Estudo Neuropsicológico em Adolescentes Institucionalizados
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
Dissertação de Mestrado em Medicina Legal
2010
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
Estudo Neuropsicológico em Adolescentes Institucionalizados
Dissertação de Candidatura ao grau de
Mestre em Medicina Legal submetida ao
Instituto de Ciências Biomédicas de Abel
Salazar da Universidade do Porto.
Orientador – Prof. Doutora Sara Fernandes
Categoria – Professora Auxiliar
Afiliação – Universidade Lusíada, Porto
Agradecimentos
Quero agradecer ao Centro Educativo Santo António, por ter aceitado o meu
projecto e por se disponibilizarem para me receber. À Dra. Isabel, Psicóloga, por me ter
orientado e ajudado no que foi preciso, pela paciência e pela disponibilização. Ao Director
Viana que autorizou o meu projecto e que facilitou a minha recolha de dados. Aos
adolescentes da Instituição que contribuíram para que o meu projecto fosse concretizado.
À minha orientadora, Professora Dra. Sara Fernandes, pela disponibilização
dispensada para o meu trabalho, para me ajudar e apoiar em todas as questões que
surgiram.
À Professora Maria José Pinto da Costa pelo incentivo e pela paciência para o
esclarecimento de todas as dúvidas e pela ajuda fundamental em muitos aspectos.
Aos colegas do Mestrado que tive o prazer de conhecer e de quem me tornei
amiga, pelas conversas intermináveis ao telefone e no Instituto de Ciências Biomédicas
Abel Salazar, pelas ideias trocadas e pelo apoio de todos.
Aos meus amigos pela compreensão da minha ausência e por quererem contribuir
para me ajudar no que fosse preciso.
Às minhas primas, Ana e Marta, pela força e apoio ao longo deste tempo.
À minha família, Mãe e Pai, sem os quais isto não seria possível, pelo apoio,
paciência, disponibilização para tudo e por estarem presentes em todos os momentos.
A todos vós o meu Muito Obrigado!
“Não é fácil estabelecer-se uma etiologia da criminalidade juvenil porque os factores
endógenos e exógenos são variados e variáveis. É possível, no entanto, à margem de
quaisquer escolas ou correntes apontar factos que predispõem à delinquência no jovem”
(Moura, 2000)
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
V
Resumo
Introdução: A delinquência juvenil tem crescido progressivamente e a percepção
desta situação começa a ser maior, no entanto, para definir um jovem como delinquente
é fundamental ter em conta os seus factores de risco, os padrões de conduta
delinquente, o ambiente familiar, escolar, relacional e social em que está inserido e a
existência de Perturbação do Comportamento.
Objectivos: Com este estudo, de natureza exploratório, procuramos averiguar as
possíveis alterações a nível neuropsicológico em adolescentes que delinquiram e se
encontravam a cumprir medida tutelar no Centro Educativo Santo António, no Porto,
estabelecimento integrado na estrutura orgânica da Direcção Geral de Reinserção Social.
Procuramos também analisar a existência de correlações significativas intra-teste e inter-
teste das provas de avaliação neuropsicológicas utilizadas neste estudo e também a
existência de diferenças significativas entre as variáveis sócio-demográficas em função
do rendimento dos testes utilizados.
Sujeitos e Metodologia: Para este efeito foi constituída uma amostra composta
pelos adolescentes, que na altura se encontravam no Centro Educativo (N=31). Para
avaliar as possíveis alterações foi utilizada uma bateria de testes neuropsicológicos, entre
os quais a Escala de Inteligência de Wechsler para Crianças (Wechsler, 2003), Figura
Complexa de Rey (Rey, 1988), Stroop – Teste de Cores e Palavras (Golden, 2007),
TRVB – Teste de Retenção Visual de Benton (Benton, 2002) e o WCST – Teste de
Classificação de Cartas de Wisconsin (Heaton, Chelune, Talley, Kay, e Curtiss, 2001) e
foi utilizada a Entrevista Semiestruturada para Realização de Anamnese (Christensen,
1975; adaptada com autorização por Maia, Loureiro e Silva, 2002) para recolher
informação complementar. Os dados obtidos através destes instrumentos foram
submetidos a tratamento estatístico, sendo posteriormente analisados qualitativamente e
quantitativamente. Para avaliar a existência de correlações significativas intra-teste e
inter-teste procedeu-se à análise de correlações de Spearman e para a análise de
diferenças significativas entre as variáveis sócio-demográficas da amostra, optamos por
utilizar o Teste Não Paramétrico de Mann-Whitney. Esta opção de utilizar este teste foi
devida ao tamanho da amostra.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
VI
Resultados: Os resultados obtidos por esta amostra, não generalizáveis ao
universo dos adolescentes delinquentes institucionalizados, sugerem alterações
neuropsicológicas a nível da memória, das funções executivas, funções verbais e
atencionais. Verificou-se também a existência de correlações significativas intra-teste e
inter-teste e em relação às variáveis sócio-demográficas, não se encontraram diferenças
estatisticamente significativas no rendimento dos testes.
Conclusão: Este estudo permitiu identificar alterações neuropsicológicas
características em adolescentes delinquentes e a existência de factores de risco para a
delinquência na amostra estudada.
Palavras-chave: Delinquência Juvenil; Conduta Delinquente; Aspectos
Neuropsicológicos da Delinquência; Alterações de Memória; Funções Executivas; Défices
de Atenção; Dificuldades de Aprendizagem.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
VII
Abstract
Introduction: Juvenile delinquency has been increasing progressively and the
perception of this situation is starting to become bigger. Nevertheless, to define a
youngster as a delinquent it is imperative that we should take into account his or her risk
factors, the patterns of delinquency conduct, his or her family, school and social
environment and the existence of a Behavioural Disturbance.
Objectives: With this exploratory study, we are trying to find some possible
alterations in a neuropsychological level in teenagers which turned into delinquents and
were accomplishing a tutelary measure in the Santo António‟s Educational Center, in
Oporto, an establishment which is part from the organic structure of the General Board of
Social Reinsertion. We also tried to analyze the existence of significant intra-test and
inter-test correlations in the neuropsychological evaluation exams used in this study and
also the existence of significant differences between the socio-demographical variables
according to the results from the tests that were used.
Subjects and Methodology: With this purpose it was analysed a sample made by
the teenagers that were at that time in the Educational Centre (N=31). To evaluate some
possible changes it was used a battery of neuropsychological tests, among them were
Wechsler Intelligence Scale for Children (Wechsler, 2003), Rey’s Complex Figure (Rey,
1988), Stroop – Color and Word Test (Golden,2007), TRVB – Revised Visual Retention
Test from Benton (Benton, 2002) and the WCST – Wisconsin Card Sorting Test (Heaton,
Chelune, Talley, Kay and Curtiss, 2001) and also the Semi-structured Interview to the
Accomplishment of Anamnesis (Christensen, 1975; adapted with permission by Maia,
Loureiro and Silva, 2002) to gather some complementary information. The data obtained
by these instruments were submitted to a statistical treatment and later analysed in a
qualitative and quantitative manner. To evaluate the existence of significant intra-test and
inter-test correlations it was used the Spearman Correlations Analysis and to analyse the
significant differences between the socio-demographical variables we choose to use the
Non-Parametric Test of Mann-Whitney. This option was made due to the size of the
sample.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
VIII
Results: The results obtained through this sample, not applicable to the whole
universe of young institutionalised delinquents, suggest neuropsychological adjustments
concerning to memory, executive functions, verbal functions and attention functions. It
was also verified the existence of significant intra-test and inter-test correlations. As for
the socio-demographical variables, it was not found any statistical relevant difference in
the tests results.
Conclusion: This study allowed us to identify some neuropsychological changes
which were part of the characteristics from delinquent teenagers and the existence of risk
factors to delinquency in this sample.
Key-words: Juvenile Delinquency; Delinquent Conduct; Neuropsychological Aspects from
Delinquency; Memory Changes; Executive Functions; Attention Deficits; Learning
Difficulties
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
IX
Índice
Resumo ............................................................................................................................ V
Abstract .......................................................................................................................... VII
Introdução ........................................................................................................................14
Parte A: Enquadramento Teórico .....................................................................................15
Capítulo 1: Delinquência ..............................................................................................16
1.1. Definição de Adolescência .............................................................................17
1.2. Definição de Delinquência Juvenil ..................................................................18
1.2.1. Tipos de Delinquência .............................................................................21
1.2.2. Factores de Risco e de Protecção ..........................................................27
1.3. Contextualização Histórica .............................................................................36
1.3.1. Enquadramento Legal - A Lei Tutelar Educativa .....................................42
1.4. Características da Delinquência .....................................................................45
1.4.1. Padrões de Conduta Delinquente ...........................................................45
1.4.2. A Importância Familiar na Delinquência Juvenil ......................................48
1.4.3. A Influência dos Pares e dos “Gangs” na Conduta Delinquente ..............51
1.4.4. A Importância da Escola no Desenvolvimento de Conduta Delinquente .58
1.4.5. O Uso de Estupefacientes na Delinquência Juvenil ................................59
1.4.6. A Importância da Comunidade no Desenvolvimento da Delinquência .....62
1.5. Neuropsicologia e o Comportamento Delinquente .........................................64
1.5.1. Perturbação do Comportamento .............................................................64
1.5.2. Aspectos Neuropsicológicos na Delinquência .........................................68
Parte B: Planeamento Empírico .......................................................................................78
Capítulo 2: Objectivos ..................................................................................................80
Capítulo 3: Metodologia da Investigação ......................................................................82
3.1. Caracterização da Amostra ............................................................................83
3.2. Instrumentos e Recolha de Dados .................................................................86
3.3. Procedimentos da Investigação .....................................................................93
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
X
3.4. Análise de Dados ...........................................................................................93
Capítulo 4: Resultados .................................................................................................95
Capítulo 5: Discussão e Conclusões do Estudo ......................................................... 106
Referências Bibliográficas ............................................................................................. 115
Anexos I......................................................................................................................... 120
Anexo II ......................................................................................................................... 121
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
XI
Índice de Tabelas
Tabela 1...........................................................................................................................83
Tabela 2...........................................................................................................................85
Tabela 3...........................................................................................................................87
Tabela 4...........................................................................................................................99
Tabela 5......................................................................................................................... 101
Tabela 6......................................................................................................................... 101
Tabela 7......................................................................................................................... 102
Tabela 8......................................................................................................................... 104
Tabela 9......................................................................................................................... 105
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
XII
Índice de Figuras
Fig. 1 Ordenação aproximada do desenvolvimento dos factores de risco associados com
comportamento perturbado e delinquente ........................................................................34
Fig. 2 Critérios de Diagnóstico para Perturbação do Comportamento ..............................67
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
XIII
Lista de Abreviaturas
ADHD – Perturbação de Hiperactividade com Défice de Atenção
Fig. Comp. Rey – Figura Complexa de Rey
FCRC – Figura Complexa de Rey, processo de Cópia
FCRM – Figura Complexa de Rey, processo de realização de Memória
D.P. – Desvio Padrão
PD – Pontuação Directa
QIG – Quociente de Inteligência Global
QIR – Quociente de Inteligência de Realização
QIV – Quociente de Inteligência Verbal
SP – Stroop Palavras
SC – Stroop Cor
SPC – Stroop Palavra-Cor
TRVBCC – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma C, Reproduções Correctas
TRVBCE – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma C, Valorização de Erros
TRVBDC – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma D, Reproduções Correctas
TRVBDE – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma D, Valorização de Erros
TRVBEC – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma E, Reproduções Correctas
TRVBEE – Teste de Retenção Visual de Benton, Forma E, Valorização de Erros
WCSTNE – Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin, Número Total de Erros
WCSTRP – Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin, Respostas Perseverativas
WCSTEP – Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin, Erros Perseverativos
WCSTENP – Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin, Erros Não Perseverativos
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
14
Introdução
Quem vive no mundo real, depara-se com situações e notícias que às vezes nos
parecem impossíveis de serem reais, nomeadamente no que toca à delinquência juvenil
e principalmente o que leva a que muitos jovens enveredem por este caminho.
O facto de vivermos numa sociedade mais egocêntrica, permissiva e menos
atenta a situações de carências emocionais, educacionais, económicas e morais,
também contribui para este desajuste social.
Segundo Strecht (2004), “os actos anti-sociais ou marginais como forma de
expressão de um sofrimento psíquico têm a vantagem de ser altamente inquietantes.
Vulgarmente o acto delinquente tem um sentido, um objectivo, e esse é habitualmente
conseguido: provoca um mal-estar, uma preocupação em todos nós”.
A delinquência juvenil remonta há muitos anos atrás, pois sempre existiram
relatos de histórias de menores que caíram nas malhas do crime (Lima, 2003; Martins,
2006).
A sua história, a sua tipologia, os seus factores de risco a nível individual
(comportamento anti-social precoce, factores emocionais, desenvolvimento cognitivo e
hiperactividade (cit. Wasserman et al., 2004)) e os próprios antecedentes familiares no
mundo da criminalidade, e as suas características, quer a nível da sua evolução para a
delinquência, quer a influência do grupo de pares, juntamente com o consumo precoce
de estupefacientes, a influência familiar, a escola, a comunidade, são variáveis que na
actualidade são também estudadas pela Neuropsicologia.
Por ser uma nova perspectiva no estudo da delinquência juvenil, pareceu-nos
interessante para este trabalho de investigação, estudar as características
neuropsicológicas de adolescentes que delinquiram e verificar se as variáveis sócio-
demográficas influenciam o seu rendimento nos testes de avaliação neuropsicológica.
Esta dissertação encontra-se dividida em duas partes – uma referente à
componente mais teórica e conceptual relacionada com o nosso objecto e objectivos de
estudo e a outra parte relacionada com o estudo empírico desenvolvido, metodologias
utilizadas e apresentação e análise dos seus resultados.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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Parte A: Enquadramento Teórico
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
16
Capítulo 1: Delinquência
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
17
1.1. Definição de Adolescência
Não existe consenso quanto à definição do conceito de adolescência, devido aos
limites inerentes serem difíceis de precisar e devido a isso tornar-se um conceito relativo,
uma vez que se trata de uma fase decisiva no processo de desenvolvimento humano.
A adolescência é o período de transição entre a infância e a idade adulta, em que
ocorrem várias transformações, inerentes a esta fase, a nível físico, fisiológico,
psicossocial e cognitivo, provocando interferências na dimensão intrapessoal do
adolescente, acarretando consequências psicológicas que se traduzem na representação
de si próprio e do outro, na auto-estima e na auto-confiança, nas emoções e na
interacção e nas relações que estabelece no núcleo familiar e em outros grupos
(Fonseca, Miranda e Monteiro, 2003).
Neste período de desenvolvimento, a desvinculação emocional da infância é um
processo lento, existindo também um processo de maturação biológica, psicológica e
social, com consequentes mudanças que podem decorrer de forma mais ou menos
harmoniosa.
Estas mudanças necessitam de um desenvolvimento da capacidade de reformular
sentimentos internos e de reorganizar uma nova relação consigo próprio, com o mundo
que o rodeia e com o mundo interior. Esta fase termina com a resolução dos dois
objectivos principais desta etapa, a primeira é a aquisição da autonomia, isto é, o
abandono da relação de dependência infantil relativamente às figuras parentais e a
segunda, é a construção da identidade, na qual terá que se reformular um passado e
construir um futuro, em que o adolescente deverá encontrar as respostas às suas
dúvidas, questionando os valores, os interesses, as atitudes e os comportamentos
(Fonseca et al., 2003).
Actualmente, existe um paradoxo no processo de crescimento e de mudança, pois
por um lado, os adolescentes antecipam determinados movimentos de autonomia,
liberdade e atingem de forma prematura a maturidade fisiológica, por outro, atrasam a
saída da habitação dos progenitores, ou seja, o período de tempo entre a maturação
afectivo-sexual e o atingir socialmente o estatuto de adulto é cada vez mais demorado. O
que tem contribuído para esta situação é o prolongamento do tempo académico, a
dificuldade em iniciar a vida profissional e a aquisição da autonomia em termos afectivos
e materiais.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
18
Todas estas condicionantes associadas à falta de comunicação intra-familiar e ao
nível da estrutura escolar, podem resultar na possibilidade de o adolescente fazer uma
identificação com indivíduos que lhe são sugeridos pela sociedade de consumo ou uma
identificação com os seus pares através da adesão a formas marginais de socialização.
Esta situação poderá ser transitória se existir um suporte psicossocial equilibrado.
1.2. Definição de Delinquência Juvenil
“O conceito de delinquência reveste-se actualmente de alguma especificidade,
embora o termo continue a ser utilizado por vezes de forma indistinta e referindo-se a
diferentes níveis de interpretação” (Peres e Gonçalves, 2006).
A noção de delinquência é um conceito multidimensional, resultando de um
debate que se centra particularmente na opção de uma perspectiva legal ou de uma
perspectiva não legal, que pode ser psicológica, sociológica ou psicopatológica.
Aparece como uma construção social e institucional em torno da qual se agregam
definições e ideias sobre situações e comportamentos que contrastam com o conceito
ideal que temos da infância e da juventude. A delinquência juvenil é definida a partir de
leis, práticas e crenças relativas à conduta das crianças e dos jovens que se encontram
nas instituições responsáveis social e legalmente pelo controlo e tratamento da conduta
considerada delinquente e de outros problemas juvenis. A delinquência juvenil também
definida como comportamento; o comportamento que os jovens estabelecem com a
família, os amigos e outros adultos nos espaços onde a delinquência nasce (Ferreira,
1997).
A delinquência juvenil refere-se a todo o tipo de infracção criminal que acontece
durante a infância e a adolescência, envolvendo o conjunto de respostas e de
intervenções institucionais e legais em relação a menores que cometem infracções
criminais ou que se encontram em situações ou apresentam condutas potencialmente
delinquentes, nomeadamente nos casos em que existe grave negligência familiar ou em
que as crianças ou adolescentes demonstram comportamentos desviantes e
desajustados da realidade psicossocial do grupo etário a que pertencem.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
19
A compreensão da delinquência durante a adolescência não pode ser entendida
como uma oposição inqualificável entre a infracção e a moral convencional ou legal. Por
vezes, as infracções cometidas, devido à importância atribuída à reputação perante os
seus amigos e às integrações grupais. Ao procurar compreender os adolescentes,
devemos reconhecer que eles hesitam entre as exigências formais da lei e as prescrições
mais informais que resultam das pertenças e socializações grupais (Ferreira, 1997).
Conforme a perspectiva legal, o conceito de delinquência aparece associado à
situação de inimputabilidade criminal dos menores e de acordo com o Código Penal, art.º
19, indivíduos com idade inferior a 16 anos, não podem ser criminalmente imputáveis e
por isso o menor delinquente é considerado como “indivíduo sujeito à jurisdição do
tribunal de menores, isto é, todo o indivíduo que praticou um acto ilícito depois dos 12
anos e antes dos 16 anos, jovem a quem foi aplicada uma medida tutelar educativa”
(Costa, 1999, cit. Marteleira, 2005), visando objectivos de protecção e de educação.
Os menores internados em Centros Educativos são formados por jovens
delinquentes. Este conceito está frequentemente relacionado, a um determinado tipo de
conduta irreverente, de contestação ou mesmo ao consumo de drogas.
A delinquência pode ser definida quer a partir das leis, quer pelas práticas e
crenças relativas à conduta dos menores, como pela própria conduta destes últimos
(Ferreira, 1997, cit. Marteleira, 2005).
Pode dividir-se a delinquência juvenil em duas categorias: a delinquência
expressiva e instrumental. A delinquência expressiva caracteriza-se pela chamada de
atenção do jovem através da transgressão; a delinquência instrumental caracteriza-se
pela utilização do crime como meio de obtenção de determinados bens ou serviços
(Moura, 2000).
Existe uma definição dos delinquentes muito jovens em três categorias (Grupo de
Estudo da OJJDP (Office of Juvenile Justice and Delinquency Prevention), 2001, cit.
Loeber, Farrington e Petechuk, 2004):
Crianças com delinquência grave, que cometeram um ou mais actos punitivos,
tais como homicídio, assalto agravado, roubo, violação ou fogo posto grave;
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
20
Outras crianças delinquentes que cometeram outros tipos de crime, talvez não
tão graves;
Crianças com comportamento perturbado persistente que se encontram em
risco de delinquir.
O comportamento passado é o melhor indicador do comportamento futuro, em
que menores com comportamento perturbado persistente têm mais possibilidade de se
virem a tornar crianças delinquentes e, consequentemente, de se tornarem delinquentes
juvenis graves, violentos ou crónicos. No entanto, nem todos os menores com
comportamentos perturbados se tornarão menores delinquentes e nem todas as crianças
delinquentes virão a ser delinquentes juvenis graves, violentos ou crónicos (Loeber et al.
2004).
O envolvimento dos jovens na delinquência está associado com a atracção que a
situação exerce, ao ponto de suspender transitoriamente o risco de punição e os valores
morais vigentes.
Para Travis Hirschi (1969), a questão que se coloca não é saber por que é que os
jovens delinquem, mas sim por que razão não o fazem. “A resposta consiste no facto dos
sistemas de sanções existentes na sociedade exercerem uma acção de controlo sobre os
indivíduos, o que explica a conformidade e um número reduzido de delinquentes”
(Hirschi, 1969). Este controlo deve-se a dois tipos: interno, que está associado à
interiorização das normas sociais, traduzindo a adesão voluntária à ordem social; e
externo, que reforça a importância e o peso das sanções.
Hoje em dia, é frequente ouvir que a delinquência está a aumentar e provocou um
aumento da preocupação do público. No entanto, a forma como se lida com este tipo de
situação provavelmente ainda não será a melhor.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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1.2.1. Tipos de Delinquência
É necessária uma distinção, do ponto de vista comportamental, entre o menor que
comete um acto de delinquência isolado e aquele que comete actos de delinquência
muitas vezes. No entanto, é difícil explicar esta distinção, pois o acto isolado pode ser
muito grave, como por exemplo um caso de crime passional, ou então ser pouco grave,
como por exemplo um pequeno furto. O que se pode concluir desta questão, é que o
acto, quer seja muito grave, quer seja pouco grave, é o resultado de um percurso pessoal
do menor que passará ao acto, enquanto um outro menor encontrará outras condutas
não delinquentes para alcançar os seus objectivos ou para resolver uma situação
problemática (Born, 2005).
A diferença entre o delinquente e o não delinquente consiste na persistência dos
actos que podem começar precocemente por volta dos 6/7 anos e se prolongam para
além dos 9 anos. O estudo dos autores Moffitt e Caspi (Moffitt, 1993; Moffitt, 1994; Caspi
& Moffitt, 1995; Moffitt, 1997, cit. Born, 2005 e Peres et al. 2006) propõem duas
categorias que sustentam esta questão: “Delinquência limitada à adolescência”
(Adolescence limited delinquency) e a “Delinquência persistente durante a vida” (Life-
course-persistent delinquency).
A “delinquência limitada à adolescência” caracteriza-se pelo aparecimento da
delinquência ao longo da puberdade, por volta dos 11/12 anos, caracterizando-se por um
período de desfasamento entre a maturidade biológica e a maturidade social, pois ainda
não tem um papel social totalmente definido, em que os menores procuram obter o ganho
material, para assim alcançarem protagonismo, estatuto e aceitação no seio do grupo,
rompendo com os valores familiares, para assim demonstrar autonomia em relação aos
pais e acelerar a sua maturação. O carácter deste tipo de delinquência é temporário, não
se prolongando para a idade adulta. A renúncia à delinquência ocorre no fim da
adolescência, por se iniciar uma vida afectiva e profissional que dá estatuto e
responsabilidades. No entanto, esta situação não é linear, uma vez que se tem
constatado que a saída da adolescência nem sempre é seguida do fim dos
comportamentos ilícitos (Moffitt, 1993, cit. Born, 2005 e Peres et al., 2006).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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A “delinquência persistente durante a vida” caracteriza-se pelo início precoce,
em que certas alterações de conduta ou mesmo de alguma delinquência se verificam
ainda na infância, quando o comportamento difícil na criança de grande risco é agravado
por um meio social igualmente de alto risco. O risco da criança tem a sua origem em
défices neuropsicológicos herdados ou adquiridos, que inicialmente começam a
manifestar-se por défices cognitivos subtis, dificuldades temperamentais ou
hiperactividade ou défice das funções de controlo, a nível da aprendizagem verificam-se
várias problemáticas e insucessos escolares. Por outro lado, os autores incluem estilos
parentais inadequados, quebra de laços familiares perturbados e, ainda, a pobreza. A
ligação aos pares delinquentes torna-se mais forte, reforçando as actividades marginais.
“Existe uma interacção entre traços pessoais e factores ambientais, desde a infância, e
ao longo de toda a vida adolescente e adulta, que ajudam a manter a actividade
delinquente” (Moffitt, 1993, cit. Born, 2005 e Peres et al. 2006).
Outra investigação, mais generalizada, sugere uma diferenciação da conduta
delinquente em que acompanha o menor desde que inicia a delinquência, a sua
frequência, a sua gravidade e a sua persistência, permitindo visualizar em que ponto se
situa o menor na sua carreira de delinquente, dividindo em dois grupos: Delinquência
“comum” ou “insignificante” e Delinquência “distinta” ou “significativa” (Frechette
e LeBlanc, 1987, cit. Baptista, 2000 e Born, 2005).
A delinquência “comum” é caracterizada por condutas delituosas menores,
pouco significativas e intrínsecas ao processo de desenvolvimento do adolescente, pode-
se considerar como uma fase de “crise” do desenvolvimento psico-social, em que os
limites e as regras sociais são constantemente desafiados, por prazer/excitação ou até
desconhecimento. Verifica-se um agravamento das circunstâncias sócio-familiares e
escolares ou problemas de desenvolvimento do menor, que criam problemas de
comportamento, socialmente pouco danosos e frequentemente de carácter auto-
destrutivo. São condutas que resultam, quer da insuficiente supervisão parental, quer da
exposição a situações delinquenciais, resultantes da integração em grupo de iguais e do
deficiente enquadramento institucional na ocupação dos tempos livres. É interpretada
como um pedido inconsciente de ajuda (Winnicott, 1987, cit. Baptista, 2000). É
fundamental, um diagnóstico diferencial oportuno e intervenção no meio natural de vida
do adolescente, tendo como objectivo reduzir as oportunidades situacionais de
desvio/delinquência, bem como a reorganização do meio familiar e o apoio psicológico ao
jovem.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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A delinquência “distinta” diferencia-se em três sub-tipos:
Delinquência de “ocasião” ou “esporádica”: associada a um número restrito de
delitos, de média gravidade, que resultam de um ligeiro atraso no desenvolvimento psico-
social de menor, verificando-se através das dificuldades de integração e de
desvalorização das aprendizagens, com episódios de indisciplina. Caracteriza-se pela
existência de um certo grau de convencionalidade, apoiado numa ligação positiva à
família, principalmente à figura materna. A avaliação da personalidade revela uma auto-
imagem desfavorável, insegura, desconfiada, insatisfeito e com sentimento de
infelicidade. Surge num momento muito específico da vida do menor e raramente
prevalece.
Delinquência de “conflito” ou “explosiva”: caracteriza-se pelo aparecimento
súbito de delitos, heterogéneos e abundantes, mas circunscritos a um determinado
período de tempo. É ligeiramente mais grave que a anterior observando maiores
dificuldades de integração no contexto escolar, sobretudo a oposição aos professores e
os fortes índices de absentismo. As ligações afectivo-relacionais familiares são fracas,
verificando uma deficiente actividade de supervisão parental e um ressentimento do
jovem contra a família. No campo da personalidade detectam-se problemas ao nível do
relacionamento interpessoal, devido à sua dificuldade em se relacionar com os adultos
com posição de autoridade. Possuem um auto-conceito negativo, desconfiança e
hostilidade e perturbações ao nível dos vínculos.
Delinquência de “condição”: pode ser de “persistência intermédia” ou de
“persistência grave”. A primeira é de gravidade intermédia, heterogénea de longa
duração, em que se verificam fugas à escola, enraizamento nas práticas delinquentes,
mas não existe uma evolução para as agressões e roubos à mão armada ou homicídios,
a carreira é oscilante e existem momentos mais tranquilos, mas não se verifica uma
desistência antes da idade adulta e é patente um mal-estar pessoal (fatalismo,
pessimismo, insatisfação permanente); a segunda caracteriza-se por um aumento do
número e da gravidade dos actos, persistindo numa carreira criminal adulta. Estas
condutas são de clara oposição aos valores de convivência social. São consequências de
perturbações sérias e precoces na dinâmica familiar que afectaram gravemente a
organização da personalidade do adolescente. Verificam-se alterações a nível da
vinculação, sobretudo fragilidade e deformação dos laços com figuras significativas, no
não envolvimento institucional (absentismo escolar intenso e/ou abandono prematuro,
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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ausência de institucionalização na ocupação dos tempos livres) e na falta de interesse
pelas actividades convencionais. Enfatiza-se o papel decisivo da figura paterna na
emergência destes comportamentos delituosos dos adolescentes. Um pai ausente,
distante, desinteressado pelas actividades do filho, modelo de identificação muito lacunar
e que não favorece a autonomia e a construção da identidade positiva do jovem,
vulnerabiliza-o às influências negativas e delinquenciais. Ao nível da personalidade
detecta-se egocentrismo e isolamento interpessoal com índices elevados, associados a
traços de desconfiança, insegurança, hostilidade e fatalismo, que sustentam uma
elaboração mental compensatória, que se traduz em sentimentos de poder e numa
insensibilização às exigências da realidade. Estas características reduzem a capacidade
de desenvolver laços afectivo-relacionais com os outros e com as instituições, facilitando
o desenvolvimento da criação de uma moralidade própria, tendo como princípio o “regime
do mais forte” e que é partilhada pelo “gang” a que frequentemente se associa, ou funda,
e onde está presente a insensibilidade ao outro e a minimização do sentimento reparador
(Frechette e Le Blanc, 1987, cit. Baptista, 2000). Os jovens com estas características
necessitam de intervenção judicial, de um diagnóstico diferencial precoce e regime de
internamento, para evitar um endurecimento da personalidade e que permita neutralizar a
acção violenta e diminuir a probabilidade de reincidência, de intervenção terapêutica na
mudança de personalidade, com vista a reforçar os constrangimentos internos e reeducar
a capacidade de vinculação do jovem, no sentido de travar a evolução da delinquência.
Uma outra tipologia de delinquência juvenil foi estabelecida (Weiner, 1995, cit.
Fonseca et al. 2003), classificando o fenómeno em quatro tipos: “delinquência
socializada”, “delinquência caracteriológica”, “delinquência neurótica” e
“delinquência psicótica e neuropsicológica”.
A “delinquência socializada” consiste em actos delinquentes, do tipo grupal,
enquanto elementos bem integrados de uma subcultura delinquente. Neste caso, trata-se
de condutas adaptativas e não tanto desadaptativas. Relaciona-se mais com actos
sociais do que com os individuais, exceptuando situações em que se quer impressionar o
grupo ou a pedido do próprio grupo, é que poderão surgir situações de crimes individuais.
A “delinquência caracteriológica” considera os comportamentos como
consequência de uma perturbação da personalidade, revelando uma imaturidade social,
do “tipo solitário”, reflectindo uma orientação associal da personalidade do jovem que não
pertence a nenhum grupo. Os delitos ocorrem em virtude da indiferença pelos direitos e
sentimentos dos outros e pela incapacidade de parar de lhes fazer mal. Caracterizam-se
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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por actos impulsivos, agressivos e insaciáveis de procura do prazer, violam a lei como
uma mera expressão de raiva, da procura da satisfação de um impulso ou para
adquirirem algo que desejam e não devido à influência do grupo ou pela procura de
aceitação dos companheiros. A orientação interpessoal e o padrão comportamental são
equiparados a uma forma principiante da condição adulta diagnosticada como distúrbio
psicopático ou distúrbio anti-social da personalidade.
Na “delinquência neurótica” os actos de transgressão da lei são ocasionais e
situacionalmente determinados. Os actos cometidos têm início depois de uma série de
rejeições e desilusões, sendo praticados numa tentativa individual e pessoalmente
significativa de transmitir necessidades psicológicas não satisfeitas, mas que tendem a
parar após a resolução do mesmo.
Na “delinquência psicótica e neuropsicológica”, a prática delinquencial é
causada como consequência de patologias psicóticas, nomeadamente a esquizofrenia
em que a lógica e a capacidade crítica estão alteradas, assim como a capacidade de
autocontrolo que é oscilante, e por distúrbios neuropsicológicos, principalmente
dificuldades de atenção, hiperactividade e epilepsia do lobo temporal, cujas erupções
explosivas de raiva se assemelham à conduta anti-social agressiva característica da
delinquência caracteriológica.
Existem mais estudos que apontam para dois tipos de delinquência que
caracterizam as principais explicações de fenómeno delinquente (Ferreira, 1997): o
“delinquente subsocializado” e o “delinquente socializado”.
O “delinquente subsocializado”, que deriva das teorias que realçam a
importância do controlo social. Neste ponto, a causa fundamental da delinquência reside
na ausência relativa de laços fortes entre o indivíduo e a ordem social. A família
convencional oferece uma fonte de ligações básicas à ordem da sociedade e de
envolvimento com as suas instituições e actividades. A família age como um travão
contra as influências desviantes, propiciando ao jovem uma fonte de motivações para se
conformar com as normas e regras sociais. O funcionamento adequado da família ajuda
a inibir os impulsos desviantes, limitando a probabilidade de os comportamentos
delinquentes ocorrerem, isto é, o controlo social é uma variável explicativa da
conformidade. Quando a estrutura familiar se desorganiza, perde a capacidade de
supervisionar e controlar os comportamentos dos filhos, aumentando a probabilidade da
delinquência.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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O “delinquente socializado”, explica a delinquência através da aprendizagem de
comportamentos socialmente desviantes através da exposição às acções dos outros. O
comportamento de imitação torna-se mais frequente quando gera consequências
positivas do que quando não tem consequências ou quando elas são negativas. Devido
ao reforço diferencial, as crianças aprendem a valorizar determinados comportamentos
em detrimento de outros. As definições sociais são apreendidas em virtude das
consequências proporcionadas pelo reforço dos comportamentos que são consistentes
com os valores, normas e atitudes das pessoas com quem se relacionam. Assim, as
crianças podem descrever favoravelmente condutas delinquentes devido à sua exposição
às acções de outros cujas definições dessas condutas são positivas. Este tipo de
delinquência salienta a influência dos aspectos económicos e sociais da família sobre a
natureza e o conteúdo dos controlos familiares, ou seja, a estratificação económica pode
influenciar a delinquência através das práticas educacionais familiares. Os factores sócio-
económicos têm grande importância nas práticas familiares.
Com estes dois tipos de delinquência verifica-se a existência de dois factores
fundamentais: por um lado, o papel dos controlos, interno e externo, e por outro lado, a
exposição à influência das acções dos outros, que podem constituir um meio gerador de
definições e de condutas alternativas à conformidade. Estes dois factores são
dependentes um do outro. Os controlos variam inversamente com as influências culturais.
A adolescência é definida como um tempo de mudança entre a responsabilidade e a
dependência, em que a diminuição dos constrangimentos é paralela a novas aberturas
em relação ao mundo. Mas, noutros casos, as influências culturais podem afectar
consideravelmente a natureza dos controlos sociais. As práticas educacionais e de
socialização dos diferentes grupos sociais afectam o modo como a conformidade é
reforçada. A natureza e o conteúdo dos controlos que as famílias incutem nos filhos
assumem um papel relevante na inibição e na prevenção das manifestações delinquentes
(Ferreira, 1997).
Uma outra tipologia de delinquentes foi apontada, para caracterizar a delinquência
nos dias de hoje: a “delinquência expressiva” e a “delinquência instrumental”
(Moura, 2000).
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A “delinquência expressiva” desperta atenção através da transgressão. O
delinquente procura acção, risco e às vezes a publicidade. O carácter expressivo do
comportamento resulta deste não ser instrumento de qualquer fim lucrativo ou ter
objectivo. As formas que caracterizam este tipo são: o vandalismo em bando; a violência
na escola; o fenómeno da violência no desporto; a violência xenófoba e racista;
criminalidade lúdica.
A “delinquência instrumental” é a mais semelhante à delinquência tradicional,
em que o crime é o meio para se obterem bens ou serviços. É possível estabelecer
etapas na carreira criminosa do jovem (Raldúa, 1990, cit. Moura, 2000). A primeira
poderá ir dos 11 aos 14 anos e está relacionada com a prática do furto, geralmente em
estabelecimentos ou em veículos. A partir daí fazem parte os crimes contra o património,
cometidos com alguma violência. Depois dos 17 anos, mantém-se este tipo de crime,
mas aparecem os crimes contra a liberdade sexual e o tráfico de estupefacientes.
1.2.2. Factores de Risco e de Protecção
As crianças delinquentes têm uma probabilidade maior de virem a tornar-se
delinquentes graves, violentos e crónicos do que os adolescentes cujo comportamento
delinquente apenas começa nessa altura.
A maior parte dos profissionais refere que um factor de risco não é por si só
suficiente para levar uma criança muito nova à delinquência. O que se constata é que “a
probabilidade da delinquência juvenil precoce aumenta à medida que aumenta o número
factores de risco e de áreas de factores de risco” (Wasserman, Keenan, Tremblay, Coie,
Herreenkohl, Loeber, Petechuk, 2004).
Alguns factores de risco são comuns a muitas crianças delinquentes, no entanto,
os padrões e a combinação desses factores, variam de criança para criança.
Alguns profissionais verificam que, numa fase precoce da vida da criança, os
factores de risco mais significativos são os de origem individual (complicações no parto,
hiperactividade, procura de sensações e dificuldades temperamentais) e os familiares
(comportamento parental anti-social ou criminal, abuso de substâncias e práticas de
educação de baixa qualidade). À medida que a criança se vai desenvolvendo e se integra
na sociedade, surgem novos factores de risco nomeadamente os que estão associados
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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ao grupo de pares, à escola e à comunidade começando a desempenhar um papel
preponderante (Figura 1).
O período pré-escolar é fundamental para estabelecer as bases de precaução do
desenvolvimento da conduta perturbada e da delinquência infantil. O comportamento
problemático perturbado, com agressões graves e violação crónica dos direitos e da
propriedade de outros é a causa mais comum de indicação aos serviços de saúde mental
para crianças em idade pré-escolar (Keenan e Wakschlag, 2000, cit. Loeber et al., 2004);
a relação entre problemas de conduta na pré-escola e a posterior perturbação de conduta
e a delinquência infantil (Silva, 1990, cit. Loeber et al., 2004); as competências
desenvolvimentais importantes (como a linguagem) iniciam-se neste período e as
dificuldades no desenvolvimento destas competências podem quebrar as bases de
aprendizagem e contribuir para posterior conduta perturbada e delinquência infantil
(Keenan, 2001, cit. Loeber et al., 2004); o entendimento do aparecimento precoce de
condutas problemáticas pode ajudar na criação de intervenções precoces e eficazes para
a prevenção da delinquência infantil (Kadzin e Kendall, 1998, cit. Loeber et al., 2004).
Estas são algumas das razões principais que permitem explicar como o período pré-
escolar pode ter consequências fundamentais para a compreensão e prevenção da
prática de factos criminais.
As condutas que colocam um menor em risco para uma carreira precoce de
comportamento perturbado e delinquência infantil podem estar presentes numa idade tão
tenra como os 2 anos de idade (Keenan, 2001, cit. Loeber et al., 2004).
Uma outra dificuldade, nas idades pré-escolares, é lidar com os rótulos
inconvenientes tais como “perturbado” para condutas que podem estar de acordo com o
desenvolvimento da criança. Exemplos como, a agressão, a desobediência e a mentira
são condutas características no segundo ano de vida e fazem parte do desenvolvimento
da identidade própria, do auto-controlo e da compreensão da natureza das relações
sociais (Landy e Peters, 1992; Kuczynski e Kochanska, 1990; Achenbach e Edelbrock,
1981, cit. Loeber et al., 2004).
É importante verificar se existem também factores de protecção, pois são estes
que reduzem o risco de delinquência. Alguns factores de protecção, que podem contribuir
para a diminuição da delinquência e o comportamento perturbado, são serem do sexo
feminino, comportamento pró-social durante os anos pré-escolares e bom desempenho
cognitivo (desenvolvimento adequado da linguagem e bom desempenho escolar). Os
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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factores de protecção podem compensar a acção da exposição da criança a múltiplos
factores de risco (Wasserman et al., 2004).
O Grupo de Estudo, constituído por 39 investigadores peritos em delinquência
infantil e psicopatologia infantil, convocado pelo Office of Juvenile Justice and
Delinquency Prevention (OJJDP), classifica os “factores de risco na infância para a
delinquência infantil e para a posterior delinquência juvenil violenta” (Loeber e Farrington,
2001, cit. Wasserman et al., 2004) em quatro grupos: Individuais, Familiares, Relativos
a pares e Relativos à comunidade.
Nos factores de risco individuais destacam-se:
Comportamento anti-social precoce: Caracteriza-se por várias formas de
violação e agressão contra a norma (furtos, agressões físicas e vandalismo). A agressão
precoce é a característica de comportamento social mais relevante para predizer o
comportamento delinquente antes dos 13 anos de idade. No entanto, o comportamento
pró-social (dar ajuda, partilhar e ser cooperante) surge como um factor de protecção,
nomeadamente para aqueles que têm factores de risco para a comissão de crimes
violentos e crimes contra a propriedade antes dos 13 anos de idade.
Factores emocionais: Aos três anos de vida, as crianças podem expressar um
conjunto de emoções humanas, tais como a fúria, orgulho, vergonha e culpa. Os pais, os
professores e o grupo de pares têm responsabilidade na influência na socialização de
expressão emocional da criança e ajudam-na a aprender a lidar com as emoções
negativas de uma forma construtiva. A forma como a criança exprime as suas emoções,
nomeadamente, a ira pode colaborar para o risco para a delinquência ou reduzir esse
mesmo risco. O Grupo de Estudo verificou que níveis elevados de activação
comportamental e níveis baixos de inibição comportamental são preditores para
comportamento anti-social. Rapazes impulsivos e não ansiosos têm uma maior
probabilidade de cometerem actos delinquentes entre os 12 e 13 anos de idade.
Desenvolvimento cognitivo: Quer o desenvolvimento emocional, quer o
cognitivo, parecem estar relacionados com a capacidade da criança controlar o
comportamento social nos dois primeiros anos de vida. Estes dois factores parecem
desempenhar um papel importante no desenvolvimento da delinquência precoce e
afectar a aprendizagem das normas sociais. O baixo desenvolvimento cognitivo e os
problemas comportamentais durante os primeiros anos de vida podem explicar a
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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associação entre o desempenho escolar e a delinquência. Muitos estudos apontam para
um quociente de inteligência não verbal mais alto do que um quociente de inteligência
verbal do delinquente (Moffitt, 1993, cit. Wasserman et al., 2004), podendo também
apresentar um quociente de inteligência global médio inferior e índices de desempenho
escolar inferiores comparativamente com os não delinquentes (Fergusson e Horwood,
1995; Maguin e Loeber, 1996, todos cit. Wasserman et al., 2004). Défices
neuropsicológicos moderados presentes no nascimento podem ir complicando até
atingirem um nível de problemas comportamentais graves afectando o temperamento da
criança. Estes défices podem afectar o controlo dos comportamentos pela criança, tais
como, a linguagem, a agressão, o comportamento de oposição, a atenção e a
hiperactividade. As alterações cognitivas básicas podem estar relacionadas com
processos cognitivos sociais deficientes, tal como o fracasso em dar atenção a sinais
apropriados (instruções dos adultos e iniciações sociais dos pares).
Hiperactividade: Alguns estudos evidenciam que crianças agitadas, antipáticas
e nervosas têm uma maior probabilidade de virem a envolver-se em comportamento
delinquente (Farrington, Loeber e Van Kammen, 1990, Lynam, 1997, todos cit.
Wasserman et al. 2004).
Nos factores de risco familiares destacam-se:
Parentalidade: São três as práticas parentais específicas que estão
relacionadas com problemas de comportamento: um nível elevado de conflito entre os
pais e os filhos, uma monitorização deficiente e um baixo nível de envolvimento positivo
(Wasserman et al., 1996).
Maus tratos: Quer os maus tratos, quer a negligência de crianças, acontecem
em simultâneo com outros factores de risco familiares relacionados ao inicio precoce da
delinquência. Uma investigação que comparou crianças sem história de maus tratos ou
negligência com crianças que foram maltratadas ou negligenciadas verificou que este
grupo apresentava um maior número de detenções juvenis e na idade adulta de 25 anos
de idade (Widom, 1989, cit. Wasserman et al., 2004).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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Violência familiar: Milhões de crianças, anualmente, assistem aos maus tratos
físicos e verbais entre os pais (Jaffe, Wolfe e Wilson, 1990, cit. Wasserman et al., 2004).
O facto de testemunharem a violência doméstica tem sido associado com o aumento de
problemas de conduta nas crianças, nomeadamente do sexo masculino. O facto de
sofrerem maus tratos e de testemunharem violência doméstica, sobretudo nas mulheres,
afecta a adaptação dos menores. Outras condicionantes que conduzem a um risco
adicional nas famílias violentas incluem uma elevada ocorrência de outros problemas
comportamentais, tais como o abuso de álcool e encarceração, em maltratantes do sexo
masculino. “O sofrimento psicológico materno também pode expor as crianças a riscos
indirectos adicionais, tal como a mãe não ter disponibilidade emocional para os filhos”
(Zuckerman, 1995, cit. Wasserman et al., 2004).
Divórcio: Filhos de pais que se divorciaram apresentam uma maior
probabilidade de desenvolveram problemas com comportamentos anti-sociais, com uso
de ameaças e não conformes às regras (Hetherington, 1989, cit. Wasserman et al.,
2004). É difícil determinar os efeitos exactos do divórcio nos menores porque existem
outros factores de risco em simultâneo, tais como a perda de um dos pais, problemas de
conduta dos menores anteriores ao divórcio, conflitos familiares, diminuição do
rendimento familiar e uma possível nova união de um progenitor.
Psicopatologia parental: Perturbações de personalidade de progenitores anti-
sociais, abuso de substâncias e depressão por parte dos progenitores têm sido
associados a progenitores de rapazes que apresentam problemas de conduta.
Progenitores deprimidos evidenciam muitas dificuldades no exercício da parentalidade
relacionadas com o aumento de comportamentos anti-sociais nos filhos, tais como
oposição, irritabilidade e falta de supervisão (Cummings e Davies, 1994, cit. Wasserman
et al., 2004). A psicopatologia parental tem sido associada com o aumento das taxas de
perturbações psiquiátricas entre as crianças em idade escolar (Costello et al., 1997, cit.
Wasserman et al., 2004).
Comportamentos familiares anti-sociais: Os progenitores anti-sociais
demonstram níveis elevados de conflito familiar, exercendo uma supervisão mais fraca,
experienciando mais fracassos familiares e transmitindo hostilidade para os filhos. O facto
de se ter um irmão ou uma irmã com conduta anti-social também aumenta a
probabilidade de uma criança vir a desenvolver uma conduta anti-social (Farrington,
1995, cit. Wasserman et al., 2004).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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Parentalidade na adolescência: O facto de ser filho de uma mãe adolescente é
um forte indicador de delinquência na adolescência, embora, esta questão possa ser
consequência na própria história anti-social da mãe e no seu envolvimento com parceiros
anti-sociais (Rutter, Giller e Hagell, 1998, cit. Wasserman et al., 2004).
Estrutura familiar: Os menores que estão inseridos em famílias monoparentais,
constituídas apenas pela mãe, apresentam uma situação de risco aumentado para
deficientes resultados a nível comportamental (Pearson, 1994; Vaden-Kiernan, 1995;
McLanahan e Booth, 1989; Sampson, 1987, todos cit. Wasserman et al., 2004). As mães
isoladas têm mais problemas de saúde mental, apresentando níveis elevados de
mobilidade residencial e menores recursos para supervisionar os filhos.
Dimensão da família: Quanto maior for o número de filhos numa família, mais
difícil se torna a supervisão, daí o risco de poderem delinquir ser maior. “O Cambridge
Study verificou que, comparativamente com rapazes que têm menos irmãos e irmãs, os
rapazes que, aos 10 anos de idade, têm quatro ou mais irmãos e irmãs têm uma
probabilidade duas vezes superior de delinquir, independentemente do estatuto sócio-
económico dos pais” (West e Farrington, 1973, cit. Wasserman et al., 2004).
Aos factores de risco relativos aos pares associam-se:
Associação com pares desviantes: Os pares desviantes influenciam os
menores, que já têm um histórico de delinquência, a aumentar a gravidade ou a
frequência da sua delinquência. Um estudo com menores do Iowa corrobora esta
hipótese, pois verificaram que “o envolvimento com o sistema de justiça de menores
atingia o ponto mais elevado relativamente àqueles que revelavam comportamentos
perturbados e associação com pares desviantes numa idade baixa” (Simons, 1994, cit.
Wasserman et al., 2004). Os pares desviantes colaboram para a delinquência grave por
crianças durante a fase de transição para a adolescência.
Rejeição dos pares: A rejeição de crianças pequenas agressivas pelos pares
pode contribuir para um aumento do risco, dessas crianças apresentarem,
posteriormente, condutas anti-sociais crónicas. Um estudo recente, demonstrou que a
rejeição de crianças no terceiro ano escolar previa condutas anti-sociais crescentemente
mais graves a partir do 6º ano, mesmo tendo em conta a agressividade precoce dos
rapazes (Coie et al., 1995, cit. Wasserman et al., 2004). Em virtude da rejeição dos pares,
as crianças que são rejeitadas e agressivas têm maior probabilidade de se tornarem
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membros de grupos de pares desviantes (Bagwell et al., 2000, cit. Wasserman et al.,
2004). O facto da sua pertença ao grupo ser muito frágil, pode fazer com que se
empenhem em mais actividades anti-sociais no sentido de serem reconhecidos no seio
do grupo. O Grupo de Estudo enfatiza que a influência dos pares tem um impacto na
delinquência em duas vertentes, quer na delinquência daqueles que se iniciaram mais
tarde, quer na escalada da delinquência grave entre os que se iniciaram precocemente.
Nos factores de risco escolares e comunitários evidenciam-se:
Factores escolares: Crianças com baixo nível de empenho à escola, baixas
aspirações educacionais e desmotivadas, têm forte probabilidade de delinquirem
(Hawkins, 1998; LeBlanc, Coté e Loeber, 1991, todos cit. Wasserman et al., 2004). É
natural que crianças que têm fraco desempenho nas tarefas escolares desenvolvam
falhas no desenvolvimento de laços fortes com a escola e tenham menores expectativas
de sucesso. Em contrapartida, os bons resultados escolares e os laços à escola são
interdependentes. Uma investigação averiguou, que os menores do sexo masculino que
acabam por delinquir, não estão empenhados na escola e apresentam uma maior
probabilidade de não terem grandes perspectivas em termos escolares (LeBlanc et al.,
1991, cit. Wasserman et al., 2004).
Factores comunitários: Crianças que são educadas numa família com poucos
recursos quer económicos, quer sociais, têm maior probabilidade de delinquirem do que
aquelas que são educadas numa família abastada (Farrington, 1989, 1991, 1998, cit.
Wasserman et al., 2004). Situações de carência existentes em bairros, a sua própria
desorganização e os poucos sistemas de controlo que possuam, contribuem para o
desenvolvimento de condutas anti-sociais, muitas vezes sem vigilância e despercebidas
(Catalano e Hawkins, 1996; Elliott, 1996; Sampson e Lauritsen, 1994, todos cit.
Wasserman et al., 2004). Um estudo desenvolvido por Sampson, Raudenbush e Earls
(1997), citado por Wasserman et al. (2004), verificou que a desorganização social e a
concentração da pobreza da comunidade originam a diminuição da boa vontade dos
residentes para intervirem quando as crianças praticam actos anti-sociais, aumentando a
probabilidade de violência nos bairros.
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Fig. 1 Ordenação aproximada do desenvolvimento dos factores de risco associados com comportamento perturbado e
delinquente
Factores de risco que surgem durante a gravidez e a partir do nascimento
Crianças Complicações da gravidez e do parto
Lesões neurológicas
Exposição a neurotoxinas após o nascimento
Temperamento difícil
Hiperactividade/impulsividade/problemas de atenção
Baixa inteligência
Sexo masculine
Família Mãe fumadora/consumidora de álcool e de drogas durante a gravidez
Mãe adolescente
Mudança frequente de prestadores de cuidados
Pais com baixo nível de educação
Depressão maternal
Abuso de Substâncias/conduta anti-social dos progenitores e filho
Pobreza/baixo estatuto sócio-económico
Discórdia conjugal séria
Família numerosa
Factores de risco que surgem a partir dos primeiros anos de vida
Criança Comportamento agressivo/perturbado
Mentira persistente, falta de sentimento de culpa e de empatia
Correr riscos e procura de sensações
Família Hábitos disciplinares severos e/ou irregulars
Maus tratos ou negligência
Comunidade Violência televisiva
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Fonte: Adaptado de Loeber e Farrington, 1998
Factores de risco que surgem a partir do meio da infância
Criança Furto e delinquência em geral
Início precoce de outros comportamentos perturbados
Início precoce de uso de substâncias e de actividade sexual
Humor depressive
Comportamento asocial
Atitude de aprovação face a comportamento problemático
Vitimização e exposição à violência
Família Supervisão parental pobre
Escola Desempenho escolar pobre
Repetição de ano(s)
Absentismo escolar
Atitude negativa face à escola
Escolas mal organizadas e a funcionar mal
Pares Rejeição dos pares
Associação com pares desviantes e/ou com irmãos/irmãs desviantes
Comunidade Residência num bairro desfavorecido/desorganizado
Disponibilidade de armas
Factores de risco que surgem a partir do meio da adolescência
Criança Porte de arma
Tráfico de droga
Desemprego
Escola Abandono da escola
Pares Pertença a um bando
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1.3. Contextualização Histórica
A delinquência é o resultado de uma falha no controlo, de uma atitude negligente
do mundo adulto perante as suas responsabilidades em relação ao mundo mais jovem. A
falta de acompanhamento e de supervisão ao longo do desenvolvimento infantil e juvenil
pode levar ao aparecimento de condutas que em nada se assemelham àquelas que
consideramos como sendo o conceito ideal de infância e de juventude. O aparente
fracasso das estruturas de socialização convencionais e o aparecimento de condutas
desviantes justificam a intervenção de outras instituições de controlo social no processo
educativo dos adolescentes e jovens (Ferreira, 1997).
Durante muitos séculos não se demonstrou grande interesse pelas necessidades
e bem-estar das crianças, chegando a ser tratadas com indiferença e até com crueldade.
As crianças eram olhadas mais como versões pequenas e inadequadas dos adultos do
que como seres com necessidades de protecção especial. Com o despertar da Europa,
após longa hibernação intelectual e de estagnação social da Idade Média, surgiu uma
filosofia que iniciou o debate dos costumes tradicionais de educar e de tratar as crianças.
Nos séculos seguintes, a situação foi-se remodelando havendo uma preocupação maior
pelos menores. “Os cuidados familiares substituíram o sistema de aprendizagem e a
infância passou a ser vista como um período transitório no qual a protecção, mais do que
a indulgência, em relação às actividades adultas, se tornou a regra. Foi neste tempo de
mudança que emergiu o conceito moderno de infância, um conceito que enfatiza a ideia
de que as crianças são um valor em si mesma e que devido à sua fragilidade e
simplicidade deviam ser alvo de protecção enquanto não fossem devidamente
preparadas para enfrentarem o mundo adulto” (Ferreira, 1997).
Recuando até aos séculos XIX-XX, constata-se que o destino das crianças não se
diferenciou muito da vida social quotidiana dos adultos, a nível do trabalho, da família, da
mendicidade, da vagabundagem, das situações de promiscuidade, da „rua‟ e das cadeias.
A criança sofria da desorganização familiar ou de um lar considerado normal o que
levava a privações e a carências e desta maneira aprendia as normas sociais, ajudava no
lar e nas necessidades económicas familiares. Nem o adulto, nem a família se
interessavam em compreender a criança como um ser em desenvolvimento com etapas
mais ou menos definidas que exigiam uma atenção educativa, moral e afectiva especial.
A criança encontrava-se num mundo fechado dentro do próprio meio familiar, social,
cultural e educativo em que crescia. Não se considerava a família como um valor moral,
sentimental e educativo (Martins, 2006).
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A implementação dos serviços de protecção, surge no tempo da criação das
misericórdias (séculos XV-XVI), que coincide com o início de estruturas organizadas de
carácter religioso vocacionadas para a prática da caridade, da assistência e beneficência,
não só para as crianças, como para os pobres e idosos, e apoio aos presos nas cadeias.
Posteriormente, foram surgindo outros estabelecimentos assistenciais e de educação
para as crianças abandonadas, órfãs e pobres (hospícios, orfanatos, seminários,
recolhimentos, colégios, asilos, creches). No final do século XVIII, o Estado preocupado
com estas problemáticas sociais e assistenciais, cria para os menores vadios,
delinquentes e marginalizados, a Real Casa Pia de Lisboa (1780), a Casa de Detenção e
Correcção de Lisboa (1871) e a Colónia Correccional Vila Fernando (1880), em moldes
correccionais de reclusão e no século XX, cria os reformatórios e colónias (Martins,
2002).
Até finais do século XIX, as crianças e os adolescentes que não viviam dentro do
marco social normal, não constituam uma preocupação jurídico-social e socioeducativa
de „ordem‟, pois o número de delitos e os problemas sociais que provocavam eram
escassos. Apesar de existirem menores em situações de desvio social, as instituições
penais e institucionais não os separavam dos adultos, misturando-os nas instituições
onde “os menores cumpriam as suas penas nas prisões em péssimas condições
higiénicas, e em promiscuidade com os criminosos adultos, com medidas educativas
repressivas e intimidativas, falta de instrução e de trabalho” (Martins, 2006). Além disso,
eram julgados em tribunais que não apresentavam qualquer tipo de diferença dos
tribunais dos adultos, sendo sujeitos às mesmas regras processuais, assim como às
mesmas penas dos adultos, com atenuação devido a serem menores (Lima, 2003).
A família portuguesa evidenciava uma diversidade cultural e geográfica que ia
desde o norte ao sul e do litoral ao interior do país, relacionando-se o seu modo de vida
com as questões sociais, económicas e educativas que o País atravessou ao longo dos
tempos. Os comportamentos da infância caracterizavam-se por um tipo de socialização
na família, passando historicamente nos últimos séculos por três períodos de respostas
sociais que implicaram modelos de intervenção socioeducativa, práticas (re) educadoras
e de reinserção social para os que caíam em desvio social, delinquência e/ou de
abandono, que são a „moralização‟, „normalização‟ e de „tutela‟ (controlo). Muitas das
situações de „anormalidade‟ nas famílias, provocavam nos filhos formas de destruição,
abandono, vagabundagem e inadaptação, e consequentemente, para estas crianças a
sua vivência era na „escola da rua‟, sujeitas à delinquência e às situações de perigo moral
(Martins, 1995, cit. Martins, 2002).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
38
Algumas alterações de vida e do ambiente familiar tinham repercussões na
educação e na vida das crianças, nomeadamente as carências familiares, devido às
condições sócio-económicas, habitacionais, higiénicas e culturais em que viviam e que
provocavam nas crianças privações, carências afectivas, doenças psíquicas,
deteriorização moral, vadiagem e comportamentos agressivos, contribuindo para uma
correlação entre a delinquência e marginalidade com a pobreza, miséria, defeitos
educativos, promiscuidade moral e outros tipos de carências; a desestruturação familiar,
desde situações de pais separados, amancebados, ausência dos pais naturais ou de um
deles, influências hereditárias e doenças sociais ou psíquicas em muitos casais,
situações de consanguinidade provocava o aparecimento dos filhos ilegítimos,
abandonados e órfãos; a incapacidade educativa, cultural e moral da família nas classes
sociais mais pobres, em situação precária, de mendicidade, a ausência ou a falta dos
pais determinavam situações de orfandade e de abandono, sendo entregues a familiares
que muitas vezes os maltratavam (Martins, 2002).
A 27 de Maio de 1911, elaborou-se a primeira legislação para crianças no país, a
Lei de Protecção à Infância, em que o Estado assumia a função educativa, assistencial e
protectora em relação às crianças e jovens em perigo e delinquentes. O Decreto
determina que as Tutorias advenham sempre no interesse da criança e do jovem e não o
carácter intimidante e repressivo, mas a função tutelar das instituições que protegem.
Assim, aos jovens com idade inferior a 16 anos detidos e julgados nas tutorias,
aplicavam-se várias decisões e medidas judiciais, uma das quais era o internamento em
estabelecimento especial que adoptava o sistema de internato e semi-internato. A Tutoria
decidia em função da situação específica da criança ou do jovem e da sua família e as
penas variavam segundo as causas do crime e a idade do seu autor. Estes serviços
públicos serviam a finalidade de defesa social, contudo, apresentavam vários
inconvenientes na aplicação prática da legislação e na implementação das medidas ou
tratamento médico-pedagógico (Martins, 2006).
Em 1924, proclamaram-se os “Direitos da Criança”, de acordo com os termos da
Declaração de Genebra, em que se reconheceu um novo princípio de redenção social e a
dedicação à vida das novas gerações. Posteriormente, em 1959 na Assembleia-Geral
das Nações Unidas, proclamou-se a Declaração dos Direitos da Criança que constitui a
“Carta Magna” para que sirva de orientação no respeito à criança por todos,
independentemente da sua cultura, afinidade populacional e etnia, devendo protegê-la
contra as problemáticas de exploração, de desvio social, numa nobre missão de
Humanidade e como dever social e Humano (Martins, 2006).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
39
Em 1925, procede-se à simplificação da legislação anterior (Lei de 27 de Maio de
1911), através de um novo Decreto-Lei de 15 de Maio de 1925, em que se evidencia a
importância da dimensão social e médico-pedagógica da delinquência, alegando-se que
o objectivo seria o estudo do agente do crime e não o crime em si mesmo. Implementam
três níveis de intervenção das instituições e entidades que compunham os designados
Serviços Jurisdicionais e Tutelares de Menores, dependentes do Ministério de Justiça e
dos Cultos com uma coordenação e fiscalização superior, que passou a ser assegurada
pela Administração e Inspecção Geral; um nível jurisdicional, instituído por um Tribunal
Superior de Recurso, pelas Tutorias Centrais de Infância e pelas Tutorias de Infância
Comarcãs, que passariam a funcionar em todas as comarcas; um conjunto de serviços
que garantiam a detenção provisória (Refúgios das Tutorias Centrais), detenção
disciplinar (Reformatórios) e correccional (Colónias Correccionais) das crianças e jovens
delinquentes (Caldeira, 1993, cit. Lima, 2003). Por outro lado, as crianças e jovens não
delinquentes, passavam a não poder ingressar nos Reformatórios ou Colónias
Correccionais nem a permanecer nos Refúgios (Lima, 2003).
Em 1944, pelo Decreto nº 33547, as tutorias de infância passaram a denominar-se
por tribunais de menores, sendo constituídas por um juiz-presidente (no âmbito jurídico-
penal ou jurídico-social), um médico (contribuindo com as ciências médicas no
diagnóstico dos sintomas da criminalidade e delinquência infantil e juvenil) e um professor
(no âmbito pedagógico das decisões e tratamento reeducativo), formando-se tribunais
singulares de equidade, de protecção e tutela, representando a figura de um bom pai que
julga em consciência, amor e justiça os menores, de acordo com as suas problemáticas
(Martins, 2006).
A partir da década de 50, surgiram os “lares de semi-liberdade” nas cidades, como
extensões dos reformatórios e colónias. Os semi-internatos eram dirigidos às crianças e
jovens que trabalhavam ou estudavam na cidade sob a vigilância socioeducativa de
técnicos ou funcionários, jovens que se encontravam internados para serem (re)
educados, regenerados moralmente e prestar assistência a muitas crianças
problemáticas e em situações de desvio social (Martins, 2006).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
40
Nestes estabelecimentos, era proporcionado aos internados uma formação
baseada no trabalho, em que o silêncio era a regra, sob pena de falta disciplinar a quem
a infligisse. Os sistemas organizativos mais utilizados eram o regime disciplinar
intimidativo ou punitivo e o ambiente do internato burocrático e austero, misturando os
menores incorrigíveis e outros de mais fácil correcção, dificultando a regeneração moral
(Lima, 2003; Martins, 2006).
Nos anos 80, deu-se ênfase a dois modelos, o de “justiça” (em que se privilegia a
defesa da sociedade e o respeito pelos direitos, liberdades e garantias dos menores) e o
modelo de “protecção” (em que se privilegia a intervenção no Estado na defesa do
interesse do menor sem que formalmente lhe seja reconhecido o direito contraditório).
O Direito de Menores quer seja o “tutelar educativo de crianças que praticam
crimes” quer o de “ protecção de crianças em risco”, procura permitir que o menor venha
a ser um actor social, assim que sejam superadas as situações que o levaram à prática
de um crime ou a uma situação de risco.
A intervenção protectora do Estado justifica-se quando o gozo ou o exercício de
direitos cívicos, sociais, económicos ou culturais do menor são ameaçados por factores
que lhe são exteriores (por exemplo, abandono, maus tratos). Este tipo de intervenção é
da responsabilidade da Segurança Social (Peres et al., 2006).
A intervenção tutelar tem outro fim e deve limitar-se aos casos em que o Estado
se encontra legitimado para educar o menor, mesmo contra a vontade de quem está
investido no poder paternal, o que apenas pode admitir-se quando se tenha manifestado
uma situação desviante que torne clara a ruptura com elementos nucleares de ordem
jurídica. Este tipo de intervenção tutelar das situações criminais de menores entre os 12 e
16 anos é da competência da Direcção-Geral de Reinserção Social do Ministério da
Justiça (Peres et al., 2006).
Perante esta situação e com a reforma do Direito de Menores, surgem duas
legislações separadas: a Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (Lei n.º
147/99 de 1 de Setembro) e a Lei Tutelar Educativa (Lei n.º 166/99 de 14 de Setembro).
Com a reforma legislativa do direito tutelar, que engloba um conjunto de
iniciativas e medidas, permitiram a separação jurídica entre menores que cometem
crimes e menores que são vítimas de maus tratos.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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“O Estado age porque uma criança desprovida do apoio suficiente dos seus
progenitores, ou de quem lidera a sua protecção, traduz um sofrimento inaceitável, no
presente, para a própria criança e para todos os cidadãos e sugere um mau prognóstico
no que concerne aos futuros desempenhos dessa criança, sendo uma acção orientada
para recolocar, ou pelo menos tentar, reorientar esse caminho, esses caminhos de e para
a autonomia” (Peres et al., 2006).
Procura ser um sistema que promove os direitos dos menores, de prevenção de
situações de perigo e que intervém quando essas mesmas situações gradualmente se
devem subordinar aos princípios constitucionais que atribuem a condução do processo
de socialização das crianças e dos jovens aos seus próprios pais, abrindo-se um espaço
de cooperação ao Estado. O sistema de protecção de menores em perigo surge perante
situações em que às crianças e aos jovens se atravessam obstáculos susceptíveis de
colocar em crise o seu processo de socialização.
As regras e normas sobre a educação e o controlo das crianças foram elaboradas
gradualmente devido ao processo de descoberta da infância e do aparecimento da
delinquência. Num primeiro momento, apareceu um conjunto de regras informais com o
objectivo de criar uma imagem ideal de infância capaz de proporcionar orientações aos
pais na educação dos filhos, convertendo-se posteriormente em leis. Perante esta
imagem ideal, as crianças deveriam ser obedientes, trabalhadores e empenhadas no
cumprimento dos seus objectivos, autocontroladas, modestas e mantidas afastadas dos
perigos do sexo, do álcool e de outros vícios adultos e evitar a desonestidade. “A
moderna imagem de infância sublinharia, possivelmente, outros atributos psicossociais,
tais como a responsabilidade, a iniciativa e o autocontrolo, mas conservaria, com poucas
adaptações, os restantes atributos morais” (Ferreira, 1997).
Determinados comportamentos delinquentes são graves quando desafiam valores
institucionais e sociais, outros são considerados menos graves, quando não constituem
uma ameaça para esses valores, mas podem ser considerados ofensivos à sensibilidade
dos outros, podendo ser necessária uma intervenção legal. Se os crimes forem
cometidos por menores são considerados sempre delinquência, excepto quando é
cometido por alguém tão novo para que possa ser considerado responsável por ele.
Outros actos apenas são ilegais quando cometidos por menores, tais como a liberdade
de trabalhar, de casar, de mobilidade especial ou de consumo de álcool, são
considerados ilegais abaixo de uma determinada idade (Ferreira, 1997).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
42
1.3.1. Enquadramento Legal - A Lei Tutelar Educativa
A criminalidade é um problema social, nomeadamente entre jovens, e como tal
tem sido alvo de um processo de mediatização e politização constante. Mediante a
dificuldade que tem sido a reinserção social dos jovens, foram accionadas medidas
legislativas, como a nova Lei Tutelar Educativa, cujo objectivo é implementar um modelo
mais eficaz de reinserção social (Marteleira, 2005).
A Lei Tutelar Educativa (Lei n.º 166/99, de 14 de Setembro), que entrou em vigor
em Janeiro de 2001, legitima o Estado a intervir nas situações em que há prática de um
facto qualificado pela lei como crime e como isso representa necessidades de educar
para o direito e de inserir o menor, de forma digna e responsável, na vida em comunidade
(Figueiredo, 2001), aplicando-se aos menores que apresentam uma conduta desviante,
tendo como objectivo a sua educação para o Direito e para os valores fundamentais da
vida em sociedade intervindo em casos de menores agentes de actos qualificados pela
lei como crimes, os delinquentes e reconhece a necessidade de aplicação de nove
diferentes medidas tutelares, da admoestação ao internamento, diferenciando níveis de
violação da lei e níveis de gravidade na ofensa aos valores essenciais da comunidade,
isto é, reconhece e diferencia tipos de conduta delinquente e delinquentes (Baptista,
2000).
O art. 4º da Lei nº 166/99, de 14 de Setembro, diz respeito às diferentes medidas
tutelares aplicadas com graus de gravidade díspares, sendo a menos severa a
admoestação, prevendo também a aplicação de privação de alguns direitos, tais como a
condução de ciclomotores, a reparação ao ofendido, realização de prestações
económicas ou de tarefas a favor da comunidade, a imposição de regras de conduta,
imposição de obrigações, frequência de programas formativos, acompanhamento
educativo, até à mais severa que é o internamento em Centro Educativo em regime
aberto, semi-aberto ou fechado.
Segundo o art. 5º a execução destas medidas tutelares podem prolongar-se até o
jovem completar 21 anos, momento em que termina obrigatoriamente.
A medida mais severa desta legislação é o internamento em Centro Educativo, e
segundo o art. 17º: “ a medida de internamento visa proporcionar ao menor, por via do
afastamento temporário do seu meio habitual e da utilização de programas e métodos
pedagógicos, a interiorização de valores conformes ao direito e a aquisição de recursos
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
43
que lhe permitam, no futuro, conduzir a sua vida de modo social e juridicamente
responsável”. Quanto à duração da medida de internamento, o art. 18º refere: “ a medida
de internamento em regime aberto e semiaberto tem a duração mínima de três meses e a
máxima de dois anos; a medida de internamento em regime fechado tem a duração
mínima de seis meses e a máxima de dois anos, salvo o disposto no número seguinte; a
medida de internamento em regime fechado tem a duração máxima de três anos, quando
o menor tiver praticado facto qualificado como crime a que corresponda pena máxima,
abstractamente aplicável, de prisão superior a oito anos, ou dois ou mais factos
qualificados como crimes contra as pessoas a que corresponda a pena máxima,
abstractamente aplicável, de prisão superior a cinco anos” (Lei n.º 166/99, de 14 de
Setembro).
A execução de medidas tutelares educativas, tem como princípios, a permissão
do confronto do jovem consigo mesmo; promoção de uma reconciliação com a sua
história; promoção da compreensão do seu presente; ajudar a perspectivar o seu futuro,
tendo em conta as limitações decorrentes do seu nível de maturidade e considerando a
potencialidade do seu “património” afectivo e intelectual; deve também assentar numa
pedagogia de responsabilidade, tendo em conta a individualidade do jovem; proporcionar
a construção da coerência de “si” próprio; promover a apreensão de valores e confrontar
o jovem com os seus direitos e deveres; manter no “tempo” a noção de respeito pelo
“outro”; ter presente que os comportamentos exteriorizam problemas emocionais, que
advêm de vivências traumáticas, em fases precoces de desenvolvimento; nos casos mais
complexos, requerer uma intervenção terapêutica com recurso a programas específicos
que visem maior estabilidade emocional, capacidade de autocontrolo, adesão à mudança
e prevenção da reincidência; e subordinar-se a rigoroso controlo temporal (Figueiredo,
2001).
A lei contempla a possível intervenção da Direcção-Geral de Reinserção Social,
quando o tribunal determinar, na reparação ao ofendido, na realização de prestações
económicas e nas tarefas a favor da comunidade e prevê, também a intervenção dos
serviços na execução das medidas de acompanhamento educativo e nas que envolvem
internamento.
Com esta legislação procura-se solucionar as problemáticas mencionadas
anteriormente e que Gersão (1998) assinalava de “… um sistema totalmente desprovido
de meios para impedir que esses jovens (considerados “a um passo de consolidarem
uma carreira criminal”) fujam repetidamente das instituições tutelares e se envolvam de
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
44
forma crescente na criminalidade…” e assim, evitar a convivência, nessas instituições, de
menores em perigo com menores delinquentes, principalmente com aqueles cuja conduta
realça uma personalidade egocêntrica, que vai contra a convivência social, em que o
outro é percebido como objecto ao seu serviço e que reiteradamente recusam qualquer
mudança pessoal (cit. Baptista, 2000).
Os princípios desta Lei são o da mínima intervenção, idade mínima de doze anos
para a intervenção tutelar, existência de uma ofensa a bens jurídicos fundamentais,
traduzida na prática do facto considerado na lei como crime, sendo a finalidade da
intervenção tutelar a educação do menor para o direito e a correcção da sua
personalidade (Marteleira, 2005).
Esta Lei diferencia o delinquente em função do grau e frequência da violação da
Lei, permitindo ao Tribunal a decisão da melhor medida a aplicar e o regime da sua
execução (Baptista, 2000).
No entanto, a problemática da delinquência juvenil necessita de uma intervenção
multidisciplinar, isto é, apoiado noutros conhecimentos pode-se diagnosticar, identificar,
compreender e distinguir os adolescentes judiciarizados, tendo em conta a sua conduta
delinquente no passado e no presente, de personalidade e das circunstâncias da vida
(Baptista, 2000).
Como se referiu anteriormente, o objectivo das medidas e com elas do próprio
processo tutelar educativo, é educar o menor para o direito e a sua inserção de forma
digna e responsável na vida em comunidade. O menor, dada a sua idade, apresenta uma
personalidade em formação, que ainda não está consolidada e se ao longo da sua
evolução for adoptado um comportamento que rompa com os valores fundamentais à
convivência social, que a sociedade estabeleceu como tal, então a ilicitude típica
funcionará como um sinal de que o processo de construção da personalidade não se está
a desenvolver correctamente.
Esta fase é de intensa aprendizagem, em que o menor é um actor social, em que
vai interagir para aprender. Essa aprendizagem implica a observação de certas normas
de conduta, pelo que deve ser ajudado, para que em primeiro lugar as conheça e em
segundo para que as observe.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
45
Se educar é propiciar um desenvolvimento coerente de uma personalidade, então,
numa meta final que é a existência de condições de felicidade, importa favorecer
equilíbrio, quer entre as várias componentes da personalidade de cada menor, quer entre
o menor e o meio em que se vai inserir. “Educar é educar para viver em sociedade, e não
está preparado para viver em sociedade quem não observa as condições mínimas de
subsistência e funcionamento da sociedade” (Moura, 2000).
A tutela educativa não procura formar jovens bons ou santos, mas sim formar
homens e mulheres que interiorizem uma ideia de interdito. Há comportamentos que
podem assumir e outros coincidentes com o ilícito penal, que a sociedade onde se vão
inserir não tolera.
O essencial é que os agentes de toda essa pedagogia percebam que com o
respeito pelo direito se vão criar condições de integração e paz social que beneficiam o
jovem acima de tudo.
Educar para o direito é, em primeiro lugar, ajudar alguém a tornar-se um cidadão
adaptado, e não apenas defender a sociedade (Moura, 2000).
1.4. Características da Delinquência
O conhecimento da delinquência juvenil envolve a interacção de factores de
diferente natureza: biológica, psicológica e social.
Os actos delinquentes são actos anti-sociais ilegais que levam ao contacto com as
instituições. Os jovens que uma ou duas vezes, na sua adolescência, roubaram um
brinquedo numa loja, não pagaram nos transportes públicos ou no cinema, faltaram às
aulas e que rapidamente abandonaram estas condutas, não são considerados
verdadeiros delinquentes (Peres et al., 2006).
1.4.1. Padrões de Conduta Delinquente
“Delinquência e “perturbação do comportamento” não são expressões sinónimas,
embora se refiram a áreas comuns do comportamento e personalidade, referem-se a
universos conceptuais distintos” (Baptista, 2000).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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Frechette e LeBlanc (1987), citado por Baptista (2000), desenvolveram uma
investigação sobre a conduta delinquente, com enfoque sobre o desenvolvimento do
comportamento durante a adolescência, a partir de uma amostra com mais três mil
adolescentes comuns e uma outra com mais de quatrocentos adolescentes com prática
delituosa reconhecida pelo tribunal.
Os indicadores, observados na investigação, que permitem qualificar a actuação
delinquente são:
Precocidade: a probabilidade da delinquência surgir é maior na faixa etária
entre os 10 e os 12 anos. Constatando-se que quanto mais cedo o adolescente se inicia
na prática de condutas delinquentes, maior é a probabilidade da sua frequência e
gravidade aumentarem.
Persistência ou duração: verificar se a actuação delinquente continua de forma
persistente. Se isso se verificar, a probabilidade de ele enveredar por esses
comportamentos é maior. Constaram num grupo restrito de adolescentes, uma prática
delinquente que continua para além do meio da adolescência.
Variedade do comportamento delinquente: comportamento delinquente variado
e persistente indica probabilidade de perpetuação do mesmo pelo adolescente.
Motivo subjacente à prática do delito: selecção da vítima, premeditação,
utilitarismo.
Os investigadores, Frechette e LeBlanc (1987), concluíram que a evolução da
delinquência juvenil processa-se por duas vias diferentes, com consequências distintas.
O primeiro processo foi designado por “delinquência regressiva”, ou seja, delinquência
transitória, acidental, que pode ser grave e constante, mas que desaparece a partir da
segunda metade da adolescência; o segundo processo foi designado por “delinquência
extensiva”, com início precoce, que se vai consolidando e fazendo parte do
comportamento do adolescente e que reside aos constrangimentos sociais.
A delinquência juvenil está constituída na lei, mas se esta é muito heterogénea, a
busca de simples variáveis psicológicas que separam os “delinquentes” dos “não-
delinquentes” não pode ser considerada uma busca estratégica. As causas não são
isoladas, daí a complexidade do processo (Quay, 1987).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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Uma outra visão considera cada delinquente como um indivíduo que partilha
pouco ou nenhuns atributos psicológicos com outros autores de actos delinquentes (cit.
Quay, 1987).
Uma terceira visão agrupa os delinquentes num grupo de pessoas com
determinado cariz psicológico.
Esta última teoria tem sido alvo de maior atenção, efectuando mesmo uma
separação de grupos, dividindo-os em sub-grupos baseados nas características pessoais
de personalidade (cit. Quay, 1987).
No entanto, a técnica estatística usada por norma é a análise factorial. Este
método permite determinar o grau de relacionamento de cada uma das variáveis e suas
dimensões. É este relacionamento que capacita a interpretação do ponto de vista
psicológico (Quay, 1987).
Segundo Quay (1987), alguns factores podem estar na origem da delinquência
juvenil, tais como:
Agressões não-sociais: relacionadas com características que envolvam
agressão, o negativismo e falta de consideração ao seu semelhante.
Agressões sociais: englobam os factores externos, estando muitas vezes
relacionado a “gangs” de delinquentes. Esta é uma resposta às circunstâncias de
desenvolvimento da sociedade.
Défices de atenção: traduzem os problemas de concentração e sua
manutenção durante certo período de tempo, impossibilitando a realização de variadas
tarefas. Este tipo de problema está, muitas vezes, relacionado também com problemas
sociais acima mencionados.
Ansiedade: está intrinsecamente ligada a uma necessidade de escape por
parte do delinquente juvenil.
Estes quatro factores estão oficialmente relacionados com a delinquência, mas
são os factores psicológicos que os fazem emergir.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
48
Com isto, constata-se que este sub-grupo está associado a problemas cognitivos,
a nível académico e pobre relacionamento social que poderá resultar, em alguns casos,
em delinquência. Quando diagnosticado, cuidadosamente, a grande maioria destas
crianças e adolescentes, conseguem uma melhoria significativa quando tratadas com
medicamentos estimulantes (Campbell e Werry, 1986, cit. Quay, 1987).
1.4.2. A Importância Familiar na Delinquência Juvenil
Segundo Sampaio (1985), citado por Fonseca et al. (2003), a abordagem
sistémica, a delinquência juvenil é definida como um “sintoma que funciona como
regulador da homeostasia familiar – é uma tentativa feita pela totalidade do sistema para
ultrapassar a crise e é também um sinal que não há solução possível nas modalidades
habituais de interacção familiar”. Este princípio salienta que a crise na adolescência, não
é apenas vivenciada pelo jovem, mas também pela família.
Kratcoski e Kratcoski (1982) reconheceram três tipos de modelos educativos de
famílias que podem estar, ou não, relacionados com a manifestação de condutas
delinquentes na adolescência (cit. Fonseca et al., 2003):
Estruturas familiares monoparentais: estas famílias, não contribuem para o
aparecimento de condutas associais, se adoptarem uma disciplina monoparental firme e
uma qualidade de vida considerada “normal”, contudo se a estrutura familiar funcionar de
forma disfuncional interna/relacional pode contribuir para a manifestação de condutas
delinquentes.
Rejeição parental: a rejeição parental apresenta uma relação causal com a
conduta delinquencial.
Disciplina educacional consistente e adequada: as estruturas utilizadas para
controlar a conduta juvenil podem influenciar significativamente as actividades dos
jovens, no entanto, um modelo educativo desajustado, extremamente rígido e os níveis
de controlo parental muito baixo pode conduzir à delinquência.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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O tipo de estratégias disciplinares adoptadas pelas famílias tem implicações sobre
a conduta do menor. Quanto mais coercivas forem as estratégias adoptadas, mais
positiva é a correlação com a conduta desviante das crianças, sendo mais evidente nos
casos das condutas agressivas e violentas. Crianças agressivas que tenham uma maior
tendência para provocar respostas coercivas, aumentam a probabilidade de as crianças
se exporem à agressão e à violência (Ferreira, 1997).
Pais de estatuto económico mais baixo apresentam uma maior dificuldade em
supervisionar os filhos do que os pais de estatuto económico mais elevado, havendo por
isso uma relação entre o estatuto sócio-económico, família e delinquência. As teorias de
controlo social referem que uma inadequada supervisão aumenta a delinquência porque
liberta os adolescentes dos constrangimentos familiares, defendendo que uma
supervisão fraca das relações dos seus filhos com os amigos estimula a delinquência,
porque podem obter influências favoráveis à delinquência. A aprendizagem grupal tem
grande importância na reprodução subcultural e por isso, as associações com os amigos
delinquentes são essenciais para a integração no mundo da delinquência (Ferreira,
1997).
Outra perspectiva para a aquisição de influências favoráveis à delinquência,
apresentada por Ferreira (1997), é uma consequência da intensidade com que as
condutas delinquentes são reprovadas em casa ou na comunidade. Quanto mais os pais
contrariarem a prática de condutas delinquentes, menor será a probabilidade de os filhos
se deixarem influenciar por essas condutas. Contrapondo a probabilidade de que grupos
de amigos com actos delinquentes aumentam a influência para a prática desses actos. A
família é o pilar do contexto cultural onde o adolescente pode receber e interiorizar as
orientações e as definições no sentido da conformidade, que são dominadas pelo modo
como os factores sócio-económicos ajustam as relações que estruturam o conteúdo e a
natureza das práticas educativas através das quais se incutem e se exercem os controlos
sociais.
Os factores causais parecem demonstrar consistentemente que as questões
parentais e a sua interacção estão associados ao desenvolvimento anti-social e de
delinquência (Snyder e Patterson, 1987).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
50
Este facto é relativamente claro. Pais de ofensores, quer na infância quer no
presente, são mais encorajadores às questões anti-sociais do que aqueles que o fizeram
isoladamente (Dishon e Loeber, 1983; Gold, 1970; Hanson, 1984; Hirschi, 1969; Loeber e
Schmaling, 1985; McCord, 1978; Pulkkinen, 1983; West e Farrington, 1973, todos cit.
Snyder et al., 1987). As dimensões parentais também são importantes, mas a queda é
maior nas famílias recidivas, que parecem dar mais oportunidades e inibem com
regularidade as práticas anti-sociais.
As diferentes associações de variáveis familiares que distinguem a questão de
“anti-social” e “delinquência” são menos claras. No entanto, podemos diferenciar estas
questões em dois grupos:
Comportamento anti-social aberto, que inclui agressão/assalto, conduta
desordeira e crimes pessoais orientados (Snyder et al., 1987).
Comportamento anti-social fechado, inclui mentir/roubar, conduta não
agressiva desordeira e crime contra a propriedade. Neste caso, as crianças que
apresentam padrões anti-sociais vêm de famílias mais punitivas, severas e restritivas
(Hetherington, 1971; Simcha-Fagan, 1975; Farrington, 1978; Petterson, 1980; Loeber,
1983, todos cit. Snyder et al., 1987).
Parece haver mais conflitos familiares e agressões, maior número de rejeições
parentais ao filho e mais frequente e fraterna relação pais-filhos em casas de crianças
com um comportamento anti-social aberto (Hewitt e Henkins, 1946; Lewis, 1954; Simcha-
Fagan, 1975; McCord, 1978, 1979; Patterson, 1980, todos cit. Snyder et al., 1987). Aqui a
característica comum é a permissividade disciplinar, bem como uma grande distância e
envolvimento entre pais e filhos (Hewitt e Jenkins, 1946; Lewis, 1954; Hetherington, 1971;
Farrington, 1978; Patterson, 1980, todos cit. Snyder et al., 1987).
Mas nem só a família tem importância na questão de anti-socialização, também os
colegas da mesma idade têm a sua quota-parte de responsabilidade. As crianças que
não adquirem os “ensinamentos” básicos de como fugir à anti-socialização, estão mais
permeáveis a continuar actos delinquentes depois de se envolverem com pessoas de
mesma idade e com hábitos negativos semelhantes.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
51
É cada vez mais importante distinguir os delinquentes. Tentativas que identifiquem
as variáveis familiares capazes de caracterizar os ofensores recidivos dos não-recidivos e
os com comportamento anti-social aberto do fechado são importantes na promoção de
programas clínicos de prevenção adaptáveis a cada caso singular de anti-socialização.
Outra limitação é a falta de unanimidade no processo que conduz ao
desenvolvimento da delinquência e qual o respectivo papel da família e colegas. Pais,
colegas e outros agentes socializadores não têm um efeito unidireccional no
desenvolvimento da criança. O efeito é recíproco. A criança é simultaneamente vítima e
arquitecta do seu meio-ambiente (Snyder et al., 1987).
Por outro lado, as questões genéticas, mais que as questões ambientais, tomam
lugar de destaque na delinquência. Neste caso, o fraco controlo familiar por parte dos
pais e o papel anti-social desempenhado pelo filho são expressões de uma pré-
disposição genética que, sob pressão, é evidente em ambos.
A falta de clareza quanto ao papel da família nas variáveis de desenvolvimento de
delinquência leva a um terceiro passo. Aquelas famílias associadas à delinquência
devem ser manipuladas para demonstrar convincentemente o seu status causal (Snyder
et al., 1987).
1.4.3. A Influência dos Pares e dos “Gangs” na Conduta Delinquente
Howeel (1997), citado por Albuquerque (2007), define “gang” como uma
associação organizada por pares “com uma designação oficial e símbolos identificáveis,
uma liderança clara, um território geográfico, uma forma de reunião regular e acções
colectivas destinadas ao desenvolvimento das suas actividades”. No entanto e ao que
parece, em Portugal, tal não se verifica desta maneira, porque os “gangs” apresentam
características extremamente informais e voláteis, sendo constituídos de forma muito
espontânea. Contudo, estas características contribuem para as dificuldades com que se
deparam as autoridades públicas em localizá-los e lidar com eles, devido ao facto de
estes “gangs” terem uma enorme capacidade de auto-regeneração, isto é, no caso de
alguns membros mais importantes de um “gang” forem apanhados pela polícia, tal terá
uma enorme influência sobre a sua capacidade de actuar. No entanto, se essas
estruturas forem soltas e informais, mesmo que alguns membros do “gang” sejam
capturados, algumas horas ou dias depois o “gang” já recrutou novos elementos e está
novamente em acção.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
52
A idade exacta de entrada de menores em “gangs” varia de país para país. Em
Portugal, a idade de risco para a integração nestes grupos situa-se entre os 13 e os 19
anos (Albuquerque, 2007).
Os factores que levam os menores a aderirem a “gangs” são externos aos
próprios grupos e são comuns ao aparecimento e à existência continuada dos mesmos
(Albuquerque, 2007). Estes factores são:
a) Existência de enclaves urbanos de pobreza: os grupos dominam territórios
específicos dentro dos centros urbanos, em áreas que são consideradas mais pobres. Os
grupos são diferenciados por um lado geograficamente e por outro socialmente. As
desigualdades sócio-económicas das populações locais nestas áreas, comparadas com
outros sectores da sociedade, contribuem para o enraizamento e permanência deste tipo
de actividade nestes grupos.
b) Subsistência de elevadas percentagens de jovens, níveis
desproporcionadamente baixos de educação e elevados de desemprego: as áreas
geográficas onde os “gangs” actuam caracterizam-se por populações com um número
muito elevado de filhos e os jovens, que aqui vivem, têm níveis baixos de educação
formal e muitos são desempregados. Os “gangs” locais, que oferecem às crianças
emprego, dinheiro, ascensão social, estatuto e poder têm um número significativo de
voluntários, acabando por não ser necessário realizar actividade de recrutamento.
c) Presença estatal diminuída ou diferenciada: a limitação ou falha de presença
das forças de segurança e de outros serviços públicos levaram ao rompimento do
contrato social entre os residentes locais e o Estado, permitindo aos “gangs” reforço da
sua presença.
d) Corrupção estatal: de forma directa ou indirecta, o Estado está constantemente
associado com os “gangs”, através da prestação de apoio financeiro ou militar, directo, ou
através de funcionários estatais, principalmente polícias corruptos.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
53
e) Aparelho estatal violento: os Estados são responsáveis por tentarem lidar com
os “gangs” através de uma política policial e legislativa repressiva. Contudo, não se pode
responsabilizar o Estado pela violência praticada por estes grupos, mas a repressão
colocada demonstrou não trazer benefícios quer para a redução da presença dos
“gangs”, quer para a diminuição dos níveis de violência na qual estão envolvidos.
f) Acesso à economia ilegal: os “gangs” são em grande parte financiados através
de actividades ilegais ou criminais, principalmente pelo tráfico de droga. Através da
legalização de drogas proibidas, o acesso a economias ilegais seria negado e assim a
independência económica destes grupos seria reduzida.
g) Acesso a armas de pequeno calibre: as armas de fogo são ferramentas que
podem ser usadas para exercer domínio sobre um território, populações locais e recursos
ilícitos.
Existem algumas características semelhantes às histórias pessoais das crianças e
jovens dos membros de “gangs”, no âmbito do contexto familiar, educacional e
económico (Albuquerque, 2007).
O autor identifica as seguintes situações, no âmbito do contexto familiar:
a. Famílias monoparentais: residência com um só progenitor, nomeadamente a
mãe. Por vezes resultado de os pais estarem separados ou abandono da família por
parte dos pais ou terem sido mortos.
b. Violência doméstica e mau relacionamento familiar: ausência de boa
comunicação com os pais, fracas relações familiares e famílias desestruturadas, origina
que muitas crianças e jovens vivam mais durante a noite, dormindo o dia todo, acordando
pela tarde e vivendo à noite, que é a altura propícia ao encontro com outros jovens em
situações idênticas à deles, consumindo álcool e desenvolvendo actividades no seio de
“gangs”.
c. Casas sobrelotadas: crianças que vivem em casas demasiado pequenas para
suportarem o número de pessoas que lá residem, contribuindo para que passem mais
tempo na rua e assim, muitas das vezes, juntarem-se aos “gangs”.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
54
No âmbito do contexto educacional, as crianças que muitas vezes se juntam a
“gangs”, geralmente desistiram da escola antes ou após a adesão ao respectivo grupo,
muitas das vezes devido ao facto de as famílias não disporem de dinheiro suficiente para
pagarem as propinas ou mensalidades escolares, ou então pelo próprio desinteresse pela
escola, já que a criança não acreditava que a escola a conduzisse a um posto de
trabalho. Noutras situações, as crianças foram expulsas da escola por mau
comportamento, devido ao facto de já estarem inseridas em “gangs”.
No âmbito do contexto económico, muitas das vezes os pais estão
desempregados, trabalham durante muitas horas por dia e recebem salários muito
baixos. Por sua vez, as crianças começam a procurar uma vida melhor, diferente e mais
fácil, acabando por se integrarem num “gang”.
No entanto, nem todas as crianças e/ou adolescentes expostas ao risco se
integram em “gangs”, devido a certos factores de resistência (cit. Albuquerque, 2007), tais
como, a existência de uma pessoa de referência, ou seja, uma pessoa a quem se
poderiam dirigir no caso de estarem com problemas, mesmo em situações de famílias
desestruturadas ou de famílias monoparentais; estudar ou seguir um programa de
formação profissional; algumas crianças que não tinham entrado num “gang” e
experimentaram uma situação de desemprego, acabaram por conseguir encontrar
trabalho a tempo inteiro ou outra forma de emprego remunerado; todas as crianças que
foram alvo de algum tipo de violência, poderia tê-las conduzido a um “gang”, no entanto,
o desejo de se manterem vivas para tomarem conta de um membro mais jovem da
família, ou o simples facto de terem testemunhado um amigo ou um familiar a ser morto
pela polícia por ser membro de um “gang”, travou essa possibilidade de integração
nestes grupos.
Voltando a fazer referência a Albuquerque (2007), as causas que podem levar
uma criança a aderir a um “gang” são variadas. Muitas vezes a questão de baixa auto-
estima, o facto de não serem aceites pelos seus pares, as quebras das estruturas
familiares e comunitárias, tornam as crianças mais receptivas a este tipo de
recrutamento, que lhes confere um certo estatuto e assim melhorar a auto-estima e
conseguir a aceitação dos seus pares. Isto acontece muitas vezes em meios mais
pobres, no entanto, pode também ocorrer em meios com melhor situação económica,
mas em que as crianças se sentem alienadas dos seus amigos e familiares. As causas
identificadas são:
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
55
Identidade: o sentimento que une os elementos dos “gangs” aos restantes
elementos do grupo é forte porque eles identificam uns com os outros, através de um tipo
de música, roupa ou cultura específica. A exibição em público, por estes elementos, pode
motivar a adesão junto de crianças e jovens que crescem em locais onde se sente uma
forte presença deste tipo de grupos.
Protecção: muitas das vezes os menores podem integrar-se num “gang” devido
a viverem na mesma zona, correndo o risco de ofensas à integridade física ou mesmo à
sua vida, pois por vezes podem estar nos locais considerados “errados” ou encontrarem-
se com membros de um grupo rival que não seja da sua área, levando-os por isso à
procura de segurança e de protecção, sendo uma das razões pela qual aderem a estes
grupos. Embora, na realidade o risco de estarem inseridos num “gang” seja maior, mas
noção de que serão protegidos constitui um incentivo para se juntarem ao grupo.
Vingança: é uma das outras razões pela qual os menores se integram nos
“gangs” e isto verifica-se porque alguns menores se querem vingar pelo facto de terem
perdido um membro familiar, mas muitas vezes como uma forma de vingança pela
maneira como a sua comunidade é tratada pela polícia.
Lucros financeiros: menores com fracos recursos, com dificuldade de acesso à
educação e necessitados de empregos decentes, procuram aderir a um “gang” com fim
de obter proveitos económicos. O aumento do tamanho do “gang” deve-se ao facto de
através do tráfico de droga, conseguirem grandes quantidades de dinheiro, e isto quer
por um aumento do número de jovens recrutados, quer pelo prolongamento do tempo de
permanência de cada jovem ao grupo, já que preferem contratar menores para fazerem o
trabalho ilícito dos “gangs” uma vez que o tratamento judicial para com os menores é
mais brando do que para os adultos, bem como a idade de imputabilidade criminal.
Segundo Born (2005), “os co-autores e cúmplices nem sempre constituem bandos
ou “gangs”, pois pode tratar-se de associações momentâneas de duas ou três pessoas
que não constituem um grupo propriamente dito. Entre os jovens, a formação de grupos é
mais frequente, pois responde a uma lógica da adolescência, de emparelhamento, que é
normal na construção da socialização e da identidade psicossocial”.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
56
Quando um grupo transforma-se em bando delinquente, poderá estar patente um
desenvolvimento de uma subcultura. Contudo, estas características subculturais podem
levar a um enfraquecimento se o grupo for aumentando demasiado, pois podem
subdividir-se em subgrupos de pares. Cada nível de proximidade pode desempenhar um
papel aditivo ou interactivo em relação à aprendizagem das normas convencionais ou
desviantes (Born, 2005).
Pode definir-se uma subcultura como uma configuração de condutas adquiridas,
que inclui normas, conhecimentos, modos de comportamento e valores e que se
transmite no interior de um grupo.
No caso de os bandos adoptarem comportamentos delinquentes, é porque no
interior deles existe uma subcultura na qual o acto de delinquência é tolerado ou mesmo
encorajado (Lautner, 1954; Shaw e McKay, 1969, todos cit. Born, 2005). Bairros
desorganizados podem apresentar o aparecimento de bandos delinquentes, verificando-
se que se desenvolvem subculturas não convencionais que concebem uma
suborganização social na qual a delinquência é aceite como uma conduta normal e as
características subculturais de organização de valores e de comportamentos
permanecem em toda a grande delinquência (Robert e Lascoumes, 1974, cit. Born,
2005).
Os delinquentes quando estão envolvidos numa mesma cultura e num mesmo
processo de socialização, tendem a enriquecer o seu reportório comportamental
culminando pela partilha de certas normas de conduta que são reforçadas pelos outros,
isto é, “o comportamento é aprendido e essa aprendizagem começa pela transmissão e
imitação de técnicas e de atitudes criminais num processo de comunicação com outras
pessoas” (Sutherland, 1940; Killias, 1991, todos cit. Born, 2005).
Foi elaborada uma tipologia das subculturas delinquentes segundo as
oportunidades e os meios utilizados (Cloward e Ohlin, 1960, cit. Born, 2005): “subcultura
do conflito e da violência enquanto expressão de necessidades de afirmação e de
aquisição nos grupos que têm fracas oportunidades; subcultura criminal que se organiza
para adquirir com eficácia os bens invejados; subcultura de retirada, na qual o uso de
drogas e a procura de prazer imediato sem grandes esforços são as principais
motivações”.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
57
Este tipologia permite descrever os principais tipos de bandos:
Bandos conflituais: caracterizam-se pela violência física; são constituídos por
um duro núcleo central, com uma dezena de indivíduos e por um núcleo periférico móvel,
cujos indivíduos não se integram em todas as actividades e têm um estatuto menos claro;
o líder é carismático; defendem um território e reconhecem-se entre si por um modo de
vestir característico; a integração no núcleo é geralmente de forma violenta e humilhante
para o interessado, que deve comprovar a sua força e a sua submissão ao chefe e aos
assistentes; a coesão do bando é primordial.
Bandos criminosos: as suas actividades são centradas no furto, com ou sem
violência, no comércio, no tráfico de objectos ou de droga; são constituídos por quatro ou
cinco elementos, apresentando uma coesão muito forte devido a uma necessidade de
protecção recíproca; a liderança é muito estruturada e a divisão do trabalho muito
precisa; a violência é um meio de defesa dos seus bens e a sua segurança; a
delinquência é a razão de ser do bando.
Bandos marginais: estrutura e coesão fracas, emergindo muitas vezes do
consumo comum de droga; as actividades estão centradas quer na droga quer no seu
comércio; a delinquência não é sistemática e é utilizada com fins de aprovisionamento;
funcionam como grupos móveis, sem líderes indiscutíveis e estão à margem da
sociedade.
Alguns estudos que referem que as ligações entre a delinquência na adolescência
e a associação com pares delinquentes são muito fortes, pois proporcionam aos
adolescentes reforços sociais muito poderosos pela sua aprovação das condutas
desviantes (Jessor e Jessor, 1977; Born, 1983; Elliott, Huizinga e Ageton, 1985, todos cit.
Born, 2005).
Quando um menor é portador de variados factores de risco, tais como ser
proveniente de um bairro com alta taxa de delinquência, de uma família que apresenta
normas desviantes ou dificuldades de supervisão, se for impulsivo, agressivo e em
ruptura da ligação social, a probabilidade de se relacionar com pares delinquentes é
muito maior (Born, 2005).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
58
Estudo realizado por Patterson e Dishion (1985), constatou a existência de
correlação entre a realização de condutas delinquentes e a presença de delinquentes
entre os pares. Os pares delinquentes procuram um ambiente social propício para
fomentar a delinquência. Para estes jovens é muito importante a sua aceitação pelos
pares, possuírem um estatuto no seio grupo e até mesmo só a simples aprovação da sua
presença no grupo.
1.4.4. A Importância da Escola no Desenvolvimento de Conduta
Delinquente
Em relação à importância da escola na evolução deste tipo de conduta, importa
referir que este é o local onde se formam maioritariamente grupos etários homogéneos,
onde procuram partilhar representações e interesses comuns que constituem a chamada
subcultura juvenil. As associações grupais juvenis funcionam como uma alternativa às
relações que são proporcionadas pela família. A importância do lazer na vida dos jovens,
como espaço compensador ou mesmo alternativo à constituição e desenvolvimento da
própria identidade, pode ao mesmo tempo desautorizar as orientações escolares mais
convencionais e, por conseguinte, diminuir a influência e o controlo que a própria escola
pode exercer (Ferreira, 1997).
A relação entre a escola e a delinquência analisada pela perspectiva do controlo
social, que considera que os níveis baixos de desempenho escolar e de competência
académica criam um afastamento em relação à escola, que precipita a rejeição da
autoridade escolar e faz aumentar as possibilidades do comportamento delinquente. Essa
renúncia à autoridade escolar parece constituir um elemento fundamental para a
participação nos grupos de idade cujo estilo de vida, pelo menos em termos escolares, se
organiza em volta de uma subcultura de rejeição ou de oposição escolar. A perspectiva
do controlo sublinha os factores que accionam a conformidade (Hawkins e Lishner, 1987,
cit. Ferreira, 1997). Este aspecto evidencia a força da relação aos professores e à escola,
assim como o grau de envolvimento com os objectivos educacionais, como dois
elementos fundamentais para se garantir a conformidade. Quanto mais positivas as
atitudes face à relação com a escola e com os professores, a participação em actividades
escolares e o empenho no seguimento dos objectivos educacionais, mais negativas são
as correlações com as práticas delinquentes e o envolvimento nesse tipo de condutas.
Existem outros indicadores que também se correlacionam negativamente com a
delinquência como o tempo gasto nos trabalhos de casa e a percepção da importância da
carreira académica. Os alunos que apresentam mais dificuldade de adaptação à escola e
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
59
que dificilmente participam nas actividades escolares acabam por apresentar mais
problemas disciplinares.
De facto, Cernkovich e Giordano (1992), citado por Seydlitz e Jenkins (1998),
defendem que o factor escola é tão importante como os factores amigos e família. Esta
literatura demonstra que o empenho escolar e esforço reduzem significativamente a
probabilidade de existir delinquência. No entanto, as evidências mostram que a escola
contribui para esta ao “etiquetar” alguns alunos como mais importantes que outros no seu
sistema de ensino. Para além disto, as escolas favorecem as condições necessárias ao
aparecimento de tais actos ao “empurrar” os alunos para fora da escola, incluindo
práticas de pobre disciplinariedade. Tal como estas práticas são usuais no seio familiar.
Também os superiores escolares as utilizam na escola. De facto, Agnew (1992) acredita
que a delinquência é o resultado de uma relação negativa entre comunidade, família e
figuras autoritárias na escola. Kelly e Pink (1982), citado por Seydlitz et al. (1998),
concluem num dos seus artigos sobre “crime escolar” que deve ser efectuada uma
investigação estruturante sobre as causas do aparecimento do comportamento
delinquente.
1.4.5. O Uso de Estupefacientes na Delinquência Juvenil
O problema dos consumos de drogas pelos mais jovens deverá ser analisado do
ponto de vista global, já que não podemos encontrar as razões para o aumento do uso de
drogas na adolescência em apenas um factor, mas sim num conjunto de possíveis
agressões (Leukefeld, Logan, Clayton, Martin, Zimmerman, Cattarello, Milich, Lynam,
1998).
Começando por abordar a questão individual e as variáveis da personalidade de
um adolescente, podemos afirmar que a conduta desordeira e uma personalidade anti-
social estão relacionadas com o abuso de drogas na generalidade da população. A
questão de problemas na infância e a baixa auto-estima são exemplos de variáveis de
personalidade que aumentam o risco de um jovem experimentar drogas. Um outro bom
exemplo é a questão das experimentações de novas sensações, fruto da adolescência,
que leva os jovens a tentar novas dimensões do ambíguo e desconhecido (Leukefeld et
al., 1998).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
60
A literatura sugere que existe uma relação entre o uso de drogas nos
adolescentes e determinadas características familiares específicas. Existem duas
características familiares que são muito importantes para esta questão: o uso de drogas
na família e a atmosfera familiar.
O uso de drogas numa família pode levar ao consumo do adolescente, assim
como os hábitos familiares e suas atitudes perante o fenómeno, que poderão influenciar a
escolha do jovem (Blum, 1972; Adler e Lotecka, 1973; Tec, 1974; Craig e Brown, 1975;
Tolone e Dermott, 1975; Beardslee, Son e Vaillant, 1986; Needle et al., 1986; Denton e
Kampfe, 1994, todos cit. Leukefeld et al., 1998).
A atmosfera familiar tem influência na medida das interacções e da própria
composição familiar. O conflito no seio de um agregado e os lares destruídos são um
fenómeno crescente e que aumentam a potencialidade do uso de drogas num jovem.
Mas também uma fraca comunicação, inconsistência, limites mal delineados e
expectativas irrealistas (Denton e Kampfe, 1994, cit. Leukefeld et al., 1998), sugerem que
o uso de drogas poderá sair reforçado face a tais características.
Outra variável responsável por este fenómeno está associado à rejeição dos
adolescentes num determinado grupo com o qual se identificam e querem ser parte
integrante.
Bauman e Ennett (1994) referem que a influência do grupo se revela com a
disponibilidade de consumo de drogas num grupo de amigos. Também consideram a
selecção e formação dos constituintes do grupo como factores importantes no consumo
de drogas.
O falhanço escolar está ligado ao abuso de drogas na adolescência (Jesson,
1976; Robins, 1980; Smith e Fogg, 1978, todos cit. Leukefeld et al., 1998). A boa
performance escolar reduz o abuso das mesmas (Hundleby e Mercer, 1987, cit.
Leukefeld et al., 1998). Crianças que gostam da escola e dos trabalhos de casa têm
menos propensão a tomar contacto com drogas (Kelly e Balch, 1971, cit. Leukefeld et al.,
1998).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
61
Os níveis de delinquência e criminalidade tendem a estar bem delimitadas
geograficamente. Por exemplo, as áreas maiores são, normalmente, mais violentas do
que outras de menor dimensão (Fischer, 1975, cit. Leukefeld et al., 1998). O abuso de
álcool e outras drogas tem de ser vista no contexto sócio-económico em que os
adolescentes vivem. O uso de álcool e drogas está ligado à vizinhança, sua
desorganização e problemas económicos (Wilson, 1987, cit. Leukefeld et al., 1998).
Do ponto de vista biológico, tem sido estudado a testosterona – principal hormona
masculina – e estrogénio – principal hormona feminina, como relação causal para o uso
de drogas e consumo de álcool. Comprovou-se a correlação no consumo destes dois
componentes.
Os investigadores descobriram um novo gene – D4 dopamina (Bower, 1996, cit.
Leukefeld et al., 1998), como responsável pela sensação de novas descobertas e novos
prazeres.
Apesar de os maiores factores relacionados com o uso/abuso de drogas e
delinquência estarem identificados, não existe um modelo teórico que os una. Lattieri,
Sayers e Pearson (1980, cit. Leukefeld et al., 1998), identificaram quarenta e três teorias
diferentes para o uso de drogas e Petraitis, Flay e Miller (1995, cit. Leukefeld et al., 1998),
identificaram catorze multivariáveis teorias para o consumo de drogas. Todos estes
estudos são importantes para compreender o desenvolvimento biológico, psicológico e
sociológico para melhor compreender as interacções entre as variáveis e medi-las
correctamente.
É importante compreender as causas e efeitos das múltiplas variáveis para depois
utilizar correctamente em programas de prevenção e intervenção. Mas novos estudos
terão de ser realizados para perceber as interacções escola-família-vizinhança-factores
pessoais com o objectivo de efectivar e obter maior eficiência nos programas a
implementar (Gordon, 1983, cit. Leukefeld et al., 1998).
O “timing” da intervenção será outro factor importante a ter em conta já que os
jovens intervencionados com maior brevidade obterão melhores resultados do que os
outros (McLellar, Luborsky, O´Brien, Woody e Druley, 1982, cit. Leukefeld et al., 1998).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
62
Finalmente, será importante colocar de lado a ideia de tratar os abusadores de
droga de uma forma global e começar a olhar para as necessidades das intervenções se
centrarem nas necessidades individuais de cada indivíduo.
1.4.6. A Importância da Comunidade no Desenvolvimento da
Delinquência
O uso do conceito comunidade para explicar o comportamento delinquente pode
ter diversas interpretações. Esta é usada, por vezes, para referir “vizinhança” e as suas
composições características. A vizinhança que experimenta mudanças composicionais,
também altera os comportamentos delinquentes (Bursik e Webb, 1982, cit. Seydlitz et al.,
1998). Este termo também pode significar o estrato social de uma pessoa na
comunidade.
Bursik e Grasmick (1993), citado por Seydlitz et al. (1998), centram o problema
do crime e delinquência nos aspectos da vizinhança e não individualmente. Examinaram
o grau privado de controlo social, o grau paroquial e o grau público de controlo social na
vizinhança. A delinquência ocorre nos centros onde um ou mais de três graus são pobres
na escala de controlo social.
A pobreza e o racismo são também importantes para compreender como a
delinquência provém dos grupos de vizinhança. Massey (1990, cit. Seydlitz et al., 1998)
refere que uma combinação de pobreza e racismo é uma definição clássica de baixa
classe social. Blackwell (1991, cit. Seydlitz et al., 1998) sugere que as desigualdades
étnicas são um forte predicado para os altos números de homicídio. O efeito nos
adolescentes em viverem em bairros onde ocorrem estes fenómenos é uma importante
variável para compreender a delinquência juvenil.
Weis e Sederstrom (1981, cit. Seydlitz et al., 1998) abordam a problemática do
emprego. Eles advogam um serviço vocacional operado a partir da escola, assim como
um programa para “juniores” e “seniores” interessados em possuir um treino vocacional
baseado em experiências laborais. Também referem que urge criar uma “escola-
emprego” capaz de ter uma ligação entre o presente escola e o futuro emprego. Afirmam
que aqui devem centrar as atenções naqueles alunos que deixaram a escola.
A posição pessoal de um indivíduo na comunidade/sociedade é também
importante para compreender as variáveis da delinquência.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
63
Uma das interpretações factuais permite-nos identificar que a delinquência ocorre
maioritariamente entre o género masculino e não no feminino, dependendo, no entanto,
da classe social (Hagan, Gillis e Simpson, 1985).
A posição sócio-económica está intimamente relacionada com este problema. A
maior parte dos investigadores aceita que os adolescentes das classes mais
desfavorecidas estão mais receptivos à delinquência.
As questões étnicas também são diagnosticadas. Os mais variados estudos
afirmam que as comunidades afro-americanas cometem mais crimes do que os brancos
e que os níveis de delinquência são maiores nas áreas onde existe um maior aglomerado
étnico e uma maior concentração de pobreza.
Uma outra questão amplamente debatida quando debatemos a delinquência é a
questão da idade. A conclusão de vários autores é a de que existe um incremento aos
actos delinquentes a partir dos 13 anos de idade, alcançando o maior pico entre os 16-18
anos. A partir daí dá-se um declínio (Steffensmeier e Streifel, 1991; Warr, 1993;
Thornberry et al., 1995, todos cit. Seydlitz et al., 1998).
No entanto, o grau de ofensas varia consoante a idade. Neste momento,
verificamos que a maior parte dos crimes de rua são cometidos por crianças cada vez
mais novas.
Thornberry (1987, cit. Seydlitz et al., 1998) acredita que a aceitação de certas
actividades sociais assim como os ideais de casamento, fazem diminuir os actos
delinquentes. Refere-se também à ajuda a que a escola poderá ter no combate a tal
fenómeno.
Urge proteger e estimular as crianças desde cedo, dar-lhes as ferramentas
necessárias para que se desviem de comportamentos que possam levar à prática de
fenómenos de delinquência.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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1.5. Neuropsicologia e o Comportamento Delinquente
A Neuropsicologia é uma área abrangente e também muito importante para
compreender certas alterações a nível comportamental.
Alguns estudos (Walsh e Beyer, 1986; Vermeiren, Clippele, Schwab-Stone,
Ruchkin e Deboutte, 2002; entre outros) apresentam uma relação entre alterações a nível
neuropsicológico e o comportamento delinquente.
1.5.1. Perturbação do Comportamento
O conceito de Perturbação do Comportamento tem como objectivo caracterizar
um tipo de comportamento anti-social que é clinicamente significativo já que é
considerado como algo que está fora dos padrões considerados normais do
funcionamento do indivíduo (Kazdin, 1987, cit. Negreiros, 2001).
As principais características de um indivíduo com Perturbação do Comportamento
englobam uma fraca empatia, insensibilidade para com os sentimentos, desejos e bem-
estar dos outros, ausência de sentimentos de culpa ou mesmo de remorso, tornando-se
muito difícil de avaliar se é sincero, dado que estes indivíduos sabem que se admitirem a
culpa o castigo pode ser reduzido ou anulado, além disto, possuem também uma auto-
estima baixa, embora não aparentem essa fragilidade, têm uma baixa tolerância à
frustração, irritabilidade, temperamento explosivo e são imprudentes. Muitas das vezes
os indivíduos considerados mais agressivos e com esta perturbação têm uma percepção
errada das intenções dos outros, interpretando-as como mais adversas e ameaçadoras
do que são na verdade, respondendo de forma agressiva (American Psychiatric
Association, 2002).
A esta perturbação estão frequentemente associadas o comportamento sexual
precoce, o consumo de álcool e de estupefacientes, e actos imprudentes e arriscados. O
consumo de estupefacientes pode aumentar o risco de persistência da Perturbação do
Comportamento. A nível comportamental esta perturbação pode levar a problemas de
suspensão ou expulsão da escola, problemas de adaptação ao trabalho, conflitos legais,
doenças sexualmente transmitidas, gravidez não desejada e danos físicos por acidentes
ou lutas. Estes problemas conduzem a uma dificuldade na permanência de escolas
normais, e a própria convivência em casa dos pais ou no lar adoptivo (American
Psychiatric Association, 2002).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
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O nível de inteligência é frequentemente classificado como inferior à média,
situando-se abaixo do nível esperado para a idade e inteligência do indivíduo,
principalmente em relação ao QIV, podendo justificar-se um diagnóstico adicional de
Perturbação da Aprendizagem ou da Comunicação. A ADHD (Perturbação de
Hiperactividade com Défice de Atenção) é frequente nas crianças com Perturbação do
Comportamento. Podem também ser associadas a esta perturbação as Perturbações da
Ansiedade, Perturbações do Humor e Perturbações pela Utilização de Substâncias
(American Psychiatric Association, 2002).
Alguns factores, como o abandono e negligência dos pais, temperamento infantil
difícil, práticas educativas rígidas, falta de supervisão, abusos sexuais ou físicos,
institucionalização precoce, instabilidade a nível de mudanças constantes de pessoas
que tomam conta de crianças, famílias numerosas, história de tabagismo materno
durante a gravidez, relacionamento com grupos delinquentes, viver em bairros
considerados violentos e antecedentes psicopatológicos familiares (por exemplo,
Perturbação Anti-Social da Personalidade, Dependência ou Abuso de Substâncias),
podem contribuir para o desenvolvimento de perturbações comportamentais. Esta
perturbação também parece ser mais frequente em crianças de pais biológicos com
Dependência do Álcool, Perturbação do Humor ou Esquizofrenia ou pais biológicos que
têm uma história de ADHD ou Perturbações do Comportamento (American Psychiatric
Association, 2002).
O diagnóstico de Perturbação do Comportamento só deve aplicar-se quando este
tipo de comportamento for sintomático de uma disfunção subjacente ao indivíduo e não
apenas uma reacção a um contexto social imediato.
Os sintomas evoluem conforme a idade em que os comportamentos de menor
gravidade (por exemplo, mentir, furtos nas lojas, lutas físicas) surgem numa primeira
fase, enquanto outros comportamentos (por exemplo, roubos por assalto) vão surgindo
progressivamente até iniciarem os problemas de comportamento mais graves (por
exemplo, violação, roubo enfrentando a vítima).
Os sintomas significativos observam-se no período entre o meio da infância e o
meio da adolescência, podendo, no entanto, ocorrerem alguns sinais na idade pré-
escolar. Muitos destes indivíduos apresentam uma Perturbação de Oposição que é
considerado como prenúncio comum da Perturbação do Comportamento Tipo Início na
Segunda Infância. Na maioria dos indivíduos, a perturbação diminui na idade adulta
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
66
conforme indicam os estudos de Moffitt (1993) sobre os tipos de delinquência
referenciados anteriormente. Muitos indivíduos, quer os de Tipo Início na Adolescência,
quer aqueles que apresentam sintomas mais ligeiros, conseguem adaptar-se socialmente
na idade adulta. No entanto, o início precoce prevê um mau prognóstico e o risco de
sofrer na vida adulta uma Perturbação Anti-Social da Personalidade e Perturbações pela
Utilização de Substâncias é maior (American Psychiatric Association, 2002; Figura 2).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
67
Fig. 2 Critérios de Diagnóstico para Perturbação do Comportamento
A. Um comportamento repetitivo e persistente, em que são violados os direitos básicos dos outros ou importantes
regras ou normas sociais próprias da idade, manifestando-se pela presença de 3 ou mais dos seguintes
critérios, durante os últimos 12 meses, e pelo menos, de um critério durante os últimos 6 meses:
Agressão a pessoas ou animais:
1) com frequência insulta, ameaça, ou intimida as outras pessoas;
2) com frequência inicia lutas físicas;
3) utilizou uma arma que pode causar graves prejuízos físicos aos outros (por exemplo, pau, tijolo, garrafa
partida, faca, arma de fogo);
4) manifestou crueldade física para com as pessoas;
5) manifestou crueldade física para com os animais;
6) roubou confrontando-se com a vítima (por exemplo, roubo por esticão, extorsão, roubo à mão armada);
7) forçou alguém a uma actividade sexual.
Destruição da propriedade:
8) lançou deliberadamente fogo com intenção de causar prejuízos graves;
9) destruiu deliberadamente a propriedade alheia (por meios diferentes do incêndio).
Falsificação ou roubo:
10) arrombou a casa, a propriedade ou o automóvel de outra pessoa;
11) mente com frequência para obter ganhos ou favores para evitar obrigações (por exemplo, «vigariza» os
outros);
12) rouba objectos de certo valor sem confrontação com a vítima (por exemplo, roubo em lojas sem
arrombamento, falsificações).
Violação grave das regras:
13) com frequência permanece fora de casa de noite apesar da proibição dos pais, iniciando este
comportamento antes dos 13 anos de idade;
14) fuga de casa durante a noite, pelo menos duas vezes, enquanto vive em casa dos pais ou em lugar
substituto da casa paterna (ou só uma vez, mas durante um período prolongado);
15) faltas frequentes à escola, com início antes dos 13 anos.
B. A Perturbação do Comportamento causa um défice clinicamente significativo no funcionamento social, escolar
ou laboral.
C. Se o sujeito tem 18 anos ou mais, não reúne os critérios de Perturbação da Personalidade.
Especificar o tipo em função da idade de início:
Tipo Início na Segunda Infância: antes dos 10 anos, início de pelo menos uma das características do critério
de Perturbação do Comportamento.
Tipo com Início na Adolescência: antes dos 10 anos ausência de qualquer critério característico de
Perturbação do Comportamento.
Início Não Especificado: a idade de início é desconhecida.
Fonte: DSM-IV-TR (2002)
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
68
1.5.2. Aspectos Neuropsicológicos na Delinquência
Neuropsicologia é a “ciência que estuda as manifestações comportamentais que
têm origem em disfunções cerebrais” (Lezak, 1995, cit. Wechsler, 2003) e “as alterações
cognitivas e emocionais, assim como os transtornos da personalidade provocadas por
lesões cerebrais, que é o órgão do pensamento e, por tanto, o centro da consciência”
(Gil, 2001).
Através dos resultados de algumas investigações realizadas nas áreas das
dificuldades de aprendizagem e dos défices cognitivos, constatou-se que os testes
neuropsicológicos fornecem informações relevantes para o diagnóstico e intervenção
nestas áreas (Hynd e Obrzut, 1981; Rourke, Fisk e Strang, 1986, todos cit. Wechsler,
2003).
A interpretação dos resultados obtidos nos testes deve ter em conta aspectos
como a motivação, atenção, capacidade para recordar regras complexas necessárias a
um bom desempenho, linguagem usada na administração das provas e o contexto
cultural do indivíduo.
As escalas de Wechsler têm sido muito úteis neste campo, embora não tenham
sido construídas com este propósito.
Os testes padronizados obtidos por subteste e o QI obtido, quando se associam a
outras medidas neuropsicológicas específicas, fornecem informações bastante relevantes
para um diagnóstico neuropsicológico (Kaplan, 1988, cit. Wechsler, 2003).
Um estudo desenvolvido por Kandel, Mednick, Kirkegaard-Sorensen, Hutchings,
Knop, Rosenberg e Schulsinger (1988, cit. White, Moffitt e Silva, 1989), demonstra que
um elevado QI pode ter um efeito protector em indivíduos de alto risco no que diz respeito
à delinquência juvenil.
De acordo com este estudo, os indivíduos que se encontravam em grupos de alto
risco relativamente à delinquência juvenil e que se tornaram efectivamente delinquentes,
tinham um QI mais baixo do que aqueles que embora estivessem inseridos nesse mesmo
grupo não se tornaram delinquentes.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
69
Outro factor que pode ser tido em conta para fazer uma previsão acerca das
crianças que mais tarde se poderão vir a tornar delinquentes juvenis, são os problemas
comportamentais anti-sociais desenvolvidos por essas mesmas crianças precocemente
na sua infância.
Ainda inserido na temática dos comportamentos anti-sociais, um outro estudo
realizado por Walsh e Beyer (1986), refere que o QIR e o QIV apresentam diferenças
significativas, ou seja, a performance verbal é inferior à de realização. Devido a estas
discrepâncias, os jovens que as possuem tornam-se delinquentes numa fase bastante
precoce.
Também um estudo desenvolvido por Vermeiren, Clippele, Schwab-Stone,
Ruchkin e Deboutte (2002) vai de encontro a estas conclusões acerca da performance
verbal e de realização.
Segundo estes autores, um défice de QI está directamente ligado à delinquência
juvenil. De acordo com Moffitt (1990, cit. Vermeiren et al., 2002) isto acontece apesar do
controlo do estatuto sócio-económico, do grau académico, raça, motivação durante o
teste e de detenção por parte da polícia. Este elaborou algumas teorias para explicar esta
relação entre o défice verbal e os distúrbios de conduta apresentados por estes jovens. A
primeira conclusão a que chegou foi que o défice verbal podia influenciar negativamente
o desenvolvimento de estratégias de auto-controlo fazendo com que estas crianças
tivessem padrões de comportamentos mais impulsivos. Esta baixa inteligência pode
também afectar negativamente a capacidade das crianças aprenderem e generalizarem o
tipo de comportamento que será mais aceitável dentro da sociedade, podendo mesmo
limitar o leque de respostas das crianças a situações ameaçadoras ou de ambiguidade
social, tornando as reacções agressivas mais comuns. Finalmente, uma criança com
baixa inteligência estará susceptível a interagir positivamente menos vezes com os pais e
a alcançar o sucesso escolar, sendo muitas vezes alvo de castigos físicos com mais
frequência.
Associados a esta baixa inteligência estão então os problemas de aprendizagem e
os distúrbios comportamentais, como confirmam os estudos que se referem a este tópico
e que em parte demonstram estes distúrbios como sendo não só causa mas também
efeito (Howlin e Rutter, 1987; Frick et al., 1991; Hinshaw, 1992; Maughan, Pickles, Hagell,
Rutter e Yule, 1996, todos cit. Vermeiren et al., 2002).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
70
Deste modo, o abuso de estupefacientes e a delinquência juvenil têm alguns
pontos em comum; a influência de um modelo parental negativo (abuso de drogas ou
álcool) ou um modelo parental com uma personalidade anti-social (agressividade e
comportamentos desordeiros) são duas hipóteses que podem ser adoptadas pelos
adolescentes e que têm como consequência directa estes mesmos distúrbios
comportamentais. No entanto, permanece ainda por responder uma questão: até que
ponto a dependência de drogas destes delinquentes adolescentes interfere com as
funções neuropsicológicas?
De acordo com estudos realizados neste campo por Teichner, Donohue, Crum,
Azrin e Golden (2000), sobre a relação entre o funcionamento neuropsicológico e o abuso
de estupefacientes em adolescentes com distúrbios comportamentais e com historial de
abuso destas substâncias, não foram encontrados dados conclusivos relativamente ao
uso de Cannabis, drogas duras ou abuso de álcool. Sendo assim, seria de esperar que
adolescentes que enveredem pelo caminho da delinquência precocemente mostrassem
níveis baixos de QI particularmente em testes verbais e défices de auto-controlo ao
contrário de outros adolescentes que não estando sujeitos a estas variáveis, não
apresentam estes défices neuropsicológicos.
Outro aspecto neuropsicológico importante para este estudo é a flexibilidade
mental que consiste na capacidade de adaptar as suas escolhas às ocorrências.
O conceito de funções executivas teve origem na psicologia cognitiva, que foi
posteriormente enriquecido com dados da neuropsicologia, principalmente com aqueles
que estão relacionados com o funcionamento pré-frontal (Lussier, Guérin e Lassonde,
1998, cit. Iria e Barbosa, 2008).
A terminologia utilizada por Luria, “higher cortical function in man”, juntamente
com os contributos de Lezak (1976) e Fuster (1986), citados por Iria e Barbosa (2008),
unificou-se no conceito de funções executivas.
Segundo Lezak (1983), citado por Braun (2000), as funções executivas podem ser
caracterizadas em quatro componentes: a formulação voluntária de objectivos; a
planificação; a execução de planos intencionais e dirigidos, isto é, a execução auto-
regulada de planos orientados para objectivos; e uma performance eficazmente
executada. No entanto, há um provável quinto componente (Luria, 1973, cit. Braun,
2000): a verificação, correcção e inflexão das acções.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
71
Para os autores Welsh, Pennigton e Groise, 1991, citados por Lussier et al., 1998,
“as funções executivas dizem respeito ao conjunto de competências necessárias para
perseguir um objectivo e atingir a sua realização, englobando, entre outras, a capacidade
de planificação, a aplicação de estratégias flexíveis, o controlo da impulsividade, a auto-
correcção, a organização e/ou sistematização da procura”. Estes componentes são
imprescindíveis para travar a produção de respostas desadequadas em determinada
situação, para coordenar a realização simultânea de duas ou mais tarefas, e para
detectar e corrigir os erros.
Um teste que permite avaliar o funcionamento das funções executivas é o Teste
de Classificação de Cartas de Wisconsin (Heaton, Chelune, Talley, Kay e Curtiss, 2001)
que consistem em colocar quatro cartas na frente do sujeito com um número de
elementos (de 1 a 4), cores (vermelho, verde, amarelo e azul) e formas (triângulo, estrela,
cruz e círculo) diferentes para o sujeito classificar as cartas de acordo com um critério de
sua escolha. O indivíduo deve emparelhar as cartas durante seis tentativas consecutivas,
para os elementos apresentados e sem grandes esclarecimentos, deve apenas basear-
se no feedback do examinador para mudar o elemento que está a emparelhar. Após a
conclusão do teste calcula-se o número de categorias escolhidas, o número de erros e o
número de erros perseverativos, ou seja, os erros correspondentes à resposta
imediatamente anterior, embora se tenha informado o indivíduo de que estava errado,
neste tipo de situação pacientes com lesões frontais (sobretudo dorsolaterais direita ou
esquerda) cometem mais erros perseverativos do que indivíduos normais ou sem lesões
frontais.
Estudos desenvolvidos por Benson (1991), Heilman, Voeller e Nadeau (1991) e
Mattes (1980), todos citados por Heaton et al. (2001), permitiram verificar a semelhança
entre as condutas de abandono de inibição que apareciam em pacientes que haviam
sofrido dano em áreas do lobo frontal e os sintomas de inatenção, impulsividade e
hiperactividade, que aparecem em crianças e adolescentes com transtornos por défice de
atenção e transtornos por défice de atenção com hiperactividade.
Outra investigação levada a cabo por Barkley, Grodzinsky e DuPaul (1992), citado
por Heaton et al. (2001), comprovaram que as crianças com transtornos por défices de
atenção com hiperactividade haviam completado menos categorias e deram mais
respostas perseverativas e erros perseverativos.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
72
A resolução dos problemas necessita da activação de processos organizados pelo
lobo frontal. Todos os problemas necessitam “do interesse do indivíduo e de concentrar a
sua atenção, da análise dos dados do problema, do estabelecimento de uma estratégia
ou programa, execução controlada do programa, apoiado pela memória prospectiva,
avaliação dos resultados, ou seja, comparação dos resultados obtidos e dos dados
iniciais, em termos de aceitação e credibilidade” (Gil, 2001).
Existem várias concepções do funcionamento executivo (Callahan, 2001),
expondo nos diversos modelos que descrevem as funções executivas:
O modelo de Sohlberg e Mateer (1989) propõe a antecipação, a selecção do
objectivo, o planeamento, o início da actividade, a auto-regulação/monitorização e uso do
feedback.
O modelo de Lezak (1995) sugere um elemento volitivo (auto-consciência e
estado motivacional), o planeamento (concepção da mudança e das alternativas,
realização de escolhas, desenvolvimento de um plano de forma objectiva e focalizada), a
acção intencional (incluindo produtividade e auto-regulação) e a performance efectiva
(autocontrolo da qualidade da acção).
O modelo de Holland, Hogg e Farmer (1997) aponta a velocidade de
processamento, a sequenciação, a flexibilidade, a geração das ideias e análise das
tarefas, o planeamento e organização, a iniciação, a avaliação das estratégias, a atenção
aos detalhes, a auto-consciência e a gestão do tempo.
O modelo de Callahan (2000) recomenda a iniciação, a conclusão e a auto-
regulação.
O funcionamento executivo controla os processos mentais como a memória e a
atenção, utilizando-os na resposta à mudança, sempre que é fundamental a adaptação
do comportamento a novas exigências ambientais.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
73
Normalmente os estudos neuropsicológicos desenvolvidos sobre a temática de
comportamentos anti-sociais focam principalmente as funções executivas e verbais, não
fazendo grande referência às funções de memória (Moffitt, 1990; Raine, 1993; Henry e
Moffitt, 1997; Fishbein, 2000; Nigg e Huang-Pollock, 2002; Ishikawa e Raine, 2002, todos
cit. por Raine et al. 2005).
Embora haja indícios que psicopatas possuam memórias superiores, alguns
estudos recentes demonstram a existência de danos ao nível da memória em grupos
violentos e anti-sociais (Brickman, McManus, Grapentine e Alessi, 1984; R. A. Cohen,
Rosenbaum, Kane, Warnken e Benjamim, 1999; Moffitt e Caspi, 2001; Sigurdsson,
Gudjonsson e Peersen, 2001; Teichner, Golden, Van Hasselt e Peterson, 2001; Dolan e
Park, 2002; Seguin, Arsenault, Boulerice, Harden e Tremblay, 2002; Vermeiren, De
Clippele, Schwab-Stone, Ruchkin e Deboutte, 2002, todos cit. por Raine, Moffitt, Caspi,
Loeber, Stouthamer-Loeber e Lynam, 2005).
Sendo assim, no que diz respeito à Memória a Curto Prazo, esta funciona como
um sistema de capacidade limitada capaz não só de armazenar, mas também de
manipular as informações, permitindo o desempenho de tarefas cognitivas como o
raciocínio, a compreensão e a resolução de problemas, através da manutenção e
disponibilidade temporal das informações, funcionando assim como uma "memória
tampão" que permite a locação de recursos atencionais controlados por um sistema de
controlo de atenção chamado "executivo central" (análogo ao sistema de supervisão da
atenção, relacionado com o lobo frontal e descrito por Shallice, 1988, cit. Gil, 2001), que
coordena os sistemas chamados auxiliares ou subservientes, dos quais, os mais
estudados são o laço articulatório e a agenda visuo-espacial.
Segundo Shallice (1988, cit. Gil, 2001), o lobo frontal controla um sistema
atencional de supervisão que modula o nível de activação dos esquemas de acção
competitivos seleccionados por um plano de gestão, evitando assim a distractibilidade,
inibindo esquemas parasitas e a perseverança, inibindo também esquemas dominantes e
assim permitir a flexibilidade da mente.
Segundo o autor, Gil (2001), as funções visuo-espaciais são sustentadas pela
percepção visual ou pela imagem mental. O seu funcionamento análogo ao do laço
fonológico ou articulatório permite manter temporariamente informações visuais (relativas
ao reconhecimento, ou seja, o "quê") e informações espaciais (que dizem respeito à
localização, ou seja, o "onde").
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
74
Em relação aos défices das actividades perceptivo-visuais, outro aspecto
neuropsicológico de interesse para este estudo é o movimento dos olhos que regista a
identificação de imagens feita a partir de alguns detalhes que são fixados
compulsivamente, o que pode explicar alguns erros de identificação, tratando-se de uma
incapacidade para estabelecer uma estratégia comportamental (Gil, 2001). A reprodução
de Memória da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988) mostra uma simplificação com
repetição estereotipada dos detalhes. No entanto, ao apresentar sucessivamente ao
indivíduo os diferentes detalhes da figura o seu desempenho melhora, demonstrando que
se trata de um défice de programação e deste modo, o examinador, ao indicar as etapas
da tarefa, converte-se de certo modo, no «lobo frontal do paciente».
Indivíduos com lesões frontais apresentam um maior índice de distractibilidade e
os estímulos externos do contexto afectam as tarefas (“efeito de campo”, chamado por
Luria) confirmando as dificuldades atencionais destes indivíduos. A atenção supõe, por
sua vez, uma orientação-concentração mental para uma tarefa e inibição de actividades
concorrentes.
Estes indivíduos alteram espontaneamente o tipo de estímulo e recaem neste
comportamento, uma vez que respondem em função da impressão inicial provocado pela
visão de figuras e não de acordo com a regra que foi adoptada. A sensibilidade às
interferências avalia-se selectivamente pelo processo de Stroop, o mais conhecido é o
teste de Palavra-Cor (Golden, 2007), que consiste, em primeiro lugar, ler as palavras
escritas em preto para as três cores, de seguida, ler cruzes com as três cores e,
finalmente, o nome da cor da tinta com as palavras, sabendo que esta cor não
corresponde à palavra escrita, o que prevê a existência de interferência entre a leitura da
palavra e do nome da cor que faz aumentar, no sujeito normal, o tempo da designação da
cor da tinta das palavras “conflito” (como a palavra azul escrita em vermelho), a
interferência pode ser medida quer pelo tempo de reacção quer por comparação do
número de itens referidos em cada uma das três partes da prova. No indivíduo com
alteração frontal, a interferência é muito maior do que em indivíduos normais.
Nesta última categoria, é necessário focalizar uma componente de estímulos (cor
das letras) enquanto as outras são ignoradas (cor que a palavra significa). Quando a
tarefa-irrelevante (componente ignorada) entra em conflito com a dimensão a que se
presta atenção, os participantes saudáveis demonstram um certo efeito de interferência.
Este efeito de interferência indica que, nas populações saudáveis, focar a atenção
selectivamente numa dimensão não previne completamente o processamento da
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
75
dimensão ignorada. No entanto, uma interferência exacerbada indica défice de atenção
selectiva, como se reflecte no excessivo processamento da tarefa-irrelevante. Desta
forma este teste providencia medidas privilegiadas para avaliar a influência automática de
informação a negligenciar (MacLeod, 1992, cit. Hiatt, Schmitt e Newman, 2004).
Um estudo com pacientes com lesões frontais propôs que a resolução da
interferência tem uma localização pré-frontal e lateralizada no hemisfério esquerdo
(Perret, 1974, cit. Adleman, Menon, Blassey, White, Warsofsky, Glover e Reiss, 2002).
Outros investigadores aprofundam estes resultados, aludindo que pacientes com lesões
pré-frontais laterais cometem mais erros neste teste do que controlos normais (Vendrell
et al., 1995, cit. Adleman et al., 2002).
Segundo Golden (1978, cit. Golden, 2007), a capacidade de leitura simples e de
nomear cores pode estar alterada em pacientes com lesão cerebral. Em geral, as
alterações a nível da leitura de palavras relacionam-se com lesões no hemisfério
esquerdo, enquanto as alterações de nomeação de cores pode dever-se a lesões do
hemisfério direito, se a dificuldade apresentar-se na capacidade de reconhecer e
classificar os estímulos de cor, ou no hemisfério esquerdo, se a incapacidade consistir na
atribuição de um nome ao estímulo de cor.
Estudo realizado por Perret (1974, cit. por Golden, 2007) comprovou que os
efeitos da interferência apareciam mais em indivíduos com lesões no hemisfério
esquerdo, principalmente na zona anterior ou frontal.
Contudo, é importante estar atento à forma como o indivíduo realiza o teste e não
somente a pontuação obtida, como por exemplo, um indivíduo que apresente dificuldades
em seguir a ordem correcta das colunas, pode ser um sinal de uma grave dificuldade
espacial que pode acompanhar as disfunções cerebrais do hemisfério esquerdo; a
perseveração pode indicar a existência de lesões no hemisfério esquerdo; pontuações
baixas devidas à incapacidade de conter a frustração, evidenciadas pela negação de
seguir a tarefa ou mediante reacções de ira, podem ser indicativas de existência de
desordens psiquiátricas ou de lesões cerebrais agudas.
O estudo realizado por Golden (1976, cit. Golden, 2007) demonstrou que os
indivíduos psiquiátricos obtiveram valores relativamente normais nas três pontuações,
com médias 10% mais baixas que os indivíduos normais e, em geral com pontuações T
superiores a 40. Sendo frequente encontrar, em pacientes psiquiátricos, um valor de P
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
76
baixo, um valor de C alto ou normal e um valor de PC baixo, o que é muito raro em
doentes de origem orgânica. Segundo este autor, o valor da pontuação de C por si só
pode ser capaz de discriminar os grupos de pacientes orgânicos dos psiquiátricos com
uma fiabilidade de 83%.
O uso de certos medicamentos pode afectar os resultados de Stroop, como ocorre
com outros testes neuropsicológicos. Por isso, deve aplicar-se o teste quando o sujeito
está menos afectado pelos efeitos psicomotores agudos que produzem que algumas
medicinas psicoactivas produzem (Golden, 1976, cit. Golden, 2007).
Callaway e Dembo (1958, cit. Golden, 2007) usaram o Stroop para estudar um
fenómeno a que chamaram de “atenção concentrada”, que para estes autores, se devia a
drogas estimulantes e permitia ao indivíduo concentrar a sua atenção e ignorar estímulos
irrelevantes. Desta forma o indivíduo rende melhor em provas, como a do PC do Stroop
já que pode ignorar o estímulo que supõe a palavra. Devido a isso, a interferência diminui
porque na prova C não há estímulos distractivos para eliminar. No entanto, segundo esta
teoria, as drogas depressoras deveriam produzir um efeito contrário, isto é, piores
resultados em PC e na interferência. Este efeito produz-se porque as drogas ampliam o
campo de atenção e torna-se mais difícil que o sujeito suprima os estímulos distractores.
Posteriormente, uma revisão dos dados realizados por Callaway e Stone (1969,
cit. Golden, 2007), mostraram que os estimulantes melhoravam todas as pontuações de
Stroop enquanto as depressoras as pioravam.
A nível do TRVB (Benton, 2002), o sinal mais importante que indica a patologia
cerebral é o nível geral de execução, medido pelo número de reproduções correctas ou
pela valorização de erros, uma vez que ambas constituem o índice de perfeição da
percepção e da reprodução. Este teste consiste numa tarefa que implica uma interacção
dos factores visuo-construtivos, visuo-motores e de memória visual. O fracasso na
aplicação A pode ser devido ao facto de existência de incapacidade visuo-perceptiva ou
visuo-construtiva.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
77
Crianças ou adolescentes que mostram com frequência uma diminuição selectiva
da função intelectual, no sentido de que as capacidades verbais estão relativamente bem
desenvolvidas, enquanto o rendimento visuo-perceptivo e visuo-motor é
significativamente defeituoso (Taylor, 1959, cit. Benton, 2002) contribuem para que este
teste tenha valor específico no exame de crianças nos quais se suspeita de lesão
cerebral.
Rowley e Baer (1961, cit. Benton, 2002) desenvolveram um estudo entre crianças
com lesão cerebral e crianças emocionalmente perturbados e chegaram à conclusão de
que “o Teste de Retenção Visual de Benton é muito útil como ajuda para discriminar entre
a patologia cerebral e as perturbações emocionais nas crianças. Uma execução
defeituosa (de três ou mais pontos) é indicativo de lesão cerebral e não é provável que
seja causada por dificuldades de atenção e concentração associadas a uma perturbação
emocional. Isto não quer dizer que tais dificuldades não possam influenciar o nível de
execução; quando influenciam, no entanto, o seu efeito típico parece consistir em baixar
o resultado total em apenas um ou dois pontos, de tal maneira que o nível de execução
todavia fica dentro dos limites normais”.
Segundo Silverstein (1962, cit. Benton, 2002) o fracasso observado na tarefa de
reproduzir de memória, em algumas crianças pequenas e em alguns deficientes mentais,
deve-se mais à incapacidade visuo-construtiva que a uma diminuição da memória
imediata. Contudo, não é aconselhável considerar a aplicação A do TRVB (Benton, 2002)
como uma tarefa visuo-construtiva, porque em muitos casos o factor memória tem um
papel decisivo.
Pelo exposto, parece que à delinquência juvenil, estão associadas a existência de
alterações neuropsicológicas significativas, nomeadamente a nível da área da
Inteligência, Memória, Funções Executivas, nas funções Visuo-espaciais e Perceptivo-
visual. São estas mesmas funções que pretendemos estudar neste trabalho, procurando
verificar se também se encontram alteradas.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
78
Parte B: Planeamento Empírico
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
79
Ao longo da primeira parte deste trabalho, foram apresentados factores de risco
associados à delinquência na adolescência, nomeadamente comportamento anti-social
precoce, factores emocionais, desenvolvimento cognitivo, antecedentes familiares,
associação a pares desviantes, factores escolares e comunitários (Loeber e Farrington,
2001, cit. Wasserman et al., 2004).
Quay (1987) descreve que existem alguns factores que caracterizam a
delinquência como os padrões de conduta que muitas vezes estes jovens desenvolvem,
tais como, agressões não-sociais, agressões sociais, défices de atenção e ansiedade.
Contudo, refere que são factores psicológicos que os fazem emergir.
Estes jovens muitas vezes são diagnosticados com Perturbações do
Comportamento que caracterizam o comportamento anti-social clinicamente significativo
(Kadzin, 1987, cit. Negreiros, 2001). O facto de com muita frequência estar associado o
consumo estupefacientes, pode influenciar este tipo de perturbação, contribuindo para o
aparecimento de alterações a nível neuropsicológico em indivíduos muito jovens
(Teichner et al., 2000) e, serem caracterizados por um baixo QI Verbal (Walsh e Beyer,
1986; DSM-IV-TR, 2002; Vermeiren et al., 2002).
Ao longo da recolha da informação bibliográfica, levantaram-se algumas
questões, principalmente sobre que tipo de alterações neuropsicológicas é que estes
jovens podem apresentar e de que modo essas alterações são características comuns
neste tipo de população. A capacidade de planificar, de executar e de resolver
problemas, a atenção e, a memória, foram as funções cognitivas mais referenciadas na
literatura que podem estar alteradas nos adolescentes delinquentes.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
80
Capítulo 2: Objectivos
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
81
Tendo em conta o anteriormente exposto, apresentamos os seguintes objectivos:
Objectivo Geral
1. O presente estudo tem como objectivo geral averiguar possíveis alterações a nível
neuropsicológico em adolescentes que delinquiram e que, actualmente, se encontram
no Centro Educativo Santo António, no Porto.
Objectivos Específicos
1.1. Analisar se existem correlações significativas intra-teste e inter-teste, das provas
de avaliação neuropsicológicas utilizadas neste estudo.
1.2. Estudar se existem diferenças significativas entre as variáveis sócio-demográficas
em função do rendimento dos testes utilizados neste estudo.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
82
Capítulo 3: Metodologia da Investigação
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
83
3.1. Caracterização da Amostra
A amostra é constituída por 31 sujeitos do sexo masculino, que se encontram a
cumprir medida tutelar no Centro Educativo Santo António, no Porto. As idades variam
entre os 13 e os 16 anos de idade, com uma média de 15,32 (D.P. = 0.871), conforme
Tabela 1.
A amostra é representativa daquela Instituição que tinha um total de 41 elementos
no momento da recolha de dados, sendo que o número limite é de 33, mas acontecem
situações em que o número de sujeitos na Instituição é superior.
Tabela 1
Média das Idades
Mínimo Máximo Média Desvio padrão
13 16 15.32 0.871
Em relação às restantes variáveis sócio-demográficas, conforme Tabela 2,
consideram-se as seguintes variáveis: Ciclo a que pertence; Habitação com os Pais; Uso
de Drogas; Medicação; Modo de actuar; Posse de Arma ilegal; Actos ilegais; e
Antecedentes Familiares.
Verificou-se que 48.4% dos sujeitos se encontravam a frequentar o 2º Ciclo (5º/6º
ano) e 51.6% estavam a frequentar o 3º Ciclo (7º/8º/9º ano).
Quanto ao facto da Habitação com os Pais até à entrada no referido Centro
Educativo, constatou-se que 24 dos sujeitos inquiridos viviam com os seus progenitores,
enquanto 7 dos sujeitos viviam fora da habitação dos pais (com avós, tios, instituições e
famílias de acolhimento).
Alguns destes sujeitos, 58.1% apresentavam histórico de consumo de
estupefacientes (cocaína, heroína, pastilhas e haxixe) e 22.6% fazia medicação
psiquiátrica, nomeadamente, com Anti-Psicóticos (Cisordinal Depot 200, Zyprexa Velotab
5, Risperdal Consta 25 injectável, Risperidona 1, Seroquel 200 SR e Seroquel 400 SR),
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
84
Estimulantes Inespecíficos do Sistema Nervoso Central (Concerta 18 e Concerta 36),
Anti-Depressores (Sertralina 50), Antiepiléticos e Anti-Convulsivantes (Proaxen 300) e
Sedativos (Livetan 500).
Quanto ao modo de actuar em actividades ilegais, 29.0% optava por actuar
sozinho, enquanto 64.5% preferia actuar em grupo e apenas 6.5% actuava sozinho e
outras vezes em grupo. Já em relação ao porte de armas ilegais, 25.8% afirmaram que
utilizavam armas na prática das suas actividades e 74.2% referiram que não usavam
armas.
Em relação ao tipo de actos que cometeram: 6.5% por tráfico de droga, 58.1% por
crimes contra a propriedade (furto, roubo, furto de uso de veículo e crime de dano), 3.2%
por ofensas à integridade física, já 25.8% encontravam-se a cumprir medida tutelar
nomeadamente pela prática anterior de crimes contra a propriedade e por ofensas à
integridade física e 6.5% pela prática de concurso de crimes (trilogia mais comum: crimes
contra a propriedade, ofensas à integridade física e por tráfico de droga). O crime de
Tráfico de Droga encontra-se regulado pela Lei nº 18/2009 de 11 de Maio, os Crimes
Contra a Propriedade apresentados neste estudo encontram-se consagrados nos artigos
203.º, 204.º, 208.º, 210.º, 212.º e 214.º do Código Penal e o Crime por Ofensas à
Integridade Física vem tipificado nos artigos 143.º, 144.º do mesmo código, todos eles
com remissão para a Lei Tutelar Educativa, pelo facto de os sujeitos serem menores de
18 anos e como tal, serem considerados inimputáveis em razão da idade.
Averiguou-se também que 54.8% destes sujeitos tinham antecedentes familiares
no meio criminal (consumo de estupefacientes, tráfico de droga, roubo, furto, lenocínio,
violência doméstica) e de situações de abandono e negligência.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
85
Tabela 2
Variáveis sócio-demográficas
Frequência
(N)
Percentagem
(%)
Ciclo a que pertence 2º Ciclo 15 48.4
3º Ciclo 16 51.6
Habitação com os Pais Sim 24 77.4
Outros 7 22.6
Uso de drogas Sim 18 58.1
Não 13 41.9
Medicação Sim 7 22.6
Não 24 77.4
Modo de actuar
Sozinho 9 29.0
Grupo 20 64.5
Sozinho e/ou Grupo 2 6.5
Posse de arma ilegal Sim 8 25.8
Não 23 74.2
Actos ilegais
Tráfico de droga 2 6.5
Crimes contra a propriedade 18 58.1
Ofensas à integridade física 1 3.2
Crimes contra a propriedade e Ofensas à
integridade física
8 25.8
Crimes contra a propriedade, Ofensas à
integridade física e Tráfico de droga
2 6.5
Antecedentes familiares Sim 17 54.8
Não 14 45.2
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
86
3.2. Instrumentos e Recolha de Dados
Ao rever a literatura, alguns estudos na área da delinquência (Heaton et al., 2001;
Adleman et al., 2002; Vermeiren et al., 2002; Hiatt et al., 2004; Iria et al., 2008, entre
outros) apontavam para défices neuropsicológicos ao nível atencional, pré-frontal, visuo-
espacial e memória. A opção pela utilização destes testes deveu-se, sobretudo por estes
testes apresentarem critérios de validade e fidelidade e por serem muito utilizados na
comunidade científica e por alguns destes testes estarem adaptados à população
portuguesa.
3.2.1. Entrevista Semiestruturada para Realização de Anamnese (Christensen,
1975; adaptada com autorização por Maia, Loureiro e Silva, 2002)
Tem como objectivo recolher informações de forma aprofundada sobre dados
sócio-demográficos, historial de saúde e de dificuldades funcionais do sujeito (Anexo I).
A amostra é constituída por adolescentes, daí algumas questões terem sido
adaptadas (Anexo II).
3.2.2. WISC-III, Escala de Inteligência de Wechsler para Crianças - III (David
Wechsler, 1949; adaptada para a população portuguesa pelo Professor Mário Simões,
2003)
Para avaliar as variáveis do nível do conhecimento mental global e em áreas
cognitivas específicas, foi utilizado, como instrumento de avaliação, a Escala de
Inteligência de Wechsler para Crianças – 3º Edição (WISC-III).
É um instrumento clínico de administração individual, que avalia a inteligência de
sujeitos com idades compreendidas entre os 6 anos e os 16 anos e 11 meses. À
semelhança de todas as escalas de inteligência de Wechsler, a WISC-III é constituída por
vários subtestes, cada um deles avaliando um aspecto diferente de inteligência.
Em termos de análise dos resultados, o desempenho dos sujeitos pode ser
sintetizado em três resultados compósitos, identificados em QIV, QIR e QIG. A análise
destes resultados permite ao avaliador determinar a qualidade do desempenho do
indivíduo relativamente a um conjunto de aptidões intelectuais.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
87
Na WISC-III, cinco subtestes verbais linguísticos estão subjacentes ao QIV. São
eles: Informação (conhecimento factual geral), Semelhanças (conhecimento lógico-
abstracto), Aritmética (raciocínio aritmético), Vocabulário (conhecimento de palavras) e
Compreensão (maturação social e compreensão de normas sociais).
Cinco subtestes visuo-espaciais estão subjacentes ao QIR. São eles:
Complemento de Gravuras (reconhecimento e identificação visual), Disposição de
Gravuras (sequenciação temporal), Cubos (visualização espacial), Composição de
Objectos (organização perceptiva) e Código (velocidade de processamento).
A classificação dos níveis de inteligência está representada na Tabela 3.
Tabela 3
Classificação dos Níveis de Inteligência
Percentagem
Q.I. Classificação Teórica Amostra Portuguesa
130 ou mais Muito Superior 2.2 1.9
120-129 Superior 6.7 8.4
110-119 Médio Superior 16.1 16.8
90-109 Médio 50.0 49.8
80-89 Médio Inferior 16.1 15.9
70-79 Inferior 6.7 5.7
69 ou menos Muito Inferior 2.2 1.4
Fonte: Simões, M. & Ferreira, C. (2003). WISC-III, Escala de Inteligência de Wechsler para Crianças - III (p. 30).
Lisboa: CEGOC-TEA
3.2.3. Figura Complexa de Rey (André Rey, 1942; adaptada para a população
portuguesa por António Rocha e Maria Helena Coelho, 1988)
Procura avaliar a actividade perceptiva e a memória visual e, nas duas fases –
processo de cópia e reprodução de memória - o objectivo é analisar o modo como o
indivíduo apreende os dados perceptivos que lhe são fornecidos e o que foi preservado
pela memória, ou seja, este teste procura avaliar a capacidade de organização
perceptivo-motora, a atenção e a memória visual imediata.
É uma prova bastante utilizada em contexto clínico, mais propriamente na
avaliação da estrutura espacial e da organicidade dos défices manifestados.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
88
A prova é realizada em dois momentos, o primeiro momento é a fase do processo
da cópia e o segundo momento é a fase de reprodução de memória.
O indivíduo deverá então, num primeiro momento fazer a cópia do modelo da
Figura A ou B (dependendo da idade; Figura A aplicado a partir dos 8 anos até à idade
adulta, Figura B é aplicado dos 4 aos 7 anos de idade) e posteriormente, com um
intervalo de tempo de três minutos, fazer a reprodução de memória do mesmo desenho,
sem o ter à sua frente. A figura utilizada para a realização desta prova foi a Figura A,
devido às idades dos sujeitos deste estudo estarem compreendidas entre os 13 e os 16
anos.
As pontuações directas que são obtidas na prova são transformadas em
percentis, variando de 10 (mínimo) a 100 (máximo), considerando o percentil 50 como o
valor médio.
3.2.4. Stroop, Teste de Cores e Palavras (Charles J. Golden, 1975; adaptada
para a população espanhola por TEA-Ediciones, 2007)
Procura detectar problemas neurológicos e cerebrais, e também avaliar os efeitos
de interferência em qualquer um dos dois hemisférios, a partir da identificação de cores e
de palavras. Esta prova não depende do nível cultural do sujeito e pode ser utilizada em
diversos casos (por exemplo: lesões cerebrais, demência, psicopatologia).
Avalia a capacidade de inibição de respostas, de resolução de situações de
interferência cognitiva e de resolução de conflitos comportamentais, consideradas
processos executivos interferidos pelo lobo frontal (Adleman et al., 2002).
Investigações realizadas (Golden, 1978, cit. Golden, 2007) evidenciaram que este
teste examina processos psicológicos básicos úteis no estudo da neuropsicologia
humana e dos processos cognitivos. As dimensões básicas avaliadas, que se associam
com a flexibilidade cognitiva, a resistência à interferência procedente de estímulos
externos, a criatividade, a psicopatologia e a complexidade cognitiva, jogam um papel
evidente em muitos processos cognitivos inter-relacionados que determinam a habilidade
individual para enfrentar o stress cognitivo e processar informações complexas. Este
teste pode ser útil em estudos neuropsicológicos, neurofisiológicos, de personalidade e
de processos cognitivos em psicopatologia.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
89
Este teste apresenta três categorias: a leitura, a denominação e a interferência.
Na categoria de leitura são apresentadas, as palavras Verde, Vermelho e Azul escritas a
negro e o sujeito deverá lê-las. Na categoria de denominação, o sujeito deve indicar a cor
de um conjunto de cruzes que lhe é apresentado. A categoria de interferência, é idêntica
à categoria de leitura, a nível de material, mas cada designação de cor está impressa
numa cor que não corresponde à designada (por exemplo Verde surge escrita a Azul) e o
sujeito deve dizer a cor impressa, evitando ler o nome da cor. Posteriormente, para se
calcular o valor da pontuação de interferência pura, deve-se calcular a diferença entre PC
e PC‟ (PC estimada).
Devido a este instrumento não estar aferido para a população Portuguesa e se
encontrar apenas em versão Espanhola, partiu-se para a tradução para Português da
palavra Rojo para Vermelho.
As pontuações directas obtidas são posteriormente transformadas em Pontuações
T, que variam entre 20 (mínimo) e 80 (máximo), considerando 50 o valor médio para as
Pontuações T.
3.2.5. TRVB - Teste de Retenção Visual de Benton (Arthur L. Benton, 1945;
adaptada para a população espanhola por TEA-Ediciones, 2002)
Instrumento clínico e de investigação com o objectivo de avaliar a percepção
visual, a memória visual e as capacidades visuo-construtivas.
As três formas deste teste (Forma C, D e E) são constituídas, cada uma delas, por
10 pranchas com uma ou mais figuras.
Existem quatro tipos de administração, que se podem aplicar a qualquer uma das
três Formas. O tipo de administração escolhido para este estudo foi a Aplicação A,
justamente porque por cinco segundos poderia haver um maior risco de desinvestimento
na tarefa, devido a exigir maiores níveis de concentração prancha a prancha.
Os critérios de correcção são realizados através de uma dupla análise:
Quantitativa e Qualitativa.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
90
A análise Quantitativa é realizada através da contabilização do número de
Reproduções Correctas, que são quantificadas com base do “Tudo ou Nada” em que se
concedem 1 ou 0 pontos.
A análise Qualitativa é realizada através da Valorização de Erros específicos
cometidos que são classificados em seis categorias: Omissões, Distorções,
Perseverações, Rotações, Deslocamentos e Tamanho.
A interpretação da execução deve fazer-se com base na cotação “esperada”
correspondendo ao suposto nível intelectual original ou pré-mórbido do sujeito.
A eficiência do sujeito nesta prova é o resultado da diferença entre a Nota “Obtida”
e a Nota “Esperada”.
Nas Reproduções Correctas uma pontuação de dois pontos abaixo da esperada
pode considerar-se como “um aviso” de que está a produzir uma deterioração da função
cognitiva; uma pontuação de três pontos abaixo da esperada “sugere” esta deterioração;
uma pontuação de quatro pontos ou mais abaixo da esperada é uma “clara indicação” de
deterioração.
Na Valorização de Erros uma pontuação de três erros acima da esperada pode
considerar-se como “um aviso” de que está a ocorrer uma deterioração; uma pontuação
de quatro erros acima da esperada “sugere” essa deterioração; uma pontuação de cinco
erros ou mais acima da esperada corresponde a uma “clara indicação” dessa
deterioração.
Esta prova permite o diagnóstico de anomalias em áreas de patologia cerebral e
de organicidade.
Em Adultos mede e é especialmente sensível à Deterioração Mental e
Organicidade, tendo em conta o tipo de erros que o sujeito comete. Em Crianças mede e
é especialmente sensível à atenção e concentração.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
91
3.2.6. WCST - Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin (Robert K.
Heaton, Gordon J. Chelune, Jack L. Talley, Gary G. Kay e Glenn Curtiss, 1981; adaptada
para a população espanhola por Mª Victoria de la Cruz López, 2001)
Desenvolveu-se para avaliar o raciocínio abstracto e a capacidade de utilizar
estratégias cognitivas para resolução de problemas e sensibilidade ao feedback do meio
(Berg, 1948; Grant e Berg, 1948, cit. Heaton et al., 2001).
É considerado como uma medida da função executiva que requer capacidade
para desenvolver e manter as estratégias de resolução de problemas que sejam
adequadas para conseguir um objectivo, através de condições que implicam mudanças
de estímulos (Luria, 1973; Shallice, 1982, todos cit. Iria et al., 2008). As suas raízes
remontam a anteriores investigações sobre a abstracção (Weilgl, 1941, cit. Heaton et al.,
2001) e os efeitos das lesões no lobo frontal na manutenção da atitude cognitiva,
realizadas em pessoas e animais (Settlage, Zable e Harlow, 1948; Tender, Battersby e
Bender, 1951; Zable e Harlow, 1946, todos cit. Heaton et al., 2001). É muito popular entre
os clínicos devido à sua sensibilidade para proporcionar informação sobre disfunções
cerebrais que afectam os lóbulos frontais (Drewe, 1974; Milner, 1963; Robinson, Heaton,
Lehman e Stilson, 1980; Weinberger, Berman e Zec, 1986, todos cit. Heaton et al., 2001).
O interesse pelos efeitos que se produzem precocemente no lobo frontal, em
aspectos cognitivos e de desenvolvimento, em crianças, fez surgir um interesse
considerável para a utilização deste teste como medida potencial da função executiva em
idade escolar.
O teste é formado por quatro cartas-chave, contendo respectivamente um
triângulo vermelho, duas estrelas verdes, três cruzes amarelas e quatro círculos azuis,
dispostos horizontalmente da esquerda para a direita do sujeito, na parte superior de uma
mesa. É apresentada ao sujeito uma carta-estímulo de cada vez, para combinar com uma
destas quatro cartas-chave, seja em função da cor, da forma ou do número. É dada a
indicação ao participante de que deverá colocar cada carta-estímulo debaixo da carta-
chave que ele julgue que é a correcta e, de seguida, o investigador indica se a escolha foi
certa ou errada, de tal forma que essa informação possa ser considerada nas respostas
seguintes.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
92
O sujeito deve tentar obter o máximo de dez respostas correctas consecutivas
para cada categoria (Cor, Forma e Número), mas o critério de resposta altera-se sem
aviso prévio. O sujeito nunca é claramente informado sobre a categoria que está em
curso, mas deverá descobri-la de forma pragmática, formulando hipóteses e tendo em
conta o feedback fornecido pelo investigador. Há medida que vai realizando a prova,
deverá aperceber-se de que a regra de classificação muda e, em consequência,
modificar a sua resposta.
Há diversas formas para interpretar a baixa performance neste teste: dificuldade
em compreender a exigência da tarefa, défice na flexibilidade comportamental ligada a
um problema de inibição, dificuldade em utilizar feedbacks, dissociação entre a
capacidade de verbalizar as contingências impostas pela tarefa e a capacidade de utilizar
essa verbalização para dirigir a acção, défice quer na conceptualização dos critérios de
classificação, quer na capacidade de utilizar a informação para gerar hipóteses sobre a
maneira mais eficaz de classificar as cartas, incapacidade para controlar a performance
durante a prova a fim de manter um nível de desempenho correcto, dificuldade em inibir
respostas perseverativas e não pertinentes, défice na atenção selectiva (dificultando a
focalização da atenção sobre um e um só dos três atributos presentes em cada carta)
(Van der Linden et al., 2000, cit. Iria e Barbosa, 2008).
A performance pode ser avaliada pelo número de erros perseverativos, isto é, o
número de vezes em que o participante insiste numa resposta mesmo depois de ter sido
informado que estava errado, ou quando insiste numa classificação de acordo com uma
categoria que era correcta anteriormente, mas deixou de o ser. Esta medida foi utilizada
em vários estudos na área das neurociências visto apresentar-se como uma medida
sensível ao funcionamento pré-frontal (Lapierre, Braun e Hodgins, 1995, cit. Iria et al.,
2008).
As pontuações directas obtidas são posteriormente transformadas em Pontuações
Típicas, Pontuações T e em Centil. Para este estudo foram utilizadas as Pontuações T,
pois o Stroop também utiliza estas pontuações e ambos avaliam as funções executivas, o
que permite uma melhor comparação. As Pontuações T variam entre <20 (mínimo) e >80
(máximo), considerando 50 o valor médio para as Pontuações T.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
93
3.3. Procedimentos da Investigação
Para o processo de recolha de dados elaborou-se um pedido por escrito para a
Direcção-Geral de Reinserção Social.
Para cada criança foram necessárias aproximadamente 6 sessões, sendo as duas
primeiras sessões para a realização da Anamnese, a terceira e quarta sessão para a
realização da WISC-III (Wechsler, 2003), a quinta sessão para a realização da Figura
Complexa de Rey (Rey, 1988), Stroop - Teste de Cores e Palavras (Golden, 2007) e
TRVB - Teste de Retenção Visual de Benton (Benton, 2002) e a sexta sessão foi para a
realização do WCST - Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin (Heaton, Chelune,
Talley, Kay e Curtiss, 2001).
Contudo, o tempo das sessões dependeu da capacidade do adolescente para
colaborar na Investigação, com uma duração aproximada de 60 minutos, sendo o hiato
temporal de um dia ou uma semana como limite máximo.
3.4. Análise de Dados
Estudo de natureza exploratório, sendo os dados tratados de forma quantitativa
através do SPSS, recorrendo à versão 17.0 do programa informático Statiscal Package.
Os dados relativos às características sócio-demográficas da amostra e dos
resultados obtidos nos diferentes testes utilizados no estudo foram submetidos as
diversas análises estatísticas (médias, desvio padrão e frequências) e análise qualitativas
desses mesmos resultados.
Para verificar a existência de correlações significativas inter-teste e intra-teste
procedeu-se à análise de correlações de Spearman.
Para classificar intensidade das correlações significativas utilizamos a
classificação de Bryman e Cramer (2003): .20 (muito baixa), .20 e .40 (baixa), .40
e .70 (moderada), .70 e .90 (alta), .90 (muito alta).
O valor do nível de significância pré-estabelecido foi de p≤.05, p≤.01.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
94
Para estudarmos a existência de diferenças significativas entre as variáveis sócio-
demográficas da amostra optamos por utilizar o Teste Não Paramétrico de Mann-
Whitney. Esta opção de utilizar este teste foi devida ao tamanho da amostra que de
acordo, como recomenda a literatura (Pestana e Gageiro, 2005), é um teste preferível ao
Teste t, quando se viola a normalidade para números menores ou iguais a 30, ou quando
se trata de variáveis de nível ordinal com duas ou três categorias.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
95
Capítulo 4: Resultados
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
96
De seguida apresentam-se os resultados obtidos no estudo, que foram divididos em
duas partes. (1) Numa primeira parte encontram-se as correlações significativas dos
resultados dos testes utilizados neste estudo e (2) numa segunda parte os resultados do
estudo empírico para obter as características neuropsicológicas dos adolescentes
delinquentes institucionalizados.
(1) Correlações Significativas Inter-Teste e Intra-Teste
Através da análise dos resultados apresentados na tabela 4, verificamos que
existem correlações positivas e negativas entre os resultados dos testes. Contudo, nem
todas resultaram estatisticamente significativas.
Correlações Significativas Inter-Teste
Para a WISC-III (Wechsler, 1949) identificaram-se para o QIG uma correlação
positiva significativa com o processo de Memória, da Figura Complexa de Rey (Rey,
1942), de intensidade baixa (r = .383) e para o QIR apenas uma correlação positiva
significativa com o processo de Memória, da Figura Complexa de Rey.
No Stroop (Golden, 1975), os resultados encontrados evidenciam correlações
significativas positivas entre a prova P com o QIG e QIV, ambos de intensidade
moderada (r = .447) e (r = .513) respectivamente, e também com QIR, de intensidade
baixa (r = .384); para a prova C verificam-se correlações positivas significativas com o
QIG, QIR e QIV, todos de intensidade moderada (r = .525), (r = .444) e (r = .570)
respectivamente.
A Forma C, Reproduções Correctas, do TRVB (Benton, 1945), apresenta
correlações negativas significativas com o Q.I.G. e com o Q.I.V., ambos de intensidade
baixa (r = -.380) e (r = -.369) respectivamente; os resultados da Forma D, Reproduções
Correctas, revelam apenas uma correlação positiva significativa com a prova PC, do teste
de Stroop, de intensidade baixa (r = .383); a Forma D, Valorização de Erros, apresenta
correlações significativas negativas com o processo de Cópia, da Figura Complexa de
Rey, de intensidade moderada (r = -.417) e com a prova PC, do Stroop, de intensidade
baixa (r = -.386); a Forma E, Reproduções Correctas, revela unicamente uma correlação
significativa positiva com o processo Cópia, da Figura Complexa de Rey, de intensidade
baixa (r = .373); a Forma E, Valorização de Erros correlaciona-se significativa e
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
97
negativamente com o processo de Cópia, da Figura Complexa de Rey, de intensidade
moderada (r = -.428).
Os resultados do WCST (Heaton, Chelune, Talley, Kay e Curtiss, 1981)
apresentam correlações negativas significativas entre o Número Total de Erros, e o
processo de Memória, da Figura Complexa de Rey, de intensidade baixa (r = -.373); entre
as Respostas Perseverativas e o processo de Memória, da Figura Complexa de Rey, de
intensidade baixa (r = -.363); entre os Erros Não Perseverativos e o processo de
Memória, da Figura Complexa de Rey, o QIV e a prova P, do Stroop, ambos de
intensidade baixa (r = -.397) e (r = -.373) respectivamente.
Correlações Intra-Teste
Através da análise realizada, verifica-se uma correlação significativa positiva entre
o processo de Memória e o processo de Cópia, da Figura Complexa de Rey, de
intensidade moderada (r = .474).
Para a WISC-III verificaram-se correlações significativas positivas de intensidade
muito alta entre QIR e QIG (r = .938) e entre QIV e QIG (r = .950), o QIV apresenta
também uma correlação positiva significativa de intensidade alta com o QIR (r = .798).
Em relação ao Teste de Stroop, observaram-se correlações positivas significativas
entre a prova C e a prova P, de intensidade alta (r = .729), entre a prova PC e a prova P,
de intensidade baixa (r = .363) e entre a prova PC e a prova C, de intensidade moderada
(r = .488).
No TRVB os resultados obtidos demonstram correlações significativas positivas
entre a Forma C com as Formas D e E, todas Reproduções Correctas, de intensidade
alta (r = .712) e de intensidade moderada (r = .562) respectivamente; entre as Formas D
e E, ambas Reproduções Correctas, de intensidade moderada (r = .636); entre a Forma C
e as Formas D e E, todas Valorizações de Erros e de intensidade moderada (r = .652) e (r
= .570) respectivamente; entre as Formas D e E, ambas Valorizações Erros, de
intensidade moderada (r = .650). Demonstraram-se ainda correlações negativas
significativas entre a Forma C, Reproduções Correctas e as Formas C, D e E, todas
Valorizações de Erros, de intensidade alta (r = -.857) e de intensidade moderada (r = -
.524) e (r = -.550) respectivamente; entre a Forma C, Valorização de Erros e as Forma D,
Reproduções Correctas, de intensidade alta (r = -.774) e, com a Forma E, Reproduções
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
98
Correctas, de intensidade moderada (r = -.581); entre a Forma D, Reproduções Correctas
e as Formas D e E, Valorizações de Erros, de intensidade alta (r = -.886) e de intensidade
moderada (r = -.610) respectivamente; entre a Forma D, Valorização de Erros e a Forma
E, Reproduções Correctas, de intensidade moderada (r = -.559); e as Reproduções
Correctas e a Valorização de Erros, ambas da Forma E, de intensidade alta (r = -.866).
Os resultados obtidos no WCST revelam correlações positivas significativas entre
as Respostas Perseverativas e o Número Total de Erros, de intensidade muito alta
(r = .936); entre Erros Perseverativos e o Número Total de Erros, de intensidade muito
alta (r = .936) e as Respostas Perseverativas também de intensidade muito alta
(r = .993); entre os Erros Não Perseverativos e o Número Total de Erros de intensidade
muito alta (r = .963) e as Respostas Perseverativas e os Erros Não Perseverativos,
ambos de intensidade alta (r = .830) e (r = .829) respectivamente.
99
*p≤.05; **p≤ .01
FCRC FCRM QIG QIR QIV SP SC SPC TRVBCC TRVBCE TRVBDC TRVBDE TRVBEC TRVBEE WCSTNE WCSTRP WCSTEP WCSTENP
FCRC
1.000
FCRM
.474
(**)
1.000
QIG
.258
.383
(*)
1.000
QIR
.316
.392
(*)
.938
(*)
1.000
QIV
.179
.329
.950
(**)
.798
(**)
1.000
SP
-.059
.117
.447
(*)
.384
(*)
.513
(**)
1.000
SC
-.067
.279
.525
(**)
.444
(*)
.570
(**)
.729
(**)
1.000
SPC
.115
.253
.189
.150
.196
.363
(*)
.488
(**)
1.000
TRVBCC
.181
-.132
-.380
(*)
-.338
-.369
(*)
-.062
-.154
.188
1.000
TRVBCE
-.188
.028
.303
.276
.269
-.004
.042
-.231
-.857
(**)
1.000
TRVBDC
.313
.103
-.186
-.173
-.160
.098
.102
.383
(*)
.712
(**)
-.774
(**)
1.000
TRVBDE
-.417
(*)
-.162
-.049
-.003
-.112
-.153
-.175
-.386
(*)
-.524
(**)
.652
(**)
-.886
(**)
1.000
TRVBEC
.373
(*)
.142
-.057
.002
-.080
.160
.175
.203
.562
(**)
-.581
(**)
.636
(**)
-.559
(**)
1.000
TRVBEE
-.428
(*)
-.104
-.130
-.137
-.164
-.174
-.252
-.121
-.550
(**)
.570
(**)
-.610
(**)
.650
(**)
-.866
(**)
1.000
WCSTNE
-.102
-.373
(*)
-.273
-.190
-.341
-.272
-.178
-.141
.208
-.002
-.028
.072
-.070
.103
1.000
WCSTRP
-.029
-.363
(*)
-.185
-.119
-.248
-.170
-.069
-.042
.247
-.017
.002
.030
.086
-.042
.936
(**)
1.000
WCSTEP
-.032
-.347
-.140
-.073
-.200
-.131
-.024
-.037
.205
-.009
.010
.004
.073
-.040
.936
(**)
.993
(**)
1.000
WCSTENP
-.214
-.391
(*)
-.343
-.277
-.397
(*)
-.373
(*)
-.237
-.189
.185
-.008
-.049
.122
-.159
.194
.963
(**)
.830
(**)
.829
(**)
1.000
Tabela 4
Correlações Significativas Intra-Teste e Inter-Teste
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
100
(2) Resultados do Estudo Empírico para obter as características
neuropsicológicas dos adolescentes institucionalizados
Média dos Resultados da WISC-III
De acordo com os resultados apresentados na Tabela 5 obtidos com o cálculo da
média dos resultados obtidos do QIG, QIV e QIR da WISC - III, permitem-nos verificar,
que os resultados do QIG estão situados abaixo da média, o que representa um QI
Inferior, tendo em consideração a classificação apresentada pelo manual do teste e na
tabela 5.
Relativamente aos resultados médios obtidos no QIR, o valor situa-se dentro da
média, representando um QI Médio-Inferior.
No entanto, no QIV, verifica-se que a média dos resultados obtidos encontram-se
também abaixo da média, representando um QI Inferior.
No total dos 31 sujeitos, 14 apresentam um QIG entre 42-69 que corresponde a
um QI Muito Inferior; 9 apresentam um QIG entre 71-79 que equivale a um QI Inferior; 2
apresentam um QIG entre 83-86 que corresponde a um QI Médio Inferior; os restantes 6
sujeitos apresentam um QIG entre 92-108 que equivale a um QI Médio.
No QIR dos 31 dos sujeitos, 9 apresentam um QIR entre 46-69 que corresponde a
um QI Muito Inferior; 5 apresentam um QIR entre 72-77 que equivale a um QI Inferior; 5
apresentam um QIR entre 82-87 que corresponde a QI Médio Inferior; 9 apresentam um
QIR entre 90-109; os restantes 3 apresentam um QIR entre 113-115 que corresponde a
um QI Médio Superior.
Em relação ao QIV dos 31 sujeitos, 19 apresentam um QIV entre 47-69 que
equivale a um QI Muito Inferior; 5 apresentam um QIV entre 75-78 que corresponde a um
QI Inferior; 4 apresentam um QIV entre 80-84 que corresponde a um QI Médio-Inferior; 3
apresentam um QIV entre 91-110 que corresponde a um QI Médio Superior.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
101
Tabela 5
Média dos Resultados da WISC-III (David Wechsler, 1949; adaptada para a população
portuguesa pelo Professor Mário Simões, 2003)
Média Desvio Padrão
Q.I. Global 72.10 16.654
Q.I. Verbal 68.48 14.855
Q.I. Realização 82.45 19.204
Média dos Resultados da Figura Complexa de Rey
Através da análise da Tabela 6, verifica-se que os sujeitos no processo de Cópia
se encontram dentro da média a nível percentil, enquanto no processo de realização de
Memória o percentil dos resultados obtidos se encontra abaixo da média.
No processo de Cópia, dos 31 sujeitos, 12 situam-se abaixo do percentil 50, ou
seja, estão abaixo da média, os restantes 19 situam-se no entre o percentil 50 e acima
deste percentil, isto é, estão acima da média.
No processo de Reprodução de Memória, dos 31 sujeitos, 17 estão abaixo do
percentil 50, ou seja, estão abaixo da média, enquanto 14 estão entre o percentil 50 e
acima deste valor, ou seja, situam-se na média e acima da média.
Tabela 6
Média dos Resultados dos Percentis da Figura Complexa de Rey (André Rey, 1942; adaptada
para a população portuguesa por António Rocha e Maria Helena Coelho, 1988)Tabela 6
Média Desvio Padrão
Fig. Comp. Rey (PD) Cópia 31.87 2.872
Memória 19.65 6.058
Fig. Comp. Rey (PC) Cópia 50.52 24.811
Memória 39.68 28.488
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
102
Média dos Resultados da Pontuação T do Teste de Cores e Palavras de Stroop
Pela análise da Tabela 7, podemos observar através das médias obtidas das
Pontuações T, que os resultados dos três subtestes (Palavras, Cor e Palavras-Cor) se
situam abaixo da média. No entanto, a média do valor da Interferência obtida pelas
Pontuações T situa-se dentro da média.
Dos 31 sujeitos, apenas 2 estão situados entre 50-58 das Pontuações T e
somente no subteste de Palavra-Cor, porque quer no subteste de Palavras, quer no
subteste de Cor, todos os 31 sujeitos se situam abaixo da Pontuação T 50. A nível da
Interferência, 10 sujeitos, dos 31 inquiridos, estão entre 40-48 das Pontuações T,
enquanto os restantes 21 sujeitos situam-se entre 50-72 das Pontuações T.
Tabela 7
Média dos Resultados da Pontuação T do Teste de Cores e Palavras de Stroop (Charles J.Golden,
1975, adaptação espanhola pelo Departamento de I+D de TEA Ediciones, S.A.)
Média Desvio Padrão
Palavras 32.97 7.078
Cor 34.90 7.480
Palavras-Cor 39.68 6.635
Interferência 52.77 6.960
Média dos Resultados das Diferenças entre Nota Obtida e Nota Esperada do
Teste de Retenção Visual de Benton
Ao observar a Tabela 8 verifica-se que na Forma C, Reproduções Correctas, a
nota média calculada foi de -0.81, que corresponde a uma não existência de deterioro,
assim como a média de 2.13 na Valorização de Erros, uma vez que apenas é
considerado deterioro com uma diferença ou valor inferior a dois pontos abaixo da
esperada, nas Reproduções Correctas, e com uma diferença ou valor superior a três
pontos acima da esperada, na Valorização de Erros, conforme o manual do TRVB.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
103
No entanto, na Forma D, a média calculada para as Reproduções Correctas foi de
-1.68 e este resultado aproxima-se de um “aviso de deterioro” e o mesmo se verifica pela
média de 3.39 calculada na Valorização de Erros que corresponde a um “aviso de
deterioro”, uma vez que apenas é considerado deterioro com uma diferença ou valor
inferior a dois pontos abaixo da esperada, nas Reproduções Correctas, e com uma
diferença ou valor superior a três pontos acima da esperada, na Valorização de Erros,
conforme o manual do TRVB.
Na Forma E, quer a média calculada para as Reproduções Correctas (aviso de
deterioro), quer para a Valorização de Erros, indicam uma não existência de deterioro,
uma vez que apenas é considerado deterioro com uma diferença ou valor inferior a dois
pontos abaixo da esperada, nas Reproduções Correctas, e com uma diferença ou valor
superior a três pontos acima da esperada, na Valorização de Erros, conforme o manual
do TRVB.
Na Forma C, Reproduções Correctas, 17 sujeitos não apresentam deterioro
cognitivo, 9 apresentam um “aviso” de que se está a produzir uma deterioração da função
cognitiva, 3 apresentam uma “sugestão” de ocorrência de deterioro e 2 apresentam uma
“clara indicação” de deterioro. Através da avaliação pela Valorização de Erros, na Forma
C, verifica-se que 15 sujeitos não apresentam deterioro das funções cognitivas, mas 5
sujeitos apresentam um “aviso” de deterioração, 4 sujeitos apresentam uma “sugestão”
de ocorrência desse deterioro e 7 sujeitos apresentam uma “clara indicação” de
deterioração das funções cognitivas.
Através da análise das Reproduções Correctas, da Forma D, dos 31 sujeitos
avaliados, 16 não apresentam deterioro, 3 apresentam um “aviso” de deterioração, 4
apresentam uma “sugestão” de deterioração e 8 apresentam uma “clara indicação” de
deterioração. Na análise da Valorização de Erros, 14 dos sujeitos avaliados não
apresentam indicação de deterioração, 1 apresenta um “aviso” de deterioração, 3
apresentam uma “sugestão” de deterioração das funções cognitivas e 13 apresentam
uma “clara indicação” de ocorrência de deterioração.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
104
Pela análise da Forma E, Reproduções Correctas, 16 sujeitos não apresentam
deterioração, 5 apresentam um “aviso” de deterioração, 4 apresentam uma “sugestão” de
deterioração e 6 apresentam uma “clara indicação” de deterioração das funções
cognitivas. Na análise da Valorização de Erros, 16 sujeitos não apresentam qualquer
indicação de deterioração, 4 apresentam um “aviso” de deterioração, 2 apresentam uma
“sugestão” de deterioração e 9 apresentam uma “clara indicação” de deterioração das
funções cognitivas.
Tabela 8
Média dos Resultados das Diferenças entre Nota Obtida e Nota Esperada do Teste de Retenção Visual de
Benton (Arthur L. Benton, 1945, adaptação espanhola pelo Departamento I+D de TEA Ediciones, S.A.)
Média Desvio Padrão
Forma C Reproduções correctas -.81 1.973
Valorização de erros 2.13 3.374
Forma D Reproduções correctas -1.68 2.197
Valorização de erros 3.39 4.702
Forma E Reproduções correctas -1.45 2.047
Valorização de erros 2.35 3.980
Média dos Resultados da Pontuação T do Teste de Classificação de Cartas de
Wisconsin
Pela análise da Tabela 9, verifica-se que os resultados médios das Pontuações T
obtidos pelos sujeitos no Número de Erros situam-se dentro da média, assim como nas
Respostas Perseverativas, Erros Perseverativos e Erros Não Perseverativos.
Pela observação da categoria do Número Total de Erros, 9 sujeitos, dos 31
avaliados, estão abaixo da Pontuação T 50 e 22 estão acima da Pontuação T 50.
Na categoria de Respostas Perseverativas, 9 sujeitos estão abaixo da Pontuação
T 50 e 22 estão acima da Pontuação T 50.
Na categoria de Erros Perseverativos, 8 sujeitos estão abaixo da Pontuação T 50
e 23 estão acima da Pontuação T 50.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
105
Na análise da categoria de Erros Não Perseverativos, 9 sujeitos estão abaixo da
Pontuação T 50 e 22 estão acima da Pontuação T 50.
Tabela 9
Média dos Resultados da Pontuação T do Teste de Classificação de Cartas de Wisconsin (Robert
K. Heaton, Gordon J. Chelune, Jack L. Talley, Gary G. Kay & Glenn Curtiss, 1981; adaptação
espanhola por Mª Victoria de la Cruz do Departamento de I+D de TEA Ediciones, S.A.)
Média Desvio Padrão
Número Total de Erros 53.71 10.982
Respostas Perseverativas 56.06 12.364
Erros Perseverativos 56.00 12.337
Erros Não Perseverativos 52.03 9.941
Verificação de existência de diferenças significativas entre as variáveis sócio-
demográficas em função do rendimento dos testes utilizados
Para analisar a existência de diferenças significativas entre as variáveis sócio-
demográficas, nomeadamente Ciclo de estudos a que pertence, Habitação com os Pais,
Consumo de Drogas, Medicação, Modo de actuar, Posse de Arma ilegal, Actos ilegais
cometidos e Antecedentes Familiares utilizamos o Teste de Mann-Whitney. Contudo, não
foram encontradas diferenças significativas em nenhuma das variáveis.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
106
Capítulo 5: Discussão e Conclusões do Estudo
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
107
Discussão
Neste capítulo pretendemos a partir da interpretação dos nossos resultados,
realizar uma discussão dos mesmos, procurando uma comparação dos nossos
resultados com os encontrados na literatura sobre o tema.
Correlações Significativas dos Resultados dos Testes
Pode-se definir Correlação como uma força e direcção do relacionamento linear
entre duas variáveis aleatórias, mas isto não implica uma causalidade. Neste sentido
geral, existem vários coeficientes que medem o grau de correlação adaptados à natureza
dos dados. O coeficiente de correlação utilizado para este estudo foi o de Spearman que
mede a intensidade da relação entre variáveis ordinais e, não é sensível a assimetrias na
distribuição (Pestana e Gageiro, 2000).
No nosso estudo, foram encontradas correlações estatisticamente significativas,
positivas e negativas. As correlações são positivas, se a variação entre as variáveis for
no mesmo sentido, ou negativas, se a variação entre as variáveis for em sentido
contrário, ou seja, se os aumentos de uma variável estiverem associados a diminuições
da outra.
(1) Correlações Significativas Inter-Teste
Analisando as correlações, pudemos verificar que os resultados do QIG
apresentou correlações positivas significativas com o teste da Figura Complexa de Rey
(Rey, 1988) processo de Memória e com o Teste de Stroop (Golden, 2007), prova P e C,
e correlações significativas negativas com o TRVB (Benton, 2002), Forma C,
Reproduções Correctas.
O QIR apresentou correlações positivas significativas com o teste da Figura
Complexa de Rey (Rey, 1988), processo de Memória e com o Teste de Stroop (Golden,
2007), prova P e C.
O QIV apresentou correlações significativas positivas com o Teste de Stroop
(Golden, 2007), prova P e C, e correlacionou-se negativamente com o TRVB (Benton,
2002), Forma C, Reproduções Correctas e o WCST (Heaton et al., 2001) com o critério
de Erros Não Perseverativos.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
108
Estas correlações podem sugerir que o rendimento destes testes pode estar
influenciado pelo nível intelectual dos sujeitos, principalmente nas correlações que
apresentam valores mais elevados, dado que, quanto maior é o resultado da correlação,
melhor é a relação que existe entre as variáveis.
A Forma D, Reproduções Correctas, correlacionou-se significativa e positivamente
com o Teste de Stroop (Golden, 2007), prova PC, já a Valorização de Erros, da mesma
forma, apresentou correlações significativas negativas com o teste da Figura Complexa
de Rey (Rey, 1988), processo de Cópia e com Teste de Stroop (Golden, 2007), prova PC.
As correlações existentes entre a Forma D, Reproduções Correctas e o Teste de
Stroop (Golden, 2007), prova PC evidenciam que o rendimento de uma está dependente
da outra, apresentando um valor da correlação alto, já a Valorização de Erros
correlaciona-se negativa e significativamente com o Teste de Stroop (Golden, 2007),
prova PC, pois quanto menores forem os resultados de um, maiores serão os resultados
do outro.
A correlação existente entre a Forma D, Valorização de Erros e o processo de
Cópia, da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), é significativa e negativa pois quanto
mais elevados forem os resultados na Valorização de Erros, pior será o resultado do
processo de Cópia da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988).
Os resultados das correlações entre estas provas, reforçam a existência de uma
relação entre a actividade perceptivo-visual, e estratégia comportamental (programação),
tal como Gil (2001) refere existir.
A Forma E, Reproduções Correctas, apresentou correlações significativas
positivas com o teste da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), processo de Cópia e a
Forma E, Valorização de Erros, correlaciona-se significativa e negativamente com o teste
da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), processo Cópia.
Neste caso particular existe uma relação entre as pontuações obtidas entre o
TRVB (Benton, 2002) e a Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), uma vez que ambas
avaliam a área visuo-construtiva. Quanto maiores forem os resultados obtidos nas
Reproduções Correctas do TRVB (Benton, 2002), melhor serão os resultados do
processo de Cópia da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), correlacionando-se por isso
positiva e significativamente. Quanto à Valorização de Erros, quanto maiores forem os
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
109
resultados obtidos nesta categoria, menores serão os resultados obtidos no processo de
Cópia da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), correlacionando-se desta forma
significativa e negativamente.
As categorias de Número Total de Erros e de Respostas Perseverativas do WCST
(Heaton et al., 2001), apresentaram correlações significativas negativas com o teste da
Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), processo de Memória, e a categoria de Erros Não
Perseverativos apresentou correlações significativas negativas quer com o Teste de
Stroop (Golden, 2007), prova P e com o teste de Figura Complexa de Rey (Rey, 1988),
processo de Memória.
As correlações existentes entre a categoria de Erros Não Perseverativos, do
WCST (Heaton et al., 2001) e a prova P, do Teste Stroop (Golden, 2007) eram
esperadas, na medida em que a escala que quantifica o rendimento é inversa. Ou seja,
quanto maior o número de erros na categoria do WCST (Heaton et al., 2001), menor é o
rendimento na prova P do Teste de Stroop (Golden, 2007). A existência desta correlação
estatisticamente significativa reforça também a validade concorrente entre estes dois
testes. Ou seja, ambos estão a medir os mesmos constructos, neste caso, funções
executivas.
(2) Correlações Significativas Intra-Teste
As correlações significativas positivas Intra-Teste encontradas foram entre o
processo da Cópia e o processo de Memória da Figura Complexa de Rey (Rey, 1988);
entre o QIG com o QIR e QIV e entre o QIR e QIV da WISC-III (Wechsler, 2003); entre a
prova C e P e entre a prova PC com a prova P e C do Teste de Stroop (Golden, 2007); no
TRVB (Benton, 2002) as correlações positivas encontradas foram entre as três Formas,
C, D e E, das Reproduções Correctas e entre as três Formas, C, D e E, da Valorização
de Erros, as correlações negativas encontradas foram entre as Reproduções Correctas e
a Valorização de Erros das três Formas; entre as Respostas Perseverativas com o
Número Total de Erros, Erros Perseverativos e Erros Não Perseverativos, entre os Erros
Perseverativos com o Número Total de Erros e os Erros Não Perseverativos, entre Erros
Não Perseverativos e o Número Total de Erros.
Analisando as correlações encontradas intra-teste verifica-se que todos
apresentaram correlações estatisticamente significativas. Perante este resultado,
podemos concluir que a validade destes testes fica bastante reforçada.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
110
Discussão dos Resultados do Estudo Empírico para obter as características
neuropsicológicas dos adolescentes institucionalizados
A média dos resultados obtidos na WISC-III (Wechsler, 2003) aponta para um QIG
Inferior, um QIV Inferior e um QIR Médio-Inferior, o que de acordo com a literatura é um
resultado esperado nesta população. Segundo Walsh e Beyer (1986), Moffitt (1990,
1993), Vermeiren, Clippele, Schwab-Stone, Ruchkin e Deboutte (2002) a diferença entre
o QIV e o QIR, em que a performance verbal é inferior à de realização, aponta para uma
correlação directa com a delinquência juvenil, uma vez que um défice verbal pode afectar
de forma negativa o desenvolvimento de estratégias de auto-controlo. A aprendizagem
também pode ser afectada diminuindo o sucesso escolar e existe também a hipótese de
uma baixa inteligência provocar uma interacção menos positiva com os progenitores.
Os problemas associados a este défice na inteligência são os problemas de
aprendizagem e os distúrbios comportamentais, sendo estes distúrbios apontados não só
como causa, mas também como efeito, segundo defendem Howlin e Rutter (1987), Frick
et al. (1991), Hinshaw (1992), Maughan, Pickles, Hagell, Rutter e Yule (1996), citados por
Vermeiren et al. (2002).
Quanto à influência do abuso de estupefacientes por adolescentes no
funcionamento neuropsicológico, não foram encontrados dados conclusivos que
demonstrassem essa correlação, como concluíram os autores Teichner, Donohue, Crum,
Azrin e Golden (2000). Contudo, seria de esperar que adolescentes que delinquíssem
precocemente apresentassem um nível baixo de QI nomeadamente em testes verbais e
défices de auto-controlo.
O facto de neste estudo se ter obtido um QIV baixo é compatível com a descrição
do DSM-IV-TR (2002) em que indivíduos com Perturbação do Comportamento
apresentam um QIV Inferior à média, situando-se abaixo do nível esperado para a idade
e inteligência do indivíduo, podendo adicionar-se o diagnóstico de Perturbação da
Aprendizagem ou da Comunicação. Já Fergusson e Horwood (1995), Martin e Loeber
(1996) apontam para um QIG Médio-Inferior sendo compatível com um nível baixo de
desenvolvimento cognitivo, e o QI obtido neste estudo foi um QIG Inferior, não se
afastando muito do resultado obtido pelos autores mencionados.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
111
Em relação à média alcançada pelos resultados obtidos no processo de Cópia da
Figura Complexa de Rey (Rey, 1988), constata-se que os mesmos se encontram
situados nos padrões considerados normais, enquanto no processo de Memória a média
obtida situa-se abaixo do padrão de normalidade.
O processo de Cópia avalia a actividade perceptiva, que é influenciada pela
atenção e concentração, verificando-se neste estudo que o seu rendimento que depende
também destas funções não se encontra afectado, não se verificando também uma
alteração na actividade perceptiva. No entanto, a Memória Visual Imediata encontra-se
deteriorada, o que levanta a hipótese de uma alteração a nível da capacidade de
organização afectando a capacidade de memória dos sujeitos.
Segundo Moffitt (1990), Raine (1993), Henry et al. (1997), Fishbein (2000), Nigg et
al. (2002), e Ishikawa et al. (2002), todos citados por Raine et al. (2005) sobre esta
temática os comportamentos anti-sociais focam principalmente as funções executivas e
verbais, não dando grande importância às funções de memória. No entanto, existem
estudos que sugerem que a existência de danos ao nível da memória em grupos
violentos e anti-sociais (Brickman et al., 1984; Cohen et al., 1999; Moffitt et al., 2001;
Sigurdsson et al., 2001; Teichner et al., 2001; Dolan et al., 2002; Seguin et al. 2002;
Vermeiren et al., 2002, todos cit. Raine et al., 2005), o que sustenta os resultados
encontrados neste teste.
Estes resultados podem sugerir uma alteração quer a nível da memória, quer a
nível da atenção, não conseguindo por isso formular objectivos voluntariamente,
planificar, executar planos intencionais e dirigidos, executar de forma eficaz a
performance e ainda não conseguir verificar, corrigir e inflectir as acções, segundo Lezak
(1983) e Luria (1973), citado por Braun (2000).
Pode-se considerar a hipótese de existirem alterações a nível da capacidade de
armazenamento e de manipular a informação, afectando assim o desempenho das
tarefas cognitivas tais como o raciocínio, a compreensão e a resolução de problemas.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
112
Ao analisar a média das Pontuações T dos resultados obtidos nos três subtestes
(Palavra, Cor e Palavra-Cor) do Teste de Cores e Palavras de Stroop (Golden, 2007),
verificou-se que os mesmos situam abaixo da média, o que sugere, segundo Golden
(1978, cit. Golden, 2007), a existência de uma alteração a nível do hemisfério esquerdo,
responsável pela leitura das palavras, e também uma alteração no hemisfério direito,
responsável pela nomeação das cores.
Podendo também levantar a hipótese de existir um défice de atenção, por
dificuldades de concentração, principalmente na manutenção desta por determinado
período de tempo, como sugere Quay (1987).
Quanto ao valor obtido na Interferência, o mesmo situa-se dentro da média, não
indo de encontro ao que a literatura referência quanto à existência de uma alteração
frontal.
No que diz respeito à média dos resultados obtidos no TRVB (Benton, 2002),
verifica-se um “aviso de deterioro” quer nas Reproduções Correctas, quer na Valorização
de Erros, da Forma D, o que representa uma alteração a nível da interacção dos factores
visuo-construtivos, visuo-motores e memória visual, segundo a teoria de Silverstein
(1962, cit. Benton, 2002), embora este autor não considere que este resultado se deva a
uma diminuição da memória imediata. No entanto, como se utilizou a aplicação A, não se
pode considerar apenas como uma tarefa visuo-construtiva, porque em muitos casos o
factor memória influencia o rendimento das provas.
Os resultados médios obtidos pelas categorias Número Total de Erros, Respostas
Perseverativas, Erros Perseverativos e Erros Não Perseverativos, do WCST (Heaton et
al., 2001), situam-se nos padrões normais.
Apesar dos resultados da amostra total se situar na média, alguns destes
indivíduos apresentam valores abaixo da média, o que pode sugerir alterações ao nível
frontal pois cometeram mais Erros Perseverativos. Segundo Barkley, Grodzinsky e
DuPaul (1992), citados por Heaton et al. (2001), é o que acontece com menores que
apresentam défices de atenção com hiperactividade que, têm mais dificuldade de
completar menos categorias, fornecendo mais respostas perseverativas e erros
perseverativos.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
113
Alguns destes indivíduos tomam medicação psiquiátrica e por isso, pensamos
que, este seja um factor que pode ter influenciado o rendimento dos testes. Ou seja, o
rendimento dos testes, nomeadamente do Teste de Cartas de Wisconsin (Heaton et al.,
2001) e Teste de Stroop (Golden, 2007), poderia ter sido inferior, caso não existisse um
suporte compensatório, como sugere Golden (1976, cit. Golden, 2007).
O que se vai verificando ao longo dos resultados obtidos neste estudo, é que
estes indivíduos apresentam alguns problemas cognitivos (memória imediata, funções
executivas, concentração, défice de atenção, défice na leitura, raciocínio, a compreensão
e a resolução de problemas), a nível académico e pobre relacionamento social como
sugere Campbell e Werry (1986), citado por Quay (1987).
Quanto ao facto de consumirem estupefacientes há pouco tempo, pois ainda são
menores, poderá contribuir para o facto de ainda não haver alterações neuropsicológicas
significativas. Pensamos que avaliássemos estes indivíduos numa fase posterior a um
consumo continuado, seria possível encontrar alterações a nível neuropsicológico.
Em relação aos antecedentes familiares, alguns destes indivíduos apresentam
factores de risco nesta vertente, tais como comportamento parental anti-social, consumo
de estupefacientes e práticas de educação de baixa qualidade, como sugerem
Wasserman (1996) e Wasserman et al. (2004), muitos deles apresentavam também,
desestruturação familiar, pais divorciados e psicopatologia parental, sendo também um
factor de risco que contribuem para as atitudes delinquentes, como sugerem
Hetherington (1989), Costello (1997), Farrington (1995).
No que toca ao envolvimento com os pares, muitos dos sujeitos inquiridos
preferiam actuar em grupo, o que vai de encontra a outro factor de risco que fomenta a
delinquência, como sugere Simons (1994), citado por Wasserman (2004).
Apresentavam também factores de risco escolares, nomeadamente ao nível do
baixo desempenho escolar, desmotivação e baixas aspirações educacionais, como
sugerem Hawkins (1998), LeBlanc, Coté e Loeber (1991), todos citados por Wasserman
et al. (2004).
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
114
Para finalizar, queremos dizer que o facto de não terem sido encontradas
diferenças estatisticamente significativas entre as variáveis sócio-demográficas no
rendimento dos testes, pode estar relacionado com o tamanho da amostra e
homogeneidade da mesma. Todavia, o objectivo principal deste trabalho de investigação
era o de estudar apenas um grupo de adolescentes que delinquiram e que, fosse
representativo de uma Instituição de Reinserção Social. Contudo, sabemos que se o
estudo tivesse sido alargado a outras Instituições, para além de um maior número de
sujeitos na amostra, os resultados obtidos poderiam ter sido outros.
Conclusões
De acordo com os objectivos gerais deste trabalho de investigação, e a partir dos
nossos resultados, podemos extrair as seguintes conclusões que passamos a expor:
1) Este trabalho permitiu demonstrar a existência de alterações neuropsicológicas no
grupo de adolescentes que delinquiram, nomeadamente, a nível da memória
imediata, das funções executivas, funções verbais e atencionais e que,
corroboram com alguns estudos referenciados na literatura;
2) Através das correlações estatisticamente significativas obtidas, pudemos observar
que o nível intelectual pode influenciar o rendimento dos testes utilizados neste
estudo e que, a validade dos mesmos fica bastante reforçada.
3) Não se verificaram diferenças estatisticamente significativas entre as variáveis
sócio-demográficas, nomeadamente Ciclo de estudos a que pertence, Habitação
com os Pais, Consumo de Drogas, Medicação, Modo de actuar, Posse de Arma
ilegal, Actos ilegais cometidos e Antecedentes Familiares, no rendimento dos
testes;
4) Foram identificados factores de risco para a delinquência no grupo de
adolescentes em estudo, nomeadamente, antecedentes familiares, envolvimento
com os pares e baixo rendimento escolar.
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
115
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Ana Sofia Beça Ribas da Silva
120
Anexos I
Entrevista Semiestruturada para Realização de Anamnese
AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DE LURIA
(TRADUZIDA E ADAPTADA SOB AUTORIZAÇÃO1)
LUIS ACR MAIA, PHD; MANUEL S LOUREIRO, PHD E CARLOS F SILVA PHD
UNIVERSIDADE DA BEIRA INTERIOR
DEPARTAMENTO DE PSICOLOGIA E EDUCAÇÃO
PROVAS DE EXPLORAÇÃO, CONDUTA DO PACIENTE E LOCALIZAÇÃO CEREBRAL
DOS TRANSTORNOS NEUROSPICOLÓGICOS NUMA SÍNTESE PRÁTICA
MANUAL
1 Traduzida e adaptada da versão espanhola Christensen AL (1987) El diagnóstico neuropsicológico de
Luria. Aprendizaje Visor, com autorização da autora para utilização experimental.
Luria Neuropsychological Investigation – Versão experimental
Universidade da Beira Interior – Departamento de Psicologia e Educação
2
B - A ENTREVISTA PRÉVIA
____________________________________________
1. ESTADO DE CONSCIÊNCIA DO PACIENTE
ORIENTAÇÃO
a. Como se chama? _______________________________________________
b. Onde nasceu? __________________________________________________
c. Que dia é hoje? ___ Em que mês estamos? ___ Em que ano estamos?___
Que horas são? ______________ O que fez hoje?
_____________________________________________________________
d. E ontem? _____________________________________________________
e. Em que data se celebra o Natal? ____ E o dia da independência? ____ Qual
é o dia do trabalhador? ___ E o do descobrimento da América? ___ Onde
reside? __________________________ É casado? ___ Qual foi a data do
casamento? ________ Tem filhos? ___ Quantos anos têm? ___
NÍVEL PRÉ-MÓRBIDO
a. Em que escolas estudou? _________________________________________
Qual o grau académico alcançado? _________________ Quando? ________
b. Qual é a sua profissão? ____________ Há quanto tempo desempenha essa
profissão? _____________________________________________________
Onde trabalhou antes? ___________________________________________
O que faz aos fins-de-semana? ____________________________________
E às tardes? ___________________________________________________
Que coisas despertam o seu interesse? ______________________________
ATITUDE DO PACIENTE FACE À SUA SITUAÇÃO?
a. Como se sente? _____________________________________________
b. Onde está agora? ____________________________________________
Quando chegou cá? __________________________________________
Qual o nome do seu médico assistente?
c. Quem sou eu? ___________________ Conhecia-me anteriormente? ___
d. Descontrola-se com facilidade?
Luria Neuropsychological Investigation – Versão experimental
Universidade da Beira Interior – Departamento de Psicologia e Educação
3
e. Pode realizar bem o seu trabalho habitual?
Tem dificuldades específicas nele? _________________________________
Como é a sua vida familiar? ______________________________________
_____________________________________________________________
_____________________________________________________________
Luria Neuropsychological Investigation – Versão experimental
Universidade da Beira Interior – Departamento de Psicologia e Educação
4
____________________________________________
2. PRINCIPAIS QUEIXAS DO PACIENTE
QUEIXAS SUBJECTIVAS E ESPONTÂNEAS
a. Como se sente? ___________________________________________________
b. Sente que alguma coisa está mal consigo? (tente explicar como se sente)
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
Onde se localizam as suas queixas? ______________________________________
Por vezes sente ansiedade? _____________________________________________
Como é o seu sono normal? ____________________________________________
Sente demasiada fome? __________________ E sede? ______________________
Notou recentemente alguma mudança no seu comportamento sexual? ___________
___________________________________________________________________
QUEIXAS GENERALIZADAS
a. Tem dores de cabeça? ___________ Pode descrever como são? _______________
________________________________ Onde se localizam? _________________
__________________________________________________________________
Esta é a sua única queixa? _____________________________________________
b. Tem perdido visão? ___________ Quando começou a notar? _________________
c. Tem dificuldades de audição? __________ Quando começaram? ______________
Não tem qualquer outra queixa? _________________________________________
d. Acredita ter perdido a sua capacidade de iniciativa? _________________________
Sente-se mais cansado do que o habitual? _________________________________
e. Tem dificuldades de memória? ______ De que tipo? ________________________
Por exemplo: esquece-se do que lê? Esqueceu-se do que aconteceu ontem?
Esqueceu-se do que ocorreu à uma hora? _________________________________
__________________________________________________________________
Usualmente custa-lhe a encontrar as palavras correctas? _____________________
Tem dificuldades em escrever? _________________________________________
Esquece-se das coisas que se propõe fazer? ________________________________
Luria Neuropsychological Investigation – Versão experimental
Universidade da Beira Interior – Departamento de Psicologia e Educação
5
QUEIXAS SOBRE OS SINTOMAS ESPECÍFICOS EPISÓDICOS
a. Tem tido desmaios? __________ Pode descrever as sensações ou experiências
relacionados com estes acontecimentos?
________________________________________________________________
________________________________________________________________
________________________________________________________________
b. Alguma vez sentiu estar a ver coisas? __________ Pode descrevê-las? ____
_____________________________________________________________
Por vezes parece-lhe que os objectos para os quais está a olhar estão a mudar de
tamanho ou de forma? _________________________________________
c. Alguma vez sentiu estar a ouvir coisas? ______________ Pode descrevê-las?
_______________________________________________________________
Por vezes as músicas que está a ouvir transformam-se em ruídos?
________________________________________________________________
d. Tem sentido ou percepcionado sabores ou odores especiais?
________________________________________________________________
e. Tem sentido ou percepcionado sensações no seu corpo? ___________________
Alterações do tamanho das mãos e dos braços ou de outras partes do corpo?
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
Luria Neuropsychological Investigation – Versão experimental
Universidade da Beira Interior – Departamento de Psicologia e Educação
6
QUEIXAS SOBRE SINTOMAS CONSTANTES E DE EVOLUÇÃO PROGRESSIVA
a. Sente que os seus sintomas (visuais, auditivos, motores) pioraram?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
Obs. __________________________________________________________________
______________________________________________________________________
QUEIXAS SOBRE TRANSTORNOS NAS FUNÇÕES COMPLEXAS
b. Tem dificuldades em orientar-se? _______________________________________
c. Tem problemas em vestir-se ou despir-se? ________________________________
d. Tem problemas em ler ou escrever? ____________ E com a COMPREENSÃO
MUSICAL? _________________________ Descreva com mais detalhe
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
É com esforço que segue o que é dito nas conversações? _________________
e. É-lhe difícil falar espontaneamente? (e.g., gagueja para articular as palavras,
etc.)_______________________________________________________________
______________________________________________________________
Tem problemas de pronunciação? _____________________________________
f. Tem problemas de cálculo? __________ De que tipo? _____________________
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
121
Anexo II
Questões da Entrevista de Anamnese que foram adaptadas à população estudada
Ana Sofia Beça Ribas da Silva
122
Orientação
e. E o dia da Restauração da Independência de Portugal?
Dia em que se comemora o dia de Portugal?
Não se colocou a questão: É casado? Qual foi a data do seu casamento?
Tem filhos? Quantos anos têm?
Nível Pré-Mórbido
b. Que é que estás a estudar? Disciplina que gostas mais?
Disciplina que gostas menos? Quantas vezes reprovaste?
Atitude do Paciente Face À sua Situação
e. Podes realizar bem o teu trabalho aqui na Instituição?
Com quem vives? Tomas medicação? Alguma vez consumiste drogas?
Qual foi o motivo pelo qual entraste para cá? Quanto tempo vais ficar aqui?
Queixas Subjectivas e Espontâneas
b. Não se colocou a questão: Notou recentemente alguma mudança no seu
comportamento sexual?
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