UNIVERSIDADE ESTADUAL PAULISTA “JÚLIO DE MESQUISTA FILHO”
FACULDADE DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS
ROBERTO GALASSI AMARAL
TERCEIRO SETOR: A GESTÃO DO PENSAR, SENTIR, AGIR.
FRANCA
2013
ROBERTO GALASSI AMARAL
TERCEIRO SETOR: A GESTÃO DO PENSAR, SENTIR, AGIR.
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como pré-requisito para obtenção do título de Doutor em Serviço Social. Área de concentração: Serviço Social: Trabalho e Sociedade. Orientadora: Profª Drª Claudia Maria Daher Cosac
FRANCA
2013
Amaral, Roberto Galassi
Terceiro setor : a gestão do pensar, sentir, agir / Roberto
Galassi Amaral. –Franca : [s.n.], 2013
306 f.
Tese (Doutorado em Serviço Social). Universidade Estadual
Paulista. Faculdade de Ciências Humanas e Sociais.
Orientador: Cláudia Maria Daher Cosac
1. Terceiro Setor. 2. Governança. 3. Organizações não-gover-
namentais. I. Título.
CDD – 303
ROBERTO GALASSI AMARAL
TERCEIRO SETOR: A GESTÃO DO PENSAR, SENTIR, AGIR.
Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, como pré-requisito para obtenção do título de Doutor em Serviço Social. Área de concentração: Serviço Social: Trabalho e Sociedade.
BANCA EXAMINADORA
Presidente: _________________________________________________________
Profª Drª Claudia Maria Daher Cosac
1º Examinador (a) ____________________________________________________
2º Examinador (a) ____________________________________________________
3º Examinador (a)____________________________________________________
4º Examinador (a)____________________________________________________
Franca,_____de____________de 2013
Dedico este trabalho às minhas queridas Mara, Débora e Priscila, cuja presença, estímulo, apoio e amor sustentaram minha caminhada.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, irmãos e familiares pelo estímulo e presença constante ao longo
deste percurso.
À cidade de Franca que me acolheu carinhosamente e indicou caminhos
inesquecíveis.
Ao amigo Marcio Henrique da Silva Nalini pelo incentivo e amizade.
Aos meus colegas de caminhada André Luis Centofante Alves, Inês da Silva
Moreira, Jose Alfredo de Pádua Guerra, Juliana Polloni, Léia Maria Erlich Ruwer e
Tatiana Machiavelli.
A todos os meus amigos que direta ou indiretamente contribuíram para este
trabalho, sintam-se contemplados.
Aos professores do Curso de Pós-Graduação em Serviço Social da Universidade
Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Campus Franca/SP.
Ao estimado e saudoso Padre Mário, por seu incentivo e ensinamentos.
Ao grupo de pesquisa GESTA, Uni-Facef, Profa. Dra. Edna Maria Campanhol,
Jucimeire Ligia Pereira e Iara Silvia Domiciano pela parceria na investigação.
Em nome do Grupo GESTA, registro o agradecimento ao ex-prefeito do município de
Franca Senhor Sr. Sidnei Franco da Rocha na efetivação de oficio visando acesso
às informações das Organizações Sem Fins Lucrativos locais.
A Márcia Galassi Amaral Araujo pela dedicação e apoio técnico.
A Maria Angélica Souza Ribeiro por seu inestimável apoio, diálogo e indicações
precisas.
A Laura Odette Dorta Jardim, meu agradecimento por sua disponibilidade, atenção e
preciosa ajuda.
Aos diretores e coordenadores das Organizações Não Governamentais que
aceitaram participar da pesquisa.
AGRADECIMENTO ESPECIAL
À Professora Doutora Claudia Maria Daher Cosac, por sua dedicação, esmero e
parceria que pautaram todos os momentos de diálogo, orientação e trabalho.
Obrigado pelo valor do conhecimento e o significado da vida acadêmica transmitidos
ao longo desta jornada.
Às vezes ouço passar o vento; e só de ouvir
o vento passar, vale a pena ter nascido.
(Fernando Pessoa)
AMARAL, Roberto Galassi. Terceiro Setor: a gestão do pensar, sentir, agir. 2013. 306 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2013.
RESUMO
A presente tese resgata a dimensão da gestão das organizações do Terceiro Setor e tem o objetivo de compreender e explicar a participação das organizações sem fins lucrativos, de interesse público, não governamental, no desenvolvimento das políticas sociais públicas do município de Franca/SP. O estudo aborda e envolve o sistema de classificação de contas brasileiro relativo às organizações privadas sem fins lucrativos, que permite compreender a base de informação utilizada pelos órgãos públicos de pesquisa e estatísticas que têm produção na área, bem como abrange bibliografia multidisciplinar buscando refletir sobre a identidade e dimensões de análise, além da legislação específica. A investigação incluiu exame a respeito do Terceiro Setor no âmbito internacional e realiza análise detalhada sobre composição, estrutura e funcionamento do Terceiro Setor no Brasil, utilizando-se de estudos nacionais e análises estratificadas elaboradas por organizações representativas. O estudo sobre o campo da gestão e sua aplicação às organizações não governamentais, bem como a compreensão a respeito da sustentabilidade complementam as análises. A investigação de campo foi construída a partir de informações sobre organizações sem fins lucrativos da cidade disponíveis no âmbito do grupo de pesquisa Gestão Socioambiental e as Interfaces com as Expressões da Questão Social (GESTA), integrado ao Curso de Serviço Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da UNESP, Campus de Franca. A sondagem com a totalidade do universo das instituições permite conhecer a formação e composição do Terceiro Setor local. Após a seleção da amostra, os dados primários foram alcançados através de entrevistas, com sujeitos dirigentes voluntários e sujeitos coordenadores, pautadas por formulários semiestruturado e que revelaram os aspectos quantitativos, possibilitando a construção do perfil das entidades e dos sujeitos. A composição das diretorias e conselhos, a função de coordenação, equipe técnica, áreas de atuação, presença de voluntários e diversificação nas fontes de financiamento se constituem nos temas analisados nesta perspectiva. A dimensão qualitativa emerge a partir das falas dos sujeitos que considera a visão geral sobre a gestão e a realidade das organizações não governamentais, além da sustentabilidade financeira. A amplitude dos dados revelados possibilita refletir a cerca da governança das entidades, sobre o estilo e modelos de gestão empregados, estratégias de envolvimento, avaliação de resultados, a dimensão das mudanças, bem como a sustentabilidade. Palavras-chave: Terceiro Setor. organizações não governamentais. gestão de
ONGs. sustentabilidade. organizações sem fins lucrativos.
AMARAL, Roberto Galassi. Terceiro Setor: a gestão do pensar, sentir, agir. 2013. 306 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2013.
ABSTRACT The present thesis brings forward the scope of the management in Third Sector organizations and aims at understanding and explaining the participation of non-profit, public interest and non-governmental organizations in the development of social public policies in the city of Franca, São Paulo. The study addresses and surrounds the Brazilian account classification method in relation to the non-profit private organizations, which leads to understanding the source of data used by public institutes of research and statistics active in the area, and it also addresses the multidisciplinary bibliography in order to reflect upon the identity and extent of the analysis, beyond the applicable laws. The investigation included scrutiny of the Third Sector overseas and performs a detailed analysis over the composition, structure and operation of the Third Sector in Brazil, making use of national studies and stratified analyses made by class organizations. The study over the scope of management and its application to non-governmental organizations as well as the comprehension on sustainability complement the analyses. The field investigation was built upon data from local non-profit organizations available in the scope of the research group “Socio-environmental Management and its Interfaces with the Expressions of Social Issues” ( GESTA ) integrated into the Social Services course from the UNESP Human and Social Sciences Faculty at the Franca campus. The poll made with the entire scope of institutions leads to the familiarization with the formation and composition of the local Third Sector. After sample selection, the primary data was collected through interviews with subject volunteer directors and subject coordinators, guided by semi-structured forms which revealed the quantitative aspects, enabling the construction of the profile for the entities and their subjects. The structure of the Directory Boards and Councils, the purpose of the coordination, technical team, areas of expertise, presence of volunteer work and the diversified sources of financing are established within the themes analyzed in this outlook. The quantitative dimension emerges from the testimonies of the subjects which take into consideration the general view upon management and the reality of the non-governmental organizations, as well as the financial sustainability. The scope of the data revealed allows for the reflection upon the governance within the organizations, upon its style and applied management models, involvement strategies, evaluation of results, scope of change as well as sustainability. Keywords: Third Sector. non-governmental organizations. NGO management.
sustainability. non-profit organizations.
AMARAL, Roberto Galassi. Terceiro Setor: a gestão do pensar, sentir, agir. 2013. 306 f. Tese (Doutorado em Serviço Social) – Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Franca, 2013.
RESUMEN En esta tesis se rescata la dimensión de la gestión de las organizaciones del tercer sector y tiene como objetivo comprender y explicar la participación de las organizaciones sin fines de lucro, de interés público, organizaciones no gubernamentales, en el desarrollo de políticas sociales públicas de la ciudad de Franca / SP. El estudio se acerca e implica el sistema de clasificación de las cuentas relativas a las organizaciones privadas sin fines de lucro en Brasil, lo que nos permite entender la base de la información utilizada por la investigación pública y las estadísticas que tienen una producción en la zona, así como bibliografía abarca multidisciplinario busca reflexionar sobre la identidad y las dimensiones de análisis más allá de la legislación específica. La investigación incluyó el examen sobre el tercer sector en el ámbito internacional y lleva a cabo un análisis detallado de la composición, estructura y funcionamiento del Tercer Sector en Brasil, con estudios nacionales y estratificado análisis efectuados por las organizaciones que representan. El estudio sobre el ámbito de la gestión y su aplicación a las organizaciones no gubernamentales, así como la comprensión acerca de la sostenibilidad complementar los análisis. La investigación de campo fue construida a partir de la información disponible sobre la ciudad sin fines de lucro dentro del grupo de investigación de Gestión Ambiental e interfaces con las expresiones de Asuntos Sociales (GESTA), Curso Integral de la Facultad de Trabajo Social de Humanidades y Social, UNESP, Franca. Una encuesta realizada con todo el universo de instituciones permite conocer la formación y composición del sitio Tercer Sector. Después de seleccionar la muestra, los datos primarios se obtuvieron a través de entrevistas con líderes y voluntarios sometidos coordinadores temáticos, guiados por semi-estructuradas formas y reveló que los aspectos cuantitativos, permitiendo la construcción del perfil de las entidades y los particulares. La composición de las juntas y consejos, la coordinación de la función, el equipo técnico, áreas de práctica, la presencia de los voluntarios y la diversificación de las fuentes de financiación constituyen los temas analizados desde esta perspectiva. La dimensión cualitativa surge del discurso de los participantes considera que la visión general de la gestión y la realidad de las organizaciones no gubernamentales y la sostenibilidad financiera. La amplitud de los datos revelados permite hacer una reflexión sobre la gobernanza de las entidades en los modelos de estilo y de gestión empleadas, estrategias de participación, evaluación de resultados, la magnitud de los cambios, así como la sostenibilidad.
Palabras clave: Tercer Sector. las organizaciones no gubernamentales. gestión de las ONGs. Sostenibilidad. Las organizaciones sin fines de lucro.
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Distribuição das ONGs por ano de abertura ............................................ 47
Tabela 2 - Resultado da sondagem nas listas do município ..................................... 49
Tabela 3 - Perfil de atuação das ONGs de cunho social .......................................... 58
Tabela 4 - Fontes de financiamento das organizações associadas à ABONG ............ 77
Tabela 5 - Classificação internacional para as OSFLs ............................................. 83
Tabela 6 - Importância econômica do Terceiro Setor mundial .................................. 85
Tabela 7 - Código das entidades sem fins lucrativos ................................................ 87
Tabela 8 - Código das OSFL enquadradas na FASFIL ............................................ 88
Tabela 9 - Número de Fundações privadas e Associações sem fins lucrativos
(FASFIL) segundo classificação das entidades sem fins lucrativos – Brasil
– 2005 ...................................................................................................... 89
Tabela 10 - FASFIL por regiões ................................................................................ 92
Tabela 11 - FASFIL – Pessoal ocupado assalariado ................................................ 94
Tabela 12 - Entidades de Assistência Social por região ........................................... 98
Tabela 13 - Força de trabalho – Entidades de Assistência Social ............................ 99
Tabela 14 - Público alvo atendido pela entidade .................................................... 102
Tabela 15 - Tipo de EAS ......................................................................................... 104
Tabela 16 - Áreas de atividade das associadas à ABONG ..................................... 106
Tabela 17 - Público alvo das associadas à ABONG ............................................... 109
Tabela 18 - Ano de constituição das associadas à ABONG ................................... 120
Tabela 19 - Área de atuação das associadas ao GIFE ........................................... 126
Tabela 20 - Recursos financeiros para ISP ............................................................ 128
Tabela 21 - Distribuição do quadro de pessoal – I .................................................. 165
Tabela 22 - Distribuição do quadro de pessoal – II ................................................. 169
Tabela 23 - Atendimento mensal ............................................................................ 218
Tabela 24 - Recursos Públicos (origem) ................................................................. 222
Tabela 25 - Recursos Privados (origem) ................................................................ 225
Tabela 26 - Identificação dos sujeitos coordenadores ............................................ 230
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Tipos de fatos ocorridos nas ligações telefônicas................................... 50
Gráfico 2 - Razões que impossibilitaram a efetivação do contato ............................ 50
Gráfico 3 - Situações registradas na categoria algo aconteceu ............................... 51
Gráfico 4 - Ocorrências nas chamadas efetivadas ................................................... 52
Gráfico 5 - Atividades das ONGs de cunho social e associativo .............................. 55
Gráfico 6 - Classificações das ONGs de cunho associativo ..................................... 56
Gráfico 7 - Cunho social (subcategorias) ................................................................. 56
Gráfico 8 - Formação dos profissionais das EAS ................................................... 100
Gráfico 9 - Presença territorial dos associados ao GIFE (%) ................................. 122
Gráfico 10 – Campos essenciais de atuação do gestor ......................................... 190
Gráfico 11 - Tempo de fundação das ONGs pesquisadas ..................................... 198
Gráfico 12 - Conselho de Administração ................................................................ 199
Gráfico 13 - Homens e Mulheres na Diretoria e Conselho Fiscal ........................... 201
Gráfico 14 - Homens e Mulheres na Diretoria e Conselho (por entidade) .............. 202
Gráfico 15 - Homens e Mulheres na Diretoria ........................................................ 202
Gráfico 16 - Homens e Mulheres no Conselho Fiscal ............................................ 203
Gráfico 17 - Homens e Mulheres (Coordenação e Presidência) ............................ 204
Gráfico 18 - Escolaridade (Coordenadores) ........................................................... 205
Gráfico 19 - Equipe técnica (outros cargos) ........................................................... 206
Gráfico 20 - Outros cargos (escolaridade) ............................................................. 207
Gráfico 21 - Funcionários na função básica (CLT) por entidade ............................ 208
Gráfico 22 - Formação equipe função básica ......................................................... 209
Gráfico 23 - Escolaridade equipe função básica .................................................... 209
Gráfico 24 - Tempo de casa (equipe função básica) .............................................. 210
Gráfico 25 – Voluntários ......................................................................................... 212
Gráfico 26 - Modalidades de atuação dos voluntários ............................................ 214
Gráfico 27 - Utilização de serviços terceirizados .................................................... 215
Gráfico 28 - Utilização de assessoria ..................................................................... 216
Gráfico 29 - Utilização de consultoria ..................................................................... 217
Gráfico 30 - Público alvo das ONGs pesquisadas .................................................. 217
Gráfico 31 - Outros atendimentos .......................................................................... 219
Gráfico 32 - Fontes de financiamento (quadro geral) ............................................. 221
Gráfico 33 - Esfera e área do financiamento público .............................................. 223
Gráfico 34 - Fonte de financiamento privado.......................................................... 224
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Análise comparativa das listas das ONGs .............................................. 45
Quadro 2 - Classificação Geral (atividades das ONGs com dados
confirmados) ........................................................................................... 53
Quadro 3 - Amostra .................................................................................................. 59
Quadro 4 - Multiplicidade de áreas de atuação ........................................................ 69
Quadro 5 - Países cobertos pelo projeto de Pesquisa The Johns Hopkins
Comparative Nonprofit Sector Project .................................................... 82
Quadro 6 - Componentes da sustentabilidade organizacional ............................... 155
Quadro 7 - Quadro de referência sobre a gestão ................................................... 159
Quadro 8 – Outros funcionários .............................................................................. 211
Quadro 9 - Atividades dos voluntários .................................................................... 213
Quadro 10 - Classificação da atuação dos voluntários ........................................... 213
Quadro 11 - Atividades desenvolvidas em outros atendimentos ............................ 220
Quadro 12 - Identificação dos sujeitos dirigentes voluntários ................................. 233
LISTA DE SIGLAS
ABONG Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
ADCE-SP Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa de São Paulo
APM Associação de Pais e Mestres
CAPES Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal do Ensino
Superior
CC Código Civil
CEATS Centro de Empreendedorismo Social e Administração do
Terceiro Setor
CEBAS Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social
CEMPRE Cadastro Central de Empresas
CEP Comitê de Ética em Pesquisa
CETS Centro de Estudos do Terceiro Setor
CF Constituição Federal
CIESP Centros das Indústrias do Estado de São Paulo
CLT Consolidação das Leis Trabalhistas
CMAS Conselho Municipal de Assistência Social
CMDCA Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente
CMMA Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente
CMS Conselho Municipal da Saúde
CNAE Cadastro Nacional de Atividade Econômica
CNAS Conselho Nacional de Assistência Social
CNPJ Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica
CNPQ Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico
CNUMAD Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o
Desenvolvimento
COMADE Conselho Municipal sobre Drogas
COMUTI Conselho Municipal da Terceira Idade
CONCLA Comissão Nacional de Classificação
CEBDS Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável
COP Conferência das Partes
COPNI Classificação dos Objetivos das Instituições sem Fins
Lucrativos a Serviço das Famílias
CPF Cadastro de Pessoas Físicas
CRAS Centros de Referência em Assistência Social
CREAS Centros de Referência Especializada em Assistência Social
DS Desenvolvimento Sustentável
EAE-FGV/SP Escola de Administração de Empresas da Fundação Getúlio
Vargas/SP
EAS Entidades de Assistência Social
ESFL Entidade Sem Fins Lucrativos
ESFLs Entidades Sem Fins lucrativos
FASFIL As Fundações Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos no
Brasil
FEA/USP Faculdade de Economia e Administração da Universidade de
São Paulo
FIA Fundo da Infância e do Adolescente
FIDES Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial e Social
FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo
GESTA Gestão Socioambiental e Interfaces com a questão Social
GETS Grupo de Estudos do Terceiro Setor
GIFE Grupo de Institutos Fundações e Empresas
GRI Global Reporting Initiative
HIV/AIDS Human Immunodeficiency Virus/ Acquired Immunodeficiency
Syndrome
IBGC Instituto Brasileiro de Governança Corporativa
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IBOPE Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística
ICMS Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
ICNPO Classification of Non-Profit Organizations
IEE Instituto de Estudos Especiais
IEERS Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
IPEA Instituto de Pesquisas Econômicas e Aplicadas
IPRS Indicador Paulista de Responsabilidade Social
ISER Instituto Superior de Estudos da Religião
ISIC International Standard Industrial Classification
ISO International Organization for Standardization
ISP Investimento social privado
LARAMARA Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual
MBA Master of Business Administration
MDS Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome
MEC Ministério de Educação
MS Ministério da Saúde
NCNB National Center For Nonprofit Boards
NEATS Núcleo de Estudos Avançados Terceiro Setor
NOB-RH/SUAS Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema
Único de Assistência Social
ODM Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
OESP Jornal O Estado de São Paulo
OIT Organização Internacional do Trabalho
ONGs Organizações Não Governamentais
ONU Organizações das Nações Unidas
OSCIP Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público
OSCs Organizações da Sociedade Civil
OSFL Organizações Sem Fins Lucrativos
OTS Organizações do Terceiro Setor
PDCA Planejamento – Desenvolvimento – Controle - Ação corretiva
PEAS As Entidades de Assistência Social Privadas Sem Fins
Lucrativos
PEAS Pesquisa de Entidades de Assistência Social
PIB Produto Interno Bruto
PNAS Política Nacional de Assistência Social
PNUMA Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente
PUC Pontifícia Universidade Católica
RFF Delegacia da Receita Federal de Franca
RFB Receita Federal do Brasil
RSE Responsabilidade Social Empresarial
SBC São Bernardo do Campo
SC Sociedade Civil
SC Sujeito da Coordenação
SDV Sujeito da Diretoria Voluntária
SENAC Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial
SENAI Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SESC Serviço Social do Comércio
SESI Serviço Social da Indústria
TBL Triple Botton Line
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TP Termo de Parceria
TS Terceiro Setor
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UNESP Universidade Estadual Paulista
UNIAPAC-LA União Internacional Cristã de Dirigentes de Empresa da
América Latina
Uni-Facef Centro Universitário de Franca
UNIFRAN Universidade de Franca
USAID Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento
Internacional
WBCSD World Business Council for Sustainable Development
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 20
PARTE 1 A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA ........................................................... 34
1.1 O cenário ............................................................................................................ 35
1.2 O processo da pesquisa ................................................................................... 48
1.3 Terceiro Setor: dimensões de análise ............................................................. 60
1.3.1 Internacional ..................................................................................................... 81
1.3.2 Nacional: Dados oficiais ................................................................................... 86
1.3.3 Nacional: Estratos específicos ....................................................................... 105
1.4 Gestão das Organizações Não Governamentais e Sustentabilidade ......... 129
1.4.1 O Campo da Gestão....................................................................................... 146
1.4.2 Gestão de Organizações Não Governamentais (ONGs) ................................ 158
PARTE 2 A REALIZAÇÃO DA PESQUISA ............................................................ 194
2.1 O processo de Configuração dos Dados ...................................................... 195
2.2 Universo das Organizações Não Governamentais do município de
Franca/SP ......................................................................................................... 197
2.2.1 O perfil das Organizações .............................................................................. 198
2.2.2 O perfil dos sujeitos ........................................................................................ 228
2.2.3 A fala dos sujeitos .......................................................................................... 233
CONCLUSÃO ......................................................................................................... 265
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 278
APÊNDICES
APÊNDICE A – Perfil da Instituição ..................................................................... 293
APÊNDICE B – Perfil dos Sujeitos ....................................................................... 298
APÊNDICE C – Representante da Diretoria Voluntária ...................................... 299
APÊNDICE D – Formulário de sondagem ao telefone ........................................ 300
ANEXOS
ANEXO A – Ofício nº 0520/2008/GabPref de 22/04/2008, referente solicitação de
informações cadastrais de organizações sem fins lucrativos ...... 302
ANEXO B – Documentos que inspiraram a configuração da classificação
geral utilizada na definição da amostra (Mapa do Terceiro Setor;
Panorama ABONG; FASFIL)............................................................. 303
ANEXO C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ............................... 306
INTRODUÇÃO
21
Nas últimas três décadas o país assistiu o crescimento das
organizações não governamentais (ONGs). Elas permeiam o tecido social
mostrando as iniciativas, as capacidades de mobilização, realização, e as bandeiras
pelas quais lutam. Raramente, ao descrever um fato, seja na área econômica, social,
política, ambiental, os veículos da impressa deixam de capturar as falas e
percepções destes atores sociais presentes na cena contemporânea.
Espaço original do ativismo político e dos movimentos sociais
mostra-se agora numa configuração mais plural, diversificada e pouco estruturada
ampliando a complexidade na busca do conhecimento científico sobre sua
identidade.
O estudo da gestão e as questões que envolvem a estrutura destas
organizações vêm responder a curiosidade científica do pesquisador em revelar a
variedade de condições nas quais ações das diferentes organizações se
concretizam.
A preocupação com o processo de planejamento das ações, tomada
de decisão, se centralizada ou participativa, a relação entre objetivos e pessoas
capacitadas para realizá-los, atendimento as exigências das políticas públicas,
existência de recursos financeiros e o olhar dos dirigentes voluntários sobre a
contribuição das organizações para a sociedade, foram inquietações presentes
durante a trajetória de vida profissional do pesquisador.
A atenção a estes fatores tomou vulto no inicio dos anos 1990 após
assumir o desafio, contido nas atribuições do cargo de gestor de recursos humanos
em fábrica do setor de autopeças, de gerir iniciativa no campo da educação não
formal voltada para jovens e adolescentes de baixa renda na cidade de São
Bernardo do Campo, enquanto política interna da empresa.
As inquietações sobre os limites e as possibilidades desta ação
social, em particular, associadas aos resultados percebidos pelas empresas da
região, governo municipal e comunidade local, despertaram o interesse no estudo da
dimensão social a partir de iniciativas privadas.
Mais a frente, em meados dos anos de 1990 ao ingressar no Grupo
de Institutos, Fundações e Empresas (GIFE), ocupando a superintendência, cresce o
nível de exposição e reflexão, no cenário nacional e internacional, às questões como
pobreza, desenvolvimento sustentável, assistência social, mobilização social, papel
22
social da empresa, educação, gestão social, filantropia empresarial, terceiro setor e
políticas sociais públicas.
No exercício das relações institucionais, âmbito das
responsabilidades do cargo, processos de interlocução entre o GIFE e, por exemplo,
Instituto de Estudos Especiais (IEE) da PUC/SP revelaram-se momentos
importantes de aproximação com o Serviço Social.
As experiências vividas na direção profissional de dois projetos
internacionais também possibilitaram interlocução com diferentes atores sociais
oriundos de várias áreas do conhecimento. Cientistas sociais, cientistas políticos,
sociólogos, filósofos, administradores, economistas, antropólogos, assistentes
sociais, psicólogos, historiadores e outros, fazem parte de extensa lista de
profissionais com os quais foi possível atuar e agregar conhecimentos.
Tal período foi marcado por intensa aprendizagem e realizações,
seja no âmbito de processos colaborativos intersetoriais, reunindo empresas,
fundações de origem empresarial e organizações do terceiro setor, seja na gestão
do GIFE enquanto organização associativa recém-criada na busca de sua
consolidação.
Em meados de 1999, nova dimensão se agregou à vivência
profissional no universo das organizações não governamentais. O convite partiu do
fundador da Associação Brasileira de Assistência ao Deficiente Visual (LARAMARA)
para assumir a posição de diretor executivo. Os desafios, nele contidos,
compreendiam desde a necessidade da instalação de processos de governança,
que inclui a configuração de conselho consultivo, às demandas para captação de
recursos, ordenamento de programa, projetos e ações de atendimento ao cego e
seus familiares, gestão das equipes e relações com órgãos públicos na efetivação
das prestações de contas e entrega de relatórios, próprios de organizações
possuidoras de títulos de utilidade pública.
Esta vivência no campo da gestão de organização não
governamental de atendimento produziu impactos importantes na construção do
conhecimento bem como nas inquietações já existentes fortalecendo a compreensão
de que a dimensão social requer, antes de tudo, profissionais sensíveis, capazes de
integrar o conhecimento e conceber ações que resultem efetivamente na
transformação da realidade social.
23
Este pesquisador, administrador de formação, enquanto docente em
curso de graduação e pós-graduação lato sensu em Administração, mais
especificamente na área de desenvolvimento de organizações e pessoas, atento ao
crescimento do Terceiro Setor e às reflexões globais sobre a filantropia empresarial,
foi estimulado a iniciar programa de mestrado na Pontifícia Universidade Católica
(PUC) de São Paulo em sua área de formação.
O trabalho de pesquisa que fundamentou a dissertação tratou de
compreender a atuação das empresas na dimensão social, debatendo sobre o papel
mediador das áreas de Recursos Humanos, o campo da filantropia empresarial e o
vínculo crescente com organizações do Terceiro Setor.
Os examinadores deste trabalho indicaram a possibilidade de
continuidade da pesquisa no que tange a contribuição das organizações sem fins
lucrativos no desenvolvimento social. Tal estímulo inspirou a busca contínua em
aprofundar o tema, o que impactou a atuação docente, sendo chamado a contribuir
para a formação de líderes em geral através da elaboração de instrumentais
variados tais como aconselhamento gerencial (coaching), educação continuada,
desenvolvimento de competências gerenciais e, também, na construção de projetos
sociais e gestão das organizações sem fins lucrativos por todo território nacional.
Deste período resultou a aspiração em ganhar maior densidade na
compreensão sobre o Terceiro Setor para além da filantropia empresarial no que
tange aos elementos constitutivos de seu surgimento, a filantropia e sua participação
no desenvolvimento das políticas públicas.
No ano de 2007, após mudança de residência para a cidade de
Franca, novas interlocuções permitiram configurar espaços adicionais de
contribuição aguçando ainda mais o interesse científico por estes temas. Diálogos,
cursos e palestras sobre terceiro setor, gestão de ONGs e filantropia foram
solicitadas pelas Instituições locais, como: Universidade de Franca (UNIFRAN),
Centro Universitário de Franca (Uni-Facef) e Universidade Estadual Paulista
(UNESP) campus Franca, através de dois grupos, um de extensão intitulado Orbe,
empresa júnior de Relações Internacionais, ligado ao Curso de Relações
Internacionais, e um de pesquisa, Gestão Socioambiental e Interfaces com a
questão Social (GESTA), vinculado ao Curso de Serviço Social.
Mais à frente a Secretaria de Ação Social de Franca buscou junto ao
pesquisador o desenho, e efetivação, de projeto de intervenção na área de gestão e
24
elaboração de projetos sociais para profissionais das organizações que recebem
recursos públicos e do respectivo órgão gestor, com o objetivo de capacitar
profissionais da área da Assistência Social que integram a rede prestadora de
serviços.
Os temas centrais solicitados para esta intervenção estão voltados
aos conceitos básicos de elaboração de projetos envolvendo: metodologia prática
para elaboração tendo como referência os serviços existentes no município;
administração de projetos; prestação de contas e elaboração de relatório final,
visando o aprendizado de metodologias e estratégias adequadas à elaboração dos
planos de ação1, necessárias ao cumprimento da Política Nacional de Assistência
Social (PNAS).
A intervenção partiu de diagnóstico junto aos profissionais do órgão
gestor da PNAS e do exame dos planos de trabalho das ONGs do município que
recebem recursos públicos municipais do orçamento da Assistência Social. Com
base nas informações obtidas foi desenhada estratégia de intervenção que
considerou o estabelecimento de estrutura padrão para o plano de trabalho a ser
elaborado pelas equipes das organizações sociais (entidades), envolvimento dos
dirigentes e técnicos responsáveis por tais documentos, realização de oficinas de
elaboração dos referidos planos e sessões de capacitação e alinhamento conceitual
das equipes dos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e Centros de
Referência Especializada em Assistência Social (CREAS) de Franca.
Nas abordagens realizadas, 82 participantes estiveram presentes
incluindo coordenadores e dirigentes das ONGs da cidade, além de profissionais do
CRAS e do CREAS. Da intervenção exclusiva executada para os profissionais do
Serviço Social das unidades, além dos profissionais da própria Secretaria de Ação
Social, totalizaram 30 participantes.
Na esteira dos resultados alcançados com a intervenção da
Secretaria de Ação Social do município, a Secretaria da Educação de Franca
solicitou projeto de capacitação dos gestores das ONGs vinculadas à rede
conveniada das creches. Adicionalmente ao tema do plano de trabalho, esta
1 O Plano de trabalho é o documento oficial de interlocução entre a ONG, candidata ao recurso municipal da Assistência Social, ou à sua renovação, e a Secretaria de Ação Social, que é examinado para verificação das ações que serão efetivadas. Nele é descrito o projeto, devidamente fundamentado e estruturado, bem como seu cronograma e orçamento.
25
Secretaria buscou fortalecer os princípios da gestão democrática trazendo para as
sessões de capacitação, além dos gestores, os dirigentes das organizações.
A efetivação da intervenção obedeceu às fases de diagnóstico da
realidade local contemplando diálogos com diretoria e equipe técnica da Secretaria,
visitas às creches, planejamento, execução de oficinas e sessões de devolutivas aos
profissionais do órgão gestor na Secretaria da Educação do município. Nas oficinas,
participaram aproximadamente 50 pessoas entre gestores, técnicos e dirigentes.
Estas vivências no município, em particular a intervenção promovida
através da Secretaria de Ação Social, evidenciaram o valor dos conceitos, princípios
e instrumentos de gestão que, ao serem trabalhados de forma sistematizada e
estruturada ancorados para o desenvolvimento social, agregam aos resultados
estratégicos das ONGs. Demonstram, igualmente, espaços de contribuição e
compartilhamento com equipes profissionais das organizações constituídas em
grande parte por assistentes sociais com responsabilidade de planejamento,
coordenação e execução de projetos e planos de trabalho.
Como administrador de formação e tendo atuação profissional
desenvolvida no campo da ação social, vislumbrou o potencial de qualificação fruto
da aproximação com a prática profissional do Serviço Social que, associado ao
desejo de participar ativamente do município construiu caminho para o envolvimento
com diferentes atores locais, em particular o Grupo de Pesquisa Gestão
Socioambiental e as Interfaces com as Expressões da Questão Social (GESTA),
culminando com a candidatura e submissão do projeto de pesquisa ao Programa de
Pós Graduação no curso de Doutorado em Serviço Social, na linha de pesquisa
“mundo do trabalho” da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”,
UNESP, Campus de Franca. Posteriormente se deu o ingresso no Grupo na
condição de pesquisador.
O GESTA, devidamente certificado pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), criado e coordenado pela
professora doutora Claudia Maria Daher Cosac, Grupo integrado ao Curso de
Serviço Social da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais, da UNESP, Campus
de Franca, vem desenvolvendo atividades investigativas interessado na
compreensão de temáticas sociais que se avolumam na sociedade na medida em
que o Estado já não é capaz de suprir as demandas. O Grupo de pesquisa inscreve
seus objetivos a estudos e reflexões críticas, de caráter interdisciplinar, à construção
26
de conhecimentos científicos para contextualização dos grandes problemas locais e
regionais, inerentes ao mundo contemporâneo. Este conjunto de objetivos incentiva
a definição de metodologias exequíveis que visem o desenvolvimento nos moldes
sustentáveis e, neste sentido, fica evidente a busca de soluções compartilhadas
entre sociedade civil, Estado, iniciativa privada, e o consequente fortalecimento de
premissas que enfatizem o Terceiro Setor. Destaca a preocupação com a qualidade
da prática na busca por resultados de efeitos multiplicadores identificando ações que
conduzam a melhores condições de vida à população inserida neste contexto, com
crescimento econômico planejado ligado a investimentos sociais. Esta proposta abre
espaço para um planejamento que se molda às demandas da sociedade do século
XXI (CNPQ, 2008).
Dentre os indicadores sociais selecionados para a investigação
temática do Grupo, foi enfatizada a questão das políticas sociais e de gestão
abrangentes a governos, distribuição de renda, equidade, justiça social, direitos,
bem estar, estrutura, infraestrutura (urbana e rural), população (gênero, etnia,
cronologia), organizações governamentais, não governamentais, associações e
fundações. Deste conjunto foi selecionado o indicador ONGs, associações e
fundações, que deu origem ao mapeamento do Terceiro Setor no município de
Franca.
Na expectativa de conhecer e identificar as organizações não
governamentais sem fins lucrativos com sede na cidade de Franca/SP no sentido de
sua caracterização jurídica, de acordo com a legislação brasileira, Constituição
Federal de 1988 e leis complementares, sob a forma de associações e fundações
foram estabelecidas parcerias com a Prefeitura Municipal de Franca com a finalidade
de ampliar reflexões, reavaliar e reelaborar as políticas sociais públicas do município
no cumprimento dos objetivos essenciais à prestação de serviços com excelência, e
com o Centro Universitário de Franca (Uni-Facef) tendo em vista a inserção de
profissionais, docentes e alunos na pesquisa, enfatizando a interdisciplinaridade
proposta pelo Grupo GESTA.
No ano de 2009, por solicitação formal do prefeito de Franca, o
Grupo recebeu uma listagem da Delegacia da Receita Federal (RFF) do município
referente ao Cadastro Nacional de Atividade Econômica (CNAE) de todas as ONGs
registradas. Este documento fornece o nome da organização, endereço, data de
abertura, situação cadastral, atividade em acordo com o CNAE e o Cadastro
27
Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ). Três itens da listagem exigem breves
comentários introdutórios.
O primeiro deles é o CNPJ. A inscrição é obrigatória para qualquer
organização e é demandada no ato de sua constituição. Neste momento, além das
informações cadastrais básicas, como endereço e nomes das pessoas envolvidas, é
indicada a atividade econômica básica e secundária, de acordo com a CNAE,
segundo item a comentar.
O CNAE é um instrumento de padronização da classificação das
atividades executadas por todos os agentes econômicos do país, incluindo governo,
setor privado e organizações sem fins lucrativos. Tal classificação está sob a
coordenação da Receita Federal do Brasil (RFB) e orientação técnica do IBGE com
interação em todos os níveis de governo.
Esta classificação foi oficializada pela primeira vez no Brasil em
1994 e guarda vínculo com sistemas de classificação internacional adotada pelas
Nações Unidas em 1948. Em outras palavras o CNAE tem com base o padrão de
referência adotado internacionalmente e incorpora as diversas contribuições dos
sistemas de pesquisa nacional, o que contribui para o desenvolvimento de
estatísticas econômicas no nível internacional. Ao mesmo tempo garante a
comparação entre diferentes contextos e mantém confiabilidade com a realidade
local.
As normas e padrões estabelecidos no CNAE são de
responsabilidade da Comissão Nacional de Classificação (CONCLA) criada também
em 1994 e instalada no ano seguinte, da qual participam representantes de quase a
totalidade dos ministérios incluindo o Ministério de Desenvolvimento Social e
Combate a Fome. A versão do CNAE em vigor data de 2007, resultou de amplo
processo de atualizações, ajustes e harmonização com os sistemas internacionais
(IBGE, 2007a) e tem sido a referência das organizações constituídas a partir deste
ano. A listagem fornecida pela RFF recebe a influencia desta versão.
O terceiro item se refere à situação cadastral. Conforme a Instrução
Normativa da Receita Federal do Brasil (RFB) nº 748, de 28 de junho de 2007, em
seus artigos 30, 31,32, 33, 34, 53, 54 e 55, ela pode ser ativa; suspensa, inapta,
baixadas e nulas.
Sem entrar na especificidade da área fiscal, excetuando-se a
situação considerada ativa, as demais situações indicam condição de não operação.
28
Assim, por definição dos pesquisadores do GESTA somente foram trabalhadas as
Organizações que possuem a situação cadastral ativa, indicando a condição
operacional e sem restrições.
A análise e tabulação dos dados demonstraram que o município
conta com 513 organizações não governamentais; destas, 69 (13,45%) se
encontram baixadas, 66 (12,86%) inaptas, uma (0,19%) nula e 377 (73,50%) são
ativas entre Associações e Fundações nas formas de entidades e atividades
diversas inscritas de acordo com as opções previamente definidas pela própria
Receita. O universo da pesquisa ficou mapeado.
Organizações de interesse público, voltadas para o conjunto da
sociedade, e de benefício mútuo, orientadas para seus associados, tornaram-se alvo
de abordagem direta, mediante construção de instrumental adequado à consecução
dos objetivos propostos, o que permitiu identificar a amostra da pesquisa:
organizações filantrópicas sem fins lucrativos cujas atividades estejam orientadas
para o atendimento de demandas sociais, sediadas em Franca, com nível básico de
organização legal e administrativa, conduzindo a reflexões que esclareçam
premissas básicas sobre o Terceiro Setor.
Em seguida ao mapeamento do universo foi realizada sondagem,
por telefone, com todas as organizações e fundações ativas através de formulário
construído com base nas informações da listagem, nome jurídico, endereço,
telefone, levantamento das atividades, público alvo, responsáveis, com a
recomendação de que a pessoa que atendesse ao telefone se identificasse e
fornecesse as informações.
Em função da expansão do universo a ser pesquisado o Grupo
estabeleceu outro critério para a sondagem, os contatos telefônicos seriam
realizados nos períodos manhã, tarde e noite dando oportunidade de repetir as
ligações daqueles que não atenderam às primeiras chamadas. O cronograma
delimitado pelo Grupo para esta etapa foi cumprido com a duração de 60 dias. Os
resultados da sondagem provocaram nos membros do Grupo interesse investigativo
específico por quatro modalidades: creches, fundações, associações de classe e
organizações sem fins lucrativos, de interesse público, não governamental. Para
cada modalidade foram estabelecidos critérios para seleção da amostra, construção
de instrumental adequado à abordagem tanto no que se refere ao levantamento do
perfil da instituição quanto na abordagem direta, face a face, com os sujeitos da
29
investigação. O Grupo GESTA também decidiu que os sujeitos seriam os
responsáveis por elas, os gestores, sejam das diretorias voluntárias, sejam das
diretorias executivas, sejam coordenadores.
Quatro pesquisadores iniciaram a investigação em cada uma destas
modalidades. Um mestrando, à época, investigou as creches cujos resultados
integraram a dissertação intitulada “Gestão de Organizações Não Governamentais”
defendida através do Programa de Pós Graduação em Serviço Social, na UNESP,
Campus de Franca, em 2011. Dois doutorandos iniciaram a pesquisa em duas
modalidades, respectivamente: associações de classe e fundações.
O autor do presente estudo, como parte integrante do Grupo
GESTA, incidiu pesquisar o universo das ONGs, através da listagem da Receita
Federal do município de Franca, selecionando aquelas cujas atividades se
encontram inscritas como executoras de ação social. O objetivo da investigação
ficou definido em compreender para explicar a participação das organizações sem
fins lucrativos, de interesse público, não governamental, no desenvolvimento das
políticas sociais públicas do município.
A emergência das ONGs a partir dos anos 1980 resultou na
expressiva expansão no numero de organizações criadas. Dados do IBGE (2008)
apontam que 41,5% do total de fundações e associações privadas sem fins
lucrativos no Brasil, espaço jurídico onde estas organizações estão circunscritas,
nasceram na década de 1990 que coincide com o contexto de redemocratização do
país e do fortalecimento da participação cidadã.
Ao considerar este processo histórico vários questionamentos
inspiraram a construção da pesquisa na referida modalidade. A experiência
profissional mostra que parte da expansão destas organizações surge como fluxo da
convocação à participação cidadã. Esta perspectiva individual de construção da
democracia, se não adequadamente trabalhada, pode suscitar a perspectiva
particular na construção dos objetivos da entidade. Assim as organizações sociais
de interesse público se orientam por objetivos individuais ou coletivos? Outro
questionamento, ainda como reflexo do contexto anterior, diz respeito à construção
das intervenções. Estabelecer objetivos com clareza, apropriar metas adequadas,
desenvolver metodologia eficaz, dimensionar resultados esperados e criar processos
de monitoramento e avaliação, requerem parâmetros bem delineados. Para tanto as
ONGs consideram os indicadores sociais nas ações que desenvolvem?
30
Diante da multiplicidade de origens e características das
organizações existentes observa-se igual pluralidade nas intervenções e agendas de
trabalho. Considerando tal diversidade qual o tipo ideal de estrutura para o terceiro
setor? Ainda na esfera da estrutura, ela necessariamente deve corresponder ao
conjunto de intencionalidades da organização e são materializadas nas
especificações das atividades, no dimensionamento das equipes, na proposta de
ação em uma dada realidade. Neste sentido questiona-se, até que ponto o modelo
das estruturas das ONGs correspondem à proposta de desenvolvimento?
Ao pensar em estruturas de atuação, seus idealizadores necessitam
considerar os recursos de que dispõe, ou mesmo aqueles que a sociedade dispõe,
para a realização do que foi se concebido. Neste sentido, outro questionamento se
coloca. Este modelo estrutural considera a perspectiva da captação de recursos e,
consequentemente, a sustentabilidade financeira?
Como último questionamento, mas não menos importante, é
fundamental evidenciar a relação existente entre ações empreendidas pelas
organizações e as políticas sociais. Ainda que a dimensão particular tenha
influenciado a construção da instituição e seus planos e propostas tenham
demarcado um traço pessoal de decisão sobre os atos, ao realizar as intervenções
estão conectados a um universo maior de intervenção. Assim, as ONGs
compreendem que são veículos da efetivação das políticas sociais públicas?
Partindo destas indagações a presente pesquisa apresenta como
objeto de estudo a gestão das organizações não governamentais do município de
Franca.
A integração de todos os elementos contidos nos questionamentos
evidencia a prática de gestão da organização e denota coerência ou não entre as
decisões tomadas por seus dirigentes e coordenadores. Está ai a riqueza a ser
compreendida e explicada.
O interesse investigativo conduziu o pesquisador a pressupor que o
primeiro e o segundo setor, Estado e Mercado, se compõem estruturalmente
levando em conta o conhecimento racional e científico, de acordo com as
especificidades da natureza operacional. Por sua vez, o terceiro setor se organiza
em torno das expressões da questão social, miséria, fome, violência, desigualdades
e tantas outras. As ausências de características específicas que estabelecem
padrões estruturais e operacionais às organizações não governamentais, incluindo a
31
qualidade no desempenho do controle financeiro e, essencialmente, nos resultados
efetivos das ONGs junto às demandas sociais, tornam vetores à complexidade,
diversidade e às contradições que compõe o Terceiro Setor, em relação direta ao
seu desenvolvimento e sustentabilidade.
O desenho da presente pesquisa, a justificativa, a metodologia e o
processo de coleta de dados ficam vinculados à lista das associações e fundações
que a Receita Federal do município de Franca forneceu ao grupo de pesquisa
GESTA vinculado ao Programa de Pós Graduação em Serviço Social da Faculdade
de Ciências Humanas e Sociais da UNESP, campus de Franca. Da referida listagem
constam nome completo das ONGs, a natureza das atividades desenvolvidas, o
Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ) a situação cadastral, o endereço
completo, levando em consideração a data de origem das organizações.
Tendo em vista este conjunto de fatores, o recorte temporal se
reporta ao ano de 2009, quando da obtenção dos dados constantes no relatório da
Receita Federal até o ano de 2012, referente à operacionalização da presente
pesquisa.
Como resultados esperam-se a geração de categorias que auxiliem
a compreensão sobre a composição e gestão das organizações, no sentido de
efetivar melhorias às políticas sociais públicas da cidade de Franca/SP, tendo em
vista o desenvolvimento sustentável, maior compreensão sobre a identidade do
Terceiro Setor na cidade, suas ações, desafios atuais e a avaliação dos resultados;
contribuição para o desenvolvimento de competências dos atuais e futuros gestores
das organizações sem fins lucrativos de interesse público não estatal da cidade;
fornecer elementos que possa auxiliar a formação de redes sociais e potencializar as
já existentes.
No que tange à pesquisa de caráter nacional, esforços recentes do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) com outras entidades
representativas caminham no sentido de ampliar a compreensão sobre o conjunto
das ONGs brasileiras. Quem é; o que faz; quem a financia qual a contribuição efetiva
à sociedade; quem está na direção, qual a força de trabalho que emprega, número
de voluntários que mobiliza, são alguns dos aspectos que a referida pesquisa
elucida.
Tentativas de melhor entendimento a respeito das organizações e do
campo de atuação não provêm apenas dos órgãos governamentais. As
32
Universidades passam a representar importante papel neste cenário e já o faz
através de seus núcleos e grupos de pesquisa, de programas de pós-graduação
buscando dimensionar este tema.
Dados obtidos no banco de teses da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes2), por exemplo, ajudam a
configurar esta questão. No ano 2009, 86 estudos sendo 16 teses e 70 dissertações
abordaram pelo menos alguma das múltiplas interfaces relacionadas à ONGs. Em
2010 foram 76 trabalhos dos quais 21 teses e 55 dissertações.
Os conteúdos destes trabalhos não foram analisados, mas tais
números indicam a presença importante de universidades, professores,
pesquisadores e de recursos investidos na leitura deste contexto.
A proposta do presente estudo consiste em olhar mais detidamente
para este universo cuja identidade está sendo delineada pela conjunção de
expressões como: organizações da sociedade civil, organizações sociais,
organizações sem fins lucrativos e terceiro setor. Esta última, em particular, merece
ser sublinhada pelo ingrediente aglutinador que sugere.
Pensar em terceiro setor implica considerar a existência de outros
dois setores: Estado e Privado. Implica, também, em circunscrever em um mesmo
espaço organizações com diferentes processos históricos e, consequentemente,
diferentes características estruturais e operativas. Desta forma, o sentido subjacente
à expressão terceiro setor, mais frequentemente apropriado a ele, denota a tentativa
de uma estrutura teórica suficientemente abrangente, e agregadora, que serve para
diferenciar organizações a ele pertencentes, de organizações contidas em outro
conjunto estrutural. Em suma, organizações do terceiro setor não pertencem ao
Estado nem ao Mercado.
Esta pesquisa propõe desvelar as estruturas e funcionamento das
ONGs. Na América Latina é frequente o uso das expressões “sociedade civil” (SC) e
“organizações não governamentais” (ONGs) abrigando desde movimentos de
militância e ativismo, a desenvolvimento e atendimento social.
Este acrônimo ONG é o mais utilizado por diferentes atores para
designar organizações que são privadas, autogeridas, voluntárias, sem fins
2 A pesquisa foi realizada online, no portal da Capes. O pesquisador selecionou os dois últimos anos que antecederam a elaboração da presente tese, que apresentassem dados disponíveis referentes aos níveis dos Cursos de mestrado e doutorado strictu senso e a palavra chave “ONG”.
33
lucrativos e que efetivam ações de interesse público. Privadas porque não são
organizações que pertençam à estrutura pública de Estado; autogeridas, pois são
conduzidas por órgão próprio de direção; voluntárias por não serem formadas por
força de lei, e contam com o trabalho voluntário de pessoas; e sem fins lucrativos por
não distribuírem lucro.
A tese está estruturada em duas partes: construção e realização da
pesquisa. Na primeira, o capítulo inicial apresenta o cenário que envolve a
investigação em seus aspectos metodológicos, fala sobre o arcabouço que organiza
os dados oficiais a respeito das organizações sem fins lucrativos. Adicionalmente
efetiva a introdução das pesquisas nacionais na área e situa o estudo no município
de Franca/SP. O segundo capítulo descreve o processo de pesquisa a partir da
sondagem da totalidade do universo e explica os critérios para definição da amostra.
O terceiro capítulo contempla o referencial teórico que trata da
compreensão sobre Terceiro Setor em seus aspectos históricos, expondo diferentes
dimensões de análise e realizando conexões entre estudos internacionais, nacionais
elaborados por órgãos de governo além de organizações representativas da
sociedade civil. O quarto capítulo apresenta as bases sobre desenvolvimento
sustentável, sustentabilidade das organizações, o campo da gestão e sua efetivação
nas organizações não governamentais.
A segunda parte teve o objetivo de evidenciar a realização da
pesquisa. O primeiro capítulo fala do processo de configuração dos dados, através
das entrevistas com os sujeitos (diretores e coordenadores) orientadas por
formulários semiestruturado, bem como expõe sobre o tratamento dos dados.
O segundo capítulo contempla o universo das ONGs de Franca e
objetivou expressar os diferentes aspectos sobre o perfil das entidades pesquisadas,
dos sujeitos, bem como as falas dos sujeitos. Por fim, as observações finais estão
desenvolvidas na conclusão.
PARTE 1 A CONSTRUÇÃO DA PESQUISA
35
1.1 O cenário
No contexto da era da informação, a construção do conhecimento
ganha elevado grau de importância e seu processo de concepção igualmente
relevante. Assim, a pesquisa assume papel estratégico e o pesquisador, com sua
visão, habilidade e sensibilidade, tornar-se o principal instrumento a serviço da
compreensão da realidade. Tal realidade se apresenta plural, diversa, multi, inter e
transdisciplinar exigindo do pesquisador humildade e sagacidade para capturar da
realidade àquilo que produzirá efeito na humanidade.
No processo de geração do conhecimento com estas características
os procedimentos investigativos e metodológicos assumem equivalente influência e
seria imprudente afirmar que existe apenas uma maneira correta de se fazer. “Não
há método melhor que outro, ou seja, o mais indicado sempre será aquele capaz de
conduzir o investigador a alcançar as respostas para suas dúvidas.” (MINAYO, 2007,
p. 22). Desta forma a opção metodológica torna-se ponto fundamental para o êxito
dos resultados esperados.
A presente pesquisa não busca representatividade estatística e fez
opções metodológicas que desvelassem a realidade em seus contornos, cores e
imagens. Partiu-se do fato adotando o método indutivo que, “[...] parte do particular e
coloca a generalização como produto posterior do trabalho de coleta de dados.” (GIL
1999, p. 28).
Para fazer frente aos objetivos da investigação optou-se pela
abordagem quantiqualitativa, em particular por seus elementos constitutivos que
permitem coerência com o método indutivo. Minayo indica esta possibilidade quando
considera que
Os dois tipos de abordagem e os dados delas advindo, porém, não são incompatíveis. Entre eles há uma oposição complementar que quando bem trabalhada teórica e praticamente, produz riqueza de informações, aprofundamento e maior fidedignidade interpretativa. (MINAYO, 2007, p. 22).
A riqueza de dados possibilita que as informações junto aos sujeitos
possam auxiliar a compreensão dos fatores objetivos que emergiram dos dados
quantitativos, a partir do levantamento do perfil das organizações e dos sujeitos
selecionados. Os dados subjetivos, que surgiram ao longo do processo investigativo,
36
indicam, qualitativamente, os significados que atribuem aos questionamentos
formulados. Segundo Minayo (2007, p. 21).
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se ocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode ou não deveria ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo dos significados, dos motivos, das aspirações, das crenças, dos valores e das atitudes.
O estudo adotado para a presente investigação foi o descritivo e
exploratório. Conforme Barros e Lehfeld (2000, p. 70),
Neste tipo de pesquisa, não há interferência do pesquisador, isto é, ele descreve o objeto de pesquisa. Procura descobrir a frequência com que o fenômeno ocorre, sua natureza, característica, causas, relações e conexões com outros fenômenos.
Cervo e Bervian (1996, p. 49) reforçam “Os estudos exploratórios
não elaboram hipóteses a serem testadas no trabalho, restringindo-se a definir
objetivos e buscar maiores informações sobre determinado assunto de estudo.”
A pesquisa no campo das ONGs tem suas especificidades.
Pesquisadores ao redor do mundo apontam para a complexidade envolvida na
obtenção de dados sobre as Organizações Sem Fins Lucrativos (OSFL). Seu
desenvolvimento acelerado nas últimas décadas, a diversidade de vocações, a
amplitude e profundidade das transformações ocorridas nos espaços de atuação
destas estruturas sejam econômicas, culturais, sociais e políticas, determinam
obstáculos e desafiam a capacidade dos organismos voltados para a produção do
conhecimento.
No âmbito da presente investigação foi necessário recorrer ao
estudo aprofundado do sistema de classificação de contas brasileiro relativo às
organizações privadas sem fins lucrativos, que permitiu compreender a base de
informação utilizada pelos órgãos públicos de pesquisa e estatísticas que têm
produção na área, como o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
Buscou-se entendimento sobre a Tabela de Natureza Jurídica que
estrutura o Cadastro Central de Empresas (CEMPRE) cujo objetivo é identificar as
entidades públicas e privadas nos cadastros da administração pública do país.
Examinou-se o papel da Comissão Nacional de Classificação (CONCLA), o Cadastro
Nacional de Atividades Econômicas (CNAE), e sua origem no sistema de
37
classificação internacional de atividades econômicas, desenvolvido pela Divisão de
Estatísticas das Nações Unidas conhecido pela denominação International Standard
Industrial Classification (ISIC). Estudou-se, ainda, sobre a Classificação dos
Objetivos das Instituições sem Fins Lucrativos a Serviço das Famílias (COPNI), sigla
da expressão em inglês – Classification Of The Purpose of Non-Profit Institutions
Serving Households, a Lei n. 10406 de 2002 que institui o novo Código Civil
Brasileiro, em seus parágrafos que orientam a constituição de pessoas jurídicas
incluindo as Associações e Fundações, bem como a Lei n. 9790 de 1999 que regula
e institui as Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP).
Pertence ao processo de investigação o exame da pesquisa
internacional Global Civill Society em 36 países, incluindo o Brasil, organizada pelo
pesquisador Lester Salamom. da Johns Hopkins Comparative Nonprofit Sector
Project, bem como as pesquisas nacionais realizadas pelo IBGE: As Fundações
Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos no Brasil” (FASFIL) e As Entidades de
Assistência Social Privadas Sem Fins Lucrativos (PEAS). No que tange à pesquisa
bibliográfica os temas centrais que nortearam o pesquisador foram: terceiro setor,
desenvolvimento sustentável e gestão de organizações sem fins lucrativos.
Os dados primários foram obtidos através de entrevistas com os
sujeitos da pesquisa a partir de formulário semiestruturado contendo questões
fechadas (Apêndice A), (Apêndice B) e abertas (Apêndice C). No que diz respeito às
questões fechadas reportam-se ao perfil dos sujeitos e das instituições revelando o
entendimento dos sujeitos sobre a gestão das organizações bem como a cultura que
organiza a mesma.
As questões abertas revelaram a compreensão do membro da
diretoria voluntária sobre a organização em seus aspectos de decisão e avaliação. A
pesquisa foi realizada com uso do gravador e com a devida autorização dos sujeitos.
Adicionalmente o pesquisador lançou mão da técnica de observação direta e
sistemática conforme descrevem Marconi e Lakatos (2003, p. 190), “[...] a
observação direta intensiva é realizada através de duas técnicas: observação e
entrevista”, permitindo o estabelecimento do dialogo aberto e franco entre o
pesquisador e os sujeitos, o que ampliou a compreensão do objeto de estudo pela
visão, ainda que subjetiva, dos próprios sujeitos. A observação utilizou os sentidos
do entrevistador para captar elementos adicionais à entrevista e que estavam
presentes no instante de sua execução.
38
No momento da abordagem de campo da presente pesquisa, no
cenário nacional, um quadro adverso às Organizações Sem Fins Lucrativos (OSFL)
tornava-se mais evidente. As saídas dos ministros Pedro Novais (Turismo), Orlando
Silva (Esporte) e Carlos Lupi (Trabalho) nos meses de setembro, outubro e
dezembro de 2011, respectivamente, motivadas pela suspeição em convênios entre
as pastas citadas e ONGs, fez ressurgir o debate sobre a relação entre Estado e
sociedade civil organizada, em particular sobre a transparência e gestão das
Entidades Sem Fins Lucrativos (ESFL). Documento do Instituto de Pesquisas
Econômicas e Aplicadas (IPEA), sistematizando as transferências da União para
estas organizações no período de 1999 a 2010, faz importante indicação “[...] é
necessário investigar em que condições, com que objetivos e por quais meios os
gestores e as ESFLs escolhem celebrar parcerias.” (IPEA, 2011, p. 12).
Em claro processo de criminalização, setores da mídia, formadores
de opinião e parte da sociedade passaram a considerar todo e qualquer convênio
como escuso, passível de suspeita, o que acabou por determinar postura da
presidente Dilma Rousseff suspendendo todos os convênios por 30 dias. Esta
generalização provocou situações delicadas como, por exemplo, a falta de recursos
para manter e dar prosseguimento aos projetos aprovados pela união e, por outro
lado, prejudicou a já abalada relação de confiança entre Estado e sociedade civil
organizada.
Se na década de 1990 elas materializam o melhor espírito de
participação agora parecem figurar, para alguns, como instrumento de corrupção. O
mesmo documento do IPEA, contudo, em suas considerações finais pondera sobre a
relevância do papel das ONGs na construção das políticas públicas.
De um ponto de vista normativo, é claro que se deve tentar construir um arcabouço jurídico e administrativo orientador da relação entre Estado e ESFLs que busque blindá-la de vícios tidos como históricos da formação do governo brasileiro, tais como o clientelismo e o patrimonialismo. Ao mesmo tempo, deve-se reconhecer que a parceria entre Estado e sociedade na execução das políticas públicas pode oferecer ganhos democráticos, baseados em características como a criatividade, a capilaridade, a proximidade dos beneficiários e até mesmo a ética do cuidado cultivada por muitas dessas organizações. Recusar a possibilidade desse tipo de parceria pode até resolver alguns problemas, mas traz outros, tais como o possível déficit de legitimidade do mercado ou de uma burocracia insulada na condução dos negócios públicos. (IPEA, 2011, p. 14).
39
A presença de ONGs no espaço de atuação pública não estatal é
reconhecida nestas notas e aponta para a importância da gestão destas
organizações no que concerne à clareza de objetivos, propósitos claros com as
parcerias e com processos de gestão que culminem em transparência e confiança
de toda a sociedade. Por outro lado destaca que a parceria entre Estado e ONGs,
no limite, se traduz em instrumento de democracia para as organizações sociais, em
geral, enquanto espaço de participação efetiva da sociedade no exercício da
cidadania ativa.
Em seminário intitulado “Marco Regulatório da Sociedade Civil:
desafios e propostas”1 (2012), Pedro Pontual, atual diretor de participação social da
Secretaria de Articulação Social da Secretaria Geral da República, destacou o direito
à participação e o controle social das políticas públicas no contexto da
democratização da gestão pública. Ao apresentar os números de ouvidorias no
Estado brasileiro (160) o papel das audiências e consultas públicas, os Conselhos
de participação e Conferências reforçou o papel das organizações da sociedade civil
na gestão das políticas públicas. Sublinhou, ainda, que o momento se diferencia das
décadas anteriores, quando a convocação se dava pelo discurso à participação dos
indivíduos, mas que agora o chamado é pela participação das organizações no
controle social e nas políticas públicas.
Destaques como estes fortalecem a necessidade de geração do
conhecimento nesta área a fim de colocar luz sobre a atuação das ONGs,
informando e esclarecendo seu perfil, sua estrutura, seu planejamento estratégico,
seu plano de ação além da efetiva contribuição nas questões de interesse público.
Outro ingrediente no cenário nacional é a Rio +20: Conferência das
Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável, realizada na cidade do Rio de
Janeiro entre os dias 13 e 22 de junho de 2012, com a presença de muitos chefes
de Estado. Neste ambiente ocorreu a Cúpula dos Povos, evento paralelo organizado
pela sociedade civil, realizado no aterro do Flamengo, no qual 8038 ONGs foram
credenciadas (ONU, 2012e, online). Como espelho do que ocorreu na ECO-92, à
época intitulado de Fórum das ONGs, a reunião produziu documentos, realizou
diálogos intersetoriais, debates temáticos, articulações e um volume significativo de
1 Evento ocorrido em 10/05/2012 e promovido pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) Unidade Nove de Julho, São Paulo/SP, no âmbito do curso de especialização (latu-sensu) em Projetos Sociais: gestão e perspectiva.
40
eventos que reuniram pessoas de muitos países. Pode-se afirmar que estas
intervenções puderam ecoar o sentido de urgência que o tema requer e que se
espera ver materializada nas decisões das nações, mas o que se deseja destacar
também é o papel que as ONGs assumem, não somente elevando o nível da
participação da sociedade civil, mas efetivando o controle social que Pedro Pontual
afirmou. Certamente com estas indicações o papel da Universidade, e da pesquisa,
ganha especial notoriedade.
Haddad (2002), ao apresentar publicação colocando em pauta o
tema das ONGs e das Universidades, revela que o saber e pesquisa a respeito do
universo das organizações do terceiro setor, que inclui as ONGs, pertencem
predominantemente aos países do norte, tendo em vista a forte presença dos
investimentos oriundos de organizações privadas e pessoas físicas. Assim, importa
destacar a necessidade do conhecimento nas investigações científicas dos países
do sul, incentivar comportamentos e padrões semelhantes às estruturas dos países
desenvolvidos, tenho em vista contextos culturais sensivelmente diferentes.
No Brasil, a partir da segunda metade dos anos 1990, e após o
envolvimento de pesquisadores brasileiros em investigação internacional, que
promove estudo comparado entre vários países, ampliou-se o entendimento no que
tange a necessidade de gerar maior conhecimento sobre a realidade local.
Nos primeiros anos desta década dois estudos brasileiros foram
gerados revelando a composição deste universo, idade, vocação, distribuição
geográfica e importância, em termos de geração de emprego além do fluxo de
recursos financeiros. As análises ocorrem em dois eixos distintos, porém conexos. O
primeiro é a pesquisa intitulada “As Fundações Privadas e Associações Sem Fins
Lucrativos no Brasil” (FASFIL), nas edições 2002 e 2005, realizado pelo IBGE e
Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), em parceria com a Associação
Brasileira de Organizações Não Governamentais (ABONG) e o Grupo de Instituto
Fundações e Empresas (GIFE).
Esta investigação FASFIL-2005 (IBGE, 2008) evidencia a presença
de 338 mil organizações oficialmente registradas no país representando o
crescimento de 22,6% em relação à primeira edição empregando 1,7 milhão de
pessoas, que corresponde a 5,3% dos trabalhadores brasileiros.
A base de informações deste estudo é o Cadastro Central de
Empresas (CEMPRE) e a referência para a definição da FASFIL está na
41
metodologia elaborada na Divisão de Estatísticas das Nações Unidades, em
conjunto com a Universidade Jonh Hopkins, em 2002. Os resultados originaram-se
do confronto destas informações com a Tabela de Natureza Jurídica (IBGE, 2012b,
online,) e com a Classificação dos Objetivos das Instituições Sem Fins Lucrativos
aos Serviços das Famílias (COPNI). Simultaneamente buscou-se o enquadramento
com os seguintes critérios:
(i) privadas, não integrantes, portanto, do aparelho de Estado; (ii) sem fins lucrativos, isto é, organizações que não distribuem eventuais excedentes entre os proprietários ou diretores e que não possuem como razão primeira de existência a geração de lucros – podendo até gerá-los, desde que aplicados nas atividades-fim;(iii) institucionalizadas, isto é, legalmente constituídas; (iv) auto administradas ou capazes de gerenciar suas próprias atividades; e (v) voluntárias, na medida em que podem ser constituídas livremente por qualquer grupo de pessoas, isto é, a atividade de associação ou de fundação da entidade é livremente decidida pelos sócios ou fundadores. (IBGE, 2008, p. 13).
Em se tratando de estudo de caráter nacional, seu papel foi
apresentar um retrato mais completo do conjunto destas organizações
demonstrando dados de forma regionalizada permitindo, por exemplo, observar certa
tendência na distribuição do número de ONGs em acompanhar a distribuição
populacional. Na região sudeste há concentração de 42,4% das organizações e
42,6% dos brasileiros.
A idade média das instituições pesquisadas na FASFIL é de 12,3
anos. O exame sobre o grupo das mais antigas, criadas antes de 1980, indica a
predominância das organizações ligadas à saúde (36%) e religião (20,2%). No grupo
das mais novas, com origem nos primeiros cinco anos deste milênio, destacam-se
as de defesa de direitos (30,1%) e as vinculadas ao meio ambiente e proteção
animal (45,1%).
Em relação ao ritmo de crescimento a FASFIL-2005 (IBGE, 2008,
p. 47) analisou o período entre 1996 e 2005 identificando a expressiva taxa de
215,1%, realçando quão fértil este momento histórico se caracterizou. A
pesquisa, entretanto, não evidencia dados por município que possibilita conhecer
esta dimensão em suas peculiaridades.
O segundo eixo de análise se baseia em outro estudo, também
organizado pelo IBGE, desta vez em parceria com o Ministério de Desenvolvimento
Social e Combate à Fome (MDS): As Entidades de Assistência Social Privadas Sem
42
Fins Lucrativos (PEAS/2006) (IBGE, 2007b). Tal investigação está estruturada por
unidade da federação, por região e faixa populacional, permitindo o exame mais
apurado em relação à FASFIL, no que tange a este tipo especifico de organização,
mas não revela dados segregados por municípios.
Em sua primeira edição a PEAS identifica, com base no CEMPRE e
na FASFIL, 33.076 organizações agrupadas no grupo 5 - assistência social2. Deste
universo, 16.089 foram qualificadas como entidades de assistência social
distribuídas pelo território nacional, sendo 51,8% na região sudeste, 22,6% região
sul, 14,8% nordeste, 7,4% centro oeste e 3,4% na região norte. Estão presentes
somente no Estado paulista, 29,6% e se aglutinados os Estados de São Paulo,
Minas Gerais e Paraná, tem-se 55,6%. A PEAS indica, quanto ao âmbito de atuação
das entidades, que 11.197 (69,9%) atuam na esfera do município. Revela, ainda,
que o conjunto destas entidades envolvem 509.152 pessoas sendo 277.301 (53,4%)
voluntárias e 241.851 não voluntárias.
A presente investigação ocorre na cidade de Franca. Dentre os
5.565 municípios brasileiros (IBGE, 2012, online) esta municipalidade figura no
seleto grupo constituído de 81 cidades com mais de 300.000 habitantes (INSTITUTO
TRATA BRASIL, 2012). Também pertence ao grupo de 118 maiores cidades da
região sudeste, ou das 233 de todo o país, se considerar a faixa populacional entre
100.001 a 500.000. (IBGE, 2010c, online).
Com população total de 318.239 (IBGE, 2010b, online,) habitantes,
possui o 108º Produto Interno Bruto (PIB) dentre os municípios brasileiros, na ordem
de 4.220.313 (IBGE, online) (em R$ 1.000,00), concentrando 98,2% (SEADE, online)
da população em áreas urbanas superando em alguns pontos percentuais a taxa de
urbanização do Estado de São Paulo que é de 95,9%. Ocupa 605, 7 km² de área e
apresenta o índice de densidade demográfica de 525,6 hab./km².
No ano de 2009 a cidade comemorou 185 anos de sua emancipação
política integrando o Grupo 3 do Indicador Paulista de Responsabilidade Social
2 A classificação adotada para este estudo bem como para a FASFIL, em suas duas versões, foi a Classification of the Purpose of Non-Profit Instituions Serving Households - Classificação dos objetivos das Instituições sem Fins Lucrativos ao Serviço das Famílias (COPNI), definida pela Divisão de Estatísticas das Nações Unidas.
43
(IPRS), que agrega os municípios com baixo nível de riqueza3 e bons indicadores de
longevidade e escolaridade.
A primeira ação empreendida pelo grupo de pesquisa GESTA, no
sentido de identificação do universo de ONGs, ocorreu em 2008 através da
abordagem a Cartório de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Registro Civil
de Pessoas Jurídicas de Franca, por considerar a obrigatoriedade na formalização
do estatuto para posterior registro na Junta Comercial do Município e obtenção do
CNPJ. A coordenadora do GESTA, Profa. Dra. Claudia Maria Daher Cosac, as
pesquisadoras Dra. Edna Maria Campanhol, Jucimeire Ligia Pereira, mestranda à
época, e Graziela Alves Corrêa, responsável pelo arquivo histórico do município de
Franca, realizaram contato junto à autarquia, não sendo possível o acesso aos
estatutos ali registrados e arquivados.
No mesmo ano, com auxilio de André Luis Centofante Alves,
também pesquisador do GESTA e mestrando à época, a coordenadora e
pesquisadores estiveram em audiência com o prefeito do município, Sr. Sidnei
Franco da Rocha expondo os objetivos estratégicos da pesquisa e solicitando
acesso às informações das ONGs da cidade de Franca. Desta reunião resultou oficio
(Anexo A) encaminhado ao Delegado da Receita Federal em Franca/SP (RFF), Sr.
José César Agostinho Costa. Assim, este estudo se baseia em informações locais
fornecidas pela RFF permitindo analise inédita e diferenciada a considerar o
conjunto dos estudos até aqui realizados.
A composição das ONGs do município tem a mesma diversidade
encontrada na FASFIL. São associações de diferentes naturezas de atividade que
reúnem grupos de funcionários de empresas, fornecedores das industriais de
calçados, cursos de idiomas, médicos e produtores rurais. Fazem parte também
deste grupo os centros comunitários, agremiações de esporte, centros de arte e
cultura, igrejas, condomínios, associações de pais e mestres, clubes de serviço,
fundações, organizações de atendimento a saúde, além das entidades de
assistência social e creches. Sobre estas, em particular, se faz necessário registrar
alguns comentários específicos.
3 Os componentes analisados na dimensão “riqueza municipal” são: consumo residencial de energia elétrica; consumo de energia elétrica na agricultura, no comércio e nos serviços; remuneração média dos empregados com carteira assinada e do setor público; e valor adicionado fiscal per capita.
44
O pesquisador do GESTA que desenvolveu estudo sobre este tipo
de organizações, o fez a partir do universo de 38 creches inscritas na Secretaria de
Educação da Prefeitura de Franca no ano de 2009, todas registradas como
associações sem fins lucrativos. Ao analisar tal informação surgem dois
questionamentos: (a) As creches têm sua natureza de atividade expressa em seu
nome? (b) As 38 creches figuram na lista da RFF, base da presente pesquisa? A
verificação demonstrou ausência de padrão no registro na medida em que apenas
cinco organizações apresentam a expressão “creche” em seu nome, evidenciando
que os nomes das organizações não se constituem em indicações únicas e objetivas
da ação por elas efetivadas. Explorando um pouco mais se examinou o CNAE
principal destas organizações resultando nas seguintes indicações com os
respectivos números de organizações encontradas: atividades de assistência social
prestadas em residências coletivas e não especificadas anteriormente (1); atividades
de associações de defesa de direitos sociais (2); e educação infantil-creche (2).
Como se pode observar, nome da instituição, natureza da atividade e CNAE
registrado não possuem correspondência explícita.
Para responder ao segundo questionamento, foi examinada a
presença ou não da razão social das creches, contidas na listagem fornecida ao
pesquisador do GESTA pela Secretaria da Educação do Município de Franca, na
lista da RFF, base da presente pesquisa. Para ilustrar a verificação gerou-se o
seguinte quadro:
45
Quadro 1 - Analise comparativa das listas das ONGs
Nº
Nome da Creche
Pertence à lista
Secretaria
da Educação
de Franca
Receita
Federal de
Franca
1 Acalanto CCI Profª Maria Luiza Ribeiro Vieira – Aeroporto III Sim Não
2 Ação Social Caminho da Luz Sim Sim
3 ADRA – Centro Adventista Desenvolvimento da Infância Sim Não
4 Associação Assistencial Presbiteriana Bom Samaritano Sim Não
5 Associação Fides et Caritas Santa Rita Sim Não
6 Associação Metodista de Assistência Social Sim Sim
7 Associação Santa Gianna Beretta Molla Sim Sim
8 Associação Solidária Futuro Feliz Sim Não
9 Casa Maternal de Miramontes Sim Sim
10 Casa Maternal São Francisco de Assis Sim Sim
11 CCI CL Benedicto do Amaral Sim Não
12 CCI dos Servidores Públicos Municipais Sim Sim
13 CCI Fonte de Luz Sim Sim
14 CCI Jardim Panorama Sim Não
15 CCI Pintando o Sete Sim Não
16 CCI Sagrada Família Sim Não
17 Centro Espírita Esperança e Fé - Creche Maria da Cruz Sim Sim
18 Creche Ângelo Verzola Sim Não
19 Creche Antonieta Covas do Couto Rosa Sim Não
20 Creche Bom Pastor Sim Sim
21 Creche Eurípedes Barsanulfo Sim Sim
22 Creche Frei José Luiz Egea Sainz - Jardim Rivieira Sim Não
23 Creche Jardim das Acácias Sim Sim
24 Creche Jesus Maria José Sim Não
46
Nº
Nome da Creche
Pertence à lista
Secretaria
da Educação
de Franca
Receita
Federal de
Franca
25 Creche Joana de Angelis Sim Não
26 Creche Nossa Senhora Aparecida Sim Sim
27 Creche Nossa Senhora das Graças Sim Não
28 Creche Rômulo Vieira Lopes Sim Não
29 Creche São José Sim Sim
30 Fundação Educandário Pestalozzi Sim Sim
31 Instituição Espírita Estrada de Damasco Sim Sim
32 Instituição Espírita Joana de Ângelis - CCI Jardim Leporace Sim Sim
33 Instituição Família Cav. Caetano Petráglia – INFACAPE Sim Não
34 Instituto Democrata - NEI Casal Tomás e Aparecida Novelino Sim Não
35 N.V. Sociedade Solidária - CCI Nossa Senhora Conceição. Sim Sim
36 NEI - Núcleo de Educação Infantil – CAIC Sim Não
37 Pastoral do Menor e Família Sim Sim
38 Sociedade Espírita Veneranda - CCI Espírita Veneranda Sim Sim
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir da pesquisa de Alves (2011, p. 103), pesquisador do GESTA.
Das 38 creches listadas pela Secretaria de Educação de Franca,
apenas 19 figuram à lista da RFF, denotando inconsistência nos registros públicos.
Somente pesquisa dedicada poderá elucidar tal incoerência, contudo, é possível
pontuar que não há um padrão na indicação do CNAE entre as creches citadas
reforçando a complexidade já comentada inerente a processos de investigação no
campo desta pesquisa, quando da busca de dados da gestão pública. Demonstra,
igualmente, que as outras organizações que atuam como creches, e não possuem
esta expressão em seu nome, têm diferentes razões sociais. Assim, qualquer
trabalho investigativo nesta área deve estabelecer diferentes critérios, e não
somente o título, para caracterizar a natureza de sua atividade.
Retomando o tema sobre a composição das ONGs da cidade de
Franca e considerando o universo de 377 organizações ativas oficialmente
47
registradas, observa-se a idade média de 14,3 anos, ou seja, dois anos mais velha
em relação à média nacional. A análise a partir do ano de abertura revela a seguinte
distribuição:
Tabela 1 - Distribuição das ONGs por ano de abertura
Década
1960
1970
1980
1990
2000
Total
Quantidade. 6 40 42 149 140 377(*)
% (s/total) 1,59 10,61 11,17 39,52 37,14 100,00
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir da lista da Receita Federal de Franca.
As ONGs do município datam da década de 1960 distribuindo-se ao
longo das seguintes. Foi, no entanto, nas décadas 1990 e 2000 que a expansão se
apresentou de forma mais intensa. Juntas representam 76,66% sobre o total das
ativas, confirmando os elementos do contexto vividos pelo país. Dentre as mais
antigas, nascidas nas décadas de 1960 e 1970, 65,22% declararam como atividade
principal “atividades de associações de defesa de direitos sociais” enquanto 15,22%
declararam “atividades de organizações religiosas”.
Quando examinada as atividades das ONGs nascidas a partir de
2000, observa-se que a atividade principal “associações de defesa de direitos”
representa a maioria com 56,43% ao lado da atividade “organizações religiosas” com
18,57%. Tais dados indicam predominância menos diversificada que a FASFIL
podendo delinear um perfil mais tradicional de atividades e demarcando traços
culturais específicos desta sociedade. Com o objetivo de identificar o ritmo de
crescimento das organizações de Franca e traçar um paralelo com a FASFIL,
analisou-se o total de ONGs existentes até o ano 1995 (134) e número daquelas
constituídas entre 1996 a 2005 (242). Observa-se, assim, a taxa de 180,6%,
evidenciando um crescimento menos acelerado em relação aos 215,1%
demonstrado pela FASFIL no mesmo período.
48
1.2 O processo da pesquisa
Após o recebimento da lista da RFF, a coordenadora do Grupo de
Pesquisa GESTA, em conjunto com os pesquisadores, iniciou a configuração dos
dados que revelaram o universo de 513 organizações oficialmente registradas,
sendo 69 baixadas, 66 inaptas, uma nula e 377 ativas.
Parceria firmada com o Centro Universitário de Franca (Uni-Facef),
através da pesquisadora Profa. Dra. Edna Maria Campanhol, integrante do grupo
GESTA, permitiu realizar sondagem, cujo foco se concentrou na confirmação do
efetivo funcionamento e localização física das entidades dentro do município. Da
lista das 377 ONGs ativas foram extraídas 10 fundações para que o pesquisador,
responsável por este conjunto de ONGs, pudesse efetivar a sondagem no momento
da primeira abordagem.
Esta ação investigativa consistiu em localizar os números de
telefones das 367 ONGs para, na sequência, confirmar seus dados. A fim de realizar
esta atividade foi elaborado formulário especifico (Apêndice D) que contemplou
dados gerais da entidade como: denominação, nome fantasia, endereço completo,
endereço eletrônico e página na internet. Adicionalmente foram confirmadas as
atividades que a entidade desenvolve, públicos atendidos, dados sobre a
presidência, telefones e nome do responsável pelas informações.
Para esta atividade foi identificada, junto a Uni-Facef, pessoa que
recebeu treinamento específico para realizar esta abordagem, incluindo simulações
de pesquisa e orientações sobre os registros a serem feitos, sejam de confirmações
dos dados constantes na lista da RFF, sejam de alterações ou inclusões.
A estratégia adotada para localizar os números dos telefones das
ONGs pertencentes à lista consistiu no exame dos guias telefônicos do município,
SABE e Guia SEI, visando identificação do endereço e número de telefone. A
pergunta que orientou o trabalho da auxiliar de pesquisa foi: a organização consta
das listas do município? Esta sondagem produziu o resultado abaixo.
49
Tabela 2 - Resultado da sondagem nas listas do município
Situação encontrada
Nº de ONGs
% sobre o total
Constam da lista 231 63
Não constam da lista 136 37
Total 367 100
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados da sondagem.
Do total de 367 organizações não foi possível confirmar a presença
nos guias telefônicos de 136 (37%), entretanto a auxiliar teve sucesso na
confirmação de 231 (63%). Este número passou a ser a base para o inicio da
abordagem às ONGs via telefone, tendo como objetivo confirmar, substituir ou
complementar os dados.
Durante os meses de maio, junho e julho de 2009, a auxiliar da Uni-
Facef abordou a totalidade das 231 Organizações. Em alguns casos foram
necessários de duas a três tentativas para a efetivação do contato e ao final desta
etapa deu-se inicio à análise dos dados registrados pela auxiliar na fase de
abordagem telefônica. No gráfico abaixo estão demonstrados os dois fatos
diferentes ocorridos nesta sondagem.
50
Gráfico 1 - Tipos de fatos ocorridos nas ligações telefônicas
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral com base nos formulários da sondagem.
A auxiliar obteve êxito na confirmação de dados de 145 entidades
que corresponde a 63% do total, dentre as que se encontram configuradas nas listas
do município. Com estas ONGs, foi possível confirmar total ou parcialmente os
dados já conhecidos, bem como complementar as informações.
No caso de 86 organizações, correspondente a 37%, a pesquisadora
não obteve êxito no contato por duas razões distintas: não houve atendimento à
chamada telefônica ou algo diferente aconteceu, conforme aponta o gráfico abaixo.
Gráfico 2 - Razões que impossibilitaram a efetivação do contato
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
51
A ligação telefônica não foi atendida por 39 Organizações, 45%
dentre as ONGs com as quais não se obteve êxito. Nas chamadas para 47
Organizações, (55%) ocorreram diferentes situações impeditivas à efetivação do
contato e, consequentemente, a confirmação dos dados. Para ilustrar melhor estas
situações, apresenta-se o seguinte gráfico:
Gráfico 3 - Situações registradas na categoria ‘algo aconteceu’.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral.
Em 17 Organizações (36%), a auxiliar ouviu mensagens como: sinal
interrompido temporariamente, telefone desligado a pedido do cliente ou não foi
possível completar a chamada. Estes eventos foram classificados usando a
expressão: desligado. Em seis ONGs (13%), o número chamado indicou condição
de telefone ocupado nas duas tentativas, enquanto que para 24 Organizações (51%)
dos casos as ligações foram direcionadas para o sinal de fax ou caixa postal. O total
destes três eventos corresponde a 47 entidades com as quais não se obteve êxito
na sondagem por telefone, conforme o Gráfico 2.
Retomando-se a analise sobre as 145 Organizações com os quais
se obteve êxito nos contatos telefônicos, a sondagem encontrou diferentes
resultados como se pode observar no gráfico a seguir.
52
Gráfico 4 – Ocorrências nas chamadas efetivadas.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Em 25 ONGs (17%), a pessoa que atendeu a pesquisadora ao
telefone não pode confirmar os dados contidos nos formulários e, em não havendo
outra pessoa no momento que pudesse fazê-lo, recebeu a classificação de ‘dados a
confirmar’. A classificação ‘Outras atividades’ resultou do contato com 23 (16%)
Organizações, sendo possível confirmar, ou completar dados, e concluir que são
organizações com finalidades comerciais. Em alguns casos os dados da lista
telefônica indicavam a existência de Organização Sem Fins Lucrativos, mas o
número de telefone foi confirmado como sendo residencial.
Em 11 casos (8%) a auxiliar efetivou o contato, mas o conjunto de
informações obtidas não foi suficiente para permitir clareza quanto à finalidade da
organização recebendo a classificação de ‘Análise de Dados indefinida’. A
sondagem por telefone também permitiu identificar que 10 Organizações (7%)
mudaram de endereço. Por último, a sondagem obteve êxito na confirmação de
dados de 76 ONGs (56%).
A partir deste momento o procedimento investigativo se baseou na
aplicação de critérios para a seleção da amostra, visando à identificação das ONGs
a serem abordadas na pesquisa de campo. O primeiro consistiu na configuração da
lista de classificação geral, que resultou da análise das anotações efetivadas pela
auxiliar no formulário de cada ONG, no ato da sondagem, e do confronto com o
nome e o CNAE constante na lista da RFF. O objetivo foi estruturar diferentes
atividades relatadas à na sondagem. As nomenclaturas para esta classificação
foram inspiradas em três documentos (Anexo B): (a) tipologia e classificação das
53
entidades sem fins lucrativos (pesquisa FASFIL 2005); (b) áreas de atividade das
ONGs associadas à Associação Brasileira de Organizações Não Governamentais
(ABONG 2010); e (c) distribuição das organizações cadastradas no Mapa do 3º
Setor, segundo área/subárea de atuação, conforme relatório de estatísticas
elaborado pelo Centro de Estudos do Terceiro Setor da Fundação Getúlio Vargas
(FGV) de São Paulo (2005). A aplicação destes critérios resultou em 17
classificações distintas demonstradas no quadro abaixo com as devidas notas
explicativas.
Quadro 2 – Classificação Geral (atividades das ONGs com dados confirmados)
Nº Classificação Notas explicativas
1 Assistência/Doação Atividades de amparo e doações não programáticas ou
sistematizadas.
2 Assistência Social Atividades de assistência e promoção social, realizadas
com base em planos de trabalho.
3 Associação de Pais e Mestres (APM) Associação civil de direito privado sem fins lucrativos,
criada para apoiar a gestão escolar na esfera pública
estatal4.
4 Associação de Moradores Associação civil de direito privado sem fins lucrativos
criada para centralizar discussões e decisões sobre
temas de interesse de uma comunidade especifica,
onde seu membros residam.
5 Associativas Atividades associativas de qualquer natureza, com
finalidades exclusivas de atendimento aos interesses, e
demandas, de seus associados e não inseridas em
outras classificações.
6 Atividades culturais Atividades vinculadas a qualquer expressão de arte e
cultura na inseridas em outras classificações.
7 Atividades esportivas Atividades relacionadas ao exercício dos esportes ou
cursos a eles relacionados como agremiações de
futebol ou escolas para este fim.
8 Atividades religiosas Atividades exclusivamente voltadas à disseminação e
manutenção de qualquer doutrina. Incluem igrejas,
centros de estudo e culto.
9 Clubes de serviço Atividades vinculadas às unidades do Rotary ou Lions
Clube.
4 (Secretaria de Estado da Educação do Estado de São Paulo, 2012, online).
54
Nº Classificação Notas explicativas
10 Creches Atividades relacionadas à educação infantil conforme
determina a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional (LDB) – Lei 9.394/96, nos artigos 29 a 31.
11 Crianças Atividades realizadas para e com crianças, que não
estão inseridas nas demais classificações.
12 Dependentes químicos Atividades de atenção, apoio e abrigamento às pessoas
com dependência química.
13 Escola/contraturno Atividades assemelhadas à escola formal que atuam no
apoio ou aceleração da aprendizagem escolar.
14 Especiais Atividades de atenção e apoio às pessoas com algum
tipo de necessidades diferenciadas.
15 Idosos Atividades vinculadas a atenção e apoio de qualquer
natureza à idosos incluindo moradia.
16 Voluntários Atividades de mobilização de voluntários
17 Outras Atividades não específicas anteriormente, como: escola
de samba, associação comunitária, partido político,
aeroclube, guarda noturna e rádio comunitária.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Observando a pluralidade contida na lista de classificações, pode-se
inferir que nem todas as ONGs que confirmaram seus dados, ainda que sejam
associações sem fins lucrativos, possam ser caracterizadas como organizações que
atuam em benefício da sociedade no seu sentido amplo. Lançou-se mão de novo
critério fundamentado nas definições de Szazi (2001, p. 28), sobre cunho associativo
e cunho social, para verificar a condição e demarcar fronteiras de atuação.
[...] o fato de criarmos uma associação não implica necessariamente a criação de uma entidade de cunho social, pois diversos propósitos podem não visar lucro, mas, mesmo assim, não servir de proveito de todos. Casos típicos são os clubes recreativos, de acesso restrito a sócios, eventualmente com critérios rígidos de admissão, e as associações que visam divulgar interesses particulares de seus associados, como os clubes de colecionadores de selos ou automóveis importados. Portanto, é oportuno distinguirmos o cunho associativo do cunho social ou, adotando o critério de separação, aquelas destinadas ao benefício mútuo daquelas dedicadas ao benefício público.
55
Considerando os limites desta definição, a ação investigativa
permitiu separar as ONGs de cunho associativo e voltadas para o conjunto de seus
associados, daquelas de cunho social que denotam atuação orientada para a
sociedade no sentido mais amplo. O resultado encontra-se ilustrado no gráfico
abaixo.
Gráfico 5 – Atividades das ONGs de cunho social e associativo
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Dentre as 76 ONGs com dados confirmados na sondagem, 43
organizações (57%) foram classificadas na categoria ‘cunho associativo’. Esta
categoria é composta pelas classificações: clubes de serviço, Associações de
Moradores, Associação de Pais e Mestres (APM), atividades esportivas, atividades
exclusivamente religiosas e outras. O gráfico a seguir apresenta a quantidade de
ONGs e seu percentual em relação ao total das ONGs desta categoria.
56
Gráfico 6 – Classificações das ONGs de cunho associativo
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Os números mais expressivos deste grupo ficam por conta das
Associações de Pais e Mestres (APM) e as associativas, ambas com 12
organizações representando 27,9% cada. Duas organizações foram classificadas
como clube de serviço, duas como associações de moradores, duas como
atividades vinculadas ao esporte, seis com atividades exclusivamente religiosas e
sete na subcategoria outras.
Das 76 ONGs, 33 delas (43%) foram alocadas na categoria ‘cunho
social’ cuja distribuição apresentou 10 classificações conforme a ilustração a seguir,
denotando diversidade de atuação.
Gráfico 7 – Cunho social (subcategorias)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
57
Estes critérios apoiam o entendimento sobre a pluralidade
encontrada dentre as 76 organizações que confirmaram seus dados, em especial
nas 33 ONGs classificadas na categoria ‘cunho social’. A mais representativa
aparece na classificação ‘Crianças’, na ordem de 30,3% do total, com 10
organizações. Estas confirmaram, no período da sondagem, que as atividades
compreendem algum tipo de assistência à criança ou realizam atividades com este
público em projetos. As creches ou atividades similares são verificadas em seis
organizações (18,2%). Atividades para idosos ou que realizam alguma ação de
apoio são encontradas em quatro ONGs (12,1%). Aquelas que confirmaram
atividades voltadas para dependentes químicos e as que realizam atividades de
apoio/assistência baseadas exclusivamente em doações estão presentes em 6,1%
da amostra. Com duas ONGs, cada, as classificações ‘assistência social’ e as
vinculadas a ‘pessoas especiais’ representam individualmente 9,1% do total.
Para a aplicação do terceiro critério de recorte, na tarefa de
identificação da amostra a ser pesquisada no campo, retomou-se a analise das
anotações efetuadas pela auxiliar de pesquisa nos formulários de sondagem,
fazendo a separação entre dois perfis distintos: (a) aquelas cujas ações estão mais
em linha com o atendimento direto, têm menor ênfase no momento presente e cujos
mecanismos de atuação sugerem a existência de programas e projetos (ações
estruturadas); e (b) daquelas que, ainda que atuem no atendimento, apresentam
maior ênfase no momento presente e seus mecanismos sugerem ausência de
programas ou projetos (ações não estruturadas). Assim, ação social específica e
ação social genérica, respectivamente, e considerando o grupo das 33 ONGs
contidas no Gráfico 7, a aplicação do terceiro critério resulta na seguinte
composição:
58
Tabela 3 - Perfil de atuação das ONGs de cunho social
Ação Social Específica
Ação Social Genérica
Subcategoria
Quantidade
de ONGs
Subcategoria Quantidade
de ONGs
Idosos 4 Voluntários 1
Pessoas especiais 2 Escola/contraturno 1
Dependentes químicos 3 Creches 6
Assistência social 3 Assistência/Doação 2
Crianças 10 Atividades culturais 1
Total 22 Total 11
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Cabe enfatizar que somente a pesquisa de campo permite
classificação mais assertiva. Neste momento, tomando como base os dados
registrados na sondagem, foi possível identificar as subcategorias que serão
abordadas. As ONGs classificadas como Idosos (4), Pessoas especiais (2),
Dependentes químicos (3), Assistência Social (3) e Crianças (10), totalizando 22
ONGs, compõem a amostra para ação investigativa no campo.
Em síntese, as 22 ONGs pesquisadas, são associações civis
pertencentes ao ordenamento jurídico das organizações privadas sem fins lucrativos,
formalmente registradas no município de Franca/SP, participantes e respondentes
da sondagem por telefone, classificadas como cunho social e promotoras da ação
social específica. Compõem esta lista, as seguintes organizações:
59
Quadro 3 – ONGs (amostra)
Nº Razão Social
1 AMAFEM- Associação Mão Amiga de Amparo Feminino.
2 Associação Assistencial e Educacional Casa Mãe.
3 Associação Assistencial e Educacional Filadélfia.
4 Associação Casa da Sopa Bom Jesus.
5 Associação De Desenvolvimento Humano e de Assistência Social.
6 Associação Nacional das Pessoas Altas.
7 Associação Pro-Re-A-Vi Projeto Restaura - Ação de Vidas.
8 Caminhar - Associação das Famílias, Pessoas e Portadores de Paralisia de Franca.
9 Clube da Terceira Idade, sempre jovem.
10 Conselho Central de Franca da Sociedade de São Vicente de Paulo.
11 Conselho Particular de Franca da Sociedade São Vicente de Paula.
12 Cosfam - Comunidade da Sagrada Família.
13 Diocese de Franca.
14 Grupo Educacional Veredas.
15 Grupo Espírita Dr. Denner Limonta.
16 Igreja Presbiteriana de Franca.
17 Instituição Espírita Nosso Lar.
18 Instituto Empresarial de Apoio a Formação da Criança e do Adolescente
19 Lar de Idosos Eurípedes Barsanulfo.
20 Missão Projeto Vida.
21 Obras Assistenciais Dr. Ismael Alonso y Alonso.
22 Projeto Amor.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
60
No que se refere aos sujeitos desta investigação, identificada a
amostra do universo, foram selecionados dois sujeitos de cada organização. Um
deles, especificamente, membro da diretoria voluntária por ordem hierárquica, os
presidentes, na ausência dele, subsequentemente, o vice-presidente, o secretário ou
tesoureiro. Outro sujeito imprescindível à compreensão do objeto de estudo é o
profissional que atua na coordenação das atividades realizadas pela organização e
nos casos em que não há este profissional o sujeito desta categoria reportou-se à
pessoa que exerce esta função, mesmo que seja voluntário como membro da
própria diretoria ou voluntário da sociedade civil.
1.3 Terceiro Setor: dimensões de análise
Para compreender o Terceiro Setor (TS) se faz mister refletir sobre
as características estruturais, a composição e atuação das organizações,
sobremodo, em consideração à emergência do tema a partir da década de 1980 no
cenário brasileiro. Por outro lado, o entendimento sobre tal espaço de atuação, no
que tange ao cenário internacional, é igualmente relevante, na medida em que o
Brasil está inserido no esforço global de mapeamento das Organizações Sem Fins
Lucrativos (OSFLs).
As Organizações Não Governamentais (ONGs) integram o Terceiro
Setor (TS), muito embora preservem identidade e características particulares cuja
referência, por vezes, confunde-se com a ideia de TS, campo que ainda merece
aprofundamento, em que pese figurar na linguagem cotidiana da sociedade.
A análise realizada neste capítulo, parte, por um lado, dos diferentes
significados atribuídos à expressão TS e, por outro, do exame das pesquisas
produzidas na área, visando compreensão abrangente e multidisciplinar.
As discussões presentes nesta tese espelham e aprofundam as
reflexões contidas no artigo intitulado “Terceiro Setor e Desenvolvimento
Sustentável”, publicado por este pesquisador e pela Professora Doutora Claudia
Maria Daher Cosac, na revista Serviço Social & Realidade (AMARAL; COSAC,
2009), vinculada ao Programa de Pós-Graduação em Serviço Social da Faculdade
Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita
Filho”, campus de Franca/SP.
61
A sociedade considera diferentes significados quando da
designação TS. O termo pode estar associado ao trabalho voluntário, à
benemerência e caridade ou ao ativismo na área do meio ambiente; o último
reconhecido por adotar condutas radicais para a preservação da natureza. TS
circunscreve, ainda, iniciativas de fortalecimento da cidadania, de ativismo
político e luta por direitos. De maneira geral, indica o conjunto de atividades
protagonizadas pela sociedade civil organizada, que envolvem o trabalho
voluntário e que recebem recursos — financeiros e materiais — da própria
sociedade, de empresas e de governos.
A expressão tem origem na designação Third Sector, traduzida do
idioma inglês e com uso frequente nos Estados Unidos da América. Outras
nomenclaturas também são utilizadas naquele país, tal qual apontado por
Fernandes (1997) organizações não lucrativas (non profit organizations), dando
ênfase a atividades que não auferem lucros, e organizações voluntárias (volunteer
organizations), cujo destaque é dado ao caráter voluntário com o qual as pessoas se
vinculam a elas.
São encontradas distintas designações em outros países, embora
carreguem os mesmos significados. No Canadá, por exemplo, predomina o uso
da expressão setor voluntário (voluntary sector) ou setor benevolente (benevolent
sector) para designar as atividades executadas por organizações que não
pertencem ao aparato do Estado, mas atuam em questões de interesse público.
Fernandes (1997, p. 26) destaca que “[...] da Europa continental vem
o predomínio da expressão ‘organizações não governamentais’ (ONGs) cuja origem
está na nomenclatura do sistema de representação das Nações Unidas.” Nesse tipo
de organização, apenas chefes de Estado ou seus representantes diretos ganham
assento (participação, voz e voto) nas assembleias. No momento em que
organizações não representantes de Estados nacionais, como a Organização
Internacional do Trabalho (OIT), por exemplo, passam a ter representatividade e
audiência na reunião, começa-se a designá-las ONGs.
Na América Latina, é frequente o uso da expressão “sociedade civil”
(SC) para abrigar desde movimentos de militância e ativismo político àquelas
entidades comprometidas com o desenvolvimento social. Hoje, a expressão
“Terceiro Setor” (tercer sector, em países de língua hispânica) designa aquelas
62
mesmas ações e, do ponto de vista da sua denominação, podem ser observadas
similaridades.
No caso brasileiro, a história das organizações pertencentes ao TS
remonta ao descobrimento. Coelho (2000) e Mestriner (2008), ao abordarem o papel
do associativismo, afirmam que as associações voluntárias estiveram sempre
presentes. Ligadas às organizações religiosas, e essas ao Estado português, tais
entidades marcam a história pelo caráter religioso e estatal de suas iniciativas. Para
efeito de ilustração, cita-se a Irmandade da Misericórdia, instalada em São Paulo, no
ano de 1560 e ocupada com a oferta de albergue, alimentação e cuidados de
enfermagem.
As Santas Casas se estabelecem como referência, reforçando o
papel da Igreja no campo da caridade e benemerência, permanecendo em atividade,
desta mesma forma, até 1889, ano da proclamação da República. Landim, no trecho
abaixo, destaca a presença da igreja:
[...] até os finais do século XIX, quase tudo que havia de consolidado em termos de assistência social, saúde e educação constituía-se organizações (formalmente sem fins econômicos, claro) criadas pela Igreja Católica – é bom lembrar, com o mandato do Estado, em uma situação de simbiose entre as duas instituições. (LANDIM, 2002, p. 23).
A partir deste momento histórico, ainda no atendimento da dimensão
médica e religiosa, as obras sociais passam a prestar serviços voltados,
especificamente, para crianças, idosos, mendigos, doentes e imigrantes.
Entre os anos 1930 e 1954, observa-se o nascimento de outras
instituições assistenciais, independentes das religiosas predominantes na época,
tais como: sindicatos, organizações de governo, associações de classe, clubes de
serviço, movimentos comunitários e as organizações reconhecidas pela
expressão “Sistema S”, financiadas pelo setor privado. Dentre as últimas, listam-
se as seguintes: Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), fundado
em 1942, Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), Serviço Social
da Indústria (SESI) e o Serviço Social do Comércio (SESC), estabelecidos em
1946. O surgimento de organizações com objetivos semelhantes segue até os
anos da ditadura militar, de 1964 a 1985, provocando o recrudescimento das
organizações da sociedade civil, em particular no campo da militância política.
63
Os anos 1980 foram importantes no que se refere à emergência das
ONGs. Ocorre, no período, a multiplicação das temáticas e áreas de atuação e, em
particular, a ação de natureza privada; fatos que favorecem a pluralidade do espaço
de atuação, cuja predominância histórica esteve vinculada à igreja. Abrem-se
parênteses para destacar a presença de dois pesquisadores brasileiros que
despontaram no entendimento dos episódios citados e no delineamento do TS local.
São eles: Leilah Landim, doutora em Antropologia Social, pesquisadora do Instituto
Superior de Estudos da Religião (ISER), atualmente professora titular da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), na Escola de Serviço Social; e
Rubem Cezar Fernandes, doutor em História do Pensamento Social e pesquisador
do ISER.
O emprego da designação TS passa a ser frequente na virada dos
anos 1980 para 1990. Nesse período, surge o projeto de pesquisa internacional
intitulado The Jonhs Hopkins Comparative Nonprofit Sector Project, sob a
coordenação de Lester Salamon, diretor do Johns Hopkins Institute for Policy
Studies, sediado em Baltimore, Estados Unidos da América. A pesquisa investiga 36
países, incluindo o Brasil, e envolve 150 pesquisadores em todo o planeta
(SALAMON, 2004).
No início da mesma década de 1990, num contexto que combina o
processo de redemocratização e, ao mesmo tempo, a insuficiência do Estado com a
relação à inclusão social, criam-se condições ideais para a expansão de atividades
das ONGs. A difusão de tais entidades é potencializada, sobremaneira, pela ação de
movimentos sociais e organizações de causas ambientais. Eventos comprometidos
com a discussão do tema colaboram, em grande medida, para o alargamento do
campo de ação das ONGs. Destaca-se o Fórum Internacional de ONGs e
Movimentos Sociais, ocorrido no ano de 1992, em paralelo a Conferência das
Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento (ECO 92), na cidade do
Rio de Janeiro.
Surgem importantes organizações no cenário nacional que
contribuem para a agenda de trabalho das ONGs, caso da Associação Brasileira das
Organizações Não-Governamentais (ABONG), “[...] fundada em 1991 com o objetivo
de representar e promover o intercâmbio entre ONGs empenhadas no fortalecimento
da cidadania, na expansão dos direitos fundamentais e na consolidação da
democracia.” (HADDAD, 2002, p. 5).
64
No âmbito do setor privado, despontam duas organizações
representativas. A primeira delas inicia reuniões, informalmente, no ano de 1989
e, formalmente, em 1995. Trata-se do Grupo de Institutos Fundações e Empresas
(GIFE), cuja missão consiste em aperfeiçoar e difundir os conceitos e práticas do
uso de recursos privados para o desenvolvimento do bem comum (FALCONER;
VILELA, 2001, p. 5). O GIFE trabalha com a estruturação e profissionalização de
seus associados e não associados e com o enfrentamento das diferentes
expressões da questão social, a partir do contexto do setor privado.
A segunda entidade foi fundada em 1998, por iniciativa de alguns
empresários do Estado de São Paulo, recebendo o nome de Instituto Ethos de
Empresas e Responsabilidade Social. Trata-se de organização sem fins lucrativos
(OSFL), de natureza associativa, que congrega empresas de diferentes portes e
setores; além de algumas fundações e outras OSFLs. Sua missão tem por objetivo
“[...] mobilizar, sensibilizar e ajudar as empresas a gerir seus negócios de forma
socialmente responsável, tornando-as parceiras na construção de uma sociedade
sustentável e justa.” (INSTITUTO ETHOS, online).
Atentos à ampliação dos espaços de diálogo, representantes da
academia passam a organizar uma série de eventos e conferências acerca do
TS. São criados, na cidade de São Paulo, três centros de estudos na área. Tais
núcleos, formados a partir de escolas de administração, desempenharam tarefa
de sistematização, capacitação e disseminação de instrumentos de gestão
específicos. O primeiro deles, fundado em 1994, e sediado na Escola de
Administração de Empresas da Fundação Getúlio Vargas/SP (EAE-FGV/SP),
designado Centro de Estudos do Terceiro Setor (CETS). No ano de 1998,
nasceram os demais, sendo o Núcleo de Estudos em Administração do Terceiro
Setor (NEATS), posteriormente Núcleo de Estudos Avançados do Terceiro Setor
(NEATS) vinculado à Pontifícia Universidade Católica (PUC) de São Paulo e o
Centro de Estudos em Administração do Terceiro Setor, mudando para Centro de
Empreendedorismo Social e Administração do Terceiro Setor (CEATS) com base
na Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo
(FEA/USP).
Com a expansão dos debates em torno das ONGs, e a entrada de
novos atores nas cenas local e internacional, iniciativas de articulação e geração de
espaços de compartilhamento eclodiram, também, na primeira metade da década de
65
1990. No ano de 1992, ocorreu o primeiro Encontro Ibero-americano do Terceiro
Setor, na cidade de Cárceres, Espanha. A reunião, cuja agenda bianual preserva o
intercâmbio e a troca de experiências, cumpriu papel disseminador e, ao mesmo
tempo, aglutinador de especialistas, dirigentes e financiadores. Assim, após a 1ª
edição, ocorreram outras como no México (1994 e 2006), no Brasil (1996 e 2004),
com os auspícios do GIFE, Argentina (1998 e 2010), Colômbia (2000), Espanha
(2002) e Equador (2008) (ENCONTROS..., online).
A mudança nos títulos dos referidos eventos é um aspecto que
merece destaque. O primeiro, em 1992, denominou-se “Encontro de Fundações
Iberoamericanas”. O segundo, em 1994, “Encontro Iberoamericano de Filantropia”. A
partir do terceiro, ocorrido no Brasil e sob a gestão do GIFE, até o oitavo evento, em
2006, novamente na cidade do México, as reuniões foram intituladas “Encontros
Iberoamericanos do Terceiro Setor”.
A inserção da expressão TS no título do evento, transcorrido no
Brasil, configura outro aspecto relevante. Marca, historicamente, o papel do GIFE
enquanto organização disseminadora e promotora do conceito; sendo, inclusive,
reconhecida pela sociedade e pelos críticos. Ao reunir pesquisadores, formadores de
opinião, especialistas, empresários, representantes de governo, além de diversos
profissionais da área, o GIFE desenhou o estado da arte e estabeleceu os
parâmetros iniciais, com amplitude local e global, para áreas como marco legal,
financiamento, papel dos governos, empresas, universidade, profissionalização,
gestão, entre outros temas.
De 2008 em diante, o eventos passaram a chamar “Encontros
Iberoamericanos da Sociedade Civil”, retomando, em certa medida, a titulação das
primeiras reuniões. A denominação, entretanto, denota a incorporação das vivências
viabilizadas pela agenda dos encontros que se sucederam. O subtítulo da reunião
de 2008 “Desenvolvimento Local, Empresa e Cidadania”; demonstrou perspectiva
ampliada, e integrada, de entendimento por parte da sociedade. A inclusão da
sociedade incorporou-se à agenda central das discussões iniciais sobre TS e
potencializou a capacidade de integração; contrapondo-se a fragmentação apontada
por alguns críticos.
A literatura sobre TS indica que o esforço para definição do termo e
delineamento do campo, de alguma forma, é sempre requisitado. Mesmo assim,
66
novos olhares sobre tal matéria se fazem necessários para auxiliar análises que
guardam sintonia com seu tempo.
Descrever a identidade do TS implica examinar suas diferentes
dimensões. E a formalidade é a primeira a ser observada. Entende-se como
organização formal aquela que figura nos registros públicos e que atende aos
quesitos legais para seu funcionamento. O exame de tal dimensão é essencial e visa
apontar a perspectiva estruturante subjacente ao uso da expressão TS.
Uma das críticas endereçadas às pesquisas no Terceiro Setor, em
particular a realizada pela John Hopkins, reside no fato de não contemplarem um
amplo conjunto de organizações e movimentos não são institucionalizados sendo,
por isso, imprecisas. Examinar aspectos estruturais e formais só é possível a
partir de parâmetros de comparabilidade e padrões mínimos de existência
jurídica. Estas condições permitem que investigações sejam mais assertivas na
identificação das diferenças organizacionais. Condição esta que não seria
possível atingir a partir de organizações não formais, não aderentes ao marco
regulatório vigente, em que pese seu papel representativo no processo histórico
do país. Gohn (2000, p. 49) em análise sobre as diferenças e semelhanças entre
ONGs e movimentos destaca,
As organizações são institucionalizadas, os movimentos não. Elas podem ser sistemas de relações internas informais pouco burocratizadas, mas precisam ser, no mínimo, eficientes. Elas têm de se preocupar com a perenidade para sobreviver, e ter um cotidiano contínuo. Os movimentos não; eles têm fluxo e refluxos, não são exatamente estruturas funcionais. São aglomerados polivalentes, multiformes, descontínuos, pouco adensados, não necessitam compromisso com eficácia operacional, a não ser algum tipo de resultado para suas bases. Eles não têm de fazer balancetes, prestar contas ou pagar funcionários. As ONGs têm tudo isso no seu cotidiano: seus orçamentos ocupam maior parte do tempo dos dirigentes. Em síntese, a lógica que preside as ONGs tem de se basear na ação racional. Os movimentos são um misto não racional/racional e até de irracional em certos momentos.
Alguns elementos são centrais na tentativa realizada por Gohn para
traçar os limites entre os formatos “ONGs” e “movimentos”: perenidade versus
descontinuidade, contínuo versus descontínuo e eficácia operacional versus
resultados para as bases. Tais elementos respondem ao anseio do pesquisador,
focado na identificação da realidade. Mas, para um olhar multidisciplinar, é desejoso
67
que determinada realidade possa ser observada a partir do seu contexto e na
integração de diferentes áreas do conhecimento.
Do ponto de vista da gestão de ONGs, perenidade e
descontinuidade são decisões estruturadas com base nos atores envolvidos, assim
como ocorre nos movimentos. No que diz respeito ao contínuo e descontinuo,
igualmente, o conjunto de decisões e ações pode, perfeitamente, se desdobrar em
uma ou outra condição. No campo da eficácia operacional e resultados para as
bases talvez resida o mais relevante dos aspectos.
Da perspectiva da organização institucionalizada, a chamada
eficácia operacional está a serviço da agenda institucional. Tal agenda resulta da
interação entre seus atores internos e os anseios da sociedade (SILVA, 2000); e
não, apenas, dos interesses manifestados pelos atores que a fundaram. Gerar
exclusivamente alguns resultados para as bases, como aponta Gohn (2000) ao se
referir aos movimentos, demarca fronteiras de escolhas. São escolhas as mais
substantivas, realizadas por seus atores. O que indica, em linhas gerais, que a não
institucionalização é determinada pela decisão de seus envolvidos e não por
aspectos estruturais (uma vez que poderiam ser institucionalizados se assim
desejassem seus atores). No que diz respeito à transparência (FALCONER; VILELA,
2001; COSTA, 2005; LANDIM, 2006/2007; ABONG, 2012; ANGÉLICO, 2011),
requisito da contemporaneidade no contexto das organizações da sociedade civil,
cabe considerar a centralidade da formalidade. Assim, as organizações, para serem
alcançadas pelas políticas de governo, organizações de pesquisa, organismos de
fomento — públicos e privados —, bem como pela sociedade, necessitam de
institucionalização.
Para que esta condição formal ocorra, a organização deve
viabilizar sua existência civil e jurídica. No caso de uma associação, basta que
pessoas maiores de 21 anos, com propósitos comuns e não lucrativos, preparem
a minuta de um estatuto5 e se reúnam em assembleia, formalizando as intenções
e aprovando o estatuto da organização. O trâmite inclui, entre outras, a
explicitação dos objetivos e a nomeação de presidente, membros da diretoria e
conselho fiscal. Esta reunião deve ser planejada, comunicada com antecedência
e, ao seu término, seu conteúdo explicitado em ata para posterior registro em
5 Exigibilidades para estatuto social ver Szazi (2001, p. 29-30).
68
Cartório. No caso de uma fundação, o instituidor deve manifestar, publicamente,
sua vontade e seus objetivos. Pode, ainda, lançar mão de uma escritura e mesmo
de testamento, dado que para a abertura da fundação é necessária a existência
de patrimônio. Neste caso, a formulação e aprovação do estatuto social se dão
por ordem do Ministério Público. Estas duas condições, ata aprovada por
assembleia na associação e manifestação pública na fundação, com estatuto
aprovado pelo Ministério Público, possibilitam a existência civil da organização.
Vale enfatizar que a existência destas organizações, no caso da associação e do
instituidor das fundações, é determinada pela livre escolha de seus envolvidos.
A existência jurídica se dá a partir dos registros, de igual modo para
os casos acima, no Cartório de Registros de Pessoas Jurídicas do município sede
da organização. Na sequência, realiza-se a inscrição no Cadastro Nacional da
Pessoa Jurídica (CNPJ), na prefeitura e nos órgãos relacionados à atividade da
instituição (seja saúde, educação ou assistência social).
Em síntese, caso as associações não atendam as condições
estruturais formais não são consideradas organizações institucionalizadas e não
estão contempladas na composição do TS.
Outra dimensão a ser considerada é a pluralidade de organizações,
materializada pelos diferentes atores sociais e agendas institucionais, sejam igrejas,
hospitais, escolas, clubes de serviço, associações de bairro, associações de classe,
sindicatos e, mais recentemente, aquelas que têm origem no setor privado, como
institutos e fundações. Pluralidade também manifestada nas diversas naturezas
presentes sejam elas movimentos sociais, instituições assistenciais, organizações de
luta por direitos, ativismo ambiental, apoio e prestação de serviços sociais, como
também, financiadoras de projetos sociais.
A área de atuação configura outro indicador da pluralidade
observável no TS. Para ilustrar este dado, recorre-se a três documentos distintos,
publicados por diferentes organizações. O primeiro, elaborado pela ABONG
(GOUVEIA; DANILIAUSKAS, 2010), refere-se ao censo realizado entre seus
associados, cuja amostra foi de 189 ONGs. O segundo, elaborado pelo Centro de
Estudos do Terceiro Setor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo, sistematiza
e informa as áreas de atuação das 4.589 organizações que compõem a base de
dados, ao que se chamou “Mapa do 3º Setor” (CETS, 2005). O terceiro, criado
69
pelo GIFE (2012), censo realizado entre seus associados e cujos dados
correspondem a 102 organizações.
Quadro 4 - Multiplicidade de áreas de atuação
ABONG
CETS
GIFE
1. Educação 2. Organização
popular/Participação popular
3. Relações de gênero 4. Justiça e promoção de
direitos 5. Meio ambiente 6. Saúde 7. Fortalecimento de outras
ONGs/Movimentos populares
8. Trabalho e renda 9. Agricultura 10. Economia solidária 11. Arte e cultura 12. Questões agrárias 13. Orçamento público 14. DST/Aids 15. Segurança alimentar 16. Questões urbanas 17. Assistência social 18. Segurança pública 19. Discriminação sexual 20. Relações de consumo 21. Discriminação racial 22. Comunicação 23. Esporte 24. Comércio
1. Educação e Pesquisa 2. Assistência e Promoção
Social 3. Desenvolvimento
comunitário social econômico/moradia
4. Cultura e recreação 5. Saúde 6. Religião 7. Meio ambiente 8. Associação de
profissionais, de classe e sindicatos.
9. Intermediárias filantrópicas e de promoção de ações voluntárias
10. Serviços legais, defesa de direitos civis e organizações políticas.
11. Atividades internacionais
1. Apoio à Gestão do 3ºSetor 2. Assistência Social 3. Comunicação 4. Cultura e Artes 5. Defesa de direitos 6. Desenvolvimento
comunitário / de base 7. Educação 8. Formação de jovens para o
trabalho e/ou para cidadania
9. Geração de trabalho e renda
10. Meio ambiente 11. Saúde
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir de Gouveia e Daniliauskas (2010, p. 38); CETS (2005, p. 9); GIFE (2012, online).
Nota: Para a ABONG, as áreas de atuação foram designadas como “principais lutas políticas”.
No documento da ABONG, que computa dados de ONGs a ela
associadas e que tem no ativismo e militância a origem das organizações, 24 áreas
distintas foram registradas. Já no Mapa do 3º Setor, que organiza informações de
diferentes organizações da sociedade civil (OSCs) e cuja inclusão na base de dados
depende do cadastramento voluntário, observam-se 11 áreas de atuação
especificadas.
Por último, no GIFE, organização composta por empresas,
fundações e institutos de origem empresarial, também 11 indicações distintas foram
70
sistematizadas. Independente da natureza distinta de cada estudo destaca-se a
multiplicidade de espaços de atuação nos quais ONGs efetivam ações de interesse
público não estatal. Salamon (1997, p. 90) observa este aspecto quando volta sua
atenção para o TS:
Estou falando, é claro, da vasta coleção de Instituições e relações existentes entre o mercado e o Estado, para as quais também temos diversos nomes: Terceiro Setor, setor sem fins lucrativos, setor da sociedade civil, setor voluntário, setor social-econômico, setor ONG, setor de caridade etc.
Ao empregar a expressão “vasta coleção”, a fim de referenciar as
organizações, o autor sublinha as dificuldades implicadas na definição da identidade
do TS. Por outro lado, ao nominar variações existentes, faz uso corrente da
expressão “setor”, indicando a opção metodológica de analisá-las a partir de visão
de conjunto.
A expressão TS é emprestada da economia e responde,
adequadamente, à necessidade de compreender a importância: (a) de um conjunto
amplo de iniciativas como assistência social, saúde, meio ambiente, habitação,
geração de emprego e renda, preservação de direitos da infância, do idoso, contra a
violência das mulheres, entre outras; (b) de diferentes características como
associações de bairro, de serviço, centros comunitários, movimentos sociais,
fundações e associações; (c) de diferentes origens tais como religiosas, da
sociedade civil e empresarial. Estas três categorias (a,b e c) representam, juntas,
atividades, postos de trabalho remunerado, trabalho voluntário e recursos financeiros
envolvidos.
Ao assumir a tarefa de revelar a composição e características do TS,
o pesquisador conclui não haver unanimidade quanto ao uso da denominação,
tampouco quanto à capacidade para designar um tipo específico e único de
organização. A diversidade, manifestada na sua composição, nas distintas origens,
identidades e ações realizadas, constitui sua particularidade básica. Sendo assim,
para realizar a leitura das organizações deste setor, licito supor a não existência de
um único instrumento e perspectiva, suficientemente eficaz para dar cabo da tarefa.
Torna-se, portanto, fundamental considerar diferentes perspectivas de análise.
A terceira dimensão a ser examinada, destacada por Cabral (2004),
diz respeito à esfera jurídica. As Organizações do Terceiro Setor (OTS), por não
71
pertencerem ao aparato do Estado, estão sob o patrocínio do direito privado. São,
portanto, privadas, sem fins lucrativos e não distribuem lucros, diferenciando-se das
organizações mercantis. Cabe ressaltar que no ordenamento jurídico brasileiro, mais
especificamente, na Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002, que atualiza o Código
Civil (CC), as pessoas jurídicas de direito privado são associações, sociedades,
fundações, organizações religiosas, partidos políticos e as empresas individuais de
responsabilidade limitada. Dentre as organizações listadas, as sociedades e
empresas individuais de responsabilidade limitada são organizações de atividade
econômica, enquanto as demais são consideradas organizações sem fins de lucro.
As organizações religiosas e os partidos políticos foram mencionados e
incluídos no CC pela Lei n. 10.825 de 22 de dezembro de 2003. Até aquele momento,
tais organizações não figuravam na lista de pessoas jurídicas, sendo reconhecidas
como associações. As empresas individuais de responsabilidade limitada foram
incluídas pela Lei n. 12.441 de 2011 que altera o CC.
O estudo desenvolvido salientou as múltiplas nomenclaturas
utilizadas para identificar as organizações pertencentes ao TS: movimentos sociais,
clubes de serviço, associações de bairro, fundações, entre outras. No que tange à
dimensão jurídica, importa evidenciar que as OSFLs — exceto as registradas como
fundações, organizações religiosas e partidos políticos — são associações definidas
nos termos de Szazi (2001, p. 27): “Uma associação pode ser definida como uma
pessoa jurídica criada a partir da união de ideias e esforços de pessoas em torno de
um propósito que não tenha finalidade lucrativa.” Em outras palavras, associação de
bairro, clubes de serviço, movimentos sociais e entidades de assistência, desde que
formalizados, são associações regidas pelo Código Civil brasileiro.
As fundações também são regidas pelo CC com determinações
específicas, sendo definidas por Szazi (2001, p. 37) como “[...] um patrimônio
destinado a servir, sem intuito de lucro, a uma causa de interesse público
determinada, que adquire personificação jurídica por iniciativa de seu instituidor.” Um
rápido parêntese para esclarecer os dois elementos que diferenciam as fundações
das associações. O primeiro elemento diz respeito à fundação como um patrimônio.
Isso significa que, para a abertura deste tipo de organização, é necessário haver
patrimônio (bens), disponível para sua constituição, assim como determina o Código
Civil, capítulo III, das fundações, no artigo 62: “Para criar uma fundação, o seu
instituidor fará, por escritura pública ou testamento, dotação especial de bens livres,
72
especificando o fim a que se destina, e declarando, se quiser, a maneira de
administrá-la.”(BRASIL, 2002, online).
Para a abertura de uma associação, as pessoas responsáveis não
precisarão comprovar a efetivação de dotação especial de bens livres, sendo
suficientes os registros oficias públicos. O segundo elemento evidencia que a
fundação pode ser instituída por vontade de apenas um individuo (instituidor), o que
difere das associações, nas quais somente mais de uma pessoa pode viabilizar sua
constituição.
A legislação sobre fundações define, ainda, instância de controle
específico, conforme o Código Civil, artigo 66, nos termos “Velará pelas fundações o
Ministério Público do Estado onde situadas.” (BRASIL, 2002, online). Esta atividade
ocorre por meio das Curadorias de Fundações, presentes em cada Estado da
Federação, incluindo o Distrito Federal. Tais entes governamentais acompanham,
através de regime de prestação de contas e auditorias, o funcionamento, a condição
financeira e as ações realizadas. Isto significa ter o Estado auditando e
acompanhando as entidades que estão sob a égide do direito privado.
Na tarefa de delineamento da dimensão jurídica, como elemento que
contribui para a configuração do TS e estabelecidas as fronteiras entre as
associações e fundações, ambas sem fins lucrativos (OSFL), importa tecer algumas
reflexões sobre títulos e certificados que figuram no âmbito do marco legal, fornecido
às instituições mediante o cumprimento de exigências na forma da lei.
Primeiro, sobre a declaração de utilidade pública. Conforme capitula
Szazi (2001, p. 89): “[...] as associações e fundações constituídas no país que
sirvam desinteressadamente à coletividade poderão ser declaradas de utilidade
pública [...].” Tal mecanismo, quando adotado pela organização, permite: (1)
dedução fiscal, com vistas ao benefício de pessoas jurídicas que doaram recursos
para a entidade e (2) acesso a recursos na esfera federal, além da possibilidade de
realizar sorteios. A questão do financiamento sempre foi um dos maiores desafios do
cotidiano das OTS e a obtenção dessa declaração pode ser traduzida como
resposta positiva ao seu enfrentamento.
Por outro lado, a exigência comprobatória daqueles “serviços à
coletividade de maneira desinteressada”, registra visada, excessivamente,
burocrática: a comprovação da composição da diretoria e suas atividades devem ser
apresentadas por meio de relatórios. Sublinha-se, contudo, que a instância de
73
monitoramento das OTS possuidoras desta declaração pertence ao Ministério da
Justiça, e que a organização aceita o conjunto de regras de prestação de contas,
bem como o monitoramento. A declaração de utilidade pública, fornecida nas esferas
municipal, estadual e federal, é, também, passível de cassação, conforme a lei. E
assim acontecerá quando a instituição deixar de enviar relatórios, não cumprir os
objetivos contidos em seu estatuto ou der algum tipo de retribuição financeira a
dirigentes (membros da diretoria e conselho) ou qualquer tipo de vantagem a seus
financiadores e associados.
Outro documento fornecido pelo poder público às organizações é o
certificado de entidade de fins filantrópicos ou certificado de filantropia. O documento
declara a condição da entidade como realizadora de atividades beneficentes e de
assistência social, possibilitando a isenção da cota patronal, relativa à contribuição
previdenciária e que incide sobre a folha de pagamento da entidade.
Na atualidade, esta certificação é conhecida como Certificado de
Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS). Tal documento — até a
entrada da Lei 12.101 de 27 de novembro de 2009, que dispõe sobre a certificação
das entidades beneficentes de assistência social — exigia registro no Conselho
Nacional de Assistência Social e tinha sua expedição, independente da área de
atuação, pelo mesmo órgão. Com a vigência da referida lei, a emissão do certificado
é realizada pelo ministério, considerando a área de atuação da organização. Assim,
se for de assistência social, caberá ao Ministério de Desenvolvimento Social e
Combate à Fome (MDS), se da educação, ao Ministério de Educação (MEC) e
quando for da área da saúde, com o Ministério da Saúde (MS).
Estes títulos e certificados cumpriram vários papéis ao longo dos
tempos. Do ponto de vista das organizações, a obtenção de declaração pública da
natureza de sua atividade e correição na prestação de contas, amplia as
possibilidades de entrada de recursos públicos e privados, na medida em que
pessoas físicas e empresas passam a requerer tal documentação. Do ponto de vista
do gestor público, garante acesso à informação, possibilitando o monitoramento e
controle no uso dos recursos públicos. Por outro lado, o desestímulo provocado pelo
emaranhado de leis e regras, acrescido do impacto negativo causado pelas
frequentes notícias sobre desvios no uso de recursos públicos, em nada contribuem
para o fortalecimento do setor como um todo. Mais à frente será dedicado espaço
interessado em ampliar esta discussão.
74
No final dos anos 1990, diante da maior consciência da sociedade
sobre a gestão de organizações pertencentes ao TS e, ao mesmo tempo, da
exigência dos profissionais do setor em relação às melhorias no marco regulatório
específico, o país assistiu ao surgimento de novo momento. A chegada da Lei 9.790
de 23/3/1999, que trata da qualificação como organização da sociedade civil de
interesse público (OSCIP6), regulamentada pelo Decreto n. 3.100 de 30/6/1999,
trouxe novos olhares para as Organizações Sem Fins Lucrativos (OSFL), em
particular, para as associações, uma vez que aspectos específicos para as
fundações já eram conhecidos.
Primeiro, buscou-se alterar o fator negativo sutilmente contido nas
expressões ONGs ou OSFLs. Apresentar-se pela negação (não governamental ou
sem fins lucrativos) sempre causou desconforto para parte dos envolvidos com tais
entidades (FERNANDES, 1994). Daí a procura por uma forma mais afirmativa de
identificação. Assim, a denominação OSCIP contribuiu para o desenlace, eliminando
o sentido de negação e marcando, positivamente, a origem (sociedade civil) e sua
finalidade (interesse público).
Em segundo lugar, estabeleceu o Termo de Parceria (TP),
destacado por Szazi (2001, p. 97): “A principal vantagem da nova qualificação é a
possibilidade de firmar termos de parceria com o Estado para a execução de
atividades de interesse público em regime de cooperação.” Esta condição veio
facilitar, especialmente, atividades cuja execução ultrapassa o exercício fiscal e que,
estando sob o concurso de convênios, poderiam sofrer solução de continuidade,
face ao regime de desembolso anual por parte do ente governamental.
Em terceiro, a exigência sobre a gestão, no que concerne à
prestação de contas da OSCIP, aproxima-se do formato requerido para as
fundações: a preceituação de práticas contábeis melhor definidas, regime anual
de prestação de contas, realização de auditorias externas especialmente nos
casos em que foram firmados TP com o Estado. Em quarto lugar, na esfera do
patrimônio da organização e na hipótese de sua dissolução, a inclusão de
previsão em estatuto da sua transferência para outra organização que tenha o
mesmo objeto social. Em quinto, no que tange à possibilidade de instituir
6 Dados do Ministério da Justiça indicam que 6.166 organizações foram qualificadas como OSCIPs em todo o país, até a presente data. No caso específico do município de Franca, figuram 13 OSCIP. (MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2012a, online).
75
remuneração para dirigentes que executem a gestão executiva. Estes cinco
elementos reafirmam o espírito do legislador na busca por maior confiabilidade
em relação à existência das OSFLs.
Em síntese, na tarefa de desvelar a composição e identidade do TS,
até aqui, destacou-se a natureza voluntária da constituição de uma OSFL,
manifestada pela livre escolha dos envolvidos. Debateu-se, ainda, sobre a condição
institucionalizada das organizações e os diferentes aspectos que constituem a
dimensão jurídica: organizações privadas, sem fins lucrativos, associações, com ou
sem a qualificação de organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP) e
fundações.
Continuando o estudo sobre a composição e identidade do TS,
propõe-se a quarta dimensão de análise, focalizando o olhar para além da condição
formal, plural e jurídica. Cabral (2004, p. 3) vincula o TS à escolha de indivíduos
interessados em ações colaborativas.
A designação TS aplica-se ao conjunto de iniciativas e organizações privadas, baseadas no trabalho associativo e voluntário, cuja orientação é determinada por valores expressos em uma missão e com atuação voltada ao atendimento das necessidades humanas, filantropia, direitos e garantias sociais.
Ao destacar o trabalho associativo e voluntário, a autora reforça a
condição colaborativa subjacente à atuação coletiva de membros da sociedade em
questões de interesse público. Reforça, igualmente, o aspecto voluntário (escolha
livre) desta ação associativa, demarcando um TS composto por organizações
formadas pela vontade de pessoas e não por determinação de lei. Suas palavras
expressam, também, que a atuação das organizações aponta para um leque amplo
de atividades o que inclui atendimento às necessidades humanas, filantropia,
direitos e garantias sociais. O entendimento destas questões, a compreensão sobre
as ações a serem efetivadas e os resultados a serem atingidos, abrem espaço para
debates e reflexões além de receber diferentes influências também manifestadas por
Cabral (2004, p. 4):
As OTS [Organizações do Terceiro Setor] atuam na prestação de serviços e na abordagem de problemas sociais, de natureza pública, que dizem respeito a interesses sociais e concepções de desenvolvimento. Por outro lado, enquanto iniciativa privada representam interesses dos grupos instituidores que projetam sua ação através da proposição de uma missão.
76
A ação privada, na esfera pública não estatal, representa um avanço
importante para a sociedade brasileira. Considere-se o visível incremento na
participação da sociedade quando do tema ambiental, por exemplo, seja no recente
debate a respeito do Código Florestal brasileiro, seja no enfrentamento do problema
relacionado à mobilidade urbana, em particular, nas grandes cidades. A atuação de
organizações do TS nas duas questões citadas dá, em parte, o tom deste concerto
contemporâneo.
Por outro lado, quando se trata do conjunto de interesses que
lastreiam o financiamento destas ações, muitas das iniciativas contidas no TS têm
mostrado, de fato, que merecem avaliação profunda. Sendo um setor que congrega
ações financiadas, tanto pelo poder público estatal, como pelo mercado e sociedade,
importa considerar o seguinte: a predominância deste ou daquele financiador imporá
um agir orientado, fortemente, pelos interesses daqueles que contribuem com
recursos econômicos. Esforço para a configuração adequada da missão
organizacional deve ser realizado pelos dirigentes, equipes de profissionais e
voluntários, a fim de construir bases sólidas de autonomia e independência
institucional.
A questão do financiamento que mobiliza o olhar para os recursos
que fluem às OTS, auxiliando na tarefa da caracterização e composição constitui
outra dimensão a ser examinada. Fernandes (1994, p. 20), ao analisar a origem e
aplicação dos recursos financeiros, define o TS como uma concepção “[...] entre
as quatro combinações resultantes da conjunção entre o ‘público’ e o
‘privado’[...].”
Assim sendo, o recurso financeiro destinado à organização, oriundo
de agentes privados e cuja finalidade é, igualmente privada, pertence ao setor
mercado. Quando o recurso tem origem nos agentes públicos, e a finalidade do seu
emprego é pública, a organização pertence ao setor público. Entretanto, quando
recursos forem provenientes de agentes privados, e a finalidade de sua utilização for
pública, a organização pertencerá ao TS.
Este modelo de compreensão, amplamente disseminado na
sociedade, carrega algumas limitações que reclamam um e outro aparte. A
expressão “mercado” figura na área da economia e representa o espaço onde
agentes econômicos operam trocas de bens e serviços. O termo, pelo seu uso
corrente e genérico, indica “empresas” e a dimensão do cidadão não parece estar
77
exatamente contemplada. Assim, no lugar de atribuir a expressão “mercado” a um
dos setores, propõe-se designar apenas privado, a fim de caracterizar os recursos
de empresas e de indivíduos.
Outro aspecto relevante, com a expansão da participação privada
(indivíduos e empresas) no financiamento de ações de interesse público, bem
como a presença importante de recursos públicos nos orçamentos das OTS,
tornar-se impreciso configurar o TS como resultante, apenas, da aplicação de
recursos provenientes de agentes privados. Na verdade, o TS é financiado pelos
outros dois setores (privado e público), marcando um ambiente de atuação e
enfrentamento conjunto dos problemas sociais. Para ilustrar, destacam-se dados
obtidos pelo censo das organizações associadas da ABONG, conforme a tabela a
seguir.
Tabela 4 - Fontes de financiamento das ONGs associadas à ABONG7
até
20%
21% a
40%
41% a
60%
61% a
80%
81% a
100%
Cooperação e solidariedade internacional. 20,60 20,60 18,50 21,70 18,50
Empresas, institutos e fundações
empresariais.
57,40 21,30 12,80 4,30 4,30
Agências multilaterais e bilaterais 83,40 16,60 0,00 0,00 0,00
Contribuições associativas 94,10 5,90 0,00 0,00 0,00
Recursos públicos federais 80,0 5,70 8,60 2,90 9,80
Recursos públicos estaduais 80,0 5,70 8,60 2,90 2,90
Recursos públicos municipais 71,40 14,30 11,40 0,00 2,80
Doações de indivíduos 90,90 0,0 2,30 2,30 4,50
Comercialização de produtos e serviços 79,20 14,60 2,10 4,20 0,00
Fonte: Gouveia e Daniliauskas (2010, p. 41).
Os dados confirmam a variedade dos tipos das fontes de recursos
que financiam as atividades das ONGs em questão. A tabela, igualmente,
evidencia fontes de origem privada como empresas, institutos e fundações
empresariais; e também doação de indivíduos, independente das fontes de
origem pública nas esferas municipal, estadual e federal. Fazem parte da tabela
7 No original a tabela é nº 9.
78
outras fontes como cooperação internacional e agências multi e bilaterais que
não permitem classificação precisa dentro da dualidade público/privada.
Por último, identifica-se a presença relevante do privado (indivíduos
e organizações de origem empresarial, como empresas, institutos e fundações
empresariais) em todas as faixas de orçamento estudadas pelo censo. E, se
considerado, por exemplo, a faixa de orçamento entre 21 e 40%, notar-se-á que o
volume de recursos — oriundos de empresas, institutos e fundações — supera todas
as demais fontes. Tais dados configuram a realidade do contexto e ajudam a
compreender o TS como lugar onde a pluralidade é traço marcante de sua
constituição.
Até aqui, foram examinadas as dimensões da formalidade,
pluralidade, esfera jurídica, associativismo voluntário e financiamento como aspectos
diferenciadores entre as organizações que compõem o TS e aquelas que não estão
a ele vinculadas.
Como derradeira dimensão a observar, figura a finalidade das
organizações. Gohn (2000), em seu trabalho de análise a respeito da atuação de
movimentos sociais e ONGs, detecta mudança de perfil das organizações nos anos
1990 e estabelece tipologia que auxilia sua classificação. Primeiramente, aponta as
ONGs caritativas que correspondem àquelas que atuam no campo da assistência,
no contexto urbano e em várias áreas como, menor, idosos e gênero — indicando o
campo da educação infantil como aquele onde ocorreu maior expansão no que
tange ao número de organizações. Na sequência, tipifica como desenvolvimentistas
as que nasceram no centro das discussões ocupadas com o desenvolvimento
sustentável, durante a realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio
Ambiente e o Desenvolvimento (CNUMAD), conhecida por ECO-92 e realizada na
cidade do Rio de Janeiro. Cabe sublinhar que foi a primeira reunião a admitir a
expressão “desenvolvimento” em seu título, introduzindo questões para além do
tema ambiental, tais como saúde, pobreza e consumo. Gohn (2000) tipifica, ainda,
como ONGs cidadãs as que se voltam para luta por direitos, bem como para o
fortalecimento de redes de colaboração com atuação no espaço urbano. Por último,
classifica como ambientalistas as organizações de maior destaque na área da
ecologia.
A classificação proposta por Gohn (2000) recebeu críticas de
Coelho (2000) em, pelo menos, dois níveis. O primeiro no campo de sua eficácia
79
e no que se refere à impossibilidade de um tratamento único, materializado pelo
uso da expressão ONG, sugerindo definição que coloca como iguais
organizações distintas. Enfatiza Coelho (2000, p. 63): “Entendemos que esta
tipologia não resolve o problema básico da delimitação desse universo de
organizações, ao tentar homogeneizar através do termo ‘ONG’ coisas de
natureza distinta e ao criar uma falsa unidade.” Este posicionamento abre espaço
para reflexão acerca do propósito da classificação proposta por Gohn. Coelho
justifica seu argumento sugerindo que a expressão ‘ONG’ reúne práticas diversas
debaixo de uma mesma designação. Tal posição chama atenção por sua
interpretação particular e realizada a partir do esforço de Gohn em explicitar, de
forma didática, as diferentes naturezas. Coelho deixa de observar, o conjunto de
argumentações de Gohn que, por sua vez, parte da leitura sobre diferenças para
chegar a tipificações aglutinadoras sem, entretanto, desconsiderar a sua
essência. Coelho, ao realizar a crítica, alinha-se com pesquisadores de distintas
áreas do conhecimento (LANDIN 2002; FERNANDES 1994; MONTAÑO, 2008;
TEIXEIRA 2003) que se ocupam da tarefa de desvelar o TS, mas que marcam,
por vezes em demasia, aquilo que separa, colocando como acessórios menores
os aspectos que integram. Tal posicionamento desfavorece a compreensão mais
equilibrada da realidade estudada, no caso do TS, evidenciando os conflitos, as
diferenças e contribuindo para a construção de um ambiente menos participativo
e colaborativo, ingredientes requeridos nas sociedades contemporâneas.
Em que pesem as limitações existentes em qualquer esforço de
delimitação do TS, o mérito atribuído à análise de Gohn é sua capacidade para
esclarecer que as distintas naturezas de atividades das organizações contribuem
para o estabelecimento de aproximações dentro da unidade TS, o que revela, por
fim, a pluralidade como identidade. Se considerada esta perspectiva, a crítica de
Coelho, a respeito de criar uma falsa unidade, parece perder efeito na medida em
que a intencionalidade, no entendimento da realidade, sugere interpretá-la e não
engessar seu sentido.
A segunda crítica é pontual e evidencia a dificuldade no uso da
classificação proposta. Para Coelho (2000) não ficam claras as fronteiras entre
ONGs ambientalistas e, como a própria Gohn denomina, as desenvolvimentistas.
Igual modo, identifica a ausência das fundações empresariais que atuam,
80
exclusivamente, para os funcionários da empresa mantenedora, assumindo a função
de área de Recursos Humanos.
A fronteira entre as ONGs ambientalistas e desenvolvimentistas é
uma questão de fato. Sobremodo, se observadas às agendas institucionais de
organizações criadas num contexto que combina maior preocupação ambiental
com o entendimento sobre o campo do desenvolvimento como prioridade.
Observando o mapeamento das principais ONGs ambientais, realizado pela
Editora Análise, sob o título Análise Gestão Ambiental – Anuário 2010/2011
(PERFIL..., 2011, p. 199), que traça o perfil de 330 organizações, constata-se a
existência de áreas de atuação como saúde alimentar, transporte urbano,
habitação, povos indígenas, dentre aquelas de predominância ambiental, quais
sejam florestas, água, poluição, lixo, energia, clima, oceanos e outras. A
combinação entre propostas de atuação, no campo do desenvolvimento e no
campo ambiental, demonstra a dificuldade em distinguir, com precisão, as
finalidades destas organizações.
Com relação à ausência, na tipologia de Gohn (2000), das
fundações empresariais que se voltam para as políticas internas da empresa
mantenedora, vale tecer breves comentários. As organizações citadas possuem a
mesma designação jurídica que as demais ONGs, como já foi esclarecido no
capítulo em curso, identificadas como organizações sem fins lucrativos (OSFL).
Assim, a abordagem feita por Coelho (2000) traz à tona o fato de que, embora seja
OSFL e se coloque no universo do TS, a organização tem atuação dirigida para uma
população assistida pelas políticas privadas, no caso específico, para os
funcionários da empresa.
Autores como Szazi (2001), Coelho (2000) traçam linha divisória
sobre o campo de atuação das OSFL. Consideram que não se pode generalizar
ou julgar todos os casos como se fossem os mesmos: nem toda OSFL está
orientada para o interesse público em seu sentido mais amplo. Szazi, como já
destacado anteriormente, aponta a distinção entre cunho social e associativo.
Coelho faz distinção entre organizações orientadas para interesses coletivos e
aquelas que são orientadas, efetivamente, para o interesse do público. As
primeiras estão voltadas para grupos específicos da sociedade, como os
sindicatos, organizações associativas profissionais, igrejas, clubes, agremiações;
as segundas distinguem-se da primeira por atuarem em prol do interesse amplo e
81
geral da sociedade. Portanto, o uso da expressão TS implica na consideração de
tais diferenças. É fundamental destacar que a sociedade busca instrumentos,
sejam certificados ou leis, como as que regulam as OSCIPs, para poder isolar as
organizações que atuam com vistas ao interesse público daquelas dedicadas ao
privilégio de grupos específicos.
Percorrida a trilha de caracterização das organizações do TS,
através das dimensões formalidade, pluralidade, esfera jurídica, associativismo,
financiamento e finalidades — e em face da perspectiva de figurarem, lado a
lado, organizações de trajetória histórica tão distintas — fortalece-se o elemento
complexidade como seu traço marcante. Atenuam-se, por outro lado, as leituras
que apontam o TS como algo inadequado. Os autores de destas leituras,
reforçadas pelo uso da expressão “setor”, julgam que o TS tem papel semelhante
ao da associação ou sindicato. Estas organizações sustentam um ideário único e
buscam, de modo rígido, integrar somente associados, cuja identidade seja
compatível com os pressupostos indicados pela entidade, não admitindo ideais
diferentes. O TS sugere, ao contrário, disposição para o plural, para o múltiplo e
diverso.
Diante de tal posicionamento, a compreensão sobre o TS está mais
próxima da afirmação de Fischer (2002, p. 45): “Terceiro Setor é a denominação
adotada para o espaço composto por organizações privadas, sem fins lucrativos,
cuja atuação é dirigida a finalidades coletivas ou públicas.” Ao considerá-lo um
espaço, e não um tipo específico de organização ou de estrutura torna-se possível
observá-lo com mais tolerância á convivência entre diferentes atores sociais e a
partir das possibilidades existentes.
A preocupação de mostrar o TS em números enfrenta o mesmo
desafio que aquele da sua configuração tendo a complexidade como traço que
marca os esforços em compreendê-lo, principalmente, sob a perspectiva
quantitativa, seja no plano internacional ou nacional.
1.3.1 Internacional
Na esfera internacional, a pesquisa The Johns Hopkins Comparative
Nonprofit Sector Project inicia-se em 1991, reunindo, aproximadamente, 150
pesquisadores de países de todo o mundo, incluindo o Brasil. O projeto ocorre no
82
âmbito da Johns Hopkins Center for Civil Society Studies, no Jonhs Hopkins Institute
for Policy Studies, vinculado a Johns Hopkins University em Baltimore/EUA. Sob a
coordenação do professor Lester Salamon, a iniciativa é identificada como “[...] o
grande projeto que temos em curso em todo o mundo para trazer o setor da
sociedade civil para um melhor enfoque empírico e conceitual.”8 (SALAMON;
SOKOLOWSKI, 2004, p. xxi, tradução nossa).
O The Johns Hopkins Comparative Nonprofit Sector Project é
desenvolvido em mais de 40 países, mas os resultados publicados incluem apenas
36 deles, distribuídos por todos os continentes habitados. A tabela a seguir indica os
países, separados em categorias, a saber: países desenvolvidos, em
desenvolvimento e em transição.
Quadro 5 - Países cobertos pelo projeto de pesquisa The Johns Hopkins
Comparative Nonprofit Sector Project
Países desenvolvidos
Países em desenvolvimento
Alemanha Israel Argentina Marrocos
Áustria Irlanda África do Sul México
Austrália Itália Brasil Paquistão
Bélgica Holanda Colômbia Peru
Espanha Japão Egito Quênia
Estados Unidos Noruega Filipinas Tanzânia
Finlândia Suécia Índia Uganda
França Reino Unido Korea do Sul
Países em transição
Eslováquia República tcheca
Hungria Romênia
Polônia
Fonte: Salamon e Sokolowski (2004, p. 6). Nota: O quadro foi adaptado e suas informações traduzidas por Roberto Galassi Amaral, do original
em inglês, cuja tabela recebe o numero 1.1.
8 The major project we have had under way around the world to bring the civil society sector into better empirical and conceptual focus.
83
Do total de países informados, 16 estão listados na categoria
“desenvolvidos”, 15 na categoria “em desenvolvimento” e cinco “em transição”. O
Brasil figura como “em desenvolvimento” e teve com Landim (1993), representante
brasileiro, documento de trabalho, no contexto daquele projeto, que trouxe o primeiro
delineamento do TS no país.
Para a realização do estudo, foi utilizado o Manual da ONU de
classificação das OSFLs9 que menciona as cinco características a partir das
quais as organizações podem ser identificadas. São elas: (a) organizadas, que
mostram algum grau de institucionalização; (b) privadas, fora do aparato do
Estado; (c) não auferem ou distribuem lucros entre seus diretores, gestores e
associados; (d) autogovernadas, com mecanismos internos de governança; (e)
voluntárias, são criadas de forma voluntária, com filiação e participação não
impostas por lei.
Johns Hopkins (2010) informa que o manual recomenda aos países
a utilização da Classificação Internacional estipulada para as OSFLs, do inglês,
Classification of Non-Profit Organizations (ICNPO). A estrutura de classificação de
atividades das OSFLs contempla 12 grupos distintos, conforme indicado na tabela a
seguir:
Tabela 5 - Classificação internacional para as OSFLs.
Código
Campo
Código
Campo
1 Cultura e recreação 7 Advocacia, direito e política.
2 Educação e pesquisa 8 Intermediários filantrópicos e
promoção do voluntariado
3 Saúde 9 Internacional
4. Serviços sociais 10 Religião
5. Meio ambiente 11 Associações empresariais e
profissionais
6 Desenvolvimento e habitação 12 Não classificados em outra parte
Fonte: Elaborada por Roberto Galassi Amaral a partir de Johns Hopkins (2010, p. 12, tradução nossa).10
Nota: A tabela foi adaptada e suas informações traduzidas pelo autor do original em inglês, cuja
tabela recebe o numero 1.2.
9 Do original em inglês: United Nation Nonprofit Institutions (UNNPI) Handbook.
10 Do original no idioma inglês: 1. Culture and recreation 2. Education and research 3. Health 4. Social services 5. Environment 6. Development and housing 7. Law, advocacy and politics 8. Philanthropic intermediaries and voluntarism promotion 9. International 10. Religion 11. Business and professional associations,unions 12. Not elsewhere classified).
84
A estrutura acima sintetiza o conjunto das possibilidades de
atuação das organizações consideradas integrantes do TS. Tal ordenamento,
chamado de “conta satélite”11, e cujo modelo os países são estimulados a seguir,
integra o Manual da ONU e o sistema de classificação de contas nele incluído. Na
medida da elaboração da conta satélite, país a país, as especificidades nacionais
recebem tratamento dirigido, de forma a construir uniformidade necessária para
viabilização de comparações entre países. No caso brasileiro, ano de 2010, a
Johns Hopkins Center for Civil Society Studies, em cooperação com o IBGE e
United Nations Volunteers (UNV), desenvolveu estudo intitulado Nonprofit
Organizations in Brazil: A Pilot Satellite Account with International Comparisons, a
fim de realizar comparações internacionais, a partir da conta satélite citada e sua
aplicação no Brasil.
Retomando a pesquisa, na esfera internacional e considerando os
36 países, Salamon e Sokolowski (2004) sublinham questões conhecidas como
“grandes descobertas transnacionais”. A primeira delas aponta para a força
econômica do setor, segundo o que segue:
Em primeiro lugar, além de sua importância social e política, a sociedade civil passa a ser uma força econômica considerável nos países que examinamos, representando uma participação significativa dos gastos nacionais e emprego.
12 (SALAMON; SOKOLOWSKI, 2004, p. 15, tradução
nossa).
Em termos de gastos, a pesquisa indica o total de 1,3 trilhões de
dólares, representando 5,4% do Produto Interno Bruto (PIB) combinado. Foram,
ainda, mobilizados trabalhadores remunerados e voluntários na ordem 45,5 milhões
ou 4,4% da população economicamente ativa. Isso significa que se o setor fosse um
país, seria a sétima economia do mundo, conforme tabela abaixo:
11
A conta satélite pertence ao sistema de contas nacionais e é elaborada para analisar com mais profundidade determinadas áreas possibilitando comparações com o conjunto da economia. (IBGE, 2012d, online).
12 Do original, em inglês: In the first place, in addition to its social and political importance, the civil society sector turns out to be a considerable economic force in the countries we have examined, accounting for a significant share of national expenditures and employment.
85
Tabela 6 - Importância econômica do TS mundial
País
PIB (Trilhões de US$)
Estados Unidos 7.2
Japão 5.1
China 2.8
Alemanha 2,2
Reino Unido 1.4
França 1.3
Gastos com setor da sociedade civil (36 países) 1.3
Itália 1.1
Brasil 0.7
Rússia 0.7
Espanha 0.6
Canadá 0.5
Fonte: SALAMON e SOKOLOWSKI (2004, p. 16). Nota: A tabela foi adaptada e os nomes dos países escritos no idioma português pelo autor, do
original em inglês, cuja tabela recebe o numero 1.4.
O TS, identificado por Salamon e Sokolowski como setor da
sociedade civil (Civil Society Sector) e considerando a somatória dos dados de 36
países, ficaria atrás de Estados Unidos, Japão, China, Alemanha, Reino Unido e
França; ficando à frente do Brasil, Rússia, Espanha e Canadá, indicando
considerável importância a respeito do fluxo de recursos que pelo setor transita.
A segunda questão trata da significativa participação voluntária. As
estimativas apresentadas pelos autores da pesquisa giram em torno de 132 milhões
de voluntários, ou cerca de 10% da população adulta.
O terceiro apontamento realizado pelos pesquisadores compreende
sentido mais ampliado e revela grandes variações entre as organizações dos países
participantes da pesquisa. Tais variações estão no campo da força de trabalho
remunerado, força de voluntários engajados, serviços que realizam e intervenções
executadas nas mais diferentes áreas, demonstrando que este espaço não é,
apenas, um local de trabalho. O que faz com que o setor seja relevante é, de fato,
aquilo que realiza.
Por último, os autores do estudo indicam que o TS não substitui o
Estado e demonstra, a partir da fonte de receita das organizações, a dimensão da
86
participação da sociedade como um todo. Segundo dados apresentados, no âmbito
da referida investigação, 34% da receita provêm do Estado, 12% da filantropia e
53% de taxas; além de ampla gama de receitas comerciais. Cabe destacar que a
expressão “filantropia” se refere a doações e investimentos de pessoas físicas e
jurídicas. Quanto às taxas de comercialização, vale lembrar que, no caso brasileiro e
com o surgimento da lei das OSCIPs, a possibilidade das OTS comercializarem bens
e serviços dá nova espessura ao financiamento das atividades.
Os dados até aqui analisados, no âmbito internacional, contribuem
para a compreensão a respeito do TS em todos os continentes do planeta. Indica,
em larga medida, os parâmetros de comparabilidade entre diferentes países, bem
como orientam os esforços investidos para dimensionar e compreender o setor em
solo brasileiro.
1.3.2 Nacional: Dados oficiais
A FASFIL, já apresentada de forma introdutória neste documento,
representa o empenho articulado entre o Estado e entidades representativas do TS.
Seu trabalho dá a conhecer as organizações em suas especificidades, realizando
investigação que utiliza os mesmos critérios da pesquisa internacional e segue as
orientações contidas no Manual do ONU sobre recomendações para o Sistema
Nacional de Classificação de Contas. Por se tratar de estudo abrangente, cobrindo a
totalidade do território brasileiro e os diferentes aspectos que envolvem as FASFIL,
esta fundamentação destacará os aspectos que apoiarão as reflexões e análises
demandadas pelos objetivos já expostos.
A pesquisa é realizada a partir do exame do CEMPRE (Cadastro
Central de Empresas), grande diretório de dados das atividades econômicas no país.
O cadastro reúne informações organizadas em níveis de classificação que, por sua
vez, constituem o CNAE (IBGE, 2007a) e leva em consideração o código de
natureza jurídica, versão 2003. Esta estrutura de códigos possui quatro dígitos
divididos em cinco categorias. O primeiro dígito define a natureza que corresponde
a: (1) administração pública; (2) entidades empresariais; (3) entidades sem fins
lucrativos; (4) pessoas físicas; (5) outras instituições extraterritoriais. A categoria (3)
é base do estudo da FASFIL e está desmembrada conforme tabela a seguir.
87
TABELA 7 - Código das entidades sem fins lucrativos (ESFLs)
Código
Descrição
303-4 Serviço Notarial e Registral (Cartório)
304-2 Organização Social
305-0 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscip)
306-9 Outras Formas de Fundações Mantidas com Recursos Privados
307-7 Serviço Social Autônomo
308-5 Condomínio Edifício
309-3 Unidade Executora (Programa Dinheiro Direto na Escola)
310-7 Comissão de Conciliação Prévia
311-5 Entidade de Mediação e Arbitragem
312-3 Partido Político
313-0 Entidade Sindical
320-4 Estabelecimento, no Brasil, de Fundação ou Associação Estrangeira
321-2 Fundação ou Associação Domiciliada no Exterior
Código
Descrição
322-0 Organização Religiosa
323-9 Comunidade Indígena
399-9 Outras Formas de Associação
Fonte: IBGE (2008, paginação irregular).
Os 16 códigos ilustram a multiplicidade de organizações registradas
como OSFL no Brasil. Os códigos, ainda, foram confrontados13, no âmbito da
FASFIL com os critérios constantes do Manual da ONU definindo as instituições
integrantes ao TS como: organizadas, privadas; não distribuidoras de lucros,
autogovernadas e voluntárias. Algumas organizações, embora sejam OSFLs, não se
enquadraram, simultaneamente, em todos os critérios; o que determinou, por sua
vez, os códigos que serviriam de base para FASFIL.
13
Os resultados deste enquadramento podem ser conhecidos no Quadro 1 IBGE (2008, p. 14).
88
Tabela 8 - Códigos das OSFLs enquadradas na FASFIL.
OSFL não enquadradas
OSFL enquadradas
Código Descrição Código Descrição
303-4 Serviço Notarial e Registral (Cartório);
304-2 Organização Social;
307-7: Serviço Social Autônomo; 305-0 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP;
308-5; Condomínio em Edifícios; 306-9 Outras Fundações Mantidas com Recursos Privados;
309-3: Unidade Executora (Programa Dinheiro Direto na Escola);
320-4: Filial, no Brasil, de Fundação ou Associação Estrangeira;
310-7 Comissão de Conciliação Prévia; 322-0 Organização Religiosa;
311-5 Entidade de Mediação e Arbitragem;
323-9: Comunidade Indígena;
312-3 Partido Político; 399-9 Outras Formas de Associação.
313-1 Entidade Sindical;
321-2 Fundação ou Associação
Domiciliada no Exterior.
Fonte: Elaborada por Roberto Galassi Amaral partir dos dados de IBGE (2008).
Como resultado da aplicação dos critérios, sete do total de 16
códigos das OFSLs atenderam, concomitantemente, a todos eles; configurando os
códigos norteadores da referida pesquisa. São eles: 304-2 (Organização Social),
305-0 (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público – OSCIP), 306-9
(Outras Fundações Mantidas com Recursos Privados), 320-4 (Filial, no Brasil, de
Fundação ou Associação Estrangeira), 322-0 (Organização Religiosa), 323-9
(Comunidade Indígena) e 399-9 (Outras Formas de Associação). As organizações
registradas nos bancos de dados oficiais, classificadas nestes códigos, formam,
portanto, a base da FASFIL. A pesquisa reforça, com este procedimento, que a
delimitação do TS — designado por Fischer (2002) como espaço e por Fernandes
(1994) como resultante da aplicação de recursos privados para fins públicos — deve
ser analisada de forma multidisciplinar.
Àquele enquadramento, a FASFIL aplicou a Classificação dos
Objetivos das Instituições sem Fins Lucrativos a Serviço das Famílias (COPNI),
gerando a COPNI ampliada e que considerou um universo maior de OSFLs em
relação à COPNI original. O dimensionando implicou na utilização do CNAE e na
análise da principal atividade econômica declarada no ato da efetivação dos
89
registros oficiais. A tabela a seguir mostra o resultado da FASFIL nos termos da sua
classificação e quantidade no Brasil.
Tabela 9 - Número de Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos (FASFIL), segundo classificação das entidades sem fins lucrativos – Brasil- 2005.
Classificação das entidades sem fins
lucrativos
Número de Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos
Total 338 162
Habitação 456
Habitação 456
Saúde 4 464
Hospitais 2 068
Outros serviços de saúde 2 396
Cultura e recreação 46 999
Cultura e arte 14 796
Esportes e recreação 32 203
Educação e pesquisa 19 940
Educação infantil 3 154
Ensino fundamental 7 910
Ensino médio 1 448
Educação superior 2 152
Estudos e pesquisas 2 441
Educação profissional 447
Outras formas de educação / ensino 2 388
Assistência social 39 395
Assistência social 39 935
Religião 83 775
Religião 83 775
Associações patronais e profissionais 58 796
Associações empresariais e patronais 4 321
Associações profissionais 19 645
Associações de produtores rurais 34 830
Meio ambiente e proteção animal 2 562
Meio ambiente e proteção animais 2 562
Desenvolvimento e defesa de direitos 60 259
Associação de moradores 19 196
Desenvolvimento rural 1 752
90
Classificação das entidades sem fins
lucrativos
Número de Fundações Privadas e Associações sem Fins Lucrativos
Emprego e treinamento 722
Defesa de direitos de grupos e minorias 6 276
Outras formas de desenvolvimento e defesa dos direitos
2 727
Outras instituições privadas sem fins lucrativos
21 516
Outras instituições privadas sem fins lucrativos não especificadas anteriormente
Fonte: IBGE (2008, paginação irregular). Nota: a tabela foi adaptada por Roberto Galassi Amaral. No original recebe o número de Tabela 3.
A tabela demonstra a presença de 338.162 OSFLs no Brasil. Esta
referência, que será atualizada em dezembro de 2012, é utilizada por todos os
estudos realizados a partir da data de publicação da pesquisa FASFIL (IBGE, 2008,
paginação irregular), ocupados com a compreensão do TS no Brasil. Sua
potencialidade de análise permite considerá-la como instrumento atual e abrangente,
conforme observação de por Lais de Figueiredo Lopes, Assessora do Ministro da
Secretaria Geral da Presidência da República14.
Em referência ao total das FASFIL, comenta a pesquisa: “Uma
análise geral das atividades desenvolvidas por essas instituições revela que sua
vocação não é assumir funções típicas de Estado e sim defender direitos e
interesses dos cidadãos e difundir preceitos religiosos” (IBGE, 2008, paginação
irregular). Esta avaliação está alinhada ao diagnóstico de Salamon e Sokolowski
(2004) significando que o TS e as OSFLs que o compõem, constituem-se agentes
autônomos de transformação da realidade, em que pesem os posicionamentos
críticos de outros autores (Landim; Tenório, Montaño, Coelho; Gohn), muito
concentrados, sobretudo, na identificação das origens e diferenças históricas.
Igualmente presente no discurso de vários formadores de opinião,
membros da academia e profissionais da mídia encontra-se o argumento de que o
TS existe para atuar na lacuna deixada pelo Estado. O raciocínio resulta da lógica
do Estado mínimo, deixando de considerar a participação cidadã que o processo de
redemocratização instalou.
14
Informação fornecida durante palestra proferida no Seminário sobre o Marco Regulatório das Organizações da Sociedade Civil: desafios e propostas, organizado pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC/SP), unidade Nove de Julho, em 10/05/2012.
91
O total das FASFIL está distribuído na tabela 9, segundo a
classificação de entidades sem fins lucrativos. Considerado o volume de entidades
em cada classificação, do maior para o menor, observa-se que a categoria “Religião”
reúne o maior número de organizações equivalente a 83.775.
Em segundo lugar, “Desenvolvimento e defesa de direitos” com
60.259, sendo que 29.586 delas figuram na categoria “Centros e associações
comunitárias”, com maior volume de entidades. A distribuição reforça o argumento
acima. Na medida em que o processo de democrático evolui, a consciência e
necessidade de luta por direitos ampliam, forçando o aparelho do Estado a se
organizar para atender a nova realidade.
O crescimento das religiões na contemporaneidade e suas
manifestações em solo brasileiro não pertencem ao escopo deste estudo. Julga-se
que esta matéria pertença ao campo da sociologia, antropologia e estudos da
religião. Entretanto, do ponto de vista das reflexões aqui contidas, é licito supor que
as organizações caminham na mesma trilha que a sociedade brasileira e que, seu
crescente aumento responde, em grande medida, aos anseios de expansão,
legitimação e atuação próprios de ambientes democratizados. Adicionalmente, não
se pode esquecer a presença das organizações religiosas em outras áreas, tal qual
demonstrado pela pesquisa:
Vale destacar que a influência da religião não se restringe a esse grupo de instituições, posto que milhares de entidades assistencial, educacional e de saúde, para citar apenas alguns exemplos, são de origem religiosa, embora não estejam classificadas como tal, o que impede dimensionar a abrangência efetiva das ações de influência religiosa. (IBGE, 2008, paginação irregular).
Em terceiro lugar, figuram as 58.796 organizações classificadas
como “Associações patronais e profissionais”, sendo que as “Associações de
produtores rurais” aparecem em maior número com 34.830 entidades. Em quarto,
estão as de “Cultura e Recreação” com 46.999, sendo que 32.203 (68,51%) figuram
na área de “Esporte e Recreação”. Em quinto, para registrar as numericamente mais
significativas, estão as 39.395 organizações classificadas como “Assistência social”
que serão abordadas mais à frente no contexto da pesquisa realizada também pelo
IBGE (2007b), intitulada Pesquisa de Entidades de Assistência Social (PEAS/2006).
92
A distribuição das 338.162 FASFIL pelo território brasileiro não é
uniforme. Dito de outra maneira, não acompanha, de modo necessário, a densidade
demográfica. Na tabela abaixo observa-se a informação mencionada. Destacam-se
a distribuição das FASFIL absoluta e relativa, a posição da região em termos
populacionais e a posição da região quanto ao número de organizações. Por fim,
sublinham-se o Estado da região com maior número de Entidades sem Fins
Lucrativos (ESFLs) e a participação deste número em relação ao total de
organizações do país.
Tabela 10 - FASFIL por regiões
Região FASFIL
Distribuição Ordem Maior participação na região
Absoluta Relativa (%) BR
(1)
RG
(2)
Estado
(3)
Absoluto
(4)
Relativo (%)
(5)
Brasil 338 162 100
Norte 16 164 4,5 4º 5º PA 6 609 2,0
Nordeste 79 998 23,7 2º 2º BA 23.203 6,9
Sudeste 143 444 42,4 1º 1º SP 68 658 20,3
Sul 76 888 22,7 3º 3º RS 29 645 8,8
Centro-
oeste
21 668 6,4 5º 4º GO 7 728 2,3º
Fonte: Elaborada por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de (IBGE, 2008). Nota: (1) Posição da região em relação Brasil em termos populacionais, com base na população de
31.12 informada na tabela 4 de (IBGE, 2008); (2) Posição da região em relação ao Brasil, no que se refere à quantidade de FASFIL; (3) Estado com maior participação na região; (4) Número absoluto do referido Estado; (5) Número relativo deste Estado dentre os demais Estados da federação.
No geral, a tabela não evidencia grandes discrepâncias. A região
sudeste é a primeira em número de organizações, respondendo por 42,4% do total
ou o correspondente a 143.444 FASFIL, sendo também a primeira em termos
populacionais. O estado de São Paulo concentra, ainda, 20,3% das FASFIL do
território brasileiro, registrando o número de 68.658.
93
A segunda região com maior densidade de FASFIL é a nordeste
que, igual modo, apresenta a segunda maior população, tendo a Bahia com 6,9% de
todas as organizações. A região sul, com 22,7% de todas as FASFIL do país, figura
na terceira posição. É também a terceira no quesito populacional, mantendo a
uniformidade na distribuição de FASFIL por região. O Rio Grande do Sul é o
destaque na região com 29.645 organizações, representando 8,8% do total
brasileiro.
Entre a quarta e quinta posições aparece a única discrepância
apresentada pelos dados. A quarta região é a centro-oeste, com 21.668, ou seja,
6,4% do total. O estado que concentra o maior número é Goiás: 7.728 organizações
ou o equivalente a 2,3% do total do país. Entretanto, a região é a quinta mais
populosa, ou seja, possui maior densidade em termos de organizações e menor em
populações.
A quinta região com maior número de ESFL relacionadas pela
FASFIL é a região norte: 16.164 organizações e participação de 4,5% do total, tendo
o Pará como estado com maior número na região — 6.609 e participação de 2,0%
no país. Contudo, a região norte é a quarta maior em termos populacionais
brasileiros, ou seja, possui menor número de FASFIL para maior densidade
populacional.
A pesquisa IBGE (2008) não apresenta análise sobre as possíveis
razões para as discrepâncias configuradas nos dados apresentados. Diversos
fatores podem determinar o desalinhamento entre densidade populacional e número
de OSFLs presentes nas regiões norte e centro-oeste; desde a menor ou maior
organização da sociedade civil às diferenças históricas na presença do Estado e das
políticas públicas. E, no caso particular da região centro-oeste, se acrescenta a
influência do centro político localizado naquela região. Estudos que possam se
debruçar sobre estes dados poderão realizar análises mais específicas para o
enfrentamento das discrepâncias apontadas.
Outro aspecto relevante na pesquisa IBGE sobre as FASFIL diz
respeito à força de trabalho nas organizações da amostra estudada. O Brasil possui
1.709.156 de pessoas ocupadas e assalariadas em todo o território brasileiro. Fato
que, de maneira geral, tem perfil de distribuição assemelhado à análise anterior
sobre as 338.162 organizações. Este número, segundo a referida pesquisa,
representa 22,1% do total de empregados na administração pública no país.
94
Para ilustrar a distribuição deste contingente, utilizou-se a tabela
abaixo que possui a mesma configuração da anterior. Em outras palavras, os
números demonstrados pertencem às cinco regiões brasileiras e estão distribuídos
em números absolutos e relativos, contendo a posição que a região ocupa tanto em
termos populacionais quanto em número de organizações. Destaca, também, o
estado de maior participação regional, com seus respectivos números absoluto e de
participação relativa no país.
Tabela 11 - FASFIL / Pessoal ocupado assalariado
Região FASFIL
Distribuição Ordem Maior participação regional
Absoluta Relativa (%) BR
(1)
RG
(2)
Estado
(3)
Absoluto
(4)
Relativo (%)
(5)
Brasil 1 709 156 100
Norte 54 370 3,2 4º 5º PA 23 522 1,4
Nordeste 230 371 23,7 2º 2º BA 70 956 4,2
Sudeste 975 158 57,1 1º 1º SP 553 712 32,4
Sul 324 896 19,0 3º 3º RS 149 200 8,7
Centro-
oeste
124 361 7,3 5º 4º DF 47 494 2,8º
Fonte: Elaborada por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de (IBGE, 2008). Nota: (1) Posição da região em relação ao Brasil em termos populacionais, com base na população
de 31.12 informada na tabela 4 de IBGE (2008). (2) Posição da região em relação ao Brasil, no que se refere à quantidade de FASFIL; (3) Estado com maior participação na região; (4) Número absoluto do referido Estado; (5) Número relativo deste Estado dentre os demais Estados da federação.
A região sudeste é a primeira em número absoluto no emprego da
força de trabalho nas FASFIL, aglutinando mais da metade dos trabalhadores destas
organizações, em todo o território nacional (57,1%). E um terço do contingente se
concentra somente no estado de São Paulo, evidenciando a já conhecida
concentração de empregos nesta unidade da federação.
A segunda região é a nordeste com 230.371 pessoas ocupadas e
assalariadas, concentrando 23,7% do total. Esta região também é a segunda em
95
dimensões populacionais, sendo a Bahia o estado com maior número absoluto,
70.956, e participação de 4.2% no Brasil. Ainda em termos de força de trabalho, a
região sul figura na terceira posição, aglutinando 324.896 pessoas que trabalham
com remuneração ou 19% sobre o total geral. Ocupa também a terceira posição no
que se refere à distribuição populacional e tem no Rio Grande do Sul a maior
concentração: 149.200 trabalhadores, representando 8,7% dentre demais estados
brasileiros.
A disparidade entre as regiões norte e centro-oeste, demonstrada na
tabela 10, volta a aparecer quando da distribuição de pessoas ocupadas e
assalariadas. A quarta posição em número absoluto é a região centro-oeste, que tem
a quinta maior população e 3,2% do total de trabalhadores. O Distrito Federal,
destaque da região, reúne 47.494 pessoas ou o equivalente a 1,4% do total em
relação aos outros estados do país.
Por último, a região norte. A quinta região em número das FASFIL,
54.370, com participação de 3,2%, possui a quarta posição em população. O Pará é
o estado que congrega 23.522 organizações e 1,4% de participação entre todos os
estados brasileiros. Assim como a análise anterior sobre a distribuição das FASFIL
pelo país, a pesquisa do IBGE não apresenta reflexões específicas que elucidem a
inversão de posição entre as regiões norte e centro-oeste; quando analisados
comparativamente os quesitos “posição da região em termos populacionais” versus
“posição da região em número de organizações”. Os comentários realizados sobre
as razões desta situação são igualmente lícitos para análise sobre a força de
trabalho — exceto quanto ao volume de pessoal ocupado, dado haver desproporção
em relação às diferenças no número de organizações. O Distrito Federal, capital
federal do país e maior concentração de organizações em relação aos demais
estados, possui maior reunião de trabalhadores em OSFLs da região centro-oeste.
Este e outros apontamentos podem ser estudados em pesquisas que aprofundem
análises sobre os estados e seus municípios.
Considerando a tarefa de auxiliar a compreensão sobre o TS,
analisaram-se dados internacionais, situando o Brasil neste contexto. Iniciou-se,
outro modo, a análise de dados obtidos por meio de estudos que empreenderam
investigação em solo brasileiro; caso, por exemplo, do IBGE (2008) e sua
identificação das FASFIL.
96
Os dois estudos citados trazem dados que abrangem países e
refletem a composição do TS de forma ampliada e geral. A necessidade de avançar
no estudo e aprofundamento a respeito não apenas da composição, número de
profissionais envolvidos, mas também da natureza das atividades, públicos
atendidos e a dimensão da gestão, passa, necessariamente, por investigações mais
verticais, regionais ou locais. O presente estudo caminha nesta direção.
Diagnósticos que buscam identificar especificidades locais — pela
natureza particular da sua ação — afastam-se da realidade na dimensão macro e
ganham densidade ao se aproximar da dimensão micro, onde as particularidades
revelam outro enredo. Assim, estudos ampliados e análises locais se
complementam, indicando o quadro da totalidade.
No contexto brasileiro, há três estudos que caminham em direção a
compreensão do TS com foco local, reiterando a pluralidade e a diversidade já
debatidas; além de apresentar perspectivas adicionais de entendimento. O primeiro
estudo consolida o esforço do mesmo órgão de pesquisa (IBGE) e ocorreu como
desdobramento da FASFIL para compreender as particularidades das organizações
de assistência social no Brasil. Trata-se do estudo “Pesquisa das Entidades de
Assistência Social” (PEAS), documentado na publicação intitulada “As Entidades de
Assistência Social Privadas sem Fins Lucrativos” (IBGE, 2007b), realizada em
parceria com o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS).
Para tanto, os pesquisadores utilizaram o cadastro CEMPRE, mesma base de
informações da FASFIL, focalizando as organizações que se declararam prestadores
de serviço de assistência social, ou seja, aquelas relacionadas no grupo 05 –
Assistência Social da COPNI Ampliada. O resultado deste processo metodológico
indicou a existência de 33.076 entidades privadas de assistência social sem fins
lucrativos no Brasil.
Cabe efetivar breve ressalva a respeito do número encontrado, em
razão da divergência do montante aqui indicado, 33.076, com aquele informado pela
FASFIL — explicitado na tabela 9 deste estudo, na categoria “Assistência Social” —,
equivalente a 39.935 organizações. A pesquisa IBGE (2008) destaca imprecisões no
entendimento do que seja assistência social. Tais imprecisões podem responder
algumas dúvidas sobre a disparidade registrada (na ordem de 6.859), fortalecendo a
necessidade de realização de pesquisa específica e já mencionada nas conclusões
da FASFIL:
97
Pelos dados levantados, observou-se que, na prática, boa parte (29,9%) das entidades que se cadastraram como de assistência social não prestavam exatamente os serviços considerados como de política de assistência social pelo MDS. (IBGE, 2008, p. 29).
Como já comentado, no ato do cadastramento junto ao CNPJ, a
entidade indica sua atividade principal de forma autodeclarada, a partir do CNAE. Os
pesquisadores responsáveis pela FASFIL analisam um aspecto fundamental: a
vulnerabilidade das informações. Semelhante inconsistência evidencia a
necessidade de criação de mecanismos que minimizem a irregularidade do dado
declarado seja alertando programática e sistematicamente os envolvidos nos
processos contadores, advogados, administradores, dirigentes das instituições,
gestores de projetos, seja capacitando os servidores públicos das áreas implicadas
na identificação para a apuração de qualquer incoerência e mesmo as fragilidades
na informação.
Estes elementos respondem as divergências encontradas entre os
dados das duas pesquisas, FASFIL e PEAS, e fundamentaram o projeto de parceria
entre IBGE e MDS que visa conhecer a estrutura e funcionamento das instituições
de assistência social.
A partir do estudo das autodeclarações classificadas com
assistência social, os pesquisadores da PEAS desenvolveram exame, tendo em
vista a identificação do serviço prestado pela entidade e as características de seu
público-alvo nas unidades locais. Com estes procedimentos metodológicos, e
contando com um universo formado por 33.077 instituições, a pesquisa entrevistou
16.089 delas, todas qualificadas como entidades de assistência social. Com 16.988,
por diferentes razões, as entrevistas não foram realizadas. Importante destacar que
a pesquisa incluiu entrevistas, preenchimento de questionários e certa estrutura
comprometida com a viabilização de coleta das informações, bem como o
tratamento dos dados. A tabela a seguir apresenta a distribuição das entidades pelo
território brasileiro e as entidades entrevistadas, ambas em números absolutos, e o
porcentual das entidades entrevistadas em relação às regiões brasileiras.
98
Tabela 12 – Entidades de assistência social por região
Entrevista realizada
Região
Total
Absoluto
Relativo
%
Brasil 33 077 16 089 100,0
Norte 924 552 3,4
Nordeste 4 897 2 392 14,8
Sudeste 14 783 8 332 51,8
Sul 10 404 3 631 22,6
Centro-oeste 2 069 1 192 7,4
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de IBGE (2007). Dados contidos na tabela 1 do referido documento.
Do total de 16.089 entidades, 51,8% se concentra na região sudeste.
A pesquisa registra que o porcentual se deve, em grade medida, às organizações
localizadas no estado de São Paulo (29,6%); reiterando contexto indicado em outras
pesquisas quanto à dimensão do TS nesta região. Tal concentração sugere
dinâmica que impõe às organizações, de maneira geral, níveis superiores de
profissionalização das equipes e processos de gestão. É lícito supor que a menor
concentração de organizações em determinada região, impõe pressão em menor
escala sobre o cotidiano das entidades, seja no que tange aos salários, princípios e
processos de gestão, financiamento das atividades, seja no nível de prestação de
contas.
As demais regiões apresentam outros porcentuais. Na região sul,
figura 22,6% das organizações, enquanto na nordeste, 14,8%, na centro-oeste 7,4%
e na norte, 3,4%. A FASFIL, quando analisou as organizações de assistência social
na pesquisa, abordou a aparente contradição na distribuição das entidades de
assistência social pelo país; o que também, em certa medida, se aplica a PEAS.
Pode parecer estranho que a distribuição dessas organizações não acompanhe a distribuição da pobreza no Brasil: enquanto 47,5% dos brasileiros com renda familiar per capita de até meio salário mínimo mensal em 2005 se encontram no Nordeste [...]. (IBGE, 2008, p. 27).
No caso da PEAS, apenas 14,8% das entidades se localiza na
região nordeste, o que denota a mesma contradição. Entretanto, para os
pesquisadores da FASFIL, a pobreza não é o único campo de ação destas
99
entidades, igual modo abrange a questão da violência, da população em situação de
vulnerabilidade e risco e em outras de forma significativa nas grandes concentrações
urbanas.
As organizações pertencentes ao TS distribuem-se por toda a
extensão do território nacional, mas, é inegável a preocupação com o âmbito local.
Algumas atuam em todo o estado e outras desdobram suas atividades sobre a
diversidade das expressões da questão social. A pesquisa demonstrou que as
entidades de assistência social (EAS) têm suas ações concentradas em municípios
com 11.197 organizações o que representa 69,9% do total. O cenário marca,
claramente, o envolvimento de sua estrutura (física e social) na dimensão local com
o cotidiano das cidades. A segunda maior frequência ocorre na esfera nacional, com
2.482 instituições (15,4%), seguida do âmbito regional, com 1.260 (7,8%) e estadual,
com 1.114 (6,9%).
Para realizar as intervenções em todo o território brasileiro, as EAS
mobilizam força de trabalho equivalente a 519.152 colaboradores vinculados às
organizações de diferentes formas. Para demonstrar esta distribuição, apresenta-se
a tabela a seguir.
Tabela 13 - Força de trabalho EAS
Pessoas envolvidas
Total Porcentual sobre total
PEAS total 519.152 100%
Funcionários 166.711 32,11
Cedidos 37.702 7,26
Prestadores de serviço 22.942 4,42
Estagiários 14.496 2,79
Voluntários 277.301 53,41
Fonte: Elaborada por Roberto Galassi Amaral com base nas informações de IBGE (2007, p. 27). Nota: No original, os dados se encontram no Gráfico 10.
Considerando o total de pessoas dedicadas às atividades das EAS,
os voluntários representam sua maior parte, 277.301 pessoas envolvidas o que
equivale a 53,41% da força de trabalho. Este dado demonstra a importância do
trabalho voluntário para o setor, que tem raízes históricas e vem se transformando
ao longo dos tempos.
100
Importante destacar a relação existente entre a expansão do TS e o
processo de democratização do país, que inclui novos componentes na mobilização
de pessoas para o trabalho voluntário. Diante do expressivo número e considerando,
por exemplo, os elementos prescritivos da Política Nacional de Assistência Social
(PNAS) sobre a execução dos serviços de proteção social especial de média
complexidade e quanto à exigência de maior estruturação técnico-operacional das
EAS e das equipes, necessário se faz que as lideranças ponderem sobre as
atividades desempenhadas pelos voluntários, valorizando e respeitando o papel que
cumprem e garantindo que a PNAS se torne eficaz.
Constam, ainda, da tabela sobre a força de trabalho das EAS,
números igualmente relevantes, demonstrando que as diferentes formas de
composição de equipes de trabalho, nas organizações de maneira geral, também
foram utilizadas pelas EAS. Os funcionários com vínculo empregatício
representam 32,11% do número de pessoas envolvidas, totalizando 166.711. Os
trabalhadores cedidos por outras instituições correspondem a 6,3% e equivalem à
37.702. Os prestadores de serviços aparecem na pesquisa com o total de 22.942
(4,42%) e, por último, 14.496 estagiários correspondente a 2,79% do total de
colaboradores.
Na área da gestão de pessoas, além da composição das equipes, a
PEAS analisou a formação dos profissionais envolvidos, sendo que as mais
representativas estão ilustradas no gráfico abaixo.
Gráfico 8 - Formação dos profissionais das EAS
Fonte: Adaptado por Roberto Galassi Amaral a partir das informações de IBGE (2007, p. 28).
Nota: No original, corresponde ao Gráfico 11.
101
A categoria profissional mais representativa dentre os
profissionais de nível superior, não voluntários, é a dos pedagogos, com 19.909
pessoas. Os médicos aparecem na segunda posição, com 6.745 profissionais. Os
assistentes sociais e psicólogos têm representações muito próximas: 5.707 e
5.428, respectivamente. Na sequência, em números menores, estão os
enfermeiros (2.944), terapeutas (2.156), advogados (1.655), sociólogos (320) e
jornalistas (267).
Pode-se afirmar, a partir das cifras indicadas, que Assistência
Social, enquanto Política Pública Nacional, revela-se espaço de ação
multidisciplinar, materializado pela presença de diferentes áreas do
conhecimento, requerendo dos envolvidos disposição e práticas profissionais
integradoras, sem as quais os resultados esperados não se efetivam. O que faz
conhecer, grande medida, um duplo: a alta complexidade da proposta e os
desafios enfrentados quando da compreensão das expressões da questão socia l
e da natureza humana.
O público atendido pela EAS constitui outro indicador analisado pela
PEAS. A título de referência, o item 2.4 da PNAS define os usuários da Política
como formadores dos seguintes grupos:
Constitui o público usuário da política de Assistência Social, cidadãos e grupos que se encontram em situações de vulnerabilidade e riscos, tais como: famílias e indivíduos com perda ou fragilidade de vínculos de afetividade, pertencimento e sociabilidade; ciclos de vida; identidades estigmatizadas em termos étnico, cultural e sexual; desvantagem pessoal resultante de deficiências; exclusão pela pobreza e, ou, no acesso às demais políticas públicas; uso de substâncias psicoativas; diferentes formas de violência advinda do núcleo familiar, grupos e indivíduos; inserção precária ou não inserção no mercado de trabalho formal e informal; estratégias e alternativas diferenciadas de sobrevivência que podem representar risco pessoal e social. (BRASIL, 2004, p. 27).
A pesquisa trabalhou com as EAS que se autodeclararam
pertencerem à Assistência Social e, conforme o procedimento metodológico
adotado, foi permitido que as entidades, se assim desejassem, pudessem incluir
vários grupos como públicos atendidos. Os resultados demonstraram alinhamento
com as diretrizes da PNAS no que se refere aos grupos de usuários da Política. A
tabela abaixo apresenta a distribuição em relação ao público alvo-declarado e
atendido pela entidade.
102
Tabela 14 - Público-alvo atendido pela entidade
Público-alvo Número de entidades
Pessoas vulnerabilizadas ou em situação de risco social 9.413
Pessoas com deficiência 4.896
População em situação de rua 2.587
Gestantes/Nutrizes 1.709
Crianças e adolescentes em situação de trabalho 1.440
Vitimas de violência 1.438
Dependentes químicos 1.163
Autores de ato infracional 308
Egressos do sistema penal 219
Minorias étnicas 211
Fonte: Adaptado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de IBGE (2007, p. 25). Nota: No original, ver Gráfico 7.
A distribuição indica concentração de organizações atuando com
pessoas em situação de vulnerabilidade ou em risco social, sendo mencionada
por 9.413 entidades quase o dobro do segundo público mais citado, o de pessoas
com deficiência indicado por 4.896 organizações. O público-alvo população em
situação de rua, indicado por 2.587 entidades, integra o primeiro grupo com mais
entidades atuantes. O segundo grupo é formado por 1.709 instituições que
atendem gestantes e mães em amamentação, 1.440 ocupadas com crianças e
adolescentes em situação de trabalho, 1.438 com vítimas de violência e 1.163
entidades que acolhem dependentes químicos. O terceiro grupo, não menos
importante, mas com número menor de entidades é aquele dedicado aos autores
de ato infracional com 308 indicações. Por fim, egressos do sistema penal com
219 e minorias étnicas com 211.
Esta informação em particular, cumprindo o papel da pesquisa, pode
influenciar a efetivação das políticas públicas e subsidiar esforços envolvendo o TS,
a sociedade, o Estado, bem como o setor privado. É fundamental ampliar o
atendimento de pessoas que, por uma razão ou outra não possuem, à sua
disposição, organizações que possam oferecer-lhes suporte, conforme as diretrizes
da PNAS.
103
A Política, em momento nenhum, determina que se deva ter um
número menor de entidades que prestem atendimento, por exemplo, à população
egressa do sistema prisional em relação às pessoas com deficiência, mas isso,
efetivamente, ocorre. Apenas como exemplo, dados do censo da Gouveia e
Daniliauskas (2010), documento que resulta da pesquisa entre seus associados,
aponta o que se segue: apenas 1,4% das organizações respondentes indicaram a
população carcerária como público-alvo de ações e 2,1% assinalaram o foco para
portadores de necessidades especiais. O Mapa do Terceiro Setor (CETS.
EAEFGV/SP, 2005) não especifica, na sua lista de ações cadastradas, atividades
relacionadas com o publico alvo das ações.
Dados do censo de 2010 demonstram que 23,9% da população
brasileira15 (45.606.048) possuem, pelo menos, uma deficiência. Já dados do
sistema prisional do Ministério da Justiça brasileira dão conta de 473.626 brasileiros
integrantes da população carcerária16. Assim, o número populacional maior em um
determinado grupo de pessoas não serve, necessariamente, como indicador
absoluto de escolha da ação social. A prática de elaboração de projetos sociais
indica que há áreas com as quais os atores sociais se envolvem em menor grau. A
questão da comunidade carcerária e egressos do sistema prisional é uma destas,
sugerindo que não basta ter política definida e indicando que somente a disposição
em articular diferentes atores sociais é que poderá surtir efeitos mais
representativos, em termos de maior rede de atendimento e usuários alcançados
pela política.
15
IBGE (2010c) 16
Ministério da Justiça (2012b, online).
104
Tabela 15 - Tipo de EAS
Tipo
Entidades
Centro de atendimento à pessoa com deficiência 2 078
Centro de atendimento às famílias 1 804
Centro de atendimento à criança e ao adolescente 1 630
Asilo 1 145
Centro de múltiplo uso 935
Centro de convivência 899
Casa lar 749
Abrigo 677
Centro de geração de trabalho e renda/profissionalizante 580
Plantão social ou similar 511
Centro-dia 216
Casa de acolhida (passagem) 132
Albergue 104
Moradias provisórias 60
Centro da juventude 58
Família acolhedora 50
República 40
Centro de atendimento ao adolescente em conflito com a lei 39
Fonte: Adaptado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de IBGE (2007, p. 26). Nota: No original, ver Gráfico 8.
As informações contidas na PEAS demonstram que as organizações
que se autodeclaram “Centro de atendimento à pessoa com deficiência” aparecem
em maior número (2.078). Formando o bloco das principais estão: “Centro de
atendimento à família” (1.804) e o “Centro de atendimento à criança e adolescente”
(1.630). O tipo de EAS com menor frequência foi o “Centro de Atendimento ao
adolescente em conflito com a lei” (39).
Cabe destacar que os tipos identificados no âmbito da pesquisa se
apresentam alinhados com a PNAS no que se refere aos serviços de proteção social
básica, média e de alta complexidade17. Da mesma forma, a PEAS identificou que
5.947 organizações estão voltadas para a execução de atividades recreativas,
lúdicas e culturais, enquanto 5.933 realizam atendimento sócio-familiar e 5.859
17
Para detalhes ver Ministério do Desenvolvimento Social e Combate A Fome (BRASIL, 2004).
105
executam atendimento socioeducacional. Os três compõem o grupo dos principais
serviços realizados.
Diferente das pesquisas de maior amplitude como a realizada pelo
The Johns Hopkins Comparative Nonprofit Sector, que analisou 36 países, e a
FASFIL que estuda o setor no Brasil, a PEAS 2006 permite nível de investigação
local, revelando número de EAS por região, dimensionamento da força de trabalho,
sua formação; além de público atendido, tipo de atendimento e serviços prestados.
Estudos com este nível de aprofundamento contribuem de forma significativa para a
compreensão do TS no país.
1.3.3 Nacional: Estratos específicos
O documento Panorama da ABONG, já citado alguma vezes no
presente texto, cumpre papel semelhante no sentido de demonstrar especificidades
da parcela associada do TS. Seus autores introduzem o trabalho construindo as
fronteiras entre a proposta de consolidar o perfil dos associados e o cenário em que
se inserem. O objetivo foi perseguido por seus idealizadores, indicando que o
trabalho se propõe a fazer um estudo de campo, a partir do qual se localiza a
entidade e o exame das ações dos associados.
A ABONG foi fundada no ano de 1991 e se caracteriza como
[...] uma sociedade civil sem fins lucrativos, democrática, pluralista, antirracista e anti-sexista, que congrega organizações que lutam contra todas as formas de discriminação, de desigualdades, pela construção de modos sustentáveis de vida e pela radicalização da democracia. (ABONG, online).
Destaca, ainda, sua origem em organizações de perfil político.
O número de associados não está visível de forma clara em sua
página na internet, mas é possível obtê-lo através do sistema de busca disponível na
página principal. Com este procedimento, identificam-se 240 organizações
associadas e distribuídas pelas regiões brasileiras da seguinte forma: 19 ONGs, na
região norte (7,92% em relação ao total), 88 (36,67%) na nordeste, 16 (6,67%) na
região centro-oeste, 92 (38,33%) na sudeste e 25 (10,42%) na sul.
Quando colocados estes números ao lado dos porcentuais de
participação nas regiões das EAS, um dado se destaca dos demais. Na PEAS, a
106
região nordeste concentra apenas 14,8% das EAS, enquanto, na ABONG, o
porcentual de ONGs associadas é de 36,67%, dividindo com a região sudeste
(38,33%) a posição de maior concentração. Um estudo mais detalhado da origem e
finalidades das 88 ONGs da região nordeste poderá apontar razões mais objetivas
para esta concentração. De todo modo, chama a atenção o fato de, em se
intitulando ONGs de perfil político, não ter porcentual expressivo de atuação no
centro econômico do país, como ocorre com as EAS.
Retomando o documento da ABONG, que traça o panorama de seus
associados, o primeiro aspecto analisado foi denominado pelos autores como
principais lutas políticas, considerando, obviamente, que as ONGs atuam no campo
político. As diferentes lutas ou áreas de atuação, numa linguagem mais universal,
constam do Quadro 4 da presente tese e foram demonstradas como elementos que
contribuem para a compreensão sobre sua multiplicidade. O dado adicional ao já
demonstrado indica o porcentual de associados à organização que atuam em cada
área. É o que se vê evidenciado na tabela a seguir.
Tabela 16 - áreas de atividades dos associados da ABONG
Áreas
Porcentual de
respondentes
(%)
Educação 48,9
Organização popular /Participação popular 33,8
Relações de gênero 27,1
Justiça e promoção de direitos 23,3
Meio-ambiente 21,8
Saúde 20,3
Fortalecimento de outras ONGs /Movimentos populares 20,3
Trabalho e renda 18,0
Agricultura 15,0
Economia solidária 12,8
Arte e cultura 11,3
Questões agrárias 8,3
Orçamento público 6,8
DST Aids 6,8
Segurança alimentar 6,0
107
Áreas
Porcentual de
respondentes
(%)
Questões urbanas 6,0
Assistência social 6,0
Segurança pública 4,5
Discriminação sexual 3,8
Relações de consumo 3,8
Discriminação racial 3,8
Comunicação 3,8
Comércio 0,8
Esporte 0,8
Fonte: Adaptado por Roberto Galassi Amaral a partir de Gouveia e Daniliauskas (2010). Nota: No original, ver tabela 1.
Quatro grandes blocos podem ser observados, sendo o primeiro
aquele que concentra os maiores porcentuais (acima dos 30%). Tratam-se do campo
"educação", com 48,9%, e "organização popular", com 33,8%. Estas áreas de
atuação, ou campos temáticos, de acordo com o documento, são predominantes nas
agendas institucionais das referidas ONGs.
No segundo bloco, cuja distribuição corresponde a faixa entre 20 e
29%, figuram relações de gênero (27,1%), justiça e promoção de direitos (23,3%),
meio ambiente (21,8%), saúde (20,3%) e fortalecimento de outras
ONGs/movimentos sociais (20,3%). No terceiro bloco, aparecem aquelas áreas cuja
distribuição corresponde ao intervalo entre 10 e 19%. Trabalho e renda (18%),
agricultura (15,0%), economia solidária (12,8%), arte e cultura (11,3%). No quarto e
último bloco estão os temas com distribuição inferior a 10%. São eles: orçamento
público e DST AIDS (6,8%), segurança alimentar, questões urbanas e assistência
social (6,0%), segurança pública (4,5%), discriminação sexual, relações de
consumo, comunicação e discriminação racial (3,8%), comércio e esporte (0,8%
cada).
O mérito de estudos que desenvolvem uma investigação a partir de
recortes específicos do TS é trazer a riqueza das perspectivas particulares, e menos
generalistas, da realidade examinada. Este é o caso do referido documento que
sondou a natureza das atividades das ONGs respondentes. Nomeada pelos seus
108
organizadores de “principal perspectiva de trabalho”, identificou quatro naturezas
distintas: desenvolver a consciência crítica/cidadania (82%), transformar essas
ações em políticas públicas (57%), fortalecer as entidades e os coletivos
organizados (53,1%) e solucionar problemas imediatos (9,4%) (GOUVEIA;
DANILIAUSKAS, 2010, p. 38).
Duas questões imediatas surgem com os dados apresentados sobre
a perspectiva de trabalho das ONGs. A primeira tem relação com o porcentual
reduzido da natureza “solucionar problemas imediatos” diante dos destacados
porcentuais apresentados nas demais. Segunda questão, a pesquisa não conceitua
as naturezas acima citadas, não sendo possível compreender com precisão o
significado contido na expressão escolhida para designar a perspectiva de menor
valor.
Uma análise superficial da distribuição apresentada, considerando
os índices das principais lutas políticas (educação com 48,9% e organização popular
com 33,8%), indica que as instituições buscam resultados em longo prazo e a
solução de problemas imediatos, sugerindo atuação em curto prazo, recebe menor
atenção do conjunto de organizações respondentes.
Por outro lado, admitindo a associação possível entre a perspectiva
de longo prazo (grau elevado de importância) e o curto prazo (grau menor), é lícito
supor que tal percepção pode exprimir viés na leitura e formação do juízo a respeito
do que seja relevante ou não. Aos olhos de instituições fortemente orientadas para o
longo prazo, qualquer ação que não se encaixe naquele parâmetro temporal é
interpretada como menos relevante e, logo, ações e projetos que visem solucionar
problemas imediatos não são alternativa cabível. É preciso considerar que entre os
dois extremos, longo prazo e curto prazo, há uma miríade de outras ações possíveis.
A partir das informações contidas no estudo realizado pela ABONG,
sobre seu campo associativo, os organizadores expuseram a tipologia utilizada para
refletir sobre as intervenções realizadas pelos associados respondentes da
pesquisa. A articulação política/advocacy18 aparece em 71,1% das respostas,
18
A expressão é trazida do idioma inglês e não tem ainda, em língua portuguesa, uma tradução precisa e consolidada. É, com frequência, utilizada por organizações do Terceiro Setor ocupadas com a defesa de interesses. No caso de organizações ativistas, o advocacy inclui a luta por direitos. No contexto norte-americano está associado à expressão "lobby" que é exercido de forma organizada e sistemática, sem que a sociedade interprete a prática como algo impróprio, negativo ou escuso. No caso brasileiro, a expressão “lobby”, ao contrário, associa-se às atividades que favorecem agentes econômicos, muito vinculadas às questões econômicas e obtenção de poder.
109
enquanto a tipologia capacitação técnica e política apresenta marca de 61,2%. Ainda
estão indicadas as tipologias assessoria (55,4%), pesquisa (24,8%) e prestação de
serviços (23,1%). Cabe explicitar que os respondentes apontam mais de uma
tipologia em suas atividades, razão pela qual os resultados não totalizam 100%.
Quando analisadas as tipologias com maior expressão, no contexto
da principal área de atuação indicada na tabela 16, pode-se estranhar a prevalência
da área da educação (48,9%), dado cuja imagem corrente associa, na prática, a
relação professor/aluno/sala de aula. O documento analisado apresenta reflexão
diferenciada sobre o domínio, em face da clara compreensão sobre o plano político
por parte de seus idealizadores e sujeitos da pesquisa, como traço de identidade
das organizações associadas. A análise é determinada pela relação entre os
elementos citados, a natureza principal (desenvolver a consciência crítica/cidadania,
82%) e o tipo de intervenção mais presente nas respostas (articulação política e
advocacy, 71,1%); introduzindo caráter particular à expressão "educação".
Concluindo a reflexão sobre as informações contidas no estudo
empreendido pela ABONG, destaca-se a multiplicidade de públicos-alvo, intitulados
"sujeitos" pelos pesquisadores, partícipes do rol de ações das organizações
pesquisadas. O documento apresenta 19 diferentes populações, cuja distribuição
pode ser explorada na próxima tabela.
Tabela 17 - Público-alvo das associadas à ABONG.
Ordem Sujeitos Porcentual (%) de
indicações
01 Organizações populares/movimentos sociais 54,8
02 Mulheres 36,3
03 Crianças e adolescentes 32,9
04 Jovens 28,8
05 Trabalhadores rurais/sindicatos rurais 21,9
06 População em geral 21,2
07 Professores 13,7
08 Outras ONGs 11,0
09 Comunidades tradicionais 6,8
10 Negros 4,8
11 Estudantes 4,8
12 Povos indígenas 4,1
110
Ordem Sujeitos Porcentual (%) de
indicações
13 Gays, lésbicas, transexuais e travestis 3,4
14 Portadores de HIV 2,7
15 Portadores de necessidades especiais 2,1
16 Moradores de áreas de ocupação 2,1
17 Trabalhadores urbanos/sindicatos urbanos 1,4
18 População carcerária 1,4
19 Terceira idade 0,7
Fonte: Adaptado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados informados em Gouveia e Daniliauskas (2010).
Nota: No original, corresponde a tabela 03 (Sujeitos a que as ações são dirigidas).
A distribuição pode ser analisada aglutinando-se faixas porcentuais.
Assim, a primeira faixa apresenta índices superiores a 30%, sendo as organizações
populares/movimentos sociais a mais representativa dentre as indicações (54,8%).
As outras duas, com porcentual acima dos 30%, são mulheres (36,3%), crianças e
adolescentes (32.9%). No conjunto, estes dados, que apontam para os três públicos
de maior atenção dos associados, denotam sintonia com o tipo de intervenção
predominante (articulação política e advocacy) e com a principal perspectiva de
trabalho das ONGs (desenvolver a consciência crítica/cidadania), sem perder de
vista que as mulheres representam a maioria da população brasileira (50,7%)19 e as
crianças, na faixa de zero a nove anos (15%)20, são socialmente aceitas como
representantes do futuro do país.
O segundo grupo de porcentuais, na faixa compreendida entre 20%
e 30%, corresponde aos jovens (28,8%), trabalhadores rurais/sindicatos rurais
(21,9%) e população em geral (21,2%). No terceiro bloco, estão os professores, com
13,7% das organizações respondentes como público-alvo de suas ações, e ONGs
(11,0%). No quarto e último conjunto, formado pelas predominâncias de respostas
que variam na faixa entre zero e 10%, aparecem comunidades tradicionais (6,8%),
negros e estudantes (4,8%), povos indígenas (4,1%), gays, lésbicas, transexuais e
travestis (3,4%), portadores de HIV (2,7%), portadores de necessidades especiais e
moradores de área de ocupação (2,1%), trabalhadores urbanos/sindicatos urbanos e
população carcerária (1,4%), terceira idade (0,7%), sendo os últimos, os sujeitos
19
IBGE (2010d, online). 20
IBGE (2010d, online)
111
com menor atenção por parte das ações empreendidas pelas associadas da
ABONG.
Este estudo (GOUVEIA; DANILIAUSKAS, 2010), ao lado da PEAS
(IBGE, 2007b), configura extratos quantitativos e específicos do universo contido na
FASFIL (IBGE, 2008), que representa o Brasil na pesquisa internacional da Johns
Hopkins (SALAMON; SOKOLOWSAKI, 2004). Neste contexto, e no início do
presente capítulo, foi possível analisar as dimensões formalidade, pluralidade, esfera
jurídica, associativismo, financiamento e finalidades das Organizações do Terceiro
Setor (OTS) que, juntas, formatam as bases para a leitura deste espaço de atuação.
Extratos específicos e bases de entendimento contribuem para melhor compreensão
da composição e agendas do TS brasileiro.
Os estudos mais referenciados e pioneiros no campo do TS, como
Fernandes (1994), Landim (1993; 2002), autores das ciências sociais como Iochpe
(1997), Beghin (2005), Falconer e Vilela (2001), Calil (2001) e Rico (2000), além dos
dois documentos que analisam extratos quantitativos — PEAS (IBGE, 2007b) e
Gouveia e Daniliauskas (2010) — contemplam a presença das organizações de
origem empresarial no rol de atores que figuram na cena cotidiana de enfrentamento
da questão social.
Enquanto pesquisadores se ocupam em construir a lógica de
compreensão da emergência de sua participação, considerando aspectos históricos
e inferindo motivações, os extratos quantitativos demonstram o incremento no
envolvimento de tais atores. Em primeiro lugar, por meio do volume crescente de
recursos financeiros e não financeiros empregados no financiamento das atividades
das OTS; em segundo, com o aumento de sua mobilização e participação nas
relações com as diferentes instituições que compõem o TS.
A PEAS, por exemplo, no âmbito do exame sobre a questão do
financiamento das entidades de assistência social (EAS), indica “[...] que 59,5% das
entidades têm como fonte principal recursos de origem privada (que englobam
recursos próprios, privados e contribuição voluntária) [...]”. (IBGE, 2007b, p. 23). No
mesmo documento, ao analisar o tema das parcerias para realização dos serviços
das EAS, comenta: “[...] prevalecem as parcerias com os órgãos do Poder Executivo,
seguidos pelas empresas privadas [...].”(IBGE, 2007b, p. 23).
112
A participação de organizações do TS de origem empresarial,
fundações e institutos, bem como das próprias empresas, também é destacada no
documento produzido pela Gouveia e Daniliauskas (2010, p. 30).
Com relação às duas primeiras [(1) Empresas, Institutos e Fundações Empresariais; (2) Recursos Públicos Municipais.] houve um aumento de quase 9 pontos percentuais em sete anos, sendo o crescimento maior no período 2003 - 2007, passando de 35,1% para 41,5%. É importante destacar que se tomarmos como referência a primeira pesquisa realizada pela ABONG com suas associadas, os dados referentes a 1993 indicam que apenas 3% delas acessavam recursos de Empresas, Institutos e Fundações Empresariais, quadro que se modifica bastante em quatorze anos.
A indicação de que associadas acessaram, em maior escala,
recursos de origem empresarial não deve informar, de forma linear, que a
participação das organizações doadoras dos mesmos recursos se dá apenas e tão
somente no financiamento de ações das ONGs, como se cumprissem um papel
relativo ao setor bancário, visando a obtenção de recursos através de créditos a
serem amortizados ao longo de determinado período. Assim como a PEAS revelou a
ampliação de parcerias, efetivadas para além do recurso financeiro, é fundamental
destacar que a participação das organizações de origem empresarial — fundações,
institutos empresariais, bem como das próprias empresas — ocorre de forma
crescente em termos de investimentos de recursos financeiros e em ações
qualificadas, planejadas, organizadas com base em diagnósticos pautados por toda
sorte de instrumentos de planejamento de ações sociais.
Obviamente, este destaque não pode ser atribuído, indistintamente,
a toda e qualquer organização vinculada ao setor privado, com finalidade lucrativa;
mas é legitimo para a parcela destas organizações cuja maturidade das reflexões
promovidas, tempo de atuação, princípios contemporâneos de gestão e
sensibilidade de seus profissionais, tem configurado papel diferenciado no universo
das instituições da sociedade civil organizada.
Antes de abordar pesquisas ocupadas com o extrato do TS,
composto pelas organizações privadas sem fins lucrativos de origem empresarial,
propõe-se efetivar breves apontamentos no que tange a ação das empresas no
campo do interesse público não estatal. Para refletir sobre tal envolvimento, não se
pode escapar da aproximação com o tema da responsabilidade social empresarial
(RSE), entretanto, estudá-lo com correção significa efetivar análise aprofundada
sobre o papel das empresas privadas na sociedade brasileira, seu estágio de
113
desenvolvimento e a função social estabelecida pela carta magna. Este
procedimento exige compreensão histórica desde o nascimento do setor privado no
país, passando pelas escolas de gestão e seu posicionamento atual frente à
competição global, para alçar a temática da responsabilidade social da empresa,
que emerge no país em meados da década de 1990.
Por escolha metodológica, orientada pelos objetivos da presente
tese, a RSE não pertence ao escopo da análise aprofundada face à dimensão
ampliada das variáveis que fundamentam o contexto empresarial contemporâneo.
Por outro lado, para refletir adequadamente a respeito do envolvimento das
empresas no enfrentamento das expressões da questão social, é necessário
estabelecer entendimento sobre a relação existente entre responsabilidade social
empresarial (RSE) e relações com a comunidade.
Partindo da premissa que RSE e relações com a comunidade são
questões distintas, ainda que conexas, há, ao menos, três perspectivas de análise
sobre RSE. A primeira delas se coloca no campo da qualidade da empresa como
ator social, cujo princípio está contido na Constituição Federal (CF), capítulo I, artigo
170, que assim determina:
A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...] propriedade privada (inciso 1º); função social da propriedade. (inciso 2º)” (BRASIL, 1988, online).
Ainda que a propriedade seja privada, conforme definido pela CF,
ela possui função social; denotando que as atividades e resultados do uso da
propriedade devem espraiar-se por toda a sociedade. Com este entendimento, é
legítimo que o conjunto da sociedade espere equilíbrio entre o interesse privado (da
empresa, seus proprietários, acionistas e tomadores de decisão) e o interesse
público, materializado pela função social, atribuindo à empresa a qualidade
socialmente responsável ou não socialmente responsável. O argumento é reforçado
por Luiz Amaral (2008, p. 115).
No instante em que a empresa aparece no contexto social como importante agente de dinamismo e transformação do regime comercial (empresarial), criando relações entre diversos setores sociais e projetando efeitos os mais distintos sobre eles, observa-se que, assim como se deu com os demais institutos do direito privado, a empresa também tem uma feição social.
114
A "feição social", caráter sublinhado pelo autor, bem como o ditame
constitucional, determinam a condição de atuação da organização privada com
finalidade lucrativa (empresa), na sociedade contemporânea, independentemente
das questões determinadas pela competição existente no chamado mercado. Antes
de tudo, a empresa é avaliada, portanto, pela qualidade da propriedade privada.
A segunda perspectiva de análise sobre a RSE propõe interpretá-la
como movimento, na medida em que fatos relevantes protagonizados por diferentes
atores sociais, associados ao universo empresarial, promoveram a instalação e o
avanço na compreensão do papel da empresa no contexto atual. Dentre os atores,
está a Associação de Dirigentes Cristãos de Empresa de São Paulo (ADCE-SP),
filiada à União Internacional Cristã de Dirigentes de Empresa da América Latina
(UNIAPAC-LA), e fundada em 1961. Sua agenda institucional encontra-se vinculada
ao exercício das atividades empresariais baseadas em princípios cristãos.
Acrescentam-se, igual modo, a Fundação Instituto de Desenvolvimento Empresarial
e Social (FIDES), fundada no ano de 1986, com alguns integrantes comuns a ADCE-
SP, visando o bem comum, a ética e a humanização das empresas; o Pensamento
Nacional das Bases Empresariais (PNBE), que iniciou suas atividades em 1987 pela
ação de alguns empresários paulistanos como Oded Grajew, Hélio Mattar, Emerson
Kapaz, Eduardo Capobianco e outros, cuja agenda consiste no aprofundamento da
democracia e da cidadania; Fundação ABRINQ, fundada em 1990, com princípios
voltados aos direitos das crianças e adolescentes; Grupo de Institutos, Fundações e
Empresas (GIFE), organização associativa com atividades informais iniciadas em
1989 e, formalmente, em 1995, congrega atualmente 142 investidores sociais
privados (GIFE, 2012b), sendo responsável em grande medida pela promoção e
difusão da agenda do TS; Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento
Sustentável (CEBDS), fundado em 1997 por líderes empresarias como Antonio
Erminio de Moraes, Jorge Gerdau, entre outros, vinculado ao World Business
Council for Sustainable Development (WBCSD), focalizado na interação entre as
empresas, Estado e sociedade, com vistas ao desenvolvimento sustentável; e o
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social (IEERS), organização
associativa fundada em 1998 por lideranças empresariais. Dentre eles figuram Oded
Grajew, Hélio Matar, Ricardo Young, Sérgio Mindlin, Guilherme Peirão Leal, entre
outros. Com agenda institucional voltada para a promoção, difusão e aprimoramento
da RSE, conta atualmente com 1.495 organizações associadas (INSTITUTO
115
ETHOS, 2010, online) e mantém vínculos com várias instituições congêneres ao
redor do planeta.
Esta última organização, mais especificamente, gerou extensa gama
de instrumentais e documentos que pautou o aprofundamento da RSE nas
organizações lucrativas (empresas), sugeriu reflexões e promoveu debates,
articulando atores da sociedade e do Estado no sentido da melhor compreensão da
temática. Como movimento, propôs agenda institucional ampla, reafirmando o papel
das empresas. Favoreceu, ainda, interlocução com o poder público em todas as
esferas, com a academia e a mídia, estabelecendo claramente novos padrões de
conduta e cultura empresarial.
Alguns anos após sua fundação, em uma fase avançada de
trabalho, o IEERS criou, no ano de 2004, uma organização à parte e que recebeu o
nome de UNIETHOS. Focalizada, exclusivamente, na educação para a RSE,
incorporou o acervo bibliográfico desenvolvido até então, investindo em cursos e
programas educacionais voltados a dirigentes, executivos e profissionais
interessados na compreensão, implantação e gestão da RSE. Adicionalmente,
iniciou atividades de consultoria na área, auxiliando empresas e pessoas no
exercício das várias questões que abrangem a temática da RSE.
O desenvolvimento de todas as ações aqui indicadas aponta para a
perspectiva dos movimentos sociais nos anos 1990, apresentada por Gohn (2000) e
que, de forma abrangente e de característica não popular, mobiliza pessoas e
organizações para a construção de novas significações no plano da relação entre
empresas, sociedade e Estado.
A terceira perspectiva de análise sobre RSE é delineada no campo
da administração enquanto área de conhecimento das ciências sociais aplicadas e
incorporada em sua definição pelo IEERS.
Responsabilidade social empresarial é a forma de gestão que se define pela relação ética e transparente da empresa com todos os públicos com os quais ela se relaciona e pelo estabelecimento de metas empresariais compatíveis com o desenvolvimento sustentável da sociedade, preservando recursos ambientais e culturais para gerações futuras, respeitando a diversidade e promovendo a redução das desigualdades sociais. (INSTITUTO ETHOS, 2012, p. 76).
Dentre os elementos aduzidos por esta afirmação, o primeiro deles
destaca, de maneira objetiva, que a RSE se traduz em forma, portanto, modelo de
116
gestão. Em língua portuguesa, o emprego da palavra modelo indica “tudo o que
serve para ser imitado” (MICHAELIS, online), caracterizando aspectos que se deseja
sejam multiplicados entre as organizações. A esta característica, considerando o
campo da gestão, a expressão modelo é compreendida no âmbito da ação
gerencial, assim com Fischer (2002, p. 11) conceitua:
[...] modelo de gestão como “a maneira pela qual uma empresa se organiza para gerenciar e orientar o comportamento humano no trabalho. Para isso a empresa se estrutura, definindo princípios, estratégias, políticas e práticas ou processos de gestão”.
A configuração estrutural, em termos de políticas internas, processos
de gestão e práticas organizacionais, constitui base para a realização das ações. No
campo da gestão, é condição imprescindível determinando tempo, energia e
recursos neste delineamento, visando gerar ambiente propício para o exercício das
competências. Por se tratarem de condições estruturais, os modelos também são
afetados por momentos históricos particulares e características organizacionais
próprias (INSTITUTO ETHOS, 2006). Tais especificidades são relativas à evolução
das organizações, respondendo, em boa medida, porque as empresas têm
respostas e comportamentos diferentes ainda que ofereçam o mesmo serviço, o
mesmo produto e localizadas na mesma região geográfica. Adicionalmente, cabe
pontuar que a expressão “gerencial” não indica, necessariamente, pessoas que
ocupam cargos gerenciais, mas todo e qualquer profissional que atua nos processos
gerenciais (planejamento, direção, coordenação, execução, controle e avaliação) de
uma dada organização.
O segundo elemento indica que o modelo de gestão (RSE) é
definido com ética e transparência pelas bases de relacionamento interno e externo
à empresa, tendo ao seu redor pessoas e organizações que mantêm expectativas e
interesses em relação às práticas e decisões da empresa. Os chamados
stakeholders21·— acionistas, governos, sociedade em geral, comunidades locais no
entorno das operações do negócio, funcionários, clientes, concorrentes e
fornecedores — recebem especial atenção na gestão contemporânea, marcando
mudança histórica no contexto das organizações; no que se refere tange à
21
Do idioma inglês, significa grupos de interesse que são influenciados e/ou influenciam as atividades da empresa. Para aprofundamento, ler Hitt, Ireland e Hoskisson (2003, p. 28).
117
centralidade das relações estabelecidas no processo de planejamento e de tomada
de decisão empresarial.
Como terceiro e último elemento, figura o posicionamento político
que orienta o papel das empresas no sentido de cumprir, no limite, a função social
requerida pela carta magna e assim como pontua Roberto Amaral (2009, p. 85): “[...]
na verdade esta forma de gestão recupera a verdadeira finalidade da organização,
reforçando a finalidade social, cujos benefícios de que dela surgem devem fluir para
a sociedade, recolocando o lucro como meio e não como fim.”
Em outras palavras, o modelo de gestão intitulado RSE cumpre
função meio. Primeiramente, envolve as organizações com as questões ambientais,
sociais e de desenvolvimento do país e, posteriormente, estabelece ações de
diferentes tipos e magnitudes visando alcançar a finalidade proposta, o
desenvolvimento sustentável da sociedade.
Sintetizando, as perspectivas denominadas qualidade do ator social,
movimento social e modelo de gestão, são compreensões contidas na relação entre
Estado e sociedade, no espaço dos movimentos sociais e no universo da gestão
empresarial, respectivamente. Este dimensionamento sugere que o entendimento
sobre a temática da RSE e participação da iniciativa privada empresarial, no
enfrentamento das expressões da questão social, deve ser construído com um olhar
plural, integrando áreas de conhecimento e práticas profissionais distintas.
A partir das considerações efetivadas, foi possível alinhavar
diferentes concepções sobre RSE, restando esboçar sobre as relações com a
comunidade, antes de retomar as análises a respeito das pesquisas com foco nos
extratos específicos que conformam o TS de origem empresarial. A RSE, enquanto
modelo de gestão, pressupõe a existência de relações entre a empresa e os
chamados grupos e pessoas de interesse (stakeholders). Dentre eles, figura a
comunidade22, espaço externo à organização e de interação cotidiana onde parte
significativa do papel social é desempenhada. No trilho destas relações, a empresa
aprimora, na medida de seu estágio de desenvolvimento, seus princípios e políticas
internas; além da participação na resolução de questões que a comunidade lhe
apresenta.
22
Para efeito deste trabalho, e conforme indicado em Roberto Amaral (2007), será utilizada a expressão comunidade, referindo-se ao agrupamento menor de pessoas e que estão no entorno das operações empresariais. O termo sociedade será utilizado considerando abrangência geográfica ampliada, ou seja, comunidades em várias regiões.
118
O relacionamento com comunidades de base, associações de bairro,
ONGs de múltiplas origens, projetos sociais em desenvolvimento, igrejas, escolas,
hospitais, órgãos públicos, outras empresas, cidadãos comuns moradores do
entorno e toda a sorte de instituições existentes, constitui-se, portanto, dos
elementos que compõem a chamada comunidade.
Com base nas reflexões realizadas, configura-se o seguinte
entendimento: RSE é um modelo de gestão e relações com a comunidade, parte
integrante do cotidiano da empresa, pode ser concebida, hierarquicamente ou não,
sob o patrocínio deste modelo. Em outras palavras, as empresas podem estabelecer
relações comunitárias sem a vigência do modelo de gestão RSE como descrito
neste estudo. Por esta razão, há diferentes modos na efetivação das relações
estabelecidas e os critérios que determinam a incidência das ações, neste campo,
são igualmente diversas.
No âmbito do presente estudo, focalizado na compreensão e
delimitação do TS, é necessário frisar que a empresa, no que concerne ao
relacionamento comunitário, pode optar entre configurar área interna para a gestão
das atividades e projetos inerentes e, também, criar organização formal para este
fim. No caso, organização sem fins lucrativos (OSFLs), uma associação civil sem
fins lucrativos, nomeada Instituto e, mesmo, Fundação, cujas peculiaridades foram
tratadas no início deste capítulo.
Considerando o escopo das reflexões desenvolvidas, o foco de
atenção recairá sobre a OSFLs de origem empresarial (Institutos ou Fundações),
que são organizações pertencentes aos TS. Tendo em vista que as empresas
constituem o setor privado, importa esclarecer que elas não pertencem ao TS, mas
podem dele participar ativamente através do investimento de recursos financeiros e
materiais.
Com vistas à complementação do raciocínio registram-se três
pesquisas com a preocupação em elaborar estudos sobre a inserção das empresas
na área social levando em conta a RSE e que estão na fronteira do propósito das
presentes reflexões, mas, não receberão análises aprofundadas face aos objetivos
expostos de antemão.
A primeira, intitulada “A iniciativa privada e o espírito público: a
evolução da ação social das empresas privadas no Brasil” (IPEA, 2006), em duas
edições (2002 e 2006), pioneira na investigação do campo de ação social das
119
empresas (para dentro e fora da organização), a partir das respostas de 871
organizações pesquisadas, com um ou mais empregados, nas cinco regiões do país.
Um dos resultados indica que 69% dos respondentes desenvolvem ações sociais em
benefício da comunidade.
A segunda recebeu o nome de “Responsabilidade Social
Empresarial: panorama e perspectivas” (FIESP; CIESP, 2003), sendo realizada pela
Federação e Centros da Indústria do Estado de São Paulo (FIESP/CIESP). Pioneira
no formato de investigação, tendo como fundamento o modelo de gestão RSE e as
relações com os grupos de interesses. Foi desenvolvida no ano de 2003 e contou
com a resposta de 543 empresas (11,1% das empresas cadastradas no sistema
FIESP-CIESP). O resultado, vinculado à participação em ações sociais, demonstra
que 75,9% dos respondentes realizaram ações e/ou doações para a comunidade
nos 12 meses que antecederam a pesquisa.
A terceira, realizada pelo Instituto Ethos de Empresas e
Responsabilidade Social, Instituto AKATU de Consumo Consciente e IBOPE
Inteligência, recebeu o título de “Práticas e Perspectivas da Responsabilidade Social
no Brasil 2008” (INSTITUTO ETHOS; AKATU; IBOPE, 2009). Pesquisou a
implantação abrangente do modelo de gestão RSE e foi realizada a partir de 1.333
entrevistas, englobando três categorias de amostras de empresas: Brasil, filiadas ao
Instituto Ethos e listadas como uma das 500 Maiores & Melhores empresas da
Revista Exame23. Dentre os resultados apresentados, destaca-se o apoio a projetos
socioambientais nas comunidades, indicado por 27% dos respondentes.
O dimensionamento do extrato específico e quantitativo, que faz
referência à parcela do TS composta por organizações sem fins lucrativos de origem
empresarial, além da participação direta de empresas está contido no Censo GIFE24
(2012a), já citado no curso da presente tese. Esta investigação, que se ocupa das
organizações que materializam a esfera da relação com a comunidade, é realizada
bianualmente com as organizações associadas, sendo que os dados aqui
apresentados pertencem à versão de 2010, realizada com amostra de 102
associados (23 empresas e 79 Institutos ou Fundações).
23
Revista publicada pela Editora Abril com uma edição especial por ano. Faz análise das empresas e emite classificação pormenorizada.
24 O Censo GIFE se constitui em banco de dados de acesso livre à qualquer pessoa. Para tanto o pesquisador deve efetivar cadastro com designação de senha que possibilita a obtenção de qualquer informação. Assim, para que o leitor possa acessar os endereços da internet relativos ao Censo GIFE indicados na tese, será necessário possuir o referido cadastro.
120
Visando introduzir os dados que virão na sequência, cabe relembrar
que o GIFE congrega os investidores sociais privados cujo conceito que fundamenta
a atividade está assim explicitado: “Investimento social privado (ISP) é o repasse
voluntário de recursos privados de forma planejada, monitorada e sistemática para
projetos sociais, ambientais e culturais de interesse público.” (GIFE, 2012c). Este
entendimento foi construído em contraponto à ideia de doação que denota a
ausência de planejamento e objetivos no ato do fornecimento do recurso financeiro.
Em outras palavras, recurso doado com planejamento, gerenciamento, de forma
sistemática, na visão deste coletivo, é compreendido como investimento. Logo, não
existindo tais características, o recurso é doação, sem compromisso com a geração
de resultados sociais.
O Censo inicia exposição apresentando o tempo de existência das
organizações associadas. Por se tratar de base de dados online, foi possível arrolar
as informações específicas das associações (Institutos) e das Fundações, não
contabilizando aquelas relativas às empresas, pelas razões já explicitadas. A tabela
abaixo permite melhor visualização.
Tabela 18 - Ano de constituição das associadas ao GIFE
Faixas em anos
Número de associados
respondentes (Base 79)
% sobre o total
Até 10 anos 24 30
De 10 a 20 anos 29 37
De 20 a 30 anos 9 11
De 30 a 40 anos 3 4
De 40 a 50 anos 7 9
Mais de 60 anos 7 9
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir dos dados de GIFE (2012d, online).
A faixa compreendida entre 10 e 20 anos possui o maior porcentual
(37%). Ao adicionar a esta faixa o dado relativo ao extrato de até 10 anos, juntas,
correspondem a 67% do total das organizações respondentes indicando que a
maioria das associadas foi criada no período compreendido entre 1992 e o momento
atual. Pode-se inferir, com base no dado, que o processo de democratização, de
emergência da cidadania e do TS que impactou a sociedade, os movimentos sociais
121
e as ONGs de maneira geral, também favoreceu a expansão das ONGs de origem
empresarial.
Nas faixas seguintes, os números porcentuais são menos
expressivos, ou seja, 4% na faixa entre 30 e 40 anos e 9% para as faixas de 40 a 50
anos e com mais de 60. Entretanto, desmistificando a imagem de que a atuação
empresarial nas relações comunitárias é fenômeno recente, se observado o conjunto
formado pelas instituições que nasceram na há 30 e mais de 60 anos, nota-se o
porcentual de 22%. Não se pode desprezar a porcentagem dos associados ao GIFE
e atuantes desde 1952. Obviamente em menor número, presente em contexto
histórico diferente do atual, mas realizando ações no campo das relações
comunitárias, e ainda, ação social, expressão utilizada como sinônimo e de uso
frequente por leigos e pesquisadores (como aqueles que realizaram o estudo do
IPEA em 2006).
A presença territorial de seus associados e investidores sociais
privados é outro apontamento contido no Censo. Estão presentes em todo o país,
nos 26 estados e no Distrito Federal, sendo que a distribuição está representada
conforme o gráfico a seguir.
122
Gráfico 9 - Presença territorial dos associados ao GIFE (%)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir das informações de GIFE (2012g, online).
A presença dos investidores sociais pode ser analisada a partir de
três grandes blocos que designam faixas de porcentuais, sendo a primeira a que
aglutina valores acima dos 50%. Cabe frisar que cada respondente pode estar
presente com escritórios instalados ou projetos executados em vários locais.
Do total de associados, 80% indicaram atuação no estado de São
Paulo, destacando 24 pontos porcentuais acima dos estados cuja atuação dos
respondentes aparece imediatamente abaixo: Bahia e Rio de Janeiro com 56%. Na
sequência, Minas Gerais com 54%. Estes quatro estados compõem o espaço de
maior presença das ações do TS de origem empresarial.
O segundo bloco, pertencente à faixa entre 50% e 30%, engloba 16
estados e o Distrito Federal. São eles: Paraná com 49%, Rio Grande do Sul (48%),
123
Pernambuco (44%), Goiás e Santa Catarina (42%), Ceará e Espírito Santo (39%),
Distrito Federal e Pará (37%), Maranhão, Mato Grosso e Rio Grande do Norte com
34%, Mato Grosso do Sul, Piauí e Sergipe (34)% e Alagoas (30%). O terceiro e
último bloco, contendo sete estados, contempla Amazonas e Paraíba (29%), Amapá,
Rondônia e Tocantins com 25%, Roraima com 20% e Acre com 19%.
Corroborando as análises da FASFIL (IBGE, 2008), a presença do
TS de origem empresarial acompanha a distribuição populacional, sendo que o
estado de São Paulo, o primeiro em população com 21,63% (IBGE, 2012d, online), é
o primeiro estado em concentração com 80% dos associados presentes. Pequenas
diferenças são observadas, nos estados pertencentes ao primeiro bloco, quanto à
correlação entre a presença de associados versus população. Rio de Janeiro é o
terceiro em população e o segundo em presença do TS de origem empresarial.
Bahia, terceiro em presença de associados ao GIFE e o quarto estado em
população, e Minas Gerais, segundo em população e quarto em associados da
entidade.
Observando alguns estados do último bloco, têm-se o Tocantins, 24º
em população e 25º em presença de Fundações e Institutos empresariais, Roraima
ocupando a 27º posição em habitantes e a 26º em presença do GIFE e o Acre, 25º
em distribuição populacional e última posição em termos de entidades do TS de
origem empresarial.
Parte dos analistas e consultores que atuam no campo de ação
social de origem empresarial advoga que os investidores sociais privados, para
ampliar o sucesso de suas intervenções na área, deveriam manter estreita relação
entre suas ações e o ramo de atividades das empresas vinculadas. O Censo do
GIFE traz dado nesta área indicando que, na verdade, esta orientação não é
absorvida pelos referidos investidores. Ao perguntar aos associados quanto ao
direcionamento das ações, 44% responderam que parte delas é, enquanto 38 %
indicaram nenhum vínculo e 18% vínculos de alguma ordem.
O número dos respondentes que indicaram a inexistência de
vínculos (38%) demonstra a independência entre a organização e sua mantenedora.
Este dado se justifica pelo fato de que as organizações do TS (OTS) possuem
direção, gestão, processo decisório e planejamento independentes, qual seja,
embora tenham vínculos com a entidade empresarial, possuem agenda e ações
orientadas por outras finalidades.
124
Outro dado que materializa essa independência, além de
caracterizar a intervenção, é a dimensão dos critérios utilizados pelos investidores
sociais privados para a definição de suas ações. A pesquisa indicou que 75%
utilizam indicadores econômicos e sociais, enquanto 66% observam critérios de
vulnerabilidade social. Outros critérios também utilizados: demandas colocadas
pelas comunidades do entorno (44%), localidades vizinhas às instalações da
organização e da empresa (38%), critérios sobre o grau de organização comunitária
(28%), critérios baseados no mercado de trabalho (19%), demandas identificadas
pelos colaboradores da empresa (15%), motivação pessoal —
filantrópica/humanitária/religiosa etc. — (13%) e indicadores de oferta de serviços
públicos (10%).
Ao analisar o conjunto dos critérios apresentados, pode-se afirmar
que as ações promovidas pelo TS de origem empresarial definem suas realizações
por indicadores econômicos e sociais. Identifica, ainda, níveis de vulnerabilidade
social e oferta de serviços públicos, ouvindo demandas das comunidades do
entorno, das suas bases e localidades vizinhas. Observa o grau de organização
comunitária, mercado de trabalho e questões ressaltadas pelos funcionários das
organizações. Este conjunto de fatores denota a utilização de mecanismos que
permitem construir diagnósticos da realidade e atenção à qualidade das ações que
realizam. Cabe destacar que apenas 15% se utilizam de critérios vinculados às
questões de motivação pessoal dos seus dirigentes, desmistificando a ideia de que
as empresas realizam o investimento social privado (ISP) por questões
mercadológicas e aumento de seu faturamento.
O censo GIFE (2012g, online) examina também para que tipo de
organizações, ou projetos, os membros do GIFE investem os recursos de que
dispõem. As ONGs, organizações comunitárias e de base receberam 46% dos
recursos, os institutos e centros de pesquisa/universidades 11%, as unidades
educacionais/escola 11%, movimentos sociais 9%, centros culturais/museus 8%,
centros de saúde/hospitais 8% e centros de juventude 3%. Os dados revelam
diversidade no emprego dos recursos, corroborando os resultados de outras
pesquisas (FASFIL, PEAS e ABONG) já apresentadas e que sublinham a presença
das empresas e do TS de origem empresarial.
Em termos de beneficiários diretos das ações realizadas pelos
respondentes ao censo GIFE (2012g, online), os números demonstram diversidade.
125
Para 84%, os indivíduos/grupos de indivíduos (alunos das escolas públicas, jovens
em situação de risco, mulheres chefes de família, pessoas portadoras de deficiência,
moradores das comunidades próximas às unidades de negócio etc.) representam o
foco principal, enquanto 76% voltam-se a instituições não governamentais (ONGs,
associações beneficentes, redes sociais e comunitárias, escolas, universidades
privadas etc.). Profissionais de categorias específicas (professores da rede pública,
educadores sociais, gestores escolares, profissionais da área de saúde, assistência
social etc.) foram apontados por 57% dos respondentes, enquanto 43% declararam
ser a sociedade em geral (ações de comunicação, mobilização, advocacy, produção
de conhecimento, pesquisa etc.). Órgãos/serviços/programas no âmbito da
administração pública, ministério ou Secretaria da educação, da saúde, da
assistência social, universidades, escolas, hospitais, também foram apontados por
39% dos associados ao GIFE.
O modus operandi deste tipo de membro do GIFE, em particular os
Institutos e Fundações, está demonstrado no referido censo e em duas categorias:
execução de projetos próprios e financiamento de projetos de terceiros. A primeira
indica que o processo de elaboração, desenvolvimento e avaliação dos projetos fica
sob a responsabilidade do associado, conforme critérios já analisados. A segunda se
caracteriza pelo investimento de recursos financeiros e materiais em projetos já
existentes, desde que sob a responsabilidade das ONGs. Este é o ponto de conexão
com as demais pesquisas analisadas no âmbito deste estudo — FASFIL, PEAS e
ABONG que revelaram a presença dos Institutos e Fundações como financiadores
de ações sociais públicas. Na tabela a seguir observa-se o porcentual de
respondentes distribuídos por categorias, bem como apresenta as áreas de atuação
e não atuação das entidades respondentes.
126
Tabela 19 - Áreas de atuação das associadas ao GIFE.
Área de atuação
Não atua
nesta área (%)
Executa
projetos
próprios (%)
Financia
terceiros (%)
Apoio à gestão de organizações do 3º Setor 54 27 19
Assistência social 53 30 16
Comunicação 76 14 10
Cultura e Artes 41 38 22
Defesa de direitos 70 15 15
Desenvolvimento comunitário/de base 56 32 13
Educação 59 24 18
Esportes 71 20 9
Formação de jovens para o trabalho e/ou para
a cidadania
47 44 9
Geração de trabalho e renda 49 38 13
Meio ambiente 44 41 15
Saúde 62 23 15
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir das informações contidas no Censo GIFE (2012f, online).
Nota: Base de respondentes: 79.
São 12 as áreas correspondentes ao universo de atuação dos
associados que participaram do censo: apoio à gestão de OTS, assistência social,
comunicação, cultura e artes, defesa de direitos, desenvolvimento comunitário/de
base, educação, esportes, formação de jovens para o trabalho e para a cidadania,
geração de trabalho e renda, meio ambiente e saúde. Importante sublinhar que os
associados investem em todas as áreas, seja executando projetos próprios, seja
financiando projetos de terceiros. Neste contexto, observam-se as respostas que
apresentam porcentuais mais elevados de não atuação, caso das áreas de
comunicação (76%), esportes (71%) e defesa de direitos (70%). O censo não indica
razões e não traz análise qualitativa dos dados apresentados, tampouco discorre
sobre as razões para os números demonstrados. Por outro lado, tendo examinado a
independência existente na gestão destas organizações, em relação às
mantenedoras, e conhecidos os critérios de atuação, pode-se inferir que a não
atuação mais elevada nas áreas pontuadas não resulta de uma premissa padrão
qualquer. Advoga-se que há um conjunto de razões específicas para a não atuação
em cada uma das áreas citadas configurando terreno de estudos e pesquisas que se
127
ocupem em aprofundar sobre as áreas de participação de ONGs de origem
empresarial.
Examinando os porcentuais de participação e sua distribuição pelas
duas categorias, execução de projetos próprios e financiamento de projetos de
terceiros, observa-se que as áreas de atuação nomeadas formação de jovens para o
trabalho e para a cidadania (44%), seguida de meio ambiente (41%), geração de
trabalho e renda, cultura e artes, ambas com (38%), aparecem com porcentuais
mais elevados, indicando maior incidência de execução de projetos próprios. No que
se refere ao financiamento de projetos de terceiros, os maiores índices estão
vinculados à área de cultura e artes (22%), seguida de apoio à gestão de
organizações do terceiro setor (19%) e educação (18%). Apenas como dado a
destacar, entre as duas categorias, a área da cultura e artes aparece com
porcentuais elevados em ambas, indicando concentração tanto em projetos próprios
quanto investindo em projetos de terceiros.
Para concluir as reflexões a respeito das organizações do
Terceiro Setor (OTS) de origem empresarial, destaca-se o comportamento do
orçamento para Investimento Social Privado (ISP), fruto do censo realizado.
Antes, porém, necessário se faz a seguinte ressalva. Como já mencionado a
respeito do censo GIFE, os dados das empresas foram segregados do presente
estudo por pertencerem ao setor privado com finalidade lucrativa. Contudo, tem-
se claro que suas ações no campo do investimento privado também estão
orientadas para o espaço designado de TS. Sendo assim, exclusivamente na
análise sobre orçamento, somam-se as informações das empresas associadas ao
GIFE, respondentes do censo, ao conjunto das informações dos institutos e
fundações. Na tabela a seguir, poder-se-á observar os valores distribuídos em
faixas em três anos distintos.
128
Tabela 20 - Recursos financeiros para o ISP
Faixas de Orçamento (R$)
2008
2009
2010
Até 500.000 11 11 11
De 500.000 a 2.000.000 32 28 24
De 2.000.000 a 8.000.000 28 33 34
De 8.000.000 a 20.000.000 16 16 18
De 20.000.000 a 50.000.000 8 8 8
De 50.000.000 a 100.000.000 1 1
De 100.000.000 a 200.000.000 3 3 3
Mais de 200.000.000 3 3 3
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir de GIFE (2012e, online). Notas: Respondentes (Base 102).
‘
A tabela apresenta oito faixas de orçamento e o número absoluto de
respondentes com orçamento planejado. O primeiro destaque se refere às três
faixas iniciais de orçamento (até 500.000; de 500.000 a 2.000.000; de 2.000.000 a
8.000.000) que, juntas, abrigam a maioria dos respondentes (aproximadamente 70%
em cada um dos anos especificados). Em outras palavras, a maioria das
organizações respondentes ao censo indica que seus orçamentos para o ISP
figuram nas faixas assinaladas.
O segundo destaque deve ser dado para o aumento do ISP entre os
anos de 2008 e 2009. No primeiro ano, 32 respondentes indicaram pertencer a
segunda faixa (de 500.000 a 2.000.000), sendo também esta faixa aquela que reúne
o maior número de organizações. No segundo ano, 33 organizações figuram na
faixa superior (de 2.000.000 a 8.000.000), configurando-a como de maior
concentração de orçamentos disponíveis para o ISP.
Sublinha-se, adicionalmente, que o ano de 2009 seria, para alguns
analistas, um dos piores anos da economia brasileira face à crise econômica que se
alastrou pelo planeta nos anos anteriores. No entanto, não afetou os orçamentos
planejados de ISP no Brasil. O mesmo censo GIFE capturou também os orçamentos
realizados no ano de 2009 sendo que a relação "previsto" versus "realizado"
apresentou-se da seguinte forma: para a faixa compreendida entre 2.000.000 e
8.000.000, 33 respondentes planejaram execução e 34 realizaram orçamentos
contidos no mesmo intervalo.
129
Por último, embora os porcentuais sejam em menor escala, cabe
destacar os 31 respondentes em 2008, 30 em 2009 e 33 em 2010 que planejaram
orçamentos para ISP nas faixas compreendidas acima de 8.000.000 sendo que seis
acima de 200 milhões para cada ano que compõe o censo. Os valores não são
desprezíveis e apoiam o delineamento do conjunto das que compõem o censo. A
participação do setor privado com finalidade lucrativa, em conjunto com as OTS de
origem empresarial, não se limita ao financiamento de projetos (GOUVEIA;
DANILIAUSKAS, 2010) e avança no sentido da elaboração de diagnósticos,
planejamento das intervenções, fazendo opções metodológicas adequadas,
aplicando critérios técnicos, compondo, nos casos dos Institutos e Fundações,
equipes e orçamentos independentes, monitorando e avaliando resultados.
Qualquer estudo sério a respeito do TS, nacional ou internacional,
não deve deixar de apontar a presença do setor privado lucrativo e das OTS de
origem empresarial; indicando para os dirigentes das ONGs, lideranças, profissionais
e estudiosos, ocupados em refletir sobre este espaço (TS), que a cena
contemporânea integra diferentes olhares e origens. Desprezá-las, por qualquer
razão, parece um grande equívoco.
Até aqui, na presente tese, foi possível traçar as linhas que
caracterizam o TS, analisando as dimensões formalidade, pluralidade, esfera
jurídica, caráter associativo, financiamento e finalidades. Para apoiar tal
configuração, foi preciso analisar as principais pesquisas disponíveis, iniciando pelo
The Jonhs Hopkins Comparative Nonprofit Sector Project que investiga 36 países
incluindo o Brasil, passando pela FASFIL e PEAS, ambas as investigações
executadas pelo IBGE, o Panorama ABONG e o Censo GIFE. Todas as análises,
observações e reflexões designam as ONGs, das mais diferentes origens, que
atuam neste espaço chamado de TS (FISCHER, 2002), para a relevância do
desenvolvimento social, enquanto parte integrante da sustentabilidade da sociedade.
1.4 Gestão das Organizações Não Governamentais e Sustentabilidade
Como já refletido nas análises do capitulo anterior, a partir do final
da década de 1980, o Brasil presenciou o reflorescimento da democracia com a
promulgação da constituição cidadã, com o fortalecimento das organizações da
130
sociedade civil, da participação cidadã e emergência do Terceiro Setor (TS). Este
espírito de envolvimento e organização dos atores sociais, ao lado da abertura
política, constituiu-se em elemento facilitador do olhar da sociedade para as
questões nacionais.
Em paralelo, o país assistiu ao aumento das inquietações diante da
aceleração do crescimento econômico versus a capacidade da natureza suportar o
avanço do consumo. Tais preocupações, presentes nas esferas internacional e
nacional, resultam da combinação de diferentes eventos ocorridos em distintas
esferas da vida humana. Dentre eles, destacam-se: acidentes ambientais como o
ocorrido em Bhopal25, quando os cientistas confirmam o crescente volume de
emissão de CO2 na atmosfera terrestre; as mobilizações coletivas a partir das
Conferências da ONU (sobre o Meio Ambiente Humano, realizada em Estocolmo no
ano de1972; para o Meio Ambiente e Desenvolvimento, sucedida em 1992 e
conhecida como ECO-92; e sobre o Desenvolvimento Sustentável em 2012,
intitulada de Rio+ 20, ambas ocorridas na cidade do Rio de Janeiro); a pressão de
Estados nacionais cujas populações se tornam mais vulneráveis face aos eventos
climáticos; a crescente ampliação de espaços na mídia em geral dedicados ao
debate a respeito do papel de governos, sociedade e empresas frente ao conjunto
destas questões. Fatos como estes propiciaram a ascensão da agenda ambiental à
condição de tema global gerando a percepção de haver ocorrido um deslocamento
da atenção da sociedade do campo social para o ambiental, fazendo nascer o
vocábulo “socioambiental” cujo uso se torna frequente e busca assentar os debates
em torno da interlocução entres tais prioridades (VEIGA, 2007).
A riqueza mundial cresceu consideravelmente nas últimas três
décadas, sob os efeitos conjugados do aumento da produtividade e do processo
tecnológico. O modo de vida e o estilo de consumo sofreram transformações globais
e o projeto pela melhoria do bem-estar da humanidade, via modernização da
economia, ganha forma universal. Contudo, o modelo de desenvolvimento baseado
no crescimento econômico revelou-se profundamente desigual em ritmos diferentes
em todo o mundo, rumo ao progresso.
O professor Celso Furtado, possuidor de visão clara sobre os efeitos
do modelo de crescimento, alertava, em sua célebre obra “O Mito do
25
Acidente que ocorreu em 1984 e causou a morte de cerca de 3.000 pessoas na Índia, nas instalações da fábrica da Union Carbide.
131
Desenvolvimento Econômico” (1983), sobre os possíveis riscos que a elevação no
padrão de consumo haveria de trazer. Partindo do estudo intitulado “Os limites do
crescimento”26, comenta:
[...] os autores do estudo se formularam a seguinte questão: que acontecerá se o desenvolvimento econômico, para o qual estão sendo mobilizados todos os povos da terra, chega efetivamente a concretizar-se, isto é, se as atuais formas de vida dos povos ricos chegam efetivamente a universalizar-se? A resposta a essa pergunta é clara, sem ambiguidades: se tal acontecesse, as pressões sobre os recursos não renováveis e a poluição do meio ambiente seriam de tal ordem (ou, alternativamente, o custo do controle da poluição seria tão elevado) que o sistema econômico mundial entraria necessariamente em colapso. (FURTADO, 1983, p. 19).
O autor faz as suas considerações tendo como pano de fundo os
efeitos da revolução industrial e a cultura do consumo que já mostravam seu
potencial destrutivo face à ênfase da questão econômica em detrimento, por
exemplo, do meio ambiente. A afirmação sintetiza a corrente preocupação com os
recursos finitos da natureza e sua capacidade de viabilizar o desenvolvimento da
sociedade. Mostra, adicionalmente, a inseparável relação entre a ação do homem e
a vida no planeta. Assim, ler a presente citação com olhos da segunda década do
terceiro milênio, no contexto pós-gestão do governo Lula e atual gestão Dilma, faz
emergir a mesma reflexão, em que pese o equilíbrio explicitado no discurso dos
governantes quanto aos objetivos de crescimento econômico, menos desigualdade
social e maior respeito aos limites ambientais.
Fatores como a progressiva expansão da capacidade produtiva, as
consequências desta expansão sobre o ser humano, a degradação ambiental sem
precedentes, a qualidade de vida e saúde afetadas pela poluição e estoque de
recursos naturais; fazem refletir, no momento presente, o desequilíbrio
socioeconômico mundial que caminha por entre as décadas. Semelhantes eventos
determinam novos olhares sobre a conduta humana. É o que Seiffert comenta
(2007, p. 5) ao afirmar que “[...] tal contexto induziu o ser humano a repensar seu
modelo de desenvolvimento calcado no crescimento econômico, o qual, até então,
vinha relegando a um segundo plano as questões ambientais.” A autora se alinha às
palavras de Furtado (1983), reforçando a predominância da visão cartesiana do
26
Do original em inglês The limits to growth, documento entregue ao Clube de Roma em 1972 e realizado por técnicos do Massachusetts Institute of Technology (MIT).
132
crescimento econômico em detrimento do cuidado integral com a fonte dos recursos
naturais e ignorando efeitos produzidos sobre o conjunto da sociedade.
A mobilização de setores da sociedade, atentos à progressiva
expansão da capacidade produtiva, com suas manifestas consequências sobre o ser
humano, a sensibilidade ao impacto da crescente poluição sobre a qualidade de vida
e a preocupação com a finitude dos recursos naturais, construíram as condições
para emergência do Desenvolvimento Sustentável (DS). Desta forma, o tema se
coloca de maneira crescente nos debates, ao mesmo tempo em que a ideia é
construída por diferentes setores da sociedade, colocando-se como condição
essencial para a humanidade.
Furtado (1983), em sua citação acima destacada, fez referência ao
Clube de Roma, um dos marcos iniciais da discussão sobre DS. A organização foi
criada em 1968 pelo industrial italiano Peccei e pelo cientista escocês Alexander
King que, junto a outros pensadores, cientistas e economistas, iniciaram estudos
sobre o impacto global da produção industrial. O relatório denominado “Os limites do
crescimento”, entregue em 1972 ao Clube de Roma, previa as tendências de
escassez de recursos naturais. No mesmo ano, acontecia a Conferência das Nações
Unidas sobre o Meio Ambiente, em Estocolmo, aglutinando 113 representantes de
países, 250 organizações não governamentais (ONGs) e diversas entidades da
Organização das Nações Unidas (ONU), cujo principal mérito foi introduzir a atenção
necessária à relação do homem com a natureza.
Em 1983, a ONU cria a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente
(CMMA), presidida pela médica, mestre em saúde pública e ex-primeira ministra da
Noruega, Gro Harlem Bruntland, razão pela qual ficou conhecida como Comissão
Brundtland, cujo documento publicado em 1987 recebeu o título de “Nosso Futuro
Comum”27. Este documento, o mais citado como marco do conceito de DS, aponta
as desigualdades entre as nações e a pobreza como as principais causas dos
problemas ambientais, culminando em grande preocupação para as gerações
futuras. Ao examinar o documento original, item 2728 (ONU, 1987, tradução nossa),
observa-se o modo como a expressão DS é inserida. “A humanidade tem a
capacidade para tornar o desenvolvimento sustentável e garantir que ele atenda as
27
Do original em inglês Our commom future. 28
Do original em inglês: Humanity has the ability to make development sustainable to ensure that it meets the needs of the present without compromising the ability of future generations to meet their own needs.
133
necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de
suprir suas próprias necessidades.”
O relatório da CMMA, na verdade, faz uma afirmação ao indicar que
humanidade (todos nós, portanto) possui a capacidade de dar ao desenvolvimento o
adjetivo “sustentável” e, para tanto, sublinha a necessidade de estabelecimento de
compromissos que acolham todas as possibilidades de entendimento sobre o que
venha a ser “sustentável”. Scotto, Carvalho e Guimarães (2007, p. 8) apontam para
este caminho crítico: “Ocorre que a noção de desenvolvimento sustentável e a
própria ideia de sustentabilidade são, mais de que conceitos homogêneos e bem
delimitados, campos de disputa sobre diferentes concepções de sociedade [...]”;
ainda que, no relatório, a CMMA utilize a palavra “deve”, ou seja, que o DS se torne
um principio orientador para todos os países membros da ONU, sociedades,
empresas, governos e instituições.
O desafio é de grande magnitude. O fosso das incongruências, das
coisas que não se adaptam, das vicissitudes que se manifestam no curso das ações
humanas, das idiossincrasias, dos projetos institucionais foram responsáveis e
trouxeram o planeta até aqui. Isto posto, expressa, de alguma maneira, o
entendimento dos membros da comissão e a articulação dos países membros. São
elementos que colocam ingredientes adicionais na complexa relação entre o ser
humano e seu meio ambiente, entre os modelos de desenvolvimento e a capacidade
de Estados e sociedades efetivarem a sustentabilidade.
Neste contexto histórico importa destacar, ainda, a Conferência das
Nações Unidas para o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CNUMAD), oficialmente
designada pela expressão “Cúpula da Terra” e conhecida como ECO-92, reunindo
na cidade do Rio de Janeiro mais de 100 chefes de Estado. Dois fatos relacionados
à conferência merecem ser sublinhados.
Primeiramente, nesta reunião foram aprovados vários acordos
internacionais como Convenção da ONU sobre a Diversidade Biológica, a
Convenção da ONU de Combate à Desertificação em Países (ONU, 2012a), a
Declaração do Rio sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Declaração de
Princípios para a Gestão Sustentável de Florestas e a AGENDA 21(ONU, 2012b).
Este último preconiza um plano de ação conjunto e participativo entre diferentes
setores da sociedade, no sentido do enfrentamento das questões socioambientais.
134
Seiffert (2007) dá destaque à declaração mencionada e a outro documento
resultante da referida conferência, demonstrando seu impacto em diferentes áreas.
Dois importantes resultados desta conferência foram a Agenda 21 e as normas da série ISO 14.000. Ambos são instrumentos valiosíssimos para a gestão ambiental. Enquanto a Agenda 21 permite uma atuação em nível macro, através do estabelecimento de diretrizes gerais, para processos de gestão em nível federal, estadual e municipal, as normas da série ISO 14.000 apresentam importante função de um contexto micro, em nível organizacional. (SEIFFERT, 2007, p. 16).
Segundo afirmação da autora, a combinação virtuosa de dois
documentos possibilitou o fortalecimento da gestão ambiental. Esta pontuação
permite fazer referência a um instrumento de gestão pertencente ao universo das
empresas, pautado pelas discussões ocorridas na reunião ECO-92, e que surge
para dar padrão e certificar atividades de gestão ambiental por parte destas
organizações. Neste sentido, abre-se breve parêntese para esclarecimento.
A International Organization for Standardization (ISO) foi fundada em
Londres, no ano de 1946, por 25 delegações de engenheiros civis, a fim de facilitar a
unificação de padrões industriais. Conta, nos dias atuais, com 164 países e mais de
3.000 organismos técnicos em todo o planeta, sendo percebida como a maior
organização no desenvolvimento de normas internacionais voluntárias, cuja marca
alcança 19.000 já formuladas (ISO, online). Tais normas são classificadas em séries
de acordo com sua natureza. Dentre as mais conhecidas, estão as normas da série
ISO 9.000 e que tratam da gestão da qualidade nos diversos campos, como
materiais, produtos, processos e serviços.
Em 1993, um ano após a conferência no Rio de Janeiro, nascia a
norma da série ISO 14.000, atualmente presente em mais de 140 países. As
organizações que a adotam devem desenvolver política ambiental, investigar os
aspectos ambientais inerentes ao processo de produção ou prestação de serviço
realizado pela empresa; bem como verificar as obrigações legais e voluntárias
aplicáveis. Devem, ainda, possuir um sistema de gestão e submeter-se à série de
auditorias internas periódicas e externas; além da elaboração de relatórios para a
alta gestão. Tais compromissos e ações correspondem ao campo da gestão
ambiental destas organizações, destacado por Seiffert (2007). Marcam, ainda, a
presença do setor privado, com finalidade lucrativa na execução de ações voltadas
para a relação entre a atividade econômica e o meio ambiente. Estes
135
esclarecimentos e apontamentos não pretendem servir de defesa das atividades
empresariais, mas, tão somente de indicação histórica do crescente envolvimento
destas organizações com a temática ambiental.
O segundo fato a ser sublinhado refere-se à participação das
organizações não governamentais (ONGs). Criado na década de 1990, em São
Paulo, o Fórum Brasileiro das ONGs e Movimentos Sociais, como preparatório para
a reunião que ocorreria em paralelo à ECO-92, intitulada de Fórum das ONGs,
marcou posicionamento crítico frente ao conceito de DS. Na análise deste coletivo,
antes de tornar o desenvolvimento sustentável é fundamental lutar por uma
sociedade sustentável e pela compreensão de que pobreza, fome e demais
problemas sociais não são enfrentados unicamente pela via econômica, assim como
destacam Scotto, Carvalho e Guimarães (2007, p. 48):
Os debates da sociedade civil, após criticarem o acento desenvolvimentista do conceito, buscaram diferenciar sua posição, demarcando uma nova preocupação que é com a sustentabilidade da sociedade, mas do que com o desenvolvimento. Desta forma, buscavam apontar para o sujeito social da sustentabilidade e não apenas para o desejo de duração de um modelo de desenvolvimento.
A ênfase no ser humano, sujeito deste processo, marca os debates
no âmbito do Fórum, realizados até a conferência, sendo mantida por seus
integrantes após o evento e nas reuniões que se sucederam a ECO-92. Se na
reunião de Estocolmo lograram-se os esforços em estabelecer visão clara sobre a
relação entre a vida humana e o meio ambiente, a ECO-92 configurou grande
mobilização para além dos Estados nacionais e delegações de países, viabilizando
que diferentes atores sociais refletissem sobre os desdobramentos na elaboração do
modelo de desenvolvimento vigente. A mesma reunião também avançou no
estabelecimento de acordos, compromissos e documentos que tornaram exequível a
articulação entre atores da sociedade, Estados e empresas.
Fechando o parêntese e retomando a linha do tempo, cabe menção
a outros fatos importantes no âmbito do esforço global, ocorridos ainda nos anos
1990. O primeiro é a reunião Rio+5, ocorrida em 1997, interessada na retomada do
documento elaborado durante a Eco-92 e ocupada em avaliar a implementação da
Agenda 21. O segundo refere-se ao Protocolo de Kyoto, proposto por ocasião da 6ª.
Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudanças
136
Climáticas, em 1997, no Japão, e assinado por 18 países. Independentemente de
nações com expressão econômica no mundo terem se recusado a assiná-lo,
inegável reconhecer a importância deste acordo no que tange a fixação de metas de
redução da poluição e o empenho global gerado no entorno de tal documento.
Na virada do milênio, no mesmo contexto histórico, outros dois
documentos convergiram esforços e engajaram diferentes setores da sociedade,
além de Estados nacionais. Tratam-se do Pacto Global29 e Metas do Milênio. O
primeiro foi iniciativa do então secretário geral da ONU, Kofi Annan, que buscou
mobilizar as empresas nas áreas dos direitos humanos, trabalho, meio ambiente e
combate à corrupção (ONU, 2012c). O documento foi assinado por mais de 8.700
empresas e por altos executivos pertencentes a 130 países. No Brasil, o órgão
responsável pela mobilização foi o Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade
Social, posteriormente integrando a recém-formada Rede Brasileira Pacto Global
(PACTO GLOBAL REDE BRASILEIRA, online).
O segundo documento foi assinado por 189 países, firmando o
compromisso de combate à pobreza, entre outras questões. A chamada “Declaração
do Milênio” deu origem aos “Objetivos de Desenvolvimento do Milênio” (ODM) que,
por sua vez, estabeleceram metas a serem cumpridas até 2015 (PNUD, 2012), de
acordo com oito quesitos: redução da pobreza, ensino básico universal, igualdade
entre os sexos e autonomia da mulher, redução da mortalidade infantil, melhoria da
saúde materna, combate ao HIV/AIDS, malária e outras doenças, garantia da
sustentabilidade ambiental e estabelecimento de uma parceria mundial para o
desenvolvimento. Este tipo de compromisso, que traduz de forma concreta metas a
serem atingidas, alinha-se aos debates realizados no âmbito do Fórum das ONGs há
pouco citado, pois materializam a busca pelo desenvolvimento sustentável,
engajando atores sociais na resolução de questões para além do plano econômico.
Ao longo da década de 2000, eventos vinculados à ONU mantiveram
os países membros mobilizados em torno do DS. Em 2002, ocorreu na África do Sul,
na cidade de Johanesburgo, a Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Sustentável.
Seu intuito era a conclusão de um inventário sobre os avanços e desafios
enfrentados pela ECO-92, bem como a abertura de espaço para análise de novas
questões. Neste mesmo evento, foram observados os compromissos no plano da
29
Do original Global Compact.
137
AGENDA 21 e debatidas metas e ações concretas para sua implantação. No ano de
2005, os países voltaram a se reunir nas Ilhas Maurício para tratar das condições
climáticas, elevação do nível do mar, resíduos sólidos, dentre outros temas, sob os
auspícios do Programa de Barbados das Nações Unidas (ONU, 2012a), aprovando
recomendações para sua realização.
Ao longo da referida década, a comunidade internacional se
manteve envolvida ora com os desdobramentos disparados pela conferência no Rio
de Janeiro, que gerou mobilizações de todos os atores da sociedade e a expansão
de ações nas esferas de governo, na sociedade civil, empresas e universidades, ora
com a agenda de discussões globais que foi ganhando destaque em vários setores
da mídia internacional, sem esquecer o fenômeno contemporâneo das redes sociais.
Reuniões como a Conferência das Partes30 (COP), em especial a COP15, realizada
em Copenhague (Dinamarca), no ano de 2009, quando o Brasil assumiu o
protagonismo. Como país em desenvolvimento e bem sucedido nas políticas
econômicas internas frente à crise internacional em curso na época, e diante do
reconhecimento global do patrimônio natural que possui, foi alçado a um papel
sobressalente.
Tal reunião recebeu, segundo Maria Cristina Frias (2009, online), da
coluna Mercado Aberto: “[...] um número recorde de empresários além de
ambientalistas e cientistas das outras reuniões [...]” e reforçou, definitivamente, a
entrada das empresas, enquanto atores sociais, nos colóquios e negociações a
respeito das condições climáticas e seus efeitos danosos sobre a natureza, no limite,
sobre a vida humana. Tal acontecimento responde ao anseio daquela parcela da
sociedade que compreende a necessidade de configurar conciliação,
indistintamente, entre todos os atores sociais.
Nesta mesma reunião, cabe destacar ainda, cinco princípios que
pautaram o evento (BRASIL, online): visão compartilhada, buscando pontos comuns
no que tange à meta global de redução das emissões e responsabilidades;
mitigação, visando definição de metas por países para a mesma redução das
emissões; adaptação, debate sobre o auxílio financeiro aos países pobres para lidar
com os efeitos das mudanças climáticas; transferência de tecnologia para os países
30
A partir de 1995, os signatários (partes) do documento “Convenção-Quadro das sobre Mudanças Climáticas”, organizado pela ONU, passaram a se reunir a cada ano. Para conhecer detalhes, ler Brasil (online).
138
em desenvolvimento propondo-se evitar os resultados já conhecidos dos modelos de
crescimento via aumento do consumo; e financiamento, com a criação de um fundo
com relevante contribuição dos países ricos para que países pobres e em
desenvolvimento possam estabelecer suas estratégias de mitigação, adaptação e
desenvolvimento tecnológico, com vistas ao desenvolvimento sustentável.
Outras Conferências das Partes (COPs) ocorreram na virada e
começo da década de 2010. A COP 16, efetivada em 2010, na cidade de Cancun
(México), e a COP 17, ocorrida em 2011, na cidade de Durban (África do Sul),
mantiveram as nações em constante articulação em torno das mudanças climáticas
e do protocolo de Kyoto.
O conjunto destes fatos, transcorridos ao longo da década de 2000 e
na virada para a década de 2010, foi fundamental para manutenção do tema
ambiental na agenda dos diferentes atores da nação. Tais fatos receberam particular
atenção da sociedade, mas, a Rio+20, ocorrida 20 anos após a ECO-92, em junho
de 2012, fez convergir os olhares do planeta.
Realizada na cidade do Rio de Janeiro, a Conferência das Nações
Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, à primeira com a expressão DS em seu
nome e conhecida com “Rio+20 – o futuro que queremos”, estampou em sua página
oficial na internet números expressivos: 45.381 participantes, delegações de 188
Estados-Membros, mais de 100 Chefes de Estado e de governos, além de 9.856
ONGs. (ONU, 2012d).
Tendo como documento base “O Futuro que Queremos – Rascunho
zero”, a conferência realizou debates ao redor de temas, tais como biodiversidade,
povos tradicionais, agricultura, pobreza, água, energia, cidades, oceano, mudanças
climáticas e economia verde. A discussão sobre este último objetivou a instalação de
modelos econômicos mais amigáveis ao desenvolvimento sustentável, sendo
pautada por documento elaborado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA), intitulado de “Rumo a uma Economia Verde: Caminhos para o
Desenvolvimento Sustentável e a Erradicação da Pobreza – Síntese para os
Tomadores de Decisão”.
Como ocorreu em eventos semelhantes, a Rio+20 foi acompanhada
pelas redes sociais na internet. Embora não se tenha indicadores que possam
mostrar a ordem de grandeza desta participação, pode-se considerar o episódio um
marco nesta conferência, corroborado pelos diferentes veículos de imprensa. A
139
Cúpula dos Povos, espaço de discussão e participação das ONGs das mais variadas
naturezas e finalidades, foi igualmente ativa assim como na ECO-92, repercutindo os
debates da conferência e sintetizando na “Declaração final da Cúpula dos Povos na
Rio +20” o conjunto das reflexões e consequente posicionamento. Com o mote
“Cúpula dos Povos na Rio+20 por Justiça Social e Ambiental – Em defesa dos bens
comuns, contra a mercantilização da vida” (CÚPULA DOS POVOS, 2012, online), o
documento expressa a crítica ao sistema capitalista, aponta a dívida ambiental e
indica a chamada economia verde como instrumento de mercantilização da questão
do meio ambiente.
Assim como a ECO-92, a Rio +20 assistiu a presença expressiva do
setor privado. Desta vez, uma área foi criada para levar os visitantes da conferência
Rio+20 à reflexão sobre o centro de atenção do conceito de desenvolvimento
sustentável. Intitulado de “Humanidade 2012”, o espaço aglutinou exposição em
diferentes lugares, promoveu debates, palestras e seminários, realizou shows e
reuniões diversas para um público superior a 210.000 pessoas (HUMANIDADE,
2012, online). A conferência se encerra em meio a críticas, ceticismo e moderação.
Críticas pela ausência de compromissos efetivos, ceticismo face ao confronto entre a
urgência do tema e a dimensão das mudanças, e moderação para olhos de quem vê
um processo em construção.
O Jornal “O Estado de S. Paulo”, em seu caderno especial sobre o
evento, estampa: “Documento fraco e decepção marcam o último dia da reunião
Rio+20” (DOCUMENTO..., 2012, p. H1). Para os setores da sociedade que
clamavam por definições rápidas e imediatas, como metas globais para a redução
da pobreza em países em desenvolvimento ou mesmo a diminuição de gases de
efeito estufa, houve frustração. Nada impede, entretanto, de ocorrerem ações locais.
Neste sentido, a mobilização da sociedade, Estado e de empresas é relevante e
aponta para o processo de construção de novas relações entre as dimensões
econômica, ambiental e social. A recente aprovação da lei sobre resíduos sólidos, a
atenção de diferentes setores durante a aprovação do código florestal, os avanços
na redução da pobreza, a ascensão de extratos sociais, o envolvimento crescente
das empresas no Brasil e grau de participação da sociedade civil organizada, os dois
últimos já refletidos no presente documento, são sinalizações inequívocas de
avanços locais. Aguarda-se, ainda, a efetiva construção de ações globais que
140
possam enfrentar os desafios que o desenvolvimento sustentável impõe a todas as
nações.
Na opinião de parte dos observadores, o Brasil deixou escapar a
oportunidade de se estabelecer enquanto liderança efetiva, também no que se refere
ao desenvolvimento sustentável, na medida em que optou por trabalhar com um
documento apontado como fraco e pouco ambicioso, pelo fato de não conter metas
claras, precisas e quantificáveis. De todo modo, apesar das manifestações
divergentes, segue o permanente esforço que as nações do planeta vêm
perseguindo ao longo das últimas décadas e que agora segue na esfera das
discussões da COP, cuja 18ª conferência, nomeada Doha Climate Change
Conference, ocorrerá em novembro do presente ano de 2012.
A percepção inicial a respeito do deslocamento da atenção da
sociedade do campo social para o ambiental, tratado no início deste capítulo,
mostra-se verdadeira. De fato, por todos os eventos listados ocorridos até aqui,
pelas negociações globais, mobilizações regionais e locais é justo considerar esta
ênfase. Por outro lado, a noção sobre DS também avançou no sentido de entender
que não há desenvolvimento ou sociedade sustentável se pobreza, fome, injustiça
social e degradação ambiental persistirem. A ideia contida no conceito DS impõe ao
conjunto da sociedade uma visão integral a respeito da vida humana, o ambiente
onde vive e as condições que lhe são dadas para viver. Em outras palavras, o
desafio não está em colocar o tema ambiental na agenda de nações e instituições
públicas ou privadas, mas em traduzir esta visão integral, contida na expressão DS,
em modelos e práticas públicas e privadas, de tal sorte que toda e qualquer ação
tenha a mesma orientação.
Entre a última década do século XX e a primeira década do século
XXI, observa-se que a expressão ‘sustentabilidade’ passa a figurar ao lado da
expressão ‘desenvolvimento sustentável’ (DS). Ela é incorporada na vida cotidiana
de diferentes maneiras, seja no discurso das autoridades constituídas, da academia,
das empresas, da sociedade civil e da mídia em geral. Um olhar rápido e desatento
sobre o uso daquele vocábulo admite a possibilidade de simples substituição e
considera que, seja por economia na pronúncia, seja por ensejar facilidade na
compreensão de seu significado, tal designação pode ser suficientemente
abrangente e genérica para servir a qualquer ocasião. Basta abrir um jornal, revista,
ouvir um programa de rádio ou de TV e logo o leitor, espectador ou ouvinte
141
observará a oferta de um produto sustentável por consumir menos recursos naturais
ao longo da sua fabricação, uma escola oferecendo curso que visa a
sustentabilidade da carreira, um serviço de frete que já não se faz com motocicletas,
mas com bicicletas, tornando o serviço sustentável.
Há faces nestes exemplos que, ao contrário de estimular o desejo de
compra dos produtos e serviços exemplificados, cria verdadeira dúvida sobre o
campo da sustentabilidade, suscitando a convicção de que se fosse fácil, então,
deveria ter sido assim deste o início. Há, entretanto, outra face, e que não pode ser
desprezada. Trata-se do sentido prático, da aplicação real, da tradução urgente de
algo que está no plano conceitual para o cotidiano da sociedade. Conforme indicado,
este segundo lado carrega um sentido positivo e revela o desafio contemporâneo de
transformar práticas e modelos ultrapassados em concepções atualizadas,
contemporâneas, alinhadas com o presente momento.
Nas conferências de organizações multilaterais, nas conversações
entre chefes de Estados, nos fóruns como a Cúpula dos Povos ou mesmo nos
debates de governos locais, o DS é tratado sob a ótica da dimensão política, visando
decisões de grande envergadura, definição de metas e compromissos de alta
complexidade. Neste ambiente a expressão DS parece predominar, enquanto no
cotidiano que envolve a sociedade, onde o tema se vincula à busca pela condição
sustentável, o vocábulo “sustentabilidade” se apresenta de forma mais recorrente.
Visto desta forma, pode-se inferir que, pelo fato da expressão DS se
materializar no palco do enfrentamento político e o vocábulo sustentabilidade,
utilizado pelo interlocutor que deseja demonstrar o domínio do concreto, reside aí
uma possível trilha de discernimento entre a esfera política e o campo de ação dos
atores que estão sendo convocados a materializar, de forma urgente, as mudanças
necessárias para dar perenidade a vida no planeta.
O economista Ignacy Sachs (2009, 2007a), polonês naturalizado
francês, que fundamenta seus estudos no conceito da ecossocioeconomia31, embora
não tenha sido o primeiro a trazer esta concepção, tem acompanhado o debate no
campo da sustentabilidade há longa data. O autor, que esteve presente na
conferência de Estocolmo em 1972, tem observado de forma privilegiada o
desenvolvimento humano ao longo das décadas e seus postulados são identificados
31
Trata-se de abordagem que combina crescimento econômico igualitário, bem-estar social e preservação ambiental. Tais postulados podem ser conhecidos em Sachs (2007b).
142
como a base sobre a qual se construiu o conceito de DS. Sua trajetória e visão
contribuíram para a formulação das cinco dimensões da sustentabilidade que todo
planejamento precisa levar em conta tendo em vista o desenvolvimento.
A primeira, entendida como criação de um processo de
desenvolvimento sustentado por crescimento subsidiado, visa construir um modelo
de civilização com maior equidade na distribuição de renda e de bens, em busca da
justiça social. Tal dimensão foi intitulada, por Sachs, de sustentabilidade social. A
segunda dimensão é a sustentabilidade econômica, cuja possibilidade se dá através
da alocação, gerenciamento eficiente dos recursos e da permanência de
investimentos privados e públicos. A análise valorativa sobre o desempenho
econômico deve ser considerada a partir de visão ampla e social e não por critérios
empresariais, localizados na dimensão microeconômica.
A sustentabilidade ecológica, terceira dimensão apresentada pelo
autor, propõe a utilização intensiva de recursos de diversos ecossistemas, freando o
consumo de combustíveis fósseis, de outros recursos e produtos esgotáveis ou
danosos à natureza. Propõe, ainda, atuar na redução drástica do volume de
resíduos produzidos pelo consumo da sociedade, bem como a diminuição das
emissões e da poluição via conservação da energia, preservação de recursos e
ampliação da reciclagem. O papel do Estado, além de estimulador de práticas
ecológicas mais adequadas, é atuar na normatização da proteção ambiental e
construir processos de gestão que permitam garantir as condições institucionais
adequadas.
A quarta dimensão, nomeada sustentabilidade espacial, considera
que não há sustentabilidade se não houver distribuição equilibrada entre o campo e
a cidade, contribuindo para a diminuição das grandes concentrações metropolitanas.
Por último, e não menos importante, figura a sustentabilidade cultural que considera
processos de modernização integrados a processos que proporcionem mudanças
culturais nas comunidades.
O mesmo autor sintetiza as múltiplas faces da sustentabilidade de
outra forma. “Trabalho atualmente com a ideia do desenvolvimento socialmente
includente, ambientalmente sustentável e economicamente sustentado. Ou seja, um
tripé formado por três dimensões básicas da sociedade.” (SACHS, 2007a, p. 22).
Na visão do autor, o desenvolvimento sempre tem como objetivo a
vida humana, o que denominou de “ético e social”, portanto includente. Este
143
processo deve encontrar respaldo nas condições ambientais e considerar que a
viabilidade econômica é condição necessária, mas não suficiente, destacando que
tal condição é, na verdade, instrumental e não fim em si mesmo.
A presente tese tem como eixo central de análise a gestão das
ONGs no conjunto das reflexões inseridas no Terceiro Setor (TS). Neste sentido,
abre-se breve parêntese para evidenciar a contribuição das organizações de
interesse público não estatal para a efetivação das políticas sociais públicas e a
sustentabilidade, a partir das reflexões de Sachs. Para tanto, propõe-se observar, de
forma articulada, as dimensões propostas pelo autor e as áreas de atuação
abordadas no capítulo anterior. A contribuição para sustentabilidade social apontada
pelo autor se manifesta nas diferentes organizações de luta pelos direitos civis, pelos
direitos humanos e pelas questões de gênero. Ainda, aquelas relacionadas com
abuso e violência sexual, direitos dos indígenas, das crianças e dos adolescentes,
dos portadores de necessidades especiais, dos homossexuais, do consumidor, nas
questões de desigualdade, exclusão social e justiça social.
Igualmente, as organizações que atuam na promoção e assistência
social com diferentes populações, as que atuam na saúde mobilizando recursos,
efetivando ações nas áreas da desnutrição, saúde reprodutiva, droga e alcoolismo,
doenças sexualmente transmissíveis, entre outras. Agregam-se a este raciocínio, as
organizações que atuam no apoio da educação formal e efetivação de iniciativas de
educação informal.
Ao se observar a sustentabilidade econômica como dimensão do
DS, deve-se destacar as iniciativas que estão no campo do microcrédito, no apoio ao
desenvolvimento rural e agrícola, fortalecimento de pequenos produtores, na criação
de oportunidades de trabalho e geração de renda, no desenvolvimento da
microempresa.
A dimensão sustentabilidade ecológica se efetiva nas contribuições
das organizações orientadas para as questões do meio ambiente, conservação da
natureza e biodiversidade, manejo de recursos naturais, recuperação de áreas
degradadas e reciclagem de materiais. A sustentabilidade espacial ocupa-se com
programas de melhoria habitacional, de gestão urbana e agrária, recuperação das
paisagens por meio de assessorias técnicas, ações de mobilização, conscientização
e disseminação de conhecimentos.
144
A sustentabilidade cultural, pontuada pelo autor como uma das
dimensões do DS, apresenta-se nas ações das organizações voltadas para as áreas
das artes em geral, cultura negra, cultura popular, cultura indígena, dança, literatura,
música, patrimônio histórico, teatro, entre tantas outras que buscam ampliar a
consciência humana sobre seu momento presente, sua memória histórica e seu
futuro.
O exame realizado no referido parêntese representa universo amplo
de participação de organizações do chamado TS que materializam as contribuições
para a sustentabilidade em seu sentido concreto e cotidiano. Tal visão integradora
das ações das ONGs e seu vínculo com o DS requerem breves apontamentos
adicionais. O primeiro faz referência direta ao próprio projeto de DS que deve ser
compreendido e construído pelo conjunto da sociedade. Sem clara definição a
respeito do modelo de desenvolvimento e das condições necessárias que
possibilitem a mesma sociedade ser efetivamente mais justa, permanecerá a dúvida
quanto à qualidade sustentável atribuída a ele, quem é seu beneficiário e de que
forma isto pode acontecer. Neste contexto, as ONGs desempenham papel relevante
ao se colocarem como espaço de efetivação de ações concretas do interesse
público não estatal, pois mobilizam e engajam atores sociais, possibilitam vivências,
confirmam visões, debatem critérios, contribuem para a identificação dos elementos
definidores da instalação do projeto de DS em suas diferentes dimensões.
O segundo se refere à qualidade das ações, em particular das
organizações de cunho social (SZAZI, 2001) voltadas para o interesse público
irrestrito e não só para coletivos específicos. É imprescindível que as ações se
orientem pela liberdade, autonomia, construção da cidadania, pela real
transformação da realidade, considerando cada indivíduo como sujeito de direitos, e
não somente individuo merecedor da benevolência que, embora necessária
pontualmente, pode fortalecer a relação de dependência.
Finalmente, destaca-se o campo da gestão social, evidenciado a
partir da reflexão sobre a atuação das ONGs e a relação com as dimensões da
sustentabilidade, cuja definição sobressai-se no apontamento de Carvalho (1999,
p. 19): “Quando falamos em gestão social, estamos nos referindo à gestão das
ações sociais públicas.”
Diante da emergência do TS e do exercício da esfera pública não
estatal, efetivada por organizações diversas e de múltiplas origens, torna-se
145
imprescindível alargar a consciência de tais atores institucionais quanto ao impacto das
ações que realizam, no sentido dado pela compreensão de Tenório (2005, p. 121):
[...] a gestão social deve ser praticada como um processo intersubjetivo, dialógico, no qual todos têm direito à fala. E este processo deve ocorrer em um espaço social, na esfera pública. Esfera onde se articulam diferentes atores da sociedade civil, que ora em interação com o Estado, ora em interação com o mercado, ora os três interagindo conjuntamente, vocalizam as suas pretensões com o propósito de planejar, executar e avaliar políticas públicas ou decisões que compartilhem recursos em prol do bem comum. Assim, entendemos gestão social como o processo gerencial deliberativo que procura atender às necessidades de uma dada sociedade, região, território ou sistema social específico.
O autor vincula gestão social, intersubjetividade e ação dialógica.
Senso comum, processos de gestão se realizam sob a égide de estruturas de poder
e hierarquia, não sendo compatíveis com os valores democráticos relacionados à
sociedade civil. Tal percepção nega, entretanto, a possibilidade da existência de
horizontalidade nas relações existentes no campo da gestão. Tenório, entretanto,
evidencia o diálogo e a intersubjetividade como características de um processo
possível e diferenciado de gestão, demarcando especificidades em relação a outros
espaços e estilos neste campo.
Descreve, ainda, o propósito da esfera pública como o local onde a
atuação ocorre orientada para as políticas públicas e compartilhamento de recursos
visando o bem comum. Com tal afirmação, Tenório deixa transparecer a ideia de que
o bem comum é objeto dos esforços de atores sociais com aquelas orientações e
conclui que a gestão social é processo deliberativo, cujo foco é o atendimento das
necessidades da sociedade ou de um sistema social específico. Vale frisar que,
embora a identificação das necessidades esteja implícita na concepção de gestão
social, sem a efetivação de processos adequados de diagnóstico, não há
atendimento. Ou seja, não há resultado quando a compreensão sobre as
necessidades citadas for inadequada, precária ou inexistente.
Sintetizando, as ONGs cujas ações estão orientadas para o
interesse público, não estatal, geram contribuições ao desenvolvimento sustentável
(DS). Tal condição se amplia na medida em que houver direção institucional aos
pilares da sustentabilidade, existência de projeto que articule esforços e recursos ao
DS, qualidade e abrangência das ações institucionais; além do efetivo atendimento
das necessidades da sociedade. Em outras palavras, as ONGs gerarão
146
contribuições na medida em que existirem processos horizontais de diálogo, direção,
diagnóstico, projeto, qualidade e resultado.
1.4.1 O Campo da Gestão
Todos os componentes citados pertencem ao campo da gestão e,
antes de refletir sobre esta temática no ambiente das ONGs, faz-se necessário
esboçar algumas linhas introdutórias a respeito da referida área de conhecimento.
De maneira geral, observa-se que o emprego do vocábulo ‘gestão’,
na contemporaneidade, é frequente e não se restringe a um ambiente específico.
Com presença destacada no universo das empresas privadas, assiste-se à sua
utilização nas diferentes áreas de conhecimento e práticas profissionais, seja na
academia, nas três esferas de governo, na sociedade civil ou em qualquer setor de
atividade humana, como nos esportes, cultura, saúde, educação e religiões. Com
esta abrangência, difícil escapar ao seu uso também na dimensão das organizações
que integram o Terceiro Setor (TS), no caso, as ONGs.
A utilização em larga escala não significa, entretanto, que a
expressão contenha significado universal, ou suficientemente abrangente, a partir do
qual se possa admitir a existência de compreensão uniforme sobre ele por parte de
todos que a utilizam. Neste contexto, torna-se prudente situar alguns pontos,
visando configurar um quadro de referência que auxilie a compreensão sobre a
temática da gestão. Inicia-se pelo campo da definição. Amiúde, o verbo ‘gerir’ é
utilizado em sentido diverso de outro vocábulo: ‘administrar’. Entretanto, o dicionário
da língua portuguesa indica o mesmo teor para ambos os verbetes. Se ‘administrar’
significa “[...] gerir, governar, reger (negócios particulares ou públicos).”
(MICHAELIS, online); ‘gerir’ significa “[...] ter gerência sobre; administrar, dirigir,
gerenciar, governar, regular.” (MICHAELIS, online). Pequenas diferenças podem ser
notadas, mas o sentido primário designa a mesma atividade.
Ao longo da história da administração, diferentes ênfases
sustentaram a ação de seus protagonistas. A racionalidade identificada com o
campo da aplicação de instrumentais técnicos e com a rigidez de métodos neles
contidos, marcaram a fase inicial desta área de conhecimento, tendo como expoente
147
o engenheiro Frederick Winslow Taylor (1856-1915) e suas contribuições para a
escola de administração científica32.
Embora a origem desta escola de pensamento esteja distante no
tempo, ela permanece viva até os dias atuais por sua aplicação prática em diferentes
setores da atividade humana. Seus postulados, outro modo, não produzem efeitos
universais que possam marcá-la como única referência da ação de administradores
profissionais ou de todo e qualquer profissional que ocupe posição compreendida no
campo da administração. O estudo em tal campo compreendeu a relevância e
contabilizou as contribuições da administração científica para os seus fundamentos,
circunscrevendo-os a aplicações específicas e a referências históricas33.
Na medida das mudanças na sociedade e de entendimento sobre a
realidade das organizações, outra lógica passou a se destacar. Sem perder a origem
histórica, o conhecimento sobre a ação da administração avança para um estágio
muito além da simples aplicação de técnicas e instrumentos, notabilizando o ser
humano dentro de um conjunto mais amplo de variáveis. Com este espírito, gerou-se
a necessidade de marcar diferenciações entre a atividade do administrador, centrada
32
A expressão “escola” é utilizada para significar um conjunto de estudos, conceitos, princípios, elementos e visões que formatam um modelo de pensamento e que se pode multiplicar em termos de aplicação, corroborando a construção de um determinado conhecimento. Neste caso em particular, a administração científica compreende estudos de vários outros autores, mas reconhece-se a obra “Princípios da Administração Científica” de autoria de Taylor (1911) como um dos principais fundamentos.
33 Outras teorias e autores vieram após os postulados da administração científica conforme sistematização de Chiavenato (1987): Teoria Clássica (Fayol); Teoria da Burocracia (Weber); Escola de Princípios de Administração (Fayol); Escola das Relações Humanas (Mayo e Lewin); Teoria de Sistemas (Bertalananffy; Kast e Rosenzweig); Teoria Sociotécnica (Emery e Trist); Teoria Neoclássica (Drucker); Escola Comportamental da Administração (McGregor; Likert; Argyris); Escola do Desenvolvimento Organizacional (Bennis; Schein); Teoria da Contingência (Lawrence; Lorsch). A fronteira que demarca as escolas e teorias é construída considerando o conjunto de postulados, pressupostos e visão de homem que as compõem. Algumas se contrapõem entre si nascendo da crítica ao modelo proposto, como é o caso da administração científica (atenção preponderante à tarefa e especialização) e a escola de relações humanas (atenção preponderante ao fator humano sem, contudo, superar os princípios da administração científica de Taylor). Outras adicionam elementos sem necessariamente contrapor os pressupostos, assim como a administração clássica que traz elementos complementares a administração científica, formando, ambas, a abordagem clássica da administração. Forma adicional de diferenciação entre as escolas e teorias é concebida situando a ênfase que cada postulado sustenta. Exemplificando: a administração científica de Taylor explicita ênfase nas tarefas, enquanto a administração clássica de Fayol e neoclássica de Peter Drucker enfatizam a estrutura do trabalho e da organização. Seguem-se as seguintes ênfases adicionais: nas pessoas (Teoria das Relações Humanas, comportamento e desenvolvimento organizacional); no ambiente (Teoria Estruturalista e neoestruturalista) e na tecnologia (Teoria da Contingência e as discussões mais recentes no contexto da sociedade da informação). Por último, cabe destacar que muitas são as áreas de conhecimento que contribuíram com o desenvolvimento das bases conceituais que formam as escolas, abordagens e teorias da administração. Entre elas estão sociologia, psicologia, economia, direito, antropologia e educação.
148
no tecnicismo e aquela que contempla, em maior grau, outros elementos, tal qual o
papel do fator humano e sua interação com a tarefa, materializando a expressão
contida na definição da língua portuguesa: governar. Em certa medida, o vocábulo
‘gestão’, ao ser empregado, busca aproximar-se de um significado mais
contemporâneo, fato que não ocorre quando da utilização da expressão
“administração”. Em síntese, embora tendo sentido partilhado, estas expressões
diferem uma da outra pelo exercício daquele que promove a ação, hoje
frequentemente denominado gestor.
Realizadas as devidas considerações a respeito do campo que
envolve a definição e uso do vocábulo ‘gestão’, propõe-se avançar na composição
do quadro de referência e dos seus elementos constituintes. O segundo campo
refere-se ao estudo da “[...] administração de empresas e demais tipos de
organizações do ponto de vista da interação e interdependência entre cinco
variáveis principais” (CHIAVENATO, 1983, p. 9): tarefas, estrutura, pessoas,
tecnologia e ambiente.
As tarefas dizem respeito às ações a serem realizadas no âmbito da
organização. Enquanto estrutura, correspondem ao conjunto de cargos e
responsabilidades que permite a realização das ações de forma organizada, bem
como a existência de recursos materiais e financeiros para sua realização. Os temas
que envolvem o trabalho humano, como condições físicas do local de trabalho,
treinamento, remuneração, saúde do trabalhador, o atendimento a legislação
pertinente, relações de trabalho entre colegas e gestores, mobilidade e carreira
interna, avaliação do desempenho nas funções definidas, atendimento a familiares,
compõem a variável “pessoas”. Tecnologia compreende métodos, processos e
técnicas utilizadas na realização das ações organizacionais de qualquer natureza,
enquanto ambiente abrange tudo que se coloca no ambiente externo à organização,
seja no campo da relação com a sociedade, Estado, organismos multilaterais,
nacionais ou internacionais, seja no campo da relação com o mercado consumidor,
concorrentes, fornecedores. Enfim, tudo que pode gerar impacto na atividade da
organização ou ser impactado por ela.
Ao longo do tempo, resultante das reflexões inseridas pelas teorias e
escolas de pensamento da administração que capturaram as mudanças da
sociedade, observam-se alterações no grau de importância das variáveis citadas, no
que concerne à orientação dos processos de tomada de decisão das organizações.
149
Em outras palavras, assim como a realização da tarefa determinou a atenção dos
gestores, na primeira metade do século XX, as variáveis “estrutura” e “pessoas”
passaram a integrar, em grande medida, as mesmas decisões.
O processo do conhecimento, que se apresenta dinâmico e
acumulativo, é o mesmo que impõe às organizações maior atenção à variável
“ambiente”, evidenciada pelas questões aqui debatidas; sejam elas a função social
da propriedade privada, a responsabilidade social da empresa, o investimento social
privado, maior relacionamento com stakeholders externos ou a sustentabilidade,
para citar, apenas, os temas de gestão debatidos com maior destaque no momento
atual.
Refletido sobre a definição e variáveis, segue-se para o terceiro
campo que compõe o quadro de referência proposto: funções ou atividades
gerenciais. Inicialmente, sublinha-se que a expressão ’gerencial’ não designa
atividades exercidas apenas por profissionais que ocupam cargos de gerente,
embora, habitualmente, esta associação seja observada. A atividade de gestão não
é responsabilidade de uma posição específica na estrutura34 da empresa e pode
estar distribuída entre vários cargos num volume maior do que a existência de
gerentes na organização. Assim, todos os cargos que contenham responsabilidades
de coordenação de pessoas (o que implica em orientar e avaliar o trabalho
realizado), de análise e decisão sobre quaisquer processos organizacionais ou de
planejamento, sinalizam atividades gerenciais. Em suma, todos os gestores realizam
atividades de natureza gerencial, mas, os cargos que ocupam podem ser distintos.
Para elucidar as atividades realizadas pelo gestor, propõe-se
examinar a natureza gerencial indicada e que, para Nogueira (2002, p. 118), “[...]
compreende as funções de planejamento, organização, direção e controle.” O ato de
planejar significa não apenas prever, fixar objetivos, estabelecer compromissos e
planos de ação, mas também antecipar-se a situações e problemas, o que exige
elevado grau de entendimento sobre uma dada realidade, fruto de diagnósticos
adequadamente elaborados.
34
A palavra estrutura está sendo empregada, neste caso específico, para referenciar a composição de cargos de uma organização. A imagem mais recorrente para demonstrar a estrutura é o organograma, instrumento que permite observar a composição dos cargos, as relações de hierarquia e subordinação, bem como determinar o nível das responsabilidades. Exemplo: cargos posicionados em nível elevado na estrutura possuem responsabilidades correspondentes.
150
Enquanto ação de natureza gerencial, a organização deve
assegurar, também de forma adequada, a alocação dos recursos materiais e
financeiros existentes, definir responsabilidades, bem como as atribuições, alinhando
as competências humanas às atividades, a fim de atingir os objetivos propostos. No
que se refere à direção, a atividade compreende a coordenação dos esforços no
sentido de atingir aquilo que se propôs e, para tanto, estimular o desempenho
humano, conduzindo os esforços de todos os envolvidos. Finalmente, a atividade
“controle”, implica em verificar o estágio de desenvolvimento, comparar o que foi
concluído com o que foi planejado.
Cabe destacar que as funções gerenciais, portanto da gestão,
ocorrem de maneira contínua e ininterrupta. Assim, após o planejamento, seguem a
organização, direção e controle. Verificando-se diferenças entre o planejado e o
realizado, e conhecidas as razões que impediram sua conclusão, espera-se que o
gestor aja de forma corretiva, alterando o plano e retomando o desenvolvimento da
ação. Este movimento da gestão, dinâmico e cíclico, foi percebido e popularizado
por William Edwards Deming,35 com o nome de Ciclo Deming ou Ciclo PDCA36, sigla
que tem origem nas ações gerenciais: planejamento (P), desenvolvimento (D),
Controle (C) e ação corretiva (A).
O presente destaque se justifica, salvo melhor juízo, pela percepção
de que gestores e organizações promovem esforço considerável na elaboração de
um plano exequível, mas deixam de revisitá-lo ao longo do processo de execução, o
que provoca constrangimentos sequenciais não promovendo os devidos e
necessários ajustes tendo em vista os resultados esperados. Com tal postura, o
documento se transforma em papel sem valor, perdendo a característica de
instrumento orientador face ao seu afastamento da realidade em pauta.
O quarto campo que integra o quadro de referência sobre os
elementos que compõem a gestão, diz respeito aos níveis de desempenho.
Esclarecida a dinâmica da ação gerencial, explicitada pelo ciclo PDCA, pode-se
avançar no sentido da compreensão sobre o cotidiano do gestor, marcado pela
necessidade de monitorar e avaliar diuturnamente a utilização dos recursos, bem
como o alcance dos objetivos e o cumprimento de metas.
35
Professor universitário norte-americano que na década de 1950, após a realização de estudos e pesquisas no Japão, foi reconhecido mundialmente pelos trabalhos na área da qualidade.
36 Sigla do original em inglês: Plain (P), Do (D), Check (C) e Action (A).
151
Na medida em que o profissional da gestão se ocupa em analisar a
relação existente entre as atividades realizadas e os recursos utilizados para tal,
estará refletindo sobre o primeiro nível de desempenho: eficiência. Portanto, a
palavra-chave que orienta a análise sobre este nível é ‘recursos’ e compreende a
dimensão dos processos como campo de análise. O estudo sobre a melhor forma de
se fazer algo, a busca por metodologias mais adequadas de trabalho e o
dimensionamento qualificado dos recursos são exemplos de questões que envolvem
este nível de desempenho.
O segundo nível de desempenho exige que o gestor monitore e
avalie o alcance do objetivo proposto e, ao fazê-lo, estará observando a eficácia. A
palavra-chave é ‘resultado’ e a pergunta chave da eficácia: ‘é a coisa certa?’. Ao
ocupar-se da definição precisa dos objetivos, da análise sobre os fatores que
garantem impactos positivos sobre as atividades, da gestão sobre as questões que
influenciam negativamente o processo de execução das atividades, o profissional
responsável pela gestão atuará sobre o campo da eficácia. Assim, a atuação da
gestão está vinculada à definição e avaliação constante de indicadores que
permitam acompanhar, de maneira concreta, o desempenho, seja das pessoas
envolvidas, seja da organização.
Outro elemento a considerar, e ainda em relação ao quadro de
referências, refere-se ao emprego da expressão ‘estratégia’. De múltiplos
significados e variando de conotações negativas a positivas, seu uso foi incorporado
por diferentes atores, reforçando a presença do campo da gestão em qualquer área
de atividade humana.
No dicionário da língua portuguesa (MICHAELIS, online) encontram-
se três definições: “Arte de conceber operações de guerra em planos de conjunto;
ardil, manha, estratagema; e arte de dirigir coisas complexas.” A ideia de ardil
sugere ação que objetiva causar algo a alguém e cujo benefício o ator espera colher,
enquanto pensar estratégia como operações de guerra sugere artifício de um plano
maior de conquista. Tal definição recupera a origem militar da expressão e, talvez
por isso mesmo, seu uso possa fazer emergir percepções e sentimentos
contraditórios. Contudo, a terceira definição traz concepção superior, afirmativa e
mais nobre ao traduzir o termo como a arte de dirigir coisas complexas.
No campo de atuação da gestão, a expressão ganha significados
adicionais. A estratégia pode estar associada a um plano quando indica a
152
propriedade de documento altamente importante, seja pelo processo de sua
elaboração, informações nele contidas, técnicas de diagnósticos, tomada de decisão
e pela capacidade de sintetizar o pensamento da cúpula da organização,
qualificando-se como instrumento orientador da organização.
O uso do vocábulo pode também designar ações especificas cujo
valor para os resultados ganha elevada dimensão. Exemplificando. Quando a
organização aspira atingir determinado resultado, e o empenho da equipe de
trabalho é imprescindível para este fim, uma campanha de comunicação assertiva e
constante torna-se a estratégia mais indicada.
No ambiente das organizações é igualmente frequente a indicação
do termo ’estratégico’ quando em referência aos níveis organizacionais (estrutura)
ocupados por profissionais de cargos mais elevados, como altos executivos ou
dirigentes; o que inclui a posição de presidência, sendo ocupada por profissionais ou
acionistas. Por último, outra associação recorrente é o uso relativo ao tempo
dedicado ao foco de atenção. Em outras palavras, na medida em que a organização
passa a focalizar a dimensão futura, três, cinco ou nove anos à frente, a ação recebe
a conotação “estratégica”.
A análise dos diferentes significados atribuídos à palavra estratégia,
abre espaço para sublinhar seu uso indiscriminado, também observado no cotidiano;
em particular, naquelas situações interessadas em atribuir valor superior a certa
escolha em detrimento de outra. Ao intitular uma dada ação como estratégica
espera-se que os interlocutores a identifiquem como algo diferenciado, com valor
superior a outras no conjunto das questões colocadas.
O emprego indistinto, e por vezes acrítico, da palavra ‘estratégico’ é
recorrente no cotidiano, oposto ao que se espera do profissional de gestão que tem
propriedade para considerar seus diferentes sentidos. Assim, considera-se o plano
como estratégico, a ação estratégica, o debate estratégico, a gestão estratégica e o
resultado estratégico, na medida da real importância destas operações para as
organizações e o conjunto de atores envolvidos. Em outras palavras, o gestor pode
afirmar que algo é efetivamente estratégico quando a ação apresenta relação com
os objetivos tidos por superiores, ou seja, com o resultado esperado e que se
materializará no plano futuro: curto, médio ou longo prazo.
Como último componente do quadro de referência sobre gestão,
inclui-se a sustentabilidade. No início do presente capítulo, foram discutidas as
153
determinações para o uso da expressão como condição prática de implantação do
desenvolvimento sustentável (DS); além de pontuar sobre o crescente envolvimento
das empresas com tais temáticas. Assim como o tema da responsabilidade social
empresarial (RSE), igualmente já debatido no presente documento, a
sustentabilidade eleva-se ao patamar de estratégico para o campo da gestão.
Na busca de melhor tradução, para o universo das organizações,
dos pressupostos contidos na concepção de DS, sistematizadas pelo Relatório
Brundtland (ONU, 1987), interpretadas por Sachs (2007b), Scotto, Carvalho e
Guimarães (2007), Seiffert (2007) e Veiga (2007), e que viabilize a efetiva
materialização, John Elkington, sociólogo britânico, consultor de empresas e
fundador da organização de consultoria SustainAbility37 desenvolve o conceito de
sustentabilidade tendo como base três pilares (ELKINGTON, 2001).
Com visível aproximação ao trabalho de Sachs (2007b), mas com
discurso voltado para o ambiente das empresas e organizações, é reconhecido
como precursor do conceito triple botton line38 (TBL) que, em tradução livre, significa
três níveis de resultado.
Ao longo da história da gestão, e para não dizer ainda presente, a
prática de avaliação da organização empresarial pela linha de resultado econômico
financeiro tem se mostrado como a opção de caminho mais recorrente de gestores,
dirigentes e acionistas. Elkington (2001) contrapõe-se ao pensamento presente e
formula entendimento ampliado sobre resultados de qualquer organização,
considerando o DS e propondo avaliação segundo os três pilares: econômico,
ambiental e social.
No pilar econômico, o autor reflete sobre a questão do lucro,
indicando novas perspectivas de análise sobre custos, produção, serviços,
planejamento em longo prazo, capacitação para profissionais da área contábil com
foco na sustentabilidade, formação de indicadores, ampliação da transparência das
informações e uso de relatórios com vistas à compreensão mais ajustada com
respeito ao resultado econômico financeiro.
37
O autor nomeia a empresa fazendo um jogo de palavras. Em tradução livre sustain significa sustentar enquanto ability significa capacidade.
38 A expressão botton line tem significado específico na atividade empresarial. De uso frequente,
designa linha de cálculo de qualquer documento que apresente as contas da atividade. Por exemplo: na atividade de verificação do resultado econômico financeiro da empresa, observa-se no balanço patrimonial, a linha de cálculo que demonstra o resultado final da operação. Neste caso aponta-se para o botton line financeiro.
154
No pilar ambiental, reconhece que organizações estão sendo
desafiadas nas questões ambientais, ora pelos impactos causados pela atuação, ora
pelo uso da riqueza natural existente. E propõe, ainda, novos valores, novos campos
de análise para gestores, visando incorporação de critérios que indiquem a
contribuição das atividades na área das emissões, manejo dos recursos ambientais,
responsabilização sobre o ciclo de vida integral do produto, padrões de produção e
políticas internas alinhadas com políticas públicas na área.
Elkington (2001) indica o pilar social como a terceira base do tripé da
sustentabilidade e reflete sobre a construção de indicadores que possam garantir
aos gestores, dirigentes e acionistas, adequado entendimento do resultado da
organização avaliada. As questões relacionadas à ética, ao tratamento da questão
social, aos direitos humanos, a equidade e justiça social, demandam significativo
aumento na capacidade critica de todos que atuam na dimensão da gestão, e ao
estabelecer a mudança de modelo de avaliação exclusivamente financeiro para o
olhar ampliado dos três pilares, refina os sistemas analíticos de resultados e se
aproxima da perspectiva concreta do âmbito do DS.
Em um contexto que combina conceitos em permanente construção
e a necessidade para demonstrar vínculo com ações no campo do DS, surge
expressão complementar que aplica a sustentabilidade ao universo das
organizações, atribuindo-lhes a ideia da sustentabilidade organizacional ou
corporativa. De conceituação imprecisa, a ideia começa a ser debatida em fóruns e
simpósios de diferentes áreas do conhecimento, indicando campo fértil para
pesquisas que se ocupam em demonstrar a sustentabilidade organizacional. No
quadro abaixo, apresentam-se duas visões acerca dos componentes deste conceito.
155
Quadro 6 - Componentes da Sustentabilidade Organizacional.
Delai e Takahashi (2008, p. 26) Munck; Munck; Souza (2011, p. 153)
‘Dimensão social’
Práticas trabalhistas e trabalho decente;
Gerenciamento do relacionamento com
consumidor; Cidadania corporativa;
Fornecedores e parceria; Setor público.
‘Subsistema: Sustentabilidade social’
Gestão do impacto das operações;
Desenvolvimento humano dos trabalhadores;
Adequado ambiente de trabalho; ambiente ético.
‘Dimensão ambiental’
Ar; Terra; Materiais; Energia; Água;
Biodiversidade; Produtos e serviços.
‘Subsistema: Sustentabilidade ambiental’
Viabilidade ambiental; Avaliação do impacto das
operações; Ecoeficiência.
‘Dimensão Econômica’
Relações com investidores; Investimentos; Lucro
e valor; Gerenciamento de crises.
‘Subsistema: Sustentabilidade econômica’
Competitividade; Oferta de empregos;
Lucratividade no longo prazo; Retorno
econômico suficiente.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir de Delai e Takahashi (2008) e Munck, Munck e Souza (2011).
Delai e Takahashi (2008), em trabalho que propõe a mensuração da
sustentabilidade organizacional, definem tal noção como resultante da aglutinação de
três dimensões: social, ambiental e econômica. Cada dimensão analisa práticas
organizacionais que viabilizam a operacionalização do conceito de DS para o contexto
organizacional, apontando a abrangência e multiplicidade de temas que requerem a
atenção da gestão. No caso de Munck; Munck e Souza (2011), os autores também
configuram o conceito como a aglutinação de três subsistemas, a saber:
sustentabilidade econômica, sustentabilidade ambiental e sustentabilidade social.
Há fontes comuns na lista de referências dos dois trabalhos como o
caso dos indicadores da Global Reporting Initiative39 (GRI) e do Instituto Ethos de
Empresas e Responsabilidade Social40. De maneira geral, se observa similaridades
entre as duas propostas, tanto no que se refere à composição do conceito quanto
39
Trata-se de modelo para relatório de sustentabilidade, criado pela organização britânica, em 2000, que possui o mesmo nome, resultando de processo de escuta de profissionais e grupos de interesse em vários países, incluindo o Brasil. Foi lançado no país em 2004 pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social e compreende a análise de 79 indicadores divididos nas três dimensões (social ambiental e econômico). Para detalhes acesse o portal Global Reporting Initiative.
40 Trata-se de instrumento de autoavaliação pelas organizações baseadas na conceituação sobre
responsabilidade social da empresa (RSE) e em sua materialização no ambiente organizacional. O documento é dividido em sete temas (valores, transparência e governança; público interno; meio ambiente; fornecedores, consumidores e clientes, comunidade; governo e sociedade), 40 indicadores de profundidade (estágios 1, 2, 3 e 4 da RSE), 294 questões binárias (resposta sim ou não) e 167 indicadores quantitativos. Para detalhes acesse o portal Instituto Ethos.
156
em relação aos seus componentes mais específicos recebendo, grosso modo, o
mesmo nome (dimensão e subsistema). Alguns componentes, dentre aqueles
constantes de um universo partilhado, podem ser destacados, bem como questões
sobre o poder público e a cidadania corporativa, explicitadas na dimensão social por
Delai e Takahashi (2008), ou retorno suficiente, indicado por Munck; Munck e Souza
(2011).
Destaques à parte, a breve análise indica que, com este ou aquele
título, as ideias expostas traduzem o conceito de sustentabilidade organizacional
como sinônimo em relação àquilo que Elkington (2001) ou mesmo Sachs (2007b)
traduziram por sustentabilidade. Por outro lado, é justo indicar que o modelo de triplo
resultado (econômico, ambiental e social), proposto por Elkington (2001), enfatiza a
relação de qualquer organização com seu ambiente externo na medida em que
coloca luz sobre o resultado que as organizações devem gerar. Diferentemente, a
analise dos autores, a partir do quadro 6, explicita a visão sobre as dimensões do
ambiente interno, basicamente ações localizadas no campo da gestão e aquelas que
determinam as condições organizacionais viabilizadoras da sustentabilidade. Desta
forma, é possível traçar uma delimitação entre sustentabilidade e sustentabilidade
organizacional.
Para encerrar o exame dos componentes contidos no quadro de
referência, propõe-se trazer o foco para o gestor: o profissional que opera no campo
da gestão. O tema, face à complexidade da natureza humana e das organizações
igualmente humanas, requer tratamento multi e interdisciplinar; além de sugerir
diálogos no campo da psicologia, sociologia e antropologia, a fim de viabilizar a
compreensão do ser humano em sua amplitude. A proposta inserida no âmbito da
presente tese é, entretanto, circunscrevê-lo no contexto de análise identificado no
interior do campo da gestão.
O estudo sobre o gestor, na literatura da referida área de
conhecimento, está frequentemente associado a diferentes perspectivas.
Considerando o papel do gestor frente à maneira de conceber a organização,
observa-se que o papel de controlador, presente na concepção da administração
científica do início do século passado, justifica-se pelo fato de que esta escola de
pensamento atribui valor importante ao controle do tempo e do movimento, inerente
a produção industrial.
157
Analisado sob a ótica da teoria das relações humanas, desenvolvida
por Elton Mayo, o gestor é inserido no campo de estudo da liderança e de sua
relação com o desempenho das equipes de trabalho em um contexto de valorização
do ser humano, contrapondo-se ao papel controlador descrito anteriormente.
Examinando a teoria da burocracia de Max Weber, observa-se que o estudo sobre o
gestor se insere na compreensão das relações de poder e autoridade. Na medida do
desenvolvimento das organizações, gestores alteram suas concepções sobre elas,
atribuindo à própria figura um papel atualizado. Ou seja, não mais o de controlador,
com ênfase no cargo que possui, mas como facilitador dos processos
organizacionais que culminam em resultados.
Em segundo lugar, pode-se observar o estudo sobre o gestor
levando em consideração seu papel frente ao grupo de trabalho. Nesta perspectiva,
a temática da liderança é colocada em toda a sua dimensão, seja na compreensão
sobre os estilos mais apropriados (autocrático, democrático ou liberal), seja nas
relações de hierarquia submetidas aos cargos e estruturas que configuram limites de
autoridade sobre as equipes. No esforço de viabilizar o melhor desempenho deste
papel, as organizações põem em curso, sistematicamente, programas de formação e
desenvolvimento dos profissionais na função da liderança, com vista à obtenção do
melhor desempenho possível.
Como terceira possibilidade de estudo, observa-se a presença do
tema “gestor” pensado a partir do exame de suas competências individuais para o
exercício de suas atividades. Surgem, neste contexto, os instrumentais de
mapeamento das áreas de conhecimento, habilidades e atitudes requeridas do líder;
outra forma utilizada para analisar a ação do gestor. Este esforço objetiva, como nos
estudos anteriores, vincular o desempenho deste profissional ao desempenho da
equipe por ele gerida.
Pensar o gestor frente ao tipo de organização, segmento e
características setoriais se constitui em uma quarta perspectiva de estudo. Nela
observam-se análises ocupadas com o estudo do gestor inserido, por exemplo, em
organizações lucrativas, organizações sem fins lucrativos e mesmo na esfera
pública. Independente do espaço de atuação, tais estudos vinculam a ação do
gestor à natureza dos resultados que a organização alcança.
Como observado até aqui, as reflexões que integram, de alguma
maneira, o universo que envolve o gestor, vinculam, de forma recorrente, o seu
158
desempenho aos resultados organizacionais. Entretanto, na última perspectiva a ser
explicitada, tal vínculo revela: pensar o gestor não em função da organização, mas
frente ao universo de demandas que se colocam no mundo externo à organização.
Esta abordagem se justifica face, principalmente, às analises
efetivadas sobre as variáveis contidas no quadro de referência da gestão, mais
especificamente sobre a mudança de concepção, da ênfase no ambiente interno
para valorização das questões que se colocam no ambiente externo.
Exemplo desta condição são as exigências que o tema da
sustentabilidade determina no universo das organizações quanto ao relacionamento
e escuta dos grupos de interesse que gravitam em seu entorno. Assim, pensar no
gestor como um profissional orientado para o ambiente externo, sem prejuízo de
suas responsabilidades e com atenção aos elementos que caracterizam o ambiente
interno, parece ser estágio desafiador e assunto de reflexão.
1.4.2 Gestão de Organizações Não Governamentais (ONGs)
No capítulo anterior, tratou-se de conhecer as diferentes
perspectivas de analise, origens e composição do Terceiro Setor (TS). Observou-se
a pluralidade existente e a dimensão de atuação das organizações, o que permite
inferir sobre a complexidade envolvida, seja na realização das ações, na garantia
dos recursos materiais e financeiros, nas competências humanas envolvidas, seja no
diagnóstico adequado das demandas sociais. Em última análise, cumpre atentar
para a gestão deste conjunto de variáveis.
As organizações são criadas por pessoas que se agrupam, visando
atingir determinados objetivos. Para defini-los, levam em consideração variáveis
múltiplas que permitem construir a visão sobre o caminho a percorrer. Pertence ao
conjunto destas variáveis o processo de tomada de decisão, que no contexto das
ONGs é realizado de maneira mais participativa que em outras organizações, o
diagnóstico a respeito das demandas sociais, as metodologias que serão efetivadas,
o engajamento da sociedade e voluntários nas causas trabalhadas, a formação de
equipe profissional que viabilize os objetivos, o financiamento das atividades, além
da avaliação do impacto social alcançado pela organização após a ação realizada.
No ambiente das ONGs, ouvem-se, repetidamente, indicações sobre
a necessária utilização do instrumental pertencente ao mundo da gestão das
159
organizações privadas com finalidade lucrativa (empresas). Assiste-se, igualmente,
ao exercício de aplicação de tais instrumentos, bem como a proliferação de eventos
de capacitação de profissionais que disseminam a coleção de técnicas disponíveis.
As iniciativas se articulam em torno do esforço de ampliar a
eficiência das organizações, contudo, como refletido até aqui, a gestão não se dá
apenas pela aplicação do arsenal de instrumentos e técnicas, mas através de
estudos mais amplos, envolvendo princípios e analises sobre o seus elementos
constitutivos. Assim, traçadas as linhas introdutórias sobre o campo da gestão,
propõe-se agora analisa-lo no contexto das ONGs e à luz do quadro de referências
construído durante reflexão anterior e ilustrado abaixo.
Quadro 7 - Quadro de referência sobre gestão
Definição
Variáveis de estudo da
gestão
(Tarefas, estrutura, pessoas,
tecnologia e ambiente).
Função gerencial
(planejamento, direção,
organização e controle).
Gestor
Níveis genéricos de
desempenho
Estratégias
Sustentabilidade
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral.
Em etapas precedentes, examinou-se o significado do vocábulo
‘gestão’ e depreendeu-se que as palavras ‘administrar’ e ‘gerir’ contém o mesmo
teor, com destaque para a expressão ‘governar’ que está presente em ambos os
casos. Para melhor situar a gestão das ONGs, amiúde mais direcionada para a ação
que para a aplicação de técnicas e métodos de gestão, propõe-se, primeiramente,
refletir de forma particular sobre sua definição.
Em que pese o uso do vocábulo ser frequente em todas as
instituições, cabe evidenciar aspectos relacionados à natureza das ONGs que
ampliam o sentido atribuído pela gestão às organizações não governamentais.
160
Nelas, por princípio, a associação entre pessoas visando atingir objetivos comuns e
decisões coletivas, mostra-se mais presente que em outras organizações, na medida
em que tais atores aderem, voluntariamente, à condição indicada e percebem-se
como um coletivo que luta pelo motivo ao qual aderiram.
Vinculado à expressão ‘governar’, há outro termo cuja utilização tem
se intensificado, em particular, nas empresas. Trata-se da ‘governança’ que, para o
Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) (2009, p. 19), consiste no “[...]
sistema pelo qual as organizações são dirigidas, monitoradas e incentivadas,
envolvendo o relacionamento entre Conselho, equipe executiva e demais órgãos de
controle.”
Este termo indica o envolvimento da alta direção41 da organização,
sejam dirigentes, executivos e membros de conselho, em outras palavras, de
pessoas que fazem parte da gestão. No caso das ONGs, na sua grande maioria, não
são encontradas divisões tão racionais como aquelas propostas pelo conceito. O
número de pessoas que poderiam ser intituladas como ocupantes de cargo de
gestão se mostra pequeno, excetuando, obviamente, as de maior porte, como
grandes fundações e organizações internacionais.
Independente da questão de cargos e porte das estruturas, a
expressão governança, nestas organizações, também é compreendida como a
complexa tarefa de distribuir o poder entre o conjunto de dirigentes (membros da
diretoria que figuram no estatuto e, eventualmente, dirigentes profissionais não
estatutários, membros de outros conselhos da organização), profissionais e grupos
de interesse, além de assegurar os devidos mecanismos de controle sobre a vida da
organização, visando o desempenho na sociedade (LAMBERT; LAPSLEY, 2010).
Aprofundar o tema não é tarefa das mais simples, dada a ausência
de informações sobre este campo específico e, para ilustrá-lo, retomam-se as
pesquisas analisadas no capítulo anterior. A FASFIL (IBGE, 2008), por exemplo, não
trata do assunto, limitando-se a indicar o número de pessoal assalariado ocupado. A
PEAS (IBGE, 2007b) avança identificando funcionários, terceirizados, estagiários,
mas sem analisar cargos de gestão.
41
A expressão é de uso frequente nas organizações privadas lucrativas (empresas) e designa a estrutura dos cargos; em particular, naquelas instituições que lançam mão de certa divisão hierárquica (organograma), visando distinguir cargos elevados daqueles de nível médio.
161
O Panorama Gouveia e Daniliauskas (2010) não chega a oferecer
detalhes sobre cargos e funcionários de seus associados. O censo GIFE (2012a,
online) explicita, apenas, o que chama de “Conselhos de Governança”, não tratando,
mesmo modo, de informar algo sobre a gestão. Apenas o Mapa do 3º Setor42
(CETS, 2005, p. 15) menciona o dado, indicando porcentuais de ocupação de
cargos de “Direção (14%) e Administração (10%) [...]”, além de outros vinculados ao
nível operacional.
Dois estudos adicionais, e que trazem contribuições novas à análise,
foram identificados. Primeiro, o trabalho de Coelho43 (2000, p. 123) cita pessoas que
ocupam os cargos “Direção geral (11,1%), Assessoria e coordenação técnica (6,3%)
[...]”. O segundo é o relatório de Merege44 (2009, p. 54) que também evidencia a
presença dos cargos de “Direção (21,03%) e Administração (25,93%) [...].” Cabe
destacar que os dados, mencionados na última pesquisa, utilizam a mesma
metodologia que o Mapa do 3º setor (CETS, 2005), uma vez ter sido conduzido pelo
mesmo centro de pesquisa e coordenado pelo mesmo pesquisador.
De toda maneira há, nas ONGs, estruturas de poder e
responsabilidades ditadas por assembleias de associados e por estatutos por elas
aprovados, muito embora a natureza da instituição exija que os processos
decisórios, de planejamento e de execução sejam efetivados a partir da participação
dos demais envolvidos. Por esta razão, o vocábulo ‘governar’ expressa, com maior
precisão, o campo da gestão neste ambiente, alertando os gestores para o fato de
que a prática deve estar sustentada pelo princípio da participação, agregando
sentido para além da aplicação de técnicas e procedimentos. Em síntese, governar
atribui valor superior e diferenciado à noção de gestão, especialmente, quando
examinado o universo das ONGs.
O segundo item do quadro de referência diz respeito às variáveis da
organização. O estudo sobre tais elementos embasa a prática dos gestores,
permitindo chegar a resultados de qualidade. São eles: tarefas, pessoas, estrutura,
tecnologia e ambiente.
42
A base de dados deste relatório consiste em 4.589 organizações brasileiras. 43
Trata-se de pesquisa comparativa entre 74 organizações brasileiras e 24 norte-americanas. O trabalho identificou o total de 1.708 pessoas que atuam nas organizações. Para detalhes, veja Coelho (2000, p. 123), tabela 1.
44 Trata-se de documento que sistematiza pesquisa intitulada “Censo do 3º Setor”, realizada no
município de São Bernardo do Campo, região metropolitana de São Paulo. O universo da pesquisa foi de 830 organizações sem fins lucrativos e identificou o total de 8.699 colaboradores distribuídos em diferentes categorias. Para detalhes, ver Merege (2009, p. 54), tabela 4.
162
Vale lembrar a opção, desde o início, pela utilização de
nomenclatura abrangente (ONGs), que contemplasse o TS enquanto campo de
estudo e permitisse a aglutinação, para efeito das reflexões em curso, de
organizações variadas, tendo entre elas as associações, as organizações de luta por
direitos, de Assistência Social e vinculadas a outros temas. O destaque serve para
sublinhar o seguinte: cada organização realiza atividades determinadas por
diferentes mecanismos, relacionadas aos planos de trabalho, projetos de
intervenção ou por políticas públicas, como no caso da Política Nacional de
Assistência Social (BRASIL, 2004).
Assim, as tarefas (ações) a serem realizadas têm origem nas
atividades (agrupamento de ações) que, por sua vez, vinculam-se à natureza de
cada ONG. Portanto, a efetivação das tarefas tem que ser precedida por estudos
que cabe ao gestor promover, considerando cada instituição, seus valores, objetivos
e o formato participativo na construção de seus planos de ação e processos.
Também a estrutura (relação entre poder e responsabilidades,
divisão de tarefas, cargos e relação entre cargos) requer entendimento específico.
Coelho (2000, p. 145), em suas observações gerais a respeito do estudo
comparativo realizado, comenta:
Na definição dos objetivos e na forma de atuação, há uma grande influência do diretor executivo, seja nas organizações americanas, seja nas brasileiras. Entretanto, tal influência é mediada pelos processos estabelecidos legalmente para a tomada de decisões (a existência de conselhos e assembleias), nos quais o líder tem que construir democraticamente um consenso interno. Embora o fenômeno seja comum a todo o universo pesquisado, ele ainda é mais evidente nas associações, onde, por terem uma estrutura mais formal e menos ativa, a atuação dos dirigentes “corre solta” e duas decisões são apenas referendadas.
O aspecto sutil presente nas considerações da autora, sobre a
influência dos dirigentes, relaciona-se com as características das burocracias45
preponderantes na sociedade brasileira, atribuindo, por vezes, excessivo valor
àqueles que detêm cargos elevados, subordinando cargos considerados inferiores.
Exemplificando, a expectativa colocada sobre presidentes de organizações,
45
Max Weber (1864-1920), intelectual alemão, jurista e economista, considerado o “pai da Sociologia”, estudou as relações entre economia e sociedade, construindo as bases de compreensão das burocracias, cujas características principais são: atividades determinadas, rigorosamente, por normas e procedimentos, hierarquia com regras objetivas e a divisão entre a função exercida e a pessoa que a exerce. Para detalhes, ver Motta e Vasconcelos (2002).
163
dirigentes e lideranças, de maneira geral, no sentido de acreditar que eles
desenlaçarão todos os nós, comprova visão burocrática e centralizadora do poder e,
porque não dizer, paternalista. Este comportamento, deslocado do contexto atual de
participação, reconhecidamente em curso, tanto na esfera publica quanto na
privada, persiste em boa parte das relações sociais, incluindo, obviamente, as
organizações integrantes de quaisquer setores.
No que refere à gestão no universo da ONGs, e considerando a
questão da governança, ponto central de sua definição específica, admite-se como
incompatível a centralização de poder. Do ponto de vista da variável estrutura, o
gestor deve, então, compreender, claramente, os aspectos que compõem a
identidade da organização, bem como as bases sobre as quais se estabelecem os
processos decisórios, visando estabelecer formas adequadas e compatíveis ao
propósito institucional e às expectativas da sociedade.
O apontamento realizado pela pesquisadora, relativo à influência do
diretor executivo, mostra-se relevante. Embora o estudo não tenha indicado
diferenciação, cabe sublinhar que o ocupante daquele cargo pode ser qualquer
pessoa dentre os membros da diretoria voluntária, cujos nomes figuram no estatuto,
bem como o próprio fundador da organização. Como a pesquisa foi realizada em
período anterior à promulgação da Lei das OSCIPS, é licito inferir que não se trata
de profissional contratado ocupando o cargo de diretor executivo, pois esta situação
não encontrava amparo legal até então.
A análise tem caráter de esclarecimento adicional, pois nas
situações em que o fundador (a) da ONG acumula os cargos de presidente e diretor
executivo, a influência citada se eleva, podendo adicionar ao ambiente da
organização elementos outros como carisma e representatividade da história
pessoal. Estas questões passam a ter valor simbólico importante na comunicação
entre profissionais e dirigentes, marcando também os processos decisórios da
organização. Coelho (2000, p. 114) destaca outra questão associada a este tema.
É preciso ainda apontar que a influência das lideranças, e muitas vezes a predominância do personalismo, foi observado tanto em associações como em ONGs, indiscriminadamente. Nas últimas, essa influência pode ser bem contrabalançada com uma estrutura interna de funcionamento mais rígida.
164
A citação evidencia a presença de traços observados nas lideranças
(profissionais e fundadores) que, quando presentes, aumentam o nível de
complexidade da gestão da organização. Para a autora, o personalismo, cujo
significado explicitado pelo dicionário da língua portuguesa corresponde a “Conduta
daquele que refere tudo a si próprio” (MICHAELIS, online), não está vinculado ao
tipo de organização. Logo, pode-se inferir que a referida característica está
visceralmente ligada ao indivíduo, neste caso, àqueles que ocupam tais posições.
Em que pese as ONGs possuírem a natureza coletiva, seus
processos internos, por vezes assimétricos, cooperam para que a participação não
se efetive.
O quadro é agravado quando pessoas vinculadas à organização não
se envolvem na rotina e nas ações realizadas, mantendo a gestão nas mãos de
poucos e favorecendo a manutenção de determinados dirigentes no comando
gestor. Diante de tal perspectiva, as organizações brasileiras se diferem das norte-
americanas, onde a atuação, em conselhos e assembleias, é percebida com maior
intensidade.
Prosseguindo com a análise sobre os itens que compõem o quadro
de referência, mais especificamente sobre as variáveis de estudo que sustentam a
gestão, sugere-se refletir sobre as pessoas. Ao tratar deste tema, relacionado ao
campo das organizações, rapidamente emerge o dimensionamento da força de
trabalho, além das questões relativas ao vínculo de trabalho, qualificação
profissional e presença de voluntários.
Na FASFIL (IBGE, 2008), as pessoas das organizações são
designadas como pessoal ocupado e seu número está distribuído por região,
conforme a Tabela 11 do presente documento. Na PEAS (IBGE, 2007b), o
agrupamento humano é nomeado força de trabalho e seus dados estão
apresentados na Tabela 13. No Gráfico 8, são exibidos os dados a respeito da
formação profissional.
As informações relativas aos profissionais que atuam nas ONGs
associadas não participam do estudo da Gouveia e Daniliauskas (2010). Buscou-se
no, portal da instituição, publicação relativa ao tema, sendo possível localizar a
pesquisa “ONGs no Brasil - Perfil das associadas à ABONG”, porém, no momento
da elaboração da presente tese, o material não estava disponível para acesso.
165
Com relação ao GIFE (2012h, online), são designados como
colaboradores. A investigação, cujos dados estão disponíveis em portal específico
que permite filtrar itens a pesquisar, possibilitou identificar informações das
organizações do TS de origem empresarial, que correspondem a 57 institutos e
fundações. Embora a pergunta46 dirigida aos associados busque identificar tipos de
colaboradores, e o título do quadro consultado no portal afirme esta intenção, as
informações não estão segregadas por tipo, impossibilitando compreender com
precisão o que foi demonstrado.
A investigação efetivada por Coelho (2000) possibilita leitura a
respeito da variável ‘pessoas’, sistematizada como quadro de pessoal, no contexto
da análise comparativa entre ONGs brasileiras e norte-americanas. Na tabela
abaixo, apresentam-se os dados.
Tabela 21 - Distribuição do quadro de pessoal - I
ONGs brasileiras ONGs norte-americanas
Função Nº % Nº %
Direção Geral 190 11,1 140 30,9
Assessoria e coordenação técnica 108 6,3 25 5,6
Educação 774 45,3 227 50,2
Alimentação e saúde 292 17,1 23 5,0
Serviços de administração 103 6,0 22 4,8
Serviços gerais e de manutenção 241 14,2 15 3,4
Total 1.708 100,0 452 100,0
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir de Coelho (2000). Nota: (1) No original os dados estão contidos na Tabela 1 (COELHO, 2000, p. 123) e Tabela 2
(COELHO, 2000, p. 124); (2) A somatória dos porcentuais relativos às ONGs norte-americanas totaliza, na verdade, 99,9%, embora a referência no original indique 100,0%. Para manter fidelidade ao documento pesquisado, decidiu-se manter a informação com a ressalva, por julgar que a diferença 0,01% se trata de arredondamento, não interferindo nas análises realizadas.
A primeira reflexão que os dados permitem realizar, considerando as
pessoas e o entendimento sobre a gestão das ONGs, vincula-se ao número de
ocupantes de cargos e como estes se distribuem, tomando como base o foco das
atividades. A pesquisadora dividiu-os em direção geral, assessoria e coordenação
46
“Do total de colaboradores, quantos são remunerados (próprios da organização ou cedidos pela empresa mantenedora) e quantos são voluntários?” (GIFE, 2012h, online).
166
técnica, educação, alimentação e saúde, serviços de administração e serviços gerais
e de manutenção. Assim, pode discriminar o número de pessoas cujas atividades
estão focalizadas no cumprimento dos objetivos da organização versus o número de
pessoas que ocupam cargos que auxiliam outros a atingirem resultados. Para
expressar esta distinção, chamou a primeira de ‘atividade-fim’ e a segunda de
‘atividade-meio’.
Com base nesta formulação, o número de pessoas na atividade-fim
(educação e alimentação, e saúde) corresponde a 1.066, ou seja, 62,41% do total;
enquanto na atividade-meio (direção geral, serviços de administração, serviços
gerais e manutenção) figura o número de 642, portanto, 37,58% do total. Nas
organizações norte-americanas têm-se na atividade-meio 44,69% e na atividade-fim
55,30% do total de pessoas.
Proporcionalmente, encontra-se, nas organizações brasileiras,
porcentual superior em relação às norte-americanas na atividade-fim (62,41% e
55,30% respectivamente). Consequentemente, na atividade-meio, as norte-
americanas registram 44,69%, índice mais elevado do que as brasileiras que, por
sua vez, registram o valor de 37,58%.
Coelho (2000) adverte que não há padrão para avaliar a relação
entre pessoas vinculadas com atividades-fim e atividades-meio, mas o
aprofundamento de estudos neste campo pode cumprir papel relevante na
identificação de eventuais discrepâncias existentes nas organizações.
Outra questão que os números permitem analisar diz respeito ao
porte da direção. Considerando o total de 1.708 pessoas nas organizações
brasileiras pesquisadas, 11,1% ocupam posições de direção, enquanto nas norte-
americanas aparece o índice de 30,9%. Embora, também para este caso,
desconheça-se a existência de padrão na composição da direção47, o dado revela
um tema que merece reflexão adicional. De maneira geral, as ONGs lutam por
recursos que viabilizem suas atividades e o porte de seus quadros guarda relação
com o volume de recursos financeiros disponíveis.
No que concerne à diretoria, vale frisar, voluntária, o desafio se
mostra presente na divisão de responsabilidades e na efetiva presença do dirigente
47
O estudo não discrimina quais cargos foram identificados pela pesquisadora e quais foram utilizados para gerar a categoria descrita (direção geral). Por esta razão, fica imprecisa qualquer comparação que faça referência aos cargos de diretoria contemplados no estatuto de qualquer organização e que vise concluir sobre a existência de tal padrão.
167
no cotidiano da entidade. Reforçando análises anteriores, com frequência, ouvem-se
dirigentes ressentidos da ausência de seus pares, resultando em acúmulo de
atividades sobre um diretor em particular.
Coelho (2000, p. 124), ao comparar o índice encontrado nas
organizações norte-americanas com as brasileiras, comenta a respeito da direção
geral naquelas organizações. “Além de possuírem mais participantes, os conselhos
diretores americanos são também mais atuantes [...].” A autora leva em
consideração a cultura própria das organizações norte-americanas quanto do
desenvolvimento de membros de conselhos diretores nos cargos que ocupam. A
existência da BoardSource Building Effective Nonprofit Board oferece nova visão
sobre a natureza das entidades norte-americanas. Criada em 1988 e focalizada na
qualificação de membros de conselhos de organizações sem fins lucrativos, afirma
em seu portal que “[...] apoia, treina e educa mais de 60.000 líderes de conselhos
sem fins lucrativos de todo o país a cada ano.”48 (BBENB, online, tradução nossa).
No caso brasileiro, o tema da capacitação de membros de diretoria e
conselheiros de ONGs não se constituiu em agenda de trabalho, seja pela ausência
de organizações assemelhadas ao BoardSource Building Effective Nonprofit Board
BBENB, seja pela importância do assunto dentre a lista de questões prioritárias que
fazem parte do dia a dia das ONGs, como a captação de recursos, por exemplo.
No Brasil, virada dos anos 1990 para 2000, algumas iniciativas
buscaram tratar das questões de capacitação de membros de conselhos diretores e
conselhos consultivos49. Para ilustrar, registram-se três exemplos deste movimento.
Primeiro, o GIFE analisou, por várias vezes, a abertura de programa de atividades
na área, que, por sua vez, não se viabilizaram.
Em segundo, o projeto de cooperação vigente no período de 1997 a
2002, entre organizações brasileiras e canadenses, o Grupo de Estudos do Terceiro
Setor (GETS), planejava, inicialmente, trocar experiências baseadas nas vivências
48
Do original: “[…] trains, and educates more than 60,000 nonprofit board leaders from across the country each year.”
49 Importa sublinhar que esta difere dos conselhos de participação estabelecidos na relação entre Estado e Sociedade Civil, como: Conselho Nacional de Assistência Social e outros. Aqui, o conteúdo refere-se, exclusivamente, aos órgãos de gestão das ONGs. Assim, o conselho diretor pode também ser intitulado de diretoria. A existência do conselho consultivo não é obrigatoriedade para a elaboração do estatuto que represente um órgão não deliberativo, reunindo-se uma vez por ano (de acordo com as estratégias de funcionamento das entidades), sendo formado por pessoas representativas na área de atuação da organização e que são convidadas para compor tal órgão e opinar a respeito de uma determinada questão.
168
que as ONGs de ambos os países possuíam. Resultaram deste projeto várias
dezenas de sessões de capacitações de ONGs brasileiras, intercâmbios entre
profissionais dos países em áreas como captação de recursos e metodologias
sociais, muito embora o desenvolvimento de membros de conselhos não tenha se
efetivado.
Publicações específicas elaboradas pelo BBENB, na época com o
nome de National Center For Nonprofit Boards (NCNB), que tratavam de temas
relacionados às atribuições de conselheiros como o papel do diretor executivo,
desenvolvimento de comitês e avaliação de membros de conselhos, foram
comercializadas no Brasil. O Instituto Fonte, organização especializada em gestão
de ONGs, chegou a desenvolver o tema e distribuir aquelas publicações, mas, em
visita à página na internet50, mantida pela organização, não foi possível identificar
qualquer publicação e informação relativos ao assunto.
Os exemplos citados sinalizam que os estudos necessitam
aprofundamento e compreensão por parte das ONGs. Por outro lado, cabe pontuar
que o tema da governança, em certa medida, liderado pelo Instituto Brasileiro de
Governança Corporativa (IBGC), que elaborou documento em parceria com o GIFE
sobre o tema das OSFLs, trata da relação dos dirigentes com os públicos de
interesse que estão no entorno das organizações. O crescimento deste assunto
poderá trazer contribuições significativas, podendo ser ainda maior se incorporar, de
fato, os conteúdos de formação de membros de conselhos de dirigentes e
consultivos das ONGs.
Retomando as análises sobre o quadro pessoal nas organizações,
três das pesquisas estudadas permitem fazer reflexões comparativas adicionais. A
PEAS (IBGE, 2007b), que identifica as entidades de Assistência Social no Brasil,
informa a existência de 519.152 pessoas nas 16.089 organizações pesquisadas. O
censo do 3º Setor (MEREGE, 2009), realizado na cidade de São Bernardo do
Campo (SBC) /SP, indica a presença de 8.699 pessoas nas 830 organizações51 que
fizeram parte da investigação e, por fim, o Mapa do 3º Setor (CETS, 2005), que
revela o dado de 143.579 pessoas nas 4.589 organizações cadastradas.
Importa apontar as diferenças entre as pesquisas citadas. Enquanto
a PEAS trata, exclusivamente, das organizações classificadas como entidades de
50
Para detalhes ver INSTITUTO FONTE PARA O DESENVOLVIMENTO SOCIAL (online). 51
O estudo identificou 769 organizações formais e 61 informais, totalizando 830 organizações.
169
Assistência Social (EAS) no Brasil, o censo do 3º Setor SBC tem abrangência
municipal e analisa a pluralidade de organizações contidas no Terceiro Setor (TS).
Já o Mapa do 3º Setor tem dimensão nacional e compreende, igualmente, o TS.
A PEAS (IBGE, 2007b) apresenta os dados relativos às pessoas nas
categorias funcionários, cedidos, prestadores de serviço, estagiários e voluntários. O
censo do 3º Setor (MEREGE, 2009) classifica os cargos em direção, administração,
captação de recursos, técnico-operacional, funcionários, comissionados prestadores
de serviço, voluntários e estagiários. O mapa do 3º Setor (CETS, 2005) utiliza as
seguintes denominações: comissionados, estagiários, funcionários, prestadores de
serviço e voluntários.
Dois aspectos impediram a construção de análise comparativa entre
todas as categorias citadas. Primeiro, o Mapa do 3º Setor (CETS, 2005) não traz
dados absolutos por categoria, somente em valores porcentuais. Segundo, não há
coincidência das categorias entre os três estudos. Mas, para viabilizar a reflexão
proposta, buscaram-se categorias comuns e a apresentação dos dados em
porcentuais. A tabela a seguir apresenta o resultado desta opção metodológica.
Tabela 22 - Distribuição do quadro de pessoal - II
Pesquisas
PEAS
(IBGE, 2007b)
(%)
Censo do 3º Setor
(MEREGE, 2009)
(%)
Mapa do 3º Setor
(CETS, 2005)
(%)
Funcionários 32,1 18,5 30
Prestadores de serviços 4,4 3,8 4
Estagiários 2,8 1,9 1
Voluntários 53,4 75,5 61
Fonte: elaborado por Roberto Galassi Amaral a partir das pesquisas mencionadas. Notas: (1) Os valores foram arredondados para uso de apenas uma casa decimal, exceto os dados
do Mapa do 3º setor (CETS, 2005) que na investigação foram demonstrados sem uso de casas decimais. (2) No original, ver Gráfico 10 IBGE (2007, p. 27), Tabela 4 em Merege (2009, p. 54) e Gráfico 7 em CETS, 2005, p. 15).
Observando as quatro categorias comuns aos estudos (funcionários,
prestadores de serviços, estagiários e voluntários), conclui-se que as organizações
do TS fazem uso das formas e vínculos no trabalho conhecidas no campo da gestão
das ONGs. O segundo aspecto diz respeito aos estagiários. Dentre os documentos
analisados, somente Merege (2009 p. 53) apresenta uma definição da categoria: “O
170
colaborador que desempenha função que o auxilia no seu aprendizado. A jornada de
trabalho normalmente é regular e a remuneração é pré-fixada”.
A definição sugere que o estagiário é, na verdade, profissional em
aprendizagem e que o colaborador responsável pela função é quem favorece o
desenvolvimento do estagiário. Esta definição representa a realidade conceitual que
norteia os programas de estágios nas organizações, mas não se pode afirmar que
seja a realidade objetiva, ainda que as entidades possuam políticas claras e
programas delineados para este fim. Diante das dificuldades, no que se refere ao
financiamento de suas atividades, e da eventual ausência de princípios de gestão
adequados, é possível ocorrer os mesmos equívocos observados no país, quando
da utilização destas pessoas na qualidade de ‘mão de obra barata’. Assim, mais do
que indicar números e composição dos quadros de trabalho, as pesquisas estimulam
a alcançar a identificação das políticas e práticas de gestão.
Os porcentuais apresentados constituem o terceiro aspecto de
análise. A tabela mostra equilíbrio, considerando as categorias e as três pesquisas.
Os valores não possuem grandes discrepâncias entre si nas quatro categorias,
exceção ao porcentual de funcionários. No PEAS, o estudo apresenta o dado de
32,1%, que se aproxima dos 30% informados no Mapa do 3º Setor. Entretanto, no
censo do 3º Setor em SBC, o valor cai para 18,5%. O documento produzido por
Merege (2009) não revela, de forma objetiva, as razões que poderiam justificar tal
porcentual e permite inferir, como uma das possibilidades, ser a marca resultante de
políticas de gestão específicas destas organizações, tal qual sinalizado ao final da
análise desenvolvida no parágrafo anterior.
O quarto e último aspecto observado na tabela 22, diz respeito à
presença relevante de voluntários (acima de 50% nos três documentos
apresentados). Com índices representativos como estes, é licito supor que os
documentos analisados dedicam espaço para interpretá-los, refletindo sobre
eventuais razões e discorrendo sobre a importância que, pelo volume, é tornada
notória.
Do ponto de vista quantitativo, cabe sublinhar que os três estudos
apresentam informações em graus diferentes, o que não deixa de indicar a
representatividade. No Mapa do 3º Setor (CETS, 2005), por exemplo, o dado
aparece apenas no Gráfico 9. Na PEAS (IBGE, 2007b), das 34 tabelas que
organizam os dados, apenas as Tabelas 9 e 10 incluem o tema e, no censo do 3º
171
Setor em SBC (MEREGE, 2009), de suas 15 tabelas, somente as de números 5 e 6
explicitam o assunto.
Do ponto de vista qualitativo, foram encontradas duas afirmações no
censo 3º Setor em SBC, contendo aspectos passíveis de serem estudados. Merege
(2009, p. 6) afirma que os números de voluntários apresentados estão “[...] indicando
uma extraordinária manifestação de cidadania por parte da população.” Com este
posicionamento, o pesquisador vincula a presença de voluntários ao exercício da
cidadania dos moradores do município de SBC.
A relação entre trabalho voluntário e cidadania é construção recente.
Surge no mesmo período de fortalecimento da ideia sobre o terceiro setor e em
contraponto à visão que vincula o nascimento da ação voluntária ao exercício da
benemerência e filantropia, como já examinado na presente tese. Posto desta forma,
Merege (2009) registra aquilo que se poderia chamar de impacto das ações de
mobilização e compreensão do conceito, ocorrido da segunda metade da década de
1980 em diante e que redundou na instalação de ambiente estimulador para o
trabalho voluntário.
Compreende este momento a instalação, em 1985, do dia
internacional do voluntário pela ONU, a criação, em todo país, de centros de
voluntariado, na segunda metade da década de 1990, especializados na
identificação, capacitação e colocação de voluntários em ONGs, além de identificar
entidades que necessitam de voluntários e apoiar com programas de capacitação na
gestão destas pessoas. Somam-se a estes eventos a expansão de projetos de
envolvimento das comunidades, a atenção de pesquisadores e órgãos de pesquisa
no plano nacional e internacional.
A segunda menção qualitativa, observada em Merege (2009, p. 54),
indica que,
Com relação ao total geral de colaboradores nessas funções [direção, administração, captação de recursos e técnico/operacional] a atividade de voluntariado é a que praticamente sustenta as atividades das organizações uma vez que do universo de técnicos (4.256 registros
52) 65,8% são
voluntários [...].
52
Na tabela 4 do estudo (MEREGE, 2009, p. 54), encontra-se o detalhamento do número referido na citação. Deste total, os demais registros da categoria técnico/operacional estão assim distribuídos: 1.101 (25,9%) são funcionários registrados, 7 (0,02%) comissionados, 232 (5,4%) são prestadores de serviço e 114 (2,7%) estagiários.
172
A preponderância da categoria fez com que o pesquisador se
dedicasse a explicação da relevância que o trabalho voluntário possui. Seu ponto de
partida foi, então, a expressão ‘sustenta’.
Do ponto de vista da gestão, tal grupo de pessoas demanda
cuidado, capacitação e avaliação, da mesma forma que os demais trabalhadores da
organização. A crítica à presença de voluntários nas organizações sugere
descompasso com a realidade e risco para as instituições.
A compreensão sobre a relevância apontada se amplia quando
observado que os trabalhadores estão distribuídos por organizações de vários tipos
de atuação. Apenas para citar as mais representativas, das 769 organizações
formais pesquisadas53, 185 (24,1%) foram classificadas na categoria Religião, 179
(23,35) em Assistência e Promoção Social, 154 (20%) Desenvolvimento Social e 118
(15,3%) como Cultura e Recreação. No conjunto, estas categorias citadas
representam 82,7% do total. Como se pode reparar, o trabalho voluntário contribui
de forma expressiva para maioria das organizações do município pesquisado,
assumindo importância para o campo da gestão e tornando-se questão para as
investigações.
Sobre as pessoas, pontua-se também a respeito da capacitação das
ONGs. Considerando, ainda, as três pesquisas analisadas neste item, o tema não foi
prospectado pelo Mapa do 3º Setor (CETS, 2005). A PEAS (IBGE, 2007b),
entretanto, inclui a questão em sua investigação, revelando os números54 indicados
a seguir. Do total de 16.089 EAS identificadas, 59% (9.493) responderam que há
capacitação para seus quadros e 41% (6.520) responderam que não. Das EAS que
responderam sim, as unidades da federação com porcentuais mais elevados de
organizações que realizam capacitação tem-se São Paulo, com 28,41% (2.697),
Minas Gerais com 12,95% (1.229) e Paraná com 12,07% (1.146).
A mesma pesquisa não realiza análises qualitativas a respeito dos
dados revelados, fazendo somente a indicação dos números. De todo modo, o dado
encontrado pelos pesquisadores, em 59% das EAS, afirma que a realização da
capacitação é atividade relevante. O estudo não evidência se tais números resultam
diretamente da execução da PNAS (BRASIL, 2004) e da ação da política de
53
Para detalhes, ver Tabela 8 em Merege (2009, p. 60). 54
Para detalhes, ver Tabela 10 em IBGE (2007, p. 60).
173
recursos humanos, conforme cita a Norma Operacional Básica de Recursos
Humanos do Sistema Único de Assistência Social (BRASIL, 2006, p. 12).
Integra a NOB-RH/SUAS uma Política de Capacitação dos trabalhadores públicos e da rede prestadora de serviços, gestores e conselheiros da área, de forma sistemática, continuada, sustentável, participativa, nacionalizada e descentralizada, respeitadas as diversidades regionais e locais, e fundamentada na concepção da educação permanente.
A análise demonstra a importância da existência de política de
gestão que direcione os esforços dos gestores para o alcance dos resultados
esperados pelas organizações. Entretanto sinaliza, também, que a capacitação
necessita ser priorizada pelo conjunto das entidades. Os dados apresentados
indicam que os estados de São Paulo, Minas Gerais e Paraná, juntos, concentram
as EAS que realizam atividades na área, impactando o nível de profissionalização
das instituições.
O Censo do 3º Setor em SBC (MEREGE, 2009) também examina o
tema da formação e treinamento das pessoas. A pesquisa revelou que, em
treinamento, as organizações investem apenas “[...] 0,2% do total dos desembolsos
[...]” (MEREGE, 2009, p. 72). Entretanto, o estudo examina este tema associado à
questão de captação de recursos e demonstra que as organizações pesquisadas se
ressentem das dificuldades de recursos financeiros para manter ativas as ações de
profissionalização, conforme aponta Merege (2009, p. 72):
Nas duas últimas décadas estas foram as áreas [captação de recursos e treinamento dos colaboradores] que mais se desenvolveram em nosso País para a formação e qualificação de profissionais nas universidades e institutos por meio de cursos e programas de educação continuada e de especialização. Porém, pelo fato destes cursos serem pagos e o preço ultrapassar a possibilidade financeira das organizações, elas são praticamente excluídas deste processo de qualificação de seus colaboradores. 86% das organizações quando indagadas na pesquisa de campo sobre suas principais solicitações no que diz respeito à capacitação e formação responderam que necessitam de acesso ao conhecimento nas áreas de gestão administrativa, gestão social, elaboração de projetos, planejamento e captação de recursos.
Em síntese, está demonstrada a presença de capacitação no âmbito
das ONGs. Contudo, a manutenção de programas com tal finalidade depende,
primeiramente, da existência de políticas de gestão que determinem diretrizes, à luz
do que ocorre com a PNAS e, em segundo lugar, dos recursos financeiros que as
174
subsidie. Já o Estado, como forma de tornar universal a prática da capacitação por
todas as organizações que recebem recursos públicos (municipal, estadual e
federal), deve fazer constar, nas políticas públicas, recursos para a capacitação dos
colaboradores das organizações conveniadas e assegurar compromissos de
definição e instalação de políticas de gestão na área. Tal medida produziria efeitos
combinados, seja no aumento da qualidade do trabalho das pessoas que atuam nas
ONGs, seja na qualidade da gestão.
Avançando na reflexão acerca das variáveis contidas no quadro de
referência da gestão, abre-se espaço para tratar da tecnologia, enquanto métodos,
processos e técnicas utilizadas. Na gestão das ONGs, reconhece-se a frequência
encontrada na aplicação de técnicas oriundas da gestão empresarial, fazendo
crescer o volume de opiniões desfavoráveis sobre tal utilização, em particular, pelo
emprego acrítico que sugere.
Cabe sublinhar que as técnicas e instrumentos correspondem ao
aparato auxiliar do gestor no enfrentamento da realidade prática e não se constituem
no todo da fundamentação da gestão. Como estudado até o presente momento, esta
área do conhecimento compreende universo amplo de variáveis e dimensões e,
reduzi-la ao campo das técnicas, incorreria em erro de julgamento sobre a
necessidade de sua presença para o conjunto de organizações, bem como a
respeito da relevância de seu papel no alcance dos resultados esperados.
Sendo assim, e aqui está a ênfase, técnicas e instrumentos são
aplicáveis, mas a formulação de diretrizes, políticas organizacionais e geração das
condições necessárias para a consecução dos objetivos correspondem ao centro do
campo da gestão, exigindo, dos que atuam na área, competências e sensibilidade
para compreender as questões fundamentais da instituição e do espaço de atuação
da organização.
No que se refere às questões relativas à tecnologia, observa-se, de
forma recorrente, a associação do termo ao conjunto de computadores e
informações. Em tempos de internet, de redes sociais digitais e da ampliação no uso
de sistemas de informação, tal vínculo é recorrentemente percebido. Entretanto, o
conceito de tecnologia é ainda mais complexo, envolvendo saberes e prática
distintas.
No caso específico das ONGs, face à pluralidade das áreas de
desempenho, é licito considerar igual diversidade na aplicação de técnicas,
175
instrumentos e metodologias utilizadas para o enfrentamento das expressões da
questão social. Basta observar as diferentes áreas de atuação, examinadas no
Quadro 4 da presente tese, para concluir sobre riqueza de formas, métodos e
práticas empregadas para realizar o devido trabalho. Esta variedade é conhecida
como tecnologia social assim como Lassance Júnior e Pedreira (2004, p. 65)
conceituam55: “Conjunto de técnicas e procedimentos, associados a formas de
organização coletiva, que representam soluções para a inclusão social e melhoria da
qualidade de vida”.
Desta forma, a variável ‘tecnologia’, no âmbito das ONGs, mostra-se
como dimensão ampla, densa, de necessária compreensão e de constante
capacitação, posto que seu uso prescreva a capacidade de intervenção criativa e
inovadora das organizações.
Ao analisar as variáveis que se constituem em campos de estudo da
gestão, abre-se espaço para tratar da variável ‘ambiente’, em particular, a relação da
organização com o ambiente externo.
Como visto no capítulo anterior, e considerando a história das
organizações, a supremacia das questões do ambiente interno da organização
(cargos, tarefas, produtos, processos, recursos, entre outras) sobre o ambiente
externo (demandas sociais, comunidades, impactos ambientais e até mercados
consumidores) teve direta relação com a compreensão dos gestores a respeito do
contexto, das mudanças da sociedade e de suas exigências para com a
organização, bem como com o julgamento das lideranças sobre prioridades. Assim,
em que pese e permaneça o debate sobre produção em escala, o grau de
aceitabilidade de elevada produção, por exemplo, com danos ao meio ambiente, ao
menos no discurso da sociedade, tende a zero. Isto mostra a relevância para a
gestão contemporânea do ambiente externo sobre o ambiente interno, condição bem
diferente àquela encontrada no passado.
No campo da gestão das ONGs, a convocação para a
profissionalização, como refluxo ao período de expansão das organizações do TS,
redundava quase sempre na incorporação de profissionais que pudessem ampliar
competências, a partir da utilização de métodos e técnicas de gestão consolidadas
55
Segundo os autores, o conceito resulta de construção coletiva capturada pelos mesmos em seminário sobre tecnologias sociais, promovido pela Fundação Banco do Brasil, no ano de 2004. Os palestrantes indicados pelos autores foram: Juçara S. Pedreira, Ladislau Dowbor, Maia Takagi, Sandra Boudarovsky, Rogério Miziara e Sonia Kruppa.
176
no ambiente das organizações privadas (empresas). Na esteira destas ações, cursos
proliferaram pelo país, treinando pessoas de diferentes áreas, além das envolvidas
na gestão, com vistas a ganhos substantivos para as entidades.
Neste cenário, observou-se que a capacitação voltada para
instrumentos e técnicas não foi suficiente para a profissionalização esperada, na
medida em que as organizações do TS possuem características diferentes, objetivos
distintos, demandas sociais outras, entre questões que se manifestam no ambiente
externo a organização.
Falconer (1999, p. 16) pondera acerca deste tema.
A gestão do Terceiro Setor deve resgatar a interdisciplinaridade do campo da Administração, trazendo da administração de empresas a visão de negócio, da administração pública a competência de gestão de serviços públicos, mas também do campo de políticas públicas no sentido de capacitar para o atingimento de objetivos públicos e não exclusivamente organizacionais. A perspectiva de problemas públicos e políticas públicas devem estar na mente do administrador do Terceiro Setor, tanto quanto os problemas imediatos de sobrevivência de suas organizações.
Cabe sublinhar que a interdisciplinaridade é inerente à construção
desta área do conhecimento. Para lidar com as tantas variáveis, do porte das
analisadas no presente documento, o gestor lança mão de uma série de construções
teóricas que visam levar a êxito as organizações. A partir destas considerações, o
autor, ao dedicar-se à visão de negócio, privilegia uma dentre as múltiplas
competências da área e articula-as com competências de outros setores, apontando
interlocução possível e determinante para o contexto das ONGs. Finaliza o referido
pensamento explicitando o diferencial do campo da gestão nas organizações do TS
e que inclui diretriz para o gestor, a saber: a relevância do ambiente externo.
Retomando o quadro de referência da gestão (Quadro 7), no sentido
de dar continuidade à construção de reflexões próprias às ONGs, propõe-se tratar
da função gerencial materializada no planejamento, direção, execução e controle.
O primeiro aspecto a ser considerado diz respeito às características
das organizações do TS, do ponto de vista dos processos decisórios e análises que
os embasam. Nestas organizações, nascidas da sociedade civil e construídas a
partir da associação de pessoas e esforços em torno de questões comuns, a lógica
da análise e decisão coletiva deve permear todos os processos que elas conduzem.
177
Desta forma, a função gerencial é desenhada desde o momento
inicial, de maneira diferenciada em relação, por exemplo, às empresas, cujos
processos frequentemente se apresentam burocratizados e fortemente
hierarquizados. No caso da ONGs, espera-se da gestão processos participativos de
planejamento, análise, tomada de decisão, escolhas metodológicas, bem como de
direção (coordenação).
Contudo, o exame sobre as práticas das entidades tem mostrado
que este comportamento esperado não se estabelece de forma universal. Em sua
pesquisa, Coelho (2000, p. 117-118) aponta para seguinte realidade.
As funções usualmente atribuídas à diretoria abrangem o planejamento, a gestão, a execução e a avaliação das atividades desenvolvidas. Cabe-lhe também estabelecer contatos com instituições públicas e privadas com o objetivo de firmar acordos e convênios. [...] Vimos anteriormente que a organização administrativa da entidade é, via de regra, centrada na diretoria, especialmente na figura do diretor. Este é o interlocutor para quaisquer contatos externos da organização, o elo [sic] para todos os assuntos. Ele administra a instituição, garantindo seu funcionamento, suprindo necessidades materiais e financeiras e organizando promoções e eventos para arrecadar recursos, sempre que necessário. Decide questões administrativas e pedagógicas (no caso das entidades que compõem nosso universo [educação infantil] de pesquisa) com o auxílio da coordenadora pedagógica, quando houver. [...] O planejamento e a programação das atividades, bem como a administração de pessoal e administração orçamentário-financeira, são desempenhados pela diretoria da instituição.
O primeiro aspecto sublinhado pela pesquisadora diz respeito à
abrangência das funções da diretoria que vai desde atividades voltadas para o
ambiente interno, como planejamento e gestão, até as ações vinculadas ao âmbito
externo, como o estabelecimento de contatos com atores públicos e privados.
Uma agenda com amplitude elevada, como a citada, impõe
dificuldades. Pode parecer razoável esperar do dirigente tamanha competência,
entretanto, do ponto de vista das qualificações humanas para o trabalho, tem-se
claro não ser possível dominar e ser exitoso em todas as áreas nas quais se atua.
Por esta razão, em organizações de origem privada, observa-se a alta incidência dos
programas de capacitação que buscam suprir eventuais deficiências na atuação de
seus profissionais para que o conjunto da organização alcance seu resultado.
Cenário, como o relatado pela pesquisadora, sugere resultados positivos em
algumas áreas e, em outras, nem tanto.
178
O segundo aspecto faz emergir o componente da centralização, ao
expressar que a organização administrativa está centrada na diretoria. Este fato, em
particular, contradiz a natureza participativa e coletiva das ONGs. Análise rápida e
superficial pode sugerir certa obviedade, na medida em que se conhece a
precariedade de boa parte das estruturas das organizações do TS, no que se refere
ao número de profissionais e voluntários que realizam as atividades. Contudo,
exatamente por esta razão, a forma recomendada de gestão não se aproxima da
centralização e, sim, da descentralização. Seja por seu alinhamento ao princípio da
participação, seja pela relação com período no qual a gestão da diretoria se insere,
pois, os cargos de diretoria são efetivados a partir de períodos específicos de gestão
e de acordo com o que os estatutos definem.
Na medida em que as entidades têm, por princípio, alternância nos
cargos de direção, quanto mais descentralizado e participativo forem os processos
de gestão, menor o risco de perda de informações relevantes e das experiências na
resolução das questões cotidianas. Organizações cujos dirigentes são mantidos nos
cargos de direção, e que o mantém, centralizam os processos de gestão, podem
elevar seu grau de risco e gerar disfunções importantes, repercutindo nos resultados
esperados. O terceiro e último aspecto refletido na fala da pesquisadora, remete à
imagem do líder “faz tudo”. Os dirigentes parecem assumir atribuições que
combinam responsabilidades civis e criminais (OLIVEIRA, 2005), de governo da
entidade (SILVA, 2002), além das técnicas operacionais como a autora aponta.
Tal cenário é vulnerável. Do ponto de vista das qualificações, como
já refletido, poderá haver áreas com resultado positivo, outras nem tanto e até
resultados negativos, se considerar, por exemplo, o campo da prestação de contas.
Qualquer precariedade no exercício do controle dos recursos e na apresentação das
informações poderá gerar dúvidas junto aos seus financiadores e diferentes
públicos.
Do ponto de vista da qualidade dos serviços prestados, os
resultados serão as dificuldades na sistematização, padronização, avaliação e
priorização, na medida em que a multiplicidade de ações a realizar determinará
prioridades mais localizadas no curto prazo, culminando na expressão “apagando
incêndios”, comum em muitas organizações.
No que concerne a real contribuição no exercício do papel de
dirigente, importa considerar que este difere do gestor, do técnico, dos especialistas,
179
dos voluntários e demais profissionais envolvidos. Assim, posto que os dirigentes
estejam ocupados com múltiplas atividades, que vão do estratégico ao operacional,
a dimensão da interlocução entre atores sociais, dos resultados de longo prazo e do
governo efetivo da entidade deixa de ser atendida.
Chait (1996, p. 3), em reflexão análoga, delimita fronteira entre
‘administrar’ e ‘governar’ sugerindo algumas razões.
Administrar, mais do que governar, cria, a partir dos resultados, um sentimento imediato de realização e satisfação. Isso ocorre, em parte, porque os problemas administrativos frequentemente são mais sensíveis às ações e decisões. Já as questões estratégicas e políticas, em comparação, geralmente requerem longas discussões, análises profundas e um conhecimento considerável do contexto da organização.
O autor trata do sentimento de cumprimento das atividades. Em
contextos onde as tarefas se avolumam, o sentimento de satisfação é real quando o
volume diminui. Por outro lado, o autor sinaliza as competências, mais precisamente
a articulação e o conhecimento sobre o contexto da organização, como questões
que inibiriam a presença mais efetiva dos dirigentes nas áreas, dada a complexidade
inerente às atividades. Com tais comentários, o autor descreve espaços possíveis de
investigação que possibilitem, por um lado, identificar competências para governar e,
por outro, instalar processos de capacitação que construam condições para o
exercício concreto do papel de dirigente.
Ainda no campo da função gerencial, Coelho (2000, p. 145), ao
comentar as estruturas das ONGs, sinaliza aspecto adicional que deve ser
considerado.
Nos dois países [Brasil e Estados Unidos] as estruturas de funcionamento são basicamente semelhantes, mas o grau de institucionalização administrativa das americanas é maior, havendo mesmo certo burocratismo. Nas brasileiras, as práticas gerenciais são mais informais. Observa-se hoje, entretanto, uma preocupação maior com estas práticas, o que visa a maximizar recursos. Na época em que a pesquisa de campo foi realizada [1994], essa preocupação estava apenas surgindo, em parte conscientização da precariedade dos serviços, em parte por pressão de novos agentes financiadores.
A autora discorre sobre a institucionalização administrativa (gestão)
nas organizações pesquisadas e pontua sua crescente implantação.
180
Cabe, entretanto, breve comentário sobre o uso impreciso que a
autora faz da expressão “práticas gerenciais mais informais”. O uso do vocábulo
‘informal’ está, frequentemente, associado à ideia de algo que ocorre e que não está
sob a égide do formal. Ora, estando no ambiente das organizações, não há nada
que lá ocorra, quando da execução das atividades, que não seja a ação de alguém
institucionalmente vinculado àquela organização. Assim sendo, toda e qualquer ação
deve ser considerada formal pela relação existente entre as pessoas e a instituição.
A autora, na verdade, desejou pontuar que tais práticas gerenciais
são executadas sem a observância e fundamentação adequadas, sem a utilização
de técnicas e procedimentos metodologicamente testados e sem princípios formais
definidos que as orientem, tentando estabelecer graus de gestão diferenciados.
Designou, desta forma, como ‘informal’, uma prática realizada em condição de
improviso, tecnicamente duvidosa e metodologicamente experimental. Distingue-se,
então, entre estrutura com base em improvisos daquela caracterizada pela presença
da gestão.
O tema da improvisação sempre esteve presente nas discussões
sobre as ONGs, assim como na pesquisa de Coelho (2000, p. 120): “O
gerenciamento nunca foi de fato uma ‘questão’ para essas associações. Sempre
houve um grande grau de improvisação diante das necessidades administrativas
[...]”, em que pese parte de suas lideranças serem oriundas de empresas,
teoricamente, lideranças que exercitam a gestão.
De razões objetivamente desconhecidas, tal postura pode se
assentar na ideia de que “para este setor qualquer coisa serve” ou, mais nefasto
ainda, no entendimento de que a gestão guarda vínculo com o capitalismo e, por
esta razão, é imprópria para as entidades. Seja esta ou aquela concepção, ambas
inadequadas se considerada a contemporaneidade que está diante de desafios
complexos como os enfrentados pelas ONGs.
Prosseguindo na reflexão sobre os itens que compõem o quadro de
referência da gestão no campo das ONGs, dedicam-se linhas adicionais para
comentários sobre os níveis genéricos de desempenho das organizações. Quando
analisadas estas questões, no item 1.3.2.1 desta tese, examinou-se os níveis da
eficácia e da eficiência nas organizações em geral, considerando a gestão sobre os
recursos (eficiência) e a gestão para os resultados (eficácia). Entretanto,
complementações se fazem necessárias para tratá-las no âmbito da gestão das
181
ONGs, pois além dos níveis de eficiência e eficácia, destaca-se o nível da
efetividade.
Tenório (2006, p. 20) define este nível da seguinte maneira:
Há ainda uma terceira medida a ser levada em consideração quando se efetua a avaliação das atividades de uma organização: a efetividade. Esta se refere à capacidade da organização de atender às demandas da sociedade. [...] É mais complexo medir o grau de efetividade porque isso pressupõe conhecer a demanda ou expectativa de demanda de determinado produto ou serviço e compará-las com a capacidade da organização para fazer frente a essa demanda.
O autor fala daquilo que se pode chamar do propósito, em termos
genéricos56, da organização. As organizações que constituem o TS, conforme
parâmetros já tratados nascem para atender demandas da sociedade e tal
configuração pressupõe fundamentação em diagnóstico da realidade, bem como
estudos pormenorizados sobre o perfil das demandas.
O exercício do diagnóstico é competência das mais relevantes em
um ambiente onde personalismos e visões particulares também estão presentes,
assim como o debate a respeito da centralização e participação permite considerar.
Em outras palavras, a efetividade, enquanto nível genérico de desempenho
materializa o foco no interesse público, o que é expresso em boa parte da
documentação das instituições, mas que carece de avaliação concreta.
Retomando o quadro de referência sobre o campo da gestão nas
ONGs, propõe-se desenvolver linhas complementares a respeito do item ‘estratégia’,
debatido genericamente no contexto das organizações em geral.
Pensar neste tema significa colocar luz sobre os processos de
planejamento da instituição que, no universo das organizações do TS, considerando
sua natureza e as características de participação nelas contidas, assume contornos
particulares. Silva (2002, p. 97) comenta:
A estratégia deve ser consistente com a visão de longo prazo desenvolvida pela organização. Deve ser flexível, podendo ser melhorada e corrigida a todo o momento, num movimento contínuo de ação e reflexão. Precisa ser
56
A expressão foi utilizada para designar espaço comum a qualquer ONG, tendo-se claro que cada organização, face à área de atuação, aos temas com os quais lida e objetivos que constrói, pode definir propósito específico.
182
factível e, idealmente, construída em conjunto pela equipe executiva, diretoria e conselho da instituição.
O autor inicia suas reflexões indicando a necessidade da visão de
longo prazo. Significa dizer que a organização constrói processo de análise a
respeito do seu futuro e, ao fazê-lo, inclui as questões que estão no ambiente
externo (mudanças na sociedade, políticas públicas em sua área de atuação, a
realidade do seu público-alvo, entre outros aspectos) e considera o conjunto de
questões internas (competências, recursos, pessoas) que permitem avaliar na
medida da contribuição para as questões analisadas.
Ao examinar o tema à luz das especificidades das ONGs é justo
considerar que a visão de longo prazo não deve ocorrer apenas a partir das
reflexões de sua diretoria e conselho, mas sim a partir de ampla consulta a seus
distintos grupos de interesses, sem os quais a efetividade não se concretizará.
Na sequência, o autor ressalta que a estratégia deve ser construída
pelo conjunto dos dirigentes (diretoria e conselho) incluindo a equipe executiva. Com
efeito, se a organização construiu a visão de longo prazo, fundamentada em ampla
consulta aos grupos de interesse, justifica-se a definição da estratégia pelos
dirigentes e equipe executiva como ação delegada da sociedade para operar a
realização das ações. Entretanto, não existindo a referida consulta ao grupo de
pessoas envolvidas na organização, a definição pelos dirigentes se torna frágil,
limitada e pouco participativa, tornando-se ação incongruente com a natureza da
organização. Em síntese, o estabelecimento de estratégias em ONGs que visem à
efetividade da organização, deve considerar processos de consulta para além de
seus dirigentes.
A sustentabilidade é outro item contido no quadro de referência
sobre gestão de ONGs. No capítulo anterior, foram analisadas as definições no
campo da sustentabilidade e tratou-se de compreender sobre o modo como a noção
de sustentabilidade organizacional carrega para dentro de si aspectos internos e
externos a organização.
Entretanto, quando se examina este tema no campo das ONGs,
observa-se, com frequência, seu vínculo à dimensão econômico-financeira. “No caso
da ABONG e suas associadas, sustentabilidade é também pensar em termos
político-financeiros, o que significa refletir não só sobre o que necessitamos, como
qual o sentido de nossa existência.” (GOUVEIA; DANILIAUSKAS, 2010, p. 21).
183
Desta forma, a mencionada organização combina o olhar estratégico
sobre o papel que cumpre diante de seus associados com a dimensão dos recursos
financeiros que viabilizam sua agenda de trabalho. Cabe frisar que a ABONG é
organização de natureza associativa e representa parcela de ONGs existentes. Ou
seja, a dimensão da consulta referida se estabelece de forma programática neste
tipo de organização.
Considerando o aspecto financeiro (financiamento das ONGs) como
ideia integrante do conceito de sustentabilidade, verificaram-se os dados de
pesquisas nacionais disponíveis. A FASFIL 2005 (IBGE, 2008) não tratou do tema. A
PEAS 2006 (IBGE, 2007b) abordou o assunto no momento da análise sobre o
financiamento das entidades de Assistência Social (EAS), revelando o seguinte
dado:
[...] 59,5% das entidades têm como fonte principal recursos de origem privada (que englobam recursos próprios, privados e contribuição voluntária), dado coerente com a própria natureza do objeto investigado. Outras 32,6% são financiadas majoritariamente por recursos públicos; 2,1% por recursos provenientes de outros países; e 5,1% por outros tipos de recursos não relacionados.
Os dados sobre o financiamento das associadas à ABONG já foram
apresentados na tabela 4 do presente documento. O censo do 3º setor em SBC
(MEREGE, 2009, p. 66) apresenta os resultados abaixo relacionados.
Na composição da receita do setor cerca de 90% são recursos próprios que alcançam o valor de R$ 341 milhões. Os restantes 10% estão, pode-se afirmar, igualmente divididos entre os recursos públicos e doações. É uma estrutura econômica que se diferencia substancialmente daquela registrada para o nosso País e mesmo em nível internacional. Com relação aos recursos públicos e as doações disponibilizadas para o setor, essas rubricas estão muito abaixo da média brasileira.
A citação referenciada sugere três esclarecimentos adicionais. O
primeiro refere-se à composição de recursos próprios, aglutinados nas seguintes
categorias57: aplicação financeira, retorno financeiro sobre patrimônio próprio,
eventos, associados, vendas de produtos e serviços e outros. O segundo constitui o
montante em origem de receitas (nacionais e internacionais), contabilizado em R$
57
Para detalhes, ver Tabela 11 em Merege (2009, p. 66).
184
379.807.640,00. Por último, os porcentuais de participação nas receitas oriundas
dos cofres públicos e doações, respectivamente, 5,2% e 5,0% do total.
Coloca, ainda, questão complementar sobre a definição de
sustentabilidade. “Além dos recursos financeiros as organizações podem e contam
com recursos humanos voluntários que se constituem em uma estratégica fonte de
trabalho para a sua sustentabilidade.” (MEREGE, 2009, p. 66).
Para o pesquisador, o campo da sustentabilidade nas organizações
pesquisadas se dá a partir da combinação de recursos financeiros e aquilo que
chamou de “recursos humanos voluntários.” Sua definição confirma o vínculo entre a
sustentabilidade e a questão financeira, sinalizando um aspecto relacionado à
dimensão interna da organização: voluntários.
Além da busca de compreensão mais precisa a respeito da
sustentabilidade, vale pontuar sobre duas iniciativas internacionais que visam
mensurar este campo na dimensão das organizações do TS. A primeira corresponde
ao mesmo projeto de investigação comparada em 36 países (The Johns Hopkins
Comparative Nonprofit Project) que construiu proposta denominada de Índice Johns
Hopkins da Sociedade Civil Global58 com três indicadores: capacidade,
sustentabilidade e impacto. O primeiro examina o conjunto de ações e atividades
mobilizadas no setor. O segundo recebe a seguinte definição59.
Tão importante quanto a escala ou a força da sociedade civil em um ponto no tempo é a sua capacidade de se sustentar ao longo do tempo. Para se sustentar, as organizações devem, no mínimo, garantir os recursos de que precisam para operar, mas tais recursos não são apenas financeiros. Eles também são humanos. (SALAMON; SOKOLOWSKI, 2004, p. 70, tradução nossa).
Importante frisar que, novamente, a definição de sustentabilidade no
campo das ONGs associa recursos financeiros com a existência de pessoas para
operar as atividades das organizações, corroborando a indicação de Merege (2009).
Em síntese, a sustentabilidade está vinculada à capacidade da instituição para
mobilizar recursos e pessoas.
58
Johns Hopkins Global Civil Society Index. (SALAMON; SOKOLOWSKI, 2004, tradução nossa) 59
Do original: “As important as the scale or strength of the civil society sector at a point in time is its ability to sustain itself over time. To sustain themselves, organizations must, at a minimum, secure the resources they need to operate. But such resources are not only financial. They are also human. What is more sustainability requires a broader environment that is enabling and supportive.”
185
O terceiro indicador contemplado no índice internacional trata do
impacto propriamente dito. Nas palavras dos pesquisadores60:
Em última análise, o que é importante sobre as organizações da sociedade civil não é apenas a sua capacidade ou sua capacidade para sustentar-se, mas o impacto de suas atividades. Queremos saber qual a contribuição que a sociedade civil está fazendo para a vida social, econômica e política. (SALAMON; SOKOLOWSKI, 2004, p. 73, tradução nossa).
O vocábulo “impacto” tem sido utilizado de forma intensa pelas
pessoas envolvidas nas atividades da sociedade civil e parece elevar a expressão
do trabalho realizado. Nos casos em que se depara com designações cuja utilização
se mostra ampla e irrestrita, sente-se a necessidade de refletir e apropriar-se de
mais sentido. Albuquerque (2006, p. 125) trata de impacto no interior de sua
discussão sobre gestão de resultados e avaliação nas organizações do TS. E define:
“Produto: resultados de curto prazo e abrangência individual. Efeitos: resultados de
médio prazo e abrangência ao nível da comunidade, organização. Impactos:
resultados de longo prazo com abrangência no nível da sociedade.”
Admite-se que qualquer ação resulte em algum nível de impacto,
mas o autor o designa como grau mais elevado de resultado que se pode alcançar e
complementa: “Os projetos devem contribuir para o impacto, mas a consecução
deste normalmente ocorre depois do final do projeto e depende de outros fatores.”
(ALBUQUERQUE, 2006, p. 125).
Com as considerações efetivadas, torna-se possível ter maior
clareza sobre a proposta de Salamon e Sokolowski (2004) para a mensuração do
impacto na vida social, econômica e política. Isto significa que a premissa de análise
será o longo prazo e que as formas de avaliação devem conceber mecanismos para
capturar aspectos no período após o término das intervenções promovidas pelas
organizações avaliadas. Sem sombra de dúvida, trata-se de processo de alta
complexidade, e que não deve ser procrastinado.
A segunda iniciativa internacional de mensuração da
sustentabilidade no campo das ONGs vem do Escritório para a Europa e Eurásia61,
60
Do original: Ultimately, what is important about civil society organizations is not just their capacity or their ability to sustain themselves, but the impact of their activities. We want to know what contribution the civil society sector is making to social, economic and political life.
61 Bureau for Europe and Eurasia (USAID, 2011, tradução nossa).
186
Escritório de Governo, Democracia e Transição Social62, vinculado à Agência dos
Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional63 (USAID). Trata-se do Índice
2010 de Sustentabilidade de ONGs para Europa Central e Oriental e da Eurásia64,
realizado desde 1999. Em sua 14. edição, datada de novembro de 2011, apresenta
indicadores de sustentabilidade de organizações em 29 países.
Este índice analisa sete áreas chamadas de “dimensões de
sustentabilidade”: ambiente jurídico, capacidade organizacional, viabilidade
financeira, advocacy65, prestação de serviços, infraestrutura e imagem pública. Na
sequência, apresenta cada indicador em três níveis distintos de sustentabilidade:
maior, evoluindo e impedida. Deste cruzamento resultam as notas atribuídas para as
ONGs de cada país.
Por fim, encontra-se diversidade no campo do dimensionamento da
sustentabilidade nas ONGs. Do ponto de vista de sua definição, observou-se que a
questão financeira é recorrente nas referências estudadas, possibilitando o
entendimento de que sua consecução passa, necessariamente, pelo financiamento.
Os estudos analisados, enfaticamente apontam para um tipo de financiamento que
parte de todas as áreas da sociedade e de todos os setores, sejam públicos,
privados, nacionais e internacionais. Demonstram, ainda, a presença destacada dos
recursos de origem privada, sejam oriundos da contribuição de cidadãos, de
empresas e, como sinalizou Merege (2009), da geração de recursos próprios.
As finanças, contudo, não sintetizam a sustentabilidade das ONGs.
Há vinculo importante com a capacidade de mobilização de pessoas e, assim como
os índices internacionais apontam, a definição transita por um conjunto complexo de
questões que se estende ao ambiente jurídico, capacidade organizacional, entre
outros. Ficam, ainda, as dimensões debatidas no Quadro 6 a respeito da
sustentabilidade organizacional que, em parte, guarda proximidade com os aspectos
refletidos e abrem espaço para novas investigações.
Para encerrar as reflexões relativas ao quadro de referência da
gestão das ONGs, desenvolvem-se, a seguir, algumas linhas sobre o papel do
62
Office of Democracy, Governance and Social Transition (USAID, 2011, tradução nossa). 63
USAID - United States Agency for International Development (USAID,2011, tradução nossa). 64
The 2010 NGO Sustainability Index for Central and Eastern Europe and Eurasia (USAID, 2011, tradução nossa).
65 A decisão em manter a expressão no idioma original reside no fato de já ter sido incorporado pela linguagem cotidiana das ONGs. Seu significado está apresentado na nota de rodapé de número 20.
187
gestor; tema que foi, anteriormente, tratado lato sensu, mas que agora será refletido
no âmbito das referidas organizações.
O primeiro aspecto a considerar possui relação com a visão da
organização. No capítulo anterior, verificou-se que o modo de compreender as
entidades produz efeitos nos processos internos e na maneira de se relacionar com
o ambiente externo. Assim, a visão que as concebe como algo isolado, por exemplo,
da sociedade, das pessoas em geral, e até mesmo de outras organizações, tende a
valorizar o processo decisório interno, atribuindo-lhe dimensões muito elevadas,
desenvolvendo pouca sensibilidade em ouvir os atores externos. Exemplos
genéricos referentes às organizações empresariais e estatais se encontram nos
produtos e serviços oferecidos, concebidos de acordo com a visão da organização.
São impostos ao conjunto da sociedade, não instalam processos de escutar, de
ouvir os que dele fazem uso e, de maneira autoritária, persistem oferecendo algo em
descompasso com a realidade.
Na outra extremidade há organizações que reconhecem a relação
entre ambiente interno e externo, passam a desenvolver habilidades de escutar seus
integrantes e adotam postura flexível, no que concerne à reorganização do ambiente
interno visando manter coerência entre as necessidades e a ação. Recordar estes
elementos permite reforçar a relevância do entendimento sobre as teorias da
organização inerentes ao espaço de atuação do gestor, bem como sinalizar área
que merece aprofundamento e inclusão nos diferentes processos de formação de
gestor, seja na academia, seja nas diferentes instituições que se ocupam desta
tarefa.
O papel do gestor frente ao grupo constitui outro aspecto a ser
considerado. Em seção anterior, refletiu-se sobre o tema da liderança, distinguindo
entre os papéis impostos ao exercício de um cargo específico e as características
pessoais que fundamentam as posturas dos gestores. Tratando do universo das
ONGs, cabe destacar o entendimento acima mencionado e a natureza coletiva
participativa atinente a elas. Neste ambiente, gestores centralizadores, que
promovem processos de planejamento, direção, execução e controle centralizados,
estão em desacordo com a realidade. Os efeitos das suas ações são inadequados,
alimentando os quadros negativos contidos nas reflexões de Coelho (2000) sobre a
influência dos dirigentes, do personalismo, impactando a baixa participação nas
assembleias e conselhos.
188
Insere-se no conjunto das discussões a cerca da gestão das ONGs
o aspecto “competências do gestor”. Ao tratar dos mitos relacionados ao TS,
Teodósio (2002, p. 260) afirma:
Entre as peculiaridades organizacionais atribuídas ao Terceiro Setor, destacam-se: proximidade do beneficiário, ações em « rede », estruturas desburocratizadas e enxutas, gestão participativa, imagem institucional consolidada e motivação da mão de obra (voluntária).
A perspectiva frequentemente analisada na literatura, no campo da
gestão, vincula o debate sobre o tema das competências às características das
organizações onde os profissionais atuam. Neste sentido o autor sinaliza
peculiaridades das ONGs que podem servir de parâmetros para a mesma reflexão,
ainda que mereça ressalvas.
A proximidade com beneficiários ocorre a partir de processos de
escutar as populações, de elaborar diagnósticos apropriados a respeito das
demandas sociais. Tal condição não é uma verdade absoluta, na medida em que
são encontradas organizações cujas agendas pessoais dos dirigentes são mais
determinantes que a voz da coletividade.
Outro reparo: o campo das redes. Salamon (1997, p. 108) destaca
que o TS “[...] enfrenta um desafio formidável ao promover a colaboração em suas
próprias fileiras.” O que denota, ao mesmo tempo, a competência pela abrangência
de atuação e a crítica, pelo nível de articulação entre organizações.
Quanto às estruturas desburocratizadas cabe frisar que, na medida
da ampliação de convênios com o poder público, até mesmo com o setor privado, o
requerimento na área documental é considerável. Da mesma forma, ao pensar na
ampliação e qualificação na prestação de contas como exigência de financiadores e
sociedade. Estas duas questões sugerem, ao contrário, burocracia presente no
ambiente das organizações.
No campo da gestão participativa, e sem incorrer em erro de
repetição, parece ser ainda um atributo desejável, pois a análise empreendida no
presente documento, a partir da tese de Coelho (2000), mostra centralização e
características gerenciais mais próximas das estruturas hierarquizadas e menos
participativas.
189
A imagem institucional consolidada merece tratamento de igual
cuidado, dada a recorrente criminalização das ONGs face aos processos de
utilização privada de recursos públicos. A motivação do voluntariado constitui-se em
aspecto de elevada complexidade, por compreender a dimensão subjetiva e de
definição pessoal de cada indivíduo. Assim, aquele que se voluntaria para
determinada causa, faz o que faz seguindo princípios próprios e vinculados à
autonomia enquanto indivíduo, tendo o gestor da ONGs papel diferente em relação,
por exemplo, a seus funcionários.
Exatamente sobre este ponto, sublinha-se certo desconforto ao
designar o voluntariado como mão de obra. Esta expressão sugere a existência de
relações de poder e comando muito presentes nas configurações de vínculo
empregatício entre as partes. Se analisada no cenário da escravidão, igualmente, na
medida em que a expressão ‘mão de obra escrava’ sugere um indivíduo sem acesso
aos direitos do trabalhador. Nos dois exemplos, portanto, configura-se determinado
nível de controle impróprio de ser pensado para o voluntariado e referência
imprecisa para desenvolver competências do gestor.
A demanda do ambiente externo é aspecto derradeiro a ser
considerado. Facilitado pelas considerações já efetivadas, observando a visão da
organização, a natureza coletiva e o princípio da participação, implícitos na definição
de ONG, o entendimento sobre a gestão nas referidas instituições evidencia-se
complexa e particularmente desafiadora.
Se observada a atual concepção que coloca a organização em
permanente relação com o ambiente externo, e se compreendida a importância dos
grupos de interesse (stakeholders), então os desafios são potencializados, seja no
campo da coordenação das estruturas, seja na capacitação de integrantes.
Para fazer frente à complexidade assinalada, os gestores lançam
mão de instrumentos que auxiliam a formulação de um diagnóstico gerencial capaz
de enfrentar os desafios de uma organização que se deseja articulada com os
anseios da sociedade. Silva (2000; 2002) têm trabalhado no campo da gestão das
organizações da sociedade civil, a partir da compreensão dos campos essenciais de
atuação do gestor, cuja imagem a seguir possibilita ilustrar.
190
Gráfico 10 – Campos essenciais de atuação do gestor
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral. Nota: Do original em Silva (2002, p. 29).
Também chamado de modelo trevo66, a imagem contempla cinco
áreas distintas (pessoas, serviços, recursos, sociedade). Da relação entre estas
áreas surgem seis aspectos distintos (qualidade, viabilidade, legitimidade,
motivação, capacidade e direcionamento). Por último, o exame do quinto campo de
atuação do gestor (Conselho e Diretoria), e que “[...] tem um papel vital na entidade
[...]” (SILVA, 2000, p. 72), integra e consolida o modelo de análise.
O autor demonstra estar na sociedade o sentido da existência da
organização, pois é lá que estão as demandas e necessidades. O gestor, ao
considerar tais questões, leva a organização a contemplar adequado ponto de
partida. Na área dos recursos estão todos os aportes materiais e econômicos de que
a organização necessita. Estudá-los, organizá-los e utilizá-los de forma adequada
são atividades afeitas à prática do gestor. Já os serviços correspondem a tudo que a
organização realiza e oferece como fruto da ação da entidade. Na área das pessoas,
estão as competências e os talentos que se colocarão à disposição para a
realização dos objetivos da entidade.
66
A designação é utilizada por conter quatro áreas bem definidas (pessoas, serviços, recursos e sociedade), cuja disposição tem forma semelhante ao trevo de quatro folhas. Segundo Kisil (2008, p. 64), Silva adaptou modelo desenvolvido por Bernard Lievegoed, psicólogo organizacional de nacionalidade holandesa, no ano em 1991, que recebeu o nome de Clover-leaf Organization, sem tradução para o português. Kisil traduziu como “Modelo Trevo”.
191
Cabe pontuar duas questões inerentes ao modelo e que chamam a
atenção pelo princípio que efetivam. Ambas estão na área das pessoas, sendo a
primeiro a visão humanizada da organização:
O desenvolvimento da entidade guarda estreita relação com o desenvolvimento das pessoas que dela fazem parte. É através das pessoas que ocorre o aprendizado da organização. É pelas pessoas que a entidade cresce, muda, evolui, se transforma. Saber lidar com esses processos implica, não resta dúvida, saber lidar com as pessoas. (SILVA, 2000, p. 62).
A visão contida nas palavras do autor sugere que pessoas e
organizações se desenvolvem, levando seus gestores ao papel de facilitadores do
processo de desenvolvimento e configurando a prática gerencial para além da
aplicação de técnicas, instrumentos e obtenção do maior rendimento possível dos
recursos, como muitos insistem em defini-la.
A segunda questão é sutil e relevante. No modelo referenciando, há
clara distinção entre pessoas e recursos, tratando-os de forma independente. O uso
frequente da expressão “recursos humanos” por empresas, organizações da
sociedade civil, sociedade em geral e governos, pode levar o leigo a sensação de
estar diante da verdade absoluta em termos valorativos. O modelo sugere que as
pessoas não são recursos e, sim, pessoas. Tratá-las como pessoas, seres humanos,
detentores de capacidades e valor, reeduca o olhar do gestor, tão impregnado pela
visão de que pessoas, por serem recursos (ainda que humanos), possam ser
“utilizadas” da maneira que melhor convier.
Retomando o modelo, seguem-se algumas linhas para tratar dos
seis aspectos que tem origem na relação entre as áreas. O primeiro corresponde à
qualidade e considera as áreas, as pessoas e os serviços. Para o autor, talentos e
serviços se potencializam mutuamente de forma que tanto pessoas quanto serviços
são desenvolvidos quando associam a aplicação do conhecimento às necessidades.
O segundo aspecto corresponde à viabilidade, analisada a partir da relação entre
serviços e recursos. Permite ao gestor estudar a compatibilidade existente entre os
objetivos, traduzidos em serviços, e os recursos disponíveis. O terceiro aspecto é
designado “legitimidade" e, para o autor, é estabelecida na relação entre as áreas:
recurso e sociedade. Como a organização recebe doações, é a sociedade que a
legitima em cada ato de investimento. A motivação é o quarto aspecto e tem origem
na análise da relação entre a sociedade e as pessoas. As demandas e
192
necessidades sociais existentes na sociedade correspondem às causas que se
constituem a fonte da motivação das pessoas da organização.
A capacidade, relação entre pessoas e recursos, constitui o quinto
aspecto de atuação do gestor. Para o autor, importa levar em consideração as
próprias condições para realizar seus objetivos, mantendo em equilíbrio capacidades
e infraestrutura. O sexto e último aspecto corresponde ao direcionamento que se
obtém a partir da análise da relação entre serviços e sociedade, cujo entendimento
se expressa nas palavras de Silva (2000, p. 64):
A relação entre os serviços e a sociedade é chamada de ‘função primária’ da entidade social. É por causa dela que as pessoas doam dinheiro. Para que a entidade possa fazer o que elas próprias não podem, mas gostariam que fosse feito. Por isso, pode-se dizer que o dinheiro de doação não é da entidade – ela simplesmente o administra e o transforma em serviços, repasses, educação, etc..
O entendimento a respeito dos recursos captados e do papel da
entidade em relação a eles merece destaque, pois embasa os processos de gestão
a partir da postura da prestação de contas, tornando-a função precípua e não um
peso para a organização.
O quinto campo de atuação do gestor é constituído pelos dirigentes
(conselho e diretoria). O autor focaliza neste conjunto de pessoas toda a atenção
necessária pelo fato de estarem no centro da governança.
As pessoas que ‘carregam’ uma organização da sociedade civil e que ocupam o papel de gestoras (sejam diretores, conselheiros, superintendentes, presidentes, coordenadores, gerentes) estão no centro de tudo. Elas têm a responsabilidade de manter o todo em movimento e em equilíbrio. Os gestores estão encarregados de administrar todos esses campos e relações, de tal forma que a entidade possa conseguir o melhor resultado possível para a sociedade. (SILVA, 2000, p. 71).
A pontuação acerca do campo central do modelo trevo completa a
concepção que compreende a organização de forma dinâmica, integrada e que
envolve diferentes temas e questões. Sem privilegiar um e outro elemento, a
estrutura trata de igual modo seus componentes. A ênfase ideada pelo autor, e
expressa pela ênfase a algumas palavras, encontra ressonância nas reflexões
realizadas durante o presente estudo a respeito da governança das organizações e
relevância do papel exercido pelos gestores. Isto mostra que este campo necessita
193
ser desenvolvido de maneira diuturna, seja nos processos de planejamento,
diagnóstico, avaliação de resultados, seja nas relações intra e interinstitucionais,
visando articulações necessárias na compreensão sobre as políticas públicas,
atendimento ao marco jurídico regulatório e às necessidades da sociedade. Enfim,
no conjunto de conteúdos requeridos no âmbito ONGs.
Com a presente reflexão, consolida-se o quadro de referência da
gestão das ONGs. Em síntese, este campo de atuação requer compreensão sobre
as variáveis (tarefas, pessoas, estrutura, tecnologia e ambiente), entendimento
contextualizado sobre as funções gerenciais, competências para atingir os diferentes
níveis de desempenho (eficiência, eficácia e efetividade), concebendo estratégias
alinhadas à natureza das organizações, orientadas por parâmetros que se
desdobrem em sustentabilidade, com gestores que saibam interpretar a realidade
organizacional, seu papel frente às equipes, as competências requeridas, e que
combinem racionalidade e sensibilidade com as demandas trazidas pela sociedade.
PARTE 2 A REALIZAÇÃO DA PESQUISA
195
2.1 O processo de Configuração dos Dados
A investigação foi realizada em cinco etapas. A primeira consistiu na
revisão bibliográfica e análise documental visando o aprofundamento teórico
necessário para embasar a pesquisa de campo. Foram utilizados autores de várias
áreas do conhecimento para apoiar as reflexões sobre o tema que orienta a
pesquisa. Assim, o estudo contemplou áreas como administração (privada e
pública), Antropologia, Ciências Sociais, Ciências Políticas, Direito, Economia,
Serviço Social e Sociologia. Investigaram-se, de igual modo, pesquisas
representativas internacionais e nacionais permitindo conectar a presente tese ao
conjunto de iniciativas que visam à compreensão do universo investigado.
A segunda relaciona-se com as atividades de planejamento e
preparação para abordagem às organizações e sujeitos. Neste sentido, a tarefa do
pesquisador teve inicio em outubro de 2011 e constituiu-se da retomada dos
registros sobre as 22 organizações (Quadro 3), realizados no momento da
sondagem. Para efeito de estruturar o trabalho de pesquisa foi mantida
correspondência precisa entre a lista da RFF e a lista contendo estas entidades.
Com base nas informações contidas em tais registros o pesquisador
iniciou contatos telefônicos para confirmação dos dados, lembrar o interlocutor sobre
o vínculo existente entre a sondagem ao telefone a presente abordagem, apresentar
as próximas etapas da pesquisa, identificar os nomes dos sujeitos a serem
entrevistados e realizar os devidos agendamentos. Em duas situações específicas o
contato foi reforçado por correio eletrônico: quando o contato telefônico não se
efetivou e havia endereço de correio eletrônico disponível, e quando foi solicitado
pelo interlocutor para formalizar o pedido de entrevista.
Desta ação resultaram cinco casos distintos demonstrados a seguir
com os respectivos números de organizações: projetos e organizações que
deixaram de existir (2); mudança na diretoria que impossibilitou fornecer informação
(1); vínculos com outras organizações (2); não respondeu ao telefone/correio
eletrônico (6); não aderência aos critérios (1).
O procedimento sistematizou o total de 12 organizações que não
foram abordadas na pesquisa. Em 10 entidades os contatos foram realizados,
critérios confirmados, sujeitos identificados e entrevistas agendadas.
196
A terceira etapa corresponde à execução das entrevistas. O contato
do pesquisador com os sujeitos foi pautado por dialogo franco e aberto,
desenvolvido face a face, e inserido em ambiente facilitador. Neste sentido, a
entrevista considerou parte introdutória que visava esclarecer propósitos, explicar a
maneira de realização e envolver os sujeitos no processo.
No momento inicial e com a devida aprovação pelo Comitê de Ética
em Pesquisa (CEP) da Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da UNESP,
Campus Franca, foi colhido assinaturas no Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE) bem como solicitada autorização para a utilização de gravador
de áudio durante a entrevista.
Foram realizadas 20 entrevistas cuja conclusão ocorreu em fevereiro
de 2012, sendo 10 com sujeitos que ocupam cargos de direção e 10 de
coordenação. Vale esclarecer a ocorrência de suas situações. Uma dentre as
entrevistas realizadas com dirigentes voluntários ocorreu através do envio de
respostas às questões do formulário de pesquisa por correio eletrônico. Embora
tenham ocorrido várias tentativas para a efetivação da entrevista frente a frente, o
sujeito fez opção por este meio alegando agenda indisponível.
Em duas organizações, a diretoria voluntária não designou nomes
de sujeitos coordenadores para serem entrevistados, o que supõe a não contratação
deles. Somente nestes casos, dois dos diretores voluntários responderam tanto os
formulários referentes à diretoria como o formulário dos coordenadores, conduzindo
o pesquisador a deduzir acumulo da função de diretor e o cargo de coordenador.
As entrevistas foram pautadas pelas questões fechadas contidas
nos formulários (Apêndice A; Apêndice B) e abertas (Apêndice C) ocorridas sem
intervenção do pesquisador. Quando necessário fez-se uso de perguntas
complementares visando elucidar as respostas fornecidas. A observação enquanto
técnica adicional foi utilizada pelo entrevistador com o objetivo de captar elementos
adicionais cujas informações foram registradas em diário de pesquisa.
Cabe esclarecer que durante as entrevistas com o sujeito
coordenador, mesmo tendo sido pautadas por formulário com questões fechadas,
alguns falaram espontaneamente em face de oportunidade gerada pelo
entrevistador.
A quarta etapa compreendeu a sistematização das informações e
organização do material de pesquisa. As entrevistas possibilitaram mais de 10 horas
197
de gravação em áudio, sendo necessárias 33 horas e 30 minutos para a transcrição
dos dados em textos respeitando as questões contidas nos formulários. Integra esta
fase a elaboração de controles dos dados do estudo, desde as informações contidas
na lista entregue pela RFF, passando pela sondagem até as entrevistas com os
sujeitos.
A quinta e última etapa constitui-se no tratamento dos dados da
pesquisa que objetiva revelar o perfil das organizações e dos sujeitos entrevistados.
As falas dos sujeitos dirigentes estão estruturadas respeitando a sequência das
questões abertas (Apêndice C) e foram aglutinadas de falas espontâneas de sujeitos
coordenadores quando agregam conteúdos ao assunto.
Visando a preservação das identidades individuais foram utilizadas
siglas compostas pelas primeiras letras das seguintes expressões: sujeito da
diretoria voluntária (SDV) e sujeito da coordenação (SC). Para organização das falas
dos sujeitos foi adotado número de ordem, observada a posição da entidade na lista
contida no Quadro 3, associada a sigla do sujeito, iniciando pelas sigla relativa aos
sujeito da diretoria voluntária (SDV) e posteriormente pelo sujeito coordenador (SC).
O ordenamento ficou da seguinte forma: SDV1 a SDV10 e SC1 a SC10. De igual
modo, para designar as entidades foram utilizadas letras de ‘A’ a ‘J’ tendo como
base a mesma a ordem.
2.2 Universo das Organizações Não Governamentais do município de Franca/SP
Nesta parte da investigação apresentam-se as informações obtidas
através da coleta de dados junto às ONGs pesquisadas. Primeiramente serão
demonstrados os aspectos quantitativos e as análises correspondentes, ambas
relativas ao perfil das organizações e dos sujeitos. Posteriormente, os aspectos
qualitativos serão revelados a partir da fala dos sujeitos que permitem efetivar as
reflexões a respeito da gestão das entidades.
Cabe esclarecer que a expressão ‘dirigente’ será utilizada para
designar sujeitos que pertencem ao nível de direção (diretoria) da entidade. No que
se refere à palavra ‘gestor’ seu emprego será genérico focalizando o campo de
atuação independente do nível na estrutura e do cargo que o sujeito ocupa, podendo
ser dirigentes, gerentes e coordenadores.
198
2.2.1 O perfil das Organizações
Gráfico 11 – Tempo de fundação das ONGs pesquisadas
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O exame a partir da data de fundação das ONGs entrevistadas
revela a maturidade organizacional presente na amostra. Com idade média de
16,8 anos, pode-se constatar que a ONG mais antiga possui acima de 50 anos de
existência enquanto a mais jovem apresenta 11 anos desde sua origem. Em
termos de período que concentra nascimento das entidades, aquele
compreendido entre as décadas de 1990 e 2000 é o mais significativo, sendo que
maior destaque deve ser dado ao surgimento de sete organizações no primeiro
decênio do presente milênio.
A investigação possibilitou identificar diferentes aspectos a respeito
da estrutura organizacional. O primeiro a ser demonstrado será a composição da
diretoria voluntária.
No que refere aos cargos existentes o padrão contido no formulário
(Apêndice A) busca identificar: presidência, vice-presidência, secretaria e tesouraria.
A pesquisa identificou que em 70% das organizações encontram-se referida a
formação padrão e nos 30% restantes são observadas pequenas variações nas
nomenclaturas dos cargos como, por exemplo, a inclusão de vice-secretaria, 1º, 2º e
3º secretários e tesoureiros com a mesma graduação. Assim, em sete organizações
199
a diretoria contém quatro cargos em sua formação, em duas seis e em apenas uma
este nível aparece com oito cargos.
O segundo aspecto corresponde à composição do conselho fiscal,
com seus titulares e suplentes, bem como o de administração. Em 50% dos casos
foi observada a presença de três titulares e três suplentes e nas demais
organizações apresenta-se a seguinte variedade na composição: três titulares e dois
suplentes; três titulares e um suplente; dois titulares e um suplente; e três titulares
sem a designação de um suplente.
Gráfico 12 – Conselho de Administração
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O terceiro aspecto refere-se ao conselho de administração. Duas
ONGs indicaram sua existência, sendo que uma informou sua composição com dois
membros e outra com 14. Se considerar a existência deste tipo de órgão interno, não
obrigatório do ponto de vista da legislação, como espaço adicional aos já existentes
(diretoria e atendimento da entidade), que contribui para o envolvimento de pessoas
da sociedade civil, pode-se inferir que apenas uma dentre as ONGs pesquisadas
mobiliza mais indivíduos no meio onde atua. Tal comportamento pode redundar, em
última análise, em maior interlocução com diferentes atores do município
viabilizando o incremento de ideias para a entidade e ampliação em termos de
fontes de financiamento.
200
O quarto aspecto diz respeito ao número de pessoas envolvidas nos
cargos de direção. Considerando o conjunto de cargos contidos nas diretorias e
conselhos, no contexto da participação de pessoas voluntárias no nível decisório das
ONGs, foi possível identificar o total de 97 dirigentes envolvidos nas 10 entidades
pesquisadas.
A efetiva presença e participação das referidas pessoas nas
atividades das organizações se constitui em tema tratado em parte das pesquisas
analisadas. Esta questão não faz parte das indagações do presente estudo,
entretanto, importa registrar que o número de indivíduos mobilizados releva-se
expressivo e com potencial para impulsionar o papel das entidades na cidade em
que atuam.
O quinto aspecto trata da participação de homens e mulheres na
direção das entidades, cujo exame não foi observado, ao menos nas pesquisas
examinadas neste estudo, no conjunto das análises sobre a gestão das ONGs. Com
frequência tem-se que a presença feminina prepondera nas atividades sociais e a
masculina em menor grau.
No momento atual observa-se, contudo, um aumento das reflexões
sobre a diversidade nas organizações em geral, com objetivos claros de tornar estes
espaços mais coerentes com a realidade demográfica. Assim, a presente
investigação insere algumas referências neste campo visando contribuir na
configuração da realidade e não buscando traçar qualquer associação entre gênero
e gestão, por escapar dos objetivos desta tese.
Considerando o cargo de presidente, dentre as 10 entidades
pesquisadas, oito são ocupadas por homens e duas por mulheres. No gráfico a
seguir, será demonstrada a composição no conjunto dos cargos de direção.
201
Gráfico 13 – Homens e Mulheres na Diretoria e Conselho Fiscal
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
No gráfico geral observa-se que a presença masculina se mostra
mais elevada correspondendo a 78% do total das pessoas mobilizadas no referido
nível das entidades, enquanto mulheres representam 22%. Quando examinados os
dados relativos à diretoria e conselho fiscal em separado os dados apresentam-se
da seguinte forma: na diretoria a maioria continua sendo masculina representando
73% e as mulheres 27%; na composição do conselho observa-se um aumento da
participação dos homens em relação às mulheres, com seguintes valores: 82% e
18% respectivamente.
Assim, seja neste ou aquele órgão da entidade, os homens
representam a maioria no âmbito da alta gestão. Em outras palavras, no que
concerne ao âmbito da instituição que planeja o futuro da organização e efetiva as
decisões cotidianas, atividades inerentes às diretorias, bem como as ações de
acompanhamento e validação no âmbito financeiro, próprias dos conselhos fiscais,
os dados demonstram que estes temas estão sob o predomínio do olhar masculino.
As informações obtidas permitem, ainda, examinar a relação entre
cargos ocupados por homens e mulheres no nível das entidades, conforme gráfico a
seguir.
202
Gráfico 14 - Homens e Mulheres na Diretoria e Conselho Fiscal (por entidade)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
As mulheres ocupam cargos diretivos em oito organizações (A, B, C,
D, F, G, H e J). Na entidade (G) há equilíbrio na ocupação dos cargos entre homens
e mulheres e nas organizações (E) e (I) somente homens ocupam as referidas
posições, inexistindo mulheres em seus quadros diretivos estatutários.
Nos dois gráficos abaixo é possível examinar a presença de homens
e mulheres na diretoria e conselho em separado.
Gráfico 15 – Homens e Mulheres na Diretoria
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
203
Ao observar isoladamente a diretoria pode-se analisar que, embora
exista um aumento no número de organizações compostas somente por homens em
relação ao quadro anterior (E e I) para (E, H e I) e a presença feminina em
organizações decaia de oito para sete (entidades A, B, C, D, F, G e J), em duas (B e
G) há equilíbrio entre homens e mulheres e em uma (C) há mais mulheres do que
homens. Em outras palavras, persiste a presença masculina em números elevados.
Gráfico 16 – Homens e Mulheres no Conselho Fiscal
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Quando se observa a distribuição entre homens e mulheres no
conselho fiscal a diferença se evidencia. Em cinco organizações (B, C, D, E e I) as
mulheres não compõem este órgão da gestão e dentre as cinco restantes, em uma
há equilíbrio (G) e em quatro (A, F, H e J) há alguma participação.
O exame em separado não revela alterações significativas na
ocupação de cargos diretivos por homens e mulheres, mantendo a predominância
da presença masculina. Entretanto, os dados apontaram para a sensível diferença
nesta relação no âmbito da diretoria no que se refere à presença feminina, assim
como evidenciou sua maior ausência junto ao conselho fiscal.
Além da estrutura organizacional o estudo possibilitou configurar
dados a respeito das equipes responsáveis pelas atividades. Quanto à função de
coordenação foi observada sua existência em todas as entidades pesquisadas,
sendo que em oito seus ocupantes figuram nos quadros oficias de funcionários
204
registrados de acordo com a Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT). Nos dois
casos restantes há situações distintas: em um o ocupante do cargo mantém vínculo
com a organização como prestador de serviço e noutro a coordenação é exercida
por um voluntário.
Considerando a participação de homens e mulheres na função
examinada e compara-la à função de presidência já analisada têm-se o seguinte
dado:
Gráfico 17 – Homens e Mulheres (Coordenação e Presidência)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Ao contrário da distribuição encontrada no cargo de presidente, a
coordenação em sua maioria é ocupada por mulheres, marcando clara diferenciação
nas organizações participantes da pesquisa: maioria de homens na gestão
institucional e preponderância de mulheres na gestão técnica.
205
Gráfico 18 – Escolaridade (coordenadores)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
A coordenação das entidades pesquisadas é efetivada por
profissionais, em sua maioria com formação superior, oriundos de diferentes
áreas do conhecimento. Os dados permitem observar diversidade em termos de
carreira, abrangendo: ciências humanas (Psicologia e Educação); ciências sociais
aplicadas (Serviço Social e Administração); ciências da saúde (Enfermagem); e
Linguística (Letras). Do ponto de vista do nível de escolaridade observa-se a
presença de oito profissionais com formação superior e dois de nível técnico,
dentre eles os profissionais da Pedagogia figuram em maior número (3), seguido
do Serviço Social (2).
Além da coordenação a investigação buscou caracterizar a equipe
técnica1 que atua nas entidades investigadas. As respostas indicaram a existência
de outros 19 cargos ocupados por 36 profissionais, todos com vínculo CLT. No
gráfico a seguir estão demonstrados tais cargos e os respectivos números de
profissionais que os ocupam.
1 Grupo de pessoas que detêm o conhecimento técnico relacionado à natureza da atividade
da organização. Não está relacionado ao cargo, mas sim ao conhecimento envolvido.
206
Gráfico 19 – Equipe técnica (outros cargos)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Dentre os múltiplos cargos informados quatro se destacam pelo
número de profissionais que ocupam tais posições. São eles: Enfermeiro (6),
Assistente Social (4), Psicólogo (3) e Operador de call center2 (3).
Vale destacar que, ao indagar as entidades sobre a composição da
equipe técnica, o entendimento a respeito da natureza técnica da atividade dos
profissionais não se mostrou unânime dentre os interlocutores que forneceram as
informações. Isto de certa forma responde por que os cargos de Assessor da
Administração, Auxiliar Administrativo, Coordenador e Operador de call center,
Motorista e Secretaria figuram no gráfico acima.
Apenas uma entidade informou a existência de profissionais da
equipe técnica e que não possui vínculo empregatício regido pela CLT. No total são
2 Estruturas físicas e de pessoas que realizam atividades via telefonia. As atividades
geralmente têm caráter de atendimento a usuários de um determinado serviço. No caso das atividades relacionadas às ONGs, estão frequentemente associadas à função de captação de recursos financeiros.
207
seis profissionais sendo um psicólogo e cinco educadores contratados como
prestadores de serviço.
No que diz respeito à escolaridade dos ocupantes da equipe técnica
a pesquisa revela predominância do ensino superior, assim como está demonstrado
a seguir.
Gráfico 20 – Outros cargos (escolaridade)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Do total de 36 funcionários 24 (66,7%) possuem nível superior, um
(2,8%) apresenta formação superior incompleta e sete (19,4%) indicaram ensino
médio. Em quatro casos (11,1%) as entidades não informaram o nível de
escolaridade dos ocupantes destes cargos.
Continuando no tratamento dos dados relativos à equipe, na próxima
ilustração apresentam-se os números de funcionários da função básica3 das
entidades com vínculo CLT.
3 Diz respeito ao quadro necessário (por força do método empregado e também por lei) para
realizar adequadamente os objetivos a que se propõe.
208
Gráfico 21 – Funcionários na função básica (CLT) por entidade
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
A pesquisa revela um total de 180 funcionários registrados em
regime CLT, sendo duas entidades com 13 (D e F) duas com nove (A e J), uma com
três pessoas (B), três instituições com dois (E, G e I) e uma com 127 (H), revelando-
se a maior em número de funcionários na função básica dentre as entidades
investigadas. Considerando a distribuição por sexo deste total, têm-se: 23% homens
e 77% mulheres. Este dado reforça as análises sobre a expressiva presença
feminina na realização das atividades das entidades.
O estudo objetivou, também, identificar a formação e a escolaridade
dos integrantes da referida equipe. Do total de 180 funcionários, a pesquisa teve
acesso à informação de 50 profissionais e apresenta os resultados nos próximos
dois gráficos. Os dados relativos aos demais (130) não foram revelados pelas
entidades pesquisadas.
209
Gráfico 22 – Formação equipe função básica
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Do total de 53 pessoas que integram a referida equipe quatro
profissões apresentaram frequência superior em relação às demais. A enfermagem
figura como a profissão com maior frequência da amostra pesquisada com oito
profissionais. Com valores próximos, a Pedagogia (6), Serviço Social (6) e
Administração (4) foram as profissões mais citadas. Nos 12 casos restantes do
quadro, seus componentes não possuem formação.
Gráfico 23 – Escolaridade equipe função básica
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
210
Os dados demonstram que a maioria, 27 integrantes do quadro
equivalente a 54% do total, possuem curso superior completo. Com a informação
pode-se afirmar que a função básica, de forma preponderante, está sustentada por
práticas profissionais efetivadas a partir de parâmetros, diretrizes, conceitos,
metodologias e instrumentos inerentes à formação universitária, sugerindo que as
atividades das entidades ocorrem tecnicamente alinhadas às profissões envolvidas.
Ao analisar em conjunto a formação da equipe da função básica e o
dado obtido no Gráfico 23, referente à escolaridade da equipe técnica, confirma-se
que, do ponto de vista da operação da entidade, a condução está sob a
responsabilidade de profissionais com formação superior. Em outras palavras, no
âmbito operacional das entidades, os elementos examinados permitem inferir sobre
a ausência de improvisos e execução amadora.
Com números inferiores estão presentes o ensino médio com 11
pessoas (22%), nível técnico com seis funcionários (12%) e ensino fundamental com
dois funcionários (4%). Foi observada a existência de um funcionário da função
básica com pós-graduação.
O estudo analisou o tempo médio do vínculo dos funcionários que
integram a equipe da função básica com as entidades nas quais atuam e o resultado
está apresentado na próxima ilustração. Apenas uma entidade não forneceu o
tempo de casa de seu profissional e outra não indicou profissionais na função.
Gráfico 24 – Tempo de casa da equipe função básica
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
211
Os dados mostram que os profissionais que atuam na função básica
permanecem nas organizações, considerando a média de anos, por tempos
similares, assim como apresentam as entidades A (3,4), B (3,3), D (3,5), G (3,4) e
até mesmo J (2,6). Destaque deve ser dado à organização (I) cujos profissionais
pertencem aos seus quadros por 13,5 anos em média. De igual relevância, mas com
valores menores figuram as instituições (E) e (F): 8,5 e 5,9 anos respectivamente.
A rotatividade de profissionais em uma organização é consequência
de leque complexo de condições e variáveis. Com frequência, ambientes que
apresentam baixo índice na relação entre saída e entrada de funcionários na equipe,
são, por um lado, espaços onde há práticas adequadas no campo da gestão de
pessoas e, por outro, são organizações onde os profissionais relatam graus
elevados de satisfação em suas carreiras profissionais e com a entidade onde atua.
A investigação não coletou informações a respeito das práticas de
gestão das pessoas, tampouco teve acesso a qualquer pesquisa interna às
entidades estudadas que identificasse o grau de bem estar percebido por seus
colaboradores. Contudo, com os dados apresentados pode-se supor que os
aspectos acima citados estão presentes nas ONGs em face da existência de
vínculos (tempos de casa) como os indicados.
Quanto a outros funcionários existentes, o estudo identificou os
seguintes cargos.
Quadro 8 – Outros funcionários
Entidade Cargos
A Não possui.
B Não possui.
C Coordenador de telemarketing, operador de telemarketing e mensageiros.
D Terapeuta ocupacional e arte terapeuta.
E Não possui.
F Educadores; pediatra, monitores de pintura, crochê e artesanato.
G Não possui.
H Não possui.
I Professores.
J Serviços gerais e terapeutas.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Dentre as 10 organizações pesquisadas cinco indicaram não possuir
funcionários além dos já informados enquanto, nas demais, foi possível observar
212
cargos variados que complementam o quadro de profissionais na realização das
atividades.
Para ampliar as análises efetivadas no que tange ao perfil das
entidades pesquisadas e ao campo da realização das atividades, ao lado das
equipes técnica e de função básica, figuram os voluntários. No conjunto das 10
organizações pesquisadas revelou-se o número de 85 pessoas e apenas uma
organização que informou a existência de voluntários não revelou número
específico.
Gráfico 25 - Voluntários
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O primeiro aspecto a considerar é a presença de pessoas
voluntárias atuando em todas as entidades, dado que reafirma a relação existente
entre o trabalho social executado por elas e o universo das ONGs. O segundo está
associado o número envolvido. Em duas organizações (A e C) foram informadas a
presença de um voluntário. Em quatro entidades os números estão no mesmo
patamar. São elas: (D) e (H) com três, (B) com quatro e (E) que relata a presença de
cinco pessoas no trabalho voluntário. Nas três instituições restantes observam-se os
números mais elevados configurando-se no destaque da amostra pesquisada. Na
sequência: (G) com 13 pessoas, (J) 21 e (F) que indicou 34 voluntários.
A pesquisa possibilitou identificar em quais atividades especificas
eles estão desempenhando seu trabalho. No quadro abaixo se apresenta o referido
dado por entidade.
213
Quadro 9 – Atividades dos voluntários
Entidade Trabalho desempenhado
A Nutricionista.
B Coordenação pedagógica, aula de artesanato e transporte de merenda.
C Trabalho administrativo.
D Musicoterapia, bazar e captação de recursos.
E Divulgação das atividades, vendendo as promoções (pizza). Dentista.
F Equipe da cozinha e oficina de cidadania.
G Professores de português, balé, canto e violão, inglês, rodas de leitura, artes marciais, pintura, matemática, marketing e empreendedorismo.
H Dentista e educadores.
I Docência e palestras
J Nutricionista, médico, fisioterapeuta, pintura, auxiliar administrativo, psicólogo, podóloga, monitor de artesanato, recreadores e monitores.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Como aqui se observa, as pessoas envolvidas no trabalho voluntário
realizam múltiplas atividades, seja no apoio administrativo, seja naquelas vinculadas
às atividades-fim da entidade. Para melhor retratar o espaço de atuação dos
voluntários na amostra pesquisada propõe-se classificar as atividades indicadas na
ilustração anterior em cinco modalidades de trabalho. Este procedimento resultou no
quadro abaixo:
Quadro 10 – Classificação da atuação dos voluntários
Modalidades de trabalho
Atividades indicadas Entidades (frequência)
Na administração
Trabalho administrativo; auxiliar administrativo. (C) e (J)
Em eventos Bazar; divulgação das atividades; vendendo as promoções (pizza).
(D) e (E)
Como funções Coordenação pedagógica; captação de recursos; equipe de cozinha.
(B), (F), e (D).
Caráter Profissional
Nutricionista; Dentista; Médico, Fisioterapeuta; Psicólogo, Podólogo.
(A), (H) e (J).
Vinculadas às atividades-fim.
Aula de artesanato; oficinas de cidadania; professores de português, balé, canto e violão, inglês, rodam de leitura, artes marciais, pintura, matemática, marketing e empreendedorismo; educadores; docência e palestras; recreadores; monitores e transporte de merendas.
(B), (F), (G), (H), (I) e (J).
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Com base na classificação acima foi possível identificar em quais
modalidades estão as maiores frequências.
214
Gráfico 26 – Modalidades de atuação dos voluntários
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O gráfico com as cinco diferentes modalidades, resultantes da
classificação contida no quadro 10, apresenta o respectivo número de entidades
(frequência) em cada uma delas. Duas observações se fazem necessárias.
Primeiramente cinco organizações (B, D, F, H e J) indicaram
atuações em mais de uma modalidade. Por esta razão a soma das frequências (16)
ultrapassa o número total das entidades pesquisadas (10). Em segundo, a
modalidade ‘na administração’ diz respeito exclusivamente à atuação voluntária
relacionada à realização das atividades e não deve ser confundida com a atuação
voluntária na direção da entidade, tema já tratado neste estudo.
A ilustração permite observar que as atividades vinculadas às
atividades-fim configuram a modalidade mais representativa dentre as apresentadas,
sendo indicadas pelas ONGs (B), (F), (G), (H), (I) e (J), correspondendo a 37% do
total da frequência. Em seguida aparecem duas modalidades (como funções e
caráter profissional) com indicação de três entidades em cada. Nos casos das
entidades (B), (F) e (D), a modalidade de trabalho voluntário efetivado corresponde a
uma função no centro da estrutura operacional. Nas organizações (A), (H) e (J), a
atuação voluntária está vinculada ao espaço de atuação de categorias profissionais
liberais. Cada modalidade corresponde a 18,8%.
As outras modalidades (na administração e em eventos) foram
indicadas por duas entidades representando, cada uma, 12,5%. A primeira foi
relacionada pelas organizações (C) e (J) e, a segunda, assinaladas pelas instituições
(D) e (E).
215
O presente estudo analisou a utilização de serviços terceirizados.
Assim, como as organizações dos demais setores, as ONGs têm à sua disposição
os mesmos mecanismos de contratação de profissionais e de serviços para
realizarem suas atividades de forma adequada e, no que se refere à amostra
pesquisada, observa-se a presença pouco expressiva deste tipo de situação.
Gráfico 27 – Utilização de serviços terceirizados
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Das 10 entidades, três indicaram a utilização de serviços
terceirizados em áreas bem distintas. Uma delas mencionou a contratação de
professores nas áreas da musica e informática através deste regime. Outra sinalizou
a contratação do sistema operacional que sustenta o call center e a última informou
a utilização nos serviços de contabilidade e auditoria.
Cada vez mais se exige da gestão das ONGs o cumprimento de
requisitos relacionados à prestação de contas e transparência dos recursos
(materiais e financeiros) envolvidos na realização das atividades. Para atender a tais
condições as entidades necessitam da orientação e, por vezes, execução de ações
de monitoramento e controle de informações que são realizadas por profissionais
especializados.
Considerando a realidade econômica das instituições, as atividades
de assessoria e consultoria deixam de ser buscadas e, quando ocorrem, na maioria
das vezes se efetivam sob a forma de contribuição voluntária. Vale inserir breve
esclarecimento a respeito da diferença entre os termos citados.
216
A pesquisa utilizou a expressão ‘assessoria’ para designar
atividades que são realizadas por profissionais externos à organização e que
auxiliam a execução de determinada tarefa. A ênfase neste caso está no apoio à
realização.
Quanto à ‘consultoria’ o sentido empregado relaciona-se às
atividades também realizadas por profissionais externos, mas voltadas para
aconselhamentos, pareceres, opiniões que visam auxiliar os gestores das
organizações a efetivarem decisões. Diferentemente do conceito anterior, o
destaque ocorre menos na ação de realizar e mais no ato de refletir sobre a ação a
ser executada.
No quadro a seguir, apresenta-se o dado relativo à assessoria.
Gráfico 28 – Utilização de assessoria
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O gráfico permite observar que 70% das entidades pesquisadas
informaram não utilizar atividade de assessoria, enquanto 30% utilizam no formato
de contribuição voluntária. Nestes casos, as assessorias se localizam nas áreas da
contabilidade, citadas pelas entidades (B) e (D), e jurídica indicada pelas
organizações (D) e (H). Vale destacar que a instituição (D) mencionou a utilização de
assessoria nas duas áreas comentadas.
Com relação à consultoria, de igual modo, os números mostram
baixa utilização.
217
Gráfico 29 – Utilização de consultoria
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Apenas 10% da amostra informou a utilização este tipo de serviço,
designando a contabilidade como área que recebe este serviço. No entanto a
maioria (90%) respondeu negativamente.
Gráfico 30 – Público alvo das ONGs pesquisadas
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
A investigação revela oito diferentes públicos. Três organizações
indicaram as crianças e adolescentes caracterizando-as como maioria na atenção
das organizações. As demais ONGs informaram sete diferentes categorias:
adolescentes; crianças; crianças, adolescentes e famílias; idosos; homens e
mulheres dependentes químicas; e pessoas com paralisia cerebral.
218
Se forem agrupadas pelas aproximações existentes as quatro
primeiras categorias (adolescentes; crianças; crianças e adolescentes; crianças,
adolescentes e famílias) poder-se-á afirmar que 50% da amostra apresentam foco
na criança e adolescente.
Tabela 23 – Atendimento Mensal
Entidade Número de
atendidos Notas explicativas
A 14 Realizado em alojamento
B 60 Similar a centro educacional
C 90 Atendimento diversificado
D 112 Atendimento ambulatorial
E 20 Realizado em alojamento
F 505 Similar a centro educacional
G 1200 Inclui atendimento realizado pelo Centro de Referência em
Assistência Social (CRAS) nas instalações.
H 1139 Centro educacional adicionado de convênio para atendimento de
Proteção Básica e Especial.
I 60 Similar a centro educacional
J 19 Alojamento
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Em termos de atendimentos efetivados pelas ONGs pesquisadas
podem-se observar números e situações distintas, o que não permite realizar
reflexões somente considerando o número total, sem antes levar em conta as notas
explicativas.
Nas entidades que realizam atendimento em alojamento (A), (E) e
(J) os números correspondem à quantidade de pessoas que permanecem por
períodos longos. Nestes casos o número continua praticamente o mesmo durante o
ano com poucas variações.
A nota explicativa ‘similar a centro educacional’ foi utilizada para
designar situações de atendimento em sala de aula, geralmente no período diferente
do curso que atendido faz normalmente (contraturno), e que consiste em atividades
cujo publico alvo também permanece por períodos longos, assemelhando-se a
situação de escola. Verifica-se tal cenário nas entidades (B), (F) e (I).
219
No caso da instituição (C) o número informado pode variar ao longo
dos meses, por incluir atividades em oficinas variadas e atendimentos desde
pequenos esclarecimentos a orientações prolongadas com respeito ao tema
trabalhado pela organização, razão pela qual se designou ‘atendimento
diversificado’.
Outras situações são observadas. No caso da organização (D) que
realiza atendimentos sequenciais para a mesma pessoa envolvendo diferentes
especialidades, de maneira rotineira e por períodos longos, os números mensais
representam praticamente o mesmo ao final de um ano. A entidade (G) realiza
oficinas variadas além de contabilizar os atendimentos que os profissionais do
Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) realizam nas próprias
instalações, fazendo crescer o número de atendidos e tornando-os híbridos, pois
somam alunos das oficinas com pessoas da comunidade que a procura. Por último
está a instituição (H) que integra centro educacional com vários níveis além de
atividades de atendimento de proteção social básico e especial de acordo com a
Política Nacional de Assistência Social (MDS, 2004).
Gráfico 31 – Outros atendimentos
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
A pesquisa examinou a existência de outros atendimentos bem
como sua modalidade e constatou que 100% da amostra realizam atividades para
outras pessoas além do público alvo. Na imagem acima há quatro classificações
distintas sendo que a mais representativa relaciona-se com o atendimento e trabalho
com famílias (5), seguida de atendimento e trabalho com famílias além da
comunidade (3), oficina de artesanato (1) e adultos moradores da região (1).
220
Ao agrupar as duas primeiras modalidades, que têm a família como
aspectos comuns, obtêm-se a maior frequência (8) evidenciando tal grupo como
relevante para o conjunto de entidades participantes do presente estudo.
Quadro 11 – Atividades desenvolvidas em outros atendimentos Entidade Descrição
A Orientação, supervisão e acompanhamento para facilitar tratamento do paciente,
palestras em escolas, conselhos e realização de fóruns.
B Oficina de artesanato em tecido.
C Não informado.
D Visitas da assistente social nas comunidades iniciando geração de renda.
E Não informado.
F Visitas domiciliares encaminhamentos para projetos e serviços.
G A entidade serve de ponto focal. CRAS vai para atendimento à comunidade. OAB já
fez atendimento no local.
H Atendimento médico, odontológico, psicológico e fonoaudiológico.
I Não informado.
J Atendimento a comunidade que chega solicitando serviço.
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Ao serem solicitadas para especificação das atividades que
desenvolvem em outros atendimentos, as organizações respondentes apresentaram
diferentes formas. Para (A) as atividades tem caráter de apoio ao seu atendimento
principal e adicionalmente realiza intervenções em outros locais, sempre vinculado
ao tema que trabalha. A (B) executa oficina que serve de certa forma como apoio às
atividades principais. As entidades (C), (E) e (I), não detalharam o que realizam. No
caso da organização (D) a atividade é conduzida por Assistente Social, o que
também ocorre com a (F), (G) e (J). A instituição (H), por possuir estrutura maior, faz
atendimentos clínicos à comunidade em suas instalações.
Para executar as iniciativas declaradas pelas organizações e
remunerar as equipes a elas vinculadas torna-se fundamental possuir recursos
materiais e econômicos para fazer frente aos resultados esperados. Do ponto de
vista dos recursos financeiros a investigação identificou como se dá a composição e
quais são as fontes das receitas institucionais, privadas e públicas, em suas
diferentes formas. Inicialmente o estudo revelou o seguinte quadro geral.
221
Gráfico 32 – Fontes de financiamento (quadro geral)
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O gráfico demonstra que nas entidades pesquisadas a presença do
recurso privado financiando as atividades ocorre de forma significativa. A análise
permitiu identificar a composição e as fontes de receitas, primeiramente, na
perspectiva geral. Assim, observa-se que a organização (A) apresenta recursos
privados e públicos na proporção 30% e 70% respectivamente. A entidade (B) indica
igual porcentual entre as duas origens possíveis. Com valores muito próximos as
ONGs (D) e (H) declararam a existência das duas fontes de recurso sendo que (D)
assinala 60% para origem privada e 40% de recurso público, enquanto (H) descreve
66,6% de fonte privada e 33,4% público.
Há quatro respondentes que assinalam a existência de única fonte
de financiamento. São eles (C), (E), (G) e (I) que indicaram 100% de origem privada.
Já as estruturas (F) e (J) demonstraram quadro distinto a anterior, ou seja, possuem
ambas as fontes de financiamento. Contudo mostram volumes diferentes, sendo a
primeira com 87% dos recursos oriundos da área pública e 13% da esfera privada e
a segunda 40% e 60%, nesta ordem.
Em resumo evidencia-se o seguinte cenário: a maioria (seis
organizações) possui as duas fontes de financiamento; quatro são financiadas
apenas por recursos privados; nenhuma entidade é financiada apenas por recursos
públicos; duas possuem recursos em maior volume do privado; três têm
222
financiamento maior do público do que do privado; e uma apresenta equilíbrio entre
as duas fontes.
As fontes de recursos públicas e privadas compõem-se de diferentes
tipos. A seguir o destaque será dado para a dimensão dos recursos públicos
observando três esferas de governo.
Tabela 24 – Recursos públicos (origem)
Entidade
Participação tipo
do recurso em
relação ao total das
receitas
Esfera
Outros
Municipal Estadual Federal
A 70% Sim Sim Não Sim
B 50% Sim Não Não Não
C 0 % Não Não Não Não
D 40% Sim Não Não Não
E 0% Não Não Não Não
F 87% Sim Sim Não Sim
G 0% Não Não Não Não
H 33,4% Sim Sim Não Sim
I 0% Não Não Não Não
J 40% Sim Sim Não Não
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O primeiro aspecto a observar diz respeito à participação do
montante de recursos públicos em relação ao total dos recursos existentes, nas
instituições que apresentaram este tipo na composição das receitas. Dentre as
pesquisadas, as entidades (A), (B), (D), (F), (H) e (J) possuem algum tipo de
financiamento público, sendo que (A), (B) e (F) evidenciam níveis consideráveis de
participação: 70%, 50% e 87%. As demais (D), (H) e (J) mostram níveis de
participação no orçamento mais baixo, na ordem de 40% para menos.
O segundo aspecto a pontuar refere-se à existência de valores
oriundos das três esferas de governo. As organizações (A), (F), (H) e (J) relatam que
há valores no orçamento de origem municipal e estadual. As instituições (B) e (D)
declararam vínculos de financiamento apenas no município. Nenhuma estrutura
mencionou recursos originados na esfera federal.
223
Cabe sublinhar que recursos oriundos do Fundo da Infância e do
Adolescente (FIA) foram apropriados na coluna ‘outros’ e não nas esferas, municipal,
estadual e federal, apenas com vistas à organização dos dados. Neste sentido a
tabela explicita que as entidades (A), (F) e (H) informaram a existência de tais
recursos.
Quanto aos recursos públicos vale esclarecer, adicionalmente, que
eles são viabilizados através de convênios, subvenções e auxílio, entre outras
formas4. Considerando a amostra analisada, no âmbito da esfera municipal, foram
observados os seguintes mecanismos com as respectivas frequências: Subvenção
(6); Convênio (1), e Auxilio (1). Na esfera estadual, duas formas se evidenciaram:
Convênio (2) e Subvenções (2). Estas últimas correspondem à emenda parlamentar
cujo acesso aos recursos ocorre via Subvenção.
O estudo possibilitou verificar as áreas de origem dos recursos
analisados até aqui.
Gráfico 33 – Esfera e área do financiamento público
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
Na esfera municipal observa-se que a maioria dos recursos tem
origem na área da Assistência Social (6) enquanto duas entidades sinalizaram o
acesso aos recursos da Educação. No âmbito estadual a Assistência Social também
aparece como maioria, sendo indicada por três entidades. Com uma indicação
aparece a área da Cultura.
Assim como o financiamento público, os recursos privados podem
ter diferentes origens. Na próxima ilustração serão demonstrados os tipos existentes
e o correspondente número de entidades da amostra que os utilizam.
4 Para conhecer as formas possíveis, ver Szazi (2001, p. 99–110).
224
Gráfico 34 – Fontes de financiamento privado
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
O gráfico permite considerar a existência de diferentes fontes em
três níveis distintos. Aquelas com maiores frequências, doações de indivíduos (5),
eventos e campanhas (5), contribuições associativas (4) empresas, institutos e
fundações empresariais (4), indicam o primeiro nível e evidenciam as mais
representativas.
Um segundo nível está demonstrado por fontes que tiverem
frequências menores e equivalentes, assim como: geração de renda própria (3) e
outras (2) com quatro indicações. Em terceiro figuram aquelas que foram sinalizadas
apenas por uma entidade cada. São elas: aplicações financeiras, retorno financeiro5
e agência internacional.
Ainda, sobre a análise do financiamento privado, na próxima tabela
será possível examinar como se comportam fontes mais representativas no âmbito
das organizações da amostra.
5 Referem-se, por exemplo, a aluguéis recebidos de imóveis cuja propriedade seja da
entidade.
225
Tabela 25 – Recursos privados (origem) Entidade A B C D E F G H I J
Total (*) 30% 50% 100% 60% 100% 13% 100% 66,6% 100% 40%
Subtipo de fonte
Contribuições Associativas
40% 0,07 50% 4%
Geração de Renda própria
13% 60,35% 0,08%
Doação de indivíduos
30% 80% 80% 0,77% 6%
Eventos 10% 20% 60% 10% 8,72% Aplicações financeiras
0,87%
Retorno financeiro
Empresas, Institutos e Fundações
Empresariais.
100% 0,82% 50% 21,20%
Agência internacional
0,57%
Outros 10% 3,07%
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral Nota: (*) o valor indica o porcentual do recurso privado em relação ao total dos recursos da entidade
e tem relação com o Gráfico 32. O dado que correspondente a entidade (H) sofreu arredamento.
Propõe-se iniciar a análise pelos subtipos das fontes cujas
frequências figuraram como mais representativas no gráfico anterior. A doação de
indivíduos indicada por cinco organizações, quando observada por entidade, permite
verificar que na instituição (A) este subtipo representa, na verdade, 100% dos
recursos, pois a totalidade informada (30%) corresponde à única fonte.
Este caso não se repete nas demais entidades (C), (E), (H) e (J) que
informaram recursos da mesma origem, pois têm outras fontes. Ainda assim, para as
organizações (C) e (E) o subtipo responde por 80% de suas receitas o que sugere a
necessidade de estabelecimento de estratégias bem desenvolvidas para captar um
tipo de recurso sobre o qual se tem pouco controle em sua entrada. Nas situações
das ONGS (H) e (J), o quadro difere do anterior face ao porcentual menor de
participação do subtipo em questão e por existir distribuição maior entre as várias
fontes existentes.
Considerando o subtipo ‘eventos’ a tabela demonstra que cinco
participantes da amostra informaram a existência desta modalidade na composição
dos recursos de financiamento das atividades. Em três organizações (B), (E) e (J) os
226
valores porcentuais ficam próximos: 10%, 10% e 8,72% respectivamente. Na (C) o
porcentual sobe para 20%. O destaque fica com a entidade (D) que apresenta o
subitem como única fonte de financiamento privado e com seu valor total (60%).
Com a frequência (4) estão os subtipos ‘contribuições associativas’ e
‘empresas, institutos e fundações empresariais’. O primeiro está indicado na tabela
pelas entidades (B), (H), (I) e (J) sendo os valores mais significativos àqueles
informados por (B) 40% e (I) 50%. Na situação (B) o recurso responde pela quase
totalidade dos recursos de origem privada. Para (I) o total de financiamento da
instituição vem de duas fontes e as contribuições associativas correspondem a uma
dentre elas.
Como visto no capitulo anterior o protagonismo das empresas e
outras organizações de origem empresarial, como institutos e fundações, têm se
mostrado cada vez mais presente na cena contemporânea, dado que por um lado é
reforçado na amostra pesquisada na medida em que 40% (organizações (G), (H), (I)
e (J)) informaram a existência deste subtipo como fonte de seus recursos. Por outro
se observa o espaço existente ainda não ocupado pelas empresas no município
(seis respondentes não indicaram recursos neste subtipo).
Quando examinados os dados de cada organização constatam-se
três situações. Para a entidade (G), por ter apenas uma fonte para seu
financiamento, este subtipo se traduz no mais relevante, pois se trata de contexto
em que uma empresa mantém a organização integralmente. Nos casos das
instituições (I) e (J), o recurso de origem empresarial representa a metade dentre
todos os recursos privados existentes originários de outras fontes. Para a ONG (H)
este subtipo tem pouca participação por existirem outros recursos no orçamento da
instituição com maior participação.
A geração de renda própria, como subtipo de fonte de
financiamento, foi mencionada pelas entidades (F), (H) e (J), sendo que para as (J)
representa apenas 0,08% do total de recursos privados. Oficinas de artesanato
constituem-se na a atividade geradora desta receita.
Para a organização (F), o porcentual se mostra mais representativo
(13%), especialmente porque se trata da única fonte de recurso privado. Nesta
entidade a usina de reciclagem responde pelo porcentual informado.
Destaque deve ser dado para a situação encontrada na instituição
(H) que indica neste subitem o valor de 60,35% de participação dentre 66,6%
227
informado como o total de financiamento privado. Em outras palavras, o subitem,
para esta entidade, corresponde a pouco mais de 90% de todo o financiamento de
origem privada e que tem, na renda de aluguéis dos imóveis e receitas de serviços
prestados, a estratégia que permite configurar estrutura menos comum no setor,
conhecida por organizações autossustentáveis.
Nos demais subtipos verificam-se os seguintes contextos:
‘aplicações financeiras’ e ‘agência internacional’ foram mencionados apenas pela
organização (H). Em ‘outros’ as ocorrências referem-se a duas situações: para
entidade (E) expressam recursos oriundos de outra ONG; para instituição (H) a
origem do dado (3,07%) não foi revelada.
Um aspecto importante para concluir a analise sobre o perfil de
financiamento das entidades participantes da amostra tem relação com a
diversidade de fontes, tema debatido nos meios de discussão sobre gestão de
ONGs e prática estimulada como referência para as organizações que visam
sustentabilidade financeira.
Duas instituições da amostra possuem tal diversificação e informam
recursos públicos de várias esferas e, privadas, de várias fontes. Tratam-se das
estruturas (H) e (J), cuja primeira deixou de indicar na fonte privada os subitens
‘eventos’ e ‘retorno financeiro’ e a segunda não atribuiu valores em ‘retorno
financeiro’, ‘agência internacional’ e ‘outros’.
A investigação procurou conhecer se as instituições da amostra
desenvolvem seus planos de trabalho, mesmo considerando que tal documento
figura quesito obrigatório para o acesso a recursos nas diferentes esferas públicas,
quando do relacionamento com financiadores privados de origem empresarial.
Foi possível constatar em 100% das entidades pesquisadas a
utilização deste instrumento como mecanismo de estruturação das atividades. Seu
conteúdo é diversificado obedecendo a padrões específicos, não sendo objeto de
analise do presente estudo, exceto a informação sobre as atividades
socioeducativas.
De maneira geral na composição destas atividades figuram oficinas
e cursos sobre diferentes áreas e temas, atividades de acompanhamento, orientação
do publico alvo atendido e de famílias, reuniões socioeducativas grupais, visitas
domiciliares e acompanhamentos.
228
As oficinas foram citadas nos planos de ação em três entidades, cursos
envolvendo disciplinas como matemática, português, na área de esportes, artes e
capacitação profissional também são apontados por três instituições. A palavra
atendimento aparece em apenas um plano e atividades com as famílias em dois.
Duas organizações não responderam de forma objetiva sobre o
conteúdo do plano demonstrando, em seu lugar, os objetivos da própria entidade.
O último aspecto analisado e que compõe o perfil das ONGs
pesquisadas diz respeito à existência de certificações em conselhos de direitos. Das
10 entidades da amostra duas não possui quaisquer certificados e inscrições em
conselhos. Considerando as oito instituições restantes, seis apresentam certificado
no Conselho Municipal dos Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA), seis no
Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS).
Outros conselhos foram citados, sendo que cada um por apenas
uma organização. São eles: Conselho Municipal sobre Drogas (COMADE), Conselho
Municipal da Saúde (CMS), Conselho Municipal da Terceira Idade (COMUTI) e
Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).
2.2.2 O perfil dos sujeitos
A investigação foi realizada a partir de dados colhidos através de
entrevistas com dois tipos de sujeitos distintos. Visando capturar informações sobre
a entidade, no âmbito de sua caracterização e gestão técnica, foi entrevistado,
primeiramente, o sujeito indicado pela organização para responder as perguntas, o
coordenador, no item ‘O perfil das Organizações’. A dimensão da gestão institucional
foi alcançada através de entrevista com um dos dirigentes voluntário para responder
às questões abertas. Assim, coordenadores e dirigentes constituem-se os sujeitos
deste estudo.
Importante esclarecer que para preservar a identidade dos sujeitos e
atendendo às especificações do Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de
Ciências Humanas e Sociais da UNESP, campus de Franca, foram utilizados letras
para revelar suas falas, por exemplo, Sujeito Coordenador (SC), e das entidades
investigadas, um dos dirigentes voluntários os quais receberam a denominação
SDV. Em ambos os casos foram adicionados a letra ‘s’ o que significa concordância
229
verbal quando se trata do plural. A sequência numérica nas siglas adotadas recebe
numeração de 1 a 10 (SC1 e SDV1 etc.) com a finalidade de organização dos dados
referentes à fala dos sujeitos. Não necessariamente correspondem às entidades
identificadas na amostra do universo (Quadro 3).
Inicialmente serão apresentadas as informações relativas ao sujeito
coordenador (SC) e, antes de revelar o perfil individual, propõe-se conhecer a
perspectiva geral.
A função de coordenação nas entidades pesquisadas não possui
padrão determinado em termos de nomenclatura de cargo, sendo efetivada por
equipe de nível superior, madura do ponto de vista da experiência e prática
profissional, não acumula papel de direção, mas elabora o plano de ação e, em certa
medida, envolvem-se com atividades em outras ONGs além da que atuam.
Constata-se este traço marcante no perfil dos sujeitos coordenadores (SCs).
Considerando o cargo que ocupam apenas três possuem o título de
coordenador efetivamente. Nos demais sete casos, as nomenclaturas são distintas.
Há dois que figuram como Assistentes Sociais. Na sequência aparecem as citações
com apenas uma frequência: Diretora Presidente, Presidente, Cuidadora, Diretor de
Projetos e Auxiliar Administrativo.
Excetuando-se as situações nas quais os sujeitos ocupam posição de
direção (Diretora Presidente, Presidente e Diretor de Projetos), há dois cenários onde a
coordenação é desenvolvida por pessoas cujos cargos ocupados não são compatíveis
com a função que exercem (Cuidadora e Auxiliar Administrativo). Ainda que tais sujeitos
tenham o respeito da organização e equipe pelo conhecimento que possuem, esta
condição carece de ajustes e denota menor preocupação da gestão com o tema.
No que se refere à faixa etária média, o conjunto de SCs apresentou
o indicador de 46,4 anos. A investigação identificou que os respondentes estão, em
média, oito anos e dois meses na função, observando a ONG onde atua e outras em
que já atuou. Quanto ao tempo do vínculo de trabalho com a entidade pesquisada,
os respondentes apresentaram a média de oito anos e quatro meses. A análise
integrada dos três últimos dados revela um grupo de profissionais cuja maturidade
se evidencia, seja no aspecto da idade, seja no campo da prática profissional.
Ao mesmo tempo em que estes dados sugerem equipes
consolidadas e conhecedoras da realidade onde atuam, permite, igualmente, supor
que a renovação de profissionais não ocorra de forma frequente. Quando ONGs
230
focalizam as políticas internas neste campo podem favorecer, tanto a oxigenação
bem vinda aos processos internos, quanto contribuição na formação de outros
trabalhadores que buscam o campo social como prática profissional.
No item escolaridade os dados demonstram que os SCs em sua
maioria (oito) possuem formação superior, enquanto dois indicaram o ensino médio
como maior formação obtida. Dentre os respondentes quatro possuem curso de pós-
graduação. Três sujeitos cursaram programas lato sensu nas seguintes áreas e
respectivas quantidades: um em Direito Civil, outro Master of Business
Administration (MBA) em Gestão Empresarial e dois em Psicopedagogia, sendo que
um SC cursou também Metodologia do Ensino Superior.
Completa-se o perfil deste grupo com as seguintes informações. Do
total de SCs entrevistados, oito não pertencem à diretoria da instituição e quatro
assinalaram envolvimento em outras ONGs. Ainda, oito elaboraram o plano de ação da
organização, mas todos os sujeitos afirmaram acompanhar as atividades nele inseridas.
A tabela a seguir introduz a perspectiva individual na identificação
dos sujeitos entrevistados.
Tabela 26 – Identificação dos sujeitos coordenadores (SCs)
Sujeito Cargo Idade Escolaridade
SC1 Assistente Social 30 Superior
SC2 Auxiliar Administrativo 41 Ensino Médio
SC3 Diretora Presidente 52 Ensino Médio
SC4 Coordenadora 50 Superior
SC5 Presidente 39 Superior
SC6 Coordenadora 54 Superior
SC7 Cuidadora 53 Superior
SC8 Diretor de Projetos 50 Superior
SC9 Coordenadora 69 Superior
SC10 Assistente Social 26 Superior
Fonte: Elaborador por Roberto Galassi Amaral
231
A SC1 atua como Assistente Social, tem 30 anos de idade com
formação em Serviço Social e possui especialização lato sensu em Psicopedagogia.
Tem experiência de 10 anos na função e está há nove na organização. Não faz
parte da diretoria, participa de outras ONGs na direção de creche além de
coordenação pedagógica e escolar de outra entidade. Relata, também, que elabora
e acompanha o plano de ação da entidade.
A SC2 ocupa o cargo de auxiliar administrativo, está com 40 anos de
idade e informa o Ensino Médio como seu grau de escolaridade. Há dois anos na
função relata ter vínculo profissional com a instituição há seis. Declarou que o plano
de ação não foi preparado por ela, mas afirmou acompanhar todas as atividades.
A SC3 é fundadora da instituição e atualmente figura como Diretora
Presidente da organização. Tem 52 anos de idade e declara possuir o Ensino Médio.
Está na função desde a constituição da entidade e faz parte da diretoria voluntária.
Informa, ainda, que elaborou e acompanha as atividades do plano de ação, não se
envolvendo com outras organizações.
A SC4 é coordenadora. Tem 50 anos de idade, nível superior cuja
profissão não foi informada e possui dois cursos de especialização (lato sensu). O
primeiro em Psicopedagogia e o segundo em Metodologia do Ensino Superior.
Informa estar na função há quatro anos na entidade 14 e declara ter elaborado o
plano de ação bem como acompanha sua efetivação. Quanto ao envolvimento na
diretoria da organização assinalou que não tem cargo algum e que participa de outra
entidade.
O SC5 atua no cargo de Presidente da entidade e tem 39 anos.
Advogado de profissão cursou especialização em Direito Civil. Há 14 anos na função
e há 10 na organização, afirma que elabora e acompanha o plano de ação. Declara
que participa de outras ONGs na condição de voluntário realizando palestras sobre o
tema que trabalha.
A SC6 coordena as atividades na instituição. Assistente Social de
formação têm 54 anos de idade e não possui curso de especialização, mas informou
ter participado de cursos de extensão universitária na área de família e grupos além
de teoria e prática do Serviço Social. Com relação ao plano de ação da instituição
relata que elabora e acompanha sua realização. Revela que não participa da
diretoria da entidade e está envolvida com outras ONGs onde voluntariamente
coordena grupo de apoio e atua na função de conselheira fiscal.
232
A SC7 atua na função de Cuidadora, tem 53 anos e possui formação
em Pedagogia. Como professora relata que ocupa tal função há 16 anos e mantém
vínculo com organização pesquisada há seis. A elaboração do plano de ação está
sob sua responsabilidade, assim como seu acompanhamento, e assinala não estar
envolvida na diretoria da instituição, não participando de atividades em outras ONGs.
O SC8 responde pela Diretoria de Projetos. Engenheiro formado,
não declarou a especialidade da engenharia e possui o título de Master of Business
Administration (MBA) em Gestão Empresarial. Com 50 anos de idade, está na
função e na organização há um ano e cinco meses. O plano de ação não foi
elaborado por ele face à recente entrada nos quadros da instituição tendo sido
herdado da gestão anterior, mas acompanha sua efetivação. Ele não pertence à
diretoria e relata não ter envolvimento com outras entidades.
A SC9 ocupa a função de Coordenação Pedagógica e relata
também ocupar o cargo de Diretora Superintendente. Com 69 anos é formada em
Pedagogia, estando na função e na ONG há 15 anos. Elabora e acompanha as
atividades relativas ao plano de ação e declara não participar de outras
organizações.
A SC10 é Assistente Social de formação e atua no mesmo cargo.
Com 26 anos de idade, configura-se no SC mais jovem do grupo entrevistado.
Declara estar na função, bem como na instituição, por um ano e seis meses, tendo
elaborado o plano de ação e efetivado seu acompanhamento. Não participa de
outras organizações.
Os 10 sujeitos da diretoria voluntária (SDVs) completam o quadro de
respondentes da investigação. Do ponto de vista geral o grupo é formado por sete
homens e três mulheres que ocupam cargos distintos: sete presidentes, sendo que
seis declararam o título específico de presidente enquanto um informou ocupar o
cargo de diretor presidente.
Adicionalmente evidenciou-se um tesoureiro, um 2º tesoureiro e um
que se declarou fundador, não especificando um cargo em particular. Vale destacar
que a presença de fundadores neste grupo é relevante, pois cinco dentre os 10
(SDVs), se apresentaram desta forma. Cenários com estas características sugerem
a tomada de consciência por parte de tais atores quanto aos processos de longo
prazo da organização, em particular relativos à inovação e profissionalização da
gestão.
233
Na ilustração abaixo se apresenta a identificação adotada no
presente estudo.
Quadro 12 – Identificação dos sujeitos dirigentes voluntários (SDVs)
Sujeito Gênero Cargo
SDV1 Masculino Fundador
SDV2 Masculino 2º Tesoureiro
SDV3 Feminino Tesoureiro
SDV4 Feminino Diretora Presidente
SDV5 Masculino Presidente
SDV6 Masculino Presidente
SDV7 Feminino Presidente
SDV8 Masculino Presidente
SDV9 Masculino Presidente
SDV10 Masculino Presidente
Fonte: Elaborado por Roberto Galassi Amaral
2.2.3 A fala dos sujeitos
As entrevistas com os sujeitos dirigentes voluntários (SDVs) foram
orientadas por formulário (Apêndice C) contendo questões abertas vinculadas a três
eixos distintos:
Visão geral sobre a gestão;
Um olhar sobre a realidade;
Sustentabilidade financeira.
Tendo em vista o primeiro eixo os SDVs foram abordados com a
indagação: como se dá a gestão na entidade? O segundo resulta de três
interrogações complementares entre si que possibilita alcançar o olhar avaliativo a
respeito das práticas institucionais. Assim, foram solicitadas respostas às perguntas:
O que está certo? Por quê? O que está errado? Por quê? O que precisa mudar? O
terceiro eixo foi revelado a partir do questionamento a respeito das dificuldades
financeiras e como superá-las.
As entrevistas com os sujeitos coordenadores (SCs) tiveram ênfase
em aspectos quantitativos (Apêndice A). Entretanto, em alguns casos, foi possível
234
registrar impressões que trazem conteúdos qualitativos e que serão adicionadas ao
presente capitulo a fim de complementar o entendimento sobre suas falas.
A forma de gerir a instituição, primeiro eixo, está inserida
historicamente no percurso trilhado por seus fundadores e no enfrentamento das
lutas cotidianas para levar a cabo os objetivos de instalação da entidade como
atores da sociedade civil. Em um cenário onde o sentido da ação parece evidente
aos olhos de seus autores, não se medem esforços para efetivar condições
necessárias que a viabilizam. O relato do sujeito abaixo (SDV8) faz emergir as bases
iniciais.
No início dessa associação, o próprio presidente, as próprias pessoas da diretoria, elas mesmas administravam a entidade, porque tinham dificuldade de recurso, não tinha como remunerar um executivo. O fundador, ele administrou e foi presidente, [...] ele ficou praticamente 30 anos administrando a própria entidade, construiu, buscou recursos, tanto recursos no exterior (ele tinha muitos contatos) projetos que ele buscou. (SDV8).
A primeira questão contida na fala do dirigente dá conta do tempo no
qual o fundador administrou a própria entidade, realidade que se pode observar em
outras organizações que compõem o Terceiro Setor. O período de limitações
financeiras impostas, seja pelas condições da própria direção em alcançar recursos,
seja pelo baixo volume de doações oriundo de outros atores sociais, faz com que
lideranças se sobrecarreguem na tarefa de viabilizar projetos e ações.
Nesta fala evidenciam-se, de igual modo, aspectos que merecem
reflexão. O item financeiro surge como tema que perpassa todas as áreas das
entidades, permanecendo como problema desde a fundação da ONG assim como
durante todos os dias de sua existência. Esta necessidade reflete a natureza
constitutiva das organizações da sociedade civil que, não lucrativas, mantêm-se
captando recursos da sociedade, Estado e organizações privadas a todo o instante.
Em que pese a atual legislação das Organizações Sociais permitir,
em determinadas condições a existência de produtos e serviços que podem gerar
receitas para as entidades, a realidade tem mostrado que tal condição não está
acessível a todas elas, pelo menos até o momento presente. Este quadro faz com
que o tema ‘finanças’ seja central e foco da atenção da diretoria.
A fala do dirigente (SDV8) delineia, também, tarefa corretamente
atribuída aos demais membros da direção, que não se constitui necessariamente em
235
gerir de forma operacional a entidade, mas sim ocupar-se do futuro e com os
recursos para viabilizá-lo, por serem os representantes diretos da consecução das
finalidades da instituição perante a sociedade.
Outra questão contida em nesta fala reside no fato de associar a
presença de um executivo a um cenário favorável do ponto de vista financeiro, uma
vez presente na instituição possibilita ao fundador dividir a tarefa da administração.
Esta citação permite observar que em muitos casos a presença
persistente do fundador na gestão da organização está, também, associada à
postura centralizadora da diretoria que se opõem ao processo de profissionalização
colocando, em primeiro lugar, a questão racional sobre falta de recursos, sem admitir
outra possibilidade.
Tal comportamento se justifica, em certa medida, porque a
expressão ‘minha ONG’ permanece presente no ambiente das organizações do
Terceiro Setor. São dois lados da mesma moeda. A ONG necessita do envolvimento
intenso de seus fundadores e líderes, com a finalidade institucional. A
responsabilidade, que os orientam na ação, amplia-se com sentido de pertencimento
inerente a ele. O mesmo envolvimento pode produzir a centralização que, se
efetivado como método de gestão, fortalece o significado de posse percebido na
expressão. Somente a capacitação de tais lideranças poderá levá-los à
compreensão a respeito da contradição entre a natureza coletiva da instituição e
formas centralizadoras de gestão.
Não gerimos nada sozinho. [...] apesar de estar à frente no trabalho da gestão, eu tenho muita ajuda. Todo o pessoal que está ligado a mim, da diretoria, está sempre ajudando na gestão. A gestão é dia a dia. Você faz um cronograma, mas, por exemplo, amanhã eu vou fazer tal coisa. Não existe isso. Amanhã vão aparecer 10 pessoas para você atender com casos diferentes e você tem que deixar de fazer algo para poder atender aqui. Nosso primordial é o atendimento com qualidade. Toda parte burocrática, a parte financeira passa pela minha mão, os pagamentos, os controles tudo isso sou eu que faço. (SDV3).
No inicio da sua fala o sujeito SDV3 se apresenta com estilo
cooperativo e reconhece a contribuição da equipe e pares. Ao final este quadro se
altera suscitando postura centralizadora e revelando incompatibilidade entre as duas
situações.
Outro tema contido nesta fala diz respeito ao planejamento e foco no
atendimento. Tal situação se mostra irrepreensível, pois não há o que se opor a este
236
cenário, sendo esperado que o atendimento figure como prioridade absoluta.
Contudo, a fala não deixa claro se o cronograma elaborado anteriormente é
retomado para ser realimentado com as informações resultantes das análises sobre
a relação: previsto versus realizado. Somente desta forma a aprendizagem obtida
com este processo pode ser formalmente integrada ao planejamento das atividades
tornando o cronograma um instrumento realístico.
A diferença entre as situações refletidas (cronograma hipotético e
cronograma realístico) está no campo da confiabilidade. Se cronogramas são
constantemente deixados de lado, denotam pouca confiabilidade não passando de
papel esquecido na gaveta. Por outro lado, cronogramas reais são instrumentos que
estão à vista de todos, são reanalisados frequentemente frente à realidade e
inspiram maior confiança.
Outra fala que carrega sutilezas se apresenta a seguir.
A nossa gestão é centralizada na diretoria. A diretoria é independente. [...] e todas as decisões são tomadas nessa diretoria. Essa diretoria, normalmente, a cada dois meses, ou quando necessário, eventualmente numa necessidade, se reúne num espaço menor, mas normalmente são dois meses. (SDV2).
Ela faz uso da expressão ‘centralizada’ significando a forma de
conceber a gestão como algo que ocorre somente no nível da direção, reforçando
um modelo rígido de distribuição de tarefas entre a diretoria e os demais atores,
enquanto parte integrante da entidade, e que se encarregam da operacionalização
das atividades. Adicionalmente a expressão ‘independente’ sugere duplo sentido:
não ser afetada por questões alheias aos objetivos e, mesmo, não ouvir ninguém.
Considerando a natureza coletiva das entidades, a gestão
centralizada combinada com a prática de não ouvir as pessoas, se constitui em
modelo incompatível e que deve ser repensado por todos os envolvidos, face aos
efeitos negativos sobre toda a organização, incluindo colaboradores e atividades.
Outro fator a ser levado em conta se refere à própria natureza das entidades
filantrópicas, sem fins lucrativos, exigidas na Política Nacional da Assistência Social,
a inclusão, a participação direta da coletividade beneficiária dos serviços que efetiva
a cidadania. O que se torna claro são as distâncias entre os níveis decisórios e os de
execução.
237
Falas adicionais contribuem com novos elementos para refletir sobre
a maneira como a gestão ocorre.
A ONG [...] tem uma diretoria legalmente constituída que estabelece normas, cria condições e cuida de acompanhar o desenvolvimento de projetos educativos definidos [...]. (SDV7).
Neste caso SDV7 demarca claramente atribuições voltadas para
dentro da entidade no estabelecimento de normas e geração de condições para a
realização das atividades, contudo não explicita atividades que se localizam na
esfera do pensar o futuro da organização e na busca de recursos.
A gestão se dá por intermédio de uma diretoria e nossa superintendente [...] que coordena todos os projetos mais a [...] assistente dela. O sistema é exatamente isso. Deliberamos sobre projetos, finanças. Qualquer assunto é deliberado na reunião de diretoria que ocorre uma vez por semana na sede da entidade. (SVD9).
Para SDV9 há definição clara entre os níveis de diretoria e execução
das atividades, efetivada pela referida superintendente. Assim, entre deliberação e
execução a organização segue seu cotidiano.
Outra resposta reforça o raciocínio de atribuição das questões
administrativas à diretoria.
A Instituição tem duas vertentes. A área administrativa e área terapêutica [...] a parte administrativa é toda realizada pela diretoria que são diretores voluntários, que fazem o trabalho estatutário (documentação, financeiro, parte de organização). Da parte burocrática é tudo feito por estes diretores. (SDV1)
Neste caso SDV1 faz distinção ampla dividindo administração e
atendimento associando a primeira a aspectos burocráticos. Com tal afirmação
evidencia a compreensão sobre gestão vinculada ao universo da burocracia e
formalismo, também presente de forma frequente no universo das entidades.
Ao atribuir responsabilidade de dirigente inserido na dimensão das
tarefas administrativas, deixa de trazer para os membros da diretoria atividades que
potencializam o nível de conhecimento que possuem, de relacionamento e de visão
a respeito do propósito da ONG. Em certa medida este cenário responde por que as
organizações têm dificuldades em renovar, atrair e manter membros da diretoria:
tema sinalizado pelas falas seguintes.
238
Sou atualmente segundo tesoureiro [...] esse me parece que vai ser o sexto mandato que nós temos aqui como corpo diretivo da Associação. Os meus primeiros quatro anos foram dois mandatos, como tesoureiro, posterior foi presidente, em seguida dois anos estive fora da diretoria, por questão de descanso mesmo e voltei há quatro anos (há dois mandatos atrás) como presidente novamente. Portanto foram quatro anos como tesoureiro, três como presidente, são sete anos. Outro se iniciou agora, em Janeiro de 2012, uma nova diretoria, a qual eu sou o segundo tesoureiro também. (SDV2).
O relato de SDV2 não evidencia as razões para a sucessão de
gestões que realizou, mas pode-se inferir que o número de candidatos à sucessão
não se mostra suficientemente elevado para dar conta de renovações constantes.
Cabe frisar que a renovação integral dos cargos, a cada eleição, pode também
acarretar dificuldades. Por esta razão, parte das organizações estabelecem critérios
para este fim no âmbito do estatuto.
Outro depoimento reforça o debate.
São 12 pessoas, e geralmente as pessoas se cansam, então de 12 você pode contar aí quatro, cinco e seis, que pegam firmes mesmo, que trabalham pra vender rifa, pra vender pizza, pra vender jantar e vários eventos que a gente faz durante o ano para manter a Entidade, mas eu sei que com o apoio de um ou de outro, se um está cansado , o outro não, cada um vai dando o apoio final, sabe sempre todos se unem, e a gente tem um final feliz. (SDV4).
A vivência de SDV4 demonstra que mesmo contando com certo
número na composição dos cargos da diretoria, com o tempo o ânimo de seus
membros sofre alterações afetando o cotidiano, especialmente se considerar as
reflexões anteriores a respeito da natureza das atividades designadas aos
dirigentes. No caso, a fala indica a superação do quadro adverso pela cooperação
entre as pessoas.
A sucessão se mostra tarefa complexa e faz suscitar expressões
protagonizadas pela fala a seguir.
Juridicamente falando a gestão da organização se dá pela nomeação do presidente, vice-presidente e conselheiros, sempre com o mandato de dois anos. Na verdade não realizam a eleição, pois quem assume é quem está disponível (“quem vai pegar o pepino”). Estamos tentando profissionalizar o máximo. Na verdade é muito bonito pegar uma ata com presidente e vice-presidente, conselheiro e na verdade ninguém está empenhado em realizar nada. (SDV5).
239
O sujeito SDV5 sintetiza crítica de muitos dirigentes que possuem
responsabilidade em gerir a entidade além de evidenciar prática recorrente em
muitas organizações, auxiliando a compreensão a respeito da alternância de poder e
sucessão nas diretorias das entidades e aproximando-se da indicação de Coelho
(2000, p. 116): “[...] a existência do estatuto é pro forma [...].”
Na medida em que as opções para a composição dos conselhos de
dirigentes oferecem poucas possibilidades, os quadros se repetem alternando,
eventualmente entre os cargos. Neste contexto a prioridade se torna identificar
aquele que seguirá na realização da tarefa. Os objetivos da instituição e seus
resultados passam a ser subordinados ao quadro adverso.
Escolhas forçadas como a descrita no referido relato, tendem a
afastar membros da sociedade das ONGs além de contribuir com o reforço de
exemplos equivocados no que se refere à dinâmica interna das entidades.
Cabe destacar, entretanto, que tal comportamento não carrega
necessariamente dolo, se considerar a ausência de líderes para assumir a tarefa.
Importa colocar luz sobre as razões que levam a comunidade a participar em níveis
que inviabilizam o surgimento de pessoas identificadas com a função de dirigentes.
As ONGs, pela natureza coletiva e pública de sua constituição, reverberam o
envolvimento e mobilização da sociedade que as cercam.
Em outros contextos onde a presença de líderes se apresenta mais
elevada, a gestão retoma o curso original de seu significado, tornando os ambientes
mais facilitadores para seus objetivos.
Através de uma diretoria, dificilmente nós tomamos decisões unilaterais. É sempre colocado ao grupo, isso decisões de última estância. A administração é feita através de uma gerente, que administra toda a parte operacional. A gestão é feita em grupo, é feita em conjunto com a diretoria. Reunião oficial uma vez por mês, surgindo alguma coisa em evidência, ou que demande um menor tempo ou rapidez, convocamos uma extraordinária, ou até mesmo via fone (olha estou precisando de uma ajuda aqui, ou o que devemos fazer?), entra em contato, e depois traz o que foi decidido. [...]. (SDV10).
O relato de SDV10 sugere cenário onde as atividades ocorrem
através de processos participativos e mais cooperativos, ainda que exista a
delimitação entre o operacional e a gestão propriamente dita. Vale frisar que a
referida delimitação se faz necessária para a execução das atividades e não se
mostra negativa. Contudo em ambientes onde a cultura de gestão participativa não
240
está presente, a separação entre pensar e agir se torna demasiadamente
pronunciada, gerando obstáculos para integração das equipes e processos.
Em conjunturas alinhadas ao relato de SDV10 torna-se possível
observar os mesmos princípios na dimensão operacional, assim como destaca a
próxima fala.
Basicamente, quem sistematiza o plano no papel sou eu, mas com todos os profissionais. Eu coloco e específico atividade por atividade. Só que antes de terminar o plano todos os profissionais são consultados. Todos os profissionais colaboram na elaboração. (SC10).
A citação evidência a condição onde o plano de trabalho da
instituição resulta de processo de consulta a outros profissionais, neste caso, antes
de validá-lo. Há conjunturas, entretanto, onde sua elaboração contempla a dinâmica
da participação desde seu momento inicial de colocação das bases até o estágio de
aprovação e validação.
Seja um caso ou outro, observam-se princípios de gestão inclinados
a ouvir diferentes profissionais, configurando ambientes alinhados com a natureza
coletiva das entidades. Na próxima fala, observa-se a presença do ato de escutar
em uma simples atividade.
Assim que o grupo assumiu esta entidade ele trouxe um nome e a nova direção pensou que pudéssemos ter um nome próprio. E a gente, junto com a comunidade, colocamos a oportunidade para nossas crianças de sugerir um novo nome. Na semana que vem oficializamos por documento. (SC7).
O sujeito indica situação onde o nome da entidade resulta da
decisão em ouvir a comunidade que, em outros contextos, poderia ser definido
internamente por um dirigente. Neste caso a escolha recaiu por ouvir pessoas não
pertencentes à direção, que pode reforçar os vínculos existentes entre a sociedade
local e a entidade, além de permitir maior integração entre ambiente interno e
externo. Do ponto de vista da gestão, esta última favorece o estabelecimento de
visão integradora fortalecendo a concepção coletiva inerente ao universo da ONG.
Outro elemento contido na próxima narrativa possibilita evidenciar a
respeito da maneira como a gestão ocorre.
Toda reunião nossa isso [projeto] é avaliado, porque se nós deixarmos para fazer uma avaliação anual, nós perdemos muito tempo, e podemos errar onde poderíamos ter corrigido antes. E de uma maneira, não vou dizer
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superficial, mas de uma maneira sim mais prática, é toda reunião. Agora, todo final de ano, é feita uma avaliação anual, não somente com a diretoria, mas nós também fazemos com os pais das crianças. Nós tentamos envolver as famílias. A família envolvida, o processo de trabalho, e o sucesso, ficam mais possíveis. (SDV2).
O ato de avaliar as ações realizadas se mostra parte integrante da
responsabilidade dos dirigentes, conforme relato do sujeito SDV2. Seja de forma
estruturada, seja de maneira empírica, confrontar rotineiramente o que foi planejado
com o resultado alcançado fortalece os líderes no exercício desta função gerencial
além de instalar o comportamento preventivo na entidade. Fala adicional acrescenta
elementos a esta perspectiva.
Nós estamos começando a se profissionalizar nesta área, hoje fazemos simples, senta a diretoria e faz um momento de avaliação, o que foi bom, o que não foi bom, pega informações só da nossa entidade, não compara com alguns, com uma visão externa. (SDV8).
SDV8 associa a presença do ato de avaliar ao processo de
profissionalização. Em outras palavras, concebe o ato profissional como uma
técnica, um instrumento de trabalho. Realizar processos de avaliação
metodologicamente coerentes com a entidade e com os processos internos faz parte
do modo de agir de todo o gestor que esta à frente de atividades.
Profissionalizar não significa somente contratar profissionais para
realizar determinada tarefa, mas também instalar processos de gestão na instituição
que permitam seu desenvolvimento. O significado deste raciocínio encontra-se
integrado à compreensão que se faz sobre ‘profissionalizar’, o que representa dizer
pessoas egressas do ensino superior, capazes de construir instrumentais adequados
com metodologias exequíveis que conduzam a entidade de acordo com a realidade
em que ela se encontra inserida.
A narrativa de outro sujeito sinaliza busca de alternativas simples e
que podem trazer ganhos para entidade.
Hoje nós somos: presidente, tesoureiro, vice-presidente, primeiro secretário, Segundo secretário, diretor de patrimônio, primeiro e segundo, e tem três pessoas no conselho fiscal. Reúne mensalmente. Agora, quando nós fizemos a mudança, nós pensamos em criar comissões, só que ainda, infelizmente, essas comissões não nasceram. (SDV6).
242
O relato demonstra a necessidade de inovar nos processos de
gestão para fazer frente às dificuldades do cotidiano das ONGs. Ainda que as
comissões citadas não tenham sido implantadas e se referem a marketing, captação
de recurso, projetos sociais entre outras, obviamente devem ser consideradas à luz
das reflexões sobre a participação da diretoria, ainda assim servem de pontuação
para referenciar formas utilizadas no sentido da ampliação de possibilidades de
cooperação entre eles, contrapondo-se às formas de centralização.
Os aspectos relacionados ao futuro da organização e a prestação de
contas, apesar de não ter sido feita diretamente aos sujeitos coordenadores, fez
parte do desabafo espontâneo de um deles.
Dois projetos estão comigo. O primeiro é fazer um detalhamento maior, fazer planejamento estratégico mais formal [...] e o segundo é um balanço social [...] detalhar todo o serviço que a associação faz e prestar esta informação tanto pela nossa comunicação via site, como para nossos associados, comunidade, prefeitura e nossos parceiros. (SC8).
Neste caso, SC8 afirma que tais atividades fazem parte do rol de
tarefas que estão sob sua responsabilidade. Sendo um sujeito coordenador, sugere
realidade diferenciada em relação à maioria das ONGs, pois parte da tarefa de
pensar o futuro está nas mãos da coordenação, assim como a sistematização das
informações que possibilita o ato de informar aos diferentes públicos envolvidos com
a entidade, sobre a utilização dos recursos disponibilizados e os resultados
alcançados.
Tal formato não é inviável para as ONGs em geral e depende, em
maior parte, da confiança dos dirigentes em abrir todos os temas para o debate com
toda a equipe. Esta estrutura de divisão do trabalho encontrada na maioria das
vezes em empresa de maior porte, no que se refere à função estratégica para o
dirigente e operação para a equipe, não é o contexto das entidades e, também, não
devem esperar crescer a estrutura para pensar seu futuro. Reforçando reflexões
anteriores, em organizações coletivas qualquer separação entre pensar e agir
redunda em formato incongruente com sua natureza.
O segundo eixo de análise revelado a partir das falas dos sujeitos,
corresponde ao olhar avaliativo sobre o que está certo e errado no dia a dia das
instituições.
243
Foi possível perceber certo desconforto entre os entrevistados com a
pergunta, face ao caráter amplo e a necessidade de emitir opinião a respeito das
práticas da entidade, sem ouvir os demais diretores.
As narrativas deixam transparecer preocupações sutis a partir das
quais se pode inferir que o ato de avaliar não seja parte integrante do cotidiano. O
caminho pautado pelo constante aprimoramento pode permitir a todos o conforto
necessário em realizar tão importante tarefa.
Olha, a questão de estar certo é muito relativo, nós achamos que está certo do jeito que estamos fazendo. Pelo menos cada dia mais, temos sucesso. Está aumentando o número de crianças e adolescentes atendidas. (SDV9).
Para SDV9 o dado trazido da realidade, através de seus olhos, se
torna suficiente para considerar que o modelo em execução está correto. Contudo,
deixou de evidenciar olhar mais crítico sobre o contexto, postura esperada daquele
dirigente que ultrapassa a eloquência de um dado em particular para buscar o
exame detido das variáveis que produziram o referido dado. Assim, a resposta tem
aparência de reação rápida com vistas ao menor comprometimento possível diante
do pesquisador.
É eu acho que o que está certo são os objetivos que a gente tem, de trabalhar, de atender a todos da comunidade, seja de Franca, da região [...] está no rumo certo sabe, querendo ajudar as pessoas e com o objetivo bem focado [...] (SDV4).
De certa forma observa-se igual conduta na narrativa do sujeito
SDV4 que assinala algo que está estabelecido e validado pelo conjunto dos
dirigentes, no caso os objetivos, evitando colocar o olhar sobre atividades, processos
e práticas institucionais que poderiam ser verbalizados considerando a pesquisa.
A existência de processos rotineiros de avaliação que ocorrem de
maneira coletiva pode preparar qualquer membro da diretoria para responder,
quando solicitado, questões de natureza avaliativa sobre a entidade, pois será porta
voz na emissão da visão coletiva acerca da realidade na instituição e não
representará a percepção individual.
Narrativa análoga a anterior é revelada a seguir.
244
Acredito que nós conseguimos acertar, muito bem, a questão terapêutica do nosso trabalho [...]. Nós mudamos também nossa forma de atendimento. [...] Nós conseguimos dar uma alavancada enorme na questão do tratamento, para oferecer o que se tem de melhor em relação ao tratamento. Isso nós acertamos e acertamos bem. (SDV1)
SDV1 afirma repetidas vezes acertos na área do atendimento. Vale
relembrar que esta fala vem de um fundador e isso não diminui a relevância de sua
indicação. A presença da expressão ‘nós’ sugere abrangência coletiva deste acerto,
embora a citação não explicite a quem se refere. De todo modo, fundador, líderes e
profissionais que vivem processos coletivos de avaliação rotineira se credenciam a
expressar posição igualmente coletiva. Em outros cenários, pode prevalecer a visão
individual.
A ONG tem acertado nos cursos oferecidos porque eles são escolhidos a partir de pesquisa na própria comunidade que os elege de acordo com suas necessidades. (SDV7).
Para o sujeito dirigente SDV7 o aspecto a referenciar sobre o que
está certo e porque, diz respeito também ao tema do atendimento. Sua contribuição
adicional diz respeito à reflexão que está no campo da pesquisa que realizou. A
associação entre o acerto efetivado e o ato de investigar necessidades na
comunidade é benéfica e bem vinda, em face do caráter coletivo da ONG já
debatido, além do sentido de pertencimento que pode estar nas relações da
instituição com os públicos que são atendidos.
Esta prática tem maior possibilidade em alterar o sentido de
propriedade por vezes relacionada à organização social, em relação às entidades
onde a centralização se observa presente, pelo fato de não ser individual, de seu
dirigente, de seu fundador. A entidade, como associação civil, associam pessoas e
ideias em torno de uma questão, de uma finalidade. Pertence ao conjunto de
pessoas, não a um indivíduo.
Uma coisa que eu vejo é o empenho dos colaboradores, e aqui nós temos uma coisa muito boa, porque o profissional vem pra cá, primeiro que ele vem e fica então aqui deve ter ser bom de trabalhar, ter uma condição boa, então é uma coisa positiva. Nós não temos uma grande rotatividade de pessoal. (SDV8).
Para ele o ponto a ser destacado como certo envolve a dimensão
dos colaboradores. Sendo o único sujeito a observar tal questão, sua fala destaca o
245
empenho da equipe e reforça um traço do perfil das instituições do município no que
concerne à baixa rotatividade. Em sua indicação supõe que o ambiente que dirige se
mostra facilitador do trabalho.
A identificação entre pessoas e as finalidades da entidade não
ocorre somente no plano dos colaboradores. O próximo relato demonstra igual
condição.
Essa organização, quando comecei aqui como voluntário, o que chamou a atenção é a questão como ela foi formada. Foi ideia de uma pessoa, que trouxe pessoas da rua para dentro de casa, ou no caso, do lado, alugou uma casa do lado, e trouxe pessoas da rua para tomar conta, começou a crescer, entraram outros voluntários, de forma que hoje também ela faz parte da diretoria, ela é uma das pessoas de nosso Conselho Fiscal, e continua fazendo parte da instituição, só que entraram mais voluntários, entrou mais gente, o grupo cresceu [...] então isso nos chamou muita a atenção, a forma com que é feito, então a primeira coisa vai selecionar, vai dar ênfase àquele que tem menos recurso, que não teria condição nenhuma [...] Isso pra mim é o mais forte, sai um pouquinho da administração, mas é o que me chamou a atenção quando entrei aqui e o que eu continuo fazendo enquanto gestor. Há quatro anos. [...] na gestão há um ano e meio, os outros anos anteriores como voluntário, participando sempre. (SDV10).
As entidades como espaços de cooperação que visam atuar em prol
de determinadas causas, sintetizam histórias que possibilitam a mobilização de
pessoas. SDV10 fez opção em responder à questão da investigação registrando que
a forma de construção da entidade deve ser referenciada.
Embora a pergunta remeta a observar a forma de fazer no momento
atual, a citação indica o componente histórico cujos efeitos ainda são percebidos no
presente. Seu próprio caso materializa o que apresentou. Em outras palavras, em
função da formação histórica da identidade da organização e a forma de realizar as
atividades, pessoas se mobilizam hoje, tornando-se voluntários dirigentes.
Ao indagar os sujeitos da pesquisa a respeito do que está errado na
Instituição, bem como suas razões, chamou a atenção o fato de quatro SDVs dentre os
10 que ocupam esta posição, reportarem-se ao recurso financeiro como razão principal.
O que eu poderia dizer que não deu certo ainda é por falta de recursos financeiros mesmo. (SDV2).
Ela [organização] está 70% correta porque podemos melhorar o nosso atendimento com outras ações. [...] enfim estamos pecando neste assunto exatamente pela questão financeira mesmo. Isso é muito pesado com tantas atividades e tantos profissionais. Só vivemos de doação mesmo. (SDV3).
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[...] é tão difícil gente, enumerar alguma coisa errada aqui dentro [...] o que mais me incomoda e que eu sei que está errado é essa estrutura física. Eu não me conformo com isso, mas infelizmente como eu não posso fazer nada hoje, porque tudo a gente depende de verba, depende de dinheiro, de pessoas que ajudam, do poder público [...] (SDV4).
Não podemos falar de erros, pois tudo é pensado e planejado de forma realística. As falhas redundam de falta de maiores recursos para oferecer mais cursos técnicos de curta duração. (SDV7).
Interessante observar a razão direta estabelecida. Havendo falta de
recursos estaria implícito o erro na prática de gestão, não importando observar as
decisões, os métodos, os processos e o diagnóstico que possam ter realizado.
A questão proposta objetivou alcançar a visão avaliativa do dirigente
sobre a entidade, mas cada sujeito, além de mencionar o recurso financeiro agregou
temas adicionais a presente reflexão.
O sujeito SDV3, por exemplo, ao final de seu relato faz referência à
doação de maneira depreciativa. Repercute parte do senso comum que qualifica o
ato de doação pelo valor daquilo que foi doado, em geral o roto, o rasgado, aquilo
que não tem mais utilidade e a esmola. Entretanto a sociedade já avançou nesta
compreensão. Permanece o sentido exposto, mas cresce o entendimento que a
doação se coloca como investimento social, em particular quando o recurso doado
está vinculado á realização de projetos sociais, cujos resultados estão a médio e
longo prazo, são monitorados e deles se prestam contas.
A fala de SDV4 evidencia associação realizada entre a questão da
pesquisa e a estrutura física disponível para o atendimento. Na verdade ela
responde indicando limitações existentes e não aspectos que se mostram
equivocados e merecem maior atenção.
Da mesma forma o sujeito SDV7 afirma que falhas ocorrem pela
ausência de recursos. Porém, faz alusão à inexistência de erros em face do
planejamento realístico sem considerar que mesmo diagnósticos assertivos e
planejamentos adequadamente elaborados não estão imunes à efetivação
imperfeita.
Nas demais narrativas os sujeitos apresentam perspectivas
diferentes para a questão, não vinculando as ocorrências à eventual ausência de
recurso financeiro.
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Acredito que nós ainda não conseguimos uma questão de formação e informação [área de atendimento] Não sei se posso dizer que é erro, mas há falta de informações e de pesquisas que nós não temos. Nós ainda não sabemos lidar com este público. [...] Esta é uma das questões que nós temos que tentar evoluir, crescer, pesquisar e trabalhar em cima disso para que consigamos uma melhora dos nossos atendimentos. (SDV1).
Para SDV1 a capacitação para o atendimento e a elaboração de
pesquisas são temas que merecem maior atenção por parte da instituição, indicando
que em sua avaliação está aquém de onde deveria.
Mas normalmente também, nós colocamos isso em diretoria, coloca em reunião da diretoria porque sempre tem abertura, tem um tempo que a pessoa [funcionário] pode colocar o que quer, inclusive o que está achando que está errado. Nós vamos buscar alternativas, alterar, buscar fazer de uma forma diferente, sempre nós vamos buscar alternativas, mas não é muito do meu feitio ficar, sabe, às vezes eu dou até menos importância do que deveria, mas o que está errado não me chama muito atenção. (SDV10).
[...] Essa é uma questão meio difícil. Eu não gosto muito de pegar coisas desse tipo, eu prefiro dizer que nós vamos levando o que está certo, dando ênfase nisso, que ele vai arrastando mesmo o que está errado e vai corrigindo naturalmente, num processo, porque se começar a colocar dedo em ferida, ela vai doer mais e vai sobressair mais do que o que está correto, então deixa de lado, e vamos dar ênfase no que está correto, que ele vai arrastar e vai corrigir naturalmente esses eventuais erros. (SDV10).
O sujeito SDV10 traz três contribuições sobre a questão que
merecem ser sublinhadas. Na primeira ele explica a prática da diretoria em abrir
espaço para ouvir membros da equipe sobre, de maneira ampla, tudo o que
julgar errado. Esta postura simples, ouvir as pessoas sobre a instituição, produz
efeitos substantivos no cotidiano das entidades, uma vez que cria a
possibilidade para que os problemas sejam conhecidos por todos, viabilizando
encaminhamentos que os solucionem. Neste caso os membros da diretoria tem
mais propriedade para falar a respeito da organização porque a conhece com
mais profundidade e conhece também seus colaboradores que se sentem
partícipes da gestão.
A segunda contribuição se coloca no campo da característica
particular deste líder quando evidencia a respeito da atenção menor dada ao erro.
Em se tratando da dimensão do discurso, expressar que o olhar
sobre o êxito é mais relevante do que aquele que se coloca sobre o que está errado,
248
parece palatável. Entretanto, a experiência com o insucesso se mostra mais intensa
do ponto de vista da aprendizagem e, portanto, com maior poder de correção do
engano cometido.
Em termos de gestão, se está diante de dois cenários: um no qual se
espera que o erro seja corrigido naturalmente e outro onde se constrói o
conhecimento. Menor consideração ao equívoco cometido pode redundar em menor
aprendizagem para os envolvidos.
A terceira contribuição a esta reflexão efetivada, observando a
relação entre as duas primeiras, diz respeito a algo que parece contraditório:
dirigente com menor atenção ao erro participa de direção que investiga
programaticamente o que não está bem na visão de seus funcionários.
Este talvez seja um dos exemplos que melhor definem os efeitos
relacionados à natureza coletiva das decisões que emanam dos Conselhos nas
entidades, em contraponto às narrativas de sujeitos que mostram diretorias aonde
apenas um de seus membros conduzem os processos decisórios. Consolida-se,
assim, argumento a favor da gestão coletivizada que traduz o melhor de cada um de
seus membros e neutraliza as características individuais.
Muita coisa que nós fazíamos estava sem normatização. Nós fazíamos correto, mas isso não está escrito em lugar nenhum. Então se chegar alguém e resolver mudar, ele mudaria [...], e a nossa ideia, que nós estamos tentando corrigir, é normatizar. (SDV8).
Outro tema trazido pelas narrativas diz respeito ao universo da
gestão. O sujeito SDV8 relata de maneira específica o procedimento da instituição
que pressupõe ter sido avaliado negativamente, mas que pode ser corrigido através
da medida de normatização.
A referida sistematização se constitui em tarefa das mais relevantes
para as entidades, em particular no campo das atividades sociais. No que concerne
aos procedimentos de gestão, igualmente, mas não se deve perder de vista a rigidez
trazida por normatizações em níveis elevados.
Quando você tem um projeto social, por exemplo, que tem toda uma normatização para seguir, você vai e busca dentro desta normatização, depois verifica se enquadrou ou não enquadrou se está certo ou errado, o que vai precisar mudar para enquadrar. Agora este projeto não tem isso. Ele nasceu e fomos implementando, fomos fazendo e acontecendo e está ai cada ano crescendo mais. Agora nós pegamos aquilo que damos conta.
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Não tenho pesquisa que aponte para o número de necessidades de cidade. Eu gasto meu tempo é atendendo esse pessoal e não fazendo pesquisa (SDV9).
A fala de SDV9 permite ao menos três reflexões. A primeira chama
atenção por sugerir que a entidade que dirige não corresponde a um projeto social.
A segunda refere-se ao fato de não possuir ‘normatização’ que possibilite
comparações. Tal condição permite inferir que a avaliação do trabalho realizado não
tem base, indicadores como parâmetros. Em terceiro, sinaliza que pesquisas não
são realizadas, as razões não são sinalizadas, mas, podem ser inferidas: se falta
tempo a pesquisa não é necessária.
Com estes elementos, a fala descrita sugere distanciamento entre
seu autor e ação da entidade levando-o a concepções distorcidas sobre a tipologia e
características do projeto que dirige. Adicionalmente, coloca em dúvida sobre seu
entendimento a respeito da construção de projetos sociais, a necessidade de
avaliação e formulação de diagnósticos que os sustentem.
A amizade extrema que sempre nos ajudou acabou virando um amadorismo extremo na gestão da instituição e nós percebemos isso em tempo. (SDV5).
O sujeito SDV5 relata um equívoco de maneira objetiva, ocorrido
dentro da própria diretoria. Esta fala se insere no âmbito da composição dos
conselhos diretores das entidades e das relações entre seus membros.
Para parte das entidades os critérios de identificação de pessoas da
sociedade que devem compor a diretoria normalmente estão associados à esfera
pessoal daquele que preside a organização. Em outras palavras, critérios como
proximidade, amizade, convivência nos mesmos ambientes, podem não produzir o
efeito esperado, assim como a fala deste sujeito expressa.
Examinando esta questão à luz da gestão de ONGs e da formação
de conselhos diretores, a base para a identificação de um membro da diretoria deve
se constituir de aspectos que ultrapassam a simples amizade e que vão desde a
identificação com as finalidades até a disposição para ser submetido a entrevistas
conduzidas pelos demais componentes da diretoria. Os coordenadores, por
exemplo, onde o percurso profissional, realizações, envolvimento com a causa e
experiência devem ser igualmente requeridos.
250
Sem demagogia, o que acho que está errado é que deveríamos estar atendendo muito mais. Não só deveria como tenho vontade de atender. Isso é o que eu penso. (SDV9).
A fala, em sua simplicidade, demonstra o olhar avaliativo a respeito
do atendimento realizado pela organização que dirige. Tal indicação permite supor a
existência de um diagnóstico que sinaliza eventual defasagem entre a necessidade
pesquisada e o número de atendimento que realiza. Este embasamento (informação
gerada por diagnóstico da realidade) se traduz no melhor dos procedimentos para se
refletir a respeito do crescimento da entidade, considerando sempre as condições
em termos de infraestrutura, pessoas e recursos financeiros para realizá-lo.
Fazer crescer o atendimento sem a observância de critérios técnicos
sobre a capacidade do atendimento e sustentados somente por percepção e desejo
pessoal, pode colocar em risco a instituição, além de permitir toda sorte de
interpretações a respeito das motivações do líder da ONG.
Em outra narrativa a ação do líder também se apresenta.
Eu digo que, talvez, seja uma falha minha, como presidente hoje [...] até para buscar movimentar mais, até por questão de tempo. Eu acho que hoje, tenho passado, e o pessoal me critica muito, que eu tenho outras atividades, e acabo deixando essas de lado. Eu me envolvo com outros projetos meus, social, que eu sou responsável [...] e eu não estou dando conta de cuidar do meu quintal. Então o pessoal me critica muito nesse sentido. [...] Então, vamos dizer, é outra falha da minha equipe que fica esperando o outro começar a fazer. Apesar de que eu tenho pessoas que realmente, bate de frente, faz e corre atrás e ajuda, toma iniciativa, a gente tem pessoas, nesse sentido, na equipe, que faz acontecer. (SDV 6).
O envolvimento não é privilégio dos membros da diretoria. O
presente estudo ao tratar do perfil dos sujeitos coordenadores pode revelar em que
medida estes profissionais participam de outras ONGs.
Participo de uma ONG, de uma forma bem tímida, como voluntária, uma vez por semana só. [...] e eu ajudo a coordenar o grupo de famílias. (SC4).
Assim, a diretoria e coordenadores demonstram que no Terceiro
Setor a prática de envolvimento em atividades adicionais de outras entidades é
frequente e reconhecidamente benéfica.
A fala de SDV6 materializa esta realidade que se expressa pela
própria experiência. Contudo, também explicita o aspecto negativo associado ao
251
envolvimento que ocorre em larga escala. Sua narrativa reveladora a respeito das
condições pessoais em dedicar-se adequadamente a cada uma das iniciativas a que
está vinculado, se constitui em referência relevante a ser considerada pelas
lideranças sociais.
Partindo do cenário onde se espera que o envolvimento da diretoria
em diferentes ONGs possa trazer ganhos para uma das entidades, o ponto de
inflexão se dá quando avaliações indicam perda de qualidade ocasionada pela
ausência de seu líder. Neste caso abre-se espaço para interpretar tal postura como
ação que visa apenas ganhos pessoais, pois, aquele que se refere ao coletivo fica
comprometido.
Do ponto de vista das mudanças os sujeitos apresentaram variedade
de temas e ações envolvidas.
O horário de atendimento precisa ser ampliado. A estrutura disponível não os comporta, especialmente porque seria necessário reforçar a segurança, pois o bairro onde a ONG se encontra [...] viveu no passado cenas de extremada violência [...]. (SDV7).
As entidades, tendo vencido o momento de implantação, seguem
ampliando a oferta de atividades no interior da comunidade onde se localizam.
Convivem com as vicissitudes inerentes a sociedade e compreendem com
profundidade sobre como as expressões da questão social se apresentam naquele
contexto.
Com frequência diagnosticam a necessidade de mudança, mas nem
sempre encontram as condições para fazê-la. Este quadro indica a importância do
estabelecimento de estratégias que articulem diferentes atores sociais privados e o
poder público, no sentido da efetivação das políticas públicas e de ações que
integram um conjunto mais amplo de esforços.
Uma estratégia interessante neste sentido é revelada por outro
sujeito.
Temos uma parceria com o CRAS, emprestamos as nossas dependências para o Centro de Referências e Assistência Social, que o endereço deles é bem longe para a região sul. Nós temos uma sala e a Assistente Social dá atendimento aqui. (SC7).
252
Com a referida parceria organizações do Terceiro Setor e o poder
público municipal atuam na execução da política pública. Nesta relação, vínculos se
estabelecem viabilizando múltiplas ações visando o atendimento das famílias da
região e fortalecendo o argumento a favor do enfrentamento como esforço articulado
entre Estado e sociedade, incluindo indivíduos e organizações de todas as origens.
O crescimento nas atividades das ONGs, desdobramento esperado
face ao atendimento por elas efetivado, repercute nas condições estruturais para
realizar os projetos que foram elaborados trazendo desafios adicionais aos gestores
das entidades.
Acredito que aqui em nosso trabalho é só uma questão de mudança física e de estrutura física. No nosso trabalho terapêutico, aquilo que nós temos para aplicar para [público alvo], não mudaríamos, hoje, nada. Pelas informações que temos. Mas as questões estruturais e físicas precisam de algumas adequações. (SDV1).
Para ele a alteração necessária está relacionada à estrutura física
face às informações que detêm a respeito da realidade em sua área de atividade.
Esta narrativa reforça a existência de um dos desafios frequentes na vida das
entidades que atuam no atendimento direto das comunidades que os cercam.
As mudanças podem ser determinadas por vários fatores, sendo que
nas falas anteriores predominaram aqueles relacionados ao atendimento e a
comunidade. A próxima narrativa indica mudanças por outras razões.
Outra coisa que eu também criei nesses últimos anos. Nós fomos até obrigados a fazer isso, por que tivemos que estar adequando o estatuto, nessas novas orientações que veem surgindo aí da nova lei da filantropia. Também, eu tive que me adequar às mudanças. Antes era só ligada a assistência social, hoje, eu sou obrigado a me adequar, a educação, a saúde, porque você é obrigado também a estar atento à essas situações. (SDV6).
O relato de SDV6 coincide com reações de parte das entidades que
sofreram os impactos no âmbito dos ajustes nos convênios com a Secretaria de
Ação Social, a partir da tipificação dos serviços e programas sócios assistenciais do
município.
A situação trazida por estes ajustes promoveu o repensar de
projetos e relacionamento com o poder público, bem como lançou novo olhar sobre o
253
financiamento das instituições visto a necessidade de captar recursos públicos em
outras áreas.
Mudanças na legislação impõem alterações não apenas no
financiamento e nas atividades, mas sim em todas as áreas.
Fiz a separação das atividades em CNPJ diferentes [...] é uma demanda da nova legislação de filantropia de ter os projetos bem separados bem identificados bem controlados neste sentido. Eu já comecei a fazer projetos de despesas, comecei a trabalhar mais forte na parte orçamentária. (SC8).
Para este sujeito coordenador, as mudanças impactaram no modelo
de gestão dos projetos que passou a exigir melhor estrutura de identificação e
controle, sendo possível fortalecer os instrumentos, dentre eles o orçamento. Tal
alteração não implica somente em adequar questões burocráticas, mas atinge
aspectos culturais no uso dos recursos e no campo do planejamento em longo
prazo. Instituições que vivenciam a implantação de orçamento, com frequência
compreendem a necessidade de capacitar gestores e dirigentes para o atendimento
de novos padrões.
Com visão mais clara a respeito dos valores necessários para a
execução das atividades, dirigentes se percebem melhor embasados para a busca
de novos financiadores. O relato a seguir traz parte desta perspectiva.
Eu acho que nós temos que sair mais para fora. A entidade perdeu um pouco da sua ousadia. Então o que nós estamos buscando agora, estamos tentando buscar parcerias com fundações de grandes empresas, toda a iniciativa privada hoje, as grandes empresas multinacionais, empresas que agem, normalmente elas tem uma parte que elas destinam. Elas normalmente têm uma fundação, uma instituição, e ela faz parcerias com entidades sérias que desenvolvem projetos em muitas das áreas que nós atuamos. (SDV8).
Este dirigente manifesta avaliação sobre a postura adotada pela
entidade e julga estar no momento de buscar novos financiadores. Dentre os
sujeitos ouvidos neste estudo apenas este traz de maneira objetiva a possibilidade
de ampliar a interlocução com empresas e organizações sem fins lucrativos de
origem empresarial. Vale lembrar que no capitulo anterior, quando da análise da
composição dos orçamentos das ONGs pesquisadas, foram debatidas questões a
este respeito.
254
A menção neste ponto da investigação visa sinalizar o campo de
crescimento possível para as entidades do município, no que se refere ao recurso
privado identificado com projetos sociais. Na medida em que processos de gestão se
qualificam e permitem que membros da diretoria e cordenadores dominem melhor os
processos da entidade, eles se sentem mais confortáveis para alçar novas esferas
de ação.
Outro nível de mudanças apresentadas pelas falas dos sujeitos se
localiza no âmbito das próprias diretorias.
Nossa diretoria, ela vai mudar o número de membros, mas em função da mudança de estatuto. Também está previsto que nós mudaremos o estatuto e incluiremos alguns conselhos que atualmente não tem, porque o nosso estatuto já é defasado, apesar dele estar de acordo com a legislação atual. Mas ele tem outras coisas que atualmente já não se enquadram mais, e algumas coisas que são exigidas hoje, como Conselho Administrativo, por exemplo, nós não temos. (SDV10).
Esta fala indica alterações que irão ocorrer em face de ajustes no
estatuto da organização e reforça tema atual no campo da gestão: a criação de
Conselhos, órgãos internos, que possibilitam maior envolvimento de pessoas nas
comunidades, bem como melhor aproveitamento do conhecimento trazido por estas
pessoas.
A figura de um Conselho Consultivo, por exemplo, composto por
pessoas identificadas com o propósito da organização, lideranças sociais locais de
outras áreas de atuação e que se reúnem uma vez por semestre para opinar sobre
planos e projetos, pode estabelecer ganhos expressivos de conhecimento e
articulação que, ao lado da diretoria e demais conselhos, resultam em melhoria na
gestão como um todo. Parte deste entendimento o mesmo sujeito propõe:
Não, o conselho administrativo não será só a diretoria, nós vamos chamar outros membros, da Cidade, de fora, que vai ter acesso ao conselho de administração. (SDV10).
Outro campo que merece atenção no âmbito das ONGs se localiza
na relação entre diretoria e coordenação.
Havia certo distanciamento da diretoria com a execução isso levava o presidente a ter que ficar muito tempo na operação. Estamos fazendo mudanças e assumindo toda a parte operacional. Por isso toda a reunião de diretoria eu estou junto. (SC8).
255
Com frequência gestores relatam sobre diretorias que, em função do
regime adotado de reuniões, nível de participação dos envolvidos e mesmo o estilo
empreendido pelo diretor, permanecem boa parte do tempo nas questões
designadas de operacionais.
Por ser de natureza tangível, a realização das atividades tem maior
poder de atração levando as pessoas a se envolverem rápida e intensamente.
Considerando a esfera da direção da entidade, a coordenação também possui a
tarefa de educar os membros da diretoria na relação entre o operacional e o
estratégico e medidas simples, como estar presente nas reuniões, podem facilitar
este processos.
Cabe sublinhar que esta condição passa necessariamente pela
disposição dos diretores em assumir verdadeiramente sua função, bem como do
coordenador em assumir o desafio de construir atribuições complementares entre
ambos.
A fala sobre o tema das mudanças, trás a dimensão do
entendimento da sociedade a respeito do trabalho das ONGs.
O que eu acho que precisa mudar mesmo é tudo isso que eu já disse. É mudar a parte física, mudar de repente também o conceito das pessoas aí fora sobre as entidades, para que possam colaborar mais, porque a entidade vive de que? De ajuda, de doação, não é? De colaboração das pessoas. De repente o que precisa mudar é fora, é a maneira das pessoas pensar sobre as ONGs, que a gente pede muito, que a gente faz isso, que só vive pedindo, não, mas por quê? Porque a gente só quer dar o melhor da gente para a entidade para passar esse atendimento com a maior qualidade e o maior amor, porque se não tiver amor aqui dentro também não vai para frente. (SDV4).
De certa forma, em tom de desabafo, este dirigente sugere que a
visão da sociedade local a respeito do trabalho das instituições não é adequada,
mas sim, pouco compreensiva em relação à função que cumprem no fortalecimento
das atividades destas organizações. Adicionalmente evoca outro entendimento
sobre o ato de doar.
Tais considerações têm pertinência considerando o quadro
desenhado na presente tese a respeito do Terceiro Setor, no mundo, no Brasil e
com relação à participação da sociedade, que registram níveis consideráveis. Pode-
se inferir que, ao menos, parte da sociedade local se encaixa no perfil estabelecido
pelo dirigente, sugerindo que o envolvimento dos munícipes carece de expansão.
256
Da mesma forma, a clareza sobre as ONGs, as contribuições e
resultados gerados devem ser trabalhados em todos os setores da cidade, com
vistas a alcançar dimensões de participação mais representativas e níveis de
consciência mais elevados.
Por outro lado, e ainda recorrendo à fala do sujeito SDV4, há um
aspecto sutil que merece destaque. O mesmo tom de desabafo sugere estar envolto
em sentimento depreciativo, em que pese à dedicação e amor relatados.
A leitura que o dirigente faz da possível reação dos seus
interlocutores ao seu pedido de participação e doação, materializada pela fala “[...]
que só vive pedindo [...]” (SDV4), demonstra certo cansaço nesta tarefa além de
denotar certa vergonha e humilhação.
Tais aspectos, já refletidos no eixo teórico do presente estudo,
reaparecem na presente análise indicando que a compreensão sobre a participação
da sociedade, a contribuição das ONGs, a doação, e outros temas correlacionados,
ainda carecem de debate com as pessoas da comunidade, incluindo munícipes,
lideranças de todos os setores, bem como os diretores das instituições.
Em suma, observam-se duas perspectivas. A primeira corresponde à
compreensão dos cidadãos sobre o trabalho das entidades. A segunda refere-se aos
aspectos sutis que fundamentam o entendimento dos dirigentes a respeito do
trabalho que executam. Ambas, necessitam ser refletidas pela diretoria,
coordenadores, profissionais e sociedade, objetivando a assimilação de visão
afirmativa sobre a real contribuição das entidades às demandas usuárias dos
serviços como também o valor da doação.
O terceiro eixo examinado nesta investigação relaciona-se ao campo
da sustentabilidade financeira, parte já refletido quando da análise sobre o perfil das
organizações, parte nas reflexões pertinentes à fala dos sujeitos que agora será
retomado a partir das próximas narrativas sobre o recurso financeiro e as
dificuldades neste campo.
Eu acho assim, todo o dia eu estou tentando buscar novas coisas, todo dia eu estou tentando superar o que está errado. Nós passamos por dificuldades, já passei momentos de não dormir, porque não tinha o dinheiro para pagar o funcionário, que chegou o dia do pagamento dele, não ter o dinheiro ali naquela hora. Teve momentos que eu tive que pegar dinheiro emprestado, não foi nenhuma, nem duas, nem três vezes. Aí depois, ainda, ter que achar um jeito de pagar esse dinheiro que eu peguei emprestado para fazer folha de pagamento. (SDV6).
257
O relato do dirigente esboça o quadro da realidade com cores
menos alegres. A condição não é desconhecida, tampouco irrelevante. Para boa
parte das entidades o cenário cotidiano de dificuldades generalizadas de acesso a
recurso parece irreversível. Este quadro contrasta com outras organizações que
possuem orçamentos polpudos compostos por recursos públicos e privados,
nacionais e até mesmo internacionais, com estruturas bem desenvolvidas e
profissionais capacitados de disputar os recursos financeiros disponíveis.
Assim, se observam no Terceiro Setor os mesmos elementos
presentes no mercado de negócios privados onde os melhores e mais estruturados,
com melhor poder de relacionamento e interlocução, acessam recursos com mais
facilidades. Às demais restam o compromisso de seus dirigentes e o olhar de parte
da sociedade local que, pela proximidade, pode alterar este quadro.
A fala do sujeito SDV6 se traduz em alerta aos financiadores, público
e privado, ao conjunto da sociedade e universidades, no que tange ao quadro de
dificuldades apresentado pelo dirigente. Tais atores possuem a competência
necessária para intervir e alterar este cenário.
Para fazer frente ao financiamento das atividades, as instituições
recorrem a diferentes mecanismos. Um dos mais utilizados figura no campo de
eventos exclusivos para o acesso a recursos financeiros e, em certos casos,
também materiais. Importante registrar que neste quesito as falas dos sujeitos SDVs
e SCs se integram e revelam o tema.
Nós temos pizzas, temos bazar, temos jantares, inclusive tem um na semana que vem. Esse ano nós participamos de alguns que não pretendemos continuar, porque o retorno é muito pequeno e o trabalho é muito grande, que foi arraial, festa da Achiropita, foi muito pequeno. (SC4).
Nós fazemos pizza, fazemos feijoada, fazemos esses eventos, para poder completar essa verba e poder manter a instituição. É dessa maneira. Acreditamos que se, no caminhar, nós conseguirmos essa certificação (de ordem pública nós já temos: federal), mas conseguir a liberação do Estado, em relação aos encargos, esse valor vai ser muito importante para nós aqui também. E de repente até uma verba pode vir, apesar de sabermos que é muito pequena quando vem. (SDV2).
Os sujeitos SC4 e SDV2 descrevem cenário sobre o envolvimento
da entidade em eventos que visam captar recursos. Sempre de caráter diversificado,
mas pouco significativo em termos de volume de recurso financeiro captado, a ação
258
necessita de grande envolvimento das pessoas, gerando avaliações duvidosas
como a descrita.
Por outro lado, este quadro suscita questionamentos no que tange à
mera utilização de instrumentais para melhor aproveitamento das iniciativas.
Participar dos referidos espaços parece fazer mais sentido nos casos em que haja
planejamento estrategicamente elaborado que inclua planos de ação específicos, de
acordo com cada atividade proposta, além da participação, por exemplo,
estabelecendo vínculos entre aqueles que frequentam o evento e a instituição.
Retomando a fala do sujeito SDV2, observa-se citação referente à
busca de certificações para que a entidade possa acessar recursos públicos. Com
frequência, tais recursos não se mostram suficientes conforme o relato abaixo.
Com relação ao financeiro por parte do setor público é que deixa a desejar. A participação do poder público, tanto municipal, como estadual, poderia ser bem maior. (SDV10).
Foi possível constatar nas análises sobre o perfil das organizações
que as instituições dos municípios são financiadas por atores privados e pelo poder
público, mas, a fala de SDV10 sugere que o recurso público não atende às
expectativas. A próxima fala confirma e insere questões adicionais.
Sim, por sermos uma Instituição sem fins lucrativos, nós recebemos algumas verbas do município. [...]. Insuficiente. Não dá para cobrir todos nossos gastos, então temos que correr atrás [...] O maior desafio é a busca destes recursos e apoios. Conseguimos muitos apoios nas questões relacionadas a material. Conseguimos material de cozinha, beliche, bens e utensílios. Entretanto recursos para pagar funcionários, por exemplo, nós não temos. Eu te dou cesta básica [exemplo típico citado pelo entrevistado para fazer referência às doações em espécie], mas eu não posso pagar conta de luz ou combustível com cestas básicas. Eu preciso de recurso financeiro e, aí, temos que nos desdobrar pedir daqui, arrumar dali, conseguido aqui, porque a instituição não visa fins lucrativos. Não queremos ter dinheiro em caixa, mas também precisamos ter o dinheiro para pagar nossas contas. (SDV1).
Há quatro itens a serem observados na fala de SDV1. O primeiro faz
referência entre organizações sem fins lucrativos (OSFLs) e recurso financeiro de
origem pública, que merece o seguinte reparo. Para acessar fundos públicos não
basta ser OSFL, pois nem todas o recebem. Elas devem estar aptas conforme
legislações e critérios específicos.
259
O segundo item corrobora as narrativas anteriores quanto ao
entendimento sobre a insuficiência do recurso público. O terceiro sugere crítica às
doações realizadas em materiais, pois não podem ser utilizadas como recurso para
pagamento de despesas. Cabe lembrar que doações de qualquer natureza se
traduzem em uma das formas de envolvimento da sociedade com projetos das
ONGs. Criticar esta postura pode redundar em desestímulo de tal mobilização.
Talvez a crítica devesse ser endereçada à própria gestão no sentido
de comunicar de maneira mais eficaz a respeito da finalidade da instituição, sobre
recursos e formas que necessitam, a partir das quais a comunidade pode participar.
Em quarto o dirigente, ao se referir a dinheiro em caixa, apresenta
discurso contraditório na medida em que demonstra a necessidade de tê-lo. Duas
pontuações adicionais sobre este item em particular. O dirigente usou jargão da
administração que significa recurso financeiro disponível parado e sem utilização,
que poderia ser aplicado para render juros.
A ideia que OSFLs não possam ter dinheiro em caixa disponível está
equivocada. Ao contrário, espera-se que a instituição tenha recursos disponíveis
para pagamentos e utilização no momento da efetivação das atividades, evitando os
efeitos observados na fala do dirigente SDV6 quando narrou ter colocado recursos
próprios no caixa da entidade.
Para comentar a segunda pontuação, acrescenta-se a fala de outro
sujeito entrevistado.
[...] nós juntamos dinheiro de vários eventos, justamente para nós construirmos. Nós nunca pudemos colocar isso em poupança. [...] ele tem que ficar numa conta comum. O que nós fizemos para não misturar o dinheiro foi ter duas contas correntes, e deixar esse dinheiro separado, mas ele não podia ser aplicado, não podia ser colocado nada dele. [...] Mas não importa, a conta é de uma ONG, ela não pode aplicar o dinheiro. (SC4).
Esta citação trata exclusivamente da aplicação de recursos
financeiros disponíveis em poupança. Como na fala anterior, o tema merece ajustes,
pois do ponto de vista das finanças em ONGs, não há impedimento para aplicações,
devendo, o gestor, buscar esta condição.
Para tanto ele necessitará de orçamento bem elaborado que indique
a disponibilidade de recursos a curto, médio e longo prazo, bem como transparência
na gestão das contas permitindo que financiadores e interessados visualizem que, a
260
totalidade dos ganhos auferidos com a aplicação do recurso disponível, foi
integralmente aplicada conforme rege o estatuto.
As críticas dos gestores ao volume de recursos financeiros para as
entidades também se dirigem às empresas.
Dificuldades financeiras existem porque a ONG não conta com recursos públicos nem com o apoio contínuo e constante da iniciativa privada [...] (SDV7).
Assim como o acesso a fundos públicos se reportam às condições
das políticas públicas e as exigências contidas nos convênios, subvenções e
auxílios, os recursos da iniciativa privada, em boa parte, fluem para as entidades
com base nas exigências de projetos sociais, alinhados aos objetivos de
investimento social privado. Outro sujeito descreve mais a respeito das exigências.
Aquele eterno problema, até você conseguir recursos. Então, muitas vezes, até você conseguir recursos da sociedade privada, eles te pedem como você está? Como você funciona? Como é a sua organização? Quais são os seus objetivos, seus critérios? Então, se você mostra isto, estatutariamente falando, eles te ajudam. Se você não tem, eles não vão te ajudar, então você acaba ficando amarrado. (SDV6).
As duas falas anteriores se voltam para o campo dos recursos
privados de origem empresarial. Vale frisar que os valores doados pelos indivíduos
também têm origem privada. Como já examinado nesta tese, o envolvimento com as
empresas, em particular aquelas possuidoras de políticas internas configuradas para
este fim, requer das ONGs projetos elaborados, processos de gestão definidos
envolvendo planejamento, execução, monitoramento, avaliação e demonstração de
resultados.
Por outro lado, algumas iniciativas estratégicas podem ser
empreendidas pelas ONGs caso haja objetivo em alterar o quadro revelado pelo
sujeito SDV7, que retrata falta de apoio da iniciativa privada. É preciso ter claro e
com precisão o estágio de desenvolvimento das empresas no campo do
investimento social privado, identificando aquelas que realizam fomento na área
social. Tem também que promover interlocução apropriada com elas demonstrando
de forma objetiva, conhecimento aprofundado sobre as necessidades do cenário que
envolve a entidade, incluindo diagnósticos relacionados ao perfil do público alvo e
261
negociar condições estruturais para a concreta realização da proposta prescrita no
plano de ação.
Ainda, a respeito da dimensão das dificuldades financeiras, em uma
das respostas, o dirigente apresentou mecanismo de acesso a recurso público que
tem sido disseminado desde 2009 no Estado de São Paulo.
E agora no último ano, nós crescemos bastante na Nota Fiscal Paulista, o trabalho de pegar as notinhas nos estabelecimentos comerciais e digitar, e esse trabalho cresceu bastante os recursos pra nós, inclusive, essa construção que estamos fazendo aqui, de um bazar permanente, é com essa fonte de recurso, sem a nota fiscal não teria como construir. (SDV10).
Trata-se da Nota Fiscal Paulista que permite acesso a recursos
estaduais vinculados ao Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços
(ICMS). Consiste na digitação de notas fiscais cujos consumidores não indicaram
número do Cadastro de Pessoas Físicas (CPF). Através de voluntários, a entidade
recolhe as notas nos estabelecimentos comerciais, digita o número de seu Cadastro
Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ) e, posteriormente, recebe os valores através
de doações de créditos.
Este exemplo se enquadra nas alternativas de mecanismos
disponíveis para a obtenção de recursos financeiros públicos empreendida pela
entidade dirigida pelo SDV10. Entretanto, os processos que permitem acesso à
esfera pública nem sempre são facilitadores e o relato a seguir enfoca as
dificuldades.
As dificuldades financeiras existem a todo o momento entendeu? Existe e muito, então é aquilo que eu estava te falando. Você tem que rebolar o mês inteiro pra suprir as nossas necessidades, porque entra uma verba da prefeitura que é do social, já tentamos fazer alguns convênios com a saúde não conseguimos. É difícil abrir e é muita burocracia, e eu acho que é o que emperra também nessa vida nossa, mesmo de uma sociedade civil, e o pessoal de entidade sofre muito por conta da burocracia. É uma burocracia muito, muito, muito grande. Sim, porque às vezes entra com um projeto, às vezes sabe que tem uma verba num determinado local, manda o projeto, aí é uma burocracia imensa que fica talvez meses pra você conseguir organizar a documentação. Às vezes eu falo assim: meu Deus aonde é que eu vou arrumar dinheiro para tirar xerox, porque é tanta xerox, é tanta coisa que eles pedem, que eu falo, será que eles esquecem que a entidade vive com pouco dinheiro? Então é muita coisa que pede, é muita burocracia entendeu? As dificuldades existem e são muitas sabe? Então eu acho que a gente tem que trabalhar muito mais. O poder público deveria olhar para as entidades com [...] mais carinho, porque a gente faz, faz com muito amor [...] precisa dar um apoio melhor para as entidades, na parte financeira eu acho que é muito difícil. Se você me provar por A e B, que é bom, que é
262
organizado, que é honesto e que se faltar um pequeno documento, um pequeno papel em qualquer projeto que você faz, a coisa emperra. De repente, a gente não tem pessoas qualificadas pra ajudar a gente fazer, você tem que estar correndo, você tem que estar pedindo, você tem que estar pedindo ajuda mesmo, ajuntando assistente social, um pessoal assim que se empenha mesmo, a gente sofre muito com isso, então eu acho que precisava dar mais facilidade pra isso. A gente sabe que tem que ser correto, isso aí eu não tiro essa questão, eu acho que a gente tem que ser correto sim, mas a nossa entidade ela é tão correta, tão certa e a gente já sofre tanto, imagina outras, que de repente não tem essa facilidade também. Então é isso, precisa melhorar muito mais. Superar tudo isso com a ajuda de todos, poder público, eu acho que municipal, estadual, federal. Eu acho que isso que você está fazendo vai ajudar muito as entidades, quem sabe esse tipo de pesquisa não possa chegar até as pessoas certas. Que venha de um deputado, mas que não venha só daquele momento que ele precisa da gente. Venha antes para saber nossas necessidades, porque quando você bate lá e precisa conversar com alguém, às vezes vira as costas. Então eu acho que precisa de um olhar melhor pelas nossas entidades, pra todas, porque todas fazem um trabalho perfeito, de todas que eu conheço de Franca, olha é de tirar o chapéu, todos trabalham com muito amor, mas com muita dificuldade. Acho que essa é a minha posição. (SDV4)
O longo depoimento de SDV4 introduz questões que merecem
atenção. Em uma primeira vista, o tom que permeia a narrativa apresentada sugere
se aproximar de um desabafo fundamentado na experiência vivida no
relacionamento a partir da entidade com a esfera pública, objetivando acessar
fundos para a ONG que dirige. Transmite certo cansaço e indignação com a ênfase
dada à documentação (papelada) necessária neste processo.
Contudo, os traços com os quais desenha este quadro não
diminuem a pertinência da crítica pontuada. O alvo é a burocracia do poder público.
Seu questionamento sinaliza até que ponto esta papelada requerida pode afiançar
as características éticas ensejadas para entidade?
Em seu entendimento o sujeito indica que possui os requisitos
necessários, no entanto não consegue acessar tais recursos. O mesmo volume de
papéis e cópias requeridas para o processo representa custo para a entidade e
coloca em dúvida se o interlocutor público conhece a vida de muitas ONGs do
município.
Neste contexto, encaminha também pedido no sentido da
simplificação dos processos e pontua, ao final, expectativas com a presente
pesquisa no sentido de se desdobrar em melhorias para o setor. Aceita, ainda, que
tais desdobramentos possam vir através da relação com membro da assembleia
263
Legislativa, mas que venha baseado em dimensionamento adequado tendo como
base a necessidade da instituição.
Este conjunto de pontuações caracteriza o cenário cuja percepção
se mostra compartilhado por parte das instituições que, ao longo do tempo, mantém
relações com o poder público nas diferentes esferas. Contexto não desconhecido
pelos gestores públicos dos quais se esperam encaminhamentos.
O mesmo depoimento carrega dimensão adicional a ser pontuada,
desta vez relativa à gestão, que caracteriza o momento presente onde entidades
avançam no atendimento aos usuários, sem deixar de lado os processos de
gerenciamento das ações.
A constatação de que empenho pessoal dos envolvidos nas
entidades não se constitui em fator suficiente para manutenção das atividades da
instituição deve merecer processo de reflexão continuado por parte de todos os
gestores e motivar transformações no modo de realizar os resultados das
instituições.
Retomando análise já encaminhada, os gestores públicos, atores
sociais privados, universidades, financiadores da iniciativa privada local podem
estabelecer mudança de patamar na gestão das entidades, cujas características
sinalizam dificuldades em conduzir seu próprio desenvolvimento, apoiando e
compartilhando conhecimentos, financiando capacitações, formando profissionais
que empreendam as mudanças necessárias.
Neste contexto o gestor assume protagonismo relevante cujos
aspectos estão sinalizados na próxima narrativa.
A gente percebe que precisa ter um pouco mais de presença política, ajudar na construção de políticas públicas, ser influente em conselhos municipais, buscando os movimentos, cobrando aquilo que existe de organizações também, daquilo que seria de projetos de governo federal, estadual, fazendo acontecer as políticas públicas que já foram definidas para que aconteçam e não estão acontecendo. Então eu sou uma pessoa assim, que vivo cobrando isso. Então eu acho que se a gente não cobrar também, não formar comunidade para estar inserido nesses conselhos, para que a gente busque mais e mais melhorias, a gente não consegue. (SDV6)
A narrativa de SDV6 apresenta perspectiva de atuação do gestor
localizada no ambiente externo à organização. As linhas que descreve em sua fala
ampliam, e ao mesmo tempo consolidam a importância que o gestor tem não apenas
264
para a organização que dirige, mas para o conjunto da sociedade, quando a ação de
seu trabalho integra a ação da instituição com as políticas públicas.
No depoimento indica a dimensão política dele próprio na medida
em que a postura ativa se apresenta na mobilização de organizações, das esferas
do poder público e na participação em conselhos municipais.
Os riscos presentes nesta postura estão vinculados à falta de
equilibro entre a presença no âmbito interno e externo a organização e a ausência
de objetivo coletivo para dar sentido à sua função de gestor, que vai da construção
das condições organizacionais que viabilizam as atividades à ação política
consequente, que contribui para efetivação das políticas públicas.
Assim, ao longo das análises contidas no presente capítulo,
viabilizadas por sujeitos dirigentes voluntários e coordenadores ficou demonstrada a
amplitude dos temas na qual a gestão das ONGs se insere. Neste sentido a riqueza
das falas dos sujeitos possibilitou revelar aspectos inerentes às questões
formuladas, ampliando a compreensão sobre o cotidiano da amostra investigada e
estabelecendo parâmetros para o desenvolvimento de gestores e organizações.
CONCLUSÃO
266
O estudo a respeito do Terceiro Setor (TS) tem motivado
Universidades, Centros de Pesquisa, pesquisadores, estudiosos, profissionais de
diferentes setores ao redor do planeta. Prova deste cenário se observa com The
Jonhs Hopkins Comparative Nonprofit Sector Project ligado ao Johns Hopkins
Institute for Policy Studies, sediado em Baltimore, Estados Unidos da América que
mobiliza 150 pesquisadores e 36 países.
De amplitude importante, este espaço mobiliza múltiplas áreas do
conhecimento a fim de conhecê-lo aprofundadamente, compreender suas origens,
composição e importância na cena contemporânea. No Brasil a pesquisa “As
Fundações Privadas e Associações Sem Fins Lucrativos no Brasil” (FASFIL), edição
2005, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e Instituto
de Pesquisa Econômica e Aplicada (IPEA), em parceria com a Associação Brasileira
de Organizações Não Governamentais (ABONG) e o Grupo de Instituto Fundações e
Empresas (GIFE), evidenciou a presença de 338 mil organizações oficialmente
registradas no país.
Com o tema figurando no conjunto de seus objetivos o Grupo de
Pesquisa Gestão Socioambiental e as Interfaces com as Expressões da Questão
Social (GESTA), ligado ao Programa de Pós Graduação em Serviço Social, da
Faculdade de Ciências Humanas e Sociais da Universidade Estadual Paulista “Júlio
de Mesquita Filho”, UNESP, Campus de Franca, propôs realizar pesquisas na área.
Na vinculação ao programa e ao grupo de pesquisa, este
pesquisador integrou seu projeto de estudo aos objetivos estratégicos do GESTA
buscando complementaridade e apoiando esforços em curso.
Tendo como proposta olhar de forma detida para o universo das
Organizações Não Governamentais (ONGs), desvelar as suas estruturas e
funcionamento, configurou a presente pesquisa cujo objeto de estudo está
focalizado na gestão das ONGs do município de Franca/SP.
A curiosidade investigativa foi orientada por questionamentos
persistentes que incomodavam e acabaram por provocar a busca de compreensão
para explicar a questão. As organizações se orientam por objetivos individuais ou
coletivos? Consideram indicadores sociais nas ações que desenvolvem? Qual o tipo
ideal de estrutura para o TS? Consideram a captação de recursos e a
sustentabilidade financeira? As ONGs compreendem que são veículos da efetivação
das políticas públicas?
267
Do ponto de vista teórico o estudo buscou aprofundamento sobre a
composição e características do Terceiro Setor através das principais pesquisas na
área. No plano internacional através do The Jonhs Hopkins Comparative Nonprofit
Sector Project e, no plano nacional, a partir dos dados da FASFIL (IBGE, 2008), das
Entidades de Assistência Social Privadas Sem Fins Lucrativos no Brasil (PEAS)
(IBGE, 2007b), Panorama ABONG (GOUVEIA; DANILIAUSKAS, 2010), Censo GIFE
(2012), Mapa do Terceiro Setor (CETS, 2005) e Censo do 3º Setor em SBC
(MEREGE, 2009).
Adicionalmente foram realizadas reflexões a respeito do campo da
gestão utilizando-se de quadro de referência que integrou as análises sobre o
conceito, variáveis e funções de gestão, o campo do desempenho, estratégias,
sustentabilidade e o gestor. Os estudos partiram da gestão do ponto de vista
genérico avançando para sua compreensão na dimensão das ONGs.
O TS se organiza em torno das expressões da questão social. Este
pressuposto permitiu iniciar a investigação cujo recorte temporal compreendeu o
período entre os anos de 2009 e 2012.
O ponto de partida da investigação constituiu-se na listagem
fornecida pela Receita Federal do município de Franca que, por solicitação do
GESTA ao Prefeito, à época, a disponibilizou ao grupo em 2009.
No mesmo ano deu-se inicio à sondagem com intenção abrangente
a 100% do universo. A etapa inicial contou com a parceria firmada com o Centro
Universitário de Franca (Uni-Facef) e consistiu na identificação dos respectivos
números de telefones das entidades nos guias telefônicos da cidade. Foi possível
confirmar a presença de 231 ONGs nas referidas listas.
Na sequência, estas entidades foram abordadas via telefone por
pesquisadora treinada para este fim. Destas, 145 ONGs atenderam às ligações
sendo possível a verificação de informações. Dentre elas 76 tiveram seus dados
confirmados.
A seleção da amostra ocorreu a partir da aplicação de três critérios
às 76 ONGs. O primeiro consistiu na construção de lista de classificação a partir da
área de atuação. Em segundo aplicou-se o conceito de cunho social e cunho
associativo (SZAZI, 2001) que resultou na seguinte configuração: 43 (cunho
associativo) e 33 (cunho social).
268
Para identificação da amostra a ser pesquisada, elaborou-se critério
que discerniu entre ação social genérica e ação social específica e o aplicou às 33
entidades de cunho social, resultando na identificação de 11 e 22 entidades
respectivamente.
Visando a confirmação dos dados e agendamento das entrevistas
para a pesquisa de campo com as 22 ONGs, retomaram-se os registros da etapa de
sondagem e novos contatos telefônicos foram efetivados, desta vez por este
pesquisador. Este procedimento investigativo resultou na comprovação de dados e
agendamento de 10 ONGs.
Foram abordadas as 10 entidades e entrevistados 20 sujeitos, sendo
10 sujeitos em cargos de coordenação e 10 de dirigentes voluntários, que assinaram
o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em cumprimento a processo
devidamente aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) da Faculdade de
Ciências Humanas e Sociais da UNESP, Campus Franca.
Os dados primários colhidos nas entrevistas foram obtidos partir de
formulários semiestruturado e observação do pesquisador, sendo possível construir
o perfil das ONGs do município de Franca, o perfil e as falas dos sujeitos.
Os aspectos quantitativos revelados por esta investigação estão
contidos no perfil das entidades e dos sujeitos. Os aspectos qualitativos
possibilitaram a construção das falas dos sujeitos.
A investigação revelou que as ONGs pesquisadas possuem em
média 16,8 anos de existência sendo que, a década de 1990, figura como a mais
representativa por ter abrigado a maior quantidade de nascimento das organizações.
A maioria das entidades possuem diretorias compostas de quatro
cargos e somente duas instituições declaram a existência de Conselhos de
Administração. Somados os membros da diretoria de todas as organizações tem-se
97 pessoas, tendo 78% dos cargos ocupados por homens e em 22% dos casos por
mulheres, sendo que esta proporção permanece equivalente quando examinado a
composição da diretoria e conselho fiscal em separado.
Se observado o cargo de coordenação este número se inverte sendo
predominantemente cargo feminino. Pedagogia e Serviço Social foram os cursos
que tiveram maior incidência na amostra pesquisada.
Ao analisar os cargos existentes na equipe técnica e aglutinando-se
as entidades os dados revelam a existência de 19 cargos distintos. No quadro de
269
funcionários da função básica que possuem vínculo empregatício regido pela
Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) figuram 180 funcionários sendo 77%
mulheres, com tempo médio de trabalho na instituição acima dos três anos.
A presença de voluntários nas organizações do Terceiro Setor (TS)
se mostra efetiva e tem sido refletida em pesquisas nacionais e internacionais. A
amostra pesquisada no município revelou a presença de 85 voluntários que apoiam
diferentes trabalhos. Parte destes colaboradores auxiliam rotinas das entidades
como secretaria, controles administrativos, e até mesmo transporte de merendas,
enquanto outros atuam na captação de recursos, promoção e realização de eventos,
divulgando atividades e vendendo itens (ingressos, pizza, feijoada) que visam à
geração de receitas.
Outra parcela de pessoas desempenham ações que podem ser
consideradas ‘funções da estrutura organizacional’, assim como ocorre com
professores de informática, artesanato, música, português, matemática,
empreendedorismo, idiomas e artes marciais. Enquadram-se, ainda, nesta categoria,
os responsáveis por recreações, monitores e cozinheiras.
Com maior índice de frequência, observa-se a participação de
profissionais liberais voluntários que se vinculam à atividade fim das instituições. São
médicos, dentistas, nutricionistas, psicólogos, podólogos e fisioterapeutas, cuja
atuação permite ser classificada de ‘caráter profissional’.
Enquanto população atendida a investigação pode demonstrar
variedade, mas as crianças e adolescentes figuram como público alvo preferencial.
As ONGs estudadas são financiadas por recursos de origem pública
e privada com predominância pelo segundo, sendo que 100% das entidades
recebem recursos privados e apenas 60% delas acessam recursos públicos.
Quando analisados em separado, observa-se que na segunda
categoria, 60% têm origem na esfera municipal e 40% na esfera estadual. O total da
amostra indicou não receber recursos da esfera federal.
No que se refere à origem privada, o estudo deste item em particular
indicou que, dentre as nove categorias possíveis, quatro receberam a maior
frequência, são elas: contribuições associativas; doações de indivíduos; eventos e
campanhas; empresas, institutos e fundações empresariais.
Do ponto de vista da diversificação das fontes de financiamento,
apenas uma organização apresentou nível mais elevado (de nove tipos diferentes
270
utiliza sete). Três entidades possuem apenas um tipo, demonstrando níveis baixos
de diversificação de receitas.
Em termos de certificações existentes, o Conselho Municipal dos
Direitos da Criança e Adolescente (CMDCA) e Conselho Municipal de Assistência
Social (CMAS) figuram como os mais indicados.
A pesquisa avançou na busca de compreensão sobre a gestão das
ONGs o que foi viabilizado nas falas dos sujeitos envolvidos. A riqueza de dados e
possibilidades de reflexão que emergiram das entrevistas fez evidenciar ao
pesquisador que as análises não se esgotam permitindo a continuidade dos estudos.
Ate aqui o olhar dos sujeitos sobre o campo da gestão evidenciou a
visão geral sobre a gestão da entidade, o olhar sobre a realidade e sustentabilidade
financeira.
Os gestores da Diretoria Voluntária trouxeram luz sobre a
importância dos fundadores no processo de identidade das ONGs e nos exemplos
de práticas que manifestam seguir. Alguns permanecem na gestão enquanto outros
figuram como pares de outros diretores na gestão das entidades. A influência
permanece e se mostra importante, mas o tema da sucessão também aparece para
as entidades.
Nas diretorias a questão da centralização surge como traço ora de
estilo pessoal, ora como uma característica do processo de tomada de decisão e
encaminhamento das atividades. Entretanto, tal aspecto se mostra contraditório se
analisado no contexto da natureza coletiva das entidades que, associações civis,
associam pessoas e ideias.
Parece que o espírito coletivo termina na concepção jurídica, não
ultrapassando as barreiras de estilos individuais e deixando de atingir a essência da
participação em todos os processos da organização, sejam internos ou externos.
Em linhas gerais as atribuições que são conferidas às diretorias
representam tarefas por vezes burocráticas e administrativas, transmitindo para a
sociedade a imagem assertiva do afastamento entre o dirigente voluntário que se
ocupa de atividades burocráticas e o verdadeiro enfrentamento que as causas
defendidas pelas ONGs possibilitam. Associando este entendimento à gestão
centralizada pode produzir, por exemplo, efeitos como menos mobilização de
pessoas para assumir funções essenciais à configuração formal requerida pela
estrutura.
271
Este aspecto foi manifestado nas falas dos Sujeitos da Diretoria
Voluntária. Há situações onde, não havendo opções de nomes para oxigenar a
instituição, dividir tarefas e contribuir com a superação de desafios, o encargo recai
sobre este ou aquele dirigente mais voluntarioso, no sentido de fazer valer sua
vontade independente da participação dos outros membros, o que faz transparecer a
atuação como um fardo pesado a partir do momento que, de alguma forma, assume
sozinho as decisões que precisam ser tomadas.
As investigações sobre a percepção dos erros, acertos e a do olhar
sobre a realidade possibilitaram emergir outras questões. A associação entre a
existência de processos estruturados de avaliação e a presença de profissionais
para executá-las.
A implantação de processos sistemáticos que permitam conduzir
análises a respeito da realidade está presente no cotidiano da diretoria também de
maneira simples como, por exemplo, ouvir funcionários a respeito da funcionalidade
da entidade como relatado pelos sujeitos. Assim, associar a implantação de
processos somente à entrada de profissionais, por acreditar que podem produzir
instrumentos mais sofisticados de análise, deixa de construir a essência da prática
da gestão que se constitui em avaliações continuadas com metodologias variadas e
a participação de todos que são parte integrante da entidade.
Outra questão aborda a compreensão sobre o erro. O vínculo que
emergiu o define como aquilo que não se pode fazer dado à falta de recurso. Assim,
demonstra que tudo que se faz está certo e realizado sem recursos. Dentre os
aspectos sutis que permeiam tal entendimento, a baixa estima parece despontar,
pois a natureza das atividades impõe o ato de ‘pedir’ constantemente.
Em que pese os desafios de financiamentos existentes, a visão
sobre a natureza e as características da atividade que se realiza não devem impedir
os gestores de avaliar com clareza o que se faz. Da mesma forma se torna
imprescindível refletir até que ponto a visão sobre a atividade se mostra afirmativa.
Outro tema evidenciado está no campo das mudanças. As ONGs
enfrentam situações de ajustes e alterações a todo instante. Sejam impulsionadas
pelas eleições da diretoria, legislação do setor, das políticas públicas, do
crescimento na demanda.
Gestores se percebem diante de cenário complexo de mudança, que
associado a outros temas, amplia as exigências sobre atuação dos envolvidos.
272
Contudo, mudanças também são requeridas da sociedade no que se refere à
compreensão sobre a contribuição e importância das ONGs para o município.
Quanto ao campo da sustentabilidade financeira o estudo revela que
o tema se apresenta central para o conjunto da amostra e que o anseio real incide
no poder público municipal no sentido de atribuir maior orçamento às entidades.
Criticas a burocracia e aos requisitos legais que figuram nos
processos de solicitação de recursos públicos são frequentes. Mesmo tendo
conhecimento que o acesso a recursos públicos deve ser pautado por mecanismos
que garantam a ausência de qualquer vício no processo, exigências documentais se
apresentam como elevadas e restritivas, em particular às entidades menos
estruturadas.
As instituições desenvolvidas parecem sugerir mais competências
no cumprimento de requisitos formais. Se a afirmação for verdadeira, ainda que
legítima, o campo de acesso a recursos fica reservado somente às entidades
maiores, mais estruturadas e profissionalizadas. O fator competitividade também se
apresenta no acesso a recursos públicos.
Os dados apresentados sobre a composição dos recursos
demonstrou presença importante da iniciativa privada. Predominam nesta categoria
aqueles oriundos de doações individuais e os que advêm da promoção de eventos.
Estes dois se constituem em recursos de menor monta que chegam através de um
número grande de pessoas, por isso exigindo grande esforço.
Os dados da pesquisa também demonstram a presença das
empresas e organizações do Terceiro Setor de origem empresarial, cujos recursos,
em maior quantidade, porém provenientes de volume menor de empresas. Para
parte dos dirigentes voluntários este se constitui em desafio para a gestão.
Diante da complexidade inerente ao campo, da consecução das
finalidades a que as ONGs se propõe alçar, dos projetos e ações que realizam,
dentre os diretores voluntários ainda se observa critica ao modo como a sociedade
processa o trabalho das entidades. Eles ainda se surpreendem quando constatam
que a boa vontade não se constitui eixo de sustentação material das entidades.
A pesquisa contempla três resultados esperados em duas
dimensões simultâneas: conhecimento e geração de referências.
O primeiro resultado está dirigido para a maior compreensão sobre a
identidade do Terceiro Setor no município de Franca/SP, seus desafios atuais,
273
avaliação de resultados e contribuições ao desenvolvimento de competências dos
atuais e futuros gestores.
Com os dados contidos na listagem da Receita Federal do município
foi possível delinear a composição histórica das ONGs de Franca permitindo
análises comparativas com os dados trazidos pela FASFIL (IBGE, 2008).
As informações da etapa da sondagem permitiu avançar na
compreensão sobre a identidade do TS na cidade. Adicionalmente, a amostra
pesquisada e a fala dos sujeitos evidenciaram entendimentos que podem se
constituir em contribuições ao desenvolvimento de competências dos atuais e
futuros gestores, seja na dimensão estratégica das organizações, seja no campo da
ação gerencial. Contribui, igualmente, para o tema da avaliação dos resultados em
que pese o menor número de evidências contidas nos dados primários.
O segundo resultado esperado está voltado tanto ao fornecimento
de elementos que auxiliam a formação de redes como potencializar as já existentes.
O perfil traçado das ONGs possibilitou observar a convergência em
termos de população atendida na área da criança e do adolescente. Esta evidência
permite inferir sobre a existência de capacidade e competências instaladas no
município nesta área, aspecto que auxilia o tema das redes explicitado no âmbito do
segundo resultado esperado.
Geração de categorias que auxiliem a compreensão sobre a
composição e gestão das ONGs corresponde ao terceiro resultado esperado.
As análises realizadas permitiram a configuração de categorias no
tocante a temas que demarcam o campo da gestão das ONGs da cidade de Franca
tais como governança, estilo e modelo de gestão, estratégia de envolvimento,
avaliação de resultados, mudanças e sustentabilidade.
O campo da governança analisado no âmbito do presente estudo
tem se mostrado central na vida cotidiana das organizações.
A compreensão sobre a identidade das organizações, ainda que
exista o reconhecimento por parte dos envolvidos sobre a natureza coletiva e a
permanência no tempo por longos períodos dos fundadores e dirigentes voluntários,
a gestão deve criar condições para que a alternância seja mais efetivada.
Esta condição isoladamente não trará efeito se a diretoria não for
espaço de audiência das várias formas de perceber os fatos, o cenário e os atores.
Mecanismos que visam criar instâncias para ouvir diferentes grupos tem se
274
mostrado possibilidade de ações proativas nas mais diferenciadas situações. Assim,
a criação de comitês, comissões e grupos de estudo sobre determinados temas no
interior da direção podem produzir espaços de debates que viabilizam o olhar
coletivo corroborando a natureza da entidade.
Neste cenário, a criação de conselhos consultivos formados por
lideranças públicas e privadas, pessoas comuns envolvidas com o tema,
pesquisadores, dirigentes de outras organizações, que se reúnem uma vez por
semestre para conhecer os planos da diretoria e opinar sobre eles pode,
efetivamente, constituir em espaços de troca, compartilhamento e fortalecimento das
relações. Tais condições geram possibilidades do surgimento de futuras lideranças,
maior proximidade com a comunidade e expansão mais acelerada da informação
sobre os projetos, inclusive ampliando fontes de financiamento.
A composição das tarefas dos diretores voluntários também deve
receber atenção. Se o foco das atividades do diretor estiver orientado apenas para a
realização das questões que envolvem a área em que atua, por exemplo, o
tesoureiro, seu conhecimento está orientado exclusivamente para estas questões
podendo desestimular os envolvidos se não houver a possibilidade de conhecer
coisas novas e atuar em esforços mais estratégicos.
A distribuição de cargos na diretoria não deve servir de amarras para
que seus dirigentes não circulem pelas atividades de todas as áreas. Além de
atribuições no âmbito interno, vale estimular os líderes das entidades a assumirem
atividades que viabilizem a interação entre eles e os diferentes públicos externos, o
que amplia a mobilização de pessoas no entorno das instituições.
Estilos e modelos de gestão constituem outro tema.
No contexto da natureza coletiva das instituições, a centralização se
mostra contraditória. Entidades que se localizam onde há articulação de pessoas e
ideias em torno do enfrentamento de uma dada realidade, devem primar pelo
estabelecimento de modelos de gestão compromissados com a participação dos
envolvidos e em estruturas menos rígidas e piramidais.
Seja o fundador no principal cargo de direção, seja não fundador, a
existência centralizada da gestão implica em baixa participação dos envolvidos,
desestimulando o sentimento de pertencimento.
Neste sentido, vale destacar a importância que processos de
capacitação de líderes gestores das entidades podem ter no aprimoramento destas
275
estruturas no município. Como medida prática para enfrentamento desta questão a
inclusão, nas políticas públicas, de requisitos vinculados ao financiamento público. A
cada convênio e subvenção, parcela de recurso pode ser destinada para este fim.
Situação análoga pode ocorrer quando do investimento de empresas ou entidades
de origem empresarial garantindo parcela de recursos vinculados compulsoriamente
a programas de capacitação de dirigentes.
O campo da estratégia de envolvimento de pessoas da sociedade
nas questões da instituição merece igual atenção.
Os dados da amostra indicam a presença de 97 pessoas envolvidas
nas diretorias das diferentes organizações. Em contexto de dificuldades geradas
pela renovação das diretorias, bem como de necessidade na ampliação de pessoas
envolvidas na entidade, coloca-se a questão: que contribuição este grupo pode dar
para o conjunto das ONGs da cidade?
Estes dirigentes são os primeiros embaixadores das instituições e
ações práticas nesta área são realizadas sob a forma de promoção de eventos onde
as lideranças compartilham de forma estruturada suas competências e dificuldades.
Assim, mecanismos que deem visibilidade ao trabalho das pessoas se tornam
instrumento de ampliação no número de voluntários, seja para a direção, seja para
desenvolvimento de outras atividades. Constituir fóruns com tais líderes redunda na
expansão de conhecimento coletivo na área da gestão de ONGs.
Tais eventos fornecem elementos substantivos para viabilização de
estratégias de mobilização de toda a sociedade no município. A criação de eventos,
fóruns técnicos, seminários sobre gestão, congressos acadêmicos, debates sobre o
TS local, a contribuição das entidades para a efetivação das políticas públicas, a
contribuição das empresas e a relação entre Estado e sociedade são algumas das
possibilidades.
A esfera da avaliação de resultados se apresenta como outro tema
de gestão para as ONGs do município. Como já assinalado a cultura da avaliação
precede ao valor do método. Na medida em que a instituição aguarda a chegada de
recursos com os quais há contratação de profissional para que conduza o processo
de avaliação, impõe à entidade um desvio oneroso.
É inegável que a avaliação é um processo e só se coloca em prática
através de pessoas com conhecimento de metodologias adequadas e exequíveis.
Mas também há outra face da mesma questão. Caso as ONGs não tenham a cultura
276
da avaliação, principalmente levando em consideração a dificuldade de captação de
recursos para manter um coordenador profissional, ela pode e deve ampliar a
participação interna na figura de funcionários e diretores, e incentivar a participação
externa através das famílias e agregados dos usuários dos serviços, consultando,
ouvindo, estimulando a inclusão, efetivando a cidadania ativa. Certamente melhorias
se tornam visíveis nos processos e nos resultados esperados.
As mudanças se constituem em aspecto relevante no debate a
respeito da preparação da diretoria voluntária para a gestão da entidade. Item que
também deve compor a agenda das instituições de maneira geral. A necessidade de
estabelecer mudanças estruturais por exigência legal tal como a Política Nacional de
Assistência Social e mesmo tendo em vista o desenvolvimento integrado da
entidade, torna a questão da mudança foco central para as ONGs que carecem de
modelos próprios, de elaboração de instrumentos de trabalho. Os modelos se
constituem em fator a ser refletido. O modelo de gestão do primeiro setor, as
organizações estatais, não atendem as expectativas das entidades do terceiro setor,
aplicam modelos rígidos, herméticos, piramidais. Por outro lado, os modelos do
segundo setor, organizações que tem como foco a geração de lucro, também não se
adequam às finalidades daquelas essencialmente sem fins lucrativos. O que fica
claro para estas diz respeito a ações racionais, sim, mas desenvolvidas com extrema
sensibilidade tendo em vista se voltar às expressões da questão social tais com a
violência, a fome, a miséria, a seguridade, o que provoca atendimentos
diferenciados principalmente tendo em vista o respeito à realidade vivida pelas
demandas sociais.
E, mudanças, exigem educação das equipes e gestores. Seja, ainda,
na esfera da sucessão das lideranças, dos processos de atendimento e estrutura
física, os envolvidos necessitam compreender as razões e reconhecer melhorias em
sua implantação visando à manutenção do vínculo das pessoas com a causa em
que atuam e a viabilização dos ajustes necessários.
No campo da sustentabilidade financeira, os dirigentes sinalizam o
anseio pela expansão da participação do poder público no financiamento das
entidades do município, mas compreendem, igualmente, a necessidade de
intensificação na aproximação com a iniciativa privada visando à ampliação dos
volumes de investimentos para o setor.
277
Este ponto em particular tem estreita relação com o tema do
envolvimento de toda a sociedade nas questões que incluem o universo das ONGs.
Adicionalmente guarda relação com a compreensão sobre o estágio de
desenvolvimento das empresas na região e como os temas sociais são interpretados
por empresários e executivos. A partir de inventário amplo e participativo, a questão
a respeito da contribuição das empresas se insere no âmbito das discussões da
participação de toda sociedade.
A presença dos recursos privados de origem empresarial é questão
que a pesquisa também evidenciou. Ampliar a captação destes recursos e revertê-
los em ações responsáveis com resultados efetivos incide em compromisso dos dois
atores (empresas e ONGs).
Medidas práticas nesta área se apresentam no campo da
qualificação das empresas no que se refere à realização de investimento social
privado e aprimoramento das entidades, no que tange à organização necessária
para atrair recursos e realizar objetivos.
Quanto à diversificação de outras fontes privadas de financiamento,
além da aqui delineada, o tema sugere igual atenção por parte dos gestores. As
estratégias de mobilização dos recursos oriundos da promoção de eventos, por
exemplo, necessitam de igual diversificação. Os esforços não devem se limitar a
execução das atividades, mas estudos sobre novas formas de vinculação dos
investidores às entidades após os eventos necessitam compor o rol de tarefas a
realizar.
Neste sentido a geração de renda própria e outras medidas de
aprimoramento da gestão financeira, são indicações possíveis para todas as ONGs,
se tornando tema de compartilhamento entre gestores locais no âmbito dos eventos
que são realizados com esta finalidade.
A palavra que surge neste momento figura no campo da
mobilização.
Organizações e dirigentes se mobilizam em torno do enfrentamento
das expressões da questão social. O desafio está na expansão do envolvimento por
toda a sociedade local cujas reflexões são potencializadas no âmbito da gestão das
ONGs.
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APÊNDICES
293
APÊNDICE A – Perfil da Instituição
PERFIL DA INSTITUIÇÃO: (nome)
1) Razão Social: ________________________________________________
2) Nome fantasia (se houver):_____________________________________ 3) Data da Fundação: ___/____/____
4) Estrutura Organizacional a) Diretoria voluntária
Presidente: ____________________________________________________ Vice Presidente: ________________________________________________ Secretario: ____________________________________________________ Tesoureiro: ____________________________________________________
b) Conselhos Conselho Fiscal: nº de titulares ___ nº de suplentes ___ Nome Titulares Suplentes ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ Conselho Administrativo: nº de titulares ___ nº de suplentes ___ Nomes: Titulares Suplentes ________________________________________________________________ ________________________________________________________________ ________________________________________________________________
b) Equipe técnica
Cargo: Coordenador ( ) sim ( ) não Com vínculo CLT: ( ) Sim ( ) Não Formação profissional:_________________________ Outros:
Cargo:
Com vinculo CLT: ( ) Sim ( ) Não Formação profissional:______________________________
Cargo: Com vinculo CLT: ( ) Sim ( ) Não Formação profissional:_______________________________________
294
c) Assessoria: ( ) Sim ( ) Não Se sim: ( ) voluntária ( ) remunerada Nominar área: ______________________________________________ d) Consultoria: ( ) Sim ( ) Não Se sim: ( ) voluntária ( ) remunerada Nominar área: ______________________________________________ 5) Público-alvo: (faixa etária) _________________________________
_______________________________________________________ _______________________________________________________
6) Quantidade média mensal do público alvo atendido: nº ___ a) Outros Atendimentos: (as famílias, a comunidade etc.)
Nominar Periodicidade do atendimento Média mensal nº _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________ b) Atividades desenvolvidas em outros atendimentos: _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________ _________________________________________________________ 7) Fontes de Recursos: a) Pública (em relação ao total mensal) Municipal: área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ Estadual: área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ Federal: área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ Interna- cional: área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ OUTROS: área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ área: _________ Tipo: ____________ Recurso por quanto tempo______ $ __________ (Tipo: parcerias; auxílios; subvenções; convênios; acordos; ajustes; contratos de gestão)
295
b) Privada (percentual em relação ao total mensal)
Tipo de fonte privada Percentual
Contribuições associativas
Geração de renda própria
Doações de indivíduos
Eventos e Campanhas
Aplicações financeiras
Retorno financeiro sobre patrimônio próprio
(aluguel e outros)
Empresas, Institutos e Fundações de
Empresas
Cooperação
Agência internacional
Outros
8) Geração de renda própria: Atividades _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________
296
9) Nº de funcionários com função básica e vínculo CLT: nº _____ Perfil dos funcionários
Nº Função básica
Gênero Formação profissional
Escolaridade Tempo de trabalho na Instituição
F MM
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
Outros Funcionários: (assinalar a função e se são esporádicos) ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ ____________________________________________________________ 10) Corpo de voluntários: ( ) Sim ( ) Não
Nº _____ Atividades específicas dos voluntários _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ _____________________________________________________________ 11) Serviços terceirizados: ( ) Sim ( ) Não Quais: ______________________________________________________________ ______________________________________________________________
297
12) Plano de Ação da Instituição: ( ) Sim ( ) Não Atividades sociais (propostas socioeducativas): 1 ______________________________________________________________ 2 ______________________________________________________________ 3 ______________________________________________________________ 4 ______________________________________________________________ 5 ______________________________________________________________ 6 ______________________________________________________________ 7 ______________________________________________________________ 8 ______________________________________________________________ 9 ______________________________________________________________ 10 _____________________________________________________________
13) Certificações em Conselhos de Direitos: ( ) Sim ( ) Não
Quais:
_________________________________________________________
_________________________________________________________
_________________________________________________________
_________________________________________________________
298
APÊNDICE B – Perfil dos Sujeitos
PERFIL DOS SUJEITOS
(o mesmo que respondeu o Apêndice A)
Cargo: __________________________
Idade: __________________ Escolaridade: ___________________________________ Profissão: ______________________________________ Especialização (especificar áreas e tempo de duração): _________________________________________________________________ _________________________________________________________________ Tempo de trabalho na função: __________________ Tempo de trabalho na Organização: _____________ Elaborou o plano de ação da Organização: ( ) Sim ( ) Não Se Não, nominar quem elaborou (por cargo, assessoria, consultoria, voluntários etc.) e quando_________________________________________________________________ Se Sim, acompanha as atividades? ( ) Sim ( ) Não Se Não, quem acompanha: (por cargo, assessoria, consultoria, voluntários etc.) __________________________________________________________________ Nominar as atividades desenvolvidas pela instituição (no plano de ação) 1_________________________________________________________________ 2_________________________________________________________________ 3_________________________________________________________________ 4_________________________________________________________________ 5_________________________________________________________________ 6_________________________________________________________________ 7_________________________________________________________________ 8_________________________________________________________________ 9_________________________________________________________________ 10________________________________________________________________
Observações (sobre o plano de ação)
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
__________________________________________________________________
Faz parte da diretoria da Organização: ( ) Sim ( ) Não Participa de outras ONGs? ( ) Sim ( ) Não Se Sim, qual tipo de participação: ___________________________________
299
APÊNDICE C – Representante da Diretoria Voluntária
(representante da diretoria voluntária)
Como se dá a gestão da organização?
Em sua opinião, o que está certo na Organização? Por quê?
O que está errado? Por quê?
O que precisa mudar?
Há dificuldades Financeiras? Quais e como superá-las?
300
APÊNDICE D - Formulário de sondagem ao telefone
TELEFONE
CONTATO EM / /2009 / /2009 / /2009
DADOS DA ENTIDADE
DENOMINAÇÃO Yara Clube
ESTÁ CORRETA? ( ) SIM ( ) NÃO. Anote a nova
denominação na linha abaixo:
CORREÇÃO
(denominação)
NOME FANTASIA
ENDEREÇO COMPLETO Rua Lazar Segal , 350 Recreio Campo Belo - 14400-902
ESTÁ CORRETO? ( ) SIM ( ) NÃO. Anote o novo
endereço na linha abaixo:
CORREÇÃO
(ENDEREÇO)
SITE
ATIVIDADES QUE A ENTIDADE DESENVOLVE:
NESSAS ATIVIDADES, QUAIS OS PÚBLICOS QUE SÃO ATENDIDOS?
DADOS DO PRESIDENTE
TELEFONE FIXO
TELEFONE CELULAR
RESPONSÁVEL PELAS INFORMAÇÕES:
301
ANEXOS
302
ANEXO A – Ofício nº 0520/2008/GabPref de 22/04/2008, referente solicitação de
informações cadastrais de organizações sem fins lucrativos
303
ANEXO B – Documentos que inspiraram a configuração da classificação geral
utilizada na definição da amostra.
(Mapa do Terceiro Setor; Panorama ABONG; FASFIL)
304
305
306
ANEXO C – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE) NOME DO PARTICIPANTE: DATA DE NASCIMENTO: __/__/___. IDADE:____ DOCUMENTO DE IDENTIDADE: TIPO:_____ Nº_________________ SEXO: M ( ) F ( ) ENDEREÇO: _______________________________________________________________ BAIRRO: _________________ _______CIDADE: ______________ ESTADO: _________ CEP: _____________________ FONES: _________________________________________ Eu, ___________________________________________________________________, declaro, para os devidos fins ter sido informado verbalmente e por escrito, de forma suficiente a respeito da pesquisa: _______________________________________. O projeto de pesquisa será conduzido por _____________________, do curso de __________________________, orientado pelo Prof (a). Dr(a) _______________________, pertencente ao quadro docente ___________________________. Estou ciente de que este material será utilizado para apresentação de Tese observando os princípios éticos da pesquisa científica e seguindo procedimentos de sigilo e discrição. ______________________________________________________________________________________________________________________________________________________ Fui esclarecido sobre os propósitos da pesquisa, os procedimentos que serão utilizados e riscos e a garantia do anonimato e de esclarecimentos constantes, além de ter o meu direito assegurado de interromper a minha participação no momento que achar necessário. Franca, de de 201__ . _____________________________________________. Assinatura do participante
_____________(assinatura)____________________________ Pesquisador Responsável Nome: Endereço: E-mail: _____________(assinatura)____________________________ Orientador Prof. (ª) Dr. (ª) Endereço: E-mail:
Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de História, Direito e Serviço Social da Unesp – Campus de Franca/SP Av. Eufrásia Monteiro Petráglia, 900 – Jd. Dr. Antônio Petráglia - CEP: 14409-160 – CP 211 – FRANCA – SP
Telefone: (16) 3706-8723 - Fax: (16) 3706-8724 - E-mail: [email protected]
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