A conexidade sinttica
Kazimierz Ajdukiewicz
I
1. Com a descoberta das antinomias e dos modos de resolv-las, os problemas
da sintaxe da lngua assumiram uma importncia central para a lgica (com-
preendendo este termo numa acepo ampla o suciente para incluir tambm
as questes metatericas). Entre estes problemas, contudo, o mais relevante em
relao lgica o da conexidade sinttica. Ele est relacionado especica-
o das condies sob as quais uma seqncia de palavras providas de sentido
forma uma expresso que possui, por sua vez, um sentido unitrio, ainda que
composto a partir do sentido das palavras que pertencem a ela. Uma seqncia
de palavras deste tipo sintaticamente conexa.
Por exemplo, a seqncia de palavras Joo ama Ana construda de modo
sintaticamente conexo com palavras da lngua portuguesa providas de sentido, e
pertence ao conjunto de expresses providas de sentido desta lngua. Ao contr-
rio, talvez cavalo se contudo aparecerei compe-se certamente de palavras da
lngua portuguesa providas de sentido, mas desprovida de conexo sinttica
e no pertence ao conjunto das expresses da lngua portuguesa providas de
sentido.
Existem vrias solues para o problema da conexo sinttica. Uma delas
, por exemplo, a teoria russelliana dos tipos. Contudo a noo de conexidade
sinttica pode ser formulada de modo particularmente simples e elegante com
Este texto apareceu originalmente com o ttulo Die syntaktische Konnexitt, em Studia
Philosophica, 1, 1935, pp. 127; e recebeu uma traduo para o ingls de H. Weber, Syntactic
Connexion, in McCall, S. (ed.), Polish Logic: 19201939, Oxford: Oxford University Press,
1967, pp. 207231, e outra para o italiano de Giovanni Piana, La Connessit Sintattica, in
Bonomi, A. (org.), La Struttura Logica del Linguaggio. Milano: Bompiani, 1973, pp. 345372.
A presente traduo para o portugus serviu-se basicamente da traduo italiana, com poste-
rior cotejamento com a traduo inglesa. O termo original Konnexitt tem como traduo
literal conexidade, isto , `a propriedade de ser conexo'. Outros termos da lngua portuguesa
que poderiam ser utilizados seriam coeso e conexo. Evitamos o termo conexo porque
este, a rigor, denota o resultado de um processo; evitamos o termo coeso em virtude de
seus signicados j bem estabelecidos no interior da teoria lingstica. (Nota dos tradutores)
Traduo de Lgia Negri e Jos Borges Neto julho de 1997.
1
o auxlio da teoria das categorias do signicado, elaborada por Stanislaw Le-
niewski. Basear-nos-emos, aqui, justamente sobre os resultados de Leniewski
1
e proporemos de nossa parte um simbolismo que pode ser aplicado, em princ-
pio, a quase todas as lnguas e com cujo auxlio a conexidade sinttica de uma
seqncia de palavras pode ser examinada e denida atravs de um clculo.
2. E. Husserl foi o primeiro a introduzir a noo e o termo categoria do
signicado (Bedeutungskategorie). Na sua Logische Untersuchungen,
2
ele ob-
serva que as palavras isoladas e as expresses compostas, de uma lngua, podem
ser subdivididas em classes de modo tal que duas palavras ou expresses per-
tencentes a uma mesma classe possam ser substitudas uma pela outra em um
contexto que possua um sentido unitrio, sem que para isso o contexto modi-
cado se transforme em um agregado de palavras privado de coeso, e perca
assim seu sentido unitrio. Ao contrrio, duas palavras ou expresses perten-
centes a classes diferentes no possuem esta propriedade. Tomemos o enunciado
O sol brilha como exemplo de um contexto que possui um sentido unitrio. Se
operamos nele a substituio de brilha por queima ou ainda por assobia ou
dana, obteremos do enunciado O sol brilha outros enunciados, verdadeiros
ou falsos, que possuem um sentido unitrio. Mas se substitumos brilha por,
por exemplo, se ou verde ou ainda talvez, obteremos uma seqncia de pa-
lavras sem coeso. Husserl denomina categorias do signicado justamente tais
classes de palavras e de expresses.
Queremos denir um pouco mais precisamente esta noo. A palavra ou
expresso A, entendida no sentido x, e a palavra ou expresso B, entendida nosentido y, pertencem mesma categoria do signicado se e somente se existeuma sentena (ou mesmo uma funo sentencial) SA na qual A ocorre com osentido x e que possui a seguinte propriedade: se nela se substitui A por B como sentido y, mantendo rigorosamente inalterados os sentidos das outras palavrase da articulao de SA, obtm-se uma expresso SB que tambm uma sentena(ou uma funo sentencial).
A hierarquia das categorias do signicado est intimamente ligada hierar-
quia simplicada dos tipos lgicos ainda que seja muito mais articulada e
representa, em ltima anlise, a sua contraparte semntico-gramatical.
3
Entre as categorias do signicado podem-se distinguir duas espcies, que de-
1
S. Leniewski Grundzge eines neuen Systems der Grundlangen der Mathematik. (Reim-
presso de Fundamenta Mathematica 14 (Warsaw, 1929) pp. 13 e ss., 67 e ss.). Mantemos de
Leniewski apenas a idia de base das categorias do signicado e de suas espcies. Entretanto,
para a formulao literal das explicaes e das denies correspondentes de nossa proposta,
como tambm para os detalhes de contedo que atribumos a esta noo, Leniewski no pode
ser considerado responsvel, uma vez que suas denies no so gerais e se aplicam apenas
a seu simbolismo particular, num sentido bastante distinto, altamente preciso e puramente
estrutural.
2
Edmund Husserl, Logische Untersuchungen, vol. II, parte 1 (segunda edio revista,
Halle/S., 1913), pp. 294, 295, 305312, 316321, 326342.
3
R. Carnap, Abriss der Logistik (Viena, 1929), p. 30); A. Tarski, Pojecie prawdy w jezykach
nauk dedukcyjnych (O conceito de verdade nas cincias dedutivas formalizadas) (Varvia,
1933), p. 67.
2
sejamos chamar de categorias fundamentais e categorias funtoras (a designao
funtor deriva de Kotarbinski, so meus contudo o termo, e a noo, de ca-
tegoria fundamental). Infelizmente, no estamos em condio de denir estas
noes de maneira razoavelmente precisa. No difcil entretanto ilustrar do
que se trata. Funtor tem o mesmo signicado de signo de funo. O que est
em questo, portanto, o signo no-saturado, que comporta parnteses. As
categorias funtoras so de fato as categorias do signicado s quais pertencem os
funtores. Chamo, ento, de categoria fundamental toda categoria do signicado
que no uma categoria funtora.
Da denio de categoria do signicado segue imediatamente que duas sen-
tenas quaisquer pertencem mesma categoria do signicado. As sentenas no
so obviamente funtores, portanto a categoria do signicado das sentenas in-
cluda entre as categorias fundamentais. Alm da categoria-sentena pode haver
tambm outras categorias fundamentais. Em Leniewski, ao lado da categoria-
sentena h apenas uma outra categoria fundamental, a dos nomes, e a ela
pertencem no apenas nomes singulares, mas tambm nomes gerais. Querendo
comparar a teoria simplicada dos tipos e a teoria das categorias do signicado,
dever-se-ia incluir entre as categorias fundamentais o tipo das sentenas e o tipo
dos nomes prprios. Os outros tipos pertencero s categorias funtoras. Parece
que na linguagem ordinria nem todos os nomes formam uma nica categoria
do signicado. Segundo nosso ponto de vista, na linguagem ordinria pode-se
distinguir em relao aos nomes pelo menos duas categorias do signicado: em
primeiro lugar a categoria do signicado qual pertencem os nomes singulares
dos indivduos e os nomes gerais dos indivduos, enquanto assumidos in suppo-
sitione personali ; em segundo lugar, a categoria do signicado dos nomes gerais
enquanto ocorrem in suppositione simplici (isto , como nomes de universais).
Se se quisesse formular a noo de conexidade sinttica de modo inteira-
mente geral, no se poderia decidir nada sobre o nmero e a espcie das ca-
tegorias fundamentais do signicado e das categorias funtoras, na medida em
que elas podem variar de lngua para lngua. Para simplicar, gostaramos en-
tretanto de limitarmo-nos a lnguas nas quais (como ocorre com Leniewski) se
apresentam apenas duas categorias fundamentais, precisamente a das senten-
as e a dos nomes. Alm destas duas categorias fundamentais do signicado
gostaramos, seguindo Leniewski, de assumir uma hierarquia ramicada, e em
princpio ilimitada com relao ao nvel superior, das categorias funtoras; estas
ltimas sero caracterizadas, em primeiro lugar, pelo nmero e pelas categorias
do signicado de seus argumentos juntamente com sua ordem, e em segundo lu-
gar pela categoria do signicado da expresso composta inteira que elas formam
com os seus argumentos. Por exemplo, os funtores que formam uma sentena
com um nico nome como argumento representam uma categoria do signicado
especca; os funtores que formam uma sentena com dois nomes como argu-
mentos constituem uma outra categoria, e assim por diante. Os funtores que
formam um nome com um nico nome como argumento reunir-se-o por sua vez
em uma outra categoria. Tambm os funtores que formam sentenas assumindo
uma nica sentena como seu argumento (por ex., o sinal na lgica) sero
3
indicados como uma categoria do signicado particular, e assim por diante.
3. Ns assumimos que a categoria do signicado de uma palavra seja deter-
minada pelo sentido que ela possui. Atribuamos, agora, um ndice s palavras
segundo a categoria do signicado qual pertencem: s palavras pertencentes
categoria-sentena, o ndice simples s; s palavras pertencentes categoria-nome, o ndice simples n. s palavras que no pertencem a uma categoriafundamental, mas s categorias-funtoras, atribuiremos um ndice em forma fra-
cionria constitudo de um numerador e de um denominador: no numerador
se encontrar o ndice da categoria do signicado qual pertence a expresso
composta do signo de funo juntamente com os seus argumentos, enquanto
que no denominador estaro os ndices, dispostos em ordem, das categorias do
signicado s quais pertencem os argumentos com os quais os funtores podem
combinar-se em um todo provido de sentido. Por exemplo, uma palavra que
forma uma sentena com dois nomes como argumentos receber o ndice fraci-
onrio
sn n. Cada categoria do signicado teria deste modo um ndice que a
caracterizaria. A hierarquia das categorias do signicado se espelharia em uma
srie de ndices do seguinte tipo: s, n,sn,
sn n,
sn n n, . . . ,
ss,
ss s,
ss s s, . . . ,
sn s,
ss n, . . . ,
ssn
,
ssn
sn
, . . . ,
nn,
nn n,
ns n,
. . . ,
snsn
, etc.
Se, para ilustrar esta notao, tomamos um enunciado da lgica como, por
exemplo,
p p . . pe atribumos s palavras isoladas seus ndices, obteremos ento:
p p . . p
s s s s s s
s s s s s
Querendo aplicar este mtodo linguagem ordinria, as categorias do signi-
cado que assumimos (conforme Leniewski) sero insucientes, na medida em
que, ao que parece, a linguagem ordinria tem uma riqueza maior de catego-
rias do signicado. Alm disso, por conta da utuao do sentido das palavras,
torna-se bastante difcil decidir em qual categoria do signicado deva ser in-
cluda uma dada palavra. s vezes existe incerteza tambm sobre o que deve
4
ser tratado como uma nica palavra. Contudo em casos simples e favorveis o
aparato de ndices acima indicado se adequa bastante bem ao uso lingstico,
como se pode ver pelo seguinte exemplo:
a madeira queima muito lentamente e a lua desaparece.
nn
nsn
snsnsnsn
snsn
ss s
nn
nsn
4. Em toda expresso composta provida de sentido, vem indicado, de al-
gum modo, que expresses intervm como argumento e a que expresses, que
intervm como funtores, estas pertencem. Se o funtor possui mais argumentos,
deve-se indicar tambm qual dentre eles o primeiro, qual o segundo, e assim
por diante. A ordem de sucesso dos argumentos cumpre, assim, um papel
essencial; a diferena entre sujeito e predicado ou mesmo entre antecedente e
conseqente de uma proposio hipottica so casos especiais da diferena im-
portante que produzida pela ordem de sucesso dos argumentos. Esta ordem
no portanto em termos gerais idntica ordem externa em que os argu-
mentos se apresentam na expresso correspondente. No se trata, em geral, de
uma questo puramente estrutural, isto , puramente externa, mas ela est fun-
damentada nas propriedades da expresso completa que so determinadas pelo
seu sentido. S nas linguagens simblicas e em algumas linguagens ordinrias
que a ordem externa dos argumentos corresponde sua seqncia ordenada.
A m de indicar os vrios modos em que as partes de uma expresso se re-
lacionam reciprocamente nela, as linguagens simblicas recorrem a convenes
que dizem respeito fora aglutinadora dos diferentes funtores, ao uso de pa-
rnteses e ordem das palavras. Na linguagem ordinria, esta relao recproca
vem indicada atravs da ordem das palavras, de exes, de preposies e de
sinais de pontuao.
Uma seqncia de palavras em que esta relao no seja indicada de forma
completa, ou no seja indicada de fato, desprovida de sentido unitrio.
Em cada expresso composta provida de sentido, as relaes entre os funtores
e seus argumentos devem ter uma forma tal que permita uma anlise em partes
da expresso inteira, de maneira que uma das partes seja o funtor (que pode
ser por sua vez uma expresso composta) e as demais, seus argumentos. A este
funtor chamamos de funtor principal da expresso. (A noo de funtor principal
e a idia de base para sua denio devem-se a Leniewski.) No exemplo lgico
indicado acima, o funtor principal da expresso como um todo o segundo sinal
de implicao; j no exemplo da linguagem ordinria, o funtor principal a
5
palavra e. Se uma expresso composta pode ser analisada em um funtor prin-
cipal e seus argumentos, dizemos que tal expresso bem articulada. Queremos
indicar o funtor principal de uma expresso e seus argumentos como compo-
nentes de primeiro grau desta expresso. Se os componentes de primeiro grau
de uma expresso A j so palavras, ou mesmo, se so elas mesmas expressescompostas, que so por sua vez bem articuladas, e se regredindo dos compo-
nentes dos componentes aos componentes dos componentes dos componentes e
assim por diante, logo aos componentes de n-simo grau, chegarmos sempre apalavras ou mesmo a expresses bem articuladas, dizemos que a expresso A completamente bem articulada.
Note-se que a linguagem ordinria admite freqentemente expresses elpti-
cas, assim uma expresso composta provida de sentido no pode ser considerada
completa, em relao sua boa articulao, enquanto nos limitarmos s palavras
explicitamente manifestadas nela. Contudo, fcil apresentar uma boa articu-
lao completa se se introduzem as palavras que, embora estando omitidas, so
entendidas implicitamente. Diculdades maiores surgem se uma lngua, como
por exemplo o alemo, admite palavras que podem ser descontnuas. Neste caso
no mais possvel indicar um critrio puramente estrutural da unicidade da
palavra.
5. A boa articulao completa de uma expresso composta certamente
uma condio necessria, mas no suciente, para que a expresso possua um
sentido unitrio, e seja portanto uma expresso provida de sentido. A esta con-
dio deve-se acrescentar uma outra. De fato, para que uma expresso bem
articulada tenha sentido, seus componentes de mesmo grau que se encontram
na relao funtor-argumento devem ser adequados uns aos outros. Isto , para
cada componente de n-simo grau que se apresente como um funtor principal ouda expresso completa ou de um seu componente de grau (n1), e que requeira conforme a sua categoria do signicado estes ou aqueles argumentos per-
tencentes a determinadas categorias do signicado para formar junto com eles
uma expresso provida de signicado, devem estar associados como argumentos
outros tantos componentes de n-simo grau pertencentes s categorias do signi-cado correspondentes. Por exemplo, a um componente que pertence categoria
do signicado designada pelo ndice
sn s(para o caso em que ele ocorre como
funtor principal) correspondem, em primeiro lugar, dois argumentos e, em se-
gundo lugar, o primeiro argumento deve pertencer categoria do signicado dos
nomes e o segundo das proposies. Queremos chamar sintaticamente conexa
uma expresso completamente bem articulada que satisfaa ambas as condies
acima indicadas.
Podemos agora formular estas condies de outro modo, e de forma mais
precisa, com o auxlio da nossa representao em ndices. Para isso, devemos
introduzir a noo de expoente de uma expresso, que ilustramos antes de mais
nada com base em um exemplo. Tomemos a expresso
p p . . p
6
e acrescentemos os ndices s palavras. Obteremos ento
p p . . p
s s s s s
s s s s
(A)
Ordenemos agora os componentes desta expresso segundo o seguinte prin-
cpio. Escrevamos em primeiro lugar o funtor principal da expresso completa
e em seguida, pela ordem, o seu primeiro argumento, o segundo (o terceiro, o
quarto, etc.). Obteremos portanto
, p p , p
s s s s s
s s s s
(B)
Se qualquer dos componentes desta seqncia ainda uma expresso com-
posta de um funtor principal e de seus argumentos, analisamos este componente
nos componentes do grau imediatamente superior e o ordenamos segundo o
mesmo princpio, colocando antes de tudo o funtor principal, depois seu pri-
meiro argumento, o segundo, etc.
, , p , p , p
s s s s s
s s s s
(C)
Se nesta seqncia houvesse ainda um componente composto, faramos a
anlise segundo o mesmo princpio, repetindo o procedimento at o ponto em
que apaream na seqncia apenas palavras. Uma seqncia assim ordenada,
que consta apenas de palavras de uma expresso, chamamos seqncia prpria
de palavras desta expresso. No nosso exemplo a seqncia prpria de palavras
j aparece na segunda etapa, vale dizer que C a seqncia prpria de pala-
vras de A. Se agora separamos das palavras, que esto ordenadas segundo a
seqncia prpria de palavras de uma expresso, os seus ndices, e se escreve-
mos os ndices destas palavras segundo a mesma ordem, obteremos aquilo que
chamamos seqncia prpria de ndices da expresso em questo.
A seqncia prpria de ndices da expresso A tem portanto a seguinte forma:
ss s
ss s
s s s (1)
Examinemos agora se nesta seqncia de ndices, da esquerda para a direita,
encontramos uma combinao de ndices tal que o primeiro lugar seja o de um
7
ndice fracionrio seguido imediatamente pelos mesmos ndices que se apresen-
tam no seu denominador. Se encontramos uma ou mais destas combinaes de
ndices, cancelamos a primeira delas (da esquerda para a direita) da seqncia
de ndices e substitumo-la pelo numerador do ndice fracionrio. Chamamos
a nova seqncia obtida deste modo de primeira derivao da seqncia dos
ndices prpria da expresso A. Ela se apresenta como se segue:
ss s
s s (2)
A primeira derivao consiste de um ndice fracionrio ao qual segue imedia-
tamente uma combinao de ndices idnticos ao ndice que forma o numerador
deste ndice fracionrio. Podemos, portanto, transform-la da forma acima in-
dicada, obtendo dela a segunda derivao que forma o ndice simples
s (3)
e que chamamos, no havendo possibilidade de outras derivaes, de ltima
derivao.
A ltima derivao da seqncia prpria de ndices de uma expresso dada
recebe o nome de expoente desta expresso.
Queremos ainda determinar o expoente da sentena, formulada na linguagem
ordinria, mencionado na p. 5. A sua seqncia prpria de ndices e as suas
derivaes sucessivas apresentam-se da seguinte maneira:
ss s
snsnsnsn
snsn
sn
nn
nsn
nn
n
(Seqncia prpria de ndices)
ss s
snsn
sn
nn
nsn
nn
n
(Derivao I)
ss s
sn
nn
nsn
nn
n
(Derivao II)
ss s
sn
nsn
nn
n
8
(Derivao III)
ss s
ssn
nn
n
(Derivao IV)
ss s
ssn
n
(Derivao V)
ss s
s s
(Derivao VI)
s
(Derivao VII e ltima)
Agora podemos denir: uma expresso sintaticamente conexa se e somente
se (1) ela completamente bem articulada, (2) para cada funtor que ocorra como
funtor principal nesta expresso, esto coordenados tantos argumentos quantas
so as letras contidas no denominador do seu ndice; e (3) a expresso possua
um expoente que consiste em um nico ndice.
4
Este ndice pode ter a forma de uma nica letra, mas pode tambm apre-
sentar-se de forma fracionria. Assim a expresso
4
A satisfao da primeira e da terceira condies no assegura ainda a conexidade sinttica.
De fato, no exemplo
( , x )
s s n
s n
no sintaticamente conexa, embora esta expresso tenha um boa articulao completa, e seu
expoente, que obtido do modo seguinte
s s n
s n
s s
s
s
seja um ndice simples.
9
queima muito lentamente
sn
snsnsnsn
snsn
cuja seqncia prpria de ndices
snsnsnsn
snsn
sn
tem como expoente o ndice fracionrio
sn.
Como exemplo de uma expresso sintaticamente no conexa consideremos a
seguinte seqncia de palavras:
F () : : ()ssn
sn
ss s
ss
sn
sn
A sua seqncia prpria de ndices e suas derivaes so:
ss s
ssn
sn
ss
sn
sn
ss s
sss
sn
sn
A primeira derivao que, neste caso, tambm a ltima, forma um expo-
ente que constitudo de vrios ndices. A expresso em questo , portanto,
sintaticamente no conexa.
(A seqncia de palavras deste exemplo representa a conhecida denio
que conduz antinomia russelliana da classe das classes que contm a si mesmas
como elementos.)
10
O expoente de uma expresso sintaticamente conexa indica a categoria do
signicado a que pertence esta expresso composta considerada como um todo.
6. Uma representao que atribusse os ndices s palavras no precisaria
de parnteses ou de outros meios anlogos para indicar a articulao de suas
expresses sintaticamente conexas (a inerncia recproca dos funtores e de seus
argumentos). Para isso bastaria ater-se rigorosamente, ao ordenar as palavras,
ao mesmo princpio que determina a ordem dos ndices na seqncia prpria
de ndices de uma expresso. Dever-se-ia ordenar assim as palavras de cada
expresso composta de modo tal que venha antes de mais nada o smbolo da
funo principal, seguido de seu primeiro argumento, do segundo, etc. Por
exemplo, o enunciado na notao russelliana
p . q . r : : r . q . p (A)deveria ser escrito, segundo este princpio, da seguinte maneira:
. p q rs s s s s s
s s s s s s
5 s
s s
1 3
. r qs s s s
s s s
4 ps s
s 2
(B)
Dizemos que um funtor tem n lugares quando o denominador do seu ndicecontm n ndices. Podemos ento dizer: a expresso A representa o k-simoargumento do funtor de n lugares F na expresso B se e apenas se (I) daexpresso B pode-se separar uma parte ininterrupta T imediatamente direitade F , cujo expoente possua a mesma forma do denominador do expoente de F ;(II) esta parte T pode ser subdividida sem resto em n subpartes ininterruptas demodo tal que o expoente destas subpartes sejam, na ordem, idnticos aos ndices
contidos no denominador do ndice de F ; (III) A a k-sima destas subpartese (IV) F juntamente com T forma ou toda a expresso B ou ento um membrode B (rigorosamente falando, esta explicao deveria ser substituda por umadenio recursiva).
Segundo esta explicao, por exemplo, a parte da expresso em B designada
por 3 o primeiro argumento, enquanto a designada por 4 o segundo argumento
do smbolo de implicao, que designado por 5 na mesma expresso em B. De
fato (I) pode-se separar da expresso em B a parte designada por 1, ou seja,
aquela parte ininterrupta que se encontra imediatamente direita de 5 e cujo
expoente tem a mesma forma do denominador do ndice de 5; (II) pode-se dividir
1 em duas subpartes ininterruptas sem resto tal que os seus expoentes sejam,
na ordem, idnticos aos ndices contidos no denominador do ndice de 5; (III) 3
a primeira destas subpartes e 4 a segunda; (IV) 5, juntamente com 1, um
membro da expresso em B.
11
Esta vantagem da notao atravs de ndices, que torna supruos todos os
parnteses, pode talvez parecer de pouca conta se se consideram unicamente
exemplos tirados do clculo proposicional. Para este clculo, J. ukasiewicz
introduziu uma notao que, embora sem auxlio dos ndices, no requer parn-
teses ou smbolos auxiliares anlogos para indicar a articulao das expresses
sintaticamente conexas.
5
A possibilidade de dispensar os parnteses sem in-
troduzir ndices explica-se contudo pelo fato do clculo proposicional trabalhar
com poucas categorias do signicado (na prtica apenas com trs), onde todas
as variveis pertencem a uma nica categoria do signicado e o nmero das
constantes limitado, o que permite indicar a categoria do signicado de uma
expresso dada mediante uma forma particular dos smbolos. Neste caso, as
regras de articulao podem ser tambm simplesmente enumeradas. Mas se se
tem que lidar com um nmero grande, teoricamente no previsvel, de categorias
do signicado diversas, deve-se recorrer a uma caracterizao sistemtica destas
diversas categorias semelhante quela apresentada em nossa notao.
At agora as nossas indagaes dizem respeito apenas a expresses que no
contenham operadores (v. abaixo seo 7). Agora, ao contrrio, levaremos em
considerao expresses que os contm.
II
7. Pressups-se anteriormente que cada palavra da lngua, graas ao seu sen-
tido, pode ser atribuda a uma determinada categoria do signicado e em con-
seqncia, provida de um ndice. Apenas se esta condio satisfeita, possvel
analisar todas as expresses compostas segundo o esquema funtor-argumento.
Embora esta condio possa talvez ser satisfeita por algumas linguagens, ela
no parece valer para certas linguagens simblicas. Estamos pensando aqui nas
linguagens que se servem dos operadores acima mencionados. Com esta ca-
racterizao estamos pensando em smbolos como o quanticador universal da
lgica simblica, que tem a forma x ou ento (x), denominado tambmoperador-todo (cf. Carnap, 1929: 13), e ainda o operador existencial (x),bem como o smbolo da soma algbrica
10k=1
, o smbolo do produto
100k=1
, o
smbolo da integral denida
10
dx, etc. Todos estes smbolos tm em comum a
seguinte propriedade: referem-se sempre a uma expresso que contm uma ou
mais variveis e conferem, a uma ou mais delas, o papel de varivel aparente.
Se portanto um operador, por exemplo, refere-se a uma expresso que contm
5
Cf. Jan ukasiewicz, `Philosophische Bemerkungen zu mehrwertigen Systemen des Aussa-
genkalkls', Comptes rendus des sances ded la Socit des Sciences et des Lettres de Varsovie
13, Cl. iii (Varsvia, 1930).
12
uma nica varivel, o resultado uma expresso composta que possui um valor
constante. Assim (x).x um homem e 10k=1
x2 tm valor constante, ainda
que a ocorram variveis. Mediante o operador, estas variveis so tornadas
aparentes ou, como se diz, vm ligadas pelo operador.
Ora, no caso de uma expresso que contenha um operador, (por exemplo
no caso de um enunciado universal (x).fx), a anlise em funtores e argu-mentos com categorias do signicado apropriadas parece de fato deparar-se com
diculdades insuperveis.
Sem enveredar pela estrutura interna do operador composto (x), quere-mos antes de mais nada recusar a concepo mais natural da estrutura sinttica
do enunciado universal (x).fx, segundo a qual num tal enunciado o operador(x), desempenharia o papel do funtor principal e a funo proposicional de-sempenharia o papel de seu argumento. Se esta fosse a anlise sinttica correta
do enunciado universal, dever-se-ia incluir o operador-todo (x) entre aquelesoperadores que, juntamente com seus argumentos, formam um enunciado, e que
portanto pertencem categoria
s
s
. Em oposio a isso pode-se lembrar que,
em uma lgica extensional, um funtor
s
s
deve ser um funtor de verdade (truth
functor). Portanto, dever corresponder a uma das quatro tabelas seguintes:
p f1p p f2p p f3p p f4p0 0 0 1 0 1 0 0
1 1 1 0 1 1 1 0
Em outras palavras, se o operador-todo um funtor
s
s
, o enunciado
(x).fx
deveria ser equivalente: (1) a fx, ou (2) a fx, ou (3) deveria ser sempreverdadeiro, ou (4) sempre falso, independentemente de x. Em uma lgicaextensional, ento, o operador (x) no pode ser entendido como um funtors
s
. Mas j que junto de um enunciado fx ele forma um enunciado, no pode
ser nenhum outro funtor.
Neste momento se impe a idia de que a estrutura sinttica de um enunciado
universal
(x).fx
possa receber uma interpretao diferente da anterior. Talvez no seja xo funtor principal neste enunciado e fx o seu argumento, mas pode ser queo funtor principal seja o smbolo e que x e fx sejam respectivamenteo seu primeiro e o seu segundo argumentos. Neste caso, o enunciado universal
deveria ser escrito corretamente do seguinte modo:
13
(x, fx)
J que x pode pertencer a diversas categorias do signicado, tambm deveria receber diferentes interpretaes. Se, por exemplo, x pertence cate-
goria nome e f categorias
n
, deveria ento pertencer categorias
n s
.
Mas se x pertencesse categoria das sentenas e f categorias
hline s
, en-
to deveria pertencer categorias
s s
, para que (x, fx) possa ser uma
sentena. Neste caso, deveria ser, em uma lgica extensional, um funtor deverdade de dois lugares, e deveria portanto corresponder a uma das dezesseis
tabelas conhecidas para funtores de verdade de dois lugares. Mas v-se logo que
isso incompatvel com o signicado do enunciado universal (x).fx.No possvel ento interpretar a estrutura sinttica do enunciado universal
segundo o esquema funtor-argumento, nem do primeiro modo nem do segundo.
8. Nada pode substituir uma varivel que, numa sentena autntica, esteja
ligada por um operador (assumindo-se que este no seja um operador universal
que se constitua num membro principal do enunciado integral). Este o sen-
tido da aparncia da varivel, do seu estar ligada. Deste ponto de vista, os
funtores se comportam de maneira oposta.
Se ento os funtores so concebidos como no ligadores e os operadores como
ligadores, v-se logo que um operador no pode ser includo entre os funtores.
Dever-se-ia ainda indicar, como diferena secundria entre um funtor e um
operador, o fato de que um funtor pode apresentar-se tambm como argumento
de um outro funtor, enquanto um operador nunca pode apresentar-se como
argumento de um funtor.
Apesar desta diferena entre eles, subsiste ainda uma analogia entre operador
e funtor. Um operador, juntamente com a expresso a que se refere, pode formar,
exatamente como um funtor com os seus argumentos, uma totalidade composta
que contm um sentido unitrio. Poder-se-ia ento atribuir ndices tambm
aos operadores; mas eles deveriam distinguir-se daqueles atribudos aos funtores
porque, na determinao do expoente, no sero tratados do mesmo modo que
os ndices dos funtores. Em outras palavras, j que um operador nunca pode
ser argumento, o seu ndice no deve ser fundido com um ndice que o preceda
na seqncia prpria de ndices ou nas suas derivaes, mas deve ser combinado
com ndices que o seguem. Proponhamos ento para os ndices dos operadores
a forma de uma frao, esquerda da qual se acrescenta um trao vertical. O
operador (x) receberia ento o ndices
s
sempre que ele, junto com uma
sentena, forme uma sentena.
Atribumos um nico ndice ao operador considerado como um todo, mesmo
se o operador parea ser formado por mais de uma palavra. Com isso, no
estaremos transgredindo o princpio segundo o qual um ndice deve ser associado
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apenas a uma palavra isolada, enquanto os ndices de expresses compostas
devam ser considerados apenas como expoentes (isto , como derivaes ltimas
de suas seqncias de ndices). De fato, um operador no pode ser tratado como
uma expresso formada por mais de uma palavra. Em ltima anlise, o operador
uma palavra singular composta de muitas letras. H tambm notaes para
os operadores nas quais isso aparece claramente. Por exemplo, Scholz escreve
x no lugar de (x). E de resto, tambm na notao usual em que se escreve(x) ao invs de (x), ou mesmo x ao invs de (x), manifesta-se ocarter de palavra singular do operador.
9. Se uma expresso contm um operador, o seu expoente dever ser calcu-
lado de ummodo diferente do indicado anteriormente. De fato, se procedssemos
com os ndices dos operadores da mesma forma que o zemos com os ndices dos
funtores, poderia ocorrer uma fuso do ndice de um operador com um ndice
que o precede, coisa que, como j observamos, inadmissvel.
Tomemos, por exemplo, a expresso seguinte:
F . x . xsnss
ss
n(A)
Se formssemos o seu expoente segundo a indicao anterior, obteramos
estas derivaes:
I.
s
n
s
s
s
s
n, II.
s
n
n, III. s
Obter-se-ia ento como expoente o ndice da sentena, enquanto bvio que
a expresso em A sintaticamente mal-formada.
A nova regra para a formao do expoente de uma expresso requer que
a parte da sua seqncia prpria de ndices que comea com o trao vertical
mais direita seja considerada separadamente, e precisamente que, pela parte
que possui um ndice com o trao apenas no seu incio, a ltima derivao seja
obtida segundo a regra precedente. O ndice com o trao vertical ser tratado
assim do mesmo modo que aquele sem trao; por exemplo, o ndice s pode
substituir tanto
s
s
s quanto
s
s
s, e assim por diante.
Uma vez que calculada a ltima derivao desta seqncia parcial de n-
dices, ela substituda pela seqncia parcial de ndices na seqncia inteira
de ndices. Aqui se distinguem dois casos. Ou no clculo da ltima derivao
da seqncia parcial de ndices com o trao que se encontra no seu incio no
ocorre (isto , na formao da n-sima derivao a partir da n 1-sima, ele foi
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substitudo, na n 1-sima derivao, junto com os ndices que o seguem peloseu numerador) ou isso no acontece.
Se ocorre esta segunda possibilidade, isto , se o ndice com o trao continua
iniciando a seqncia parcial de ndices, paramos a e declaramos que a seqncia
de ndices inteira (obtida substituindo a seqncia parcial de ndices separada
pela sua ltima derivao) a ltima derivao, isto o expoente, da seqncia
inteira de ndices prpria da expresso considerada.
Mas se se verica a primeira possibilidade, isto , se o ndice com o trao
no aparece no incio da seqncia parcial de ndices, ento o seu trao vertical
desaparece da seqncia inteira de ndices e o nmero de traos verticais se reduz
de uma unidade. Este procedimento prosseguir ento segundo esta mesma
regra, at que ou qualquer ndice com o trao no pode mais ser resolvido ou
todos os ndices com o trao j o foram e conseguimos uma seqncia de ndices
privada de traos que no admite nenhuma outra derivao. Designamos a
seqncia obtida na ltima fase deste procedimento como a ltima derivao
da seqncia prpria de ndices inicial da expresso em questo e como seu
expoente.
Queremos ilustrar este novo procedimento exemplicando com a seguinte
expresso:
( f g) : . (x) . f x g x : : (x) . f x . . (x) . g xss
ss
sn
nsss
sn
nsss
ss
sn
nsss
ss
sn
n
(A)
A sua seqncia prpria de ndices tem a forma:
ss
ss s
ss
ss s
sn
nsn
nss s
ss
sn
nss
sn
n (I)
Formamos antes de mais nada a ltima derivao da parte que se encontra
direita do ltimo trao vertical:
1.
ss
sn
n 2.ss
s 3. s
Substitumos agora em (I) a parte separada pelo ltimo trao pela sua ltima
derivao e teremos assim um trao a menos. Obteremos deste modo:
ss
ss s
ss
ss s
sn
nsn
nss s
ss
sn
n s (II)
Procedamos em relao a (II) do mesmo modo que no caso (I) e obteremos:
ss
ss s
ss
ss s
sn
nsn
nss s
s s (III)
que ser tratado do mesmo modo. Obteremos assim a ltima derivao da
parte separada em (III) pelo ltimo trao. J que se trata de um procedimento
extenso, executemo-lo passo a passo aqui:
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ss
ss s
sn
nsn
nss s
s s (1)
ss
ss s
ssn
nss s
s s (2)
ss
ss s
s sss s
s s (3)
ss
sss s
s s (4)
ss
s s (5)
s s (6)
Substituindo este valor pela parte separada em (III) pelo ltimo trao, ob-
teremos:
ss
ss s
s s (IV)
Assim, determina-se facilmente
s
como ltima derivao da seqncia de ndices restante.
A ltima derivao obtida da seqncia de ndices deste modo constitui o
expoente da expresso (A).
Examinemos um novo exemplo em que no se resolvem todos os ndices com
o trao. Tomemos, por exemplo, a expresso
(x) . f x : : (x) . g (x, z)ss
sn
nss s
ss
nn n
n n(B)
A sua seqncia prpria de ndices
ss s
ss
sn
nss
nn n
n n (I)
Formamos a ltima derivao da sua parte separada pelo ltimo trao. Ela
tem a forma
ss
n
Neste caso, o ndice com o trao ocorre. Em conseqncia, o ltimo trao
no deixado de lado e a ltima derivao de (I), como tambm o expoente de
B, tem a forma
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ss s
ss
sn
nss
n
A expresso B no tem, portanto, um ndice nico como expoente.
Obtemos assim um mtodo para conseguir o expoente das expresses con-
tendo operadores. claro que isso inclui em si, como caso especial, o mtodo
anteriormente indicado para expresses desprovidas de operadores. (Dever-se-ia
apenas falar, na sua formulao, de ndices que se apresentam eventualmente
com o trao.) Poderemos agora repetir integralmente a denio de coeso
sinttica anteriormente apresentada, e ela valeria tambm para expresses que
contenham operadores.
10. No caso de expresses desprovidas de operadores, a coeso sinttica coin-
cide com a boa formao sinttica. Entretanto, no caso de expresses em que
ocorrem operadores, alm da coeso sinttica uma outra condio deve tambm
ser satisfeita. Esta condio requer que, no argumento de cada um dos opera-
dores, isto na expresso a que o operador se aplica,
6
a toda varivel contida
no operador corresponda uma varivel da mesma forma que no esteja ligada
dentro deste argumento. Apenas se esta condio satisfeita, uma expresso
sintaticamente coesa contendo operadores tambm sintaticamente bem
formada.
III
11. Indicamos o papel de ligao dos operadores como sua caracterstica
peculiar, que os distingue dos funtores. Ligar uma ou mais variveis a pro-
priedade comum a todos os operadores. Alm disso, os diferentes operadores
desempenham tambm outros papis segundo os quais eles se diferenciam entre
si. Mas existe um operador cuja nica funo a de ligar uma ou mais variveis.
Um tal operador parece ser indicado pelo smbolo do circunexo introduzido
por Whitehead e Russell. Russell utiliza este smbolo para distinguir o que ele
chama de o valor indeterminado de uma funo daquilo que ele chama de a
prpria funo. Se fx representa o valor indeterminado de uma funo, entofx representa a prpria funo. Mas, atravs de um exame mais minucioso,parece claro que o que Russell chama de valor indeterminado de uma funo
no outra coisa seno o que se chama comumente de valor da varivel depen-
dente. Ao contrrio, aquilo que Russell chama de a prpria funo no uma
6
A rigor no se deveria falar de argumento de um operador, mas se deveria usar, por
exemplo, o termo operando. As nossas observaes precedentes referentes boa articula-
o de uma expresso devem ser claramente estendidas tambm relao entre operador e
operando.
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varivel, mas qualquer coisa constante. Um exame cuidadoso do que Russell usa
para explicar a noo de prpria funo torna lcito presumir que, com esta
caracterizao, eles tinham em mente aquilo que ns indicaremos como correlato
objetivo de um funtor. Portanto, fx seria a mesma coisa que f e os smbolosfx e f designariam a mesma coisa. Se esta interpretao correta, pode-seincluir o circunexo entre os operadores, uma vez que o seu papel consiste em
cancelar ou ligar uma varivel. Vale lembrar que, com o auxlio do circun-
exo, muitas variveis podem estar ligadas simultaneamente em uma expresso.
Assim, por exemplo, fxy representa o funtor biargumental f .Nos casos mais simples, em que o circunexo vem aposto a todos os argumen-
tos do funtor principal da expresso inteira, como, por exemplo, nos exemplos
esquemticos fx ou fxy, ele tem a mesma funo de um trao com auxliodo qual a varivel marcada (isto , marcada com o circunexo) seria cancelada,
e assim eliminada. Mas se nem todos os argumentos do funtor principal da
expresso inteira vm marcados, o papel do circunexo no pode mais ser com-
parado ao de um trao comum. Por exemplo, p .a. a (onde a umenunciado constante) representa o funtor fx de tipo
sspara o qual vale a
seguinte equivalncia:
fp. .p .a. aV-se logo que o smbolo da negao no lugar de f satisfaz esta equiva-lncia. Por isso p .a. a signica a mesma coisa que . Ao contrrio, .a. a, que signica a mesma coisa que p .a. a uma vez que sesuprima p, no representa um funtor
sse no , de fato, uma expresso
sintaticamente coesa.
12. Se uma expresso inteira pertencente categoria dos enunciados pos-
sui uma varivel marcada pelo circunexo, encontramos na notao russelliana,
neste caso, um outro smbolo que pode ser colocado no mesmo nvel que o cir-
cunexo. Trata-se do prexo (x) que utilizado para a formao dos smbolosdas classes e, respectivamente, dos prexos (xy) que so utilizados no caso dossmbolos de relaes. De fato, se fx representa uma funo proposicional, osmbolo (x).fx (deixando de lado certas complicaes derivadas da admissode funes intensionais, abandonadas por Russell na segunda edio dos Prin-
cipia) designa a mesma coisa que o funtor f , portanto tambm fx. Issovale tambm em relao equivalncia do signicado dos smbolos (xy).fxye fxy.Queremos servir-nos dos prexos (x) ou (xy) tambm nos casos em que aexpresso a que eles se aplicam no pertence categoria enunciado, de modo
que em geral podemos escrever (x).fx no lugar dos smbolos de tipo fx e(xy).fxy no lugar dos smbolos de tipo fxy. Com esta mudana de nota-o para o circunexo, a expresso inteira em que se d tal operao pode ser
claramente caracterizada; isso no era possvel nas notaes anteriores, e podia
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conduzir, em casos particularmente complexos, ambigidade. Alm disso, este
novo modo de escrever nos permite aplicar tal operao a uma expresso vrias
vezes, iterativamente; permite, portanto, escrever (x) : (y).fxy que no amesma coisa que (xy).fxy (conforme a notao anterior, fxy). Nesta novanotao ca claramente evidenciado o carter de operador do circunexo.
13. Na medida em que um operador, o circunexo (x) (ou (xy), etc.)recebe em nossa notao um ndice com um trao. Mas j que tais operadores
podem ser aplicados a expresses de vrias categorias do signicado, que elas
por sua vez se transformam em expresses de categorias diversas, o circunexo
no recebe sempre o mesmo ndice com o trao.
A explicao em termos do operador circunexo (de um lugar) a seguinte:
um operador (x) aplicado a uma varivel X em uma expresso A um ope-rador circunexo se, juntamente com esta expresso, forma um funtor que, com
a varivel X como argumento, forma uma expresso equivalente expresso A.Isso pode ser esclarecido pelo exemplo que se segue, no qual a expresso A tema forma fx e a varivel X, a forma x:
(x).fx : x. : .fx
Do que foi dito acima, ca claro que se a expresso A, a que o operador seaplica, tem o expoente E1 e a varivel X o ndice E2, o operador deve ter ondice com o trao
E1
E2E1
O ndice com o trao do operador circunexo assumir formas diversas con-
forme os ndices que devero substituir E1 e E2.A mesma coisa ocorrer tambm no caso dos operadores de vrios lugares.
Como j observamos, o papel do operador circunexo parece exaurir-se na
ligao das variveis. Os outros operadores tm, ao contrrio, um papel mais
amplo. Assentamos a diferena principal entre um funtor e um operador no
fato de que o segundo, mas no o primeiro, serve para ligar variveis. Passa
a ser natural ento pensar que provavelmente o papel dos operadores que no
tm apenas o efeito de ligar as variveis possa ser duplo, o papel de ligao do
operador assumido pelo operador circunexo, e qualquer outro por um funtor.
Introduzamos, por exemplo, o funtor , ao qual atribumos o ndicessn,
isto , o interpretamos sintaticamente como um funtor que forma, junto com
um funtor
sncomo seu argumento, um enunciado. Neste ponto acrescentamos
ainda a seguinte explicao em termos deste funtor. (f) satisfeito por todos
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e apenas os funtores
sn(no lugar de f ) que com qualquer nome formam um
enunciado verdadeiro. Vale portanto:
(f). .(x).fx.
Um tal funtor chamamos de funtor universal. Podemos ento substituir o
operador-todo por um funtor universal toda vez que pudermos indicar, pela
funo proposicional a que se aplica o operador (x), um funtor que, com xcomo argumento, forme uma expresso equivalente a esta funo proposicional.
Mas isso sempre permitido pelo operador circunexo. Na verdade, (x).fx de fato o funtor requerido pela funo proposicional fx, em qualquer formaque ela se apresente. Podemos, portanto, escrever ((x).fx) no lugar de(x).fx. Deste modo, o papel do operador-todo pode ser substitudo poruma combinao dos papis do funtor universal e do operador circunexo. No
necessrio frisar que no um nico funtor universal, mas so vrios que se
diferenciam nas suas categorias do signicado, segundo a categoria do signicado
do funtor que assumem como seus argumentos.
Graas equivalncia
(f). .(x).fx.
o funtor universal pode facilmente ser denido com auxlio do operador-todo. A
sua denio defronta-se com diculdades insuperveis se nela no se quisesse
utilizar deste operador. Parece-nos que a denio do funtor universal poderia
encontrar um substituto na indicao das regras inferenciais que se aplicassem
ao seu uso dedutivo. O smbolo seria ento introduzido abertamente nalgica como um smbolo primitivo e teria uma posio mais clara, no sistema
desta cincia, que o esprio operador-todo, que no pertence nem aos smbolos
denidos nem aos smbolos primitivos da lgica.
Mas o operador circunexo deveria ser denido ou deveria ser contrabande-
ado para a lgica a partir do operador-todo. Abster-nos-emos de resolver aqui
este dilema. Contudo, se resolvssemos contrabandear o operador circunexo,
poder-se-ia supor que talvez este expediente fosse mais rendoso, uma vez que
existe a possibilidade de substituir todos os demais operadores, presentes em
bom nmero nas cincias dedutivas, pelo operador circunexo e pelos funtores
correspondentes. A nosso ver, o fato de se conseguir em qualquer lugar fazer uso
de um nico tipo de operador, isto , do operador circunexo, no representaria
uma vantagem a ser desprezada.
Allatum est die 15. Iulii 1934
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