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A UTILIZAÇÃO DA CARTOGRAFIA SOCIAL NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DOS
PROFESSORES DE GEOGRAFIA DO 6º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL
Autora: Zenaide Delgado Gussão1
Orientador: Altair Pivovar 2
RESUMO
O presente trabalho é fruto dos resultados obtidos com a implementação
pedagógica do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) oferecido pela
Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), turma 2010-2012. A
intervenção ocorreu no Colégio Estadual Elias Abrahão, município de Quatro Barras,
Região Metropolitana de Curitiba, com um professor de geografia. Esse professor
desenvolveu o trabalho com três turmas de 6º ano do período da tarde. Objetivou-se
incorporar, ao trabalho pedagógico do professor de geografia, encaminhamentos
que visam auxiliar sua prática pedagógica e enriquecer as aulas de cartografia, por
meio de novos aportes metodológicos, fazendo uso da cartografia social. A
proposição foi instigar os professores a criarem situações que proporcionem ao
aluno pensar o espaço, desenvolvendo atividades que utilizem a cartografia social
como meio de interagir na comunidade local. A metodologia usada foi um trabalho
de campo, mapeando os arredores da escola, utilizando-se de imagens do Google
Maps como referência. Os alunos, sob orientação do professor, fizeram uma inter-
relação social, humana, de ordem natural, que os levou a perceber a sua integração
ao espaço, mapeando-o.
Palavras-chave: Geografia escolar; metodologia do ensino da geografia; cartografia
social; cartografia escolar.
_____________________1- Professora da Rede Estadual de Ensino da Educação Básica do Estado do Paraná- e-mail: [email protected] Doutor em Educação, professor do Departamento de Teoria e Prática de Ensino, Setor
de Educação, Universidade Federal do Paraná.
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1- INTRODUÇÃO
O presente artigo mostra resultados obtidos com a implementação do Projeto
de Intervenção Pedagógica intitulado “A Utilização da Cartografia Social na Prática
Pedagógica dos Professores de Geografia do 6º ano do Ensino Fundamental”.
A Secretaria de Estado da Educação (SEED) oferece aos professores da rede
estadual de ensino o Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE), que prevê
o afastamento do professor da sala de aula para um aprimoramento em sua carreira,
com parcerias junto às Instituição de Ensino Superior (IES) estaduais e federais.
Esse profissional passa dois anos sendo acompanhado por um professor orientador
da IES indicada, estudando e produzindo, com a finalidade de intensificar seus
conhecimentos e voltar à sua prática de sala de aula com uma bagagem capaz de
garantir a diferença e o sucesso no interior da escola.
O PDE é de extrema importância ao professor, pois lhe permite constatar,
analisar e refletir sobre seu próprio trabalho e/ou ambiente onde atua, detectando
pontos que merecem ser repensados ou melhorados e buscando uma intervenção
pedagógica que possibilite a reflexão e tomada de decisão capaz de interferir
positivamente na qualidade de ensino.
O professor PDE também recebe formação tecnológica, com a finalidade de
garantir sucesso no Grupo de Trabalho em Rede (GTR), vivenciando a experiência
de tutoria, na modalidade de EaD (Educação a Distância). Esse professor assume o
papel de tutor e tem a responsabilidade de orientar, coordenar e acompanhar a
distância um grupo de no máximo quinze profissionais docentes da Rede Estadual
de Ensino da Educação Básica de diferentes municípios e núcleos do Estado do
Paraná, interessados em aprofundar seus conhecimentos, discutindo o tema
proposto no projeto. Os professores participantes recebem certificação pela
participação no GTR, sendo parte de uma formação continuada que servirá para
ascensão em sua carreira.
Esta implementação teve como objeto de estudo a cartografia ensinada pelos
professores nas séries finais do Ensino Fundamental, fazendo-se uso da Cartografia
Social, a fim de enriquecer a prática pedagógica do professor, com vistas a facilitar o
entendimento do aluno.
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Dessa forma, a cartografia social vem instigar novas formas de ensino da
geografia nas escolas, através de uma metodologia que deu certo aos povos da
floresta, na região norte do país, com um enfoque diferente de ensinar e
compreender o espaço, estimulando o aluno a ser protagonista do seu próprio
trabalho, ou seja, o aluno como criador do seu próprio mapa.
1.1- Um pouco sobre a Cartografia Social
A nova Cartografia Social nasceu na Amazônia, mas disseminou-se por
outros estados, como, por exemplo, o Paraná, através de estudos que ocorrem na
Universidade Federal do Paraná.
A Amazônia é um lugar que boa parte dos brasileiros só conhece no mapa,
em geral, verde, cortada por muitos traços azuis, ocupando todo o Norte do país.
Para muitos, há muito tempo, ela é associada ao vazio demográfico, à natureza
selvagem.
Como é conhecida no mundo inteiro, virou marca de uso comercial e político.
Mas a realidade da região, de fato, ainda é bastante ignorada pela dita sociedade
globalizada, que cada vez mais se preocupa (ou diz se preocupar) com o meio
ambiente.
Quem conhece bem a Amazônia é, paradoxalmente, pouco conhecido. São
povos e comunidades tradicionais, que lutam contra um processo de invisibilidade
social ao qual, historicamente, foram condenados. A legislação existente,
principalmente quanto à ocupação da terra, não se encaixa com a complexidade da
realidade amazônica, gerando uma série de conflitos.
As demandas dos grupos sociais e comunidades tradicionais se tornam ainda
mais urgentes na medida em que não têm visto na prática o direito constitucional do
reconhecimento de seus “modos de criar, fazer e viver”. Por meio deles, com o apoio
do projeto Nova Cartografia Social da Amazônia, o verdadeiro mapa da maior
floresta tropical do planeta está sendo desenhado.
O projeto consiste no levantamento de dados sobre movimentos, conflitos e
comunidades existentes na região.
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A proposta é utilizar o conhecimento dos movimentos sociais para mapear as
diferentes situações, visualizar a real situação da Amazônia e oferecer subsídios
claros para a elaboração de políticas públicas que visem a resolução de conflitos.
Mulheres quebradeiras de coco babaçu do Piauí, quilombolas da Ilha de
Marajó, ribeirinhos da região do Zé-Açu, no Amazonas, e homossexuais na cidade
de Belém são exemplos dos títulos dos 50 fascículos que o projeto já lançou nos
últimos dois anos e meio, desde que seu coordenador, o antropólogo Alfredo
Wagner Berno de Almeida, mudou-se para Manaus, como professor visitante do
Programa de Pós-Graduação em Sociedade e Cultura da Amazônia, da
Universidade Federal do Amazonas (UFAM).
Nessas localidades, são feitas oficinas de mapeamento participativo, nas
quais as fronteiras entre os sujeitos e os objetos de pesquisa se dissolvem.
Professores e alunos de graduação e de pós-graduação apoiam o processo, no qual
membros de um determinado grupo registram quem são, onde e como vivem.
Os textos das publicações são quase que exclusivamente depoimentos das
pessoas que participam das oficinas. Os fascículos têm sido usados como
instrumentos de luta. Eles alcançam grande circulação e fortalecem essas
comunidades no encaminhamento de reivindicações.
A experiência teve início em 2005 e aos poucos foi se expandindo no estado
do Amazonas, mas a ideia é transformar essa cartografia em um instrumento
científico e social para toda a Amazônia. O trabalho ganha força dentro do Estado
brasileiro: o reconhecimento de que um quarto do território nacional é legitimamente
ocupado por cinco milhões de famílias representantes de povos e comunidades
tradicionais.
Foi com base na experiência desses povos da floresta que nos ocorreu a
possibilidade de aplicar em ambiente escolar os procedimentos de mapeamento
empregados na cartografia social. Através de conceitos cartográficos básicos, como
mapas, cartas, plantas, escala e projeção, a Cartografia Social leva o aluno a
compreender e entender o seu espaço.
Ao apropriar-se da linguagem cartográfica criada por ele através de símbolos
que expressam também seus sentimentos, o aluno estará apto a conhecer
representações de realidades mais complexas.
Através deste trabalho, realizamos uma apropriação da Cartografia Social
como aporte metodológico nas aulas de cartografia escolar e de geografia em geral.
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A cartografia social tem a proposta de levar o aluno a criar seu próprio mapa, para
que ele defina a legenda a ser utilizada, fazendo uso de convenções específicas.
As pesquisas realizadas mostram que o processo é válido, pois não interessa
levar o aluno a simplesmente memorizar algum tipo de convenção, levá-lo a
interpretar. Com esta proposta, pretendemos que o aluno desenvolva conhecimento
do real para o abstrato, vivenciando-o essa transposição através da confecção de
mapas e maquetes, para que a superfície plana, bidimensional ou tridimensional, o
leve a compreender a ideia de legenda e proporção.
Uma cartografia sensorial efetiva pode ser trabalhada conjuntamente com a
Cartografia Social, por meio da qual o aluno terá condições de expressar e montar
um mapa situacional ou locacional, como ele é visto ou percebido naquele espaço.
Juntamente com a criação da legenda, o professor chamará a atenção para a
questão da proporção, fundamental para a compreensão da noção de escala. Nesse
caso, o que importa é que o aluno compreenda ou tenha noção do real e do
abstrato, do espaço vivido por ele, colocando ali suas emoções e percebendo-se
como parte do espaço que estuda.
Esse trabalho tende a contribuir com a metodologia dos professores, pois é
muito comum ouvir dos alunos que as aulas de geografia têm sido consideradas
complexas, especialmente em se tratando de assuntos ligados à cartografia, por
exemplo. Isso afeta grande parte de nossos estudantes, não porque não gostam da
disciplina, mas porque não entendem muito em que irão usá-la em seu cotidiano..
Não conseguem compreender como podem ser usados os mapas e tudo o que eles
podem informar.
Esses fatores ainda levam a constantes reflexões de como oferecer aos
docentes de geografia subsídios ou métodos de ensino da cartografia escolar.
Os conceitos básicos, como título, legenda e orientação espacial, ainda
deixam muitas dúvidas para eles, principalmente a escala, que, devido à
complexidade dos cálculos, continua sendo o mais difícil, muitas vezes sendo
deixada de fora apresentada de forma superficial na sala de aula.
Saber ler mapas faz com que a pessoa consiga pensar sobre territórios e
regiões que não conhece.
Ao assimilar as informações do espaço vivido e conseguir visualizar essas
mesmas informações em uma representação bidimensional, o aluno reelabora seus
saberes, o que trará mais sentido às suas atividades escolares e ao seu cotidiano.
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No 6º ano do Ensino Fundamental, os alunos sentem dificuldade em
compreender os conceitos de espaço da mesma forma que um adulto. Nessa série,
esses conhecimentos devem ser desenvolvidos e aprofundados, pois são essenciais
ao entendimento dos conceitos que possibilitarão ao aluno realizar a análise
geográfica.
É um processo que vai do concreto ao abstrato, da imagem para o
significado, desenvolvendo a etapa de representação de realidades não conhecidas
e que exigem maior abstração.
Almeida e Passini (1991) lembram que ler mapas é um processo que começa
com a decodificação, envolvendo algumas etapas metodológicas que devem ser
respeitadas para que a leitura seja eficaz. Preparar o aluno para essa leitura deve
passar por preocupações metodológicas tão sérias quanto a de ensinar a ler e
escrever, contar e fazer cálculos matemáticos. Trata-se de dominar a linguagem
cartográfica.
Diante disso, propusemos a Cartografia Social como prática pedagógica do
professor, para que ele possa facilitar o entendimento do aluno, e o conteúdo, por
sua vez, passe a ter sentido e seja assimilado com mais facilidade.
Este trabalho objetivou compreender a cartografia como linguagem da
geografia, iniciando o aluno em sua tarefa de mapear, mostrando caminhos para que
ele se torne um leitor consciente da linguagem cartográfica, criando condições de
realização de leitura das paisagens locais com raciocínio geográfico. Isso remeterá
os educandos ao entendimento do significado de seu espaço de vivência e,
consequentemente, da geografia.
Entendemos que a articulação dos conteúdos nacionais e gerais com a
realidade local permite ao educando maior compreensão de seu mundo e cria novas
formas de interferências no mundo conhecido.
Os conteúdos com dados locais permitem a construção de novas
interpretações do espaço. Partindo dos elementos locais da paisagem, podemos
produzir imagens e linguagens com significados e assim assimilar os conhecimentos
imprescindíveis à construção da cidadania.
A produção e aplicação de conhecimentos locais auxiliados por meios
modernos de comunicação facilitam o desenvolvimento do trabalho, assim como a
disponibilização dos conhecimentos a outros educadores ligados ao ensino de
geografia. Superar barreiras quanto à adoção de novas metodologias é o grande
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desafio lançado aos educadores, pois é diante da diversidade de problemas e da
necessidade de elaboração de soluções que o homem constrói conhecimentos.
Paganelli (1985) mostra como os passos metodológicos de mapear levam à
formação de um bom leitor. Baseada na teoria de Piaget de que a criança na idade
do pensamento concreto necessita agir para conseguir construir conceitos e edificar
os conhecimentos, essa autora sugere que se leve o aluno a elaborar mapas para
torná-lo um leitor eficaz. Cavalcante (1998, p. 135) afirma que o ensino de geografia
tem a função de lidar com a espacialidade e com o conhecimento geográfico de
cada um, para provocar neles alterações no sentido de uma ampliação.
Para o desenvolvimento da prática de ensino no processo de produção e
reprodução do conhecimento geográfico, faz-se necessária a utilização de recursos
que auxiliem essa prática. Cavalcante enfatiza ainda que essas alterações são
possíveis pela reflexão e pelo exercício de abstração propiciado com o tratamento
de conhecimentos científicos. Lembramos, ainda, que o papel básico do ensino de
geografia é proporcionar várias ferramentas para alfabetizar o aluno espacialmente
em suas diversas escalas, dando-lhe a capacitação para entender noções de
espaço, paisagem, natureza, Estado e sociedade.
Segundo Cavalcante (1998, p. 128), a função da geografia é formar uma
consciência espacial, um raciocínio geográfico, levando à compreensão da
espacialidade das práticas sociais para permitir a intervenção no cotidiano de forma
mais autônoma.
A compreensão de como a realidade local se relaciona com o contexto global
é um trabalho a ser desenvolvido durante toda a escolaridade, de modo cada vez
mais abrangente, com o cuidado de não se cair numa análise simplista do lugar até
chegar ao global de forma linear, pois as relações entre essas escalas são mais
complexas.
É imprescindível que se supere a ideia dos círculos concêntricos, partindo do
próximo e supostamente mais simples para o mais distante, que seria mais
complexo (CASTROGIOVANNI, 2000, p. 108).
A pesquisa e a sugestão de novas metodologias para serem utilizadas em
sala de aula a partir dessa perspectiva foram a ação pedagógica proposta neste
artigo.
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2 - DESENVOLVIMENTO
Este projeto foi idealizado para atender professores de geografia de 5ªsérie/6º
ano do Ensino Fundamental do Colégio Estadual Elias Abrahão, município de
Quatro Barras, Região Metropolitana de Curitiba. Foi trabalhado com professores de
geografia de 5ª série/6º ano do Ensino Fundamental, apresentando-se os conceitos
básicos que envolvem noções de alfabetização cartográfica, com a intenção de
auxiliá-los a enriquecer sua prática pedagógica quanto ao uso da Cartografia Social
e propiciar o desenvolvimento de ferramentas para a alfabetização cartográfica do
aluno, de modo a contribuir com o entendimento das noções de espaço e domínio
da linguagem cartográfica dos mapas.
Procurou-se criar um estudo diferenciado, construído com representações
que revelam uma crítica consciente, dando margem à reflexão. Essas sugestões
visam propiciar alguns momentos em que todos possam descobrir, criar,
experimentar e discutir suas ideias, para que as aulas de geografia possam se tornar
momentos agradáveis, fontes de descobertas, com atividades lúdicas e uso de
recursos e meios disponíveis para garantir a apropriação do conhecimento, como
informática, mapas, imagens, gráficos e tabelas, entre outros.
Visa também possibilitar discussões entre os professores da área, que
permitam identificar as reais dificuldades encontradas no cotidiano das aulas de
geografia.
Através de sugestões de atividades com a Cartografia Social, o professor
pode fazer uso de recursos diversos que abordem a espacialidade dos fenômenos,
como, por exemplo, os mapas, indicadores e textos que, em escala local, permitem
ao educando entender e perceber de maneira mais adequada e sistematizada o
lugar em que vive.
Inicialmente, foram ouvidos três professores de geografia de 5ª séries/6º ano
do Ensino Fundamental, percebendo-se que todos encontravam as mesmas
dificuldades na hora de ensinar cartografia.
Através de algumas perguntas formuladas e dirigidas a esses professores, foi
possível identificar a dificuldade encontrada por eles em facilitar o entendimento da
cartografia nas aulas de geografia, principalmente para alunos das séries iniciais da
segunda etapa do Ensino Fundamental.
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A partir dessa constatação, pensou-se em instigar os professores com novas
formas de ensino nas escolas, com o uso da Cartografia Social.
Sendo assim, a intenção deste trabalho foi de auxiliar professores a
realizarem seu trabalho de ensinar por meio da linguagem cartográfica, contribuindo
para o entendimento do processo de ensino de mapas. Diante disso, foi proposta a
cartografia social como prática pedagógica do professor, para que ela possa facilitar
o entendimento do aluno e dar mais sentido aos conteúdos abordados.
No relato feito pelos professores, ficou claro que a falta de interesse dos
alunos está relacionado à dificuldade de entenderem o conteúdo, o que torna o
processo desinteressante. Esse fato se deve à não apropriação das técnicas de
representação da linguagem específica cartográfica, ou seja, à inexistência de uma
alfabetização cartográfica nas séries iniciais, pois indicadores mostram que o estudo
e a compreensão do mapa tornam-se familiares ao aluno à medida que eles fazem
parte do seu cotidiano escolar, pois são objetos constantes em nossas vidas e
fazem parte do nosso dia a dia.
Para Heller (1989, p. 38), o sujeito já nasce na cotidianidade. É no cotidiano
que ele inicia o processo de apropriação das tarefas do mundo, tarefas
estabelecidas a partir da interação social, em que o sujeito cotidiano atua e sofre
influências, em que estabelece raízes e é alvo de influências anteriores.
Hoje, com o fácil acesso às tecnologias, a maioria dos jovens visualiza
imagens, mapas superficialmente, ou seja, fazem uma leitura incompleta dos
mesmos, não dominando o sistema da linguagem cartográfica.
É notável a falta de um trabalho de elaboração de mapas. Torna-se urgente
uma prática mais intensa, concreta e menos superficial com mapas, cartas e
imagens, principalmente para alunos do 6º ano, para que eles possam
gradativamente decodificar e representar mentalmente sua mensagem.
Sabemos que o aluno de 6º ano do Ensino Fundamental, não tem o mesmo
poder de observação e leitura em comparação a um aluno de Ensino Médio.
Contudo, ele se apropriará melhor dos conteúdos quando lhe for permitido vivenciar
a construção de mapas.
A criança nessa fase tem uma curiosidade muito mais aguçada para imagens,
cores e fotos e também gosta de fazer representações, sendo esse período a melhor
fase para se aproveitar seu interesse e construir, de forma prazerosa, o que se
tornará mais tarde de fácil acesso e compreensão: a leitura mais abstrata.
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Diante dessa dificuldade em fazer uso dos conhecimentos geográficos,
principalmente no que se refere à localização e orientação espacial, é que propomos
a nova metodologia mencionada, com o objetivo de auxiliar o aluno a compreender a
cartografia como linguagem da geografia, iniciando-o em sua tarefa de mapear e
mostrando caminhos para que ele se torne um leitor consciente da linguagem
cartográfica.
Segundo Passini (2002), nas séries iniciais do Ensino Fundamental, o
professor deve iniciar seu trabalho com o estudo do espaço concreto do aluno, o
mais próximo dele, ou seja, o espaço de aula, da escola, do bairro, do município e,
posteriormente, falar de espaços maiores, chegando ao planisfério. Almeida e
Passini (1991) defendem que ler mapas é um processo que começa com a
decodificação e envolvem algumas etapas metodológicas que devem ser
respeitadas, para que a leitura seja eficaz.
Nesse contexto, as sugestões não cumprem o propósito de reproduzir algo para que
o professor se apoie e finalize sua prática pedagógica, mas vêm no sentido da teoria
de Vygotsky, para quem o sujeito interativo é construído na e pela interação com os
outros e nas pautas da relação interpessoal.
Entendemos que, com o apoio da Cartografia Social, é possível trabalhar os
conteúdos escolares por meio de um encaminhamento que estimule tanto o
professor quanto os alunos a trabalharem a cartografia enquanto linguagem da
geografia, voltada para a produção do saber em todas as áreas do conhecimento,
mas principalmente em geografia.
Portanto, este trabalho objetivou, por meio de novos aportes metodológicos,
inserir o professor em situações que proporcionem ao aluno pensar o espaço,
incorporando, ao trabalho pedagógico do professor, encaminhamentos que
promovam a um só tempo, maior autonomia e menor desgaste dos alunos diante da
aprendizagem, visando auxiliar e enriquecer as aulas de geografia. É a partir dessa
nova orientação que se espera formar alunos críticos de mapas e mapeadores
conscientes.
Assim, esta intenção esteve fundada no entendimento de que a apreensão
desses espaços é possível através de sua representação gráfica, a qual envolve
uma linguagem própria – a da cartografia –, que a criança deve começar a conhecer.
Cabe, pois, ao professor introduzir essa linguagem e, através do trabalho
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pedagógico, levar o aluno a se aprofundar cada vez mais na estruturação e
extensão do espaço no que diz respeito à sua concepção e representação.
Dessa forma, objetivou-se auxiliar o professor com novas metodologias
simplificadas, através de um exemplo que foi construído pelos povos da região Norte
e trazido para as salas de aula como instrumento de ajuda à disciplina de geografia,
mais especificamente a cartografia. Esse conceito nos faz compreender que o
ensino da cartografia escolar na sala de aula deve ser expandido a outros lugares
vivenciados pelas crianças, pois, através do movimento sala de aula–arredores, o
conhecimento poderá se tornar mais consolidado.
Assim, este trabalho se consolida através da ambiência promovida pelo
professor de geografia na construção do conhecimento da cartografia escolar, com a
participação dos sujeitos e seus pares.
A cartografia tornou-se importante na educação contemporânea, tanto para o
aluno atender às necessidades do seu cotidiano quanto para estudar o ambiente em
que vive.
Aprendendo as características físicas, econômicas, sociais e humanas do
ambiente, ele pode entender as transformações causadas pela ação do sujeito e dos
fenômenos naturais ao longo do tempo.
Para trabalhar os conteúdos cartográficos nessa complexidade, o professor
de geografia, primeiro, tem de trabalhar com as emoções: paciência, afeto e rigidez.
Isso porque os conteúdos da cartografia escolar são trabalhados de forma
interdisciplinar, pois temos que ter conhecimento de matemática, geografia,
comunicação, educação e cartografia sistemática.
Conforme Piaget, (1974), as crianças só aprendem se tiverem interesse.
Nesse sentido, entra a sensibilidade do professor em despertar interesses na
disciplina com que trabalha, estimulando a construção do conhecimento. Essa deve
ser também sua função. Por sua vez, a leitura dos Parâmetros Curriculares
Nacionais (1998) nos remete ao conceito de cartografia como um conhecimento que
vem se desenvolvendo desde a pré-história até os dias de hoje e que, por intermédio
de uma linguagem específica, torna possível sintetizar informações, expressar
conhecimentos e estudar situações, entre outras possibilidades – sempre
envolvendo a ideia de produção do espaço, sua organização e distribuição.
O desenvolvimento da linguagem gráfica torna-se importante desde o início
da escolaridade, porque contribui não apenas para que os alunos venham a
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compreender e a utilizar os mapas, mas também para que desenvolvam habilidades
e capacidades relativas à representação e leitura do espaço geográfico.
Assim, entendemos que a construção do conhecimento cartográfico escolar
poderá auxiliar os educadores a terem uma aproximação mais forte com seus
educandos, no sentido de conhecerem a realidade, a formação dos pares no meio
em que eles vivem e, a partir desse conhecimento, elaborar meios comunicacionais
e métodos afetivos que mais se aproximem da realidade desses sujeitos. Partindo
desse pressuposto, foi pensada uma sugestão para o professor trabalhar,
independentemente de seu lugar de origem ou de atuação, adaptando essa
proposta à sua realidade e à de seus alunos.
Na concepção crítica do ensino, os professores são sujeitos que possuem
saberes específicos que produzem e utilizam no âmbito das atividades cotidianas da
sua profissão de ensinar. Como propôs Vygotsky (1985), o professor é um mediador.
Desse modo, talvez seja oportuno discutirmos a competência para ensinar, mas
discutir essa competência em relação a conteúdos e metodologias para se ensinar
na escola. O grande e principal desafio do ensino da cartografia é tornar-se crítico.
Não é nada fácil trabalhar conteúdos voltados para a realidade e
compreensão dos sujeitos, (re)dimensionando-os no âmbito do conhecimento
científico. Os materiais didáticos, quase que em sua totalidade, são voltados para a
vivência de seu(s) autor(es). Assim, o professor fica à mercê de trabalhá-los tais
como a bibliografia os apresenta, sem adaptá-los ao seu contexto. Com esses
argumentos, justificamos a produção deste material, elaborado para auxiliar
educadores na parte prática mais direta do ensino e, ao mesmo tempo,
enriquecendo seu trabalho em sala de aula com o aluno.
Lembramos, ainda, que o papel básico do ensino de geografia é proporcionar
várias ferramentas para alfabetizar o aluno espacialmente em suas diversas escalas,
dando-lhe a capacitação para entender noções de espaço, paisagem, natureza,
Estado e sociedade.
Segundo Cavalcante (1998, p. 128), a função da geografia é formar uma
consciência espacial, um raciocínio geográfico, levando à compreensão da
espacialidade das práticas sociais como modo de intervir no cotidiano de uma forma
mais autônoma. O maior desafio aqui estabelecido é o desenvolvimento de uma
metodologia compatível com a série do aluno, ou seja, o 6º ano do Ensino
Fundamental, que venha a enriquecer seus conhecimentos, em um processo
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contínuo, com a finalidade de contribuir para a formação de pessoas com
capacidade de ler e interpretar um mapa com seus símbolos e significados.
Sendo a escola o espaço em que o indivíduo é alfabetizado e aprende os
cálculos aritméticos, é, portanto, nesse espaço que se deve dar o ensino da
cartografia, para que assim possam ser formados indivíduos que tenham pleno
domínio do espaço em que vivem e, dessa forma, possam agir, transformando-o de
forma crítica e consciente.
De acordo com Almeida e Passini (2008: 15): “Ler mapas, portanto, significa
dominar esse sistema semiótico, essa linguagem cartográfica. E preparar o aluno para essa
leitura deve passar por preocupações metodológicas tão sérias quanto a de ensinar a ler e
escrever, contar e fazer cálculos matemáticos”.
Portanto, a escola deve ser o espaço onde o aluno passa a conhecer a
linguagem cartográfica e a utilizá-la no seu dia a dia. Só dessa forma estará
cumprindo sua função social, que é a de formar cidadãos críticos, com capacidade
de analisar sua realidade e com poder de transformação. O desenvolvimento dessa
capacidade permitirá que o aluno seja capaz de interpretar os dados geográficos,
não sendo apenas conteúdo ilustrativo ou para localizar fatos geográficos, como nos
alerta Passini (1990).
Deve-se ressaltar, ainda, que esse trabalho partirá do espaço concreto do
aluno (sala, escola, bairro), podendo atingir escalas maiores, como o município, o
estado, o país etc., e que não se trata de trabalhar o espaço de forma concêntrica,
isolada, mas deixando claro que existe uma inter-relação entre os elementos
estudados. Dessa forma, faz-se necessária a articulação entre conteúdos e
metodologias que possam levar o aluno superar suas dificuldades de aprendizagem.
O que temos percebido em sala de aula, no que diz respeito à orientação e
localização no espaço geográfico, é que grande parte dos alunos têm dificuldade
para se orientar no espaço onde vive. Percebe-se o desconhecimento dessa
orientação em sua formação inicial, que consideramos indispensável que seja
sanada para a compreensão dos conceitos. Portanto, se as crianças, logo nos
primeiros anos escolares, iniciarem um processo de aprendizagem que leve em
consideração as recomendações necessárias para a alfabetização cartográfica,
terão iniciado a sistematização para aprender a ler o espaço geográfico espaço
vivido.
O aluno tornar-se-á leitor crítico e mapeador consciente, após passar por
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uma alfabetização cartográfica agregada a uma compreensão significativa de seu
cotidiano. Aos poucos, seu olhar e associação se estenderão a um "mundo maior",
do local ao global, do planetário ao interplanetário, do concreto ao espaço abstrato.
Para isso, fará uma longa “caminhada”, a qual dependerá, principalmente, de como
foram introduzidos os elementos da representação gráfica, iniciada nos dois
primeiros ciclos da Educação Básica, para posteriormente introduzir a representação
cartográfica.
Saber ler o espaço inclui não só o que lhe está próximo, mas saber ler o
espaço geográfico que inclui as relações entre o homem e a natureza. Os mapas,
como instrumento de localização, foram e são essenciais para se fazer a leitura,
interpretação e compreensão da extensão da área, de sua riqueza natural,
econômica e política; para se estabelecerem estratégias de ações e intervenções
nesse espaço.
O livro “Geografia, isso serve em primeiro lugar para fazer a guerra”, de Yves
Lacoste (2001), dá ênfase para a importância do conhecimento sobre o espaço e os
erros cometidos pelo desconhecimento sobre o mesmo, cabendo aos professores e
geógrafos fazer uma geografia que seja uma teoria dos conjuntos espaciais e uma
práxis da articulação dos diferentes níveis de análise, não só informando sobre o
conteúdo espacial, mas preparando para saber pensar e fazer o espaço.
No entanto, para alcançar esses resultados, “é preciso fazer que a criança aja
num primeiro momento como mapeadora, para vir a ser um leitor eficaz de mapas,
sejam mapas colocados no papel ou no computador” (PASSINI, 2004, p. 19).
A prática, os métodos, a metodologia adotada em sala de aula, não pode ser
separada da realidade social. Portanto, a geografia ensinada para os alunos deve
ser a que realmente dê conta de entendê-la como ciência geográfica, capaz de
atender a todos os interesses da população de modo geral.
A preparação do aluno para leitor deve, antes, cumprir a passagem pelo papel
de mapeador, respeitando o nível de seu desenvolvimento cognitivo, sua faixa etária
e a realidade de seu espaço vivido, para aos poucos ir se aprofundando e se
familiarizando com outras realidades, outras simbologias, de forma globalizada. Para
que os conceitos e noções cartográficas sejam apreendidos cognitivamente, de
modo que os sujeitos se sintam como parte integrante do sistema do conhecimento,
é necessário estabelecer o “elo” entre o que foi estudado e sua importância e
significado na prática.
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A dificuldade encontrada, hoje, para localizar lugares, traçar as coordenadas
geográficas, não é somente de alunos, pois mesmo entre o corpo docente percebe-
se insegurança com relação à não facilidade e rapidez no manuseio de mapas,
consequência de um ensino em que não foi trabalhada essa prática. Portanto, cabe
aos educadores, a partir dos conhecimentos que as crianças trazem de seu
“mundo”, aprofundá-los, sistematizá-los e torná-los concretos, para serem exercidos
de forma significativa.
De acordo com as Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná, o trabalho
com mapas deve ser iniciado através de representações feitas pelos alunos, para a
identificação de objetos em escala proporcional aos desenhos representados. Aos
poucos, vão-se apropriando da linguagem cartográfica padronizada, ou seja, oficial,
válida para todo o território internacional, em sua leitura.
A leitura do espaço geográfico só ocorre, de fato, com a contribuição da
cartografia como ferramenta da linguagem da geografia. Precisamos pensar numa
metodologia que não se detenha somente à teoria, à memorização, mas que tenha o
compromisso de articulá-la com suas transformações, produções, possibilitando uma
leitura mais coerente, compreensível e real do mundo. Nesse sentido, a cartografia é
uma ferramenta indispensável no ensino de Geografia. Os mapas devem ser "lidos
pelos alunos como textos passíveis de interpretação, problematização e análise
crítica" (DCE, 2006 p. 48), vinculados aos conteúdos de maneira a integrar teoria e
prática de forma coerente com os fundamentos propostos para o ensino de
geografia.
Atendendo esses objetivos, foram apresentados as professores de geografia
de 5ª série/6º ano do Ensino Fundamental conceitos que envolviam noções básicas
de alfabetização cartográfica, com a intenção de auxiliá-los a enriquecer sua prática
pedagógica, fazendo uso da Cartografia Social. Tivemos a intenção de criar um
estudo diferenciado, construído com representações que revelassem uma crítica
consciente, dando margem à reflexão. A intenção também foi propiciar, entre os
professores da área, a identificação das reais dificuldades encontradas no cotidiano
das aulas de geografia, levando-os a buscar alternativas de novas metodologias que
auxiliem no entendimento da cartografia.
Portanto, a sugestão proposta foi de um trabalho de campo, que resultasse
num mapeamento de um determinado espaço, podendo ser dentro da escola, em
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seus vários ambientes, em seu entorno ou em seu bairro, definido previamente e
acompanhado pelo professor.
Para realizar a atividade proposta inicialmente, o professor aplicador iniciou
com a motivação dos alunos para o trabalho. Nesse ponto, era fundamental que eles
percebessem o significado da produção cartográfica como atividade muito
importante na sociedade e, portanto, na escola também. Nesse primeiro momento, a
intenção também era apresentar-lhes uma possibilidade a mais: a de que eles
fossem agentes produtores de seus próprios mapas, e mapas mais significativos,
mapas que trouxessem informações que eles próprios, em equipe, julgassem
relevantes durante um levantamento que fariam, in loco, de diversos dados e, mais
do que isso, de diversas informações consideradas importantes por eles (como se
sentiam em determinado local, o que lhes chamava a atenção em outro...).
Nesse primeiro momento, também foi apresentada às turmas uma imagem
retirada do Google Maps, uma vista aérea da região do entorno do colégio, que seria
a área a ser mapeada por eles. Isso foi fundamental para que os alunos
compreendessem o formato do trabalho que deles se esperava.
Vista do Colégio Est. Elias Abrahão no bairro Jardim Menino Deus- Quatro Barras, Pr.
Fonte: Google mapas acesso em 01/08/11
Em seguida, foi feita a divisão dos alunos em equipes e passadas as
orientações práticas para o trabalho de campo:
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• Os alunos deveriam tomar cuidados redobrados em relação à sua segurança,
transitando por calçadas sempre que possível, e obedecendo às orientações do
professor (ou outro funcionário da escola) que os acompanhava.
• Nas entrevistas, seria interessante e mais produtivo levar um grupo pequeno de
questões preestabelecidas, de modo que o processo fosse mais dinamizado. Os
próprios alunos, a partir disso, frequentemente criaram outras tantas questões,
enriquecendo seus trabalhos e diversificando a gama de informações neles
presentes.
• Seria estabelecido um tempo-limite para a atividade extraclasse, o que permitiria
que não se perdesse tempo com brincadeiras e distrações fora do trabalho.
• Os alunos deveriam ir a campo, munidos de material de escrita para fazer suas
anotações e desenhos.
• Para cada equipe seria designado um espaço específico a ser mapeado, dentro
do espaço maior, para evitar repetições na mesma sala.
Esses trabalhos mais tarde seriam expostos juntos para dar a noção do
conjunto. Mesmo assim, várias equipes cobriram o mesmo espaço, uma vez que o
trabalho foi aplicado a várias turmas;
Importante também, nesse momento, foi a escolha de se fazer equipes de no
máximo 8 alunos, por se entender que grupos maiores se dispersariam mais
facilmente, dificultando o bom andamento do trabalho.
A faixa etária escolhida também estava bastante adequada, pois os alunos
demonstraram grande envolvimento com a atividade, inclusive inibindo
comportamentos inadequados de certos alunos menos bem comportados. As ações
de campo transcorreram sem incidentes, e foi um momento de grande
aproveitamento do trabalho prévio em sala de aula sobre a Cartografia Social.
Os alunos levantaram dados como “região com muito lixo”, “comércio
abandonado”, “asfalto novo”, “terreno baldio”, “igreja”, “oficina mecânica”, “rua bem
cuidada”, “esgoto a céu aberto” e “rua barulhenta”, entre outros. Dados mais
pessoais, como “casa da tia do Tiago”, foram também anotados por eles. O
professor permitiu que assim o fizessem, pois mais tarde haveria debate sobre a
relevância de todas as informações.
Foi importante a presença do professor, orientando os alunos a investigarem
o espaço à sua volta com um olhar mais crítico, percebendo e anotando coisas que
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normalmente lhes passariam despercebidas. Um dos critérios foi “aquilo que é
importante saber que existe aqui, para se saber como é este lugar aqui”. Essa
orientação o professor passou já de início, antes da separação das equipes, e
mesmo aquelas que foram acompanhadas por funcionários não professores
executaram com bastante proveito o trabalho.
Segundo o professor aplicador, esse trabalho também permite, de maneira
excelente, a educação das crianças sobre respeito. Respeito pelas diferenças
sociais, especialmente quando estão descrevendo em suas anotações lugares mais
pobres e entrevistando pessoas muito simples. Respeito aos outros, quando estão
fazendo a entrevista, uma vez que alguns alunos parecem claramente não trazer de
casa a noção do “com licença, por favor, obrigado”. É também papel do professor
interferir nesse momento e educar, simplesmente.
Depois do trabalho de campo, todos retornaram para as salas de aula e
tiveram um momento de intensos debates e troca de experiências. Foi bastante
edificante ver a que ponto as crianças tomaram posse para si da tarefa de criar seus
próprios mapas. Também foi bastante interessante verificar que os alunos
efetivamente passaram, em conjunto e trocando relatos entre si, a conhecer melhor
o próprio bairro. Muitos sugeriam aos membros de outras equipes que
representassem dessa ou daquela forma o que não tinham visto, mas que
conheciam por ali perto morarem.
Os alunos, então, reunidos novamente nas mesmas equipes, selecionaram as
informações que fossem socialmente mais relevantes, excluindo-se anotações muito
pessoais, como “minha casa”, mas mantendo-se, para sua surpresa, outras, como
“lugar triste”, “campo de futebol” e “rua sem calçada”.
Passaram então à confecção dos mapas, trabalho feito em equipes, mas
estas agora se separando em grupos com tarefas específicas: alguns
confeccionavam as legendas (utilizando seus próprios desenhos, sem a interferência
direta do professor), outros elaboravam a parte das ruas e casas, outros estavam
encarregados de cuidar da correspondência do trabalho de todos (legendas,
desenhos e anotações).
A seguir, fotos tiradas da confecção dos mapas em sala de aula:
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A avaliação, como não poderia deixar de ser, foi diagnóstica e contínua, e as
ações e reações dos alunos durante todo o processo deram o tom das notas,
bastante satisfatórias.
O resultado final, segundo o professor, foi motivo de orgulho para todos e
para ele especialmente, pela satisfação de um trabalho feito com um significado
bastante claro e pertinente, sendo a melhor parte a adesão dos alunos. O professor
aplicador é novamente professor das mesmas turmas em 2112, agora no 7º ano, e,
segundo ele, os alunos querem saber quando farão de novo um trabalho parecido.
Relata o professor: “Também demonstram conhecimentos muito bons na leitura e
interpretação de mapas, embora eu já tenha ouvido frases como "os nossos mapas
eram mais legais, né professor?".
2.1 - GTR – Grupo de Trabalho em Rede
É importante considerar que nesse processo também ocorreu o GTR (Grupo
de Trabalho em Rede), que ofereceu tutoria para um grupo de catorze professores
da Rede Estadual de Ensino, através da EaD (Educação a Distância), o que
possibilitou uma discussão sobre o tema proposto – Cartografia Social.
Dessa forma, o GTR veio não somente contribuir com a prática pedagógica
do professor PDE, mas também possibilitar uma socialização com outros
profissionais que atuam na rede, visando o conhecimento de novos aportes
metodológicos para as aulas de cartografia escolar e geografia em geral.
2.2 - Relatos dos professores cursistas que participaram do GTR em 2011
Professor 1:
– "Muito importante o projeto da professora tutora, pois trabalho com a 5ª
série e percebo a dificuldade dos alunos dessa faixa etária em ler e interpretar
diferentes mapas e em fazer orientação e localização espacial. Também acredito
que se deva iniciar a alfabetização cartográfica desde o início do processo escolar
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do educando, ou seja, na pré-escola, trabalhando com desenhos de trajetos, espaço
da sala de aula, da casa do aluno, da escola, entre outros...".
Professor 2:
– "Quero iniciar falando, ou, melhor, escrevendo, que adoro cartografia e
trabalho incansavelmente com todas as turmas em que leciono. Nas 5as séries (6os
anos), realizo inúmeras atividades com os alunos partindo sempre da realidade que
os permeia. Desenvolvi, nesses 20 e poucos anos, várias atividades com mapas,
cartas, utilizando o nosso cotidiano. É de suma importância seu trabalho e que ele
contribua para clarear aos educadores a necessidade da cartografia e a não
desvinculação dessa da geografia escolar, ressaltando que já esteve deixada de
lado há algum tempo, sendo resgatada atualmente pelos autores e valorizada como
deve ser. Só é possível entender o espaço geográfico se ele estiver firmemente
baseado na cartografia. E esse entendimento começa na escola. Citamos aqui e no
seu projeto os 6os anos, mas creio que deveria ser trabalhada com muita seriedade
no início da vida escolar, onde os alunos dão início e embasamento a todo o seu
aprendizado. Como você cita em seus objetivos, a elaboração de símbolos,
legendas levará o aluno à leitura e compreensão, mais tarde e através da
cartografia, do espaço em que vive, e esse é o grande objetivo da geografia
escolar."
Professor 3:
– "Acho muito importante o estudo da Cartografia no ensino da
Geografia, pois quando iniciei meu trabalho como professora de Geografia no ano
de 2003, percebi que a cartografia havia sido deixada de lado por parte de muitos
professores e senti a dificuldade dos alunos em ler, interpretar e localizar
informações em mapas, cartas, gráficos, plantas. Foi quando retomamos novamente
o trabalho com a cartografia desde a 5ª série na escola em que trabalho, e já
estamos colhendo os frutos".
–
22
Professor 4:
– "Em minha opinião, a cartografia faz parte da Geografia, é uma ferramenta
muito importante para entender o espaço geográfico, pois muitas vezes a cartografia
é deixada de lado pelo próprio professor que não tem domínio e nem conhecimento
de metodologias para desenvolver o trabalho com a linguagem cartográfica,
principalmente nas séries iniciais. Esse é um tema que me chama muito a atenção,
pois quando cursei a faculdade também senti dificuldade com a cartografia, por isso
busco me aperfeiçoar sempre para poder passar para meus alunos a importância
desse conteúdo em nossa vida cotidiana. Deve-se dar prioridade à construção dos
conceitos pela ação da criança, tomando como referência as suas observações do
lugar de vivência, para que se possam formalizar conceitos geográficos por meio da
linguagem cartográfica. E as Diretrizes Curriculares de Geografia do Estado do
Paraná (2009) sugerem que os mapas e seus conteúdos sejam lidos pelos
estudantes como se fossem textos, passíveis de interpretação, problematização e
análise crítica. 'Não devem ser meros instrumentos de localização dos eventos e
acidentes geográficos'”.
2.3 - Semana Pedagógica
Outro instrumento elaborado, voltado para o professor com o objetivo de
compreender sua percepção da ação escolar, foi a oficina proposta sobre
Cartografia Escolar, na semana pedagógica de julho de 2012.
Nesse momento ocorreu a reflexão com os professores sobre novas
metodologias na hora de ensinar, partindo-se do conhecimento trazido pelos alunos
do lugar onde vivem.
Professores e funcionários do Colégio Estadual Elias Abrahão tiveram a
oportunidade de vivenciar, nessa oficina, novas práticas colocadas pelos povos da
região Norte e que, trazidas para a sala de aula, deram ótimos resultados, como
puderam também ouvir do professor aplicador a experiência que viveu trabalhando
essa nova proposta.
Ao verem fotos e assistirem aos vídeos sobre a Cartografia Social, os
participantes se sentiram motivados a trazer novas formas de ensinar partindo da
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realidade do aluno e perceberam, com o relato do professor, o quanto isso é
significativo e gratificante para o aluno confeccionar seu próprio mapa.
3 – CONCLUSÃO
Concluiu-se que a nova metodologia ligada ao processo das noções de
orientação, localização e representação do espaço para professores dos de 6º ano
do Ensino Fundamental foi de grande importância para o desenvolvimento das
atividades relacionadas à Cartografia Social no entorno da escola.
A ideia contribuiu para instigar o professor com novas proposições e
situações que proporcionam a reflexão de como levar o aluno a pensar o espaço
através da cartografia social. Constatou-se que a sugestão do presente material foi
entendida como um recurso metodológico imprescindível ao professor, mas que,
como qualquer outro instrumento didático, deve ser adequado à realidade do aluno e
dos professores, ou seja à realidade escolar em que atuam.
Dessa forma, a implementação contribuiu com o processo de ensino-
aprendizagem de conteúdos cartográficos, atingindo seu objetivo central para o
processo de alfabetização cartográfica.
A experiência apresentada neste trabalho corresponde a algumas reflexões
realizadas com professores de geografia do 6º ano do Ensino Fundamental do
Colégio Estadual Elias Abrahão, em Quatro Barras, a partir das quais foi possível
perceber algumas dificuldades em levar o aluno a fazer uso dos conhecimentos
geográficos, principalmente no que se refere à localização e orientação espacial.
A sugestão metodológica apresentada mostrou, no decorrer do
desenvolvimento de suas atividades, que é possível trabalhar os conteúdos
escolares por meio de um encaminhamento que estimule tanto o professor quanto
os alunos a entenderem a linguagem cartográfica, voltada para a produção do saber
em todas as áreas do conhecimento, mas principalmente em geografia.
Com a aplicação da nova metodologia, puderam-se observar algumas
habilidades nos alunos que normalmente não são vistas, no que diz respeito aos
conceitos básicos de legenda, escala e orientação espacial: estimulados a criar seu
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próprio mapa, tiveram motivação para desempenhar um trabalho que foi além das
expectativas do professor.
Através da proposta, o professor pode desenvolver atividades utilizando-se da
cartografia social, interagindo na comunidade local, verificando sua viabilidade com
estratégia de ensino na aprendizagem de conceitos geográficos e cartográficos,
além de incentivar a criação de símbolos e legendas, identificando as mudanças
espaciais ocorridas na região ao longo do tempo.
Vale a pena ressaltar que não foi um simples trabalho prático de registros e
acontecimentos, mas sim o trabalho de uma cartografia sensorial afetiva,
conjuntamente com a Cartografia Social, em que o aluno teve condições de
expressar seus sentimentos num mapa situacional ou locacional como ele é visto ou
percebido naquele espaço, dando fundamental importância para a compreensão ou
noção do real e do abstrato, do espaço vivido pelo aluno, no qual ele próprio colocou
suas emoções e percebeu-se como parte do espaço que estuda.
Espera-se que o trabalho proposto tenha contribuído para o alcance dos
objetivos de incentivar e orientar professores a buscarem novas práticas de ensinar,
construindo noções de orientação e localização geográficas através do uso da
Cartografia Social. Esse exercício em diferentes níveis, no mapa e na realidade com
o mapa, possibilita ao aluno um entendimento gradativo das relações espaciais, que
lhe permitem sua própria construção, relacionando os estudos sobre o espaço com
as condições para exercer sua cidadania.
4 – REFERÊNCIAS
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ALMEIDA, Rosangela; PASSINI, Elza Y. O espaço geográfico: ensino e representação. São Paulo: Contexto, 2008. (Coleção Repensando o Ensino)
CASTROGIOVANNI, Antonio Carlos et al. Geografia em sala de aula. Práticas e reflexões. 4. ed. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 2003.
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CAVALCANTI, Lana de Souza, Geografia, Escola e Construção de Conhecimentos. Campinas, S.P: Papirus, 1998. (Coleção Magistério: Formação e Trabalho Pedagógico) 16ª Edição – 2010.
DCEs – Diretrizes Curriculares da Educação Básica – Paraná 2006, p. 48.
GOOGLE: Lages Lara, Folha do NAEA, acesso em 06/04/2011.
HELLER, Agnes. O cotidiano e a História. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1989.
LACOSTE, Yves. A geografia – isso serve, em primeiro lugar, para fazer a guerra. 2. ed. Campinas: Papirus, 1989. p. 142-151.
NOVA CARTOGRAFIA SOCIAL DA AMAZÔNIA. Disponível em: http://www.novacartografiasocial.com/. Acesso em: 08/06/2011.
PAGANELLI, Tomoko Yyda et al. Para ensinar e aprender geografia. São Paulo: Cortez, 2009.
PARANÁ, Secretaria de Estado da Educação. Superintendência de Ensino. Diretrizes Curriculares da Educação Básica – Geografia, 2008.
PIAGET, Jean. Formação do símbolo na criança. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1974.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. Rio de Janeiro: Martins Fontes,1996.
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