Dissertação apresentada para cumprimento dos requisitos necessários à obtenção
do grau de Mestre em Ciência Política e Relações Internacionais, realizada sob a
orientação científica da Mestre Ana Isabel dos Santos Figueiredo Pinto e
coorientação do Doutor Daniel Marcos
À memória do meu pai, Henrique Martins A quem devo o gosto pelo estudo
“Where you sit really does influence what you see”
Christopher Hill, The Changing Politics of Foreign Policy
AGRADECIMENTOS
Nunca estamos verdadeiramente sós quando empreendemos um novo passo
na vida. Temos os que nos inspiram, os que nos incentivam e aqueles que nos apoiam.
Todos eles são importantes, cada um à sua maneira, cada um no seu momento. Foi o
caso na elaboração desta tese, objetivo há muito desejado.
Os que nos inspiram com o seu exemplo deixam sementes. A nossa primeira
inspiração esteve na casa dos pais, em que se cultivava o gosto pelo estudo. Em
particular, o pai, a quem dedicamos a nossa dissertação. Nem todas as horas foram
agradáveis, houve algumas mais complicadas mas o balanço final deste trabalho é
muito gratificante.
Mas não podemos deixar de agradecer, desde logo, aos nossos orientadores. À
professora Ana Pinto pelas aulas de Metodologias de Investigação que semearam
tanta interrogação no nosso espírito. Dúvidas que vieram a, afinal, a ser um precioso
auxílio quando das dúvidas surgiram algumas respostas, ao passar da teoria à
realização. E todo o apoio ao longo da redação do texto com importantes sugestões
que orientaram e reorientaram a nossa caminhada. Mas, também pela compreensão
num momento mais complicado. Ao professor Daniel Marcos, pela disponibilidade
para nos apoiar nos primeiros passos desta “caminhada” e depois em muitos
momentos‐chave, inclusive com indicações bibliográficas e alguns incentivos ao
trabalho feito que nos deram entusiasmo para continuar.
Finalmente, o reconhecimento ao universo dos meus afetos. Os amigos. Os
amigos que são, também, família. O apoio da família e a alegria de ter partilhado com
o meu filho Luís, ao longo deste ano, a condição de estudante. E os amigos de coração.
Todos os que me incentivaram a prosseguir, em particular a Célia Chamiça que
prescindiu de parte do seu tempo livre, oferecendo‐se para rever o texto em vários
momentos e procurando ser tão rigorosa quanto é possível.
EUROPEIZAÇÃO DA POLÍTICA EXTERNA PORTUGUESA? – O CASO DA RELAÇÃO COM CABO VERDE
MARIA MADALENA DE CARVALHO ZOIO MARTINS TEIXEIRA FRANCO
RESUMO
Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?
A presente dissertação visa compreender o impacto do processo de integração europeia na Política Externa Portuguesa.
Procura‐se identificar e compreender os efeitos da Europeização na elaboração, definição e implementação da Política Externa Portuguesa relativamente aos Países de Língua Oficial Portuguesa, elegendo Cabo Verde como estudo de caso.
Num primeiro capítulo, de enquadramento conceptual, revisitamos os conceitos de política externa e de Europeização, bem como as principais teorias neste domínio.
Em seguida, sistematizamos as grandes prioridades da Política Externa Portuguesa no período democrático pós‐Revolução de 1974 até à atualidade, com enfoque nos Países Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa, em particular Cabo Verde.
Identificamos igualmente os principais traços da atuação externa da União Europeia (UE) e a sua ação na África subsaariana, destacando, naturalmente, a Parceria Especial UE‐Cabo Verde.
As relações entre Portugal e Cabo Verde merecem natural destaque, dado o enfoque específico da presente dissertação, constituindo o objeto do quarto capítulo.
Depois de cruzar os dados e aplicando indicadores de Europeização desenvolvidos em modelos disponíveis na literatura (Capítulo V), concluímos que existe uma Europeização na elaboração, definição e implementação da Política Externa Portuguesa.
O processo europeu influenciou os atores e o enquadramento, mas também alargou a zona de influência da Política Externa Portuguesa. Na relação com Cabo Verde, aumentou as possibilidades e os recursos disponíveis e, dessa forma, influenciou o relacionamento entre os dois países.
PALAVRAS‐CHAVE: Europeização, Cabo Verde, Política Externa, Portugal, União
Europeia.
ABSTRACT
Was the Portuguese Foreign Policy Europeanized?
This thesis aims to understand the impact of the European integration process in the Portuguese Foreign Policy.
It seeks to identify and understand the effects of Europeanization in the design, definition and implementing Portuguese Foreign Policy towards the Portuguese Speaking Áfrican Countries, choosing Cape Verde as a case study.
In the first chapter, dedicated to the conceptual framework, we revisit the concepts of foreign policy and europeanization and the major theories in this field.
Then we systematize the main priorities of the Portuguese Foreign Policy since the Democratic period after the Revolution of 1974 until today focusing on the Portuguese Speaking Áfrican Countries, in particular Cape Verde.
We also identify the main features of the external action of the European Union and its action in Sub‐Saharan África, highlighting, the European Union ‐ Cape Verde Special Partnership.
Relations between Portugal and Cape Verde deserve particular attention, being the object of the fourth chapter.
After crossing data and applying Europeanization indicators developed in models available in the literature (chapter V) we conclude that it really exists an europeanization within the making, definition and implementing Portuguese foreign policy.
The European process affected the players and framework but also increased the
influence zone of the Portuguese foreign policy. Regarding Cape Verde it has improved
the possibilities and resources available and so the relations between the two
countries.
KEYWORDS: European Union, Europeanization, Cape Verde, Foreign Policy, Portugal
ÍNDICE
Introdução…………………………………………………………………………………………………………………….1
Capítulo I: Enquadramento Conceptual………………………………………………………………………...8
I. 1. Política Externa ……………………………………………………………………………………………..8
I.1.1 – Conceito, níveis de análise e principais teorias…………………………………...8
I.1.2 – Os pequenos países têm mesmo política externa?.....………………….…….14
I. 2. Europeização…………………………………………………………………………………………………16
I.2.1 – Teorias da integração e Governação multisistémica..…………………………16
I.2.1 – Europeização ‐ de que falamos?………………………………………………………..19
I.2.3 –A Europeização das políticas externas……………..………………………………..21
Capítulo II: A Política Externa Portuguesa……………………………………………………………………..25
II. 1 Principais eixos – uma breve leitura da história recente.……..……..………………….25
II.2 Contornos da dimensão Áfricana. ..……………………..……………………………….……….33
II.2. 1 – A relação com os PALOP ……………………………………………………….………..33
II.2.2 – Trazer África para a Europa…………………………………………………….………..41
Capítulo III – A Ação Externa da União Europeia (UE)……..……………………….………………….. 46
III. 1 Evolução histórica, natureza e prioridades geográficas…………………................ 46
III.2 África na agenda europeia……….…………………………………..………………................ 50
III.2.1 ‐ Da Declaração Schuman à Declaração da IV Cimeira UE‐África…........ 50
III.2 .2 – A cooperação europeia com os PALOP – o caso de Cabo Verde…..... 56
Capítulo IV: As relações Portugal‐Cabo Verde……………………………………………………………… 62
IV. 1 Alguns dados sobre Cabo Verde …………………………………………………….….…….. 62
IV.2 A Cooperação portuguesa em Cabo Verde………………………………………..….………67
Capítulo V‐ Sinais de Europeização na relação com Cabo Verde…..…………………….........76
V. 1 Contornos do processo de Europeização……………….……………………………….…...76
V.2 Europeização top‐down.....................................................................................77
V.2.1 – A socialização das elites.......................................................................77
V.2.2 – Reorganização burocrática...................................................................79
V.2.3 – Alterações constitucionais....................................................................85
V.2.4 – Opinião pública.....................................................................................86
V.2 5 – Adaptação e convergência política……………………………………………..87
V.3 –Europeização bottom‐up.....................................................................................89
Conclusões………………………………………………………………………………………………………………….92
Fontes e Bibliografia .............................………………………………………………………………..99
Lista de Figuras ………………………………………………………………………………………………………….111
LISTA DE ABREVIATURAS
ACP – África, Caraíbas e Pacífico
AR – Assembleia da República
ASEAN ‐ Associação de Nações do Sudeste Asiático
CAD/OCDE – Comité de Ajuda ao Desenvolvimento da OCDE
CEDEAO ‐ Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental
CEDN – Conceito Estratégico de Defesa Nacional
COAFR – Grupo Trabalho África
CPE – Cooperação Política Europeia
CPLP – Comunidade dos Países de Língua Oficial Portuguesa
DGPDN – Direção Geral de Política de Defesa Nacional
EUA – Estados Unidos de América
FED – Fundo Europeu para o Desenvolvimento
FRONTEX ‐ Agência Europeia de Gestão da Cooperação Operacional nas Fronteiras
Externas dos Estados‐Membros da União Europeia
IILP – Instituto Internacional da Língua Portuguesa
JOUE – Jornal Oficial da União Europeia
MERCOSUL – Mercado Comum do Sul
MNE – Ministério dos Negócios Estrangeiros
NEPAD ‐ Nova Parceria para o Desenvolvimento da África
OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico
OIM – Organização Internacional para as Migrações
OSCE – Organização para a Segurança e Cooperação Europeia
OMC – Organização Mundial do Comércio
OTAN – Organização do Tratado do Atlântico Norte
PAC – Programas Anuais de Cooperação
PAICV – Partido Áfricano de Independência de Cabo Verde
PAIGC – Partido Áfricano de Independência da Guiné e Cabo Verde
PALOP – Países Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa
PCC – Política Comercial Comum
PCSD – Política Comum de Segurança e Defesa
PE – Parlamento Europeu
PESC ‐ Política Externa e de Segurança Comum
PEV – Política Europeia de Vizinhança
PIC – Programa Indicativo de Cooperação
PIR – Programa Indicativo Regional (de Cooperação)
PVD –Países em Vias de Desenvolvimento
RUP – Regiões Ultraperiféricas
SEAE – Serviço Europeu de Ação Externa
TFUE – Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia
TUE – Tratado da União Europeia
UE – União Europeia
1
INTRODUÇÃO
A proliferação dos atores intervenientes, em particular das organizações
internacionais, alterou as dinâmicas das relações internacionais.
Os Estados já não são os únicos atores a definir as dinâmicas internacionais.
Continuam, todavia, a ter um papel de relevo por toda uma série de razões e até
porque são os próprios Estados que estão, na grande maioria dos casos, na génese das
organizações internacionais. Definem os seus fins últimos, os seus meios de atuação e
as suas limitações.
Mas as organizações internacionais ganham também vida própria que resulta
do equilíbrio entre os interesses dos vários países membros, quase sempre com
influência notória dos seus fundadores. Num processo que consideramos ser de
influência recíproca, também os Estados ganham contornos específicos quando
participam numa ou outra organização internacional. No período de guerra fria, a
participação de um país na OTAN ou no Pacto de Varsóvia, por exemplo, não era isenta
de significado e consequências na inserção desse país no sistema internacional.
Na constelação das organizações internacionais, a União Europeia (UE) ocupa
um espaço ímpar, sendo uma experiência única no domínio dos processos de
integração regional1 em função do seu carácter distintivo no tipo e aprofundamento
das relações de interdependência estebelecidas. E, nesse sentido, não é comparável a
participação na UE ou numa outra qualquer organização internacional, como por
exemplo a Organização de Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) ou o
Conselho da Europa. Ao carácter claramente intergovernamental destas últimas,
sobrepõe‐se a natureza híbrida da UE.
Ora, se a inserção nas organizações internacionais intergovernamentais já
acarreta efeitos nos países participantes, um processo de integração regional, e
1 Lembre‐se, a título de exemplo, o caso do MERCOSUL (Mercado Comum do Sul) o caso da CEDEAO (Comunidade Económica dos Estados da África Ocidental) ou o caso da ASEAN (Associação de Nações do Sudeste Asiático).
2
sobretudo com as características do que se tem vindo a desenvolver no quadro da UE,
não pode deixar de ter efeitos nos seus Estados‐membros, não só nas políticas internas
como também no domínio externo.
Os efeitos da adesão ao projeto europeu2 são mais nítidos quando falamos de
políticas comuns nas quais existe, por exemplo, a transposição de diretivas para a
ordem jurídica interna dos Estados‐membros. São, todavia, menos claros e também
menos lineares quando se trata de outros domínios de cooperação. Em todos eles,
estamos convictos, o impacto é diverso do que prevalece nas organizações
internacionais ditas clássicas.
A Europeização tem suscitado muitos estudos, pese embora a dificuldade de
encontrar uma definição unanimemente aceite do conceito. Trata‐se de um processo
que, na nossa visão, traduz uma dinâmica de dois sentidos, na qual a UE tem impacto
nos Estados‐membros, sendo igualmente influenciada por estes, já que definem e
conduzem o projeto comum de integração.
Os efeitos da Europeização na política externa dos Estados‐membros são
eventualmente dos mais difíceis de autonomizar, compreender e medir. Em primeiro
lugar pela própria natureza da política externa, em segundo lugar porque o seu efeito
coexiste com vários outros. De facto, num ambiente internacional de globalização
crescente, em que as fronteiras de um Estado são cada vez mais porosas, é muito
difícil autonomizar os efeitos dos vários fatores que concorrem para a elaboração,
definição e implementação da política externa do Estado. Acresce a este cenário o
papel dos fatores domésticos (nacionais), eles próprios com ramificações
internacionais.
A presente dissertação visa compreender o impacto do processo de integração
europeia na Política Externa Portuguesa.
Procura‐se identificar e compreender os efeitos da Europeização na elaboração,
definição e implementação da Política Externa Portuguesa relativamente aos Países de
Língua Oficial Portuguesa (PALOP), elegendo Cabo Verde como estudo de caso. A
2 Adotamos a expressão projeto europeu para nos referirmos à UE, incluindo igualmente todas as suas configurações anteriores (Comunidade Económica Europeia/Comunidade Europeia do Carvão e do Aço/Comunidade Europeia de Energia Atómica e Comunidade Europeia).
3
análise é, pois, desenvolvida com enfoque geográfico numa região do planeta em que
o nosso país tem vindo a procurar marcar presença após o período de descolonização.
Esperamos que esta reflexão possa acrescentar valor ao atual estado da arte
neste domínio. Existe, ainda, um “número reduzido de trabalhos que analisam a
participação portuguesa nas organizações multilaterais” (Mendes, 2012:1), apesar da
crescente importância que estas vêm ganhando.
Aliás, em geral, a análise de política externa parece ter ainda pouco
desenvolvimento em Portugal, existindo poucos estudos sobre Política Externa
Portuguesa contemporânea.
Contudo, existem alguns estudos no universo da história diplomática e do
relacionamento externo do país em geral que não podemos deixar de referir, como é o
caso (e não sendo exaustivo) dos estudos de Nuno Severiano Teixeira (Teixeira, 2005,
2010), de José Medeiros Ferreira (Ferreira, 2010), de António José Telo (Telo, 2008) ou
de Calvet Magalhães (Magalhães, 2002). Ou de outros que se dedicaram já à temática
da relação de Portugal com espaços geográficos específicos: a relação com a Europa,
por exemplo, nas obras de José Magone (Magone,2006) ou a relação com África e as
questões coloniais, como é o caso de Daniel Marcos (Marcos,2010).
Consideramos o papel que os PALOP (com enfoque no caso de Cabo Verde) têm
vindo a assumir na constelação das prioridades da Política Externa Portuguesa
constantes nos Programas dos Governos Constitucionais do período pós ‐
revolucionário.
O peso dos PALOP na Política Externa Portuguesa está, pois, subjacente à
escolha do nosso universo de estudo. Dentro dos PALOP, a identificação de Cabo
Verde surge por um conjunto de fatores. Consideramos que Cabo Verde pode ser um
bom estudo de caso. Trata‐se de um eixo prioritário da Política Externa Portuguesa e,
simultaneamente, um caso bem‐sucedido, existindo desde muito cedo, após a
independência de Cabo Verde, um bom relacionamento entre os dois Estados. Mas
também porque se trata de um Estado que mantém um relacionamento especial com
a UE. Finalmente existe (como sempre existe) uma motivação que ultrapassa a
4
racionalidade e que corresponde ao interesse pessoal no relacionamento entre
Portugal e Cabo Verde.
Elegemos, assim, a Política Externa Portuguesa como tema central da nossa
dissertação.
Abordamos o tema enquanto tópico de Relações Internacionais no quadro da
análise do sistema internacional e do comportamento dos seus atores numa
perspetiva multidisciplinar. Tratamos da relação entre o ator‐Estado (o Estado
Português) com outros atores estatais (os PALOP em geral, o Estado de Cabo Verde em
particular), sob a influência de um enquadramento institucional, a UE.
Não dispomos, ainda, do ponto de vista conceptual, de ferramentas já
consensualizadas. De facto, muitos conceitos que iremos utilizar não são (ainda)
conceitos incontestados e consensuais na literatura científica. É o caso do conceito de
Política Externa mas também, e sobretudo, do conceito de Europeização.
A análise de política externa é uma área relativamente recente (data
sensivelmente do pós‐segunda Guerra mundial) e complexa porque envolve vários
atores e várias dimensões de análise. Adotamos uma conceção abrangente de política
externa:
“(…) o conjunto de objetivos, estratégias e instrumentos que decisores
dotados de autoridade (por regra os Estados acrescentamos nós) escolhem
e aplicam a entidades externas à sua jurisdição política bem como os
resultados não intencionais dessas decisões” (Freire,2011:18).
Coexistem atualmente vários modelos teóricos de análise dos processos de
formulação e decisão em política externa (com claro predomínio da abordagem
clássica do ator racional), cada um dos quais com vantagens e limitações. Procuramos,
assim, uma análise multinível e multifacetada da Política Externa, uma política que é
definida e implementada em vários ambientes (doméstico e internacional) e que
muitas vezes funciona como plataforma de ligação entre os vários tabuleiros em que a
política do Estado se joga. Sendo certo que atualmente a política externa não se
restringe ao ator‐Estado, é a dimensão do Estado que nos vai nortear.
5
A Europeização da política externa dos Estados‐membros da UE decorre da
natureza desta política, o que introduz maior complexidade a uma temática ainda
muito pouco consensual. Apesar de não ser aceite de forma unânime, juntamo‐nos aos
que defendem a Europeização como um processo de duas vias que interagem: a
influência da UE na política dos Estados‐membros, a qual é (ou foi em determinado
momento) igualmente influenciada pelos próprios Estados‐membros. De facto, trata‐
se de “um processo de mudança contínuo, interativo e mutuamente constitutivo onde
as respostas dos Estados‐membros ao processo de integração europeia alimentam de
volta as instituições da UE e seus processos políticos e vice‐versa” (Radaelli,2000;
Jeffrey,2003; Boerzel,2003 cit. por Major,2005:177).
Todavia, e embora convictos de que este é um processo dinâmico e sem
fronteiras nítidas entre os dois fluxos de influência, previlegiamos na nossa análise a
dimensão top‐down de influência do projeto europeu na Política Externa Portuguesa.
É nesta lógica que se enquadra a nossa questão de partida:
Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?
E também as questões subsequentes e dela decorrentes3:
Qual foi o impacto da adesão à UE e aos seus mecanismos de coordenação
na dimensão externa4 na Política Externa Portuguesa?
Como é que a participação nas estruturas e práticas de coordenação da
política externa da UE influenciou a Política Externa Portuguesa para os
PALOP, em particular para Cabo Verde (país eleito como estudo de caso)?
Houve lugar a uma adaptação nacional?
Houve uma projeção da Política Externa Portuguesa para Cabo Verde em
virtude da adesão de Portugal à União Europeia?
3 Para a formulação destas dúvidas iniciais, recebemos inspiração junto de autores que já procederam à analise da política externa de um Estado à luz do enquadramento europeu, designadamente Wong, R The The Europeanization of French Foreign Policy ‐ France and the EU in East Asia.
4 Da Cooperação Política Europeia à atual Política Externa e de Segurança Comum.
6
A presente dissertação está, assim, organizada, em torno de duas hipóteses de
trabalho, sendo a primeira a de que houve lugar a uma Europeização da Política
Externa Portuguesa. A segunda respeita aos efeitos da Europeização. Identificamos
dois tipos principais de efeitos. Ao nível dos processos e dos atores (quem faz e como é
feita a definição e implementação da Política Externa). E, depois, ao nível dos objetivos
prosseguidos, isto é, a acumulação (que argumentamos que existe) de novos objetivos
em função da integração na UE e por efeito da influência entre pares, designadamente
a nível da áreas geográficas de intervenção prioritária da Política Externa Portugesa.
O período analisado nesta dissertação inicia‐se com a fase das negociações
para a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia e estende‐se até à
atualidade, ou seja, sensivelmente entre 1977 e 2013, procurando o comparativo
entre o momento de partida e o momento de chegada.
Apesar desta delimitação temporal, existe um pequeno recuo no tempo até ao
ano de 1975, enquanto marco da Política Externa Portuguesa em virtude do fim da
Ditadura. Procedemos igualmente a uma breve incursão histórica nas relações entre
Portugal e Cabo Verde imediatamente depois do processo de independência daquele
país.
Apesar de haver uma parte eminentemente explicativa neste trabalho,
adotamos igualmente um modelo de análise compreensivo já que procuramos
interpretar o impacto da participação de Portugal no projeto europeu na sua política
externa para os PALOP e em especial para Cabo Verde.
A bibliografia utilizada baseou‐se em fontes primárias e secundárias bem, como
em bibliografia crítica. A análise dos Programas de Governo, dos discursos dos
decisores políticos em momentos‐chave, bem como a documentação oficial da UE
auxiliaram, em muito, o trabalho realizado.
A presente dissertação foi escrita ao abrigo do Acordo Ortográfico e está
estruturada em cinco partes.
Um primeiro capítulo respeita ao enquadramento conceptual e às principais
teorias em jogo. Este primeiro capítulo divide‐se em dois blocos. Um primeiro bloco
em torno do conceito de política externa, um segundo sobre a Europeização, incluindo
7
a Europeização da política externa dos Estados‐membros. Resumimos as principais
teorias em confronto, assumindo a nossa perspetiva em torno das grandes questões
que se perfilam neste horizonte.
O segundo capítulo tem uma natureza histórica, descritiva, de carácter
instrumental para a nossa reflexão. Procuramos traçar as grandes linhas da Política
Externa Portuguesa.
No terceiro capítulo identificamos os principais vetores da ação externa da UE,
muito em particular, em razão do nosso objeto, os principais interesses e atuação da
UE na África Subsaariana, incluindo o relacionamento com Cabo Verde. Neste capítulo
analisamos a Parceria Especial UE‐Cabo Verde.
O quarto capítulo é dedicado às relações entre Portugal e Cabo Verde.
No quinto e último capítulo procedemos ao cruzamento e análise dos dados,
procurando sinais de Europeização na Política Externa Portuguesa em geral e em
particular na relação com Cabo Verde.
Utilizamos, para o efeito, vários indicadores, trabalhando os contributos já
desenvolvidos na literatura. Desde logo, o modelo desenvolvido por Michael Smith
(2000) que analisa os efeitos da Europeização na política externa dos Estados com base
em quatro indicadores: a socialização das elites políticas, a reorganização burocrática,
a reforma constitucional e a adesão da sociedade à cooperação política europeia no
domínio da política externa. Consideraremos igualmente os indicadores que apontam
Wong e Hill (2011) relativamente à adaptação e convergência política, muito em
particular a crescente importância da agenda europeia e da adesão aos objetivos
comuns. A aplicação destes indicadores visa validar as hipóteses de trabalho acima
identificadas e cujos resultados são trabalhados nas Conclusões da presente
dissertação.
8
CAPÍTULO I: ENQUADRAMENTO CONCEPTUAL
O presente capítulo visa enquadrar o objeto da presente dissertação nas
principais teorias das relações internacionais, nas teorias de análise de política externa
e nas teorias de integração europeia e estabelecer os conceitos e abordagens que são
adotados neste contexto.
I. 1. Política Externa
I.1.1 – Conceito, níveis de análise e principais teorias
Em primeiro lugar é necessário explorar o conceito de política externa.
A literatura oferece um vasto leque de definições para o conceito de política
externa, o que, numa primeira abordagem, parece confundir o que julgamos, à
partida, evidente. Todavia ao olhar para as várias definições, podemos verificar que
não são (por regra), incompatíveis, partilhando mesmo nalguns casos, elementos
importantes.
Acresce que o processo de globalização complicou, de alguma forma, a situação
ao tornar cada vez mais porosas as fronteiras entre os domínios interno e externo e ao
transformar a própria noção de Estado e do seu papel no sistema internacional. Muitas
das grandes questões que hoje fazem parte da chamada agenda global (como, a título
de exemplo, as questões ambientais) reclamam a definição de soluções partilhadas
entre as esferas nacional e internacional, numa lógica que ultrapassa o nível interno
dos Estados.
Para alguns autores (é o caso de Hermann, cit. por Neack, 2008:9) quando
falamos de política externa falamos do comportamento dos Estados; para outros,
existe uma abordagem mais abrangente que considera as fases anteriores e
posteriores ao comportamento, à ação. Estes incluem, assim, as intenções, as
declarações, as ações, mas também as reações do outro (é o caso de Gerner, cit. por
Neack, 2008:9).
Uma segunda questão é a de saber se restringimos o conceito ao ator‐Estado
ou se consideramos que a política externa pode corresponder a uma outra qualquer
entidade. Esta questão deriva naturalmente da abordagem que se adota mas
9
arriscamos considerar que já existe algum consenso sobre a coexistência de diversos
atores na esfera internacional (independentemente do peso que a cada um se atribui).
E o conceito adotado tem consequências para o tipo de análise que se procura
fazer.
Como já se referiu na Introdução, adotamos um conceito abrangente que
considera a ação e a reação e que abre espaço a outras entidades que não apenas o
Estado, até porque analisamos a política de um Estado (Portugal) e não poderemos,
portanto, fugir a uma visão minimamente estatocêntrica, mas vamos fazê‐lo num olhar
cruzado com o efeito da atuação externa de um ator não estatal (a UE). Assim, Política
Externa no âmbito desta dissertação é concebida como:
“(…) o conjunto de objetivos, estratégias e instrumentos que decisores
dotados de autoridade (por regra os Estados,acrescentamos nós) escolhem
e aplicam a entidades externas à sua jurisdição política bem como os
resultados não intencionais dessas decisões” (Freire,2011:18)”.
A política externa é um dos temas de estudo das relações internacionais. É
nesse âmbito que vamos trabalhar. De facto, nesta reflexão vamos proceder à análise
da política externa no quadro das relações internacionais, dando assim primazia (mas
não exclusividade) à dialética das relações entre os diversos atores, neste caso
Portugal, Cabo Verde e UE.
As questões de análise da política externa são tributárias das teorias das
relações internacionais. A distinção entre as teorias sistémicas das relações
internacionais e a teoria de política externa é, para alguns, pouco nítida. James D.
Fearon defende que “o tema das teorias sistêmicas no seu domínio original é e deve
ser a política externa dos Estados e suas consequências” (Fearon, 1998:297).
A análise do sistema internacional, enquanto estudo autónomo é relativamente
recente e revela uma grande primazia anglo‐saxónica, o que não é inconsequente.
De fato, desde a instituição da primeira cátedra na Universidade de
Abertytwyth5, no Reino Unido, nos anos vinte do século passado até hoje, diversas
5 Cátedra Woodrow Wilson, na Universidade de Aberystwyth, no País de Gales, no Reino Unido, em 1919, de acordo com Ken Booth e Steve Smith na obra International Relations Theory Today de 1995.
10
tendências se foram definindo, em muito influenciadas pelo decurso da História
(sobretudo pelo decurso das guerras) e até pelas histórias de vida e pelos percursos
pessoais dos seus defensores.
As teorias que se foram desenvolvendo nas Relações Internacionais são gerais
(as grandes teorias) ou parciais, quando apenas se dedicam a estudar uma parte
específica da realidade, por exemplo o efeito do meio geográfico.
Apesar de existirem muitas outras, duas grandes teorias têm dominado as
relações internacionais: o realismo e liberalismo. Mas, do ponto de vista do nosso
objeto, também o Construtivismo tem interesse na medida em que nele assenta um
dos conceitos que vamos trabalhar: o da Europeização.
Sem prejuízo da evolução e das variações, uma premissa básica tem perpassado
o pensamento e as ideias defendidas pelos pensadores realistas, isto é, a ideia de que
no sistema internacional, o Estado é o ator principal.
Os realistas analisaram a forma como as características do Estado influenciam a
sua política externa. E este Estado corresponde a uma entidade soberana, tem o
monopólio da utilização legítima da força, autonomia para decisão política e
económica, tem uma população e um território. É perspetivado “como uma forma
unitária e tende a maximizar o seu interesse através de escolhas de política (externa)
racionais e amorais” (Fernandes, 2011, 52). Na natureza do Estado está a prossecução
do seu interesse próprio, isto é, a procura do poder. Preocupados com a sua segurança
e o seu poder, os Estados estão, naturalmente, predispostos para o conflito e
competição. Nesta ótica, tal como defende Hans Morgenthau, “Toda a História
comprova que na política internacional as nações estão continuamente a preparar‐se
para se envolver ativamente ou para recuperar da violência organizada, sob a forma
da guerra” (cit. in Keohane e Nye, 1977). Prevalece, assim, uma visão negativa (ou no
mínimo pessimista) da natureza humana e, em consequência, da natureza dos Estados
que são norteados pela busca de segurança num ambiente internacional anárquico.
Note‐se que, para os Norte‐americanos, o início de tudo estará, pelo contrário, na obra de Hans Morgenthau Politics Among Nations ‐ the struggle for Power and Peace de 1948.
11
Sendo os Estados os principais atores, as organizações internacionais, nesta
ordem de ideias, não fazem mais do que refletir a distribuição do poder e em
particular o interesse das grandes potências. De acordo com esta lógica, a UE seria
sobretudo o reflexo dos interesses do eixo Berlim‐Paris e também do Reino Unido ou
em geral, o domínio dos grandes Estados‐membros (uma ideia que tende a ganhar
mais adeptos em períodos de crise do projeto europeu).
Nesta equação “causa‐efeito”, os neorrealistas (na esteira das ideias avançadas
por Kenneth Waltz) apenas mudam a variável “causa”, continuando a acreditar no
mesmo efeito. Os Estados são centrais, procuram o poder mas atuam, assim, não em
função de um imperativo natural (por ser da sua essência), mas em virtude da
natureza do sistema internacional. A anarquia do sistema internacional (em oposição
ao universo nacional) cria a necessidade estatal de promover a sua segurança
(Dougherty e Pfaltzgraff, 2003).
O Realismo neoclássico promove algum regresso às origens ao considerar que
para além das causas sistémicas, existem também variáveis nacionais que explicam o
comportamento agressivo dos Estados e defende que “a política externa é ainda
afetada por escolhas fundadas em perceções, valores e outros fatores pertencentes ao
nível doméstico” (Dougherty,2003: 113).
Esta dicotomia entre a influência dos fatores externos e internos tem‐se
mantido como um importante tema de discussão entre os pensadores que se
interessam por esta temática. Trata‐se de saber qual dos dois fatores tem impacto na
definição da política externa de um Estado e, sobretudo, saber qual o peso relativo de
cada um.
A teoria realista tem vindo a evoluir, coexistindo hoje vários realismos. E, como
aliás, sublinham Dougherty e Pfaltzgraff (2003:118), “(…) aquilo a que se chama
realismo contingente deixa aberta a questão do papel que as instituições
desempenham na facilitação da cooperação internacional”.
O Liberalismo, por sua vez, é pluralista no sentido em que considera a
existência de múltiplos atores (que não exclusivamente os Estados) e defende que as
relações entre os Estados podem ser norteadas pela cooperação, em virtude,
12
designadamente, da interdependência económica existente. Esta visão tem o seu
corolário na teoria económica liberal que defende o livre comércio, o qual pode evitar
o conflito. Os Estados acabam por reconhecer que uma estratégia de cooperação pode
ser mais válida do que a própria guerra. O Direito Internacional e as organizações
internacionais ganham, assim, relevo.
No contexto da teoria das Relações Internacionais, os neoliberais focam a sua
atenção na forma como as instituições podem influenciar o comportamento dos
Estados através dos valores ou da criação de regras de comportamento.
Enquanto os realistas perspetivam as organizações internacionais como uma
forma de os Estados projetarem o seu poder, os institucionalistas neoliberais
defendem que as organizações internacionais podem contribuir para a paz ao
fomentar a cooperação entre os Estados. De acordo com esta visão, muito embora as
instituições (as organizações internacionais) possam resultar da necessidade de
satisfazer os interesses (egoístas) dos Estados num ambiente internacional que é
anárquico por natureza, têm como objetivo gerar interdependência entre os atores, o
que, no final, acaba por gerar uma maior cooperação entre eles. Nesta visão, as ideias
e crenças assumem também um papel no ambiente internacional porque este, em
última instância, se baseia nas pessoas (Dougherty e Pfaltzgraff, 2003).
É neste sentido que abordamos a questão. A UE resulta do interesse dos
Estados e baseia‐se na procura da paz, mas gera interdependência entre os seus
membros e fomenta a cooperação na gestão dos interesses comuns. Parece aliás ter
sido essa a ideia, verdadeiramente inspirada, de Jean Monnet que defendeu a
necessidade de evitar novo conflito no palco europeu, colocando acima das fronteiras
a gestão do carvão e do aço que eram, à data, “a chave do poder económico e do
arsenal onde se forjavam as armas da guerra “ (Monnet, 1986:260).
Por outro lado, a análise da política externa pode ser feita a vários níveis: a
nível individual (pensamos sobretudo nos decisores políticos), a nível do Estado (a
política interna, o impacto da opinião pública, dos meios de comunicação social ou o
papel das elites) e a nível do sistema internacional propriamente dito (Neack,2008). É
neste último nível que nos vamos situar por excelência, mas não abandonando em
absoluto algumas contribuições dos outros níveis.
13
E, como refere Hudson e Vore (1995:212) e Freire (2011: 14), a análise da
política externa enquanto abordagem teórica autónoma teve na sua génese três
estudos inovadores que vieram a influenciar o desenvolvimento deste ramo do saber
em três vias. É o caso de J. Rosenau, que verificou a existência de uma permeabilidade
entre o meio interno e externo com a sua “Teoria da ligação” (Rosenau, 1966),
defendendo a necessidade de uma análise multinível e que conduziu a uma análise
comparativa. A obra de Richard C. Snyder, H.W. Bruck e Burton Sapin dedicada à
análise do processo de decisão, explorou os efeitos do processo e estrutura dos grupos
nas decisões em política externa (Snyder, Bruck e Sapin,1954). Harold e Margaret
Sprout procuraram a forma como as crenças do decisor pesam na política externa de
um Estado (Sprout e Sprout, 1956).
Estes trabalhos pioneiros marcaram os estudos posteriores criando
pressupostos teóricos relevantes para a análise de política externa, tais como a
importância de considerar as características dos decisores para compreender o
processo de decisão, a necessidade de considerar múltiplos níveis e o interesse de, em
paralelo com os resultados das decisões em si mesmos, procurar compreender a fase
da formulação da política externa.
Hoje, coexistem, assim, vários modelos de análise da decisão em política
externa desde o processo da decisão racional à teoria sobre o papel dos líderes,
passando pela teoria relativa às organizações burocráticas e pequenos grupos.
No primeiro caso, com estreita relação com a lógica realista “(…) o modelo de
racionalidade implica que o Estado aja intencionalmente, motivado por objetivos
claramente definidos, demonstrando capacidade para ordenar as suas opções e
preferências e maximizar a utilidade da sua escolha” (Mintz e Derouen Jr.,cit.por
Freire,2011:21). Outros estudam em particular o papel que as organizações
burocráticas acabam por assumir, já que a complexidade da realidade atual torna os
decisores de alguma forma reféns de organizações especializadas pela recolha e
tratamento da informação. Uma outra abordagem foca‐se no papel‐chave, que
acreditam, podem os líderes e o tipo de liderança assumir nas decisões em matéria de
política externa.
14
A aplicação de uma ou outra abordagem tenderá a produzir uma leitura
diferente de uma mesma ocorrência. Em todo o caso, mais do que concorrentes, estes
modelos devem ser perspetivados como complementares.
Neste trabalho procuramos uma análise multinível e multifacetada, aplicando
todavia, uma abordagem perto do institucionalismo neoliberal, pois estamos convictos
de que sendo o Estado (ainda) o principal ator das relações internacionais, os novos
atores não estatais – como é o caso da UE – podem influenciar a política externa do
Estado. Com efeito, os institucionalistas neoliberais, embora partilhando pressupostos
com os Neorrealistas (a anarquia do sistema internacional e a natureza racional e
unitária do ator‐Estado), admitem e consideram a cooperação entre os Estados com
potencialidade de gerar ganhos conjuntos. E, nesse contexto, as instituições
internacionais podem desempenhar um papel relevante (Mendes e Lima, 2005:72).
Mas consideramos igualmente a visão construtivista. Esta visão coloca o
enfoque na construção social da política internacional e inclui uma abordagem
interessante do processo de construção europeia no contexto da nossa reflexão. “(…)
O construtivismo é uma conceção teórica que enfatiza a importância das estruturas
normativas e materiais, na construção da identidade e do papel que esta exerce na
definição da ação política. (Adler, 1999). Pressupõe que o mundo é permanentemente
construído através da interação dos atores. E neste sentido a UE, enquanto realidade
dinâmica, em permanente evolução, corresponde a uma estrutura que exerce
influência nos Estados‐membros, sendo, em simultâneo, moldada por estes. Ficamos,
assim, perto da ideia de Europeização como um processo de duas vias.
I.1.2 – Os pequenos Estados têm mesmo política externa?
Na verdade, a grande maioria dos estudos que se têm vindo a desenvolver no
domínio da política externa tem‐se focado na política externa das grandes potências,
no relacionamento externo dos que têm, de uma forma muito visível, impacto no
equilíbrio de forças internacional. É o caso paradigmático das várias leituras da Política
Externa dos EUA (país onde, aliás, se iniciaram os trabalhos pioneiros neste domínio),
mas também um importante volume de trabalhos sobre a política externa da ex‐União
15
Soviética, por exemplo. Os realistas, em geral, não veem grande interesse no estudo
da realidade dos pequenos países.
A política externa das pequenas potências tem sido analisada ‐ por pensadores
liberais ou marxistas – mas quase sempre no sentido, como assinala Neack (2008:164)
de procurar averiguar “(…) se e como podem os pequenos poderes encontrar forma de
desenvolver uma política externa independente”6.
A questão é relevante no contexto do nosso objeto de estudo.
É difícil generalizar, até porque não é evidente o agrupamento das potências
em pequenas, médias ou grandes, existindo diversos critérios possíveis. O dilema
inicia‐se, uma vez mais, em torno do conceito. O que é um pequeno Estado? É uma
noção absoluta ou será sempre relativa? Em regra, recorre‐se a critérios quantitativos
relacionados com a dimensão do território, mas também com a sua capacidade militar
ou económica, mas existem zonas de alguma indefinição.
Acresce que dos cerca de duzentos Estados atualmente reconhecidos no
mundo, a grande maioria são de pequena dimensão e não parece muito rigoroso
aplicar uma regra geral a todos eles.
Em todo o caso, a História (que é, neste domínio, um poderoso auxiliar) tem
vindo a demonstrar que alguns Estados conseguem, mercê de fatores diversos, criar
oportunidades não só de independência na definição, elaboração e implementação da
sua política externa, como também na obtenção de algum poder na cena
internacional. Vários fatores podem contribuir para tal, tangíveis ou não.
É nesse sentido que Adriano Moreira chama a atenção para o que definiu como
poder funcional que corresponde a uma influência externa que não é proporcional, no
contexto internacional, à dimensão e poder do Estado. Resulta, em determinado
momento histórico, duma situação geográfica estratégica do ponto de vista da
segurança internacional ou da posse recursos económicos escassos que são objeto de
grande procura no mercado internacional (Moreira, 2002).
6 Tradução livre, da nossa autoria
16
O caso de Portugal pode servir de exemplo. A posição geográfica do nosso país
contribuiu muito para o benefício de um poder funcional neste sentido e durante um
determinado período histórico, como se sabe.
Outros autores portugueses também se debruçaram sobre o poder do pequeno
Estado como Políbio de Almeida, de acordo com o qual a diplomacia é a melhor opção
de um pequeno Estado, como Portugal (Almeida, 1990). E o contexto multilateral pode
contribuir para amplificar a sua voz, auxiliando a sua projeção de poder. Existem já
vários estudos sobre a problemática dos pequenos países no seio da UE. De acordo
com Tonra (2011:269), os líderes dos Estados pequenos encaram a participação do seu
país na política externa da UE como fator de reforço da sua política externa nacional.
I. 2. Europeização
I.2.1 – As Teorias da integração e a Governação multisistémica
Sendo o conceito de Europeização central no nosso estudo, é importante
compreender, antes de mais o enquadramento conceptual do fenómeno de integração
em geral e a sua aplicação ao projeto europeu em particular. Ou seja, há que
considerar as várias leituras do processo de integração no sentido de ponderar a
interpretação da influência da natureza e tipo de funcionamento do projeto europeu
nas políticas nacionais, no nosso caso da política externa.
O projeto europeu é um processo ímpar que desafia os conceitos estabilizados.
Não é um Estado, não é uma Federação de Estados, mas também é muito mais do que
uma organização internacional clássica, de natureza puramente intergovernamental
(será eventualmente um pouco de várias daquelas realidades). Acresce que, para além
de ser um processo dinâmico por natureza, não tem evoluído nem no mesmo sentido
nem ao mesmo ritmo em todas as áreas da Governação.
A procura de um modelo que sirva esta realidade híbrida nas Relações
Internacionais tem animado os debates e alimentado a literatura. A matéria é
relevante para o nosso objeto de estudo já que para compreender os efeitos da UE na
Política Externa Portuguesa, interessa, antes de mais, identificar a natureza e modo de
funcionamento da UE.
17
Numa primeira fase, a integração europeia é objeto de três modelos teóricos: O
Federalismo, o Funcionalismo e o Intergovernamentalismo.
O Federalismo, de inspiração norte‐americana, esteve presente em momentos‐
‐chave da história da Europa no século XX7 e está subjacente ao desenvolvimento do
projeto europeu que tem como fim último a criação de Uma união cada vez maior
entre os povos da Europa. Depois do êxito dos Tratados de Roma, a ideia federal
esteve na base da proposta para a criação da fracassada Comunidade Europeia da
Defesa e, bastante mais tarde, e de forma bem evidente na procura de uma
Constituição para a Europa.
Mas dois paradigmas clássicos têm dominado o debate sobre a integração
europeia (Lobo‐Fernandes, 2006:147): o Supranacionalismo apoiado na corrente
Neofuncionalista da integração regional e o Intergovernamentalismo com base na
teoria realista da Relações Internacionais.
Na visão supranacional apoiada na lógica neofuncionalista, a integração
económica liderada por instituições centrais poderá conduzir, a prazo, à união política.
Com efeito, a coordenação da cooperação torna‐se cada vez mais necessária num
efeito de spill over em que a integração económica num sector conduz à integração
noutros sectores tornando a integração política necessária. Esta teoria, note‐se, esteve
na base da solução defendida por Jean Monet e apresentada por Robert Schuman de
uma integração passo a passo, sector a sector.
A história do processo de integração europeia (designadamente a crise da
cadeira vazia8) veio evidenciar os limites daquele modelo teórico, demonstrando que
não está assegurado o automatismo e que o poder dos Estados não está, de todo,
esgotado.
7 Veja‐se o caso do Manifesto de Viena de 1927 promovido pelo Conde Coudenhouve‐Kalergie e, mais tarde, do Manifesto para uma Europa unida e livre (Manifesto de Ventotene) de Altiero Spinelli, em 1941
8 Em 1965, naquela que ficaria conhecida na história do processo europeu como a “crise da cadeira vazia”, a França manteve‐se ausente das reuniões em sinal de protesto contra a falta de financiamento da Política Agrícola Comum bloqueando, assim, a decisão no seio da Comunidade.
18
Para o Intergovernamentalismo, desenvolvido em primeira mão por Stanley
Hoffman o processo de integração é explicado com base numa escolha racional dos
Estados que procuram através da integração maximizar os seus ganhos. Andrew
Moravcisk desenvolveu o Intergovernamentalismo liberal que considera três
elementos para a compreensão do processo europeu, as preferências nacionais, a
negociação e a coordenação política entre os Estados.
“Para o intergovernamentalismo liberal, os desenvolvimentos da integração
europeia têm sido conduzidos por um processo gradual de convergência de
preferências entre os estados‐membros mais poderosos, no termo de um
processo negocial onde o poder relativo dos estados‐membros é a bitola,
estabelecendo compensações aos Estados afetados e uma delegação
minimalista de poderes às instituições supranacionais com o intuito de
assegurar a exequibilidade dos compromissos” (Torres,2013,106).
E “(…) qualquer que seja a dimensão dos poderes atribuídos às instituições
comunitárias, a autoridade máxima permanecerá nos Estados‐membros” (Lobo‐
Fernandes, 2006:152) até porque “Para os realistas, a delegação de autoridade por
parte dos Estados é revogável a qualquer momento”( Lobo‐Fernandes, 2006:152).
Também este modelo tem sido ultrapassado, pelo menos em parte, pela realidade, já
que as formas de atuação dos Estados e algumas das suas políticas públicas têm sido
objeto de alteração por um efeito de convergência que não tem apenas na escolha
racional e no interesse nacional a sua origem.
No domínio da Política Externa (um dos domínios mais caros aos Estados), este
debate é, pois, muito relevante. Trata‐se de um domínio em que os Estados‐membros
têm procurado resistir. Mas a evolução do processo, mesmo que lenta, tem
contrariado esse desiderato, sendo interessante notar que em nenhuma área a UE tem
evoluído tanto nos últimos anos como no domínio da sua atuação externa. A
Europeização também parece atingir esta área, mesmo que mais tarde em relação a
muitas outras e através de fórmulas diversas (menos evidentes, mas, talvez não menos
importantes) como procuraremos demonstrar.
Apesar de, na nossa opinião, este debate estar longe de estar esgotado,
atualmente verifica‐se uma tendência para alterar o foco da investigação das teorias
da integração para o estudo da governação europeia em que se destaca uma nova
19
corrente de pensadores que concebem a UE como uma comunidade política multinível
com uma governação multisistémica. Nesta abordagem a UE “ (...) emerge, assim,
como uma entidade política onde a autoridade está dispersa entre diferentes
patamares de governação e, onde existem significativas variações sectoriais nas
dinâmicas de governação” (Rosamond, 200:110, cit. por Lobo‐Fernandes, 2006:155).
As decisões são tomadas em vários níveis (nacional, subnacional ou supranacional)
numa geografia variável em função das áreas de cooperação. E, acrescentamos nós, o
nível dominante numa área pode não o ser numa outra.
I.2.2 – Europeização ‐ de que falamos?
Parece incontestável que a adesão de um Estado à UE não é comparável, do
ponto de vista dos efeitos, com a participação em qualquer outra organização
internacional. Mas esta quase evidência esconde muitas dificuldades e outros tantos
desacordos quando se procura definir o conceito de Europeização.
O termo não é, desde logo, muito rigoroso pois não identifica de forma clara o
ator não‐estatal europeu a que se refere, sendo utilizado para definir uma
multiplicidade de fenómenos e pelo menos em duas perspetivas diferentes.
Com efeito, inicialmente, a investigação adotou uma abordagem bottom‐up,
com o enfoque na influência dos Estados‐membros na construção europeia; num
segundo momento procurou‐se a perspetiva inversa e, assim, numa lógica top‐down,
os estudos concentraram‐se no impacto do processo europeu nos Estados‐membros.
Atualmente, alguns autores consideram que o processo de Europeização é um
processo de dois sentidos, mas esta não é uma conceção unanimemente aceite. Para
alguns (Major, 2005, Bulmer e Radaelli, 2004) esta dualidade pode até representar, do
ponto de vista metodológico, um risco, já que não permite distinguir com clareza causa
e efeitos.
Entendemos, todavia, que uma não faz sentido sem a outra e não podem ser
vistas de forma totalmente autónoma. Com efeito, dificilmente se pode definir uma
fronteira nítida e rígida entre as duas dimensões da Europeização uma vez que se trata
de “um processo de mudança contínuo, interativo e mutuamente constitutivo onde as
respostas dos Estados‐Membros ao processo de integração europeia alimentam de
20
volta as instituições da UE e seus processos políticos e vice‐versa” (Radaelli, 2000;
Jeffery, 2003; Boerzel, 2003 cit. por Major,2005: 177).
Assim, os efeitos que o processo europeu tem na Política Externa Portuguesa
não podem, na nossa visão, ser desligados da projeção para o quadro europeu que
Portugal tenta fazer dos seus interesses em África, como se as duas realidades fossem
totalmente independentes.
Acresce ainda que, em último caso, existe uma ‘nacionalização’ da
Europeização já que o impacto da UE não é igual em todos os Estados‐membros.
Depende de uma série de variáveis com raiz histórica, tais como, por exemplo a cultura
organizacional e a estrutura e organização administrativa do Estado. Os Estados‐
membros não são agentes totalmente passivos no processo. Com alguma razão se
pode pensar que “a Europeização (…) será sempre o produto entre a capacidade
europeia de impor e a capacidade interna de absorver, adaptar e implementar”
(Paulo,2006:4).
Estamos, na nossa reflexão, perto da definição do conceito de Europeização de
Cláudio Radaelli entendida como um
“processo de construção, difusão e institucionalização de regras formais e
informais, procedimentos, políticas, estilos, modos de atuação e interesses
e normas partilhados que são em primeiro lugar definidos e consolidados a
nível das estruturas da UE e depois incorporados na lógica do discurso
doméstico (…) nas estruturas políticas e nas políticas públicas dos Estados‐
membros” (Radaelli,2003:30, cit por Abreu, 2006).
A noção de Europeização implica assim, como muitos autores já salientaram, um
desalinhamento entre o nível europeu e o nível nacional já que, se o nível europeu
alinhar totalmente com o modus operandi doméstico “(…) não é necessária mudança ao
nível nacional” (Borzel e Risse, 2003:61).
Podem existir vários níveis ou tipos de mudança.
21
Radaelli identifica quatro:
A inércia, quando se verifica ausência da mudança;
A absorção, que se traduz em adaptação;
A transformação, como um mudança pragmática;
A oposição, que corresponde a uma reação e pode resultar em “menos
Europa”.
A análise dos efeitos é, contudo, diferente consoante o domínio em que nos
situamos. Neste contexto interessa‐nos apenas um: o da Política Externa dos Estados‐
membros.
I.2.3 –A Europeização das políticas externas
A maioria dos estudos sobre os efeitos da UE nas políticas domésticas tem‐se
concentrado nas áreas socioeconómicas. Foi nestas áreas que a UE avançou mais
rapidamente. No domínio das políticas comuns, por exemplo, a produção legislativa
que é necessário transpor para a ordem jurídica interna, tornou evidente a
comunitarização das políticas nacionais.
No caso da política externa, os efeitos não são tão evidentes.
Em primeiro lugar, porque a atuação externa da UE foi, e ainda hoje se
mantém, pelo menos em parte, reservada a uma cuidadosa dimensão
intergovernamental.
O impacto na esfera nacional foi sendo feito de uma forma progressiva e numa
base voluntária, em grande parte, através de uma lógica de convergência que nem
sempre é muito nítida.
Depois, é evidente que se torna muito difícil isolar os efeitos da Europeização
dos efeitos de outros fatores, muito em especial dos efeitos da globalização, mas
também dos efeitos de fatores domésticos diversos.
Nicole Alecu de Flers (2011:22) identifica as dimensões, mecanismos e
respetivos resultados da Europeização da Política externa dos Estados‐membros que
apresenta num quadro‐síntese.
22
Fig. 1 – Dimensões, mecanismos e resultados da Europeização da Política Externa
Dimensões Mecanismos Resultados/Indicadores
Uploading/Bottom‐up Estados‐membros procuram influenciar a política externa da UE e as políticas externas dos outros Estados‐membros
Socialização /Aprendizagem
Projeção da política Projeção das preferências da política nacional e dos modelos e ideias nacionais para o nível europeu
Downloading/Top‐down Os Estados‐membros são sujeitos a influência e estímulo por parte da UE e dos outros Estados‐membros
Socialização/ Aprendizagem
Adaptação política Mudanças nas instituições, processos, preferências, ideias e políticas em virtude das práticas, regras, objetivos e normas adotadas ou prescritas ao nível europeu
FONTE: Alecu de Flers e Muller, 2012:22 (tradução da nossa autoria)
Os mecanismos de Europeização são, no entender daquela autora, a
socialização e aprendizagem, uma e outra variando em função da periodicidade e
duração do contacto, bem como do grau de autonomia dos atores envolvidos.
Assim, e sendo certo que existe também Europeização ao nível da Política
Externa, a dificuldade centra‐se, pois, na sua aferição, pelo que se torna necessário
utilizar indicadores que nos auxiliem na análise.
Michael Smith sugere no seu artigo (2000) um quadro de referência com quatro
indicadores: a socialização das elites políticas, a reorganização burocrática, a reforma
constitucional e a alteração da perceção da opinião pública relativamente à
cooperação europeia neste domínio, concedendo, todavia, primazia aos três primeiros.
Também Wong e Hill (2011) coligiram um conjunto de indicadores9
relativamente às três dimensões da Europeização da política externa (adaptação e
convergência política/projeção nacional/reconstrução da identidade). Relativamente à
dimensão top‐down, identificam cinco indicadores: a crescente importância da agenda
política europeia, a adesão aos objetivos comuns, as obrigações que se sobrepõem aos
“domínios reservados” do Estado, a internalização do estatuto de Estado‐membro e
9 Estes indicadores foram aplicados a um conjunto de dez Estados‐membros e apresentados na publicação R. Wong. and C.J. Hill, eds (2011), National and European Foreign Policy: Towards Europeanization, Routledge
23
(tal como Smith) as alterações na estrutura e nos procedimentos da burocracia
nacional.
Na Europeização da política externa devem, pois, ser consideradas duas
vertentes.
Uma primeira, mais imediata e visível, ligada à importação de procedimentos (o
como fazer) e às alterações orgânicas (quem faz) decorrentes da participação na UE,
relativamente à qual a aplicação de indicadores simples nos pode fornecer dados
fidedignos.
Uma segunda vertente, mais mediata e menos visível, é a que resulta dos
efeitos nos interesses e objetivos da política externa nacional. Já não se trata aqui do
como, nem do quem, mas sim do quê e para quê. Falamos, pois de um impacto
substantivo quando se trata de acrescentar os interesses e objetivos da UE aos
interesses nacionais por pressão da UE, mas também por pressão dos pares. O
processo de integração faz surgir novos interesses e valores comuns. Resta saber até
que ponto os Estados‐membros se apropriam totalmente deles. É aí que que reside a
parte mais difícil, mas também mais interessante.
A análise torna‐se ainda mais complexa já que a atuação externa da UE se
estende hoje a vários domínios e com vários níveis e tipos de Governação.
Com efeito, do ponto de vista formal, a atuação externa da UE, após a entrada
em vigor do Tratado de Lisboa, apresenta uma dualidade de regimes jurídicos e
métodos – “ a vertente da PESC, incluindo a PCSD prevista no TUE e as vertentes
previstas no TFUE “ (Mesquita, 2011:102). Do ponto de vista material, como refere
aquela autora, a atuação externa inclui a Ação externa10, outras políticas e ações
internas com dimensões externas11 e demais domínios de ação que podem incluir
atuação externa12.
10 A Ação Externa propriamente dita integra a Política Externa e de Segurança Comum, incluindo a Política Comum de Segurança e Defesa, a Política Comercial Comum, a Cooperação com países terceiros e a Ajuda humanitária (nesta última a cooperação para o desenvolvimento, a cooperação económica, financeira e técnica com países terceiros e a ajuda humanitária)
11 É o caso de algumas matérias do Espaço de Liberdade, Segurança e Justiça, as questões relativas à Imigração e Asilo, mas também a política monetária, o desporto, a formação profissional, a cultura, a
24
Naturalmente não poderemos do ponto de vista substantivo contemplar no
nosso trabalho todas estas áreas, tanto mais que o nosso foco é claramente geográfico
e será essa a orientação a seguir para procurar compreender da existência da
Europeização da Política Externa Portuguesa na sua relação com Cabo Verde. Acresce
que se trata de matéria complementar – com efeito, o objeto do nosso estudo é a
Política Externa Portuguesa e não a Política Externa da UE.
saúde pública, as redes transeuropeias, a investigação e desenvolvimento tecnológico, o ambiente e a proteção civil.
12 É o caso da Política de vizinhança e dos Direitos Fundamentais
25
CAPÍTULO II: A POLÍTICA EXTERNA PORTUGUESA
II. 1 Principais eixos – uma breve leitura da história recente
Considerando o objetivo da nossa dissertação, procuraremos, de forma
necessariamente breve, identificar os grandes eixos da Política Externa Portuguesa
desde a fase das negociações para a adesão de Portugal à então Comunidade
Económica Europeia até à atualidade. Para compreender as grandes opções feitas
neste período há que recuar a 1974, enquanto marco fundamental nas condições
internas subjacentes ao posicionamento externo do Estado Português.
Com efeito, a Revolução do 25 de Abril de 1974 marca, na história recente do
país, o momento em que deixamos de estar “orgulhosamente sós”13 e se iniciam os
processos de descolonização, alterando assim e de forma profunda o paradigma da
inserção internacional de Portugal.
Como bem assinalam António Costa Pinto e Nuno Severiano Teixeira (2005:34),
os primeiros grandes desafios da Política Externa Portuguesa no período pós fim da
ditadura foi o fim do ciclo do Império e a abertura ao mundo com o restabelecimento
de relações diplomáticas alargadas.
A Revolução altera, pois, o paradigma de inserção internacional do país a dois
níveis. Por efeito de um fator exclusivamente interno, mas também por efeito da
conjugação de fatores internos e externos.
O ano de 1974 marca, efetivamente, uma verdadeira rutura na definição da
Política Externa Portuguesa, que deixa de estar vocacionada para o Atlântico e para a
manutenção das colónias e passa fundamentalmente a estar vocacionada para a
Europa, para o Atlântico e para a reinvenção das relações pós‐coloniais.
13 Célebre expressão utilizada por Oliveira Salazar, a 18 de fevereiro de 1965, relativamente às guerras coloniais, uma frase frequentemente utilizada para descrever o carácter isolacionista da Política Externa Portuguesa durante os anos sessenta do século XX. Note‐se, contudo que alguns autores, como por exemplo António Telo, consideram que este isolamento é um dos mitos da história recente do país, contrapondo que o regime tinha apoios externos relevantes (Telo, 1994, cit.por Rodrigues, 2004).
26
O fim do regime ditatorial do Estado Novo14, provoca uma abertura de Portugal
ao mundo. Acresce que esta abertura é feita num período particular em que se
processa, em plena Guerra Fria, uma transformação do chamado Estado Soberano15.
Esta condicionante (que não é exclusiva do caso português) tem também
influência em Portugal e conduz a um movimento tendente à inserção em grandes
espaços. Trata‐se, aliás, de uma necessidade sentida com maior acuidade pelos
Estados de média e pequena dimensão.
É assim que Portugal, que já pertencia à Organização do Tratado do Atlântico
Norte (1949)16 , é membro fundador da OECE (1948), mais tarde OCDE (1960), adere à
ONU (1955), é membro fundador da EFTA (1960) adere ao Conselho da Europa (1976),
pede a adesão à Comunidade Económica Europeia (1977) e promove o
estabelecimento da CPLP.
Este ciclo de adesão a organizações internacionais veio, aliás, a conduzir, como
defende Adriano Moreira, a uma pluralidade de fronteiras não coincidentes:
“(…) a fronteira geográfica deixou de coincidir com a fronteira de segurança,
que é a da NATO, que a fronteira económica, a evoluir para política, é a da
União Europeia, diferente daquelas duas e que a fronteira cultural emergente,
com apoio na língua, se diferencia de todas as outras (Moreira, 2000:319)17.
O multilateralismo não esgota, todavia, a dinâmica da Política Externa de
Portugal, que tem procurado promover relações bilaterais consideradas fundamentais.
O caso dos EUA é paradigmático, mas outros se devem assinalar como a relação com a
14 Estado Novo é a designação oficiosa do regime político que vigorou em Portugal desde a aprovação da Constituição de 1933 até à Revolução de 25 de Abril de 1974.
15 Alguns autores consideram que, num período de forte globalização em que as chamadas “questões globais” ultrapassam as fronteiras dos Estados, o chamado Estado soberano, na aceção que lhe é dada por Jean Bodin está hoje ultrapassado. No nosso entender, trata‐se de uma modificação e não (talvez ainda) do seu fim já que, apesar de tudo, o Estado ainda permanece, dentro de certas condicionantes, um dos principais atores intervenientes na cena internacional.
16 O estatuto de Portugal como país fundador da OTAN logo em 1949, em pleno regime de ditadura é a exceção num período de algum isolamento de Portugal na cena internacional e deve‐se, naturalmente, a fatores de natureza geopolítica da arquitetura do sistema de segurança ocidental em que os Açores assumiam “valor estratégico acrescentado” (Teixeira, 1995:804).
17 Mantemos o itálico do autor.
27
Espanha (a que o enquadramento na UE viria a dar novos contornos), a relação com a
Alemanha (muito importante no processo de consolidação da democracia e também
no processo de adesão à CEE), com o Reino Unido e a França, mas também as relações
bilaterais com os PALOP, cada vez mais com o Brasil, e ainda, em geral, com os países
nos quais vivem alargadas comunidades portuguesas.
A inserção em organizações multilaterais e as relações bilaterais privilegiadas
que o país tem promovido ao longo da sua história são, em parte (mas apenas em
parte),18 o resultado da nossa localização geográfica. País de reduzida dimensão com
uma única fronteira terrestre, Portugal tem, como vários autores defendem (Pereira,
2007; Teixeira, 2010) oscilado entre a dimensão marítima e a dimensão continental,
com efeitos diretos nas suas opções de Política Externa.
De acordo com Teixeira (2010) Portugal conheceu três modelos de inserção
internacional.
Um primeiro modelo corresponde ao período medieval e gira,
fundamentalmente, em torno das relações peninsulares.
Do séc. XV ao séc. XX, o autor considera um segundo modelo que designa como
“clássico” e define com base em três ideias: a perceção contraditória entre o
continente e o mar, entre a Europa e o Atlântico, o afastamento estratégico em
relação à Europa (percecionada como ameaça espanhola), a afirmação do vetor
marítimo/a opção atlântica e a diversificação das alianças extrapeninsulares. Na opção
atlântica, em primeiro lugar as alianças com as potências marítimas (primeiro o Reino
Unido, depois os EUA), por outro lado o projeto dos Descobrimentos e do Império
além‐mar.
A democratização resultou num terceiro modelo de inserção internacional, o
atual. Depois de um momento de clara indefinição no período revolucionário, o I
Governo Constitucional iniciou uma nova fase em que a opção europeia se identifica
como a principal inovação em política externa.
18 Estamos convictos que a geografia explica uma parte, mas não define o todo, influencia sem determinar.
28
Para a economia do presente estudo interessa‐nos este último período ditado
pelo fim do ciclo imperial, pela descolonização (Portugal “encolheu”) e pela opção
europeia (Portugal procura “crescer” de novo).
Os documentos oficiais (Programas de Governo, discursos dos atores
relevantes) permitem uma leitura histórica da Política Externa e a identificação das
principais tendências.
Pavia e Monteiro (2013) fizeram este exercício e com base na análise dos
Programas dos Governos de 1974 a 2013 identificam quatro ciclos na política externa
portuguesa desde 1974: o ciclo da descolonização (1974‐76), o ciclo de adesão às
Comunidades Europeias (1976‐1985), o ciclo da institucionalização da Comunidade dos
Países de Língua Portuguesa (1985‐1996) e o ciclo da Diplomacia Económica (o atual).
António Telo (2008:146)19, por sua vez, identifica igualmente quatro fases que,
pelo menos parcialmente, são coincidentes com aqueles ciclos.
Para este autor, a primeira fase corresponde ao período de abril a setembro de
1974 e tem como eixo central as grandes opções de descolonização. Depois considera
uma segunda fase em que a tónica fundamental é a do “ (…) envolvimento externo na
luta para o estabelecimento de uma democracia pluralista em Portugal “ (Telo,
2008:147) e que decorre até novembro de 1975. A terceira naturalmente traduz‐se no
ciclo da adesão (embora com algum desfasamento temporal relativamente a Pavia e
Monteiro). António Telo não divide contudo a fase posterior e considera que a fase de
1986 à atualidade diz respeito à procura de renovação da secular disfunção
internacional20 de Portugal.
No período imediatamente após a Revolução, destaque‐se, pela sua
centralidade no presente estudo, a independência de Cabo Verde (5 de Julho de 1975)
e a assinatura, na mesma data, de um Acordo Geral de Cooperação e Amizade com
19 Refere‐se este autor às relações externas de Portugal e não da Política Externa que considera apenas como uma das suas componentes.
20 No entender de António Telo, “os múltiplos mecanismos edificados ao longo dos séculos que potenciam e aumentam a força e capacidade de manobra nas relações internacionais” de Portugal, dando como exemplos as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo, os fluxos financeiros do exterior ou a posição estratégica, por exemplo dos Açores.
29
Cabo Verde (entre outros assinados com outras ex‐ colónias portuguesas), iniciando‐se
a cooperação com os PALOP, enquanto vertente importante do relacionamento
externo da democracia portuguesa.
A Constituição da República Portuguesa, aprovada a 2 de Abril de 1976,
estabelece os princípios a que nas relações internacionais o Estado português se
vincula e estabelece no nº 3 do art.º 7 que Portugal manterá laços especiais de
amizade e cooperação com os países de língua portuguesa21. A relação com os PALOP
será, desde então, uma variável sempre presente nos objetivos de política externa
assumidos nos Programas dos diversos Governos.
Todavia, é claro que existe um cruzamento desta variável com a opção
europeia, logo desde o início. No nosso entendimento, apesar de muitas vezes estas
duas dimensões surgirem como dimensões alternativas, uma leitura mais cuidada não
pode deixar de evidenciar, que, efetivamente, estas duas variáveis têm sido
complementares ao longo da nossa história recente.
O Programa do I Governo Constitucional (1976‐1978) que consagra “ (…) a
separação formal entre política externa e política ultramarina“ (Pavia, 2013:45) integra
igualmente a decisão estratégica de solicitar a adesão à Comunidade Económica
Europeia.
De interesse registar que, reconhecendo o movimento dos PALOP no sentido
da adesão à Convenção de Lomé22 este Programa de Governo defende o seguinte:
Entronca aqui uma das razões para que Portugal venha a integrar‐se no
Mercado Comum, visto que até que tal aconteça, Portugal assumirá o papel de
um país terceiro, sendo forçado a assistir ao estabelecimento de atos
privilegiados entre os novos países Áfricanos de expressão portuguesa e a
Comunidade Económica Europeia (CEE).
21 Optamos, ao longo do nosso trabalho, pela utilização de um formato itálico para a citação de documentos oficiais e de normativos.
22 Acordo comercial assinado, em 1975, entre a CEE e os países de África, Caraíbas e Pacifico (ACP), a que veio a suceder o atual Acordo de Cotonu, assinado em 23 de Junho de 2000.
30
O pedido de adesão à CEE é formalmente apresentado em 28 de março de
1977:
“...) Em nome da República Portuguesa e em conformidade com a posição
tomada pela Assembleia da República sobre este assunto, tenho a honra de
informar Vossa Excelência, por este meio, do pedido de adesão de Portugal à
Comunidade Económica Europeia, em conformidade com o disposto no artigo
237.º do Tratado que institui a CEE (...)”23
Como defende António Telo o pedido de adesão “(…) deve ser entendido como
um corte com o passado (…) uma inversão drástica da grande estratégia para Portugal
(…) um corte de grande envergadura” (2008:207).
Não podemos deixar de notar que no Parecer da Comissão Europeia sobre o
pedido de adesão de Portugal (19 Maio de 1978), apesar de se referirem as
dificuldades económicas se salienta que “(…) a adesão de Portugal, tendo em conta,
nomeadamente a sua política de abertura para o mundo exterior e as suas relações
tradicionais com a América Latina, a África e o Extremo Oriente, irá reforçar o papel
desempenhado pela Comunidade ao nível mundial” (Parlamento Europeu, 2001:199).
Por outro lado, o Programa do Governo identifica ainda a “necessidade de
“intensificar os contactos, quer a nível político quer a nível militar, com vista à
execução dos compromissos decorrentes da Aliança” (a OTAN), e nas relações
bilaterais defende (para além do Reino Unido, da Espanha, da França e da RFA) a
tradicional amizade com os EUA. A opção europeia não era, pois, entendida como
excluindo uma política atlântica que se assume dever prosseguir.
Apesar de reconhecer dificuldades com Angola e Moçambique (existia já um
bom entendimento com a Guiné, Cabo Verde e S. Tomé e Príncipe), o Programa do I
Governo Constitucional reserva igualmente espaço para a cooperação com os países
de expressão portuguesa, destacando, no continente americano, a relação com o
Brasil.
23 In Carta dirigida pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros português ao Presidente do Conselho da CEE em 28 de Março de 1977.
31
De acordo com Teresa Gouveia (2013) “ A nova política externa da democracia
portuguesa fica, no essencial, definida no Programa do I Governo Constitucional e não
vai mudar até aos nossos dias (…) uma hierarquia flexível entre três dimensões – a
dimensão europeia, a dimensão atlântica e a dimensão Áfricana”.
No Programa do II Governo Constitucional (1978) a opção pela adesão é central
nos vários objetivos e planeamento de toda a ação governativa. Três questões nos
interessam salientar neste ponto.
Em primeiro lugar, a motivação não só de política externa, mas também
económica e política da adesão. De fato, a opção pela adesão traduziu, naquele
momento uma forma de ancorar a democracia portuguesa a um modelo político e de
sociedade:
“ (…) A opção europeia era não apenas uma opção de política externa, mas uma
opção de modelo constitucional e de modelo económico. (…), fundamental,
não só em termos de política externa mas também em termos de política
interna” (Lamego in Ferreira, 2001:89).
Em segundo lugar, e uma vez mais, a ligação entre a opção europeia e a opção
Áfricana. Nas grandes linhas de orientação política e de política externa, surge a
“Opção europeia, com preservação da identidade e da soberania nacionais, sem
prejuízo da valorização, no plano internacional, da nossa experiência Áfricana”24, mas
também Desenvolvimento de uma política externa diversificada, fiel às alianças
tradicionais, e empenhamento na intensificação das relações de amizade e cooperação
com os Estados de língua portuguesa” 25.
Por último, e não menos importante para a economia desta reflexão (muito
antes pelo contrário), a ideia expressa no Programa de Governo de que a opção pela
adesão implica grandes transformações a nível nacional como forma de preparação e
internalização do acervo comunitário. Trata‐se, pois, do início da Europeização no
sentido top‐down, ou seja na aceção do impacto do processo europeu nos Estados‐
membros/futuros Estados‐membros.
24 In Diário da República, II série‐A, nº 34, Suplemento I, de 3 de Fevereiro de 1978, p. 4
25 Ibidem.
32
Efetivamente, a opção tomada e o pedido feito junto do Conselho da CEE está
na base de muitas medidas previstas no Programa do II Governo Constitucional que
reconhece a necessidade de adaptação das estruturas produtivas, das instituições mas
também, naturalmente ao nível legislativo.
O processo de adaptação perpassa este, como todos os Programas dos
Governos seguintes (incluindo o atual) como veremos, relativamente ao nosso objeto
de estudo, no último Capítulo do nosso trabalho.
O designado ciclo da adesão termina na vigência do IX Governo Constitucional
(1983‐1985) no qual se assume como a primeira prioridade programática em termos
de política externa a Aceleração da fase final do processo de negociação para a
entrada nas Comunidades Europeias, com encerramento dos dossiers em aberto e
lançamento de ofensiva diplomática que conduza a uma tomada de decisão por parte
dos governos e das instâncias comunitárias26.
O Tratado de Adesão é assinado já na vigência do Governo seguinte, em 12
Junho de 1985, e Portugal passa ser membro efetivo da CEE no dia 1 de Janeiro de
1986.
O processo de integração europeia prossegue como central27 mas surgem
depois objetivos específicos nos ciclos seguintes, como salientam Pavia e Monteiro já
que depois da realização daquele objetivo (a adesão), “Portugal tinha agora condições
para se envolver mais ativamente noutros palcos” (2013:103).
Um destes objetivos corresponde ao reforço da cooperação com os PALOP e o
estabelecimento da CPLP.
O Programa do XIII Governo Constitucional (1995‐1999) identificando três
dimensões prioritárias no domínio da Política Externa (europeia, transatlântica e
Áfricana), daria prioridade à institucionalização da CPLP, como veremos no ponto
seguinte.
26 In Diário da Assembleia da República, II Série‐A, nº 6 Suplemento, de 21 de Junho de 1983, pp 9‐10
27 Depois da adesão vem o processo de integração propriamente dito e também o de aprofundamento.
33
Em suma, e como muitos autores sublinham, existe uma grande continuidade
nos principais eixos da Política Externa Portuguesa desde 1974 até à atualidade.
Como refere Severiano Teixeira, a opção europeia, o vetor atlântico, o
estabelecimento de relações com os PALOP e a renovação das relações com o Brasil
são as traves‐ mestras da política externa portuguesa do período democrático, às quais
se junta a partir dos anos noventa “(…) a participação portuguesa na produção de
segurança internacional, com a presença dos militares portugueses nas operações de
paz da NATO, da União Europeia (…) e das Nações Unidas” (2010:54). Com efeito,
sensivelmente a partir dos anos noventa a participação portuguesa em missões de paz
soba égide sobretudo da ONU e da UE em várias partes do Globo representa uma
importante dimensão da Política Externa Portuguesa que não pode deixar de ser
referenciada.
Existe, todavia, uma prioridade de primeira linha para um conjunto de objetivos
e relações privilegiadas no posicionamento externo de Portugal que se localizam “ (...)
nos quatro lados do retângulo atlântico: a Europa, a América do Norte, a América
Latina e a África” (Almeida, 2010:89).
Numa outra visão, como afirmou Medeiros Ferreira (2010:43), caso o estudo
das negociações financeiras internacionais do Estado português nos séculos XIX e XX
estivesse feito, poderíamos verificar que (…) a história da Política Externa Portuguesa
é, em grande parte, a história da captação do capital no exterior para as necessidades
da economia interna”. Uma diplomacia económica (expressamente assumida no
Programa do atual Governo Constitucional) que parece estar, assim, subjacente e ser
intemporal na Política Externa Portuguesa.
II.2 Contornos da dimensão Áfricana
II.2. 1 – A relação com os PALOP
Com uma leitura cuidada dos Programas de Governo e outros documentos
programáticos
“(…) facilmente se constata que a relação com África e em particular com o
conjunto de países de expressão portuguesa é um dado incontornável da ação
externa do Estado português. Talvez mesmo um dos que, historicamente se
34
compagina com os mais fortes e perduráveis traços de identidade de Portugal
na comunidade internacional” (MNE,1995:11).
Assim, a presente análise não pode deixar de lado uma referência particular à
dimensão Áfricana. É, aliás, fundamental para o objeto do nosso estudo.
Os vários processos de descolonização, constituíram uma das primeiras
questões a que a Política Externa Portuguesa teve de dar resposta e a procura de uma
relação privilegiada com aqueles países Áfricanos é questão central que, com maior ou
menor acuidade, surge nos vários Programas de Governo desde o final da Ditadura.
Com efeito, desde 1974, está subjacente em todos os Programas de Governo,
uma clara preocupação em reinventar as relações com as antigas colónias, de forma a
apagar as marcas deixadas pelas guerras coloniais e pelo processo de descolonização.
Como refere João Cravinho, “(…) as elites portuguesas tentam (…) encontrar uma base
nova e estável relativamente às relações de Portugal com África” (Cravinho, 2005:90).
Esta é uma matéria central logo no Programa do I Governo Constitucional como
vimos, mas mesmo no período em que o investimento se concentrou no objetivo de
adesão à CEE, a cooperação com os Estados de língua portuguesa foi sempre
identificada como uma das opções estratégicas. Nesse sentido, defende ainda João
Cravinho que:
“(…) mesmo que o futuro de Portugal seja entendido como pertencendo à
Europa, permanece o sentimento de que as relações privilegiadas com África
podem contribuir para ultrapassar as limitações intrínsecas de um país,
simultaneamente, periférico do ponto de vista geográfico e fraco do ponto de
vista económico, num contexto de expansão europeia” (Cravinho, 2005:92).28
Esta procura de uma recuperação da ligação com as ex‐colónias é visível nos
documentos programáticos ao longo dos anos. Vejamos:
O relacionamento e cooperação com os novos Estados Áfricanos de expressão
portuguesa ocupará lugar específico e de particular relevo no âmbito da nossa
política externa (Programa do II Governo Constitucional, 1978);
28 Tradução da nossa autoria.
35
A Comunidade de língua é afinal, o expoente e o símbolo da existência de
vínculos e afinidades históricas fundamentais cujas potencialidades (…) – desde
a materialidade das trocas comerciais até à solidariedade humana que as
correntes migratórias criam, ‐ terão de constituir uma das grandes prioridades
da ação do Governo na ordem externa. No elenco de Ações prioritárias, a
identificação da Implementação dos Acordos de Cooperação com Angola,
Moçambique, Guiné‐Bissau, Cabo Verde e S.Tomé e Príncipe (Programa do III
Governo Constitucional, 1978);
Especial atenção será dada às relações de Portugal com os Estados do
continente Áfricano (…) serão envidados esforços para incrementar, alargar e
solidificar uma política de cooperação global com os novos Estados de
expressão portuguesa, na base de interesse mútuo e do estrito respeito pelas
soberanias nacionais (Programa do IV Governo Constitucional, 1978‐1979);
Entende o Governo que a revitalização das relações com os países ex‐colónias
portuguesas, é um dos objetivos fundamentais deste período (Programa do V
Governo Constitucional, 1979‐1980);
De acordo com José Carlos Venâncio (citado por Pavia e Monteiro, 2013:77)
“(…) o VI Governo Constitucional ( 1980‐1981) colocou maior empenho na cooperação
com os PALOP (…) uma política de relacionamento diplomático e de cooperação de
Estado a Estado”. O Governo seguinte, com a mesma base política, viria a dar
seguimento a esta política.
A partir dos finais dos anos oitenta e depois de cumprido o objetivo de adesão
à CEE (como já referimos), o investimento viria a ser feito na instituição da
Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), o que é expressamente assumido
no Programa do XIII Governo Constitucional (1995‐1999) como uma prioridade –
procurando com todo o empenho, constituir, com os Países Áfricanos de Língua Oficial
Portuguesa e com o Brasil, uma Comunidade dos Países de Língua Portuguesa.
36
No Programa daquele Governo pode ler‐se que O Governo ativará a vertente
Áfricana da sua política externa (…) Portugal deve, de forma particular, reforçar as
suas relações com a África Austral.29.
A CPLP tem na sua base uma partilha histórico‐cultural que se traduz numa
língua comum. E, é assim, que os primeiros passos tendentes ao seu estabelecimento
são dados com a criação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa (IILP), criado
em Novembro de 1989, no 1º Encontro dos Chefes de Estado e de Governo dos países
de Língua Portuguesa (Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné Bissau, Moçambique, Portugal
e S. Tomé) realizado no Brasil.
Fig. 2 – Mapa dos países da CPLP
FONTE: CPLP, em http://www.cplp.org/id‐22.aspx
Estabelecida em 17 de Julho de 1996, a CPLP tem três objetivos gerais30:
A concertação político‐diplomática entre seus Estados‐membros,
nomeadamente para o reforço da sua presença no cenário internacional;
A cooperação em todos os domínios, inclusive os da educação, saúde,
ciência e tecnologia, defesa, agricultura, administração pública,
comunicações, justiça, segurança pública, cultura, desporto e comunicação
social;
29 É nesta zona de África que se situam os dois maiores PALOP (Angola e Moçambique) e existe uma importante comunidade portuguesa na África do sul.
30 De acordo com o nº 4 dos seus Estatutos, disponíveis em: http://www.cplp.org/Files/Filer/cplp/CCEG/IX_CCEG/Estatutos‐CPLP.pdf
37
A materialização de projetos de promoção e difusão da língua portuguesa.
Para além dos PALOP e Brasil e, a partir de 2002, Timor Leste, a X Conferência
de Chefes de Estado e de Governo da CPLP (Dili, 23 de julho de 2014) aprovou a
adesão da Guiné Equatorial como Estado membro e aprovaou a Resolução sobre a
concessão da categoria de Observador Associado da CPLP à Geórgia, à República da
Namíbia, à República da Turquia e ao Japão que assim se juntam, neste estatuto à Ilha
Maurícia e ao Senegal.
Nos Programas de Governo seguintes a relação com os PALOP e o papel da
CPLP foram sendo, sempre, destacados no quadro das prioridades da Política Externa
Portuguesa.
O atual Governo (XIX Governo Constitucional), no seu Programa, estabelece
como nova prioridade a definição de uma fortíssima diplomacia económica numa
política externa assente em três opções: europeia, atlântica e lusófona e a título desta
última define, como um dos objetivos estratégicos Redobrar a importância do
relacionamento com os países de expressão portuguesa, tendo sempre presente a
relevância da língua que nos une, que no quadro da CPLP se revela estratégica e
economicamente relevante31.
A dimensão da cooperação não pode, neste âmbito ser esquecida já que, na
relação com os PALOP, a cooperação para o desenvolvimento é vetor estruturante da
Política Externa Portuguesa.
A este título, três documentos são de salientar no período em análise.
Em 1999, procurando uma abordagem coerente e sistemática, o XIII Governo
Constitucional aprovou em Conselho de Ministros um documento de orientação
estratégica “A Cooperação Portuguesa no Limiar do Século XXI” no qual se lê que:
O importante desafio que se coloca a Portugal é o de saber articular, nos planos político, económico e cultural, a dinâmica da sua integração europeia com a dinâmica de constituição de uma comunidade, estruturada nas relações com os países e as comunidades de língua portuguesa no mundo, e de reaproximação a outros povos e regiões. (…) Torna‐se assim necessário dotar a política de cooperação de mais rigor e coerência estratégica, de um comando político mais
31 Diário da Assembleia da República, II Série‐A,nº4. de 28 de Junho de 2011, p.101
38
eficaz, de uma organização mais racional e de um sistema de financiamento adequado.”(Resolução do Conselho de Ministros nº 43/99, de 18 de Maio).
Procurava‐se, à data, ultrapassar um modelo descentralizado que, com uma
grande dispersão de meios pelos vários Ministérios, não permitia uma política
verdadeiramente coerente. Foram então definidos cinco objetivos específicos de curto
prazo: reforçar a democracia e o Estado de direito, reduzir a pobreza, estimular o
crescimento económico, promover o diálogo e a integração regionais e promover uma
parceria europeia para o desenvolvimento humano. Depois de duas décadas de ajuda
portuguesa ao desenvolvimento às suas antigas colónias, a visão daquele documento
estratégico mantém a concentração dos esforços na ajuda ao desenvolvimento dos
PALOP, não só em função das dificuldades que vivem, mas também tendo em conta o
objetivo estratégico de consolidar e reforçar a Comunidade dos Países de Língua Oficial
Portuguesa e a sua afirmação no sistema internacional. Ao nível sectorial, as
prioridades centram‐se na formação, educação, cultura e património; saúde; atividade
produtiva e infraestruturas; sociedade e suas instituições e segurança.
Esta abordagem seria reiterada no documento “Uma visão estratégica para a
cooperação portuguesa”, aprovada em 200532 no qual se mantêm os países de língua e
expressão portuguesa, sobretudo os PALOP e Timor‐Leste, como espaços de
intervenção prioritária da Cooperação Portuguesa.
Um terceiro documento é digno de nota. Em fevereiro de 2014 foi adotado o
“Novo Conceito Estratégico da Cooperação Portuguesa 2014‐2020”33 que se baseia em
quatro princípios:
A coerência/coordenação entre parceiros;
A concentração geográfica e setorial, apostando em projetos com dimensão
e natureza estruturante;
A apropriação, com enfoque no desenvolvimento de capacidades e na sustentabilidade;
32 Resolução do Conselho de Ministros nº 196/2005, de 24 de novembro, publicada no Diário da República, I série B nº 244 de 22 de dezembro de 2005.
33 Resolução do Conselho de Ministros nº 17/2014 de 27 de fevereiro de 2014, publicada no D.R. nº 47, 1ª Série, de 07 de março de 2014
39
A parceria, através da partilha de capacidades e recursos, incluindo fontes de financiamento.
O Conceito Estratégico tem como prioridades geográficas os PALOP e Timor‐
Leste e define que, para além de prosseguir o investimento nos sectores tradicionais
(educação e ciência, saúde, capacitação, proteção social e emprego e segurança), deve
ser feita uma aposta em novos domínios como o crescimento verde, a energia, o
sector privado e o desenvolvimento rural e do mar. Claramente assumida como um
pilar da Política Externa Portuguesa, a Política da Cooperação Portuguesa deve ter, nos
termos deste Novo Conceito, uma abordagem integrada, coordenada e supervisionada
pelo Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Fig. 3 – Síntese dos Objetivos, Princípios e Prioridades da Cooperação Portuguesa
FONTE: DR, 1ª série, nº 47 – 7 de março de 2014
Coerência/Coordenação
Parceria Apropriação Concentração
Governação, Estado de direito
Desenvolvimento Humano e Bens Públicos Globais
Educação e Ciência Saúde Ambiente, Crescimento verde e Energia
Desenvolvimento rural e mar
Proteção e inclusão social e emprego
Capacitação institucional Segurança e Desenvolvimento
Atores MNE ‐ Camões, I.P
Ministérios Setor Privado
ONGDFundações
Municípios Universidades
Tipos de ajuda
Intervenção
tipo projeto
Contribuições
gerais
ApoioOrçamental
Bolsas Peritos e
Assistência
Objetivos
Erradicação da pobreza e desenvolvimento sustentável dos países terceiros
Prioridades Geográficas e sectoriais
PAÍSES ÁFRICANOS DE LÍNGUA OFICIAL PORTUGUESA E TIMOR LESTE
Igualdade de género e direitos da criança
40
A Cooperação atua a três níveis: cooperação para o desenvolvimento, educação
para o desenvolvimento e ajuda humanitária e de emergência.
Num momento de crise financeira, o novo conceito introduz
“ (…) novos modelos de financiamento, apostando na diversificação e
alavancagem de fontes bilaterais e multilaterais, combinando a tradicional
ajuda pública ao desenvolvimento com outros fluxos de investimento e
comércio internacional”34.
Este documento procura dar resposta aos novos desafios e realidades
internacionais, estando aliás alinhado com o novo Quadro Financeiro Plurianual da UE
para 2014‐2020, no qual estão previstos cerca de mil milhões de euros para os PALOP
e Timor‐Leste – um apoio financeiro que deverá apoiar o investimento dos Estados‐
membros neste domínio.
Finalmente, não se pode deixar de fazer uma referência muito especial à
cooperação técnico‐militar que Portugal tem vindo a desenvolver com e nos PALOP.
O vetor militar tem‐se vindo a assumir, nos últimos anos, como um instrumento
cada vez mais relevante da Política Externa Portuguesa. Esta matéria ganha relevo nas
nossas relações com os PALOP. É assim que o Conceito Estratégico de Defesa Nacional
(CEDN) no quadro do objetivo de Afirmar Portugal como coprodutor de segurança
internacional, define que compete ao Estado português “Estabelecer parcerias
estratégicas de segurança com os países da CPLP, abertas a iniciativas conjuntas no
domínio da segurança e da defesa e Incrementar o esforço que vem sendo
desenvolvido na área da cooperação técnico‐militar” (CEDN,2013:35).
A Cooperação Técnico‐Militar (CTM) é desenvolvida com os PALOP desde a
década de oitenta do século passado, embora se tenha iniciado com ajudas de caráter
pontual, logo após as independências daqueles países. Pretende afirmar a presença de
Portugal no mundo, contribuir para o apoio ao desenvolvimento, para o estreitamento
da cooperação na CPLP e para a estabilidade dos PALOP e de Timor Leste. É
34 Luís Campos Ferreira, Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Cooperação ‐ Opinião, Jornal Público de 25.03.2014, disponível em http://www.publico.pt/política/noticia/o‐novo‐conceito‐estrategico‐da‐cooperacao‐portuguesa‐20142020‐1629575
41
operacionalizada através de projetos inscritos nos Programas‐Quadro da Cooperação
Portuguesa e centra‐se fundamentalmente na capacitação institucional, formação
militar e serviços (fardamento e equipamento). De 1993 a 2011, “(…) participaram em
ações de CTM 3 775 militares das Forças Armadas Portuguesas” (DGPDN, cit. em
Figueiredo, 2011: 6).
Fig. 4 – Cooperação Técnico‐militar com os PALOP
FONTE: Ministério da Defesa, http://www.emgfa.pt/
II.2.2 – Trazer África para a Europa
No contexto europeu, Portugal tem promovido, em muito, as questões
Áfricanas junto dos seus parceiros europeus. ‐ “(…) temos no âmbito da União
Europeia (…) desenvolvido uma atividade consistente e permanente (…) no sentido de
reforçar o diálogo euro‐Áfricano, como prioridade no topo da agenda externa
(Antunes, 2007:12).
O exercício da Presidência rotativa do Conselho da União Europeia
representou, naturalmente, um momento de particular relevo e utilidade nesse
42
sentido35. A 3ª Presidência Portuguesa, no segundo semestre de 2007, foi, a este título,
emblemática, mas não exclusiva.
A vertente externa foi sempre considerada uma prioridade nos Programas das
várias Presidências Portuguesas do Conselho da UE.
A Presidência Portuguesa do Conselho da UE no primeiro semestre de 1992,
estabeleceu três prioridades: consolidar o Tratado da União Europeia (Tratado de
Maastricht), reforçar as relações com o resto do mundo36 e perspetivar o alargamento.
O Tratado de Maastricht representou um importante avanço na política de cooperação
para o desenvolvimento37, questão importante nas relações da Europa com África. O
Ponto 13 das Conclusões do Conselho Europeu de junho de 199238 é dedicado às
Relações entre a Comunidade Europeia e seus Estados‐membros e os países em
desenvolvimento e o ponto 16 refere‐se às questões da África Austral (situação na
África do Sul e também de Moçambique).
No Relatório para o Conselho Europeu de Lisboa sobre a evolução provável da
Política Externa e de Segurança Comum (PESC) com vista à identificação de áreas
passíveis de ações comuns em relação a determinados países ou grupos de países que
constitui o Anexo I daquelas Conclusões, o Conselho Europeu defende a particular
importância das relações Norte‐Sul e refere que a União poderá desenvolver as suas
atividades em relação aos países de África (e também América Latina, Caraíbas e da
Ásia) em todas as vertentes das suas relações (por exemplo, políticas externa, de
segurança, económica e de desenvolvimento), de maneira a contribuir para o
desenvolvimento dessas regiões (ponto 17 do Relatório).
35 Afloramos aqui de alguma forma a Europeização no sentido bottom‐up que, muito embora não corresponda ao nosso objeto de estudo, é consequente para a nossa análise, como referimos no Capítulo I.
36 Recorde‐se a assinatura do Acordo‐Quadro de Cooperação entre a Comunidade Económica Europeia e a República Federativa do Brasil, em Brasília, em 29 de junho.
37 Com este Tratado, a Política de desenvolvimento é formalmente assumida, com objetivos definidos no artigo 130 U do Tratado.
38 Conclusões da Presidência, Conselho Europeu de Lisboa, 26/27 de junho de 1992, disponível em: http://www.european‐council.europa.eu/media/848538/1992_junho_‐_lisboa__p_.pdf
43
Note‐se, finalmente, que data de 1992 o Primeiro Programa Indicativo Regional
de Cooperação da Comunidade Europeia com os PALOP (PIR PALOP) no âmbito da
Convenção de Lomé IV. O PIR tinha como objetivos específicos a promoção dos
sistemas de educação, a formação no domínio da saúde, o reforço/capacitação
institucional e a cooperação cultural39.
Nas vésperas da segunda Presidência Portuguesa do Conselho da UE, o
Programa do XIII Governo Constitucional (1995‐1999) definia já que “(…) Ao nível da
União Europeia, Portugal deverá atuar como um agente de sensibilização para os
problemas do continente Áfricano e assumir uma postura político‐diplomática de
promoção e aprofundamento do diálogo euro‐Áfricano” (Paiva,2013:131).
De facto, a segunda Presidência Portuguesa que decorreu de 1 de Janeiro a 30
de junho de 200040 ficaria marcada pela realização da 1ª Cimeira África‐Europa, que
decorreu sob a égide da Organização da Unidade Áfricana (OUA) e da UE, no Cairo, a 3
e 4 de abril, que adotou o Plano de Ação do Cairo. Esta Cimeira é um marco
fundamental nas relações entre os dois continentes e, certamente, um ponto de
viragem na abordagem da UE.
Mas foram várias as iniciativas promovidas por esta Presidência Portuguesa:
“Logo em janeiro de 2000, a Presidência organizou um Conselho Informal dos Ministros do Desenvolvimento que inaugurou o debate sobre as condições para uma «Nova Parceria entre a União Europeia e África» e foi dado um importante impulso para a aprovação de uma nova convenção entre a UE e os países do Grupo ACP (África, Caraíbas e Pacífico) mediante a revisão da Convenção de Lomé”. (Ferreira‐Pereira,2008:139).
O Conselho Europeu de Santa Maria da Feira, de 19 e 20 de junho, (Conclusões
da Presidência), reiterou os compromissos assumidos no Cairo, congratulou‐se com a
disponibilidade manifestada por Portugal de acolher a próxima Cimeira Europa‐África
em Lisboa, em 2003, (o que acabaria por ser adiado) e reiterou a sua disponibilidade
39 Os projetos incluíam formação em Portugal, promoção da língua portuguesa e cooperação com Portugal em geral.
40 Período no qual Portugal assumiu igualmente a Presidência da União da Europa Ocidental (UEO).
44
para continuar a apoiar medidas que visem um rápido crescimento económico e um
desenvolvimento sustentável em África.
Mas a Presidência foi, ainda, marcada pela assinatura do Acordo de Parceria
entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico (ACP) e a Comunidade Europeia e
os seus Estados‐Membros, em Cotonu, a 23 de Junho (Acordo de Cotonu)41.
O Programa42 da terceira Presidência Portuguesa do Conselho da UE, que
decorreu de 1 de julho a 31 de dezembro de 2007, reflete, no domínio externo43 um
dos eixos da Política Externa Portuguesa, as relações com África:
África e a Europa têm uma história recente de oportunidades perdidas. Chegou o momento de acordarem numa Estratégia Conjunta. Temos de agir juntos e sermos vistos a agir em concerto. A ênfase que colocamos na realização em Lisboa da Cimeira entre a UE e África resulta desta perceção (Programa da Presidência Portuguesa de 2007).
Como refere Lobo Antunes (2007:11), um dos pontos centrais da Política
Externa para África foi, nas vésperas da terceira Presidência Portuguesa, uma
aproximação efetiva à União Áfricana44, mas também às organizações sub‐regionais,
em particular a Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) e a
Comunidade Económica dos Estados da África Austral (CEDEAO).
Como se pode ler no Balanço da Presidência Portuguesa de 200745,
41 O Acordo foi assinado entre os países ACP e os então 15 Estados‐membros da UE, no dia 23 de junho de 2000, na cidade de Cotonu, no Benim.
42 Portugal integrou o trio de Presidências (Alemanha, Portugal, Eslovénia) que elaborou um Programa do Trio para os dezoito meses, a partir do qual cada uma das Presidências apresentou o Programa para o seu semestre. Prioridades da Presidência Portuguesa disponíveis em https://infoeuropa.eurocid.pt/registo/000038660/documento/0001/
43 Não podemos esquecer que a Presidência Portuguesa ficou marcada pela adoção da Estratégia de Lisboa, um marco fundamental no processo de integração europeia, mas o enfoque do nosso estudo reside na dimensão externa na qual Portugal obteve também resultados, naturalmente, no quadro da atuação de todas as instituições comunitárias e dos parceiros europeus.
44 Nesse sentido Portugal nomeou um Embaixador em Addis Abeba , na Etiópia.
45 Balanço do Ministério dos Negócios Estrangeiros disponível em https://infoeuropa.eurocid.pt/registo/000040070/documento/0001/
45
Portugal continuou a desenvolver e a reforçar uma persistente ação diplomática
em diversas instâncias incluindo junto da União Áfricana, tendo em vista o
reforço do diálogo euro‐Áfricano, a finalização dos documentos a serem
apresentados na 2ª Cimeira e a efetiva realização e sucesso deste encontro.
Esta Presidência ficaria, pois, marcada pela realização da 2ª Cimeira UE‐África,
em Lisboa, a 8 e 9 de dezembro, na qual foi adotada a Estratégia Conjunta UE‐África
que estabelece, na relação entre os dois continentes, um novo paradigma de
verdadeira parceria entre iguais.
A Estratégia Conjunta constitui e estabelece os princípios, objetivos,
metodologia e grandes áreas de interesse comum, cujas medidas são depois
desenvolvidas no Plano de Ação. A Declaração de Lisboa, igualmente adotada nesta
Cimeira, destaca a alteração estratégica no relacionamento entre os dois continentes,
bem como os mecanismos de seguimento da Cimeira.
No decorrer desta Presidência Portuguesa foram igualmente assinados dois
documentos relevantes: o Memorando de Entendimento entre a Comissão Europeia os
PALOP e Timor‐Leste (que deu continuidade ao PIR PALOP), no quadro do 10º Fundo
Europeu de Desenvolvimento (FED) e o Memorando de Entendimento entre a Comissão
Europeia e o Secretariado Executivo da CPLP, com o objetivo de reforçar a concertação, a
cooperação e a coordenação no sentido de promover a eficácia dos projetos conjuntos.
Digno de nota muito em particular, é a assinatura da Parceria Especial entre a
União Europeia e Cabo Verde, a primeira que a União estabeleceu com um país ACP,
que veremos com maior detalhe nos capítulos seguintes, dada a sua centralidade no
presente estudo.
46
CAPÍTULO III – A AÇÃO EXTERNA DA UE
III.1 – Evolução histórica, natureza e prioridades geográficas
Tendo em mente o objetivo da nossa reflexão é importante considerar a Ação
Externa da UE.
Referimos, de forma consciente, Ação Externa e não Política Externa.
Pretendemos, desta forma, acautelar as diferenças entre a Política Externa do ator‐
Estado e a ação no domínio externo de uma realidade híbrida que (pelo menos por
ora) não é assimilável ao ator‐Estado. Fazemos, simultaneamente, remissão à própria
terminologia do Tratado de Lisboa46, mas consideramos igualmente a dimensão
externa das políticas internas, de peso cada vez maior (veja‐se, por exemplo, o peso
das questões migratórias na dimensão da segurança).
Apesar de tudo, muito se tem evoluído (embora de forma algo lenta) na
dimensão externa da UE quer do ponto de vista do direito internacional quer do ponto
de vista das relações internacionais.
Como refere Severiano Teixeira, “A construção europeia tem, inequivocamente,
uma dimensão internacional (…) sendo hoje, um dos atores centrais da cena
internacional contemporânea” (Teixeira, 1998:121).
A dimensão internacional iniciou‐se no domínio da Política Comercial Comum.
Nas décadas de cinquenta e sessenta do século passado,
“ (…) a Comunidade desenvolveu e assegurou uma presença internacional de
algum relevo através das suas relações económicas internacionais, que se
materializavam numa poderosa e complexa rede de acordos comerciais “
(Teixeira,1998:123).
Depois do fracasso da Comunidade Europeia de Defesa, o mecanismo de
coordenação das políticas externas nacionais (Cooperação Política Europeia ‐ CPE) de
natureza puramente intergovernamental, criado por força das circunstâncias, evoluiu e
46 Sob esta designação o Tratado inclui os domínios materiais enquadrados formalmente nesta categoria e as respetivos regras e procedimentos, deixando, contudo, de fora a dimensão externa das políticas internas que serão igualmente consideradas nesta reflexão.
47
veio a ser institucionalizado através do Ato Único Europeu que procedeu à
consagração de uma prática pré‐existente.
A sua substituição foi operada pelo Tratado de Maastricht, em 1992, através do
segundo pilar da União Europeia, com a Política Externa e de Segurança Comum (PESC)
que alargou os objetivos da CPE. Pouco depois, o Tratado de Amesterdão, em 1997,
introduzia duas alterações importantes: a criação do Alto Representante para a PESC
(um rosto para a Ação Externa da UE) e as “missões de Petersberg” (missões
humanitárias e de evacuação, missões de manutenção da paz e missões de forças de
combate para a gestão de crises, incluindo missões de restabelecimento da paz).
O Tratado de Lisboa “(…) reconfigurou a atuação externa da União Europeia”
(Mesquita, 2011: 15). Com efeito, o Tratado, que elimina a estrutura de pilares,
procede a algumas inovações/alterações significativas: a atribuição de personalidade
jurídica à UE, a organização de uma série de domínios sob o chapéu das relações
externas, bem como diversas alterações orgânicas. São criados o cargo do Presidente
do Conselho Europeu, de Alto Representante para os Negócios Estrangeiros e
estabelecido um Serviço Europeu de Ação Externa (SEAE). Todavia, tudo continua a
depender, em última instância, dos Estados‐membros, não tendo efetivamente havido
uma plena comunitarização da PESC. Como adianta Goucha Soares,
“(…) o Tratado de Lisboa permitiu a entrada em vigor de um conjunto de novos meios de natureza política, diplomática e militar que, se devidamente implementados, consentirão à Europa aspirar a um nível de protagonismo na cena internacional mais consentâneo com aquele que desempenha no quadro das relações econômicas externas. (…) A concretização de uma política externa europeia e de uma política de defesa dependerá, todavia, da vontade política dos Estados‐membros (Soares, 2011:102).
Atualmente, os domínios incluídos diretamente na Ação Externa da UE são a
Política Externa e de Segurança Comum, a Política Comercial Comum, a Cooperação
com países terceiros (cooperação para o desenvolvimento, cooperação económica,
financeira e técnica) e a Ajuda Humanitária.
48
Sendo o maior bloco comercial do mundo, as relações comerciais da UE são
centrais nas relações externas da União. A Política Comercial Comum (PCC) é
efetivamente uma política comum na qual se reflete o caráter supranacional do
projeto europeu. Desde 1957, a PCC tem vindo a tornar‐se cada vez mais abrangente
no sentido de dar resposta à evolução do comércio internacional.
Igualmente central nas relações externas é a política de cooperação para o
desenvolvimento. Tal como se lê na Comunicação da Comissão Europeia, Aumentar o
impacto da política de desenvolvimento da UE: uma Agenda para a Mudança,
“Nos termos do Tratado de Lisboa, o apoio aos esforços empreendidos pelos
países em desenvolvimento para erradicar a pobreza constitui uma prioridade
da ação externa da UE e o objectivo primeiro da sua política de
desenvolvimento. Esta política contribui igualmente para fazer face a outros
desafios globais e ajuda a concretizar a Estratégia Europa 2020” (Comissão
Europeia, 2011:3).
A UE é hoje, de acordo com os dados da OCDE, o maior doador de ajuda ao
desenvolvimento. “A Ajuda Pública ao Desenvolvimento (APD) concedida pela UE no
seu conjunto (instituições e Estados‐Membros) aumentou, passando de 55,3 mil
milhões de euros em 2012 para 56,5 mil milhões em 2013” (Comissão Europeia, 2014).
Também no domínio da Ajuda humanitária a UE ocupa lugar de destaque:
“Atualmente, a União disponibiliza, em média, mais de mil milhões de euros
por ano para apoiar as populações mais vulneráveis no mundo inteiro. Se
juntarmos a este montante o financiamento concedido pelos Estados‐
Membros, a União Europeia é o principal doador de ajuda humanitária a nível
mundial, contribuindo com mais de metade da ajuda humanitária oficial”
(Comissão Europeia, 2014:10).
A UE mantem relações diplomáticas com praticamente todos os países do
mundo e participa de forma ativa numa série de organizações internacionais, tomando
inclusive posições concertadas, em determinados domínios, no seio das Nações
Unidas. Existem atualmente cento e trinta e nove delegações e escritórios da UE em
49
todo o mundo. A União tem vindo a desenvolver relações privilegiadas com parceiros
estratégicos
“ (…) cujo apoio e cooperação é essencial para enfrentar os grandes desafios
globais em termos de segurança, desenvolvimento sustentável ou na luta
contra as mudanças climáticas (…) EUA, Canadá, México, Brasil, China, Rússia,
India, África do Sul, Japão e Coreia do sul” ( Zacarias, 2013:19).
No domínio das relações externas regionais e na medida em que, por força do
objeto do nosso estudo, as relações com África serão objeto de um sub‐capítulo
especifico, afigura‐se importante fazer uma referência muito particular à Política
Europeia de Vizinhança (PEV). Trata‐se, efetivamente, de matéria relevante na Ação
Externa da UE e que não é inconsequente para a Política Externa Portuguesa, como
veremos.
A PEV foi lançada em 2003 com base na consciência de que “ (…) a
capacidade de a União garantir a segurança, a estabilidade e o desenvolvimento
sustentável aos seus cidadãos passará a ser indissociável do seu empenhamento numa
cooperação estreita com os países vizinhos” (Comissão Europeia, 2003:1). Trata‐se da
vizinhança a leste (Arménia, Azerbaijão, Bielorrússia, Geórgia, Moldávia e Ucrânia) e a
sul (Argélia, Autoridade Palestiniana, Egipto, Israel, Jordânia, Líbano, Líbia, Marrocos,
Síria e Tunísia).
Os movimentos gerados pela Primavera Árabe viriam atribuir enorme
atualidade à PEV, motivando igualmente a sua adaptação, na procura de uma maior
coerência e eficiência. “Os movimentos de contestação, exigindo mudanças estruturais
nos países da vizinhança sul motivaram, assim, o reajustamento de prioridades (…) do
Leste para o Mediterrâneo” (Graça, 2013: 74).
A região do Mediterrâneo reveste‐se de grande importância estratégica para
a União em termos económicos (comércio, energia e migração) e no domínio político
(segurança, estabilidade).
Acresce que existe a perceção de que aqui também se joga o papel da UE
como ator do sistema internacional e tem‐se assistido, por força de toda uma série de
fatores, a uma maior convergência dos Estados‐membros relativamente aos países do
50
Magrebe. As questões de segurança, energéticas ou das migrações são algumas das
grandes questões que impelem a UE a uma maior ação junto desta zona do globo.
Numa recente Comunicação Conjunta da Alta Representante da UE para os Negócios
Estrangeiros e a Política de Segurança, a UE reconhece a necessidade de apoiar “(…)
uma cooperação mais estreita entre os países do Magrebe, a partir da sua ampla
experiência de integração e tendo em conta o seu interesse na região como vizinho e
parceiro essencial dos cinco países em causa” (Comissão Europeia, 2012:2).
Assim, e como vimos de forma necessariamente sucinta, a Ação Externa da UE tem
vindo a evoluir,mas apresenta diversos contornos no quadro dos quais se pode inserir a
relação com o continente Áfricano. Por outro lado, trata‐se de questão fundamental na
compreensão do impato do processo europeu nas políticas externas nacionais, o que é
relevante para o nosso estudo.
III.2 – África na agenda europeia
III.2.1 ‐ Da Declaração Schuman à Declaração da IV Cimeira UE‐África
A Europa e a África são continentes vizinhos com relações ancestrais. Para a
economia deste estudo, interessa‐nos (tendo em vista enquadrar o objeto desta
investigação) aflorar as relações da UE com o continente Áfricano, com os PALOP e,
muito em particular, com Cabo Verde.
As relações da Europa com o continente Áfricano foram, desde o início,
inscritas no projeto europeu – Como escreve Andreia Henriques (2009:6), “A
reestruturação das relações da Europa com as colónias e ex‐colónias constituiu uma
parte essencial da criação da então Comunidade Económica Europeia”. Nos seis países
fundadores, encontravam‐se países com relações coloniais e a França desempenhou,
a este título, um papel relevante.
Nos termos da Declaração Schuman, de 9 de maio de 1950, Com meios
acrescidos, a Europa poderá prosseguir a realização de uma das suas funções
essenciais: o desenvolvimento do continente Áfricano47.
47 Disponível em http://europa.eu/about‐eu/basic‐information/symbols/europe‐day/schuman‐declaration/index_pt.htm
51
O Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia48, no seu Preâmbulo
estabelece que a Comunidade pretende confirmar a solidariedade que liga a Europa e
os países ultramarinos, e deseja assegurar o desenvolvimento da prosperidade destes.
Nesse sentido, a Parte IV do Tratado de Roma é consagrada à associação dos
países e territórios ultramarinos, estabelecendo que Os Estados‐membros acordam em
associar à Comunidade os países e territórios não europeus que mantêm relações
especiais com a Bélgica, a França, a Itália e os Países Baixos (…) A finalidade da
associação é promover o desenvolvimento económico e social dos países e territórios e
estabelecer relações económicas estreitas entre eles e a Comunidade no seu conjunto
(art.º 131, nº 1 e 2). A Convenção anexa ao Tratado fixa as modalidades e o processo
desta associação.
No início, as relações foram, pois, marcadas pelo paradigma da ajuda ao
desenvolvimento, tendo sido criado, para esse efeito, o Fundo Europeu para o
Desenvolvimento (FED).
A restrição da cooperação aos territórios ultramarinos e associados, a evolução
das perspetivas no domínio da cooperação e as mudanças, entretanto, operadas no
continente Áfricano, designadamente em resultado dos processos de independência
nos finais dos anos cinquenta estiveram na base da Convenção de Yaoundé, em
196349.
A Convenção de Yaoundé incluía dois tipos de cooperação: a ajuda ao
desenvolvimento e a promoção de relações comerciais com acesso privilegiado. A
Convenção Yaoundé I (1963‐69) e Yaoundé II (1969‐75) financiadas, respetivamente,
pelo FED II (1964‐1970) e FED III (1970‐1975) previam, em grande parte, o apoio à
África francófona, na sua fase de descolonização.
48 Hoje conhecido por “Tratado de Roma” e que está disponível em: https://infoeuropa.eurocid.pt/opac/?func=service&doc_library=CIE01&doc_number=000037605&line_number=0001&func_code=WEB‐FULL&service_type=MEDIA
49 Convenção assinada na capital da República dos Camarões, em 1963, entre os seis fundadores da CEE e dezoito Estados Áfricanos e Madagáscar.
52
O enquadramento foi alterado na década de setenta, com alteração da
abordagem europeia da política de cooperação (de tendência mais global) e com uma
Comunidade agora alargada à Irlanda, Dinamarca e Reino Unido.
No ano de 1975 foi assinado o Acordo de Georgetown50 que criou formalmente
o Grupo ACP e a Convenção de Lomé que, sujeita a várias revisões e atualizações51,
constituiu o enquadramento das relações entre a CEE/UE‐Países ACP até 2000. A
entrada do Reino Unido na CEE e a necessidade de acomodar os países da
Commonwealth estiveram subjacentes a esta fase da cooperação europeia.
Assim, o atual Acordo de Cotonou52, assinado em 2000, revisto em 2005 e 2010
e em vigor até 2020, baseia‐se em várias décadas de cooperação entre os países ACP
(um grupo que se foi alargando ao longo do tempo) e a União Europeia.
Fig.5 – A cooperação europeia com os países ACP: de Yaoundé a Cotonu
Tratado de Roma Convenção Yaoundé Convenção de Lomé Acordo de Cotonu
Yaoundé I Yaoundé II Lomé I Lomé
II
Lomé
III
Lomé IV
2000
2005
2010
1957 1964 1969 1975 1980 1985 1990
Regime de
associação
Cooperação financeira, técnica e comercial (acordos comerciais preferenciais)
Ajuda ao desenvolvimento. Cooperação comercial.
STABEX53.SYSMIN54.
Direitos humanos
Cooperação para o Desenvolvimento
Cooperação económica e comercial
Dimensão política
FED I
FED II
FEDIII
FEDIV
FEDV
FED VI
FEDVII+VIII
FED IX
FEDX
UE 6 UE 6 UE 6 UE 9 UE 9 UE10 UE12 EU 15
UE25 UE27
17 ACP 18 ACP 18 ACP 46 ACP 58 ACP 65 ACP 68 ACP 77 ACP
77 ACP
79ACP
Fonte: Elaboração própria
50 Disponível em: http://www.caricom.org/jsp/secretariat/legal_instruments/georgetownagreementonacp.jsp?menu=secretariat 51 Assinada entre a CEE e 46 países ACP, em 1975, prolongou a sua vigência até ao ano de 2000 : Lomé I (o acordo inicial de 1975 a 1980), Lomé II (1980‐1985), Lomé III (1985‐1990) e Lomé IV (1990‐2000).
52 Acordo 2000/483/CE de parceria entre os Estados de África, das Caraíbas e do Pacífico e a Comunidade Europeia e os seus Estados‐Membros, assinado em Cotonu, em 23 de Junho de 2000 ‐ JOUE nº L 317 de 15/12/2000 p. 0003 ‐ 0353
53 Sistema de Estabilização das receitas de exportação no domínio agrícola
54 Apoio à atividade mineira
53
Ao diálogo regional e à cooperação com países e regiões Áfricanas acresce a
dimensão do diálogo continental.
Esta dimensão continental só surgiu com a realização da 1ª Cimeira UE‐África
que teve lugar no Cairo, Egipto, em abril de 2000. O Plano de Ação do Cairo55 definiu
cinco grandes áreas para a cooperação entre os dois continentes: Questões
económicas (cooperação e integração económicas regionais em África), integração de
África na economia mundial56, direitos humanos, governação e Estado de direito, paz,
prevenção, gestão e resolução de conflitos e questões de desenvolvimento.
Este Plano previa a realização de uma nova Cimeira três anos depois, o que
todavia, não veio a acontecer, em parte por força da problemática da participação do
Zimbabué57, embora a dinâmica do diálogo tenha progredido através de reuniões
ministeriais.
Entretanto, a Estratégia da UE para África58, aprovada em 2005 sob Presidência
Britânica, “constituiu um primeiro passo destinado a criar uma nova base nas relações
entre os dois continentes deixando para trás o paradigma pós‐colonial e lançando um
novo paradigma de diálogo estratégico que aborda questões globais” (Eurodefense –
Portugal, 2007:5). Para além das prioridades identificadas no Cairo, dois tópicos
assumem agora grande importância dada a sua atualidade: a luta contra o terrorismo e
os fluxos migratórios. Procurava‐se, em simultâneo, promover uma maior coerência
entre as várias políticas consequentes neste domínio, designadamente a ajuda ao
desenvolvimento, o comércio, a defesa, as migrações e a política agrícola.
A Europa e a África viriam a conhecer mudanças que estiveram na base da
evolução do relacionamento entre os dois continentes vizinhos. Destaque‐se, ao nível
55 Disponível em http://www.summits.aip.pt/África/docs/The_Cairo_Action_Plan_EN.pdf
56 Incluindo comércio, desenvolvimento do sector privado, investimento, desenvolvimento de recursos, infraestruturas industriais, tecnologia, dívida externa e cooperação em fora internacionais.
57 O Zimbabué é país membro da UA. Todavia, a questão da participação do Presidente Robert Mugabe, alvo de sanções por parte da UE por violação dos direitos humanos e repressão da oposição, foi questão de sensibilidade política e diplomática acrescida no quadro da preparação da 2ª Cimeira.
58 Comunicação da Comissão ao Conselho, ao Parlamento Europeu e ao Comité Económico e Social Europeu Estratégia da UE para África: rumo a um Pacto Euro‐Áfricano a fim de acelerar o desenvolvimento de África – COM (2005) 489 final, Bruxelas, 12.10.2005.
54
europeu, o desenvolvimento da PESC e PCSD; ao nível Áfricano, a transformação da
Organização da Unidade Áfricana na União Áfricana e o lançamento da Nova Parceria
para o Desenvolvimento da África (NEPAD).
A Estratégia Conjunta UE‐África adotada na 2ª Cimeira UE‐África, realizada em
Lisboa, em 2007, foi mais longe. Pela primeira vez estamos perante uma Estratégia
conjunta e um Plano de Ação que resultam de um trabalho conjugado com o lado
Áfricano, envolvendo também atores não‐estatais e as sociedades civis Áfricana e
europeia. A cooperação articula‐se em torno de oito parcerias temáticas previstas no
Plano de Acão e lideradas por copresidências Áfricanas e europeias (“chefs‐de‐file”):
1ª Parceria: Paz e Segurança; 2ª Parceria: Governação Democrática e Direitos Humanos 3ª Parceria: Comércio, Infraestruturas e Integração Regional; 4ª Parceria: Objetivos de Desenvolvimento do Milénio; 5ª Parceria: Energia; 6ª Parceria: Alterações Climáticas; 7ª Parceria: Migrações, Mobilidade e Emprego; 8ª Parceria: Ciência, Sociedade de Informação e Espaço.
A 3ª Cimeira UE‐África (Tripoli, Líbia, em 2010), adotou um novo Plano de Acão
da Estratégia Conjunta para o triénio 2011‐2013 que procurou aprofundar as ações
conjuntas de cada uma das oito parcerias temáticas, reduzindo, simultaneamente, o
número de áreas prioritárias em cada parceria.
Sob o lema Investir nas pessoas, na prosperidade e na paz, a 4ª Cimeira dos
Chefes de Estado e de Governo, reunidos em Bruxelas, em 3 e 4 de abril de 2014,
reafirmou os princípios e objetivos da Estratégia Conjunta, reconheceu os progressos
já alcançados e definiu cinco áreas prioritárias para o período de 2014 a 2017: Paz e
Segurança; Democracia, Boa Governação e Direitos Humanos; Desenvolvimento
humano; Desenvolvimento e Crescimento Sustentável e Inclusivo e Integração
Continental; Questões Globais e Emergentes. Tal como consta na Declaração final da
Cimeira, a UE compromete‐se a assegurar para 2014‐2020 mais de 28 mil milhões de
euros para África, para além da cooperação bilateral dos seus Estados‐membros.
Na abertura da Cimeira, o Presidente da Comissão defendeu que a Parceria
entre a Europa e África é fundamental para os interesses mútuos, afirmando que “a
55
vossa paz é a nossa paz, a vossa prosperidade, o bem‐estar dos vossos povos é
também o bem‐estar dos nossos povos”.
A questão da segurança é cada vez mais um dos desafios comuns. Recorde‐se a
este título que “Na última década foram enviadas para o continente Áfricano, ao
abrigo da Política Comum de Segurança e Defesa, 16 missões de gestão de crises
destinadas a manter a paz e a prevenir conflitos: sete missões militares59 (…) e nove
missões civis60” (Conselho da UE, 2014).
Várias questões criam hoje uma urgência no diálogo com África: a necessidade
de combater o terrorismo e a criminalidade organizada (a dimensão da segurança cada
vez mais presente); a necessidade de dar resposta às situações de desagregação e de
guerra civil em muitos Estados Áfricanos; mas também as questões climáticas e os
fluxos migratórios. E, por último, mas não menos importantes, a afirmação da UE
como ator global junto de outras potências que competem em África pelos recursos
energéticos presentes no continente Áfricano.
Kotsopoulos, Faria e Olsen, três analistas citados por Maria da Costa Ferreira
(2008: 52) consideram que, de alguma forma, o continente Áfricano constitui
“terreno” para ensaio da visão integrada nas relações externas que a UE tem
procurado vir a desenvolver.
A política da UE para o continente Áfricano tem, pois, evoluído nas últimas
décadas.
Em todo o caso, é importante ter em consideração que na UE, atualmente
composta por vinte e oito Estados‐membros, coexistem diversas perceções neste
domínio.
Com efeito, dentro da UE, alguns Estados‐membros mantêm relações
privilegiadas com os países Áfricanos ‐ é o caso de Portugal, mas também da França e
do Reino Unido. Mas, por outro lado, as questões Áfricanas não são prioritárias para
59 ARTEMIS e EUFOR República Democrática do Congo, EUFOR Chade/República Centro Áfricana, UE NAVFOR ATALANTA, EUTM Somália, EUTM Mali, EUFOR República Centro Áfricana.
60 EUPOL, Quinxassa, República Democrática do Congo, EUSEC RDC, Apoio à AMIS II, Sudão Darfur, EUPOL RDC, EUSSR, Guiné‐Bissau, EUAVSEC, Sudão do Sul, EUCAP NESTOR, EUCAP Sael, Níger, EUBAM, Líbia.
56
outros Estados‐membros, designadamente para os mais recentes Estados‐membros da
Europa mais a leste, os quais representam hoje uma parcela significativa da União.
III.2.2 – A cooperação europeia com os PALOP ‐ o caso de Cabo Verde
No quadro da sua política de cooperação para o desenvolvimento em geral e do
seu relacionamento com os países ACP, a UE, desenvolve relações com os PALOP,
através de Programas Regionais, tais como previstos logo no articulado da Convenção
de Lomé.
O primeiro PIR foi assinado em 1992 (PIR‐PALOP I) e contou com uma dotação
global de 25 milhões de euros e o segundo em 1997 (PIR PALOP II) com um orçamento
de 30 milhões de euros, com o objetivo de promover a boa governação e o
desenvolvimento económico e social daqueles países e incluindo projetos nos
domínios da reforma da administração pública, da justiça, da educação, da cultura e da
estatística.
Já no quadro do Acordo de Cotonu, foi assinado, em novembro de 2007 um
Memorando de Entendimento com a Comissão Europeia61 que tem por principal
objetivo estabelecer orientações gerais para a cooperação entre a Comissão Europeia e
o grupo dos seis países ACP62 em causa. A cooperação no domínio da governação
democrática tem em conta quatro dimensões: a governação política, eficácia do
Governo, governação económica e governação social.
Dentro dos PALOP, a cooperação da UE com Cabo Verde merece uma particular
atenção por dois motivos. A relação UE‐Cabo Verde reveste‐se de características muito
específicas no universo dos países ACP e dos PALOP e, naturalmente, trata‐se de
questão crucial para a nossa reflexão.
61 Memorando de Entendimento entre a Comissão Europeia, por um lado, e os Países Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa (PALOP) e Timor‐Leste por outro, assinado em Lisboa e disponível em https://infoeuropa.eurocid.pt/files/database/000040001‐000041000/000040062.pdf
62 Angola, Cabo Verde, Guiné‐Bissau, Moçambique, S. Tomé e Príncipe e Timor Leste.
57
Sendo certo que as relações com a UE remontam à independência do país, o
relacionamento foi institucionalizado em 1977 quando o país aderiu à Convenção de
Lomé.
A UE é hoje um dos principais parceiros de Cabo Verde, no quadro do atual
Acordo de Cotonu e da Parceria Especial, celebrada em 2007.
Com efeito, na sequência da Comunicação da Comissão Europeia sobre o futuro
das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde63, e das
subsequentes Conclusões do Conselho64 sobre a matéria, foi adotada a Parceria
Especial UE‐Cabo Verde.
Fig.6: Parceria Especial UE‐Cabo Verde
FONTE: Serviço Europeu de Ação Externa (http://eeas.europa.eu/delegations/cape_verde/documents/relacoes_entre_a_ue_e_cv_2012_pt.pdf)
A Parceria Especial traduz uma abordagem política que pretende ultrapassar o
paradigma da relação dador‐beneficiário e dar resposta a interesses comuns.
Desenvolve, sem contudo substituir, o Acordo de Cotonu.
63 Comunicação da Comissão ao Conselho e ao Parlamento Europeu sobre o futuro das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde, COM (2007) 641 final, Bruxelas, 24.10.2007
64 Conclusões do Conselho e dos representantes dos Governos dos Estados‐membros reunidos no Conselho relativas ao futuro das relações entre a União Europeia e a República de Cabo Verde adotadas no Conselho Assuntos Gerais e Relações Externas de 19 de Novembro de 2007 – Disponíveis em: http://register.consilium.europa.eu/doc/srv?l=PT&f=ST%2015114%202007%20INIT
58
A abordagem é, assim, política, de complementaridade (para além do FED são
utilizados outros instrumentos como o Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional –
FEDER), progressiva e baseada nos princípios de boa governação, de integração
regional (promovendo a aproximação de Cabo Verde às Regiões Ultraperiféricas ‐RUP65
66‐ e à África Ocidental, no âmbito da CEDEAO) e de convergência (convergência em
matéria de normas e padrões).
Nos termos do Quadro Orientador para a implementação (23 de outubro de
2008)67, a Parceria assenta em seis pilares:
i) Boa governação;
ii) Segurança e estabilidade;
iii) Integração regional;
iv) Transformação e modernização;
v) Sociedade do conhecimento e da informação;
vi) Luta contra a pobreza e desenvolvimento.
O apoio económico da UE a Cabo Verde é muito significativo. Com efeito, “ (…)
o montante financeiro das ajudas da UE a Cabo Verde desde 1977, ano em que a
República de Cabo Verde começou a beneficiar de fundos no âmbito do 4º FED,
ultrapassa os 300 milhões de euros” (Pinto Teixeira,2012:5).
A UE é o principal parceiro comercial de Cabo Verde. Acresce que Cabo Verde
obteve em dezembro de 2011, um regime comercial especial, o designado Sistema de
Preferências Generalizadas Plus (SPG+) através do qual pode exportar parte
significativa dos seus produtos com tarifa zero.
65 São regiões ultraperiféricas da UE: Guadalupe, Guiana Francesa, Reunião, Martinica, Maiote, São Martinho (França), Açores e Madeira (Portugal) e Ilhas Canárias (Espanha).
66 A UE prevê medidas especiais para apoiar o desenvolvimento das regiões ultraperiféricas tendo em vista atenuar as limitações que estas regiões conhecem em função da sua localização remota. Esta situação tem a sua base legal no artigo 349.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE).
67 Documento disponível em http://www.governo.cv/documents/Parceria_especial_UE.pdf
59
Por outro lado, a questão da segurança revela‐se um tema absolutamente
crucial no relacionamento da UE com Cabo Verde.
A posição geoestratégica de Cabo Verde e, em consequência, a dimensão
securitária (para além do simbolismo e da dimensão económica) é um elemento
central na Parceria Especial.
Nas suas Conclusões, o Conselho Assuntos Gerais e Relações Externas, de 19 de
Novembro de 2007
“(...) acolhe com agrado a disponibilidade do Governo de Cabo Verde para
promover a segurança coletiva através da cooperação estreita com a União Europeia
em sectores como o controlo dos tráficos (droga, imigração ilegal, armamento, etc), a
luta contra o terrorismo, etc, estes sectores são da maior importância tanto para Cabo
Verde como para a União Europeia”.
E foi, aliás, neste contexto que veio a ser assinada a Parceria para a Mobilidade
UE‐Cabo Verde.
Com efeito, no contexto da Parceria Especial UE‐Cabo Verde foi formalizada, no
Luxemburgo, à margem do Conselho Justiça e Assuntos Internos, de 5 de junho de
2008, uma Declaração Comum entre Cabo Verde, por um lado, e Portugal, Espanha,
França, Luxemburgo68 e a Comissão Europeia, por outro, instituindo uma Parceria para
a Mobilidade com aquele país Áfricano.
A Parceria para a Mobilidade constitui um quadro político para o diálogo e
cooperação reforçados com Cabo Verde no domínio da migração o qual prevê uma
série de iniciativas comunitárias e dos Estados‐membros participantes em três
vertentes das migrações:
Mobilidade, migração legal e integração;
Migração e Desenvolvimento
Gestão de fronteiras, documentos de identidade e viagem, luta contra a
imigração ilegal e tráfico de seres humanos.
68 A que os Países Baixos vieram posteriormente a aderir.
60
Assim, para além de uma Declaração Política, a Parceria inclui em Anexo uma
lista de áreas no quadro das quais têm vindo a ser desenvolvidos projetos69 .
Entretanto, e tal como previsto na Declaração Política, foram celebrados dois
acordos no âmbito da Parceria: um Acordo de Readmissão e um Acordo de Facilitação
de Vistos de Curta Duração. O Acordo de Facilitação de Vistos foi assinado em Cabo
Verde no dia 24 de Outubro de 201270, por ocasião do 5º aniversário da Parceria
Especial e o Acordo de Readmissão em 18 de Abril de 201371.
O Acordo de Facilitação de Vistos com o objetivo de promover a mobilidade,
visa facilitar, numa base de reciprocidade, a emissão de vistos para os cidadãos de
Cabo Verde e da União relativos a estadas por um período máximo de 90 dias em cada
período de 180 dias.
O Acordo de Readmissão visa estabelecer, numa base de reciprocidade,
procedimentos rápidos e eficazes de identificação e de repatriamento ordenado e em
segurança das pessoas em situação irregular nos territórios de Cabo Verde ou de
qualquer dos Estados‐Membros da União, bem como facilitar o trânsito dessas
pessoas, num espírito de cooperação. Note‐se que Cabo Verde é o primeiro país
Áfricano a aceitar a readmissão de nacionais de países terceiros no quadro de um
Acordo de Readmissão com a UE.
Os dois acordos, são, aliás, os primeiros acordos desta natureza que a UE
celebra com um país ACP.
Existe um acompanhamento da aplicação do Plano de Ação da Parceria sob a
forma de reuniões a nível político, O acompanhamento operacional da Parceria é
assegurado pelo “Grupo Local de Seguimento”, estabelecido no quadro da Parceria
Especial, e por reuniões dos Estados‐membros participantes em Bruxelas.
A Parceria para a Mobilidade entre a UE e Cabo Verde tem sido avaliada de
forma muito positiva por ambas as Partes, designadamente nos encontros ministeriais. 69 Os projetos portugueses serão objeto de referência no capítulo seguinte do presente trabalho.
70 Acordo entre a União Europeia e a República de Cabo Verde sobre a facilitação da emissão de vistos de curta duração para os cidadãos da República de Cabo Verde e da União Europeia, publicado no JOUE, série L, n.º 282, de 24/10/2013. 71 Acordo entre a União Europeia e a República de Cabo Verde relativo à readmissão de pessoas que residem sem autorização, publicado no JOUE, série L, n.º 282, de 24/10/2013.
61
Trata‐se de uma Parceria pioneira72 que demonstrou a validade e interesse deste
instrumento da Abordagem Global das Migrações e Mobilidade73 que tem entretanto
vindo a ser aperfeiçoado.
72 Cabo Verde e a Moldávia (2008) foram as primeiras Parcerias assinadas. Entretanto, a UE já celebrou Parcerias para a Mobilidade com a Geórgia (2009), a Arménia (2011), Marrocos (2013), o Azerbaijão (2013) e a Tunísia (2014). 73 A Abordagem Global para a Migração e a Mobilidade (AGMM) é, desde 2005, um quadro abrangente da política externa da UE relativa à migração e asilo com base no qual a UE desenvolve o diálogo político e a cooperação operacional com países e regiões terceiros. Veja‐se sobre esta matéria a recente Comunicação da Comissão Europeia sobre a implementação da AGMM em 2012‐2013 – COM (2014) 96 final de 21.2.2014, disponível em file:///C:/Documents%20and%20Settings/madalena.martins/Os%20meus%20documentos/Downloads/1_PT_ACT_part1_v2.pdf
62
CAPÍTULO IV: AS RELAÇÕES ENTRE PORTUGAL E CABO VERDE
IV.1 – Alguns dados sobre Cabo Verde
Apesar da partilharem um passado e uma língua comum, os PALOP possuem
muitas diferenças “(…) em termos de localização geográfica, dimensão e perfis
socioeconómicos (Chabal, 2002). Os dois maiores (Angola e Moçambique) localizam‐se
na África Austral, os restantes ‐ Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe e a Guiné Bissau ‐ na
África Ocidental. O número de habitantes, o nível de formação ou o PIB são igualmente
fatores que os diferenciam.
Cabo Verde apresenta características únicas.
É um arquipélago de dez ilhas e oito ilhéus, localizado na África Ocidental a
aproximadamente 500km a oeste do Senegal. De reduzida dimensão74, Cabo Verde
ocupa, todavia, uma posição estratégica75 de ligação entre os três continentes,
Áfricano, europeu e americano.
O arquipélago, descoberto pelos portugueses no ano de 1460, foi uma das
colónias portuguesas até 1975. Como colónia teve, apesar de tudo, um estatuto
específico que se traduziu, designadamente, na atribuição de algumas regalias sociais
com consequências, por exemplo, no nível de formação da população cabo‐verdiana.
Pelo menos formalmente, aos habitantes dos arquipélagos de Cabo Verde não se
aplicou o estatuto do indigenato76.
O país obteve a independência em 5 de Julho de 1975 e como refere António
Telo, “Cabo Verde foi a mais exemplar das descolonizações, com um acordo onde se
74 Cabo Verde ocupa a posição 176ª (em 252 países listados) no ranking relativo ao território do CIA World Factbook: https://www.cia.gov/library/publications/the‐world‐factbook/rankorder/2147rank.html?countryname=Cabo%20Verde&countrycode=cv®ionCode=afr&rank=176#cv
75 Muitos eventos históricos traduzem a relevância da posição geográfica do país. Esta posição fez com que Cabo Verde fosse utilizado, no período colonial como entreposto comercial e de aprovisionamento. Foi também em grande parte devido à sua localização que a primeira missão da OTAN no continente Áfricano teve lugar precisamente em Cabo Verde em 2006 ("Steadfast Jaguar 06") tendo em vista testar a operacionalidade da Força de Reação Rápida.
76 O Estatuto dos Indígenas Portugueses das Províncias da Guiné, Angola e Moçambique (Decreto‐lei n.º 39 666, de 20 de Março de 1954) não se aplicou em Cabo Verde muito embora outros diplomas aplicassem lógica semelhante, designadamente ao nível da legislação do trabalho indígena.
63
previa a formação de órgãos provisórios (…) encarregados de preparar uma consulta
popular para eleição da Assembleia Constituinte”. Adianta ainda o historiador que
“Cabo Verde acedeu à independência como o caso mais próximo de uma democracia
que saiu da descolonização portuguesa” (2008:183).
Depois de um período de unidade política com a Guiné Bissau (1975‐1981) e de
manter, ainda após esse período, um sistema de partido único (PAICV), Cabo Verde
viria a ter as primeiras eleições multipartidárias em 1991.
É hoje considerado como uma das democracias mais estáveis do continente
Áfricano, obtendo bons resultados em indicadores internacionalmente consagrados
relativamente à democracia, às liberdades civis ou à boa governação. Estas condições
têm permitido o crédito do país junto de Governos, empresas e organizações
financeiras internacionais.
Sendo um país de poucos recursos77 e ecologicamente frágil, a sua economia
depende, em muito, do exterior seja sob a forma das receitas do turismo, do
investimento direto estrangeiro, seja da ajuda bilateral ou das remessas de
emigrantes.
É nessas condições que “ (…) a sua política externa tem sido subsidiária do
desenvolvimento” (Cardoso, 2008:195), procurando, assim e de uma forma
pragmática, relações externas diversificadas e consequentes. Esta orientação é aliás
assumida e expressa no atual Programa do Governo78 na seção “Afirmar a Nação
Global e desenvolver parcerias para a competitividade” de acordo com a qual,
“ (…) são cruciais as parcerias que teremos de consolidar e criar para garantir o
acesso ao financiamento – seja sob forma de ajuda oficial ao desenvolvimento,
de financiamento concessional ou de investimento directo externo – e, bem
assim, o cada vez mais importante acesso aos mercados. Continuaremos a
consolidar antigas alianças e parcerias, enquanto procuraremos construir novas
77 De acordo com o Banco Mundial, apenas cerca de 10% do seu território está classificado como terra arável e com limitados recursos minerais. Informação disponível em: http://www.worldbank.org/pt/country/caboverde/overview#1
78 Programa do Governo – VIII Legislatura 2011‐2016, disponível em http://www.governo.cv/index.php/programa‐do‐governo
64
pontes de cooperação na procura de benefícios mútuos. Igualmente,
continuaremos a aprofundar a participação do país e o envolvimento em
organizações regionais e internacionais, tais como a CEDEAO, a CPLP, a União
Áfricana, a Macaronésia, os ACP e a Francofonia. Continuaremos as nossas
parcerias especiais com a União Europeia, com a RUP e com a Macaronésia e
reforçaremos a participação de Cabo Verde nas Nações Unidas” (Programa do
Governo, Cabo Verde, pág.55).
Recorde‐se, a este título, que, em 2007, o país saiu da lista dos Países Menos
Desenvolvidos (PMA) das Nações Unidas, passando, desde então, a integrar a lista do
Países de Desenvolvimento Médio (PDM).
“Boa governação, sólida gestão macroeconómica, abertura ao comércio e uma
maior integração na economia global, para além da adoção de políticas eficazes
de desenvolvimento social, têm produzido resultados notáveis em todo o
arquipélago. O crescimento do produto interno bruto (PIB) per capita atingiu
7,1% no período 2005‐08, bem acima da média para a África Subsariana e para
pequenos estados ilhas” (Banco Mundial).
Igualmente digno de nota é a o facto de se prever que Cabo Verde possa
alcançar a maioria dos Objetivos do Milénio (ODM)79 até 2015, tendo já atingido,
designadamente os objetivos relativos à educação primária, à igualdade de género, à
mortalidade infantil e à saúde materna.
Cabo Verde é, por tradição, um país de emigração. Nos termos do Perfil
Migratório80, “Está profundamente enraizada na sociedade cabo‐verdiana a ideia de
79 Os ODM são objetivos de desenvolvimento acordados internacionalmente com base na Declaração do Milénio assinada em 2000 e com metas até 2015. São oito os ODM: Reduzir a pobreza extrema e a fome (Objetivo 1); Alcançar o ensino primário universal (Objetivo 2); Promover a igualdade de género e o empoderamento das mulheres (Objetivo 3); Reduzir a mortalidade infantil (Objetivo 4); Melhorar a saúde materna (Objetivo 5); Combater o VIH/SIDA, a malária e outras doenças (Objetivo 6); Garantir a sustentabilidade ambiental (Objetivo 7); Criar uma parceria mundial para o desenvolvimento (Objetivo 8). 80 O Perfil migratório de Cabo Verde de 2009 foi elaborado no quadro da Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde e está disponível em http://www.un.cv/files/Cape_Verde_Profile_2009.pdf. O conceito de Perfil migratório foi inicialmente proposto pela Comissão Europeia como um relatório estatístico (Comunicação sobre Migração e Desenvolvimento de 2005) mas veio a evoluir no sentido de funcionar como um instrumento tendente a facilitar o desenvolvimento de políticas por parte do Governo do país objeto da análise.
65
emigrar, como estratégia de alcançar sucesso pessoal, familiar e social” (OIM,
2010,17). Portugal é um dos principais destinos da emigração cabo‐verdiana – de
acordo com o citado Perfil Migratório, no período entre 1995 e 2000, Portugal recebeu
54% dos emigrantes cabo‐verdianos (seguido dos EUA com 19%, França, 8%, Países
Baixos, 5%). Digna de uma nota muito particular é a situação dos estudantes:
“No período entre 1997/98 e 2002/2003, saíram ao todo 5.382 estudantes
bolseiros e não bolseiros, para receberem formação superior no estrangeiro.
Destes, cerca de 77% não terão regressado (OIM, 2009:53).
Dados mais atualizados reforçam estas tendências.
O Módulo Estatísticas das Migrações (2008‐2013) do Inquérito Multi‐objetivo
Contínuo (IMC) recentemente apresentado pelo Instituto Nacional de Estatística (INE)
de Cabo Verde81, revela um total de 11903 emigrantes dos quais a maioria com destino
a Portugal (56.4%), num fluxo maioritariamente associado ao estudo (36%):
Fig. 7 Emigrantes de Cabo Verde por país de destino (2008‐2013 ‐ dados ponderados)
FONTE: INE Cabo Verde
81 Disponível em http://www.ine.cv/actualise/destaques/files/94456152942014APRESENTA%C3%87%C3%83O%20MIGRA%C3%87%C3%83O‐%20FINAL.pdf
66
Fig. 8 Emigrantes de Cabo Verde segundo motivo de emigração, por sexo (%) (2008‐2013 ‐ dados
ponderados)
FONTE: INE Cabo Verde
Em resultado desta situação existe uma grande comunidade cabo‐verdiana
espalhada pelo mundo. A dimensão da diáspora é tão significativa que vários autores
referem ser o número de cabo‐verdianos no estrangeiro maior do que os que residem
no território nacional.
Na seção Afirmar a Nação Global, o Programa do atual Governo de Cabo Verde
defende que “ os emigrantes na Diáspora foram e continuam sendo uma importante
alavanca para o desenvolvimento das ilhas. Serão sempre considerados parte
integrante da Nação cabo‐verdiana e estarão no centro das políticas internas e
externas da governação”. É objetivo do Governo, no quadro da agenda “Nação sem
fronteiras”, promover o aprofundamento dos laços das segundas e posteriores
gerações da diáspora com a Nação cabo‐verdiana. Defendendo que “(…) neste sentido
(…) trabalharemos para a implementação dos acordos recentes, tal como a Parceria
para a Mobilidade com a União Europeia, para facilitar vistos e assistência àqueles que
queiram regressar.”
A imigração para Cabo Verde é igualmente relevante e tem registado um
aumento. De acordo com o Perfil Migratório, os dados do Centro de Pesquisa para o
67
Desenvolvimento sobre Migrações, Globalização e Pobreza apontavam para que, em
2007, “a maioria dos imigrantes em Cabo Verde (82%) fosse proveniente dos Países
Áfricanos de Língua Oficial Portuguesa e de Portugal (16%).
Existe assim um importante fluxo de pessoas entre Cabo Verde e Portugal que
deve ser considerado na análise da relação entre estes dois países.
IV.2 – A Cooperação Portuguesa em Cabo Verde
Cabo Verde é, no quadro da política externa portuguesa, um país prioritário a
nível do diálogo político e da cooperação. As questões do desenvolvimento económico
mas também as questões de segurança e as migrações fazem hoje parte da agenda da
relação bilateral entre os dois países.
E, de todas as ex‐colónias, Cabo Verde foi o país com o qual mais rapidamente
Portugal definiu boas relações. Esta situação está expressa nos Programas de Governo
como já se referiu no Capítulo II. Aliás, logo em 1975, foi assinado entre Portugal e
Cabo Verde o Acordo Geral de Cooperação e Amizade, de acordo com o qual As Partes
Contratantes reconhecem a existência de especiais laços de amizade e de solidariedade
entre os respetivos povos e prosseguirão uma política comum de cooperação com vista
a reforçar esses laços (artigo 1).
Como assinala António Telo,
“A cooperação com as ex‐colónias deu os primeiros passos em Cabo Verde,
logo em 1975. Este arquipélago foi o primeiro a beneficiar de subsídios ao
desenvolvimento a fundo perdido (…). Portugal aceitou igualmente a
responsabilidade de concluir as principais obras em curso de execução no Plano
de Fomento de Cabo Verde e assinou acordos de cooperação na área da saúde
e educação” (Telo, 2008:217).
Portugal e Cabo Verde, têm, assim, desde então, mantido boas relações, sendo
Portugal um dos principais parceiros daquele país. à data da presente dissertação,
Portugal tem cerca de cem instrumentos internacionais82 com Cabo Verde dos quais
cerca de oitenta em vigor e os restantes recentemente assinados .
82 Considerando, para este efeito, Tratados, Protocolos, Acordos ou Memorandos de Entendimento entre os dois Estados mas também entre departamentos das respetivas administrações públicas.
68
Destes acordos, é digno de uma referência especial o Acordo de Cooperação
Cambial, assinado em 13 de Março de 1998, entre a República de Cabo Verde e a
República Portuguesa83 que visa “(…) garantir a estabilidade nominal de Cabo Verde,
aprofundar os laços da economia cabo‐verdiana a Portugal e à Europa e sustentar
reformas conducentes à abertura e modernização da economia” (CEMPRE,2008:vi).
Este Acordo tem sido identificado como fator de promoção do bom desempenho da
economia cabo‐verdiana.
Nos últimos anos, a cooperação portuguesa com Cabo Verde tem sido
desenvolvida84 ao nível bilateral e ao nível multilateral.
A nível bilateral, a cooperação articula‐se em torno dos Programas Indicativos
de Cooperação (PIC) que definem os principais eixos estratégicos para períodos de três
anos e que se materializam em Planos Anuais de Cooperação (PAC). Ao nível
multilateral, Portugal enquadra‐se nos programas das organizações internacionais
ativas na cooperação com Cabo Verde (em especial a UE mas também as Agências das
Nações Unidas e a CPLP) ou desenvolve projetos em parceria com outros doadores85.
Os PIC têm como áreas prioritárias a valorização dos recursos humanos e a
capacitação institucional tirando partido da vantagem relativa de Portugal (uma língua
comum, laços culturais e sistemas jurídicos semelhantes) e tendo sempre como
objetivo último contribuir para a redução da pobreza.
“ A programação é feita (…) com base nas Estratégias de Redução da Pobreza
ou em documentos similares dos parceiros, atentas as prioridades e
necessidades aí definidas, de modo a garantir a complementaridade de
esforços” (IPAD,2005:27).
83 Após janeiro de 1999, o Acordo envolve uma paridade fixa do Escudo cabo‐verdiano ao Euro. Inclui ainda uma facilidade de crédito de Portugal a Cabo Verde, mas também a adoção por parte deste país dos critérios macroeconómicos de referência dos Estados‐membros da UE.
84 MNE (1995) Dez anos de Política de Cooperação, Lisboa.
85 Portugal integra a comunidade doadora internacional e participa, como tal, em diversos fora internacionais, em particular a UE, a OCDE e a ONU, nos quais tem subscrito compromissos internacionais em matéria de coerência das políticas para o desenvolvimento. Sobre esta matéria veja‐se a Estratégia Portuguesa para a cooperação multilateral, disponível em https://www.instituto‐camoes.pt/images/cooperacao/estrategia_multilateral.pdf e bem assim a Resolução do Conselho de Ministros n.º 82/2010 (21/10/2010).
69
Os instrumentos da cooperação são essencialmente a cooperação técnica e
ações de alívio da dívida mas também o apoio direto ao orçamento. Esta matriz geral
da Cooperação Portuguesa aplica‐se ao caso de Cabo Verde.
O PIC relativo ao triénio 2002‐2004, com um orçamento indicativo de 50 milhões
de euros:
“(…) identificou os seguintes eixos de concentração das intervenções: reforço da
estabilidade macroeconómica, apoio à consolidação das instituições, valorização
dos recursos humanos, desenvolvimento de infraestruturas, alargamento da base
produtiva e melhoria da competitividade do sector empresarial cabo‐verdiano e
valorização da cultura e preservação do património histórico”. (IPAD,2005:61).
No quadro da Visão Estratégica para a Cooperação Portuguesa e das
prioridades da Estratégia de Crescimento e Redução da Pobreza (ERCP)86 de Cabo
Verde foi assinado, em novembro de 2004, o PIC 2005‐2007 com um envelope de 55
milhões de euros. Este novo PIC procurou tirar partido da experiência passada
(tentando, em particular, ultrapassar alguma dispersão e pequenas ações com
reduzido impacto e visibilidade) e concentrou a Ajuda em três eixos:
Valorização dos recursos humanos e capacitação técnica
Apoio à criação de infraestruturas básicas, ordenamento do território e
recuperação do património
Apoio à estabilidade macroeconómica
A inserção de Cabo Verde no sistema e mercado internacionais sofreu,
entretanto, algumas alterações. Destaca‐se, em particular, em 2008, a graduação de
Cabo Verde do Grupo dos Países Menos Avançados, a celebração da Parceria Especial
com a UE (que inaugura um novo tipo de relacionamento) e a adesão à Organização
Mundial de Comércio (OMC).
É neste contexto que o PIC 2008‐2011 se baseia numa abordagem renovada e
inaugura uma nova modalidade de ajuda, a ajuda orçamental. Este PIC tem
subjacentes alguns princípios fundamentais, a saber:
86 Em 2004 Cabo Verde adotou o Documento de Estratégia de Crescimento e Redução da Pobreza (ECRP) 2004‐2005/2007 com base nas Grandes Opções do Plano e no Plano Nacional de Desenvolvimento 2002‐2005. O documento define a centralidade da redução da pobreza nas políticas públicas e identifica cinco eixos (boa governação, competitividade, capital humano, infraestruturas básicas, proteção social).
70
Concentração da cooperação em eixos Estratégicos;
Descentralização geográfica;
Aprofundamento da abordagem bi‐multi na concretização de projetos de
cooperação (identificação de projetos para implementar em parceria com
agências multilaterais (sobretudo UE e o Sistema das Nações Unidas);
Aprofundamento da coordenação com outros doadores bilaterais;
Maior participação da sociedade civil e do sector privado;
Introdução de questões transversais como o género, a boa governação e
sustentabilidade ambiental.
Com um orçamento indicativo de 70 milhões de euros, as prioridades de
cooperação centraram‐se “ (…) na Boa governação, participação e democracia, no
Desenvolvimento Sustentável e Luta contra a Pobreza (o eixo que recebeu a maior
fatia de orçamento) e na concretização de um Cluster de Cooperação” (IPAD, 2008:49).
Entretanto, em 9 de Junho de 2010, teve lugar em Lisboa a I Cimeira Luso‐Cabo‐
verdiana87 que
“ (…) confirmou a assinalável densidade do relacionamento existente entre
Portugal e Cabo Verde, assente não só em fortes laços históricos como também no
desejo de os projetar de forma privilegiada no futuro, através de uma parceria
estratégica e dinâmica” (in Declaração Conjunta).
Por ocasião desta Cimeira, foi assinado o Tratado de Amizade e Cooperação
entre a República Portuguesa e a República de Cabo Verde88 que define os principios
que regem as relações entre os dois países. O Tratado prevê um mecanismo de
87 A realização de Cimeiras entre os dois países de dois em dois anos visa institucionalizar, ao mais alto nível, as relações de cooperação e foi decidida na sequência da visita de uma delegação ministerial (incluindo o Primeiro Ministro) e de empresários portugueses à Cidade da Praia, em Cabo Verde, em Março de 2009.
88 Tratado de Amizade e Cooperação entre a República Portuguesa e a República de Cabo Verde, assinado em Lisboa em 9 de junho de 2010 e publicado no Diário da República, 1.ª série, nº 58 de 21 de março de 2012.
71
consultas políticas, nomeadamente através da Comissão Permanente Luso‐Cabo‐
verdiana, criada pelo respetivo artigo nº12.
A Declaração Conjunta da I Cimeira refere, ainda, os vários dominios da
cooperação bilateral (defesa nacional, finanças, ciência, tecnologia e ensino superior,
cultura, economia e modernização administrativa) e também a concertação político‐
diplomática nas organizações internacionais, como a ONU e a CPLP (defesa da língua
portuguesa) e na UE (com referência específica à Parceria Especial UE‐Cabo Verde e à
Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde).
Dois anos depois, na II Cimeira (Mindelo, 2012), os Chefes de Estado
salientaram, uma vez mais, a vontade de ampliar e melhorar a cooperação centrando‐
a na economia e nas empresas. Note‐se que nesta reunião foi igualmente debatida a
futura Escola Portuguesa em Cabo Verde89.
O PIC 2012‐2015, numa linha de continuidade face aos anteriores, resultou
igualmente dos compromissos internacionais a que os dois Estados se vinculam90 e dos
documentos programáticos de Portugal91 e de Cabo Verde92.
Com um orçamento indicativo de 56 milhões de euros, aposta, para além das
áres tradicionais (formação de recursos humanos e assitência técnica) em duas novas
áreas: capacitação cientifica e tecnológica e empreendedorismo e desenvolvimento
empresarial.
89 À semelhança das Escolas Portuguesas de Angola, Moçambique, Macau e Timor Leste.
90 Designadamente ODM, Declaração de Paris e (2005), Agenda de Ação de Acra (2008) e Declaração de Busan (2011).
91 Estratégias sectoriais, Estratégia de Cooperação multilateral, Recomendações do CAD/OCDE, Avaliação do PIC 2008‐2011, entre outros.
92 Dos quais se destacam a ECRP III (2012‐2016) e o Programa de Governo 2011‐2016.
72
Fig 9 – PIC 2011‐2015: Eixos Estratégicos e áreas de intervenção
Eixo % do Orçamento
Eixo estratégico I Boa governação, Participação e Democracia
Área de intervenção I Capacitação Institucional – Governo e sociedade civil 6%
Área de intervenção II Segurança e Desenvolvimento
Eixo estratégico I Desenvolvimento sustentável e luta contra a pobreza
Área de intervenção I Educação e Serviços Sociais básicos
94% Área de intervenção II Capacitação Cientifica e tecnológica
Área de intervenção III Empreendedorismo e Desenvolvimento Empresarial
Área de intervenção IV Programa Geral de Assistência/Ajuda sob a forma de
Produtos
FONTE: CAMÕES, Instituto da Cooperação e da Língua, I.P
Por outro lado, é introduzida a filosofia dos Projetos‐bandeira, isto é, projetos
de maior dimensão que possam ter um maior impato, numa lógica de custo‐benefício.
São identificados dois projetos‐bandeira:
Programa de Cooperação técnico‐policial que visa “Desenvolver as
competências técnicas e operacionais das Forças e Serviços de Segurança cabo‐
verdianas, incrementar a assessoria técnica em áreas organizacionais e
funcionais, fortalecendo os princípios emergentes dos Acordos de Cooperação
assinados entre os dois países” (CAMÕES, 2008:15)93.
Apoio ao sector da educação combinando várias modalidades e formas de
cooperação para os diferentes níveis de ensino (Ensino Secundário, Ensino
Técnico‐Profissional, Ensino Superior e Bolsas de Estudo).
Refira‐se finalmente que
93 O Programa de Cooperação Técnico – Policial com Cabo Verde tem vindo a ser implementado desde 2007, procurando promover níveis de segurança que permitam consolidar o Estado de direito e promover a Boa Governação (http://www.instituto‐camoes.pt/cabo‐verde/root/cooperacao/cooperacao‐bilateral/cabo‐verde#programa‐de‐cooperação‐técnico‐policial)
73
“(…) os diferentes programas sectoriais do PIC serão enquadrados de forma
coerente numa política de cooperação estrategicamente orientada, com
objetivos partilhados e atividades complementares, quer nas ações bilaterais,
quer nas ações ao nível multilateral, numa abordagem “whole‐of‐government”
(CAMÕES, 2008:10).
No relacionamento com Cabo Verde não se pode deixar ainda de referir a
temática das migrações, uma agenda em muito enquadrada pela Parceria para a
Mobilidade UE‐Cabo Verde.
Tal como já referido, é muito significativa a mobilidade de pessoas entre
Portugal e Cabo Verde. A cooperação no domínio das migrações tem vindo a ser
desenvolvida quer ao nível bilateral (foi mesmo criada uma subcomissão Luso‐Cabo‐
verdiana para as migrações) quer ao nível multilateral no âmbito da Parceria para
Mobilidade UE‐Cabo Verde.
Alguns projetos da cooperação portuguesa são, a este título, emblemáticos e
não podem deixar de ser referenciados.
É o caso do CAMPO, Centro de Apoio ao Migrante no País de Origem, um
projeto bilateral, financiado pela Cooperação Portuguesa com o objectivo de prestar
informações a potenciais emigrantes sobre possibilidades de trabalho e estudo em
Portugal. Com base numa avaliação muito positiva, as atividades do projecto foram
prolongadas e alargadas através de um projeto conjunto entre a Comissão Europeia,
Portugal e a Espanha intitulado “Reforço das Capacidades de Cabo Verde no domínio
da gestão da migração laboral e do retorno”, integrado na Parceria para a Mobilidade.
O Projeto94, com a duração de 36 meses (2009 –2011) teve como objetivo
promover a mobilidade legal entre Cabo Verde e a UE e incluiu três dimensões
complementares: migração laboral para a UE; retorno da “diáspora” cabo‐verdiana
(em particular a sua reintegração no mercado laboral de Cabo Verde); promoção do
investimento e empreendedorismo migrante. O principal resultado do projeto foi a
criação de um centro de atendimento aos migrantes (os que pretendem sair, mas
94 Foi mantida a designação de “CAMPO” no sentido de aproveitar a respetiva “imagem de marca”
74
também os que pretendem regressar) 95. Houve uma apropriação do Centro por parte
das Autoridades cabo‐verdianas que reconheceram a sua mais‐valia e, assim, no final
do Projeto foi feita a sua transferência para a Administração Pública cabo‐verdiana96.
Um segundo projeto digno de nota é o Projeto DIASpora para o
desenvolvimento de Cabo Verde (DIAS de Cabo Verde), um projeto do Instituto das
Comunidades de Cabo Verde co‐financiado pela Comissão Europeia e por Portugal e
implementado pela Organização Internacional para as Migrações (OIM). Concluído em
2011, este Projeto visava promover o contributo da diáspora caboverdiana em
Portugal, Itália e Holanda como agentes de desenvolvimento do seu país de origem
através da aplicação das suas competências e conhecimentos profissionais no reforço
do capital humano de Cabo Verde em quatro sectores funadamentais: a Saúde, a
Educação,as Infra‐estruturas e o Turismo.
Sem prejuizo de vários outros projetos em desenvolvimento, merece
igualmente referência o Centro Comum de Vistos inaugurado em 2010 e que:
“(…) actualmente, processa pedidos de visto Schengen97 para Portugal, Bélgica
e Luxemburgo, bem como para os seguintes Estados‐Membros da União
Europeia representados: Alemanha, Áustria, Eslovénia, Finlândia, França, Itália,
Países Baixos, República Checa e Suécia” (CCV, em
http://www.eurovisaccv.com/web/guest/home).
Uma última nota para a cooperação Técnico‐Militar com Cabo Verde que tem a
sua origem num acordo bilateral assinado em 1988. No âmbito do PIC 2012‐2015, a
cooperação técnico militar visa apoiar a Estrutura Superior das Forças Armadas
caboverdianas, apoiar a organização e funcionamento da Escola Militar, apoiar a
organização e criação de Unidades de Polícia Militar, apoiar a consolidação da
estrutura organizacional, formativa e operativa da Guarda Costeira e dos Fuzileiros,
95 Para mais informações consulte‐se https://www.instituto‐camoes.pt/cabo‐verde/root/cooperacao/cooperacao‐bilateral/cabo‐verde#campo‐–‐centro‐de‐apoio‐ao‐migrante‐no‐país‐de‐origem
96 O CAMPO está disponível em http://www.campo.com.cv/
97 O Visto Schengen é uma autorização emitida por um Estado Membro com a finalidade de escala aeroportuária, trânsito ou intenção de estadia de curta duração no território de um ou mais Estados‐membros, permitindo que o seu portador se apresente na fronteira externa, não garantindo, contudo, a respetiva entrada, que será decidida pelas autoridades fronteiriças à sua chegada.
75
apoiar o Centro de Instrução Militar Conjunto do Morro Branco e disponibilizar
formação em Portugal.
Portugal mantém, pois, boas relações com Cabo Verde sendo atualmente um
dos principais parceiros daquele país. As questões económicas, a segurança e as
migrações são temas centrais nesta relação.
76
CAPÍTULO V – SINAIS DE EUROPEIZAÇÃO NA RELAÇÃO COM CABO VERDE
V.1 – Contornos do processo de Europeização
O processo de Europeização, é, no nosso entendimento, um processo dinâmico,
de duas vias. E reflecte‐se nas políticas nacionais dos Estados‐membros, de diversas
formas incluindo através de produção legislativa que ganha vida no ordenamento
nacional.
Assim acontece, também, embora de forma menos perceptível, com a
elaboração, definição e implementação da política externa. Não existe, neste domínio,
uma aplicação direta ou uma transposição de legislação da UE, mas a inserção no
projeto europeu de integração influencia as formas, os atores e os objetivos da política
externa. É sempre necessário procurar distinguir (tarefa nem sempre fácil) o fator
Europeização de muitos outros fatores que, num mundo globalizado, vêm a ter
influência na política externa dos Estados‐membros.
E, por outro lado, os Estados‐membros procuram influenciar a posição comum
a nível da UE e marcar a agenda de acordo, designadamente, com os seus interesses
geográficos em zonas particulares do globo. Trata‐se de um processo que, muitas
vezes, inclui a influência junto de um ou mais Estados‐membros com idênticas
preocupações e objetivos.
Como registamos no Capítulo I, diversos autores procuraram já identificar as
dimensões, os mecanismos e os efeitos da Europeização nas políticas externas do
Estados‐membros.
Nicole Alecu Flers (2011:22) identificou duas dimensões: a dimensão de
Downloading/Top‐down em que os Estados‐membros são sujeitos a influência e
estímulo por parte da UE e dos outros Estados‐membros e a dimensão
Uploading/Bottom‐up através da qual os Estados‐membros procuram influenciar a
política externa da UE e as políticas externas dos outros Estados‐membros.
Michael Smith sugeriu num seu artigo (2000) um quadro de referência com
quatro indicadores: a socialização das elites políticas, a reorganização burocrática, a
reforma constitucional e alteração da perceção da opinião pública relativamente à
cooperação europeia neste domínio, concedendo, todavia, primazia aos três primeiros.
77
Reuben Wong (2008) isolou três dimensões da Europeização da política
externa: adaptação e convergência política, projeção nacional e reconstrução da
identidade.
Procuramos agora analisar a Política Externa Portuguesa em geral e a relação
particular com Cabo Verde, à luz das duas dimensões que nos surgem como
fundamentais: top‐down e bottom‐up.
V.2 –Europeização top‐down
Numa primeira fase, isto é, no período que antecede a adesão e no qual se
prepara o cumprimento das condições para aderir ao “clube”, estamos, por regra,
perante uma Europeização de uma só via na qual os Estados candidatos, e mais tarde
membros, procuram aceitar e implementar o acervo comunitário. Este tipo de
Europeização, note‐se, prossegue depois, mas já não como um processo
exclusivamente top‐down.
V.2.1 A socialização das elites
Tal como Smith assinala, “A resolução dos problemas depende
fundamentalmente do grau de socialização dos decisores com o sistema” (Smith,
2000:617)98.
Ora, este é um fenómeno muito evidente na esfera da União, não só entre os
representantes governamentais mas, sobretudo, entre a elite diplomática e os
representantes e técnicos da Administração Pública. Nestes últimos, ao contrário do
que acontece com os primeiros, existe o efeito da continuidade. São eles que, em
última instância, preparam os dossiês e o processo de decisão política e, por regra,
permanecem, apesar das alterações governamentais resultantes dos processos
eleitorais.
Esta socialização opera‐se na intensa rede de contactos entre os
representantes nacionais, designadamente, através das reuniões dos diversos comités
e instâncias preparatórias das reuniões ministeriais e de Chefes de Estado, na
preparação das declarações conjuntas, nos exercícios de elaboração de relatórios em
98 Tradução da nossa autoria
78
conjunto. Opera‐se, igualmente, através da informação COREU99, “uma rede que em
2010 distribuiu cerca de 8500 mensagens no domínio da política externa da UE aos
vinte e sete Estados‐membros, ao Secretariado‐Geral do Conselho, ao Conselho e à
Comissão Europeia” ( Bicchi e Carta, 2012)100.
A alteração de atitude é percetível, como defende Smith (2000:619) através de
dois indicadores: as elites familiarizam‐se com a posição dos outros em termos de
política externa e, por outro lado, valorizam a cooperação política. Criam‐se assim,
como adianta o autor, novas formas “de fazer” e uma identidade comum.
No caso português, a socialização começou ainda antes da adesão,
fundamentalmente quando a adesão se tornou o principal objetivo da Política Externa
Portuguesa. “ A socialização das elites portuguesas inicou‐se muito cedo com o “Tour
europeu “ de Mário Soares em 1977 (..) Reino Unido, Irlanda, Dinamarca e Itália, mais
tarde França, Alemanha, Países Baixos, Luxemburgo e Belgica” e “ os contactos no seio
do movimento socialista europeu aceleraram o seu processo de socialização “
(Chrobot, 2012: 89)101. A missão junto da CEE aumentou substancialmente e os seus
conselheiros monitorizaram de perto o policy making das Comunidades” (Ferreira,
2001, cit por Chrobot, 2012).
A Europeização da política inicia‐se assim pela própria Europeização das elites,
dos agentes que decidem em Política Externa.
Note‐se, todavia, que no processo de adesão houve alguma prudência
relativmente à
“participação nacional num processo de coordenação de políticas externas que
representava uma inovação de fundo e que podia, além disso, conduzir a uma
secundarização dos interesses portugueses face às opções estratégicas de
potências com maior peso no contexto internacional ou mais influentes no
processo europeu de decisão” (Correia,2006:63).
99 A COREU (CORrespondência EUropeia) é uma rede de comunicação da União Europeia entre os Estados‐Membros e a Comissão, tendo em vista a cooperação no âmbito da política externa. A COREU facilita uma tomada de decisão rápida em caso de crise (in Glossário ‐ http://europa.eu/legislation_summaries/glossary/coreu_pt.htm) 100 Tradução da nossa autoria
101 Tradução da nossa autoria
79
Mas a situação evoluiu e foi‐se progressivamente consolidando a participação
do país na Cooperação Política Europeia, tendo como um primeiro marco importante o
exercício da Presidência do Conselho no primeiro semestre do ano de 1992.
A socialização é um processo contínuo e vai muito além do processo incial,
prosseguindo até hoje. Atua sobre os decisores políticos, sobre os diplomatas mas
também sobre os técnicos e decisores da Administração Pública Portuguesa que
acompanham os dossiês relativos à Ação Externa da UE e ainda os relativos à dimensão
externa das políticas internas.
Este processo de tendência geral tem igualmente relevância na relação com
Cabo Verde tanto mais que este país integra um dos eixos principais da Política Externa
Portuguesa contemporânea e possui uma relação especial com a União Europeia.
A socialização entre pares é também feita de forma específica nos grupos e
instâncias que trabalham as questões africanas, designadamente no âmbito do Grupo
de Trabalho África (COAFR)102 e do Grupo de Trabalho ACP103.
V.2.2 Reorganização burocrática
Esta é a área mais facilmente identificável do processo. Com efeito, a
preparação da adesão, a adesão e a participação na construção europeia têm efeitos
diretos, visíveis e mensuráveis na burocracia dos Estados‐membros, provocando a
alteração das estruturas existentes e a criação de novas estruturas.
Como define Smith (2000:619), a organização da estrutura de elaboração,
definição e implementação da política externa é afetada pela participação na UE e na
PESC em particular.Estes efeitos são muito claros, por exemplo, quando se prepara e
exerce a presidência rotativa do Conselho da UE (questão que já não se coloca, no
domínio da PESC após o Tratado de Lisboa). O autor identifica, em particular, três
alterações: o estabelecimento de novos técnicos/representantes, a
102 O COAFR visa garantir uma política coordenada e coerente da União em relação aos países da África Subsariana (incluindo questões relacionadas com a prevenção e gestão de conflitos) sendo responsável pelas relações com organizações regionais tais como a União Africana.
103 Grupo de Trabalho responsável pelas relações com os países de Africa, Caraíbas e Pacífico no quadro do estbelecido no Acordo de Cotonu.
80
expansão/reogranização das redes diplomáticas (apesar de estas terem sofrido cortes
em função da crise financeira e económica) e a reorganização das estruturas da
Administração Pública.
No primeiro caso, a questão resulta, não só da necessidade de assegurar a
participação nas reuniões regulares, mas, também a designação de representantes
para cargos específicos criados no domínio da CPE e mais tarde da PESC. Veja‐se o caso
dos correspondentes europeus “(…) de ligação entre as capitais e grupos de trabalho
que efetuavam análises geográficas ou temáticas para a CPE” (Teles, 2006), no quadro
da obrigação de consulta entre os Estados em todas as questões de política externa.
A reorganização da rede diplomática foi mais evidente nuns países do que
noutros. Smith refere que, entre 1972 e 1978, sete dos nove Estados‐membros
aumentaram o número das missões em países terceiros (Smith,2000:621). Houve, por
outro lado, uma reorganização dos serviços internos, isto é, dos Ministérios dos
Negócios Estrangeiros – número de efetivos e orçamento – e a criação de novas
estruturas nos Ministérios setoriais.
Vejamos o caso português.
No quadro das negociações para a adesão houve lugar a uma série de
alterações nas instituições portuguesas.
Desde logo, na Assembleia da República (AR), no seio da qual foi instituida, em
1979, uma delegação para o estabelecimento de informações com delegação
correspondente do Parlamento Europeu (PE). No ano seguinte era criada a Comissão
Parlamentar de Integração Europeia, vocacionada para acompanhar a negociação da
adesão e dialogar com o PE, os seus congéneres e a sociedade civil. Em 1987 mudaria o
nome para Comissão para os Assuntos das Comunidades Europeias e, no ano seguinte,
adotava a atual designação de Comissão de Assuntos Europeus104. É esta Comissão que
é responsável pela “(…) apreciação parlamentar global dos assuntos europeus e a que
representa a AR na COSAC – Conferência dos Órgãos Especializados em Assuntos
Comunitários. “ (Paulo, 2006). É também logo nos primeiros anos de adesão (1987)
104 No entretanto esta Comissão foi fundida com a Comissão dos Negócios Estrangeiros durante a IX Legislatura: 2002‐2004).
81
que é publicada a primeira lei portuguesa sobre o acompanhamento parlamentar dos
assuntos europeus105.
Mas no sistema político português o poder de direção e condução da Política
Externa está atribuída ao Governo e, portanto, interessa antes de mais identificar as
alterações provocadas pela adesão e participação no projeto europeu em geral e na
CPE e PESC em particular nas estruturas da orgânica do Governo ‐ no Ministério dos
Negócios Estrangeiros (MNE) mas também nos Ministérios sectoriais.
Na fase de preparação da adesão e quando foi formalmente assumido este
objetivo “(…) o processo foi transferido para o topo do executivo” ( Correia, 2006:39),
tendo sido criada a Comissão para a Integração Europeia à qual competia preparar e
dirigir as negociações com vista à adesão, sob a orientação do Governo.
O MNE não teve assim no início um papel central neste processo. Como se
pode ler no Preâmbulo do normativo que cria a Comissão,
“Em virtude de o processo de negociações envolver aspetos políticos, técnicos e
económicos que caberiam normalmente no âmbito da competência de vários
Ministérios, optou‐se por fazer depender as novas estruturas diretamente da
Presidência do Conselho de Ministros, a fim de facilitar a indispensável
coordenação e de assegurar uma visão integradora da economia global das
negociações” (Decreto‐Lei nº 306/77 de 3 de Agosto)
Para o apoio técnico e administrativo da Comissão foi criado o Secretariado
para a Integração Europeia ao qual competia (artigo 6º):
Realizar estudos especializados indispensáveis à preparação das negociações com a CEE;
Colaborar com os serviços envolvidos nos trabalhos de preparação das negociações;
Acompanhar a execução dos acordos celebrados com a CEE, por forma a garantir o seu eficaz funcionamento e o melhor aproveitamento das potencialidades respetivas.
105 Lei n.º 28/87, de 29 de Junho publicada no DR, I série, nº146, de 29.06.1987 sobre a Participação da Assembleia da República na definição das políticas comunitárias, disponível em http://www.dre.pt/pdf1s/1987/06/14600/24942495.pdf
82
Esta estrutura veio a sofrer diversas alterações desde então.
Em 1979 foi instituido o Conselho de Ministros para a Integração Europeia e a
Comissão passou a depender do Vice‐Primeiro‐Ministro para os Assuntos Económicos
e Integração Europeia. O MNE continuava a ter um papel algo marginal – tinha a
prerrogativa de ser informado das atividades desenvolvidas e promovia no âmbito de
ação da sua competência prórpia, as iniciativas que, no processo das negociações,
assumem expressão política, e que não poderão ser consideradas isoladamente da
política externa no seu conjunto (Decreto‐Lei nº185/79 de 20 de junho).
Acresce que este diploma de 1979, prevê a criação de Gabinetes para a
Integração Europeia nos Ministérios sectoriais mais diretamente envolvidos
(Administração Interna, Educação e Investigação Científica, Habitação e Obras Públicas
Transportes e Comunicações, Comunicação Social). Esta é uma questão relevante já
que se relaciona com uma das consequências da integração. Efetivamente são
introduzidos novos atores na implementação da Política Externa ao envolver o
trabalho dos Ministérios sectoriais em políticas que têm uma dimensão externa
assinalável – veja‐se o caso, a título de exemplo, da dimensão das migrações e da
segurança no domínio da admnistração interna.
Numa fase mais adiantada da negociação, foi criado, na orgânica do VII
Governo, um Ministério da Integração Europeia com um Secretário de Estado da
Integração Europeia, solução que foi abandonada logo no Governo seguinte, o qual
veio a colocar o Secretário de Estado na dependência do Ministério das Finanças e do
Plano, um cargo que viria a ser extinto no IX Governo Constitucional. Na fase final das
negociações o processo foi, de alguma forma, centralizado no Presidente da Comissão
de Integração Europeia, sob dependência direta do Ministro das Finanças e do Plano.
Mas, como refere José de Matos Correia “A integração plena na Europa
Comunitária, ocorrida em 1986, veio alterar sensivelmente o quadro descrito e fazê‐lo
em benefício do ‘Palácio das Necessidades’ (Correia, 2006:44) – na orgânica do X
Governo Constitucional, o Secretário de Estado, a Comissão e o Secretariado para a
Integração Europeia transitam para o MNE, numa lógica que apesar de toda uma série
de modificações, permance até hoje.
83
O reforço do papel do MNE deve‐se, como assinala José de Matos Correia, a
quatro motivos fundamentais: as questões europeias são centrais na Política Externa
Portuguesa, a valoração decisiva para a definição da posição nacional é de natureza
política, o projeto europeu envolve negociações com países terceiros ou organizações
internacionais o que implica envolvimento do Estado ao nível da sua representação
externa, e alguns temas mais delicados do processo europeu são eminentemente
políticos (Correia, 2006: 59).
Mas, como salienta igualmente aquele autor, as questões europeias são, em
regra, de carácter técnico, muito para além da vocação política e generalista do
pessoal diplomático. Para dar resposta a esta exigência, a Direção Geral das
Comunidades Europeias (sucessora do Secretariado para a Integração Europeia) foi
concebida como um serviço “(…) de interface eficaz quer das instituições comunitárias
quer da administração pública nacional (…) e criada recorrendo ao recrutamento (…)
de pessoal técnico exterior à carreira diplomática” (Correia, 2006:60). Naturalmente os
progressos no processo de integração que se traduz num carácter muito técnico do
acompanhamento de alguns dossiês permanece como um desafio ao papel
coordenador do MNE, sobretudo porque algumas políticas internas têm, na
atualidade, um forte componente de relacionamento externo com países terceiros.
Neste esforço de adequação das estruturas nacionais é também digna de nota
uma menção à Comissão Interministerial para as Comunidades Europeias (atual
Comissão Interministerial para os Assuntos Europeus), uma estrutura de coordenação
horizontal concebida para assegurar a coordenação entre os diversos ministérios,
regiões autónomas e serviços do Estado com vista à definição das posições a assumir
pelo Governo Português nas diferentes instituições das comunidades europeias
(Decreto‐Lei nº527/85 de 31 de Dezembro).
E, para além desta, interessa no âmbito da nossa reflexão, referir também a
Comissão Interministerial para a Cooperação106 criada em 1985 como órgão de
consulta e articulação das atividades desenvolvidas na área da cooperação.
106 Originalmente criada pelo Decreto‐Lei n.º 175/85, de 22 de maio, e funciona atualmente junto do Camões – Instituto da Cooperação e da Língua, I.P.
84
A participação na CPE/PESC muito em particular traduziu‐se, em termos
formais, em duas alterações/adaptações concretas: a instalação da rede COREU e a
criação do serviço Correspondente Europeu inicialmente numa base informal e depois
formalizada na Lei orgânica do MNE, de dezembro de 1985.
Nas novas estruturas criadas em geral, não se pode deixar de referir a
Representação Permanente em Bruxelas (REPER)107 criada com a missão de assegurar
a defesa dos interesses do Estado Português junto de todas as instituições
comunitárias. A missão tem desenvolvido um papel importante designadamente na
CPE e PESC, sendo, “(…) porventura a missão diplomática portuguesa de maior
relevância” (Correia,2006:61). Reflete as novas formas de assegurar a representação
externa do Estado. Com efeito a REPER é liderada por um Embaixador, são‐lhe
aplicáveis as disposições legais que regulam o funcionamento das missões
diplomáticas portuguesas no estrangeiro, integra funcionários do quadro diplomático
do MNE mas inclui também funcionários dos diferentes Ministérios e do Banco de
Portugal. Aliás a revisão da orgânica desta estrutura operada em 2006 foi feita no
sentido de reforçar a componente dos conselheiros técnicos em áreas económicas
consideradas fundamentais.
A nível das Embaixadas e Consulados, também a participação na CPE/PESC veio
a ter efeitos já que, como assinala José de Matos Correia,
“ o caráter permanente da negociação comunitária multiplicou a necessidade
de contatos diretos aos mais diversos níveis entre responsáveis políticos e de
reuniões entre os altos funcionários, diplomáticos ou não que, em cada capital,
gerem os distintos dossiês europeus (…)” (Correia,2006:68).
Com o evoluir da Ação Externa da UE, as Embaixadas portuguesas deixaram de
ser apenas as Embaixadas de Portugal, para serem igualmente Embaixadas de um
Estado‐membro da UE com tudo o que este novo estatuto acarreta. O mesmo
acontece com os Consulados – neste caso a sua atividade registou alterações
significativas em resultado do princípio da proteção diplomática dos cidadãos
107 Criada pelo Decreto‐Lei nº459/85, de 4 de novembro (a que foi dada nova redação através do Decreto‐Lei 97/2006 de 5 de junho).
85
comunitários introduzido pelo Tratado de Maatricht e das consequências do Espaço
Schengen. De fato, em 1992, o Tratado de Maastricht, ao instituir a cidadania
europeia, estabelece que, na ausência de proteção nacional num país terceiro, o
cidadão tem direito a beneficiar da proteção de outro Estado‐Membro da UE nas
mesmas condições de que beneficiam os nacionais desse Estado. O Espaço Schengen
com origem num Acordo assinado em 1985, estabelece a supressão gradual dos
controlos nas fronteiras comuns e inclui, designadamente procedimentos uniformes
para a emissão de vistos.
Neste domínio é digno de nota o referido Centro Comum de Vistos na Praia, em
Cabo Verde. Trata‐se de projeto europeu liderado por Portugal (em parceria com a
Bélgica e o Luxemburgo), que recebe pedidos de visto Schengen para Portugal, Bélgica
e Luxemburgo, bem como para a Alemanha, Áustria, Eslovénia, Eslováquia,Finlândia,
França, Itália, Países Baixos, República Checa e Suécia. Existe pois aqui uma evidente
Europeização no domínio dos instrumentos diplomáticos.
V.2.3 Alterações constitucionais
Como assinala Michael E. Smith (2000), o processo de integração europeia em
geral e a CPE/PESC, em particular também resultaram em debates constitucionais e
mesmo na revisão das Constituições dos Estados‐membros, correspondendo a mais
um indicador do impacto da construção europeia na esfera nacional.
Assim aconteceu em Portugal.
Como refere Maria Teresa Paulo “Todas as revisões da Constituição da
República Portuguesa desde 1976 introduziram ou alteraram disposições relativas à
participação de Portugal na União” (Paulo, 2006). Assinala a autora que existe uma
lógica de causa/efeito nas revisões constitucionais:
“(…) 1982 (como preparação da adesão), 1989 (no seguimento do Ato Único
Europeu), 1992 (durante a Presidência Portuguesa do Conselho da UE, como
resposta às disposições do Tratado de Maastricht e na sequência de um novo
ambiente político europeu, resultante da queda do Muro de Berlim e do fim da
URSS), 1997 (depois do Tratado de Amesterdão), 2001 (depois da Presidência
Portuguesa do Conselho da UE e como resposta ao Tratado de Nice), 2004 (no
86
ambiente pós Convenção) e 2005 (na sequência da assinatura do Tratado
Constitucional)” (Paulo, 2006).
Tratou‐se de acompanhar o processo de evolução da própria integração
europeia – como foi o caso da terceira revisão que resultou do Tratado de Maastricht ‐
mas também de afastar normas e principíos constitucionais que podiam constituir
obstáculos à integração do país no bloco europeu – o caso da primeira revisão em
1982.
Com efeito, “”(…) as mutações induzidas pelo processo de integração geraram
pressões (..) que determinaram a necessidade de alterar o texto constitucional de
forma a poder corrigir o desfasamento (…)” ( Guedes e Coutinho, 2006:99). E nesta
base geraram‐se alterações designadamente no princípio de separação de poderes
(com o Governo a ganhar terreno na arquitetura comunitária e a Assembleia da
República a perdê‐lo) e, naturalmente, as questões relativas à organização económica
da Constituição.
V.2.4 Opinião pública
Para Michael Smith, o indicador relativo à crescente adesão da opinião pública
à CPE é dos quatro o menos forte mas, deve, em todo o caso, ser considerado.
Como se pode ler no Eurobarómetro108 “Os portugueses revelam, desde o início
da integração, atitudes afetivas positivas relativamente à pertença de Portugal à UE”
(Eurobarómetro 64, 2005: 15). Ao longo dos primeiros 20 anos de adesão, a
percentagem de cidadãos nacionais que considera que a integração europeia é “uma
coisa boa” foi sempre superior a 50 por cento. Acresce que “Os portugueses são mais
favoráveis à integração política da Europa do que a média dos cidadãos europeus”
(idem:44). Todavia,
“os Portugueses arrancaram com crescente otimismo até ao início dos anos 90
(…) Com a recessão do início dos anos 90, esse apoio diminuiu brevemente,
mas voltou a recuperar na segunda metade da década. Desde então, contudo, a
108 EUROBARÓMETRO 64 – Opinião Pública na União Europeia, Outono de 2005 ‐ http://ec.europa.eu/public_opinion/archives/eb/eb64/eb64_pt_nat.pdf
87
estagnação económica portuguesa e o acentuar da crise a partir de 2009
fizeram sentir os seus efeitos. Hoje, menos de metade dos Portugueses vêem a
nossa pertença à UE positivamente” (Fundação Manuel Francisco dos Santos,
2013:49‐50).
Mas os cidadãos portugueses , “são em geral favoráveis à Política Externa e de
Segurança Comum (…)” (Eurobarómetro, 2004:47). (…) muito embora pareça existir
uma significativa falta de informação e conhecimento, como se pode deduzir do
número elevado de respostas “Não sabe/Não responde”.
V.2 5 – Adaptação e convergência política
Reuben Wong distingue, ao nível da adaptação e convergência política, três
dimensões: a crescente importância da agenda política europeia, a adesão a objectivos
comuns e a prevalência dos objectivos comuns sobre os tradicionais “domínios
reservados”.
Distinguimos aqui alguns exemplos de adaptação que nos parecem poder
ilustrar a situação relativamente ao caso português.
Em primeiro lugar, o alargamento da Política Externa Portuguesa para além dos
seus eixos/regiões tradicionais de atuação.
De facto, a participação portuguesa na CPE/PESC não teve apenas impacto nos
atores, nas estruturas e no enquadramento normativo da definição e elaboração da
Política Externa Portuguesa. Sem “beliscar” os grandes eixos da Política Externa
Portuguesa, a nossa participação na CPE/PESC alargou as zonas de atuação nacional.
“(...) a nossa qualidade de Estado‐membro da UE permite agora ter um contacto
directo e atuante com certos países ou regiões, e neles com um leque de questões das
quais tínhamos estado mais afastados pela geografia ou pela história“
(Pereira,2006:143). Novas áreas como as questões relativas ao Leste, aos Balcãs, ao
Mediterrâneo passam, contra a tradição e a história, a interpelar Portugal ( Janus,
2002).
“A política externa portuguesa virá a sofrer alterações em três direcções
essenciais com a adesão às Comunidades Europeias: a orientação
predominantemente atlântica das relações externas do país será temperada pela
componente europeia (...) euro‐atlantismo; a extrema cautela no
88
relacionamento com a Espanha dará lugar a uma intensificação das consultas
políticas intergovernamentais e a uma convergência de posições quanto às mais
relevantes matérias de interesse comunitário; o relacionamento com o Brasil e
em especial com os países Áfricanos de expressão portuguesa passará a ser feito
com base numa área de apoio mais significativa, em que Portugal surgirá
simultaneamente como dinamizador europeu do espaço da lusofonia e como a
janela de acesso a uma Comunidade desenvolvida que aposta no diálogo Norte‐
Sul e na cooperação para o desenvolvimento. (Vicente,2011:387‐388)”.
O caso do Mediterrâneo é paradigmático. Como salienta Chrobot, “Foi a
Cooperação Política Europeia que aproximou Portugal do Mediterrâneo”
(Chrobot,2012: 110). Ou, pelo menos, reaproximou já que não se pode esquecer que o
nosso país tem um passado comum com os países do Magrebe. Como escreve Pedro
Esteves, de relações dispersas até à adesão, as relações de Portugal com estes países
“ganharam corpo com a implementação de políticas de cooperação europeias
centradas no Mediterrâneo e com a participação em fora internacionais como o
chamado “(Diálogo) 5+5”109 e outras iniciativas na área da Defesa euro‐atlântica”
(Esteves, s.d:7). Com efeito, a Europa rapidamente percebeu que a sua segurança
depende da estabilidade no Mediterrâneo sul, razão pela qual tem apostado na
relação com os seus vizinhos do sul e Portugal tem vindo a participar do esforço de
promoção desse diálogo.
Mas não só. As posições de Portugal sobre determinadas questões
internacionais têm vindo a ser alinhadas com a CPE/PESC – por exemplo,
relativamente ao conflito israelo‐palestiano ou relativamente à invasão do Kuwait pelo
Iraque em 1990, como assinala Chrobot (Chrobot, 2012:111).
Finalmente, o relacionamento de Portugal com o seu vizinho ibérico também
sofreu a influência da adesão – Portugal e Espanha passaram a ser membros da mesma
aliança militar (OTAN) e da mesma organização de integração económica (CEE).
“(…) a Espanha passou a ser matéria de primeira linha de relevância no
posicionamento internacional de Portugal. Numa ótica de avaliação estratégica,
109 O Processo de Cooperação no Mediterrâneo Ocidental ("Dialogo 5 + 5") é um fórum político informal, criado em 1990, entre 5 países europeus (Espanha, França, Itália, Malta e Portugal) e 5 países do Norte de África (Argélia, Líbia, Marrocos, Mauritânia e Tunísia) (www.dgai.mai.gov.pt) e que tem por objectivo principal a coesão geográfica através da cooperação em diversos domínios, como a energia, as migrações ou a defesa.
89
pode dizer‐se que este foi um dos mais significativos elementos de alteração do
enquadramento de Portugal, por efeito da adesão à CEE” (Lopes, 2001:40).
Na relação previligiada com os PALOP, incluindo com Cabo Verde, é notória a
convergência. Com efeito, a UE assume grande relevância na política da Cooperacao
Portuguesa, tanto em termos politico‐institucionais, como ao nível das contribuições
financeiras.
“A politica portuguesa de cooperação para o desenvolvimento está cada vez
mais intimamente ligada à política da União Europeia (…). Os objectivos últimos
são os mesmos: lutar contra a pobreza, com vista a sua erradicação, e
contribuir não só para o desenvolvimento sustentável de todos os países como
também para a sua integração na economia mundial” (IPAD,2011:229).
V.3 – Europeização bottom‐up
Sendo a Europeização um processo de duas vias que são comunicantes, é
necessário perspectivar igualmente a Europeização da Política Externa Portuguesa
como um processo bottom‐up, já que a projeção nacional também constitui um factor
de influência nessa política.
Nesta dimensão, o Estado procura aumentar a influência nacional no mundo,
tenta influenciar as políticas externas dos seus parceiros europeus e procura utilizar a
UE como cobertura/chapéu (Wong, cit. por Abreu, 2006). Existe como que a procura
de um efeito catalizador, ou talvez melhor, da economia de escala, aberta pela
integração num espaço maior e, portanto, com mais possibilidades e peso no sistema
internacional. E, no caso de um país pequeno como Portugal, esta questão ganha
naturalmente relevância.
Na sessão ministerial de abertura das negociações para a adesão de Portugal às
Comunidades Europeias, em 17 de outubro de 1978, o Ministro dos Negócios
Estrangeiros português, Correia Gago declarava que “ Portugal não deixará de
contribuir com as suas aptidões e a sua experiência de diálogo com os povos de outros
continentes (...)” (AR, 2001).
Com efeito, Portugal procurou introduzir na agenda europeia algumas das
principais preocupações e objectivos da sua Política Externa. Nalgumas situações com
90
relativo sucesso como aconteceu em particular quando exerceu a presidência do
Conselho da UE (1992, 2000 e 2007).
Foi o caso, desde logo, da sua relação previligiada com os PALOP. Depois de
alguma resistência à CPE, as Autoridades Nacionais rapidamente perceberam que, no
quadro europeu, o país ganharia margem de manobra para enfrentar a concorrência
de outros intevenientes em África, em particular a França e o Reino Unido. De fato, a
integração no projeto europeu deu a Portugal acesso a meios financeiros que
permitiram desenvolver a cooperação com os PALOP, desinadamente com Cabo
Verde. Portugal procurou reforçar a posição de África, em particular da África
Subsaariana na agenda da UE. A realização da 1ª Cimeira UE‐África na segunda
Presidência Portuguesa do Conselho da UE, em 2000 e a realização da 2ª Cimeira UE‐
África e da 1ª Cimeira UE‐Brasil no decorrer da terceira Presidência Poruguesa do
Conselho da UE, no segundo semestre de 2007, traduzem marcos importantes da
estratégia nacional nesse sentido. No quadro da UE, o país tem‐se vindo a assumir
como ponte entre a Europa, África e a América Latina.
De fato, Portugal tem‐se empenhado no processo de decisão das políticas da
UE na área da cooperação para o desenvolvimento mas também na definição de
políticas sectoriais e horizontais (migrações, segurança ou alterações climáticas) em
diversas regiões do globo mas muito em particular no que diz respeiro ao continente
africano.
“Portugal interage na UE procurando, por um lado, influenciar as políticas e
estratégias que são adotadas no Conselho e a sua operacionalização pela
Comissão Europeia com base na experiência e boas práticas da cooperação
bilateral e, por outro lado, sendo influenciado pelas decisões comunitárias,
traduzindo‐as para práticas de cooperação bilateral e para o estabelecimento
de parcerias específicas com a Comissão Europeia” (IPAD,2011:229).
Dois outros casos merecem uma referência: a questão dos direitos humanos e a
situação de Timor Leste, mas também a relação com os EUA e sua inserção na OTAN.
Timor Leste é um exemplo de como a participação de Portugal na PESC
permitiu a mulltilateralização das relações e de dossiers políticos importantes para a
Política Externa Portuguesa. Portugal conseguiu, por exemplo, levar o Conselho a
91
adoptar, em 25 de Junho de 1996, uma posição comum relativa a Timor‐Leste, na qual
a UE dá o seu apoio às iniciativas tomadas no âmbito das Nações Unidas para a
resolução da questão.
Assim,
“(...) o facto de Portugal colocar a questão timorense no plano europeu (da
PESC) permitiu que a questão de Timor‐Leste ganhasse uma relevância
internacional, que dificilmente teria sido possível sem (...) levar a questão
timorense para o plano da PESC, e de relacionar a questão timorense com os
direitos humanos” ( Hermenegildo, 2001:s.pag.).
A PESC funcionou, assim, como um multiplicador de visibilidade, de poder, de
contactos e de influência.
Por outro lado, Portugal procurou igualmente preservar o laço transatlântico,
promovendo o uploading dos seus objetivos estratégicos. Neste caso, Portugal tinha
como objectivo manter o eixo atlântico da sua Política Externa sem colocar em causa
os esforços europeus no domínio da defesa. Tratava‐se, assim, de equilibrar o binómio
UE / NATO e, nesse sentido, Portugal defendeu que
“ (...) o desenvolvimento da então chamada “identidade europeia de segurança
e defesa” pela UE não conduziria inevitavelmente a uma incompatibilidade
entre esta e a Aliança Atlântica desde que se aceitassem mecanismos de
coordenação e cooperação adequados” (Pereira, 2006:136).
92
CONCLUSÕES
Com a presente dissertação procurou‐se compreender o impacto do processo
de integração europeia na Política Externa Portuguesa, tentando identificar os efeitos
na sua elaboração, definição e implementação, relativamente aos PALOP e elegendo
Cabo Verde como estudo de caso.
Optámos por uma análise multinível e multifacetada da política externa,
apelando a dois enquadramentos teóricos. Uma visão próxima dos Institucionalistas
Neoliberais que admitem a cooperação entre os Estados da qual podem resultar
ganhos mútuos numa visão na qual as instituições internacionais podem assumir papel
relevante. A UE, como experiência singular no universo das organizações
internacionais, faz mesmo a diferença. E, tanto assim é, que considerando os ganhos
conjuntos que podem obter os Estados‐membros têm vindo a aprofundar o processo
de integração e tem, em paralelo, vindo a aumentar o número de Estados‐membros,
existindo um poder de atração que se traduz na existência, em todos os momentos, de
novos candidatos à adesão.
Mas, também o Construtivismo que, dá enfâse às estruturas normativas na
construção da identidade e do seu papel na definição da ação política, pressupondo
que o mundo é permanentemente construído através da interação dos atores – e,
neste sentido, a Europeização é entendida como um processo dinâmico, de duas vias,
de influência recíproca entre a UE e os Estados‐membros.
No final da nossa investigação e subsequente reflexão regressamos ao ponto de
partida: Foi a Política Externa Portuguesa Europeizada?
Consideramos igualmente as interrogações resultantes daquele ponto de
partida. Trata‐se de saber qual o impacto da adesão à UE na Política Externa
Portuguesa, a forma como a participação nas estruturas e práticas de coordenação da
política externa da UE influenciou a Política Externa Portuguesa para os PALOP, em
particular para Cabo Verde e averiguar se houve, afinal, lugar a uma adaptação e/ou
projeção nacional.
93
Concluímos pela confirmação da nossa primeira hipótese de trabalho ‐ a
Política Externa Portuguesa foi (e continua a ser) objeto de um processo de
Europeização e exploramos os diversos sinais dessa Europeização que confirmam a sua
existência.
Analisámos as duas dimensões, a dimensão top‐down e a dimensão bottom‐up
do processo de Europeização. Na primeira dimensão Portugal foi (e ainda é) sujeito à
influência e estímulo por parte da UE e dos restantes Estados–membros na sua Política
Externa. Na segunda, o país procurou influenciar a Ação Externa da UE e as políticas
externas dos seus parceiros europeus. Por uma e outra razão e, talvez, sobretudo pelas
duas em interação, a Política Externa Portugesa alterou‐se. Alterou‐se nos meios, nos
atores e no alargamento dos objectivos.
Por efeito da adesão portuguesa ao projeto europeu, produziram‐se uma série
de alterações.
Em primeiro lugar, ocorreu uma socialização das elites portuguesas que se
iniciou, como vimos, muito cedo, ainda antes da adesão propriamente dita. Esta
socialização prosseguiu e prossegue sobretudo junto dos decisores políticos que
compreendem, aceitam e negoceiam as grandes linhas das posições comuns europeias
sobre questões consequentes das relações internacionais. Esta socialização entre pares
é igualmente muito evidente entre o corpo diplomático, os técnicos e funcionários de
alto nível da Administração Pública portuguesa que trabalham ao nível europeu, entre
pares, no seio dos diversos Comités e Grupos de Trabalho. Trata‐se, muitas vezes, de
questões com incidência, direta ou indireta, no posicionamento externo de Portugal.
Houve igualmente lugar a diversas alterações na estrutura da burocracia
nacional com uma reformulação do MNE para dar resposta aos requisitos de
participação na CPE/PESC e com a concomitante criação de Gabinetes de Relações
Internacionais nos diversos Ministérios Sectoriais. O papel que as Embaixadas e os
Consulados são chamados a desempenhar em países terceiros foi igualmente
influenciado pelo processo europeu.
94
Os efeitos estenderam‐se, como referimos, à Constituição da República
Portuguesa que foi diversas vezes objeto de alteração para evitar o desfasamento com
o processo europeu e em função da própria evolução desse processo de integração.
Finalmente houve um alargamento do universo da Política Externa Portuguesa.
Com efeito, e como vimos, depois de uma importante rutura operada com o 25 de
Abril e o fim da Ditadura, a Política Externa Portuguesa tem estado articulada em torno
de alguns eixos consideravelmente consensuais e estáveis ao longo dos últimos anos: a
opção europeia, a ligação atlântica, as relações com os PALOP e uma renovação das
relações com o Brasil. Ora a participação na UE não modificando estes eixos, conduziu
a ação externa de Portugal a outras zonas do globo, em particular através da Política
Europeia de Vizinhança. As fronteiras da Política Externa Portuguesa em determinadas
condições vão para além das fronteiras do território nacional, dilatando‐se aos vizinhos
da UE a leste mas também a sul. Por efeito desta situação, Portugal tem vindo a
assumir um papel importante no relacionamento com os países do Mediterrêneo sul.
Em diversos domínios. É a este título, por exemplo, que Portugal é dos Estados‐
membros signatários das Parcerias para a Mobilidade, recentemente assinadas com
Marrocos e a Tunísia, e participa de forma ativa em diversas operações da FRONTEX no
quadro do diálogo sobre mobilidade, migrações e segurança.
Houve, pois uma adaptação. Mas, também uma projeção da Política Externa
portuguesa, particularmente evidente, naturalmente, no exercício da Presidência do
Conselho da UE. E, neste âmbito, o pilar Áfricano da nossa Política Externa (e em geral
as relações com as ex‐colónias) parece ter sido aquele em que esta projeção mais se
sentiu (embora, como vimos, não tenha sido, de todo, o único). Interessa‐nos em
particular porque representa o enquadramento do nosso estudo de caso.
Com efeito, a designada dimensão Áfricana tem sido uma constante desde
1974, na procura de um novo relacionamento com as ex‐colónias. No domínio das
relações com os PALOP, a Cooperação Portuguesa tem sido um dos instrumentos
fundamentais da Política Externa Portuguesa e o caso de Cabo Verde é, a este título,
emblemático.
95
Portugal tem vindo a procurar, como referimos no Capítulo II, trazer África para
a Europa, diligenciando no sentido de que o diálogo euro‐africano possa ser uma das
prioridades da agenda internacional da UE. Se olharmos para os resultados das três
Presidências Portuguesas do Conselho da União Europeia, não podemos deixar de
reconhecer algum sucesso nesse sentido.
Em 1992, obtiveram‐se avanços na política de cooperação para o
desenvolvimento e foi assinado o primeiro PIR PALOP no quadro da Convenção de
Lomé IV. Em 2000 teve lugar a 1ª Cimeira UE‐África e foi assinado o Acordo de Cotonu,
como resultado da revisão da Convenção de Lomé em que Portugal foi
particularmente ativo. Finalmente, na terceira Presidência, em 2007, Portugal colocou
novamente na agenda europeia, ao mais alto nível, o reforço do diálogo euro‐Áfricano
que se traduziu na realização da 2ª Cimeira UE‐África, em Lisboa no mês de dezembro.
E, finalmente, de grande significado para a nossa reflexão, a assinatura da Parceria
para a Mobilidade UE‐Cabo Verde, a primeira parceria desta natureza com um país
ACP e uma das duas parcerias pioneiras da UE no domínio da gestão dos fluxos
migratórios.
Houve, pois, uma projeção dos interesses estratégicos de Portugal. Uma
projeção da Política Externa Portuguesa (Europeização bottom‐up), designadamente
no plano do eixo Áfricano.
E desta forma, verifica‐se um processo de Europeização da Política Externa
Portuguesa, em geral e, em particular, para África, enquanto pilar dessa política.
E, no quadro deste processo geral, houve lugar a uma Europeização da Política
Externa para Cabo Verde.
As relações entre Portugal e Cabo Verde normalizaram‐se logo desde o início
do período pós‐descolonização. Hoje, existem laços importantes entre os dois países a
nível do diálogo político, materializado na cooperação operacional – cooperação ao
nível económico, educativo, da capacitação institucional, relativa aos fluxos
migratórios, e ao nível da cooperação técnico‐policial e tecnico‐militar entre outros, tal
como o testemunham os diversos PIC. A mobilidade de pessoas entre os dois Estados e
96
o peso da diáspora caboverdiana em Portugal são igualmente elementos estruturantes
das relações lusocaboverdianas.
A relação de Portugal com Cabo Verde foi influenciada pela adesão de Portugal
à UE, não só por todas as modificações operadas em geral, como referimos nos
parágrafos anteriores, como também, e sobretudo, em virtude de outras de caráter
mais específico. Estas resultam, também, do relacionamento muito especial deste país
Áfricano com a UE que influencia a relação bilateral Portugal‐Cabo Verde.
A Cooperação Portuguesa teve acesso a meios, designadamente financeiros
que fortaleceram a presença de Portugal em Cabo Verde – é o caso dos projetos
educativos ou da cooperação técnico‐policial, mas também a cooperação no domínio
das migrações sob o “chapéu” da Parceria para a Mobilidade UE‐Cabo Verde, na qual
Portugal assume claramente um papel de liderança e de “ponte”.
Com efeito, Portugal tem‐se assumido como uma “ponte” entre Cabo Verde e a
UE. Três exemplos podem ser mencionados: o papel de Portugal na graduação de Cabo
Verde, na celebração da Parceria Especial UE‐Cabo Verde e da subsequente Parceria
para a Mobilidade.
Em todos estes processos Portugal teve um papel ativo. Na graduação de Cabo
Verde para o grupo de Países em Vias de Desenvolvimento (PVD) Portugal exerceu
pressão diplomática no quadro da UE (mas também das Nações Unidas) tendo em
vista a consagração de um período transitório para Cabo Verde. Nos dois últimos casos
propondo e diligenciando para a assinatura daquelas parcerias que concedem um
estatuto especial a Cabo Verde no quadro europeu.
Este relacionamento especial entre Cabo Verde e a UE tem efeitos positivos e
mensuráveis na relação bilateral entre Portugal e Cabo Verde como, aliás, as duas
partes reconhecem ao mais alto nível.
Tal como se pode ler na Declaração Final da I Cimeira Luso‐Caboverdiana,
realizada em 2010, Portugal e Cabo Verde:
97
Saudaram os progressos alcançados na implementação da Parceria para a Mobilidade entre a União Europeia e Cabo Verde, cuja consolidação se reflecte positivamente nas suas relações bilaterais, e comprometeram‐se a prosseguir a cooperação para dar resposta aos desafios e oportunidades desta agenda comum.
Na Declaração do Mindelo (II Cimeira Luso‐caboverdiana, realizada em
dezembro de 2012) e no que respeita à concertação político‐diplomática, as duas
partes saudaram o quinto aniversário da Parceria Especial entre a UE e Cabo Verde e
Portugal reafirmou a sua disponibilidade para apoiar Cabo Verde no diálogo com os
demais Estados‐membros da UE e outras instituições, bem como no aprofundamento
da Parceria.
Concluímos, assim, pela validação da primeira hipótese de trabalho já que
houve lugar a uma Europeização da Política Externa Portuguesa. E identificamos os
efeitos já que o processo e os atores da Política Externa foram alvo do processo de
Europeização que conduziu a alterações na burocracia que é responsável por esta
política, mas também ao nível dos objectivos já que houve, como vimos um
alargamento do universo das relações que Portugal mantém com determinadas áreas
do globo.
Este movimento global é igualmente evidente na relação com África, e em
particular, com Cabo Verde.
No caso de Cabo Verde não houve propriamente alteração substantiva da
Política Externa Portuguesa do ponto de vista dos objetivos mas houve, sem dúvida,no
acesso a um novo enquadramento e sobretudo no acesso a meios financeiros que
potenciam a realização dos objetivos da Cooperação Portuguesa.
De uma forma geral, a relação bilateral está agora enquadrada numa relação
multilateral que teve efeitos ao nível da cooperação portuguesa. Os projetos em Cabo
Verde são, em muitos casos projetos da Cooperação Portuguesa mas beneficiam de um
enquadramento diverso e do acesso a meios de financiamento que potenciam a nossa
ação. É o caso dos projetos desenvolvidos ao abrigo da Parceria para a Mobilidade.
98
Por outro lado, a projeção que Portugal tem promovido das questões Áfricanas
na agenda europeia tem vindo a beneficiar Cabo Verde. Portugal, enquanto Estado‐
membro da UE foi particularmente ativo na promoção de um estatuto especial de Cabo
Verde junto da União Europeia, o que se reflete de forma positiva no relacionamento
com este país.
99
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111
LISTA DE FIGURAS OU ILUSTRAÇÕES
Fig. 1: Dimensões, mecanismos e resultados da Europeização da Política Externa.... 22
Fig. 2: Mapa dos países da CPLP………………………………………………………………………………. 36
Fig. 3: Síntese dos Objetivos, Princípios e Prioridades da Cooperação Portuguesa…. 39
Fig.4: Cooperação técnico‐militar com os PALOP…………………………………………………….. 41
Fig. 5: A cooperação europeia com os países ACP: de Yaoundé a Cotonu ……………… 52
Fig.6: Parceria Especial UE‐Cabo Verde…………………………………………………………………… 57
Fig.7: Emigrantes de Cabo Verde por país de destino (2008‐2013 ………………………….. 65
Fig.8: Emigrantes de Cabo Verde segundo motivo de emigração, por sexo ………….. (2008‐2013)
66
Fig.9: PIC 2011‐2015 – Eixos estratégicos e áreas de intervenção…………………………… 72
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