AVALIAÇÃO DE CERÂMICOS AVANÇADOS POR ENSAIOS DE INDENTAÇÃO
INSTRUMENTADA
Felipe da Silva Pestana
Projeto de Graduação apresentado ao Curso
de Engenharia de Materiais da Escola
Politécnica, Universidade Federal do Rio de
Janeiro, como parte dos requisitos
necessários à obtenção do título de
Engenheiro de Materiais.
Orientador:
Celio Albano da Costa Neto
Co-orientador:
Geovanio Lima de Oliveira
Rio de Janeiro
Janeiro de 2015
iii
Pestana, Felipe da Silva
Avaliação de Cerâmicos Avançados por Ensaios de
Indentação Instrumentada/Felipe da Silva Pestana. – Rio de
Janeiro: UFRJ/ Escola Politécnica, 2015.
XII, 44 p.: il.; 29,7 cm.
Orientador: Celio Albano da Costa Neto.
Co-orientador: Geovanio Lima de Oliveira
Projeto de Graduação – UFRJ/ Escola Politécnica/
Curso de Engenharia de Materiais, 2015.
Referências Bibliográficas: p. 42-44.
1. Cerâmicos Avançados. 2. Indentação Instrumentada
3. Comportamento Mecânico 4. Fratura.
I. Costa Neto, Celio Albano da. II. Universidade
Federal do Rio de Janeiro, Escola Politécnica, Curso de
Engenharia de Materiais. III. Avaliação de Cerâmicos
Avançados por Ensaios de Indentação Instrumentada.
iv
AGRADECIMENTOS
A Deus por ter colocado as pessoas certas no meu caminho.
Aos meus pais, Nelson Pinto Pestana e Raquel M. Monteiro da Silva, por todo o
apoio e carinho durante toda minha trajetória. Graças a eles tive condições de
alcançar meus objetivos e prosseguir com meus sonhos.
Ao professor e amigo Celio Albano da Costa Neto, por todas as oportunidades
que me ajudou a criar, sendo paciente e me incentivando de todas as formas
possíveis durante este percursso sem se importar com o dispendio de seu precioso
tempo.
Ao Programa de Formação de Recursos Humanos da Agência Nacional do
Petróleo (ANP PRH-35) pela bolsa de estudos para realização deste projeto.
Ao meu orientador acadêmico Prof. Luiz Carlos Pereira (Lula) por ter investido
parte do seu tempo me apontando o caminho correto para atingir o sucesso
acadêmico.
A todos que me ajudaram no Laboratório de Análises Químicas e Processamento
de Cerâmicos, em especial ao Geovanio Lima que prestou seu tempo a crucial
co-orientação deste trabalho, ao Roberto Medeiros pela ajuda no decorrer, aos
meus amigos Eduardo Vitral, Leandro dos Santos, Rafael Freitas e Luís Saba
pela companhia nos dias de laboratório e a Meire Sgarbi e Cássia Monteiro por
todo auxílio.
Ao Programa Capes/BRAFITEC pelo apoio financeiro que permitiu um ano de
estudos e oportunidades infinitas na França e ao Prof. Dilson Santos pelo apoio
moral durante esse período tão especial.
À Tamara Zangerolame por todo amor e carinho que certamente ajudaram na
conclusão deste ciclo na minha vida.
v
Aos amigos do Departamento de Engenharia Metalúrgica e Materiais, em
especial à Thais Pintor pela compreensão e apoio, ao Raphael Leibel pela
parceria, ao Leandro por toda ajuda, à Laura Pereira por toda ajuda para que me
tornasse bolsista integral do MBA em Gestão e Finanças pela Escola Politécnica
da UFRJ e ao Eduardo Vitral por me contagiar com sua inteligência e afinco ao
estudo das ciências técnicas.
Aos amigos que sempre estiveram presente durante o intercâmbio, em especial
ao Niccola Torres, Leandro Urbano, Isadora Viçosa, Thais Pintor e Leandro
Sander por todas as viagens e companhia, ao grande amigo Karim Mekki por
toda disponibilidade e amizade e aos amigos italianos Edoardo Simontacchi,
Simone Grassi, Basilio Giurgola e Luca Sacco pela camaradagem.
vi
Resumo do Projeto de Graduação apresentado à Escola Politécnica/UFRJ como parte dos
requisitos necessários para a obtenção do grau de Engenheiro de Materiais.
Avaliação de Cerâmicos Avançados por Ensaios de Indentação Instrumentada
Felipe da Silva Pestana
Janeiro/2015
Orientador: Celio Albano da Costa Neto
Co-orientador: Geovanio Lima de Oliveira
Curso: Engenharia de Materiais
O presente trabalho objetivou a medição das propriedades mecânicas de dureza e módulo
de elasticidade em materiais cerâmicos óxidos e covalentes, tais como nitreto de silício
(Si3N4) monolítico e com a adição de 10% em peso de whiskers β-Si3N4, zircônia
tetragonal (ZrO2) e carbeto de silício (SiC) sinterizado por estado sólido, pela técnica de
indentação instrumentada (IIT). Em cada amostra pelo menos três cargas na faixa entre 1N
e 15N e entre quatro e nove indentações para cada carga foram realizadas.
Após a realização dos ensaios de IIT, verificou-se que para os cerâmicos covalentes havia
uma carga que iniciava fratura nas indentações, enquanto para o cerâmico óxido não foi
observado a iniciação de fratura na faixa carga utilizada. A diferença de comportamento
entre estas duas classes de materias está associada aos mecanismos de tenacificação, os
quais são dependentes da microestrutura de cada material. Os cerâmicos covalentes aqui
testados tiveram um comportamento típico de deflexão de trinca, enquanto a ZrO2 pode
estar associada a tenacificação por transformação de fase.
vii
Abstract of Senior Project presented to POLI/UFRJ as a partial fulfillment of the
requirements for the Materials Engineer degree.
Evaluation of Advanced Ceramics by Instrumented Indentation Tests
Felipe da Silva Pestana
January/2015
Advisor: Celio Albano da Costa Neto
Co-advisor: Geovanio Lima de Oliveira
Major: Materials Engineering
This work evaluated the hardness and the elastic modulus of four advanced ceramics,
monolithic silicon nitride (Si3N4) and 10% wt of β-Si3N whiskers-reinforced silicon
nitride, tetragonal zirconia (ZrO2) and solid-state sintered silicon carbide (SiC), using
instrumented indentation tests (IIT). The materials were tested with loads varying from 1N
and 15N and, at least, four indentations for each load at each sample.
After the IITs, it was observed a threshold load for the covalent materials where cracks
started at the indentation corners, while no cracks were observed for the ionic ceramics
(ZrO2). This difference between the behaviors of each classes of materials may be related
to toughening mechanisms, which is dependent of the microstructure of each material.
Covalent ceramics tested in this work are likely to have a typical crack deflection
mechanism, while ZrO2, an oxide ceramic, may be associated with phase transformation
toughening mechanisms.
viii
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ......................................................................................................... 1
2. REVISÃO BILIOGRÁFICA ................................................................................... 2
2.1. PROPRIEDADES DOS MATERIAIS CERÂMICOS ......................................................3
2.1.1. ASPECTOS GERAIS ...............................................................................................3
2.1.2. EFEITO DOS POROS NAS PROPRIEDADES MECÂNICAS DOS CERÂMICOS................7
2.2. MEDIÇÃO DO MÓDULO DE ELASTICIDADE E DA DUREZA POR INDENTAÇÃO
INSTRUMENTADA ...............................................................................................................8
2.3. MECANISMOS DE TENACIFICAÇÃO .....................................................................12
2.3.1. ZIRCÔNIA ..............................................................................................................12
2.3.2. NITRETO DE SILÍCIO ..............................................................................................13
3. MATERIAIS E MÉTODOS .................................................................................. 15
3.1. MATERIAIS ...........................................................................................................15
3.2. ENSAIO DE INDENTAÇÃO INSTRUMENTADA ........................................................18
3.3. PREPARAÇÃO DA SUPERFÍCIE .............................................................................21
4. RESULTADOS ........................................................................................................ 25
4.1. NITRETO DE SILÍCIO ............................................................................................25
4.2. ZIRCÔNIA .............................................................................................................32
4.3. CARBETO DE SILÍCIO (PREMIX) ..........................................................................35
5. DISCUSSÕES .......................................................................................................... 38
6. CONCLUSÕES ....................................................................................................... 41
7. REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 42
ix
ÍNDICES DE FIGURAS
Figura 1 – Tipos de comportamento dos materiais pela análise da tensão e da
deformação de engenharia: (a) Fratura frágil, típica em cerâmicos; (b) Deformação
plástica sem patamar de escoamento; (c) Deformação plástica com patamar de
escoamento. (Adaptada de [4]) ..........................................................................................5
Figura 2 - Deformação de um material sobre tensão, de forma a obter a definição física
da razão de Poisson............................................................................................................6
Figura 3 – Dureza Vickers em função do carregamento aplicado para diferentes
cerâmicos (Adaptada de [9]) ..............................................................................................7
Figura 4 – Representação esquemática dos dados de força versus profundidade de
indentação obtidos a partir de um ciclo completo de carregamento e descarregamento
(adaptada de [14]) ..............................................................................................................9
Figura 5 – Representação esquemática do processo de descarregamento detalhando
parâmetros da geometria de contato (Adaptada de [15]) .................................................10
Figura 6 – Representação esquemática do mecanismo de transformação martensítica na
zircônia como forma de aumentar a tenacidade (Adaptada de [24]) ...............................13
Figura 7 – Representação esquemática do mecanismo de deflexão de uma trinca em
torno dos whiskers de diferentes razões de aspecto, R, a fração volumétrica constante.
(Adaptada de [29]) ...........................................................................................................14
Figura 8 – Representação esquemática dos mecanismos de tenacificação pelo
ponteamento de trincas (Adaptada de [2]) .......................................................................15
Figura 9 – Microestrutura do Si3N4 sinterizado por prenssagem a quente (Adaptado
de [36]) ............................................................................................................................17
Figura 10 – Ciclo de Sinterização da Zircônia com 3% mols de Y2O3 [33] ..................17
x
Figura 11 – Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) do disco cerâmico de
zircônia sinterizada com óxido de ítria. [33] ...................................................................18
Figura 12 – CSM Instruments MHTX S/N: 01-2802 ....................................................19
Figura 13 – Representação esquemática dos componentes básicos que compõem o
sistema para realização do ensaio de indentação instrumentada (adaptada de [14]) .......20
Figura 14 - Máquina de corte Buehler ISOMET® 4000 ................................................22
Figura 15 - Prensa Metalográfica Buehler SimpliMet® 1000......................................22
Figura 16 - Lixadeira-politriz automática Buehler AutoMet® 250 ................................23
Figura 17 – Micrografias das indentações realizadas na amostra de Si3N4 sem inclusão
de whiskers fase β com as seguintes cargas: (a) 0.5N, (b) 1N, (c) 10N, (d) 13N e (e) 15N
.........................................................................................................................................27
Figura 18 – Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de Si3N4 + 0% whiskers β-Si3N4 ..................................28
Figura 19 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de Si3N4 +0% whiskers β-Si3N4 .......................................................................28
Figura 20 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de Si3N4 + 10%
whiskers β-Si3N4 com as seguintes cargas: (a) 1N, (b) 5N, (c) 10N e (d) 13N ...............30
Figura 21 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4 ................................31
Figura 22 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4 ....................................................................31
Figura 23 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de ZrO2 com as
seguintes cargas: (a) 1N, (b) 5N e (c) 10N ......................................................................33
Figura 24 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de ZrO2 .........................................................................34
xi
Figura 25 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de ZrO2 .............................................................................................................34
Figura 26 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de SiC SES com as
seguintes cargas: (a) 0.5N, (b) 5N e (c) 10N. (d) é a matriz de indentação quando
aplicada carga de 10N ......................................................................................................36
Figura 27 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de SiC SES ...................................................................37
Figura 28 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de SiC SES .......................................................................................................37
Figura 29 – Comparação entre a ordem de grandeza de uma indentação da amostra de
nitreto de silício com adição de whiskers e a micrografia da estrutura de uma amostra
similar adaptada de [36]. .................................................................................................38
Figura 30 – Comparação entre a profundidade máxima de indentação e o carregamento
utilizado para cada amostra. ............................................................................................40
xii
ÍNDICE DE TABELAS
Tabela 1 – Valores típicos do módulo de elasticidade a temperatura ambiente para
materiais de diferentes naturezas [5] [6] [7] ......................................................................4
Tabela 2 – Lista dos Materiais Utilizados .....................................................................18
Tabela 3 – Variáveis utilizadas para cada valor de carregamento .................................20
Tabela 4 – Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de ..25
Tabela 5 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4 ........................................................................................30
Tabela 6 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
ZrO2 .................................................................................................................................32
Tabela 7 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
SiC sinterizado em estado sólido .....................................................................................35
Tabela 8 – Comparação entre os módulos de elasticidade médio encontrados na
literatura e os avaliados por EII para cargas de 0.5 e 1N ................................................39
1
1. INTRODUÇÃO
Cerâmicas avançadas ou de engenharia possuem alta resistência a temperatura, alto
grau de inércia química e propriedades mecânicas como módulo de elasticidade e dureza
elevadas. Tais características permitem a aplicação desses materiais em diversos
segmentos industriais mesmo com a baixa tenacidade inerente aos materiais cerâmicos.
Componentes como rolamentos e peças de turbinas a gás de nitreto de silício, válvulas de
exaustão de gases de zircônia e sedes de selos mecânicos de carbeto de silício são
exemplos típicos de componentes utilizados no setor de petróleo e gás com cerâmicos
avançados, função das características anteriormente mencionadas.
Os materiais cerâmicos são fabricados por sinterização, um processo onde partículas
se consolidam pela redução da sua energia de superfície. Neste processo, sempre haverá
uma porosidade residual, ou seja, descontinuidades geométricas que atuam como
concentrador de tensões e reduzem a área da secção resistente em caso de uma força
trativa, por exemplo, assim, causam dependência das propriedades mecânicas e demais à
fração volumétrica de poros. Em outras palavras, a presença dos poros interrompe a
continuidade da matéria ao longo da geometria, premissa básica da mecânica do contínuo
que rege o comportamento realisticamente para metais e polímeros, mas nem tanto para
cerâmicos.
No caso das propriedades mecânicas, diversas técnicas são utilizadas para medir
valores de dureza e módulo de elasticidade dos materiais. Entre elas está o ensaio de
tração, usualmente utilizado para medição do módulo de elasticidade e cuja aplicação em
cerâmicos torna-se problemática devido à dificuldade de obtenção de corpos de prova e
o contínuo alinhamento do trem de carregamento durante o teste. Uma técnica,
relativamente recente, será empregada neste trabalho para determinar a dureza e, através
dela, obter o módulo de elasticidade. Esta técnica é a indentação instrumentada (TII,
Técnica de Indentação Instrumentada). Nela, um ciclo completo de carregamento e
descarregamento, onde a força máxima de indenção é relacionada a profundidade máxima
de indentação, permite distinguir as propriedades elásticas das plásticas, determinando
tanto a dureza quanto o módulo de elasticidade, de acordo com o método de Oliver e Pharr
prosposto no item 2.2 deste trabalho.
Esta técnica apresenta a grande vantagem de apresentar medições de dureza
automaticamente, sem a necessidade de inferir medidas de área de indentação
2
manualmente como os ensaios de dureza da norma ASTM C 1327 (Standard Test Method
for Vickers Indentation Hardness of Advanced Ceramics), e também a vantagem de ser
uma técnica de aplicação relativamente simples, principalmente em cerâmicos, onde a
aplicação dos tradicionais ensaios de tração é particularmente custoso e demorado.
O objetivo deste trabalho é mensurar a dureza e o módulo de elasticidade através da
técnica de indentação instrumentada em cerâmicos avançados e avaliar a influência das
trincas geradas e dos mecanismos de tenacificação na magnitude dos resultados.
2. REVISÃO BILIOGRÁFICA
Cerâmicos são materiais cuja natureza química é caracterizada por ligações de metais
e ametais ou ametais e semi-metais; isto é, usando o conceito de eletronegatividade de
Linus Pauling, as ligações químicas são de origem iônica, covalente ou intermediárias
[1]. Estes compostos inorgânicos têm seu processamento baseado na união de partículas
e sua densificação é obtida pela aplicação de calor, com ou sem o uso de pressão [2].
A força dessas ligações atômicas confere aos materiais cerâmicos, via de regra, alto
ponto de fusão, elevada resistência química, módulo de elasticidade e dureza com valores
superiores a dos metais. Não obstante, o mesmo carácter das ligações atômicas presentes
em materiais cerâmicos, associados a uma cristalografia de baixa simetria, resulta na
elevada fragilidade observada no mesmo. Adicione-se os efeitos dos poros provenientes
da fabricação, intrínseco a estes materiais, e o comportamento de natureza estatística se
fará presente, sendo necessário uma análise estatística pelo método de Weibull [3].
O conhecimento das propriedades mecânicas, neste caso, é determinante tanto para
avaliar as condições de processamento de um material como para identificar as utilizações
possíveis para o dado material. Portanto, esta revisão bibliográfica abordará as principais
características que permeiam a elasticidade e a dureza em materiais cerâmicos, bem como
as variáveis que as influenciam e técnicas de medição.
3
2.1. Propriedades dos Materiais Cerâmicos
2.1.1. Aspectos Gerais
O comportamento mecânico dos materiais baseia-se na mecânica do contínuo, cujas
premissas são continuidade da matéria ao longo da geometria e homogeneidade da
mesma. Esta análise é bastante realística para os metais e polímeros, mas nem tanto para
os cerâmicos, como será apresentado abaixo. Conceitos básicos destes princípios são: i)
elasticidade, a qual consiste em uma deformação reversível até um certo limite de tensão
aplicada, ou seja, quando a tensão é retirada, o corpo retorna as suas dimensões originais,
sendo este um conceito imaterial. Nesta região, via de regra, a relação entre a tensão ()
e a deformação () se dá linearmente para metais, cerâmicos e compósitos, conforme a
equação (1), sendo que o coeficiente angular é o módulo de elasticidade ou módulo de
Young (E).
𝜎 = 𝐸 (1)
A magnitude do módulo de elasticidade é determinada pelo grau de coesão dos átomos
(a resistência das ligações atômicas) e pela densidade atômica dos planos cristalino sob
tensão (isotropia/anisotropia). Os materiais cerâmicos possuem ligações iônicas e
covalentes, cuja a resistência das ligações são bastante elevadas. Já as ligações metálicas,
apresentam resistência intermediárias entre cerâmicos e polímeros, estes últimos
dominados principalmente pelas ligações secundárias entre as cadeias moleculares, tipo
van der Waals, por exemplo. A Tabela 1 exemplifica os valores do módulo de elasticidade
para diferentes tipos de material.
É importante salientar que a medida do módulo de elasticidade em um monocristal
pode sofrer variações de acordo com a direção cristalográfica. Essa anisotropia ocorre
tanto em monocristais metálicos como em cerâmicos, assim, por exemplo, um
monocristal de ferro apresenta módulo de elasticidade médio de 283 GPa na direção
cristalográfica [111], enquanto na direção cristalográfica [100] o valor é de 124 GPa. Está
diferença se dá em função da direção cristalográfica [111] apresentar maior
empacotamento dos átomos e, portanto, maior resistência neste plano [4].
4
Tabela 1 – Valores típicos do módulo de elasticidade a temperatura ambiente para
materiais de diferentes naturezas [5] [6] [7]
Material Natureza E Médio (GPa)
Borracha Polimérica 0.0035 – 3.5
Nylon Polimérica 2.8
ZrO2 Cerâmica 138
Ferro Metálica 197
Superliga de Ni (IN-100) Metálica 210
Si3N4 Cerâmica 304
SiC Cerâmica 414
Analisando o comportamento dos materiais até a fratura, dentro do conceito de
mecânica do contínuo, temos que existe uma variedade de comportamento, conforme
ilustrado na Figura 1. Resumidamente, materiais podem ter comportamento linear elástico
até a fratura (Figura 1.a), típico dos cerâmicos, metais de elevadíssima resistência
mecânica e resinas termofixas. Ou elasto-plástico, típico de metais. No primeiro caso a
fratura é denominada de frágil, enquanto no segundo de dúctil.
5
Figura 1 – Tipos de comportamento dos materiais pela análise da tensão e da
deformação de engenharia: (a) Fratura frágil, típica em cerâmicos; (b) Deformação
plástica sem patamar de escoamento; (c) Deformação plástica com patamar de
escoamento. (Adaptada de [4])
Para os materiais com comportamento dúctil, a passagem do regime elástico para o
plástico é determinado pelo limite de escoamento, com as respectivas tensão e
deformação de escoamento. Após o escoamento, quando a curva atinge d/d = 0,
caracterizado a tensão máxima, há a formação de um pescoço e é determinado o limite de
resistência à tração do material. Após este ponto, as deformações ficam concentradas no
pescoço até o momento da fratura, quando de determinada a resistência à fratura do
material.
A razão de Poisson é mais uma variável importante para a comparação e avaliação de
materiais e está ligada a rigidez, correspondendo a relação entre a variação do
comprimento e da espessura, conforme ilustrada na Figura 2 e na equação abaixo:
= −
∆𝑑 𝑑⁄
∆𝑙 𝑙⁄
(2)
Em caso de materiais isotrópicos, a razão de Poisson apresenta uma relação com o
módulo de elasticidade (E) e com o módulo de cisalhamento (G), conforme abaixo:
𝐸 = 2𝐺(1 + ) (3)
6
Figura 2 - Deformação de um material sobre tensão, de forma a obter a definição física
da razão de Poisson
Outra propriedade de muito interesse nos materiais é a sua dureza. Esta representa a
resistência do material à penetração decorrente de uma força pontual compressiva, isto é,
define a resistência à indentação. A indentação é uma propriedade complexa porque
envolve a criação de uma pequena região plástica constrita por uma imensa região
elástica.
A medição da dureza é, normalmente, feita através de ensaios de indentação, que
consistem na aplicação de uma carga (P) sobre um indentador de área (A), sendo possível
obter vários tipos de dureza, por exemplo, Brinell, Rockwell, Vickers, Knopp e etc. A
equação (4) é a representação tradicional da medição da dureza [8]. A geometria do
indentador terá papel fundamental na dureza medida.
𝐻 =
𝑃
𝐴
(4)
Materiais cerâmicos são extremamente frágeis e o teste de dureza torna-se ainda mais
complexo porque há deformação plástica, a qual pode ser seguida de fratura. Neste
contexto, estudos mostram que a dureza definida pela equação (4) é dependente do
carregamento [9], de forma que em baixos carregamentos apresentam valores de dureza
altos e sofrem redução conforme há o aumento do carregamento. Tal fenômeno, ilustrado
na Figura 3 segundo trabalho de Gong et al. [9], é conhecido como efeito do tamanho da
7
indentação (ISE, sigla em inglês para Indentation Size Effect) e pode gerar incertezas
quanto aos resultados obtidos. As causas desse fenômeno são atribuídas as duas razões
principais: uma, referente aos erros experimentais provenientes da resolução das lentes
dos microscópios [10] e outra, descrita por Bückle [11], relacionada às características
intrínsecas do material, como recuperação elástica da indentação, encruamento durante
os ensaios, problemas na penetração devido à presença de poros etc.
Figura 3 – Dureza Vickers em função do carregamento aplicado para diferentes
cerâmicos (Adaptada de [9])
2.1.2. Efeito dos Poros nas Propriedades Mecânicas dos Cerâmicos
Materiais cerâmicos são fabricados por sinterização, um processo onde partículas se
consolidam pela redução da sua energia de superfície. Neste processo, sempre haverá uma
porosidade residual, a qual interrompe a continuidade da matéria e requer ajustes nas
equações constitutivas da mecânica do contínuo.
A presença de poros, uma descontinuidade geométrica, atua tanto como concentrador
de tensões como reduzindo a área da seção resistente. Estes efeitos combinados resultam
8
na dependência das propriedades mecânicas, elétricas, magnéticas, ópticas e demais à
fracção volumétrica de poros (porosidade).
No caso de propriedades mecânicas, Mackenzie [12] formulou, em 1950, uma relação
de dependência entre o módulo de elasticidade e a fração volumétrica de poros, mostrados
na equação (5).
𝐸 = 𝐸0(1 − 1.9𝑃 + 0.9𝑃2) (5)
Onde E0 é o módulo de elasticidade para o material sem poros, P representa a fração
volumétrica de poros, e sua validade é dada para ν=0.3 e até 50% de porosidade. A partir
da equação obtida por MacKenzie, pode-se inferir que o módulo de elasticidade será
menor quanto maior a fração volumétrica de poros.
No caso da resistência à fratura, uma relação exponencial com a fração
volumétrica de poros foi determinada por Ryskewitsch [13]. Fica bastante evidente o
forte impacto da presença de poros no valor da resistência à fratura do material.
𝜎𝑓 = 𝜎0exp(−𝑁𝑃) (6)
Onde σf representa a resistência a fratura do material; σ0, o módulo de ruptura do material
sem poros; e N é uma constante empírica (3<N<7) dependente da distribuição de
tamanhos e geometria dos poros.
2.2. Medição do módulo de elasticidade e da dureza por indentação
instrumentada
Diversas técnicas são utilizadas para medir a dureza e o módulo de elasticidade de um
material. Entre elas estão o ensaio de tração, usualmente utilizado para medição do
módulo de elasticidade e cuja aplicação em cerâmicos torna-se problemática devido à
dificuldade de obtenção de corpos de prova e o contínuo alinhamento do trem de
carregamento durante o teste; o ensaio de frequência de ressonância, também usualmente
utilizado para medir o módulo de elasticidade, relacionando proporcionalmente a massa
e a frequência ao quadrado.
Uma técnica, relativamente recente, será empregada neste trabalho para determinar a
dureza e, através dela, obter o módulo de elasticidade. Esta técnica é a indentação
instrumentada (do inglês IIT, Instrumented Indentation Technique). Nela, um ciclo
completo de carregamento e descarregamento, onde tempo, força (P) e profundidade de
9
indentação (h) são medidas, ilustra na Figura 4. Durante a penetração do indentador,
deformações elásticas e plásticas são impostas, onde a força máxima de indentação (Pmax)
está relacionada a profundidade máxima de indentação (hmax). No descarregamento,
apenas a porção elástica da energia aplicada é recuperada, assim permitindo distinguir as
propriedades elásticas das plásticas, determinando tanto a dureza como o módulo de
elasticidade, automaticamente. Como o indentador é conhecido, a dureza é determinada
pela equação (4), enquanto o módulo é calculado através da inclinação da curva de
descarregamento, conhecida como rigidez de contato elástico (S=dP/dh), que apresenta
dimensões de força por unidade de distância.
Figura 4 – Representação esquemática dos dados de força versus profundidade de
indentação obtidos a partir de um ciclo completo de carregamento e descarregamento
(adaptada de [14])
O modelo do comportamento mecânico associado à curva da Figura 4 está
representado na Figura 5. Nela, as relações fundamentais pelas quais a dureza e o módulo
de elasticidade são determinados são expressas pelas variações de profundidade, a área
relativa à profundidade máxima (A) e as constantes do indentador, conforme equação (7)
[14].
10
Figura 5 – Representação esquemática do processo de descarregamento detalhando
parâmetros da geometria de contato (Adaptada de [15])
𝐸𝑟 =
√𝜋
2𝛽
𝑆
√𝐴
(7)
Onde Er é o módulo de elasticidade reduzido e β é uma constante relacionada a geometria
do indentador ( [16] e [8]) onde, para indentadores do tipo Vickers, β = 1.012 [17]. A
equação (4) se refere a medição da dureza a partir da razão entre o carregamento aplicado
e a área de contato projetada sob carregamento, diferentemente da definição tradicional
de dureza, onde a área de contato projetada residual é levada em consideração. Assim,
essas duas definições retornam valores similares quando o processo de deformação
plástica é dominante e uma impressão completamente plástica é formada, o que raramente
ocorre em cerâmicos avançados e deve ser ponto de atenção nas análises.
Sabendo que podem ocorrer deformações não somente no material analisado, como
também no indentador, Oliver and Pharr [8], formulou a seguinte equação de forma a
levar tal fenômeno em consideração:
1
𝐸𝑟=1 − ν2
𝐸+1 − ν𝑖
2
𝐸𝑖
(8)
Onde ν é a razão de Poisson da amostra e Ei e νi representam o módulo de elasticidade e
a razão de Poisson, respectivamente, do indentador. Para um indentador de diamante,
como no caso deste trabalho, as constantes elásticas Ei = 1141 GPa e νi = 0.07 são
utilizadas [8].
Além do módulo de elasticidade reduzido, a rigidez de contato é uma variável
diretamente proporcional ao módulo de elasticidade, sendo definido por Oliver-Pharr [8]
como a variação da parcela do descarregamento nos dados da Figura 4 em função da
11
variação da profundidade de penetração do indentador, quando a profundidade é máxima.
Como proposto por Oliver e Pharr, a parcela do descarregamento é dada pela seguinte
equação:
𝑃 = 𝐵𝐴(ℎ − ℎ𝑓)𝑚 (9)
Onde B e m são parâmetros empiricamente determinados e hf é o deslocamento final após
o descarregamento, conforme representado na Figura 5 e na Figura 4. Portanto, a partir
da diferenciação da equação acima, é possível chegar a um valor da rigidez de contato
(equação (10)), que, assim como a dureza, depende da área de contato projetada.
𝑆 = (
𝑑𝑃
𝑑ℎ)ℎ=ℎ𝑚𝑎𝑥
= 𝐵𝑚(ℎ𝑚𝑎𝑥 − ℎ𝑓)𝑚−1 (10)
A área de contato projetada no ensaio de indentação instrumentada é determinada pela
análise dos dados de carregamento e descarregamento representados na Figura 4, ao invés
da aquisição de imagens das indentações impressas, como nas técnicas tradicionais de
dureza. Assim, sabendo a geometria do indentador e a profundidade de contato hc, que,
para contatos elásticos é menor que a profundidade total de penetração do indentador hmax,
conforme ilustrado na Figura 5, é possível chegar ao valor da área de contato, A. Segundo
o método proposto por Oliver et al. ( [18] e [19]), é possível descrever a geometria do
indentador como sendo uma função de área F(h) que relaciona a área da seção transversal
do indentador com a distância até sua ponta, portanto, considerando que não haja
deformações significativas do indentador, a área de contato projetada segue a seguinte
relação:
𝐴 = 𝐹(ℎ𝑐) (11)
Cuja função F é estabelecida experimentalmente e a profundidade de contato hc definida
conforme abaixo e como representado na Figura 5:
ℎ𝑐 = ℎ𝑚𝑎𝑥−ℎ𝑠 (12)
Sendo a profundidade de penetração máxima hmax diretamente extraída dos dados
experimentais e hs fortemente dependente da geometria do indentador. O cálculo de hs
pode ser feito a partir da equação de Sneddon [20]:
ℎ𝑠 = 𝜀
𝑃𝑚𝑎𝑥
𝑆
(13)
Onde ε é uma constante relacionada a geometria do indentador. Portanto, a partir das
equações (12) e (13), chega-se a relação analítica da profundidade de contato hc que
permite quantificar a área de contato e, portanto, definir a área de contato (equação (11)):
12
ℎ𝑐 = ℎ𝑚𝑎𝑥 − 𝜀
𝑃𝑚𝑎𝑥
𝑆
(14)
A carga de indentação dos ensaios de IIT são da ordem de mN, assim, as propriedades
medidas são dependentes de variáveis, tais como: ligação atômica, estrutura cristalina,
tamanho de grão, poros, inclusões e defeitos presentes na microestrutura.
2.3. Mecanismos de Tenacificação
Como mostrado na Tabela 1, cerâmicos avançados apresentam alto módulo de
elasticidade, além de elevada resistência química e mecânica. No entanto, de maneira
geral, eles são frágeis, apresentando baixa tenacidade à fratura. Entretanto, alguns
mecanismos de tenacificação podem mitigar esse efeito e conferir maior resistência à
fratura. Neste trabalho, exemplos de mecanismos de tenacificação por transformação de
fase, como no caso da zircônia estabilizada com ítria, e deflexão de trinca devido à
presença de whiskers, como no caso do nitreto de silício, serão abordados.
2.3.1. Zircônia
A Zircônia (ZrO2) apresenta três formas polimórficas, a cúbica, a tetragonal e a
monoclínica, que dão origem a diversas classificações dependendo do tipo e da
quantidade de aditivos utilizados e do processo de fabricação. Usualmente, classifica-se
como Zircônia Totalmente Estabilizada, devido à presença de óxidos estabilizadores
(magnésia, ítria, céria etc.) em quantidade suficiente para manter a fase cúbica totalmente
estabilizada [4]; Zircônia Parcialmente Estabilizada, que apresenta concentração de
óxidos inferior a necessária para estabilizar completamente o material, resultando em
finas partículas de zircônia tetragonal dispersas em uma matriz de zircônia cúbica [4]; e
Zircônia Tetragonal Policristalina (TZP), que apresenta concentração de ítria até 3% em
mols [21] e microestrutura homogênea com grãos entre 0,1 e 1,0 µm [4], este material é
considerado parcialmente estabilizado mas com características peculiares de
microestrutura e tamanho de grãos.
A fase polimórfica tetragonal citada acima sofre uma transformação martensítica para
fase monoclínica durante o resfriamento, sendo associada a uma expansão volumétrica de
3 a 5% e suficiente para levar o material à fratura. A adição de ítria permite que os grãos
na fase tetragonal cheguem a temperatura ambiente, formando uma segunda fase,
conhecida como t’, resistente a transformação martensítica para monoclínica [22]. Esta
13
segunda fase apresenta maior concentração de ítria, o que a concede um caráter menos
tetragonal e dificulta a transformação [21].
A presença de aditivos estabilizadores, como a ítria, permitem manter a fase
polimórfica tetragonal metaestável em condições ambientes até que o campo de tensões
de uma trinca em propagação induza a transformação martensítica para fase monoclínica
estável, de forma a expandir o volume na área da transformação e gerar tensões
compressivas sobre as superfícies das trincas nas proximidades, obstruindo seu
crescimento [23], conforme ilustrado na Figura 6.
Figura 6 – Representação esquemática do mecanismo de transformação martensítica
na zircônia como forma de aumentar a tenacidade (Adaptada de [24])
2.3.2. Nitreto de Silício
O nitreto de silício (Si3N4) é um cristal cuja natureza das ligações é de 70% covalente
e 30% iônico [25], aproximadamente, resultando em alto módulo de elasticidade. Ele
pode ser encontrado nas fases polimórficas α e β de estrutura cristalográfica hexagonal
que diferem entre si principalmente pelo parâmetro de rede, onde a fase α apresenta quase
o dobro do valor do parâmetro de rede da fase β (0,516-0,569nm e 0.271-0.292,
respectivamente) [26], [27].
A transformação da fase α para β apresenta uma característica peculiar no aumento da
resistência e da tenacidade à fratura do material, uma vez que resulta em grãos em formato
de whiskers. Tal constatação foi observada por Lange em 1973 [28], quando a partir de
um pó constituído pela fase α obteve whiskers fase β com tenacidade à fratura de 69 J/m2
e quando partiu de um pó fase β obteve grãos equiaxiais da fase β, resultando em uma
14
queda de quase 75% na tenacidade à fratura e atribuiu tal discrepância à presença de
diferentes morfologias.
Diversos mecanismos são responsáveis por conceder certo grau de tenacificação a
fratura devido à presença de whiskers, tais como deflexão de trincas, puxamento (pullout)
dos grãos ou whiskers e ponteamento de trincas. Uma visão geral de alguns dos
mecanismos ajudará a compreender a diferença dos resultados analisados neste trabalho.
Deflexão de Trinca
Este fenômeno está associado à atração ou repulsão da trinca pelos whiskers, devido à
tensão residual ou a interfaces de baixa resistência. O principal modelo proposto para
avaliar o aumento de tenacidade à fratura em razão da deflexão não plana de uma trinca
considera a redução do fator de intensidade de tensão devido à torção máxima da frente
da trinca [29], conforme ilustra a Figura 7. Esse mecanismo tem como principais variáveis
a fração volumétrica da segunda fase, razão de aspecto, espaçamento entre whiskers (ou
grãos alongados) de segunda fase bem como a morfologia desses grãos.
Figura 7 – Representação esquemática do mecanismo de deflexão de uma trinca em
torno dos whiskers de diferentes razões de aspecto, R, a fração volumétrica constante.
(Adaptada de [29])
Ponteamento de Trincas
Para que esse mecanismo ocorra, a interface whisker-matriz deve apresentar
resistência suficiente para transferir o carregamento para o whisker, que por sua vez deve
15
apresentar alta resistência à tensão para sustentar a tensão aplicada pela ponta da trinca
[30]. Caso o módulo de elasticidade dos whiskers seja muito superior ao da matriz, a
trinca pode sofrer um desvio do plano, conforme ilustrado na Figura 8.a, o que não ocorre
no nitreto de silício uma vez que as constantes elásticas são similares [31]. Usualmente,
no nitreto de silício, o descolamento da interface whisker/matriz devido ao campo de
tensões gerado pela trinca, que permite que a trinca se estenda através dos whiskers [31],
conforme ilustra a Figura 8.b, é o mecanismo de tenacificação mais presente.
Figura 8 – Representação esquemática dos mecanismos de tenacificação pelo
ponteamento de trincas (Adaptada de [2])
Como citado anteriormente, diversos mecanismos podem ocorrer de forma a mitigar
o efeito da trinca do material, entretanto, somente os dois mecanismos acima serão citados
porque cobrem os comportamentos observados neste estudo.
3. MATERIAIS E MÉTODOS
3.1. Materiais
Os materiais selecionados para realização deste trabalho já haviam sido sinterizados
por outros alunos/pesquisadores e todos os tratamentos realizados visavam somente a
adequação da superfície para realização dos testes de indentação instrumentada, conforme
detalha o item 3.3. Dentre os materiais escolhidos estão cerâmicos óxidos e covalentes
que apresentam ou não algum tipo de mecanismo de tenacificação, de forma a obter uma
visão abrangente dos resultados dos ensaios.
Foram selecionadas amostras de nitreto de silício (Si3N4) sinterizadas por prensagem a
quente com patamar de 2 horas em 1825°C e 6% de Y2O3 como aditivo de sinterização
16
[32]. Ao todo, duas amostras diferentes foram utilizadas, uma contendo 10% em peso de
whiskers de β-Si3N4 introduzidos diretamente no material, e outra que apresenta whiskers
provenientes somente da transformação α-Si3N4 para β-Si3N4. As microestruturas
resultantes são similares a ilustrada na Figura 9. Segundo o trabalho de Costa [32], ambas
têm aproximadamente o mesmo módulo de elasticidade medido por ultrassom de 320
GPa, mesmo coeficiente de Poisson de 0,28, dureza Vickers (HV) de 15,1 GPa e 15,9
GPa, respectivamente, e densidade de pelo menos 98,6% (medida por porosimetria de
mercúrio) em relação a teórica.
Uma amostra de zircônia, cerâmico tipicamente óxido, foi utilizada. Essa amostra foi
sinterizada com adição de 3% em mols Y2O3 a partir do ciclo de sinterização representado
na Figura 10 [33]. Os resultados encontrados por Pinheiro [33] apresentam densidade
girando em torno de 97,6% da densidade teórica - calculada pelo método de Archimedes;
coeficiente de Poisson igual 0,34; módulo de elasticidade de 194 GPa (obtido pelo método
de ultrassom) e dureza Vickers (HV) média de 12,8 GPa [33]. A Figura 11 mostra o
resultado da microestrutura da zircônia sinterizada com óxido de ítria.
Uma amostra de carbeto de silício obtida na forma particulada (pó) e em seguida
processada pelo Laboratório de Análises Químicas e Processamento Cerâmico da
COPPE/UFRJ [34] também foi selecionada. Esta amostra foi processada através da
sinterização por estado sólido (SES) a partir de um material denominado PREMIX, uma
pré-mistura importada contendo concentrações de carbono, boro e ligantes, que são
aditivos de conformação a verde e de sinterização. Como resultado, obteve-se uma
densidade relativa de 97,5%, coeficiente de Poisson de 0,16, módulo de elasticidade
medido por ultrassom de 347,8 GPa [35] e testes de dureza não foram realizados
previamente neste material.
Em suma, foram selecionadas quatro amostras, sendo o Si3N4 e o SiC cerâmicos
tipicamente covalentes e a ZrO2 um cerâmico tipicamente óxido. A Tabela 2 sintetiza
todas as informações referentes as propriedades das amostras utilizadas.
17
Figura 9 – Microestrutura do Si3N4 sinterizado por prenssagem a quente (Adaptado de
[36])
Figura 10 – Ciclo de Sinterização da Zircônia com 3% mols de Y2O3 [33]
18
Figura 11 – Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV) do disco cerâmico de
zircônia sinterizada com óxido de ítria. [33]
Tabela 2 – Lista dos Materiais Utilizados
Amostra E (GPa) HV (GPa) Ref.
Si3N4 + 0% whiskers β-Si3N4 + 6% Y2O3 320 15,9 0,28 [32]
Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4 + 6%
Y2O3
320 15,1 0,28 [32]
ZrO2 + 3% Y2O3 194 12,8 0,34 [33]
SiC SES Premix 347,82 - 0,16 [35]
3.2. Ensaio de Indentação Instrumentada
O equipamento MHTX S/N: 01-2802 da fabricante CSM Instruments (Figura 12), que
foi utilizado na realização dos testes de indentação instrumentada, consiste em três
componentes básicos, conforme representação esquemática da Figura 13: um indentador
de geometria específica acoplado a uma coluna rígida pela qual a força é transmitida; um
19
atuador responsável pela aplicação da força; e um sensor para medir o deslocamento do
indentador durante o processo.
Figura 12 – CSM Instruments MHTX S/N: 01-2802
Além dos três principais componentes acima citados, o equipamento conta também
com itens auxiliares, como um microscópio de aquisição de imagens cromáticas ConScan
3D da fabricante CSM Instruments e, para completo aproveitamento do sistema de
instrumentação de alta precisão responsável por medir o deslocamento do indentador, o
microindentador é estruturado sobre uma mesa com sistema de isolamento de vibração.
20
Figura 13 – Representação esquemática dos componentes básicos que compõem o
sistema para realização do ensaio de indentação instrumentada (adaptada de [14])
Procedimento
Todos os ensaios foram realizados através de um ciclo de carregamento composto por
uma única etapa que consiste em alcançar a carga máxima através de uma determinada
taxa de carregamento, que, uma vez atingida, permanece aplicada durante um patamar de
dez segundos, para então, ser retirada a uma determinada taxa de descarregamento. No
caso de materiais cerâmicos, as taxas de carregamento e descarregamento não são
siginificativas para o resultado do ensaio, mas estão descritos, assim como as demais
variáveis pertinentes aos ensaios, na Tabela 3 de acordo com o carregamento máximo
alcançado.
Para cada carga foram realizadas entre quatro e nove indentação de forma a obter as
propriedades de interesse.
Tabela 3 – Variáveis utilizadas para cada valor de carregamento
Carregamento
Máximo
Taxa de
Carregamento
Tempo de Patamar Taxa de Descarregamento
0.5N 1 N/min 10,0 s 1 N/min
Amostra
21
Carregamento
Máximo
Taxa de
Carregamento
Tempo de Patamar Taxa de Descarregamento
1N 2 N/min 10,0 s 2 N/min
5N 10 N/min 10,0 s 10 N/min
10N 20 N/min 10,0 s 20 N/min
13N 26 N/min 10,0 s 26 N/min
15N 30 N/min 10,0 s 30 N/min
3.3. Preparação da Superfície
Para realização dos ensaios de indentação instrumentada, é necessário que a
rugosidade da superfície similar a de uma superfície polida, uma vez que as propriedades
mecânicas em questão são medidas em função da área de contato projetada na superfície
da amostra, que é considerada como sendo uma superfície plana. Outro ponto preocupante
na realização dos ensaios ocorre quando o comprimento das deformações em uma
superfície rugosa, como poros, por exemplo, é comparado com raio de contato entre o
indentador e a amostra, neste caso, a área de contato determinada a partir dos dados da
Figura 4 é subestimada quando a área de contato real incide sobre vales na superfície, e
superestimada quando incide nos pontos mais elevados de uma superfície rugosa [14].
Assim, para minimizar a magnitude dos erros relacionados à rugosidade na superfície,
procedimentos clássicos de preparação de superfícies foram realizados, tais como como
corte com disco diamantado, embutimento, lixamento e polimento, visando à preparação
dos corpos de prova.
Corte por abrasão (cut-off)
Primeiramente os corpos de prova foram cortados pelo equipamento ISOMET® 4000
da Buehler (Figura 14), através de um disco da série 20 LC Diamond de forma a dividir
as amostras em três partes. Este processo ocorreu com velocidade de rotação do disco de
2000RPM à taxa de alimentação de 2mm/min, sendo o ponto de contato do disco com a
amostra resfriado por água durante todo processo, de forma a lubrificar e retirar o material
residual do corte. Esse processo não foi regido por nenhuma norma em vigor, e os valores
utilizados estão registrados neste trabalho para fim de consulta.
22
Figura 14 - Máquina de corte Buehler ISOMET® 4000
Embutimento
Em seguida, para que houvesse adequada manipulação durante o lixamento e
polimento, as amostras foram embutidas à quente sob pressão de 290 bar na prensa
metalográfica (embutidora) Buehler SimpliMet® 1000 (Figura 15) com sistema de
refrigeração à água, respeitando o tempo mínimo de dois minutos para aquecimento e
quatro minutos para resfriamento. A resina Buehler ProbeMet [37], que possui materiais
condutores como cobre (Cu) e óxido de silício (SiO2) adicionados à matriz de epóxi, foi
utilizada no embutimento para viabilizar futuras análises no microscópio de varredura
(MEV) – método que exige condutividade nas amostras analisadas.
Figura 15 - Prensa Metalográfica Buehler SimpliMet® 1000
Lixamento
23
Uma vez embutidos, os corpos de prova passaram pelo lixamento. Processo que
consiste em aplicar uma pressão nos corpos de prova durante um determinado período de
tempo, de forma a maximizar seu contato com uma lixa acoplada a uma base circular
giratória, visando a mitigação dos sulcos e riscos superficiais resultantes do
processamento dos corpos de prova, resultando em uma superfície plana cuja
profundidade de deformação seja suficientemente fina para que desapareça na posterior
operação de polimento. Como a própria lixa pode danificar a superfície dos corpos de
prova, reduz-se a granulometria da lixa a cada etapa subsequente.
Neste trabalho, o lixamento foi realizado na lixadeira-politriz automática Buehler
AutoMet® 250 (Figura 16), em quatro etapas subsequentes com lixas de carbeto de silício
modelo Buehler CarbiMet® 2 seguindo a ordem granulométrica de 240, 320, 400 e 600
mesh, duração de seis minutos para cada etapa, à uma rotação de 500 RPM e força
aplicada de 20N por amostra.
A utilização de um item refrigerante se faz necessária para remoção de eventuais
partículas do abrasivo na superfície da amostra e, portanto, maximizar o contato entre o
corpo de prova e o abrasivo presente nas lixas. No caso deste trabalho, o processo foi
inteiramente refrigerado à água.
Figura 16 - Lixadeira-politriz automática Buehler AutoMet® 250
Polimento
24
Posterior a etapa de lixamento, o polimento tem metodologia e variáveis de processo
semelhantes ao do processo de lixamento, sendo que um tecido especial com a capacidade
de absorver um agente polidor líquido foi acoplado à base - em detrimento de uma lixa
abrasiva - com a finalidade de eliminar a fina camada de deformação residual resultante
do processo de lixamento, de forma a obter uma superfície plana e livre de sulcos e riscos
superficiais, para tal, o processo consistiu em diversas etapas, reduzindo a granulometria
do agente polidor a cada uma subsequente.
A lixadeira-politriz da Buehler utilizada para o lixamento (Figura 16) também foi
empregada no processo de polimento dos corpos de prova cerâmicos deste trabalho, bem
como a mesma pressão e velocidade de rotação em todas as três etapas que o processo foi
dividido, sendo três minutos de duração para cada uma. A primeira etapa foi realizada
com diamante monocristalino em suspensão de 15µm da marca Buehler MetaDi® e as
etapas seguintes com diamante policristalino em suspensão, também da marca Buehler
MetaDi®, de 6µm e 1µm, respectivamente.
25
4. RESULTADOS
Todos os materiais foram ensaidos com pelo menos três cargas e entre quatro e nove
indentações para cada carga. As observações e resultados obtidos serão segmentados por
cada diferente material e sintetizadas ao final, de forma comparativa.
4.1. Nitreto de Silício
No caso do material sem a inclusão de whiskers, foram realizados ensaios com as
cargas de 500mN, 1N, 10N, 13N e 15N, cujas micrografias das indentações impressas
estão ilustradas na
Figura 17 (a), (b), (c), (d) e (e), respectivamente. Nos resultados dos ensaios realizados
para cargas acima de 10 N é visível a abertura de trincas, sendo ainda mais evidente para
as cargas de 13N e 15N.
A profundidade máxima de indentação (hmax), a dureza (HIT) e o módulo de
elasticidade (EIT) calculado pelo método de indentação instrumentada mostra valores
variando entre 17,9 e 22,7 GPa para dureza e entre 240 e 300 GPa para o módulo de
elasticidade. A Tabela 4 resume os dados e dá origem aos gráficos ilustrados na Figura
18 e Figura 19. Verifica-se nos gráficos que o módulo de elasticidade foi praticamente
constante até a carga de 10 N, correspondente a profundidade de indentação de 6000nm,
aproximadamente. Observando a Figura 18, nota-se que na carga de 10N há o início de
danos/trincas consideráveis ao redor da indentação e para cargas superiores os danos são
extensivos, passando a influenciar os ensaios. De fato, se o método usado para medir a
dureza fosse o da ASTM C 1327 (Standard Test Method for Vickers Indentation Hardness
of Advanced Ceramics), os valores de dureza não conseguiriam ser medidos,
diferentemente do método aqui aplicado. As trincas abertas das extremidades da
indentação e a quebra das mesmas extremidades mostram a dificuldade inerente em se
fazer este tipo de ensaio em materiais frágeis, como os cerâmicos.
Tabela 4 – Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
Si3N4 + 0% whiskers β-Si3N4
Carga (N) hmax (nm) HIT (Gpa) EIT (GPa)
26
0,5 1295,82 19,4 ± 2,3 296,1 ± 21,4
1 1742,4 22,6 ± 1,6 305,2 ± 14,4
10 5968,44 17,7 ± 1,0 287,8 ± 7,2
13 6876,75 18,2 ± 0,6 258,9 ± 2,0
15 7499,08 17,9 ± 1,2 242,3 ± 8,1
27
Figura 17 – Micrografias das indentações realizadas na amostra de Si3N4 sem inclusão
de whiskers fase β com as seguintes cargas: (a) 0.5N, (b) 1N, (c) 10N, (d) 13N e (e) 15N
28
Figura 18 – Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de Si3N4 + 0% whiskers β-Si3N4
Figura 19 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de Si3N4 +0% whiskers β-Si3N4
29
No caso do nitreto de silício com 10% de whiskers β-Si3N4 inseridos, os ensaios
foram realizados para as cargas de 1N, 5N, 10N e 13N, e as micrografias referentes as
indentações impressas na superfície estão representadas na Figura 20 (a), (b), (c) e (d),
respectivamente, onde é possível notar a abertura de trincas para cargas acima de 5N.
A Tabela 5 organiza os valores obtidos para a profundidade máxima de indentação
(hmax), a dureza (HIT) e o módulo de elasticidade (EIT) calculado pelo método de IIT,
mostrando valores variando entre 15,7 e 20,9 GPa para a dureza entre 250 e 320 GPa para
o módulo de elasticidade. Esses valores estão organizados na Figura 21 e Figura 22,
respectivamente.
O comportamento do material com a presença de whiskers difere bastante daquele
monolítico, visto acima. A presença de whiskers modifica a microestrutura e, em
particular, os mecanismos de tenacificação. Comparando com a
Figura 17 com a Figura 20, verifica-se que a presença dos whiskers manteve a
integridade do material ao redor da indentação, a qual pode ser associada a um aumento
da tenacidade à fratura, mesmo que não quantificada. O mecanismo de tenacificação
típico para o nitreto de silício é o de deflexão de trinca.
30
Figura 20 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de Si3N4 + 10%
whiskers β-Si3N4 com as seguintes cargas: (a) 1N, (b) 5N, (c) 10N e (d) 13N
Tabela 5 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4
Carga (N) hmax (nm) HIT (GPa) EIT (GPa)
1 1802,68 20,8 ± 5,2 285,6 ± 4,3
5 4461,91 15,7 ± 3,0 252,5 ± 3,8
10 5640,54 20,4 ± 1,4 321,4 ± 15,4
13 6823,29 18,2 ± 2,7 276,5 ± 23,5
31
Figura 21 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4
Figura 22 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de Si3N4 + 10% whiskers β-Si3N4
32
4.2. Zircônia
Nas amostras de zircônia tetragonal policristalina estabilizada com ítria, ensaios com
cargas de 1N, 5N e 10N foram realizados, e as micrografias das indentações impressas
estão ilustradas na Figura 23 (a), (b) e (c), onde, mesmo para carga de 10N, não há
abertura de trincas. O módulo de elasticidade variou entre 85 e 180 GPa enquanto que a
dureza variou entre 4,8 e 12,2 GPa, dependendo da carga e profundidade de indentação.
A Tabela 6 e os gráficos da Figura 24 e Figura 25 representam os resultados obtidos para
zircônia.
Cabe frisar que para este cerâmico óxido, tenacificado por transformação de fase, não
se observou a presença de trincas ao redor das indentações até 10N, ao contrário do Si3N4
reportados acima. Isso mostra a força do mecanismo de tenacificação e a constante busca
pelo entendimento e aprimoramento dos mesmos.
Tabela 6 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
ZrO2
Carga (N) hmax (nm) HIT (GPa) EIT (GPa)
1 3450.4 4,8 ± 1,7 85,2 ± 9,3
5 5345.9 10,5 ± 1,4 179,5 ± 6,4
10 7269.53 12,2 ± 2,0 170,4 ± 7,8
33
Figura 23 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de ZrO2 com as
seguintes cargas: (a) 1N, (b) 5N e (c) 10N
34
Figura 24 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de ZrO2
Figura 25 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de ZrO2
35
4.3. Carbeto de Silício (Premix)
O carbeto de silício apresentou resultados que variaram entre 365 e 455 GPa para o
módulo de elasticidade e entre 17,4 e 30,9 GPa para a dureza. As cargas realizadas nessas
amostras foram de 500mN, 5N e 10N e as micrografias das indentações impressas estão
ilustradas na Figura 26 (a), (b) e (c), enquanto os resultados estão organizados na Tabela
7 e nos gráficos da Figura 27 e da Figura 28.
A partir das micrografias, é possível notar que as cargas de 5N e 10N geraram trincas
muito mais expressivas. Tal fato é bem ilustrado pela Figura 26 (d), que mostra a matriz
de indentação realizada com 10N de carga, onde pelo menos cinco das nove indentações
impressas estão visivelmente destruídas e uma única indentação pôde gerar uma
impressão de aproximadamente 100µm.
Tabela 7 - Resultados dos ensaios de indentação instrumentada para as amostras de
SiC sinterizado em estado sólido
Carga (N) hmax (nm) HIT (GPa) EIT (GPa)
0.5 1039,35 30,9 ± 4,3 453,4 ± 23,7
5 4253,23 17,4 ± 2,6 276,3 ± 15,8
10 5077,71 27,9 ± 3,8 366,4 ± 22,1
36
Figura 26 - Micrografias das indentações realizadas na amostra de SiC SES com as
seguintes cargas: (a) 0.5N, (b) 5N e (c) 10N. (d) é a matriz de indentação quando
aplicada carga de 10N
37
Figura 27 - Módulo de elasticidade obtidos através de ensaios de indentação
instrumentada para as amostras de SiC SES
Figura 28 - Dureza obtida através de ensaios de indentação instrumentada para as
amostras de SiC SES
38
5. DISCUSSÕES
É possível notar que, para cargas muito pequenas de indentação (leia-se entre 0,5 e
1N), os valores de módulo de elasticidade se aproximam muito dos valores encontrados
na literatura (Tabela 1), onde os ensaios refletem propriedades volumétricas. Para estas
cargas, onde pequenas indentações da ordem de 5 a 10 µm são impressas, as propriedades
são medidas em uma região muito pequena e com pouca influência da presença de poros
e para materiais altamente densos, como os aqui testados, este comportamento era
esperado. A Figura 29 compara a micrografia da superfície de uma amostra de nitreto de
silício com o tamanho de uma indentação de 10 µm realizada na amostra de nitreto de
silício com 10 % de whiskers β-Si3N4, nela pode-se comparar a baixa influência de poros
em uma indentação desta ordem de grandeza.
Figura 29 – Comparação entre a ordem de grandeza de uma indentação da amostra de
nitreto de silício com adição de whiskers e a micrografia da estrutura de uma amostra
similar adaptada de [36].
A Tabela 8 mostra a comparação entre os valores encontrados na literatura e aqueles
para baixos carregamentos.
39
Tabela 8 – Comparação entre os módulos de elasticidade médio encontrados na
literatura e os avaliados por EII para cargas de 0.5 e 1N
Amostra E Médio (GPa)
[5] [6] [7]
E Médio (GPa)
Medido pelo EII
(0,5 e 1N)
ZrO2 138 85,2
Si3N4 (com e sem whiskers inseridos) 304 295,7
SiC 414 453,4
Também é possível notar que conforme ocorre o aumento do carregamento
aplicado e, consequentemente, o aumento da profundidade de indentação, trincas
começam a surgir a partir de carregamentos em geral superiores a 5N. Neste momento,
os mecanismos de tenacificação tornam-se importantes para manter a integridade do
material. A Figura 30 mostra a comparação dos quatro materiais acima e verifica-se que
para os cerâmicos covalentes (Si3N4 e SiC) existem dois regimes distintos, um até 5 N e
outro para cargas superiores. Estes cerâmicos, pelo menos os deste trabalho, têm sua
tenacidade à fratura gerada por deflexão de trinca, um mecanismo com menor capacidade
de gerar aumento de tenacidade do que o de transformação de fase, típico da ZrO2. De
fato, nesta mesma figura, verifica-se que a relação entre carga e profundidade foi linear
até 10N, corroborando a diferença entre os materiais e seus mecanismos de tenacificação.
40
Figura 30 – Comparação entre a profundidade máxima de indentação e o
carregamento utilizado para cada amostra.
41
6. CONCLUSÕES
O módulo de elasticidade medido por ultrassom, reportados na literatura, para as
amostras de nitreto de silício [32], de zircônia tetragonal [33] e de carbeto de silício
sinterizado por estado sólido [34] foram de 320 GPa, 194 GPa e 348 GPa,
respectivamente, enquanto o módulo de elasticidade medido por indentação
instrumentada para as mesmas amostras foram de 280 GPa, 145 GPa e 365 GPa,
respectivamente. Dessa forma é possível afirmar que a medição do módulo de elasticidade
por indentação instrumentada (EIT), uma técnica localizada, é coerente com a medição
da mesma propriedade pelo método de ultrassom, uma técnica volumétrica.
A dureza Vickers encontradas para as amostras de nitreto de silício [32], zircônia [33]
e carbeto de silício [34] foram de 20 GPa, 9,2 GPa e 19,2 GPa, respectivamente, enquanto
que a dureza medida pelas indentações instrumentadas foram de 18 GPa, 11,4 GPa e 17,9
GPa, respectivamente, mostrando que os valores encontrados por este último método são
também coerentes.
Também é possível inferir a partir do gráfico representado na Figura 30 a influência
dos mecanismos de tenacificação na zircônia tetragonal e no nitreto de silício, mostrando-
se o primeiro ser mais eficaz na tenacificação do material. Portanto, conclui-se que a
expansão volumétrica associada a transformação martensítica da fase tetragonal para fase
monoclínica em decorrência da presença do campo de tensões de uma trinca contribui de
forma significativa para o aumento da tenacidade a fratura da zircônia estabilizada com
ítria, impedindo que a amostra trincasse, enquanto que o mecanismo de deflexão de
trincas, embora tenha tenacificado o material, não foi suficiente para evitar o trincamento,
gerando a descontinuidade no gráfico carregamento/profundidade.
42
7. REFERÊNCIAS
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