UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE: UMA VISÃO MAIS
ABRANGENTE
Por: Leonardo Antunes Ferreira da Silva
ORIENTADOR
Prof. Dr. Jean Alves
Rio de Janeiro
2005
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
INSTITUTO A VEZ DO MESTRE
EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE: UMA VISÃO MAIS
ABRANGENTE
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como condição prévia para a
conclusão do Curso de Pós Graduação “Lato
Sensu” em Direito Processual Civil.
Por: Leonardo Antunes Ferreira da Silva
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AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar a Deus, por permitir
a minha existência e convívio nesse
mundo tão complicado. Ao corpo
docente do instituto “À vez do Mestre”,
de excelência qualidade, que
contribuiu tanto para enriquecer ainda
mais o meu conhecimento jurídico.
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DEDICATÓRIA
Dedico essa monografia a minha
esposa, Ana Paula, pelo apoio
espiritual e material, por suportar a
minha ausência durante o árduo
exercício da profissão e ainda pela
recíproca verdadeira de amor que
sentimos um pelo outro. A minha
sogra, D. Jussara, pela experiência de
vida e dedicação à família que
colaborou para meu amadurecimento.
Aos meus pais por terem me colocado
no mundo e permitir que eu desfrute
da vida ao lado das duas mulheres
maravilhosas, minha esposa e sogra,
que Deus colocou em meus
caminhos.
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RESUMO
O presente estudo tende a discorrer sobre uma visão mais abrangente do
instituto processual conhecido como Exceção de Pré Executividade.
Por derradeiro, essa monografia demonstra a aplicabilidade desse instituto
apesar da inexistência de previsão legal, haja vista que é bastante utilizado pelos
praticantes do direito, sejam eles advogados, doutrinadores ou julgadores.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 7
CAPITULO 1. Processo de execução 9
CAPITULO 2. O contraditório e outros princípios constitucionais no processo de
execução 12
CAPITULO 3. Embargos de devedor 17
CAPITULO 4. Raízes históricas do Instituto no Brasil 22
CAPITULO 5. A possibilidade de defesa do executado no direito de outros
países 26
CAPITULO 6. Fundamento do Instituto 28
CAPITULO 7. Momento adequado para a interposição da Exceção de Pré-
Exceutividade 31
CAPITULO 8. A Exceção de Pré-Executividade em face da Lei de Execuções
Fiscais 33
CAPITULO 9. Recursos Cabíveis 38
CAPITULO 10. Jurisprudências 39
CONCLUSÃO 44
Referências bibliográficas 46
FOLHA DE AVALIAÇÃO 48
7
INTRODUÇÃO
O tema em questão não possui legislação específica, como vários
outros institutos, sendo seu uso regulado apenas e tão somente por construção
jurisprudencial e com arcabouço doutrinário, que, a cada dia, vem se enriquecendo
mais acerca deste tema.
Já de muito tempo o processo de execução vinha carecendo de um
meio em que o devedor pudesse, em alguns casos, se defender, sem, contudo ter
que expropriar-se dos seus bens, em vista dos princípios do contraditório e da ampla
defesa, inerentes a todos os processos, inclusive o executivo.
Além disso, preponderou algum tempo, em nosso sistema jurídico, a
idéia de que o contraditório, no processo de execução, é diferido apenas nos
embargos, no sentido de que é transferido a eles. Doutrinadores de respeito e parte
da jurisprudência defendiam a idéia da inexistência do contraditório nesta
modalidade de tutela jurisdicional. Contudo, com raras exceções, a idéia de não
existir defesa no bojo do processo de execução vem perdendo espaço, tanto na
doutrina como na jurisprudência, principalmente após a difusão do instituto em
questão.
Abre-se, assim, a possibilidade, em casos específicos, do executado se
insurgir contra o despacho inicial proferido no processo executivo, sem que esteja
seguro o juízo. Argumenta-se não ser cabível a aplicação literal do artigo 737 do
Código de Processo Civil, que exige a penhora ou o depósito em fase preliminar,
quando o réu está exatamente contestando a eficácia executiva do título levado à
baila, bem como de outros vícios que não exijam dilação probatória para serem
comprovados, além da prescrição e da decadência.
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Em suma, quando o processo executivo carecer de pressupostos
processuais, condições da ação e, até, havendo vícios do título em que se funda a
execução em que não se necessite de dilação probatória, há a possibilidade de se
atacar o referido processo executivo, até fulminando-o de nulidade, sem garantir o
juízo por meio do depósito espontâneo de dinheiro ou coisa, assim como, mediante
penhora.
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CAPITULO 1
- O processo de execução
A função jurisdicional não se reduz à prolação da sentença, por meio
do processo de conhecimento. Não basta formular a regra jurídica concreta aplicável
a espécie. Faz-se necessário atuá-la, modificando a situação fática até então
existente para adaptá-la ao comando contido na sentença. A jurisdição, dessa
forma, não tem escopo meramente cognitivo: quer, também, a atuação prática do
direito objetivo.
Neste contexto, o processo de execução visa a uma pretensão
jurisdicional consistente em tornar efetiva a sanção, por meio de atos próprios da
chamada “execução forçada”.
A este respeito, explica Humberto Theodoro Júnior (1996, p..5.)
“Atua o Estado, na execução, como substituto,
promovendo uma atividade que competiria ao devedor
exercer: a satisfação da prestação a que tem direito o
credor. Somente quando o obrigado não cumpre
voluntariamente a obrigação é que tem lugar a
intervenção do órgão judicial executivo. Daí a
denominação de ‘execução forçada’, adotada pelo Código
de Processo Civil, no art. 566, à qual se contrapõe a idéia
de ‘execução voluntária’ ou ‘cumprimento’ da prestação,
que vem a ser o adimplemento.”
O legislador cuidou de traçar normas de procedimento capazes de
assegurar a observância, forçada, se preciso, do comando contido nas decisões
judiciais que visão a solução de conflitos de interesse, ou dos títulos extrajudiciais
revestidos de força executiva, por meio de uma atuação prática. Fê-lo através do
processo de execução.
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No processo executivo é proposta uma nova ação, chamada de “ação
executiva” onde, então, o credor (exeqüente) busca um provimento jurisdicional
satisfatório. Neste processo, o magistrado não examina o mérito, reservando essa
tarefa quando do conhecimento dos eventuais embargos (CPC, artigo 741, inc. VI).
Tem como pressuposto um título executivo, que, normalmente, resulta do processo
de conhecimento, uma vez, que na sentença condenatória, soma-se à declaração
uma sanção, formando-se, então, o título executivo necessário à atuação prática.
Quando se está diante de um título executivo, pressupõe-se o
conhecimento do direito material nele inserido, revelando-se despicienda qualquer
fase cognitiva no processo executivo para aplicação do direito contido no referido
título, uma vez que este foi o resultado de um anterior juízo de conhecimento. Nos
casos de títulos executivos extrajudiciais, pode o credor comparecer ao juízo de
execuções portando um título extrajudicial (necessariamente líquido, certo e exigível)
para que o devedor se veja forçado, judicialmente, a cumprir a obrigação de
entregar, fazer, desfazer ou pagar o que não satisfizera espontaneamente.
De qualquer modo, é para assegurar a eficácia dos títulos executivos,
sejam eles judiciais, resultantes de processo movimentado para solucionar conflitos
de interesses resistidos, ou extrajudiciais, nos casos que a lei prevê que o credor
dispõe do processo de execução, em suas diversas modalidades.
Observa-se, pois, no processo executivo, a supremacia do credor,
decorrente da relação material da qual se originou o crédito.
O título executivo, originado dessa relação, de direito material, consiste
na representação documental do crédito, e, presumindo-se a veracidade deste,
exsurge a permissão para que se procedam atos constritivos em relação ao
patrimônio do devedor. No entanto, para a admissibilidade da execução, se fazem
necessários, além da representação documental do crédito materializada no título,
que estejam presentes, neste, os requisitos legalmente exigidos para que a ele se
confira executoriedade.
Sem título executivo líquido, certo e exigível não há possibilidade de
execução válida. Trata-se de condição da própria execução, o que deve ser
verificado de ofício pelo juiz quando do recebimento da petição inicial, indeferindo-a.
Se for aceita uma execução nula, sem os requisitos legais, cabível a interposição de
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exceção de pré-executividade, independentemente da penhora e da oposição
embargos de devedor para fulminar a execução indevida.
O processo de execução, sujeita-se tanto quanto o processo de
conhecimento à verificação de pressupostos de existência e validade específicas do
título, devendo este ser qualificado pelos requisitos da certeza, liquidez e
exigibilidade, sem os quais não pode a execução prosperar. Desse modo, vê-se que
o título executivo é pressuposto ou condição geral de qualquer execução e, assim,
de execução forçada. Se não se afigura existente um título executório, o processo
de execução deve ser de plano recusado pelo judiciário.
Por outro lado, a execução, em qualquer das suas modalidades, além
de se submeter às normas gerais aplicadas ao processo de conhecimento e
invocáveis subsidiariamente (art. 586 do CPC), fica subordinada, igualmente, a
regras próprias, às vezes, especiais, fixadas pelo legislador.
Feitas estas explanações, é de se notar que a prestação jurisdicional
de execução comporta, no plano de direito objetivo, uma deficiência substancial:
ressalvado o exame realizado ex officio pelo julgador, somente se prevê
formalmente uma única via - a incidental de embargos do devedor - para a aferição,
verificação e discussão dos pressupostos da execução. A legislação não fornece
alternativa: tem o devedor que embargar para que possa reclamar justiça.
A adoção desse caminho legal - a interpretação do texto legislado, que
somente prevê a via dos embargos para defesa do executado – obriga, entretanto o
executado a submeter o seu patrimônio à grave constrição da penhora, ainda que
irregularidades de ordem variada sejam evidentes na execução e passíveis de
apreciação imediata pelo juiz.
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CAPITULO 2
- O contraditório e outros princípios constitucionais no processo de execução
O ordenamento jurídico é um composto plurivalente de normas
jurídicas interagindo e inter-relacionando-se e, dentro deste conjunto de enunciados,
sobressaem-se certos valores tidos como pilares mestres do ordenamento. São os
princípios que vigoram como bússolas do próprio sistema, servindo como valores
supra-normativos, que os juspositivistas absorveram, a contragosto, do Direito
Natural, a fim de resolver os problemas gerados dentro do próprio ordenamento,
quando os mecanismos positivados existentes tornaram-se ineficientes na solução
das antinomias presentes nos sistemas.
Os princípios se apresentam, pois, como enunciados lógicos, supra-
normativos, servindo como base de validade para as normas, necessidade e
decorrência lógica do próprio ordenamento jurídico que não consegue resolver suas
contradições internas por meio apenas de suas regras positivas.
Com efeito, o ordenamento jurídico é composto, além de normas, por
princípios que se apresentam como fundamento de validade destas normas.
Entretanto, mesmo dentre os princípios, há alguns que se sobressaem, tornando-se
sustentáculos dos outros, é o que acontece com o princípio do devido processo legal
incorporado por nossa Carta Magna e positivado em seu art. 5º, LIV.
Deste princípio, decorrem vários outros como o princípio da isonomia,
princípio do duplo grau de jurisdição, princípio da proibição da prova ilícita, princípio
do contraditório, princípio da publicidade dos atos processuais e outros. Para a
extensão de sua aplicação temos que entender que o due process of law não
corresponde somente à tutela processual, tendo o princípio se alargado desde a sua
primeira aparição na Magna Carta de João Sem Terra, em 1215. Revela-nos Nelson
Nery Júnior (1997, p. 33-38), em obra de grande envergadura, que o princípio do
due process of law sofreu grande alargamento no seu âmbito de abrangência, de
sorte a permitir uma interpretação bastante elástica. Hoje há um sentido mais
genérico e se caracteriza de forma bipartida em substantive due process e
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procedural due process. Se manifesta, assim, tanto na esfera do direito substantivo,
quanto do direito processual.
Nos atenhamos, então, ao princípio que nos interessa para o presente
trabalho, decorrente diretamente do devido processo legal, em seu sentido de
procedural due process, o processo do contraditório.
Normatizado na esfera constitucional (art. 5º, LV), o princípio do
contraditório teve reconhecido com a Constituição Federal de 1988 o que a doutrina
e jurisprudência já haviam consagrado, a sua aplicação ao processo civil e
administrativo. Lembremo-nos que, na Constituição de 1969, o contraditório era
expresso apenas para o processo penal.
De forma singular, Cármem Lúcia Antunes Rocha (1990. P.19.) nos
leva, através de suas palavras, a reconhecer o mérito obtido pela Constituição de
1988, a “Constituição Cidadã”, a positivar valores dentre nós já consagrados:
“O sistema constitucional positiva valores –
transformando-os, então, em princípio jurídico – a fim de
que a esfera de manifestação humana destes – a poética
que é limitada – encontre limites em dados normativos
determinantes do comportamento do indivíduo no seio da
sociedade. E por um exercício de racionalização do
sentimento social sobre o valor absoluto da justiça, que é
reduzido à dimensão humana pautada no tempo e na
história, traduz-se o sentimento a partir do qual e com o
qual se materializa a essência das normas jurídicas
inseridas no sistema constitucional.”
O contraditório constitui garantia às partes de um processo justo, sem
máculas, em que os litigantes possam ter um tratamento jurisdicional igualitário, sem
que uma parte prevaleça sobre a outra. Os contendores têm o direito de se fazer
ouvir, de deduzir suas pretensões em igualdade de condições.
Em que pese o tratamento dispensado ao processo civil, no que diz
respeito ao contraditório não ser o mesmo dispensado ao processo penal, até
porque neste busca-se a verdade real, o contraditório continua sendo a pedra
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angular do sistema processual civil, sem a qual não teríamos um devido processo
legal.
Quando, então, a Constituição Federal de 1988 assegurou o
contraditório ao Processo Judicial, em seu art. 5º, LV, “aos litigantes, em processo
judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório
e ampla defesa, com os meios e recurso a ela inerentes”, não discriminou em qual
das categorias de processo, que nos reportamos no início deste trabalho, deveria ser
ele aplicado, entendendo-se cabível em qualquer uma delas, ou seja, tanto no
processo de conhecimento, quanto no de execução ou cautelar, o princípio do
contraditório deverá ser aplicado indistintamente. Há quem, inclusive, admita a sua
incidência nos processos de jurisdição voluntária.
Entende-se, portanto, que, da mesma forma que no processo de
conhecimento, o contraditório se aplica, também, no processo de execução. Não
temos dúvida de que a aplicação no processo de execução se dá de forma bem
menos elástica e abrangente do que no conhecimento, até porque neste tipo de
processo já se encontra superada a fase cognitiva, partindo-se do pressuposto de
que o direito invocado já se encontra reconhecido num título. Contudo não se pode
olvidar que, embora de forma mais reduzida, dentro de algumas peculiaridades, o
contraditório se reveste como necessário ao processo executivo, para a garantia de
um processo justo. E não há que se falar aqui de embargos como única forma de
contraditório dentro do processo executivo. Mecanismos outros existem que
possibilitam ao devedor impugnar o processo executivo, instalando-se o
contraditório, como a exceção de pré-executividade.
Entendimento contrário importaria negar as garantias constitucionais
anteriormente referidas ou defender-se que a execução não se realiza através de
um processo, pois este sempre é essencialmente dialético.
Interessante anotar que, além destes casos específicos, a doutrina
alemã tem reconhecido o contraditório na execução forçada quando ao devedor é
assegurado direito de nomear bens à penhora, é o que nos informa Nelson Nery:
(1997, p. 33-38)
15
“Embora negando o contraditório amplo como no
processo de conhecimento, a doutrina alemã entende
presente a garantia constitucional do `rechtliches Gehör’
no processo de execução, com as limitações naturais
deste tipo de processo. Seriam manifestações do
contraditório na execução, por exemplo, o direito à
nomeação de bens à penhora, interposição de recursos e
outros atos cuja prática a lei confere ao devedor.”
O equívoco que há muito se vem praticando é de se presumir que,
tendo o mérito sido discutido e julgado no processo de conhecimento, não caberia
mais o contraditório no processo de execução, como se aquele fosse o único
objetivo do contraditório. GIUSSEPE MARTINETTO, mestre italiano, citado por
Cândido Rangel Dinamarco (1994. p. 169.), assevera:
“a existência de um título executivo, indispensável para
proceder a execução forçada cria uma legítima
desigualdade entre o credor e o devedor, de modo que
este último não pode contestar a demanda executiva do
primeiro em via de exceção.”
Ao executado não se pode exigir que se imponham sacrifícios maiores
do que aqueles que deve suportar, nem ao exeqüente é permitido que se satisfaça
além daquilo que lhe permite seu direito. Assim, cada um dos envolvidos é levado a
participar do processo, realizando atos que assegurem a satisfação do seu direito,
impondo-se uma relação jurídica processual, em que o contraditório é a própria
garantia de justiça.
Não fosse desta forma, não teríamos nem mesmo processo. Tratar o
executado como mero sujeito passivo da execução, não o admitindo a participar do
contraditório, frustra o próprio conceito de processo e, por conseguinte de processo
de execução. Afirma Dinamarco: (1994, p. 164)
16
“Um procedimento em que uma das partes compareça
como mero sujeito passivo não é sequer processo. Como
tal só se pode considerar o procedimento, como se disse
antes, desde que animado por uma relação jurídica
(relação jurídica processual). No inquérito policial , por
exemplo, o indiciado aparece como simples alvo de
investigações e é por isso que de processo não se trata:
ali não haverá um provimento final da autoridade policial ,
senão mero relatório, razão porque se dispensa a
participação contraditória do indigitado agente criminoso,
nada havendo a ser supostamente legitimado por essa
via.”
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CAPITULO 3
- Embargos de devedor
A fim de melhor se compreender o tema, deve-se lembrar que o
devedor de um título executivo é citado para efetuar o pagamento do que deve e não
para apresentação de defesa que, nestes casos, é realizada por meios de embargos
do devedor, que têm natureza jurídica de ação de conhecimento proposta
incidentalmente à ação de execução, que admite também a antecipação de tutela.
Os referidos embargos, entretanto, apresentam um inconveniente: a obrigatoriedade
da segurança/garantia do juízo para se propor tal ação.
Consistem os embargos no instrumento processual destinado à
oposição do devedor ao processo executivo. É, como foi explicado anteriormente,
uma ação autônoma, devendo sujeitar-se à distribuição, a registro e à autuação
próprios e ainda obedecer aos requisitos de admissibilidade, genéricos ou
específicos. Trata-se, pois, de instrumento adequado para que o devedor possa
alegar matéria de defesa na execução, admitindo-se, para tanto, a realização da
atividade cognoscitiva ampla.
Cabe trazer a baila que tanto o Código de Processo Civil (artigo 738)
quanto a Lei de Execução Fiscal (artigo 16) estipulam a necessidade de o devedor
garantir a dívida - acrescida dos consectários legais - para poder combater o título
executivo em que se baseou o credor para a propositura da ação executiva. Uma
vez garantida a dívida, pode o devedor propor os embargos, ação de conhecimento,
nos quais estariam todas as defesas possíveis elencadas para anular, ceifar,
cancelar o crédito do exeqüente (credor). A legislação, objetivamente, não fornece
alternativa: há necessidade dos embargos para que o devedor possa reclamar
justiça.
Assim, vê-se que um dos requisitos imprescindíveis à propositura dos
embargos é a segurança do juízo. A regra é que, após garantido o juízo com bens
bastantes à satisfação da pretensão deduzida pelo credor, o devedor movimente a
jurisdição por meio de processo cognitivo oposto ao executivo.
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Há de ser feita a garantia da execução, mediante depósito judicial de
um bem apto a satisfazê-la, para, só então, viabilizar-se o exame dos embargos.
Caso o executado não garanta o juízo, não poderá apresentar essa defesa com
sucesso.
Como se pode notar, o processo de execução tem o condão de levar o
devedor a submeter seu patrimônio à constrição da penhora ou do depósito, mesmo
se entender indevida aquela pretensão do credor. Ainda que abusiva, irregular,
viciada, despida dos pressupostos de existência e validade, na fria letra do CPC (art.
737), para que seus embargos sejam admitidos, há que antes, fazer seguro o juízo.
Uma exceção a esta restrição legalmente imposta se dá no caso de ser
o executado comprovadamente pobre, não possuindo bens penhoráveis, pois
impedi-lo de embargar a execução seria o mesmo que desprezar princípios
constitucionais tais como o do contraditório, da ampla defesa e ainda o do acesso à
justiça, que serão vistos com mais propriedade a seguir, que, por seu caráter
eminentemente democratizador e, por ser corolário da isonomia, deve ser sempre
observado, mesmo porque tal fato nenhum prejuízo causará ao credor, haja vista
que a execução sem bens lhe restará inútil, por não ser efetiva.
Outra situação, mais comum do que se possa imaginar, em que
também não se justifica a segurança do juízo a fim de embargar, se dá quando as
execuções são aforadas em juízos incompetentes ou suspeitos, donde seria também
um absurdo submeter o executado à constrição dos seus bens para então poderem
levantar e questionar a incompetência ou suspeição do juiz.
Ao tratar de hipóteses que não se justifica a segurança do juízo para o
oferecimento de embargos do devedor, Hélio Apoliano Cardoso (nº4/99, p. 94,
1999). faz um precioso alerta:
“Dentre outros casos, a segurança do juízo não pode ser
imposta nos casos em que o título em execução não se
reveste das características de título executivo, porque,
destarte, a própria execução estaria sendo ajuizada com
abuso de direito por parte do credor do credor, utilizando
uma via processual que a lei, em tese, não lhe concede.
Uma outra hipótese é aquela em que o executado, pobre,
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não dispõe de bens para oferecer à penhora, não sendo
possível, dentro do sistema jurídico constitucional
brasileiro, em que se assegura o pleno contraditório,
limitá-lo, desta maneira, contra pessoas economicamente
carentes.No caso, poder-se-ia dizer que, em não havendo
bens a penhorar, não haverá execução propriamente dita.
Não é bem assim. Neste caso específico, a execução
ficará suspensa na falta de bens penhoráveis, verdadeira
mancha a enodoar-lhe o crédito, sem que possa ele
apresentar a defesa de que, talvez, até já tenha pago o
título ou de que realmente nada deva. Portanto, não pode
o executado, nos casos acima abordados, dentre outros,
ser constrangido pela penhora em bens de seu patrimônio
quando inexistente o título executivo a ser exigido, ou
mesmo ficar impossibilitado de apresentar defesa na
própria execução ou mesmo embargos do devedor,
também sem constrição judicial, pois tais proibições
afrontam os dispostos nos incisos XXXV e LV (garante a
resposta a toda acusação e a integralidade da defesa no
processo penal, no processo civil - contencioso ou não - e
no administrativo) do Estatuto da Nacionalidade em vigor.”
Deve-se levar em conta, ainda, que a atividade para a satisfação do
crédito, efetuando uma constrição dos bens do executado, acarretará transtornos
irreparáveis ou de difícil reparação, se recair sobre alguém que não devesse
suportá-la. A segurança do juízo é legítima na medida em que a execução obedeça
a todos os requisitos de admissibilidade; caso contrário, será frontalmente adversa
aos ditames constitucionais.
Observa-se, assim, que a propositura de uma ação executiva de
maneira indevida, impõe ao executado um ônus inadmissível, e tal conduta deve ser
repelida, pois consiste em abuso de direito utilizar-se de uma via processual
imprópria. Afinal, se o suposto devedor nada deve, por imposição da mais alta
justiça, não convém ao magistrado (nem ao credor) obstaculizar o seu direito,
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através de formalidade inconsistente, qual seja, a obrigatoriedade da propositura dos
embargos.
A penhora não se justifica em caso de flagrante nulidade da execução,
porque esta pressupõe a executoriedade do título, seja este judicial ou extrajudicial.
Assim, não poderá haver penhora, se não existe título executivo. A penhora e o
depósito são medidas executivas, que, entretanto, não são legítimas se fundadas
num título manifestamente nulo ou inexistente. E, considerando-se que o patrimônio
do devedor pode ser insuficiente para suportar tal ônus, o prejuízo advindo de
garantir um processo manifestamente irregular será ainda maior.
Se, por exemplo, estivermos diante de uma execução fundada em nota
promissória sem assinatura e, por isso, eivada de nulidade absoluta, inadmitirmos a
possibilidade do executado manejar a exceção de pré-executividade, impedindo-o
de se defender sem a prévia segurança do juízo, estaria o devedor sendo
injustamente processado por um tempo quase que indeterminado, com uma série de
mazelas processuais acessórias, tais como a impossibilidade de obter certidão
negativa, inclusão do seu nome nos órgãos de proteção ao crédito, sem qualquer
chance da se defender, não obstante a nulidade absoluta da nota promissória sem
assinatura.
Como se vê, é inequívoca a gravosidade da exigência de garantir o
juízo para embargar a execução, apesar da sua constitucionalidade, uma vez que
atende ao princípio da efetividade da tutela jurisdicional. A sua importância é
inquestionável para que o credor não tenha a sua pretensão frustrada. Mesmo
assim, configura um ônus demasiadamente sacrificante para o devedor, que terá de
separar uma parte de seu patrimônio para apresentar suas pretensões em juízo.
Ora, para se firmar no entendimento de que o Diploma de ritos exige a
prévia segurança do juízo, para que se admita a interposição de embargos, é
absolutamente necessário que seja diante de uma execução regular, onde todos os
requisitos de admissibilidade estejam presentes. Desta feita, para argüir justamente
a desobediência a estes requisitos, é de se dispensar a segurança prévia do juízo.
Trata-se mesmo de uma questão de bom senso e justiça.
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Para que se mantenha efetiva a garantia do direito de defesa,
conciliando-a, ainda, com o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana,
se faz necessária a adoção de um mecanismo apto a realizar a oposição do
executado ao processo de execução sem a concretização da penhora. Observe-se,
porém, que isto será possível apenas nos casos em que a segurança do juízo
consista num gravame injustificável a parte executada. O aplicador do direito deve
buscar sempre a coexistência dos preceitos da efetividade da tutela jurisdicional, a
favorecer o credor, e da dignidade da pessoa humana, que protege o devedor.
Assim, temos que, justamente em razão deste requisito bastante
oneroso - a segurança do juízo - que condiciona a interposição dos embargos, cuja
propositura revelar-se-á inadequada, quando não injusta, é que se impõe a
necessidade de, em determinados casos, admitir-se outras formas de defesa do
executado, tais como a exceção de pré-executividade, objeto do presente estudo.
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CAPITULO 4
- Raízes históricas da exceção de pré-executividade
Sendo o propósito deste trabalho a análise do instituto da exceção de
pré-executividade, a questão histórica será aqui enfocada apenas e tão somente
com a preocupação de identificar, no passado, raízes do instituto em estudo, sem a
pretensão de historiar a evolução da atividade executiva ao longo dos tempos.
No direito luso-brasileiro, a regra era a prévia segurança, através da
penhora, para a interposição dos embargos, salvo algumas hipóteses encontradas
nas Ordenações Filipinas, quais sejam os de restituição de menor, os de retenção de
benfeitorias, sendo líquidas ou juradas, os de compensação, de líquido a líquido já
julgado (os que se chamam hoje de créditos com execução aparelhada).
Cabe registrar o caso de um Assento da Casa de Suplicação de 1690,
que também admitiu embargos nos próprios autos, sem prévia segurança do juízo,
em face de nulidade patente ou de pagamento provado com quitações e
documentos legais.
Mas na verdade, a idéia exceção de pré-executividade, obviamente
ainda sem essa denominação, surgiu de fato no ordenamento jurídico pátrio, na
época do império com o advento do Decreto Imperial nº 9.885/1888, que, em seus
artigos 10 e 31, dispunha da seguinte forma:
Art. 10 - “Comparecendo o reo para se defender, antes de
feita a penhora, não será ouvido sem primeiro segurar o
juízo, salva a hypotese do art. 31.”
(...)
Art. 31 – Considerar-se-á extincta a execução, sem mais
necessidade de quitação nos autos, ou de sentença, ou
termo de extincção, juntando-se em qualquer tempo no
feito: 1. O documento authentico de haver sido paga a
respectiva importância na repartição fiscal arrecadadora;
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2. A certidão de annullação da dívida, passada pela
repartição fiscal arrecadadora, na forma do art. 12,
parágrafo único; 3. A requerimento do Procurador da
Fazenda, pedindo archivamento do processo em virtude
de ordem transmittida pelo Thesouro.”
Além desse Decreto, surgiria, um pouco mais tarde, o Decreto 848, de
11 de outubro de 1891, que dispunha sobre a organização da Justiça Federal, que
previa de alguma forma a possibilidade de defesa do executado, na execução fiscal,
sem a necessidade de constrição dos seus bens. Assim dispunha o referido diploma
legal:
“ele previa, para o processo de execução fiscal, que
comparecendo o réu para se defender antes de feita a
penhora, não será ouvido sem primeiro segurar o juízo,
salvo se exibir documento autêntico de pagamento da
dívida, ou anulação desta (...). Ainda no art. 201 admitia
que: a matéria da defesa, estabelecida a identidade do
réu, consistirá na prova de quitação, nulidade do feito e
prescrição da dívida.”
Tempos depois, entrou em vigor o Decreto nº 5.225, de 31/12/1932, do
Rio Grande do Sul, que instituiu, em seu art. 1º, a exceção de improbidade do meio
executivo, em que a parte, citada para a execução, poderia, de imediato, opor
exceções de suspeição, incompetência e de impropriedade do meio executivo.
Cabe ressaltar, porém, que o primeiro a mencionar no direito brasileiro
a expressão “exceção de pré-executividade”, nos termos em que é conhecida
hodiernamente, foi o brilhante Pontes de Miranda. O brilhante autor foi chamado a
dar seu parecer elaborado em 1966, em virtude de um processo envolvendo a
siderúrgica Mannesmann, que vinha sofrendo várias execuções no Rio de Janeiro,
São Paulo e Belo Horizonte, baseadas em títulos que continham a assinatura falsa
de um dos seus diretores. Naquele processo, formularam-se pedidos de decretação
da abertura de falência da empresa e o juiz os havia indeferido ao fundamento de
24
que se baseavam em títulos falsos, sem, entretanto, que houvesse exigido penhora
ou depósito. Ao ser inquirido, Pontes de Miranda afirmou que, se o juiz podia
conhecer tais vícios de ofício, estava evidenciado que o executado também poderia
alegá-los.
25
CAPITULO 5
- As possibilidades de defesa do executado no ordenamento jurídico de outros
países
No presente capítulo, tentar-se-á demonstrar, em breves linhas, como
se dá a defesa do executado em outros sistemas jurídicos, tais como o uruguaio, o
espanhol, o francês, dentre outros, como a seguir será demonstrado.
Há nos ordenamentos jurídicos do Uruguai, da França e da Espanha,
tal qual no Brasil, um instituto jurídico denominado “oposição à execução”,
semelhante aos nossos embargos, também no que diz respeito à necessidade da
efetivação da penhora.
No ordenamento jurídico italiano, não existem hipóteses de se fulminar
a eficácia do título executivo no bojo do próprio processo de execução, no entanto o
executado possui três meios de defesa fora da execução: a) oposições à execução;
b) oposições aos atos executivos; c) oposições de terceiros. De acordo com o
brilhante mestre Carnelutti (apud, BATISTA JÚNIOR, 2003, p.5), “as primeiras
podem ser preventivas ou sucessivas, conforme sejam propostas antes ou depois da
prática de atos executivos sobre o patrimônio do devedor.’
No que tange ao direito alemão, há três possibilidades do executado
reclamar a execução:
“a) reclamação contra a cláusula executiva – as
execuções neste país não são processadas por órgãos do
Poder Judiciário, daí a necessidade da expedição, por
este, de fórmulas executórias, que se prestam a certificar
oficialmente que os títulos que instruem as execuções
foram reconhecidos como executivos; b) ação de defesa
contra a execução; c) reclamação contra o modo ou
fórmula dos atos executórios.” (BATISTA JÚNIOR, 2003,
p.5-6)
26
Assim como na Itália, todas essas modalidades independem de prévia
penhora para se efetivarem.
Nos Estados Unidos, apesar do fato de a legislação, em matéria de
execução, ser predominantemente estadual, a oposição do devedor pode se dar,
dentre outros meios, para correção de erros de julgamento; para a correção de erros
materiais e de forma e uma ação direta para anular o julgamento por fraude.
Nenhuma das formas elencadas anteriormente assemelha-se ao nosso processo de
embargos à execução, mas todas se prestam a evitar a execução e, também,
independem de prévia penhora.
No direito Norte-Americano, por ser o direito executivo matéria
regulada pelos Estados, a oposição do executado, “objetivará a correção de erros de
julgamento; para a correção de erros materiais e de forma e uma ação direta para
anular o julgamento por fraude” (BATISTA JÚNIOR, 2003, p.6). Cabe ressaltar, que
as formas citadas em nada se parecem com os nossos embargos de devedor,
porém todos os casos servem para afastar de plano a pretensão executiva.
Já em Portugal, a qualquer tempo, o pronunciamento do magistrado
quanto às nulidades absolutas da execução, à incompetência absoluta e à
litispendência, pode ser solicitado, mediante simples petição.
Depreende-se do exposto que vários são os países em que não é
necessária prévia penhora para o devedor se insurgir contra a pretensão executiva
do credor. Contudo o que mais se assemelha ao direito pátrio é sem dúvida
nenhuma o direito português, uma vez que não exige, em determinados casos, a
prévia penhora ou a garantia do juízo, além de aceitar a defesa do executado dentro
dos próprios autos da execução.
27
CAPITULO 6
- Fundamentos do instituto
O principal fundamento que ampara a exceção de pré-executividade é
a nulidade do processo executivo. Temos que os artigos 618 combinado com os
artigos 586, 652, 736 e 737 do Código de Processo Civil, autorizam a interposição
da exceção de pré-executividade, em que é possível suscitar qualquer matéria, que
possa ser conhecida de ofício pelo juiz, além, no nosso ponto de vista da prescrição
e da decadência, sem que para tanto seja necessário oporem-se os embargos de
devedor.
Saliente-se, que não é toda matéria de defesa que pode ser argüida
por meio desse instituto, já que os embargos de devedor continuam, apesar de
serem uma ação autônoma, como o principal meio de defesa no processo de
execução, principalmente no que tange às matérias que necessitem de dilação
probatórias para serem comprovadas. De qualquer forma, os dispositivo legais já
referidos, permitem que o devedor possa se insurgir contra o despacho inaugural
proferido na execução, mediante nulidade da execução, agravo de instrumento e
mandado de segurança, mesmo sem estar seguro o juízo.
Por outro lado, ao interpor a exceção de pré-executividade, não se está
querendo passar por cima das normas em vigor, mas, sim, de fulminar a execução
viciada desde o seu nascedouro.
Como todos sabem, ou deveriam saber, o direito é o principal
instrumento para a realização de justiça, sendo esta a sua finalidade basilar.
Formalismos exagerados devem ser rechaçados de plano, já que contribuem, e
muito para que não se tenha um processo célere, ou seja, retardam a prestação
jurisdicional, o que pode trazer sérios prejuízos às partes. Assim, não devemos ver o
direito à luz da interpretação literal e limitativa, que significa concentrar apenas nos
embargos de devedor qualquer meio de defesa.
28
Senão vejamos a brilhante opinião do advogado e escritor Hélio
Apoliano Cardoso ( nº4/99, p.94, 1999):
“A interpretação literal é a pior forma de interpretação, não
podendo ser tolerada em um regime democrático de
direito que assegura as mais amplas garantias aos
cidadãos. Incabível, em nossos tempos, o ultrapassado
fetichismo legal. A lei deve ser imposta quando e como o
interesse da sociedade exige, e nunca ao arrepio do bem-
estar geral.”
O direito, como ciência social, deve ser analisado sob tal prisma, como
determina o artigo 5º da Lei de Introdução ao Código Civil. Caso assim não fosse,
estaria fadado ao insucesso, ao total abandono, fragilizando o próprio Estado de
Direito, incapaz de atender aos anseios sociais, uma vez que a pedra angular
norteadora dos seus ditames mostra-se afastada da realidade.
Portanto, uma vez editada uma norma pelo Poder Legislativo, esta
deve ser interpretada conforme o ordenamento jurídico vigente no momento e não
de acordo com a vontade política do legislador. A norma deve ser fundamentada, ter
toda sua essência voltada para o prisma social. Leis antigas podiam ter uma
interpretação àquela época, que não mais a de hoje, devendo adequá-la aos
ditames e costumes atuais.
Ademais, não podemos esquecer que a maior finalidade tanto dos atos
processuais como de uma norma vigente é de atingir sua finalidade, conforme
expresso no artigo 154 do Código de processo Civil, é o que chamamos de princípio
da instrumentalidade das formas.
A interpretação literal das leis é a mais singela das exegeses, assim,
cumpre mitigar a hermenêutica do artigo 737 do CPC, fazendo emergir o primado do
bom senso, da moral e do bem comum muito bem insculpido na Lei de Introdução ao
Código Civil.
Há que se reconhecer, pois, a possibilidade de defesa do executado no
processo de execução, por meio de uma simples petição, trazendo junto de si prova
pré constituída do direito do executado, que deverá ser decidida de plano pelo
29
julgador. Tal peça de bloqueio deverá informar a autoridade julgadora qual o vício
insanável que pesa sobre o título executivo, sob pena de sua rejeição liminar. Não
há qualquer incompatibilidade entre os embargos à execução e a exceção de pré-
executividade, uma vez que, como exaustivamente já dito, a exceção necessita de
prova pré constituída, bem como só é possível a sua interposição, nos caso em que
o juiz pode decidir alguma causa ex officio, enquanto nos embargos, por ser um
processo autônomo, pode se argüir qualquer meio de prova em direito admitido,
além de necessitar prévia garantia do juízo, seja com o depósito ou com a penhora.
Diferentemente do que ocorre na maioria dos casos, a argüição da
ausência dos requisitos norteadores do processo de execução deveria ter o condão
de suspender o seu curso, uma vez que põe em risco a efetiva prestação
jurisdicional. Como assim não se entende, subverte-se o comando legal
determinante da impossibilidade de privação de bens sem a observância ao princípio
do devido processo legal.
Sendo assim, a exceção de pré-executividade tem cabimento em
hipóteses em que se verifica a ausência das condições da ação como, por exemplo,
a possibilidade jurídica subtraída em virtude de um título flagrantemente nulo ou
inexistente, hipótese esta que não se justificaria, de forma alguma, à necessidade de
constrição patrimonial, que pressupõe a executoriedade do título. No mesmo
diapasão, quando restar clara a ilegitimidade ativa do exeqüente, por ser um terceiro
que não o verdadeiro credor, também se impõe a procedência da exceção de pré-
executividade.
30
CAPITULO 7
- Momento adequado para interposição da exceção de pré-executividade
É com a citação que se dá ao réu o conhecimento de que contra ele foi
interposta uma demanda. Diante disso, embora se admita a exceção de pré-
executividade, antes de efetivada a citação, o momento que se afigura oportuno
para o oferecimento da exceção é no prazo de 24 (vinte e quatro) horas, após o
recebimento do mandado, que visa a compelir o executado a pagar o valor
exequendo ou oferecer bens à penhora.
É a partir do despacho, determinando a citação do devedor, que ele
fica ciente da propositura de uma ação executória. Incumbirá ao magistrado a
condução do processo executivo, a prática dos atos processuais, cuja realização lhe
compete, segundo as normas processuais que regem o processo, com o dever de
agir adequadamente. A não observância lesiona o direito do executado, que
somente será citado se presentes os pressupostos e condições da ação executiva.
A citação do executado para pagamento em 24 (vinte e quatro) horas
ou nomeação de bens à penhora decorrente de uma execução inviável lhe causa
violação à sua privacidade e tranqüilidade moral, em flagrante afronta às garantias
constitucionais de inviolabilidade da vida privada, proteção ao patrimônio e devido
processo legal.
Isto porque, como diz o brilhante mestre Araken de Assis (1994, p. 82):
“tem o ato executivo de peculiar, distinguindo-o destarte,
dos demais atos do processo e dos que do juiz
promanam, a virtualidade de provocar alterações no
mundo natural. Objetiva a execução, através de atos
desta jaez, adequar o mundo físico ao projeto sentencial,
empregando força do estado (artigo 759 do CPC). Essas
modificações fáticas requerem, por sua vez, a invasão da
esfera jurídica do executado, e não só do seu círculo
patrimonial, porque, no direito pátrio, os meios de coerção
31
se ostentam admissíveis. A medida do ato executivo é
seu conteúdo coercitivo.”
Ocorrendo a omissão judicial no juízo de admissibilidade, a execução
prosseguirá em seu curso normal com a citação do executado para pagar ou nomear
bens à penhora, e é, neste momento, que nasce o direito subjetivo à exceção de
pré-executividade do título, que, como dito, deve ser argüida nos próprios autos da
execução.
Não há, entretanto, previsão legal de prazo para a interposição da
exceção de pré-executividade, e, além disso, obviamente, por aludir sempre matéria
de ordem pública, sobre a qual já deveria ter o juízo se manifestado, pode ser
deduzida em qualquer momento e grau de jurisdição, mas somente afastará os
efeitos danosos da constrição patrimonial e de seus reflexos no direito de
personalidade, se alegada nas 24 (vinte e quatro) horas para pagar ou nomear bens
à penhora.
Destaca-se, ainda, que o momento mais oportuno para a apresentação
do instituto em questão, é, sem dúvida alguma, na própria petição que nomeia bens
à penhora, até porque, assim, o executado se resguardaria, no caso de não ser
acolhida a sua exceção.
Justifica-se tal entendimento, pelo fato de a exceção de pré-
executividade não ter o condão de suspender o curso da execução e, após a
interposição da referida peça, abre-se a oportunidade do credor de se manifestar
acerca do bem oferecido à penhora, bem como de todo o alegado na exceção.
Por conseqüência, a decisão que determinará a redução a termo da
penhora ou aceitará a recusa do credor, dando a oportunidade que indique o bem a
ser penhorado, será manifestada pelo juiz que ordenará, se procedente, a extinção
da execução ou, se improcedente, não intervirá no seu curso normal (due process).
32
CAPITULO 8
- A Exceção de pré-executividade em face da Lei de Execuções Fiscais
A cobrança da dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios e respectivas autarquias, é regulada pela Lei nº 6.830 de 22.09.1980 –
Lei de Execuções Fiscais - aplicando-se a ela, subsidiariamente, o Código de
processo Civil.
O artigo 16 da referida lei concede ao executado o prazo de 30 dias para o
oferecimento de embargos, perante o próprio juízo da execução, constituindo
verdadeira ação incidente, na qual o devedor-executado é o autor. A sentença será
proferida naqueles e não na ação de execução. A autuação em separado se faz
necessária, ocasião em que o executado deverá alegar toda a matéria útil à defesa,
requerer provas e juntar documentos e o rol de testemunhas, segundo o princípio da
eventualidade, concentrando-se então toda a defesa do devedor.
Entretanto, não admite a LEF os embargos, antes de garantido o juízo.
Este é, também, o conteúdo do artigo 737 do CPC, com o amparo da
jurisprudência. O direito exige esteja o juízo seguro pela penhora, depósito da coisa
ou seu equivalente. Apesar disso, existem acórdãos que admitem a apresentação de
embargos, mesmo antes de seguro o Juízo, nos casos em que o título executivo não
se reveste das formalidades legais, denotando abuso de direito ou se o executado é
pobre e não dispõe de bens para submeter à penhora. Desta forma, em casos
excepcionais, admite-se a dispensa do pressuposto básico da garantia do juízo, com
amparo na Lei Maior.
É possível, pois, mostrar-se sensível a esse posicionamento e, mesmo
assim, estar em harmonia com o princípio constitucional do contraditório.
À luz do entendimento acima exposado, LEON FREJDA SZKLAROWSKY,
incisivo, esclarece:
33
"O executado pode efetuar o pagamento no juízo da
execução e não obrigatoriamente na repartição fiscal e
alegar o pagamento nos próprios autos da execução
fiscal, antes de efetivada a penhora, quando então o juiz
deverá abrir vista dos autos ao exeqüente, atento ao
magistério ditado pela jurisprudência, sinalizada pelo
acórdão relatado, pelo Min. Pádua Ribeiro."
E continua o mestre, passando ao tema central deste estudo:
"O Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em acórdão
relatado pelo ínclito juiz, Teori Albino Zavascki, com o
beneplácito dos seus pares, decidiu que ‘a chamada
exceção de pré–executividade do título consiste na
faculdade, atribuída ao executado, de submeter ao
conhecimento do juiz da execução, independentemente
de penhora ou embargos, determinadas matérias próprias
da ação de embargos do devedor. Admite-se tal exceção,
limitada, porém, sua abrangência temática, que somente
poderá dizer respeito a matéria suscetível de
conhecimento de ofício ou à nulidade do título, que seja
evidente e flagrante, isto é, nulidade cujo reconhecimento
independa de contraditório ou dilação probatória.’ Cita, em
abono a essa tese, Pontes de Miranda, Galeno de
Lacerda e Araken de Assis."
Por outro lado, podemos invocar o princípio norteador da execução que
impõe seja a mesma realizada pelo meio menos gravoso ao executado. Sob a luz de
tal princípio, verificamos ser lógica, bastante e oportuna a impugnação de certas
matérias, capazes de fulminar a execução, por outra via processual que não a dos
embargos do devedor, que, por exigir a garantia do juízo, se mostra a mais onerosa
ao executado.
34
A este respeito, a preleciona OSWALDO MOREIRA ANTUNES:
"O artigo 620 do Código de Processo Civil, embora, numa
primeira vista, pareça apenas direcionado às constrições
de bens do executado, nos quais o magistrado deva
inclinar-se pela forma menos onerosa ao devedor, trata,
na verdade, de principio norteador das normas
processuais; isto é, o juiz terá em conta, sempre, a forma
menos danosa ao executado, deverá o magistrado
escolher a maneira menos gravosa ao devedor. Ora, se o
devedor pode impugnar determinada matéria nos próprios
autos da execução fiscal, sem a necessária constrição
sobre seus bens, qual o motivo de aguardar-se a
efetivação da garantia e a propositura dos embargos?"
Do exposto até agora, vê-se que tanto a doutrina como a jurisprudência
contemplam a tese já vitoriosa de que a nulidade da execução pode ser argüida a
qualquer momento, não se exigindo esteja o juízo seguro, nem sejam apresentados
embargos à execução. Basta, para tanto, uma simples petição, devendo aquela
nulidade ser decretada ex officio, ou, quando muito, resolvida incidentalmente. É a
chamada exceção de pré-executividade, tema de nosso estudo. Ainda, "oposição
pré-processual ou processual", na linguagem do festejado Pontes de Miranda.
Ora! Se um credor cria um falso título executivo ou falta a este algum
requisito essencial, deverá o executado dispor de seu patrimônio, com o objetivo de
garantir o juízo para opor embargos do devedor? Seguramente que não!
Na mesma linha de raciocínio, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria Nery
indicam, dentre outros doutrinadores, o magistério de Pedro Barcelos, que admite os
embargos, independentemente de estar garantido o juízo.
35
LEON FREJDA SZKLAROWSKY nos conta ainda, que "o STJ, pela palavra
do Relator Min. Eduardo Ribeiro, da 3.ª Turma, sentenciou que a nulidade do título,
em que se alicerça a execução, pode ser oposta por simples petição, por ser
suscetível de exame, de ofício, pelo magistrado, homenageando as Súmulas 346 e
473 do Pretório Excelso. Iterativa e torrencial é a orientação pretoriana."
Realmente, se as decisões sumuladas ordenam que a Administração pode (e
deve) anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais,
porque deles não se originam direitos, respeitados sempre aqueles já adquiridos,
com mais razão, podemos entender e pregar que o Judiciário deve fazê-lo, de
imediato, ao se deparar com ato ou título maculado com a chaga da nulidade ou de
vício insanável. Isto porque, na hipótese de ilegalidade ou ilegitimidade do ato, o
julgado pode e deve, evidentemente, ser invocado para amparar a anulação do ato,
tanto pela Administração como pelo Judiciário.
O experiente, LEON FREJDA SZKLAROWSKY, mais uma vez, alerta:
"A LEF ampara, ex abundantia, essa exegese, ao ditar
que, até a decisão de primeira instância, a certidão de
dívida ativa poderá ser emendada ou substituída,
assegurada ao executado a devolução do prazo, com o
apoio inequívoco do artigo 26 que autoriza a extinção da
execução fiscal, até a decisão de primeira instância, se, a
qualquer título, for cancelada a inscrição da dívida ativa,
sem qualquer ônus para as partes. Entretanto, a doutrina
e a jurisprudência, por unanimidade, têm instruído que a
desistência da execução fiscal, após os embargos, não
afasta a responsabilidade da exeqüente pelo ônus da
sucumbência."
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Para o § 3º do artigo 2º da LEF, a inscrição é o ato de controle administrativo
da legalidade, para apurar a liquidez e certeza do crédito, tributário ou não, da
Fazenda Pública, realizado por autoridade competente, que é o órgão jurídico, ou
seja, é o derradeiro ato do procedimento administrativo que permitirá a cobrança
daquele crédito, gozando da presunção juris tantum de certeza e liquidez. A própria
jurisprudência considera a inscrição da dívida como uma fase integrativa da eficácia
do procedimento administrativo do lançamento.
Observemos, por fim, que este ato vinculado – a inscrição - não se confunde
com o lançamento, apresentando natureza distinta deste. Diz respeito à certeza e
liquidez do débito já constituído, devendo-se apurar se este é legalmente líquido, ou
seja, se se cobra o que a lei permite e se é legalmente exato, ou seja, se a
obrigação foi constituída legalmente.
37
CAPITULO 9
- Recursos Cabíveis
No juízo de admissibilidade da execução, o juiz acolherá ou não a
exceção de pré-executividade. Acolhendo-a, o juiz dará termo a execução, julgando-
a extinta sem apreciação do mérito. Não a acolhendo, o processo de execução
seguirá seu rito, tendo o executado seus bens penhorados para garantia do feito.
Note-se que, no primeiro caso, o juiz proferiu sentença de mérito ao
acolher a exceção, cuja conseqüência lógica é que o recurso cabível será o de
Apelação Cível. Já no segundo caso, como foi decidida pela improcedência da
exceção de pré-executividade interposta pelo devedor, caberá recurso de agravo de
instrumento ao Tribunal Superior, com a possibilidade de atribuição de efeito
suspensivo e, verificando ausentes as condições da ação, poderá o Tribunal ad
quem reformar a decisão e extinguir o feito sem julgamento do mérito.
A análise pelo Tribunal faz coisa julgada em relação à matéria
suscitada, não podendo mais alegá-la, quer em sede de embargos ou em nova
apelação. Decorre disso, também, que, caso não tenha havido qualquer recurso
acerca da decisão que admite ou não a exceção de pré-executividade, esta pode ser
apreciada pelo Tribunal, por dizer respeito a matérias de ordem pública que podem
ser conhecidas de ofício.
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CAPITULO 10
- Jurisprudência
"A nulidade do processo por falta de citação pode ser reconhecida até em
mandado de segurança" (RSTJ 46/528 e STJ - RT 697/189; JTAERGS-90/325).
"O exame de anomalia na citação independe de provocação da parte, uma
vez que ao Judiciário incumbe apreciar de ofício os pressupostos processuais e as
condições da ação (CPC, arts. 267, § 3º, e 301, § 4º)." (STJ -4ª Turma, REsp
22.487-5-MG, rel. Min. Sálvio de Figueiredo, j. 2.6.92, deram provimento, v.u., DJU
29.6.92, p. 10.329-2ªcoluna).
"A nulidade ou inexistência de citação deve ser alegada em embargos à
execução (art. 741, I)." LE3-JTA-142/364.
"A nulidade da execução por falta de título pode e deve ser decretada de
ofício." (RT 711/183).
"A nulidade da execução pode ser argüida a todo o tempo; sua argüição não
requer segurança do juízo, não exige a apresentação de embargos à execução (RT
511/221, 596/146, JTA 53/37, 95/128, 107/230, RJTAMG 18/111). Deve ser
decretado de ofício (JTA 97/278)."
"A nulidade da execução pode ser alegada a todo tempo; sua argüição não
requer segurança do juízo, nem exige a apresentação de embargos à execução."
(STJ - RT 671/187, maioria; STJ -3ª Turma, REsp 3.079-MG, rel. Min. Cláudio
Santos, j. 14.8.90, deram provimento, v.u., DJU 10.9.90, p. 9.126, 2ª col., em.; RT
596/146, JTJ 157/214, 158/181, JTA 95/128, 107/230, RJTAMG 18/111).
Deve ser decretada de ofício: (STJ - RT 671/187, maioria, TA 97/278).
"A segurança do juízo não pode ser imposta naqueles casos em que o título
em execução não se reveste das características de título executivo, porque,
destarte, a própria execução estaria sendo ajuizada com abuso de direito por parte
39
do credor, utilizando uma via processual que a lei, em tese, lhe não concede. Outra
hipótese, em que creio não ser caso de se exigir a segurança do juízo, é aquele
caso em que o executado, pobre, não dispõe de bens para oferecer à penhora. Não
é possível, dentro do sistema jurídico constitucional brasileiro, em que se assegura o
pleno contraditório, limitá-lo, desta maneira, contra pessoas economicamente
carentes." (STJ - Bol. AASP 1.746/187, REsp 7.410- MS; a citação foi retirada do
voto do Min. Athos Carneiro-p.190)
"O sistema processual que rege a execução por quantia certa, salvo as
exceções legais, exige a segurança do juízo como pressuposto para o oferecimento
dos embargos do devedor. Somente em casos excepcionais, sobre os quais a
doutrina e a jurisprudência vêm se debruçando, se admite a dispensa desse
pressuposto, pena de subversão do sistema que disciplina os embargos do devedor
e a própria execução" (RSTJ-31/348).
"Transitando em julgado a sentença de mérito proferida no processo de
conhecimento, sua nulidade não poderá ser alegada em embargos à execução,
salvo na hipótese de inexistência jurídica da sentença ou no caso de nulidade ou
falta de citação no processo de conhecimento, se este correu à revelia." (JTA
103/266, 125/444).
"Não se revestindo o título de liquidez, certeza e exigibilidade, condições
basilares exigidas no processo de execução, constitui-se em nulidade, como vício
fundamental; podendo a parte argüi-la, independentemente de embargos do
devedor, assim como pode e cumpre ao juiz declarar, de ofício, a inexistência
desses pressupostos formais contemplados na lei processual civil" (RSTJ 40/447).
Neste sentido:RJ-205/81.
"Cabe mandado de segurança para pôr termo a execução iniciada,
indevidamente, sem título executivo." (Bol. AASP-1.637/109).
"Ainda que não seguro o juízo, o executado pode alegar a nulidade da
execução." Neste sentido: RJTJESP 85/274, 95/281, JTA 64/15, maioria. Admitindo
a alegação de prescrição antes de seguro o juízo (RT-624/105).
40
"Tratando-se de execução aparelhada com base em título nulo, por falta dos
requisitos de certeza, liquidez e exigibilidade, admitem-se embargos do devedor,
antes de seguro o juízo, por penhora. CPC arts. 737, 618, I, e LEF, art. 16 § 1º."
(RTFR-122/133).
"Ajuizada ação tendente a desconstituir o título em que veio a se fundar a
execução, não se pode exigir sejam apresentados embargos com o mesmo objetivo
o que, aliás, sequer seria possível, pois haveria litispendência. A solução está em,
garantido o juízo, tratar-se a ação em curso como embargos, com as conseqüências
daí decorrentes" (STJ -3ª Turma, REsp 33.000-6-MG, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j.
6.9.94, negaram provimento, v.u., DJU 26.9.94, p. 25.646, 1ª col., em.).
"EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL - Objeção de pré-executividade.
Cabimento. Condições da ação. Questões de ordem pública, sujeitas a
pronunciamento judicial independente de provocação das partes. Acolhimento para
afastar inconcebível iniqüidade de se exigir a afetação patrimonial do executado em
processo írrito, por falta de quaisquer das condições da ação. Recurso provido."
(BAASP – Boletim da Associação dos Advogados de São Paulo - 2022)
"EXECUÇÃO POR TÍTULO EXTRAJUDICIAL - Duplicata. Empresa estatal
prestadora de serviços públicos. Conceito. Pessoa administrativa que, conquanto
constituída sob a roupagem formal de pessoa jurídica de direito privado, tem por
único objeto prestação de serviço público. Aplicação, portanto, das regras contidas
no artigo 730, do CPC e artigo 100 da CF. Ineficácia do saque cambial reconhecida,
ante a incompatibilidade com o regramento de direito público aplicável. Recurso
provido, para julgar extinta a execução." (1º TACIVIL - 1ª Câm.; Ag. de Instr. nº
699.909-3-SP; Rel. Juiz João Carlos Garcia; j. 16.09.1996; v.u.).
"PROCESSO DE EXECUÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. Não
há dúvida de que cheque é título executivo extrajudicial tipificado na lei respectiva e
no inciso I do artigo 585 do CPC. Nessa conformidade, a exceção de pré-
executividade só é cabível quando manifesta a inexecutividade do documento, seja
por ausência das próprias condições da ação ou por evidente nulidade da execução,
circunstância que não é o caso dos autos." (TA-RS - RECURSO: AGI nº: 197158520
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- data: 26/11/1997 - Terceira Câmara Cível – Rel. Gaspar Marques Batista - Porto
Alegre)
"NOTA DE CRÉDITO COMERCIAL. EXECUÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-
EXECUTIVIDADE. Títulos que não apresentam certeza e liquidez à primeira vista
não ensejam processo de execução e sua argüição pode ser feita via exceção de
pré-executividade. Nota de Credito Comercial, desacompanhada de histórico claro
da dívida, desde seu nascedouro não enseja processo de execução. Exceção de
pré-executividade acolhida. Execução extinta. Agravo provido." (TA-RS - RECURSO:
AGI nº 197112626 - data: 30/10/1997 - Segunda Câmara Cível - Rel. Marco Aurélio
dos Santos Caminha - ORIGEM: Gravataí)
"AGRAVO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. Admite-se que o
executado venha a Juízo por meio da denominada exceção de pré-executividade
quando quiser discutir a qualidade do documento em que se funda a execução como
titulo executivo extrajudicial. AGRAVO PROVIDO." (TA-RS - RECURSO: AGI nº
197220080 - data: 11/12/1997 - Quinta Câmara Cível – Rel. Márcio Borges Fortes -
Porto Alegre)
"EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. Cabe o oferecimento da exceção
quando alegada ausência ou nulidade do título e da execução, sendo as condições
da ação matéria apreciável de oficio pelo magistrado. Precedentes jurisprudenciais.
AGRAVOS PROVIDOS. DECISÃO: Dado provimento. Unânime. (TJRS - RECURSO
: AGI nº 196035695 - data: 16/05/1996 - Quarta Câmara Cível – Rel. Moacir
Leopoldo Haeser - Porto Alegre). Neste sentido: (TJRS - RECURSO: AGI nº
196061485 - data: 16/05/1996 - Quarta Câmara Cível – Rel. Moacir Leopoldo
Haeser - Porto Alegre)
"PETIÇÃO INICIAL - indeferimento - reconsideração inadmissível - Agravo
provido - Aplicação do art.618, nº I, do Código de Processo Civil. A nulidade prevista
no art. 618, I, do Código de Processo Civil é decretada de ofício, sem necessidade
apresentação de embargos à execução."(RT 511, maio de 1978, p. 221-2).
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"PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROCESSO DE
EXECUÇÃO - EMBARGOS DO DEVEDOR - NULIDADE - VÍCIO FUNDAMENTAL -
ARGUIÇÃO NOS PRÓPRIOS AUTOS DA EXECUÇÃO - CABIMENTO - ARTIGOS
267, § 3o.; 585, II; 586; 618, I DO CPC. I - Não se revestindo o título de liquidez,
certeza e exigibilidade, condições basilares exigidas no processo de execução,
constitui-se em nulidade, como vício fundamental; podendo a parte argüí-la,
independentemente de embargos do devedor, assim como, pode e cumpre ao Juiz
declarar, de ofício, a inexistência desses pressupostos formais contemplados na lei
processual civil. II - Recurso conhecido e provido." (Recurso Especial n.º 13.960 -
SP, in R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 4, (4); 229-567, dezembro l992.)
No mesmo sentido e do mesmo Tribunal, verbis:
"PROCESSO CIVIL - EXECUÇÃO - TÍTULO IMPERFEITO - NULIDADE -
DECLARAÇÃO INDEPENDENTEMENTE DA APRESENTAÇÃO DE EMBARGOS. A
argüição de nulidade da execução com base no art. 618 do estatuto processual civil,
não requer a propositura de ação de embargos à execução, sendo resolvida
incidentalmente. Recurso conhecido e provido." (REsp. n.º 3.079 - MG, Relator
Eminente Ministro Cláudio Santos). No julgamento do REsp. 3.264-PR, o STJ
entendeu que: "A nulidade do título em que se embasa a execução pode ser argüida
por simples petição, uma vez que suscetível de exame, ex offício pelo Juiz." (RT
671/187, Rel. Min. Eduardo Ribeiro.)
"O tradicional princípio de direito processual, de que não se admitem
embargos do devedor antes de seguro o juízo pela penhora – (Código de Processo
Civil – art. 737, LEF, art. 16, § 1º) – admite temperamentos em caso de nulidade da
execução ajuizada com apoio em título executivo inexigível, ilíquido e não certo."
(RTFR 122/133).
"Independentemente da oposição de embargos do devedor, o executado
pode também exercer defesa na própria execução, no que diz com matéria estranha
ao objeto daqueles (CPC, art. 471), a fim de pugnar para que a mesma se contenha
em seus limites legais, de modo a não causar dano desnecessário." (1.º Tribunal de
Alçada Cível do Estado de São Paulo, no incidente de uniformização de
jurisprudência: AI n.º 41.165-SP)
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Conclusão
Temos, pois, que é plenamente admissível, no direito pátrio, o instituto
da exceção de pré-executividade. Tal instrumento nos revela que cognição e
execução não são institutos incompatíveis, de modo que o executado pode provocar
a cognição do juiz por meio de embargos ou mediante referida exceção. Entretanto,
como já debatido, os embargos do devedor, como ação autônoma, embora conexa
com a execução, continua a ser a forma principal de defesa no processo de
execução.
A exceção de pré-executividade tem natureza de incidente processual
e, ao contrário dos embargos - que têm natureza jurídica de ação - não provoca
suspensão do feito: pode ser oposta por simples petição nos autos da execução.
Por outro lado, é de se notar que a utilização da exceção de pré-
executividade - este incidente processual ou pré-processual, como querem alguns
autores - é de grande valia para os casos de falha no controle de admissibilidade da
execução, quer seja em virtude de um lapso do magistrado ou por qualquer outro
motivo. Verifica-se o desenrolar de um processo executivo que não se reveste de
todos os pressupostos os quais deveria atender.
Neste sentido, Araken de Assis reconhece que, embora não tenha
previsão legal e o juiz tenha cometido algum lapso, é possível ao devedor requerer,
independente de penhora e de oposição de embargos, que o juiz aprecie a alegação
da inexistência dos pressupostos processuais.
Nas palavras do mestre ARAKEN DE ASSIS ( 1997. p.444.)
"Embora não haja previsão legal explícita, tolerando o
órgão judiciário, por lapso, a falta de algum pressuposto, é
possível o executado requerer seu exame, quiçá
promovendo a extinção da demanda executória, a partir
do lapso de vinte e quatro horas, assinado pelo art. 652.
Tal provocação de matéria passível de conhecimento de
ofício pelo juiz prescinde de penhora, e, a fortiori, do
oferecimento de embargos (art. 737, I)."
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Há de se reconhecer ao devedor o direito de apontar irregularidade
formal do título que aparelha a execução, bem como a falta de citação, a
incompetência absoluta do juízo, o impedimento do juiz e outras questões de ordem
pública, sem a necessidade de prévia garantia do juízo e da oposição de embargos,
como manifestação do princípio do contraditório.
O certo é que, de um modo geral, a jurisprudência tem admitido a
exceção de pré-executividade nas hipóteses relacionadas às matérias que o juiz
pode conhecer de ofício - matérias de ordem pública - notadamente pressupostos
processuais e condições da ação de execução, nos termos do art. 267, § 3º, do CPC
e nos casos em que é admitida a alegação da parte a qualquer tempo, como
nulidade do título, da execução - art. 618 do CPC - e penhora de bem impenhorável.
Entretanto, algumas decisões, ampliaram seu espectro e também admitiram a
exceção de pré-executividade em matéria de mérito, tais como prescrição,
decadência e pagamento.
Nos casos de ausência de pressupostos essenciais à constituição
válida ou ao desenvolvimento regular da execução, seria arbitrário exigir do
executado a segurança do juízo, pois este, freqüentemente, sequer possui
patrimônio disponível sobre o qual recaia a penhora.
Assim, a dificuldade do tema está em estabelecer os limites da
exceção de pré-executividade, distinguindo-se o que pode ser alegado por meio
dela, o que, necessariamente, deve ser matéria de embargos. A exceção de pré-
executividade não tem o escopo de substituir os embargos do devedor, nem fornecer
expediente temerário que permita frustrar a execução pela não constituição de
garantia do juízo, uma vez que não se pode conceber a discussão de matérias de
mérito ou que demandem produção de provas em sede de outra ação que não os
embargos à execução.
A exceção de pré-executividade apenas pode ser utilizada quando não
for necessária a dilação probatória para a verificação de vícios no processo
executivo. Se diferente fosse, alterar-se-ia toda a estrutura do processo de
execução, que restaria inócuo para o atendimento de suas finalidades.
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Cumpre observar, por fim, que a decisão relacionada à exceção, pode
extinguir ou não o mérito da execução. Caso seja acolhida a exceção, o juiz proferirá
decisão de mérito e julgará extinto o processo sem julgamento do mérito, interpondo
contra essa decisão recurso de Apelação. No caso do não acolhimento da exceção
será proferida decisão interlocutória, cabendo a interposição de Agravo de
Instrumento para o Tribunal Superior.
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Referências bibliográficas:
1. ASSIS, Araken de. Manual do processo de execução. 4..ed. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 1997.
2. BATISTA JÚNIOR, Geraldo da Silva. Exceção de pré – executividade: alcançe e
limites. Rio de Janeiro: ed. Lumen Juris, 2003.
3. CARDOSO, Hélio Apoliano. Exceção de pré-executividade e suas
particularidades. Repertório IOB de Jurisprudência. 2ª Quinzena de fevereiro de
1999. nº4/99. Caderno 3. Civil, Processual, Penal e Comercial. p.94.
4. CELSO NETO, João. Exceção de Pré-executividade. Disponível em:
<http://www.jus.com.br/doutrina/preexe.html>. Acesso em 20 mai. 2001.
5. DINAMARCO, Cândido Rangel. Execução Civil. 4. ed. São Paulo: Malheiros,
1994.
6. GONÇALVES, Helena de Toledo Coelho. Objeção de pré-executividade – Uma
análise principiológica. In: SHIMURA, S.; WAMBIER, T. A. A. (Org.) Processo de
Execução. São Paulo: ed. Revista dos Tribunais, 2001. v. 2.
7. MAGALHÃES, Renato Vasconcelos. Juízo de admissibilidade na execução
forçada e exceção de pré-executividade. Disponível em:
<http://www.jus.com.br/doutrina> Acesso em setembro de 2002.
7. NERY JUNIOR, Nelson. Princípios do processo civil na constituição federal. 4. ed.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.
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8. ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. O princípio Constitucional da Igualdade. Belo
Horizonte: Lê, 1990.
9. THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de direito processual civil. v. 2, 17.ed. Rio
de Janeiro: Forense, 1996. p.5.
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: Instituto A Vez do Mestre
Título da Monografia: Exceção de Pré Executividade
Autor: Leonardo Antunes Ferreira da Silva
Data da entrega: 17/11/2005
Avaliado por: Conceito:
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