GT HISTORIA DO JORNALISMO
COORDENAÇÃO GERAL: MARIALVA BARBOSA (UFF)
INICIAÇÃO CIENTÍFICA I = EM FOCO A IMPRENSA MARANHENSE
1º DE JUNHO – 14 ÀS 16 HORAS
COORDENAÇÃO: LETICIA CANTARELA MATHEUS E DANIELE
BRASILIENSE (UFF)
CENSURA E IMPRENSA NA HISTÓRIA DO BRASIL: 300 ANOS DE DESAFIO
DA ARTE TIPOGRÁFICA
O Possível Alicerce da Imprensa Brasileira Inserido na Tipografia Recifense que foi
Censurada em 1706
* Por Luís Carlos Cipriano
* *Orientação de Salett Tauk e Antonio Moura
Palavras Chaves: Imprensa, história, Censura
1. A HISTÓRIA COMO BASE
As vésperas do consistente fato dos 300 anos da primeira CENSURA em terras
brasileira , revelou - se um forte indício da influência holandesa e judaica neste assunto.
Por outro lado assegurou diversas indagações de o porque se censurar uma tipografia
única e exclusivamente para impressão de letras de cambio e orações devotas.
Até o momento não se tinham notícias sobre documentos que fundamentassem
as raízes da imprensa ainda no período colonial do Brasil. Porém, isso não acalentou o
ímpeto de muitos pesquisadores. Entre eles, Nelson Werneck Sodré. “(...) Em 1706, sob
os auspícios do governador Francisco de Castro Morais, instalou – se no Recife pequena
tipografia para impressão de letras de câmbio e orações devotas. A carta régia de 8 de
junho do mesmo ano (...) determinava que deveria seqüestrar as letras impressas.”
(p.17)
Partindo desse pressuposto, diversas bibliografias e manuscritos oficiais
descobertos recentemente alertaram para este fato. Fato este, que colocou – nos diante
de um questionamento importante. Como pôde ser documentado o período imperial
como marco do nascimento da Imprensa brasileira, sabendo – se que muito antes já
existia impressos; e fora esses impressos e escritos informativos, que receberam a
primeira censura do Brasil?
A partir desses fatos surge a interrogação: Será que todos os fatos foram
esclarecidos nesses 300 anos, desde a ocorrência da 1ª Censura documentada do país?
Esta indagação começa a tomar estrutura e respostas a partir do Livro TEMPO DOS
FLAMENGOS, do historiador José Antonio Gonsalves de Mello, e de documentos
encontrados no Arquivo Público de Pernambuco e Arquivo Nacional.
Portanto, para responder esse questionamento, vislumbrou – se a necessidade de
criar esta pesquisa, que se baseia especificamente na Carta Régia que decreta o
fechamento da tipografia e, documentos da época com obras atuais que referência o
fato. Criando assim, uma metodologia comparativa de documentos de época e análise de
informações direcionadas.
2.CONTEXTO HISTÓRICO DA ÉPOCA
A região européia que hoje denomina – se Holanda compunha econômica e
geograficamente no século XVII, um complexo de províncias de caráter cosmopolita e
burguês. Com interesses em comum, um grupo de comerciantes diretamente ligados a
tais províncias fundaram uma companhia que objetivava o lucro farto e imediato; essa
companhia foi nomeada, Companhia das Índias Ocidentais. A mesma agia em regiões
de exploração coloniais Portuguesas.
No Brasil, especificamente em 1630, a Companhia das Índias Ocidentais aporta
em Pernambuco dotada de considerado poderio militar, como destaca o historiador
JOSÉ ANTONIO GONSALVES DE MELLO, em TEMPO DOS FLAMENGOS. Esta
companhia citada desprendera esforços acerca de estudos estratégicos em torno da
geografia pernambucana setecentista: “ Há anos que vinham sendo reunidos na Holanda
dados e informações sobre a Capitania de Pernambuco, a configuração de sua costa, os
portos, desembocaduras, regime dos ventos, a sua riqueza, a sua agricultura.” (MELLO,
1987, p.36).
A chegada dos Flamengos a Pernambuco em 16 de fevereiro de 1630, já fora
ambientada num panorama de especulações constantes de povos europeus sobre o Brasil
e suas riquezas. Fator que passava a ser estimulado muitas vezes pelos estudos
descritivos de cronistas, e até de brasileiros em torno das riquezas minerais e agrícolas
constituídas. Por mais, a divulgação dessas explorações e comercializações tornava o
campo a ser explorado muito mais perigoso. Um forte exemplo disso, é a Obra
CULTURA E OPULÊNCIA DO BRASIL, de André João Antonil publicada em 1711,
que com pouco tempo de divulgação de seu conteúdo sofrera a CENSURA do Estado
Português.
Diante do supracitado, é nítido que Portugal busca reprimir todas as
possibilidades de produção e difusão de obras informativas sobre o Brasil. Pois, foi com
esse caráter repressor, que a metrópole em 1706 determinou o encerramento das
atividades de uma tipografia instalada na cidade do Recife. Período no qual Portugal
está reestruturando os seus ditames sobre sua mais prospera colônia.
O que se constata nas pesquisas documentais, é que a tipografia recifense
recebeu da Companhia das Índias Ocidentais, apoio considerável; uma vez que letras de
imprensa vindas de Amsterdã agilizavam todo o processo de impressão da colônia
brasileira. Salienta – se que este processo de impressão tinha os mais distintos objetivos,
questão esta, que levanta e permite analisar a imprensa no Brasil, especificamente em
Pernambuco, a partir da presença holandesa e judaica.
É demasiado sabido, que durante a estada dos Flamengos em Pernambuco houve
uma convergência considerável, de comunidades judaicas, no território da maior
província de poder econômico da colônia no século XVII. E estes Judeus, radicados na
Holanda contribuíram financeiramente de forma irrestrita, ao processo de
empreendimento da Companhia das Índias em Pernambuco.
“O Mundo Português na América sofrera em todo seu período colonial
investidas de corsários ingleses, franceses, (...) objetivando tomar posse das riquezas
brasileira”(Mello, 1987. p.26). Logo, os Flamengos que aqui estavam passaram a
incentivar a impressão de obras informativas não apenas em terras pernambucanas, mas
também nos Estados Gerais das Províncias Unidas – Holanda, para notificarem tais
ocorridos.
2.1 A TIPOGRAFIA
Realmente, muito pouco se tem a respeito da tipografia pernambucana censurada
em 08 de junho de 1706. A não ser, a menção feita por Francisco A Pereira, em anais
pernambucano – volume V, data de 08 de junho, ano 1706, que também ofereceu
subsídios à pesquisa do autor e historiador de comunicação, Nelson Werneck Sodré, em
história da imprensa no Brasil.
“ ... Os holandeses, dominando a área mais rica da colônia, no século XVII
introduziram no Brasil alguns elementos característicos da atividade burguesa, de quem
foram pioneiros. Não a imprensa, apesar de lhe terem dado singular desenvolvimento,
na área metropolitana, na proporção do avanço da burguesia, não se empenharam em
trazer ao seu novo domínio americano a arte tipográfica. Inúteis foram os esforços de
Nassau nesse sentido. É curioso o fato, porque mostra como as condições da colônia
constituíam obstáculo mais poderosos ao advento da imprensa ao que os impedimentos
oficiais que caracterizaram a atitude portuguesa. Claro que estes, na sua vigilância
permanente concorreram também para o retardo com o que conhecemos a imprensa.
Mas a razão essencial estava nas condições coloniais adversas. O escravismo dominante
era infeso à cultura e a nova técnica de sua difusão. A etapa econômica e social
atravessada pela colônia não gerava as exigências necessárias à instalação da
imprensa...” sendo, “(...) em 1706, sob os auspícios do governador Francisco de Castro
Moraes que, instalou – se no Recife pequena tipografia para impressão de letras de
câmbio e orações devotas. A Carta Régia de 8 de junho do mesmo ano, entretanto
liquidou a tentativa. Determinava que se devia seqüestrar as letras impressas e notificar
os donos dela, e os oficiais da tipografia que não imprimissem nem consentissem que se
imprimissem livros ou papeis avulsos. Essa iniciativa pioneira tem significação
meramente cronológica, pois não teve nenhuma função efetiva, nem as suas atividades
despertaram atenção.” (Sodré, 1999. p.16 – 17)
Ora, se por acaso essa iniciativa só teve significado cronológico, e suas
atividades não despertaram atenção, porque seqüestrar tais letras de impressão e fechar
tal tipografia? Outro fato merecedor de menção é: Os holandeses dominando a área
mais rica da colônia foram pioneiros em diversas atividades, NÃO A IMPRENSA,
apesar dos esforços de Nassau. Pois, acredita – se que tais fatos não seriam de
intenção das condições da colônia..
Porém, se observa nesse contexto que existe um ponto de discordância entre o
historiador Francisco de A. Pereira, de Anais Pernambucanos e o autor de História da
Imprensa, Nelson Werneck Sodré. Pois, Francisco Pereira em nenhum momento cita
que tal tipografia tenha nascido no mesmo ano de sua censura, 1706, como pronuncia –
se Nelson Werneck Sodré. Mas como isso pode ocorrer, se o próprio Sodré buscou
informações nos Anais de Francisco Pereira, segundo suas próprias descrições em sua
obra?
Outro fator que suscita essa discordância são as análises realizadas nas Ordens
Regias 6, 4, e DIII – 01, do Arquivo Público do Estado de Pernambuco. Estas ordens,
que datam o período do governo de Francisco de Castro Moraes, o mesmo que cumpriu
as ordens do Conselho Ultramarino em cassar as letras e impressos da Tipografia
pernambucana, não faz nenhuma referência a este fato. Sendo o único documento
existente acerca dessa censura, a Carta Regia que se encontra atualmente no Arquivo
Ultramarino em Portugal. Então, como entender que essa tipografia nascera no mesmo
ano de sua censura, como nos revela Sodré?
Nas análises do historiador José Antonio Gonsalves de Mello, percebe – se
nitidamente que a preocupação dos holandeses era com as riquezas existentes em terras
pernambucanas. Porém, com a Presença do Conde João Mauricio de Nassau possibilitou
– se um ambiente para que se desenvolvesse as artes e sua propagação. Dentre elas a
arte Tipográfica. Principalmente porque recebeu dos Cristãos – Novos, Judeus em
Pernambuco, tamanho incentivo burocrático e financeiro. Salientando – se que quase
toda estrutura da Companhia das Índias Ocidentais era mantida pelos Judeus radicados
em Holanda.
Outro fator que considera as afirmações históricas em Mello, é que o dinheiro
doado pelos Judeus vindos para o Brasil tornou o comércio próspero, e para tanto se
necessitava de notas e papéis para considerar as vendas e a difusão de seus credos.
“ ... sabe – se hoje o enorme valor da Nação Judaica do Recife Holandês (...)
Fundaram a sua Sinagoga, onde não faziam somente rezar as suas orações, mas
redigiam memoriais (...) A Isaac Aboab da Fonseca (...) deve – se um poema sobre a
Insurreição Pernambucana que M. Kayserling publicou.” (Mello, 1987. p. 27)
Ao levantar essas informações, se percebe de imediato as lacunas deixadas pela
história da imprensa. Afinal ligações diretas e indiretas com essa tipografia censurada
no século XVIII, são de extrema delicadeza, levando em conta que poucas são as fontes
que traduzem tais questionamentos acerca da mesma com veemência.
Portanto, é imprescindível acolher essas informações acerca da Tipografia
Censurada, para que se consiga entender a arte tipográfica como um todo no período
colonial. Pois, só assim será constatado quais foram os reais alicerces da imprensa no
Brasil.
3. ATOS DE IMPRENSA NO SÉCULO XVII
Ao entender a essência da palavra Jornais de Viagens descrita no Livro Tempo
dos Flamengos, é possível descrever o que seria informações e disseminações de
informações no governo de Holanda no Brasil. E assim assemelhar aos atos de imprensa
como o conhecemos hoje, Neste, Jornal de viagens se tinha informações e dados acerca
de muitos atos e acontecimentos ocorridos naquele período da história. Tanto que,
Nassau pedia para que todos os Capitãs de suas Naus relatassem suas observações e
crônicas para serem lidas e disseminadas na metrópole – Holanda.
“ Ao lado das cartas à Holanda há papéis vários: Atas de Assembléias
religiosas, JORNAIS DE VIAGENS, cartas interceptadas aos portugueses, depoimentos
de prisioneiros, requerimentos, exposições, que via de regra seguiam como apensos às
Generale Missiven. Preservou – se para os estudiosos, toda esta enorme coleção de
documentos – o governo holandês em Pernambuco não se CANSAVA DE SOLICITAR
À HOLANDA PAPEL DE CARTA, TINTA E PENAS – que, aproveitada agora,
permitiu deixar esclarecidas muitas dúvidas sobre a história do Brasil holandês em geral
e a de Pernambuco em particular.” (MELLO,1987.p.26)
Com isso, se percebe que mesmo sem intenção, ou até mesmo com intento,
Nassau inseriu em nosso meio a pratica do cronista – jornalista, iniciando assim os atos
dessa profissão em terras de Recife, Pernambuco. Este assunto também é citado no
segundo parágrafo da página 22, onde Mello descreve que o Doutor Alfredo de
Carvalho (1904) enriqueceu vários números da Revista do instituto arqueológico
Pernambucano e outras revistas que versam sobre a criação da imprensa no período
holandês.
“ ...Em 9 de maio de 1886, José Hygino fez entrega dos volumes copiados na
Holanda ao Instituto arqueológico, Histórico e geográfico de Pernambuco e este pode
ter orgulho de se considerar, desde então, o possuidor da mais completa coleção
existente, fora da Holanda, de documentos sobre o período da dominação neerlandesa
do nordeste brasileiro. Nem sobre outra documentação é que se baseou – o, sob certo
aspecto, melhor trabalho sobre o assunto: o livro do professor da Universidade de
Munster Dr. Hermann Watjen, Das Hollandische Kolonialreich In Brasilien. O próprio
José Hygino tomou a peito demonstrar a grande riqueza do material reunido: no seu
interessante relatório, que constitui hoje uma preciosidade bibliográfica, e em traduções
para jornais e revistas históricas. Não realizou, porém, nenhum estudo de conjunto
como aconteceu, também, com o seu seguidor próximo, outro pernambucano ilustre, o
Dr. Alfredo Ferreira de Carvalho (1870 – 1916). Este enriqueceu vários números da
Revista do Instituto Arqueológico Pernambucano e outras revistas com traduções e
estudos detalhados em que abordava determinados temas: Minas de Ouro e Prata,
CRIAÇÃO DA IMPRENSA NO DOMINIO HOLANDÊS, brasões d´armas, moedas
obsidionais, Jacob Rabe, etc...” (Mello, 1987.p.22)
Outro aspecto revelador sobre atos de imprensa no século XVII, são as obras
de Brito Freyre – Guerra Brasílica, Gaspar Barléu – O Brasil Holandês sob o Conde
João Maurício de Nassau , e Frei Manuel Calado – Valeroso Lucideno ou Trimpho da
Liberdade. Esses três personagens tiveram grande destaque por narrarem diversos
ocorridos no Brasil holandês (1630 – 1654).
Brito Freyre, tinha suas memória diárias escrita, sendo importante GUERRA
BRASILICA, sua maior obra acerca do domínio holandês.
“... Alguns deles merecem uma referência especial: entre estes o muito
caluniado Brito Freyre a quem Varnhagen acusou de ter se aproveitado do material
reunido pelo Marquês de Basto. O que me parece um exagero. Acusou – o ainda, de
escrever em um estilo ultra culto e muito guindado. No que, também, há exagero. É
verdade que, em certos trechos, o autor se deixa arrebatar pela eloquência: não se pode
negar, também que o livro hauriu muito das MEMORIAS DIÁRIAS – E COMO
ESTAS ABRANGE O PERÍODO 1630 – 1638 : NÃO SERIA POSSÍVEL QUE
SENDO AQUELAS MEMÓRIAS A MELHOR RELAÇÃO CRONOLÓGICA,
DELAS NÃO SE TIVESSE SERVIDO O GENERAL BRITO FREYRE. QUE ESTE
MUITAS OUTRAS FONTES TEVE EM MÃO, VÊ – SE DO TEXTO. QUE MUITA
EXPERIÊNCIA PESSOAL DOS LUGARES, SABE – SE. QUE MUITAS NOTICIAS
E INFORMAÇÕES PESSOALMENTE RECOLHEU, É COISA QUE TAMBÉM SE
VÊ NO LIVRO. E acrescenta-se, que algumas lendas veiculou, como a da morte heróica
do almirante Pater.
Várias razões levaram Brito Freyre a escrever os sucessos da Guerra Brasílica
, a quem não era alheio o desejo de contrapor a sua as obras publicadas na Holanda e o
orgulho da vitória Luso – Brasileira: Acumulando sobre o mesmo argumento, volumes
grandes, as elegâncias estrangeiras, enquanto o fim do sucesso, não emudeceu o orgulho
de Olanda. E também o fato de se ter achado presente ao período final da guerra e de ter
sido testemunha de vista: Não só esta confiança me animou esta ocupação, mas
parecerem – me melhor os limitados talentos que nalguma se empregão, do que os
grandes sujeitos que passão em silêncio a vida; disfarçando por encolhimento modesto o
que é frouxidão ociosa. Revela-se por essas firmes palavras, Brito Freyre, uma
personalidade para quem os acontecimentos e a própria vida criavam obrigações. O fato
de se ter achado presente à guerra levou – o a escrever o sucesso dos seus patrícios
contra o invasor. Ele, que tinha sido sempre um soldado, aparou a pena com a espada e
lançou – se ao grande trabalho. Bem certo estava ele que do ócio ocupado – como
chamava ao seu trabalho intelectual – poderia resultar grande serviço à pátria: a qual
muitas vezes tirou mais fruito do ócio ocupado de alguns, que do suor inútil de
outros...” (MELLO,1987.p.28 – 29).
Gaspar Barléu, narrou em texto datado de 1647 o Brasil holandês sob o conde
João Mauricio de Nassau os oito anos de administração do Conde em terras de
Pernambuco – Brasil.
No que se refere ao frei Calado temos, “... um dos documentos mais preciosos
da bibliografia em Lingua portuguesa é o VALEROSO LUCIDENO, OU TRIUMPHO
DA LIBERDADE da autoria de frei Manuel Calado, pregador da ordem de S. Paulo da
Congregação dos Eremitas de Serra D´ossa. Calado, como se sabe, é o nome com que se
refere a si próprio Frei Manuel do Salvador, personagem bastante conhecido entre
holandeses – nas Dagelijksche Notulen aparece referido como o Frei Manuel – e
portugueses, entre os quais, morador que era lá para as bandas de Giquiá, era chamado
de Frei Manuel dos óculos. O seu livro, publicado pela primeira vez em 1648, depois de
sofrer censura eclesiástica – tendo incorrido na pena de inclusão no Index Librorum
Prohibitorum – reaparece em 1668 para continuar sofrendo fortes ataques de estudiosos
brasileiros e estrangeiros. O bom Frei Manuel fez – me pressentir, graças ao tom de
espontaneidade em que está redigido o seu livro, a veracidade de suas afirmações;
depois, no que pude confrontar muitas de suas narrativas com documentos holandeses,
principalmente as Dagelijksche Notulen, não tenho dúvida em referir que no
VALEROSO LUCIDENO está o mais importante testemunho sobre Pernambuco sob o
domínio holandês.” (MELLO, 1987.p.31)
Outro aspecto importante é “...A bibliografia do domínio holandês do nordeste
brasileiro é das mais vastas da história do Brasil. Não está senão incompletamente feita
por alguns estudiosos: Tiele, Knuttel Wulp, Petit, , Asher, J. C. Rodrigues, Alfredo de
Carvalho, José Honório Rodrigues. A parte, no Brasil, menos acessível – não pela
lingua, mas pela raridade – São os chamados PANFLETOS OU BROCHURAS
IMPRESSOS NA HOLANDA ANTES E DURANTE O PERÍODO DA OCUPAÇÃO
HOLANDESA. SÃO EM BOA PARTE DE PEQUENO INTERESSE OU DE
INTERESSE SUBSIDÍARIO; VERSAM PRINCIPALMENTE ASSUNTOS DE
CARATER MERCANTIL.
Alguns, porém, são de maior importância, e descrevem a vida econômica da
colônia e são, em primeiro plano, O MACHADÃO DO BRASIL (De Brasilsche Breede
– Byl) e o SACO DE OURO DO BRASIL (Brasilsche Gelt – Sack). Raro, Talvez
único, um com interesse social do Cort ende Sonderlingh Verhael da autoria do
predicante de língua francesa Soler e para o qual fui um dos primeiros a chamar
atenção. Alguns Panfletos, como refere Asher, são de inspiração anti – holandesa, como
aqueles custeados pela embaixada portuguesa na Holanda. Um outro contém cartas de
um índio brasileiro, Antonio Parauapaba, e um relatório dos vexames sofridos pelos
moradores pernambucanos dos chefes flamengos. Outro, de 1624, traz uma gravura das
mais antigas de Olinda e do Recife, há pouco reproduzida na tradução brasileira de
Nieuhof...” (MELLO, 1987.p.27 – 28)
Mesmo sem uma constatação exata sobre qualquer impresso oficialmente
tipógrafado em terras brasileira no final do século XVII, verificou -se a circulação
destes. Por mais, a busca de dados e informações, as anotações e a disseminação dos
fatos ocorridos naquele período da história fazem perceber as características que
determinam a profissão de um jornalista. De acordo com o significado da palavra
tipografia temos: É a arte de imprimir textos com tipos. Estabelecimento onde se faz
composição e impressão com tipos. Porém, cabe a profissão de períodista/jornalista a
busca de dados, a disseminação das informações. Portanto, nesse caso, e em
consonância com o significado descrito, se constata elementos e fatos que caracterizam
atos de um tipógrafo, períodista, e não poderíamos aqui dizer um jornalista?
Outro fator que também caracteriza a arte tipográfica no século XVII, é a
manifestação dos Cristãos Novos instalados em Pernambuco no período holandês. Essas
manifestações correspondem a composição de textos, onde possivelmente se vislumbra
o prelo tipográfico na sinagoga existente no Bairro do Recife, antiga rua dos Judeus,
atual rua do Bom Jesus.
“ ... Sou o primeiro a lamentar no estudo que se segue o fato de que lhe faltam
quase completamente dados provenientes de fontes judaícas. Sabe - se hoje o enorme
valor da nação judaica do Recife Holandês e que aqui nasceu a cultura sefardínica na
América. Vultos da maior importância no mundo dos Judeus Ibéricos reuniram – se em
Pernambuco e, em um primeiro andar de certo sobrado da rua dos Judeus, fundaram a
sua sinagoga, onde não faziam somente rezar as suas orações, mas redigiam memoriais
e consultas e mantinham estreita ligação com outros centros judaicos: Constantinopla,
Amsterdam, Salonica.
Parece que muitos deles eram adeptos de Sabbathai Zevi; esses adeptos
guardaram por longos anos tradições e reminiscências Ibéricas e foi entre eles que
Menendez Pidal foi encontrar trechos inteiros de antigos romances espanhóis. A Isaac
Aboab da Fonseca, rabino de grande nomeada no seu tempo, deve -se um poema sobre a
insurreição Pernambucana que M. Kayserling publicou...” (MELLO, 1987.p.27)
“...Também no Recife foi que compôs poemas e orações o primeiro escritor
israelita em terras das Américas: o já citado rabino Isaac Aboab da Fonseca. Conhecem
– se dele duas orações compostas em Pernambuco. E um poema sobre os sofrimentos
dos Judeus durante a Insurreição Pernambucana (1645 – 1654), publicado, juntamente
com aquelas, por Kayserling. O poema intitula -se Memorial dos Prodígios de Deus e da
grande bondade que Ele, na Sua compaixão e misericórdia, mostrou para com a casa de
Israel no Brasil, quando surgiu a tropa de Portugal para destruir e exterminar tudo que
se chama Israel, mulheres e meninos, em um dia...”(MELLO,1987.p.251)
3.1 A CENSURA
Diversos são os argumentos que levam a dúvida de o porque fechar uma
tipografia, pelo que se consta, única no Brasil colônia.Ou seja, a censura no Brasil como
se ver, não é um caso recente, e os fragmentos deixados pela história são contundentes
para se chegar a essa conclusão.
Para tanto, se tomou como linha de partida para essa investigação, a Carta
Censuradora de 08 de junho de 1706, que se encontra atualmente em copia guardada, no
Arquivo Ultramarino de Portugal.
Até então não se tinha dado a importância devida a este fato, porque no texto
oficial da carta que censurou a tipografia, não se faz menção a qualquer investida de
divulgações de assuntos referentes a colônia. E como se sabe, é necessário esse tipo de
informação para que se defina tais fatos como comparativos entre a tipografia e o
alicerce da imprensa.
Porém, o que se escapou à análise desse documento foi a contextualização
histórica, e o cruzamento de dados com outros documentos da época.
Evaldo Cabral de Melo, em Norte Agrário do Brasil , em descrição do ano de
1647 descreve: “ ... a primeira reação de Souza Coutinho foi esconder o acontecimento,
mas no dia seguinte a nova era conhecida em Amsterdã e em Haia por navios vindos de
Recife. As gazetas descreviam a extensão das perdas... O embaixador não sabia a quem
imputar a rapidez com que a novidade difundira – se, se a linha no fito de provocar um
sobressalto de indignação nacional, se aos inimigos da W.I.C (Companhia das Índias
Ocidentais) no intuito de torpedear – lhe as ambições no Brasil... (p.107)
Esse trecho de Norte Agrário do Brasil descreve, que o diplomata Souza
Coutinho (Português) se utilizou de panfletos e folhetos para difundir em meio da
colônia e nas terras holandesas, assuntos de interesses portugueses, enquanto o padre
Antonio Vieira auxiliava o governo as margens das ações oficiais.
Certo desses acontecimentos, se coloca em linha de raciocínio a arte tipográfica
no Brasil, especificamente em Recife, local onde ocorreu a censura de 08 de junho de
1706, tida nesta investigação, como a primeira censura documentada, e oficial, a
imprensa do Brasil. Portanto, a partir desses acontecimentos descritos em Norte Agrário
do Brasil, que afirma: “... Holanda investia nas terras invadidas de Portugal, e
certamente Portugal usufruía desses investimentos. Após expulsão dos holandeses não
havia motivos de manter tais investimentos...”, possivelmente uma tipografia.
Em suma, a censura da tipografia pernambucana questiona veementemente a
castração dos ideais e desenvolvimento da imprensa em solo brasileiro no período
colonial. Pois, a cada momento em que se adentra nos fatos que questionam o porque da
castração dessa tipografia, se observa que o único intuito era não difundir informações
acerca da colônia e do seu povo.
3.2 O ALICERCE DA IMPRENSA NO BRASIL
Mesmo sendo essa tipografia de 1706, a primeira a ser descrita pela história da
imprensa como uma mera certidão cronológica, sem nenhuma função efetiva, e sem
atividades que despertem atenção. É notório levar em conta, que outros autores
históricos – sociais levantaram a hipótese para a probabilidade de um desenvolvimento
da imprensa no Brasil Colonial. E esta probabilidade é contundentemente constatada por
José Antonio Gonsalves de Mello, in TEMPO DOS FLAMENGOS. Mello foi a maior
autoridade em período holandês e presença judaica no Brasil.
“ ... Dr. Alfredo Ferreira de Carvalho (1870 – 1916). Este enriqueceu vários
números da revista do Instituto Arqueológico de Pernambuco e outras revistas com
traduções e estudos detalhados em que abordavam determinados temas: (...) Criação da
Imprensa no domínio holandês...” (Mello, 1987. p. 22)
O que se percebe, é que com o passar do tempo, a história começa a revelar fatos
e fontes que alicerçam o século XVII e XVIII como momento critico para o
desenvolvimento e alicerçamento da imprensa no Brasil.
Ainda na côrte de Nassau ocorreu a chegada de papéis, penas e tintas para
escrita de informações e diversos jornais de viagens como relata Mello em seu texto.
Outro fator que pode referenciar esta pesquisa trata de um documento datado
de 1792, que fala do regulamento do Conde de Oeiras, Sebastião José de Carvalho e
Melo, para controlar o comercio de livros e textos em Portugal e suas colônias. A lei
obriga todos os impressores, livreiros e negociantes de livros a entregarem a um
magistrado uma lista completa com os títulos das obras e textos de que dispõem. Entre
outras determinações, é punida com pena capital a introdução de obras estrangeiras,
irradiadas principalmente pela Holanda.(Arquivo Nacional. Livro X, Cap. 7, pag. 30 –
33. Local: Lisboa)
Em 1792, também ocorreu um registro da criação de um tribunal da mesa
censória pelo Conde de Oeiras, Sebastião José de Carvalho e Melo. Com base na
necessidade de limites para Liberdade de Imprensa, o tribunal supremo deveria
permitir as obras úteis e proibir as que fossem perigosas. Era composto por 17
deputados, sete ordinário e 10 extraordinário, dos quais eram representantes do Santo
Ofício.(Arquivo Nacional. Livro V, cap. 24, pág. 78 Livro: Lisboa)
Levando em consideração as distâncias, e a demora na chegada de documentos
vindos da Europa, se nota que entre 1654 e 1706 são 52 anos, tempo mais que próximo
para ocorrer qualquer censura de cunho repressor aos resquícios do invasor.
Sendo assim, os ditos em torno da tipografia recifense, que foi censurada
começam a tomar ares de ponto alicersatório para a história da imprensa no Brasil,
podendo ser este, um ponto até então desconhecido da história.
3.3 O LEGADO DA TIPOGRAFIA CENSURADA EM FAVOR DA
IMPRENSA
Se atualmente a Constituição da República Federativa do Brasil, em seu artigo
220, datada de 1988 diz que:
“ A manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observando o
disposto nesta constituição. 1º nenhuma lei conterá dispositivo que possa constituir
embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social. 2º É vedada toda e qualquer CENSURA de natureza política,
ideológica ou artística.”
Fora porque, a coragem de muitos compatriotas brasileiros, que lutaram ao
longo da história fizeram com que a imposição de interesses da coroa portuguesa, não
prevalecessem, apesar de toda repressão.
A castração ocorrida no período colonial mostra que Portugal tinha alto interesse
em ocultar qualquer fato ou assunto acerca da colônia que fosse divulgada. Esse assunto
é descrito pelo autor Jorge Caldeira, em Nação Mercantilista. “ ... O motivo da
proibição era a velha política de sigilo dos portugueses, cultivada com fervor desde os
tempos do infante Dom Henrique no século XV ... Quando se tratava de cultivar a
ignorância no Brasil e sobre o Brasil, o governo português não titubeava. Quase todos
os exemplares impressos foram confiscados e queimados...” (p.13)
O que se observa com clareza, é o intuito da coroa portuguesa em esconder
todos os fatos e fontes que comprometessem o andamento da colônia brasileira. Afinal,
no período em que se censurou a tipografia pernambucana, Portugal estava se
reestruturando da invasão e expulsão holandesa, tendo ainda como resquícios dessa
invasão, os Judeus. Após também decisão de reenviar estes Judeus para outros lugares,
o governo português definiu que todos os bens fossem confiscados, e esse
confiscamento dizia respeito a todas as obras e documentos que co – relacionassem esse
período da invasão.
Para tanto, Melo incomodado com a falta de informações começou a preencher
esta lacuna, principalmente quando abriu os documentos que estavam até os dias atuais
guardados, e sem nenhuma análise, no Arquivo Real de Haia, e Arquivo Público de
Amsterdã. Salientado que estes documentos visto e analisados por Mello, diz respeito a
todo o período holandês no Brasil. Dentre eles, se revelam assuntos direcionados a arte
tipográfica. Assunto este, que não era o foco do historiador. Portanto, eis a necessidade
de uma grande análise em cima de toda esta documentação para que se alicerce com
fundamentos a história da imprensa no Brasil.
4. CONCLUSÃO
As vertentes da história da imprensa, até então sufocadas pelos arquivos que
contém fontes importantes acerca do assunto começam a revelar, fatos importantes, que
consolidam o alicerce da informação no país. Afinal, redes e teias começam a se
entrelaçarem para responder a questionamentos dantes inquestionáveis.
Pois, falar de Censura no período colonial, é contestar a história em quase tudo
que fora dito até este momento. Porém, fatos novos, e fontes credenciadas revelam que
a arte tipográfica tem seus alicerces, muito antes daqueles que se conhece hoje,
fundamentando assim, a exigência de nova pesquisa que constate essas novas
informações.
Por isso, em CENSURA E IMPRENSA NA HISTÓRIA DO BRASIL: 300 ANOS DE
DESAFIO DA ARTE TIPOGRAFICA. O Possível Alicerce da Imprensa Brasileira
Inserido na Tipografia Recifense que foi Censurada em 1706, percebe – se
fidedignamente a busca de novos fatos e fontes, que foram apresentadas pela história
para a ampliação do conhecimento acerca desse assunto.
No mais, constata – se que o historiador Jose Antonio Gonsalves de Mello
forneceu dados de extrema importância para tal pesquisa, principalmente no que diz
respeito aos locais exatos de onde buscar tais informações.
“ ... sabe – se hoje o enorme valor da Nação Judaica do Recife Holandês ...
Fundaram a sua Sinagoga, onde não faziam somente rezar as suas orações, mas
redigiam memoriais ... A Isaac Aboab da Fonseca ... deve – se um poema sobre a
Insurreição Pernambucana que M. Kayserling publicou.” (Mello, 1987. p. 27)
Portanto já se coloca em linha de raciocínio os séculos XVII e XVIII como
ponto de partida da Imprensa Nacional, e que possivelmente a tipografia recifense
censurada tenha sido o marco de todo esse prelo, reforçando assim, Recife como berço
da Imprensa do Brasil.
BIBLIOGRAFIA
CABRAL DE MELO, Evaldo. Norte Agrário do Brasil. Rio de Janeiro:
TopBooks.1999.
GONSALVES DE MELLO, Jose Antonio. Tempo dos Flamengos. Recife:
Massangana.1997.
BRANDÃO, Ambrosio Fernandes. Diálogo das Grandezas do Brasil. Recife:
Massangana.1997.
CALDEIRA, Jorge. Nação Mercantilista. São Paulo: Editora 34.1999.
VARNHAGEN, Francisco Adolfo de. Historia Geral do Brasil, antes de sua Separação
e Independência de Portugal – TOMO I, II, III, IV. São Paulo: Melhoramentos. 1948.
ANTONIL, André João. Cultura e Opulência do Brasil. São Paulo: USP e
Itatiaia.1982.
PEREIRA, Francisco de A. Anais Pernambucano – Vol. V. Recife: UFRPE.1960.
SODRÉ, Nelson Werneck. História da Imprensa no Brasil. Rio de Janeiro:
Mauad.1999.
ORDEM REGIA – 6 (1701 – 1706). Recife: Arquivo Público do Estado de
Pernambuco.2004.
ORDEM REGIA – 4 (1670 – 1745). Recife: Arquivo Público do Estado de
Pernambuco.2004.
ORDEM REGIA – D.III – 01 (1696 – 1801). Recife: Arquivo Público do Estado de
Pernambuco.2004.
* LUIS CARLOS CIPRIANO, 28 anos, natural de Jaboatão, estado de
Pernambuco é formado em jornalismo pela Universidade São Marcos de São Paulo,
especializado em Comunicação na Era Ponto. Com pela Universidade Católica do
Uruguay, e Novas Rotas da Comunicação para América do Sul pela Universidade de
Rio Cuarto – Argentina. Atualmente, gradua – se no Curso Normal Superior da UFRPE,
e é membro da SBPJor. O mesmo é Vencedor de Prêmios na área de Comunicação.
** Salett Tauk coordenadora do PAPE – Projeto de Associativismo e
Pesquisa do Mestrado em Comunicação, Associativismo e cooperativismo Rural da
UFRPE. Doutora em Comunicação pela USP. E membro da Associação Internacional
de Cooperativismo e Associativismo.
Antonio Moura é Mestrando em arqueologia da UFPE e professor de História
na prática pedagógica, Metodologia do Ensino de História e Ciências Sociais da UFRPE
– Departamento de Educação.
O Desenvolvimento da Democracia e da Imprensa no Brasil –
uma cobertura política
DORNELES, Felipe Rigon. Graduando em Comunicação Social – habilitação
Jornalismo da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul –
UNIJUÍ - RS
ENDRUWEIT, Leila Martina Baratieri. – Graduando em Comunicação Social –
habilitação Jornalismo da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande
do Sul – UNIJUÍ
Resumo
A história da política e da imprensa brasileira é marcada por lutas rumo à democracia
e à liberdade de imprensa. Movimentos e protestos marcaram este desenvolvimento.
Analisando esta história à luz das teorias da comunicação percebemos as influências,
positivas e negativas, dos meios de comunicação sobre a população. Parte desta
influência foi e é exercida pelo telejornal de maior audiência no Brasil, o Jornal
Nacional, da Rede Globo de Televisão. Neste sentido, este artigo tem como objetivo
analisar as relações entre mídia e política, enfocando as principais coberturas políticas
do Jornal Nacional: desde o Movimento “Diretas Já”, em 1985, período em que a
imprensa ainda sofria com a censura do regime militar, até a eleição do presidente
Lula, em 2002, momento em que a imprensa goza de uma liberdade que jamais teve.
Através deste estudo observamos que a imprensa trabalhou junto com a política para o
desenvolvimento da democracia em nosso país. A relação que a imprensa cria com a
população é de influência recíproca, uma relação entre mídia, política e população.
Palavras-chave: história; imprensa; democracia; influência dos meios.
Considerações Iniciais
A política no Brasil tem sido marcada por grandes conquistas rumo á
democracia, fato este que também é presente na história da imprensa. Na política temos
uma caminhada desde a conquista do voto pela mulher, passando pela ditadura militar,
as eleições diretas, a vitória e o impeachment de Collor, os oito anos de poder de
Fernando Henrique Cardoso e a tão esperada vitória do dito socialismo regido por Lula.
A história da imprensa brasileira também é marcada por vitórias e fracassos,
desde o surgimento dos primeiros jornais impressos no início do século XIX e das
primeiras rádios brasileiras. Passando pela censura do regime militar e pela conquista da
liberdade de imprensa, pós-ditadura, marcada pela consolidação de grandes emissoras
de televisão.
É neste contexto que este artigo tem como objetivo analisar o desenvolvimento
da democracia e da imprensa brasileira. Faremos uma retrospectiva dos últimos e mais
importantes acontecimentos políticos no Brasil citados acima, analisando a cobertura
realizada pela imprensa brasileira.
Em 2006 o Jornal Nacional completa 37 anos sem nunca ter saído do ar. Foi um
modo de fazer telejornal que deu certo no Brasil e hoje ele é responsável por uma das
maiores audiências da televisão brasileira. O Jornal Nacional é um programa assistido
por aproximadamente 31 milhões de brasileiros todos os dias e, a médio e longo prazo,
passa a influenciar estes brasileiros, que vivem em sociedade e trocam idéias com seus
integrantes.
Nesta trajetória os fatos políticos tiveram lugar de destaque e,
consequentemente, ajudaram a construir a consciência política da população brasileira.
Claro, sabemos que as relações com grupos de amigos, igreja, trabalho, escola e família
são os principais responsáveis pela formação da identidade de cada um, mas não
podemos negar que o Jornal Nacional influenciou a população (negativamente ou
positivamente) desde o Movimento “Diretas Já” até a eleição do presidente Lula. Sob a
luz das teorias de comunicação podemos analisar como tais fatos forma abordados e
como foram recebidos pelos telespectadores.
O que nos faz analisar estes últimos anos da história da política e da imprensa
brasileira é a crise política que se passa no Brasil, onde podemos refletir um pouco
sobre a democracia, a pouco tempo conquistada em nosso país, claro, comparada a
países como França e Inglaterra. E também pela realidade da imprensa, que de um
“estado” de censura, passou para um “estado” de liberdade, este que talvez não soube
ser usado, ultrapassando os limites da liberdade, sofrendo uma crise de credibilidade em
relação à manipulação da população.
A imprensa brasileira evolui a cada dia. Repressão e censura não fazem parte do
vocabulário da imprensa atual. Muitos fatos foram encobertos por interesses políticos
das famílias donas dos grandes meios de comunicação sob o pretexto de censura.
Analisaremos então, a partir de um breve contexto histórico da política e da imprensa
brasileira, a cobertura dos principais fatos políticos que marcaram a história do Brasil
nos últimos 20 anos.
Breve contexto histórico da política e da imprensa brasileira
A partir de 1985 o Brasil começa a desenvolver-se como um país democrático.
O período repressão regido por Getúlio Vargas, que assumiu o poder no país em 1930
governando durante 15 anos, cansou a população. Sua forma de governo era
centralizadora e controladora. Controlava e censurava manifestações contrárias ao seu
governo. Perseguia opositores políticos, o povo e os meios de comunicação. Foi um
período de extrema repressão, tanto para a população quanto para os meios de
comunicação, que serviam de porta-voz do governo, sofrendo com a censura.
Após a morte de Getúlio em 1954, assume a presidência Juscelino Kubitschek,
seguido de Jânio Quadros e João Goulart, dando continuidade ao governo getulista, mas
claro, com grandes inovações, pregando o “nacionalismo”.
A partir de 1964, o Brasil entra em um regime de ditadura, a Ditadura Militar,
um período da política brasileira em que os militares governaram o país. Este período
foi marcado pela falta de democracia, supressão de direitos constitucionais, censura,
perseguição política e repressão aos que eram contra este regime. Neste período que a
imprensa brasileira mais sofre com a censura. Os meios de comunicação sofriam uma
grande repressão, não podiam publicar matérias que, de uma forma ou outra,
comprometeriam a administração do governo militar.
Este regime durou até 1985, com a campanha das Diretas Já. Mas a censura e
rastros do regime militar ainda continuaram até 1988, quando a Constituição de 1988
estabeleceu princípios democráticos no país.
O Brasil, então, entra em uma fase democrática. Se estabelecem no país vários
partidos políticos. Volta às eleições diretas. O povo começa a ter voz ativa na
sociedade e a pressão sobre os meios de comunicação diminui. Neste momento,
através da liberdade de imprensa, os meios de comunicação passam a ter uma grande
influência na vida política do país. A voz ativa na sociedade permite uma influência
recíproca.
O telespectador é um ser social, exposto a diversas influências
de inúmeros agentes que se contradizem entre si. O jornalista
que trabalha na televisão também é uma pessoa que recebe
pressões e idéias de diversas fontes e tenta conviver com elas
dentro de si mesmo e nas mensagens que produz e veicula. A
empresa em que ele trabalha é um agente social, que tem de
responder aos estímulos diferenciados que recebe e que mudam
junto as circunstâncias políticas e sociais. (SILVA, 1985, p.15).
Em 1989 ocorre a primeira eleição direta depois de 25 anos de Regime Militar.
Entre os candidatos estava Collor, Lula e Brizola, sendo Collor o vencedor. Anos
depois ocorre o impeachment do presidente. Estudantes e protestantes Caras Pintadas
invadem as ruas do país protestando contra a administração de Collor. Assume a
presidência Itamar Franco e em 1994 ocorrem novas eleições.
Concorrem a eleição presidencial de 1994, Fernando Henrique Cardoso, Lula,
Enéas e Brizola. Fernando Henrique ganha a eleição e cria o Plano Real com o
objetivo de controlar a hiperinflação. Em 1998 Fernando Henrique reelege-se,
vencendo novamente Lula.
Em 2002, depois de três candidaturas, Luiz Inácio Lula da Silva vence a
eleição presidencial. Tinha como ideal o socialismo: a luta contra a fome, miséria e
desigualdade social. Criou no povo a esperança de renovação diante á critica ao
governo de Fernando Henrique Cardoso. Mas na prática deu continuidade ao governo
de FHC. Ainda com uma grande crise política envolvendo seu partido, ministros e
chefes de estado.
O Brasil é um país democrático, o povo tem voz ativa na sociedade, tem o
direito do voto e é livre para lutar por seus direitos. Os meios de comunicação gozam
de uma liberdade que jamais tiveram, e tem liberdade de expor e impor sua opinião.
Imprensa
A criação e o desenvolvimento da imprensa brasileira se deram com o
surgimento dos primeiros jornais impressos no Brasil, no início do século XIX. O
primeiro jornal foi o Correio Brasiliense de Hipólito José da Costa, editado em
Londres e de linha ideológica a favor da independência. Logo depois foi criado A
Gazeta do Rio de Janeiro e O Patriota e outros também de circulação nacional.
A rádio no Brasil começou a ganhar grande poder no início dos anos 1930.
A primeira transmissão de rádio no Brasil foi realizada no dia 7 de setembro de
1922, quando o então presidente Epitácio Pessoa usou a estação instalada no alto
do Corcovado, no Rio de Janeiro, pela Westinghouse Electric International, para
fazer um discurso em comemoração ao centenário da Independência.
A primeira estação a entrar no ar foi a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro,
fundada por Henrique Morize e Edgar Roquette Pinto e instalada na Academia
Brasileira de Ciências. A rádio começou a ganhar grande força no ano de 1932,
como demonstra o fato de a Rádio Record de São Paulo ter sido invadida por um
grupo de estudantes no levante constitucionalista, durante o qual José Lefèvre leu
um manifesto nos microfones “em favor da liberdade do Brasil e pela
Constituição”. Não foi à toa, portanto, que o presidente Getúlio Vargas fez intenso
uso do rádio para divulgar as suas obras e fazer proselitismo político.
No Brasil a televisão foi inaugurada pelo jornalista e empresário Assis
Chateaubriand. A primeira transmissão oficial ocorreu no dia 18 de setembro de
1950, pela TV Tupi de São Paulo. A Rede Globo só seria inaugurada em 1965 no
Rio de Janeiro. Em poucos anos tornou-se uma força hegemônica no mercado,
liderada pelo seu carro-chefe: o Jornal Nacional. Desde este período até os dias de
hoje a imprensa conquistava, aos poucos, seus direitos rumo á liberdade de
imprensa, pautando os acontecimentos políticos do país.
A Cobertura Política
Na imprensa brasileira a política é pauta na maioria dos telejornais. É pauta, pelo
fato de esclarecer e divulgar acontecimentos políticos do país, dos estados e das cidades
aos telespectadores, para que haja uma comunicação entre o governo e cidadãos.
A mídia tem usado seu poder de transmissão dos acontecimentos políticos, para
muitas vezes interferir na recepção do telespectador, por descuido ou até por interesses.
“É a televisão como um ambiente que está moldando e reformando o caráter nacional e
os padrões de sentir e pensar” (...) “Televisão é o contexto na qual maioria de nós
percebe o mundo, no qual pensamos sobre política...” (LIMA, 2001 p.221).
A imprensa brasileira é considerada agressiva e audaciosa, exercendo enorme
influência na vida política do país. Através da mídia criamos conceitos e opiniões que
servirão como fonte na hora de tomar decisões políticas. Esta relação predomina nos
tempos de hoje, pois na época da ditadura quem exercia o poder de influência na
sociedade era o governo. A época da censura foi um período obscuro, pois se
evidenciava o papel censor do estado autoritário diante da imprensa e da sociedade. Na
medida em que a mídia conquistava uma certa liberdade de expressão, ela ia ocupando o
espaço de influência na sociedade que antes era do governo.
Movimento “Diretas Já”
Em março de 1983, quando o Brasil ainda se encontrava sob o governo do
regime militar, o deputado Dante de Oliveira (PMDB-MT) propôs ao Congresso
Nacional uma emenda à constituição prevendo o restabelecimento das eleições diretas
no Brasil. O Jornal Nacional acompanhou o desenrolar das “Diretas Já”.
No dia 16 de novembro de 1983 o repórter Álvaro Pereira entrevistou o
presidente João Batista Figueiredo durante uma visita à Nigéria. Na entrevista,
Figueiredo disse que se dependesse de seu voto as eleições diretas para presidente no
Brasil retornariam, mas que o seu partido, o PDS, não estava disposto a abrir mão de
escolher o novo presidente. A entrevista foi exibida ainda naquela noite no Jornal
Nacional.
O assunto, como era de interesse nacional, teve uma imensa receptividade e
repercussão, sendo discutido em todos os lugares, se tornou o assunto do momento e
apenas dois dias depois, ou seja, no dia 18 de novembro, nove minutos do JN foram
dedicados a este assunto.
A partir deste fato fica claro o agendamento: a reportagem foi exibida e teve
repercussão logo, mais reportagens sobre o assunto foram realizadas, pois o público
havia demonstrado interesse, caso contrário o JN não teria reservado 1/3 de seu tempo
de exibição para falar sobre eleições diretas para presidente.
Outro fato que representa muito bem a influência que a população tem sobre o
que é transmitido tem relação com os primeiros comícios realizados em favor do
movimento das “Diretas”, a quatro meses da votação pela emenda Dante de Oliveira.
Em janeiro de 1984, um comício em Curitiba reuniu cerca de 50 mil pessoas.
Nos dias seguintes as cidades de Salvador, Vitória e Campinas também realizaram
comícios com a participação de 15, 10 e 12 mil pessoas respectivamente, porém, esses
comícios foram apresentados apenas nos telejornais locais e não foram sequer
mencionados no JN. Neste momento os comícios ainda tinham ares utópicos e a Globo,
a fim de evitar um transtorno com o governo que ainda mantinha certo grau de censura,
tentava ao máximo não se envolver muito com as “Diretas”, afinal, inimizade com o
governo não faria bem a nenhuma emissora muito menos para a Rede Globo, a maior
emissora do País.
Mas o JN não conseguiu manter sua política de preservação por muito tempo.
Com o crescimento da participação de vários segmentos da sociedade no movimento o
JN se viu pressionado a cobrir os comícios e manifestações, pois era isso o que o
telespectador queria, ver o seu empenho, seu esforço, seu desejo ser mostrado na TV.
Atendendo os pedidos da população o JN passou a cobrir os comícios. A
primeira cobertura transformou-se numa das mais polêmicas da história da televisão
brasileira. A Globo mostrou no JN o comício ocorrido na Praça da Sé, em São Paulo,
reunindo mais de um milhão de pessoas, mas se referiu a ele como sendo parte dos
festejos do aniversário de São Paulo, na reportagem o locutor disse: “Festa em São
Paulo. A cidade comemorou seus 430 anos com mais de 500 solenidades. A maior foi
um comício na Praça da Sé”.
O episódio causou muita confusão e até hoje não se consegue chegar a um
consenso: a população em geral, que viveu as “Diretas já”, afirma que a Globo tentou
“matar” o movimento, ou pelo menos mascará-lo, logo no seu início, outros afirmam
que Roberto Marinho agiu de boa vontade impedindo que se mostrasse o nascimento do
movimento, pois, considerava que a realização dos comícios pelas “Diretas Já”, em
1984, "poderia ser um fator de inquietação nacional", o que não convinha ao magnata,
que no início de sua empreitada no ramo televisivo teve o pleno apoio do governo
militar.
A única certeza que se tem é que o episódio “Diretas Já” fez com que muitas
pessoas perdessem a credibilidade pela Rede Globo e, principalmente, pelo Jornal
Nacional. O fato foi largamente comentado e a população brasileira se posicionou
contra a Globo: não é possível a televisão porta voz do Brasil não mostrar em seu
principal jornal os esforços para a voltas às eleições diretas. Para contornar a situação,
que já contava até mesmo com o povo na rua gritando o refrão: “o povo não é bobo,
abaixo a Rede Globo”, a emissora de Roberto Marinho se viu obrigada a exibir todas as
manifestações relacionadas ao movimento Diretas Já, mas era tarde demais, a confiança
pela emissora já estava perdida.
Mais uma vez é possível perceber a hipótese do agendamento no fato narrado: o
povo influenciou a mídia a pautar um assunto de interesse de grande parte da sociedade.
Ou, nas próprias palavras de Armando Nogueira, diretor da Central Globo de
Jornalismo na época, “a cobertura cresceu em tamanho e intensidade à medida que
também de um lado, crescia a força da sociedade na sua luta por diretas”, ou seja, a
sociedade mostrou interesse pelo assunto e a mídia se viu obrigada a transmiti-lo. No
livro Jornal Nacional: a notícia faz história, a Globo admite que errou:
Houve erros, principalmente em relação ao comício da Sé, quando
a notícia exata e detalhada sobre a manifestação foi introduzida
por um texto do locutor que revelava ambigüidade. O povo, no
entanto, desde o início, soube da campanha das diretas pela
Globo. Embora a Globo não tenha feito campanha. (MEMÓRIA
GLOBO, 2004, p.167).
Durante as campanhas “Diretas já”, a Globo não voltou a errar, e passou a
noticiar tudo o que fosse relevante em relação ao movimento, mas já era tarde, a
credibilidade já estava perdida e muitos dos esforços por parte da emissora foram em
vão pois grande parte dos telespectadores já haviam criado consciência de sua
parcialidade diante do governo, fato que pôde ser confirmado anos mais tarde na
polêmica edição do debate para as eleições de segundo turno de 1989.
Eleição presidencial de 1989
A eleição presidencial de 1989 ficará registrada na história da política brasileira,
um fato inédito no país, pois aconteceu 25 anos depois do golpe militar de 1964 e quase
30 anos após a última eleição presidencial direta, também, por ter sido alvo de críticas
em relação a influência da mídia.
Eram 22 candidatos à presidência da República, entre os mais conhecidos
estavam Ulysses Guimarães (PMDB), Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Leonel Brizola
(PDT), Mário Covas (PSDB), Paulo Maluf (PDS), e Fernando Collor (PRN).
As intenções de votos realizadas pelo IBOPE e divulgadas pela mídia no
primeiro turno da eleição, indicava uma grande oscilação entre os três primeiros
colocados, de março à novembro de 1989. Collor começa a campanha com 7% das
intenções de voto, chega a 44% e na última pesquisa está com 28%. Lula começou com
15%, desceu à 5% e terminou com 16% das intenções de voto. Brizola começou com
16%, chegou a 19%, desceu a 10%, e terminou com 15% das intenções de voto.
Segundo LIMA (2001), estas oscilações ocorriam de acordo com a presença dos
candidatos na mídia - debates, propaganda eleitoral, entrevistas e coletivas - e na
veiculação de informações sobre os candidatos também feita pela mídia, mais
especificamente pelo Jornal Nacional.
Foi a primeira eleição que se realizou em dois turnos - nenhum dos candidatos
alcançou a maioria absoluta dos votos no primeiro turno - passaram paro o segundo
turno Fernando Collor e Luiz Inácio Lula da Silva, terminando com a vitória de Collor.
O Jornal Nacional foi alvo de críticas em relação a influências que teria gerado
aos telespectadores na eleição presidencial de 1989. Denúncias sobre o apoio da TV
Globo à Fernando Collor surgiram no país, um trabalho a longo prazo, que a emissora
teria começado muito antes da campanha eleitoral, ao divulgar várias reportagens sobre
o importante trabalho do então governador de Alagoas, Fernando Collor, no Jornal
Nacional. Situação que é confirmada pela hipótese da agenda setting: “Os meios de
comunicação por conseqüência influenciam sobre o receptor não a curto prazo (...) mas
sim a médio e longo prazo” (HOHLFELDT, 2001 p. 190).
Estas hipóteses de apoio à Collor se confirmavam com descobertas de ligação do
candidato à presidência e a Rede Globo, onde a família de Collor teria posse de uma
filial da emissora em Alagoas. Declarações de Roberto Marinho, presidente das
Organizações Globo, como: “Collor, eu soube que há emissoras de TV que não lhe
apoiam, quero que você me diga quem são, porque vou conversar com eles
pessoalmente”, entre outras em que o empresário declara que o perfil de um presidente
se “encaixa” com o perfil de Collor, foram provas desta possível ligação entre Collor e a
Globo.
Durante a campanha eleitoral ocorreram dois debates entre Collor e Lula, o
primeiro transmitido dos estúdios da TV Manchete, no Rio de Janeiro e o segundo dos
estúdios da TV Bandeirantes, em São Paulo.
No dia seguinte a realização do último debate da campanha eleitoral, a Rede
Globo apresentou duas edições diferentes desse último debate, uma no Jornal Hoje e
outra no Jornal Nacional. A edição transmitida no Jornal Nacional foi polêmica, sendo
outra confirmação do apoio à Collor, onde foram mostradas denúncias de Collor à Lula
e cortadas falas de defesa de Lula. O tempo de depoimentos foi totalmente desmedido
entres candidatos, mostrando um melhor desempenho do candidato Collor.
Então recebemos um fluxo contínuo de informações, também explicado pela
hipótese da agenda setting, onde: “consciente ou inconscientemente, guardamos de
maneira imperceptível em nossa memória uma série de informações de que,
repentinamente, lançamos mão” (HOHLFELDT,2001 p. 190).
Tentativas de influências da Rede Globo foram lançadas aos telespectadores que
decidiram receber e aceitar estas influências, concordando com as ideologias da
emissora, o que se confirmou com a vitória de Collor. “Há 35 anos, todos as noites, sete
em cada dez aparelhos de televisão ligados sintonizam o Jornal Nacional” (Memória
Globo, 2004). Esta grande audiência mostra que os telespectadores tem uma certa
credibilidade no telejornal, por isso, na época das eleições de 1989, é que o público
aceitou informações sobre Fernando Collor criando também uma certa credibilidade ao
candidato.
Segundo LIMA (2001), “É exatamente como ambiente que a mídia revela todo o
seu poder nas sociedades contemporâneas, é capaz de definir a temática e estabelece os
limites em que as campanhas eleitorais se desenvolvem”.
A maioria dos autores pesquisados, que estudaram os fatos da eleição
presidencial de 1989, acreditam que houve uma grande influência por parte do Jornal
Nacional devido a todos os fatos citados acima, alguns afirmam que: “Grande parte dos
eleitores que atualmente votam em função de um candidato, estabelece relações de
identificação pontuais (...) tendo em vista os atributos simbólicos dos candidatos
percebidos através da mídia.” (PEDROSO, 1999 p.47).
Utilizamos dois livros para analisar os fatos da eleição presidencial de 1989,
duas versões totalmente contraditórias. A primeira versão é da Rede Globo, em um livro
escrito por editores da Memória Globo e comentado por jornalistas que fizeram parte da
cobertura eleitoral em 1989 pelo Jornal Nacional. A outra versão é do livro editado pela
Fundação Perseu Abramo, fundada pelo Partido dos Trabalhadores, partido mais
prejudicado pela influência da mídia na eleição de 1989.
No livro “Jornal Nacional – a notícia faz história”, os editores da Memória
Globo dizem que a edição do debate teria sido um erro jornalístico, por ter sido a
primeira cobertura de uma campanha eleitoral, e que o erro serviu como aprendizado.
“Hoje a TV Globo adota como norma não editar debates; eles devem ser vistos na
íntegra. Porque, ao condensá-los, necessariamente bons e maus momentos dos
candidatos terão de ficar de fora, segundo a escolha de um editor”. (MEMÓRIA
GLOBO, 2004 p.214). Em nome de todos, Roberto Marinho diz que o debate foi de
maior felicidade para Color e de infelicidade para Lula, ainda:
Não é verdade que eu exerça poder político hegemônico e
menos ainda que o faça em caráter pessoal. A orientação que
imprimo aos veículos que me cabe dirigir visa estritamente à
defesa do que julgo serem os reais interesses do país e dos
caminhos a serem trilhados para que se possa alcançar o bem-
estar do povo. (Roberto Marinho in LIMA, 2001 p.213).
Ainda dizem que o que abalou a candidatura de Lula foi uma “bomba”
apresentada por Collor em seu programa eleitoral gratuito, onde uma enfermeira dava
um depoimento dizendo ser ex-namorada de Lula e mãe da sua filha Lurian, ainda, que
Lula pediu para ela abortar a criança em troca de dinheiro, acusando o candidato de
racista.
Uma melhor campanha, um melhor desempenho nos debates e acusações reais
contra Lula, segundo profissionais da Rede Globo especialmente do Jornal Nacional,
que levaram o candidato Fernando Collor a se eleger presidente da República.
Já no livro “Mídia: teoria e política”, Lima (2001) afirma que o eleitorado foi
com certeza influenciado pela mídia, que o Jornal Nacional, desde 1988, ano em que
Collor foi eleito governador de Alagoas, divulgava, pelo menos duas vezes por semana,
matérias sobre Collor e sobre seu bom trabalho no estado de Alagoas.
Em 1989, quase metade dos eleitores (47%) ainda não tinha completado 30 anos,
um eleitorado jovem, que segundo LIMA (2001): “Essa geração se constitui no Brasil
ao lado da consolidação do sistema comercial de comunicações e, sobretudo, da TV
como veículo nacional...”. Ele usa o termo “geração da televisão” para se referir ao
eleitorado jovem.
LIMA (2001) ainda afirma que a Rede Globo usou o Jornal Nacional como
“arma” para influenciar os telespectadores pois seria o horário de maior audiência, em
que 84% dos televisores estariam sintonizados na Rede Globo.
Impeachment do presidente Collor
A mídia não pauta apenas assuntos que serão tratados pelos seus telespectadores:
é comum um meio de comunicação pautar o quê será abordado por outro. Foi o que
aconteceu no caso do Impeachment de Fernando Collor de Mello. Depois de
especulações e boatos sobre corrupção no governo Collor, no dia 24 de maio de 1992,
numa entrevista a revista Veja, o irmão do presidente, Pedro Collor, acusou o ex-
presidente de manter uma sociedade com Paulo Cézar Farias, tesoureiro da campanha
Collor. A entrevista causou polêmica em todo o Brasil e, na mesma semana, o Jornal
Nacional passou a dedicar boa parte de seu espaço para o assunto. No dia seguinte, 25
de maio, foi ao ar trechos da carta do presidente a nação, onde ele se dizia chocado
pelas declarações “falsas e insensatas”. Desde então, num período de apenas dois dias
seguiram-se entrevista coletiva de Pedro Collor, exame médicos de sanidade mental do
irmão do presidente, solicitação por parte de parlamentares do PT para instauração de
uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar as denúncias contra PC Farias. O
Jornal Nacional acompanhou diariamente o desenrolar das denúncias e apurações até o
dia 9 de junho de 1992, quando o repórter Álvaro de Azevedo assistiu ao depoimento do
ex-tesoureiro da campanha Collor e apresentou um resumo com as principais
declarações no jornal daquela noite.
O fato já tomava todos os meios de comunicação e era o principal assunto entre
rodas de amigos, familiares, no trabalho e em todos os cantos do Brasil: o Caçador de
Marajás agora era acusado de corrupção. No dia 24 de agosto, três meses após a
primeira notícia divulgada pela revista Veja, a CPI apontou os responsáveis pelos
desvios de dinheiro público e considerou ligações entre o presidente Collor e o esquema
de corrupção envolvendo mais de 6 milhões de dólares que teriam sido transferidos para
gastos pessoais do presidente. Neste dia, o JN teve uma parte de sua transmissão, ao
vivo, direto de um estúdio em Brasília.
Em 16 de agosto de 1992, a população passou a tomar as ruas das cidades,
principalmente das grandes capitais, vestindo preto, contra a corrupção. A partir de
então estudantes, que ficaram conhecidos como caras pintadas, foram as ruas com os
rostos pintados de verde e amarelo. O JN cobriu as manifestações e seu repórter,
Marcelo Canellas, pintou-se também com as cores do movimento durante a reportagem.
Apesar das reportagens e matérias minuciosas feitas pelo JN, a cobertura chamou a
atenção: o presidente, visivelmente apontado como o candidato da Globo, como
descrevemos acima, agora era hostilizado pela emissora que três anos atrás o havia
elegido. Mais uma vez percebemos, neste contexto, a influência não só da mídia sob a
população, mas também da população sob a mídia.
O debate de 1989 ainda era apontado como estratégia da emissora carioca para
convencer eleitores de que Collor era o melhor candidato que Lula, ainda estava na
memória dos brasileiros a relutância da Globo em transmitir as manifestações a favor
das Diretas Já: mais um erro não seria permitido. A pressão da população era grande e,
esta pautou o JN, que não viu outra alternativa se não apoiar a população, sobretudo o
movimento “caras pintadas”: era uma maneira de se redimir pelos fatos ocorridos
anteriormente e recuperar a credibilidade abalada, tornando-se novamente um jornal
visto com imparcialidade e comprometimento com o cidadão brasileiro.
O Jornal Nacional, em sua cobertura, transmitiu também a solenidade de entrega
do pedido de impeachment e a abertura de processo contra o presidente. Finalmente, em
29 de setembro de 1992, com 441 votos a favor e 39 contra foi declarado o
impeachment do Presidente Fernando Collor de Mello.
Fernando Collor foi afastado do cargo e em 2 de outubro de 1992 assumiu a
presidência o vice, Itamar Franco. O último julgamento de Collor aconteceu em 29 de
dezembro do mesmo ano, antes disso Collor resolveu renunciar. Mesmo assim, o
julgamento prosseguiu e ele foi condenado.
Oito anos de governo FHC
Com o impeachment de Collor, o principal candidato a presidência para as
eleições de 1994 era Luiz Inácio Lula da Silva. Dois sentimentos dividiam a população
brasileira: a vontade de reverter a situação das últimas eleições e eleger um presidente
“honesto" e inovador e o descontentamento em ter que eleger outro candidato que,
segundo alguns, apenas continuaria com a trajetória de corrupção.
Neste contexto de sentimentos opostos, Lula liderava as pesquisas como favorito
até maio de 1994. No entanto o novo plano econômico do governo Itamar Franco iria
mudar este cenário. Em 1º de julho entra em vigor o plano Real, que leva o então
desconhecido (pela grande parte da população) Fernando Henrique Cardoso, a ter sua
popularidade gradativamente impulsionada pela estabilidade econômica alcançada com
o novo plano. Fernando Henrique já havia sido ministro da Fazenda do governo Itamar
Franco, e um dos autores do Plano Real, agora era candidato da coligação PSDB-PFL.
A disputa entre Lula e FHC se tornava mês a mês mais acirrada, a Globo então pensou
em promover um debate, que não veio a acontecer devido as novas regras impostas pela
legislação eleitoral:
A legislação eleitoral determinou também que a realização
dem debates entre os presidenciáveis só seria permitida
se as emissoras assegurassem a presença de todos os
candidatos. Só seria permitida alguma ausência se o veículo de
comunicação comprovasse haver convidado o candidato com antecedência
mínima de 72 horas. O debate poderia ser feito de duas formas:
num único dia ou em dias diferentes, sendo que a
escolha dos participantes de cada dia seria feita através de
sorteio. Por esse motivo, a Globo preferiu não promover
nenhum debate. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p.281).
O motivo da decisão de não promover o debate foi explicado em matéria do
jornal O Globo, publicada em 13 de junho de 1994, por Alberico de Sousa Cruz, diretor
da Central Globo de Jornalismo na época:
Se fizermos um debate reunindo nove candidatos vai ficar uma
loucura total, ou seja, o telespectador não consiguirá descobrir
nada. Pensamos, então, em produzir dois debates. Só que a
justiça eleitoral não permite que a gente escolha quais serão os
candidatos de cada dia. Ela exige que isso aconteça através de
sorteio ou de um acordo entre os partidos. E aí fica difícil, pois
não sabemos se vai dar para confrontar os principais
concorrentes. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p.281).
Através desta citação é possível considerar uma hipótese: a Globo desejava
confrontar os dois principais candidatos, disso não há dúvida, o próprio Alberico de
Sousa Cruz afirma. Mas, talvez com a intenção de, novamente, editar o debate em favor
do candidato de sua escolha. Não sendo isso possível, a emissora optou por não realizar
o debate.
Apesar do apoio ao movimento para o impeachment de Collor, a Globo ainda
era mal vista pela edição do debate de 1989 e, como afirma o jornalista da emissora
Alexandre Garcia, a Globo tomou muitos cuidados para evitar críticas: “Embora nós
julgássemos que tínhamos feito uma cobertura isenta em 1989, ainda assim tomamos
cuidados redobrados em 1994”. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p.281-282).
As eleições de 1994 foram realizadas no dia 3 de outubro e a apuração começou
no dia seguinte. O JN acompanhou as eleições e, durante toda a semana, a apuração em
todas as regiões do Brasil. Fernando Henrique venceu as eleições ainda em primeiro
turno com 54,3% dos votos, seguido por lula 27,1%.
Quatro anos depois, em 1998, a história se repetiu: Lula e FHC novamente se
enfrentaram nas urnas, desta vez com uma peculiaridade – era a primeira vez que um
presidente brasileiro concorreria à reeleição. O presidente havia conseguido, em 1997,
a aprovação na Câmara de Deputados e no Senado da emenda constitucional instituindo
a possibilidade de um presidente ter dois mandatos consecutivos.
A exemplo das eleições de 1994, naquele ano a Rede Globo também não
realizou debate, dado o grande número de candidatos – doze no total. O trecho retirado
do livro Jornal Nacional: A Notícia faz história, comprova que o interesse da emissora
carioca era confrontar apenas grandes candidatos.
A legislação obrigava que todos os candidatos fossem
chamados, ou, não havendo acordo entre eles, que fosse feito
um sorteio para realização do debate em diferentes dias, mas
essa solução sempre foi considerada descabida, pois dá margem
a que o candidato principal debata apenas com outros
candidatos de partidos nanicos. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p.
312)
No dia anterior as eleições daquele ano, 3 de outubro, o Jornal Nacional
dedicou-se inteiramente as eleições. Anunciou os números das últimas pesquisas que
apontavam vitória de FHC com 49% dos votos. O resultado se confirmou na apuração e
Fernando Henrique Cardoso se reelegeu, ainda no primeiro turno, com 53,6% dos votos.
A Eleição do Lula
Em 2002, a Rede Globo fez o plano de cobertura de eleições políticas mais bem
elaborado que já havia realizado. O planejamento começou no ano anterior, 2001, e
contou até mesmo com apresentação do plano de cobertura para o TSE e a
representantes de cada partido. A partir de 1º de julho o Jornal Nacional passou a
acompanhar o dia-a-dia dos quatro principais candidatos a presidência: José Serra, Luiz
Inácio Lula da Silva, Ciro Gomes e Antony Garotinho. Como explica Kamel:
Pela legislação a gente poderia dar um dia 3 minutos para o
Lula e 30 segunda para o Serra, se o Lula tivesse produzido
mais notícias naquele dia. Mas para evitar mal-entendidos
decidimos que daríamos todos os dias tempos iguais aos quatro
candidatos. Agora, claro, quando o Lula lançou seu programa
econômico, que era importante, o mercado estava esperando, a
gente deu tempos iguais para a matéria do dia-a-dia dos
candidatos, e a matéria do programa econômico do Lula à parte,
em outra reportagem. Porque, um dia, o Garotinho e o Serra
também iriam lançar o seu programa e, quando lançassem,
teriam tratamento igual. (MEMÓRIA GLOBO, 2004, p.363)
Através desta citação percebe-se que, mais de 10 anos depois do polêmico
debate entre Collor e Lula, a Globo finalmente queria recuperar a credibilidade que
ainda estava abalada frente alguns grupos da sociedade. Dentro do plano de cobertura
das eleições, forma realizados esclarecimentos para população, ensinando o eleitor a
usar a urna eletrônica, esclarecendo as funções dos governadores, presidentes,
deputados e senadores. Mas, onde o JN mais se destacou, inovando, foi ao entrevistar,
ao vivo, os quatro principais candidatos a presidência. As entrevistas aconteceram entre
8 e 11 de julho em seqüência decidida por sorteio: Ciro Gomes, Antony Garotinho, José
Serra e Luiz Inácio Lula da Silva, responderam as perguntas de Willian Bonner e
Fátima Bernardes com regras previamente negociadas com as equipes dos candidatos.
A iniciativa agradou o público e a crítica. O site Observatório da Imprensa, num
artigo de Alberto Dines, declarou que através destas entrevistas foi possível perceber
que “o jornalismo político pode ser conduzido sem veemências, a serviço do
esclarecimento”.
Houve ainda uma segunda rodada de entrevistas entre os dias 23 e 26 de
setembro, com os mesmos candidatos. Desta vez, cada um deles expôs suas idéias em
20 minutos e responder perguntas dos âncoras e do público, que participou através da
internet.
A cobertura das eleições de 2006 definitivamente pretendia apagar quaisquer
resquícios de parcialidade restante do confronto entre Lula e Collor, em 1989. A Globo
exibiu no último dia da campanha, às 22h o debate entre os quatro principais candidatos
a presidência. No dia seguinte, o jornalista Pedro Bial apresentou uma reportagem
especial sobre os bastidores do debate do dia anterior, no entanto, nenhum trecho do
debate foi exibido.
As eleições de 2002 já contaram com urnas eletrônicas na maior parte das Zonas
Eleitorais, em decorrência disso, em 7 de outubro, um dia após as eleições, quando o JN
foi ao ar, 99% das urnas já haviam sido apuradas, restando apenas as urnas localizadas
em zonas eleitorais de difícil acesso. Os números indicavam que Serra e Lula
disputariam o segundo turno das eleições para presidência do Brasil. Ainda naquela
noite os dois candidatos deram entrevista ao vivo durante o JN, falando sobre os rumos
que suas campanha tomariam nesta segunda etapa da votação.
No dia seguinte as entrevistas, o JN voltou a acompanhar o dia-a-dia dos
candidatos, reservando o mesmo espaço de tempo para cada um no telejornal. Em 25 de
outubro, dois dias antes das eleições do segundo turno, a Globo exibiu debate entre
Serra e Lula. Novamente, Pedro Bial, apresentou reportagem especial, durante o JN do
dia seguinte sobre os bastidores do debate. No dia 28 de outubro de 2002, o Jornal
Nacional anunciou a vitória de Lula, aguardada por seus fiéis simpatizantes a mais de
uma década. Naquela edição do JN foi exibida entrevista ao vivo com Lula.
Por fim, o polêmico debate de 1989 havia ficado no esquecimento: Lula eleito
como o presidente mais votado na história do Brasil com 61,27% dos votos válidos e a
Rede Globo recuperando sua credibilidade que ainda encontrava-se abalada.
Considerações Finais
O movimento das “Diretas Já” pode ser considerado o momento mais importante
na história da democracia política brasileira, pois foi o momento em que a população
criou coragem e foi às ruas protestar pelo direito do voto. E os meios de comunicação
tiveram um importante papel neste processo.
O Jornal Nacional que surgiu durante o período do regime militar, considerado
um porta-voz do governo, apresentava-se cada vez mais independente. Os importantes
acontecimentos políticos pautados pelo telejornal foram os responsáveis pela conquista
da liberdade de imprensa no Brasil.
Partindo de 1985, com a campanha das Diretas Já, quando a imprensa começa a
ter um a certa liberdade, o Jornal Nacional realmente deixou de pautar os movimentos
das “Diretas Já”, mas, mais tarde, percebeu que a força da população era uma grande
aliada para a conquista da democracia e da liberdade de imprensa, passando a transmitir
os protestos.
Na eleição de 1989 o telejornal editou o debate de acordo com seus interesses, se
consolidando como um meio de comunicação independente, que tem o poder de
influência. Mas a sociedade deveria ter a capacidade de discernir a veracidade das
informações. “O receptor, por sua vez, também realiza mediações, de caráter
psicológico, determinadas pelas de caráter sociocultural, em um processo constante e
dialético”. (ESCOSTEGUY; JACKS, 2005, p.69).
A polêmica desta cobertura política fez com que o telejornal retomasse a
credibilidade perdida desde a campanha das “Diretas Já”. Então, a partir da eleição de
1994 não existia mais edição de debates, passariam a serem transmitidos ao vivo e a
presença dos candidatos na mídia seria outro aspecto muito relevante na cobertura
política.
Estes acontecimentos políticos responsáveis pelo desenvolvimento da
democracia e da liberdade de imprensa no Brasil foram parte da história do país nestes
últimos 20 anos. Muitos movimentos sociais e culturais também surgiram nesta história,
lutando juntamente com os movimentos políticos na luta por um país democrático. É os
meios de comunicação e a sociedade que, munida de aspectos culturais e identidades,
fazem de um país, uma nação.
Bibliografia:
BOURDIEU, Pierre. “Sobre a Televisão”. Tradução, Maria Lúcia Machado. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1997.
DEFLEUR, Melvin L.; BALL-ROKEACH, Sandra. Teorias da comunicação de massa.
Tradução de Octavio Alves Velho. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993.
ESCOSTEGUY, Ana Carolina; JACKS, Nilda. Comunicação e Recepção. São Paulo:
Hacker Editores, 2005.
HOHLFELDT, Antônio. “Teorias da Comunicação: conceitos, escolas e tendência”.
Petrópolis, RJ: Vozes, 2001.
LIMA, Venício A. de. “Mídia: teoria e política”. São Paulo: Editora Fundação Perseu
Abramo, 2001.
LOPES, Maria Immacolata Vassallo de. “Pesquisa em Comunicação”. 5ª ed. São
Paulo: Editora Loyola, 2001.
MEMÓRIA GLOBO. “Jornal Nacional: a notícia faz história”. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 2004.
PEDROSO, Elizabeth Kieling (org.) “ELEIÇÕES: histórias e estratégias” Porto
Alegre: Editora Evangraf, 1999.
RODRIGUES, Alberto Tosi. “Brasil de Fernando a Fernando”. Ijuí - RS: Editora
UNIJUÍ, 2000.
SILVA, Carlos Eduardo Lins da. “Muito Além do Jardim Botânico – um estudo sobre a
audiência do Jornal Nacional entre trabalhadore”. São Paulo: Summus, 1985.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
BRUNA SAMPAIO DE CARVALHO
GUIDA MENDONÇA FIGUEIREDO FERREIRA
NATÁLIA RAPOSO DA FONSÊCA
VALÉRIA ROMANO UCHÔA
ALUÍSIO AZEVEDO E A IMPRENSA MARANHENSE DO SÉCULO
XIX
São Luís
2006
BRUNA SAMPAIO DE CARVALHO
GUIDA MENDONÇA FIGUEIREDO FERREIRA
NATÁLIA RAPOSO DA FONSÊCA
VALÉRIA ROMANO UCHÔA
ALUÍSIO AZEVEDO E A IMPRENSA MARANHENSE DO SÉCULO
XIX
Artigo Científico apresentado às disciplinas
Métodos e Técnicas de Estudo e Pesquisa
Bibliográfica, e História da Comunicação
do Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal do Maranhão para
obtenção da 3ª avaliação, ministradas pelos
professores Márcia Cordeiro e Franklin
Douglas.
São Luís
2006
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................................................4
2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA....................................................................5
3 ALUÍSIO AZEVEDO NESSE CONTEXTO............................................................7
4 PRÁTICA PROFISSIONAL DE ALUÍSIO..............................................................9
4.1 No Maranhão......................................................................................................10
4.2 No Rio de Janeiro..............................................................................................11
5 JORNAIS MARANHENSES..................................................................................12
5.1 A Flecha.............................................................................................................13
5.2 O Pensador........................................................................................................14
5.3 A Pacotilha.........................................................................................................15
6 CONCLUSÃO........................................................................................................16
REFERÊNCIAS.........................................................................................................16
ANEXOS...................................................................................................................18
ALUÍSIO AZEVEDO E A IMPRENSA MARANHENSE DO SÉCULO XIX *
Bruna Sampaio de Carvalho**
Guida Mendonça Figueiredo Ferreira
Natália Raposo da Fonsêca
Valéria Romano Uchoa
RESUMO
Resgata-se a produção do jornalista e escritor maranhense Aluísio Azevedo, a partir de
investigações de sua colaboração aos jornais A Flecha, A Pacotilha e O Pensador.
Contextualização da produção de Aluísio Azevedo em sua época. Destacam-se as
influências política, econômica, social e cultural recebida pelo escritor. Além disso,
registros das caricaturas, textos jornalísticos e literários de Aluísio Azevedo.
Palavras-chave: Jornalismo maranhense. Imprensa no século XIX. Literatura.
1 INTRODUÇÃO
Aluísio Azevedo é no Brasil talvez o único escritor que ganha
pão exclusivamente a custa de sua pena, mas note-se que apenas
ganha o pão: as letras no Brasil ainda não dão para a manteiga.
Magalhães (1896 apud MARTINS, 2002)
As dezenove anos, em 1876 Aluísio Azevedo deixou sua terra natal, a fim de
realizar-se profissionalmente na Corte Imperial, queria cursar a Academia Brasileira de
Belas-Artes, pretendendo seguir a carreira de pintor, tornando-se posteriormente, um
excelente caricaturista. Foi então que teve seu primeiro contato com os jornais, pois os
periódicos ilustrados tinham contribuição de caricaturistas. Em agosto de 1878, por
motivo do falecimento de seu pai, Aluísio retorna ao Maranhão onde escreveu seu
primeiro romance: Uma Lágrima de mulher.
A literatura incentivou a participação de Aluísio nos jornais maranhenses, nos
quais desenvolveu um jornalismo de combate. Exercia um jornalismo opinativo,
___________________
*Artigo Científico apresentado às disciplinas Métodos e Técnicas de Estudo e Pesquisa
Bibliográfica, e História da Comunicação do Curso de Comunicação Social da
Universidade Federal do Maranhão, ministradas pelos professores Márcia Cordeiro e
Franklin Douglas, para obtenção da 3ª avaliação.
** Alunas do 1º período do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do
Maranhão.
totalmente parcial e anticlericalista, marcado por muita subjetividade e adjetivação, com
a abordagem dos problemas vividos à época e com a identificação de tipos marginais da
sociedade, como aconteceu muito fortemente em O cortiço.
O momento sócio-histórico do final do século XIX permitiu que o jornalismo
fosse
desenvolvido ao lado da literatura com o objetivo de levantar, alimentar e estimular os
debates públicos, acerca das questões sociais em que acreditava.
2 CONTEXTUALIZAÇÃO HISTÓRICA
Para se que se entenda a produção de Aluísio Azevedo, bem como sua
contribuição no jornalismo e literatura, deve-se considerar o contexto histórico em que
este autor viveu e desenvolveu sua obra.
Aluísio Azevedo viveu em um contexto de grandes mudanças a nível de mundo,
de Brasil e de Maranhão. Tais mudanças na realidade econômica, política e cultural já
vinham sendo desencadeadas desde o século XVIII com a Revolução Francesa que
implicou o surgimento de uma nova classe: a burguesia.
Posteriormente, a Revolução Industrial modificou ainda mais os contornos da
sociedade do século XIX, devido às grandes transformações geradas pela automação da
produção de bens e pelo surgimento da classe proletária,que assim como a burguesa
possuía um certo poder de compra, mas não tinha instrução suficiente para consumir
uma literatura clássica que exigisse maior rebuscamento intelectual. Além disso, o
grande êxodo rural decorrente da revolução industrial, uma vez que a mão-de-obra dos
servos e colonos foi substituída por mão-de-obra assalariada, empurra esse excedente
para a atividade industrial que ascende nesse período.
Essa nova configuração da sociedade implica modificações no tipo de
jornalismo que era feito na época, voltado somente para um público mais erudito. O
crescimento da classe proletária obrigou a produção jornalística e literária a encontrar
formas de atender a esse novo público com características próprias, um público que
divide seu tempo em jornada de trabalho e tempo de lazer, por isso o jornalismo deveria
ter função informativa e de entretenimento. A questão era como tornar os jornais mais
populares e mais interessantes à grande massa, de forma a aumentar as vendagens
abrangendo um público mais amplo.
Revolução Industrial
Fonte: http:// www.vestigios.hpg.ig.com.br
Dessa questão surgiu o folhetim, uma forma de narrativa literária que segundo
Cristina Costa em sua obra, A milésima segunda noite, originou-se da narrativa árabe
“As mil e uma noites”, cuja versão mais antiga data do século X, exatamente por se
tratar de uma narrativa ficcional e apresentada de forma fragmentada, deixando
“ganchos” que instigassem a curiosidade na continuação da história.
gancho, aquele recurso narrativo que procura, através da
suspensão
temporária da resposta, intensificar e solucionar a espécie
de angústia
que assalta o leitor (telespectador) diante de um fato
desconhecido [...]
uma forma narrativa, popular e produzida pela indústria
cultural. (COSTA, 2000, p.10)
Devido a esse caráter seriado do folhetim é que sua inserção no jornalismo diário
foi tão importante, pois graças ao sucesso desse tipo de narrativa o público leitor
comprava diariamente o jornal e acabava por fim, tendo acesso também às notícias que
nele circulavam e recebendo influência direta dessas notícias, já que nessa época os
jornais eram declaradamente parciais e traziam de forma clara a visão política e
ideológica do grupo a que pertenciam.
O folhetim, que surge na França já em fins do século XIX, é considerado uma
obra aberta, pois assim como as telenovelas atuais, descendentes diretas dos folhetins,
tinham seus roteiros passíveis de mudanças de acordo com a aceitação popular. A
temática explorada nos folhetins variava a cada lugar onde fossem produzidos, mesmo
porque a realidade européia divergia bastante do momento vivido no Brasil, e por isso
foi importante a atuação de Aluísio Azevedo como escritor de folhetins, pois suas
narrativas, assim como suas obras retratavam com riqueza de detalhes as peculiaridades
da sociedade brasileira, sobretudo a maranhense.
No século XIX, o Brasil vivia um momento de movimentos abolicionistas, que
culminou o fim da escravidão em 1888, a chegada dos imigrantes ao Brasil para suprir a
escassez de mão-de-obra ocasionada pela abolição, e também forte impulso no
movimento republicano, o qual contava com o apoio de diversos escritores famosos,
dentre os quais citamos Aluísio Azevedo.
Por fim, as transformações ocorridas desde o século XVIII e ao longo do
século XIX repercutiram no Maranhão, sobretudo em questões referentes à briga
pelo poder entre Igreja e Estado. O Maranhão por ter sido o último estado a aderir à
independência, ainda se encontrava muito arraigado a Portugal e muito dominado
pela poder eclesiástico. Dessa forma, os pensamentos positivistas, bastante
disseminados pela Europa e já chegados ao Brasil, enfrentaram duras resistências da
Igreja que não admitia a mudança do eixo do poder.
3 ALUÍSIO AZEVEDO NESSE CONTEXTO
As transformações que ocorriam no mundo, no Brasil e no Maranhão
repercutiam diretamente na produção literária e jornalística de Aluísio Azevedo, já que
este, enquanto autor de grande expressão realista/ naturalista, devia fidelidade à
realidade.
No âmbito literário, o Realismo surge em oposição
à alienação dos ultra- românticos, propondo uma
nova estética, que apregoa a descrição exata da
realidade física e humana, através da anotação
dos pormenores e com a máxima verossimilhança,
sem a distorção do subjetivismo, do
sentimentalismo e das visões fantasiosas e
alucinatórias dos românticos. (D’ ONÓFRIO,
2000, p.380).
A produção de Aluísio Azevedo retrata exatamente o período em que ele estava
inserido. Pode-se perceber isso através dos traços declaradamente anti-clericais dos
jornais que contavam com a sua contribuição e através também das características de
seus personagens, retratando por vezes pessoas reais da sociedade maranhense; o caráter
abolicionista também é presença constante em suas obras.
O século XIX presenciou mudanças tão significativas que se estendem até os
dias atuais, e Aluísio Azevedo sofreu influência dessas mudanças, assim como também
foi agente das mesmas no que tange ao jornalismo maranhense, onde ele deu
contribuição de grande valia, apesar de ser mais conhecido por sua produção literária,
sobretudo O Mulato(1881) e O Cortiço(1890), ambos romances polêmicos que
possibilitaram projeção nacional a Azevedo
Iniciando sua vivência no meio jornalístico, Azevedo começa como caricaturista
em jornais cariocas e registram algumas fontes que ele, posteriormente, passou a
compor a personalidade de seus personagens por meio das caricaturas. Os jornais O
Fígaro e O Mequetrefe contaram com suas caricaturas.
Charge de Aluísio Azevedo
publicada em O Mequetrefe
Fonte: http:// www.klickeducacao.com.br
Já em São Luís, começa a escrever para três jornais: A FLECHA, O PENSADOR
e A PACOTILHA, nos quais expressa seu posicionamento político e ideológico atacando
frontalmente e algumas vezes utilizando pseudônimos, a Igreja, não só através dos
jornais, mas também ao publicar O Mulato(1881) durante o curto período em que
permaneceu em sua terra natal.
De volta ao Rio de Janeiro, Azevedo dá início à produção de folhetins
seguindo uma tendência mundial, no entanto, seus folhetins não se igualam aos
produzidos na Europa, pois possuem traços tipicamente brasileiros bastante
presentes na obra desse autor: um clima tropical, retratando o comportamento da
mulher e trazendo a figura de um padre que vem destacar a visão que Azevedo
possui da Igreja, dentre outros elementos igualmente importantes.
4 PRÁTICA PROFISSIONAL DE ALUÍSIO
Na busca de analisar a vida de Aluísio Azevedo como escritor e jornalista
teve-se que fazer uma distinção da sua característica marcante no Maranhão e no
Rio de Janeiro. O escritor em apreço nesse artigo é “produto” da terra maranhense,
mas foi buscar um lugar de destaque com as Artes na capital carioca, como afirma
Pinheiro (2003, p. 3):
Aluísio fazia jornalismo opinativo, nada preocupado
com os anseios de imparcialidade. Era,
declaradamente, anticlerical. Essa característica é
muito evidente em seus registros deixados, seja na
literatura, seja no jornalismo. Esse é um aspecto
muito presente, desde o início de sua carreira, como
caricaturista no Rio de Janeiro.
Aluísio Azevedo, aos dezenove anos, embarca para o Rio de Janeiro, com
o fim de matricular-se na Imperial Academia de Artes, tinha ele um sonho de se
tornar desenhista. Seu primeiro emprego foi como caricaturista nas redações de
jornais políticos e humorísticos. Com a morte do seu pai, ele volta ao Maranhão, em
1878, e na capital maranhense, aos vinte e dois anos, lança seu livro “Uma Lágrima
de Mulher”. Aluísio, que pretendia ficar no Maranhão por três meses, acaba ficando
por três anos, e durante esse período, teve uma contribuição marcante para a
imprensa maranhense.
4.1 NO MARANHÃO
Aluísio Azevedo teve sua produção jornalística expressada por três jornais
anticlericais, nos quais contribuiu como colunista de crônicas e charges. Como
enfatiza na entrevista Ferreira Junior(2006, p. 2):
Aqui em São Luís ele escreve O Mulato, quando se
depara com questão grave que era a influência da Igreja, de
uma igreja muito conservadora e ele era um homem
Liberal, Republicano, Abolicionista e Marçon e era
sobretudo Anticlerical. Aqui no Maranhão ele colabora na
fundação de três jornais. No primeiro jornal mais
expressivo de caricaturas do Maranhão que foi o jornal
anticlerical “A Flecha”, no qual ele tinha uma coluna
chamada “Piticaia” e assinava com o pseudônimo
“Pitrybi”. Ele ajudou a fundar o jornal “O Pensador” e o
jornal “A Pacotilha” que foi o primeiro jornal diário do
Maranhão.
No Maranhão, Aluísio colaborou de forma intensa nos jornais locais,
tendo uma atividade ativa de protestos contra as atitudes da igreja, que possuía
na época um jornal chamado “Civilização” que demonstrava os ideais clericais.
Esse jornal estava vinculado aos padres do Seminário Santo Antônio, como
relata Ferreira Júnior (2006, p. 2): “o embate na época era muito forte, era
quase que de luta corporal, na Praia Grande”.
Interessante observar que Aluisio Azevedo quando vem ao Maranhão
por motivos pessoais, não possuía interesses em estabelecer vínculo
empregatício e acabou por escrever um livro, “Uma Lágrima de Mulher”, e
pintou um quadro á óleo “Depois de uma banicada”, além da publicação de “O
Mulato”, fundando “O Pensador” e ficando como colunista no jornal “A
Pacotilha” até as vésperas de sua viajem de volta ao Rio de Janeiro. Nesse
último jornal, Aluísio publica uma Carta de Despedida (Ver Anexo 1).
O livro “Um Lágrima de Mulher” não possui uma repercussão tão boa a nível
nacional apenas tendo sua abrangência restrita principalmente ao Maranhão, como
coloca Fanini (2003, p. 287):
Mas o livro não prenuncia, de forma alguma, o
romancista de pulso que dois anos mais tarde, ainda em
São Luiz, publicava “O Mulato”. Mesmo assim, o
romance desperta certo interesse no público da terra. O
idealismo romântico, dentro de cujos princípios fora
concebida a narrativa, ainda provoca enternecimentos e
paixões nos serões de leitura da sociedade imperial. E o
livro, por isso mesmo, é aceito e discutido.
4.2 No Rio De Janeiro
Aluísio retorna ao Rio de Janeiro em 1982. Na capital carioca, o
escritor maranhense começa a escrever romances-folhetins que se chamava de
Ministério da Tijuca que, posteriormente, dará origem ao livro Girândola de
Amores. Esses folhetins eram editados pelo jornal “Folha Nova” (1882-1883).
Ressalta-se que essa edição folhetinesca foi alvo de diversas críticas
devido ao fato de Aluísio ter escrito uma carta a um amigo, na qual pedia uma
função pública, já que a considerava uma produção fabril e queria escrever
“Casa de Pensão”. Como coloca Fanini (2003, p.292):
Certamente, Aluízio terá sentido sempre
algum remorso de “O mistério da Tijuca”, que
reapareceu mais tarde com o título “Girândola dos
Amores”, como se a mudança de nome pudesse
tornar essa narrativa menos soporífera.
Aluísio toma os romances-folhetins como um laboratório de
experimentação para a produção da obra “Casa de Pensão”, e assim faz uma
certa mistura entre as duas escolas (Romântica e Realista-Naturalista). Jean-
Yves Mérian, o mais minucioso pesquisador da obra de Aluísio, coloca:
Seus folhetins são romances em tese, mas o
autor desenvolve neles teses sociais e políticas
claras ao mesmo tempo em que, por outro lado, faz
descrições de cenas irreais e fantásticas. (MÉRIAN
apud FERREIRA JUNIOR, 2005, p. 2).
Aluísio Azevedo, além de escrever “Girândola de Amores”, também
escreveu A Condessa Vésper no Jornal “Gazetinha”. Após sua passagem pela
imprensa carioca, Aluísio, em 1891, troca a carreira de literato e jornalista pela
diplomacia. Foi nomeado oficial-maior da secretária do Governo do Estado do
Rio e, logo em seguida, torna-se cônsul de carreira ao ser nomeado Vice-Cônsul
em Vigo.
Suas principais obras foram:
a) Romance: Uma Lágrima de Mulher (1879); O mulato (1881); Memórias de um
Condenado (1882); Mistério da Tijuca (1882); Casa de Pensão (1884); Filomena
Borges (1884); O Coruja (1885); O homem (1887); O cortiço (1890); A
mortalha de Alzira (1894); Livro de uma sogra (1895).
b) Conto: Demônios (1893); Pegadas (1897).
c) Teatro publicado: A flor de lis (1882); Fretzmac (1888); Casa de Orates (1956);
Fluxo e refluxo (1905).
d) Crônica e epistolário: O touro negro (1954).
Observações: Grande parte da obra teatral de Aluísio Azevedo, embora levada à cena,
não foi editada, como, por exemplo: “O mulato”; “Filomena Borges” ; “A República”;
“Um caso de adultério”.
Outras peças não foram publicadas nem representadas: “As minas de Salomão”;
“A mulher”; “Alma de prego” etc.
Aluísio deixou inconcluso um livro de impressões de viagens, que se intitularia
“Japonesas e norte-americanas”, e do qual um excerto foi publicado em 1904 pelo
Almanaque Garnier.
5 JORNAIS MARANHENSES
Como já citado, a contribuição de Aluísio Azevedo foi de grande
importância para o jornalismo maranhense, pode-se falar em imprensa
maranhense antes e depois de Aluísio, um verdadeiro divisor de águas. Para
que se entenda melhor essa divisão, há de se caracterizar os principais jornais
maranhenses da época que contaram com a participação ativa deste autor.
Aluísio Azevedo fazia jornalismo opinativo,
nada preocupado com os anseios de imparcialidade.
Era, declaradamente, anticlerical. Esta característica
é muito evidente em seus registros deixados, seja na
literatura, seja no jornalismo. Este é um aspecto
muito presente, desde o início de sua carreira, como
caricaturista no Rio de Janeiro. (MARTINS, 2002,
p. 35)
5.1 A Flecha
Coluna Piticaias,
Jornal A Flecha, 1879
Fonte: SIOGE
Fundado em 1879, foi o primeiro jornal caricatural no Maranhão, utilizado por
Aluísio Azevedo para atacar o clero maranhense. Surgiu no século XIX, em um período
de grandes debates, momento em que estavam em foco as questões da abolição da
escravatura e da Proclamação da República. O primeiro número, na seção Fechadas se
lê:
A irmandade dos Passos, deu um passo na senda do
progresso
E deu um exemplo também
E fez uma economia
E acabou uma ostentação
E matou uma mamata
E merece um amigável aperto de mão
- Ponto de interrogação do leitor...
Ora esta! Não fez procissão.
O jornal a flecha caracterizava-se por ser abolicionista, determinista, contra-
espiritualista, liberalista, anticlericalista, positivista e naturalista.
Aluísio escrevia em uma coluna chamada Piticais, onde assinava com o
pseudônimo de Pitrybi, utilizava esse anonimato para favorecer o enfrentamento com o
clero maranhense, já que era a favor da abolição e da Proclamação da República.
5.2 O Pensador
Teve sua primeira edição publicada no dia 10 de setembro de 1880, em oposição
ao jornal Civilização, periódico clerical que surgiu quando a Igreja Católica reagia
diante da expansão positivista que chegava ao Maranhão. Os textos publicados nesse
jornal, preocupavam os sacerdotes e seus seguidores.
No longo editorial-programa da primeira edição de O Pensador, escrito segundo
presunção geral por Manuel de Bethencourt, há trechos assim:
O Cristianismo fora vencido
Vencido? Completamente não. Já ao longo começa a
erguer-se o vulto majestoso da Reforma. Ouve-se
o troar de um canhão, é Lutero que fala. Vem
retemperar o cristianismo vem fazer brotar as fontes
da liberdade.
A voz da Reforma o clero treme. Parece então que
o mundo lhe vai escapar... Cristo peleja contra
ele pela voz daqueles que apregoam a doutrina.
O Papa recorre aos grandes meios: inventa uma
Máquina infernal – o jesuíta.
Em meio deste século de ciência ele inventou
a maior das monstruosidades – a infabilidade papal,
essa mutilação enorme da razão. E não ficou
aqui. Corrompeu o ensino, alterou a história, deturpou
a moral, perverteu as consciências e fez o Silabus.
Finalizando dizia assim o editorial:
Tal é o programa do PENSADOR: pensar e só
pensar. Pensar rasgar os horizontes do povir.
Aluísio aproveita-se dos deslizes dos representantes da Igreja Católica para
atingir essa Instituição, que possuía respeito e credibilidade e exercia poder sobre a
sociedade.
Devido às severas críticas que fazia ao clero e a Igreja Católica, o jornal
Civilização apontava Aluísio como indivíduo que tem pacto com o satanás. A rivalidade
era tão grande, que O Pensador foi processado judicialmente, devido às injúrias escritas
cometidas contra o clero, principalmente contra o Padre Francisco José Batista.
Após tantos conflitos, Aluísio e seus parceiros perceberam que apenas três
edições mensais de O Pensador não respondiam à situação criada pela rivalidade entre
grupos clericais e seus opositores. Daí fez-se necessário a publicação de um jornal
diário. Essa idéia concretizou-se com o jornal A Pacotilha, lançado em outubro de 1880.
5.3 A Pacotilha
O jornal diário A Pacotilha foi fundado em 1880 por Victor Lobato e dirigido
durante muitos anos por Agostinho Reis, surgiu com o objetivo de atiçar ainda mais os
embates com o jornal Civilização, fortalecendo o já provocativo periódico O Pensador.
Neste jornal, Aluísio publicava textos de outras pessoas que tinham os mesmos
objetivos que os seus, a fim de se legitimar junto a setores da sociedade.
Aluísio escreveu diversos artigos, assinados com vários pseudônimos, entre eles:
Giroflê e Semicúpio dos Lampiões. Foi através d’A Pacotilha que Aluísio se despediu
da sociedade maranhense, ao retornar, onde conta, resumidamente sua mensagem pelo
Maranhão.
6 CONCLUSÃO
Aluísio Azevedo ficou mais conhecido por sua obra ficcional. Fundou a cadeira
número quatro da Academia Brasileira de Letras, com relevante acervo literário. A
análise de sua obra tornou-se importante por trazer consigo um pouco da consolidação
da imprensa no Brasil do século XIX.
O fazer jornalístico de Aluísio era envolvido pela sua inspiração literária, sem
deixar de lado a verdadeira finalidade jornalística, de informar, interpretar, orientar e
entreter.
ALUÍSIO AZEVEDO AND THE PRESS MARANHENSE OF CENTURY XIX
ABSTRACT
Rescue of the production of the journalist and maranhense writer Aluísio Azevedo, from
inquiries of its contribution to periodicals A Flecha, A Pacotilha and O Pensador.
Historical context of the production of Aluísio Azevedo at its time, detaching the
influences politics, economic, social and cultural received by the writer. Moreover,
journalistic and literary registers of caricatures, texts and Aluísio Azevedo.
Keywords: Maranhense journalism. The press in séc. XIX. Literature.
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, Aluisio Tancredo Belo Gonçalves. A Flecha, São Luís, 1979. p.47. Coluna
Piticaias.
COSTA, Cristina. A milésima segunda noite: da narativa mítica à telenovela análise
estética e sociológica. São Paulo: Annablume, 2000.
D’ONÓFRIO, Salvatore. Literatura ocidental: autores e obras fundamentais. 2ed. São
Paulo: Ática, 2000.
FANINI, Ângela Maria Rubel. Os romances-folhetins de Aluísio Azevedo: aventuras
periféricas. Florianópolis: Tese apresentada para obtenção do título de Doutor – UFSC,
2003.
FERREIRA, Déborah M. M. Jornalismo e Literatura em Aluísio Azevedo:
contribuições do escritor para os jornais maranhenses e folhetins, no período de 1879 a
1883. São Luís: Trabalho de Conclusão de Curso – UFMA, 2002.
____________. Palcos de uma causa: jornalismo e literatura em Aluísio Azevedo. São
Luís: Artigo Científico apresentado para obtenção do título de especialista – UFMA,
2004.
FERREIRA JÚNIOR, José. Entrevista sobre Aluísio Azevedo e a imprensa
maranhense do séc. XIX. São Luís, 18 mar 2006.
_____________. Aluísio Azevedo: o jornalista, o critico literário e o romancista. Jornal
da Rede Alcar. São Paulo, v.5, n. 59, 1 nov. 2005. Disponível em:
<http.www2.metodista.Br/unesco/rede_alçar/rede_59/rede_alcar-serie-aluisio-59.ht>.
Acesso em: 10 mar. 2006.
JORGE, Sebastião Barros. Os primeiros passos da imprensa no Maranhão. São
Luis: EDUFMA, 1987. (Coleção Ciências Sociais; Série Comunicação).
MERIAN, :Jean-Yves. Aluísio Azevedo: vida e obra(1857-1913). Rio de Janeiro:
Espaço e tempo/ Banco Sudameris-Brasil:INL,1988.
PINHEIRO, Roseane. Sob Pena do Jornalismo e do Romance. Associação
Maranhense de Imprensa. São Luís, dez. 2003. Disponível em: <http//www.ami-
ma.com.br/index.php?catID=59&blID-7&ID=331>. Acesso em: 10 mar.2006.
ANEXOS
ANEXO 1 – Carta de despedida de Aluísio Azevedo
Pacotilha, São Luís, 06 set. 1881
DESPEDIDA
Ao lerem estas palavras estará o autor delas sendo conduzido a vapor para o Rio
de Janeiro e sendo conduzido pela saudade para o mundo nebuloso das meditações e das
tédias idéias.
Nessa ocasião ele ao menos sentirá o prazer íntimo de calcular que não
desapareceu ainda da memória de seus comprovincianos e deixará embelar-se pela
esperança de um dia prestar bons serviços à sua pátria e a seus amigos.
A estes sejam entretanto dedicadas estas palavras singelas e sem elegância cujo
único mérito está exclusivamente na sinceridade que as dita.
Seria imperdoável ingratidão partir sem patetear publicamente o muito
penhorado que vou do Maranhão pelos inestimáveis obséquios que me foram
dispensados nesta cidade desde que vim do Rio de Janeiro.
Estava bem longe de merecer tanto – vou por conseguinte com o coração arejado
por uma boa idéia de reconhecimento e com a consciência satisfeita pela convicção de
não ter jamais procedido mal – não me arrependo de coisa alguma que fiz.
Arrastado ao Maranhão pela lastimável morte de meu pai, cujo inventário
reclamava à presença de um de seus filhos, tencionava demorar-me aqui apenas três
meses – demorei-me quase três anos.
Durante esse espaço tive ocasião de avivar velhas amizades da infância e de
entabolar novas relações, que me puseram em contato com alguns caracteres e alguns
corações de primeira agoa.
Já é grande consolação não descrer dos homens – já o que me sucedeu.
Para aproveitar os lazeres escrevi aqui o meu primeiro romance – Uma lágrima
de mulher; pintei um quadro a óleo – Depois de uma banicada; publiquei meu último
trabalho literário – O Mulato; fundei com alguns amigos distintos e talentosos O
Pensador, do qual só me despedi na ocasião de retirar-me, e finalmente chamado à
redação da Pacotilha aqui demorei-me até a véspera de minha viagem.
Todos esse trabalhos que enumerei pouco com nada valerão, se não lhes valer o
único mérito que possuem – a boa intenção com que foram praticados.
Essa, afianço que foi a melhor, se nem sempre os recursos intelectuais, do autor
corresponderam a sua vontade, não o devemos responsabilizar por isso. Ao contrário,
seria resolução firme de aperfeiçoar-se. É uma boa resolução e se ela depende somente
do esforço e do trabalho, devemos animá-lo para que ele trabalhe e no futuro produza
cousa mais aproveitável.
A intenção possuo-a eu, muito feliz serei se dela colher bons e sazonados frutos.
A todas as pessoas que contribuíram por conseguinte para a realização dos
trabalhos que empreendi nesta cidade; assim como o público que as acolheu com
protetora condescendia os meus mais sinceros protestos de gratidão e estima – em
quanto viver guardarei no coração a idéia desses favores.
Agora, que meu irmão Américo veio substituir-me ao lado de minha família,
nada mais tenho a fazer aqui e como a plantar minha atividade e minha perseverança em
um terreno mais amplo e produtivo.
Sei que audácia dos padres de Santo Antônio aumentará na razão inversa do meu
afastamento, porém isso pouco me abala – a lama que me fizeram atirar há de voltar as
suas pias de água benta; além disso tenho bastante confiança no seguinte provérbio –
cão que ladra não morde!
Por mais que dissessem eles a meu respeito nunca daria eu por mal empregados
os serviços que prestei à sociedade maranhense colaborando abertamente n’O Pensador
– muitas famílias tenho consciência e ter arrancado às garras do fanatismo para restituir
às sublimes obrigações do lar doméstico.
Digam embora os padres que sou ignorante e atrevido, porém nunca poderão
dizer que sou um homem mal intencionado.
O leitor que me desculpe esse esbanjamento de palavras com semelhante
assunto, porém depois que tanto se escreveu a meu respeito nesta província, não será
muito que também eu acrescente alguma cousa.
Muito me escreveu e, seja dito em verdade, a maior parte das vezes
desfavoravelmente.
E, como de tudo conservo as melhores recordações, peço licença ao leitor para
terminar as minhas despedidas, transcrevendo a seguinte engraçada poesia do Sr. Rocha
Santos, que foi o primeiro assento das descomposturas que levei.
(...)
ANEXO 2 – Entrevista com o Prof. Dr. José Ferreira Junior
Por que Ministério da Tijuca passou a se chamar Girândola de Amores?
Vários romances dele tinha um título em folhetim e outro quando passava a ser
livro, o folhetim Ministério da Tijuca tinha um apelo mais popular, Girândola de
Amores tinha um apelo mais romântico, mais bucólico, telúrico.
O que é a edição critica?
Você reedita o trabalho do autor, com todas as notas sobre ortografia e sobre
sintaxe. E nessa edição vem o original e a ultima edição publicada que foi em 1973.
O interessante dessa edição critica, é que ela tem dois capítulos na versão
folhetinesca, no Mistério da Tijuca, que é o capítulo 61 e o capítulo 76, onde ele
interrompe a narrativa do romance e vai fazer um crítica literária, que foi muito
estigmatizada; a crítica foi ferrenha em cima dele por que ele estava escrevendo de uma
forma muito romântica, já que o Romantismo é da primeira metade do séc. XIX, e no
final deste século já se estava diante dos autores realistas/ naturalistas, então para os
críticos aquele romance rocambolesco, já estava fora de sintonia.
Nesses dois capítulos (61 e 76) ele responde a esses críticos, dizendo que o
público ainda queria o romance rocambolesco, queria o folhetim melodramático. Ele
teria que agradar aos dois tipos de público, tendo uma preocupação com a formação do
leitor.
Como se dava a produção de Aluísio?
Era em forma narrativa, o folhetim do Ministério da Tijuca era absolutamente
novelístico. Era uma narrativa que tem uma história, só que a historia é prolongada,
porque o autor fazia um contrato com o jornal de produção diária.
Talvez o maior estigma do Mistério da Tijuca seja esse apelo a um amigo, feito
por Aluísio, no qual demonstra o desejo de conseguir emprego público, para que ele
tivesse mais tempo para escrever Casa de Pensão do que fabricar Mistério da Tijuca,
por que realmente era um romance fabril era uma produção industrial, para conseguir o
“pão de cada dia” e ele foi um dos poucos escritores do séc. XIX que viveu da sua
literatura só que teve uma hora em que ele saturou. Quando ele entra pro Itamarati ele
deixa a literatura, aí ele dá o golpe.
O Mistério da Tijuca foi um romance, publicado no Jornal carioca “A Folha
Nova”.
Aluísio nasce em São Luís e fica aqui até a adolescência depois vai para o rio de Janeiro
e lá começa a trabalhar como caricaturista, ele foi fazer a escola de belas artes, sendo
que ele era um artista plástico “frustrado”.
Tem um período que ele trabalha como artista plástico e depois volta ao
Maranhão por motivos pessoais.
Aqui em São Luís ele escreve O Mulato, quando se depara com questão grave
que era a influência da Igreja, de uma igreja muito conservadora e ele era um homem
Liberal, Republicano, Abolicionista e Marçon e era sobretudo Anticlerical. Aqui no
Maranhão ele colabora na fundação de três jornais. No primeiro jornal mais expressivo
de caricaturas do Maranhão que foi o jornal anticlerical “A Flecha”, no qual ele tinha
uma coluna chamada “Piticaia” e assinava com o pseudônimo “Pitriby”. Ele ajudou a
fundar o jornal “O Pensador” e o jornal “A Pacotilha” que foi o primeiro jornal diário
do Maranhão. Embora num intervalo de tempo muito curto que passou aqui, ele teve
uma participação atuante na imprensa maranhense. Alguns críticos como Mérian diz
que o Aluísio não foi bem um homem de jornal, eu até acredito que lá no Rio realmente
não tenha sido, mas aqui ele foi, até mesmo em função da polêmica que ele tinha com
um jornal da Igreja Católica chamado “Civilização”, um jornal que foi criado para
combater as idéias na época republicanas, abolicionistas, sobretudo as idéias
anticlericais. Era um jornal vinculado aos padres ao clero do seminário Santo Antônio.
E o embate na época era muito forte, era quase que de luta corporal na Praia Grande.
O que há de mais interessante na obra de Aluísio Azevedo?
A vinculação com o jornal, fazer do folhetim um laboratório para desenvolver a
técnica do romance isso fica interessante no capítulos 61 e 76 chamado Parêntese.
Como a edição de um livro tinha um custo elevado, o folhetim funcionava como
consolidação de um público que iria posteriormente ser consumidor(leitor) da obra que
iria reunir os folhetins. O romance feito por jornal era um “passaporte” para criar um
público leitor. O romance de folhetim brasileiro foi revolucionário na forma e no
conteúdo, porque o autor brasileiro descobriu que livro e jornal eram coisas diferentes.
No jornal teria que ter uma escrita direta, com orações coordenadas e não com
subordinadas o mestre disso foi Machado de Assis.
Já o Aluísio Azevedo ele também usa isso, porém ao contrário do Machado, ele
ia aumentando, esticando as coordenadas, ele para descrever um personagem fazia
praticamente um retrato, seu processo de criação se dava primeiro visualmente e só
depois ele escrevia, dizem que isso se dava por ser um artista plástico. A sua parataxe
era extensiva, até mesmo para render o romance.
No Jornal “A Flecha” ele era caricaturista e também tinha uma coluna (Piticaia)
na qual, ele fazia crítica de Teatro, crítica Literária e crítica de costumes como se fosse
uma crônica.
Na sua opinião, Aluísio fazia isso por que gostava ou por sobrevivência, já que
posteriormente, ele se tornaria um funcionário público?
Ele fazia pelas duas coisas, por que gostava e por que precisava pra ganhar
dinheiro. O fato de ele ter entrado para o Itamarati, ele já era um homem de meia
idade(idoso), deixando de escrever ficção, romance e vende sua obra em 1990 para
editora Garnier.
Por que O Prof. Dr. Ferreira Júnior resolveu ser pesquisador do tema?
Sobretudo pela crítica literária embutida no romance e também por que foi um
romance que ele escreveu pouco depois de sair do Maranhão. Eu queria fazer uma certa
analogia sobre a atividade intelectual que ele teve aqui, jornalística, anticlerical de
combate e essa produção folhetinesca. Tem uma questão que eu achei relevante ressaltar
quando eu fiz minha edição crítica: é que tem um personagem no Mistério da Tijuca que
é absolutamente lateral e descartável, poderia nem estar ali, que é o Padre Almeida, um
padre totalmente diferente dos padres com os quais o Aluísio se digladiou aqui no
Maranhão através da impressa. Era um padre liberal, astuto, um padre que fazia suas
“traquinagens”, que aceitava os avanços da ciência, era muito arguto.
Na minha análise era o tipo de padre que o Alísio aceitava, mesmo sendo
anticlerical, republicano, antiabolicionistas, até por que acho que ele não era anti-
religioso.
Componentes: Aurilene Alencar
Juliana Lima
Letícia Silva
Nayara Vieira
Suellen Wolff
Objetivo:
Mediante a este artigo temos como principal objetivo mostrar que os pasquins
foram determinantes no movimento social que contribuiu efetivamente à adesão do
Maranhão à Independência do Brasil. Sendo assim um marco na história da imprensa
maranhense.
Sumário
1. Introdução
2. Desenvolvimento
3. Considerações finais
4. Bibliografia
Introdução
Observa-se nesse artigo científico os acontecimentos que culminaram na adesão
do Maranhão à Independência do Brasil, e a importância dos pasquins nesse processo.
Os pasquins eram jornais periódicos que apareciam e sumiam sem deixar
vestígios.
Apesar disso, seu rastro surtia efeitos imediatos na economia, política e
principalmente na sociedade gerando indignação nos maranhenses do século XIX.
Desenvolvimento: A voz que não conseguiram calar
Nos primeiros 20 anos do século XIX da imprensa maranhense, os jornais não
foram apenas testemunhas da história, mas autores da mesma, pela participação política
e cultural da província.
Foi uma época brilhante pela presença de Odorico Mendes (precursor dos
pasquins no Maranhão, com participação também nos jornais de São Paulo e Rio de
Janeiro), Garcia de Abranches, Frederico Magno, José Cândido de Moraes e Silva, João
Lisboa, Cândido Mendes, Sotero dos Reis entre outros. Houve aqueles que encheram de
vergonha o jornalismo com suas infâmias e pasquins terríveis.
O período que vai de 1821 a 1841, marca a trajetória de uma fase de ouro da
imprensa maranhense (surgimento dos pasquins). Essa é uma das fases mais
conturbadas, pois os portugueses residentes no Maranhão se recusavam a aderir à
Independência do Brasil, passando depois, por outros problemas, tais como a abdicação
de Dom Pedro I A Regência Trina e os movimentos como a Setembrada e a Balaiada.
Em 1822, foi organizada em Lisboa, a Junta Provisória e Administrativa do
Maranhão, por ato das Cortes Constituintes que abriria a página de adesão à
Independência do Brasil. Com a chegada do almirante Cochrane à província, em missão
oficial, deu-se a 28 de Julho de 1823 a adesão do Maranhão à Independência.
Mediante esses acontecimentos, surgem assim, os pasquins. Que possuíam como
objetivo central expressar sua indignação através desses folhetins que eram entregue em
domicílio ou pregados nas paredes durante a noite.
No entanto, havia muitas pessoas no qual discordavam do objetivo dos pasquins,
sempre acreditaram que eram utilizados como forma de denegrir a imagem das
principais autoridades da província. Como é o caso de Sebastião Jorge (autor do livro
“A linguagem dos pasquins”), que coloca nesse livro a sua visão sobre o trabalho dos
pasquins no Maranhão.
Para Sebastião Jorge, os pasquins tinham como objetivo denegrir a imagem do
grupo político rival utilizando uma linguagem de baixo nível onde atacava não só a vida
política e sim a privacidade do desejado e de toda sua família.
Tinha como características principais o ataque à honra, a vida pessoal, ofensa,
insulto, vingança, entre outros. Os pasquins tinham como finalidade denegrir a honra
das personalidades de destaque, o qual era motivado pela ambição do poder. Enfim,
para ele, os pasquins não tiveram nenhuma contribuição cultural, social, apenas política
uma vez que houve vários assassinatos por conta desses folhetins.
Porém, ao se falar em liberdade de expressão naquela época o Maranhão era
bastante censurado pelas autoridades provinciais, ao passo que esses mesmos sempre
impediam a qualquer custo o surgimento dos movimentos revolucionários.
Por causa de tamanha censura a população se via no direito de reivindicar todas
as suas “mágoas” de alguma forma. No caso, os pasquins foram o único meio
encontrado para expressar a indignação política da população.
Somente através desse mecanismo, pode-se conhecer o outro lado da história, a
versão das camadas populares, e não o que as autoridades queriam apresentar.
Considerações finais
Concluí-se através desse artigo a importância relevante dos pasquins no processo
de adesão do Maranhão à Independência do Brasil.
O desdobramento desse processo, que durou décadas, acabou por dar muita “dor
de cabeça” nas autoridades gerando polêmica na sociedade maranhense do século XIX.
Sendo muitas vezes menosprezado por alguns, mas que com ousadia e idealismo
venceram os obstáculos e, hoje, têm o seu valor reconhecido pela história.
Bibliografia
História do Maranhão, Autor: Mário M. Meireles.
A linguagem dos Pasquins, Autor: Sebastião Jorge.
Os primeiros passos da imprensa no Maranhão, Autor: Sebastião Jorge.
Pantheon maranhense
Jornais maranhenses, 1821-1979, Fundação cultural do Maranhão.
Jornais:
1. Os Argos da Lei (1825)
2. O Censor Maranhense (1825)
3. O Astro (1827)
4. Poraquê (1828)
5. A Cigarra (1829)
6. Brasileiro (1830)
7. Farol Maranhense (1831)
8. O Guajajara (1840)
9. O Conciliador (Sete de Maio de 1823, nº. 190).
UNIVERSIDADE FEDERAL DO MARANHÃO
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS
CURSO DE COMUNICAÇÃO SOCIAL
ALUNOS: FÁBIO PERES DE BERRÊDO MARTINS E JANAÍNA DOS SANTOS
JANSEN
DISCIPLINA: LABORATÓRIO DE RADIOJORNALISMO
PROFESSOR: FRANKLIN DOUGLAS
************************************************************
TÍTULO: ANISTIA POLÍTICA E O MARANHÃO
**********************************************************************
<Tchaikovsky>
LOC: UM GOLPE MILITAR DERRUBA O PRESIDENTE DA
REPÚBLICA./ O COMANDO REVOLUCIONÁRIO EDITA O
ATO INSTITUCIONAL NÚMERO 1, QUE MODIFICA UMA
SÉRIE DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS./ COMEÇA UM
PERÍODO DE VIOLÊNCIA, MEDO E REPRESSÃO./
INTELECTUAIS LOTAM AS PRISÕES DE TODO O PAÍS;
LIVROS E JORNAIS SÃO APREENDIDOS./ A CULTURA
AGONIZA.//
EM 1968, É DECRETADO O ATO INSTITUCIONAL
NÚMERO 5, QUE LIMITA AINDA MAIS AS GARANTIAS
CIVIS./ A TORTURA E O DESAPARECIMENTO DE PRESOS
POLÍTICOS MARCAM UMA FASE OBSCURA NA
HISTÓRIA DA REPÚBLICA.//
NO MARANHÃO A SITUAÇÃO NÃO ERA DIFERENTE./
GOVERNANTES ESCOLHIDOS PELOS MILITARES
TENTAVAM CONTROLAR MOVIMENTOS SOCIAIS./
COMBATIAM ESTUDANTES E SINDICALISTAS COM
MÃO DE FERRO./ A PARTIR DE 1975, UMA NOVA LEI
ABRE AS TERRAS DO MARANHÃO PARA GRANDES
GRUPOS NACIONAIS./ COM ISSO, O MOVIMENTO
CAMPONÊS SE ERGUE EM DEFESA DA TERRA./ ESSE
GRUPO VAI CONTRIBUIR PARA O INÍCIO DA LUTA PELA
ANISTIA, JUNTO AOS MOVIMENTOS DE MÃES E
ESPOSAS DE DESAPARECIDOS POLÍTICOS./ O ENTÃO
JORNALISTA DO “DIÁRIO DO POVO”, ALDIONOR
SALGADO.//
(SONORA 1 ALDIONOR SALGADO)
<música suspense>
ERAM CRIADOS OS COMITÊS BRASILEIROS PELA
ANISTIA, FORMADOS POR INTELECTUAIS, POLÍTICOS E
ESTUDANTES./ EM 1978, A IGREJA CATÓLICA ADERE AO
MOVIMENTO./ NO MARANHÃO, O COMITÊ PELA
ANISTIA É INSTALADO NO SEMINÁRIO DA IGREJA DE
SANTO ANTÔNIO, COM O APOIO DO ARCEBISPO DE SÃO
LUÍS, DOM MOTA./ O ENTÃO PRESIDENTE DO COMITÊ
BRASILEIRO PELA ANISTIA, REGINALDO TELLES.//
(SONORA 1 REGINALDO TELLES)
<Rossini>
REGINALDO, QUE ALÉM DO COMITÊ PRÓ-ANISTIA
PRESIDIA O MOVIMENTO FAMILIAR CRISTÃO, FALA
SOBRE A REPRESSÃO QUE SOFREU DURANTE A
DITADURA.//
(SONORA 2 REGINALDO TELLES)
<Hino Independência>
FORÇAS NACIONAIS E INTERNACIONAIS EXIGIAM A
ANISTIA NO BRASIL./ O GOVERNO FIGUEIREDO JÁ
DAVA MOSTRAS DA QUEDA DO REGIME MILITAR:
APRESENTAVA ÍNDICES ECONÔMICOS TERRÍVEIS E
SOFRIA COM MANIFESTAÇÕES DE RESISTÊNCIA
SOCIAL./ É NESTE MOMENTO QUE PRESOS POLÍTICOS
INICIAM UMA GREVE DE FOME EM 22 DE JULHO DE
1972./ OBJETIVO: O PERDÃO AOS CHAMADOS
“SUBVERSIVOS”.//
COM A GREVE, OS MANIFESTANTES ALCANÇAM A
IMPRENSA E CONVENCEM IMPORTANTES
PARLAMENTARES./ A GREVE DUROU 32 DIAS./ EM SEU
AUGE, O PRESIDENTE FIGUEIREDO SE COMPROMETE A
REVER INQUÉRITOS E CONDENAÇÕES DE PRESOS
POLÍTICOS./ EM AGOSTO DE 1979 ELE ENCAMINHA O
PROJETO AO CONGRESSO NACIONAL, QUE É
APROVADO./ ESTÁ DECRETADA A ANISTIA.//
<Caetano Veloso>
ANTES DA ABERTURA, HAVIA CERCA DE 10 MIL
BRASILEIROS EXILADOS./ ENTRE ELES O POLÍTICO
LEONEL BRIZOLA, O EDUCADOR PAULO FREIRE, O
CANTOR CAETANO VELOSO E O JORNALISTA
MARANHENSE NEIVA MOREIRA./ NEIVA ERA, NA
ÉPOCA, SECRETÁRIO DA FRENTE NACIONAL
PARLAMENTARISTA, MOVIMENTO QUE COMBATIA O
TOTALITARISMO E A CENSURA./ COM A ANISTIA,
NEIVA RETORNA AO BRASIL: MAIS DE 20 MIL PESSOAS
O ESPERAM NA PRAÇA DEODORO, CENTRO DE SÃO
LUÍS./ O JORNALISTA ALDIONOR SALGADO.//
(SONORA 2 ALDIONOR SALGADO)
<Som multidão>
O JORNAL PEQUENO DE 16 DE OUTUBRO DE 1979
ANUNCIAVA: CHEGA O LÍDER NEIVA MOREIRA./ NA
MESMA EDIÇÃO, A MANCHETE “NEIVA MOREIRA
MUDA O TRÂNSITO” INFORMAVA QUE A POLÍCIA
PRETENDIA MUDAR O ITINERÁRIO DOS ÔNIBUS QUE
CRUZAM O CENTRO DA CIDADE./ TUDO POR CAUSA DA
MULTIDÃO QUE AGUARDAVA O ANISTIADO.//
NO DIA SEGUINTE, 17 DE OUTUBRO DE 1979, O JORNAL
O IMPARCIAL PUBLICA: “EXILADO MARANHENSE FALA
MODERADAMENTE NA DEODORO”./ DE ACORDO COM A
EDIÇÃO, O EX-DEPUTADO INCITOU O POVO A LUTAR
PELA REFORMULAÇÃO DO PODER IMPLANTADO A
PARTIR DE 1964.//
NO MESMO DIA O JORNAL PEQUENO IRONIZAVA./
ESTAMPAVA NA PRIMEIRA PÁGINA: O GOVERNO
CONTRIBUIU PARA A MULTIDÃO QUE LOTOU A PRAÇA
DO PANTHEON, GRAÇAS À ALTERAÇÃO DO
TRÂNSITO.//
<Chico Buarque>
A IMPRENSA MARANHENSE NÃO FICOU IMUNE À
CENSURA EMPREENDIDA PELA DITADURA./ A
CENSURA, DIFERENTE DA PRATICADA NOS JORNAIS
DO SUDESTE DO PAÍS, FOI SUFICIENTE PARA
INTIMIDAR JORNALISTAS E IMPEDIR A CIRCULAÇÃO
DE JORNAIS COMO “O RUMO”, “CAMPO E CIDADE” E
“TRIBUNA DO POVO”./ O JORNALISTA ALDIONOR
SALGADO.//
(SONORA 3 ALDIONOR SALGADO)
APESAR DAS PRESSÕES, INTERNAS E EXTERNAS,
JORNAIS COMO DIÁRIO DO POVO E JORNAL PEQUENO
INSISTIAM EM COMBATER A ORDEM VIGENTE./ O
JORNAL O IMPARCIAL, COMO RESSALTA ALDIONOR,
CHEGOU A ABRIGAR E PROTEGER MILITANTES
COMUNISTAS.//
(SONORA 4 ALDIONOR SALGADO)
<Rossini>
NÃO SÓ O JORNALISMO IMPRESSO FOI ALVO DO
CONTROLE DO GOVERNO./ O RÁDIO TAMBÉM SOFREU
CENSURA, PRINCIPALMENTE A RÁDIO EDUCADORA,
COMO AFIRMA O ENTÃO DIRETOR DA RÁDIO GURUPI
JOSÉ ARNOLD FILHO.//
(SONORA 1 JOSÉ ARNOLD)
JOSÉ ARNOLD COMENTA SUA EXPERIÊNCIA FRENTE À
RÁDIO GURUPI.//
(SONORA 2 JOSÉ ARNOLD)
<Tchaikovsky>
ASSIM, PERCEBEMOS QUE A IMPRENSA DO MARANHÃO
(OU PARTE DELA), MESMO EM MOMENTOS DE CRISE,
SOUBE CONTORNAR A INFLUÊNCIA DO PODER, E
REIVINDICAR O QUE A TORNA UMA EXTENSÃO DA VOZ
POPULAR: A LIBERDADE DE APONTAR O QUE
ACONTECE, DE INFORMAR E DENUNCIAR O MUNDO./ A
ANISTIA FOI, PARA ELA, UM PRESENTE
INESQUECÍVEL.//
<Hino nacional>
E A LUTA, ANTES DESTINADA À ANISTIA E AO FIM DA
DITADURA MILITAR, HOJE TOMA NOVOS RUMOS./ A
REDEMOCRATIZAÇÃO, HÁ DUAS DÉCADAS, ABRIU AS
PORTAS PARA A “DITADURA DO CAPITAL”./ A
CENSURA CONTINUA, E SEGUE O RITMO DITADO PELOS
GRANDES BLOCOS ECONÔMICOS.//
(SONORA 3 REGINALDO TELLES)
<Geraldo Vandré>
QUEM SABE AMANHÃ, INTELECTUAIS E IMPRENSA
LUTARÃO POR UMA NOVA ANISTIA./ UMA ANISTIA ÀS
IDÉIAS DE PAZ E JUSTIÇA SOCIAL.//
JANAÍNA JANSEN E FÁBIO PERES PARA A SÉRIE
“MARANHÃO SOB CENSURA”.
<Geraldo Vandré. Reginaldo Telles lê, ao fundo, texto escrito por ele sobre a
injustiça social>
Silêncio e memória: a cobertura jornalística da Guerrilha do Araguaia
Autora: MOURÃO, Mônica. Graduada em Comunicação Social – Jornalismo pela
Universidade Federal do Ceará (UFC) e estudante de especialização em Teorias da
Comunicação e da Imagem pela UFC – Fortaleza-CE.
Endereço digital: [email protected]
GT: História do jornalismo.
Resumo: A pesquisa se refere à cobertura da imprensa sobre a guerrilha do Araguaia
(1972-1975). É apresentada a situação da imprensa nos chamados “anos de chumbo”.
Em meio ao silêncio dos jornais de grande circulação sobre a Guerrilha do Araguaia,
duas matérias que davam conta das movimentações no sul do Pará foram publicadas,
em dois dias seguidos, por jornais da mesma empresa: O Estado de S. Paulo e o
vespertino Jornal da Tarde. O texto era praticamente o mesmo. A partir do estudo das
matérias jornalísticas, é discutido o conceito de documento histórico. Com a mudança
do lugar da memória na sociedade pós-escrita, o silêncio da imprensa com relação à
Guerrilha do Araguaia é considerado um dos fatores que impediram o acontecimento de
ser apropriado pela memória hegemônica dos brasileiros, subsistindo nas memórias
subterrâneas dos parentes e amigos dos participantes da Guerrilha.
Palavras-chave: História, jornalismo, censura, memória, Guerrilha do Araguaia.
1. A censura durante o regime de 1964
Enquanto governava o general Castelo Branco, a censura era sutil: o presidente e o
general Golbery do Couto e Silva procuravam os jornais e os conquistavam – era a
chamada censura branca. Com o poder nas mãos dos militares da linha dura e o decreto
do AI-5, a censura se tornou mais ofensiva.
Apesar de a Carta Magna garantir a livre manifestação de pensamento, através de
decretos-lei e atos institucionais, a imprensa brasileira passou a ser “legalmente”
cerceada. Em 1967, foi instituída a Lei de Imprensa e, em 1969, a Lei de Segurança
Nacional – em vigor até 1978. Houve ainda o Decreto-Lei Nº 898, também de 1969,
que delegava ao ministro da Justiça os poderes de apreender qualquer tipo de
publicação e suspender sua impressão, circulação, distribuição ou venda em todo o
território brasileiro.
Pela Lei de Imprensa, não se podia divulgar nenhum crime cometido por presidente
da República, ministros de Estado, presidentes do Senado e da Câmara, chefes de
Estado ou governo estrangeiros e seus representantes diplomáticos. Essa lei também
determinava que o ministro da Justiça podia, a qualquer momento, decretar a apreensão
de impressos que contivessem propaganda de guerra ou que promovessem incitamento
à subversão da ordem política e social. Além da censura, houve também casos de
violência física e até de atentados a bomba (como nas redações dos alternativos Em
Tempo e Opinião e da Associação Brasileira de Imprensa, em 1976) para barrar a
divulgação de determinadas informações.
A atuação da censura tinha duas vias: impedir a publicação de certos assuntos e
impor a de outros. Não sob qualquer abordagem, mas a que interessasse aos militares.
Se, por um lado, não se podiam noticiar reações contra o governo que obtivessem
sucesso, por outro, quando “subversivos” eram derrotados, o fato tinha de ser
publicado.
Esse caso ilustra bem a censura caracterizada por Eni Orlandi como a
impossibilidade de o sujeito manter certo discurso, de se situar em determinada posição.
Dessa maneira, a censura vai além da interdição, pois também é um processo que
impede o sujeito de realizar seu movimento de identidade.
Isso levou alguns jornalistas a buscarem formas de comunicar informações
proibidas. Uma das táticas utilizadas era a mudança da pirâmide invertida; outro recurso
era a publicação de pequenas notas que desmentiam a versão oficial que ganhava
destaque de página. Também se abria espaço para regimes ditatoriais de outros países,
na expectativa de que o leitor os associasse ao governo militar brasileiro.
Entretanto, as “manobras” feitas pelos jornalistas dependiam muito da percepção do
leitor. Ele tinha que estabelecer uma relação de cumplicidade com os órgãos de
comunicação e, talvez, já estar ideologicamente de acordo com o conteúdo dos textos.
2. O silêncio
O silêncio pode ser caracterizado em dois tipos: o silêncio fundador e a política do
silêncio ou silenciamento. Este último dá margem às retóricas da dominação (opressão)
e do oprimido (resistência). O silêncio fundador é aquele necessário a qualquer
elaboração de sentido. É como se a palavra se imprimisse no silêncio contínuo e, dessa
maneira, ele fosse marcado e segmentado por ela, distinguindo sentidos.
Na política do silêncio, o sujeito, quando diz um sentido, não diz outros. Quanto à
censura, ela pode fazer com que se diga A porque não se pode dizer B. Desse modo,
afeta a identidade dos sujeitos, já que eles não podem se inscrever em todas as
formações discursivas historicamente possíveis – somente nas formações devidas. A
censura impõe o silêncio não somente calando o interlocutor, mas o impedindo de
sustentar outro discurso.
3. Cobertura de O Estado de S. Paulo e Jornal da Tarde sobre guerrilha
No período da Guerrilha do Araguaia (1972-1975) e durante todo o governo Médici
(1969-1974), sob a vigência do AI-5, apenas duas matérias foram publicadas nos
periódicos nacionais de grande circulação sobre o assunto. Elas foram veiculadas nos
dias 24 e 25 de setembro de 1972, respectivamente, por dois jornais do mesmo grupo
empresarial, O Estado de S. Paulo e o Jornal da Tarde, apesar de os dois terem sofrido
censura prévia até 1975.
Somente dois anos e meio após a retirada do Exército da região do Araguaia, foram
publicadas outras matérias sobre o assunto, nos periódicos Coojornal, Movimento,
Jornal da Tarde e IstoÉ. Segundo João Batista de Abreu, esta é “uma situação na qual a
ausência de informação é vista como informação, porque traz subjacente às matérias em
destaque a idéia de que nada de mais importante ocorreu nas últimas 24 horas, além do
que está publicado” (ABREU, 2000, p. 159).
Foram publicados 14 textos que tratavam de guerrilhas no Brasil do início do
governo Médici até o final das movimentações armadas no Araguaia (1969 a 1975), nos
jornais Estadão e Jornal da Tarde (JT) – sete em cada um. Trabalharemos, nesse
momento, excetuando as matérias específicas sobre a Guerrilha do Araguaia. Das 12
restantes, sete têm como tema movimentos que já haviam sido descobertos e derrotados,
alguns até anos antes da publicação. Dentre as outras cinco, uma – do Jornal da Tarde
de 12 de agosto de 1969 – relata movimentações que a matéria do dia seguinte anuncia
como desarticuladas, com “aparelhos descobertos e desmantelados”.
Na matéria do JT de 30 de outubro de 1969, intitulada “O Exército cerca seus
guerrilheiros”, de autor desconhecido, o movimento não tinha sido derrotado, mas seu
fracasso já estava previsto na abertura: “Os 2.300 homens das fôrças [sic] regulares
cercaram os guerrilheiros numa fazenda, perto de Salesópolis. No máximo hoje ou
amanhã – segundo prevê o Estado-Maior das fôrças [sic] regulares – guerrilha será
derrotada”.
Uma outra matéria do JT que não foi contabilizada dentre as que tratam de
movimentos já vencidos também não diz respeito a uma guerrilha que estivesse se
desenrolando naquela época. Em “Um nôvo plano contra a guerrilha?”, do dia 28 de
dezembro de 1970, o repórter buscou indícios de qual seria a nova política de segurança
do Estado, apontando a atuação do Ministério da Educação, cujo titular era Jarbas
Passarinho, e o reforço na segurança das regiões Norte e Centro-Oeste como ações
contra o movimento armado.
Das matérias do Estadão, apenas duas não falavam sobre guerrilhas ou tentativas de
organizá-las já frustradas. Uma, cujo título é “Mapas, armas contra guerrilhas”, de 2 de
agosto de 1970, não se refere a movimento armado uma vez sequer no corpo do texto.
Seu subtítulo estabelece uma relação entre levantamentos topográficos e prevenção a
guerrilhas: “A cartografia poderá se revelar muito util [sic] no combate às guerrilhas
rurais, segundo informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em
entrevista por escrito, fornecida ao ‘Estado’”. No decorrer do texto, contudo, o que se
encontra são detalhes sobre como se fazer um mapa, o significado de escalas e a
importância de satélites.
Quase dois meses depois da reportagem especial que tratava do movimento armado
no Araguaia, veiculada nos dois jornais da família Mesquita, uma matéria publicada no
Estadão faz referência à guerrilha do sul do Pará. Em 16 de novembro de 1972, o texto
intitulado “Brasília ignora foco de terror” diz respeito a uma possível organização de
movimentos armados no norte de Mato Grosso, mas é feita uma comparação com a
Guerrilha do Araguaia – sem, no entanto, mencionar esse nome. O termo utilizado foi
“foco guerrilheiro da região Xambioá-Araguatins, Norte de Goiás”.
Nessa matéria, membros do governo reclamam da existência de boatos sobre
possíveis focos guerrilheiros. Isso também acontece nos textos “Um novo inimigo
procura a guerrilha. E vai atacar”, de 12 de agosto de 1969, e “E um cerco a seis
homens do terror”, de 13 de agosto de 1969, ambas do JT, a própria imprensa é
acusada de disseminar boatos.
– Os moradores da área fantasiam muito; e existem jornalistas
que acreditam nisso e publicam tudo como se fosse verdade. E
se isso que estamos fazendo aqui for um simples treinamento? –
pergunta um oficial do Corpo de Fuzileiros (SOUZA e
STRAUSS, 12 ago. 1969).
– Por falta de informações oficiais, vários órgãos de imprensa
têm dado a conhecer ao público meias verdades – começou o
capitão Paulo Freire, em sua entrevista de ontem, explicando
que ali estava para evitar que isso continuasse acontecendo
(JORNAL DA TARDE, 13 ago. 1969).
Observa-se que uma característica dessas matérias é o grande peso das fontes
oficiais, fato já comum na imprensa brasileira. No contexto específico da ditadura
militar, contudo, divulgar os fatos a partir de declarações e de ações de autoridades era
uma espécie de disfarce para encobrir certos aspectos que poderiam ser barrados pela
censura.
Algumas matérias relatam a maneira como os grupos de oposição à ditadura
conquistam aliados de forma que as palavras “guerrilheiro”, “subversivo” e “terrorista”,
embora possuam cargas semânticas diferentes, fiquem todas num campo negativo de
sentidos. Na matéria “Não houve julgamento”, no Estadão de 8 de janeiro de 1969, fala-
se de “aliciamento de novos membros”. Em matéria do mesmo jornal, em 1971 –
“Goiás abrigou durante 11 anos um Estado comunista”1 –, a conquista de membros para
a luta armada também é colocada de forma difamatória: “Recorrendo a um proselitismo
dialetico [sic] com acenos de melhoria e possibilidade de facil [sic] enriquecimento,
1 A matéria tem como tema as Ligas Camponesas, já desbaratadas desde o início do regime.
dirigentes comunistas reuniram, em torno de alguns lideres [sic], diversos grupos de
lavradores”.
Outra característica dessas matérias é que lhes falta maior contextualização. Alguns
textos mais parecem tramas recheadas de personagens, surpresas e reviravoltas do que
matérias jornalísticas.
4. As matérias sobre a Guerrilha do Araguaia
O Estado de S. Paulo se posiciona como um jornal liberal, procurando se afirmar
como defensor da família, da propriedade e da liberdade de imprensa. Seus
representantes procuram dar a ele uma feição de independência em relação a governos e
partidos. Afirmando ser contra extremismos de esquerda e de direita, o jornal preferia
pender para esta última e até renunciar aos princípios de liberdade se o caso fosse o
enfrentamento do comunismo.
Foi esse veículo e o vespertino Jornal da Tarde, fundado em 1965, que publicaram,
na imprensa nacional de grande circulação, em setembro de 1972, as duas únicas
matérias sobre a Guerrilha do Araguaia no período em que ela aconteceu. Enquanto em
O Estado de S. Paulo, o título é: “Em Xambioá, a luta é contra guerrilheiros e atraso”, o
Jornal da Tarde trouxe o título “A luta na selva, contra terroristas e doenças”, seguido
da seguinte abertura: “Cinco mil homens do Exército, Marinha e Aeronáutica estão
combatendo terroristas nas matas da margem esquerda do rio Araguaia, em Goiás. Na
cidade de Xambioá, nessa região, o Exército está iniciando a operação ACISO”.
O texto jornalístico, ainda que não atinja plena imparcialidade, sempre busca ser
objetivo, porque isso daria credibilidade a ele em relação ao leitor. Porém, “a ordenação
das informações obedece a uma seleção arbitrária e o relato submete-se ao sujeito da
narrativa” (ABREU, 2000, p. 141). Assim, há vários níveis de intervenção no texto.
A matéria de O Estado de S. Paulo traz a guerrilha logo no título. A abertura da
matéria fala sobre a operação Ação Cívico e Social (Aciso), que buscava conquistar o
apoio da população urbana da região contra a influência dos guerrilheiros, e outras
ações do Exército contra o movimento. Porém, nos dois primeiros parágrafos da
matéria, só se encontram informações sobre a operação Aciso e a criação de um
Batalhão de Infantaria da Selva. Embora com outro título, o Jornal da Tarde traz
informações semelhantes, com a valorização da operação Aciso. A partir daí, os textos
dos dois jornais seguem praticamente iguais. As diferenças são que o JT traz menos
subdivisões no texto e utiliza os termos “terrorismo” e “terrorista” em substituição a
“guerrilha” e “guerrilheiro”, mais usados na matéria do Estadão. É com ela que vamos
trabalhar a partir de agora.
Na retranca O Município, o primeiro parágrafo fala de guerra sem explicar que
conflito era esse nem suas razões. O segundo parágrafo descreve a política da cidade,
com detalhes sobre o prefeito de Xambioá, um dos principais municípios da região. Em
Militares e Políticos, o repórter exalta os benefícios que os militares trouxeram, como a
abertura de estradas, o que, segundo ele, proporcionava desenvolvimento para a região.
É possível notar que o fornecimento desse tipo de benefício era um meio para facilitar o
combate à guerrilha.
A imprensa da época usava os termos “guerrilheiro” e “terrorista” como sinônimos.
Embora os significados se misturem, “a identidade ‘terrorista’ está impregnada da idéia
de transgressão e ameaça não apenas ao Estado, mas à própria sociedade” (ABREU,
2000, p. 161). A matéria do Estadão e do JT tentou esclarecer o leitor sobre essas
diferenças:
A guerrilha já deixou mortos e feridos entre os militares, mas a
expressão “guerrilheiros” não é empregada. Os militares usam o
termo “terroristas”, afastando, dessa forma, qualquer conotação
aventureira ou romantica [sic], que a palavra guerrilheiro possa
implicar (O ESTADO DE S. PAULO, 24 set. 1972).
Mesmo com essa ressalva, o próprio repórter utiliza os dois termos
indiscriminadamente ao longo da matéria, o que talvez não se devesse a uma tomada de
posição ideológica do jornal, mas apenas a descuido e a uma tentativa de não repetir
palavras. Mas a escolha dos termos utilizados é de grande relevância.
Figuras como “negro”, “comunista”, “puta” têm um conteúdo cheio
de preconceitos, aversões e hostilidades, ao passo que outras como
“branco”, “esposa” estão impregnadas de sentimentos positivos.
Não devemos esquecer que os estereótipos só estão na linguagem
porque representam a condensação de uma prática social (FIORIN,
1993, p. 55).
Nos dois jornais, a matéria sobre o Araguaia é a de maior destaque da página: seu
título se encontra em local de visão privilegiada e é destacado por um tipo de fonte
diferente daquele utilizado no corpo do texto e do que é usado no título da outra
matéria. Não há classificação do conteúdo da reportagem, se política ou policial. Em O
Estado de S. Paulo, informa-se apenas que se trata de trabalho de um enviado especial.
Taís Morais e Emano Silva afirmam que o autor da matéria publicada no Estadão foi
Henrique Gonzaga Júnior. Mas o jornalista Fernando Portela, que ainda trabalha no
Jornal da Tarde e, na época, era editor de reportagens, diz não lembrar quem foi o autor
das matérias, mas acredita que tenha sido o correspondente em Belém. Segundo ele, o
texto não especifica que os acontecimentos no Araguaia constituíam uma guerrilha,
definindo-os apenas como um “movimento estranho”, e o jornal não sofreu nenhum tipo
de retaliação2.
5. Documento histórico
As duas matérias sobre a Guerrilha do Araguaia resultaram “do esforço das
sociedades históricas para impor ao futuro – voluntária ou involuntariamente –
determinada imagem de si próprias” (LE GOFF, 1996, p. 548), por isso, segundo esse
conceito, podem ser consideradas documentos históricos. Embora Le Goff não se refira
a textos jornalísticos, e seu trabalho seja mais voltado para a história medieval, suas
considerações sobre documento e monumento históricos são interessantes para esta
pesquisa.
Paul Zumthor defende uma distinção entre monumento e documento. O primeiro
responde a uma intenção de edificação, “no duplo significado de elevação moral e de
construção de um edifício”. De acordo com Zumthor, o segundo responde apenas às
necessidades da intercomunicação corrente. Para ele, “o escrito, o texto, é mais
freqüentemente monumento do que documento”. O que distingue um tipo de texto do
outro é “esta elevação, esta verticalidade” que a gramática confere a um documento e,
2 Fernando Portela em entrevista à autora, por correio eletrônico, em mensagem recebida em 19 de novembro de 2004.
assim, ele é transformado em monumento (ZUMTHOR apud LE GOFF, 1996, p. 544-
545).
Transportando essas reflexões para esta pesquisa, as matérias jornalísticas sobre a
guerrilha também seriam documentos, pois constituem escritos deixados pela sociedade
da época sobre esse assunto. O valor documental se torna maior por haver poucos
registros sobre o tema – na história oficial, a guerrilha praticamente não existiu.
Esses documentos são todos verdadeiros, por serem legados da sociedade da época,
e falsos, por terem sido construídos para simbolizar tal sociedade na posteridade,
mesmo que involuntariamente. Entretanto, a história se faz mesmo sem documentos
escritos, porque ela é feita “com tudo o que, pertencendo ao homem, depende do
homem, serve o homem, exprime o homem, demonstra a presença, a atividade, os
gostos e as maneiras de ser do homem” (LE GOFF, 1994, p. 540).
6. Memória, oralidade e escrita
A memória coletiva, definida por Pierre Nora como “o que fica do passado no
vivido dos grupos ou o que os grupos fazem do passado” (NORA apud LE GOFF, 1996,
p. 472), pode ser considerada um dos fatores de coesão das comunidades. Já Le Goff
utiliza o termo “memória coletiva” somente para as sociedades sem escrita, mas aqui a
expressão se refere a todo tipo de sociedade, inclusive a atual. O próprio Le Goff afirma
que “a verdade é que a cultura dos homens sem escrita é diferente, mas não
absolutamente diversa” (LE GOFF, 1996, p. 428).
A idéia de memória é um dos fatores que mantêm comunidades, podendo ser
exemplificada com a memória nacional. A memória também é importante para a
identidade de classe, de etnias e de “minorias”, sendo fundamental em lutas contra a
opressão e a dominação. “Valorizada, então, quer por sua participação na construção da
identidade da comunidade, quer pelo papel que desempenha no fortalecimento e
emancipação dos fracos, ela não pode nem deveria ser esquecida” (LOVISOLO, 1989,
p. 16).
Apesar disso, o Ocidente não formou profissionais da memória, que deveriam
repassar as tradições para as gerações futuras. Nos séculos XIV e XV, a “arte da
memória” era ensinada e valorizada nas escolas. Mesmo entre conhecedores da escrita,
“a concepção da memória que transmitem implica a idéia de uma presença real dos
corpos: um laço, em particular, entre a memória e a vista, fundado sobre a função da
imagem e de suas relações com a palavra” (ZUMTHOR, 1993, p. 141).
Nas sociedades sem escrita, segundo Paul Zumthor, a poesia tem a função primária
de conferir coesão e estabilidade ao grupo. “Por isso, os modos de difusão oral
conservarão um status privilegiado, para além das grandes rupturas dos séculos XVI e
XVII. A voz poética é, ao mesmo tempo, profecia e memória” (ZUMTHOR, 1993, p.
139). No entanto, ele afirma que, com seu surgimento, a escrita se integra a outras
tradições.
O impresso, ligado ao desenvolvimento urbano, provoca significativas mudanças
para a memória coletiva. As alternativas que o homem “poderia ter estiveram limitadas
por sua experiência imediata do passado, em sua comunidade, e pelo que lhe foi
transmitido oralmente por seus antepassados” (LERNER apud MEDINA, 1978, p. 19-
20) até o surgimento da escrita e a circulação dos primeiros impressos.
Com o impresso não só o leitor é colocado em presença de uma
memória coletiva enorme, cuja matéria não é mais capaz de
fixar integralmente, mas é freqüentemente colocado em
situação de explorar textos novos. Assiste-se então à
exteriorização progressiva da memória individual; é do exterior
que se faz o trabalho de orientação que está escrito no escrito
(LEROI-GOURHAN apud LE GOFF, 1996, p. 457).
Logo após o surgimento da escrita, ela era utilizada mais seletivamente para aquilo
que não se podia memorizar completamente, como o calendário. Numa espécie de
esboço de escrita, eram feitas inscrições em materiais resistentes como pedra, metal,
argila e cera. Robert reflete sobre a função da epigrafia na Grécia e Roma antigas, onde
foram construídos verdadeiros monumentos para a perpetuação da memória,
constituindo aquela que se poderia chamar de “civilização da epigrafia”. As inscrições
estavam em todos os locais públicos – templos, cemitérios, avenidas – forçando a
comemoração e perpetuação da lembrança. A pedra e o mármore eram o suporte da
memória. “Os ‘arquivos de pedra’ acrescentavam à função de arquivos propriamente
ditos um caráter de publicidade insistente, apostando na sustentação e na durabilidade
dessa memória lapidar e marmórea” (ROBERT apud LE GOFF, 1996, p. 432).
A partir dessa idéia, a memória pode ser entendida como “propriedade de conservar
certas informações” através de “um conjunto de funções psíquicas, graças às quais o
homem pode atualizar impressões ou informações passadas”. Ela não se desvincula da
intenção de se perpetuar determinada imagem para as gerações futuras (LE GOFF,
1996, p. 423). Tanto através da construção de monumentos quanto por meio de
discursos encampados em entrevistas a pesquisadores, existe o propósito de transmitir
aquilo que interessa. Por isso, no sentido desenvolvido por Le Goff, a memória funciona
também como monumento.
As idéias desenvolvidas por Iúri Lotman, da Escola Semiótica de Tartu Moscou,
deram grande contribuição para os estudos da memória, aproximando cultura, história e
comunicação. Ele analisa a cultura como memória não-hereditária de uma comunidade.
Por isso, segundo Lotman, a história intelectual da humanidade é uma luta pela
memória, situando a origem da história e do mito como forma de memória coletiva. De
acordo com ele, cultura é memória, porque ambas constituem uma espécie de
“bagagem”, o conjunto de referências a que nos remetemos. Compartilhar algum grau
de memória é essencial para que as pessoas se comuniquem. Um exemplo dessa idéia é
que hoje Hamlet não é somente uma peça de Shakespeare. É a memória de todas suas
interpretações anteriores e de todos os eventos históricos que ocorreram fora do texto,
mas que a peça pode evocar.
7. Memória hegemônica e memórias subterrâneas
A memória nacional (histórica e coletiva) costuma ser valorizada, e sua perda,
através, por exemplo, da colonização de um determinado país, é considerada negativa.
As funções positivas da memória coletiva, enfatizadas por autores como Maurice
Halbwachs, compõem um pensamento segundo o qual ela é dotada de força, duração e
estabilidade. Para Halbwachs, a memória coletiva é “uma corrente de pensamento
contínuo que nada tem de artificial, já que retém do passado somente aquilo que ainda
está vivo ou capaz de viver na consciência do grupo que a mantém” (HALBWACHS,
1990, p. 81-82).
Já Michael Pollak insere a questão da dominação e da violência simbólica no
conceito de memória coletiva. São muitas as memórias coletivas dentro de uma
sociedade, e todas coexistem pacificamente, integrando-se sem dificuldades à memória
nacional – dominante e hegemônica. Mas nem todas as memórias coletivas se
enquadram nessa situação. As memórias de perseguidos políticos – e suas redes
familiares e de amizade, por exemplo – costumam constituir memórias subterrâneas.
Em desacordo com a memória nacional, os grupos portadores de memórias
subterrâneas, em geral, silenciam até que mude o contexto político-social que os impede
de manter uma posição diferente da memória hegemônica e enquadrante.
Segundo Pollak, o problema de toda memória hegemônica é a sua legitimação, já
que ela não sobreviveria se fosse simplesmente imposta à força. Os militares
justificaram o enquadramento da memória propagando as idéias de progresso
econômico e de que o Brasil precisava temer e barrar a “ameaça comunista”. Tiveram
papel essencial nesse trabalho as campanhas da Assessoria Especial de Relações
Públicas (Aerp).
Por outro lado, as memórias subterrâneas têm como empecilho o silêncio que é
imposto a elas e precisam manter vivas as lembranças até que o contexto sociopolítico
permita que aflorem. Então, essa memória proibida e clandestina ocupa a cena cultural,
comprovando, algumas vezes, o abismo que separa a sociedade civil e a ideologia do
grupo que pretende alcançar dominação hegemônica. Nesse momento, surgem as
reivindicações das “minorias” que detêm as memórias subterrâneas.
No caso das famílias dos desaparecidos na Guerrilha do Araguaia e de outros
perseguidos políticos durante o regime de 1964, o período de silêncio não se prolongou
muito. Cedo, as famílias começaram a se organizar para denunciar o que lhes era
narrado pelos parentes detidos e presos e a mobilizar outros setores da sociedade civil.
Esse movimento foi reforçado quando os sobreviventes de cárceres e sessões de tortura
voltaram para suas casas: eles tornaram público o que acontecera com aqueles que não
puderam retornar. As denúncias de crimes cometidos pelo regime ditatorial começaram
a ser feitas desde o golpe, principalmente a partir de organizações formadas por
familiares de presos e de desaparecidos políticos, que o governo não tardou a reprimir.
Em 1969, a União Brasileira de Mães foi cassada. No ano seguinte, contudo,
formaram-se entidades como o Movimento Feminino Pela Anistia e Liberdades
Políticas e os Comitês Brasileiros pela Anistia, que se iniciaram no Rio de Janeiro e em
São Paulo, espalhando-se depois para outros Estados brasileiros. Eram expressões de
uma reivindicação que tomou as ruas principalmente em 1978 – pela anistia ampla,
geral e irrestrita dos presos e exilados políticos. Como reflexo da pressão desses grupos,
nesse ano, Geisel aboliu o AI-5 e restituiu o habeas-corpus. Contudo, ele avançou nas
reformas que aumentavam o poder do Executivo, como o de ratificar medidas de
emergência e de decretar estado de sítio sem a legitimação do Congresso.
A busca das famílias por seus parentes desaparecidos, apesar de ter começado logo
que se instalou o regime ditatorial no Brasil, não fazia parte da cultura hegemônica na
época. Esse silêncio era resultado de uma política que impedia determinadas questões,
relativas a setores sociais perseguidos pela ditadura, de aflorar para outras camadas que
ficaram inebriadas com o “milagre econômico” e com o sucesso da seleção brasileira de
futebol.
Apesar de, durante a ditadura militar brasileira, questões como perseguição, prisão e
tortura por motivos políticos terem feito parte somente da cultura de pessoas cerceadas
pelo regime, elas atualmente constituem a memória nacional. Quando se iniciava a
“abertura”, ainda nos anos de chumbo, no fim da década de 1970 e início da década
seguinte, a maior parte da população começou a tomar conhecimento do lado obscuro
do governo militar. Depois, a mídia eletrônica, embora beneficiada com concessões de
funcionamento autorizadas pelos militares, aproveitou-se do interesse despertado sobre
o tema, veiculando-o na televisão através de novelas e seriados3.
8. Considerações finais
A Guerrilha do Araguaia, que teve reduzida cobertura da imprensa, aconteceu numa
região até hoje pouco presente no cenário nacional. Isso só mudou de forma mais
acentuada a partir do ano 2000, quando procuradores da República foram ao Araguaia
para colher informações junto a moradores, a partir de solicitação da Comissão de
Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos. O episódio suscitou o debate sobre a
abertura de arquivos militares, um tema que permanece presente na imprensa. Devido
ao silenciamento imposto pela ditadura, a Guerrilha do Araguaia continua sendo um
acontecimento obscuro na história nacional. Com a coerção provocada pelo regime, o
3 Um exemplo é a minissérie “Anos Rebeldes”, que estreou na Rede Globo em 1992.
não-dito constituía o que não era exteriorizado, mas subsistia num discurso interior. Por
isso, as memórias da guerrilha ainda são subterrâneas; sobreviveram à memória da
sociedade englobante4 através de redes afetivas e políticas.
9. Referências bibliográficas
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jornalística da luta armada no Brasil: (1965-1979). Niterói: EdUFF; Rio de Janeiro:
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4 Termo usado por Michael Pollak para se referir às pessoas que formam a sociedade e compartilham a memória “oficial e dominante” (Cf. Bibliografia).
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vai atacar. Jornal da Tarde, 12 de agosto de 1969.
ZUMTHOR, Paul. A letra e a voz. São Paulo: Cia das Letras, 1993.
Agradecemos a Deus, aos nossos pais, aos
professores, e a todos que de alguma forma
contribuíram para o sucesso desse trabalho.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO................................................................................................6
2 CONJUNTURA HISTÓRICA (1945 – 1964)...................................................7
2.1 Internacional...............................................................................................7
2.2 Brasil...........................................................................................................8
2.3 Maranhão....................................................................................................9
Dedicamos a todos aqueles que acreditam na
função social dos veículos de comunicação que
apesar do caráter mercadológico deve, antes de
tudo, suprir a necessidade básica da população: o
direito a informação.
3 SOBRE JOSÉ GUIMARÃES NEIVA MOREIRA..........................................12
4 JORNAL DO POVO......................................................................................15
5 AMPLIANDO HORIZONTES: a causa continua..........................................17
6 CONCLUSÃO...............................................................................................20
REFERENCIAS..................................................................................22
ANEXOS.............................................................................................24
NEIVA MOREIRA E A IMPRENSA MARANHENSE: O JORNAL DO POVO *
Amanda Dutra Ramos**Ana Lívia Leitão Monteiro
Daniela Marques dos AnjosSuelaine Soraia Cantanhede Pereira
RESUMO
Reconstitui a história do Jornal do Povo que foi um dos diários mais influentes no
cenário maranhense de 1950 a 1964. Resgata-se a produção jornalística e política de Neiva
Moreira e a fundação desse periódico financiado inicialmente pelo líder nacional do Partido
Social Progressista (PSP), Adhemar de Barros. Situa-se o jornal na conjuntura sócio-política da
época a partir das disputas travadas entre as oposições coligadas e o vitorinismo até o período
em que foi fechado pela ditadura militar.
Palavras-chave: Jornal do Povo. Imprensa Maranhense. Mídia e política
1 INTRODUÇÃO
Neste artigo científico abordaremos a trajetória do jornalista e político Neiva Moreira e
sua importância na imprensa maranhense, a frente do periódico conscientizador: Jornal do
Povo. Dentro de um contexto de Guerras, redemocratização e clientelismo político. No afã de
resgatar e mostrar a um público maior sua relevância nos fatos ocorridos entre 1945 a 1964.
Período de destaque que poderia ser considerado, assim como, no século XIX – A ERA DAS
REVOLUÇÔES – que segundo o historiador Eric J. E. Hobsbawm, foi marcado
_________________
*Artigo apresentado às disciplinas de História da Comunicação e Métodos e Técnicas de Pesquisas Bibliográficas.
** Alunas do 1° período do curso de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão.pelo fim das monarquias absolutistas como ocorreu na Revolução Francesa (final do século
XVIII e início do século XIX); crescimento da classe proletariada e a ascensão histórica da
burguesia que apoderou-se do poder político e engendrou condições para o desenvolvimento
do capitalismo.
Contudo, o número alarmante de mortos com as Guerras, as ditaduras na América
Latina, a causa do mundo islâmico e as mudanças e contradições do desenvolvimento do
mercado mundial imposto pela economia capitalista transformou o século XX em A ERA DOS
EXTREMOS, como afirma Hobsbawm. No panorama internacional vimos findar o trâmite de um
líder nazista em transformar a humanidade numa raça ariana, e os veículos de comunicação
crescerem de acordo com a hegemonia do capitalismo reinante.
No Brasil, após oito anos de regime ditatorial assistimos perplexos a deposição de
Getúlio Vargas que optou por sair da vida para entrar na história. Em meio a Guerras e suicídio,
no Maranhão, a consciência das massas entrava em choque com a estrutura política vitorinista
da sociedade. Através de um líder populista-progressista e do seu matutino que denunciava e
mostrava ao povo as raízes de sua miséria e descaso que perduravam por anos, a população
ganhava força e esclarecimento, tornando-se politicamente ativa.
2 CONJUNTURA HISTÓRICA (1945 – 1964)
No período que o Jornal do Povo circulou na imprensa maranhense (1950 – 1964), o
mundo vivia sob a influência do Pós-guerra. Nacionalmente, com a queda do Estado Novo, em
1945, o Brasil tinha iniciado sua redemocratização que perdurou até 1964 com o Golpe Militar.
No Maranhão o quadro político e social era marcado pelas disputas político-partidárias e
tensões sociais.
2.1 Internacional
Dentro do panorama internacional, o século XX foi marcado por duas grandes guerras: a
Primeira Guerra Mundial (1914 – 1918) e a Segunda Guerra Mundial (1939 – 1945). Com
término desta, o mundo caracterizou-se pelo fortalecimento do socialismo e pela hegemonia
dos Estados Unidos nos países capitalistas.
A partir do Pós-guerra, houve a bipolarização mundial entre o bloco capitalista e o socialista
e iniciou-se a Guerra Fria, que consistia numa “luta ideológica entre os Estados Unidos e a
União Soviética pela manutenção e expansão de suas áreas de influência” (CACERES, 1996,
p.411).
2.2 Brasil
Com a entrada do Brasil na Segunda Guerra Mundial ao lado das democracias lideradas
pelos Estados Unidos, houve as primeiras manifestações contra o regime ditatorial,
corporificado no Estado Novo. Em 1945, com a derrubada de Getúlio Vargas do poder, o país
entrou num processo de redemocratização. No ano seguinte, seguindo a lógica da maioria dos
países da América Latina, o Brasil iniciou o seu período populista que se estendeu até 1964
com o Golpe Militar.
Nesse período, o primeiro presidente eleito foi Eurico Gaspar Dutra, do PSD (Partido Social
Democrático). Seu governo foi marcado pela repressão aos comunistas, no qual o Partido
Comunista foi extinto devido à ameaça de sua representatividade na Assembléia Constituinte e
o início da Guerra Fria. Nesta o Brasil apoiou os Estados Unidos e rompeu relações
diplomáticas com a URSS. Ainda nesse governo, a primeira emissora de televisão da América
Latina foi inaugurada em São Paulo, por Assis Chateaubriand (PSD) que posteriormente se
elegeu senador pelo Maranhão, pois não conseguiu se reeleger pelo seu estado natal, Paraíba.
Após o populismo refreado de Dutra, os partidos que tinham referências populistas
se fortaleceram, como o PTB (Partido Trabalhista Brasileiro), liderado por Getúlio
Vargas, e o PSP (Partido Social Progressista), que tinha como líder o maior
representante populista de São Paulo, Adhemar de Barros. Em 1951, Getúlio voltou ao
Poder Executivo com o apoio de Adhemar de Barros, permanecendo até 1954, quando
sob a ameaça de deposição, se suicidou e Café Filho, o vice-presidente, assumiu o
cargo.No ano seguinte, outro candidato populista, Juscelino Kubitschek, foi eleito presidente e
iniciou um governo marcado pela industrialização e crescimento econômico financiado pelo
capital estrangeiro, que trouxe sérios problemas sociais e econômicos, como as grandes
disparidades regionais e constantes êxodos para as cidades industrializadas.
Nas eleições de 1960, Jânio Quadros, inicialmente candidato pelo Partido Democrata
Cristão e depois pela UDN (União Democrática Nacional), ganhou as eleições e adotou uma
política antiinflacionária ortodoxa e uma política externa independente, que foi seguida por João
Goulart até 1964. Essa postura do presidente chegou a reatar as relações diplomáticas com os
países socialistas, levando a UDN a romper com ele. A denúncia de que ele pretendia dar um
golpe, o levou a renúncia.
Essa vacância no Poder gerou impasses sobre a legalidade da sucessão à presidência e
deixou o país à beira do caos e de uma guerra civil. A solução encontrada pelo Congresso foi
adoção do Parlamentarismo, que em tese significa que o poder Executivo é chefiado pelo
primeiro-ministro. Assim, João Goulart assume a presidência, em 1961, num efêmero sistema
parlamentarista e através de um plebiscito volta-se ao Presidencialismo em 1963. No entanto, o
regime democrático estava em risco, o país era ameaçado pelas tensões sociais, crises política
e econômica e pelo conflito entre a esquerda e a direita radicais. E na madrugada de primeiro
de abril de 1964, João Goulart foi derrubado: começa o Golpe Militar.
2.3 Maranhão
Após a redemocratização do Brasil, no sistema politíco-partidário maranhense o ex-
interventor, Paulo Ramos (1937 – 1945), teve sua participação reduzida e o pernambucano,
Victorino Freire, ascendeu na chefia política estadual.
Victorino entrou na política maranhense em 1933, quando foi nomeado secretário no
governo de Martins Almeida, com a incumbência de organizar o PSD para as eleições da
Câmara Federal e da Constituinte Estadual em 1934. Não tendo êxito na eleição de um
candidato pessedista e enfrentando a hostilidade de Paulo Ramos, ele regressou ao Rio de
Janeiro.
Com a deposição de Vargas, Victorino Freire retornou ao Maranhão como articulador da
campanha de Eurico Gaspar Dutra à Presidência da República e (re)organizador do PSD
maranhense. Em 1945, com a eleição de dois senadores e seis deputados federais
pessedistas, além da influência na indicação do novo interventor, Saturnino Bello, ele iniciou
sua ascendência na política maranhense, como afirma Wagner Cabral (2004, p.266), “estava
dado um passo decisivo na trajetória ascendente da ‘raposa’ ao comando político estadual,
com a posterior formação de sua corrente política, o vitorinismo, inaugurando o período da
Ocupação do Maranhão”.
No entanto, a hegemonia vitorinista foi contestada tanto pela oposição como pelas
dissidências dessa corrente. No quadro partidário, a oposição se reuniu numa frente chamada
de Oposições Coligadas (ver anexo 1). Segundo Neiva Moreira, esta coligação não era de
esquerda, mas “representava um passo à frente no quadro político e social do estado,
dominado então pelas oligarquias rurais” (MOREIRA, 1989, p.45).
Em destaque na frente oposicionista, o PSP/MA, com o apoio de Adhemar de Barros
(candidato à Presidência da República), foi o segundo maior partido do Estado e o único a
desenvolver formas de populismo através do deputado federal Neiva Moreira. Apesar de nunca
ter conseguido derrotar o vitorinismo nas eleições, as Oposições Coligadas elegeram vários
parlamentares e aglutinaram os diversos segmentos sociais.
As campanhas eleitorais de 1950 foram bastante agitadas e provocaram o interesse da
população. Em agosto deste ano, Adhemar de Barros, em campanha a favor de Getúlio
Vargas, veio à São Luís (ver anexo 2). As atividades programadas para recepcioná-lo foram
sabotadas pelos governistas e o comício que estava marcado para ser na Praça João Lisboa
foi transferido, na última hora, para a Praça Deodoro, com objetivo de esvaziar a manifestação.
As sabotagens não pararam por aí, quando Adhemar iniciou o seu discurso, a energia elétrica
foi cortada. Após o comício, uma passeata direcionou-se à Praça João Lisboa, onde a
população partiu para o confronto com a polícia e o operário João Evangelista de Sousa foi
morto.
Desse modo, as eleições de 1950 se realizaram sob acusações de fraudes eleitorais e
Eugênio Barros (ligado ao vitorinismo) venceu Saturnino Bello, candidato das oposições,
iniciando uma prolongada disputa jurídica no TRE. Para agravar a situação, o candidato das
oposições sofreu um ataque cardíaco e o TRE estadual ante o problema inédito decidiu que
não seriam realizadas eleições suplementares. Logo, Eugênio Barros foi diplomado governador
do Maranhão com o atestado de óbito de Saturnino Bello. Este foi o estopim do movimento
político, articulado pelas oposições, conhecido como Greve de 1951, que se deu em dois
momentos: fevereiro/março e setembro/outubro (ver anexo 3), chegando a reunir de três a
quatro mil pessoas por dia em praça pública.
O povo instigado pelos líderes oposicionistas foi às ruas e acampou na chamada praça
João Lisboa (ver anexos 4 e 5). Essa mobilização e agitação popular levaram a capital
maranhense a ser acunhada de Ilha Rebelde. Segundo a análise de Negrão de Lima, o “caso
maranhense” não era apenas uma crise política, mas também social. A crise - apesar de
provinciana - teve destaque na mídia nacional e internacional.
A Greve de 1951, embora não tenha atingido êxito na deposição de Eugênio Barros,
sedimentou os sentimentos da oposição de combate à corrupção e à fraude eleitoral, que
preconizava a libertação do Maranhão das rédeas da oligarquia vitorinista.
Nesse quadro político, surgiu o nome de José Sarney na esfera pública, passando de
assessor do governo de Barros a candidato a deputado federal através do “apadrinhamento” de
políticos fortes, pois “foi uma flor de estufa, plantada e cultivada no Palácio dos Leões: apenas
a criatura (Sarney) engoliu o criador (Vitorino)” (COSTA, 2004, p.285).
Até a década de 1960, a carreira política de Sarney foi marcada pelos seus “saltos” entre o
governo e a oposição. Inicialmente, candidatou-se pelo grupo vitorinista. Depois, em 1955, ele
passou para o grupo dos dissidentes do PSD que entraram na UDN. Em 1958, ele foi eleito a
deputado federal pelas Oposições Coligadas. Em 1960, a UDN saiu das oposições e apoiou a
candidatura de Newton Bello (governador de 1961 a 1965). Além disso, a UDN amparou a
candidatura de Jânio Quadros, o que possibilitou uma a transformação nas relações estaduais
com o governo federal, pois “no lugar de Victorino brilhava com intensa luminosidade em
Brasília a estrela do deputado José Sarney” (BUZAR, 1998, p.409).
Com a implantação do parlamentarismo no Brasil, as ligações entre o PSD/UDN foram se
deteriorando no Maranhão e , em 1962, esta aliança se rompeu. Assim, a UDN voltou as
Oposições Coligadas e elegeu Sarney como o segundo deputado federal mais votado do
estado. Outro nome que atingiu projeção nacional foi o deputado federal Neiva Moreira (PSP),
que transformou-se o alvo principal da campanha anticomunista maranhense.
No entanto, o quadro político modificou-se com o Golpe Militar de 1964. A política
maranhense foi marcada pela forte repressão aos nacionalistas e reformistas e o Golpe
provocou o acirramento às disputas internas do PSD, que opôs o governador Newton Bello e o
senador Victorino Freire, acentuando a crise vitorinista.
Além disso, com o Golpe, a candidatura de José Sarney pela Frente de Libertação do
Maranhão (formada pela UDN, PR E PSP) foi apoiada pelo governo do general Castelo Branco,
modificando os grupos de poder no Maranhão, como analisa Wagner Cabral:
Passados quase quinze anos da Greve de 1951, a bandeira da
‘moralização dos costumes políticos’ foi empunhada pela ditadura, que,
‘do alto’, determinou a mudança das regras do jogo, reestruturando o
sistema de dominação e provocando a alternância de grupos no poder
(CABRAL, 2001, p.?).
Desse modo, somente quinze anos após a greve que mobilizou mais três mil pessoas
nas praças públicas de São Luís, num período marcado pela repressão, o vitorinismo ruiu com
a reestruturação e, não com o rompimento, do sistema oligárquico e de dominação.
3 SOBRE JOSÉ GUIMARÃES NEIVA MOREIRA
10 de outubro de 1917. Em Nova Yorque do Maranhão nasce José de Guimarães
Neiva Moreira. Sendo o mais velho de seis irmãos. Filho de um quitandeiro: Antonio Neiva
Moreira; com uma professora, Luzia Guimarães Moreira. Sua família tinha dois ramos: uma
grande parte pobre; a outra (ínfima parte) de abastados que com muito esforço conseguiu
terras e gados. José Guimarães Neiva Moreira- ou simplesmente Moreirinha- era do ramo
pobre, e foi ainda na infância que tornou-se conhecedor de uma realidade de mazelas e
descasos que permeava dois cenários próximos: Piauí e Maranhão.
Dona Luzia –carinhosamente- chamada de Mariinha, foi contratada pelo Governo do
Maranhão, juntamente com outras professoras para implantar o ensino primário no sertão,
durante a seca de 1915. Seu filho primogênito a caracterizava pela sua agitação intelectual
e sempre a considerava uma militante progressista. Tendo-a como exemplo, Neiva Moreira
transformou-se desde cedo em um não-conformista. Seu pai, Antônio, morreu cedo aos 30
anos. Antes da morte de seu pai, Neiva Moreira e sua família haviam se mudado para Barão
de Grajaú cidade pequena próxima do município piauiense de Floriano. Com a morte
precoce de seu marido, dona Mariinha passou a receber ajuda do cunhado, Cícero Neiva
Moreira. Três grandes influências de sua vida eram: primeira, a sua mãe, com quem ele
aprendeu francês e jornalismo, dando início a sua carreira em um jornal produzido por ela, A
Liberdade, que não agradava a todos; segunda, o agreste, Neiva Moreira vivia em um
“ambiente de confrontação de clãs familiares e conflitos comunitários” (MOREIRA, 1986,
p.19) época em que cada um fazia sua lei e se defendia como melhor aprouvesse; por fim, o
Rio Parnaíba, por sua vez, foi palco de memoráveis eventos um dos mais marcantes foi o
grande embate entre a Coluna Prestes e o Exército:
O comando da expedição, com mais de 5mil soldados, estava a
cargo de um oficial piauiense que depois tornou-se político: o coronel
Jacob Gaioso e Almendra.[...] Depois dessa vitória, a fama da
Coluna cresceu. Os revolucionários viraram mito e passaram a
alimentar a temática do cotidiano e o cancioneiro popular.
(MOREIRA, 1986, p.27)
A fase seguinte de seu aprendizado foi quando se matriculou no LICEU de Teresina.
Nessa escola Neiva Moreira fez todo o curso secundário até o quarto ano, tendo feito amigos
como o Abdias Silva, o Carlos Castelo Branco e outros que o acompanhariam por toda sua
história. Carlos presenteou Neiva Moreira com um dos livros mais importantes que ganhara em
sua vida: o ABC do Comunismo. Sua estréia na nova escola não poderia ser mais triunfal. No
primeiro dia convidaram-no a participar de uma greve. Neiva Moreira juntou-se aos grevistas e
acabou sendo suspenso durante 15 dias. Porém na mesma semana recebeu sua primeira
anistia, pois havia morrido o patriarca da família Ferraz, homem de grande influência na região.
Ainda em Floriano, Neiva Moreira e alguns amigos lançaram seu primeiro jornal: A
Luz, jornal estudantil que publicavam desde intrigas pessoais a crônicas sociais. Quando foi
para Teresina participou, com seu amigo Carlos Castelo Branco, da fundação de outro jornal -
A Mocidade- também de curta duração. Foi em São Luis que Neiva Moreira, por intermédio de
seu tio Cícero, teve sua primeira oportunidade em um jornal da Capital: O Globo - Pacotilha,
um dos mais tradicionais do Maranhão na época. Periódico que estava ligado ao situacionismo
do Estado.
Neiva Moreira, agora, dividia seu tempo entre a redação do jornal e os estudos no
Liceu Maranhense. Sem com isso deixar a militância, pois o próprio Neiva Moreira no Liceu,
encabeçava uma chapa que reunia católicos de direita, agitadores, anarquistas e radicais de
esquerda sem filiação ideológica, segundo ele. Da política estudantil à política partidária. Neiva
Moreira assumia uma postura que ele denominava de “esquerda da direita”. Nesse período
participou de vários jornais, militou na Associação Maranhense de Imprensa (AMI), serviu ao
Exército e casou-se com uma professora do Colégio Santa Teresa.
Não demorou muito para o jornalista maranhense ir trabalhar no Rio de Janeiro como
“free lancer” no Diário de Noticias. Mais tarde iria para os Diários Associados que tinha como
diretor Leão Gondin. Segundo Neiva Moreira, o Diário da Noite foi a sua grande escola de
jornalismo.
Não demorou muito para o jornalista maranhense ir trabalhar no Rio de Janeiro como
“free lancer” no Diário de Noticias. Mais tarde iria para os Diários Associados que tinha como
diretor Leão Gondin. Segundo Neiva Moreira, o Diário da Noite foi a sua grande escola de
jornalismo. Neste pouco tempo que Neiva ficou no Rio de Janeiro conseguiu projetar-se
profissionalmente, sobretudo, quando passou a integrar à equipe da revista O Cruzeiro - de
maior circulação nacional nos anos cinqüenta.
Com a redemocratização do Brasil, Neiva é convidado pelo médico Clodomir Millet
para encabeçar a equipe redacional de um veículo de comunicação, que daria sustentabilidade
política ao PSP maranhense: o Jornal do Povo.
4 JORNAL DO POVO
Fundado em 29 de abril de 1949 pelo médico Clodomir Millet (ver anexo 10), o Jornal
do Povo foi o veículo que surgiu com o objetivo de dar sustentação política ao Partido Social
Progressista, criado pelo governador de São Paulo, Adhemar de Barros (PSP) o qual financiou
a implantação do jornal.
O Jornal do Povo era um veículo que sempre procurou exercer uma influência
conscientizadora progressista em quase todos os aspectos e que foi também um “reformador
da imprensa no Maranhão” uma vez que substituiu aquele analítico jornalismo literário ou de
fuxico doméstico, e valorizou a reportagem e a denúncia (MOREIRA, 1989, p. 107).
Funcionando em sua primeira fase na rua da Paz, logo na sua primeira edição, o
jornal apresenta uma matéria intitulada “Geração da Lama”, que contava a história dos meninos
que viviam nos alagados do bairro do Lira. Essa matéria, escrita por Neiva Moreira em parceria
com Reginaldo Telles, também uma referência do jornalismo do Maranhão, emocionou São
Luís. Até hoje, quem a lê fica chocado com a realidade cruel daqueles garotos. Essa tônica de
denúncias norteava a maioria das matérias que o Jornal do Povo apresentava em suas edições
até o seu fechamento pelo regime militar.
O Jornal do Povo tornou-se um referencial para toda a população de São Luís.
Segundo Neiva, quando uma greve estava sendo articulada, os operários aglomeravam-se
diante da fábrica, esperando o jornal chegar com as últimas notícias sobre o movimento. Como
saía quase sempre atrasado (por volta das 8 ou 9 horas da manhã), César Aboud, industrial do
ramo de tecidos e presidente da Associação Comercial do Maranhão, apelava: “Neiva, vê se
solta a porcaria do jornal mais cedo. Preciso saber se vai haver greve ou não” (MOREIRA,
1989, p.107).
Entre os colaboradores figuravam verdadeiros medalhões do jornalismo
maranhense, entre eles encontravam-se nomes como: Amorim Parga, Walbert Pinheiro, Celso
Bastos, Clodomir Millet, Lago Burnertt (revelação como chargista), Ferreira Gullar, Odylo Costa
Filho, Franklin de Oliveira, Mata Roma, Bandeira Tribuzi e José Sarney. Era um grupo de peso,
com nomes que viriam a fazer parte da história política nacional e outros com extraordinário
destaque no meio intelectual do Brasil. Entre os jovens que começaram a carreira no jornalismo
através do Jornal do Povo estavam Nonato Masson, Ubiratan Teixeira, Ilmar Furtado, Benito
Neiva e Edson Vidigal.
A partir de outubro de 1952, Neiva Moreira (começando a sua carreira política)
adquire o controle acionário do Jornal do Povo e indica Euclides Neiva para a diretoria
administrativa e Reginaldo Telles para chefe de redação.
Sob o comando de Neiva Moreira, o JP tornou-se durante um tempo o órgão da
imprensa maranhense mais lido no estado, principalmente na capital. Com o tempo aprofundou
ainda mais a sua linha editorial de combate sistemático aos desmandos do governo e de duras
críticas ao mandonismo de Vitorino, pernambucano que comandou com “mão-de-ferro” as lutas
políticas no cenário estadual (ver anexo 11). O matutino de maior prestígio e credibilidade junto à sociedade maranhense teve
também um importante papel na divulgação de grandes acontecimentos nacionais como: As
eleições presidenciais, A greve de 1951(rebelião maranhense que teve repercussão
internacional), a Era Vargas, a criação de Brasília, a renúncia de Jânio Quadros, o Golpe Militar
de 1964, e vários outros acontecimentos nos quais Neiva estava presente, ou como
testemunha ou como protagonista.
No editorial, Neiva Moreira clamava por um regime político mais humano, de respeito
às comunidades trabalhadoras. O lema do jornal do povo: ”contra a opressão e a injustiça
social”, expressa bem a postura contrária aos mandonistas locais que fez Neiva e outros
colaboradores desse periódico sofrerem vários ataques e atentados.
A relação da imprensa com a política sempre foi delicada, sobretudo quando os
meios de comunicação desafiam o poder vigente. No século XX, os riscos eram ainda maiores
em cidades provincianas como São Luís. Era comum ocorrerem incêndios misteriosos e
assaltos onde os ladrões quebravam as máquinas, mas não levavam nada. O jornal já
funcionando na Rua da Palma, centro histórico de São foi invadido várias vezes por capangas
armados. Como eram invasões relâmpago as melhores opções era ficar escondido.
O último ato de vandalismo contra o Jornal do Povo foi o incêndio que destruiu quase que completamente as suas instalações, até hoje origem do fogo continua desconhecida. “É uma característica das ditaduras acreditar que as idéias se acabam quando são destruídos os meios e instrumentos que as veiculam”, afirma Moreira (1989, p. 112).
Em abril de 1964, após o golpe militar, o jornal foi definitivamente fechado e com a
edição do “Ato Institucional n° 1 Neiva Moreira teve seu mandato parlamentar cassado e
suspenso por dez anos” (BUZAR, 1997, p. 19). Em seguida, ele foi exilado juntamente com seu
amigo Bandeira Tribuzi. “Era impossível que o velho e inconformado JP circulasse sob
censura”, conta Neiva Moreira (1989, p.112). A censura também atingiu a Tribuna do Povo
(periódico do PCB).
5 Ampliando horizontes: a causa continua
É inevitável registrar os momentos político-jornalísticos de Neiva Moreira, sem
destacarmos um fato crucial: o exílio.
Estando o país respirando tirania, Neiva sofreu grandes represálias, no que resultou
em um amargo exílio de 15 anos. Vários foram os lugares por onde passou, mas a ideologia
era sempre a mesma: lutar contra as forças opressivas, juntando-se a cada mobilização.
Mesmo distante, constatou-se que era bastante influente, causando “complicações” por onde
passava.
“Neiva Moreira é uma legenda em caixa alta” ¹, sentenciou com veemência o
desembargador aposentado Almeida Teles. O seu espírito revolucionário o denunciava desde
sua infância.
Aos 15 anos foi premiado com uma suspensão de 15 dias por juntar-se
aos estudantes-grevistas do colégio Liceu (em Teresina); mais tarde, foi enquadrado por
indisciplina quando fazia o serviço militar no 24º Batalhão de Caçadores, levando-o ao
comando.
Da política estudantil, passou à política partidária, consolidando suas posições
ideológicas, estas notavelmente percebidas em seus artigos e
____________
1 Comentário realizado pelo desembargador aposentado Almeida Teles, São Luís, em abril de
2006.
reportagens. Como exemplo, em visita ao Maranhão, Neiva escreveu um artigo no jornal O
Combate, relatando o descaso e o abandono em que encontrava sua terra natal. Isso lhe
resultou em uma prisão de 10 dias a mando do senador Victorino Freire.
Sua trajetória de ‘exílio’, como tudo em sua vida, começou cedo e por levantar as
bandeiras de seus ideais, Neiva foi perseguido desde sempre. Bolívia foi seu primeiro ‘porto
(in)seguro’, que mesmo não aceitando mais asilados, mas tendo ele uma boa relação com os
presidentes Estenssorro e Siles Suazo, foi autorizado a entrar ficando por lá vários dias,
ocupando-se em grande parte do tempo de brincar com seus filhos gêmeos.
Os momentos que antecederam sua viagem, Neiva discursou sobre o golpe militar e
com um olhar compenetrado gravou na memória todos aqueles que foram se despedir; entre
amigos e parentes, a emoção se fez com o abraço através do olhar de seu amigo compositor
João do Vale, que sempre se atrasava, mas nunca faltava; dessa despedida abstrata nasceu
um samba em que o compositor frisa que mesmo distante, a sua essência ficava no ar. (ver
anexo 6).
O exílio começava. Neiva já estivera várias vezes na Bolívia cobrindo revoluções,
mas em 64 quando chegou exilado, foi recebido pelo presidente Estenssorro, compartilhando
em seguida um apartamento com outros jornalistas políticos. Logo depois residiu em uma casa
com um nome curioso: República Popular de los Pepitos, isso porque todos se chamavam
José, então todos eram pepes.
Foi oficializado, pela presidência boliviana, o convite para trabalhar em sua
assessoria de imprensa com um salário satisfatório. Enquanto isso, a embaixada brasileira
monitorava seus passos 24 horas por dia, pressionando o governo para tirá-lo de La Paz com a
intenção de levá-lo a um confinamento em Sacre, já que esta capital ficava muito distante e
isolada da sede política e administrativa do país.
Ainda na Bolívia, Neiva foi convidado para estruturar o jornal Clarín, tendo êxito e o
colocando, é claro, na mira dos militares golpistas que tramavam contra o presidente, o que
resultou no seu recambiamento ao Uruguai; na rotina do exílio, viveu um momento de
entusiasmo ao reencontrar em Montevidéu seus familiares e, de esperança, por estar num país
aberto politicamente e de fácil comunicação ao Brasil.
Chegando à capital uruguaia no último dia de 64, Neiva foi acolhido fraternalmente
por seus companheiros. Os centros de concentração antiditadura já tinham endereços certos;
todavia, a vida de Neiva exilado era difícil, bastante severa, em 15 anos de exílio, lembrou de
não ter ido meia dúzia de vezes a um cinema ou teatro, e quando fora, sempre era para assistir
filmes que envolviam batalhas, constatando que vivia para a luta ou pensava nela.
Entre os exilados em Montevidéu havia dois grupos: o de Brizola e o de Jango,
diferentes mas paralelos, Neiva constituía o lado de Brizola( ver anexo 7), discutindo e traçando
planos para derrubar, pelas armas, a ditadura brasileira; Brizola, porém, era contra a guerrilha,
pois achava que ela excluía o povo da participação direta na luta, mas de forma alguma, ele
impedia os incentivos que pudessem enfraquecer a ditadura.
Neiva recebeu treinamentos onde aprendeu a sobreviver na selva, a atirar e a aplicar
algumas táticas militares. Como Uruguai representava um papel essencial na luta de libertação
da América Latina, virou um refúgio de patriotas perseguidos no continente. É oportuno
ressaltar o apoio que ele deu a Revolução Cubana, frisando a impressão que teve de Fidel
Castro, a de um líder responsável e brilhante.
Enquanto aprendia a língua espanhola, Neiva não se esquivou do trabalho
jornalístico, escrevendo artigos, quase sempre com pseudômios, que colegas uruguaios
traduziam. Recebia ajuda financeira da família no Brasil e de amigos. Logo depois aceitou o
convite para trabalhar em um jornal do Partido Socialista, Isquierda, porém não demorou muito
ele foi fechado pelo governo por conter notícias desastrosas, como a prisão de milhares de
pessoas como forma de repressão às matérias.
Com a turbulência política do Uruguai, Neiva prosseguiu para a Argentina exercendo
a sua grande paixão que era escrever, agora para a revista Terceiro Mundo, mas em virtude da
radicalização política, sua estadia foi bastante curta, prosseguindo para o Peru, onde escreveu
o livro Modelo Peruano, (ver anexo 8) que lhe rendeu um bom dinheiro com direitos autorais.
Através de uns amigos ao diário de notícias, onde publicou artigos sobre guerras armadas,
recebendo vários elogios, porém com a queda do governo do general Velasco em 75, o único
caminho que restou foi México.
Sua estada no México foi mais complicada ainda, pois Neiva encontrou grandes
dificuldades para dar seqüência as revistas, uma vez que os recursos não eram suficientes
para dar vivência aos exemplares. Neiva conseguiu alguns êxitos memoráveis com suas
edições, infiltrando-se em repartições públicas e privadas, no entanto, o retorno para o Brasil já
estava marcado.
Durante esses 15 anos de exílio, muito aconteceu com Neiva. O sentimento se
misturava a cada país que ele desembarcava; contudo, dois prevaleciam, o de melancolia
quando era assaltado vez por outra com a possibilidade de morrer clandestinamente e, é claro,
o da esperança de retornar à sua terra natal.
Para os exilados, um fato, um evento, tem uma dimensão adversa, e ao perceber
mesmo de longe, que a anistia era possível, a preocupação firmou-se em indagar o que fazer
quando voltar. Quando o anunciaram que Lei da Anistia foi assinada, Neiva Moreira festejou às
lágrimas e, não demorou muito, já estava no Brasil, sendo recebido por 20 mil pessoas que
aclamavam o seu nome, muitos nem sabiam de sua história, o que interessava-os era a
informação de que ele desagradava o governo atual do Maranhão (ver anexo 9).
6 CONCLUSÂO
“Jornal do Povo: contra a opressão e a injustiça social”, durante 14 anos foi um dos
maiores e influentes periódicos de oposição mais relevante no cenário político e na imprensa
maranhense na segunda metade do século XX. Sendo a maior ferramenta do Partido Social
Progressista (PSD) encabeçado por Adhemar de Barros.
Nessa conjectura, os jornais e os partidos políticos eram indissociáveis (Tribuna do
povo/Maria Aragão-PCB, O Combate/Lino Machado-PR, Jornal do Povo/Neiva Moreira-PSP
etc.) um muito raramente sobreviveria sem o outro, como se fossem – irmãos siameses.
A luta entre as oposições coligadas (inclui-se o PSP) contra a política vitorinista
acontecia na esfera das oligarquias, pois mesmo havendo um deslocamento do poder - “sai
Vitorino Freire e assume a oposição” - tal luta se constitui enquanto disputa intra-oligárquica.
Os desdobramentos da luta contra a opressão e a injustiça social não resultaram em
êxito pleno, todavia, provou que um veículo de comunicação cumprindo sua função social pode
esclarecer, conscientizar e mobilizar uma sociedade, tornando-a politicamente ativa.
Para Neiva Moreira, os periódicos devem ser audaciosos, não
podendo perder a esperança e nem clamar contra a escuridão, pois era melhor
acender uma vela. Na qual “a chama” que iluminava a consciência da
população era o jornal, muitas vezes a única trincheira contra o obscurantismo
oligárquico que ainda hoje insiste em querer vendar e amordaçar a população
do Maranhão.
SUMMARY
Reconstitutes the history of the Newspaper of the People that was one of the most
influential diaries in the scenery from Maranhão from 1950 to 1964. It is rescued Neiva Moreira
journalistic and political production and the foundation of that newspaper financed initially by the
national leader of Progressive Social Party (PSP), Adhemar of Barros. He/she locates the
newspaper in the partner-political conjuncture of the time starting from the disputes joined
between the associated oppositions and the vitorinismo until the period in that was closed for
the military dictatorship.
Word-key: Newspaper of the People. Press from Maranhão. Media and politics
___________
2 Comentário realizado pelo deputado federal Neiva Moreira, São Luís, em abril de 2006.
REFERÊNCIAS
BUZAR, Benedito (org.). Neiva Moreira: o jornalista do povo. São Luís: Lithograf, 1997.
_________. Vitorinismo & oposicionistas. São Luís: Lithograf, 2001.
_________. Os 50 anos da Greve de 51. São Luís; Lithograf, 2001.
CÁCERES, Florival. História geral. 4.ed.rev.ampl.São Paulo: Moderna, 1996.
COSTA, Wagner Cabral da (org). História do Maranhão: novos estudos. São Luís: EDUFMA, 2004.
_________ . O “salto do Canguru”: ditadura militar e reestruturação oligárquica no Maranhão pós-1964. São Paulo: UNICAMP, 2001. Dissertação de Mestrado em História.
FERREIRA JÚNIOR, Ribamar. A arena da palavra: parlamentarismo em debate na imprensa maranhense 1961 – 1963. São Paulo: Annablume, 1998.
MEIRELES, Mário M. História do Maranhão. 3.ed. São Paulo: Siciliano, 2001.
MOREIRA, José Guimarães Neiva. Brasília hora zero. Rio de Janeiro: Terceiro Mundo, 1988.
_________. O pilão da madrugada. Rio de Janeiro: Terceiro Mundo, 1989.
SENA, Clovis. Neiva Moreira: testemunha da libertação. Brasília: Alvorada, 1976.
SILVA, Francisco de Assis. História do Brasil. São Paulo: Moderna, 1992.
MEMÓRIA BIOGRÁFICA DE JORNALISTAS E RADIALISTAS DO MARANHÃO (suplemento da revista Nossa Imprensa). São Luís; Sindicato dos Jornalistas e Radialistas do Maranhão,
jul/2004.
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