ANÁLISE DAS POLÍTICAS PÚBLICAS PARA O PATRIMÔNIO CULTURAL:
UM ESTUDO DE CASO NO IPHAN DO CEARÁ
Gabrielly Pamela Lopes Soeiro Amanda Alcântara da Silva Rafaela Pereira de Carvalho
Camila Silva Vasconcelos Gilcimara Lopes Nobre
RESUMO O artigo tem como intenção pesquisar sobre as políticas públicas executadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) no estado do Ceará para a aplicação do método dessa pesquisa. O foco das análises feitas neste trabalho envolve a questão do patrimônio cultural e das políticas publicas para a preservação da memória e da cultura na sociedade, ou seja, todos os elementos que envolvem essa temática. Iniciando pela abordagem histórica, visando dar melhor compreensão ao tema, posteriormente adentrar com conceitos de cultura e memória na sociedade e também sua influência na discussão do tema. A pesquisa exploratória traz como objetivo a análise dos dados coletados em campo através da realização de visitas de cunho exploratório para a obtenção de dados preliminares onde constatou-se a falta de autonomia da superintendência estadual e a necessidade de uma melhor divulgação das atividades realizadas pela instituição. PALAVRAS-CHAVE: Políticas Públicas. Preservação. Patrimônio Cultural. Patrimônio Histórico. IPHAN. ABSTRACT The article has the intention to research about the public politics executed by the National Institute of Historical and Artistic Heritage (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN) on the state of Ceará for the application of this research method. The focus of the analysis made in this paper involves the questions of cultural heritage and public politics for the preservation of memory and culture on society, in other words, all the elements involving this theme. Starting with a historical approach, aiming to better understand the topic, then enter with culture and memory concepts in society and its influence on the discussion of the topic. The exploratory research has as objective to analysis the collected data in the field by conducting exploratory visits to obtain preliminary data which showed the autonomy lack of state oversight and the need for better activities dissemination performed by the institution. KEYWORDS: Public politics. Preservation. Cultural heritage. Historical heritage. IPHAN. 1 INTRODUÇÃO
Esta pesquisa teve como intenção estudar as políticas públicas culturais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) do Ceará, com foco na investigação de como elas se definem no estado. No panorama atual, os bens culturais brasileiros vão muito além dos bens imóveis: estendem-se principalmente às criações artísticas que representam a história do povo brasileiro, suas expressões e modo de viver, os costumes de cada região, o patrimônio cultural concebido atualmente traços que demarcam a identidade brasileira. Diante da realidade expressa, confere relevância à resposta para a seguinte questão: Como são definidas as políticas públicas culturais do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) para o Ceará? A motivação para realizar a pesquisa se apresenta pela relevância do tema preservação do patrimônio cultural, mantido através das políticas de preservação, importância vista do ponto social, histórico, econômico e político. Pela necessidade ideológica que a sociedade tem pela busca de identidade seja através de edifícios antigos ou por manifestações culturais. Por esses contextos, entendemos que a pesquisa se justifica pelas contribuições da teoria e das práticas que pode proporcionar, bem como pelos aspectos de relevância que a envolvem. Assim, o objetivo geral do trabalho é apresentar o panorama das políticas publicas voltada para a preservação do patrimônio com foco na instituição IPHAN para o Ceará. Com base no objetivo geral, elaboraram-se os seguintes objetivos específicos: a) identificar na literatura os conceitos e elementos relacionados às políticas públicas e culturais do IPHAN no Ceará; b) apresentar as problemáticas que envolvem a temática e o órgão responsável c) mostrar os desafios enfrentados pela instituição e identificar possíveis melhorias na promoção da memória e da cultura no estado. Nesta pesquisa, apresentamos os resultados referentes ao objetivo geral e específico. Também apresentamos na literatura os conceitos e elementos relacionados às Políticas Públicas e culturais do IPHAN no Ceará. Assim, será necessário primeiramente entender sobre a criação dessas políticas no Brasil. 2 DESENVOLVIMENTO 2.1 APANHADO HISTÓRICO E CONTEXTUALIZAÇÃO A preocupação com o patrimônio começou em Roma, quando os humanistas passaram a cobrar a preservação das antiguidades romanas. A partir de então, a igreja proibiu as demolições, porém, seus sucessores não respeitavam suas proibições, que eram mudadas cada vez que um novo pontífice entrava no poder. O conceito de monumento saiu desse contexto histórico, mas só após a Revolução Francesa que a preocupação com a preservação deixou de ser exclusiva da igreja católica e passou a ser governamental. 2.2 BREVE HISTÓRICO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS NO BRASIL Os primeiros registros obtidos em relação à preservação do patrimônio são antigos. No Brasil, há indícios de que desde o final do período colonial a preocupação com o patrimônio material deu início, e que logo se espalhou por outras cidades como Ouro Preto e no estado Baiano. Entretanto, o que se sabe é que essas políticas foram de difícil consolidação. Somente no século XX, essa questão começa a ser discutida, levando em conta todo o contexto da época. Na década de 1920, surge uma série de movimentos artísticos que foi acompanhada pelos modernistas, assim despertando o interesse pelo assunto. Em 1937, temos a criação do projeto que se tornou Lei, da autoria de Mário de Andrade, que é
visto como um marco pelo fato de ser considerado o primeiro ato legislativo e por apresentar abrangência nos conceitos de patrimônio, saindo um pouco mais da visão elitista. A criação do Serviço do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (SPHAN), também no mesmo período, é outro ponto relevante por se tratar da instituição responsável por cuidar do que foi instituído naquele momento. (LEMOS, 1981) Em relação às políticas no cenário nacional, podemos considerar duas fases: a primeira tinha muito mais visão a respeito de tornar consistente o nacionalismo, seguindo assim o pensamento de preservação dos bens materiais com o propósito de tornar cada vez maior a sensação de identidade e também trazendo um caráter de civilidade. A partir desse momento, temos a criação de instituições que tinham como objetivo a preservação. A exemplo, temos o Instituto Nacional do Livro e Conselho Nacional de Cultura, todos surgidos na era Vargas. (CALABRE, 2007). Na década de 1960, o governo começou a pensar em políticas que fossem voltadas para a área cultural e notou-se uma necessidade na elaboração das mesmas para a cultura no âmbito nacional. Neste marco até praticamente a década de 1980, podemos observar o surgimento tanto de instituições (FUNARTE1, PAC2, DAC3, etc.) em conjunto com a criação do Centro Nacional de Referência Cultural (CNRC) trouxeram mudanças significativas, pois possuíam um referencial baseado em estudos que tinham o intuito de conhecer a realidade nacional, também temos os primeiros registros do envolvimento da iniciativa privada. E no decorrer de todo esse processo, outras medidas foram tomadas, como as mudanças ocorridas na constituição para tornar mais abrangente a questão de patrimônio cultural, anteriormente relacionado somente ao material, passando agora a integrar a questão imaterial também. A principal modificação que sintetiza a corrente de pensamento vigente da época é o fato de serem considerados agora os bens de caráter monumental, sendo referências de memória, ação e identidade dos diversos grupos que compõem a nação brasileira. Nos anos 1970, em detrimento das novas diretrizes nas questões do patrimônio (novos conceitos) e em substituição ao SPHAN, foi criado o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Em 1985, foi criado o Ministério da Cultura. Antes, as políticas que se relacionavam a cultura e preservação patrimonial eram ligadas ao Ministério da Educação (MEC), e que agora também se estende aos municípios. Desde 1988, os municípios tem tido maior liberdade nas ações dessas das mesmas em conjunto com o IPHAN. Outro ponto que vale a pena ressaltar é a lei de incentivo a cultura, conhecida como Lei Rouanet4, considerada um aperfeiçoamento da Lei Sarney. As primeiras noções formuladas sobre patrimônio cultural são pertencentes a Mário de Andrade e é dele também a ideia de criar um órgão responsável pela preservação da história e da cultura do povo brasileiro.
1 Funarte é o órgão responsável, no âmbito do Governo Federal, pelo desenvolvimento de políticas públicas de fomento às artes visuais, à música, ao teatro, à dança e ao circo. Os principais objetivos da instituição, vinculada ao Ministério da Cultura, são o incentivo à produção e à capacitação de artistas, o desenvolvimento da pesquisa, a preservação da memória e a formação de público para as artes no Brasil. 2 Plano de ação cultural foi criado durante a gestão do ministro Jarbas Passarinho, para o financiamento e promoção de eventos culturais. 3 Departamento de assuntos culturais fazia parte do MEC, criado em 1970. 4 A Lei de Incentivo à cultura, popularmente Chamada de Lei Rouanet, é conhecida principalmente por sua política de incentivos fiscais. Possibilita que cidadãos (pessoa física) e empresas (pessoa jurídica) apliquem parte do Imposto de Renda devido em ações culturais. Assim. Além de ter benefícios fiscais sobre o valor do incentivo, esses apoiadores fortalecem iniciativas culturais que não se enquadram em programas do ministério da cultura (Minc). <http://www.brasil.gov.br/sobre/cultura/Regulamentacao-e-incentivo/lei-rouanet>
O que podemos perceber de acordo com o que foi analisado em relação às políticas públicas é que existe uma dificuldade encontrada no começo das discussões sobre o assunto “o que tem de ser preservado” (questão essa que faz parte das discussões desde o início), também sobre as partes constituintes desse contexto e no processo da construção da identidade nacional para ter-se uma delimitação sobre o trabalho que as políticas venham a desenvolver no seio da sociedade como é abordado por Fonseca (1997, p.36): [...] uma política de preservação do patrimônio abrange necessariamente um âmbito maior que o de um conjunto de atividades visando à proteção de bens. É imprescindível ir além e questionar o processo de produção desse universo que constitui um patrimônio, os critérios que regem a seleção de bens e justificam sua proteção; identificar os atores envolvidos nesse processo e os objetivos que alegam para legitimar o seu trabalho; definir a posição do Estado relativamente a essa prática social e investigar o grau de envolvimento da sociedade. Faz-se necessário falar sobre a importância da conscientização da sociedade em relação à busca pela aproximação com o patrimônio, visto que, com o passar do tempo, houve uma espécie de afastamento dele com os indivíduos como afirmado por Canclini, 1994 “[...] expressa a solidariedade que une os que compartilham um conjunto de bens e práticas que os identifica, mas também costuma ser um local de cumplicidade social.” Entretanto, existe uma postura mediante ao assunto do uso dos bens patrimoniais que é como uma espécie de Cultura dominante e de cada classe. E sobre a delimitação desse tema, iremos abordar mais a respeito dos conceitos que permeiam todo esse universo da preservação do patrimônio cultural e histórico. 2.3 INSTITUTO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL (IPHAN) NO CEARÁ O IPHAN instalou-se através da 4° coordenadoria regional em 1982, atendendo tanto o Ceará como o Rio Grande do Norte, com projetos voltados mais para a parte de projetos arquitetônicos. A instituição possui escritórios em Icó, onde se situa um importante sítio arqueológico desde 1998, e também na cidade de Sobral. As superintendências regionais possuem importância no aspecto das tomada de decisões imediatas e relevantes de acordo com a legislação, ou seja, de maneira legal. 2.4 CONCEITO DE PATRIMÔNIO No dicionário Houaiss da língua portuguesa, o termo patrimônio significa bens de família que são passados de pai para filho, podendo ser materiais ou não, e que sejam passíveis de apreciação econômica. Dessa forma, inicialmente pode-se entender que o conceito de patrimônio refere-se a um conjunto de bens com algum valor simbólico e memorial referente à história de um povo; algum fazer que o caracterize aquela nação como tal; e um elemento portador de identidade. Esses bens patrimoniais podem ser divididos em Histórico, Cultural e Ambiental. O antropólogo Néstor Garcia Canclini coloca que o conceito de patrimônio pode mudar de acordo com as épocas. Ele destaca ainda que não se pode definir nação por conjuntos de bens utilizados por um povo, pois atualmente a própria população consome produtos estrangeiros, modificando-os e sendo modificadas por eles num processo de troca. Com a modernidade e o avanço das tecnologias de informação, a própria mídia passou a fazer parte do processo de difusão da cultura, mudando modos de ver e abordar a questão cultural, podendo influenciar no comportamento das pessoas. Canclini (1994) afirma:
[...] o patrimônio não inclui apenas a herança de cada povo, as expressões “mortas” de sua cultura – sítios arqueológicos, arquitetura colonial, antigos objetos em desuso –, mas também os bens culturais, visíveis e invisíveis: novos artesanatos, língua, conhecimentos, documentação e comunicação do que se considera apropriado através das indústrias culturais. (CANCLINI, 1994, p. 95). Assim, podemos entender patrimônio como conjunto de bens simbólicos que caracteriza os indivíduos, seja através dos legados do passado ou das impressões culturais. 2.5 PATRIMÔNIO CULTURAL E AS RELAÇÕES SOCIAIS A memória de um povo ou de um lugar está diretamente ligada a sua herança histórico-cultural e, embora as mesmas estejam intimamente conectadas, é necessário fazer uma distinção entre elas. A cultura de um povo faz parte de sua identidade, é isso que os diferencia e os torna únicos. Esses elementos culturais como objetos, canções, lendas, modos de falar, são considerados bens patrimoniais de uma nação. Segundo o Ministério Público Federal, “Denomina-se patrimônio cultural o conjunto de bens, materiais ou imateriais, que traduzem a história, a formação e a cultura de um povo, uma comunidade ou um país”. O Patrimônio cultural tem como característica o dinamismo. Ele segue as modificações feitas pela sociedade ao longo do tempo. Não possuindo um sentido único, pois é parte de um ambiente histórico numa formação sócio-territorial, onde agem como mediadores da memória dos agentes políticos (MESSENTIER). De acordo com a Constituição Federal de 1988, Artigo 216, constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores da sociedade brasileira, nos quais se incluem as formas de expressão; os modos de criar, fazer e viver; as criações científicas, artísticas e tecnológicas; as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados às manifestações artístico-culturais; e os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico. No Ceará e em alguns outros estados e municípios brasileiros, o órgão responsável pelo cumprimento dessas leis é o Instituto de Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), criado em 13 de janeiro de 1937 pela Lei nº 378, no governo de Getúlio Vargas, de acordo com o site da instituição. Mas foi apenas no dia 30 de novembro do mesmo ano que o Decreto de Lei que toma conta da proteção do patrimônio histórico, artístico cultural brasileiro foi promulgado para garantir a preservação do mesmo. Atualmente, a instituição está vinculada ao Ministério da Cultura e tem como missão proteger, preservar, documentar, fiscalizar e promover o patrimônio histórico e cultural brasileiro seja em acervos arquitetônicos, paisagens, acidentes geográficos, documentos, obras de arte integradas e bens móveis. Na obra O que é Patrimônio Histórico?, Carlos Lemos separa em três categorias o natural, o técnico e os bens culturais, esse por sua vez o mais abrangente “englobam toda a sorte de coisas, objetos artefatos e construções obtidas através do ambiente e do saber fazer.” (LEMOS, 1981) Todos são frutos da sociedade no caso, os artefatos propostos no texto são justamente as produções arquitetônicas e ferramentas usadas pelo homem, consideradas também como outros elementos que compõe um repertório vasto. Hoje o conceito de patrimônio cultural é mais utilizado, por abordar o patrimônio de forma mais abrangente. Em relação à definição de ambos (patrimônio cultural e patrimônio histórico) no contexto atual, digamos que uma compõe a outra, sendo que o histórico é mais voltado para a questão dos bens móveis e o cultural ocupa um bojo muito maior, com a questão do material e do imaterial.
Ao tratarmos do assunto, podemos observar a dificuldade que envolve o patrimônio cultural, levando em consideração de que está ligado à sociedade e à sua cultura, que se encontra em estado de mutabilidade em diversos períodos. É uma temática que está sempre em conjunto com as mudanças sociais de uma época, como citado por Canclini, sofre as mudanças decorrentes da industrialização, arquitetura e no caso também do surgimento da indústria cultural, até as diretrizes na atualidade para os rumos que deve ser tomado (1994, p.91). Com isso, podemos perceber a complexibilidade das relações sociais e o patrimônio, principalmente por estarem interligadas a várias questões. Uma delas, a memória coletiva, que tem sua expressão através dos chamados lugares de memória, que é a capacidade de monumentos, edificações de se tornarem símbolos para determinado grupo, dando a capacidade de retratar ou até mesmo vivenciar situações passadas. Como expressa Canclini (p.47 1994): [...] ou seja, o que um conjunto social considera como cultura própria, que sustenta sua identidade e o diferencia de outros grupos- não abarca apenas os monumentos históricos, o desenho urbanístico e outros bens físicos; a experiência vivida também se condensa em linguagens, conhecimentos, tradições imateriais, modos de usar os bens e os espaços físicos. Embora ainda seja vista como muito ligada à questão do material como representativo do simbólico nessas relações, a identidade da sociedade está intimamente relacionada às suas crenças, seus ritos, modos de fazer, os saberes, tudo que envolva a interação entre o homem e o meio em que vive. Essa identidade é a cultura de uma sociedade. Os conceitos sobre cultura, porém, são diversos e abrangentes, mas de um modo geral podemos conceituá-la como a manifestação da identidade de um povo e a realização material e imaterial humana. É praticada e renovada na vivencia diária do homem. E dentro de todos esses aspectos que envolvem a cultura na sociedade, para este trabalho é importante ressaltarmos a relevância da memória na construção da identidade cultural, como elemento que merece atenção no campo da preservação do patrimônio cultural. Para Simson, (2000), “memória é a capacidade humana de reter fatos e experiências do passado e retransmiti-los às novas gerações através de diferentes suportes empíricos (voz, música, imagem, textos etc.)”. É preciso salientar a necessidade e importância que a memória, principalmente a coletiva, utiliza para tornar o patrimônio “vivo” em seu meio. Seguindo a respeito desses questionamentos sobre a memória na sociedade, atualmente alguns autores questionam o porquê da obsolescência que acontece na maioria das vezes em relação a esses locais. Como intitulado de “crise da memória”, acreditam que alguns aspectos dificultam o acesso e o uso desses meios devido a sua estruturação. A memória é dinâmica, encontra-se no cerne da sociedade e existe entre eles, sociedade e memória, uma rapidez nas grandes transformações, gerando crises em várias dimensões, como socioeconômicas, políticas, culturais e documentais. À medida que o aumento dos centros de memória assume o aumento no volume das informações, instituições como bibliotecas, arquivos, museus etc., tem grande responsabilidade mediante a organização e técnica, levando aos profissionais que exercem as funções de organização e preservação um papel de suma importância. A tecnologia cada vez mais recorrente nos meios permitiu que ocorresse o processo de externalização da memória e mudou a forma como os indivíduos lidam com o fluxo das informações atualmente, tendo que ser pensada tanto quanto os suportes documentais e a problemática em toda sua dimensão.
2.6 NOVAS FRONTEIRAS PARA PATRIMÔNIO A participação dos cidadãos é um dos maiores problemas a serem enfrentados pelos gestores do patrimônio, por conta da crise de memória que hoje se encontra na sociedade. Porém, novas abordagens e metodologias estão sendo elaboradas para superar esse desafio e incentivar a participação da sociedade na tomada desses locais como pontos de memória/cultura coletiva. Iniciativas como a economia da cultura que estuda os efeitos econômicos que as manifestações artísticas e criativas; a cultura e seus produtos têm na sociedade atual podem modificar a maneira como o governo, a iniciativa privada e a população encaram o patrimônio cultural. A cultura e seus produtos têm movimentado cada vez mais a economia; a indústria cultural é um dos principais geradores de recursos na sociedade e outra forma positiva de gestão do patrimônio cultural é o turismo cultural. Segundo o Ministério do Turismo, o conjunto de atividades turísticas relacionando às vivências de elementos do patrimônio histórico e cultural, à valorização dos eventos culturais e à promoção de bens culturais materiais e imateriais é correspondente ao turismo cultural. O turismo cultural tem mudado a forma como a população encara a história do lugar em que vive. Ele favorece o crescimento econômico local e revitaliza as cidades com propensões a desenvolver atrações culturais e promover a valorização da história local. Sobre a educação patrimônio, que é uma iniciativa interessante e nova, discorremos a respeito de definições do assunto. Caracterizada segundo HORTA como um instrumento de “alfabetização cultural”, possibilitando ao indivíduo uma tomada de consciência quanto ao seu lugar na sociedade e seu papel como agente criador e transformador da cultura. Através da sensibilização entre indivíduo, patrimônio e suas manifestações há uma leitura do mundo ao seu redor, propondo uma maior valorização da cultura brasileira, que deve ser compreendida como plural, e para o IPHAN: O IPHAN concebe educação patrimonial como todos os processos educativos que primem pela construção coletiva do conhecimento, pela dialogicidade entre os agentes sociais e pela participação efetiva das comunidades detentoras das referências culturais onde convivem noções de patrimônio cultural diversas. Estimular a interação entre indivíduo e objeto cultural não é uma tarefa fácil, principalmente em nosso país onde a questão de preservação e conservação é recente. Para tal tarefa, a educação patrimonial se utiliza de situações onde o patrimônio faça parte da realidade, inserindo o indivíduo como um agente construtor do bem em si (HORTA). No Ceará, iniciativas de preservação vem através do projeto MONUMENTA, que possui proposta inovadora visando à recuperação em conjunto com a auto-sustentabilidade dos locais atendidos pelo projeto, gerando empregos e desenvolvendo atividades econômicas, ao mesmo tempo em que mostra a importância da preservação desses locais. Cooperando também na construção de sítios históricos, também há a criação de uma rede de proteção ao patrimônio, com a ampliação dos tombamentos. Outro exemplo de iniciativa que visa despertar na comunidade a sensibilização e reflexão, dentro da proposta e educação patrimonial, é o projeto Patrimônio Para Todos - uma aventura através das memórias. O projeto é desenvolvido pelo Instituto de Artes e Cultura do Ceará – IACC, por meio da Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho e mantido pela Secretaria da Cultura do Ceará (Secult). Seu objetivo é a sensibilização de jovens moradores locais para “a importância do patrimônio cultural a partir da realização de oficinas de educação patrimonial.” (site eao) desde o ano de
2009. Possui metodologia participativa e interativa e material didático próprio, adaptado para o trabalho junto ao público jovem. Porém, seu principal diferencial é a associação do patrimônio com as novas mídias móveis e tecnologias, criando uma ligação com a realidade deles e uma nova participação desse bem, promovendo em outros locais sua visualização. Busca também localizar pontos de memória e cultura nas localidades em estudo, saindo assim do convencionado como patrimônio, estimulando o jovem a perceber e identificar a sua cultura e memória. Todas as atividades são registradas em diferentes formas e guardadas. O principal meio de acesso a esses registros é o blog do projeto, que pode ser acessado on-line e conta com vídeos e depoimentos de integrantes e alguns entrevistados. O registro das atividades é uma parte importante, pois através dele se é guardada e difundida não só as experiências vividas, mas a memória construída por aquele grupo, podendo ser material para futuros trabalhos. Segundo a definição encontrada em seu blogspot: Buscando dar visibilidade ao patrimônio não consagrado o Patrimônio Para Todos busca ir além dos bens já reconhecidos pelo poder público e instituições de preservação e estimula que as próprias comunidades identifiquem, selecionem e registrem as referências culturais mais significativas para suas memórias e histórias. Trabalhando a arte e a cultura como ferramenta de responsabilidade social, o Governo do Estado do Ceará, a Secretaria da Cultura e o Instituto de Arte e Cultura do Ceará apresentam mais uma ação inovadora, de qualidade, e em benefício da sociedade. Com o Patrimônio Para Todos, a Escola de Artes e Ofícios Thomaz Pompeu Sobrinho capacita, sustenta e promove a cidadania, empregando a cultura como elemento indispensável de modificação das situações de desigualdade social. Todas essas iniciativas são importantes para que haja a mudança no quadro referente à preservação e, sobretudo, a preparação para todos os fenômenos que acarretam a chamada sociedade da informação, com a globalização se inserindo cada vez mais nesse contexto o patrimônio está tomando o status de componente estratégico para as cidades. Por isso, o desenvolvimento mediante esse contexto é muito importante na atualidade. Ao analisarmos os projetos criados com embasamento nessas novas abordagens patrimoniais, vemos uma pequena semente germinar, posto que são iniciativas relativamente novas e seus resultados ainda surtirão efeitos maiores com o passar do tempo, mas já se pode notar algumas mudanças e resultados obtidos. A criação dessas novas abordagens reitera a mudança de visão proposta pela constituição e indica uma modificação no modo de agir e falar sobre patrimônio, tornando a abordagem interativa uma forma indispensável para se fazer patrimônio. 3 MÉTODO A pesquisa caracteriza-se como exploratória. Adota o procedimento de estudo de caso aplicado no Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) do Ceará. O questionário é o principal instrumento de pesquisa. Utiliza-se a análise de conteúdo proposta por Bardin (2010) para organizar os dados, entendida como: [...] um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. (p. 42).
A natureza da pesquisa se caracteriza como aplicada, por ensejar conhecimentos dirigidos à solução de questões específicas (SILVA; MENEZES, 2005). No que diz respeito à abordagem do problema, o estudo expressa aspectos predominantemente qualitativos. Neste estudo, a população foi constituída pelos funcionários da instituição com aplicação do instrumento da pesquisa o questionário. 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES Com base no questionário aplicado na instituição, podemos analisar o nível de atuação da instituição IPHAN no estado do Ceará. Observa-se que o Instituto possui ações centralizadas com base na instituição em Brasília, sendo assim fica a cargo das superintendências estaduais aplicarem de acordo com as normas os projetos decididos e também sobre destinação das verbas. Em relação às políticas de acordo com a pesquisa, o IPHAN considera ter várias frentes: a de regulamentação mediante a quem interessa a preservação desses bens, no caso a sociedade. Para isso, é necessária a adoção de um sistema jurídico-burocrático. Existe também a linha que faz o reconhecimento dos bens, e são através destas pesquisas que o IPHAN realiza suas escolhas em relação ao patrimônio que é efetuado de modo estratégico de acordo com a localidade escolhida. Uma forma de preservação muito utilizada é o acautelamento do que é feito através do tombamento para bens materiais e o registro dos considerados bens imateriais. Após o tombamento, é feito o trabalho de recuperação, monitoramento e divulgação desses bens. Em relação preservação, o IPHAN tem iniciativas para de incentivos a preservação de bens privados através de uma linha de crédito, sem juros ainda em desenvolvimento, mas já implantada e testada nas cidades de Sobral, Fortaleza e Viçosa. A instituição também tem uma grande preocupação com os acervos documentais. A preservação desses ocorre através do laboratório de restauração de papéis, considerado o mais importante do estado. Dentre os projetos realizados nos últimos cinco anos, serão apresentados a seguir alguns: Restauros e demais obras: restauro do Museu Jaguaribano (Aracati); restauro do Teatro Pedro II (Viçosa do Ceará); obras de conservação emergenciais em prédios sob-risco de ruína (Aracati e Icó). Tombamento: Fortaleza de Nossa Senhora da Assunção (2008). Registro de patrimônio imaterial: Festa do Pau da Bandeira de Santo Antônio de Barbalha (em andamento); Lugares Sagrados de Juazeiro do Norte (em andamento). Publicação, em parceria com a Fundação Demócrito Rocha e o BNB, de livros didáticos com foco sob o patrimônio de cidades cearenses (Aracati, Sobral, Icó, Viçosa do Ceará e Quixadá). Restauração de bens em papel (últimos dez anos): 350 metros lineares de acervos, 4.000 fotografias, 1.200 desenhos de arquitetura, 250 livros, além de capacitar e orientar equipes para atuarem em mais de cinquenta instituições cearenses. 5 CONCLUSÃO Como informado na introdução, apresentamos os resultados referentes ao objetivo geral e aos objetivos específicos de identificação na literatura dos conceitos de preservação e das políticas públicas relativas ao patrimônio culturais, aplicadas pela instituição IPHAN no estado do Ceará. Nessa perspectiva, entendemos que a pesquisa irá contribuir para o desenvolvimento da área por trazer à tona questionamentos acerca não somente de como devem ser realizadas as políticas no estado, mas também a nível nacional de acordo com os resultados alcançados decorrente dos estudos para a realização da pesquisa.
Na concepção atual, os bens culturais vão muito além dos bens imóveis, e se estendem principalmente as criações artísticas e tudo que representam a história do povo brasileiro, os costumes de cada região, suas expressões e modo de viver. O patrimônio cultural concebido atualmente demarca a identidade brasileira. A preservação desse patrimônio é a preservação da memória brasileira, que deve ser resguardada para que as próximas gerações possam ter acesso a ela. Em relação ao estudo feito e de acordo com os projetos apresentados anteriormente, nota-se que existe uma atenção voltada para o interior do estado, em cidades que possuam sítios arqueológicos do que para a capital Fortaleza. Isso é justificado pelo fato dos sítios envolverem uma série de atividades em seu entorno tornando um trabalho consideravelmente maior do que a capital, onde alguns locais tombados ou em processo de tombamento ainda são propriedades particulares, o que limita a intervenção da instituição. A saída é a elaboração de outros projetos. Entretanto, a burocracia e os dispositivos legais colocados pela instituição como meio de ação, como um sistema que auxiliam a gestão do patrimônio ainda é pouco eficaz na parte de divulgação. O que podemos concluir de acordo com as análises feitas no decorrer dessa pesquisa é que há uma problemática a ser considerada, que é a obsolescência dos locais de memória coletiva. E é uma questão que se agrava nos centros urbanos, locais onde o crescimento de construções descaracteriza a paisagem com uma velocidade vertiginosa, como alguns estudiosos apontam que são frutos da globalização. É importante ressaltar que há uma necessidade de serem trabalhadas políticas que tenham em vista das especificidades de cada local e não somente seguindo diretrizes centrais, como no caso que são feitas em Brasília. Talvez uma medida de aproximação entre o patrimônio cultural e a sociedade, tendo a sensibilidade de percepção não mais defensiva, mas de perceber todo o ambiente complexo em que estamos inseridos e perceber que até mesmo as mudanças podem ser caracterizadas como o produto da sociedade que vivemos.
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BIBLIOTECA, LEITURA E INFORMAÇÃO NO CONTEXTO DAS POLÍTICAS
PÚBLICAS: UM OLHAR SOBRE O BRASIL DA ERA LULA/DILMA
Maria Mary Ferreira
RESUMO Discute-se as políticas de bibliotecas, leitura e informação implantadas no Brasil a partir do Estado Novo, quando foi criado o Instituto Nacional do Livro - INL, responsável pelas políticas direcionadas a estes campos, o que significa, no início do Século XX, um avanço considerável no sentido de estimular a formação de leitores e o acesso à informação e ao conhecimento no Brasil. Observa-se, entretanto, que em um País onde a falta de informação, pobreza e analfabetismo atingem proporções agudas, o acesso à informação através de serviços adequados de bibliotecas públicas se constitui uma necessidade urgente, porém as contradições da implementação do INL e os entraves que perpassam a construção do Estado Nacional, interferem na consolidação desta política, principalmente no período em que se instaura a ditadura no Brasil e em seguida, com a implantação do modelo neoliberal nos governos Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso, quando o Estado brasileiro reduz sua função social. A reconstrução do Estado nacional e a implantação de uma política voltada para as bibliotecas públicas, leitura e informação somente é reconstruída nos governos de Lula e Dilma, com ações articuladas no Programa Mais Cultura e no Programa Livro Aberto, implantados a partir de 2002. Há, no entanto, lacunas a serem corrigidas para a efetivação desses programas. PALAVRAS–CHAVE: Estado Democrático. Bibliotecas Públicas. Leitura. Informação. Brasil - Democratização da Informação. ABSTRACT It discusses the libraries policies, reading and information implemented in Brazil since the Estado Novo, when the National Book Institute (INL) was created, a policy directed to these fields, what means in beginning of XX century, which constitutes a considerable advance in order to stimulate the formation of readers and access to information and knowledge in Brazil. It is noted, however, that in a country where lack of information, poverty and illiteracy affect acute proportions, access to information by providing suitable public libraries constitutes an urgent need, but the contradictions of the implementation of INL and the barriers that underlie the construction of the national state whose size is democratic, interfere the consolidation of this policy, especially in the period when it is established a dictatorship in Brazil and then, with of the neoliberal model implementation in Collor de Mello and Fernando Henrique Cardoso governments, when the Brazilian state reduces its social function. The reconstruction of the state and the implementation of a policy aimed at the public libraries, reading and information is only reconstructed under Lula and Dilma presidentships, with actions articulated in More Culture Program and Program Open Book, deployed since 2002. There are, however, lacks to be corrected for the efectiveness of these programs. KEYWORDS: Democratic state; Public Libraries, Reading; Information; Brazil - Democratization of Information. 1 INTRODUÇÃO
Ao pensar políticas públicas no campo das bibliotecas públicas, leitura e
informação no atual contexto, subentende-se pensar o Brasil em toda sua diversidade e
contradições, subentende-se também pensar o processo de construção da democracia e
da cidadania dos brasileiros, que emerge a partir de vários fatores, entre os quais o
acesso à informação vista como bem social que dá à população a capacidade de se
constituir como sujeito, à medida que o acesso é facilitado e garantido pelo Estado.
A necessidade de mudanças com que o País vem se defrontando, desde os
movimentos revolucionários que buscavam na república a saída do coloniaismo, se
insere na luta pela liberdade de expressão e na luta por educação e cultura. Naquele
momento histórico, a necessidade de informação se fez presente pelas iniciativas de
setores da sociedade que viam na constituição das bibliotecas públicas uma forma de
criar canais de acesso à informação e ao conhecimento à população. Esses primeiros
movimentos é são considerados como mecanismos criados para socializar o livro em
um tempo em que biblioteca e livro ainda eram privilégio de poucos.
O acesso à informação ao longo da constituição do Estado brasileiro vem sendo
garantido pelas bibliotecas públicas e pelas bibliotecas de instituições públicas. É um
direito conquistado nas diversas constituições, é consolidado, porém, somente no artigo
5º na Constituição de 1988, quando o País avançou na construção dos direitos sociais
exigidos pelo povo Brasileiro após longo período ditatorial. Nos últimos vinte anos,
houve avanços significativos, principalmente no governo de Lula/Dilma, quando as
bibliotecas públicas e os programas de leitura adquiriram maior expressão e recursos
públicos para efetivá-los.
A proposta deste artigo é refletir sobre a constituição das bibliotecas públicas
brasileiras, tendo como recorte o Estado Novo, quando elas saíram da segregação dos
conventos e mosteiros para espaços mais abertos, com a criação das bibliotecas
municipais. As bibliotecas municipais se constituíram, naquele momento histórico, um
canal importante para democratizar o livro, a leitura e a informação, embora ainda
pouco acessíveis, dado o índice de analfabetismo elevado (em torno de 80%) que
vigorava no País. Nos dias atuais, tal realidade ainda é um fator de interdição a grande
parte de brasileiros, uma vez que o analfabetismo supera os 20% em estados como
Maranhão, Piauí e Alagoas.
Neste texto, abordamos como as bibliotecas municipais concebidas no Estado
Novo contribuem para a formação de leitores e se inserem no processo de
redemocratização, que inicia nos finais dos anos setenta do Século XX. Refletimos
sobre o processo de democratização do Brasil e as ações pensadas e implementadas no
governo de Fernando Collor de Melo e Fernando Henrique Cardoso para as bibliotecas
municipais. Finalmente, apresentamos uma análise sobre o governo de Luiz Inácio Lula
da Silva/Dilma Roussef e sua política voltada para a democratização do acesso ao livro
e à informação, com a implantação do Programa Livro Aberto.
2 REFERENCIAL TEÓRICO:
Neste item apresentamos reflexões acerca das bibliotecas municipais no Brasil
e sua emergência a partir de iniciativas do governo de Getúlio Vargas, refletimos sobre
as políticas públicas como estratégias para garantir a democratização da informação
tendo as bibliotecas como canais importância para viabilizar e garantir o acesso da
população ao livro e a leitura.
2.1 As Bibliotecas Públicas Municipais: apontamentos para compreender sua emergência no Brasil Até o ano de 1937, o Estado permanecia desatento às questões sobre bibliotecas
públicas. Nesse ano, foi criado pelo Ministério da Educação e Cultura, através do
decreto-lei nº 93, de 21 de dezembro de 1937, o Instituto Nacional do Livro – INL, com
a missão de incentivar a organização e auxiliar a manutenção de bibliotecas públicas
em todo o território nacional. É importante ressaltar que somente quando Getúlio
assumiu o governo, em 1930, no século XX, é que o Estado passou a assumir as
responsabilidades sobre os direitos sociais. Na visão de Emir Sader, é no Estado Novo
que o estado brasileiro é elevado à categoria de nação, quando Getúlio rompe com a
visão elitista até então em vigor, e implanta um modelo de desenvolvimento do Estado
nacional articulado com “um projeto de expansão econômica e de extensão dos direitos
sociais” (SADER, 2011, p.12).
Para Sader (2010), o governo de Getúlio Vargas é visto como o primeiro
governo brasileiro realmente republicano ao pensar um Estado com caráter nacional, ao
dar voz aos trabalhadores e ao fortalecer uma interlocução com os sindicatos de
trabalhadores de diversas categorias e inaugurar um conjunto de obras que, em grande
parte, recuperava a cidadania do povo brasileiro.
Neste período, várias ações culturais foram desenvolvidas pelo Estado Novo no
campo da cultura, em diferentes espaços: no rádio, no cinema, no livro, no teatro, nas
escolas, e em muitas outras formas de manifestações culturais, todas sempre imbuídas
de consolidar a ótica do Estado Novo, na qual este é o único interlocutor legítimo para
falar com e para a sociedade. Para Araújo (2002), porém, nesse período o Brasil
vivenciou um profundo autoritarismo estatal, no qual o Estado funcionava como
regulador de várias intervenções junto à sociedade, inclusive de ações culturais. “O
INL, bem como outras instituições culturais criadas nesse período, refletem a
necessidade de legitimação social do regime político autoritário instaurado” (ARAÚJO,
2002, p.20). Embora as críticas de Eliane Araújo sejam pertinentes, não se pode
desconsiderar que a criação do Instituto Nacional do Livro, contribuiu em grande parte
para a implantação de uma política de bibliotecas – até então inexistente – em todo o
País.
A partir de então, as bibliotecas públicas municipais passaram a fazer parte do
cenário cultural brasileiro, situadas, porém, nos estados mais prósperos, o que não
significou que nessa época não houvesse reclamações sobre a ausência de verbas para a
manutenção destes órgãos nos estados onde foram implantadas. Os estudos de Gomes
(1983) apontam que a inexistência de verbas regulares impedia a manutenção de
acervos atualizados e que a aquisição de livros acontecia através de verbas obtidas por
meio da cobrança de uma taxa junto aos usuários, ou ocorria por meio de campanhas de
doação de livros usados para compor o acervo das bibliotecas. As bibliotecas públicas,
naquele período, eram administradas sempre por professores, poetas, intelectuais ou
funcionários públicos. Muitas sobreviviam pelo esforço isolado de algumas pessoas,
fato que ainda é observado nos dias de hoje. As bibliotecas do Estado Novo tinham a
finalidade de auxiliar a educação formal, promover o lazer e o “progresso moral” do
povo brasileiro.
O fato de existirem não significou pleno acesso às bibliotecas municipais a
grande parte da população brasileira, basta observar aspectos com relação às normas e
horários de funcionamento, por exemplo. Era norma comum naquele período que a
biblioteca não realizasse empréstimo domiciliar e que também não permitisse o livre
acesso do usuário ao livro nas estantes. Esse modelo de biblioteca foi sendo
gradativamente superado, porém, em 19831, ainda encontramos bibliotecas públicas
municipais com avisos proibindo a “entrada de pessoas trajando bermudas e sandálias
japonesas”. Os horários de funcionamento das bibliotecas eram restritos, o que indica
1 Em 1983, fui convidada pelo prefeito da Cidade de Arari/MA, para organizar a Biblioteca Municipal daquela Cidade e, entre as muitas interdições encontradas, um aviso chamava a atenção na entrada da biblioteca: “proibida a entrada de pessoas trajando bermudas e sandálias japonesas”. O surpreendente da placa é o fato de que aquela era uma Cidade composta por pessoas consideradas pobres, onde aquele vestuário e calçado era o mais comum, usado por mais de 90% da população daquele município.
que a frequência às bibliotecas era mínima. Vale lembrar que este quadro é agigantado
pelo fato de 80% da sociedade brasileira na década de trinta serem analfabetos, o que
obstaculizou a popularização das bibliotecas públicas.
A ação do Instituto Nacional do Livro para a criação de bibliotecas públicas no
País foi estimulada através de duas medidas: a) a firmação de convênio com as
prefeituras para a criação e manutenção de bibliotecas públicas, com definição das
obrigações do INL e, em consequência, também as dos municípios. Essa medida foi
importante porque municipalizou os serviços da biblioteca pública, levando-a aos
lugares mais longínquos deste país de proporções geográficas tão extensas; b) adoção de
um sistema de co-edição de livros – o Instituto, conjuntamente com os autores,
publicava os livros, comprava-os por preços mais baixos e os enviava às bibliotecas
públicas. Essa medida foi tomada devido aos altos preços dos livros, fator que
justificava – e por que não dizer que ainda justifica? – a compra de livros para a criação
e manutenção do acervo das bibliotecas públicas. Além disso, essa medida contribuiu
em grande parte para difundir novos autores entre os brasileiros.
Outro fator importante foi a criação da Lei 5.692/71, que reformulou o ensino
fundamental e o ensino médio, à época conhecidos como 1º e 2º graus, respectivamente,
tornando obrigatória a pesquisa no processo de ensino aprendizagem, por parte dos
alunos. Como não havia possibilidade de se manter bibliotecas em todas as escolas, as
bibliotecas públicas passaram a ser vistas pelos gestores com maior importância, pois
começaram a servir aos estudantes e à população em geral. Inicia-se assim, o processo
de escolarização da biblioteca pública, que passou a dar prioridade para o atendimento
estudantil em detrimento de outros segmentos da comunidade que também
necessitavam dos serviços bibliotecários (SUAIDEN, 2000).
Ao longo das décadas, observamos que o País alterou seus modos de vida, a
população superou em grande parte o analfabetismo e a pobreza e, ao longo das
décadas, o número de pessoas com curso superior alterou substancialmente a condição
de existência dos brasileiros. Nesse ínterim, foi criada uma consciência crítica de valor e
direitos com a emergência de conceitos como estado de direito, democracia, igualdade,
política e políticas públicas. É a partir destes conceitos que podemos compreender a
dimensão social e política das bibliotecas municipais, da leitura e da informação na
constituição de um estado-nação.
2.1 Políticas de Estado e Políticas Públicas
Política é a ciência da governação de um Estado ou Nação e também uma arte de
negociação para compatibilizar interesses coletivos. Weber a concebeu como “o
conjunto de esforços feitos com vistas a participar do poder ou a influenciar a divisão do
poder, seja entre Estados, seja no interior de um único Estado” (WEBER, 1998, p. 55).
O sentido da expressão política efetiva-se na ação, em especial, de bons parlamentares e
governantes, que estão imbuídos de bons propósitos e sabem das suas responsabilidades
em criar leis que servem para transformar a sociedade, garantindo igualdade de direitos
e vida digna para todos.
No que se refere ao conceito de políticas públicas, este emerge no contexto dos
estados capitalistas, colocando em debate o fosso existente entre ricos e pobres,
buscando formas de construir canais que promovam a igualdade. Neste debate,
evidencia-se o acirramento das relações entre os que detêm os meios de produção e
aqueles que dominam o estado e os que movem a máquina e produzem o capital, ou
seja, os trabalhadores, que vendem sua força de trabalho em troca de salários para que
os ricos continuem mais ricos e poderosos. Durante muito tempo, esta lógica foi
reforçada pelo Estado que, em grande medida, difundiu ideologicamente a ideia de
direito universal, em que teoricamente todos se constituem como iguais e detentores de
direitos, materializado pelo sentimento de soberania e de cidadania. A partir dessa visão
aparente e desses dispositivos é que “os antagonismos internos são neutralizados e o
Estado se apresenta como incumbido da realização do interesse geral e, por isto, objeto
maior da lealdade dos cidadãos. É nesse sentido que se afirma que a ideologia nacional
é estruturalmente burguesa.” (ALMEIDA JÚNIOR, 2005, p.284).
O que temos observado na prática é que os interesses gerais não se realizam.
Vários estudos reforçam essa assertiva. Em estudo recente, menciono as dificuldades
enfrentadas pelos movimentos feministas nos anos oitenta e noventa para implementar
políticas públicas nas áreas de saúde e segurança no Maranhão. Tais dificuldades se
deram em virtude de inúmeros fatores, entre eles as relações entre estado e sociedade
“marcadas pelo autoritarismo, pela postura de tratar a coisa pública como patrimônio
privado, legitimado pelo clientelismo que se reflete nas relações de “amizade” e que
fazem dele um Estado oligárquico e, portanto, atrasado” (FERREIRA, 2007, p. 181).
A relação entre democracia no Brasil e o papel do Estado, até finais do século
XX, foi conflituosa ao manter um persistente desencontro das políticas públicas e as
necessidades da população, tendo como consequência a agudização do analfabetismo,
da violência urbana, doméstica, da exclusão social e da pobreza. A herança política
compreendendo o período que vai dos anos 30 do Século XX aos dias atuais demonstra
que o Brasil passou por uma grande transformação, como enfatiza Bacelar (2003, p.1):
Nos anos 20, era um país rural e agrícola. O censo de 1920 revelava que 30% da população brasileira viviam nas cidades e 70%, no campo. Cinquenta anos depois, ocorria o inverso – 70% nas cidades e 30% no campo. Até 1930, a economia do Brasil era uma economia agrícola. Em 1980, o Brasil era o oitavo PIB industrial do mundo. Depois dos sete grandes, o oitavo era o Brasil. Isto nos dá uma ideia da mudança de perfil na sociedade e na economia em meio século. O que alguns países levaram séculos para fazer, o Brasil fez em cinquenta, sessenta anos. Transformou-se numa potência industrial média, com a maior parcela da sua gente morando nas cidades. Este é o perfil atual do Brasil.
Esta riqueza adquirida nos últimos oitenta anos não tem sido dividida
proporcionalmente entre os brasileiros, haja vista as distâncias sociais que permanecem,
e até naturalizam, conforme indicadores sociais, entre os quais a renda per capita, o IDH
e os índices de escolaridade, nos quais os Estados do Norte e Nordeste despontam com
os menores índices. Assim, vale ressaltar que a construção de um estado
verdadeiramente democrático se viabiliza através de políticos/gestores que tenham
clareza das desigualdades e sejam comprometidos em transformá-las, que partilhem as
riquezas e o poder de forma a construir uma sociedade de iguais. Para tanto, é também
necessário que a sociedade se mobilize, exija e articule a elaboração e implementação
de políticas públicas que visem atender as suas reais necessidades voltadas para os mais
variados aspectos da vida social. Essas políticas devem atender demandas de saúde,
educação, trabalho e renda, segurança pública, cultura, leitura e informação.
Pensar políticas públicas de biblioteca, informação e leitura subentende a
possibilidade de intervenção do Estado nos problemas apontados pela sociedade como
estratégia de mudança, tendo as políticas de leitura e informação como parte de um
processo de transformação incorporado ao projeto de Estado. A ação do Estado via
políticas públicas se dá a partir de um processo que pode garantir à sociedade condições
de existência dignas, isso porque políticas públicas são mecanismos utilizados pelos
órgãos estatais para fazer chegar aos setores populares e à sociedade, como um todo, o
sentido da própria realidade, contribuindo para ampliar suas descobertas e garantindo as
condições de existência.
É importante enfatizar, ainda, que as políticas públicas não podem estar
dissociadas de seus interlocutores. Assim, uma política pública de cultura, de biblioteca
ou de leitura deve ser articulada pelos e entre os produtores culturais, como
bibliotecários, professores, escritores a sociedade como um todo e o Estado. Sua
efetivação se dá através de um conjunto de ações desenvolvidas pelos órgãos públicos
responsáveis pela sua implementação a partir da pressão da sociedade.
A necessidade de aprofundar a discussão sobre o real sentido de política pública
que emerge da ação/necessidade de intervenção/mudança na sociedade, insere-se na
gestão pública como um projeto de ação e se transforma em bem social e coletivo. Uma
política pública não se reduz a uma política de governo que muda a cada
gestão/mandato, sendo, portanto, descontínua. Uma política pública deve ser vista como
uma política de estado, que se insere dentro de um plano de metas e se efetiva com
recursos regularmente liberados, para mantê-las em pleno funcionamento.
Ao refletir sobre os processos de mudanças e os mecanismos para construir uma
sociedade de iguais, não basta a criação de estruturas: hospitais, escolas, bibliotecas,
telecentros. É necessário criar, além de políticas e programas de formação continuada
envolvendo a comunidade como um todo, meios de socialização da informação e do
conhecimento, como canais que irão municiá-la para uma melhor compreensão dos
fatos, capacitando-se, desse modo, a tomar decisões, refletidas a partir da apropriação de
conhecimentos. É necessário, ainda, dotar esses espaços de pessoal qualificado para
desenvolver o trabalho direcionado a cumprir a finalidade de um projeto de sociedade
democrática.
3 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
A intencionalidade deste estudo vai ao encontro das demandas da classe
bibliotecária preocupada em apontar saídas para os dilemas sociais, e em busca de
medidas que possam pensar o papel das bibliotecas na construção de uma sociedade
democrática tendo a leitura e a informação como canais necessários para efetivá-la.
Sabe-se que a definição do percurso metodológico é um dos pontos definidores
do bom andamento da pesquisa e de uma produção científica. Wrigts Mills (1982,
p.135) enfatiza que muitos pesquisadores “começam atacando o problema do método de
forma acertada. Mas depois de estudarem metodologia, eles se tornam conscientes das
numerosas armadilhas e outros perigos que os esperam”. Daí que este artigo foi
construído fundamentalmente através de pesquisa bibliográfica e reflexões construídas a
partir dos resultados da pesquisa de informação e políticas públicas: as bibliotecas como
espaço de construção de sujeitos cujo objetivo foi pensar a relação entre conhecimento,
espaços de informação e desenvolvimento social dos municípios2. Para tanto, buscamos,
em um primeiro momento, compreender e aprofundar conhecimentos sobre o papel das
bibliotecas, sua dimensão social e sua relação com as políticas de informação no Estado
do Maranhão.
Entende-se que um trabalho de pesquisa envolve vários componentes internos e
externos para consecução de seus objetivos, onde a inquietação, a subjetividade, o
domínio prévio do conhecimento, a utilização de métodos e a vontade de esclarecer
dúvidas somam-se à tentativa de elucidação da realidade empírica que se apresenta.
Portanto, nossas reflexões são, em grande parte, construídas pelas inquietações de
pensar o Estado e as políticas públicas voltadas para as bibliotecas, a leitura e a
informação, ampliando nosso olhar para o contexto do Estado brasileiro, tendo as suas
ações como canal de transformação da realidade social.
Trata-se de um estudo qualitativo fundamentado em autores no campo da
política, da sociologia e da biblioteconomia. Buscamos, neste estudo, construir uma
perspectiva dialética de pensar as bibliotecas como instituições que passam por
processos de mudanças, de continuidade e descontinuidades imbricadas com as
mudanças dos governos republicanos, autoritários, liberais, neoliberais e social-
democratas, que refletem na forma como as políticas foram implementadas no Brasil
nos últimos cinquenta anos.
Assim, na construção do percurso metodológico, consideramos pertinente
analisar como cada governo investiu na construção de um modelo de política que
possibilitou efetivar as políticas de biblioteca, leitura e informação no Brasil.
4 BIBLIOTECAS, LEITURA E INFORMAÇÃO: ações do Estado para democratizá-las 1990-2002
A partir da eleição de Collor de Melo, em 1989, o Brasil adere a uma política
privatista, em um governo marcado por escândalos de corrupção e desvio das funções
republicanas do Estado. Tais medidas têm como consequência seu impeachment. Em
seu governo, foram extintos diversos órgãos públicos, entre os quais o Instituto
Nacional do Livro, passando sua atividade para a Fundação Biblioteca Nacional para o
recém-criado Departamento Nacional do Livro.
2 Esta pesquisa foi realizada no Maranhão envolvendo 165 municípios, financiada com recursos do CNPq e FAPEMA no período de 2008‐2011
É importante lembrar que, durante o processo de redemocratização do País e
antes de sua extinção, o INL passou por várias mudanças, transformando-se
gradativamente para se adequar ao novo modelo de Estado exigido no processo de
redemocratização. Neste período, as políticas do INL somaram contribuições
expressivas de bibliotecários que atuavam na gestão das bibliotecas públicas estaduais e
municipais em diversos estados brasileiros através de fóruns estaduais, regionais e
nacionais, proporcionando alguns avanços, entre os quais a política de aquisição de
livros para constituir os acervos das bibliotecas que, a partir de então, passaram a ser
comprados através da indicação e consultas aos bibliotecários em diferentes regiões do
Brasil. Ao lado das políticas de bibliotecas foram sendo delineadas as políticas de livro,
que contribuíram em grande parte para a frutificação deste veículo de comunicação em
todo o Brasil.
Neste período, observamos que as políticas de bibliotecas e de leitura passam a
ser incorporadas na agenda governamental, proporcionando o crescimento dos acervos e
o aumento da produção de livros, livrarias e editoras, ao mesmo tempo em que se
presenciava o apoio dado ao desenvolvimento da Biblioteconomia no País, estimulando
a criação de novos cursos em diferentes estados da federação.
Após o fim do INL, é quase inexistente o número de intervenções do Estado nas
questões sobre políticas de bibliotecas públicas e de leitura no governo Fernando Collor,
marcado por muitas irregularidades, por descontinuidades no campo da cultura,
educação, saúde e por denúncias de corrupção. A transformação do Instituto em
Departamento Nacional do Livro, subordinado à Biblioteca Nacional, contribui para o
quase desaparecimento da política de livro e de bibliotecas no Brasil, tendo como
consequência o fechamento de grande parte das bibliotecas municipais.
No governo de Fernando Henrique Cardoso (1994-2001), algumas mudanças
foram efetivadas com a criação do programa de bibliotecas municipais: “Uma biblioteca
em cada município”, porém sem grandes repercussões, uma vez que o cunho neoliberal
implantado pelo governo dificultou a efetivação das políticas gestadas no Departamento
Nacional do Livro, que, subordinada à Biblioteca Nacional, sofreu impedimento para a
sua expansão. Vale ressaltar que foi positiva, neste governo, a criação do PROLER –
Programa Nacional de Leitura, em 1992, subordinado à Biblioteca Nacional, cujo
objetivo foi instaurar uma política para a leitura em todo o território nacional. O
programa foi reformulado em 1996 por meio de uma Comissão Nacional na qual se
integram vários parceiros, entre os quais o MEC. A implantação deste programa
possibilitou a inserção da leitura nas escolas e na prática de professores da rede pública
com uma programação que envolveu diversos escritores, tornando a literatura infantil
um instrumento de práticas pedagógicas que muito contribuiu para a formação de novos
leitores em todo o País.
4.1 O GOVERNO DE LULA/DILMA E SEU PROJETO DE CULTURA: como estão sendo implementadas as políticas para a biblioteca, a leitura e a informação - 2002-2012
O Governo Lula (PT) iniciou timidamente sua política voltada para o livro, a
biblioteca e a leitura, com ações muito pontuais, culminando com a reabertura das
bibliotecas municipais fechadas e um plano mais audacioso para o livro e a leitura.
Somente a partir de 2005, no segundo mandato, com a retomada do crescimento do País
e uma equipe mais integrada e articulada no Ministério da Cultura, muitas ações foram
tomadas no sentido de criar uma política para o livro e para as bibliotecas em
localidades onde ainda não existiam e melhorar e ampliar as existentes. As políticas do
governo Lula para a Cultura foram sendo delineadas a partir de um diagnóstico sobre os
equipamentos de cultura, o qual mostrou uma realidade bastante preocupante, como já
foi mencionado. Os resultados refletiram na proposta do Programa Mais Cultura.
A partir desses dados foi construída a nova política de cultura, denominada
Programa Mais Cultura, fundamentada em diretrizes e linhas de ação conforme tabela
abaixo:
Fonte: Brasil. Programa Mais Cultura, 2007
Observamos que a questão da biblioteca e da leitura está presente de forma
ampla na linha de ação denominada Cultura e Cidadania na qual se agrega um conjunto
de Programas que visam desconstruir e alterar os indicadores apontados na área de
leitura, biblioteca e cultura de modo geral, com a finalidade de construir uma sociedade
leitora e cidadã. Observe abaixo os programas vinculados:
Fonte: Brasil. Programa Mais Cultura, 2007
Em cada um desses programas é agregado um conjunto de ações que visam fazer
chegar às camadas populares o livro, a música, o teatro e a informação de forma a fazer
da cultura um bem social de fato e de direito.
Além do Programa Mais Cultura, foram implementados o Programa Livro
Aberto em 2002 e, a partir de 2006, o Plano Nacional do Livro e Leitura (PNLL). Esses
programas agregam um conjunto de projetos, programas, ações, atividades e eventos na
área do livro, da literatura e das bibliotecas articulados nas três esferas: federal, estadual
e municipal.
No que se refere ao Programa “Livro Aberto”, este foi criado no contexto da
Política Nacional de Cultura implementado no governo de Luiz Inácio Lula da Silva
com a finalidade de:
[...] implantar uma política de livro e leitura e dar uma nova dimensão às bibliotecas públicas municipais. Em sua filosofia, o Programa Livro Aberto se propõe, entre outros objetivos, a: estimular o hábito da leitura, a partir de um conjunto de ações que visam facilitar o acesso às bibliotecas públicas e propiciar a difusão do conhecimento científico, acadêmico e literário. (FERREIRA, 2010, p.707).
O programa compõe linhas de atuação que redimensionam as políticas públicas
neste campo, entre as quais destacamos: Fomento a Projetos Culturais na Área do Livro
e da Leitura; Fomento à Produção de Obras Literárias, Científicas e Acadêmicas;
Capacitação de Agentes Multiplicadores do Hábito da Leitura; Promoção de Encontros
de Leitura; Assessoria Técnica a Bibliotecas Públicas; Promoção e Intercâmbio de
Eventos Culturais na Área do Livro e da Leitura; Concessão de Prêmios à Arte Literária;
Estudos e Pesquisas nas Áreas de Memória Bibliográfica, Editorial e Literária;
Modernização de Bibliotecas Públicas; Concessão de Bolsa para Escritores Brasileiros.
(BRASIL, 2007). Trata-se, portanto, de um programa audacioso que atende, em grande
parte, às aspirações da sociedade brasileira.
A intensidade dessas ações demonstra que, nos últimos dez anos, o Estado
brasileiro tem efetivado políticas de estado com a perspectiva de criar uma sociedade
leitora e cidadã. Contudo, essas políticas ainda não são perceptíveis, principalmente em
grande parte dos estados nordestinos e em quase toda a Região Norte do País. É certo
que, neste governo, foi implantada uma ousada política de cultura, que tem contribuído
para ampliar os números de espaços de cultura e de leitura através de bibliotecas
públicas, escolares e pontos de cultura, o que começa a produzir efeitos na formação de
leitores. O exemplo dessa assertiva são os indicadores que apontam que o brasileiro
começa a ler mais. Entretanto, muito há de ser feito para consolidar o pacto federativo
entre todos os estados brasileiros, tendo em vista as lacunas que se apresentam quando
se analisam as bibliotecas públicas no Norte e Nordeste, cujas descontinuidades são
visíveis. O exemplo ilustrativo pode ser observado no estado do Maranhão, que não
acompanha os avanços nacionais e onde as políticas de bibliotecas são, em geral,
descontínuas.
Na contemporaneidade, em meio ao crescente desenvolvimento de uma
sociedade onde a força motriz é a informação, a leitura não deve mais ser vista como
um bem ao qual apenas os eruditos, intelectuais ou literatos têm acesso. A leitura é um
bem social e deve cumprir o seu papel social de esclarecer, iluminar e igualar todos os
cidadãos e cidadãs. Para tanto, o Estado precisa criar as condições favoráveis a esta
formação cidadã.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pensar políticas públicas voltadas para as bibliotecas, leitura e informação
subentende pensar o estado de direito e sua capacidade de intervir nesta área a partir da
articulação de diversos setores: escola, universidade, bibliotecas, uniões de moradores,
igrejas, partidos políticos, que vejam na biblioteca o espaço de democratização do saber
e na leitura e informação instrumentos de construção de novos sujeitos sociais capazes
de pensar a sociedade, e, através deste pensar, contribuir para que esta sociedade seja
melhor e busque respostas coletivas para problemas cotidianos.
Uma sociedade leitora tem maior discernimento para intervir nos processos de
mudança, tem capacidade de refletir sobre fatos e fenômenos e contribui para preservar
e difundir o conhecimento produzido pela humanidade, aprimorando a visão cultural e
estimulando a leitura dos indivíduos em diferentes contextos.
A efetivação de uma política pública voltada para a biblioteca e a difusão da
leitura e informação não se realiza apenas através da boa vontade de um grupo e/ou
segmento social, a exemplo dos bibliotecários e professores. Uma política pública se
realiza através da ação do Estado e de políticos comprometidos com mudanças. Os fins
da política, como bem enfatiza Norberto Bobbio, é transformar a vida social. Cabe ao
Estado, portanto, criar estruturas orgânicas com políticas e programas que tenham
começo, meio e fim, com orçamentos adequados, com pessoal qualificado para articular
o projeto com a sociedade e com avaliação constante, para que seja readequado sempre
que necessário.
Em um estado democrático, “os grupos e não os indivíduos são os protagonistas
da vida política”, enfatiza Bobbio (2002, p.35). Dessa maneira, pensar políticas e
programas de biblioteca, de leitura e informação a partir das indicações da sociedade
representa uma forma de garantia do Estado de Direito, que tem como princípio a
igualdade.
Uma boa política não se viabiliza na burocracia dos ministérios, das secretarias
de estado ou dos municípios, mas sim através de um amplo movimento social capaz de
direcionar os rumos que deseja para que a população se sinta parte desta política e veja
o programa como consequência do trabalho coletivo do qual fez parte.
Uma política pública de biblioteca, de leitura e informação se constrói com a
criação de estruturas orgânicas que garantam o acesso ao livro, à leitura e à informação
em diferentes suportes para que ela, de fato, se federalize e universalize. Estes espaços
de cultura devem estar fundamentados no ideal de democratização e socialização do
saber.
No atual contexto, observa-se que o Estado brasileiro vem criando estratégias de
políticas de biblioteca, de leitura e informação visando transformar a sociedade
brasileira em uma sociedade crítica e cidadã. Porém, é necessário ampliar os
investimentos neste campo com envolvimento maior da sociedade, com ampliação de
recursos financeiros, contratação de pessoal qualificado para construir e consolidar
pactos que visem tornar a leitura, a informação e o conhecimento acessíveis para todos.
É necessário, ainda, ampliar o número de bibliotecas públicas e escolares, apoiar as
bibliotecas comunitárias em bairros, igrejas, sindicatos, feiras, quitandas, debaixo da
ponte. Somente assim é possível vislumbrar mudanças e alterar os indicadores no
campo da leitura.
Esses indicadores serão alterados quando as bibliotecas e a leitura
acompanharem o cotidiano das comunidades elevando seus níveis de conhecimento, o
que, por sua vez, pode lhes assegurar tomadas de decisões livres e conscientes,
permitindo que as comunidades e os sujeitos compreendam melhor a realidade que os
cerca e como podem reagir a ela, buscando transformar os contextos e a realidade em
que estão inseridos. Somente assim é possível vislumbrar uma sociedade democrática.
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1
POLÍTICAS PÚBLICAS DE INFORMAÇÃO E A INDÚSTRIA CRIATIVA E CULTURAL
COMO ESPAÇO COGNITIVO DE SOBERANIA SIMBÓLICA: PERSPECTIVA DA CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO NO CASO DOS GUERREIROS DE MACEIÓ
Cristian Berrío Zapata
Mona Cleide Quirino da Silva de Farias Ângela Grossi de Carvalho
Ricardo Cesar Gonçalves Sant'ana RESUMO A cultura popular é um espaço simbólico e cognitivo de soberania que deve ser defendido. Neste artigo se discutem as políticas do setor, a globalização e o efeito do modelo de centro-periferia para a indústria cultural local, a partir de aportes da Ciência da Informação sobre o comportamento Informacional. O setor, como construtor da identidade, esta em retrocesso, e precisa de políticas que mudem a percepção do público e o aparelho burocrático sobre ele. Mostra-se o caso dos Guerreiros de Maceió e sua luta na preservação do seu legado cultural, de costas ao universo digital. Na era da informação, o desenvolvimento da indústria criativa e cultural de América Latina esta afetada por olhares reducionistas a respeito do comportamento informacional e a tecnologia. A indústria criativa e cultural local deve assumir questões relativas ao patrimônio cultural, redução da pobreza e infraestrutura básica, para se tornar sustentável. Para balancear o poder das indústrias dominantes, faz-se necessário formular políticas com base na compreensão do comportamento informacional humano e agir sobre esse conhecimento. Os governos como protetores da soberania têm que entender que a criação e defesa de uma indústria cultural local tem por base a defesa da soberania simbólica; uma atividade que tem que se profissionalizar e ganhar condições de sustentabilidade econômica isenta de paternalismo. O aporte deste artigo é mostrar o caso dos Guerreiros de Maceió e sua presencia na web, e disponibilizar elementos de analise interdisciplinar sobre informação e políticas de informação aplicáveis, como alicerce para sustentar uma mudança de olhar sobre a defesa do espaço semiótico cultural. PALAVRAS CHAVE: Industrial Criativa e Cultural. Políticas Públicas. Comportamento Informacional. Ciência da Informação. Cultura Digital. ABSTRACT Popular culture is a cognitive and symbolic space of sovereignty that must be defended. In this paper we discuss policies for this area, globalization and the effect of the center-periphery model for the local cultural industry, from the contributions of Information Science on information behavior. The industry, as a builder of identity, is in dying and policies need to change the perception about this. We show the case of Maceió Warriors and their struggle to preserve their cultural legacy, backwards to the digital universe. In the information age, the cultural and creative industry development in Latin America is affected by reductionist visions about information behavior and technology. The local cultural and creative industry must face cultural asset issues, poverty reduction and basic infrastructure availability to become sustainable. To balance the power of the dominant industries, it is necessary to formulate policies that understand human information behavior, and act according to this knowledge. Governments, as protectors of sovereignty, must understand that the creation and defense of a local cultural industry the base of the defense of a symbolic sovereignty; an activity that has to turn professional and earn economic sustainability free of any paternalism. The contribution of this paper is to show case the Warriors Maceio and its presence in the web, providing an interdisciplinary analysis of the elements of information and information policies implied, as a foundation to support a change to sight about the defense of the cultural semiotic space.
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KEYWORDS: Creative & cultural industry, public policy, information behavior, Information Science, digital culture.
1. Introdução
Na Era da Informação, o discurso sobre o acesso dos cidadãos às informações
relevantes, tornou-se fala comum, mas vazia. Embora seja inegável o impacto das redes de
computadores, na avaliação da contribuição destas tecnologias à preservação do patrimônio
cultural os resultados não são claros. Desde o início do século, os países latino-americanos
adotaram múltiplas políticas para o desenvolvimento das infraestruturas e a regulação do
acesso, intercâmbio, processamento e armazenamento da informação. Mas os avanços na
criação de uma estrutura informacional que alabarde a indústria criativa local, têm sido
obstruídos por visões reducionistas do comportamento informacional, políticas inexistentes ou
pouco razoáveis, e usuários de baixa competência informacional e informática.
Desconhecem-se os progressos que a Ciência da Informação tem feito em termos da
compreensão do comportamento informacional e a articulação desses elementos com o
contexto geográfico e histórico.
Este artigo descreve alguns desses avanços, revisa a discussão sobre políticas de
desenvolvimento da indústria criativa aplicada na América Latina, e mostra o caso dos
Guerreiros de Maceió, representantes da cultura popular de Alagoas, ameaçados pela
extinção, lutando pela preservação de seu legado. O espaço cultural é definido como uma
matriz cognitiva compartilhada em que as isotópias, representações semióticas que conduzem
a ação humana e suas rotinas construindo formas de transferência de cultura e de dominação
(Blikstein 2003), transformam a idiossincrasia e valores que caracterizam um território, país,
região ou comunidade. Destaca-se a necessidade de ação de forma sistemática e sustentada,
baseada nos desenvolvimentos teóricos e a pesquisa empírica da Ciência da informação, para
enfrentar o desafio da formulação de políticas aplicadas à preservação do território cognitivo
cultural.
2. Cultura popular e a soberania simbólica dos países do sul
A sociedade de massa e a indústria do entretenimento, seguindo o modelo de produção
fordista, criou um paradoxo entre a cultura erudita, que se restringe a recintoss que a
3
legitimam, em coleções em quefica exposta, dissecada, reduzida a parcialidades, tendo
museólogos, bibliotecários e curadores como seus guardiões. Os governos criam políticas e
leis para a sua conservação baseados em seu valor comprovado e evidente. A outra é a cultura
popular ou vulgata, espalhada pela cotidianidade, sem forma definida, mas que as suas
múltiplas manifestações. É a cultura que atua os conflitos sociais e a sua simbologia, espelho
dos status socioeconômicos; produto de comunidades veladamente desprezadas por seu
envolvimento no negócio da criatividade (GANS, 2008). A cultura erudita recuperou sua
aura perdida (BENJAMIN, 1973) rodeando-se de um equipamento que a preserva e difunde,
afastada do sujeito comum e entronizada nos ícones do que é culto. Mas a cultura popular
dificilmente consegue validar seu status e importância e assim, evolve dentro de uma mescla
caótica de tradições vernáculas feridas de morte, às vezes banalizadas, assediadas pelos
produtos da Hollywood ou Silicon Valley, que contam com a vantagem do respaldo de um
império milionário construído sobre o desabafo dos obreiros industriais do primeiro mundo
(ADORNO & HORKHEIMER 2002).
A cultura popular fica subvalorada porque é viva, construída no dia a dia do cidadão
comum, no seu sistema de linguagens e simbologia cotidiana. Nunca fica claro quando ela
pula do domínio do ordinário para o nível do extraordinário. Este status incerto afeta e é
afetado pela dimensão informacional da cultura popular. Neste artigo se trata de contribuir à
compreensão destes aspectos informacionais, como premissa dos processos de recuperação,
salvaguarda, processamento e difusão da cultura popular como espaço cognitivo de soberania
simbólica. Soberania simbólica no senso do espaço cognitivo que nos representa, que encarna
uma sociedade e sua visão singular de mundo. Cria-se um processo contínuo de tradução e
construção de sentidos a partir da relação com as manifestações da cultura popular (FLEURY,
2009).
O sujeito informacional atual é um leitor intensivo de textos audiovisuais, imerso em
um mar de informação. Nesta avalanche de dados, composta em uma porcentagem
significativa pelos conteúdos das indústrias criativas de países dominantes, como pode
sobreviver o espaço semiótico local? Como pode a cultura local ser percebida e preservada de
forma sustentável? Se perceber é representar e representar é perceber (PEIRCE, 1995), nas
respostas a estes interrogantes definem a sobrevivência da soberania semiótica, a identidade
sócio cultural dos países do sul.
4
2.1 O sujeito informacional na busca perene do sentido, o lúdico e a emoção
Durante quarenta anos após fundada, a Ciência da informação evoluiu da sua
epistemologia inicial de tipo reducionista. Na década dos 1970, Dervin (Dervin 1976)
concluiu que o comportamento informacional não podia se considerar como "racional". A
informação precisa de um contexto, e os melhores canais para informar nem sempre são os
formais. A função da informação não se esgota no econômico ou científico; tampouco é
pragmática. O objetivo da informação é criar sentido, conceituar, construir conhecimento,
alimentar o lúdico próprio do intelecto desbordando fronteiras no alimentar a imaginação. A
informação é um verbo e não um substantivo; é diversidade e complexidade que só se pode
gerenciar com base na criação de sentido (DERVIN, 1998).
O humano é um informívoro (MILLER, 1983), um ser que rumina informação para a
construção diária de significado. Foge da dissonância cognitiva e a incerteza (FESTINGER,
1957; KRIKELAS, 1983) caçando dados a procura de criar sentido. A exatidão ou a
excelência técnica das fontes não é importante tanto quanto o sentido que provejam.
Paulatinamente, as fontes verbais foram menosprezadas frente às fontes escritas, “exatas”,
formais, estendidas por meios mecânicos e elétricos massivos no mundo grafocêntrico que
temos criado (SERRES, 2003). Mas assim como o poder destes meios globalizou a
consciência sensitiva do homem, também amputou partes dos seus sentidos e narcotizou a
humanidade (McLUHAN, 1969). O homem é um ser em procura permanente e desesperada
de sentido, e hoje, os meios audiovisuais, os filmes, a TV, a rádio, a Web, a indústria cultural
multinacional em geral, o apresam num projeto global e universal que desloca suas
representações vernáculas em favor do imaginário global que responde ao mercado e lucro.
Cada vez sabemos mais do mundo e menos do nosso lar.
Stephenson (1988) afirma que os cientistas sociais estiveram tão ocupados no
problema da comunicação de massas, que esqueceram de perguntar como seu uso podia
contribuir na compreensão existencial do ser. A resposta está na relação entre a comunicação,
informação e o lúdico. O conceito do Homo Ludens (HUIZINGA, 1949) mostra o lúdico
como centro da cultura, e não como o elemento periférico que o discurso capitalista vitoriano
condenava. O lúdico é voluntária, sem propósito ou interesse aparente, procura o prazer da
5
atividade em si mesma. Na comunicação, ela é um dos motores da construção da cultura. A
comunicação prove a dose diária de entretenimento para manter a audiência cativa, criar
tecido social, e fugir das incertezas e ansiedades próprias da construção do sentido existêncial.
O lúdico é um dos pilares do comportamento informacional e a construção de sentido.
O elemento lúdico leva a revalorizar o valor do afeto dentro dos processos
informacionais. Nahl (2007) desde uma perspectiva sócio biológica propõe um enfoque
construcionista, em queo sujeito permanentemente esta se adaptando ao contexto por meio do
aproveitamento dos fluxos de informação através de procedimentos cognitivos, sensoriais e
afetivos. O construcionismo ecológico é aplicado nos modelos de comportamento
informacional micro ou macro dentro da teoria da informação, seguindo o pensamento
construcionista de Tuominen e Savolainen (1997). Nele, o elemento tecnológico é definido
como expressão social (TUOMINEN; SAVOLAINEN et al., 2005). O emocional tem que ver
com os elementos conativos e motivacionais que peneiram a percepção, avaliação e uso da
informação. Seu interesse é cada vez mais destacado no desenvolvimento de arquiteturas
informacionais digitais (Nahl 1998; Kim 2008).
Outra dimensão da informação é sua economia energética. Nessa área Zipf é
conhecido por seu princípio da economia das palavras: um termo será menos utilizado na
medida em que seja mais comprido, difícil de pronunciar ou ler, como uma forma de
economia energética da língua dentro da ecologia humana. Este é o princípio do mínimo
esforço (ZIPF 1945; 1949). Este comportamento é fundamental dentro da ordem linguística e
simbólica: a troca informacional será limitada pelos custos energéticos ou econômicos que os
sujeitos tinham que encarar, na criação de mensagens e sua codificação e decodificação
(FERRER CANCHO; SOLÉ, 2003). A mesma lei se aplicara á utilização das arquiteturas
informacionais, por exemplo, os sistemas informáticos ou redes de dados (MOOERS, 1959).
Como última dimensão, temos o comportamento de enxame (MILLER, 2007;
GUTIÉRREZ; PARDO et al., 2008). A conduta coletiva exibida pelos sujeitos que se agregam
em um mesmo local, movendo em massa, migrando em alguma direção, como um corpo
organizado intuitivamente. Estes coletivos tentam otimizar um objetivo através da pesquisa
colaborativa, interagindo indiretamente através de rastros e sinais. Como farejadores de
dados, os sujeitos vão seguindo o cheiro da informação (CHI; PIROLLI et al., 2001) deixada
pelos geradores de dados, e coletando eles como “amoras no bosque” (BATES, 1989). O
comportamento e inteligência dos enxames parecem caóticos porque são coletivos e
6
emergentes, embora cada indivíduo siga intuitivamente e com rigor sua rotina programada. O
enxame informacional leva ao conceito jungueano de mente coletiva, um espaço cognoscitivo
que excede o individual e é um exercício social, fazendo da cultura e cognição indivisíveis
(KENNEDY; KENNEDY et al. 2001). A propriedade mais interessante dos enxames é sua
capacidade de auto-organização, e o fato de que uma quantidade de processos simples leva a
resultados complexos. O conceito tem amplas aplicações na internet que estão sendo
estudadas (GUTIÉRREZ; PARDO et al., 2007).
Finalmente, como marco do comportamento informacional está o contexto. Esquecido
pelos primeiros cientistas da informação, a importância dos contextos foi resgatada nos anos
setentas por Dervin, e hoje é pesquisado por Courtright (2007) dentro da vida cotidiana. O
contexto para Courtright são as regras, recursos, capital social, autoridade e cultura, que
definem o tecido de estruturas e dinâmicas que guiam o comportamento informacional e as
condições de troca informacional. O contexto marca o meio de adaptação e desenvolvimento
da incerteza, a procura de sentido, o lúdico, a tecnologia, o afeto, a economia energética e o
comportamento de enxame no sujeito informacional.
Cultura, informação e criatividade estão marcadas pelo contexto e dinâmicas de
comportamento aqui descritas. Toda política de geração da uma indústria criativa e cultural,
deve interrogar-se sobre estes parâmetros de comportamento informacional, e avaliar suas
chances reais de criar fluxos de comunicação, estruturas de processamento, reprodução e
salvaguarda, que facilitem a coleta, preservação e difusão das culturas.
3. O contexto da globalização informacional da cultura
No mundo pós-capitalista e da Sociedade em rede (CASTELLS, 1999; DRUCKER,
1999), os saberes alcançaram um novo estatuto de aplicação e produção industrial,
padronizados, processados e mediados por máquinas na procura da eficiência econômica e
política: o saber “coisa”, massificado, esquartejado e descontextualizado para sua
distribuição; o saber “mercadoria” para ser comprado ou vendido com lucros no mercado; o
saber “poder” que define o controle das parcelas da realidade por conta do seu valor
estratégico e tecnológico (LYOTARD, 2004). A cultura como forma de conhecimento e
informação sofreu um processo similar de industrialização, descrito por Adorno (ADORNO;
HORKHEIMER, 1985).
7
A escola de Frankfurt gerou uma crítica profunda deste processo, mas também criou
uma lenda negra sem saída visível. A indústria criativa ficou desvalorizada como setor
produtivo marginal e cultura denegrida. No fim do século XX, esta indústria foi resgatada
como coletivo e processo social, assim como fenômeno derivado de iniciativas políticas. As
duas visões não são excludentes segundo O’Connor (2011). O século XX viu esforços bem
sucedidos de produção cultural, planejados desde políticas impulsionadas por forças sociais
que foram desde o fascismo alemão, ao comunismo soviético e o capitalismo norte-americano
da Rosie the Riveter. Movimentos de arte planejada como ícone nacional e ideológico
contrastaram com a arte independente. A gama de produtos era extensa, complexa e difícil de
classificar, mas começou ocupar um lugar destacado e a ser pesquisada dentro das sociedades
de países como os EUA, França e UK (BOURDIEU, 2002; HESMONDHALGH, 2007;
WILLIAMS, 2011).
Enquanto isso, nos países “do sul” a nova relação de dependência do modelo centro-
periferia (FURTADO, 1981; PREBISCH, 1986), criou sua equivalência na cultura e a
indústria criativa: o imperialismo cultural (SCHILLER, 1976). Uma força que espalha,
naturaliza e sincroniza a semiótica do espaço cognoscitivo da comunidade dominante, por
meio de produtos culturais massivos (DORFMAN; MATTELART, 1978). Na era digital, a
dominação por meio deste fluxo de dados, informação, cultura e tecnologia configuram uma
nova força conceitualizada como colonialismo eletrônico (McPHAIL, 2010). As promissórias
indústrias culturais de Argentina e México descaíram no final do século XX frente a
Hollywood. A arte cubana conseguiu florescer como projeto ideológico de Estado, no entanto,
o respaldo da URSS e a guerra fria se mantiveram. Artistas independentes de Chile, Argentina
e Brasil ganharam alguma notoriedade desde seu exílio forçado por regimes militares, por
conta do descontento popular crescente nos seus países e a crueldade dos governos de turno.
Terminada esta era de resistência política canalizada pelas artes e letras, o balanço do
desenvolvimento da indústria cultural latino-americana por fora dos mecanismos da indústria
multinacional dominante, decaiu a níveis de inexistência.
No trânsito entre os séculos XX e XXI, a cultura popular e urbana ganhou algum
protagonismo sendo reconhecida nas suas manifestações pelos governos locais (O'CONNOR,
2011), mas sua visibilidade local e global ainda depende dos conglomerados das media. Ainda
assim, no “sul” a indústria criativa esta afetada por problemas de renda per capita dos
consumidores, dependência e domínio das multinacionais criativas, investimento fraco em
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produção, grande pirataria, concentração dos media, foco em mercados urbanos, e a entrada
massiva de conteúdos dos EUA, Europa e Japão via cabo (MASTRINI; BECERRA, 2011).
Sendo o capital privado o grande concentrador dos meios, resulta mais eficiente e lucrativo
distribuir conteúdos importados que tentar produzir conteúdo local de qualidade. Neste
contexto, o advento da digitalização encarna ameaças e oportunidades. É possível promover a
produção independente de baixo custo, mas por outro lado, o fluxo de conteúdo global e a
engenharia comercial multinacional bombardeiam sem descanso os consumidores com
produtos das indústrias culturais dominantes, não só do entretenimento mas do setor
acadêmico, literário e tecnológico.
4. Análise crítica das políticas sobre Indústria Cultural & Criativa, e a construção da
realidade cotidiana
A relevância deste debate sobre a indústria cultural nativa vs. a globalizada, fica na
esperança de que os meios criativos e artísticos possam funcionar como analisador crítico da
sociedade, e mobilizador econômico que garantisse a subsistência de espaços semióticos
nativos dentro da globalização, preservando sua voz particular e diferenciada. As artes e
ciências já tiveram na América Latina um protagonismo importante na identificação, denúncia
e solução de problemas sociais. No fim do século XX, a CEPAL (Comissão Econômica para
América Latina y o Caribe) gerou teorias próprias sobre desenvolvimento e dependência que
fixaram uma posição autônoma da região, frente ao discurso de desenvolvimento das
potências globais. Movimentos artísticos de resistência na música encarnados em figuras
como Víctor Jara, Quilapayún, Inti Illimani, Violeta Parra em Chile, Mercedes Sosa, Piero De
Benedictis, Charlie Garcia, León Gieco, Facundo Cabral na Argentina, Alfredo Zitarrosa em
Uruguai, Ana y Jaime, Pablus Gallinazus na Colômbia, e Geraldo Vandré, Gilberto Gil,
Caetano Veloso no Brasil, visibilizaram as ações das diferentes ditaduras e mobilizaram a
opinião pública com a criação de ícones de resistência. As capacidades de liderança social e
compromisso político dos criadores sul-americanos, são reconhecidas nos estudos críticos
sobre políticas de cultura e indústria criativa (MILLER, 2007).
Mas este papel foi desaparecendo na dualidade entre a sustentabilidade comercial do
setor e sua vocação transformadora social. Tal dicotomia pode ser resolvida pelo convite que
Cunninham (2012) faz para explorar sem preconceitos o elemento econômico da criação. As
9
artes, ciências e técnicas precisam dar os seus profissionais, meios de subsistência e
aprimoramento mínimos. Este axioma tão simples briga na América Latina com a imagem
arraigada da atividade criativa como uma boêmia lúdica de pouca utilidade, ou um gesto
ascético e romântico. O resgate do valor da criatividade como profissão valorizada,
dignamente remunerada e atrativa para o investimento, ainda esta longe de ser apropriada pela
região e considerada seriamente pelos governos. As políticas ficam presas a um círculo
vicioso que mantém a precariedade da vida dos trabalhadores da cultura, enfraquecendo a
criação, os meios, e a cultura mesma (MILLER; BEATY et al., 2010). Os movimentos de
criação e cultura regionais estão estreitamente ligados a interesses partidários, como o caso da
Nova Trova Cubana, ou as reações ideológicas e emotivas de luta, como o caso da música de
protesto ou a tropicália (ROMEU, 2005; DUARTE; GONZALEZ, 2007; DONAS 2011). A
arte, ciência e inovação como projeto de vida profissional sustentável, são uma raridade na
região.
A situação faz urgente a criação de políticas eficientes que mudem a percepção do
público e do aparelho burocrático sobre as artes, as ciências e a invenção, para dar suporte aos
seus professionais do mesmo jeito que se suportaria um médico, um engenheiro ou um
empreendedor. A ação política deve propiciar o investimento de risco na indústria local não
sob uma visão paternalista, mas dentro de um esquema de competitividade e sustentabilidade
que inclua o setor privado, medindo-o com ferramentas claras e eficientes seu desempenho
produtivo (CUNNINGHAM, 2012).
4.1 O caso dos Guerreiros de Maceió na Alagoas na globalização
O nordeste brasileiro é rico em exemplos de arte popular. Neste artigo se analisa o
caso dos Guerreiros de Maceió.
Os Guerreiros são um elemento da cultura popular de Alagoas, nordeste do Brasil.
Surgiram por volta da década de 1920 como uma mistura de diversos folguedos, bem como o
Pastoril, Chegança, Auto das Caboclinhas e o Reisado (BRANDÃO, 1982; VASCONCELOS,
1998). O guerreiro passou ser interpretado em diversas cidades do interior de Alagoas e
considerado auto popular em si mesmo, e como sincretismo com o Reisado. Compõe-se de
coleções de cetim, guarda peitos enfeitados de areia brilhante e espelho, além dos meiões
brancos de algodão e chapéus com forma de igreja, decorados com fitas e espelhos.
10
Os senhores de engenho da região e chefes políticos, em seu nativismo patriota
financiaram muitos artistas que mantiveram este folclore. O auxílio era um meio para
conquistar uma boa imagem e relaxar a situação de dominação e servidão com algo de
entretenimento e paternalismo. Por sua parte, os artistas criavam cantorias de devoção e
elogios aos seus benfeitores e a ordem que eles mantinham. Não poderia ser diferente, pois
todos dependiam deles como obreiros agrários ou artistas. Os mestres dos folguedos ajudavam
a manter a cultura da cana de açúcar, e assim podiam mostrar suas criações. Tais criações
perduram até hoje, embora afeitadas pelo descaso e o preconceito das novas gerações.
No ano de 1927, quando o Guerreiro começou espalhar nas regiões de Alagoas, era
tido como uma “brincadeira” de prestígio, na qual o povo aplaudia e se fazia presente para
celebrar sua identidade cultural criativa. O marco das apresentações dos Guerreiros foram as
festas natalinas e religiosas promovidas pelos representantes políticos e religiosos do
município, os quais possuíam autoridade para a realização de festas populares locais. Daí
surge a denominação de folguedo natalino. O Guerreiro tinha suas apresentações entre os dias
vinte e quatro de dezembro e o seis de janeiro, para anunciar e celebrar o nascimento de Jesus.
Nas regiões interioranas, os grupos eram solicitados pelos senhores de engenho que os
ofereciam estadia e alimentação pelas diversas noites de festividades ocorridas nas Casa-
Grande das cidades.
Após da mudança da economia e o fim da aristocracia açucareira, os folguedos, assim
como os grupos de Guerreiro, se dispersaram. Os poucos grupos que resistiram às mudanças,
buscaram sobreviver com suas manifestações culturais em modestas apresentações em festas
do interior do Estado de Alagoas, financiadas por líderes municipais ou indústrias, a mercê da
gentileza de políticos e proprietários que ao fim das apresentações, ajudavam dando-lhes uma
gorjeta ou algum alimento (DANTAS, 1986). Em Maceió, os grupos de Guerreiros se
apresentam em eventos passageiros, sem continuidade na cidade. Os grupos de Guerreiro são
integrados pela Associação dos Folguedos Populares de Alagoas (ASFOPAL), e também
participam de alguns eventos promovidos pela Secretaria do Estado e da Cultura do Estado de
Alagoas (SECULT). Como figura da cultura popular alagoana, o Guerreiro precisava da
colaboração das instituições e a sociedade na legitimação do seu folclore, para viabilizar suas
atividades como expressão cultural da região. Apesar das dificuldades, os mestres resistem e
persistem no prosseguimento da sua manifestação cultural. Ao longo deste processo histórico
e cultural, diversos grupos surgiram e foram se multiplicando em toda a região, cada qual com
11
sua forma de se expressar, mas todos com algo em comum: a vontade em vivenciar as suas
culturas.
Estes representantes da cultura popular maceioense estão aparentemente incluídos nas
atrações culturais e turísticas da cidade. Atualmente os grupos de Guerreiros se apresentam
em qualquer época do ano, desde que seja solicitado, algo que não ocorre comumente na
cidade. Alguns ainda reúnem-se aos sábados para realização de seus ensaios, em espaços
cedidos pela comunidade nos bairros ou locais disputados pelas outras atividades das
prefeituras. A questão a respeito dos Guerreiros mostra-se cada vez mais obscura. O
desconhecimento da sua trajetória histórica e repercussão cultural são evidentes, delineando a
insatisfação diante da falta de incentivo e apoio para sua manutenção. Hoje o Guerreiro
encontra-se em parte oculto, não por vontade dos seus participantes, mas pelas dificuldades
enfrentadas na sua conservação e reconhecimento pela sociedade e as autoridades locais.
Em Maceió e em boa parte da região do nordeste brasileiro, os grupos folclóricos,
assim como os Guerreiros, são uma oportunidade de indústria criativa incompreendida, e um
espaço simbólico cognitivo em vias de extinção, afogado entre os conteúdos forâneos e as
suas próprias incapacidades para procurar a sustentabilidade e difusão. Um sujeito da
demagogia política e o paternalismo feudal da cultura da cana; uma memória coletiva que
poderá se perder na população de Maceió e no Estado de Alagoas, frente a o avanço das
outras memórias que espalham e ocupam o espaço semiótico cognitivo do coletivo global,
montadas sobre as indústrias culturais dominantes. A cidade de Maceió não dispõe de uma
política cultural com continuidade. Podem-se apenas deparar projetos e eventos esporádicos.
Ainda que ocorra a promoção de tais projetos, não existe sustentabilidade neles nem uma
profissionalização dos trabalhadores da cultura.
Destaca-se a iniciativa da Lei de Patrimônio Vivo (ALAGOAS, 2004) a qual visa dar
condições aos folguedos de se manter, mas para usufruir desta contribuição são estabelecidos
critérios como os seguintes: os mestres necessitam estar cadastrados na Secretaria do Estado e
da Cultura (SECULT), e associados à Associação dos Folguedos Populares de Alagoas
(ASFOPAL). Devem ser brasileiros, naturais de Alagoas há mais de vinte anos contado da
data da inscrição. Comprovar a participação em atividades culturais por mais de vinte anos, e
apresentar condições para transmitir seus conhecimentos a outros indivíduos. O total dos
beneficiários desta lei não poder superar os 30 mestres, que no final, recebem
aproximadamente o equivalente a 1,5 salários mínimos brasileiros (COSTA, 2011).
12
Para tanto, as iniciativas de entretenimento permanecem e resultam em momentos de
satisfação para os folguedos e seu público, mas ao final da apresentação tudo volta à estaca
zero. Não há condições de pensar em uma ação cultural, pois as políticas propõem barreiras
de ingresso exageradas para o espaço da legitimação e preservação da tradição cultural.
Tampouco consideram a educação do público na valorização dos folguedos, nem levantam
condições de sobrevivência digna e sustentabilidade econômica para os mestres. Ainda assim,
os folguedos têm reconhecimento além do Estado, e os mestres são considerados como
figuras representativas do folclore de Alagoas. As políticas e discursos dos administradores
culturais locais tornam-se demagógicas, facilitando a extinção das expressões culturais.
O Guerreiro se configura como uma manifestação cultural inserida em um universo
multicultural, em processo de modernização e globalização. Um meio em quea ideia de
multiculturalismo passa a por grandes desafios a respeito das formas de preservação da
cultura popular e folclórica local.
4.2 Procurando os Guerreiros no Universo digital
Coelho Neto (1997) estabelece quatro fases ou níveis no sistema de produção cultural:
produção, distribuição, troca e uso. Esses níveis e fases podem ser desenvolvidos dependendo
do interesse resultante das negociações simbólicas entre o criador, e os stakeholders
pertinentes. Dai resulta a validação de uma prática criativa como valiosa em primeira
instancia. Uma segunda alternativa é pular os gatekeepers da cultura (BERKOWITZ, 2012);
críticos, burocratas, políticos, museus, institutos, expertos, os media, e tentar legitimar-se
diretamente com o consumidor para assim criar uma demanda. Com o advento da Internet, a
possibilidade de poupar os gatekeepers da infraestrutura de cultura parecia possível.
Espalhou-se a ideia que criar uma grande audiência na Web era simples e fácil. O mito
do sucesso instantâneo de pessoas comuns que conseguiram se fizer visíveis. Mas aqueles que
tinham experiência na criação de blogs, postagem de vídeos e outras ações de difusão de
produtos criativos pela Web, sabem que ainda existam histórias de sucesso, na generalidade
dos casos é muito difícil criar visibilidade e cativar audiências. Concorre-se com conteúdo das
grandes corporações de meios, que têm experiência, recursos e tecnologia para aplicar
engenharia comercial e monopolizar a maior parte da atenção do público. E nos países “do
sul”, pelas limitantes de infraestrutura, recursos técnicos, conhecimento e idiossincrasia, não
13
são tantos os criativos que tenham a capacidade técnica e inclinação para pensar as
tecnologias de informação e comunicação (TIC) como uma via para visibilizar sua produção.
Os Guerreiros são vítimas destas contingências.
Por outro lado, se apresentam fenômenos como aqueles descritos por Viveiros de
Castro (VIVEIROS DE CASTRO, 2002; VIVEIROS DE CASTRO, 2004; VIVEIROS DE
CASTRO 2010) quando fala do Perspectivismo a respeito das epistemologias indígenas na
América do Sul. Fazendo uma abstração dos seus conceitos antropológicos no tema da cultura
global e local, o cidadão do mundo tanto quanto o cidadão raiz, embutido no seu folclore local
e vida cotidiana, compartilham seu o desprezo pelos modos alheios. O fato de pensar a
semiótica própria como centro do mundo em detrimento da semiótica dos outros, parece ser
uma condição tipicamente humana. O nativo raiz, similar no indígena, trabalha no corpo, na
cotidianidade: o cidadão global assim como o conquistador europeu, trabalha no espírito, os
conceitos, as ideias. No entanto o cidadão raiz atua na sua tradição, na personificação, nos
objetos que encarnam sua terra, história e valores, o cidadão global gosta de olhar desde uma
distância segura, mediada pelas bondades da tecnologia digital, sujeitando um copo de uísque
com gelo num ambiente confortável e seguro. Ambos, cidadãos da cultura global e da cultura
raiz, colidem na sua epistemologia porque percebem distinto, e em isso Viveiros de Castro
(2002) é enfático: não é uma diferença de perspectiva mas de percepção. Assim, que enquanto
o globalismo procura uma realidade multimedia separada do corpo e mediada por tecnologias
que asseguram uma vivência “quase real”, o sujeito raiz e a tradição local procuram atuar no
corpo e na ação: viver a cultura. Mundos distintos e percepções distintas.
Estes fenômenos que reiteram o que McLuhan (1995) chamou a colisão dos mundos
entre sociedades informacionalmente quentes e frias, permitem afirmar que os problemas de
supervivência de elementos culturais e artísticos como os dos Guerreiros, incluem problemas
tão profundos como a mesma percepção da realidade, e um desprezo mútuo entre os mundos
globais e locais. E a tecnologia da informação fica no meio como solução mas também como
problema adicional.
Ao procurar o termo (A) “Guerreiros de Maceió” no Google, obteve-se 32 resultados.
Mudando para (B) “Guerreiros de Alagoas” obteve-se 94 resultados. Misturam-se conteúdos
que confundem denúncias de artesãos de Maceió com notícias esportivas. No Youtube mostra
para (A) dez resultados e para (B) 255 resultados com alguns vídeos específicos de dançantes
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e músicos, chegando alguns deles a superar as mil reproduções1. Existe só um vídeo postado
pelo Ministério da Cultura no 15/01/2010 com 769 reproduções2. Encontra-se uma página do
Facebook com o nome Guerreiros de Alagoas, mas seu conteúdo não é artístico nem cultural.
No Google Trends é impossível pesquisar a demanda destes termos por ter uma quantidade
insuficiente para a análise estatística.
A página web de CENARTE “Identidade Alagoana”3, desenvolvida pela Secretaria de
Estado da Cultura SECULT, não faz referência aos Guerreiros e nem tem material audiovisual
sobre eles. Contrasta com o blog de ASFOPAL4 que é bem completo e didático. Em
conclusão, a imagem dos Guerreiros de Maceió na Internet se perde afetada pela sua escassez,
e confundida com outros folguedos. Os folguedos Alagoanos, que contam com maior
presença no Youtube que os Guerreiros, estão representados por vídeos produzidos de forma
caseira, desorganizada e com baixa qualidade. São escassos os que têm audiências que
superem as mil reproduções. No caso dos Guerreiros e sua luta pela supervivência, internet
não faz diferença como equipamento cultural.
5. Considerações
O discurso das indústrias criativas nos países do “sul global” deve incorporar questões
relativas ao patrimônio cultural, redução da pobreza e infraestrutura básica, como pré-
condições para torná-lo sustentável. Frente a isso, o prestígio dos novos meios como Internet
e a Web, não pode ficar indiscutível nem pode ser assumido (CUNNINGHAM, 2012). As TIC
abrem oportunidades, mas pela sua origem e sinergia com os países desenvolvidos, até agora
representam um fluxo semiótico massivo que afoga o reduzido espaço cognitivo digital criado
pelos países do sul. Além disso, a mesma colisão dos mundos global e local, envolvendo sua
rejeição mútua e semióticas egocêntricas, como estudado pela antropologia no caso dos
indígenas americanos e os conquistadores europeus, denota a necessidade de mudanças
conceituais profundas no campo das políticas, usando a perspectiva crítica das ciências
sociais.
1 1,351 reproduções para o Mestre Venâncio de Alagoas, acesso no 20/07/2012. 2 Jornal Futura, Canal Futura, postado no 14/01/2010, Notícia sobre a vida de Nelson Dos Santos, acesso no
20/07/2012. 3 http://www.identidadealagoana.com.br 4 http://asfopal.blogspot.com.br
15
A América Latina têm demostrado uma capacidade criativa importante durante o fim
do século XX, mas ela languidesce vítima da pressão das indústrias multinacionais
dominantes, que em chave com os interesses dos grupos locais que concentram os meios de
difusão, mantem cativa à audiência reduzindo cada vez mais o espaço semiótico cognitivo
vernáculo. A ditadura dos lucros e o mercado, a engenharia comercial que conhece bem e
aproveita os mecanismos do comportamento informacional humano, não deixa lugar para a
supervivência de vozes alternativas.
O Estado, como defensor da soberania nacional e a diversidade das minorias, ainda
não compreende bem a existência de uma soberania semiótica, além das simbologias
evidentes como a língua e os símbolos pátrios. Por ignorância e preconceito, a indústria
criativa local é inserida dentro de um discurso demagógico que nos fatos gera ações mínimas,
dando continuidade ao esquema paternalista feudal herdado da colônia e a cultura do
monocultivo, e oferecendo condições de sustentabilidade indignas que socavam a valoração
social da figura dos representantes da cultura raiz e popular. Assim, a profissão de criador no
âmbito da cultura, é percebida como uma brincadeira ocasional, um ato boêmio marginal.
Ambos, cenários que impossibilitam a profissionalização e aprimoramento dos criadores e
seus empreendimentos, obstruindo a construção de alicerces para uma indústria criativa e
cultural viável que com seu peso, defenda e difunda o patrimônio semiótico e as isotópias dos
povos “do sul”.
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