As Políticas Públicas antidrogas e a violação às garantias de Direitos Humanos
João Felipe Ferreira de Souza Nogueira1
RESUMO:
Objetiva-se neste artigo abordar a política pública antidrogas do Brasil e compará-la
com as graves violações de direitos humanos, no tocante à prevenção e repressão do uso e
consumo de psicoativos, tendo em vista que a proibição não é fato garantidor ao extermínio
do alto consumo e dependência de psicoativos na população brasileira e a guerra contra as
drogas causa mais destruição de vidas que o consumo de psicoativos em si mesmo. A
proibição se transformou em uma política globalmente imposta e a posterior declaração de
uma guerra sanguinária reafirmou a atuação do poder punitivo do Estado, destruindo vidas,
espalhando violência, mortes, prisões, estigmas e doenças, sem que obtivesse qualquer
resultado positivo, tanto na pretensão de extinguir o consumo, quanto na redução da
circulação destas substâncias. Enquanto o Estado busca, de maneira fracassada, dizimar o
mercado de psicoativos, os riscos, danos e sofrimento causados pela proibição são agravados
a cada dia. É neste cenário que se observa que as garantias dos direitos fundamentais não se
compatibilizam com a obstrução e o impedimento aplicados pelas políticas antidrogas.
Todas essas violações às normas garantidoras de direitos fundamentais do indivíduo
demonstram que os riscos e danos relacionados as drogas não são causados por elas mesmas,
sendo certo que a causadora destas violações é a proibição. A metodologia dedutiva utilizada
nesta pesquisa tem como principais fontes as doutrinas, artigos científicos, políticas públicas,
congressos, simpósios, seminários e encontros relacionados ao tema de política de drogas do
Brasil e violação aos Direitos Humanos.
Palavras-chave: Políticas Públicas – Drogas – Violação de Direitos Humanos.
1 Mestrando em Fronteiras e Direitos Humanos pela Universidade Federal da Grande Dourados - UFGD.
Graduado em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados - UNIGRAN (2016). Advogado
devidamente inscrito na Ordem dos Advogados do Brasil no MS. Pesquisador da Política Criminal de Drogas
no Brasil.
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1 INTRODUÇÃO
No Brasil, como em grande parte do mundo, é adotada uma política de prevenção ao
consumo e repressão ao tráfico de drogas. Assim, buscando-se enfrentar o problema social
relacionado às drogas no século XX, foi definido um caminho que parte da construção do
estigma do drogado e da emergência da solidariedade à pessoa que adoeceu pelo consumo
de drogas, e finda-se na aceitação do uso de drogas como aspecto indissociável da condição
humana.
Com o advento da aids os danos à saúde associados ao consumo ilícito de
entorpecentes tornaram-se intoleráveis, ainda mais quando se trata do crescimento da
epidemia, tendo em vista a prática de usos de drogas injetáveis. Neste caminho é que os
países passaram a reformular suas políticas de drogas e aplicaram medidas voltadas ao
combate do uso de drogas.
O objetivo da política antidrogas é exterminar o consumo e o fornecimento de drogas
no país, e tal objetivo é executado por meio de uma sangrenta guerra declarada contra os
usuários e traficantes.
A atual política mundial sobre drogas tem sido organizado em torno de discursos
científicos que tendem a configurar a questão, como problema de saúde pública e segurança
pública.
Observando o alto consumo de drogas e o tráfico no Brasil, certifica-se que a guerra
contra estas substâncias não é, e nunca foi, uma guerra contra as drogas. Trata-se de uma
guerra contra as pessoas: os produtores, comerciantes e consumidores das selecionadas
substâncias psicoativas tornadas ilícitas. Porém, os “inimigos” nessa guerra, são seus
produtores, comerciantes e consumidores pobres, não brancos, marginalizados, desprovidos
de poder.
Neste ponto é que a guerra declarada contra as drogas viola os direitos humanos,
provocam violência, causam morte e destruição de famílias, além de lotar os
estabelecimentos prisionais de meros usuários, que por portarem ilicitamente substância
psicoativa, muitas vezes para o próprio consumo, foram condenados como traficantes.
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2 A POLÍTICA ANTIDROGAS DO BRASIL
2.1 – Políticas Públicas
Quando se fala em política antidrogas, deve-se analisar antes, o conceito de
políticas públicas, que pode ser concebido como um conjunto de ações do governo que irão
produzir efeitos específicos, que implicam em linhas gerais, responder as questões: quem
ganha o quê? por que? e que diferença faz?
O que se deve levar em consideração é a importância das políticas públicas na
solução de problemas. Suas definições conduzem nosso olhar para onde os embates entorno
de interesses, preferências e ideias se desenvolvem, ou seja, dentro do governo, e assumem
uma perspectiva de que o todo é mais importante do que a soma das partes, e que indivíduos,
instituições, ideologias, interações e interesses devem ser observados, mesmo existindo
diferenças sobre a importância destes fatores.
Pode-se chegar então à definição de que política pública é o campo do
conhecimento que busca ao mesmo tempo colocar o governo em ação, analisar essa ação e,
quando necessário, propor mudanças em seus cursos.
A política pública é um campo abrangente sendo que torna-se território de outras
várias disciplinas, teorias e modelos analíticos, porém, embora seja um ramo da ciência
política, ela não se resume, podendo também ser objeto da filosofia, psicologia, economia,
e ainda, comporta vários pontos de vista, não carecendo de coerência teórica e metodológica.
A política pública possui dois elementos fundamentais, quais sejam:
Intencionalidade Publica e o Problema Público. O primeiro elemento serve como motivação
para o estabelecimento de ações para tratamento ou para resolução de um problema, já o
segundo elemento é relativo à diferença entre uma situação atual vivida (status quo) e uma
situação ideal possível à realidade coletiva.
Estas políticas tomam forma por meio de programas públicos, projetos, leis,
campanhas publicitárias, esclarecimentos públicos, inovações tecnológicas e
organizacionais, entre outros.
O modelo de democracia é de extrema importância para as políticas públicas, uma
vez que é garantidor da participação do cidadão nas formulações destas políticas além de
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necessitar de participação para se efetivar, eis que o próprio princípio democrático implica
participação nos processos de decisão, pois não há como se negar que a democracia desloca
o poder para o povo, sendo que o cidadão tem o direito de participar ativamente das decisões
acerca das políticas públicas, sob pena de estar-se difundindo uma democracia meramente
retórica.
A relação entre os Direitos Humanos e a participação democrática é constitutiva,
tendo em vista que a efetivação dos Direitos Humanos não ocorre fora da participação
democrática e independentemente de estarem consagrados na Constituição Federal, sem a
ação no espaço público não há efetividade dos Direitos Humanos, mas sim mera declaração
em textos legais.
É nesse ponto de vista que se observa que os Direitos Humanos são fundamentais
à afirmação democrática, posto que possibilitam a discussão pública de problemas sociais e
por isso, o Programa Nacional de Direitos Humanos prevê ações programáticas democráticas
que asseguram a participação popular nas políticas públicas em Direitos Humanos,
reafirmando a democracia enquanto sinônimo de participação democrática e afirmando a
efetividade dos Direitos Humanos.
2.2 – A Política Antidrogas do Brasil
A política de drogas do Brasil segue o exemplo internacional de prevenção e
repressão ao uso e consumo de entorpecentes, bem como buscam extinguir o comércio ilegal
dessas substâncias.
Embora sejam encontrados vestígios da criminalização de drogas ao longo do
desenvolvimento da sociedade brasileira, somente a partir de 1940 é que se pode verificar o
surgimento de política proibicionista sistematizada.
O debate atual sobre drogas tem sido organizado em torno de discursos científicos
que tendem a configurar a questão ora como problema de segurança pública, relacionado ao
tráfico e à repressão, ora como problema de saúde pública, relacionado à repressão da
demanda por um lado e à redução de danos por outro.
O proibicionismo então, pode ser entendido como um posicionamento ideológico,
que se traduz em ações políticas voltadas para a regulação de fenômenos, comportamentos
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ou produtos vistos como negativos, através de proibições estabelecidas notadamente com a
intervenção do sistema penal, sem deixar espaço para as escolhas individuais, para o âmbito
de liberdade de cada um, ainda quando os comportamentos regulados não impliquem em um
dano ou em um perigo concreto de dano para terceiros.
A política antidrogas, se expressa internacionalmente em três convenções da ONU
sobre a matéria, vigentes e complementares: a Convenção Única sobre entorpecentes de
1961, que revogou as convenções anteriores e foi revista através de um protocolo de 1972;
o Convênio sobre substâncias psicotrópicas de 1971; e a Convenção das Nações Unidas
contra o tráfico ilícito de entorpecentes e substâncias psicotrópicas de 1988 (Convenção de
Viena).
Tais convenções internacionais pretendem restringir a fins exclusivamente médicos
e científicos a produção, a distribuição e o consumo das substâncias e matérias primas
tornadas ilícitas, mediante a criminalização de condutas relacionadas àquelas atividades que
se realizem com quaisquer outros fins.
A versão brasileira da “guerra às drogas” se revela explicitamente a partir de 1998,
quando foi criada a Secretaria Nacional Antidrogas, órgão executivo do Conselho Nacional
Antidrogas, ambos dirigidos por generais do Exército e subordinados ao Gabinete de
Segurança Institucional da Presidência da República. A própria denominação da Secretaria
Antidrogas sugere uma visão distorcida e delirante sobre as substâncias psicoativas,
visualizadas, militarmente, como se fossem o “inimigo”.
O proibicionismo criminalizador leva à criação de leis penais que definem como
crimes condutas relacionadas à produção, à distribuição e ao consumo de algumas dentre as
inúmeras substâncias psicoativas e matérias primas para sua produção. As substâncias
psicoativas e matérias primas, que, assim selecionadas, recebem a qualificação de drogas
ilícitas, como a maconha, a cocaína, a heroína, a folha de coca, etc., não têm natureza
diferente de outras substâncias igualmente psicoativas, como a cafeína, o álcool, o tabaco,
etc., destas só se diferenciando em virtude da artificial definição como criminosas de
condutas realizadas por seus produtores, distribuidores e consumidores.
Maria Lucia Karam, juíza de direito, membra da diretoria da LEAP e presidente da
LEAP Brasil, traduzido em português como, Agentes da Lei Contra a Proibição, afirma que:
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A Lei 11.343/2006 é apenas mais uma dentre as legislações dos mais
diversos países que, reproduzindo os dispositivos criminalizadores
das proibicionistas convenções da ONU, conformam a globalizada
intervenção do sistema penal sobre produtores, comerciantes e
consumidores das selecionadas substâncias psicoativas e matérias
primas para sua produção, que, em razão da proibição, são
qualificadas de drogas ilícitas. (Karam, Maria Lucia (2009.a). Escritos
sobre a Liberdade, vol.3: Proibições, riscos, danos e enganos: as drogas
tornadas ilícitas. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris.)
A lei 11.343/06 nivela a importância do tratamento diferenciado entre usuários e
traficantes, criando dois estatutos autônomos com respostas punitivas de natureza distinta:
alta repressão ao traficante de drogas, com imposição de severo regime de punibilidade; e
patologização do usuário e do dependente com aplicação de penas e medidas.
Importante ressalvar que, apesar da crítica criminológica relativa ao fracasso da
política de guerra as drogas, não apenas a criminalização do comércio de entorpecentes e
suas variáveis são mantidas, como são aumentadas gradativamente as penas e restringidas
às hipóteses de incidência dos substitutos penais.
Além disso, dispõe sobre a adoção de uma nova política nacional sobre drogas,
passado a humanizar o tratamento legal dispensado aos usuários de drogas, através do
abrandamento e adequação das penas cominadas a conduta de uso, de forma a impor sanção
que vise reeducar e ressocializar o usuário.
Neste quadro, fundamental lembrar que:
(...) as políticas contra as drogas na América Latina tem seguido os
passos da ‘guerra contra as drogas’ propostas pelos EUA. Por esta
abordagem, os governos pretendem livrar as sociedades das drogas
com medidas repressivas. Após décadas de experiência, essa política
colheu um retumbante fracasso. Mesmo assim, seus seguidores não
se cansam de propor doses mais fortes do mesmo remédio. (ROLIM,
A Síndrome da Rainha Vermelha, p.174.).
De acordo com Rolim, a guerra contra as drogas adotada pelo Brasil e também por
vários outros países, no tocante à repressão ao tráfico e prevenção ao uso colheu um
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retumbante fracasso, tendo em vista que tais substancias jamais deixaram de serem
consumidas e comercializadas em nosso país.
2.3 – A Política de Drogas e a Redução de Danos
A política de repressão e prevenção adotada pelo Brasil e efetivada por meio de
uma nociva guerra, também prevê uma política de redução de danos aos usuários e
dependentes que não se compatibiliza com uma guerra sangrenta, já que a redução de danos
caracteriza-se como uma abordagem ao fenômeno das drogas que visa minimizar danos
sociais e à saúde associados ao uso de substâncias psicoativas.
Juntamente com as práticas punitivas aplicadas aos usuários de drogas surge, no
Rio Grande do Sul, em 1999, a Política Estadual de Educação Preventiva e Atenção ao
Usuário de Drogas, que reconheceu a complexidade do fenômeno das drogas propondo,
como alternativa, a integração das diferentes secretarias sob a coordenação da secretaria
geral de governo. No mesmo ano é criada a Associação Carioca de Redução de Danos
(ACRD), com a participação de técnicos do Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao
Uso de Drogas (NEPAD).
Acrescenta-se à consolidação das práticas em saúde ao usuário de drogas o Decreto
Presidencial n° 4.345, de 26 de agosto de 2002, que estabeleceu a Política Nacional
Antidrogas (PNAD).
No mesmo ano, a Portaria nº 816/2002 implementa no SUS o Programa Nacional
de Atenção Comunitária Integrada a Usuários de Álcool e outras Drogas. Esse programa
enfatizava a prestação de serviços não hospitalares, articulados em rede, sob abordagem
multidisciplinar, direcionados ao apoio das estratégias em redução de danos e acessíveis à
comunidade, que deveria se apoderar do controle social.
Inicia-se assim, o processo de territorialização na saúde a fim de articular
tratamento, prevenção, educação, inclusão social e intersetorialidade entre os serviços e a
comunidade, no que se relaciona ao (ab)uso de drogas.
Juntamente com o PNAD foi editada uma agenda nacional que buscava reduzir a
demanda de drogas, em três pontos principais, veja-se:
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Integração das políticas públicas setoriais com a Política Nacional
Antidrogas, visando ampliar o alcance das ações; descentralização
das ações em nível municipal, permitindo a condução local das
atividades da redução da demanda, devidamente adaptada à
realidade de cada município; estreitamento das relações com a
sociedade e com a comunidade científica. (DUARTE, 2011, p. 34).
De acordo com Duarte (2011), “o Ministério da Saúde considera que o consumo de
álcool e outras drogas é uma questão de saúde pública e não de segurança pública ou de
polícia” (apud DELGADO, CORDEIRO, 2011, p. 46).
Objetivando-se reavaliar os fundamentos da PNAD, em 2004, frente às mudanças
sociais, políticas e econômicas em andamento no País, a política de drogas é atualizada, em
articulação e sob a coordenação da SENAD - Secretaria Nacional Antidrogas, por intermédio
do Seminário Internacional de Políticas Públicas sobre Drogas, seis fóruns regionais e um
Fórum Nacional sobre Drogas.
Após esses movimentos, a política pública sobre drogas, em 23 de maio de 2005,
passa a chamar-se Política Nacional sobre Drogas (PNAD) que prioriza em suas ações o
planejamento e a articulação entre os diferentes equipamentos sociais e instituições de saúde,
apresentando direções e diretrizes sobre prevenção, tratamento, recuperação e reinserção
social; redução dos danos sociais e à saúde; redução da oferta; e estudos, pesquisas e
avaliações, sendo orientada pelo princípio da responsabilidade compartilhada, segundo o
qual governo, iniciativa privada, terceiro setor e cidadãos devem atuar de forma cooperada
e articulada entre si. Esse indicativo descentraliza as ações sobre substâncias psicoativas no
Brasil.
Por sua vez, a Lei nº 11.343, cria o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre
Drogas (SISNAD), colocando o Brasil em destaque nas discussões mundiais sobre drogas
ao apontar medidas preventivas contra o uso indevido de substâncias psicoativas e
promotoras da reinserção social dos usuários e dependentes de drogas no panorama
internacional, distinguindo o traficante do usuário e dependente, carente por tratamento e
leis diferenciadas.
A edição dessa lei aproximou a Justiça dos serviços de saúde e de assistência social,
conferindo-lhes um papel central no atendimento a essas pessoas. Duarte (2011), ao discutir
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esse novo modelo de concepção da temática das drogas, faz algumas considerações sob os
seus aspectos jurídicos:
A justiça retributiva baseada no castigo, é substituída pela justiça
restaurativa, cujo objetivo maior é a ressocialização por meio de
penas alternativas, tais como: advertência sobre os efeitos das
drogas; prestação de serviços à comunidade em locais/programas
que se ocupem da prevenção/recuperação de usuários e dependentes
de drogas; medida educativa de comparecimento à programa e curso
educativo (DUARTE, 2011, p. 35).
As diretrizes dessa política estão focadas na responsabilidade compartilhada entre
governo e sociedade, no que se relaciona a drogas, colocando ênfase na garantia, e não
apenas no reconhecimento desse direito, de tratamento ao dependente e ao usuário. Essa
política prioriza as ações de prevenção e avança no que tange às políticas de redução de
danos.
Nos termos da política de redução de danos as atividades de atenção e as de
reinserção social do usuário, do dependente de drogas e respectivos familiares devem
garantir o respeito ao consumidor, independentemente de quaisquer condições, observados
os direitos fundamentais da pessoa humana, os princípios e diretrizes do Sistema Único de
Saúde e da Política Nacional de Assistência Social, adotar estratégias diferenciadas de
atenção e reinserção social, considerando suas peculiaridades socioculturais, entre outras
garantias.
Segundo Boiteux et al. (2009), “as políticas públicas sobre substâncias psicoativas
promovidas pelo Brasil são reconhecidas como as mais avançadas da América Latina, assim
como também as que são previstas nas convenções internacionais sobre o tema”.
Nessa perspectiva, a Redução de Danos foi adentrando nos espaços institucionais
por intermédio das políticas centrais de saúde do SUS, como a Política Nacional da Atenção
Básica, a Política Nacional de Saúde Mental, a Política do Ministério da Saúde de Atenção
Integral de Usuários de Álcool e outras Drogas e a Política Nacional sobre Drogas,
realinhada em 2004.
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Ocorre que tais princípios previstos nesta lei, identificados como políticas de
redução de danos acabam despercebidos pela lógica proibicionista, não deixando de ser
apenas uma carta de intenções direcionadas ao sistema de saúde pública.
As propostas de redução de danos procuram, a partir da abertura com o discurso de
pânico que veem nas políticas descriminalizadoras, incentivos ao consumo, afastar a
incidência lesiva da intervenção penal. Segundo Maria Lucia Karam a enunciação de
programas mínimos de redução de danos, objetiva em última análise, evitar a transformação
do toxicodependente em tóxico-delinquente.
2.4 – A Política Antidrogas e a Violação de Direitos Humanos.
O debate internacional sobre drogas é abraçado por uma política de repressão ao
consumo e comercialização de entorpecentes e executado por uma violenta e sanguinária
guerra contra os consumidores e traficantes.
É lógico que dentro de uma guerra o que se encontra é um alto número de violência.
O custo mais elevado da criminalização das drogas é a sangrenta e violenta guerra de
repressão que afrontam os direitos humanos. O principal objetivo da “guerra às drogas”
brasileira é claro: eliminar a comercialização e o consumo a qualquer custo e assim a
explícita guerra contra as drogas deixa claro o descompromisso com os direitos
fundamentais dos cidadãos, sendo lógico que guerras e direitos humanos são naturalmente
incompatíveis.
A toxicomania assim é definida como uma delinquência (infração, delito ou crime)
e como uma doença (dependência química) que compete ao Estado e à medicina eliminar e
tratar.
Mortes, doenças, violência, e encarceramento massivo são o resultado dessa danosa
e sanguinária política, institucionalizada nas convenções internacionais da Organização das
Nações Unidas (ONU) e que impõem as diretrizes criminalizadoras adotadas pelas
legislações internas dos mais diversos Estados nacionais em matéria de drogas.
Característica marcante de tais diplomas internacionais e nacionais é a sistemática violação
a princípios garantidores positivados em normas inscritas nas declarações internacionais de
direitos e constituições democráticas.
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O problema relacionado as drogas assume a forma de uma guerra, e esta guerra é
imposta por uma política pública que o Estado define em forma de governo e de
administração da sociedade da modernidade. A guerra contra as drogas faz parte de uma
questão social de acumulação do capital e de modos de exercício do poder político.
A guerra contra as drogas não é outra coisa senão uma declaração de guerra de um
Estado contra sua própria população. Um ato deliberado contra a cidadania local e contra os
cidadãos outros; os que produzem, transportam, vendem e consomem, local e globalmente
as ditas substâncias.
Pela sua ineficácia, a guerra contra a droga representa um custo elevado para as
sociedades civis, não só em termos materiais e sociais, mas também morais. Estes últimos
dizem respeito aos danos causados ao conjunto das faculdades mentais que caracterizam o
bem estar intelectual de uma população determinada, e às ordens normativas exteriores ao
Estado que solidificam e unem a estrutura mental coletiva. De uma certa maneira estaremos
diante de uma violação de fato dos direitos humanos.
A cada passo da guerra contra a droga, numerosos setores das sociedades civis se
dão conta de algo importante. Que essa guerra transforma as populações em inimigo e em
vítima ao mesmo tempo! Mais ainda: que todo o aparato montado pelo Estado e pelo
criminoso-traficante tem como objetivo a reprodução dos símbolos e das condições sociais,
políticas e econômicas que sustentam o mito da eficácia da guerra contra a droga. O Estado,
o capital financeiro e o traficante passam a ser os vencedores dessa situação. Ao cidadão
cativo só lhe resta três possibilidades: ser vítima, ser drogado-criminoso ou drogado-doente,
e finalmente traficante.
As leis da guerra contra a droga, a proibição e a criminalização, pretendem proteger
os indivíduos deles mesmos, com a desvantagem de punir todos pelos excessos de alguns.
Do ponto de vista jurídico, as leis de proibição das drogas, tendo como alvo a criminalização
e a punição do consumidor, são geralmente anticonstitucionais.
Elas não podem proibir as ações de um cidadão que causem danos somente a ele
próprio, ou à sua integridade. Enquanto o consumidor se mantiver solitário no seu consumo,
e não forçar ninguém a fazer o mesmo que ele, esse ser humano não causa dano senão a ele
próprio. A sua condenação à qualquer tipo de penalidade constitui uma violação dos direitos
humanos.
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Podemos afirmar que a guerra contra a droga é anticonstitucional porque viola os
direitos e as liberdades fundamentais da cidadania, mas também que a política pública parte
de premissas e postulados falsos. Mesmo no caso da dependência (toxicomania), a
impossibilidade de a quebrar é relativa. Basta pensar no trabalho da medicina, apesar da sua
mercantilização, e das políticas sociais centradas na dignidade e liberdade do cidadão cujo
objeto é o tratamento do toxicômano.
A criminalização de qualquer ação ou omissão deve estar sempre referida a uma
ofensa relevante a um bem jurídico alheio, relacionado ou relacionável a direitos individuais
concretos, ou à exposição deste bem jurídico a um perigo de lesão concreto, direto e
imediato.
O documento da ONU sobre a política antidrogas pretende exterminar o tráfico e o
consumo aumentando a repressão e o controle, até o ano de 2019 e a guerra contra as drogas
continua a ser declarada sendo que a violação aos direitos humanos e a política de redução
de danos é deixada de lado pelo proibicionismo.
Assim, valendo-se da ilegítima intromissão estatal na liberdade individual dos
cidadãos e de uma desastrada intervenção no mercado produtor e distribuidor de drogas e
também da declaração de uma guerra nociva é que a política proibicionista vem destruindo
vidas e espalhando violência, mortes, prisões, estigmas, doenças, sem sequer obter qualquer
resultado significativo em seu declarado objetivo de erradicar ou reduzir a circulação das
selecionadas drogas tornadas ilícitas.
Após anos da globalizada proibição com os 40 anos de “guerra às drogas”, o
resultado visível é que as substâncias proibidas foram se tornando mais baratas, mais
potentes, mais facilmente acessíveis, diversificadas, fornecidas e consumidas.
A guerra, as mortes e as prisões nem sequer afetam o fornecimento de drogas.
Toda intervenção estatal supostamente dirigida à proteção de um direito contra a
vontade do indivíduo que é seu titular se torna absolutamente inconciliável com a própria
ideia de democracia, pois exclui a capacidade de escolha do indivíduo. O Estado democrático
não pode substituir o indivíduo em decisões que dizem respeito apenas a si mesmo. Ao
indivíduo há de ser garantida a liberdade de decidir, mesmo se de sua decisão possa resultar
uma perda ou um dano a si mesmo, mesmo se essa perda ou esse dano sejam irreparáveis ou
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definitivos.
Essas violações a normas garantidoras de direitos fundamentais, que estão na base
da proibição e se aprofundam à medida que cresce o tom repressor, já demonstram que os
maiores riscos e danos relacionados às drogas não são causados por elas mesmas. A
proibição causa maiores riscos e danos, provocando a expansão do poder punitivo,
desprezando as ideias que deram origem à proteção dos direitos fundamentais e assim
minando as bases da democracia, o que acaba por perigosamente aproximar Estados
democráticos de Estados totalitários.
Mas, a proibição das drogas tornadas ilícitas não produz apenas o encarceramento
massivo. A política antidrogas, ou melhor, anti determinadas drogas, não promove apenas a
humilhação, o controle e a submissão dos pobres, não-brancos, marginalizados e
desprovidos de poder.
Estamos lidando com crimes sem vítimas, mas não com uma guerra sem vítimas.
Guerra esta, que foi declarada sobre o pretexto de proteção à saúde. A política antidrogas
produz violência. A nociva, insana e sanguinária guerra às drogas, como qualquer outra
guerra, também é letal. Nesses termos:
A proibição não é apenas uma política falida. É muito pior do que
simplesmente ser ineficiente. A proibição causa danos muito mais
graves e aumenta os riscos e os danos que podem ser causados pelas
drogas em si mesmas. O mais evidente e dramático desses riscos e
danos provocados pela proibição é a violência, resultado lógico de
uma política baseada na guerra. (MARIA LUCIA KARAM, Drogas:
Dos Perigos da Proibição à Necessidade de Legalização, p.02.).
Segundo Maria Lúcia Karam, Juíza de Direito, o proibicionismo em relação ao uso
de drogas além de retrógrado e sem validade é ineficaz comparado aos danos provocados
pelo consumo (uso e abuso) das mesmas drogas. Observa ainda que o ato proibitivo de
utilizar drogas não reduziu o consumo e tal ato aumenta os riscos e danos que podem ser
causadas pelas drogas em si.
Salo de Carvalho, por sua vez, dita que não houve descriminalização do uso de
drogas, pois o artigo 28 da atual lei de drogas prevê penalidades para usuários, penalidades
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que podem ser classificadas como violação aos direitos humanos do cidadão que, faz o uso
de entorpecentes, e sob a alegação de proteção à saúde pública, é obrigado a cumprir alguma
penalidade, assim:
Não ocorreu processo de descriminalização do porte para consumo
pessoal de drogas porque o Art. 28 da Lei de Drogas mantém as
condutas dos usuários criminalizadas, alterando apenas sanção
prevista, impedindo, mesmo em caso de reincidência (Art. 28, § 3º),
a pena de prisão “quem adquirir guardar, tiver em depósito,
transportar ou trouxer consigo, para consumo pessoal, drogas sem
autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar será submetido às seguintes penas: I – advertência
sobre os efeitos das drogas; II – prestação de serviços à comunidade;
III – medida educativa de comparecimento a programa ou curso
educativo. (CARVALHO, Salo, de. A política criminal de drogas no
Brasil: estudo criminológico e dogmático. Rio de Janeiro: Lumen
Juris, 2010, p. 110.).
A sustentação da política punitiva decorre de dois pontos relevantes: (a) ser o delito
previsto no artigo 28 da Lei 11.343/06 de perigo abstrato e (b) ser a saúde pública o bem
jurídico tutelado. A identificação de bens jurídicos sob a chancela do Estado estabelece a
espiritualização do valor ou interesse de tutela. No caso de drogas, inúmeros danos à saúde,
à autonomia e a liberdade de pessoas, são lembrados pela política de saúde pública.
Ainda, junto aos argumentos decorrentes dos princípios da lesividade da autonomia
individual, os princípios da igualdade e da inviolabilidade da intimidade e da vida privada,
permitem a densificação da tese de inconstitucionalidade do art. 28 da Lei 11.343/06.
A ofensa ao princípio da igualdade estaria nos momentos em que se estabelece
distinção de tratamento penal (drogas ilícitas) e não penal (drogas lícitas) para usuários de
diferentes substâncias, tendo ambas a potencialidade de determinar dependência física ou
psíquica.
Entre os que consomem, a principal consequência da criminalização é a
estigmatização do usuário com a identificação em subculturas criminais, a partir de sua
amplificação pelos meios de comunicação em massa, produz a reação dos aparatos formais
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e informais do controle social.
A visão patologizada dos usuários, deflagrada pelo sistema penal, produz seu
isolamento e sua rotulação que impede qualquer tipo de escuta diversa da policial. O sujeito
envolvido com drogas, por força da política criminal proibicionista, ingressa no vicioso ciclo
clandestino, fato que, em caso de dependência, inviabiliza a utilização de serviços médicos
e sociais.
Luigi Ferrajoli compara os efeitos da criminalização das drogas com a
criminalização do aborto, visto que em ambos os casos, sua ocultação por ser clandestina,
impede o acesso aos mecanismos de assistência sanitária.
O efeito principal da lei [penal] é levar os toxicodependentes a
esconder sua condição, refutar o contato com aqueles que poderiam
ajudá-lo, mas também denunciá-lo, e com os serviços de assistência
pública, e, sobretudo, a integrar-se cada vez mais no mundo da droga
por força de sua maior dependência do mercado ilegal.
(FERRAJOLI, Proibizionismo e Diritto p.138).
Se tratando do Brasil, a lei 11.343/06, apesar de insinuar intervenções redutoras,
prevê medidas descarcerizantes que acabam sendo consumidas pela lógica da punitividade,
fato que assegura identificar na base argumentativa da lei a inversão ideológica do discurso
de contradição de riscos, ou seja, é enunciada formalmente política de redução de danos,
mas sua instrumentalidade reforça a condição repressiva.
A manutenção das condutas de uso de entorpecentes na ilegalidade não permite
fiscalização mínima sobre as condições de consumo e sobre a própria substância consumida.
A ausência de controle do estado no fornecimento destas substâncias, incentiva a
produção de drogas pelo mercado ilegal com custo econômico menor e o princípio ativo
desregulado. Assim a variação da qualidade e do nível de concentração do princípio ativo é
responsável, na maioria das vezes, pelas dosagens excessivas que geram severas
intoxicações e mortes.
A mais forte manipulação interpretativa relacionada com as drogas em si ocorre,
inegavelmente, com a afirmação da criminalização como mecanismo de tutela do bem
jurídico saúde pública. Propõe Maria Lucia Karam que:
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É evidente que na conduta de uma pessoa que, destinando-se a seu
uso próprio, adquire ou tem posse de uma substancia que causa ou
pode causar mal à saúde, não há como identificar ofensa à saúde
pública, dada ausência daquela expansibilidade do perigo. (KARAM
Maria Lucia, De Crimes, Penas e Fantasias... p.125).
Acontece que, na “guerra às drogas”, o destaque estatal não se volta contra a
existência de tais substâncias, mas sim contra as pessoas que usam, produzem ou
comercializam produtos psicoativos. Como acontece em qualquer manifestação do poder
punitivo estatal, os mais atingidos pela repressão são – e sempre serão – aqueles mais
vulneráveis social e economicamente.
São pessoas pobres e/ou negras, indivíduos enquadrados pelo sistema penal como
traficantes na quase totalidade dos casos, e não como meros usuários. Sobre essa frágil
questão, Maria Lúcia Karam lembra muito bem que:
No Brasil, os mais atingidos são os muitos meninos, que, sem
oportunidades e sem perspectivas de uma vida melhor, são
identificados como “traficantes”, morrendo e matando, envolvidos
pela violência causada pela ilegalidade imposta ao mercado onde
trabalham. Enfrentam a polícia nos confrontos regulares ou
irregulares; enfrentam os delatores; enfrentam os concorrentes de
seu negócio. Devem se mostrar corajosos; precisam assegurar seus
lucros efêmeros, seus pequenos poderes, suas vidas. Não vivem
muito e, logo, são substituídos por outros meninos igualmente sem
esperanças. Os que sobrevivem, superlotam as prisões brasileiras.
(KARAM, Maria Lucia, Guerra às drogas encarcera mais negros do
que apartheid, 12/2010).
A Guerra às Drogas lançada pelos EUA há 40 anos fracassou. Políticas
proibicionistas baseadas na erradicação, interdição e criminalização do consumo
simplesmente não funcionaram. A violência, o crime organizado e as mortes associadas com
o tráfico de drogas se mantêm como problemas críticos em nosso país, sendo uma forte e
falha consequência da criminalização das drogas no Brasil.
Guerra, violência, mortes, prisões não afetam em nenhum ponto fornecimento das
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drogas tornadas ilícitas. Patrões e empregados das empresas produtoras e distribuidoras, após
serem mortos ou presos, são substituídos por outros igualmente interessados em acumular
capital ou necessitados de trabalho.
Por maior que seja o repressivismo, as oportunidades de trabalho e de acumulação
de capital sobreviverão enquanto estiverem presentes as circunstâncias socioeconômicas
favorecedoras da demanda que impulsiona o mercado ilegal, enquanto existirem usuários ou
dependentes. Onde houver demanda, sempre haverá oferta. A realidade não pode deixar de
obedecer às leis econômicas. As leis penais não têm o poder de revogar as naturais leis
econômicas. A proibição do desejo simplesmente não funciona.
O majestoso e inevitável fracasso da política antidrogas, em seu objetivo de
extinguir as substâncias proibidas ou reduzir sua circulação, já deveria ser razão suficiente
para o abandono da globalizada proibição. O fracasso, no entanto, não é algo assim tão grave.
É apenas um visível sinal da inutilidade da proibição. Muito mais graves são os imensos
riscos, danos e sofrimentos causados pela irracional opção proibicionista.
3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente artigo teve como objetivo verificar a aplicação da política antidrogas no
Brasil e constatar que mesmo buscando extinguir e reprimir as drogas da sociedade, mostra-
se cada vez mais ineficazes, tendo em vista o tráfico de drogas existentes em nosso país e o
alto consumo de entorpecentes, principalmente na população jovem.
O porte de psicotrópicos para uso pessoal é tema que tem causado grande polêmica,
discussões e questionamentos, como por exemplo, quando se fala em maconha (cannabis) e
o seu grande potencial medicinal, tendo em vista que a cada dia a população aumenta e
também aumenta a preocupação do Estado que busca manter a paz por meio da repressão e
prevenção contra o uso destas substâncias.
De acordo com o demonstrado, a nova lei antidrogas alterou a pena do usuário
tratando-o como doente, e modificou a nomenclatura das drogas, antes tratadas como
substâncias que causam dependência física ou psíquica.
Por fim, vale lembrar que a política de prevenção e repressão ao uso de drogas,
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criada nos Estados Unidos, se mostra ineficiente também no Brasil sendo que o números de
usuários aumentam a cada dia e o efeito mais devastador não se dá pelo uso e abuso de
drogas, mas sim pela guerra declarada e apoiada pelo próprio Estado.
Ocorre que nesta guerra contra drogas, o estado não busca combater as substâncias,
mas seus inimigos são as pessoas que fazem uso e comercializam o produto.
A proibição não é só uma política falida, esta não veio para resolver a vida do
dependente ou do usuário, ela é também ineficiente e causa danos mais gravosos e aumentam
esses danos causados pelas drogas em si mesmas. O mais evidente logicamente é a violência
baseada na política de guerra adotada.
4. REFERÊNCIAS
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Acesso em: 04 de agosto de 2017.
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FERRAJOLI, Luigi. “Proibizionismo e Diritto”, em Legalizzare la droga: Uma
ragionevole proposta di sperimentazione. Milano: Feltrinelli.
KARAM, Maria Lúcia. Guerra às drogas encarcera mais negros do que apartheid. Brasil de
Fato, São Paulo, 10 dez. 2010b. Disponível em: <www.brasildefato.com.br>.
______________. Drogas: Dos Perigos da Proibição à Necessidade de Legalização. Palestra
na abertura do Seminário “Drogas: dos perigos da proibição à necessidade da legalização”,
promovido por Law Enforcement Against Prohibition – Agentes da Lei Contra a Proibição
(LEAP BRASIL), em conjunto com o Fórum Permanente de Direitos Humanos da Escola
da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ), o Fórum Permanente de
Especialização e Atualização nas Áreas do Direito e do Processo Penal da Escola da
Magistratura do Estado do Rio de Janeiro (EMERJ) e o Instituto Carioca de Criminologia
(ICC) – Rio de Janeiro-RJ – 4 abril 2013.
ROLIM, Marcos. A Síndrome da Rainha Vermelha: policiamento e segurança pública no
século XXI. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editora, 2006.
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