Liturgia 2 Aulas 1 – Doutrina Geral dos Sacramentos
Mater Ecclesiae
Definição
Toda a vida litúrgica da Igreja gravita em torno do sacrifício eucarístico e dos sacramentos (CIgC 1113).
“Aquilo que era visível em nosso Salvador passou para os seus mistérios” (São Leão Magno).
Os sacramentos são sinais eficazes da graça, instituídos por Cristo e confiados à Igreja, por meio dos quais nos é dispensada a vida divina (CIgC 1131).
Fundamentação Bíblica
Σημείον
... vendo os sinais que Jesus fazia, muitos creram em seu nome.” (Jo 2,23)
10 vezes em Mt
7 vezes em Mc
23 vezes em Lc
24 vezes em Jo
8 vezes em Paulo
1 vez em Hb
Σημείον
O sinal identifica.
• Isto vos servirá de sinal: encontrareis um recém-nascido envolto em faixas deitado numa manjedoura. (Lc 2,12)
• O traidor dera-lhes um sinal, dizendo: “É aquele que eu beijar. Prendei-o.” (Mt 26,48)
O sinal assinala autoridade.
• Para pô-lo à prova, pediam-lhe um sinal vindo do céu. (Mc 8,11)
O sinal é figura que antecipa.
• Uma geração má e adúltera busca um sinal, mas nenhum sinal lhe será dado a não ser o do profeta Jonas. (Mt 12,39)
O sinal é milagre.
• Os sinais que distinguem o Apóstolo realizam-se entre vós: paciência a toda prova, sinais milagrosos, prodígios e atos portentosos. (2Cor 12,12)
Μυςτήριον
Calar, silenciar
Para os gregos, o rito tornava presente a aventura do herói mítico
No Antigo Testamento, designava os ritos gregos
• “Com seus ritos infanticidas, seus mistérios ocultos ou suas frenéticas orgias de estranho ritual” Sb 14,23.
Nas Epístolas Paulinas, tem significado definido
• É plano eterno de salvação: 1Cor 2,7
• É revelado aos homens pela pregação dos Apóstolos: Ef 3,3ss
• É marca da plenitude dos tempos: Ef 1,9s
Μυςτήριον
Já nos primeiros séculos do Cristianismo, o μυστήριον veio a ser:
• o plano salvífico concebido por Deus desde toda a eternidade
• a ação salvífica de Cristo, que começou a revelar esse plano
• a celebração dessa obra salvífica no culto sagrado
• os símbolos do Antigo Testamento que prefiguravam o Salvador
• as verdades de fé ligadas a essa ação salvífica do Senhor
Sacramentum
Designava o juramento prestado pelos soldados
perante os deuses.
Passou a traduzir o vocábulo μυστήριον nas traduções
latinas da Escritura, mesmo considerando a existência da
palavra mysterium.
“Assume a tua parte de sofrimento como bom
soldado de Cristo.” (2Tm 2,3)
Cristo continua atuando em nós pelos
Sacramentos
“Vós não estais na carne, mas no espírito, se é verdade que o Espírito de Deus habita em vós, pois quem não tem o Espírito de Cristo não pertence a ele. Se, porém, Cristo está em vós, o vosso corpo está destinado à morte, pelo pecado, mas o Espírito é vossa vida, pela justiça. E se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos habita em vós, aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos dará vida também a vossos corpos mortais, mediante o seu Espírito que habita em vós.” (Rm 8,9-11)
Ações de Jesus
Jesus poderia nos ter comunicado a graça diretamente, mas ele escolheu fazê-lo por atos e palavras.
• “Ele estendeu a mão e, tocando-o disse: Eu quero, sê purificado. E imediatamente ficou livre da sua lepra.” (Mt 8,3)
• “Logo tocou-lhe a mão e a febre a deixou.” (Mt 8,15a)
• “Depois, pondo-se de pé, conjurou severamente os ventos e o mar. E houve grande bonança.” (Mt 8,26)
• “Tendo dito isso, cuspiu na terra, fez lama com a saliva, aplicou-a sobre os olhos do cego e lhe disse: Vai lavar-te na piscina de Siloé.” (Jo 9,6s)
• “Jesus disse-lhe: Vê de novo; tua fé te salvou.” (Lc 18,42)
Testemunho Patrístico
Compreensão do mistério
Santo Agostinho (séc. V)
• “Tira a palavra e que é a água senão água? Acrescenta a palavra ao elemento e faz-se o sacramento, tão visível como a própria palavra.”
• “O que vedes hoje no altar de Deus, vós o vistes na noite passada. Mas o que seja, o que signifique, quão grande coisa contenha o sacramento, ainda não ouvistes. Pois o que vedes é pão e cálice. É o que vos mostram vossos olhos. Mas o que exige vossa fé, que deve ser instruída, é que o pão é o Corpo de Cristo e o cálice, o sangue de Cristo. Mas podeis agora dizer-me: como o pão é seu corpo? E como o cálice, o que há dentro do cálice, é seu sangue? Pois estas coisas, irmãos, se chamam sacramentos porque uma coisa é o que se vê nelas e outra coisa o que se entende. O que se vê tem aparência corporal; o que se entende tem fruto espiritual.”
Compreensão do mistério
Santo Isidoro de Sevilha (séc. VII)
• “Os sacramentos são assim chamados, porque, sob a coberta das coisas corporais, mais secretamente uma força divina efetua a salvação dos mesmos sacramentos, pelos segredos da força ou pelas realidades sagradas. Tais coisas se realizam frutuosamente na Igreja, porque o Espírito Santo, que nela permanece, Ele mesmo realiza o efeito dos sacramentos.”
Já na Idade Média...
Hugo de São Vitor (séc. XII)
• “No sacramento não há apenas significação, mas também eficácia, de tal maneira que o sacramento, ao mesmo tempo, significa por sua instituição, representa por sua semelhança e confere por sua santificação.”
Já na Idade Média...
Santo Tomás de Aquino (séc. XIII)
• “Os sacramentos da Igreja recebem do Verbo Encarnado sua eficácia.”
• “Assim como na voz sensível, enquanto procede da concepção da mente, existe certa força espiritual para excitar a inteligência do homem, da mesma maneira encontra-se uma força espiritual nos sacramentos enquanto ordenados por Deus para produzir efeitos espirituais.”
• Há três finalidades para os sacramentos: (1) edificar a Igreja; (2) estruturar o culto da Igreja; e (3) santificar os fiéis, livrando-os do pecado e comunicando-lhes a graça sacramental.
Perspectivas Teológicas
União hipostática
Tudo o que Jesus fez e padeceu atua como instrumento da Divindade para salvação do
homem. (Santo Tomás de Aquino)
Os mistérios de Jesus são a fonte da divina graça, que prolonga em nós seus efeitos, sendo cada um
deles, segundo a sua própria índole, a causa da nossa salvação.
(Papa Pio XII, Mediator Dei)
Do lado de Cristo adormecido na cruz jorraram os sacramentos
com os quais a Igreja foi construída. (Santo Tomás de
Aquino)
Instituição dos sacramentos
Só pode ser autor quem tenha o poder de
comunicar-lhe o vigor necessário para sua
finalidade.
A finalidade dos sacramentos é
transmitir a graça e santificar os fiéis.
Só Deus pode ser autor dos sacramentos.
Jesus instituiu explicitamente: Batismo (Mt 28,18ss); Eucaristia (Lc 22,19); Penitência
(Jo 20,21-23)
Os Evangelhos não relatam tudo o que
Jesus fez; para as novas circunstâncias, Cristo deixou-nos sua Igreja.
O número de sete indica totalidade: os sacramentos cobrem
toda a vida do homem.
Matéria e Forma
Hilemorfismo
• A essência dos corpos resulta da união de dois princípios, ditos “matéria” e “forma”.
• A diferença entre os corpos provém de algum outro princípio que não a matéria.
Pedro Lombardo (séc. XII)
• “São dois os elementos de que consta o sacramento: palavras e coisas. Palavras, como a invocação da Trindade; coisas, como a água, o óleo e similares.”
Santo Tomás de Aquino (séc. XIII)
• “O pleno significado dos sacramentos exige que o sentido das coisas sensíveis seja determinado por algumas palavras. Das palavras e das coisas faz-se nos sacramentos uma só realidade como se fossem matéria e forma; as palavras aperfeiçoam e significado das coisas.”
Matéria e Forma
• “Todos os sacramentos constam de três elementos: coisas, que são a matéria; palavras, que são a forma; e a pessoa do ministro, que confere o sacramento. Caso falte um desses componentes, não há Sacramento.”
Concílio de Florença
(séc. XV)
• “O significado do sacramento, embora deva ser expresso pelo rito essencial, isto é, pela matéria e pela forma, é manifestado principalmente pela forma; a matéria é o elemento não determinado que a forma determina.”
Papa Leão XIII, Carta
“Apostolocae curae” (1896)
Caráter e Graça Sacramental
Caráter significa efígie, marco ou selo
• “Fostes selados pelo Espírito da promessa, o Espírito Santo.” (Ef 1,13)
• É indelével e apenas produzido pelos três sacramentos consecratórios.
Santo Agostinho (séc. VI)
• O selo funciona como uma marca no escravo. Mesmo que ele se perca, nunca se poderá negar a quem pertence. De forma análoga, quando se afasta de Cristo, o cristão perde a graça santificante, mas guarda o selo ou o caráter.
Santo Tomás de Aquino (séc. XIII)
• O caráter confere a possibilidade de participação no Sacerdócio de Cristo: Batismo e Crisma pelo sacerdócio comum; Ordem pelo sacerdócio ministerial.
Ex opere operato
Por efeito da própria obra realizada
O sacramento é canal da graça por efeito do próprio
rito e não por efeito das virtudes do ministro que aplica ou do sujeito que recebe o sacramento.
Cristo garante a eficácia sacramental, desde que se
utilize matéria e forma corretas.
Essa doutrina não isenta o ministro de uma vida santa,
nem o sujeito de criar as condições para que a graça produza seus frutos nele.
Ex opere operantis sacramentais
Ex opere operato
Um padre celebra a Eucaristia tendo cometido pecado grave, sem confissão. A Eucaristia é
válida? É tão eficaz quanto outra celebrada por um padre em
estado de graça?
Uma pessoa recebe a Eucaristia tendo cometido pecado grave, sem confissão. A Eucaristia é
válida? Ela produziu os mesmos efeitos como em uma pessoa
em estado de graça?
Aspectos Canônicos dos Sacramentos
Validade e Licitude
Sacramento válido é aquele que, na sua confecção ou
na sua recepção, se produziu verdadeiramente; ou seja, houve sacramento.
Sacramento lícito é aquele sacramento válido, que foi, além disso, confeccionado e recebido com todas as condições próprias
dele.
Elementos canônicos dos sacramentos
Matéria Forma Sujeito Ministro
Sujeito
Condições para recepção lícita dos sacramentos
Estado de graça, para os sacramentos de vivos
Fé e arrependimento, para os sacramentos de mortos
Demais requisitos específicos
Condições para recepção válida dos sacramentos
Capacidade específica de cada sacramento
Intenção
Sujeito é a pessoa que recebe o sacramento.
Ministro
Por ministro, entende-se a pessoa que confere o sacramento.
Jesus Cristo é o ministro primário de todos os sacramentos, pois ele, único sacerdote,
ofereceu o sacrifício redentor ao Pai.
• Ministro ordinário ex-officio
• Ministro extraordinário ad usum
O ministro do sacramento faz as vezes
de Cristo e deve ter a intenção de fazer o que
a Igreja faz.
Bibliografia
Catecismo da Igreja Católica
BETTENCOURT, Estevão. Curso sobre os Sacramentos (EME – CL). mimeo.
SADA, Ricardo; MONROY, Alfonso. Curso de Teologia dos Sacramentos. 2ª. ed. Lisboa: Rei dos Livros, 1998.
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