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FESTEJOS DE SAtildeO SEBASTIAtildeO EM ITAGIMIRIM-BA Memoacuteria e Histoacuteria de Um
Povo (1960- 1998)
Jairo Viana de Castro1
INTRODUCcedilAtildeO
A festividade em um olhar da sociedade moderna representa apenas uma manifestaccedilatildeo
de caraacuteter popular poreacutem dentro desse universo de popularidade estaacute repleta de aspectos que
inicialmente podem se destacar a religiosidade catoacutelica negra e indiacutegena o proacuteprio ato de
agradecer um santo pela benccedilatildeo recebida ou mesmo agrave feacute dos membros constitui a base de uma
sociabilidade entre o homem e o meio social ao qual estaacute inserido
O culto aos santos eacute uma apropriaccedilatildeo do campo religioso forma encontrada pelos
leigos de participarem dos atos lituacutergicos a partir de suas expressotildees religiosas como aborda
Edilece Souza Couto2 ldquoA partir do seacuteculo X a Igreja tentava impor a devoccedilatildeo aos seus
patronos membros das ordens religiosas Poreacutem os fieacuteis continuaram cultuando crianccedilas
virgens e pessoas comuns figuras familiares e caridosasrdquo
Na contemporaneidade existem diversas pesquisas sobre festas e festejos no Brasil e
sobretudo na Bahia no entanto natildeo existem estudos sobre a origem o desdobramento e a
permanecia de uma manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular em devoccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo na
cidade de Itagimirim-Ba que estaacute localizada entre o Vale do Jequitinhonha e a Costa do
Descobrimento
Flaacutevia Pires (2011) descreve a transformaccedilotildees e permanecircncia da festa ao padroeiro
Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira- PB3 onde o evento nesta localidade eacute organizado pela Igreja
Catoacutelica com missas durante nove dias (denominado de novenas) Apoacutes as celebraccedilotildees em um
determinado espaccedilo os devotos se socializam com comidas e bebidas ou ainda quermesses
onde satildeo realizadas diversas atividades
1 Graduando em Licenciatura em Histoacuteria pela Universidade do Estado da Bahia Departamento de Ciencias
Humanas e Tecnologias Campus XVIII Eunaacutepolis- Ba castrovianajgmailcom 2 Edilece Souza Couto FESTEJAR OS SANTOS EM SALVADOR REGRAS ECLESIAacuteSTICAS E
DESOBEDIEcircNCIAS LEIGAS (1850-1930) Universidade Federal da Bahia 3 Para compreender as anaacutelises da festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira PB recomenda-se a leitura do artigo de
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez anos depois
University of Sheffield 2011
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A memoacuteria que carrega a histoacuteria de um povo e suas experiecircncias humanas aleacutem de
ser um meacutetodo usado antes do surgimento da Histoacuteria para descrever uma sociedade e suas
formas de organizaccedilatildeo agraves pessoas iletradas trazia uma riqueza de detalhes de suas vivecircncias
por meio da oralidade e muitas vezes se perdem ou caminham em um mundo paralelo aos dos
letrados
O festejo que nasce a partir da junccedilatildeo entre duas religiotildees o catolicismo popular
reconhecido oficialmente pela coroa portuguesa e a Umbanda religiatildeo de matriz africana que
se desenvolve na colocircnia brasileira pelas culturas africanas e indiacutegenas surge entre esses
conflitos culturais e religiosos existentes no Brasil Para Abreu (1999) ldquo[] as festas satildeo
sempre recriadas e reapropriadas contendo as paixotildees os conflitos as crenccedilas e as esperanccedilas
de seus proacuteprios agentes sociais Ou seja atraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a
coletividade e a eacutepoca em que aconteceramrdquo
Este Trabalho busca contribuir e analisar o festejo de Satildeo Sebastiatildeo uma manifestaccedilatildeo
religiosa e profana que fez parte do desenvolvimento e da sociabilidade urbana e rural desde o
tempo que surgiu em Itagimirim-Ba uma demonstraccedilatildeo de feacute e agradecimento pelas becircnccedilatildeos
recebidas ao longo do ano o cortejo dos foliotildees representa um espaccedilo de respeito por duas
religiotildees que manteacutem a tradiccedilatildeo
Quando menino nas muitas vezes que meus pais me levaram para contemplar os
festejos a SAtildeO SEBASTIAtildeO natildeo entendia por que aquelas pessoas danccedilavam e brincavam
com seus instrumentos como bumba gaitas violas caixas triacircngulos e pratos velhos de
esmalte que produziam um som estranho as muacutesicas difiacuteceis de compreender em muitas
vozes roucas mas meu pai conta que era para demonstrar a feacute e agradecer o santo pelas
becircnccedilatildeos recebidas ao longo dos anos
Mesmo fazendo parte desta cultura perguntas ficaram sem respostas tais como
quando surgiu este festejo que elementos de renovaccedilatildeo os mantiveram durante o periacuteodo
percorrido
A escolha do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba como corpus deste Trabalho
se deu com a finalidade de analisar a comunidade itagimiriense a partir das suas
manifestaccedilotildees populares e suas praacuteticas em relaccedilatildeo aos rituais religiosos festivos que
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representa uma demonstraccedilatildeo de feacute e devoccedilatildeo desenvolvida por trabalhadores rurais pessoas
simples que migraram de outras regiotildees a qual foi iniciada pela religiatildeo afro-brasileira
A memoacuteria eacute algo fundamental na trajetoacuteria de vida dos seres humanos para a histoacuteria
oral essa fonte perpassa os indiviacuteduos pelo motivo da transmissatildeo dos valores culturais esse
longo espaccedilo percorrido no tempo eacute possiacutevel graccedilas agraves lembranccedilas e tradiccedilotildees coletivas e
individuais de grupos sociais
SURGIMENTO E MOTIVOS DO FESTEJO DE SAtildeO SEBASTIAtildeO EM
ITAGIMIRIM-BA
Com a descoberta do ouro e pedras preciosas em Minas Gerais o Rio Grande de
Belmonte torna-se uma rota de comeacutercio com o porto da cidade de BelmonteBA nas
margens desse rio que hoje eacute conhecido como Jequitinhonha 4
Aleacutem das relaccedilotildees comerciais e as trocas culturais da Bahia o fluxo de mercadoria
tambeacutem fazem surgir agraves tradiccedilotildees da regiatildeo o festejo a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba teve
seu surgimento no povoado de Cachoeirinha ldquoFreguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da
Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhardquo tiacutetulo de um livro onde o autor descreve que
Cachoeirinha ldquo[] foi o primeiro ponto de recebimento das tropas e canoas que transportavam
mercadorias para abastecer o norte de Minas Gerais []rdquo (NASCIMENTO 2010 P 14)
O cortejo ao santo eacute desenvolvido pelo terreiro de umbanda 5que se instalou no
povoado por dona Marta Gomes da Conceiccedilatildeo que herdou de seus pais vinda de Minas
Gerais casada com Sr Antocircnio Rodrigues que migrou do estado de Alagoas na localidade de
Palmeiras dos iacutendios6 como nos relata sua filha a Srordf Maria Conceiccedilatildeo Rodrigues7
4NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha
do Baixo Jequitinhonha ldquoA regiatildeo da baixa do Jequitinhonha que se inicia e Salto da divisa Minas Gerais indo
ateacute a foz em Belmonte no extremo sul da Bahia () p- 11 5Simbolizado pela flechas eacute um dos maacutertires mais queridos e cultuados pela Igreja Catoacutelica no sincretismo
religioso com as religiotildees afro-brasileiras eacute representado como Oxossi o orixaacute das matas da sauacutede e das ervas
medicinais O seu nome deriva do grego sebastoacutes que significa divino veneraacutevel (que seguia a beatitude da
cidade suprema e da gloacuteria altiacutessima) No Brasil ele eacute celebrado com festas e feriados no dia 20 de janeiro como
padroeiro de vaacuterias cidades httpproblemaenossoblogspotcombr201101sob-flechas-e-martirio-ontem-
igrejahtmlacesso dia 06-05-12 agraves 12h43min horas 6 Palmeira dos Iacutendios Alagoas ndashAl Histoacuterico A terras ocupadas pelo municiacutepio de Palmeira dos Iacutendios
construiacuteam primitivamente um aldeamento dos iacutendios Xucurus que aiacute se estabeleceram no meado do seacuteculo
XVIII Tinham esses indiacutegenas o seu haacutebitat cercado de esbeltas palmeiras bem proacuteximo ao peacute da serra onde
hoje se ergue a cidade de Palmeira dos Iacutendios O nome do municiacutepio veio pois em consequumlecircncia dos seus
primeiros habitantes e do fato da abundacircncia de palmeiras que entatildeo havia em seus campos Os gentios
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Conheci o festejo com doze anos de idade quando saia com meus pais ()
Antigamente a gente morava em cachoeirinha onde hoje eacute a barragem De laacute
o percurso ia para Itapebi Itagimirim que natildeo era emancipada era uma roccedila
soacute tinha mesmo essa pracinha Castro Alves tinha mas natildeo era calccedilada e
nem nada Entatildeo noacutes ia para Itapebide laacute vinha pra aqui (Itagimirim) Neste
tempo eu era pequena papai me colocava eu muntada na cangaia com os
panicus cheios de comida pra da os foliotildees eu no meio pequena mas jaacute no
meio ai agente vinha pra aqui acampava trecircs a quatro dias daqui passava em
Gabiarra A peacute andando andando nessa cidade tudo passava em Uniatildeo
Baiana descia e saia em cachoeirinha ( Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Neste sentido o festejo a Satildeo Sebastiatildeo na comunidade Itagimiriense eacute um tradiccedilatildeo e
memoacuteria de familiares sendo passada as novas geraccedilotildees como se pode perceber no trecho
acima essa devoccedilatildeo foi passada de matildee para filha O membro responsaacutevel tem a missatildeo de
todos os anos organizar e desenvolver o festejo comprando mantimentos ou pedindo doaccedilotildees
aos devotos e fazendeiros no qual as doaccedilotildees satildeo divididas com os tocadores ou foliotildees
Inicialmente nos anos de 1960 a manifestaccedilatildeo de feacute acontecia fora do periacutemetro
urbano como nos relata a Srordf Hilda Queiroz (04-05-14) ldquoesse negoacutecio de reisado era
realizado na zona ruralrdquo Jaacute o Sr Gildo Gonccedilalves (30-05-14) evidencia que ldquoera trinta dias
de reisado visitando as fazendas e a cidade tambeacutem era Satildeo Sebastiatildeordquo
Percebemos que a praacutetica de reisado a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim eacute desenvolvido
por pessoas da zona rural com isso os foliotildees no momento do cortejo entravam dentro da
cidade e compartilhe com os moradores que festejavam a Satildeo Joatildeo Batista padroeiro
instituiacutedo pela igreja catoacutelica
O festejo que se desenvolveu pela memoacuteria herdada tambeacutem natildeo eacute um acontecimento
imoacutevel sofre transformaccedilotildees no decorrer das geraccedilotildees de acordo com o contexto social sendo
agregados valores e concepccedilotildees do momento vivenciado
A Srordf Maria da Conceiccedilatildeo relata que a organizaccedilatildeo do festejo a Satildeo Sebastiatildeo
comeccedilou a ser desenvolvido dentro da zona urbana quando o seu pai faleceu com isso eles
formaram seu aldeamento entre um brejo chamado Cafuma e a serra da Boa Vista Diz a tradiccedilatildeo que mais ou
menos em 1770 chegou a regiatildeo Frei Domingos de Satildeo Joseacute conseguindo converter os gentios ao cristianismo
Posteriormente o franciscano obteve de D Maria Pereira Gonccedilalves e dos seus herdeiros a doaccedilatildeo de meia leacutegua
de terra para patrimocircnio da capela que aiacute foi construiacuteda sendo com sagrada ao Senhor Bom Jesus da Morte
httpcidadesgovbrpainelhistoacutericophplang=ampcodmun=270630ampsearch=alagoas|palmeira-dos-
C38Dndios|infograficos-historico Acesso em 09-07-2014 agraves 2045 7 Moradora de Itagimirim-Ba conhecida como Matildee Ceicinha nasceu em 11 de setembro de 1950
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perderam a fazenda atraveacutes de um golpe quando seu primo a vendeu a propriedade
utilizando uma procuraccedilatildeo cedida a ele sendo obrigados a residir dentro da cidade
Antigamente era na fazenda pedreira o nome que dava onde mamatildee
comeccedilou o candombleacute Quando agente chegou aqui montou o terreirinho
dela aiacute veio para cidade em 62 quando Itagimirim jaacute era bem desenvolvida
e movimentada (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Diante desse acontecimento e da mudanccedila de um lugar para o outro o festejo continua
sendo cultuado pelos devotos salientando que dentro do cenaacuterio urbano jaacute existia o culto ao
Padroeiro Satildeo Joatildeo Batista Poreacutem o festejo ao padroeiro antes da instalaccedilatildeo do padre era
desenvolvido o lado profano pela populaccedilatildeo que tinha maior participaccedilatildeo na montagem das
barracas para vender comidas tiacutepicas das festas juninas
Com a organizaccedilatildeo das cerimocircnias religiosa e profana como as quermesses e leilotildees
para arrecadar fundos para construccedilatildeo da igreja catoacutelica em 1963 pelo padre haacute um
afastamento da populaccedilatildeo que ganhava um dinheiro extra com o evento
Segundo Hobsbawm (1997 P 20) ldquoAntes de mais nada pode-se dizer que as tradiccedilotildees
inventadas satildeo sintomas importantes e portanto indicadores de problemas que de outra forma
poderiam natildeo ser detectadas nem localizadas no tempordquo
Portanto a manifestaccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo ganha mais participantes principalmente
dentro da cidade fazendo um movimento contraacuterio no momento das celebraccedilotildees ao santo
pois antes as pessoas se deslocavam para zona rural Agora o povo das fazendas quem se
desloca para zona urbana O Sr Jonas A de Castro relata que na eacutepoca que chegou ao
municiacutepio itagimiriense em 1975 a praacutetica do reisado era desenvolvido por vaacuterios grupos
Quando eu cheguei ao municiacutepio existiam quatro grupos de reisado o de
Ceizinha o de Zeacute de Cabelatildeo o de Joaquim Teixeira e Otaciacutelio da Caccediloada
trecircs festejavam a Satildeo Sebastiatildeo e um a Santos Reis Eu participava dos dois
o de Otaciacutelio que festeja a Santos Reis ai eu participava com Joaquim
Teixeira que festejava a Satildeo Sebastiatildeo (Sr Jonas Almeida de Castro 30-05-
14)
O que se observa neste trecho descrito pelo Sr Jonas eacute o aumento de grupos de reisado
na localidade isto se deu devido agraves memoacuterias da populaccedilatildeo estar ligadas as folias de reisado
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ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
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Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
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para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
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dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
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VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
2
A memoacuteria que carrega a histoacuteria de um povo e suas experiecircncias humanas aleacutem de
ser um meacutetodo usado antes do surgimento da Histoacuteria para descrever uma sociedade e suas
formas de organizaccedilatildeo agraves pessoas iletradas trazia uma riqueza de detalhes de suas vivecircncias
por meio da oralidade e muitas vezes se perdem ou caminham em um mundo paralelo aos dos
letrados
O festejo que nasce a partir da junccedilatildeo entre duas religiotildees o catolicismo popular
reconhecido oficialmente pela coroa portuguesa e a Umbanda religiatildeo de matriz africana que
se desenvolve na colocircnia brasileira pelas culturas africanas e indiacutegenas surge entre esses
conflitos culturais e religiosos existentes no Brasil Para Abreu (1999) ldquo[] as festas satildeo
sempre recriadas e reapropriadas contendo as paixotildees os conflitos as crenccedilas e as esperanccedilas
de seus proacuteprios agentes sociais Ou seja atraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a
coletividade e a eacutepoca em que aconteceramrdquo
Este Trabalho busca contribuir e analisar o festejo de Satildeo Sebastiatildeo uma manifestaccedilatildeo
religiosa e profana que fez parte do desenvolvimento e da sociabilidade urbana e rural desde o
tempo que surgiu em Itagimirim-Ba uma demonstraccedilatildeo de feacute e agradecimento pelas becircnccedilatildeos
recebidas ao longo do ano o cortejo dos foliotildees representa um espaccedilo de respeito por duas
religiotildees que manteacutem a tradiccedilatildeo
Quando menino nas muitas vezes que meus pais me levaram para contemplar os
festejos a SAtildeO SEBASTIAtildeO natildeo entendia por que aquelas pessoas danccedilavam e brincavam
com seus instrumentos como bumba gaitas violas caixas triacircngulos e pratos velhos de
esmalte que produziam um som estranho as muacutesicas difiacuteceis de compreender em muitas
vozes roucas mas meu pai conta que era para demonstrar a feacute e agradecer o santo pelas
becircnccedilatildeos recebidas ao longo dos anos
Mesmo fazendo parte desta cultura perguntas ficaram sem respostas tais como
quando surgiu este festejo que elementos de renovaccedilatildeo os mantiveram durante o periacuteodo
percorrido
A escolha do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba como corpus deste Trabalho
se deu com a finalidade de analisar a comunidade itagimiriense a partir das suas
manifestaccedilotildees populares e suas praacuteticas em relaccedilatildeo aos rituais religiosos festivos que
3
representa uma demonstraccedilatildeo de feacute e devoccedilatildeo desenvolvida por trabalhadores rurais pessoas
simples que migraram de outras regiotildees a qual foi iniciada pela religiatildeo afro-brasileira
A memoacuteria eacute algo fundamental na trajetoacuteria de vida dos seres humanos para a histoacuteria
oral essa fonte perpassa os indiviacuteduos pelo motivo da transmissatildeo dos valores culturais esse
longo espaccedilo percorrido no tempo eacute possiacutevel graccedilas agraves lembranccedilas e tradiccedilotildees coletivas e
individuais de grupos sociais
SURGIMENTO E MOTIVOS DO FESTEJO DE SAtildeO SEBASTIAtildeO EM
ITAGIMIRIM-BA
Com a descoberta do ouro e pedras preciosas em Minas Gerais o Rio Grande de
Belmonte torna-se uma rota de comeacutercio com o porto da cidade de BelmonteBA nas
margens desse rio que hoje eacute conhecido como Jequitinhonha 4
Aleacutem das relaccedilotildees comerciais e as trocas culturais da Bahia o fluxo de mercadoria
tambeacutem fazem surgir agraves tradiccedilotildees da regiatildeo o festejo a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba teve
seu surgimento no povoado de Cachoeirinha ldquoFreguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da
Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhardquo tiacutetulo de um livro onde o autor descreve que
Cachoeirinha ldquo[] foi o primeiro ponto de recebimento das tropas e canoas que transportavam
mercadorias para abastecer o norte de Minas Gerais []rdquo (NASCIMENTO 2010 P 14)
O cortejo ao santo eacute desenvolvido pelo terreiro de umbanda 5que se instalou no
povoado por dona Marta Gomes da Conceiccedilatildeo que herdou de seus pais vinda de Minas
Gerais casada com Sr Antocircnio Rodrigues que migrou do estado de Alagoas na localidade de
Palmeiras dos iacutendios6 como nos relata sua filha a Srordf Maria Conceiccedilatildeo Rodrigues7
4NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha
do Baixo Jequitinhonha ldquoA regiatildeo da baixa do Jequitinhonha que se inicia e Salto da divisa Minas Gerais indo
ateacute a foz em Belmonte no extremo sul da Bahia () p- 11 5Simbolizado pela flechas eacute um dos maacutertires mais queridos e cultuados pela Igreja Catoacutelica no sincretismo
religioso com as religiotildees afro-brasileiras eacute representado como Oxossi o orixaacute das matas da sauacutede e das ervas
medicinais O seu nome deriva do grego sebastoacutes que significa divino veneraacutevel (que seguia a beatitude da
cidade suprema e da gloacuteria altiacutessima) No Brasil ele eacute celebrado com festas e feriados no dia 20 de janeiro como
padroeiro de vaacuterias cidades httpproblemaenossoblogspotcombr201101sob-flechas-e-martirio-ontem-
igrejahtmlacesso dia 06-05-12 agraves 12h43min horas 6 Palmeira dos Iacutendios Alagoas ndashAl Histoacuterico A terras ocupadas pelo municiacutepio de Palmeira dos Iacutendios
construiacuteam primitivamente um aldeamento dos iacutendios Xucurus que aiacute se estabeleceram no meado do seacuteculo
XVIII Tinham esses indiacutegenas o seu haacutebitat cercado de esbeltas palmeiras bem proacuteximo ao peacute da serra onde
hoje se ergue a cidade de Palmeira dos Iacutendios O nome do municiacutepio veio pois em consequumlecircncia dos seus
primeiros habitantes e do fato da abundacircncia de palmeiras que entatildeo havia em seus campos Os gentios
4
Conheci o festejo com doze anos de idade quando saia com meus pais ()
Antigamente a gente morava em cachoeirinha onde hoje eacute a barragem De laacute
o percurso ia para Itapebi Itagimirim que natildeo era emancipada era uma roccedila
soacute tinha mesmo essa pracinha Castro Alves tinha mas natildeo era calccedilada e
nem nada Entatildeo noacutes ia para Itapebide laacute vinha pra aqui (Itagimirim) Neste
tempo eu era pequena papai me colocava eu muntada na cangaia com os
panicus cheios de comida pra da os foliotildees eu no meio pequena mas jaacute no
meio ai agente vinha pra aqui acampava trecircs a quatro dias daqui passava em
Gabiarra A peacute andando andando nessa cidade tudo passava em Uniatildeo
Baiana descia e saia em cachoeirinha ( Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Neste sentido o festejo a Satildeo Sebastiatildeo na comunidade Itagimiriense eacute um tradiccedilatildeo e
memoacuteria de familiares sendo passada as novas geraccedilotildees como se pode perceber no trecho
acima essa devoccedilatildeo foi passada de matildee para filha O membro responsaacutevel tem a missatildeo de
todos os anos organizar e desenvolver o festejo comprando mantimentos ou pedindo doaccedilotildees
aos devotos e fazendeiros no qual as doaccedilotildees satildeo divididas com os tocadores ou foliotildees
Inicialmente nos anos de 1960 a manifestaccedilatildeo de feacute acontecia fora do periacutemetro
urbano como nos relata a Srordf Hilda Queiroz (04-05-14) ldquoesse negoacutecio de reisado era
realizado na zona ruralrdquo Jaacute o Sr Gildo Gonccedilalves (30-05-14) evidencia que ldquoera trinta dias
de reisado visitando as fazendas e a cidade tambeacutem era Satildeo Sebastiatildeordquo
Percebemos que a praacutetica de reisado a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim eacute desenvolvido
por pessoas da zona rural com isso os foliotildees no momento do cortejo entravam dentro da
cidade e compartilhe com os moradores que festejavam a Satildeo Joatildeo Batista padroeiro
instituiacutedo pela igreja catoacutelica
O festejo que se desenvolveu pela memoacuteria herdada tambeacutem natildeo eacute um acontecimento
imoacutevel sofre transformaccedilotildees no decorrer das geraccedilotildees de acordo com o contexto social sendo
agregados valores e concepccedilotildees do momento vivenciado
A Srordf Maria da Conceiccedilatildeo relata que a organizaccedilatildeo do festejo a Satildeo Sebastiatildeo
comeccedilou a ser desenvolvido dentro da zona urbana quando o seu pai faleceu com isso eles
formaram seu aldeamento entre um brejo chamado Cafuma e a serra da Boa Vista Diz a tradiccedilatildeo que mais ou
menos em 1770 chegou a regiatildeo Frei Domingos de Satildeo Joseacute conseguindo converter os gentios ao cristianismo
Posteriormente o franciscano obteve de D Maria Pereira Gonccedilalves e dos seus herdeiros a doaccedilatildeo de meia leacutegua
de terra para patrimocircnio da capela que aiacute foi construiacuteda sendo com sagrada ao Senhor Bom Jesus da Morte
httpcidadesgovbrpainelhistoacutericophplang=ampcodmun=270630ampsearch=alagoas|palmeira-dos-
C38Dndios|infograficos-historico Acesso em 09-07-2014 agraves 2045 7 Moradora de Itagimirim-Ba conhecida como Matildee Ceicinha nasceu em 11 de setembro de 1950
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perderam a fazenda atraveacutes de um golpe quando seu primo a vendeu a propriedade
utilizando uma procuraccedilatildeo cedida a ele sendo obrigados a residir dentro da cidade
Antigamente era na fazenda pedreira o nome que dava onde mamatildee
comeccedilou o candombleacute Quando agente chegou aqui montou o terreirinho
dela aiacute veio para cidade em 62 quando Itagimirim jaacute era bem desenvolvida
e movimentada (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Diante desse acontecimento e da mudanccedila de um lugar para o outro o festejo continua
sendo cultuado pelos devotos salientando que dentro do cenaacuterio urbano jaacute existia o culto ao
Padroeiro Satildeo Joatildeo Batista Poreacutem o festejo ao padroeiro antes da instalaccedilatildeo do padre era
desenvolvido o lado profano pela populaccedilatildeo que tinha maior participaccedilatildeo na montagem das
barracas para vender comidas tiacutepicas das festas juninas
Com a organizaccedilatildeo das cerimocircnias religiosa e profana como as quermesses e leilotildees
para arrecadar fundos para construccedilatildeo da igreja catoacutelica em 1963 pelo padre haacute um
afastamento da populaccedilatildeo que ganhava um dinheiro extra com o evento
Segundo Hobsbawm (1997 P 20) ldquoAntes de mais nada pode-se dizer que as tradiccedilotildees
inventadas satildeo sintomas importantes e portanto indicadores de problemas que de outra forma
poderiam natildeo ser detectadas nem localizadas no tempordquo
Portanto a manifestaccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo ganha mais participantes principalmente
dentro da cidade fazendo um movimento contraacuterio no momento das celebraccedilotildees ao santo
pois antes as pessoas se deslocavam para zona rural Agora o povo das fazendas quem se
desloca para zona urbana O Sr Jonas A de Castro relata que na eacutepoca que chegou ao
municiacutepio itagimiriense em 1975 a praacutetica do reisado era desenvolvido por vaacuterios grupos
Quando eu cheguei ao municiacutepio existiam quatro grupos de reisado o de
Ceizinha o de Zeacute de Cabelatildeo o de Joaquim Teixeira e Otaciacutelio da Caccediloada
trecircs festejavam a Satildeo Sebastiatildeo e um a Santos Reis Eu participava dos dois
o de Otaciacutelio que festeja a Santos Reis ai eu participava com Joaquim
Teixeira que festejava a Satildeo Sebastiatildeo (Sr Jonas Almeida de Castro 30-05-
14)
O que se observa neste trecho descrito pelo Sr Jonas eacute o aumento de grupos de reisado
na localidade isto se deu devido agraves memoacuterias da populaccedilatildeo estar ligadas as folias de reisado
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ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
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Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
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21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
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CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
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COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
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1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
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22
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1997
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Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
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VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
3
representa uma demonstraccedilatildeo de feacute e devoccedilatildeo desenvolvida por trabalhadores rurais pessoas
simples que migraram de outras regiotildees a qual foi iniciada pela religiatildeo afro-brasileira
A memoacuteria eacute algo fundamental na trajetoacuteria de vida dos seres humanos para a histoacuteria
oral essa fonte perpassa os indiviacuteduos pelo motivo da transmissatildeo dos valores culturais esse
longo espaccedilo percorrido no tempo eacute possiacutevel graccedilas agraves lembranccedilas e tradiccedilotildees coletivas e
individuais de grupos sociais
SURGIMENTO E MOTIVOS DO FESTEJO DE SAtildeO SEBASTIAtildeO EM
ITAGIMIRIM-BA
Com a descoberta do ouro e pedras preciosas em Minas Gerais o Rio Grande de
Belmonte torna-se uma rota de comeacutercio com o porto da cidade de BelmonteBA nas
margens desse rio que hoje eacute conhecido como Jequitinhonha 4
Aleacutem das relaccedilotildees comerciais e as trocas culturais da Bahia o fluxo de mercadoria
tambeacutem fazem surgir agraves tradiccedilotildees da regiatildeo o festejo a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba teve
seu surgimento no povoado de Cachoeirinha ldquoFreguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da
Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhardquo tiacutetulo de um livro onde o autor descreve que
Cachoeirinha ldquo[] foi o primeiro ponto de recebimento das tropas e canoas que transportavam
mercadorias para abastecer o norte de Minas Gerais []rdquo (NASCIMENTO 2010 P 14)
O cortejo ao santo eacute desenvolvido pelo terreiro de umbanda 5que se instalou no
povoado por dona Marta Gomes da Conceiccedilatildeo que herdou de seus pais vinda de Minas
Gerais casada com Sr Antocircnio Rodrigues que migrou do estado de Alagoas na localidade de
Palmeiras dos iacutendios6 como nos relata sua filha a Srordf Maria Conceiccedilatildeo Rodrigues7
4NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha
do Baixo Jequitinhonha ldquoA regiatildeo da baixa do Jequitinhonha que se inicia e Salto da divisa Minas Gerais indo
ateacute a foz em Belmonte no extremo sul da Bahia () p- 11 5Simbolizado pela flechas eacute um dos maacutertires mais queridos e cultuados pela Igreja Catoacutelica no sincretismo
religioso com as religiotildees afro-brasileiras eacute representado como Oxossi o orixaacute das matas da sauacutede e das ervas
medicinais O seu nome deriva do grego sebastoacutes que significa divino veneraacutevel (que seguia a beatitude da
cidade suprema e da gloacuteria altiacutessima) No Brasil ele eacute celebrado com festas e feriados no dia 20 de janeiro como
padroeiro de vaacuterias cidades httpproblemaenossoblogspotcombr201101sob-flechas-e-martirio-ontem-
igrejahtmlacesso dia 06-05-12 agraves 12h43min horas 6 Palmeira dos Iacutendios Alagoas ndashAl Histoacuterico A terras ocupadas pelo municiacutepio de Palmeira dos Iacutendios
construiacuteam primitivamente um aldeamento dos iacutendios Xucurus que aiacute se estabeleceram no meado do seacuteculo
XVIII Tinham esses indiacutegenas o seu haacutebitat cercado de esbeltas palmeiras bem proacuteximo ao peacute da serra onde
hoje se ergue a cidade de Palmeira dos Iacutendios O nome do municiacutepio veio pois em consequumlecircncia dos seus
primeiros habitantes e do fato da abundacircncia de palmeiras que entatildeo havia em seus campos Os gentios
4
Conheci o festejo com doze anos de idade quando saia com meus pais ()
Antigamente a gente morava em cachoeirinha onde hoje eacute a barragem De laacute
o percurso ia para Itapebi Itagimirim que natildeo era emancipada era uma roccedila
soacute tinha mesmo essa pracinha Castro Alves tinha mas natildeo era calccedilada e
nem nada Entatildeo noacutes ia para Itapebide laacute vinha pra aqui (Itagimirim) Neste
tempo eu era pequena papai me colocava eu muntada na cangaia com os
panicus cheios de comida pra da os foliotildees eu no meio pequena mas jaacute no
meio ai agente vinha pra aqui acampava trecircs a quatro dias daqui passava em
Gabiarra A peacute andando andando nessa cidade tudo passava em Uniatildeo
Baiana descia e saia em cachoeirinha ( Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Neste sentido o festejo a Satildeo Sebastiatildeo na comunidade Itagimiriense eacute um tradiccedilatildeo e
memoacuteria de familiares sendo passada as novas geraccedilotildees como se pode perceber no trecho
acima essa devoccedilatildeo foi passada de matildee para filha O membro responsaacutevel tem a missatildeo de
todos os anos organizar e desenvolver o festejo comprando mantimentos ou pedindo doaccedilotildees
aos devotos e fazendeiros no qual as doaccedilotildees satildeo divididas com os tocadores ou foliotildees
Inicialmente nos anos de 1960 a manifestaccedilatildeo de feacute acontecia fora do periacutemetro
urbano como nos relata a Srordf Hilda Queiroz (04-05-14) ldquoesse negoacutecio de reisado era
realizado na zona ruralrdquo Jaacute o Sr Gildo Gonccedilalves (30-05-14) evidencia que ldquoera trinta dias
de reisado visitando as fazendas e a cidade tambeacutem era Satildeo Sebastiatildeordquo
Percebemos que a praacutetica de reisado a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim eacute desenvolvido
por pessoas da zona rural com isso os foliotildees no momento do cortejo entravam dentro da
cidade e compartilhe com os moradores que festejavam a Satildeo Joatildeo Batista padroeiro
instituiacutedo pela igreja catoacutelica
O festejo que se desenvolveu pela memoacuteria herdada tambeacutem natildeo eacute um acontecimento
imoacutevel sofre transformaccedilotildees no decorrer das geraccedilotildees de acordo com o contexto social sendo
agregados valores e concepccedilotildees do momento vivenciado
A Srordf Maria da Conceiccedilatildeo relata que a organizaccedilatildeo do festejo a Satildeo Sebastiatildeo
comeccedilou a ser desenvolvido dentro da zona urbana quando o seu pai faleceu com isso eles
formaram seu aldeamento entre um brejo chamado Cafuma e a serra da Boa Vista Diz a tradiccedilatildeo que mais ou
menos em 1770 chegou a regiatildeo Frei Domingos de Satildeo Joseacute conseguindo converter os gentios ao cristianismo
Posteriormente o franciscano obteve de D Maria Pereira Gonccedilalves e dos seus herdeiros a doaccedilatildeo de meia leacutegua
de terra para patrimocircnio da capela que aiacute foi construiacuteda sendo com sagrada ao Senhor Bom Jesus da Morte
httpcidadesgovbrpainelhistoacutericophplang=ampcodmun=270630ampsearch=alagoas|palmeira-dos-
C38Dndios|infograficos-historico Acesso em 09-07-2014 agraves 2045 7 Moradora de Itagimirim-Ba conhecida como Matildee Ceicinha nasceu em 11 de setembro de 1950
5
perderam a fazenda atraveacutes de um golpe quando seu primo a vendeu a propriedade
utilizando uma procuraccedilatildeo cedida a ele sendo obrigados a residir dentro da cidade
Antigamente era na fazenda pedreira o nome que dava onde mamatildee
comeccedilou o candombleacute Quando agente chegou aqui montou o terreirinho
dela aiacute veio para cidade em 62 quando Itagimirim jaacute era bem desenvolvida
e movimentada (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Diante desse acontecimento e da mudanccedila de um lugar para o outro o festejo continua
sendo cultuado pelos devotos salientando que dentro do cenaacuterio urbano jaacute existia o culto ao
Padroeiro Satildeo Joatildeo Batista Poreacutem o festejo ao padroeiro antes da instalaccedilatildeo do padre era
desenvolvido o lado profano pela populaccedilatildeo que tinha maior participaccedilatildeo na montagem das
barracas para vender comidas tiacutepicas das festas juninas
Com a organizaccedilatildeo das cerimocircnias religiosa e profana como as quermesses e leilotildees
para arrecadar fundos para construccedilatildeo da igreja catoacutelica em 1963 pelo padre haacute um
afastamento da populaccedilatildeo que ganhava um dinheiro extra com o evento
Segundo Hobsbawm (1997 P 20) ldquoAntes de mais nada pode-se dizer que as tradiccedilotildees
inventadas satildeo sintomas importantes e portanto indicadores de problemas que de outra forma
poderiam natildeo ser detectadas nem localizadas no tempordquo
Portanto a manifestaccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo ganha mais participantes principalmente
dentro da cidade fazendo um movimento contraacuterio no momento das celebraccedilotildees ao santo
pois antes as pessoas se deslocavam para zona rural Agora o povo das fazendas quem se
desloca para zona urbana O Sr Jonas A de Castro relata que na eacutepoca que chegou ao
municiacutepio itagimiriense em 1975 a praacutetica do reisado era desenvolvido por vaacuterios grupos
Quando eu cheguei ao municiacutepio existiam quatro grupos de reisado o de
Ceizinha o de Zeacute de Cabelatildeo o de Joaquim Teixeira e Otaciacutelio da Caccediloada
trecircs festejavam a Satildeo Sebastiatildeo e um a Santos Reis Eu participava dos dois
o de Otaciacutelio que festeja a Santos Reis ai eu participava com Joaquim
Teixeira que festejava a Satildeo Sebastiatildeo (Sr Jonas Almeida de Castro 30-05-
14)
O que se observa neste trecho descrito pelo Sr Jonas eacute o aumento de grupos de reisado
na localidade isto se deu devido agraves memoacuterias da populaccedilatildeo estar ligadas as folias de reisado
6
ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
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Conheci o festejo com doze anos de idade quando saia com meus pais ()
Antigamente a gente morava em cachoeirinha onde hoje eacute a barragem De laacute
o percurso ia para Itapebi Itagimirim que natildeo era emancipada era uma roccedila
soacute tinha mesmo essa pracinha Castro Alves tinha mas natildeo era calccedilada e
nem nada Entatildeo noacutes ia para Itapebide laacute vinha pra aqui (Itagimirim) Neste
tempo eu era pequena papai me colocava eu muntada na cangaia com os
panicus cheios de comida pra da os foliotildees eu no meio pequena mas jaacute no
meio ai agente vinha pra aqui acampava trecircs a quatro dias daqui passava em
Gabiarra A peacute andando andando nessa cidade tudo passava em Uniatildeo
Baiana descia e saia em cachoeirinha ( Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Neste sentido o festejo a Satildeo Sebastiatildeo na comunidade Itagimiriense eacute um tradiccedilatildeo e
memoacuteria de familiares sendo passada as novas geraccedilotildees como se pode perceber no trecho
acima essa devoccedilatildeo foi passada de matildee para filha O membro responsaacutevel tem a missatildeo de
todos os anos organizar e desenvolver o festejo comprando mantimentos ou pedindo doaccedilotildees
aos devotos e fazendeiros no qual as doaccedilotildees satildeo divididas com os tocadores ou foliotildees
Inicialmente nos anos de 1960 a manifestaccedilatildeo de feacute acontecia fora do periacutemetro
urbano como nos relata a Srordf Hilda Queiroz (04-05-14) ldquoesse negoacutecio de reisado era
realizado na zona ruralrdquo Jaacute o Sr Gildo Gonccedilalves (30-05-14) evidencia que ldquoera trinta dias
de reisado visitando as fazendas e a cidade tambeacutem era Satildeo Sebastiatildeordquo
Percebemos que a praacutetica de reisado a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim eacute desenvolvido
por pessoas da zona rural com isso os foliotildees no momento do cortejo entravam dentro da
cidade e compartilhe com os moradores que festejavam a Satildeo Joatildeo Batista padroeiro
instituiacutedo pela igreja catoacutelica
O festejo que se desenvolveu pela memoacuteria herdada tambeacutem natildeo eacute um acontecimento
imoacutevel sofre transformaccedilotildees no decorrer das geraccedilotildees de acordo com o contexto social sendo
agregados valores e concepccedilotildees do momento vivenciado
A Srordf Maria da Conceiccedilatildeo relata que a organizaccedilatildeo do festejo a Satildeo Sebastiatildeo
comeccedilou a ser desenvolvido dentro da zona urbana quando o seu pai faleceu com isso eles
formaram seu aldeamento entre um brejo chamado Cafuma e a serra da Boa Vista Diz a tradiccedilatildeo que mais ou
menos em 1770 chegou a regiatildeo Frei Domingos de Satildeo Joseacute conseguindo converter os gentios ao cristianismo
Posteriormente o franciscano obteve de D Maria Pereira Gonccedilalves e dos seus herdeiros a doaccedilatildeo de meia leacutegua
de terra para patrimocircnio da capela que aiacute foi construiacuteda sendo com sagrada ao Senhor Bom Jesus da Morte
httpcidadesgovbrpainelhistoacutericophplang=ampcodmun=270630ampsearch=alagoas|palmeira-dos-
C38Dndios|infograficos-historico Acesso em 09-07-2014 agraves 2045 7 Moradora de Itagimirim-Ba conhecida como Matildee Ceicinha nasceu em 11 de setembro de 1950
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perderam a fazenda atraveacutes de um golpe quando seu primo a vendeu a propriedade
utilizando uma procuraccedilatildeo cedida a ele sendo obrigados a residir dentro da cidade
Antigamente era na fazenda pedreira o nome que dava onde mamatildee
comeccedilou o candombleacute Quando agente chegou aqui montou o terreirinho
dela aiacute veio para cidade em 62 quando Itagimirim jaacute era bem desenvolvida
e movimentada (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Diante desse acontecimento e da mudanccedila de um lugar para o outro o festejo continua
sendo cultuado pelos devotos salientando que dentro do cenaacuterio urbano jaacute existia o culto ao
Padroeiro Satildeo Joatildeo Batista Poreacutem o festejo ao padroeiro antes da instalaccedilatildeo do padre era
desenvolvido o lado profano pela populaccedilatildeo que tinha maior participaccedilatildeo na montagem das
barracas para vender comidas tiacutepicas das festas juninas
Com a organizaccedilatildeo das cerimocircnias religiosa e profana como as quermesses e leilotildees
para arrecadar fundos para construccedilatildeo da igreja catoacutelica em 1963 pelo padre haacute um
afastamento da populaccedilatildeo que ganhava um dinheiro extra com o evento
Segundo Hobsbawm (1997 P 20) ldquoAntes de mais nada pode-se dizer que as tradiccedilotildees
inventadas satildeo sintomas importantes e portanto indicadores de problemas que de outra forma
poderiam natildeo ser detectadas nem localizadas no tempordquo
Portanto a manifestaccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo ganha mais participantes principalmente
dentro da cidade fazendo um movimento contraacuterio no momento das celebraccedilotildees ao santo
pois antes as pessoas se deslocavam para zona rural Agora o povo das fazendas quem se
desloca para zona urbana O Sr Jonas A de Castro relata que na eacutepoca que chegou ao
municiacutepio itagimiriense em 1975 a praacutetica do reisado era desenvolvido por vaacuterios grupos
Quando eu cheguei ao municiacutepio existiam quatro grupos de reisado o de
Ceizinha o de Zeacute de Cabelatildeo o de Joaquim Teixeira e Otaciacutelio da Caccediloada
trecircs festejavam a Satildeo Sebastiatildeo e um a Santos Reis Eu participava dos dois
o de Otaciacutelio que festeja a Santos Reis ai eu participava com Joaquim
Teixeira que festejava a Satildeo Sebastiatildeo (Sr Jonas Almeida de Castro 30-05-
14)
O que se observa neste trecho descrito pelo Sr Jonas eacute o aumento de grupos de reisado
na localidade isto se deu devido agraves memoacuterias da populaccedilatildeo estar ligadas as folias de reisado
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ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
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21
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Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
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22
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2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
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1997
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graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
5
perderam a fazenda atraveacutes de um golpe quando seu primo a vendeu a propriedade
utilizando uma procuraccedilatildeo cedida a ele sendo obrigados a residir dentro da cidade
Antigamente era na fazenda pedreira o nome que dava onde mamatildee
comeccedilou o candombleacute Quando agente chegou aqui montou o terreirinho
dela aiacute veio para cidade em 62 quando Itagimirim jaacute era bem desenvolvida
e movimentada (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Diante desse acontecimento e da mudanccedila de um lugar para o outro o festejo continua
sendo cultuado pelos devotos salientando que dentro do cenaacuterio urbano jaacute existia o culto ao
Padroeiro Satildeo Joatildeo Batista Poreacutem o festejo ao padroeiro antes da instalaccedilatildeo do padre era
desenvolvido o lado profano pela populaccedilatildeo que tinha maior participaccedilatildeo na montagem das
barracas para vender comidas tiacutepicas das festas juninas
Com a organizaccedilatildeo das cerimocircnias religiosa e profana como as quermesses e leilotildees
para arrecadar fundos para construccedilatildeo da igreja catoacutelica em 1963 pelo padre haacute um
afastamento da populaccedilatildeo que ganhava um dinheiro extra com o evento
Segundo Hobsbawm (1997 P 20) ldquoAntes de mais nada pode-se dizer que as tradiccedilotildees
inventadas satildeo sintomas importantes e portanto indicadores de problemas que de outra forma
poderiam natildeo ser detectadas nem localizadas no tempordquo
Portanto a manifestaccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo ganha mais participantes principalmente
dentro da cidade fazendo um movimento contraacuterio no momento das celebraccedilotildees ao santo
pois antes as pessoas se deslocavam para zona rural Agora o povo das fazendas quem se
desloca para zona urbana O Sr Jonas A de Castro relata que na eacutepoca que chegou ao
municiacutepio itagimiriense em 1975 a praacutetica do reisado era desenvolvido por vaacuterios grupos
Quando eu cheguei ao municiacutepio existiam quatro grupos de reisado o de
Ceizinha o de Zeacute de Cabelatildeo o de Joaquim Teixeira e Otaciacutelio da Caccediloada
trecircs festejavam a Satildeo Sebastiatildeo e um a Santos Reis Eu participava dos dois
o de Otaciacutelio que festeja a Santos Reis ai eu participava com Joaquim
Teixeira que festejava a Satildeo Sebastiatildeo (Sr Jonas Almeida de Castro 30-05-
14)
O que se observa neste trecho descrito pelo Sr Jonas eacute o aumento de grupos de reisado
na localidade isto se deu devido agraves memoacuterias da populaccedilatildeo estar ligadas as folias de reisado
6
ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
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21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
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BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
6
ou o proacuteprio culto a Satildeo Sebastiatildeo que eacute um santo de crendice popular que proteger contra a
fome guerra e afliccedilotildees principalmente neste municiacutepio empobrecido
Devido agrave quantidade de grupos e um nuacutemero pequeno de muacutesicos havia uma
disputa entre os grupos para atrair esses foliotildees tocadores com isso alguns liacutederes procuravam
agradar dividindo as esmolas e doaccedilotildees que eram arrecadadas no percurso do cortejo que
passava em residecircncias e casas comerciais
Oito homens e quatro mulheres que estatildeo diretamente responsaacuteveis pelos os cantos
manusear os instrumentos e na maioria das vezes apenas as mulheres quem carrega a bandeira
de Satildeo Sebastiatildeo As folias do divino Espiacuterito Santo sobre as descriccedilotildees de Thomas Ewbank
em 1846 um escritor e desenhista de Nova York destaca que a praacutetica de pedir esmolas eacute
fundamental para o desenvolvimento dos festejos Abreu concluiu que
O haacutebito de se pedirem esmolas era muito comum desde o periacuteodo colonial e
tinha como objetivo a reuniatildeo para as festas das irmandades ou para o
financiamento dos benefiacutecios aos irmatildeos carentes como indicam os vaacuterios
anuacutencios de festas No caso das folias do Divino conta Ewbank os irmatildeos
nem precisavam bater de porta em porta porque a muacutesica por si soacute jaacute atraiacutea
todos agrave rua Pela descriccedilatildeo deste viajante norte-americano se todas as
classes contribuiacuteam com donativos as irmandades do Espiacuterito Santo
pareciam distinguir-se entre si pela riqueza A da Lapa por exemplo
contratava barbeiros brancos haacutebeis tocadores de clarim e violinistas que
ofereciam seus serviccedilos por um preccedilo mais elevado (ABREU 1999 P 51)
Com essa descriccedilatildeo e anaacutelise da autora se percebeu que essas praacuteticas estatildeo presentes
nos festejos em homenagem a Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim desde a contrataccedilatildeo dos foliotildees
tocadores ateacute o cortejo de casa em casa em que ganham donativos Esta situaccedilatildeo estaacute evidente
no canto de chegada no seguinte trecho
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro 8
8 Parte do quinto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
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21
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Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
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COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
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dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
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22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
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VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
7
Eis o poder da memoacuteria oral aonde essas praacuteticas vem sendo seguidas desde a eacutepoca
colonial chegando ateacute o periacuteodo analisado do trabalho em estudo com algumas mudanccedilas
mas mantendo uma continuidade na maneira de homenagear ao santo intercessor
Alessandro Portelli (2009) dialoga sobre a valorizaccedilatildeo da memoacuteria a partir da oralidade onde
as trajetoacuterias de vidas dos excluiacutedos devem ser relatadas e conhecidas por todas as esferas
sociais
Com frequecircncia se diz que na Histoacuteria Oral damos voz aos sem voz Natildeo eacute
assim Se natildeo tivessem voz natildeo teriacuteamos nada a gravar natildeo teriacuteamos nada a
escutar Os excluiacutedos os marginalizados os sem-poder sim tem voz mas
natildeo haacute ningueacutem que os escute Essa voz estaacute incluiacuteda num espaccedilo limitado
O que fazemos eacute recolher essa voz amplificaacute-la e levaacute-la ao espaccedilo puacuteblico
do discurso e da palavra Isso eacute um trabalho poliacutetico porque tem a ver natildeo soacute
com o direito agrave palavra o direito baacutesico de falar mas com o direito de falar e
de que se faccedila caso de falar e ser ouvido ser escutado de ter um papel no
discurso puacuteblico e nas instituiccedilotildees poliacuteticas na democracia (PORTELLI
2009 P2)
A devoccedilatildeo ao santo na cidade de Itagimirim corresponde agrave trajetoacuteria de vida do
maacutertir que lutou contra as afliccedilotildees impostas aos cristatildeos pelo impeacuterio romano devido agrave dura
realidade financeira vivida pela populaccedilatildeo Salomatildeo (2008) descreve que
Satildeo Sebastiatildeo eacute um maacutertir cristatildeo elevado a condiccedilatildeo de santo pela devoccedilatildeo
popular A tradiccedilatildeo cristatilde afirma que o maacutertir foi assassinado em 20 de
janeiro de 288 em Roma () Sua proteccedilatildeo eacute evocada para deter as guerras
a fome e epidemias No candombleacute haacute referecircncias de sua associaccedilatildeo a
Oxoacutessi divindade guerreira que o sincretismo religioso relacionava na Bahia
a Satildeo Jorge (SALOMAtildeO 2008 p87)
Ter um santo para interceder sobre suas necessidades fiacutesicas e espirituais eacute significante
para o povo pois suas afliccedilotildees poderiam ser resolvidas junto ao divino atraveacutes da feacute
Contudo no decorrer dos anos alguns grupos vatildeo desaparecendo seja por morte do liacuteder ou
por questotildees financeiras
Fotografia -5
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
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21
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22
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VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
8
Foto cedida pela Srordf Alzira Pereira de Souza do arquivo familiar fotoacutegrafo desconhecido Ano 1972
Nesta imagem se pode verificar o Sr Joaquim Teixeira (jaacute falecido) que estaacute atraacutes e no
lado direito da porta bandeira com seu grupo de Reisado os seus foliotildees vestido de branco e
vermelho poreacutem ele nos cortejos estava sempre com seu vestuaacuterio branco que relatava ser
sua devoccedilatildeo Outro aspecto visiacutevel na populaccedilatildeo itagimiriense satildeo seus traccedilos com diversos
grupos eacutetnicos que habitavam a regiatildeo
O que se concluiu em relaccedilatildeo ao outro grupo e seu desaparecimento estatildeo
relacionados com questotildees financeiras pois muitos habitantes deixaram a cidade para
procurar melhores condiccedilotildees de vida nos grandes centros urbanos
OS FOLIOtildeES E O ESPACcedilO SACRALIZADO
As festas de Satildeo Joatildeo foram sempre diferentes do reisado que todo ano tem
o reisado de SAtildeO SEBASTIAtildeO comeccedila do dia primeiro de janeiro que o
primeiro reis eacute Santo Reis (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
Os foliotildees representam uma manifestaccedilatildeo de feacute em movimento poreacutem enquanto estaacute
festejando em uma residecircncia aquele espaccedilo eacute sacralizado pelos que compartilham com o
festejo a bandeira com a imagem do santo representa o martiacuterio a santificaccedilatildeo a interseccedilatildeo
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
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Satildeo Paulo 2001
9
para aqueles que sofrem com as condiccedilotildees de vidas precaacuterias a fome a peste e as afliccedilotildees
sendo descriminados por expressarem seu sentimento religioso
No festejo de Satildeo Sebastiatildeo eacute possiacutevel ver elementos do sagrado e do profano No
entanto o espaccedilo sagrado eacute delimitado Segundo Edilece Souza eacute preciso criar limites entre os
espaccedilos sagrado e profano9
No entanto eacute necessaacuterio sacralizar o espaccedilo para que ele seja habitado E por
isso procura-se um eixo um centro de orientaccedilatildeo que pode ser um templo
o local ou o altar de sacrifiacutecio de um animal cruz poste ou mastro escada
aacutervore ou montanha Qualquer um desses elementos marca o limiar entre o
sagrado e o profano e torna-se o eixo de ligaccedilatildeo entre o ceacuteu a terra e o
mundo inferior (COUTO 2008 p1)
As muacutesicas iniciam-se quando os foliotildees chegam agrave casa de uma pessoa eacute em forma de
louvor onde o dono da residecircncia espera o teacutermino da canccedilatildeo para abrir a porta e oferecer a
sua casa como salatildeo de reza e brincadeira
A letra da muacutesica para sair de uma casa eacute em forma profana ou mesmo uma
contradanccedila que canta os acontecimentos do cotidiano familiar e do trabalho representa uma
forma de socializaccedilatildeo entre familiares amigos e conhecidos festejados do dia 10 aacute 20 de
janeiro que o aacutepice da festa
No canto em louvor10 ao Satildeo Sebastiatildeo pode-se identificar em alguns trechos a ligaccedilatildeo
dos devotos com o Santo
Eacute filho de um homem nobre
Ele estaacute lhe pedido uma esmola
Natildeo eacute por ganhar dinheiro
Mas pra cumprir uma promessa
No dia 20 de janeiro
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Cada um da o que pode
Vocecirc jaacute pagou sua esmola
Deus lhe dar merecimento
9 COUTO Edilece Souza DEVOCcedilOtildeES FESTAS E RITOS ALGUMAS CONSIDERACcedilOtildeE Revista Brasileira de
Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria 10 O canto da Chegada em homenagem ao Santo SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute entoado quando os foliotildees de Itagimirim-
Ba chegam agrave porta de uma residecircncia para Louvar A letra eacute cantada por todos os grupos que existiram e existe
na localidade natildeo se sabe quem eacute o verdadeiro autor No final da entrevista com Sr Jonas Almeida de Castro
cantou um trecho no entanto veio o interesse de transcrever e analisar alguns trecho na letra do canto
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
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a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
10
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Ele chegou aqui
Quem tem promessa com ele
Ta na hora de cumprir
Viva Satildeo Sebastiatildeo
Eacute um santo de alegria
Quem tem saudade dele
Vai agrave reza do seu dia 11
Neste sentido o significado da muacutesica que os foliotildees cantam ao chegar a uma casa eacute
ldquopara louvar o dono da casa porque vocecirc cantar o Reis laacute fora e agradece dentro da casa
poreacutem a contra danccedila eacute uma musica entoadardquo isso que evidencia o Sr Jonas A de Castro (30-
05-14)
Sendo assim o festejo acontece nas casas das pessoas que compartilham com a devoccedilatildeo
a Satildeo Sebastiatildeo onde se reuacutenem com alegria dentre eles idosos crianccedilas jovens homens e
mulheres tendo momentos de oraccedilatildeo de comer de beber e festejar desde que a noite
chegava ateacute quando a noite desaparecia em belos raios de sol o local na muitas das vezes natildeo
eacute fixo passava de casa em casa dos que compartilhavam com a tradiccedilatildeo
Esse cortejo visita todas as casas do lugar que rezavam em forma musical com
instrumentos como gaitas caixas bumbas e violas maneira utilizada na maioria das festas e
festejos populares Os foliotildees do primeiro grupo de reisado trazem em suas memoacuterias um
milagre que foi atendido pelo santo que segundo Srordf Maria C Rodrigues um acontecimento
coletivo estabelece a devoccedilatildeo por Satildeo Sebastiatildeo
Minha matildee era professora e costureira laacute em Cachoeirinha (comunidade
desenvolvida na beira do rio Jequitinhonha) meu pai era canoeiro vendedor
ambulante em 1951 eu tinha um ano de idade eu natildeo lembro mas meus pais
contavam meu pai saia de Cachoeirinha para vim comprar farinha teve um
ano que ficou conhecido como o ano da fome que a seca foi tanta que natildeo
tinha como se achar o que comer Meu pai passa em Itagimirim que soacute
estava comeccedilando tinha aquela pracinha ali que hoje eacute a Castro Alves Soacute
tinha poucas casinhas ele vinha laacute de Gabiarra-Ba acampava aqui desde
11 Eacute o quinto sexto seacutetimo e oitavo trecho do canto de chegada em Louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos
foliotildees da cidade de Itagimirim-Ba Letra relatada pelo Sr Jonas Almeida de Castro (30-05-14)
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
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das letras 1994
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21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
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BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
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(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
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JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
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1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
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22
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Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
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POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
11
dessa eacutepoca eu com um ano de idade jaacute participo da histoacuteria de Itagimirim-
Ba Ele acampava aqui para trazer mantimento tinha um barracatildeo grande em
Cachoeirinha laacute ele leva as coisas comprava gado era magarefe ele servia
praticamente essa regiatildeo daqui todinha era meu pai trabalhava vendendo
coisa ambulante com as tropas que antigamente natildeo tinha carro eram tropas
34 5 6 burros Com aqueles caccediloar que hoje ainda existe em muito lugar
trazendo coisa para manter a regiatildeo Foi uma fome muito grande e nessa
eacutepoca Satildeo Sebastiatildeo junto com Nossa Senhora da Conceiccedilatildeo eram padroeiro
de Cachoeirinha e todo mundo fazia promessa com ele pedindo chuva Que
levou um ano sem chover na regiatildeo na eacutepoca todo mundo carregava pedra
na cabeccedila para botar no cruzeiro da igreja de nossa senhora da Conceiccedilatildeo
para fazer penitecircncia como era chamado antigamente para pedir ao santo que
chovesse foi um ano de sofrimento quando levantou esse povo e fez essa
promessa foi quando surgiu a primeira festa a Satildeo Sebastiatildeo Quando choveu
todo mundo saiu de vermelho e branco homenageando a ele que a minha
folia ateacute hoje todos se vestem de vermelho e branco por causa dessa fome
que foi demais aqui na regiatildeo (Srordf Maria C Rodrigues 20-03-14)
Foi atraveacutes desse ritual que se constituiu a memoacuteria coletiva dessa populaccedilatildeo esse
acontecimento que fez desenvolver a religiosidade cultural Michel Pollak (1988 p 2) ao
analisar a memoacuteria como identidade social reflete que ldquo[] Eacute perfeitamente possiacutevel que por
meio da socializaccedilatildeo poliacutetica ou da socializaccedilatildeo histoacuterica ocorra um fenocircmeno de projeccedilatildeo
ou de identificaccedilatildeo com determinado passado tatildeo forte que podemos falar numa memoacuteria
quase que herdadardquo
Alguns habitantes de Cachoeirinha ao migrarem para a comunidade Itagimiriense
como no caso do primeiro grupo de reisado de religiatildeo Umbanda que montam seu terreiro em
sua fazenda nas proximidades de Itagimirim trazem o cortejo como uma forma de devoccedilatildeo e
tornando tambeacutem um espaccedilo de socializaccedilatildeo
Onde a maioria dos foliotildees relatou que essas praacuteticas de reisado e devoccedilatildeo a Satildeo
Sebastiatildeo esta relacionada com a histoacuteria de suas famiacutelias ligadas a acontecimentos como
Promessas milagres um momento difiacutecil ou alegrias e brincadeiras Hobsbawm (1997 p21)
afirma que ldquo[] o estudos dessas tradiccedilotildees esclarece bastante as relaccedilotildees humanas com seu
passado []rdquo
Entre costureiras vaqueiros pedreiros vendedores ambulantes accedilougueiros
professoras de primaacuterio e pessoas de pouca leitura mas de uma feacute grandiosa que faziam da
relaccedilatildeo com o ambiente uma forma de sobrevivecircncia e ligaccedilatildeo com o divino mesmo com
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
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21
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rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
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Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
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ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
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IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
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Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
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1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
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POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
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Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
12
aacuterduo labor no campo essa relaccedilatildeo entre homem e divindade pode ser percebido no trecho do
canto de chegada
Deus lhe dar merecimento
Deus lhe dar chuva santa
Para molhar seu mantimento 12
Para a cidade que desenvolve a religiosidade popular foi um fator de extrema
importacircncia pois a relaccedilatildeo social do povo atraveacutes dos festejos tornou-se uma expressatildeo
devocional de identificaccedilatildeo entre eles No entanto as experiecircncias culturais Segundo Abreu
(2003 p 94-95) ldquo[] pode tambeacutem estimular a criaccedilatildeo de identidades sociais culturais e
viacutenculos duradouros entre grupos de reconhecida expressatildeo cultural ou religiosa como por
exemplo as escolas de samba os grupos que organizam folias de reis e congadasrdquo Para as
duas senhoras que tem centros de Umbanda em Itagimirim eacute uma missatildeo a seguir pois estaacute
ligado a uma promessa familiar e o compromisso passado a elas
O festejo criou viacutenculos duradouros entre os participantes pois suas expressotildees de feacute
estatildeo relacionadas no cotidiano familiar e por meio do lugar onde se encontram e
desenvolveu uma organizaccedilatildeo social que ao longo dos anos constituiu grupos distintos
Segundo Abreu (1999) ldquoatraveacutes das festas pode-se conhecer melhor a coletividaderdquo e com
isso quais indiviacuteduos que se relacionam com religiosidade popular
No entanto o que se discute neste trabalho eacute a festa enquanto espaccedilo de sociabilidade
a partir de uma memoacuteria coletiva e individual no espaccedilo social onde esta produccedilatildeo do
cotidiano ganha significado e que agrega valores entre o profano e o sagrado Sendo que estes
acontecimentos quebram o ritmo do cotidiano e estatildeo fixos dentro do calendaacuterio devocional
festivos das comunidades que desenvolvem os rituais
Os foliotildees no mecircs de janeiro quando saem agraves ruas apropriam dos espaccedilos puacuteblicos
festejando durante o dia eles mostram suas tradiccedilotildees para a populaccedilatildeo os indiviacuteduos ao
escrever suas tradiccedilotildees nos espaccedilos histoacutericos da cidade estatildeo demonstrando o seu lugar social
que segundo Larissa Novais Britto (2009)13
12 Parte do sexto trecho do canto de chegada que louva a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees na cidade de
Itagimirim-Ba 13 A festa de Satildeo Benedito eacute um evento dinacircmico que eacute reinventado e reformulado atraveacutes de celebraccedilotildees
anuais descrito no trabalho monograacutefico de Larissa Novais Britto a festa se organiza no interior de uma
13
Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
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O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
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No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
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compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
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O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
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BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
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BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
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Nos dias da festa os negros saem do anonimato e assumem lugar de
destaque na cena urbana e promovem uma ruptura com a rotina cotidiana
extremamente marcada pela submissatildeo Ao danccedilar e cantar para seu santo
os festeiros revivem a liccedilotildees de seus ancestrais e revertem
momentaneamente o lugar secundaacuterio que ocupam na hierarquia do poder
local ( BRITTO 2009 p 9 )
Ao entrevistar as pessoas dessa comunidade que traz em suas memoacuterias um periacuteodo de
muitas recordaccedilotildees do tempo festivo no qual o homem rural criava seus modos de
sociabilidade atraveacutes de praacuteticas e instrumentos simples que faziam parte do seu cotidiano
Uma maneira de cultuar ao santo de forma direta atraveacutes de brincadeiras rezas
demonstraccedilotildees de feacute que tinha um grande significado diante de toda a expectativa para um
novo ano
Mediante a esses costumes e tradiccedilotildees que contribuem para o desenvolvimento da
localidade que teve avanccedilos permitindo que novos elementos fossem inseridos na festividade
Ao analisar a festa a Santos Reis na comunidade de aldeia com o processo de modernizaccedilatildeo
do lugar com a chegada da luz eleacutetrica que deu outros rumos ao ritual festivo apropriando de
outras caracteriacutesticas Brandatildeo (2010 P7) afirma que ldquo[] A festa em louvor a Santos Reis
esta viva justamente pela sua capacidade de se reinventar e natildeo pelo apego a uma praacutetica
ritualiacutestica congelada no tempordquo
A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes das praacuteticas culturais
seja no movimento das danccedilas ou manuseio dos instrumentos com muita alegria e devoccedilatildeo
sendo tambeacutem um lugar de afirmaccedilatildeo das relaccedilotildees sociais
A festa eacute repleta de interesses e significados disfarccedilados Segundo Guarinello (2001
p974) ldquo[] o sentido da festa eacute portanto da identidade que propotildee e produz depende sempre
dos participantes eventuais ou desejados cuja presenccedila e envolvimento determinam o
sucesso e o significado uacuteltimo de qualquer festa []rdquo
Assim se constituiu a relaccedilatildeo existente entre os foliotildees e devotos Habitantes de um
espaccedilo rural e urbano que no periacuteodo do festejo migram de um local a outro levando a boa
nova atraveacutes do cortejo ao santo
irmandade religiosa e em funccedilatildeo de um mito fundador que remete a histoacuteria de vida de um santo que considerado
protetor do povo negro
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O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
14
O RITO
Todo mundo espera chegou primeiro de Janeiro O reisado de santos reis eacute agrave
noite o de SAtildeO SEBASTIAtildeO eacute de dia Se noacutes cantamos em uma rua canta
de um lado ateacute o final depois passamos para o outro lado noacutes natildeo podemos
cruzar bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
No primeiro dia (10 de janeiro) acontece uma reza nos salotildees de umbanda e tambeacutem
na igreja catolica essa praacutetica eacute realizada tanto por um grupo quanto pelo outro Quando os
foliotildees saem do salatildeo em cortejo vatildeo direto a igreja neste espaccedilo fazem vaacuterios pedidos e
rezas
Poreacutem dentro da igreja apenas as violas e gaitas satildeo ultilizadas para acompanhar o
louvor trovado agrave Satildeo Sebatiatildeo Pode ser pela amanhatilde ou agrave tarde para pedir proteccedilatildeo durante os
dias que os foliotildees percorrem em fazendas cidades vizinhas para depois que estiver faltando
uns quatro dias para vinte de Janeiro que eacute o dia de comemoraccedilatildeo a Satildeo Sebastiatildeo eles
retornam a Itagimirim Como foliatildeo do primeiro grupo de reisado o Sr Diomario relata o
trajeto do primeiro dia
Quando noacutes descemos da casa de Ceicinha no primeiro dia com a bandeira
noacutes vamos direto a igreja noacutes cantamos na igreja depois noacutes esparramamos
nos gerais esparramamos no mundo noacutes vai para casa do prefeito que eacute de
obrigaccedilatildeo ele receber a bandeira (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O primeiro grupo reisado segue a seguinte rota vatildeo para cidade de Itabepi onde satildeo
recebidos com muita festa pela populaccedilatildeo e governante local que disponibiliza uma pousada
para os foliotildees descasarem Depois de quatro dias cantando nesta cidade retornam a
Itagimirim cantam em diversas casas finalizando com a reza do terccedilo no oratoacuterio dentro do
salatildeo entre os dias 20 (vinte) para 21 (vinte e um) de janeiro A preparaccedilatildeo do foliatildeo para a
reza do terccedilo no uacuteltimo dia de Festejo eacute evidenciado pelo O Sr Diomario
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No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
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O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
15
No dia vinte noacutes estamos chegando em casa para poder descansar de meio
dia para tarde tomar banho ajeitar para a noite ter a reza de sete para oito
horas da noite a gente reza ai encerrou aquele reisado depois da reza acabou
mas se noacutes querer amanhecer o dia brincado pulando fazendo contra danccedila
tomando cachaccedila comendo tira gosto porque ela mata um boi para dar
despesa para os foliotildees dela e alguns visitantes que querem acompanhar (Sr
Diomaacuterio de Jesus 04-05-14)
O segundo grupo de Reisado apoacutes as rezas em seu salatildeo de umbanda tambeacutem seguem
com o cortejo para a igreja catoacutelica a bandeira do santo representando o martiacuterio e estaacute
sempre agrave frente do grupo Nenhum foliatildeo passa a frente da bandeira ficando atraacutes e se por
acaso necessitar passar na frente da bandeira logo eacute reverenciada pelos foliotildees colocando se
de joelho e beijando o manto sagrado
Essa praacutetica tambeacutem eacute abordada por Abreu (1999 p 48) na festa do divino Espiacuterito
santo a partir dos relatos do Escritor Thomas Ewbank ldquo[] que sempre estranhava nossos
haacutebitos beijando-se tambeacutem a bandeira ou melhor ldquoafundava-se o rosto em suas dobrasrdquo
para realizar a devoccedilatildeo e tanto fazia se fossem pessoas brancas ou negras []rdquo
Beijar a bandeira com a imagem de Satildeo Sebastiatildeo para um devoto que participa do
cortejo eacute uma forma de respeito que expressa agrave fidelidade ao santo onde seus pedidos foram
ouvidos e realizados uma relaccedilatildeo de proximidade e confianccedila na intercessatildeo do santo diante
do divino
Os foliotildees dizem que antes de iniciar o cortejo vatildeo a igreja catoacutelica pedir proteccedilatildeo
com a presenccedila ou natildeo do padre eles pedem licenccedila e entra na igreja entoando seus cacircnticos
uns ajoelham outros cantam com muita entonaccedilatildeo A Srordf Maria diz que sempre cantou na
igreja ldquoEu natildeo sei por que natildeo mas realmente quando a gente chega laacute tem vez que o padre
natildeo esta mais a gente canta eacute um direito nosso que ali eacute a casa de Deus casa nossa ali eacute
portas abertardquo
Santos (2010) ao analisar o catolicismo na cidade Maragogipe-Ba a partir do culto a
Satildeo Bartolomeu nos anos de 1851 a 1943 Destaca a seguinte informaccedilatildeo
No Brasil colonial as manifestaccedilotildees religiosas tinham como caracteriacutestica a
superficialidade constituindo-se como uma religiatildeo epideacutermica de fundo
emocional comprazendo-se nas exterioridades do culto mesmo sem
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
16
compreendecirc-lo e tomando um gosto de festa de reuniatildeo social sem aquela
convicccedilatildeo profunda nascida de uma interioridade forte e espiritualizada
Essa superficialidade fez-se notar pela enfaacutetica predominacircncia de ritos
externos pelo colorido e pompa das praacuteticas exteriores Tudo se fazia para
cultuar e homenagear os santos protetores No fundo uma religiatildeo
imediatista distante da ortodoxia (SANTOS 2010 P 63)
Neste sentido a igreja catoacutelica na cidade de Itagimirim natildeo participa diretamente das
homenagens ao santo cultuado por parte da populaccedilatildeo mas respeita o louvor a Satildeo Sebastiatildeo
que eacute manifestado pelos foliotildees atraveacutes de uma devoccedilatildeo desenvolvida por vaacuterias famiacutelias
contudo pode se perceber que alguns dos devotos satildeo frequumlentadores das missas dominicais e
que tambeacutem participam de muitos eventos promovidos pela igreja Couto (2004) ao investigar
os estudos sobre religiatildeo oficial e religiosidade popular abordou que
A partir da emergecircncia da espiritualidade laica no seacuteculo XIII o clero sentiu
a necessidade de falar a mesma liacutengua dos fieacuteis utilizar formas orais nas
liturgias ndash cantos e sermotildees ndash aceitar procissotildees e peregrinaccedilotildees a oratoacuterios
consagrados pelo povo e as funccedilotildees pagatildes atribuiacutedas aos santos (P 45)
Apoacutes o rito dentro da igreja os foliotildees entram em um carro geralmente alugado pela
dona do reisado passando por fazendas e chegando ao distrito de Gabiarra municiacutepio de
Eunaacutepolis retornando por Uniatildeo Bainana (distrito de Itagimirim-Ba) que faz divisa com o
estado de Minas Gerais
E concluem o cortejo dentro da cidade de Itagimirim passando em muitas residecircncias
No dia 19 (dezenove) agraves 18h00 (dezoito) realizam um jantar depois de muita contra danccedila
com as oitavas um roda de oito pessoas com instrumentos como gaitas bumba viola
pandeiro pratos de esmalte e palmas girando e passando um pelo o outro Depois das
brincadeiras fazem uma pausa para rezar o terccedilo dentro do oratoacuterio na passagem do dia 19
(dezenove) para 20 (vinte) de Janeiro
Os foliotildees percorrem a regiatildeo anunciando a boa nova um tempo de paz e alegria cada
pessoa que recebe esse cortejo fortalece sua feacute e de seus familiares O festejo representa um
ato de feacute para as pessoas que se juntam para agradecer pelas becircnccedilatildeos recebidas ao longo do
ano com esperanccedilas de dias melhores e sendo entrelaccediladas pelos festejos natalinos e todas as
expectativas para um novo ano
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
17
O festejo serve tambeacutem para pagar uma promessa ou mesmo para seguir a tradiccedilatildeo
aleacutem da questatildeo religiosa o festejo representa um sentimento de pertencimento e sociabilidade
para as pessoas que herdaram a devoccedilatildeo Segundo relata Edilece Souza
No entanto natildeo podemos perder de vista que o cristianismo inaugurou o
tempo lituacutergico baseado na historicidade de Jesus Cristo Dessa forma o
tempo festivo eacute repetido mas natildeo eacute imoacutevel nem imutaacutevel Apesar de se
revelar especial e diferente do calendaacuterio profano tambeacutem natildeo eacute um evento
isolado pois quebra o ritmo regular do cotidiano promove a sociabilidade e
o sentimento de pertencimento e identidade em um determinado grupo
social (COUTO 2008 P 2)
Nem todos os devoltos dos dois ternos de reisado vatildeo para os cortejos nas fazendas ou
para outras cidades alguns ficam nos salotildees de oraccedilotildees preparando as comidas e bebidas
organizando para a chegada e finalizaccedilatildeo do festejo segundo o Sr Diomario foliatildeo do
primeiro grupo de reisado satildeo poucas as pessoas que ficam a frente do cortejo
Mas os dela (foliotildees) satildeo oito macho e quatro fecircmea que satildeo de carregar a
bandeirae os machos para tocar os instrumentos pois cada um daqueles oito
tem os instrumento deles que domina que satildeo reco-reco pandeiro a caixa
era de Ceicinha o bunda eacute de quem saber bater que nem esse Neo era
bumbeiro nosso Neo batia bumba muito bem mas agora ficou o filho de
Ceicinha que eacute bumbeiro dela tambeacutem eacute isso (Sr Diomaacuterio de Jesus 04-05-
14)
O individuos pertecente a um grupo desde o seu nascimento e no decorrer da vida vatildeo
aquirindo os usos haacutebitos alimentares vestimentas moradia objetos de pertecimento
ensiados pelas pessoas idosas que tem experiecircncia a religiosidade que vai sendo transmitida
de geraccedilatildeo em geraccedilatildeo independe de tamanho e de grupo social ao qual estaacute inserido
Resultando em caracteriacutesticas peculiares ou a chamada memoacuteria comum do grupo para
Jacqueline Hermann (1997) chega-se ao ponto onde religiatildeo e religiosidade se cruzam
Quando o cortejo chega na porta de uma casa cantam um louvor para chamar atenccedilatildeo
do morador ldquoPorque vocecirc canta o Reis laacute fora e agradece dentro da casa o dono da casa abre
a porta vocecirc entra ai deu bom dia vocecirc louva o dono da casa e agradece o Reisrdquo isso que nos
relata o Sr Jonas Almeida de Castro Depois do lovour abre a porta dentro da residecircncia foi
observando que em um trecho do canto o devoltos obedecem a letra
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
18
Ajoelha pecadores
Potildee seu joelho no chatildeo
Para cobrir com a bandeira
Viva satildeo Sebastiatildeo
Essa bandeira me salva
Quando chegar laacute no ceacuteu
Alevanta pecador
Todo coberto de veacuteu 14
Sendo assim a bandeira eacute passada pela cabeccedila de todos os devotos que ajoelham
algumas pessoas beijam o manto outras se emocionam e agradecem Para Brandatildeo (2011 P
64) ldquo[] A festa eacute o momento de reconhecer que foram agraciados com uma benccedilatildeo e que eacute
preciso retribuir []rdquo A contra danccedila ndash uma muacutesica entoada cantado coisas do cotidiano para
os foliotildees saiacuterem da residecircncia como aborda o Sr Jonas Almeida de Castro (2014)
Convidei meus companheiros
para fazer sociedade
Para roubar dessa cigana
um amor da eternidade
O ciganhinha hora eacute hora
quem quiser comigo eacute hora
Agrave Deus ponta da areia
que laacute vai a cigana embora
A festa eacute uma forma de diversatildeo tatildeo especial para os foliotildees que toca os instrumentos
por prazer em estar festejando que apaga todo o cansaccedilo do corpo Brandatildeo (2011 P74)
afirma que ldquoApesar de a festa ser uma celebraccedilatildeo do cotidiano das sociedades ela representa uma
quebra nesse cotidiano quando as pessoas deixam suas atividades do dia- a- dia para se
dedicarem ao seu inversordquo
Dois foliotildees relataram duas situaccedilotildees envolvendo o cortejo de Satildeo Sebastiatildeo a
primeira foi quando uma senhora os convidou o terno de reis para entrar em sua residecircncia
muito humilde Poreacutem a dona da casa tinha apenas dois ovos de galinha para oferecer nesta
situaccedilatildeo um foliatildeo fez a doaccedilatildeo por ela e devolveu a oferta da senhora A outra situaccedilatildeo eacute
14 Nona e deacutecima estrofe do canto de chegada em louvor a Satildeo Sebastiatildeo entoado pelos foliotildees em Itagimirim-
Ba
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
19
quando uma fita da bandeira do santo cai dentro de uma casa eacute sinal de milagre concedido ao
morador como Aborda dona Srordf Alzira P de Souza
Olha se cair na casa da pessoa eacute para pegar e guardar ali eacute uma virtude que
esta deixando na casa da pessoa e uma forccedila que esta deixando ali na casa
da pessoa o santo deixou cai aquela fita ali para agradecer e recomendar o
dono da casa (Srordf Alzira Pereira de Souza 08-05-14)
Para muitos moradores essa fita eacute utilizada como remeacutedio quando um familiar sente
uma dor amarando no local essa recordaccedilatildeo eacute guardada como muita alegria
Quando o reisado chega em uma rua eles cantam de um lado e depois do outro a
bandeira indo por um canto natildeo pode voltar pelo mesmo lugar tem que seguir o giro o
caminho aberto A Srordf Maria C Rodrigues relata que ldquoquando passo numa casa e vejo a porta
fechada eu acho que a pessoa natildeo quer que eu paro ai a bandeira passa se pedir para voltar
a gente natildeo pode maisrdquo Hobsbawm (1997) dialoga que entende-se por ldquotradiccedilatildeo inventadardquo
um conjunto de praacuteticas normalmente reguladas por regras taacutecita ou abertamente aceitas ldquo[]
tais praacuteticas de natureza ritual ou simboacutelica visam inculcar certos valores e normas de
comportamento atraacuteves de repeticcedilatildeo o que implica automaticamente uma continuidade em
relaccedilatildeo ao passado []rdquo
Muitas festas foram apontadas por vaacuterios pesquisadores do periacuteodo colonial como
forma de fugas e rebeliotildees ou sendo para assumir uma identidade por determinados grupos
nesse contexto as festas natildeo satildeo vistas simplesmente como passivas mas como oportunidade
de romper com o cotidiano
CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS
O trabalho realizado atraveacutes do festejo de Satildeo Sebastiatildeo em Itagimirim-Ba investigou
e analisou o surgimento da manifestaccedilatildeo religiosa de caraacuteter popular sendo renovada e
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
20
modificada com as migraccedilotildees de pessoas vindas de outros povoados e municiacutepios da regiatildeo
re-significando a tradiccedilatildeo e incorporando novas praacuteticas
A devoccedilatildeo dos foliotildees por um santo representa uma afirmaccedilatildeo de identidade
possibilitando novas relaccedilotildees entre os homens e o meio social ao qual estaacute inserido
Rememorar natildeo significa trazer de volta a festa do mesmo jeito que era outrora e sim
reafirmar e reconstruir novos haacutebitos
O festejo eacute um elemento que fez e faz parte da origem e desenvolvimento da cidade
pois seus habitantes fundadores jaacute traziam em suas memoacuterias essa forma de socializaccedilatildeo
religiosa Que tambeacutem se construiu como um escape para os longos dias de trabalhos
quebrando o ritmo do cotidiano A manifestaccedilatildeo de feacute eacute um espaccedilo de troca de saberes atraveacutes
das praacuteticas de alegria e devoccedilatildeo sendo um lugar de afirmaccedilatildeo de relaccedilotildees sociais ou criar
novos laccedilos de amizade o que fundamental para comunidade itagimiriense
REFEREcircNCIAS
ABREU Marta Cultura popular um conceito e vaacuterias histoacuterias In Ensino de Histoacuteria
conceitos temaacuteticas e metodologia Martha Abreu amp Rachel Sohiet (orgs) Rio de Janeiro
Casa da Palavra 2003
ALBERTI Verena Manual de Histoacuteria oral ndash 3 ed ndash Rio de Janeiro Editora FGV 2005
BOSI Ecleacutea Memoacuteria e Sociedade Lembranccedilas de Velhos ndash 3 ed ndashSatildeo Paulo Companhia
das letras 1994
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis Festa Poder e Memoacuteria (Governador
Mangabeira- BA 1970-2000) Artigo apresentado no X Encontro Nacional de Histoacuteria Oral
Recife 2010
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
Bahia Salvador 2010
VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
Jancsoacute Iris kantor (orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume I
Satildeo Paulo 2001
21
BRANDAtildeO Alex Sandro da Conceiccedilatildeo Santos Reis festa poder e memoacuteria na comunidade
rural de aldeia (Governador Mangabeira- BA 1970-2000) Dissertaccedilatildeo apresentada ao
programa de poacutes-graduaccedilatildeo em histoacuteria regional e local da universidade do estado da
BahiaUNEB Santo Antonio de Jesus ndash BA abril ndash 2011
BRITTO Larissa Novais Festa de Satildeo Benedito O Sagrado e o profano nas festas regiliosas
de origem africana em Porto Seguro-Ba Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CASTRO Jakson Viana de Educaccedilatildeo patrimonial um instrumento de ensino para Histoacuteria local
Monografia apresentada a UNEB Eunaacutepolis 2009
CHALHOUB Sidney Visotildees da liberdade uma histoacuteria das uacuteltimas deacutecadas da escravidatildeo
na Corte Sidney Chalhoub mdash Satildeo Paulo Companhia das Letras 2011
COUTO Edilece Souza Devoccedilotildees festas e ritos algumas consideraccedilotildees Revista Brasileira
de Histoacuteria das Religiotildees ndash Ano I no 1 ndash Dossiecirc Identidades Religiosas e Histoacuteria Maio
2008
GUARINELLO Noberto Luiz Festa trabalho e cotidiano Istvaacutem Jancsoacute Iris kantor
(orgs)Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa Volume II Satildeo Paulo 2001
GUERRA Teoney Araujo Dados e informaccedilotildees para Estudantes Itagimirim-Ba 2000
HERMANN Jacqueline Histoacuteria das religiotildees e religiosidades Domiacutenios da Historia
ensaios da teoria e metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de
Janeiro Campus 1997
HOBSBAWM Eric A invenccedilatildeo das tradiccedilotildees Eric Hobsbawn e Terenge Ranger
organizadores Traduccedilatildeo Celina Cardim Cavalgante 2ordf ediccedilatildeo Rio de Janeiro 1997
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatiacutestica Disponiacutevel emwwwibgegovbr acesso
dia 06-05-12 agraves 13h00min
JANCSOacute Istvaacutem KANTOR Iris (orgs) Festa Cultura amp Sociabilidade na Ameacuterica
Portuguesa Volume I Satildeo Paulo 2001
JANCSOacute Istvaacutenamp KANTOR Iris Festa Cultura e Sociabilidade na Ameacuterica Portuguesa (2
volumes) Satildeo Paulo Imprensa Oficial Hucitec Edusp Fapesp 2001
1 NASCIMENTO Nilson do Carmo Cachoeirinha Freguesia de Nossa Senhora da
Conceiccedilatildeo da Cachoeirinha do Baixo Jequitinhonhandash Brasiacutelia 2010
22
2 NASCIMENTO Mara Regina do Religiosidade e cultura popular Catolicismo
irmandades e tradiccedilotildees em movimento Revista da Catoacutelica Uberlacircndia v 1 n 2 p 119-130
2009 ndash catolicaonlinecom BR revista da catoacutelica
PORTELLI Alessandro Histoacuteria Oral e Poder Transcriccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos
Blume a partir do arquivo em aacuteudio wmp Traduccedilatildeo de Luiz Henrique dos Santos Blume e
Heliana de Barros Conde Rodrigues Mnemosine Vol6 nordm2 p 2-13 (2010) ndash Artigos
Conferecircncia no XXV Simpoacutesio Nacional da ANPUH Fortaleza 2009
POLLAK Michel Memoacuteria e identidade social Conferecircncia foi transcrita e traduzida por
monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos histoacutericos rio de janeiro vol
5 n 10 1992 p 200-212
POLLAK Michel Memoacuteria Esquecimento Silecircncio Conferecircncia foi transcrita e traduzida
por monique augras A ediccedilatildeo eacute de Dora Rocha Flaksman Estudos Histoacutericos Rio de
Janeiro vol 2 n 3 1989 p 3-15
PIRES Flaacutevia A Festa de Satildeo Sebastiatildeo em Catingueira transformaccedilotildees e permanecircncias dez
anos depois Revista de antropologia Satildeo Paulo USP 2011 v 54 nordm 2 Artigo Recebido em
novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
a satildeo Bartolomeu em Maragogipe (1851-1943) dissertaccedilatildeo apresentada ao programa de poacutes-
graduaccedilatildeo em histoacuteria da faculdade de filosofia e ciecircncias humanas universidade federal da
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VAINFAS Ronaldo Da festa tupinambaacute ao sabaacute tropical a catequese pelo avesso Istvaacutem
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Satildeo Paulo 2001
22
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novembro de 2010 Aceito em julho de 2011
SOIHET Rachel Histoacuteria das mulheres Domiacutenios da Historia ensaios da teoria e
metodologias Ciro Flamrion Cardoso Ronaldo Vainfas (orgs) Rio de Janeiro Campus
1997
SANTANA Tacircnia de Devoccedilotildees catoacutelicas entre os negros na Bahia colonial Artigo
apresentado na participaccedilatildeo no evento Fala Professor em 250803 promovido pelo curso de
Histoacuteria das Faculdades Jorge Amado
SANTOS Fernanda reis dos ldquoa festa do excelso padroeiro da cidade das palmeirasrdquo o culto
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Satildeo Paulo 2001
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