1 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
1. INTRODUÇÃO
Os contratos diferenciais, tipicamente conheci-
dos como CFD’s, são uma das importantes
inovações introduzidas no mercado financeiro
nacional1. A aparente simplicidade de negocia-
ção destes contratos, aliada à facilidade com
que os investidores têm acesso aos meios ele-
trónicos onde é disponibilizada a sua negocia-
ção, tem contribuído para o significativo cresci-
mento das transações deste tipo de instrumentos
financeiros derivados, bem como para a sua
crescente utilização por parte de investidores
não institucionais como forma de acesso ao
mercado. A Figura 1 apresenta a evolução da
composição do valor das ordens transmitidas
pelos investidores a intermediários financeiros
autorizados a exercer a atividade em Portugal
por tipo de instrumento financeiro derivado.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE
RICARDO SILVA*
* O Autor é Economista no Gabinete de Estudos da CMVM. As opiniões e ideias expressas no presente artigo vinculam exclusivamente o Autor. O Autor agradece os comentários de Victor Mendes, João Osório, e Rita Correia a uma versão anterior do presente artigo. 1- Para uma análise aprofundada sobre a evolução do enquadramento legislativo envolvendo os contratos diferenciais veja-se Almeida
(2011).
Figura 1. Composição do Valor das Ordens Recebidas no Mercado a Prazo
Fonte: Cálculos próprios com base em dados reportados à CMVM no âmbito da Instrução da CMVM nº 5/2011.
2 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
A Figura é reveladora das preferências dos in-
vestidores para acesso ao mercado através de
instrumentos financeiros derivados. Especifica-
mente, é patente um aumento substancial do
valor das ordens transmitidas sobre CFD’s e
uma evolução de sentido contrário e magnitude
semelhante em outros instrumentos derivados.
Em particular, constata-se que este crescimento
tem sido sustentado essencialmente por investi-
dores não institucionais, tal como se ilustra na
Figura 2.
Figura 2. Composição do Valor das Ordens Recebidas no Mercado a Prazo
Nota: Cálculos próprios com base em dados reportados à CMVM no âmbito da Instrução da CMVM nº 5/2011. “NI”
– investidores não institucionais; “I” – investidores institucionais.
Os investidores institucionais têm uma maior
preferência por instrumentos financeiros deri-
vados negociados em mercado, em particular os
futuros que conferem uma maior proteção em
termos de risco de contraparte na medida em
que o clearing é possível.
Em termos absolutos, o crescimento da negoci-
ação de CFD’s tem sido significativo tal como
evidencia a Figura 3. É particularmente interes-
sante notar que esse crescimento se acentuou no
início do ano de 2009, atingindo alguma matu-
ração nos anos subsequentes.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 27
3 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
O significativo crescimento da negociação de
CFD’s é indicativo da capacidade de absorção
da inovação financeira por parte dos investido-
res nacionais. A par com este aumento da capa-
cidade de absorção da inovação, denotou-se um
reforço da preocupação das entidades de super-
visão com a potencial imperfeita perceção de
todos os riscos envolvidos na negociação dos
mesmos por parte dos investidores não qualifi-
cados, que têm cada vez mais constituído o pú-
blico-alvo das campanhas de marketing realiza-
das por parte dos intermediários financeiros
que disponibilizam a sua negociação.
A composição das ordens por tipo de subjacen-
te denota (Figura 4) que as preferências dos
investidores se centram na negociação de taxas
de câmbio e, em menor grau, de índices e
ações. Dado que o mercado cambial (Forex) é
caracterizado por elevada liquidez e por níveis
de risco não despiciendos, a utilização de
CFD’s sobre taxas de câmbio amplifica o risco
do investimento neste tipo de ativo financeiro.
O presente artigo pretende caracterizar os
contratos diferenciais, descrevendo de forma
prática os riscos, vantagens e desvantagens
envolvidos na sua negociação. Por forma
prática entende-se uma narrativa exemplificati-
va, que permita uma perceção adequada do seu
funcionamento.
Figura 3. Valor das Ordens e Número de Contratos CFD Negociados
Fonte: Cálculos próprios com base em dados reportados à CMVM no âmbito da Instrução da CMVM nº 5/2011.
Valores em milhões de euros.
28: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
4 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
2. OS CONTRATOS DIFERENCIAIS
Os contratos diferenciais são um instrumento
financeiro derivado essencialmente negociado
over-the-counter (OTC)2, que permite aos in-
vestidores a exposição a um determinado ativo
subjacente (por exemplo ações, índices de mer-
cado, mercadorias, taxas de juro, taxas de câm-
bio, futuros ou Exchange Traded Funds) sem a
necessidade de detenção física desse subjacen-
te. Este instrumento garante uma posição pura-
mente sintética e tem como objetivo replicar os
ganhos e perdas que um investidor suportaria
caso detivesse o ativo subjacente ao contrato.
Como refere Brown et al. (2010), na ausência
de custos de transação, o valor teórico de um
CFD iguala o valor do seu ativo subjacente.
Ademais, em qualquer momento no tempo e
mediante variações no preço desse subjacente, o
valor do CFD implica para o investidor um flu-
xo financeiro com a sua contraparte correspon-
dente à diferença entre o valor desse ativo em
mercado (ou difundido pelo intermediário fi-
nanceiro3) e o preço de abertura do contrato
diferencial. Este valor será positivo ou negativo
para o investidor (isto é, implicará um recebi-
mento ou um pagamento) consoante a evolução
do preço do ativo subjacente (isto é, valorização
ou desvalorização), bem como a natureza da
posição que o investidor tenha tomado (curta ou
longa).
Com efeito, uma das grandes vantagens do in-
vestimento em CFD’s é a facilidade em tomar
tanto posições longas como posições curtas no
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 29
Figura 4. Composição do Investimento em CFD’s por Tipo de Subjacente
Fonte: Cálculos próprios com base em dados reportados à CMVM no âmbito da Instrução da CMVM nº 5/2011.
2- Existe já a admissão de contratos diferenciais em mercado, como por exemplo na Austrália. Todavia, essa realidade ainda não abrange o mercado nacional.
3- Tal como será discutido mais adiante, o preço do ativo subjacente para efeitos de pricing do CFD pode não ser igual ao preço do ativo
subjacente em mercado.
5 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
ativo subjacente. Desta forma, um comprador
de CFD’s toma uma posição longa, benefician-
do se o preço do ativo subjacente (e consequen-
temente do CFD) aumentar. Contrariamente, se
o investidor vender CFD’s sobre um determina-
do ativo (isto é, se tomar uma posição curta, ou
como é comummente designado, uma posição
short) beneficiará se o preço desse ativo desva-
lorizar.
Um CFD pode assim ser identificado como
uma aposta na evolução futura do preço do ati-
vo subjacente, podendo (de forma talvez exces-
sivamente simplista) ser equiparado a um con-
trato de futuros com liquidação financeira mas
sem maturidade pré-definida. Contrariamente
aos contratos de futuros, o desenho dos CFD’s
não incorpora a existência de uma maturidade
para o contrato, podendo o investidor manter a
posição ao longo do horizonte de investimento
que desejar, desde que assuma quaisquer res-
ponsabilidades financeiras que dele advenham.
Cumpre ainda referir uma das principais carac-
terísticas. Os CFD’s são instrumentos financei-
ros negociados de forma alavancada
(leveraged). Tal decorre do modo como são
transacionados, isto é, recorrendo ao depósito
de margens junto do intermediário financeiro
mantendo, no entanto, a exposição ao valor
total do contrato.
3. UMA DESCRIÇÃO DOS RISCOS
E VANTAGENS DO INVESTIMENTO EM CFD’S
O investimento em CFD’s, independentemente
de qual seja o subjacente, não se encontra isen-
to de riscos para os investidores. Na presente
secção são referidos os principais riscos e van-
tagens que subjazem ao investimento nos con-
tratos diferenciais.
3.1 Alavancagem
Tal como referido, os CFD’s são instrumentos
financeiros que permitem ao investidor a expo-
sição alavancada a um determinado ativo subja-
cente. O recurso à alavancagem surge da neces-
sidade/possibilidade de os investidores, para
abrirem uma posição, depositarem junto do in-
termediário financeiro um determinado valor de
margem, correspondente na prática a uma per-
centagem relativamente reduzida do valor total
do contrato.
Como exemplo, vamos assumir que um deter-
minado intermediário financeiro exige a consti-
tuição de uma margem de 5% sobre o valor do
contrato para abertura de novas posições em
CFD’s. Um investidor que deseje comprar
CFD’s no valor de, por exemplo 10.000 euros,
não necessita de provisionar a sua conta junto
do intermediário financeiro em tal montante,
exigindo-se apenas o depósito do valor da mar-
gem, neste caso de 500 euros (correspondente a
5% de 10.000 euros). Contudo, apesar deste
investimento inicial de menor dimensão, a ex-
posição do investidor ao ativo subjacente é, de
facto, de 10.000 euros.
O valor exigido de margem não representa o
valor que o investidor tem sob risco de perda
dado que este apenas é constituído como forma
de o intermediário financeiro gerir o seu risco
de contraparte e de flutuações adversas de curto
prazo no preço do ativo subjacente. A vantagem
do uso de alavancagem (através do depósito de
margem) consiste na possibilidade de amplifi-
cação dos resultados dos investimentos realiza-
dos. Mas da mesma forma que amplifica os
ganhos, também amplifica as perdas. O investi-
dor pode sofrer perdas superiores ao montante
inicialmente investido (isto é, depositado como
30: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
6 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
margem), tornando-se na prática um devedor
líquido perante a sua contraparte, para o que
basta que a desvalorização do ativo subjacente
seja superior a um certa percentagem. No
exemplo acima, uma desvalorização de 5% no
ativo subjacente implicará uma perda de 100%
do montante efetivamente investido (e deposi-
tado como margem), e uma desvalorização su-
perior a 5% corresponderá a uma perda superi-
or aos 500 euros depositados. O nível de ala-
vancagem utilizado neste caso é de aproxima-
damente 1:20 (ou de 5:100), isto é, por cada
variação de 1% no ativo subjacente o investidor
terá ganhos (ou perdas) de 20% no seu investi-
mento.
Consideremos agora a utilização de alavanca-
gem de uma outra perspetiva. Em geral, um
investidor investe as suas poupanças por forma
a incrementá-las e, quando recorre ao mercado,
raras são as vezes em que duvida da segurança
das suas previsões quanto à evolução do preço
dos ativos em que pretende investir. A utiliza-
ção de alavancagem (ainda que de forma possi-
velmente inconsciente) constitui uma oportuni-
dade para conseguir rentabilidades considera-
velmente superiores (ou perdas consideravel-
mente superiores às que o investidor poderá
eventualmente suportar).
Recorramos ao mesmo exemplo acima. O in-
vestidor pretende investir 10.000 euros das suas
poupanças em barris de crude oil pois acredita
que o seu preço irá valorizar. Assumiremos que
cada CFD tem o valor de 10.000 euros e é refe-
rente a 1 barril de crude. O investidor poderia
comprar um contrato diferencial mas, em vez
de provisionar a sua conta com o valor total do
contrato (10.000 euros), apenas necessitaria do
valor da margem (isto é, 500 euros como vimos
acima). Contudo, o investidor pretende tirar o
máximo partido que o sistema de margem lhe
proporciona, e compra 20 contratos CFD, depo-
sitando a correspondente margem de 10.000
euros. Quase sem dar conta, o valor dos CFD’s
passa (erroneamente) para o investidor a ser de
10.000 euros (o valor de investimento inicial),
quando na realidade a sua exposição total é de
200.000 euros. Também neste caso uma redu-
ção de 5% no preço do crude oil conduzirá a
uma perda de 100% do montante efetivamente
investido (isto é, de 10.000 euros), e uma redu-
ção de 10% no preço do crude oil conduzirá a
uma perda de 20.000 euros, superior ao mon-
tante do provisionamento da conta.
A utilização do nome alavancagem está associ-
ada ao conceito de financiamento. Senão repa-
remos no seguinte paralelismo. Aquando da
abertura de uma posição longa/compradora por
parte de um investidor, a sua contraparte permi-
te que, em vez de depositar/pagar o valor total
correspondente ao investimento (valor facial do
CFD), este deposite um valor mais reduzido (a
margem) apenas para fazer face às flutuações
imediatas da posição (mark-to-market) e para
mitigar o risco de contraparte. Na prática, tal
equivale a uma situação em que a contraparte
financia o investidor no montante restante do
investimento, permitindo-o iniciar a transação
com um valor monetário inferior. No cenário
em que o preço do ativo subjacente não variou
aquando do fecho da posição, não existirá qual-
quer fluxo monetário entre o investidor e a con-
traparte decorrente do CFD, para além do mon-
tante depositado como margem (que em todo o
caso o investidor não perdeu e que constará na
sua conta). No caso oposto, aquando da abertu-
ra de uma posição curta/vendedora, apesar do
investidor necessitar de depositar o montante
correspondente à margem, tal equivale a uma
situação em que o investidor financia a sua
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 31
7 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
contraparte (o intermediário financeiro) para
que este assuma a posição compradora. Mais
uma vez, se o ativo subjacente não valorizar ou
desvalorizar, não existirá qualquer pagamento a
fazer pelo comprador ao vendedor ou pelo ven-
dedor ao comprador.
A negociação com recurso a margem tem sub-
jacente, como tal, o uso de alavancagem, dado
que, na compra de CFD’s, como o investidor
não é obrigado a pagar o total do seu investi-
mento no momento da abertura da posição, es-
tará naturalmente a beneficiar de um financia-
mento da sua contraparte. Quanto menor for o
montante de margem necessário para negociar
maior será o nível de alavancagem utilizado4.
Em casos limite, quando o montante de mar-
gem é muito reduzido (e a alavancagem eleva-
da), pequenas variações no preço do ativo sub-
jacente podem conduzir a perdas superiores ao
montante de margem inicial depositado pelo
investidor.
Como ilustração dos efeitos práticos da alavan-
cagem, iremos assumir um investidor que pre-
tende ter exposição ao índice PSI20. Assumi-
mos como exemplo que o investidor adquire
um CFD sobre o índice PSI20 a 2 de Janeiro de
2012, pelo que o intermediário financeiro o
obriga a depositar um montante de margem cor-
respondente a 5% do valor facial do contrato. O
investidor transmite uma ordem de compra a
5611,37 pontos5, que o intermediário financeiro
aceita, depositando 280,57 euros. A Figura 5
ilustra os ganhos e perdas para o investidor de-
correntes da manutenção da posição até ao dia
20 de Julho de 2012. Nessa data o investidor
decide fechar a sua posição6, tendo que assumir
uma perda de -305,5% no seu investimento,
enquanto o índice PSI20 registou uma perda de
aproximadamente -15,27%. O investidor torna-
se devedor de aproximadamente 576,58 euros
ao intermediário financeiro.
4- Como iremos ver adiante, a manutenção de posições abertas de um dia para o outro implica o pagamento (no caso de posições longas) ou recebimento (no caso de posições curtas) de uma taxa de juro, devido à necessidade de financiamento da posição.
5- Cotação de fecho do índice nesse mesmo dia, assumida para o presente exemplo. Iremos também ignorar para já a existência de custos
de corretagem bem como de financiamento, por forma a isolar o efeito do nível de alavancagem utilizado. 6- Dado que pretendemos apenas analisar os efeitos da alavancagem, assumimos que o intermediário não fecha a posição do investidor
após as perdas verificadas na margem inicialmente depositada, o que é implausível numa situação real.
Figura 5. Ganhos e Perdas CFD sobre o índice PSI20
Fo
nte
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álcu
los
pró
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bas
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Blo
om
ber
g.
32: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
8 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Apesar de constituir um risco significativo para
o investidor, o uso de alavancagem é também
uma das suas vantagens dado que, com um in-
vestimento inicial mais reduzido, o investidor
consegue obter uma exposição ao ativo subja-
cente muito superior.
3.2 Margin Calls
A negociação de CFD’s implica uma constante
monitorização, por parte dos investidores, das
posições que tomam em mercado. A elevada
exposição assumida aos ativos subjacentes em
virtude da alavancagem dos contratos diferen-
ciais pode conduzir a uma deterioração signifi-
cativa e rápida do montante investido.
Quando o valor depositado pelos investidores
se revela insuficiente em virtude da desvalori-
zação dos ativos subjacentes, os intermediários
financeiros requerem junto dos investidores
depósitos adicionais de margem. Tais reforços
de margem são denominados de margin calls e
permitem aos intermediários financeiros gerir o
risco de contraparte, isto é, o risco dos investi-
dores se revelarem incapazes de fazer face às
responsabilidades assumidas com o contrato
diferencial.
Como é realizado tal procedimento? Em cada
momento no tempo, o intermediário financeiro
realiza o mark-to-market (avaliação do CFD’s
ao preço de mercado dos ativos subjacentes)
das posições dos investidores e avalia o cumpri-
mento das necessidades de margem em cada
uma. A Tabela 1 exemplifica o procedimento7:
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 33
7- Não serão incluídas quaisquer comissões adicionais nem custos de financiamento overnight por motivo de simplicidade. Estes serão descritos e considerados adiante.. 8- Note-se contudo que determinados intermediários financeiros fixam níveis de liquidação mais reduzidos, podendo até igualar 0%. Tal
significa que o intermediário financeiro encerra as posições do investidor quando este sofre uma perda igual ao montante que depositou em
conta. Deve ainda ser notado que existem intermediários financeiros que realizaram os pedidos de reforço de margem tendo por referência
o preço de fecho do ativo subjacente (ou seja no final de cada sessão de negociação, não sendo esta operação necessariamente realizada em
tempo real), em virtude da elevada volatilidade que o valor das posições pode tomar. Contudo, quando as perdas sofridas pelo investidor são consideráveis e os limites de liquidação das posições são atingidos ou ultrapassados durante a sessão de negociação, poderá conduzir
ao encerramento das mesmas pelo intermediário financeiro.
Vamos assumir que o intermediário financeiro
exige a constituição de 5% de margem para
abertura da posição. Assume-se ainda que o
intermediário financeiro realiza o mark-to-
market da posição dos investidores em tempo
real e, quando o saldo líquido da conta do in-
vestidor representa menos de 5% do valor total
da sua posição, o intermediário financeiro con-
tacta o investidor requerendo um reforço de
margem. Este limite de margem é também por
vezes designado de margem de manutenção
(“maintenance margin”). Na prática, tal equiva-
le a avaliar se o saldo líquido da conta do inves-
tidor é inferior ao valor da margem de manuten-
ção (neste caso de 5% do valor da posição).
Assume-se ainda que quando o saldo líquido da
conta do investidor representa menos de 3% do
valor total da sua posição, o intermediário fi-
nanceiro procede ao seu encerramento de forma
a evitar perdas adicionais. Este limite é por ve-
zes também designado de nível de liquidação
(“liquidation level”)8.
Tabela 1. Exemplo do funcionamento de reforço de margem
Preço Crude ∆ Preço (%) Valor CFD ∆ Valor CFDRequerimento de
Margem (5%)Conta
Rentabilidade
(%)
Conta / Requerimento
de Margem (%)
Conta / Valor
CFD (%)Reforço
100,0 € - 100.000 € - 5.000,0 € 5.500,0 € - 110,00% 5,50% 0,0 €
99,9 € -0,10% 99.900 € -100,0 € 4.995,0 € 5.400,0 € -2,00% 108,11% 5,41% 0,0 €
99,3 € -0,65% 99.250 € -650,0 € 4.962,5 € 4.750,0 € -13,01% 95,72% 4,79% 212,5 €
98,8 € -0,46% 98.790 € -460,0 € 4.939,5 € 4.290,0 € -9,27% 86,85% 4,34% 649,5 €
97,3 € -1,51% 97.300 € -1.490,0 € 4.865,0 € 2.800,0 € -30,16% 57,55% 2,88% 2.065,0 €
Total -2,70% -2,70% -2.700,0 € - - -54,00% - - -Nota: Cálculos Próprios. Assume-se que o intermediário financeiro realiza o mark-to-market das posições dos investidores em tempo real, debitando e credi-
tando as perdas e ganhos obtidas com o investimento, representando a coluna "Conta" o saldo líquido do investimento.
9 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
O investidor pretende adquirir CFD’s tendo
como subjacente o crude oil, por forma de ga-
nhar exposição a esta mercadoria. Cada contra-
to tem como subjacente 1.000 barris de petró-
leo, pelo que o investidor decide adquirir 1
CFD que, ao preço de abertura (100 euros por
barril) tem um valor de 100.000 euros.
Antes de iniciar a transação, o investidor depo-
sita na sua conta 5.500 euros, sendo a margem
exigida pelo intermediário financeiro corres-
pondente a 5% do valor facial do CFD, isto é,
5.000 euros. Logo após a abertura da posição, o
preço do crude desvaloriza -0,1%, implicando
uma redução de 100 euros no valor do CFD e o
correspondente débito desse valor na conta do
investidor. O preço do crude desvaloriza nova-
mente, para 99,3 euros por barril, implicando
uma perda adicional de 650 euros. Com esta
desvalorização, o montante líquido em conta
iguala agora 95,72% daquele necessário para
atingir 5% do valor do CFD (a margem de ma-
nutenção ou requerimento de margem). Nesse
momento, o investidor recebe um pedido de
reforço de margem por parte do intermediário
financeiro num montante correspondente a
212,5 euros (valor necessário para igualar a
margem de manutenção) 9 sendo este válido por
1 dia.
Contudo, assumimos que o investidor opta por
não depositar mais margem, e que se verifica
uma redução ainda mais acentuada do preço do
crude para 98,8 euros por barril e posteriormen-
te para 97,3 euros por barril, o que provoca
uma quebra adicional no valor da posição (de
460 euros e 1.490 euros respetivamente). Com
uma redução desta magnitude, o valor disponí-
vel em conta já não é considerado suficiente
pelo intermediário financeiro dado que é inferi-
or a 3% do valor da sua posição em CFD’s, o
que conduz à liquidação automática da posição.
Notemos agora o resultado deste exercício.
Uma redução de -2,7% no preço do crude (ativo
subjacente) implicou uma perda de 2.700 euros
para o investidor, equivalente a uma perda de
54% do investimento realizado. A amplificação
da perda deve-se ao efeito produzido pela ala-
vancagem.
Tendo em conta a dinâmica de evolução dos
mercados, conclui-se que o uso de instrumentos
financeiros como os CFD’s é mais apropriado
para horizontes de investimento relativamente
curtos e com uma monitorização constante por
parte do investidor. Em investimentos de mé-
dio/longo-prazo, os custos associados à manu-
tenção da posição podem ser substanciais, po-
dendo ser preferível a detenção direta do ativo
subjacente.
3.3. Custos de Financiamento
Como referido, a detenção de posições longas
em CFD’s implica que a contraparte do investi-
dor se encontra a financia-lo pelo montante cor-
respondente à diferença entre o valor do CFD e
o montante exigido de margem inicial. Como
tal, existe lugar ao pagamento de custos (juros)
referentes a esse financiamento caso a posição
se mantenha aberta por mais de um dia. As ta-
xas de juro cobradas podem ter como referência
benchmarks de mercado largamente aceites
(como exemplo, a euribor) ou taxas fixadas pe-
lo próprio intermediário financeiro.
9- Na grande maioria dos casos, o contacto realizado pelo intermediário financeiro constitui o envio de uma mera mensagem eletrónica através do sistema de negociação ou de um email. O tempo concedido pelo intermediário financeiro ao cliente para proceder ao reforço da
sua conta deverá em princípio depender do montante do reforço necessário.
34: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
10 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
As taxas de juro em vigor, independentemente
do seu método de determinação, poderão variar
ao longo do tempo sem qualquer aviso prévio
dirigido aos investidores, correndo estes o risco
de ver a rentabilidade esperada dos seus inves-
timentos diminuir por esta via.
Notemos contudo uma característica própria da
negociação destes instrumentos. Aquando do
apuramento do montante de juros, em geral o
intermediário financeiro não considera apenas
o montante implícito de financiamento (valor
total da posição menos montante exigido de
margem) mas sim o valor total da posição. Esta
é uma das formas de remuneração dos interme-
diários financeiros, além das comissões ou
spreads que cobram aos investidores.
3.4. Modelo de Funcionamento
do Intermediário Financeiro
A principal vantagem associada às transações
de contratos diferenciais centra-se na sua sim-
plicidade de funcionamento, dado que o pricing
do instrumento derivado é feito simplesmente
com recurso ao preço do ativo subjacente. Con-
tudo, os sistemas de formação do preço do ati-
vo subjacente (e consequentemente do CFD)
podem variar consoante o modelo de negócio
adotado pelo intermediário financeiro. Existem
atualmente dois modelos fundamentais de ne-
gócio utilizados na negociação de CFD fora de
mercado:
I. Um no qual o intermediário financeiro
assume uma posição de criador de mer-
cado (market maker), difundindo os seus
próprios preços para toda a oferta de
CFD’s. Em geral, tais preços seguem os
preços formados em mercado para os
ativos subjacentes. No entanto, não existe
qualquer garantia que tal aconteça, po-
dendo existir divergências significativas
e podendo esta divergência aumentar ou
diminuir em função da liquidez do mer-
cado do ativo subjacente, da volatilidade,
ou de outros fatores tidos como relevan-
tes pelo intermediário financeiro.
Neste tipo de modelo, o intermediário
financeiro é por norma contraparte final
do investidor, podendo o primeiro cobrir
ou não o risco que assume nas transações
com o segundo. Tal configura uma situa-
ção em que o intermediário financeiro
não assume uma posição neutral em mer-
cado, podendo conduzir a uma acumula-
ção significativa de riscos.
Não é incomum os intermediários finan-
ceiros que seguem este modelo publicita-
rem a não cobrança de comissões aos
investidores. Na prática, tal não configura
uma imagem rigorosa e verdadeira do
modelo de negócio dado que existem cus-
tos suportados pelos investidores sob for-
ma de spreads aplicados aos preços. Es-
tes funcionam como um fator que encare-
ce as compras e torna as vendas mais ba-
ratas no montante do spread. Assim, os
investidores pagam efetivamente uma
comissão de corretagem que se encontra
já refletida no preço difundido pelo inter-
mediário financeiro.
Os investidores são price-takers dado
que a determinação dos preços é realiza-
da pelo intermediário financeiro. A Figu-
ra 6 ilustra como o modelo de negócio se
processa.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 35
11 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
A parte a tracejado refere-se à possibili-
dade do intermediário financeiro (através
do seu dealer) poder cobrir ou não os
riscos decorrentes das transações com os
clientes. Este modelo de negócio, pela
necessidade de analisar e confirmar as
transações, poderá conduzir a atrasos na
execução das ordens transmitidas pelos
clientes.
II. Um no qual os preços dos CFD’s corres-
pondem exatamente ao preço de mercado
dos ativos subjacentes. As ordens trans-
mitidas pelos investidores sobre CFD’s
originam automaticamente ordens que
são encaminhadas pelo intermediário
financeiro para o mercado do ativo sub-
jacente (justificando o nome de Direct
Market Access atribuído ao modelo). Em
consequência, os intermediários financei-
ros não suportam qualquer risco associa-
do às flutuações do preço de mercado
dos ativos subjacentes dado que se
encontram devidamente cobertos. Os in-
vestidores tornam-se na prática partici-
pantes do mercado físico, podendo ver as
suas ordens automaticamente replicadas
no livro de ordens do mercado onde o seu
subjacente é negociado.
Tendo em consideração que os preços
dos CFD’s são diretamente determinados
pelos preços de mercado dos ativos sub-
jacentes, os intermediários financeiros
irão apenas disponibilizar aos investido-
res CFD’s sobre ativos com liquidez sufi-
ciente em mercado onde sejam capazes
de replicar sem grande dificuldade as
ordens transmitidas pelos clientes sobre
CFD’s. Este fator conduz a que por nor-
ma os intermediários financeiros utilizem
este modelo apenas para a negociação de
CFD’s sobre ações, enquanto para subja-
centes como taxas de câmbio, petróleo,
índices de mercado ou taxas de juro o
modelo corresponde ao de criador de
mercado. Uma ilustração do procedimen-
to é apresentada de seguida.
Figura 6. Modelo de negócio Market-Maker
36: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
12 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
A execução das ordens neste modelo é tipica-
mente realizada em tempo real, isto é, assim
que o intermediário financeiro procede à aqui-
sição/venda do ativo subjacente no mercado
físico confirma ao cliente a sua transação em
CFD’s. Consequentemente, a execução da tran-
sação do cliente deverá na prática demorar pou-
co mais do que o tempo que o intermediário
financeiro leva a executar a sua própria opera-
ção em mercado.
Neste tipo de modelo é comum os intermediá-
rios financeiros cobrarem uma comissão de
corretagem (percentual ou fixa) em detrimento
da imposição de spreads nos preços que o in-
vestidor enfrenta em mercado.
O modelo de negócio DMA é mais transparente
do que o modelo de market maker dado que, a
cada momento, os investidores podem efetiva-
mente ver as suas ordens sobre CFD’s serem
replicadas no mercado, tornando-se participan-
tes do mercado do ativo subjacente com as van-
tagens inerentes à negociação de CFD’s. Con-
clui-se, assim, que uma análise correta dos ris-
cos que emanam do investimento em contratos
diferenciais passa também pela correta compre-
ensão da forma como os preços desses instru-
mentos são formados.
3.5. Risco de Contraparte
Como referido, os contratos por diferenças são
instrumentos financeiros essencialmente nego-
ciados em mercado de balcão (OTC) pelo que
partilham os riscos inerentes às transações de
outros derivados OTC (como por exemplo
forwards, opções e swaps, para nomear alguns).
Em particular, o risco de contraparte merece
relevo.
O risco de contraparte emerge quando, no âm-
bito da celebração de um contrato, uma das par-
tes envolvidas poder vir a não cumprir as obri-
gações que decorrem da aplicação do mesmo.
No caso dos instrumentos financeiros deriva-
dos, como os CFD’s, o risco de contraparte está
associado à incapacidade de uma das partes
(investidor ou intermediário financeiro) não
conseguir fazer face a quaisquer obrigações que
decorrem da transação, como por exemplo, o
pagamento de qualquer montante necessário
para cobrir perdas.
Decorrente da negociação com recurso a ala-
vancagem, os intermediários financeiros usual-
mente obrigam os investidores a depositar um
montante de margem, como forma de fazer face
a flutuações adversas no valor das suas posi-
ções. Os investidores, contudo, não detêm igual
capacidade de gestão de risco no momento de
realização dos investimentos, impedindo-os da
execução de um exercício adequado de gestão
de risco da sua contraparte (que é o intermediá-
rio financeiro) poder não honrar os compromis-
sos que advêm das posições que toma. Conse-
quentemente, aquando da transação do CFD
com o intermediário financeiro, o investidor
está também a apostar que o mesmo detém uma
condição financeira sólida e que conseguirá
honrar os seus compromissos.
Figura 7. Modelo de negócio Direct Market Access (DMA)
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 37
13 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Uma forma de mitigar este risco e incrementar
o nível de proteção para os investidores seria o
de introduzir a obrigatoriedade de clearing das
transações. As propostas legislativas nesta
área10 não permitem ainda descortinar quais as
classes de derivados OTC que serão sujeitos a
clearing obrigatório, contudo, a distribuição da
negociação por tipo de investidor (ilustrada na
Figura 2) indicia que não seria desproporciona-
da a inclusão destes instrumentos, a bem da
proteção dos próprios investidores.
3.6. Gapping
A natureza OTC dos contratos diferenciais po-
derá conduzir à existência de desfasamentos
temporais consideráveis entre o momento em
que a ordem é transmitida pelo investidor e o
momento em que essa ordem é executada pelo
intermediário financeiro. Este fenómeno é nor-
malmente designado de gapping. O risco deste
desfasamento temporal emerge quando o preço
de mercado do ativo subjacente varia antes da
ordem do investidor ser executada, levando a
que a execução seja realizada a um preço me-
nos favorável para o investidor. As razões para
a existência destes desfasamentos estão em ge-
ral relacionadas com a liquidez do mercado
subjacente, com a dificuldade de os intermediá-
rios financeiros conseguirem um matching das
ordens dos investidores, bem como com as con-
dições operacionais das plataformas eletrónicas
com que negoceiam.
3.7. Cobertura de Risco
Este tipo de instrumento financeiro pode ser
útil para efectuar a cobertura de riscos. Imagi-
nemos que uma determinada refinaria de crude
acredita que o preço da sua principal matéria-
prima (o petróleo) irá subir nos próximos me-
ses, encarecendo a refinação de derivados de
petróleo e possivelmente o custo final para o
consumidor de combustíveis. Uma forma práti-
ca de cobrir o risco de subida dos preços seria
deter uma exposição longa a esses produtos,
comprando CFD’s sobre o crude, beneficiando
positivamente se os preços subissem e cobrindo
as perdas que derivam de maiores gastos com a
compra da matéria-prima. Da mesma forma, um
investidor que queira mitigar o risco de merca-
do de uma carteira poderá utilizar CFD’s para o
efeito, tomando posição sobre um índice que
considere de referência.
4. A PROLIFERAÇÃO DE PLATAFORMAS
ELECTRÓNICAS DE NEGOCIAÇÃO:
QUEM É QUEM?
O crescimento da negociação de contratos dife-
renciais tem sido acomodado por uma prolifera-
ção de plataformas eletrónicas de negociação
(muitas delas localizadas/registadas em países
offshore). Estas plataformas permitem aos in-
vestidores um acesso fácil aos mercados a prazo
em virtude destes necessitarem apenas de insta-
lar o software de negociação, abrir uma conta
junto da sociedade corretora (em muitos dos
casos com procedimentos simplificados que
não garantem uma proteção devida dos investi-
dores) e provisionar essa conta na medida dos
seus investimentos.
Muitos intermediários financeiros que oferecem
estes serviços de investimento conseguiram
contornar a necessidade de investir no desen-
volvimento de plataformas próprias através da
negociação de parcerias com concorrentes que
o fizeram, contribuindo para a multiplicação de
plataformas de “marca branca” e para o reforço
10- Que não cabem no âmbito deste artigo.
38: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
14 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
da quota de mercado dos intermediários forne-
cedores da tecnologia (que na realidade são a
verdadeira contraparte dos investidores).
Nestas condições, dificilmente saberá o investi-
dor quem de facto lhe está a prestar o serviço
de investimento, se o intermediário financeiro
onde abriu conta ou a entidade fornecedora da
plataforma de investimento onde negoceia. Tal
assume especial relevância no âmbito do mode-
lo market maker, onde o sistema de pricing dos
CFD’s é da responsabilidade do próprio inter-
mediário financeiro. Não raras são as vezes em
que a entidade onde os investidores abrem con-
ta realiza na prática o serviço de receção e
transmissão de ordens por conta de outrem,
onde cada ordem dada pelo cliente sobre
CFD’s é reencaminhada para o intermediário
fornecedor da plataforma de negociação, que
por sua vez é também responsável pela difusão
dos preços nas plataformas eletrónicas utiliza-
das pelos clientes. Este fornecimento de servi-
ços de investimento com recurso a plataformas
white label poderá conduzir a uma opacidade
no serviço junto dos investidores, já que existe
uma dificuldade acrescida na avaliação dos
riscos em que estes incorrem, em particular, o
risco de contraparte. Em todo o caso, o inter-
mediário financeiro onde os investidores abrem
conta mantém-se totalmente responsável peran-
te os seus clientes pelas falhas existentes nos
serviços de investimento que presta e disponi-
biliza através das plataformas de negociação,
sejam estas propriedade sua (tecnologia pró-
pria) ou de terceiros.
5. O INVESTIMENTO EM AÇÕES
E CFD’S DE AÇÕES
Temos para nós que as diferenças subjacentes
ao investimento em ações e ao investimento em
CFD’s sobre ações são objeto de alguma confu-
são. Tais diferenças devem ser aclaradas a bem
da correta perceção dos riscos por parte dos
investidores (em particular dos não qualifica-
dos).
Os CFD’s permitem ao investidor a exposição
às flutuações do ativo subjacente mas não im-
plicam a detenção física desse subjacente. Tal
significa que a compra de CFD’s sobre ações
não confere a detenção física das mesmas, e
subsidiariamente, de quaisquer direitos societá-
rios além dos económicos que delas emanem.
Por direitos económicos entende-se, por exem-
plo, a distribuição de dividendos. Nestes casos,
o investidor é devidamente compensado pelo
intermediário financeiro, devendo o segundo
pagar ao primeiro o montante que lhe seria de-
vido se detivesse as ações. Pelo contrário, o
investimento em CFD’s sobre ações não garan-
te quaisquer direitos de voto, não tendo o inves-
tidor qualquer direito de participação em atos
societários tais como assembleias gerais.
6. COMO FUNCIONA NA PRÁTICA
A NEGOCIAÇÃO DE CFD’S
Nesta secção procedemos a uma aplicação prá-
tica da negociação de CFD’s, compactando to-
das as noções introduzidas nas secções anterio-
res, em particular, tomando agora em conside-
ração não só a possibilidade de posições longas
e curtas bem como a aplicação de custos de fi-
nanciamento, de corretagem e margin calls.
Assumimos que um investidor acredita que a
recente crise de dívida soberana irá continuar a
penalizar os mercados acionistas, e em particu-
lar, acredita que existirá um contágio ao merca-
do Espanhol, pelo que o investidor pretende
construir uma posição que beneficie da desvalo-
rização do mercado acionista de Espanha. As-
sim, o investidor decide abrir uma posição curta
sobre o índice IBEX35.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 39
15 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
No dia 26 de Setembro, o índice inicia a sessão
a cotar 8.032,2 pontos e o investidor abre uma
posição curta sobre esse índice, vendendo 5
CFD’s com um valor total de 40.161 euros. A
Tabela 2 apresenta os resultados do exercício.
A coluna “Variação Índice (€)” apresenta varia-
ção do índice IBEX35 face à sua cotação ante-
rior, a coluna “Valor Posição (€)” apresenta a
exposição total do investidor ou, de forma equi-
valente, o valor “real” do seu investimento em
CFD’s, a coluna “Variação Posição (€)” apre-
senta o montante que o investidor ganha (-) ou
perde (+) na realidade mediante a variação do
ativo subjacente, a coluna “Juros (€)” refere-se
ao montante recebido (+) ou pago (-) de juros
pela detenção da posição por um período supe-
rior a uma sessão, a coluna “Conta Corrente
(€)” simula o montante que o investidor teria na
sua conta junto do intermediário financeiro ca-
so encerrasse a posição a cada preço correspon-
dente, a coluna “Rent. CFD (%)” apresenta a
rentabilidade do investimento obtida pelo in-
vestidor através dos CFD’s sobre o índice
IBEX35, e a coluna “Rent. IBEX35 (%)”
apresenta a rentabilidade de um investimento
similar (posição curta) no índice IBEX35 sem
recurso a alavancagem.
O intermediário financeiro exige o depósito de
margem inicial para abertura da posição num
montante de 5% do valor da mesma, pelo que o
investidor deposita na sua conta corrente (junto
do intermediário financeiro) o valor correspon-
dente de 2.008,1 euros.11 Tendo em conta a na-
tureza da posição (curta), o investidor irá lucrar
caso o índice IBEX35 desvalorize. A análise
simples da evolução do índice permite desde
logo ajuizar que apresentou ao longo da sessão
um movimento descendente, o que permite con-
cluir que o investidor beneficiou do seu investi-
mento. Pelas 12:00 horas da sessão do dia 26, o
índice IBEX tinha desvalorizado cerca de 1,6%
para 7.904,7 pontos, implicando uma rentabili-
dade bruta para o investidor de aproximada-
mente 31,7% (admitindo que este fecharia a
posição a este preço) e um ganho monetário de
637,5 euros. Assumimos, contudo, que este
mantém a posição aberta dadas as perspetivas
de maior lucro com o investimento.
Tabela 2. Exemplo de posição curta sobre índice IBEX35
Fonte: Cálculos próprios com base em dados retirados da Bloomberg.
11- No presente exercício, à semelhança do que foi realizado acima para o índice PSI20, são utilizados dados reais de mercado. Contudo, neste exemplo, são utilizados dados intra-diários com uma diferença temporal de 30 minutos, para facilitar a análise.
40: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Data/Hora Preço (€) Variação Índice (€) Valor Posição (€) Variação Posição (€) Juros (€) Conta Corrente (€) Rent. CFD (%) Rent. IBEX35 (%)
26-09-2012 08:00 8.032,2 40.161,0 2.008,1
26-09-2012 08:30 7.981,7 -50,5 39.908,5 -252,5 2.260,6 12,6 0,6
26-09-2012 09:00 7.954,3 -27,4 39.771,5 -137,0 2.397,6 19,4 1,0
26-09-2012 09:30 7.991,0 36,7 39.955,0 183,5 2.214,1 10,3 0,5
26-09-2012 10:00 7.980,2 -10,8 39.901,0 -54,0 2.268,1 12,9 0,6
26-09-2012 10:30 7.967,4 -12,8 39.837,0 -64,0 2.332,1 16,1 0,8
26-09-2012 11:00 7.927,1 -40,3 39.635,5 -201,5 2.533,6 26,2 1,3
26-09-2012 11:30 7.919,7 -7,4 39.598,5 -37,0 2.570,6 28,0 1,4
26-09-2012 12:00 7.904,7 -15,0 39.523,5 -75,0 2.645,6 31,7 1,6
26-09-2012 12:30 7.895,0 -9,7 39.475,0 -48,5 2.694,1 34,2 1,7
26-09-2012 13:00 7.901,7 6,7 39.508,5 33,5 2.660,6 32,5 1,6
26-09-2012 13:30 7.901,2 -0,5 39.506,0 -2,5 2.663,1 32,6 1,6
26-09-2012 14:00 7.914,1 12,9 39.570,5 64,5 2.598,6 29,4 1,5
26-09-2012 14:30 7.897,6 -16,5 39.488,0 -82,5 2.681,1 33,5 1,7
26-09-2012 15:00 7.873,4 -24,2 39.367,0 -121,0 2.802,1 39,5 2,0
26-09-2012 15:30 7.845,1 -28,3 39.225,5 -141,5 2.943,6 46,6 2,3
26-09-2012 16:00 7.867,8 22,7 39.339,0 113,5 2.830,1 40,9 2,0
26-09-2012 16:30 7.854,4 -13,4 39.272,0 -67,0 2,152 2.899,2 44,4 2,2
27-09-2012 08:00 7.879,4 25,0 39.397,0 125,0 2.774,2 38,2 1,9
Custo Abertura Posição -10,0
Custo Fecho Posição -10,0
Valor Conta Corrente 2754,2 37,2
16 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Ao longo da segunda metade da sessão o índice
IBEX continua a desvalorizar, incrementando
os ganhos potenciais. A sessão de 26 de Setem-
bro fecha com o índice nos 7.854,4 pontos,
com uma rentabilidade potencial de 44,4% na
posição em CFD’s, por comparação com uma
rentabilidade de 2,2% que se obteria com uma
posição curta no índice sem recurso a alavanca-
gem. O investidor decide manter a posição
aberta até à sessão do dia seguinte, implicando
a cobrança de custos de financiamento à sua
contraparte, que assumimos serem de 2%. A
sua conta é correspondentemente creditada em
39.272 x 2% / 365= 2,2 euros. Na sessão do dia
27 de Setembro, o índice IBEX35 abre nos
7.879,4 pontos (valorizando 25 pontos face à
cotação de fecho da sessão anterior e reduzindo
o ganho potencial). O investidor decide encer-
rar a sua posição, obtendo uma rentabilidade
bruta de 38,2%, e um ganho de aproximada-
mente 766 euros. Deduzindo os custos de cor-
retagem correspondentes à abertura e fecho da
sua posição (10 euros cada), o investidor obtém
uma rentabilidade líquida de 37,2% e um ganho
de cerca de 746 euros.
Com a potencial inversão da tendência do índi-
ce, o investidor decide agora tomar a posição
contrária, isto é, comprar CFD’s sobre o índice
IBEX35. Pelas 14:30 horas o índice encontrava
-se nos 7.853,4 pontos e o investidor decide
adquirir 5 CFD’s sobre o mesmo, sendo obriga-
do, como anteriormente, a depositar margem
inicial correspondente a 5% do valor da
posição, isto é, 1.963,4 euros. A Tabela 3 ilus-
tra a evolução do investimento. Nesta análise
são acrescentadas duas colunas adicionais, uma
com indicação do grau de cobertura de
margem, isto é, de cumprimento da margem
de manutenção, e outra com o montante
necessário de reforço de margem.
Ao longo da restante sessão, o índice evidenci-
ou uma tendência de queda, com um impacto
negativo no valor do investimento. Pelas 15
horas, o índice evidenciava uma desvalorização
de aproximadamente 21,9 pontos. Em conse-
quência, o montante que o investidor dispõe em
conta passa a ser inferior à margem de manu-
tenção (igual 5% do valor da posição), receben-
do um pedido de reforço (margin call) por parte
do intermediário financeiro no valor de 103,5
euros, com período limite de 1 dia útil. Assume
-se que o investidor opta por não reforçar a con-
ta e mantém a posição aberta. Até ao final de
sessão de negociação, o índice corrige ligeira-
mente a queda sofrida, no entanto, encerra com
uma ligeira desvalorização de -0,1% face ao
preço de abertura do contrato, implicando uma
a rentabilidade de -2,9% no investimento em
CFD’s. Note-se no entanto, que o valor neces-
sário para cumprir o requisito de margem é ago-
ra mais reduzido dada a ligeira correção da que-
da no valor do índice no final da sessão, igua-
lando agora 54,9 euros. Assume-se que o inves-
tidor não procede a qualquer depósito adicional
de margem e mantém o seu investimento ativo,
sendo-lhe debitados 2,1 euros = 39.211,5 x
2%/365, correspondentes a custos de financia-
mento.
O índice abre a sessão do dia 28 a subir 0,94%,
compensando a perda registada na sessão do dia
anterior. A performance ao longo da sessão in-
verte contudo o sentido, e o investimento come-
ça a perder valor. O montante necessário para
manter a posição aberta (reforço de margem)
aumenta também à medida que esta desvaloriza.
Pelas 14:30 horas, decide encerrar a posição
com o IBEX35 nos 7.766,2 pontos.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 41
17 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
A rentabilidade bruta do investimento é de
aproximadamente -22,3%, isto é, uma perda de
aproximadamente 438,2 euros relativamente ao
investimento inicial. É ainda debitado ao inves-
tidor o valor correspondente aos custos de cor-
retagem (abertura e fecho da posição) no valor
de 20€, penalizando ainda mais a rentabilidade
do investimento realizado. A rentabilidade lí-
quida do investimento, quando comparada com
uma posição não alavancada no IBEX35, é re-
veladora dos riscos que os investidores incor-
rem. Enquanto o investimento através de
CFD’s rendeu -22,3% em termos brutos, a
construção de uma carteira que replicasse o
índice implicaria uma perda para o investidor
de apenas -1,1%. Existe no entanto o reverso da
moeda. No caso da posição curta, o investidor
conseguiria obter ganhos através de CFD’s de
38,2%, apesar do índice ter desvalorizado ape-
nas -1,9%.
7. RENTABILIDADE ASSOCIADA
AO INVESTIMENTO EM CFD’S:
UMA ANÁLISE TEÓRICA
Nesta secção iremos, através de uma aborda-
gem mais analítica, analisar a estrutura de
cash-flows de uma transação em CFD’s, proce-
dendo ainda a uma análise dos perfis de ganhos
e perdas (rentabilidade) associados. Esta análise
terá como objetivo não só documentar as rela-
ções que se estabelecem entre as diversas variá-
veis que afetam a rentabilidade do investimento
em CFD’s como também, pela incorporação
dos diversos tipos de comissionamento utiliza-
dos pelos intermediários financeiros em cada
modelo de negócio (DMA ou market maker),
comparar as rentabilidades que poderão ser ob-
tidas em cada um. Na primeira parte da análise
será assumido que o horizonte de investimento
é de uma sessão (isto é, que o investidor encerra
sempre as suas posições no final de cada sessão
de negociação), não existindo custos de financi-
amento. A introdução destes custos não altera-
ria significativamente as conclusões que se po-
derão extrair na análise realizada, mantendo-se,
assim, uma estrutura simples e intuitiva no mo-
delo. Numa segunda fase serão analisados de
forma isolada os efeitos dos custos de financia-
mento na rentabilidade do investimento.
7.1 Cenário Base
Assumamos por simplicidade que não existem
custos de corretagem. Seja P0 o preço do ativo
subjacente no início da transação e PT o seu
preço na data de encerramento da posição.
Assim, o retorno do ativo subjacente no período
Tabela 3. Exemplo de posição longa sobre índice IBEX35
Fonte: Cálculos próprios com base em dados retirados da Bloomberg.
42: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
18 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
da transação pode ser definido como PT / P0 - 1
= r. No início de cada transação, o intermediá-
rio financeiro exige ao investidor o depósito de
uma margem inicial, correspondente a m ϵ ]0,1]
do valor facial dos CFD’s.
O investidor decide comprar N CFD’s sobre o
ativo subjacente pelo que o valor total do inves-
timento iguala NP0. Para iniciar a transação, o
investidor deposita o montante de margem exi-
gido, correspondente a mNP0 e financia-se jun-
to do intermediário financeiro no montante res-
tante, isto é, (1– m) NP0.12
Aquando do encerramento da posição, o valor
dos CFD’s iguala NPT, sendo o resultado do
investimento igual a:
(1)
Resultado = NPT - mNP0 - (1– m)NP0
Isto é, os resultados para o investidor igualam o
valor dos CFD’s no momento de encerramento
do contrato (número de CFD’s multiplicado
pelo preço do ativo subjacente no final do in-
vestimento), deduzido do montante pago de
margem e do montante que o investidor obteve
de financiamento (e que agora tem que ser pago
à contraparte) para iniciar a transação. Note-se
que numa situação real, o investidor não realiza
qualquer pagamento à sua contraparte no mon-
tante de financiamento dado que, quando reali-
za a venda dos CFD’s (encerra a posição), parte
do montante dessa venda servirá para liquidar
esse financiamento. Tal equivale a uma situa-
ção em que o investidor adquire CFD’s com
financiamento da sua contraparte e, em que, no
final do contrato, parte do produto da alienação
dos mesmos CFD’s servirá para liquidar esse
financiamento. Com alguma manipulação, a
equação supra pode ser exprimida como:
(2)
Resultado = N (PT - P0)
o que evidencia que os resultados de uma tran-
sação de CFD’s têm uma estrutura simétrica e
linear, dependendo inteiramente da evolução do
preço do ativo subjacente. Contudo, é útil expri-
mir os resultados na forma de rentabilidade,
permitindo analisar de forma clara quais os fa-
tores essenciais que contribuem para a sua evo-
lução. Tendo em conta que estamos na presença
dos resultados do investimento em CFD’s (e
não do investimento direto no ativo subjacente),
a taxa de rentabilidade pode ser obtida dividin-
do a expressão acima pelo investimento inicial
realizado pelo investidor, isto é, mNP0:
(3)
Denominando a taxa de rentabilidade dos
CFD’s por R, podemos manipular a equação
para obter:
(4)
Torna-se agora evidente que quanto menor a
margem m exigida pelos intermediários finan-
ceiros, maior será o efeito das flutuações do
preço do ativo subjacente na rentabilidade do
investimento, isto é, a margem tem um efeito
amplificador. Torna-se ainda claro que os
CFD’s se caracterizam por uma estrutura de
ganhos linear face ao preço do ativo subjacente.
Esta estrutura é ainda simétrica, no sentido de
que, no caso de uma posição curta, a função de
rentabilidade iguala:
(5)
Uma rentabilidade negativa do ativo subjacente
(r < 0) traduz-se numa rentabilidade positiva no
investimento em CFD’s. A rentabilidade
(payoff) do investimento em CFD’s em função
do preço de fecho da posição encontra-se
ilustrada na Figura 8.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 43
12- Assume-se que os custos de financiamento são nulos uma vez que o horizonte de investimento é de apenas uma sessão de negociação.
19 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
O montante de margem m exigido aos investi-
dores determina o declive da função de rentabi-
lidade. Quanto menor o volume de margem,
maior a inclinação da função de rentabilidade
dado que, em resultado de uma maior alavanca-
gem, flutuações do ativo subjacente irão impli-
car flutuações cada vez maiores na rentabilida-
de potencial dos CFD’s.
7.2 Efeito dos Custos de Corretagem
Assumamos agora que por cada transação reali-
zada pelo investidor terá que ser paga uma co-
missão de corretagem f ϵ ]0,1] ao intermediário
financeiro13. Mantendo-se a estrutura e as res-
tantes hipóteses do modelo exatamente iguais,
o investidor agora paga não só o montante de
margem para abertura da posição mas também
a respetiva comissão de corretagem (ou seja,
(m + f) NP0), e financia-se como anteriormente
no montante restante do valor da posição (isto
é, (1 – m) NP0). Para encerrar a transação, o
investidor tem que pagar taxa de corretagem no
montante equivalente a fNPT.14 Os resultados
são agora dados por:
(6)
Resultado = NPT - fNPT - (m + f)NP0 - (1 - m)NP0
A equação (6) pode ser escrita como:
(7)
Resultado = N{(1 - f)PT - (1 + f )P0}
A introdução de comissões faz agora com que o
resultado implícito da transação do CFD dimi-
nua, não só pelo seu efeito no preço de abertura
(dado que incrementa o investimento inicial que
o investidor terá que fazer) como no
encerramento da posição (dado que reduz na
prática os benefícios decorrentes da venda).
Dividindo pelo montante inicialmente investi-
do, (m + f) NP0, obtemos a rentabilidade do in-
vestimento em CFD’s (R) :
(8)
No caso de uma posição curta, a simetria no
racional da operação permite uma dedução
simples15:
(9)
Figura 8. Função de Rentabilidade dos CFD’s
Fonte: Cálculos próprios. Assume-se P0 =20
13- Os efeitos dos custos de transação são extensamente analisados na literatura, veja-se como exemplos, Constantinides (1986) e Liu (2004).
14- Assume-se que a comissão de corretagem é uma função linear do valor da transação, não existindo valores mínimos ou máximos
pré-definidos. 15- Para o desenvolvimento da função, o investidor procede a uma venda pelo valor inicial do ativo subjacente NP0 , depositando margem
e o custo de corretagem exigidos pelo intermediário financeiro (m + f) NP0). Aquando do fecho da posição o investidor procede a uma
compra no valor de NPT pagando a correspondente taxa de corretagem exigida pelo intermediário financeiro no valor de fNPT e recebe a sua margem de volta no valor de mNP0 (dado que se assume que paga o valor total do contrato na recompra) e recebe o montante de
financiamento que concedeu à contraparte, ver Venter (2008).
44: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
20 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 45
Apesar do perfil de retornos (payoff) se revelar
semelhante no que toca à evolução em função
do preço, existem diferenças que devem ser
ressalvadas. A Figura 9 compara a função de
rentabilidade com e sem custos de corretagem.
16- Tendo em conta que a função de rentabilidade é simétrica entre posições curtas e longas, sendo as conclusões análogas, analisaremos apenas o caso referente às posições longas.
Figura 9. Função de Rentabilidade dos CFD’s com Custos Corretagem
Fonte: Cálculos próprios. Assume-se P0 =20, e m = 5%
Existem dois efeitos produzidos pela introdu-
ção de comissões de corretagem, um efeito de
translação da função e um efeito de rotação. O
primeiro opera pelo facto do investidor ter que
efetuar o pagamento da taxas de corretagem
independentemente do preço do ativo subjacen-
te variar, causando desta forma uma redução da
rentabilidade potencial do investimento para
cada nível de preços possível do ativo subja-
cente. O efeito de rotação é causado pela altera-
ção que a taxa de corretagem introduz no decli-
ve da função, tornando-a menos inclinada, dado
que o nível de alavancagem efetivo será inferi-
or, em virtude da necessidade do investidor ter
que desembolsar um valor superior para iniciar
e encerrar a transação. A apresentação das
equações (4) e (8) como se segue, permite visu-
alizar estes efeitos16:
(10)
(11)
Para cada nível de preços a introdução da co-
missão de corretagem na forma de percentagem
do valor do CFD, reduz em parte o efeito pro-
duzido pela margem, reduzindo o nível de ala-
vancagem efetivo de 1/m para (1 + f) / (m + f).
Adicionalmente, a ordenada na origem sofre um
acréscimo dado que - (1 + f) / (m + f) > - 1/ m.
Encontramo-nos perante dois efeitos: um devi-
do ao facto de o investidor ter sempre de supor-
tar um custo para realizar o seu investimento e
o segundo devido ao facto de o investimento a
efetuar pelo investidor ser necessariamente su-
perior, implicando um esbatimento dos ganhos
potenciais (a alavancagem efetiva é menor).
A análise da equação permite ainda concluir
que à medida que o custo de corretagem
aumenta (em percentagem do valor inicial da
21 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
posição) menor é o incentivo à utilização de
CFD’s para a realização do investimento dado
que o aumento da comissão de corretagem anu-
la de forma progressiva a vantagem que deriva
da utilização de uma margem mais reduzida.
No caso analisado até agora, a comissão de
corretagem depende do valor total do investi-
mento. Todavia, pode dar-se o caso de se estar
em presença de uma comissão monetária fixa.
Assim, para qualquer nível/valor de investi-
mento, o intermediário financeiro cobra um
montante de F euros por transação, mantendo-
se a restante estrutura do modelo inalterada.
Para um valor inicial do investimento igual a
NP0 e para abrir uma posição de compra, o in-
vestidor terá agora que pagar mNP0 + F , isto é,
a margem inicial e o custo de corretagem, fi-
nanciando-se junto do intermediário financeiro
no montante (1 - m)NP0 . O valor de fecho da
posição é NPT, e o investidor terá novamente
que pagar comissão de corretagem no valor de
F euros. O resultado do investimento iguala:
(12)
Resultado = NPT - F-(1- m)NP0 - mNP0 - F
E pode ser reescrito como:
(13)
Resultado = N(PT - P0) - 2F
Dividindo pelo investimento inicial realizado
mNP0 + F, obtém-se:
(14)
Dividindo agora o numerador e o denominador
do membro direito da equação por NP0 e
definindo f’ = F / NP0 obtemos a equação de
uma forma simplificada.
(15)
Importa desde já efetuar uma distinção entre a
equação supra e a função de rentabilidade obti-
da com base no método de comissionamento
percentual (11). Na presente análise, releva-se
que f’ não iguala f. Tal resulta do facto de f ser
constante independentemente do nível de inves-
timento realizado pelo investidor dado que é
uma variável decidida pelo intermediário finan-
ceiro de acordo com a sua política de negócio,
enquanto que f’ irá variar não só de acordo com
o preço inicial do CFD mas também de acordo
com o número de CFD’s que o investidor ad-
quirir. Neste modelo de negócio, a variável de
política decidida pelo intermediário financeiro é
F e não f. Assim, enquanto no modelo de negó-
cio de comissionamento percentual [equação
(11)] o número de CFD’s não afeta a rentabili-
dade obtida no investimento (veja-se que o nú-
mero de CFD’s não entra na equação), no mo-
delo de negócio agora em análise
(comissionamento fixo ou lump-sum) o número
de CFD’s é uma das variáveis que afeta a renta-
bilidade do investimento dado que f’ = F /NP0.
Tal acontece devido à possibilidade que o in-
vestidor tem de diluir o montante pago em co-
missões (que são fixas independentemente do
valor da sua posição) através do aumento da sua
exposição, isto é, aumentando o número de
CFD’s adquiridos. Embora esta estratégia não
altere as suas probabilidades de ganho ou perda,
permite aumentar os ganhos ou perdas que po-
derá vir a ter através de um aumento da alavan-
cagem efetiva.
Por outro lado, o investidor não paga comissão
apenas quando abre uma posição, mas também
quando fecha a posição. Desta forma, os custos
46: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
22 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 47
efetivos (em percentagem do valor total da po-
sição aquando do fecho da mesma) poderão ser
maiores ou menores consoante o preço de fe-
cho da posição aumente ou diminua. No méto-
do de comissionamento percentual o investidor
irá sempre pagar uma percentagem fixa do va-
lor de fecho da posição.
É ainda possível concluir que um método de
comissionamento do tipo lump-sum servirá me-
lhor os interesses de investidores com exposi-
ções mais elevadas em mercado, dado que po-
derão na prática beneficiar de comissões mais
reduzidas para um nível de investimento sufici-
entemente elevado. No entanto, não é verdadei-
ramente necessário um montante de investi-
mento elevado para beneficiar de uma comissão
reduzida (neste caso de um f’ reduzido), dado
que o investimento inicial realizado poderá ser
também relativamente reduzido graças à utiliza-
ção de uma margem baixa. Assim, reduções na
margem utilizada poderão auxiliar na obtenção
de um f’ reduzido uma vez que permitirão ao
investidor uma exposição superior. Contudo,
exposição superior (através de uma margem
mais reduzida) implica alavancagem mais ele-
vada, não sendo apenas os ganhos potenciais
que ficam mais elevados mas também as perdas
potenciais. A Figura 10 compara a função de
rentabilidade nos casos de custos de corretagem
fixos, de custos de corretagem percentuais e
sem custos de corretagem.
Figura 10. Função de Rentabilidade dos CFD’s com Custos de Corretagem Fixos
Fonte: Cálculos próprios. Assume-se P0 =20, N=1 e m = 5%
No exercício realizado assume-se que o investi-
dor irá comprar apenas um CFD sobre um de-
terminado ativo subjacente e que o custo de
corretagem é fixado em 0,2€, de forma a com-
parar diretamente com a simulação presente na
Figura 7 (onde o investidor paga 1% de comis-
são). Os parâmetros foram escolhidos de forma
a garantir que no momento inicial o investidor
paga o mesmo montante de comissão nos dois
casos analisados.
Embora pareça que a rentabilidade do investi-
mento é igual entre os dois métodos de comissi-
onamento, independentemente do preço de fe-
cho da posição, tal não se revela acertado uma
vez que a comissão efetiva paga em percenta-
gem do preço de fecho vai variando. Assim,
apesar da comissão paga para abrir a posição
ser igual, a comissão paga para fechar a posição
aumenta à medida que o preço de fecho
diminui, verificando-se o contrário à medida
23 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
que o preço de fecho aumenta. Para ver as dife-
renças nas rentabilidades, apresenta-se na Figu-
ra 11 a diferença entre a rentabilidade do inves-
timento no caso de comissionamento fixo e no
caso de comissionamento percentual. Apenas é
apresentado o caso em que o investidor adquire
uma posição longa, dado que no caso de uma
posição curta a diferença é simétrica da exibida.
Figura 11. Diferença de Rentabilidade entre Comissão Fixa e Percentual
Fonte: Cálculos próprios.
À medida que o preço de fecho aumenta a ren-
tabilidade potencial é superior no caso de co-
missão fixa dado que o investidor paga em ter-
mos relativos menos para fechar a sua posição.
Verifica-se o oposto para diminuições do preço
de fecho.
Os modelos de comissionamento estudados até
agora são usualmente utilizados por intermediá-
rios financeiros que seguem modelos de Direct
Market Access. No modelo de market maker, os
CFD providers incorporam um custo de transa-
ção fixo, que designam de spread, aos preços
de compra e venda de CFD’s. Assumamos que
o investidor enfrenta um spread de S euros por
cada CFD que adquire ou vende. Quando inicia
a transação (de compra), a posição que era ante-
riormente valorizada em NP0 é agora valoriza-
da em N(P0 + S) dado que o investidor terá que
pagar o custo de transação. Como anteriormen-
te, o intermediário financeiro exige o depósito
de um montante de margem valorizado em
mN(P0 + S), e financia o investidor num mon-
tante igual a (1 - m) N(P0 + S). Para encerrar a
transação o investidor vende os CFD’s valoriza-
dos em N(PT + S), sendo o resultado dado por:
(16)
Resultado = N(PT - S) - (1- m) N (P0 + S)
- mN(P0+ S)
A equação pode ser reescrita como:
(17)
Resultado = N {(PT - S) - (P0 + S)}
Dividindo pelo investimento inicial realizado
pelo investidor mN (P0 + S) obtemos:
(18)
Definindo s = S / P0, podemos reescrever a
equação como:
(19)
48: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
24 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 49
Uma análise da equação permite detetar que a
rentabilidade total do investimento não depende
do número de CFD’s que o investidor adquire
(vende) pelo que não existe a possibilidade de
diluição dos custos de intermediação financeira.
Tal acontece porque o custo para o investidor
cresce à medida que adquire (ou vende) CFD’s
(ao contrário do anterior modelo de comissões
fixas por operação).
A Figura 12 compara as funções de rentabilida-
de enfrentadas pelo investidor para os três siste-
mas de comissionamento estudados. A função
de rentabilidade foi simulada para os três méto-
dos de comissionamento para que coincidam
quando a rentabilidade do ativo subjacente é
nula, isto é P0 = PT ou r = 0. Para que tal seja
possível, é calculado o valor de spread S que o
intermediário financeiro cobraria ao investidor
de forma a que os três modelos garantam a
mesma rentabilidade no momento inicial do
investimento. Igualando as equações (8) e
(18) e impondo que P0 = PT obtemos
S = fmP0/{m+ f (1 - m)}.
Figura 12. Função de Rentabilidade dos CFD’s Spread
Fonte: Cálculos próprios. Assume-se P0 =20, N=1 e m = 5%
Ao absorver o custo de intermediação financei-
ra no preço, o modelo de negócio baseado na
inclusão de um spread no preço de aquisição
conduz a uma função de rentabilidade com de-
clive mais acentuado que o dos restantes méto-
dos de comissionamento, isto é, conduz a uma
alavancagem efetiva mais elevada do que ante-
riormente, para níveis equivalentes de comissi-
onamento no início do investimento. A Tabela
4 compara o valor de alavancagem implícito em
cada um dos modelos, bem como no cenário
base sem custos de corretagem.
25 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
Tabela 4. Níveis de Alavancagem Efetivos
O nível de alavancagem efetiva do método de
comissões recorrendo a spread será superior ao
de corretagem percentual e fixa respetivamente
desde que:
(21)
e,
(22)
Note-se contudo, uma comparação direta dos
resultados entre os métodos de comissionamen-
to percentual, spread e fixo, deverá ter em con-
ta que no último o investidor pode aumentar a
alavancagem efetiva do seu investimento atra-
vés da compra de um maior número de CFD’s.
Nos restantes métodos de comissionamento, tal
opção não se encontra à disposição do investi-
dor, pelo que, os resultados presentes na Tabela
4, ao assumirem simplisticamente que N =1
poderá conduzir a uma subvalorização dos re-
sultados associados a uma comissão fixa. Caso
o investidor adquirisse 2 CFD’s, o seu nível de
alavancagem aumentaria para 18,2 (mantendo
os restantes parâmetros constantes) com o mé-
todo de comissionamento fixo.
Conclui-se, assim, que o método de remunera-
ção que o intermediário financeiro utiliza influi
na rentabilidade do investimento em CFD’s.
Como tal, devem os investidores encetar uma
análise aprofundada e comparada dos preçários
dos intermediários financeiros que fornecem os
serviços de investimento desejados, no sentido
de entender com clareza de que forma os custos
de intermediação financeira impactam na renta-
bilidade dos seus investimentos. Tal assume
maior importância para os investidores que ne-
goceiam CFD’s para beneficiar da alavancagem
que estes instrumentos permitem assumir.
7.3 Efeitos dos Custos de Financiamento
Assume-se agora que o investidor mantém a sua
posição aberta após o encerramento da sessão
de negociação, sendo-lhe cobrado custos de
financiamento. Mais uma vez, iremos tratar
apenas do caso em que o investidor assume
uma posição longa sobre o ativo subjacente da-
do que o caso em que o investidor assume uma
posição curta tem conclusões análogas, manten-
do-se assim a análise menos extensa. Por cada
dia que o investidor mantenha a posição aberta
ser-lhe-ão cobrados juros a uma taxa efetiva de
i € ]0,1] sobre o valor total da posição.17 O ho-
rizonte temporal do investimento assume a se-
guinte estrutura:
Sem Custo
de Corretagem
Comissão
de Corretagem
Percentual
Comissão
de Corretagem Fixa Spread
20 16,5 16,7 19,8
Fonte: Cálculos próprios. Assume-se P0 =20, N=1 e m = 5%, f = 1%, F = 0,2€, S = 0,17€ (aprox.). Na tabela f’ = F / NP0 e s = S/P0
17- Lembremo-nos que uma das características da negociação de CFD’s é que, apesar do investidor se financiar junto da sua contraparte no montante correspondente à diferença entre o valor de abertura do contrato e o montante de margem exigido, ser-lhe-ão cobrados juros
sobre o valor total e não apenas sobre o valor de financiamento. Esta é uma das formas de remuneração do intermediário financeiro (além
das comissões e spreads).
50: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
26 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 51
O período 0 corresponde ao momento temporal
em que o investidor compra os CFD’s, o perío-
do 1 ao momento em que é conhecido o preço
de fecho de sessão do ativo subjacente e sobre o
qual o investidor terá que pagar juros e o mo-
mento T corresponde ao momento de encerra-
mento da posição por parte do investidor. Assu-
me-se que os períodos 0 e 1 correspondem à
mesma sessão enquanto o período T correspon-
derá a qualquer momento da sessão seguinte.
Para o desenvolvimento da função de rentabili-
dade assumiremos o cenário base sem custos de
transação. Como anteriormente, o investidor
deposita margem no valor mNP0 e financia-se
no montante (1 - m)NP0. No final da sessão
paga custos de financiamento no montante iNP1
por manter a posição aberta após o encerramen-
to da sessão. O resultado desta transação iguala:
(23)
Resultado = NPT - mNP0 - (1– m) NP0 - iNP1
= N { PT - P0 - iP1}
Dividindo pelo investimento inicial e definindo
r1 = P1 / P0 - 1 obtém-se a rentabilidade do
investimento:
(24)
=
Como esperado, os custos de financiamento
têm um impacto negativo na rentabilidade do
investimento em CFD’s. Esse impacto será tan-
to mais elevado quanto maior for P1 face a P0
(isto é, quanto maior for a valorização da posi-
ção no momento de apuramento do montante de
juros).
8. SÍNTESE CONCLUSIVA
A participação dos investidores no mercado
financeiro com recurso a contratos diferenciais
tem aumentado significativamente. Este incre-
mento tem sido feito a par com uma expansão
do número de fornecedores de serviços de in-
vestimento através da internet, com recurso a
plataformas eletrónicas de negociação, que em
variadas situações não fornecem aos seus clien-
tes uma descrição completa dos riscos que de-
correm do investimento nestes instrumentos
financeiros nem tão pouco do seu modo de fun-
cionamento.
O presente artigo pretendeu realizar uma análi-
se abrangente das características, vantagens,
desvantagens e riscos do investimento em
CFD’s, procedendo a uma caracterização deste
instrumento derivado bem como da conexão
entre os riscos da negociação de CFD’s e o mo-
delo de negócio dos intermediários financeiros
que providenciam tais serviços de investimento.
Os contratos diferenciais são instrumentos fi-
nanceiros que permitem aos investidores a ex-
posição a uma variada gama de ativos subjacen-
tes, desde ações, a índices, taxas de juro, taxas
de câmbio ou mercadorias. Estes instrumentos
detêm a particularidade de permitirem o investi-
mento alavancado, através da possibilidade de
investimento inicial de um reduzido montante
de margem (financiando-se o investidor no
montante remanescente) mantendo a exposição
ao valor global do contrato. A posição criada
pelo contrato diferencial sobre o ativo subjacen-
te é puramente sintética, não existindo qualquer
direito do investidor sobre o mesmo, algo que
Abre Posição
valorizada em: NP 0
Paga juros no
montante: iNP 1
Encerra Posição
valorizada em: NP T
0 1 T
27 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
nem sempre é corretamente percecionado pelos
investidores e que, em boa verdade, nem sem-
pre lhes é explicitamente referido. Como exem-
plo, um detentor de uma posição longa em
CFD’s sobre uma determinada ação não o torna
detentor dessa ação e, por inerência, não o torna
acionista da empresa. Com a detenção de
CFD’s um investidor terá apenas direito ao va-
lor correspondente à diferença entre o preço do
ativo subjacente nas datas de encerramento e de
abertura da posição, caso este seja positivo,
bem como a eventuais dividendos que a empre-
sa (cujas ações constituem o ativo subjacente)
distribua.
A característica de derivado OTC e da inexis-
tência de clearing dos instrumentos negociados
significa faz com que os investidores estão su-
jeitos a riscos de contraparte. As propostas le-
gislativas recentes nesta área não permitem ain-
da descortinar quais as classes de derivados
OTC que serão sujeitos a clearing obrigatório,
contudo, a distribuição da negociação por tipo
de investidor (ilustrada na Figura 2) sugere que
não seria desproporcionado o clearing obrigató-
rio para esta classe de instrumentos em benefí-
cio dos investidores a quem seria garantida pro-
teção superior.
A proliferação de plataformas eletrónicas de
negociação white label introduziu uma maior
opacidade neste mercado, uma vez que o inter-
mediário financeiro junto do qual os investido-
res abrem conta não é necessariamente a sua
contraparte nas transações; esse intermediário
financeiro limita-se por vezes a receber e reen-
caminhar as ordens para a entidade fornecedora
da tecnologia de negociação utilizada pelos
seus clientes. A aferição do risco de contraparte
nestas condições fica certamente dificultada.
Em todo o caso, o intermediário financeiro man-
tém-se inteiramente responsável perante os seus
clientes pelos serviços de investimento que
presta e/ou disponibiliza através de plataformas
de negociação eletrónicas, independentemente
de constituírem tecnologia sua ou não.
Conclui-se no presente artigo que a rentabilida-
de do investimento pode ser significativamente
alterada em função da existência de custos de
transação e, em particular, pela forma como es-
ses custos são impostos aos investidores. A pro-
moção junto dos investidores de uma melhor
compreensão sobre a forma como os custos de
transação lhes são imputados deve ser garantida
pelos intermediários financeiros, a bem de uma
maior eficiência na negociação por parte dos
seus clientes.
Em suma, a evolução da regulação deste setor
deve passar pela promoção de maior transparên-
cia. A natureza complexa e por vezes não com-
preendida de produtos financeiros como os
CFD’s deverá exigir mais, não só às sociedades
que prestam tais serviços de investimento, mas
também, às entidades que têm por missão a vi-
gilância do cumprimento das melhores práticas
e regras na comercialização e marketing
(particularmente agressivo) de produtos desta
natureza. Contudo, cabe também aos investido-
res um papel fundamental no sentido de empre-
ender formas de garantir uma maior compreen-
são sobre o funcionamento dos produtos que
negoceiam, exigindo dos intermediários finan-
ceiros a todo o momento uma explicitação cabal
de todos os riscos, vantagens e desvantagens da
negociação de tais produtos. Só assim esses in-
vestidores poderão tomar decisões fundamenta-
das para os seus investimentos.
52: CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
28 : CADERNOS DO MERCADO DE VALORES MOBILIÁRIOS
REFERÊNCIAS
Almeida, C. F. (2011), Contratos Diferenciais, Direito dos Valores Mobiliários, Vol. 10, pp. 9-42.
Brown, C., Dark, J. e Davis, K. (2010), Exchange Traded Contracts for Difference: Design, Pricing,
and Effects, The Journal of Futures Markets, Vol. 30, 12, pp. 1108-1149.
Constantinides, G. M. (1986), Capital Market Equilibrium with Transaction Costs, The Journal of
Political Economy, Vol. 94, 4, pp. 842-862.
Liu, H. (2004), Optimal Consumption and Investment with Transaction Costs and Multiple Risky
Assets, The Journal of Finance, Vol. 59, 1, pp. 289-338.
Venter, J.H. (2008), The Profitability of CFD day trading on the JSE, Investment Analysts Journal,
Vol. 67, pp. 37-48.
CFD’S: OS RISCOS DA SIMPLICIDADE: 53
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