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A EXPANSÃO DA EDUCAÇÃO SUPERIOR E A VALORIZAÇÃO DE
PROFESSORES DA EDUCAÇÃO BÁSICA: O “PACTO EDUCATIVO” NO ESTADO
DO PARANÁ
Marta Lucia Croce
Universidade Estadual de Maringá - UEM
Manuel Tavares Gomes
tavares.lusó[email protected]
Universidade Nove de Julho – UNINOVE
Eixo 6. Produção do conhecimento na expansão da educação superior.
RESUMO
O compromisso com a valorização dos professores da Educação Básica, como exigência
instaurada pelo Sistema Nacional de Formação de Profissionais do Magistério, está
fortemente vinculado ao programa de expansão universitária gestado no Paraná pelo governo
Requião-Pessuti (2003-2010). Na tentativa de qualificar o debate acerca da ampliação das
Instituições Públicas de Ensino Superior do Paraná (IPES), entendida por nós como política
pública local proveniente das demandas da educação pública paranaense, consideramos para
este artigo o “pacto educativo” firmado entre Governo Estadual, Sindicato dos Trabalhadores
em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato) e IPES. Expomos os caminhos políticos e de
governança traçados para a formação continuada de professores do Quadro Próprio do
Magistério Estadual (QPM) em serviço, e a expansão, concomitante, das universidades
estaduais, a partir da criação do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE. Trata-se
de uma política educacional implantada em 2006 para atender demandas sindicais e
salvaguardar as IPES, carentes de investimentos em sua estrutura física e humana. O PDE
possui características bem peculiares, diante das práticas de capacitação comumente
realizadas, e por este motivo tornou possível a governabilidade do setor educacional público,
tendo em vista o consenso institucional que permitiu ações político-administrativas de
impacto positivo na educação escolar, e enquanto neutralizador de conflitos.
Palavras-Chave: Pacto Educativo; Expansão Universitária; Formação Continuada.
INTRODUÇÃO
As políticas nacionais de formação de professores, com destaque para aquelas
instituídas a partir dos anos 2000, têm adquirido corpo por meio dos programas
implementados pelos governos estaduais, em todo o País. Acompanhando o movimento
nacional de valorização do magistério público, o Estado do Paraná, no Governo Requião-
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Pessuti (2003-2010) implanta, em 2006, o Programa de Desenvolvimento Educacional –
PDE1.
Trata-se de um programa voltado à formação continuada e valorização dos Professores
do Quadro Próprio do Magistério Público – QPM, que possui características inovadoras em
relação aos modelos de capacitação docente, comumente realizados. Para além de suas
especificidades formativas, o PDE deve ser entendido como uma política educacional voltada
à formação continuada de professores da rede estadual de ensino, que possibilitou uma
expressiva expansão das Universidades Públicas de Ensino Superior – IPES.
Apresentando caráter sem precedentes no país, o Programa de Desenvolvimento
Educacional (PDE) foi planejado durante a campanha eleitoral para governadores, em 2002, e
gestado em 2003 após conversações entre os governantes eleitos e o Sindicato dos
Profissionais da Educação Básica do Paraná – APP Sindicato. No intuito de atender às
demandas sindicais, apaziguar os professores e garantir governabilidade, o Governo Requião-
Pessuti propõe o PDE, amalgamado ao Plano de Carreira do Magistério e oferecendo um ano
sabático para que os professores voltassem às universidades para se capacitarem.
Considerando o preâmbulo deste texto e admitindo que a realidade sociopolítica é
dinâmica e requer dos agentes políticos adequação constante às mudanças e demandas da
sociedade, tomamos uma questão que vem nos acompanhando nos estudos desenvolvidos na
tese de doutoramento, referente ao papel dos atores políticos na criação e implementação de
políticas educacionais voltadas à educação escolar pública, em seus diferentes níveis e
modalidades de ensino. Debruçamo-nos sobre um objeto de investigação que possui
características sui generis, como o PDE, interpelando, também, seu papel na expansão das
universidades públicas paranaenses.
Nosso intuito foi estabelecer os vínculos criados entre os atores políticos e sociais ao
buscarem atender demandas federais de aspectos jurídico-legais, políticos eleitorais e sociais.
Neste sentido, consideramos como foco de análise a gênese do PDE, quando resgatamos o
papel dos atores políticos e sociais, com observância para o cenário político-educacional
vigente à época das eleições de 2002, e nos anos seguintes à instauração do Governo. Na
campanha eleitoral ficaria estabelecido entre candidatos ao Governo estadual e diretoria do
Sindicato dos Profissionais da Educação Básica (APP) um “pacto educacional”, que
1 O Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, criado no Estado do Paraná em 2006, apesar da mesma
sigla difere totalmente do Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE, lançado pelo governo federal em 2007.
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permitiria um entrelaçamento de ações, que culminaram na expansão das universidades do
Paraná.
Como “pacto educacional”, entendemos acordos firmados e o consenso estabelecido
entre Governo, APP-Sindicato e IPES, para que os interesses e necessidades dos agentes
políticos e sociais fossem plenamente atingidos, contemplados por um Governo progressista,
com propósito de garantir governabilidade. Formou-se, portanto, um tripé político-
institucional, considerando os caminhos da administração pública, esboçados na
implementação da formação continuada em serviço dos professores QPM, e que propiciou a
expansão das universidades estaduais com atendimento às demandas sindicais.
Ao implantar o PDE, no ano de 2006, o governo Requião/Pessuti instituiria um novo
modelo de formação de professores, envolvendo o espaço acadêmico e a mão de obra docente
das universidades. Coroando um processo iniciado em 2003, com a criação do Plano de
Carreira dos Professores QPM, esta política educacional possibilitou, sem dúvida, o
fortalecimento dos atores políticos e sociais nos acordos firmados entre instituições ligadas à
educação pública.
O que expomos e analisamos é o modus operandi dos governantes e lideranças
sindicais no ato da criação do PDE, que resultou no “pacto educativo” propiciando, de modo
inequívoco, a expansão universitária no Paraná. Nosso estudo demonstrou que as intenções e
objetivos em torno de uma política de formação continuada de professores contribuíram,
ainda, para um período de hegemonia política legitimada pelo consenso institucional.
Apresentamos, a seguir, o PDE, de modo sintético, porém esclarecedor, assim como
configuramos o cenário político e social que possibilitaria, ao então candidato Roberto
Requião (PMDB), legitimar sua governabilidade contando com o apoio da APP-Sindicato, e a
consequente adesão das universidades públicas à proposta de governança. Tecemos algumas
considerações acerca do “pacto educativo” e o que tem representado a parceria entre os atores
políticos e sociais, para a expansão das IPES do Paraná.
O PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL (PDE)
Para tratarmos da criação do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE)
originado na gestão Requião-Pessuti (2003-2010) é indispensável uma breve apresentação do
plano de ação proposto pela Secretaria de Estado da Educação do Paraná (SEED), constitutivo
da formação continuada em serviço dos professores da Educação Básica. Na criação do PDE,
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o governo estadual traz para o cenário político-administrativo-social as demandas sindicais
históricas; o caráter imperativo de propiciar a formação continuada dos professores da
educação básica; e propõe soluções que redimensionam o papel social e a
manutenção/ampliação das Instituições Públicas de Ensino Superior (IPES), frente a um
contexto sócio-político e econômico de desmonte da educação pública, herança do governo
anterior, de Jaime Lerner.
O PDE encontra-se descrito em material informativo distribuído pela Superintendência
da Educação e Coordenação do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE, que
recebe o título de: Uma Nova Política de Formação Continuada e Valorização dos
Professores da Educação Básica da Rede Pública Estadual- Documento Síntese: versão para
discussão, com primeira edição publicada em 2007. Está elaborado em consonância com as
Diretrizes Curriculares para a Educação Básica do Estado do Paraná, e tem como política
pública a formação continuada dos professores de todas as áreas de ensino da Educação
Básica. Como acréscimos, o Programa prevê avanços na carreira dos professores do Quadro
Próprio do Magistério (QPM), com tempo livre para estudos, demonstrando:
[...] a justa preocupação com a formação permanente das educadoras e dos
educadores e com o real aprendizado de nossos estudantes [...]. Ao optar
pela implementação do Programa de Desenvolvimento Educacional – PDE,
um programa de formação continuada que não encontra modelos públicos
similares, a educação permanente, mais uma vez, mostra-se inovadora,
coerente na perseguição à utopia da educação de fato universal, democrática,
transformadora e de qualidade (PARANÁ/SEED, 2007, p.4)
Dentre os vários elementos pertinentes ao PDE, citados no Documento Síntese
(PARANÁ/SEED, 2007), e diante de seu caráter inédito e inovador, destacamos, para a
temática em tela, a parceria com as Instituições Públicas de Ensino Superior do Paraná
(IPES), que se sobressai por abarcar, hoje, um total de treze instituições, entre universidades,
institutos e faculdades envolvidas com o Programa. No ano de sua implantação eram cinco as
universidades estaduais, duas instituições federais e faculdades públicas espalhadas por todas
as regiões do Paraná.
A instalação do PDE/PR aconteceu no segundo semestre de 2006, com o
preenchimento de mil e cem vagas para professores QPM, distribuídas em dezessete áreas
curriculares. O processo seletivo englobou prova escrita sobre conhecimentos gerais e
específicos, com observância para o uso da linguagem “culta”, e prova de títulos. Incluiu,
ainda, posição funcional na carreira docente e currículo com pontuação para cursos
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realizados. Como objetivo estabelecido previu-se atendimento, de forma indireta, a quarenta e
quatro mil professores da rede estadual de ensino básico, utilizando grupos de trabalho em
rede. Até este momento, o Programa mantém seu formato original.
O PDE propicia que os professores selecionados sejam afastados de suas atividades
escolares, com remuneração integral, pelo período de dois anos, sendo que no primeiro ano
este afastamento é de 100% e no segundo ano de 30%. Neste espaço de tempo eles voltam a
frequentar a universidade para receberem orientações individuais em sua área de atuação,
participam de cursos, palestras, seminários e de todos os eventos proporcionados no ambiente
acadêmico e nos exclusivamente organizados para eles. Há uma inserção total na academia,
com acesso à biblioteca central, laboratórios, grupos de estudo, dentre outras atividades.
Tendo como um de seus pressupostos “a organização de um programa de formação
continuada integrado com as instituições de ensino superior” (PARANÁ/SEED, 2007), ficou
estabelecido que a capacitação pelo PDE fosse presencial, no espaço físico das IPES, com
diferentes recursos metodológicos e didáticos. Esta relação estreita entre os sistemas de ensino
propiciaria o redimensionamento das práticas educativas; a reflexão sobre os currículos das
licenciaturas e melhor qualificação profissional.
Cabe, no entanto, desvelarmos o contexto político no ano de 2002, diante das eleições
para Governador, no Paraná que conduziram os encaminhamentos para o “pacto educacional”.
INCURSÕES SOBRE O PACTO EDUCACIONAL
Durante a campanha eleitoral pertinente ao primeiro turno das eleições de 2002, os
então candidatos ao Governo do Paraná, Roberto Requião de Mello e Silva e Orlando Pessuti,
debateram sobre o Plano de Carreira docente e técnico administrativo dos profissionais da
educação básica, junto à APP-Sindicato. Naquele momento, o então presidente da APP,
Professor José Rodrigues Lemos, com demais membros da diretoria sindical levaram aos
candidatos as reivindicações postas aos governos anteriores, sem sucesso. Destacam-se, para
além do Plano de Carreira: aumento real de salários; abertura de concursos públicos;
legalização de professores temporários; reconhecimento de cursos de pós-graduação strictu
sensu para ascensão de nível na carreira docente.
Era de conhecimento geral, tanto por parte dos educadores quanto pelos
candidatos, que aquelas reivindicações sempre foram prometidas e nunca
cumpridas integralmente pelos governos anteriores, em especial o Governo
de Jaime Lerner (1995-2002). Todas as tentativas de negociação com o
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Governo Lerner redundaram infrutíferas, portanto, um acordo pré-eleitoral,
firmado em documento, no qual Requião e Pessuti, se eleitos, tomariam
como primeiras medidas de seu Governo o atendimento aos professores do
Paraná foi uma notícia recebida com entusiasmo. (CROCE, 2013, p.191)
Este acordo pré-eleitoral significou a tão esperada oportunidade da APP-Sindicato
obter sucesso pelas lutas empreendidas por mais de uma década. Sacramentadas as promessas
de campanha e com prazos determinados para execução, Requião e Pessuti vencem o
adversário Alvaro Dias, que em seu mandato, de forma autoritária e desrespeitosa agrediu os
professores em greve diante do Palácio Iguaçu, sede do Governo. Neste cenário, muitos
funcionários da educação confiaram seu voto à Chapa Requião-Pessuti.
Logo após o resultado das eleições, Roberto Requião de Mello e Silva solicita do
então governador, Jayme Lerner, a suspensão de concurso público para contratação de 13.643
professores, previsto para ser realizado em 03/11/2002. Alegando necessidade de “[...] revisão
do concurso, para atender a um compromisso de campanha assumido com dirigentes do
sindicato dos professores paranaenses” (AGÊNCIA FOLHA, 2002), Requião abraça a tarefa
de promover o referido concurso logo no início de seu mandato. Assim o fez, e o concurso
ocorreu em 18/05/2003, com 46 mil professores inscritos.
Neste contexto desponta a ideia de se criar o PDE, e surge o interesse do Governo
eleito em estabelecer parceria com as IPES para a realização da formação continuada dos
professores. Era preciso atender aos professores da educação básica, dada a insatisfação dos
profissionais com o modelo de capacitação oferecido anteriormente pelo Governo Lerner,
considerado inadequado para a garantia de capacitação com qualidade técnica e
epistemológica. Para além deste fator determinante, estava presente a urgência de uma relação
amigável com a APP-Sindicato, para garantia de governabilidade, já que, historicamente, os
embates entre governantes e sindicalistas remontavam à década de 1980.
Em entrevista concedida à autora deste artigo, o agora Senador Roberto Requião
afirmou que as promessas de campanha foram duramente discutidas em encontros com os
dirigentes sindicais (REQUIÃO, 2012, In: CROCE, 2013). As pressões para atendimento às
reivindicações marcaram um processo cansativo, desgastante, até porque o Estado do Paraná
se comprometera a apoiar o Governo Lula da Silva, o que implicaria estar em consonância
com as decisões em nível federal, não só pela dependência legal exigida pela Constituição
Federal de 1988, como também pela LDB 9394/96.
Croce (2013) assevera que:
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Era preciso que o Governo paranaense reafirmasse o compromisso de
campanha voltado para a valorização do serviço público, pela afirmação da
democracia e pela transparência nas relações entre Estado e Sociedade, o que
envolvia o fortalecimento dos movimentos sociais, frustrados pelas gestões
anteriores. Os interesses político-partidários do PMDB do Paraná também
estavam na pauta do Governo. (CROCE, 2013, p.195)
Manter a administração estadual no mesmo compasso da administração federal
implicava em definir políticas educacionais de formação continuada em consonância com a
Rede Nacional de Formação Continuada de Professores de Educação Básica – REDE
(SEB/MEC). Na REDE está formalizada a necessidade de parceria entre escolas e
universidades no atendimento à formação em serviço.
Um conjunto de medidas legais estava em sintonia com as necessidades dos
trabalhadores em educação do Paraná, assim a ideia de um programa de formação continuada,
em parceria com as IPES, igualmente em franco desmonte por falta de investimentos no
Governo Lerner, consolidou o surgimento do PDE. Pensado inicialmente pelo Governo como
curso de pós-graduação em nível de mestrado, foi logo contestado pelos docentes das IPES e
proposto como curso de Extensão Universitária.
No mecanismo de implementação de políticas educacionais, consta do Art. 69 da LDB
que o Estado, no caso de sistemas estaduais de educação, deve aplicar, anualmente, pelo
menos 25% da receita resultante de impostos na manutenção e desenvolvimento do ensino
público, em todos os níveis. No cômputo geral da receita entram as transferências federais
feitas via Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização do Magistério:
FUNDEB. O Governo Requião-Pessuti, no entanto, ampliou para 30% os recursos financeiros
destinados à educação pública.
As obrigações para com o sistema federal foram atendidas, então o estado garantiu
verba para manter a educação pública, o pagamento de professores, a formação continuada via
PDE, e provimento de recursos para manutenção e ampliação das universidades estaduais.
Medidas que propiciaram governabilidade durante oito anos de gestão estadual.
Partes acordadas, negociações sacramentadas entre Estado, APP e IPES, com recursos
assegurados, inicia-se o PDE no segundo semestre de 2006. A primeira turma de professores
PDE começa a frequentar as universidades estaduais em março de 2007. Houve, a partir de
então, uma proximidade das IPES com as secretarias: de justiça, educação, ciência e
tecnologia, administração e previdência. Vários convênios foram firmados. O viés mais
privatista adotado pelo governo Jayme Lerner estava ficando para trás, dando lugar a um
modelo que privilegiava a instituição pública.
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Os acordos que possibilitaram o “pacto educativo” foram determinantes para a
expansão das universidades públicas. Tomando o caso da Universidade Estadual de Maringá,
em entrevista concedida a esta professora pesquisadora, o Professor Doutor Mario Luiz Neves
de Azevedo, nos anos de 2006 a 2010 atuando como Vice-Reitor, corrobora a nossa tese de
que o tripé pactual traçado com a criação do PDE propiciou significativa expansão das IPES
no Paraná.
De acordo com Azevedo (In: CROCE, 2013, p.246): “Com o PDE, sem dúvida houve
mais estímulo à expansão da universidade, com novos investimentos do estado”. No entanto,
a UEM obtém outros investimentos públicos para pesquisas e projetos que retornam à
sociedade em forma de prestação de bens e serviços. Com a criação do PDE, no entanto, a
construção de novos blocos com salas de aula, laboratórios de informática, auditórios
equipados para grandes eventos, sem falar na contratação de professores e técnicos
administrativos cresceu de modo significativo.
É necessário frisar que todas as sete universidades públicas do Paraná obtiveram
verbas extras relativas à sua participação na promoção e manutenção do PDE. Haja vista, os
prédios construídos exclusivamente para atendimento aos professores PDE, com estrutura
física de ótima qualidade e contratação de pessoal para serviços gerais e secretaria. O projeto
piloto dos prédios PDE, para todas as IPES, foi planejado e executado na UEM por arquitetos
e engenheiros que atuam na Prefeitura do Campus Sede, em Maringá.
Os investimentos do Governo estadual junto às IPES propiciariam, portanto, um
período de crescimento quantitativo e qualitativo da universidade pública, tendo como pano
de fundo o “pacto educativo” configurado no contexto sócio-político e econômico do
momento.
CONFIGURAÇÃO DO PACTO EDUCATIVO
Trouxemos nossa análise para a expansão das universidades estaduais, a partir da
chegada dos professores da Educação Básica, vindos de todos os municípios atendidos pelo
Campus Sede da Universidade Estadual de Maringá – UEM. Com a finalidade de partilharem
espaços de ensino, saberes docentes de diferentes áreas e cursos, estabelecerem contato
dinâmico com pessoas e seus conhecimentos no movimento acadêmico cotidiano, os
Professores PDE fortaleceram a parceria entre estado, ensino superior e educação básica,
descrita pela Secretaria de Estado da Educação – SEED - como um trabalho que promove:
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“[...] o diálogo entre os professores do ensino superior e os da educação básica através de
atividades teórico-práticas orientadas, tendo como resultado a produção de conhecimento e
mudanças qualitativas na prática escolar da escola pública paranaense” (SEED, 2012).
O ensino superior, como espaço de formação inicial do professor e diante da nova
política de formação continuada sustentada pelo PDE, estaria presente na instalação de um
modelo de governo progressista e interventor no Paraná. Michelotto (2005) registra aquele
momento como uma situação de mudança almejada pela sociedade e pelos educadores, mas
que não se distanciaria dos ditames da ordem econômica mundial. O capitalismo global,
apesar das mudanças nas últimas décadas, não garantiria ao Brasil e ao Estado do Paraná um
rompimento nas relações de ordem econômica, já que múltiplos fatores e atores acabam por
interferir na estruturação de uma decisão política pertinente aos países periféricos e
semiperiféricos.
Na gênese do PDE estabeleceu-se, portanto, um “pacto político-educacional”
conduzido pelo consenso entre atores políticos e sociais, sendo entendido como um dos níveis
possíveis de participação/influência da sociedade nas decisões em políticas públicas. De
acordo com Marin (2005): “Influenciar é o elemento nevrálgico na análise dos níveis de
participação”, isto posto pelo Banco Mundial nos remete à dimensão do cenário preparado
para os acordos firmados entre Governo, APP-Sindicato e IPES, no Paraná.
O discurso político de valorização docente, como fator de melhorias no sistema
escolar público, abarca o coletivo dos professores e as instituições que os representam
socialmente, mas se insere em um cenário político mundial característico do Estado capitalista
contemporâneo, conformado pela participação de agentes políticos e sociais, com interesses
diversos e soluções corporativas.
Afonso (2003) defende que:
É necessário discutir em maior profundidade a valorização das redes (ou
parcerias) entre actores colectivos e o Estado, porque, embora traduzam uma
das alternativas mais inovadoras e interessantes das actuais políticas
educacionais, elas também escondem uma nova (e mais eficaz) forma de
legitimação da acção do Estado, num contexto de retracção das políticas
públicas e dos direitos sociais, económicos e culturais (AFONSO, 2003,
p.40).
No caso de parcerias com responsabilidades articuladas, a criação de espaços de
atuação dos atores engajados em prol de objetivos comuns contribui para a concepção de
movimento social, de sociedade e de cultura, todavia com o risco de se instaurar um processo
de construção de consenso que servirá como mecanismo de controle, arrefecendo as
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iniciativas de contestação e, conjecturamos, como ferramenta de regulação do sistema
educacional.
Ao assumir o papel de articulador, com novos formatos de poder, o Estado contribui
para a mudança da noção moderna de Governo, por outra de Governança. A dimensão política
da nova relação entre Estado e Sociedade desponta, assim, como alternativa de liberdade no
conjunto dos indivíduos e em cada um. Superando-se o paradigma da modernidade, não
caberia somente aos governantes as tomadas de decisão, sem que haja espaço de reflexão e
ação dos atores sociais envolvidos na mudança, até porque se torna essencial a legitimação de
setores da sociedade, enquanto poder.
Quando propomos a análise do “pacto educacional” firmado no Paraná entre Governo,
APP-Sindicato e IPES conseguimos reforço epistemológico em Brandão (2003) ao afirmar
que a educação escolar pública tem como prioridade voltar-se para a “[...] criação, a
transformação, a aquisição e a partilha do saber [...]” (p.108), como um bem de direito
universal e uma resposta democrática à Sociedade. Existe a responsabilidade e o compromisso
de cada um e de todos nós, e sobre aqueles que designamos como nossos representantes, em
qualquer esfera de representação política.
Com respeito à articulação entre universidades e escola básica, já existiam inúmeros
projetos de capacitação docente em serviço, organizados e desenvolvidos pelas universidades
públicas paranaenses. O que chama a atenção no PDE, no entanto, é que a expectativa da
formação continuada em serviço recai sobre a ação político-administrativa do Governo, como
condição para que os professores da educação básica e do ensino superior façam frente ao que
lhes compete profissionalmente, mas com apoio inconteste aos governantes.
Sendo assim, promover o retorno dos professores da educação básica às universidades,
com tempo integral dedicado a leituras, pesquisas, orientações de projetos e cursos específicos
ofertados pelos docentes da academia, produz um sentimento de pertença ao meio
universitário, mas também induz à aceitação do controle do Governo sobre outras demandas
passíveis de contestação por parte dos atores sociais.
No “pacto educativo”, formalizado entre os agentes envolvidos, fica explícito que o
PDE é um programa catalizador “[...] integrado às atividades da formação continuada em
educação [...] e disciplina a promoção do professor para o nível III da carreira, conforme
previsto no Plano de Carreira do magistério estadual – Lei Complementar n.103, de 15 de
março de 2004” (SEED, 2011). Neste Plano de Carreira foi criado este nível de ascenso, como
o último da carreira docente, consagrando a luta sindical por um plano de carreira com
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progressão na Tabela de Vencimentos dos Professores do Quadro Próprio do Magistério.
Denominado como “nível PDE”, o professor que concluiu o curso ascende à classe A, do
nível PDE, tendo, a cada dois anos, direito à progressão de classe até a classe D.
As negociações entre Governo e APP produziram o nível PDE, estimulando o vínculo
entre formação e remuneração. Desta forma, o tripé estrutural formado pelos agentes –
Governo, APP e IPES – acabou por atender as demandas destas três esferas de poder político,
administrativo e social, com o Governo conseguindo aproximar-se do sindicato dos
professores (APP-Sindicato) antes mesmo das eleições de 2002, levantando as principais
reivindicações da categoria e tecendo acordos imediatos. Se eleitos, os governantes
atenderiam a todas elas e a APP-Sindicato igualmente respeitaria a necessidade de manter-se
apoiando o Governo e debatendo questões emergentes.
A chapa Requião-Pessuti concorda com uma promessa documentada e registrada em
cartório, com os acordos firmados junto à APP, e a utiliza como carro chefe da campanha
eleitoral. No documento, garante o plano de carreira, reajustes de salário e a formação
continuada. Anuncia, nos programas eleitorais, que promoverá uma formação continuada com
afastamento total da escola, tendo em vista o desgaste do professor no cotidiano escolar.
Para os professores da educação básica, as promessas de campanha soam como vitória
da categoria, que passa apoiar os candidatos. Vitorioso, já em 2003 o Governo articula os
meios para criar um plano de carreira e gera uma ideia de formação docente à qual
denominaria de Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE. Aloca, então, o nível PDE
ao Plano de Carreira, atrelando ascensão de nível com formação continuada. Um não existiria
sem o outro.
Em 2006, o Governo agrega as universidades públicas estaduais ao propósito do PDE,
já que seria obrigação do estado manter as instituições de ensino básico e superior. Congrega
propostas, projetos e acordos à efetivação de uma formação continuada diferenciada e inédita.
Mas não bastaria apenas manter escolas e IPES, seria necessário investir em construções,
reformas, ampliações e contratações. As exigências para a implantação do PDE estavam
impostas pelos gestores da educação, configurando a necessidade de novos acordos.
No caso da UEM, a Reitoria (2007-2010) abriu várias negociações quanto a
investimentos no Campus Sede e nos Campi de diferentes municípios da região. Para receber
professores, cerca de 1.500 a 2.000 a cada seleção que aconteceria anualmente, seria
indispensável concursos públicos para contratação de professores, verbas extras para
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ampliação dos espaços e aquisição de equipamentos e materiais de consumo diário. Tudo foi
feito e, em 2007, as IPES recebem a primeira turma de professores PDE, no total de 1.100.
O PDE passa de programa de governo a política pública de Estado, regulamentado
pela Lei Complementar nº 130, de 14 de julho de 2010. Desde então vem se mantendo com
alguma dificuldade, por conta das mudanças impostas pelo Governo atual, que demonstra
franco desinteresse pelas instituições de ensino público do estado e desrespeito pelos
profissionais da educação paranaense.
Mantem-se a proposta de formação continuada, com o mesmo formato e número
regular de professores, anualmente, mas já não há investimentos significativos e
comprometidos com o PDE, com a APP-Sindicato e universidades estaduais. As verbas de
custeio para manutenção das IPES sofrem cortes gradativos, exigindo que universidades,
escolas e sindicato estejam em alerta e cobrando do Governo suas obrigações com a educação
básica e superior.
Apesar das mudanças governamentais ocorridas de 2011 até o momento, a expansão
das universidades estaduais continua acontecendo?
CONSIDERAÇÕES FINAIS: Expansão universitária ou nada disso?
Em nossas reflexões finais, diante das abordagens aligeiradas impostas pelo modelo de
documento aqui produzido, decidimos questionar se a expansão do ensino superior pode ser
considerada real, substantiva, e se respeitado o “pacto educativo” durante todo o Governo
Requião-Pessuti, mantém-se a mesma promessa no Governo atual. Especialmente com a
alteração do PDE para Política de Estado.
Observando, durante a pesquisa de doutoramento, as mudanças estruturais e
estruturantes ocorridas nas IPES estaduais, concluímos que a expansão universitária ocorreu
em todos os campi, de todas as instituições de ensino superior do Paraná, entre 2006 e 2010.
Garantia-se não só a formação continuada aos professores da educação básica pelo PDE, com
todas as prerrogativas acordadas, mas também possibilitando que outras áreas de pesquisa e
ensino acadêmicos fossem beneficiadas com verbas suplementares.
Citamos, a título de exemplo, a Fazenda Escola da UEM, que viu ampliada sua frota
de tratores; a aquisição de insumos para a agricultura e pecuária; renovação das ferramentas
de pesquisa aos estudantes de Agronomia e Medicina Veterinária.
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Na Universidade Estadual do Centro-Oeste (UNICENTRO), como em todas as demais
IPES, houve a ampliação de campus, com novas construções e edificações que atendem
alunos das mais diferentes áreas de conhecimento, como Ciências Biológicas, Ciências da
Saúde e Ciências Agrárias. Esta expansão do ensino superior se dá, também, na ampliação das
vagas por curso e nas transferências externas.
Quanto à educação básica, é inegável o aprendizado promovido pela parceria
Universidade-Escola, aos professores PDE. No primeiro ano de curso são afastados de seus
locais de trabalho e frequentam aulas, encontros, cursos no ensino superior recebendo, ainda,
orientação de projetos de pesquisa e de intervenção em suas áreas de formação ou atuação,
sob condução de professores mestres e doutores. No segundo ano, ainda sob orientação, estes
profissionais retornam às suas escolas para implementarem um projeto que interfira no
cotidiano escolar, de modo a implantar modificações no Projeto Pedagógico, na organização e
gestão do ambiente educativo.
Quanto ao papel do Governo, durante a gestão Requião-Pessuti a governabilidade foi
garantida pela paz política e social junto ao setor da educação pública. Não havia conflitos
que pudessem desestruturar os planos governamentais. As demandas escolares e universitárias
eram prontamente atendidas, com pouca intervenção da APP-Sindicato e alguns embates
pouco intensos entre reitores e secretários de governo.
Consideramos que, como ator político e social, o Estado contemporâneo vê-se
ampliado em seu papel de organizar e gerenciar questões econômicas, jurídicas e de bens
sociais materiais e imateriais de manutenção da sociedade, devendo cumprir sua promessa de
paz, liberdade, igualdade a todos os indivíduos. Na temática abordada, a instauração de um
processo de reorganização da valorização dos professores da escola básica conseguiu
promover, junto às universidades do Paraná, um sentimento real de florescimento das
instituições, por meio da expansão de seus espaços, ampliação de suas possibilidades ligadas
ao ensino, extensão e pesquisa, manutenção de seu quadro docente qualificado e ampliado,
garantindo, com competência, o estreitamento dos laços entre educação superior e educação
básica.
Afirmamos com segurança que a expansão das IPES, no Governo Requião-Pessuti foi
real e garantiu a sobrevivência de muitas delas, de menor porte, prestes a fechar suas portas
após o Governo Lerner. Houve um resgate do sistema universitário do Paraná, durante, pelo
menos, cinco anos, fortalecendo o ensino superior público, que, infelizmente, hoje, se
encontra em franco desmonte, orquestrado pelo Governo Richa-Borguetti.
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REFERÊNCIAS
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agenda de investigação. Revista Brasileira de Educação. n.22. pp.35-46. jan./fev./mar./abr/ -
2003.
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LDB n. 9394/96. Brasília: DF, 1996.
CROCE, Marta L. A Construção do Consenso em Políticas Públicas: um estudo sobre a
gênese do Programa de Desenvolvimento Educacional (PDE) do Estado do Paraná. Tese de
Doutorado - Políticas e Práticas Educacionais. Universidade Nove de Julho (UNINOVE).
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MARIN, A.J. Educação Continuada: introdução a uma análise de termos e concepções.
Cadernos Cedes. v.36. pp. 13-20, 1998.
MICHELOTTO, R.M. Universalização da Educação Superior em Cuba. GT 11 – Política da
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PARANÁ. Lei Complementar 130/2010. Regulamenta o Programa de Desenvolvimento
Educacional – PDE, instituído pela Lei Complementar 103/2004. Paraná: Diário Oficial 8266
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PARANÁ. SEED. Programa de Desenvolvimento Educacional – Uma nova política de
formação continuada e valorização dos professores da educação básica da rede pública
estadual. Documento Síntese: versão para discussão. Curitiba: SEED, 2007.
PARANÁ. SEED. Resolução 5544/2012. Curitiba, PR: 2012
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