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Page 1: Entrevista Claude Troisgros - Monet

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O chef conta o que faz – e o que cozinha – quando não está à frente das câmeras no programa Que Marravilha!, que neste mês ganha episódios especiais, com massas e sobremesas

Francês com tempero brasileiro

LE É FRANCÊS, RENOMADO e faz parte de uma família famosa na alta gastronomia. Mas nem por isso Claude Troisgros faz questão de coisas requinta das. E isso fica ainda mais claro pessoalmente. De forma des-

contraída, ele recebeu a reportagem da MONET em seu restaurante Olympe, no Rio de Janeiro – onde vive desde 1979 –, para contar o que está por vir nos cinco episódios de Que Marravilha!

– Massas e Sobremesas e quais suas preferências quando é o chef que senta à mesa. Entre boas risadas, Troisgros revelou quais os conse-

lhos de família que segue até hoje, deu dicas do que observar quando se vai a um restaurante e suas impressões sobre a culinária brasileira.

E o contrário: temos algum prato popular do qual você não gosta?Em qualquer lugar do mundo vai ter algo de que você não gosta. Sarapatel, por exemplo. Acho que não sou o único que não gosta, mas tenho certeza que é por uma coisa até psicológica, por saber que é feito com entranhas. Mas, de repente, alguém sabe fazer muito bem e eu ainda não provei. Acho que a gente não pode criticar nenhum estilo de comida, devemos respeitar o regionalismo. Se alguma coisa é popular, é porque é boa, se não gostamos é porque alguma coisa saiu errada no caminho, ou virou um prato turístico e não tem mais a ver com a receita original.Sua família está na gastronomia há várias gerações. Que ensinamentos você traz dos mais velhos e passa para os mais novos?A família toda vivia em cima de um restaurante, então nossas vidas desde muito cedo estavam envolvidas com a cozinha. Aprendemos a lidar com clientes, fornecedores, produtores, administração, tudo. Então tivemos muitos ensinamentos sem nem perceber – saíram da rotina mesmo. Meu pai, que foi um dos criadores da Nouvelle Cuisine francesa, tinha uma linha de conduta sempre bem definida, que passou para a gente e eu passei para os meus filhos. Fora a técnica culinária e a qualidade do produto, em termos de prato finalizado, é preciso três coisas: acidez é fundamental – vinagre, limão, maracujá, laranja, tomate... essas coisas dão água na boca, ativam as glândulas salivares; a segunda é a crocância, fazer barulho na boca, o “crac” é uma massagem para o cérebro, dá vontade de comer mais; a terceira é o verde, porque tem um sinônimo de frescor, natureza, algo que acabou de ser colhido.Se você tivesse que escolher uma refeição, qual seria?Difícil... Há tantas boas. Adoro jantares especiais gastronômicos. No dia a dia, fico satisfeito com uma salada verde e uma boa carne. Mas um bolinho de feijoada com caipirinha me faz muito feliz. Comer é saber escolher o momento certo e com a pessoa certa.

O que você acha que há de melhor na culinária brasileira?Ela é muito vasta, não só por ser um país grande, mas porque sofreu influências de culturas muito diferentes. Cada região do país tem a sua particularidade. Sem contar o tanto de especiarias que ainda desconhecemos, peixes, ervas, folhas. Por isso o Brasil está em boa forma na gastronomia. Os ingredientes evoluíram, os chefs evoluíram e até a TV evoluiu. Eu não gosto de falar em alta gastronomia, mas há uma influência em querer mostrar produtos brasileiros de uma maneira mais moderna. O olho do mundo está no Brasil com tanta

por Sarah Mund

[ CLAUDE TROISGROS ]

E QUE

MARRAVILHA! I A PARTIR DO DIA 2, QUINTAS, 21H30, GNT, 41 E 541 (HD)

ADORO JANTARES ESPECIAIS GASTRONÔMICOS. MAS UM BOLINHO DE FEIJOADA COM CAIPIRINHA ME FAZ MUITO FELIZ. COMER É SABER

ESCOLHER O MOMENTO

CERTO E COM A PESSOA

CERTA”

coisa acontecendo. São produtos surpreendentes e chefs competentes.Quais as diferenças e as similaridades que são encontradas entre a cozinha francesa e a brasileira?A comida mineira se parece com a que se come no interior da França, comida caseira. Feijoada é como cassoulet com outro feijão e coq au vin e galinha ao molho pardo são parecidos. Quando se vai para a região do Mediterrâneo, aí não, até porque, apesar da costa enorme, no Brasil quase não se come peixe. É inacreditável. Na Amazônia, por exemplo, tem peixes incríveis e o principal prato é o pato. De onde tiram o pato até hoje eu não sei [risos].Tem algum prato de que você gosta e que não é popular entre os brasileiros?O brasileiro não tem a cultura de comer peixe. Você encontra churrascarias em todo lugar, mas não restaurantes de peixes. Eu estou doido para abrir um, só estou esperando o momento certo. Para isso preciso de um barco que vá pescar para mim, tem que ser em frente ao mar. O cliente tem que sentir o frescor, ver a água na frente. É uma pena, porque o Brasil tem bons peixes, uma costa imensa e peixes de rio incríveis. O paladar de uma cultura se forma pouco a pouco. Não é porque sou estrangeiro que sei mais, mas eu demorei a entender um pouco essas coisas. Acho que parte do sucesso dos meus restaurantes é que eu soube adaptar os pratos para os brasileiros. Alguns chefs não têm essa habilidade ou não querem mudar nada, o que é um erro. É preciso ter abertura de espírito.

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