degenerado pois corresponde aos dois vectores próprios que
definem o plano ortogonal ao eixo c. Na mesma expressão (4.45), verifica-se que o operador é uniaxial
porque os dois eixos 1d e 2d , do caso biaxial, reduzem-se a apenas um eixo c.
Fazendo a particularização ao caso uniaxial é possível introduzir outro operador. Posto isto,
considerando que
ε ε⊥=� iε= (4.46)
54
a equação (4.45) vai reduzir-se a
( ) iε=a aεεεε (4.47)
O operador resultante é um operador isotrópico porque todas as direcções do espaço 3ℜ são
equivalentes.
Resumindo, os vectores 1d e 2d unitários caracterizam o meio biaxial, o vector c unitário
caracteriza o meio uniaxial e não é possível descriminar qualquer direcção preferencial num meio
isotrópico.
A função inversa da função dieléctrica εεεε é a função de impermeabilidade e é definida, sempre que
existir, da forma 1−η = εη = εη = εη = ε , tal que
( )
0ε=
DE
ηηηη (4.48)
Para que se consiga encontrar os vectores que caracterizam a função ηηηη , o campo eléctrico é escrito
na seguinte forma
1 1 2 2 3 3E E E= + +E e e e (4.49)
sendo os eixos dieléctricos principais 1,e 2 e e 3e , que correspondem aos valores próprios 1ε , 2ε e 3ε ,
tal como verificado no exemplo anterior, com 1 2 3ε ε ε< < . Então verifica-se que
1 1 1 2 2 2 3 3 3E E Eε ε ε= + +D e e e (4.50)
e
1 1 1 2 2 2 3 3 3D D Dη η η= + +E e e e (4.51)
com 1i iη ε −= , 1,2,3i = .
É fácil provar, como se fará de seguida, que sendo 1d e 2d os vectores que caracterizam εεεε (como
foi referido anteriormente), 1c e 2c serão os dois vectores unitários que caracterizam ηηηη . Para isso
considera-se a Fig. 4.3.
55
Fig. 4.3: Vectores 1d e 2d que caracterizam εεεε e 1c e 2c que caracterizam ηηηη , num meio biaxial.
Pela Fig. 4.3 obtém-se que
2 1 1 3 3
1 1 1 3 3
= + = − +
τ ττ τ
c e e
c e e (4.52)
Considerando as seguintes relações,
31 1
2
13 3
2
=
=
ετ γε
ετ γε
(4.53)
obtém-se, através da Fig. 4.3, que
1 sin2
δτ =
(4.54)
e
3 cos2
δτ =
(4.55)
Estão reunidas as condições para que, semelhante ao caso da equação (4.28), se escreva a seguinte
expressão,
2 1R Rδ δ= ɶc c (4.56)
Sendo Rδ um rotor com a seguinte forma
31exp2
Rδδ =
e
31cos sin2 2
δ δ = +
e (4.57)
56
Fazendo a ponte entre os vectores 1d e 2d unitários, que caracterizam a função dieléctrica e os
vectores 1c e 2c unitários, que caracterizam a função inversa, tem-se o seguinte sistema de equações,
1 1
2 2
γ γβα
γβ γ−
= −
c d
c d (4.58)
onde
3 1
3 1
ε εβ
ε ε−
=+
(4.59)
e
2
1
1γ
β=
− (4.60)
com
1 3
2
ε εα
ε= (4.61)
Tendo em conta as considerações anteriores, verifica-se que
( )coshγ ξ= (4.62)
e
( )sinhγβ ξ= (4.63)
levando deste modo a
( )tanhβ ξ= (4.64)
com
( ) ( )1 / 1
ln2
β βξ
+ − =
(4.65)
( )3 1ln /
4
ε ε=
e finalmente tem-se
3
1
tan tan2 2
εδ φε
=
(4.66)
57
Pode-se agora escrever a expressão da função inversa da função dieléctrica, da mesma forma que
foi feito para a equação (4.28), verificando-se que
( ) ( ) ( )3 12 1 2 2 12
η ηη − = + ⋅ + ⋅
D D D c c D c cηηηη (4.67)
Os eixos ópticos de um cristal biaxial são os eixos definidos pelos vectores 1c e 2c unitários e não
os definidos pelos vectores 1d e 2d , tal como se pode verificar na Figura 4.3.
No caso dos meios uniaxiais, à semelhança do que foi efectuado na expressão (4.28) para a função
dieléctrica, apenas é necessário, na equação (4.67), ter em conta o seguinte
11 1η ε −= 2η= 1
2ε −= η⊥= (4.68)
e
13 3η ε −= η= � (4.69)
com
1 2c = c = c (4.70)
A ultima igualdade (4.70) significa que, nos cristais uniaxiais, os eixos definidos pelos vectores 1c
e 2c são o mesmo, sendo definidos pelo mesmo vector c . Verifica-se então que
( ) ( ) ( )η η η⊥ ⊥= + − ⋅ �D D D c cηηηη (4.71)
4.3.2 – Propagação de ondas electromagnéticas em meios anisotrópicos
Considere-se a álgebra geométrica 3Cl para a análise da propagação de ondas electromagnéticas
em cristais uniaxiais e biaxiais, e a seguinte variação do campo eléctrico:
( ) ( )0exp expi t ik ctω⋅ = ⋅ k r - n r - (4.72)
∴ ( ) ( ){ }0 0, expr t = ik ct ℜ ⋅ E E n r - (4.73)
com
0kc
ω= (4.74)
sendo
0kk = n (4.75)
e
ˆnn = k (4.76)
58
Na equações (4.75) e (4.76), k é o vector unitário que caracteriza o vector da constante de
propagação, 0k a constante de propagação no vácuo, n o vector índice de refracção efectivo e n é o índice
de refracção efectivo da onda.
No caso de regiões sem fontes, as equações de Maxwell, no âmbito da álgebra geométrica 3Cl ,
podem ser escritas simplesmente na seguinte forma:
123
123
= 0
= 0
c
c
∧ = ∧ = − ⋅ ⋅
n E Be
n H De
n D
n H
(4.77)
A equação = 0⋅n H mostra, para já, que todas as ondas são TM (transversais magnéticas).
4.3.2.1 – Cristais uniaxiais
Em meios uniaxiais, como foi verificado na secção 4.2.1, a função dieléctrica é a seguinte:
( ) ( )( )ε ε ε⊥ ⊥= + − ⋅�a a c a cεεεε (4.78)
Nos meios uniaxiais, utiliza-se habitualmente a notação
2enε =� (4.79)
e
20nε⊥ = (4.80)
Estes cristais classificam-se como negativos ou positivos consoante a relação entre ε⊥ e ε� , tal
como se verifica na Tabela XI e observando as Figuras 4.4 e 4.5.
Tabela XI: Cristais uniaxiais
Cristais uniaxiais negativos ε ε⊥ > �
Cristais uniaxiais positivos ε ε⊥ < �
Na Fig. 4.4 representam-se as superfícies dos índices de refracção correspondentes às ondas
características de um cristal uniaxial positivo, com ε ε⊥ < � .
59
Fig. 4.4: Índices de refracção correspondentes às ondas características de um cristal uniaxial positivo,
com ε ε⊥ < � .
A Fig. 4.5 representa as superfícies dos índices de refracção correspondentes às ondas
características de um cristal uniaxial negativo, com ε ε⊥ > � .
Fig. 4.5: Índices de refracção correspondentes às ondas características de um cristal uniaxial negativo,
com ε ε⊥ > � .
Como referido previamente, analisa-se aqui apenas a anisotropia eléctrica, recordando a relação
constitutiva do meio
( )0ε=D Eεεεε (4.81)
que é equivalente a
( )
0ε=
DE
ηηηη (4.82)
60
recorrendo à inversa da função dieléctrica, sempre que a mesma exista. Para a anisotropia eléctrica tem-se
também
0µ=B H (4.83)
Então, tem-se sucessivamente,
( ) ( )
( ) ( )( )
2
2
123 123
0 123
0
1( )
n
n
c
c
µµ
⊥
∧ = − ⋅ = = ∧
= ∧ = =
n n E E n E n
E
n Be n B e
n H e
D
E
�
�
εεεε
(4.84)
Da equação (4.84) infere-se que,
( )2n ⊥ =E Eεεεε ⇒ ( )2= n ⊥E Eηηηη (4.85)
= ⊥�E E - E ⇒ ( )2= n ⊥ ⊥−�E E Eηηηη (4.86)
Observando-se a expressão (4.86), verifica-se que �E , ou seja, a componente paralela do campo
eléctrico, é definida como a componente segundo k , ou seja, tal que 0⊥⋅ =k E . Observando a mesma
equação pode-se verificar que a componente �E pode-se obter apenas a partir da componente
perpendicular do campo eléctrico, ⊥E , desde que n seja conhecido. Formalmente tem-se,
( )1E
n= ⋅� n E ⇒ ( )2
1
n= ⋅�E n E n
⇒ ( )2 2n n⊥ = �E E - E (4.87)
( )2n= − ⋅E n E n
Estão reunidas as condições para se obter as equações da onda ordinária e da onda extraordinária
para cristais uniaxiais. Considere-se a equação de onda,
= 0∧ �k E (4.88)
61
a partir da qual se pode obter a seguinte equação,
( )2 ˆ ˆ ˆn ⊥ ⊥ ∧ − ∧ = ∧ �k E k E k Eηηηη (4.89)
0=
notando que,
( ) ( )
( ) ( ) ( )( )
0 0
0 0ˆ ˆ
α β
α β
⊥ ⊥ ⊥
⊥ ⊥
= + ⋅ ∧ = ∧ + ⋅ ∧
E E c E c
k E k E c E k c
ηηηη
ηηηη (4.90)
sendo 0α e 0β os seguintes,
0
20
0
2 20
1
1 1
e
n
n n
α η
β η η
⊥
⊥
= = = − = −
�
(4.91)
No caso dos cristais uniaxiais, tem-se a seguinte equação de onda, que resulta da aplicação das
expressões de (4.89) e (4.90),
( )( ) ( )( )2 20 0
ˆ ˆ1 0n nα β⊥ ⊥− ∧ + ⋅ ∧ =k E c E k c (4.92)
Assim, é mais simples obter-se as duas ondas características, ou ondas isonormais (onda ordinária e
extraordinária), para cristais uniaxiais. Aplicando a contracção à esquerda da equação de onda no cristal
uniaxial (4.92), com ∧k c , obtém-se
( ) ( ) ( )2
2 20 0
ˆ1 0
ondaonda extraordinária ordinária
n nα β ⊥
− + ∧ ⋅ =
������������� �����k c c E (4.93)
É simples demonstrar como se obtém a expressão anterior, tendo em conta a operação contracção
descrita no Capítulo 3. Considerando o caso geral, com 3, , , ∈ ℜa b c d , verifica-se que
( ) ( ) ( )( ) ( )( )∧ ∧ = ⋅ ⋅ − ⋅ ⋅a b c d a d b c a c b d� (4.94)
62
Através da expressão (4.94) e ao aplicar-se um raciocínio semelhante à contracção de (4.92) com
ˆ ∧k c , obtêm-se
( ) ( ) ( )( )
( ) ( ) ( )2
ˆ ˆ ˆ ˆ
ˆ ˆ ˆ
⊥ ⊥ ⊥
⊥
∧ ∧ = ⋅ ⋅ − ⋅ = − ⋅ ∧ ∧ = ∧
k c k E k E k c c E
c E
k c k c k c
�
�
(4.95)
Ao se efectuar a operação 0⊥⋅ =c E na equação (4.95) obtém-se a onda ordinária. Ao substituir-se
esta solução na equação de onda (4.93) tem-se
( )( )20
ˆ1 0nα ⊥− ∧ =k E ⇒ 20 1 0nα − = (4.96)
então,
2
0
1n
α= (4.97)
20n=
A onda extraordinária resulta da outra solução da equação (4.95), ou seja, da equação,
( ) ( )22 2
0 0ˆ1 0n nα β − + ∧ =
k c (4.98)
Ao desenvolver-se a solução obtém-se,
( )2
0 02
1 ˆn
α β= − ∧k c (4.99)
e ao considerar-se c
( ) ( )2 2
ˆ cos
ˆ sin
θ
θ
⋅ =
∧ = −
k c
k c (4.100)
Substituindo a expressão (4.99) em (4.100), obtém-se
( )2
0 02
1sin
nα β θ= + ⇒
( ) ( )2 2
2 2 20
cos sin1
en n n
θ θ= + (4.101)
63
sendo a solução da onda extraordinária a seguinte
( ) ( )
2 22 0
2 22 2
0ˆ ˆ
e
e
n nn
n n=
∧ − ∧k c k c (4.102)
4.3.2.2 - Cristais biaxiais
De seguida, serão apresentadas as duas ondas características (ou ondas isonormais), que podem
propagar-se num cristal biaxial não magnético sem perdas, ou seja,
( )0ε=D Eεεεε (4.103)
e
0µ=B ΗΗΗΗ (4.104)
tendo-se para a função dieléctrica a expressão vista anteriormente (4.44). Considerando a propagação de
ondas electromagnéticas e a expressão (4.73), tem-se
( )
( )
2
ˆ ˆ
n ⊥
⊥
= == ⋅
�
E E
E E - E
E - E k k
εεεε
(4.105)
Em relação à expressão da função inversa da função dieléctrica (4.71), obtêm-se as seguintes
expressões (sendo a primeira a equação de onda)
( )2
ˆ = 0
-= n ⊥ ⊥
∧
�
�
k E
E E Eηηηη (4.106)
Ao proceder-se de forma semelhante ao caso do cristal uniaxial, obtém-se a seguinte equação de
onda num cristal biaxial
( )( ) ( )( ) ( ) ( )2 20 0 1 2 2 1
ˆ ˆ ˆ 0n nα β⊥ ⊥ ⊥ 1 ∧ + ⋅ ∧ + ⋅ ∧ =
k E c E k c c E k c−−−− (4.107)
com
0 2α η= (4.108)
e
3 10 2
η ηβ −= (4.109)
64
Ao introduzir-se os seguintes vectores,
( )1 123ˆ= ∧u - k c e (4.110)
e
( )2 123ˆ= ∧v - k c e (4.111)
aplicando a contracção à esquerda dos bivectores 1ˆ ∧k c e 2ˆ ∧k c com a equação das ondas num cristal
biaxial, vem
( ) ( )
2 20
1 220 01
n
n
βα β⊥ ⊥
⋅ = ⋅ − + ⋅
uc E c E
u v (4.112)
e
( ) ( )
2 20
2 120 01
n
n
βα β⊥ ⊥
⋅ = ⋅ − + ⋅
vc E c E
u v (4.113)
ou, simplesmente numa expressão,
( )
( )4 2 2 2
0122
0 0
1 01
n
n
β
α β⊥
− ⋅ =
− + ⋅
u vc E
u v (4.114)
As ondas características que correspondem à direcção de propagação k (onda normal) são
caracterizadas por dois índices de refracção distintos (birefringência) −n e +n , tais que,
( )2 20 02
1
nα β
±
= + ⋅ ±u v u v (4.115)
A expressão anterior (4.114) permite que se conclua que, para ondas a propagarem-se ao longo de
1c ou 2c , de acordo com as equações (4.110) e (4.111), tem-se = 0u ou = 0v respectivamente, sendo
2
0
1n
α± = (4.116)
2ε=
ou seja, os dois índices de refracção são iguais. De acordo com a definição de eixo óptico, conclui-se que
os dois vectores 1c e 2c unitários (que caracterizam a função de impermeabilidade) são os dois eixos
ópticos do cristal biaxial, sabendo-se que as duas ondas características isonormais não podem ser
65
classificadas como ondas ordinária e extraordinária num cristal biaxial. Na Fig. 4.6 representam-se os
índices de refracção das ondas características num cristal biaxial.
Fig. 4.6: Índices de refracção das ondas características num cristal biaxial.
4.4 - Conclusão
Normalmente recorre-se ao cálculo diádico para estudar meios anisotrópicos, implicando a
utilização de um sistema de coordenadas bem definido e específico. Pode-se usar álgebra geométrica do
espaço como alternativa para o estudo dos meios anisotrópicos. A grande vantagem é a abordagem sem
sistema de coordenadas específico. Este tipo de abordagem é mais elegante que a feita pelo cálculo
tensorial clássico, ao permitir, por exemplo, encontrar os índices de refracção em meios anisotrópicos sem
ser necessária a definição de tensores.
Destacam-se, neste capítulo, o estudo dos cristais uniaxiais e biaxiais. Para ambos os casos é
necessário determinar as funções dieléctricas correspondentes e as respectivas inversas, se existirem,
permitindo que seja possível encontrar as equações de onda para cada caso. Baseado nessas deduções,
para obter os índices de refracção em cada caso, pode-se fazer a contracção à esquerda da equação de
onda com o produto exterior entre o vector que representa a direcção de propagação e o eixo óptico do
cristal em causa.
Para o caso dos cristais uniaxiais pode-se distinguir entre a onda ordinária e a extraordinária. No
caso dos cristais biaxias é impossível fazer tal distinção porque as superfícies do índice de refracção de
cada caso têm, em simultâneo, características de onda extraordinária.
No caso dos cristais uniaxiais a função dieléctrica é um caso particular da função dieléctrica dos
cristais biaxiais, sendo apenas necessário considerar nestes últimos que
1 2ε ε ε⊥= = (4.117)
e
66
3ε ε⊥= (4.118)
e que os eixos dieléctricos são iguais.
67
Capítulo 5
Aplicações dos meios anisotrópicos
As placas retardadoras são introduzidas neste capítulo como uma aplicação dos cristais uniaxiais,
descritos em detalhe no Capítulo 4. É também efectuada a análise de uma interface.
5.1: Placas retardadoras
As placas retardadoras são uma classe de componentes de óptica, com utilização em variadas áreas.
As mais utilizadas são as de meia onda e quarto de onda. As placas retardadoras são constituídas por
material anisotrópico transparente, tipicamente calcite-uniaxial negativo ou quartzo-uniaxial positivo.
Permitem que haja modificação do estado de polarização de uma onda de luz, através de transmissão.
A figura seguinte descreve uma placa retardadora de material anisotrópico transparente que ao
incidir em 2 0x = uma onda polarizada linearmente, observa-se em 2x d= uma onda transmitida cuja
polarização é elíptica. A elipticidade vai depender da espessura d da placa, do comprimento de onda de
operação e da birefringência do material.
1X
2X
3X
0E
0⊥E
0�E
O
d
4π
Fig. 5.1: Placa retardadora de material anisotrópico transparente: incidência e transmissão de onda
polarizada.
Considerando-se um cristal uniaxial de espessura d, com o eixo óptico segundo 3x , representado na
Figura 5.1. Na face que intersecta o plano (que é definido pelos eixos 1X e 3X ), há incidência de luz
68
com polarização linear a 4π com o respectivo eixo. Decompondo o campo E nas respectivas
componentes perpendicular e paralela ao eixo óptico, verifica-se com 2 0x = o seguinte,
0 00 ⊥= +�E E E (5.1)
0 00 3 1
2 2
E E= +E e e (5.2)
A componente normal ao eixo óptico, ⊥E , vai propagar-se segundo 2e a uma velocidade 0υ . Esta
componente corresponde à onda ordinária do cristal uniaxial. A componente paralela ao eixo óptico �E
vai propagar-se sob a forma de uma onda extraordinária com velocidade eυ . No caso do quartzo, com
0eυ υ< , o eixo 3X é o eixo lento da placa. No caso da calcite, com 0eυ υ> , o eixo rápido da placa é o
mesmo eixo 3X .
Na saída da placa, em 2x d= verifica-se em geral, que as componentes do campo eléctrico,
perpendicular ( ⊥E ) e paralela ( �E ), surgem com um desfasamento, originando uma polarização elíptica,
ou seja,
03
2eiE
e φ−=�E e (5.3)
e
01
2oiE
e φ−⊥ =E e (5.4)
com
e e on k dφ = (5.5)
e
dωυ
=
e
o o on k dφ = (5.6)
o
dωυ
=
A diferença de fase δ entre os ângulos eφ e oφ , descritos anteriormente, define o grau de
elipticidade, sendo,
e oδ φ φ= − (5.7)
0
2nd
πλ
= ∆
com
e on n n∆ = − (5.8)
69
sendo 0λ o comprimento de onda no vazio. Para o comprimento de onda referido a espessura da placa é
0d n mλ∆ = (5.9)
sendo m inteiro. É referido que a placa é de onda completa, com ordem m, implicando que a diferença de
fase, considerando o intervalo fundamental, seja 0δ = . Nesta situação a radiação à saída da placa tem
polarização linear e paralela em relação à polarização incidente em 2 0x = .
5.2 - Placa de meia onda
As placas de meia onda alteram a direcção da polarização de um feixe polarizado linearmente. Para
um ângulo de α entre o eixo óptico e a direcção de polarização do feixe incidente resulta numa rotação
de polarização de 2α . O ângulo 45α = � é tipicamente o mais utilizado. No caso em que
0
1
2d n m λ ∆ = +
(5.10)
sendo a placa de meia onda, de ordem m, tendo-se para este caso a diferença de fase δ π= . A radiação à
saída mantém-se polarizada linearmente, sendo agora perpendicular à radiação de entrada, ou seja houve
uma rotação da polarização de 45� , como se pode verificar na Figura 5.2.
1X
3X
0E
dE
2 0x =
2x d=
3X
1X
4π
4π
Fig. 5.2: Polarização à entrada (2 0x = ) e à saída (2x d= ) de uma placa de meia onda.
70
Se a polarização da luz incidente à entrada, fizer um ângulo de 45� com o eixo óptico, à saída esse
ângulo será de 135� , o que se pode confirmar também através da figura 5.3.
Fig. 5.3: Rotação de polarização numa placa de meia onda [10].
Se à entrada existir uma polarização esquerda, à saída obtém-se uma polarização direita.
5.3 - Placa de quarto de onda
As placas de quarto de onda são utilizadas para obter-se um feixe de luz polarizado circularmente
a partir de um feixe de luz com polarização linear e vice-versa. Para que isso aconteça, a polarização do
feixe incidente deverá fazer um ângulo de 45� com o eixo óptico. Se o ângulo for diferente é produzido
um feixe com polarização elíptica. Se a direcção da polarização do feixe de luz incidente for paralelo ao
eixo óptico, o feixe à saída apenas terá um desvio de fase.
Para o caso da placa de quarto de onda, de ordem m, tem-se,
0
1
4d n m λ ∆ = +
(5.11)
Para este caso, a diferença de fase é 2δ π= e à saída a radiação é circular. Os resultados obtidos
até agora para a placa retardadora são por si só conceptuais, ou seja, uma placa retardadora de um
determinado tipo, só desempenha a função prevista a uma determinada frequência óptica. Como exemplo,
tendo-se uma placa de quarto de onda dimensionada para operar a uma determinada frequência 0f , para
que seja possível produzir à sua saída uma polarização circular, se for utilizada noutra frequência 1 0f f≠
será produzida uma polarização elíptica.
71
Para frequências próximas (voltando ao exemplo anterior) com 1 0f f≈ , a placa poderá produzir
uma polarização circular (apesar daquela nuance), sendo apenas necessária a rotação ligeira da placa
sobre um dos seus eixos, lento ou rápido. Então as rotações no eixo lento da placa irão aumentar a
diferença de fase δ e as rotações no eixo rápido irão diminuir a diferença de fase, sendo possível obter a
diferença de fase desejada de 2δ π= .
Se à entrada existir uma polarização linear, à saída obtém-se uma polarização circular.
.
5.4 - Placas de ordem múltipla
A influência da frequência faz sentir-se na diferença de fase da placa retardadora nas formas
explícita pela variação do comprimento de onda 0λ , e implícita pela variação da birefringência
e on n n∆ = − (5.12)
e pela natureza mais ou menos dispersiva do material constituinte da placa. Pelas expressões (5.9), (5.10)
e (5.11) pode-se obter a espessura das placas retardadoras de ordem m dos materiais quartzo e calcite,
considerados anteriormente. Exemplificando, uma placa retardadora de ordem 0m = , de meia onda, tem
uma espessura
0
2d
n
λ=
∆ (5.13)
ao considerar-se a radiação de um laser de He-Ne, com 0 0.633 mλ µ= , tem-se para a espessura dos
materiais, os valores apresentados na Tabela XII.
TABELA XII: Materiais
Como se pode observar pela espessura dos materiais, este tipo de placas, com ordem 0m = são
praticamente impossíveis de realizar, nomeadamente ao nível do polimento. Por este motivo as placas
utilizadas não são de ordem zero, sendo de ordem múltipla.
No entanto, apesar de ser mais fácil realizar as placas retardadoras múltiplas, elas têm a
desvantagem de não serem facilmente empregues nos casos em que a frequência difere, mesmo que
pouco (como no exemplo anterior), da frequência nominal, ou seja, a sua sensibilidade a desvios de
frequência pequenos é mais critica que nas placas de ordem zero. Esta situação é particularmente crítica
n∆ ( )d mµ
Calcite 0.172 1.84
Quartzo 0.009 35
72
no que diz respeito à diferença de fase da placa. Considerando por exemplo uma placa retardadora de
meia onda, na qual existe um desvio de frequência f∆ em relação à frequência 0f nominal, existe uma
diferença de fase, que vai variar directamente com este desvio de frequência e com a ordem da placa, ou
seja,
( )0
2 1f
mf
δ π ∆∆ = + (5.14)
Em ultima instância, pode ser impossível compensar este desvio através das rotações dos eixos
rápido e lento da placa, ou se for possível existe a hipótese de se tornar crítico e muito difícil de realizar.
Porém, apesar desta dificuldade, as placas retardadoras de ordem múltipla têm a vantagem de
permitirem manter o seu carácter e frequências bem diferentes, o seu significado em inglês é dual
wavelength plates.
No exemplo seguinte, de novo no caso da placa de meia onda, pode-se construir uma placa em
simultâneo para 1λ e 2λ , sendo necessário apenas escolher a espessura d adequada, de modo que a placa
seja de ordem 1m para um comprimento de onda e para o outro, de ordem 2m ,
1 1
1
2 22
1 1
2
1 1
2
mn
d
mn
λ
λ
+ ∆ = + ∆
(5.15)
com 1n∆ e 2n∆ a representar o valor da birefringência para 1λ λ= e 2λ λ= .
Finalmente, é importante indicar que apesar da construção de placas de ordem zero ser impraticável
(como referido anteriormente), é possível realizá-las com espessuras manipuláveis, sem as desvantagens
descritas para as placas de ordem múltipla, através da combinação de duas placas de ordem múltipla, uma
de ordem 1m± e outra de ordem m, para que o eixo rápido de uma delas possa coincidir com o eixo lento
da outra e vice-versa.
5.5 – Interface: meio isotrópico/cristal uniaxial
Considerando-se a interface da figura 5.3 (em 0x = ), entre um meio isotrópico, com índice de
refracção in , correspondendo à região 0x > e um cristal uniaxial positivo com índices ordinário on e
extraordinário en , correspondendo à região 0x< , cujo eixo óptico do cristal uniaxial coincide com o
eixo z .
A incidência faz-se do meio a para o meio b , no meio anisotrópico dá-se uma dupla refracção ou
birefringência, sendo excitadas simultaneamente a onda extraordinária e a onda ordinária.
73
Considerando que incide uma onda plana monocromática proveniente do meio a, cuja constante de
propagação é
a i ok n k= (5.16)
e fazendo um ângulo iθ com o eixo x , verifica-se que
( )sini o in kβ θ= (5.17)
( )cosi i o iq n k θ= (5.18)
Fig. 5.4: Interface entre um meio a (isotrópico) e um meio b (cristal uniaxial positivo).
No meio b são excitadas, em simultâneo, a onda extraordinária e ordinária, representadas pelas
superfícies normais respectivamente, na Figura 5.3. Para o caso da onda ordinária verifica-se que
( )sino o on kβ θ= (5.19)
( )coso o o oq n k θ= (5.20)
Através das equações (5.17) e (5.18) obtém-se a relação entre os ângulos iθ e oθ , ou seja a lei de
Snell. No entanto, o mesmo não se aplica relativamente à onda extraordinária, uma vez que o
correspondente índice de refracção efectivo é, por si só, função do ângulo eθ , ou seja,
74
tem-se
( )en n θ= (5.21)
sendo assim, obtém-se
( ) ( )sine o en kβ θ θ= (5.22)
( ) ( )cose e o eq n kθ θ= (5.23)
Na determinação do ângulo eθ , com 2 eθ π θ= − , verifica-se que
( ) ( )
( )2 2
2 2 2 2 2 2
cos sin 1e e
e o o o e on k n k n k
θ θθ
+ = (5.24)
resultando das equações (5.22) e (5.23) que
( )cote eq β θ= (5.25)
( )2 2 2 20e en k qθ β= + (5.26)
podendo a equação (5.24) escrever-se da seguinte forma
( ) ( ) ( )2 2 2
2 2 2 2 2
cos sin sine e e
e o o on k n k
θ θ θβ
+ = (5.27)
Através da equação (5.27) é possível calcular o ângulo eθ , podendo obter-se β pela equação (5.17.
Obtendo-se através da equação (5.27) a seguinte expressão
( ) ( )( ) ( )
22
2 2 2 2 2
sinsin
1 sini
e
e i e o in n n n
θθ
θ=
− − (5.28)
5.6 - Conclusão
As placas retardadoras são componentes da óptica utilizadas na polarização por transmissão de
ondas luminosas, pelas propriedades anisotrópicas que contêm. Classificam-se nomeadamente em três
tipos diferentes, quarto de onda. meia onda e onda completa. Implicando inicialmente uma diferença de
fase δ , bem definida, dando uma medida do grau de elipticidade.
75
As placas retardadoras podem ter ordem zero, ou seja 0m = , ou ordem múltipla, com 1m≥ . As
placas de ordem zero são quase impossíveis de realizar por causa da sua espessura na ordem dos mµ ,
porém podem ser realizadas recorrendo a duas placas com ordem múltipla. No entanto as placas de ordem
múltipla são possíveis de realizar, mas têm uma grande desvantagem que consiste na sua pouca
sensibilidade a desvios pequenos da frequência nominal para que foram projectadas. Porém têm a grande
vantagem de serem dual wavelength plates.
76
77
Capítulo 6
Conclusão
6.1: Conclusão final
Nesta dissertação conclui-se que quando se analisam ondas electromagnéticas, planas e
monocromáticas, em meios anisotrópicos (a propagarem-se em cristais uniaxiais e biaxiais), a abordagem
utilizando álgebra geométrica é muito simples, revelando invariantes físicos (eixos ópticos de um cristal).
A álgebra geométrica é uma ferramenta utilizada nesta dissertação, sendo mais elegante do ponto
de vista do formalismo matemático do que o calculo diádico quando se trata de tensores, devido a fazer
uma abordagem livre de um sistema de coordenadas, simplificando o estudo da anisotropia eléctrica. A
formulação do electromagnetismo com recurso ao cálculo diádico recorre no essencial a escalares e
vectores. Para especificar a divergência e o rotacional dos campos eléctrico e magnético recorre-se a
quatro equações. Através da álgebra geométrica utiliza-se apenas uma equação para fazer esta
formulação. Nesta nova álgebra as entidades envolvidas são mais complexas, porque são geradas por
operações geométricas, utilizando-se escalares, vectores, bivectores e trivectores.
Os aspectos importantes a destacar da álgebra geométrica são a invertibilidade dos objectos de
Clifford, a interpretação associada a todas as operações realizadas com estes mesmos objectos e a
facilidade na definição da rotação de vectores. Estes aspectos fazem com que a manipulação de vectores
seja mais intuitiva. Permite também a definição da anisotropia eléctrica através do produto exterior entre
o campo eléctrico e o deslocamento eléctrico.
Em anisotropia os cristais podem ser uniaxiais ou biaxiais. A um cristal uniaxial anisotrópico
corresponde um elipsóide de revolução com dois eixos principais, com comprimentos proporcionais aos
índices de refracção das ondas ordinária e extraordinária. O tensor dieléctrico num cristal uniaxial tem
dois dos seus elementos não nulos iguais, quando expresso na forma diagonal. Para este caso as
propriedades ópticas são invariantes por rotação do cristal em torno do eixo óptico. Verifica-se que todo o
raio incidente, passando pelo centro, atravessa o cristal sem sofrer desvio ou mudança nas direcções de
propagação e vibração ou ambas. Então, nesta direcção o raio de luz comporta-se como se estivesse a
atravessar um meio isotrópico, porque se incidir polarizado ou não, ao atravessar o cristal permanecerá
nesta mesma forma. Esta direcção chama-se eixo óptico, na qual o cristal comporta-se como um material
isotrópico, não estando sujeita ao fenómeno da dupla refracção.
Nos cristais biaxiais, tal como nos cristais uniaxiais anisotrópicos, nenhuma das direcções de
propagação coincide com as direcções dos eixos ópticos, observando-se o fenómeno de birefringência. Os
materiais biaxiais têm um elipsóide de índices, com os três semi-eixos principais diferentes entre si. Em
coordenadas principais, o tensor dieléctrico tem três elementos distintos na diagonal, caracterizando-se
por ter dois eixos ópticos distintos, resultando desse facto a designação biaxiais, não existindo dupla
refracção em duas direcções.
78
É analisada nesta dissertação a utilização da álgebra geométrica como uma ferramenta poderosa
para o estudo da anisotropia em cristais e exemplifica-se a sua aplicação aos meios uniaxiais e biaxiais.
Como aplicações dos meios anisotrópicos são analisadas as placas retardadoras de meia onda e de quarto
de onda. Conclui-se que a primeira converte polarização linear em circular e a segunda transforma
polarização vertical em horizontal.
6.2: Perspectivas de trabalho futuro
Para trabalhos futuros pode considerar-se, na área da mecânica relativista, um estudo relacionado
com as vantagens da utilização da álgebra geométrica na formulação da electrodinâmica clássica no
espaço-tempo de Minkowski.
Na aplicação da álgebra geométrica, no âmbito da propagação de ondas planas monocromáticas,
seria interessante estudar meios:
• DNG ou duplamente negativos
• SNG ou simplesmente negativos
• Bisotrópicos
• Bianisotrópicos
• Com anisotropia eléctrica e magnética em simultâneo
79
Referências
[1] Carlos R. Paiva, “Álgebra Geométrica do Espaço: Introdução”, Instituto Superior Técnico, 2008.
[2] Carlos R. Paiva, “Álgebra Geométrica e Electromagnetismo”, Instituto Superior Técnico, 2006.
[3] Carlos R. Paiva, “Meios Anisotrópicos”, Instituto Superior Técnico, 2003.
[4] S. A. Matos, C. R. Paiva and A. M. Barbosa, “Anisotropy done right: a geometric algebra approach”,
Eur. Phys. J. Apllied Physics 49.33006, 2010.
[5] S. A. Matos, M. A. Ribeiro and C. R. Paiva, “Anisotropy without tensors: a novel approach using
geometric algebra”, Optics Express, Vol. 15, No. 23, 2007.
[6] C. Doran, A. Lasenby, “Geometric Algebra for Physicists” , Cambridge University Press 2003.
[7] Amon Yariv, Pochi Yeh, “Optical Waves in Crystals, Propagation and Control of Laser Radiation” ,
Wiley, 1984.
[8] J. A. Brandão Faria, “Óptica, Fundamentos e Aplicações” , Editorial Presença, 1995.
[9] D. Hestenes, “New Foundations for Classical Mechanics” , Kluwer Academic Publishers, 1984.
[10] Figura da capa e Fig. 5.3 : http://en.wikipedia.org/wiki/File:Waveplate.png
[11] http://www.lasercomponents.com
80
81
Apêndice A
Algumas relações envolvendo o operador nabla em 3333ClClClCl
Considerando-se as coordenadas cartesianas rectangulares numa base ortonormada
{ } 31 2 3= ∈ℜe e eB , a expressão seguinte corresponde ao operador nabla
1 2 31 2 3x x x
∂ ∂ ∂∇ = + +∂ ∂ ∂
e e e (A.1)
Considerando o campo vectorial
31 1 2 2 3 3a a a= + + ∈ℜa e e e (A.2)
com ( )1 1 , ,a a x y z= , ( )2 2 , ,a a x y z= e ( )3 3 , ,a a x y z= .
( ) 123∇∧ ∇×a= a e (A.3)
( ) 123∇× ∇ ∧a = - a e (A.4)
( )123∇= - ae�
( ) ( )123 123∇ ∧ ∇ ⋅ae = a e (A.5)
∇ ∇ ⋅ ∇ ∧a = a + a (A.6)
( ) 123= ∇ ⋅ + ∇×a a e
( ) ( ) ( )123 123 123∇ ∇ + ∇ ∧ae = ae ae�
( ) 123= ∇a e (A.7)
( ) 123= ∇ ⋅ − ∇ ×a e a
Para além do anterior, considere-se agora também o campo vectorial
31 1 2 2 3 3b b b= + + ∈ℜb e e e (A.8)
com ( ) 3, ,x y z ∈ ℜb , e sendo os campos escalares ( ), ,x y zΦ ∈ ℜ e ( ), ,x y zΨ ∈ℜ , tais que,
82
= 0∇ ∧ ∇ ∧ a (A.9)
( ) = 0∇ ∧ ∇Φ (A.10)
( ) = 0∇× ∇Φ (A.11)
( ) = 0∇ ⋅ ∇×a (A.12)
( ) ( ) 123∧ ∇ × = ⋅ ∇ × a b a b e (A.13)
( ) ( )∇ ∧ = − × ∇ ×a b a b� (A.14)
( ) ( ) 2∇× ∇ × = ∇ ∇ ⋅ − ∇a a a (A.15)
( ) ( )∇ ∇ ∧ = −∇× ∇ ×a a� (A.16)
( )2= ∇ − ∇ ∇ ⋅a a
( ) ( ) ( )+∇ ΦΨ = Φ ∇Ψ Ψ ∇Φ (A.17)
( ) ( ) ( )+∇ ⋅ Φ = ⋅ ∇Φ Φ ∇ ⋅a a a (A.18)
( ) ( ) ( )+∇ ∧ Φ = ∇Φ × Φ ∇ ∧a a a (A.19)
( ) ( ) ( )+∇× Φ = ∇Φ × Φ ∇ ×a a a (A.20)
( ) ( ) ( )∇ ⋅ × = ⋅ ∇× ⋅ ∇×a b b a -a b (A.21)
( ) ( ) 123= ∧ ∇ ∧ − ∧ ∇ ∧ a b b a e
( ) ( ) 123∇ ∧ ∧ = ∇ ⋅ × a b a b e (A.22)
( ) ( )= ∧ ∇ ∧ − ∧ ∇ ∧b a a b
( ) ( ) ( ) ( ) ( )∇ ⋅ = ⋅∇ + ⋅∇ − ∇ ∧ − ∇ ∧a b a b b a a b b a� � (A.23)
( ) ( ) ( ) ( )= × ∇× + × ∇× ⋅∇ + ⋅∇a b b a + a b b a
83
( ) ( ) ( ) ( ) ( )∇× × = ∇ ⋅ − ∇ ⋅ + ⋅∇ − ⋅∇a b b a a b b a a b (A.24)
( ) ( )∇ × = −∇ × ×a b a b� (A.25)
( ) ( ) ( ) ( )= ∇ ⋅ − ∇ ⋅ ⋅∇ − ⋅∇a b b a + a b b a
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