I I J A ( I ' I . in . i ) 99 min. P&B
l i l l o n i . i : inj'Jcs
D l r e ç S o : Fritz Lang
P r o d u c S o : Fritz Lang, Walter Wanger
R o t e i r o : Rufus King, Silvia Richards
i " i 'T , i - i l i . i : Manley Cortez
Mutlci: Miklós Rózsa
l lrnco: loan Bennett , Michael
Krilf'i.ivc. Anne Revere, Barbara
O'Neil l, N.it.ilic Schafer, Anabel Shaw,
I' ill Rey, (ames Seay, Mark Dennis,
I ' .Mil I . I V . I I I . l j ' . l l
0 SEGREDO ATRAS DA PORTA mm (SECRET BEYOND THE DOOR) Os fãs de Fritz Lang geralmente se div idem entre os que preferem seus clássico',
consagrados e pretensiosos como M, o vampiro de DusscJdorf (1931), Metrópolis (1926) I
Os corruptos (1953) e os que preferem os f i lmes mais estranhos, crípticos e perversos dl
sua obra, que pendem para áreas menos bem-vistas da cultura popular, como O diabo
feito mulher (1952) e O tesouro do Barba Rubra (1955). Para alguns, O segredo atrás da
porta consegue se safar como um f i lme noir respeitável, porém é sua divertida mistura
de vários gêneros - melodrama feminino, estudo de caso freudiano, mistério de serial
killer e alegoria do processo artíst ico/criat ivo - que o torna uma peculiaridade tão
especial e impressionante na carreira do diretor.
O f i lme faz parte do período do "Gót ico Femin ino" de Hol lywood, explorando o
relacionamento fecundo de uma mulher (aqui, Joan Bennct t ) com um homem (Michacl
Redgrave) que é ao mesmo tempo enigmát ico, sedutor e (à medida que a trama se de
senrola) perigoso. Como em Rebecco, a mulher inesquecível (1940), de Hitchcock, que
serviu de inspiração para Lang, a heroína adentra o lar de estranhos, repleto de traumas
passados e ocultos e relacionamentos doent ios e secretos.
Lang se concentra nas ambigüidades c laramente sadomasoquis tas desta trama
(Qual a verdadeira natureza da fera mascul ina, sensibi l idade ou agressividade? O que a
mulher quer dele na verdade, amor ou morte?) dentro de um contexto surpreendente
mente original: Redgrave é um atormentado gênio da arquitetura que
construiu uma casa de "cômodos precisos", cada qual a reconstrução da
cena de um assassinato atroz e aber tamente psicossexual.
O segredo atrás da porta faz parte de um grupo especial de f i lmes da
década de 40 que incluem A mulher desejada {1947), de Jean Renoir, e a pro
dução de Val Lcwton A sétima vítima (1943), cuja aura poderosa e onírica é
prat icamente garantida pela sua precariedade de f i lme B e pela trama de
associação livre - assim como por uma narração que, aqui , muda de forma
desorientadora de Bennet t para Redgrave, sucess ivamente. Por mais
heresia que seja para um defensor de carteir inha do cinema de autor
admitir, os cortes impostos pela Universal na montagem original de Lang
provavelmente acentuaram essa qual idade onírica. O resultado final pode
carecer de associações ou explicações racionais, porém O segredo atrás da
porta é uma das preciosas ocasiões em que Lang - auxiliado de forma
imensurável pela fotografia barroca de Stanley Cortez e pela trilha exube
rante de Mik lós Rózsa - conseguiu acrescentar uma dimensão r icamente
poética ao seu fatal ismo habitual . AM
A FORÇA DO MAL (1948)
(FORCE OF EVIL) Como O mensageiro do diabo, A força do mal é um acontecimento único na história do
cinema amer icano. Seu diretor, Abraham Polonsky, realizou mais dois f i lmes mui to de
pois deste, roteirizando ainda outros, mas este é o único em que toda a extensão do
seu bri lhantismo promissor f icou clara, antes de ele ter sido extinto pela lista negra do
inacarthlsmo.
A força do mal se coloca de forma desconfortável dentro do gênero noir, apesar da
presença de um astro (John Carficld) associado a f i lmes de detet ive. Ele é, acima de tu
do, poético, conduzido por uma narração em "versos brancos" e por diálogos harmo
niosos a l tamente esti l izados, que estão entre as mais surpreendentes e radicais
inovações do c inema da década de 40, antecipando Terra de ninguém (1973), de Malick.
Esta é uma história de amoral idade, culpa e redenção, dramatizada através do
recurso quase bíblico da traição entre irmãos. Polonsky quebra o fatal ismo sombrio do
f i lme (sua imagem final que desce até um cadáver em meio ao lixo é aterrorizante) com
uma história de amor comovente c muito moderna entre Carf ield e Beatr ice Pearson.
O f i lme c estil izado até os mín imos detalhes com sua ambição poética: libertar
som, Imagem e atuação e fazer os três interagirem em uma polifonia inebriante. AM
E U A (Enterprise, M C M ) 78 min. P&H
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Abraham Polonsky
P r o d u ç ã o : Bob Roberts
R o t e i r o : Abraham Polonsky, Ira
Wolfert, baseado no livro Tucker's
People, de Ira Wolfert
F o t o g r a f i a : George Barnes
M ú s i c a : David Raskin
E l e n c o : John Carfield, Thomas
Comez, Marie Windsor, Howland
Chamberlain, Roy Roberts, Paul I ix.
Stanley Prager, Barry Kelley, Paul
McVey, Beatrice Pearson, Fred o.
Sommers
PRIMAVERA NUMA PEQUENA CIDADE (1948)
(XIAO CHENG ZHI CHUN) Se uma das marcas de um grande f i lme é a capacidade de apresentar personagens de
forma econômica, Primavera numa pequena cidade, de Fei M u , projeta sua grandeza
ins tantaneamente. De maneira hábil e tocante, ele nos revela cinco figuras: "A Esposa"
(Wei Wc i ) , solitária e cansada das tarefas domést icas; "O Mar ido" (Shi Wu) , um homem
melancól ico e doent io; "A Irmã" (Zhang Hongmei) , jovial e cheia de vida; Lao Huang, "O
Cr iado" (Cui Chaoming) , sempre vigi lante; c "O Vis i tante" (Li Wei ) , chegando à cidade
do título (vindo do passado) para se tornar o catal isador da mudança.
O f i lme constrói de maneira concisa seu drama do pós-guerra: os desejos, esperan
ças, sonhos e mágoas que circulam entre esses personagens capturados em um arranjo
de corpos emoldurados, uma coreografia de olhares furt ivos e gestos súbitos de resis
tência e resignação. Contudo, há também um elemento modernista: a narração da es
posa, que reitera de forma poética o que está meramente visível, oculta acontec imen
tos que ela não presenciou e põe realidades tristes em palavras brutais.
Apenas recentemente esta obra-prima do cinema chinês recebeu o reconhecimento
mundia l que merece, inf luenciando Amor ò flor da pele (2001), de W o n g Kar -Wai , e ge
rando uma ref I lmagem respeitosa em 2002. Primavera numa pequena cidade está entre
os melhores, mais ricos e comoventes melodramas do c inema. AM
C h i n a 85 min. P8cB
I d i o m a : mandarim
D i r e ç ã o : Fei Mu
R o t e i r o : LI Tianjl
F o t o g r a f i a : LI Shengwei
M ú s i c a : Huang Yijun
E l e n c o : Cul Chaoming, Li We i , Shi
W u , Wei We i , Zhang Hongmei
M l
I U A ( i Maries K. Feldman, Monterey)
133 min. P & B
l . lmr i i . i i n i ' l c ,
Director Howard Hawks, Arthur
KIP . ' . n i l
i i ( '( l i iç.1o: Charles K. Feldman,
1 1 1 1 1 1 1 Hawks
i' Iro: Borden Chase, Charles
S< l i n e r
l o i o | ' i . i i i a : Russell Harlan
M M - . K . 1 . 1 mini 1 i Tiomkin
rlcnco: John Wayne, Montgomery
1 III 1, |oanne Dru, Walter Brennan, 1 Oleen Cray, Harry Carey, John
in 1 uni Nu,1I1 Beery Jr., Harry Carey
l i . 1 h i d Yowlachie, Paul Fix, Hank
Worden, Mickey Kuhn, Ray Hyke,
w.illv Wales
IndU .ii, .10 ,10 Oscar: Borden Chase
( i iHrl io), Christian Nyby (edição)
RIO VERMELHO <i948)
(RED RIVER) Uma ref i lmagem em forma de faroeste de O grande motim (1935), este é um filme
consideravelmente mais profundo do que o original, apresentando a relação entre Bligli
e Christian cm termos de um conflito pai/f i lho. O astro John Wayne - um dos mais
bonitos protagonistas mascul inos da década de 30, interpretando um personagem mais
velho do que ele próprio com uma aspereza autêntica e circunspecta - é contrastado de
forma interessante por Hawks com o fotogênico Montgomcry Cllft, a síntese do tipo
de neurose sensível e masculina que entraria em moda na década seguinte.
Depois de um longo prólogo que se passa durante as conseqüências de um ataque de
índios em 1851, no qual vemos o empobrecido Tom Dunson (Wayne) e o órfão Matthew
Carth (Clift) juntarem seus rebanhos para formar um império do gado, somos apresentados
à Red River D - como o personagem de Wayne chama sua propriedade - na depressão eco
nômica pós-Guerra Civil. Conduzindo um rebanho até o Missouri, o inflexível Dunson se
torna cada vez mais tirânico, levando Matt a se rebelar e conduzir a boiada para o Oeste atra
vés de uma rota mais segura até Abilenc. Dunson admira a coragem do rapaz, mas, ainda
assim, jura ira seu encalço para matá-lo, o que leva a um clímax que é dos mais emotivos do
gênero, no qual dois homens que se amam duelam em meio ao gado nas ruas de Abilene.
Hawks, o grande cronista das sagas masculinas do cinema, encena aqui a ópera de
caubóis definitiva, ofuscando todos os outros faroestes de condução de gado com seqüên
cias belas, líricas e empolgantes de estouro de boiada, clima árido, vaquejadas e conflitos
com os índios. Os protagonistas estão no auge, com Wayne surpreendentemente rivali
zando Clift em termos de sutileza. Temos ainda coadjuvantes excelentes, como Walter
Brennan como o tolo desdentado; John Ireland como um pistoleiro magricela; c joanne Dru
como a garota pioneira q u e é c a p a z d e levar uma f lechada no ombro quase sem cambalear.
Embora seja conhecido por seus faroestes, Hawks fez, surpreendentemente, poucos
filmes do gênero. Este parece ser um tributo carinhoso a John Ford, realizado com uma
certa atitude de também-posso-fazer-isso, uma vez que Hawks escalou vários membros
da trupe do colega; Harry Carey e Harry Carey Jr., Hank Worden c até o próprio Wayne. O
diretor usa uma abordagem fordiana dos esplendores perigosos da paisagem do Oeste,
assim como uma trilha à Ford de Dimitri Tiomkin, baseada em canções folclóricas. KN
FESTIM DIABÓLICO mm (ROPE) I inliora deva sua fama a um estilo mirabolante e carregado de emoções fortes, Alfred
l InÍ hcock sempre foi um dos cineastas mais experimentais do cinema comercial. Tendo
i n i n o base sólida uma peça de Patrick Hamil ton (famoso por À meia-luz) baseada no
Caso Leopold e Loeb e dramatizada de forma mais convencional no f i lme Estranha
npuísão, de 1959, festim diabólico chama atenção para seu cenário único util izando
h 11 nadas de um rolo de duração que são juntadas de maneira quase invisível para que ele
pareça não ter cortes. Em se considerando que, em 1948, muitos dos espectadores mal
'.ablam que f i lmes consist iam cm trechos breves montados para efeito dramático - até
hoje, a maioria dos f i lmes sobre cinema parece sugerir que as cenas são f i lmadas como
se estivessem acontecendo ao vivo, como em um palco - , pode-se supor que Hitchcock
estivesse mais interessado em se dirigir a colegas de profissão, demonstrando uma
maneira alternativa de se contar uma história em f i lme de forma semelhante ao que o
posterior movimento Dogm.195 e A bruxa de Blair (1999) tentaram fazer.
Além dos desafios técnicos de fazer a câmera seguir os personagens por um aparta
mento grande cm Nova York, contando uma história em " tempo real", Festim diabólico c
bastante interessante por si próprio, mostrando dois solteiros que moram juntos (John
Dall e Farley Cranger) que tentam se safar de um assassinato casual para provar uma teo
ria obscura. Ao mesmo tempo um drama psicológico intenso c uma comédia de humor
negro ao estilo de Este mundo 6 um hospício (1944), o f i lme apresenta um conflito de gato
e rato à medida que os assassinos convidam o professoral J immy Stewart para Impres
sioná-lo com a inteligência deles, flertando de várias formas com a revelação do crime.
A técnica distrai menos do que se poderia esperar, permitindo a Stewart e Dall se
confrontarem em uma grande batalha entre afetação homicida e retidão moral. É possível
que toda a atenção que se deu aos planos longos tenha feito os censores ignorarem a re
presentação extraordinariamente aberta de uma relação quase homossexual entre os as
sassinos - apesar de nunca mencionado nos diálogos, há apenas um quarto no aparta
mento que eles dividem. A insegurança de Cranger fica ainda mais clara com a duração
impiedosa das tomadas, mas Dall e Stewart mostram-se á altura do desafio de apresentar
atuações ininterruptas, ao estilo do teatro, na mídia mais intimista do cinema. KN
E U A (Transatlantic, Warner Bros I
80 min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Alfred Hitchcock
P r o d u ç ã o : Sidney Bernstein
R o t e i r o : Hume Cronyn, Arttiut
Laurents, baseado na peça Rope'1
End, de Patrick Hamilton
F o t o g r a f i a : Wi l l iam V. Skall, Joseph *.
Valentine
M ú s i c a : David Buttolph
E l e n c o : James Stewart, John Dall.
Farley Cranger, Cedric Hardwii ke,
Constance Collier, Douglas Dick,
Edith Evanson, Dick Hogan, Juan
Chandler
I U A (lux) 108 min. P&B
Idloma: ingles
I > in \ .>o: Anatole Litvak
I luçSo: Robert Bassler, Anatole
111 v.11«., Parryl F. Zanuck
ROtllro: Millen Brand, Frank Partos,
I I . I M ' . K I O no üvro de Mary Jane Ward
F o t o g r . i f l a : Leo Tover
M i i - . n a: Alfred Newman
I I I - I K u: ( ilivia de Havil land, Mark
[I ens, Leo Genn, Celeste Hoim,
I i l i ' i iu I angan, Helen Craig, Leif
i ni - n i , Hculah Bondi , Lee Patrick,
Howard Freeman, Natalie Schäfer,
Im Ii I nelly, Katherine Locke,
I I ml I niiioy, Minna Gombell
i r id ic . i t . t o a o O s c a r : Robert Bassler,
-M itole I Itvak (melhorf i lme),
An.Hole I itvak (diretor), Frank Partos,
Milieu Brand (rotelro), Olivia de
Havilland (atriz). Alfred Newman
I M I a)
NA COVA DA SERPENTE (imbi
(THE SNAKE PIT) Um dos produtos mais impressionantes da guinada de Hollywood em direção a um maior
realismo no pós-guerra é esta abordagem brutalmente honesta de Anatole Litvak sobre ,i
doença metal e seu tratamento nos sanatórios modernos, cujos horrores incluem a ala
superlotada em que os incuráveis são confinados - a "cova da serpente" do título. O filme
apresenta uma visão mais equilibrada dos distúrbios mentais do que muitos fi lmes mais
recentes, entre eles o mui tas vezes louvado Um estranho no ninho (1976).
Virgínia Cunn ingham (Olívia de Havl l land) parece, a princípio, uma psicótica
incurável, porém, com o t ratamento de Mark Kick (Leo Genn), um médico compassivo,
ela consegue se submeter a uma "cura pela fala". Flashbacks mostram uma infância na
qual lhe foi negado não só o amor da mãe como tarríbém a atenção do pai, que morreu
quando Virgínia era muito jovem. Ela também sofre com a morte do homem que ama,
pela qual acredita ser responsável. Sob os cuidados do Dr. Kick, ela se eleva a "melhor
pac iente" da ala, apenas para ser molestada lá dentro por uma enfermeira tirânica. O
mau compor tamento subseqüente de Virgínia a coloca na "cova da serpente"; porém
essa experiência aterrorizante se mostra estranhamente terapêutica. Por f im, ela recebe
alta, f ina lmente compreendendo como seus sent imentos de culpa são irracionais.
A maneira como o f i lme mostra o terror pelo qual a doença de Virgínia a faz passar
é memorável . O realismo otimista de A cova da serpente contrasta com as soluções
pseudofreudianas de outros fi lmes da época, incluindo Qtrcjndo faia o coração (1945), de
Hitchcock. K B P
1 1 1 A (1 oliiinhia, Mercury) 87 min. P8cB
I d l n m . t s : ingles / cantones
P u n .Mi I > I • . 1 . 1 1 Welles
I ' I I H I I I C H O : Wil l iam Castle, Orson
Welles, Rli haul Wilson
U n l t ' l i n : 1 ' r . m i Welles, baseado no
111 Pie Before / Wake, de
'.hr'iwood King
lopigi . i f ia: Charles Lawton Jr.
M i e n .1 11111 Is Fisher, Allan Roberts.
I l e i n / Koemheld
I I r a n i : KM a l layworth, Orson Welles,
1 v r i e i 1 Sloane, Glenn Anders, Ted de
1 I I I - . i . I , 1 rsklne Sanford, Gus Schill ing, 1 e l 11,111k. I nuis Merrill, Evelyn Ellis,
H . H i y shannon
A DAMA DE SHANGAI (ms) (THE LADY FROM SHANGAI) Depois de provar com O estranho (1946) que podia fazer um f i lme "norma l " se quisesse,
Orson Wel les retorna, aqui, ao gênero noir, escolhendo quase ao acaso um romance
pu/p (lf / Die Before I Wake, de Sherwood King) e apresentando algo tão rico e estranho
que estava fadado a desagradar Harry Cohn, diretor da Columbia. Ao s implesmente cor
tar a cabeleira que era marca registrada de Rita Hayworth e tingi-la de louro, Wel les des
valorizou del iberadamente uma propriedade do estúdio, que calhava de ser t ambém
sua ex-esposa. E Isso se deu antes de ficar claro que ela não estava Interpretando a
beldade cat ivante de Gilda (1946) , mas uma vilã tão cruel que até seu Indisfarçável sex
appeal se torna repulsivo.
Com um sotaque irlandês t i tubeante, Wel les é um marinheiro contratado por um
advogado aleijado (Everett Sloane, sórdido e assustador) para trabalhar em seu iate e
talvez também (como no enredo preservado por Wel les em Uma história imortal [1968])
prestar serviços à sua bela esposa. Um assassinato ocorre, seguido por um ju lgamento
em que todos agem de forma no mín imo antiét ica, e um caleidoscópio louco é
despedaçado por um clímax envolvendo um tiroteio numa sala de espelhos. A dama de
Shangai, como f i lme, é um espelho despedaçado, com fragmentos de genial idade que
jamais poderão ser juntados para formar algo que faça sentido. KN
i l
O VALENTE TREME-TREME (i948)
(THE PALEFACE) Jane Russel interpreta Calamity Jane, recrutada pelo governo dos Estados Unidos para ajudar
na caçada a uma gangue de brancos renegados que estão vendendo armas para os Índios.
Para poder se passar por emigrante cm um trem que está indo para o Oeste, ela se casa com
Painless Peter Potter, um dentista incompetente e covarde. (Não se deve buscar plausibilida
de neste tipo de filme!) Bob Hope se diverte no papel de Painless, disparando uma enxurrada
de piadas e partindo do princípio de que, se você não gostou da que acabou de ser contada,
logo virá outra. Muito do humor de O valente treme-tremeé previsível, com índios inalando
o gás do riso do dentista e Hope protagonizando uma série de trapalhadas, que o levam a
ser confundido com um corajoso combatente de peles-vermelhas. Hope, é claro, sente-se
loucamente atraído pela curvilínea Russell: "Você tem o tipo de boca na qual eu gostaria de
trabalhar." Há uma piada recorrente sobre a consumação eternamente postergada do
casamento, á medida que Russell continua seu trabalho de derrotar os bandidos.
Painless e Calamity são capturados e levados para um acampamento Indígena,
onde os índios são interpretados tanto pelo chefe Yowlachie (que era índio de fato)
quanto por Iron Eyes Cody (um ítalo-americano que se faz passar por pele-vermelha). As
piadas às custas deles, embora não sejam pol i t icamente corretas, são bobas demais
para ser consideradas ofensivas.
Hope faz uma interpretação simpática da canção "But tons and Bows" , escrita por
Victor Young, que ganhou um Oscar. Ela é um pedido para que as garotas vol tem para o
Leste e v is tam roupas bonitas, mas Russell está igualmente encantadora com seus
vestidos de seda e calças de couro. Quatro anos depois, "Bu t tons and B o w s " foi
reprisada em uma seqüência Intitulada O filho do treme-treme (dirigida pelo roteirista
do f i lme original). Hope e Russell se reencontram, desta vez contando com Roy Rogers
e seu cavalo Trigger, que ganha uma canção só para ele: "A Four-Legged Friend". EB
EUA (Paramount) 91 min. Ter hnlcoloi
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Norman Z. McLeod
P r o d u ç ã o : Robert L. Welch
R o t e i r o : Edmund L. Hartmann, I i,inl<
Tashlin
F o t o g r a f i a : Ray Rennahan
M ú s i c a : Ray Evans, Jay Livingston,
Victor Young
E l e n c o : Bob Hope, Jane Russell,
Robert Armstrong, Iris Adrian, Itohhy
Watson, Jackie Searl, Joseph Vital*,
Charles Trowbridge, Clem Bevans, |ell
York, Stanley Andrews, Wade Cmshy,
Cheif Yowlachle, Iron Eyes Cody, |ohfl
Maxwell
O s c a r : Jay Livingston, Ray Evans,
Victor Young (canção origin,il)
i M f J . i i r r i . i (Independent, Rank, The
Mi I h t . ) 113 min. Technicolor
I d i o m a : l i i f j e s
D l r e ç A o : Michael Powell, Emeric
I • I 111 li J r * I
Produc.lo: dt'or^e R. Busby, Michael
I'tiwrll. I i tH ' iu Prcssburger
Rottlro: Mn hael Powell, Emeric
l'it",',l)iii)',ci, Keith Winter, baseado
ihm mil o (Ir I inns Christian Andersen
l u i u p . i . t l i . i [.1.1 ( ardiff
M u - . i . .1 • • i m I ,isdnle
I ' l r i H o : Anion Walbrook, Marius
(.niiiif,, Moira Shearer, Robert
I Id (Mil.inn, I eon ide Massine, Albert
I ' • M I L I U M , Iudmll laTchérina,
I M l i n l l i l I 111;. •. 111
< >M . l i I lein Heckroth, Arthur Lawson
(•in.•< , i u ilc arte), Brian Easdale
( M ' u
imtli .10 Oscar: Michael Powell,
I Pirsshiiif.ei (melhor filme),
I mui 11 l ' ic-.shii i j ' .er, Michael Powell
I ), Reginald Mills (edição)
O S SAPATINHOS VERMELHOS ( m s ) (THE RED SHOES) A produção de 1948 de Michael Powel l -Emer ic Pressburger foi amada por gerações dl
garotas que queriam ser bailarinas quando crescessem, embora sua mensagem pari elas seja decididamente de duplo sentido. Em uma fascinante releitura da velha hlstorll
do nasc imento de uma estrela, Victoria Page (Moira Shearer), uma jovem dançarina
atraente, obstinada e talentosa, se apaixona pelo empresário Bóris Lermontov (Anlon
Walbrook) , uma mistura de Svengal i com Rasputin e Diaghilev. Ela negligencia sua vida
pessoal (um romance com o compositor Mar ius Goring) em prol de uma devoç.m
passional e quase doentia â arte, o que antecipa um final trágico belamente encenado.
Depois que Boronskaja (Ludmil la Tchérina), a bailarina principal que Lermontov
abandona quando ela diz querer se casar, sai de cena, Vicky estréia em uma adaptação
para o balé da história de Hans Christ ian Andersen sobre uma garotinha cujos sapatos
a man têm dançando até ela cair morta. Isso leva os cineastas - auxil iados pelo dança-
rino-coreógrafo Robert He lpmann, o co-astro Léonide Mass inc e o maestro Sir Thomas
Beecham - a uma seqüência de dança fantástica de 20 minutos que criou uma ten
dência (ver Sinfonia de Paris, Um dia em Nova York, Oklahoma!) de interlúdios estilizados
e sof ist icados em musicais . No entanto, ela consegue ser mui to melhor do que
qualquer uma de suas imitações ao recontar em síntese a história do f i lme ao mesmo
tempo em que ainda funciona bem como um número musical independente.
Obv iamente , a vida de Vicky fora dos palcos segue os passos daquela da heroína de
Andersen, conduzindo ao clímax em que ela salta - como em um balé - diante de um
trem e ao inesquecível tr ibuto no qual seus colegas desolados fazem uma nova apre
sentação de "Sapat inhos Vermelhos" apenas com os sapatos no lugar da estrela.
Shearer, pequenina e extraordinária na sua estréia nas telas, é uma presença poderosa
que consegue fazer frente a toda a intensidade da atuação soberba de Walbrook. Ela
consegue convencer tanto como uma dançarina ingênua em um salão lotado com uma
companhia de terceira categoria quanto como a grande estrela adorada por todo o
mundo. A heroína é cercada por telas de fundo estranhas, dignas de contos de fadas,
para o exuberante balé, porém o desenhista de produção Hein Heckroth, o diretor de
arte Arthur Lawson e o fotógrafo Jack Cardiff t rabalham duro para tornar as cenas fora
dos palcos aparentemente normais tão ricas e exóticas quanto os momentos de
destaque no teatro.
Walbrook - com os olhos bri lhando, quando não escondidos atrás de óculos es
curos - arrulha e sibila falas diabólicas com uma satisfação da qual não conseguimos
deixar de comparti lhar, manipulando tudo à sua volta com faci l idade, embora esteja
t ragicamente sozinho na sua devoção religiosa ao balé. Os sapatinhos vermelhos é um
raro exemplo de musical que captura a magia dos espetáculos teatrais sem negligen
ciar o esforço árduo e sofrido necessário para se criar esse tipo de veículo para o encan
tamento . Seu clima de bastidores ajudou bastante a tornar o balé acessível para a lém
da elite, contrastando as expectat ivas dos apreciadores de musicais amontoados nas
poltronas mais altas (e mais baratas) com a condescendência desdenhosa dos figurões
bem vest idos nos camarotes, para os quais as pérolas artíst icas são jogadas. Contando
com cores bri lhantes maravi lhosas, uma seleção de músicas clássicas que fogem ao
cl ichê e um viés sinistro que captura perfei tamente a ambigüidade do tradicional, ao
contrário dos contos de fadas da Disney, esta é uma obra-prima exuberante. KN
I U A (Warner Bros.) 126 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : John Huston
P r o d u ç ã o : Henry Blanke, Jack L.
Wamel
K o t i ' i r o : John Huston, B. Traven,
baseado no livro de B. Traven
I n t o g r n f i a : Ted D. McCord
M ú s i c a : Buddy Kaye, Max Steiner
E l e n c o : Humphrey Bogart, Walter
Huston, Hm Holt, Bruce Bennett,
li.iiion MacLane, Alfonso Bedoya,
AH '.oto Rangel, Manuel Donde,
I t i ' .e loivay, Margarlto Luna
Otc.ir: John Huston (direção e
roteiro), Walter Huston (ator
< n.idjuvante)
Indli i ç l o a o O s c a r : Henry Blanke
(inelhiii l i lme)
0 TESOURO DE SIERRA MADRE ( i 9 4S)
(THE TREASURE OF SIERRA MADRE) Jornadas fracassadas, a l imentadas pela ambição e frustradas pela ganância e desavri l
ças internas, eram o enredo favorito de John Huston, pois agradavam a mistura dl
romant ismo e c in ismo que compunha sua própria personalidade. De O falcão ma/tél
(1941) até O homem que queria ser rei (1975), ele realizou uma série de variações sohie o
tema - porém O tesouro de Sierra Madre o apresenta dentro de algo próximo da sul
forma arquetípica. No México, três andari lhos americanos Incompatíveis juntam fon,.is
para garimpar ouro, o encontram e - inevi tavelmente -, no f im, retiram a derrota das
garras da vitória e f racassam novamente . Huston, responsável por grandes adaptaçoi".
da literatura para as telas, retirou essa história do misterioso e recluso escritor B. Traven
e, como sempre, tratou o material original com respeito e carinho, preservando boa
parte dos diálogos lacônicos e do sarcasmo do autor.
Apesar da oposição do estúdio - pois f i lmagens em locação, pelo menos para
produções hol lywoodlanas classe A, eram raras naquela época -, Huston Insistiu em
fi lmar quase Inteiramente em locações no México, próximo a um vilarejo Isolado a mais
de 200 qui lômetros da capital . Sua intransigência rendeu bons frutos. A textura do
f i lme transpira a aridez poeirenta da paisagem mexicana, de modo que, ao assisti-lo,
você quase consegue sentir a areia entre os dentes; e os atores - exilados do ambiente
confortável do estúdio e tendo que enfrentar as Intempéries - são obrigados a oferecer
interpretações tensas e irascívels. Isso combinava com o tema de O tesouro...: como as
pessoas reagem sob pressão. Enquanto o velho garimpeiro (interpretado por Walter
Huston, pai do diretor) e o jovem ingênuo (o ator de f i lmes de caubói Tim Holt) se
agarram a seus princípios diante das adversidades e da tentação do ouro, o paranóico
Fred C. Dobbs (Humphrey Bogart em um dos seus papéis mais memoravc lmcnte afl i t i
vos) desmorona e sucumbe.
A determinação de Huston em fi lmar O tesouro... como queria t ambém rendeu bons
frutos ao estúdio. A princípio, Jack Warner detestou o f i lme, mas ele rendeu à Warner
Brothers não só um sucesso de bilheteria como um desempenho tr iunfante no Oscar.
Huston ganhou duas estatuetas - de Melhor Direção e Melhor Roteiro -, enquanto seu
pai conquistou o prêmio de Melhor Ator Coadjuvante. Foi a primeira e - até o momento
- única vez que uma equipe de pai e fi lho foi premiada na cerimônia. PK
A HISTORIA DE LOUISIAIMA m (LOUISIANA STORY) Pira sua últ ima obra, A história de Louisiana, o grande documentarista Robert J . Flaherty
li 1'itou o patrocínio da Standard 011 para fazer um f i lme sobre a extração de petróleo nos
luaços de rio da Louisiana. O patrocínio foi dado sem compromissos, porém, mesmo
Sim, Flaherty talvez tenha sido um pouco complacente no seu retrato da companhia
ile petróleo, mostrando-a como uma força benéfica que não causa danos à natureza
virgem. No entanto, um toque de ingenuidade não é algo inteiramente despropositado:
OS acontecimentos no braço de rio ca chegada dos petroleiros são mostrados através do
olhar de um garoto de 12 anos (Joseph Boudreaux). A paisagem desoladora e inundada sc
lorna um lugar mágico, repleto de folhagens escuras e animais exóticos, onde uma torre
ile perfuração deslizando de forma majestosa em um canal parece mítica e insondável,
c orno os lobisomens e sereias nos quais o menino acredita.
O diálogo é mín imo - em parte porque o diretor, como de hábito, trabalhou com
nativos da área e não com atores profissionais - e Flaherty confia pr incipalmente nas
suas imagens comoventes e líricas e na trilha de Virgil Thomson para conduzir a narra
tiva. A música de Thomson ganhou o Prêmio Pulitzer - a primeira trilha sonora a
receber essa honra. Em A história de Louisiana, assim como em todos os seus melhores
trabalhos, Flaherty celebra a beleza, o perigo e o fascínio das regiões selvagens. Pl<
E U A (Robert Flaherty) 78 min. P8.I!
I d i o m a s : Inglês / francês
D i r e ç ã o : Robert J . Flaherty
P r o d u ç ã o : Robert J . Flaherty
R o t e i r o : Frances H. Flaherty,
Robert J . Flaherty
F o t o g r a f i a : Richard Leacock
M ú s i c a : Virgil Thomson
E l e n c o : Joseph Boudreaux, Lionel I c
Blanc, E. Blenvenu, Frank Hardy, 1 P
Cuedry
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Frances I I .
Flaherty, Robert J . Flaherty (roteiro)
IV)
I U A (I '. i iamount) 115 ™ir>- P&B
l . l i o m . i : nij'Jes
l H n - 1 . i n : Wil l iam Wyler
• ' i m l u i a o : I csier Koenig, Robert
W v l n . Wil l iam Wyler
K n t r l r o : Augustus Goetz, Ruth Goetz,
ban ado no romance A herdeira, de
Hrn iy James
I BtOgraJ i a : I co Tover
Mull) Aaron Copland
I i n n i t (ilivia dc Havil land,
Montgomery ( l i f t , Ralph Richardson,
Mil lain I lopklns, Vanessa Brown,
Bitty I inli'v, Ray Collins, Mona
II I'd 11 a 11, Selena Royle, Paul Lees,
I in iv Am i n n , Russ Conway, David
Ihui-.hy
(Hear : Wil l iam Wyler (melhor f i lme),
Wi l l i . im W y l n (diretor), Olivia de
Havilland (atri /), John Meehan, Harry
11 I I mile Ktui (direção de arte),
I il i lh I lead, Gile Steele (figurino),
I opland (música)
i m l i < .11.10 a o O s c a r : Ralph
Kll hardson (ator coadjuvante), Leo
Invei (fotografia)
TARDE DEMAIS (1949)
(THE HEIRESS) "Como você pode ser tão cruel?" " E u aprendi com os melhores." A inesquecível
adaptação de Wi l l iam Wyler do romance A herdeira, de Henry James (refilmado sem ne
cessidade em 1997) , gira em torno de atuações Inesquecíveis, Intensif icadas pelos
exigentes planos longos que eram marca registrada do diretor e pelo domínio meticulo
so da atmosfera, i luminação e técnica de f i lmagem. Olivia de Havl l land, que recebeu seu
segundo Oscar pelo papel, está de tirar o fôlego como a garota terr ivelmente insossa e
dolorosamente gaúche fadada a ser uma solteirona apesar da fortuna que irá herdar do
pai frio e ríspido (Ralph Richardson), que a considera um estorvo.
Montgomcry Clift, então bonito na pele de um caçador de fortunas Imprestável, a
corteja com doses iguais de sedução e falsidade. Apesar das objeções afrontosas do pai
e com a conivência de uma tia to lamente romântica (Mir iam Hopkins), Catherine trama
uma fuga. Quando seu amante decide tentar suas chances em outro lugar, ela passa por
uma dura transformação. Quando a Ingênua Catherine percebe que foi abandonada, a
lentidão c o cansaço com que Havil land sobe as escadas da casa são eternamente apavo
rantes. Sua última subida para o andar de cima, saboreando um amargo triunfo à medi
da que seu pretendente, que havia retornado, esmurra desesperadamente a porta, é
igualmente tocante. A classe de toda a produção é ressaltada pela trilha original evoca
tiva de Aaron Copland, também ganhadora do Oscar. AE
I
AS OITO VITIMAS (1949)
(KIND HEARTS AND CORONETS) Uma das primeiras comédias produzidas pelos estúdios Eallng - a fábrica de invenções
humoríst icas de Sir Michael Balcón, localizada na zona oeste de Londres - c um
rxemplo perfeito do seu humor inconfundivelmente Inglês, As oito vít imas é uma co
média de humor negro incomparável em termos de elegância e savoir faite. Ela é
'.ofisticada, del ic iosamente espirituosa e determinada por outra marca registrada dos
i stúdios Ealing: um enredo provocativo e intel igente.
Oito membros da esnobe, rica e aristocrática família D'Ascoyne most ram-se um
obstáculo entre Louís Mazzini (o suti l Dennis Price) - um parente pobre, amargo e
(r iamente egoísta - e um ducado, o que o obriga a cometer uma série de assassinatos
nesta comédia de classes audac iosamente elegante de Robert Hamer. O f i lme foi
adaptado por Hamer e John Dighton de um pungente romance sobre a decadência da
alta sociedade, Israel Rank, de Roy Horn iman, embora se especule que ele também
tenha sido inf luenciado pelo mais controverso Monsicur Verdoux (1947), de Charles
Chaplin. Na sua escalada inexorável e Inescrupulosa, o maquiavél ico Mazzini de Prlce se
envolve de maneira fatídica com duas mulheres diferentes: Edith D'Ascoyne (Valerie
Hobson, esposa de John Profumo, o notório protagonista do escândalo sexual de 1963
que derrubou o governo inglês), viuva de uma das v í t imas e dona de uma graciosidade
comovente ; e a sensual Sibella - fabulosamente excêntrica e per igosamente felina -,
intepretada por Joan Greenwood, a atriz favorita da produtora inglesa.
Todos os oito D'Ascoynes, c laramente incestuosos e amalucados - incluindo a su
fragista Lady Agatha, que é derrubada a tiros de um balão; o general expansivo conde
nado ao breve prazer de urna lata de caviar explosiva; e o almirante louco que poupa
trabalho a Mazzini afundando com o próprio navio -, são interpretados pelo homem de
mil faces dos estúdios Ealing, irreconhecível de um f i lme para o outro (e, neste caso, de
uma cena para a outra), o encantador Alec Cuinness.
Hamer alcançou seu breve auge como diretor com As oito vítimas. Ele chegou ao filme
com uma bagagem valiosa de montador e encontrou o equilíbrio entre diálogos Inteligentes
e esquetes visuais vigorosos e satíricos. O habilidoso trabalho em preto-e-branco de
Douglas Slocombe, um cameraman de cinejornais de guerra que se tornou fotógrafo, levou
a uma carreira muito mais longa e prolífica: ele filmou vários clássicos ingleses da década de
60 e, mais tarde, sucessos internacionais como a trilogia Indiana Jones. AE
I n g l a t e r r a (Eallng Studios) 106 min.
P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Robert Hamer
P r o d u ç ã o : Michael Balcón, M¡< hail
Relph
R o t e i r o : Robert Hamer, Roy
Horniman, John Dighton, baseado 111
livro Israel Rank, de Roy Horniman
F o t o g r a f i a : Douglas Slocombe
M ú s i c a : Ernest Irving
E l e n c o : Dennis Price, Valerie llnh'.uii
Joan Greenwood, Alec Guinness,
Audrey Fildes, Miles Malleson, ( live
Morton, John Penrose, Cecil R.iiu.ige.
Hugh Griffith, John Salew, Eric
Messlter, Lyn Evans, Barbara I e.ike,
Peggy Ann Clifford
F e s t i v a l d e V e n e z a : Robert Hamei,
tUA (King, Pioneer) 86 mln. P&B
lil lnma: ingles
DlrccMo: Joseph H. Lewis
PfOdUCSoi frank King, Maurice King
i i n i i ' i i o : MacKinlay Kantor, Millard
l< .mini,in
F o t o g r a f i a : Russell Harlan
Mu j l ca : Victor Young
i Ir Peggy < ummins, John Dall,
I'.euv Kroeger, Morris Carnovsky,
ii ihel '.h.iw, Harry Lewis, Ned rick
]•,. Hire. Tamblyn, Ross Elliott
MORTALMENTE PERIGOSA (1949)
(GUN CRAZY / DEADLY IS THE FEMALE) Moralmente perigosa, a pérola cult de Joseph H. Lewis, é uma espécie de caso de tes t l
em debates contemporâneos sobre o significado do controverso termo " f i lme noir".
L ivremente baseado na história dos infames bandidos da década de 30 Bonnie Parker I
Clyde Barrow (o roteiro foi escrito por MacKin lay Kantor e pelo escritor Dalton Trumbn,
que na época fazia parte da lista negra e foi creditado como Mil lard Kaufman para es
conder o fato de que era um dos Dez de Hol lywood), esta t rama rural sobre dois aman
tes em fuga parece ter pouco a ver com o submundo barra-pesada, noturno e urbano
que geralmente define a tradição noir. Contudo, se comparado à história semelhante de
dois amantes mal fadados de Amarga esperança (1948), assim como a f i lmes que
traziam trabalhadores honestos em uma maré de azar - como O desesperado (1947),
Mercador de ladrões (1949) e justiça injusta (1951) -, Morta/mente perigosa comparti lha do
tema noir do homem marginal e desenraizado (prevalecente durante a Depressão e
ainda fonte de ansiedade nos anos que sucederam a Segunda Guerra Mundial) que
t ambém caracteriza cânones do gênero, como O destino bate à porta {1946) e Curva do
destino (1945), ambos histórias fatal istas de andari lhos.
Desde criança, Bart Tare (John Dall) era obcecado por armas de fogo. Depois de dei
xar o exército, ele conhece e Imed ia tamente se apaixona pela estonteante Annie Laurie
Starr (Pcggy Cummins) , que compart i lha do seu fetiche por armas e era a atração prin
cipal do número de tiro ao alvo em um show de variedades it inerante. Eles iniciam uma
série de roubos que, antes da morte dos dois pelas mãos da lei, culmina no assalto do
depar tamento de contabi l idade de uma distribuidora de carnes.
No nível formal, o status privilegiado de Morta/mente perigosa em meio à imensa
quantidade de filmes B é mais do que justificável, em virtude das suas inovações estéticas
dentro das limitações de orçamento - o longo plano-seqüência de um roubo de banco, a
perseguição através do abatedouro - e da caracterização incomparável de Cummins de uma
femme fatale psicótica. Esta história atemporal de amour fou (amor louco) foi uma grande
influência para Acossado (1960), o clássico da nouvelle vague de Jean-Luc Godard. OS
A COSTELA DE ADÃO ( i r o ) (ADAMS RIB) " lodos temos nossos truques." Esta excelente comédia de guerra dos sexos serviu de
inspiração para incontáveis f i lmes e séries de televisão sobre casais briguentos, porém
'.( 'xualmente in f lamáveis. Dos nove f i lmes que a lendária dupla Spencer Tracy e
Katharlne Hepburn fez entre 1947 e 1967, A costela de Adão pode ser considerado o me
lhor. Ele ainda conserva o frescor com seus diálogos espir i tuosos, discussão animada
'.obre Igualdade entre os sexos e estereótipos de gênero e atuações maravi lhosas. O
loteiro foi escrito pelos grandes amigos de Tracy e Hepburn, o casal Garson Kanin e
Ruth Gordon (a atriz que ganhou um Oscar por O bebê de Rosemary). A história real que
deu origem ao enredo foi a dos advogados Wi l l iam e Dorothy Whi tney, marido e
mulher, que representaram o Sr. e a Sra. Raymond Massey em seu divórcio, em seguida
se divorciaram e casaram-se com seus respectivos cl ientes.
A coisa não chega a tanto em A costela de Adão. Quando Dóris Attinger, uma loura
meiga e amalucada - interpretada pela sensacionalmente engraçada Judy Holllday, es
treando no papel que lançou sua carreira meteórica -, é acusada de tentativa de assas
sinato de Warren (Tom Ewell), seu marido infiel, a advogada protofemlnista Amanda,
"P ink le" Bonner (Hepburn) concorda em defendê-la. No entanto, o marido de Amanda
Adam "Pinky" Bonner (Tracy), é o promotor público e a batalha dos dois no tribunal logo
se estende para o quarto. As hosti l idades se agravam quando Kip (David Wayne) , um
músico apaixonado, passa a mostrar interesse por Amanda, compondo "Farewel l ,
Amanda" (uma canção escrita por Cole Porter) em sua homenagem.
O diretor George Cukor, reconhecendo a teatral idade Inerente a si tuações de
tr ibunal, mantém um ritmo del iberadamente teatral depois da seqüência de abertura de
suspense cômico em que Dóris segue Warren do trabalho até o local do encontro com
Beryl (Jcan Hagcn), sua amante vulgar, e tenta matá- lo inut i lmente a tiros. Os longos
planos-seqüência do fi lme dão a Hepburn a liberdade de passear pelo tr ibunal, onde ela
faz seu show extraordinariamente astucioso, e permitem a Tracy extravasar sua indigna
ção diante das tát icas da esposa. Dentre os momentos de destaque estão Amanda
Interrogando a Idiota Dóris no início e o espetáculo de Adam em lágrimas expondo seu
lado feminino para ficar bem com a esposa. Embora alguns dos argumentos possam
parecer ant iquados hoje em dia, a sofisticação do f i lme permanece Intacta. AE
E U A (MGM) 101 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : George Cukor
P r o d u ç ã o : Lawrence Weingarten
R o t e i r o : Ruth Gordon, Garson Kanin
F o t o g r a f i a : George J . Folsey
M ú s i c a : Cole Porter, Mlklõs Ró/s.i
E l e n c o : Spencer Tracy, Katharine
Hepburn, Judy Holllday, Tom Ewell.
Francis Attinger, David Wayne, lean
Hägen, Hope Emerson, Eve March,
Clarence Kolb, Emerson Treacy, Polly
Moran, Will Wright, Elizabeth
Flournoy
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Ruth Cordon,
Garson Kanln (roteiro)
I n g l a t e r r a {Ealing Studios, Rank)
Hz mln. P&B
Idlomi: Inglês / gaélico
i m i l l o : Alexander Mackendrlck
1'roduç.lo: Michael Balcon, Monja
I • M U M h e w s k i
I ' i ' i i - i i o : Aii j^us MacPhai l , Compton
i l l i n . i r , luseado no livro de
t ninploti Mackenzie
l u l o | > , i a f i a : Gerald Cibbs
M ú s i c a : Ernest Irving
i Ir : I ' J ' . I I Radford, Catherine
1.11 By, Bruce Setton, Joan Greenwood,
Wyl lc Watson, Gabrielle Blunt,
I n n I . H kson, Jean Cadell, James
Robertson Just ice, Morland Graham,
I'll igson, James Woodburn,
I a m i " . Andi ' ison, Jameson Clark,
I M im . in m.H rae, Finlay Currie
ALEGRIAS A GRANEL (1949)
(WHISKY GALORE!) Juntamente com Um pnís de anedota e As oito vítimas, Alegrias o granel faz parte da pri
melra safra das célebres comédias inglesas produzidas no pós-guerra pelos estúdios
Eallng, sob o comando do paternal produtor sír Michael Balcon. Universalmente admira
do, o f i lme foi fundamental para o estabelecimento do tom característico, autodepre
dat ivo e ligeiramente satírico daqueles que se seguiram a ele, assim como do tema recor
rente das pessoas humildes, porém destemidas, que triunfam sobre os mais poderosos.
A inf luente comédia de choques culturais de Alexander " S a n d y " Mackendrick, bela
mente f i lmada em locação em Barra, nas Ilhas Hébridas, no esti lo de um falso do
cumentár io , relata a procura do capitão da guarda local (Basil Radford) - um inglês
carola, cert inho e abstêmio - pelo carregamento de uísque "sa lvado" de um navio
naufragado. A bebida deveria ter seguido para a América, mas foi interceptada por
i lhéus sedentos e empobrecidos por conta da guerra. O capitão da guarda é habi lmente
despistado pelos astutos nat ivos de Todday, que são mais rápidos do que ele e os
homens do fisco. A história, imortal izada pelo escritor Compton Mackenz ie , foi
inspirada no "desaparec imento" real de 50 mil engradados de uísque depois que um
navio cargueiro naufragou nos arredores da ilha de Eriskay. O romancista-roteirista tem
uma part icipação no f i lme como o capitão do S .S . Cabinet Minister.
Alegrias a granel é mais datado do que a lgumas das comédias dos estúdios Ealing,
embora seu charme ant iquado seja contrabalançado por sua hilaridade histriónica, sua
crítica social apaixonada e inteligente e seu retrato autêntico da vida nas ilhas Hébridas,
com atuações deliciosas. A principal atriz inglesa da produtora, a sedutora Joan Green-
wood, está fabulosa como a filha provocante de Macroon (Wyl ie Watson) , um taverneiro
malandro. O mesmo pode ser dito dos protagonistas genuinamente escoceses, como
James Robertson Just ice, Gordon Jackson e Finlay Currie, o cômico narrador. O apelo
universal do humor antiautoritarlsta do f i lme está na sua idealização da vida em um
vilarejo remoto repleto de excêntricos, garotas bonitas e um povo brigão e justo estra
gando a festa dos seus inimigos pomposos e burocráticos.
Mackendrick, um amer icano com jeito escocês que dirigiu três das maiores pérolas
dos estúdios Eallng (as outras duas são O homem do terno branco, de 1951, e O quinteto
da morte, de 1955), mostraria mais tarde um talento Igualmente impressionante para
dirigir d ramas, pr incipalmente depois de sua ida para a Amér ica, com o f i lme A
embriaguez do sucesso, de 1957. AE
FÚRIA SANGUINÁRIA (1949)
(WHITE HE AT) "Você sabe o que fazer?", pergunta Cody (James Cagney) com rispidez a seu parceiro no
1111< io de um audacioso roubo de t rem; quando o outro começa a responder, Cody o
i i l ic r rompe: "En tão feche essa matraca e faça!" Essa at i tude impetuosa e impulsiva
i l r l ine o vigor dos f i lmes de Raoul Wa lsh , que (conforme observado por Peter Lloyd)
"medem o pulso de uma energia indiv idual" e a inserem em uma "trajetória enlouque-
Ida da qual nasce a construção de um ritmo". Poucos f i lmes possuem uma narrativa
Mo tensa, uni forme e econômica quanto Fúria sanguinária.
Walsh é um diretor implacavelmente linear e direto cujo trabalho remonta ao
( inema mudo - como na empolgante seqüência de abertura em que um carro alcança
o t rem. Entretanto, ele t ambém explora as possibil idades intrigantes e complexas da
psicologia do século XX . Durante o roubo, Cody mata de forma Impiedosa. U m a vez
rntocado como um animal em uma jaula com sua gangue - da mesma forma que será
preso mais tarde -, sua psicopatologia começa a vir à tona: indiferença ao sofr imento
alheio, fixação em uma mãe violenta e enxaquecas lancinantes que o deixam furioso.
Cody, imortal izado na atuação intensa de Cagney, personifica a maior das contra
dições que leva os gàngstercs do cinema à ruína: um egoísmo fantástico e delírios de
invencibil idade ( "Olhe, mãe , estou no topo do mundo") minados por dependências e
vulnerabil idades demasiado humanas . AM
E U A (Warner Bros.) 114 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Raoul Walsh
P r o d u ç ã o : Louis F. Edelman
R o t e i r o : Virginia Kellogg, Ivan Coff,
Ben Roberts
F o t o g r a f i a : Sidney Hickox
M ú s i c a : Max Steiner
E l e n c o : James Cagney, Virginia MayO,
Edrnond O'Brien, Margaret Wy< 111 • 11v.
Steven Cochran, John Archer, w.illv
Cassell, Fred Clark
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Virginia Kcllog
(roteiro)
NA TEIA DO DESTINO (1949)
(THE RECKLESS MOMENT) Na teia do destino é um f i lme nolr i ncomum, pois inverte os gêneros em uma releitura
da conhecida história (presente em Poeto sinistro e Almas perversas) da personagem
inocente que se envolve com um vigarista sedutor e se enreda em um cr ime. Aqui, a
classe e a respeitabil idade assumem um status geralmente atr ibuído ao sexo e ao di
nheiro à medida que a dona de casa Lúcia Harper (Joan Bennett) é tirada do seu cotidia
no suburbano quando o canalha (Shepperd Strudwick) que vinha saindo com sua filha
(Geraldine Brooks) é morto de forma quase acidental sob circunstâncias suspeitas e ela
se livra do cadáver para fazer as coisas parecerem melhores.
O justiceiro de Lúcia é interpretado por James Mason , estranha porém acertada
mente escalado para o papel de um vagabundo irlandês que começa por chantageá- la,
mas depois passa, de forma perturbadora, a fazer sinceras propostas românt icas. O
foco do f i lme então muda à medida que o cr iminoso é levado a fazer um sacrifício que
trará a vida da heroína de vol ta, mas que também sugere que Bennet t - que, afinal de
contas, era uma prostituta cm A/mos perversas - pode tê-lo manipulado inconsciente
mente para benefício próprio todo o tempo. O diretor v ienense Max Ophüls está mais
interessado na ironia e na emoção do que no crime e no drama, o que dá a este fi lme
um clima excepcionalmente afl i t ivo. Ele também conduz os protagonistas a atuações
reveladoras e inusi tadas. KN
E U A (Columbia) 82 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Max Ophüls
P r o d u ç ã o : Walter Wanger
R o t e i r o : Mel Dinelli, Henry Car ,on
F o t o g r a f i a : Burnett Cuffey
M ú s i c a : Hans J . Salter
E l e n c o : James Mason, Joan Bennett,
Geraldine Brooks, Henry O'Neil l,
Shepperd Strudwick, David Blair, Roy
Roberts
• ' • I ' .
Inglaterra (British Lion, London)
104 min. P&B
Idioma: inglês / alemão
D i r e ç ã o : Carol Reed
1 ' i o i l n ç ã o : Hugh Perceval, Carol Reed
Rottlro: Graham Greene, Alexander
K o r d a <
Intngraf ia: Robert Krasker
Múllca: Henry Love, Anton Karas
E l e n c o : loseph Cotten, Alida Valli,
' In Welles, Trevor Howard, Paul
Hflrblger, I mst Deutsch, Erich Ponto,
l l tgfr led Breuer, Hedwig Bleibtreu,
v i u . m l Lee, Wilfrid Hyde-White
' •••> .o U n b e l t Krasker (fotografia)
i m l i i . i ç . i o a o O s c a r : Carol Reed
(diretor), O s w a l d Hafenrichter
(rdlç.tii)
0 TERCEIRO HOMEM (1949)
(THE THIRD MAN) Roteirizado por Graham Greene - o livro foi, na verdade, escrito a partir do roteiro! -, O
terceiro homem transfere de maneira ef iciente o mundo de pesadelo urbano dos fi lmes
noir da Hol lywood de 1940 para um cenário europeu. Part indo das conseqüência',
caót icas da guerra e oferecendo uma cont inuação - passada cinco anos depois - al
obras de escritores de thrlllers ingleses e cineastas europeus exilados, ele mostra os
efeitos pós-guerra dos mov imentos retratados nos f i lmes do começo da carreira de
Hitchcock, como A dama oculta (1938) e O agente secreto (1936), bem como nas obras do
meio da carreira de Fritz Lang - como Quando desceram as trevas (1944), baseado em
Greene, ou O homem que quis matar Hitler (1941), inspirado em Geoffrey Household - e
ainda nas adaptações de Eric Ambler, como tornada do pavor (1942) e A máscara de
D/m/tr/OS (1944). A Viena ocupada, dividida entre quatro poderes mil itares e infestada
de vigaristas do mercado negro, é um cenário tão fantástico quanto qualquer outro
projetado pelo exotismo de estúdio, contudo Reed e sua equipe conseguiram f i lmar em
locação, em meio aos escombros e à exuberância, capturando um mundo de medo
ext remamente real.
Nesse mundo devastado pela corrupção surge o amer icano inocente Holly Mart ins
(Joseph Cotten). Um escritor de faroestes pu/p, ele é de alguma forma chamado para dar
uma palestra sobre literatura séria para uma platéia pedante. Somente o sargento de
polícia (Bernard Lee), sentado no f im do auditório, leu alguns de seus livros. Holly fica
chocado ao descobrir que seu amigo de Infância Harry Lime (Orson Welles) morreu
recentemente de maneira misteriosa, tendo sido apontado como suspeito de envolvi
mento cm um golpe especialmente covarde. Holly se envolve com uma das namoradas
de Harry (Alida Valli) e uma série de excêntricos sinistros na sua busca pelo "terceiro
homem" , que foi visto levando o corpo de Lime embora. Harry, como todos (menos
Holly) sabem, na verdade forjou a própria morte para fugir do policial Cal loway (Trevor
Howard).
Depois de todos esses anos, não é exatamente uma surpresa, mas o momento em
que o Harry de Wel les é pego por um facho de luz da rua enquanto um gato se esfrega
em seus sapatos ainda é mágico. O tema de cítara inesquecível de Anton Karas se
destaca na trilha sonora e Wel les faz prat icamente uma ponta como um dos vilões mais
charmosos do c inema. A fala mais famosa de O terceiro homem - a piada do "relógio
cuco", contada no alto da roda-glgante de Viena - foi escrita por Wel les no calor do mo
mento , como acréscimo ao roteiro de Greene, dando substância ao personagem e
talvez assegurando a grandeza duradoura desta película.
Um raro f i lme Inglês que é tecn icamente tão perfeito quanto os melhores clássicos
de Hol lywood - Reed jamais faria algo tão magistral novamente -, O terceiro homem é
uma extraordinária mistura de thrlller polít ico, estranha história de amor, mistério
gótico e tormento romântico em preto-e-branco. Wel les, que está verdadeiramente
bri lhante nos cinco minutos em que aparece, ganhou toda a atenção, mas este é um
f i lme de atuações impecáveis, contando com um trabalho maravi lhoso de Cotten como
o herói aturdido e desapontado - sua "palestra literária" é inest imável - e com a beleza
radiante da estrela Italiana Vall i , como a heroína pro forma. Este é um f i lme que
resplandece constantemente, com suas paisagens urbanas noturnas, seus rostos
aflitos e as águas caudalosas dos esgotos que carregam Lime no f im. KN
| l .
i UA (M( ,M) 98 min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Stanley Donen, Gene Kelly
P r o d u ç ã o : Roger Edens, Arthur Freed
U n i i ' i i o : Adolph Green, Betty
( omden, baseado na peça de sua
•ml 01 l.i
l o l o g r a f i a : Harold Rosson
M o - . i i . 1 : 1 eonard Bernstein, Saul
( h.nihil, Roger Edens
1 I r i n o: 1 , i w Kelly, Frank Sinatra,
hei iv dairct t , Ann Mi l le r ju les
Mine,hin, Vera-Ellen, Florence Bates,
Alii 1 iv. i ne , i ,eorge Meader, Judy
lliilllday
1 IM .11: Roger Edens, Lennie Hayton
( m i c h ,1)
UM DIA EM NOVA YORK (1949)
(ONTHETOWN) Dois marinheiros, Gabey (Gene Kelly) e Chip (Frank Sinatra), na companhia da taxlstl
Brunhi ldc (Bct ty Garrett), invadem uma aula de desenho com modelo vivo. Eles fii arfl
boquiabertos ao verem uma mulher nua, de costas. A modelo se vira: está usando uni
vest ido sem a parte de trás. O trio sai correndo pela porta giratória pela qual entrou.
Vemos então o terceiro marinheiro, Ozzie (Jules Munshin) , e sua namorada antropólo
ga, Claire (Ann Mil ler), que se bei jam fur t ivamente.
A diversão levemente subversiva de Um dia em Nova York está toda contida nesta
complexa gag. O f i lme é basicamente uma caça a sexo casual : três marinheiros, em
uma licença de 24 horas, que querem transar. Na superfície, o f i lme tenta negar esse
impulso básico temos, af inal, o amor de Gabey por Ivy (Vcra-Ellen), a meiga e inocente
"M iss Turnsti les" - mas há prova disso em toda parte: nas referências culturais (um
museu devotado ao "homo erectus") , nas frases de duplo sentido ("Ele queria ver as
atrações turíst icas e eu mostrei tudo") c, pr incipalmente, nos números musicais, em
que todo o erot ismo c subl imado, embora a performance vir tuosa de Mil ler de
"Prehistor ic M a n ! " não faça questão de esconder nada.
Um dia em Nova York oferece mui tos e variados encantos com sua premissa simples
porém vigorosa de "uma vida em um dia", mesmo com os diretores Kelly e Stanley
Donen ainda a alguns anos de distância do seu ideal de musical dramat icamente inte
grado. Depois que os marinheiros se separam, o f i lme fica especialmente agitado, indo
desde o burlesco ("You Can Count On Me" ) até o alto balé, este últ imo a cargo do dueto
Slnatra-Garrett ("Come Up to My Placc", um dos destaques da trilha jazzfstica de Leonard
Bernstein). Os acontecimentos abrem caminho para toda sorte de devaneios (Gabey
imaginando to lamente Ivy como uma garota para toda a vida), digressões e gags.
A faceta esquerdista da vida e da carreira de Kelly é geralmente ignorada. No entan
to, Um dia em Nova York possui - escondida sob a superfície, jun tamente com o impul
so sexual - uma aspiração política: esta "sinfonia urbana" (com uma fotografia em
locação formidável) é uma verdadeira ode às alegrias e tristezas de trabalhadores
comuns, acumulando experiências nas brechas de uma rotina massacrante. AM
f
ORFEU (1949)
(ORPHÉE) "A eternidade é privilégio das lendas", observa o narrador desde o início. E isso se mos-
nou verdadeiro para Orfeu, o f i lme de fantasia de Jean Cocteau, uma alegoria infinita
mente estranha e divertida que é também uma espécie de autobiografia velada. Orfeu
(interpretado por Jean Marais, amante de Cocteau) é um poeta aclamado que saiu de
moda. Depois que um rival desprezado é atropelado por dois motocicl istas unifor
mizados, ele se fascina pela Princesa Morte (Maria Casares), porém, quando Eurídice
(Marie Déa), sua esposa negligenciada, morre, Orfeu desce ao Inferno para buscá-la.
Anal isado apenas como um fi lme de efeitos especiais, ele ainda é um marco por
conta do uso engenhoso de Cocteau das técnicas de reverse mot ion e retroprojcçáo.
I spelhos fazem as vezes de portas para o Além ("Olhe em um espelho por toda uma
vida e você verá a ação da Mor te" ) , embora apenas poetas possam atravessá-los a seu
bel-prazer. O Purgatório é um l imbo em câmara lenta no qual as leis da física são
suspensas. Embora a narrativa enigmática possa ser confusa em alguns momentos (o
fato de tanto Orfeu quanto Cocteau parecerem estar mais encantados com a Mor te do
que com Eurídice não ajuda), a imaginação poética do f i lme é fascinante. T C h
F r a n ç a (André Paulvé, Palais Royal)
112 min. P & B
I d i o m a : francês
D i r e ç ã o : J e a n Cocteau
P r o d u ç ã o : André Paulvé
R o t e i r o : Jean Cocteau
F o t o g r a f i a : Nicolas Hayer
M ú s i c a : Georges Aurlc
E l e n c o : Jean Marais, François Perler, Maria Casares, Marie Déa, Henri
Crémieux, Juliette Greco, Roger Blin,
Edouard Dermithe, Maurice Carnegc.
René Worms, Raymond Faure, Pierre Bertin, Jacques Varennes, Claude
Mauriac
0 SEGREDO DAS JÓIAS (1950)
(THE ASPHALT JUNGLE) Talvez o mais rebuscado f i lme de "ga tunos" já produzido em Hol lywood, o estudo de
John Huston sobre um roubo a uma loja de jóias mostra as relações profissionais entre
cr iminosos de carreira de diversos tipos - desde um gênio do cr ime até o " h o m e m da
caixa", que arromba o cofre, passando pelo "b ru tamontes" escalado para cuidar dos
guardas. Um cr ime desses é apenas "uma forma heterodoxa de trabalho", sugere o
homem de negócios "respei tável" que Irá receptar o furto.
O segredo das jóias focaliza não só o assalto, mas t ambém as vidas privadas dos
membros da ganguc, que são individualizados com toques notáveis de diálogo e estilo
v isual . Huston conduz com maestr ia um ót imo grupo de atores, incluindo Mari lyn
Monroe - que interpreta a amante desmiolada de um velho, em um de seus mais
importantes papéis em início de carreira. Como na maioria dos f i lmes de Huston, a
ênfase temática está nas alegrias e tristezas das relações mascul inas, com a inevitável
derrota dos cr iminosos pela lei - e por suas próprias fraquezas - sendo representada de
forma quase heróica. Doe Reidenschneider (Sam Jaffe), o líder da gangue, é capturado
porque se demora em um café assistindo a uma jovem bonita dançar, e o durão Dix
(Sterling Hayden) sangra até a morte enquanto tenta voltar para o Interior e para os
cavalos que ama. Esses e lementos melodramáticos contrastam de forma interessante
com o retrato no geral Implacável que o f i lme realiza da loucura, da traição e da
sociopatia. RBP
E U A (MGM) 112 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : John Huston
P r o d u ç ã o : Arthur Hornblow J i .
R o t e i r o : W. R. Burnett, Ben M.iridow.
John Huston, baseado no livro de
W. R. Burnett
F o t o g r a f i a : Harold Rosson
M ú s i c a : Mlklós Rózsa
E l e n c o : Sterling Hayden, Louis
Calhem, Jean Hagen, James
Whltmore, Sam Jaffe, John M c l o l i i e .
Commissioner Hardy, Marc I awreni t Barry Kelley, Anthony Caruso. FereSJ Celll, Marilyn Monroe, Wil l iam "Wee
Wil l ie" Davis, Dorothy Tree, Brad
Dexter, John Maxwell
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : John Huston
(diretor), Ben Maddow, John Huston
(roteiro), Sam Jaffe (ator
coadjuvante), Harold Rosson
(fotografia)
-1 ' «
J a p ã o (Daiei) 88 min. P & B
i d i o m a : japonês
ü l r c ç ã o : Akira Kurosawa
P r o d u ç ã o : Minoru Jingo, Masaichi
N.i) ' , ,H,i
R o t e i r o : Ryunosuke Akutagawa, Akira
I Lirosawa, Shinobu Hashimoto,
baseado nos contos "Rashomon" e
"Dentro da mata", de Ryunosuke
Akutagawa f o t o g r a f i a : Kazuo Miyagawa
Múllca: Fumio Hayasaka
llinco: lóshiro Mifune, Machiko Kyó,
Uasayukl Mori , Takashi Shimura,
Mil ioni Chiaki, Kichijiro Ueda,
I n i i i i k i i Honma, Daisuke Katô
O s c a r : Akira Kurosawa (prémio
honorário)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : 5o Matsuyama,
li Motsumoto (direção de arte)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Akira Kurosawa
[Ltfto de Ouro), Akira Kurosawa
(prêmio da crítica italiana)
RASHOMON (1950)
Três v ia jantes se reúnem sob as ruínas de um templo durante uma tempestade. Uni
lenhador (Takashi Shimura) , um sacerdote (Minoru Chiaki) e um servo (Kichijiro Ueda)
fazem uma fogueira e refletem sobre uma história perturbadora. Assim começa uma
história dentro da história sobre um homem e uma mulher casados e um bandido que
se encontram em uma estrada na floresta. O lenhador se depara mais tarde com o
cadáver do marido e dá seu tes temunho diante de uma comissão da polícia que inves
tiga o ocorrido. A explicação horroriza o sacerdote e entretém o servo de tal forma que
os man tém ocupados durante toda a tempestade com quatro versões do cr ime.
Contado a partir de pontos de vista confl i tantes em forma de f lashback, f i lmado
com uma câmera fluida, em constante movimento, e fotografado sob uma abóbada de
luz salpicada, Rashomon detalha perspectivas nâo-confiáveis. A sinceridade dos perso
nagens na tela e a veracidade das ações relatadas mostram-se, portanto, enganosas.
Fatos são colocados à prova e imediatamente quest ionados. Discrepâncias entre as
histórias sobrepostas do marido, da esposa e do bandido tornam difícil um relato fiel.
Um perfeito pesadelo epistemológico, a obra de Akira Kurosawa vencedora do
Oscar ainda termina com uma injeção de retidão moral. Embora Rashomon explore de
forma Implícita a possibil idade perdida de renovação e redenção, seu tema central da
descoberta da verdade como uma dist inção entre o bem e o mal é sustentado por
gestos simples de bondade e sacrifício.
Como a estrada na floresta é explorada através da perspectiva do bandido Tajomaru
(Toshiro Mifune), ele é caracterizado como um ser diabólico. Depois de ver Masako
(Machiko Kyô), ele se encanta com sua submissão voluntária antes de soltar seu marido
samura i , Takehlro (Masayukl Mori) , para que os dois homens possam lutar até que um
deles seja morto. Do ponto de vista de Masako, ela é estuprada, desonrada e em
seguida rejeitada pelo marido; então sucumbe a uma ira histérica e o mata. Concordan
do apenas que foi morto, Takehiro fala através de um médium (Fumiko Honma) ,
explicando como sua esposa correspondeu à paixão de Tajomaru antes de exigir a mor
te dele pelas mãos do bandido. S e m ver nenhum benefício no assassinato, Tajomaru
foge, assim como Masako, abandonando Takehiro, que comete suicídio.
Cada história é contada de forma lisonjeira pelos seus próprios protagonistas.
Ass im, Tajomaru é um criminoso impiedoso, Masako é uma vít ima
inocente e Takehiro, um guerreiro honrado. Tudo isso parece verdade,
até o lenhador explicar o que viu escondido nas sombras. Sua perspec
tiva ratifica a frivolidade da esposa, a bravata do bandido e a covardia do
marido. Ela também oculta a sua cumpl ic idade em relação ao cr ime até
o servo apontá- la, desprezando a busca pela verdade.
Kurosawa termina esta história desoladora com uma nota positiva.
Um bebê abandonado é descoberto sob as ruínas do templo. O lenhador
introduz no f i lme o tema da bondade humana ao assumir a responsabi
lidade de cuidar do órfão como forma de redenção. Um desfecho coeren
te - dada a esquizofrenia formal de Rashomon com sua estrutura narra
tiva bri lhante - para esta obra-prima de Kurosawa. CC-Q
I UA (universal) 92 min. P&B
I d l o m a : ingles
D l r c c a o : Anthony Mann
I ' r o d u c a o : Aaron Rosenberg
ROtelro: Borden Chase, Stuart N.
i il - Reiben I. Richards, baseado no
in le •,in,ut N. Lake
l o l o g r . i f i . i : Wi l l iam H. Daniels
M ü s l c a : Walter Scharf
l l e n c o : ),imes Stewart , Shelley
Winters, I).in Duryea, Stephen
Mi Nll ly, Millard Mitchel l , Charles
Duke, John Mclntire, Wil l Geer, Jay C.
I Uppen, Rock Hudson, John
' * 111 • 111111' 11 Steve Brodie, James
M i l l n . i n . Aimer Biberman, Tony Curtis
WINCHESTER 73 (1950)
O primeiro dos oito f i lmes que o diretor Anthony Mann fez com o ator James Stewart ,
Winchester '73 estabelece o tom dessa parceira lendária. Os faroestes que esses dois ho
mens realizaram juntos são geralmente amargos e de uma beleza árida, com fascinan
tes impl icações de incerteza moral .
Winchester '73 gira em torno de um rifle poderoso que troca de mãos repetidas
vezes. Cada homem que o possui é modi f icado de alguma forma - a lgumas vezes para
o bem, outras para o mal . Tudo se decide em uma compet ição de tiro na qual o prêmio
é a própria arma do tí tulo.
O elenco é ext remamente forte. Shel ley Winters está excelente e entre os coadju
vantes há atores versáteis como Mil lard Mitchcl l , Stephen McNally, Wil l Geer e o incom
parável Dan Duryea. (Veja se você consegue identif icar um jovem Tony Curtis e Rock
Hudson como um guerreiro indígena!)
Considerado hoje em dia um ator de Incomum versatil idade, Stewart estava preocu
pado - na época da produção do f i lme - com críticas relacionadas às suas limitações
como intérprete. Seu personagem, Lin McAdani , é um herói insólito - t i tubeante, de
certa forma, embora seja o eixo moral do f i lme. As atuações de Stewart para Mann se
tornariam cada vez mais complexas e cínicas em fi lmes como Um certo capitão Lockhart
e O preço de um homem, provando, sem deixar sombra de dúvida, que esse mestre do seu
ofício poderia interpretar com competência qualquer papel que lhe fosse dado. EdeS
1 ha (Aij',n',y, Republic) 105 min. P&B
I d l o m a nir l i " .
U l i r c . l o : I0I111 lord
Produfio: Merian C. Cooper, John
I o k I . Herbert J . Yates
11 Iro: I,lines Warner Bellah, James
I' • •vn i Mi Guinness, baseado na
111.11 e i 1.1 d e jornal "Mission With No
I I cord . i l e I.lines Warner Bellah
i , i t , , | - . i . i l i . i : I'.eit Glennon
mo .,.., 11.ile [ vans, Stan Jones, lex
i iweie., Vic lor Young
l l r n t o : John Wayne, Maureen
1 ' 1 lira, Ben lohnson, Claude Jarman
li . l l .niy ( areyjr., Chill Wil ls, J. Carrol
lllh, vii tor McLaglen, Grant
Withers, Peter Ortiz, Steve Pendleton,
I' irolyn Grimes, Alberto Morin, Stan
loin-,, 1 ied Kennedy
RIO GRANDE (1950)
A últ ima parte da "Trilogia da Cavalar ia" de John Ford - Sangue de heróis (1948) e
Legião invencível (1949) são as outras duas -, Rio Grande é um f i lme menor, embora
essencial, supostamente realizado para garantir o f inanciamento para o projeto pessoal
do diretot. Depois do vendaval (1952). Ele é menos revisionista, criador de mitos e
elegíaco do que os dois f i lmes anteriores da série, oferecendo uma mistura de
bebedeiras, farras no quartel e cenas de cavalgada repletas de ação.
O capitão Kirby York (John W a y n e , não exatamente recriando seu Kirby York de
Sangue de heróis), um ianque rabugento, se reconcilia com Kathleen (Maureen 0 'Hara) ,
sua ex-mulher sulista - cuja mansão foi incendiada durante a Guerra Civil -, para que
possa criar com ela seu ingênuo fi lho recruta (Claude Jarman Jr.) . O fi lho se torna um
homem sob a influência do pai sem perder a sensibil idade da mãe . York lidera seus
homens na perseguição aos indígenas que a tacam o quartel, v indos do México com a
intenção de promover seqüestras, premissa que indica um embrião da obra-prima de
Ford e W a y n e , Rastros de ódio. Esta é uma aventura menos neurótica e mais interessada
em ação, além de um raro f i lme de Ford que adota, de forma inquest ionável, uma abor
dagem mocinhos versus bandidos dentro da guerra contra os índios.
Ben Johnson demonstra seu ta lento de peão de rodeio em ousadas seqüências de
cavalgada e o grupo musical Sons of the Pioneers acrescenta um tom folclórico com
baladas oportunas, embora "Bo ld Fenian M e n " tenha sido um improvável sucesso v in
do do Oeste na década de 1870. KN
A MALVADA (1950)
(ALL ABOUT EVE) 1 onsiderado um dos f i lmes mais perspicazes e sombrios já feitos sobre o show
huslness, o drama de 1950 de Joseph L. Manklewicz, baseado cm "The W isdom of Eve" ,
um conto de 1946 publicado na revista Cosmopo/iton, t ambém foi adaptado para o
rádio. Evi tado durante quatro anos por outros estúdios, a combinação do roteiro cínico
e espirituoso de Mankiewicz com um elenco de alto calibre transformou a história em
um enorme sucesso cinematográf ico. Recebendo 14 Indicações ao Oscar, um recorde
para a época, A malvada ganhou seis estatuetas. Incluindo as de Melhor Filme e Melhor
Ator Coadjuvante (George Sanders), assim como as de Melhor Direção c Melhor Roteiro
para Manklewicz. Bet te Davis, Anne Baxter, Celeste Holm e Thclma Ritter foram indica
das, tornando-o o recordista de indicações femininas.
O f i lme começa com um plano fechado do prêmio a ser recebido pela jovem atriz
Eve Harrington (Anne Baxter). A câmera então recua, revelando um salão repleto de
convidados. Em seguida, Addison DeWIt t (Sanders) começa uma narração que volta no
tempo para revelar a verdadeira história de como aquele sucesso foi conquistado. Bette
Davis é Margo Channing, uma envelhecida atriz da Broadway de 40 anos que se torna
amiga de Eve, uma jovem fã atormentada por uma vida dura. Birdle (Ritter), a camareira
de Margo, é a primeira a desconfiar da história triste de Eve, falando: " Q u e história! Só
fa l tam os cães de caça mordendo-a no traseiro." Eve retribuí a conf iança da atriz
infi ltrando se na sua vida profissional e pessoal através de uma série de ment iras. Em
seguida, Eve engana a melhor amiga de Margot (Holm), seduz seu crítico leal, porém
distante (Sanders), e fracassa em sua tentativa de roubar o noivo dela (Gary Merri l l ,
marido de Davis na vida real). Em uma ponta breve, porém deslumbrante, Mari lyn
Monroe aparece nos braços de DeWi t t na festa de Margo, em que ela diz a famosa frase:
"Apertem os cintos, vai ser uma noite turbulenta."
Tendo também ganhado um Oscar em 1949 por Quem é o infiel?, há quem considere
o sucesso de Mankiewicz com A malvada a prova definit iva de seu talento se com
parado ao seu irmão Herman, que ganhou o prêmio de Melhor Roteiro Original por
Cidadão Kane. Independentemente dessa discussão, A malvada é amp lamente consi
derado a maior conquista da longa carreira
de Davis; o único senão do f i lme é Baxter,
que não parece ser nada mais que pura
ambição na forma de mulher. KK
E U A (Fox) 138 min. P8tB
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Joseph L. Manklewicz
P r o d u ç ã o : Darryl F. Zanuck
R o t e i r o : Joseph L. Manklewicz,
baseado no conto "The Wisdom of
Eve" , de Mary Orr
F o t o g r a f i a : Mi l ton R. Krasner
M ú s i c a : Alfred Newman
E l e n c o : Bette Davis, Anne Baxter,
George Sanders, Celeste Holm. Gary
Merrill, Hugh Marlowe, Gregory
Ratoff, Barbara Bates, Marilyn
Monroe, Thelma Ritter, Walter
Hampden, Randy Stuart, Cralg Hill,
Leland Harris, Barbara Whi te
O s c a r : Darryl F. Zanuck (mclhoi
fi lme), Joseph L. Mankiewicz (diretor),
Joseph L. Mankiewicz (roteiro),
George Sanders (ator coadjuvante),
Edith Head, Charles Le Malre
(figurino), Thomas T. Moul lon (j I
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Anne Baxter,
Bette Davis (atriz), Celeste Holm,
Thelma Ritter (atriz coadjuvante),
Lyle R. Wheeler, George W. Davis,
Thomas Little, Walter M. Scott
(direção de arte), Milton R. Krasnei
(fotografia), Barbara McLean (edli 10), Alfred Newman (música)
F e s t i v a l d e C a n n e s : Joseph L .
Mankiewicz (prêmio especial do (ml).
Bette Davis (atriz)
I UA (Paramount) no min. P&B
Idioma: inglês
D i r e ç ã o : Billy Wilder
Producto: Charles Bracken
ROtllro: Charles Brackett, Billy
Wilder, n. M. Marshman Jr., baseado
un i un i o "A Can of Beans", de Charles
lit.u ken e Billy Wilder
I o t o g r a f i a : John F. Seitz
M ú s i c a : Jay Livingston, Franz Waxman
I I r n c o : Wil l iam Holden, Gloria
' .w .nr .mi , Erich von Stroheim, Nancy
i I I I Fred Clark, Lloyd G o u g h j a c k
Webb, I ranklyn Farnum, Larry J.
Ill.ikr, Charles Dayton, Cecil B.
DtMllle, Hedda Hopper, Buster
II , Anna Q. Nilsson, H. B. Warner
Oicar: Charles Brackett, Billy Wilder,
D M Marshman Jr. (roteiro), Hans
i iriler, lohn Meehan, Sam Comer, Ray
M " V ' i (,ln,'(..i» de arte), Franz
Waxman (música)
Indli -li a o a o O s c a r : Charles Brackett
( i i i i l l i i i i filme), Billy Wilder (diretor),
W i l l i . m i Holden (ator), Gloria
IWIniOn (atriz), Erich von Stroheim
(.um i oadjuvante), Nancy Olson
(.ii i l /1 u.uljiivante), John F . Seitz
(fotografia), Doane Harrison, Arthur
I' '.i i n n , I ; (edição)
CREPÚSCULO DOS DEUSES ( isso)
(SUNSET BOULEVARD) Joe Gill (Wi l l iam Holden), um rotelr is fa desempregado, f lu tuando morto em um
piscina, reconta a história do seu relacionamento pessoal e profissional malfadado com
a megalomaníaca diva do cinema mudo Norma Desmond (Gloria Swanson) . Uma me
lindrosa c inqüentona, cuja tentat iva de permanecer jovem a faz parecer ter mil anos,
Norma vive em uma mansão decadente no Sunset Boulevard, realizando um funeral á
meia-noi te para seu macaco de est imação ("Ele deve ter sido um chimpanzé muito
importante", reflete Joe) , rascunhando um roteiro impossível de se produzir e sonhando
com um recomeço inviável ("Odeio essa palavra! Este será um retorno!") como Salomé.
De prontidão, há um mordomo sinistro (Erich von Stroheim), que havia sido seu
diretor favorito e que foi, a propósito, seu primeiro marido.
Geralmente um cineasta avesso a visuais ostentosos, Wilder é Incentivado por esse
cenário a criar composições que trazem à mente o covil do Fantasma da Ópera ou a man
são Xanadu, de Kane, como o enorme dose nas mãos de luvas brancas tocando um órgão
sibilante enquanto o gigolô aprisionado aproxima-se agitado ao fundo. O passeio ácido,
porém nostálgico, de Wilder por essa casa mal-assombrada da indústria cinematográfica
é um fi lme que pode ser revisto Incontáveis vezes, mesmo depois de sua Influência ter se
Infiltrado no gênero terror (O que terá acontecido a Babyjane?, de Robert Aldrich) e gerado
uma adaptação para o teatro de Andrew Lloyd Webber. Ele combina um estranho carinho
pela decadente Norma e pelo fracassado Joe com o uso um tanto sádico de rostos devas
tados e enrijecidos do cinema mudo como Buster Keaton, H. B. Warner e Anna Q. Nilsson.
U m a das discretas ironias de Crespúscuío dos deuses é que, embora Norma não
consiga se safar da sua loucura ( "Ninguém dá as costas para uma estrela!"), a indústria
permite que todas as outras pessoas a jam como monstros: Cecil B. DeMil le (interpre
tando a si mesmo) lembra gent i lmente a Norma que o ramo do c inema mudou, porém
Wilder conclui essa cena apontando a câmera para suas botas de equi tação lustrosas e
i in . i
seu andar pomposo de estrela absurdamente ant iquado. Embora tenham reconhecido
suas chances de um últ imo momento de glória, Swanson (que aceitou o papel depois
de Mary Plckford tê-lo recusado) e von Stroheim (que é forçado a assistir a um trecho de
Queen Kelly, um desastre não concluído de 1920 no qual dirigiu Swanson) compreende
ram a crueldade da visão de Wilder e a maneira como ele os transformava todos em
monstros. Trata-se de um f i lme duro e cínico, em conflito com seu mal fadado, porém
terno, caso de amor "norma l " : no f im. Norma está tão aterrorizada pelo fato de Joe
estar escrevendo um roteiro [História de amor sem-título) com a assistente de produção
Nancy Olson quanto pela possibil idade de ele a abandonar pela rival mais jovem.
Swanson ("Eu sou grande. Os f i lmes é que f icaram pequenos.") está v ibrante em sua
loucura, que at inge o clímax em um momento de Inesquecível horror-glamour, à
medida que ela se aproxima de forma sedutora de um cinegrafista de cincjornal
durante sua prisão por assassinato e declara que está pronta para seu d o s e . Ao mesmo
tempo, Wi lder recua a câmera para enquadrá-la em um plano aberto que enfatiza sua
solidão e insanidade, enquanto o grande espetáculo em torno de um assassinato
envolvendo celebridades começa. Este fi lme indica o caminho para A montanha dos sete
abutres (1951), de Wilder, ao mostrar t ambém uma cultura de exploração de crimes pela
mídia que permanece terr ivelmente viva mais de meio século depois. KN
M e x i c o (Ultramar) 85 min. P8tB
I d i o m a : espanhol
D i r e ç ã o : Luis Bunuel
P r o d u ç ã o : Oscar Danclgers, Sergio
Kogan, Jaime A. Menasce
R o t e i r o : Luis Alcorlza, Luis Bunuel
l o t o g r a f i a : Gabriel Figueroa
M u s i c a : Rodolfo Halffter, Gustavo
I'n 1 .iluj',.1
•Itnco: Alfonso Mejia, Estela Inda,
Miguel Inclán, Roberto Cobo, Alma
1 ' ' l i . 1 1 uentes, Francisco Jambrina,
losus Navarro, Efrain Arauz, Sergio
Villarreal, Jorge Perez, Javier
Anuvcua, Mário Ramirez
r r s t i v a l d e C a n n e s : Luis Bunuel
(melhor diretor)
OS ESQUECIDOS (1950)
(LOS OLVIDADOS) Embora Os esquecidos faça uso de várias convenções dos f i lmes sobre questões sociais,
ele vai mul to a lém delas. Passado na periferia da Cidade do México, a pungente obra
prima de Buñuel se concentra em dois garotos desafortunados: Pedro (Alfonso Mejia),
que se esforça para ser bom, e o mais velho e Incorrigível Jaibo (Roberto Cobo), que
surge a todo momento como um irmão demoníaco para desencaminhar Pedro. Um dos
críticos do neo-realismo ital iano, Buñuel exigia que o conceito de realismo fosse expan
dido para incluir e lementos essenciais, como o sonho, a poesia e a irracionalidade - re
presentados pelo pesadelo de Pedro, no qual um emaranhado de culpa e desejos é
desl indado na imagem sensacional de uma peça de carne crua oferecida pela mãe do
garoto faminto, e pela visão que se apresenta a um Jaibo agonizante, na qual o anjo da
morte surge como um cão sarnento que o conduz por uma estrada longa e sombria.
Dentre as outras a lmas perdidas da cidade dos condenados de Buñuel estão o re
pulsivo mendigo cego Carmelo (Miguel Inclán); o menino de rua Ojitos (Mário Ramirez),
explorado por Carmelo: a ninfeta Meche (Alma Della Fuentes), cujas coxas nuas são ba
nhadas em leite e uma das mul tas Imagens provocativas do f i lme; e o vir tuoso Jul ián
(Javier Amézcua), rapidamente assassinado por Jaibo. Pegando emprestado o bordão de
Nos/iW/le, pode-se dizer que o ú l t imo personagem essencial é você, espectador
hipócrita. Um fator crucial que torna Os esquecidos superior a outros f i lmes sobre ques
tões sociais é a maneira como ele provoca agressivamente a platéia - de forma mais
assombrosa quando Pedro, revoltado em um reformatorio, joga um ovo na camera.
De maneira menos espetacular, porém ainda chocante. Os esquecidos desencoraja o
espectador a assumir a postura de sensibilidade nobre geralmente cultivada pelos fi lmes
de mensagem liberal. Para começar, o tom é cáustico demais, distanciado e contraditório
- como quando o espetáculo patético do l inchamento do cego Carmelo pela gangue de
Jaibo é acobertado por um plano sarcástico de uma galinha. Além disso, Buñuel evita
pr imorosamente um verdadeiro catálogo de subterfúgios de f i lmes-mensagem, entre
eles o uso de arquétipos para conduzir nossos sent imentos e a concentração em casos
específicos para atenuar o problema mais amplo. Os esquecidos foi crit icado por sua
insensibil idade e falta de soluções construt ivas, porém Buñuel é um artista, não um
legislador, e talvez seja difícil reconhecer a compaixão deste f i lme extraordinariamente
honesto apenas por ela não estar amenizada pelo sent imental ismo. MR
NO SILENCIO DA NOITE (1950)
(IN A LONELY PLACE) No silêncio da i ioítcpode ser chamado de obra prima sob vários aspectos: como o melhor
filme do diretor cult Nlcholas Ray; como um drama nolr s ingularmente romântico
e Infeliz; como vitr ine para as melhores atuações das carreiras de Humphrey Bogart e
Gloria Grahame; e como um dos mais perspicazes filmes sobre Hol lywood já produzidos.
Dix Steele (Bogart) , um roteirista de pavio curto, é suspeito de um assassinato es
pecialmente cruel, porém sua vizinha de porta. Laurel Gray (Grahame), pode lhe servir
de álibi. Isso leva a dupla a um caso passional que é minado quando Laurel se apavora
com as tendências violentas de Dix e começa a se perguntar se ele não teria comet ido
de fato o assassinato. Depois de anos Interpretando sujeitos durões, porém românt i
cos, aqui Bogart mergulha mais fundo na sua própria persona, revelando um viés neu
rótico que poderia ter feito de S a m Spade ou Rick Blalne personagens instáveis e
absolutamente assustadores nas seqüências em que Dlx explode, apl icando surras em
quem merece e cm que não merece.
O tema depressivo do f i lme é retratado de forma empolgante pelo visual sombrio de
Ray e por uma qualidade poética quase surrealista. O bom romance de Dorothy B.
Hughes é adaptado de maneira interessante: no livro, descobre-se que Steele é mesmo o
assassino, porém o f i lme é ainda mais desolador, uma vez que, no f im das contas, o que
importa não é o fato de ele ser Inocente, e sim que ele poderia faci lmente não ser. KN
E U A (Columbia, Santana) 94 min.
P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Nlcholas Ray
P r o d u ç ã o : Henry S. Kesler, Robert
Lord
R o t e i r o : Dorothy B. Hughes, Edmund
H. North, Andrew Scott, baseado no
romance de Dorothy B. Hughes
F o t o g r a f i a : Burnett Guffey
M ú s i c a : George Anthell
E l e n c o : Humphrey Bogart, Gloria
Grahame, Frank Lovejoy, Carl Benlon
Reid, Art Smi th, Jeff Donnell. Martha
Stewart, Robert Warwick, Morris
Ankrum, Wil l iam Ching, Steven
Geray, Hadda Brooks
A MONTANHA DOS SETE ABUTRES (1951)
(THE BIG CARNIVAL) A montanha dos sete abutres é lembrado por dois mot ivos: é a única parceria de Klrk
Douglas com Billy Wi ldcr c é um dos f i lmes mais raivosos e amargos já saídos de algum
estúdio de Hol lywood.
Douglas interpreta Chuck Tatum, um repórter cínico e arrogante que vai parar em
um jornal numa cidadezinha do Novo México depois de ser despedido de vários jornais
na cidade grande. Quando cobre a história de um minerador (Richard Bcnedict) preso
em uma caverna por causa de um desl izamento, ele vê a chance de dar a volta por cima.
Instiga o xerife a atrasar as equipes de resgate com a promessa de atrair turistas e
curiosos para fazerem parte de uma comovente matéria de cunho humano. Tatum
Incita o frenesi midlát ico, assume o papel de repórter solitário com um furo nas mãos
e transforma o acontec imento em um espetáculo. Até mesmo a desafortunada esposa
do minerador (Jan Sterl lng) - o paradigma da mulher egoísta e material ista - não
escapa ao alcance de Tatum, provando-se uma rival à altura na sua busca desonesta por
vantagens pessoais. E tudo termina como se pode esperar, ou seja, mul to, multo mal .
A raiva permanece no ar muito tempo depois do f im do f i lme e a mordacidade
verbal que é a marca registrada de Wllder mal consegue adocicar o núcleo amargo da
história, que nos acusa a todos. Pungente e austero. AT
E U A (Paramount) i n min. P&B
I d i o m a : inglês / latim
D i r e ç ã o : Bllly Wllder
P r o d u ç ã o : Wil l iam Schorr, Bllly W l l d l
R o t e i r o : Walter Newman, Lesser
Samuels, Billy Wilder
F o t o g r a f i a : Charles Lang
M ú s i c a : Hugo Frledhofer
E l e n c o : Kirk Douglas, Jan Sterling)
Robert Arthur, Porter Hall, Frank
Cady, Richard Benedict, Ray leal.
Frank Jacquet
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Bllly Wiklc i .
Lesser Samuels, Walter Newman
(roteiro)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Bllly Wllder
(prêmio Internacional), Indicação
(Leão de Ouro)
E U A (charles K. Feldman, Warner
Bros.) 122 min. P & B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Elia Kazan
P r o d u ç ã o : Charles K. Feldman
H o t e l r o : Tennessee Wi l l iams, Oscar
liul, baseado na peça de Tennessee
Wil l iams
I l i t o g r a f i a : Harry Stradllng Sr.
M u s i c . 1 : Alex North
I l e n c o : Vivien Leigh, Marlon Brando,
Kim I lunter, Karl Maiden, Rudy Bond,
Nl< k Dennis, Peg Hillias, Wright King,
Uli haul Garrlck, Ann Dere, Edna
Ihom.is, Mickey Kuhn
O i c a r : Vivien Leigh (atriz), Karl
Maiden (ator coadjuvante), Kim
Hunter (atriz coadjuvante), Richard
11. IV . i lemge James Hopkins (direção
d e ,iile)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Charles K.
leldin.in (melhor f i lme), Elia Kazan
( i l i i e i o t ) . lennessee Wil l iams
1 • n o ) . Marlon Brando (ator), Harry
11 e l l in} ' , Sr. (fotografia), Luanda
li.ill.ml (figurino), Alex North
(uiuslt a). Nathan Levlnson (som)
UMA RUA CHAMADA PECADO (1951)
(A STREETCAR IMAMED DESIRE) "Sempre dependi da bondade de estranhos." Embora a peça deTennessee Wil l iams manti
vesse o foco exclusivamente no heroísmo desesperado e poético de Blanche DuBois, o
magnet ismo grosseiro e animal de Marlon Brando, em contraste com a bel/e frágil e
lânguida de Vivien Lclgh, domina a tela. Da mesma forma que havia eletrizado platéias nos
palcos da Broadway em detrimento da Blanche de Jéssica Tandy, quatro anos antes (numa
produção também dirigida por Elia Kazan). Até hoje, o naturalismo taciturno de Brando,
sua sexualidade mundana e seus gritos de "Stcl laaaaa!" tornam quase impossível o
trabalho dos atores que se aventuram no papel do bruto Stanley Kowalskl depois dele.
I ronicamente, a versão de Kazan para o cinema - t ambém roteirizada por Wi l l iams,
m a s submet ida à censura por alguns conteúdos impróprios - ganhou três das quatro
estatuetas do Oscar de atuação às quais concorreu, Incluindo a de Leigh, que também
havia interpretado Blanche na produção do estúdio londrino Wes t End, dirigida por seu
marido, sir Laurence Ollvier. Kim Hunter e Karl Malden também ganharam os prêmios
de atriz e ator coadjuvantes, porém Brando foi derrotado por Humphrey Bogart (por
Uma aventura na África). Não obstante, o impacto de Brando em Uma rua chamada
pecado o colocou na vanguarda dos atores de cinema modernos, tornando-o o mais
famoso e inf luente expoente do "mé todo" do Actors Studlo.
Tendo perdido para o fisco a propriedade da sua família há muito decadente, e sua
reputação ao buscar esquecimento e consolo, Blanche chega a Nova Orleans para
morar com Stel la, sua irmã mais nova, e seu rude cunhado Stanley no apar tamento
apertado e abafado dos dois. Stanley - convencido de que Blanche está escondendo
uma herança imaginária - é enlouquecido pela mulher neurót ica, que se agarra de
forma patética a seu ref inamento e aos seus devaneios. Sob as ameaças rancorosas de
Stanley, as úl t imas esperanças de Blanche são brutalmente destruídas e ela se refugia
em um estado psicótico.
Embora seja o sét imo longa-metragem de Kazan, Uma rua chamada pecado é mais
teatral do que cinematográf ico. Seu poder provém das atuações, especia lmente do
cat ivante duelo entre a teatral Leigh, com seu estilo ferino, etéreo e clássico (que
poderia ser chamado de determinado), e o explosivo e instintivo Brando, que são tão
dist intos em seus métodos de atuação quanto Blanche e Stanley o são em suas per
sonal idades. Kazan, que foi co-fundador do Actors Studio em 1947 e ainda era um nome
de peso no teatro amer icano da época, mostrava pouco Interesse nas possibil idades
visuais da mídia, mas seu traquejo com atores fica multo claro aqui . AE
PACTO SINISTRO (1951)
(STRANGERS ON A TRAIN) Não é nenhuma surpresa que Alfred Hltchcock tenha se Interessado pelo livro Pacto
sinistro, de Patricla H lghsml th . O primeiro romance da autora possui e lementos
encontrados em prat icamente todos os f i lmes de Hltchcock: uma fascinação por assas
sinato, mal-entendidos e desejos homossexuais não exatamente reprimidos. Desneces
sário dizer que o diretor não tardou a comprar os direitos do livro e pôr mãos à obra.
Contando com um grande roteiro de Raymond Chandler - com retoques de Ben Hecht,
entre outros -, o f i lme se tornou um dos mais bem-succdidos do diretor.
Pacto sinistro começa inocentemente. Guy Haincs (Farley Granger), um tenista de
sucesso, l i teralmente dá de cara em um trem com Bruno Anthony (Robert Walker) , um
estranho excêntrico c excltável. Ambos têm em sua vida uma pessoa da qual gostar iam
de se livrar. Guy quer tirar do mapa sua esposa e Bruno quer fazer o mesmo com o pai
dominador, de modo que este úl t imo bola o assassinato "perfei to" para resolver os
problemas dos dois homens: eles s implesmente t rocam de ví t ima. Guy rejeita a idéia,
mas logo Bruno o chantageia para que ele cumpra sua parte do acordo.
Quase uma comédia de humor negro, Pacto sinistro t ambém funciona como um
bizarro ritual de acasa lamento , no qual Granger faz o papel do homem cert inho e
Walker o de louco extravagante. Como sempre, Hitchcock se diverte explorando os
apuros do seu protagonista. Os diálogos ganham brilho à medida que Walker fecha o
cerco em volta de Granger, o que leva ao que pode ser considerada a partida de tênis
mais repleta de suspenso da história do c inema. Porém, em se tratando de Hltchcock, o
desfecho emocionante se dá em um carrossel, com Granger e Walker lutando enquanto
o brinquedo fora de controle gira cada vez mais rápido.
É um final destoante para o que é em
grande par te um f i lme In t rospect ivo
sobre loucura, chan tagem c culpa, porém
Hltchcock o executa de fo rma br i lhante .
À medida que o charme caricato de Walker
leva a impulsos mais abertamente homici
das, ele cresce como vilão e só pode ser
morto de uma maneira que faça jus a sua
personalidade exuberante. Na verdade,
Walker (em seu úl t imo papel) domina o
f i lme. Ele é o ego desencadeado, o espalha
fatoso outro lado da moeda da loucura mais
reprimida que Hitchcock também exploraria
nove anos mais tarde em Psicose. JKI
E U A (Warner Bros.) íoi min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Alfred Hitchcock
P r o d u ç ã o : Alfred Hitchcock
R o t e i r o : Raymond Chandler,
Whitf ield Cook, Czenzi Ormonde,
baseado no livro de Patrícia
Hlghsmith
F o t o g r a f i a : Robert Burks
M ú s i c a : Dimitri Tiomkln
E l e n c o : Farley Granger, Ruth Uniu
Robert Walker, Leo G. Carroll
Hitchcock, Kasey Rogers, Marlon
Lome, Jonathan Hale, Howard St.
John, John Brown, Norma Varden.
Robert Gist
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Robei I I'm I
(fotografia)
Inglaterra (Ealing, Rank) 78 min. P8<B
Idloma: ingles
D l r e c S o : Charles Crichton
FTOduclo: Michael Balcon, Michael
human
Rottlro: i.e. b.Clarke
l o t o g r a f i a : Douglas Slocombe
M i i m c . 1 : i ,corge Auric
1 k m n : A ln Guinness, Stanley
I Inllow.iy, sld James, Alfle Bass,
Mirjorle Fielding, Edie Mart in, John
•..ilrw, Kim. i ld Adam, Arthur
M.imhllng, Glbb McLaughl in, John
1 ir tgjon, ( live Morton, Sydney Tafler,
M.ir 11* Burke, Audrey Hepburn
' III 11 11 B. Clarke (roteiro)
Indll " .10 a o O s c a r : Alec Guinness
(.inn)
0 MISTÉRIO DA TORRE (1951)
(THE LAVENDER HILL MOB) Jun tamen te com O quinteto da morte, de 1955, que também é uma comédia de ladrões,
O mistério da torre é a mais engraçada das célebres comédias dos estúdios Eallng pro
duzldas por slr Michael Balcon e internacionalmente adoradas por seu humor inglês
irreverente. Irônico e inimitável. O Inigualável Alec Guinness Interpreta o insignif icante
caixa de banco quatro-olhos que planeja f inanciar uma aposentadoria de luxo como
recompensa por uma carreira que considera sem valor. Ele bola um roubo ousado de
barras de ouro com o produtor de souvenlrs Stanley Hol loway e os trapalhões crimi
nosos profissionais Sid James e Alfle Bass neste roteiro vencedor do Oscar do ex-policial
T. E. B. "Tibby" Clarke.
O f i lme é uma aula de como elaborar um roteiro repleto de armações e Incidentes,
apresentado de forma admirável pela direção empolgante de Charles Cr ichton,
especia lmente durante a confusão na Torre Eiffel (Guinness e Hol loway descendo às
pressas as escadas em espiral, perseguindo em vão as colegiais Inglesas que compra
ram inocentemente modelos em ouro maciço do ponto turístico parisiense, trocados
por engano) e o clímax alucinante de perseguição (no qual, em determinado momento ,
um policial galês cantante pega carona no estribo do carro da horrorizada dupla de
fugit ivos). Não perca a jovem Audrey Hepburn na cena de abertura no Rio, na qual um
Guinness generoso e simpático conta sua história para um grupo de pessoas Inte
ressadas. AE
l M | . l . i t < t i . i ( I i n i k a y . Romulus) 122 min.
I n h i m u lo l
i ' l 1.1: ingles / espanhol
l i l i r ç . l o : A l l i n I I ewin
Produçlo: loseph Kaufman, Albert
I r w i n
R n t r l r o : All ien Lewin
r . i . i l i . i : in I Cardiff
M i r . l i . i : Alan Rawsthorne
11, in c . 1 m u " . Mason, Ava Gardner,
i i ' i ' I I'.iirick, Sheila S i m , Harold
w . i i i r i i i l r i . Mario Cabré, Marius
1 • l " l m 1 .iiirie, Pamela Mason,
1 1 . 1 1 ' . u n e . Margarita D'Alvarez,
111 ' l l l in . i . Abraham Sofaer, Francisco
in i l , 1 iiilllcrmo Beltran
OS AMORES DE PANDORA (1951)
(PANDORA AND THE FLYING DUTCHMAN) Embora já tenha sido desprezada como pretensiosa e absurda, a reputação desta fanta
sia romântica mágica melhorou gradualmente com o passar dos anos. Ambientado no
começo da década de 30 em uma cidade chamada Esperanza na "costa me-diterrânea
da Espanha", onde exilados ricos e ociosos se misturam com pescadores locais. Os amo
res de Pandora começa com a descoberta de dois corpos afogados com as mãos
entrelaçadas. Em f lashback. Pandora Reynolds (Ava Gardncr), uma cantora americana
especializada em levar homens à loucura e â morte, encontra seu par Ideal em Hendrlck
Van Der Zee (James Mason) , capi tão e única tr ipulação de um luxuoso iate que é, na
verdade, o Holandês Voador, condenado a navegar pelos mares até encontrar uma m u
lher disposta a morrer por ele.
O produtor, diretor e roteirista Albert Lewin, um dos poucos intelectuais de Holly
wood , era um homem de ostentosa erudição literária (seus f i lmes são repletos de cita
ções de poesias, a ponto de Pandora fazer um comentár io improvisado sobre como
tudo o que as pessoas dizem parece uma citação) e romant ismo fantást ico (todos os
seus f i lmes são sobre amores Impossíveis que gozam de momentos de perfeição entre
maldições). Com sua fotografia em Technicolor de tons escuros, porém arrebatadores, a
cargo de Jack Cardiff, o f i lme é u m tributo à beleza de Ava Gardner, com referências ã
intensidade taciturna de James Mason . KN
UMA AVENTURA NA AFRICA (1951)
(THE AFRICAN QUEEN) O clássico de 1951 de John Huston é uma das aventuras mais impressionantes,
divert idas e cat ivantes de Hol lywood. Baseado no romance homôn imo de 1935 de C. S.
Forester, Uma aventura na África narra o improvável caso amoroso de Charl le Allnut
(Humphrey Bogart) , capitão de um barco mercante a vapor, e Rose Sayer (Katharlne
Hepburn), uma missionária puritana solteirona. Rose prat icamente não suporta Charlle,
mas o destino os une. Quando se vê em meio à violência da Primeira Guerra Mundia l
Iminente, Rose precisa escapar rio abaixo no velho rebocador de navios de Charl le. No
entanto, um navio de guerra a lemão bloqueia a rota de saída c Rose põe em prática seu
plano de encher o carregamento de Charlle de material explosivo para deter os a lemães
e os dois conseguirem fugir.
A história de aventura, no entanto, fica em segundo plano diante do relacionamen
to difícil entre Charlie e Rose e, apesar do conteúdo aber tamente político do enredo de
guerra, a alegoria mais interessante de Uma aventura na África c representada pela his
tória de amor dos dois. Rose, uma solteirona inglesa certinha e reprimida, é seduzida
pela mascul in idade desalinhada e beberrona de Charl ie. Embora se passe em 1914, a
mensagem implícita da emergência dos Estados Unidos como principal potência
internacional após a Segunda Guerra, à medida que os poderes coloniais tradicionais se
enfraqueciam, é inequívoca.
Hepburn e Bogart estão divert idíssimos como protagonistas. Ambos estrelas
veteranas e grisalhas usando ao máx imo trejeitos e cacoetes que eram marcas
registradas, eles dão ao f i lme um clima leve e cômico que não atenua a ação. A química
entre os dois é perfeita e a passagem das con
dições d iametra lmente opostas de camaradas
para amantes se dá de forma tranqüila e con
vincente, embora sejam mais divertidos quan
do estão voando um na garganta do outro. A
fotografia colorida e as verdadeiramente sur
preendentes tomadas em locação da floresta
aumen tam o enorme charme de Uma aventura
na África. Bogart ganhou seu único Oscar por
sua atuação no f i lme e Huston também foi
indicado (direção e roteiro), j un tamente com
Hepburn e o roteirista James Agee. As resenhas
e subseqüentes elogios que o f i lme recebeu
não são capazes de capturar sua mágica. Mes
mo tendo-o assistido várias vezes, ele sempre
me deixa com um sorriso no rosto e de bom
humor, e, em meio aos vários f i lmes maravi
lhosos resenhados neste livro, é verdadeira
mente imperdível. RH
I n g l a t e r r a (Horizon, Romulus)
105 min. Technicolor
I d i o m a : inglês / alemão / suaíli
D i r e ç ã o : John Huston
R o t e i r o : James Agee, John Huston,
baseado no romance de C. S. Forestfll
E l e n c o : Humphrey Bogart, Katharine
Hepburn, Robert Morley, Peter Bull,
Theodore Blkel, Walter Gotell, I ' r in
Swanwick, Richard Marner
O s c a r : Humphrey Bogart (atoi)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : John Huston
(diretor), James Agee, John Huston
(roteiro), Katharine Hepburn (.un/)
. •1 ,1
tança (UGC) i i o min. P&B
I d l o m a : francês
D l r e ç â o : Robert Bresson
R o t c l r o : Robert Bresson, baseado no
llvio de Georges Bernanos
in. . i c i : Léon Carré, Robert
\ I I V , I V I ( I ,
l n t o g r . i f i a : Léonce-Henri Burel
MÛlll a: jV.~in-Jacqu.es Griinenwald
I Itnco: t laude Laydu, Léon Arvel,
Antoine Ualpêtré, Jean Danet, Jeanne
I I levant, André Guibert, Bernard
nubienne, Nicole Ladmiral, Mart ine
l ' i n . m e , Nicole Maurey, Louise
(Mme Louise) Martial Morange.Jean
Ktvryrc, Gaston Séverin, Gilberte
I r ibols, Marie-Monique Arkell
Nftlvil d e V e n e z a : Robert Bresson
(ptPmlo internacional), (prêmio da
-1 ii i i .1 italiana), (prêmio OCIC),
i i n l i i H , . i i ) ( icào de Ouro)
DIÁRIO DEUM PADRE (195D (JOURNAL DUN CURÉ DE CAMPAGNE)
Um dos maiores art istas do c inema estava em busca de Inspiração e a encontrou no
livro Diário de um pároco de aldeia. Com imaginação, coragem e rigor, Robert Bresson
descobriu que para se fazer c inema não eram necessários orçamentos polpudos, estre
las ou efeitos especiais. O cinema poderia contar qualquer história, provocar qualquer
emoção, se abrir a todos os temas materiais e imateriais, privados e públicos através do
uso mais e lementar de sua verdadeira natureza.
O romance de Georges Bcrnanos conta a história de um jovem padre que vive no
interior, tendo que lidar com as dif iculdades do dia-a-dla e o quest ionamento dos seus
atos e da sua fé. Bernanos se recusa a dar trégua tanto aos crentes quanto aos ateus,
abrindo abismos no mundo concreto. A adaptação de Bresson do livro é um êxito hu
milde que revela os alicerces da mensagem cristã. Uma mensagem que diz que o
cinema foi feito para traduzir a palavra em imagem e som, transformando-a em carne.
O c inema é a consumação do Mistério da Encarnação. O f i lme de Bresson demons
tra que tudo pode se tornar possível: brincar com a morte, escrever na tela, jogar com o
desejo, observar os Insights da psique, gerar fascinação pela vida na França rural da
metade do século XX e confrontar questões religiosas. J -MF
I U A (M( ,M) 113 min. Technicolor
Idioma: Inglês / francês
D l r c ç i l o : Vincente Minnelli
•fOduÇlo: Roger Edens, Arthur Freed
k i i i r i r n : Al.in Jay Lerner
I o t o g r a f i a : John Alton, Alfred Gilks
M u i l c . i : Saul Chaplin
I I n n o : ' ,1 in Kelly, Jerry Mull igan,
II in 1 rise Bouvier, Oscar
1 ev.i i i l , Adam Cook, Georges Guétary,
11 I', illlel, Nina Foch, Milo Roberts
OlCII Arthur Freed (melhor fi lme),
AI HI I iv 11 1 (roteiro), Cedric
Gllilxins, I. Preston Ames, Edwin B.
Wille. I Keogh Gleason (direção de
.nie), All ied Gilks, John Alton
(fnliiK.i.ifla), Orry-Kelly, Walter
i i i inl ei t . Irene Sharaff (figurino),
1 - -111 • 11 Gieen, Saul Chaplin (música)
n u l l « ,i(,.\o a o O s c a r : Vincente Minnelli
(dlieli i i), Adrlenne Fazan (edição)
SINFONIA DE PARIS (1951)
(AN AMERICAN IN PARIS)
Sinfonia de Paris conquistou seis estatuetas do Oscar - incluindo a de Melhor Filme
(derrotando os supostos favoritos Uma rua chamada pecado e Um lugar ao sol) -, além
de uma menção honrosa ao coreógrafo-astro Gene Kelly e o prêmio Thalberg Memoria l
para o produtor da M G M Arthur Frecd. O alegre musical de Vincente Minnel l i foi escrito
di retamente para as telas, concebido por Freed como um veículo para Kelly e construído
em torno de a lgumas das canções mais populares de George Gershwin ("I Got Rhythm",
" ' S Wondcr fu l " ) .
Kelly, um artista pobretão, traz um pouco de exuberância para a asséptica região de
Montmar t re , dança com cr ianças, se apaixona pela musa travessa Leslle Caron e a
disputa com o cantor francês de fala mansa Georges Guétary. Enquanto isso, a mecenas
Nina Foch ferve de raiva. Isso tudo é observado com indiferença pelo pianista e In
térprete de Gershwin Oscar Levant, no papel do amigo compositor. Parodiando a ten
dência dos americanos da Geração Perdida de mergulhar em um pouco de cultura
francesa, Minnel l i enche o f i lme de vi ta l idade, romance e uma apoteose de cores. O
sensacional e inovador auge é o balé original de Kelly ao som da canção-t í tu lo, en
cenado através de cenários ao esti lo dos art istas franceses, notadamente Toulouse
Lautrec, e "Our Love Is Here To Stay," o número de dança às margens do rio Sena do
casal a legremente romântico Kel ly-Caron. AE
UM LUGAR AO S0L(1951)
(A PLACE IN THE SUN) Ao adaptar Uma tragédia americana, de Theodore Dreiser, para as telas, o diretor George
Stevens se deparou com a dif iculdade de tornar a história cruelmente natural ista de lu
ta de classes algo Interessante para uma platéia da década de 50, mais ávida por entre
tenimento do que por doutr inação política. Sua solução foi de uma eficácia bri lhante:
dar destaque ao desejo sexual de George Eastman (Montgomery Clift) pela bela Angela
Vlckers (Elizabeth Taylor). Parente pobre de um industrial rico, George é enviado a ele
pela mãe para vencer na vida. No entanto, dominado por sent imentos de privação e
exclusão, George não demonstra disposição ou iniciativa para sair da sarjeta através do
trabalho. Na verdade, ele é tão fraco que, mal começa a trabalhar na fábrica, viola uma
de suas regras fundamenta is . Ao sair com uma colega, acaba engravidando a pobre
mulher, pela qual logo perde o Interesse.
Interpretado com uma Ingenuidade patética por Clift, os maiores bens de George
passam a ser sua beleza e doci l idade. Ass im, Um (rigor ao sol se tornou um dos roman
ces mais comoventes e trágicos da Hol lywood clássica, resultado da maneira cuidadosa
como George Stevens dirigiu os protagonistas (que foram Instruídos a enfatizar a
l inguagem corporal, e não o diálogo) e de sua manipulação habilidosa de dois estilos
contrastantes. O encontro de conto de fadas de George com a Inocente Angela é domi
nado por um trabalho de câmera Int imista, com doses sobrepostos de forma especial
mente cuidadosa em uma fotografia borrada. As cenas na fábrica, com a namorada
Alice (Shelley Wintcrs) , e posteriormente no tr ibunal, no entanto, são fotografadas no
estilo de f i lme noir, enfat izando a i luminação chiaroscuro e composições Instáveis que
expressam belamente a ameaça que as circunstâncias representam ao desejo de
George por seu " lugar ao sol".
Grávida, Alice ameaça entregar George a sua família se ele não se casar com ela: ele
é salvo desse destino somente porque a prefeitura está fechada por causa de um feriado
quando o casal chega. George sugere um
passeio no lago em um pequeno barco; sua
Intenção é que ocorra um "ac idente" e Alice
se afogue. Não consegue levar a cabo o as
sassinato, porém Alice, assustada, cai na
água. Ela se afoga porque ele não tenta
salvá-la e George paga com a vida pela sua
indiferença. Stevens, no entanto, o torna
mais memorável como amante trágico do
que como objeto de lição política. BP
E U A (Paramount) 122 min. P&B
Idioma: inglês
Direção: George Stevens
Produção: Ivan Moffat, George
Stevens
Roteiro: Harry Brown, Theodore
Dreiser, Patrick Kearney, Michael
Wi lson, baseado no livro Uma
tragédia americana, de Theodore
Dreiser, e na peça Um lugar iw sol, dl
Patrick Kearney
Fotografia: Wi l l iam C. Mellor
Música: Franz Waxman
Elenco: Montgomery Clift, Elizabeth
Taylor, Shelley Winters, Anne Revert,
Keefe Brasselle, Fred Clark, RaynT I
Burr, Herbert Heyes, Shepperd
Strudwlck, Frieda Inescort, Kathryn
Glvney, Walter Sande, Ted de Coisl.i,
John Ridgely, Lois Chartrand
Oscar: George Stevens (diretor),
Michael Wi lson, Harry Brown
(roteiro), Wi l l iam C. Mellor (fotogrll l|
em P&B) , Edith Head (figurino),
Wil l iam Hornbeck (edição), Franz
Waxman (música)
Indicação ao Oscar: George M r v n r ,
(melhor fi lme), Montgomery ( 1
(ator), Shelley Winters (atri/)
m i a (Fox) 92 min. P&B
I d i o m a : inglês
ü l t c c S o : Robert Wise
1 lucJo: Jiil ian Blausteln
R o t e i r o : Harry Bates, Edmund H.
Ni 11 ih, baseado no conto "Adeus ao
Mn . i h ' , de Harry Bates
1 grafia: Leo Tover ,
M 1 r . i 1 . 1 : l',ri 11,ml Herrmann
E l e n c o : Mlchael Rennie, Patrícia Neal,
Hiigh Mai lowc, Sam Jaffe, Bllly Cray,
11.11111". n.ivier, Lock Martin
0 DIA EM QUE A TERRA PAROU (1951)
(THE DAY THE EARTH ST00D STILL)
O drama de ficção científ ica dirigido por Robert Wise em 1951, baseado no conto "Adeus
ao mestre", de Harry Bates, sensibil izou o público da época, que estava cansado de
ouvir falar em guerra nuclear e política. Começando em um estilo quase documenta l ,
ele veicula uma arrepiante mensagem antibélica através de efeitos especiais
espetaculares e caracterizações memoráveis . Ma is do que um f i lme B, este foi o
primeiro f i lme de ficção científ ica adulto de sucesso a transmitir uma mensagem real
sobre a humanidade.
Um emissário interestelar chamado Klaatu (Mlchael Rennie) aterrissa em Washing
ton, D.C. para transmitir a mensagem de que a guerra no nosso mundo deve parar. Sua
espaçonave é cercada de armas e tanques e Klaatu é acidentalmente ferido e enviado para
um hospital, deixando apenas Gort (Lock Mart in), um robô de mais de dois metros, para
proteger a nave. Sem rosto, mudo e possuindo uma espécie de ralo laser mortal, Gort é
invencível. A única maneira de impedi-lo de proteger a espaçonave c dizendo: "Gort,
Klaatu barada niktoh", uma frase decorada por prati
camente todas as crianças que viram o fi lme.
Klaatu escapa do hospital e conhece Helen (Pa
tricia Neal), uma bela mulher de inteligência excep
cional , e seu filho Bobby (Bllly Gray), e é ela quem
deve desarmar o mortífero Gort. A f im de provar seu
poder e dar peso à sua mensagem de paz, Klaatu
desenvolve um plano para Interromper todos os
mov imentos mecânicos do mundo (com exceção de
aviões e hospitais).
Or ig inalmente, o papel de Klaatu seria interpre
tado por Claude Reins, mas problemas de agenda
deram a oportunidade a Rennie, cujo rosto anguloso
e temperamento calmo conferem uma ligeira e suave
superioridade ao personagem. Neal , um símbolo de
bravura feminina, resume o que de me lhora human i
dade tem para oferecer. Gort foi interpretado por
Mar t in , um porteiro de 2,3501 do Teatro Chinês de
Grauman, em Los Angeles. Sobrecarregado pela roupa
pesada, Mart in precisou de ajuda para segurar Neal
nos braços e, em algumas cenas, os cabos que o sus
ten tavam f icam claramente visíveis. Para que a nave
parecesse inteiriça, a fenda da porta foi vedada e pin
tada de prateado. A vedação então se rompia, fazen
do com que a porta surgisse de repente, sem aviso
visual a lgum, jamais superado, O dia em que a Terra
parou é um clássico em vários aspectos, não só por
conta da sua mensagem antibélica e efeitos especiais
intel igentes, como também pelo uso marcante que
Bernard Hermann fez do teremlm, o mais amigo ins
t rumento musical eletrônico. KK
MICHAEL RENNIE PATRICIA NEAL HUGH MARLOWE siiitiiE um [tu ttmu ttm ita « i m
HAN BLAUSTEIN • ROBERT WISE • EOMUNO H. NiMH 2o
DEPOIS DO VENDAVAL (1952,
(THE QUIET MAN)
O diretor John Ford é mais conhecido por suas celebrações da história e da cultura
amer icanas, porém ele também realizou uma série de f i lmes que exploraram suas ori
gens celtas e, especia lmente, ir landesas, dentre os quais Depois do vendaval talvez seja
o mais bem-sucedido. Uma Interessante mistura de drama e comédia, o f i lme acom
panha o retomo de Sean Thornton (John Wayne) , um amer icano de or igem irlandesa, à
"velha terra", onde começa uma relação passional c tempestuosa com Mary Kate
Danaher (Maureen 0 'Hara) . Fi lmado no condado de Calway (de onde a família de Ford
emigrou para os Estados Unidos) , Depois do vendaval oferece bastante ação ao estilo
Ford, tendo como clímax épico e apropriado a luta do ex-boxeador Sean com Wil l
Danaher (Victor McLaglen) , I rmão de Mary, por causa de sua recusa em conceder a mão
da Irmã.
A briga termina porque os dois homens vão ficando bêbados demais (durante os In
tervalos na ação) para continuar; eles acabam se tornando amigos e, no f im, depois de
Wi l l , a família aceita o casamento. Contudo, o f i lme não é exatamente sobre valores
mascul inos. Mary é multo mais do que o simples mot ivo da disputa entre os dois.
Embora deseje Sean , Mary se recusa a ir contra o irmão para se casar com ele. Casar-se
com Sean nessas circunstâncias seria um insulto para ela. A princípio, Sean que
matara um homem no ringue - se recusa a lutar e Mary pensa que ele não a ama o
suf iciente para se arriscar em uma briga com seu i rmão. Um plano é bolado por tercei
ros no vilarejo para que Danaher dê sua permissão para o casamento sem saber e os
dois f ina lmente se casam. Porém o irmão logo descobre que foi enganado e se nega a
pagar o dote de Mary. Ela, por sua vez, se recusa a dormir com Sean antes que o dote,
que representa seu valor Individual, seja pago. No entanto, a luta de boxe do final
resolve ambas as questões e o casal se reconcilia.
Sob a direção intel igente de Ford, Depois do vendaval contrapõe o charme con
vencional do vilarejo à beleza do cenário natural, resultando em um fi lme que é sério o
bastante para ser comovente , porém fantasioso o bastante para ser ext remamente
divertido. ESP
E U A (Argosy, Republic) 129 min.
Technicolor
I d i o m a : inglês / gaélico
D i r e ç ã o : John Ford
P r o d u ç ã o : Merian C. Cooper, I, B
Forbes, John Ford, L. T. Rosso
R o t e i r o : Frank S. Nuget, Maurice
Walsh, baseado no conto "Green
Rushes", de Maurice Walsh
F o t o g r a f i a : Winton C. Hoch
M ú s i c a : Victor Young
E l e n c o : John Wayne, Maureen ( I T i.n. 1 .
Barry Fitzgerald, Ward Bond. Vk toi
McLaglen, Mildred Natwick. 1 1 . •
Ford, Eileen Crowe, May Craij',, A11 I1111
Shields, Charles B. Fitzsimons, | .une\
Lilburn, Sean McClory, Jack
MacGowran, Joseph O'Dea
O s c a r : John Ford (diretor), Winton 1
Hoch, Archie Stout (fotografia)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : : John I mil.
Merlan C. Cooper (melhor filme), 11.111k
S. Nuget (roteiro), Victor Mr l agleu
(ator coadjuvante), Frank Hni.iliui:,
John McCarthy Jr., Charles S.
Thompson (direção de arte). Daniel I
Bloomberg (som)
F e s t i v a l de V e n e z a : John I ord (prl
internacional), (prêmio OCIC),
indicação (Leão de Ouro)
.ue,
I •.mu -i (Mlver) 102 min. P&B
IdiomI! fiances
D l r c ç A o : René Clément
Ptoduçao: Robert Dorfmann
R o t e l r o : l rançois Boyer, Jean
'mu<-1n lie, Pierre Bost, René Clément,
li.r.i'.tdo mo romance Les Jeux
in. i innus, de François Boyer
i OtOgrafla: Robert Juillard
Mutlca: Narciso Yepes
i I n n n i .ruines Poujouly, Brigitte
I ov.cy, Amédée, Laurence Badie,
M idelelne Barbulée, Suzanne
( ourt.il, Lucien Hubert, Jacques
M,H in, Pierre Merovée, Violette
M er, Penise Péronne, Fernande
Roy- Louis Saintève, André Was le
• K i • 11 i i . i n i . i (melhorf i lme
rsli.inf,eiro)
Indll i ç l o a o O s c a r : François Boyer
(lolrlri l)
l r % t l v . i l d e V e n e z a : René Clément
( I r a o de Ouro)
BRINQUEDO PROIBIDO (1952)
(JEUX INTERDITS) Vários f i lmes realçam os absurdos e crueldades da vida ao representá-los a partir dos
olhos de crianças, contudo, poucos o fizeram de forma mais eficaz e pungente que a
obra máxima de René Clement, Brinquedo proibido. O cenário, como em muitos dos
melhores f i lmes de Clement, é a Segunda Guerra Mundia l : uma menina de cinco anos,
Paulette (Briglttc Fossey), fica órfã quando seus pais, fugindo de Paris, são mortos em
um ataque aéreo. Adotada contra a vontade por uma família camponesa, ela se torna
amiga do filho mais jovem, Michel (Georges Poujouly), de 11 anos, e os dois cr iam um
mundo secreto que reflete a morte que vêem ao seu redor. Recolhendo os cadáveres de
animais e insetos, eles executam ritos solenes e os enterram em um celeiro abandonado,
murmurando frases que não entendem por completo de rituais funerários cristãos. Essa
prática, que é o "brinquedo proibido" do título, escandaliza os adultos que a descobrem
e as crianças - angust iadas e perplexas - são separadas.
Clement ganhou fama com um documentár io dramatizado, A batalha dos trilhos
(1946), sobre as operações da Resistência na malha ferroviária francesa, e a abertura de
Brinquedo proibido contém um impacto poderosamente realista, à medida que caças
a lemães bombardeiam c metra lham uma coluna dispersa de refugiados. A seqüência
do ataque é ainda mais aterrorizante por contar apenas com efeitos sonoros naturais,
sem o acréscimo de música, e por se passar em meio ao suave calor de verão do Interior
da França. No entanto, depois disso, o f i lme se torna mais esti l izado. Por um lado, ele é
sobre o mundo dos camponeses visto através dos olhos Intrigados e fascinados das
crianças - as rixas e disputas mesquinhas são caricaturadas, com falsos elogios pres
tados à religião, enquanto vidas são dominadas pela ganância e pelo rancor. Em con
traste, as crianças são vistas com ternura e carinho à medida que constroem seu
secreto mundo de fantasia, e a separação forçada dos dois ao f im é desoladora.
De seus jovens protagonistas, C lement retira atuações extraordinar iamente
expressivas e convincentes, fel izmente livres de pieguice; há uma graça instintiva na
bondade do menino em relação a sua pequena amiga. Narciso Yepes contribui com
uma lírica trilha de guitarra solo, expressiva em sua simplicidade. PK
ALMA EM PÁNICO (1952)
(ANGEL FACE) O mov imento noir amer icano é dominado por romances mal fadados e femmes fcita/es
poderosamente manipuladoras, que levam homens ingênuos à ruína. Alma em pânico,
de Otto Preminger, é um exemplo tardio do gênero e, obv iamente , deve muito a f i lmes
como Fuga do passado ( 1 9 4 7 ) , de Jacques Tourneur. Aqui, temos Robert M i tchum em um
papel semelhante de detet ive particular que descobre as maquinações da mulher que
ama, mas não consegue escapar delas.
Alma em pânico, contudo, é mais cínico e sarcástico do que seus antecessores. Ele
acompanha a obsessão de um homem da classe trabalhadora, Frank Jessup (Mi tchum),
por uma bela mulher rica que o envolve em um plano para matar sua madrasta. Antes,
Diane Tremayne (Jean S lmmons , bem escalada exatamente por não fazer o tipo) havia
destruído del iberadamente o noivado de Frank com Mary (Mona Freeman), a mulher
"boa" que representa a vida normal que já não basta para Frank depois que ele conhece
Diane e desenvolve o gosto pelo luxo. O plano de assassinato dá certo, porém apenas ao
custo adicional e inesperado da vida do pai de Diane. Ela, no entanto, não sente um
pingo de culpa, e nada a faz desistir dos seus objetivos. O casal é acusado do que logo se
suspeita ser um cr ime, porém, na linha de O destino bate à porta, é absolvido pelo
advogado charlatão que Diane contrata para defendê-los. Embora aparentemente
destinados a ficar juntos, a consciência de Frank f inalmente pesa. Ele tenta romper com
Diane depois do ju lgamento e retomar sua antiga vida. Em um gesto que sela seu
destino (e que traz mais uma vez à mente o personagem de Mi tchum em Fuga do
passado), Frank deixa Diane levá-lo de carro à estação rodoviária. No entanto, ela prefere
morrer a perdê-lo. Diane joga o carro em um desfiladeiro, matando ambos, em uma
ati tude semelhante ao "ac idente" que tramara anteriormente.
Alma em pânico nos traz Interpretações impressionantes de Mi tchum e S immons ,
reforçadas de forma sutil pela direção de Preminger através de uma habil idosa
manipulação da mise-en-scène - um f i lme noir clássico. BP
E U A (RKO) 9 1 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Otto Preminger
P r o d u ç ã o : Otto Preminger, Howird
Hughes
R o t e i r o : Chester Erskine, Oscar
Millard, Frank S. Nugent
F o t o g r a f i a : Harry Strandllng Si .
M ú s i c a : Dimitri Tiomkln
E l e n c o : Robert Mi tchum, Jean
S immons, Mona Freeman, Herbert
Marshall , Leon Ames, Barh.u.i < 1'Nlll
Kenneth Tobey, Raymond Greenlral,
Griff Barnett, Robert Gist, Morgan
Farley, J im Backus
CANTANDO NA CHUVA (1952)
(SINGIN' IN THE RAIN)
I I I A (M( ,M) 103 min. Technicolor
Idlomi! inglês
D i r e ç ã o : Stanley Donen, Gene Kelly
P r o d u ç ã o : Arthur Freed
R o t e i r o : Betty Comden, Adolph Green
fotografia: Harold Rosson
M ú s i c a : Nacio Herb Brown, Lennie
Hayton
E l e n c o : Gene Kelly, Donald O'Connor,
I lobble Reynolds, Jean Hagen, Millard
Mm hell, Cyd Charisse, Douglas
I n w l e y , Rita Moreno
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Jean Hagen (atriz
1 Oldjuvante), Lennie Hayton
(1111r .11 .1 )
Alguns filmes são tidos em alta conta por seus
famosos ineditismos - uma Inovação artística
impressionante ou a estréia surpreendente de al
gum astro. Outros são reverenciados simplesmen
te por serem os melhores de seu gênero. Cantando
na chuva se enquadra nesta última categoria. Ele
não é pioneiro em nenhum verdadeiro sentido da
palavra, tampouco representa um grande avanço
na linguagem cinematográfica, porém poucos fil
mes conseguiram englobar de forma tão simples e
maravilhosa tudo o que há de bom no cinema: as glórias jubilosas, os fracassos lastimáveis
e a oscilação perfeita e eterna entre esses dois pólos.
É abso lu tamente apropriado que o maior de todos os musicais de Hol lywood seja,
em essência, sobre o próprio som. Ou pelo menos sobre a chegada dele. O ano é 1927, e
Don Lockwood (Gene Kelly) é um famoso astro do cinema mudo. No meio das f i lma
gens de um f i lme de capa e espada com sua parceira das telas Lina Lamont (Jean
Hagen), o estúdio é informado da estréia iminente de O cantor de jazz e cancela a pro
dução. A única maneira de o f i lme ser concluído é transformá-lo em um musical , porém
existem dois problemas: Don não suporta Lina, sua co-protagonista, e o forte sotaque
nova-iorquino dela jamais daria certo na nova era dos f i lmes sonoros. A solução? Usar
a ingênua Kathy (Debbie Reynolds) para dublar a voz horrível de Lamont e torcer para
que o público jamais descubra. Contudo, essa solução tapa-buraco gera outro proble
ma: Don se apaixona por Kathy, o que arruina sua relação profissional com Lisa.
Co-dirigido por Kelly e Stanley Donen, Cantando na chuva traz vários grandes nú
meros musicais, especia lmente " M a k e 'Em Laugh", de Donald O'Connors, e o famoso
solo de Kelly durante a canção-t í tu lo. Kelly, com uma capa de chuva amarela, gira
trepado em um poste de luz e pisoteia poças em êxtase, de tão apaixonado que está
pelo novo amor da sua vida. Est ranhamente, mui tas das canções de Cantando na chuva
foram recicladas dos arquivos musicais da M G M , mas Kelly e sua equipe as renovam
de tal forma que hoje elas são inextr icavelmente relacionadas ao f i lme. O roteiro, de
Adolph Green e Betty Comden, é ligeiro e engraçado, parodiando a difícil transição do
cinema mudo para o falado com a espirituosidade veloz que somente a geração seguin
te de roteiristas poderia oferecer.
Em uma ironia digna do próprio f i lme, Cantando na chuva foi recebido inicialmente
com relativa indiferença e passou quase em branco pelo Oscar. No entanto, com o t e m
po, suas seqüências an imadas e astros carismáticos tornaram-se irresistíveis. Agradeça
em parte às reapresentações pela coroação de Cantando na chuva como rei dos mus i
cais, agradeça aos inúmeros crít icos de cinema por colocá-lo nas listas dos 10 mais,
porém, acima de tudo, agradeça a Kelly e Donen por tê-lo realizado. O mundo do
cinema tornou-se um lugar melhor depois de Cantando na chuva. JKI
Japta ( loho) 143 min. P & B
Idioma: j.iponês
D i r e ç ã o : Akira Kurosawa
Produção: sojiro Motoki
R o t e i r o : Shinobu Hashimoto, Akira
Kuiosawa, Hideo Oguni
F o t o g r a f i a : Asakazu Nakai
Musica: I umio Hayasaka
1 lanço: rakashi Shimura, Shinichi
1 i m n i i i . Haruo Tanaka, Minoru Chiaki,
Ml Kl odagir i , Bokuzen Hidari,
M Silke Yamada, Ka mata ri
1 ujlwara, Makoto Kobori, Nobuo
1 ineko, Nobuo Nakamura, Atsushi
w.ii anabe, Isao Kimura, Masao
Ihlmlzu, Yunosuke Ito
I r s l i v a l I n t e r n a c i o n a l d e B e r l i m :
Al- li.1 Kuiosawa (prémio especial do
\ rn.ulo de Berlim)
VIVER (1952)
(IKIRU)
Embora seja mais conhecido por seus épicos samurais (Os sete samurais; Yojimbo, o
guarda-costas), Akira Kurosawa nunca esteve, no f im das contas, essencialmente in
teressado em sangue e tripas - embora se possa argumentar que nenhum outro diretor
explorou tão a fundo o potencial das imagens violentas nas telas. Kurosawa foi um dos
maiores humanis tas do c inema e em nenhuma outra obra sua isso fica tão claro
quanto em Viver.
O f i lme é sobre Kenjl Wa tanabe (Takashi Shimura, um dos atores recorrentes de
Kurosawa), um burocrata cujo cotidiano é maçante e Insatisfatório. Sua maior reali
zação - que ele leva multo a sério - é o fato de nunca ter faltado um só dia ao trabalho
na repartição da prefeitura de Tóquio em 30 anos. Ele não se arrepende da trivial idade
da sua vida; apenas não conhece outra opção.
Tudo isso muda quando ele descobre que está com câncer e tem pouco tempo de
vida. Durante seus últ imos meses, Wa tanabe reconsidera suas conquistas (nenhuma) e
suas prioridades (nenhuma) e decide que não é tarde demais para mudar o mundo para
melhor. Ele devota toda a sua energia à construção de uma praça - um pequeno gesto
que, todavia, significa muito para Wa tanabe , e também para Kurosawa.
Shimura nos brinda com a maior interpretação da sua vida em Viver. Depois que
Wa tanabe descobre que está doente, o rosto do ator nos revela tudo o que precisamos
saber: da Inexprcssivldade à humi ldade, está tudo lá, nos traços de Shimura. É impos
sível não sentir a dor do personagem, que se move pelas cenas com a aparência de um
homem que foi verdadeiramente devastado.
Embora repleto de tristeza, Viver é um f i lme de grande ot imismo espiritual. E esta
era a intenção de Kurosawa: mostrar que, para se conquistar qualquer tipo de satisfa
ção e fel icidade, é preciso sofrer. Contudo, o sofr imento faz parte da vida e pode ser
usado para o bem. Viver é imensamente pró-vida, embora seja sobre a morte e a
tristeza. A dádiva de Kurosawa foi revelar como esses estados de espírito não são con
traditórios, mas interl igados como parte do ciclo da vida. Sua crença sincera de que pe
quenos gestos fazem diferença é ao mesmo tempo animadora e comovente , especial
mente na aldeia global dos dias de hoje, tão impregnada de ironia. E d e S
EUROPA 51 (1952)
Europa 51, de Roberto Rossell ini, contém a mais imprevisível mistura de ingredientes
que se pode imaginar, o que o transforma em uma iguaria que você talvez não queira
provar: ela inclui uma atriz escandinava que se tornou uma estrela de Hol lywood; o pai
do neo-real ismo ital iano; um comentár io sobre as condições sociais das cidades no
pós-guerra europeu; uma reflexão metafísica sobre a natureza do bem e do mal e sobre
o direito inalienável à autodeterminação; a oposição em todos os níveis entre burgue
sia e classes populares; a morte de uma criança; a traição e redenção de uma mãe. . .
Moirano mia! E, então, você se senta no escuro, a tela se i lumina e o f i lme começa. É
simples, é óbvio. Elegante, profundamente tocante, incrivelmente vivo.
Um ano depois, em Stromboii, Rossellini transforma Ingrld Bergman - com a
anuência da atriz - em uma extraordinária marionete, submetida s imu l taneamente ao
jugo de Deus e do seu diretor (e amante) . Isso não acontece aqui . O que se dá é apenas
a criação ousada - pelo mesmo cineasta e a mesma estrela - de uma inédita fusão do
melodrama como gênero popular com o f i lme de autor, com suas preocupações éticas
e sociais. Todas as si tuações em Europa 51 são compostas de e lementos convencionais,
porém cada cena é surpreendente, repleta de uma perturbadora sensação de realidade,
de ligações secretas com a vida real, embora elas pareçam jogar apenas com as referên
cias habituais, tanto no aspecto romanesco quanto no temát ico. E tudo ocorre sem
qualquer efeito dramático evidente, sem qualquer tipo de ostentação, c s im, pelo con
trário, com uma incrível modéstia (partindo de um diretor c uma atriz que poderiam ser
tudo, menos humildes) na maneira como a história é contada, f i lmada e interpretada.
Europa 51 foge a qualquer gênero no qual poderia, aparentemente, se enquadrar,
a lcançando um nível de humanismo fundamenta l raras vezes visto no cinema - e sem
nunca usar métodos apelat ivos. À medida que a personagem de Bergman, Irene Girard,
ultrapassa os obstáculos em seu reconhecimento como santa pelas pessoas, o próprio
f i lme traça esse mesmo caminho, evi tando to
dos os pecados em que poderia incorrer. Um
f i lme "san to"? Por que não? J-MF
I t á l i a (Ponti-De Laurentiis) 113 min.
P&B
I d i o m a : italiano
D i r e ç ã o : Roberto Rossellini
P r o d u ç ã o : Dino de Laurentiis,
Roberto Rossellini
R o t e i r o : Sandro De Feo, Mario
Pannunzio, Ivo Perilli, Brunello Rondl
Roberto Rossellini
F o t o g r a f i a : Aldo Tonti
M ú s i c a : Renzo Rossellini
E l e n c o : Ingrid Bergaman, A l e x . i n d e i
Knox, Ettore Giannini, Glulicl la
Masina, Teresa Pellati, Sandro
Franchina, Wil l iam Tubbs, A l l i e d
Brown
F e s t i v a l d e V e n e z a : Roberto
Rossellini (prêmio Internacional),
indicação (Leão de Ouro)
. 7 1
I U A (I dew's, M G M ) 118 min. P8tB
I d l o m a : ingles
D l r e c a o : Vincente Minnell l
ProducSo: John Houseman
R o t c i r o : George Bradshaw, Charles
' , ( l iner
l o t o g r a f l a : Robert Surtees
M I I ' . K . I : David Raksin
i linco: I ana Turner, Kirk Douglas,
W.il ici I'idgeon, Dick Powel l , Barry
Sull ivan, Gloria Grahame, Gilbert
Unland, Ieo G. Carroll, Vanessa
Brown, Paul Stewart, Sammy White,
11.line Stewart, Ivan Triesault
i .11: i Ii.ii los Schnee (roteiro),
Gloria i . iahame (atrlz coadjuvante),
( ciliii Gibbons, Edward C. Carfagno,
I i lwln H. Will is, F. Keogh Gleason
M i n i . H I Je arte), Robert Surtees
(litingi.ilia), Helen Rose (flgurino)
ImlUacao a o O s c a r : Kirk Douglas
(• )
ASSIM ESTAVA ESCRITO (1952)
(THE BAD AND THE BEAUTIFUL) Ainda o melhor f i lme hol lywoodiano sobre Hol lywood, Assim estava escrito é l ivremente
baseado na carreira de David O. Selznlck, fugindo ao tema para incluir a lgumas piadas
internas sobre Val Lewton, Orson Wel les, Raymond Chandler, Diana Barrymore, Alfred
Hltchcock e Irving Thalbcrg. Atenção também à esposa discreta, porém Inf luente, do
diretor Inglês (interpretado por Leo G. Carroll, um dos atores recorrentes de Hltchcock).
Três pessoas com bons motivos para odiar o produtor Jonathan Shields (Klrk Douglas)
estão reunidas aguardando uma ligação de Paris, na qual o decadente Shields tentará
vender um novo projeto. Através de f lashbacks, eles discorrem sobre sua carreira - de
diretor de filmes B para o estrelato -, lembrando por que o detestam tanto. O diretor Fred
Amiel (Barry Sullivan) é um antigo sócio que foi incentivado por Shields a fazer um filme de
monstros barato chamado A maldição do homem-gato (A marca da pantera vem à mente),
mas então é afastado do projeto dos seus sonhos, uma produção mexicana risivelmente
" importante" chamada A montanha distante. Geórgia Lorrison (Lana Turner), a filha vulgar
e bêbada de um astro encrenqueiro estilo John Barrymore, é retirada da sarjeta, transfor
mada em uma deusa do cinema e depois trocada por uma qualquer (a maravilhosamente
irônica Elaine Stewart) na noite da estréia. Dentre os três, o menos disposto a perdoá-lo é
o roteirista profissional James Lee Bartlow (Dick Powell), cuja mulher frívola e assanhada
(Gloria Grahame, vencedora do Oscar) Shields repassa para o "amante latino" Victor
"Gaúcho" Ribera (Gilbert Roland), que a mata em um acidente de avião.
Douglas está Imbatível como um megalomaníaco ambicioso. O retrato que faz de
Shields, abusando dos dentes tr incados e das suas covinhas, está entre os melhores de
sua carreira. O roteiro cheio de fofocas (a cargo de outro vencedor do Oscar, Charles
Schnee) é conduzido de forma impecável pela melodramaturgla exuberante do diretor
Vincente Minnel l l e pela trilha sonora sedutora de David Raksin. Passados 50 anos, o
f i lme ganhou um efeito tragicômico, uma vez que a reputação de Selznick foi por água
abaixo. A convicção de Shields de que está fazendo uma grande arte (compart i lhada
com seu contador!) pela qual vale a pena sacrificar a vida de outras pessoas torna-se
ainda mais perturbadora quando Minnell i nos permite vislumbrar exatamente o tipo de
espetáculo exagerado e arrogante que acabou sendo menos bem-sucedido do que
produções mais modestas. Sabemos que, na fi lmografia de Shields, preferiríamos ver A
maldição do homem-gato no lugar de A montanha distante. KN
ORIO DA AVENTURA (1952)
(THE BIG SKY) Em O rio da aventura, de Howard Hawks, Kirk Douglas e Dewey Mart in são dois vende
dores de peles na década de 1830 que sobem o rio Missouri até a região dos índios
algonquinos em uma pequena embarcação. O f i lme é baseado em um excelente ro
mance de A. B, Guthr ie Jr., que t ambém escreveu o roteiro de Os brutos também a m a m
(1953) e cujos livros These T/iotrsand Hi/is e Tire Way West t ambém se tornaram f i lmes de
faroeste. No caminho. Douglas e Mart in enfrentam obstáculos tanto naturais quanto
humanos e transformam sua tripulação em uma elite profissional típica de Hawks. Essa
camaradagem é ameaçada quando capturam uma garota indígena. Teal Eye (Elizabeth
Threatt), como refém para garantir sua segurança. Os dois homens se apaixonam por
ela, mas o confl i to é solucionado no f im.
Fotografado em preto-e-branco, com alguns cenários impressionantes, o f i lme de
Hawks está menos Interessado nas possibil idades épicas da história do que na sua rica
galeria de personagens. Incluindo Hank Worden como um velho índio enlouquecido,
Arthur Hunnicut t como um velho rabugento e Steven Ceray como Frenchy, o capitão do
barco. Há também os toques de humor negro característicos do diretor, especia lmente
quando Douglas precisa ter seu dedo amputado, uma cena que, or ig inalmente, deveria
ter sido interpretada por John Waync em Rio vermelho (1948). EB
E U A (Winchester) 1 4 0 min. P & R
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Howard Hawks
P r o d u ç ã o : Howard Hawks, Edward
Lasker
R o t e i r o : A. B. Guthrie Jr., Dudley
Nichols, baseado no livro de A. B.
Guthrie Jr.
F o t o g r a f i a : Russell Harlan
M ú s i c a : Dimitri Tiomkln
E l e n c o : Kirk Douglas, Dewey M.111111
Elizabeth Threatt, Arthur Hunnll U M .
Buddy Baer, Steven Geray, Henri
Letondal, Hank Worden, J im Davi)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Arthur
Hunnicutt (ator coadjuvante), Ruifl l l
Harlan (fotografia)
MATAR OU MORRER (1952)
(HIGHNOON) Numa bela manhã de domingo na pacata cidade de Hadleyvi l le, no Novo México,
quando o xerife Wi l l Kane (Gary Cooper) está prestes a se casar com uma quacre (Grace
Kelly), chega a notícia de que Frank Mlllcr (Ian MacDonald) - o psicopata que Kane ha
via prendido anter iormente - foi solto da prisão e vai chegar no trem do meio-dia. En
quanto os mais odiosos cúmpl ices de Miller esperam na estação, o xerife tenta
conseguir ajuda. No entanto, os habitantes da cidade (colegas, amigos, dignitários) se
recusam a arriscar suas vidas por ficar do seu lado contra o cr iminoso que quer não
apenas vingança como t ambém dominar Hadleyvi l le novamente .
Vários relógios revelam que o meio-dia está se aproximando: todos insistem para
que Kane saia da cidade, mas o herói, no melhor estilo Gary Cooper, precisa arcar com
suas responsabil idades. Matar ou morrer se passa em tempo real, com a hora fatal se
aproximando enquanto a música- tema (a balada "Do Not Forsake M e , Oh My Darl ing")
insiste em frisar os acontecimentos, com aqueles que o xerife supõe que vão ajudá-lo
caindo como pinos de boliche. No clímax, que continua pungente mesmo nestes dias
de f i lmes de ação de um homem contra um exército, ele é deixado prat icamente
sozinho contra quatro vi lões. O f i lme de Z innemann é ao mesmo tempo um excelente
faroeste de suspense e uma perfeita alegoria do cl ima de medo e suspeita que
prevalecia nos Estados Unidos durante a era McCarthy. KN
E U A (Stanley Kramer) 85 min iT.it
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Fred Zinnemann
P r o d u ç ã o : Carl Foreman, Stanley
Kramer
R o t e i r o : John W. Cunningham, 1 ail
Foreman, baseado no conto "The tio
Star", de John W. Cunningham
F o t o g r a f i a : Floyd Crosby
M ú s i c a : Dimitri Tiomkin
E l e n c o : Gary Cooper, Thomas
Mitchell , Lloyd Bridges, Kaly lurado,
Grace Kelly, Otto Kruger, Lon 1 hani
Jr., Harry Morgan, Ian MacDonald,
Eve McVeagh, Morgan Farley, Harry
Shannon, Lee Van Cleef, Roheii |
Wilke, Sheb Wooley
O s c a r : Gary Cooper (ator), Elmo
Will iams, Harry W. Gerstad (edição),
Dimitri Tiomkin (música), Diiiiitn
Tiomkin, Ned Washington (cançlo)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Stanley K i . i m e i
(melhor fi lme), Fred Zinnemann
(diretor), Carl Foreman (roteiio)
•Vi
n . i l i . i (Amato, De Sica, Rizzoli) 91 min.
P&B
I d i o m a : italiano
D i r e ç ã o : Vittono De Sica
1 ' i o d u ç . í o : Giuseppe Amato, Vittorlo
1 ir ',ii a, Angelo Rizzoli
Roteiro: Cesare Zavatt ini
i otografia: Aldo Grazlati
M u s i c a : Alessandro Cicognini
E l e n c o : Carlo Batt ist i , Maria-Pia
••Mio, I ina Cennari , lleana Slmova,
1 lena Rea, M e m m o Carotenuto
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Cesare Zavattini
(itileíro)
UMBERTO D (1952)
Este f i lme comovente sobre um burocrata aposentado (Carlo Batt ist i) e seu cachorro
Fllke ficará para sempre na sua memór ia . Depois de terem realizado o clássico neo-
realista Ladrões de bicicleta em 1948, o diretor Vittorio De Sica e o roteirista Cesare
Zavat t in i retornam a um tema e método semelhantes em Umberto D. A técnica da du
pla é estruturar o f i lme em torno de uma história pessoal cat ivante e carregada de
emoção que revela, ao ser contada, as condições sociais que lhe servem de cenário.
Umberto D foi f i lmado nas ruas de Roma e os papéis principais são interpretados
por atores não-profissionais, o que dá ao f i lme maior urgência e autent ic idade. Uma
das maiores críticas ao neo-real ismo é que o t ra tamento melodramát ico dispensado à
história menor dilui a mensagem social mais ampla e a reivindicação de realismo do
próprio f i lme. Com sua história trágica, contada sem pudor, sobre o desespero de um
senhor de idade e o seu amor pelo seu bicho de est imação, e com sua visão incisiva das
injustiças sociais, Umberto D oferece a oportunidade perfeita para o espectador refletir
sobre essa questão, que diz respeito a um dos mov imentos mais inf luentes da história
do c inema.
Batt ist i , um professor aposentado, Interpreta o personagem do título com um
senso contido de dignidade e resignação diante da sua si tuação. Vivendo com uma
pensão insuficiente, Umber to mal consegue pagar seu quarto alugado, no qual está à
mercê de uma senhoria Insensível, que quer se livrar dele. Ele divide a comida que con
segue na insti tuição beneficente local com seu cachorro, que é seu único companheiro
e fonte de consolo. À medida que as coisas f icam cada vez piores para Umber to , ele é
forçado cm várias situações a escolher entre a própria vida e a de Fllke. Em uma das
seqüências mais importantes do f i lme, Flike se perde e Umberto teme que ele seja mor
to no canil municipal . Como em Ladrões de bicicleta, o suspense construído em torno da
busca cada vez mais desesperada rivaliza com um thrlller de Hitchcock. O f i lme nos
mostra que um cãozinho que traz alegria a uma existência desprovida dela (ou uma
bicicleta que significará um emprego em uma época de grande pobreza) é capaz de
gerar o mesmo grau de interesse e emoção que uma arma secreta ou um esconderijo de
jóias roubadas, em um cenário mais fantást ico. Aqui , De Sica faz com que nos pergun
temos se o amor de Umberto por seu cão é redentor ou fúti l. RH
A CARRUAGEM DE OURO (1952)
(LE CARROSSE DOR) O primeiro f i lme da trilogia " teat ra l " de Jean Renolr (os outros dois são French Cancan,
de 1955, e As estranhas coisas de Paris, do ano seguinte), esta co-produção I tál ia/França
traz um elenco anglo- i tal lano capi taneado pela infatigável Anna Magnan i . Na versão
falada em inglês, ela lamenta a impossibi l idade de atuar em uma língua estrangeira
usando seu inimitável e forte sotaque ital iano. Ela interpreta Camil la, uma colombina
em uma trupe de commedia deWarte que chega ao Peru do século XVI I I . Ao Invés de ruas
asfal tadas com ouro, eles não encontram asfalto a lgum - precisam até construir o
teatro para o qual foram contratados.
O que eles acham do Novo Mundo?
Ele vai ficar bonito depois de terminado.
Apesar das primeiras impressões de Camil la, ela logo começa a ser cortejada por
pretendentes dist intos, um deles, o vice-rei espanhol (Duncan Lamont) , que a presen
teia com a carruagem de ouro do tí tulo. Infel izmente, para um ator, a honest idade na
vida não é garantia de um final feliz. A trama superf ic ialmente frívola e farsesca escon
de uma obra madura e até mesmo melancólica sobre a relação tensa entre amor, arte e
vida. François Truffaut o chamou de "o f i lme mais nobre e refinado de todos os
tempos.. . ele é todo finesse e delicadeza, graça e frescor... um f i lme sobre o teatro
dentro do teatro". Antonio Vivaldi fornece a trilha e Claude, irmão de Renoir, é responsá
vel pela bela fotografia colorida. TCh
0 BIGAMO (1953)
(THE BIGAMIST) Este f i lme Inesquecível é uma das várias inesperadas obras-primas dirigidas por um
curt íssimo período por Ida Lupino, considerada a "ESette Davis dos pobres" quando era
uma estrela calejada da Warner Brothers na década de 40. Edmond O'Br ien interpreta
Harry Graham, um vendedor de geladeiras que, graças a suas andanças desastradas
pela vida, acaba com duas esposas. Eve (Joan Fontaine) e Phyllis (Lupino), sendo que
uma não sabe da existência da outra. A direção subest imada de Lupino envolve os
personagens em uma piedade discreta c impotente.
O tipo de drama presente em O bígamo tem sua origem na tristeza de três pessoas:
a solidão de Harry; o pesar de Eve pela morte de seu pai e sua incapacidade de conceber
uma criança; e a relutância de Phyllis em exigir que Harry a assuma, por não querer se
tornar um fardo para ele. O f i lme inteiro é uma cristalização dessa tristeza coletiva
representada pela ambientação (São Francisco e Los Angeles são os cenários da vida
dupla de Harry), pelo compor tamento dos personagens (a passividade entorpecida e
aflitiva de Harry; o isolamento caprichoso de Phyll is; o esforço desesperado e patético
de Eve em ser ao mesmo tempo a esposa perfeita e a parceira profissional perfeita) e,
acima de tudo, pelos olhares trocados ou parcialmente evitados entre as pessoas. Na
devastadora seqüência final no tr ibunal, a orquestração desses olhares alcança uma
combinação de ambigüidade e intensidade que traz à mente tanto Carl Dreyer quanto
Nicholas Ray. Cfu
I t á l i a / F r a n ç a (Hoche, Panaria)
103 min. Technicolor
I d i o m a : italiano
D i r e ç ã o : Jean Renoir
P r o d u ç ã o : Francesco Alliata, Rcnzn
Avanzo
R o t e i r o : Renzo Avanzo, jack Kirkland
Ginette Doynel, Giulio Mace l i 1, hm
Renoir, baseado na peça te Carrosse
du Saint-Sacrement, de Prosper
Mérimée
F o t o g r a f i a : Claude Renoir
M ú s i c a n ã o o r i g i n a l : Antonio Vivaldi
E l e n c o : Anna Magnani , O d o a i d o
Spadaro, Nada Fiorelli, Dante.
Duncan Lamont, George Hlgglns,
Ralph Truman, Gisella Mathews. Ral
De La Torre, Elena Altieri, Paul
Campbell, Riccardo Rioli, Wil l iam
Tubbs, Jean Debucourt
E U A (Filmmakers) 80 min. P81B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Ida Lupino
P r o d u ç ã o : Collier Young
R o t e i r o : Larry Marcus, Lou S< hor,
Collier Young
F o t o g r a f i a : George E. Dlskanl
M ú s i c a : Leith Stevens
E l e n c o : Joan Fontaine, Edmund
Gwenn, Ida Lupino, Edmond O'Brltn,
Kenneth Tobey, Jane Darwell, Peggy
Maley
• 7 \
I U A (MGM) i n min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Vincente Minnell i
l ' t o d u c ä o : Arthur Freed
R o t e i r o : Betty Comden, Adolph Green
fotografia: Harry Jackson
MÚlIca: Adolph Deutsch, Arthur
'.i hw .n i / (canções)
I I r n c o : I red Astaire, Cyd Charisse,
I Iii .11 i evant, Nanette Fabray, Jack
I'm hanan, James Mitchell , Robert
Gilt
I n d i c . i ç á o a o O s c a r : Betty Comden,
Adolph (,icen (roteiro), Mary Ann
Nyberg (figurino), Adolph Deutsch
(mtr.lt .1]
A RODA DA FORTUNA (1953)
(THE BAND WAGON) Como Cantando na chuva, lançado no ano anterior, A roda da fortuna, de Vincente
Minnel l i , é um musical que se debruça de forma afetuosa sobre a história do seu
gênero. A partir daí, ele funda um esti lo novo e "integrado", baseado nos personagens
e no enredo, ao mesmo tempo que goza dos benefícios do esti lo antigo e "de revista".
E o faz de maneira intel igente, ao transformar o Fred Astaire de O picolino (1935) em um
dinossauro em um melo artístico moderno e fazê-lo passar por uma provação em que
deve lidar com a visão autoritária de um diretor estilo Orson Wcl lcs (Jack Buchanan) e,
por f im, afirmar seu valor como um dançarino à moda antiga, porém adaptável , em um
espetáculo dinâmico e de sucesso.
Como a maioria dos musicais, A roda da fortuna é sobre compromisso, o casamento
de tendências antagônicas. Os personagens simbol izam os extremos da baixa e da alta
cultura: Tony Hunter (Astaire) contra Gabriel le Gerard (Cyd Charisse), sua relutante co-
protagonista, vinda do balé. Porém, quando a necessidade bate à porta, essas diferen
ças culturais caem por terra no mesmo instante. Tony se prova um especialista em arte
e Gaby canta "I See a New S u n " a plenos pulmões no palco como uma dançarina de
cabaré. Essa mistura estética é t ambém, l i teralmente, um romance, sacramentado por
"Danc ing In the Dark", o pas de deux imortal no Central Park.
Essencia lmente, no entanto, A roda da fortuna é uma agradável "colagem de atra
ções" - começando com as contr ibuições cômicas cheias de energia de Nanet te Fabray
e Oscar Levant, alter egos dos rotelristas Betty Comden e Adolph Grcen. Minnell i tem a
oportunidade de exibir vários tipos de mlsc-en-scène: seja jogando com a decoração e
a arquitetura na cena cm que Buchanan entoa seu "Faus to" enquanto personagens em
três cômodos contíguos ouvem às escon
didas; conduzindo com fluidez um grupo
de art istas através das mudanças de clima
na inesquecível " T h a f s Enter ta lnment" ; ou
aproveitando as inovações puramente
teatrais do número tresloucado "Triplets".
No entanto, o maior de todos os espe
táculos é o extraordinário número de 11 mi
nutos "Girl Hunt: A Murder Mystery in Jazz",
uma paródia dos f i lmes noir (em cores
vibrantes) na qual a coreografia de Michael
Kldd explode em arabescos estil izados de
gestos comuns (fumar, lutar) e as estrelas
exibem seu glamour, seja numa demons
tração de sensual idade (Charisse) ou no
simples prazer de caminhar (Astaire). AM
DESEJOS PROIBIDOS (1953)
(MADAME DE...) Poucos f i lmes dizem tanto, em tantos níveis e com uma economia tão impressionante,
quanto o subl ime Desejos proibidos, de Max Ophüls. Louise (Daniel le Darrleux) é a
" M a d a m e de..." do título original por ser anôn ima, típica da sua classe privi legiada; são
somente os brincos que vemos na abertura - prestes a serem empenhados - que
desencadeiam seu drama. Conforme esses brincos se movem, a câmera se move com
eles, f ina lmente revelando Louise em um espelho, em melo aos seus bens materiais.
Desse momen to em diante, Ophüls jamais nos permitirá ignorar o que sustenta esse
mundo de opulência: a circulação de dinheiro e dívidas, os criados onipresentes a
postos, o ritual da preparação antes das aparições em público. Mesmo o trajeto do
quarto à porta da frente se torna uma elegante exposição sociológica.
Depois da casa e da loja de penhores vêm a igreja (lar da hipocrisia burguesa) e a
ópera, onde tudo é mostrado; lá, somos apresentados ao marido de Louise, André
(Charles Boyer) , "encan tador " enquanto consegue controlar os casos ( tanto seus
quanto dela) que caracterizam esse casamento "sof ist icado". Quando os brincos vol
t am às mãos de André pela terceira vez - e Louise se apaixona per igosamente por
Donat i (Vittor io De Sica) -, o que poderia ser um conceito simpát ico (os brincos ligando
todos os personagens, o que remete ao anterior Conflitos de amor [1950], t ambém de
Ophüls) acaba art iculando todas as distinções sutis c cruciais entre enredo e tema. Para
Louise, que vive em um estado de negação no que diz respeito às condições que tor
nam possível sua suposta liberdade, os brincos
são um símbolo do seu relacionamento com
Donat i ; para André, são um símbolo de posse,
do poder patriarcal, mil i tar c aristocrático que
ele exerce sobre o dest ino das outras pessoas.
Desejos proibidos é, a l ternadamente, frágil,
brutal, compassivo e tocante. Ophüls delineia
esse mundo com uma precisão digna de Brecht,
contudo, jamais despreza a força ou importân
cia dos anseios Individuais reprimidos. Mesmo
com os personagens debatendo-se em suas
prisões metafór icas ou capturando-se mutua
mente em suas armadi lhas, suas paixões nos
comovem: especia lmente quando André fecha
as janelas diante de Louise como um carcereiro
enquanto declara, quase sussurrando em se
gredo: " E u te amo." AM
F r a n ç a / I t á l i a (Franco London, IndUI
Rlzzoll) 105 min. P&B
I d i o m a : francês
D i r e ç ã o : Max Ophüls
P r o d u ç ã o : Ralph Baum
R o t e i r o : Mareei Achard, Max OphUll
Annette Wademant , baseado no l ivm
Madame de, de Louise de Vil mui 111
F o t o g r a f i a : Christian Matras
M ú s i c a : Oscar Straus, Georges v.m
Parys
E l e n c o : Charles Boyer, Danielle
Darrieux, Vittorio De Sica, jean
Debucourt, Jean Galland, Mlrellle
Perrey, Paul Azais, josselin Hulieii
Noel, Lia Di Leo
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Georges
Annenkov, Rosine Delamare
(figurino)
E U A (Columbia) 118 min. P8<B
Idioma: inglês
D i r e ç ã o : Fred Zlnnemann
P r o d u ç ã o : Buddy Adler
R o t e i r o : James Jones, Daniel
rtradash, baseado no livro de James
|| Mil's
l o t o g r a f i a : Burnett Guffey
Múllca: Morris Stoloff, George
1 n ig, James Jones, Fred Karger,
Robert Wells
E l e n c o : Burt Lancaster, Montgomery
1 hi I, Deborah Kerr, Donna Reed,
1 i.nik Sinatra, Philip Ober, Mickey
lhaughnessy, Harry Bellaver, Ernest
Borgnlne, Jack Warden, John Dennis,
Mei le Iravls, Tim Ryan, Arthur
Kccgan, Barbara Morrison
O s c a r : Buddy Adler (melhor f i lme),
1 h ' i I Zlnnemann (diretor), Daniel
i.u.iil.rJi (roteiro), Frank Sinatra (ator
Coadjuvante), Donna Reed (atriz
coadjuvante), Burnett Guffey
(Inlografia), Wi l l iam A. Lyon (edição),
I11I111 P. I ivadary (som)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Montgomery
1 hi 1 (ator), Burt Lancaster (ator),
I irborah Kerr (atriz), Jean Louis
(figurino), Morris Stoloff, George
Dull ing (música)
i A UM PASSO DA ETERNIDADE (1953)
(FROM HERE TO ETERNITY) Apesar da famosa cena icônlca de Burt Lancaster e Deborah Kerr rolando e se
beijando em uma praia do Havaí, a versão de Fred Z innemann do best-seller
de James Jones sobre a vida em uma base militar americana em 1941, às
vésperas do ataque japonês a Pcarl Harbor, sofreu de certa forma a ação do
tempo. Embora o linguajar, o sexo e a violência já não tenham o mesmo
Impacto, o foco em temas como adultério, prostituição, corrupção e intimi
dação sádica garantiram ao f i lme a premiação em oito categorias do Oscar.
Com o passar dos anos, seus e lementos sensacionalistas parecem menos ousados e são
as atuações Intensas do seu elenco de estrelas que f icam na memória. Lancaster é o sar
gento Warden , um homem de princípios, porém pragmático. Montgomery Cllft é
Prewitt , o trompetista novo no quartel (cuja recusa em lutar boxe para a equipe do seu
batalhão gera um tratamento preconceituoso por parte dos oficiais) e Frank Sinatra é seu
amigo Maggio, que sofre a implicância do odioso sargento Fatso (um memorável Ernest
Borgnlne). Inevitavelmente, talvez, neste estudo profundamente "mascul ino" sobre a
coragem abrutalhada ea honra individual em conflito com as expectativas conformistas
da comunidade em geral, as atrizes não se saem tão bem. A Inglesa Kerr está apenas um
pouco constrangida como a tórrida adúltera americana e Donna Reed interpreta uma
prostituta que se faz passar por aeromoça.
Z innemann provavelmente não era o diretor Ideal para este trabalho. Um artesão
bastante meticuloso que progrediu de entretenimentos razoavelmente eficientes para
f i lmes algo conscientes demais da sua própria " importância", ele se encontrava aqui no
que se mostrou um ponto de virada na sua carreira. As estatuetas signif icaram que ele
poderia passar a fazer f i lmes mais ostensivamente "de qual idade", porém A um passo
da eternidade teria lucrado com um toque menos "realista". Afinal de contas, ele é na
verdade um melodrama, e um pouco de expressionismo sombrio viria a calhar. Dito
isso, o f i lme é ef iciente quando se concentra na dinâmica da Int imidação dos mais
fracos e nos oficiais que fazem vista grossa às Infrações e aos preconceitos que conta
m inam qualquer grupo fechado. Além disso, Z innemann conseguiu extrair interpreta
ções vigorosas dos seus atores. E, depois daquele rolar na areia da praia, a vida jamais
seria a mesma. GA
J / K
ERA UMA VEZ EM TÓQUIO (1953)
(TÔKYÔ MONOGATARI) "A vida não é decepcionante?", pergunta uma adolescente a sua cunhada viúva no
funeral da mãe ; " S i m " , é a resposta, acompanhada de um sorriso. Esse breve diálogo,
perto do f im de Era uma vez em Tóquio, a obra-prima de Yasujiro Ozu, exemplif ica a
atmosfera não sent imenta l de tranqüila resignação que dist ingue sua obra. As
atuações, o cenário - o lar de classe média que a garota dividia até então com seus pais
idosos - e os diálogos são to ta lmente natural istas e não parecem, nem por um
instante, ter sido planejados para fazer parte de a lgum clímax grandioso. No entanto,
quando as palavras são ditas, elas possuem um enorme peso emocional e f i losófico. Os
f i lmes de Ozu são maravi lhosamente contidos e de uma simpl ic idade ilusória ao
retratarem, em sua maioria, rituais cot idianos domést icos e profissionais da classe
média japonesa com uma Idiossincrática falta de ênfase (dramática ou esti lística) que
pode fazer com que os mais desatentos os considerem banais. Aqui , tudo o que
acontece é que os pais idosos deixam sua filha em sua casa no campo para visitar seus
outros fi lhos em Tóquio; eles nunca hav iam ido à capital, mas fazem esse esforço por
saberem que seu tempo está se acabando. Porém seus f i lhos já têm suas próprias
famíl ias e ev i tam os pais, mal disfarçando a necessidade de vol tarem para suas vidas
atarefadas no Japão do pós-guerra. Apenas a nora deles, que perdeu o marido na guerra,
parece ter tempo para os dois. Não que eles reclamem disso, nem ela tampouco.
Tudo é observado, como de costume nos f i lmes de Ozu, por uma camera parada a
alguns poucos metros do chão; apenas um plano do f i lme se move - e, ainda assim, ele
o faz com discreta lent idão, embora se dê no exato momento em que os pais dec idem
voltar para casa. Então como Ozu prende nossa atenção, quando o que vemos e
ouvimos é tão distante do que a maioria dos espectadores considera dramát ico ou
incomum? Tudo se resume no caráter con tem
plativo desse olhar, que implica que qualquer
at ividade humana, por mais "des impor tante"
que seja, merece nossa atenção. Em contraste
com seu esti lo de f i lmar especial (e especial
mente Inspirador), as experiências, emoções e
pensamentos dos seus personagens são tão
"universa is" quanto qualquer outra coisa no c i
nema - um paradoxo que consagrou este f i lme
com justiça como um dos maiores de todos os
tempos. GA
J a p ã o (shochlku) 136 min. p&B
I d i o m a : japonês
D i r e ç ã o : Yasujiro Ozu
P r o d u ç ã o : Takeshi Yamamoto
R o t e i r o : Kôgo Noda, Yasujiro Ozu
F o t o g r a f i a : Yuharu Atsuta
M ú s i c a : Kojun Saitô
E l e n c o : Chishu Ryu, Chieko
Higashiyama, Setsuko Hara, Haruko
Sugimura, Sô Yamamura, Kunlko
Mlyake, Kyoko Kagawa, Ejirõ Tono,
Nobuo Nakamura, Shirô Osaka, 1 l lsio
Toake.Teruko Nagaoka, Mutsuko
Sakura, Toyoko Takahashl, Tom Abi
E U A (Paramount) 118 min. P8<B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Wil l iam Wyler
P i o d u ç ã o : Robert Wyler, Wil l iam
W y l e l
R o t e i r o : Ian McLellan Hunter, John
1 Hgl ]
MÚlIci: Georges Auric
F o t o g r a f i a : Henri Alekan, Franz
1'l.inei
E l e n c o : Gregory Peck, Audrey
Hepburn, Eddie Albert, Hartley Power,
1 li uri Wil l iams, Margaret
Riwl lngs, Tullio Carminati , Paolo
I i i l i i n Claudio Ermelli, Paola
hoiboni, Alfredo Rizzo, Laura Solari,
Tl,1 Cori, Heinz Hindrich, John
Horne
O s c a r : Audrey Hepburn (atriz), Edith
He.kI (figurino), Ian McLellan Hunter
(1 l i l ton Irumbo) (roteiro - história)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Wi l l iam Wyler
( Ihor fi lme), Wil l iam Wyler
(diretor), Ian McLellan Hunter (Dalton
li ninho), John Dighton (roteiro -
i rgumento), Eddie Albert (ator
1 oadjuvante), Hal Pereira, Walter H.
lyler (direção de arte), Franz Planer,
Henri Alekan (fotografia), Robert
'.wink (edição)
A PRINCESA E 0 PLEBEU (1953)
(ROMAN HO LI DAY) Se os produtores soubessem exatamente o que t inham em mãos à época, talvez t ives
sem mudado o título A princesa e o plebeu para Nasce uma estrela. Audrey Hepburn havia
aparecido apenas em alguns papéis de européia e em uma montagem da Broadway de
Cigi quando foi escalada como uma princesa no fi lme de Wi l l iam Wyler. Nem é preciso
dizer que o papel caiu como uma luva, A princesa e o plebeu foi um sucesso e Hepburn foi
catapultada para o topo da realeza de Hol lywood. Ela foi um caso de história de Cinde
rela transformada em realidade pela mágica do cinema.
O próprio f i lme apresenta o outro lado da fábula da Cinderela. A princesa Ann de
Hepburn está cansada da pompa e circunstância das suas obrigações oficiais. Uma noi
te, ela foge do controle dos seus manipuladores e, disfarçada de garota comum, conhe
ce o jornalista americano Joe Bradlcy (Gregory Peck). Ele vê na princesa a possibilidade do
furo da sua carreira, porém, à medida que a conhece melhor, sente-se muito mal por tirar
proveito da sua inocência. Enquanto os dois passeiam pela cidade, percebem que estão
se apaixonando, contudo, a realidade das suas respectivas situações pode tornar esse
relacionamento impossível. Assim, eles aproveitam a cidade e seus encantos, sabendo
que o curto tempo que estão passando juntos pode não se repetir.
Peck e Hepburn estão excelentes como o casal improvável e Eddle Albert está per
feito como o entusiasmado cinegrafista de Peck levado a reboque. Wyler, um dos cineas
tas mais confiáveis de Hol lywood, f i lmou em locação em Roma e os pontos turísticos da
cidade a judam a realçar a já mágica história. Outro ponto alto é o roteiro divertido, que
foi alvo de controvérsia por ter sido escrito por Dalton Trumbo, que estava na lista negra.
Passaram-se l iteralmente décadas antes de Trumbo f inalmente receber o credito que
merecia por ter ajudado a fazer este f i lme maravi lhoso.
O restante da equipe não teve que esperar tanto - A princesa e o plebeu recebeu
impressionantes 10 indicações ao Oscar, rendendo uma vitória para a quase desconhe
cida Hepburn. Ela seria escalada para o papel de ingênua muitas outras vezes na sua
carreira, mas foi este f i lme que marcou de forma oficial e promissora sua chegada. JKl
O SALÁRIO DO MEDO (1953)
(LE SALAIRE DE LA PEUR) Um retrato contundente da ganância e da influência corruptora do capi ta l ismo
disfarçado de f i lme de aventura, O salário do medo, de Henri Georges-Cluzout, pode ser
considerado, com justiça, um dos f i lmes mais carregados de tensão de todos os t e m
pos. Passado na América do Su l , duas equipes competem para realizar um serviço
relat ivamente simples: transportar um caminhão de nitroglicerina por um desfi ladeiro
de cerca de 5 0 0 qui lômetros até o local de um Incêndio em uma refinaria de petróleo
para que a companhia petrolífera possa explodir o oleoduto e apagar o fogo. O
problema? Notor iamente instável, o carregamento de nitroglicerina fará o motorista ir
pelos ares se ele não tiver o máximo de cuidado.
Com uma Imaginação sádica, Clouzot coloca vários obstáculos no caminho dos
dois caminhões à medida que eles seguem (em ritmo de tartaruga) pelo desfiladeiro
acidentado. Curvas fechadas e pontes bambas já são um problema mesmo se os
caminhões não correm o risco de explodir e cada buraco ou desl izamento de pedras traz
consigo a possibil idade de morte instantânea. Não é a promessa de glória que faz cada
dupla de motoristas aceitar esse serviço tão arriscado, e s im a promessa de dinheiro, e,
à medida que o f i lme se desenrola, começamos a nos perguntar até onde aqueles
homens Iriam para pôr suas mãos nele.
De forma vi ta l , Clouzot antecede os momentos de ação em que os protagonistas
desaf iam a morte com uma longa seqüência - que foi cortada por seu caráter político -
passada em uma favela à beira de uma estrada sul-americana, na qual andari lhos e
vagabundos vão parar quando já não têm para onde Ir. Lá, descobrimos que, em muitos
aspectos, quase não vale a pena conhecer aqueles patifes dispostos a arriscar suas
vidas por dinheiro. Suas at i tudes suicidas são impulsionadas pelo egoísmo e pelo
desespero, traços explorados pela corporação oportunista que segura com cinismo a
cenoura na ponta da vareta diante desses homens que, na prática, não passam de
mulas. De fato, esse grupo mal-ajambrado de mercenários, cheio de desconfiança e
ódio, age de maneira primitiva e bestial, representando uma ameaça tão grande uns
aos outros quanto os carregamentos de explosivos representam a todos. É uma situa
ção sem saída, uma vez que a linha de chegada é a recompensa financeira à custa da
falência espir i tual. JKI
F r a n ç a / I t á l i a (CICC, Fllmsonoi, h m ' 1,
Vera) 141 min. P&B
I d i o m a : francês / inglês / espanhol /
alemão
D i r e ç ã o : Henrí-Georges Clouzot
P r o d u ç ã o : Raymond Borderle, Henri
Georges Clouzot, Louis Wipf
R o t e i r o : Henri-Georges Clouzot.
Jérôme Géronlmi, baseado no
romance de Georges Arnaud
F o t o g r a f i a : Armand Thlrard
M ú s i c a : Georges Aurlc
E l e n c o : Yves Montand, Charles Vanel
Peter van Eyck, Antonio Ceuta,
Darling Legit imus, Luis De Lima, Jo
Dest, Dario Moreno, Faustini,
Seguna, Wil l iam Tubbs, Vera t louzot
Folco Lulll, Jerónimo Mitchell
F e s t i v a l I n t e r n a c i o n a l d e B e r l i m :
Henri-Georges Clouzot (Urso de
Ouro)
F e s t i v a l d e C a n n e s : Henri Georgei
Clouzot (Palma de Ouro), ch.nl i - .
Vanel (menção honrosa atuai 9o)
.•II
F U A (i.oew's, M G M ) g i min.
Ic< linicolor
Idioma: inglês
DlrtçSo: Anthony Mann
P r o d u ç ã o : Wi l l iam H. Wright
R o t e i r o : Sam Rolfe, Harold Jack
Hloom *
F o t o g r a f i a : Wil l iam C. Mellor
M u s i c a : Branislau Kaper
I I ' - i n o: |.imes Stewart, Janet Leigh,
Roberl Ryan, Ralph Meeker, Millard
Mitchell
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Sam Rolfe,
Hamid Jack Bloom (roteiro)
0 PREÇO DE UM HOMEM (1953)
(THE NAKED SPUR) O terceiro da extraordinária série de faroestes que o diretor Anthony Mann realizou com
J a m e s Stewar t na década de 50, O preço de um homem traz Stewar t como Howard
Kemp, um caçador de recompensas amargurado tentando conseguir dinheiro para
comprar de volta o rancho que perdeu quando sua mulher o traiu durante a Guerra de
Secessão. No caminho, ele se junta a Jessé (Millard Mltchel l) , um velho mlnerador, e
Anderson (Ralph Meeker), um oficial do Exército renegado. O personagem de Stewart
acaba capturando o homem que está perseguindo, um matador sarcástico chamado
Ben (Robert Ryan), porém seus problemas estão apenas começando. A jornada árdua
pelo deserto para levar Ben à justiça testa os l imites de Kemp.
O que torna este f i lme excepcional é, em primeiro lugar, a exploração - escrita com
mão f i rme e belamente representada - das tensões entre os personagens, à medida que
Kemp e Ben lutam para ter a supremacia psicológica, com Ben usando sua namorada
Lina (Janet Leigh) como Isca ao notar a vulnerabil idade sob a dureza exterior do rival.
J a m e s Stewar t oferece um retrato bri lhante de um homem à beira da histeria. Em se
gundo lugar, Mann possui um enorme talento para fi lmar cenários montanhosos,
usando a natureza árida do terreno como um contraponto físico à confusão interna dos
personagens. O f i lme é quase inteiramente rodado em locação. EB
IUA (Fox)8omin. P & B
I d i o m a : inglês
l i i r c ç a o : Samuel Fuller
P r o d u ç ã o : Jules Schermer
R o t e i r o : Samuel Fuller, baseado no
"iii 11 de Dwight Taylor
F o t o g r a f i a : Joseph MacDonald
M ú s i c a : Lelgh Harline
I l e n ç o : Richard Widmark, Jean Peters,
rhelma Ritter, Murvyn Vye, Richard
I' ili'V, Willis Bouchey, Jerry O'Sull lvan,
II n iv 1 arter, George E. Stone, George
I Idtedge, Stuart Randall, Frank
i- umagal, Victor Perry, Emmet t Lynn,
Parley Baer
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Thelma Ritter
(.a 1 1 / 1 oadjuvante)
I e s t i v a l d e V e n e z a : Samuel Fuller,
Indli a i , a o (Leão de Ouro)
ANJO DO MAL (1953)
(PICKUP ON SOUTH STREET) Um fenômeno menor do Início da Guerra Fria, o ciclo do gênero de f i lmes de espião
ant icomunistas gerou uma obra-prima, Anjo do mal. Um batedor de carteiras deve
escolher entre o patr iot ismo e o lucro depois de roubar um microf i lme confidencial.
Anjo do mal t ranscende seu subgénero com seu estilo d inâmico e representação vívida
do submundo nova-iorquino. Samuel FuIler demonstra um prodigioso leque de criativi
dade esti l ística, descobrindo novos conceitos visuais para quase todas as cenas. O
ingrediente-chave é o d o s e , com a câmera enfiada no rosto dos atores de forma tão
agressiva que quase conseguimos ver a respiração deles embaçar a lente. Esse excesso
de doses sinaliza a prioridade que o f i lme dá ao intimísimo em detr imento do aspecto
ideológico, sua aprovação das at i tudes mot ivadas não só por abstrações, mas por amor,
lealdade e culpa no seu nível mais ínt imo e pessoal.
Os protagonistas nunca est iveram tão bem: Richard Widmark , o cínico convencido;
Jean Peters, a prostituta de coração grande; Richard Kiley, o patife suarento; e, especial
mente , a delatora sem arrependimentos Thelma Ritter. A cena mais poderosa mostra
uma Ritter exausta encarando a morte pelas mãos do assassino de aluguel Kiley. Em
um f i lme tão devotado à individual idade, faz sentido que seu maior medo não seja a
morte, mas uma sepultura anôn ima. Como diz ela em uma das mui tas frases de efeito
do roteiro: " S e fosse para ser enterrada em Potter 's Field, eu me matava! " MR
OS HOMENS PREFEREM AS LOURAS (1953)
(GENTLEMEN PREFER BLONDES) A canção " W h e n Love Coes Wrong" não é o número mais famoso de Os homens preferem
as louras, mas ela captura o que há de mais contagiante neste musical extravagante e
hilariantemente camp. Dorothy (Jane Russell) e Lorelei (Marylin Monroe) reclamam em
um café parisiense ao ar livre da dificuldade de manter relacionamentos com os homens.
À medida que uma mult idão se junta, as duas mulheres se entus iasmam com o ritmo
cada vez mais expansivo das suas queixas, que logo as faz sair de suas cadeiras, cami
nhando e pavoneando-se entre os curiosos ao estilo do coreógrafo Jack Cole. E então a
comoção diminui: a música morre, a mult idão se dispersa e nossas heroínas vão embora
em um táxi - da banalidade ao êxtase e de volta à banalidade, maravi lhosamente.
Produto típico da década de 50, Os homens preferem as louras é uma comédia ácida
sobre caça à fortuna, sem medo de misturar sonhos sent imenta is com um leve
sarcasmo e mágica glamourosa com um tino materialista a respeito do que uma garota
precisa fazer para se virar - uma espécie de contradição divertida imortal izada no
número f reqüentemente imitado de Monroe, "D íamonds Are A Clrl 's Best Friend". Con
forme escreveu Jonathan Rosenbat im, o f i lme é " u m objeto
impossível - um Cinemascope da mente , um Potemkin
capitalista".
O f i lme (segundo os teóricos) é um pal impsesto, selecio
nando e descartando aleator iamente partes do romance de
Anita Loos, de sua adaptação para a Broadway, de canções
das duplas Leo Robi / Ju le S tyne e Hoagy Carmichacl /Harold
Adamson e, acima de tudo, das possibil idades oferecidas por
suas duas poderosas estrelas. A persona de Russell combina
rispidez com praticidade; Monroe é uma mistura vigorosa de
erotismo provocante e inocência infanti l , arrematada com
um toque de manipulação sagaz. O auge cômico é quando
os papéis se t rocam para a impetuosa imitação que Dorothy
faz de Lorelei no tr ibunal.
Howard Hawks é gera lmente considerado um diretor
muito clássico e contido, mas aqui ele pende para o estilo
das comédias loucas e espetacularmente vulgares de Frank
Tashlin uma constatação comprovada pela presença de
George Wins low, aquela criança maravi lhosamente grotesca.
Os excessos e a estranheza de certas seqüências (como a
imortal serenata de Russell endereçada a um grupo de bruta
montes Indiferentes, "Ain' t There Anyone Here To Love") e a
relação f reqüentemente superficial que elas têm com a his
tória principal são alguns dos aspectos que tornam o f i lme
tão delicioso para as platéias contemporâneas. AM
E U A (Fox) 91 min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Howard Hawks
P r o d u ç ã o : Sol C. Siegel
R o t e i r o : Charles Lederer, baseado nu
livro de Anita Loos e na peça de
Joseph Fields e Anita Loos
F o t o g r a f i a : Harry j . Wild
M ú s i c a : Harold Adamson, Hoagy
Carmlchael, Leo Robin, Julc Styne
E l e n c o : Jane Russell, Marilyn Monroe,
Charles Coburn, Elliott Reid, Tommy
Noonan, George Winslow, Man el
Dalio, Taylor Holmes, Norma Vardeu,
Howard Wendel l , Steven Geray. Henri
Letondal, Leo Mostovoy, Alex 11.1/n
George Davis
2
OS CORRUPTOS (1953)
(THE BIG HE AT)
I U A (< ulumbia) 89 min. P 8 c B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Fritz Lang
Produção: Robert Arthur
R o t e i r o : Sydney Boehm, baseado no
llvio de Wil l iam P. McGivern
1 grafia: Charles Lang
Musica: Daniele Amfitheatrof, Arthur
M i l l i o n
I lenco: Glenn Ford, Gloria Grahame,
Im r lyn Brando, Alexander Scourby,
I r r Marvin, Jeanette Nolan, Peter
Whitney, Will is Bouchey, Robert
Burton, Adam Wi l l iams, Howard
Wendell, Chris Alcaide, Michael
Gl,inger, Dorothy Green, Carolyn
| i , i n " .
Como O diabo feito mulher, o faroeste de 1937 de Fritz Lang, Os corruptos é
uma balada de "ódio, assassinato e vingança": começa com um dose de
uma arma prestes a ser usada pelo policial corrupto Tom Duncan para
cometer suicídio e se volta rapidamente para os horrores chocantes que
deformam os personagens. O policial Dave Bannion (Glenn Ford) passa de
homem de família a obsessivo quando sua esposa (Jocelyn Brando) é
morta por um carro-bomba endereçado a ele. Moll Debby (Gloria Graha
me) fica amargurada quando Vince (Lee Marvin), seu namorado gângster,
a desfigura jogando-lhe café quente no rosto, e passa para o lado de
Bannion. Em um desdobramento crucial à trama, o herói atormentado ainda não consegue
cometer assassinato a sangue-frio, de modo que um substituto precisa entrar em cena para
tomara atitude decisiva que permititá que a justiça seja feita: a grande operação policial que
derruba o chefão do crime Lagana (Alexander Scourby) é desencadeada quando Debby
confronta e assassina sua "Irmã de casaco de pele", a gananciosa viúva do policial corrupto.
Ma is baseado em uma realidade política do que a maioria dos f i lmes noir de Lang,
graças ao detalhismo contundente do romance de Wi l l iam P. McGivcrn e do roteiro de
Sydney Boehm, Os corruptos faz parte de um ciclo de f i lmes de denúncia da década de
50 ao esti lo máf ia-controla-a-cldade - dentre outros exemplos estão Cidade do vício
(1955) e Cidade cativa (1952). A direção de Lang ainda bebia no expressionismo aqui , com
cenários que refletem os traços de personalidade dominantes dos personagens: o luxo
frio da casa de Duncan, comprada com dinheiro sujo; a opulência de mau gosto da
mansão de Lagana, com o retrato horroroso da santif icada mãe do mafioso c suas
festas de adolescente; a cobertura moderna de Vince e Debby, onde o comissário de
polícia joga cartas com assassinos; o apar tamento pequeno, pobre, porém honrado, da
família Bann ion ; e o quarto de hotel em que Bannion termina, sua vida degradada pelo
desejo de v ingança. O final tampouco oferece conforto: depois da queda da máf ia, o
herói retorna para sua mesa no Depar tamento de Homicídios. As boas-v indas dos seus
colegas de trabalho - expressadas, é claro, pela oferta de um café - são abreviadas à
medida que os créditos finais surgem sobre Bann ion , que coloca seu chapéu e casaco
ao sair para cuidar de um "caso de atropelamento e fuga na South Street". KN
AS FERIAS DO SR. HULOT (1953)
(LES VACANCES DE MONSIEUR HULOT) Este clássico atemporal e cat ivante do cinema francês revelou Jacques Tatl, em seu
segundo longa-metragem como diretor, como um dos estil istas mais invent ivos e ori
ginais da mídia cinematográf ica. Uma sucessão de incidentes prat icamente desprovi
dos de enredo e diálogos passados em um resort à beira da praia, o f i lme retira graça
dos detalhes aparentemente mais banais do dia-a-dla. Paralelamente aos aconteci
mentos encenados com esmero - como um bando de turistas correndo de uma plata
forma de t rem para outra à medida que mensagens distorcidas são vociferadas de
forma incompreensível pelos alto-falantes -, há vários momentos engraçados e delicio
sos em que quase nada acontece. As pessoas s implesmente sentam-se, c o m e m , lêem,
f icam à toa, determinadas a permanecer no r i tmo de feriado o tempo todo. A
imobi l idade estóica de tudo é ext remamente contagiante.
Tati compreendeu tão bem quanto Hltchcock que a mlse-en-scène não deve ser
imposta pelo cineasta, mas sim descoberta dentro dos rituais cotidianos: quão perto as
pessoas se sentam umas das outras em uma sala de jantar; os códigos em vigor quan
do se permite que elas t roquem olhares; todas as regras de etiqueta e compor tamento
social durante o período livre, porém estruturado, de férias na França - Tati encontrou
inspiração para sua comédia nesse tipo de observação atenta.
O f i lme controla r igorosamente o t iming cômico, a organização espacial e os sons
pós-sincronizados das suas gags concebidas de forma brilhante - até o repetitivo
rangido de uma porta é engraçado, graças à maneira como Tati o "muslcal lza". Ele pega
formas conhecidas de gags - como a maneira à la Buster Keaton com que o protago
nista imita a luc inadamente os mov imentos de um fanático por exercícios - e então as
torna estranhas pelo modo como as f i lma e monta a ação, mui tas vezes desviando
rapidamente nossa atenção para outra gag que está começando perto da anterior.
Embora nos seus úl t imos f i lmes Tatl tenha reduzido del iberadamente suas apari
ções na tela, aqui a figura esguia c desajeitada do Sr. Hulot é uma grande fonte de
charme e graça - e há até a tentativa comovente , embora mal-sucedida, de uma intriga
amorosa. Sempre hesitando antes de entrar em qualquer lugar, desculpando-se e c u m
pr imentando com educação todos os presentes ao fazê-lo, Hulot não consegue deixar
de desencadear a lguma calamidade com os mov imentos aflitos de seu corpo - que
cu lm inam no mais inspirado uso de fogos de artifício da história do c inema. AM
França (Cady Films, Specta Fllms)
114 min. PücB
Idioma: francês
Direção: Jacques Tati
Produção: Fred Orain
Roteiro: Jacques Tati, Henri Marquei ,
Plerre Aubert, Jacques Lagrange
Fotografia: Jacques Mercanton, h . n i
Mousselle
Música: Alain Romans
Elenco: Jacques Tati, Nathalle
Pascaud, Micheline Rolla, Raymond
Carl, Luclen Frégis, Valentinr ( . n n . i •
Indicação ao Oscar: Jacques L m .
Henri Marquet (roteiro)
1 1 . u n .1 / Italia (Titanus, Italia, Junior,
Ariane, S.E.C., SCC, Sveva) 100 min.
P&B
I d i o m a : Italiano
i M n - i . K i : Roberto Rossellini
ROtiIro: Vltaliand Brancati, Roberto
Rossellini ,
F o t o g r a f í a : Enzo Serafín
tviii-.ii.i: Renzo Rossellini
I l e n c o : Ingrid Bergman, George
• tnders, l eslíe Daniels, Natalia Ray,
M.nia M.uiban, Anna Proclemer,
Lu kie I lost. Paul Millier
ROMANCE NA ITÁLIA (1953)
(VIAGGIO IN ITÁLIA) Jacques Rivette escreveu certa vez que Romance na Itália, de Roberto Rossell ini, "abre
uma brecha [pela qual] todo o c inema, sob pena de morte, precisa passar". Isso fica
claro desde os primeiros planos, repentinos e crus - uma Imagem tremida, que segue
por uma estrada em direção a Nápoles; um vislumbre da paisagem que passa; e, f inal
mente, duas estrelas, Ingrld Bergman e George Sanders, distantes de Hol lywood em um
road-movle desprovido de enredo e não exatamente picaresco no qual expressam o que
há de mais profundo em seus personagens através de banalidades lacônicas e gestos
simples, mundanos .
Hoje, os críticos cunharam o termo "comédia de renovação matr imonial" , um gê
nero no qual casais colocam sua união à prova e, depois de mul tas compl icações, a
reaf i rmam. Romance na Itália é algo raríssimo: um drama de renovação matr imonia l no
qual a revitalização deve ser encontrada no fluxo não dramático da comunhão diária.
Os Joyce, Alex (Sanders) e Katherlne (Bergman), entediados e ressentidos um com o
outro, estão em um estado de suspensão. Estar "de férias" os deixa Irrequietos, às vezes
angust iados com a cultura estrangeira que os cerca. A comida é diferente; o sono vem
em horários esquisitos, com o sol ainda no céu; há encontros com estranhos que
oferecem distração ou tentações.
E há também a paisagem, as cidades de Nápoles, Capri e Pompeia. Romance na
Itália representa uma virada radical na obra da década de 50 de Rossell ini: ele deixa de
lado o neo-real ismo "socia lmente compromet ido" em função de um realismo intros
pectivo e emot ivo, prefigurando Michclangelo Antonloni e, especia lmente, o Jean-Luc
Godard de O desprezo (1963). Porém há ainda um clima de realidade documenta l nas
Imagens que Katherlne vê de seu carro, nas Igrejas, ca tacumbas, poças de lama, escava
ções arqueológicas... O ambiente Imposit ivo acrescenta contexto, história e até mitolo
gia ao enredo Intimista e conjugal. Ele faz o passado Influir no presente, levando os
personagens a recordarem de forma Incessante momentos format ivos. E insere essa
pequena crise individual em um ciclo cósmico de nascimento, morte e renascimento.
Pouco é explicado em Romance na /tá/ia, porém tudo é sentido: este é um fi lme que
pode terminar orgulhosamente - pouco antes de outro plano de uma mult idão passagei
ra e comum - com um arrebatador plano de grua e a milenar declaração: "Eu te amo." AM
186
CONTOS DA LUA VAGA (1953)
(UGETSU MONOGATARI) Em meados da década de 50, quando o circuito internacional de festivais de cinema
começava a surgir, os cineastas do Ocidente f inalmente descobriram o que seus colegas
japoneses já sabiam há anos: que aquele tal Kenji Mizoguchi era realmente algo fora de
série. Contos do lua vaga (cujo título original significa, l iteralmente, A história de Ugetsu,
mais conhecido s implesmente como Ugetsu) foi o f i lme no qual as atenções Inter
nacionais se concentraram. Embora não seja necessariamente o melhor de Mizoguchi
(honra que poderia ser concedida com a mesma facilidade ao profundamente tocante
Crisântemos tardios, de 1939), ele ainda é o mais conhecido do diretor na Europa e nos
Estados Unidos c certamente uma das maiores obras-primas do cinema mundia l .
Mizoguchi vinha escrevendo e dirigindo f i lmes desde a década de 20, contudo, não
podemos culpar n inguém pelo fato de sua obra ter permanecido prat icamente Inédita
no Ocidente, pois o Japão era um mercado isolado. No entanto, quando Contos da lua
vaga aportou nas margens ocidentais, ele veio com tudo: críticos tanto europeus
quanto norte-amer icanos o elogiaram entus iast icamente, proclamando-o o arauto de
uma maneira to ta lmente nova de se fazer c inema. Talvez t ivessem razão. Porém, o que
torna Contos da lua vaga tão extraordinário?
A mescla do real com o Imaginário é essencial ao f i lme, um tema que permeia os
enquadramentos e as interpretações dos atores a cada instante. O mestre nos puxa de
um plano da existência ao outro - às vezes com aviso, outras vezes sem. O controle
de Mizoguchi sobre o tom do f i lme é total : a aura de sobrenatural ldade e profanação
jamais se dissipa por completo.
Entretanto, esta não é uma história de fan tasmas comum. Contos da lua vaga util i
za a dicotomia real/sobrenatural para explorar questões referentes a amor, honra, res
ponsabil idade e famíl ia. Cada um desses temas é tocado de alguma forma pelo mundo
fantasmagór ico que Mizoguchi traça minuc iosamente sobre a realidade que conhece
mos, e nenhum deles sai incólume desse contato. Os homens tolos e as mulheres
sofridas do f i lme passam todos por transformações violentas causadas pela interação
do sobrenatural com o real.
Contos da lua vaga é perturbador, des
concertante e belo. Acima de tudo, po
rém, ele é belo; um f i lme que nos faz as
sumir uma postura humi lde: assisti-lo é
estar na presença da grandeza. EdeS
J a p ã o (Dalei) 94 min. P&B
I d i o m a : japonês
D i r e ç ã o : Kenji Mizoguchi
P r o d u ç ã o : Masaichi Nagata
R o t e i r o : Matsutarô Kawaguchí.
Akinari Ueda, Yoshikata Yoda,
baseado nos contos "Asaji Ca YadO" I
"Jasei No In", de Akinari Ueda
F o t o g r a f i a : Kazuo Miyagawa
M ú s i c a : Fumio Hayasaka, Tamekli hl
Mochizuki, lehirô Saitô
E l e n c o : Masayuki Mori, Machiko Kyfl,
Kinuyo Tanaka, Eitarò Ozawa, Ikib
Sawamura, Mitsuko Mito, Klkue
Mori, Ryosuke Kagawa, Eigoro Ouoc,
Saburo Date, Sugisaku Aoyama.
Reiko Kondo, Shonzo Nanbu,
Kozabuno Ramon, lehírô Aniano
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Kusune
Kainosho (figurino)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Kenji Mlzogui I"
(Leão de Prata), indicação (Leão de
Ouro)
E U A (Paramount) 118 min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : George Stevens
P r o d u ç ã o : Ivan Moffat, George
Stevens
R o t e i r o : A. B. Guthrie Jr., baseado no
livro de Jack Shaefer
l o t o g r a f i a : Loyal Griggs
M ú s i c a : Victor Young
llinco: Alan Ladd, Jean Arthur, Van
Heflln, Brandon De Wi lde, Jack
I ' . I I . I I H c, Ben Johnson, Edgar
Bui I1.111.1n, Emile Meyer, Elisha Cook
li , 1 louglas Spencer, John Dierkes,
I Urn Corby, Paul McVey, John Miller,
Edith I vanson
O s c a r : loyal Griggs (fotografia)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : George Stevens
(melhoi Ulme), George Stevens
(diretor), A. B. Guthrie Jr. (roteiro),
I'.i,1 IH I n n De Wilde (ator coadjuvante),
|li I Palance (ator coadjuvante)
OS BRUTOS TAMBÉM AMAM (1953)
(SHANE) Os brutos também amam não é o mais glorioso dos fi lmes de faroeste - para m im, este
seria El Dorado (1967) -, nem o mais mascul ino - que seria Rio vermelho (1948) - ou
mesmo o mais autêntico - Jogos & trapaças .(1971) -, o mais estranho - lohnny Cuitar
(1954) - ou o mais dramático - No tempo das diligências (1939). No entanto, é certamente
o mais icônico, o faroeste que fica cravado na nossa memória, aquele que ninguém
consegue esquecer depois de assistir. Tudo no f i lme, na verdade, é pura Imagem: o herói
vestido de couro que surge por acaso na cidade (Alan Ladd); o boladelro conivente (Emile
Meyer) , com seus caubóls asquerosos e mal-educados; o colono humilde (Van Heflln),
com sua esposa amorosa, dócil c prendada (Jean Arthur) e seu filho Ingênuo (Brandon De
Wilde); o dono do bar e da loja de artigos gerais taciturno, desconfiado e velho (Paul
McVcy) ; o Imigrante sueco t ímido (Douglas Spencer); Wi lson, o matador de aluguel (Jack
Palance, vestido de preto dos pés à cabeça), que é a sombria, ardilosa e abjeta personifi
cação do Mal encarnado. De fato, os personagens por si próprios são a história.
O boiadeiro quer as terras do colono. Shane instala-se na propriedade deste para ajudá-
lo a protegê-la, conquistando, no processo (e talvez um pouco demais), sua esposa ordeira
e seu filho deslumbrado, que tem a infância roubada. Wilson é trazido para expulsar os
colonos e, não fosse pela Intervenção de Shane - fogo contra fogo, olho no olho, nobreza
versus maldade -, teria com toda a certeza conseguido. No entanto, o Bem triunfa, e de
forma tão profunda que Shane passa a ver o efeito que teve naquela charmosa e modesta
família, monta em seu obediente cavalo e parte no final do filme, cavalgando em direção
a um pôr-do-sol que ofusca todos os demais pores-do-sol. O
pequeno Joey corre atrás dele, gritando: "Shane! Eu te amo, Shane!"
Filmado em Jackson Hole - e antes da era do widescreen e do Dol
by Stereo -, Os brutos também amam é repleto de Imagens icônlcas. A
cordilheira arroxeada do Grand Tetons ao fundo; um cervo pastando
diante de um lago espelhado enquanto o menino atira nele com seu ri
fle de brinquedo; o sorriso repugnante de desdém no rosto do
boiadeiro quando Starrett (Heflin) se recusa a lhe entregar suas terras;
a expressão nos olhos de Palance quando ele atira no desarmado Frank
"Stonewall" Torrey (Elisha Cook Jr.), derrubando-o na lama. O diretor
George Stevens torna a lama palpável, como chocolate derretido.
Duas imagens já fazem com que este f i lme seja digno de ser
assistido diversas vezes. Elas servem de testemunha, senão da
História, ao menos do cinema. Wilson andando como um pavão
pela calçada de madeira com as esporas de suas botas retinindo,
enquanto o cachorro da cidade é mostrado em um plano fechado,
fugindo com o rabo entre as pernas. E Shane , depois de conhecer
os Starrett e aceitar o convite deles para jantar, refestelando-se
com uma torta de maçã. Essa é a torta de maçã das tortas de ma
çã: suculenta, dourada, treliçada, volumosa, retirada do forno por
uma bela garota em um vestido de algodão azul e servida com um
bom café preto. Podemos até imaginar que foram tortas de maçã
como essas que fizeram o Oeste americano; não armas, gado ou
aquele olhar distante e sonhador para o horizonte. MP
O DIABO RIU POR ULTIMO (1953)
(BEATTHEDEVIL) Faci lmente um dos f i lmes mais irreverentes e irônicos produzidos sob os auspícios de
Hol lywood, O diabo riu por último se destaca por vários mot ivos. Em primeiro lugar, a
quant idade e o nível dos talentos envolvidos nele são verdadeiramente extraordinários.
John Huston dirige com base em um roteiro espirituoso e amargo que escreveu em
parceria com n inguém menos do que Truman Capote; o fotógrafo Oswald Morr is teve
como assistente o futuro gigante da fotografia Freddie Francis; até mesmo um jovem
Stephen Sondhe im participou das f i lmagens batendo as claquetes.
E então temos o elenco. Humphrey Bogart foi um dos produtores e foi seu respaldo
que possibil i tou que o f i lme fosse feito. Na tela, unem-se a ele Gina Lollobrigida e
Jennifer Jones , a lém de dois dos maiores coadjuvantes de todos os tempos: Peter Lorre
e Robert Morley. Esta é uma produção em que se percebe que os atores se divert iram
imensamente no set de f i lmagem.
O enredo tem algo a ver com a exploração de urânio na África, mas não é tão Im
portante. Aqui, as leis tradicionais de causa e efeito são flexibilizadas, graças, em parte,
ao fato de o f i lme ser uma co-produçâo internacional e independente. Isso aumentou a
liberdade criativa e a autonomia f inanceira, e os talentos por trás de O diobo riu por
último t iraram proveito disso. Este é um f i lme único que se perdeu no tempo. EdeS
I n g l a t e r r a / E U A / I t á l i a (Rizzoll-
Haggiag, Romulus, Santana) |{ m
P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : John Huston
P r o d u ç ã o : Jack Clayton
R o t e i r o : Truman Capote, John
Huston, baseado no livro de Jamei
Helvick
F o t o g r a f i a : Oswald Morris
M ú s i c a : Franco Mannino
E l e n c o : Humphrey Bogart, Je I n
Jones, Gina Lollobrigida, Robeii
Morley, Peter Lorre, Edward
Underdown, Ivor Barnard, Man 0 lulli
Bernard Lee, Mario Perrone, Giulio
Donnini, Saro Urzi, Aldo Silv.iui. I i i . i n
de Landa
JOHNNY GUITAR (1954)
O melodrama de johnny Cuilar é tão exagerado que alguns o acharão risível. Outros
serão conquistados por seu poder hipnótico. Joan Crawford interpreta Vienna, a dona
de um saloon que fica em um terreno valorizado por uma ferrovia. Mercedes M c C a m -
bridge é Emma Smal l , a filha solteirona, que só se veste de preto, de um grande proprie
tário de terras. Ela é apaixonada pelo homem apelidado de Dancing Kld (Scott Brady)
que, por sua vez, ama Vienna, que tem outro homem no seu passado: Johnny Guitar,
interpretado por Sterl ing Hayden. Enlouquecida por seu desejo frustrado, Emma lidera
um bando de l inchadores para incendiar o saloon de Vienna e enforcar Kid. Vienna, no
entanto, não se deixa abalar. No f im, há um tiroteio entre as duas mulheres, o tipo de
subversão de convenções que levou alguns críticos a considerarem o f i lme feminista.
Ele também foi interpretado como uma alegoria ant i -McCarthy, contra a histeria cole
tiva e a favor daqueles que defendem seus princípios.
Seja qual for seu verdadeiro signif icado, johnny Cultor, f inanciado pelos estúdios
Republic, uma produtora menor, é corajosamente barroco no uso que faz de cores
fortes, no seu estilo de a tuação virtuoso (com Crawford part icularmente espetacular) e
na beleza inesquecível da sua canção- tema, cantada pela grande Peggy Lee. Se esse
tipo de exuberância artística for demais para você, talvez seja melhor se l imitar aos
documentár ios. EB
E U A (Republic) no min. Trucolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Nicholas Ray
P r o d u ç ã o : Herbert J . Yates
R o t e i r o : Philip Yordan, bascad
livro de Roy Chansior
F o t o g r a f i a : Harry Stradllng S i .
M ú s i c a : VictorYoung
E l e n c o : Joan Crawford, Sterling
Hayden, Mercedes McCambridge,
Scott Brady, Ward Bond, Ben ( n u p e i .
Ernest Borgnine, John Carradiue,
Royai Dano, Frank Ferguson, Paul I I " .
Rhys Wil l iams, Ian MacDonald
I U A ( ( nliimbia, Horizon) 108 min.
I 'M !
i d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Elia Kazan
P r o d u ç ã o : Sam Spiegel
ROttlro: Malcolm Johnson, Budd
Si hulberg, baseado, na série de
>I I Igos de Malcolm Johnson
F o t o g r a f i a : Boris Kaufman
Mdlll »: I couard Bernstein
I I c - i n o : Marlon Brando, Eva Marie
l | Karl Maiden, Lee J . Cobb, Rod
Slelgcr, Pat Henning, Leif Erickson,
limes Wcstcrf ield, Tony Galento,
I. M.iuriello, John F. Hamil ton,
1'ilni Hi ' ldabrand, Rudy Bond, Don
nl.ii l'm.m, Arthur Keegan, Abe Simon
Oil • " : ' i i n Spiegel (melhor fi lme),
III I I . M U (diretor), Budd Schulberg
( i i i i i ' i n i ) , Marlon Brando (ator), Eva
Marie Saint (atriz coadjuvante),
III haul Day (direção de arte), Boris
I m i I I I . i i i (fotografia), Gene Milford
(edição)
u n i u . H .10 a o O s c a r : Lee J . Cobb (ator
I oadjuvante), Karl Maiden (ator
' ' ladjuvante), Rod Steiger (ator
I oadjuvante), Leonard Bernstein
( m i l ' . I i . l)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Elia Kazan
[prêmio OCIC), (Leão de Prata),
( 11111111 i ( I < 1.1 crítica italiana), indicação
(I l i o de Ouro)
SINDICATO DE LADROES (1954)
(ON THE WATERFRONT) " E u poderia ter classe. Eu poderia ter sido um lutador. Poderia ter sido a lguém, em vez de
um vagabundo, que é o que eu sou, vamos admitir." Um dos maiores f i lmes americanos
de todos os tempos, Sindicato de ladrões caiu como uma bomba em um país abalado
pelas traições e pela paranóia do pânico ant icomunista. Doloroso e terno, ele Introduziu
em Hol lywood um novo tipo de realismo social contundente, graças, em grande parte,
ao fato de ser repleto de interpretações inesquecíveis de vários atores do teatro nova-
iorquino da geração do pós-guerra, adeptos do natural ismo e do "Mé todo " do Actors
Studio, técnica de representação baseada nos preceitos de Constantin Stanislavsky.
O bronco, porém sensível, Terry Mal loy (Marlon Brando, mais belo do que nunca),
um boxeador fracassado que se tornou estivador e garoto de recados do corrupto chefe
do sindicato Johnny Friendly (Lee J. Cobb), é a tormentado pela sua part icipação
involuntária no assassinato de um estivador descontente. Sua culpa é exacerbada
quando ele se apaixona pela irmã do morto, Edie Doyle (Eva Marie Saint em sua estréia
no c inema), porém a descoberta de que ele t ambém foi traído - de forma ainda mais
desoladora, por seu irmão mais velho e mais esperto, Charley (Rod Steiger), que é
advogado e braço direito de Friendly - desencadeia uma crise i luminadora. Depois que
Edie convence o padre da região (Karl Malden), antes omisso, a liderar a cruzada contra
a corrupção do sindicato, as int imidações de Friendly se tornam mais mortais. Terry
desafia penosamente a lei do silêncio e testemunha em uma comissão parlamentar.
Apesar de fazer a coisa certa, Terry é rechaçado por "dedurar" a comunidade litorânea e
espancado no estaleiro antes de seus temerosos camaradas se jun tarem a ele,
desfazendo o controle de Friendly sobre suas vidas e seu trabalho.
O f i lme foi mais claramente inspirado na série de artigos de jornal chamada "Cr ime
on the Water f ront " (Crime no litoral), de autoria de Malco lm Johnson , que expunha a
corrupção nos estaleiros de Nova York e Nova Jérsei . O dramaturgo Arthur Mil ler
começou a trabalhar em um roteiro a pedido do diretor Elia Kazan. No entanto, quando
Kazan tes temunhou diante do Comitê de At iv idades Ant iamer icanas do Congresso,
Miller rompeu com ele. Kazan recorreu a uma outra " testemunha amigável", o roteirista
Budd Schulberg. A reputação dos dois homens sofreu danos permanentes e Sindicato de
ladrões é mui tas vezes rotulado como o pedido de desculpas ou como a defesa deles.
Kazan admit iu que se identif icava com o conflito de lealdade de Terry Malloy. Indepen
dentemente de qual lado se escolha, esse doloroso pano de fundo da vida real deu ao
f i lme um núcleo emocional visceral e sincero para o realismo do seu tema e o
natural ismo das suas interpretações (complementadas pela trilha evocativa de Leonard
Bernstein).
Terry confrontando Charley no banco de trás de um táxi é a cena clássica citada com
mais freqüência, porém há muitos outros momentos inesquecíveis: Brando brincando
com a pequena luva de Saint , colocando-a na própria mão; Terry descobrindo que todos
os seus pombos, dos quais ele cuidava com tanto carinho, foram mortos pelo menino
vizinho, que o admirava; Terry arrombando a porta de Edie e forçando-a a admit ir seu
amor à medida que eles descem ao chão em um beijo desesperado.
Cinqüenta anos depois, este f i lme cont inua sendo uma reflexão implacável sobre a
traição. AE
I UA (MGM) 102 min. Anscocolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Stanley Donen
Produção: Jack Cummlngs
U o t e i r o : Albert Hackett, Frances
I 'li i( h, Dorothy Kingsley, baseado
to "The Sobbin' Women" , de
Meplici i Vincent Benet
F o t o g r a f i a : George J . Folsey
Múllca: Adolph Deutsch, Saul
i 11.11>l11•. Johnny Mercer, Gene de Paul
llenco: Jane Powell, Howard Keel, Jeff
Rll haul',, Russ Tamblyn, Tommy Rail,
Man Hair . Mat t Mattox, Jacques
d'Ambolse, Julie Newmar, Nancy
Kllg.is. Betty Carr, Virginia Gibson,
t ' n i . i I I T . Norma Doggett, Ian Wolfe
( In , n : Adolph Deutsch, Saul Chaplin
(mush a)
i i n l i i .it .10 a o O s c a r : Jack Cummlngs
(melhoi fllme), Albert Hackett,
1 1 . IS Goodrich, Dorothy Kingsley
Iro), George J. Folsey (fotografia),
Ralph I. Winters (edição)
SETE NOIVAS PARA SETE IRMÃOS (1954)
(SEVEN BRIDES FOR SEVEN BROTHERS) Sete noivas para sete irmãos é um musical de 1954 profundamente sexista e a l tamente
assobiável - supostamente passado em grandes espaços abertos, porém f i lmado
sobretudo em estúdio -, com coreografias excelentes e atlét icas a cargo de Michael
Kidd e direção acima da média de Stanley Donen. Baseado em um conto de Stephen
Vincent Benet , que se Inspirou no rapto e estupro das mulheres sabinas, o f i lme é sobre
seis repulsivos irmãos caçadores de peles que vão à cidade procurar mulheres para
casar depois que Adam (Howard Keel), o mais velho deles, se casa com Mllly (Jane
Powel l) . Eles acabam seguindo seus instintos de homens da fronteira ao raptar as
mulheres. No entanto, precisam suportar todo o Inverno até que suas parceiras
improvisadas decidam perdoá-los na primavera.
Um olhar fascinante sobre a fantasia de estupro patriarcal que era considerada
bem-intencionada e até "boni t inha" à época, Interpretado ao som das músicas de
Johnny Mercer e Gene de Paul , que grudam no ouvido, Sete noivos para sete irmãos traz
no elenco Russ Tamblyn, Virgínia Glbson e Tommy Rali. Dentre as canções mais memo
ráveis - sendo que a lgumas delas Indicam com precisão a política sexual do f i lme -
estão: "B less Your Beautl ful Hldc", "Sobb in ' W o m e n " , "Go in ' Court in'", Tm A Lonesome
Polecat " e "Spr ing, Spring, Sprlng". J R . O S
Franca (1 ilmsonor, Vera) 114 min. P&B
Idioma: francês
D i r e ç ã o : Henri-Georges Clouzot
Producta Henri-Georges Clouzot
R o t e i r o : Henri-Georges Clouzot,
I ' • G r r o n i m i , Frederic Grendel,
kn ie Masson, baseado n o livro Celle
• im l i , i , i i í plus, de Pierre Boileau e
Thomas Narcejac
I l i t o g r a f i a : Armand Thirard
mii - . ic . 1 : George Van Parys
l l e n c o : Simone Signoret, Vera
i I- luzol. Paul Meurlsse, Charles
V i n i ' l . l e a n Brochard, Pierre Larquey,
Mu hei ' ,1 ' i rault , Therese Dorny, Noel
Roquevei 1, Yves-Marie Maurin,
< .fulges Poujouly, Georges Chamarat,
I I ques Varennes, Robert Dalban,
lean I elebvre
AS DIABÓLICAS (1954)
(LES DIABOLIQUES) Em uma escola pública decadente e provinciana, paixões assassinas fervem logo abaixo
da superfície. A esposa maltratada e frágil (Vera Clouzot) e a amante mister iosamente
sensual (S imone Signoret) de um diretor sádico (Paul Meurisse) o assassinam, desovan
do o corpo em uma piscina coberta de algas. Quando a piscina é drenada, o corpo não
está mais lá e as mulheres começam a enlouquecer, especialmente quando um aluno
afirma ter visto um fantasma. Logo as duas mulheres estão vendo coisas e algo horri
pi lante surge na banheira.
Um grande sucesso Internacional em 1954, As diabólicas perdeu um pouco do seu
poder perturbador, embora dezenas de filmes (Arrrradi/lia mortal. Com a maldade na alma)
tenham pegado emprestado seu enredo ardiloso e transformado seus momentos mais
chocantes em clichês. Henri-Georges Clouzot dirige com uma crueldade sombria que
combina a trama impiedosamente intricada digna de Hitchcock (dizem que o Mestre
realizou Ps/cose para resgatar a coroa de Rei do Suspense, que havia perdido brevemente
para Clouzot) com três interpretações centrais fortes e um cenário maravi lhosamente
deplorável. O f i lme possui cenas de horror físico (um truque com lentes de contato é
apavorante), mas Clouzot t ambém causa arrepios com Incidentes de sadismo comum,
como quando Meurisse força a esposa a comer o repugnante jantar da escola. KN
A REVOLUÇÃO DOS BICHOS {1954)
(ANIMAL FARM) A revolução dos bichos é o primeiro longa-metragem de an imação inglês
(se você desconsiderar Handling Ships (1945), um f i lme institucional da
época da guerra). Dirigido pela dupla de marido e mulher Halas-Batche-
lor (o inglês nascido na Hungria John Halas e a inglesa Joy Batchelor), é
baseado na sátira política mordaz de George Orwel l , publicada em 1945.
Na época em que o f i lme foi produzido, a an imação de longa-
metragem era dominada pela Disney. Determinados a se manter longe
do estilo do Tio Wa l t de animais bonit inhos e adoráveis, Halas-Batchelor
aceitaram prontamente uma encomenda do produtor americano Louis
De Rochemont (mais conhecido pela série de cinejornais March ofTime) para realizar o
primeiro longa de an imação ser iamente voltado para platéias adultas fora do bloco
comunista. Até o úl t imo rolo, A revolução dos bichos se atém com fidelidade ao roman
ce original, escrito por Orwell como uma sátira à traição dos Ideais da Revolução Russa.
Na Granja do Solar, os animais se revoltam contra seu dono bêbado e decadente e
Instauram uma comunidade democrát ica, livre de humanos, na qual " todos os animais
são iguais - mas alguns animais são mais iguais do que outros". A massa de animais,
oprimida e aterrorizada, apenas trocou um czar por outro.
Para realizar o f i lme, a empresa de Halas-Batchelor foi expandida, tornando-se o
maior centro de an imação da Europa Ocidental . A an imação alcança um sagaz equilí
brio entre esti l lzação e natural ismo - os animais não são antropomorf lzados e os cená
rios da fazenda são desenhados de forma realista. Sons de fazenda reais foram grava
dos para a trilha. O compositor clássico Matyas Seiber (como Halas, um inglês nascido
na Hungria) contribui com uma trilha poderosa e emotiva que mistura e lementos folk
com modern ismo, e todos os animais são dublados - com Incrível versat i l idade - pelo
ator Maur ice Denham.
A revolução dos bichos preserva de forma fiel a raiva, a compaixão e o humor
sarcástico do romance de Orwel l . A cruel
dade de certos incidentes não é atenuada -
pata desespero dos pais da época, que le
varam suas cr ianças ao cinema esperando
sent imenta l ismo ao estilo Disney. Apenas
o final foi modif icado para algo mais ot i
mista - De Rochemont e Halas-Batchelor
concordaram que a desolação sombria do
original era demais para o público. A m u
dança t a m b é m pode reivindicar uma certa
just i f icat iva histórica: Stal in morreu en
quanto o f i lme estava em produção. PK
I n g l a t e r r a (Halas and Batchelor)
72 min. Technicolor
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Joy Batchelor, John Halas
P r o d u ç ã o : Louis De Rochemoni , John
Halas
R o t e i r o : Joy Batchelor, John ll,il.i\,
Borden Mace, Philip Stapp, Lolhai
Wolff, baseado no livro de George
Orwell
F o t o g r a f i a : S. G. Grifflths, J . Gurr,
W.Taylor, R.Turk
M ú s i c a : Matyas Seiber
E l e n c o : Gordon Heath (narrador),
Maurice Denham (todos os animai'.)
JANELA INDISCRETA (1954)
(REAR WINDOW) A apoteose de todas as fixações psicossexuais ardentes e mal reprimidas de Hltchcock,
janeío indiscreta é também provavelmente (com a possível exceção de Um corpo que cai, de
1958) a mais bem-sucedida mistura de entretenimento, intriga e psicologia da extraordi
nária carreira do diretor. Um estudo fascinante sobre a obsessão e o voyeurismo, janela
indiscreto combina um elenco perfeito, um roteiro perfeito e principalmente um cenário
perfeito para um fi lme - que é ainda melhor do que a soma de suas partes.
Para ter o máximo de liberdade, Hitchcock construiu uma complexa réplica de um
prédio de apar tamentos abarrotado de pessoas e em constante agi tação com seu pátio
igualmente mov imentado. Cada janela dá vista para uma outra vida e, para todos os
efeitos, conta outra história. Em uma, um compositor se debruça sobre seu plano,
lutando com sua obra mais recente. Em outra, um dançarino treina compuls ivamente.
Um apar tamento abriga uma mulher solitária, mal-sucedlda no amor, enquanto outro
abriga um apaixonado casal recém-casado.
L. B. "Jef f " Jeffrles (James Stewart) é um fotógrafo de sucesso afastado do trabalho
por conta de uma perna quebrada. Preso a uma cadeira de rodas o dia todo, não tem
nada melhor para fazer do que espiar seus vizinhos. Ou pelo menos é o que ele afirma,
pois sua namorada (e aspirante a esposa), a modelo profissional Lisa (Interpretada por
uma surpreendentemente sensual Grace Kelly, em um de seus úl t imos papéis antes da
aposentadoria), e sua enfermeira rabugenta Stella (Thelma Ritter) observam com pers
picácia que ele está apenas viciado na emoção do voyeurismo.
1 HA (Paramount, Patron) 112 min.
I r i l inkolor
l i l i n i n . i : i n j ' l r s
D l r e c a o : Alfred Hitchcock
P r o d u c H o : Alfred Hitchcock
H o t i ' l r o : lohn Michael Hayes,
bueado no conto "ft Had to Be
M i i t i h i " . de Cornell Woolrlch
t o t o g r a f l a : Robert Burks
M u t k a : I ranz Waxman
11• -• 1«11. | . l i n e s Stewart, Grace Kelly,
Wendell Corey, Thelma Ritter,
Raymond Burr, Judith Evelyn, Ross
! • > • ! • . m a n , Ceorglne Darcy, S a r a
1 1 1 1 1 . 11.ink Cady, Jesslyn Fax, Rand
ll.npi'i, liene Winston, Havls
Davenport
l i u l k . i c S o a o O s c a r : Alfred Hitchcock
[dlrttor), lohn Michael Hayes
(ui lelm), Robert Burks (fotografla),
I men 1 Ryder (som)
A idéia de que alguém conseguirla desgrudar os olhos de uma personagem tão bela e
radiante quanto Lisa é difícil de acreditar, até que Jeff começa a suspeitar que um de seus
vizinhos (um carrancudo Raymond Burr) assassinou a esposa. Logo, Jeff arrasta Lisa e
Stella para o mistério, estudando obsessivamente o comportamento do personagem de
Burr em busca de sinais de culpa. Contudo, à medida que a Investigação furtiva de Jeff
avança, o mesmo acontece com histórias de todos os seus outros vizinhos, que ignoram
a trama abominável que possivelmente se desenrola literalmente na porta ao lado.
janela indiscreta é construído de forma tão minuciosa quanto seu complexo
cenário. Assisti- lo é como observar um ecossistema vivo, pulsante, com a emoção adi
cional de um misterioso assassinato para completar. Hltchock se diverte com o cenário
part icularmente pós-moderno do f i lme: nós, os espectadores, somos hipnotizados
pelas ações dos personagens, que, por sua vez, estão hipnotizados pelas ações de
outros personagens. É um círculo vicioso de obsessão arrematado com humor negro e
um toque de sensual idade.
De fato, embora o abelhudojef f possa descobrir um assassinato no seu vilarejo ur
bano, são os vários romances que ocorrem nos outros apar tamentos que chamam
inic ialmente sua atenção para o peep show do pátio. É uma perfeita ironia que suas
obsessões pela vida amorosa dos v iz inhos o impeçam de admit i r seu interesse
romântico em Lisa. Na verdade, o solteiro que existe em Jeff vê seus vizinhos como uma
desculpa para repelir os avanços dela. Apenas quando suas at i tudes a co locam em
perigo ele f ina lmente percebe que o que tem diante de si é melhor do que qualquer
coisa que possa ver pela janela. JKl
I UA 1 h.nr.(on,i, Warner Bros.)
ill In hnicolor
i i l i i i o i . i : Inglês
nhi ' i , i u I ,eorge Cukor
r i . i . l i i i .10: Vern Alves, Sidney Luft
ROUlro: Moss Hart, baseado no
n i i i ' i i o i l r 1937 de Alan Campbell e
I I hv Parker, argumento de
Willi.nu A. Wel lman
l o l o n i . i f i . i : Sam Leavitt
M ú s i c a : Harold Arien, Ray Heindorf
11 , - in o hilly (,,11 land, James Mason,
I n f I . i r ,on, Charles Bickford, Tommy
Noon.in, I ucy Marlow, Amanda Blake,
li viii|'. Ii.ii on. I lazel Shermet
i n i l l i at .10 a o O s c a r : James Mason
( ). I m l y Garland (atriz), Malcolm
i l ien, Gene Allen, Irene Sharaff,
' , e o i | ; e |,unes Hopkins (direção de
li o I h i n I oiiis Mary, Ann Nyberg,
em Sharaff (figurino), Ray Heindorf
ill a), H,nold Arlen, Ira Gershwin
(1 . n u , , 1 0 )
NASCE UMA ESTRELA (1954)
(A STAR IS BORN) O terceiro é o melhor (e o segundo dirigido por George Cukor) de quatro f i lmes sobre
um casamento arruinado pela ascensão meteórica ao estrelato da esposa mais jovem e
a autodestruição do ídolo decadente/mentor que ela ama. O f i lme de 1937, de Wi l l iam
We l lman , com Fredric March e Jane t Gaynor, ainda é um drama comovente; a versão
rock de 1976, com Barbra Streisand e Krls Kristofferson, é memorável apenas por tê-la
cantando. Porém o musical de Cukor, com Judy Garland (em um retorno tr iunfante) e
J a m e s Mason em interpretações excelentes, inovou dentro do gênero musical ao
impulsionar uma narrativa dramática com canções - especia lmente na atormentada
"The Man That Got Away" de Garland e no número arrebatador "Born In A Trunk". Insu
perável, o Norman Maine de Mason está fascinante em sua aparição bêbado na cerimô
nia do Oscar.
Em parte uma sátira a Hol lywood - divertida ao mostrar a transformação no es tú
dio da insossa Esther Blodgett na glamourosa Vicky Lester e ácida em sua representa
ção da máquina publicitária que aprisiona Esther e Norman -, o f i lme é uma bela mis
tura de música, inteligência e tragédia romântica, realizado com uma convicção cat i
vante. Em 1983, mais de 20 minutos de material anter iormente cortado foram restaura
dos, incluindo dois números escritos para Garland por Harold Allen e Ira Gershwin. AE
1 HA / l i . i l i . i (Figaro, Rizzoli-Haggiag)
1 1 lei hnicolor
l i l l o m a : ingles
i i i , e , . i o : Joseph L. Mankiewicz
P i o d u c . i o : Franco Magli
in , 1 , m i . loseph L. Mankiewicz
F o t o g r a f l a : Jack Cardiff
M u s k . i : Mai io Nascimbene
1 l e i u o : 1 lumphrey Bogart, Ava
1 . . 111111 • 1 , 1 dinond O'Br ien, Marius
g, Valentina Cortese, Rossano
i i i 1 . 1 l i /abeth Sellars, Warren
M e v i ' i i ' . , Franco Interlenghl, Mari
A l i l i m . Alberto Rabagliati, Enzo
Sl . i lo l . i , Maria Zanol i , Renato
1 hl intonl , Bill Fraser
( I I I .11: I dinond O'Brien (ator
1 n.iiljuvante)
Indli I I .10 a o O s c a r : Joseph L.
M i n i ' lewlcz (roteiro)
A CONDESSA DESCALÇA (1954)
(THE BAREFOOT CONTESSA) Os atrativos superficiais de A condessa descalça, de Joseph Mankiewicz, são óbvios - Ava
Gardner no auge do glamour como Maria Vargas, a estrela que saiu da sarjeta para a for
tuna, ao lado de Humphrey Bogart em seu momento mais amargo, embora terno, como o
cineasta Harry Dawes; uma enxurrada de falas passíveis de citação ("Nunca é tarde demais
para se desenvolver um personagem"); e as alusões Intrigantes a celebridades da vida real,
incluindo Rita Hayward e Howard Hughes. No entanto, o fi lme não se limita a eles.
A condessa descalça foi buscar em Cidadão Kane (1941) a sua estrutura em mosaico
que oferece vários pontos de vista sobre um personagem - o que revela somente como
aquela pessoa era insondável. A partir do funeral de Maria, oito f lashbacks provêm de
quatro narradores. Mul to antes de Pulp F/ction - Tempo de violência (1994), Mank iewicz
realiza uma seqüência que mostra a transição de Maria de Bravano (Marius Goring) para
Vincenzo (Rossano Brazzi) de dois pontos de vista diferentes.
O fi lme transita por três realidades sociais - o show business de Hol lywood, a alta
sociedade francesa e a aristocracia italiana - excepcionalmente distintas, cada qual
fechada em sl mesma, decadente e moribunda. Essa sinfonia da decadência encontra eco
na representação do mundo do teatro no clássico de 1950 de Mankiewicz, A malvada.
Enquanto seus fi lmes são às vezes criticados, com justiça, como teatrais e presos ao texto
escrito, a riqueza e a coerência de A condessa descalça vêm da sua metáfora do espetáculo
teatral. A marca de Mankiewicz é o "congelamento" da imagem, em que a história pára e
um narrador apresenta o personagem e nos dá o perfil de cada "jogador" à mesa. AM
A ESTRADA DA VIDA i v . (LA STRADA) A estrada da vida é o quarto f i lme de Federico Fel li ni e o que fez sua reputação
internacional. Estrelando Anthony Qulnn como Zampano, o homem-múscu los , e a
esposa do diretor, Giulietta Maslna, como a miserável Gelsomina. É uma história de
amor e c iúme passada no circo, um melo recorrente na obra de Felliní. Zampano faz um
número banal em que arrebenta correntes amarradas cm volta do seu peito. Precisa de
uma assistente, então compra Gelsomina de sua mãe para acompanhá- lo pela estrada.
Ela atua como palhaça e seus gestos lembram Charles Chapl in. Quando eles se jun tam
a um circo i t inerante, Gelsomina fica temporar iamente fascinada por um acrobata,
Bobo, interpretado por Richard Basehart . Embora a trate mal , Zampano sente c iúmes
de Bobo e suas at i tudes levam o f i lme ao seu poderoso desfecho.
A estrado da vida é contado em um estilo de fábula que começa a se afastar do neo-
realismo de boa parte do cinema Italiano no pós-guerra, um movimento com o qual
Felllni se envolveu Int imamente como roteirista. Embora seja f i lmado em locação, ele
poderia se passar nos dias de hoje ou há 100 anos. Zampano e Gelsomina são arquéti
pos, personagens simples impulsionados pelas emoções e desejos mais elementares. A
ação do fi lme se dá como se fosse predeterminada e os personagens precisam agir da
forma que agem, o que torna a história trágica. A representação comovente de Maslna
da maltratada porém corajosa Gelsomina definiria sua persona cinematográfica em vá
rios f i lmes posteriores de Felllni e em boa parte de seus outros trabalhos como atriz.
Ouinn está igualmente inesquecível como o bruto homem-músculos, incapaz de com
preender os próprios sent imentos cm relação a Gelsomina. Ambos os atores realçam o
descompasso entre as performances de seus personagens e a realidade de suas vidas.
Em toda a sua obra, Fel Mn i foi fascinado pela tensão entre a faceta teatral de seus
personagens e suas vidas Interiores Inexploradas e confusas. A estrada da vido
conquistou o Oscar de melhor f i lme
estrangeiro e é provavelmente o f i lme
mais acessível e querido do diretor.
Contudo, esnobes e sofist icados em
geral não devem usar isso contra esta
obra complexa e comovente , que con
tínua oferecendo novos ínslghts c
idéias a cada vez que a revemos. RH
I t á l i a (Ponti-De Laurentlis) 94 min
P & B
I d i o m a : italiano
D i r e ç ã o : Federico Felllni
P r o d u ç ã o : Dino de Laurentlis. ( n i "
Ponti
R o t e i r o : Federico Felllni, Tullio Pl l i l l
F o t o g r a f i a : Otello Martell i , Carlo
Carlini
M ú s i c a : Nino Rota
E l e n c o : Anthony Quinn, Giulietta
Maslna, Richard Basehart, Aldo
Sl lvanl, Marcella Rovere, Lívia
Venturini
O s c a r : Itália (melhor f i lme
estrangeiro)
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Federico I elllnl
Tullio Pinel li (roteiro)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Federit 111 i-llim
(Leão de Prata), indicação (I ejo dl
Ouro)
J j p J u (loho) 155 min. P & B
idioma: japonês
DlriçSo: Akira Kurosawa
Produção: sojiro Motoki
Roteiro: Shinobu Hashimoto, Akira
!• urosawa, Hideo Ogumi
f o t o g r a f i a : AsakazU Nakai
M u s i c a : Fumio Hayasaka
I Itnco: lakashi Shimura.Toshiro
Mi lui i r , Yoshio Inaba, Seiji
Mlyafuichi, Minoru Chiaki, Daisuke
Kalo, Kao Kimura, Keiko Tsushima,
ml' [ko Shlmazaki, Kamatari Fujiwara,
rOlhlO Kosugi, Bozuken Hidari,
r*0ihl0 iMichiya, Kokuten Kodo j i ro
Kum.ici
n u l l t a ç ã o a o O s c a r : So Matsuyama
(direção <lc arte), Kôhei Ezaki
(ftguiino)
f e s t i v a l d e V e n e z a : Akira Kurosawa
il lio de Prata), indicação (Leão de
I mio)
OS SETE SAMURAIS (1954)
(SHICHININ NO SAMURAI) Akira Kurosawa é o diretor japonês mais conhecido em todo o mundo. Os sete samurais,
um épico empolgante e humano, é sua obra-prima de popularidade mais duradoura e
t ambém seu f i lme mais assistido. A ref i lmagem hol lywoodiana eletrlzante, embora
menos profunda, Sete homens e um destino (1960) é o mais bem-sucedido dos muitos
f i lmes de faroeste baseados na obra de Kurosawa - incluindo Quatro confissões, de
1964, uma releitura de Rashomon (1950), e o western spaghett l fundamenta l Por um
punhado de dolares (1964), comple tamente decalcado por Sergio Leone de Vojimbo, o
guarda-costas (1961). A divertida permuta cultural é uma deliciosa prova da l inguagem e
do apelo universais do c inema. Kurosawa inspirou-se nos faroestes de John Ford e rea
lizou algo que rompe corajosamente com as tradições l imitadas do típico jidal-geki
japonês, f i lme histórico com ênfase em lutas de espadas em um Japão medieval
retratado como uma terra de fantasia. Os sete samurais é carregado de cenas de ação
surpreendentes, Incidentes cômicos, desventuras, drama social , ó t imo desenvolvi
mento de personagens e confl i to entre dever e desejo, tudo tratado com uma atenção
imaculada ao realismo.
Um pobre vilarejo de fazendeiros, à mercê de bandidos que retornam todos os anos
para estuprar, matar e roubar, toma a decisão radical de revidar contratando roii/n (sa
murais it inerantes, sem mestre) para salvá-los. Uma vez que podem oferecer apenas
pequenas porções de arroz como pagamento, os afl itos emissários que saem em busca
de espadas de aluguel têm a sorte de encontrar Kambel (Takashi Shlmura) , um homem
honrado c compassivo resignado a fazer o que um homem tem que fazer, apesar de
saber que não ganhará nada ao fazê-lo. Em muitos aspectos o arquétipo do herói, ele
recruta cinco outros andari lhos dispostos a lutar por comida e diversão, entre eles um
velho e bem-intencionado amigo, um jovem aprendiz inocente e um mestre espada
chim de poucas palavras. O jovem Kikuchlyo (Toshlro Mi fune) , esquentado, Impulsivo e
palhaço, é rejeitado pelos homens experientes, mas o camponês fantasiado de samurai
os acompanha assim mesmo, louco para provar seu valor e Impressionar Kambel . Os
aldeões t ratam o grupo com desconf iança, mas, aos poucos, laços se for
m a m , um caso de amor f loresce, as crianças se aproximam de seus heróis
e Kambei organiza uma resistência impetuosa que surpreende, enfurece e
acaba derrotando os invasores.
O f i lme é leve, ágil e econômico, el iminando explicações desneces
sárias. Ele evoca mistério e sustenta um clima de apreensão - com planos
breves e cortes rápidos const i tu indo a busca dos camponeses por prote
tores em potencial e expondo seu caso a Kambel . Há mul tas cenas de um
poder visual e emocional avassalador - uma mulher à beira da morte se
arrastando de um moinho em chamas e entregando seu bebê para
Klkuchiyo, que se senta no riacho em choque, soluçando e gri tando: "Es te
bebê sou eu. Aconteceu a mesma coisa comigo", a roda do moinho, incen
diada, girando às suas costas. No entanto, o melhor momento do f i lme é o
desfecho: os três sobreviventes examinam as covas dos seus camaradas à
medida que os camponeses abaixo, distraídos, vo l tam toda sua atenção
para o alegre ritual da plantação do arroz. AE
SEDUÇÃO DA CARNE (1954) (SENSO) Sedução da carne foi o terceiro f i lme do conde Lucfnno Visconti e seu primeiro em cores.
Passado nas Veneza e Verona da década de 1860, às vésperas da expulsão dos austríacos
realizada por Ciuseppc Garibaldi e da criação do Estado italiano moderno, marcou uma
ruptura total com o meio proletário dos f i lmes anteriores do diretor, Obsessão (1942) e
A terra treme (1948). Não obstante, a teatral idade patente de Sedução da carne não é
diferente das paixões extravagantes de Obsessão, nem menos "au tênt ica" por conta de
seu cenário aristocrático suntuoso (dizem que o diretor insistiu para que flores fossem
cortadas diar iamente para cada aposento no set de f i lmagem, independentemente de
haver ou não f i lmagem ali).
Alida Valli é a condessa Lívia Sepier i , uma partidária de Garibaldi que intercede em
favor de seu primo quando ele desafia, de forma suicida, um oficial austríaco para um
duelo. O tenente Franz Mahler (Farley Granger) dist intamente foge da luta. Um conquis
tador bonito e sem princípios, Mahler seduz a condessa, que irá trair impuls ivamente
seu marido, sua honra e seu país pelo amor dele.
Com um roteiro creditado tanto a Tennessee Wi l l iams quanto a Paul Bowles - entre
seis roteirlstas no total -, Sedução da carne é um melodrama ni t idamente de alto nível.
Vall i , uma atriz que já passara do seu auge, com olhos faiscantes, os dentes expostos,
mal parece acreditar nas suas at i tudes à medida que pede cautela aos quatro ventos e
aposta tudo em um irresponsável que não faz questão de esconder sua própria covar
dia. Farley Granger está ainda melhor, es
pecialmente na grande cena do clímax em
que ele dá vazão ao seu autodesprezo. Re
lações desequil ibradas e sadomasoquistas
semelhantes a essas vo l tam a aparecer em
f i lmes posteriores de Viscont i , especial
mente em Os deuses ma/d/tos (1969) e Mor
te em Veneza (1971), porém nenhum deles
alcança a ferocidade demonstrada aqui .
Sedução da carne começa na ópera e a
trilha de Anton Bruckner acentua cada ponto
de virada dramático com um trovão operís
tico. "Gosto muito de óperas, mas não
quando elas ocorrem fora do palco", observa
a condessa ao tentar dissuadir Mahler de
aceitar o desafio de seu primo. O mais re-
nomado diretor de óperas da Itália, Visconti
claramente pensava o contrário. TCh
HOMENS INDOMÁVEIS (1954)
(SILVER LODE) Neste faroeste emocionante , John Payne interpreta Dan Ballard, um boiadeiro res
peitado e querido na pequena cidade em que viveu pelos úl t imos dois anos. Durante as
comemorações do 4 de Ju lho, quatro estranhos aparecem na cidade, l iderados por um
bandido beligerante e desagradável (Dan Duryea) que afirma ser um agente federal com
um mandado de prisão por assassinato para Ballard. À medida que a ação se desenrola
(em um período equivalente à duração do f i lme), os moradores da cidade se vol tam
contra Ballard e acabam organizando um grupo para caçá- lo, enquanto ele luta para
provar sua inocência.
Homens indomáveis é um f i lme de Allan Dwan por excelência: conciso, s imples, In
vent ivo, ágil, irônico, belo sem ser espetacular. Provavelmente nenhum outro faroeste
tem tantos planos através de janelas (Dawn gostava de encenar suas seqüências em
profundidade e de enfatizar si tuações em que os personagens se observam mutua
mente) e poucos uti l izaram de forma tão esplêndida a arquitetura e a decoração bem
conhecidas da cidade do Velho Oeste hol lywoodiana. Em um impressionante plano
seqüência, a câmera de Dwan acompanha Payne à medida que ele atravessa correndo
quatro quarteirões da cidade. Graças à segurança visual do diretor (e ao gênio da ilu
minação John Alton), Homens indomáveis é um dos melhores dos vários faroestes
amer icanos subest imados. C f u
E U A (Pinecrest) 81 min. Technicolor
D i r e ç ã o : Allan Dwan
P r o d u ç ã o : Benedict Bogeaus
R o t e i r o : Karen DeWolf
F o t o g r a f i a : John Alton
M ú s i c a : Louis Forbes
E l e n c o : John Payne, Lizabeth Scott,
Dan Duryea, Dolores Moran, I mile
Meyer, Robert Warwick, John I l i n K o n ,
Harry Carey Jr., Alan Hale Jr.
CARMEN JONES (1954)
A atriz afro descendente Dorothy Dandridgc, legendária por sua beleza e personalidade
problemática, como muitos outros sex symbo/s, foi uma mártir da sua beleza em vida,
ao passo que na morte continua soterrada pela sua própria mitologia. Carmen Jones é o
conteúdo por trás do alarde, uma explanação pungente do seu apelo e petmanêncía na
imaginação alheia tanto tempo depois da sua morte.
Baseado na ópera Carmen, de Bizet, Carmen Jones conta a história de uma jovem vo
raz e ambiciosa (Dandridge) cujo narcisismo e ganância levam à destruição de Joe
(Harry Belafonte), um bom homem que a ama ternamente. Repleto de canções clássicas
(a música e o libreto são do lendário Oscar Hammerstein) e com um elenco de apoio de
primeira linha que inclui Pearl Bailey e uma jovem Diahann Carroll, o f i lme conta com
uma série de números musicais extraordinários (em sua maioria em tomadas únicas do
diretor Otto Preminger) que são parte integrante do f i lme. No entanto, por mais
impecáveis que sejam a produção, a equipe e o elenco de apoio, este é um veículo para
Dandridge do início ao f im. Sua Carmen é uma das deusas do sexo mais ardentes e
v isceralmente devastadoras já registradas em película - o andar felino frio, o corpo
curvi l íneo, os olhos f lamejantes e a mistura de desejo e desprezo pelos homens captu
rados em sua armadilha a tornam uma criatura sobrenatural. Trata-se de uma atuação
poderosíssima que eleva este f i lme excelente ao patamar dos clássicos. EH
E U A (Fox, Carlyle) 105 min. C01
D i r e ç ã o : Otto Preminger
P r o d u ç ã o : Otto Preminger
R o t e i r o : Harry Kleiner, base,id
livro Carmen, de Prosper Mérimée
F o t o g r a f i a : Sam Leavitt
M ú s i c a : Georges Bizet, Oscar
Hammerstein
E l e n c o : Harry Belafonte, Dorothy
Dandridge, Pearl Bailey, Olga lamei,
Joe Adams, Brock Peters, Roy Glenn,
Nick Stewart , Diahann Carinii, I e V e i n
Hutcherson, Marilyn Hörne, M.nvlii
Hayes
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Dorothy
Dandridge (atriz), Herschel C i n t e
Gilbert (música)
F e s t i v a l I n t e r n a c i o n a l d e B e r l i m :
Otto Preminger (Leão de Prata)
O INTENDENTE SANSHÔ <1954)
(SANSHÔ DAYÜ) " S e m compaixão, um homem deixa de ser humano." É o que diz Taira (Masao Shimizu),
um governador no Japão medieval exilado por conta de suas políticas liberais, ao seu
jovem fi lho Zushiô. Junto com Tamakl (a grande Klnuyo Tanaka), sua mãe , e sua irmã
Anju, Zushiô foge da propriedade da famíl ia; traídos por uma sacerdotisa, ZushíS e Anju
são enviados para um enorme complexo de trabalho escravo controlado pelo notoria
mente cruel Sanshô (Eitarô Shindô), ao passo que sua mãe é raptada e forçada a se
prostituir em uma ilha distante. Assim começa uma das maiores jornadas emocionais
e f i losóficas já realizadas no c inema. Possivelmente o ápice de uma série ininterrupta
de obras-pr imas dirigidas por Kenjl Mizoguchl pouco antes de sua morte, O intendente
Sanshô apresenta o auge de um estilo visual característ ico, construído, predominan
temente, por planos longos e complexamente encenados, r i tmados por movimentos de
câmera f luidos, que Mlzoguchi começou a desenvolver ainda na década de 30.
Depois da abertura angust iante, a história salta vários anos. O Zushiô adulto (Yo-
shiakl Hanayagl) , forte, porém morto emociona lmente, se tornou um dos mais confiá
veis capangas de Sanshô; com uma crueldade Imperturbável, ele executa ordens de
torturar e muti lar escravos. Um dia, Zushiô recebe a incumbência de largar uma idosa
doente do lado de fora dos muros do complexo para morrer; Anju (Kyoko Kagawa) o
segue ostensivamente para ajudar, mas um pequeno acidente - eles caem quando
ten tam quebrar um ramo de uma árvore - evoca a memória da infância dos dois juntos
antes de serem escravizados. De repente, Zushiô percebe como ele se tornou uma
pessoa horrível. Ele e Anju decidem fugir, porém, temendo que sejam capturados se
f icarem juntos, a irmã se sacrifica para que Zushiô possa escapar.
Zushiô foge e acaba conseguindo recuperar a posição de nobreza de sua família. Ele
retorna, agora como oficial, ao complexo de Sanshô; depois de expulsar o feitor, entre
ga o complexo aos escravos, que o incendeiam em uma cena extraordinária de frenesi
orgástico. Abandonando seu posto de oficial, Zushiô sai em busca da mãe. Anos antes,
ele e Anju hav iam ouvido uma história sobre uma prostituta velha e manca em uma
Ilha, que cantava constantemente uma canção de lamento sobre seus fi lhos perdidos.
Ele vai até a ilha e, em um trecho deserto de uma praia, reencontra
sua mãe. Zushiô desmorona, pedindo perdão por todo o mal que fez;
pelo contrário, garante- lhe a mãe, seu pai ficaria orgulhoso ao ver
que o filho viveu de forma tão fiel aos seus ens inamentos.
Se a essa altura você não estiver se debulhando em lágrimas, é
um desalmado. A visão de mundo de Mizoguchl é negra como a noi
te: violência, traição e crueldade Injustif icável são as palavras de or
dem. Porém, embora não se possa mudar Isso, é possível protestar,
mantendo-se fiel aos próprios Ideais. A batalha entre o bem o mal é,
no f im das contas, uma batalha dentro de nós mesmos e, na magní
fica seqüência f inal , enquanto mãe e fi lho se abraçam chorando,
sent imos que o amor entre eles é a força mais poderosa do universo;
mesmo que esse amor não possa conquistar o mundo, ele pode
transcendê-lo. RP
l U A (Independent, Intl Union of
U n i , Mill 8. Smelter Workers)
l-l min. P&B
dloma: inglês
D i r e ç ã o : Herbert J . Biberman
ä r o d u c ä o : Adolfo Barela, Sonja Dahl
l l l ie i inan, Paul Jarr ico,
I m i : Michael Biberman, Michael
•Vll'.nn
t tognf la : Stanley Meredith,
t fnnaid Stark
f i n i r a : M i l Kaplan
le l i ' ' .nua Revueltas, Wil l Ceer,
i,n/1.1 Wol le, Mervin Wi l l iams, David
W V l l i lu.m Chacón, Henrietta
Mill.un-., I mesto Velazquez, Angela
H' LE , l o e i . Morales, Clorinda
• I L . " i te, (har les Coleman, Virginia
em 1 1 , i li ti I on Jencks, Victor Torres
OSAL DA TERRA (1954)
(SALT OF THE EARTH) Este clássico pouco exibido é o único longa-metragem Importante da American
Independem feito por comunis tas. Uma história f iccional sobre os mexicanos
mineradores de zinco no Novo México, que na época estavam em greve contra seus
chefes amer icanos, O sal da terra foi permeado por at i tudes feministas bastante
incomuns para aquele período. O f i lme foi inspirado pela inclusão na lista negra do
diretor Herbert B iberman, do roteirista Michael Wi l son , do produtor e ex-roteirista Paul
Jarrico e do compositor Sol Kaplan. Conforme refletiu posteriormente Jarrico, já que
t inham sido expulsos de Hol lywood por serem subversivos, eles cometeram " u m crime
que correspondia à punição", realizando um f i lme subversivo. O resultado é uma
propaganda esquerdista da melhor qual idade, poderosa e inteligente mesmo quando o
f i lme soa, em algumas partes, ingênuo e datado.
Bas icamente afastado dos c inemas amer icanos até 1965, ele foi amp lamente
exibido e premiado na Europa. Porém jamais recebeu o reconhecimento que merece nos
Estados Unidos. Infel izmente, o debate crítico mais bem conhecido nos Estados Unidos
sobre ele é um ataque de Pauline Kael em que o f i lme é ridicularizado como "propagan
da". Por mais precisa que Kael seja sobre alguns dos clichês esquerdistas de O sal da
terra, ela retira indiscr iminadamente alguns de seus exemplos do roteiro original e não
do próprio f i lme, não fazendo nenhuma alusão aos mot ivos que o mant iveram tão
essencial meio século depois. JRos
• »A I I ' 1 1 . unit) 109 min.
•' I I m
j l o i l l . i : ingles
Irocao: FrankTashlin
i n d u c . l o : Paul Nathan, Hal B. Wall is
« ' i . ' i m 1 'on Mi Guire, Frank Tashlin,
1 ' i i " no (onto "Rock-A-Bye Baby",
i' Me li.iel Davidson e Norman
fv. l l ie
i i . i r i . i l i a : Daniel L Fapp
D i l l . 1 : I L iny Warren
m i o: 1 ir,111 Mart in, Jerry Lewis,
i i i l '-v M.11 Laine, Dorothy Malone,
Idle Mayehoff, Eva Gabor, Anita
i" ir 1 ,eorge W i n s l o w j a c k Elam,
. i i " i i Rudley, Richard Shannon,
th i rd Webb, Alan Lee, Otto Waldis
ARTISTAS E MODELOS (1955)
(ARTISTS AND MODELS) Como os melodramas de Douglas Slrk, as comédias loucas de FrankTashIln exageram ao pon
to da subversão os valores populares dos Estados Unidos da década de 50. O terreno de
Tashlin era a esfera midiática da publicidade, tevê, cinema e showbiz: ao abraçar alegremen
te e satirizar com sagacidade essa arena de clichês e estereótipos, ele antecipou a pop art.
Artistas e modelos, que ofereceu à dupla Dean Mart ln-Jerry Lewis seus mais glorio
sos momentos nas telas, é uma brincadeira ver t ig inosamente auto-reflexiva sobre a
ilusão do c inema. Eugene Fullstack (Lewis) é um viciado em histórias em quadrinhos
cujos sonhos pitorescos são transcritos - e vendidos em segredo - por Rick Todd (Dean
Mart in). Eles são espelhados por duas mulheres, a sensual artista gráfica Abby (Dorothy
Malone) e a atrapalhada Bessie (Shirley MacLaine) . O jogo inf in i tamente inventivo de
permuta e combinação entre esses quatro personagens de Tashlin gera um grande
momento de caos burlesco: O détournement delirante de Eugene e Bessie da balada
romântica kitsch " Inamorata" .
Com um enredo que lança mâo sem aviso de uma intriga de espionagem interna
cional (com o aparecimento de Eva Gabor) e de uma demonstração musical esplêndida
de engenhosidade audiovisual ( "When You Pretend") , faz todo sentido que as estraté
gias de Artistas e modeios encontrem eco nos alegres modernismos de Jacques Rivette
(Celine et ¡ulie Vont en Bateau), P. T. Anderson (Embriagado de amor) e no austral iano
Yahoo Serious (O desastrado). AM
ELES E ELAS (1955)
(GUYS AND DOLLS) Os estereótipos feitos por Hol lywood de outras culturas mui tas vezes são tomados
como ofensa, mas é impossível resistir à visão de Havana, em Cuba, na cena principal
de Eles e elas. Sky Masterson (Marlon Brando), um jogador de fala mansa, convence a
certlnha Sarah Brown (Jean S immons) , membro do Exército da Salvação, a pegar um
avião e jantar com ele. À medida que fica bêbada e sucumbe a seus impulsos, ela é
Inf lamada pelo drama primit ivo e lat ino-americano que se desenrola ao seu redor: uma
dançarina exótica, sua rival Instantânea, tentando seduzir Sky. Logo, todo o lugar é
arrebatado por uma dança hilariante de paixões embriagadas.
A cena fornece um exemplo magnífico da coreografia revolucionária de Michael Kldd
para o cinema. Cestos normais, cotidianos, como andar ou apontar algo, são aos poucos
estil izados, tornados angulares e rítmicos, até se transformarem por completo em
dança. As ações individuals são organizadas em padrões coletivos. E, acima de tudo, a
encenação incorpora movimentos que são propositalmente desajeitados, deselegantes
e aparentemente amadores - como as estocadas e giros bêbados de Sarah.
Eles e elas é, na verdade, dois f i lmes em um, dividido entre sua dupla de protagonis
tas mascul inos - e, de fato, há um diálogo entre Brando e Sinatra que antecipa o encon
tro entre Al Pacino e Robert De Niro cm Fogo contra fogo (1995). A metade de Nathan
Detroit (Sinatra) está mais em dívida com a fonte do roteirista e diretor Joseph
Mankiewicz, as histórias de Damon Runyon sobre trapaceiros adoráveis e malandros
(cada maneir ismo "étn ico" do linguajar e compor tamento nova-iorquino deliciosa
mente exagerado). Nathan tem como par uma mulher que já sofreu bastante, Adelaide
(Vivian Blaine), o que gera momentos divertidos no tenso caminho dos dois para o altar,
como a canção "Adelaide's Lament " na animada trilha de Frank Loesser.
Contudo - embora os números cole
t ivos arrebatadores e mais convencionais
como "Luck Be A Lady" e "S i t Down, You're
Rocking The Boa t " sejam os mais recor
dados pelos fãs da Broadway -, é na metade
mais romântica de Sky e Sarah que o f i lme
realmente deslancha, com Mankiewicz
f ina lmente superando sua habitual verbor
ragia. As canções "If I Were A Be l l " e "I ' l l
Know W h e n My Love Comes A long" são
gloriosos ápices de emoção amorosa, e
Mankiewicz as cerca de uma maravilhosa
mlse-en-scène de idas e vindas e atração e
repulsão entres esses dois corpos admi
ráveis. AM
E U A (Samuel Goldwyn) 150 min.
Eastmancolor
I d i o m a : Inglês
D i r e ç ã o : Joseph L. Mank lewic /
P r o d u ç ã o : Samuel Coldwyn
R o t e i r o : Joseph L. Mankiewicz,
baseado na peça de jo Swerling v Ah<-
Burrows e no conto "The Idyll ol Mlsj
Sarah Brown", de Damon Runynn
F o t o g r a f i a : Harry Stradling Sr.
M ú s i c a : Jay Blackton, Frank Loessci
E l e n c o : Marlon Brando, Jean
S immons, Frank Sinatra, Vivian
Blaine, Robert Keith, Stubby Kayfi,
B. S. Pulley, Johnny Silver, Sheldon
Leonard, Danny Dayton, Ceoigr I
Stone, Regis Toomey, Kathryn (avni'v.
Veda Ann Borg, Mary Alan HokanSOrl
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Oliver Smith,
Joseph C. Wright, Howard Bristol
(direção de arte), Harry Stradling Si
(fotografia), Irene Sharaff (figulino).
Jay Blackton, Cyril J . Mockridge
(música)
India (l loverno de Bengala Ocidental)
n', min. P&B
•lema: bengali
D i r e ç ã o : Satyajit Ray
1 ' i m l i i ç a o : Satyajit Ray
R o t e i r o : Satyajit Ray, baseado no
In/m de Blbhutibhushan
lindyopadhyay
l i i lograf la: Subrata Mltra
M u s i c a : Ravi Shankar
E l e n c o : Kanu Bannerjee, Karuna
linnerjee, Subir Bannerjee, Uma Das
Gupta, ( hunlbala Devi, Runki
Ban jcc, Reba Devi, Apaena Devi,
ll.ui'ii Bannerjee, Tulsi Chakraborty,
llibli.ni.ini Devi, Roma Canguli , Binoy
I in ! herjee, Harimohan Nag, Kshlrod
RO) I una Cangopadhaya
l i ' s i l v a l d e C a n n e s : Satyajit Ray
I in ile melhor documento
hiiin.iiio), (Prêmio OCIC - menção
r ' . p r i i.il)
A CANÇÃO DA ESTRADA (1955)
(PATHER PAIMCHALI) Baseado em um romance clássico do escritor bengali Bibhut ibhushan Bandyopadhyay,
A canção da estrada, primeiro f i lme de Satyaj i t Ray, faria, poster iormente, parte de uma
trilogia com O invencível (1957) e O mundo de Apu (1959). Ray, que trabalhava em uma
agência de publicidade de Calcutá na época, teve grande dif iculdade em levantar o
dinheiro para fazer seu f i lme. Acabou conseguindo emprést imos suficientes para
começar as f i lmagens, na esperança de que o material convencesse os patrocinadores a
ajudá-lo a concluí- las. Embora tenham começado a fi lmar em outubro de 1952, somente
no começo de 1955 A canção da estrada foi f inalizado.
Apu (Subir Bannerjee) é um menino crescendo em um remoto vilarejo do interior de
Bengala. Seus pais são pobres e mal conseguem prover comida suficiente para Apu e
Durga (Uma Das Cupta) , sua irmã mais velha, quanto mais para a idosa conhecida co
mo Tia (Chunibala Devi), que vive com eles. Em uma das primeiras cenas, Durga rouba
a lgumas mangas, que dá à Tia, mas a mãe das cr ianças, Sarbajaya (Karuna Bannerjee),
ralha com ela. Mais tarde, Durga é acusada por um vizinho mais rico de ter roubado um
colar. Nessa hora, tes temunhamos não só a afl ição da mãe e da filha como t ambém a
reação de Apu, à medida que ele f ica, impl ic i tamente, do lado da Irmã.
Essas passagens menores de drama são pontuadas por grandes tragédias. U m a das
cenas mais conhecidas do f i lme se dá quando as crianças brigam c Durga é mais uma
vez repreendida pela mãe. Ela sal correndo pelos campos, com Apu no seu encalço.
Vemos fumaça preta subindo ao céu e, em seguida, um t rem. Apu e Durga correm na
direção dele, empolgados por essa visão de algo do imenso mundo além do seu
vilarejo. No caminho de volta, conversando, as pazes feitas, eles encontram a Tia em
uma plantação de bambus - quando Durga toca nela, ela cal de lado, está morrendo.
O pai, Harlhar (Kanu Bannerjee), parte para a cidade para arranjar a lgum dinheiro.
Enquanto está longe, Durga contrai pneumonia e morre. Sem saber de nada, o pai volta,
an imado pelo sucesso e carregando presentes para a famíl ia, incluindo um sãrl para
Durga. Sarbajaya começa a chorar. Harlhar desmorona de dor. Observamos Apu
ouvindo o choro do pai.
Com o tempo, Harihar decide levar o resto da sua família para a
cidade. Em um momento revelador, enquanto ajuda a l impara casa, Apu
encontra um colar escondido em um vaso. Então Durga o havia roubado,
no fim das contas. A descoberta torna a dor de Apu ainda mais pun
gente. Ele joga o co larem um lago, onde as algas se fecham sobre ele.
A direção de Ray é de uma grande delicadeza, capaz de expressar
tanto emoções fortes quanto l ir ismo. Poucos esquecerão a seqüência
em que Apu e Durga ouvem o som do vendedor de doces ambulante.
Embora não tenham dinheiro para comprar as guloseimas, os dois
saem correndo atrás dele, seguidos por um cachorro curioso, enquan
to a pequena procissão é refletida em uma lagoa.
Auxiliado pela música maravilhosa de Ravi Shankar, A canção da
estrada alcançou sucesso mundial , alçando Ray ao reconhecimento no
Festival de Cannes em 1956. EB
, (>(
I U A (MGM) 8 1 min. Eastmancolor
I d i o m a : ingiês
D i r e ç ã o : John Sturges
1 ' r o d u ç ã o : Hermann Hoffman, Dore
Schary
R o t e i r o : Howard Breslin, Don
M l 1 iulre, Millard Kauf fman, baseado
no "Bad Day at Hondo", de
lli iw.ud Breslin
I n i o g r a f i a : Wil l iam C. Mellor
M u s i c a : André Previn
E l e n c o : Spencer Tracy, Robert Ryan,
Am o-1 nineis, Dean Jagger, Walter
r i ' im i n . John Ericson, Ernest
lorgnlne, Lee Marvin, Rüssel Collins,
Walter Sande
i i i i i n - n ã o a o O s c a r : John Sturges
(diretor), Millard Kauffman (roteiro),
Spt'iu ci Tracy (ator)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Spencer Tracy
I ). empatado com o elenco de
I l i iMmyn Semyrj
1
CONSPIRAÇÃO DO SILENCIO 0955)
(BAD DAY AT BLACK ROCK) O ano é 1945, logo após a Segunda Guerra Mundial, e Spencer Tracy é um veterano de um
braço só que desembarca de um trem em Black Rock, urna remota cidade deserta da Califór
nia. Não sabemos a que ele veio, tampouco os habitantes da cidade. Porém eles são hostis
e logo fica claro que estão escondendo algo. O diretor John Sturges aumenta lentamente a
tensão à medida que Tracy cava mais fundo em direção ao segredo da cidade, enquanto os
habitantes cortam os fios telefônicos e sabotam um carro no qual ele tenta partir.
Tendo como cenário uma paisagem árida do Oeste, que o formato Cinemascope do
fi lme valoriza ao máximo, e produzido em cores, em grande parte sob uma luz do sol
ofuscante. Conspiração do silêncio está espremido entre uma série de faroestes notáveis
de Sturges, entre eles A fuga do Forte Bravo e Sem lei, sem alma. Ainda assim, apesar de sua
aparência, Conspiração do silêncio aproxima-se mais, na verdade, do gênero noir, com seu
enredo de segredos obscuros no passado. Há pouca ação física e quase nenhum tiroteio,
embora uma cena seja memorável , quando Tracy é f inalmente desafiado pelo abruta-
Ihado Ernest Borgnlne. O homem de um braço só revela um repertório de golpes de caratê
e socos que derrubam seu oponente como um boi abatido.
Tracy enfrenta um impressionante leque de pesos-pesados aqui, Incluindo o líder
Robert Ryan, cuja histeria nunca vai além da superfície, e Lee Marvin em um de seus papéis
mais ameaçadores. Tracy precisa recorrerá ajuda dos membros mais fracos da comunidade:
o recluso Doe (Walter Brennan) e o xerife bêbado e covarde (Dean Jagger). Acaba conse-
• j p . guindo investi-los de um pouco da sua coragem e eles o ajudam a fugir,
fcjB mas, no f im, é forçado a contar apenas com sua própria engenhosldade.
™ ^g^F ^ O segredo sujo da cidade é o assassinato de um nlpo-americano
nos dias que se seguiram a Pearl Harbor. O f i lme foi produzido por
\ l l dd D o l c Schaty, que tentou lutai contra a lista negra e cuja gestão na
• WH M G M foi mau ,ii 1,1 por uma sci i r de produções liberais. Conspiração
I do silêncio é um bom exemplo disso, um thriller sólido, interpretado
e dirigido com esmero, que veicula uma mensagem bem clara sobre
tolerância racial. Contudo, Independentemente de suas boas inten
ções, é Tracy que fica mais gravado na nossa memória. Poucos atores
conseguiriam t ransmi t i r tão bem uma bondade fundamenta l sem o
menor traço de hipocrisia. EB
OS MESTRES LOUCOS (1955)
(LES MÂITRES FOUS) Em 1954, o cineasta etnográfico Jean Rouch foi convidado por um pequeno grupo de
haukas da cidade de Acra, na África Ocidenta l , para documentar seu ritual religioso
anual . No decorrer dessa cerimônia, os haukas entram em um estado de transe e são
possuídos por espíritos que representam os colonial istas ocidentais (o engenheiro, a
esposa do médico, o governador-geral, o major cruel, e t c ) .
Embora tenha apenas 36 minutos, as imagens de Os mestres loucos são extraordiná
rias e mui tas vezes chocantes: homens possuídos, com os olhos girando, espumando
pela boca, queimando seus corpos com tochas. De fato, o f i lme Marat/Sade, de 1966, di
rigido por Peter Brook, faria referência ao histr ionismo e à l inguagem Inventada
capturados aqui por Rouch.
No entanto, como o próprio diretor observou, para os haukas, a possessão por espí
ritos era verdade, não arte. Embora o f i lme nunca explique por completo o signif icado
por trás do ritual, a narração de Rouch sugere que a part icipação na cerimônia religiosa
resulta em uma espécie de catarse que dá aos haukas - em sua maioria trabalhadores
rurais migrantes - a força necessária para manter sua dignidade e continuar t rabalhan
do sob condições duras e opressivas. Conforme observa um acadêmico, a questão mais
Intrigante levantada por Os mestres loucos - um f i lme no qual "os oprimidos se tornam,
por um dia, possuídos e poderosos" - diz respeito à relação complexa dos haukas com
sua experiência colonial ista. Uma das obras-primas do cinema etnográfico. SJS
F r a n ç a (Plêiade) 36 min.
I d i o m a : francês
D i r e ç ã o : Jean Rouch
F o t o g r a f i a : Jean Rouch
E l e n c o : Jean Rouch (narrador)
HILL 24 DOESN'T ANSWER (1955)
Realizado pelo diretor inglês Thorold Dickinson, que tinha ido para Israel fazer um
documentár io sobre o Exército (The Red Background), Hill 24 Doesn't Answer (A colina 24
não responde) foi o primeiro f i lme desse período a alcançar sucesso internacional.
Dickinson, que foi inf luenciado pelos f i lmes que misturavam documentár io e f icção
produzidos na Inglaterra durante a Segunda Guerra Mundia l , usa técnicas consagradas
do gênero (mapas explicativos, narração segura) para contar a história de urna pequena
unidade israelense defendendo uma posição estratégica em uma colina próxima de
Jerusalém contra um ataque árabe durante a guerra de 1948.
À maneira de Nosso barco, nossa alma, de David Lean, Dickinson dedica pouco tem
po à ação propriamente dita, que se torna um pano de fundo sobre o qual são contadas
as histórias dos quatro personagens principais: um judeu amer icano, um irlandês, um
israelense de nascença e um judeu sefaradlta. Todos morrem na bem-sucedlda defesa
do local, que, depois da visita de um observador da O N U , é confirmado como território
Israelense. Flashbacks deta lham os mot ivos que levaram cada um dos soldados a lutar.
O f i lme é ardorosamente pró-sionista, com Druse e os personagens Ingleses sendo
apresentados de forma favorável e os árabes como uma força anônima, hostil e des
trutiva, cujos mot ivos para o ataque jamais são esclarecidos. Apesar do propagandismo
óbvio, o f i lme de Dickinson é uma obra-prima em menor escala, uma análise intrigante
da mot ivação e do heroísmo em meio à batalha ideológica mortal . BP
I s r a e l (Israel Motlon Picture, 'aí 'or)
101 min. P&B
I d i o m a s : inglês / hebraico
D i r e ç ã o : Thorold Dlckinson
P r o d u ç ã o : T h o r o l d Dlckinson, 1'elei
Frye, Zvi Kolitz, Jack Padwa
R o t e i r o : Peter Frye, Zvl Kolitz
F o t o g r a f i a : Gerald Glbbs
M ú s i c a : Paul Ben Chayim
E l e n c o : Edward Mulhare, Mir hael
Wagner, Margallt Oved, Arík I avi.
Mlchael Shillo, Haya Harareet, I iii
Greene, Stanley Preston, Haini I yn.iv.
Zalman Lebiush, Azaria Rapaporl
l i e .
Inglaterra (Ealing, Rank) 97 min.
I c i hilicolor
Idioma: inglês
D t r o ç ã o : Alexander Mackendrick
Produção: Michael Balcon, Seth Holt
H o i c l r o : Wil l iam Rose
I ( t t o g r a f i a : Otto Heller
M u s i c a : Tristram Cary ;
I l c n c o : Alec Guinness, Cecil Parker,
Herben lorn, Peter Seilers, Danny
Orten, l . ickWamer, Katie Johnson,
Philip Mainton, Frankie Howerd
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Wil l iam Rose
( i t i t c l i i i )
0 QUINTETO DA MORTE (1955)
(THE LADYKILLERS) O últ imo f i lme de Alexander Mackendr ick para os estúdios Ealing (e também o mais
sombrio de todos), realizado antes de ele ir para Hol lywood e nos presentear com o me-
moravelmente raivoso A embriaguez do sucesso (1957), é uma deliciosa comédia de hu
mor negro sobre os costumes ingleses. Um bando de ladrões, escondidos sob o disfarce
de um quinteto musical na luxuosa casa de uma senhorinha Ingênua e muito, muito
decente interpretada por Katle Johnson , decide que precisa assassiná-la antes que ela
descubra sobre seu roubo recente e Insista que eles devolvam o but im. O problema é
que a honra entre esses ladrões em especial é algo distorcido e, embora não consigam
se decidir a matar a doce velhinha, eles não possuem esse tipo de pudor em relação uns
aos outros.
Ass im, essencia lmente, O quinteto da morte é uma variação cômica do clássico te
ma do roubo que saiu errado, fascinante tanto pelas suas habilidosas caracterizações (o
bando engloba um gênio do cr ime; um tipo militar rude; um matador ital ianizado; um
elegante "Teddy Boy", com suas roupas ao estilo eduardiano; e um brutamontes ta
pado) e por sua insinuação de que a Inglaterra do pós-guerra - com sua clara reverência
a uma era passada - estava dividida a ponto de não conseguir fazer a transição para a
era moderna. A fotografia em cores de Ot to Heller e o desenho de produção de J lm
Morahan ajudam a reforçar o cl ima de uma sociedade presa ao passado. CA
t U A ( l lcrht, Hill & Lancaster, Steven)
91 min. P&B
l i l l u m a : inglês
1 • So: Delbert Mann
ProducSo: Harold Hecht
ROttlro: I ' a d d y Chayefsky
l i i i o g i a f i a : Joseph LaShelle
M i i - . i i . 1 : George Bassman, Harry
W . i i i r n , ( toy Webb
1 loni 0: 11 nest Borgnine, Betsy Blair,
1 I t h e i M l n c l o t t l , Augusta Ciolli, Joe
M . i n h ' l l , Karen Steele, Jerry Paris
Oscar: Harold Hecht (melhot f i lme),
1 Itlben Mann (diretor), Paddy Chayefsky
( r o t e i r o ) , truest Borgnine ( a t o r )
I l i d i r a ç ã o a o O s c a r : Joe Mantel l (ator
1 Oldjuvante), Betsy Blair (atriz
1 ii.uljuvante), Ted Haworth, Walter
M S l m o n d s , Robert Priestley (direção
ill* .11 le), Joseph LaShelle (fotografia)
1 i".i I v a l d e C a n n e s : Delbert Mann
<I1111 •. 1 de Ouro), (Prêmio OCIC)
MARTY (1955)
Durante a Era de Ouro da televisão, Paddy Chayefsky escreveu a peça para tevê Marty. Ela
ficou famosa por se concentrar na vida comum de um açougueiro solteiro. Chayefsky
então transpôs o roteiro para a tela gtande com Ernest Borgnine no papel principal.
Desde então, Mar ty Pilleti se tornou uma cause célebre para a busca da felicidade fora
dos moldes da conformidade e do consenso de meados da década de 50.
Vendido como "a história de amor de um herói desconhecido!", Mar ty emocionou
platéias com seu enredo sobre um homem que v ive com a mãe , a matriarca italiana
clássica. Freqüentando bares para solteiros com seu melhor amigo Angie (Joe Mantel l ) ,
ele conhece Clara (Betsy Blair) e os dois começam um ritual de acasalamento. Angie
logo fica com c iúmes, enquanto a Sra. Pilletti (Esther Minciott i ) confunde a questão
com pesadelos de abandono, mas Marty f ina lmente vai atrás de Clara, pois gosta dela.
Descrito dessa forma, Marty parece uma chatice sem tamanho . Porém, como
retrato do seu tempo, especia lmente das neuroses do pós-guerra sobre tranqüil idade
domést ica, o f i lme tem um enorme valor sociológico. Deixando de lado as políticas
culturais contemporâneas, a luta das pessoas solitárias para conquistar aceitação e
amor é sem dúvida um tema poderoso. Dando leveza ao f i lme, esse motivo também faz
um elogio ao mesmo tempo da vida cotidiana e da beleza. G C - 0
3111
A PALAVRA (1955)
(ORDET) Uma obra extraordinária e, indiscut ivelmente, a maior realização deste
grande cineasta, a adaptação de Carl Theodor Dreyer da peça de Kaj
Munk é uma raridade cinematográf ica no sent ido de que, com os
recursos mais simples e sem qualquer t ipo de efeito especial, consegue
persuadir o espectador de que um milagre pode acontecer.
A palavra é sobre os Borgen, uma família de fazendeiros, amorosa e
unida, mas também abalada por tensões que provêm de uma série de
divergências e adversidades - especialmente o comportamento extrava
gante de um dos irmãos adultos, aparentemente enlouquecido pela
dedicação excessiva aos estudos sobre o pensamento religioso. Contudo,
nem todos pensam que Johannes (Preben Lerdorff Rye) é louco e, quando
Inger (Birgitte Federspiel), a esposa de outro Irmão, morre, seu filho pede
que ele traga a mãe de volta - o que, ao final do f i lme, ele parece fazer. Na
verdade, Dreyer deixa a cargo do espectador decidir se a sua ressurreição
é uma questão de mera incapacidade científica de compreender o
improvável ou da força da fé. A cena, entretanto, é extraordinariamente
poderosa precisamente por ele se recusar a dar explicações e intensificar
a carga dramática do fi lme; ela convence graças a sua própria atmosfera
de tranqüil idade, assim como a tudo que a precede.
De fato, este é, em muitos aspectos, o f i lme mais "real ista" ou "na - ^
tural lsta" sobre o poder da fé, do amor (em todos os sentidos) e do
sobrenatural já realizado. Dreyer abstém-se de qualquer tipo de t rucagem. Embora as
Imagens em preto-e-branco minimal istas, porém excepcionalmente belas, de Henning
Bendtsen conf i ram à casa e aos pastos dos Borgen um certo resplendor, o r i tmo lento
de Dreyer, seus planos longos e direção enganosamente simples podem sugerir que o
f i lme é um drama intimista sobre fazendeiros comuns. Apenas a voz sedutora de
Johannes pode parecer algo incomum, mas ele, no f im das contas, não bate bem da ca
beça. Esta é a grandeza de A polovra: quando o "mi lagre" acontece, o f i lme já conquis
tou nosso respeito por sua integridade - compreendemos as pessoas na tela, pois suas
at i tudes, emoções, pensamentos e dúvidas são como as nossas. E, quando Inger abre
os olhos novamente , provavelmente sent imos exatamente o mesmo que elas: assom
bro, fel icidade e uma admiração genuína. Pois, mesmo que A palavra não consiga nos
converter à crença religiosa, teremos ao menos testemunhado arte cinematográf ica de
primeira grandeza. CA
D i n a m a r c a (Palladium) 126 min. P M i
I d i o m a : dinamarquês
D i r e ç ã o : Carl Theodor Dreyer
P r o d u ç ã o : Carl Theodor Dreyer, I ilk
Nielsen, Tage Nielsen
R o t e i r o : Kaj Munk, baseado na peç l
de sua autoria
F o t o g r a f i a : Henning Bendtsen
M ú s i c a : Poul Schierbeck, Sylvia
Schierbeck
E l e n c o : Hanne Agesen, Kirsten
Andreasen, Sylvia Eckhausen. Bligltti
Federspiel, Ejner Federspiel, Emll
Hass Christensen, Cay Krlstlansen,
Preben Lerdorff Rye, Henrik Malheig,
Gerda Nielsen, Ann Elisabeth Rud,
Ove Rud, Susanne Rud, Henry SkjNr,
Edith Trane
F e s t i v a l d e V e n e z a : Carl Theodor
Dreyer (Leão de Ouro)
•rança (<>CC, Play Art, Cyme) 98 min.
> M I d i o m a : francês
D i r e ç ã o : Jean-Pierre Melvil le
P r o d u ç ã o : Jean-Pierre Melvil le
ROtatro: Auguste Le Breton, Jean -
Pleir i 'Melvi l le *
I l i t o g r a f i a : Henri Decaë
M u s i c a : I ddie Barclay
E l e n c o : Isabelle Corey, Daniel Cauchy,
Kogei Duchesne, Guy Decomble,
André Caret, Gérard Buhr, Claude
( r iva l . Colette Fleury, René Havard,
Simone Paris, Howard Vernon, Henry
Ail.m , Germaine Amlel, Yvette
Anil iai i le, Dominique Antoine
BOB, 0 JOGADOR (1955)
(BOB LE FLAMBEUR) Bob, o jogador, o quarto longa-metragem de Jean-Plerre Melvi l le, faz parte de um
período multo específ ico da História e da história do c inema. Ele marca um sutil ponto
de virada e saboreia esse momento . Havia o cinema clássico e o cinema moderno. Ha
via f i lmes de gângster, comédias e retratos do cotidiano. Havia um homem, ainda rela
t ivamente jovem para um cineasta, que, com 39 anos de idade e bastante experiência
de vida, já havia realizado um f i lme de guerra fantasmagórico de incrível intensidade (O
silêncio do mar), uma adaptação de um romance de Jean Cocteau (Les enfants tcrribles)
e um melodrama fraco (Quando leres esta carta). Mais tarde, se tornaria o Tio da nou-
velle vague, o mestre francês dos f i lmes noir, o diretor que pavimentou o caminho para
Sergio Leone, John W o o e muitos outros, o dono de um estúdio (que logo foi à falência)
e o maior dândi do cinema europeu. Porém, na época em questão, Melvi l le estava de
senvolvendo a modernidade da segunda metade do século XX uti l izando as ferramen
tas da primeira. Bob, o jogador é nostálgico e burlesco, embora repleto de compaixão e
uma atenção apurada e respeitosa a lugares, objetos, palavras e aos sonhos que todos
têm o direito de carregar.
Cassinos assaltados, gângsteres de ombros largos, conversa de macho, carros em
disparada na noite, traição... está tudo aqui ! O f i lme está interessado no material
humano , em uma polifonia de vozes e na memória de uma era de ouro que nunca exis
t iu . É comum dizer que grandes f i lmes são universais e eternos. Contudo, Bob, o jogador
é grande jus tamente pelo mot ivo oposto: ele pertence a uma época e a um lugar,
part indo, de forma mais ou menos consciente, em direção a um futuro completamente
dist into. Embora sua trama Irônica seja Importante, a essência do f i lme está na sua
beleza e melancol ia. Certamente, o mundo se transformou desde Bob, o jogador. No
entanto, algo foi capturado por ele, como em um globo de vidro, para que possamos
olhar para trás e nos lembrarmos. E não há nada de triste nisso. J -MF
H l
A MORTE NUM BEIJO (1955)
(KISS ME DEADLY) A morte num beijo é uma obra-prima casca-grossa, parida a fórceps pelo diretor Robert
Aldrlch e pelo roteirista A. I. Bezzerides do romance trash de Mickey Spil lanc, fi lmada com
poesia ("Remember Me" , de Chrlstina Rosettl), violência inenarrável (as pernas nuas de
uma mulher se debatendo enquanto é torturada na vagina com um alicate), l inguagem
doidona das ruas, personagens estranhos e elementos marginais fantásticos.
Depois de créditos que passam ao contrário na tela e da Imagem de um carro sendo
guiado à noite, Clóris Leachman, nua debaixo de um sobretudo, faz sinal para Mike
Hammer (Ralph Meeker), um detetive particular brutamontes, parar na estrada e o ar
rasta para uma trama que envolve espiões, arruaceiros, um gênio do cr ime tão etudlto
que só consegue falar em metáforas ao mandat uma louta burra não mexer em algo
mortal o suf iciente para matar todos ao seu alcance, agentes secretos que t rocam
senhas ("Los Alamos.. . Trinity... Projeto Manha t tan " ) e uma pasta contendo "o grande
sei - lá-o-quê" (uma caixa com algo f lssionável que pode ser plutónio puro ou a cabeça
da Medusa) . O herói malvado de Meeker (atenção ao sorriso dele enquanto tortuta
testemunhas Inocentes quebrando discos de ópera insubstituíveis ou fechando gavetas
com força sobre suas mãos) abre caminho aos murros por um elenco de pervert idos e
prostitutas e então (pelo menos em algumas cópias) voa pelos ares com uma nuvem
em forma de cogumelo que sobe de uma casa de praia no final apocalípt ico bem no
estilo da década de 50, KN
E U A (Parklane) 106 min. P & B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Robert Aldrich
P r o d u ç ã o : Robert Aldrich
R o t e i r o : Mickey Spil lane, A. I.
Bezzerides, baseado no livro de
Mickey Spil lane
F o t o g r a f i a : Ernest Laszlo
M ú s i c a : Frank De Vol
E l e n c o : Ralph Meeker, Albert Dskker,
Paul Stewart, Juano Hernandez,
Wesley Addy, Marian Carr, Marjorie
Bennett , Maxine Cooper, Fortúnio
Bonanova, Clóris Leachman, Gaby
Rodgers, Robert Cornthwaite, Nick
Dennis, jack Lambert, Jack Elam
UM CERTO CAPITÃO LOCKHART (1955)
(THE MAN FROM LARAMIE) Este é o úl t imo de uma série de faroestes extraordinários realizados por Anthony Mann
- logo antes de ele passar para projetos mais ambiciosos (e talvez menos Interessan
tes), como Ei Cid (1961) - e j ames Stewar t , cujos caubóis impulsionados pelo medo da
década de 50 cotrem paralelos aos heróis t i tubeantes que interpretou para Hitchcock. O
gancho da t rama é quase noir, prefigurando Cárter, o vingador (1971), com Wil l Lockhart
(Stewart) invest igando a morte do seu irmão e envolvendo-se na disputa famil iar (nos
moldes de Rei Lear) de um barão do gado cego (Donald Crlsp), cujo fi lho adorado (Alex
Nicol) é um fracote sádico. As platéias de 1955 ficaram chocadas com a cena em que
Nicol manda seus lacaios segurarem Stewart e retribui um fer imento at i tando na mão
do herói à queima-roupa.
O capataz Vic Hansbro (Arthur Kennedy) é - como no faroeste anterior de M a n n , E
o sangue semeou a terra - quase tão machão quanto o herói, mas acaba se mostrando
seu equivalente demoníaco, impulsionado pelo rancor em relação à famíl ia de cujo
rancho cuida, mas que jamais herdará graças a um negócio sujo envolvendo a venda de
armas para apaches renegados. Um certo capitão Lockhart é uma história tensa e
trágica, com uma inesquecível canção- tema (com seu verso "O Oeste jamais verá um
homem com tantas marcas na sua arma", em referência ao costume de se dar um talho
na pistola a cada homem morto com ela), o habitual tato de Mann em relação ã
maneira como homens desesperados e obsessivos se relacionam e uma paisagem
ameaçadora que enfatiza seus estados psicológicos extremos. KN
E U A (Columbia) 104 min. Technlcoloi
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Anthony Mann
P r o d u ç ã o : Wil l iam Goetz
R o t e i r o : Philip Yordan, Frank llui 1 ,
baseado no conto de Thomas I I Iviin
F o t o g r a f i a : Charles Lang
M ú s i c a : George Dunning
E l e n c o : James Stewart, Arthui
Kennedy, Donald Crisp, Cathy
O'Donnell, Alex Nicol, Aiine
MacMahon , Wallace Ford, Jack I I . i m
John War Eagle, James Mill ican,
Gregg Barton, Boyd Stockman. 1 i.ml
DeKova
; i I
I l i f t (W.iiner Bros.) il l min.
W.ll I H ' H llllll
Idl .1 ingles
Dlrncao: Nicholas Ray
i ' i " ' l in. io: David Weisbart
Rotelro: Nicholas Ray, Irving
Minimal). Stewart Stern
m u m . , i : I ronard Rosenman
I I n n ii I ••, I lean, Natalie Wood.
'..il Mlneo, J im Backus, Ann Doran,
i prty Allen, Wil l iam Hopper, Rochelle
Hudson, Dennis Hopper, Edward
M m Steffi Sidney, Marietta Canty,
H - n i l . i Brlssac, Beverly Long, Ian
Will ie
India IC lO ao Oscar: Nicholas Ray
( i n l e l m ) , Sal Mlneo (ator coadjuvante),
r i i i Mm Wood (atrlz coadjuvante)
JUVENTUDE TRANSVIADA (1955)
(REBEL WITHOUT A CAUSE) Mui tas vezes este clássico popular é inconscientemente condenado ao elogio d iminu
tivo de ser o melhor dos três longas-metragens estrelados por j ames Dean durante sua
vida t ragicamente curta. No entanto, juventude transviada continua sendo, com vanta
gem, o melhor f i lme da década de 50 a lidar com o então novo fenômeno da del inqüên
cia juveni l . Ele é também uma obra essencial de Nicholas Ray, um diretor Imensamente
talentoso e especial que, infel izmente, continua sendo tão subest imado quanto na
época em que trabalhava em Hol lywood.
"Vocês estão me destruindo!", grita o j im Stark de Dean com os pais que vivem
brigando, dando voz à confusão e alienação angustiante de tantos dos protagonistas de
Ray. Desde o seu primeiro f i lme. Amarga esperança (1949), o diretor lidou de forma
recorrente com a classe solitária dos outsiders dos Estados Unidos, mostrando simpatia
especial pelos jovens vulneráveis que buscavam orientação de uma geração mais velha
que não era mais sábia ou mais feliz do que eles próprios, j im se desilude com sua famí
lia, com seus professores, com a polícia e com a maioria de seus amigos. Sua busca cons
tante por diversão é tão irresponsável (embora menos condenável, dada sua juventude)
quanto a recusa dos adultos em encarar di lemas morais. Junto com outras almas
perdidas, Judy (Natallc Wood) e Plato (Sal Mlneo), J im tenta estabelecer sua própria famí
lia alternativa, baseada em compreensão mútua. Não é de surpreender que o trio -
aproximado pela morte absurda de um amigo levado pelo tédio a provar seu valor em um
"racha" no topo de um penhasco e unido por noções Idealistas de "sinceridade" - vivesse
em uma casa abandonada nas colinas de Los Angeles, bem longe das outras pessoas.
A solução que Ray encontrou para retratar o idealismo romântico de seus jovens so
nhadores é admirável e alegremente física. O fi lme seria originalmente preto-e-branco,
mas Ray convenceu os Irmãos Warner a deixá-lo filmar em cores. Os tons muitas vezes es
plendorosamente expressionistas de Ray e suas composições cheias em CinemaScope evo
cam a natureza febril da adolescência. Da mesma forma, Ray usa a arquitetura e os cená
rios, principalmente a diferença entre o espaço público e o privado, para aumentar nossa
compreensão das emoções dos personagens. A escuridão de dentro de um planetário se
torna um espaço de piadas íntimas, refúgio e fantasias, até mesmo de contemplação do
lugar do Indivíduo no cosmos. O terraço do lado de fora se transforma mais tarde, através
de uma câmera posicionada no alto, em uma arena Iluminada pelo sol na qual uma luta de
facas semelhante a uma tourada é encenada com gestos apropriadamente histriónicos.
Ray compreende como, especialmente na juventude, vemos nossas vidas como um drama,
a ' - » sua sensibilidade Imaculada para cores, composição, cones, i luminação e
direção de atores eleva a Importância da ação.
Um dos motivos que fez com que ele e Dean fossem perfeitos um para
o outro é que era não só o estilo do ator, mas todo seu corpo que dava vida
dramática à turbulência Interna. Assistir ao J im de Dean é ver um persona
gem nascer, crescendo a cada instante diante dos nossos olhos. Isso, é
claro, combina com o tema de juventude transviada, mas também comple
menta a direção de Ray quanto à precisão com a qual ele expressa fisica
mente a atormentada vital idade dos seus personagens. Assim, é uma tris
teza que os projetos nos quais Ray e Dean planejaram trabalhar juntos
jamais tenham sido realizados. Um só grande f i lme teve que bastar. GA
i UA (Allied Artists) roo min. P&B
I d i o m a : inglés
Dlrcc.io: Phil Karlson
l ' i o d u c á o : Samuel Bischoff, David
Diamond
R o t e i r o : Daniel Mainwar ing, Crane
Wilbur '
Fotografía: Harry Neumann
M ú s i c a : Harry Sukman
l l r n c o : John Mclntire, Richard Kiley,
r ii In v i i Giant, Edward Andrews,
1 ni i Peterson, Biff McGuire, Truman
I I i , lean Carson, Katby Marlowe,
I 1 ' l 1 1 1 I in h, Allen Nourse, Helen
f i. i. o i i o Hulett, George Mitchell,
M.l hrath ie
CIDADE DO VICIO (1955)
(THE PHENIX CITY STORY) Cidadãos decentes travam uma guerra sangrenta para expulsar a marglnália que deu à
cidade do Alabama o título de "Cidade do Pecado, EUA". Baseado em fatos reais e f i lmado
em locação. Cidade do vicio, de Paul Karlson, relaclona-se com certas tendências do pós-
guerra, como o semidocumentário, a denúncia da corrupção urbana e o fi lme degãngster,
porém nenhum desses rótulos faz justiça ao extraordinário poder visceral do filme.
Embora sua violência gráfica fosse algo prat icamente sem precedentes em Holly
wood , o que torna este f i lme de baixo orçamento e feito para chocar verdadeiramente
inovador é o reconhecimento de que novos conteúdos exigem novas formas. A cidade
do vício é um f i lme propositalmente feio, repleto de caipiras feios, espeluncas feias, en
quadramentos feios (no sentido de que desdenham as convenções de uma "boa" com
posição) e violência feia, não estil izada. O cadáver de uma garotinha de óculos é atirado
em um gramado suburbano, um velho aleijado leva um tiro à queima-roupa na boca, os
habi tantes da cidade são feridos e alvejados com uma regularidade de campo de
batalha. As atrocidades ou são esfregadas de forma abrupta nas nossas caras, ou m a n
tidas a uma distância desnorteante, como se superassem a capacidade do f i lme de
representá-las a contento. Mui tos f i lmes retrataram a violência de forma mais explícita
e elaborada desde então, mas poucos transmit i ram a sua força caótica com uma crueza
tão Intel igente. MR
• S u é c l a (svensk) 108 min. P8cB
I d l o m a : sueco
D l r e ç J o : Ingmar Bergman
l ' i o d i i ç . i o : Allan Ekelund
i i o i c i i o : Ingmar Bergman
F o t o g r a f i a : Gunnar Fischer
M u s l c a : I lik Nordgren
E l c n c o : Ula Jacobson, Eva Dahlbeck,
I l u i ni Andersson, Margit Carlqvist,
I . H I H I . H Björnstrand,Jarl Kul le,Âke
I rldell, Björn Bjelfvenstam, Naima
Wtfltrand, Julian Kindahl, Gull
N.iloip. Biigitta Valberg, Bibi
Andi' isson
I r s t l v . i l d e C a n n e s : Ingmar Bergman
(ptihnlo de humor poétlco)
SORRISOS DE UMA NOITE DE AMOR (1955)
(SOMMARNATTENS LEENDE) O primeiro sucesso internacional de Ingmar Bergman pode parecer, em retrospecto,
uma anomal ia em sua carreira. Em entrevistas, Bergman af i rmou mul tas vezes não ter
talento para comédia, e suas incursões posteriores no gênero - O o/ho do diabo (1960) e
Para não faiar de todas essas mulheres (1964) - pareceriam confirmar este sent imento.
Contudo, em Quando as mulheres esperam (1952) e, especia lmente, em Uma lição de
amor (1954), ele encontrou uma fórmula bem-sucedida para comédias espiri tuosas e
sofisticadas com os dois excelentes atotes Gunnar Bjõrnstrand e Eva Dahlbeck (carinho
samente chamada pelo diretor de "O Encotiraçado Femini l idade") como um casal de
meia- idade que atotmenta alegremente um ao outto.
Sorrisos de uma noite de amor é uma variação dessa fórmula, transposta para uma
comédia moral passada no século X IX e com um enredo teatral a l tamente inf luenciado
por Sonhos de uma noite de verão, de Shakespeare. Aqui , o personagem de Bjõrnstrand
é um fi l isteu de meia- idade e o de Dahlbeck é uma atriz envelhecida. Ambos são
vaidosos e egoístas, v ivendo relacionamentos dist intos que se mostraram ainda mais
frustrantes do que o caso anterior dos dois. Com a ajuda de um vinho afrodisíaco e do
crepúsculo mágico de uma noite de verão, os verdadeiros sent imentos deles - e de seus
cônjuges - são revelados. Porém esse novo equilíbrio de complacência burguesa seria
posteriormente abalado de forma vingativa por Bergman em suas visões infernais do
casamento e da crise de meia- idade em Cenas de um casamento (1973) e Da vida das
marionetes (1980). MT
NOITE E NEBLINA (1955)
(NUIT ET BROUILLARD) A documentação da desumanidade do homem é, por si só, uma história ant iga. Ainda
assim, ela mal serviu para preparar o mundo para as atrocidades específ icas do Holo-
t austo, uma série de eventos orquestrados tão horrível que ainda confunde a mente .
Ciente de como o passar do tempo costuma diluir as memór ias, por mais poderosas
que se jam, o cineasta Alain Resnais (que posteriormente alcançou maior destaque co
mo diretor de longas como Hiroshiina, meu amor e Ano passado em Marienbad) decidiu
i apturar as atrocidades dos nazistas em película, se não para a posteridade, cer tamen
te como um lembrete duradouro do que somos capazes de fazer uns com os outros.
O primeiro f i lme a abordar de fato o Holocausto em uma época em que a Segunda
Guerra Mundia l ainda produzia ân imos exaltados, especialmente na Europa, Noite c
neblina sobrepõe material de arquivo em preto-e-branco de campos de concentração e
de suas v í t imas com imagens pastorais coloridas dos prédios e localidades 10 anos
depois. Revelando a Intensidade da desconfiança e da negação que existia mesmo uma
década depois da queda do Terceiro Reich, Resnais util izou imagens de arquivo da
França, da Bélgica e da Polônia, mas, c laramente, não da Alemanha. Ele mostrou que
multas pessoas envolvidas com os campos de extermínio não sabiam como lidar com a
própria culpa e cumpl ic idade ou não queriam fazê-lo.
A negação é a mola propulsora de Noite c neblina. Resnais inclui imagens de arquivo
dos mortos sendo jogados aos montes em covas coletivas, cadáveres pendurados em
cercas de arame farpado, rostos emagrecidos congelados de medo, corpos nus esque
léticos sendo enfi leirados para sofrerem humilhações e trens e caminhões transpor
tando sabe-se lã o quê para sabe-se lá onde. Ele documenta as câmaras de gás e crema
tórios, assim como as tentat ivas grotescas dos nazistas de encontrar ut i l idade para os
objetos pessoais descartados, ossos, pele e corpos de suas ví t imas.
Resnais, nas f i lmagens de sua autoria, observa que esses campos de concentração
não f icavam em postos avançados isolados, mas freqüentemente próximos de cidades
grandes, sugerindo que todo o ocorrido se deu com pelo menos uma parcela de c u m
plicidade por parte dos civis. Ainda ass im, mesmo os nazistas responsáveis pelos
campos negam ter culpa. Um após outro, eles a f i rmam: "Não sou responsável." Mas , se
eles não são, pergunta o f i lme, quem o é?
Noite e neblina está mais preocupado em atribuir culpa coletiva do que acusar qual
quer figura específ ica. Mesmo tão pouco depois da guerra, Resnais percebeu que a
natureza fugaz da memória ameaçava apagar os horrores nazistas. " U m crematório
pode ser tão bonito quanto um cartão-postal" , observa o narrador. "Hoje em dia, turis
tas t i ram fotos diante deles." Trabalhando com o roteiro de Jean Cayrol, um sobre
vivente do Holocausto, e contando com uma trilha sonora est ranhamente singela de
Hanns Eisler (um marxista e exilado a lemão que foi deportado dos Estados Unidos
durante o expurgo comunista de Hol lywood), Resnais deixa as Imagens acumuladas de
morte e terror servirem de vívida refutação a qualquer pessoa que volte a dar as costas
a esse t ipo de atrocidade. Se , no f im das contas, o breve, porém poderoso, Noite e
neblina se aproxima da forma concisa de um cartão-postal , ele é um cartão-postal que
t ransmite uma mensagem eternamente válida - o mal sempre pode ressurgir. JKI
F r a n ç a (Argos) 32 min. P&B / Cor
I d i o m a : francês
D i r e ç ã o : Alain Resnais
P r o d u ç ã o : Anatole Dauman, Samy
Halfon, Phillppe Llfchitz
R o t e i r o : Jean Cayrol
F o t o g r a f i a : Ghlslaln Cloquet, Sacha
Vlerny
M ú s i c a : Hanns Eisler
E l e n c o : Michel Bouquet, Reinhaid
Heydrich, Heinrich Himmler, Atlnll
Hitler, Jullus Strelcher
1 1 /
I H A (Paul Gregory, United Artists)
93min . P&B
I d l o m a : inglês
D i l e t .10: Charles Laughton
l ' i o d u ç . i o : Paul Gregory
K n t r i r o : James Agee, baseado no
llviii de Davis Grubb,
F o l o g r a f i a : Stanley Cortez
M u s i c . 1 : Walter Schumann
t l r n c o : Robert Mi tchum, Shelley
W im rr . . Lilian Gish, James Gleason,
1 velyn Varden, Peter Graves, Don
llddoe, Billy Chaplin, Sally Jane
I , 1 iloria Castillo
0 MENSAGEIRO DO DIABO (1955)
(THE NIGHTOF THE HUNTER) Baseado no romance curto e violento de Davis Ctubb, o único filme de Charles Laughton
como diretor é uma fábula passada durante a Depressão sobre psicose e fé, impres
sionantemente sinistra e, ainda assim, profundamente humana. Contada em sua maioria
do ponto de vista de crianças, a história tem a simplicidade de um conto de fadas, embora
fervilhe de problemas adultos. O estopim é um dinheiro escondido roubado pelo bandido
pobretão Ben Harper (Peter Craves) e confiado a seus filhos John (Billy Chaplin) e Pearl (Sally
Jane Bruce), o que torna Willa (Shelley Wlnters), a viúva desesperada de Ben, objeto de
desejo de um dos mais inesquecíveis vilões do cinema. O "reverendo" Harry Powell
(Robert Mitchum), em vestes clericais preto-e-branco e com um chapéu estilo puritano
cujas abas se enrolam no formato de dois chifres de aspecto demoníaco, é associado à
Bíblia e a um canivete. Com as palavtas "amor" e "ódio" tatuadas nos nós dos dedos, seu
sermão consiste em um discurso alegórico sobre essas forças em conflito, que ele ilustra
em uma queda-de-braço contra si mesmo. O cortejo de Willa por parte de Powell é tenso,
e ele engana a mulher (que acaba sendo serenamente afogada), mas não as crianças, que
fogem depois do assassinato com o dinheiro escondido dentro da boneca da menininha.
Mitchum interpreta aqui um vilão comprometido com seu ofício, fazendo hora-extra
como serial killer de mulheres liberadas, mas sexualmente obcecado pelo dinheiro, do qual
acredita precisar para custear sua cruzada sangrenta. A fuga noturna rio abaixo, com sua
fotografia monocromática expressionista, é uma seqüência mágica, com doses de uma
estranha fauna e flora pantanosa. Com o binômio Amor/Ódio transmitido de forma tão
poderosa, O mensageiro do diabo precisava de uma força para representar o Bem e o Amor.
Laughton conseguiu convencer Lilian Gish a abandonar sua semi-aposentadoria para inter
pretar Rachel, uma mulher bondosa cuja fazenda está de portas abertas para as crianças
fugitivas. Como uma serpente no Éden, Powell ameaça o idílio de Rachel, usando seu
charme repulsivo com uma das garotas mais velhas para entrar na fazenda. Em um extraor
dinário clímax de cerco, o cantarolar ameaçador de Mitchum é acompanhado e completado
por Gish, que conhece a letra inteira ("Confie em Jesus") e acrescenta sua voz à dele, expul
sando sua escuridão no campo auditivo antes de ele ser derrotado de fato. KN
• M C I / A l e m a n h a O c i d e n t a l
li i la, Gamma, Oska-Fllm) no min.
Eastmancolor
Idioma: f rancês/ i ng lês / alemão
D l r c ç J o : Max Ophuls
P i m l u ç ã o : Albert Caraco
M O I I - I U I : Max Ophuls,,Annette
W.iileni.in, Jacques Natanson,
I I ido no livro La vie extraordinaire
jf| Lo/o Montês, de Cecil Saint-Laurent
Fotografia: Christian Matras
M u s i c a : Georges Aurlc
U l m c o : Martine Carol, Peter Ustinov,
Anton w.ilbrook, Henri Guisol, Lise
i >,T.1111.11,'. Paulette Dubost, Oskar
i" lean Cal land, Will Quadfl leg,
HCIrna Manson, Germaine Delbat,
i ail 11 d. Jacques Fayet, Friedrich
l ionil i i , Werner Flnck
LOLA MONTES (1955)
(LOLA MONTÊS) Nascido na Alemanha, naturalizado francês, v ienense por uma sensibi l idade que o
acompanhou por toda a vida, Max Ophüls era a escolha perfeita para f i lmar a vida de
Lola Montes, uma das grandes femmes fatales cosmopol i tas da história. Montes, exímia
dançarina e cortesã, protagonizou uma série de escândalos pela Europa de meados do
século X IX , incluindo entre seus vários amantes Franz Llszt e o rei da Bavária.
O f i lme de Ophüls, seu últ imo (e o único colorido), não é uma cinebiografla conven
cional. Em vez disso, ele elabora uma luxuosa extravagância barroca, parte circo, parte
cortejo, repleta de f lashbacks, e faz sua câmera notor iamente móvel passear pelas
complexas decorações. No papel-t í tulo, Mart ine Carol oferece uma interpretação tac i
turna e emoc iona lmente chapada. No entanto, apesar de todas as suas l imitações,
Carol se encaixa no conceito de Ophüls. Como sempre, seu interesse está no abismo
entre o ideal do amor e sua realidade falha e desencantada. Sua Lola é apenas uma
tabula rasa passiva em que os homens projetam suas fantasias. Seu destino final como
uma atração de circo que vende beijos por um dólar reduz sua profissão à sua lógica
mais brutal. Lola Montes, um fl/m maudit clássico, foi retalhado pelos seus distri
buidores e, durante muito tempo, esteve disponível apenas em uma versão truncada,
porém uma cópia recém-restaurada nos permite apreciar o canto de cisne de Ophüls
em todo o seu pungente esplendor. PK
I U A (M( ,M) '|K min. Eastmancolor
I d i o m a : ingles
I H i r ç . t o : I led M. Wllcox
I ' , , I , l , , , . 10 : Nicholas Nayfack
l u a , nu living Block, Allen Adler,
1 vill Hume
I i ' . I . i l l a : George J . Folsey
M I E . I , .1 Bebe Barron, Louis Barron
I Itnco Waller Pldgeon, Anne Francis,
I e- . l ie N i e l s e n , Hobby, o Robô, Warren
5 | . H k Kelly, Richard Anderson,
I .n i I lull lman, George Wal lace,
Unheil i m , Jimmy Thompson, James
IH in v, H a i ly Harvey Jr., Roger McGee,
I V I e i Mlllel
I , n i e j ç A o a o O s c a r : A. Arnold
• a l l i ' sp i r , l iving G. Ries, Wesley C.
M l l l e i (eleitos especiais)
PLANETA PROIBIDO (1956)
(FORBIDDEN PLANET) Esta pérola da f icção científ ica dos anos 50 dirigida por Fred M. Wilcox, f i lmada ambi
c iosamente em Cinemascope, não deve nada à paranóia relacionada ao macar th lsmo
da época com invasores hostis do espaço sideral, mas deve muito ao enredo de A tem
pestade, de Wi l l i am Shakespeare, e à premissa psicológica sofisticada de que os
monstros mais perigosos são aqueles que se escondem dentro dos impulsos primitivos
do subconsciente.
Uma missão liderada pelo comandante John J. Adams (Leslle Nielsen) ao planeta
Altair 4, para descobrir o que aconteceu com uma expedição da Terra da qual não se
tem notícia há décadas, descobre que os únicos sobreviventes da colônia são o
cientista genial e arrogante Edward Morbius (Walter Pidgeon) e sua filha Altaba (Anne
Francis), nascida em melo à natureza, com suas minissaias provocantes. Os dois são
servidos por um dos mais queridos personagens metál icos do c inema, o versátil e
prestativo Robby, o Robô. O doutor Morbius encontrou as impressionantes ruínas da
antiga civil ização extinta dos Krell, e mexer com suas maravi lhas tecnológicas faz com
que a destruição recaia sobre todos eles. Efeitos extraordinários (entre eles os "mons
tros do id" que são l ibertados), o fascinante complexo subterrâneo dos Krell e uma tri
lha sonora sinistra e inovadora de tons eletrônicos são a lgumas das delícias de um fil
me multo ci tado que Inspirou várias das ficções científ icas posteriores que especulam
sobre como a tecnologia pode destruir seus usuários. AE
A HARPA DA BIRMÂNIA (1956)
(BIRUMA NO TATEGOTO) Embora Akira Kurosawa possa ser o cineasta japonês mais famoso no Ocidente, seu
contemporâneo Kon Ichikawa demonstrou o mesmo talento e m , l i teralmente, dezenas
de f lmes, dentre eles A harpa da Birmânia, sua elegia à inocência perdida. Começando
no f im da Segunda Guerra Mundia l , o capitão Inouye (Rentaro Mikunc) lidera seu pelo
tão até a Birmânia com uma saudável mistuta de disciplina e aulas de música. Tendo
ensinado seus soldados a lutar, mas também a cantar, eles sâo um conjunto estranho
de recrutas que acabam indo de encontro ao Dia do Armistício.
Presos em campo de detenção inglês enquanto aguatdam a repatr iação, eles
ouvem boatos sobre um grupo Isolado de japoneses que se recusam a se render. Como
o tocador de harpa de Inouye e centro da vida espiritual do seu pelotão, Mizushlma
(Shôji Yasul) se ofetece para acalmar os ân imos dos soldados em vez de deixá-los mor
rer em um ataque de artilharia. Inabalada pelas súplicas, a força entrincheirada é morta
e Mizushima é dado como perdido, embora, graças a boatos, o pelotão cont inue acre
ditando na sua sobrevivência.
O que se segue é uma jornada comovente à medida que Mizushima desperta do
ataque, ferido e com medo. Auxiliado por camponeses, ele começa a voltar para
Inouye, porém descobre aos poucos um propósito mais elevado. Vestido de monge
budista, ele passa a enterrar os mortos da guerra espalhados pelo Sudeste da Ásia sem
cerimônias funerárias ou mensagens de despedida para seus lares. Ele reconhece a
necessidade do luto, mas também sabe que a paz se baseará em atenção mútua e
lealdade pessoal, de modo que renega sua vida pregressa para caminhar pelo mundo
fazendo pequenos serviços onde eles são necessários. Subseqüentemente , seus cami
nhos se cruzam várias vezes com os de Inouye, mas ele f inalmente explica sua causa
como uma últ ima homenagem aos mortos, sejam eles inocentes ou culpados, bons ou
maus, pois é sobre os ombros deles que o futuro se erguerá.
Uma lufada de sent imento caloroso em um cenário macabro, A harpa da Birmânia
retém cada partícula de dignidade associada à gentileza e à bondade. A própria Bir
mânia se torna uma coadjuvante passiva, porém a idéia de renovação espir i tual, apre
sentada sem dogmat ismo ou impulsos proselit istas, gera um agradável epílogo aos
horrores da Segunda Guerra Mundia l nesta obra-prima precoce de Ichikawa. G C - Q
J a p ã o (Nikkatsu) 116 min. P&B
I d i o m a : japonês
D i r e ç ã o : Kon Ichikawa
P r o d u ç ã o : Masayuki Takaki
R o t e i r o : Natto Wada, baseado no
livro de Michio Takeyama
F o t o g r a f i a : Minoru Yokoyama
M ú s i c a : Akira Ifubuke
E l e n c o : Rentaro Mikune, Shôji Y . is in,
Jun Hamamura, Takeoshi NaltÔ, t 0
Nishímura, Hiroshi Tschuikata,
Sanpei Mine, Yoshitaki Kato, Sojlro
Amano, Yôji Nagahama, Eiji
Nakamura, Shojiro Ogasawara,
Tomoko Tonai, Tatsuya Mihashi,
Yonosuke Ito
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Japão (melhoi
fi lme estrangeiro)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Kon Ichikawa
(Prêmio OCIC - menção honrosa),
indicação (Leão de Ouro)
RASTROS DE ÓDIO nsse)
(THE SEARCHERS) Rastros de ódio começa com o plano de uma paisagem de deserto vista de dentro de
uma casa. Alguém se aproxima montado em um cavalo. É Ethan Edwards (John Wayne) ,
vol tando da Guerra Civil para a fazenda do irmão no Texas. Através de uma série de
olhares e gestos, percebemos que Ethan está apaixonado pela mulher do I rmão,
Martha (Dorothy Jordan). No dia seguinte, ele parte com um grupo de Texas Rangers em
busca de índios que hav iam roubado a lgumas cabeças de gado. Enquanto está
afastado, comanches a tacam a fazenda, matando o Irmão e a cunhada de Ethan e
raptando suas duas f i lhas. Por todo o resto do f i lme, em atos que se passam em um
período de cinco anos, Ethan e Mart in (Jcffrey Hunter), seu companheiro de sangue
indígena, cruzam o Oeste em busca das garotas.
Como John Ford transformou esse enredo simples em um dos maiores faroestes de
todos os tempos? Em primeiro lugar, há o cenário. Ford rodou muitos faroestes no
Monumen t Valley, uma região desolada na fronteira entre Utah e Arizona. As rochas de
arenito erodldas são um espetáculo extraordinário, e o olho clínico de Ford para
composições as Investe de uma aura especial. O próprio tamanho da paisagem faz as
figuras humanas parecerem especialmente vulneráveis e a vida dos colonos texanos,
precária. Como é possível tirar sustento de um lugar tão Inculto e árido?
No coração da história, entretanto, está a figura de Ethan Edwards. Na interpre
tação de W a y n e , Ethan é um colosso, devastador e Indomável . Contudo, ele tem um
defeito trágico. Ethan é devorado por seu ódio aos índios e fica claro que sua busca é
Impulsionada por um racismo Implacável . Sua Intenção, conforme percebe Mart in , não
é resgatar Debble (Natal ie Wood) , sua sobrinha sobrevivente, mas assassiná-la. Na vi
são de Ethan, ela se contaminou de forma irremediável pelo contato com seus raptores
comanches. Aos poucos, percebemos que Scar (Henry Brandon), o chefe comanche,
funciona como uma espécie de espelho de Ethan. Ao estuprar Martha antes de matá- la,
Scar executou um terrível simulacro do ato que Ethan, em segredo, sonhava cometer.
Ass im, a ânsia deste últ imo em matar Scar e Debbie nasce da sua necessidade de
destruir seus próprios desejos i legít imos.
A verdadeira genial idade de Rastros de ódio está no fato de ele conseguir manter a
simpatia dos espectadores por Ethan, apesar de ele ser um racista homicida. Ao fazê-lo,
a fita gera uma reação multo mais complexa e produtiva do que a maioria dos f i lmes
liberais desse fi lão, como Flechas de fogo (1950). Em vez de pregar uma mensagem, Ford
nos conduz para as complexidades da experiência americana com a diferença racial.
Há vários outros prazeres pelo caminho, entre eles uma trilha sonora maravilhosa
de Max Stelner e muito humor a cargo de membros da Sociedade Anônima John Ford,
como Harry Carey Jr., Ken Curtis, Hank Worden e Ward Bond. Vera Mlles está excelente
como Laurle, a namorada de Marty, cuja mãe é interpretada por Olive Carey, viúva do
primeiro astro do faroeste de Ford, Harry Carey.
Em 1992, Rastros de ódio foi votado o quinto melhor f i lme de todos os tempos em
uma enquete com críticos de cinema de vários países promovida pela revista Sight &
Sound. É uma honra e tanto, mas o f i lme de Ford faz jus a ela. EB
F r a n ç a (Gaumont, Nouvelles Éditions}
I l min. p & b
• a: l lancés
U h r ç . l o : Robert Bresson
F i o d u ç â o : Alain Poiré, Jean Th u il Mer
lotllro: Robert Bresson, baseado no
l lvio de inemôrias de André Devigny
P o t o f t r . i f l a : Léonce-Henri Burel
• w o . i . .1 n a o o r i g i n a l : Wolfgang
•Aiii.idcus Mozart
l l i n c o : François Leterrier, Charles Le
: l.ilm he, Maurice Beerblock, Roland
Monod, lacques E r t a u d j e a n Paul
Delhi au, Roger Treherne, Jean -
Phll lppr Delamare, César Gattegno,
' lerlemans, Klaus Detlef
l . irvri ihntst, Leonhardt Schmidt
N l t l v a l d e C a n n e s : Robert Bresson
Indlcaçâo (Palma de Ouro)
UM CONDENADO A MORTE ESCAPOU (1956)
(UN CONDAMNÉ À MORT S E S T ÉCHAPPÉ OU LE VENT SOUFFLEOÜILVEUT) Se alguém precisar ser convencido das alegrias e recompensas do min imal ismo no c i
nema, Um condenado à morte escapou é o melhor lugar para se começar. Boa parte dele
mostra Fontaine (François Leterrier) sozinho em sua cela, fazendo contato com seus
colegas prisioneiros, cavando lentamente seu caminho para a l iberdade.
Como todos os filmes de Bresson, este Ilustra suas teorias de longa data sobre o
"cinematógrafo": atores não-profissionais oferecendo interpretações completamente não
dramatizadas; enorme ênfase no som em off e na Informação que ele traz; música evitada
até um último e glorioso momento. E, como os demais grandes filmes de prisão do cinema
francês - A um passo da liberdade (1960), de Jacques Becker, e Uma canção de amor (1950), de
Jean Cenet -, Um condenado ã morte escapou oferece uma alegoria de extraordinária pun
gência do sofrimento humano c do desejo de liberdade. Ao mesmo tempo, proporciona um
tipo de suspense atenuado e tenso à altura do melhor de Hitchcock.
Durante mui tos anos, Um condenado à morte escapou foi admirado por seus
aspectos existenciais e espirituais: a solidão do homem, a fragil idade da comunicação
com o outro, o dom da graça de Deus. Mais recentemente, seu aspecto político foi
colocado em primeiro plano e ele passou a ser visto como uma reflexão da experiência
de Bresson na Resistência - dando a toda sua carreira, com seus temas de sujeição e
"a lmas atormentadas" , uma urgência de cunho social. AM
I DA (Uiiivcisal) 99 min. Technicolor
I d i o m a : inj'Jes
i h i i i . i o : DouglasSirk
i ' o ' , l o , .10: Albert Zugsmith
i ' . a i im I ieorge Zuckerman, baseado
im l u l u do Robert Wilder
Fotograf ia: Russell Met ty
M i r . l i . i : 11,111k Skinner, Victor Young
l l enco : Rock Hudson, Lauren Bacall ,
• • • " I " ii Stai k. Dorothy Malone,
l ob i r l 1 dl 11, Grant Wi l l iams, Robert
I Will< . I dward Piatt, Harry
- i i innon, John Larch,Joseph Granby,
I " I , L i u I . M , lid i e Norman, Wi l l iam
•a h.illi'il. Inane Jordan
O i c a r : Dorothy Malone (atriz
I O . l l l ) l l V . l l l t ( ' )
l e i n .ii. .10 ,10 O s c a r : Robert Stack
J 1 adjuvante), Victor Young,
V. v I alui (canção)
PALAVRAS AO VENTO (1956)
(WRITTEN ON THE WIIMD) Robert Stack, em uma fúria bêbada, atira uma garrafa de bebida contra a parede.
Lauren Bacal l , diante das cort inas de seu quarto, desmaia. Tiros, morte, lágrimas. E, na
trilha sonora, um coro mascul ino começa a cantar "Our nlght of stolen bliss was
wri t ten on the w i n d " ("Nossa noite de felicidade roubada estava escrita nos ventos") .
Desde seus primeiros momentos , este é o melodrama hol lywoodiano que contém em si
todos os demais de forma elétrica, condensada e poderosamente lírica.
Palavras ao vento é sobre as ligações distorcidas e fatais entre sexo, poder e dinheiro.
Os personagens são dispostos como reflexos invertidos uns dos outros, o bem diante do
mal - no entanto, todos, no fim das contas, assumem uma posição complexa e
contraditória no esquema geral (e impraticável) das coisas. Dorothy Malone - maravi
lhosa como o arquétipo da garota má, que bebe, fuma, adora jazz, fisga homens em
torres de petróleo e atita o próprio pai escada abaixo - está especialmente instigante.
Poucos f i lmes são ao mesmo tempo tão viscerais e perspicazes quanto Palavras ao
vento - uma novela com paixão, seriedade e Inteligência. O diretor Douglas Sirk se es
pecializou em f i lmes que já foram desdenhados tanto por adeptos da alta quanto da
baixa cultura como "arranca-lágr imas para mulherzinhas". Quando eles foram redesco
bertos no Início da década de 70 em festivais de cinema por todo o mundo, a audácia e
a verdadeira subversão da sua obra foram apreciadas pela primeira vez. AM
O HOMEM QUE SABIA DEMAIS 0956)
(THE MAN WHO KNEWTOO MUCH) A única refilmagem de Hitchcock de um de seus próprios filmes levanta a questão da su
perioridade da sua obra americana em relação à sua produção Inglesa. Embora a versão original
de 1934 seja espirituosa, a refilmagem é mais exuberante e eficiente, contendo algumas das
cenas mais poderosas de Hitchcock. James Stewart interpreta um médico americano de férias
no Marrocos com sua família que descobre acidentalmente que um assassinato político
acontecerá no futuro próximo. Um casal Inglês amigável é, na verdade, uma dupla de espiões
que faz parte da conspiração. Eles raptam o filho de Stewart para garantir que ele ficará calado.
Assim, ele precisa evitar o assassinato sem colocar o filho em perigo.
Como na maioria dos f i lmes de Hitchcock, a intriga internacional é menos Impor
tante do que a odisséia do herói. Stewart de fato "sabe demais", sem valorizar as
capacidades de sua esposa (Dóris Day). Com o desenrolar da trama, no entanto, a ajuda
dela se mostra essencial, apesar dos seus medos de que ela sofra um colapso emocional
(ele chega a drogá-la antes de lhe contar sobre o assassinato). O clímax do f i lme se dá no
Albert Hall em umas dàs melhores seqüências de toda a carreira de Hitchcock. O homem
que sábio demais oferece interpretações excelentes de Stewart e Day e de Bernard Mllcs
e Brenda De Banzle como os agentes Ingleses. A trilha sonora de Bernard Herrmann, que
aparece no f i lme conduzindo a orquestra, é uma de suas melhores. BP
ASSIM CAMINHA A HUMANIDADE (1956)
(GIANT) Edna Ferber se especializou em escrever sagas de famíl ias desunidas, mui tas delas
passadas no Oeste . Cimarron, seu romance de 1930, foi f i lmado duas vezes por
Hol lywood, assim como Show Boat, de 1926, passado no Sul Profundo. Em Ciam, escrito
em 1950, Blck Benedict (Rock Hudson) é um barão do gado texano que se casa com uma
Impetuosa belle de Maryland chamada Leslle (Elizabeth Taylor). A Irmã de Blck deixou
parte da propriedade para Jet t Rink (James Dean), um ex-empregado seu. Rlnk descobre
petróleo e fica imensamente rico, porém sua vida pessoal é um fracasso (ele é apai
xonado por Leslle) e ele se entrega ao alcool ismo. À medida que Bick e Leslie envelhe
cem, eles se preocupam com a questão de quem cuidará da fazenda depois da morte
dos dois. A filha deles (Carroll Baker) quer assumir o controle, mas não conta com a
aprovação de Leslle. Para decepção de Bick, seu filho (Dennis Hopper) se casou com
uma mulher latina e se tornou médico. Com o tempo, Bick e Leslie passam a aceitar seu
destino.
Com bem mais de três horas de duração, Assim caminha a humanidade faz jus ao
seu título original, Ciant (Gigante). Porém o elenco está excelente, especialmente James
Dean, que morreu t rag icamente em um acidente de carro pouco depois de concluir sua
participação no f i lme. O diretor George Stevens faz justiça à imensidão da paisagem do
Texas e, de forma incomum para a época, o f i lme Ilda de maneira interessante com as
diferenças raciais e de classe. EB
E U A (Paramount) 120 min.
Technicolor
I d i o m a : inglês
P r o d u ç ã o : Herbert Coleman
R o t e i r o : Charles Bennett, D. B.
Wyndham-Lewis , John Michael H j y t l
F o t o g r a f i a : Robert Burks
M ú s i c a : Bernard Herrmann
E l e n c o : James Stewart, Doris I >.iv.
Brenda De Banzie, Bernard Miles,
Ralph Truman, Daniel Gélln, Mogen-,
Wie th , Alan Mowbray, Hillary Broi .F.
Christopher Olsen, Reggie Nal.lei,
Richard Watt is , Noel Wl l lman, Alix
Talton, Yves Brainville
O s c a r : Jay Livingston, Ray Eva.is
(canção)
E U A (Giant, Warner Bros.) 197 min
Warnercolor
I d i o m a : Inglês / espanhol
D i r e ç ã o : George Stevens
P r o d u ç ã o : Henry Ginsberg, <,.-..ir.
Stevens
R o t e i r o : Fred Gulol, Ivan M u l l . 1 1 .
baseado no livro de Edna Feibei
F o t o g r a f i a : Wil l iam C. Mello.
M ú s i c a : Dimitri Tiomkin
E l e n c o : Elizabeth Taylor, Rock Hudson,
James Dean, Carroll Baker, Jane
Withers, Chill Wil ls, Mercedes
McCambridge, Dennis Hoppei, '.ai
Mineo, Rod Taylor, Judith Evelyn, 1.111
Holl iman, Robert Nichols, Paul 11 -
O s c a r : George Stevens (diretor)
i n d i c a ç ã o a o O s c a r : George Steven-.
Henry Ginsberg (melhor filme). I ted
Gulol, Ivan Moffat (roteiro), Ja in . - .
Dean (ator), Rock Hudson (ato.).
Mercedes McCambridge (atriz
coadjuvante), Boris Leven, Ralph
S. Hurst (direção de arte), Mn-,', M. i l . iy
Marjorle Best (figurino), Wil l iam
Hornbeck, Philip W. Anderson, I led
Bohanan (montagem), Dimlt
Tiomkin (música)
> \
I u r t (I iniversal) 89 min. Technicolor
I d i o m a : ingles
DtriçSo: Douglas Sirk
Produção: Ross Hunter
ROtflro: Peg Fenwick, Edna L. Lee,
1 ),M 1 v I ee, baseado no conto de Edna
L, Lee *
1 otografla: Russell Metty
M ú s i c a : Frank Skinner
flcnco: Jane W y m a n , Rock Hudson,
Agnes Moorehead, Conrad Nagel,
Virginia drey, Gloria Talbott, Wil l iam
Reynolds, Charles Drake, Hayden
ROtke, Jacqueline deWit , Leigh
Inowden, Donald Curtis, Alex Gerry,
Ni itoi Paiva, Forrest Lewis
TUDO 0 QUE 0 CEU PERMITE (1956)
(ALL TH AT HEAVEIM ALLOWS) Em um nível, Tudo o que o céu permite, de Douglas Sirk, é como um exemplo fabuloso e
irônico de arteperformát ica, uma relíquia de um género específico da metade do século
XX que degenerou na novela de tevê. Contudo, as experiências emocionais no centro das
vidas do f i lme são eternamente cativantes. Este é, indiscutivelmente, o melhor exemplo
dos luxuosos melodramas em Technicolor da década de 50 e o mais clássico dos diri
gidos na Universal por Sirk. Nascido na Dinamarca, Sirk (cujo nome verdadeiro era Detlef
Sierck) era um diretor de teatro esquerdista que se tornou um cineasta de certo
prestígio. Ele fugiu com a esposa judia da Alemanha nazista para Hol lywood e, ao voltar
à estaca zero como um emigrante desconhecido, conferiu um bom gosto característico
a trabalhos aparentemente simples e banais. Sua sofisticação européia e formalidade
visual t ransformaram histórias absurdas e sentimentalóldes em realidades delirante
mente divertidas e dramas domést icos comoventes, entre eles Sublime obsessão (1954),
Palavras ao vento (1956), Almas maculadas (1958) e Imitação da vida (1959).
Em Tudo o que o céu permite, Cary Scott (Jane W y m a n ) , uma simpática viúva de
classe média, abandonada por seus fi lhos adultos egoístas e condenada ao ostracismo
social por seu frívolo grupo de amigos, se apaixona por Ron Kirby (Rock Hudson), um
jardineiro muito mais jovem - Hudson era um dos atores favoritos de Sirk e também
aparece como co-protagonista de W y m a n em Sublime obsessão. Ned (Wil l iam Reynolds),
seu filho distante, está mais preocupado com a carreira, e Kay (Gloria Talbott), a filha
adolescente mimada, sente vergonha por sua mãe ser uma mulher com desejos
sexuais. Um aparelho de tevê é o que imaginam ser um ót imo presente para preencher
o tempo dela. O amor vence, mas somente depois de passar pela provação de fofocas
cruéis, uma separação lacrimosa e uma crise que coloca a vida do casal em risco. Esses
são todos e lementos tradicionais dos ant igos f i lmes para mulheres, mas Sirk os apre
senta com um olho para os impulsos mais sombrios por debaixo da salubridade dos
subúrbios ensolarados idealizados na América dos anos 50 - e com uma manipulação
sutil das inseguranças reprimidas.
Juntamente com Imitação da vida. Tudo o que o céu permite foi uma grande referência
para Longe do paraíso (2002), o tributo ao melodrama ousado e suntuoso deTodd Haynes.
Ele também serviu de fonte para a releitura de cunho racial de Fassbinder,
passada alguns níveis abaixo na escala socioeconómica. O medo devora a
alma (1974) traz uma pobre viúva alemã que é exposta ao preconceito e ao
escárnio quando se apaixona pelo muito mais jovem Ali, um gentil e
igualmente solitário imigrante do Norte da África. A influência do figurino de
Tudo o que o céu permite chegou até à comédia francesa que homenageia o
período. Oito mulheres (2002), com a filha de Catherine Deneuve chegando
em casa das férias em uma réplica do gorro e do conjunto de Gloria Talbott.
Rock Hudson, que fez boa parte de seus melhores trabalhos com Sirk,
está perfeitamente sincero como o jovem rude, porém sensível, no qual a
dona-de-casa sentimental de W y m a n encontra carinho e empatia libertado
res. O fi lme tem uma aparência saborosa, com cores, composições, i lumina
ção, direção de arte, figurinos e fotografia maravilhosos. Porém o estilo
serve perfeitamente ao conteúdo, e a observação da natureza humana re
pleta de esplendor compõe um melodrama divinamente romântico. AE
VAMPIROS DE ALMAS (1956)
(INVASION OF THE BODY SNATCHERS)
I I M (Allied Artists, Walter Wanger)
10 m i n . P & B
l i l l n m . i : I I I J ' . I I " ,
l l h i ' 1 , . 1 1 1 : I K m Siegel
I l u c . t o : Waller Wanger
i t ' i i e i i n 11,1 1 Malnwaring, baseado
im llvm Hie Body Snatchers, de Jack
I M i l l ' V
f o t o g r a f l a : Ellsworth Fredericks
M ü i l c a : Carmen Dragon
I I n n o: I ' evin McCarthy, Dana
Wvi i ie i , I airy Gates, King Donovan,
Carolyn Jones, Jean Wil les, Ralph
I lumke, Virginia Christine, Tom
1 nidi 11 1 enneth Patterson, Guy Way,
I Hi 111 Stevens, Beatrice Maude, Jean
Aii ihen. Bobby Clark
Um dos f i lmes mais populares e paranóicos da Era de Ouro do cinema de ficção
científ ica amer icano, Vampiros de almas, de Don Siegel, é ao mesmo tempo uma
alegoria ambígua/ambiva lente da Guerra Fria e uma história de terror extraterrestre.
Apesar do cl ima de f i lme B, a obra de Siegel - baseada no romance de Jack Finney -
está menos interessada em respeitai as convenções da f icção cientif ica do que em
dramatizar os perigos do conformismo social e a ameaça de Invasão que pode vir tanto
de fora quanto de dentro da própria comunidade, No entanto, a ausência de qualquer
monstro explícito - em parte graças a mot ivos econômicos, o tema das plantas que
roubam corpos e dos duplos zumbif icados serviu como uma criativa tática de corte de
despesas - é mais do que compensada pela representação sinistra da "vida c o m u m "
que talvez não seja mais tão comum quanto parece. Conforme escreve Kim N e w m a n ,
" E m vez de garras de borracha, dinossauros animados e raios laser al ienígenas mortais,
o f i lme retira terror de um tio cortando a grama, de uma barraca de vegetais de beira de
estrada abandonada, de um bar vazio de cl ientes, de uma mãe colocando uma planta
no berço de uma criança, ou de uma mul t idão se reunindo intencionalmente em uma
praça às 7I145 da manhã em um sábado."
Quando o Dr. Ml les Bennell (Kevin McCarthy) volta para sua casa na cidadezinha de
Santa Mira, na Califórnia, de um congresso de medicina, ele se depara com relatos
estranhos de muitos dos seus pacientes, que Insistem que seus parentes aparentemen
te benévolos são, na verdade, impostores. Depois de algum cet ic ismo inicial, Ml les se
convence quando, durante um churrasco com alguns amigos, ele descobre dois casulos
que arrebentam, liberando um fluido borbulhante e duas réplicas humanas incom
pletas, uma das quais está bem próxima de ficar Idêntica ao próprio Mi les. Especulando
que uma invasão alienígena bizarra está acontecendo, ele e Becky (Dana Wyntc r ) , sua
namorada, tentam fugir enquanto toda a cidade é dominada pelos efeitos desumanlza-
dores dos casulos.
Um pesadelo cinematográf ico sobre a ameaça comunista em potencial , ou um fi l-
me-mensagem ant lmacarthista disfarçado de fantasia de ficção científ ica? Vampiros de
a/mas fornece argumentos para sustentar
ambas as interpretações. E seu final aberto
e pessimista, no qual Mi les perambula por
uma estrada e grita "Você é o próximo" di
retamente para a câmera, fará você se per
guntar quem de fato está dormindo do
seu lado à noite. SJS
O HOMEM ERRADO (1956)
(THE WRONG MAN) O homem errado é um dos f i lmes mais desoladores da carreira de Hitchcock. Henry
Fonda interpreta Manny Balestrero, um músico de jazz que é Identi f icado por engano
como o homem que assaltou uma agência de seguros. Embora seja l ibertado sob
f iança, a Indignação e a vergonha começam a afetar sua esposa. Rose (Vera Mi les). Eles
tentam encontrar pessoas que possam confirmar o álibi de Manny, mas f racassam.
Rose tem um colapso nervoso antes do ju lgamento e é internada em um manicômio.
No f im, quase por acaso, o verdadeiro assaltante é encontrado, mas Isso prat icamente
não altera seu estado menta l .
Fotografado em preto-e-branco, com um realismo quase documenta l , O homem
errado é baseado em uma história real, de acordo com o próprio Hitchcock em um curto
prólogo. Ele explora um dos temas eternos do diretor, o de um homem acusado por um
crime que não cometeu (Intriga internacional, de 1959, parte de uma premissa seme
lhante). Hitchcock transmite de forma brilhante com que presteza os procedimentos de
acusação e encarceramento conspiram para conferir uma sensação de culpabi l idade
mesmo aos Inocentes. Em uma seqüência magistral que faz uso da câmera subjetiva,
vemos Manny sofrer a humi lhação de ser autuado, revistado e ter as Impressões digi
tais t i radas, a tinta suja em suas mãos parecendo uma conf i rmação da sua culpa. EB
EUA (First National, Warnei Broj.1
105 min. P & B
Idioma: Inglês
Direção: Alfred Hitchcock
Produção: Herbert Coleman, All 1 nI
Hitchcock
Roteiro: Angus MacPhai l , Maxwell
Anderson, baseado no livro rhe MM
Story of Chistopher Emmanuel
Balestrero, de Maxwell Anderson
Fotografia: Robert Burks
Elenco: Henry Fonda, Vera Mi l ' " .
Anthony Ouayle, Harold Stone, lohn
Heldabrand, Doreen Lang. Normi
Conolly, Lola DAnnunzIo, Robei 1
Essen, Dayton Lummls, Charlei
Cooper, Esther Mlnciott i , I aurlndl
Barrett, Nehemlah Persofl, Klppy
Campbell
DELÍRIO DE LOUCURA (1956)
(BIGGER THAN LIFE) O melhor dos f i lmes de Nlcholas Ray é um melodrama expressionista bri lhante que uti
liza a controvérsia então atual da descoberta e Implementação da "droga milagrosa"
cortlsona (um tipo de esferóide) para desenvolver uma crítica devastadora ao conformis
mo materialista de classe média que definia o Sonho Americano durante o pós-guerra.
O taci turno James Mason (que também produziu o f i lme) está perfeito como o
professor de uma cidade pequena atormentado por uma crise f inanceira e de meia-
idade que, depois de lhe receitarem esteróldes, fica viciado na sensação de bem-estar
que eles provocam. Isso o transforma em um tirano megalomaníaco e de uma neurose
Irascível em relação à mulher, ao filho e a todos ao seu redor. A droga, obv iamente , é
apenas um catalisador que desperta a repulsa que ele sente por sl próprio e pelo mundo
entorpecido e passivo no qual se vê preso. Na verdade, seu desespero é tão profundo
que quando, f ina lmente, ele decide que precisa salvar o filho das depravações da
humanidade matando-o e sua esposa (Barbara Rush) o recorda que Deus Impediu
Abraão de matar Isaac, Mason se l imita a responder: "Deus estava errado."
Um fi lme hol lywoodlano profundamente radical para a época, que se destaca não só
por seu desprezo pela idéia suburbana de "normalidade", mas também pela clareza bela
mente apavorante da sua Intensidade colorida em CinemaScope. Uma obra-prima. CA
E U A (Fox) 95 min. Color Del 11
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Nlcholas Ray
P r o d u ç ã o : James Mason
R o t e i r o : Cyril Hume, Richaul
Ma lbaum, baseado no artigo dl
Burton Roueche
F o t o g r a f i a : Joseph MacOonald
M ú s i c a : David Raksin
E l e n c o : James Mason, Barbam Ruih
Walter Mat thau, Robert F. Simon,
Christopher Olsen, Roland Wi i i i r t ' . .
Rusty Lane, Rachel Stephen'., r Ipp
Hamilton
F e s t i v a l d e V e n e z a : Nicholas Ray,
indicação (Leão de Ouro)
I IM (lililí; Crosby, M C M , Sol C. Siegel)
I n ; min, lechnlcolor
hi lu i o. i : i i i j ' les
Direção: Charles Walters
ProduçSo: Sol C. Siegel
l i , , i , •mi i i i l in I'atrick, baseado na peça
Hu l'/iilndclphiö Story, de Philip Barry
l u i i i | ; i . i f l a : Paul Vogel
Mullen: Saul Chapman, Cole Porter
I U n , o I •. 1111 -. i insby, Grace Kelly,
' f in i Sinatra, Celeste Holm, John
I muí, I nuis Clahern, Sidney Blackmer,
(mi ls Ainistrong, Márgalo Gillmore
I n , I I , jç. io .10 O s c a r : Edward Bernds,
I Iw I tlllnian (roteiro),* Johnny
L i l i l í , '..ml Chaplin (música). Cole
I ' l l l l i ' l (l .1111, .10)
* luí Id ai, ai 11 ei usada quando a Academia
I-, i, i l l , H que havia confundido o
h i i i i i i i i i i i i i i ) High Society, de Bernds e
I M i n i . m . i u n i a produção de Sol Siegel
ALTA SOCIEDADE (19 5 6)
(HIGH SOCIETY) Uma atual ização em forma de musical da comédia romântica da classe alta de George
Cukor, Núpcias de escândalo, Afta sociedade une os talentos melódicos imbatíveis de Bing
Crosby, Ftank Sinatra e Louis Armstrong com a beleza de Grace Kelly em seu últ imo papel
no cinema antes de abandonar Hol lywood e se tornar a princesa Grace de Mônaco.
A gélida e mimada Tracy (Kelly) está prestes a se casar com George (John Lund), um
galã chato e previsível, porém, às vésperas das núpcias, seu ex-marido Dexter (Crosby)
retorna para tentar impedir o casamento. A tiracolo para registrar as frivolidades do
evento social do ano estão os jornalistas Liz (Celeste Holm) e Mike (Sinatra), com o
gigante do jazz Armstrong (interpretando a si mesmo) oferecendo uma espécie de coral
grego, deixando a platéia a par das confusões afet ivas de Dextet e Tracy.
Seguindo Inúmeros musicais hol lywoodianos da década de 40 e do começo dos
anos 50 que eram repletos de complexos números musicais, o diretor Charles Wal ters
encaixa perfei tamente nove interpretações básicas de canções de Cole Porter no f i lme,
sem deixar que elas o dominem. Armstrong começa cantando "High Society", que
explica a t rama, do banco de trás da l lmusine lotada que divide com sua banda, en
quanto a clássica " W h o Wan ts To Be A Mi l l ionaire" é cantada an imadamente por Sina
tra e Holm sozinhos em um quarto cheio dos vários presentes de casamento extrava
gantes de Tracy. Uma comédia musical leve, pueril e atcmporal . JB
I U A 1111 i l I i DeMil le, Paramount)
U M lechnlcolor
lillnin.i: inj'.le-,
OlrocJo: Cecil B. DeMille
Produclo: Cecil B. DeMil le, Henry
W l l i i i - u i i
Hui r l i 11 I ne . i ' . M a i Kenzie, Jessie Lasky
Ii 11.1 ' .111 - .1 l e i l e i i r M. Frank, baseado
, liviii1, i'lilai of Fire, de J. H. Ingraham,
1 '111 .'il. '•, IV1111/, de A. E. Southon, e
I 'm ' /qvpi. de Dorothy Clarke Wilson
liitu|.,iafia: Iuya l Griggs
M u \ l i .1:11111 <-1 Bernstein
t lrnco: ( harlton Heston.Yul Brynner,
A n n e l'.axiei, I dward G. Robinson,
Yvonne de ( ailo, Debra Paget, John
1'' n 1 ' . ' I i i' I lardwicke, Nina Foch
11-.. .11 l"l 1111' 111I11 in (efeitos especiais)
linlli .11.10.10 O s c a r : Cecil B. DeMille
( Ih. 11 l i l i n e ) , Hal Pereira, Walter H.
Tyl i ' i . All ien Nozaki, Sam Comer, Ray
M o v e i (dliecao de arte), Loyal Griggs
( i n i i i i ' i . h i . 1 ) . I tilth Head, Ralph Jester,
M m I ' Men, Dorothy Jeakins, Arnold
I i lbei i ; ( l lguilno), Anne Bauchens
( ' ' I " i " l I 1 1 I . Ryder (som)
OS DEZ MANDAMENTOS (1956)
(THE TEN COMMANDMENTS)
Com quase quatro horas de duração, o últ imo longa-mctragcm de Cecil B. DeMil le e seu
mais extravagante arrasa-quarteirões é repleto de absurdos e vulgaridades, porém a cor
é arrebatadora e a demonstração de vir tuosismo de DeMi l le , que inclui sua própria
narração, jamais falha. Pode-se afirmar que Charlton Heston alcançou seu auge como
Moisés - a não ser que consideremos que foi Moisés que alcançou seu auge como
Heston - e a maioria dos demais atotes do elenco está igualmente mít ica.
Ao mesmo tempo ridículo e esplêndido, este épico é Impulsionado pelo tipo de
convicção pessoal que praticamente não voltaria a ser encontrada em futuros monólitos
hol lywoodianos. Para o interpretarmos corretamente, precisamos vê-lo como um
manifesto ideológico e espiritual que diz respeito especif icamente à maneira como
DeMille enxergava o mundo refém da Guerra Fria em 1956. Assim, quando ele surge diante
de uma cortina franjada de dourado para apresentar o f i lme, seu objetivo principal não é
apenas falar sobre o uso de fontes como Filo e Josefo para narrar os 30 anos da vida de
Moisés omit idos na Bíblia, mas também declarar que "o tema deste fi lme é se o homem
deve ser governado pelas leis de Deus ou... pelos caprichos de um ditador como Ramsés".
Quando fala "ditador", ele está claramente pensando em uma figura ao estilo Mao Tse-
tung, o que o orlentallsmo sugerido por Yul Brynner como Ramsés deixa claro.
O f i lme foi relançado algumas vezes - mais recentemente em 1990 - em um formato
em widescreen esticado e anamórf ico, o que significa que a parte de cima e de baixo de
cada quadro foram cortadas. Talvez haja alguma espécie de vingança divina envolvida
nisso: DeMil le tinha um famoso fetiche por pés e, graças a esse truque de estúdio,
muitos dos intérpretes em primeiro plano encontram-se agora com eles cortados. JRos
DOZE HOMENS E UMA SENTENÇA (1957)
(12ANGRY MEN) O f i lme de tr ibunal de Sidney Lumet goza de uma popularidade duradoura por ser um
caldeirão de interpretações intel igentes, viradas repentinas e monólogos apaixonados.
De forma única, o drama br i lhantemente econômico e Inst igante de Doze homens e
uma sentença não se dá exatamente no tr ibunal - exceto por um breve prólogo em que
o júri é dispensado com as instruções do juiz -, e sim no decorrer de uma única tarde
calorenta na sala do júri.
Henry Fonda Interpreta o Jurado ns 8, cujas dúvidas cabíveis e resistência bem
fundamentada aos poucos demovem os 11 outros membros do júri de seu primeiro e
impensado veredicto de culpado no caso de um jovem acusado da mor te do próprio
pai. Fonda ficou impressionado com o poder da engenhosa peça para tevê de Reginald
Rose, exibida ao vivo pela CBS em 1954 (e que se acreditava estar perdida até 2003,
quando uma fita VHS foi descoberta). Reconhecendo um papel que se adequava com
perfeição à sua sinceridade tranqüila e vendo a oportunidade de um f i lme emoc ionan
te, ele o produziu do próprio bolso. Entregou a direção a Lumet, um dinâmico veterano
do teatro de tevê ao vivo. cuja experiência lhe permit iu - e ao diretor de fotografia Borls
Kaufman, outro especialista cm trabalhar cm espaços l imitados c em preto-e-branco -
extrair a tensão galopante do roteiro bem amarrado de Rose e concluir o f i lme em
menos de 20 dias.
A adorada e cat ivante estréia de Lumet não se envergonha de sua teatral idade, tor
nando sua intensidade claustrofóbica e tórrida uma virtude. E cada ator deixa sua mar
ca nesta vitr ine de caracterizações excelentes, que é também um exemplo de dinâmica
de grupo, desde o inseguro líder dos jurados de Mart in Balsam até o beligerante e amar
gurado Jurado n2 3 de Lee J. Cobb. Interessantemente, dois dos homens, Joseph Sweeney,
como o idoso e perspicaz Jurado n'J 9, e George Voskovlc, como o metódico Jurado ns 11,
estiveram na produção televisiva original. Preconceitos de classe e raciais, suposições
pessoais e personalidades vêm à tona em uma batalha colossal por um ju lgamento
l impo. O f i lme ganhou o Urso de Ouro no Festival de Berl im, mas sua maior glória é que,
depois de assisti-lo, n inguém participará novamente de um júri sem fantasias de se
tornar um tenaz campeão da justiça como Fonda, seja qual for o caso em questão. AE
E U A (Orlon-Nova) 96 min. P8di
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Sidney Lumet
P r o d u ç ã o : Henry Fonda, Reginald
Rose
R o t e i r o : Reginald Rose
F o t o g r a f i a : Boris Kaufman
M ú s i c a : Kenyon Hopkins
E l e n c o : Henry Fonda, Lee J . í ohh, I d
Begley, E. G. Marshall , Jack Waiden,
Martin Balsam, John Fiedler, l a d
Klungman, Ed Blnns, Joseph
Sweeney, George Voskovet. Robir l
Webber
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Henry i I i
Reginald Rose (melhor filme), slilm y
Lumet (diretor), Reginald Rose
(roteiro)
F e s t i v a l d e B e r l i m : Sidney I i i u i e i
(Leão de Ouro), (Prêmio OCIC)
S u é c i a (Svensk) 9 6 min. P & B
Mloma: sueco
D i r e ç ã o : Ingmar Bergman
Produção: Allan Ekelund
Roteiro: Ingmar Bergman, baseado
na peça Itümàlning, de Ingmar
B r i i / M U I l «
f o t o g r a f i a : Gunnar Fischer
M u s i c a : Erik Nordgren
f I rnco: Gunnar Björnstrand, Bengt
I |uj)rOt, Nils Poppe, Max von Sydow,
luhi Amlnsson, Inga Gill, Maud
Hansson, Inga Langré, Gunnel
I Indblom, Bertil Anderberg, Andres
I k, Akt- Fridell, Gunnar Olsson, Erik
Strandmark
P c i t l v . i l d e C a n n e s : Ingmar Bergman
(pi^inlo especial do júri), empatado
<mu I . i i i i i í
0 SÉTIMO SELO (1957)
(DET SJUNDE INSEGLET) A imagem de uma Mor te de manto preto e rosto branco (Bengt Ekerot) jogando xadrez
na praia com um cruzado cansado e quest ionador (Max von Sydow) está tão arraigada
na memór ia coletiva dos cinéfi los quanto King Kong no topo do Empire State Bui lding,
Humphrey Bogart rechaçando Ingrid Bergman no aeroporto, Janet Leigh sendo esfa
queada no chuveiro ou o cruzador Imperial passando por cima da camera. Essa simples
cena do f i lme de arte sueco O sétimo selo resume a importância, o encanto e o impacto
que novas formas de cinema t iveram em uma certa época, quando as certezas de
Hol lywood estavam em baixa. Senão, como explicar as paródias ou referências que vol
ta e mela aparecem cm fi lmes tão variados quanto A máscara mortal (1964), de Roger
Corman, A últ ima noite de Boris Crashenko (1975), de Woody Allen, O dirimo grande herói
(1993), de John McTIernan, e Bill e Ted - Dois loucos no tempo (1991), de Peter Hewit t , no
qual a Mor te joga twister?
Essa cena foi parodiada diversas vezes e é uma pena que tenha passado a repre
sentar todo o f i lme no imaginário popular. Há uma Idéia injusta de que o escritor e
roteirista Ingmar Bergman foi solene demais ao tentar realizar algo que pudesse ser um
arquétipo da seriedade e da qual idade artística. Na verdade, O sétimo selo, embora
tenha suas raízes nos grandes temas do auge de Bergman, é um f i lme muito divertido,
f reqüentemente cômico uma fábula medieval Inf luenciada pelo entus iasmo do
diretor pelos f i lmes de samurai de Akira Kurosawa -, tão preocupado em celebrar os
prazeres simples quanto cm apontar tormentos complexos.
Antonius Block (Sydow), retornando após 10 anos de uma cruzada sangrenta que foi
iniciada por um trapaceiro que agora ganha a vida roubando cadáveres, sente que sua
fé em Deus é uma doença que deveria ser extirpada da humanidade. Com seu escudeiro
(Gunnar Bjbrnstrand), que é tanto um companheiro de debates quanto seu escada,
Block encontra a morte na forma de um cadáver infestado pela peste antes de encon
trá-la em pessoa. O que está em jogo na partida de xadrez jogada por todo o fi lme entre
a Mor te e o cavaleiro não é apenas a vida do cruzado, mas suas Idéias sobre Deus, a
religião e a humanidade. No f im, a esperança chega na forma de uma família sagrada
alternativa - um malabarista alegre (Nils Poppe), sua mulher de sensual idade mundana
(Gunnel Lindblom) e o bebê Inocente e cheio de energia dos dois que Block salva da pes
te se jun tando por vontade própria à dança da morte, que convoca personagens mais
venais e corrompidos.
Se o cavaleiro, constantemente atormentado por curiosidades sobre Deus e o nada
(ele chega a se aproximar de uma bruxa condenada a ponto de se queimar para per
guntar a ela o que o Demônio sabe sobre Deus), representa um lado de Bergman, o
simples artista de circo, gent i lmente repreendido pela sua esposa prática ("Você e seus
sonhos e v isões", diz ela na últ ima fala do f i lme), representa o outro. Este busca reden
ção através de divert imentos honestos e fica consternado quando sua apresentação
inocente é ofuscada pelo espetáculo grotesco, aprovado pela Igreja, de uma mult idão
de penitentes sendo chicoteados e torturados. Bergman está sempre indignado e en
tristecido diante do mal ptaticado pelos homens, especialmente quando ele é sancio
nado por uma suposta religião, porém o f i lme também celebra o amor físico e espi
ri tual, a expressão artística coletiva, a comida e a bebida e a beleza natural . KN
I L I A (I ux ) 119 min. Color De Luxe
dloma: Ingles
Slreclo: Leo McCarey
'roducao: Leo McCarey, Jerry Wald
lottlro: I eo McCarey, Mildred Cram,
irlini'i Daves, Donald Odgen Stewart
• n i n p . i . i f i . i : Milton R. Krasner
Muilca: Hugo Frledhofer, Harry Warren
l e H V tirant, Deborah Ken,
nil I I Denning, Neva Patterson,
. Ithleen Nesbltt, Robert Q. Lewis,
: h.iile-. W a l l s , Fortunio Bonanova,
S r o i j t r Winslow
n d l i .11, an ao Oscar: Milton R. Krasner
Jtolni'.ialla), Charles Le Maire
jfljiiulnn). Hugo Friedhofer (muslca),
•l.inv w. inen , Harold Adamson, Leo
Mi ( aiey (cancan)
TARDE DEMAIS PARA ESQUECER (1957)
(AN AFFAIR TO REMEMBER) "Quer ido, se você pode pintar, eu posso andar novamente ! " Por anos a fio, o caminho
cheio de espinhos percorrido por Cary Grant e Deborah Kerr em Tarde demais para
esquecer foi quase i l ic i tamente venerado. Então ele foi consagtado - especialmente por
Sintonia de amor, de 1993 - como um dos maiores f i lmes de mulherzinha de todos os
tempos, para ser visto, idealmente, com bastante chocolate e uma caixa de lenços
descartáveis à mão. O f i lme - ref l lmagem de Duas vidas, de 1939, uma comédia dramá
tica do mesmo diretor, estrelado por Irene Dunne e Charles Boyer - reflete dois lados
conf l i tantes do produtor/roteirista/diretor Leo McCarey. No seu auge, o gênio da comé
dia uniu o Gordo e o Magro, dirigiu os Irmãos Marx em Diabo a quatro e ganhou seu pri
meiro Oscar dirigindo Grant em Cupido é moleque teimoso, o clássico das comédias es
crachadas da década de 30. No entanto, McCarey também possuía um sent imental is
mo descarado que ficou patente em seu adorado f i lme dos anos 4 0 , 0 bom pastor (pelo
qual ganhou os prêmios de Melhor Fi lme, Direção e Roteiro).
O playboy espirituoso Nick Ferrante, interpretado pot Grant, é um pintor fracas
sado. Ele e Terry McKay, a desconfiada cantora de boate de Kerr (seus vocais foram
dublados pela cantora de estúdio Marnie Nixon, que também a dublou em O rei eeti), se
conhecem a bordo de um transatlânt ico luxuoso e se rendem
- com muito bom humor - à atração que sentem um pelo
outro. Infel izmente, ambos estão compromet idos com seus
noivos e passados. Então fazem um pacto romântico. Dall a
seis meses, se t iverem dado um jeito em suas vidas, se en
contrarão no topo do Empire State Bui lding e viverão felizes
para sempre. Na data marcada, Grant põe seus pincéis de
lado e se encaminha alegremente para o observatório do
arranha-céu, porém Kerr, correndo empolgada cm direção ao
prédio, é atropelada por um carro.
O que se segue é quase inconcebível para a geração do
telefone celular, mas, acreditando que levou um bolo, Grant
se entrega a um cinismo amargurado, sem saber que Kerr
está tentando btavamente aceitar o fato de ter f icado para
plégica, mas é orgulhosa demais para informá-lo da sua
si tuação. A comédia é abandonada na lacrimogênea segunda
metade do f i lme, enquanto os espectadores são deixados em
uma del ic iosamente prolongada e aflitiva dúvida sobre se
eles vão ficar juntos ou não. McCarey exagera nas canções,
mas nem mesmo Kerr ensinando um coro de cr ianças bonit i
nhas demais consegue estragar o clímax de reunião, revela
ções e abraços apertados. AE
MORANGOS SILVESTRES (1957)
(SMULTRONSTÀLLET) Possivelmente a mais terna das obras-primas de Ingmar Bergman, Morangos silvestres
acompanha a odisséia geográfica e espiritual traçada pelo Idoso professor Isak Borg
(cujo nome em sueco significa, aproximadamente, "fortaleza de gelo") , Interpretado
por Victor S jõst rõm. Borg vai de carro, em companhia da sua nora Mar ianne (Ingrid
Thulln), de Estocolmo para a Universidade de Lund para receber um título honorário. No
caminho, dá carona para três jovens - entre eles a animada Sara (Bibi Anderson), cujo
nome e índole o fazem lembrar do amor de sua vida - e um casal de mela Idade. Ele
visita sua mãe já anciã, antes de f ina lmente ter uma conversa sincera com seu filho
Evald (Cunnar Bjõrnstrand), um misantropo cínico que Mar ianne planeja abandonar. A
conversa que Borg tem com Edvald é crucial não só porque pode salvar o casamento do
seu fi lho, mas por mostrar que a jornada do professor lhe trouxe um certo grau de
autoconhec imento. Ele se tornou ciente não só da sua mortal idade, mas t ambém da
sua própria reticência emocional - herdada dos pais, consolidada por uma vida de
decepções e por sua imersão no trabalho. E ele a t ransmit iu, quase inconscientemente,
como um vírus, para Evald.
A força do relato de Bergman deste dia na vida - ou, melhor falando, de uma vida
em um dia, pois a longa jornada de 24 horas traz de volta toda sorte de memór ias reve
ladoras - está na maneira segura com que ele combina as realidades objetivas e
subjetivas da vida de Borg. Os detalhes internos e externos jogam, aos poucos, mais luz
sobre o h o m e m . Não são apenas seus sonhos e lembranças que I luminam nossa com
preensão dele (e sua compreensão de sl mesmo), mas também seus vários encontros e
conversas. Mar ianne, embora educada e carinhosa, é comparat ivamente explícita na
suas alusões aos fracassos de Borg. Sara o recorda de sua juventude mais apaixonada.
O casal briguento lhe traz à mente sua própria rabugice e o futuro que Mar ianne pode
enfrentar com Edvald.
A aquisição redentora de autoconhecimento de Borg também afeta aqueles ao seu
redor, e o milagre de Morangos silvestres é
que Bergman jamais imbui essa conclu
são de sent imenta l ismo. Abençoado por
uma interpretação radiante, porém cora
josamente desagradável , de Sjõstrõm -
ele próprio um dos maiores cineastas da
Suécia antes de Bergman -, este f i lme
extraordinário c multo Imitado possui
uma honest idade emocional completa
mente em harmonia com a v iagem feita
por seu protagonista. CA
S u é c i a (Svensk) 91 min. P&B
I d i o m a : sueco / latim
D i r e ç ã o : Ingmar Bergman
P r o d u ç ã o : Allan Ekelund
R o t e i r o : Ingmar Bergman
F o t o g r a f i a : Gunnar Fischer
M ú s i c a : Erik Nordgren
E l e n c o : Victor Sjõstrõm, Bibi
Anderson, Ingrid Thulln, Gunn.n
Björnstrand, Julian Kindahl, Füll
Sundqvist, Björn Bjelfvenst.mi
Nalma Wlfstrand, Gunnel Brost mm,
Gertrud Frldh, Sif Ruud. Gunnai
Sjöberg, Max von Sydow. Ake Frida II
Yngve Nordwall
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Ingmat Bsrgmin
(roteiro)
F e s t i v a l d e B e r l i m : Viel 111 s j i r . t mm
(Prêmio FIPRESCI), Ingmar Bergman
(Urso de Ouro)
F e s t i v a l d e V e n e z a : Ingmai Bi
(prêmio da crítica italiana)
• H l / i rança (De Laurentiis,
n n eau) no min. P & B
d l o r n . i : italiano
3lreç3o: Federico Fellini
• • • U n o i rdcrico Fellini, Ennio
i o, hillio Pinelli, Pier Paolo
• . P . o l l h l ,
I n n t i : • aiilictta Masina, François
• •m i Aiiicdco Nazza ri, Aldo Si Iva ni,
' im i Mar / i , Dorian Gray, Mario
•.r.-..mie, i'ina Gualandri, Polidor,
olami, Christian Tassou,
f .m Molller, Riccardo Fellini, Maria
|j i Rolando, Amedeo Girardi,
l l l in l o i a / /ar i
Iii .H Itália (melhor f i lme
l l tungr l ro)
> » t l v . i l d e C a n n e s : Giulietta Masina
tT i r l l i c i i atrlz), Federico Fellini
i OCIC - menção especial)
NOITES DE CABIRIA (1957)
(LE IMOTTI DI CABIRIA) A Cabíria do t í tulo do clássico de 1957 de Federico FeIIIni é interpretada pela esposa do
cineasta, Giuletta Masina, que ganhou, com justiça, o prêmio de Melhor Atriz em
Cannes por sua atuação como uma prostituta ingênua. Envergonhada pela sua profis
são, a vigorosa Cabíria busca, sem grandes esperanças, a lgum ricaço para levá-la e m
bora, porém, no fundo, o que está procurando é por um amor duradouro.
Depois de sua estréia, um trecho controverso envolvendo um samaritano repleto de
boas intenções foi cortado devido aos protestos da Igreja Católica. Aparentemente, gene
rosidade espontânea é uma característica provinciana, mas, felizmente, o material foi
resgatado com o passar do tempo. De fato, a questão da bondade é essencial ao fi lme de
Fellini, no qual, apesar do material ismo de fachada, Cabíria só quer ser feliz, como qual
quer um. Ainda assim, ela é a maior das prostitutas com coração de ouro, nunca triste o
bastante a ponto de um bom mambo, ou uma feira de rua, não levantar seu moral.
Cabíria não consegue deixar de espalhar sua bondade, porém ela muitas vezes lhe
causa decepção ou, piot, humilhações. Um encontro casual com um hipnotizador de circo
(Aldo Silvani), que extrai dela seus desejos íntimos, é bastante comovente, mas também
particularmente cruel, uma vez que lhe dá esperanças de que seus sonhos e fantasias de
uma vida melhor possam se tornar realidade. Sua franqueza até leva um observador a
explorar sua fragilidade emocional. As atenções igualmente cruéis do artista de cinema
galantcador (Alberto Lazzari) também lhe dão falsas expectativas, mesmo quando ela é, no
fim das contas (e literalmente), tratada como um cachorro.
Os sonhos de Cabíria jamais se tornam realidade e, na ver
dade, muitas vezes resultam cm violência casual, à medida que
predadores se aproveitam de sua inocência obstinada. Mesmo
assim, Fellini não explora a história de Cabíria em busca de com
paixão fácil. Ela é uma mulher forte e orgulhosa que compra
brigas, erguendo-se depois de cada queda, sacudindo a poeira e
recomeçando sua caminhada em direção a uma vida nova e me
lhor. Noites de Cabíria é, como A doce vida (1960), também de
Fellini, contado através da perspectiva dos destituídos, um olhar
para o proverbial outro lado da sociedade, ornamentado com uma
alegria otimista, mas, no fim das contas, imbuído de tristeza. JKI
TRONO MANCHADO DE SANGUE (1957)
(KUMONOSU JÔ) Com bastante justiça, a adaptação habi l idosamente arrepiante, formal e ext remamente
Mel de Akira Kurosawa de Macbcth é considerada uma das mais sensacionais versões
para o cinema de uma peça de Shakespeare. A trama e a psicologia são transpostas
belamente para o Japão feudal, onde o valoroso guerreiro samurai general Wash lzu
(loshlro Mi fune) e sua esposa demoníaca, Lady Asaji (Isuzu Yamada), Impulsionados
por uma ambição implacável e inspirados pela profecia de uma bruxa, assassinam seu
1 omandante militar, Invadem um reino e se condenam a um f im ritual e Inescapável de
(arni f ic lna, paranóia, loucura e ruína.
O maravi lhoso Mifune - um dos protagonistas favoritos de Kurosawa em uma par-
tcr ia longeva (mais de 16 f i lmes) tão notável quanto a de Mart in Scorsese com Robert
De Niro - aprofundou sua reputação como ilustre astro Internacional japonês com sua
atuação. A seqüência da sua morte, encenada de forma brilhante, na qual ele é cravado
por uma saraivada de f lechas, é uma das grandes Imagens Icônicas do cinema mundial .
I lementos do teatro Nô, da tradicional arte da batalha japonesa, de realismo histórico
e da reflexão contemporânea sobre a natureza do bem e do mal são fundidos aqui em
um mundo opressivo e envolto em neblina, repleto de presságios sinistros e mágicos,
com suas f lorestas e castelos (o castelo foi construído em locação nas alturas do monte
Fuji, com a ajuda de um batalhão do Corpo de Fuzileiros Navais dos Estados Unidos
baseado nas proximidades). AE
J a p ã o (Toho) 105 min. P&B
I d i o m a : japonês
D i r e ç ã o : Akira Kurosawa
P r o d u ç ã o : Akira Kurosawa, Sojlro
Motokl
R o t e i r o : Shinobu Hashimoto, Ryu/11
Klkushima, Akira Kurosawa. Hideo
Ogunl, baseado na peça Mui betfl .Ir
Wil l iam Shakespeare
F o t o g r a f i a : Asakazu Nakal
M ú s i c a : Masaru Satô
E l e n c o : Toshlro Mifune, Isuzu
Yamada, Takashi Shimura, Akira
Kubo, Hiroshi Tachikawa, Mlnuii i
Chiaki, Takamaru Sasaki, Kokuten
Kodo, Kichljiro Ueda, Eiko Mlyiishl,
Chleko Nanlwa, Nakajiro Touilla, vu
Fujikl, Sachio Sakaí, Shin Otomc
F e s t i v a l d e V e n e z a : Akira Kurosawa,
Indicação (Leão de Ouro)
0 INCRÍVEL HOMEM QUE ENCOLHEU (1957) (THE INCREDIBLE SHRINKING MAN) 1 xposto a uma nuvem misteriosa, provavelmente radioativa, enquanto estava em um
( luzeiro, Scott Carey (Grant Wi l l iams) se surpreende encolhendo aos poucos. A simpll-
( Idade visual do diretor Jack Arnold combina perfei tamente com o caráter absurdo e
ambíguo da premissa da história de Richard Matheson . A primeira metade de O incrível
homem que encolheu - representando a condição do herói como um problema alterna
damente médico, doméstico e socioeconómico - não faria feio ao lado de Delírio delou-
1 ura (1956), de Nlcholas Ray, e de Palavras ao Vento (1956), de Douglas Slrk, com seu
retrato Irônico e aterrorizante da vida da classe média americana virada do avesso.
Contudo, é na sua segunda metade - Scott , então menor do que o salto de um sapato,
i ' abandonado em seu porão e precisa enfrentar várias ameaças naturais - que o f i lme
lealmente deslancha, tornando-se uma aventura de f icção científ ica emoc ionante e
poética. O desfecho inspirador - "Para Deus, não existe zero" - é um raro exemplo de
1 inema popular l idando de forma explícita com a metafísica.
Grande parte da força do f i lme vem da sua agudeza psicológica e do uso vívido e
preciso dos objetos - sua arquitetura de escadas, caixotes, caixas de fósforos e latas de
tinta. Para Matheson e Arnold, Scott Carey é um típico homem da era atômica: sua
aventura é uma lição sobre a hostil idade do espaço urbano e da propensão Indestrutível
da humanidade de tomar a si mesma como medida de todas as coisas. Cfu
E U A (Universal) 81 min. P&B
I d i o m a : inglês
D i r e ç ã o : Jack Arnold
P r o d u ç ã o : Albert Zugsmlth
R o t e i r o : Richard Matheson, Rn li.inl
Alan S immons, baseado no livro Dll
Shrinking Man, de Rlchaid Mathe-.ini
F o t o g r a f i a : Ellis W. Carter
M ú s i c a : Foster Carling, Earl
E. Lawrence
E l e n c o : Grant Wil l iams, Randy Muni
April Kent, Paul Langton, Ray I
Bailey, Wil l iam Schallert, Frank I
Scannell , Helene Marshall, Diana
Damn, Billy Curtis
1 1 /
I n d i a ( i pic) 127 min. P&B
I d i o m a : bengali
D l i rçao: Satyajlt Ray
P r o d u ç ã o : Satyajit Ray
R o t e i r o : Satyajit Ray, baseado no
l l v i u de Bibhutibhusan
handyopadhyay '
f o t o g r a f i a : Subrata Mitra
IHÚtll .1 : Ravi Shankar
llenco: Kanu Bannerjee, Karuna
I ineerjee, Pinaki Sengupta, Smaran
Bhòlllt Santl Gupta, Ramanl
Srngupla, Ranibala, Sudipta Roy, Alay
Ifltra,' h.miprakash Gosh. Subodh
(í.injrull. Mani Srimani, Hemanta
Chatterjee, Kali Bannerjee, Kalicharan
l i ny
i c u i v . d d c V e n e z a : Satyajit Ray (Leão
dr < lum)
0 INVENCÍVEL (1957)
(APARAJITO) O invencível é o segundo f i lme da grande trilogia de Apu de Satyaj i t Ray. Após a morte
da sua irmã em A canção da estrada, o j ovem Apu (Pinaki Sengupta) e seus pais se
mudam para Bcnares. Enquanto o pai Harihar (Kanu Bannerjee) ganha a vida como
pregador nas margens do Ganges, o menino perambula pela cidade, fascinado pela rica
mistura de paisagens e sons que ela oferece. Porém Harihar contrai uma febre e morre,
e Sarbojaya (Karuna Bannerjee), a mãe de Apu, incapaz de se sustentar sozinha, leva o
filho de volta para o campo, para a famíl ia de seu sogro. Apu, tendo sentido o gosto da
Imensidão do mundo, já não se satisfaz com a vida interiorana simples da sua infância
e o professor da região Incentiva a ambição e curiosidade do rapaz. Aos 16 anos, ele
ganha uma bolsa para estudar em Calcutá. Seduzido pela agi tação da cidade fervi lhan-
te, Apu (então Interpretado por Smaran Ghosal) volta para casa raramente e com
relutância. Sarbojaya, solitária e desesperadamente doente, se recusa a pedir que seu
filho tenha compaixão dela por medo dc atrapalhar seus estudos. Finalmente, uma
carta do tio de Apu o traz de volta - um dia tarde demais. Depois do funeral, recusando-
se a seguir o pai no sacerdócio, ele volta para Calcutá.
Como convém à sua condição de f i lme do meio, O invencível forma uma ponte
essencial na trilogia de Ray. Ele apresenta a vida atcmporal e auto-suf ic iente da aldeia
bengali de A canção da estrada à Influência nociva da cidade, mostrando o jovem herói
de Ray dividido entre dois mundos e se afastando gradual e inevi tavelmente dos seus
pais. Como de hábito, Ray não pesa a balança a favor de um ou outro personagem. En
tendemos por que Apu se sente compelido a buscar o mundo mais amplo; compart i lha
mos sua alegria em aprender, sua sensação de conquista pessoal. No entanto, ao mes
mo tempo, vemos a dor de Sarbojaya, que perdeu a filha de forma prematura e agora
está perdendo seu fi lho. No momen to
mais pungente do f i lme, Sarbojaya, uma
noite, aguarda, à beira da morte, a chega
da do t rem, na esperança dc que ele lhe
traga Apu de volta uma últ ima vez. Um
trem se aproxima ao longe; ela se levan
ta, ansiosa, o lhando para a escuridão.
Nada - apenas o silêncio e a dança dos
vaga- lumes. PK
SEM LEI, SEM ALMA (1957)
(GUNFIGHT AT THE OK CORRAL) A recriação de John Sturges da famosa batalha entre Wyat t Earp e a gangue de Clanton em
lombstone, Arizona, no dia 26 de outubro de 1881, não foi a primeira versão para o cinema
do ocorrido. Contudo, o fi lme de Sturges é um pouco mais historicamente preciso do que
Puixõo de fortes (1946), de John Ford. No fi lme de Ford, por exemplo. Doe Holllday, o sócio
de Earp, é morto na batalha; na verdade, ele continuou vivo por mais seis anos. Sem lei.
Sem alma é uma grande produção, tecnicamente excelente e com um orçamento polpu
do, e tem a seu favor um ót imo elenco. Burt Lancaster está repleto de autoridade como
1 11 p, por vezes assustador em sua determinação. Em contraste, Klrk Douglas se diverte
como o tuberculoso Holliday, sempre com um sorriso no rosto, mas tão mortal quanto
uma serpente. Há também um elenco de apoio de peso, com Jo Van Fleet como "B lg
Nose" Kate, a mulher maltratada de Doe, e John Ireland como o pistoleiro Johnny Ringo.
A trilha sonora melodiosa, a cargo de Dimitri Tiomkin, que também compôs a músi -
c a de outros faroestes no estilo "cidade em perigo", como Matar ou morrer e Onde come
ra o inferno, é uma contribuição considerável, e a cançâo-tema de Frankie Laine foi um
grande sucesso. No entanto, se você deseja um tratamento mais real ist icamente pessi
mista da história de Wya t t Earp, deve assistir A hora da pistola, a seqüência de 1967,
l ambem de Sturges, no qual o Incidente no OK Corral é apenas o começo. EB
A PONTE DO RIO KWAI (1957)
(THE BRIDGE 0N THE RIVER KWAI) Pode não haver honra entre ladrões, mas o mesmo não se pode dizer de inimigos de
guerra. Pelo menos é nisso que acredita o coronel Nlcholson de Alec Guinness em A
ponte do rio Kwai, que insiste que os inspetores japoneses do calorcnto campo de con-
, f i l t ração birmanês em que está preso o t ratem, e a seus homens, com respeito. Porém,
enquanto esse comandante impecável - um paradigma do pragmatismo inglês - organi-
.1 11 nnstrução de uma ponte ferroviária inimiga, um grupo de americanos comandado
pelo prisioneiro fugit ivo major Shears (Wil l iam Holden) está a caminho para explodi-la.
0 diretor David Lean retira do conflito iminente o máximo de ironia, estabelecendo
1 iiiinness como a contraparte trágica do ianque frio de Holden. Como sempre, Lean carrega o
hl de Inúmeros detalhes, preenchendo a Imagem em widesercen com atividades comple-
1 cenários meticulosamente construídos.
No entanto, o que sustenta a unidade deste
epii 11 da Segunda Guerra Mundial são os três
pioiagonistas leônicos: Guinness, rígido e tra-
dli ninai; Holden, relaxado e cínico; c Sessue
Hayakawa, como o coronel japonês apanha
do, Inadvertidamente, no meio de um conflito
transatlântico de vontades. Embora as cenas
i I H . i r . de destruição sejam enaltecidas, com
lUItlça, por seu trabalho de dubles, coreogra-
lla e montagem, um dos elementos mais me-
i.ivels de Kwai continua sendo "The Colo-
in' l Bogey March", a marcha bem-humorada e
i v . 11Iii,ida de Malcolm Arnold. JKl
E U A (Paramount) 122 min. Tech loi
I d i o m a : Inglês
D i r e ç ã o : John Sturges
P r o d u ç ã o : Joseph H. Hazen, Paul
Nathan, Hal B. Wall ls
R o t e i r o : George Scull ln, Leon N u I ,
baseado no artigo "The Killer", de
George Scullin
F o t o g r a f i a : Charles Lang
M ú s i c a : Dimitri Tlomkln
E l e n c o : Burt Lancaster, Klrk Dougll l ,
Rhonda Fleming, Jo Van Fleet, lohn
Ireland, Lyle Bettger, Frank Faylen.
Earl Hol l lman, Ted de Corsia, Dennis
Hopper, Whi t Blssel, George
Mathews, John Hudson, De Foresl
Kelley, Mart in Milner
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Warren I o w
(edição), George Dutton (s )
I n g l a t e r r a (Columbla, Horlzon)
161 min. Technicolor
I d i o m a : I n g l ê s / j a p o n ê s / tallandll
D i r e ç ã o : Davld Lean
P r o d u ç ã o : Sam Splegel
R o t e i r o : Carl Foreman, Mi< hael
Wi lson, baseado no llvrn A ponte d"
rio Kwai, de Pierre Boulle
F o t o g r a f i a : Jack Hildyard
M ú s i c a : Malcolm Arnold
E l e n c o : Wi l l iam Holden, Alec
Guinness, Jack Hawkins, SeS!
Hayakawa, James Donald, Geoffriy
Horne, André Morell, Pcter W I I I I . I I I I * . ,
John Boxer, Percy Herbert. Harold
Goodwln, Ann Sears, Heihachlro
Okawa, Kelichiro Katsumolo, M R 11
Chakrabandhu
O s c a r : Sam Spiegel (melhor filma),
David Lean (diretor), Plerre B o u l l e . 1 nl
Foreman, Mlchael Wilson (roteiro)
Alec Guinness (ator), Jack Hildyaul
(fotografia), PeterTaylor (edição),
Malcolm Arnold (música)
*Os roteírístas Carl Foreman e Mu hael
Wilson estavam na lista negia <• lm.111
premiados postumamente em n 1
I n d i c a ç ã o a o O s c a r : Sessue
Hayakawa (ator coadjuvante)
! ! ' i
MAE INDIA (1957)
(BHARAT MATA)
i n , l i . I (Mehboob) 172 min. Technicolor
i - l i .1 : h i n d i
Dli i ' tao: Mehboob Khan
Produção: Mehboob Khan
Roteiro: Mehboob Khan, Wajahat
M i l / . I , S. All Raza
I 1:1.ilia: Faredoon A. Irani
M M M I . 1 : Naushad
I le i ico: N.irgis, Sunil Dutt, Raaj
I . 1 1 , Rajendra Kumar, Kanhaiyalal,
I- mill' um, Mestre Sajid, Sitara Devi,
• m i n , Sajid Khan, Azra, Chanchal,
• IN in I aushal, Sheela Naik
Indll i c l o ao Oscar: índia (melhor
flliiu' estrangeiro)
Mõc índia, de Mehboob Khan, continua sendo o mais fundamenta l f i lme indiano mes
mo 50 anos depois do seu lançamento. Ele retrata a luta de uma mulher, Radha
(Nargis), para conciliar valores tradicionais e a vida rural com uma prometida utopia
moderna. Um sucesso internacional de público em boa parte da Ásia e da África - que
v iam a índia como exemplo de luta pela descolonização -, Mãe índia também conquis
tou reconhecimento na Europa e nos Estados Unidos como um dos poucos f i lmes
indianos já indicados para um Oscar.
Mehboob Khan, um dos primeiros diretores indianos a utilizar ostensivamente as co
res, já havia trabalhado cm uma escala épica em seus filmes históricos e se aproveitou des
sa experiência neste estudo da vida rural, realizando, no processo, um épico nacional, uma
nova história para uma nova nação. Mãe índia possui um enredo poderoso, que acom
panha a heroína de seu casamento até a velhice, e é repleto de referências mitológicas,
uma vez que os nomes dos personagens os associam a figuras-chave do panteão hindu.
O filme conta com as principais estrelas indianas da época, notadamente Nargis, Raj
Kumar e Sunil Dutt. Nargis, que tinha um relacionamento amoroso com o lendário Raj
Kapoor, causou frisson ao se casar com Sunil Dutt após o término das filmagens, especial
mente por ele ter Interpretado seu filho nas telas. A trilha sonora eternamente popular de
Mãe índia foi composta por Naushad Ali, numa mistura de canções populares e rogos
(melodias hindus) arranjadas em um estilo ocidental com sua orquestra de 100 músicos,
marca registrada do estilo de cinema indiano supostamente inventado pelo compositor.
Mãeíndia também é visualmente espetacular. Seus planos da heroína arrastando um arado
como um animal de carga e os rostos felizes de Radha com seus filhos depois da colheita,
olhando em direção a um futuro melhor no estilo do realismo soviético, se tornaram ícones.
A complexidade de Mãe índia e a série de interpretações diferentes que ele gerou
tornaram este f i lme um dos poucos que ainda conseguem atrair platéias onde quer que
seja exibido. Este é o primeiro f i lme Indiano que qualquer pessoa Interessada no
cinema mundial deveria assistir. RDw
QUANDO VOAM AS CEGONHAS (1957)
(LETJAT ZHURAVLI) Nos úl t imos anos de Stal ln e do stal lnismo, o c inema soviético prat icamente desapa-
icceu. A contínua devastação econômica acarretada pela guerra, assim como o medo
generalizado que definia a vida cotidiana, f izeram com que os antes prósperos estúdios
soviéticos quase fechassem as portas. Após a morte de Stal in em 1953, um cinema so
viético redivivo começou lentamente a vir à tona, e o f i lme que velo a simbolizar esse
renascimento foi Quando voam as cegonhas, de Mikhal l Kalatozov. Aparentemente um
romance de guerra sobre dois amantes, Borls (Aleksel Batalov) e Veronika (Tatiana
••amollova), que são separados logo depois do início do conflito, o f i lme desaf iou,
corajosamente, todos os cl ichês do gênero. Em vez de celebrar as vitórias gloriosas do
Exército Vermelho, Quando voam as cegonhas se concentra em alguns dos momentos
mais sombrios da guerra, quando a ext remamente eficaz e aterrorizante máquina de
guerra alemã estava derrotando com facil idade o mal organizado c equipado (embora
heróico) exército russo.
Na frente interna há pouco mais que desespero e a sensação de que é "cada um por
'.!". Admiravelmente, as platéias soviét icas receberam de braços abertos essa reflexão
sobre suas experiências dos tempos de guerra. Talvez por estar cansada de propaganda,
eles sabiam multo bem que a guerra, na verdade, produzira poucos heróis de qualquer
ilpo. Como os jovens amantes , Batalov c Samol lova estão maravi lhosamente comoven-
les, sexy e cat ivantes, porém a verdadeira estrela do f i lme é o trabalho de câmera
voluptuoso do fotógrafo Sergcl Uruscvsky. Com seus planos de grua de tirar o fôlego,
panorâmicas arrebatadoras c uso vibrante de câmera na mão, Urusevsky (que havia
trabalhado com Dovzhenko no bri lhante documentár io de guerra A batalha pela
Ucrânia soviética) traduz um mundo que perdeu o rumo, ou
mesmo qualquer ponto de referência fixo - seja ele moral ou po
litico - e tangível . Urusevsky faria posteriormente, com Kalato
zov, o in fame, embora mui to admirado, Soy Cuba (1964), po-
lem, enquanto para alguns este úl t imo parece sabotado por m
Sua própria esti l ização barroca, Quando voam as cegonhas ja- jm
mais se permite usar seus efeitos visuais de forma gratuita, j
Este t ambém foi o primeiro f i lme soviético da era da Guerra •
Mia a receber distr ibuição ampla (pela Warner Brothers) nos 18
I-.lados Unidos. RP
U R S S (Mosfl lm) 97 min. P&B
I d i o m a : russo
D i r e ç ã o : Mikhell Kalatozishvil i '
P r o d u ç ã o : Mikhell Kalatozishvili
R o t e i r o : Viktor Rozov, baseado em
sua peça ietjat Zhuravll
F o t o g r a f i a : Sergel Urusevsky
E l e n c o : Tatiana Samoilova, Air 11
Batalov, Vasill Merkuryev, Aleksandl
Shvorln, Svetlana Kharítonova,
Konstantin Nikitin, Valentin / nl'I "
Antonina Bogdanova, Boris Kokovkln
Yekaterina Kupriyanova
F e s t i v a l d e C a n n e s : Mikhell
Kalatozishvili (Palma de Ouro),
Tatiana Samoilova (menção espei M I |
* O diretor também é chamai In d.
Mlkhail Kalatozov
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