Celia Maria Sivalli Campos
Necessidades de saúde como objeto das políticas públicas: as práticas do Enfermeiro na Atenção
Básica
Tese apresentada à Escola de Enfermagem da USP, como parte dos requisitos para o concurso de Livre-Docência junto ao Departamento de Enfermagem em Saúde Coletiva.
São Paulo
2013
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Resumo
Este trabalho buscou refletir sobre as necessidades de saúde tomadas como objeto das
políticas estatais de saúde e sobre as práticas do enfermeiro em resposta a elas, na
Atenção Básica. Recuperou a concepção de necessidades de saúde como necessidades
sociais, traduzidas nas categorias necessidades de reprodução social; necessidade da
presença do Estado e necessidade de participação social e apresentou como o trabalho
do enfermeiro, uma prática social, vem se relacionando com as necessidades sociais de
saúde. As práticas em saúde, dentre elas as do enfermeiro, são orientadas pelas políticas
estatais de saúde, que na atualidade têm induzido brechas na consolidada organização
da AB. No entanto, essas políticas não conseguem regularizar a expansão das ações para
agir sobre os determinantes das necessidades sociais de saúde. Por fim, propõe a
inclusão na política de saúde da reflexão sobre os processos de trabalho, para permitir
aos trabalhadores a compreensão dos limites e das contradições das formas de
regularização do processo de produção em saúde, compreendendo que ao dominar o
objeto na sua amplitude, pela apreensão do conceito de necessidades sociais de saúde e
dos limites das políticas para induzir práticas que respondam mais amplamente a elas,
estarão menos capturados pelas frustrações produzidas pela idealização e mais
fortalecidos para desenvolver práticas emancipatórias, novas práticas que acirrem as
contradições.
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Abstract
This study sought to reflect on health needs taken as an object of state health policies
and the nurses’ practices in response to them, in Primary Health Care. Health needs are
seen as social needs, translated into the categories needs of social reproduction; need
for the presence of the State and need for social participation. Nurses’ labor is
presented as a social practice related to social health needs. Health practices, and those
of nurses among them, are guided by state health policies, which at present have
induced some changes in the organization of the consolidated Primary Health Care.
However, such policies can’t regulate health actions expansion by addressing the
society health needs determinants. Finally, we propose the inclusion of the debate of
labor processes as health policy to enable health workers to understand the limits and
the contradictions in regulating the health production process. The apprehension of the
concept of health and social needs and of the limits of political practices to induce them,
in order to respond them more broadly, is reached by mastering the object in its breadth.
So, health workers are less subject to the frustrations produced by idealization of health
work and more empowered to develop emancipatory practices, new practices that
embolden contradictions, thus enabling social transformation.
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Apresentação
A categoria necessidades de saúde compõe o núcleo central do campo da Saúde
Coletiva e sua compreensão é fundamental para o desenvolvimento de práticas de
Enfermagem. O desafio reside em explorar sua dimensão teórica e traduzi-la em
categorias mais próximas da realidade, permitindo sua operacionalização nas práticas do
cuidado em saúde. Este estudo discute os elementos envolvidos na operacionalização da
categoria necessidades de saúde nas práticas do cuidado do enfermeiro.
O capítulo 1- Saúde coletiva e necessidades sociais de saúde recupera a
concepção de necessidades de saúde como necessidades sociais, traduzidas nas
categorias necessidades de reprodução social; necessidade da presença do Estado e
necessidade de participação política.
O capítulo 2 - As necessidades sociais de saúde e as práticas de Enfermagem
que compõem o cuidado apresenta como o trabalho da Enfermagem vem se
relacionando com as necessidades de saúde.
O capítulo 3 - O trabalho do enfermeiro como prática social recupera o sentido
da historicidade do trabalho do enfermeiro que demandou a compreensão dessa
articulação com a estrutura e a dinâmica das formações sociais.
No capítulo 4 - intitulado As políticas de saúde como eixo norteador das
práticas busca explicitar como as práticas são induzidas pelas políticas de saúde, assim
como o eixo norteador das políticas de saúde na atualidade: o paradigma da clínica.
O capítulo 5 - As respostas sociais da política estatal e as necessidades de saúde
induzidas aborda como as necessidades tem sido operacionalizadas nas práticas de
saúde, por meio de revisão da literatura. Reconhece-se que as políticas têm induzido
brechas na organização da Atenção Básica; no entanto, não conseguem regularizar a
expansão das ações para agir sobre os determinantes do processo saúde-doença.
O capítulo 6 - As respostas sociais da política estatal e as necessidades de saúde
induzidas na especificidade do cuidado do enfermeiro na AB propõe a inclusão na
política de saúde da reflexão sobre os processos de trabalho, para permitir aos
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trabalhadores a compreensão dos limites e das contradições nas formas de regularização
do processo de produção em saúde.
Ao dominar o objeto em sua amplitude, pela apreensão do conceito de
necessidades sociais de saúde e dos limites das políticas para induzir práticas que
respondam mais amplamente a elas, os trabalhadores da saúde, em especial os da
Enfermagem, estarão menos capturados pelas frustrações produzidas pela idealização
sobre seu objeto trabalho e mais fortalecidos para identificar as contradições presentes
em seu cotidiano, para desenvolver práticas emancipatórias, novas práticas que acirrem
as contradições.
O capítulo 7 - Necessidades sociais de saúde e o trabalho do enfermeiro –
propõe uma definição de práticas emancipatórias. São aquelas que possibilitam refletir
sobre a origem dos problemas de saúde, superando ações que incidem no âmbito dos
problemas já instalados, para atingir determinantes do processo saúde-doença;
instrumentalizam os sujeitos dos grupos sociais a acessar direitos e a lutar por eles e
aquelas que incentivam valores de solidariedade.
Práticas emancipatórias resgatam a condição humana como condição social, em
contraposição à naturalização do sujeito como ser biológico.
O capítulo 8 - Para fazer a síntese – retoma o percurso empreendido no
trabalho.
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1 - Saúde Coletiva e Necessidades Sociais de Saúde
O campo da Saúde Coletiva, para operacionalizar seu projeto político-ideológico,
buscou um corpo de conhecimentos que propôs a revisão das concepções de saúde e
doença, bem como uma reconceitualização do seu objeto: as necessidades de saúde
(Paim, 2008:164).
Para superar a concepção funcionalista do processo saúde-doença, retomou
conceitos da Medicina Social e incorporou outros das Ciências Sociais, fundamentando
teoricamente a compreensão de que o objeto das práticas em saúde é o coletivo,
constitutivamente heterogêneo, heterogeneidade esta determinada por suas
características sociais, e que o processo saúde-doença do coletivo é produto do processo
de reprodução da vida social (Laurell, 1982).
Ou seja, os perfis saúde-doença estão diretamente associados às distintas formas
com que cada grupo social insere-se na produção e como se relaciona com os demais
grupos sociais (Navarro, 2004; Borrell et al, 2004; Navarro et al, 2006; Blas et al 2008).
Coerentemente com essa perspectiva teórica, o processo de produção em saúde, que
resulta da articulação social dos diferentes processos de trabalho em saúde, tem como
finalidade responder às necessidades sociais (Mendes-Gonçalves, 1992).
Para Heller (1986), necessidade social é um conceito associado a valor positivo,
por ser interpretado como necessidade da sociedade, que tem diferentes significados. O
primeiro deles, bastante relevante na sociedade capitalista, é o de necessidades sociais
como sinônimo de interesse geral da sociedade, sendo definidas acima dos indivíduos e
de suas necessidades pessoais.
Na prática, tais necessidades objetivam-se como necessidades dos grupos
dominantes ou com maior poder de negociação, sob a pretensa imagem de validade
geral, universalidade e sociabilidade. A decisão de quais necessidades da classe são
justas e quais são injustas é tomada por representantes das denominadas necessidades
sociais; as necessidades efetivas da maioria não são consideradas verdadeiras (Heller,
1986: 78).
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Isso porque as necessidades de valorização do capital são as que preponderam
sobre as necessidades de desenvolvimento e aprimoramento dos indivíduos em
particular, e o valor econômico não pode ser transcendido por nenhum outro (Heller,
1986).
Na área da saúde, exemplo disso foram os ataques ao Sistema de Saúde
brasileiro em seu aspecto fundamental – a saúde como direito, de caráter universal,
coletivo e gratuito. Por ser financiado pelos cofres públicos, a justificativa das reformas
foi baseada em aspectos técnicos, que se sustentavam na premissa da falta de recursos
públicos para o setor (Puccini, 2002). Sob o pretexto de interesse geral da sociedade, as
reformas foram apresentadas como necessidades sociais.
Necessidades sociais também se identificam com necessidades socialmente
produzidas, que operacionalizam o mecanismo que viabiliza a ampliação do capital,
pois criam demandas de consumo de bens e mercadorias que incorporam valor de troca
(Heller, 1986). Essa demanda, ao mesmo tempo em que é força motriz para a produção
e o consumo de mercadorias, pode representar o limite da riqueza, pois com a produção
da riqueza material da sociedade há a criação da riqueza e da multiplicidade de
necessidades dos indivíduos. Porém, essas necessidades concretizam-se nos indivíduos
de maneira desigual, pois desiguais são os acessos aos produtos que as satisfazem, a
depender do lugar que ocupam na divisão social do trabalho. Essas necessidades são
complexas e sofisticadas para os grupos que se localizam na alta esfera do consumo,
enquanto para outros grupos permanecem nos limites mínimos para a manutenção da
sobrevivência (Heller, 1986).
Essa interpretação de necessidades sociais, segundo Heller (1986), é somente
aplicável a necessidades cuja satisfação viabiliza-se mediante aquisição de produtos
com valor de troca, materiais ou imateriais. São socialmente produzidas as necessidades
humanas alienadas que, por se tornarem constituintes do imaginário e do desejo e por
serem inesgotáveis, foram adquirindo prioridade sobre outras necessidades humanas.
Até mesmo os bens atinentes à esfera dos direitos, como a saúde e a educação,
tornaram-se necessidades socialmente produzidas que passaram a ser comprados no
mercado.
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A associação entre o privado e a melhor qualidade da atenção à saúde que faz
parte do imaginário coletivo é uma necessidade socialmente produzida.
Este estudo filia-se à definição de necessidades sociais como as constituídas pela
média das necessidades individuais, desenvolvidas historicamente, e não interpretadas e
determinadas pela perspectiva econômica. Trata-se, segundo Heller (1986: 82), de
uma categoria objetiva: um determinado homem, de uma determinada classe, de uma determinada época, nasce em um sistema e em uma hierarquia de necessidades pré-constituídas (ainda que em evolução) pelos costumes, pela moral das gerações precedentes e sobretudo pelos objetos de suas necessidades.
Esta definição expressa que indivíduos de características singulares portam
necessidades a serem satisfeitas por processos de trabalho realizados em instituições
sociais, destinados à satisfação coletiva, como as necessidades culturais, de
aprendizagem, de proteção e de aprimoramento das condições de saúde, entre outras
(Heller, 1986).
A partir dessa compreensão, neste estudo as necessidades de saúde são
entendidas como necessidades de reprodução das classes sociais, pois se constituem de
modo distinto nos indivíduos de diferentes classes, dado que o acesso desses indivíduos
ao que as satisfaz é desigual. Assim, necessidades de saúde devem ser interpretadas e
respondidas como necessidades sociais, subordinadas às diferenças de classe, no âmbito
de instituições sociais (Campos, Mishima, 2005; Campos, 2009).
Atender necessidades de saúde significa tomar o conceito da determinação social
do processo saúde-doença para instaurar processos de trabalho que respondam a elas no
âmbito dos determinantes e também dos resultados - a doença propriamente dita, e
encaminhar a política pública de saúde na direção do direito universal (Campos,
Mishima, 2005). Isso significa que o objeto das práticas em saúde – as necessidades de
saúde - é amplo, abrangendo, além da dimensão biológica, as dimensões cultural,
econômica, ecológica e política que, no modo de produção capitalista, são comandadas
pela dimensão econômica (Samaja, 2000).
Uma vez que são os serviços de saúde que reconhecem necessidades de saúde e
as transformam em demandas, o sistema de atenção à saúde deve se articular com outros
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setores sociais, pois, como afirmam Giovanella, Escorel e Mendonça (2009) somente
com ações intersetoriais é possível alcançar os determinantes do processo saúde-doença.
No entanto, na Atenção Básica os processos de trabalho têm prescindido do
reconhecimento das necessidades de saúde dos usuários (Campos, Mishima, 2005;
Santos, 2009; Shimizu, Rosales, 2009) e são implementados a partir de programas
propostos pelo Ministério da Saúde, ainda bastante voltados ao atendimento e
monitoramento de algumas doenças e agravos, justificados por seus resultados técnicos
e apresentados como necessidades sociais.
Assim, as necessidades de saúde têm sido reconhecidas pela população como
necessidades de serviços de saúde e são tomadas pelos serviços como sinônimo de
problemas de saúde já instalados no corpo bio-psíquico de um indivíduo, que devem ser
corrigidos pelas práticas do serviço, primordialmente as fundamentadas nos
instrumentos da clínica médica (Campos, Bataiero, 2007).
Entretanto, as práticas de saúde configuram-se como trabalho (Mendes
Gonçalves, 1992), como processo de transformação intencional de um dado objeto - as
necessidades de saúde, mediado por instrumentos utilizados pelos trabalhadores de
saúde, resultando em um produto - as necessidades aprimoradas ou atendidas. Assim, é
possível aos trabalhadores buscar a ampliação do objeto de suas práticas, reconhecendo
necessidades ampliadas, que alcancem os determinantes do processo saúde-doença,
expandindo as respostas além da diminuição ou da remissão de sintomas.
As necessidades de saúde devem ser identificadas no conjunto da vida social dos
indivíduos, nas formas de produzir, partilhar e consumir o que é socialmente produzido,
nas formas de trabalhar e nos modos de viver do indivíduo, da família e da classe ou
grupo social à qual pertencem; nas relações que estabelecem com outras pessoas, outros
grupos e com a instituições sociais e nas características ambientais, geográficas e sociais
do território onde vivem. Devem ser identificadas ainda nas doenças, consequências
dessas formas de trabalhar e de viver no corpo bio-psíquico dos indivíduos e das família
de diferentes classes ou grupos sociais(Campos, 2009:148)
Em síntese, a partir do arcabouço teórico da Saúde Coletiva, a necessidades de
saúde são necessidades de reprodução social que constituem a base do processo
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saúde-doença que, para serem detectadas e respondidas em sua complexidade,
convocam a necessidade da presença do Estado, que será mais efetiva na
responsabilização pela garantia dos diversos serviços que promovem o bem-estar social
da população e o acesso a direitos universais representados pelos bens produzidos nos
serviços públicos, quanto mais estiver consciente a necessidade de participação
política. É essa instância que possibilita a discussão e o embate das necessidades e dos
interesses das classes e grupos sociais diversos e dos grupos organizados da sociedade
civil, que revela os conflitos sociais encobertos pelos desgastes advindos do mundo do
trabalho contemporâneo e que possibilita a construção de um projeto emancipatório, no
qual estejam postas as necessidades de todos (Campos, 2004).
Nessa perspectiva, reconhecer necessidades de saúde significa identificar as
atinentes à reprodução social de indivíduos e grupos, como ocupação; vínculo
empregatício; horas trabalhadas por semana; benefícios provenientes do trabalho, além
do salário; escolaridade; condições da moradia; número e idade das pessoas residentes
no domicílio; sexo, idade e escolaridade do chefe da família; entre outros indicadores de
condições de trabalho e vida; e também os problemas de saúde; tratamentos e
monitoramento por profissionais de saúde.
Implica ainda identificar as características da presença do Estado, expressa no
acesso das residências a serviços de infraestrutura, como água, iluminação elétrica, rede
de esgoto; pavimentação e arborização das ruas; presença de instituições sociais
públicas, como escolas, serviços de saúde; segurança pública, entre outros. E também
reconhecer a participação dos indivíduos em atividades associativas, como associações,
sindicatos, comitês, entre outras. Acredita-se que dessa forma alcançam-se os
determinantes do processo saúde-doença.
Partindo das redes de conhecimento estabelecidas pela OMS para apoiar a
Comissão sobre os Determinantes Sociais da Saúde, Blas et al (2008: 1684)
identificaram que a ação governamental deve prover ou garantir “direitos humanos e
serviços essenciais; ser propositora de diretrizes políticas que proporcionem um
aperfeiçoamento igualitário das condições de saúde; prover e monitorar informações
que gerem dados a respeito de morbidade, mortalidade e equidade de condições de
saúde da população”, evidenciando que a presença do Estado e a participação da
sociedade civil reduzem desigualdades das condições de saúde de uma dada população.
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O estudo empírico desenvolvido por Navarro et al (2006) também demonstrou
que países que implementaram políticas redistributivas visando à redução de
desigualdades sociais apresentaram melhores indicadores de saúde, dentre os
selecionados (mortalidade infantil e expectativa de vida).
Já no tocante à participação social dos indivíduos e grupos sociais, Blas et al
(2008) afirmaram que na esfera da sociedade civil, os movimentos sociais, tanto as
organizações formais como os sindicatos, quanto os grupos comunitários informais,
como os comitês, e os movimentos sociais de larga escala, como o antiapartheid na
África do Sul) estão associados a modificações positivas na esfera social, política e
econômica, que impactam positivamente o aprimoramento das condições de saúde
individual e de toda a população.
É a partir dessa conceituação de necessidades de saúde que este estudo pretende
reconhecer nas práticas realizadas na Atenção Básica, com enfoque nas desenvolvidas
pelos enfermeiros, a potencialidade de atingirem os determinantes sociais dos processos
saúde-doença e constituírem respostas ampliadas às necessidades de saúde.
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2 As necessidades sociais de saúde e as práticas que compõem o cuidado de
Enfermagem∗
As considerações que se seguem foram publicadas em Campos, Soares (2013).
O arcabouço teórico que embasa as práticas de Enfermagem acompanhou as
inflexões sofridas pela ciência, associadas ao contexto econômico, social e político em
que se desenvolveu (Silva, 1989; Almeida, Rocha, 1989), posto que a ciência é
historicamente determinada (Mendes Gonçalves, 1992; Silva, 1989).
Em sua origem como trabalho, a Enfermagem esteve mergulhada no contexto
das mudanças sociais de países da Europa, que culminaram com a Revolução Industrial,
a consolidação do capitalismo como modo de produção social e o aumento descomunal
da mortalidade, especialmente entre jovens em idade produtiva.
Nesse contexto econômico, social e político, a necessidade social de saúde
preponderante era o controle ou o combate de surtos ou epidemias. O setor saúde
respondeu à essa necessidade social de controlar o que colocava em risco o capitalismo,
tomando para si o controle social das condições de reprodução social dos grupos
sociais, por meio de práticas normativas de saneamento ambiental urbano e de educação
em saúde.
Assumidas pela Saúde Pública e direcionadas ao proletariado, tais práticas
visavam diminuir ou estabilizar a ocorrência de novos casos. Tornaram-se possíveis de
serem viabilizadas pelo desenvolvimento das ciências naturais, como a matemática, por
exemplo, que permitiu o desenvolvimento de métodos capazes de prever quantos
indivíduos seriam acometidos por uma epidemia, e pelo conhecimento da geografia, que
possibilitou a antevisão de onde os casos ocorreriam (Mendes Gonçalves, 1992;
Sabroza, s.d.).
Uma vez que as concepções de necessidades de saúde estão intrinsecamente
relacionadas às concepções do processo saúde-doença e diante da incontestável
associação entre a distribuição das doenças e mortes na população e o lugar social que
os indivíduos ocupavam na reprodução da vida social, era inegável que responder
∗ As considerações deste capítulo foram publicadas em (Campos, Soares, 2013: 267-277).
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socialmente a necessidades de saúde significava implementar mudanças nas condições
de trabalho e de vida desses indivíduos, só factíveis com mudanças na estrutura social.
No entanto, essa concepção era contrária à necessidade social de expansão do
capitalismo, pois as desigualdades sociais constituem uma das premissas do modo de
produção capitalista. Portanto, ficou restrita ao debate em círculos não influentes para
alterar o processo em curso (Mendes Gonçalves, 1992).
Nesse período, a influência das ciências naturais, dessa vez com o
amadurecimento da fisiologia e da patologia, permitiu que fosse ultrapassada a
dimensão da constituição de métodos de identificação de necessidades de saúde
pautados na epidemiologia e na estatística. Além da identificação de necessidades, essas
ciências fundamentaram a interpretação da doença como “alteração morfológica e/ou
funcional do corpo humano” e o corpo biológico individual passou a ser o lugar
privilegiado para a investigação e o cuidado da doença (Mendes Gonçalves, 1992: 69).
Assim, à necessidade de conter doenças transmissíveis, agregou-se a necessidade social
de recuperação e manutenção dos corpos nos padrões fisiológicos de normalidade.
Porém, foi apenas no século XX, após o desenvolvimento de medicamentos e
procedimentos, que esse modelo clínico, baseado nos saberes da clínica anátomo-
patológica, ganhou proeminência (Mendes Gonçalves, 1992). A Medicina baseada na
clínica anátomo-patológica serviu bem a esse propósito, alinhando-se às necessidades
sociais de saúde próprias do capitalismo, ou seja, a manutenção e o restabelecimento
dos corpos dos indivíduos em condições para o trabalho, e à premissa do projeto
político-ideológico do capitalismo, o convencimento de que todos somos iguais perante
a lei, o que individualiza cada um, pois também é individualizante. A doença localiza-se
no corpo individual, um corpo abstrato e reduzido às dimensões biológicas,
naturalizando o fenômeno do adoecimento, que “deixa de ser imediatamente social”
(Mendes Gonçalves, 1992: 71).
Coerente com essa concepção de doença, a relação técnica médico-paciente
passou a ser estabelecida entre o médico e o corpo individual do paciente. O hospital,
que até então era depósito de excluídos de toda sorte, passou a ser um local adequado
para sediar tal relação técnica e tornou-se espaço de tratamento, contando com a
presença sistemática do médico (Mendes Gonçalves, 1992). Foi nesse contexto que a
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Enfermagem firmou-se como prática social, desenvolvendo práticas para responder às
necessidades sociais de saúde que lhe deram origem.
Para fundamentar suas práticas de cuidado à saúde, a Enfermagem foi se
apropriando, desde meados do século XIX, da influência das ciências naturais, na
tentativa de superar o cuidado realizado por leigos, baseado em saberes do senso
comum. Florence Nightingale, filha da aristocracia inglesa, que diferentemente das
mulheres do seu tempo estudou e tinha domínio da escrita e da estatística, protagonizou
essa inflexão que deu origem à Enfermagem profissional. Ela aceitou o desafio de
cuidar de soldados feridos na Guerra da Criméia em hospitais militares com precárias
condições de higiene, de equipamentos e com insuficiência de recursos humanos (Silva,
1989).
Por adotar a concepção dominante das ciências da fisiologia e da patologia, que
propunha a existência de agente causador da doença no ambiente (os miasmas),
Florence propôs adaptações no ambiente de tratamento nas frentes de batalha, para
permitir a ação da natureza sobre os enfermos, com vistas a sua recuperação. A adoção
de medidas de organização do espaço para afastar contaminantes determinou a
diminuição vertiginosa das mortes entre os combatentes. Florence levou para dentro do
hospital essa concepção e organizou as práticas de Enfermagem para cuidar e para
controlar o ambiente (Silva, 1989).
No hospital, já como local privilegiado para a realização da prática clínica no
corpo do paciente, a Enfermagem centrou suas ações no ambiente, enquanto a medicina
delas se afastou (Almeida, Rocha, 1989).
A Enfermagem passou a ser uma prática social para realizar uma parte do
trabalho do médico, a parte mais manual, pois a complexidade do tratamento do
paciente no hospital inviabilizou que todo o trabalho fosse realizado apenas pela
categoria médica. Constituiu-se assim “a primeira extensão do médico em um
trabalhador coletivo” e seguiu-se a divisão social do trabalho médico, que dividiu partes
do seu trabalho com outros trabalhadores da saúde, mas manteve o domínio e continuou
sendo o determinante do processo ao manter a parte mais intelectual – o diagnóstico, a
prescrição e certas técnicas privilegiadas (Mendes Gonçalves, 1992: 72).
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Foi assim que a prática de Enfermagem, que até então era independente, passou
a ser dependente e subordinada à prática médica e o saber médico, preponderantemente
o da clínica anátomo-patológica, que passou a ser o eixo de todas as práticas advindas
da divisão social do trabalho (Almeida, Rocha, 1989). Desde a segunda metade do
século XIX até a década de 1960, a Enfermagem construiu a prática do cuidado sob essa
premissa.
Com o projeto de retomada da independência e de se constituir como prática
autônoma, a Enfermagem buscou desenvolver um corpo de conhecimentos específicos
da profissão.
Foi em busca do estatuto científico para a profissão que, a partir da década de
1960, enfermeiras americanas desenvolveram as teorias de Enfermagem, pressupondo,
como reiterou Horta (1975), que a autonomia profissional dependia fundamentalmente
da adoção da ciência no planejamento e na execução do cuidado.
Foi com essa finalidade que as teorias de enfermagem foram constituídas,
majoritariamente nas décadas de 1960 e 1970, tomando como ponto de partida
conceitos, teorias e linguagem de outras disciplinas ou áreas do saber já estabelecidas,
como a medicina, a psicologia e as ciências sociais (Silva, 1989; Almeida, Rocha, 1989;
Horta, 1979; Mckenzie, 2007), com a finalidade de organizar e sistematizar suas
práticas.
Dessa forma, a Enfermagem, pela mediação das teorias das várias áreas,
construiu métodos para organizar e sistematizar suas práticas, métodos esses que
articulados constituíram o processo de Enfermagem. As teorias de Enfermagem
orientam o cuidado de pacientes, desde a identificação das necessidades de saúde até a
avaliação do cuidado prestado.
Por isso, da mesma forma que Almeida e Rocha, optou-se por reconhecer as
teorias de enfermagem mais como um conjunto de métodos que operacionalizam e
sistematizam o cuidado específico de Enfermagem, baseados em referenciais teóricos de
outras áreas do conhecimento científico, do que um corpo teórico constituído por
saberes particulares da Enfermagem.
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Os métodos propostos por Florence, a primeira que aceitou o desafio de
organizar a prática da Enfermagem como profissão (1854 a 1860) e por isso conhecida
como a primeira teorista da Enfermagem, baseavam-se no paradigma positivista que
amparou a construção científica das ciências naturais, introduzindo no cuidado a
influência do meio ambiente, considerado como meio natural, ou seja, como espaço
controlável que faz parte de um sistema que precisa se harmonizar para efetivar a cura.
O hospital, então, foi proposto como espaço em que se podia controlar a
segurança, a higiene e o conforto do doente e os métodos para a sistematização do
cuidado de Enfermagem, denominados teorias de Enfermagem, foram desenvolvidos no
âmbito hospitalar.
Em meados do século XX, acompanhando o movimento crítico da ciência ao
positivismo, que propôs novos paradigmas para interpretar os fenômenos associados às
relações humanas e sociais, a Enfermagem incorporou conhecimentos dos paradigmas
interpretacionista e crítico. Lançou mão de diversas correntes teóricas que tinham em
comum o resgate das características das relações humanas no âmbito afetivo e
emocional, no paradigma interpretacionista, no entanto, sem abrir mão da centralidade
teórica das concepções sistêmicas do paradigma positivista.
No Brasil, é possível identificar essa tendência mais geral no processo de
Enfermagem de Wanda Horta (1979), enfermeira precursora da sistematização do
cuidado pautado no método científico, que ampliou o rol das necessidades humanas
básicas ao incorporar às dimensões fisiológicas, dimensões afetivas e emocionais,
valendo-se da teoria motivacional do psicólogo Abraham Maslow, e aspectos
espirituais, pautando-se na teoria das necessidades humanas básicas do padre João
Mohana, de quem incorporou uma certa classificação de necessidades - as necessidades
psicobiológicas, psicossociais e psicoespirituais.
Um olhar sobre as referências da constituição internacional dos métodos de
sistematização do cuidado de Enfermagem* mostra que foram maciçamente
desenvolvidos por enfermeiras americanas.
* Nursing theories: a companion to nursing theories and model [on line]. Disponível em: <http://currentnursing.com/nursing_theory/ > (22 mar 2012).
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No contexto histórico social das décadas de 1960 e 1970, período de
questionamento e discordâncias epistemológicas dos encaminhamentos positivistas
pautados nos saberes da clínica anátomo-fisiológica, a Enfermagem acompanhou a
inflexão da construção do conhecimento científico e foi, a partir desse período,
agregando os saberes dos paradigmas compreensivistas, que incorporaram outras
dimensões à concepção do processo saúde-doença, até então restrita às necessidades
fisiológicas.
Somente depois de um século da proposta de Florence Nightingale para
organizar as práticas de Enfermagem por meio de métodos assentados no paradigma
científico, foi proposto o segundo conjunto de métodos. No entanto, a Enfermagem
apenas agregou esses saberes - da Psicologia, da Sociologia e até da Teologia – aos já
estabelecidos pela tradição positivista, mantendo como eixo central do cuidado os
saberes da Biologia.
A primeira autora a incorporar esses saberes foi Hildegard Peplau†, que em 1952
buscou teorias da área da psicologia para embasar seu método de reconhecimento de
necessidades de saúde, ampliando a possibilidade de identificação de necessidades do
âmbito emocional dos indivíduos. Esse método, a Teoria do Relacionamento
Interpessoal, foi o primeiro de muitos outros desenvolvidos por enfermeiras nos
Estados Unidos.
Essa teoria foi influenciada pelo Modelo Relacional desenvolvido pelo
psiquiatra Harry Stack Sullivan que, partindo do paradigma interpretacionista e em
contraposição à concepção individualista, afirmou que os humanos são seres em
relação, sem as quais é impossível o aprimoramento e a realização da natureza humana.
O método constituído por Peplau também sofreu influência dos estudos científicos
sobre personalidade feitos pelo psicólogo Percival Symonds, além da teoria do
Biofeedback de Neal Elgar Miller, cientista social que utilizava conceitos da Psicologia
Comportamental e da Psicanálise em seus estudos e pesquisas. Utilizou também a teoria
da motivação humana de Abraham Maslow.
† Theory of the interpersonal relations [on line]. Disponível em: <http://currentnursing.com/nursing_theory/interpersonal_theory.html> (24 mar 2012).
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A partir dessa articulação de saberes, Peplau adotou a concepção de saúde como
conjunção de vários fatores no âmbito do organismo (dinâmico e que busca equilíbrio),
do ambiente (forças externas ao indivíduo), das condições de saúde e de vida
comunitária, que em harmonia determinam o bem-estar do indivíduo. Portanto,
coerentemente a essa concepção multicausal de saúde, as necessidades de saúde no
método de Peplau são reconhecidas no âmbito desses fatores.
A exemplo de Peplau, outras enfermeiras americanas desenvolveram métodos
para organizar o cuidado de Enfermagem (Teorias de Enfermagem), notadamente entre
as décadas de 1960 e 1970.
De maneira geral, todos esses métodos foram desenvolvidos a partir do
paradigma interpretacionista, principalmente a fenomenologia, o existencialismo e o
holismo, que subsidiam a concepção multicausal do processo saúde-doença. Embora
partam de uma base comum, apresentam nuances que os diferenciam como, por
exemplo, as diferentes escolas teóricas de referência e os diferentes aspectos
privilegiados na determinação das necessidades de saúde.
Vários desses métodos tiveram a influência mais da Teoria dos Sistemas, como a
Teoria dos Sistemas de Betty Newman e a Teoria dos três C’s (core, care, cure) de
Lydia Hall. Outros incorporaram à Teoria dos Sistemas conhecimentos das Ciências
Sociais (funcionalista) e da Psicologia (comportamental), como, por exemplo, o Modelo
de Adaptação (de comportamentos), de Sister Callista Roy; o Modelo dos Sistemas, de
Dorothy Johnson; a Teoria do Alcance de Metas, de Imogene King; e a Teoria dos
Quatro Princípios de Conservação, de Myra Estrine Levine.
Outro conjunto de métodos pautados nos saberes da Psicologia e da Filosofia
acrescentaram mais fortemente a centralidade do indivíduo como sujeito do cuidado ao
rol de necessidades de saúde, incorporando para isso aspectos do desenvolvimento da
consciência, da auto-estima e de auto-aceitação, tanto do paciente quanto do enfermeiro.
Podem ser citados como exemplos dessa perspectiva o Modelo do Relacionamento
Pessoa a Pessoa, de Joyce Travelbee; a Teoria Humanística de Enfermagem, de
Josephine Peterson e Loretta Zderad; a Teoria da Unicidade dos Seres Humanos, de
Marta E. Roger; a Teoria da Saúde como Expansão da Consciência, de Margareth
19
Newman; a Teoria do Processo de Enfermagem Deliberativo, de Ida Orlando, e a
Teoria da Arte da Ajuda na Enfermagem Clínica, de Ernestine Wiedenbach.
Enquanto essa tendência incentiva a consideração do sujeito desde o
planejamento até a avaliação do cuidado, a Teoria das Necessidades Humanas de
Maslow caracterizou-se por dar ênfase aos aspectos motivacionais dos sujeitos. A
Enfermagem utilizou essa teoria no desenvolvimento da Teoria de Necessidades, de
Virginia Henderson; a Teoria dos 21 Problemas de Enfermagem, de Faye Glenn
Abdellah e a Teoria do Déficit de Auto-cuidado ou Teoria Orientada pela Doença, de
Dorothea Orem. No Brasil, inspirou A teoria das necessidades humanas, de Wanda
Horta. Mais recentemente, entre as décadas de 1980 e 1990, foi também desenvolvida a
Teoria da Enfermagem Transcultural, de Madeleine Leininger‡, embasada em
conhecimentos da Antropologia, particularmente a culturalista.
Associados à teoria dos sistemas como teoria fundante dos métodos de
enfermagem para o cuidado em saúde, seguiram-se métodos de identificação de
necessidades de saúde. As necessidades de saúde, que continuaram tomando por base as
necessidades fisiológicas, foram classificadas de maneira compartimentalizada e
hierarquizadas por sistemas em necessidades físicas, de relação com o ambiente,
emocionais, espirituais e da vida societária.
Portanto, referir-se a necessidades humanas, ou a necessidades humanas básicas,
significa considerar que o processo saúde-doença é determinado por fatores naturais,
num corpo individual que abriga um conjunto de necessidades que podem ser
identificadas separadamente e que em conjunto determinam o gradiente de saúde desse
indivíduo. O que permite essa interpretação é a naturalização do fenômeno saúde-
doença, que prescinde da essencialidade da dimensão social e considera que o corpo
não é nenhum corpo concreto, socialmente determinado em suas relações, mas sim um
corpo relativamente abstrato, reduzido a suas dimensões biológicas (Mendes
Gonçalves, 1989).
Tal interpretação do fenômeno saúde-doença permite no mesmo movimento o
obscurecimento e a naturalização dos determinantes das desigualdades sociais e
‡ Madeleine Leininger [on line]. Disponível em: <http://www.madeleine-leininger.com/en/index.shtml> (24 mar 2012)
20
possibilita afirmar que a doença, ou o agravo, é igual em todos os indivíduos (Mendes
Gonçalves, 1989). Também permite afirmar que há necessidades universais, iguais para
todos, definidas como o déficit entre o padrão de normalidade, considerado o padrão
ótimo de saúde, e o problema apresentado pelo sujeito.
A partir dessas considerações é possível afirmar que a gastrite, a tuberculose ou
o consumo de drogas são iguais em todos os sujeitos e também é possível definir um
conjunto de necessidades de saúde consideradas naturais, igual para todos (alimentação,
ingestão hídrica, sono e repouso, proteção do corpo, entre outras, consideradas básicas
para a sobrevivência).
Essa afirmação, no entanto, permitiria constatar que o fenômeno saúde-doença
acomete igualmente o proprietário da construtora, o operador de máquinas e o pedreiro;
a executiva da multinacional e a faxineira da empresa terceirizada que limpa sua sala; o
gerente do banco e o office-boy; o dono da confecção e o imigrante ilegal que lá
trabalha; o jovem paulistano do Capão Redondo e o jovem paulistano do Jardim
Paulista. Também seria verdadeiro afirmar que todos esses sujeitos têm o mesmo acesso
ao que responde a suas necessidades. No entanto, objetivamente essas afirmações não
são verificáveis na realidade, mesmo que a comparação restrinja-se a necessidades
atinentes à dimensão biológica e as consideradas básicas à sobrevivência, as que Heller
(1986) nomeou de necessidades necessárias.
Mas, ao se analisar os métodos que organizam o cuidado de Enfermagem, ou
seja, as teorias de Enfermagem, a partir dessa compreensão, evidenciou-se que
expressam a compreensão sistêmica do sujeito e da sociedade e a concepção multicausal
do processo saúde-doença.
A influência do paradigma crítico na produção do conhecimento em
Enfermagem tem sido notada por estudiosos (Weaver, 2006) que indicam a influência
de diferentes abordagens nesse paradigma: estudos feministas, humanistas (nessa
abordagem, principalmente Paulo Freire), movimentos sociais de caráter emancipatório,
e a escola de Frankfurt (principalmente Habermas). Na América Latina esse paradigma
foi desenvolvido particularmente na vertente do materialismo histórico e dialético
(MHD), essencialmente a partir dos escritos de Marx e Engels.
21
No Brasil, na vertente do MHD, Egry (1996) propôs um método para
sistematizar o cuidado de Enfermagem em Saúde Coletiva, compreendido como um dos
instrumentos do processo de trabalho em saúde, na mesma conjuntura político-social em
que os movimentos pela democratização da atenção à saúde retomaram o paradigma
crítico. Esse método de sistematização do cuidado parte da captação e interpretação de
um fenômeno da realidade, com suas bases no processo de produção e reprodução
social, e chega à proposta de projetos de intervenção e de reinterpretação da aplicação
do método. Foi denominado Teoria da Intervenção Práxica da Enfermagem em Saúde
Coletiva – TIPESC (Egry, 1996).
Embora tenha sido desenvolvida uma variedade de teorias, métodos e
metodologias (Mckenzie, 2007), e apesar de tentativas de formulação de métodos
críticos no âmbito da academia, os métodos clínicos baseados no padrão de normalidade
do funcionamento do organismo persistem de maneira dominante. Consequentemente,
uma vez que esses métodos são instrumentos de reconhecimento de necessidades de
saúde para a proposição do cuidado, as práticas de Enfermagem tem sido
primordialmente dirigidas a disfunções de órgãos e sistemas.
Assim, para necessidades biopsíquicas no âmbito individual ministram-se
medicações e realizam-se procedimentos prescritos pelo médico e pelo enfermeiro,
como por exemplo: enema para os problemas de eliminação, controle hídrico para os
problemas renais, curativos para lesões, relacionamento terapêutico para o cuidado na
dimensão psíquica/emocional, ambiente seguro e tranquilo para as necessidades de sono
e repouso, apoio familiar, entre outros.
22
3 O trabalho do enfermeiro como prática social
A hegemonia do paradigma da clínica funcionalista na fundamentação das
práticas não é característica unicamente das práticas dos enfermeiros, e sim das práticas
das profissões da área da saúde.
As práticas de saúde são instrumentos dos processos de trabalho em saúde, um
trabalho que tem como objeto necessidades de saúde. O processo de trabalho em saúde
não se objetiva na produção de um bem material, que no modo de produção capitalista
tomam a forma de produto, que incorporado de um valor de troca, é consumido na
forma mercadoria (Mendes Gonçalves)
Na saúde, o bem produzido incorpora-se imediatamente no próprio vir a ser do
homem individual, ou no vir a ser das condições objetivas de reprodução de suas
relações sociais (Mendes Gonçalves, 1992: 50). Portanto, na abstração do processo, o
bem produzido nos processos de trabalho em saúde não pode tomar forma de
mercadoria, nem poderia ser apropriado como tal. Por isso, justifica Mendes Gonçalves
(1992: 50), o trabalho em saúde terá sempre um estatuto especial, por comparação com
os processos de trabalho que se objetivam em bens materiais.
O processo de produção em saúde compõe o processo de produção mais geral da
sociedade e alinha-se com sua finalidade - a produção de excedentes e o consumo de
bens e serviços que movimentam a economia, na lógica da produção de lucros.
Portanto, a dinâmica que o rege o trabalho em saúde é a do modo de produção
preponderante, a mesma que rege o trabalho capitalista.
Esse quadro teórico geral norteou a discussão sobre necessidades apresentada na
tese de doutorado (Campos, 2004). O intuito era discutir como, a partir da
preponderância do capitalismo nas formações sociais, a relação do trabalho para
responder as necessidades humanas e seu aprimoramento, e o estabelecimento de
relações sociais mais ampliadas e solidárias ficou sobre-determinado pela nova finalidade
primordial do trabalho – a produção de excedentes.
Foi com a determinação do processo de produção que o trabalho humano foi
ficando subsumido aos instrumentos de trabalho e desta forma a atividade pôde ser
23
realizada sem que o projeto do resultado estivesse guiando e subordinando à vontade do
trabalhador (Althusser, 1999; Antunes, 2000).
Assim, desde que a necessidade social passou a ser a reprodução do capital, a
finalidade do trabalho passou a ser a produção do lucro, para atender os imperativos
expansionistas do capital (Antunes, 2000). Para responder à necessidade de produção de
excedentes o processo de trabalho passou por reorganização, que resultou na divisão
parcelar da produção. Essa divisão, que aparenta ser determinada pelas características
técnicas do trabalho, é na verdade determinada pelas características de inserção de
classe.
Para Viana, Soares, Campos (2013: 127) é “a divisão social do trabalho em seu
sentido mais amplo, em uma determinada sociedade, que institui as classes
fundamentais (instituídas pelo modo de produção dominante) e as demais classes
oriundas das relações de trabalho/produção nos demais modos de produção”. Para esses
autores “cada classe social ocupa uma posição no conjunto da divisão social geral do
trabalho. As classes fundamentais são a classe produtora/explorada e a classe
dominante/exploradora, que só existem nas suas relações mútuas”. Para viabilizar as
relações de produção e reprodução,
as classes auxiliares da classe dominante são aquelas que executam o trabalho de reprodução das relações de produção dominantes, por meio da direção, normatização, repressão e legitimação (...), que executam a ação de direção e legitimação no sentido de reproduzir as relações de produção capitalistas. As classes subalternas são aquelas que executam atividades subordinadas que visam à reprodução geral da sociedade (Viana, Soares, Campos 2013:127).
Dada a divisão em classes, o acesso a tecnologias, conhecimento e processos de
formação para o trabalho é desigual. A execução das partes mais marginais, menos
valorizadas e menos remuneradas dos processos de trabalho (geralmente as práticas
mais manuais), fica a cargo dos sujeitos das classes sociais mais exploradas. Já a parte
intelectual do trabalho, associada aos processos de criação, planejamento e
gerenciamento da atividade, é executada por sujeitos que tiveram mais acesso aos
processos de formação (Mendes Gonçalves, 1992). É evidente que essa divisão, que se
expressa numa divisão técnica, é sobre-determinada pela divisão social (Viana, Soares,
Campos 2013). As relações sociais são estabelecidas no interior das possibilidades
concretas que essa divisão oferece.
24
(...) Para Marx e Engels, a consciência não pode ser outra coisa senão o ser consciente. Por conseguinte, não há espaço, nesta concepção, para se pensar a consciência como algo autônomo. A consciência não é separável do ser humano que a desenvolve e este não é um indivíduo isolado e, sim, um ser social (Viana, 2008: 83)
Em estudo que tomou por objeto a divisão de trabalho na enfermagem, Budjoso
et al (2007) abordaram a dicotomia entre o trabalho manual e o intelectual e, pautando-
se na concepção de ideologia da competência técnico-científica definida por Marilena
Chauí, afirmaram:
Os dirigentes são os que recebem a educação científica e tecnológica, considerados portadores de saberes que os tornam competentes e por isso com poder de mando. Já os executantes apenas executam tarefas sem conhecer as razões e as finalidades de sua ação, por isso são considerados incompetentes e destinados a obedecer. Essa divisão social converteu-se na ideologia da competência técnico-científica, que coloca o "possuidor" do conhecimento como naturalmente dotado de poder de mando e direção, que se propagou nas escolas, hospitais, universidades, serviços públicos, dentre outros, sendo todos separados entre os "competentes" que sabem e os "incompetentes" que executam.
As práticas em saúde, instrumentos dos processos de trabalho em saúde, são
regidas pela mesma lógica. Dessa forma, a submissão do trabalho do enfermeiro aos
instrumentos possibilitou a preponderância da dimensão técnica do trabalho na
formação desse trabalhador, com uma certa desvalorização da dimensão teórica que,
como advertem Abrantes, Martins (2007), é a dimensão que possibilita o
reconhecimento da finalidade do projeto a ser executado e das características do objeto
a ser transformado.
Em decorrência da divisão social do trabalho, à Enfermagem coube a parcela
mais manual do trabalho em saúde, tendo sido atribuído ao médico o domínio do
processo, por assumir a parte mais intelectual – o diagnóstico e a prescrição (Mendes
Gonçalves, 1992). Posteriormente, para a prestação dos cuidados, a Enfermagem
reproduziu a mesma divisão, cabendo ao enfermeiro a parte mais intelectual do trabalho
manual – o planejamento e o gerenciamento do cuidado, ficando a parte mais manual
para os demais integrantes da equipe de enfermagem (Silva, 1989)
O processo de produção capitalista produz a desarticulação teoria-prática que,
dialeticamente, torna-se mecanismo importante de sustentação da divisão que fragmenta
o trabalho. Esse processo expressa-se no trabalho do enfermeiro por meio da reprodução
25
reiterativa de práticas originadas a partir da disponibilidade dos instrumentos e das
possibilidades de desenvolvimento da consciência, que se processa nas relações sociais
estabelecidas. Essas condições estruturais forjam também mediações particulares do
trabalho em saúde.
Na Enfermagem, uma das mediações é o paradigma da clínica, um dos pilares
do processo de produção em saúde na lógica da produção capitalista. Ele sustenta a
produção do conhecimento que faz desaparecer o ser social, por meio do mecanismo de
conceber o indivíduo como ser biológico, desenvolvendo práticas de cuidado para
responder a necessidades de saúde identificadas como disfunções de partes do
organismo bio-psíquico, com vistas a restabelecer a normalidade funcional.
Um agravante para a superação ou ao menos para a formulação de crítica a
respeito da limitação imposta por esse paradigma às práticas, é certamente o
desenvolvimento limitado da produção de conhecimentos na Enfermagem a partir de
conhecimentos de outras disciplinas.
26
4 - Políticas de saúde como eixo norteador das práticas
O Estado é a principal dentre as formas de regularização das relações sociais,
controlando e influenciando o funcionamento das demais, na tentativa de garantir a
reprodução das relações de produção e das relações sociais (Viana, 2007).
Parte-se do pressuposto que as políticas públicas de saúde, dispositivos do
Estado, são formuladas para sustentar e viabilizar o processo de produção em saúde,
regido pela mesma lógica do processo de produção mais geral da formação social.
Só é possível compreender a constituição das políticas no interior da totalidade
das relações sociais, considerando que o Estado é o agente do processo e propõe as
políticas no interior de suas contradições internas e pressões externas,
fundamentalmente determinadas em favor dos interesses gerais do capital e das
necessidades da acumulação capitalista. Mas não só, são também respostas a conflitos
de classes, de grupos de interesse e de partidos que dominam o Estado capitalista e
pressionam pela via da pressão popular, dos lobbies, entre outros (Viana, 2006)
As políticas estatais de assistência social, destinadas a atingir amplos setores da
população especialmente os mais desfavorecidos e os trabalhadores, são geradas, por
um lado, para garantir a reprodução da força de trabalho para as empresas capitalistas;
por outro, para responder a pressões de demandas da classe trabalhadora e de outros
grupos; e também pela necessidade de amortecimento de conflitos sociais, que podem
gerar crise de governabilidade ou a transformação social (Viana, 2006: 2)
O SUS, instrumento da política estatal de saúde, foi fruto dessa pressão,
protagonizada pelo movimento da Reforma Sanitária Brasileira, que trouxe à cena
pública as reivindicações de segmentos da sociedade civil pela democratização do
direito à saúde. A Reforma defendeu a necessidade de democratização da sociedade, do
Estado e das instituições, por meio de um conjunto de transformações capazes de
aprimorar as condições de saúde e permitir a todos o acesso a bens materiais e
imateriais, com vistas ao aprimoramento das condições de saúde (reforma agrária,
reforma urbana, distribuição de renda, rompimento com a dependência externa, controle
social dos meios de comunicação, ensino gratuito, controle do ambiente e acesso à
assistência à saúde) (Paim, 2008:136).
27
Um dos protagonistas desse movimento, Sérgio Arouca, disse que
operacionalizar os princípios básicos da Reforma Sanitária Brasileira não se resumiam à
criação do SUS, uma vez que para aprimorar as condições de saúde a política deveria
atingir esses âmbitos. “Por isso, era preciso discutir a saúde não como política do
Ministério da Saúde, mas como uma função de Estado permanente”§.
Do ponto de vista político, o projeto do SUS previa a superação dos insuficientes
sistemas de proteção social anteriores e respostas mais amplas às necessidades de saúde,
encaminhando ações de instrumentalização dos grupos sociais. Ao denunciar o desgaste
proveniente das formas de trabalhar diante dos encaminhamentos do projeto político
neoliberal, requeria o aprofundamento das políticas sociais públicas de redistribuição da
riqueza (Campos, Stotz, Soares, 2006).
A concepção política e ideológica do movimento pela Reforma Sanitária
Brasileira defendia a saúde (...) como uma questão social e política a ser abordada no
espaço público (Paim et al, 2011).
Do ponto de vista filosófico, os princípios do SUS constituem a essência do direito à saúde, um direito não mercadorizado, e seu usufruto não deveria depender do lugar em que o indivíduo ou grupo social se encontra na relação capital-trabalho, ou seja, trata-se de um direito cuja satisfação vai além das necessidades de sobrevivência. Nessa direção, as análises convergem para a compreensão de que os princípios da universalidade e da igualdade de atenção à saúde definem de modo mais explícito a essencialidade do direito universal (Calipo, Soares, 2013:4).
Esse direito foi conquista da mobilização de amplos setores da sociedade, no
contexto de lutas por direitos humanos, num período de distensão política do governo
de ditadura militar. O SUS, da forma como foi inscrito na Constituição, foi fruto de
embates entre grupos organizados com interesses diversos (Calipo, Soares, 2013).
Embora o ideário do SUS estivesse alinhado com a concepção de direito
universal, concretamente, o processo da implementação ocorreu no contexto de
reestruturação do processo de produção geral da sociedade (Calipo, Soares, 2013), que
produziu o aprofundamento das desigualdades sociais, o desemprego estrutural e o
§ extraído do verbete Reforma Sanitária, da biblioteca virtual Sérgio Arouca, da Fundação Osvaldo Cruz. Disponível em: http://bvsarouca.icict.fiocruz.br/sanitarista05.html. Acessado em 25 ago.2013
28
triunfo do neoliberalismo, que alcançou grande êxito no âmbito social, político e
ideológico (Boron, 1999).
Esse sucesso ideológico e cultural do neoliberalismo manifestou-se:
a) na avassaladora tendência à mercantilização de direitos e prerrogativas conquistadas pelas classes populares (...) convertidos agora em “bens” ou “serviços” adquiríveis no mercado. A saúde, a educação e a seguridade social, por exemplo, deixaram de ser componentes inalienáveis dos direitos de cidadão e se transformaram em simples mercadorias intercambiadas entre “fornecedores” e compradores à margem de toda estipulação política. b) no deslocamento do equilíbrio entre mercados e estado, (...) fenômeno objetivo (...) reforçado (...) no terreno ideológico que “satanizou” o estado (...). Potentes definições culturais [foram] solidamente arraigadas na população, [associando] o estatal com o mau e o ineficiente e os mercados com o bom e o eficiente. c) na criação de um “senso comum” neoliberal, (...) que penetra muito profundamente no chão das crenças populares (...). Este conformismo também se exprime no terreno mais elaborado das teorias econômica e sociais, [o chamado] “pensamento único. d) (...) convenceu amplíssimos setores das sociedades capitalistas – e a quase totalidade de suas elites políticas – de que não existe outra alternativa (...) [e rejeita todo discurso] que se atreva a dizer que a sociedade pode se organizar de outra maneira” (Boron, 1999: 9-10).
Essa reestruturação produziu a lógica da globalização econômica - dos
mercados, da produção e do consumo, e por consequência a subordinação do Estado às
leis de mercado mundial, a diminuição do investimento público em políticas, deixando
bens públicos, como a saúde e a educação, ao sabor das leis do mercado (Boron, 1999).
Nas diferentes formas de organização do Estado as políticas sociais públicas
estão intimamente vinculadas ao encaminhamento do projeto de manutenção da ordem
econômica (Laurell, 1997). Assim, as políticas estatais por ocasião da implementação
do SUS instrumentalizaram o rearranjo do núcleo capital/trabalho/Estado, baseando-se
na concepção do modelo neoliberal.
Carvalheiro (2000:12) teceu considerações a respeito da guinada neoliberal da
política estatal de saúde, considerando que a sensibilidade social do setor expressava
com maior nitidez as distorções e discrepâncias de um mundo repleto de aleijões, e
constatando que a ideologia e as propostas revolucionárias dos sanitaristas, que
impulsionaram a Reforma Sanitária Brasileira se chocaram com o “pragmatismo” do
stablishment, dominado pelos economistas (grifo do autor).
29
Paim (2006) sinalizou consequências para o processo de produção em saúde,
provenientes desse alinhamento das políticas de saúde às políticas econômicas, quando
descreveu que o processo de implantação do SUS esteve alinhado a diversas
concepções e projetos, até se tornar refém da política econômica.
O SUS formal, estabelecido pela Constituição, Lei Orgânica da Saúde e portarias; o SUS democrático, integrante de uma totalidade de mudanças desenhadas pela RSB; o SUS real, com direito a trocadilho com o nome da moeda que simboliza as políticas econômicas monetaristas e de ajuste macro-estrutural, refém da chamada área econômica dos governos e do clientelismo e do patrimonialismo que caracterizam o Estado brasileiro; e o SUS para pobres, como parte das políticas focalizadas defendidas por organismos internacionais (Paim, 2006:36).
Portanto, a adesão do projeto de manutenção da ordem econômica pelo Estado
brasileiro abalou o projeto que estava nas origens do SUS, que intencionava o cuidado à
saúde como direito e a saúde como resultado do acesso a bens e serviços que
favorecessem o aprimoramento das condições de trabalho e de vida dos sujeitos dos
grupos sociais. Também feriu um dos princípios fundamentais do SUS, o da
universalidade (Calipo, Soares, 2013).
Segundo Mészáros (2003:17), pautando-se em Marx:
(...) é impossível existir universalidade no mundo social sem igualdade substantiva. Evidentemente, portanto, o sistema do capital, em todas as suas formas concebíveis ou historicamente conhecidas, é incompatível com suas próprias projeções – ainda que distorcidas e estropiadas – de universalidade (...). A potencialidade da tendência universalizante do capital, por sua vez, se transforma na realidade da alienação desumanizante e na reificação.
Considerando-se as práticas como instrumentos da política e que não há
dissonância entre a indução das práticas pelas políticas estatais de saúde e o recorte de
necessidades de saúde, ou seja, não há base material concreta para conceber o SUS
como provedor do direito universal à saúde e nem a política de saúde como indutora da
ampliação das práticas. Tal idealização tem produzido nos trabalhadores insatisfação
com as práticas que realizam.
O caminho concreto que a implementação do projeto do SUS tomou parece não
ter sido amplamente discutido entre os trabalhadores da saúde. Os que conviveram à
época com o processo da concepção do SUS continuam com olhar nostálgico, voltado
30
ao ideário da política e a um projeto idealizado de SUS, que não se efetiva. Os
trabalhadores que chegaram depois parecem aceitar a realidade dos serviços de saúde,
esboçando reações um tanto ingênuas que se dirigem à ineficiência do setor público
para prover saúde, o que de alguma forma encobre as verdadeiras direções e
intencionalidades assumidas pelo Estado.
Esse mecanismo pode ser compreendido, em parte, pela crescente despolitização
do espaço público descrito por Calipo, Soares (2008:127), ao abordarem a
deslegitimação do poder político dos espaços públicos de decisão, como o das
Conferências: (...) a política passa a ser coisa de especialistas e não de cidadãos.
As necessidades de saúde - social e biologicamente determinadas - somente
serão reconhecidas socialmente, uma vez que é o sistema de atenção que utiliza critérios
para transformá-las de necessidades auto-referidas pelo indivíduo em um código
reconhecido pelo sistema (Stotz, s.d.), assim como a atenção a elas (Stotz, 2001). É o
sistema de saúde que deverá então organizar suas práticas para responder às
necessidades de saúde.
Uma vez que os processos saúde–doença desenvolvem-se coerentemente com os
perfis de reprodução social dos indivíduos que conformam os diferentes grupos sociais,
“quanto mais desigual for, nestes aspectos, uma sociedade, quanto mais essa
desigualdade for sancionada culturalmente, tanto maior serão as necessidades de saúde
dos diferentes grupos da população” (Stotz, s.d., p.3).
O conceito saúde-doença traz consigo a possibilidade de eleger o objeto do
cuidado (Mendes Gonçalves, 1992) e para toda necessidade há um processo de trabalho
correspondente. Assim, os processos de trabalho em saúde deveriam responder a
necessidades de saúde identificadas com os determinantes e condicionantes do processo
saúde-doença, em direção às necessidades atinentes ao aprimoramento da essência
humana. No entanto, como o processo de produção em saúde é alinhado ao modo de
produção geral da sociedade, os processos de trabalho em saúde serão coerentes com
sua finalidade. As políticas de saúde refletem a intencionalidade do Estado, como fica
evidente na afirmação: os sistemas de atenção à saúde são respostas sociais deliberadas às necessidades de saúde das populações que se expressam, fundamentalmente, nas suas situações de saúde. Por consequência,
31
deve haver uma sintonia muito fina entre essas necessidades de saúde e a forma como o sistema de atenção à saúde se organiza para respondê-las socialmente (Mendes, 2012: 38).
Por isso, as necessidades de saúde são tomadas como necessidades de
procedimentos realizados pelos serviços de saúde e os processos de trabalho em saúde,
que também reiteram as necessidades, induzem ao consumo de bens e serviços
(consultas, exames, medicamentos, produtos disponíveis no mercado), respondendo a
interesses do processo de produção.
32
5 - As respostas sociais da política estatal e necessidades de saúde
induzidas∗
Partindo do pressuposto de que as respostas às necessidades de saúde oferecidas
pelos serviços de saúde sofreram impacto com a regulamentação do SUS, Campos e
Bataiero (2007) propuseram um estudo para apreender as tendências dessa
reorganização do processo de produção de serviços de saúde, em publicações científicas
nacionais sobre o tema, por meio da análise das respostas sociais às necessidades de
saúde.
A complexidade do tema das necessidades de saúde e sua relação com os
serviços de saúde já foi abordada em diversos estudos no campo da Saúde Coletiva
(Campos, 2004; Matsumoto, 1999; Schraiber, Mendes Gonçalves, 1996; Stotz, 1991).
Embora partindo de diferentes disciplinas, esses estudos evidenciaram uma mesma
tendência: o conceito de necessidades de saúde eleito pelos serviços de atenção à saúde
tem sido o operacional, aquele utilizado para eleger o objeto da atenção à saúde.
Consequentemente, os projetos de atenção à saúde e a operacionalização das políticas
estatais têm sido determinados por essa perspectiva, associando as necessidades de
saúde ao consumo de um serviço de saúde, geralmente a consulta médica (Schraiber,
Mendes Gonçalves, 1996).
A partir do que foi tomado como objeto e como objetivo, as publicações foram
distribuídas entre as que tinham como centralidade a oferta ou a demanda de ações nos
serviços de saúde (associavam necessidades de saúde à necessidade de consumo de
serviços de saúde); as que abordavam a administração ou planejamento de serviços de
saúde (apresentavam as necessidades de saúde como instrumento para o planejamento
de serviços e de ações de saúde); e as que tinham como centralidade as necessidades de
saúde (tanto no âmbito abstrato quanto operacional do conceito, na perspectiva da
organização da produção de serviços de saúde ou de processos de trabalho, com a
finalidade de ampliação do objeto de atenção em saúde) (Campos, Bataiero, 2007).
∗ As considerações do âmbitos ações que promovem o cuidado direto aos sujeitos foram publicadas no artigo Necessidades de saúde: uma análise da produção científica brasileira de 1990 a 2004 (Campos, Bataiero, 2007).
33
Dentre os estudos analisados, a maior porcentagem (61,6%) tinha como
centralidade a oferta ou a demanda de ações nos serviços de saúde. Em muito menor
proporção (28,8%), havia os que abordavam a administração ou planejamento de
serviços de saúde e a menor porcentagem era a dos que tinham como centralidade as
necessidades de saúde (apenas 9,6%) (Campos, Bataiero, 2007).
Vale ressaltar que à ocasião do estudo as ações da Atenção Básica (AB) eram
normatizadas pela Norma Operacional Básica de 1996 (NOB/96), que pactuou o
financiamento da AB, por meio de repasse do Piso de Atenção Básica (PAB). Era
repassado aos municípios na forma de um valor fixo per capita, e previa um valor
variável, que dependia da adesão do município ao modelo oficial adotado pelo MS, o
Programa de Saúde da Família (PSF).
A NOB/96 previa as ações que deveriam estar contempladas na AB - dirigidas a
toda a população, para reduzir indicadores e índices (voltadas ao ambiente e a produtos,
a grupos de risco (sem defini-los) e a doenças e agravos, com enfoque nas de
notificação compulsória) e as dirigidas a grupos específicos da população (classificados
por faixa etária, por doenças ou agravos ou por eventos específicos de determinadas
fases da vida fases da vida) (Brasil, 1997). Eram ações de caráter claramente focalizado
em grupos específicos e restritivo no tocante ao impacto que delas se podia esperar,
identificado a com redução de índices e com a relação custo-benefício econômico.
Vale relembrar que a implementação do PSF ocorreu num contexto econômico
que operou um processo seletivo de privatização dos benefícios sociais, incentivado por
políticas estatais dirigidas à criação de um mercado disponível e garantido (Cohn,
1997). O setor saúde passou a despertar interesse como polo de consumo de
mercadorias industrializadas, independendo da existência ou não de necessidades dos
usuários dos serviços de saúde. Os serviços médico-hospitalares passaram a incorporar
equipamentos de alta densidade de capital, acarretando em custos crescentes da atenção
à saúde (Paim, 2006).
O contexto econômico em que foi eleita a AB para a reorganização do Sistema
de Saúde no Brasil dos anos 1990 se assemelha às origens da reorganização do Sistema
pela APS na Inglaterra dos anos 1920 e a lógica que regeu a eleição das práticas no
PSF, expressas pela NOB/96, parece ser a mesma que permeou as recomendações da
34
Conferência de Alma Ata, em 1978, para a Atenção Primária à Saúde (APS) (OMS,
1978), coerentes à lógica da focalização da APS as populações pobres, como pode ser
lido no sub item 5, do item das recomendações da Conferência.
a Conferência recomenda que a APS implemente, ao menos, as seguintes atividades: programas educativos relacionados aos problemas de saúde mais freqüentes e aos métodos para identificá-los, preveni-los e combatê-los; promover o fornecimento de alimentos e de uma nutrição apropriada; abastecimento suficiente de água potável e medidas de saneamento básico; assistência materno infantil, incluindo-se o planejamento familiar, a imunização contra as principais doenças infecciosas; prevenção e combate às doenças endêmicas locais, tratamento apropriado de doenças e agravos comuns; promoção da saúde mental e fornecimento de medicamentos essenciais.
O estudo (Campos, Bataiero, 2007) analisou artigos publicados entre 1990 e
2004, contemplou o contexto do período anterior à reorganização da AB pela NOB/96.
No entanto, os resultados das publicações mostraram a preponderância da lógica
orientada na NOB/96, o que condiz com a possibilidade da política de financiamento de
pesquisas ter induzido essa tendência.
Tal preponderância dessa lógica pode ser verificada nos resultados do estudo
(Campos, Bataiero, 2007). Dentre os 45 trabalhos que abordavam a oferta e/ou a
demanda de ações nos serviços de saúde, 36 (80%) centralizavam a oferta e/ou a
demanda em ações dirigidas a doenças e nove (20%) abordavam ações dirigidas a
planejamento familiar ou pré-natal/puerpério, ou seja, tinham como objeto um evento
específico numa fase da vida da mulher - gravidez/parto/puerpério.
Todos esses 45 trabalhos (100%) descreviam ações que se coadunavam com as
ações ou programas previstos pela NOB/96, que orientava a gestão de recursos para a
saúde (Brasil, 1996) regulando, por conseqüência, as políticas de financiamento do SUS
segundo a lógica da racionalização de custos, submetida à relação custo-benefício.
Coerentemente com as orientações da NOB/96 que preconizava que o Estado
financiasse algumas ações para alguns grupos, classificados primordialmente pelo
chamado ciclo vital, dos 45 estudos que tratavam de oferta e/ou demanda de ações nos
serviços de saúde, 34 deles (75,6%) apresentavam ações dirigidas a grupos específicos,
e nove (20%) abordavam ações programáticas, todas descritas na Portaria n. 3925/98
que regulamenta as orientações da NOB 96 (Brasil, 1996).
Assim, todos esses artigos (100%) referiam-se a necessidades de saúde
institucionalmente determinadas, que prescindem a leitura de necessidades dos
35
indivíduos que ocupam o território de abrangência dos serviços de saúde. Este resultado
evidencia que os serviços de saúde abordavam as necessidades como sinônimo de
necessidades de cuidado a agravos ou, no caso do pré-natal e planejamento familiar,
eventos específicos de um determinado ciclo vital: a fase reprodutiva.
Calipo e Soares (2008) sinalizaram que a reorganização do modelo de atenção
advinda da NOB/96 fere o princípio da universalidade do SUS, uma vez que limita
ações a grupo classificados como de risco (não estão descritos critérios), o que
certamente exclui os que não se enquadrarem. Além disso, ações voltadas a sofrimentos
psíquicos eram reduzidas à sugestão de grupos de autoajuda para evitar internação por
depressão em idosos.
As práticas induzidas são respostas a um conjunto definido de necessidades de
saúde, comum a todos os indivíduos de um determinado grupo (etário, “de risco”,
relacionados a processos tomados como naturais de determinadas fases da vida),
tomado como agrupamento homogêneo no que diz respeito a sua inserção nas condições
de reprodução social, ou seja, sua condição de classe. Além disso, são práticas que
incidem privilegiadamente no âmbito da doença, numa perspectiva funcionalista e
classificatória. Portanto, a indução de práticas na AB feita pelo MS após a promulgação
do SUS expressava uma intencionalidade que não era a da ampliação do objeto da
atenção à saúde.
A partir das publicações científicas que foram objeto do estudo, pode-se inferir
que a tendência dos serviços de saúde continuava sendo a de tomar necessidades de
saúde bastante identificadas com a doença, apreendidas como expressão biológica ou no
máximo como expressão bio-psíquica no corpo individual de um sujeito abstrato.
Considerando-se a circularidade entre necessidades e processos de trabalho, as ações em
saúde reiteravam que necessidades de saúde eram respondidas com o consumo de
procedimentos de saúde, majoritariamente a consulta médica (Campos, Bataiero, 2007).
Posteriormente, utilizando-se os mesmos descritores, na mesma base de dados,
esse levantamento foi ampliado até o ano de 2012, perfazendo um período de 7 anos,
metade do tempo considerado no estudo anterior (1990 a 2004).
36
Quanto à proporcionalidade da distribuição do tema abordado, a dos estudos
com centralidade na oferta ou na demanda de ações nos serviços de saúde houve
pequena diminuição, guardando semelhança na proporcionalidade com os do período
1990 a 2004 (61,6% e 58,1%, respectivamente). Já entre os que abordavam a
administração ou planejamento de serviços de saúde a diminuição foi
proporcionalmente maior (28,8% e 23,3%). A maior diferença foi observada entre os
estudos que abordavam centralmente as necessidades de saúde, que praticamente
dobraram (9,6% e 18,6%).
Quanto ao conteúdo dos estudos que abordavam a oferta ou demanda de ações
nos serviços de saúde, no geral não foram muito marcantes as diferenças identificadas
nas tendências da reorganização do processo de produção de serviços de saúde, na
comparação entre com os resultados dos estudos dos dois períodos sinalizados, a não ser
pelas ações dirigidas a grupos ou com especialidades antes não previstas na NOB/96,
como aos adolescentes ou ações para saúde ocupacional e saúde mental (Cossetin,
Olschowsky, 2011, Rhis, Sousa, Cypriano, 2010, Lucchese Oliveira Conciani Marcon,
2009, Paula, Duarte, Bordin, 2007, Murta, Tróccoli, 2007, Claro et al, 2006, Mandu,
2005). Esse conjunto de ações não previstas na NOB/96, é parte das ações acrescentadas
na Norma Operacional da Assistência à Saúde/SUS – NOAS-SUS 01/01 (Brasil, 2001),
reiterada na NOAS-SUS 01/02 (Brasil, 2001).
A implantação da NOAS teve o propósito de dar continuidade ao processo
iniciado pela NOB/96 para a operacionalização do SUS, de descentralização da gestão
financeira e de processos e projetos de cuidados antes concentradas no nível federal
para os níveis estadual e principalmente municipal.
A NOAS inscreveu em Portaria “a atenção básica como parte imprescindível de
um conjunto de ações necessárias para o atendimento dos problemas de saúde da
população, indissociável dos demais níveis de complexidade da atenção à saúde e
indutora da reorganização do Sistema” (Brasil, 2001). Embora se propusesse indutora
da reorganização do Sistema, a referida Norma apenas acrescentou ao conjunto anterior
de ações previstas pela AB, “o tratamento dos distúrbios mentais e psicossociais mais
frequentes; o controle das doenças bucais mais comuns e o suprimento/dispensação dos
medicamentos da Farmácia Básica” (Brasil, 2001).
37
O que diferiu significativamente no conjunto dos estudos de oferta ou demanda
de ações nos serviços de saúde, do período 2005 - 2012, foi a proporção de estudos da
área da odontologia (42,5%). Esse aumento certamente foi resultado da inserção da
equipe de saúde bucal (ESB) (cirurgiões-dentistas (CD), atendentes de consultório
dentário e técnicos de higiene dentária) no PSF a partir do ano 2000. Esses estudos
tinham como centralidade o diagnóstico e a necessidade de tratamento de cáries e outros
problemas bucais.
Estudo crítico sobre as práticas dessa equipe no PSF (Cericato, Garbin,
Fernandes, 2007:18), afirmou que as características do trabalho (predominância do
enfoque assistencial, que prioriza o atendimento clínico individual) não se alteraram
significativamente com a entrada da ESB no PSF. As autoras afirmaram que “muitas
vezes o que ocorre é apenas a transferência linear do espaço de trabalho do CD”.
Atribuíram a dificuldade de mudança do enfoque assistencial ao descompasso
entre o começo da Estratégia e a entrada da ESB no PSF, à formação acadêmica dos
CD, que não contempla a interdisciplinaridade e o preparo para o trabalho em equipe.
Sinalizando a necessidade de motivação para a reflexão e o redirecionamento dessas
práticas, sugeriram como ponto de partida os processos de educação continuada
(Cericato, Garbin, Fernandes, 2007). No entanto, essa não é uma peculiaridade das
práticas da Equipe de Saúde Bucal no PSF (ou Estratégia Saúde da Família – ESF).
A análise da totalidade desses estudos com centralidade em necessidades de
saúde como sinônimo de oferta ou demanda de ações nos serviços de saúde (50 artigos)
focalizava a mesma perspectiva - ações e serviços voltados a aspectos do corpo bio-
psíquico de indivíduos abstratos como resposta a necessidades de saúde. No tocante à
AB, as ações identificadas foram as previstas pelos programas prioritários do Ministério
da Saúde, operacionalizados em unidades de saúde da família (USF). Resultados de
avaliação do atendimento à demanda espontânea no acolhimento em USF reiteram essa
afirmação.
Num desses estudos, realizado em MG, os resultados atestaram que 100% dos
motivos da procura estiveram associados a queixas clínicas, que foram atendidas em
consultas realizadas por médicos ou enfermeiros, ou foram encaminhados a serviços
especializados da rede de atenção à saúde (Esperança, Cavalcante, Marcolino, 2006).
38
Noutro, realizado em município do interior de SP, a procura por acolhimento associada
a problemas de natureza intrinsecamente biológica foi de 93,9% (Baraldi, Souto,
2011).
Essa perspectiva também se manteve no atendimento processual e grupal, como
se verificou na descrição de grupo educativo realizado em USF, identificado como
programa de educação em diabetes, guiado por protocolo (Staged Diabetes
Management). Pode-se verificar a finalidade da atividade a partir do título do protocolo,
totalmente identificada com o controle de sintomatologia da doença (Santos et al, 2009).
As expectativas dos usuários e os benefícios por eles verbalizados ao final do
programa são identificadas com aspectos bio-psíquicos derivados da doença - controle
emocional e da doença, aceitação da doença, disciplina e cura total foram relatados
como expectativas. Já o controle de parâmetros clínicos, aceitação e uso correto da
medicação, e troca de experiências com o grupo foram relatados como benefícios da
participação no programa (Santos et al, 2009). Resultados semelhantes no atendimento
grupal a diabéticos foram descritos por Torres, Pereira, Alexandre (2011).
Estudos avaliativos da implantação a ESF em municípios com mais de 10 mil
habitantes identificaram a mesma tendência. As práticas desenvolvidas, incluindo as de
enfermagem, seguiam as diretrizes da ESF e eram operacionalizadas para diminuir
fatores de risco de sujeitos pertencentes aos grupos considerados prioritários nas
diretrizes do Ministério da Saúde (Elias et al., 2006; Facchini et al., 2006; Giovanella,
Escorel, Mendonça, 2009; Szwarcwald et al., 2006).
39
6 As respostas sociais da política estatal e as necessidades de saúde
induzidas na especificidade do cuidado do enfermeiro na AB
A intencionalidade da política de saúde pode ser identificada desde o ingresso do
trabalhador enfermeiro na ESF, pela característica do curso que lhes é ministrado
previamente ao início do trabalho. Martins et al. (2010:284) destacaram que a temática
abordada restringe-se aos grupos de risco (hipertensos, diabéticos, entre outros) ou
grupos prioritários (puericultura, crianças, mulheres em idade reprodutiva, idosos) e que
a atenção é orientada por protocolos.
Embora possa contemplar as desiguais condições de vida e de saúde, uma vez
que advém das secretarias municipais de saúde (Rodrigues, 2008), o protocolo**
utilizado em saúde é relacionada a aspectos bio-psíquicos, para guiar procedimentos,
portanto tem potência para instrumentalizar parte da consulta de Enfermagem. No
entanto, dada a característica do trabalho do enfermeiro - que reproduz práticas a partir
da disponibilidade dos instrumentos – o procedimento pode ficar subsumido a ele e com
isso o procedimento passa a responder à finalidade nele contida.
A consulta de Enfermagem na ESF é guiada por protocolos centrados nos
saberes da clínica, nos moldes da consulta médica. Santos et al. (2008) identificaram o
constrangimento de enfermeiros que, pela fragilidade nos conhecimentos clínicos,
sentiam-se expostos perante colegas e usuários do serviço quando realizavam as
consultas de Enfermagem. Portanto, verifica-se que a centralidade da consulta era o
protocolo.
Vários estudos identificaram que a finalidade das consultas de Enfermagem na
ESF era principalmente a adesão ao tratamento medicamentoso (Ermel, Fracolli, 2006;
Roecker, Marcon, 2011; Shimizu, Rosales, 2009). Resultado de estudo de Ermel,
Fracolli, (2006) identificou também o objetivo de aliviar a agenda do médico.
** Conjunto de regras instituídas ou definidas que permitem um entendimento universal ou em grupos,
dispensando assim a comunicação verbal.
Disponível em: http://www.dicionarioinformal.com.br/protocolo. Acesso em 25 ago 2013.
40
Quando utilizada como instrumento de educação em saúde, a consulta de
enfermagem tem tomado como objetivo apresentar um conjunto de normas e regras, nos
moldes de orientação e convencimento, com a finalidade de imprimir ou acompanhar
mudanças de hábitos e instrumentalizar o usuário para o autocuidado,
responsabilizando-o pela manutenção de sua saúde (Ermel, Fracolli, 2006; Roecker,
Marcon, 2011), repetindo acriticamente um dos preceitos da AB recomendado por
organismos multilaterais, para desresponsabilizar o Estado da prestação de cuidados e
racionalizar os custos do Sistema de Saúde.
As práticas de vigilância epidemiológica (VE), por serem amparadas pela
Epidemiologia clássica, também são pautadas nos conhecimentos da clínica e tomam
por objeto as doenças. Portanto, as práticas tem a finalidade de identificá-las e de
prevenir que outros sujeitos sejam atingidos. Resultados de estudos empíricos
confirmam essa afirmação (Nascimento, Nascimento, 2005; Santos, Rigotto, 2010;
Shimizu, Rosales, 2009; Silva et al., 2001; Teixeira, 2008; Thumé, 2001). Como
decorrência, as ações de VE são principalmente mutirões para vacinação, para avaliação
ou realização de exames preventivos (Shimizu, Rosales, 2009).
Coerentemente com o enfoque de consultas e protocolos, as visitas domiciliárias
(VD) assumem um caráter controlador e por vezes invasivo (Nascimento, Nascimento,
2005). São prioritariamente realizadas para usuários inviabilizados de chegar à USF ou
por fazerem parte de grupos de risco ou programas e serem faltosos, ou ainda para
fiscalização e convencimento de mudança de hábitos, incluindo os de higiene
(Nascimento, Nascimento, 2005; Shimizu, Rosales, 2009; Thumé, 2001). O enfoque da
VD é o indivíduo que mobilizou o procedimento e a família é abordada apenas como
contribuinte para a terapêutica (Ermel, Fracolli, 2006; Oliveira, Marcon, 2007).
No que diz respeito às práticas educativas, essas têm sido tomadas como mais
uma tarefa dentre tantas outras do enfermeiro, um instrumento técnico que prescinde de
conhecimento específico e reproduz o modelo biomédico (David, Acioli, 2010).
Utilizam recursos pedagógicos precários e comunicação pouco interativa, com baixa
participação dos usuários (Nascimento, Nascimento, 2005; Oliveira, Marcon, 2007;
Shimizu, Rosales, 2009; Teixeira, 2008; Silva, 2010). Essas práticas têm sido delegadas
aos ACS, com suporte de outros profissionais da USF, quando necessário.
41
As atividades grupais na ESF envolvem sujeitos considerados de risco pelo MS
(Oliveira, Marcon, 2007; Rodrigues, 2008; Shimizu, Rosales, 2009; Thumé, 2001). O
objetivo é ensinar comportamentos saudáveis (Jesus et al., 2008) para o controle e a
prevenção de doenças (Shimizu, Rosales, 2009; Teixeira, 2008). Assim como as
práticas educativas, embora o grupo seja um instrumento previsto junto a outras práticas
da USF, a o preparo e a competência do trabalhador para realizá-lo não é pré-requisito e
a falta de formação leva o trabalhador a cometer equívocos. Assim como acredita que
dominando o protocolo realizará uma boa consulta, avalia que basta munir-se de jogos
e dinâmicas que envolvam o grupo para realizar uma prática que vá além de atividade
lúdica.
O envolvimento de trabalhadores da saúde com a participação social é escasso
(Martins et al., 2010). O enfermeiro, ainda que timidamente, vem promovendo alguma
forma de participação dos usuários ou da população em espaços de discussões junto às
famílias e aos grupos comunitários (Nascimento, Nascimento, 2005), bem como no
Conselho Gestor da USF (Silva, Motta, Zeitoune, 2010).
A programação em saúde da ESF também define as ações de gerenciamento de
serviços da AB (Martins et al., 2010; Nascimento, Nascimento, 2005; Santos et al.,
2008; Shimizu, Rosales, 2009; Silva et al., 2001). As práticas de gerenciamento dos
serviços têm objetivado o cumprimento de metas associadas à produtividade
quantitativa preconizada pelas diretrizes de avaliação do MS, que representam ganhos
financeiros para a equipe (Brasil, 2012), limitando a participação dos profissionais nas
tomadas de decisões. Essa lógica limita o gerenciamento centrado no cuidado das
necessidades de saúde da população e gera insatisfações na equipe de enfermagem
(Jonas, Rodrigues, Resck, 2011; Spagnuolo, Pereira, 2007).
Embora essas práticas sejam previamente definidas pela lógica programática e
dirigidas preponderantemente aos sujeitos que utilizam exclusivamente o SUS para
assistência à saúde, incoerentemente chamados de SUS dependentes, há diversas
nuances em sua operacionalização por enfermeiros. Se por um lado muitos descrevem
ações circunscritas e restritas aos agravos já estabelecidos (Nascimento e Braga, 2004;
Felipe, Abreu, Moreira, 2008; Freitas et al, 2008) e aos eventos específicos dos ciclos
vitais previstos pela ESF (Oliveira, Tavares, 2010), sem sinalizar a limitação intrínseca,
42
frente ao modelo prometido pela ESF, por outro há os que identificam as limitações e
sinalizam as incoerências.
Ermell, Fracolli (2006) identificaram que as ações de Enfermagem continuam
preponderantemente dirigidas a agravos, sob a perspectiva teórica da multicausalidade
do processo saúde-doença, distanciadas da proposta de ampliação do objeto das práticas
na AB. Na mesma perspectiva, Fortuna et al (2011) evidenciaram que embora
enfermeiros estejam realizando ações voltadas a coletivos, essas também continuam
majoritariamente ancoradas nos saberes tradicionais da saúde e da educação.
Há estudos que refletem práticas que tencionam essa lógica hegemônica.
Matumoto, Mishima e Pinto (2001) discutiram a necessidade da operacionalização de
práticas ancoradas em marcos teóricos da Saúde Coletiva, ou seja, que a Enfermagem,
uma prática social que não é neutra, tencione seus processos de trabalho tomando
objetos ampliados, sob a ótica da concepção de processo saúde-doença socialmente
determinado e a partir da leitura de necessidades de saúde coerentes com essa
concepção.
Na mesma perspectiva, sob o ponto de vista do processo de trabalho em
gerenciamento, Vilas Boas, Araújo e Timóteo (2008) evidenciaram que a ampliação do
objeto trará consigo a necessidade de instrumentos de trabalho também mais
abrangentes, se incorporados de outros saberes, como a educação emancipatória.
Com o propósito de ampliar o objeto da atenção nas práticas de enfermagem na
equipe na AB, Nakamura et al (2009) apresentaram um instrumento para identificação
de necessidades de saúde que incorpora itens associados a condições de reprodução
social de indivíduos e famílias. Já Matumoto, Mishima et al (2011) propuseram a
ampliação do objeto do cuidado a partir de processos de reflexão com equipes de USF,
utilizando a discussão de casos. Matumoto, Fortuna et al (2011) apresentaram a
ampliação no âmbito das práticas clínicas de enfermeiras da AB, sob a ótica da clínica
ampliada.
Mishima et al (2010), Matumoto et al (2009) e Gaioso e Mishima (2007)
mostraram que a satisfação do usuário com o cuidado à saúde no âmbito da AB também
está bastante associada à qualidade das relações estabelecidas com a equipe, sinalizando
43
a importância da utilização de instrumentos relacionais que viabilizam o vínculo com a
equipe e com o cuidado por ela prestado e, consequentemente, a longitudinalidade da
atenção, um dos pressupostos da AB.
As publicações mostraram que há um tensionamento na análise e na discussão
dos resultados dos estudos, que expõe a limitação das práticas hegemônicas da USF
para responder as necessidades de saúde dos usuários. No entanto, não foram
encontradas publicações que descrevessem práticas que incorporassem em alguma
medida essa ampliação. Dessa forma, pode-se afirmar que o conhecimento que
fundamenta preponderantemente as várias abordagens das práticas permanece o mesmo,
o clínico.
Estudos que buscaram explicar causas dessa constatação (Baraldi, Souto, 2011;
Cericato, Garbin, Fernandes, 2007; Esperança, Cavalcante, Marcolino, 2006),
associaram a limitação na ampliação do objeto do trabalho no acolhimento à
organização do processo de produção em saúde, que não operacionaliza a
intersetorialidade (Baraldi, Souto, 2011), aos processos de trabalho na USF, que não
promovem a interdisciplinaridade e a reflexão a respeito do objeto do trabalho (Baraldi,
Souto, 2011; Cericato, Garbin, Fernandes, 2007; Esperança, Cavalcante, Marcolino,
2006) e a forma de utilização da USF pelos usuários, que buscam o acolhimento com
demandas clínicas e o utilizam nos moldes de pronto- atendimento, inviabilizando a
adequação das práticas às finalidades da ESF (Baraldi, Souto, 2011; Esperança,
Cavalcante, Marcolino, 2006).
A partir dessa interpretação acerca do que limita o acolhimento na ampliação do
objeto da atenção à saúde, prometida pela ESF, esses autores sugeriram formas de
enfrentamento dirigidas aos trabalhadores e aos usuários das USF. Na esfera do
trabalho, sugeriram que além dos da enfermagem, outros trabalhadores de diferentes
áreas disciplinares fizessem parte do acolhimento, para que fossem agregados outros
saberes (Baraldi, Souto, 2011; Esperança, Cavalcante, Marcolino, 2006). Cericato,
Garbin, e Fernandes (2007) sinalizaram a necessidade de capacitação de todos os
profissionais da equipe de saúde da família, exigida por esta nova dinâmica do
processo de trabalho (Esperança, Cavalcante, Marcolino, 2006: 31).
44
No tocante aos usuários, foi sugerido um trabalho de capacitação, nos moldes
preconizados pela Carta de Otawa, para “empoderar” a população para que ela tenha
autonomia na solução das causas desses problemas (grifo no original) (Esperança,
Cavalcante, Marcolino, 2006: 36).
Esse termo - empowement ou empoderamento, juntamente com o termo
autonomia, que não poucos trabalhadores da saúde repetem acriticamente, tem servido
para culpabilizar os sujeitos por suas condições materiais e de saúde e responsabilizá-
los a encontrar soluções (Stotz, Araujo, 2004). O princípio que subjaz a essas
terminologias trazidas pela Carta de Otawa foi anunciado no item 19 do resumo do
debate da Conferência de Alma Ata e equivocadamente nomeado participação.
A importância da participação plena e organizada e da auto-responsabilidade final da comunidade, de maneira que os indivíduos, as famílias e as comunidades sejam mais responsáveis pela própria saúde. A participação da comunidade na identificação e solução de seus problemas de saúde pode ser facilitada pelo apoio de grupos, tais como os organismos de administração local, as personalidades locais, os grupos de voluntários, os grupos juvenis e femininos, os grupos de consumidores, a Cruz Vermelha e sociedades análogas, outras organizações não governamentais e movimentos de liberação, assim como pela possibilidade de informar devidamente a população (OMS, 1978: 21). (...) a Conferência recomenda aos governos que estimulem e assegurem a plena participação da comunidade, mediante a difusão eficaz da informação pertinente, o incremento da alfabetização e o estabelecimento do marco institucional necessário que permita aos indivíduos, às famílias e às comunidades tornarem-se responsáveis pela sua saúde e bem estar (OMS, 1978: 27).
Portanto, na exemplaridade dessas publicações, de autores três diferentes estados
do país, é possível afirmar que um grande número de trabalhadores, ao se relacionarem
com um projeto idealizado de SUS e do modelo de atenção e não presenciarem sua
efetivação no cotidiano do trabalho, buscam explicações que ora são atribuídas à
ineficiência do setor público, ora aos próprios trabalhadores e suas práticas, ora à
incompreensão dos usuários quanto à finalidade dos processos de trabalho da USF.
Como consequência dessa interpretação, a sugestão das formas de enfrentamento,
também idealizadas, passam ao largo da consciência de que a política estatal é
instrumento das intencionalidades assumidas pelo Estado.
45
Concretamente, as formas de regularização das relações sociais expressas pela
política nacional de saúde brasileira, na particularidade da AB, induzem práticas
programáticas, que respondem a necessidades de saúde delimitadas pelo recorte de
doenças e agravos priorizados pelo MS, voltadas a populações com dificuldade de
acesso a serviços de saúde oferecidos no mercado, viabilizadas nos municípios pelos
financiamentos federais.
A AB, internacionalmente nominada Atenção Primária à Saúde (APS), tem sua
origem como eixo organizador do sistema de saúde quando foi reconhecida na
Inglaterra como possibilidade para enfrentar os altos custos do sistema, pautada na
atenção médica e marcada por sua crescente complexidade. A proposta foi publicada no
Relatório Dawnson, documento governamental que descrevia a organização do modelo
de atenção em centros de saúde primários e secundários, serviços domiciliares [SD],
serviços suplementares e hospitais de ensino (Matta, Morosini, 2009).
Os centros de saúde primários e os serviços domiciliares deveriam estar organizados de forma regionalizada, onde a maior parte dos problemas de saúde deveriam ser resolvidos por médicos com formação em clínica geral (Matta, Morosini, 2009).
Esse método de racionalização de custos está expresso no relatório da I
Conferência Internacional sobre Atenção Primária de Saúde, conhecida como a de
Alma-Ata, publicado em 1978. Ao sugerir que as práticas da APS tivessem coerência
com os custos possíveis para a comunidade e para o país suportarem, a Conferência já
sinalizou seu alinhamento à lógica de que os gastos do Estado devem ser mínimos para
políticas sociais e as ações e projetos devem ficar ao máximo sob responsabilidade da
sociedade civil, deixando sob o auspício do Estado apenas projetos para os que não têm
acesso a serviços de saúde privado.
A APS é a assistência sanitária essencial baseada em métodos e tecnologias práticos, cientificamente fundamentados e socialmente aceitáveis, postos ao alcance de todos os indivíduos e famílias da comunidade, mediante sua plena participação e a um custo que a comunidade e o pais possam suportar em todas e em cada uma das etapas de seu desenvolvimento, com um espírito de auto responsabilidade e autodeterminação (...) (OMS, 1978: 19).
a APS exige a elaboração, a adaptação e a aplicação de tecnologia apropriada para a saúde, que a população possa utilizar e custear, incluindo o fornecimento suficiente de medicamentos essenciais baratos e de boa qualidade (...) (OMS, 1978: 23).
46
a necessidade de uma distribuição equilibrada de todos os recursos disponíveis, e em particular dos recursos públicos, de maneira que se preste uma atenção apropriada aos grupos desfavorecidos da população, em matéria de APS e desenvolvimento em geral. As políticas nacionais de saúde devem ser acessíveis a todos, com caráter prioritário (...) (OMS, 1978: 21).
O termo Atenção Básica à Saúde passou a ser adotado a partir dos anos 1990,
para caracterizar a primeira instância de uma rede hierarquizada de serviços de atenção
à saúde. Essa terminologia vem sendo utilizada com a intenção de desfazer a associação
entre a concepção de atenção primária e seletividade das práticas à população que não
tem acesso à assistência à saúde de caráter privado. No entanto, para além da
terminologia, AB abrangente é aquela que orienta o sistema de saúde, articulado em
rede para responder às necessidades de saúde da população (Giovanella, Escorel,
Mendonça, 2009).
Embora tenha adotado a terminologia AB, sua definição de pelo MS brasileiro
não diverge das concepções de APS anteriormente citadas.
A Atenção Básica à Saúde caracteriza-se por um conjunto de ações de saúde (...), dirigidas a indivíduos e grupos da população de espaços delimitados (área de abrangência do serviço de saúde), utilizando tecnologias de elevada complexidade e baixa densidade [tecnológica], que devem resolver os problemas de saúde de maior freqüência e relevância em seu território. (...) (Brasil, 2007: 12).
ATENÇÃO BÁSICA – O Saúde da Família é a principal estratégia do Ministério da Saúde para reorientar o modelo de assistência à saúde da população a partir da atenção primária, que é a principal e mais próxima porta de entrada do SUS, capaz de resolver até 80% dos problemas de saúde das pessoas (MS, s/d).
Para realizar esse projeto de AB no território nacional, o governo federal
viabilizou um mecanismo de repasse de verbas federais para os municípios. Embora a
descentralização, um dos pilares de sustentação do Sistema de Saúde brasileiro, só tenha
se efetivado no SUS, a discussão da concepção de que a heterogeneidade das condições
de saúde dos brasileiros só poderia ser respondida com a municipalização da atenção à
saúde teve suas origens no sanitarismo desenvolvimentista dos anos 1950, e foi
apresentada como proposta já na 3a Conferência Nacional de Saúde, em 1963, pelo
47
então ministro da saúde Wilson Fadul††*. No entanto, como o período de governo
militar posterior favoreceu a centralização e privatização do setor, até meados dos anos
1970 as experiências de ações locais foram desenvolvidas no formato de programas
comunitários, voltados à populações pobres, sem acesso a serviços de saúde, de áreas
rurais ou da periferia urbana, nos moldes do que preconizava a Medicina Comunitária
(Heimann et al, 2000).
O contexto da descentralização do sistema de saúde era o da transição política e
reconfiguração da Federação Brasileira. Segundo Paim et al (2011: 19), a saúde foi o
único setor que implementou uma descentralização radical, com importante
financiamento e ações regulatórias do governo federal.
A descentralização financeira e da gestão do Sistema foi celebrada como
componente democrático do processo de operacionalização do SUS. Na agenda da RSB
essa diretriz era considerada estratégica para a democratização e a viabilização do
Sistema, à medida que tornava imprescindível a descentralização do poder econômico e
de gestão da esfera federal e colocava no jogo das decisões outras instâncias de governo
e da sociedade civil. Era a diretriz que viabilizava a universalidade e integralidade do
Sistema (Noronha, Lima, Machado, 2008). Para efetivá-la foram necessárias reformas
administrativas em todos as instâncias governamentais (Paim et al, 2011), provocando
mudanças nos papéis dos gestores.
É o gestor estadual aquele que fica mais perturbado (...). Seu papel original de executor de ações voltadas para o atendimento da população e de contratante de serviços privados e filantrópicos é substituído por uma função de coordenação, apoio e regulamentação do sistema estadual de saúde (Heimann et al, 2000: 111).
No entanto, as relações entre as secretarias estaduais e municipais foram pouco
efetivadas e a fragilidade das secretarias estaduais no cumprimento desses novos papéis
levou as secretarias municipais a contratar universidades e organizações não
governamentais para instrumentalizar os trabalhadores para as novas demandas
assistenciais e gerenciais (Heimann et al, 2000).
* Wilson Fadul já trazia à tona a discussão da necessidade de se considerar os problemas de saúde de forma mais ampla, asociando-os com as condiçõe de vida da população brasileira (Viana, Soares, Campos, 2013).
48
Em que pesem as dificuldades, essa reestruturação representou grande inovação
no âmbito político, permitindo que a sociedade civil participasse dos processos de
decisão e apoio à implementação da política nacional de saúde. Foram
institucionalizadas as conferências de saúde, os conselhos de saúde e os comitês
intergestores nos âmbitos estadual (bipartite) e federal (tripartite), para tomadas de
decisões consensuadas (Paim et al, 2011).
A década de 1990 foi de fato um período em que a centralidade política,
administrativa e financeira do âmbito federal perdeu força para a participação de
gestores das demais instâncias de governo (Levcovitz, Lima, Machado, 2001) e a
participação da população foi inserida em instâncias que, ainda que com caráter
opinativo e não decisório (Calipo, Soares, 2008).
Como forma de regularização das relações sociais, a política estatal é
influenciada e controlada pela principal dessas formas, o Estado (Viana, 2007). Assim,
o processo político que carreou o SUS foi moldado pelos programas de ajuste
macroeconômico (Paim et al, 2011: 19).
Levcovitz, Lima, Machado (2001:269) ressaltaram que a descentralização foi a
única diretriz organizativa do SUS que não colidiu com o ideário neoliberal. Por isso foi
efetivada, “ainda que fundado em bases político-ideológicas diferentes - os ideais de
democratização e de redução do tamanho do Estado”. Esse mecanismo de repasse de
verbas “deu mais autonomia aos municípios, mas também expandiu os recursos e
controles do nível federal” (Paim et al, 2011:19). O processo de descentralização
produziu “grande capacidade indutora de política de saúde pelo gestor federal,
mormente pela destinação de recursos financeiros (...)” (Heimann et al, 2011:111).
Concretamente, as formas de regularização das relações sociais expressas pela
política nacional de saúde brasileira, na particularidade da AB, tem induzido práticas
viabilizadas por meio de mecanismos instáveis, casuístas, derivados de projetos de
governo, muitas vezes paralelos à própria política, em editais que contratam serviços de
instituições de ensino superior para investigar temas específicos e financiam secretarias
de saúde municipais para implementar ações, programas e estratégias.
49
Estudo posterior e complementar ao de Campos e Bataiero (2007), entre 2005 e
2012, identificou que as 20 (22,7%) publicações que abordavam as necessidades de
saúde na perspectiva da administração ou do planejamento de serviços de saúde tinham
enfoque na utilização da rede de serviços que compõem o Sistema de Saúde brasileiro.
Vale ressaltar que 14 (70%) dessas 20 publicações tiveram financiamento de agências
de fomento – 8 do CNPq, 4 do sistema estadual – FAPE..., 1 da CAPES e outro de
institutos internacionais. Portanto, pode-se afirmar que as temáticas desses estudos
foram induzidas pelas agências financiadoras, que elegem as temáticas de interesse dos
âmbitos onde são geradas as políticas estatais de saúde.
Apenas duas (10%) publicações referiram ser do âmbito da AB, quatro (20%)
analisaram o consumo de serviços de média complexidade (rede de atenção à saúde
mental e centros de referência para hanseníase, por exemplo) e 14 (70%) abordaram a
utilização do Sistema de Saúde (acesso a serviços e a consumo de procedimentos –
consultas médicas e exames de imagem, como mamografia e ultrassonografia)
Na maior parte dos artigos que abordavam o acesso à rede de serviços ou a
procedimentos, a justificativa era a necessidade de conhecimento das características dos
usuários dos serviços de saúde e do padrão de acesso ou da utilização das ações e
serviços. Tinham características de estudos avaliativos de oferta, demanda ou impacto
de serviços e práticas.
Santos e Victora (2004) sinalizaram que tem sido realizadas pesquisas em duas
áreas de naturezas complementares, em serviços de saúde: para testar a eficácia de
novos procedimentos ou estratégias de cuidado e para avaliar o resultado dessas
intervenções sobre a saúde de usuários e da população. Para realizar as do primeiro,
sugerem o método proposto por Habicht et al (1999) (Evaluation designs for adequacy,
plausibility and probability of public health programme performance and impact),
composto por dois eixos: 1- indicativo do processo que se quer medir (o processo, o
resultado ou ambos os aspectos do programa), composto por: a) indicadores de oferta,
de utilização e de cobertura, que analisam o processo e b) indicadores de impacto, que
analisam o resultado; 2- composto por avaliações que possam demonstrar que os
resultados observados, tanto de processo quanto de impacto, foram efetivamente
decorrentes da exposição à intervenção (Santos, Victora, 2004). Identificou-se que os
50
estudos tinham características avaliativas e puderam ser classificados segundo o método
proposto por Habicht et al., citado por Santos, Victora (2004).
Estudos avaliadores de programa – a) indicadores de oferta de serviços:
O único estudo do âmbito hospitalar tomou como objeto a internação,
relacionando-a à insuficiência de oferta de outros serviços do Sistema de Saúde. As
autoras afirmaram que a oferta de serviços ambulatoriais contribui para o uso racional
de internações hospitalares (Castro, Travassos, Carvalho, 2005).
Já os resultados do estudo desenvolvido por Miranda et al (2006) atestaram
insuficiência de oferta de serviço de diagnóstico de deficiência auditiva em PE. A
mesma insuficiência foi atestada em estudos que analisaram a demanda por atendimento
de hanseníase em estados da região Norte do país, sinalizando um represamento da
demanda em serviços de média complexidade (Correia et al, 2008; Ferreira et al, 2008).
Dentre os que abordaram a AB, na ESF, um deles (Piccini et al, 2006) tinha por
objetivo verificar a efetividade na oferta de serviços básicos e sua utilização por idosos
portadores de hipertensão e diabetes. Essa publicação era parte de um estudo em 41
cidades brasileiras, que tinha por objetivo avaliar a implantação da ESF em municípios
com mais de 100 mil habitantes. Para isso o MS contratou pesquisadores de
universidades, por meio de edital - Estudo de Linha de Base do Proesf. Os resultados
atestaram que os piores indicadores econômicos foram identificados na comunidade do
PSF. Embora o desempenho das USF tenha sido avaliado como melhor do que o das
UBS, as deficiências foram sinalizadas como perdas de efetividade na oferta e na
utilização de serviços. Um dos indicadores de avaliação da efetividade era resolução de
no mínimo 80% dos problemas que chegavam na USF.
O outro estudo sobre a ESF (Villela et al, 2009) propôs-se a examinar a oferta de
serviços de Atenção Básica em uma região do município de São Paulo. Os resultados
mostraram que os trabalhadores reconheciam o cuidado na USF centrado na consulta
médica e nos programas prioritários do MS, com limitações para encaminhamentos a
serviços especializados e para o atendimento de outras demandas, como, por exemplo,
situações ligadas à sexualidade e à violência.
51
Considerando-se a circularidade entre necessidades e processos de trabalho para
respondê-las (Mendes Gonçalves, 1992), ou que as necessidades (tomadas como
sinônimo de demanda) são influenciadas pela oferta de ações e serviços (Castro, 2005),
pode-se supor que a AB tem primado por criar necessidades associadas a consumo de
procedimentos, majoritariamente consultas, exames e medicação, em resposta a
necessidades de saúde.
Estudos avaliadores de programa – a) indicadores de utilização de serviços e de
cobertura
Este item abrigou a maior parte das publicações com centralidade na discussão
das necessidades de saúde na perspectiva da administração ou do planejamento de
serviços de saúde. Uma delas buscou identificar características individuais de usuários
de serviços de saúde associando-as à utilização e super-utilização de consultas médicas
(Capilheira, Santos, 2006). Afirmaram que poderiam tornar-se importante ferramenta
para gestores de saúde, uma vez que esses sujeitos sobrecarregam o sistema
ambulatorial de consultas, “tanto no aspecto tempo (maior demanda para os serviços),
quanto no aspecto financeiro (maior solicitação de exames complementares)”,
focalizando apenas a relação custo-benefício financeiro do procedimento.
Foram identificados estudos que comparavam o acesso da população à rede de
serviços de saúde, por meio de diferentes metodologias. Resultados mostraram que
indivíduos de melhor nível socioeconômico utilizam mais os serviços de saúde em geral,
públicos e privados (Bastos et al, 2011; Dias-da-Costa et al, 2011; Osorio et al, 2011;
Fernandes et al, 2009; Dias-da-Costa et al, 2008; Louvison et al, 2008; Lima-Costa et
al, 2007). Já os resultados de pesquisa realizada com idosos identificou relação
diretamente proporcional entre bons indicadores de saúde e nível de escolaridade, mas
não encontrou relação significativa entre escolaridade e utilização de serviços de saúde
(Barros et al, 2011).
Resultados de estudo de demandas de serviços do SUS por população
estrangeira nas regiões fronteiriças ao Brasil mostraram que as práticas demandadas são
as relacionadas a consulta médica de Atenção Básica e suas consequências, a retirada de
medicamentos e a imunização (Giovanella et al, 2007).
52
Dias-da-Costa et al (2007) analisaram o acesso a exame clínico de mamas da
população feminina de um município do RS e concluíram que as mulheres de classes
mais baixas tem menos acesso ao exame e, dentre essas, as não brancas foram as menos
examinadas, mesmo dentre as que tiveram acesso a serviços de saúde. Corrêa et al
(2011) analisaram a cobertura mamográfica em GO e identificaram que a oferta de
exames é menor que a demanda e que a produção do SUS é inferior à do sistema
privado.
Já resultados de estudo de Andrade et al (2011) mostraram que a oferta de novos
serviços de imagem por empresa privada gerou aumento da demanda pelo exame.
Abordaram essa relação pela perspectiva da economia da saúde, que aborda o
gerenciamento dos recursos financeiros (financiamento), de sua aplicação (custos) e dos
resultados de sua utilização. Para essa gestão várias metodologias são empregadas,
“todas visando avaliar a relação entre o que se gasta e o que se ganha”.
Não foram identificados, na base de dados utilizada (LILACS), publicações de
avaliações que demonstrassem resultados decorrentes da exposição à intervenções.
As publicações que abordavam necessidades de saúde e tinham centralidade na
administração ou no planejamento de serviços de saúde mostraram que os indicadores
de avaliação da rede de serviços pautaram-se na concepção de necessidades de saúde
como sinônimo de necessidades de consumo de serviços de saúde.
Vários estudos mostraram a relação diretamente proporcional entre indicadores
socioeconômicos e utilização de serviços de saúde, e inversamente proporcional quando
se trata do sistema público de saúde, mostrando que a focalização do sistema público à
população pobre prevalece sobre a universalidade.
Essa relação poderia, desavisadamente, ser justificada pelo princípio da
equidade do SUS e provavelmente seria plausível se a análise se restringisse à utilização
da AB, intencionalmente organizada para atender a população das classes exploradas.
No entanto, mostra-se equivocada quando se analisa a oferta e a utilização do Sistema,
em níveis de maior complexidade tecnológica, como evidenciou o estudo realizado por
Dias-da-Costa et al (2007).
53
Ao contrário da equidade anunciada no SUS, como mostraram Castro Tavares,
Carvalho (2005), a oferta de serviços pelo SUS não é distribuída proporcionalmente às
necessidades de serviços de saúde. Segue o princípio da inverse care law, descrita por
Hart (1971) que, segundo o autor, é mais efetiva quanto mais o sistema de saúde estiver
orientado pelas leis do mercado.
Portanto, as publicações atestaram que parece que os financiamentos do governo
federal estão induzindo pesquisas que tomam por objeto a utilização de serviços
médicos e as características dos usuários.
Pode-se afirmar que na prática o grande mérito do SUS foi melhorar a
distribuição de serviços de saúde e incluir no Sistema um grande contingente de
brasileiros, anteriormente à margem da atenção à saúde oferecida pelo Estado (Cohn,
2009).
Essa constatação foi descrita por Paim et al (2011), que constatou em 1981
apenas 8% da população (9,2 milhões de pessoas) afirmava ter usado serviço de saúde
nos últimos trinta dias, enquanto que em 2008 os que relatavam uso de serviços de
saúde nos últimos quinze dias eram 14,2% (26.866.869 pessoas). Esse aumento foi de
174%. Nesse mesmo período, o aumento da busca por atendimento na AB foi de 450%.
A implantação do SUS passou por diversas tentativas de organização, que
apresentaram em comum o fato de terem sido pautadas pelo financiamento e não pelas
necessidades de saúde da população (Santos, Andrade, 2009).
as necessidades e direitos da população ainda são secundárias na lógica do modelo de gestão vigente onde predominam os interesses da oferta: dos trabalhadores de saúde, dos prestadores de serviços, da indústria de medicamentos e do modelo econômico financeirizado (Santos, 2009:15).
De fato, as orientações tem sido mais voltadas à gestão do Sistema. No que diz
respeito à assistência, o que substituiu a NOB/96 e a NOAS/02, foi o Pacto pela Saúde –
Consolidação do SUS, publicado em 2006, reafirmando a consolidação e a qualificação
da ESF “como modelo de atenção básica à saúde e como centro ordenador das redes de
atenção à saúde do SUS” (Brasil, 2006).
54
As ações e programas a serem pactuados pelos gestores não apresentaram
modificações significativas às normatizações anteriores. As prioridades pactuadas são
relacionadas à saúde do idoso, ao controle do câncer de colo de útero e de mama
(aumento na cobertura de mamografias); redução da mortalidade infantil e materna
(reduzir óbitos); capacidade de respostas às doenças emergentes e endemias, com ênfase
na dengue, hanseníase, tuberculose, malária e influenza; fortalecimento da Atenção
Básica e Promoção da Saúde (Brasil, 2006).
A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB) define a função da AB nas
Redes de Atenção à Saúde (RAS) como coordenadora e ordenadora do cuidado. Na
PNAB mais recente (Brasil, 2012) foram definidas equipes de atenção básica para
populações específicas: equipes do consultórios na rua; equipes de Saúde da Família
para o atendimento da populações ribeirinhas e fluviais (em Unidades Básicas de Saúde
Fluviais).
Em 2011, o Departamento de Atenção Básica (DAB) passou a integrar a
Secretaria de Atenção à Saúde (SAS) e assumiu, entre outras, as funções de definir e
rever periodicamente as diretrizes da PNAB, pactuando-as com representantes dos
secretários estaduais e municipais de saúde; estabelecer diretrizes nacionais para gestão,
formação e educação permanente dos gestores e trabalhadores da AB; articular as
gestões estaduais e municipais do SUS para institucionalizar a avaliação e qualificação
da AB; articular com o Ministério da Educação estratégias de indução a mudanças
curriculares nos cursos de graduação e pós-graduação na área da saúde visando à
formação de profissionais e gestores com perfil adequado à Atenção Básica (Brasil,
2011).
Foi o DAB que, em 2011, criou o Saúde mais perto de você, composto por
ações, projetos e estratégias. Segundo o Departamento, parte desse conjunto estrutura a
AB. São eles: Academia da saúde, Amamenta e alimenta Brasil, Bolsa família, Brasil
sorridente, equipes de Consultório na rua, Doenças crônicas, ESF, e-SUS AB, Melhor
em casa, NASF, Práticas integrativas e complementares, Prevenção e controle dos
agravos nutricionais, Projeto de expansão e consolidação da ESF (PROESF), Promoção
da saúde e da alimentação adequada e saudável, Programa nacional de melhoria do
acesso e qualidade na AB (PMAQ-AB), Programa nacional de suplementação de
vitamina A, Programa de requalificação das Unidades Básicas de Saúde, Programa
55
Telessaúde Brasil redes; Programa saúde na escola, Unidade básica de saúde fluvial e
Vigilância alimentar e nutricional.
Por meio do DAB, o MS induz a implementação desses projetos mediante a
contratação de secretarias municipais da saúde. Portanto, serão contemplados com esses
projetos os municípios que o gestor inscrever. A verba é repassada para o município,
que a repassará diretamente à equipe ou contratará serviços.
Uma dessas estratégias foi o Projeto de Expansão e Consolidação do Saúde da
Família (Proesf), que intenciona a expansão da cobertura, a qualificação e a
consolidação da ESF como estruturante da RAS em municípios com população superior
a 100 mil habitantes. Para consolidar o projeto, vigente desde 2002, o MS conta com
recursos financeiros do Banco Interamericano de Reconstrução e Desenvolvimento
(BIRD), repassados para os municípios. A fase 1 teve início em 2002 e encerramento
em 2007 e para monitoramento e avaliação do processo, na etapa 2 contou com
processos de avaliação Estudos de Linha de Base - ELB. A fase 2 começou em 2009. A
primeira etapa foi encerrada em mar/2012 e a segunda etapa em mar/2013.
A segunda etapa da fase 2 do PROESF relaciona-se com o atual momento de desenvolvimento da Atenção Básica brasileira marcado pela publicação da Portaria n 2.488, de 21 de outubro de 2011 que aprova a Política Nacional de Atenção Básica, estabelecendo a revisão de diretrizes e normas para a organização da Atenção Básica e para a Estratégia Saúde da Família e da Portaria n. 1.654, de 19 de julho de 2011 que institui o Saúde Mais Perto de Você - Acesso e Qualidade, Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção Básica PMAQ (DAB, 2011).
Os ELB do Proesf foram desenvolvidos com a proposta de monitoramento e
avaliação das equipes e do desempenho dos serviços, com vistas à avaliação da ESF.
Esses processos foram realizados com a contratação de pesquisadores de instituições de
ensino superior e de pesquisa (Brasil, 2003).
Dentre os vários estudos, o de Facchini et al. (2006) avaliou mais de 40
municípios, tendo feito ressalvas quanto à necessidade de aprimoramento conceitual e
operacional da ESF. Foram avaliadas a necessidade de monitoramento e avaliação
regulares da AB, de processos de supervisão da equipe que superem as reuniões de
caráter informativo e a utilização de dados de relatórios periódicos para embasar a
tomada de decisões. O estudo constatou que a gestão da AB necessita de forte estímulo,
56
não só no tocante a condições materiais, mas principalmente no aperfeiçoamento dos
gestores.
Resultados de outro ELB realizado em quatro capitais revelaram que médicos e
enfermeiros avaliaram positivamente a potencialidade da ESF em alcançar a atenção
integral. Os parâmetros citados por esses trabalhadores foram a capacidade de
trabalhadores da ESF, ao menos o Agente Comunitário de Saúde (ACS), de conhecer e
intervir nos principais problemas de saúde da população, garantir acesso à AB e nessa
instância estabelecer vínculos, acolher a demanda espontânea, realizar atividades
preventivas individuais, acompanhar os grupos prioritários e resolver ao menos 80%
dos problemas atendidos. Foram poucas as descrições de ações intersetoriais, que são as
que têm mais potência para incidir sobre os determinantes do processo saúde-doença
(Giovanella, Escorel, Mendonça, 2009).
Os ELB do Proesf mostraram que as necessidades apreendidas continuam
bastante associadas ao controle e ao monitoramento de agravos, com ações
desenvolvidas internamente à USF e voltadas a grupos prioritários. Para aderir e receber
os recursos financeiros do governo federal, os municípios deveriam fazer as pactuações
relacionadas ao aumento de cobertura pela ESF e o cumprimento de metas, dentre elas a
resolução de ao menos 80% dos problemas que chegassem à USF e cumprir metas
quantitativas de consultas e outros procedimentos (Brasil, 2003). Portanto, o PROESF
induziu o aumento de cobertura de serviços da AB e as práticas associadas aos
programas prioritários do MS.
Na etapa 2 da fase 2 do PROESF o instrumento de indução de práticas foi o
PMAQ-AB (Programa Nacional de Melhoria do Acesso e da Qualidade da Atenção
Básica) e o Incentivo Financeiro PMAQ-AB (Componente de Qualidade do Piso de
Atenção Básica Variável – PAB Variável) (Brasil, 2011).
O PMAQ é composto por 4 fases: 1) adesão e contratualização; 2)
desenvolvimento; 3) avaliação externa e 4) recontratualização (a partir dos resultados
das fases 2 e 3) (Brasil, 2011). Um dos itens de implementação da fase 2 é a auto-
avaliação das equipes. Vale ressaltar que do instrumento (AMQ) constam indicadores
que ampliam o objeto da atenção.
57
Indicadores vão além dos grupos previstos no pacote mínimo (NOB 96 e o Pacto) para o
cuidado.
A equipe de atenção básica participa de ações de identificação e enfrentamento dos problemas sociais de maior expressão local, com ênfase no desenvolvimento comunitário e na atuação intersetorial.
A equipe participa de iniciativas de desenvolvimento comunitário em conjunto com a população e/ou movimentos sociais. Considerando-se a necessidade de articular e integrar as agendas de intervenção para a modificação dos determinantes sociais do processo saúde–doença, a realização de ações/estratégias/projetos integrados com diversos setores governamentais e não governamentais é de fundamental importância (Brasil, 2012:75).
A equipe de atenção básica reúne-se com a comunidade para desenvolver ações conjuntas e debater os problemas locais de saúde, o planejamento da assistência prestada e os resultados alcançados.
O fortalecimento da participação popular amplia a compreensão dos profissionais de saúde sobre a realidade de vida da população, fortalece vínculos e práticas dialógicas, críticas e reflexivas. O plano de trabalho da equipe inclui agendas de discussão conjunta com a população por meio de reuniões comunitárias, grupos de discussão de ações específicas, reuniões de conselhos e conferências locais de saúde. Além disso, a equipe busca parcerias e/ou articulação com associações, grupos de populações específicas, movimentos sociais, igrejas e ONGs, entre outras (Brasil, 2012:75).
Reconhece-se que a política de indução das práticas via financiamento de ações,
projetos e estratégias permite brechas na consolidada organização da AB. No entanto,
não consegue regularizar a expansão das ações para agir sobre os determinantes do
processo saúde-doença, dada a finalidade das políticas na sustentação do modus
operandi da formação social. Pode-se dizer que os trabalhadores de gestão que induzem
as práticas, da forma que os dos serviços procuram de maneira idealizada atribuir às
brechas a potência para atender as necessidades sociais mais plenamente.
Tomando o processo educativo como aquele que permite a consciência das
contradições que estão nas bases das relações sociais concretas (Almeida, Trapé,
Soares, 2013), propõe-se o desenvolvimento de amplos e profundos processos de
reflexão entre os trabalhadores. Para além de instrumentalizar a resistência à lógica do
mercado como ditador da formulação das políticas de saúde, que também possibilite
processos de trabalho questionadores das práticas hegemônicas, que incluam no
cotidiano do trabalho práticas de cuidado emancipatórias.
58
59
7 Necessidades sociais de saúde e o trabalho do enfermeiro‡‡
Partiu-se da compreensão que necessidades de saúde são o objeto do processo de
trabalho da Enfermagem. No entanto, essas necessidades também são objeto das
práticas de cuidado realizadas pelos demais trabalhadores que compõem a equipe
interdisciplinar, um conjunto de profissões atuando de forma parcelar, a partir da
divisão do trabalho do médico e da fragmentação do conhecimento e da ação sobre o
objeto.
Dada a característica parcelar do trabalho e uma vez que as necessidades de
saúde são complexas, somente o conjunto de instrumentos das diversas práticas
profissionais incidindo no mesmo objeto é que terá potência para responder a essa
complexidade.
O cuidado é a essência do trabalho do enfermeiro (Kebian, Acioli, 2010), a
especificidade do trabalho do Enfermeiro para responder necessidades de saúde é o
cuidado de Enfermagem, constituído pelos saberes e tecnologias que lhe são próprios
(Queiroz, Salum, 1996). No entanto, o cuidado não é uma prática de saúde exclusiva
dos trabalhadores de enfermagem, “(...) não está relacionado a um ofício, nem mesmo a
uma profissão” (Ferreira, Kebian, Acioli, 2011: 441).
Como na Enfermagem em Saúde Coletiva o cuidado incide sobre os perfis
epidemiológicos do coletivo, será particularizado para cada grupo social, projetado e
operacionalizado nos espaços sociais de trabalho e vida, em processos intersetoriais,
além do cuidado realizado no espaço interno da UBS.
7.1- Práticas de cuidado emancipatórias: dimensão propositiva
Como trabalho, as práticas em saúde são guiadas por uma intencionalidade,
mesmo que ela não esteja explícita (Mendes Gonçalves, 1992).
Isto porque o trabalho é realizado por humanos, seres que se subjetivam como
sujeitos nas relações sociais que estabelecem para garantir a produção e a reprodução da
vida material (Viana, 2007; Mendes Gonçalves, 1992). As representações que o sujeito
‡‡ Parte das considerações que se seguem foram publicadas em Campos, Soares (2013: 280-288).
60
elabora a respeito dessas relações com a natureza e a sociedade, sejam elas reais ou
ilusórias, é a consciência. (Viana, 2007:29).
O que permite superar práticas engendradas na concepção da clínica e do
mercado, em direção a práticas emancipatórias, é primeiramente tomar consciência da
intencionalidade do desenvolvimento das práticas induzidas pelas políticas estatais,
enquanto forma de regularização do modo de produção em saúde, que reproduz o modo
de produção social mais geral.
O arcabouço teórico que subsidia a Saúde Coletiva foi buscado para fazer a
crítica radical à abordagem funcionalista da clínica e para produzir novas práticas .
Análise de processo ensino-aprendizagem em uma disciplina de Enfermagem
em Saúde Coletiva (Campos et al, 2009) mostrou que há descompasso entre as teorias
da Saúde Coletiva e as práticas nos serviços de saúde da AB.
Como componente teórico explorou a articulação teoria-prática como relação
indissociável do trabalho essencialmente humano, e as características do ensino que
instrumentaliza trabalhadores para o processo de produção capitalista em saúde.
A práxis é uma categoria potente para explicar a conexão/discussão entre o
conhecimento acumulado (apreensão dos conceitos de Saúde Coletiva pelos
estudantes) e a sua aplicação nas práticas de Enfermagem; trata-se de uma
atividade ajustada a objetivos, guiada pela consciência (atividade teórica) para
transformar um dado objeto, a partir de um projeto intencionalizado (Vásquéz,
2007).
A forma como a consciência está presente na atividade prática do sujeito
configura diferentes níveis de práxis, sendo possível distinguir práxis criadoras
de práxis reiterativas. A práxis reiterativa é uma prática que segue uma lei
previamente traçada, com produtos análogos. A práxis criadora, dado que
advém de projeto consciente, não se adapta plenamente a uma lei previamente
traçada e culmina num produto novo e único(Vásquéz, 2007).
Nessa perspectiva, a produção do conhecimento é determinada por finalidades
práticas, no entanto, o problema prático que o mobilizou - o objeto desse
processo - requer o conhecimento sobre um desconhecido que se necessita
61
conhecer. Ou seja, sem o domínio do conhecimento não é possível incursionar
no desconhecido [...]. Portanto, a proposição da experimentação ou da
problematização como ponto de partida para a construção do conhecimento
requer, a priori, um domínio conceitual básico. Caso contrário, a decodificação
dos dados identificados pode não alçar a superação de um conhecimento
imediato, circunscrito ao pensamento empírico (Abrantes, Martins, 2007).
É um equívoco privilegiar o conhecimento imediato (empírico) em detrimento
daquele fundamentado em conceitos, na falsa ideia de que a teoria (uma
abstração) é desprovida de objetividade (Abrantes, Martins, 2007). Inexiste
prática sem teoria, bem como teoria desprovida de prática. Nesse movimento
teoria-prática o conhecimento teórico é prenhe de conteúdos empíricos, que,
por sua vez, se configuram como conhecimento verdadeiramente humano, por
suas mediações teórico-abstratas[...] Se, por um lado, as abstrações, os
conceitos se distanciam do objeto, por outro lado, nada há mais apto para se
aproximar de sua essencialidade, uma vez que o verdadeiro conhecimento não
nos é dado pela contemplação viva ou pelo contato imediato. [...] o código
genético (concreto pensado) jamais será apreendido imediatamente pela
observação do sangue (concreto aparente) [...] (Abrantes, Martins, 2007).
O estudo mostrou que é
imprescindível que o educador direcione o educando para elaboração de sínteses, com a finalidade de formar enfermeiros comprometidos com a interpretação da saúde-doença como processo social e da saúde como direito social e, portanto, com a transformação das práticas reiterativas do modelo hegemônico (Campos et al, 2009: 1231)
Da mesma forma, é imprescindível que nos serviços os processos educativos
retomem a leitura da realidade.
O enfermeiro formado no modelo clínico tem uma consciência parcelar da
realidade, ou ilusória.
É o processo educativo que permite o processo de retomada de leitura da
realidade, a partir das bases conceituais de saúde como resultado das relações sociais.
Ou seja, a partir das necessidades sociais de saúde e da concepção de saúde como
direito.
62
Outra reflexão que permite superar práticas engendradas na concepção da clínica
e do mercado, em direção a práticas emancipatórias, é a discussão sobre o objeto da
Saúde Coletiva, iluminado pela concepção de necessidades sociais de saúde.
Esse processo permitirá aos trabalhadores a percepção da limitação do
instrumental da clínica para transformar a realidade de saúde e dá elementos para o
trabalhador propor novas práticas e novas políticas, que constituam formas de
regularização diferentes das hegemônicas, das que mantém o status quo.
As relações sociais entre os sujeitos, que retroalimentam as formas de
regularização que mantém o modo de produção, dialeticamente reproduzem as
contradições de classe (Viana, 2007).
Logo, é no interior delas que as mudanças se gestam. Os movimentos sociais, a
organização das classes exploradas, são formas de regularização e estas entram em
conflito com as formas de regularização da classe dominante.
em períodos revolucionários, são embriões de novas formas de regularização, formas que expressam uma nova sociedade. (...) A consciência revolucionária existe, embora em grau menor, mesmo em períodos não-revolucionários. Ela existe de forma marginal e muitas vezes sofrendo a influência da consciência burguesa. No entanto, é uma forma de resistência e luta que traz em si o embrião de uma nova forma de consciência que rompe com o capitalismo (...).
Em uma época revolucionária, há a efervescência e o contágio da consciência revolucionária, gerando formas de regularização em visível contradição com as relações de produção existentes e suas formas de regularizações correspondentes (Viana, 2007: 77).
7.2- Práticas de cuidado emancipatórias: dimensão operacional
O relato a seguir refere-se a atividades de ensino prático de uma disciplina da
graduação em enfermagem da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo
(EEUSP), que foram desenvolvidas em uma USF do município de São Paulo. A tutoria
dessas atividades foi realizada por duas docentes que se revezavam semestralmente no
acompanhamento de estudantes no ensino teórico-prático.
A disciplina tinha como finalidade o reconhecimento de necessidades de saúde
de famílias moradoras na área de abrangência da USF e o desenvolvimento de prática
de educação em saúde em resposta a elas.
63
Ao longo de um ano trabalhadores da USF informavam o processo de ocupação
irregular às margens de um córrego no bairro. Esses moradores eram atendidos na USF
nos moldes de pronto atendimento, em folha de prontuário avulsa, que invariavelmente
não era encontrada quando o usuário retornava à unidade. Como parte das atividades
acadêmicas, foi proposto à gerente da USF o reconhecimento de necessidades de saúde
de famílias residentes nessa área de “ocupação”.
As ações descritas a seguir foram planejadas e desenvolvidas ao longo de dois
anos. Inicialmente estabeleceu-se contato com uma das lideranças dos moradores para
apresentar a proposta da disciplina, articulada com a USF, e a metodologia de
reconhecimento de necessidades de saúde. Esse morador reuniu-se com outros
moradores e concordaram com a proposta.
Nos dois semestres desse ano os grupos de estudantes realizaram inquéritos
domiciliares, com o objetivo de identificar condições de reprodução social. O
questionário era composto por indicadores das condições de trabalho, vida e saúde de
famílias residentes em domicílios localizados numa das margens do córrego.
Durante esse primeiro ano os estudantes sistematizaram as respostas e
retornaram os dados aos moradores da “ocupação” e aos trabalhadores da UBS
(principalmente os ACS), enfocando os potenciais de fortalecimento e desgaste
advindos das condições de reprodução social desses moradores, relacionando-os aos
agravos de saúde identificados.
Entre várias reflexões dos moradores destacaram-se as relacionadas às condições
das moradias e às condições de atendimento na UBS. As moradias eram feitas com
material aproveitado, madeira na maior parte, ou alvenaria sem acabamento. Algumas
delas eram do que chamavam “lona” (plástico preto), o que causava a impressão de
estarem ali de passagem, em situação provisória.
Não se sabe se a gente constrói [as casas] de bloco, empata as economias que tem e a prefeitura vem e derruba tudo...
Ao serem relacionadas as poucas atividades de lazer referidas pelos moradores,
uma moradora relatou que por terem ligações elétricas irregulares nos domicílios, “os
gatos”, já houve incêndio e como os moradores da residência incendiada e seus
vizinhos estavam no culto religioso, a família perdeu quase tudo o que tinha.
64
A gente tem preocupação de sair de casa porque pode haver problema com a luz e a água e se acontecer tem que acudir logo, avisar todos os moradores para arrumar.
Esses depoimentos mostravam a instabilidade nas formas de reprodução social,
que tem como consequência a dificuldade de desenhar um projeto de futuro. Dessa
forma, avaliou-se que além das necessidades do âmbito da reprodução social que
ameaçavam até mesmo a sobrevivência de famílias, também era tênue a presença do
Estado naquela área e era evidente a necessidade de participação social dos moradores,
como descrito no excerto abaixo.
É importante vocês se preocuparem com a gente porque se ninguém der um passo à frente, ninguém vai apoiar a gente. As pessoas que tem endereço é mais fácil ser atendido do que quem não tem endereço, e a gente tem mais condições de adoecer por causa das condições dali. Tem uma instituição que a gente possa cobrar os políticos?
Dado que os moradores reivindicavam melhor atendimento na UBS e que a
gerente da Unidade pretendia organizar o fluxo do atendimento, optou-se por
implementar ação que promovesse a melhor inserção desses moradores na USF,
melhorando o acesso a algum direito de aprimoramento da saúde, por meio de melhora
da presença do Estado naquela área.
Os ACS envolveram-se no processo. Os estudantes visitaram as instituições
sociais do bairro, identificaram atividades realizadas (inclusive as da USF) e
investigaram as formas de acesso desses moradores às atividades. Várias instituições
não sabiam da existência desses moradores no bairro. Na USF eram oferecidas
consultas médicas, exames e medicamentos. Por não terem endereço eles não haviam
sido cadastrados na ESF.
Os estudantes confeccionaram folders, descrevendo as atividades da USF e das
demais instituições, que foram entregues aos moradores em nova reunião, da qual
também participaram ACS, verificando com eles no que a participação naquelas
atividades poderia representar fortalecimento e aprimoramento das condições de saúde.
No primeiro semestre do ano seguinte o grupo de estudantes realizou mais um
conjunto de inquéritos domiciliares, dessa vez com o objetivo de identificar o número
de residências e sua localização naquela área. As ruas e os domicílios foram
65
representados graficamente, a princípio manualmente e posteriormente foi
confeccionado o mapa da “ocupação” em programa computacional.
No segundo semestre o grupo de estudantes, juntamente com moradores e ACS
nomearam as ruas e vielas e numeraram as casas, valendo-se do mapeamento anterior.
Entregou-se em cada residência um impresso para registro dos membros da família e do
endereço oficioso, que deveria ser levado à UBS quando fossem para algum
atendimento.
Com isso a USF foi aos poucos registrando os moradores em prontuários de
família, que foram sendo guardados organizadamente em prateleiras reservadas para
esses moradores. Dessa forma, encontrou-se uma forma alternativa de organização do
atendimento e os registros passaram a ser facilmente encontrados.
Os moradores passaram a utilizar a UBS sistematicamente e insistiram na
reivindicação de serem incluídos no PSF. No ano seguinte foi refeita a re-
territorialização da área de abrangência e uma das equipes passou a ser referência para
essas famílias.
Assim, ainda que a área da saúde não disponha de instrumentos que incidam
diretamente nos processos de reprodução social e embora as condições materiais de vida
dessas famílias continuassem precárias, as ações empreendidas tornaram os moradores
mais visíveis para as instituições sociais do bairro, inclusive para a USF, possibilitando,
de alguma maneira, o aprimoramento das condições de saúde desses moradores.
No ano seguinte, quando os graduandos voltaram a fazer o levantamento de
necessidades de saúde de outra parcela dos moradores, um aviso judicial circulava entre
eles causando muito desgaste, uma vez que teriam um prazo para desocupar a área.
Os estudantes ajudaram a mobilizar moradores, colhendo seus depoimentos
sobre o processo de ocupação da área e, articulados a trabalhadores da UBS,
conseguiram agendar reunião com a Comissão Municipal de Direitos Humanos de São
Paulo. Nessa reunião participaram moradores da “ocupação”, trabalhadores da UBS,
estudantes e docente da EEUSP e foram vislumbradas opções de encaminhamento.
Nesse processo, um dos direitos humanos importantes, o da moradia, foi
discutido com o envolvimento do setor saúde e moradores, graduandos e trabalhadores
da UBS aprenderam o caminho para desenvolver uma ação intersetorial que,
decididamente, inscreve-se no âmbito das práticas que respondem a necessidades de
66
reprodução social e da presença do Estado no bairro, promovendo o fortalecimento do
grupo de envolvidos.
Ainda na mesma UBS foi desenvolvido projeto de extensão universitária (Soares
et al, 2009), como resposta a necessidades de saúde identificadas em pesquisa anterior
(Campos, Mishima, 2005). As docentes propuseram um ciclo de oficinas voltadas a
trabalhadores de instituições sociais que tinham ações dirigidas à população jovem do
bairro, com objetivo de os sensibilizar para o tema das drogas e aprimorar o
conhecimento a respeito dos mecanismos contemporâneos de produção, distribuição e
consumo das substâncias psicoativas, especialmente entre os jovens, na perspectiva da
Saúde Coletiva. As oficinas foram implementadas com a ajuda de duas graduandas
bolsistas de iniciação científica (Soares et al, 2009; Soares et al, 2011).
A avaliação ao final do processo educativo mostrou que os trabalhadores das
diferentes instituições sociais apreenderam o envolvimento com as drogas como
fenômeno social, incorporando-o ao objeto de práticas das instituições sociais. A partir
dessa compreensão, propuseram a criação de espaços de discussão nas instituições e a
elaboração de projetos intersetoriais de prevenção do consumo prejudicial de drogas,
especialmente do setor saúde com o da educação (Soares et al, 2009).
Resultados de estudo avaliativo dessas oficinas indicaram que trabalhadores que
participaram do processo continuavam compreendendo o envolvimento com drogas
como necessidade social e perceberam mudanças pessoais em relação à aproximação
com a realidade do envolvimento com drogas no bairro, o que lhes permitiu convivência
e atitudes de apoio a conhecidos envolvidos com o problema. Em contrapartida,
apontavam a dificuldade das instituições em desenvolver ações para responder a essa
necessidade (Soares et al, 2011).
Com o objetivo de apoiar o desenvolvimento de ações voltadas a essa
necessidade, de forma contínua e com envolvimento intersetorial, procurou-se articular
o ensino e a extensão junto à escola pública de ensino fundamental na qual a USF
desenvolve ações de saúde. Foi então desenvolvida ação educativa como atividade
acadêmica voltada a estudantes da sétima série.
Partindo do depoimento de professores e da coordenação pedagógica, foram
levantadas necessidades provenientes dos padrões instáveis de reprodução social das
famílias e da ausência de Estado no bairro, visível pelos pontos de venda de drogas, pela
67
violência, entre tantos outros abandonos. A maior preocupação dos professores era com
o que chamavam de “sexualidade exacerbada”.
O processo educativo com os estudantes consistiu de uma série de oficinas que
possibilitou ao grupo de universitários apropriar-se mais plenamente das necessidades,
indicando que elas estavam ligadas a um certo desencaixe social e uma excessiva
desatenção para com os jovens, expressas por eles durante o desenvolvimento das
oficinas. A categoria mediadora, os valores sociais, foi tomada como ponto de partida e
de chegada do processo educativo.
Os educandos mostraram que no espaço das oficinas sentiam-se livres para
conversar sobre assuntos que não conseguiam conversar em casa ou com os professores
e até mesmo com os colegas no cotidiano de sociabilidade. Afirmaram também que
aprenderam a ouvir a opinião dos colegas e que começaram a refletir sobre os próprios
valores a partir daí. Nesse processo, o diagnóstico anteriormente feito pelos professores
fez pouco sentido, visto que as necessidades dos alunos foram representadas por uma
enorme carência de espaço social, de visibilidade, de atenção e de sociabilidade.
Essa articulação ensino-serviço-extensão permitiu, no âmbito da escola do bairro
(extensão), a reinterpretação da necessidade expressa inicialmente pelos professores,
favorecida pela compreensão ampliada das necessidades de saúde, processo esse que foi
discutido com professores e coordenação pedagógica, complementar ao realizado com
os estudantes, e possibilitou à escola a visualização de caminhos para tratar a
problemática trazida anteriormente. No âmbito do serviço houve o estabelecimento de
confiança mútua entre a escola e a UBS, de forma que a direção da escola passou a
participar ativamente da rede de instituições sociais do bairro, capitaneada pela UFS.
No âmbito do ensino na EEUSP, o diálogo entre estudantes de escolas públicas
tão desiguais na sua valoração social, uma universidade considerada de ponta e uma
escola de ensino fundamental negligenciada pela política pública, permitiu que os
estudantes envolvidos no processo como educadores e educandos refletissem sobre seus
valores e que ao final tivessem suas práticas sociais transformadas, certamente
contribuindo para o fortalecimento dos dois grupos.
Os exemplos mostram que é possível implementar o cuidado de enfermagem em
saúde coletiva na dimensão dos grupos sociais:
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▪ a partir da identificação de necessidades de reprodução social dos grupos que
habitam o território sob a responsabilidade da USF, superando as ações
programáticas definidas verticalmente nos níveis centrais de gestão;
▪ por meio de interlocução com instituições sociais, para constituir ações sobre os
determinantes das necessidades de saúde;
▪ para efetivar o fortalecimento dos grupos sociais na luta para a emancipação
humana, para o desenvolvimento pleno de todas as suas capacidades.
69
8 - Para fazer a síntese
O trabalho do enfermeiro, um trabalhador da saúde, é uma prática social
localizada no setor terciário da produção capitalista.
O trabalho do enfermeiro se constitui no interior da divisão social e técnica do
trabalho em saúde.
A divisão técnica na saúde está assentada nos saberes da clínica.
A clínica se desenvolve pela fragmentação dos saberes, em especialidades. Essa
fragmentação permite o isolamento das partes que compõem o organismo e destacar
esse organismo das relações sociais.
Para transformar tal objeto foram se constituindo instrumentos eficazes, o
cuidado de Enfermagem é um conjunto desses instrumentos.
As políticas de saúde são instrumentos do Estado, para manter o processo de
produção em saúde.
As práticas de saúde, induzidas pelas políticas, são instrumentos do processo de
produção.
As políticas estatais também são o resultado da luta social e dos interesses em
disputa nas relações sociais.
O projeto do SUS (a política de saúde) expressava a contradição entre a
concepção de saúde que sustenta a clínica e a concepção de saúde como resultado das
relações sociais e a contradição entre a saúde como mercadoria e a concepção de saúde
como direito.
As políticas de saúde expressavam a tensão entre a intencionalidade do Estado e
as lutas sociais que refletiam os dois projetos em disputa.
As políticas de saúde que se constituíram após o SUS, engendradas pelo ideário
neoliberal, favoreceram o projeto da saúde para o mercado e as políticas
compensatórias.
As práticas de saúde que prosperaram nessa política foram as da concepção da
clínica e do projeto de saúde como mercadoria.
70
As práticas que fogem da lógica que prosperou seguem dois caminhos, que tem
em comum a concepção de saúde como resultado das relações sociais e a concepção de
saúde como direito.
Um dos caminhos nas instituições estatais de saúde é o de induzir práticas
inovadoras, pela adesão do gestor público a programas especiais, com financiamentos
“diferenciados” por verbas originadas da união, de agências de fomento e de agências
multilaterais. Para concretizar tal caminho as políticas estatais tem oferecido espaço
para o setor privado, que passa a gerenciar esses recursos.
Outro caminho tem sido trilhado no cotidiano pelos trabalhadores que oferecem
resistência às práticas hegemônicas, formulando práticas emancipatórias.
Práticas emancipatórias possibilitam refletir sobre a origem dos problemas de
saúde, superando ações que incidem no âmbito dos problemas já instalados, para atingir
determinantes do processo saúde-doença.
Práticas emancipatórias instrumentalizam os sujeitos dos grupos sociais a
acessar direitos e a lutar por eles.
Práticas emancipatórias incentivam valores de solidariedade.
Práticas emancipatórias resgatam a condição humana como condição social, em
contraposição à naturalização do sujeito como ser biológico.
A proposição de práticas emancipatórias demanda que a universidade assuma
para si a responsabilidade de formar enfermeiros comprometidos com a concepção de
necessidades de saúde como processo social e de saúde como direito, o que leva à
redefinição do objeto sobre o qual incidem as práticas em saúde; à compreensão da
limitação das práticas em função de sua fundamentação no paradigma clínico; a criticar
as políticas de saúde reiterativas do paradigma clínico e a propor novas práticas,
privilegiando a instrumentalização dos grupos sociais que vivem nos territórios sob
responsabilidade da AB para a participação social. Além do ensino, a universidade deve
assumir a responsabilidade de desenvolver pesquisas e projetos de extensão que
transformem as práticas.
71
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