FOZ DO IGUAÇU ANAIS DO VI ENCONTRO INTERNACIONAL DE LETRAS A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE LETRAS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS ISSN 2175-384X 06/12/2012 a 08/12/2012 ARTIGOS COMPLETOS: POLÍTICAS LINGUÍSTICAS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM CONTEXTO DE FRONTEIRA
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6, 7, 8 de dezembro de 2012
VI ENCONTRO INTERNACIONAL DE LETRAS
A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE LETRAS:
DESAFIOS E PERSPECTIVAS
O VI Encontro Internacional de Letras, que acontecerá de 06 a 08 de dezembro de 2012,
no campus da UNIOESTE de Foz do Iguaçu, terá como tema A FORMAÇÃO DO
PROFESSOR DE LETRAS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS. É um evento organizado
por uma equipe de professores do colegiado do curso de Letras e acadêmicos do 3º ano,
e espera-se um público de aproximadamente 400 participantes, entre acadêmicos e
professores, profissionais da área da educação, pesquisadores da área de linguagem da
região de Tríplice Fronteira, além de pesquisadores de outras regiões do Brasil.
Eixos Temáticos
1) Ensino - Aprendizagem de Língua Estrangeira
2) Tecnologia e Ensino de Língua Estrangeira
3) Ensino – Aprendizagem de Língua Portuguesa
4) Gêneros do Discurso e Ensino
5) Políticas Linguísticas e Formação de Professores em contexto de
fronteira
6) Estudos Literários
7) Plurilinguismo, Pluriculturalismo e Interculturalidade
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Comissões
Comissão organizadora:
Ana Maria Kaust
Flávio Pereira
Ildo Carbonera
Secretaria do evento:
Andressa Pâmela Schimdt Oliveira
Josiane Nava
Raíza Brustolin de Oliveira
Comissão de Abertura:
Diego Damasceno
Laura Sanchez Pereira Battistella
Liz Basso Antunes de Oliveria
Comissão da Coordenação Científica:
Flávio Pereira
Martha Ribeiro Parahyba
José Luiz da Silva Acosta
Laura Sanchez Pereira Battistella
Comissão de Infraestrutura e Apoio logístico:
Ildo Carbonera
Ana Maria Kaust
Andrieli Lopes Francisco
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Denize Juliana Reis Cardoso
Herica Valerio Terra
Jessica Lopes Boita
Comissão de Ensalamento e Monitoria:
Nataly Yolanda Capelari dos Santos
Olga Viviana Flores
Aline Diuliana Ribeiro Resende
Andressa Pâmela Schmidt Oliveira
Andrieli Lopes Francisco
Carlos Xavier Aguero Verdun
Clarice de Souza Lima dos Santos
Eder Luiz Basquiroto
Gerusa Graeff Hoteit
Herica Valerio Terra
Igor Perrud da Silva
Jeane de Souza Castro
Jessica Lopes Boita
Josiane Nava
Josiane Peres dos Santos
Marcelo Loof Talasca
Mariane Dutra Magnabosco
Mayara Zanatta
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Meyre dos Santos Andrade
Raíza Brustolin de Oliveira
Thiago Benitez de Melo
Adriana Akemi Tateishi
Graziele Burmann
Comissão Cultural:
Ildo Carbonera
Centro Acadêmico de Letras da Unioeste - Campus Foz do Iguaçu – CALU
Jean Carlos Rodrigues da Silva
Jéssica Ribeiro Franco
Liz Basso Antunes de Oliveria
Luiza Victória Repanas
Comissão de Patrimônio e Recursos:
Josiane Nava
Raíza Brustolin de Oliveira
Mariangela Garcia Lunardelli
Comissão de Logística em Informática:
Diego Damasceno
Eliane Dávilla Savio
Comissão de Organização dos Intervalos:
Andressa Pâmela Schmidt Oliveira
Herica Valerio Terra
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Mayara Zanatta
Mariane Dutra Magnabosco
Raíza Brustolin de Oliveira
Comissão de Divulgação:
Ildo Carbonera
Centro Acadêmico de Letras da Unioeste - Campus Foz do Iguaçu – CALU
Andressa Pâmela Schmidt Oliveira
Caroline Arenhart de Bastiani
Kayanna Pinter
Mayara Zanatta
Raíza Brustolin de Oliveira
Adriana Akemi Tateishi
Graziele Burmann
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1) A IMPORTÂNCIA DO BILINGUISMO NA TRAJETÓRIA DA SURDEZ
2) IGUALDADE NA DIFERENÇA: AS ALTERNATIVAS PARA O
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO DE ALUNOS SURDOS EM
PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
3) O ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA EM ESCOLAS PÚBLICAS NA
FRONTEIRA E AS POLÍTICAS LINGUÍSTICAS
4) DISCUTINDO AS TRÊS GRANDES MATRIZES EPISTEMOLÓGICAS
OCIDENTAIS E A FORMAÇÃO DOCENTE
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“A IMPORTÂNCIA DO BILINGUISMO NA TRAJETÓRIA DA SURDEZ”
CANTELLE, Graziela.1
CARVALHO, Taísa2
RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo fazer uma trajetória histórica da educação
especial com foco sobre a educação dos surdos, e os desafios vivenciados pelos mesmos
em relação à língua de sinais X língua oral. Explanaremos sobre a inclusão educacional
que trata do direito a educação, comum a todos os indivíduos e o direito de receber a
educação junto às demais pessoas nas escolas e nas universidades. Promover a inclusão
do deficiente significa mudar de postura, de olhares a cerca da deficiência. Implica na
quebra de paradigmas, reformulações do sistema de ensino para a conquista de uma
educação de qualidade, na qual o acesso, o atendimento independente de suas diferenças
e necessidades. Falaremos também sobre o Congresso de Milão de 1880 que
representou uma fase obscura na história dos Surdos, pois o oralismo foi imposto como
o melhor método para os Surdos. Trataremos das filosofias aplicadas na educação
desses sujeitos, oralismo – comunicação total e o bilinguismo, com ênfase neste último,
dada a sua importância para resgatar o direito de expressão da pessoa Surda e
discutiremos que estar no processo bilíngue significa estar em sintonia real, em
constante crescimento verdadeiro no sentido estreito de permitir-se e permitir aos
outros: aproximação, entendimento e inclusão. E para a composição deste artigo nos
1 Aluna especial do Mestrado de Educação da disciplina de Educação Especial e Processos Inclusos, na
Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE/ Campus de Cascavel; Pós Graduanda em Libras e Educação Especial na Faculdade Eficaz em Maringá – PR; Especialista em Psicopedagogia pela Universidade Paranaense – UNIPAR/ Campus de Cascavel; Graduada em Pedagogia pela Universidade Paranaense – UNIPAR/ Campus Cascavel; Tradutora/Intérprete da Língua Brasileira de Sinais/TILS na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE/ Campus de Cascavel; Membro do Grupo de Pesquisa Educação, Cultura e Cidadania UNIOESTE/ Campus Toledo; Supervisora do Programa Institucional de Ações Relativas às Pessoas com Necessidades Especiais – PEE na UNIOESTE/ Campus de Cascavel. [email protected] 2 Mestranda em Letras, na linha de pesquisa Linguagem Literária e Interpretações Sociais: Estudos
Comparados, na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE/ Campus de Cascavel; Especialista em Literaturas Inglesa e Norte-Americana pela União Pan-Americana de Ensino – UNIPAN; pós-graduanda em Língua de Sinais Brasileira e Educação Especial na Faculdade Eficaz em Maringá – PR; Graduada em Letras Port./Ing. pela Universidade Paranaense – UNIPAR/Campus de Cascavel; Docente efetiva da disciplina de Língua Brasileira de Sinais – LIBRAS, na Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE/ Campus de Toledo; Membro do Grupo de Pesquisa Educação, Cultura e Cidadania e também Membro do Programa Institucional de Ações Relativas às Pessoas com Necessidades Especiais – PEE na UNIOESTE/ Campus de Toledo. E-mail: [email protected] ou [email protected]
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baseamos em estudiosos como Skliar, Stokoe, Strolbel, Quadros, Sacks entre outros e
nas legislações da área da educação especial, bem como nas específicas da área da
surdez.
Palavras-chave: Educação Especial, Sujeitos Surdos, Bilinguismo.
ABSTRACT
This article aims to make a historical trajectory of education with special focus on the
education of the deaf, and the challenges experienced by them in relation to the as sign
language as oral language. We will explain about the educational inclusion that comes
from the right to education, common to all individuals and the right to receive education
along with the other people in schools and universities. Promote the inclusion of
disabled means changing posture, looks about the disability. Implies the breaking of
paradigms, reformulations of the education system for achieving quality education, in
which the access, care regardless of their differences and needs. We will also talk about
the Milan Congress of 1880 which represented a dark phase in the history of the Deaf,
because oralism was imposed as the best method for the Deaf. We will apply the
philosophies in education these subjects, oralism - total communication and
bilingualism, with emphasis on the latter, given its importance to rescue the person's
right of expression Deaf and discuss the process to be bilingual means being in tune
real, constantly growing true in the narrow sense to allow yourself and allow others:
approach, understanding and inclusion. And for the composition of this article we rely
on scholars as Skliar, Stokoe, Strolbel, Frames, Sacks and other laws and in the area of
special education, as well as in the specific area of deafness.
Keywords: Special Education, Deaf subjects, Bilingualism.
1. INTRODUÇÃO
A inclusão de alunos com necessidades especiais3 impõe nos sistemas
educacionais muitos desafios ocorridos desde os primeiros progressos inclusivos nos
3 A expressão necessidades especiais consta no Art. 58 da LDB 9394/96 em seu capítulo V
referente ao aluno da educação especial e segundo Edler Carvalho (2009) que diz que a substituição dos termos “excepcionais”, “deficientes”, “portador de deficiência” e outros pela expressão necessidades especiais, traduz uma intenção persuasiva dos especialistas aos leigos. Objetiva-se favorecer, por meio de palavras, um corte epistemológico que evolua do paradigma reducionista organicista, centrado na deficiência do sujeito, que exige uma leitura dialética e interessante das relações sujeito/mundo.
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anos 90. Esse período apresentava as transições de uma escola que antes ignorava as
diferenças de tais alunos, para um resgate de direitos e de exigência do reconhecimento
dessa diferença pelo sistema educacional.
Conforme Edler Carvalho (2009) historicamente a educação especial tem sido
considerada como a educação de pessoas com deficiência, seja ela mental, auditiva,
visual, motora, física, múltipla ou decorrente de distúrbios invasivos do
desenvolvimento, além das pessoas superdotadas que também têm sido integrado o
alunado da educação especial. Numa visão clínica, os sujeitos que apresentam
alterações orgânicas são considerados como “desviantes” nas palavras de Carvalho.
Percebidos como doentes, deficientes e incapazes, se confundindo com patologias e as
limitações da pessoa com necessidades especiais passam a ser um limitador de uma vida
“normal” em sociedade.
Portanto nesse artigo viemos propor um pequeno caminhar histórico na
educação especial com foco na educação dos Surdos4 para dar-lhes um pouquinho de
pepita, ou encorajá-los a pensar, refletir e discutir sobre a escola bilíngue para os surdos
e a importância desta para as pessoas Surdas se expressarem como indivíduos
participantes de uma sociedade.
2. EDUCAÇÃO ESPECIAL
A educação especial se organizou tradicionalmente como atendimento
educacional especializado substituindo o ensino comum, evidenciando diferentes
compreensões, terminologias e modalidades que levaram à criação de instituições
4 Em nosso artigo usamos a terminologia Surda e não deficiente auditivo baseada na fala de
Sueli Fernades a qual diz que a mudança de estatuto da surdez, de patologia para fenômeno social ou diferença, vem acompanhada, também, de mudança de nomeclatura, não só na terminologia, mas conceitual. Para o grupo, a expressõe deficiente auditivo é pejorativa e carrega o estereótipo de doença incurável, do déficit, da limitação. É a expressão utilizada por médicos e audiologistas que se ocupam com do aspecto clínco-terapêutico da surdez. Educadores,lingüistas e antropólogos devem ter como foco o sujeito, e não a deficiência. Assim a opção pela palavra Surdo é ideologicamente marcada.
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especializadas, escolas especiais e classes especiais. Essa organização fundamentou-se
no conceito de normalidade/anormalidade, determinada por avaliações clínicas e por
meio de diagnósticos que definiram as práticas escolares para os alunos com
deficiência.
Esse conceito de inclusão envolve um repensar radical da política e da prática
e reflete um jeito de pensar fundamentalmente sobre as origens da
aprendizagem e as dificuldades de comportamento. Em termos formais
estamos falando sobre uma mudança de ideia de “defeito” para um “modelo
social”.
(MITTLER, 2003. pg, 25).
No Brasil, o atendimento às pessoas com deficiência teve início na época do
Império, com a criação de duas instituições: o Imperial Instituto dos Meninos Cegos, em
1854, atual Instituto Benjamin Constant – IBC, e o Instituto dos Surdos Mudos, em
1857, hoje denominado Instituto Nacional da Educação dos Surdos – INES, ambos no
Rio de Janeiro.
No início do século XX foi fundado o Instituto Pestalozzi (1926), instituição
especializada no atendimento às pessoas com deficiência mental; em 1945 foi criado o
primeiro atendimento educacional especializado às pessoas com superdotação na
Sociedade Pestalozzi, por Helena Antipoff e em 1954, é fundada a primeira Associação
de Pais e Amigos dos Excepcionais – APAE.
Ao reconhecer que as dificuldades encontradas nos sistemas de ensino
evidenciam a necessidade de confrontar as práticas discriminatórias e criar alternativas
para superá-las, a educação especial com escolas especializadas deram lugar a educação
inclusiva que assume espaço central no debate a cerca da sociedade contemporânea e do
papel da escola na superação da lógica da exclusão. O movimento mundial pela
educação inclusiva é uma ação política, cultural, social e pedagógica, desencadeada em
defesa do direito de todos os alunos de estarem juntos, aprendendo e participando, sem
nenhum tipo de discriminação. A educação inclusiva constitui um paradigma
educacional fundamentado na concepção de direitos humanos, que conjuga igualdade e
diferença como valores indissociáveis, e que avança em relação à idéia de eqüidade
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formal ao contextualizar as circunstâncias históricas da produção da exclusão dentro e
fora da escola.
O Brasil em 1994, tendo participado da Conferência Mundial sobre
Necessidades Educativas Especiais: Acesso e Qualidade, realizado em Salamanca, na
Espanha, assumindo o compromisso de que até 2015 garantirá o acesso de todas as
crianças ao ensino fundamental de forma gratuita e obrigatória. As escolas a partir disto
tendem serem planejadas e os programas de ensino organizados considerando as
diferentes características e necessidades de cada aluno. Em 1996 a LDB reiterou a
formação básica do ensino fundamental e em 1999 numa convenção na Guatemala que
contribuiu para o atendimento das políticas de inclusão na perspectiva de remoção de
barreiras arquitetônicas e atitudinais, entre outras possibilidades. Tal concepção vem
nutrindo um posicionamento segundo o qual o termo “inclusão” é associado à ideia de
“acessibilidade”.
Em 2000 fora criada a Lei n° 10.048/00, a qual dá prioridade de atendimento às
pessoas deficientes, idosos e gestantes, a Lei n° 10.098/02 estabelece normas gerais e
critérios básicos para a promoção da acessibilidade e o decreto n° 5296 que regulamenta
as leis citadas especificando detalhadamente o atendimento para a acessibilidade. E para
contribuir e fortalecer ainda mais a legislação que ampara a pessoa com necessidades
especiais em 2009 fora criado o Decreto n° 6949 que promulga a Convenção
Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e seu Protocolo
Facultativo, assinados em Nova York, em 30 de março de 2007.
Muito se tem falado sobre inclusão e quase sempre com sentido de que inclusão
e integração escolar seriam sinônimos. Sendo que na verdade, a integração insere o
sujeito na escola esperando uma adaptação deste ambiente escolar já estruturado,
enquanto a inclusão escolar é o processo de redimensionamento das estruturas físicas do
ambiente, atitudes e percepções dos educadores, alunos e comunidade.
A inclusão num sentido mais amplo significa o direito à cidadania, sendo a
inclusão escolar apenas uma parte desse processo que precisamos percorrer. A cidadania
da pessoa com deficiência é um caminho novo e que evolui de maneira tímida, pois
toma corpo apenas na década de 90, com o movimento “Educação para Todos”, apesar
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de ter início em 1948 na forma de diretrizes políticas, quando fora aprovada a
Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Ainscow caracteriza a inclusão deste modo:
A agenda da educação inclusiva refere-se à superação de barreiras, à
participação que pode ser experienciada por quaisquer alunos. A tendência
ainda é pensar em “política de inclusão” ou educação inclusiva como dizendo
respeito aos alunos com deficiência e a outros caracterizados como tendo
necessidades educacionais “especiais”. Além disso, a inclusão é
frequentemente vista apenas como envolvendo o movimento de alunos das
escolas especiais para os contextos das escolas regulares, com i implicação de
que eles estão “incluídos”, uma vez que fazem parte daquele contexto. Em
contrapartida, eu vejo inclusão como um processo que nunca termina, pois é
mais do que um simples estado de mudança, e como dependente de um
desenvolvimento organizacional e pedagógico contínuo no sistema regular de
ensino.
A inclusão educacional trata do direito a educação, comum a todos os indivíduos
e o direito de receber a educação junto às demais pessoas nas escolas e nas
universidades. Promover a inclusão do deficiente significa mudar de postura, de olhares
a cerca da deficiência. Implica na quebra de paradigmas, reformulações do sistema de
ensino para a conquista de uma educação de qualidade, na qual o acesso, o atendimento
independente de suas diferenças e necessidades.
2.1 ASPECTOS HISTÓRICOS
Bem, agora nos focando na trajetória inicial dos institutos criados na época
Imperial, prestemos atenção a da área da surdez para que possamos desenvolver o
percurso histórico por ele traçado. A trajetória social da pessoa Surda sempre esteve
dialeticamente implicada com a concepção de homem e cidadania ao longo do tempo.
Antes de surgirem estas discussões sobre a educação, os sujeitos Surdos eram rejeitados
pela sociedade por vezes sacrificados, e posteriormente eram isolados nos asilos para
que pudessem ser “protegidos”, pois não se acreditava que pudessem ter uma educação
em função da sua ‘anormalidade’, cada país, cada povo, desenvolvia ou não trabalhos
com as pessoas deficientes de acordo com o que acreditavam ser o mais correto, na
maioria das vezes não sendo.
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Segundo Fonseca (2001, pág.77),
Educação é tudo o que permite ao individuo aprender novas aquisições,
novas competências e novas atitudes. Sem educação os deficientes não
poderão atingir uma vida de valor e de significados humano.
Passado a Idade Média, os sujeitos Surdos tornaram-se mais aceitos pela
sociedade, um exemplo disso foi em Constantinopla, tiveram trabalhos como auxiliares
de corte e costuras dos alfaiates. Os Surdos passaram a receber educação a partir do
século XVI na Espanha onde fora criada a primeira escola para Surdos com o Monge
Pedro Ponce de Léon, o qual se utilizava da datilologia e alguns sinais como abordagem
pedagógica. Depois disto, muitos outros métodos se desenvolveram. Na França, no
século XVIII Charles M. L’Epée (1712 – 1789), considerado “Pai dos surdos”, usava a
metodologia gestual para ensinar os surdos, iniciou o seu trabalho com duas irmãs
surdas e posteriormente fundou a primeira escola para surdos o Instituto Nacional para
Surdos-Mudos de Paris, ele conseguiu reconhecer que os surdos tinham uma maneira de
se comunicar, através de gestos, e que este poderia ser usado para ensinar/educar o
surdo.
Para Sacks (1990, p. 37), L´Epée criou a partir da:
[...] linguagem de ação, uma arte metódica, simples e fácil, pela qual
transmitia a seus pupilos ideias de todos os tipos e até mesmo, ouso dizer,
ideias mais precisas do que as geralmente adquiridas através da audição.
Enquanto a criança ouvinte está reduzida a julgar o significado de palavras
ouvidas, e isto acontece com frequência, elas aprendem apenas o significado
aproximado; e ficam satisfeitas com essa aproximação por toda a vida. É
diferente com os surdos ensinados por L’Epée. Ele só tem um meio de
transmitir ideias sensoriais: é analisar e fazer o pupilo analisar com ele.
Assim, ele os conduz de ideias sensoriais a abstratas; podemos avaliar como
a linguagem de ação de L’Epée é vantajosa sobre os sons da fala de nossas
governantas e tutores.
No Brasil a história da educação dos Surdos só teve início com a vinda do
professor Surdo francês Ernest Huet em 1855 a convite de Dom Pedro II, o qual
organizou uma proposta de ensino com uso da datilologia e língua de sinais francesa
sendo a partir disto criado o Instituto dos Surdos Mudos em 26 de setembro de 1857,
atual INES, já citado e também fora assinada a lei n° 839 da criação deste instituto por
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Dom Pedro II. Ernest era discípulo de L’Epée e trouxe essas influências para a criação
do instituto.
Conforme Goldfeld (2002),
O século XVIII é considerado o período mais fértil da educação dos surdos.
Nesse século, ela teve grande impulso, no sentido quantitativo com o
aumento de escolas para surdos, e qualitativo, já que, pela língua de sinais os
surdos podiam aprender e dominar diversos assuntos e exercer várias
profissões.
Há um momento de obscuridade na história da pessoa surda, que fora sem
dúvida, o Congresso de Milão, em 1880, onde um grupo de ouvintes decide excluir a o
uso de sinais do processo de aprendizagem da pessoa Surda e substituí-lo pelo
oralismo5. A visão ouvintista defendia que só através da fala o indivíduo surdo poderia
ter seu desenvolvimento pleno e uma “perfeita” integração social.
Durante o período em que o oralismo dominou e fora por 100 anos, pode ser
observado até hoje os resquícios, as marcas e traumas que ficaram nas vidas das pessoas
Surdas e para quem trabalhou e trabalha com elas. A autora Quadros (2005) apresenta
pesquisas desenvolvidas com Surdos nos Estados Unidos da América que resultaram
num esmagador fracasso acadêmico em que o Surdo fora inserido. Os Surdos que hoje
são adultos, muitos deles, não sabem escrever, nem ler muito bem e poucos sabem a
língua de sinais, pois os mesmos passaram por vários processos educacionais até
chegarem ao momento em que estamos.
A fase oralista, que se fundamenta na recuperação da pessoa surda chamando-a
de deficiente auditivo. O ouvintismo6 enfatiza a língua oral em termos terapêuticos,
outro problema dessa proposta também apresentada por Quadros (2005) fora que
pesquisadores americanos constataram que crianças surdas gastam anos de sua vida na
oralização para captar somente cerca de 20% da mensagem da fala e, além disso, a fala
5 Segundo Goldfeld (2002) o oralismo ou filosofia oralista visa integração das crianças surdas
na comunidade de ouvintes, dando-lhes condições de desenvolver a língua oral, sendo um treinamento da fala. 6 Para Skliar (1999) o termo “Ouvintismo” e as suas derivações “ouvintização”, “ouvintistas”,
etc., sugerem uma forma particular e especifica de colonização dos ouvintes sobre os surdos. Supõem representações, práticas de significação, dispositivos pedagógicos, etc., em que os surdos são vistos como sujeitos inferiores, primitivos e incompletos.
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dessa criança normalmente não é muito compreendida por pessoas que não convivem
com ela. Essa fase oralista chegou ao Brasil em 1911.
Diante desse difícil contexto, surgiu então, uma proposta que permitiria o uso de
sinais com o objetivo de desenvolver a linguagem na criança Surda. Entretanto, a estes
eram usados como um recurso para o ensino da língua oral. Os sinais passaram a ser
utilizados pelos profissionais em contato com o Surdo dentro da estrutura da língua
portuguesa. Esse sistema artificial passou a ser chamado de Português Sinalizado ou
Bimodalismo. Pois o ensino não enfatizava mais o oral exclusivamente, mas o bimodal.
Tal proposta se caracterizava pelo uso simultâneo de sinais e fala. Outra tentativa que
também não teve respostas tão agradáveis fora a Comunicação Total em 1975.
As duas primeiras fases constituíram grande parte da educação dos surdos, mas
ao despertar das comunidades Surdas, percebendo a importância do uso de sinais, com
os avanços das pesquisas relacionadas à educação e aquisição da linguagem.
A partir dos anos 60, nos Estados Unidos um pesquisador chamado Willian
Stokoe, iniciou os seus estudos sobre as línguas de sinais em especial ASL (American
Sign Language – Língua Americana de Sinais), o autor concluiu que elas ocupavam
todos os requisitos científicos para serem consideradas línguas, tendo estrutura
gramatical própria, assim como as línguas orais e que esta deveria ser utilizada na
escolarização da pessoa Surda. Surgiram então rumores de uma nova proposta de ensino
o Bilinguismo7 a partir dos anos 90, como sendo uma proposta de ensino usada por
escolas que propõem a tornar acessível à criança surda duas línguas no contexto escolar.
Considerando a língua de sinais a língua natural e que parte desse pressuposto para o
ensino da língua portuguesa escrita.
2.2 BILINGUISMO
7 Para Goldelf (2002) o termo Bilinguismo tem como pressuposto básico que o surdo deve ser
bilíngue, ou seja, deve adquirir como língua materna a língua de sinais, que é considerada natural dos surdos e, como segunda língua, a língua oficial de seu país.
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Os Surdos buscaram ao longo da história, por meio da língua, a constituição da
subjetividade com Identidade Surda, em que o reconhecimento da própria imagem
acontece através das relações sociais entre surdos, determinando a significação do
próprio eu. Portanto a aquisição da linguagem é fundamental para que o sujeito Surdo
possa se reescrever através da interação social, política, cultural e científica. Conforme
Skliar (1997) a língua de sinais é uma língua natural adquirida de forma espontânea pela
pessoa Surda em contato com usuários da língua e a língua portuguesa escrita é
adquirida de forma sistematizada.
E de acordo com Silva (1998), reconhecer a diferença entre o Surdo e o ouvinte
é encarar a realidade relativa ao surdo. É reconhecer suas limitações no que diz respeito
ao seu desempenho na aquisição de uma língua oral e reconhecer também sua
habilidade linguística que se manifesta na criação, uso e desenvolvimento de línguas
visual-espacial, ou seja, de línguas de sinais.
Uma grande conquista para a comunidade surda fora a criação da lei n°
10.436/02 reconhecendo a Libras como a língua de sinais oficial do Brasil, bem como
incluindo a disciplina de Libras como parte do currículo nos cursos de formação de
professores e fonoaudiologia. E em 2005, com o decreto n° 5.626 para regulamentar a
lei já citada, no que diz respeito, ao ensino da língua portuguesa como segunda língua
(L2), dos direitos dos instrutores/professores de Libras, e do Tradutor/Intérprete - TILS
presente em sala de aula em todos os órgãos públicos, bem como sobre a formação
destes profissionais. Só para esclarecimento, ao TILS cabe o papel de intermediário da
língua fonte para a língua alvo, é o que resgata significados e os transporta para o outro
lado, ou seja, torna compreensível aquilo que antes era inacessível. O mesmo teve sua
profissão reconhecida somente em 2010 com a lei n° 12. 319.
Na prática disso tudo, ou seja, a realidade escolar se mostra de forma equívoca,
as escolas estão com projetos de bilinguismo, mas o que encontramos, são escolas com
enfoque em qual linha deve seguir ou pertencer a ouvintista ou a sinalista e o objetivo
de se ensinar a língua de sinais e a língua portuguesa escrita fluentemente para que o
surdo possa se comunicar com propriedade e se desenvolva numa perspectiva mais
sócio antropológica, não está acontecendo. Com a criação do decreto n° 7611/11 que
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dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá outras
providências, surge então o atendimento do AEE aos surdos também, mas como
funciona esse AEE? O Atendimento Educacional Especializado (AEE), na perspectiva
da educação inclusiva, tem um caráter exclusivamente de suporte e apoio à educação
regular, através do atendimento à escola, ao professor da classe regular e ao aluno. O
atendimento educacional especializado (AEE) é um serviço da educação especial que
identifica, elabora, e organiza recursos pedagógicos e de acessibilidade, que eliminem
as barreiras para a plena participação dos alunos, considerando suas necessidades
específicas" (SEESP/MEC, 2008).
O ensino oferecido no atendimento educacional especializado é necessariamente
diferente do ensino escolar e não pode caracterizar-se como um espaço de reforço
escolar ou complementação das atividades escolares. São exemplos práticos de
atendimento educacional especializado: o ensino da Língua Brasileira de Sinais
(LIBRAS) e do código BRAILLE, a introdução e formação do aluno na utilização de
recursos de tecnologia assistiva, como a comunicação alternativa e os recursos de
acessibilidade ao computador, a orientação e mobilidade, a preparação e
disponibilização ao aluno de material pedagógico acessível, entre outros.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
No entanto, no questionamos será que é esse atendimento que os Surdos
precisam? É o melhor caminho para aprendizagem acontecer? E os sujeitos Surdos o
que pensam a respeito disso? Será que a sociedade dominadora das questões a respeito
da educação e aquisição da linguagem está ouvindo o que os Surdos dizem sobre sua
própria forma de aprendizagem, ou está “surda” perante os Surdos? Pois um fato
interessante é que as decisões sobre métodos educacionais de Surdos sempre foram
determinadas por ouvintes que se auto conferem poder para tomada de decisão.
Fundamentar a educação de surdos na teorização cultural contemporânea sobre a
identidade e a diferença parece ser o caminho. Estamos num momento que primam pela
defesa cultural: a educação na diferença na mediação intercultural. Esta modalidade
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oferece fundamento para a educação dos surdos a partir de uma visão em outra filosofia
invariável hoje. A educação dá-se no momento em que o surdo é colocado em contato
com sua diferença para que aconteça a subjetivação e as trocas culturais. Neste espaço
não mais há a sujeição ao que é do ouvinte, não ocorre mais a hibridação, ocorre à
aprendizagem nativa própria do surdo.
Outro ponto importante em que a educação de surdos pode fundamentar-se hoje
está no procedimento intercultural que trabalha com as identidades surdas constituídas.
Este procedimento intercultural de educação de Surdos é um processo coerente com a
necessidade de habilidades e competências, face à necessidade do sujeito Surdo
posicionar-se frente às diferentes culturas e suas peculiaridades. O procedimento da
mediação cultural não rejeita a cultura ouvinte. A cultura ouvinte está aí como cultura, e
a metodologia arma estratégias para a posição de diferença, para a afirmação cultural.
Elevar a cultura de modo natural, não impositivo, a etapa mais forte da Educação
plena e real dos Surdos está justamente no quesito cultural, a diversidade com relação à
maioria populacional linguística. Por isso reforça-se o bilinguismo verdadeiro sem
interferências, nem arroubos súbitos por simples vaidade, mas por fato e por
proporcionar a potencialidade dos indivíduos Surdos, numa escola bilíngüe para Surdos.
Estar no processo bilíngue significa estar em sintonia real, em constante crescimento
verdadeiro no sentido estreito de permitir-se e permitir aos outros: aproximação,
entendimento e inclusão.
Conforme Fonseca (2001, pág.77), programas educacionais e inclusivos podem
fazer a diferença na vida dos alunos surdos. As sociedades civilizadas não podem
contentar em dar assistência às pessoas com necessidades especiais, pois lhes assiste o
direito fundamental de otimizarem e maximizarem os seus potencias habilitivos e
cognitivos. Se os serviços educacionais falharem nesta obrigação social, cada vez mais
se deficientarão as pessoas com necessidades especiais, impedindo-os de contribuírem
ativamente e produtivamente, para a vida da comunidade onde devem estar inseridos.
Pois a legislação por si só não muda a situação de exclusão do sujeito Surdo,
contudo as escolas devem estar devidamente equipadas, preparadas para receber ou
atender aos alunos portadores de necessidades especiais, inclusive com professores
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qualificados. Para que a inclusão se efetive na escola fazem-se necessárias adaptações
que competem, aos órgãos governamentais, através da disponibilidade de recursos
financeiros, às escolas, buscando didáticas que se adaptem a situação, a aos professores,
que devem buscar especialização para melhor conduzi as aulas. Havendo inclusão na
escola abrem-se portas para que no futuro esta inclusão aconteça na sociedade como um
todo.
REFERÊNCIAS
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IGUALDADE NA DIFERENÇA: AS ALTERNATIVAS PARA O
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO DE ALUNOS SURDOS EM
PROGRAMAS DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTO SENSU
PIRES-SANTOS, Maria Elena
MASCARELLO, Fábio
O objetivo desse trabalho é trazer para discussão as políticas de inclusão de
alunos surdos em Programas de Pós-Graduação stricto sensu e as alternativas possíveis
de apresentação de trabalho de conclusão do curso para além das formas tradicionais
que privilegiam a escrita.
O Mestrado/Doutorado em Letras da UNIOESTE, campus de Cascavel, na sua
função de garantir a igualdade na diferença para todos seus alunos – ‘igualdade’ no
sentido de garantia de direitos em relação às suas diferenças e não de homogeneidade –
neste caso, o direito do aluno surdo a cursar e concluir o Mestrado com sucesso – vem
se colocando de forma equivalente às políticas de promoção das ações afirmativas, no
sentido não só de contribuir para o atendimento às diferenças, mas principalmente, de
garantir o acesso, a permanência e a conclusão com sucesso no Programa. Para tanto,
são necessárias propostas alternativas às tradicionais dissertações, em que predominam
a modalidade escrita da língua portuguesa, a qual constitui a segunda língua (L2) para
os surdos. Para atender às especificidades desse alunado, é de fundamental importância
considerar a Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) como sua primeira língua (L1), cuja
característica é ser espaço-visual e, por isso, precisa ser priorizada nos trabalhos de
conclusão de curso.
A alternativa aqui apresentada está amparada, primeiramente, na Lei nº 10.436,
promulgada em 2002, que regulamenta o uso da Língua Brasileira de Sinais na
educação e reconhece direitos fundamentais para as comunidades surdas do Brasil
como, por exemplo, o apoio ao uso e difusão da LIBRAS como forma de comunicação
corrente nas comunidades surdas, por parte das instituições públicas e empresas
concessionárias de serviços públicos e assistência à saúde. De acordo com essa lei:
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Art. 1o É reconhecida como meio legal de comunicação e
expressão a Língua Brasileira de Sinais - Libras e outros
recursos de expressão a ela associados.
Parágrafo único. Entende-se como Língua Brasileira de Sinais -
Libras a forma de comunicação e expressão, em que o sistema
linguístico de natureza visual-motora, com estrutura gramatical
própria, constitue um sistema linguístico de transmissão de
idéias e fatos, oriundos de comunidades de pessoas surdas do
Brasil (LEI Nº 10.436, de 24 de abril de 2002).
Além da cooficialização, também fica garantida a inclusão da LIBRAS nos
cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia e de Magistério, em seus
níveis superior e médio, regulamentada pelo decreto no. 5.626, de 22 de dezembro de
2005.
Estas representam conquistas importantes para os surdos, mas a concretização
das políticas públicas nesse sentido ainda está longe de garantir os direitos esperados,
pois, conforme rege a lei 10.436, no artigo 4º, parágrafo único “A Língua Brasileira de
Sinais – Libras – não poderá substituir a modalidade escrita da língua portuguesa” o que
pressupõe a garantia, aos surdos, de acesso a uma educação bilíngue, que lhes
propiciaria uma proficiência maior nas duas línguas, cenário ainda distante na educação
brasileira. É importante lembrar, por outro lado, que já está em funcionamento, em
algumas universidades brasileiras, a Graduação em Língua Brasileira de Sinais, o que
pode cooperar para a consolidação dos direitos do surdo e para que sejam respeitados
em suas particularidades culturais e linguísticas.
A concepção bilíngue exige uma metodologia pedagógica que privilegie a
experiência espaço/visual dos surdos. As aulas e os materiais didáticos devem
aprofundar estruturas epistemológicas do campo visual (Libras e imagens conceituais
visuais), pois o conhecimento da língua falada e o domínio da escrita não acontecem de
forma natural para os surdos.
A língua que percebem e utilizam de forma natural é a língua de sinais, que é sua
primeira língua (L1) sendo a língua portuguesa reconhecida como uma segunda língua
(L2) para os surdos. Como L2, ela necessita de metodologia e recursos adequados para
seu ensino-aprendizado, tornando-se importante que se tome como referência sua
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primeira língua, a partir da qual serão construídos os conhecimentos na L2 como língua
estrangeira.
A possibilidade aqui proposta considera, também, a Lei de Diretrizes e Bases
(LDB), que garante ao surdo uma avaliação diferenciada, isto é, que também considera
a Língua Brasileira de Sinais como a primeira língua dos surdos, a qual se diferencia
das línguas orais, por sua característica espaço/visual, como já mencionado.
A alternativa de avaliação aqui trazida para discussão está ancorada, ainda, nos
princípios da pesquisa qualitativa que, como propõem Denzin & Lincoln (2006, p. 363)
quando tratam do futuro dessa abordagem, nos alertam para a importância de o
pesquisador estar ciente de seus deveres cívicos e de sua função como um “bricoleur
metodológico e epistemológico”, no sentido de ser um “artista, um confeccionador de
colchas, um artesão habilidoso, um elaborador de montagens e de colagens. Desta
forma, o futuro da pesquisa qualitativa estaria caminhando em direção oposta a uma
forma dominante de textualidade, ou seja, aponta para formas textuais híbridas:
(...) A primeira forma será a do texto etnográfico realista, clássico,
redefinido em termos pós-estruturais. Nesses textos, mais nos falarão
as vozes em primeira pessoa. A segunda forma textual híbrida será
uma mistura e uma combinação de textos poéticos, ficcionais e de
performance, transformando-os em apresentações intervencionistas
críticas. A terceira forma textual incluirá os testemunhos e os textos
em primeira pessoa (auto-etnográficos). A quarta forma consistirá em
textos de avaliação narrativos, que trabalham em um vaivém entre as
vozes em primeira pessoa e o testemunho. Essas vozes serão avaliadas
em termos de uma série cada vez mais sofisticada de critérios locais,
antifundacionistas, morais e éticos (DENZIN & LINCOLN, 2006, p.
365).
Também considerando formas de inovações metodológicas para a geração e
análise de registros, Gergen & Gergen (2006) especificam a forma híbrida da
performance. Consideram que a tradição do texto escrito não é a única forma de redação
científica e propõem também, como forma de pesquisa e apresentação, artes gráficas,
vídeo, drama, dança, magia, multimídia, etc. Nas palavras dos autores “... ao escolher a
performance, o investigador evita as alegações mistificadoras da verdade, ao mesmo
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tempo em que expande o alcance das comunidades nas quais o trabalho pode estimular
o diálogo” (p. 371).
Schiaffino (2011), pesquisadora surda, ao propor como objetivo, em seu trabalho
de conclusão do Mestrado, a verificação de como a mídia pode auxiliar na formação do
conhecimento científico dos surdos, aponta as principais barreiras para que o surdo
compreenda os textos acadêmicos e traz para problematização a questão da
comunicação, apontando alguns empecilhos para a compreensão leitora. Segundo a
autora, a forma de ler do surdo não acontece de forma linear, mas em “pinceladas” (p.
59), ou seja, ele busca palavras conhecidas na língua portuguesa, para correlacioná-las
com a equivalente em LIBRAS e vice-versa. No entanto, nem sempre os termos
apresentam correspondências entre uma e outra língua, principalmente termos teóricos,
que não encontram correspondentes em sua primeira língua. Além disso, no processo de
tradução de uma língua para outra, é preciso considerar que, em ambas, a mesma
palavra/sinal é ambivalente, possibilitando variadas interpretações, dependendo do
contexto. Para a autora, a contextualização é um dos maiores desafios para a
compreensão do que rodeia o surdo. Quando se trata de texto teórico, então, essas
ambiguidades se tornam ainda mais complexas, pois remetem a processos sócio-
históricos e paradigmáticos diversos e muitas vezes conflitantes. Assim, a pouca
familiaridade do surdo com a língua portuguesa e a não equivalência de termos e
conceitos entre as duas línguas, aliadas à dificuldade de contextualização, tornam a
compreensão leitora do surdo incipiente, instaurando-se um círculo vicioso, difícil de
ser rompido.
Outro aspecto abordado por Schiaffino (op. cit.) refere-se à importância da
presença da imagem no sentido de contribuir para a leitura do surdo, já que sua língua é
espaço-visual. No entanto, a autora afirma que, quando a imagem é mal escolhida, pode
acontecer justamente o contrário, tornando-se fator de intensificação das dificuldades de
compreensão. Em relação ao texto teórico escrito, por exemplo, a presença de textos
multimodais, pelo menos por enquanto, é ainda quase inexistente.
Apesar de todas as dificuldades apontadas, Schiaffino (2011) afirma que ainda
assim as informações chegam aos surdos, mesmo que em alguns momentos sejam
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truncadas, em outros sejam inexatas. Para que possa haver mudanças na construção do
conhecimento científico pelos surdos, a autora propõe que as mídias, as quais têm como
objetivo atingir o maior número possível de leitores, assumam o papel de funcionar
como ponto de partida para a divulgação do acesso à informação informal para que, a
partir dessas informações, os surdos tenham ampliadas suas possibilidades de
compreensão de textos acadêmicos específicos. Nesse processo, a contextualização via
imagens se torna muito importante, embora quando mal utilizadas, possam causar
contradições, pela sua própria dubiedade. Mesmo com esta restrição em relação às
imagens, a autora considera as composições visuais como facilitadoras de vivências da
ciência no cotidiano, por parte do surdo, para que este possa, a partir desses
conhecimentos prévios, dar continuidade a conhecimentos mais complexos.
Considerando o exposto é que foram propostas as formas alternativas de
conclusão de curso para o processo aqui apresentado e que passo a descrever.
A Universidade já disponibiliza o intérprete, para que este possa intermediar a
interação entre aluno surdo, alunos ouvintes, platéia e professor ouvinte, durante as
aulas, orientações e apresentações de trabalhos. É preciso considerar a importância do
papel do intérprete nesse contexto, sem o qual seria praticamente impossível qualquer
interação e aprendizado nesse contexto. Mas, embora aqui não seja espaço para maiores
discussões sobre as limitações que envolvem a mediação em línguas diferentes via
intérprete, vale ressaltar as dificuldades quanto à ausência de alguns conceitos teóricos
na LIBRAS, o que dificulta a compreensão do surdo. Somada a essa dificuldade,
também está a diferença de área do intérprete, que nem sempre tem uma formação na
área de conhecimento que está sendo desenvolvida, embora sua atuação seja de
primordial importância nesse cenário, mesmo que não suficiente, como já mencionado.
Tendo como objetivo do projeto específico aqui relatado, proposto pelo coautor
do presente texto, a verificação das representações construídas pelos professores surdos
de Libras sobre sua própria formação, a geração de registros foi conduzida em forma de
entrevistas entre o aluno surdo e o professor surdo de LIBRAS. Todas as entrevistas
foram gravadas e posteriormente traduzidas por um intérprete ouvinte. Após a tradução
escrita em língua portuguesa, as mesmas foram analisadas pelo aluno surdo da seguinte
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forma: o aluno lia as respostas e, com as explicações do orientador, apresentava sua
análise em Libras, que era traduzida simultaneamente pelo intérprete e, ao mesmo
tempo, digitada pelo orientador, para posteriormente ser ancorada teoricamente em
discussões de diferentes autores que tratam das categorias levantadas nas análises.
Posteriormente ao desenvolvimento de cada etapa de estudos propostos pelo
Programa de Pós-Graduação em Letras, todas as apresentações dos resultados dos
trabalhos (Seminários de pesquisa, qualificação e, futuramente, a defesa da pesquisa
realizada) foram/serão apresentados em LIBRAS. Para tanto, as bancas são sempre
compostas pelo orientador, professores participantes, intérprete e aluno. A apresentação
realizada pelo aluno em LIBRAS é filmada por um técnico da Universidade, para
posterior tradução para a língua portuguesa escrita. Todo esse acervo fará parte do
resultado final do trabalho de pesquisa. A tradução tem como finalidade facilitar o
acesso a leitores que não conhecem a LIBRAS.
Embora o processo ainda esteja em construção, trazer as questões aqui
apresentadas para discussão pode contribuir tanto para a divulgação de possibilidades
avaliativas mais igualitárias, como para que sejam recebidas contribuições a serem
somadas nas alternativas já adotadas.
Considerando o exposto, entendemos que oferecer uma avaliação diferenciada
para os surdos coloca-se como uma importante contribuição para que sejam respeitadas
e valorizadas as línguas e culturas de grupos minoritarizados e também para que se
concretizem Políticas Linguísticas interculturais, que considerem a igualdade na
diferença.
Bibliografia
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Disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-
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SCHIAFFINO, R. S. Mídia e comunidade surda: como a mídia pode colaborar para a
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O ENSINO DE LÍNGUA ESPANHOLA EM ESCOLAS PÚBLICAS NA
FRONTEIRA E AS POLÍTICAS LINGUÍSTICAS
PIRES-SANTOS, M. E.8
ORONÁ, T.9
RESUMO: Este texto tem por objetivo analisar o ensino de língua espanhola nas escolas
de fronteira e as políticas lingüísticas que regem esse ensino. Pensando em uma noção
de língua, bilinguismo e plurilinguismo que estão presentes no dia a dia da fronteira e
analisando as políticas linguísticas que amparam o ensino de Língua Espanhola em uma
cidade de fronteira. Além disso faço uma exposição e discussão das propostas
curriculares do Ensino Fundamental e Médio para o ensino da língua espanhola,
analisando os programas de Ensino de Língua Estrangeira no Paraná com base nos
Parâmetros Curriculares Nacionais e Estaduais. Ao perceber a realidade vivida pelos
habitantes de fronteira e suas necessidades comunicacionais quando travam contato com
o falante de Língua Espanhola, problematizando de modo a questionar se as propostas
curriculares de ensino para esse idioma, nesta região, atendem aos diferentes e
complexos âmbitos da fronteira; pensando em um ambiente escolar que propicie um
aprofundamento na Língua Espanhola, levando-se em conta a necessidade e a prioridade
dessa língua neste ambiente de fronteira e respeitando e compreendendo os vários tipos
de sujeitos bilíngues. Tendo como base os textos oficiais, publicados em sites do
Governo Federal Brasileiro que regulamentam o ensino de Língua Estrangeira, além de
autores que tratam sobre as teorias que fundamentam o ensino de línguas, como
Cavalcanti (1999), Cavalcanti e Cézar (2007), Cavalcanti e Bortoni Ricardo (2007),
Hall (2006, 2008), Maher (2007), Salgado e Savedra (2009), Silva, Hall e Woodward(
2000), Vermes e Boutet (1989).
Palavras-chave: ensino de língua espanhola, políticas linguísticas, fronteira.
8 Doutora em Linguística Aplicada, professora dos programas Mestrado Interdisciplinar em Sociedade,
Cultura e Fronteiras, programa de mestrado e doutorado em Letras da Unioeste Cascavel. Email: [email protected] 9 Professora de Língua Portuguesa e Espanhola na rede particular de ensino, mestranda em Sociedade,
Cultura e Fronteiras pela Unioeste. Email: [email protected]
FOZ DO IGUAÇU ANAIS DO VI ENCONTRO INTERNACIONAL DE LETRAS A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE LETRAS: DESAFIOS E PERSPECTIVAS ISSN 2175-384X 06/12/2012 a 08/12/2012 ARTIGOS COMPLETOS: POLÍTICAS LINGUÍSTICAS E FORMAÇÃO DE PROFESSORES EM CONTEXTO DE FRONTEIRA
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Em Foz do Iguaçu, cidade brasileira localizada a oeste do Paraná, que faz
fronteira com dois países de língua estrangeira – a Argentina, cujo idioma oficial é o
Espanhol, e o Paraguai, que por sua vez mantém dois idiomas oficiais, o Espanhol e o
Guarani - torna-se de grande importância dominar o idioma espanhol como segunda
língua com o intuito de favorecer as interações cotidianas.
Essa necessidade de aprendizagem do idioma espanhol na fronteira também se
justifica pelas estruturas de comércio e de trabalho dos habitantes, geralmente
interligando os três países. Além das relações internacionais com esses dois países e
outros do Conesul, há uma estreita ligação comercial e acordos bilaterais, como o
Mercosul. Aprender a Língua Espanhola torna-se evidente para todo brasileiro que toma
consciência do Brasil como participante do Mercosul e da enorme extensão de fronteiras
do Brasil com países hispanofalantes.
Ao perceber a realidade vivida pelos habitantes de fronteira e suas necessidades
comunicacionais quando travam contato com o falante de Língua Espanhola, cabe
questionar se as propostas curriculares de ensino para esse idioma, nesta região, são
efetivadas na rede de ensino básico.
Pensando em um ambiente escolar que propicie um aprofundamento na Língua
Espanhola, levando-se em conta a necessidade e a prioridade dessa língua neste
ambiente de fronteira, pretendo verificar as políticas linguísticas para o ensino de
Língua Estrangeira em cidade de fronteira e também observar como se efetivam essas
políticas no contexto escolar.
Neste trabalho, organizado em três partes, discuto, em primeiro lugar, a noção de
língua e bilinguismo que estão presentes no dia a dia da fronteira; em um segundo
momento, analisamos as políticas linguísticas que amparam o ensino de Língua
Espanhola em uma cidade de fronteira; e, por último, faço uma exposição das
propostas curriculares do Ensino Fundamental e Médio, analisando os programas de
Ensino de Língua Estrangeira no Paraná com base nos Parâmetros Curriculares
Nacionais e Estaduais.
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1. O rico falar da fronteira - O bilinguismo e o plurilinguismo presentes no dia
a dia da fronteira
Para analisar o ensino de língua espanhola na fronteira e as políticas linguísticas
envolvidas nesse processo é necessário que se faça uma pequena abordagem sobre
alguns conceitos que tratam sobre os falares dessa fronteira. Este item discute esses
falares e sua importância, sob as perspectivas conceituais do bilinguismo e do
plurilinguismo; como eles se apresentam na região da fronteira e como perpassa por
muitos ambientes da sociedade desta região. Para as discussões, tomamos como base os
estudos de Cavalcanti e Bortoni-Ricardo (2007), Cavalcanti e Pires-Santos (2008),
Cavalcanti (1999), Heredia (1989).
Embora tenhamos uma situação de fronteira que revela uma aproximação física
de línguas e culturas, as distâncias simbólicas e subjetivas entre os países são percebidas
e concretizadas em práticas pedagógicas, ou seja, na escola, acentuando assim, as
diferenças entre os indivíduos. A escola, sendo uma continuação da sociedade, reproduz
seu discurso e estabelece uma separação entre os que falam determinada língua e os que
falam a outra língua. Para Pires-Santos (2008), a escola, muito mais que separar, os
classifica, evidenciando neste cenário multicultural e plurilíngue uma construção de
estereótipos.
O falar cotidiano do habitante da fronteira, já por si só não demonstra uma
regularidade de idioma único, pois para que haja comunicação, para que os negócios
aconteçam, torna-se imprescindível que tanto o autóctone quanto o visitante consigam
manter um diálogo. O Português se mistura ao Espanhol e surge a mescla dos idiomas.
Podemos dizer que há uma hibridização no falar cotidiano da fronteira. Com o advento
da globalização, o cruzar fronteiras, não só geográficas, tornou-se corriqueiro.
O Brasil, país de proporções continentais, o qual abriga imigrantes de várias
etnias, ainda conserva o mito do monolinguismo. Retomando Cavalcanti e Pires-Santos
(2008, p. 432) as quais citam Decrosse (1989) e Cavalcanti (1999), no Brasil se mantém
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a crença em uma língua para uma nação, homogênea, pura. Percebemos que esse ideal
monolíngue não é óbvio quando tratamos de necessidades sócio-econômicas, como as
que acontecem na fronteira. Segundo Vermes e Boutet (1989, p. 32), a situação
contemporânea não suprimiu nem o multilinguismo social funcional nem o
multilinguismo individual. O primeiro entende o bilinguismo visto como relacionado
ao contexto político, econômico e sócio-interacional; já o segundo, considera-se
abstrato, longe de seu entorno sócio-histórico, individual.
Quando o visitante atravessa a fronteira política entre Foz do Iguaçu e Paraguai
ou Argentina, mais especificamente, Ciudad del Este e Puerto Iguazú, respectivamente,
as duas cidades dos países fronteiriços, se depara com outras línguas e nesse momento
poderá utilizar-se de seu conhecimento do espanhol, , ou mesmo de outra língua, dada a
pluralidade linguística não só na região em foco. Conforme afirma Pereira e Agnes
(2006)
No Brasil, país que se vê monolíngue, há cerca de 200 línguas faladas segundo
dados de Maher (1996). A maioria destas línguas é indígena e há que se
acrescentar a esta estatística as demais línguas: as de sinais e as de imigração.
Além disso, o Brasil tem várias fronteiras com países hispanofalantes, com
suas fronteiras secas que facilitam sobremaneira o ir e vir tanto de brasileiros
quanto de argentinos, paraguaios, entre outros. Indiscutivelmente esta situação
propicia outras situações bilíngues. (PEREIRA E ANGNES 2006, p. 22)
Considerando esse cenário mais amplo em que se inclui o cenário de fronteira,
seu posicionamento geográfico estratégico e a presença de inúmeras comunidades
linguísticas diferentes implica em um município que se caracteriza pelo plurilinguismo
e intenso hibridismo linguístico-cultural proveniente do trânsito dos indivíduos pelas
fronteiras entre os três países, como também pela presença de diversos imigrantes.
Então, podemos observar que as relações sociais e econômicas existentes entre
os que cruzam tais fronteiras influenciam a língua que será utilizada. Como cita Heredia
(1989, p. 180) falando sobre a escolha da língua de uso e o grau de bilinguismo ou
monolinguismo dos interlocutores habituais em tal ou tal situação, sendo também
portadora e índice das relações sociais.
O plurilinguismo da fronteira é enriquecedor para aqueles que percebem seu
dinamismo e efemeridade, mas passa despercebido para os atores que continuamente
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perpassam as três fronteiras. Neste ambiente, não podemos falar de cultura sem pensar
em diversidade, considerando o ir e vir diário de pessoas de um país para outro, em
diversas relações que se estabelecem e as particularidades culturais de casa país.
Nesta fronteira específica, os habitantes e visitantes encontram o espanhol, o
guarani e uma grande quantidade de línguas de imigrantes. É muito importante que o
vizinho tente desestrangeirizar a língua do outro para que ela possa servir de
instrumento social a quem dela se utilizar e para que não haja nenhuma conotação
prejudicial do falante autóctone em nenhuma situação comunicacional.
Consequentemente deixa de haver um foco no falante autóctone, suposto monolíngue
perfeito - aquele que domina a sua língua vernácula em todos os domínios - o qual deve
ser sempre imitado linguisticamente – mas passa a ser o falante competente que domina
e se utiliza de uma segunda língua efetivamente, com todas as nuances
culturais/contextuais.
Durante muito tempo a competência desse falante, supostamente perfeito, foi
objeto de desejo, de meta para o aprendiz de uma segunda língua. Hoje, podemos
perceber uma mudança na linguagem, pois há uma emergência para dominar a outra
língua. Num mundo globalizado as línguas estão sofrendo influências mútuas numa
grande escala e não há o que dantes denominavam chamadas línguas francas, pois não
podemos dizer que algum dia foram “límpidas”, mas sim sofrem influências externas
com o tempo.
Portanto, me parece importante dispor aqui da ideia, segundo Savedra (2009, p.
121) de que bilíngue não é somente aquele indivíduo com domínio igual e nativo em
duas línguas, porque senão estaríamos por certo excluindo a grande maioria. Para
Savedra, o falante bilíngue é individual, particular e caracteriza-se pela forma de
aquisição e/ou abandono que faz de duas línguas. Então, alguns habitantes da fronteira
entre Foz do Iguaçu, Puerto Iguazú e Ciudad del Este, levando em consideração as
particularidades comunicativas, se apropriam dos códigos distintos e os utilizam em
determinadas comunidades de fala, em diferentes ambientes comunicativos.
Para Maher (2007, s.p.), o bilíngue não exibe comportamentos idênticos na
língua X e na língua Y. A depender do tópico, da modalidade, do gênero discursivo, a
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depender das necessidades impostas por sua história pessoal e pelas exigências de sua
comunidade de fala ele é capaz de se desempenhar melhor em uma língua do que na
outra. Tomo meu caso como exemplo – um sujeito bilíngue português/espanhol – para
melhor explicar o acima exposto: minha competência de leitura de textos acadêmicos e
sobre linguística é equivalente nos dois idiomas, conversar em um churrasco com
pessoas amigas também será de fácil domínio, mas ao tentar expor oralmente os
conceitos lingüísticos sem um prévio estudo seria bem mais complicado. Como também
seria difícil falar sobre Fórmula 1, tanto em português quanto em espanhol.
Corroborando ainda com a noção de um bilinguismo complexo e particular do
indivíduo/falante, César e Cavalcanti (2007, p. 61) introduzem uma concepção de língua
como “caleidoscópio”, no sentido de se focalizar a língua como constituída por “um
conjunto de variáveis, interseções, conflitos, contradições, socialmente constituídos ao
longo da trajetória de qualquer falante”.
Estabelece-se então uma verdade importante, a de que devemos aproveitar as
riquezas culturais e linguísticas existentes nas regiões de fronteira e nas trocas
provenientes das idas e vindas dos falares, para que essa proximidade diminua os
aspectos negativos que surgem entre falantes de outras línguas. Esses pontos de
desgaste podem ser diminuídos em um processo de aprendizagem da L2 como algo
prazeroso e atraente, estimulando a comunicação frequente entre os habitantes desta
Tríplice Fronteira – Brasil, Paraguai e Argentina.
2. Políticas linguísticas e o ensino de língua estrangeira na fronteira
Ao discutirmos política e planificação linguística, adotamos a
definição proposta por Savedra (2007), que ressalta a interdependência que assumimos
para política e planificação linguística,
O conjunto de medidas, projetos, estratégias induzidas
(escolhas conscientes no âmbito de políticas públicas), que
tem por objetivo regular o uso das línguas, para determinadas
situações linguísticas (relação entre status e uso, peso das
línguas), propondo ações de implementação e
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acompanhamento (emprego dos meios necessários para
aplicação das políticas definidas).
Muito embora as políticas linguísticas estejam figurando recentemente na
academia e em suas reflexões, elas sempre estiveram nas gestões dos estados e
impérios, mostrando dessa forma seu comando e atendendo aos interesses políticos e
econômicos. Segundo Calvet (2007, p. 11) as políticas linguísticas, ou seja, “as decisões
referentes às relações entre línguas e a sociedade”, são designadas para prescrever ou
influenciar as línguas e variedades de línguas que devem ser usadas para diversos
propósitos.
O maior desafio para as política linguísticas nesta época de integrações regionais
é o de por em prática mudanças profundas de transição de uma posição, segundo Hamel
(1999, p. 289) “assimilacionista,” que reconhece a diferença como problema, rumo a
uma orientação que assuma as múltiplas diversidades como um enorme recurso
ecológico humano, um tesouro de visões do mundo.
Na história das políticas linguísticas latino-americanas podemos identificar,
segundo Hamel (1999), três grandes tipos de orientações culturais. Na época da colônia
e durante a maior parte da história independente, prevaleceu uma orientação rumo ao
“monoculturalismo” como política oficial que negava rotundamente toda diversidade
cultural, étnica e linguística. Posteriormente surgiu uma orientação de
“multiculturalismo” que reconhecia a diversidade como um fato, inclusive como
geradora de certos direitos, ainda que considere a diversidade como um problema (o
“problema” indígena); e uma terceira orientação que emergiu, nas últimas décadas, com
enfoque ao “pluriculturalismo” que reconhece a diferença do indígena ou do imigrante
como direito individual e coletivo e a concebe como um recurso sociocultural que
enriquece o estado e o conjunto da nação, à diferença da posição multiculturalista.
Para Hamel (1999, p. 290), as três orientações culturais e políticas não
representam etapas históricas discerníveis. Hoje, coexistem de forma conflitante, com
pesos diferentes, em praticamente todos os países latino-americanos. Este conflito não
se reflete só nas políticas indígenas, mas também, como observamos no Mercosul, no
interior de cada país frente à heterogeneidade sócio-dialetal de suas línguas nacionais e
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na relação entre Brasil e seus vizinhos hispânicos. Existe um debate entre as concepções
da multiculturalidade como problema e do pluralismo enriquecedor, sem que tenha
desaparecido totalmente a orientação monocultural.
A necessidade de incluir os modelos culturais é clara na nova relação que surge
entre o espanhol e o português no Mercosul. Qualquer política que tenha como
propósito aumentar os espaços comunicativos destas línguas e torná-las obrigatórias,
não poderá se ajustar às tradicionais políticas de Estado homogeneizador e que não
respeita a diversidade multicultural existente na fronteira. Para Hamel (1999, p. 290),
toda política deverá ter como base um conceito de interculturalidade e de comunicação
em espaços heterogêneos, e propor uma política sociolinguística que admita uma
diversidade de dialetos e registros entre as duas línguas, assim como também modelos
de comunicação bilíngue receptiva ou de alternância de línguas. Ou seja, devemos
observar e analisar as mudanças históricas para uma melhor adaptação e construção das
políticas linguísticas.
Não parece possível então, pensar em um modelo de integração entre os países
fronteiriços negando a diversidade cultural e entrecruzares das línguas e, além disso,
uma necessidade de recorrer a políticas linguísticas específicas que atendam às
demandas educacionais de fronteira. Os principais objetivos do Mercosul são a busca de
intercambio de mercadorias, tecnologias e de profissionais e uma redução de tarifas
cambiais, facilitando assim as relações comerciais e fomentando o desenvolvimento dos
países membros com outros blocos econômicos. Mas nesse contexto, a educação
sobressai como alvo de discussão estratégica dos governos, sabendo-se não só fator
fundamental no processo de qualificação dos indivíduos, mas também para a produção
de bens e seu consumo, além de aproximar culturas distintas, favorecendo e
fortalecendo a economia.
Segundo o site que trata sobre a regulamentação do Mercosul Educacional, o
desenvolvimento e crescimento econômico estão intimamente ligados à educação, os
ministros da educação dos países participantes do Mercosul, a partir da assinatura de um
protocolo de intenções, criaram o Setor Educacional do Mercosul (SEM). Tal plano
considera duas áreas prioritárias para o desenvolvimento das atividades do SEM: área I:
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desenvolvimento da identidade regional, por meio do estímulo ao conhecimento mútuo
e a uma cultura de integração; área II: promoção de políticas regionais de capacitação de
recursos humanos e melhoria da qualidade da educação. Todas essas ações educacionais
foram promovidas a partir de 1992, quando o Setor Educacional do Mercosul aprovou,
pela Decisão 07/92, o Plano Trienal, que desde então vem sendo colocado em prática.
Como forma de diminuir as distâncias culturais entre os países do Mercosul, os
governos elaboraram planos de ações para implantar planos de trabalho no sentido de
incentivar o ensino dos idiomas oficiais dos países partícipes do bloco econômico,
acoplando, como disciplinas obrigatórias, às propostas educacionais, querendo assim
que se forme uma identidade regional pelo domínio da língua e da cultura.
O processo de colonização da América do Sul, não contribuiu para a formação
de uma América Latina com uma identidade própria, mas sim notam-se as profundas
diferenças entre os indivíduos moradores da tríplice fronteira. As políticas educacionais
tendem a seguir um mesmo rumo por influência dos organismos internacionais que
promovem e financiam os programas educacionais. Destacam-se nestes últimos anos, as
políticas educacionais destinadas aos países da América Latina, ligadas a acordos com o
Banco Mundial, o FMI e outros organismos internacionais que financiam, estabelecem
metas e avaliam o desempenho do setor a fim de atender aos interesses econômicos com
o menor custo possível. Não é diferente com o Mercosul, onde as políticas educacionais
estão mais voltadas à economia do que a atender aos interesses educacionais e culturais.
Citando a fala de uma educadora e diretora de uma instituição de ensino público
estadual, “tenho observado que os programas desta língua nas escolas, tanto privadas
como públicas, se baseiam em textos didáticos desenvolvidos por editoras espanholas,
alguns de muita valia, mas que a meu ver não representam nossa realidade. A realidade
do Brasil é, sem dúvida, sem igual, já que suas fronteiras com muitos e diversos países
de fala espanhola são enormes. Penso que em primeiro lugar deve-se considerar à
cultura dos países limítrofes como ponto de partida para desenvolver um trabalho de
sucesso. As secretarias regionais de educação dos municípios de fronteiras poderiam
promover encontros de professores de espanhol para desenvolver programas e material
didático das diferentes regiões de fronteiras. Após os primeiros encontros, os
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intercâmbios de materiais e experiências poderiam ser online para que o trabalho tenha
continuidade e enriquecimento. Os interesses de cada fronteira, os diferentes climas e
regiões geográficas nos conduzem a interesses diversos, mas todos com bases
unificadas. Fica fácil encontrar, entre nossos alunos, aqueles que são filhos ou netos de
paraguaios ou argentinos, com uma língua que e uma mistura do português com o
espanhol e que não devemos ignorá-la porque forma parte do dia a dia da vida de nossos
jovens”.
Para Savedra (2007, s.p.), o reconhecimento e a defesa da pluralidade linguística
nacional apenas torna-se uma questão governamental, a partir de fortes ações de
intervenções acadêmicas, respaldadas por fóruns de instituições e de associações
nacionais, como a Associação Brasileira de Linguística (ABRALIN) e a Associação de
Linguística Aplicada do Brasil (ALAB), que elaboram documentos, propondo planos
emergenciais de ações, bem como por ações de intervenção propostas por organizações
não governamentais, como as desenvolvidas pelo IPOL (Instituto de Investigação e
Desenvolvimento em Política Linguística).
Uma maior integração das secretarias de educação, o investimento em educação
básica, a criação e posta em prática de ações inovadoras, a constante qualificação dos
profissionais da educação farão com que haja um maior intercâmbio e uma maior
aproximação na região de fronteira, respeitando suas características e sua diversidade.
3. As políticas linguísticas brasileiras para o ensino de Língua Estrangeira e as
propostas curriculares estaduais para o ensino da Língua Espanhola.
3.1 Cenário histórico da disciplina de Língua Estrangeira no Brasil
Tendo como base o documento elaborado pelo Departamento de Educação
Básica do Paraná em sua publicação “Diretrizes Curriculares da Educação Básica,
Língua Estrangeira Moderna”, o ensino de Língua Estrangeira no Brasil e a estrutura do
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currículo escolar sofreram mudanças ao longo do tempo, considerando-se a organização
social, política e econômica vivida pelo país. Além disso, podemos levar em
consideração também os avanços nos estudos e pesquisas nas áreas de linguagem,
sociais e humanidades. Neste momento há uma exposição sobre a história do ensino de
língua estrangeira no Brasil e a discussão das Política Linguísticas implantadas desde
sua colonização, com foco na observação do Brasil como país que faz fronteira com
muitos países plurilíngües e multiculturais, além dele próprio deter essas características.
No Brasil, exemplo de implantação da primeira Política Linguística oriunda do
Estado, surgiu dos gabinetes portugueses, quando o Marquês de Pombal, ignorando a
imensa população que utilizava a língua dos índios no Brasil, por questões políticas com
os jesuítas, proibiu seu uso implantando a Língua Portuguesa como a única para o Brasil
colonial. Desta lei surge a ideia de Brasil como um país monolíngue. Foi somente em 22
de junho de 1809 quando D. João VI assinou o decreto que instituía o ensino de Inglês e
Francês, línguas consideradas de prestígio, pois representavam um ideal de cultura e
civilização que outras línguas estrangeira não detinham, além de exprimirem todo um
conteúdo de submissão ao território conquistado. Muito diferente das línguas faladas na
fronteira: o espanhol, o guarani e outras línguas indígenas.
Nas instituições públicas que o ensino de línguas modernas começou a ser
valorizado. Em 1837, ocorreu a fundação do Colégio Pedro II, o primeiro em nível
secundário no Brasil e uma referência curricular para outras instituições, o qual se
inspirava nos moldes de ensino francês. Durante quase um século tal colégio inclui em
sua grade curricular sete anos de Francês, cinco anos de Inglês e três de Alemão. Na
época, o Francês era a língua de prestígio e priorizado pela sociedade, pois representava
um ideal de cultura e civilização. Mais tarde o Italiano passou a compor o currículo de
ensino brasileiro.
Nessa época a abordagem pedagógica utilizada era tradicional e prezava pela
gramática-tradução, na qual a língua era entendida como um conjunto de regras, e
privilegiava a escrita. As atividades eram feitas segundo as regras gramaticais, tradução,
versão e ditados; as avaliações eram feitas a partir das regras gramaticais. Obviamente,
somente os filhos homens de famílias nobres e/ou abastadas usufruíam desse ensino.
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Desde o final do século XIX e a partir do início do século XX, devido a vários
fatores que marcaram a história da Europa, a América recebeu muitos imigrantes. No
sul do Brasil, particularmente no Paraná, foram criadas várias colônias de italianos,
alemães, ucranianos, russos, poloneses e japoneses. Tais imigrantes, tentando preservar
sua cultura, se organizaram e construíram escolas para seus filhos, nas quais aprendiam
a língua e a cultura de seus ascendentes. O ensino de Língua Portuguesa, quando
ministrado, era considerado como uma Língua Estrangeira.
Em 1917, numa onda nacionalista, o governo federal decidiu fechar as escolas
estrangeiras ou de imigrantes e criou as escolas primárias com recursos federais sob a
responsabilidade dos Estados. Nessas escolas cultivava-se o respeito aos feriados
nacionais; o ensino da Língua Portuguesa era feito por professores natos; havia uma
proibição de ensinar a Língua Estrangeira às crianças menores de dez anos que ainda
não dominassem corretamente o português. Esse conceito nacionalista estendeu-se
durante todo o governo de Getúlio Vargas, o qual criou o Ministério de Educação e
Saúde e as Secretarias de Educação nos Estados.
Em 1931, a Reforma Francisco de Campos, instituía à escola secundária a
responsabilidade pela formação e pela preparação para o ensino superior dos estudantes.
Tal Reforma centralizava as decisões educacionais no governo Federal. A diferença
nessa Reforma foi a utilização de um método oficial de ensino de Língua Estrangeira: o
método Direto. Nesse método o ensino visada a necessidade de comunicação na língua
alvo, portanto utilizavam-se, agora, as habilidades orais, além das escritas.
No período da Segunda Guerra Mundial o Alemão, o Italiano e o Japonês foram
proibidos nos currículos das escolas de imigrantes e perseguidos pelo governo, pois tais
núcleos estrangeiros representavam riscos à segurança nacional. A partir do Estado
Novo a estrutura de um ensino nacionalista intensificou-se para o fortalecimento da
identidade nacional, nessa conjuntura, o prestígio do ensino de línguas estrangeiras foi
mantido no ginásio. O Francês se apresentava com vantagem sobre o Inglês e o
Espanhol foi introduzido como matéria alternativa ao ensino do Alemão.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) n. 4.024, promulgada em 1961,
criou os Conselhos Estaduais de Educação, cabendo-lhes decidir acerca da inclusão ou
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não da Língua Estrangeira nos currículos. Essa mesma lei determinou a retirada da
obrigatoriedade do ensino de Língua Estrangeira no colegial e instituiu o ensino
profissionalizante. Intensificou, ainda assim, a valorização da Língua Inglesa devido às
demandas de mercado de trabalho, em expansão naquele período.
Já com a Lei n. 5692/71, durante a ditadura militar, o governo desobrigou a
inclusão de línguas estrangeiras nos currículos de primeiro e segundo graus, pois
argumentava que a escola não deveria se prestar a ser a porta de entrada de mecanismos
de impregnação cultural estrangeira. Em 1976, o ensino de língua estrangeira volta a ser
valorizado, retomando seu caráter obrigatório no segundo grau e recomendado no
primeiro grau, para as escolas que tivessem condições de oferecê-lo. De acordo com o
parecer n. 581/76 do Conselho Federal, a Língua Estrangeira seria ensinada por
acréscimo, conforme as condições de cada estabelecimento. Isso fez muitas escolas
suprimirem a Língua Estrangeira no segundo grau ou reduzirem seu ensino para uma
hora semanal, por apenas um ano, com um único idioma. Imperava nesse contexto o
ensino de Inglês, tornando-se hegemônico sob a finalidade estritamente instrumental.
Com a insatisfação de professores com a reforma do ensino de Língua
Estrangeira após o parecer 581/76, e também para tentar superar a hegemonia de um
único idioma estrangeiro nas escolas, foi criado o Centro de Línguas Estrangeiras no
Colégio Estadual do Paraná, em 1982, oferecendo aulas de Inglês, Espanhol, Francês e
Alemão, funcionando no contraturno.
Em meados de 1980, já com a redemocratização do país, professores
organizados em associações, lideraram movimentos pelo retorno da pluralidade de
oferta de Língua Estrangeira nas escolas públicas do Paraná. Tudo isso contribui para
que a Secretaria de Estado da Educação criasse, oficialmente, os Centros de Línguas
Estrangeiras Modernas (CELEM), em 15 de agosto de 1986, sendo preservados até
hoje.
Em 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 9394 determinou
a oferta de pelo menos uma língua estrangeira moderna no Ensino Fundamental, a partir
da quinta série, e a escolha do idioma foi atribuída à comunidade escolar, conforme suas
possibilidades de atendimento (Art. 26, § 5º). Para o Ensino Médio, a lei determinou
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que fosse incluída uma Língua Estrangeira Moderna como disciplina obrigatória,
escolhida pela comunidade escolar, e uma segunda, em caráter optativo, dentro das
disponibilidades da instituição (Art. 36, Inciso III).
Mais tarde, como resultado de um processo que buscava destacar o Brasil no
Mercosul, em 05 de agosto de 2005, foi criada a lei n. 11.161, que tornou obrigatória a
oferta de Língua Espanhola nos estabelecimentos de Ensino Médio, procurando também
atender a interesses político-econômicos, melhorando assim as relações comerciais entre
o Brasil e os países hispanofalantes.
A proposta da SEED, na DCEB (2008, p.53), propõe que a aula de Língua
Estrangeira Moderna seja um momento para que o aluno possa compreender e
reconhecer a diversidade linguística e cultural do outro e não apenas como meio para se
atingir fins comunicativos, que restringem as possibilidades de sua aprendizagem como
experiência mais complexa.
Considerações finais
O sistema globalizado de comercialização e de relações entre os países do
mundo mudou de forma tão veloz que as sociedades não conseguiram acompanhar no
mesmo ritmo e vão se adaptando às mudanças e preparando seus jovens para esse novo
mundo, de maneira mais lenta. Assim foram se determinando as novas diretrizes de
ensino no Brasil, que inclui o ensino do idioma espanhol.
Postular a língua unicamente como um instrumento de comunicação pode ser
um dos fatores que interferem negativamente no processo de ensino-aprendizagem de
uma língua estrangeira. Ela atinge esse valor de instrumento na medida em que é
ensinada apenas com um fim nela mesma, a partir de situações forjadas entre aluno e
professor ou entre os próprios alunos, através do direcionamento do docente, que em
quase nada refletem situações cotidianas de comunicação.
Além disso, a língua estrangeira, na maioria das vezes, é vista como só mais
uma disciplina do currículo. Ora, imaginar que o sujeito deva gostar da língua
estrangeira única e exclusivamente pelos frutos que esse aprendizado pode lhe
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proporcionar futuramente é, no mínimo, reduzir a língua a quase nada. Afirmar que o
desejo de aprender é o verdadeiro motor da aprendizagem é forçar algo que já se espera.
Muito frequentemente, contudo, chega-se a esse contato com a língua, mesmo que em
um contexto inusitado, como o da sala de aula, mas, a dúvida paira: será que a língua se
aprende?
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DISCUTINDO AS TRÊS GRANDES MATRIZES EPISTEMOLÓGICAS
OCIDENTAIS E A FORMAÇÃO DOCENTE
STAUB, Tatiane10
BAR, Maira Vanessa11
STRIEDER, Dulce Maria12
MALACARNE, Vilmar13
Resumo
O presente trabalho, enquanto resultado de atividade de pesquisa de revisão
bibliográfica, busca discorrer brevemente sobre as três grandes matrizes
epistemológicas ocidentais: Positivismo, Fenomenologia e Materialismo Histórico
Dialético. Tais correntes são consideradas como fundamentais para a base de formação
teórica dos professores. O foco da reflexão é referente ao contexto histórico de origem
destas correntes, a relação sujeito objeto estabelecido pelas mesmas, à concepção de
sociedade, a concepção de conhecimento, a concepção de sujeito e as principais
características do método de pesquisa de cada uma destas matrizes. Buscando contribuir
com as pesquisas Iberoamericanas sobre a formação do professor, entende-se que a
teoria das correntes epistemológicas ocidentais é o ponto de partida que possibilita ao
professor a compreensão do seu exercício e contexto de ação das políticas educacionais
e da própria formação.
INTRODUÇÃO
10
Bolsista CAPES pelo programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus Cascavel. Integrante do Grupo de Pesquisa Formação de Professores de Ciências e Matemática. / UNIOESTE / [email protected] 11
Bolsista CAPES pelo programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação da Universidade Estadual do Oeste do Paraná - Campus Cascavel. Integrante do Grupo de Pesquisa Formação de Professores de Ciências e Matemática. / UNIOESTE / [email protected] 12
Doutora em Educação. Docente do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus Cascavel. Integrante do Grupo de Pesquisa Formação de Professores de Ciências e Matemática. / UNIOESTE / [email protected] 12
Doutor em Educação. Docente do Programa de Pós-Graduação Mestrado em Educação pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – Campus Cascavel. Integrante do Grupo de Pesquisa Formação de Professores de Ciências e Matemática. / UNIOESTE / [email protected]
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As matrizes epistemológicas integram o elenco de conteúdos de vital
importância na formação docente. É essencial que os educadores tenham ciência do
significado em particular de cada corrente de pensamento, para melhor fundamentação
teórico/prática e aprofundamento dos saberes sobre a história dos conhecimentos
científicos. As correntes em discussão no presente artigo propiciam diferentes visões da
escola em seu perfil e papel, e também diferentes visões sobre a formação de
professores.
Para haver melhor compreensão sobre o tema, é fundamental discorrer
inicialmente sobre o significado de epistemologia. Segundo Dalarosa (2008, p.344),
“[...] a epistemologia consiste em um estudo sobre a ciência tomada como sinônimo de
conhecimento. É, portanto, uma teoria do conhecimento. Busca-se analisar os
pressupostos, os fundamentos do conhecimento científico”. Tomando, pois, como
significado que a epistemologia é a teoria do conhecimento, no presente texto quer-se
desvelar aspectos das três grandes teorias epistemológicas ocidentais sendo elas: o
Positivismo, a Fenomenologia e o Materialismo Histórico Dialético.
As lacunas de compreensão de tais teorias podem comprometer a coerência do
trabalho do professor, levando a respostas desencontradas para as questões referentes ao
“o que”, “a quem” e “para que” ensina.
As possíveis carências sobre conhecimentos epistemológicos podem estar
relacionadas à formação inicial e/ou continuada do professor. Em se tratando de
professores com a formação na fronteira Latina americana, há uma preocupação em
torno da efetiva inclusão destes conhecimentos no currículo de cursos. Como ressaltam
Rego e Melo (2002, p.4) existe a preocupação com uma formação profissional que
permita desenvolver capacidades, “[...] articular conteúdos curriculares a conhecimentos
educacionais, pedagógicos e didáticos para assegurar uma gestão eficaz do ensino-
aprendizagem [...]”.
Embora os países Latino americanos estejam arraigados em uma história
política, econômica e educacional complexa e distinta, existem pontos em comum em
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discussão para solucionar ou na tentativa de melhorar a situação educacional, sendo um
deles a maior consistência na formação do professor.
Na intenção de contribuir com os estudos referentes à formação do professor,
buscamos nesse artigo, expor brevemente sobre as correntes epistemológicas ocidentais,
como base teórica fundamental de conhecimento de todos os professores, para que os
mesmos possam compreender mais a fundo as políticas educacionais de seu país, as
consequencias dessas políticas e a própria formação e atuação como educador.
O POSITIVISMO
“A idéia do positivismo brotou aqui e ali. Chispas isoladas de luz, perdidas na densa
neblina da noite medieval, alçam-se e se unem até formar um foco que é um completo
sistema de idéias. O espírito positivo de Comte é um produto genuíno do ambiente
científico que despertou sua inteligência.”
Justo Prieto
A corrente positivista inspirada em ideias originadas em escritos de Bacon,
Hobbes e Humes, durante a Idade Moderna, se fortifica em meio a um movimento
crescente de racionalismo científico durante os séculos XVII e XVIII. Mas, as ideias
positivistas afloram efetivamente, de acordo com autores como Triviños (2006), Aranha
e Martins (2009), no século XIX, na Europa. Augusto Comte (1798-1857), filósofo e
matemático francês, um dos maiores reformadores sociais da Europa do século XIX, é
considerado o pai da doutrina positivista. Doutrina essa que exerceu enorme influência
nos destinos de algumas nações latino-americanas, especialmente o Brasil, cuja bandeira
até hoje sustenta um dos seus lemas: “Ordem e Progresso” (RIO GRANDE DO SUL,
s.d.).
Durante o século XVIII o desenvolvimento da ciência e da tecnologia eclode na
Revolução Industrial e capitalista. O movimento positivista se dá, então, apoiado no
desenvolvimento da industrialização. Xavier (2009, p. 02) ressalta que, “(...) o
positivismo, defendia confiavelmente, que o progresso por meio da industrialização
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guiado pela técnica e a ciência – tese do capitalismo – traria benefícios gerais para a
sociedade contemporânea”. Comte propõe-se a investigar então, a inteligência humana
desde os antepassados e, assim dar as diretrizes de como seria pensar a partir do
progresso da ciência.
A Filosofia positiva de Comte desponta no contexto brasileiro no século XIX,
um século marcado pela sombra das influências da Revolução Industrial, da Revolução
Francesa e da Independência dos Estados Unidos. Os ideais de liberdade ecoavam e
atravessavam as fronteiras originárias, somadas a um esforço de implantação da lógica
das ciências exatas e naturais, na busca do conhecimento através do formalismo, da
experimentação, da mensuração e da crítica a qualquer representação metafísica
(PAIXÃO. 2000). Ainda segundo Paixão (2000), no Brasil o período é marcado por
ideais republicanos, pelo liberalismo político, pela luta para a abolição dos escravos,
pelo ecletismo e pela ascensão de uma burguesia urbana, que vai ser decisiva na
transição império/república.
O Positivismo foi uma das primeiras doutrinas filosóficas do século XIX e uma
das mais influentes do seu tempo. O método positivista abriu horizonte para uma cultura
nova de base experimental e tendência crítica que já apontava para o renascimento
cultural, conseguindo reunir em uma só lei, os princípios de ordem e progresso,
pregando que só podia existir progresso, onde houvesse ordem e vice-versa. Para a
filosofia positivista não é possível se estabelecer qualquer espécie de ordem e fazer com
que esta dure, se não for compatível com o progresso. Por outro lado não há progresso,
se este não for consolidado pela ordem. Ou seja, rompendo com os estados teológicos e
metafísicos do pensamento, Comte constrói sua própria ideia de ciência, introduzindo a
concepção de que o conhecimento só pode ser válido se provado pelo método científico
(MOURA, 2004).
No Positivismo o conhecimento científico além de proporcionar mudança na
realidade, proporcionaria (também) o domínio do homem sobre a natureza e,
consequentemente, um progresso, porém, sendo submisso à ordem, a racionalidade, a
organicidade. Surge assim o lema Ordem e Progresso.
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Enquanto pressuposições de Comte, o espírito humano teria passado por três
estados históricos: estado teológico, metafísico e científico (positivo). O primeiro, com
o início da inteligência humana, os costumes, e a própria origem dos seres, já o
segundo, seria uma mudança na estrutura geral cognitiva do primeiro estado e o terceiro
culminaria no pensamento maduro, a ideia formada. Isso pressupõe, na concepção
comtiana, que “Baseado na Lei dos três Estados, o ser humano é capaz de prever os
fenômenos naturais, podendo assim modificar a realidade diante disso” (XAVIER,
2009, p. 3).
O objetivo do método positivo de investigação é a pesquisa das leis gerais que
regem os fenômenos naturais. O principio da filosofia positivista seria eliminar todos os
problemas que comportavam soluções transcendentes ou que procuravam se utilizar de
métodos que a ciência contemplava (COTRIM, 2010). A compreensão do mundo com
base no cientificismo positivista, que buscava a construção de verdades absolutas e
incontestáveis, tornou-se em pouco tempo, a tônica espalhando-se para diversos campos
do saber.
O Positivismo reduz o papel do homem, enquanto ser pensante e crítico, para um
mero coletor de informações e fatos presentes nos documentos. O papel do sujeito neste
é de “coletor de dados” e deve ajeitá-los, constatando pela análise minuciosa e liberta de
julgamentos pessoais, sua validade ou não (MOURA, 2004).
De acordo com Triviños (2006) no transcorrer de seu curso, o positivismo
passou por algumas alterações metodológicas, sendo aqui elencados o positivismo
clássico e o neopositivismo.
No positivismo clássico o ser humano busca pela explicação dos fenômenos por
meio das observações dos fatos. Para ligar os fatos se utilizaria de uma teoria,
recusando-se a procurar a origem e o destino dos mesmos.
Um dos pontos referenciados por Triviños (2006) para o neopositivismo seria
conhecer a realidade formada por partes isoladas dos fatos sociais, não aceitando outra
realidade a não ser a de fatos, que possam ser observados. Pensava-se em descobrir a
relação entre as coisas, não se interessando em conhecer as consequencias dos achados
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– a concepção da neutralidade da ciência tinha como ideia “exprimir a realidade e não
julgá-la” (TRIVIÑOS, 2006, p.37).
Uma das ideias defendidas pelo Positivismo é a de que os fenômenos naturais e
sociais são conduzidos por leis não variáveis. Sendo assim, o pesquisador precisa buscar
procedimentos adequados, almejando atingir o objeto pretendido. A relação entre o
sujeito e o objeto seria de buscar o progresso. Assim, foi possível medir as relações
entres os fenômenos, bem como testar as hipóteses e formar generalizações
(TRIVIÑOS, 2006).
Segundo Dionne e Laville (1999, p.23) o método científico do Positivismo
“Baseia-se igualmente na observação, experimentação e mensuração, fundamentos do
método científico em sua forma experimental.” Os autores salientam que as principais
características do Positivismo seriam: o Empirismo, a Objetividade, a Experimentação,
a Validade, as Leis e a previsão.
Dionne e Laville (1999), ressaltam ainda que o Positivismo seja determinista, ou
seja, o homem é regido por leis, logo, estas o determinam. Os autores acrescentam: “o
conhecimento dessas leis permitiria prever os comportamentos sociais e geri-los
cientificamente” (1999, p. 28). Sendo assim, a questão central do Positivismo seria
descobrir quais leis que regem os fenômenos e, somente, era considerado verdadeiro o
conhecimento possível de comprovação científica por meio da experimentação.
De forma coerente com os outros autores acima referenciados, Dias (2000)
apresenta resumidamente as principais características dessa matriz: busca fatos ou
causas de um fenômeno, dando pouca importância aos aspectos subjetivos dos
indivíduos; assume que existe no mundo uma verdade objetiva que pode ser revelada
por método científico cujo enfoque é a mensuração sistemática e estatística de
relacionamentos entre variáveis; assume que a realidade é objetiva, transcendendo a
perspectiva individual, e é expressa por regularidades estatísticas observáveis; tenta
testar uma teoria, aumentando a compreensão preditiva de um fenômeno; tem como
característica a formulação de hipóteses que serão testadas por meio de experimentos ou
análises estatísticas; evidencia proposições formais, medidas quantificáveis de variáveis,
teste de hipóteses e inferências sobre um fenômeno a partir de uma amostra da
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população estudada; uma pesquisa puramente positivista segue o paradigma hipotético-
dedutivo; a realidade é uma propriedade do mundo empírico e não do observador;
separação dos fatos de seus significados; teste formal de hipóteses em vários casos;
manutenção da distância objetiva durante a pesquisa; uso de linguagens descritivas não
valorativas, normalmente envolvendo quantificação; geração de assertivas semelhantes
a leis.
Em suma, o Positivismo doutrina a extrema valorização do método científico,
das ciências positivas, baseada nos fatos e na experiência, e na recusa das discussões
metafísicas (culto a ciência e sacralização do método científico). Caracteriza-se por um
tom geral de confiança nos benefícios da industrialização, bem como por um otimismo
em relação ao progresso capitalista, guiado pela técnica e pela ciência. Uma doutrina
muito influente no plano prático até nossos dias (COTRIM, 2010).
Por fim, ressaltamos que a escola sofreu grandes influências dessa matriz,
verificadas, por exemplo, pela valorização da experimentação e pela tentativa de
reprodução do método científico principalmente nas aulas de ciências.
Fenomenologia
“La ciencia genuina, hasta donde alcanza su verdadera doctrina, carece de
profundidad. La profundidad es cosa de la sabiduría.’
Edmund Husserl
A fenomenologia se consolidou no século XX e sua história remete aos
trabalhos de Edmund Husserl (1859-1938) e seu sucessor Martin Heidegger, os quais
giravam em torno da matemática e da psicologia. Nesta ocasião os estudos realizados
sofriam grande influência também de Franz Brentano e Karl Stumpf (DINIZ, LOPES,
2008).
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Com o advento da Fenomenologia provocam-se na época significativas
mudanças no cenário filosófico da Europa e, desde então, em todo o mundo. Segundo
Silva, Diniz, Lopes (2008, p. 255):
O termo fenomenologia significa estudo dos fenômenos, daquilo que
aparece à consciência, daquilo que é dado, buscando explorá-lo. A própria
coisa que se percebe, em que se pensa, de que se fala, tanto sobre o laço que
une o fenômeno com o ser de que é fenômeno, como sobre o laço que o une
com o Eu para quem é fenômeno.
A Fenomenologia, segundo Aranha e Martins (2009), se contrapõem as ideias do
empirismo defendidas pelo Positivismo do século XIX. Estas autoras salientam que,
“Husserl entende por fenomenologia o processo pelo qual examina o fluxo da
consciência, ao mesmo tempo em que é capaz de representar um objeto fora de si” (p.
198).
A principal ideia da corrente Fenomenológica é a de intencionalidade, isto é, da
consciência direcionada a um objeto, não existindo assim, objeto sem sujeito. A
intencionalidade seria característica também das vivências, ou seja, a vivência seria
consciência de alguma coisa. Pode-se dizer que essa corrente epistemológica é o estudo
das essências e que somente é possível compreender o homem e o mundo a partir
daquilo que ele fez, a partir da sua ação (TRIVIÑOS, 2006).
O fenômeno é considerado o objeto da investigação fenomenológica e a intuição
o seu instrumento para buscar o conhecimento. A intuição equivale à visão intelectual
do objeto de conhecimento, do dado analisado, que é o fenômeno, ou seja, aquilo que se
apresenta ao sujeito que o questiona. A intuição só é possível devido à intencionalidade
da consciência. Toda consciência é consciência de algo é a máxima da Fenomenologia,
segundo Husserl. A Fenomenologia opõe-se aos postulados empiristas e parte do
pressuposto de que não há objeto em si, mas o objeto existe para um indivíduo,
indivíduo esse que atribui diferentes significados ao objeto. Ao contrário das ideias
racionalistas, a Fenomenologia considera que não há consciência pura, totalmente
isolada do mundo, mas toda consciência é consciência de alguma coisa existente no
mundo (OLIVEIRA; CUNHA, 2010).
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O método fenomenológico de Husserl, consistiria em fazer reduções das partes
questionáveis ou sujeitas a deduções e contradições (GUIMARÃES, s.d),. Segundo
Guimarães (s.d), desenvolve-se gradualmente, submetendo-se a várias “epochés” (a
"contemplação desinteressada" de quaisquer interesses naturais na existência). Para
Guimarães (s. d.) haveriam três reduções fenomenológicas (ou epochés): 1) redução do
objeto à consciência - de um lado a realidade transcendente, que corresponde às coisas
enquanto existentes fora, ou para além da consciência e, de outro lado a realidade
transcendental, que se aplica às coisas enquanto reduzidas à consciência. Ambos os
mundos são reais, porque nenhum deles é ilusório, porém, o primeiro é real num sentido
natural e meramente prático. O segundo é real num sentido primordial; 2) redução
psicológica do objeto - “suspendemos” o juízo relativo à existência de tudo o que é
exterior ao sujeito. Considera-se apenas o próprio sujeito cognoscente com seus atos
conscientes; 3) redução transcendental do objeto -através da redução transcendental,
para atingir a consciência transcendental, chamada de consciência pura.
Uma das abordagens feita por Husserl é a questão do conhecimento. Este se
apresenta “como uma realidade à margem do sujeito e não como um conhecimento
próprio do sujeito” (TRIVIÑOS, 2006, p. 46), ao passo que o pesquisador coloca em
suspenso às hipóteses do mundo natural, realizado por uma consciência intencional
diante do objeto. Uma segunda abordagem feita pelo filósofo, foi da redução
Fenomenológica que tem por origem a intuição das vivências do sujeito, encontrando
assim as essências universais (idem).
A maior parte das correntes filosóficas procura construir verdades que sirvam ou
são válidas a todos, sendo conhecido como caráter objetivo. Contudo, existem ideias
subjetivas, as quais consideram o conhecimento válido somente ao sujeito em
específico. Portanto, Husserl tentou mudar as ideias subjetivas em ideias cabíveis a
todos. A isso foi atribuído o termo Intersubjetividade. Afinal, a Fenomenologia estuda o
que é válido para todos de forma que seja reduzida à realidade absoluta do sujeito sem
se preocupar ou se interessar com a historicidade dos fenômenos. Contundo, busca
entender os fenômenos, como funciona a realidade, para traçá-la e exibi-la como é em
sua experiência pura, sem querer aplicar transformações nela (TRIVIÑOS, 2006).
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O currículo do sujeito estudante, como consequência da fenomenologia, para o
contexto educacional foi construído “baseada na interpretação dos fenômenos, na
intencionalidade da consciência e na experiência do sujeito, falou do currículo
construído, do currículo vivido pelo estudante” (TRIVIÑOS, 2006, p. 47). O mesmo,
em uma pesquisa fenomenológica, irá fazer interrogações, podendo até mesmo
abandonar seus pré-conceitos e interpretar o objeto pretendido.
Resumidamente, Guimarães (s.d.) elenca como principais características da
Fenomenologia husserliana: a) o “a priori” (epoché) - temos de proceder com plena
ausência de pressupostos e com inteira liberdade, “reduzindo” (epoché) todas as
influências de opiniões científicas ou filosóficas, para podermos nos orientar
exclusivamente pelas coisas em si, aprioristicamente; b) a evidência - os fatos devem
excluir as dúvidas de modo absoluto e imediato, tal como um reflexo, uma auto-
reflexão, plenamente esclarecedora do sentido da coisa; c) a intencionalidade - a
intencionalidade parte do eu e invade temporariamente os dados materiais, unificando-
os em ordem à constituição e designação do objeto enquanto consciente e significado;
d) a lógica da contradição - é o ato que depende das leis do conteúdo, para estar em
conformidade com a matemática; e) a intersubjetividade - quando a objetividade se
fundamenta pela relação a um objeto exterior, basta provar esta imposição como
necessária, para garantir sua validade. Mas se o objeto é considerado como meramente
significado, o único modo absolutamente válido de garantir o seu caráter de existência é
esclarecer que o conhecimento dele não é meramente subjetivo, mas intersubjetivo.
Segundo essa breve definição, a Fenomenologia é um método, o que significa
dizer que ela é o “caminho” da crítica do conhecimento universal das essências. Assim,
para Husserl, a Fenomenologia é o "caminho” (método) que tem por “meta” a
constituição da ciência da essência do conhecimento ou doutrina universal das
essências. A Matriz Fenomenológica também possui por sobre a educação importante
papel de influência, visto que, como apresentado, prima pela essência do conhecimento.
Materialismo Histórico Dialético
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“Os homens fazem a sua própria história, mas não o fazem como querem... a tradição
de todas as gerações mortas oprime como um pesadelo o cérebro dos vivos.”
Karl Marx
Na compreensão do Materialismo Histórico Dialético torna-se relevante
observar o contexto histórico de origem do próprio marxismo. Em meados do século
XIX, com as transformações que ocorreram no mundo ocidental, principalmente na
esfera da produção industrial, houve um crescimento expressivo no número de
trabalhadores industriais urbanos. Em decorrência da aglomeração destes em centros
urbanos, o descaso com questões de saúde e educação, e a inexistência do saneamento
básico, precursou a precariedade da vida dos operários nas cidades. As condições de
trabalho no interior das fábricas, que empregavam e super exploravam homens,
mulheres e crianças, eram péssimas, a alimentação era deficiente, os ambientes externos
eram insalubres, as moradias eram precárias. Essa situação gerou a organização dos
trabalhadores em associações, sindicatos e movimentos que visavam à transformação
das condições de vida. Houve então o desenvolvimento de um pensamento explicativo
das condições sociais, políticas e econômicas para definir as possibilidades de
intervenção nessa realidade. Muitos pensadores procuraram desde o inicio do século
XIX discutir a sociedade que estava emergindo e destacar as questões sociais de uma
perspectiva socialista. Assim, a tradição socialista, nascida da luta dos trabalhadores
muitos anos antes, tem como expressão intelectual o pensamento de Karl Marx (1818-
1883) (TOMAZI, 2010).
O Materialismo Histórico Dialético, desta forma, teve sua origem datada da
metade do século XIX, na Europa, assim como o positivismo, em meio ao processo de
industrialização e consolidação do capitalismo, um momento de estruturação de uma
sociedade de diferentes classes e espaços de relações sociais. Karl Marx, na sua luta de
classes, se junta a Friedrich Engels (1820 – 1895) desenvolvendo teorias, que mais tarde
ficaram conhecidas como pensamento marxista, no intuito de lutar pela igualdade
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social. Os mesmos tinham como referência as ideias de Hegel, o positivismo de Comte
e a Economia Clássica de Smith e Ricardo (XAVIER, 2009).
O alemão Karl Marx, filósofo, economista, jornalista e militante político, foi um
dos pensadores que mais influência exerceu sobre a filosofia contemporânea. Amigo
inseparável de Engels, ambos promoveram as idéias do marxismo. Marx procurou
compreender a história real dos seres humanos em sociedade a partir das condições
materiais nas quais eles vivem (COTRIM, 2010). Na busca de um caminho
epistemológico, ou de um caminho que fundamentasse o conhecimento para a
interpretação da realidade histórica e social que o desafiava, superou as posições de
Hegel no que dizia respeito à dialética e conferiu-lhe um caráter materialista e histórico
(PIRES, 1997).
Para Marx, a teoria de Hegel não conseguia explicar a vida social, invertendo
assim as bases do Materialismo Histórico. Para Marx, no lugar das ideias, encontravam-
se os fatos materiais e no lugar dos chamados heróis, apresentava-se a luta pelas classes
(ARANHA; MARTINS, 2009).
Segundo Cotrim (2010), para Marx os seres humanos não podem ser pensados
de forma abstrata, nem de forma isolada. Marx defende que não existe o indivíduo
formado fora das relações sociais. Isso significa que as formas como os indivíduos se
comportam, agem, sentem e pensam, vinculam-se a forma como se dão as relações
sociais. Essas relações sociais, por seu lado, são determinadas pela forma de produção
da vida material, ou seja, pela maneira como os seres humanos trabalham e produzem os
meios necessários para a sustentação material das sociedades.
Marx reconhece o trabalho como atividade fundamental do ser humano. O
filósofo expõem a lógica do modo de produção capitalista, em que a força de trabalho é
transformada em uma mercadoria com dupla fase: de um lado, é uma mercadoria como
outra qualquer, paga pelo salário; de outro, é a única mercadoria que produz valor, ou
seja, que produz o capital. Marx também entende o desenvolvimento histórico-social
como decorrente das transformações ocorridas no modo de produção (COTRIM, 2010).
Para Marx era essencial que o sujeito (que se constitui historicamente),
compreendesse a realidade a fim de transformar a mesma e essa transformação estava
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ligada, principalmente, a classe proletária (SANTANA, 2008). O objeto de Marx era o
Modo de Produção (XAVIER, 2009), e para o sujeito, seria necessário que o mesmo
utilizasse, se apropriasse da consciência racional (pensamento) em busca da essência
desse objeto. “Compreender a relação sujeito-objeto é compreender como o ser humano
se relaciona com as coisas, com a natureza, com a vida” (PIRES, 1997, p. 84).
A concepção da realidade e da vida em sua totalidade está relacionada ao
método do Materialismo Histórico Dialético. Para Marx era importante descobrir a lei
do fenômeno e, principalmente, a lei de sua transformação, examinando assim as
consequências, manifestadas na vida da sociedade (FRIGOTTO, 2006).
Para o sujeito poder entender os fenômenos concretos é necessária a tomada de
consciência da totalidade (a sociedade, população, Estado, ou seja, o todo), e da
dialética que movimenta as relações sociais. Essa análise crítica da realidade enquanto
ponto de partida do conhecimento é a atividade prática social do sujeito (FRIGOTTO,
2006).
Não mais se estabelece uma relação dialética entre sujeito e objeto; quem
conhece, conhece para si e para a academia e não para a classe. O conhecimento reflui
para o plano da especulação e da ‘objetividade’ científica (BARBOSA, s.d.).
Assim, o método consiste em passar do abstrato para o concreto gerando um
concreto pensado:
[...] movimentar o pensamento significa refletir sobre a realidade partindo do
empírico (a realidade dada, o real aparente, o objeto assim como ele se
apresenta à primeira vista) e, por meio de abstrações (elaborações do
pensamento, reflexões, teoria), chegar ao concreto: compreensão mais
elaborada do que há de essencial no objeto, objeto síntese de múltiplas
determinações, concreto pensado. Assim, a diferença entre o empírico (real
aparente) e o concreto (real pensado) são as abstrações (reflexões) do
pensamento que tornam mais completa a realidade observada (PIRES, 1997, p.
87).
Assim, para o Materialismo Histórico Dialético as ideias são:
[...] “o reflexo”, no plano da organização nervosa superior, das realidades e
das leis dos processos que se passam no mundo exterior, os quais não
dependem do pensamento, tem suas leis específicas, as únicas reais, de
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modo que só compete à reflexão racional apoderar-se das determinações
existentes entre as próprias coisas e dar-lhes a expressão abstrata,
universalizada, que corresponde ao que se chamará então de “idéias” e
“preposições” (FRIGOTTO, 1987, p. 75).
No Materialismo Histórico Dialético o sujeito realiza a investigação do todo
com o conhecimento dialético crítico, faz articulações no pensamento, buscando
descobrir a essência do objeto e parte, então, para a transformação social.
Silva Junior (s.d., p. 2-3) resume os princípios do Materialismo Histórico
Dialético:
a) As diversas partes do real organizam-se em um processo de
interdependência ativa, relacionam-se e condicionam-se reciprocamente. O
todo predomina universalmente sobre as partes e constitui a fonte de seus
significados. A totalidade é, pois, a primeira grande categoria da dialética
marxista; b) Tudo o que existe, existe em movimento, ou seja, refere-se a
um devir. O mundo não pode ser considerado como um complexo de coisas
acabadas, mas como um complexo de processos e de relações; c) O
movimento e o devir não implicam apenas continuidade, mas também
ruptura. O incremento da quantidade de um processo pode determinar a
emergência de um novo processo [...]; d) Por apresentarem sempre um lado
positivo e um negativo, um passado e um futuro, elementos que se
desenvolvem ou que desaparecem, etc., os objetos e fenômenos da natureza
implicam contradições internas. A dialética é o estudo das contradições na
própria essência das coisas. Trata-se da unidade e luta dos contrários, que
provoca e assegura o movimento e relativiza a própria verdade. A verdade
de hoje pode não ser a de amanhã [...]; e) Do caráter provisório da verdade
resulta que se não há uma verdade imutável e definitiva, também não há
uma antinomia que possa ser considerada irredutível. Na visão da dialética
marxista o espírito procede por afirmação, negação e síntese da afirmação e
da negação, ou seja, pela negação da negação. A síntese, como a verdade, é
sempre provisória, pois é uma afirmação que suscita a negação que a
contradiz, num processo que se desenvolve indefinidamente. Teorias
científicas e doutrinas filosóficas nada mais são que momentos da história
do pensamento na interminável tentativa de explicar o mundo (SILVA
JUNIOR, s.d., p. 2-3).
Assim, presidida pela visão de processo, o Materialismo Histórico Dialético
supera a separação sujeito-objeto, situando os dois elementos fundamentais da relação
cognitiva nas condições materiais históricas mediadoras dessa relação. Assim, o sujeito
estabelece uma relação dinâmica com um objeto construído com base em um
instrumental teórico-metodológico que permeia a relação, ao mesmo tempo em que a
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construção do objeto afeta também e enriquece o sujeito da relação. Essa “totalidade
concreta” define a ciência como um produto social histórico (SILVA JUNIOR, s.d.).
Em suma, no ensino formal, percebemos o método Materialista Histórico
Dialético quando voltamos os olhares a determinados currículos da educação. Tal
método é utilizado como fundamento teórico e filosófico para estruturação de muitos
currículos, estabelecendo-se assim a relação do homem com a sociedade. O
embasamento materialista também é utilizado para nortear a construção da educação,
visando o ensino para todos de forma gratuita, formando cidadãos críticos e atuantes na
sociedade.
Considerações
Da exposição feita no presente trabalho delinearam-se nuances destas que são as
três principais matrizes epistemológicas ocidentais e que incontestavelmente possuem
sua representatividade na construção do conhecimento humano.
O Positivismo como concepção de ciência analisa os fenômenos partindo das
leis da natureza. Advoga a necessidade de neutralidade, na busca da verdade a partir da
metodologia científica. Portanto, a verdade está na natureza e cabe ao homem conhecer
suas leis para poder sobre ela intervir. O mesmo para o estudo da sociedade. O
conhecimento é a expressão racional e neutra daquilo que o objeto representa.
A Fenomenologia tem como método a interpretação que o sujeito confere a
realidade. O conhecimento da realidade se dá pelo significado que o sujeito atribui ao
objeto, ou seja, na relação sujeito-objeto há a determinação do sujeito. A
Fenomenologia corresponde à vertente idealista de crítica ao Positivismo.
O Materialismo Histórico Dialético tem por princípio que conhecer a realidade
só é possível se partirmos da matéria analisada, o método parte do principio da
contradição, a realidade não se apresenta estática ou acabada. Tampouco os fenômenos
possuem em si mesmos a clareza da verdade. As categorias centrais de análise são a
contradição e a totalidade. O conhecimento se dá pela análise teórica do real elaborada
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ao nível do conceito o qual explicita as múltiplas determinações do real, é o concreto
pensado.
Tais vertentes trouxeram diferentes modelos curriculares, e ações para a escola.
A compreensão do que está subjacente ou fundamentada a tais modelos é essencial para
a ação docente na medida em que viabiliza a análise crítica e a postura do professor.
Finalizamos corroborando com Delarosa (2008) que a epistemologia, a educação
e a prática docente são produções humanas e históricas, não portadoras de neutralidade
e comprometidas politicamente, é importante que tenhamos consciência disso. Mais
importante ainda, que cada docente possua uma base teórica e epistemológica que possa
satisfazer suas questões.
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