iv
UNIVERSIDADE ESTADUAL DA PARABA
PR-REITORIA DE PS-GRADUAO E ENSINO
MESTRADO PROFISSIONAL EM FORMAO DE PROFESSORES
ANTONIO GREGRIO DA SILVA
Ensino de Geografia na era digital:
Uma experincia em sala de aula.
Campina Grande - PB
2014
v
ANTONIO GREGRIO DA SILVA
Ensino de Geografia na era digital:
Uma experincia em sala de aula.
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-
Graduao em Formao de Professores da
Universidade Estadual da Paraba, como
requisito parcial para a obteno do ttulo de
Mestre em Educao.
rea de Concentrao: Letramento Digital.
Orientador: Prof. Dr. Marcelo Gomes Germano.
Campina Grande - PB
2014
vi
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DEDICATRIA
Aos meus colegas de turma que direta ou indiretamente contriburam para a
concluso deste trabalho.
A minha famlia, que sempre esteve presente em momentos distintos e me fez
avanar. A minha cunhada/irm Andreia Ferreira, pela providencial ajuda que me
dispensou durante todos estes meses, registro minha gratido.
ix
AGRADECIMENTOS
Ao professor e orientador desta dissertao, Prof. Dr. Marcelo Gomes
Germano, pelo apoio em todos os momentos, pelas consideraes efetuadas e pela
orientao sempre to precisa.
Ao professor Antonio Roberto Faustino da Costa, pela oportunidade de
realizao de um trabalho interdisciplinar.
A professora Ana Glria da Silva Marinho, que nos meses de convivncia,
muito me ensinou, contribuindo para meu crescimento cientfico e intelectual.
As professoras Paula Almeida de Castro e Maria de Lourdes da Silva
Leandro, em nome das quais, sado a todos os professores do Programa de
Mestrado Profissional em Formao de Professores da Universidade Estadual da
Paraba, pelo proveitoso compartilhamento de saberes.
Ao servidor Bruno (secretrio do programa), por ter dispensado parte do seu
precioso tempo, atendendo s nossas demandas imediatas, tratando a todos com
distino e profissionalismo.
Aos professores Lucenildo Arajo e Petrnio Ribeiro, ambos da Escola
Municipal Luzia Laudelino, pelo indispensvel apoio na aplicao da pesquisa em
sala de aula, sem os quais este trabalho no teria obtido xito.
Ao amigo Herclito Hallysson, pela generosa contribuio no tocante a leitura
e impresso das inmeras verses deste trabalho.
A Prefeitura Municipal de Arara pelo apoio financeiro para a realizao desta
pesquisa.
A todos, meu muito obrigado.
x
Ou escreves algo que valha a pena ler,
ou fazes algo acerca do qual valha a pena escrever Benjamim Franklin
xi
RESUMO
Esta dissertao tem o objetivo de investigar o nvel de compreenso dos alunos no tocante a alfabetizao cartogrfica no 6 ano do Ensino Fundamental passando da teoria prtica, com o auxlio das ferramentas digitais disponibilizadas atravs do Google Earth, abordando as intersees entre aprendizado e experincias. Procuramos desenvolver com os alunos participantes, a noo espacial e a representao cartogrfica, comparando diferentes tipos de representao da superfcie terrestre: mapas, imagens de satlite, fotografias areas e tridimensionais partindo de estratgias educacionais e ldicas, aliadas ao letramento digital, possibilitando as crianas egressas da 1 fase do Ensino Fundamental o acesso s mdias digitais, atravs dos laboratrios de informtica cujos equipamentos servem de auxlio para uma aprendizagem mais significativa, favorecendo o domnio das tecnologias e o despertar do interesse dos educandos pela cartografia escolar. Pensando nisso, este trabalho poder promover o estmulo dos estudantes s mais diversas formas de leitura, alm de desenvolver a linguagem cartogrfica como elemento educativo formador de novas prticas e habilidades em salas de aula.
Palavras-chave: Ensino de Geografia; Letramento digital; Alfabetizao cartogrfica; Google Earth.
xii
Sntesis
Esta disertacin tiene como objetivo investigar el nivel de comprensin de los estudiantes en relacin con la cartografa la alfabetizacin en el sexto ao de la Escuela Primaria pasando de la teora a la prctica, con la ayuda de las herramientas digitales disponibles atravs del Google Earth, aproximarse a las intersecciones entre aprendizaje y experiencias. Buscamos desarrollar los estudiantes que participan en este estudio, la nocin espacial y la representacin cartogrfica, la comparacin de los diferentes tipos de representacin de la superficie terrestre: mapas, imgenes de satlite, fotografas areas y las estrategias didcticas y ldicas de ruptura en tres dimensiones, aliados a la alfabetizacin digital, lo que permite nios liberados la primera fase del acceso a la escuela primaria a los medios digitales a travs de los laboratorios de cmputo que sirven para ayudar a un aprendizaje significativo, fomentar el dominio de la tecnologa y despertar el inters de los estudiantes por la cartografa escolar. Pensando en ello, este trabajo puede promover la estimulacin de los estudiantes a diversas formas de lectura, as como el desarrollo del lenguaje cartogrfico como elemento educativo la formacin de nuevas prcticas y habilidades en las aulas. Palabras clave: Enseanza de la Geografa; La alfabetizacin digital; Alfabetizacin cartogrfica; Google Earth.
xiii
LISTA DE ILUSTRAES
FIGURA 1 Tela inicial do Google Earth .................................................... 33
FIGURA 2 Arara em destaque no mapa do Estado da Paraba............... 37
FIGURA 3
FIGURA 4
FIGURA 5
FIGURA 6
Estrutura esquematizada das 3 etapas do trabalho de
dissertao..............................................................................
Estrutura esquematizada do desenvolvimento da primeira
fase da dissertao..................................................................
Estrutura esquematizada do desenvolvimento da segunda
fase do trabalho.......................................................................
Estrutura esquematizada do desenvolvimento da terceira
fase do trabalho.......................................................................
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xiv
LISTA DE FOTOGRAFIAS
FOTO 1 Escola Municipal Luzia Laudelino Arara(PB)................. 42
FOTO 2 Alunos do 6 ano da Escola Luzia Laudelino,
participantes da pesquisa .................................................
77
FOTO 3
FOTO 4
FOTO 5
FOTO 6
Alunos da turma do 6 ano atentos ao desafio proposto
nos exerccios de cartografia...........................................
Apresentao das funcionalidades do Google Earth para
os alunos..........................................................................
Realizao de exerccios sobre a noo de espao no
laboratrio de informtica com o auxlio do Google
Earth..................................................................................
Aplicao de questionrios com os alunos para
averiguar o nvel de percepo dos conceitos
apresentados durante os encontros
semanais...........................................................................
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81
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84
xv
LISTA DE GRFICOS
GRFICO 1 Nveis de compreenso dos alunos sobre cartografia
escolar..............................................................................
21
GRFICO 2
GRFICO 3 -
GRFICO 4
GRFICO 5
GRFICO 6
GRFICO 7 -
Percentual de alunos de Arara matriculados nas redes
pblica e privada (2010) ...................................................
Reduo do nmero de matrculas no ensino
fundamental entre 2002-2012............................................
Aplicao dos recursos destinados educao em
relao receita total do municpio...................................
Percentual de acertos nas trs questes propostas para
os dois grupos de alunos avaliados...................................
Interesse dos alunos pelo uso das ferramentas digitais
nas aulas de Geografia......................................................
Aprovao do uso do laboratrio de informtica para as
aulas de Geografia............................................................
39
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41
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88
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LISTA DE TABELAS
TABELA 1 Brasil: percentual de alunos com aprendizagem adequada a
srie frequentada ...................................................................
61
TABELA 2 Arara(PB): percentual de alunos com aprendizagem
adequada a srie frequentada ...............................................
62
xvii
SUMRIO
INTRODUO ......................................................................................................... 15 CAPTULO I 1 Reviso de literatura.............................................................................................. 19 1.1 A prtica da leitura na escola: uma resistncia injustificada... .......................... 19 1.2 Uma viagem no tempo........................................................................................ 21 1.3 O espao da incluso digital na educao formal............................................... 24 1.3.1 Afinal, existe diferena entre alfabetizao e letramento? .............................. 25 1.4 Alfabetizao cartogrfica digital......................................................................... 29 1.5 A popularizao das TICs na escola................................................................... 30 1.6 Um mundo reduzido pelo Google Earth e ao alcance de um toque................... 31 1.7 Ponto de partida: incluir as TICs no planejamento de ensino............................. 35 1.8 Caracterizao da rea de estudo...................................................................... 37 1.8.1 - Aspectos socioeconmicos e educacionais................................................... 37 1.8.2 - Do recorte espacial e objeto de observao.................................................. 42 CAPTULO II 2 Formao de professores no Brasil........................................................................43 2.1 A Conferncia de Jomtien: um novo cenrio para a educao mundial? .......... 43 2.2 Qual o papel da Geografia nessa histria? ..................................................... 44 2.3 O cenrio nacional: a formao de professores de Geografia no Brasil............. 46 2.4 Novas maneiras e aprender................................................................................ 49 2.5 Foco nas TICs: o computador como aliado ........................................................ 51 2.6 Qual o papel do professor nesta aldeia global digital? .................................... 53 2.7 Como fica o ensino de geografia com a difuso das TICs? ............................... 55 CAPTULO III 3. Alfabetizao cartogrfica e ferramentas digitais ................................................ 59 3.1 TICs nas salas de aulas: possibilidades e desafios ........................................... 64 3.2 Cartografia escolar e ferramentas digitais .......................................................... 67 3.3 Alfabetizao cartogrfica e os PCNs de Geografia .......................................... 69 CAPTULO IV 4. Caminhos metodolgicos ..................................................................................... 73 4.1 Natureza da pesquisa .........................................................................................74 4.2 Local e universo da pesquisa.............................................................................. 76 4.3 Instrumentos da pesquisa ...................................................................................76 4.4 Metodologia das intervenes..............................................................................77 4.5 Organizao das etapas da pesquisa..................................................................79
CAPTULO V
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5.1 Resultados e Discusses.................................................................................... 85 5.2 Convenincia (ou no) do uso das ferramentas digitais..................................... 86
CONSIDERAES FINAIS ..................................................................................... 91 REFERNCIAS ........................................................................................................ 95 Apndices ................................................................................................................. 99 Anexos .....................................................................................................................104
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INTRODUO
Nas ltimas dcadas, com o expressivo processo de urbanizao ocorrido
no Brasil e no mundo, muitas pessoas enfrentam dificuldades para chegar a um
lugar desconhecido, mesmo que estejam na posse de um mapa. Sentir-se
desorientado entre as ruas de uma cidade ou desviar-se da rota numa estrada, um
inconveniente que todos ns j passamos algum dia e que poderia ser evitado com a
simples interpretao de um mapa. So conhecimentos bsicos que todos precisam
adquirir j a partir dos primeiros anos do Ensino Fundamental, atravs de um
processo de alfabetizao da linguagem cartogrfica.
Todavia, temos constatado por parte dos nossos alunos uma injustificada
resistncia e desinteresse no tocante a leitura e interpretao dos mapas impressos
nos livros didticos e, em decorrncia desse desinteresse, percebe-se a dificuldade
de orientao no espao sempre que se abordam as questes da geografia regional
e at local atravs dos mapas temticos, o que naturalmente, prejudica o processo
didtico, no momento em que, uma simples aula prtica, torna-se improdutiva pela
deficincia de leitura e interpretao dos mapas temticos, exigindo-se muito mais
intervenes do professor durante a realizao dos exerccios, do que o
supostamente necessrio.
A dificuldade no desenvolvimento da apreenso e entendimento dos
contedos que abordam a linguagem cartogrfica notada e comentada pelos
professores de Geografia durante os encontros bimestrais para planejamento
pedaggico realizados na escola em que leciono regularmente desde 1999 e por
isso, fiz a escolha como meu locus da pesquisa. Destaque-se que essa situao
observada na escola objeto da pesquisa, no recente e nem somente dos alunos,
tendo em vista que alguns professores admitem ter dificuldades em trabalhar esses
contedos, devido ao fato de no os terem estudado na escola, o que conduz
formao de um crculo vicioso: o professor no ensina porque no sabe e no sabe
porque no aprendeu durante a sua formao.
Como agravante da situao acima descrita, constata-se o fato de que parte
considervel dos professores que ministram esses contedos geogrficos na rede
municipal de ensino, apesar de serem detentores de diploma de nvel superior, tm
16
formao em outras reas do conhecimento, notadamente em pedagogia, fato
tambm observado por Sann (2010, p.96) ao desenvolver pesquisa sobre a
formao dos professores do Ensino Fundamental no Estado de So Paulo.
Conforme a autora a grande maioria era formada em Licenciatura, mas parte no
tinha formao especfica em Geografia; alguns no tinham nenhuma formao
superior!. Assim como foi constatado na pesquisa da professora paulistana, em
nosso trabalho tambm percebemos uma situao semelhante, o que dificulta ainda
mais o processo de ensino-aprendizagem da cartografia escolar.
Nos ltimos anos, as Tecnologias de Informao e Comunicao (TICs),
incluindo o Google Earth, tm oferecido possibilidades de apoio ao ensino das
cincias e, como lembra Almeida (2010), a tecnologia do Google Earth e do sistema
GPS em aparelhos celulares, introduz cada vez mais a cartografia no cotidiano das
pessoas. Na educao, a utilizao dos mapas tambm deve evoluir para se tornar
um recurso inovador de comunicao e expresso.
Diante desse contexto, nos propomos duas questes que orientaram esta
pesquisa: Como utilizar o Google Earth no contexto do ensino da Geografia? Ser
que este novo e poderoso veculo de comunicao possibilitar uma aprendizagem
mais significativa?
Considerado esse contexto, e a partir de intervenes didticas orientadas
para a utilizao de ferramentas digitais, mais especificamente com os mapas
digitais do Google Earth, objetivamos investigar os nveis de compreenso dos
alunos do 6 ano do Ensino Fundamental de uma escola da rede pblica do
municpio de Arara (PB), no tocante a alfabetizao cartogrfica e, embora no se
trate de um estudo comparativo, apresentamos alguns resultados com a utilizao
dos mapas analgico (formato de papel) utilizados no ensino de Geografia.
Sobre o uso das tecnologias na sala de aula, concordamos com Moran (2007)
quando defende que as tecnologias chegaram como meio e suporte para a
educao e seguem abrindo caminhos para novas possibilidades no ensino e
aprendizagem.
Com o advento das TICs na escola, quer sejam por meio dos laboratrios de
informtica, quer por meio dos aparelhos de telefonia mvel dos alunos,
caminhamos para um modelo de escola, onde alunos e professores, em dilogos
constantes, esto construindo aprendizagens, intermediadas pelas tecnologias. Essa
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nova escola que se descortina a partir da chegada das tecnologias digitais, precisa
desenvolver um currculo flexvel e contextualizado com a realidade local, em cujo
cenrio, exige-se um modelo de professor que priorize a mediao ao invs do
antigo agente detentor dos conhecimentos. O aluno, por sua vez, passa a ser um
sujeito construtor de sua aprendizagem.
O nosso entusiasmo com os mapas digitais se fortalece a partir das oportunas
observaes de Simielli (2010, pp. 77-8) ao tratar da importncia da linguagem
cartogrfica para a leitura de mundo. Na vida moderna, cada dia mais notria e
importante a utilizao de mapas [...] isso nos leva a destacar a importncia da
criao de uma linguagem cartogrfica que seja realmente eficiente para que o
mapa atinja os objetivos a que se prope. Corroborando com essa linha de
pensamento, Passini (2010, p.174), defende que no ensino de Geografia, a
linguagem grfica deve ser includa ao lado de outras linguagens no-verbais, no rol
das ferramentas que viabilizam as leituras de mundo.
Nesse sentido, os objetivos especficos desta pesquisa so os seguintes:
associar cartografia escolar ao cotidiano dos estudantes e estimular a utilizao das
ferramentas digitais, atravs do uso do Google Earth, procurando compreender a
eficcia do uso das TICs no ensino de Geografia, em comparao com outros
recursos de ensino geralmente utilizados nas escolas.
A presente dissertao est estruturada em cinco partes. No primeiro
captulo, a partir da reviso de literatura, procuramos situar o leitor, no tocante ao
tema proposto, contextualizando a problemtica a partir de uma reflexo sobre os
conceitos de alfabetizao e letramento, com destaque para a significao da escola
na formao social do indivduo, a fim de buscar caminhos para a efetivao de uma
prtica pedaggica mais significativa e prazerosa, direcionada para criao de
sentidos no real emprego dos contedos vistos e revistos em salas de aulas, atravs
dos professores de Geografia.
O segundo captulo, trata da formao de professores no Brasil, apresentando
alguns recortes histricos da formao de professores de Geografia a partir do
Sculo XVIII at os dias atuais. Enfatiza as mudanas ocorridas nas diretrizes
norteadoras da educao brasileira a partir da dcada de 1990, ps-Conferncia de
Jomtien (Tailndia, 1990) e evidencia a consolidao desse novo projeto de
formao com destaque para a prtica docente de Geografia.
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O terceiro captulo traz uma abordagem sobre a utilizao das TICs na sala
de aula e aponta a alfabetizao cartogrfica como instrumento de conhecimento e
poder sobre o territrio. Neste captulo discutimos as distores entre o que se
poderia aprender no final das duas fases do Ensino Fundamental e o que de fato se
aprende no tocante a capacidade de leitura (por ser a base para a compreenso do
mundo) na unidade escolar a qual se aplicou a pesquisa de campo, considerando-se
os resultados aferidos atravs da Prova Brasil vinculada ao sistema de avaliaes do
Ministrio da Educao.
O quarto captulo trata da metodologia da pesquisa, alm de enfocar o tipo de
pesquisa aplicada, tambm faz uma abordagem sobre as aes prticas
desenvolvidas na sala de aula com crianas do 6 ano do Ensino Fundamental,
atravs da associao entre cartografia escolar e o Google Earth, que pode
favorecer outras formas de utilizao das ferramentas digitais a servio da
alfabetizao cartogrfica.
O quinto captulo contempla os resultados e discusses da pesquisa e
procura esclarecer como o uso das ferramentas digitais pode ampliar as noes que
os alunos tm de espao, nesta fase de transio entre os elementos concretos e as
abstraes cartogrficas.
Nas consideraes finais, reiteramos que cumprimos a nossa proposta de
trabalho, direcionando o leitor para a importncia da cartografia escolar, associada
s ferramentas digitais, atravs do uso das TICs. Conclumos afirmando que o nosso
maior desafio continuar sendo o de encorajar os nossos alunos, a explorarem as
inmeras possibilidades de se adquirir conhecimentos atravs das TICs, inclusive,
enquanto no estiverem sob os olhares dos professores.
Partimos do pressuposto de que no ensino de Geografia, saber ler e
interpretar mapas estimula sobretudo a capacidade dos alunos em pensar sobre
territrios e regies que no conhecem. Sabemos que a linguagem cartogrfica
muito utilizada no decorrer de todo o Ensino Bsico, assim sendo, conhecer essa
linguagem tambm um meio para se adquirir boa parte do suporte necessrio para
a construo do conhecimento. Da mesma forma, chegar a um lugar desconhecido
utilizando-se de um mapa, requer uma srie de conhecimentos que so adquiridos
atravs de um processo de alfabetizao diferente.
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Captulo I
Muitos no sabem quanto tempo e fadiga custa a aprender a ler. Trabalhei nisso 80 anos e no posso dizer que o tenha conseguido.
Johann Goethe
1. REVISO DA LITERATURA
No cotidiano da pratica docente, tem sido lugar comum encontrarmos
professores reclamando da falta de interesses dos alunos pela leitura dos contedos
ministrados. A questo que se coloca : por que os alunos resistem tanto em ler os
materiais didticos indicados pelos professores na escola? E por que no se verifica
essa resistncia em relao s linguagens miditicas utilizada nas postagens das
redes sociais? Afinal, o que leitura?
Para responder a esse questionamento de forma bastante abalizada Sandroni
e Machado definem a leitura como sendo:
Um ato individual, voluntrio e interior que se inicia com a decodificao dos signos lingusticos que compem a linguagem escrita convencional, mas que no se restringe mera decodificao desses signos, considerando que a leitura exige do sujeito leitor a capacidade de interao com o mundo que o cerca (SANDRONI; MACHADO, 1998, p.22).
Assim, podemos afirmar que a interpretao textual uma excurso atravs
da mensagem que cada texto pretende transmitir. Com os mapas no poderia ser
diferente, considerando ser inegvel a importncia de estarmos aptos a interpretar
todo e qualquer texto, independentemente de sua finalidade. E para que isto seja
vivel, faz-se necessrio o uso de determinados recursos que nos so oferecidos e
que nem sempre os priorizamos, como a leitura e a intertextualidade.
1.1 Prtica da leitura na escola: uma resistncia injustificada...
Segundo Freire (2001), a leitura do mundo precede sempre a leitura da
palavra. O ato de ler, enquanto ao do sujeito diante do mundo expresso da
forma de estar sendo dos seres humanos, como seres sociais, histricos, seres
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fazedores, transformadores, que no apenas sabem, mas demonstram que sabem.
A leitura do seu mundo foi sempre fundamental para a compreenso da importncia
do ato de ler, de escrever ou de reescrev-lo, e transform-lo atravs de uma prtica
consciente.
Seguindo essa linha de raciocnio, Freire (2001) enfatiza a importncia da
leitura na alfabetizao, colocando o papel do educador dentro de uma educao,
onde o seu fazer deve ser vivenciado (no apenas em relao a quantidade de
pginas lidas), mas inserindo-se no contexto de uma prtica concreta de construo
da histria, incluindo o alfabetizando num processo criador, de que ele tambm um
sujeito.
A insistncia na quantidade de leituras sem o devido adentramento nos textos a serem compreendidos, e no mecanicamente memorizados, revela uma viso mgica da palavra escrita. Viso que urge ser superada. A mesma ainda que encarada deste outro ngulo, que se encontra, por exemplo em quem escreve, quando identifica a possvel qualidade do seu trabalho, ou no, com a quantidade de pginas escritas. No entanto, um dos documentos filosficos mais importantes de que dispomos, As teses sobre Feuerbach, de Marx, tem apenas duas pginas e meia... (FREIRE, 2001, p. 17-18).
Assim sendo, a leitura no deve ser memorizada mecanicamente, mas ser
desafiadora, que nos ajude a pensar e analisar a realidade em que vivemos. Nas
palavras de Freire (op. cit.) Creio que muito de nossa insistncia, enquanto
professoras e professores, em que estudantes leiam, num semestre, um sem-
nmero de captulos de livros, reside na compreenso errnea que as vezes temos
do ato de ler (FREIRE, 2001, p.17). Dessa forma, a importncia do ato de ler, no
est na compreenso equivocada de que ler devorar bibliografias, sem que
realmente sejam interessantes ao leitor. O mais importante do ato da leitura o nvel
de percepo do contedo que essencial para compreenso do mundo.
Nesse sentido, para averiguar o nvel de percepo dos alunos sobre os
contedos estudados em Geografia, realizamos uma pesquisa com 72 crianas
matriculadas no 6 ano do Ensino Fundamental, presentes nas salas de aulas no dia
16 de setembro de 2013. Naquela data, todo o contedo de cartografia indicado para
a srie avaliada j havia sido ministrado, entretanto, os resultados apontam que
66,5% dos entrevistados no se sentiam seguros em relao leitura e
interpretao de mapas, ao tempo em que apenas 12% declararam ser capazes de
21
se localizar atravs dos mapas, enquanto os 21,5% restantes, declararam que
sabiam apenas identificar os tipos de mapas em um atlas geogrfico.
Grfico 1: Nveis de compreenso dos alunos sobre cartografia
escolar
Fonte: Pesquisa realizada pelo autor em setembro/2013, com 72 alunos da escola objeto do estudo.
Diante do exposto acreditamos que para facilitar o processo de
alfabetizao cartogrfica torna-se necessrio considerar o espao de vivncia dos
alunos. Pouco interessa aos alunos estudar sobre os Alpes Apeninos ou da
Cordilheira do Himalaia, se eles no compreenderem a importncia do Planalto da
Borborema para a formao do Brejo paraibano. Alm de uma boa contextualizao,
para aprimorar o processo de ensino-aprendizagem cartogrfica, poderemos lanar
mo de mtodos inovadores de ensino, incluindo a utilizao das ferramentas
cartogrficas digitais a exemplo dos trabalhos realizados por Almeida (2011), Bueno
e Colavite (2011), Gonalves, et al. (2007) e Pereira; Silva (2012).
1.2 Uma viagem no tempo... Desde tempos remotos que o conhecimento cientfico reconhecido como um
bem precioso que poder definir os destinos de um povo. J no sculo XVI, Francis
Bacon (1561-1626) afirmava que a cincia devia ser baseada na induo e na
experimentao, no na metafsica e na especulao, como era difundido pelos
pensadores at no final da Idade Mdia.
Antes de Bacon, quem poderia prever que avanos na cincia poderiam
resultar na disseminao de tecnologias que permitiriam ao homem explorar o
22
espao, chegar na lua e alterar o destino da humanidade? Apesar desses avanos,
os aspectos relativos ao espao geogrfico, ainda so poucos considerados em
nossos dias pela maior parte dos indivduos.
Na presente dissertao, espao geogrfico e cartografia so conceitos
complementares e interdependentes. Porm, para entender a cartografia no nvel do
pensamento e na constituio do vivido, precisamos compreender o conceito de
espao geogrfico. Por isso, neste trabalho, por uma questo metodolgica,
procuramos abordar superficialmente o conceito de espao e em seguida enfatizar
os aspectos da cartografia digital.
Desde a Antiguidade Clssica, o espao geogrfico foi concebido de
diferentes maneiras, entretanto, no nosso objetivo retom-las. Tomamos como
referncia para nossas finalidades, o conceito expresso por Alves (2005), segundo a
qual o espao um produto das relaes entre homens e dos homens com a
natureza, e ao mesmo tempo um fator que interfere nas mesmas relaes que o
constituram. Dessa forma, o espao a materializao das relaes existentes
entre os homens na sociedade. Dito com outras palavras, o espao geogrfico
corresponde aos espaos produzidos pelos homens em diferentes temporalidades
ao relacionarem-se entre si, consigo mesmos e com a natureza no lugar em que
vivem.
A concepo geogrfica de espao que predominou de 1870 at metade dos
anos 1950, embora este ainda no fosse considerado como objeto de estudo, foi a
introduzida por Friedrich Ratzel (1844-1904), segundo o qual a concepo de
espao vital se confundia com a de territrio a medida em que era atrelado ele
uma relao de poder. Essa concepo ratzeliana de espao, sofreu forte influncia
do pensamento filosfico de Immanuel Kant (1724-1804), ou seja, para ele o espao
em si no existe, o que existe so os fenmenos que se materializam neste
referencial. A cartografia escolar e a localizao absoluta (coordenadas geogrficas)
foram, em parte, o suporte desta concepo. Aqui se percebe a que se destina a
cincia moderna e o potencial da cartografia na definio das fronteiras do futuro
Estado alemo, aproveitando-se do vcuo deixado pela ruptura com o pensamento
filosfico, aliado ao surgimento da cincia geogrfica.
Considere-se que desde o Renascimento, surgiram as ideias da manipulao
experimental da natureza. J naquele perodo, o conhecimento no era mais
resultado apenas da clareza de raciocnio habilmente apresentado pelos filsofos,
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ele teria que ser comprovado experimentalmente. A cincia moderna trouxe uma
nova relao homem-natureza que est intimamente relacionada com o domnio do
espao geogrfico e com a consolidao do capitalismo. A radicalizao desse
processo conduzir a uma nova fase tcnico-cientfica que, em muitos aspectos se
afasta do projeto inicial.
A viso otimista de que a cincia poder vir a descrever tudo que aconteceu e vir a acontecer, caracteriza uma nova concepo de cincia que, confirmada pela presena de incontestveis inovaes tecnolgicas, despreza a filosofia e, de certa forma, afasta-se das antigas bases filosficas de sustentao do projeto inicial da cincia moderna. (GERMANO, 2011, p. 74).
Germano (op. cit.) aponta duas grandes rupturas no processo de construo
do conhecimento ocidental. A primeira, inaugurada a partir da Revoluo
Copernicana no incio do sculo XVI.
um momento de grande revoluo do pensamento e o modelo nascente exigir toda uma nova viso de mundo com novas perguntas e novos problemas a serem enfrentados. Questes que o prprio Coprnico no conseguir responder, cabendo, dentre outros, a Bruno, Kepler e Galileu a confirmao e defesa de suas teses (GERMANO, 2011, p. 63).
A segunda, no ltimo quartel do sculo XIX e incio do sculo XX com a Teoria
da Relatividade e a Mecnica Quntica. Na incipiente cincia geogrfica a escola
alem estabelece uma relao entre os fenmenos da natureza e as aes do
homem. Os precursores dessa escola geogrfica so Alexander Von Humboldt
(Gegrafo naturalista) e Karl Ritter (Gegrafo social). Saliente-se que a Alemanha
havia se unificado tardiamente, no possuindo colnias de explorao, apesar de ser
uma nao em franco desenvolvimento e com necessidade de matrias-primas e
vida por novos mercados consumidores para alavancar o progresso.
[...] antes que os efeitos dessa grande reviravolta no pensamento viessem a repercutir na prtica, era necessrio que as bases filosficas da nova cincia fossem bem compreendidas pelos intelectuais e empreendedores da grande revoluo poltica que se processava quela poca (GERMANO, 2011, p. 74).
Conforme se vislumbra a partir do entendimento do autor, essa mudana se
afirmou com a difuso de estudos de natureza filosfica que a colocaram no centro
de sua anlise sobre a concepo de progresso.
Assim, o espao geogrfico passa a ser visto no mais como algo imutvel
24
desde o seu incio, mas fruto de uma longa histria e produto de um
desenvolvimento. O afloramento dos estudos epistemolgicos1 e da historicidade
tambm so bsicos para o nascimento da Geografia Moderna, muito embora, o
impulso mais considervel s tenha ocorrido definitivamente com as teorias de
Charles Darwin (1809-1882) que tornaram as anlises geogrficas notadamente
importantes pelos destaques atribudos ao ambiente nos mecanismos de evoluo
das espcies.
O espao se define como um conjunto de formas representativas de relaes sociais do passado e do presente e por uma estrutura representada por relaes que esto acontecendo diante dos nossos olhos e que se manifestam atravs de processos e funes. (SANTOS, 1994, p. 43).
Partindo dessa premissa maior, a Geografia apresenta alguns conceitos
(entendidos tambm como categorias geogrficas), que so importantes para que
possamos ampliar o entendimento sobre o nosso lugar no universo, alguns deles,
inclusive, surgiram em razo da necessidade de compreenso da complexidade do
mundo contemporneo.
Dessa forma, independentemente da posio social que o indivduo
eventualmente ocupa na comunidade, durante toda sua existncia ele entra em
contato com uma gama variada de informaes a respeito do espao geogrfico
local, regional e global, que exigem formao escolar para a sua compreenso.
Mesmo que essas informaes permaneam incompreendidas, no se pode ignorar
que todos ocupam um espao na terra e com o advento das Tecnologias Digitais,
esse espao se ampliou consideravelmente.
1.3 O espao da incluso digital na educao formal
No tocante ao acesso educao formal, vale salientar que no mundo
globalizado, o domnio do conhecimento das tecnologias digitais, alm de ser uma
credencial para um mercado de trabalho cada vez mais exigente, tambm uma
constante em todas as nossas aes de rotina, desde a realizao de uma chamada
telefnica, at o acionamento de um eletrodomstico, passando por uma transao
bancria atravs dos terminais de caixas eletrnicos, e chegando aos complexos
exames de ressonncia magntica, cada vez mais exige-se o domnio de leituras e
1 Epistemologia - Teoria ou cincia da origem, natureza e limites do conhecimento.
25
compreenso de textos (contidos nos manuais do usurio) que, via de regra, s
possvel atravs da educao escolar.
Desde o final da dcada de 1990, as TICs criaram uma necessidade de
sintonia das pessoas com o computer-literacy2. Da mesma forma que a
alfabetizao tradicional comea na sala de aula, a proficincia digital tambm. Mas
o que define essa nova alfabetizao mesmo a capacidade que o aluno tem de
participar. Atualmente, aqueles que no dominam os cdigos escritos, isto , os que
ainda no esto alfabetizados e letrados, inclusive no tocante a linguagem das
tecnologias digitais, estaro predestinados a excluso social na seara desta nova
aldeia global que se descortina.
1.3.1 Afinal, existe diferena entre alfabetizao e letramento?
Essa uma questo que pode gerar uma certa confuso no tocante aos
conceitos e a priori, a resposta afirmativa. Faz-se necessrios saber diferenciar
alfabetizao e letramento. Senna (2005), esclarece que alfabetizao o processo
atravs do qual o aluno adquire a capacidade de ler e escrever. J o letramento,
ocorre quando, uma vez adquirido o mtodo, o aluno tambm sabe como utiliz-lo
nas prticas sociais. O mesmo raciocnio se aplica, mutatis mutandis3, a proficincia
digital, que pode ter um carter inicial (conhecimento bsico e uso banal das mdias)
ou avanado (utilizao das mdias para tomar conscincia da realidade e
transform-la).
Senna (op. cit.) afirma que apesar do processo de letramento digital estar
presente em toda a sociedade, mesmo que seja quase imperceptvel, ele ainda no
acontece nas escolas e por isso o autor levanta o seguinte questionamento:
A primeira questo a se levantar [...] referente ao letramento, conceito este ainda por se consolidar na cultura acadmica nestes primeiros anos do Sculo XXI. De fato, letramento um fenmeno deste sculo, associado muito mais as variveis introduzidas pela sociedade informtica nas prticas de escrita de mundo do que s questes e s polmicas no entorno da j clssica problemtica da alfabetizao. (SENNA, 2005, p. 162-3).
Logo, nos dizeres do autor, implantar essa nova conscincia o grande
2 Literacy se traduz, ao p da letra, como alfabetizao, assim sendo, computer-literacy significa
familiaridade com as novas mdias e com o computador. 3 Expresso latina que significa: mudando o que deve ser mudado.
26
desafio da escola. Assim, de acordo com o seu entendimento, os seres humanos
nascem com uma predisposio para aprender, muito embora esse potencial esteja
latente em cada indivduo. Dessa forma, podemos dizer que qualquer tecnologia
fruto de interferncias internas e externas aos sujeitos. Igualmente, a lngua escrita
tambm uma representao da tecnologia.
Na verdade, a mensagem que Senna pretende transmitir nas suas reflexes
sobre mdia e letramento, que antes do indivduo ser um sujeito alfabetizado
preciso tambm estar pautado nos moldes cartesianos, isto , ser um sujeito que
pensa, que traz para si (e somente para si), os rumos de seu destino, dito em outros
termos, o senhorio de sua liberdade, enfim, sujeito da sua prpria conscincia.
A Arte Moderna do Sculo XX antes de tudo um movimento que desinaugura a modernidade acadmica e cientificista, uma provocao constante s mdias consagradas na tradio clssica e um convite ao seu alargamento [...] Nossos cadernos de hoje no representam mais os cadernos da cultura moderna; retornaram condio de mero suporte, vidos de usurios repletos de mltiplas possibilidades de utilizao, vidos, portanto, de mdias por virem a ser. (SENNA, 2005. p. 171)
O grande problema da escrita, segundo ele, a dificuldade do sujeito utilizar o
papel, porque para isto, o sujeito precisa alojar-se nos moldes cartesianos, isto ,
pensar, como o fez Ren Descartes4 (1596-1650), colocando em dvida todas as
coisas com o objetivo de reconstru-las a partir das certezas incontestveis.
Para os sujeitos contemporneos, o papel foi desmistificado e os indivduos
passaram a ser sujeitos das mdias eletrnicas com as quais os usurios escrevem
exaustivamente, ou seja, os alunos deixaram de ser escravos da escrita em papel e
passaram a fazer uso de hipertextos. dessa forma que a mdia se faz presente na
intencionalidade do usurio, "saber como utilizar a tecnologia no um processo
diferente de aprendizagem? so neurnios que se conectam. A mudana est no
contexto do processo educacional, com outras linguagens, com trabalhos
compartilhados em rede e outros recursos", arremata Senna (op. cit. p. 172).
Corroborando com essa linha de raciocnio, Antunes (2002), argumenta que:
O que torna o ser humano diferente, no apenas a capacidade de pensar, e sim de utilizar diversas formas de pensamento para procurar um melhor conhecimento da realidade, uma convivncia harmnica com seus semelhantes e a possibilidade de se sentir agente construtor da prpria felicidade. Quando se aprende a pensar, criam-se conceitos, relaes e
4 Ren Descarte notabilizou-se sobretudo por sugerir a fuso da lgebra com a geometria, fato que
gerou o sistema de coordenadas cartesianas.
27
projetos. No acreditamos que a esttua o pensador de Rodin, possa pensar, mas no duvidamos do genial pensamento do escultor antes de transformar o bronze amorfo na obra imortal. (ANTUNES, 2002, p.70)
E, entre ns que vivemos em um mundo repleto de cores e fantasias para
entretenimento, pensar olhando para uma folha de papel em branco uma atividade
extremamente penosa!
Sabemos que desde que o ser humano comeou a organizar o pensamento
por meio de registros, a escrita e a leitura foram se desenvolvendo e ganhando
extrema relevncia nas relaes sociais, na difuso das ideias e, sobretudo, nas
informaes, ou seja, a comunicao est na essncia da natureza humana e serviu
de alicerce para a sua evoluo. Por intermdio dela pode-se desenvolver um
complexo e bem elaborado sistema de linguagem que nos proporciona o contato e a
interao com os outros.
Na prtica, todos precisamos aprender a ler e escrever porque a leitura
resulta de uma motivao natural de compreender a experincia individual, fazendo
com que se propague a comunicao com o meio no qual est inserido o indivduo.
Para isto, faz-se necessrio um incentivo, um estmulo, uma orientao e este ,
naturalmente, o papel da escola.
Especificamente no que diz respeito a questo da leitura, Kleiman (2002),
aborda o tema como sendo um processo que se evidencia atravs da interao
entre os diversos nveis de conhecimento do leitor, a saber: conhecimento
lingustico; conhecimento textual e conhecimento de mundo. Dessa forma, podemos
conceituar interpretao textual como sendo uma incurso atravs da mensagem
que cada texto pretende transmitir, incluindo todos os tipos de imagens, que estejam
ao alcance da nossa viso.
Atualmente, falar ao celular, mandar e receber torpedos enquanto se assiste
as aulas, compartilhar fotografias com as quais se faz papel de parede para as telas
dos equipamentos, pesquisar na internet, postar vdeos, ouvir msicas, baixar jogos
dentre muitas outras descobertas interessantes, so aes que se tornaram
corriqueiras entre os frequentadores das nossas salas de aulas. Diante de todo esse
potencial criativo dos alunos, aliado disponibilizao gratuita de imagens de
satlites atravs do Google Earth, nos parece um momento oportuno para o ensino-
aprendizagem da cartografia escolar nas aulas de Geografia.
28
Assim sendo, retomando ao raciocnio de Senna (2005), podemos inferir que,
se por um lado, o sentido da escola tem sido o de formar um sujeito cartesiano,
consequente, previsvel, polido e educado, por outro, o uso corriqueiro das
hipermdias vem rompendo bruscamente com esse estilo certinho dos alunos que
desejamos ver e que as engrenagens do sistema capitalista financiador, assim o
exige. Porm, o produto final entregue ao mercado de trabalho pelas escolas
pblicas, no tm sido nada animador.
Essa afirmao encontra amparo, quando se analisa os resultados das
pesquisas de avaliao realizadas pelo Ministrio da Educao e disponibilizados
atravs do Sistema de Avaliao da Educao Bsica (SAEB/2010), ao indicarem
que 70% dos alunos das sries avaliadas (quinto e nono anos do ensino
fundamental e terceiro do ensino mdio) no conseguiram alcanar as metas
estabelecidas pelos organismos internacionais de acompanhamento, apresentando
nveis de aprendizado considerados inadequados em lngua portuguesa e
matemtica. O nmero mais alarmante est no terceiro ano do ensino mdio, onde
apenas 9,8% dos alunos dominam conhecimentos que deveriam saber em
matemtica. Parece assustador constatar que, no Brasil dos ltimos anos, 98% das
crianas entre 7 e 14 anos esto na escola, mas 70% deles no conseguem
aprender o esperado pela sociedade.
Ora, se a atividade-fim da educao a aprendizagem, inevitvel perguntar:
por que o aluno brasileiro no aprende o esperado? A resposta se constitui em um
quebra-cabeas repleto de peas que precisam ser encaixadas de maneira eficiente.
A pea central, porm, est no corpo docente. Um professor qualificado proporciona
mais qualidade de aprendizagem, que por sua vez eleva a qualidade na educao,
ou seja, o professor o ator principal no palco que representa uma poltica
educacional de sucesso e o avano dos ndices avaliados pelo SAEB, depende, em
grande parte, do investimento individual e permanente na prpria formao docente.
Por outro lado, diferentemente do que muitos professores afirmam, com o
uso indiscriminado das hipermdias, as novas geraes do sculo XXI, no
necessariamente desenvolveram averso leitura e escrita. Ao contrrio, os jovens
leem e escrevem muito mais do que as geraes anteriores, devido ao uso das
redes sociais, basta que lhes sejam apresentados desafios virtuais. A diferena
que se utilizam de uma nova linguagem, mais rpida e nada formal, denominada
pelos linguistas de internets. Logo, o suposto desinteresse dos alunos pela leitura
29
de mundo, no procede.
Nesse cenrio, compreender os interesses dos alunos um processo
complexo que exige mudanas significativas. possvel uma nova forma de
aprender e um novo modelo de ensino, onde no seja obrigatrio todos aprenderem
as mesmas coisas, ao mesmo tempo e no mesmo lugar. Compete aos professores,
torn-la mais crtica, inserindo os alunos no contexto social e fazendo-os
compreender seu lugar no espao.
1.4 Alfabetizao cartogrfica digital
No dia a dia, somos 'torpedeados', atravs dos meios de comunicao, com
inmeras informaes oriundas das mais diversas fontes. Por exemplo, quando
assistimos aos noticirios atravs dos telejornais dirios, vemos as apresentadoras
utilizando-se dos mapas meteorolgicos com intuito de melhor expor as informaes
sobre a previso do tempo, da mesma forma que os sistemas de navegao
veicular, esto se tornando cada vez mais populares entre os motoristas. Tem se
tornado cada vez mais comum, acessarmos um portal de notcias e vermos uma
planta da cidade com as informaes sobre o roteiro a ser seguido para se
acompanhar um determinado evento, ou as vezes, compreendermos as alteraes
demogrficas ou climticas ocorridas ao longo de muitas dcadas a partir dos mapas
temticos, ou ainda, acompanharmos uma operao da defesa civil e corpo de
bombeiros na conteno dos efeitos de um desastre, atravs dos mapas exibidos
nos noticirios locais.
O que poucas pessoas sabem que por trs de tudo isso existem mapas
digitais e anlises cartogrficas. Por exemplo, o desmatamento da floresta
amaznica para expanso da fronteira agrcola uma questo polmica entre os
desenvolvimentistas e preservacionistas, que a partir de mapas tm mostrado
possveis impactos futuros, como a desertificao da regio. No entanto, muitas
pessoas no relacionam que o complexo modelo de previso est associado a
informao geogrfica.
Enquanto a maioria das pessoas vive de forma inconsciente as questes
geogrficas, o mundo est ficando cada vez mais complexo. Dessa forma, o uso de
mapas pode ser um mtodo eficaz para transmitir um grande volume de
informaes. Simielli (2010), afirma que o sucesso desta informao depende
30
principalmente da alfabetizao cartogrfica do observador, que via de regra, est
muito aqum da ideal.
Considerando que os mapas so meios de transmisso de informao [] preciso levar em conta que os mapas tm funes especficas para determinados grupos de usurios e que a linguagem cartogrfica no deve ser compreendida s pelo cartgrafo, mas principalmente pelo usurio. [] importante que a linguagem cartogrfica seja valorizada, estudada e conhecida pelos estudantes. Atravs dela o aluno interpreta os mapas, orienta-se e estabelece-se a correspondncia entre a representao cartogrfica e a realidade. (SIMIELLI, 2010, p. 88)
Vale lembrar que no ensino de Geografia, a linguagem grfica deve ser
includa ao lado de outras linguagens no-verbais, no rol das ferramentas que
viabilizam a leitura de mundo.
Nesta abordagem, Simielli (op. cit.) assevera ainda que o sucesso do uso do
mapa repousa na sua eficcia quanto a transmisso da informao espacial, sendo
o ideal dessa transmisso a obteno, pelo leitor, da totalidade da informao
contida no mapa (p. 79). Assim sendo, podemos compreender a alfabetizao
cartogrfica como um conjunto de habilidades relacionadas a percepo do espao
que nos permitem fazer leituras de mapas, imagens e dados geogrficos da mesma
forma que lemos textos e nmeros.
1.5 A popularizao das TICs nas escolas
Com o advento das TICs, diariamente somos abastecidos com informaes
por meio das hipermdias. Essas informaes, so as mais diversas, desde mapas e
imagens de cartes-postais at grficos que nos so apresentados por meio das
mdias digitais, desafiando a nossa capacidade de interpretao dessas informaes
a partir dos dados expostos.
Por isso importante que a alfabetizao cartogrfica possa fazer parte da
aprendizagem a partir do uso de instrumentos tradicionais em sala de aulas, como
livros, atlas e globos, aliados ao uso dos programas de computadores, considerando
que desde cedo, nossas crianas so expostas s mais diversas informaes em
formato digital, impondo desafios s instituies de ensino para a introduo de
plataformas digitais como parte integrante no currculo escolar do processo de
ensino e aprendizagem.
31
Diante dessa nova realidade, os professores devero buscar alternativas para
possibilitar o desenvolvimento cognitivo dos estudantes, explorando as mltiplas
habilidades dos seus alunos. Por outro lado, quando se avalia o nosso atual modelo
institucionalizado de ensino, fcil perceber que mapas e globos, j no mais
despertam interesses no pblico-alvo do Ensino Fundamental, por se tratarem de
objetos inanimados, perderam muitos espaos na concorrncia com as mdias
digitais. No entanto, os velhos mapas no podero simplesmente ser ignorados
enquanto suporte pedaggico, em funo das hipermdias, principalmente porque o
seu uso favorece o desenvolvimento da percepo subliminar.
Nesse contexto, com auxlio da cartografia digital, podemos lanar um desafio
virtual para os nossos alunos. O poder de alterar as fronteiras traadas pela
geografia tradicional, construindo seus prprios mapas, inclusive em 3D, usando a
liberdade de imaginao. Acreditamos que nessa geografia dos poderes, a leitura
do mundo digital atravs das ferramentas do Google Earth, exige que os indivduos
tenham uma formao escolar mais slida no sentido do domnio da linguagem
cartogrfica, possibilitando-os ler, interpretar e construir mapas com mais facilidade.
Partimos das ideias de Moran (2007) que assim leciona:
Para conhecer o mundo, no preciso viajar muito. Basta enxerg-lo de onde estamos, com um olhar um pouco mais abrangente. No s 'correr o mundo', isso bom, mas conhecimento tambm se d pela interiorizao e pela observao integradora. (MORAN, 2007, pp. 50-1)
Evidentemente esta observao integradora s poder ocorrer atravs da
anlise dos elementos estruturais que nos circundam, podemos dizer ento que na
era da internet no difcil percebermos que temos muitas informaes e, as vezes,
poucos conhecimentos.
1.6 Um mundo reduzido pelo Google Earth e ao alcance de um toque
Desde a segunda metade do sculo XX, com o expressivo processo de
urbanizao ocorrido no Brasil, muitas pessoas enfrentam dificuldades para chegar
a um lugar desconhecido utilizando-se de um mapa. Sentir-se desorientado entre as
ruas de uma cidade ou se desviar da rota numa estrada, um inconveniente que
todos ns j passamos algum dia e que poderia ser evitado com a simples
interpretao de um mapa.
32
So conhecimentos bsicos que precisam ser adquiridos j a partir do
segundo ano do Ensino Fundamental, atravs de um processo introdutrio de
alfabetizao na linguagem cartogrfica, o que nem sempre realizado. A boa
notcia, que com a popularizao do Google Earth, temos uma ferramenta digital
disponvel gratuitamente, com fcil manuseio e capaz de nos orientar em qualquer
parte da terra.
Anteriormente conhecido como Earth Viewer, o software foi desenvolvido
por uma empresa norte-americana a qual foi comprada pelo Google em 2004. No
ano seguinte, o nome do produto foi alterado para Google Earth e tm se tornado
muito utilizado em todos os continentes desde ento. O programa permite navegar
por imagens de satlite de todo o planeta, gir-lo, marcar e salvar locais, medir
distncias entre dois pontos e ter uma viso tridimensional de uma determinada
localidade.
Alm da verso gratuita, o Google Earth Pro (verso profissional), inclui os
mesmos recursos e imagens fceis de usar que a verso gratuita do Google Earth,
mas com ferramentas profissionais adicionais criadas especificamente para os
usurios de empresas.
Uma vez instalado e executado no computador, o programa disponibiliza
dados geogrficos de todo o planeta. Porm, estes dados no so atualizados em
tempo real, eles vm de empresas comerciais e da compilao de dados dos ltimos
trs anos. Por exemplo, a ltima atualizao das imagens da cidade de Campina
Grande (PB), foi realizada em maio de 2012, nesta data, entretanto, nem todos os
municpios paraibanos so visualizados com a mesma nitidez disponvel para a
rainha da Borborema. Quem explica os motivos das imagens de alguns locais
apresentarem-se desfocadas Camboim (2006, p.75)
[...] como estes dados vm de diversas fontes, os mesmos tm resolues variadas, tendo imagens com maior resoluo geralmente em grandes centros urbanos. A resoluo espacial medida em metros. Quando se diz que uma imagem possui 15 metros de resoluo significa que os sensores do satlite conseguem identificar um objeto sobre o terreno que tenha, no mnimo 15 metros.
Depois de instalado no computador, o programa do Google apresenta uma
tela padro com o globo terrestre (figura 1). A partir de ento, basta o usurio seguir
as instrues do tutorial disponibilizado pelo software e explorar o universo ou
qualquer parte da terra que se deseja visualizar.
33
Figura 1: Tela inicial do Google Earth
Globo terrestre em 3D (imagem parcial). Acesso em: 25mar2014.
Desta forma, a utilizao dos recursos disponibilizados pelo Google Earth,
apresenta um incremento significativo no ensino de geografia, por meio da incluso
da viso tridimensional que permite o desenvolvimento da percepo espacial do
aluno. No momento em que se adquire uma viso em terceira dimenso das
representaes espaciais presentes nos mapas, o entendimento dos estudantes se
torna mais efetivo no tocante a percepo da noo de espao.
Outra varivel que deve ser considerada na escolha deste programa a sua
linguagem simples e acessvel, que permite uma fcil assimilao por parte das
crianas e adolescentes. Neste sentido, Silva (2002) coloca que na escola que
encontramos o espao adequado para introduzir e processar novas informaes
transformando-as em conhecimento e atravs desse processo formar cidados
preparados para desenvolver sua funo social de forma consciente e construtiva.
Nos ltimos anos, as TICs tm oferecido infinitas possibilidades de apoio ao
ensino de geografia e como lembra Almeida (2010), a tecnologia do Google Earth e
dos sistemas GPS em aparelhos celulares, introduz cada vez mais a cartografia no
cotidiano das pessoas. No que diz respeito prtica docente, a utilizao dos
mapas tambm deve evoluir para se tornar um recurso inovador de comunicao e
expresso. Porm, em nossas salas de aula, muito trabalho ainda h para ser feito
34
no sentido de facilitar a alfabetizao cartogrfica, mesmo com a eventual utilizao
do GPS e do Google Maps, instalados em alguns equipamentos de telefonia mvel
ultra modernos, nem todos dispem desses equipamentos, por isso preciso
explorar os outros recursos disponibilizados pelo Google Earth.
Saliente-se que se o sistema educacional pblico brasileiro, no se inserir
plenamente nesse contexto global de preparao dos indivduos para a leitura de
mundo e cidadania, bem como para atender as demandas do sistema econmico
mundial, estar contribuindo desastrosamente para a excluso social e ampliando as
desigualdades sociais. Porm, faz-se necessrio lembrar que a escola, por si s,
no forma o cidado; a instituio escolar apenas o prepara, o instrumentaliza
atravs dos exerccios de leitura e escrita, possibilitando as condies necessrias
para sua formao pessoal.
No entanto, sabemos que associar os contedos trazidos no livro didtico
com o conhecimento prvio do aluno e sua realidade, no to simples assim, uma
vez que estes, geralmente, expressam contedos de reas distintas realidade dos
alunos. Naturalmente isto gera uma resistncia e desinteresse no tocante leitura e
interpretao dos textos, e por extenso, tambm dos mapas.
Em decorrncia desse desinteresse, percebe-se a dificuldade de orientao
no espao quando se abordam as questes da geografia regional e at local atravs
dos mapas temticos, o que naturalmente, prejudica o processo de ensino-
aprendizagem, no momento em que, uma simples aula prtica, torna-se improdutiva
pela deficincia de leitura e interpretao dos mapas temticos, exigindo-se muito
mais intervenes do professor durante a realizao dos exerccios, do que o
supostamente necessrio, desviando assim o foco das atenes.
Saliente-se que essa situao no recente, tendo em vista que at mesmo
os professores encontram dificuldades em trabalhar esses contedos, devido ao fato
de terem estudado na perspectiva tradicional, levando formao de um crculo
vicioso: o professor no ensina porque no sabe e no sabe porque no aprendeu
na escola. Nesse sentido, Simielli (2010) expe sua preocupao ao afirmar que:
Em cursos ministrados em diferentes cidades do Estado [So Paulo], percebeu-se que boa parte o professorado no domina noes elementares de Cartografia, como: escalas, leitura de legenda, mtodos cartogrficos, projees, etc. Consequentemente, esse professor no ter condies de trabalhar amplamente com o mapa, usando-o apenas como recurso visual. (SIMIELLI, 2010, p. 87)
35
E, ainda como agravante dessa situao, constata-se que grande parte dos
professores que ministram esses contedos geogrficos tm uma formao
acadmica em outras reas do conhecimento, dificultando ainda mais o processo de
construo da noo abstrata de espao pelos alunos das sries iniciais do Ensino
Fundamental, considerando que este pblico ainda se encontra na fase de
compreenso apenas dos elementos concretos, o que gerar reflexos em todos os
nveis de ensino.
Ainda preciso lembrar que os professores de Geografia como
corresponsveis pela formao dos alunos, devem enxerg-los como sujeitos no
processo educacional e, assim sendo, devem abordar os contedos da forma mais
interessante e harmnica de modo a preservar as diferenas individuais nesse
processo de compreenso da linguagem cartogrfica, sem, no entanto, transform-
las em desigualdades.
Em nosso entender, esses so os motivos pelos quais a compreenso dos
conceitos geogrficos, destacando aqui, a categoria espao, deve contribuir na
formao dos indivduos para a vida social na sua totalidade, e por extenso,
superar as adversidades impostas por um mercado de trabalho cada vez mais
seletivo e para o qual a escola tambm um instrumento formador.
Isto tambm significa, que o papel social da escola, alm de preparar seus
alunos para o pleno exerccio da cidadania, formando indivduos capazes de
conviver numa sociedade em que as influncias culturais, polticas e econmicas
so universalizantes, tambm tem a funo de qualificar mo de obra para o
mercado de trabalho.
1.7 Ponto de partida: incluir as TICs no planejamento de ensino
Desde o ano de 2005, o Governo Federal vem sistematicamente fazendo
doaes de equipamentos para as escolas, em todo territrio nacional. O gargalo
agora a falta de planejamento e manuteno dos equipamentos para a utilizao
das ferramentas digitais na prtica docente. Se a falta de recursos humanos (e
materiais) nos laboratrios das escolas uma realidade, a ausncia de
planejamento das aulas prticas, para que se contorne essa situao conjuntural,
tambm o . Faz-se necessrio planejar o uso dessas TICs, durante todo o ano
36
letivo.
Nas aulas de Geografia, a utilizao de ferramentas digitais, quase sempre
representa uma excelente oportunidade para o aprimoramento do processo de
ensino aprendizagem, considerando que os componentes dessa disciplina, dadas as
suas caractersticas, oferecem ao aluno um saber estratgico que permite pensar no
espao e agir sobre ele. Dessa forma, podemos deduzir que:
O manuseio dos computadores poder incentivar o gosto pelas tecnologias;
O uso das ferramentas digitais poder melhorar a percepo do mundo que
nos rodeia;
A utilizao do Google Earth poder possibilitar o desenvolvimento da
capacidade cognitiva na anlise da categoria espao, atravs da
aprendizagem interativa;
O desafio de explorar as funcionalidades do programa Google Earth estimula
os alunos para estudar cartografia.
Partindo desses pressupostos e de acordo com a anlise dos Parmetros
Curriculares Nacionais (PCNs) de Geografia, podemos constatar que se torna
essencial a incluso das ferramentas digitais no planejamento anual de ensino das
escolas pblicas que dispem de laboratrios de informtica.
Para facilitar o ensino, a utilizao das TICs nos temas relacionados a
cartografia, apresentam a vantagem de serem interativos e possurem recursos da
realidade virtual. Assim sendo, em tese, o uso dos recursos do Google Earth como
auxiliar nas aulas de geografia poder proporcionar uma melhoria na aprendizagem
dos contedos expostos, reduzindo sobretudo o nvel de abstrao que os mapas
impressos submetem aos alunos.
Desta forma, as ferramentas digitais podero assumir um papel de
mediadores cognitivos do processo de ensino-aprendizagem capazes de aproximar
o aluno da realidade, e ainda, ilustrarem com exemplos da cartografia local, a partir
da visualizao e recorte de imagens das pequenas comunidades, facilitando a
compreenso dos contedos ministrados.
37
1.8 Caracterizao da rea de estudo
O municpio de Arara est localizado na Microrregio do Curimata
Ocidental e na Mesorregio Agreste (Figura 1). Sua rea territorial de 99,1 km
representando 0,1754% do Estado da Paraba e 0,001% de todo o territrio
brasileiro. A sede do municpio tem uma altitude aproximada de 467 metros, distando
55 Km do campus I da Universidade Estadual da Paraba. O acesso feito, a partir
de Campina Grande, pelas rodovias BR 104 e PB 105, sentido Nordeste.
Figura 2: Arara em destaque no mapa do Estado da Paraba
Fonte: http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AParaiba_Municip_Arara.svg, acesso em 31dez2013
1.8.1 Aspectos socioeconmicos e educacionais
O municpio foi criado em 1961 e segundo o ltimo Censo Demogrfico
realizado pelo IBGE em 2010, a sua populao total era de 12.653 habitantes, sendo
8.924 na rea urbana e 3.729 na zona rural. A estimativa de habitantes para 2013,
de 13.157 habitantes. Conforme os dados contidos no Relatrio do Programa das
Naes Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), o ndice de Desenvolvimento
Humano Municipal para Educao (IDHM-E) considerado baixo, pontuando 0,407,
numa escala que varia entre 0 (zero) a 1 (um).
Considere-se que pelos parmetros etrios definidos pelo Ministrio da
Educao (MEC), aos 6 anos uma criana deve iniciar o 1 ciclo do ensino
fundamental, aos 15, o adolescente deve ingressar na 1 srie do ensino mdio, e,
aos 22 anos, concluir o ensino superior. Dessa forma, para se avaliar o acesso de
http://commons.wikimedia.org/wiki/File%3AParaiba_Municip_Arara.svg
38
uma determinada populao educao escolar, divide-se o total de alunos dos trs
nveis de ensino, pela populao total dessa faixa etria.
Considere-se ainda que a proporo de crianas e adolescentes
frequentando ou tendo completado determinados ciclos de ensino, indica a situao
da educao entre a populao em idade escolar do municpio e compe o IDHM-
Educao. Ainda de acordo com o relatrio do PNUD, sistematizados atravs do
Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil 2013, no municpio de Arara (PB), no
perodo compreendido entre 2000 e 2010, a proporo de crianas na faixa etria
entre 11 e 13 anos frequentando as sries finais do ensino fundamental, cresceu
206,8%, entretanto, os nveis de aprendizagem avaliados pelo INEP/MEC, no
acompanharam esses ndices.
No tocante aos aspectos educacionais, segundo os dados do Censo
Escolar5, realizado pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais
Ansio Teixeira (INEP), em 2012, no municpio de Arara, foram matriculadas 327
crianas na pr-escola, 2.193 alunos no ensino fundamental e 333 no ensino mdio.
Esta parcela da populao local foi atendida por 177 professores que atuam
diretamente na regncia de sala de aula, em 13 unidades que dispem do ensino
pr-escolar, 15 estabelecimentos do ensino fundamental e 02 do ensino mdio.
Conforme o ltimo Censo Demogrfico realizado pelo IBGE em 2010, o
percentual de alunos que frequenta a rede pblica de ensino corresponde a 91,2%
no ensino fundamental, e 96,9% no mdio. Entretanto, h um aumento substancial
quando se observa o nvel superior, no qual, apenas 65,5% dos alunos de
graduao esto matriculados nas universidades pblicas. Estes dados refletem a
deficincia no ensino bsico do municpio, considerando que enquanto apenas 3,1%
dos alunos do ensino mdio estavam matriculados nas escolas da rede privada,
esse percentual foi elevado em 11 vezes mais, quando se trata do ensino superior.
interessante destacar que os 34,5% dos alunos matriculados nas instituies da
rede privada, representam uma pequena parte daqueles que no conseguiram
superar os obstculos dos exames de seleo para as universidades pblicas
(Grfico 2).
5 O Censo Escolar um levantamento de dados estatstico-educacionais de mbito nacional realizado todos os
anos e coordenado pelo Inep. Ele feito com a colaborao das secretarias estaduais e municipais de Educao e
com a participao de todas as escolas pblicas e privadas do pas.
39
Grfico 2: Percentual de alunos de Arara matriculados nas redes pblica e privada (2010).
Fonte: IBGE www.ibge.gov.br/censo2010/cidades, acesso em 03set2013.
Um dado curioso, alm do aumento substancial do nmero de alunos
matriculados na rede privada no ensino superior em relao ao ensino mdio, que
no decorrer desses ltimos dez anos, ao contrrio do que se observa na tendncia
nacional, o nmero de alunos matriculadas no ensino fundamental no municpio de
Arara, sofreu uma reduo correspondente a 11% no perodo. Em 2002, haviam
3.004 matriculas no ensino fundamental, enquanto em 2012, esse nmero sofreu
uma reduo para 2.669 matrculas, j contabilizados os 476 alunos da Educao de
Jovens e Adultos (Grfico 3).
http://www.ibge.gov.br/censo2010/cidades
40
Grfico 3: Reduo do nmero de matrculas no ensino fundamental em 10 anos.
Fonte: IBGE www.ibge.gov.br/censo2010/cidades, acesso em 03set2013.
Essa reduo deve-se ao controle mais efetivo do Ministrio da Educao
(MEC), no tocante ao aprimoramento do sistema informatizado para se evitar
duplicidade das matrculas, a partir do cruzamento dos dados do INEP, com o
Programa Bolsa Famlia do Ministrio de Desenvolvimento Social e Combate
Fome (MDS). Por seu turno, o Bolsa Famlia um dos responsveis pela
assiduidade na frequncia escolar, uma vez que uma das condies para que se
permanea no programa social, a frequncia regular das crianas na escola. De
acordo com as informaes disponibilizadas no Portal da Transparncia do Governo
Federal, durante o ano de 2012, quase 75% das famlias residentes no municpio de
Arara, receberam esses benefcios sociais a ttulo de transferncia de renda para
combate fome. Segundo o MDS, isto corresponde 2.815 famlias em situao de
pobreza e extrema pobreza, dentre as 3.911 residentes no territrio municipal.
Por outro lado, analisando-se a situao financeira dos cofres do municpio,
observa-se que a Receita Oramentria6 de Arara no exerccio de 2012, foi da
ordem de R$ 17.687.703,92 (Grfico 4). Dentre as receitas, o Governo Federal
transferiu 13,92%, para o Fundo de Manuteno e Desenvolvimento da Educao
6 Dados disponibilizados pelo Sistema de Acompanhamento da Gesto dos Recursos da Sociedade (SAGRES)
do Tribunal de Contas do Estado da Paraba. Disponvel em , acesso em 15jun2013.
http://www.ibge.gov.br/censo2010/cidades
41
Bsica e Valorizao dos Profissionais da Educao (FUNDEB), somados aos
1,47%, destinados ao Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE) e ainda 0,89% do
Programa de Alimentao Escolar (PNAE), alm dos 1,29% destinados ao Programa
de Transporte Escolar (PNATE).
Grfico 4: Aplicao dos recursos destinados educao em relao a receita total do municpio.
Fonte: Tribunal de Contas do Estado da Paraba. (Adaptado pelo autor em jun/2013).
Portanto, diante da anlise dos valores destinados aos cofres municipais
acima expostos, observa-se que dos quase dezoito milhes arrecadados, mais de
trs milhes foram recursos transferidos pelo governo federal e destinados
exclusivamente manuteno dos programas de desenvolvimento do ensino das
escolas da rede municipal. Se h um volume considervel de recursos investidos na
educao, por que no alcanamos melhores resultados?
1.8.2 Do recorte espacial e objeto de observao
A observao foi realizada na Escola Municipal Luzia Laudelino, vinculada a
rede pblica do municpio de Arara, pelo fato de ser uma instituio que atende as
crianas oriundas das zonas urbana e rural, nos dois turnos de funcionamento.
42
Foto 1: Escola Municipal Luzia Laudelino Arara(PB)
(Arquivo pessoal do autor, 02dez2013)
O pblico alvo dessa unidade escolar bastante heterogneo,
matriculando-se alunos de todas os nveis sociais da comunidade local. O 6 ano do
Ensino Fundamental foi definido como objeto de estudo por ser a srie que melhor
representa a base formal da alfabetizao na cartografia escolar, ou se aprende as
bases do conhecimento cartogrfico nesse nvel de escolaridade, ou as deficincias
no processo de ensino-aprendizagem de cartografia, tendem a se acentuar no
transcurso das sries posteriores.
A influncia desse aprendizado para a leitura e interpretao de mapas nas
sries seguintes bastante significativa, inclusive para aqueles alunos que no tero
acesso aos demais nveis de escolarizao ou outros suportes textuais alm do livro
didtico.
Compreender essas nuanas e promover uma associao entre cartografia
escolar e ferramentas digitais, analisando as razes que levam ao desinteresse dos
alunos pela cartografia escolar nas sries iniciais do Ensino Fundamental. Aqui
reside uma das minhas preocupaes diante desta questo para a qual procuro
encontrar a resposta no decorrer desta pesquisa.
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CAPTULO II
2. A formao de professores no Brasil
No decorrer do sculo XX, o Brasil passou de um atendimento educacional de
pequenas propores, prprio de um pas predominantemente rural, para servios
educacionais em grande escala, acompanhando o incremento populacional e o
crescimento econmico que conduziu a altas taxas de urbanizao e
industrializao. Em virtude desse novo cenrio, foi preciso implementar uma
reforma para melhoria educacional no Ensino Bsico, cujas diretrizes somente foram
estipuladas na Conferncia Mundial de Educao para Todos, realizada em
Jomtien (Tailndia), em maro de 1990 e s depois da qual o Brasil elaborou o Plano
Decenal de Educao para Todos (1993-2003), com atraso de mais de um sculo
em relao as naes europeias.
2.1 Conferncia de Jomtien: um novo cenrio para a educao mundial?
A Conferncia de Jomtien, convocada pela Organizao das Naes Unidas
para a Educao, a Cincia e a Cultura (UNESCO), pelo Fundo das Naes Unidas
para a Infncia (UNICEF), pelo Programa das Naes Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD) e pelo Banco Mundial, foi composta por representantes de
155 pases e tinha como objetivo, definir os rumos que deveria tomar a educao
bsica, nos nove pases com os piores indicadores educacionais do mundo, dentre
os quais, ao lado do Brasil, encontravam-se Bangladesh, China, Egito, ndia,
Indonsia, Mxico, Nigria e Paquisto, naes em cujos territrios, o capital
produtivo precisava se fortalecer, o que s seria possvel, atravs da elevao do
nvel educacional de uma Populao Economicamente Ativa (PEA) mais qualificada,
que alm de ampliar o mercado consumidor, tambm fizesse as vezes de um
exrcito de reserva para o mercado de trabalho.
Por outro lado, segundo o relatrio da UNESCO, um dos maiores problemas
da educao brasileira no incio da dcada de 1990, consistia nas elevadas taxas de
evaso e repetncia (superando os 50% dos ingressantes no Ensino Fundamental),
associadas ao elevado ndice de analfabetos adultos. Diante dessa realidade, as
agncias internacionais de fomento a servio do capital, a exemplo do BID e BIRD,
44
passaram a exigir aes mais abrangentes e concretas voltadas para a melhoria do
Ensino Bsico, tais como o uso racional dos recursos e flexibilizao dos currculos,
estipulando que um fator primordial para se alcanar as metas, seria a autonomia
das instituies educacionais7, alm de recomendar que todo o sistema educacional
brasileiro focasse nos resultados, enfatizando a necessidade de que se
implementassem sistemas de avaliaes peridicas (Provinha e Prova Brasil, Saeb,
ENEM, dentre outros).
Este fato refora a ideia da busca pela eficincia e maior articulao entre os
setores pblicos e privados tendo em vista a necessidade de se ampliar a oferta de
educao de melhor qualidade. Dentre as prioridades traadas na Declarao
Mundial de Educao para Todos (Education for All EFA) consolidada em Jomtien
e que tem no Brasil um de seus signatrios, esto a reduo das taxas de
analfabetismo e a universalizao do Ensino Bsico. Desde ento, o governo
brasileiro empreende um conjunto de aes com vistas a cumprir as metas firmadas
nessa conferncia e a melhoria da qualidade do ensino da geografia no poderia
ficar excluda desse contexto.
2.2 Qual o papel da Geografia nessa histria?
Para comear, Lacoste (1994) nos fornece um panorama do papel
desempenhado pelas cincias humanas nesse contexto, ao revelar a face oculta da
Geografia, isto , seu carter poltico. Ele afirma que desde a Antiguidade Clssica,
essa cincia tem servido de meio auxiliar para manter a hegemonia burguesa,
atravs da dominao ideolgica difundida nas escolas. Para Lacoste
[...] a dominao ideolgica, o conjunto das ideias e dos sentimentos pelos quais a burguesia impe s outras classes um certo consenso; ela no se mantm no poder pelo efeito nico do aparelho coercitivo do Estado. Uma das bases primordiais dessa hegemonia cultural e poltica da burguesia foi a ideologia nacional, a ideia da unidade nacional e da independncia nacional. (LACOSTE, 1994, p. 48)
7 Para viabilizar esta meta, o Governo Federal, atravs do Ministrio da Educao, criou mecanismos como o
Fundo de Valorizao e Desenvolvimento do Ensino Fundamental (FUNDEF, posteriormente FUNDEB), Programa Nacional de Livro Didtico (PNLD), Programa Dinheiro Direto na Escola (PDDE), dentre muitos outros, com o intuito de corrigir as distores verificadas entre os diversos sistemas de ensino nas esferas estaduais e municipais.
45
Esta constatao do autor refora a ideia de que, na Frana, assim como
ocorreu na Alemanha, o ensino da geografia tambm foi institucionalizado aps
1870, quando os franceses perceberam que a Alemanha s ganhou a guerra franco-
prussiana porque seus soldados conheciam e almejavam muito pela conquista do
espao onde estavam lutando em decorrncia dos ensinamentos geogrficos
aprendidos nas escolas elementares.
Dessa forma, a cincia geogrfica tambm serviria a alemes e franceses
como um instrumento alienante, uma vez que as aes governamentais eram
sempre exaltadas entre os jovens aprendizes, sendo justificadas como necessrias
ao sentimento de constituio da nao, e os professores prussianos repassavam
este sentimento aos seus alunos em desfavor da poltica imperialista francesa, ao
ponto do ento chanceler prussiano Otto Von Bismarck afirmar que foi o mestre-
escola quem ganhou a guerra franco-prussiana.
No tocante a formao de profissionais para essa seara, Vlach (1994), afirma
que na Europa do sculo XIX, as graduaes em geografia, foram criadas para
servir de aporte no fortalecimento da formao de professores para o ensino
elementar.
Ora, a geografia, na qualidade de cincia institucionalizada durante o sculo XIX, havia dado preciosa contribuio constituio/consolidao de uma forma essencialmente europeia de organizao, poltica e territorial, do espao geogrfico: o Estado-nao que, com muita preciso, havia espacializado as relaes polticas, econmicas, culturais da burguesia industrial de maneira que, atravs da escola, a geografia inculcava o amor ptria, nos termos de uma ideologia nacionalista embasada no pressuposto da igualdade de todos, como se todos fossem, de fato, cidados; ao mesmo tempo que, atravs de trabalhos de reconhecimento e cartografia do territrio, estabelecia as fronteiras de cada Estado moderno. (VLACH, 1994, p. 155)
Nesta perspectiva, vale ainda ressaltar, que o ensino de geografia na
formao elementar aparece bem antes que nas ctedras das universidades. J no
incio do sc. XIX, quando os prussianos queriam fundar um Estado-Nao, foram
buscar auxlio na geografia e a ela coube difundir o amor ptria entre aqueles
povos que futuramente viriam a ser chamados de alemes. Assim, a geografia
escolar, com aporte na cartografia, aparece como uma disciplina estratgica para a
construo do Estado-Nao, com a incumbncia de servir classe dominante, uma
46
vez que, mesmo utilizando-se de descrio e observao dos aspectos naturais,
humanos e econmicos de maneira fragmentada, os conhecimentos cartogrficos,
utilizados por meio da geografia escolar, garantiam aos prussianos uma viso de
unidade territorial.
Nesse sentido, ela assegura ainda que a geografia se estabelece como
cincia e criam-se ctedras universitrias, primeiramente na Alemanha e depois na
Frana, porque ambos tinham como objetivo a garantia de suporte terico e prtico
aos professores que iriam lecion-la nas escolas de ensino elementar, nos moldes
que interessavam as classes dominantes.
Neste sentido, no podemos ignorar o peso da epistemologia positivista, claramente dominante naquele momento, que, de um lado, exigia/exige um objeto prprio para reconhecer uma cincia, de outro e antes de mais nada, assegurava/assegura que a cincia e apenas a cincia podia/pode assimilar/explicar a realidade. (VLACH, 1994, p.154)
Por fim, a autora esclarece que desde 1831, a geografia passou a ser
requisito nas provas para os cursos superiores de direito, sendo considerada um
saber essencial na formao dos bacharis, futuros intelectuais e administradores
numa Europa cujas fronteiras ainda eram pouco consolidadas, logo, diante do que
foi afirmado acima, podemos deduzir que a Geografia associada a cartografia, serviu
de aporte para ampliar o controle das elites europeias sobre o espao a ser mantido,
inclusive nos domnios coloniais.
2.3 O cenrio nacional: a formao de professores de Geografia no Brasil
O pontap inicial para elaborao deste tpico foi a necessidade desse fazer
uma anlise histrica, sobre a formao dos professores no Brasil, considerando que
as inmeras contradies e transformaes presentes na sociedade e as novas
exigncias impostas pela economia mundial refletem-se nas prticas pedaggicas, e
consequentemente, na ao do professor cotidianamente, exigindo uma prtica que
atenda essas exigncias profissionais, humanas, culturais e polticas. Estas
transformaes se chocam com uma srie de deficincias oriundas da formao
inicial dos professores, haja vista que, no palco da sala de aula, estes formandos
devem ser considerados como atores coadjuvantes no processo de ensino-
47
aprendizagem. Entretanto, na prtica, os formandos em geografia ainda encontram
muitos obstculos para desempenhar o novo papel exigido pela sociedade.
No Brasil, segundo Soares Jnior (2002), a geografia comeou a ser
lecionada no Colgio Pedro II, do Rio de Janeiro, ento capital do pais, j em 1837,
depois, de maneira gradativa, foi incorporada aos currculos das demais escolas
brasileiras. Transcorridos os 90 anos seguintes, depois daquela implantao da
disciplina naquele colgio da capital federal, o ensino de geografia ainda era
ministrado por bacharis em direito, mdicos, seminaristas e engenheiros. Somente
a partir de 1934 aparecem em algumas capitais brasileiras, universidades destinadas
a formar professores de geografia, a exemplo do Rio de Janeiro, So Paulo e Porto
Alegre.
Portanto, faz-se necessrio lembrar que no decorrer das ltimas oito dcadas,
vivenciamos mudanas considerveis nos aspectos polticos, econmicos e
culturais, bem como em todas as dimenses da sociedade brasileira. Como se extrai
da leitura do pargrafo anterior, no incio da institucionalizao da geografia
brasileira e da formao do professor de geografia, os estudos e ensinamentos
geogrficos estavam praticamente limitados ao eixo Sul e os cursos superiores de
geografia que funcionavam no pas se encontravam principalmente em So Paulo e
Rio de Janeiro.
No tocante ao sistema de ensino nacional, h quase 80 anos (1934-2013), a
geografia - com maior ou menor intensidade - vem fazendo parte da base de
formao curricular dos alunos da educao bsica (desde o ensino primrio ao
ginasial, passando pelos 1 e 2 graus e mais recentemente do fundamental ao
mdio) e vem sendo aprimorada nas academias, em nveis de graduao e ps-
graduao. Com o processo de redemocratizao, a geografia tomou novos rumos
para a compreenso da sociedade brasileira e por extenso, tambm da sociedade
mundial.
Convm lembrar que as instituies de ensino superior desempenham uma
importante e ao mesmo tempo complicada funo: a incumbncia de formar os
professores. Considere-se que a carreira docente no tem sido muito atrativa nas
ltimas dcadas, se comparada a outras que exigem o mesmo nvel de formao
intelectual, tanto em relao retribuio financeira, quanto ao prestgio social, o
que faz com que, a cada ano, se torne mais difcil atrair pessoas capacitadas para
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este ofcio.
Mesmo assim, cabe aos cursos de licenciatura em geografia, a difcil tarefa de
colocar no mercado de trabalho bons professores capazes de motivar os alunos do
Ensino Bsico e convenc-los a se interessar pela aprendizagem dos contedos
geogrficos, diante da concorrncia desleal manifesta atravs dos programas
televisivos, do fascnio criado pelos jogos digitais e da interatividade promovida pelas
redes sociais, alm das incontornveis mazelas sociais que acabam por refletir nas
engrenagens do sistema educacional brasileiro na atualidade.
Evidentemente que, para as instituies de ensino superior, tambm no
fcil em 160 semanas (tempo mdio de durao de um curso de licenciatura),
entregar um produto livre de vcios redibitrios, ou seja, transformar jovens que
geralmente apresentam defasagens de aprendizagem proveniente de uma formao
bsica com deficincias marcantes, em um profissional com vasto conhecimento do
saber/fazer docente na rea das Cincias Humanas. Evidentemente, mais cedo ou
mais tarde, algum defeito oculto afluir dessa intensiva formao. Porm, nada disso
se compara com os inmeros desafios enfrentados pelos professores que atuam no
Ensino Bsico.
Nos ltimos 50 anos, tem sido prtica comum nas academias, que toda
formao superior esteja voltada para a especializao, como ocorre com a
medicina, direito e odontologia, apenas para citar alguns exemplos. O professor de
geografia do Ensino Bsico, ao contrrio, trabalha com muitas vertentes do
conhecimento geogrfico: cartografia, climatolo
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