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EVANDRO SROCHA
CORAÇÃO
FALANTE
RISOS E LÁGRIMAS DE UM POETA
SETEMBRO / 2014
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“Uma rosa, um pássaro, uma estrela, o vento, o mar, o aroma do
café coado em bule, o latido, a algazarra das crianças, o desenho
do sol feito em carvão da fogueira acesa no dia anterior para
comer batata doce e/ou milho. Enfim, as pessoas, o mundo, a vida.
Tudo é inspiração para um coração tornar-se falante. Felizmente
Falante.”
Evandro SRocha
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LUGARES E ESTADOS DA ALMA
A influência exercida sobre a nossa alma, pelos diferentes lugares, é
uma coisa digna de observação. Se a melancolia nos conquista
infalivelmente quando estamos à beira das águas, uma outra lei da
nossa natureza impressionante faz com que, nas montanhas, os nossos
sentimentos se purifiquem: ali a paixão ganha em profundidade o que
parece perder em vivacidade.
Honoré de Balzac, in 'A Mulher de Trinta Anos'
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Dedico esta obra ao Grande Arquiteto,
Meus filhos: Ruan Pablo e Cíntia Waleska
Minha esposa: Andréa Nunes de Lima,
Meus pais: Lourdes e Severino,
Meus irmãos e sobrinhos
E aos meus netos (no futuro)
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ÍNDICE
AH, COMO É MARAVILHOSO! - 13
INSTINTO S - 14
COM TODA FORÇA DA ALMA - 15
POR TODAS AS FORÇAS - 16
MESMO QUE RASGUE MEU PEITO - 17
LINDA - 18
MENINO -19
EU PENSEI... - 20
ENXERGAR O AMOR - 21
SONETO DO AMOR - 22
CANÇÃO MAGIA - 23
SAÍDA - 24
AMO, AMO, EU AMO A MIM MESMO - 25
REPÚDIO - 28
MANIFESTO -29
SONETO DA ALQUIMIA -30
SAMBAR AMOR, SAMBAR - 31
AH, A VIDA - 32
ENCHARCADOS – 33
ENCANTAMENTO - 34
SEMPRE VALE - 35
TRÊS TOQUES -36
AMAR AMOR AMAR - 37
INCANDESCENTE - 38
AH, MULHER – 39
SOFRO DE VERDADE – 40
SOU POETA MESMO – 41
LIVERTÀ – 42
LUX – 43
A CAIXA – 44
CAMINHADA – 45
PRA QUÊ? – 46
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ÍNDICE
SENTIDOS - 47
AH, ESSA MULHER! – 48
GRÃOS DO TEMPO – 51
BUSCAS E ENCONTROS – 52
ACREDITAR – 53
TUDO POSSO – 54
ELE – 55
ADORÁVEL – 56
ELA – 57
À ESMO – 58
ESCUDO -59
AS JANELAS – 60
O MENINO – 61
NUNCA! NÃO, NÃO VOU DESISTIR – 62
DIA A DIA – 63
LEMBRANÇAS – 64
DOCE PECADO – 65
SEM SENTIDO – 66
ALEGRIA E MAGIA – 67
JOSÉ, DOROTÉIA, JOANA... – 68
VEM NENEM – 70
7 VELAS – 71
ZANGA ZEFA – 72
BOTECO – 74
AH, VOU PARA O BAR - 75
BÔNUS:
CORDEL
SEVERINA DO ALAMBIQUE
CONTRA O BICHO DA ROÇA
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AH, COMO É MARAVILHOSO!
Ah, como é maravilhoso!
Sentar e sentir o vento fresco e sonoro
Olhar o horizonte e ver o início de tudo
Deitar e sentir a terra molhada e macia
Dormir feliz na noite enluarada até raiar o dia
Ah, como é maravilhoso!
Plantar uma árvore e vê-la dar frutos
Ver um cachorro abanar o rabo ao ver seu dono
Caminhar pela orla e sentir do mar o aroma único
E o Sol dar bronze aos corpos incitando o lúdico
Ah, como é maravilhoso!
Fazer um filho e ter o prazer de ser um criador
Vê-lo crescer e a cada dia mais se parecer com você
Saber que sua semente vai ser germinada e perpetuada
E que seu nome vai ser história sempre pronunciada
Ah, como é maravilhoso!
Escrever um livro com prazer tal qual orgasmo
Ver suas ideias, sonhos e pensamentos versados
Abria a alma para os olhares famintos dos outros
Fazer sua mente despejar sentimentos soltos
Enfim,
No fim...
Ah, como é maravilhoso!
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INSTINTOS
Você fala e meu falo enrijece
Peço perdão em minha prece
Sei que não posso ter você
As vezes é melhor perder
Mas a pele do meu corpo
Eleva-se a quarenta graus
Desperta meu instintos maus
A cabeça atinge o topo
O choro da glande é fatal
As dores da carência fazem mal
Fico louco com essa porra
Que penso até em danar
Com tudo isso e te agarrar
Antes que de tesão eu morra
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COM TODA FORÇA DA ALMA
Vou saltar, do mais alto prédio dessa cidade
E voar, com toda a sensação de liberdade
Te abraçar, com todas as forças da alma
Te amar, com o amar eterno que acalma
Se você se assustar com toda essa paixão
E quiser, se afastar e ficar em outra dimensão
Vou mostrar, que a paixão que tenho é natural
Te beijar, tão gostoso pra espantar todo mal
Nós estaremos juntos por todo sempre
Mesmo que encontremos barreiras a frente
Saltarei com toda força da minha alma
Vou mostrar que o amor pode espantar o mal
Te beijar em outra dimensão sobrenatural
E que a paixão que assusta também acalma
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POR TODAS AS FORÇAS
Por mais que você passe e não me dê atenção
Que pise incessantemente em meu coração
Não vou cansar de tentar a você conquistar
Por mais que digam para eu deixar de tentar
Vou fazer todas as mágicas por teu coração
E aliar minhas mandingas a esse querer
Bater todos os tambores para chamar você
E acender minhas velas em sua intenção
Que todos os santos e anjos desçam do céu
Que mudem essa dificuldade com gosto de fel
Que todos os orixás com toda proteção
Impeçam as forças contrárias à minha vitória
Que o "deus" Sol ilumine a estrada da glória
E que a Lua sele e determine a sua redenção
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MESMO QUE RASGUE MEU PEITO...
Primeiro tentei te apagar
Com uma borracha tentei
Da memória te eliminar
Sucesso não alcancei
Depois tentei te cortar
Com uma tesoura tentei
Mas comecei a chorar
Peguei suas fotos e juntei
Mesmo que rasgue meu peito
Não vou achar um jeito
De lhe esquecer
Até se olhos eu fechar
Sua imagem vai manifestar
E nos meus sonhos aparecer
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LINDA
Linda
A luz não finda quando vem de você
Ainda
O perfume que exala, faz-me enlouquecer
Fico parado e hipnotizado em sua presença
Frescor
O teu corpo nu e suado, deitado à deriva
Torpor
Calor
É o que recebo pela minha pele na tua
Sabor
Os meus lábios deslizando em sua pele nua
O desejo incessante que me atormenta
Intenso
O tesão louco e diabólico que me desencarna
Imenso
Teus olhos, teus seios, suas nádegas
Mais nada
Minha fada
Que enfeitiça e amansa minha alma sôfrega
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MENINO
Já andei de pés descalços
Já joguei bola na chuva
Fui criança, fui feliz
Cresci e não esqueci
Minhas raízes eu guardei
Sempre confiei que aqui
O que é sofrer eu não sei
Já cortei o meu pé
Também já caí da laje
Perdi na bola de gude
Voei com a pipa
Perdi meu pião
E as pedras do dominó
Perdi pelo chão
Mas com todas as mazelas
E as marcas nas canelas
Fui feliz de coração
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EU PENSEI...
Eu pensei...
Pensei que os políticos
Fossem representantes do povo
Pensei que os pastores
Fossem líderes religiosos
Eu pensei...
Pensei que padres
Fossem bons com as crianças
Pensei que os médicos
Não negassem socorro
Eu pensei...
Pensei que a polícia
Protegesse a população
Pensei que o amor
Fosse sempre sincero
Eu pensei...
Pensei que os amigos
Cuidassem uns dos outros
Pensei ingenuamente
Que o mundo fosse melhor
Eu pensei...
Eu pensei...
Eu pensei...
Mas achei melhor pensar...
Que existem pessoas boas
Que existem pessoas honestas
Que existem pessoas beneficentes
Achei melhor apenas pensar...
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ENXERGAR O AMOR
Hoje eu nem tentei chorar
Minhas lágrimas há muito secaram
Procurei no fundo da alma
Um motivo para não gritar
Minha vida descarrilou
Tombou no precipício do lodo
Chafurdou em areia suja
E quase findou
Mas procurei uma saída
Saí do beco escuro
E enxerguei um amor
Consegui curar a ferida
Passei por cima do muro
E foi do inferno ao frescor
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SONETO DE AMOR
Acordar contemplando a luz que fortalece o ser
Ouvindo a musica que a natureza nos presenteia
Feliz por mais um dia feito para vencer
A vida feliz que todo vencedor anseia
O milagre de abrir os olhos e ver os rostos
O deleite que é toda manha tocar um corpo
O arrepio na pele nua de quem ama
Dois corpos num corpo unidos na cama
Mesmo sozinho é possível amar a vida
Pois nem sempre acompanhados estamos com alguém
A dádiva de caminhar para nossos próprios destinos
O poder que o amor tem de curar a ferida
A paixão deliciosa que nos leva muito além
A pessoa que nos completa e nos torna meninos
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CANÇÃO MAGIA
Confesso, não resisti e pedi
Ajuda de todos os santos
Auxilio a meus orixás
Ajoelhado até o altar, andei
Confesso, chorei muito tempo sozinho
Perambulei pela noite qual ser
Sedento do seu sangue quente
Só entende quem o amor sente
As velas que eu acendi em sua intenção
Todos os tambores que bati pra você ouvir
Todas as orações que fiz pra purificar
Essa louca mania de ti exaltar
A vela apagou, eu não vi você
Os tambores calaram
As minhas orações feitas com fé
A você não chegaram
Mas como sou um homem de fé
E confio no poder divino do amor
Desta paixão não desistirei jamais
E desta condição não arredo pé
Vou acender minha vela novamente
E batendo tambores farei minhas orações
E quando te conquistar
Aí sim, vai ser pra sempre
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SAÍDA
Vem amor
Me ajude a encontrar felicidade
Vem amor
Venha logo antes que seja tarde
Pois um novo amor pode aparecer
E acender a chama que guardei pra você
Me deixou
No momento que eu estava tão pra baixo
Me abandonou
Quando mais precisava me encontrar
Eu sei que vacilei, não fui legal contigo
mas errar é humano e não mereço este castigo
Então volta
As portas estarão sempre abertas
Vem pra mim
Quando quiser você pode vir
Estou te esperando, com meu coração na mão
mas se demorar, entregarei a outra então
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AMO, AMO, EU AMO A MIM MESMO
Não sei se quero amar
Amar é melancólico
Até gosto de chorar
Num clima bucólico
Na vida amorosa
É triste meu histórico
Pra que gostar de alguém
O tempo todo assim
Prefiro antes de tudo
Gostar um pouco de mim
Se bem que às vezes
Da vida, quase dei fim
Já amei com tanta força
Uma mulher que encontrei
Tava Perdida pela rua
Quando nela esbarrei
Quando olhei nos olhos
Por ela me apaixonei
Mas com o tempo
Fui ficando muito triste
Nós estávamos felizes
Pra mim isso não existe
Eu me sinto bem melhor
Quando a tristeza persiste
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Ah, eu quero chorar
Quando ela for embora
Quando ela aborrecida
Me maltratar toda hora
Quando ela me trair
Até o romper da aurora
Sou feliz quando sofro
Qua a lágrima rola
Quando ouço um tango
Em minha rádio vitrola
Quando ando atrás dela
Até gastar minha sola
Quando a dor me assola
Meu corpo em convulsão
Quando mágoa é forte
Quase explode o coração
É com toda essa mágoa
Que me vem a inspiração
Que essa agonia perdure
E nunca me abandone
Que seja vilipendiado
Vá sorriso, vê se some!
Para que com os meus versos
Todos digam o meu nome
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Sendo triste sou feliz
Bem mais que eu podia ser
Expressando meu ardor
Para o verso não perder
Recitarei por toda vida
Até o dia que eu morrer
Não pensem que choro
A minha vida toda
Sou feliz por ser assim
E que o resto se foda
Vou girar até estar tonto
Me afogar na minha onda
E com essa dor no peito
Vou ser sempre um poeta
Vou falar de alegria
Fazer da morte uma festa
E transformar o mau agouro
E prosa, poema e conversa
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REPÚDIO
Repudio a morte anunciada
No leito do amor eterno
Prefiro ter amado nada
Do que descer ao inferno
Queimar minha alma impura
Nas chamas do peito ereto
Me deliciar no sangue a cura
Sêmen do amor completo
Que venha sem avisar
Que me surpreenda a pele
Quente e sempre a pulsar
Enquanto o ardor expele
Num canto da sala fria
Os ossos tremem de dor
O rubor da face jazia
A voz muda de cor
Então não venha sozinha
E traga o anjo também
Pois esperarei na casca minha
Enquanto a bela não vem
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MANIFESTO
E a minha vida se transforma a cada dia
Vou velozmente da tristeza a alegria
Sou um manifesto de indignação
Aceito e rejeito tudo aquilo que é o não
Do concreto ao abstrato nada me congela
Solto o grito que está preso em sua goela
Busco a força dos divinos ateus crentes
Sou alma, sou serpente, sou bicho sou gente
Envolto em toda a crítica da mesmice anunciada
Me apresento com a apatia e a risada calada
Encontro no caminho os sustos previsíveis
Acalanto o menino sujo de traços horríveis
Enquanto o tempo muda a trajetória das rugas
Permaneço alheio às manchas nas roupas sujas
Com meu rosto voltado para a doce maldade sombria
Tenho os olhos mergulhados em pimenta tardia
Então aceito as mudanças com fé incrédula
E a alegria que entristece minha letargia nula
Respiro o ar podre das castas e crãs insanos
E continuo buscando o limbo embaixo dos panos
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SONETO DA ALQUIMIA
Não sou normal, sou artista
Saio do meu corpo como alma
A noite toda estou na pista
Cantando meu samba que me acalma
Sou alquimista contemporâneo
Transformo pensamento em melodia
Para enriquecer a alma pobre e doente
Para confortar os corações carentes
Sou arlequim, sou pierrô, sou folião
Sou manequim, sou marionete, sou palhaço
Vou sambando nos palcos da vida
Levo alegria e magia ao coração
Na passarela do samba, meu espaço.
Minha arte sempre cura minha ferida
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SAMBAR AMOR, SAMBAR
Eu chorei,
Quando as cordas do meu cavaco arrebentaram
Quando a pele do meu surdo de primeira rompeu
Quando perdi a disputa do meu samba na quadra
Quando na hora do desfile da minha escola choveu
Oh, minha bela mulata das pernas grossas de mola
Que quando o samba explode se entrega e rebola
Com toda a sua sensualidade que me hipnotiza
Com a malemolência faceira que a beleza eterniza
Vem pra minha escola mostrar seu valor
Vem com tua magia me encher de amor
Vem esquentar meu corpo com teu calor
Bate tambor,
E a cuíca chorando anuncia a paixão
Com o batuque feliz do repique de mão
Sambando miudinho com os pés no chão
Eu sorri,
Quando as cordas do cavaco voltaram a vibrar
Quando o som do meu surdo explodiu no ar
E meu samba levou a galera a cantar
Mas sorri,
E no meio do desfile a Lua apareceu
Trazendo alegria para todos os meus
E minha mulata enfim a mim se rendeu
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AH, A VIDA...
Inconveniente e atrevida
Essa vida que nos faz diferente
Que nos leva em frente num caminhar intenso e incessante
A vida...
Que curta e desanimadora em momentos de grande dificuldade
É longa e excitante nos momentos extremamente felizes
A vida...
Dos tropeços, dos acertos, dos levantes e dos erros inevitáveis
Erros que superam os acertos afim de nos fazer evoluir e chegar ao
topo
A vida...
Dos amores que nos fazem cometer as mais doces loucuras
Dos inimigos que os fazem ter a percepção da maldade e da covardia
apurada
A vida...
A vida que sempre quero, a vida que repudio, a vida que e minha... a
minha vida...
Vivida, perdida, alcançada, odiada, vilipendiada, injustiçada,
incompreendida...
Ah! a vida...
A vida...
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ENCHARCADOS
Inerte
Deitado no chão, com o corpo em pelo
O olhar fixo em seu umbigo
Os lábios molhados, abertos, em apelo
Meu falo enrijecido, pulsa
Sua pernas se enrosca em minha cintura
Seus seios unem-se ao meu peito
Nossos beijos que a febre cura
Movimentos, gemidos, suores e mordidas
Giros, suspiros, arranhões, puxões e batidas
Apenas um corpo na sala
O poder do oral que cala
A respiração cada vez mais ofegante
Os movimentos cada vez mais excitantes
O cavalgar de uma princesa em seu alazão
O doce odor do sexo e do tesão
O licor que vem de dentro
O licor que vai adentro
Encharcados...
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ENCANTAMENTO
Fui buscar na magia, fui buscar no terreiro
Fui buscar na abadia, fui buscar canteiro
Fui buscar na Igreja, Fui buscar no salão
Fui buscar na tristeza, fui buscar na canção
Fui e não encontrei, até hoje não sei
Fui e não descobri, até hoje não vi
Voltei sem entender, não sei porque
Voltei nem sei porque, voltei pra você
Voltei sem olhar pra trás, já não vou mais
Voltei e agora vou ficar, vou me entregar
Nem toda magia, tambor no terreiro
Nem toda abadia, oração no canteiro
Nem toda igreja, nem toda tristeza
Nem todo salão, nem toda canção
Fui, voltei, tentei, nem sei se vou
Entreguei, encenei, me deixei levar
Bati no tambor, joguei e voltou
Mas meu povo da rua vai me amparar
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SEMPRE VALE
Vou tentar chamar sua atenção
Vou me vestir diferente como os góticos
Vou gritar mais alto que um urso feroz
Vou girar como os moinhos de Cervantes
Enveredarei pela multidão apressada
Vou mergulhar em uma poça para você passar
Ficarei parado na faixa mesmo que o sinal abra
Soprarei seus cabelos com o bater de asas
Mendigarei sua atenção sentado na calçada
Meu pranto vai ser a flor da pele
Minha loucura vai flertar com a sanidade
Chegarei tão perto como o perfume em sua pele
E mesmo se com tudo isso, você não me ver
Tentarei em meus sonhos suicidas
Tentarei em meus devaneios sem fim
Tentarei em minha tela pintada a sangue
Se nada disso resolver então...
Tentarei na morte...
Quem sabe se assim seu coração amoleça
E no momento em que a cal e as pétalas tocarem meu ataúde
Suas lágrimas também o toquem
E passando pelas frestas de minha cúpula
Chegue ate meu rosto
E, assim...
Tenha valido a pena tanta luta
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TRÊS TOQUES
Ah, meu pés presos às tábuas
Vejo de cada dedo brotar uma raiz
Elas vão entrando pelas frestas das madeiras
Sinto a mutação de meu corpo em arte
Não faço um movimento sequer para soltar-me
Fico deliciosamente calmo aguardando a fusão
Carne, osso e coração espalhados pelo palco
E minha alma vagando por todo o espaço
Tocam uma, duas, três vezes o som do paraíso
O vazio se transforma em multidão atônita
As luzes vêm e vão de forma cadenciada
Que eu nunca acorde e me liberto disso
Os aplausos são acordes de uma majestosa sinfônica
E a mordida causa felicidade prazerosa e amada
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AMAR AMOR AMAR
Amo amar quem ama me amar
Amo demais, meus pais
Amo de pé, minha mulher
Amo de coração, meus irmãos
Amo com alegrias, minhas crias
Amo em alta voz, meus avos
Amo e brigo, por meus amigos
Amo completo, o Grande Arquiteto
Amo arriba, arriba, minha vida
Amo de fato, poesia e teatro
Amo tudo, amo a todos
Amo amar a quem me ama
Amo o amor de quem ama
Amo quem o amor ama
Amo amar
Amo, amem!
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INCANDESCENTE
A feliz tristeza da realeza burra
Vivendo da imagem do caos
Onde o certo erra o alvo e urra
E o bem se junta ao servo do mal
E a pobreza do coração abastado
Vivendo de grãos brancos finos
Abastecendo as vias anasaladas
Enquanto o fiel queima pedras em sinos
A loucura me diz o quanto vale
A lucidez do herege alucinado
O sangue que repousou no cálice
Ferve nas veias do falo inchado
Me diz, me diz o que é o fim?
Me ouve quando eu disser sim!
Agora tira a pele e olha pra mim
Eu me dispo do inferno e digo sim
A lâmina que corta a língua acesa
Mostra o poder da livre indecência
E quando a sua alma estiver presa
A morte lhe trará vida com certeza
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AH, MULHER!
Mulheres não envelhecem
A idade não afeta deusas
O tempo não conta mais
A mulher amadurece
De uma maneira fugaz
Feliz do homem que
Em sua existência
Tenha o prazer e o privilégio
De ter a permissão
Para viver ao lado de uma mulher
Verdadeira condição
A mãe eterna
Que cuida a vida inteira
Desse ser infantil e mimado
Quando criança, amamenta
Quando jovem, orienta
Quando adulto, sustenta
Quando velho, acalenta
Quando morre, lamenta
Quando o tempo passa
A transforma em uma divindade
Onde de nada importa a idade
Quando após trinta anos
Está na sua melhor fase
É uma amante maravilhosa
Uma mulher poderosa
Neste momento
Os homens
Meninos sem rumo
Se lançam a seus pés
Mulher...
Que ser poderia ser mais perfeito?
40
SOFRO DE VERDADE
Minha vida é sofrimento
De dia e de noite eu choro
É um enorme tormento
Eu não ter a quem adoro
Minha santinha eu imploro
Que seja até pelo vento
Chegue ao ouvido dela
Esse meu triste lamento
Não é fingimento agouro
É sofrimento verdade
Sai de meus olhos o soro
Escape de minha saudade
Dessa angústia que me invade
E me deixa assim covarde
Meus olhos choram em coro
Meu coração quer socorro
Sou poeta verdadeiro
Escrevo em linhas estéreis
Por saber que não me queres
Nem se tivesse dinheiro
Girando por mundo inteiro
Deixo meu nome no muro
Ser triste eu já não aturo
Feliz também não quero ser
Assim o meu verso se mostra
Tal qual vinho em mesa posta
Que o bom verso não afrouxa
Sou poeta Evandro SRocha
41
SOU POETA MESMO!
Sou poeta mesmo?
Falo com o coração
Mostro ao mundo
O amor em palavras
Sou poeta mesmo?
Vivo em floreios
Romântico sim!
Choro quando amo
Sou poeta mesmo!
A alegria me assusta
A tristeza combustível
A lágrima alimento
Sou poeta mesmo!
Isso mesmo, sou poeta
Sou mesmo poeta
Poeta mesmo, eu sou!
42
LIBERTÀ
No azul da imensidão
Apenas asas livres plainam
Com a luz da criação
Vejo os que se amam
O vento da excitação
Atinge o corpo inerte
A alma queima de tesão
Enquanto a mente se diverte
O caos se dissipa
A ordem toma lugar
O mal não se arrisca
O bem a se apresentar
As fitas tremulam
O som invade o martelo
Os belos se juntam
Aqui sentado espero
A vida assumi seu posto
A morte caminha sem rumo
O sorriso firma no rosto
Em êxtase em azul resumo
43
LUX
Há um momento na vida
Em que o caos se instala
As feridas aparecem
Abrem o peito feito bala
O ar fica muito pesado
O corpo jaz numa vala
Mas o luz logo surge
Quanto menos espera
A fumaça vai dissipar
E se abrirão janelas
Trazendo novo luar
E Sol de uma nova era
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A CAIXA
O silêncio é quebrado
O som do desespero é ensurdecedor
A busca pela passagem na caixa
É uma busca intensa e dolorosa
Quando o vento soprar
A luz talvez esteja em uma mínima fresta
Um filete de luz pode ser o portal
Ao acreditar que a passagem existe
A mente abre o caminho para a paz
O corpo reage e torna a mente em brisa
Os males e os fatores externos não propagam
A insensibilidade da dor cotidiana
A cabeça em sua galopante translação
Faz com que o cérebro envie choques
Cargas intensas de prazer adocicado
Tentando uniformemente escalonar os sentimentos
A mente que mente descontente, e emergencialmente
Para que o coração fique forte
E perceba que a morte não tem poder sobre si
E assim, a alma pode descansar e encontrar o abrigo
Fora dessa descontrolada Caixa de Pandora
45
CAMINHADA
Trepei, tombei no tombo
Cai, chorei no ombro
Morri. meio aos escombros
Perdi, caminhos longos
Joguei, no jogo o jongo
Cortei, cabelos longos
Topei, trepei no tombo
Subi, com pés nos ombros
Escombros, eu trepei
Tombos, tantos que nem sei
Morte, a vida inventei
Perda, seu rosto imaginei
Trepei, jogando escombros
Subi, do alto tomei tombo
Cortei, os pés no jongo
Inventei, que não te encontro
No longo tombo
Joguei o jongo
Perdi o jogo
Cortei o ombro
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PRA QUÊ?
Acordei com o oceano
Ele estava em meus olhos
Pedi que fosse engano
Que fosse pesadelo
Mas meu rosto no espelho
Refletia a agonia
Que a partir daquele dia
Tornou-se desespero
A partida é guilhotina
A cabeça vai ao chão
Gira como pião
Nos abate como aves
Com as asas sem bater
Caindo no abismo
Profundo e negro
Um verdadeiro tormento
Que nos faz esmorecer
Mas ou vivo ou me entrego
Ou me escondo no freezer
Faço uma bebida forte
Com gelo do coração
Ou te espero ou vou à luta
Ou arranjo uma puta
Pra botar em seu lugar
E daí, daqui pra frente
Vou pensar milhões de vezes
Antes de me apaixonar
47
SENTIDOS
Meus olhos, pobres janelas de minh'alma
Cansados de captar a maldade humana
Se fecham a cada imagem, em trauma
Negando-se a filtrar atividades mundanas
Minha boca, pobre alto falante carnal
Cansada de tentar se fazer entender
Se fecha a cada palavra infernal
Negando-se às suas frases perder
Meus ouvidos, pobres antenas humanas
Cansados de ouvir gritos de desespero
Se fecham ao som das ratazanas
Negando-se a aceitar dos ruídos, o erro
Eu, uma pobre máquina de carne e osso
Cansado das andanças da vida vazia
Me fecho aos hipócritas perdidos no fosso
Negando-me a acreditar na deidade tardia
48
AH,ESSA MULHER...
UM DIA...UMA VIDA
Ah, essa mulher!
Que em sua vida teve momentos difíceis
Ah, essa mulher!
Que amou o amor dos sonhos
Que sonhou amar e ser amada
Ah, essa mulher!
Que teve que viver, mesmo sem querer
Uma vida sem graça, sem vida
Uma vida sem descobertas
Ah, essa mulher!
Da liberdade cerceada
Da injusta cobrança
Da total falta de esperança
Ah, essa mulher...
Ah, enfim a liberdade!
O retorno ao seio materno
Pros que realmente a amam
Ah, essa vida injusta!
O renascer d’alma na força que habita o ser
Ah, idade que chega!
Que para muitos é tão cruel
Mas que para ela é o elixir da juventude
49
Ah, essa mulher!
O recomeço e o tropeço, o amor e a decepção
O tropeço e o recomeço
Ah, essa mulher!
Da adolescência perdida
Da vida não vivida
Da grosseria e do desprezo
Que a fez esquecer que ela própria existia
Afundada na espera de uma melhora repentina
Ah, desilusão!
De ver seu amado passar de príncipe a bruxo
Arrogante e vil
Do trato com desrespeito e sem a menor compaixão
Ah, um novo amor!
Mas que não completa o todo
Que satisfaz apenas um pouco
Mas que não preenche então
Ah, essa mulher!
Que sonha que um dia o seu corpo
Ainda vai sentir o que sente as que sentiram todo prazer
Ah! ...o prazer...
Que não conheceu por completo
Que seu corpo deseja tão forte
Que ainda espera que sua carne estremeça de um tesão
Imenso e intenso que a faça enlouquecer
Tão intenso que vai fazer jorrar o suco dos deuses
50
Ah, essa mulher!
Essa linda e maravilhosa mulher
Que assim vai levando a vida
Sempre querendo mais
Ah, mais!
Mais vida, mais amor
Mais prazer, mais calor
Mais tesão, mais compreensão
Mais atenção e mais, muito mais paixão
Ah, essa mulher!
Essa mulher!
Ah! Essa mulher!
Ah!...
Ah! ...
Mulher!
51
GRÃOS DO TEMPO
A cada grão que cai pela estreita passagem
cada fração de segundo que esvai lentamente
perdemos células, glóbulos, pelos, tesão, coragem
inconscientemente o tempo muda nossa mente
Entre a ampulheta e o coração
Entre o preservativo e o tesão
Conto o tempo das batidas
Conto o tempo da ereção
A carne sangra involuntária
O sêmen jorra no invólucro
A semente explode e expande
Para permitir que o tempo ande
52
BUSCAS E ENCONTROS
VIDA I
Em que porta devo bater?
Por qual porta devo entrar?
A quem devo recorrer?
Em quem posso confiar?
Os cominhos ficam tortuosos
As estradas derrapantes
As trilhas sinuosas
As ruas inundadas
Sem luz
Sem cor
Sem força
Sem amor...
Perdido... Perdido... Perdido...
VIDA II
Bati na porta certa e fui recebido
Entrei pela porta correta e fui abraçado
Recorri a pessoa certa e fui atendido
Contei a pessoa certa e pude confiar
Os caminhos foram abertos
As estradas desobstruídas
As trilhas foram limpas
Nas ruas as águas escoaram
Fez-se a luz
As cores voltaram
o corpo se ergueu
te amo!
Te encontrei... me encontrei... nos encontramos!
53
ACREDITAR
Preso em minha própria mente
Nem percebo que o tempo se vai
Introvertido completamente
Nem mesmo me mover sou capaz
Totalmente sem saída
Paredes, tapumes e divisórias
Telhas, telhados e coberturas
Olho no relógio, não vejo as horas
Como sair desta prisão por completo?
Como libertar a mente enlouquecida?
Como encontrar o caminho correto?
Como manter a sanidade ativa?
Sem uma luz, nem mesmo uma fresta
Sem solução, nem mesmo um dilema
Sem um caminho, nem mesmo uma reta
Sem força, sem vida, nem mesmo uma cena
Quanto tempo mais vou suportar?
Em quantas portas mais irei bater?
Tenho que ter fé para continuar!
Tenho que ter tesão para viver!
Então vem me mostre o sentido
Então vem me mostre a estrela
Mostre que não há sonho perdido
Mostre que ainda posso tê-la
Só vou acreditar no dia sublime
Em que sua presença for notada
54
TUDO POSSO
Infinitamente distante
Tão longe que não consigo alcançar
Por mais que eu cante
Forças turvas tentam me desanimar
Busco no fundo de minha alma
Energias ocultas de amparo
Agarro-me e prendo-me forte
Tento a luz e a busca de um norte
Superando as fraquezas
Descubro o meu poder
Nunca é tarde demais
Ergo a cabeça, levanto luto e resisto
Em minha mente visualizo muito mais
Vitórias diante aos conflitos
Vitórias que absorvo
Com muita felicidade
Afastando o estorvo
E as mensagens da maldade
A decepção dos almejam minhas derrotas
A queda de quem me faz tanto mal
Tudo posso se a mim me permitir
55
ELE
Tu és como um pássaro
Livre e feliz a voar
De asas claras
Alvas e transparentes
Tão transparentes que às vezes
Consigo ver sua alma pura e angelical
Frágil não entende nada
Ou quase nada
Ou será um engano meu
Acho que entendes tudo
Com sua sabedoria ingênua
Tu sentes
Que tudo tem seu momento
És brincalhão e sorridente
Alegre e serelepe
Muito enxerido
Mexes em tudo
Tens a curiosidade inerente
Queres conhecer o misterioso
Teus olhos castanhos refletem
O milagre divino da criação
Tão sensível e sem malícia
Não conheces nada do mundo
Melhor assim
Poupas-te da tristeza
De ver sua geração sendo devorada
Sem pena, respeito
Pelos senhores da destruição
Mas não precisa saber
Sua vida é só amor e carinho
Foi semente e agora é fruto
Pedra bruta há de ser lapidado
Seja bem vindo, filho amado
56
ADORÁVEL
Tantas pessoas a meu redor
Porém, sozinho na multidão
Que angústia, sempre só
Acompanhado à solidão
Sentimento desprezível
Nenhuma falta me faz
Estar sem ela é horrível
Estar com ela satisfaz
Preciso de pessoas comigo
Não preciso de ninguém
Preciso de amigos
Sem companhia estou bem
Na escuridão me encontro
Tenho medo do escuro
Na claridade me assombro
Se tiver a luz, a tudo eu aturo
Minha linda dama da noite
Não me deixe um só instante
Se não a sinto é um açoite
Sou um poeta delirante
57
Ela
Olhando firme nem parece
Vou até fazer uma prece
Para que seja verdade
Meu olhar ainda arde
Uma coisa tão pequena
Acho até que vale à pena
Acreditar no que estou vendo
Nesta imagem então me prendo
Uma coisa tão singela
Uma flor na primavera
Uma estrala radiante
Com seu brilho a todo instante
Onde ando nada igual
Um ser tão angelical
Uma linda harmonia
O raiar de um novo dia
Um ser belo que eu criei
Que meu sangue eu lhe dei
Assim, sou muito feliz
Que as lágrimas por um triz
Rolam pelo meu rosto
Que com tanto gosto
Quando eu a vi
A seu sorriso me rendi
58
À ESMO
Escolhas desesperadas
Em momento de aflição
Decisões tomadas
Com medo da solidão
Em meio à multidão
Eu estou tão sozinho
Nunca vamos entender
Essa busca por caminho
Tenho tudo o que quero
O que tenho esmero
Então porque esse vazio?
Eu sou o que quero ser
Ser feliz para viver
Da tristeza o desvio
59
ESCUDO
Passei a vida inteira
Usando um maldito escudo
Atitudes impensadas, besteiras
Não descubro o “Eu” profundo
Pensamentos inversos
Vida regressa, promessas
Construindo meus versos
Vivendo às pressas
Perdi vários tesouros
Segui por mapa errado
Ingenuamente infantil
Choros, revoltas e agouros
Passado e presente marcado
Meu sofrimento ninguém viu
60
AS JANELAS
Em casa, pela janela
Observo a Terra
Vejo o céu, o Sol
Vejo pássaros, vejo árvores
Criança brincando na rua
Brincadeiras que outrora eram minhas
Vejo carros passando
Pessoas sempre apressadas
Vejo tudo da janela de casa
Em minha janela
Em meu rosto sôfrego
Não vejo alegria
Não vejo o que quero
Vejo morte vejo guerra
Não entendo!
Não aguento!
A ânsia louca e desmedida
Atinge-nos nas feridas
Dos olhos angustiados
Do menino mutilado
Da janela da morte
A janela que informa
Com a falta de escrúpulos
Com a falta de respeito
Com o cerceamento ao direito
A vida através das janelas
A morte através das telas
A distância entre as janelas
61
O MENINO (ao amigo João Gustavo)
Vejo um menino crescido
Em uma busca incansável
Que nem mesmo ele
Tinha a verdadeira noção do que poderia ser
Buscava sem limites
Em cada momento
Em cada sentimento
Satisfazer-se
Aplacar a ânsia
Alimentar a carne
Imaginando assim...
Preencher o seu vazio
Que ele mesmo não entendia
Algo que o perseguia sempre
Que o impulsionava
Fazia com que corresse
Fazia com que brindasse
Fazia com que ousasse
Tudo isso ao extremo
A imagem que resta em nossa mente
É de sua alegria espontânea
De seu sorriso solto
De sua sinceridade
De nos fazer admirar um amigo
Que amava a vida
E que amava a todos a sua maneira
62
NUNCA! NÃO, NÃO VOU DESISTIR...
Penso que é sempre possível
Mesmo que eu fique aqui
Esperando a vida inteira
Você vai aparecer
Vai ao menos passar
Mesmo que vire o rosto
Vou me satisfazer
Só preciso ver você
Sinto uma tristeza profunda
Sua ausência me deprimi
Não consigo pensar
Vejo você em todo lugar
Em cada rosto
Em todo gosto
Em tudo
Em todos
Em mim
Vejo...
Sinto...
Ouço...
63
DIA A DIA
Numa mão ou noutra
Na contra mão
Passagens loucas
Aceleração
Máquina de matar
Máquina de morrer
Máquina de correr
Ferramenta para voar
Para parar
De dentro um mundo diferente
Às vezes mudo
Vivo dentro mais que fora
Ir embora
Do amanhecer ao anoitecer
Às vezes sem querer
Celulares
Conversas confusas
Bonés e chinelos
Saias e blusas
Sem blusas
Barulho e fumaça
Segurança e ameaça
Uma cortada, uma batida
Um homicídio, uma vida
Cachorro, gato e gente
Indigente
Caminhos e casas
Batendo as asas
Circulo e quadrado
Oficinas e mercados
Consultórios e padarias
Vejo tudo todo dia
64
LEMBRANÇAS
Cavernas escuras
Caminhos tortos
Vida insegura
Pensamentos mortos
Busca incansável
Esperança teimosa
Fuga incontrolável
Chegada dolorosa
Impacto forte
Arrependimento tardio
Desculpas sem valia
Falta de sorte
Nu no frio
Sem garantia
65
DOCE PECADO
Vida engraçada
Livro dos dias
Amizade
Olhares
Sedução no olhar
Inversão de sentimentos
Encontros inocentes
Quase inocentes
Proteção
Palavras
Palavras outras
Desejo
Desejo incontrolável
Brincadeira
Seriedade
Confissões
Alivio
Cumplicidade
Quere tocar
Tocar
Tocar profundo
Frustração
Afastamento
Dor
Reencontro
Cura
Recaída
Ressurgimento
Fogo ardente
Pecado
Doce pecado
66
SEM SENTIDO
Andando pelas ruas
Sem destino ou objetivo
Vou caminhando sozinho
Perdido na imaginação
Paro um pouco e reflito
Sem lembrar por onde andei
O tempo eu nem sinto
O destino já nem sei
Viver sempre inseguro
Sem saber aonde ir
Sem caminho a seguir
No encontro de uma estrada
Vê que nela não há nada
Só o fim de uma jornada
67
ALEGRIA E MAGIA
Quero cantar, encantar
Fazer de minha voz a cura
Fazer com que ouvidos doentes
Ouçam a música mais pura
Por onde eu andar
Não haverá, nada igual
Vou levar festa às comunidades, de verdade
Vai ser especial
Vamos unir os corações, em porções
De amor maternal
Vem comigo, vem meu povo
Vem cantar uma canção
Vem sambar de novo
E sentir essa emoção
Na entrada do paraíso
Vai ser bem melhor que isso
Vai ser uma nova experiência
Uma bela cadência
Uma avalanche de alegria, energia
Vai ser encanto e harmonia
Uma explosão
E quando a musa passar
Vai deixar marmanjos de queixo no chão
Sou amor, sou guerreiro
Sou faceiro, sou da arte
Sou do palco da ilusão
Levo magia a toda parte
68
JOSÉ, DOROTÉIA, JOANA ...
Ela vem da sarjeta
Ninguém mais a respeita
Sua vida maldita, de amor tarja preta
Ela tá que é um caco
Cabelos no sovaco
Caiu do salto, beijando asfalto
Ela quer ser mulher
Mas nasceu José, de Arimatéia
De guerra, Dorotéia
Camila, Maria, Joana, Suzana
Cada dia uma mulher
Cada noite numa cama
Mas ela não encuca
Pode ser qualquer nome
Ela não quer ser homem
Tá nem aí essa maluca
Ela põe sua melhor calcinha
Com uma saia de menininha
Para o vento bater
E mostrar sua bunda siliconada
E a calcinha cavada
Com pernas torneadas, safada
Trabalhada na maquiagem
Tá no ponto até tarde
Xilocaína, senão arde, invade
É uma picardia, vadia
Vê estrela até de dia
69
No céu da boca é a melhor
Requebra tanto e não quebra
No pega pega não tem prega
Mas nunca leva a pior
Andando em seu corpo emprestado
Modificado pelas cirurgias
Uma criatura leoa leopardo
Feroz e voraz nas orgias
Ela é a dama, é a rainha
É a forma inversa da santa
Sua saia parece uma bainha
Na noite tão diva ela canta
Encanta com voz de veludo
Mas tem no gogó um caroço
Não perde uma briga sequer
Nunca foi mesmo um bom “moço”
Então pode chamar como quiser
De Carla, Andréa ou “Mulhé”
Ela pisca o olho até
Para homem ou mulher que quiser
E quando a noite cai
Tal qual vampiro
Ela foge, ela corre, ela vai
Tão rápida quanto um tiro
É que na luz do dia transforma
A beleza ilusória
Em feiura natural
E nem adianta pintura
Na cara dura
Com certeza vai se dar mal
70
VEM NENEM
Tá no fogo o feijão
Tantan tá na mão
O repique também
Vem neném, sambar
Vem meu bem
Vem neném, sambar
Vem meu bem
Aqui não tem
Feijoada manca
Feijoada surda
Feijoada coto
Tem rabo, tem orelha
Tem laranja seleta
Tem pé, tem costela
Aqui não tem dieta
Aqui não tem
Feijoada manca
Feijoada surda
Feijoada coto
Vem neném, sambar
Vem meu bem
Vem neném, sambar
Vem meu bem
71
7 VELAS
Acendi,
Sete velas brancas
Pulei sete vezes
Contei até sete
Entrei com valete
Acendi,
Sete velas brancas
Estourei a banca
Sete rosas brancas
Usei alavanca
Pra crescer,
Pulei, contei, entrei
Pra crescer
Acendi, estourei, usei
Pulei no terreiro
Contei meu dinheiro
Entrei bem rasteiro
Acendi o incenso
Estourei o preço
Usei bem intenso
72
ZANGA ZEFA
Oh, Candin cadê dona Zefa?
Tá no fogão!
Oh, candin cadê dona Zefa?
Tá no fogão
Tá preparando café
Pra multidão
Enquanto sua filha dorme
Ela tá na cozinha
Preparando o almoço
Quiabo e galinha
Preparando o almoço
Quiabo e galinha
Oh, Candin cadê dona Zefa?
Tá no fogão!
Oh, Candin cadê dona Zefa?
Tá no fogão!
Enquanto o marido no bar
Toma cerveja
Enquanto o marido no bar
Toma cerveja
Ela já fez o jantar
E pôs à mesa
Ela já fez o jantar
E pôs à mesa
73
Um dia Zefa se zanga
E joga tudo pro alto
Um dia Zefa aborrece
E pega o asfalto
Enquanto sua filha engravida
Dona Zefa não dorme
Para virar empregada
Só falta uniforme
Para vira empregada
Só falta uniforme
Um dia Zefa se zanga
E joga tudo pro alto
Um dia Zefa aborrece
E pega o asfalto
Oh, Candin cadê dona Zefa?
74
BOTECO
Quero uma cachaça com um camarada divertido
Quero uma cachaça com a menina de vestido
Quero uma cachaça com o cara de boné
Quero uma cachaça com qualquer um que vier
Só quero companhia, não quero beber sozinho
Pode ser um amigo, ou até mesmo um vizinho
Vamos tomar cachaça no bar ali da praça
Vamos ficar bêbado e de tudo achar graça
Quero tomar cachaça no natal ou carnaval
Vou beber umas garrafas até ficar sem ar
Se eu ficar muito doido vou beber um pouco mais
Quero tomar cachaça e não quero passar mal
Vou beber umas garrafas e não vou me exaltar
Não me chamem pra briga que eu só quero paz
75
AH, VOU PARA O BAR!
Ah, vou para o bar!
Vou beber sem remorsos
Vou cantarolar
Comer azeitonas e tremoços
Vou me embebedar
Ah, vou para o bar!
Encontrar o desconhecido
Achar a feia bonita
Rir com os amigos
Dar mijadas infinitas
Ah, vou para o bar!
Vou falar de futebol
Esculachar os políticos
Ficar sentado ao Sol
Falar alto, aos gritos
Ah, vou para bar!
Dona encrenca vai procurar
Mas não estarei aqui
Ela não vai me encontrar
E eu vou morrer de rir
Ah, vou pro outro bar!
Que a cerveja acabou
E fui para outro lugar
Ela não vai me encontrar
Porque eu mudei de bar
Ah, vou parar o bar...
76
77
CORDEL
SEVERINA DO ALAMBIQUE
CONTRA O BICHO DA ROÇA
78
79
- 1 –
Pode não ser muito alegre
O que eu vou lhes contar
Uma história como tantas
Você pode se encontrar
Vou falar da minha vida
Foi sofrida pra danar
Nasci dentro da garrafa
Meus pais eram pinguços
Aprenderam fazendo e
Bebendo aos soluços
A cachaça que bebiam
Mais forte que dos russos
No sertão que assolava
Com a seca a castigar
Não tínhamos o comer
A água sempre a faltar
A vida que maltratava
Pisava pra massacrar
A família era grande
Quinze irmãos pra alimentar
Eram todos pele e osso
Eram feios pra danar
Viviam de pés descalços
E a barriga a inchar
80
- 2 -
Alguns foram vendidos
Como se fossem gado
Iam para as fazendas
Dos “home” do roçado
Trabalhavam feito escravos
Também eram abolinado
Aguentei muita coisa
Era muito sofrimento
Eu enfrentei a chuva
Enfrentei forte vento
Minha vida era assim
Uma vida de tormento
Meu pai morreu primeiro
A minha mãe noutro ano
Aí eu fiquei sozinha
Em total abandono
Estava com muito medo
Arranjaram-me um dono
Fui pra casa do patrão
Casa Grande da roça
Jogaram-me no chiqueiro
Pra dormir com as porcas
E me davam lavagem
O meu banho era na fossa
81
- 3 –
Trabalhava como escrava
Cortava cana no mato
Desgraçada de vida
Choro só com relato
Mas sofria enormemente
Num buraco igual rato
Fui crescendo desse jeito
Apanhava todo dia
Meu corpo não aguentava
Toda aquela agonia
Não dormia com medo
De morrer antes do dia
Mas a coisa piorou
Quando eu me tornei moça
Acordei pela manhã
De sangue tinha uma poça
Quando o patrão viu aquilo
Me olhou tal uma onça
Toda noite ele vinha
Tirava-me do chiqueiro
Fazia eu tomar banho
Era pra tirar o cheiro
De porco do meu corpo
Era muito desespero
82
- 4 –
Usou-me por muito tempo
Até que eu engravidei
Ele tirou meu bebê
Para onde foi eu nem sei
Eu chorei a minha perda
Mas de novo engravidei
Mais um filho eu perdi
Ele me tirou de novo
Parecia uma galinha
Botava filho feito ovo
Toda noite me forçava
Sentia-me um estorvo
Um dia então eu cansei
E tentei não mais ceder
Fiz força, lutei e reagi
Eu já nem queria saber
Mas ele era muito forte
Ele fez-me arrepender
Noutra noite ele veio
Com os “zói chei di sangue”
Ele cheirava à cachaça
Estava sujo de mangue
Empurrei-o no chiqueiro
Não teria outra chance
83
- 5 –
Fugi daquele inferno
Foi pra grande cidade
Queria esquecer tudo
Mas o meu corpo inda arde
Minha carne inda treme
E o medo que me invade
Eu dormia pela rua
Comia coisas do lixo
Viva suja e fedida
Rasteja feito bicho
E por onde eu passava
Causava muito buchicho
Por fim minha saída
Deu futuro muito cruel
Eu vendia o meu corpo
Me limpava com papel
Estava pronta para
Outra vez ir pro motel
Era pouco o dinheiro
Só para alimentação
E logo apareceu
Desgraçado cafetão
Se não desse o dinheiro
Ele me descia a mão
84
- 6 –
Um dia” tava” na praça
Com o bucho bem vazio
Passou uma senhora
Foi quem logo me acudiu
Estava com muito frio
Com casaco me cobriu
Disse que me avistou
E sentiu um arrepio
Viu que era nordestina
Não era daqui do Rio
Ela também era de lá
Veio pra morar com o tio
Ofereceu um emprego
Ia ser sua empregada
Eu teria onde dormir
E não ia ter “paga”
Comida e cama quente
Pra passar a madrugada
Aceitei e fui com ela
Era um lugar bonito
Tinha árvores na rua
E um pomar infinito
Deram roupas bem limpas
Vou mudar eu acredito
85
- 7 –
A vida foi melhorando
Eu estava bem contente
Tinha uma vida digna
Já não era indigente
Com respeito era tratada
Olhavam-me como gente
Comprando coisas novas
O meu quarto enfeitei
Comprava minhas roupas
Eu até me maquiei
Mudei o meu cabelo
No espelho me amei
Já não lembrava mais
Dos tempos de desgraça
Quando dormia na rua
Vendia o corpo na praça
Do mostro do cafetão
O medo já não me abraça
E as surpresas da vida
A cada dia aumentava
Libertou os meus medos
Eu já me sentia amada
Conheci o Severino
Eu estava apaixonada
86
- 8 –
Severino era porteiro
Do prédio logo em frente
Parecia ser bom homem
E bom homem nunca mente
E todo mundo me dizia
Que ele era boa gente
Namoramos por meses
Até que eu embuchei
Contei pra minha patroa
Ela não gostou, eu achei
Mas o que podia fazer
Minha perna não fechei
Só que nós não nos cuidamos
Nós nem pensamos nisso
Só pensamos em trepar
Juro, eu não queria isso
O Severino era pobre
E morava num cortiço
Para tristeza minha
O pior aconteceu
Minha patroa decidiu
E rua me ofereceu
Fiquei desempregada
E Severino morreu
87
- 9 –
Mais uma vez na vida
Eu estava sozinha
Não tinha pra onde ir
E poucas economias
Aluguei um quartinho
Que só uma cama tinha
Em um fogão de lenha
Fazia bolo de chuva
Comia farinha pura
Em uma panela suja
A barriga a crescer
Da fome a vista turva
Numa noite muito fria
Seis meses de gravidez
Eu passava muito mal
Vomitava quando e vez
A dor era insuportável
Me causava palidez
Acordei no hospital
Deitada em uma maca
Meu filho nasceu morto
Cortaram com uma faca
Minha barriga no cortiço
Como fosse uma vaca
88
- 10 –
Ainda sentindo dores
Para rua então voltei
Novamente era uma puta
Não via mais outra saída
Eu tinha que ir a luta
Decidi que venderia
Meu corpo por todo dia
E tudo que ganhasse
Então eu guardaria
E a qualquer momento
Minha vida mudaria
Suportei horrores
Deitei-me dia e noite
Levei tapas e dentadas
Gozadas e açoites
Homens desgraçados
Até debaixo de pontes
Mas um dia eu parei
Consegui mudar o rumo
Parei de prostituir
Botei a vida no plumo
Com tudo que eu ganhei
Abri loja de consumo
89
- 11 –
Nós vendíamos comida
Gente vinha pelo faro
Tinha de tudo um pouco
Dos “barato” e dos “caro”
Tinha boa freguesia
Fazia fila de carro
Alimentos da terrinha
Bolo de fubá e goma
Queijo qualho e curado
De enfeite uma sanfona
Farinha de mandioca
E eu que era a dona
Eu ficava no balcão
Atendendo os clientes
Vinham de toda parte
Tinha até os frequentes
Me compravam todo dia
E saiam bem contentes
Mas num dia bem difícil
Ele “vei” comprar comigo
Pensava estar morto
O meu maior inimigo
Era o dono da roça
Senti doer o umbigo
90
- 12 -
Disse que me encontrou
Fazendeiro amigo seu
Que comprou na lojinha
E que me reconheceu
Havia deitado comigo
Meu endereço lhe deu
Tinha perdido tudo
E sua mulher faleceu
Não tinha onde ficar
Que era dever meu
Aceitar viver com ele
Enfim, ele me acolheu
Eu Tinha que se grata
Por ter me alimentado
Que vivendo a seu lado
Ele também seria grato
Ajudaria nos negócios
Seria homem honrado
Não podia acreditar
No que estava ouvindo
Minha cabeça girava
Dava nojo do cretino
Tomei minha atitude
Pra cima fui partindo
91
- 13 -
Amigo ouça o que falo
Tenha-me muito respeito
Pois eu digo e repito
Sou mulher Bato no peito
Você está encrencado
Mequetrefe de sujeito
Aqui não têm moleza
Eu não corro de briga
Vou pra cima vou na mão
Enfrento home e rapariga
Sou do chão, sou da terra
Da mata e da restinga
Enfrentei seca da peste
“Home” já sofri pra burro
Já senti fome do cão
Na barriga feito murro
Passei na vida um inferno
Para o inferno te empurro
Não se engane comigo
Sou uma mulher forte
Não apanho mais na cara
Sou rapariga do Norte
Se tentar me tocar aqui
Tu vai encontrar a morte
92
- 14 –
De agora pra frente
Nenhum cabra safado
Bate-me feito covarde
Como tu no passado
Tirou de mim a moça
Atacou-me feito tarado
Com marcas no corpo
Continuei a vida
Conto cada cicatriz
Como fosse ferida
Por tudo que passei
Ando de cabeça erguida
Repito o que disse
Você não vai conseguir
Entrar na minha vida
Nem meu corpo sentir
Pegue suas trouxas
Trate logo de partir
Agora entenda se cabra
Se tentar mais uma vez
Chegar perto de mim
Repetir o que você fez
Era melhor não nascer
Vou cortar você em três
93
- 15 –
O tempo foi passando
Depois de tanto sofrer
Fui ficando mais valente
A fome fez embrutecer
E no Sol de todo dia
Meu corpo fortalecer
Não dei sorte no amor
Nem mesmo mãe eu pude ser
Então aviso meu senhor
Que é pra “mode intender”
Sou Paraíba masculina
Mais forte que “vós me cê”
Sem aceitar a derrota
Veio pra cima de mim
Ele subiu no meu balcão
Puxou-me no “colarim”
E com o rosto no meu
Ele me falou “baixim”
Escuta sua rapariga
Meretriz dos infernos
Eu sei do seu passado
De todos os homens de terno
Pobres e desdentados
Chefes e subalternos
94
- 16 –
Apertou meu pescoço
Até quase me matar
Estava quase caindo
Não podia respirar
Puxei da gaveta a faca
Sua barriga atravessar
Senti o sangue quente
Escorrer por minha mão
As tripas de seu bucho
Iam caindo no chão
Enfiei mais duas vezes
Arriscar de novo, não
No momento foi passando
Tudo por minha cabeça
O corpo estrebuchando
Agora eu ia ser presa
Novamente vou fugir
Foi legitima defesa
Eu desisti de correr
E esperei a polícia
Quem paga minha dor?
Tô na areia movediça
Eu matei um estorvo
Que se faça justiça
95
96
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