UMA PROPOSTA DE METODOLOGIA PARA ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS
AMBIENTAIS
Eliana Nogueira Camacho
TESE SUBMETIDA AO CORPO DOCENTE DA COORDENAÇÃO DOS PROGRAMAS
DE PÓS-GRADUAÇÃO DE ENGENHARIA DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE
JANEIRO COMO PARTE DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA A OBTENÇÃO DO
GRAU DE MESTRE EM CIÊNCIAS EM ENGENHARIA CIVIL.
Aprovada por:
__________________________________________________
Prof. Francisco José Casanova de Oliveira e Castro, D. Sc.
__________________________________________________
Prof. Paulo Fernando Ferreira Frutuoso e Melo, D. Sc.
__________________________________________________
Prof. Edson de Pinho da Silva, D.Sc.
__________________________________________________
Dra Denise Faertes, Ph. D.
__________________________________________________
Prof.Maria Cláudia Barbosa, D.Sc
RIO DE JANEIRO, RJ – BRASIL
NOVEMBRO DE 2004
ii
CAMACHO, ELIANA NOGUEIRA
Uma Proposta de Metodologia para Análi-
se Quantitativa de Riscos Ambientais [Rio de
Janeiro] 2004
X, 140 p. 29,7 cm (COPPE/UFRJ, M. Sc.,
Engenharia Civil, 2004)
Tese - Universidade Federal do Rio de
Janeiro, COPPE
1. Análise de Riscos
1. COPPE/UFRJ II. Título (série)
iii
DEDICATÓRIA
Dedico esta Tese aos meus filhos Gabriel e Mariana, pela dedicação e compreensão
durante este longo período, em que ficaram privados de várias coisas, como brincadeiras,
passeios, de atenção, realização de tarefas escolares, por conta do meu envolvimento.
Ao meu marido, que foi a pessoa que mais colaborou para que esse dia chegasse, sem o
apoio dele, tenho certeza de que isso não aconteceria.
A minha mãe, pelo carinho e o esforço de despencar 300 km para ficar com meus filhos
para que pudesse trabalhar em minha Tese.
Ao meu pai que não se encontra presente aqui, mas foi a pessoa que mais me incentivou
a lutar pelos meus objetivos e que sempre, mesmo de onde ele está, sempre esteve
presente em mim, me dando força para lutar e com certeza estaria muito realizado com
mais esta batalha vencida.
Para finalizar agradeço a Deus, que é o responsável pela nossa existência (o dom da
vida), por estarmos aqui.
iv
AGRADECIMENTOS
- A Deus em primeiro lugar, meu marido, meus filhos e minha mãe
- Ao meu Orientador, Francisco Casanova
- A Denise Faertes – TRANSPETRO/PETROBRAS
- A Elizabete Costa – ENSR International Brasil
- A Paulo Fernando Ferreira Frutuoso e Melo - UFRJ
v
Resumo da Tese apresentada à COPPE/UFRJ como parte dos requisitos necessários
para a obtenção do grau de Mestre em Ciências (M. Sc.)
UMA METODOLOGIA PARA ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS AMBIENTAIS
Eliana Nogueira Camacho
Novembro/2004
Orientador: Francisco Casanova de Oliveira e Castro
Programa: Engenharia Civil
Neste trabalho foi proposta uma integração da metodologia de risco desenvolvida
para avaliar a performance global de segurança em plantas nucleares e químicas às
metodologias desenvolvidas para avaliar o potencial dos efeitos adversos de substâncias
químicas perigosas, em seres humanos e demais elementos do ecossistema. A
integração em questão se aplica àquelas situações onde é possível focar na segurança
de operações quer sejam elas relacionadas à produção, ao armazenamento ou à
manipulação de substâncias químicas perigosas. Por outro lado, apresentamos a
possibilidade do uso da dinâmica de populações como uma ferramenta na análise de
vulnerabilidade numa Análise Quantitativa de Riscos Ambientais.
vi
Abstract of Thesis presented to COPPE/UFRJ as a partial fulfillment of the requirements
for the degree of Master of Science (M. Sc.)
A METODOLOGY FOR ENVIRONMENTAL QUANTITATIVE RISK ASSESSMENT
Eliana Nogueira Camacho
November/2004
Advisor: Francisco José Casanova de Oliveira e Castro
Department: Civil Engineering
In this work we have proposed an integration of the methodology used to evaluate
the global performance in nuclear and chemical plants safety with that others used to
evaluate human and ecological potential adverse consequences of chemicals. This
integrated methodology is good for cases where it is possible to focus on safety of
industrial operations. On the other hand we pointed out the possibility to use the
population dynamics models as a tool in vulnerability analysis in an Environmental
Quantitative Risk Analysis.
vii
ÍNDICE DO TEXTO
1 INTRODUÇÃO 1
1.1 DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS 7
2 DESCRIÇÃO DA METODOLOGIA DE ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS 8
2.1 Introdução 8
2.2 Definição do Conceito de Risco em Atividades Industriais 9
2.3 Metodologia da Análise Quantitativa de Riscos Industriais 11
2.3.1 Definição do Sistema a ser Estudado: Fronteiras, objetivos e escopo 15
2.3.2 Identificação dos Perigos e dos Cenários Acidentais Relevantes 16
2.3.3 Avaliação das Freqüências de Ocorrência dos Cenários Acidentais 31
2.3.4 Avaliação das Conseqüências e Vulnerabilidade 48
2.3.5 Avaliação dos Riscos 53
3 DESCRIÇÃO DA METODOLOGIA DE ANÁLISE DE RISCOS AMBIENTAIS 58
3.1 Introdução 58
3.2 Avaliação de Risco a Saúde Humana 59
3.3 Avaliação de Risco Ecológico 67
3.4 Transporte de Contaminantes no Solo 69
3.5 Metodologias Usualmente Empregadas 73
4 CONCEITOS BÁSICOS DE ECOLOGIA 84
4.1 Introdução 84
4.2 Alguns Conceitos Básicos em Ecologia 85
4.3 Modelos de Dinâmica de Populações 95
5 DESCRIÇÃO DA PROPOSTA DE ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS
AMBIENTAIS 105
5.1 Introdução 105
viii
5.2 Metodologia para Análise Quantitativa de Risco Ambiental 107
5.3 Aplicação da Metodologia – Um Estudo de Caso 114
5.4 Aplicação da Dinâmica de Populações à Análise de Vulnerabilidade
em AQRA 128
6 CONCLUSÕES 133
7 REFERÊNCIAS 136
ix
LISTA DE SIGLAS
SÍMBOLO DEFINIÇÃO
AIChE Instituto Americano de Engenheiros Químicos
ALARP Tão baixo quanto praticável
ARA Avaliação de Risco Ambiental
ASTM American Society for Testing and Materials dos EUA
ETI Estação de Tratamento de Efluentes Industriais
AQR Análise Quantitativa de Risco
AQRA Avaliação Quantitativa de Riscos Ambientais
APP Análise Preliminar de Perigos
AH Análise Histórica
AE Árvore de Eventos
AF Árvore de Falhas
BLEVE Explosão de vapor por expansão de líquido fervente
CETESB Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental do Estado de São Paulo
- Brasil
C-Soil Ferramenta computacional usada para avaliação de risco ambiental
Curva F-N É uma forma de expressar o risco social, fornecendo a freqüência acumulada
de acidentes verus N ou mais fatalidades.
FEEMA Fundação Estadual do Meio Ambiente do Rio de Janeiro
fitness É a probabilidade de deixar descendentes ao longo de grandes períodos de
tempo.
GLP Gás Liquefeito de petróleo
HAZOP Estudos de Perigos e Operabilidade
JP-4 Querosene de aviação
x
VisualMODFLOW Ferramenta computacional comumente empregada nos cálculos de fluxo e
transporte de contaminantes
NA Nível d’ água
NAPLs Non-aqueous phase liquid
offshore For a da costa
OLF Associação da Indústria de Petróleo da Noruega
OMS Organização Mundial da Saúde
PROBIT Unidade de probabilidade
RBCA Ação Baseada em Risco da ASTM.
RBSL Níveis Gerais Baseados em Risco
RIVM Instituto de Saúde Pública e Meio Ambiente da Holanda
SoilRisk Ferramenta computacional para a avaliação do risco de contrair cancer
SSTL Valores-alvo específicos do sítio
TCE Tricloroetileno
TDI Ingresso diário tolerável
UCVE – Explosão em nuvem de vapor não confinada
USEPA United States Environmental Protection Agency
Uca Caranguejo chama - maré
VOC Compostos Orgânicos Voláteis
WASH 1400 Guia de procedimentos para avaliação probabilística de segurança
desenvolvido na década de 70, para ser usado como instrumento de
avaliação da segurança destas plantas nucleares.
Zoés Formas larvares do caranguejos chama-maré
1
1 INTRODUÇÃO
O conceito de risco é hoje em dia amplamente utilizado em várias áreas do conhecimento.
Não há, entretanto, uma uniformidade na sua conceituação e muito menos uma
metodologia única que seja empregada na sua avaliação.
Um marco no desenvolvimento de uma metodologia que conceituou e avaliou o risco ao
homem devido às operações das plantas nucleares, no início da década de 70, foi o
relatório WASH 1400 [1], de fato um guia de procedimentos para avaliação probabilística
de segurança para ser usado como instrumento de avaliação da segurança destas
plantas nucleares.
Ainda na década de 70 foi conduzido um estudo abrangente envolvendo instalações não
nucleares no Reino Unido, que deu origem ao relatório Canvey [2].
Em seqüência, no início dos anos 80 foi realizado um outro estudo abrangente de
avaliação de perigos envolvendo instalações não nucleares em Rijnmond, localizada no
delta do Reno entre o Rotterdam e o Mar do Norte, o relatório Rijnmond [3].
Uma outra etapa fundamental que consagrou a metodologia acima, e ampliou o seu uso
para a avaliação dos riscos relacionados à segurança das plantas de processo em geral,
foi o guia de procedimentos desenvolvido pelo Instituto Americano de Engenheiros
Químicos – AIChE [4] – no início da década de 80.
2
O conceito de risco definido na metodologia acima está associado a dois outros conceitos;
de um lado a conseqüência de um dado cenário acidental e do outro lado, a chance de
que este cenário ocorra. Especificamente, o risco é definido como sendo o produto da
conseqüência de um cenário acidental, pela sua respectiva freqüência de ocorrência.
O cálculo do risco na metodologia acima utiliza informações de duas áreas distintas do
conhecimento. De um lado os chamados modelos de conseqüência e vulnerabilidade [5],
e do outro a engenharia da confiabilidade [6].
Os modelos de conseqüência e vulnerabilidade servem para avaliar, no caso de um
acidente, a área atingida por um nível particular de efeito físico bem como a parcela dos
recursos (pessoas, estruturas, meio ambiente em geral) que sofrerão um tipo particular de
dano. Em linhas gerais trata-se, portanto, da determinação de uma espécie de resposta
dos recursos, aos efeitos físicos submetidos.
Por outro lado, a engenharia de confiabilidade permite avaliar o desempenho de
componentes, equipamentos ou sistemas de uma planta, no cumprimento de suas
missões. As técnicas de engenharia de confiabilidade como árvores de eventos e árvores
de falhas permitem determinar a chance de ocorrência, ou ainda a freqüência de
ocorrência dos cenários acidentais.
Dois outros contextos onde é avaliado o risco são: o risco à saúde humana e o risco
ecológico devido a substâncias tóxicas.
A definição de risco à saúde humana, no contexto acima, é o do potencial para efeitos
adversos à saúde causado por compostos químicos [7].
3
A avaliação do risco à saúde humana tem se desenvolvido como um capítulo da
toxicologia, esta entendida como a ciência das substâncias químicas nocivas à vida.
Neste contexto o risco é entendido como sendo uma resposta de um indivíduo, à
exposição de uma dada substância tóxica.
No caso de substâncias reconhecidamente carcinogênicas, o risco à saúde humana é
formalmente definido como a probabilidade de um indivíduo contrair câncer como
resultado de uma exposição a um nível particular do carcinogênico [7]. No caso de
substâncias não- carcinogênicas, o potencial para efeitos adversos é avaliado
comparando-se o nível de exposição ao longo de um período de tempo especificado ( por
exemplo, tempo de vida) com uma dose de referência, para o mesmo período de
exposição [7].
Portanto, se compararmos esta metodologia com aquela anteriormente apresentada, e
consolidada no guia de procedimentos estabelecido pela AIChE conclui-se que,
conceitualmente, o risco aqui é a expressão da conseqüência de um acidente.
O mesmo acontece no caso do risco ecológico. O risco ecológico, anteriormente
designado ambiental, refere-se à avaliação qualitativa e ou quantitativa do potencial dos
efeitos adversos de substâncias químicas perigosas, em plantas e animais (excluindo-se
pessoas e espécies domésticas) [8].
Assim, também no caso do risco ecológico, conceitualmente o risco é a expressão da
conseqüência de um acidente que deu origem a uma contaminação ambiental.
4
Este conceito de risco (saúde humana e ecológico), é o usado na área de Geotecnia
Ambiental [9, 10].
Em abril de 1998 a EPA publicou a versão final de um guia para avaliação de risco
ecológico [11] onde alguns conceitos foram revistos e ampliados. Por exemplo, “uma
avaliação de risco ecológico é entendida agora como o processo que avalia a chance de
um efeito ecológico adverso ocorrer, em decorrência da exposição a um ou mais agentes
tóxicos”. O conceito de efeito ecológico adverso também foi ampliado particularmente na
definição do termo ecológico. Neste documento o efeito ecológico adverso é entendido
como “mudanças que são consideradas indesejáveis porque elas alteram características
estruturais ou funcionais valoradas do ecossistema e seus componentes”. Aqui o
ecossistema compreende a comunidade biótica e o meio abiótico dentro de uma
localização especificada no espaço e no tempo. E por último, uma entidade ecológica é
definida como espécies, grupo de espécies, uma característica ou função do ecossistema
ou um habitat específico.
O conceito de toxicologia também foi estendido e atualmente a toxicologia é definida de
forma mais precisa como o estudo qualitativo e quantitativo dos efeitos adversos dos
agentes tóxicos nos organismos biológicos [12]. Por outro lado, na categoria dos agentes
tóxicos estão incluídos além dos químicos, os agentes de natureza física e biológica.
As generalizações acima estenderam os domínios da entidade ecológica bem como os
domínios da toxicologia, mas o conceito de risco neste contexto continua sendo o do
potencial de efeitos adversos e, portanto, o risco ainda é a expressão da conseqüência de
um acidente.
5
A metodologia de análise quantitativa de risco associada à segurança de plantas químicas
e nucleares, e que será apresentada no capítulo 2, é normalmente empregada para
avaliar risco agudo associado a conseqüências indesejáveis que se propagam pela
atmosfera. O risco agudo é aquele cujas conseqüências indesejáveis se manifestam de
forma intensa e numa pequena escala de tempo. Não há, entretanto, na metodologia
nada que a impeça de ser usada em cenários de contaminação de solo e ou corpos
hídricos.
Por outro lado, as metodologias que serão discutidas no capítulo 3 e que se aplicam tanto
ao ser humano quanto a outros elementos do ecossistema, consideram de forma
quantitativa apenas os efeitos adversos, sobre um ou outro, provenientes de ambientes
contaminados. A diferença está que nesta metodologia não são calculadas chances de
tais contaminações ocorrerem. De fato nesta metodologia, o foco não é a segurança com
que um contaminante é produzido, ou armazenado, ou simplesmente manipulado, mas
sim nas implicações, isto é, nos efeitos adversos sobre os elementos do ecossistema, em
suas eventuais liberações.
O objetivo central desta dissertação é sugerir a integração destas duas metodologias.
Assim, nesta nova metodologia que passo a chamar de análise quantitativa de riscos
Ambientais, por um lado são incluídos elementos de análise de confiabilidade na
metodologia considerada no capítulo 3, e por outro são considerados os demais
elementos do ecossistema, vias de exposição e suas avaliações naquela outra
metodologia descrita no capítulo 2
A razão principal para tal sugestão é que parece mais apropriado que o conceito de risco
associado às atividades antrópicas deva estar vinculado a uma avaliação de segurança
6
de tais atividades. Assim por exemplo, duas plantas químicas iguais quanto às
substâncias produzidas, armazenadas e/ou manipuladas (ou duas atividades que
manipulam substâncias químicas iguais), mas que possuem diferentes condições de
segurança, oferecem riscos diferentes à população, ao ecossistema, à saúde financeira
das empresas, ou seja, ao meio ambiente.
Uma vantagem de se expressar o risco como o produto da freqüência pela conseqüência,
e não como conseqüência apenas, é a possibilidade de intervir diretamente no projeto de
uma planta através de combinações de seus componentes e sistemas, com o intuito de
reduzir a freqüência de ocorrência de possíveis cenários acidentais e, assim, efetivamente
diminuir os riscos. Trata-se, portanto, de uma poderosa ferramenta de gerenciamento dos
riscos.
Nesta dissertação o conceito de meio ambiente é aquele empregado pela agência de
proteção ambiental do governo da Nova Zelândia, isto é, meio ambiente é um conjunto
constituído pelas pessoas, suas crenças sociais, culturais, o ambiente natural e as inter-
relações entre os diversos elementos [13].
Um outro objetivo desta dissertação é mostrar como os elementos de dinâmica
populacional podem ser usados para construir modelos que contribuem para uma análise
de conseqüências e vulnerabilidade para cenários acidentais envolvendo populações de
um ecossistema e assim serem incorporados numa complexa análise quantitativa de
riscos ambientais.
7
1.1 DESCRIÇÃO DOS CAPÍTULOS
Esta dissertação é constituída de sete capítulos organizados da seguinte forma:
• Capítulo 2 – Revisão sucinta da Metodologia da Análise Quantitativa de Riscos;
• Capítulo 3 – Revisão sucinta da Metodologia de Análise de Riscos Ambientais;
• Capítulo 4 – Revisão sucinta de Conceitos Básicos em Ecologia;
• Capítulo 5 – Descrição da Proposta de Metodologia para Análise Quantitativa de
Riscos Ambientais;
• Capítulo 6 – Conclusões
• Capítulo 7 – Referências
8
2 DESCRIÇÃO DA METODOLOGIA DE ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCO
2.1 INTRODUÇÃO
A Análise Quantitativa de Risco ou simplesmente AQR é hoje uma metodologia
amplamente utilizada como poderosa ferramenta na avaliação da perfomance global de
segurança, em especial nas indústrias nuclear e química.
A metodologia da AQR teve sua origem no desenvolvimento da indústria nuclear.
Entretanto, podemos dizer que contribuíram também de forma significativa para o seu
desenvolvimento as indústrias eletrônica e aeroespacial. Esta última, em especial,
fortemente motivada pela corrida espacial que se apresentava na época (∼ 1970) – a
conquista do espaço.
A preocupação com a segurança das indústrias nucleares acabou gerando um
documento, de fato um guia de procedimentos – Avaliação Probabilística de Risco, para
ser usado como instrumento de avaliação da segurança das plantas nucleares [1].
A generalidade desta metodologia se mostrou útil na avaliação dos riscos relacionados à
segurança das plantas de processo em geral, e em particular da indústria química, e hoje
em dia é genericamente chamada de Análise Quantitativa de Risco da Indústria de
Processos Químicos.
Esta consagrada metodologia será brevemente resumida neste capítulo, onde se
pretende apresentar seus conceitos e métodos empregados para a análise.
9
2.2 DEFINIÇÃO DO CONCEITO DE RISCO EM ATIVIDADES INDUSTRIAIS
É comum, em ciências, usarmos termos que possuem significado diferente, às vezes até
mesmo antagônico, daqueles empregados na vida cotidiana.
O risco é um exemplo desses termos. Até mesmo no domínio da ciência existem vários
significados associados com a palavra risco [14].
Transcreve-se a seguir as definições de risco extraídas da Ref [14] e que, por sua vez,
foram objeto de discussão e decisão do “SRA Committee on Definitions” [15 ].
1. “Possibilidade de perda, dano, desvantagem ou destruição; expor ao dano ou ao
perigo; incorrer em risco ou perigo”.
2. “Uma expressão para a possível perda durante um período de tempo ou por um
número de ciclos operacional especificado”.
3. “Conseqüências / unidade de tempo = freqüência (eventos/unidade de tempo) x
magnitude (conseqüências / evento)”.
4. “Medida da probabilidade e severidade de efeitos adversos”.
5. “Probabilidade condicional de um evento adverso (dado que o evento causador tenha
necessariamente ocorrido)”.
6. “Potencial que um evento ou atividade tem para conseqüências negativas
indesejáveis”.
7. “Probabilidade de que uma substância produza dano sob condições especificadas”.
8. “Probabilidade de perda ou dano às pessoas ou à propriedade”.
9. “potencial para a realização de conseqüências negativas indesejáveis à vida humana,
à saúde ou ao ambiente”.
10
10. “Produto da probabilidade de um evento adverso pelas conseqüências deste evento,
ao ocorrer (dimensão das conseqüências x tempo)”.
11. “Função de dois fatores principais: (a) probabilidade de que um evento ou uma série
de eventos de várias magnitudes ocorra, e (b) as conseqüências destes eventos”.
12. “Distribuição de probabilidades acerca de todas as possíveis conseqüências de uma
causa específica, que possa ter um efeito adverso sobre a saúde humana, a
propriedade ou ao meio ambiente”.
13. “Medida da ocorrência e severidade de um efeito adverso sobre a saúde, propriedade
ou meio ambiente.”
Nesta dissertação não se entrará no mérito da discussão sobre os vários conceitos
(muitos deles relacionados). Ao invés disso, vamos nos limitar àquelas definições e
conceitos já amplamente consagrados pela indústria de processo [4, 5, 12, 16], e que
serão discutidas na próxima seção.
Portanto, considera-se nesta dissertação que, conceitualmente, o risco é definido pela
combinação de dois outros conceitos: a conseqüência de um cenário acidental e a sua
freqüência de ocorrência. Especificamente, o risco é definido como o produto da
freqüência pela conseqüência.
Notamos que desta forma o risco não se define como uma conseqüência indesejável, mas
sim como uma combinação desta, com a chance dela ocorrer. Assim, portanto, se fosse
possível construir uma planta onde não houvesse a menor chance de perda indesejável
de contenção de substância potencialmente perigosa, o risco associado à operação deste
empreendimento seria zero. Por outro lado, na hipótese fantasiosa de um
empreendimento construído no meio do deserto e que operasse de forma completamente
11
automatizada, não sendo, portanto, necessária a intervenção humana, ainda que não
fosse pequena a chance de perda de contenção de substâncias potencialmente
perigosas, o risco ao homem associado a este outro empreendimento também seria
conceitualmente zero.
Na prática não há equipamento que não falhe e nem empreendimento, que em suas
imediações esteja livre de seres humanos. Portanto, pode-se dizer que o risco é inerente
à atividade industrial e que uma forma razoável de expressá-lo é através de uma
combinação entre a chance de ocorrência de um cenário acidental e sua respectiva
conseqüência. Considerando-se a combinação em questão como o produto desses dois
fatores, esta expressão pode ser interpretada como uma ponderação (peso) na
conseqüência, onde o fator de ponderação é a chance de ocorrência de uma liberação
indesejável de uma substância potencialmente perigosa – um acidente.
A seguir apresenta-se resumidamente as definições e conceitos relativos à análise de
risco associada à segurança de operações em plantas industriais, bem como as etapas
que definem a metodologia de AQR. A descrição a seguir está baseada nas respectivas
referências clássicas [4, 5, 12, 16].
2.3 METODOLOGIA DA ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS
De acordo com as referências [4, 5, 12, 16], o risco é formalmente definido como:
( ) ( ) ( ) ( )( )∑∑==
==n
jjj
n
jj tzyxCftzyxRtzyxR
11
,,,,,,,,, . (2.1)
12
Aqui, fj é a freqüência de ocorrência do j-ésimo cenário acidental. A freqüência de
ocorrência é o número de vezes que o cenário ocorre (portanto, ao contrário da
probabilidade, não é um número limitado ao intervalo [0,1]), e é normalmente expressa
numa base anual e, portanto, tem dimensão de inverso do tempo; Cj, é a conseqüência a
ele associado. A conseqüência se expressa através do número de pessoas, edificações e
meio ambiente que serão afetadas de uma forma particular (ferimentos, fatalidades,
destruição de construções entre outras). E finalmente, n é o número de cenários
acidentais identificados na planta. Nota-se que o risco assim definido é uma grandeza
aditiva, isto é, o risco total num dado ponto é a soma das contribuições dos riscos, neste
ponto, associados a cada cenário acidental. Na equação 2.1, R(x,y,z) é um número,
associado ao ponto do espaço de coordenadas (x,y,z), que informa o risco a um indivíduo
localizado neste ponto.
A AQR é uma técnica que foi originalmente desenvolvida para abordar os principais
perigos de acidente e cujas conseqüências se propagam pela atmosfera. A expressão
“principais perigos de acidente” tem sido definida como [16]: “Uma ocorrência tal como
uma grande emissão, um grande incêndio ou uma grande explosão que resulta de uma
liberação descontrolada de uma ou mais substâncias perigosas, no curso de uma
atividade industrial e que conduz a uma situação grave de perigo ao homem e ao meio
ambiente, imediatamente ou posteriormente, dentro ou fora da instalação”.
A AQR possibilita avaliar quantitativamente os riscos provenientes de uma instalação que
utiliza substâncias perigosas isto é, tóxicas, inflamáveis e/ou explosivas e que, portanto
possuem a potencialidade de causar danos (morte, ferimento, perda de estrutura, perda
econômica, etc) às pessoas, à propriedade e ao meio ambiente.
13
A AQR serve tanto como ferramenta para avaliar os riscos existentes, bem como ajudar
na decisão de escolha entre diferentes alternativas para redução dos riscos [17].
Antes de passar a apresentar a seqüência de etapas que definem a metodologia, é
importante definir alguns outros conceitos comumente empregados. O primeiro é o de
cenário acidental. O cenário acidental é definido como uma seqüência específica de
eventos, não proposital, que tenha uma conseqüência indesejável. O primeiro evento da
seqüência é o evento iniciador. Os demais eventos são denominados eventos
intermediários e representam as respostas do sistema e de seus operadores, ao evento
iniciador. Devemos notar que diferentes respostas ao mesmo evento iniciador
determinarão diferentes eventos intermediários e, portanto, embora o evento iniciador seja
o mesmo, podemos ter diferentes seqüências de eventos determinando assim diferentes
cenários acidentais. Observa-se também que mesmo quando as conseqüências são
semelhantes, elas podem diferir em magnitude.
Esta definição do acidente evidencia sua natureza aleatória. A freqüência de ocorrência
de um cenário acidental, ou sua probabilidade de ocorrência é determinada compondo-se
adequadamente a freqüência do evento iniciador, com as respectivas probabilidades de
ocorrência dos eventos intermediários.
Uma outra observação importante é que esta definição possibilita, conceitualmente, a
oportunidade de redução da freqüência de ocorrência do cenário acidental, através da
possibilidade de redução das probabilidades dos eventos intermediários.
A seguir se apresenta de forma resumida a metodologia da AQR. Ela é baseada nas
seguintes etapas:
14
• Definição do sistema a ser estudado bem como suas fronteiras;
• Identificação dos perigos e dos cenários acidentais mais relevantes;
• Avaliação das freqüências de ocorrência dos cenários acidentais;
• Avaliação das conseqüências e vulnerabilidade;
• Avaliação dos riscos.
A seguir na figura 2.1 apresenta-se um fluxograma que ilustra a estrutura de uma AQR:
FIGURA 2.1 – FLUXOGRAMA DA ESTRUTURA DE UMA AQR
Fonte: Ref. [17]
Definição do sistema a ser estudado
Identificação dos perigos e cenários acidentais
Avaliação das freqüências • freqüência dos eventos iniciadores • indisponibilidade do sistema de proteção • freqüência dos cenários acidentais
Avaliação das conseqüências • avaliação dos efeitos físicos • análise de vulnerabilidade • análise das conseqüências
Avaliação dos riscos
Riscos Aceitáveis ?
Plano de ação de emergência Medidas mitigadoras
sim não
15
Cabe ressaltar que o estabelecimento de critérios para a aceitabilidade de riscos é um
processo lento, complicado e que requer a participação da sociedade no seu julgamento.
Uma vez concluído o processo, passa a existir um padrão, isto é, um nível ou um intervalo
de valores em que o risco é considerado aceitável. Este padrão já existe no Brasil (Rio de
Janeiro e São Paulo) para riscos associados às substâncias tóxicas, inflamáveis e
explosivas e cujas conseqüências se propagam pela atmosfera [18, 19]. Estes critérios de
aceitabilidade usados pela FEEMA e CETESB serão apresentados mais adiante, nas
seções onde se discutirá o risco individual e o risco social.
2.3.1 DEFINIÇÃO DO SISTEMA A SER ESTUDADO: FRONTEIRAS, OBJETIVOS E
ESCOPO.
Esta fase inicial do estudo é muito importante porque nela são estabelecidos de forma
clara os limites, isto é, as fronteiras e como o sistema será estudado. Ou seja, as
fronteiras, os objetivos e o escopo definem até onde se vai investigar e com que grau de
profundidade.
Por exemplo, se uma instalação industrial contém apenas uma esfera de GLP (Gás
Liquefeito de Petróleo) e um tanque de óleo diesel e se localiza muito próximo a uma área
de proteção ambiental (APA), numa área onde há ocupação residencial, uma análise de
riscos completa deverá envolver todos os aspectos do problema.
Mas pode haver o seguinte interesse específico (como é o caso da liberação da licença
de instalação pela FEEMA e CETESB): qual é o risco agudo à população imposto pela
instalação? É evidente que este tipo de interesse limita o objeto de estudo pois não serão
16
estudadas as conseqüências de um acidente sobre a APA e nem mesmo os riscos à
saúde humana impostos por uma possível contaminação do solo ou corpo hídrico.
O grau de profundidade também pode ser limitado se se decidir não considerar as
conseqüências de um possível efeito dominó (efeito cascata, onde um acidente num
elemento da planta acarreta destruição em outro e assim sucessivamente, tal qual quando
um conjunto de peças do jogo dominó, colocadas em pé, próximas e alinhadas, em
seqüência vão caindo, uma a uma, após a primeira da fila cair).
2.3.2 IDENTIFICAÇÃO DOS PERIGOS E DOS CENÁRIOS ACIDENTAIS MAIS
RELEVANTES
A identificação dos perigos associados à operação de uma planta bem como a
identificação dos cenários acidentais associados é feita através de técnicas qualitativas
que consistem em métodos específicos, e que têm como objeto a identificação de todos
os eventos iniciadores de acidente, uma avaliação qualitativa das conseqüências e suas
severidades, a consolidação dos cenários acidentais e finalmente uma hierarquização
qualitativa dos riscos associados.
AS TÉCNICAS MAIS COMUNS DE IDENTIFICAÇÃO DE PERIGOS SÃO:
• Análise Preliminar de Perigos (APP)
• Estudos de Perigos e Operabilidade (HAZOP)
• Análise Histórica (AH)
17
• ANÁLISE PRELIMINAR DE PERIGOS (APP)
A Análise Preliminar de Perigos (APP) é uma técnica qualitativa que consiste na
identificação preliminar dos perigos existentes em uma instalação (existente ou em fase
de projeto), suas causas, suas conseqüências, e uma hierarquização qualitativa dos
riscos associados. Além disso, a APP inclui sugestões de medidas para a redução das
freqüências e/ou conseqüências dos cenários acidentais.
A APP é uma técnica precursora de outras investigações, pois identifica os cenários
acidentais mais relevantes, em que se baseará, por exemplo, uma análise de
conseqüências e vulnerabilidade e, finalmente, uma análise quantitativa de riscos.
A APP é uma técnica que pode ser usada tanto na fase de projeto quanto em instalações
já existentes. Na fase de projeto a técnica é ideal, pois faz a identificação dos perigos com
antecedência, podendo, à medida que o projeto se desenvolve, controlar os riscos ou
minimizá-los.
A realização da APP propriamente dita é feita através do preenchimento de uma planilha,
que se encontra apresentada na figura 2.2 a seguir.
18
ANÁLISE PRELIMINAR DE PERIGOS
SISTEMAS:
SUBSISTEMA CATEGORIAS
PERIGO CAUSAS MODO DE DETECÇÃO
EFEITOS FREQÜÊNCIA SEVERIDADE RISCO
RECOMENDAÇÕES CENÁRIOS
FIGURA 2.2 – PLANILHA UTILIZADA PARA A ANÁLISE PRELIMINAR DE PERIGOS
Fonte: Ref [20]
A seguir descreve-se resumidamente os conteúdos de cada uma das colunas da planilha,
ou seja, os conceitos de cada um dos itens que a define.
1a coluna: Perigo
Perigos identificados para o módulo/trecho de análise em estudo. Perigos são todos os
possíveis eventos iniciadores com potencial para causar danos às instalações,
operadores, público ou meio ambiente.
2a coluna: Causa
As causas podem envolver tanto falhas intrínsecas dos equipamentos como erros
humanos durante testes, operação e manutenção.
19
3a coluna: Modos de detecção
A detecção da ocorrência do evento iniciador pode ser através de instrumentação ou
percepção humana.
4a coluna: Conseqüências
Principais efeitos dos acidentes envolvendo substâncias tóxicas, explosivas ou
inflamáveis.
5acoluna: Categoria de freqüência
Fornece uma indicação qualitativa da freqüência esperada de ocorrência para cada um
dos cenários identificados, conforme tabela 2.1.
TABELA 2.1 – CATEGORIAS DE FREQÜÊNCIAS DOS CENÁRIOS USADOS NA APP
CATEGORIA DENOMINAÇÃO FAIXA DE FREQÜÊNCIA (/ANO)
DESCRIÇÃO
A Extremamente remota
< 10-4 Extremamente improvável de ocorrer durante a vida útil da instalação
B Remota 10-3 a 10-4 Não esperado ocorrer durante a vida útil da instalação
C Improvável 10-2 a 10-3 Pouco provável de ocorrer durante a vida útil da instalação
D Provável 10-1 a 10-2 Provável de ocorrer durante a vida útil da instalação
E Freqüente > 10-1 Esperado ocorrer várias vezes durante a vida útil da instalação
Fonte: Ref [ 20]
20
6a coluna: Categoria de severidade
Fornece uma indicação qualitativa da severidade da conseqüência, para cada um dos
cenários identificados. As categorias de severidade utilizadas no presente trabalho estão
definidas na tabela 2.2.
TABELA 2.2 – CATEGORIA DA SEVERIDADE DAS CONSEQÜÊNCIAS DOS
CENÁRIOS
CATEGORIA DENOMINAÇÃO DESCRIÇÃO
I Desprezível Sem danos ou danos insignificantes aos equipamentos, à propriedade e/ou ao meio ambiente. Não ocorrem lesões/mortes de funcionários, de terceiros (não funcionários) e/ ou de pessoas extra-muros (indústrias e comunidade). O máximo que pode ocorrer são casos de primeiros socorros ou tratamento médico menor.
II Marginal Danos leves aos equipamentos, à propriedade e/ou ao meio ambiente (danos materiais são controláveis e/ou de baixo custo de reparo). Lesões leves em funcionários, terceiros e/ou pessoas extra-muros.
III Crítica Danos severos aos equipamentos, à propriedade e/ou ao meio ambiente, levando à parada ordenada da unidade e/ou sistema. Lesões de gravidade moderada em funcionários, em terceiros e/ou pessoas extra-muros (probabilidade remota de morte de funcionários e/ou terceiros). Exige ações corretivas imediatas para evitar seu desdobramento em catástrofe.
IV Catastrófica Danos irreparáveis aos equipamentos, à propriedade e/ou ao meio ambiente, levando à parada desordenada da unidade e/ou sistema (reparação lenta ou impossível). Provoca mortes ou lesões graves em várias pessoas (em funcionários, em terceiros e/ou em pessoas extra-muros).
Fonte: Ref [20]
21
7a coluna: Risco
Combinando-se as categorias de freqüência com as de severidade, obtém-se uma
indicação qualitativa do nível de risco de cada um dos cenários identificados, isto é, a
Matriz de Riscos conforme ilustrada na figura 2.3.
FREQÜÊNCIA
A B C D E
IV
III
II
I
S
E
V
E
R
I
D
A
D
E
FIGURA 2.3 – MATRIZ DE CLASSIFICAÇÃO DE RISCOS USADA EM APP
Fonte: Ref [20]
SEVERIDADE FREQÜÊNCIA RISCO
I DESPREZÍVEL A EXTREMAMENTE REMOTA
DESPREZÍVEL
II MARGINAL B REMOTA MENOR
III CRÍTICA C IMPROVÁVEL MODERADO
IV CATASTRÓFICA D PROVÁVEL SÉRIO
E FREQÜENTE CATATRÓFICO
22
8a coluna: Medidas Mitigadoras
Recomendações de medidas preventivas ou mitigadoras que devem ser tomadas para
diminuir a freqüência e/ou a severidade do cenário acidental.
9a coluna: Cenário
Número de identificação do cenário de acidente.
Antes de iniciar o preenchimento da planilha, deve-se definir o objetivo da análise, o
escopo, as fronteiras da instalação, a substância a ser analisada, bem como as condições
meteorológicas predominantes na região, tendo em vista que tais condições podem
influenciar significativamente na avaliação dos efeitos físicos.
Para facilitar a realização da análise é interessante dividir a instalação em sistemas,
subsistemas e trechos, onde são adotados alguns critérios para tal, como, por exemplo,
dividir os trechos entre válvulas de bloqueio, o que facilita uma tomada de ação no caso
de liberação neste trecho.
• ESTUDOS DE PERIGOS E OPERABILIDADE (HAZOP)
A técnica denominada de estudos de perigos e operabilidade (HAZOP), tem o objetivo de
identificar os perigos e os problemas de operabilidade, isto é, os desvios dos parâmetros
de processo, identificando suas causas e conseqüências.
A melhor época para se realizar este tipo de análise é na fase final de projeto, quando já
se dispõe de fluxogramas de engenharia e de processo da instalação, onde ainda se pode
23
alterar o projeto sem grandes prejuízos. A partir daí, o HAZOP pode ser usado em
qualquer fase da vida útil da instalação.
A técnica pode ser usada tanto como revisão de segurança, onde enfoca a segurança dos
operadores, público externo e do meio ambiente, como também nos problemas de
operação que, embora não ofereçam perigo imediato, podem acarretar perda de produção
e na qualidade final do produto.
A realização de um HAZOP requer conhecimentos específicos da operação da planta pois
ele procura identificar as causas de desvios operacionais bem como suas conseqüências
para, enfim, serem propostas medidas que solucionem o problema.
Esta metodologia é baseada em um procedimento, em que um grupo examina um
processo e gera perguntas de maneira estruturada e sistemática através de um conjunto
de palavras guia, que se encontram ilustradas nas Tabelas 2.3 e 2.4 a seguir:
24
TABELA 2.3-TIPOS DE DESVIOS ASSOCIADOS COM AS PALAVRAS GUIA.
Palavra-Guia Tipos de Desvios
Não, Nenhum Completa negação das intenções de projeto
Menos Diminuição quantitativa de uma propriedade
física relevante
Mais Aumento quantitativo de uma propriedade
física relevante
Também, Bem como Um aumento qualitativo
Parte de Uma diminuição qualitativa
Reverso O oposto lógico da intenção de projeto
Outro de Substituição completa
Fonte: Ref [20]
TABELA 2.4 – LISTA DE DESVIOS PARA HAZOP DE PROCESSOS
CONTÍNUOS.
Parâmetro Palavra-Guia Desvios
Fluxo Nenhum Menos Mais Reverso Também
Nenhum fluxo Menos fluxo Mais fluxo Fluxo reverso Contaminação
Pressão Menos Mais
Pressão baixa Pressão alta
Temperatura Menos Mais
Temperatura baixa Temperatura alta
Nível Menos Mais
Nível baixo Nível alto
Viscosidade Menos Mais
Viscosidade baixa Viscosidade alta
Reação Nenhum Menos Mais Reverso Também
Nenhuma reação Reação incompleta Reação descontrolada Reação reversa Reação secundária
Fonte: Ref [20]
25
Esta técnica de identificação de desvios consiste em buscar as causas destes possíveis
desvios em variáveis de processo, tais como, temperatura, vazão, pressão e composição,
em diferentes pontos do sistema (denominados nós). A busca destes desvios é feita
através da aplicação sistemática de uma lista de palavras guia ilustradas nas Tabelas 2.3
e 2.4, juntamente com o tipo de desvio considerado [20].
Para facilitar a análise, divide-se a unidade em sistemas e subsistemas, onde se
escolherá um ponto no subsistema a ser analisado, que se denominará nó.
Para a realização, propriamente dita, do HAZOP, se faz uso de uma planilha contendo 8
colunas como se mostra na figura 2.4.
FIGURA 2.4 – PLANÍLHA UTILIZADA PARA ESTUDO DE PERIGOS E
OPERABILIDADE
Fonte: Ref [20]
Data: Estudos de Perigos e Operabilidade (HAZOP) Preparado por:
Unidade/subsistema: Nó: Referência: Pág
Parâmetro Palavra-guia
Desvio Causas Detecção Conseqüência Providências Ação
26
A seguir descreve-se resumidamente os conteúdos de cada uma das colunas da planilha,
ou seja, os conceitos de cada um dos itens que a define.
1a coluna: Parâmetro
É a variável de processo que deve ser mantida especificada para a adequada operação
da planta, conforme especificado na tabela 2.4;
2a coluna: Palavra-guia
Palavra que associará ao parâmetro analisado, um descontrole operacional, conforme
tabela 2.4;
3a coluna: Desvio
É a combinação do parâmetro com a palavra- guia, conforme Tabela 2.4
4a coluna: Causas
São as causas que podem acarretar o desvio, podendo envolver tanto falhas intrínsecas
de equipamentos, erros humanos de operação e de manutenção.
5acoluna: Detecção
São os meios de detecção disponíveis para identificação da ocorrência do desvio
6acoluna: Conseqüências
São as conseqüências associadas a cada uma das causas ou conjunto de causas,
podendo ser tanto distúrbios operacionais, como perda de produto e interrupção de uma
27
transferência, como efeitos que possam gerar incêndio, explosões, formação de nuvem
tóxica, etc, ou danos aos operadores, à instalação ou ao meio ambiente.
7acoluna: Providências
Recomendações propostas pela equipe de realização do HAZOP
8acoluna: Ações
É a gerência responsável pela avaliação das implicações e pela implementação das
medidas.
Após a escolha do nó, especifica-se o parâmetro, que é a variável do processo (vazão,
fluxo, pressão...), aplica-se a palavra-guia, verificando quais os possíveis desvios daquele
nó. Para cada desvio, que consiste na combinação da palavra guia com o parâmetro (ex:
menos fluxo), identifica-se suas possíveis causas, os meios de detecção e suas
conseqüências. Por fim, devem-se sugerir medidas para eliminar as causas dos desvios
ou minimizar suas conseqüências.
• ANÁLISE HISTÓRICA
A análise histórica (AH), consiste em fazer uma coleta de dados em banco de dados [21],
com relato de acidentes que se referem à liberação da mesma substância em instalações
similares à analisada.
28
O objetivo da análise histórica é auxiliar na identificação de perigos da instalação
analisada, auxiliando no levantamento das causas que levaram à ocorrência desses
acidentes e suas conseqüências.
O exame de acidentes ocorridos revela a importância de se dar atenção a detalhes, a
necessidade de vigilância constante para evitá-los e o fato de que a maioria dos acidentes
é devido, de uma forma ou de outra, à falha de gerenciamento [17].
Depois de escolher o tipo de instalação, faz-se uma classificação do acidente quanto à s
suas causas e ao tipo de efeito físico. Os dados levantados podem ser colocados numa
tabela que indique, para cada tipo de causa ou para cada tipo de efeito físico, o número
de acidentes observados, bem como o percentual que este número representa em
relação ao número total, por tipo de causa ou por tipo de efeito físico.
Pode-se ainda, por exemplo, representar o resultado na forma de gráfico tipo pizza,
indicando o percentual para cada tipo de causa ou tipo de efeito físico. Estes percentuais
de ocorrência podem então ser usados para definir a freqüência de ocorrência de cada
evento iniciador a ser considerado na análise.
TÉCNICA MAIS USADA PARA IDENTIFICAÇÃO DOS CENÁRIOS ACIDENTAIS
• ÁRVORE DE EVENTOS
Como vimos, a técnica da APP possibilita identificar cenários acidentais. Uma outra
técnica muito difundida e que também permite [4] a determinação dos cenários acidentais
é a Árvore de Eventos (AE). Embora ambas as técnicas possam igualmente bem ser
usadas em avaliações qualitativas de risco, numa avaliação quantitativa de risco a APP é
29
usada como instrumento de identificação dos eventos iniciadores de acidente. Por sua
vez, a técnica da AE se utiliza destes eventos iniciadores para, então, consolidar os
cenários acidentais propriamente ditos.
Em essência, a AE é uma estrutura gráfica lógica e seqüencial, isto é, uma sucessão
cronológica dos desdobramentos possíveis do evento iniciador. Como ilustração,
apresentamos na figura 2.5, uma AE para o evento iniciador “Grande Liberação de GLP
Causada por Ruptura Catastrófica de um Vaso Pressurizado Isolado”. Os dados a seguir
são fictícios.
30
FIGURA 2.5 – ÁRVORE DE EVENTOS PARA GRANDE LIBERAÇÃO DE GLP
Fonte: Ref [4]
sim
não
A B C D E Fde GLP para área populosa Jato de fogo para um tanque de GLP
UCVE ou Jato ignitado apontandoGrande liberação Ignição imediata Vento soprando Ignição retardada
31
2.3.3 AVALIAÇÃO DAS FREQÜÊNCIAS DE OCORRÊNCIA DOS CENÁRIOS
ACIDENTAIS
Após a fase de identificação de perigos e consolidação dos cenários acidentais devemos,
numa AQR, avaliar a freqüência de ocorrência associada a cada cenário acidental.
A avaliação da freqüência de ocorrência dos cenários pode ser feita, por exemplo,
processando os dados de uma bem elaborada Análise Histórica. Em outras situações é
mais conveniente proceder a uma avaliação desta natureza, a partir de uma AE. A AE é
uma técnica tanto qualitativa, usada para identificar cenários acidentais como vimos
acima, quanto também quantitativa, pois possibilita a avaliação da freqüência ou a
probabilidade de ocorrência do cenário.
Uma vez que se usam os resultados da engenharia de confiabilidade, no cálculo de
freqüências de ocorrência de cenários acidentais, considera-se importante apresentar
agora um breve resumo dos seus principais conceitos e resultados. O resumo a seguir foi
elaborado com base nas referências [5] e [12]. Por outro lado usou-se [22] como a
principal fonte de referência com relação aos conceitos, definições e teoremas relativos a
teoria de probabilidades
Alguns conceitos e relações fundamentais em engenharia de confiabilidade
O objetivo desta seção é apresentar, de forma resumida, algumas definições e conceitos
relacionados à engenharia de confiabilidade.
32
Conceitualmente, a confiabilidade é a probabilidade de que um componente, equipamento
ou sistema exerça sua função sem falhas, por um período de tempo previsto, sob
condições de operação especificadas.
De maneira mais formal diz-se que se n equipamentos operam sem substituição, então
após um tempo t o número de equipamentos em operação é ns e o número daqueles que
falharam é nf. Assim sendo, a probabilidade de sobrevivência de um equipamento, ou
seja, a sua confiabilidade R(t) é dada por:
ntn
tR f )(1)( −= (2.2)
A taxa de falha instantânea, ou simplesmente taxa de falha, expressa através do número
de equipamentos que sobrevivem é dada por:
dttRd
dttdR
tRdttdn
nntz f
f
)(ln)()(
1)(1)( −=−=−
= (2.3)
z(t) também é chamada de função de risco.
A função de risco acumulada é dada por:
∫=t
dttztH0
)()( (2.4)
33
portanto, por integração da equação (2.3), vê-se que a confiabilidade se expressa através
da taxa de falha de acordo com:
)](exp[)(exp)(0
tHdttztRt
−=
−= ∫ (2.5)
Dois outros conceitos importantes são a densidade de falha e a função de distribuição de
falha. A densidade de falha é a taxa de falha expressa em função do número original de
equipamentos, isto é:
dttdR
dttdn
ntf f )()(1)( −== (2.6)
f(t) é chamada de função densidade de falhas ou simplesmente a função densidade. O
complemento da confiabilidade é a chamada inconfiabilidade, assim:
)(1)( tRtF −= (2.7)
A inconfiabilidade é uma função de distribuição de falhas, ou melhor ainda, uma função de
distribuição acumulada.
Um outro conceito importante é o tempo médio até falhar (MTTF) que é definido como:
∫∞
=0
dttRTRMT )( (2.8)
A seguir são apresentadas algumas relações importantes entre as funções básicas
discutidas acima.
34
)(1)(
)()()(
tFtf
tRtftz
−== (2.9)
∫∞
=t
dttftR )()( (2.10)
∫=t
dttftF0
)()( (2.11)
Um caso especial importante é aquele para o qual a taxa de falha é constante, isto é, z(t)
= λ. Neste caso temos:
)exp()( ttR λ−= (2.12)
)exp()( ttf λλ −= (2.13)
)exp(1)( ttF λ−−= (2.14)
Um outro conceito muito importante em engenharia de confiabilidade é o conceito de
disponibilidade. A disponibilidade, ou disponibilidade instantânea é a probabilidade de que
um componente (ou sistema) esteja operacional em um dado instante A(t). O seu
complementar é a indisponibilidade que é dada por:
)()( tAtA −= 1 (2.15)
Em geral A(t) ≥ R(t)
35
Para sistemas em operação contínua, a disponibilidade representa o percentual do tempo
considerado (por exemplo: ano, mês ou campanha) em que o sistema encontra-se
inoperante. No caso de sistemas em reserva ou prontidão, a disponibilidade é a
probabilidade de sucesso na demanda. Associado com a disponibilidade tem-se a
disponibilidade média e a disponibilidade estacionária ( ou assintótica), respectivamente
definidas como:
∫=T
meddttA
TA
0
1 )( (2.16)
( ) )(lim tAA t ∞→=∞ (2.17)
Os componentes podem ser classificados, quanto à mudança de estados a que estão
sujeitos, como: irreversíveis (componentes irreparáveis, como por exemplo válvulas de
retenção), parcialmente reversíveis (componentes testados periodicamente, como por
exemplo sistemas de proteção) e reversíveis (componentes reparáveis como por exemplo
suprimento de energia elétrica, ou de gás de cozinha). A indisponibilidade é diferente para
componentes em classes diferentes. Assim, para os componentes irreparáveis a
indisponibilidade instantânea é dada por:
tetA λ−−= 1)( (2.18)
a indisponibilidade média é dada por:
)1(1111)(0
TT
tmed e
Tdte
TtA λλ
λ−− −−=−= ∫ (2.19)
36
e a indisponibilidade estacionária neste caso é dada por:
1)1(lim)( =−=∞ −∞→
tt eA λ (2.20)
Para componentes testados periodicamente, considerando-se que uma falha somente
pode ser detectada e reparada nos instantes de realização dos testes,e então durante
estes intervalos tudo se passa como se o componente fosse não reparável, a
indisponibilidade nestes casos é dada por:
tetA λ−−= 1)( (2.21)
A indisponibilidade média entre intervalos de teste é dada por:
( )λθ
λθθ −−−= eAmed 111)( (2.22)
e quando o produto λθ for muito menor do que 1 temos que:
2)( λθθ =medA (2.23)
Para componentes reparáveis a indisponibilidade instantânea é dada por:
[ ]tetA )(1)( µλ
µλλ +−−+
= (2.24)
37
A indisponibilidade média é dada por:
−+
−+
= +− Tmed eTTA )(1()(
11)( µλµλµλλ
(2.25)
e a indisponibilidade assintótica é dada por:
λτλτ
λτµλ
λ≅
+=
+=∞
1)(A (2.26)
Em seguida são apresentadas algumas distribuições de falhas comumente empregadas
em trabalhos de confiabilidade.
1. Distribuição binomial
A distribuição binomial é aplicável a situações onde é realizada uma série de ensaios
discretos e cada ensaio pode ter apenas dois resultados. Em confiabilidade esses
resultados são usualmente chamados de sucesso e falha. Se as probabilidades de
sucesso e falha são p e q respectivamente, e se n é o número de ensaios então a
probabilidade de ocorrência de r sucessos e n-r falhas é dada por:
( ) rnrnr qprP −=)( (2.27)
2. Distribuição de Poisson
38
A distribuição de Poisson pode ser pensada como um caso particular da distribuição
binomial válida no limite Np≡λ<<N. Sua forma funcional é:
!)exp()(r
rPrλλ−= (2.28)
3. Distribuição Exponencial
Trata-se de uma distribuição contínua caracterizada pela seguinte densidade de
probabilidade:
)exp()( ttf λλ −= (2.29)
onde λ é o inverso do valor médio da distribuição. Esta é distribuição empregada no caso
de taxa de falha constante (z=λ=constante).
Neste caso a confiabilidade é dada por:
)exp( tR λ−= (2.30)
onde 0 ≤ t ≤ ∞.
4. Distribuição Normal
Esta distribuição, também contínua, é caracterizada pela seguinte densidade:
39
( )
−−= 2
2
221
σπσmtf exp . (2.31)
E neste caso a confiabilidade é dada por:
( ) dtmtRt∫∞
−−= 2
2
221
σπσexp (2.32)
onde m é o valor médio da distribuição e σ seu desvio padrão.
5. Distribuição Weibull
Esta distribuição contínua, importantíssima no estudo de confiabilidade, é caracterizada
pelos três parâmetros η (parâmetro de escala), β (parâmetro de forma) e γ (parâmetro de
localização). A densidade e a confiabilidade são dadas por:
−−
−=
− ββ
ηγ
ηγ
ηβ ttf exp
1
(2.33)
−−=
β
ηγtR exp (2.34)
onde ∞≤≤ tγ .
O fator de forma β é tal que se β<1 a taxa de falha é decrescente, se β = 1 a taxa de falha
é constante e finalmente se β > 1 a taxa de falha é crescente. A distribuição de Weibull
40
contém varias distribuições como caso particular, dependendo apenas da escolha de
valores particulares do parâmetro β.
Voltando agora ao problema de interesse, para se calcular a freqüência de ocorrência de
um cenário acidental partindo-se de uma AE, devemos lembrar que um particular cenário
identificado por esta técnica é um ramo específico desta árvore, representando uma
seqüência específica de acontecimentos ordenados cronologicamente.
A AE, como vimos, é constituída de eventos intermediários e pontos de ramificação (nós),
além do evento iniciador. Associada ao evento iniciador, tem-se uma freqüência de
ocorrência que pode ser determinada, por exemplo, consultando-se um banco de dados
[23] ou realizando-se uma análise histórica.
Usualmente, embora não seja essencial, é costume construir uma árvore com divisão
binária, ao invés de múltiplas divisões. Assim, em cada nó têm-se duas possibilidades
onde uma delas certamente ocorrerá. Portanto, ao se expressar as possibilidades como
probabilidades tem-se que, em cada nó a soma das probabilidades deve ser 1.
As probabilidades associadas com os eventos intermediários são probabilidades
condicionais que expressam a chance de ocorrência deste evento dada a ocorrência ou a
não ocorrência do evento precedente.
A figura 2.6 ilustra este procedimento.
41
FIGURA 2.6 – ÁRVORE DE EVENTOS GENÉRICA APRESENTANDO AS
PROBABILIDADES CONDICIONAIS ASSOCIADAS AOS EVENTOS
INTERMEDIÁRIOS.
Finalmente, considerando-se que não haja nenhuma dependência entre os eventos
intermediários que compõem a AE, o cálculo da freqüência de ocorrência do cenário é
realizado multiplicando-se, numa dada seqüência, todas as probabilidades associadas
com cada evento intermediário bem como a freqüência de ocorrência do evento iniciador.
Do ponto de vista da matemática (teoria das probabilidades), isto se justifica por causa da
própria definição matemática do cenário, dada no início da seção 2.3, como sendo uma
sucessão de eventos. Assim, um dado cenário se expressa por exemplo como CDBA ,
onde A é o sucesso na ocorrência do evento iniciador, B é a falha na ocorrência do
evento intermediário B, C e D são os sucessos nas ocorrências dos eventos
intermediários C e D respectivamente. Portanto, a sucessão acima, que nada mais é do
que o cenário acidental particular, é a ocorrência de A e B e C e D. Como esses eventos
42
são independentes sabe-se que P(A e B e C e D) ≡ P(A∩ B ∩C∩D) =
P(A)P( B )P(C)P(D).
Para exemplificar o exposto acima consideremos a AE apresentada na Figura 2.5, agora
preenchida com as diversas probabilidades intermediárias,como ilustra a figura 2.7.
43
FIGURA 2.7 – ÁRVORE DE EVENTOS PARA GRANDE LIBERAÇÃO DE GLP, PREENCHIDA COM VALORES DAS
FREQÜÊNCIAS
Fonte: Ref[4]
0,2 BLEVE ABF 2 x 10-6
0,10,8 Radiação térmica local ABnF 8 x 10-6
sim 0,5 UCVE AnBCDEF 6,1 x 10-6
0,9 0,2 Incêndio em nuvem e BLEVE AnBCDnEF 1,2 x 10-6
1 x 10-4/ano 0,50,8 Incêndio em nuvem AnBCDnEnF 4,9 x 10-6
0,15
não 0,1 Dispersão sem dano AnBCnD 1,4 x 10-6
0,9 0,5 UCVE AnBnCDE 39,5 x 10-6
0,9 0,2 Incêndio em nuvem e BLEVE AnBnCDnEF 6,9 x 10-6
0,50,8 Incêndio em nuvem AnBnCDnEnF 27,5 x 10-6
0,85
0,1 Dispersão sem dano AnBnCnD 7,6 x 10-6
E FA B C D
Freqüênciade GLP para área populosa Jato de fogo para um tanque de GLP Físico Acidental (ano-1)
UCVE ou Jato ignitado apontando Efeito CenárioGrande liberação Ignição imediata Vento soprando Ignição retardada
44
Um aspecto importante a considerar é o da determinação da probabilidade de ocorrência
dos eventos intermediários. De fato não há uma regra única e, por exemplo, novamente
podemos lançar mão de dados provenientes de AH. Em certas situações, contudo,
podemos lançar mão de uma outra técnica da engenharia de confiabilidade conhecida
como Análise por Árvore de Falhas ou simplesmente Árvore de Falhas (AF) [4, 5, 6].
Uma AF é usada para analisarmos as causas de um dado evento. Ela começa com o
evento de interesse, conhecido como evento topo, que pode ser um evento perigoso
específico ou mesmo uma falha de equipamento e se desenvolve de cima para baixo.
Assim como a AE, a AF também é uma técnica que permite obtermos informações de
natureza qualitativa e quantitativa. Neste caso a informação de natureza qualitativa não é
um cenário acidental, mas sim um dado corte mínimo que nos leva ao evento topo. Aqui,
um corte mínimo é um conjunto de falhas simultâneas que tem como conseqüência o
evento topo.
A AF desdobra o evento topo em seus elementos contribuintes, representados por falhas
de equipamentos e erros humanos. O método se constitui, portanto, numa técnica
dedutiva onde começamos com o evento indesejável, ou seja, o evento topo e
identificamos as causas imediatas do evento em questão. Cada uma das causas
imediatas é então examinada sucessivamente até que julguemos ter identificado as
causas básicas de cada evento. As causas imediatas do evento topo estão indicadas na
AF com suas relações com o referido evento. A AF é um diagrama lógico que aponta as
inter-relações lógicas entre estas causas básicas e o evento perigoso específico ou a
falha de equipamento que representa o evento topo.
45
Se pelo menos uma das causas imediatas gera diretamente o evento topo em questão,
então essas causas estão ligadas a este evento por meio de um portão lógico “ou”. Se,
por outro lado, todas as causas imediatas são necessárias à ocorrência do evento
considerado, então essas causas estarão ligadas a ele por meio de um portão lógico “e”.
A partir daí, cada uma das causas imediatas é então tratada da mesma maneira que o
evento topo, sendo suas causas imediatas, determinadas e indicadas na AF com o portão
lógico apropriado. Este desdobramento prossegue até que todos os eventos de falhas
intermediárias tenham sido desdobrados em suas causas básicas.
O resultado de uma AF é um conjunto de combinações de falhas de equipamentos e de
falhas humanas suficientes para ocasionar o evento indesejável (ou evento topo).
Admitindo-se que os eventos de entrada sejam independentes, para a quantificação da
AF devemos observar que se as causas posteriores estão conectadas à causa anterior
por um portão lógico “e”, as probabilidades se multiplicam, caso contrário o cálculo da
probabilidade deve considerar o resultado para P(A1∪A2∪...An). No caso particular de n=2
teremos que P(A1∪A2) = P(A1) + P(A2) - P(A1)P(A2).
A seguir ilustramos a técnica da AF através de um exemplo simples [24]. O sistema em
questão é um toca-fitas cujo objetivo consiste em produzir som através dos alto-falantes,
ou seja, tocar a fita, quando o toca-fitas propriamente dito é conectado a uma fonte de
energia elétrica (considera-se a fita como parte integrante do sistema toca-fitas).
Evidentemente, este objetivo só será alcançado quando o toca-fitas e pelo menos um dos
alto-falantes funcionarem adequadamente.
46
FIGURA 2.8 – ÁRVORE DE FALHAS PARA O SISTEMA TOCA-FITAS
Fonte: Ref. [24]
Falha do sistema
Falha do toca-fitas
Falha dos Alto-falantes
2
1 3
Falha do Alto-falante A
Falha do Alto-falante B
P1= 10-2 P3= 10-2
P = 10-4
P2= 10-3
P (topo)= 10-3 + 10-4 = 1,1 x 10-3
47
A simbologia usada na árvore de falhas da figura 2.8 está descrita a seguir:
Porta lógica OU: A saída ocorre se existe uma ou mais entradas da porta
Porta lógica E: A saída ocorre se todas as entradas existem simultaneamente
Evento básico: O evento básico representa uma falha básica que não requer nenhum
desenvolvimento em eventos mais básicos.
Evento intermediário (ou topo): Usa-se o retângulo para descrição dos eventos que
ocorrem por causa de uma ou mais outros eventos de falhas.
48
2.3.4 AVALIAÇÃO DAS CONSEQÜÊNCIAS E VULNERABILIDADE
Como se explicou no início deste capítulo, esta metodologia de análise de riscos foi
desenvolvida originalmente para abordar os principais perigos de acidentes que se
relacionam à liberação de substâncias tóxicas, inflamáveis e/ou explosivas, que, com
suas liberações descontroladas, geram efeitos físicos tais como ondas de choque, fluxos
térmicos e formação de nuvens de gases tóxicos capazes de causar danos ao homem, ao
meio ambiente e à propriedade, na área atingida pelos efeitos.
A primeira etapa numa avaliação de conseqüências é, portanto, a investigação dos efeitos
físicos associados a cada cenário acidental. Assim, por exemplo, quando por perda de
contenção uma dada substância tóxica é lançada na atmosfera, devemos ser capazes de
descrever sua dispersão e prever a região sujeita a uma concentração prejudicial, por
exemplo, à saúde humana, em cada instante de tempo. Especificamente falando, neste
exemplo, devemos ser capazes de descrever o campo de concentrações, isto é, C(x,y,z,t)
e, a partir dele, e juntamente com informações de natureza toxicológica, onde e quando
haverá concentração prejudicial à saúde.
A segunda etapa é a determinação da quantidade dos recursos (pessoas, estruturas,
meio ambiente em geral) que estará vulnerável a uma certa intensidade dos efeitos
físicos. Em linhas gerais trata-se, portanto, da determinação de uma espécie de resposta
dos recursos aos efeitos físicos submetidos.
Em princípio, os recursos podem ser materiais, como as instalações de um
empreendimento; econômicos, como volume de negócios; naturais, como ecossistemas
terrestres ou aquáticos; ou mesmo humanos. Cada efeito físico pode gerar, em cada
49
recurso, um tipo particular de dano. Assim por exemplo, o desligamento num equipamento
crítico de uma dada unidade, gerado por um curto circuito devido a incêndio na unidade,
pode ocasionar a perda do próprio equipamento. Por outro lado, um incêndio de
pequenas proporções pode provocar queimaduras nas pessoas, sem que haja
fatalidades. Devemos ser capazes, então, de determinar a quantidade do recurso
comprometido com um efeito físico particular.
Quando ensaios toxicológicos são realizados num grande número de indivíduos, todos
expostos à mesma dose (integral da concentração no tempo, durante o tempo de
exposição), o gráfico indicando a fração ou percentual de indivíduos que experimentam
uma resposta específica é tipicamente uma gaussiana [12]. A figura 2.9 ilustra este fato.
FIGURA 2.9 – PERCENTUAL DE INDIVÍDUOS AFETADOS PARA UMA DADA
RESPOSTA
Fonte: Ref. [12]
50
Se a experiência toxicológica for repetida sucessivamente para vários valores diferentes
da dose, cada um dos resultados é um gráfico semelhante quanto à forma, mas com
altura máxima e largura diferentes. Ao se representar graficamente a resposta cumulativa
média para cada dose, em função desta, o resultado típico tem a forma apresentada na
figura 2.10:
FIGURA 2.10 – CURVA DOSE-RESPOSTA
Fonte: Ref. [12]
Curvas que expressam o comportamento da resposta em função da dose existem para
uma grande variedade de exposições tais como, por exemplo: calor, pressão, impacto, e
som.
Para fins de cálculo, é mais conveniente trabalhar com uma expressão analítica que
represente a curva e existem vários métodos para representá-la [25]. Para exposições de
uma única natureza, o método probit (unidade de probabilidade) [26] é particularmente
conveniente pois fornece uma representação retilínea que é equivalente à curva de dose-
resposta.
51
A variável probit está relacionada com a probabilidade segundo a equação:
∫−
∞−
−=5
2 )2/exp(21 Y
duuPπ
. (2.35)
A relação acima entre a variável probit e a probabilidade transforma a forma sigmóide da
curva normal de dose-resposta em linha reta quando ela é plotada usando-se uma escala
linear para o probit. Este resultado é apresentado na figura 2.11.
FIGURA 2.11 – CURVA NORMAL DE DOSE – RESPOSTA E A RESPECTIVA
LINEARIZAÇÃO
Fonte: Ref [12]
A tabela 2.5 apresenta uma variedade de correlações de probit para diferentes tipos de
exposições. O fator causativo V representa a dose.
52
TABELA 2.5 – CORRELAÇÕES DE PROBIT PARA VÁRIOS TIPOS DE EXPOSIÇÃO
Fonte: Ref. [27]
O significado dos símbolos presentes na tabela 2.5 é o seguinte:
te = tempo de duração efetiva (seg);
Ie = intensidade efetiva da radiação térmica (W/ m 2 );
t = tempo de duração do incêndio em poça (seg);
I = intensidade da radiação térmica proveniente do incêndio em poça (W/ m 2 );
po = sobrepressão máxima (N/ m 2 );
J = impulso (N. s/ m 2 );
C = concentração (ppm);
T = intervalo de tempo (min);
A variável Y é calculada a partir de:
Y = k1 + k2lnV, (2.36)
53
A variável causativa V (vide tabela 2.5) representa a magnitude da exposição.
2.3.5 AVALIAÇÃO DOS RISCOS
• RISCO SOCIAL
O risco social refere-se ao risco para um determinado número ou grupamento de pessoas
expostas aos danos decorrentes de um ou mais cenários, [4].
Podemos expressar o risco social através do risco social médio, que se calcula fazendo o
somatório dos produtos freqüência x conseqüência de cada cenário acidental ou também,
podemos expressá-lo através da chamada curva F-N que fornece a freqüência acumulada
de acidentes, com N ou mais fatalidades.
A seguir apresenta-se, como ilustração, o critério de aceitabilidade da FEEMA, bem como
uma curva F – N de um caso estudado.
54
FIGURA 2.12 – CRITÉRIO DE ACEITABILIDADE – FEEMA PARA O RISCO SOCIAL
FONTE: REF. [18]
FIGURA 2.13 – CURVA F-N DE UM CASO ESTUDADO
Fonte: ENSR International Brasil, 2003
Gráfico F-N
Ramal de distribuição de gás
1,0E-10
1,0E-9
1,0E-8
1,0E-7
1,0E-6
1,0E-5
1,0E-4
1,0E-3
1,0E-2
1,0 10,0 100,0 1000,0
Número de fatalidades
Freq
üênc
ia (/
ano)
Risco inaceitável
Risco aceitável
55
• RISCO INDIVIDUAL
O risco individual, que é definido pela equação 2.1, informa a probabilidade de um dano
particular (fatalidade, por exemplo) considerando-se a chance de ocorrência do acidente,
expressa através da sua freqüência de ocorrência. Portanto, seu valor não está limitado
entre zero e um e, assim sendo, não deve ser confundido com probabilidade.
A apresentação do risco individual se faz usualmente na forma de curvas de iso-risco, isto
é, o conjunto de pontos que possuem o mesmo valor do risco. Essas curvas possibilitam
visualizar a distribuição geográfica do risco em diferentes pontos nas vizinhanças da
instalação.
A figura 2.14 apresenta, como ilustração, algumas curvas de iso-risco.
FIGURA 2.14 – CURVA DE ISO-RISCO Fonte: Ref. [19]
56
Para a avaliação do Risco Individual e Social, existem os critérios de tolerabilidade que
definem níveis e ou intervalos de valores estipulados, no caso, pelo órgão ambiental ou
agências reguladoras, para decidir sobre a aceitabilidade ou não dos riscos existentes. A
seguir ilustraremos os critérios adotados pela FEEMA E CETESB.
FEEMA
Tolerabilidade dos Riscos
Instalações novas: os riscos proporcionados pela instalação serão considerados
toleráveis se:
-a curva de iso risco correspondente a 10-6 fatalidades por ano não envolver, parcial ou
totalmente, uma ocupação sensível.
-a curva de iso - risco correspondente a 10-5 fatalidades por ano não envolver, parcial ou
totalmente, ocupações não sensíveis.
-a curva de distribuição acumulada complementar, desenhada sobre o gráfico da curva F-
N, ficar abaixo ou, no máximo tangenciar a reta inferior do gráfico.
As atividades novas a serem instaladas em zona de uso estritamente industrial devem ter
a curva de iso - risco correspondente a 10-6 Fatalidades / ano contidas nessa zona.
57
Instalações existentes: os riscos proporcionados pela instalação serão considerados
toleráveis se:
-a curva de iso - risco correspondente a 10-5 fatalidades / ano não envolver parcial ou
totalmente uma ocupação sensível.
-a curva de iso -risco correspondente a 10-4 fatalidades / ano não envolver parcialmente
ou totalmente ocupações não sensíveis.
CETESB
Para risco individual foram estabelecidos os seguintes limites:
risco máximo tolerável 10-5 ano-1 ;
risco negligenciável 10-6 ano-1.
Para a aprovação do empreendimento, deverão ser atendidos os critérios de risco social e
individual conjuntamente, ou seja, as curvas de risco social e individual deverão estar
situadas na região negligenciável ou na região ALARP, isto é, tão pequeno quanto
razoavelmente praticável.
58
3 DESCRIÇÃO DA METODOLOGIA DE ANÁLISE DE RISCO AMBIENTAL
3.1 INTRODUÇÃO
A análise de risco ambiental [7] é um termo originalmente associado ao estudo dos riscos
toxicológicos a que os humanos estariam expostos devido à presença de substâncias
artificiais no ambiente. Entretanto, modernamente vem assumindo a conceituação dos
riscos que as atividades humanas impõem ao ambiente como um todo, incluindo-se aí os
riscos aos próprios seres humanos. Esta interpretação pressupõe uma visão mais ampla
da realidade, onde os humanos fazem parte do que se denomina ambiente, evitando a
tradicional cisão entre sociedade humana e natureza. Portanto, segundo o conceito acima
a análise de risco ambiental engloba tanto a análise de risco ecológica quanto a análise
de risco humano.
Como já falamos no capítulo anterior sobre a metodologia da Análise Quantitativa de
Riscos, que neste contexto também pode ser considerada como análise de risco
ambiental, visto que avalia danos ao ser humano também, aqui falaremos de outra análise
de risco, que é uma metodologia usada para avaliação dos riscos em sítios contaminados.
O principal objetivo desta avaliação de riscos é a avaliação dos efeitos adversos à saúde
humana e ao meio ambiente, com intuito de protegê-los. Um outro objetivo também é o de
diminuir os impactos decorrentes da limitação tecnológica e dos altos custos com
remediações, conseguidos através da revisão dos valores alvo de remediação a serem
atingidos, através da aplicação da avaliação de risco [28].
59
3.2 AVALIAÇÃO DE RISCO À SAÚDE HUMANA
A Agência de Proteção Ambiental dos Estados Unidos da América – USEPA, ou
simplesmente EPA, desenvolveu um documento, de fato um guia de procedimentos, com
o objetivo de avaliar os riscos à saúde humana em decorrência de liberações de
substâncias perigosas no meio ambiente.[7].
Os objetivos específicos deste documento são:
• prover uma análise dos riscos presentes e ajudar a determinar as necessidades para
ações no sítio contaminado;
• Prover uma base para determinar níveis das substâncias químicas que podem
permanecer no sítio sem oferecer riscos à saúde do público;
• Prover uma base para comparar potenciais impactos à saúde de diferentes
alternativas de remediação;
• Prover um processo consistente para avaliação e documentação das ameaças à
saúde pública nos sítios.
A parte A desse guia de procedimentos trata da avaliação de risco à saúde humana. Esta
avaliação de risco é, de fato, uma análise dos potencias efeitos adversos à saúde
(presente ou futuro) causado por liberações de substâncias perigosas num dado sítio e na
ausência de quaisquer ações para controlar ou mitigar tais liberações. A avaliação de
risco neste caso contribui para a caracterização e desenvolvimento subseqüente do sítio,
avaliação e seleção de alternativas de ações de respostas apropriadas.
Os resultados de uma avaliação de risco são usados para:
60
→ determinar a necessidade de ações de resposta adicional no sítio contaminado;
→ modificar os objetivos preliminares de remediação;
→ dar suporte às alternativas de remediação sem ação específica, quando apropriado;
→ documentar a intensidade do risco no sítio, bem como suas causas básicas.
Observa-se que as avaliações de risco são específicas para cada sítio e, portanto, podem
variar tanto nos detalhes quanto na extensão com que a análises qualitativa e quantitativa
são realizadas. Em linhas gerais tal Análise de Risco à Saúde Humana é composta de 4
etapas: coleta e análise de dados; avaliação de exposição; avaliação de toxicidade e
caracterização do risco. A seguir descreve-se brevemente cada uma das etapas.
COLETA E ANÁLISE DOS DADOS
Nesta etapa, relacionam-se e analisam-se os dados no sítio que são relevantes para a
avaliação da saúde humana e identificam-se as substâncias presentes no sítio que serão
o foco no processo de avaliação de risco.
AVALIAÇÃO DE EXPOSIÇÃO
Nesta etapa são estimadas as intensidades das exposições, reais e ou potenciais, a seres
humanos. Aqui, são avaliadas também a freqüência, a duração e as vias com que os
seres humanos estão potencialmente expostos. Ressalta-se que, com respeito ao
potencial de futuras exposições, o documento em questão fornece apenas uma estimativa
qualitativa da chance de tal exposição ocorrer.
61
Uma avaliação de exposição envolve também:
→ uma análise das condições de liberação do contaminante,
→ a identificação da população exposta,
→ a identificação de todas as vias potenciais de exposição;
→ a estimativa da concentração no ponto de exposição para uma via específica, baseado
tanto em dados de monitoramento ambiental quanto em resultados de modelagem;
→ estimativa do ingresso do contaminante para uma dada via de exposição.
Do ponto de vista prático, a determinação da fonte de liberação e em seguida a
caracterização das substâncias capazes de ocasionar os efeitos adversos é feita através
de amostragens de solo e água subterrânea, para posterior análise química, onde se
determinará a substância de interesse e sua concentração.
A caracterização da área é feita através de investigação ambiental detalhada do local,
consistindo das seguintes etapas:
1) Histórico do local onde o empreendimento encontra-se instalado ou atividades
realizadas anteriormente.
2) Descrição da área e do entorno
A descrição da área consiste em dizer qual é o seu uso, se é residencial, se é comercial,
se é área agrícola, etc. No caso de um empreendimento, dizer do que ele é composto, ex:
tanque de armazenamento, bomba, tubulação, caixa separadora, seu tipo de
pavimentação, se é concreto, suas condições, se é grama, terra batida, calçamento.
62
É importante caracterizar o seu entorno com relação à presença de residências, escolas,
igrejas, hospitais, dizendo a que distâncias se encontram da fonte, se usam água de poço
ou tratada, se possui corpo hídrico nos arredores. Pois esta caracterização vai ser de
grande importância na identificação das vias de exposição, que serão discutidas mais
adiante.
3) Caracterização dos riscos agudos presentes na área e seus arredores.
É feito através de medições de índice de explosividade (concentração de VOC capaz de
provocar uma explosão) na área estudada e determinação de fase livre, da substância de
interesse na água subterrânea.
4) Realização de sondagens e perfuração de poços
Para a medição de VOC (compostos orgânicos voláteis), realizam-se sondagens rasas
em torno da área, com a finalidade de elaborar um mapa de iso-concentração, que
delimitará a pluma de contaminação.
No caso das sondagens profundas, o objetivo é o de recolher amostras de solo para a
avaliação quanto à presença de indícios de contaminação e conhecimento de sua
litologia.
Além da coleta de solo contaminado, que será usado para determinar os compostos de
interesse presentes e que se constituem em fonte de contaminação, coleta-se também
uma amostra indeformada (é a amostra retirada e conservada de maneira a manter as
características originais do solo, como por exemplo: estrutura, textura, umidade natural,
63
composição, consistências naturais, etc.) de solo não contaminado, para a determinação
de alguns parâmetros físicos, que serão usados para alimentar os modelos de avaliação
de risco, e que são: densidade real dos grãos, densidade aparente, umidade, matéria
orgânica, porosidade total, etc.
A perfuração de poços é feita para amostragem de água subterrânea, com o intuito de
verificar possível contaminação, para medir o nível d’ água (NA) e medir a espessura de
produto em fase livre, se for o caso.
A partir das medidas dos níveis d’ água e das cotas dos poços obtidas durante o
nivelamento topográfico, é elaborado um mapa potenciométrico, para se determinar o
sentido do fluxo das águas subterrâneas e a determinação do gradiente hidráulico, para a
obtenção da velocidade de fluxo linear das águas subterrâneas.
A identificação dos cenários de exposição caracteriza as vias de exposição potenciais e
seus respectivos receptores, avaliando os riscos que a exposição ao meio apresenta.
Essa identificação das vias de exposição é definida de acordo com a caracterização da
área e de seu entorno.
Uma via de exposição potencial descreve o mecanismo através do qual o receptor é
exposto aos produtos químicos de interesse. Uma via de exposição completa inclui uma
fonte, um ponto de exposição, uma rota de exposição e possivelmente um meio de
transporte (se o ponto de exposição estiver distante da fonte).
A fonte é considerada como sendo o local da liberação. Pode ser classificada como
primária, que são as liberações em tanques, tubulações, equipamentos, etc, e como
64
fontes secundárias, que são o próprio solo superficial, sub - superficial e as águas
subterrâneas contaminados.
O contaminante pode atingir o receptor através do solo, ar e água contaminada por
diversas maneiras, que são as chamadas vias de exposição. A seguir encontram-se
alguns exemplos de vias de exposição:
• ingestão;
• inalação;
• contato dérmico.
A ingestão pode ser de água, solo, tubérculos, folhas e frutos cultivados na área ou fora.
No caso de ingestão de solo, se dá principalmente em crianças e trabalhadores de obra.
Já a inalação, pode se dar através de material particulado a partir do solo contaminado ou
de vapores desprendidos diretamente do solo ou água subterrânea contaminados, tanto
em área aberta, quanto em área fechada.
O contato dérmico se dá através do contato com o solo e água contaminados.
Após a identificação das diversas vias de exposição a que o receptor pode estar exposto,
a próxima etapa é a quantificação da exposição, que é a estimativa das conseqüências
para cada via de exposição.
65
ESTIMATIVA DAS CONSEQÜÊNCIAS
Consiste na quantificação de cada uma dessas vias de exposição a que um ser humano
pode estar exposto.
Essa quantificação leva em consideração a concentração do contaminante presente em
cada via e o tempo em que o indivíduo está exposto.
Os modelos usados para quantificação, diferem uns dos outros, com relação ao número
de vias de exposição, considerações quanto a receptores dentro e fora da área, modelos
de transporte, etc.
Esses modelos usam como parâmetros alguns dados específicos sobre a população para
o cálculo de sua exposição, como por exemplo: idade, peso corpóreo, quantidade de solo
ingerido, taxa de absorção dérmica, capacidade pulmonar, consumo de tubérculos, folhas
e frutos provenientes de áreas contaminadas, consumo de água, etc.
AVALIAÇÃO DE TOXICIDADE
Nesta etapa são considerados:
(1) os tipos de efeitos adversos à saúde associados com exposições às substâncias
químicas;
(2) relação entre a intensidade da exposição e dos efeitos adversos;
(3) incertezas associadas tais como o peso da evidência de uma particular substância
química carcinogênica em seres humanos.
66
Uma avaliação de toxicidade para os contaminantes identificados no sítio é realizada em
duas etapas: uma avaliação de perigos e uma avaliação do tipo dose-resposta.
A identificação de perigos é o processo através do qual se determina se a exposição a um
agente particular pode causar um aumento na incidência de um efeito adverso à saúde
(câncer, defeito de nascença, por exemplo). A identificação de perigos também inclui a
caracterização da natureza e intensidade da evidência da causa.
O segundo passo, a avaliação dose-resposta, é o processo que avalia quantitativamente
a informação da toxicidade e caracteriza a relação entre a dose administrada ou recebida
do contaminante e a incidência de efeitos adversos à saúde na população exposta. É a
partir desta relação quantitativa entre dose e resposta que os valores de toxicidade são
determinados e podem ser usados para estimar a incidência de efeitos adversos
ocorrendo em seres humanos para níveis diferentes de exposição.
A determinação dos parâmetros mencionados acima é importantíssima, pois serve para
alimentar os modelos de avaliação de risco.
CARACTERIZAÇÃO DO RISCO
Esta última etapa resume e combina os resultados das avaliações de exposição e
toxicidade para finalmente caracterizar o risco, tanto qualitativo quanto quantitativo.
Durante a caracterização do risco, a informação de toxicidade da substância química
específica é confrontada com os níveis medidos de exposição do contaminante, bem
67
como com os preditos por meio de modelagem, para então concluir se os níveis do
contaminante no presente ou no futuro são de preocupação potencial.
A EPA desenvolveu critérios para definir se os riscos calculados são aceitáveis ou não.
Segundo esta, um nível de risco aceitável para cada contaminante no solo é aquele no
qual existe um risco máximo de câncer de 10-6 (um caso adicional de câncer em cada 1
milhão de pessoas) para substâncias carcinogênicas, pressupondo que resultará num
risco combinado final, variando entre 10-4 e 10-6 .
Já para substâncias não carcinogênicas a EPA não usa uma abordagem probabilística
para estimar o potencial para efeitos não carcinogênicos à saúde. Ao invés disso tal
potencial é avaliado comparando-se um nível de exposição sobre um período de tempo
com uma dose de referência derivada para o mesmo período de tempo. A razão entre o
nível de exposição e a dose de referência é chamada de quociente de perigo.
Assume-se que existe um nível de exposição abaixo do qual é improvável que se observe
efeito adverso à saúde, mesmo para indivíduos muito sensíveis. Se o nível de exposição
ultrapassar este limiar, isto é o quociente de perigo for maior do que 1, deve-se haver
preocupação quanto a potencias efeitos adversos. Como regra, quanto maior for o
quociente de perigo, maior deverá ser a preocupação.
3.3 AVALIAÇÃO DE RISCO ECOLÓGICO
Em linhas gerais o processo de avaliação de risco ecológico desenvolvido pela EPA é
baseado em dois principais elementos [8, 11]:
68
→ Caracterização dos efeitos;
→ Caracterização da exposição.
Estes elementos definem o foco para a condução das três fases de uma avaliação de
risco ecológico: a formulação do problema, análise do problema e caracterização do risco.
Na formulação do problema, o propósito é articulado, o problema é definido, e são
traçadas estratégias para um planejamento e caracterização dos riscos. A formulação do
problema inclui a integração de informações disponíveis sobre as fontes, os agentes
estressores, os efeitos e as características do ecossistema e agentes receptores.
Durante a fase de análise, os dados são avaliados de forma a determinar como a
exposição aos agentes estressores pode ocorrer (caracterização da exposição) e, dado
que tal exposição ocorre, o potencial e os tipos de efeitos ecológicos que podem ser
esperados (caracterização dos efeitos ecológicos).
O primeiro passo na análise é determinar as intensidades e limitações dos dados sobre a
exposição, sobre os efeitos e sobre o ecossistema e os agentes receptores. Os dados são
então analisados de forma a caracterizar a natureza da exposição potencial ou real e as
respostas ecológicas sob as circunstâncias definidas no modelo conceitual. Os resultados
da análise nos fornecem dois tipos de informações: sobre a exposição e sobre os agentes
estressores.
Durante a fase de caracterização dos riscos, as informações sobre a exposição e as
informações resposta-agente estressor (que são do tipo dose-resposta) são integradas no
processo de estimativa do risco.
69
A fase de caracterização do risco inclui um resumo das hipóteses, das incertezas
assumidas e do grau de profundidade e limitação da análise. O produto final é uma
descrição do risco na qual os resultados da integração são apresentados incluindo uma
interpretação das adversidades ecológicas e descrição das incertezas assumidas.
3.4 TRANSPORTE DE CONTAMINANTES NO SOLO
Uma das etapas numa análise de risco, independente da metodologia a ser seguida, é
certamente aquela que se refere à avaliação da evolução de uma pluma de contaminação
que foi estabelecida. Cada modelo de avaliação de risco tem o seu próprio módulo de
transporte e, cada um deles é desenvolvido segundo as habilidades esperadas no cálculo
da dispersão.
Os modelos de transporte de produtos químicos através do solo, empregados no cálculo
da dispersão de contaminantes nos modelos de avaliação de risco, variam desde modelos
simples de transporte unidimensional de solutos que possuem solução analítica, até
modelos complexos, tridimensionais que descrevem o transporte de fases líquidas não
aquosas (NAPLs) e cujas soluções envolvem análise por elementos finitos.
Em linhas gerais os modelos de transporte e transformação de produtos químicos
englobam os seguintes elementos:
(a) a lei de conservação da massa das espécies químicas envolvidas;
(b) a separação da massa nas diversas fases que requerem descrição separada;
(c) leis de fluxo para cada fase móvel, descrevendo a taxa de transporte do composto
químico por unidade de área em cada fase;
(d) leis de transferência interfásica de massa descrevendo o movimento entre as fases;
70
(e) um termo de reação que descreve a taxa de transformação de uma substância
química em outra por unidade de volume.
Os elementos acima são caracterizados por expressões, baseadas em hipóteses
específicas, que são combinadas às equações de transporte para se calcular os fluxos e
as concentrações das fases, como função do espaço e do tempo
O ponto de partida para o desenvolvimento de modelos que descrevem o transporte e a
transformação de espécies químicas no solo é o princípio de conservação da massa. Esta
lei é aplicada à massa de um elemento químico num volume V arbitrário do solo. Em
linhas gerais esta lei natural afirma que se a massa de uma dada espécie química mudou
de um certo valor, num dado volume, é porque ou saiu ou entrou (através da superfície
que limita este volume) a mesma quantidade, ou ainda a referida quantidade desta
espécie química se transformou (quimicamente) em outra. Pode-se escrever esta idéia
como:
Taxa de variação da massa em V = (fluxo de massa entrando) - (fluxo de massa
saindo) – (taxa de transformação química da espécie considerada). (3.1)
Em símbolos, a versão unidimensional da equação acima se escreve como:
0=+∂∂
+∂
∂s
srt r
zJ
tC
(3.2)
onde Js é o fluxo mássico total da espécie química considerada, rs é a taxa de
transformação da espécie química considerada, expressa como taxa de variação da
71
massa do composto químico por unidade de volume e Crt é a concentração da espécie
química considerada no solo (massa da espécie química por unidade de volume).
As leis da física, da química e até mesmo da biologia aplicadas a cada contexto particular
fornecem representações para os fluxos mássicos e as taxas de transformações. Quando
elas são combinadas na equação 3.1, os resultados são as equações de transporte e as
transformação presentes nos modelos discutidos acima.
Um exemplo de ferramenta computacional comumente empregada nos cálculos de fluxo e
transporte de contaminantes (através dos seus vários módulos) e que utiliza análise por
diferenças finitas é o Visual MODFLOW [29]. Os elementos básicos deste programa são:
→ Modelo Modular, em diferenças finitas, do fluxo tridimensional em águas subterrâneas;
→ Aplicado apenas para meios porosos, fluxo na zona saturada, e fluidos com
temperatura e densidade uniformes;
→ Resolve as Equações Diferenciais Parciais de Fluxo (saída = carga hidráulica em cada
célula);
→ As Equações de Transporte de Solutos são resolvidas pelo módulo acoplado MT3D, ou
outros módulos compatíveis (saída = concentração do soluto em cada célula).
Há outros módulos disponíveis como PEST (calibração automática), MODPATH (trajetória
de partículas), RT3D (transporte reativo de solutos), entre outros.
72
O exemplo a seguir ilustra a aplicação da ferramenta computacional comercial “Visual
Modflow” ao seguinte problema:
Uma pluma de querosene de aviação (JP-4) migrando a partir da área de abastecimento,
em direção ao rio situado a sul do aeroporto. A pluma se move em direção a uma zona de
descontinuidade do aquitardo (formação geológica, semi-permeável, que transmite água
muito lentamente, comparado ao aquífero), e possivelmente passará por zona de poços
de abastecimento.
FIGURA 3.1 – RESULTADO DA DISPERSÃO DA PLUMA DE CONTAMINANTE
Fonte: ENSR International Brasil
Área de abastecimento (área fonte)
Representação do sentido de fluxo subterrâneo
Poços de abastecimento
Rio
Zona de descontinuidade do aquitardo
Poços de monitoramento
73
3.5 METODOLOGIAS USUALMENTE EMPREGADAS
Algumas metodologias são usadas para o estudo de avaliação de risco para áreas
contaminadas, discutiremos apenas algumas mais conhecidas, que são: Ação Corretiva
Baseada em Risco – RBCA, C-Soil (metodologia Holandesa) e SoilRisk. O RBCA e
SoilRisk foram desenvolvidos em acordo com os guias de procedimentos criados pela
EPA [7, 8, 11].
O RBCA é uma metodologia bem conhecida, talvez a mais utilizada, foi desenvolvida pela
ASTM (American Society for Testing and Materials) em 1995, [30], e aborda
especificamente a avaliação de riscos para hidrocarbonetos derivados de petróleo. Essa
metodologia consiste num guia que descreve uma seqüência lógica de ações e decisões
a serem tomadas desde a suspeita de contaminação até o alcance das metas de
remediação, com o intuito de proteger a saúde humana e o meio ambiente. Mais tarde em
1998 a ASTM expandiu essa metodologia para outros compostos, o que chamou de
“Chemical Release”.
Uma metodologia (Holandesa) também muito importante para a avaliação de riscos é o
modelo matemático C-Soil, desenvolvido pelo Instituto Nacional de Saúde Humana e Meio
Ambiente da Holanda (RIVM), que e foi usado pela CETESB, como ferramenta para
obtenção dos seus valores de intervenção com base na exposição humana durante a vida
toda, para períodos considerando adultos e crianças.
Um outro modelo integrado para avaliação de risco é o modelo SoilRisk desenvolvido por
Paula A.Labieniec, David A. DzombaK e Robert L. Siegrist e apresentado na referência
[31].
74
As diferentes metodologias disponíveis para avaliação de risco são similares no que diz
respeito à necessidade de dados sobre exposição da população afetada e sobre o efeito
dos contaminantes nesta população ou outros organismos indicadores. Essas
metodologias entretanto, diferem em seus critérios específicos para definir os diferentes
cenários de uso e ocupação do solo e vias de exposição [32]:
• Holanda: multifuncionalidade do uso do solo (agricultura, ecologia, transporte e
suprimento de água potável, etc);
• Alemanha: parques infantis, áreas residenciais, parques recreacionais e áreas
industriais/comerciais;
• Inglaterra: residencial e parques públicos;
• Canadá: área agrícola, residencial e industrial;
• Estados Unidos: área agrícola, residencial e industrial;
• Estados Unidos: residencial e industrial.
Descreve-se a seguir algumas dessas metodologias.
Metodologia Ação Corretiva Baseada em Risco – RBCA [30]
Como já dito anteriormente, essa metodologia foi elaborada pela ASTM (Estados Unidos)
em 1995 e consiste num guia para ações corretivas baseadas em risco. Esse processo
consiste numa tomada de decisão para uma avaliação e resposta a um vazamento de
petróleo com o objetivo de proteger a saúde humana e o meio ambiente.
75
A avaliação de risco ecológico nesta metodologia é abordada de forma qualitativa, isto é,
uma avaliação não numérica dos efeitos dos compostos químicos de interesse em plantas
e animais que não sejam pessoas ou espécies domésticas.
Esta metodologia considera as seguintes vias de exposição:
• Ingestão: água e solo contaminados;
• Inalação: de voláteis e material particulado;
• contato dérmico: proveniente de contato com solo e água contaminados;
De acordo com esta metodologia, a primeira ação a ser tomada é a remoção da fonte de
contaminação:
As etapas a serem seguidas no desenvolvimento da metodologia são:
• Investigação da área;
• Classificação da área em função da urgência inicial;
• Tomada de ação para uma resposta inicial apropriada para classificação da área
selecionada;
• Identificação dos compostos de interesse na área e comparação com os valores de
Níveis Gerais de Avaliação Baseados em Risco (RBSL);
• Decidir se é necessária a avaliação para um nível mais elevado, ou se se
implementam as ações interinas de remediação para o nível 1;
• Coleta de informações específicas da área, desenvolvendo o nível 2,
• Comparar se a concentração dos compostos de interesse na área está em
conformidade com os Níveis Alvo Específicos da Área (SSTL);
76
• Se as concentrações de interesse na área forem superiores aos SSTL, decidir onde é
justificável avaliar para um grau mais elevado, se implementam ações interinas de
remedição ou se usam os valores orientadores denominados SSTL, como valores para
remediação.
• Se for justificada a necessidade de uma avaliação mais específica da área para nível
3, coletam-se dados ainda mais específicos do local e da população exposta. Essa
avaliação, denominada tier 3 (nível), é mais cara e mais complexa, pois envolve uso de
modelos mais sofisticados para transporte de massa e análise probabilística.
Estas etapas estão bem definidas no fluxograma ilustrado na figura 3.2
77
FIGURA 3.2 – FLUXOGRAMA DE AÇÕES CORRETIVAS BASEADAS EM RISCOS
Fonte: Ref. [30] A classificação da área e Ação de Resposta Inicial é feita de acordo com a tabela 3.1e a
avaliação dos cenários acidentais, está expressa na figura 3.3.
78
TABELA 3.1 – CLASSIFICAÇÕES DE ÁREA E AÇÕES DE RESPOSTA INICIAL
Fonte: Ref. [30]
79
FIGURA 3.3 - FLUXOGRAMA DE AVALIAÇÃO DE CENÁRIOS DE EXPOSIÇÃO
Fonte: Ref. [30]
METODOLOGIA C-SOIL
Como já dito anteriormente, o C-Soil é um modelo desenvolvido pelo Instituto Nacional de
Saúde Humana da Holanda (RIVM), com o objetivo de quantificar o risco referente à
exposição humana, quando em contato com substâncias tóxicas.
80
Este modelo simula o risco a que uma população está sujeita quando exposta a um
contaminante de interesse presente no solo e na água subterrânea, consistindo de
fórmulas que descrevem as relações entre os contaminantes nas fases do solo (sólida,
líquida e gasosa) e o aporte dos mesmos aos seres humanos por diversas vias de
exposição, viabilizando a comparação entre o ingresso total estimado e o nível de
exposição máximo tolerável [32].
As etapas desta metodologia encontram-se descritas no fluxograma ilustrado na figura
3.4.
FIGURA 3.4 – FLUXOGRAMA DESCREVENDO OS PASSOS PARA O CÁLCULO DO
RISCO UTILIZANDO O MODELO C-SOIL.
Fonte: Ref. [32]
81
Para o modelo C-Soil, o risco máximo tolerável para os compostos não carcinogênicos é
dado por um quociente de risco igual a 1, ou seja, o ingresso diário de um contaminante
no organismo exposto pode ser no máximo igual ao ingresso diário tolerável (tolerable
daily intake- TDI).
No caso do TDI não ser conhecido para certas substâncias, o modelo utiliza o ingresso
diário aceitável (determinado para substâncias presentes em aditivos alimentares, pela
Organização Mundial da Saúde – OMS) ou a dose referência (utilizado pela EPA). Já para
contaminações do ar em ambientes fechados sobre locais contaminados, o modelo
compara essa concentração com limites para a segurança ocupacional.
Para as substâncias carcinogênicas o modelo C-Soil considera como limite máximo
tolerável o valor 10-4 para o somatório de todas as vias de exposição.
Os modelos matemáticos de avaliação de risco são usados também para a elaboração de
listas de valores orientados para proteção de solos e águas subterrâneas, sendo uma
importante ferramenta no gerenciamento de áreas contaminadas. Para o Estado de São
Paulo, a CETESB, para a elaboração de sua lista, utilizou o modelo matemático de
avaliação de risco C-Soil.
Na elaboração desta lista, foram propostos 3 níveis de valores orientadores: valor de
referência, valor de alerta e valor de intervenção.
O valor de referência de qualidade indica o limite de qualidade para um solo considerado
limpo e a qualidade natural das águas subterrâneas.
82
O valor de alerta indica uma possível alteração da qualidade natural dos solos e águas
subterrâneas.
Já o valor de intervenção, é o limite de qualidade acima do qual existe o risco à saúde
humana e ao meio ambiente, havendo a necessidade de uma intervenção imediata na
área. Esses valores são calculados a partir dos modelos para avaliação de risco,
considerando cenários hipotéticos, relacionados ao cotidiano do ser humano, como por
exemplo: quantidade ingerida de solo, água,vegetais, ar inalado, tempo de permanência
no local, etc.
METODOLOGIA SOILRISK [31].
O SoilRisk é um modelo integrado para a avaliação de risco carcinogênico para baixos
níveis de contaminação orgânica no solo. Usa um modelo analítico para descrever o
transporte e destino do contaminante orgânico em solo não saturado que contempla os
seguintes mecanismos de perda e retardo: degradação de primeira ordem, volatilização
na superfície do solo, e lixiviação para a zona saturada. O módulo da zona não saturada é
acoplado aos seguintes módulos: módulo de que descreve a dispersão e diluição no ar;
módulo que descreve o transporte na zona saturada, e os módulos de geração de
particulados, que possibilita a estimativa de concentrações médias de longa duração do
contaminante no ar. O fluxograma apresentado na figura 3.5 ilustra a integração entre os
diversos módulos do modelo.
83
FIGURA 3.5 – INTEGRAÇÃO ENTRE OS DIVERSOS MÓDULOS DO MODELO
SOILRISK
Fonte: Ref. [31] O SoilRisk permite avaliar o risco de um indivíduo contrair câncer, como resultado de uma
concentração específica de contaminante no solo, ou por outro lado o nível do
contaminante no solo atingir um nível específico de risco.
Dsg
Dar
Dsi
Dpele
Dpó
Dpw
DncExposição
Csg
CncCbaMódulo
Rsg
Rar
Rsi
Rpele
Rpó
Rpw
RncMódulo Risco
Cgw
Cpó
CarMódulo da zona não saturada
Módulo dispersão /diluição no ar
Módulo de particulado
Módulo da zona saturada
CT
Dsg
Dar
Dsi
Dpele
Dpó
Dpw
DncExposição
Csg
CncCbaMódulo
Rsg
Rar
Rsi
Rpele
Rpó
Rpw
RncMódulo Risco
Cgw
Cpó
CarMódulo da zona não saturada
Módulo dispersão /diluição no ar
Módulo de particulado
Módulo da zona saturada
CT
84
4 CONCEITOS BÁSICOS EM ECOLOGIA
4.1 INTRODUÇÃO
A dinâmica de populações é um assunto de grande interesse e importância e tem sido
estudado ao longo de décadas [33]. Ela trata da interação dos organismos biológicos [34].
Os organismos interagem entre si, interagem com organismos de outras espécies e além
disso interagem com o seu ambiente não vivo (abiótico). Tanto os organismos biológicos
quanto o ambiente abiótico, cada um deles, influencia as propriedades do outro e cada
um é necessário para a manutenção da vida.
Uma população é uma entidade em mudança, isto é, um sistema dinâmico do ponto de
vista da matemática. Mesmo quando a comunidade e o ecossistema parecem não mudar,
a densidade, a natalidade, a sobrevivência, a estrutura etária, a taxa de crescimento e
outros atributos das populações componentes geralmente flutuam à medida que as
espécies se ajustam constantemente às estações, as forças físicas e químicas e umas às
outras.
Embora as forças físicas e químicas ajam como funções motrizes primárias, os
organismos biológicos não se adaptam simplesmente de forma passiva a estas forças,
mas sim modificam, mudam e regulam ativamente o ambiente físico dentro dos limites
impostos pelas leis naturais que determinam a transformação de energia e a ciclagem de
materiais, isto é, o movimento de elementos químicos e compostos inorgânicos que são
essenciais à vida e que tendem a circular na biosfera em vias características, do ambiente
aos organismos e destes, novamente, ao ambiente.
85
A interação entre os sistemas biológicos e o ambiente determina o curso da seleção
natural e, portanto, não apenas a forma como os organismos individuais otimizam a sua
sobrevivência, mas também a maneira pela qual os ecossistemas, como um todo, se
modificaram e estão se modificando ao longo do tempo evolutivo.
O estudo da dinâmica de populações permite também a abordagem de uma grande
variedade de problemas práticos como, por exemplo, o estudo da propagação de vírus ou
outras doenças sobre uma população hospedeira, a determinação de estratégias para a
eliminação de pestes ou ainda a elaboração de estratégias para a proteção de espécies
ameaçadas de extinção, bem como torna possível também a investigação das
conseqüências de uma perturbação antropogênica crônica (persistente ou continuada)
causada, por exemplo, por episódios de poluição. Desta forma, o estudo da dinâmica da
evolução das populações pode ser importante para determinarmos se uma dada
população vai se extinguir, ou ainda melhor, as condições que conduzam a ela, ou
mesmo, as condições necessárias à proteção da espécie, quando for o interesse.
No estudo de populações, particularmente de sua dinâmica, os interesses estão nos
mecanismos que governam a evolução de uma dada população e a velocidade com a
qual esta população está mudando.
4.2 ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS EM ECOLOGIA
A ecologia é a ciência que estuda os processos e as interações de todos os seres vivos
entre si e destes com os aspectos morfológicos, químicos e físicos do ambiente, incluindo
os aspectos humanos que interferem e interagem com os sistemas naturais do planeta.
86
Em outras palavras é o estudo do funcionamento do sistema natural como um todo, e das
relações de todos os organismos vivendo no seu interior[33 – 38].
Um conceito muito importante na ecologia é o conceito de sistema ecológico ou
ecossistema. O ecossistema é qualquer unidade que abranja todos os organismos que
funcionam em conjunto (a comunidade biótica) numa dada área, interagindo com o
ambiente físico de tal forma que um fluxo de energia produza estruturas bióticas
claramente definidas e uma ciclagem de materiais entre as partes vivas e não vivas.
Assim, um ecossistema é um sistema aberto onde se estabelece um fluxo constante de
energia e matéria entre ele e o ambiente externo. É graças a estes fluxos que o
ecossistema consegue criar e manter um alto grau de ordem interna, ou uma condição de
baixa entropia (pequena quantidade de desordem ou de energia não disponível num
sistema). O mecanismo através do qual o ecossistema alcança uma baixa entropia é
através de dissipação contínua e eficiente de energia de alta utilidade (por exemplo, luz
ou alimento) resultando em energia de baixa utilidade (por exemplo, calor). A Figura 4.1
ilustra um ecossistema como um sistema aberto trocando energia e matéria com o
exterior.
87
FIGURA 4.1 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DO ECOSSISTEMA E O MEIO
EXTERIOR.
Fonte: FONTE: REF.[33]
Um aspecto importante dos ecossistemas é a sua estabilidade. Existem duas formas de
estabilidade, a estabilidade de resistência que se define como a capacidade de se manter
estável diante do estresse e a estabilidade de elasticidade, que é a capacidade de se
recuperar rapidamente. O grau de estabilidade atingido por um ecossistema varia muito,
dependendo do rigor do ambiente externo além da eficiência dos controles internos.
Um outro conceito de grande importância no estudo de ecossistemas é o conceito de
fatores limitantes. A presença e o sucesso de um organismo ou de um grupo de
organismos depende de um conjunto de condições. Por definição, uma condição que se
aproxime de ou exceda os limites de tolerância de um dado organismo ou um grupo de
88
organismos, é chamada de condição limitante ou fator limitante. Em condições de estado
estacionário ou constante (um estado do ecossistema para o qual as variáveis
macroscópicas que o descrevem não muda com o tempo), o material essencial que está
disponível em quantidades que mais se aproximam da necessidade mínima tende a ser o
fator limitante.
Um fator limitante não está associado apenas com a insuficiência de algum nutriente, mas
pode estar associado também ao excesso não apenas de matéria (nutrientes e água),
mas também de energia (luz e calor). Dessa forma, os organismos apresentam um
mínimo e um máximo ecológicos que representam os seus limites de tolerância.
Para ilustrar o conceito de fator limitante, apresenta-se a seguir dois exemplos. O primeiro
trata de ecossistemas que se desenvolvem em formações geológicas onde o solo é
serpentino [33], isto é, derivado de rochas de silicatos de magnésio e de ferro, que são
pobres em cálcio, fósforo e nitrogênio e, por outro lado, são ricos em magnésio, cromo e
níquel, sendo que as concentrações de cromo e níquel se aproximam de níveis tóxicos
aos organismos. Nestas condições, a vegetação que cresce possui uma aparência
caracteristicamente mirrada. Neste exemplo nota-se a presença de dois fatores limitantes;
de um lado a escassez de nutrientes principais (cálcio, fósforo e nitrogênio), e do outro a
abundância de metais tóxicos. Entretanto, apesar da dupla limitação, uma comunidade
biótica consegue se desenvolver ainda que num nível reduzido de estrutura e
produtividade comunitárias.
Como segundo exemplo que ilustra o conceito e a importância dos fatores limitantes no
desenvolvimento de ecossistemas, apresenta-se aquele estudado na referência [33] e que
trata da importância da interação dos três fatores limitantes temperatura, salinidade e a
89
presença de cádmio (substância especialmente tóxica aos crustáceos), na percentagem
de mortalidade de formas larvares (zoés) de caranguejos chama-maré (Uca). A figura 4.2
ilustra a interação de temperatura, salinidade e cádmio (uma substância tóxica) sobre a
mortalidade de larvas de caranguejo. Na figura 4.2 (A), apresenta-se a estimativa da
percentagem de mortalidade de zoés do primeiro estágio do caranguejo chama-maré
(Uca pugilator), baseada em uma superfície de resposta ajustada à mortalidade
observada sob 13 combinações de salinidade e temperatura. Na figura 4.2 (B), os novos
resultados apresentados se referem à adição de 1 ppb de cádmio.
FIGURA 4.2 A e B – EFEITO DA TEMPERATURA, SALINIDADE E CÁDMIO SOBRE A
MORTALIDADE DE LARVAS DE CARANGUEJO
FONTE: REF.[33]
90
Como se observa na figura 4.2, a mortalidade larvar é mais baixa com temperaturas no
intervalo de 25 ± 50 C e salinidade no intervalo 30 ± 5%. Quando se acrescenta ao
ambiente uma quantidade muito pequena de cádmio, nota-se uma alteração no padrão de
interação temperatura-salinidade. A zona ótima é reduzida (o círculo central de
mortalidade mais baixa) e a tolerância à salinidade é estreitada. Nota-se também que a
faixa de temperaturas toleradas aumenta levemente (veja que o círculo de 50% de
mortalidade estende-se até uma temperatura que é vários graus inferior quando se
adiciona o cádmio)
De interesse particular nesta dissertação estão aqueles fatores limitantes impostos pelas
atividades antropogênicas onde se encontram principalmente os resíduos industriais
tóxicos.
Os ecossistemas naturais apresentam considerável estabilidade (na forma de resistência
ou plasticidade) quando sujeitos a perturbações periódicas ou agudas, provavelmente
porque estão adaptados a ela. De fato, alguns organismos precisam de perturbação
estocástica (aleatória), como incêndios ou tempestades, para a sua persistência a longo
prazo. Assim sendo, os ecossistemas podem apresentar boa recuperação quando
submetidos a perturbações antropogênicas periódicas, tais como um episódio de
poluição.
A situação preocupante é aquela que se refere às interferências crônicas, isto é, aquelas
persistentes ou continuadas. Neste caso, como os organismos não possuem uma história
evolutiva de adaptação, a ação antropogênica, principalmente no caso de substâncias
químicas industriais, podem provocar efeitos pronunciados e prolongados no
91
ecossistema, se constituindo assim em novos fatores limitantes, que podem comprometer
a sua própria existência.
Na década de 80, somente nos EUA havia quase 50.000 substâncias químicas no
mercado, das quais quase 35.000 são reconhecidas pela agência de proteção ambiental
americana como potencialmente perigosas para a saúde humana. Também de particular
preocupação para a área de geotecnia ambiental destaca-se que um dos principais
perigos de desastre potencial é a contaminação de águas subterrâneas e dos aqüíferos
profundos, dada a grande dificuldade na sua purificação, pois que não estão expostas à
luz solar, a correntes fortes, nem outros processos naturais de purificação que limpam as
águas superficiais.
Um dos objetivos desta dissertação é mostrar como a modelagem matemática dos
mecanismos responsáveis pela evolução dos ecossistemas pode ser usada para avaliar
(calcular) seus estados subseqüentes, quando os ecossistemas estão submetidos a
certas condições ou fatores limitantes. Este assunto é o que se entende por dinâmica de
populações. Antes de discutir os modelos de dinâmica populacional é necessário
apresentar um conjunto de conceitos que estão relacionados com o tema. O primeiro
deles é certamente o próprio conceito de população.
Uma população pode ser definida como um conjunto de indivíduos, ou de forma mais
ampla organismos, da mesma espécie que ocupam um espaço determinado e funciona
como parte de uma comunidade biótica. A comunidade biótica por sua vez pode ser
pensada como um conjunto de populações que funcionam como uma unidade
integradora, através de transformações metabólicas numa dada área de habitat físico.
92
Uma população possui características próprias de um grupo de indivíduos como, por
exemplo, a densidade, a taxa de nascimento (a natalidade), a taxa de óbitos
(mortalidade), a distribuição etária, o potencial biótico, a dispersão, a forma de
crescimento entre outras.
Por outro lado, as populações possuem também características genéticas diretamente
relacionadas com sua ecologia como, por exemplo, a capacidade de adaptação, o fitness
reprodutivo (darwiniano) e a persistência, isto é, a probabilidade de deixar descendentes
ao longo de grandes períodos de tempo.
Um parâmetro importante na caracterização de uma dada população é a sua densidade.
A densidade populacional expressa o tamanho da população em relação a alguma
unidade de espaço, por exemplo, é o número de indivíduos ou biomassa da população,
por unidade de área ou de volume. Assim, por exemplo, a densidade de uma população
de árvores de uma dada espécie é expressa pelo número de árvores por hectare, da
mesma forma que podemos expressar a densidade de uma dada população de peixes
pelo número de indivíduos por metro cúbico de água.
Em ecologia é comum se distinguir entre a densidade bruta, que é o número (ou
biomassa) por unidade do espaço total, e a densidade específica ou ecológica, que é o
número (ou biomassa) por unidade do espaço do habitat (isto é a área ou o volume
disponível que realmente pode ser colonizada pela população).
No estudo da dinâmica de populações, um conjunto de parâmetros muito importantes que
permite avaliar se uma dada população está de fato aumentando ou diminuindo são os
índices de abundância relativa. Estes índices podem ser relativos ao tempo, neste caso
93
expressam o número de indivíduos observados por unidade de tempo, por exemplo, o
número de aves observadas por hora. Estes índices podem também expressar a
freqüência de ocorrência de uma dada espécie em certas áreas, por exemplo, a
porcentagem de áreas de amostra ocupada por uma espécie.
Para caracterizar uma população dois conceitos muito importantes são os conceitos de
natalidade e de mortalidade.
A natalidade se define como a capacidade de uma dada população aumentar. Associado
a este conceito está o de taxa de natalidade, que é equivalente à taxa de nascimento na
terminologia do estudo da população humana, isto é, na demografia. O termo taxa de
natalidade é um termo mais amplo que engloba a produção de novos indivíduos de
qualquer organismo, seja qual for o processo: nascimento, eclosão, germinação ou
divisão.
Ainda sobre o conceito de natalidade em ecologia utilizam-se os conceitos de natalidade
máxima e natalidade ecológica ou realizada. A natalidade máxima, também denominada
natalidade fisiológica, é a produção máxima teórica de novos indivíduos sob condições
ideais, ou seja, na ausência de fatores ecológicos limitantes, e limitada apenas por fatores
fisiológicos. Nestas condições, a natalidade máxima é constante, para uma dada
população.
Por outro lado, a natalidade ecológica ou realizada, ou simplesmente natalidade, refere-se
ao aumento populacional sob condições reais ou específicas do ambiente. Ela não é
constante para uma dada população, mas sim depende do tamanho e da composição
etária da população, bem como depende das condições do ambiente físico. Assim, se
94
uma certa espécie de pássaro coloca 510 ovos, mas apenas 256 sobrevivem até que os
filhotes se emplumem, a natalidade máxima é 510 e a realizada é 256 (52% do máximo
teórico)
Uma forma conveniente de se expressar a natalidade é através da taxa de natalidade
absoluta ou bruta definida como a razão entre o número de novos indivíduos produzidos e
o tempo gasto para tal. Uma outra maneira é através da taxa de natalidade específica
definida como o número de novos indivíduos produzidos por unidade de tempo, por
unidade de população. Ou ainda, a taxa de natalidade específica é a razão entre a taxa
de natalidade bruta e a população no início das considerações. De fato, o denominador
(população inicial), pode ser também uma parte específica dela, por exemplo, o número
de fêmeas em idade reprodutiva. Dessa forma, se uma população de 50 protozoários,
num tanque, aumenta em uma hora para 150 protozoários, sua taxa de natalidade bruta é
de 100 protozoários por hora e a taxa de natalidade específica é de 2 protozoários por
hora.
O outro conceito fundamental na caracterização de uma população é o da mortalidade. A
mortalidade se define como o número de indivíduos que morrem num dado período
(óbitos por unidade de tempo, no caso da demografia humana). Assim como no caso da
natalidade, podemos expressá-la também como a taxa específica em termos da
população total ou de qualquer parte desta. A mortalidade ecológica ou realizada é a
perda de indivíduos sob uma dada condição ambiental e, da mesma forma que a
natalidade ecológica, não é uma constante, mas varia com as condições populacionais e
ambientais. A mortalidade mínima teórica representa a perda sob condições ideais, ou
limitada apenas pela fisiologia, e é constante para uma dada população. Uma muito
usada em ecologia e que está associada à taxa mortalidade é a taxa de sobrevivência.
95
Elas são de fato complementares, na linguagem da teoria de conjuntos. Assim se M
representa a taxa de mortalidade, a taxa de sobrevivência será 1-M.
4.3 MODELOS DE DINÂMICA DE POPULAÇÕES
Os ecossistemas são sistemas abertos como já foi discutido anteriormente. Dessa forma
as populações que constituem um dado ecossistema também o são e, portanto trocam
energia e matéria com o meio exterior. Desta forma, a construção de modelos que
descrevem a dinâmica da evolução de uma dada população requer conhecimento sobre
as interações entre: (a) os componentes do sistema, isto é, os organismos que compõem
a população e (b) o sistema e o meio exterior [33, 34].
O meio exterior se comunica com o sistema através de fluxos de energia e matéria que se
estabelecem através das suas fronteiras. Assim, do ponto de vista da modelagem
matemática, a influência do meio exterior sobre a população se manifesta nas condições
de contorno que devem ser impostas à população nas fronteiras do sistema ou através de
vínculos que intervêm explicitamente nas equações que descrevem a dinâmica da sua
evolução.
Focalizando primeiramente a atenção no processo dinâmico que ocorre no interior do
sistema pode-se dizer que, como regra geral, os indivíduos das populações estão sujeitos
a processos de várias naturezas tais como de origem genética, processos que envolvem
competição, processos regulatórios e processos de comunicação.
Os processos de origem genética são caracterizados pelo fato dos organismos que
constituem as populações serem seres vivos e como tal se reproduzirem a uma certa taxa
96
e morrerem a uma outra taxa. Além disso, eles estão sujeitos a mutações que, de tempos
em tempos, podem mudar a natureza do sistema de forma imprevisível.
Quanto aos processos envolvendo competição, estes, muito freqüentemente, surgem do
fato de que num meio onde a quantidade de recursos é limitada, o crescimento de um
organismo, com freqüência, acontece à custa de outros. É sabido que em populações
humanas ou animais em geral isto resulta numa saturação do crescimento. A competição
pode envolver interações diretas entre indivíduos da mesma espécie, tais como predação
e agressão. Matematicamente, todos os tipos de competição dão origem a contribuições
não lineares nas equações que descrevem a dinâmica de tais populações.
Os processos regulatórios, por suas vez, asseguram a coordenação das atividades das
populações no espaço e no tempo. Eles dão origem à realimentação, isto é, interações
não lineares, no sentido de que eles favorecem direta ou indiretamente o crescimento de
certas partes da população que são necessárias à sobrevivência de toda população.
Como exemplo deste processo podemos citar a formação de soldados em sociedade de
insetos.
Finalmente, através dos processos de comunicação as populações se comunicam entre
áreas vizinhas ou mesmo áreas distantes. Os três processos anteriores são locais, isto é,
acontecem em qualquer área ou volume pequenos no sistema. Os processos de
comunicação, por outro lado, envolvem transferência de informação (comunicação) entre
áreas vizinhas, mas também entre áreas distantes. A dispersão espacial ou migração são
exemplos de meios de comunicação [34]. Em sociedades de insetos a comunicação pode
se estabelecer através de agentes químicos tais como os feromônios.
97
Focalizando agora a atenção nos vínculos que agem sobre o sistema, pode-se observar
que um ecossistema se comunica com o meio exterior através de uma superfície de
separação. Em geral, as condições que prevalecem no meio exterior não são idênticas
àquelas que existem no interior da superfície que limita o ecossistema. Em particular, são
diferentes os números de indivíduos de uma dada espécie dentro e fora do ecossistema.
Da mesma forma, também são diferentes as energias por unidade de volume ou por
unidade de área. Essas diferenças são sentidas pelo sistema como imposições –
vínculos, matematicamente falando, que induzem fluxos de matéria e energia através da
superfície limítrofe. Dois exemplos de interação entre o sistema e o meio exterior são: (a)
a biosfera como um todo que está sujeita ao fluxo de energia solar e (b) uma sociedade
que é relativamente avançada graças às trocas de energia e informação com as
vizinhanças.
Para se determinar a taxa de crescimento populacional que descreve os processos acima
mencionados vamos considerar inicialmente uma única espécie cujo número de
indivíduos é N, num ambiente ilimitado, isto é, onde não existem efeitos restritivos ao
desenvolvimento populacional devido ao espaço, à quantidade de alimentos ou mesmo a
competições e/ou comportamento predatório devido a outros organismos. Nestas
condições, a taxa específica de crescimento (a taxa de crescimento populacional por
indivíduo) torna-se constante e máxima para as condições microclimáticas existentes e é
um parâmetro intrínseco característico desta população que informa a sua capacidade de
crescer. O valor da taxa de crescimento sob estas condições caracteriza uma
determinada estrutura etária populacional (a distribuição etária, importante característica
das populações, é uma medida das proporções entre os seus vários grupos etários).
98
Representando por b o valor desta taxa, nas condições acima ela é dada pela lei
malthusiana de crescimento, isto é:
bNdt
dN= (4-1)
onde o parâmetro b pode ser considerado como um coeficiente instantâneo de
crescimento populacional.
A forma integrada da equação acima é a lei malthusiana de crescimento exponencial
dada explicitamente por:
( ) bteNtN 0= (4-2)
onde N0 representa a população no instante inicial de observação. É comum representar a
relação acima numa escala logarítmica. Aplicando-se o logaritmo a ambos os lados da
expressão acima obtém-se:
btNN += 0lnln (4-3)
e, portanto, escrita dessa maneira, vemos que o parâmetro b facilmente se calcula a partir
do valor da população entre dois instantes, isto é, é o coeficiente angular da reta, ou seja:
12
12 lnlnttNNb
−−
= (4-4)
A descrição correta da dinâmica populacional deve conter não apenas a taxa de
crescimento populacional, mas também uma taxa que represente a mortalidade da
população. De forma semelhante ao que escrevemos para a taxa específica de
99
crescimento, podemos escrever, para a taxa específica de mortalidade, a seguinte
expressão:
dNdt
dN−= (4-5)
onde d é a taxa específica de mortalidade. Dessa forma, a dinâmica populacional é
governada pela equação:
dNbNdtdN
−= . (4-6)
Naturalmente aqui, se b > d, isto é, se a taxa específica de crescimento for maior que a
taxa específica de mortalidade então, a equação acima ainda prediz uma explosão
populacional através de um crescimento exponencial de N (a lei malthusiana de
crescimento). Por outro lado, se b < d a população sofrerá um decréscimo exponencial até
anular-se.
Algumas vezes é comum usar um único índice que expressa a diferença entre a taxa
específica instantânea de natalidade e a taxa instantânea de mortalidade d, ou seja:
dbr −= (4.7)
Sob as condições consideradas acima, a população como um todo se expande a uma
velocidade incrível, muito embora cada organismo esteja se reproduzindo numa taxa
constante, a taxa específica de crescimento. Alguns exemplos característicos de tal
100
desenvolvimento são as irrupções planctônicas, as irrupções de pragas e o crescimento
de bactérias em novos meios de cultura.
É evidente que este crescimento vertiginoso, mais precisamente este aumento
exponencial, não pode durar para sempre; de fato, muitas vezes nem sequer é realizado.
Os outros processos que nas condições de ambiente ilimitado puderam ser desprezados
e que resultaram nas conseqüências acima, logo entram em cena e retardam a taxa de
crescimento e interferem, de várias maneiras, na determinação da forma de crescimento
populacional.
Portanto, considerando-se o caso de um ambiente onde os recursos são limitados, a taxa
de crescimento populacional é proporcional não somente ao número de indivíduos, mas
também à quantidade de recursos disponíveis.
Um caso interessante e relativamente simples onde está presente o processo de
competição é aquele para o qual considera-se que a quantidade de alimento representada
pela variável A é inteiramente reintegrada ao sistema com a morte dos indivíduos, isto é,
um sistema fechado onde A´ + X = C´, ou ainda:
1=+CNA . (4-8)
Assim, da equação (4.8) vê-se que ao diminuir a quantidade de indivíduos aumenta-se a
quantidade de alimento e vice-versa. Desta forma a taxa de nascimento pode se escrita
como:
101
bANdtdN
nas
=
(4.9)
e a taxa de mortalidade como:
dANdtdN
mor
−=
(4.10)
Assim, portanto, substituindo o valor de A, da equação 4.8, em (4.9) e (4.10) e somando-
se as equações obtém-se:
2NrNdtdN γ−= (4-11)
que é a equação de Malthus-Verhulst. Esta equação é a equação de movimento para o
número médio de indivíduos numa sociedade e tem sido largamente utilizada em
dinâmica populacional [33 - 38]. O parâmetro γ é a razão entre r e o tamanho máximo
possível da população Nmáx. Este tamanho máximo possível da população, que é
determinado na equação acima se igualando a equação da taxa a zero, representa a
saturação da população para as condições limitantes impostas. No caso acima Nmáx = 1/C
e reescrevendo-se a equação (4.11) em função de Nmáx obtém-se:
( )máx
máx
NNNrN
dtdN −
= (4.12)
102
Em palavras, a equação acima, que fornece a taxa de aumento populacional, é igual à
taxa máxima possível de aumento, isto é a taxa específica ilimitada de crescimento (r)
vezes o número de indivíduos da população, tudo isso multiplicado pelo grau, ou fração
de realização da taxa máxima.
Desta forma fica evidenciada a resistência ambiental caracterizada pela fração (Nmáx-
N)/Nmáx, a qual corresponde ao somatório dos fatores limitantes ambientais que impedem
a realização total do potencial biótico também chamado de potencial reprodutivo e
representado por r, na condição de ausência de fatores limitantes.
Como se observa diretamente da equação de Malthus, equação (4.6), ela é uma equação
linear que prevê uma explosão demográfica exponencial ou seu desaparecimento de
forma também exponencial. O termo introduzido por Verhulst, por outro lado, é de
natureza não linear e representa a interação entre os indivíduos que compõem a
população. O parâmetro γ pode ser interpretado como a contribuição não linear à taxa de
mortalidade.
A solução da equação de Malthus-Verhulst é:
( )
( ){ }1)0(1
)0()(−
−+
=−
−
tdb
tdb
edb
N
eNtNγ
(4-13)
Esta solução fornece resultados muito interessantes. Se b < d, a população decresce com
o tempo. Por outro lado, como era de se esperar, se γ = 0 o termo não linear desaparece
e a população volta a crescer indefinidamente. Entretanto agora, se b > d, a população
103
tende para o valor finito constante ( ) γ/db − . Portanto, o termo não linear tende a
estabilizar a população.
Um resultado notável da solução acima é a existência da bifurcação, isto é, para (b - d) <
0 o sistema aproxima-se do estado N = 0, enquanto que para (b - d) > 0, ele se aproxima
do estado ( ) γ/db − . Desta forma, à medida que as taxas de transição mudam o sistema
sofre uma espécie de transição de fase fora do equilíbrio, de um estado para outro, como
resultado da taxa de transição não linear.
Até o presente momento considerou-se somente uma única espécie num dado
ecossistema. O último ponto a ser discutido aqui é o que trata da interação entre duas
espécies num dado ecossistema. Os modelos de equações de crescimento apresentados
acima permitem uma determinação de como os fatores operam em situações naturais
complexas. Assim, se o crescimento de uma população pode ser descrito por uma
equação, a influência de outra população pode ser expressa por um termo que modifique
o crescimento da primeira população. Vários termos podem ser substituídos, de acordo
com o tipo de interação. Na competição, por exemplo, a taxa de crescimento de cada
população é igual à taxa ilimitada menos os seus próprios efeitos dependentes da
densidade, os quais aumentam à medida que a população aumenta, menos os efeitos
prejudiciais da outra espécie N2 (os quais também aumentam à medida que aumentam os
números das duas espécies, N1 e N2), ou seja:
NCNNNrrN
dtdN
máx2
2 −
−= (4.14)
104
esta equação é semelhante à equação de Malthus-Verhulst, exceto pelo acréscimo do
último termo que descreve os efeitos prejudiciais da outra espécie.
Assim, se considerarmos que em termos de competição dentro de um espaço limitado,
cada população possui seu nível de equilíbrio Nmáx, as equações de crescimento
simultâneo escrevem-se, cada uma delas, de forma semelhante à equação (4.14), ou
seja:
( )máx
máx
NNNN
rNdtdN
1
2111
1 α−−= (4.15a)
( )máx
máx
NNNN
rNdtdN
2
1222
2 1α−−
= (4.15b)
onde N1 e N2 representam o número de indivíduos das espécies 1 e 2, respectivamente, α
é o coeficiente de competição que indica o efeito inibidor da espécie 2 sobre a espécie 1 e
β é o coeficiente de competição correspondente, que significa a inibição de 2 por 1. Este é
o chamado modelo de Lotka-Volterra [33].
105
5 DESCRIÇÃO DA PROPOSTA DE ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCOS
AMBIENTAIS
5.1 INTRODUÇÃO
A preocupação da sociedade com o avanço da indústria nuclear, por um lado, e o anseio
da indústria pela sua expansão, por outro, em meados da década de 70, conduziu a uma
investigação sobre a segurança em empreendimentos dessa natureza que, entre outras
coisas, lançou as bases de uma metodologia para a investigação quantitativa dos riscos.
Aproximadamente 10 anos depois, também fruto dessa relação custo-benefício em que
de um lado se encontram os perigos associados a uma planta de processo e do outro os
reconhecidos benefícios sociais, o Instituto Americano de Engenheiros Químicos (AIChE)
adaptou o relatório WASH 1400 [1], para as plantas químicas e petroquímicas dando
origem à metodologia de AQR consagrada e hoje amplamente utilizada nas indústrias de
processo de uma forma geral e que foi discutida no capítulo 2.
Uma vez mais, a sociedade clama por segurança. Novamente de um lado está o
desenvolvimento industrial, acobertado agora pelo paradigma do desenvolvimento
sustentável. Mas desta vez, do outro lado, não está apenas o ser humano isoladamente,
mas sim tudo que a ele se relaciona e importa para a sua sobrevivência, ou seja, o
planeta, tudo que há nele, inclusive o próprio homem.
O desenvolvimento de uma metodologia completa e integrada que permita avaliar os
riscos dos processos industriais de forma holística, é uma tarefa extraordinariamente
106
complexa. Existem muitas razões para tal, mas sem dúvida uma razão bastante evidente
é que as interações homem-meio ambiente não são, nem de longe, bem estabelecidas.
Portanto torna-se muitíssimo difícil avaliar as conseqüências causadas por uma liberação
acidental de um contaminante e, por conseguinte, o risco.
Entretanto, apesar da extrema complexidade do problema, existem soluções pontuais.
Por exemplo, a indústria petroquímica, mais especificamente a industria petrolífera que
opera em plataformas “offshore” tem dado importante contribuição neste sentido [39].
Mesmo aqui, não há procedimentos quantitativos definitivos que permitam avaliar as
conseqüências, a vulnerabilidade dos recursos (ecossistemas) e finalmente os riscos
associados ao derramamento de óleo no mar.
A metodologia de Análise Quantitativa de Riscos associada à segurança de plantas
químicas e nucleares, e que foi apresentada no capítulo 2, é normalmente empregada
para avaliar risco agudo associado a conseqüências indesejáveis que se propagam pela
atmosfera. O risco agudo é aquele cujas conseqüências indesejáveis se manifestam de
forma intensa e numa pequena escala de tempo. Não há, entretanto, na metodologia
nada que a impeça de ser usada em cenários de contaminação acidental de solo, águas
superficiais e ou subterrâneas.
Por outro lado, as metodologias discutidas no capítulo 3 e que se aplicam tanto ao ser
humano quanto a outros elementos do ecossistema, consideram de forma quantitativa
apenas os efeitos adversos, sobre um ou outro, provenientes de ambientes
contaminados. A diferença está que nesta metodologia não são calculadas chances de
tais contaminações ocorrerem. De fato nesta metodologia, o foco não é a segurança com
que um contaminante é produzido, ou armazenado, ou simplesmente manipulado, mas
107
sim nas implicações, isto é, nos efeitos adversos sobre os elementos do ecossistema, em
suas eventuais liberações.
O objetivo central desta dissertação é sugerir a integração destas duas metodologias.
Assim, nesta nova metodologia que passo a chamar de Análise Quantitativa de Riscos
Ambientais (AQRA), por um lado são incluídos elementos de análise de confiabilidade na
metodologia considerada no capítulo 3, e por outro são considerados os demais
elementos do ecossistema, vias de exposição e suas avaliações naquela outra
metodologia descrita no capítulo 2.
5.2 METODOLOGIA PARA ANÁLISE QUANTITATIVA DE RISCO AMBIENTAL
Nesta dissertação, a definição considerada de meio ambiente é o de um conjunto
constituído pelas pessoas, suas crenças sociais, culturais, o ambiente natural e as inter-
relações entre os diversos elementos.
As etapas que definem a metodologia de uma AQRA são as mesmas que foram
consideradas no capítulo 2 para a AQR. A diferença está nas novas possibilidades de
cenários acidentais a serem considerados. As novas possibilidades incluem, por exemplo,
cenários com conseqüências indesejáveis para a imagem da empresa responsável pelo
acidente e, portanto, com desdobramentos sobre o seu desempenho econômico. Para
esses novos cenários é necessário elaborar modelos que permitam avaliar as suas
conseqüências e a respectiva quantidade de recursos vulneráveis.
108
Portanto, conceitualmente, o risco ambiental se define como o produto da freqüência do
cenário acidental pela respectiva conseqüência. Agora, a quantificação das
conseqüências deve considerar não apenas o dano à integridade física direta, mas
também avaliações de natureza ecológica e econômica, entre outras, dos efeitos
adversos provocados pelas liberações acidentais no ambiente. Assim sendo, o risco
ambiental, e sua avaliação, inclui o risco ecológico, risco à saúde humana e o risco
econômico [13].
A avaliação das conseqüências de um cenário acidental ao meio ambiente deve
considerar uma avaliação dos efeitos adversos deste cenário sobre o homem, sobre o
restante dos elementos que definem o meio ambiente, mas também as reações sobre o
homem que os efeitos adversos têm nos outros constituintes do meio ambiente. Assim, se
ocorre um derramamento acidental de hidrocarboneto no solo, o homem sofre
diretamente a sua ação (exposição ao contaminante), mas sofre também indiretamente
com a diminuição dos recursos necessários à sua existência (diminui a quantidade de
gado bovino de corte por causa da ação do contaminante sobre o gado, por exemplo).
Para a determinação das conseqüências diretas sobre o homem, podemos proceder
como no capítulo 2, se estas se apresentam de imediato, como é o caso das
conseqüências de uma explosão, de um incêndio, ou de uma nuvem tóxica. Ou então, se
o efeito adverso não se manifesta de imediato, podemos proceder como discutido no
capítulo 3, integrando as contribuições das concentrações, por exemplo, ao longo de um
período de tempo suficientemente longo.
109
De um jeito ou de outro, na discussão acima, vemos que para avaliar as conseqüências
devemos ser capazes de avaliar os efeitos adversos em cada ponto do espaço e no
tempo.
No caso de uma substância tóxica devemos ser capazes de descrever como muda, ponto
a ponto e também no tempo, a concentração do contaminante. Se, por exemplo, o
contaminante for lançado na atmosfera e tratar-se de um gás neutro ou leve, a sua
dispersão será governada pela turbulência atmosférica e um modelo consagrado neste
caso é o gaussiano. Por outro lado, se o contaminante for um líquido não criogênico e se
este se derramar sobre a superfície do solo, sua dispersão se dará através da zona não
saturada e da zona saturada – os mecanismos incluem advecção e difusão – e as
equações apropriadas para transporte e dispersão do contaminante envolvem um meio
poroso. O mesmo acontece quando parte do contaminante derramado na superfície do
solo se evapora. A dispersão atmosférica se faz em outro meio material, neste caso o ar,
e os mecanismos de transporte e interação também se alteram.
Portanto, para avaliar a concentração como função do ponto no espaço (não confundir
com atmosfera), devemos determinar as rotas (meio material), suas características físicas
(parâmetros hidrogeológicos: como porosidade e condutividade hidráulica, por exemplo;
parâmetros atmosféricos, como distribuição de temperatura e fluxos de vento e
parâmetros oceânicos como, por exemplo, salinidade, fluxos hidrodinâmicos) e em cada
uma delas estabelecer as equações de transporte que por sua vez devem incluir os
mecanismos de interação.
As conseqüências diretas sobre os seres humanos, das concentrações dos
contaminantes (de fato, as doses), podem ser expressas através das equações de “probit”
110
(que são uma forma de apresentação das curvas de dose-resposta), como discutimos no
capítulo 2. As conseqüências diretas sobre o restante dos elementos do meio ambiente
podem ser avaliadas de forma semelhante. O que é necessário conhecer novamente é a
curva de dose-resposta, agora para fauna, flora, ou mesmo para os possíveis danos
materiais e, portanto com conseqüências econômicas. A referência [11] apresenta curvas
de dose-resposta para alguns elementos do ecossistema. Entretanto, dada a grande
variedade e complexidade dos elementos, o estudo dos efeitos toxicológicos sobre os
constituintes do ecossistema encontra-se ainda na sua infância.
Resta, portanto, a determinação dos efeitos adversos indiretos. Como avaliar sobre uma
população A, os efeitos de uma conseqüência danosa sobre uma população B? Questões
dessa natureza podem ser abordadas no âmbito da dinâmica de populações. A dinâmica
de populações, um ramo da ecologia matemática, pretende, através de um conjunto de
equações diferenciais, modelar aspectos essenciais do crescimento de uma população
sujeita a certos recursos. Nessas equações fenomenológicas, que são do tipo reação-
difusão-advecção, os diversos termos presentes são inseridos de forma a pretender
modelar o crescimento populacional e as circunstâncias em que isto se dá. Dessa forma,
pelo menos em princípio, é possível pensar em criar modelos matemáticos que descreva,
ainda que de forma aproximada, o problema mencionado no início deste parágrafo. Esta
questão será discutida na seção 5.4.
Antes de apresentar uma aplicação da metodologia da AQRA a um estudo de caso,
observe-se que qualquer metodologia de análise de risco que pretenda ser um
instrumento de gerenciamento de risco, deve ter associada a ela critérios para a sua
aceitabilidade. Dada a natureza da definição de risco ambiental como freqüência vezes
111
conseqüência, em AQRA se considera medidas de redução de risco na forma de medidas
de redução de probabilidade/conseqüência.
Para a elaboração de um critério global de aceitação de riscos, nesta dissertação
inspirou-se nas linhas gerais para o estabelecimento de um critério global proposto pela
OLF [39] para derrame de óleo no mar e pela ASTM [30]. Neste caso o critério de
aceitação será apresentado como uma matriz que é baseada em níveis de probabilidade
e conseqüência.
Matriz de Riscos Ambientais
Grande
probabilidade
Significativa
probabilidade
Moderada
probabilidade
Pequena
probabilidade
Probabilidade
muito baixa
Dano ambiental não
demonstrável
Dano
ambiental
menor
Dano
ambiental
moderado
Dano
ambiental
significativo
Dano
ambiental
sério
Risco inaceitável
Região ALARP
Risco aceitável
FIGURA 5.1 – MATRIZ DE RISCO AMBIENTAL
112
Vamos, preliminarmente, sugerir os seguintes níveis de probabilidade e ocorrência que
nos permitirão elaborar um critério de aceitabilidade de riscos ambientais.
TABELA 5.1: NÍVEIS DE PROBABILIDADE DE OCORRÊNCIA
Níveis Freqüência (número de incidentes por ano)
1 0 – 0,0001 ocorre menos que um incidente por 10.000 anos
2 0,0001 – 0,01 ocorrem incidentes numa taxa de um por 10.000 anos a 1 por 100 anos
3 0,01 – 0,1 ocorrem incidentes numa taxa de um por 100 anos a 1 por 10 anos
4 0,1 – 1 ocorrem incidentes numa taxa de um por 10 anos a 1 por ano
5 1 – ocorrem incidentes com uma freqüência maior que uma vez por ano
113
TABELA 5.2: NÍVEIS DE CONSEQÜÊNCIAS
NÍVEL CATEGORIA DE DANO AMBIENTAL DESCRIÇÃO DA CATEGORIA DO DANO AMBIENTAL.
1 Dano ambiental não demonstrável Nenhum potencial de dano à saúde humana, segurança ou
receptores ambientais sensíveis – efeitos adversos não
mensuráveis.
2 Dano ambiental menor Pequeno potencial de dano à saúde humana, segurança ou
receptores ambientais sensíveis – efeitos adversos de intensidade
pequena e restritos a alguns poucos elementos do ecossistema e a
recursos naturais.
3 Dano ambiental moderado Moderado potencial de dano à saúde humana, segurança ou
receptores ambientais sensíveis – efeitos adversos de intensidade
moderada a elementos do ecossistema e a recursos naturais;
Tempo de restauração dos impactos ambientais menor que 2 anos.
4 Dano ambiental significativo Significativo potencial de dano à saúde humana, à segurança ou a
receptores ambientais sensíveis – efeitos adversos de intensidade
significativa a elementos do ecossistema e a recursos naturais;
Tempo de restauração dos impactos ambientais entre 2 e 5 anos;
Significativo comprometimento de recursos financeiros necessários
à restauração dos danos;
Áreas de interesse científico afetadas.
5 Dano ambiental sério Altíssimo potencial de dano à saúde humana, à segurança ou a
receptores ambientais sensíveis – efeitos adversos de intensidade
muito elevada a elementos do ecossistema e a recursos naturais;
Tempo de restauração dos danos ambientais superior a 5 anos;
Sério comprometimento da imagem da empresa e aporte volumoso
de recursos necessários à reparação dos danos ambientais;
Efeitos significativos sobre áreas de preservação ambiental.
114
5.3 APLICAÇÃO DA METODOLOGIA – UM ESTUDO DE CASO
Neste estudo de caso deseja-se mostrar como as avaliações de risco, que se baseiam
nos guias de procedimentos da EPA, podem ser integrados com a metodologia de risco
associado à segurança de operações. Uma AQRA, conforme se viu, requer uma
avaliação das diversas conseqüências de um cenário acidental em todos os elementos do
ecossistema bem como conseqüências de natureza econômica, entre outras. Neste
estudo, entretanto, o meio ambiente limita-se ao ser humano e serão consideradas
apenas conseqüências sobre sua saúde.
Apresenta-se aqui, passo a passo, a metodologia da AQRA discutida na seção anterior
para uma situação muito simples.
• DEFINIÇÃO DO SISTEMA A SER ESTUDADO BEM COMO SUAS FRONTEIRAS
Uma base de armazenamento constando de um único tanque de armazenagem do
composto orgânico tricloroetileno (TCE), de 200m3. O tanque encontra-se no interior de
um dique de contenção de 300 m3. A fundação do tanque é de concreto armado, e o piso
da área do dique é impermeabilizado e possui caimento para canaletas laterais
convergindo para uma só saída, equipada com válvula normalmente fechada, abrindo
para liberar as águas das chuvas. Esta válvula é ligada à rede de coleta de efluentes que,
por sua vez, termina numa estação de tratamento de efluentes industriais (ETI). As águas
tratadas são despejadas num corpo hídrico próximo.
115
Neste estudo se considera apenas risco ao ser humano, que se localiza ao redor da
instalação analisada e pode ser alcançado por efeitos físicos adversos decorrentes de
liberação acidental de TCE na instalação considerada. Embora o TCE seja uma
substância também inflamável, serão considerados aqui apenas os seus efeitos tóxicos.
A figura 5.2 ilustra, esquematicamente, a área contaminada e o cenário de exposição
residencial considerado
FIGURA 5.2 – REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA ÁREA CONTAMINADA
Fonte: REF.[31].
poço
a) zona não-saturada
b) zona saturada
Fluxo de água subterrânea
Direção predominante do vento
Camada contaminada
116
• IDENTIFICAÇÃO DOS PERIGOS E DOS CENÁRIOS ACIDENTAIS MAIS RELEVANTES
Os perigos associados à operação dessa base de armazenamento, identificados numa
APP, por exemplo, podem ser pensados como pequena e grande liberação do TCE e as
causas a eles associadas, vazamento ou ruptura do tanque. Os cenários a serem
considerados são contaminação do ar, do solo e da água. A planilha preenchida, que
representa a realização da APP propriamente dita encontra-se ilustrada na figura 5.3.
117
ANÁLISE PRELIMINAR DE PERIGOS
SISTEMA: TANQUE DE ARMAZENAGEM CATEGORIAS
PERIGO CAUSAS MODO DE DETECÇÃO
EFEITOS FREQÜÊNCIA SEVERIDADE RISCO
RECOMENDAÇÕES CENÁRIOS
pequena liberação de líquido tóxico - TCE
-vazamento em tanque, válvulas, tubulações, dique de contenção devido a: -corrosão -falha intrínseca -erro humano
-visual Contaminação do ar, do solo e da água
4 3 Região Alarp
R1) Eliminar a fonte de contaminação; R2) Realizar manutenção e inspeções periódicas do sistema de armazenagem, incluindo o tanque, válvulas, bacias de contenção; R3) Treinar os funcionários na operação deste sistema.
1
grande liberação de líquido tóxico - TCE
Ruptura em tanque, válvulas, tubulações, dique de contenção devido a: -corrosão -falha intrínseca -erro humano
-Visual, -olfato
-Contaminação do ar, do solo e da água; -possibilidade de fase livre do contaminante; -possibilidade de formação de atmosfera explosiva no subsolo.
2 5 Região Alarp
R2) Realizar manutenção e inspeções periódicas do sistema de armazenagem, incluindo o tanque, válvulas, bacias de contenção; R3) Treinar os funcionários na operação deste sistema; R4) Elaborar um plano de Ação de Emergência e acioná-lo. R5) Fazer monitoramento de solo e água subterrânea, procedendo remediação se for o caso.
2
FIGURA 5.3 – PLANILHA UTILIZADA PARA A ANÁLISE PRELIMINAR DE PERIGOS.
118
• AVALIAÇÃO DAS FREQÜÊNCIAS DE OCORRÊNCIA DOS CENÁRIOS ACIDENTAIS
Os cenários associados ao evento iniciador “Grande Liberação de Líquido Tóxico – TCE,
causada por ruptura catastrófica do tanque de armazenagem” podem ser identificados, e
suas freqüências calculadas, através da seguinte AE:
FIGURA 5.4 – ÁRVORE DE EVENTOS PARA O EVENTO INICIADOR CONSIDERADO
Neste problema hipotético, o sistema de proteção B é constituído de uma ETI e o sistema
de proteção A é constituído de:
• um dique de contenção impermeabilizado cuja capacidade de contenção é
superior ao volume do tanque;
• um ralo contendo uma válvula, normalmente fechada, conectado à rede de coleta
de efluentes que termina numa ETI.
Dessa forma simplificada os cenários acidentais identificados e que contribuirão para o
cálculo do risco são o cenário de número 2 – contaminação do corpo hídrico e o cenário
Eve nt o inic iador S ist ema de prot eç ão A S ist ema de prot e ção B Ce ná rios
Rupt ura c a t a st rófica S uc esso do sist cole t a e S uc esso sist t ra t a me nt o Ident if ic a çã o dosdo t q de a rma zenagem drenagem do cont aminan dos e f lue nt e s indust r ia is Ce ná rios
1 da no despre z í ve l
2 c ont amina çã o de c orpos hí dric os
3 Cont a minaç ão solo, a t mosfe ra e corpos
hí dric os
119
de número 3 – contaminação do solo, contaminação do ar e contaminação do corpo
hídrico.
A determinação da freqüência de ocorrência de cada cenário acidental é feita
multiplicando-se a freqüência de ocorrência do evento iniciador – neste caso ruptura
catastrófica do tanque de armazenagem – e as respectivas probabilidades condicionais
presentes em cada ramo da AE.
A determinação da freqüência de ocorrência do evento iniciador pode ser feita através de
consulta de banco de dados de falhas de equipamentos [23]. Tipicamente, para ruptura
catastrófica do tanque de armazenagem, podemos usar o valor 1,0 x 10-6 falhas/ano Para
a determinação da freqüência de falha do sistema de proteção A podemos usar a técnica
da AF. Neste caso o evento topo é a “Falha no sistema de coleta e drenagem do
contaminante” e a árvore encontra-se ilustrada na figura 5.4:
FIGURA 5.5: ÁRVORE DE FALHA DO SISTEMA DE COLETA E DRENAGEM
Falha do sistema de proteção A
Falha do sistema de coleta
Falha do sistemade drenagem
Falha da válvula em abrir
Falha de ruptura nas linhas
120
Para determinar a probabilidade do evento topo, ou seja, a probabilidade de falha do
sistema de proteção A, devemos compor as probabilidades associadas aos vários
eventos intermediários presentes na AF. Tal composição, como vimos no capítulo 2,
deverá estar de acordo com as regras associadas a cada conexão lógica. No exemplo
acima, a única conexão lógica presente é a conexão “ou” e para ela vimos que a regra de
composição de probabilidades para dois eventos independentes é P(C) = P(A) + P(B) –
P(A)P(B). P(C) é a probabilidade de falha do sistema de drenagem, P(A) é a
probabilidade de falha da válvula em abrir e P(B) é a probabilidade associada à ruptura
das linhas da rede de coleta de efluentes.
Os bancos de dados fornecem a freqüência de falha de componentes e equipamentos, e
não probabilidades de falha. Para se determinar a probabilidade, uma possibilidade é usar
a indisponibilidade do componente. Se considerarmos os componentes do tipo
irreversíveis, isto é, componentes irreparáveis segundo a mudança de estado a que estão
sujeitos, podemos considerar a indisponibilidade média como uma medida da desejada
probabilidade. Se além disso considerarmos λT < 0,1 podemos usar a equação 2.23 para
a indisponibilidade média: TAmed λ21
= . Aqui, λ é a taxa de falha encontrada no banco de
dados e T é o período de tempo para o qual se deseja investigar a indisponibilidade.
Portanto, se considerarmos a taxa de falha da válvula como sendo 3,0 x 10-5 falhas/ano
[23] e a taxa de falha de 100 metros de tubulação de 4” como sendo também 3,0 x 10-5
falhas/ano [17] e se considerarmos o período de investigação da indisponibilidade como
sendo T = 1 ano teremos
121
52
555 103100,321100,3
21100,3
21)( −−−− ≅
−+= xxxxxxxCP
Para fins de ilustração, vamos supor que a probabilidade de falha do sistema de coleta e
drenagem, P(D), é 1,0 x 10-7. A taxa de falha de sistemas dessa natureza, em principio,
pode ser determinada a partir de dados históricos relacionados a falhas de sistemas como
esse, em condições semelhantes. Portanto, aplicando uma vez mais a composição de
probabilidades para a conexão lógica “ou” encontraremos que a probabilidade do evento
topo é:
P(Falha do sistema de Proteção A) = ( )( ) 55757 1001,3100,3100,1100,3100,1 −−−−− ≅−+ xxxxx .
Novamente, se considerarmos para fins de ilustração a probabilidade de falha do sistema
de proteção B como sendo P(Falha do sistema de proteção B) = 2,0 x 10- 4 (falhas/ano),
poderemos finalmente calcular as freqüências dos cenários acidentais identificados na AE
acima. Assim teremos:
f(cen 2) = f(EI) x P(Falha sist prot A) = (1,0 x 10-6)(3,01 x 10-5) ≅ 3,01 x 10-11 (ano-1);
f(cen 3) = f(EI) x P(Sucesso sist prot A) x P(Falha sist de proteção B)
= f(EI) x (1-P(Falha sist prot A)) x P(Falha sist prot B).
= (1,0 x 10-6)(1-3,01 x 10-5)(2,0 x 10-4) ≅ 2,0 x 10-10 (ano-1).
122
• AVALIAÇÃO DAS CONSEQÜÊNCIAS E VULNERABILIDADE
No contexto da metodologia discutida no capítulo 2, a análise de conseqüências avalia os
níveis dos efeitos físicos danosos, em áreas de interesse, associados aos cenários
acidentais postulados. No presente caso, o efeito físico em questão é uma pluma de
contaminante (TCE) em solo, ar e água e os níveis do efeito físico, em áreas de interesse,
correspondem às concentrações do contaminante nos diversos extratos.
Portanto, para a determinação das conseqüências devem-se formular modelos que
descrevam a evolução da pluma em cada um dos extratos considerados. Como se viu no
capítulo 3, existem vários programas comerciais que executam várias tarefas e dentre
elas a determinação de valores de concentração em função da posição e do tempo. Nesta
dissertação optou-se por usar o SoilRisk, que foi detalhadamente discutido no capítulo 3.
De fato o caso estudado aqui, é uma adaptação de um estudo de caso apresentado na
referência [31] onde se estabeleceu o SoilRisk.
A seguir, apresenta-se os valores assumidos para os parâmetros que alimentam o
programa. Apresentam-se também os resultados das estimativas realizadas pelo SoilRisk.
123
TABELA 5.1: PARÂMETROS DE ENTRADA
Parâmetro Valor Parâmetro Valor Parâmetro Valor
C´τ0
Concentração inicial total
do contaminante
1 µg/g Tair
Temperatura do ar
120C fvol
fração do contaminante
que volatiliza
0,9
W
Espessura da camada
contaminada
1 m Ū
Velocidade do vento na
superfície
4,3 m/s KH
Coeficiente da lei de
Henry
0,410
L
Profundidade da camada
de solo limpo sobre o
solo contaminado
0 m f(φ)
freqüência do vento na
direção de exposição
0,13 Tb
Ponto de ebulição
87,200C
Ay
Extensão ortogonal ao
fluxo de água
subterrânea
100 m U+
Velocidade máxima do
vento
24 m/s Tc
Temperatura crítica
270,950C
Ax
Extensão paralela ao
fluxo de água
subterrânea
100 m PE
Índice de evaporação e
precipitação
111 Pc
Pressão crítica
49,54 atm
zwt
Profundidade da
superfície até o lençol
1,5 m P
Número médio de
dias/ano com
precipitação >0,01 pol.
130 d/y B
Constante de Antoine
13150C
H
Altura do aqüífero abaixo
da área contaminada
10 m Asdm
Modo de distribuição de
tamanho agregado
1 C
Constante de Antoine
230,050C
ρb=ρbsat
Densidade do interior do
solo
1,59 g/cm3 Lc
Razão entre rugosidade
e área
10-4 V´B
Volume molar LeBas
87,9 cm3/mol
foc=focsat
fração orgânica
0,0075 V
Fração da superfície
coberta pela vegetação
0 MW
Peso molecular
131,40
Jw
Fluxo de água no solo
10-3 m/g z0
Comprimento de
rugosidade
100 cm SFing
Fração de inclinação
para ingestão
0,011 Kgd/mg
θ
Conteúdo volumétrico de
água
0,18 S
Conteúdo de silt
50 SFinh
Fração de inclinação
para inalação
0,006Kg-d/mg
ηsat
porosidade efetiva
0,40 τ=τsat
Meia vida efetiva
4,7 x 108 Abing
Fração de absorção por
ingestão
1,0
αL
dispersividade lateral
4 m Koc
Coeficiente de partição
de equilíbrio
124 cm3/g Absi
Fração de absorção por
inalação
1,0
Vd
Velocidade de Darcy
0,03 m/d S
Solubilidade aquosa
1080 g/cm3
Abd
Fração de absorção por
contato dermal
0,50 Abdst
Fração de absorção por
inalação de particulado
0,75
Fonte: REF.[31]
124
TABELA 5.2 - RESULTADOS DAS ESTIMATIVAS REALIZADAS PELO SOILRISK
Cenários de Exposição
Símbolo Unidade Dentro da
residência
Fora da
residência
Local de
recreação
Dentro de
comércios e
escritórios
Parâmetros chave de exposição
Distância da fonte m 0 100 0 0
Tempo de
exposição
d 10,950 10,950 10,950 9,125
Estimativas médias de concentração do contaminante
Concentração total
de interesse no
solo para contato
direto
µg/g 2,1 x 10-3 Não se aplica 2,1 x 10-3 2,5 x 10-3
Concentração de
interesse para
criança
µg/g 1,0 x 10-2 Não se aplica 1,0 x 10-2 Não se aplica
Concentração de
interesse para
adulto
µg/g 0 Não se aplica 0 2,5 x 10-3
Concentração de
vapores no ar
g/m3 1,6 x 10-8 1,8 x 10-9 1,6 x 10-8 1,9 x 10-8
Concentração em
água
g/m3 4,6 x 10-2 4,5 x 10-2 4,6 x 10-2 5,5 x 10-2
Concentração de
particulado no ar
µg/m3 9,5 x 10-7 Não se aplica 9,5 x 10-7 1,7 x 10-6
Fonte: REF.[31]
125
O outro passo em direção ao cálculo do risco nesta abordagem de AQRA, é a análise de
vulnerabilidade que indica a parcela do recurso que sofrerá um tipo particular de dano, por
exemplo, fatalidade. Ou então a probabilidade de uma pessoa vir a morrer em decorrência
de um dado cenário acidental. É justamente esta informação que modelos como RBCA e
SoilRisk fornecem como resultado de suas avaliações. Portanto, o passo seguinte nesta
metodologia de integração de AQRA é considerar a saída destes modelos (e neste estudo
consideramos o SoilRisk) como a probabilidade de interesse. Ou seja, especificamente no
caso do SoilRisk, o caso em estudo apresenta os resultados exibidos na tabela 5.3 de
probabilidades de fatalidades, para as diversas vias de exposição consideradas.
TABELA 5.3 - RESULTADOS DAS ESTIMATIVAS DAS PROBABILIDADES DE
FATALIDADES REALIZADAS PELO SOILRISK.
Cenários de Exposição
Símbolo Dentro da
residência
Fora da
residência
Local de
recreação
Dentro de
comércios e
escritórios
Ppw 5,9 x 10-6 5,8 x 10-6 1,7 x 10-7 2,1 x 10-6
Psi 1,2 x 1010 Não se aplica 3,5 x 10-11 4,8 x 10-12
Pderm 5,8 x 10-10 Não se aplica 1,6 x 10-10 4,1 x 10-10
Pair 8,2 x 10-9 9,4 x 10-10 2,6 x 10-10 7,9 x 10-9
Psg 7,5 x 10-6 Não se aplica Não se aplica Não se aplica
Pnc 4,6 x 10-5 4,6 x 10-5 Não se aplica Não se aplica
Pdust 5,0 x 10-13 Não se aplica 1,6 x 10-14 7,0 x 10-13
Ptotal 6,0 x 10-5 5,1 x 10-5 1,7 x 10-7 2,1 x 10-6
Fonte: REF.[31]
126
No cenário 2 temos contaminação apenas do corpo hídrico. Neste caso as rotas de
exposição consideradas são: ingestão de água potável (pw) e inalação de vapores
contaminados provenientes da volatilização do contaminante na superfície do aquífero
(air). Para a primeira rota, o modelo SoilRisk avaliou a probabilidade de fatalidade como
sendo Ppw = 5,9 x 10-6 e para a segunda rota, Pair = 8,2 x 10-9. Portanto, a probabilidade de
fatalidade associada a este cenário é:
P(cen2) = Ppw + Pair ≅ 5,9 x 10-6.
No cenário 3 temos contaminação do solo, do ar e do corpo hídrico. As rotas
consideradas aqui são todas as rotas possíveis, isto é, além das presentes no cenário 2
teremos também: ingestão de solo (si); absorção pela pele devido ao contato direto com o
solo (derm); inalação de vapores contaminados provenientes de água não potável
também contaminada (nc); evaporação de parte do contaminante que está no interior do
solo (sg) e inalação de poeira contaminada (dust). Neste caso o SoilRisk fornece os
seguintes resultados: Ppw = 5,9 x 10-6; Psi = 1,2 x 10-10; Pderm = 5,8 x 10-10; Pair = 8,2 x 10-9;
Psg = 7,5 x 10-6; Pnc = 4,6 x 10-5; Pdust = 5,0 x 10-13. Portanto, a probabilidade de fatalidade
associada a este cenário é:
P(cen3) = Ppw + Psi + Pderm + Pair + Psg + Pnc + Pdust ≅ 5,94 x 10-5.
127
• AVALIAÇÃO DOS RISCOS
Finalmente, para se calcular o risco num dado ponto deve-se calcular a contribuição de
cada cenário, neste ponto, e então somar todas as contribuições.
A contribuição de cada cenário ao risco num dado ponto, como vimos no capítulo 2, é o
produto da freqüência de ocorrência deste cenário acidental pela respectiva
conseqüência. E como, de acordo com a metodologia de AQRA proposta, a
conseqüência, expressa como a probabilidade de fatalidade (“risco integrado”, no caso
dos modelos SoilRisk , RBCA e outros), é definida como a saída destes modelos, a
contribuição de cada cenário ao risco individual é:
Cenário 2
R(cen2) = f(cen2) x P(cen2) = 3,01 x 10-11 x 5,9 x 10-6 = 1,77 x 10-17 fatalidades/ano.
Cenário 3
R(cen3) = f(cen3) x P(cen3) = 2,0 x 10-10 x 5,94 x 10-5 = 1,19 x 10-14 fatalidades/ano
Portanto, o risco individual total no ponto considerado é:
RI = R(cen2) + R(cen3) = 1,77 x 10-17 + 1,19 x 10-14 ≅ 1,191 x 10 –14 fatalidades/ano.
128
Este é o risco de fatalidade a que um indivíduo está exposto como conseqüência do
cenário acidental, cujo evento iniciador é a “Grande liberação de líquido tóxico – TCE,
causado por ruptura catastrófica do tanque de armazenagem”.
Assim, nesta definição de risco fica evidente a presença da consideração de falhas de
equipamentos e sistemas. Se fosse possível que estes nunca falhassem, o risco,
portanto, associado à segurança de operações industriais seria nulo.
Esta situação é claramente diferente daquela que considera o risco ao ser humano
(probabilidade de morte), devido ao lançamento de defensivo agrícola num dada área de
agricultura.
Nos casos onde a possibilidade da presença de contaminante, em solo, água e ar, estiver
associada a sua liberação acidental, uma análise quantitativa de riscos ambientais deve
considerar uma análise de confiabilidade dos diversos elementos de contenção e de
segurança envolvidos.
5.4 APLICAÇÃO DA DINÂMICA DE POPULAÇÕES À ANÁLISE DE
VULNERABILIDADE EM AQRA
A dinâmica de populações, abordada no capítulo 4, se apresenta como uma ferramenta
interessante para tratar diversos problemas em ecologia, em particular aqueles que se
relacionam com a evolução de populações e ecossistemas em geral, submetidos às mais
variadas condições externas e que, portanto, podem produzir alterações na estrutura e
função das comunidades bióticas.
129
Um exemplo de tal aplicação se relaciona à questão colocada no início da seção 5.2, isto
é, como avaliar sobre uma população A, os efeitos de uma conseqüência danosa sobre
uma população B? Um problema mais simples, mas relacionado com este é o do
predador-presa onde os indivíduos de uma espécie A se alimentam de indivíduos de uma
espécie B. Um modelo que aborda com sucesso essa questão é o modelo de Lotka-
Volterra.
De interesse particular nesta dissertação, estão os problemas associados à presença,
persistente e prolongada, de substâncias químicas no solo, no ar e em corpos hídricos.
Para se abordar problemas dessa natureza, é necessário criar um modelo que seja capaz
de descrever, pelo menos, os aspectos essenciais da interação entre a população e o
contaminante. Não se pretende descrever os aspectos toxicológicos, mas sim o efeito de
um agente tóxico sobre a estrutura de uma população em desenvolvimento. Por exemplo,
pode-se perguntar em que medida tal contaminante afeta o desenvolvimento dessa
população.
Num caso simples onde uma população se desenvolve segundo a equação de Malthus-
Verhulst, pode-se perguntar qual o percentual da população que será afetada, ou mais
particularmente, irá desaparecer como conseqüência deste agente tóxico (em relação ao
número de indivíduos da população na ausência deste agente).
Assim, um modelo minimamente representativo da ação coletiva do agente tóxico deverá
conter as seguintes informações:
130
a) Na ausência do agente tóxico a população se desenvolve segundo a equação de
Malthus-Verhulst;
b) Para um dado nível do efeito adverso, quanto maior a população, maior a sua taxa
de decréscimo;
c) Para uma dada quantidade da população, quanto mais intenso for o efeito
adverso, maior será a taxa de fatalidade.
Por outro lado, como se viu no capítulo 4 os efeitos prejudiciais de uma espécie sobre
outra podem ser representados, na equação que determina a dinâmica da população, por
um termo aditivo proporcional ao produto das duas populações.
Portanto, considerando-se as observações a, b e c acima e considerando-se também a
forma de se introduzir efeitos adversos sobre uma dada população descrita no parágrafo
anterior conclui-se que um modelo de interesse plausível é descrito pela equação:
( ) CNNNdbdtdN αγ −−−= 2 5.1
o parâmetro α denota a intensidade mínima do efeito físico considerado, que é capaz de
causar um tipo particular de dano em indivíduos de uma dada espécie. O termo αC pode
ser interpretado como o nível de intensidade do efeito físico considerado que está
atuando na população.
Assim, por exemplo, se o efeito físico considerado for uma pluma de contaminante, o
parâmetro α é a concentração que tem 1% de chance de provocar fatalidade num
indivíduo, por exemplo. Se o efeito físico for um incêndio numa poça de uma substância
131
inflamável, o parâmetro α é a intensidade da radiação térmica que tem 1% de chance de
provocar fatalidade num indivíduo, por exemplo.
A equação 5.1 acima é uma equação simples. Nota-se que o termo cruzado, isto é, o
termo contendo o produto da população e do agente tóxico é linear na população. Assim
sendo, este termo pode ser incorporado no primeiro termo, também linear, da equação de
Malthus-Verhulst. Portanto a equação final é do tipo Malthus-Verhulst, tendo de diferente
a presença de um outro termo que contribui com a taxa de fatalidade. Logo, pode-se
pensar que a presença do agente tóxico na forma que foi introduzido tem como
conseqüência formal uma renormalização na taxa de fatalidade associada à equação
original de Malthus-Verhulst.
Sendo assim, a solução da nova equação é imediata e é representada por:
[ ]( ) CdbCN αγγ1
−−
= 5.2
O número acima indica o número de indivíduos da população na presença do efeito
adverso.
A razão N([C])/N([C=0]) dá a fração de indivíduos que irão sobreviver e o seu
complementar é, portanto, a fração daqueles que morrerão. Desta forma a probabilidade
de fatalidade, ou seja, a quantidade do recurso que é vulnerável, na linguagem da AQRA
se calcula como:
132
γα
γ
γα
Cdb
Cdb
NCNPf −=
−
−−== 1)(
5.3
Não se teve nesta dissertação, a pretensão de explorar com detalhes as possibilidades e
as dificuldades de abordagens usando dinâmica de populações. Ao invés disso,
pretendeu-se apenas chamar a atenção para a possibilidade de seu emprego como uma
ferramenta possível de se incorporar numa complexa Análise Quantitativa de Riscos
Ambientais.
133
6 CONCLUSÕES
Neste trabalho foi proposta uma integração da metodologia de risco desenvolvida para
avaliar a performance global de segurança em plantas nucleares e químicas, com as
metodologias desenvolvidas para avaliar o potencial dos efeitos adversos de substâncias
químicas perigosas, em seres humanos e demais elementos do ecossistema.
A integração em questão se aplica àquelas situações onde é possível focar na segurança
de operações quer sejam elas relacionadas à produção, ao armazenamento ou à
manipulação de substâncias químicas perigosas.
Nestes casos, sugeriu-se que o risco fosse compreendido como a combinação da
conseqüência do cenário acidental, com a sua respectiva freqüência de ocorrência.
Assim, na metodologia de AQRA proposta, as freqüências de ocorrências dos cenários
acidentais são calculadas usando-se ferramentas de engenharia de confiabilidade. Por
outro lado, interpretando-se os resultados de modelos de análise de risco do tipo RBCA,
SoilRisk entre outros do gênero não como risco, mas sim como probabilidade de
fatalidade, por exemplo, estes fornecem, dessa forma, as denominadas conseqüências. E
o risco, portanto, obtém-se multiplicando a freqüência pela respectiva conseqüência.
Desta forma, este valor do risco assim obtido expressa a probabilidade de um indivíduo vir
a morrer como conseqüência de um cenário acidental, que pode ocorrer com uma dada
probabilidade.
134
Assim, nesta definição de risco, fica evidente a presença da consideração de falhas de
equipamentos e sistemas. Se fosse possível que estes nunca falhassem, o risco,
portanto, associado à segurança de operações industriais seria nulo.
Esta situação é claramente diferente daquela que considera o risco ao ser humano
(probabilidade de morte) ou ao meio ambiente, devido ao lançamento de defensivo
agrícola num dada área de agricultura.
Portanto, considera-se que este conceito de risco e a associada metodologia de AQRA
proposta se constituem numa poderosa ferramenta para o gerenciamento de riscos
ambientais.
Embora os conceitos tenham sido exemplificados, nesta dissertação, num único exemplo
em que várias simplificações foram consideradas, considera-se que a metodologia possa
ser empregada numa situação geral, considerando-se os diversos elementos que
compõem o meio ambiente, bem como suas inter-relações.
Uma avaliação completa dessa natureza é tarefa extraordinariamente complexa e
extremamente trabalhosa. Ela exige a formulação de modelos de conseqüência e
vulnerabilidade que sejam capazes, minimamente, de prever os danos de natureza
econômica, ecológicos e sócio-culturais.
Neste contexto, num caso simples onde uma população se desenvolve segundo a
equação de Malthus-Verhulst, mostrou-se como os elementos de dinâmica populacional
podem ser usados na construção de modelos para simular as conseqüências da presença
de um agente tóxico, sobre uma dada população.
135
Estas considerações não tiveram a pretensão de explorar com detalhes as possibilidades
e as dificuldades de abordagens usando dinâmica de populações. Ao invés disso,
pretendeu-se apenas chamar a atenção para a possibilidade de seu emprego como uma
ferramenta possível de se incorporar numa complexa Análise Quantitativa de Riscos
Ambientais.
Para finalizar, ressalta-se os seguintes pontos como possíveis benefícios de uma AQRA:
• Permite identificar sistematicamente todos os riscos ao meio;
• Permite quantificar os riscos;
• Possibilita priorizar de forma objetiva as fontes de risco bem como as medidas
para sua redução, elemento fundamental para o gerenciamento de risco;
• Permite comparar diversos critérios padrão de aceitação ou mesmo escolher
dentre diferentes opções de projeto as de menor risco ambiental;
• Possibilita um gerenciamento pró-ativo do risco financeiro, risco à imagem pública
do empreendimento e, do risco ao negócio associado a dano ambiental.
Para a consolidação da metodologia proposta, devem se realizados estudos
complementares nos vários elementos que a compõem. Duas questões importantes que
já tem merecido nossa atenção e cujas discussões pretendemos apresentar brevemente
são: 1) a utilização de modelos de dinâmica de populações aplicados ao estudo de casos
onde são conhecidos, entre outros, os parâmetros toxicológicos (α) de uma população
específica; 2) uma contribuição ao estabelecimento de um critério quantitativo de
tolerabilidade de riscos ambientais.
136
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