Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico - CNPq
Secretaria de Desenvolvimento Territorial - SDT
Universidade Federal do Amazonas - UFAM
RELATÓRIO ANALÍTICO
TERRITÓRIO RURAL BAIXO AMAZONAS - AMAZONAS
Manaus, setembro de 2011
EQUIPE:
Coordenação
Antônio Carlos Witkoski
Vice-coordenação
Therezinha de Jesus Pinto Fraxe
Técnica da Célula de Acompanhamento e Informação
Samia Feitosa Miguez
Bolsistas
Amanda Nina Ramos
Maria Beatriz de Albuquerque D’Antona
Colaboradores
Allison dos Santos Andrade
Álvaro Jardel Conceição Santos de Oliveira
Christiane Albuquerque Feitoza
Claudioney da Silva Guimarães
Davyd Spencer Ribeiro de Souza
Francisca Bispo de Sousa
Francisco Douglas Machado
Guilherme Henriques Soarez
Heloíza Jussara Vasconcelos de Aguiar
Luciano Felipe Rodrigues Braga
Marinete da Silva Vasques
Rila da Costa Arruda
Rony Willams Frutuoso de Souza
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SUMÁRIO
1 Introdução ............................................................................................................ 042 Estratégia Metodológica....................................................................................... 093 Resultados.............................................................................................................. 15
3.1 Contextualização................................................................................................... 15Dimensão Geográfica............................................................................................. 15Dimensão Histórica................................................................................................ 16Dimensão Demográfica.......................................................................................... 22Dimensão Econômica ............................................................................................ 23Dimensão Infraestrutural........................................................................................ 33Dimensão Cultural.................................................................................................. 39Dimensão Político-Institucional............................................................................. 44
3.2 Identidade Territorial.......................................................................................... 463.3 Capacidades Institucionais.................................................................................. 563.4 Gestão do Colegiado............................................................................................. 703.5 Avaliação dos Projetos ........................................................................................ 923.6 Índice de Condições de Vida................................................................................ 1013.7 Análise Integradora de Indicadores e Contextos............................................... 1283.8 Propostas e Ações para o Território................................................................... 134
Anexo: validação de instrumentos e procedimentos ........................................ 138Referências Bibliográficas................................................................................... 140
1 Introdução
Um número significativo de estudos e análises está sendo realizado em torno da
temática do território e do desenvolvimento rural brasileiro. A abordagem territorial passa a
assumir grande importância nas estratégias de desenvolvimento das regiões rurais do país,
haja vista as dificuldades de compreensão das complexas configurações sociais e políticas que
estão sendo postas a partir da implementação de políticas de desenvolvimento territorial,
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pautadas no fortalecimento das práticas de cidadania. Estas iniciativas políticas pressupõem a
necessidade de se desenvolver novas óticas de análise com relação aos alcances das políticas
públicas e das configurações das relações sociais existentes entre os diferentes atores
envolvidos na gestão territorial.
O projeto de desenvolvimento e integração territorial brasileiro não é novo. Muitas
foram às tentativas de impulsionar este desenvolvimento econômico na região amazônica, por
meio da integração e articulação territorial. O investimento neste projeto era justificado pela
necessidade de ocupação dos espaços vazios e fortalecimento da segurança nas fronteiras
nacionais. Mas a transferência de centenas de pessoas para a ocupação territorial da região
trouxe uma série de problemas sociais e econômicos, tendo em vista a pouca estrutura
disponibilizada na zona rural da região.
Estas políticas de desenvolvimento acabaram acirrando as disparidades e as exclusões
dos grupos sociais rurais locais. Embora as tentativas de conter ou minimizar os problemas
sociais estivessem presentes em diferentes estratégias governamentais, contraditoriamente, a
pobreza, a marginalidade e a exclusão tornaram-se cada vez mais presentes na perspectiva do
desenvolvimento adotado ao campo e às cidades brasileiras. A iniciativa de impedir o avanço
da pobreza e da marginalidade tomou corpo em políticas de alcance social, focadas no
fortalecimento da cidadania e da democracia. Trata-se de uma política de territorialização da
cidadania fundamentada na multiplicação de práticas que garantam o exercício da cidadania e
da legitimidade democrática. Os Territórios da Cidadania representariam uma alternativa no
sentido de minimizar e corrigir o déficit de desenvolvimento rural deixados no Brasil por
governos anteriores.
Atualmente, o Governo Federal lançou mão de uma política social nacional baseada
no desenvolvimento sustentável1 dos territórios rurais, aliando as políticas nacionais às
iniciativas locais. Para consolidar esta proposta criou a Secretaria de Desenvolvimento
Territorial - SDT no âmbito do Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA para
implementar os programas sociais apresentados no Plano Plurianual do Brasil, 2004-2007.
Lançado em 2008, o Programa Território da Cidadania nasceu com o objetivo de promover o
1 Lembramo-nos aqui das cinco dimensões do desenvolvimento propostas por Sachs (1993, p. 25-26): sustentabilidade social: construir uma sociedade (civilização) do ser, em que exista maior eqüidade na distribuição do ter; 2 sustentabilidade econômica: assegurar a geração de renda e sua distribuição eqüitativa (benefícios financeiros a nível macrossocial); 3 sustentabilidade ecológica: respeitar os limites de capacidade de carga dos ecossistemas e agrossistemas; promover a conservação da biodiversidade; sustentabilidade espacial: voltada para um equilíbrio urbano-rural, com melhor distribuição dos assentamentos humanos, suas atividades econômicas e das áreas de conservação e de proteção; sustentabilidade cultural: voltada para a manutenção dos valores culturas diferenciados das comunidades humanas.
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desenvolvimento econômico a partir de princípios básicos de cidadania, a fim de criar uma
estratégia de desenvolvimento pautada na governança.
Dentre as diferentes ambições da política, estão a territorialização2 das ações através
dos projetos consorciados por diferentes municípios, a participação dos diferentes atores nas
decisões através dos colegiados e, por fim, a desconcentração do poder do Estado, a partir da
noção de governança e da gestão social. Ao mesmo tempo, espera-se que aconteçam
mudanças nas ações administrativas (Estado), na gestão social (sociedade civil) e nas
vertentes políticas destes fenômenos, sobretudo a territorialização que pretende alterar o
equilíbrio de poder das regiões alvo das ações.
A estratégia de desenvolvimento territorial brasileira tem buscado lançar novas
dinâmicas que estimulem a formulação descentralizada de projetos e políticas públicas.
Elaborada no início do Governo Lula (2003-2006 e 2007-2010), esta proposta de trabalho
passou a ser a principal meta da então criada Secretaria de Desenvolvimento Territorial-SDT.
Concebida em um período de transição, buscou dar consistência a um acúmulo de
conhecimentos, experiências e proposições. Tornou-se base para a formação do Programa de
Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais, incluído no Plano-Plurianual 2004-2007.
Um dos eixos principais da proposta é apontar uma nova forma de conceber políticas
públicas voltadas para o desenvolvimento rural sustentável. Um aspecto transversal nessa
discussão é a noção de território e suas múltiplas dimensões, envolvendo governos estaduais,
governos municipais e movimentos sociais. O grande desafio está em estimular um
desenvolvimento que enfatize as complementaridades, interdependências, coincidências e
agendas comuns. Para isso, é preciso, em primeiro lugar banir a pobreza e estimular a
inclusão social e política. Um dos aspectos fundamentais para a consolidação desse processo é
garantir o acesso a terra, aos serviços públicos básicos e fortalecer a agricultura familiar.
Contudo, o desenvolvimento rural não ocorrerá de forma automática e espontânea, é
fruto da dinâmica de forças políticas, econômicas, sociais e culturais que atuam no território.
O que justifica a importância da utilização de estratégias governamentais que incluam formas
de controle social e de participação de agentes sociais na definição de atividades produtivas,
com metodologias participativas de gestão social, tendo como enfoque principal o local do
produtor/empreendedor. O território precisa ser visto não apenas como uma estrutura física,
2 Entendida como “o conjunto das múltiplas formas de construção/apropriação (concreta e/ou simbólica) do espaço social, em sua interação com elementos como o poder (político/disciplinar), os interesses econômicos, as necessidades ecológicas e o desejo / a subjetividade” (HAESBAERT, 2002, p. 45).
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mas como uma unidade político-administrativa que envolve aspectos como a gestão social e
descentralização de políticas territoriais sustentáveis.
O Programa de Desenvolvimento Sustentável dos Territórios Rurais – PDSTR vai ao
encontro dessas demandas, buscando acentuar as potencialidades naturais comuns, as
interações sociais e culturais e esforços em torno de interesses partilhados. O fato é que para
implementar o que Casarotto Filho chama de “Pacto Territorial” (o encontro de atores,
instituições, administrações e políticas) são necessários alguns requisitos, como a mobilização
em torno de uma ideia guia, envolvimento de todos os atores na fase de elaboração de
projetos. Projetos de desenvolvimento voltados para as atividades produtivas do território,
realização de projetos em tempos definidos, criação de ente gerenciador que expresse acordo
e união entre os atores envolvidos (CASAROTTO FILHO, 1998, p. 98).
A implementação de um processo de territorialização envolve a criação de esferas
públicas de discussão e deliberação. A criação de fóruns que possam reunir os diferentes
atores sociais e contextos políticos e culturais. Em outras palavras, este cenário deve refletir a
recuperação das noções de Estado e Sociedade Civil, valorizando, sobretudo, a participação
cidadã. O capital social assume grande importância na estruturação de uma sociedade
democrática como fator de empoderamento.
Passados seis anos de implementação do Programa de Desenvolvimento Sustentável
dos Territórios Rurais – PDSTR, a Secretaria de Desenvolvimento territorial lança a proposta
de incluir instituições acadêmicas e de pesquisa em uma nova etapa de desenvolvimento do
Programa, o monitoramento e avaliação. Diante deste cenário, foi lançado em 2009 o Edital
MDA/SDT/CNPq - Gestão de Territórios Rurais Nº 05/2009, tendo como finalidade apoiar
atividades de pesquisa e extensão com foco para o monitoramento e avaliação,
acompanhamento da evolução e qualidade dos resultados do Programa Desenvolvimento
Sustentável de Territórios Rurais – PDSTR, mediante a seleção de propostas para apoio
financeiro.
Mediante a aprovação das propostas enviadas ao CNPq, em agosto de 2010 foi dado
início as atividades das Células de Acompanhamento e Informação. As atividades tiveram
início com a realização do I Encontro das Células de Acompanhamento e Informação,
realizado no período de 10 a 13 de agosto de 2010, na cidade de Brasília. O principal objetivo
do encontro foi fornecer informações acerca dos principais objetivos do edital gestão de
territórios rurais e apresentar os principais instrumentos de coleta de dados a serem utilizados
no processo de monitoramento e avaliação da gestão dos colegiados territoriais. Após as
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orientações iniciais de realização do projeto e consolidação do Sistema de Gestão Estratégica,
foi dado início as atividades de acompanhamento e avaliação.
O presente relatório busca trazer informações e análises acerca da pesquisa de campo
realizada junto ao território do Baixo Amazonas, coadunada com embasamento teórico-
metodológico. A pesquisa realizada pela Célula de Acompanhamento e Informação do Baixo
Amazonas teve início em outubro de 2010, tomando como referência o Cronograma de
Atividades apresentado pela Secretaria de Desenvolvimento Territorial que previa: articulação
com o colegiado (apresentação da equipe, formação do comitê e elaboração do regimento),
indicadores de desenvolvimento (Capacidades Institucionais, Identidade Territorial e Índice
de Condições de Vida), gestão do colegiado, gestão de projetos e gestão do projeto de
pesquisa e extensão.
Ao longo do relatório será possível visualizar os resultados obtidos com a pesquisa de
campo e análise dos dados obtidos a partir de Indicadores Sociais. A análise tem início com a
contextualização do território do Baixo Amazonas, destacando suas dimensões geográficas,
históricas, demográficas, econômicas, infraestruturais, culturais e político-institucionais. As
informações são fundamentais para que possamos obter uma caracterização socioeconômica
do território.
Após a contextualização territorial daremos início às análises obtidas com as coletas
de informações acerca de cada um dos indicadores sociais referentes no cronograma de
atividade. Primeiramente, buscamos discutir sobre o processo de formação das identidades
territoriais, destacando os aspectos considerados definidores da identidade territorial no Baixo
Amazonas. Em seguida, discutiremos como está caracterizada a capacidade institucional do
território, tomando como referência a percepção dos gestores públicos municipais.
Outro indicador importante trabalhado na pesquisa foi o Acompanhamento da Gestão
do Colegiado, uma vez que busca revelar os pontos fortes e deficiências da gestão social do
Colegiado Territorial. Em seguida, faremos uma exposição da situação presente em cada um
dos projetos que estão na condição de concluídos em suas obras, destacando as principais
dificuldades e alternativas percebidas nas entrevistas e pesquisa de campo. O último Indicador
Social – Índice de Condições de Vida apresenta análises da situação observada nas áreas
rurais dos municípios que compõem o território do Baixo Amazonas. Foram realizadas 288
entrevistas com famílias de agricultores de diferentes áreas municipais, ressaltando as
condições de vida a partir da percepção desses agricultores.
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Por fim, será apresentada uma análise integradora destes indicadores e seus contextos
de análise, buscamos relacionar as discussões em torno dos indicadores e os resultados
obtidos na pesquisa, a fim de problematizar e apontar algumas considerações sobre a gestão
social dos territórios rurais. Associada a análise integradora estão relacionadas às propostas e
ações para o território, elaboradas em conjunto com o Colegiado Territorial do Baixo
Amazonas.
2 Estratégia Metodológica
O trabalho de pesquisa na Amazônia apresenta especificidades e singularidades que
nos levam a perceber que para compreender o modo de vida dos grupos sociais que vivem na
Amazônia não basta apenas descrever seus vastos territórios e recursos naturais, é preciso
transpor a paisagem harmônica e romântica das primeiras impressões, e perceber que há um
cenário marcado por contrastes e contradições. Para quem busca adentrar no universo social,
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cultural e político dos povoados amazônicos logo abandona aquela impressão monótona e
repousante. Tal como afirma Marilene Corrêa (2000), é como se o quadro de moldura
passasse a ter outra dimensão, uma dimensão real e não tão perfeita assim.
Para dar conta da diversidade de cenários e contextos, a abordagem do tema e objeto
desta pesquisa dar-se-á de maneira compreensiva a partir da associação de uma abordagem
metodológica qualitativa e quantitativa. Trata-se de realizar um estudo empírico dos sujeitos
sociais e suas organizações representativas, a fim de compreender situações localizadas e suas
problemáticas. A dimensão territorial do desenvolvimento pressupõe a formação de “redes e
convenções” de relações entre instituições que permitem ações cooperativas entre si, o que
inclui a conquista de serviços públicos. Esta perspectiva chama a atenção por lançar novas
relações no meio rural e o esforço em garantir o exercício da cidadania.
A pesquisa de campo realizada no território do Baixo Amazonas tem em vista
estabelecer uma relação intersubjetiva entre o pesquisador e o pesquisado, trata-se de
estabelecer uma relação dialógica, onde ambas as partes possam ter uma função específica na
construção do texto etnográfico. Para Clifford Geertz (1978), a etnografia deve consistir num
esforço de ler as sociedades estudadas como textos, onde a interpretação se faz a todo o
momento, de todos os aspectos e à procura dos significados das instituições culturais.
Através do trabalho etnográfico é possível realizar um levantamento geral e
descritivo do espaço territorial que compreende a comunidade, tendo em vista entender como
funciona a estrutura organizacional da comunidade, identificando as características e
especificidades das instituições sociais existentes. O objetivo final consiste na elaboração de
um texto etnográfico, no sentido utilizado por Geertz (1978), um texto obtido com base nas
condutas sociais, o maior desafio esteve em interpretá-las, numa tentativa de resgatar o “dito”
e tentar “fixá-lo em formas pesquisáveis” (GEERTZ, 1978).
Durante esta etapa da pesquisa os procedimentos metodológicos devem ser pautados
na prática da observação participante, na medida que permite a participação na vida diária
das pessoas e o registro de dados importantes, por meio de instrumentos como o caderno de
campo e as fotografias. Segundo Teresa Haguette (2000:72), a observação-participante não se
concretiza apenas com participação do pesquisador nas atividades, mas com o envolvimento
nas atividades cotidianas, entremeado por subjetividades. Neste momento, o pesquisador não
deixa de ter um envolvimento direto com o objeto de estudo escolhido, pois são definidos
com base na significação cultural que possui para cada um, e passa a ser significativo para os
outros a partir do momento em que o pesquisador destaca a sua importância (WEBER, 2000).
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A observação-participante será um instrumento fundamental para a coleta de
informações referentes ao segundo objetivo desta pesquisa, que constitui na identificação dos
principais campos de conflitos na área territorial da comunidade. Os procedimentos
metodológicos adotados neste momento fazem referência ao que Little (2001) chama de
“equação do poder”, ou seja, é preciso entender como tem se dado às oscilações e divisões
deste poder na comunidade, identificando as assimetrias e antagonismos entre os interesses
dos grupos envolvidos. Trata-se de identificar quais as estratégias utilizadas pelos grupos para
garantir o poder na comunidade, as ideologias, símbolos e políticas utilizadas para manter este
poder dentro de uma mesma família.
Para a realização das entrevistas e depoimentos, buscamos aplicar as considerações
de Roberto Cardoso de Oliveira, a respeito da interação pesquisador/informante, que
pressupõe uma relação dialógica, onde o pesquisador precisa criar condições de um
verdadeiro diálogo, reconhecendo seu informante como um interlocutor, capaz de manter uma
relação de iguais, nesse caso, ambos são considerados interlocutores, a ponto de que esta
interação propicie o que o autor convencionou chamar de encontro etnográfico (OLIVEIRA,
2000: 24).
A pesquisa de campo realizada no território do Baixo Amazonas foi dividida em três
momentos. O primeiro momento caracterizou-se pela aplicação de três formulários:
capacidades institucionais, identidade territorial e acompanhamento da gestão do colegiado. A
1ª Excursão ocorreu no período de 20 a 28 de outubro de 2010, para os municípios de
Parintins, Barreirinha, Boa Vista do Ramos e Maués. Durante a 2ª Excursão foram visitados
os municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará, no período de 22 a 26 de novembro de
2010 e a 3ª Excursão ocorreu no período de 13 a 17 de dezembro de 2010, para os municípios
de Parintins e Nhamundá. Tendo em vista as dificuldades de deslocamento da equipe para os
referidos municípios, foram utilizadas dinâmicas específicas no processo de aplicação dos
questionários.
Nesse caso, as informações foram coletadas em blocos de questionários – Identidade
Territorial, Capacidades Institucionais e Gestão do Colegiado –, para cada entidade municipal
visitada foram aplicados, continuamente, dois questionários – Q2/Identidade Territorial e
Q3/Gestão do Colegiado. Esta estratégia facilitou a obtenção dos dados e possibilitou maior
conhecimento da realidade de cada uma das entidades e municípios, sendo finalizada com a
aplicação do Q1/Capacidades Institucionais com gestores públicos municipais. O trabalho de
campo junto às entidades colegiadas não se restringiu a coleta de dados quantitativos, por
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meio dos questionários indicados, mas permitiu maior conhecimento da realidade e a
utilização de instrumentos de coleta de dados qualitativos, como as entrevistas.
Antes das excursões foi realizada a I Semana Trabalho de Campo e Pesquisa na
Amazônia, no período de 04 a 08 de outubro de 2010, na Universidade Federal do
Amazonas/Manaus, que contou com a participação dos professores colaboradores do projeto
no sentido de fornecer subsídios para a realização da pesquisa de campo, destacando as
dificuldades e imponderáveis presentes nas pesquisas de campo na Amazônia. A semana foi
estruturada do seguinte modo: Oficinas: Abordagem teórico-metodológica: pesquisa
qualitativa/Professora Therezinha Fraxe. Abordagem teórico-metodológica: pesquisa
quantitativa/Professor Henrique dos Santos Pereira. Noções básicas para a aplicação de
formulários/Professora Kátia Cavalcante Viana.
Esta atividade foi fundamental para a preparação e treinamento metodológicos dos
pesquisadores que participaram da pesquisa de campo. O principal objetivo desta atividade
constitui na preparação dos pesquisadores envolvidos no projeto para a realização do trabalho
de campo. Em outras palavras, trata-se de um importante momento de discussão da
abordagem teórico-metodológica a ser adotada na pesquisa, tendo em vista maior
aproveitamento dos dados quantitativos e utilização de instrumentos qualitativos como
entrevistas, diários de campo, histórias orais e observação participante.
Ao fim de cada excursão de trabalho de campo realizada pela equipe de pesquisadores
da Universidade Federal do Amazonas, era realizada a inserção dos dados no Sistema de
Gestão Estratégica – SGE. Antes destas informações serem inseridas, eram validadas pela
técnica responsável pela Célula. Concluído o trabalho de coleta de dados e inserção dos
mesmos no sistema e análise dos resultados, a partir dos indicadores sociais criados pelo SGE
e pelo Banco de Dados elaborado pela Célula.
O segundo momento da pesquisa caracterizou-se pela realização da pesquisa de campo
para coleta de dados do Índice de Condições de Vida – ICV. A excursão do ICV Baixo
Amazonas ocorreu no período de 12 a 25 de abril de 2011, para os municípios de Boa Vista
do Ramos, Barreirinha, Maués, Parintins e São Sebastião do Uatumã. O trabalho de coleta de
dados foi realizado com o apoio de uma equipe de 15 pessoas (figura1), distribuídas entre as
inúmeras comunidades rurais visitadas.
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Figura 1 – Saída para Excursão ICV Baixo AmazonasFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Para a realização da Excursão ICV foi realizada a II Semana Trabalho de Campo e
Pesquisa na Amazonas, no período de 04 a 08 de abril de 2011. Esta atividade foi
fundamental para a realização do treinamento da equipe para a aplicação do ICV, para a qual
foram discutidos instrumentos de coleta de dados como: diário de campo, observação-
participante, entrevista e utilização de dados quantitativos. Para a orientação deste
treinamento foi utilizado o Manual de Aplicação do ICV, disponibilizado pela Secretaria de
Desenvolvimento Territorial.
Durante a pesquisa de campo foram utilizados instrumentos complementares de coleta
de informações como entrevistas, diários de campo, mapas mentais, fotografias e etnografias
de reuniões comunitárias. As entrevistas foram realizadas junto às representações
comunitárias e moradores antigos das comunidades, visando à coleta de informações sobre as
comunidades que pudessem subsidiar a análise dos dados e elaboração do relatório. Foram
elaborados mapas mentais de todas as comunidades visitadas, contando com a colaboração de
moradores locais a respeito das suas percepções espaciais e geográficas das comunidades em
que vivem.
Por fim, o terceiro momento da pesquisa caracterizou-se pela realização de uma
Oficina de Análise e Interpretação de Indicadores Sociais, dando início à agenda de extensão
proposta para o território. A oficina teve como finalidade a análise e discussão dos
indicadores sociais do Baixo Amazonas (Identidade Territorial, Capacidades Institucionais e
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Condições de Vida), por meio de ferramentas de diagnóstico participativo. Especificamente,
buscou-se socializar os resultados obtidos na pesquisa de campo da Célula de
Acompanhamento e Informação do Baixo Amazonas (figura 2); analisar os resultados obtidos
na pesquisa de campo com ênfase nos indicadores de Identidade Territorial, Capacidades
Institucionais e Condições de Vida; interpretar os resultados obtidos no trabalho de campo a
partir de metodologias de diagnóstico participativo (UFAM/DFDA/Colegiado Territorial).
Figura 2 – Saída para Excursão ICV Baixo AmazonasFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Os indicadores são fontes de informação para a formulação de políticas sociais,
programas e projetos nas diferentes esferas de governo e organizações. A construção e a
análise destes dados permitem o conhecimento sobre as mudanças sociais e suas diferentes
causas e monitoram as condições de vida e bem-estar dos grupos sociais envolvidos,
demonstrando os resultados obtidos por projetos de qualquer natureza. A Oficina constituiu
um instrumento capaz de auxiliar os gestores da sociedade civil e poder público a definir,
interpretar e analisar indicadores, conhecer cada uma das temáticas trabalhadas, a fim de
subsidiar o planejamento e a tomada de decisões em suas atividades.
Pautada neste cenário, a pesquisa contou com a seguinte programação: Socialização
dos resultados obtidos na pesquisa de campo: identidade territorial e capacidades
institucionais (Coordenador e técnicos das Células); elaboração de diagnóstico participativo:
identidade territorial e capacidades institucionais (grupos de trabalho); socialização dos
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resultados obtidos na pesquisa de campo: Índice de Condições de Vida (Coordenador e
técnicos das Células); elaboração de diagnóstico participativo: índice de condições de vida
(grupos de trabalho); socialização dos resultados obtidos na pesquisa de campo:
Acompanhamento da gestão do colegiado (Coordenador e técnicos das Células); laboração de
diagnóstico participativo: Acompanhamento da gestão do colegiado (grupos de trabalho);
Aplicação da metodologia de análise participativa SWOT/FOFA.
Por fim, foi elaborada juntamente com o Colegiado Territorial do Baixo Amazonas
uma agenda de extensão, dando início a uma nova etapa de trabalho da Célula de
Acompanhamento e Informação, baseada no desenvolvimento de atividade de extensão e
capacitação. Para a agenda foram indicados os temas e problemáticas de maior importância
para o CODETER, a fim de pudessem ser discutidas e solucionadas em parceria com a Célula
de Acompanhamento e Informação da Universidade Federal do Amazonas, as pospostas estão
indicadas no item 3.8 deste relatório.
3. Resultados
3. 1. Contextualização
Dimensão Geográfica
O Território Rural do Baixo Amazonas é constituído por sete municípios, são eles:
Urucará, São Sebastião do Uatumã, Parintins, Barreirinha, Nhamundá, Boa Vista do Ramos e
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Maués. O território compreende uma área de 107.029,63 Km², sendo os municípios de Maués
(39.989,87 Km²) e Urucará (27.903,37) os que concentram maior extensão territorial (figura
3). O território do Baixo Amazonas representa 6,8% da área total do Estado do Amazonas,
está localizado na parte leste do Estado do Amazonas com o Estado do Pará; ao norte com o
Estado de Roraima; ao sul com o município de Apuí; a leste com o Estado do Pará e oeste
com municípios de Presidente Figueiredo, Itapiranga, Silves, Urucurituba, Itacoatiara, Nova
Olinda do Norte e Borba.
Figura 3 – Unidade territorial do Baixo Amazonas Fonte: IBGE, 2009.
No que diz respeito ao contexto natural do território do Baixo Amazonas, o clima
predominante é o equatorial úmido e chuvoso com variações térmicas de 27ºC a 30ºC. Possui
formações geológicas conhecidas como: Aluviões Holocênicos, Cobertura Detrito-Laterítica
Paleogênica, Cobertura Detrito-Laterítica Pleistogênica, Formação Aruri, Formação Ererê,
Formação Itaituba, Formação Maecuru, Formação Monte Alegre, Formação Nova Olinda,
Formação Prosperança, Formação Seringa, Formação Sobreiro, Formação Urupi,
Granodiorito Rio Novo, Grupo Beneficente, Grupo Curuá, Grupo Gorotire, Grupo Iricoumé,
Grupo Jatuarana, Grupo Tapajós, Grupo Trobetas, Suite Intrusiva Água Branca, Suite
Intrusiva Abonari, Suite Intrusiva Mapuera, Suite Intrusiva Parauari, Suite Intrusiva
Porquinho, Suite Intrusiva Quarenta Ilhas, Suite Intrusiva Suretama e Terraços Holocênicos
(PTDRS Baixo Amazonas, 2010).
O relevo do Baixo Amazonas é constituído pelo tipo de planície Amazônica, varia de
plano a suave ondulado. O território não possui área de serras, possui apenas áreas de terra 15
firme acidentadas e área de várzea com restingas. O solo é formado por latossolo amarelo e
argissolo vermelho-amarelo, são encontradas areias quartzosa, quartzosa hidromórfica,
cambissolo, espodossolo, gleissolo, latossolo vermelho-amarelo, plintossolo, solo aluvial, solo
litólico e solo petroplíntico. A rede hidrográfica da região do Baixo Amazonas é constituída
pelos rios: Abacaxis, Andirá, Apoquitauá, Arari, Ariaú, Camarão, Cicantá, Curuça, Jacu, Jará,
Jatapu, Mamuru, Marau, Maués-Acçu, Maués-Mirim, Nhamundá, Pacoval, Paraconi,
Parauari, São Manuel ou Teles Pires, Tapajós, Uaicurapá e o Rio Uatumã (PTDRS Baixo
Amazonas, 2010).
Dimensão Histórica
Barreirinha
Barreirinha surgiu de um povoado em meados de 1830, da Missão do Andirá, criada
em 1848 pelo capuchinho Pedro de Cariana. Conta-se que a designação de “Andirá” vem da
grande quantidade de morcegos de asas pretas e cabeça branca na localidade, aos quais os
índios chamavam de “Andirá”. Essa denominação se estendeu ao rio e posteriormente ao
povoado que aí surgiu. A Missão de Andirá era subordinada à Província do Pará, que exercia
também, jurisdição sobre a comarca do Alto Amazonas. Em 1851, o jesuíta Manuel Justino de
Seixas chega no lugar e constrói uma capela de Nossa Senhora do Bom Socorro. Em 1852, a
Missão de Andirá é elevada a curato, com subordinação a Vila Bela da Imperatriz (figura 4).
Em 1853, pela Lei Provincial no. 14 foi criado o distrito no município de Parintins,
com a denominação de Nossa Senhora do Bom Socorro de Andirá. Em 1873, a sede do
distrito é transferida para o local denominado Barreirinha, no Paraná do Ramos. Em 1881,
pela Lei Provincial no. 539 é criado o município de Barreirinha, por desmembramento do
município de Parintins. Em 1938, pelo Decreto-Lei Estadual no. 68 Barreirinha recebe foros
de cidade. Em 1952, pela Lei Estadual no. 226 é criada a comarca de Barreirinha (Conselho
Nacional de Municípios).
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Figura 4 – Catedral em Barreirinha Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
Boa Vista do Ramos
Boa Vista do Ramos tem uma relação direta com a história da fundação de Maués,
pois, foi fundada em 1978 onde se fundou também a Aldeia de Lusea, sendo nos anos
posteriores da primeira metade do século XIX, cenário para conflitos sangrentos entre índios e
brancos. Anteriormente onde foi criado em 1850 a Província do Amazonas, Lusea tornou-se
um dos 14 municípios existentes na época, aonde posteriormente viria a se chamar Maués
(figura 5).
Figura 5 – Praça central em Boa Vista do Ramos Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
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Somente em 10 de dezembro de 1981 através da EC nº 12, a Vila de Boa Vista do
Ramos juntamente a áreas de Barreirinha e Urucurituba constituiu-se um novo município que
passaria a se chamar Boa Vista do Ramos, inicialmente era formado por casas de palha e era
liderado pelo Sr. Antero Roberto Pimentel, comerciante naquela região, o qual possuía um
comércio com nome Boa Vista que deu origem ao nome comunidade Vila de Boa Vista.
O desenvolvimento do povoado de Boa Vista, só teve início através do Decreto-Lei
Estadual nº 196 de 01/12/1938 o qual se elevou a categoria de Zona Distrital. Tempos depois
com a gestão do então governador Plínio Ramos Coelho, mediante Lei nº 117 de 29.12.1956,
se estabeleceu uma nova divisão territorial, administrativa e judiciária, passando o povoado de
Boa Vista a sub-distrito do município de Maués.
Porém, somente através da Lei nº 1 de 12.04.1961, criou-se o município com a
denominação de Boa Vista do Ramos, sendo este extinto na Lei nº 41, de 24.07.1964, com
base na justificativa de não ter ocorrido processo eleitoral, sendo Boa Vista do Ramos
reiterado a Maués só voltando a condição de município durante a administração do
Governador Dr. José Lindoso, por força da Emenda Constitucional nº 12, de 10.12.1981,
promulgada pela Mesa da Assembléia Legislativa do Estado do Amazonas.
Nhamundá
O rio Nhamundá foi o rio onde, em 1541, deu-se o encontro do viajante espanhol
Francisco Orellana e sua expedição com as mulheres guerreiras, denominadas de
“Amazonas”. Essas guerreiras eram conhecidas pelos nativos como “Icamiabas”, que
significa “mulheres sem marido”. Habitavam nessa região as etnias indígenas: Uabois ou
Jamundás, Cunuris, Guaicaris. Sobre a história do município, Otto Beltrão explica: As origens
da sede municipal remontam navegações do rio Nhamundá, ocorridas nas principais décadas
do século XVII. Os primeiros habitantes pertenciam as etnias Uabuís, Cunuris e Guaicaris, na
aldeia denominada Faro. Em 1758, ocorre sua elevação a vila (figura 6).
Na divisão administrativa do Brasil de 1911, aparece como integrante do município de
Parintins o distrito de Jamundá. Este distrito é posteriormente extinto, aparecendo Parintins,
no quadro da divisão administrativa do país, em 1933 com apenas um distrito. Em
01/12/1938, pelo Decreto Lei Estadual n. 176, o município de Parintins volta a dispor de um
distrito, além da sede, o de Ilha de Cotias. Em 19/12/1955, pela Lei Estadual n.96, o distrito
Ilha de Cotias é desmembrado de Parintins e passa a constituir o município autônomo de
Nhamundá. Em 31/01/1956 instala-se o novo município (BELTRÃO, s/ano, p.326-327).
18
Figura 6 – Município de Nhamundá Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
Parintins
Tal como todas as cidades brasileiras, Parintins foi habitada inicialmente por
indígenas. Durante o século XVIII, foi observada e explorada por viajantes, como José
Gonçalves da Fonseca que notou uma ilha que, por sua extensão, se sobressaía das outras
localizadas à direita do grande rio. Sua fundação ocorreu em 1796, por José Pedro Cordovil,
que veio com seus escravos e agregados para se dedicar à pesca do pirarucu e à agricultura,
chamando-a Tupinambarana (figura 7).
Em 25 de julho de 1833, Tupinambarana passa à freguesia, com o nome de Freguesia
de Nossa Senhora do Carmo de Tupinambarana. Em 24 de outubro de 1848, pela lei
provincial do Pará nº 146, foi elevada à categoria de vila, com a denominação de Vila Bela da
Imperatriz, e constituiu o município até então ligado a Maués. Em 15 de outubro de 1852,
pela lei nº 02, foi confirmada a criação do município. Em 14 de março de 1853, deu-se a
instalação do município de Parintins. Em 24 de agosto de 1858 foi criada pela lei provincial a
comarca, compreendendo os termos judiciários de Vila Bela da Imperatriz e Vila Nova da
Conceição. Em 30 de outubro de 1880, pela lei provincial nº 499, a sede do município
recebeu foros de município e passou a denominar-se Parintins. Em 1881 foi desmembrado do
município de Parintins o território que constituiu o município de Vila Nova de Barreirinha.
19
Figura 7 – Orla de Parintins Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
Em 24 de agosto de 1952, pela lei estadual nº 226, a comarca de Parintins perdeu os
termos judiciários de Barreirinha e Urucará, que foram transformados em comarcas. Em 19 de
dezembro de 1956, pela lei estadual nº 96, foi desmembrado do município de Parintins o
distrito da Ilha das Cotias, que passou a constituir o município de Nhamundá. Em 10 de
dezembro de 1981, pela emenda constitucional nº 12, o território de Parintins é acrescido do
distrito de Mocambo.
São Sebastião do Uatumã
As origens do município de São Sebastião do Uatumã se prendem à do município de
Urucará, cuja história remonta à povoação de Santana da Capela, em 1814, por Crispim Lobo
de Macedo. Em 1880 é criada a freguesia, com sede em Santana da Capela, que polariza o
desenvolvimento da região ribeirinha do Rio Amazonas. Em 1887 é criado na área de
freguesia o município de Urucará, que em 1930, é extinto com seu território sendo anexado a
Itacoatiara, para ser definitivamente restabelecido em 1935. Em fins de 1981, constavam da
estrutura administrativa de Urucará os seguintes sub-distritos: Urucará, Santa Maria,
Capucapu, Alto Uatumã e São Sebastião. Em 10 de dezembro de 1981, pela Emenda
Constitucional n. 12, São Sebastião e territórios adjacentes da margem esquerda do rio
Uatumã são desmembrados de Urucará e passam a constituir o município autônomo de São
Sebastião do Uatumã (figura 8).
20
Figura 8 – Orla de São Sebastião do Uatumã Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
Urucará
Historicamente, em 1814 foi fundada por Crispim Lobo Macedo à beira do Rio
Amazonas uma povoação chamada Santana da Capela que passou por progressos expressivos
nos anos posteriores. Em 03/05/1880 através da Lei Provincial nº462 houve a criação a
freguesia de Santana da Capela e sete anos mais tarde, mais precisamente em 12/05/1887 pela
Lei Provincial nº 744 esta freguesia elevou-se a vila, sendo então realizada a criação da sede
do município de Urucará (figura 9).
Figura 9 – Porto de Urucará Fonte: Pesquisa de campo, 2010.
21
Algum as mudanças foram realizadas em seu território através do Ato Estadual nº 45
elaborado em 28/11/1930, onde o município foi suprimido e seu território acabou sendo
anexado ao de Itacoatiara. E somente em 1935 quando o Estado foi reconstituído houve o
restabelecimento do município de Urucará.
Cronologicamente houve desdobramentos de alguns acontecimentos em 31/03/1938
pela DL nº 68 o município recebeu foros de cidade, alguns anos depois já em 24/12/1952 pela
Lei Estadual nº 226 é criada a comarca de Urucará. Em 10.12.1981, pela Emenda
Constitucional nº 12 Urucará perde parte de seu território em favor do novo município de São
Sebastião de Uatumã.
Dimensão Demográfica
O território rural do Baixo Amazonas possui uma população de 242.680 habitantes
(figura 10), o que corresponde a 7,2% da população total do Estado do Amazonas. O
município de Parintins é o que apresenta maio densidade populacional (102.033 habitantes),
apesar de ser o terceiro município com menor área territorial. Depois do município de
Parintins aparece o município de Maués com 52.236 habitantes, que ao contrário de Parintins
é o município que possui maior área territorial. Grande parte da população está localizada em
área urbana (133.155 habitantes), o que representa 57,6% e na área rural (97.692 habitantes),
o que representa 42,3% (figura 10).
Figura 10 – Densidade populacional do Baixo Amazonas Fonte: IBGE, 2009.
22
O território rural do Baixo Amazonas possui densidade demográfica de 2,2 hab/Km²,
sendo que a maior densidade é verificada no município de Parintins com índice de 17,1
hab/Km² e a menor densidade é verificada no município de Urucará com 0,6 hab/Km². Este
cenário se reflete no processo de ocupação do território, sendo que possui poucas áreas de
assentamento localizadas nos municípios de Parintins e Maués. Em Maués, há quatro áreas de
assentamento, são elas: Assentamento Aliança, Floresta Estadual de Maués, RDs Urariá e
Flona de Pau Rosa. Em Parintins, há dois Projetos de Assentamentos, o Vila Amazônica e o
Ilha do Paraná de Parintins.
Por outro lado, o território é cortado por áreas de Unidades de Conservação, são elas:
Unidade de Conservação Estadual - Reserva de Desenvolvimento Sustentável Urariá;
Unidade de Conservação Estadual - Parque Estadual Nhamundá, Área de Proteção Ambiental
Nhamundá, Floresta de Maués, Reserva de Desenvolvimento Sustentável do Uatumã;
Unidade de Conservação Federal - Floresta Nacional de Pau-Rosa, Reserva Biológica Uatumã
e Parque Nacional da Amazônia, que abrangem 2.002.455,47 hectares.
Além das áreas de Unidades de Conservação há também das áreas indígenas que
abrangem os municípios de Barreirinha, Maués, Parintins, Urucará e Nhamundá. As terras
indígenas são conhecidas como Andirá-Marau, Nhamundá-Mapuera e Trombetas-Mapuera.
Há também à margem esquerda do rio Andirá uma área de remanescentes de Quilombos, com
aproximadamente 600 pessoas, distribuídas nas comunidades São Pedro, Boa Fé e Matupiri.
Dimensão Econômica
A região amazônica, em particular o Estado do Amazonas, tem sua economia
caracterizada por ciclos de desenvolvimento. Estes ciclos possuem início, meio e fim, criam
uma situação de projetos e planos sempre inacabados e temporários, passando a impressão de
que todo empreendimento desenvolvido na Amazônia possui dias contados e finalidades que
pouco estabelecem relações com a realidade local. Um eterno recomeçar de rotas e
planejamentos rumo ao desenvolvimento.
A Amazônia tem sido historicamente alvo de uma longa e constante política de
colonização e integração territorial ao projeto nacional. Este permanente projeto de
colonização promove inúmeras transformações sociais e ambientais na região, que visam
sempre um interesse declarado em construir redes logísticas que favoreçam o investimento e
expansão capitalista. A construção dessas redes logísticas vem operando dentro da ótica de
ocupação dos espaços vazios e valorização econômica dos potenciais naturais da região. Seus 23
pressupostos defendem a garantia da segurança nacional e o fortalecimento da ocupação das
fronteiras nacionais, permitindo o reequilíbrio regional com o deslocamento de populações
para as áreas não ocupadas.
As estratégias da política de colonização da Amazônia têm priorizado o que
entendemos por rotas de colonização, ou seja, os projetos de ocupação territorial baseados na
instalação de empreendimentos, estradas e rodovias, que atuam como os eixos de ligação no
processo de colonização de novas terras. Contudo, grande parte desses projetos não promove
mudanças na realidade local, seus objetivos não alteram as condições de vida da população
local, ao contrário, na maioria das vezes trazem aspectos negativos e prejudiciais para a vida
local.
Por mais que possamos identificar mudanças no PIB do Estado do Amazonas como
demonstraremos abaixo, estas mudanças se dão de forma concentrada em algumas camadas
sociais, grande parte das famílias amazonenses permanece com poucas alterações em suas
condições de vida. As poucas mudanças percebidas estão concentradas na capital e nos
centros urbanos do Estado, as comunidades rurais são pouco influenciadas pelas políticas de
desenvolvimento existentes.
O Produto Interno Bruto – PIB do território do Baixo Amazonas apresentou
desenvolvimento crescente nos últimos anos, correspondendo a 2,13% do PIB do Estado do
Amazonas. O PIB do território do Baixo Amazonas é de R$ 894.107 milhões de reais, tendo
maior rendimento no município de Parintins com R$ 358.968 milhões de reais, seguido de
Maués R$ 192.319 milhões de reais, Barreirinha com R$ 96.777 milhões de reais, Nhamundá
R$ 90.446 milhões de reais, os municípios de Boa Vista do Ramos, São Sebastião do Uatumã
e Urucará somam 17,4%. A posição que cada município apresenta no ranking do Estado
Estado do Amazonas mostra a disparidade presente no processo de desenvolvimento do
território do Baixo Amazonas, ver quadro 01:
Quadro 01 – Ranking do PIB no Estado do Amazonas
Município Posição PIB (R$)Parintins 5ª 358.968Maués 8ª 192.319
Barreirinha 25ª 96.777Nhamundá 28ª 90.446
Urucará 32ª 74.338Boa Vista do Ramos 49ª 48.413
São Sebastião do Uatumã 60ª 32.846Fonte: PIB/IBGE, 2003-2007.
24
A atenuação das disparidades no processo de desenvolvimento deve ser realizada de
acordo com as potencialidades de cada um desses municípios, lembrando que a região
amazônica é caracterizada pela enorme diversidade de modos de vida e práticas culturais. O
contexto histórico e político desses municípios é diferenciado, o que torna esse
desenvolvimento repleto de aspectos singulares. Contudo, não podemos deixar de considerar
que a economia local é movimentada, principalmente, pelo setor primário, no interior do
Estado e pelo setor secundário, na capital do Estado.
Setor Primário
De acordo com Meirelles, ao longo da história podemos perceber uma constante crise
no setor primário e, conseqüentemente, o empobrecimento do homem do interior. Os planos
de desenvolvimento propostos para o Estado do Amazonas mostram uma insistente
preocupação com a crise deste setor, os diagnósticos informam que o interior permanece
apresentando deficiências que comprometem, seriamente, o setor primário. A ineficiência
desses planos mostra que depois de 40 anos a situação não melhorou, e o desenvolvimento
continua concentrado em torno da Zona Franca de Manaus, 50% da população amazonense
está em Manaus (MEIRELLES, 2008:107).
A análise do PIB revela que o setor primário tem grande importância para a economia
do Estado, mas que em contrapartida os produtos primários não estão gerando emprego e
renda suficiente para atender as necessidades da população local. Justamente por esta razão
grande parte dessa população se vê obrigada a buscar melhorias de vida nas cidades e centros
urbanos, abandonando suas terras e áreas de produção.
Além disso, não podemos deixar de mencionar que a sazonalidade da região interfere
significativamente no poder de decisão dessas famílias, muitas crises são causadas por
enchentes, principalmente para aquelas famílias que vivem em áreas de várzeas. As oscilações
climáticas alteram as relações comerciais locais, geram instabilidade nos preços e
inconsistência nas demandas. Em função deste cenário, a economia do Estado gira em torno
de alguns produtos que se adequam as condições climáticas e as demandas do Estado, como é
o caso da mandioca.
Entende-se, por lavoura temporária ou cultura temporária, a cultura de curta ou média
duração, geralmente com ciclo vegetativo inferior a um ano, que, após a colheita, necessita de
novo plantio para produzir, e, por lavoura permanente ou cultura permanente, a cultura de
25
longo ciclo vegetativo, que permite colheitas sucessivas, sem necessidade de novo plantio
(IBGE, 2002). No que diz respeito à lavoura temporária há que se destacar a importância que
tem o cultivo de mandioca (140.905 ton), com um diferencial significativo quando comparado
com as outras culturas (ver figura 11). Apesar de apresentar grande expressão em sua
produção, esta atividade não apresenta incentivos diferenciadores que estimulem a produção.
A mandioca permanece sendo produzida no Amazonas como foi herdada pelos povos
indígenas há milhares de anos.
Figura 11 – Principais cultivos agrícolas do Baixo Amazonas - Lavoura Temporária Fonte: IBGE, 2009.
Segundo a figura 11, as sete principais culturas agrícolas do Baixo Amazonas são
mandioca, cana-de-açúcar, milho, melancia, malva, arroz e feijão. A maior produção do
estado do Amazonas para lavouras temporária no ano de 2009 foram: a mandioca (140.905 t),
cana-de-açúcar (14.524 t) e milho (2.460 t). Os municípios que apresentaram maior produção
de mandioca foram: Parintins, Maués e Nhamundá.
A mandioca possui grande importância para economia local, pois constitui um
ingrediente indispensável na dieta do amazonense, sua produção é voltada tanto para o
consumo das famílias quanto para a comercialização. É produzida tanto em terra firme quanto
em área de várzea, não sendo necessário uso de fertilizante químico. Contudo, a grande
produção de farinha do Estado não é suficiente para abastecer o mercado local, sendo
necessária a importação de pelo menos 30% da farinha que chega a mesa do amazonense. A
importação ocorre, principalmente, pela falta de assistência técnica e comercial, sem apoio em
26
suas condições infraestruturais o produtor local não tem condições produzir e movimentar a
economia local.
No que diz respeito a lavoura permanente, as principais culturas do território do Baixo
Amazonas são: banana, laranja, guaraná, maracujá, cacau, urucum e borracha. Como é
possível observar, a banana possui um diferencial significativo em sua produção, totalizando
8.141 toneladas, seguida da laranja (1.264 t) e do guaraná (1.155 t). A banana em cacho no
território Baixo Amazonas alcançou uma produção média nos anos de 2007 e 2008 de 6.028
toneladas, correspondendo à maior produção (cultura permanente) em toneladas do território,
entretanto correspondeu apenas a 3,7% do total da produção no estado do Amazonas (ver
figura 12). Os municípios que se destacaram no cultivo de banana foram Parintins, Maués e
Urucará (PTDRS, 2010).
Figura 12 – Principais culturas agro-extrativistas do Baixo Amazonas - Lavoura PermanenteFonte: IBGE, 2009.
Outro setor importante para a economia no território do Baixo Amazonas é o do
rebanho animal. Grande parte das famílias locais possui produção animal, dentre os principais
tipos de rebanho analisados destacam-se o rebanho bovino, bubalino, suíno e galos, galinhas,
frangos, frangas e pintos. O rebanho bovino totaliza 247.371 cabeças, seguido do rebanho
bubalino com 27.953 cabeças e galos com 52.959 cabeças. O território do Baixo Amazonas
tem destaque por sua produção animal, sem dúvida, este setor constitui um dos principais
motores da economia local. Além disso, está relacionado a outros setores como a cultura e a
culinária (figura 13).
27
O mercado de produto de origem animal no território Baixo Amazonas se dá
principalmente pela produção de leite, ovos de galinha e mel de abelha. A produção de leite
1.000 (mil litros) destaca-se principalmente no município de Nhamundá que atinge um
equivalente de 7.088 (mil litros) em 2008, gerando uma renda de 10.631 (mil reais) para o
município. A produção de ovos de galinha ficou em 362 (mil dúzias) a maior produção no
território, somente no município de Parintins, gerando um valor de produção em torno de 782
(mil reais) em 2008. A produção de mel de abelha (quilogramas) foi destaque em 2007 e 2008
nos municípios de Barreirinha, Boa Vista do Ramos e Maués, a maior produção de mel foi
registrada em 2008 no município de Maués (PTDRS, 2010)
Figura 13 – Pecuária no Baixo Amazonas Fonte: IBGE, 2009.
A pesca constitui a principal fonte de proteína da dieta alimentar das populações
amazônicas, aliada a produção de farinha a pesca complementa a dieta local e sustenta grande
parte das famílias amazonenses. A pesca assume um caráter de atividade subsidiária ou
comercial, surgindo como elemento de apoio no que se refere à provisão de alimentos ou
trabalho e renda uma vez que a farinha de mandioca é o principal produto agrícola local.
A região amazônica é marcada por duas estações: (inverno) cheia e (verão) seca. Estas
duas estações definem os rumos que as atividades terão em cada ano, a pesca, por exemplo, é
guiada por estas estações. Para pescar determinada espécie, os ribeirinhos utilizam um tipo de
instrumento de pesca adequado para cada estação do ano. Os ambientes de pesca existentes na
região podem ser divididos em três: rios, lagos e igarapés. Eles apresentam subdivisões,
28
dependendo da sazonalidade, como e o caso da floresta inundada adjacente ao rio (várzea) e
aos lagos (igapós).
No Baixo Amazonas, a frota comercial está concentrada na calha do rio Amazonas na
seca e nos lagos durante a época da cheia. Por outro lado, a pesca de subsistência é praticada
principalmente nos lagos. As principais espécies capturadas são: curimatã (530,37 t),
tambaqui (339,88 t), jaraqui (316,74 t), mapará (264,83 t), surubim (219,21 t) e matrinxã
(8,54 t).
Com relação a extração vegetal no Baixo Amazonas está direcionada para a produção
de açaí, castanha, tucum, carvão vegetal, lenha e madeira. Voltada para a alimentação estão a
Castanha-do-Pará e o açaí. A castanha-do-pará possui uma produção de 255 toneladas, sendo
que está produção ocorre em todos os municípios de forma diferenciada, tendo maior
destaque o município de Nhamundá.
Com relação à produção de produtos extrativos para fins oleaginosos, destaca-se
apenas no município de Urucará, a extração de amêndoa de tucum, sendo uma fonte
importante de economia, pois o município representa 94% da produção do estado do
Amazonas, gerando uma renda de 23 mil reais para o município.
A produção de carvão vegetal ocorre somente nos municípios de Boa Vista do Ramos
e Parintins. Em 2007 e 2008, ambos os municípios apresentam uma produção media de 15
toneladas de carvão vegetal, representando um percentual de 0,28% do total produzido. A
produção de lenha em metros cúbicos ocorre em todos os municípios do Território Baixo
Amazonas, maior destaque e dado aos municípios de Barreirinha, Maués, Parintins e Urucara.
O território do Baixo Amazonas apresenta uma produção de lenha em metros cúbicos de
185.222.
Setor Secundário
Apesar da indústria brasileira e, em particular, a amazonense apresentar todos os itens
necessários para o seu pleno desenvolvimento como mão-de-obra, recursos naturais e matéria-
prima não disponibiliza de tecnologia para torná-la altamente competitiva. Todo investimento
que tem sido destinado ao desenvolvimento do setor das indústrias tem sido perdido, o fato é
que a industrialização foi bem vinda, mas não foi planejada, com isso trouxe inúmeras
conseqüências. O melhor exemplo disso é a disparidade causada com o êxodo rural, a
concentração urbana é justificada pela constante frustração de expectativas e marginalização
do interior do Estado. No que diz respeito ao setor secundário a disparidade é revelada a partir
29
do momento que Parintins e Maués detém 43,3 % e 25,7%, respectivamente do total de
empreendimentos cadastrados no Baixo Amazonas. Os outros municípios possuem alguns
empreendimentos, mas compõem de modo insignificante a lista de cadastros.
O município de Barreirinha possui 79 empreendimentos cadastrados (usina de
beneficiamento de arroz, olarias, marcenarias e padarias). Seguido de Boa Vista do Ramos
com 75 empreendimentos discriminados como serrarias e padarias. Nhamundá possui 69
empreendimentos. Por fim, o município de São Sebastião do Uatumã é o que possui menor
quantidade de empreendimentos (31).
Os municípios de Parintins e Maués foram os que apresentaram maior quantidade de
empreendimentos cadastrados. Em Maués, 396 empreendimentos estão cadastrados, entre as
quais se destacam a usina de extração de essências de pau-rosa, serrarias, beneficiamento de
guaraná, fábricas de gelo, movelarias, panificadoras e olarias. No município de Parintins,
constam 713, participando deste potencial estão as indústrias da construção civil, esquadrias
metálicas, peças metálicas, gelo, redes e tapetes, beneficiamento de malva, sacos/fios/tela de
juta, beneficiamento de arroz, moinho de café, beneficiamento de pau-rosa, estaleiros,
serrarias, olarias e marcenarias. Urucará possui 176 empreendimentos cadastrados, entre os
quais se destacam, olarias, fabricantes de móveis de madeira, fábricas de gelo, padarias,
vestuários, artigos de viagens e tecidos.
Seguindo a mesma linha de análise, os municípios que possuem um número maior de
empreendimentos são aqueles que oferecem maior número de empregos, como é o caso dos
municípios de Parintins (5.860 pessoas) e Maués com 2.686 pessoas, o menor percentual de
pessoas ocupadas neste setor se dá nos municípios de São Sebastião do Uatumã (257 pessoas)
e Boa Vista do Ramos com 367 pessoas. O número de pessoal assalariado é mais expressivo
em Parintins 5.196 pessoas, representando 88,7% e Maués com 2.407 pessoas, representando
89,6% do pessoal total ocupado. O salário médio mensal varia entre 1,4 a 2,3 salários
mínimos. O salário médio mensal mais elevado é pago pelo município de Barreirinha, com
pelo menos 2,3 salários mínimos mensais, o salário menos expressivo no setor fica em torno
de 1,4 no município de Boa Vista do Ramos (PTDRS, 2010).
As condições limitantes de infraestrutura básica em localidades rurais na Amazônia
ainda constituem, sem dúvida, um dos fatores determinantes para o deslocamento de
populações rurais para os centros urbanos. O abandono das áreas rurais de produção se dá,
sobretudo, em função da ausência de serviços públicos básicos, como educação, saúde,
energia e água tratada. A idéia de encontrar melhores condições de vida na cidade acaba
30
levando muitas famílias ao ato de mudar e apostar na sorte. Esses fatores se apresentam de
modo recorrente entre as principais causas para a migração nos municípios do estado do
Amazonas, muitas famílias abandonam suas propriedades ou vendem para viver nas periferias
dos centros urbanos e sedes municipais.
E muitas destas famílias que abandonam suas propriedades para viver na cidade, em
função da oportunidade de emprego oferecidos por algumas empresas locais, acabam sem
perspectiva nenhuma, considerando que o tempo de vida destas empresas é sempre reduzido.
A maioria delas, ao sair das comunidades, havia vendido suas pequenas propriedades, outras
estavam instaladas na cidade que oferecia melhor educação para os seus filhos. Pela primeira
vez, muitas dessas famílias se depararam com as insuficiências do “suposto” mercado de
trabalho na cidade. Ainda que os chamados “bicos” e pequenas prestações de serviços
garantam a refeição de cada dia, as antigas perspectivas de melhorias de vida se perderam no
processo de descontrole e desestruturação do sustento de suas famílias.
Setor Terciário
O setor terciário ou dos serviços é o setor que mais cresce no Estado do Amazonas,
embora esse crescimento se dê de forma diferenciada. No caso do território do Baixo
Amazonas percebemos que o setor dos serviços está caracterizado por especificidades locais,
portanto, varia de acordo com a realidade encontrada em cada município. Os municípios de
Maués e Parintins, por exemplo, apresentam, de forma significativa, um crescimento
acelerado neste setor, haja vista o desenvolvimento e a diversidade dos centros comerciais
locais. Contudo, os outros municípios (Boa Vista do Ramos, Barreirinha, Urucará, São
Sebastião do Uatumã e Nhamundá) se distanciam, consideravelmente, de Maués e Parintins
(figuras 14 e 15).
Esta realidade pode ser percebida durante os primeiros contatos com essas cidades,
Parintins e Maués possuem centros comerciais consolidados, possuem lojas e comércios
variados desde: vestuário, calçados, alimentação, mecânica, hotelaria, produtos diversos. Na
verdade, cada vez mais o setor comercial e de serviços apresenta maior diversidade. É
interessante destacar a criatividade do brasileiro na produção de novas fontes de renda,
fazendo do setor informal o que apresenta maior crescimento.
31
Figura 14 – Centro comercial MauésFonte: Pesquisa de campo, 2010.
Figura 15 – Centro comercial ParintinsFonte: Pesquisa de campo, 2010.
Em Maués, o comércio possui estabelecimentos varejistas e atacadistas, os
estabelecimentos mais encontrados no município são lojas de vestimentas, artigos
diversificados, livrarias, vídeo locadora e estabelecimentos de gêneros alimentícios. Parintins
conta com cerca de 1.000 estabelecimentos comerciais, varejista e atacadista dos mais
diversificados produtos, que vão de gêneros alimentícios a materiais de construção.
Em São Sebastião do Uatumã e Urucará, os estabelecimentos comerciais se dividem
em comércio varejista e atacadista. No Território Baixo Amazonas, os municípios contam
com os serviços das administrações municipais e estaduais e com os serviços prestados por
empresa privadas. Em Barreirinha, por exemplo, destacam-se os serviços oferecidos em hotéis
e pensões e estes são responsáveis por 64,5 % do PIB. No município de Boa Vista do Ramos,
os serviços de carpinteiro, costureira, pintor de paredes, mestre de obras, construtor e outros
foram responsáveis por 65,3 % do PIB.
Em Maués, os serviços de hotéis, consultórios médicos, odontológicos, protéticos,
oculistas, contadores, relojoeiros, consertos de carros, motos e barcos, cabeleireiros,
fotógrafos, borracharia, ourivesaria e oficina de refrigeração respondem por 65,1 % do PIB.
Em Nhamundá, destacam-se os serviços oferecidos em pousadas, restaurantes, oficinas
mecânicas, empresas de comunicação, etc., e são responsáveis por 48 % do PIB. A prestação
de serviços no município de Parintins é responsável por 75,4% do PIB municipal e destaca-se
nos ofícios de cabeleireiros, protéticos, borracharias, oficinas de autos e equipamentos
eletrônicos, além de médicos, dentista, contabilistas, hotéis, bares, restaurantes, etc. Parintins
possui cinco agências bancárias: Banco do Amazonas, Banco do Brasil, Banco da Amazônia,
Bradesco e Caixa Econômica Federal.
32
Em São Sebastião do Uatumã, o setor de serviços respondeu por 66,8 % do PIB
municipal, Urucará se destacou pelos serviços de agência bancária, mercado municipal, feira
do produtor, matadouro e foram responsáveis por 57,1% do PIB no município em 2007.
Dimensão Infraestrutural
Saúde
No território do Baixo Amazonas, o sistema público de saúde não atende à
necessidade de toda a população. Os problemas mais comuns relacionados à área da saúde,
relatados durante as oficinas e coleta de dados, são: falta de postos de saúde com
medicamentos; falta de conhecimento dos programas municipais de saúde; falta de transporte
para doentes das comunidades rurais; falta de serviços de referência à saúde da mulher, da
criança, do adolescente e do idoso; grande dificuldade para a realização de exames e
internações; falta capacitação dos moradores das comunidades rurais; insuficiência de
equipamentos de saúde para atender às demandas territoriais; ausência de medicina
preventiva; ineficiência de políticas públicas para meio rural; infra-estrutura deficiente; e alto
custo do profissional médico.
Apesar de todas as deficiências, há postos de saúde, unidades mistas e centros de
saúde que são responsáveis pelo atendimento básico para a população. Em alguns municípios
existem ainda alguns serviços especializados, como Parintins, que se destaca por possuir
clínicas particulares, laboratórios e policlínica, e Maués, que conta com uma clínica
especializada. Barreirinha e Nhamundá possuem o maior número de postos de saúde no
território do Baixo Amazonas (ver quadro 2).
Quadro 2 – Estabelecimentos de saúde
Município Estabelecimentos
de Saúde
Número de leitos
disponíveisBarreirinha 27 31
Boa Vista do Ramos 4 20Maués 23 90
Nhamundá 14 30Parintins 36 140
São Sebastião do Uatumã 5 20Urucará 7 40Total 116 361
Fonte: CNES, 2009
33
Em relação à variação da oferta de leitos por habitante, a disponibilidade é
extremamente baixa. Os leitos não chegam a atender nem a demanda da população urbana.
Nas áreas rurais, a situação é ainda mais precária, pois dificilmente as comunidades possuem
postos de saúde com infra-estrutura de leito e profissionais capacitados.
A incidência da malária é um fator preocupante no território, apesar de que no geral,
os casos da doença têm diminuído gradativamente. Os números que chamam mais atenção são
os do município de São Sebastião do Uatumã.
Abastecimento de água
O abastecimento de água para consumo da população na zona urbana dos municípios é
feito, na maioria das vezes, pela rede geral e seguido por poços artesianos. Na zona rural o
consumo é feito em grande parte do próprio rio, com pequenos tratamentos com hipoclorito
de sódio, fervura e coação. Há alguns poços artesianos, no entanto, a tecnologia de que
dispõem os moradores das comunidades rurais não permite uma perfuração profunda a ponto
de garantir uma água de qualidade.
O abastecimento de água está ligado à qualidade de vida das populações, e como as
cidades interioranas não passaram por uma política de planejamento adequada, muitas sofrem
com o problema do abastecimento, sendo significativo o número de casas que utilizam água
sem tratamento. Quanto à água canalizada, as cidades do Baixo Amazonas com maior
população urbana não chegam a atender 70% dos domicílios com água proveniente da rede
geral.
A partir dos dados é possível traçar uma tendência de que a maior parte da população
rural tem acesso apenas às nascentes e outras formas de abastecimento, como rios e igarapés.
O consumo de água sem tratamento provoca doenças como diarréia, febres, cáries, amebas e
outras parasitoses. Dessa forma, vê-se que o problema do abastecimento está intimamente
ligado ao problema da saúde.
Saneamento
A questão do saneamento no território do Baixo Amazonas é crítica. Todas as cidades
possuem um elevado percentual de domicílios sem coleta de esgoto. A grande maioria das
comunidades rurais não tem banheiros com fossa séptica. Mesma as cidades que coletam
esgoto e distribuem água, em sua maioria, não possuem Estação de Tratamento de Esgoto
(ETE).
34
Esses dados de água, saneamento e lixo revelam que o território necessita
urgentemente de elevados investimentos em saneamento básico. São muitos os problemas
causados por essa deficiência, como por exemplo, a suscetibilidade da população às doenças
infecciosas e parasitárias. Na zona rural a realidade é ainda mais alarmante, pois as
comunidades não possuem tratamento de água, esgoto ou lixo, os dejetos são jogados no rio e
os sanitários, como dito anteriormente, não possuem fossa séptica, sendo usadas as chamadas
fossas negras, uma casinha de madeira, coberta ou não, com piso e um buraco no chão
(quadro 3).
Quadro 3 – Saneamento básico
Município Rede
geral
ou
esgoto
pluvial
Fossa
séptica
Fossa
rudimentar
Vala Rio ou
lago
Outro
escoadouro
Sem
instalação
sanitária
Barreirinha 0,1 2,9 43,6 45,2 0,4 0,1 7,7Boa Vista
do Ramos
0,2 4,2 89,9 3,1 0,0 0,1 2,5
Maués 0,2 18,8 59,2 12,6 0,4 0,1 8,8Nhamundá 0 12,0 79,4 1,8 0,1 0,1 6,6Parintins 1,1 23,9 65,2 5,3 0,9 0,1 3,5
S.
Sebastião
do Uatumã
0 15,3 54,7 26,7 0,1 0 3,2
Urucará 0,4 18,3 48,2 29,0 0,1 0,1 3,9Fonte: IBGE, Censo Demográfico (2000)
Educação
Para uma visão geral do quadro educacional da rede pública de ensino no Território do
Baixo Amazonas, destaca-se, em larga escala, o número de estudantes de nível fundamental,
um total de 60.375. O ensino médio vem em segundo lugar, com 12.236 estudantes e o ensino
infantil possui 11.184 estudantes no total (quadro 4).
Quadro 4 – Educação no Baixo Amazonas
Municípios Infantil Fundamental MédioBarreirinha 1.922 7.585 1.460
Boa Vista do 832 3.745 772
35
RamosMaués 1.992 14.951 2.163
Nhamundá 797 4.502 855Parintins 4.606 24.179 5.566
S. Sebastião do
Uatumã
576 1.911 423
Urucará 459 3.502 997Total 11.184 60.375 12.236
Fonte: IBGE, 2008
Na maioria dos casos, as escolas ficam localizadas nas áreas mais povoadas. Nas
comunidades mais longínquas é oferecido ensino até a quarta série do Ensino fundamental, o
que faz com que muitos alunos migrem para as sedes dos municípios, onde a oferta de
educação é maior. Com relação às instalações, grande parte das escolas apresenta problemas
de estrutura e funcionamento do prédio. Nos casos dos professores, não existe oferta de
capacitação nem alojamento; o material didático é insuficiente para o número de alunos e
aqueles que moram em localidades mais distantes são penalizados por falta de condução.
O ensino superior no território tem sido incentivado por parte do Governo Federal e
Estadual, sendo a UEA (Universidade Estadual do Amazonas) um desses investimentos,
apresentando um total de 2.760 alunos matriculados, com representação nos sete municípios.
A UFAM (Universidade Federal do Amazonas) conta com 449 alunos inscritos, sendo 299 no
Campus Avançado de Parintins e 150 em Maués. Alem disso, também há de se destacar a
inserção de novas unidades de ensino do IFAM (instituto Federal do Amazonas, que em 2010
abriu 240 vagas para cursos técnicos. Apesar dos investimentos, o avanço acadêmico ainda é
escasso, evidenciando-se apenas nos municípios de Maués e Parintins.
Quadro 5 – Educação/Ensino Superior
Município Estadual
(UEA)
Federal
(UFAM)
Federal
(IFAM)
Total por
municípioBarreirinha 0 0 0 141
Boa Vista do
Ramos
36 0 0 36
Maués 584 150 120 854Nhamundá 87 0 0 87Parintins 1.790 299 120 2.209
S. Sebastião do
Uatumã
82 0 0 82
Urucará 40 0 0 4036
Total por
instituição
2.760 449 240
Fonte: IBGE/ UFAM/ IFAM/ UEA – 2010
Os índices de alfabetização, extraídos do IBGE (2008), indicam que, no Baixo
Amazonas, as cidades são as que possuem o maior índice de pessoas alfabetizadas, enquanto
que a zona rural apresenta os menores valores. Analisando a questão do analfabetismo,
observa-se que na população de 15 anos ou mais, os municípios com os maiores índices são
Barreirinha (17,3%), Nhamundá (15,5%) e Maués (15,4%).
Dessa forma, os problemas mais comuns relacionados a educação no Território do
Baixo Amazonas são: falta de formação direcionada para a educação no campo, apesar das
tentativas de implantação das Escolas Família Rurais, nos municípios de Parintins e Boa Vista
do Ramos; precária formação dos profissionais; infra-estrutura deficiente; falta de moradia
adequada para os professores nas comunidades; pouca valorização dos profissionais da
educação.
Segurança Pública
Dentre os vários problemas ligados à segurança pública no Baixo Amazonas,
destacam-se a dificuldade de deslocamento das forças da Polícia Civil e Militar, a precária
manutenção das instalações e a ausência de recursos tecnológicos adequados. Além disso, é
necessária uma política de valorização e qualificação de policiais civis e militares, juntamente
com a implantação de sistemas de informação e comunicação para uma eficiência na
segurança pública. A precariedade dos recursos para a segurança pública é muito intensa,
apesar da demanda de recursos humanos e estruturas físicas serem bem menor no interior do
estado.
A presença do conselho tutelar é assídua no território. As delegacias específicas como
delegacia da criança e do adolescente, delegacia da mulher, são inexistentes em quase todos
os municípios, com exceção de Parintins.
É importante ressaltar ainda que, no interior do estado do Amazonas, os recursos para
segurança são limitados. Não há investimentos em tecnologias, como também não há
investimentos em capacitação humana.
Transporte
37
Como na maioria dos municípios da zona rural do estado do Amazonas, a principal via
de acesso é a fluvial, seguida da aérea. O transporte terrestre é mais propício para a
locomoção dentro das sedes dos municípios.
O transporte fluvial expressa grande importância para o Território, é bastante utilizado
tanto para o transporte de cargas, quanto para a locomoção de passageiros. Esse tipo de
transporte está presente em todo local, tendo percursos que chegam ao Território desde
Manaus, através de barcos regionais. Os moradores das comunidades também costumam se
locomover com recursos próprios, em pequenas embarcações.
Nos municípios existem, principalmente nas periferias das sedes, algumas estradas que
os ligam às comunidades. Os municípios de Parintins e Maués se destacam por possuir um
número extenso de motocicletas. Em Parintins, para uma população de 107.249 pessoas,
existem 4.420 motocicletas e um total de 8.347 veículos motorizados. O município de Boa
Vista do Ramos é que tem o menor número de veículos, para uma população de 13.994,
existem apenas 60 veículos.
No Baixo Amazonas, somente Maués e Parintins possuem aeroportos autorizados pela
ANAC. As estruturas conservam boa qualidade, possuindo desde terminal de passageiros ao
parque de estacionamento. Nos demais municípios a estrutura se limita a pistas de pouso.
Energia
Os municípios do Território do Baixo Amazonas são atendidos com a presença de
unidades geradoras da Amazonas Energia. O abastecimento é feito principalmente na sede dos
municípios. Muitas comunidades, apesar do avanço do Programa Luz para Todos, do governo
federal, ainda proporcionam seu próprio consumo de energia através de motores a diesel.
O fornecimento de energia no campo tomou grande impulso com o Programa Luz para
Todos, que tem como meta a universalização da energia nos domicílios rurais. No entanto, o
atendimento à demanda das comunidades rurais ainda está muito aquém do desejado,
observando-se inclusive um aumento na demanda dessa região.
Comunicação
As empresas Telemar Norte Leste S.A e a EMBRATEL são as concessionárias
responsáveis pelos serviços de telefonia fixa no Amazonas. Ao todo são 442.962 telefones
instalados, sendo 18.543 destes telefones de uso público.
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A telefonia móvel do Baixo Amazonas é operacionalizada pela OI, VIVO e TIM. As
três operadoras atuam com freqüência em Maués e Parintins, ficando os outros municípios
apenas com a cobertura da prestadora VIVO.
Todos os municípios possuem, no mínimo, uma agência dos correios que, além dos
serviços de postagem convencionais, possui o banco postal, que abre e movimenta contas do
Bradesco. Como meio de informação, circulam no Território vários jornais impressos, como
também jornais editados em Manaus, como A Crítica, Em Tempo, Diário e outros. Há ainda o
serviço de internet na sede dos municípios e o acesso somente a rede de TV Globo. As rádios
AM e FM são os mais populares meios de informação e comunicação, existindo em cada
município uma radio que difunde as noticias em nível local, territorial e estadual.
As comunidades rurais, sejam elas distantes ou próximas dos centros urbanos, são
prejudicadas com o isolamento e falta de estrutura de comunicação, sobretudo para atender as
atividades de emergência para atendimento médico ou outras atividades de comunicação. É
necessário fornecer essa estrutura, assim como promover a inclusão digital dessas populações.
Dimensão Cultural
De modo sintético, baseando-se na “fábula das três raças”, de Roberto Da Matta, a
cultura amazonense constitui-se da interpenetração das matrizes portuguesa, africana e
indígena. Com isso queremos apenas delimitar um ponto de origem para contar a formação do
moderno Estado brasileiro. Ainda que a “fábula das três raças” encubra os conflitos raciais e
sociais existentes no Brasil, ao mesmo tempo faz com que todos se reconheçam como
nacionais (apud ORTIZ, Renato. 1985). Mas essa questão não vem ao caso no momento. O
que propomos nesta parte do relatório é caracterizar sucintamente a dimensão cultural do
território do Baixo Amazonas. Logo, não podemos abordar a questão cultural sem antes
contextualizar o território com a própria formação cultural do nosso país. E essa formação se
dá justamente pela fusão desses três povos que mais influenciaram as festas populares -
religiosas ou profanas - Brasil a fora.
Em cada município ou comunidade visitada pudemos notar a forte influência da
religião católica através das festas de devoção aos santos padroeiros dos lugares. As festas de
santo são em maior número. Mas as festas relacionadas aos principais produtos agrícolas
comercializados pelos municípios não ficam atrás nos registros. Muitas festas pelo interior do
Amazonas coincidem com o plantio de legumes, tubérculos, frutas, cereais ou até mesmo com
a pesca. Esses dois tipos de festividades – calendário religioso e calendário agrícola- são as
39
mais populares, atraindo grande número de visitantes aos municípios. Disse uma vez Mário
Ypiranga Monteiro (1983) sobre as festas profano-religiosas no Amazonas: “(...) essas
concentrações festivas favorecem no interior do Estado a expansão do pequeno comércio de
troca nos flutuantes (...). São festas de enorme atração social (...).”
Barreirinha
A população total está em 27.361 habitantes (IBGE, 2010) distribuídos na cidade,
comunidades, vilas e distritos, não contando o número de indígenas, ou seja, as etnias sateré-
mawé e Hyxkaryana. Os principais eventos e festas no município são: Exposição
Agropecuária de Barreirinha – EXPOBAE (janeiro/fevereiro), Aniversário da cidade (09 de
junho), Festival Folclórico (junho), Festa do Milho (julho), Festa da Bacaba (julho), Festa da
Padroeira Nossa Senhora do Bom Socorro (15 de agosto), Festa do Caju (setembro/outubro) e
Festa do Marujo (dezembro).
Boa Vista do Ramos
O rio principal do município é o Paraná do Ramos. Possui diversas festas como a
Festa de São Sebastião (janeiro), Festival da Canção Cristã (janeiro), Festas de Santo Antonio,
de São João, de São Pedro (junho), Festa de Nossa Senhora Aparecida (02 a 12 de outubro).
Porém o evento que mais é popular nesta região é o Festival Folclórico no último fim de
semana de junho e a festa do Padroeiro do município, São Pedro (29 de junho). Destaca-se
também a Feira Agropecuária no mês de setembro.
Maués
Maués localiza-se à margem direita do rio Maués-Açú e fica a 356 km de Manaus por
via fluvial e 268 km em linha reta. Seus principais festejos são a festa da padroeira da cidade,
Festa de São Sebastião (em janeiro), Nossa Senhora da Conceição (em 08 de dezembro),
Festival Folclórico da Ilha de Vera Cruz de (11 a 13 de julho), Festa do Divino Espírito Santo
(de 31 de maio a 08 de junho), Aniversário de Maués (dias 24 e 25 de junho), a tradicional
Festa do Guaraná (novembro), que celebra a maior produção de guaraná no estado do
Amazonas e o Festival de Verão de Maués (setembro).
Nhamundá
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O rio Nhamundá, que banha as terras do município a quem empresta o nome, é o
celebre rio em cuja foz, em 1541, deu-se o tão propalado encontro de Francisco Orellana e seu
pessoal com as mulheres guerreiras, a quem o espanhol denominou “Amazonas”. Essas
guerreiras eram conhecidas pelos seus irmãos silvícolas, pela denominação de “Icamiabas”,
que significa “Mulheres sem Marido”. Habitavam primitivamente a região os índios: Uabois
ou Jamundás, Cuniris, Guncari. Em 19.12.1955, pela Lei Estadual nº 96, o distrito de Ilha das
Cotias é desmembrado de Parintins e passa a constituir o município Autônomo de Nhamundá,
com sede na vila de Afonso de Carvalho. Em 31/01/1956, instala-se o novo município,
nomeado pelo Governador do Estado, o sr. Pedro Macedo de Albuquerque. Faz limites com
os municípios de Parintins e Urucará no Amazonas, com o estado de Roraima e o estado do
Pará.
Suas principais datas festivas são o aniversário da cidade (em 31 de janeiro), Festa de
Santo Antônio, que é o padroeiro da cidade (de 08 a 13 de junho), Festival de Verão (25 a 27
de julho), Festa de Nossa Senhora da Assunção (08 a 17 de agosto) e Festa da Pesca ao
Tucunaré (26 a 28 de setembro).
Parintins
O município de Parintins está localizado à margem direita do rio Amazonas, na Ilha
Tupinambarana, mesorregião do Centro Amazonense, limitando-se com os municípios de
Barreirinha, Urucurituba, Nhamundá e ao leste com o Estado do Pará. O município possui
uma extensão territorial de 5,952km² para 107.250 habitantes, configurando-se como a
segunda maior cidade do Estado do Amazonas. Além disso, Parintins é conhecida
internacionalmente por seu patrimônio cultural e folclórico. Todos os anos a cidade de
Parintins é palco para uma das maiores manifestações culturais da região norte, o Festival
Folclórico de Parintins. Realizado nos últimos dias do mês de junho, o Festival Folclórico de
Parintins conta com o desfile e a apresentação dos bois-bumbás Garantido e Caprichoso.
Mas Parintins conta com outras festas também muito populares, como o Dia de Reis,
no dia 06 de janeiro. Ao som das pastorinhas, uma festa que lembra o reisado nordestino,
Parintins revive o nascimento do menino Jesus. Coloridos presépios e figuras como Pastor,
Rainha das Flores, Campina, Samaritana, Galego, Castanholas, Cigana e outros, dão um
significado único à festa que sai às ruas da cidade, entoando melodias ao som de cavaquinhos,
banjos, violões e violinos. A festa tem seu encerramento com a tradicional queima das
palhinhas do presépio. Logo em seguida temos o Carnailha, nos dias 08, 09 e 10 de fevereiro.
41
O Carnailha é o carnaval de rua de Parintins, onde se mistura os ingredientes de dois
carnavais famosos: Rio de Janeiro e Bahia. A folia ganha mais animação com a irreverência
dos blocos da chave “B”, que se apresentam no domingo. Na segunda, os Blocos da Chave
“A” e na terça-feira a Chave “Especial”, com carros alegóricos, alas e tururis (abadás) que dão
um colorido especial na Avenida. A Avenida Paraíba torna-se Avenida do Samba com
Arquibancadas, frisas, camarotes e cadeiras especiais são montados, oferecendo maior
conforto e segurança aos visitantes.
No dia 25 de março acontece a encenação da Paixão de Cristo, um espetáculo ao vivo,
com mais de 40 mil espectadores que assistem emocionados a história de Jesus de Nazaré.
Nos dias 24 e 25 de junho ocorre a Feira do Artesanato - exposição de peças
confeccionadas com madeira, palha, juta cipó, sementes, penas e tecidos.
Uma das mais tradicionais festas da cidade é a Festa da Padroeira de Parintins, Nossa
Senhora do Carmo (06 a 16 de julho): estima-se que cerca de 35 mil acompanhem a maior
festa religiosa do interior do Amazonas. Durante os dias de festa acontece o arraial, com
barraquinhas de comidas e jogos e atrações regionais em palco montado na Praça da Matriz.
Temos também o Aniversário da Cidade no dia 15 de outubro, a Feira Agropecuária
EXPOPIN em novembro e o Festival das Pastorinhas no período de 21 a 23 de dezembro.
Parintins ainda conta com outros eventos que fazem parte do calendário agrícola, como a
Pesca Esportiva no dia 21 de agosto, onde são promovidas competições aquáticas e concurso
para a escolha do maior peixe do lago; Festival do Beijú na Agrovila de Mocambo, no mês de
setembro e o Festival de Pesca do Peixe Liso em agosto na comunidade do Paraná do Espírito
Santo.
São Sebastião do Uatumã
O município de São Sebastião do Uatumã tem suas origens junto à história de outro
município, Urucará. Santana da Capela foi criada em 1814 como uma povoação, por Crispim
Lobo de Macedo. Em 1880 foi criada a freguesia, com sede em Santana da Capela que
polariza o desenvolvimento dessa região ribeirinha do rio Amazonas. Em 1887 foi criado na
área da freguesia o município de Urucará, que em 1930 foi extinto e teve seu território
anexado a Itacoatiara, para ser definitivamente restabelecido em 1935. Em fins de 1981,
constavam da estrutura administrativa de Urucará os seguintes subdistritos: Urucará, Santa
Maria, Capucapu, Alto Uatumã e São Sebastião e territórios adjacentes da margem esquerda
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do rio Uatumã são desmembrados de Urucará e passam a constituir o município Autônomo de
São Sebastião do Uatumã.
O calendário cultural do município inclui a festa do seu padroeiro, festa de São
Sebastião (10 a 20 de janeiro), festa do Carnaval (fevereiro), festa de Santa Maria (01 a 13 de
maio), Festa da Santíssima Trindade (16 a 22 de maio), Festa do Sagrado Coração de Jesus
(01 a 03 de junho), Festa de São João na área rural (24 a 26 de junho), Festa de Nossa
Senhora de Santana (28 a 30 de julho), Festa de São Francisco e Festa do Tucunaré (ambas
em outubro), Desfile da Garota Uatumaense (27 de outubro), Festa de Santa Luzia (12 e 13 de
dezembro) e Festa de Aniversário da Cidade (08 de dezembro).
Urucará
Urucará está localizada na 9ª sub-região – (Baixo Amazonas), com 27.903 km de
extensão territorial, para uma população de 17.019 habitantes composto por área rural e
urbana, o município comporta um total de 37 comunidades, com uma distância de 270 km em
linha reta de Manaus e 281 km por via fluvial, possuindo os seguintes limites: Nhamundá,
Urucurituba, Itapiranga, São Sebastião do Uatumã, Presidente Figueiredo e o Estado de
Roraima. Os seus rios principais são: Amazonas e Jatapú.
O município de Urucará possui diversas festas como a Festa de São Jorge (fevereiro),
de São José (março), Festa do Divino Espírito Santo (maio), São Pedro (junho), Festa de
Sant’ana (16 a 26 de julho), Nossa Senhora Aparecida (12 de outubro), Festa de Santa Luzia
(dezembro). Porém o evento que mais é popular e festivo nesta região é o aniversário da
cidade que acontece no dia 12 de maio.
Dimensão político-institucional
Barreirinha
O Município de Barreirinha possui como autoridade o prefeito Mecias Pereira Batista,
exerce a profissão de agricultor e como vice-prefeito José Mário Trindade Carneiro e o
partido de ambos é o PMN (Partido da Mobilização Nacional). Outro membro importante é o
presidente da Câmara Municipal de Barreirinha, Carlos Marcio Tavares.
Apesar de não termos conseguido informações a respeito dos secretários municipais,
conseguimos recolher quais são as secretarias que estão em andamento. Ao todo são oito:
Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS); de Abastecimento (SEMAB); de
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Educação (SEMED); de Administração (SEMAD); de Finanças (SEMEF); de Obras
(SEMUSP); de Saúde (SEMSA); de Esporte e Lazer (SEMEL).
Os projetos que já foram desenvolvidos em Barreirinha consistem na Usina de
Beneficiamento de Arroz; Matadouro Municipal Álvaro de Silva Maia; Fábrica de Derivados
do Leite e Centro de Inclusão Digital. Vale expor que não estão funcionando.
Boa Vista do Ramos
O prefeito que ganhou as últimas eleições responde pelo nome de Elmir Lima Mota,
empresário, tem como vice-prefeito Glauciomar Correa Pimentel e são filiados ao PSC
(Partido Social Cristão). O presidente da Câmara Municipal de Boa Vista do Ramos é Marlon
Trindade Teixeira.
Em Boa Vista do Ramos encontramos dez secretarias em funcionamento: Secretaria
Municipal de Administração e Planejamento, tendo como secretário Dilmar Erich Franke;
Secretaria Executiva de Governo, Pedro Lopes; de Ação Social, Maria Madalena de Matos
Dias; de Finanças, Antonio Viana; de Educação e Cultura, Marlon Teixeira Trindade; de
Juventude e Desporto, Laureny Antonio Nascimento da Silva; de Desenvolvimento Rural,
Dilmar Erich Franke; de Meio Ambiente, Miriam Dias Ferreira; de Saúde, Regina Célia
Chaves do Carmo; de Infra-Estrutura, Paulo Jhander A. Rodrigues.
Maués
O Município de Maués é dirigido pelo prefeito Odivaldo Miguel de Oliveira Paiva e
como vice-prefeito tem Deny Dorzane Martins, ambos do PR (Partido da República). O
presidente da Câmara Municipal de Maués é Raimundo Rodrigues Souza.
O município possui três autarquias: Serviço Autônomo de Água e Esgoto de Maués,
dirigida por Rosalvo Soares Filho; Banco do Povo, gerenciada por Estevão Antunes e o
Instituto de Terras de Maués, gerenciada por Ariosto Menezes.
A Secretaria Municipal de Assistência Social é dirigida por Deny Dorzane Martins e
tem como órgãos vinculados o Conselho Municipal de Direitos da Criança e do Adolescente;
Conselho Tutelar e Conselho Municipal da Assistência Social.
A Secretaria de Governo possui uma secretária de governo que é Andréa dos Santos
Nascimento e uma secretária executiva Chrystianne Sales Teixeira. O Departamento
Municipal de Trânsito, a Coordenadoria Municipal de Defesa Civil, a Coordenadoria de
Proteção e Defesa do Consumidor e a Junta Militar são órgãos vinculados a esta secretaria.
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Na parte da educação temos como secretário João Libânio Cavalcante e dois
secretários executivos: Iêda Bentes de Almeida e Maria do Carmo Sales Coelho. Os órgãos
conectados consistem no Centro de Informática Prof. Lúcia Góes, Escola de Música Luiz
Otávio Dinelly e Pólo de Apoio Presencial da Universidade Aberta do Brasil.
A Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Meio Ambiente tem como secretário
Reynaldo Miranda de Castro e como secretária executiva Shirley Antunes. O Instituto de
Terra do Município de Maués e Conselho Municipal de Desenvolvimento e Meio Ambiente
está acoplado a esta secretaria.
O secretário Jackson Monteiro Martins e o secretário executivo Manoel Rodrigues
Filho são os responsáveis pela Secretaria Municipal de Administração e Planejamento. E o
Sistema de Previdência Própria Municipal está ligada à instituição. A Secretaria Municipal de
Saúde possui o secretário Ildnav Mangueira Trajano e trabalha com os seguintes órgãos:
Conselho Municipal de Saúde, Unidade Mista de Maués e Conselho Municipal de Combate as
Drogas.
Maués também tem a Secretaria Municipal de Cultura e Turismo, dirigida por Ademar
Gruber; de Finanças, Audízia Lobo; da Juventude e Lazer, Marcos Antonio Coelho; de Obras,
José Bruno Simões; de Fomento, Produção e Abastecimento, Luiz Antonio Nascimento.
Nhamundá
O prefeito de Nhamundá é Mário Jose Chagas Paulain e o vice-prefeiro Izaias Gomes
Rossy. O partido é o PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro). O presidente da
Câmara Municipal é Cleudo de Oliveira Tavares.
Os vereadores que mais se destacam são os chamados Sebastião Machado e Jucelino
Furtado.
Parintins
A prefeitura de Parintins é regida por Frank Luiz da Cunha Garcia e seu vice-prefeito
Messias Wilson de Medeiros, ambos filiados ao PSDB (Partido da Social Democrata
Brasileira). A Câmara Municipal tem como presidente Juscelino Melo Manso.
O município conta com oito secretarias, sendo elas: de Juventude e Cultura; do Meio
Ambiente; de Saúde, de Educação; de Obras; de Administração e Finanças; de Cultura e
Turismo; de Assistência Social e Trabalhista.
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São Sebastião do Uatumã
Carlos da Silva Amora e Fernando Washington são o prefeito e vice-prefeito do
município de São Sebastião do Uatumã, respectivamente. Ambos são filiados ao PMDB
(Partido do Movimento Democrático Brasileiro). O presidente da Câmara Municipal é
Guimaro Monteiro de Miranda.
Urucará
O economista Fernando Falabella é o prefeito da cidade de Urucará e o vice-prefeito é
Marcos Antonio Magalhães de Carvalho. Filiados ao PMDB (Partido do Movimento
Democrático Brasileiro). O presidente da Câmara Municipal é Evandro Guimarães da Cunha.
3.2. Identidade Territorial
As entrevistas realizadas para coleta de informações do indicador Social de Identidade
Territorial foram realizadas com todos os membros do do Baixo Amazonas. As entrevistas
foram realizadas em três excursões ao campo de pesquisa: a primeira excursão compreendeu
os municípios de Parintins, Barreirinha, Boa Vista do Ramos e Maués; a segunda excursão
compreendeu os municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará e a terceira excursão
compreendeu os municípios de Parintins e Nhamundá. No quadro 6 está especificada a lista
de entrevistados:
Quadro 6 – Lista dos entrevistados
BARREIRINHANome EntidadeJozivan dos Santos Souza Câmara Municipal Francisco dos Reis Andrade Sindicato dos Trabalhadores Rurais Azenilton Gomes Conceição Secretaria Municipal de EducaçãoDomingos Sávio Santos Dutra Colônia dos Pescadores Z-45Edson Carlos Viana Federação das Organizações Quilombolas José Edvan de Souza Machado Secretaria Municipal de ProduçãoAnderson Barros Serrão IDAMJoão Paulo Brandão Beltrão Associação ComercialMarcos Antônio Araújo Secretaria Municipal de Meio AmbientePaulo Afonso Cruz Belém Associação de Pequenos CriadoresNHAMUNDÁAntônio Duque de Souza Secretaria Municipal de EducaçãoFrancinete Guerreiro Costa Secretaria de Assistência SocialDina Maria Costa e Costa Associação de MulheresDickson Rodrigues Jacaúna Câmara MunicipalEnéas Cardoso Gonçalves Secretaria de Produção
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Moysés Augusto dos Santos Serrão Colônia dos PescadoresAdarlene Gomes Reis Sindicato dos TrabalhadoresJoão Batista Nogueira Cooperativa de FrutasRaimundo Oscar IDAMURUCARÁMariza Onete Pimentel Colônia de Pescadores Z-28Francisco Tavares Pinto Secretaria de Meio AmbienteDarsone Maria Zuane Gomes Secretaria de Educação e CulturaHonorato Bulcão de Matos Associação de Produtores RuraisPedro Manoel Braga Paes IDAMMatheus Garcia Paes Secretaria de ProduçãoJosé Alfredo Maia Pontes Sindicato dos TrabalhadoresOdiélio Nascimento dos Santos Fabrísio Albertine dos Santos Andrade Osmaison da Costa Gonsalves Associação dos Pequenos ProdutoresSÃO SEBASTIÃO DO UATUMÃRegina Lúcia Lima Moraes Associação dos CostureirosRaimundo Colares Chaves Câmara MunicipalCarlos Amora Prefeitura MunicipalClaudete da Cruz Lourenço Secretaria de EducaçãoCelso Melo da Silva IDAMMaria do Rosário Cabral Vieira Associação de Trabalhadores RuraisOrlando da Cunha Oliveira ConstróiElienai Barreto da Silva Colônia dos Pescadores Z-28João Chaves Furtado Sindicato dos TrabalhadoresAdriana Cristina Ferreira Pereira Secretaria de Assistência SocialBOA VISTA DO RAMOSVanesse Socorro Martins de Mato Secretaria de Meio AmbienteJair Rodrigues Arruda Cooperativa de Criadores de AbelhasAdalberto Nascimento Pinheiro Associação da Casa Familiar RuralFeliciana da Silva Barros Secretaria de EducaçãoGlaucenilda Pereira de Menezes Sindicato dos TrabalhadoresLuiz Cantalixto de Melo Secretaria de SaúdeIsaac de Oliveira Lima Colônia dos PescadoresAlexandre Lobo Pinheiro Vaz IDAMRaimundo da Silva Costa Cooperativa Mista AgropecuáriaMAUÉSLuiz Antônio Nascimento Secretaria de ProduçãoViviane dos Santos Oliveira Secretaria de Desenvolvimento e Meio AmbienteEliaque Alegria de Lima Sindicato dos TrabalhadoresEdy Carlos Cardoso dos Santos Associação dos Técnicos AgrícolasEulálio Macedo IFAMJoão Abraim da Silva Cooperativa AgropecuáriaMiguel Gonçalves Secretaria de ProduçãoMaria da Silva Batista Consórcio dos Produtores Sateré MawéRaimundo Mendes Leal Filho IDAMPARINTINSEdnaldo Oliveira da Silva Sindicato dos Trabalhadores RuraisJosé de Oliveira Ramos Centro Estadual de Unidade ConservaçãoAnselmo Ferreira Garcia Conselho Geral das Tribos Sateré-MawéTiago Viana UFAMAntônio Pereira Soares CEDARPLucivaldo Ribeiro Pereira Secretaria de Produção e Abastecimento
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Marcia de Souza Costa Sindicato dos PescadoresKlinger Reis Oliveira Cooperativa dos Técnicos em AgropecuáriaJoel Bentes Araújo Filho IBAMAJossinéias Cunha Farias Câmara MunicipalFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
A construção de uma perspectiva política e administrativa baseada no uso potencial da
noção de território perpassa pela utilização de aspectos que estão fundamentados na
abrangente definição de identidade. Falar de identidade requer alguns cuidados fundamentais,
sobretudo, quando pretendemos estabelecer limites no processo de definição de algo tão
diversificado e ambíguo. A partir deste cenário de produção e reprodução do conhecimento,
buscaremos apresentar algumas reflexões acerca da realidade encontrada em cada um dos
municípios que compõem o território do Baixo Amazonas, trata-se de elaborar uma
perspectiva inicial de compreensão da realidade encontrada a partir da identificação de
aspectos característicos do território, fundamentais para a noção de identidade territorial aqui
desenvolvida.
Buscaremos entender a noção de território a partir das contribuições de Rogério
Haesbaert. O autor afirma que o espaço não forma, necessariamente, a identidade, em outras
palavras não basta uma delimitação geográfica para a formação da identidade de um
determinado grupo. A identidade é formada a partir de forças políticas e simbólicas que se
produzem e reproduzem em uma determinada territorialidade. Só podemos perceber a ideia de
identidade a partir da concepção de espaço produzido, de territorialização como um processo
de reprodução social.
Por essa razão, alguns teóricos contemporâneos afirmam a existência de um processo
de desterritorialização, dito de outro modo, o fim dos territórios com a crescente globalização
do mundo. Para Haesbaert mais que perda dos territórios o que podemos perceber e discutir é
a formação de processo de (re)territorialização, onde são construídos territórios múltiplos e
complexos. Estamos diante de multiterritorialidades.
Os territórios surgem com duplas conotações – material e simbólica – tanto quanto
espaços de apropriação como espaços de dominação. Um espaço se faz território a partir de
processos de apropriação e dominação. Por essa razão, os territórios devem ser entendidos
como múltiplo em suas manifestações, relações e organizações. Mas o território não está
vinculado apenas a sua esfera político-administrativa, envolve relações simbólicas, culturais e
econômicas, envolve o modo como as pessoas fazem uso do seu espaço e dão significado ao
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lugar (HAESBAERT, 2004). De acordo com Haesbaert são objetivos da territorialização,
figura 16:
Figura 16 – Objetivos da territorialização Fonte: Haesbaert, 2004.
Nesse caso, estamos falando de territorializações efetivamente múltiplas, pois
envolvem multiterritorialidades construídas pelos grupos locais em conexão com outros
territórios e grupos, de forma multifuncional e multi-identitária. Levando em consideração a
definição de território adotada por Haesbaert podemos entender o território como um espaço
caracterizado por multiterritorialidades, múltiplas dimensões e múltiplas funções. Devemos
compreender o território dentro uma perspectiva político-cultural, destacando não apenas
aspectos políticos, mas aspectos simbólicos e culturais.
Trata-se de evidenciar elementos socioculturais, relacionados às questões regionais
que historicamente foram construídas e associadas às identidades territoriais. Como é o caso
do processo de territorialização buscar redefinir o papel que a agricultura familiar teria nesse
processo de identificação. Tal como foi identificado na pesquisa pelos próprios membros do
CODETER (quadro 7):
Quadro 7 – Definição da identidade territorial
O que define a identidade territorial?
GRUPO 1A agricultura familiar define a identidade territorial, pois muitos da agricultura familiar não estão ligados só na terra, pois os ribeirinhos plantam mandioca, hortaliças e pescam, caçam, criam gado. Processo histórico da redistribuição do espaço físico e geográfico. Aspecto geográfico da rede fluvial que naturalmente mobilizou o fluxo
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GRUPO 2 para a Ilha Tupinabarana, transformando-a em centro micro-regional. Econômico – extrativismo (pesca e agricultura). Características humanas do território – caboclos e indígenas. Questão ambiental – recursos naturais – abundante e ameaçado.
GRUPO 3
É uma organização que visa o bem comum para os municípios que participam geograficamente do Baixo Amazonas. Nesse sentido, engloba-se economicamente a agricultura familiar que pode ser ressaltada como forte fator de sobrevivência dessa região. Representam-se de forma positiva, pois sabe-se que muitos projetos estão voltados para uma área. No entanto, é importante fortificar a agricultura familiar por meio de mais recursos para os municípios envolvidos.
GRUPO 4 1) Agricultura Familiar (mandioca, mel de abelhas nativas, guaraná, etc.);1) Instituições que compõe o Territorial com objetivos comuns; A Cultura Territorial; Divisão geográfica; Recursos Ambientais (madeira, água, extrativismo, minério); Municípios com mesmos problemas/gargalos parecidos; Recursos Pesqueiros; Meio de Transporte (fluvial); Baixa renda dos Agricultores familiares; Métodos primitivos na produção; Falta de conhecimentos técnicos mais evoluídos; Falta de Plano Diretor nos Municípios (na maioria são Planos de governo); Falta de profissionais capacitados para o desenvolvimento dos Municípios: Engenheiro de Pesca, Agrônomo, Veterinário, Engenheiro Florestal, etc.
GRUPO 5 Agricultura familiar, envolvendo todas as suas atividades (pesca artesanal, extrativismo e as questões ambientais). A agricultura familiar nos municípios que compõem o Baixo Amazonas tem em comum questões culturais e socioeconômicas.
Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Entendendo o território do Baixo Amazonas a partir desta perspectiva múltipla e
complexa buscaremos destacar alguns aspectos importantes para a caracterização deste
território, tomando como referência a noção de identidade territorial trabalhada pela
Secretaria de Desenvolvimento Territorial – SDT. Para a SDT a construção dos territórios da
identidade constitui o eixo estratégico do programa governamental, nesse momento, cabe a
construção de estruturas territoriais e a sua delimitação pelos atores sociais envolvidos
(quadro 7).
Não podemos esquecer que os critérios para a definição e delimitação dos territórios
foram formados por duas fases: regionalização e universo de atuação. A fase da
regionalização envolve a construção de espaços de ação da SDT, tomando como referência a
microrregionalização do Brasil. A fase da definição do universo de atuação envolve
hierarquização, seleção de microrregiões, territorialização, regionalização, tipologias,
indicadores e programas. O processo de reconhecimento das identidades territoriais é
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gradativo, pois envolve outros aspectos como delimitação e regionalização, contudo, podemos
elencar alguns aspectos considerados importantes na definição dos limites do território rural
do Baixo Amazonas:
Figura 17 – Definição dos limites do Baixo AmazonasFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Com relação à definição dos limites do território foram destacados alguns aspectos
considerados importantes para a definição do que seria o território do Baixo Amazonas (figura
17). Apesar da definição envolver aspectos genéricos de classificação, cabe ressaltar o
destaque dado a agricultura familiar como um aspecto fundamental para definição do
território. A agricultura familiar constitui o aspecto definidor do território, seguido das
comunidades tradicionais e dos recursos naturais. O resultado indica a forte presença dos
segmentos da sociedade civil no processo de definição do território do Baixo Amazonas.
Seguindo a mesma perspectiva analítica, destacamos as características marcantes do território,
nesse caso, a agricultura familiar e os recursos naturais (figura 18).
A indicação da gricultura familiar como aspecto definidor da identidade territorial
marca a forte presença deste grupo social na região, sendo responsável pelo processo de
territorialização do Estado. Contudo, o reconhecimento da agricultura familiar como elemento
central para o processo de desenvolvimento regional ainda parece preso aos discursos
políticos locais.
51
Figura 18 – Características marcantes do Baixo Amazonas Fonte: UFAM/NUSEC/SDT
A definição de características marcantes está relacionada aos aspectos considerados
importantes na visão de futuro para o território (figura 18). Tal como foi indicado nos gráficos
anteriores, os aspectos considerados mais importantes para o futuro são: recursos naturais,
agricultura familiar e atividades econômicas:
Figura 19 – Visão de futuro Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Entre a visão de futuro e a as metas e objetivos do território podemos perceber resultados
diferenciados, pois enquanto na visão de futuro o aspecto mais importante foram os recursos naturais,
para as metas e objetivos o aspecto considerado mais importante foi à agricultura familiar (figura 19).
52
É importante destacar que o aspecto movimentos sociais e políticos foi indicado várias vezes como
presente nos objetivos e metas do território. A figura 20 indica os aspectos considerados importantes
nas metas e objetivos propostos para o desenvolvimento do território do Baixo Amazonas:
Figura 20 – Metas e objetivos do território Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Em síntese, a agricultura familiar desempenha importante papel na formação do que
estamos definindo como identidade territorial. Na percepção dos entrevistados o território do
Baixo Amazonas como a maioria dos territórios da Amazônia são definidos em função das
atividades econômicas e de desenvolvimento produzidas nas áreas rurais. Contudo, não
podemos esquecer que o processo histórico de distribuição física contou como fator
fundamental para a constituição desta identidade antes mesmo de uma divisão político-
administrativa. A rede fluvial na opinião dos entrevistados assume grande importância nesse
contexto, considerando que envolve naturalmente os grupos sociais que vivem no território.
Indicar a agricultura familiar como o aspecto definidor dessa identidade significa
identificar um aspecto que engloba atividades importantes como o extrativismo animal e
vegetal e a agricultura. Além disso, a agricultura constitui a principal fonte de sustento para as
famílias locais, pois dá conta da diversidade de ambientes e modos de vida da região
amazônica. A região é marcada pela sazonalidade e diversidade de paisagens, o que obriga o
morador local a desenvolver diferentes modos de sustento para garantir sua sobrevivência.
53
Este indicador social foi construído a partir das entrevistas realizadas com cada um
dos membros do Colegiado Territorial do Baixo Amazonas, representa a percepção do
CODETER no que diz respeito a identidade territorial. Cada indicador de identidade possui
uma variação entre 0 (zero) e 1 (um), sendo que, o valor 1(um) indica maior influência da
identidade nos aspectos chaves de desenvolvimento do território, e, 0 (zero), menor influência
da identidade. Nesse caso, o indicador que mais se aproxima de 1, portanto, considerado alto,
é a agricultura familiar, seguido da economia e do ambiente. Cabe destacar que todos os
aspectos foram considerados médios altos como indicadores de identidade (figura 21).
Figura 21 – Identidade territorial do Baixo AmazonasFonte: SGE/SDT, 2010.
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A agricultura familiar, como já foi dito anteriormente, aponta a influência das
condições de desenvolvimento da agricultura local, suas organizações, os problemas e
expectativas dos agricultores. O aspecto da economia indica o efeito dos processos
produtivos, pólos de desenvolvimento, geração de emprego e da estrutura econômica local. O
fator Ambiental demonstra o peso que tem os atributos relativos aos recursos naturais, áreas
de proteção, patrimônio natural e problemas ambientais nos aspectos do desenvolvimento
territorial.
Por fim, a construção das identidades parte de uma matéria-prima fornecida por
diferentes relações e processos, esse material é processado por indivíduos e grupos sociais que
se reorganizam em função das tendências sociais/políticas e projetos culturais. Neste
momento, o que nos interessa são as identidades coletivas na perspectiva territorial,
construídas a partir do significado (objetivo/subjetivo) e o sentimento de pertencimento que
cada grupo social expressa numa determinada porção do espaço geográfico (território)
produzindo a chamada identidade territorial.
Certamente, estamos diante de um processo de (re) territorialização que gira em torno
de uma estratégia política de desenvolvimento territorial. Afinal, a territorialização pode ser
motivada por diferentes fatores (sociais, culturais, políticos, econômicos). Se a estratégia está
relacionada a dimensão política e econômica, não podemos desconsiderar as interferências
geradas em um processo histórico de ocupação, onde os fatores se relacionam e estabelecem
trocas. Trata-se d uma identidade marcada por multiterritorialidades.
Este processo de territorialização promovido pelo Programa Territórios da Cidadania
está dando seus primeiros passos, seu alcance permanece restrito as sedes municipais. Poucos
resultados podem ser contabilizados, do ponto de vista político e econômicos, nas áreas rurais
dos municípios que compõem o território. Não podemos, nesse momento, afirmar um
processo de territorialização conduzido pelo programa, tampouco uma identidade territorial
que incorpore a estratégia de desenvolvimento territorial rural. Sabemos que este processo de
construção da identidade territorial é contínuo e gradativo, requer o envolvimento direto e
ininterrupto das entidades locais.
João Pacheco de Oliveira define a noção de territorialização como um processo de
reorganização social que implica a criação de uma nova unidade sociocultural; a constituição
de mecanismos políticos especializados, redefinição do controle social sobre os recursos
ambientais; reelaboração da cultura (OLIVEIRA, 1997: 56). O colegiado territorial atua
enquanto unidade político-administrativa de capacidade organizativa e representativa, dentro
55
de um processo de territorialização e consolidação de esferas públicas baseadas em uma
democracia deliberativa. Estas esferas públicas de discussão e deliberação são formadas
dentro de um princípio paritário de gestão política, que prevê o ordenamento de ações sociais
e políticas partilhadas por segmentos da sociedade civil e do poder público.
Esta política de desenvolvimento territorial prevê condições de reflexão da noção de
desenvolvimento rural, enquanto dimensão territorial e enquanto dimensão político-social.
Permite a reconstrução de uma rede de instituições e atores sociais. Esta rede está
caracterizada aqui por um fluxo de comunicação e informação que entendemos como esfera
pública. Estas esferas públicas de discussão e deliberação atuam no âmbito de uma política de
territorialização e desenvolvimento rural, onde coabitam atores sociais e políticos. De um lado
fornecem subsídios para a formação de fluxos de comunicação e do outro utilizam a esfera
publica para influenciar sistemas políticos baseados na razão instrumental.
Até que ponto os mecanismos políticos-administrativos de participação social
constituem estratégias de controle e inibição dos processos comunicativos autônomos e
democráticos? Este processo investigativo exige a compreensão da política de
desenvolvimento territorial utilizada pelo Governo Federal, além do mapeamento das esferas
públicas de participação política dos movimentos sociais que assumem grande importância no
processo de construção social da cidadania.
3.3. Capacidades Institucionais
As entrevistas realizadas para coleta de informações do indicador Social de
Capacidades Institucionais foram realizadas com todos os membros do do Baixo Amazonas.
As entrevistas foram realizadas em três excursões ao campo de pesquisa: a primeira excursão
compreendeu os municípios de Parintins, Barreirinha, Boa Vista do Ramos e Maués; a
segunda excursão compreendeu os municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará e a
terceira excursão compreendeu os municípios de Parintins e Nhamundá. Nos quadro abaixo
está especificada a lista de entrevistados:
Quadro 8 – Lista dos entrevistados
CAPACIDADES INSTITUCIONAISJoão Paulo Ribeiro da Fonseca NhamundáMatheus Garcia Paes UrucaráJosé Edvan Souza Machado BarreirinhaVanesse Socorro Martins de Matos Boa Vista do RamosCarlos Amora São Sebastião do UatumãLuiz Antônio Nascimento Maués
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Lucivaldo Ribeiro Pereira Parintins Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Não é possível compreender a Amazônia sem mencionar as singularidades das suas
cidades. Cidades que pouco revelam da vida econômica moderna, diferentes do padrão
caracterizado como urbano em outras regiões brasileiras. Indubitavelmente, a vida nas cidades
amazônicas está ligada aos seus rios e floretas, todas as impressões deixadas nos seus
visitantes tornam-se difíceis de serem esquecidas, não pela paisagem sofisticada e atrativa,
mas pela significativa e reveladora realidade. Para José Aldemir de Oliveira:
Dessas cidades, temos a primeira visão de longe quando o barco em que navegamos se aproxima. Se for dia vemos a torre telefônica, antes víamos a torre da igreja. A viagem é longa, mas a chegada à cidade, desde que temos a primeira visão, parece interminável, dando-nos tempo para os aconteceres e para a concretização do ser (27).
Após as primeiras impressões da chegada logo nos deparamos com a transitoriedade
dos portos, onde nada é perene, tudo é transitório. Para Oliveira, o porto contém o
entendimento da cidade, pois a viagem começa e finaliza no porto; o porto é o intermediário
entre o rio, a floresta e a cidade. “O rio, a floresta e a cidade têm no porto a fronteira entre a
realidade e a ficção, possibilitando-nos leituras múltiplas de espaços-tempos diversos (27).
Ver figuras 22 e 23:
Figura 22 – Boa Vista do RamosFonte: http://bvremacao.blogspot.com
Figura 23 – Porto de UrucaráFonte: http://urucaraonline.blogspot.com
Quem chega às cidades da Amazônia se depara com a concretude de um arruamento
caótico, ausência de equipamentos urbanos, uma realidade mergulhada na inércia. Por essa
razão, é bastante complexo fornecer uma interpretação das cidades perdidas na selva, essa
interpretação é fugidia, não pode ser pautada em parâmetros lógicos e comparativos. Estamos
57
falando de uma região marcada por critérios diferenciadores que envolvem: pouca articulação
entre cidades, poucos serviços públicos básicos, muitas atividades rurais.
Obviamente o processo de construção dessas cidades está relacionado a fatores
históricos específicos da região amazônica. Em geral, essas cidades são formadas a partir de
pequenos núcleos comunitários, que crescem sem infraestrutura urbana, sobretudo, àquelas
cidades as margens dos rios que não conseguem acompanhar a dinâmica da economia. No
entanto, essas cidades não ficam livres das interferências da circulação de ideias e do acesso
aos elementos da vida moderna. Tornam-se verdadeiros cenários contraditórios:
As pequenas cidades amazônicas apresentam essa contradição: são articuladas a relações pretéritas caracterizadas pela inércia e, ao mesmo tempo, articuladas a dinamicidades contemporâneas que as ligam ao mundo, especialmente a partir da biodiversidade e da sociodiversidade (28).
Para Edna Castro construir tipologias de cidades exige um rigoroso trabalho de
interpretação e escolha de critérios, basta-nos a indicação de pelo menos alguns elementos
que se sobressaem à percepção. As cidades na Amazônia revelam um complexo sistema de
organização e entendimento, que podemos buscar compreender a partir dos atores econômicos
e das formas de ocupação. Dentro desse sistema vamos encontrar uma diversidade de
formações e modos de vida, que vão desde as regularidades observadas nas cidades históricas
decorrentes de fortificações ou aldeias até as regularidades dos padrões de ocupação à
margem dos rios com economia de base agro-extrativista (CASTRO, 2008:27).
Algumas dessas cidades de economia agro-extrativista caracterizavam-se pela intensa
atividade portuária, eram localizadas nas calhas dos principais rios, assegurando a rede de
aviamento da região. As cidades menores também desempenham importante papel na
economia regional, onde os rios são incorporados como eixos de avanço e ligação. As poucas
estruturas urbanas construídas ao longo de processo de formação dessas cidades serviram para
atrair força de trabalho, apropriação fundiária e atividade econômica. Muitas dessas cidades
geraram novos fluxos de interesse e investimento, aumentaram formas de mobilidade e
interação entre cidades.
Nesse processo, os marcos institucionais locais, e sua relação com a institucionalidade
externa que têm incidência sobre o local, são elementos importantes para a compreensão dos
processos de desenvolvimento de cada região em particular. A construção social de um
território e a definição de sua identidade cultural é uma ação coletiva, determinada em
conjunto com um marco institucional que regula as atividades dos atores locais que
participam do processo de construção. Com base no papel que as institucionalidades
58
desempenham na gestão dos Colegiados Territoriais, buscaremos destacar as análises acerca
da capacidade institucional do território do Baixo Amazonas.
Iniciaremos destacando o papel cumprido pelos conselhos municipais em suas
articulações institucionais. Os principais conselhos existentes no Baixo Amazonas são os
Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável e os Conselhos de Saúde,
ambos com 24% de indicação (figura 24). Embora esses alguns desses conselhos estejam
presentes nos municípios do Baixo Amazonas, a maioria dos entrevistados afirma que eles
não possuem um nível de controle consolidado, aliás possuem poucas articulações com as
entidades sociais e políticas locais. E alguns municípios o próprio CMDRS não possuem
atuação, obviamente o nível de atuação é diferenciado, varia de município para município.
Figura 24 – Conselhos do Baixo Amazonas Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Não basta a existência dos conselhos municipais, eles precisam revitalizar suas ações e
cumprir seu importante papel na organização e controle municipal. Alguns entrevistados
sugerem que haja algum tipo de intervenção no sentido de garantir mudanças na forma de
atuação dos conselhos municipais, discussões em torno do CODETER, articulações que
devem ser estabelecidas para o seu pleno desenvolvimento.
Os conselhos são órgãos coletivos e de tomada de decisões, são agrupamentos de
pessoas que deliberam sobre alguma importante decisão. Apareceram nas sociedades
organizadas desde a Antigüidade e existem hoje, com denominações e formas de organização 59
diversas, em diferentes áreas da atividade humana. Seu sentido pode ser buscado na
etimologia greco-latina do vocábulo. Em grego, refere à “ação de deliberar”, “cuidar”,
“cogitar”, “refletir”, “exortar”. Em latim, traz a idéia de “ajuntamento de convocados”, o que
supõe participação em decisões precedidas de análises, de debates.
Toma-se como pressuposto a idéia de que os conselhos, na função de intermediação
entre o Estado e a sociedade, traduzem ideais e concepções mais amplas que, em cada
momento histórico, influenciam a dinâmica das políticas em pauta. Na atualidade, a
constituição de conselhos tem sido percebida como a abertura de espaços públicos, de
participação da sociedade civil, caracterizando a ampliação do processo de democratização da
sociedade. Como explica Bobbio (1986, p.54), trata-se da ocupação, pelas formas da
democracia representativa, de espaços até agora dominados por organizações hierárquicas e
burocráticas, nas quais estão presentes a “exigência e o exercício efetivo de uma sempre nova
participação”.
Tão importante quanto os conselhos são as entidades que prestam apoio às áreas rurais
dos municípios, considerando que grande parte dessas entidades está vinculada aos setores da
própria sociedade civil e da igreja. De acordo com os entrevistados, as entidades que
fornecem esse apoio não conseguem estabelecer relações com as entidades do poder público,
de modo que atuam de forma independente junto às comunidades rurais. Tal como mostra a
figura 25, as associações de agricultores familiares, os grupos de mulheres, os sindicatos de
trabalhadores rurais e as entidades religiosas são as entidades que fornecem algum tipo de
apoio às áreas rurais.
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Figura 25 – Segmentos de apoio às áreas rurais Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010
As principais dificuldades não estão relacionadas apenas ao fornecimento de apoio e
assistência às áreas rurais, mas ao pouco conhecimento sistematizado acerca do interior do
Estado do Amazonas, apesar de existirem inúmeros estudos voltados para as áreas rurais
poucos dão conta de questões pontuais e voltadas para a correção de políticas públicas. Até o
momento poucas informações são disponibilizadas sobre as áreas de produção, tipos de
produção e principais dificuldades encontradas pelos produtores e agricultores rurais. Sem
falar do problema da comercialização e escoamento da produção, que constitui um dos
grandes gargalos do setor primário na região amazônica.
No quadro 9, os membros do CODETER Baixo Amazonas expressaram suas
percepções com relação as capacidades institucionais do território do Baixo Amazonas,
destacando os aspectos considerados problemáticos e as potencialidades observadas na gestão
social do Programa Territórios da Cidadania:
Quadro 9 – Percepção dos entrevistados em Oficina
GRUPO I
Ausência de participação do poder público para as políticas públicas do território do Baixo Amazonas. Meio Ambiente: aterro sanitário; manejo adequado na pecuária; preservação.Assistência Técnica: assistência técnica especializada;Comunicação: criação de associação de comunicação do poder público; Não há gestão adequada;
61
GRUPO 2Meio ambiente: parcerias com instituições governamentais e não-governamentais;Assistência Técnica: Estrutura para escoamento dos produtores;Comunicação: informática para todos (comunidades rurais);Projetos de apoio: Incentivar através de recursos;
GRUPO 3
Posição estratégica dos municípios que não estão sendo utilizados. Existência dos Conselhos Municipais mesmo funcionando precariamente. A desarticulação dos Conselhos. Monopólio do poder público. Prefeituras inadimplentes.Meio ambiente: estruturar as secretarias de meio ambiente e facilitar a comercialização interna dos municípios. Agregando valor ao município, gerando trabalho e encargos sociais.Assistência técnica: existe uma precariedade no serviço, com nova proposta priorizando o tripé: produção, administração da propriedade e organização social.Comunicação: rádios comunitárias, folders, cartilhas e o compromisso das instituições em divulgar.Projetos de apoio: recursos para mobilização dos territórios e da rede territorial. Projetos acompanhados do diagnóstico e da gestão do empreendimento. Contratação de assessores na área da construção civil.
GRUPO 4
Participação e interação do colegiado. Alta rotatividade no governo. Recursos alocados. Falta de articulação entre setores da administração pública. Fortalecimento do CMDRS. Desenvolvimento territorial: as políticas públicas territoriais já implantadas; Incentivo dos órgãos ambientais para a agricultura; legislação ambiental mais divulgada; educação ambiental na grade escolar;Assistência técnica: apoio logístico aos técnicos; remuneração compatível com a graduação do técnico; Comunicação: convocar reuniões com as entidades de classe para defender o projeto macro que atenda a nível territorial;
GRUPO 5
Desvio de recursos para outras finalidades; falta de políticas publicas adequada para a Agricultura Familiar; Prefeituras inadimplentes; Inoperância dos Conselhos Municipais; Falta de Assistência Técnica adequadas ao Agricultar; Falta de infraestrutura das Secretarias Municipais; Pouco interesse dos Gestores Públicos na política Territorial; Construir Plano de Desenvolvimento Sustentável para o Território do Baixo Amazonas; Criar e apoiar Casas Familiares Rurais no Território do Baixo Amazonas; Criar um Plano para Capacitar os filhos/as dos Agricultores Familiares; Elaborar um Plano para levar Internet (banda larga) e comunicação via telefone para todas as comunidades rurais no Território do Baixo Amazonas; Definir uma Instituição no Território para receber e implementar.
Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
62
Embora grande parte dos entrevistados tenha afirmado que os investimentos
municipais são orientados por cadeias produtivas, podemos observar que esta informação
parece contraditória quando comparada com outras informações como prestação de serviços
tecnológicos, apoio às áreas rurais, disponibilização de informações, entre outras (quadro 9).
Resta saber, se os investimentos municipais são orientados por cadeias produtivas, por que às
condições de vida das famílias rurais não apresentam variação? Por que as condições e os
gargalos da comercialização não puderam ser solucionados até os dias atuais? Apesar de
existir relativa orientação por cadeias, podemos perceber que estas informações e ações não
são sistematizadas e contínuas, na maioria das vezes não apresentam resultados concretos para
os agricultores familiares, trata-se de repensar o papel que as Secretarias Municipais de
Produção estão desempenhado junto às áreas rurais (figura 26).
Figura 26 – Investimentos orientados por cadeias produtivas Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Certamente, o problema que se inicia na falta de informações e dificuldades de
comunicação terá sérios reflexos em questões posteriores, é o que ocorre com o setor
produtivo do território do Baixo Amazonas. Embora os resultados das entrevistas mostrem a
existência de acordos de venda entre produtores rurais e organizações de comercialização uma
das maiores dificuldades apontada pelos próprios agricultores é o escoamento de suas
produções, tendo em vista a ausência de organizações (associações, cooperativas) que possam
garantir o escoamento e a comercialização da produção de forma contínua e segura (figura
27).
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Figura 27 – Acordos de venda Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
A assistência técnica é de fundamental importância para qualquer tipo de atividade
comercial que seja desenvolvida atualmente, pois os grupos que não dispõem de assistência
técnica não tem condições competitiva de se lançar no mercado. Em relação à assistência
técnica rural, por suas características próprias, onde se trabalha com um público heterogêneo
em condições sociais, econômicas, educacionais e culturais podemos dizer que a assistência
técnica torna-se mais complexa. Por essa razão, é obrigação do Estado propiciar estes serviços
para os agricultores familiares, mas entende-se que os processos de se oferecer estes serviços
não necessitam ser iguais e homogêneos para todos. Atualmente, muitos agricultores não
dispõem de assistência técnica e até que estes serviços aconteçam o agricultor não poderia
ficar esperando.
Pergunta-se: Se temos profissionais sendo formados todos os anos como Engenheiros
Agrônomos, Médicos Veterinários, Zootecnistas, Técnicos Agropecuários e tantos outros;
conjugado com a falta de assistência técnica que a maioria dos agricultores tem, por que então
não temos uma política capaz de mostrar como a assistência técnica poderia ajudar a
viabilizar economicamente as propriedades e que os próprios agricultores passassem a
remunerar estes serviços? Temos que romper o ciclo da pobreza onde os serviços públicos são
oferecidos, em teoria, gratuitamente para todos, mas com uma qualidade questionável.
Trata-se de pensar em estratégias que possam corrigir as deficiências inerentes na
forma como a política voltada para o setor produtivo local está sendo conduzida.
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Figura 28 – Serviços tecnológicos Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Como é possível observar na figura 28, grande parte dos entrevistados afirmaram que
há cerca de 1 a 3 entidades que prestam serviços tecnológicos em seus municípios, sendo ela o
IDAM, as Secretarias de Produção Municipais e algumas instituições de ensino (IFAM,
UFAM, UEA). Esta realidade varia de município para município, portanto, as duas entidades
que estão presentes em todos os municípios são: Instituto de Desenvolvimento Agropecuário
e Florestal Sustentável do Amazonas - IDAM e Secretaria Municipal de Produção. A
existência de outras entidades de apoio técnico vai depender da dinâmica política e econômica
de cada um dos municípios, como é o caso do município de Maués que possui uma
Associação de Técnicos Agrícolas de Maués – ASTAMUS.
Além disso, por mais que existam entidades de assistência técnica nestes municípios, a
infraestrutura disponibilizada para elas é precária e insuficiente quando estamos falando de
um Estado com dimensões continentais, como o Estado do Amazonas. Poucos técnicos são
disponibilizados nos IDAMs e Secretarias de Produção, estes técnicos não dão conta da
quantidade de áreas diferenciadas que precisam dos mais diversificados tipos de apoio.
Portanto, não podemos reduzir e limitar a política de desenvolvimento agrícola do Estado a
distribuição de sementes e campanhas de vacinação.
Afinal essas entidades de assistência técnica possuem um importante papel na
divulgação de informações comerciais no Território do Baixo Amazonas, sendo que grande
parte das informações obtidas sobre a comercialização e os produtos de cada município são
65
encontradas, principalmente, nas Prefeituras Municipais e em entidades de assistência técnica
como o IDAM.
Figura 29 – Informações comerciais Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Com relação a este item podemos perceber grande imprecisão nas respostas, apesar
dos entrevistados afirmarem existir acesso a informações comerciais ao mesmo tempo não
conseguiam repassar maiores informações acerca das atividades produtivas locais. Na
verdade, esta imprecisão esteve presente em várias temáticas abordadas nas entrevistas, uma
delas foi a temática referente ao meio ambiente. O que podemos perceber é que poucas ações
estão sendo destinadas para as questões ambientais, a temática ambiental continua sendo
secundária nos momentos propositivos, não que está temática não seja importante na visão
dos entrevistados, mas não é prioritária quando questões voltadas para a educação, saúde e
habitação não foram resolvidas. No território do Baixo Amazonas apenas três municípios
possuem secretarias do Meio Ambiente: Parintins, Boa Vista do Ramos e Maués (figura 29).
66
Figura 30 – Normas para conservação dos recursos naturaisFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Quando questionados sobre as normas expedidas pelas prefeituras para conservação
dos recursos naturais, a maioria dos entrevistados afirmou que as poucas ações eram voltadas
para instruções de monitoramento e avaliação do patrimônio ambiental, poucas pessoas
afirmaram existir ações voltadas para o regulamento e manejo de resíduos e avaliação de
impactos ambientais. Juntamente com o item referente ao ordenamento do uso de solo com
20%, está a indicação de que nenhum tipo de medida está sendo tomada no que diz respeito às
questões ambientais (figura 30).
É fundamental destacar que apesar de existirem mapas que indicam quais são as áreas
degradadas ou que estão sendo degradadas, poucas ações são realizadas no sentido de conter o
avanço dos danos e impactos ambientais. Aproximadamente 71% dos entrevistados afirmaram
existir mapas de áreas degradadas, mas ao mesmo tempo afirmaram não saber das ações que
sendo voltadas para as questões ambientais. Não há dúvidas de que a gestão ambiental tem
obtido grande importância nas administrações municipais ao longo das últimas décadas, e um
marco importante deste processo foi a Lei N° 6.938, de 31 de agosto de 1981, que instituiu a
Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA). Nela está explícito que os municípios poderão
elaborar normas ambientais, desde que não entrem em conflito com as de âmbito federal e
estadual, e poderão exercer, na sua jurisdição, controle e fiscalização das atividades capazes
de provocar a degradação ambiental.
67
Figura 31 – Mapas da áreas degradadas Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Contudo, os resultados aqui apresentados demonstram que os instrumentos de gestão
ambiental, apesar de terem crescido em números absolutos e proporcionais, ainda são pouco
freqüentes na maioria dos municípios do território do Baixo Amazonas. O fato aponta para a
necessidade da implementação de políticas localizadas que estimulem mais fortemente a
instituição desses mecanismos, com o objetivo de conferir dinamicidade própria à gestão
municipal do meio ambiente (figura 31).
A capacidade se refere à habilidade de indivíduos de elaborar e implementar decisões
e desempenhar funções de uma maneira efetiva, eficiente e sustentável. No nível institucional,
o esforço é focalizado em capacidades organizacionais e funcionais, assim como a habilidade
institucional de adaptar-se à mudança. O conceito de capacidade institucional é um alvo
movente desde que o campo evoluiu ao longo dos anos a partir de um foco inicial no
desenvolvimento e fortalecimento de organizações individuais e provimento de treinamento
técnico e gerencial para suportar o planejamento integrado e os processos de decisão entre
instituições.
A capacidade institucional é o resultado da análise comportamental focando as ações
dos governos em definir a capacidade das organizações públicas. Estas definições assumem
que a capacidade institucional é a habilidade de realizar funções, tornando a autonomia
importante “para realçar a potencialidade de governos locais as execuções de forma
inteligente e eficiente sob seu próprio direcionamento”. A capacidade institucional tem outro
significado: a habilidade de escolher que fins perseguir e a disposição para tomar atitudes
buscando atingi-los.68
A capacidade institucional refere-se ao funcionamento de ‘regras do jogo’ adequadas e
que funcionem na organização ou entre organizações para atingir objetivos, realizar tarefas e
de se ajustar constantemente frente a novos desafios. Há diversas instituições formais e
informais operando entre e em volta de um sistema ou programa. Por essa razão, ao
avaliarmos as capacidades institucionais que giram em torno da gestão municipal do território
do Baixo Amazonas podemos perceber que na percepção dos entrevistados muitas
dificuldades são encontradas, sobretudo, no que diz respeito: aos serviços institucionais
disponíveis (0,2), mecanismos de solução de conflitos (0,3), instrumentos de gestão municipal
(0,4) e infraestrutura municipal (0,4). Ver figura 32:
Figura 32 – Indicadores de Capacidades InstitucionaisFonte: SGE/SDT, 2010.
Estes itens variam em uma escala de médio baixo a médio, sendo que nenhum dos
itens recebeu a indicação de alto. O item que obteve melhor destaque foi a própria gestão dos
colegiados e a sua capacidade organizacional. Deste modo, podemos concluir que em termos
69
de capacidades institucionais o território do Baixo Amazonas apresenta inúmeras
dificuldades, que variam desde a questão infraestrutural até a capacidade de articulação
interinstitucional.
O item referente a serviços institucionais disponíveis foi o mais problemático na visão
dos entrevistados, revelando como está caracterizado o cenário das capacidades institucionais
no Baixo Amazonas, um fator altamente comprometedor para o desenvolvimento de uma
política que está fundamentada em uma perspectiva paritária de gestão pública e social. Como
podemos pensar em construir uma nova política se não se pode contar com a estrutura mínima
se serviços institucionais?
Entendemos que, neste momento, é preciso rever alguns objetivos e investimentos
governamentais, a fim de que possamos indicar os alcances obtidos com esta política de
desenvolvimento territorial. Precisamos saber sobre quais alicerces está sendo construída esta
política.
Dos indicadores elaborados no território do Baixo Amazonas, o indicador de
Capacidades Institucionais foi o que apresentou resultados inferiores, aspectos este que pode
ser relacionado aos resultados obtidos em outros indicadores como Gestão do Colegiado e
Condições de Vida, que mostram como insatisfatória a gestão pública que está sendo
desenvolvida nos territórios rurais. Tanto os membros do poder público, quanto os membros
da sociedade civil concluem que a participação do poder público tem deixado muito a desejar,
aliás este cenário tem sido percebido, claramente, nas ausências dos representantes do poder
público em reuniões do CODETER. Trata-se de analisar e investigar, mais
verticalizadamente, os fatores que estão produzindo esta falta de interesse e envolvimento dos
gestores públicos municipais nos assuntos que dizem respeito ao território. Afinal, este
posicionamento tem comprometido, de forma significativa, o desenvolvimento da gestão dos
Colegiados Territoriais e as suas capacidades institucionais.
3.4. Gestão do Colegiado
As entrevistas realizadas para coleta de informações do indicador Social de
Acompanhamento da Gestão do Colegiado Territorial foram realizadas com todos os
membros do Colegiado Territorial do Baixo Amazonas. As entrevistas foram realizadas em
três excursões ao campo de pesquisa: a primeira excursão compreendeu os municípios de
Parintins, Barreirinha, Boa Vista do Ramos e Maués; a segunda excursão compreendeu os
municípios de São Sebastião do Uatumã e Urucará e a terceira excursão compreendeu os
70
municípios de Parintins e Nhamundá. Nos quadro abaixo está especificada a lista de
entrevistados:
Quadro 10 – Lista dos entrevistados
BARREIRINHANome EntidadeJozivan dos Santos Souza Câmara Municipal Francisco dos Reis Andrade Sindicato dos Trabalhadores Rurais Azenilton Gomes Conceição Secretaria Municipal de EducaçãoDomingos Sávio Santos Dutra Colônia dos Pescadores Z-45Edson Carlos Viana Federação das Organizações Quilombolas José Edvan de Souza Machado Secretaria Municipal de ProduçãoAnderson Barros Serrão IDAMJoão Paulo Brandão Beltrão Associação ComercialMarcos Antônio Araújo Secretaria Municipal de Meio AmbientePaulo Afonso Cruz Belém Associação de Pequenos CriadoresNHAMUNDÁAntônio Duque de Souza Secretaria Municipal de EducaçãoFrancinete Guerreiro Costa Secretaria de Assistência SocialDina Maria Costa e Costa Associação de MulheresDickson Rodrigues Jacaúna Câmara MunicipalEnéas Cardoso Gonçalves Secretaria de ProduçãoMoysés Augusto dos Santos Serrão Colônia dos PescadoresAdarlene Gomes Reis Sindicato dos TrabalhadoresJoão Batista Nogueira Cooperativa de FrutasRaimundo Oscar IDAMURUCARÁMariza Onete Pimentel Colônia de Pescadores Z-28Francisco Tavares Pinto Secretaria de Meio AmbienteDarsone Maria Zuane Gomes Secretaria de Educação e CulturaHonorato Bulcão de Matos Associação de Produtores RuraisPedro Manoel Braga Paes IDAMMatheus Garcia Paes Secretaria de ProduçãoJosé Alfredo Maia Pontes Sindicato dos TrabalhadoresOdiélio Nascimento dos Santos Fabrísio Albertine dos Santos Andrade Osmaison da Costa Gonsalves Associação dos Pequenos ProdutoresSÃO SEBASTIÃO DO UATUMÃRegina Lúcia Lima Moraes Associação dos CostureirosRaimundo Colares Chaves Câmara MunicipalCarlos Amora Prefeitura MunicipalClaudete da Cruz Lourenço Secretaria de EducaçãoCelso Melo da Silva IDAMMaria do Rosário Cabral Vieira Associação de Trabalhadores RuraisOrlando da Cunha Oliveira ConstróiElienai Barreto da Silva Colônia dos Pescadores Z-28João Chaves Furtado Sindicato dos TrabalhadoresAdriana Cristina Ferreira Pereira Secretaria de Assistência SocialBOA VISTA DO RAMOSVanesse Socorro Martins de Mato Secretaria de Meio AmbienteJair Rodrigues Arruda Cooperativa de Criadores de Abelhas
71
Adalberto Nascimento Pinheiro Associação da Casa Familiar RuralFeliciana da Silva Barros Secretaria de EducaçãoGlaucenilda Pereira de Menezes Sindicato dos TrabalhadoresLuiz Cantalixto de Melo Secretaria de SaúdeIsaac de Oliveira Lima Colônia dos PescadoresAlexandre Lobo Pinheiro Vaz IDAMRaimundo da Silva Costa Cooperativa Mista AgropecuáriaMAUÉSLuiz Antônio Nascimento Secretaria de ProduçãoViviane dos Santos Oliveira Secretaria de Desenvolvimento e Meio AmbienteEliaque Alegria de Lima Sindicato dos TrabalhadoresEdy Carlos Cardoso dos Santos Associação dos Técnicos AgrícolasEulálio Macedo IFAMJoão Abraim da Silva Cooperativa AgropecuáriaMiguel Gonçalves Secretaria de ProduçãoMaria da Silva Batista Consórcio dos Produtores Sateré MawéRaimundo Mendes Leal Filho IDAMPARINTINSEdnaldo Oliveira da Silva Sindicato dos Trabalhadores RuraisJosé de Oliveira Ramos Centro Estadual de Unidade ConservaçãoAnselmo Ferreira Garcia Conselho Geral das Tribos Sateré-MawéTiago Viana UFAMAntônio Pereira Soares CEDARPLucivaldo Ribeiro Pereira Secretaria de Produção e AbastecimentoMarcia de Souza Costa Sindicato dos PescadoresKlinger Reis Oliveira Cooperativa dos Técnicos em AgropecuáriaJoel Bentes Araújo Filho IBAMAJossinéias Cunha Farias Câmara Municipal
Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
O crescimento e a organização de movimentos sociais em torno de demandas de
participação e cidadania tornou-se um fenômeno de grande interesse e relevância para a
compreensão das mudanças e transições sociais presentes nas relações sociais e políticas na
Amazônia. No centro deste debate estão as ações coletivas que trazem para o cenário político
a possibilidade de transformação, sobretudo, das relações sociais em uma região que sempre
foi tratada como lócus de modelos de dominação tradicional. Diante de uma diversidade de
ações coletivas de mobilização, um aspecto, em particular, tem sido de grande importância
para a criação de uma cultura política de base democrática, trata-se da recorrência aos
movimentos sociais para atuarem como interlocutoras perante o Estado. E, principalmente, a
forma como eles estão respondendo a este processo de articulação e participação.
Essa participação no processo de descentralização está diretamente vinculada à
implantação de uma política de desenvolvimento territorial das áreas rurais do país, onde é
possível encontrar maior organização entre setores populares. Ainda que estas pessoas
estejam motivadas por interesses imediatos, em um primeiro momento, sabemos que elas 72
percebem o papel que podem desempenhar nesse processo, haja vista a mobilização realizada,
arduamente, para o alcance de objetivos comuns.
Esses grupos mostram como constroem sua participação política em um contexto de
fragmentação e desigualdade social, para isso são criados mecanismos de participação política
que transmitem suas demandas sociais. Esse processo suscita o desenvolvimento de formas de
mobilização e construção de identidades coletivas. Nesse contexto, há um fator novo e
diferenciador, que não é o processo de organização social desses grupos apenas, mas o papel
atribuído ao sujeito por ele mesmo.
Sem dúvida, esta política de desenvolvimento rural apresenta como estratégia
inovadora a participação legítima dos movimentos sociais em esferas públicas de discussão e
decisão. Estamos diante de um quadro estimulante para a pesquisa e construção de novos
referenciais analíticos. A abordagem territorial do desenvolvimento rural exige novas
orientações e perspectivas teóricas, pois as vertentes tradicionais não dão conta das complexas
relações sociais e políticas engendradas por esta política de construção democrática e
emancipatória. São necessários novos recortes metodológicos e teóricos que forneçam
subsídios para a compreensão das especificidades e resultados.
A construção de uma nova institucionalidade política como o território, pressupõe a
formação de novas formas de representação e de interesses políticos, econômicos e sociais.
Prevê o desenvolvimento de uma série de entraves e amarras que se dão no âmbito das
relações políticas e sociais, exigem a compreensão dos grupos sociais envolvidos e a
complexa rede de articulações estabelecidas entre eles. Um elemento fundamental para a
revitalização de uma prática política absolutamente necessária para o exercício da cidadania.
Daí a urgência em se criar uma perspectiva analítica que dê conta dos diferentes
processos e contextos relacionados à política de territorialização e desenvolvimento rural que
está curso. Trata-se de criar formas de reflexões e visibilidade das condições presentes e
criadas por esta gestão política dos territórios brasileiros, que se volte para todas as
experiências presentes, mas inexistentes das pesquisas sociais. Trata-se, portanto, de articular
conhecimentos, práticas e ações coletivas.
Com relação aos resultados obtidos com o Indicador Social do Acompanhamento da
Gestão do Colegiado buscaremos enfatizar nossas discussões em torno do tema da gestão
social nos territórios, tomando como referência os processos de desenvolvimento territorial
que estão em curso. Para isso, consideramos fundamental apresentar algumas considerações
acerca do conceito de governança territorial, tendo em vista o conjunto de iniciativas ou ações
73
que expressam a capacidade de um grupo social organizado territorialmente, como o
Colegiado Territorial, de coordenar e gerir assuntos públicos, econômicos e institucionais,
como caracterização de um processo de gestão do desenvolvimento territorial.
Tomar como parâmetro o conceito de governança territorial implica reconhecer na
sociedade civil uma fonte de poder nos processos de governança, trata-se de reconhecer a
possível correlação de interesses e necessidades entre grupos sociais específicos, de modo que
se torna difícil estabelecer divisões laterais e atribuir responsabilidades. Tal como afirma
Dallabrida e Becker (2003), o sistema de governança territorial é utilizado para referir-se ao
conjunto de estruturas em rede, através das quais os atores/agentes e organizações/instituições
territoriais atuam no planejamento e consecução das ações voltadas ao desenvolvimento
territorial. Estas estruturas em rede estabelecem diferentes relações e correlações que formam
um sistema multidimensional.
Diante de uma perspectiva de descentralização estatal vimos se estruturar a
necessidade de articulação de projetos de desenvolvimento local que estivessem baseados em
atores, capacidades e conhecimentos. Estas novas perspectivas não estão distanciadas dos
contextos nacionais e internacionais, ao contrário, precisam manter relações constantes, tal
qual um sistema que forma uma rede de relações, interações e articulações. A estrutura local
tem a finalidade de expressar as iniciativas oriundas de contextos locais. Trata-se de uma
transição do regional para o territorial.
O ponto diferenciador desse processo é expurgar do cenário local os instrumentos de
execução de políticas públicas que tendem a reproduzir políticas e relações clientelistas,
baseada na distribuição de recursos pelo Estado para obras e projetos pontuais. Os desenhos
de um governo político-administrativo descentralizado torna-se cada vez mais nítido,
tornando necessária a criação de novas formas de coordenação de agentes e instituições,
novas formas de administrar fluxos econômicos, políticos e sociais. Por essa razão, a noção de
governança territorial vai além de uma simples forma de organização econômica inter-
regional, mas englobam ferramentas sociais e políticas. Para Fuini,
A governança territorial é definida como o processo institucional-organizacional de construção de uma estratégia para compatibilizar os diferentes modos de coordenação entre atores geograficamente próximos em caráter parcial ou provisório, atendendo a premissa de resolução de problemas inéditos. Estes compromissos articulam: os atores econômicos entre si e estes com os atores institucionais-sociais e políticos, através de regras de jogo, e a dimensão local e a global (nacional ou mundial), através das mediações realizadas por atores ancorados no território (FUINI, 2011:12).
74
Analisar um sistema formando por um conjunto de relações e inter-relações é uma
tarefa difícil, pois envolve inúmeros atores sociais em um palco de representações e
articulações. No Baixo Amazonas foi possível perceber divisões, articulações e interesses
diversos a partir da aplicação do formulário de Acompanhamento da Gestão do Colegiado
Territorial, cujo principal objetivo era revelar que modo tem sido realizada a gestão do
CODETER, tomando como referência a percepção dos próprios entrevistados. Cabe ressaltar
que as entrevistas foram realizadas com todos os integrantes do CODETER Baixo Amazonas,
revelando a diversidade de grupos e opiniões, além disso, foram entrevistadas pessoas que
acompanharam o processo de desenvolvimento do colegiado, como também aqueles que estão
integrando o grupo há pouco tempo.
Apesar de o procedimento ser o mesmo em todo o Estado do Amazonas para a seleção
e eleição de membros dos Colegiados Territoriais, uma das questões do formulário buscava
investigar justamente a percepção dos entrevistados quanto às seleções e eleições, embora
41% dos entrevistados tenham informado o procedimento correto na seleção e eleição
(convite direto a organizações selecionadas), 32% dos entrevistados se confundiram em suas
respostas afirmando que o procedimento era feito por convocatória aberta para eleição de
representantes. Na verdade, algumas pessoas desconheciam a participação do Conselho
Municipal de Desenvolvimento Rural Sustentável – CMDRS na seleção e indicação das
entidades que fariam a composição do Colegiado Territorial, o que justifica a existência de
outras respostas para a questão, ver figura 33:
75
Figura 33 – Seleção e eleição dos membros do Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
A confusão nas respostas e entendimentos é justificada pela grande rotatividade de
membros do Colegiado Territorial, a troca constante dos representantes das entidades que
compõem o CODETER é um problema sério para o desenvolvimento das atividades, todas as
vezes que há mudança de um representante, formam-se ruídos de comunicação e dispersão de
interesses, o que prejudica e compromete consideravelmente a participação de cada uma das
entidades que formam o Colegiado Territorial. Outra prática usual e prejudicial tem sido a
participação de representantes do membro que realmente está na condição de representante do
CODETER, dito de outro modo, o que ocorre é que alguns dos membros do CODETER não
costumam participar das reuniões e atividades e mandam seus representantes para garantir seu
assento no colegiado, apesar desta prática não parecer tão prejudicial ao desenvolvimento do
programa, quando utilizada com maior freqüência passa a distorcer o verdadeiro objetivo e
interesse do programa:
76
Figura 34 – Problemas freqüentes do Colegiado TerritorialFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Além da alta rotatividade dos membros do colegiado, outro problema bastante
enfatizado pelos entrevistados é a pouca participação dos gestores públicos. É importante
observar que esta percepção também foi ressaltada pelos próprios representantes de entidades
do poder público, estes reconheceram que o envolvimento das entidades da sociedade civil
tem sido maior quando comparado com as entidades do poder público. Esta pouca
participação está certamente relacionada com outros aspectos considerados na questão como:
a influência política e alta rotatividade dos membros. Além disso, é um problema que
interfere diretamente na forma como está sendo construída a capacidade institucional do
território, pois se a gestão não funcionar plenamente, certamente irá comprometer a
capacidade de articulação entre esferas locais (figura 34).
O fato é que estes problemas interferem de forma significativa no desenvolvimento
das atividades do Colegiado Territorial, de modo que o enfraquecimento no processo
participativo e discursivo tem deixado a desejar. Inicialmente, a participação de todas as
entidades na gestão social dos projetos e ações do programa era significativa, mas
gradualmente as pessoas foram perdendo o interesse e deixando de participar ativamente das
reuniões e encontros. De acordo com o coordenador do Colegiado Territorial, José de Oliveira
Ramos, os encontros do colegiado ocorriam a cada três meses, nos últimos anos estas reuniões
passaram a ser anuais, contando cada vez menos com a participação dos seus membros. No
ano de 2011, foi realizada apenas uma reunião de plenária do Colegiado para a validação do
PTDRS do Baixo Amazonas, ver figuras 35 e 36:
77
Figura 35 – Reuniões formais do CODETERFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Figura 36 – Reuniões do CODETERFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Contudo, apesar do não desenvolver suas atividades com a mesma freqüência que
desenvolvia em seu processo de constituição, algo importante destacado pelos entrevistados
foi à construção de um processo político democrático e deliberativo, de modo que as decisões
tomadas durante as plenárias do Baixo Amazonas são realizadas de forma participativa, onde
todos podem opinar e discutir os assuntos que estão em pauta, 32% dos entrevistados afirmou
que o principal mecanismo de tomada de decisão permanece sendo a votação (figura 37).
Figura 37 – Mecanismos de tomada de decisão Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Seguindo esta perspectiva de análise, os entrevistados afirmaram que as entidades da
sociedade civil são as que possuem maior participação nas decisões tomadas pelo Colegiado
78
Territorial, entre as entidades que possuem maior destaque estão as associações e sindicatos,
os movimentos sociais e as associações de agricultores familiares, como é possível observar
na figura abaixo as entidades do poder público são que menos possuem capacidade de
decisão, destaque para os representantes do Governo do Estado do Amazonas, ver figura 38:
Figura 38 – capacidade de decisãoFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
O envolvimento dos membros do Colegiado Territorial ocorre, sem dúvida nenhuma,
de forma diferenciada, respeitando a capacidade de envolvimento e o engajamento político
que cada uma dessas pessoas tem. Certamente, o envolvimento de algumas pessoas no
CODETER tem sido o maior aprendizado e o maior exercício político que estas poderiam ter
(figura 39), representa uma importante oportunidade de se estabelecer trocas e experiências.
No entanto, quando estamos falando de uma importante arena política e esfera pública como o
Colegiado Territorial parece bastante arriscado pensar nas disparidades de aprendizado e
vivência política, obviamente aqueles que possuem maior desenvoltura e traquejo político
poderão levar vantagens nos momentos decisivos e de discussão.
79
Figura 39 – Oficina com CODETER Baixo Amazonas Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Na Amazônia, como em qualquer lugar do Brasil, muitas práticas políticas ainda
permanecem submetendo as pessoas aos discursos populistas e enganosos que criam um clima
de insatisfação e passividade. Essas práticas têm se caracterizado, em geral, pela apropriação
dos recursos públicos para garantir a subordinação política dos grupos sociais mediante o uso
de assistencialismo e clientelismo. Essa tendência ao desenvolvimento de práticas tradicionais
na política permanece sendo desenvolvidas nos diferentes campos de poder, refletindo um
cenário de controvérsias e limitações. Na verdade, esta perspectiva de orientação política
favorece a fragmentação social, pois não disponibiliza programas políticos capazes de
fortalecer a confiança das pessoas na política.
O grau de credibilidade que as pessoas depositam nos sistemas políticos depende,
necessariamente, da confiança que colocam nas suas instituições representativas. No entanto,
a história política do Brasil tem se afastado da possibilidade de constituir-se em um elemento
catalisador de uma qualidade democrática melhor. Entretanto, à medida que o Estado torna-se
ineficiente, diminui sua credibilidade e, consequêntemente, aumenta a instabilidade das
instituições políticas e institucionalização de relações pautadas por comportamentos
clientelistas e paternalistas. A existência e multiplicação dos problemas sociais contribuem
para a decepção e distanciamento, este clima de instabilidade se dá num contexto de crise da
credibilidade e legitimidade (BAQUERO, 2004).
Contudo, não podemos deixar de mencionar que a participação política no processo
de desenvolvimento territorial do Colegiado Territorial do Baixo Amazonas ocupa um lugar
80
central no cotidiano desses grupos sociais, não apenas no sentido de transmitir seus valores,
mas, sobretudo, no funcionamento das instituições a sua volta. Logo, a forma como se
constrói a política interfere, diretamente, no desenvolvimento destas sociedades. A
transformação da cultura política para uma dimensão participativa depende da transição das
práticas tradicionais à construção de uma democracia descentralizada. Quando a política se
constrói numa perspectiva descentralizada, procedimentos assistencialistas e clientelistas são
eliminados das relações sociais. Entretanto, o processo de descentralização só é possível com
a participação de atores sociais capazes de contribuir criticamente na construção de uma
sociedade democrática (figura 40).
Figura 40 – Validação PTDRS Fonte: UFAM/ NUSEC, 2010.
Em outras palavras trata-se da constituição das esferas públicas. A esfera pública
política, isto é, as redes de comunicação não-institucionais que se situam à margem do núcleo
do sistema político, são vistas como capazes de identificar os problemas sociais com a
sensibilidade e a linguagem específica dos próprios atingidos, articulá-los fora das estruturas
governamentais e inseri-los na pauta das deliberações políticas institucionalizadas em vista da
modificação de situações reais consideradas injustas. Neste sentido, os debates e resoluções
tomadas nessa esfera pública não-institucional, ou seja, os fluxos de comunicação aí
acumulados mostram-se capazes de atingir o sistema burocrático-estatal na medida em que
alcançam força suficiente para exercer “pressão” ou “influência” nas instituições formais de
81
tomada de decisão, obrigando-as a inscrever suas reivindicações na agenda da política oficial.
Em outras palavras,
a esfera pública é um sistema de alarme dotado de sensores não especializados, porém, sensíveis no âmbito de toda a sociedade. Na perspectiva de uma teoria da democracia, a esfera pública tem que reforçar a pressão exercida pelos problemas, ou seja, ela não pode limitar-se a percebê-los e a identificá-los, devendo, além disso, tematizá-los, problematizá-los e dramatizá-los de modo convincente e eficaz, a ponto de serem assumidos e elaborados pelo complexo parlamentar (HABERMAS, 2003:91).
Devido ao fato de a esfera pública estar vinculada essencialmente aos processos
comunicativos efetivados no âmbito da sociedade civil, ela não se confunde com a esfera do
Estado. A esfera pública se formou historicamente em contraposição ao poder, no interesse
em estabelecer um Estado Democrático de Direito. Daí a necessidade de construção e
consolidação de esferas públicas politicamente atuantes não-atravessadas por relações de
poder e pela intervenção do Estado, mas sim constituídas de fluxos de comunicação ensejadas
pelos diferentes atores e grupos sociais que compõem o mundo social, mais precisamente a
sociedade civil. A esfera pública apóia-se, portanto, no uso argumentativo e prático da
linguagem cotidiana. Com efeito, pode-se dizer que
a esfera pública ou espaço público é um fenômeno social [...]. A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. [...] A esfera pública se reproduz através do agir comunicativo, implicando apenas o domínio de uma linguagem natural; ela está em sintonia com a compreensibilidade geral da prática comunicativa cotidiana. [...]. A esfera pública constitui principalmente uma estrutura comunicacional do agir orientado pelo entendimento, a qual tem a ver como o espaço social gerado no agir comunicativo (HABERMAS, 2003:92).
Em consonância com este empreendimento, a pesquisa adota o conceito de política e
de democracia deliberativa sugerida por Habermas. A idéia de uma política deliberativa
fundamenta-se em um poder comunicativo que advém de uma comunicação política expressa
na forma de opiniões majoritárias estabelecidas por via discursiva. A democracia deliberativa
baseia-se nas condições de comunicação sob as quais o processo político de tomada de
decisão supõe-se capaz de alcançar resultados racionais, por cumprir-se de forma deliberativa,
calcada no processo discursivo-argumentativo do agir comunicativo (HABERMAS, 2002).
Trata-se de um procedimento democrático que permite criar uma coesão interna entre as
diferentes formas de negociação, discursos e proposições, as quais devem se apoiar em
princípios universais que almejem resultados racionais, justos e bons para todos os 82
envolvidos. Assim, este modelo de democracia “[...] baseia-se nas condições de comunicação
sob as quais o processo político supõe-se capaz de alcançar resultados racionais, justamente
por cumprir-se, em todo seu alcance, de modo deliberativo” (Idem, p. 277).
O fato é que um dos principais impeditivos para a construção desse processo
deliberativo dentro do Colegiado Territorial é justamente a comunicação, de acordo com as
afirmações dos próprios entrevistados um dos maiores problemas da gestão do colegiado tem
sido a deficiência na comunicação, não apenas entre os membros do colegiado, mas
principalmente entre os membros do colegiado e a sociedade. A divulgação das ações do
colegiado não são realizadas nos municípios que compõem o território do Baixo Amazonas,
tampouco em outros municípios do Estado do Amazonas. A fragilidade no processo de
comunicação e informação interfere de modo significativo na construção de uma democracia
deliberativa e legítima. Afinal, ao contrário do que estava sendo idealizado, o processo de
“empoderamento” dos grupos sociais envolvidos no programa se deu de forma fragmentada,
envolvendo apenas os membros do Colegiado Territorial, um ciclo que se fechou em si
mesmo.
Não é à toa que quando questionados acerca dos mecanismos de comunicação
utilizados pelo Colegiado Territorial a maioria dos entrevistados afirmou que continua sendo
a comunicação pessoal (23%), conhecida como “boca-a-boca”. A diversidade percebida nas
respostas se deve ao fato de cada um dos entrevistados dispor de uma forma de comunicação
diferenciada, alguns têm acesso a internet, outros dentro de suas entidades governamentais,
outros mídias de massa. No entanto, a maioria dispõe apenas da comunicação pessoal entre as
entidades da sociedade civil, lembrando que esta comunicação permanece restrita entre os
membros do Colegiado Territorial, ver figura 41:
83
Figura 41 – Mecanismos de comunicação do CODETER Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
As falhas de comunicação refletem em outros assuntos e atividades desenvolvidas pelo
Colegiado Territorial, estamos falando do envolvimento dos membros do CODETER em
temas e discussões realizadas durante as reuniões e encontros, as diferenças nos níveis de
entendimento e aprendizado de cada um dos componentes. O fato de alguns temas serem
discutidos recorrentemente em reuniões do Colegiado não significa dizer que envolvem um
processo de capacitação e formação, o entrevistados buscaram diferenciar essa duas coisas,
afinal foram realizados poucos cursos de formação e capacitação, mas, muitos assuntos são
discutidos nas plenárias, entre os quais: projetos, infraestrutura, planejamento, meio ambiente,
cidadania e inclusão social, reforma agrária, desenvolvimento agropecuário e educação, ver
figura 42:
84
Figura 42 – Principais temas discutidos Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Apesar da diversidade de respostas no item referente à oferta de capacitação, é
importante ressaltar que grande parte dos temas citados não foram contemplados mediante a
realização de cursos e treinamentos. Um dos poucos temas utilizados em cursos de
capacitação foi elaboração de projetos, os outros temas foram citados em função,
principalmente, da imprecisão das respostas e percepções (figura 43).
Figura 43 – Temas de capacitação Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
A própria elaboração do Plano Territorial de Desenvolvimento Rural Sustentável –
PTDRS envolve um processo de capacitação, afinal para a elaboração do plano são
necessários vários encontros e reuniões de discussões, mediante o levantamento de temáticas 85
fundamentais para a problematização de assuntos que são de interesse do território. Todas as
ações e atividades relacionadas com a dinâmica do território pressupõem a elaboração de um
diagnóstico territorial. Este diagnóstico territorial deve envolver, necessariamente, todos os
membros do colegiado. De acordo com os entrevistados, o Colegiado Territorial participou
apenas nas oficinas de discussão da elaboração do diagnóstico territorial e do plano
propriamente dito.
Figura 44 – Elaboração do Diagnóstico Territorial Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Apesar de alguns dos entrevistados afirmarem ter participado das outras etapas como:
a concepção e elaboração (29%) e revisão (24%), a maioria afirmou ter participado apenas das
oficinas de discussão (figura 44). O mesmo ocorreu com o Plano Territorial de
Desenvolvimento Rural Sustentável – PTDRS. Alguns entrevistados destacaram que parte das
informações do plano estão defasadas e não contemplam mais a realidade encontrada no
território do Baixo Amazonas, contudo, a maioria dos entrevistados acredita que o PTDRS
representa uma grande conquista para o território, pois quando comparado com outros
territórios do Estado o Baixo Amazonas há um avanço com a aquisição do plano de
desenvolvimento territorial. Aliás, as últimas atividades desenvolvidas pelo território estão
concentradas na validação e lançamento do Plano (figura 45).
86
Figura 45 – Elaboração do PTDRS Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Em julho de 2011 durante a realização da Oficina de Análise e Interpretação de
Indicadores Sociais, realizada no município de Parintins, nos dias 11 e 12, foi possível realizar
um levantamento de informações e análises a respeito do Indicador de Acompanhamento da
Gestão do Colegiado. Para a realização desta análise foi utilizada a dinâmica SWOT, que é
uma ferramenta utilizada para fazer análise de cenário (ou análise de ambiente), sendo usado
como base para gestão e planejamento estratégico de uma corporação ou empresa, mas
podendo, devido a sua simplicidade, ser utilizada para qualquer tipo de análise de cenário. A
sigla SWOT representa a primeira letra das palavras, em inglês: Strengths, Weaknesses,
Opportunities e Threats (Pontos fortes, Pontos fracos, Oportunidades e Ameaças), em
português recebe a tradução de FOFA. Os Pontos fracos e fortes são fatores internos.
Oportunidades e Ameaças são fatores externos.
Durante a realização da oficina no Baixo Amazonas a dinâmica foi utilizada para
analisar e interpretar a Gestão do Colegiado Territorial, de modo que todos os participantes
deveriam a partir de seus grupos indicar os pontos fortes, os pontos fracos, as oportunidades e
as ameaças da gestão do Colegiado Territorial. Foram considerados pontos fortes: esperança,
conquista, união, participação, liderança, comprometimento, determinação, perseverança,
PTDRS, CMDRS, autonomia, organização, envolvimento, NT, ND, sociedade civil e
parcerias institucionais. Entre os pontos fortes houve destaque para a união e para o
comprometimento da sociaedade civil.
87
Figura 46 – Oficina de Análise e interpretação de Indicadores sociais Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
Associados aos pontos fortes da gestão do colegiado estariam as oportunidades da
gestão como: socialização, conhecimento, desenvolvimento, inclusão social, orientação,
atitude, participação, capacitação, desenvolvimento, PTDRS, experiência, gestão, sociedade
civil e poder público trabalhando juntos. Houve destaque para a oportunidade de acesso ao
conhecimento e a capacitação durante a gestão do colegiado (figura 46), os meios de
orientação e a possibilidade da sociedade civil e do poder público trabalharem junto de forma
democrática e legítima foi considerado o maior ganho e a maior oportunidade oferecida
duarante a gestão do colegiado.
Figura 47 – Oficina de Análise e interpretação de Indicadores sociais Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2010.
88
Com relação aos pontos fracos, fraquezas, da gestão do colegiado territorial foram
considerados um número maior de pontos comuns, houve a indicação de quase os mesmos
pontos entre os grupos que participaram da dinâmica, são eles: comunicação, poder público,
projetos, CMDRS, participação, interesse, envolvimento, articulação, determinação,
rotatividade e execução. O item comunicação foi indicado 4 vezes, por quase todos os grupos,
o mesmo ocorreu com os itens poder público e articulação que foram citados 3 veses, os itens
projetos e interesse foram citados duas vezes (figura 47).
Relacionadas às fraquezas estão as ameaças a gestão do colegiado, que de acordo com
os grupos de participantes são as seguintes: desarticulação das entidades, não contratação de
projetos, inoperância, perda de recursos, divulgação dos projetos, concentração do poder
público, alternância, inadimplência, não comprometimento, falta de interesse,
descompromisso, falta de apoio, dissolução do colegiado, desarticulação política, descaso,
falta de recursos, corrupção, divergências políticas, falta de interesse dos gestores públicos,
politicagem, divergências político-partidárias. Apesar de haver maior diversidade nas
respostas este item foi o que gerou maior discussão e problematização na análise da gestão do
Colegiado Territorial.
Embora os itens das ameaças não tenham se repetido, houve concordância entre os
participantes com relação a todas as ameaças citadas, destaque para a desarticulação política e
divergências político-partidárias como os itens que mais estão prejudicando a gestão do
Colegiado Territorial, considerando que estas divergências se dão, sobretudo, no nível local,
ou seja, entre as prefeituras e o Colegiado Territorial. Este fator tem contribuído
significativamente para a desarticulação do colegiado e a perda de interesse por parte dos seus
membros.
Se tentarmos estabelecer uma relação entre os tópicos da dinâmica – Fortaleza e
Oportunidade -, poderemos obter análises importantes acerca da gestão do colegiado. Nesse
caso, daremos destaque para os itens mais citados e mais discutidos entre os participantes da
oficina. Com relação ao tópico das fortalezas, ressaltamos a importância dada ao item da
participação da sociedade civil. Para o tópico das oportunidades os itens destacados são
conhecimento e sociedade civil e poder público trabalhando juntos. Ao relacionarmos as
fortalezas e as oportunidades podemos concluir que o maior ganho obtido com a gestão do
CODETER foi o aprendizado e a experiência de uma gestão compartilhada entre a sociedade
civil e o pode público. Em síntese, uma política inovadora na história do desenvolvimento da
sociedade brasileira (figura 48).
89
Figura 48 – Fortalezas e oportinidades da gestão do Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Os tópicos fraquezas e ameaças permitem a relação de seus itens a partir da análise e
interpretação dos próprios membros do Colegiado Territorial, uma vez que buscam avaliar a
participação e a contribuição do CODETER na gestão do território do Baixo Amazonas. Com
relação às fraquezas os itens que obtiveram maior destaque foram comunicação e poder
público, ambos estão diretamente relacionados. A comunicação como um dos maiores
entraves da gestão do Colegiado Territorial, sobretudo, no que diz respeito às articulações
estabelecidas com as entidades do poder público. As ameaças envolvem os itens já citados -
desarticulação política e divergências político-partidárias (figura 49), que estão relacionados
com as fraquezas do seguinte modo:
Figura 49 – Fraquezas e ameaças da gestão do Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
90
Como já foi dito anteriormente a fraqueza é um ponto fraco, não apenas entre os
membros do colegiado, mas entre o colegiado e a sociedade em geral e entre o colegiado e o
poder público. São dificuldades de comunicação e de entendimento que prejudicam a gestão
do colegiado e as articulações necessárias para o desenvolvimento de ações e programas
sociais. A pouca participação e envolvimento dos gestores públicos é um dos fatores mais
destacados pelos participantes, por mais que a sociedade civil busque se envolver e
desenvolver ações importantes, grande parte das suas ações serão descartadas se não houver o
comprometimento dos gestores públicos municipais, estaduais e federais.
As deficiências de comunicação e articulação com o poder público são ameaças
consideráveis a articulação política necessária ao desenvolvimento da gestão territorial,
levando conseqüentemente a existência crescente de divergências político-partidárias. Na
figura abaixo estão indicadas as tarjetas com a indicação dos tópicos da fortaleza,
oportunidade, fraqueza e ameaça (figura 50).
Figura 50 – FOFA Baixo AmazonasFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
91
3.5. Avaliação de Projetos
Fábrica de beneficiamento de leite (Barreirinha – AM)
O projeto de implantação da fábrica de beneficiamento de leite, no município de
Barreirinha, data de 2003. Foi executado com recursos do PRONAF e custeado pelos
Governos Federal e Municipal, respectivamente através do MDA e pela contrapartida da
prefeitura.
O município de Barreirinha caracteriza-se por possuir um grande rebanho bovino, o
que proporcionaria matéria-prima suficiente para este tipo de empreendimento. Com a
instalação da fábrica, haveria um estímulo na produção leiteira e potencialização dessa
atividade, diversificando a pecuária local.
O objetivo do projeto era produzir leite pasteurizado embalado, totalmente automático
e sem nenhum contato manual, assim como derivados, tais qual doce de leite, manteiga,
creme de leite, queijos, iogurte e outros subprodutos, tendo em vista que o leite destinado para
a alimentação da população era In Natura, vendido em latões, oferecendo alto risco para a
saúde dos habitantes. A execução do projeto beneficiaria os pequenos e médios pecuaristas,
que teriam sua produção absorvida, aumentando assim sua fonte de renda, além de atender a
grande demanda pelo produto na região. A implantação da indústria geraria também
empregos diretos e indiretos no município. O projeto contemplava uma estratégia de
implantação e especificações dos equipamentos necessários, visando atender aos padrões
impostos pelo Ministério da Agricultura (quadro 11).
Quadro 11 - Objetivos centrais do projeto:
Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3Redução da
pobrezaX
Geração de renda X XFortalecimento de cadeias produtivas
X X
Fortalecimento de redes sociais
X
Fortalecimento da gestão social
X X
Recuperação ambiental
X
Desenvolvimento de novas
tecnologias
X X
Fortalecimento do cooperativismo
X X
92
Fortalecimento de ações afirmativas de gênero, raça e
etnia
X
Fortalecimento da educação no
campo
X
Fortalecimento das capacidades
locais
X X X
Fortalecimento da identidade territorial
X
Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
A partir dos dados obtidos na aplicação do questionário de Avaliação de Projetos de
Investimento, observam-se alguns pontos importantes. No que diz respeito ao planejamento
do projeto, do modo como ocorreu a definição deste, percebe-se que houve uma demanda
espontânea dos beneficiários, o que se confirma pelo fato de Barreirinha possuir a maior bacia
leiteira do Baixo Amazonas. Os objetivos centrais eram geração de renda, fortalecimento das
cadeias produtivas, no caso, a cadeia produtiva do leite, fortalecimento da gestão social,
desenvolvimento de novas tecnologias, fortalecimento do cooperativismo e, este item foi
apontado por unanimidade pelos três entrevistados, fortalecimento das capacidades locais.
Nota-se também que houve participação dos beneficiários na definição do projeto, elaboração
do diagnóstico e no acompanhamento do processo de implantação. Em relação aos critérios
utilizados para definir a abrangência do empreendimento dentro do território, foram
apontados critérios político/administrativo, físico/geográficos, culturais e ambientais, como
uso sustentável de recursos naturais do território, medidas de manejo dos impactos e gestão
dos custos. A SEPROR providenciou cursos de capacitação, enquanto ações referentes a
levantamento de informações e assistência técnica para a produção foram tomadas na fase de
planejamento. De acordo com os entrevistados, o colegiado não teve papel ativo na definição
destes componentes, ficando a cargo das entidades públicas todo o processo de
desenvolvimento do projeto.
Quadro 12 - Principais dificuldades para que o projeto possa operar de forma ideal:
Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3Gestão X X X
ComercializaçãoDesenvolvimento de X
93
tecnologiaAcesso à informação X
Custo da matéria prima
Custo de insumosCondições de
transporteX X
Capacitação X XMelhoria da
produçãoX
Divulgação/marketing XCapital de giro X
Abandono escolarDesinteresse da demanda social
X
Financiamento Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Apesar de todo o estudo e planejamento realizados, a fábrica de beneficiamento nunca
chegou a funcionar mesmo depois de concluído o prédio e instalado todos os equipamentos.
Diversas inconformidades foram verificadas após o término da obra, desde problemas com a
estrutura em si, até com o local onde esta foi instalada. A estrutura tinha erros de medida e foi
construída em local inapropriado, em rua não pavimentada e próxima a igarapé, sujeita a
alagamento. Uma grande dificuldade no transporte da matéria prima até a usina e com o
escoamento dos produtos seria imposta por essa situação. Dessa forma, não foram atingidos
os objetivos do projeto, nenhuma atividade econômica foi promovida, e os beneficiários não
estão sendo atendidos. A partir de alguns ajustes orçamentários, foram feitas tentativas de
solucionar as imprecações, mas não promoveram resultados.
Houve um grande impasse na hora do repasse da gestão. Inicialmente, a gestão ficaria
a cargo da associação de pecuaristas, porém a fábrica permaneceu parada. Fatores importantes
de divergência política podem estar ligados ao abandono do projeto. Verifica-se que a fábrica,
assim como todos os equipamentos, está esquecida, relegada a ação dos vândalos e das
intempéries, de forma que uma grande quantia de dinheiro seria necessária para pô-la a
funcionar de maneira adequada.
Sendo assim, as principais dificuldades para que o projeto opere de forma ideal,
apontadas por todos os entrevistados, estão na gestão, nas condições de transporte e na
capacitação. Todavia, a gestão é o maior problema. Após o termino do mandato do antigo
prefeito, e conseqüente repasse do empreendimento ao seu sucessor, o projeto foi fadado ao
94
abandono. Devido aos prefeitos serem de bases políticas diferentes, um não quis dar
seguimento à realização do outro. Dessa forma, a fábrica que já estava com toda a estrutura
pronta e equipamentos instalados, faltando apenas alguns ajustes para que começasse a
funcionar, passou a se deteriorar. Com o tempo o entorno da agroindústria foi alvo de
invasões, houve enchentes, a fábrica, sem vigia, foi saqueada, tudo isso contribuiu para que
ela definhasse cada vez mais. Esses fatores levaram ao desinteresse da demanda social, os
próprios criadores, que durante a fase de implantação se demonstravam ativos, se afastaram.
Portanto, a fábrica foi condenada tanto pelo descaso do poder público, como da sociedade
civil.
Unidade de beneficiamento de mandioca (Parintins – AM)
O projeto da fábrica de farinha foi proposto pela prefeitura de Parintins e encaminhado
pelo conselho municipal em 2003, na ocasião ainda não havia colegiado. Além da
contrapartida da prefeitura, foram liberados recursos do PRONAF para a realização do
empreendimento.
O objetivo da fábrica seria absorver a produção dos pequenos produtores de mandioca
do projeto de assentamento Vila Amazônia – Localizada no município de Parintins, e até
mesmo de outras localidades próximas que tivessem potencial produtivo. No entanto, de
acordo com os entrevistados, não houve um estudo adequado de viabilidade econômica, e
constatou-se mais tarde, depois de concluída a obra, que não havia produção suficiente para a
agroindústria funcionar, dentre outros problemas, como local inapropriado para a instalação,
em beira de estrada, o que dificulta a escoamento da produção. Voltaremos a isso mais tarde
(quadro 13).
Quadro 13 - Objetivos centrais do projeto
Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3Redução da
pobrezaGeração de renda X XFortalecimento de cadeias produtivas
X X X
Fortalecimento de redes sociais
X
Fortalecimento da gestão socialRecuperação
ambiental
95
Desenvolvimento de novas
tecnologias
X X
Fortalecimento do cooperativismo
X
Fortalecimento de ações afirmativas de gênero, raça e
etniaFortalecimento da
educação no campo
Fortalecimento das capacidades
locaisFortalecimento da
identidade territorial
X
Uma análise dos dados obtidos com a aplicação do Questionário de Avaliação de
Projetos de Investimentos permite levantar alguns pontos importantes. O projeto surge como
uma demanda espontânea dos beneficiários, mas há controvérsias. Todo o processo de
elaboração e implantação ficou a cargo do poder público. Dos objetivos apontados, destacam-
se geração de renda, fortalecimento das cadeias produtivas e desenvolvimento de novas
tecnologias. O projeto apoiaria principalmente cooperativas de produtores rurais e associações
informais. O critério de abrangência foi predominantemente físico/geográfico, a idéia era
buscar a matéria prima em todos os municípios que compõem o Baixo Amazonas. Apesar de
o questionário apontar a realização de alguns estudos sobre mercado, na prática verifica-se o
contrário, pois a fábrica está parada por diversos motivos, alguns supracitados, e os
beneficiários não estão sendo atendidos. As principais dificuldades encontradas para que o
projeto possa operar de forma ideal foram: gestão, desenvolvimento de tecnologia, custo da
matéria-prima, condições de transporte, capacitação e desinteresse da demanda social
(quadro 14).
Quadro 14 - Principais dificuldades para que o projeto possa operar de forma ideal
96
Entrevistado 1 Entrevistado 2 Entrevistado 3Gestão X X X
Comercialização XDesenvolvimento de
tecnologiaX X
Acesso à informação XCusto da matéria
primaX X
Custo de insumos XCondições de
transporteX X
Capacitação X XMelhoria da
produçãoX
Divulgação/marketing XCapital de giro X X
Abandono escolarDesinteresse da demanda social
X
Financiamento XFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Constatamos na Unidade de Beneficiamento de Farinha, problemas muito similares
aos encontrados em Barreirinha, na Fábrica de beneficiamento de Leite. Os impasses
começam com a falta de estudos apropriados de viabilidade econômica e logística. Como já
foi mencionado, após a conclusão da obra, notou-se que não havia produção suficiente para
abastecer a fábrica, isso deriva em certa medida de um fator cultural, o interiorano muitas
vezes não concebe a guarda de alimentos, daí o fracasso de programas de produção
organizada. Por outro lado, o poder público peca em previamente não estabelecer acordos
com os produtores, de forma a estimulá-los a um planejamento de suas ações em prol do
próprio benefício. Observa-se também uma grande falha na logística de implantação. A
fábrica de farinha foi construída na beira da estrada, quando melhor seria construí-la na beira
do rio, onde tanto o escoamento do produto beneficiado como a captação da matéria-prima
oriunda de outras localidades seria facilitada. Além disso, depois de construída, ainda faltava
a parte hidráulica e elétrica.
Outra constante é o impasse na gestão do empreendimento, talvez o maior deles.
Nesse caso, a gestão ficaria com a própria prefeitura, através da secretaria de produção, mas o
problema começou quando a fábrica não passou no licenciamento ambiental, e por causa
disso, não estava apta a funcionar. Os ajustes a fim de atender as exigências não foram feitos,
o mandato do prefeito terminou e seu sucessor, como observamos no caso de Barreirinha, 97
também não deu continuidade ao projeto. Portanto, mais uma vez vemos fatores de
divergência política que prejudicaram o sucesso do empreendimento, prejudicando
consequentemente os beneficiários deste.
De acordo com os entrevistados, para que a Unidade de Beneficiamento de Farinha
funcionasse seria necessário mudá-la de lugar, para a comunidade do Açaí, na Vila Amazônia,
onde existe tanto a demanda como disponibilidade da matéria prima, e um porto para o
escoamento da produção e captação de mandioca oriunda de todo o Território, como havia
sido idealizado inicialmente no projeto; e passar a gestão para a COOPAPIN. Essa medida
seria a mais adequada além de menos dispendioso do que realizar reformas na estrutura atual.
Fábrica de beneficiamento de leite
98
Exterior das instalações da fábrica de beneficiamento
Frente das instalações da fábrica de beneficiamento
Equipamentos para fabricação de queijos Equipamentos não utilizados
Empacotadora de leite Embalagem do leite pausterizado que seria produzido na fábrica
Usina de beneficiamento de mandioca
99
Casa de Farinha Equipamento
Equipamento Equipamento
Fiação elétrica Equipamento
Estrutura Equipamento
3.6. Índice de Condições de Vida
100
De acordo com os objetivos propostos neste projeto, utilizamos formulários com
perguntas fechadas do Índice de Condições de Vida (ICV) das comunidades rurais visitadas
no Baixo Amazonas, localizadas em setores censitários indicados pela SDT, estas
comunidades estavam localizadas nos seguintes municípios:
Boa Vista do Ramos
Comunidades: Cristo Bom Pastor do Parí, Nossa Senhora do Perpétuo Socorro do Amandio,
Nossa Senhora do Perpétuo Socorro da Enseada e Santo Antônio do Lago Preto do Ramos.
Maués
Comunidades: Nossa Senhora de Lourdes, Santíssima Trindade, Santa Maria e Santa Luzia,
São José do Rio Paricá, Monte Horebe, Santa Clara e Menino Deus.
Barreirinha
Comunidades: Piraí (Peixe Pequeno) e Ponta Alegre.
Parintins
Comunidades: São Sebastião (Boca do Boto), Santa Rita de Cássia (Igarapé do Boto),Vila
Bentes e Sagrado Coração de Jesus (Costa da Águia)
São Sebastião do Uatumã
Comunidades: Santa Helena (Rio Maripá), Deus Ajude (Boto), Caiaué Grande, Igarapé Açú,
Nossa Senhora de Fátima e Bom Jesus do Angelim.
Por meio da aplicação dos formulários (entrevistas estruturadas e semi- estruturadas) e
observações-participantes nas comunidades rurais, houve a possibilidade de obter dados
quantitativos (definidos pelo MDA através do ICV) e qualitativos (através de reuniões
participativas com as lideranças e agricultores locais, entrevistas com roteiros semi-
estruturados e mapas mentais) (Figura 1).
O ICV foi o indicador que permitiu interação direta entre os componentes do projeto e
os agricultores familiares dos setores censitários, tendo em vista que os outros indicadores
foram aplicados somente no âmbito do Colegiado Territorial do Baixo Amazonas. Assim para
que os formulários de ICV fossem aplicados nas comunidades rurais, foram feitas visitas em
101
unidades familiares que praticam a agricultura, objetivando desta forma demonstrar o perfil da
agricultura familiar na região (figura 51), sob a percepção dos próprios entrevistados, bem
como através do ICV, medir o grau de satisfação das necessidades básicas para as famílias e
indivíduos residentes nos setores censitários. A metodologia de cálculo do ICV envolve a
transformação das cinco dimensões por ele contempladas (longevidade, educação, renda,
infância e habitação) em índices que variam entre 0 (pior) e 1 (melhor), e a combinação destes
índices em um indicador síntese. Quanto mais próximo de 1 o valor deste indicador, maior
será o nível de desenvolvimento humano do município ou região.
Figura 51 – Reunião participativa com lideranças e agricultores familiares Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
As comunidades amazônicas instituíram formas de convívio com a floresta tropical
úmida, enfrentando as condições que lhes foram impostas pelo ambiente e compatibilizando a
exploração dos recursos locais com sua conservação. Contudo, a formação dessas
comunidades, embora tenha ocorrido em tempos diferenciados, foi impulsionada por diversos
ciclos de ocupação e modelos econômicos implantados, o que fez surgir uma sociedade
singular que interage de forma diferenciada com seu meio (SIMONETTI, 2004). É de suma
importância valorizar o conhecimento sócio-histórico sem deixar de considerar as condições
existenciais dessas populações, ou seja, o saber fazer do cotidiano. Pois se entende que ele é o
fator determinante do modo de produção particular de cada uma delas, bem como seu modo
de vida.
Desta forma, o modo de vida dos agricultores familiares da Amazônia constituído por
povos tradicionais advém de seu conhecimento sobre os ecossistemas em que vivem. O 102
conhecimento tradicional desenvolvido por essas comunidades é definido por Fraxe (2004),
como sendo as informações que as pessoas, numa determinada comunidade, desenvolveram
ao longo do tempo, baseado na experiência, adaptado a cultura e ambiente local, estando em
constante desenvolvimento. Este conhecimento é usado para sustentar a comunidade, sua
cultura e os recursos naturais necessários para a sobrevivência contínua da comunidade.
Ribeiro et al. (2002), associam a organização de produção dessas comunidades como
uma forma de preservar o ambiente, pois como dependem quase que exclusivamente do meio,
procuram se harmonizar a ele. Ainda de acordo com Diegues e Arruda (2001), populações
tradicionais que já habitam uma área a muitas gerações acumulam maior carga de
experiências e conhecimentos sobre o ambiente que manejam. Estas experiências
proporcionam a geração de um conhecimento ecológico tradicional.
Considerando estas peculiaridades da Região Amazônica, bem como os povos que
nela habitam, ou seja, nas comunidades rurais visitadas do Baixo Amazonas, com o objetivo
de analisar a percepção dos moradores em relação ao ambiente que os circunda, realizamos
oficinas em que crianças, jovens e adultos pudessem descrever os aspectos visuais/perceptivos
dos ambientes que fazem parte do seu cotidiano vivido. Assim como ferramenta gráfica de
coleta de informações subjetivas que puderam contribuir na construção do perfil do agricultor
familiar nestas localidades, foram utilizados materiais didáticos (cartolina, papel madeira,
pinceis, lápis de cor, giz de cera, dentre outros) para a elaboração de Mapas mentais, aonde os
ambientes aquáticos, as áreas de cultivos agrícolas, os espaços de criação animal, moradias, a
paisagem das matas e as áreas de lazer por eles utilizadas, foram expostas a partir de suas
representações cognitivas do lugar (figura 52, 53 e 54).
103
Figura 52 – Mapas mentais elaborados pelos moradores locais. Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Figura 53 – Elaboração de Mapa MentalFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011
Figura 54 – Elaboração de Mapa MentalFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011
Sobre os Mapas mentais, Nogueira (1994), afirma que as representações são criações
sociais ou individuais de esquemas pertinentes do real. “Essas imagens quando dizem respeito
à questão da representação do espaço, quando leva em consideração a orientação, localização
ou outras informações sobre o lugar de vida, são constituídas em mapas mentais”. Para
Matarezi (2000) os mapas mentais são analisados como sendo processos cognitivos
(conhecimento e habilidade), cuja representação do meio físico e da organização social
permite-nos identificar e conhecer a lógica de apropriação dos recursos naturais e dos
equipamentos culturais elaborados pelos atores sociais em seu cotidiano, na estruturação do
seu espaço e lugar (figura 55).
104
Figura 55 – Mapa mental elaborado por morador local Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Durante a pesquisa em campo, foram entrevistadas duzentas e noventa e uma pessoas
que representavam suas unidades de produção familiar, as quais têm como principal fonte
renda a agricultura. Os resultados permitem verificar que nas comunidades visitadas, entre os
moradores entrevistados, 181 (cento e oitenta e um) pessoas eram do sexo masculino e 110
(cento e dez) do sexo feminino (figura 56). O fato de terem sido entrevistadas, em sua
maioria, pessoas do sexo masculino, não significa dizer que as mulheres não possuem
significativa posição na organização do núcleo familiar, grande parte das entrevistas foi
realizada com a presença da esposa, contribuindo no fornecimento das informações.
Sobre a agricultura familiar no ecossistema de várzea, Fraxe (2011) ressalta que a
condição fundamental da produção familiar camponesa é a força de trabalho familiar e que a
família é a célula básica para a existência de uma unidade de produção rural. É a família quem
estimula a existência de outras relações sociais de produção, como o trabalho acessório e o
trabalho assalariado. Apesar da força de trabalho familiar ser centralizada, principalmente,
sob o gerenciamento masculino nas unidades produtivas, o trabalho produzido pelas mulheres
na agricultura familiar é fundamental para sustento da atividade, sobretudo, quando a família
ainda não possui força de trabalho suficiente dos filhos. Contudo, é comum percebermos que
a mulher desempenha um papel de coadjuvante, o que reproduz a divisão sexual do trabalho,
onde a mulher é aquela que realiza o trabalho mais leve. Entretanto, a participação da mulher
105
no processo de produção da agricultura familiar é o mesmo que o dos homens, além de
desenvolver as atividades domésticas e os cuidados com os filhos.
Figura 56 - Gênero dos participantes da pesquisa Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Quando questionados sobre a posição que ocupam no âmbito familiar, encontraram-se
os seguintes resultados: 199 (cento e noventa e nove) são chefes de família, 73 (setenta e
nove) são esposas, que representavam seus esposos, pois em algumas residências os chefes de
família estavam ausentes, enquanto que outros entrevistados restantes são filhos e parentes,
que “ajudam” nas práticas agrícolas das unidades familiares (figura 57). Tal como foi dito
anteriormente, o homem assume uma posição central na condução da unidade de produção,
não é à toa que foi considerado, na maioria das entrevistas, como o chefe da família.
106
Figura 57 - Posição do entrevistado no núcleo familiar Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Para este contexto, Fraxe (2000) enfatiza que agricultura na Amazônia é baseada em
sua maioria, na unidade de produção assentada na mão-de-obra familiar, com a participação
dos filhos, esposa e geralmente o agregado familiar. Nas comunidades visitadas as atividades
agrícolas são realizadas nos sistemas agroflorestais, roças, floresta, mananciais terrestres e
aquáticos, combinando a agricultura ao extrativismo vegetal e animal.
Grande disparidade foi percebida entre aquelas famílias que possuíam uma produção
familiar e aquelas famílias que não possuíam uma produção familiar. Cerca de 254
entrevistados afirmou ser agricultor familiar e apenas 37 afirmaram não ser agricultor
familiar. Este dado revela que o grande sustentáculo da vida rural permanece sendo a
agricultura e, principalmente, uma agricultura de base familiar.
107
Figura 58. Tipo de estabelecimentos visitados Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
As comunidades visitadas do setor censitário do Baixo Amazonas caracterizam-se por
uma biodiversidade de ambientes e paisagens que se reflete na diversidade social e cultural
dos seus povos. São inúmeras as demonstrações da rica diversidade de crenças, hábitos e
mitos compartilhados entre os grupos locais, resultados estes da herança do índio, do europeu
e do negro africano. Uma das características mais marcantes e comuns a todas as
comunidades estudadas é a formação e transformação de ambientes, espaços e paisagens em
que vivem, um dos exemplos é a centralidade da comunidade que é formada pela igreja,
escola e campo de futebol (figura 58), em outras palavras, o núcleo de sociabilização dos
moradores, na medida em que constitui o lugar do encontro e lazer. Embora, tenha-se
registrado mudanças consideráveis nas comunidades amazônicas, o “centro de sociabilização”
sempre comporta as três seguintes instituições, igreja, escola e sede (figuras 59, 60 e 61).
Figura 59, 60 e 61 - Centralidade de algumas comunidades do Baixo Amazonas Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
108
Para este estudo buscamos entender por centralidade a capacidade de um espaço em
concentrar atividades e movimento, caracterizando-se pela animação e relacionando-se com
densidade, acessibilidade, diversidade, disponibilidade de infraestrutura e serviços. Uma das
instituições sociais que possui maior influencia na vida social dos moradores das
comunidades visitadas é a igreja católica, que tradicionalmente realiza seus cultos aos
domingos e suas festas em comemorações ao santo padroeiro da comunidade. Durante anos a
igreja católica tem se mantido soberana na comunidade, as outras orientações religiosas não
obtém muita ascensão na vida social local. Como afirma Eduardo Galvão, a superestruturada
igreja católica em nenhum momento foi fundamentalmente modificada na Amazônia, ela foi
apenas enriquecida com a cultura do índio, do africano e do nordestino.
Isto não significa que outras denominações religiosas não tenham surgido, mas que a
igreja católica tem permanecido a mesma, sem profundas alterações. Paralela a atividade
religiosa, as atividades lúdicas possuem grande destaque no modo de vida das famílias locais,
como eles mesmos costumam falar “a igreja e o futebol são sagrados aqui”. O futebol tem
grande importância para o processo de sociabilização entre as pessoas na comunidade, de
diferentes faixas etárias (figura 62).
Figura 62 - Socialização através do futebol Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Através dos formulários aplicados podemos observar nas moradias dos comunitários
(figura 63) que há energia elétrica em 125 (cento e vinte e cinco) residências, ou seja, dos 291
(duzentos e noventa e um) entrevistados, menos da metade tem acesso a energia elétrica. Em
alguns casos foram verificadas casas que não possuem rede elétrica, no entanto utilizam
109
motor de luz, em ocasiões especiais, há famílias em que a iluminação noturna é feita por
candeias e lamparinas. Quanto ao acesso aos recursos hídricos, a água é obtida por bombas
d’água ou é buscada diretamente nas margens dos rios.
Figura 63 - Componentes das moradias dos comunitários Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
A mobília da casa do ribeirinho é muito simples, independente dele ter mais recursos
ou não, seus móveis são poucos e bem distribuídos. Na maioria das casas visitadas o fogão
(destaque em relação a quantidade), a geladeira e o telefone são usados freqüentemente. Na
maioria das vezes estes eletrodomésticos e eletroeletrônicos costumam ficar nas salas de
visitas para mostrar “status”. Entretanto, os dados revelam que a questão do saneamento
básico, através do uso de banheiro tem uma freqüência pouco representativa, pois apenas 13
moradias possuem banheiro nas residências. Os banheiros costumam ser construídos distante
da casa, cerca de dez metros. Esses banheiros são construídos distantes das casas em razão da
falta de saneamento básico, a maioria deles não possuem rede de esgotamento com fossas
sépticas para os dejetos. Essas fossas costumam ser grandes buracos, sobre os quais são
construídos estes banheiros, nos flutuantes (casas construídas sob a água) estes banheiros são
colados as casas, uma vez que seus dejetos são jogados diretamente no rio.
110
Figura 64 - Moradia tipo flutuante Fonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Além do banheiro, a maioria das casas nas comunidades amazônicas, sejam elas de
várzea ou terra firme, possui um “porto”, ou seja, é o local onde as pequenas embarcações
(canoas, rabetas) são atracadas. Em outras palavras, o porto é a porta de entrada da
propriedade, é onde as pessoas desembarcam e chegam às casas. No entanto, o porto tem
outras finalidades para a família ribeirinha, pois é nele que as pessoas tomam banho, lavam
roupas e louças, tratam seus peixes, levam seus instrumentos de trabalho, colocam suas
bombas d’água e outras coisas mais. Durante cheia, muitos portos deixam de ser usados e
outros acabam sendo destruídos com a subida das águas. Nas figuras 65 e 66, buscamos
destacar algumas destas finalidades do porto de uma casa:
Figura 65 – Porto em comunidade ribeirinhaFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Figura 66 – Vida no portoFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
111
O uso do telefone também é restrito para comunidades mais próximas dos centros
urbanos, é comum utilizarem mais telefones celulares que telefones fixos dependendo das
localidades.
ANÁLISE DE DADOS DO ICV DO BAIXO AMAZONAS - AM
A média do ICV do Baixo Amazonas é de 0,593. De acordo com a metodologia de
cálculo proposta pelo SGE, isto significa que o Índice de Condições de Vida da população
rural do Baixo Amazonas é considerado “médio” por estar entre os indicadores 0,40 e 0,60.
Quanto mais próximo de 1 (um), mais alto é considerado o nível de desenvolvimento das
regiões. Como explicamos anteriormente, o uso dos formulários visa obter dados a partir da
percepção dos indivíduos entrevistados sobre as condições de vida no seu território a partir de
três instâncias. A cada uma dessas instâncias se associam oito indicadores, explicados a seguir
de acordo com a realidade local do Baixo Amazonas. O resultado desse trabalho é o
cruzamento dos dados quantitativos com os dados qualitativos do estudo realizado pela Célula
Baixo Amazonas.
112
Figura 67 – Índice de Condições de Vida Fonte: SDT/SGE, 2011.
A primeira instância procura avaliar os “Fatores, recursos ou acessos que condicionam
o Desenvolvimento” no território do Baixo Amazonas, isto é, os meios que propiciam uma
boa qualidade de vida na região do setor censitário, os resultados permitem inferir que os
resultados dos Fatores de Desenvolvimento apresentam-se como médio (0,527).
113
Fatores, recursos ou acessos que condicionam o Desenvolvimento no território do Baixo
Amazonas:
Figura 68 – Índice de Condições de VidaFonte: SDT/SGE, 2011.
Número de famílias trabalhando, mão de obra e área utilizada nas atividades agrícolas:
Sobre a percepção dos agricultores no que se refere à quantidade de seus familiares
que estão trabalhando nos sistemas produtivos, a média está em 0,597, a utilização de mão de
obra familiar apresenta-se na médio-alto de 0,619, neste sentido, como discutimos
anteriormente, a agricultura nesta região, caracteriza-se como familiar, onde o pai, a mãe,
filhos, parentes e agregados trabalham, os resultados encontrados fortalecem esta questão.
Fraxe (2000) tem demonstrado em pesquisas com comunidades ribeirinhas, que as crianças a
partir dos 8 (oito) anos de idade já contribuem como força de trabalho nas unidades de
produção.
A agricultura é uma das formas mais tradicionais do uso dos ecossistemas,
principalmente na várzea, que apresenta uma vocação natural, devido à fertilidade de seus
solos (RIBEIRO e FABRÉ, 2003). Comunidades ribeirinhas amazônicas caracterizam-se pela
diversidade de suas atividades produtivas, atributo que assegura sua sobrevivência nos 114
ambientes em que vivem. Na região censitária do Projeto Territórios da Cidadania, podemos
perceber que a unidade e o trabalho são organizados pelo núcleo familiar, podendo contar por
vezes com a participação de parentes ou vizinhos de outra localidade (LAMARCHE, 1998;
FRAXE, 2000). Segundo Parente (2003), a produção familiar trabalha com um diversificado
elenco de produtos cultivados e/ou explorados nas unidades produtivas, seja para a
subsistência, seja para o mercado incluindo produtos alimentares tais como: frutas, olerícolas,
produtos extrativos vegetais, criação de animais e pescado. A diversidade nesses sistemas de
produção é mantida por permuta de sementes, pelo fluxo gênico através de trocas de material
vegetativo como mudas e estacas com vizinhos, parentes e amigos, e mesmo mediante compra
ou busca em comunidades próximas ou longínquas, aumentando assim a biodiversidade
agrícola nestes ambientes de cultivo. Essas formas de produção na Amazônia podem ser
descritos com sistemas de subsistência resultantes da integração humana com a natureza, que
não prejudicam de forma significativa o meio ambiente.
Em relação à área da unidade de produção familiar, as respostas indicam também
médio-alto (0,703). Neste fator, percebemos que o ambiente em que se encontram as
comunidades, contribui para que este indicador seja alto, pois há locais que apresentam solos
mais férteis, por exemplo, no município de Boa Vista do Ramos, há ocorrência de Terra Preta
de Índio, um tipo de solo antropizado que favorece bastante o desenvolvimento da agricultura,
sem uso de fertilizantes químicos. Ribeiro et al. (2002) considera que os sistemas de produção
utilizados por essas populações muitas vezes são tidos como modelos de conservação do
ambiente, através de formas de manejo que surgem a partir de observações da natureza, e não
de simples vontade de dominá-la, como se pode verificar nos sistemas de produção difundidos
pelos técnicos e instituições de ciências agrárias.
Escolaridade
O fator escolaridade dos membros da família é avaliada por eles como “médio-alto”
(0,672), ainda que a maioria deles não tenham concluído nem mesmo o Ensino fundamental.
Pois eles associam escolaridade com as condições de ter acesso à escola. Respondem muitas
das vezes fazendo um paralelo entre o passado e o presente da comunidade. Se antes, para
estudar, eles tinham que percorrer longas distâncias, hoje há escolas nas suas comunidades ou
bem mais próximas e “só não estuda quem não quer”. Portanto, este aspecto é considerado
bom, mas é considerado bom no sentido estrutural e não com relação à qualidade e nível do
ensino.
115
Ainda assim, diante de todas essas dificuldades, a escolaridade em nível territorial tem
aumentado bastante no que se refere às novas gerações. Por mais que os jovens ajudem na
produção familiar, também freqüentam a escola. Contudo, é importante enfatizar que as
condições de ensino na maioria das comunidades permanece estável (figura 69 e 70). O
ensino nas comunidades geralmente vai até o 9º ano do Ensino fundamental. Quem deseja
concluir o ensino médio e prosseguir com os estudos, deve ter o apoio da família para
conseguir se manter na sede do município. Os casos de evasão escolar são mais comuns
quando os estudantes devem contribuir para o sustento da família ou quando a escola fica
muito longe de seu domicílio, nesse caso, na sede municipal.
Figuras 69 - Infraestrutura das escolasFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Figuras 70 - Infraestrutura das escolasFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
No entanto, Fraxe (2007) enfatiza que no cotidiano do homem rural amazônico a
escola representa a possibilidade de mudança, de ascensão econômica e social. É nela que os
pais e filhos da comunidade projetam suas esperanças e expectativas de um futuro melhor,
com novos conhecimentos e projetos de vida. A maioria dos entrevistados no que se refere às
práticas agrícolas, prefere que seus filhos não tenham a mesma “sorte” que eles, que possam
continuar seus estudos e melhorar de vida.
Condições da moradia
As famílias respondiam que suas casas não poderiam ser ótimas porque sempre tem o
que “ajeitar”. Ruim também não pode ser porque é o lar deles. Por isso, consideravam suas
condições de vida na maioria das vezes entre regulares ou boas. Poucos consideravam a opção
“péssimo” como resposta. As condições de moradia são, de acordo com a pesquisa, médias
(0,575).
116
A casa do homem amazônico possui algumas peculiaridades (figuras 71 e 72)
relacionadas à localização geográfica da região, são habitações localizadas entre a floresta e o
rio, construídas suspensas do chão em razão das cheias. Algumas pessoas costumam chamá-
las de “casas perna de pau”, outras as definem por “palafitas”, como são conhecidas as casas
construídas nas regiões alagadiças, cuja função é evitar o alagamento dos seus cômodos
internos, é uma habitação comum nas regiões tropicais e equatoriais.
Figura 71 - Tipos de habitaçõesFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Figura 72 - Tipos de habitaçõesFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Essas casas são cobertas por telhas de amianto ou alumínio, sendo que raras vezes é
possível encontrar casas cobertas de palhas. Em geral, as paredes são feitas por tábuas de
paxiúba, palmeira abundante no vale amazônico. Nos quintais é sempre possível encontrar
pequenas hortas, que visam garantir a subsistência da família, fornecendo verduras e legumes
importantes para o preparo dos alimentos e para fortalecer a dieta do amazonense. Esta dieta
ainda é complementada pela variedade de espécies frutíferas encontradas nos quintais locais,
as mais freqüentes são: mangueiras, jambeiros, bananeiras, limoeiros, abacateiros e
cupuaçuzeiros.
As casas possuem, normalmente, quatro cômodos: sala, cozinha, e dois quartos. No
entanto, esta divisão de cômodos varia de família para família, aquelas que possuem melhores
condições financeiras possuem uma casa mais confortável e ampla, é possível observar isso
logo que se entra na sala, geralmente bem mobiliada e enfeitada. Aquelas famílias mais
humildes possuem uma casa pequena e mal conservada, muitas com madeira apodrecida e
pouca mobília.
Acesso a mercados, Programas do Governo, crédito e assistência técnica
117
O acesso aos mercados é considerado médio (0,421) pelos entrevistados. Esta questão
envolve vários fatores, como a distância do mercado consumidor, alto custo do transporte dos
produtos, as relações estabelecidas na comercialização, entre agricultores e compradores dos
produtos excedentes (marreteiros). Em outras palavras, a apropriação ocorre no momento em
que se dá a troca de produtos por moeda e/ou a troca de produtos por produtos, entre, de um
lado, agentes de comercialização, marreteiros, regatões e feirantes; e de outro, os seus
fregueses - os agricultores (figura 73).
Figura 73 - Agentes de comercializando fibra de malvaFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
A inexistência de uma política agrícola voltada para a região amazônica é um dos
principais fatores que favorecem o aparecimento de agentes de comercialização. Pode-se
caracterizar esses agentes através de uma tipificação. O marreteiro, termo regional utilizado
pelos camponeses para designar os atores sociais proprietários de pequenas embarcações, é o
agente da comercialização responsável pelo abastecimento das famílias camponesas de
mercadorias. Sua presença deve-se, fundamentalmente, à precariedade dos meios de
transporte. A maioria dos camponeses não possui motores a combustão, sendo suas
embarcações movidas pela própria energia humana (o remo), o que implica gastos grandes de
energia e altos custos por parte dos camponeses em deslocamentos pela malha hidroviária
(figura 74).
118
Figura 74 - Transporte da fibra de malva pelos agentes de comercializaçãoFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
A atividade produtiva mantém-se, geralmente, em moldes lógicos tradicionais,
impondo ao camponês a necessidade de trabalhar mais intensamente, nos dois ambientes
(água e terra). Estas condições, acrescidas da fertilidade das terras molhadas e da viscosidade
dos lagos pesqueiros, favorecem a economia do excedente. Além disso, parte significativa da
decisão do que e como produzir vem como imposição dos requisitos ditados pelo mercado
consumidor.
O acesso aos programas do Governo é médio-baixo (0,385). Durante os
questionamentos sobre esses indicadores, houve muitas críticas em relação ao acesso, os
programas de Governo como o Bolsa Família e o PRONAF são considerados burocráticos,
pois os administradores municipais, concentram os benefícios, cadastrando ou informando
apenas para as comunidades em que fazem parte de seu interesse eleitoral
Outras dificuldades apontadas, em algumas comunidades, são os documentos pessoais
pendentes ou gasto com transporte e/ou hospedagem para o cadastro em localidades próximas,
onde geralmente são feitos os cadastros para participar destes programas. O acesso a crédito
(0,362) e acesso a assistência técnica (0,327), na concepção dos agricultores, são médio-
baixos. O acesso a crédito e assistência técnica podem ser tratados de maneira conjunta pelo
fato de serem quase inexistentes dentro das comunidades do Baixo Amazonas. Os agricultores
afirmam que encontram dificuldades para acessar assistência técnica quando há necessidade,
pois os órgãos como IDAM ou SEPROR não possuem técnicos suficientes e quando
119
solicitados, os agricultores tem que pagar o transporte deles. A presença e atuação das
instituições são consideradas médias (0, 511). Alguns sentem profundo descontentamento
com a atuação de prefeitos, líderes comunitários ou órgãos do governo estadual ou municipal
na região.
Características do Desenvolvimento
A segunda instância - Características de Desenvolvimento - também é considerada
média pela população rural do setor censitário (0,582).
Figura 75 – Características do Desenvolvimento – ICVFonte: SGE/SDT, 2011.
Renda Familiar, produtividade do trabalho e da terra:
120
A Renda Familiar das comunidades visitadas do setor censitário, obteve índice médio
de 0,482, e a produtividade do trabalho nos sistemas de produção situa-se na média (0,548),
enquanto que a produtividade da terra é médio alto (0,659), estes fatores apresentam-se de um
modo geral razoáveis. Além da agricultura como principal fonte de renda nestas localidades, o
Bolsa Família, com bolsas que variam entre R$ 50,00 a 120,00 reais, tem sido considerado um
complemento importante na vida dos comunitários.
No fator produtividade do trabalho, os entrevistados descrevem que há ocorrência de
fatores limitantes como: excesso de trabalho, causando cansaço físico nos agricultores, para
este contexto Chayanov (1974) explica que a família camponesa procede mediante uma
avaliação subjetiva, baseada sobre uma longa experiência agrícola da geração atual e das
gerações precedentes. A maioria das famílias camponesas pode ou bem oferecer um grande
número de horas de trabalho, ou bem trabalhar mais intensamente, e às vezes fazer ambas as
coisas.
A quantidade de trabalho necessário, em condições dadas, pelos membros da família é
o que Chayanov (1974) denomina grau de auto-exploração do trabalho familiar. Os
camponeses não farão um esforço maior salvo que estimem que dito esforço se traduza em um
incremento do rendimento, o que poderia ser afetado e seria a um aumento do consumo
familiar, da inversão na unidade de produção familiar, ou dos dois fatores ao mesmo tempo.
Outra limitação para os agricultores são as doenças, principalmente em agricultores da
malva, que enfrentam dificuldades e condições de insalubridade, pois durante o corte e
afogamento do plantio, os agricultores permanecem submersos na água, propensos ao ataque
de cobras e arraias, além de problemas de saúde, como reumatismo, doenças dermatológicas e
respiratórias. Porém, a cultura da juta e da malva tem adquirido grande importância na
economia da região amazônica por quase meio século, em função de sua capacidade de
manter as sociedades agricultoras no meio rural na utilização de forma produtiva das áreas de
várzea na extensão do rio Amazonas.
Um fator que contribui para a manutenção e perpetuação deste cultivo é a facilidade de
exploração regional dessas plantas e o sucesso na comercialização das fibras no mercado
nacional, aliado à extraordinária adaptação da juta na região e à presença da malva, nativa no
Estado do Pará e posteriormente cultivada no Estado do Amazonas.
Sobre a produtividade da terra, segundo Therezinha Fraxe (2011) a várzea do
Solimões-Amazonas fornece aos camponeses uma renda de suas terras molhadas (que são
fertilizadas anualmente) e também de seus rios, lagos, igapós e furos, para isso, os eles
121
praticam os processos de trabalho em uma produção integrada, explorando, em maior ou
menor grau, os recursos naturais renováveis (como fontes de água e a vegetação nativa),
através das atividades de agricultura, criação e extrativismo animal/vegetal. Assim o
agricultor consegue manejar estas pluriatividades, sem causar grandes danos ao meio
ambiente, contribuindo também para a conservação do recurso terra, que conservado e
manejado adequadamente tende a ter uma boa produtividade.
Desta forma, sociedade local tem elaborado técnicas que visam estabelecer relações
estáveis com meio ambiente, orientadas pelo conhecimento dos recursos naturais que foi
desenvolvido ao longo dos anos. Este conhecimento tem contribuído para que estas
sociedades estabeleçam uma exploração racionalizada desses recursos (figuras 76, 77, 78 e
79), compatíveis com o “mínimo vital”, apresentado por Antônio Candido em Os parceiros
do Rio Bonito. Desta forma, pode-se dizer que estas sociedades desenvolveram uma economia
de tipo fechada, na medida em que produzem e comercializam para garantir, em primeiro
plano, seu sustento e não para a acumulação de capital (CANDIDO, 2001).
Figuras 76, 77, 78 e 79 - Tipos de exploração racionalizada dos sistemas produtivos Fonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Quanto à diversificação da produção agrícola, os resultados demonstram que este fator
está em torno de 0,497, ou seja, a diversidade de produtos é média. O que ocorre é que os
agricultores têm no cultivo das roças de mandioca (Manihot esculenta), seu produto mais
expressivo e importante, sendo as hortaliças e frutos considerados como produtos
complementares, tanto para a alimentação da família, como para a comercialização.
A farinha faz parte da dieta alimentar destas comunidades e algumas famílias vivem
somente do cultivo de roças, devido ao reduzido número de mão de obra nas lavouras, sendo
esta uma atividade de grande importância, não somente pelo aspecto econômico, mas também
pelo lado social, visto que ela aumenta as relações sociais entre os membros das famílias
(esposa, marido e filhos e parentes próximos) e entre as famílias locais. O que ocorre nestas
comunidades, é que a mandioca, por si só representa a diversidade agrícola, segundo Brocki 122
(2001) a espécie apresenta grande diversidade intra-específica que favorece a manutenção da
diversidade da espécie, ocorrendo principalmente através de uma rede de permuta constante
de material genético, baseada em relações amistosas de parentesco e compadrio, onde são
selecionadas aquelas variedades que produzem farinha amarela e maior quantidade de sacas.
Efeitos do Desenvolvimento
A terceira instância trata de questões referentes às múltiplas dimensões de
capacitações e funcionamentos dos efeitos do desenvolvimento nas localidades do setor
censitário, esta instancia é considerada pela população rural do Baixo Amazonas como
“médio-alto” (0,693).
Figura 80 – Efeitos do Desenvolvimento – ICV Fonte: SGE/SDT, 2011.
As condições de alimentação (0,616), e de saúde (0,623), apresentam-se como médio-
alto na percepção dos entrevistados.
Em geral, a dieta alimentar das populações que habitam o interior do Estado do
Amazonas é, sem dúvida, repleta de limitações. Nem sempre é possível ter acesso a uma
alimentação balanceada, nos três turnos do dia, manhã, tarde e noite. Por essa razão,
buscaremos ao longo deste texto compreender como tem se caracterizado a dieta do homem
amazônico, quais as mudanças que podem ser identificadas e as dificuldades que 123
permaneceram. O café da manhã do caboclo é simples, composto apenas pelo café coado logo
que amanhece o dia, com pouco açúcar, raras vezes é possível encontrar pão, bolacha ou
qualquer outro complemento. O cafezinho também é servido em outras ocasiões, quando
chega uma visita, amigos da comunidade ou quando se volta do trabalho, em algumas casas o
café é a bebida que está sempre disponível para quem chegar, mas isso depende dos recursos
que cada família dispõe.
Contudo, não são todas as comunidades que possuem hábito de tomar café pela
manhã, dada a dificuldade que encontram de ter acesso a estes produtos. Por outro lado, há
comunidades onde é possível encontrar outros produtos, como bolacha, pão, manteiga, leite e
outros produtos, dependendo da distancia desta comunidade de algum centro urbano. De fato
a dieta alimentar esta relacionada às principais atividades econômicas desenvolvidas nas
comunidades, em alguma delas é possível encontrar entre os produtos consumidos o leite de
gado, em razão da criação de gados bovinos pelas famílias. Além da criação de bois, as
famílias garantem sua subsistência através da criação de outros animais de médio e pequeno
porte, como porco, frango e pato. Esses animais são importantes para a segurança alimentar,
pois permitem o consumo de ovos e carnes, bem como podem ser vendidos em outros
momentos.
Desta forma, estas comunidades apresentam dietas alimentares diversas, algumas são
limitadas ao feijão, arroz, farinha e peixe, enquanto outras têm acesso a outros produtos como
enlatados, café, açúcar, macarrão, manteiga e outros produtos. No entanto, o peixe é o
principal recurso alimentar disponível entre as pessoas. Por essa razão, é possível encontrar
em quase todos os quintais, pequenas hortas com cheiro-verde (coentro), chicória e cebolinha,
as três principais hortaliças utilizadas para o preparo e tempero do peixe no interior do Estado.
Portanto, a variação da dieta alimentar do morador do interior do Estado do Amazonas
depende do equilíbrio que ele consegue manter entre o volume da produção e os gastos em
dinheiro, pois nem todos os meses é possível comprar outros produtos para complementar a
dieta, o que faz com que estas fiquem sempre reduzidas ao peixe, farinha, verduras e frutas
cultivadas na própria propriedade.
As relações de vizinhança são importantes para garantir a complementação da dieta
alimentar e também da saúde nos momentos difíceis, uma vez que os moradores costumam
dividir seus alimentos e plantas medicinais, estabelecendo-se, assim, um amplo sistema de
troca entre eles. Para tanto, as condições de saúde que também são tidas como médio-alto
pelos comunitários, é influenciada pelo uso de plantas medicinais, pois em sua maioria as
124
comunidades visitadas, não possuem postos de saúde, dificultando assim com que os
moradores locais possam ter acompanhamento médico/odontológico.
Os resultados permitem inferir no que se refere à permanência dos membros da família
na comunidade, que aproxima-se da escala mais alta (0,885), evidenciando que o êxodo rural
na região tem diminuído, como já visto em razão de diversos fatores que expomos
anteriormente, como o acesso a escola (em relação à dificuldade que se tinha á tempos atrás),
a assistência social, através da Bolsa família, apesar da burocracia, e das práticas agrícolas, as
quais como dissemos, são a principal fonte de renda dos moradores.
Sob o foco econômico (0,665) este é apontado como médio-alto. Neste caso, além da
agricultura, o fator mudança é atribuído, principalmente, ao Bolsa-Família, responsável pela
diversificação das fontes de renda.
A percepção sobre as mudanças na situação ambiental da unidade, também demonstra-
se favorável (0,635), os moradores (por natureza), manejam, conservam e preservam seu
ambiente, por que necessitam deste para a sua sobrevivência. Os exemplos revelados pelas
comunidades ribeirinhas no que se refere ao funcionamento de apropriação, uso e gestão dos
recursos naturais podem ser adotados como referência. Isso tem sido progressivo tanto no
âmbito nacional como internacional. Essa linha de investigação tem mostrado que, se o
respeito pelo uso sustentado dos recursos tornam-se algo compartilhado pela comunidade,
aumenta as chances de êxito nas formas de gestão capazes de favorecer o alcance simultâneo
de uma distribuição mais eqüitativa da riqueza (DIEGUES, 1994).
No entanto, é importante destacar a intensa dinâmica de modificação ambiental que
caracteriza as várzeas da Amazônia, causada não em decorrência das ações antrópicas dos
moradores locais, um dos exemplos é a sucessão florestal na várzea que é iniciada nas praias,
com a rápida acumulação de sedimentos, que intensifica com o aumento gradual da cobertura
vegetal (JUNK, 1984). Este processo resulta na formação dos chavascais, restingas baixas e
restingas altas, sendo estas últimas o estágio clímax do processo nas áreas de formação no
Holoceno (KVIST e NEBEL, 2001). Esta construção é complementada pelo
desbarrancamento das restingas altas, seguida pelo "nascimento" de novas praias. Algumas
comunidades visitadas localizam-se em meio a esta dinâmica, adquirindo desta forma, certo
caráter nômade, onde mudanças são forçadas a cada 50 anos aproximadamente, devido ao
desmoronamento das áreas comunitárias.
Participação social (cooperativas, associações), política e em atividades sociais:
125
A participação da família em organizações comunitárias (associações, cooperativas e
igrejas), eleições, conselhos, reuniões, em atividades culturais, é tida como médio-alto. Ainda
que nem todas as comunidades possuam suas cooperativas ou associações, em todas elas há
um líder comunitário. Na medida em que buscamos conhecer o universo cultural e social
formado pelos moradores das comunidades do setor censitário do Baixo Amazonas,
percebemos as fronteiras sociais e espaciais estabelecidas conscientemente por eles. Durante
os primeiros contatos com as comunidades logo entendemos que a lógica de organização
destas populações está estreitamente relacionada ao meio ambiente no qual vivem. Seus usos
se revelam no habitar, na vida cotidiana que fundamenta a história e a memória das pessoas e
suas relações sociais, diante das possíveis dinâmicas culturais que envolvem suas realidades.
Trata-se de destacar o papel que alguns grupos sociais assumem na defesa dos seus
interesses e necessidades, tornando possível à construção de lugar marcado por costumes e
práticas tradicionais de uso dos recursos naturais, mas um lugar construído a partir da uma
postura autônoma e livre em permanecer sustentando práticas simples e pouco lucrativas na
vida cotidiana.
Para Kênia Kemp (2001) nas sociedades tradicionais, ao contrário das sociedades
urbanas, há uma forte ligação entre cultura, povo e território, de forma que cada grupo social
possui uma geografia delimitada e um referencial cultural fixo, são, justamente estes aspectos
que garantem a vida comunitária. São as relações de vizinhança, as festas, a religião, os
interesses econômicos, ou seja, a vida comum, que tende a aproximar as pessoas e dão um
sentido de identificação ao lugar, bem como os conflitos que tendem a unir as pessoas em
torno de um bem comum, como ocorre nas comunidades visitadas.
O sentido de bem comum alimentado entre os povos que habitam a Amazônia tornou-
se um importante instrumento para a organização social das comunidades tradicionais,
destacando-se a importância que as famílias tiveram na formação das comunidades, pois a
rede de sociabilidade e solidariedade criada entre as famílias foi responsável pela sustentação
das tradições e valores culturais transmitidos ao longo dos anos de geração a geração. Embora
as comunidades em questão tenham passado e venham passando por transformações
socioculturais, como a mudança nas atividades produtivas (de agricultores para pescadores, ou
vice-versa), o elo que une os comunitários de um modo geral, tem sido mantido, as relações
de vizinhança, parentesco, as tradições religiosas e culturais continuam sendo sustentadas por
seus moradores e garantido assim a reprodução das práticas e relações sociais existentes.
126
Um dos exemplos que implica na reprodução das práticas e relações sociais, são os
aspectos religiosos da cultura amazônida, que apresentam uma rica diversidade de mitos,
concepções, crenças e práticas, considerando a influência religiosa indígena, africana e
portuguesa. Em geral, nas comunidades locais, os santos populares católicos assumem uma
importância significativa para a determinação da religião nestas comunidades, uma vez que
estes santos são aqueles de quem se obtém os “milagres” e “graças” por meio de promessas,
os moradores cultivam sua devoção aos santos por meio de práticas como o ato de acender
velas, colocar flores e às vezes placas e faixas de agradecimento por alguma graça alcançada.
O poder destes santos está relacionado à chegada de suas imagens nas comunidades, os
moradores gradativamente tornam-se devotos, constroem suas igrejas e realizam cultos onde
eles são venerados.
Nas comunidades pesquisadas, estes santos possuem um importante papel para
garantir a vida social local, pois são durante os cultos religiosos realizados aos domingos
constituem o momento por excelência da sociabilização, é quando os moradores podem
colocar as conversas em dia, obter informações sobre o que tá acontecendo na comunidade e
do que vai acontecer. Quando a igreja deixa de desempenhar este papel, como ocorreu em
algumas comunidades do setor censitário, a vida social da comunidade deixa de existir. Desta
forma, a igreja católica representa o núcleo social dos moradores, uma vez que grande parte
das atividades realizadas na comunidade é organizada na igreja.
Por outro lado, o que se observa em outras comunidades é a ascensão da religião
evangélica, pois um fator que tem se repetido em quase todas as comunidades abrangidas pela
pesquisa é a presença da igreja católica na formação e fortalecimento das comunidades
amazônicas e, posteriormente, sua dissolução com a chegada de novas igrejas e orientações
religiosas. Por essa razão, as comunidades são divididas pelas igrejas católicas e evangélicas,
de forma que uma parte da comunidade continua participando das festas, missas e novenas,
enquanto outras migraram para as igrejas evangélicas que foram sendo construídas ao longo
dos anos.
As comunidades em geral realizam festas em homenagem a estes santos católicos, que
ocorrem juntamente com outros eventos folclóricos, cívicos e esportivos, como o carnaval, a
semana da pátria, campeonatos esportivos e as festividades relacionadas à agricultura e à
pesca, caracterizadora das economias locais. As atividades realizadas durante estas festas,
geralmente, ocorrem na maioria das comunidades. Em geral possuem procissões, onde o santo
é retirado da igreja e carregado em um andor até a primeira casa onde será realizada a
127
primeira novena, e a segunda e última procissão ocorre a transladação do santo à Igreja. Isto
porque neste momento estão presentes na comunidade todos os convidados e curiosos da
festa.
Para que a festa do santo ocorra, são necessárias diversas figuras simbólicas, que não
só cuidam da execução da festa, mas também contribuem para a repetição e perpetuação desta
como tradição. Essas figuras preenchem o que chamamos de encargos da festa: para que a
festa se realize e, principalmente, se perpetue, existe uma série de encargos (funções) para
diferentes membros da comunidade. Cada um desses encargos possui uma atribuição
específica e presta alguma homenagem ao santo da festa, representando uma referência para a
população do local e uma garantia de responsabilidade para quem possui o encargo. De outra
forma, é um sinal de respeito e contentamento ser escolhido (ou sorteado) para uma certa
atribuição na festa.
O uso de mastros tem lugar de destaque na maioria das festas de santos que ocorrem
no Brasil. O significado dos mastros, de acordo com Câmara Cascudo (1986: 481) é variado
nas festas brasileiras: a homenagem a um santo, com a plantação de uma árvore decorada
representa a fecundidade da terra, das sementes, da reprodução da vida, da boa colheita e da
proteção. O autor cita as diferenças entre o mastro e o poste central, outra manifestação do
mastro: “[...] são, etnograficamente, entidades diversas. O primeiro é símbolo propiciatório da
fecundação vegetal e o segundo uma égide evocadora perdida unidade telúrica do mundo,
passando a representar a imagem da firmeza, da sustentação do equilíbrio, e decorrentemente,
signo da soberania domínio, força disciplinadora”. Câmara Cascudo informa ainda: sempre
que o mastro estiver com oferendas, frutos, flores, fitas, revive um vestígio do culto da
vegetação, ou seja, na maioria das vezes os cultos agrários aparecem como a origem dos
mastros, mesmo que seus participantes não percebam atualmente essa relação.
3.7. Análise Integradora de Indicadores e Contextos
A análise integradora de indicadores envolve, em um primeiro momento, dois
indicadores sociais que estão diretamente relacionados: o Indicador de Identidade Territorial e
o Indicador de Condições de Vida. Estes dois indicadores estão relacionados e gravitam em
torno da noção de agricultura familiar. A agricultura familiar foi considerada o aspecto
definidor da identidade territorial do Baixo Amazonas, relacionada com as formas de uso do
solo e formas de conservação, estes aspectos estão relacionados no sentido de delimitar a
128
identidade territorial, o que mantém relação direta com o Indicador de Condições de Vida,
que tem como foco o agricultor familiar.
Figura 81– Análise integradora de indicadores sociaisFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Com relação ao Índice de Condições de Vida – ICV foram destacados fatores de
desenvolvimento (área de produção e mão-de-obra familiar), característica de
desenvolvimento (preservação da floresta, solo e água), efeitos do desenvolvimento
(permanência no domicílio e atividades culturais). A agricultura familiar assume importante
papel na definição da identidade, pois está diretamente relacionada aos aspectos
característicos da região, nesse caso, os recursos naturais são fundamentais para esta
definição.
De acordo com Noda, a Amazônia Centro-Ocidental mantém sua vegetação natural
bastante preservada, graças às formas de produção praticadas pelos agricultores tradicionais
familiares. Essas produções apresentam níveis de sustentabilidade socioambiental e de
suficiência alimentar importantes para garantir a integridade dos ecossistemas. Esse agricultor
familiar é polivante, acessa recursos disponíveis e percebe a cronologia da produção agrícola
e reprodução ambiental. A jornada de trabalho é familiar, distribuída em atividades agrícolas,
129
extrativistas (caça, pesca, coleta de produtos florestais). A força de trabalho constitui um
elemento fundamental para o processo, o ponto forte da produção. Nas palavras de Noda:
“Além dos recursos naturais existentes, a força de trabalho é o único fator de produção,
necessitando, portanto, uma administração criteriosa da sua utilização” (NODA, 2007:074).
Este cenário revela um nível de auto-suficiência no sustento dessas famílias, o que
pode ser explicado pela diversidade de produção. Outros fatores como o compartilhamento
comunitário dos recursos são importantes para a conservação e segurança alimentar. As
intervenções feitas no sentido de especializar a agricultura causam sérios transtornos na
organização social da produção, a condução a uma produção especializada provoca crises no
abastecimento alimentar. Portanto, a possibilidade de manutenção das unidades produtivas
rurais familiares garante a existência de um sistema de preservação dos recursos naturais.
Para Noda a racionalidade do sistema produtivo está assentada em três subsistemas
básicos: subsistema de auto-suficiência e sustentabilidade familiar, subsistema de produção
agrícola e extrativa comercial e subsistema estatal. O subsistema de auto-suficiência e
sustentabilidade familiar é constituído por uma articulada rede de atividades produtivas
assentadas na força de trabalho familiar, relaciona-se com o ambiente externo dos mercados.
O subsistema de produção agrícola e extrativa comercial está caracterizado pelo
desenvolvimento de atividades extrativas de fruteiras. A quantificação do valor monetário
gerado por estas atividade é caracterizado pela falta de registro e controle dos procedimentos
comerciais. O subsistema estatal compreende fluxos econômicos gerados pelos investimentos
e transferências dos governos federal e estadual, através dos programas oficiais de fomento à
produção.
A organização espacial é resultado do processo social de produção de grupos de atores
sociais, reflete a natureza da produção e o controle exercido sobre as relações. Para Noda: “O
espaço é produzido, reproduzido, recriado, configurando-se não apenas sociedade, localidade
ou comunidade, mas também e, principalmente, como possibilidade” (2007:30). Dentro desse
campo de possibilidade estão os componentes do sistema de produção comumente utilizados
na região amazônica.
Seguindo a mesma perspectiva analítica, podemos perceber que apesar do campo de
possibilidades que se apresenta para o projeto de desenvolvimento dos territórios rurais, há
inúmeras dificuldades e problemáticas se apresentam na integração dos resultados. Grande
parte dos itens dos indicadores sociais que apresentam relações entre si são considerados
negativos. Nesse caso, buscamos estabelecer relações entre três indicadores sociais:
130
capacidades institucionais, gestão do colegiado e avaliação de projetos. Entendemos que estes
itens estão diretamente relacionados e imbricados, portanto, se um deles não funcionar bem os
outros, certamente, não vão apresentar resultados satisfatórios.
Alguns pontos (destacados na figura) apresentam repetição em todos os indicadores
citados, saltam como os principais problemas encontrados. Em primeiro lugar, as dificuldades
encontradas na gestão pública, como falamos anteriormente, os gestores públicos possuem
pouco envolvimento nos assuntos relacionados ao CODETER, o que tem dificultado
consideravelmente a gestão. Portanto, a gestão pública interfere na capacidade institucional,
na gestão do Colegiado Territorial e no desenvolvimento dos projetos e empreendimentos.
O segundo ponto – falta de capacitação técnica e operacional – surge como uma das
principais reclamações, afinal interfere diretamente na condução dos projetos de
desenvolvimento. Se não há capacitação técnica e operacional também não há a possibilidade
de executar projetos de desenvolvimento, o que resulta, consequentemente, na concentração
dos grandes empreendimentos nos municípios que dispõem de capacitação técnica. Portanto, a
falta de capacitação técnica e operacional interfere na capacidade institucional, na gestão do
Colegiado Territorial e no desenvolvimento dos projetos e empreendimentos.
O terceiro ponto – interferência político-partidária – é um item citado indiretamente
entre os entrevistados que apesar de assumirem suas posições partidárias, reconhecem a
dificuldade encontrada entre os grupos diferentes. Projetos que são desenvolvidos por um
grupo que pertence a um partido diferente daquele que está na gestão municipal, certamente
não será considerado importante ou trabalhado. O que percebemos é uma constante
fragmentação de interesses e ações em função das divisões partidárias, o que compromete,
significativamente, a formação de uma perspectiva de desenvolvimento territorial.
131
Figura 82– Análise integradora dos indicadores sociaisFonte: UFAM/NUSEC/SDT, 2011.
Todos os pontos citados até aqui contribuem para que haja um enfraquecimento nas
ações e atividades do Colegiado Territorial, durante as entrevistas era possível perceber o
descrédito e a perda de expectativas com relação ao programa Territórios da Cidadania. Os
entrevistados alegaram que já houve tempos melhores no desenvolvimento do programa, mas
que a ausência de resultados concretos e ações consolidadas acabou afastando parte do
Colegiado e deixando as outras partes descontentes e desinteressadas. O enfraquecimento das
ações do CODETER interfere no controle social exercido pelo Colegiado Territorial.
O controle social atua como a possibilidade de integração da sociedade com a gestão
publica, com a finalidade de solucionar problemas e as deficiências sociais com mais
eficiência. O controle social é um instrumento democrático no qual há a participação dos
cidadãos no exercício do poder colocando a vontade social como fator de avaliação para a
criação de metas a serem alcançadas no âmbito de algumas políticas publicas. Para isso, são
criados mecanismos que abrem a possibilidade de a sociedade civil denunciar atos ilícitos
praticados pelo poder público e também de se manifestar contrariamente sobre algum
procedimento político-administrativo.
132
Contudo, quando as articulações entre os grupos que exercem esse controle social,
como é o caso do Colegiado Territorial, não estão funcionando bem, a manifestações em
torno das gestões públicas também ficam comprometidas. Além disso, percebemos que há
dificuldade no repasse de informações. Até o momento não conseguimos identificar um
sistema de comunicação interterritorial consolidado, sobretudo, com relação às áreas rurais
dos municípios.
Em conclusão, podemos estabelecer a seguinte relação: as capacidades institucionais e
a gestão do Colegiado Territorial figuram como fundamentais para o desenvolvimento de
outras ações territoriais. Nesse caso, a identidade territorial, as condições de vida e os projetos
são conseqüência do pleno desenvolvimento da gestão e das relações institucionais. Se a
capacidade institucional não funcionar bem, certamente a identidade territorial (forjada pelo
Programa neste momento) não poderá se consolidar e as condições de vida do agricultor
familiar não apresentarão melhorias. Se a gestão do Colegiado Territorial não cumprir com o
seu papel, a identidade territorial e as condições de vida não vão mudar.
Figura 83 – Análise integradora dos indicadores sociaisFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
A partir desta análise podemos perceber que não existe uma relação hierárquica entre os
indicadores sociais, tampouco sobreposições entre estas relações. O que podemos perceber é
uma ligação direta e de dependência entre a capacidade institucional e a gestão do colegiado,
de modo de cada um desses elementos não pode existir sem o outro.
133
3.8. Propostas e Ações para o Território
As propostas e ações para o Território foram elaboradas durante a realização da
Oficina de Análise e Interpretação de Indicadores Sociais, dando início à agenda de extensão
proposta para o território. A oficina teve como finalidade a análise e discussão dos
indicadores sociais do Baixo Amazonas (Identidade Territorial, Capacidades Institucionais e
Condições de Vida), por meio de ferramentas de diagnóstico participativo. Especificamente,
buscou-se socializar os resultados obtidos na pesquisa de campo da Célula de
Acompanhamento e Informação do Baixo Amazonas; analisar os resultados obtidos na
pesquisa de campo com ênfase nos indicadores de Identidade Territorial, Capacidades
Institucionais e Condições de Vida; interpretar os resultados obtidos no trabalho de campo a
partir de metodologias de diagnóstico participativo (UFAM/DFDA/Colegiado Territorial).
Figura 84 – Oficina com CODETERFonte: UFAM/NUSEC, 2011.
Os indicadores são fontes de informação para a formulação de políticas sociais,
programas e projetos nas diferentes esferas de governo e organizações. A construção e a
análise destes dados permitem o conhecimento sobre as mudanças sociais e suas diferentes
causas e monitoram as condições de vida e bem-estar dos grupos sociais envolvidos,
demonstrando os resultados obtidos por projetos de qualquer natureza. A Oficina constituiu
um instrumento capaz de auxiliar os gestores da sociedade civil e poder público a definir,
interpretar e analisar indicadores, conhecer cada uma das temáticas trabalhadas, a fim de
subsidiar o planejamento e a tomada de decisões em suas atividades.
134
Pautada neste cenário, contou com a seguinte programação: Socialização dos
resultados obtidos na pesquisa de campo: identidade territorial e capacidades institucionais
(Coordenador e técnicos das Células); elaboração de diagnóstico participativo: identidade
territorial e capacidades institucionais (grupos de trabalho); socialização dos resultados
obtidos na pesquisa de campo: Índice de Condições de Vida (Coordenador e técnicos das
Células); elaboração de diagnóstico participativo: índice de condições de vida (grupos de
trabalho); socialização dos resultados obtidos na pesquisa de campo: Acompanhamento da
gestão do colegiado (Coordenador e técnicos das Células); laboração de diagnóstico
participativo: Acompanhamento da gestão do colegiado (grupos de trabalho); Aplicação da
metodologia de análise participativa SWOT/FOFA.
Figura 85 – Oficina com CODETERFonte: UFAM/NUSEC, 2011
Por fim, foi elaborada juntamente com o Colegiado Territorial do Baixo Amazonas
uma agenda de extensão, dando início a uma nova etapa de trabalho da Célula de
Acompanhamento e Informação, baseada no desenvolvimento de atividade de extensão e
capacitação. Para a agenda foram indicados os temas e problemáticas de maior importância
para o CODETER, a fim de pudessem ser discutidas e solucionadas em parceria com a Célula
de Acompanhamento e Informação da Universidade Federal do Amazonas. As pospostas
estão sistematizadas abaixo:
1. Proposta:
Fortalecimento dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento Rural Sustentável
135
Reunião por pólo: Urucará e SSU; Parintins, Barreirinha e Nhamundá; Maués e Boa Vista do
Ramos;
- Marco legal (suplência, regimento);
- Fortalecer o conselho – resgatar a ideia de conselho;
- Perfil, história e atuação de entidades para participar do conselho;
Esta proposta foi elaborada com base nos resultados obtidos acerca da gestão do
Colegiado Territorial, a partir da realização de diagnóstico-participativo. De acordo com os
participantes, parte das dificuldades e limitações encontradas na gestão social e no
desenvolvimento territorial do programa se devem ao fato dos CMDRS não estarem
desenvolvendo, plenamente, suas atividades. Em alguns municípios não houve um processo
de consolidação do CMDRS, como um instrumento fundamental para o desenvolvimento do
programa. O resultado é uma oscilação entre os diferentes municípios do território.
2. Proposta:
Trabalhar fortalezas e fraquezas do Colegiado Territorial
- Reunião da plenária;
- Atividade deve acontecer até 12:00h;
- Realizar atividade em um barco;
- Itens listados nas Fraquezas e Ameaças;
Durante a atividade, os participantes reconheceram que precisam trabalhar as
fraquezas e as fortalezas do CODETER. Apesar dessas fraquezas serem identificadas
frequentemente, não há um processo de discussão e superação das mesmas, o que justifica a
necessidade de realização de oficinas que possam discutir e trabalhar os itens listadas na
dinâmica participativa realizada juntamente com a equipe da CAI/Baixo Amazonas. Trata-se
da (re)construção de estratégias de atuação do CODETER, que possam fortalecer o trabalho
que vem sendo desenvolvido na gestão social do território rural do Baixo Amazonas.
3. Proposta:
Gestão dos Empreendimentos e Projetos de Desenvolvimento do Território
Reunião da plenária;
- Noções básicas de administração e contabilidade (O que é um empreendimento?)
136
- Estudo de viabilidade econômica;
- Conhecer como ocorre a distribuição dos recursos (marco legal);
- Bases de serviços;
- Bancos (financiadores);
- Parcerias possíveis (CONAB, Sebrae e Economia Solidária);
Outro problema recorrente no Baixo Amazonas tem sido a inadimplência das
prefeituras diante dos empreendimentos e projetos de desenvolvimento que estão em fase de
conclusão de suas obras em alguns municípios. Os participantes apresentaram a proposta de
realização de um seminário que possibilitasse o estabelecimento de diálogo entre as
prefeituras municipais, o Colegiado Territorial, a Delegacia do MDA e a Célula de
Acompanhamento e Informação. Este diálogo seria fundamental para a redefinição de metas,
identificação das principais dificuldades e encaminhamentos acerca dos projetos de
desenvolvimento que estão andamento em alguns municípios.
137
Anexo: validação de instrumentos e procedimentos
Identidade Territorial
As questões que envolvem a definição de identidade territorial do Baixo Amazonas são
caracterizadas pela abrangência na escolha de aspectos identitários. Os aspectos recursos
naturais, agricultura familiar, atividades econômicas e outros, não dão conta do que estamos
entendendo por identidade territorial, apenas há uma indicação de itens que são considerados
importantes para os entrevistados. Por essa razão, há uma repetição constante dos níveis de
avaliação – 0,4 e 0,5 – uma vez que todos os aspectos acabam sendo considerados
importantes, o que dificulta a definição de uma identidade territorial.
No que diz respeito ao uso do instrumento em si, podemos destacar que a aplicação é
enfadonha, considerando a repetição constante dos mesmos aspectos e mesmos níveis de
avaliação em todas as questões. Além do fato de algumas questões apresentarem repetição em
seus enunciados como as questões P8 e P12, P10 e P11. As perguntas partem do princípio de
que as pessoas conhecem os temas e conceitos utilizados, apresentando dificuldade no
entendimento. Por fim, as análises são utilizadas em nível municipal, podemos perceber
grande dificuldade de definição de uma identidade em nível territorial.
Gestão do Colegiado Territorial
O formulário que trata do Acompanhamento da Gestão do Colegiado apresenta
questões pontuais e diretas que envolvem a análise da gestão do colegiado, por essa razão
apresentou pouca dificuldade na aplicação, em função da ausência de abordagem conceitual.
O que ocorre é que a aplicação revela a diversidade de níveis de avaliação, revela o pouco
domínio das questões do colegiado por algumas das pessoas entrevistadas.
Capacidades Institucionais
O formulário também apresentou questões pontuais sobre a capacidade institucional de
cada município, contudo, foram encontradas dificuldades na seleção dos entrevistados. O fato
do público alvo do formulário ser o poder público, nesse caso, gestores públicos municipais
(secretário e prefeitos). Outro aspecto observado foi a ausência de questões que investigassem
verdadeiramente o nível de articulação entre as prefeituras e o . As questões tratam,
sobretudo, sobre as ações desenvolvidas pelas Prefeituras Municipais.
Índice de Condições de Vida138
As questões que compreendem o Índice de Condições de Vida – ICV não dão conta
das especificidades e singularidades de cada região brasileira. O que envolve diretamente a
definição de agricultor familiar, pois da forma como está posta acaba sendo reducionista e
simplificadora, sobretudo, no item que envolve questões de definição do agricultor familiar.
Na Amazônia, a polivalência de atividades para o sustento da família é essencial para a
sobrevivência da população local, afinal a sazonalidade da região não permite o exercício de
apenas uma atividade. No entanto, de acordo com os critérios do formulário a agricultura
familiar precisa ser a principal renda. Em que sentido?
Algumas questões apresentam imprecisão em seus enunciados, como por exemplo:
característica da mão-de-obra familiar? Quantidade de pessoas trabalhando? Resultado da
produção levando em conta o trabalho desenvolvido? As questões relacionadas à conservação
são pouco precisas. Conservação em que aspecto? Há confusão nos aspectos referentes à
infraestrutura como energia elétrica, água encanada e moradia. Estas questões são imprecisas
pois não revelam a realidade, as orientações do manual consideram como energia elétrica o
motor de luz? Em outras questões os parâmetros de avaliação são superficiais como: mais
para bom ou mais para ruim, a linguagem é confusa e pouco inteligível.
Avaliação de projetos
Neste formulário encontramos dificuldade na identificação dos entrevistados, esta
orientação não está presente no manual, sobretudo, com relação ao beneficiário. Quais seriam
os critérios para a definição do beneficiário?
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