FILOCOM – NÚCLEO DE ESTUDOS FILOSÓFICOS DA
COMUNICAÇÃO
I Encontro Nacional da Rede de Grupos de Pesquisa em
Comunicação22 a 25 de novembro de 2012
APRESENTAÇÃO ORAL:
Francisco Augusto Cruz de Araújo
Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais – PGCS/UFRN
Sociólogo, Bacharel em Ciências Sociais – UERN (Mossoró-RN)
Nesta comunicação, eu pretendo falar um pouco sobre o que o
Sociólogo americano WHRIGHT MILLS denominou de “artesanato
intelectual”. Eu confesso que fui surpreendido com a provocação do
professor Ciro em focarmos a nossa apresentação em torno da questão “Em
que sua pesquisa está renovando o olhar sobre a comunicação e a forma
de estudá-la?”.
Digo isto, porque fugimos completamente do modelo tradicional de
comunicação científica. Neste espaço, podemos olhar nos olhos de todos os
participantes do Encontro, estamos todos sentados em círculo e
compartilhamos uma pergunta central: “Como a minha pesquisa tem
contribuído nos estudos das práticas sociais e na produção de sentido no
campo da comunicação?”.
Eu confesso novamente: não tenho respostas objetivas para o tempo
de 5 minutos. Nem teria se me fossem oferecidos 50 minutos. São as
perguntas simples, como disse o PROF. BOAVENTURA SANTOS, que
provocam as grandes reflexões e revoluções na ciência e na subjetividade
humana.
As contribuições dos demais colegas provocaram em mim o
surgimento de outras questões tão importantes quanto aquelas surgidas
naturalmente no processo de construção do meu artesanato intelectual.
Buscarei portanto, falar menos sobre objetos de pesquisa, sobre
metodologias, objetivo geral e específicos, e buscarei falar sobre método e
rupturas que provoquei dentro do campo de estudo da Sociologia.
Não sou profissional do campo da Comunicação Social, como a
maioria de vocês aqui neste evento. Foi um desafio para mim ao ingressar
no Mestrado em Ciências Sociais, mergulhar em um universo que vai além
das teorias sociológicas, antropológicas e da política: as teorias e práticas
do campo da comunicação social e a partir deste amplo campo, pensar a
minha pesquisa. Falarei rapidamente sobre as minhas primeiras relações
com a comunicação.
O meu tema de estudo é a violência social. Durante a minha
graduação, eu tive algumas experiências em atividades de extensão
universitária que me fizeram interessar por esse vasto e complexo tema. Os
quatro anos da minha graduação culminaram com a produção de uma
pesquisa intitulada “Ta lá um corpo estendido no chão”: um estudo de
caso do Linchamento em Areia Branca – RN. Nesta pesquisa, eu me
dediquei a estudar um caso de linchamento ocorrido no início da década de
1990, e que até os dias atuais possui grande valor simbólico na identidade
da população daquela cidade. Este linchamento causou grande comoção e o
nome da cidade esteve com grande frequência no noticiário local, regional
e nacional. Por causa do tempo, não poderei apresentar detalhes do estudo,
mas preciso aqui apresentar talvez o meu primeiro grande desafio enquanto
pesquisador.
Como estudar um fenômeno (o linchamento) executado por uma
multidão? Elias Canetti, romancista búlgaro nacionalizado inglês, nos diz
que o estado de multidão é um fato social total onde os valores individuais
se esvaem e dão espaço a um único corpo, a um único sentimento. Para a
minha pesquisa, como eu conseguiria chegar aos indivíduos para apreender
o que pensaram e sentiram quando praticaram o linchamento? Fui em busca
de fontes. Os registros policiais nada me ofereceram, mas os registros
jornalísticos possibilitaram que eu chegasse até o meu objeto.
Aprofundando o meu estudo sobre o caso, fui buscar na sociologia
interpretações sobre este fenômeno coletivo violento, mas também busquei
pensar na forma como os jornais fizeram as notícias deste caso circular e
ajudar a construir as representações sociais da identidade da cidade. Hoje
em dia, tanto tempo depois do linchamento, as pessoas com mais de 20
anos de idade têm algo a falar sobre o fato ocorrido e sua importância para
a identidade individual e coletiva.
Percebam o meu desafio: entender como se constroem as
representações individuais e coletivas a partir das representações
midiáticas. Que relação de poder e força há entre o campo da comunicação
e os indivíduos comuns?
Não foi difícil encontrar manuais sociológicos que expressavam o
caráter MANIPULADOR da mídia. Li sobre alienação, controle,
manipulação, consumo e outras formas de demonizar a comunicação.
Segui então minha pesquisa, capturei dados estatísticos sobre
linchamentos, falas de participantes, fotografias, artigos de opinião,
reportagens e finalmente concluí imaturamente que a mídia foi a grande
responsável pela construção da identidade violenta da cidade e seus
habitantes.
Quando encerramos uma pesquisa, publicamos aqueles fragmentos
que mais nos interessam ou que mais interessam a quem tem o poder de
publicar e neste processo de (re) escrita da história, como disse Michel de
Certeau, o “não-dito” da minha pesquisa começou a me incomodar. Eu
deveria então, buscar aquilo que ficou no silêncio. Minha decisão foi
portanto, ingressar no mestrado e continuar desbravando o campo da
comunicação social.
Ao ingressar na pós-graduação eu sofri um choque: percebi melhor
que o homem é um animal simbólico, 100% natureza e 100% cultura, que o
corpo humano está entrelaçado a uma complexa rede de relações que
envolvem sentimentos, consumo, poder, política, etc. Consegui perceber
então o estupor assumido pelo antropólogo Massimo Canevacci como ‘um
abrir-se ao desconhecido e ao estranho e deixar que estes atravessem nosso
corpo’. E percebi que esta lógica faz parte da construção diária das
inúmeras identidades que os sujeitos possuem nesta enorme metrópole
comunicacional.
Para onde foi, portanto o caráter manipulador que a Sociologia
marxista tradicionalmente afirma? Decidi então, voltar ao primeiro passo
da pesquisa: pensar a minha forma de pensar, em busca do meu Método foi
quando recebi ajuda de Edgar Morin.
A minha pesquisa no mestrado, sob orientação da professora Josimey
Costa é intitulada Imagens da violência: um estudo sobre as
representações midiáticas do crime nos jornais de Natal-RN. Como
aproveitei meu tempo para falar sobre meus desafios enquanto pesquisador,
informo que o resumo expandido está nos anais deste evento.
Nesta pesquisa, eu busco compreender como se constroem as
notícias da violência cotidiana a partir das representações da mídia daquela
cidade. Que interesses estão em jogo? Quais os dispositivos e estratégias
são mobilizados para equilibrar a imagem de uma cidade acolhedora,
divertida, bela e agradável com um cenário crescente de sequestros,
latrocínios, homicídios, assaltos, etc.? Que imagens são aquelas de corpos
no chão que são expostas ao lado das belas imagens das paisagens da
cidade?
Eu já estou na reta final do mestrado, mas asseguro a todos que as
dúvidas permanecem. Escolhi então um sentimento que servirá como
fundação ao meu estudo: o medo social ressignificado a partir do que a
mídia circula sobre a violência.
Recentemente, a professora Norma Takeuti, socióloga e colega do
Prof. Ciro, me lembrou recentemente que ao pensar a mídia enquanto
construtora desse amplo cenário onde transitam valores, sentimentos e
interesses mais diversificados, existe um medo ontológico que não devo
confundir com o medo social-coletivo. Encontrei portanto, um outro grande
desafio: eu sou objeto e objetivo da minha própria pesquisa.
Como disse antes de ontem o Prof. Alex Galeno, o medo e as
representações que busco pesquisar também me constituem. Este é um
grande desafio na construção deste artesanato intelectual: romper com as
amarras da Sociologia, ir até a Psicologia para perceber a carga afetiva-
emocional que circula no campo da Comunicação, na Antropologia para
entender melhor o universos das trocas simbólicas e fundamentalmente na
Filosofia para perceber que, como afirmou Morin: “[...] o conhecimento
está ligado, por todos os lados, à estrutura da cultura, à organização social,
à práxis histórica” e sabendo disto, poderei fazer uma permanente auto-
crítica e tecer com mais tranquilidade os fios que dão formato ao meu
artesanato do conhecimento.
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