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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE-MAPPS HARLEY GOMES DE SOUSA VIOLÊNCIA NO UNIVERSO ESCOLAR: NARRATIVAS E SABERES LOCAIS FORTALEZA – CEARÁ 2015

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ

CENTRO DE ESTUDOS SOCIAIS APLICADOS

MESTRADO ACADÊMICO EM POLÍTICAS PÚBLICAS E SOCIEDADE-MAPPS

HARLEY GOMES DE SOUSA

VIOLÊNCIA NO UNIVERSO ESCOLAR: NARRATIVAS E SABERES

LOCAIS

FORTALEZA – CEARÁ

2015

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HARLEY GOMES DE SOUSA

VIOLÊNCIA NO UNIVERSO ESCOLAR: NARRATIVAS E SABERES LOCAIS

Dissertação apresentada à coordenação do Curso de Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade – MAPPS do Centro de Estudos Sociais Aplicados e do Centro de Humanidades da Universidade Estadual do Ceará – UECE, como requisito parcial para obtenção do título de mestre. Área de concentração: Políticas Públicas e Sociedade. Orientador: Prof. Dr. Geovani Jacó de Freitas

FORTALEZA – CEARÁ

2015

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A Deus; о que seria de mim sem а fé que eu tenho

Ele?

Dedico esta, bem como todas as demais conquistas,

aos meus amados pais, Armindo Nunes е Alvina

Gomes, aos meus irmãos Damária, Dário, Luiza de

Marillac e Pedro que, com muito carinho е apoio,

não mediram esforços para que eu chegasse até esta

etapa de minha vida! E aos meus quatro preciosos

sobrinhos: Luzia, Davi, Maria Fernanda e Pedro

Luthiely, meus melhores е maiores presentes.

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AGRADECIMENTOS

A Deus, por me ensejar este grande sonho. À minha família, por sua capacidade de acreditar e investir em mim. Ao professor Dr. Geovani Jacó de Freitas, pelo cuidado, rigor e inestimável apoio. Aos professores da Banca Examinadora de qualificação: Prof. Dr. Antônio dos Santos Pinheiro e Prof.ª Dr.ª Rosemary de Oliveira Almeida, pelo considerável auxílio acadêmico, e ao Prof. Dr. Luiz Fábio Silva Paiva, membro da banca de defesa. Aos professores do Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade – MAPPS, pelos saberes compartilhados. À nossa estimada secretária do MAPPS – Cristina Maria Pires de Medeiros, pela sua disponibilidade durante o Curso. À Prefeitura Municipal de General Sampaio e à Secretaria Municipal da Educação – SME, pelo apoio à pesquisa desenvolvida. À direção, aos professores, estudantes e a toda comunidade da escola pesquisada, pela confiança em mim depositada para viabilização deste trabalho. Ao Governo do Estado do Ceará e à Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico – FUNCAP, por concederem os recursos indispensáveis para execução da pesquisa. Aos primos е tios, pela contribuição valiosa e pelo incentivo. Aos amigos, companheiros de trabalhos е irmãos na amizade, que fizeram parte da minha formação е que vão continuar em minha vida, com certeza e, de modo especial, a Valdey Carneiro, que sempre esteve disposto a colaborar direta e indiretamente. À comunidade da Igreja Assembleia de Deus – Ministério Bela Vista, pois foi nesse meio que aprendi о valor da minha fé. E a todos os que fizeram parte da minha formação, о meu muito obrigado.

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"Se estás disposto a nunca usar da violência, e sempre resistindo, torna-te forte de corpo e de alma; é a mais difícil de todas as atitudes."

Agostinho Silva "Uma das coisas importantes da não violência é que não busca destruir a pessoa, mas transformá-la."

Martin Luther King

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RESUMO A violência na escola é recorrentemente referida, seja na mídia, ou pela própria instituição escolar. Como espaço de sociabilidades e formação psicossocial dos sujeitos, a escola não está isenta deste problema que se revela de forma multifacetada, ambígua e polifônica. Nesse sentido, este estudo buscou analisar as narrativas dos estudantes, professores e gestores, ao definirem o que é ou não violência em relação às práticas cotidianas na escola. As reflexões expostas resultam de uma pesquisa empírica, de natureza qualitativa, realizada numa Escola de Ensino Fundamental no interior do Estado do Ceará. Nesta investigação, realizou-se um estudo de caso, com o auxílio da observação direta e da aplicação de entrevistas semiestruturadas com os agentes escolares, com um universo de 24 participantes (11 estudantes, 11 professores e dois gestores). Para subsidiar a análise dos dados, utilizou-se o software IRAMUTEQ. As reflexões teóricas realizadas dialogaram com as reflexões trazidas por Michaud (1989), Maffesoli (1987), Simmel (1983), Arendt (2010), Zaluar (1999), Freitas (2003), dentre outros. Referindo-se às ambiguidades conceituais do fenômeno estudado, percebeu-se que, para os interlocutores, a violência é toda e qualquer ação social que agride física e verbalmente o outro e, sobretudo, aquelas atitudes em que faltam o respeito para com o próximo. A questão da violência é percebida de modo geral como desafio e problema para os que são atingidos negativamente por ela. Segundo os agentes escolares, contudo, o diálogo e o respeito possibilitarão o reconhecimento mútuo e a solidariedade na escola que, consequentemente, produzirão relações harmônicas e afetivas para constituir de uma realidade escolar com o emprego de menos violência e conflito. Palavras-chaves: Escola. Violência na Escola. Narrativas.

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ABSTRACT

Violence in school is repeatedly referred to, either by the media or by the school institution. How sociability space and psychosocial training of the subjects, the school is not free of this problem which is of multifaceted, ambiguous and polyphonic form. Thus, this study aimed to analyze the narratives of students, teachers and administrators to define what is and is not violence towards everyday practices at school. The foregoing considerations are the result of a qualitative empirical research, in a Primary School in the countryside of the state of Ceará. In this investigation we conducted a case study, using direct observation and the application of semi-structured interviews with school staff, with a universe of 24 participants (11 students, 11 teachers and 2 managers). To help analyze the data, we used the IRAMUTEQ software. Theoretical considerations made dialogue with the reflections brought by Michaud (1989), Maffesoli (1987), Simmel (1983), Arendt (2010), Zaluar (1999), Freitas (2003), among others. Referring to conceptual ambiguities of the object of our research, we realized that, for the interlocutors, violence is all social action that assaults both physically and verbally another person and especially those attitudes that demonstrate a lack of respect for the others. The issue of violence is usually perceived as a challenge and a problem for those who are negatively affected by it. According to school officials, however, dialogue and respect will allow mutual recognition and solidarity in school that consequently produce harmonic and emotional relationships to form a school reality with the use of less violence and conflict. Keywords: School. Violence at School. Narratives.

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CEBELA

CEE

CHD

CNEC

CREDE

EMEF

EJA

EUA

FLACSO

FNDE

IBGE

INEP

LDB

MAPPS

MEC

PCN’s

PDDE

PSE

SEB

SME

UECE

UFC

UNESCO

Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americano

Conselho de Educação do Ceará

Classificação Hierárquica Descendente

Campanha Nacional de Escolas da Comunidade

Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação

Escola Municipal de Ensino Fundamental

Educação de Jovens e Adultos

Estados Unidos da América

Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais

Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade

Ministério da Educação

Parâmetros Curriculares Nacionais

Programa Dinheiro Direto na Escola

Programa Saúde na Escola

Secretaria da Educação Básica

Secretaria Municipal da Educação

Universidade Estadual do Ceará

Universidade Federal do Ceará

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 - Principais aspectos indicados pelos estudantes ................................................... 77

Quadro 2 - Principais aspectos indicados pelos professores ................................................. 79

Quadro 3 - Principais aspectos indicados pelos gestores ...................................................... 80

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LISTA DE GRÁFICOS

Figura 1 - Similitude 1 – Práticas tidas como violentas para os estudantes ............................ 68

Figura 2 - Nuvem de palavras 2 – Práticas tidas como violência para os estudantes ............ 68

Figura 3 - Similitude 1 – Práticas tidas como violentas para os professores ......................... 69

Figura 4 - Nuvem de palavras 2 – Práticas tidas como violência para os professores ........... 69

Figura 5 - Similitude 1 – Práticas tidas como violentas para os gestores .............................. 71

Figura 6 - Nuvem de palavras 2 – Práticas tidas como violência para os gestores ............... 71

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO...................................................................................................................14

1.1 TRAJETÓRIA ESCOLAR: AS MEMÓRIAS E OS PRIMEIROS ASPECTOS

VINCULADOS À PESQUISA .................................................................................... 14

1.2 PSICOPEDAGOGIA ATIVIDADE QUE MOTIVOU A PESQUISA ............................ 16

1.3 PERCEPÇÕES DA VIOLÊNCIA ESCOLAR: INVESTIGAÇÃO ................................. 17

2 PERCURSO METODOLÓGICO A SAGA DE UM PESQUISADOR ....................... 21

2.1 ENFOQUES TEÓRICO E METODOLÓGICO ............................................................. 22

2.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................................... 23

2.3 OS CONTEXTOS DA INVESTIGAÇÃO ..................................................................... 24

2.3.1 CENÁRIOS DA ESCOLA: CARACTERÍSTICAS E CONTEXTOS LOCAIS .......... 25

2.4 PERFIL DOS AGENTES ESCOLARES: ESTUDANTES, PROFESSORES E

GESTORES ................................................................................................................... 28

2.5 ESTRATÉGIAS E PERCEPÇÕES DA PESQUISA ....................................................... 29

2.5.1 Entrevistas semiestruturadas: perspectiva oral da pesquisa .................................. 31

2.5.2 Instrumentos de coleta de dados .............................................................................. 32

3 VIOLÊNCIA ESCOLAR PERCEPÇÕES AMBÍGUAS .............................................. 33

3.1 OS PONTOS E CONTRAPOSIÇÕES DA VIOLÊNCIA .............................................. 33

3.2 SOCIABILIDADES E VIOLÊNCIA ............................................................................. 38

3.3 A (IN) DISCIPLINA NA ESCOLA: DA ANOMIA À AUTONOMIA NO

CONSTRUTO SOCIAL DAS REGRAS ...................................................................... 43

3.4 JUVENTUDES E VIOLÊNCIAS NA ESCOLA ........................................................... 49

3.5 POLÍTICAS PÚBLICAS: AÇÕES DE PREVENÇÃO E ENFRENTAMENTO

À VIOLÊNCIA NA ESCOLA ...................................................................................... 54

4 OS AGENTES ESCOLARES: CENÁRIOS, VOZES E CONCEPÇÕES ................... 61

4.1 O AMBIENTE ESCOLAR E SUAS NARRATIVAS .................................................... 73

4.2 A PERCEPÇÃO DA ESCOLA PARA SEUS AGENTES ............................................. 77

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................................... 86

REFERÊNCIAS ........................................................................................................... 89

APÊNDICES ............................................................................................................... 93

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1 INTRODUÇÃO

Via de regra, nos trabalhos acadêmicos, percebemos que o objeto de estudo tem

ligações pessoais ou profissionais com os sujeitos que realizam a pesquisa. Este ensaio não é

diferente, pois, no tema violência, se agregam vínculos particulares e profissionais. Deste

modo, não dá para subtrair as emoções e as subjetividades, porém, tentamos o máximo de

esforço e objetividade em campo para pôr em prática um escuta apurada dos fatos. Neste

panorama contraditório e num universo de informações teóricas e práticas, tecemos nossa

investigação.

1.1 Trajetória escolar: as memórias e os primeiros aspectos vinculados à pesquisa

Os primeiros registros da nossa história de vida escolar inicia aos seis anos de idade,

em 1988, quando passam a frequentar um anexo da Escola José de Anchieta e Silva, da qual a

mãe do autor deste trabalho era diretora. Esse espaço ficava localizado no bairro onde

morávamos – Ombreira – na cidade de Pentecoste, um lugar tranquilo, pacato, de crianças que

brincavam nas calçadas enquanto seus pais conversavam sentados nas cadeiras de balanço:

coisas de gente grande.

Recordar as memórias desde o início do nosso aprendizado escolar e relacionar às

experiências vividas com nossa profissão não é nada fácil, especialmente porque a nostalgia

nos revela sentimentos bons e outros não muitos agradáveis.

Continuar delineando nossa trajetória é também reviver boas lembranças,

especialmente quando nos alfabetizamos, no ano de 1989 e, a partir daí, fomos estudar a 2ª

série em outra escola, desta vez, bem maior e com renome, no Município. Referimo-nos ao

Colégio João XXIII, pertencente à Campanha Nacional de Escola da Comunidade - CNEC,

onde permanecemos até o fim do segundo grau, uma vez concluso, esta etapa de ensino.

25 de março de 1982, foi a data de nosso nascimento, no âmbito de família humilde,

numa casa pequena e simples, onde morava nossos pais e irmãos, sendo nós o caçula, “a rapa

do tacho”. Crescemos em meio a carinhos, xodós e mimos, mas o que nos marcava era a

timidez, a falta de integração social com outros colegas e amigos do bairro. Supomos que a

superproteção familiar nos favoreceu, de um lado, a fortaleza que necessitávamos pra viver,

mas, por outro, dificultou nossas relações sociais, corroborando sentimentos de vergonha e

insegurança.

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Recordamo-nos de que fomos vítima de agressões gratuitas pelos colegas de sala, por

meio de insultos, peraltices e armações. Os meninos, como eram maiores do que nós, sempre

escondiam nossa bicicleta na hora do intervalo e, muitas das vezes, quando não escondiam,

eles lhe secavam o pneu. Por inúmeras vezes, e durante anos, se repetia esse fato, que nos

chateava e intimidava. Sentíamo-nos indefeso, perseguido e coibido diante o poder exercido

sobre nós.

Refletir a cerca de alguns destes episódios da vida escolar é perceber o quanto fomos

vítima de bullying1 , uma violência que deixou marcas e lembranças duradouras de uma

violenta experiência emocional. O termo bullying e suas práticas, na época desconhecidas por

nos e pela escola, eram apenas sentidos, vividos e velados num espaço onde nós e muitas

outras crianças éramos acometidos pela maldade de garotos, autoidenficados como os

valentões da escola.

A maturidade biológica e psicológica, com o tempo, nos impulsionaram a reagir de

alguma forma. Começamos, então, a nos destacar por nossas habilidades intelectuais, sempre

tirando boas notas, pois, do 3º lugar da sala, chegamos a 1º no Quadro de Honra ao Mérito.

Essa dedicação tornou-se uma compensação pelas inúmeras agressões morais e psicológicas

sofridas durante o período escolar. Passados os períodos da pré-escola e do primeiro grau,

surgiram outros colegas, novas relações, porém nosso círculo de amizade continuava restrito

apenas quatro amigos fiéis. E, assim, concluímos os estudos, prestamos exame e fomos

aprovado: vestibular Pedagogia.

Ao percebermos e sentirmos as fragilidades na infância e a negligência da escola

para amenizar nosso sofrimento na época, buscamos nos especializar na área do conhecimento

que lida com o cognitivo e a psique. Decidimos, então, fazer o Curso de Especialização em

Psicopedagogia onde nos afirmamos e definimos a razão pela qual dedicamos grande parte do

nosso tempo, colaborando com a aprendizagem de crianças, adolescentes e adultos. E foi

nessa trajetória acadêmica e profissional que as amarras da timidez e da violência na escola

foram sendo rompidas, muito embora carreguemos na bagagem da caminhada alguns pontos

difíceis a resolver.

1 Bullying, palavra de origem inglesa, utilizada em vários países para definir a vontade consciente de molestar outra pessoa, oprimindo-a. Desenvolveu-se como definição, sobretudo, como expressão usada pela literatura psicológica anglo-saxônica nas pesquisas sobre violência na escola. (FANTE, 2011, p. 27)

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1.2 Psicopedagogia a atividade que motivou a pesquisa

Nossa carreira profissional como psicopedagogo no Município de General Sampaio-

CE iniciou-se em agosto de 2007. Era a primeira vez que a rede municipal de ensino contava

com o apoio e o trabalho psicopedagógico em suas escolas. Em virtude deste ofício, no ano de

2010, a gestão da Escola Municipal de Ensino Fundamental José Bezerra Filho requisitou a

elaboração de ações que reduzissem as práticas violentas em seu espaço.

Isto posto, idealizamos, junto à psicóloga local, o Projeto Bullying – Educar para Paz,

fundamentado na obra de Cléo Fante 2 . Referida proposta de intervenção apoiou-se nas

observações e estudo das sociabilidades conflituosas daquela escola. Naquele período, eram

frequentes as agressões físicas e verbais com base nos relatos de estudantes e professores, foi

possível identificar a prática do Bullying.

Esse projeto foi desenvolvido em duas etapas, conforme ora delineado.

Etapa A – Conhecimento da realidade: neste momento, realizamos reuniões com

professores, gestores e familiares. As observações do ambiente escolar, os estudos e

a escuta dos agentes escolares foram muito importantes nesta fase. Em seguida,

exibimos a proposta de trabalho para a comunidade escolar, sendo aprovada e

documentada no Regimento da escola. Nesta fase, formou-se a Comissão do Projeto,

representada por psicopedagogo e psicóloga (coordenadores), assistente social,

gestores, professores, estudantes, Grêmio Estudantil e Conselho Escolar.

Etapa B – Modificação da realidade: neste período, foram planejadas e realizadas

as ações de enfrentamento às práticas violentas, como: elaboração do Estatuto contra

o fenômeno Bullying, realizado em sala de aula, pesquisas com temas relacionados à

violência, gincanas educativas, oficinas para professores, exibição de vídeos, filmes e

palestras para estudantes e componentes familiares etc.

Passado um ano de implementação do referido projeto, mudanças nas relações foram

perceptíveis. Por exemplo, as agressões físicas reduziram significativamente, comprovadas

pela diminuição dos atos violentos registrados no Livro de Ocorrências da escola. Assim,

evidenciamos resultados positivos do trabalho realizado no chão da escola.

2 Projeto baseado no livro Fenômeno Bullying: como prevenir a violência nas escolas e educar para paz. A autora, Cleo Fante, é antropóloga e especialista em Bullying.

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Destarte, nos sentimos motivado a investigar sobre a temática da violência no espaço

escolar por meio da pesquisa científica, pois surgiram inquietações; como: quais as narrativas

que classificam o termo violência sob a óptica dos estudantes, professores e gestores daquela

escola?

1.3 Percepções da violência escolar: investigação

No entendimento de Tavares dos Santos (2002, p. 125) “a violência é um discurso da

recusa, ela nasce da palavra e dos gestos emparedados”, razão pela qual é importante tentar

compreender as facetas e as mensagens escondidas no código da violência. Sob esta

perspectiva, a escola foi escolhida como campo de investigação, sob motivação da carreira

profissional há pouco relatada, e por percebermos que, nas interações sociais, havia relações

consideradas violentas por agentes locais, enquanto outros não a concebiam como tal. Deste

modo, as inquietações nos impulsionaram a compreendermos quais os tipos ou práticas de

sociabilidades classificadas como violência no cenário escolar. Para isso, buscamos respostas

nas narrativas dos agentes escolares ao definirem o que é ou não violência no cotidiano

escolar.

Perceber a violência escolar como comportamentos agressivos e antissociais, seja de

forma intencional ou não, com e sem causa aparente, é prognosticar um fenômeno que “faz

parte” do espaço de convivência social na escola há certo tempo, reproduzido em experiências

conscientes e inconscientes das relações estabelecidas entre professores, estudantes, gestores,

funcionários de apoio etc.

O fenômeno da violência mostra-se cada vez mais à sociedade. Ele se expressa em

suas múltiplas formas, faces e gêneses, aspectos que, segundo estudiosos do fenômeno,

dificultam sua compreensão e tornam mais complexa a sua definição. De acordo com Santos

(2002), a violência tem caráter polissêmico, ou seja, possui diversos sentidos, e seus

significados variam de acordo com o contexto sociocultural e econômico sob o qual o

fenômeno se estrutura.

Na escola, a violência como prática reconhecida adquire dimensões cada vez

maiores, uma vez que estudantes, professores, gestores e funcionários são ameaçados,

coibidos e, em muitos casos, agredidos por motivos banais. Quando ela é expressa de modo

hostil, afeta a vida e a integridade física das pessoas. Outro ponto que assola os espaços de

aprendizagem é a violência ao patrimônio público – aquela que danifica a parte física da

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escola. Esta pesquisa se mostra relevante, na medida em que as práticas de sociabilidades

violentas se encontram nas relações sociais, revelando-se de variadas formas, desde os

conflitos armados, às brigas e xingamentos, e, sobretudo, quando a violência afeta alunos,

professores, diretores, pais e outras pessoas.

Como lembra Ortner (2007, p. 30), “as pessoas agem no mundo de acordo com suas

próprias concepções culturais, mas o mundo não se sente nada compelido a ajustar-se a essas

concepções”. Para a autora, os agentes sociais sempre estão submergidos na pluralidade das

relações sociais do espaço em que estão inseridos, sem poderem agir fora do seu contexto.

Com origem nesse pressuposto, reiteramos nossa inquietação: quais são as narrativas dos

agentes escolares no cotidiano escolar que classificam certas práticas sociais como violentas

ou não violentas?

Sobre qual violência se referem esses agentes sociais na escola? Para respondermos a

estas perguntas, lançamos mão das narrativas, cujos sentidos ancoram-se no repertório

cultural dos agentes escolares, buscando a compreensão de como as diversas falas vão

elaborando o conceito sobre violência.

Esta investigação tem como objetivo central analisar as narrativas que classificam

práticas de sociabilidades como violentas na escola sob a óptica dos estudantes, professores e

gestores. E para dar suporte a nossa finalidade, temos como objetivos específicos: a)

investigar quais as práticas de sociabilidades são classificadas pelos estudantes, professores e

gestores como “violência”; e b) identificar a visão de escola para os agentes escolares e seus

modelos de interação social e cidadã.

Em relação à violência escolar, por inúmeras vezes, esta é mencionada nos meios de

comunicação (TV, rádio, internet etc.) e pela própria escola. Tornou-se um problema para os

gestores e professores, haja vista a dificuldade enfrentada pela própria escola em lidar com os

atos percebidos como violentos. A escola, como espaço de sociabilidades e formação

psicossocial dos sujeitos, não está livre desta problemática que se manifesta de forma

multifacetada, ambígua e polifônica nas relações sociais mais amplas.

Na contextura dessa realidade, não nos parece razoável a aceitação de respostas

superficiais para o fenômeno da violência, tampouco responsabilizar os estudantes ou agentes

escolares outros por suas condutas consideradas violentas. Antes, é fundamental

compreendermos como os agentes da escola formulam seu pensamento sobre a violência, ou

seja, de que modo percebem os sentidos atribuídos à palavra, para, posteriormente,

aprendermos a definição deste termo sob a perspectiva analítica, com fundamento

sociológico.

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Desse modo, realizamos um estudo bibliográfico, buscando compreender, à luz da

produção sociológica, os consensos e dissensos conceituais a respeito da violência na escola.

Esta pesquisa, de natureza qualitativa, objetivou compreender, transpondo as mensagens

narradas pelos agentes escolares, quais os termos ou discursos que definem violência na

escola e, decerto, contribuir na elaboração de propostas para o enfrentamento dos atos

violentos que interpelam as práticas pedagógicas da escola.

Em muitos lugares, a violência escolar se fez assunto banal e, sobretudo, foco de

noticiário da televisão que, no cotidiano de seus programas, divulga as mortes e as brigas

ocorridas dentro e fora das escolas. O fenômeno da violência, contudo, passa a ser um

importante objeto de reflexão das autoridades e estudiosos da área (ABRAMOVAY; RUA,

2002).

Destacamos o fato de que foi somente na segunda metade do século XX que a

violência ganhou espaço no campo das Ciências Sociais como tema nos debates acadêmicos.

No Brasil, a temática toma corpo na produção científica na década de 1980, ampliando as

discussões e atraindo o interesse de pesquisadores de áreas diversas (BARREIRA; BATISTA,

2011).

Por isso, ao investigarmos as percepções dos estudantes, professores e gestores

quando definem a violência, acreditamos ser um passo importante, não só para entendermos

os sentidos atribuídos ao termo, mas, também, desde então, contribuirmos com o debate no

espaço acadêmico. Com esteio neste percurso, esta dissertação está estruturada em cinco

capítulos, iniciando com esta seção introdutória, na qual descrevemos com brevidade o objeto

de estudo e as motivações que justifica a pesquisa.

No segundo módulo, intitulado como Percurso Metodológico a saga de um

pesquisador, indicamos a trajetória metodológica por meio da descrição e justificativa do

caminho adotado para investigação, da identificação e caracterização da realidade escolar e

contextos locais, dos interlocutores da pesquisa, da técnica e dos instrumentos utilizados para

coleta dos dados.

No terceiro segmento, nomeado – Violência Escolar percepções ambíguas, relatamos

os consensos, controvérsias e antagonismos da violência, dialogando com autores que

fundamentam o tema da investigação. Introduzimos, pela análise, os pontos e contraposições

da violência por meio dos quais buscamos revelar o desafio de decifrar o código da violência,

isto é, a complexa tarefa de entendermos sob as distintas perspectivas, as narrativas que a

definem. Discutimos sobre as relações de sociabilidades no contexto escolar e abordamos

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temas sobre a juventude, as violências na escola, indisciplina escolar e políticas públicas

como práticas de prevenção e combate à violência escolar.

No quarto capítulo – Os Agentes Escolares: cenários e concepções, expomos os

sentidos atribuídos pelos agentes escolares à violência e às categorias analíticas delineadas

com procedência nas falas dos interlocutores da pesquisa. Nesta perspectiva, as categorias

inventariadas foram: atos violentos, indisciplina e respeito. Com suporte nas análises destas,

compreendemos como os agentes escolares percebem a violência. Deste modo, identificamos

quais as práticas de sociabilidades são concebidas como tais. Vale lembrar que, dentre elas,

destacamos o respeito compreendido pelos entrevistados como elemento importante nas

relações sociais. Tecemos as Considerações Finais da pesquisa – capítulo derradeiro –

expressando ponderações e indagações para trabalhos futuros.

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2 PERCURSO METODOLÓGICO A SAGA DE UM PESQUISADOR

Esta pesquisa foi pensada tendo por suporte inquietações que abordam o fenômeno

da violência escolar e impulsionaram a investigação sobre a seguinte indagação: como são

percebidas as práticas de sociabilidade classificadas como violência pelos estudantes,

professores e gestores? Compreender esses pontos significa abrir possibilidades para

pensarmos e refletirmos sobre as complexas relações manifestas na realidade escolar e, então,

possibilitar novos debates sobre a dinâmica escolar no que tange às práticas concebidas como

violentas.

Deste modo, intitulamos esta pesquisa como Violência no universo escolar:

narrativas e saberes locais. Para a sua realização, exploramos as leituras sobre a temática da

violência escolar indicadas nas referências deste trabalho, que proporcionaram a elaboração

dos primeiros textos e nortearam os passos metodológicos para leitura do experimento ora

relatado.

No caminho percorrido para esta investigação, é importante registra o fato de que as

primeiras observações em campo datam do mês de outubro de 2013. Neste período, iniciamos

as primeiras viagens à cidade de General Sampaio (localizada a 130 km de Fortaleza), no

interior do Estado do Ceará. Este lugar, foi conhecido outrora como Arraial do Bom Jesus3,

onde se encontra o locus de investigação a Escola Municipal de Ensino Fundamental – EMEF

José Bezerra Filho, sobre a qual descrevemos, na sequência, aspectos e dados recolhidos

durante este período exploratório e de visitas à escola.

Ressaltamos que os agentes escolares e sujeitos desta pesquisa 4 – estudantes,

professores e gestores – demonstraram interesse em participar das entrevistas. No mesmo

passo em que eram curiosos para entender o seu objetivo, mostravam-se satisfeitos em

contribuírem com suas ideias, dispondo-se a novos questionamentos caso fossem necessários.

Percebemos, depois, que as ideias e conceitos apontados pelos escolares exigiam constantes

leituras e análises que indicavam novos caminhos a trilhar.

Muitos foram os momentos vividos naquela comunidade escolar: o convívio social,

as ideias e os conhecimentos compartilhados, guardados, registrados e analisados que

3 Antigo nome do Município, quando, em 1890, ainda era um sítio, antes da construção da barragem de General Sampaio, cuja toponímia homenageou o herói cearense Antônio Sampaio, morto na guerra contra o Paraguai (Fonte: IBGE). 4 Sujeitos são todos aqueles que participaram da pesquisa de forma direta e indireta: estudantes, professores, gestores, e demais funcionários da escola. Ressaltamos que o termo sujeito poderá, ao longo do texto, ser substituído por agentes.

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concorreram para tecermos esta pesquisa. Tudo isto, sem dúvidas, trouxe momentos

prazerosos, mas, também, instantes de dúvidas, incertezas e questionamentos que,

aparentemente, não tinham respostas ou até mesmo pareciam ser óbvios. Era, porém, nestas

questões, consideradas evidentes, que nas narrativas surgiam o novo. Sendo assim,

convidamos o leitor para conhecer a “saga de um pesquisador” e adentrarmos os caminhos do

(des) conhecido.

Portanto, o percurso metodológico indicará: a descrição do locus e quem são os

sujeitos da pesquisa e, consigo, as razões que indicaram a sua escolha; a mostra das técnicas e

instrumentos usados; os aspectos que caracterizam o panorama escolar que, juntos, revelam as

marcas dos agentes escolares e, sobretudo, as características deste experimento acadêmico.

2.1 Enfoques teórico e metodológico

Para esta investigação, realizamos um estudo de caso na EMEF José Bezerra. O tipo

de pesquisa adotado foi de natureza exploratória, porquanto torna mais explícitas as ideias

(dados) fornecidas pelos sujeitos da pesquisa e as descobertas no decurso investigativo.

Como leciona Gil (2002, p. 54), o estudo de caso é hoje compreendido “como o

delineamento mais adequado para a investigação de um fenômeno contemporâneo dentro de

seu contexto real”. Para esse autor, a finalidade do estudo não é proporcionar o conhecimento

preciso das características de uma população, mas conceder uma visão global da questão

investigada ou de identificar possíveis fatores que influenciam o ensaio ou são por ele

influenciados.

Referida escolha é caracterizada pela visão acerca das relações sociais vividas no

microgrupo da escola, abordadas pela mediação dos estudos da Microssociologia, aqui

compreendida como o estudo do comportamento cotidiano em situações de interações

pessoais (GIDDENS, 2005 p. 84). Tal análise acontece no plano das pessoas ou pequenos

grupos. O autor explica que microestudos são necessários para a compreensão de padrões

abrangentes. Desse modo, esta pesquisa é um estudo com um pequeno grupo, que objetiva

entender elementos que facilitem a compreensão da “totalidade” no espaço escolar pesquisado

(as narrativas que conceituam práticas sociais como violentas).

A opção pela modalidade de estudo de caso na referida escola ocorre, basicamente,

por dois motivos iniciais: em virtude do curto tempo para a pesquisa em campo – não

teríamos tempo hábil para realizar o estudo, abrangendo todas as escolas do Município – e,

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principalmente, em decorrência da nossa atuação profissional, como psicopedagogo, na área

da Educação, no Município de General Sampaio, já expresso.

Consoante anotam Lapassade e Lourau (1972), o trabalho de campo se destaca com e

pela observação direta. Esta técnica subsidiou a interpretação das narrativas dos estudantes,

professores e gestores que classificaram e conceituam o termo “violência” com amparo em

suas relações sociopolíticas e culturais vivenciadas na escola. Para tanto, esta se enquadra no

método de pesquisa dialética e fenomenológica, pois se configura como procedimento de

investigação da realidade dialógica entre os sujeitos da pesquisa (o professor, gestor e o

estudante) e o objeto de estudo (as narrativas que delimitam o conceito de violência), cujos

fenômenos intersubjetivos são simbolizados por uma mudança constante, contrariamente a

qualquer conhecimento rígido, como nas Ciências Naturais; e, ainda, porque observamos os

fenômenos tais como se revelam, nos distanciando de proposições ou ideias preconcebidas,

mantendo de certo modo um distanciamento do fenômeno observado, ainda que seja parte

dele.

Desde modo, tecemos este trabalho “artesanal” constituído, principalmente, pelas

narrativas dos sujeitos participantes, por meio de suas experiências e múltiplas percepções da

realidade. No seguimento, descrevemos como procedemos a investigação.

2.2 Procedimentos metodológicos

Para compreendermos as percepções da violência sob a visão dos agentes escolares

da EMEF José Bezerra Filho, partimos da seguinte pergunta: como são percebidas as práticas

de sociabilidade classificadas como “violentas” no espaço escolar por estudantes, professores

e gestores?

A hipótese central é a de que as múltiplas percepções dos sujeitos escolares (direta

ou indiretamente) envolvidos nos eventos locais configuram distintos sentidos e significados

que, embora engendrados em um mesmo contexto de sociabilidades, são marcados por

ambiguidades no modo de sentir, pensar e agir perante o fenômeno da violência.

Para verificação desta hipótese, delimitamos um quantitativo de sujeitos para

participar da busca, dado que o universo5 da escola pesquisada não possibilita a investigação e

5 No que tange aos corpos discente e docente, bem como aos gestores, a escola é composta por 415 estudantes, 17 professores e três administradores, respectivamente (Dado referente ao ano de 2014 na soma dos turnos manhã e tarde).

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a análise de todos os seus agentes em tempo hábil. Em relação aos estudantes (universo maior

da escolar), o critério escolhido relaciona-se às observações em campo sobre suas práticas

discursivas e as informações dos professores e gestores da escola, no que diz respeito às

sociabilidades percebidas no cotidiano escolar.

De acordo com as percepções dos professores e dos gestores, identificamos

estudantes que denotavam comportamentos considerados satisfatórios para a aprendizagem no

convívio escolar, tais como: participação em sala de aula, frequência regular e respeito com a

comunidade escolar; e os de comportamentos tidos como inadequados: os que se envolvem

em conflitos, agressões físicas e verbais, demonstram baixa frequência e desrespeitam colegas

e professores.

Considerando os indicadores empíricos mencionados há instantes, as observações em

sala de aula e as práticas cotidianas dos estudantes durante o intervalo das aulas, selecionamos

cinco escolares que se enquadravam no primeiro perfil descrito e cinco que geralmente se

envolviam em conflitos. De modo espontâneo, um aluno pediu para participar da pesquisa,

totalizando 11 entrevistados.

Para finalizar a composição dos sujeitos participantes desta pesquisa, convidamos

três gestores e 17 docentes das séries finais do Ensino Fundamental, entre efetivos e

contratados. Onze professores, no entanto, e dois gestores se dispuseram a contribuir

significativamente com este trabalho. Deste modo, a pesquisa contabilizou 24 participantes,

sendo 11 estudantes, 11 professores e dois gestores.

Importante é lembrar que, para a recolha de dados em campo, utilizamos os seguintes

procedimentos: observação direta (observações gerais da escola, na sala de aula e no

intervalo) e entrevistas semiestruturadas. Quanto aos instrumentos, empregamos o diário de

campo e o gravador de voz.

Os procedimentos metodológicos estão aqui sistematizados em cinco categorias, a

saber: a) os contextos da investigação; b) os sujeitos; c) as técnicas; d) os instrumentos

etnográficos; e e) os cenários da escola com suas características locais.

2.3 Os contextos da investigação

As primeiras anotações e percepções da escola investigada foram aquelas que a

caracterizavam como espaço organizado, limpo, arborizado e com elementos favoráveis ao

bom andamento do processo de ensino e aprendizagem. Após sucessivas visitas à escola,

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porém, nos foi possível observar conflitos, tensões, agressões físicas, xingamentos, disputas

etc. aspectos também parte do seu cotidiano que inicialmente não foram identificados. Estes

eventos serão objeto de análise no capítulo 4.

É importante notar, contudo, que os contextos de investigação carregam significados

simbólicos, pois eles demonstram formas subjetivas e objetivas de interações das pessoas,

pois estas “[...] são produtoras de suas próprias ações e significações. Elas vivem num

ambiente material, mas os objetos desse mundo têm um “sentido” particular para cada uma,

conforme os momentos” (LAPASSADE, 2005, p.19). E é com uma visão de objetividade que

a subjetividade das interações será decifrada.

2.3.1 Cenários da escola: características e contextos locais

Para iniciarmos as observações e as investigações desta pesquisa, a priori, entramos

em contato com a Secretaria Municipal da Educação (SME) local, por meio de ofício

encaminhado pelo Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade da UECE, a fim

de esclarecer a finalidade do trabalho e sua importância, bem como obter a autorização para

efetivá-la na EMEF José Bezerra Filho. Antes de conhecermos o caminho percorrido no

espaço escolar, consideramos importante descrever um pouco da história desta escola, seus

aspectos e características.

A construção da Escola Municipal de Ensino Fundamental José Bezerra Filho se deu

no início da administração do Prefeito Raimundo Acinésio Bezerra (2001-2004), em parceria

com a Administração Estadual, no ano de 2003, e foi finalizada na administração da Prefeita

Eliene Leite Araújo Brasileiro (2005-2008), no ano de 2005. Ela possui este nome em

homenagem ao ex-prefeito, José Bezerra Filho, falecido, que administrou o Município de

General Sampaio no período de 1983 a 1988.

A fundação da Escola foi oficializada pela Lei Municipal N° 354/2003, de 28 de abril

de 2003, e está credenciada a funcionar sob o Parecer Nº 430/2009, do Conselho de Educação

do Ceará – CEE. É uma instituição 6 pertencente à rede pública municipal de ensino,

subordinada administrativamente à Secretaria Municipal de Educação, que atua sob a

jurisdição da 7ª Coordenadoria Regional de Desenvolvimento da Educação - CREDE, com

sede em Canindé – Ceará. A escola oferece os seguintes nível e modalidade do ensino da

6 A escola está localizada à rua Filomena Barbosa de Oliveira, inscrita no CNPJ sob o Nº 07481960/0001-60, e cadastrada no Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira-INEP, sob o Nº: 23260050.

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Educação Básica 7 ; Nível: Ensino Fundamental II 8 , Modalidade: Educação de Jovens e

Adultos – EJA9 e Classes de Aceleração10.

Ao lado da escola, encontramos a Praça General Sampaio11 – espaço de recreação,

utilizado pelos estudantes e pela comunidade local como lugar propício para encontros,

caminhadas e bate-papos, haja vista oferecer excelente arborização e alguns instrumentos para

a prática de exercícios físicos e diversões. Neste lugar, ao final do turno da tarde, observamos

estudantes em grupos, conversando ou brincando, e pessoas da comunidade, caminhando,

sentadas e dialogando. Percebemos, todavia, que é também espaço de brigas e conflitos

originados, em alguns casos, dentro da escola e que, posteriormente, se manifestam ali.

Diariamente, os estudantes da Sede e da zona rural do Município chegam à escola de

formas diversas: ônibus, bicicleta, a pé, canoa e carros próprios (dos pais). Ao aguardarem o

sinal de entrada, eles ficam na praça (em pares, isolados e em grupos maiores), ou à sombra

das árvores ou sob o sol escaldante, conversando, trocando ideias, ouvindo música, jogando

bola etc. Ao toque da sineta, o vigia abre o portão e a “garotada” corre para a escola (uns

gritam e empurram, alguns correm e outros andam de modo tranquilo).

O prédio da instituição é constituído pelos seguintes espaços: oito salas de aula; uma

quadra de esportes; três banheiros (dois para os estudantes e um para os funcionários); uma

sala de informática; uma sala de leitura; uma sala da diretoria e secretaria escolar; uma sala

dos professores e uma sala multifuncional. Verificamos a boa conservação de alguns desses

ambientes, embora em parte dos banheiros e das carteiras estivessem rabiscados e objetos do

prédio danificados (ventiladores e equipamentos de uso pedagógico – computador,

impressora, lâmpadas etc.). Notamos o cuidado do Núcleo Gestor de reparar os materiais, ora

solicitando os serviços da SME, outras vezes por meio de mobilização de estudantes e

funcionários para a conservação do patrimônio público.

Com efeito, como forma de reparar os bens danificados, registramos um episódio

ocorrido durante uma das visitas: um estudante chega à escola acompanhado de sua mãe para

7 É a primeira etapa da educação escolar, que compreende a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o Ensino Médio, segundo o Art. 21. da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional-LDB Nº 9.394/96 (Fonte: Portal MEC) 8 É a segunda etapa, final, obrigatória e gratuita, do Ensino Fundamental, que possui a duração de quatro anos, que corresponde do 6º ao 9º ano (BRASIL, MEC. Diretrizes Curriculares Nacionais Gerais da Educação Básica, 2003, p.36). 9 A Educação de Jovens e Adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria, segundo Art. 37 da LDB Nº 9.394/96 (Fonte: Portal MEC). 10 A LDB/96 assegura em seu Art.24, inciso V, alínea b, a possibilidade de aceleração de estudos para alunos com atraso escolar (Fonte: Portal MEC). 11 Esta praça recebeu a estátua do General Antônio Sampaio em 2010.

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conversar com a diretora por conta de um objeto quebrado por ele na escola. Depois que o

aluno revelou ter quebrado, pelo fato de estar com raiva e brigando com outro, sua mãe tenta

defendê-lo, afirmando que a culpa não é apenas do seu filho, e sim do colega que estava

envolvido na briga. Depois de muito diálogo, a diretora explica para a mãe que não pode

permitir este comportamento na escola e que os dois iriam se responsabilizar pelo objeto

danificado, substituindo-o por um novo. Percebemos que, em outros casos similares, há

tensão entre estudantes e gestores, por não aceitarem as decisões tomadas pela gestão.

Aparentemente, a escola pesquisada é limpa, com pouco barulho. Nas paredes, estão

afixados banners dos programas e projetos que a escola desenvolve, tais como: o Mais

Educação; Segundo Tempo; Cultura Afro-brasileira e Indígena etc. Entre as salas e os

corredores, existe o jardim e, no centro da escola, o pátio com mesas e cadeiras, onde os

estudantes, no intervalo, sentam-se para merendar, jogar dama, baralho, dominó, trocar ideias,

entre outras práticas de sociabilidades juvenis.

No espaço escolar ora caracterizado, as observações foram realizadas desde o

momento em que os estudantes chegavam ao ambiente escolar até a hora da saída. No período

da manhã, a escola inicia as atividades pedagógicas às sete e as finalizava às 11 horas; já no

turno da tarde, o horário de funcionamento tem início às 13 horas e se encerra às dezessete.

Antes de iniciarmos as observações em sala de aula, realizamos breve explicação do

objetivo da pesquisa, para estudantes e professores. Durante as visitas, alguns estudantes se

mostravam curiosos; perguntavam o que era registrado e para que serviam as anotações.

Alguns deles imaginavam que eram registrados seus nomes para fazer reclamações à diretora.

Ouviam-se cochichos: “Ei, ele vai nos dedurar para diretora” (estudante A); “Ele está

anotando o nosso nome para reclamar à diretora” (estudante B).

Aos poucos as visitas campo se tornaram comuns no ambiente escolar. Quando as

observações ocorreram com maior frequência, os escolares pareciam nem perceber que elas

eram realizadas, porém perguntavam quando notavam que não tinham sido realizadas no dia

anterior. Em virtude de eventos culturais produzidos pela escola, participávamos de alguns,

como datas comemorativas, jogos interclasse, projetos etc.

Nos eventos escolares, percebíamos maior integração dos estudantes, pois eles

realizavam as atividades esportivas ou recreativas com maior afinidade e melhor

envolvimento nos grupos. Notamos, não só por meio do comportamento deles, mas também

em suas falas: “eu gosto de jogar bola desde pequeno” (estudante C); “aqui é melhor que na

sala, né? Lá só tem tarefa e o professor às vezes é chato, aqui não, a gente brinca e se diverte”

(estudante D); “é porque nos jogos a gente gosta mais, tem a competição e a gente faz como

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quer” (estudante E). Evidenciamos que a escola ainda insiste em seguir modelos de ensino

conteudista e reprodutor de uma cultura divergente das ideias e necessidades dos seus

protagonistas. As falas dos estudantes denunciam que a linguagem da escola diverge das suas

maneiras de se expressarem.

Registramos as primeiras observações no turno da tarde nas turmas de 6º ao 9º ano e

na Classe de Aceleração. Neste turno, os estudantes são estigmatizados por professores e

gestores como os mais indisciplinados; ou seja, na visão desses educadores, são aqueles

estudantes mais “problemáticos”, cujos pais são ausentes da escola e da própria vida de seus

filhos. Ouvimos dos professores relatos provenientes de conversas deles com alguns pais

como “eu não sei mais o que fazer com este menino” (professor A); “ele não vai estudar de

manhã porque não acorda cedo” (professor B); “já fiz de tudo e ele não tem jeito” (professor

C). Assim, os estudantes da tarde preferem estudar neste horário por conta das atividades

noturnas (conversa na pracinha, namoro, assistir à TV, acesso à internet etc.) e acabam

fugindo do controle dos seus responsáveis.

2.4 Perfil dos agentes escolares: estudantes, professores e gestores

Os estudantes da escola pesquisada são sujeitos provenientes das zonas urbana e

rural do Município de General Sampaio. Segundo dados escolares, eles formam um

contingente de pessoas com baixo nível financeiro, filhos de agricultores e pequenos

comerciantes. De acordo com a compreensão dos educadores, a juventude também é

demarcada por outras questões sociais, que interferem no ensino-aprendizagem, como o

desemprego, a gravidez não planejada, o uso de drogas e outros. Estes aspectos são analisados

pelos professores como fatores que implicam a repetência, o abandono e a evasão escolar. No

período das observações, foi possível constatar a gravidez na adolescência, embora outros

elementos descritos há pouco não tenham sido perceptíveis. Vale ressaltar, entretanto, que

este não é o nosso objetivo, mas que não deixou de ser notado.

Dentre os 11 entrevistados, cinco são do sexo masculino e seis do feminino, com

idade de 11 a 15 anos. Estes estudantes estão matriculados na etapa final do Ensino

Fundamental da seguinte forma: dois são do 6º ano, três são do 7º ano, dois do 8º ano e quatro

do 9º ano, e estudam nos turnos manhã e tarde. Destacamos o fato de que os interlocutores

foram categorizados em dois grupos: o primeiro é composto por estudantes com bom

desempenho escolar, tendo como indicadores os registros dos diários escolares e

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comportamento considerado pelos professores como “favorável” para o ensino 12 ; para o

segundo, tomamos como referência estudantes envolvidos com um histórico de brigas, não

frequentavam a escola regulamente e não realizavam as atividades, conforme os registros do

Livro de Ocorrência da escola e relatos dos professores. A ideia de convidar estes estudantes

para participarem da pesquisa teve como objetivo beneficiar as variadas visões sobre o mesmo

assunto: o cotidiano das sociabilidades na escola e seus múltiplos significados.

Quanto aos professores, os 11 entrevistados possuem graduação com habilitação em

áreas específicas do ensino13 e 25% deles possuem pós-graduação. Com relação ao quadro

dos gestores (diretor e coordenador pedagógico), desde a fundação da escola, a gestão escolar

é formada por livre nomeação e exoneração do gestor municipal. E, a partir do ano de 2007,

os gestores foram nomeados por meio de processo seletivo (provas, provas de títulos e

entrevistas).

2.5 Estratégias e percepções da pesquisa

No arcabouço das técnicas e procedimentos para análise dos indicativos da busca de

campo, existem inúmeros métodos a serem utilizados que, variam de acordo com a pesquisa e

seus objetivos. Assim sendo, “[...] o trabalho de campo assume em geral, um contínuo

processo de reflexão e de mudanças de foco de observação [...]” (MACEDO, 2010, p. 102),

ao depararmos o campo de investigação, somos levado a fazer escolhas com relação aos

procedimentos e às técnicas de coleta de dados. Foi desta forma que, em nossa pesquisa,

utilizamos a técnica da observação direta, auxiliada pela aplicação da entrevista

semiestruturadas.

Iniciamos as observações pela estrutura física, da escola para percebermos como esta

se organiza. As características identificadas já foram mostradas no cenários da escola:

características e contextos locais, o que ajudou no entendimento da dinâmica escolar. Os

diálogos surgiram e neles foram estabelecidos pequenos vínculos que ajudaram os

interlocutores a se sentirem tranquilos para trocar ideias e depois responder às entrevistas.

Esta aproximação com alguns entrevistados se deu de modo tão natural e significativo que

sempre perguntavam pelo trabalho: “hoje tem entrevista?” (estudante F); “ei, quero ser

12 Os estudantes que realizam as atividades possuem frequência regular, demonstram resultados satisfatórios nas avaliações. 13Licenciados em Português, Matemática, História e Geografia, Biologia e outras áreas.

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entrevistado novamente” (estudante G); “eu também quero responder estas perguntas aí”

(estudante I).

Percebemos aqui a necessidade que os estudantes têm para falar, expressar e ter

atenção de alguém que os escute. A escola pouco abre espaços para escuta e diálogos com os

escolares. Quase sempre os estudantes são escutados quando levados à sala da Diretoria, cujas

falas não são caracterizadas por acordos e negociações, e sim por meras escutas, acusações e

defesas.

Estar no cotidiano escolar com uma juventude cheia de questionamentos,

rebatimentos, tensões, amizades e relações, ora conflituosas, ora cordiais, é sentir-se jovem

com possibilidades de não só ouvir ou dialogar com eles, mas também entender suas

narrativas e sentimentos, isto é, traduzir o que a linguagem desses jovens revela além das

palavras.

Consoante a lição de Macedo (2010), estando o pesquisador implicado na pesquisa,

quanto mais ele se envolver com os sujeitos, estará ele mais capaz de compreender os sentidos

das coisas que busca saber, especialmente os significados que parecem brotar do cotidiano das

pessoas.

Para Flick (2009), o tipo de observação mais utilizado na pesquisa qualitativa na

educação é a observação direta. Com esta técnica, pouco a pouco obtivemos acesso ao

ambiente escolar e às pessoas nele inseridas (estudantes, professores e gestores), tornando-nos

integrante naquele espaço investigado.

No dia a dia escolar, sempre algo se manifesta de forma reveladora, e dando-nos

pistas para o que buscamos compreender. Quando pensamos, no entanto, que encontramos

respostas, uma ação ou uma fala nos mostra que não é só o que percebemos inicialmente, mas,

também, existem outros pontos de vista contrários ao que acabou de se manifestar.

Realizamos sucessivas visitas à EMEF José Bezerra Filho. Nestas, buscamos

perceber a escola por meio de observações das relações entre os agentes escolares e aspectos

do ambiente físico. Assim, iniciamos com as percepções relacionadas ao espaço físico, tais

como: salas arejadas no período da manhã, porém quentes no turno da tarde; escola arborizada

no seu interior, no entanto poucas árvores ao seu redor; ambiente conservado (paredes, pintura

e cadeiras novas) e espaço colorido com atividades fixadas nas paredes realizadas pelos

estudantes.

Deste modo, durante a pesquisa registramos no diário de campo o modo como os

eventos sociais se constituem e acontecem, observando, principalmente, as práticas de

sociabilidades produzidas na escola.

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2.5.1 Entrevistas semiestruturadas: uma perspectiva oral da pesquisa

As experiências, as práticas sociais e o modo como os estudantes, professores e

gestores se relacionam no ambiente escolar são demonstrados por meio de suas atitudes e

falas. Os discursos nos revelam, consubstancialmente, o que nossos olhos não foram capazes

de observar. Além disso, as questões suscitadas durante o nosso dialogo surgem das narrativas

dos sujeitos durante as observações. Por isso, as falas constituem fonte reveladora para nossa

pesquisa e legitimam as nossas reflexões acerca do objeto de estudo.

Assim, as entrevistas foram meios que condicionaram representações da implicação

do trabalho de campo. Deste modo, conduzimos nossa pesquisa com entrevista aberta ou com

a semiestruturada. Conforme Macedo (2010), este tipo de entrevista proporciona o contato

entre o pesquisador e os entrevistados, pois aquele demanda compreender as perspectivas que

esses últimos têm sobre a vida e suas experiências.

A entrevista é um tipo de técnica que une o pesquisador aos sujeitos, um instrumento

fundamental nas pesquisas sociais. Possibilita a coleta de dados que interessa ao investigador

no delineamento das categorias analíticas. Podemos entender como uma das formas de

comunicação mais empregada na pesquisa qualitativa.

Para isso, aplicamos as entrevistas, no período de agosto a outubro de 2014, com

estudantes, professores e gestores, visando a compreender como são percebidas as narrativas

definidoras de violência na escola. Elaboramos um roteiro de entrevista que possibilitou a

investigação, a obtenção e análise de dados. O guia de roteiro subdividiu-se em quatro partes,

a saber: dados pessoais; visão da escola; interação escola e cidadania; e as práticas

consideradas violentas.

As entrevistas ora foram registradas em gravador, ora apenas no formulário próprio,

cujas perguntas estavam conforme o conhecimento linguístico dos sujeitos. Ressaltamos que

todas as entrevistas foram realizadas junto aos entrevistados. A entrevista dos estudantes

(APÊNDICE 1), dos professores (APÊNDICE 2) e dos gestores (APÊNDICE 3) seguem um

mesmo roteiro, como perguntas iguais para todos os participantes, para facilitar a

categorização das informações fornecidas pelos interlocutores. Para auxiliar na análise dos

dados, aplicamos o software IRAMUTEQ14.

14 O software IRAMUTEQ (Interface de R pour les Analyses Multidimensionnelles de Textes et de Questionnaires), desenvolvido por Pierre Ratinaud (2009). É um software gratuito desenvolvido sob a lógica da open source, licenciado por GNU GPL (v2). Ele ancora-se no ambiente estatístico do software R e na linguagem python (www.python.org).

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2.5.2 Instrumentos de coleta de dados

Os registros da pesquisa foram realizados com o uso do diário de campo que

“registra a temporalidade cotidiana de uma análise que engloba o projeto-processo científico,

que muitas vezes lhe escapa caso não seja anotada o que se observou” (MACEDO, 2010,

p.134). Além do mais, ele se mostra como reflexo das questões de quem pesquisa, pois

segundo Mao, “quem quiser conhecer um fenômeno não pode consegui-lo sem se pôr em

contato com ele, isto é, sem viver (entregar-se à prática) no próprio meio desse fenômeno

(LAPASSADES e LOURAU, 1972, p.46)”.

Utilizamos, ainda, a gravação em algumas entrevistas como forma de auxílio nos

registros e contextos da situação investigada. Vale lembrar que, antes de iniciarmos as

entrevistas gravadas, os interlocutores ou seus responsáveis eram comunicados sobre a

gravação, como também a respeito do objetivo da pesquisa por meio das autorizações para

divulgação dos dados da investigação (APÊNDICE 4 e 5).

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3 VIOLÊNCIA ESCOLAR PERCEPÇÕES AMBÍGUAS

A temática violência é, sobretudo, uma seara de análises complexas, a começar pela

luta dos pesquisadores do tema na tentativa de defini-la. Notamos que o fenômeno da

violência absorve a atenção dos estudiosos, não apenas pela sua complexidade e

possibilidades de interpretações, já que ele envolve múltiplos aspectos, sendo um conceito

polissêmico, ambivalente e multifacetado, encontrando-se nos diversos espaços do cotidiano

social, seja no público ou no privado. É com origem nessa dificuldade de compreender esse

fenômeno em sua totalidade que surge um arcabouço teórico e metodológico de investigações

a seu respeito, o qual buscamos descrever a seguir.

3.1 Os pontos e contraposições da violência

Como leciona Michaud (1989, p. 110), “as filosofias da violência são abordagens

especulativas onde as generalizações audaciosas, os mitos e as proclamações definitivas não

faltam”. Assim posto, seríamos capazes de definir a violência e as práticas que se enquadram

neste fenômeno? Vários pesquisadores e estudiosos da área se esforçam nesta tentativa.

Veremos a priori suas divergências e convergências, num debate que atualmente envolve

cientistas políticos, filósofos, sociólogos e antropólogos estudiosos do assunto.

A violência como objeto de estudo demonstra-se, hoje, cada vez mais desafiadora e

adquire outras configurações. Os estudos envolvem temas atuais e antigos, a exemplo da

violência juvenil, do tráfico de drogas, do sistema penitenciário etc. (BARREIRA; BATISTA,

2011).

Os diversos conceitos da violência apontam significados distintos: por um lado, a

violência indica acontecimentos e práticas sociais, ao passo que, de outra parte, expressa o

modo como a força pode ser usada por outra pessoa. No que tange à primeira óptica, Michaud

(1989, p. 7) alega que a violência “opõe-se à paz, à ordem que ela perturba ou questiona” e,

na segunda compreensão, ela é a “força brutal ou desabrida que desrespeita as regras e passa

da medida”.

A princípio, visualizamos a conotação negativa que a palavra carrega no imaginário

social. Zaluar (1999) nos lembra, entretanto, que o termo violência, além de ser polifônico no

significado, se manifesta de formas diversas e não possui definição unívoca e clara. Sob estes

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aspectos, a autora assinala não ser possível defini-la como positiva e boa ou como destrutiva e

má.

Para entendermos o termo violência, Michaud (1989) nos informa sua etimologia:

Violência vem do latim violentia, que significa violência, caráter violento ou bravio, força. O verbo violare significa tratar com violência, profanar, transgredir. Tais termos devem ser referidos a vis, que quer dizer força, vigor, potência, violência, emprego de força física, mas também quantidade, abundância, essência ou caráter essencial de uma coisa. Mais profundamente, a palavra vis significa a força em ação, o recurso de um corpo para exercer sua força e portanto a potência, o valor, a força vital. A passagem do latim para o grego confirma este núcleo de significação. Ao vis latino corresponde o is homérico que significa músculo, ou ainda força, vigor, e se vincula a bia que quer dizer a força vital, a força do corpo, o vigor e, consequentemente, o emprego da força, a violência, o que coage e faz violência. Os especialista ligam tais termos ao sânscrito j(i)ya que significa predominância, potência, dominação que prevalece. (P. 8)

Apreendemos na estrutura da palavra violência a ideia de força e potência

naturalizada, cujo uso contra alguém ou alguma coisa se qualifica como prática violenta. Tal

força, entretanto, só se torna violência quando ultrapassa as regras socialmente

institucionalizadas, ou seja, quando perturba a ordem. Na inteligência de Zaluar (1999), é,

portanto, a percepção do limite e da perturbação que vai classificar um ato como violento ou

não, percepção esta que vai variar cultural e historicamente.

Essa força adquire, contudo, seu caráter violento em função das normas legitimadas

que variam conforme os espaços públicos ou privados. Sob este ponto de vista, Michaud

(1989) apregoa a ideia de que pode haver múltiplas formas de violência, de acordo com a

quantidade diversificada de normas.

Nesta perspectiva, a violência parece expressar-se no excesso de poder que dificulta

o reconhecimento do outro (raça, gênero, classe social, singularidades) por meio do uso da

força ou repressão, causando algum prejuízo físico, psicológico ou patrimonial. O grande

dilema da definição parece estar vinculado à dificuldade de compreender onde e como esse

abuso de poder se manifesta, ou seja, que regras, normas e limites são legitimados para o uso

do poder. Isso nos leva à ideia do Estado de Direito, no qual o direito não é valor universal e,

sim, a dignidade humana. Supondo que o excesso de poder se delimite no que seja

condenável, tal concepção nos reconduz ao problema do limite, ainda não analisado

(ZALUAR, 1999).

Matar, ferir o outro, roubar, extorquir e xingar são ações que, coletiva ou

individualmente, podemos conceber ou não como atos de violência bons, maus ou nem um

nem outro. Não teríamos a certeza de que tais definições estariam destituídas de quaisquer

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referências a normas, regras e valores. Na realidade, elas se assemelham às distinções

jurídicas, mas, se fôssemos levar apenas isso em consideração, estaríamos ignorando os

estados de violência mais capciosos (MICHAUD, 1989).

Na tentativa de conceituar violência, o autor nos fornece esta reflexão:

Há violência quando, numa situação de interação, um ou vários atores agem de maneira direta ou indireta, maciça ou esparsa, causando danos a uma ou várias pessoas em graus variáveis, seja em sua integridade física, seja em sua integridade moral, em suas posses, ou em suas participações simbólicas e culturais. (P. 11)

Com este entendimento, Michaud (1989) tenta dar conta tanto dos estados quanto dos

atos de violência, delimitando vários fatores:

a) a complexidade dos diversos modelos de interações nos quais pode envolver vários

atores e até as máquinas administrativas (judiciária, organização burocrática etc.);

b) as formas de produção da violência segundo seus instrumentos – “Não é a mesma

coisa matar com a própria mão, fuzilar e assinar uma ordem de bombardeio. Os

progressos tecnológicos se orientam no sentido de uma violência produzida

indiretamente” (IDEM, p. 11);

c) da distribuição temporal da violência que pode ser ministrada gradualmente ou

distribuída – “Pode-se matar ou deixar morrer de fome” (IBID); e

d) dos distintos tipos de danos que ela pode causar – físicos, psíquicos e também

morais.

Ante o exposto, percebemos a complexidade do significado da palavra. A violência

não é apenas o embate de dois adversários ou grupos, “mas o efeito de uma empresa anônima

na qual todo mundo se subtrai à responsabilidade”. (MICHAUD, 1989, p.11).

É importante ressaltar que “a violência não é um fenômeno recente, como também

não é específico dos países pobres”. Suas formas atuais de expressão provocam mudanças nas

abordagens sociológicas. Compreendê-la com procedência nos valores “é uma das formas

existentes para entendermos a construção de relações sociais baseadas no uso da força física”.

(BARREIRA; BATISTA, 2010 pp. 22-23).

Freitas (2003), também discutindo sobre referida temática, nos desafia a refletir, ao

preconizar a noção de que a violência não pode ser avaliada sem levar em conta os pontos sob

os quais ela é compreendida, produzida, percebida e estruturada. Para o autor, a violência

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como fenômeno social mostra-se com ambíguas linguagens e definições. Por um lado, ela é

percebida como sinônimo de negatividade e, por outro, como de positividade, dependendo da

simbologia que cada um faz de suas práticas e sentidos sobre o que é violento ou não.

Ao tocarmos na ideia de positividade da violência, Maffesoli (1987, p. 13) a

compreende como elemento estruturador da sociedade. Ele revela seu aspecto utilitário e

destrutivo como “estruturante continuo do fenômeno humano”, ou seja, exprime sua forma

ambígua. Para ele, a violência possui função social: equilibra e (re) constitui uma nova ordem

social. Ele enfatiza que, antes de condená-la ou até mesmo de negar sua existência, é melhor

tentar com ela negociar.

Desde os tempos remotos, registram-se casos de barbarias, lutas e disputas que vêm

desde a formação da humanidade até os dias de hoje. Sobre este ponto Maffesoli (1987),

como outros autores, destaca a violência como herança comum aos tipos diversos de

sociedades. Para aqueles que interpretam o fenômeno da violência apenas de modo negativo,

o autor descreve e analisa com rigor seu aspecto utilitário: ela é o motor do dinamismo da

sociedade; sob um duplo movimento de destruição e construção, ela evoca nova construção,

uma outra ordem.

Ante todas estas tentativas de conceituar a palavra violência, Michaud (1989) explica

que não é por conta das divergências de ideias radicais ou convergências que a violência seja

indefinível. Sob tal prisma, ele nos alerta de que

É preciso estar consciente de que as definições objetivas, ainda que as mais úteis, não são isentas de pressupostos e também não apreendem o conjunto dos fenômenos; Há na apreensão da violência um componente subjetivo que depende dos critérios utilizados: critérios jurídicos, institucionais, valores do grupo ou do subgrupo e até mesmo disposições pessoais. Não se pode comparar ingenuamente a violência na sociedade inglesa do século XIII com a do século XX porque muitas normas mudaram; Não é possível haver um equilíbrio satisfatório entre um e outro ponto de vista; pode-se apenas corrigir um pelo outro adotando, a cada vez, uma distância, isto é, mudando de perspectiva; É preciso estar pronto para admitir que não há discurso nem saber universal sobre a violência: cada sociedade está às volta com a sua própria violência segundo seus próprios critérios e trata seus próprios problemas com maior ou menor êxito (IDEM, p. 14).

É notório o fato de que a definição de violência não carrega um caráter universal

(único saber), uma vez que estaríamos negando a singularidade de cada sociedade, ou seja, o

que é violento pra alguns não é para outros. Cada história carrega em si aspectos

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socioculturais, políticos e econômicos próprios, por isso não se tem até o momento um só

conceito sobre violência.

Assim posto, esta pesquisa visa a entender os conceitos que classificam o termo

violência sob os saberes apreendidos, nomeados e julgados segundo os critérios dos agentes

escolares. Os fatos não são o bastante para estes se tornarem indicadores, mas, como analisa

Michaud (1989, p. 111), “a violência são os fatos tanto quanto maneiras de apreendê-los, de

julgá-los, de vê-los – ou de não vê-los”. Sob esta perspectiva, veremos no capítulo 4 as

múltiplas percepções da palavra violência na visão dos agentes escolares.

Por fim, Debarbieux e Blaya (2002) explicam que é erro fundamental, idealista e

histórico acreditar que definir a violência (ou outro termo) seja uma questão de chegar ao

máximo possível de um conceito absoluto de violência, de um juízo de violência em que a

palavra e a coisa estejam sempre ajustadas. O erro a que eles se referem está vinculado ao

aspecto múltiplo que o vocábulo encerra, especialmente quando se trata dos contextos

singulares de cada sociedade ante os diversos modos de percebê-la e senti-la.

Os autores lembram que, em termos metodológicos, não se deveria pesquisar a

violência como um todo indivisível, mas há de se multiplicar os pontos de vistas. Eles

ressaltam que uma definição ampla traz um conceito inoperante em razão de sua generalidade.

Não existe “um conhecimento total acerca da violência, pois ela só pode ser representada de

formas parciais, e devemos aceitá-las como tal ou nos permitiremos cair na fantasia da

onisciência, que é tudo menos ciência”. (IDEM, p. 65).

Entre as ideias consensuais e contraditórias dos autores que versam sobre a violência,

percebemos suas múltiplas definições. Sob esta perspectiva, analisarmos as narrativas dos

atores da escola ao classificarem a violência não é tarefa simples, visto que há inúmeras

manifestações que podem ou não ser concebidas como violência, significando isto dizer que

as distintas visões dificultam a compreensão, definição e contextualização deste fenômeno.

Como pudemos constatar, os conceitos e as definições sobre violência não encontram

em um só dado científico sua plenitude, tendo em vista sua múltipla percepções e, ao mesmo

tempo, seu particular caráter subjetivo, em virtude das questões culturais que a definem. É

dicotômico assegurar que a violência tem apenas uma definição, em virtude do caráter dual

que os autores apontam em seus estudos. Esse aspecto dualístico que ela carrega traz dois

lados distintos e delimitados: ora a violência é negativa, ora é positiva. Na primeira visão,

comportam-se ações que usam da força para ferir, matar, violentar etc.; na segunda, ela se

mostra desafiadora no que se refere à mudança de ordem, do novo surgente como, por

exemplo, após as guerras, há novas configurações territoriais, sociais, políticas e econômicas,

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ou seja, para a sociedade ser reerguida, ela necessita se reinventar. Por fim, não podemos

categoricamente avaliar a violência para defini-la, sem levar em conta os aspectos sob os

quais ela é entendida, configurada, visualizada e organizada.

3.2 Sociabilidades e violência

Numa perspectiva histórica, o fenômeno da violência remonta às sociedades antigas,

cuja disputa pelo fogo até à instituição da propriedade privada, ao atual neoliberalismo,

inúmeras nações foram dizimadas. No dia a dia, os conflitos urbanos são bastante

evidenciados, seja na mídia ou pela sociedade. Estas formas de sociabilidades crescem a cada

segundo, a exemplo do crime organizado e das maneiras com as quais esses ilícitos se

atomizam no cotidiano das grandes, médias e pequenas cidades do País.

Ao tocarmos no termo conflito, é importante diferenciá-lo da ideia de violência,

como categoria explicativa das relações sociais:

O conflito é um processo natural da sociedade e um fenômeno necessário para a vida humana, podendo ser um fator positivo para a mudança e o crescimento pessoal ou um fato negativo de destruição, dependendo da forma de regulá-lo. O conflito não é bom, nem mau, simplesmente existe. Nessa dimensão, não se pode confundir conflito com violência. Ambos estão relacionados entre si, mas, de forma alguma, podem ser considerados sinônimos. (PACHECO, 2008 p. 138).

Portanto, na história da humanidade, especialmente no concernente às relações

sociais e questões que envolvem o fenômeno da violência, podemos perceber que, desde a

Pré-História, os conflitos existiram de maneira peculiar como forma de grupos obterem a

sobrevivência. Para Simmel (1983), a aversão ou a oposição entre pessoas de um grupo é

necessária às relações sociais, ou seja, o conflito é um elemento estruturador da vida social.

Deste modo, é importante no convívio escolar compreendermos, de forma reflexiva, a

distinção entre eventos conflituosos e atos violentos, para não banalizarmos as inúmeras

práticas de sociabilidades vivenciadas no espaço escolar, classificando-as como violência.

A sociedade contemporânea vive permanentemente situações de risco e ameaça de

violência, seja por conflito militar declarado, ações terroristas ou pelo crescimento das mais

variadas formas de criminalidade. Não existe praticamente país ou cidade, hoje, que possa se

considerar protegida ou imune de ações violentas, consoante a analise de Velho (2004).

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No pensamento de Simmel (1983), conviver na sociedade é sinônimo de estar com

outro sujeito, para ele ou contra ele, ou seja, as diversas relações entre as pessoas. Os modos

sob os quais origina a formação dos conteúdos 15 e interesses materiais ou individuais

denominam-se de sociabilidades. Logo, a “sociação”, para Simmel, é a maneira pela qual as

pessoas se organizam em grupos para atender suas necessidades, sob os quais constituem a

base das sociedades. Assim, todos os modelos de interações ou de “sociações” estão

permeados de conteúdos intencionais. As pessoas dialogam entre si mediante algum conteúdo

que almejam transmitir ou sobre o qual tencionam entender.

Em razão das complexas e diversificadas relações sociais, Simmel (1983) contribui

com estudos sobre as várias formas de vida social, suas combinações e inter-relações. Ele

observa que um grupo, após obter certa dimensão, precisa desenvolver formas e instrumentos

que o ajudem a se manter e a se promover. Assim, grupos pequenos possuem qualidades

(alguns tipos de interações dos seus membros) que desaparecem quando esse cresce. Para o

autor, as sociedades socialistas, ou quase socialistas, só se tornaram possíveis em grupos

pequenos e sempre fracassaram em grupos maiores, pois a justiça na repartição da produção e

o reconhecimento do grupo se tornam difíceis em grupos grandes em razão das peculiaridades

dos seus componentes, papéis e ambições.

Segundo Hannah Arendt (2010), a ação é a necessidade do homem em viver

entre seus semelhantes; sua natureza é social. Sob esta perspectiva, o homem precisa de

cuidados para sobreviver, uma criança recém-nascida se distingue de um animal porque, ao

nascer, este consegue viver por conta própria. Assim, o ser humano é um animal que

socialmente aprende e apreende para sobreviver. A qualidade da ação presume seu caráter

social e, como destaca a autora, a sua pluralidade. “Todas as atividades humanas são

condicionadas pelo fato de que os homens vivem juntos, mas a ação é a única que não pode

sequer ser imaginada fora da sociedade dos homens”. (IDEM, p. 26).

A forma pela qual crianças, jovens, adultos e velhos adquirem novos conhecimentos,

ou seja, aprendem os modos de vida de sua sociedade, é definida como socialização,

consoante declara Giddens (2005). Deste modo, a criança se torna um sujeito consciente de si

e instruído nos modos de sua cultura local. A escola terá nestes moldes sua função

preponderante de (re) produzir modelos de sociabilidades.

Para Giddens (2005), há dois tipos de socialização, a saber: a socialização primária e

a secundária. A primeira é aquela que ocorre na infância com intenso aprendizado cultural. O

15 Conforme Simmel (1983), conteúdo é tudo o que está nas pessoas, de maneira a exercer influência sobre os outros ou a receber influências. É designado como conteúdo, ou seja, a matéria da “sociação”.

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principal agente de socialização nessa fase inicial é a família. Já com relação à segunda, novos

agentes entram em cena: a escola, as organizações, a mídia etc. se tornam espaço de

aprendizado e socialização. O autor ainda ressalta que não podemos compreender os modos

de socialização como uma “programação cultural”, haja vista que a pessoa não é um ser

passivo que apenas absorve influências das quais ele está em torno. Somos, porém ser ativo

“criador”, que no seu cotidiano vai se modelando em meio às interações sociais.

De acordo com o pensamento de Hannah Arendt (2010),

A pluralidade humana, condição básica da ação e do discurso, tem duplo aspecto da igualdade e da distinção. Se não fossem iguais, os homens não poderiam compreender uns aos outros e os que vieram antes deles, nem fazer planos para o futuro, nem prever as necessidades daqueles que virão depois dele. Se não fossem distintos, sendo cada ser humano distinto de qualquer outro que é, foi ou será, não precisariam do discurso nem da ação para se fazer compreender. (Pp. 219-220).

Podemos pensar que na escola esta pluralidade onde a ação e o discurso, ao passo

que distingue os agentes escolares, os faz semelhantes. Por meio da ação e da fala, os sujeitos

se inserem no mundo escolar e mostram quem são, “revelam ativamente suas identidades

pessoais únicas, e assim fazem seu aparecimento no mundo humano”. (IDEM, pp. 223-224).

A autora nos informa que a palavra é uma ação política manifestada por intermédio

da atividade humana. Para que esta palavra institua uma ação política, ela deve se afastar da

violência, compreendida pelos gregos como ação pré-política no sentido de que, para estes

sujeitos, a força e a violência se justificavam como meios de vencer suas necessidades – a

liberdade no mundo. Assim, as sociabilidades violentas vão surgindo num cenário sobre o

qual a palavra se faz inoperante. Arendt (2010), por sua vez, trata a violência sob outra

perspectiva a violência não é percebida como expressão ou linguagem. Para ela, a “violência é

muda, e por esse motivo a violência, por si só, jamais pode ter grandeza”. (P. 31). Sob tal

perspectiva, ela se mostra de modo arbitrário, neutralizando o discurso e traduzindo-se numa

ação antipolítica.

Contrapondo o pensamento de Arendt (2010), Santos (2002) acentua que com as

consequências do processo de fragmentação social, de seleção e de exclusão econômica e

social, surgem práticas de violência como expressão social particular de grupos da sociedade,

recorrentes em diversas dimensões da violência social. Com efeito, as interações sociais

passam a ser demarcadas, pelos mais variados estilos de sociabilidades violentas, como

linguagem social.

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Deste modo, podemos pensar que a negação da expressão ou da palavra, o não

reconhecimento do outro como sujeito de direito e a hierarquização que demarca lugares

contribuem para as práticas de sociabilidades violentas.

Ainda de acordo com Santos (2002), a sociedade brasileira concebe a violência como

prática social corrente, com base nos exemplos frequentes de atos violentos, tanto nas cidades

(comercialização de drogas e armas, grupos de extermínios, torturas nas delegacias, violência

contra a mulher e crianças etc.) quanto no campo (questões agrárias, homicídios de lideranças

comunitárias) e, também, nas escolas (depredações dos bens públicos, xingamentos, roubos,

agressões físicas etc.). Neste sentido, a violência revela-se como prática “natural e normal” de

acertar as “contas”, de usurpar algo que se cobiça ou de impelir a ordem sobre o outro.

Os conflitos, tensões, mal-entendidos, amores, ódios e amizades são exemplos de

sentimentos e ações que conduzem a vida em sociedade. Aprender a conviver com estas

emoções e atitudes de modo pacífico é um indicador para o bem-estar social. O modo como

são interpretados os conflitos e problemas, no entanto, é fator importante para boas ou más

relações (ORTEGA; REY, 2002).

Perante o exposto, os grupos de meninos com meninos e de meninas com meninas

são modelos de sociabilidades dos jovens da EMEF José Bezerra Filho, preferencialmente nos

espaços de lazer – pátio e na quadra de esporte. A turma de amigos, geralmente composta do

mesmo sexo, é característica marcante dos estudantes daquela escola. Observando o cotidiano

destas relações, notamos aqueles que se distanciam e os que se aproximam, formando grupos

distintos e, ao mesmo tempo, próximos.

São marcantes cenas observadas na escola em determinados espaços, sejam elas na

sala ou fora dela. Observamos, cotidianamente, alguns adolescentes com dificuldades de se

inserirem em grupos já formados, em decorrência de algumas características que lhes são

peculiares, como: deficiências, timidez, tipo físico etc. Estudantes que passam as quatro horas

de aula sozinhos, sem interagir com colegas, e de mesmo modo se repete este cenário no

intervalo, enquanto uns conversam, brincam, jogam em grupos ou duplas, os estudantes que

permanecem isolados ou ficam pelos cantos do pátio, sem nenhum contato, ou buscam

interação junto aos grupinhos formados, e não conseguem. É importante destacarmos o fato

de que os grupos se formam de acordo com afinidades, aparentemente se fecham para

inclusão de novos membros.

Segundo Dubet e Martuccelli (1997), a escola é palco de socialização, cenário de

aprendizagem e espaço de convivência:

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Ela socializa os atores com valores laicos e universais das sociedades modernas. Sempre levando em conta a especificidade das posições sociais, ela forma indivíduos tanto mais autônomos quanto mais fundado na coletividade e na Razão moderna são os valores que comandam a educação. (IDEM, p. 258).

Assim posto, é importante lembrarmos que a função da escola não se limita a

constituir saberes conteudistas. Participar da formação sociocultural dos seus agentes, criar

espaços para diálogos a fim de constituir novos modelos de ensino e aprendizagem e se

reinventar no cotidiano parecem desafios constante neste universo multicultural, cheio de

ideias diversificadas e disputas. Em razão, contudo, das relações conflituosas e dos atos de

violência comuns nos espaços da escola, que podem interferir nas suas atividades, ela pode

criar dispositivos capazes de estabelecer equilíbrio no ambiente escolar, estabelecidos

coletivamente e negociados com a comunidade escolar, mas que nem sempre funcionam de

imediato.

Com efeito, o campo nos revela práticas de sociabilidades amistosas e conflituosas

sob o qual as diversas linguagens e sentimentos se expressam, nos dando pistas das

necessidades, contestações e desejos ocultos nos atos dos agentes escolares que podem ser

identificadas por intermédio de suas falas. Sobre as práticas de sociabilidades classificadas

como violentas pelos sujeitos escolares, aprofundaremos a análise no capítulo 4.

No que tange à socialização escolar, Barrère e Sembel (2006) nos revelam que

É na escola primária que o modelo de socialização clássica permanece o mais forte: a figura do professor continua central, dado que o grupo de crianças não está apto a contestar sua autoridade, e a transmissão das aprendizagens básicas não é em absoluto questionada. A integração à organização escolar é a lógica dominante. Num estágio mais avançado, ao contrário, a contestação da ordem escolar e o questionamento da utilidade dos estudos e do trabalho escolar são bem mais fortes. (P. 25).

Para esses autores, na escola primária, são poucos os questionamentos à

aprendizagem, pois a criança ainda não tem maturidade para realizá-los. Já quando surge o

período de contestações, a autoridade do professor e a motivação para o aprendizado tornam-

se realidades frágeis que necessitam ser reconstituídos no cotidiano escolar, para que os

estudantes deem sentido aos saberes. Por um lado, alguns deles percebem a finalidade do

saber para “ter uma boa profissão, uma boa vida” (IDEM, p. 86). De outro lado, o desemprego

é visível.

Barrère e Sembel (2006) explicam que o distanciamento da cultura escolar ao

universo social dos estudantes poderá trazer uma série de provocações no processo de

socialização, à medida que os projetos escolares divergirem dos interesses dos seus agentes.

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Para esses autores, alguns estudantes preferem se relacionar de acordo com as normas dos

seus grupos a aderir às regras escolares. Neste sentido, “a formação do sujeito se faz então

contra a socialização escolar” (p. 26); com ações em oposição à escola e aos professores, os

estudantes desprezam o curso escolar – os saberes – em benefício da vida juvenil.

3.3 A (In) disciplina na escola: da anomia à autonomia no construto social das regras

Propositalmente escolhemos pôr, no título deste subitem, o prefixo “in” separado do

termo disciplina, a fim de chamar atenção para o fato da sua função negativa ante a percepção

positiva que ela carrega. Indicamos que disciplina é o respeito que o sujeito deve dispor em

relação às regras constituídas socialmente (moral). Essa concepção, segundo Araújo (1994),

foi a ideia que Jean Piaget teve em 1932, quando escreveu o livro O juízo moral na criança.

Compreendemos dessa forma que indisciplina é toda e qualquer ação que contraria as

regras socialmente estabelecidas por uma dada sociedade, e, em nosso caso – as ações

contrárias às regras, normas e à estrutura sistêmica da escola configuram-se como indisciplina

escolar, um fenômeno que interfere nas atividades da sala de aula e em outras dependências

da escola.

Desenvolver o juízo moral, para Piaget, segundo Araújo (1994), é ação diretamente

ligada a uma elaboração e/ou passagem de três fases interdependentes – anomia 16 ,

heteronomia17 e autonomia18. Podemos então assinalar que a indisciplina, como sinônimo de

negação à disciplina, mantém um vínculo natural com os dois últimos estádios, pois o sujeito

tem conhecimento das regras, mas as nega, decidindo se as obedece ou não, mesmo tendo

consciência do que é certo e errado (passagem do estado anômico para o heteronômico).

As interações sociais vivenciadas por todos quando crianças confere uma noção da

existência das regras, especialmente ao entrarmos em idade escolar (três a quatro anos) e

começarmos a frequentar a escola; até lá a fase da ausência de regras é que persiste em nos

acompanhar. Salientamos que as regras de convivência social começam a ser disseminadas

no seio familiar, quando a criança escuta nos discursos dos adultos as seguintes regras: não

16 Consoante Araújo (1994), a anomia é uma condição de ausência de regras; 17 Segundo Araújo (1994), a heteronomia é uma condição existencial de múltiplas regras e quem as determinam são os outros; 18 Na lição de Araújo (1994), a autonomia é uma condição de conhecimento das regras, mas a fonte delas está no próprio sujeito.

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ponha o dedo na tomada; está na hora de comer; vamos tomar banho e dormir; daí elas vão

crescendo e internalizando algumas proibições, até que se chegue a fase da autonomia.

Araújo (1994) nos traz importante reflexão, quando exprime uma das ideias mais

difundidas nas escolas, situando a autonomia com fim máximo da educação. Nas escolas, no

entanto, confundem a ação de constituir autonomia com deixar o aluno livre para suas

escolhas, apenas se reportando ao sentido etimológico da palavra. A consequência clara disso

é o embate dos estudantes com as regras, pois eles acreditam que suas decisões devem ser

indiferentes à sociedade, contrariando as normas sociais do grupo a que pertencem. Para

tanto, a autonomia é uma importante fase para formação do caráter, especialmente respeitar o

outro.

A autonomia, portanto, pode ser compreendida como resultante do processo de socialização que leva o indivíduo a sair do seu egocentrismo, característico dos estados de heteronomia, para cooperar com os outros e submeter-se (ou não) conscientemente às regras sociais, e isso será possível a partir do tipo das relações estabelecidas pelo sujeito com os outros. As relações de cooperação, de reciprocidade e respeito mútuo são, para Piaget, as fontes do segundo tipo de moral: a autonomia. (ARAÚJO, 1994, p.108).

Nesta perspectiva, são importantes a percepção e a vivência, pelos agentes escolares,

da reciprocidade e do respeito mútuo como atitudes que podem ajudar na formação da

autonomia e de espaços na escola cada vez mais democráticos. Este fenômeno, no entanto, é

complexo, visto que lidamos com diversas ideias que divergem e dificultam os acordos e

negociações das disputas e tensões do cotidiano escolar.

De qualquer forma, o palco da indisciplina no nosso contexto é a escola. E, falando

nela, podemos refletir na ideia de que a indisciplina constitui uma das queixas preponderantes

nos discursos dos professores e gestores, segundo seus relatos: “tem dia que não consigo dar

aula por conta da bagunça dos alunos”, (professor D); “eles não param, a gente pede atenção,

mas não tem jeito”, (professor E); “se eles fossem mais disciplinados, ficassem mais quietos e

prestando atenção na aula seria menos complicado”. (Gestor A). A indisciplina parece ter

relação com o modelo adotado pelo professor em sala de aula, manifestando-se como resposta

à falta de autoridade ou ao seu excesso. Em muito dos casos de indisciplina, o que

aparentemente se evidencia é a afronta revelada ou não às regras ou normas em vigor na

escola, de acordo com Aquino (1994).

O autor interpela-nos com os seguintes questionamentos:

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O que estaria acontecendo com a educação brasileira atualmente? Qual o papel da Escola para a sua clientela e seus agentes? Afinal de contas, sua função primordial seria a de veicular os conteúdos classicamente preconizados ou tão-somente conformar moralmente os sujeitos a determinadas regras de conduta? (P.39).

Hajam vistas os pontos destacados, observamos que, na escola pesquisada, além de

seu papel de transmitir os conhecimentos, bem como as relações de conflitos estabelecidas em

seus espaços, ela busca preparar o sujeito para o exercício da cidadania, para que os

estudantes conheçam seus direitos e reconheçam deveres, especialmente no que tange ao

cumprimento das regras escolares.

No contexto escolar, alguns relatos privilegiam a ideia de que os professores

concebem sobre a indisciplina: “pra mim a indisciplina está em todo ato dos alunos que não

respeita o momento da aula, ficam saindo e entrando, falando alto, etc.” (Professor F); “hoje

em dia, os alunos não respeitam nem seus pais, vão respeitar nós, professores? Acho que falta

limites”. (Professor G); “tem alunos que perdeu a noção e respeito com os seus colegas, com

os professores, usam palavrões e xingamentos, parece que eles escutam só isso em casa”.

(Professor H). Fica evidente nas falas dos professores que estas atitudes são desafios para o

trabalho escolar, pois a indisciplina na sala e aula se traduz como grande problema, e alguns

professores não lidam muito bem com estas questões.

De acordo com Aquino (1994), a questão disciplinar é, atualmente, uma das

dificuldades fundamentais quanto ao trabalho escolar. “O ensino teria como um de seus

obstáculos centrais a conduta desordenada dos escolares, traduzida em termos como:

bagunça, tumulto, falta de limite, maus comportamentos, desrespeito às figuras de autoridade

etc. (P. 40)”. Assim, a questão da indisciplina possivelmente é um dos maiores problemas

enfrentados pelos educadores, uma vez que extrapola as fronteiras didático-pedagógicas. Ela

se configura como questão interdisciplinar e transversal à Pedagogia, carecendo de análises e

estudos de outras áreas que colaboram com as Ciências da Educação.

Passos (1994, p. 118), parafraseando Enguita (1989), acentua como o mais comum

nas escolas a obsessão delas pela manutenção da ordem “[...] ordem é necessária em algumas

situações de caráter mais técnico, ele chama a atenção para o fato de que a maioria dos

professores justificam-na como necessidade pedagógica, além de concebê-la como condição

imprescindível de uma instrução eficaz”. Ao recordarmos algumas situações escolares,

especialmente em visitas de campo, verificamos o quanto esta busca de disciplinamento do

comportamento dos estudantes reforça a ideia de que aprendizagem acontece num ambiente

de ordem, medo e silêncio. Mesmo concordando com a noção de que a ordem seja importante,

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discordamos quando professores apontam que a disciplina (ordem) é condição sine qua non

para uma instrução eficaz.

A escola age com autoridade de quem detém o poder legítimo de disciplinar o sujeito

aprendente, e o papel a ela concedido é por esta autoreconhecido, de imposição simbólica do

que seja certo ou errado, ou seja, o papel de imposição de uma ordem simbólica de fazer ver e

fazer crer, a todos, o seu espaço de agente socializador por meio da imposição legítima de

normas socialmente aceitas e compreendidas como civilizatórias. Esta forma eficaz de

imposição sutil, sob a adesão dos dominados, Bourdieu (1975) denomina de Poder Simbólico.

A incorporação destes valores impostos simbolicamente pela escola e reproduzida

em formas de práticas sociais, um saber-fazer que passa a orientar o modo de sentir, pensar e

agir dos sujeitos no mundo, de forma quase irreflexiva, incorporado por este processo de

socialização, Bourdieu (2012) denomina de habitus. A escola, segundo esta perspectiva, passa

a ser lócus, por excelência, desta inculcação de valores sociais dominantes em forma de

educação.

Assim posto, a escola reproduz simbolicamente os interesses da classe

economicamente favorecida (valores, hábitos, normas, disciplinamento social, apreensão de

cultura letrada, retidão linguística dominante) entre outros valores dominantes.

A escola como lugar de violência não deve ser apenas percebida como tal, pois ela

própria causa violência. Neste âmbito, é importante que o professor formule junto aos

estudantes regras comuns “que permitirão ao estudante negociar e viver com mais intensidade

a misteriosa relação que une o lugar-escola e o nós-aluno”, conforme analisa Guimarães

(1994, p. 79).

De acordo com as ideias desse autor, a escola tende a se organizar para que todas as

pessoas sejam iguais. Alguns acreditam que, quanto mais igual, mais fácil de administrar.

Esta ideia de homogeneização é exercida com a disciplina que, por meio de ação de controle

do tempo, do espaço e do comportamento dos estudantes, professores e gestores requerem a

obediência e a submissão às regras escolares, sob o forte argumento de que a disciplina

possibilita melhor espaço de aprendizagem – os estudantes aprendem mais.

As rotinas, a organização educacional, a forma de avaliar, os tempos e períodos

limitados, no entanto, impulsionaram resistências dos estudantes (entendidas como

indisciplina) por melhores condições de estar na escola.

É do espaço das filas, de cabeça atrás de cabeça, da rotina dos horários, do tempo limitado para cada atividade, dos conteúdos estagnados, das provas homogêneas, que podem emergir formas de relação que ultrapassem o controle e o poder

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instituído, para configurar uma dinâmica de troca, de ação e interação, de luta contra a submissão, que se expressa nas rotinas e relações sociais que caracterizam o cotidiano escolar. Os próprios alunos vão impondo à escola a necessidade de mudança. (PASSOS, 1994, p. 123).

Semelhantemente a Passos (1994), Guimarães (1994) assinala que a indisciplina

surge como meio de impedir o controle homogeneizador posto pela instituição. Quando a

disciplina é imposta, ela enseja práticas de indisciplina ou violência. Vale lembrar, no entanto,

que, nas brigas ou brincadeiras, são estabelecidos vínculos positivos ou não entre os escolares,

pois, ao passo que as forças heterogêneas se manifestam, as emoções ali experimentadas

formam sentimentos da vida coletiva.

Na esteira raciocinativa de Guimarães (1994), quando a escola enrijece suas normas

e aplica apenas uma lei para todos os casos de indisciplina, o grupo se desestrutura e os

vínculos são enfraquecidos, uma vez que há discordâncias em relação às regras. Uma

disciplina homogênea está condenada ao fracasso, pois as regras do jogo já não são mais as

mesmas do passado, quando a dinâmica escolar exige dos educadores o conhecimento da

história de vida de seus estudantes.

Uma regra como instrumento disciplinador legitima-se de formas diferentes, uma vez

que, ela “[...] pode, entre outras funções, expressar a ideia de um regulamento tácito ou

explicitamente formulado, através de proibições, exigências e permissões [...]; pode expressar

instruções [...] ou, ainda preceitos morais e religiosos que visam guiar a ação de um

indivíduo”. (CARVALHO, 1994, p.134). O autor ainda revela outros sentidos das regras e sua

relação com disciplina, quando expõe que elas “[...] não são só reguladoras (no sentido de

permitir, proibir, facultar), mas também constitutivas, no sentido de que a sua existência é que

possibilita a criação [...]” (IDEM, p. 136).

Ainda consoante Carvalho (pp. 136-137),

Assim, ao dar regras e transmitir uma disciplina, o professor não impede o aluno de criar; ao contrário, possibilita a criação. Se as regras fossem sempre e exclusivamente regulamentadoras, talvez esse impedimento fosse verdadeiro, mas, como vimos, elas também são constitutivas. Como no futebol, se não existissem regras constitutivas não haveria partidas, nem craques, nem jogadas criativas [...]. Se disciplina é um prática social, ter disciplina para realizar algo não significa ser disciplinado para tudo. As exigências de procedimentos, regras e métodos de uma prática não se dissociam dos objetivos e conteúdos da mesma. Nesse sentido, disciplina escolar não se identifica com uma boa ordem, mas com práticas que exigem diversas disposições e diferentes tipos de exigência.

Percebemos a importância da regra, porém, na escola, ela é questionada e

visivelmente rebatida pelos sujeitos que a ela estão submetidos: “por que não posso sair mais

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cedo?”. (Estudante B); “não gosto de usar esta farda, por mim não tinha ela”. (Estudante C);

“eu não vou fazer este trabalho”. (Estudante D). Mesmo a escola disciplinando por meio das

regras, tais como cumprir com o horário, usar a farda, realizar as tarefas, dentre outras, muitos

estudantes não estão “disciplinados” a todo tempo e não concordam com toda regra. Assim,

evidenciamos nas falas dos estudantes a importância da escola pensar seu modo de

organização, pois os jovens, ao passo que interpelam as normas, expressam seus sentimentos

por meio de outros modelos de sociabilidades na escola.

Como preconiza Passos (1994, p. 126), analisar a indisciplina na sala de aula envolve

inúmeros aspectos, a saber: “[...] estruturas de poder na escola, as pressões e expectativas dos

pais, as concepções dos professores em relação à construção dos conhecimentos, e outros”. É

com esse sentido que abordamos a concepção dos professores acerca da indisciplina.

Na compreensão de Carvalho (1994, p. 134),

A ação disciplinada é frequentemente um saber-fazer e não um saber proposicional; é um tipo de ação e não a posse de um discurso. Transferindo-se estas ideias para uma sala de aula, a disciplina não necessariamente precede de forma discursiva o trabalho, mas concretiza-se em um trabalho. Assim ela nem sempre implica a clareza de regras de comportamento apresentadas verbalmente, mas sempre implica a clareza de meios e objetivos para um trabalho. Tanto o trabalho do professor, que é o ensino, como o do aluno, que é a aprendizagem, só são possíveis porque há uma ação em alguma medida metódica e regrada, portanto, disciplinada, mesmo que permeada por comportamentos que não sejam imediatamente identificados com a boa ordem.

Deste modo, a ação disciplinadora implica no ato concreto de regras bem definidas e

compartilhadas com os estudantes, especialmente se cada sujeito da relação ensino e

aprendizagem sabe e tem ciência de seus direitos e deveres. Do contrário, se as normas forem

impostas, certamente seu resultado será a indisciplina.

Carvalho (1994) demonstrou claras indicações de que esse aspecto para a

organização sistêmica da sala, especialmente para o trabalho instrucional, é meramente

ilustrativo, pois se os acordos estão firmados, as regras e os métodos são de conhecimentos de

todos, e uma vez ou outra, os comportamentos não se harmonizam com a boa ordem (para os

olhares dos que estão de fora), isso não pode ser classificado como ato de indisciplina, mas

desordem natural, cuja estrutura não se isenta de aprendizagem.

Ao descrever a relação entre indisciplina e violência, analisamos o binômio com suas

inter-relações e subjetividades; enquanto a violência, segundo Guimarães (1994), é dinâmica,

ambígua, histórico-social, intensa, quando experenciada coletivamente, a indisciplina se

configura com inúmeras formas de conflitos, resistente à submissão, expressando-se por meio

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de depredações, zombarias, risos, ironia etc. E, considerando que o espaço delas seja a escola,

segundo o autor, na escola, há um movimento dúbio: por um lado, existem ações que visam

manter a ordem, o cumprimento das regras, das normas estabelecidas pelo sistema; de outro,

pela dinâmica dos grupos internos, suas interações, rupturas, trocas e conflitos.

A sala de aula é um espaço de confusas relações, especialmente porque, dentro dela,

se manifestam inúmeras identidades e, à proporção que o professor não percebe esse

dinamismo plural, tende a centralizar os conflitos nele mesmo ou em alguns estudantes. Como

diz Colombier (1989), citado por Guimarães (1994, p. 79), quando não há a capacidade de o

professor retornar os conflitos para a coletividade, configura-se aí uma áspera divisão entre

dois grupos, os que impõem e os que obedecem e se amotinam.

Guimarães (1994) ainda reforça o entrave que se percebe nos papéis desempenhados

pelos estudantes e professores, nos quais é nítido o posicionamento contrário e ambíguo de

um lado, os estudantes que buscam manter uma postura subversiva, quanto maior for a

repressão dos professores, ou do sistema, para garantir assim a força do grupo; de outra parte,

os professores e/ou o sistema buscam a manutenção da ordem, das normas, não reconhecendo

a pluralidade dos estudantes, o que, de modo geral, opera contrário às inúmeras forças e o

resultado dessas interações tende a produzir tensões.

De maneira geral, a ação indisciplinar na escola é uma consequente negação às

normas da convivência social, em que a subjetividade suplanta as regras socialmente

constituídas. Cada sujeito da escola, no entanto, quando supera a fase heteronômica e busca

constantemente ser autônomo, possibilita espaços de diálogos, respeito e solidariedade.

Quando se opera de maneira anômica, negando as regras, o efeito são os conflitos de ideias, a

violência. Essa violência, no entanto, por vezes é nascida na própria escola, em virtude da sua

visão pouco holística para um mundo com diversidades, cujas repressões a cada dia é mais

ocorrente a cada momento de reivindicações. A indisciplina e a violência coexistirão no

espaço escolar, mas dependerá muito do olhar da escola para que elas se fortaleçam ou sejam

amenizadas.

3.4 Juventudes e violências na escola

Os jovens da escola, como quaisquer outros da sociedade atual, têm aspirações

relativas ao acesso ao mercado de trabalho. Consideram a escola, sobretudo, como fonte dos

afetos, ainda que alguns reforcem a noção de que a escola é um lugar de aprendizagem, eles

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são questionadores e nem sempre aceitam as imposições da escola. Esses jovens são pessoas

que vivem na moda (estilo próprio deles e cada um à sua maneira), estão sempre com amigos

à sua volta, conectados a todo instante. Por fim, têm linguagem própria para se comunicarem

entre si, constituindo um léxico à parte, por meio de gírias e demais símbolos.

Para compreendermos a juventude, tomamos como base a ideia de Pais (2003), de

que é fundamental não analisarmos somente as similitudes deste grupo, mas também suas

divergências. Sob esta perspectiva de análise, o autor nos alerta para a ideia de que não é

porque alguns sentimentos são comuns a estes que podemos qualificá-los como grupo

homogêneo.

Referido autor reporta-se a duas correntes teóricas sobre a juventude: a primeira é

nomeada de teoria geracional – criticada pelo fato de entender a juventude de modo

homogêneo e relacionar esta categoria a uma determinada faixa etária; a segunda é conhecida

como teoria classista – compreende a reprodução social de acordo com o gênero, raça ou

etnia, ou seja, com base nas expectativas das classes sociais a que os jovens pertencem.

Concernente a esta última corrente, Pais (2003) assinala que os processos sociais vivenciados

pelos jovens devem ser pensados com origem nas relações sociais, em suas trajetórias

individuais e experiências de vida que cada um experimenta e carrega.

Em relação à faixa etária, Pinheiro et al (2012, p. 43) demarcam que “existem

divergências na identificação da categoria juventude”. Para os autores, o recorte etário “por

um lado, introduz uma referência concreta, por outro, não permite superar o problema da

caracterização do conceito de juventude”; ou seja, a palavra juventude admite conotações

distintas e suscetíveis de serem distinguidas de acordo com os interesses da área em estudo.

No entendimento de Pais (2003), as culturas juvenis compreendem tanto aspectos

etários, como classistas ou geracionais, formando um verdadeiro paradoxo. Assim, o uso

isolado de uma das correntes é insuficiente para uma análise da categoria juventude. Deste

modo, é a nós proposto articular as duas correntes para percebermos a juventude de modo

mais amplo.

O recorte que Pais (2003) estabeleceu sobre a juventude dá conta, no entanto, de um

equívoco muito comum que cometemos, quando categorizamos os jovens com características

comuns em virtude da geração a que pertencem, ou seja, que todos portam as mesmas

condições: revolucionários, questionadores, críticos, libertinos, distraídos e preguiçosos; no

entanto, cada um deles demonstra um modo diferente de ser e de estar na escola, constituindo

suas formas de ver o mundo.

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Deste modo, constatamos no campo da pesquisa as maneiras dos jovens se

relacionarem e se estruturarem em microgrupos, estabelecendo modelos de interação: a)

grupos de jovens de mesmo gênero – meninos/meninos e meninas/meninas; b) grupos

heterogêneos menos visíveis (meninas/homossexuais; casais de namorados; jovens especiais);

c) grupos de jovens estudiosos (meninos ou meninas); d) os rotulados como rebeldes; e) as

“patricinhas” e/ou “mauricinhos”. Assim, no cotidiano escolar, esses microgrupos, direta ou

indiretamente, se tornam (co) autores ou vítimas das práticas tidas como violentas, ora

classificadas como violência na escola, à escola e da escola.

É importante destacar algumas percepções dos estudantes da escola pesquisada: “eu

não sei muito bem o que vou fazer depois que terminar meus estudos”. (Estudante A); “queria

mesmo era trabalhar, a gente precisa de dinheiro, né?. (Estudante B); “acho importante

estudar, mas estou indecisa no que quero [...] têm muitas profissões, ainda não sei se vou

conseguir, as vezes acho difícil”. (Estudante C).

No raciocínio de Marinho (2010), os jovens passam por momentos de inseguranças e

dúvidas, de inquietações ante o presente e o futuro e, ao passo que estabelecem laços de

dependência, lutam por sua independência. Nesta circunstância, a escola pode realizar

trabalho de orientação acadêmica, profissional e de formação cidadã, na perspectiva de

elucidar algumas questões que afetam seus protagonistas.

Como examinado anteriormente, percebemos que os jovens da escola passam por

alguns conflitos internos próprios da sua idade. São sentimentos de insegurança com relação à

própria puberdade, ao primeiro namorado, medo de não ser aceito em determinado grupo;

expectativas incertas em relação ao exame vestibular, o que pensam e esperam sobre o futuro

e, especialmente, se irão superar as expectativas da família e da sociedade.

A escola investigada demonstra trabalhar a juventude, incluindo-a nos espaços de

decisão. O grêmio estudantil é um exemplo claro de que o jovem, ao participar de debates,

discussões e formações, começa a incorporar o protagonismo juvenil, em associação a outras

ações; atividades como eventos culturais (oficinas de arte, peças teatrais, gincanas etc.) que a

escola também realiza visando desenvolver e potencializar a participação juvenil.

Concordamos com Dayrell (2007, p 1107) ao preconizar a ideia de que, “quando o

ser humano passa a se colocar novas interrogações, a pedagogia e a escola também têm de se

interrogar de forma diferente”, ou seja, “cabe questionar em que medida a escola ‘faz’ a

juventude”, pensar como esta lida com as tensões e dúvidas vivenciadas pelos jovens. Assim,

constituir uma pedagogia mais participativa – com os jovens e para os jovens – é atitude que

merece atenção, haja vista seu caráter democrático e cidadão.

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No que tange à condição juvenil no Brasil, mencionado autor alega que,

Inicialmente, é importante situar o lugar social desses jovens, o que vai determinar, em parte, os limites e as possibilidades com os quais constroem uma determinada condição juvenil. Podemos constatar que a vivência da juventude nas camadas populares é dura e difícil: os jovens enfrentam desafios consideráveis. Ao lado da sua condição como jovens, alia-se a da pobreza, numa dupla condição que interfere diretamente na trajetória de vida e nas possibilidades e sentidos que assumem a vivência juvenil. Um grande desafio cotidiano é a garantia da própria sobrevivência, numa tensão constante entre a busca de gratificação imediata e um possível projeto de futuro. (Pp. 1108-1109).

Nesta perspectiva, Dayrell (2007 p. 1109) assegura que “para os jovens, a escola e o

trabalho são projetos que se superpõem ou poderão sofrer ênfases diversas”, de acordo com o

estádio de vida e as condições sociais que lhes permitam viver a condição juvenil, ou seja, as

condições políticas, econômicas e sociais se tornam preponderantes na formação de espaços

juvenis.

A inserção dos jovens no campo escolar e profissional são aspectos fundamentais à

vida social destes agentes, visto que possibilitam momentos de lazer, comunicação,

sociabilidades, encontros e desencontros, afetos e desafetos etc. Os jovens, no entanto, com

seus modos de ser e estar nos espaços, constituem características e singularidades comuns ou

não ao grupo a que pertencem. Na escola – campo pesquisado – uns se destacam pelo estilo,

adereços e dialetos que utilizam, enquanto outros pelo próprio jeito de se manifestar no grupo,

o liderando ou não. Deste modo, a cultura juvenil é expressa de várias maneiras, seja nos

ambientes públicos, seja no âmbito privado. No tocante ao cenário escolar, Dubet (2006, p. 9)

assinala que “há alguns anos a escola parece em crise. As situações escolares se

desestabilizaram. Observam-se a ascensão e a entrada dos problemas sociais no quadro da

escola. A violência, a incivilidade e o racismo são as manifestações mais visíveis desses

problemas”.

Embora concordemos com o autor, na ideia de que a escola esteja sendo desafiada

com os problemas de fora dela, de ordens diversas (econômico, sociais, culturais e políticas),

ela se mostra aberta para acolher todos os sujeitos da comunidade escolar que dela precisem.

Percebemos que a escola objeto deste estudo busca constantemente integrar família e escola,

mostrando que a responsabilidade de ensinar e educar os seus alunos não é tarefa apenas dela.

Muitas escolas, atualmente, sobretudo as de ensino público, embora se configurem

como espaços de ações solidárias, são marcadas por práticas cotidianas de violência em suas

várias formas de manifestações. Na concepção de Charlot (2002), a violência extramuros da

escola adentra a porta da frente, mesmo sem pedir licença, dificultando a dinâmica escolar,

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por meio das rivalidades entre bairros, gangues, disputas territoriais e manifestações sociais

diversas. A escola é, por sua natureza, um espaço aberto, muito embora, também, para as

ameaças que estão em seu entorno.

Para o autor, essa prática violenta “se passa como se a violência na escola estivesse

convertendo-se em um fenômeno estrutural e não mais, acidental [...] depois de instalada nas

escolas [...], ela se estende hoje a outros estabelecimentos”. (IDEM, p. 434). Ele distingue a

violência no espaço escolar de três formas:

A violência na escola é aquela que se produz dentro do espaço escolar, sem estar ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando um bando entra na escola para acertar conta das disputas que são as do bairro, a escola é apenas o lugar de uma violência que teria podido acontecer em qualquer outro lugar. A violência à escola está ligada à natureza e às atividades da instituição escolar: quando os alunos provocam incêndios, batem nos professores ou os insultam, eles se entregam a violência que visam diretamente à instituição e aqueles que a representam. Essa violência contra a escola deve ser analisada junto à violência da escola: uma violência institucional, simbólica, que os próprios jovens suportam através da maneira como a instituição e seus agentes os tratam – modos de composição da classe, de atribuição de notas, de orientação, palavras desdenhosas dos adultos, atos considerados pelos alunos como injustos ou racistas [...] (idem, p. 434-435).

Charlot (2002) ainda explica que, quando a escola não possui dispositivos de

controle em face da violência na escola, ela se encontrará vulnerável à violência à escola e da

escola. E revela que, historicamente, a violência na escola não é um fenômeno novo, pois as

relações entre alunos eram com frequência tensas nas instituições de ensino em meados dos

anos de 1850 ou 1860. Ela adquire, contudo, formas que, estas sim, são novas.

De acordo com as três formas de violência ora reveladas, notamos que a escola, ao

passo que sofre violência, gera violência. Neste contexto, a violência é protagonizada por

todos os que constituem a escola e passa a fazer parte integrante desse espaço.

Destacamos o fato de que, dos três tipos de violência (violência na escola, da escola

e à escola) ora citadas, as duas últimas ocorrem na escola pesquisada, por exemplo – violência

à escola: constatamos práticas dos estudantes que danificavam o patrimônio público: riscando

paredes e desenhando imagens obscenas nos banheiros; quebrando carteiras etc.; insultos a

colegas e professores, entre outras práticas. Em relação à violência da escola: no momento

que os professores estabeleciam suas decisões; o currículo fechado para as necessidades dos

estudantes; as rotulações de professores e gestores; o sistema de avaliação, por vezes injusto e

arcaico etc. Em relação aos tipos acima, discutiremos com melhor propriedade no próximo

capítulo.

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Salientamos que a violência surge e sobrevive na sociedade, em um contexto social

em que, visivelmente, regras, disciplinas e valores estão sob profundos rebatimentos e

questionamentos, revelando, aí, possivelmente, o enfraquecimento do monopólio legítimo da

força e da violência pelo Estado, bem assim o conjunto de suas instituições a elas creditado,

socialmente, ao longo da história contemporânea (ELIAS, 1993; WEBER, 1979).

É importante, também, ressaltar a violência simbólica, pois, conforme Pierre

Bourdieu (2012), o ato pedagógico é estruturado e arbitrariamente imposto pela cultura

dominante de um grupo em relação a outro. Este tipo de violência se mostra de forma velada,

tornando menos perceptível, mas que afeta os agentes escolares.

Não devemos recordar somente os atos violentos praticados pelos estudantes, mas

também o poder da ação pedagógica de impor ao imaginário dos agentes escolares que seus

conteúdos, metodologias e avaliações são importantes e que devem ser transmitidos. Nesta

condição, a escola reproduz e mantém a violência simbólica. Deste modo, as relações no

âmbito escolar são permeadas de um poder invisível que só pode ser exercido com a

cumplicidade daqueles que estão sujeitos a esse poder ou mesmo daqueles que o exercem,

configurando-se, deste modo, a eficácia do poder simbólico (BOURDIEU, 2012). Para o sociólogo francês, o poder simbólico constitui uma dada realidade que

estabelece uma ordem de conformidade do sujeito com relação ao mundo social, isto é, a

existência de violência simbólica na escola perpassa o consentimento de suas normas e regras

pela comunidade escolar, que não se dá conta das imposições, naturalizadas com o tempo e no

espaço escolar.

3.5 Políticas públicas: ações de prevenção e enfrentamento à violência na escola

É consensual e contraditório o fato de escutarmos dizer que na escola acontecem atos

de violência (brigas, xingamentos, empurrões, bullying etc.), haja vista a ideia de que no

espaço da escola é onde as pessoas estão para estudar, aprender, brincar, ler e escrever. Como,

porém, a escola é um campo de relações sociais, onde diversas são as maneiras de

sociabilidades, ora pacíficas, ora conflituosas, ela passa a ser palco também de conflitos de

toda natureza, demonstrados pelas formas das relações de poder.

Na escola observada, os conflitos visualizados pareciam ser quase naturais, como se

sem eles a sociedade estudantil não sobreviveria – dos empurra-empurras no momento do

lanche, do desrespeito na fila, dos apelidos postos e impostos abruptamente nas pessoas e

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brigas entre estudantes. Essa realidade era frequente antes de a escola tomar uma medida para

amenizar as situações diárias de violência; medida esta que resultou na formulação,

implantação e implementação do Projeto Bullying: educar para a paz.

Este projeto de prevenção da violência escolar objetivava prevenir e reduzir as

práticas individuais e coletivas de violência dentro da escola, que envolvessem estudantes,

professores, funcionários e gestores. Após o período de sua implementação, evidenciamos

resultados positivos, como: a redução de agressões físicas e verbais entre os sujeitos da

escola, razão por que surgiram as inquietações desta pesquisa acadêmica.

Ante a realidade em que a escola é sujeita a vivenciar, podemos assinalar que esses

conflitos violentos ocorrentes em seu espaço força o Ministério da Educação-MEC (em

especial mediante programa e projetos de suas secretarias), as organizações não

governamentais – ONG, e a sociedade civil a se organizarem em torno de programas e

projetos de prevenção à violência na escola. Quando nos referimos à organização dessas

instituições, apontamos para a formulação de políticas públicas voltadas para esta demanda

social, que pressupomos ser contemporânea, embora secular.

Dados da UNESCO, de 1996 (Relatório da Comissão Internacional sobre Educação

para o século XXI) onde se formularam os fundamentos conceituais dos quatros pilares da

educação – aprender a conhecer, aprender a fazer, aprender a viver juntos e aprender a ser,

nos mostram que já havia intenção mundial, no final do século XX, para a prevenção da

violência e da busca pela paz nas escolas. Foi por via deste relatório que o Ministério da

Educação do Brasil, dois anos depois, publicou os Parâmetros Curriculares Nacionais –

PCN’s 19 , trazendo os quatros pilares da Educação como recomendação pedagógica,

especialmente aprender a viver juntos como proposta sobre o respeito às diferenças, a

prevenção da violência e a resolução de conflitos.

[...] que aprender a viver com os outros, que consiste em desenvolver a compreensão do outro e a percepção das interdependências, na realização de projetos comuns, preparando-se para gerir conflitos, fortalecendo sua identidade e respeitando a dos outros, respeitando valores de pluralismo, de compreensão mútua e de busca da paz. (BRASIL, 1998, p.17)

Para redução da violência escolar no âmbito nacional, após mais de uma década da

publicação dos PCN’s, o MEC lançou alguns programas e projetos - A Escola que Protege e

19 São referenciais que norteiam o trabalho de planejamento educacional em diversos âmbitos, visando a uma uniformidade curricular, aquilo que é necessário cada aluno aprender em determinado período escolar para exercício de sua cidadania.

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Escola Aberta. O primeiro é voltado para a promoção e a defesa dos direitos de crianças e

adolescentes, além do enfrentamento e prevenção das violências no contexto escolar. Ele

apoia projeto de instituições superiores20 e a confecção de materiais didáticos para serem

realizados trabalhos na escola. Além disso, prevê a criação de uma Comissão Gestora Local, a

fim de que discuta e debata junto aos sistemas de ensino para definição de um fluxo de

notificação e encaminhamento das situações de violência identificadas ou vivenciadas na

escola, junto à Rede de Proteção Social.

Referindo-nos ao relato do Projeto Escola que Protege, em especial sobre a sua

atuação dos municípios cearenses, em General Sampaio, foi observado, segundo dados da

Secretaria de Educação, que a Comissão Gestora Local de Notificação e Encaminhamento das

Situações de Violência na Escola foi formada em 2012, no entanto, se verificou sua pouca ou

nenhuma atuação – se havia casos de violência na escola, não eram notificados e

encaminhados, portanto, a Comissão era inativa.

O segundo programa, Escola Aberta21, visa à abertura da escola nos fins de semana

para a comunidade local usar seus espaços em diversas atividades. Elas são organizadas no

formato de oficinas, palestras e cursos, envolvendo estudantes, jovens, crianças, adultos, pais,

responsáveis e idosos. Ressaltamos que este programa potencializa a parceria entre escola e

comunidade, especialmente em territórios de vulnerabilidade social. Vale ressaltar que o

programa funciona em todos os estados do Brasil em mais de 2000 escolas em

2010/2011(Portal MEC), no entanto, no Município da escola investigada não se tem noticia

de escolas que faça parte do programa.

O Programa Saúde na Escola (PSE)22 é outra política pública que merece nosso

destaque, pois está nas escolas de todo o País, inclusive nas municipais, também

implementado pelo MEC. Suas atividades são realizadas por meio de projetos didáticos, com 20 A Universidade Federal do Ceará – UFC recebeu recursos do MEC em 2009 para desenvolver ações do Projeto. 21 O programa é coordenado pela Secretaria de Educação Básica (SEB/MEC) e conta com a cooperação técnica da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura – UNESCO. Sua operacionalização é feita por meio do Programa Dinheiro Direto na Escola para o Funcionamento das Escolas nos Finais de Semana (PDDE/FEFS), do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE). Fonte: < http://portal.mec.gov.br/> 22 Visa à integração e articulação permanente da educação e da saúde, proporcionando melhoria da qualidade de vida da população brasileira. Tem como objetivo contribuir para a formação integral dos estudantes por meio de ações de promoção, prevenção e atenção à saúde, com vistas ao enfrentamento das vulnerabilidades que comprometem o pleno desenvolvimento de crianças e jovens da rede pública de ensino. O público beneficiário do PSE são os estudantes da Educação Básica, gestores e profissionais de educação e saúde, comunidade escolar e, de forma mais amplificada, estudantes da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica e da Educação de Jovens e Adultos (EJA). A Escola é a área institucional privilegiada deste encontro da educação e da saúde: espaço para a convivência social e para o estabelecimento de relações favoráveis à promoção da saúde pelo viés de uma Educação Integral. Fonte: http://portal.mec.gov.br/ /index.php?option=com_content&id=14578:programa-saude-nas-escolas&Itemid=817

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um direcionamento para temas atuais e específicos, como é o caso do assunto tratado em um

dos projetos - Escola que Protege: enfrentando a violência contra crianças; e o outro - A

escola faz diferença? Um estudo da produção discursiva das homossexualidades por

professores de Ensino Médio. Percebemos que há intenção favorável para que o trabalho de

combate às diversas formas de violências seja executado. Observamos, entretanto, no

contexto local da escola pesquisada, que o referido programa é realizado, mas com atividades

contigentes, necessitando da sistematização de suas ações.

O sucesso dessas iniciativas parece estar ligado prioritariamente à possibilidade de o corpo de funcionários das escolas conseguir, a despeito das dificuldades, articular suas ações no desenvolvimento das diferentes iniciativas públicas, traduzindo-as para a sua própria realidade. Assim, a capacidade que as escolas mostraram de integrar as iniciativas ao seu projeto pedagógico e, consequentemente, às suas práticas cotidianas, promovendo a adoção de posturas mais democráticas e alcançando um grau satisfatório de envolvimento dos diferentes profissionais da escola e também da comunidade, contribuiu para que os projetos pudessem obter bons resultados na melhoria da convivência escolar e diminuição dos atos de violência. (RUOTTI, 2006, pp.223-224).

À vista disso, percebemos que, quando não há uma política pública que combata os

problemas que afligem a escola, os sujeitos que nela atuam (professores, estudantes, pais,

gestores etc.) buscam, por meio de projetos, combater ou pelo menos amenizar as demandas

problemáticas, tendo como principal desejo a mudança da realidade que afeta o ensino-

aprendizagem, bem como as relações sociais ali estabelecidas.

As políticas públicas de combate e prevenção à violência na escola, ainda que sejam

incipientes, algumas práticas, como as citadas, demonstram sua aparente necessidade para o

exercício da cidadania de crianças, adolescentes e adultos. As práticas governamentais foram

melhorando após a edição da Declaração Educação Para Todos - Declaração de

Cochabamba,23 de 2001, pela qual foi possível definir melhor diretrizes político-educacionais

para o enfrentamento da violência no espaço escolar.

Pressupomos que, das crianças e adolescentes que se envolvem com brigas, drogas,

ameaças etc., muitos necessitam de acolhimento, primeiro da família, segundo da escola.

Fazer política pública para a educação é antes de tudo diagnosticar seu público, o objetivo a

ser alcançado, e de forma abrangente, e priorizar tempos: de implementação, execução e

avaliação, como preconiza Souza (2006, p. 36-37):

23 Declaração aprovada durante a VII Sessão do Comitê Intergovernamental Regional do Projeto Principal para a Educação(PROMEDLAC VII), realizada em Cochabamba, Bolívia, de 5 a 7 de março de 2001, com o concurso dos ministros de Educação da América Latina e do Caribe.

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A política pública permite distinguir entre o que o governo pretende fazer e o que, de fato, faz; [...] envolve vários atores e níveis de decisão, embora seja materializada através dos governos, e não necessariamente se restringe a participantes formais, já que os informais são também importantes; [...] é abrangente e não se limita a leis e regras; [...] é uma ação intencional, com objetivos a serem alcançados; [...] embora tenha impactos no curto prazo, é uma política de longo prazo. A política pública envolve processos subsequentes após sua decisão e proposição, ou seja, implica também implementação, execução e avaliação.

Assim, para a autora, uma política pública bem-intencionada deve se comportar de

maneira tal que seus criadores façam a escolha certa, em relação ao que precisa ser feito,

obedecendo as regras, às instituições, visando ao bem comum, e, acima de tudo, tenha em

mente sua eficiência, com base no acompanhamento e avaliação.

Ressaltamos ainda que, no Brasil, nos anos 1980, quando o problema da violência

nas escolas passou a se constituir no cenário nacional, os debates acerca das políticas públicas

voltadas para esta demanda passaram a fazer parte da pauta governamental. Especialmente,

quando se buscou abrir espaços de participação dos diversos agentes sociais na escola,

propondo a democratização da gestão interna da escola e a abertura dos seus espaços nos fins

de semana, para a comunidade interagir nas atividades esportivas, culturais e de lazer, como

descrevem Gonçalves e Sposito (2002), citados em Ruotti (2006). Nos anos 1990, a violência

escolar perdeu o foco para as questões de segurança pública, uma vez que muitas cidades

brasileiras passam a sofrer com a insegurança, tendo em vista o crescimento do crime

organizado.

Atualmente traz-se à pauta, na formulação das políticas públicas, a inclusão do

neoinstitucionalismo (a participação das instituições/regras) para decidir, formular e

implementar essas políticas. O debate acerca dessa nova forma de fazer política sucede pelo

simples fato de que uma política pública requer intenção pública para a coletividade. Dessa

forma, as instituições moldam as escolhas dos decisores políticos, tanto quanto a história do

País. Uma forma de fazer democracia, de fazer todos, o bem comum, pois uma política

pública deve estar

[...] integrada dentro do conjunto de políticas governamentais e constitui uma contribuição setorial para a busca do bem-estar coletivo [...] As políticas públicas são influenciadas, a partir da sua incorporação ao elenco de ações setoriais do governo, pelas contingências que afetam a dinâmica estatal e pelas modificações que a teoria sofre como consequência. É por isso que, no começo, estão impregnadas pelas ideias vigentes em matéria de planejamento: fixação de metas quantitativas pelos organismos centrais de planejamento, geralmente dominados por técnicos mais ou menos esclarecidos; subordinação de toda a vida social ao crescimento econômico; determinação do futuro com base em projeções das tendências do passado. (SARAIVA E FERRAREZI, 2006, p.35).

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Embora destaquem esses autores que a racionalidade técnica está no cerne da

formulação de uma política pública, e que sua influência determine a tomada de decisão, o

que de fato influencia uma política é “[...] o poder político dos diferentes setores da vida

social e sua capacidade de articulação dentro do sistema político são os que realmente

determinam as prioridades” (IBID). Ou seja, quando os programas e projetos chegam às

escolas, inclusive os que têm como estratégias prevenir e combater a violência escolar, eles

têm contribuição importante de pais, professores, gestores e estudantes, na formulação do

plano de ação, execução e avaliação.

Para subsidiar a elaboração das políticas públicas voltadas para o enfrentamento da

violência, é importante observarmos os dados estatísticos que as pesquisas sobre esta temática

nos revelam. Estudos realizados pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a

Ciência e a Cultura – UNESCO, com jovens de cidades brasileiras (Brasília, Fortaleza,

Curitiba, Rio de Janeiro), constataram que, aproximadamente, 60% dos jovens na faixa etária

de 14 a 19 anos foram vítimas de algum tipo de violência nas unidades escolares, nos últimos

anos (WAISELFISZ; MACIEL, 2003). Nesta mesma perspectiva (da violência que vitima a

juventude), o Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (CEBELA) e a Faculdade

Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO) divulgam o Mapa da Violência 201424.

Constatamos a incidência crescente de violência na qual, ao mesmo tempo em que os jovens

são vítimas, se tornam protagonistas; exigindo constantemente análises, atitudes mais

objetivas e também responsáveis no que relacionado às questões da violência e da elaboração

de políticas públicas em atenção a este contexto.

Devine (2002) assinala que, quando a pessoa é vista como o foco, motivo e causa

principal da violência, são lançados programas e projetos sociais que têm como objetivo

solucionar o problema da violência. Desse modo, a prevenção da violência se restringe a

identificar, analisar e escolher “programas promissores” voltados para menores infratores e

jovens que praticam atos violentos. Especialmente no que se refere às políticas públicas de

combate a violência na escola em alguns países, Ruotti (2006, p.212) comenta:

De forma geral, os programas de prevenção da violência escolar que vêm sendo desenvolvidos nos diferentes países estão baseados em duas concepções de

24 Os homicídios são hoje a principal causa de morte de jovens de 15 a 29 anos no Brasil, e atingem especialmente negros do sexo masculino, moradores das periferias e áreas metropolitanas dos centros urbanos. Dados do SIM/Datasus do Ministério da Saúde mostram que mais da metade dos 56.337 mortos por homicídios, em 2012, no Brasil, eram jovens (30.072, equivalente a 53,37%), dos quais 77,0% negros (pretos e pardos) e 93,30% do sexo masculino. (Texto retirado do Mapa da Violência lançado no ano de 2014).

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violência: aqueles que têm como embasamento uma abordagem focada no indivíduo, em que a preocupação está em apreender os possíveis fatores de risco (família desfeita, baixa inteligência, baixa condição econômica, desempenho escolar insatisfatório, colegas delinquentes, etc.) que afetariam os alunos, causando comportamentos violentos – uma vez identificados esses fatores de risco, os programas teriam como objetivo propiciar fatores de proteção; e aqueles que privilegiam um enfoque estrutural, colocando em relevo as configurações sociais e institucionais causadoras da violência.

O exame da autora nos permite duas reflexões: será que as políticas públicas para

prevenção da violência devem estar voltadas aos fatores de riscos, inclusive o próprio

adolescente que possivelmente pode vir a ser uma pessoa violenta? A violência é fruto das

configurações sociais e organização de instituições que podem causar ações violentas?

Segundo Ruotti (2006), nem a pessoa nem as instituições são as causadora da violência, mas é

preciso que o trabalho de prevenção seja realizado e voltado para a melhoria das instituições e

não culpando as pessoas. Enfim, as políticas públicas no âmbito de combate e prevenção à

violência têm um longo caminho a ser percorrido para que cheguem de fato até a escola e

surtam efeito.

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4 OS AGENTES ESCOLARES: CENÁRIOS, VOZES E CONCEPÇÕES

Verificamos que as percepções da violência sob a óptica dos agentes escolares são

mais bem compreendidas no cotidiano escolar. Assim sendo, em nossa investigação empírica,

buscamos captar as concepções sobre a violência na escola e o conjunto das narrativas locais a

respeito do fenômeno.

O trabalho de interpretação de dados, que se traduz numa redução fenomenológica e,

consequentemente, em reflexão imaginativa como operações cognitivas, é enumerado por

Macedo (2010, p.139) como:

[...] distinção do fenômeno em elementos significativos; exame minucioso desses elementos; codificação dos elementos examinados; reagrupamento dos elementos por noções subsunçoras; sistematização textual do conjunto; produção de uma metanálise ou de uma nova interpretação do fenômeno estudado.

Para auxiliarmos nas análises concernentes às perspectivas que conceituam a

violência escolar, utilizamos o software IRAMUTEQ,25 que contribuiu para a análise de

conteúdo. Esse programa foi desenvolvido por Pierre Ratinaud, no ano de 2009. Mencionado

software possibilita cinco tipos de análises sobre corpus textuais26.

Utilizamos nesta pesquisa apenas dois tipos de análises: a de similitude de palavras

do texto e a nuvem de palavras. Estas duas proporcionaram a visualização das palavras mais

frequentes, as relações e proximidades dos termos utilizados pelos agentes escolares, o que

possibilitou evidenciarmos os termos mais ligados às categorias analíticas e, sobretudo,

aqueles que conceituavam a violência na escola.

25 O software IRAMUTEQ é um programa informático gratuito que se ancora no software R (disponível no site www.r-project.org), permitindo formas de análises estatísticas sobre corpus textuais e tabelas de indivíduos por palavras, consoante Camargo e Justo (2013). 26 O corpus é constituído pelo pesquisador. É o conjunto de textos que se pretende analisar. São cinco tipos de análises que o programa dispõe: I) Análises lexicográficas clássicas – Identifica e reformata as unidades de texto, identifica a quantidade de palavras, frequência média e hapax (palavras com frequência um), pesquisa o vocabulário e reduz das palavras com base em suas raízes (formas reduzidas), cria do dicionário de formas reduzidas, identifica formas ativas e suplementares. II) Especificidades –Associa textos com variáveis, ou seja, possibilita a análise da produção textual em função das variáveis de caracterização. III) Método da Classificação Hierárquica Descendente (CHD) – A partir de matrizes cruzando segmentos de textos e palavras (em repetidos testes do tipo X2), aplica-se o método de CHD e obtém-se uma classificação estável e definitiva. A partir dessas análises em matrizes o software organiza a análise dos dados em um dendograma da CHD, que ilustra as relações entre as classes. IV) Análise de similitude – Esse tipo de análise baseia-se na teoria dos grafos e é utilizada frequentemente por pesquisadores das representações sociais (cognição social). Possibilita identificar as coocorrências entre as palavras e seu resultado traz indicações da conexidade entre as palavras, auxiliando na identificação da estrutura da representação. V) Nuvem de palavras – Agrupa as palavras e as organiza graficamente em função da sua frequência. É uma análise lexical mais simples, porém graficamente interessante.

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Salientamos que a análise do material colhido em campo não se resume aos

resultados oferecidos pelo software IRAMUTEQ, ou seja, este não é a técnica nem o método

utilizado para análise e, sim, uma ferramenta que subsidiou a análise dos dados. O emprego

do referido programa foi importante para demonstramos as falas dos interlocutores da

pesquisa por meio de análises estatísticas sobre corpus textuais bem como tabelas com

palavras e, assim, enriquecermos nossas análises respeitantes aos discursos dos principais

agentes entrevistados pela pesquisa.

Decidimos categorizar as falas dos entrevistados segundo o foco de observação: os

conceitos de violência e não violência na escola e as atitudes comportamentais caracterizadas

como violentas ou não violentas. As percepções da dinâmica escolar e as narrativas dos

agentes foram essenciais para definirmos as categorias analíticas.

Então, elaboramos as categorias a posteriori, ou seja, elas não estavam definidas,

mas surgiram perante os relatos das entrevistas e das conversas no cotidiano escolar. As

categorias reunidas foram: atos violentos, indisciplina e respeito. Com a análise destas,

compreendemos como os agentes escolares percebem a violência e as práticas de

sociabilidades concebidas como violentas.

Por meio das falas dos entrevistados, buscamos saber o que elas significam, o que

assinalam, justificam e até silenciam. Os ditos e não ditos revelaram os sentidos que os

agentes escolares atribuem à violência escolar. Ante as observações coletadas na EMEF José

Bezerra Filho, percebemos como o imaginário dos agentes escolares se perfaz sob um

universo de contradições e múltiplas percepções que concorrem para um espaço das disputas,

conflitos e práticas, muitas delas consideradas violentas.

O reconhecimento das práticas classificadas como violentas no campo pesquisado é

compreendido por professores, estudantes e gestores como atitudes de agressão verbal

(xingamentos, apelidos, ameaças etc.), de agressão física (brigas, murros, tapas etc.) e o

desrespeito, conforme os depoimentos dos entrevistados que classificam a violência na escola:

Aquilo que irá deixar uma outra pessoa com traumas e com raiva. Tipo as agressões como apelidos, brigas e xingamentos. (Aluno A) É um ato de irresponsabilidade. Agredir ou implicar sem motivos e zombar. A violência existe na escola através de maus entendidos, que gera conflitos fisicamente e verbalmente, são as confusões. (Aluno B) A violência é um problema que a cada dia cresce. É uma situação preocupante. Os conflitos só aumentam, as pessoas não se respeitam e acabam gerando violência, outros não se preparam e usam a violências pra roubar e matar. (Professor A) A partir do momento que um chama o outro de apelido e a pessoa não gosta já é uma forma de violência, é um falta de respeito. (Professor B) É toda e qualquer tipo de agressão, seja verbal ou física, xingamentos, brincadeiras de mau gosto, ofensas e apelidos. (Gestor A)

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É falta de respeito, aos mais velhos, a crenças, a intolerância. Como em todo sociedade ela também existe na escola. (Gestor B)

Percebemos que a violência é também confundida com os conflitos e que o respeito é

considerado como dispositivo importante para a não violência. A questão da violência aqui é

sentida por alguns como qualquer ato que afeta sua singularidade, já outros agentes percebem

a violência como atos contra a integridade física e também moral das pessoas. A violência

como ato humano é elemento peculiar à sociedade e manifesta-se de múltiplas formas, com

características e expressões de um grupo ou sujeito.

Ao conferirmos as falas há pouco reproduzidas com as ideias de Tavares dos Santos

(2002) sobre o seu entendimento a respeito da violência, podemos inferir que a violência se

configura como um dispositivo de controle, aberto e contínuo. Ela manifesta-se pelo uso da

força, coerção e dano em relação ao outro. Assim, a violência é uma relação social de excesso

de poder que impede o reconhecimento do outro sujeito, provocando algum tipo de dano,

como os que foram citados pelos entrevistados: falta de respeito, agressões físicas e verbais,

brigas etc.

Estes tipos de sociabilidades, segundo ainda Santos (2002), denuncia um estado de

conflitualidade que submete a risco a função social das escolas de socializar as novas

gerações. O que se percebe é a instituição escolar como um lugar de várias formas de

conflitos sociais.

Notamos na fala dos educadores o fato de que a relação familiar e a dificuldade dos

pais em lidar com situações do cotidiano são compreendidas como justificativa para o

comportamento “indisciplinado” de alguns estudantes. Não sabemos, porém, se, para estes

estudantes, a escola é importante, se ela se aproxima de suas necessidades ou se é algo muito

distante do seu pensamento. Neste âmbito de incertezas, podem estar pistas para uma “nova

escola”, ou seja, não “uma escola” a que segue um padrão de ensino e sim uma escola que

respeite as linguagens locais.

“Houve um tempo em que os pais preocupavam-se mais com a educação de seus

filhos”. Este discurso é sempre lembrado pelos professores e esta ideia parece provir do

discurso baseado no antigo modelo de ensino (conteudista, autoritário etc.) ainda vigente em

muitas escolas. Observando os diálogos entre educadores e os pais chamados à escola,

constatamos que ora a escola aponta a responsabilidade de educar para a família, ora a família

devolve o compromisso de ensinar para a escola. Neste jogo, no qual a função de ensinar e

educar são compreendidos de modos diferentes, se instauram tensões e conflitos cuja

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resolução encontrará resultados positivos na parceira entre família e escola – com fundamento

num trabalho participativo, democrático e solidário.

Como leciona Perrenoud (2000), a escolaridade obrigatória desde o século XX

privou os pais de seu poder educativo, e talvez seja neste ponto a razão de muito deles não

participarem efetivamente da vida escolar dos filhos, porque estes deixaram de pertencer à sua

família.

Indica o autor que o diálogo entre professores e pais se tornou desigual, porque a

visão, a competência formadora, a escolaridade e o trabalho educativo são totalmente

diferentes uns dos outros, com características diversas e por vezes sem diálogo e negociações.

A escola aponta que os pais não concedem muita importância às aprendizagens como

deveriam dar. Por isso, “[...] o diálogo com os pais é fácil de ser assumido na teoria, enquanto

na prática, quando inexiste a confiança e aparecem preconceitos [...]” (PERRENOUD, 2000,

p.112). Essas prenoções no espaço escolar podem, portanto, dificultar a ligação entre os pais e

a escola, e o que poderia se tornar parceria se transforma numa relação na qual pouco se

dialoga, raramente se pensa, reflete e elabora ideias conjuntas.

No que diz respeito ao modo de os estudantes se comportarem na sala de aula,

percebemos que, em 80% das salas 27 visitadas nos turnos manhã e tarde, os estudantes

costumam sentar-se em pares do mesmo sexo e outros isolados em suas carteiras.

Aparentemente, alguns demonstram interesse pelo ensino quando se dedicam às atividades e

explicações do professor, já outros parecem ter a necessidade de sempre interferir no trabalho

do professor, seja jogando bolinhas de papéis, pedindo frequentemente para ir ao bebedouro

ou banheiro, xingando os colegas e em muitos casos se dirigindo aos docentes e aos

funcionários com palavrões e ameaças.

Tais comportamentos caracterizam o tipo de sociabilidade próprio daquele grupo de

estudantes. É comum presenciarmos conversas paralelas entre os estudantes, especificamente

nas Classes de Aceleração28, conduta esta justificada pelos professores em virtude da falta de

motivação associada ao histórico escolar de repetência, evasão escolar, dificuldades no

aprendizado e ausência dos seus familiares da escola. Para os educadores, estes aspectos

corroboram os condicionantes, como a necessidade financeira e o desemprego, para o alto

índice de abandono e evasão escolar.

27 Salas de 6º ao 9º ano, sala de Educação de Jovens e Adultos e Salas de Aceleração nos turnos manhã e tarde, totalizando 14 salas. 28 Estudantes fora da faixa etária escolar

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Todo isso nos revela cenário com indicadores e pistas para se pensar como as

práticas educativas estão afetando de modo significativo ou não a vida dos escolares. O que

precisa ser mudado ou reinventado? As respostas poderão ser encontradas no chão da escola,

junto aos estudantes, professores e à comunidade escolar, com o objetivo de constituir a

“escola dos estudantes” e não uma “escola para os estudantes”.

Constatamos, por meio dos diálogos com os estudantes nos corredores, na quadra de

esporte e em outros lugares da escola, que algumas regras consideradas pela gestão

importantes para a escola, como o fardamento escolar, proibição do uso do boné e do celular,

são compreendidas como desnecessárias, como relata um estudante: “é uma besteira a gente

não poder usar o boné, qual o problema? [...] num tem nada haver isso é só besteira da

diretora”. (Estudante A). Segundo o estudante, o uso de boné não iria interferir na sua

aprendizagem, já a diretora percebe como organização do espaço escolar, afirma que: “aqui

não é a casa deles [...] eles precisam saber que não podem fazer o que pensa [...] eu preciso

agir desta forma se não vira bagunça”. (Gestora A). Com essas ideias contrárias, surgem as

desobediências às normas escolares, as tensões e os comportamentos considerados como

indisciplinados. É possível que a negociação possa servir de instrumento mediador para estes

casos.

Destacamos, ainda, outras práticas de sociabilidade concebidas como inadequadas

para o ambiente escolar, de acordo com as ideias dos professores e gestores que se revelaram

no campo durante a pesquisa, tais como: insultos (tapas, empurra-empurra, acertos de bola de

papel e giz no outro etc.); agressões físicas e verbais por meio dos xingamentos (baitola,

rapariga, viado, “bicha feia” etc.) e apelidos (jurubeba, “zurelhas grandes”, pneu de trator,

barrão, quatro olho etc.).

Segundo os professores e os gestores, tais comportamentos deveriam ser evitados na

escola, pois, além de transgredirem o Regimento escolar, dificultam o ensino em sala de aula

e ainda causam conflitos e, sobretudo, conduzem ao baixo índice de desempenho escolar. Os

docentes explicam que na sala de aula onde há pouco silêncio, respeito, ordem e interação

aluno-professor, o ensino fica totalmente prejudicado e, consequentemente, resultará num

aprendizado insatisfatório.

Notamos que estas percepções dos educadores são sempre elucidadas como

justificativas quando a escola não atinge o propósito de ensinar os conteúdos escolares, o que

causa em alguns educadores um “mal-estar”, demonstrado pelas seguintes falas: “às vezes

fico muito magoada com certas atitudes de alguns estudantes quando me agride com

palavras”. (Professora A); “esses meninos não deixam eu ensinar, é muito difícil, mas eu

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tento”. (Professora B); “é muito ruim saber que no final do ano por conta do comportamento

deles eu não consegui fazer com que eles aprendessem”. (Professora C).

Nas conversas informais com estudantes identificados por professores como

indisciplinados, ou seja, os que praticam os atos descritos anteriormente, no que se refere ao

modo de se relacionarem, 60% destes veem suas práticas sociais como normais; já outros

revelam que não gostam de estudar e agem daquela forma como subterfúgio para não

permanecerem em sala de aula. Muitos justificam seus atos como forma de “justiça com as

próprias mãos”, como percebemos nas falas dos estudantes: “eu bati nele porque me xingou”.

(Estudante A); “ele jogou o giz em mim, então joguei nele também para descontar”.

(Estudante B); “eu reclamo a professora e ela não faz nada então vou lá e resolvo”. (Estudante

C) etc. Aqui temos mais elementos que reiteram a ideia de repensar uma escola não pronta e

planejada e sim constituída no seu cotidiano.

Constatamos que os atos dos estudantes percebidos como indisciplinados na visão

dos professores eram caracterizados pelas bagunças (muita conversas), estudantes sentados

em carteiras fora da fila, jogando papel e giz, trocando torpedos e mensagem pelo celular em

sala de aula. Já os estudantes justificavam tais comportamentos, alegando que não “gosto de

estudar” (estudante D), “a aula não é boa” (estudante E), “o professor não sabe explicar”

(estudante F), dentre outros. Assim, o professor regente solicitava por várias vezes que todos

ficassem em silêncio, porém seu pedido não era atendido pela turma. Então, o professor

tomava outras atitudes como: “vou mandar para sala de leitura [...] amanhã só vai assistir aula

se o pai ou a mãe vier conversar comigo [...] vou chamar o coordenador e a diretora para falar

com vocês” etc. Mesmo diante destas atitudes de tentativas de retomar a autoridade, os

posicionamentos dos professores não eram suficientes para resolver aquela situação.

Em razão dos contextos aqui descritos, somam-se elementos que dão suporte e

fundamento para a escola refletir seus valores e crenças, com origem no seu cotidiano e na

comunidade escolar. Por meio das práticas consideradas indisciplinadas ou não, a escola

sinaliza a necessidade de refletir e de ser modificada.

No que tange às formas de sociabilidades estabelecidas na escola pesquisada, 55%

dos professores entrevistados consideram que necessitam melhorar o relacionamento entre

estudantes e estudantes com professores e, principalmente, no que concerne às relações de

amizade e de respeito entre a comunidade escolar: “estes alunos precisam respeitar mais o

professor” (Professor F), “alguns dias atrás eu fui ofendida por uma aluna” (Professor G),

“tem horas que eles se agridem”. (Professor H).

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Alguns educadores resaltam o individualismo, isto é, a falta de companheirismo e do

trabalho em equipe: “aqui a gente trabalha sozinho, ninguém quer ajudar o outro”. (Professor

A), “eu já falei várias vezes, mas não me escutam”. (Professor B). Outros percebem, no

entanto, diferentemente destes: “depois que entrou a nova diretora todos trabalham juntos”.

(Professor C); “agora está muito bom, a gente realiza trabalhos com os colegas”. (Professor

D). Em contraposição aos docentes, 64% dos estudantes entrevistados avaliam como bom o

relacionamento entre as pessoas da escola: “eu gosto da escola, aqui eu tenho amigos só às

vezes a gente briga (risos), mas é assim mesmo”. (Estudante A); “eu acho bom porque a gente

conversa, brinca e faz amizades novas” (Estudante B). Já os gestores também compartilham

da mesma ideia dos estudantes.

São evidentes as divergências sob os olhares de cada sujeito, as ambiguidades no

espaço escolar e as distintas relações, dando à escola um caráter polissêmico e de

compreensão difícil. Assim, as ideias contrárias, quando não respeitadas, podem ensejar

relações conflituosas, tensões e atos violentos motivados por diversas razões.

Segundo Barrère e Sembel (2006), é pela socialização que a escola e a família

possibilitam aos estudantes seu convívio social, permitindo-lhes incorporar valores, princípios

e normas de comportamento socialmente aceitas. Neste sentido, a escola passa a ser um lugar

complexo de socialização, uma vez que ela é composta por múltiplas sociabilidades,

caracterizadas pelas relações amistosas e/ou conflituosas, negociadas ou disputadas de

maneiras diversas.

O ambiente escolar, por sua vez, influencia no aprendizado de valores, atitudes e

hábitos. Os sujeitos inseridos em seu contexto social estão a todo instante, de alguma forma,

interagindo e socializando, de acordo com os mais variados tipos de relações sociais: relações

amistosas, íntimas, de dominação, de conflito etc.

Dentre estes tipos, destacamos as “relações de poder”, que podem ou não produzir

tensões na escola quando os agentes escolares imbuídos de tal “poder” o empregam para

controlar, ganhar proveitos ou direcionar relações.

Na análise de Simmel (1983), a aversão ou a oposição entre pessoas de um grupo se

tornam necessárias nas relações sociais, ou seja, o conflito é um elemento estruturador da vida

social. As relações conflituosas no convívio escolar configuram-se como um fenômeno que

inclui determinantes sociais, econômicos e culturais.

As reflexões de Simmel (1983) ajudam-nos a refletir as relações conflituosas

vigentes nos grupos e na sociedade. O autor destaca a relevância sociológica do conflito,

ressaltando que o conflito produz ou modifica os grupos de interesses, uniões ou

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organizações. Acentua que toda interação de homens é uma “sociação”, logo, o conflito que

não pode ser exercido por uma só pessoa, certamente, deverá ser considerado uma “sociação”.

Ele cita causas do conflito, entre elas o ódio, a inveja, a necessidade, o desejo etc., que, por

sua vez, são fatores da dissociação. Neste caso, o conflito está a serviço da resolução das

dualidades divergentes, sendo uma forma de alcançar algum tipo de unidade.

Logo, em um grupo, a aversão de um membro a outro não é fator social puramente

negativo, segundo Simmel (1983), quando muitas vezes essa aversão pode tornar a vida ao

menos possível com as pessoas que não suportamos. Nesse contexto, a aversão ou oposição se

tornam necessárias nas relações sociais.

Não poderíamos, todavia, pensar num espaço escolar harmonioso composto apenas

pelas relações amigáveis e negociáveis. Simmel (1983) nos proporciona, pois, a oportunidade

de refletir sobre as relações de conflito que de imediato são pedagogicamente destituídas de

positividade pela escola. O autor nos traz, porém, a ideia de síntese nas divergências e

confluências que estão na dinâmica das relações sociais, podendo ser compreendidas por meio

do lugar e do papel que assume o conflito, mediante o qual os grupos se mantêm, se refazem e

se reestruturam processualmente.

Nesta dimensão, destacamos a importância de compreender o funcionamento do

ambiente escolar, tendo o conflito como elemento essencial em suas relações sociais e, ao

mesmo tempo, não o confundir com a violência. Então, se torna possível pensar em

resoluções não violentas dos conflitos junto à comunidade escolar. Compreender o conflito

como possibilidades para reinventar seu modelo de ensino e refletir sobre as relações no

âmbito escolar poderá servir de estratégias pedagógicas utilizadas de acordo com a

criatividade e a experiência de cada escola.

As definições sobre violência, de acordo com os interlocutores da pesquisa, também

podem ser percebidas com o auxílio dos gráficos abaixo, elaborados pelo software

IRAMUTEQ:

Gráfico Similitude 1- Práticas tidas como violentas para os estudantes

Gráfico Nuvem de palavras 1- Práticas tidas como violência para os estudantes

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Esses gráficos classificam a violência na escola com suporte nas seguintes

manifestações: AGRESSÃO (física ou verbal), BRIGAS, XINGAR, CONFUSÃO,

DESRESPEITO etc. Estas categorias são as mais utilizadas pelos estudantes para conceituar

violência; no entanto, segundo outros agentes, muitas destas classificações não são percebidas

como tais: “eu acho que aqui não tem violência”. (Estudante E); “a gente só briga, mas é

assim mesmo”. (Estudante F); “outro dia só porque eu chamei meu colega de apelido já fui

mandado para secretaria”. (Estudante G). Evidenciamos nas falas de alguns estudantes que os

atos considerados violentos por outros são tidos como ação “natural” das relações sociais.

É importante lembrar que estas percepções da não violência são narradas por

estudantes classificados pela escola como problemáticos e mal-educados. Os educadores

classificam estes agentes como estudantes que não frequentam a escola regularmente, xingam

e brigam com os colegas e desrespeitam os professores com palavrões e ameaças.

Deste modo, a escola, por um lado, é percebida como espaço de atos violentos e, por

outro, como lugar de relações diferentes não concebidas como violentas. Nesta situação, na

qual múltiplos olhares divergem, percebemos que a violência não é bem definida. Assim,

podemos apreender que a violência no âmbito escolar não tem descrição própria, tampouco é

unilateral. O que existem são práticas de sociabilidades tidas como violentas.

Deste modo, o conceito de violência está agregado às relações sociais percebidas

como violentas. Ela muda conforme os pontos de vista sob os quais os agentes da escola

definem como atos violentos ou não violentos.

Conforme os gráficos abaixo, identificamos o fato de que as percepções dos

estudantes sobre a violência na escola são bem próximas das classificações feitas pelos

professores

Gráfico Similitude 1- Práticas tidas como violentas

para os professores

Gráfico Nuvem de palavras 2- Práticas tidas como violência para os professores

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Evidenciamos aqui as expressões com maior frequência pronunciadas pelos

professores nas entrevistas, e que definem as práticas de sociabilidades concebidas como atos

violentos CONFUSÃO, AGRESSÃO e o DESRESPEITO muito referidas por eles como

elemento que causa as brigas e os xingamentos. Estas palavras também foram mencionadas

pelos estudantes quando narram sobre os atos violentos na escola: “eu acho que são as brigas

e as confusões” (Estudante C); “ele me empurrou só porque eu estava na porta, ai dei um

murro e começou a confusão” (Estudante D); “acho que é quando os meninos ficam

brigando” (Estudante E). A confusão é compreendida pelos agentes escolares como as brigas

e os empurrões, geralmente ocasionados pelo desrespeito.

Segundo os professores, as manifestações que caracterizam os atos desrespeitosos

são:

Quando um aluno chama o outro de apelido começa um bate boca e daí uma briga, eles não se respeitam (Professor A). Esses dias um aluno me enfrentou disse que não ia copiar o exercício e passou o tempo todo andando pela sala de aula [...] eu me senti muito mal (Professor B). Eu já fui até ameaçada, isso é grave é um desrespeito muito grande [...] coloquei o aluno pra fora da minha sala de aula, ele só entra depois que vier acompanhando dos seus pais (Professor C).

As experiências narradas pelos professores indicam o desrespeito como ato violento.

O respeito é percebido como prática importante nas relações sociais e também como

dispositivo capaz de fortalecer as relações de amizade: “eu tinha alunos que se davam muito

bem um com o outro, mas quando começaram a tirar brincadeiras de mau gosto ai deixaram

de ser amigos” (Professor D); “sempre tem um que fica xingando o colega até eles brigarem”

(Professor E); “é muito ruim quando eles agridem a gente, tem uns que são muito ignorantes”

(Professor F).

A categoria respeito é percebida pelos gestores como ação emblemática às relações

sociais, que contribui com o ensino-aprendizagem. Ela foi bastante mencionada nas falas da

diretora e do coordenador pedagógico como atitude importante para o trabalho pedagógico:

“com o respeito às diferenças tudo fica mais fácil [...], quando há respeito entre as pessoas

facilita não só do trabalho do professor em sala de aula, mas o nosso também” (Gestor A); “eu

vejo que se um aluno respeita o outro, isso com certeza evita as brigas e as confusões” (Gestor

B).

Ao interpelarmos os gestores sobre a violência na escola, assim como os estudantes e

professores, eles também compreendem que as agressões físicas e verbais, as confusões e

xingamentos são atos violentos e práticas de sociabilidade que desrespeitam o outro. Podemos

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visualizar a importância atribuída ao respeito nas relações sociais da escola por meio dos

gráficos a seguir:

Nos gráficos, a palavra respeito se destaca das demais, indicando seu grau de

importância declarado pelos gestores da escola. O valor atribuído ao respeito é, também,

compartilhado pelos estudantes e professores, conforme verificamos nos seus discursos:

O respeito é muito importante no nosso meio. Existe muita falta de respeito dos alunos (nós todos) uns com os outros. Acontece muita besteira de aluno com aluno, devido essas coisas tem uns que começa a brigar e bater aqui dentro e lá fora. (Estudante A). Só porque sou negra ele não me respeita [...], ai a gente sempre briga [...], ele me chama de apelido eu também chamo ele, se ele me respeitasse eu também respeitava. (Estudante B). Em muitos casos a violência existe por falta de respeito [...] as vezes há ausência de dialogo por parte de algumas pessoas. (Professor A). Quando há divergências de opiniões e falta de respeito aí gera confusões entre alunos e professores na escola. (Professor B).

O respeito é citado por todos os entrevistados. Para eles, o ato de respeitar o outro

pode ser vivenciado pelas pequenas atitudes do dia a dia, tais como: “com licença”,

“desculpas”, “obrigado”, “posso ajudar?”. Segundo os agentes escolares, estas normas de

convivência ou “etiquetas” contribuem para o fortalecimento das relações de afinidade e da

não violência. Seria possível, no entanto, a existência do respeito mútuo em um espaço

escolar formado por agentes sociais com características tão singulares e diferentes? Sennett

(2004) discorre sobre o respeito na formação do sujeito e nas relações sociais.

Gráfico Similitude 1- Práticas tidas como violentas para os gestores

Gráfico Nuvem de palavras 2- Práticas tidas como violência para os gestores

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Na perspectiva desse autor, o respeito envolve de modo recíproco quatro elementos:

o status, que é a “posição de uma pessoa na hierarquia social (P.71)”; o prestígio que se

“refere às emoções que o status suscita nos outros (P.72)”; o reconhecimento “significa

respeitar as necessidades daqueles cujos interesses os levam a discordar (P.73)”; e, por último,

a honra social , por sua vez, sugere padrões ou um “código de conduta”... (P.73).

Sennett (IDEM) nos revela que o respeito envolve reciprocidade e consensos,

demonstrando o quanto pode ser difícil a instauração do respeito entre as pessoas diante das

complexas e diversas manifestações comportamentais e das desigualdades sociais. Esclarece,

ainda, que as práticas sociais formadoras do respeito estão vinculadas à constituição do

caráter das pessoas. Ao investigar sobre os rituais de algumas tribos, ele evidenciou que a

reciprocidade e a troca são os fundamentos do respeito mútuo, pois formam o caráter

humano, tornando os sujeitos abertos a ideias e sentimentos sugeridos pelas outras pessoas.

Segundo ainda Sennett (2004, p. 295),

As pessoas não são tratadas com respeito simplesmente em obediência a uma ordem de que isso deva acontecer. O reconhecimento mútuo tem de ser negociado; esta negociação envolve as complexidades tanto do caráter pessoal quanto da estrutura social.

Sendo assim, é importante a negociação nas relações sociais como prática no

convívio escolar. Deste modo, a questão do respeito pode ser percebida como conteúdo

relevante para os temas transversais à proposta pedagógica e, sobretudo, às relações do

cotidiano escolar.

Vale lembrar que Sennett (IDEM) nos alerta para a noção de que o problema

fundamental de nossa sociedade é estabelecer o respeito entre os diferentes e desiguais. É um

grande desafio para a sociedade da tecnologia, da globalização, da violência e do crime

instaurar nas suas múltiplas sociabilidades relações de respeito mútuo como atitude de

negociação ante os conflitos.

É importante lembrar, contudo, que o espaço escolar é permeado de relações sociais,

tais como: “eu chutei ele porque me chamou de apelido” (Estudante H); “eu bati nela porque

me empurrou” (Estudante I), afirmam os estudantes; “a gente discute na sala de aula porque

ele não me obedece [...] não faz a tarefa, fica o tempo todo com conversas paralelas”

(Professora D); “eu coloquei ele pra fora porque aqui não é a casa dele para ele fazer o que

quer” (Professor E), se queixam os professores; “eu dei a transferência para o aluno porque a

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escola não pode permitir isso [...] ele pode agredir e ameaçar lá fora, aqui não é a casa dele”

(Gestor A), declara a diretora.

Vale destacar o fato de que a escola, ao reproduzir a cultura das classes

economicamente favorecidas, ela expressa a violência, impondo um modelo de socialização

sob as pessoas, sujeitos a aprender uma nova forma de pensar, falar e agir de acordo com os

valores culturais das classes dominantes. Esta é a violência da educação, definida por

Bourdieu e Passeron (1975) como a violência simbólica, sobre a qual a cultura popular é

negada e a cultura dos grupos dominantes é usada para doutrinar e dominar os sujeitos; de

modo que eles não percebam que legitimam a ordem dominante.

Ao observarmos no espaço escolar como se dão as relações ali estabelecidas, é

comum visualizarmos as práticas de sociabilidades violentas na escola. Este lugar, no entanto,

é também caracterizado pelas relações sociais manifestas com a devida cordialidade. Notamos

que em sala de aula as atividades realizadas em grupo, as gincanas esportivas, os jogos e as

brincadeiras no pátio são momentos de cooperação e participação que fortalecem os vínculos

entre os escolares. Na hora do intervalo, percebemos que os estudantes escolhem com quem

conversar, onde e como brincar. Os estudantes revelaram que: “eu gosto do recreio porque

brinco com meus colegas” (Estudante C); “é a hora que mais espero (risos), é muito bom a

gente corre, conversa com as amigas” (Estudante D); “tem uns jogos nas mesas pra gente

brincar” (Estudante E). Compreendemos que estas experiências são valorizadas pelos

estudantes.

Neste contexto, os estudantes vivenciam distintos, espaços e atividades

significativas. Deste modo, a escola se revela como espaço plural de relações e percepções.

Por um lado, os estudantes convivem com seus amigos, interagindo de modo amigável; por

outro, os conflitos são inevitáveis. Afinal, o conflito é inerente às relações humanas, como

destaca Simmel (1983). Ora a escola é experimentada como espaço de integração, interações

sociais e diálogos, ora como lugar de tensões e práticas de sociabilidades violentas.

4.1 O ambiente escolar e suas narrativas

Por meio das narrativas, os agentes escolares caracterizam o ambiente escolar. Existe

“boa” relação dos agentes escolares com a estrutura física no que respeita à conservação e ao

uso dos espaços que compõem a instituição, constatado pelos poucos rabiscos nas paredes e

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objetos da escola, pela preservação dos cartazes e banners e pelo cuidado com o jardim da

escola.

Para entendermos como se dá no cotidiano escolar esta relação aparentemente

equilibrada, buscamos nas falas dos professores, gestores e estudantes respostas para tais

atitudes: “antes aqui não existia este jardim, mas agora ele só está assim porque nós

colocamos os estudantes para cuidar dele” (Diretora); “se agente vê alguém pisando no jardim

vai aguar e replantar” (Professor A); “as plantas estão bonitas né! Mas, antes era feio, todo

mundo pisava e não acontecia nada” (Estudante A); “o meu colega quebrou a luz e a mãe dele

pagou, [...] e depois colocaram chiclete debaixo da carteira e a diretora disse que não pode”

(Estudante B). Observamos que alguns disciplinamentos são utilizados pela escola ante tais

comportamentos. As sansões aplicadas estão definidas no Regimento Escolar29 e no projeto da

escola de enfretamento à violência, Bullying – Educar para Paz.

De acordo com o artigo 121, incisos IV e V do Regimento Escolar, é dever do

estudante colaborar na conservação do material e das instalações físicas da instituição e

assumir a responsabilidade por danos que causem ao patrimônio da instituição,

respectivamente. Já no quarto inciso do artigo 122, é considerada falta grave causar danos ao

patrimônio da escola. Em concordância com o Regimento Escolar, o Projeto Bullying –

Educar para Paz, que visa à prevenção e à redução da violência, este adverte os pais para o

fato de que os estudantes que causarem danos ao patrimônio escolar serão responsáveis pela

reposição ou reconstituição do material danificado.

Esta prática disciplinadora é confirmada nos discursos dos estudantes: “aqui se a

gente riscar a parede tem que apagar” (Estudante A); “o menino da sala vizinha quebrou a

carteira e o pai dele teve que consertar” (Estudante B); “quando a minha amiga sujou a sala

porque quis, ela depois ajudou a limpar” (Estudante C). É importante lembrarmos que existem

divergências nas ideias dos estudantes sobre estas práticas punitivas: “eu acho que melhorou

muito, antes era tudo feio e quebrado” (Estudante D), “depois que a gente começou a pagar

pelo que faz diminuiu essas coisas de quebrar” (Estudante E), “eu acho que é errado né,

porque a escola que era pra consertar e mandar a gente fazer outra coisa” (Estudante F).

Relata a diretora que houve situações em que estudantes se recusaram a repor o bem

danificado à escola, geralmente por não se sentirem culpados e discordarem da punição. Já

outros estudantes não reparam o dano por não terem condições financeiras diz.

29 Documento que regulamenta a organização didático-pedagógica e administrativa da EMEF José Bezerra Filho.

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Neste contexto, é evidente que a relação de cuidado e preservação do patrimônio

escolar é conduzida pela tentativa de controlar as ações que danificam o prédio da escola sob

a aplicação de advertências e reparações, quando necessário. A gestão informou que, no ato

da matrícula, os pais já são informados sobre as normas da escola e, nas reuniões, este assunto

sempre é discutido, visto que antes a escola tinha muitos prejuízos e perdas em parte ou total

de seus bens. Para a gestão, esta é uma prática usada para conservação do espaço físico da

escola que até o momento vem dando certo.

O aspecto predominante entre os agentes escolares, que caracteriza o modo de

interagir e as práticas de sociabilidades no cotidiano escolar, é a convivência e o

relacionamento em pares ou grupos do mesmo sexo, seja na sala de aula, no recreio, no pátio,

nas rodas de conversas ou fora da escola. Esta prática é percebida pelos estudantes da seguinte

forma: meninos com meninos e meninas com meninas, dialogando, brincando e se

comunicando entre eles. Este fato corriqueiro e curioso nos levou a investigar como se realiza

esta relação marcada por sujeitos que demonstravam afinidades com outros do mesmo gênero.

Percebemos então que a dinâmica escolar favorecia esta relação de aproximação,

pois a maioria das atividades escolares era realizada entre estudantes do mesmo sexo: as

gincanas escolares, trabalhos em equipes, grupos de apresentações em eventos e outras. É

importante destacar o diálogo com estudantes na quadra de esporte, na qual interrogamos um

grupo de meninas que sempre assistiam aos meninos jogarem bola: porque vocês também não

participam deste jogo? Logo responderam: “ah, eles não deixam” (Estudante A); “é o jogo

deles” (Estudante B); “a gente fica mesmo só assistindo, depois é a nossa vez” (Estudante C);

“porque é assim, essa vez é a deles, depois é nós” (Estudante D). No diálogo com os

estudantes, evidente como o modo de se relacionar entre grupos predominantemente do

mesmo sexo era percebido de forma natural e, ainda assim, a escola, “inconscientemente”,

fortalece as inter-relações homogêneas nas atividades escolares.

Vale lembrar que no cotidiano escolar as relações entre os estudantes e os

funcionários são aparentemente cordiais, visto que há poucos registros de agressões físicas e

verbais no livro de ocorrências da escola. Quando surge algum conflito ou atos violentos,

estes são registrados e, de acordo com o ocorrido, o agressor será advertido ou reparará o

dano, caso seja necessário. Dependendo, porém, da gravidade da ação praticada, a direção se

reúne com o Conselho Escolar, o Conselho Tutelar e as famílias para deliberar outras

providências, inclusive a transferência do aluno, caso necessário. A prática da transferência é,

no entanto, geralmente, questionada pelo aluno e pelos pais, o que leva a um clima tenso entre

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as partes. Assim, a escola tenta administrar os conflitos, as tensões e os atos violentos que vão

surgindo em seu espaço de convivência.

Outro aspecto visível e comum entre os estudantes são os apelidos e outros palavrões

usados com frequência como “viado”, “baitola”, “quatro olho”, “bicha feia”, “jurubeba”,

“rapariga” etc. Estes insultos provocavam conflitos e atos violentos, o que enseja brigas,

ameaças, empurra-empurra, entre outros. Nestes casos, os professores interferem, separando a

briga, mandando os estudantes para a Diretoria ou, com um tom de voz mais alto, tentam

minimizar a situação.

Diante dos bate-papos com os estudantes, buscamos entender os motivos dessas

brigas, ameaças ou apelidos e, ao questionarmos os estudantes, obtivemos as seguintes

respostas: “eu bati porque eu quero, porque a professora não faz nada” (Estudante E); “a gente

reclama pra tia e ela não diz nada” (Estudante F); “eu digo pra diretora, mas ele continua

arengando comigo” (Estudante G); “a gente vai pra diretoria, mas depois a gente desconta”

(Estudante H). Notamos aqui que as ações dos professores há pouco descritas não são aceitas

pelos alunos como resolução dos seus conflitos, brigas e discussões. As práticas dos alunos e

suas respostas podem nos servir como elementos para refletir, replanejar e reinventar o

modelo de ensino.

Ao dialogarmos sobre o comportamento dos estudantes, os professores afirmaram

que estudantes que “brigam, não realiza suas tarefas, ficam saindo da sala de aula acabam

influenciando outro” e, assim, prejudicam não só a aula, mas também o aprendizado do grupo.

Para os educadores, estas práticas podem ser consideradas como indisciplina e elas são

responsáveis por grande parte das repetências, da evasão e abandono escolar.

Assim, ante estas compreensões, pedimos aos docentes para falarem como eles

percebem a indisciplina: “ah isso é porque já vem da família, se a família educasse seria de

outro jeito” (Professor B); “olha eu acredito que o filho bem educado é também um aluno

bem comportado” (Professor C); “a indisciplina tem muito haver com a formação básica,

aquela que vem de berço lá da família” (Professor D); “se o aluno respeita os pais eles

também respeitaram os professores” (Professor E). Deste modo, a indisciplina, para os

professores, pode estar associada às relações e à educação familiar, esquecendo-se de que

estas práticas tidas como indisciplina também podem ser provocadas em detrimento do

“modelo” de escola, ou seja, é possível que alguns atos de indisciplina estejam engendrados

nas práticas cotidianas da escola (as avaliações, as normas, regras etc.).

É importante lembrarmos as falas dos estudantes que caracterizam os professores

como bons profissionais: “eu gosto muito do professor de matemática ele explica muito bem”

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(Estudante A); “gosto muito das aulas de educação física o professor é muito bom” (Estudante

B); “minha professora de história ensina direitinho” (Estudante C). No cotidiano,

evidenciamos o afeto por meio dos gestos carinhosos dos estudantes com seus professores,

como abraços, beijos e elogios. Percebemos, então, o antagonismo das práticas de

sociabilidades, por um lado, as relações concebidas como indisciplina e, por outro, as relações

afetuosas. Desta forma, os agentes escolares vão tecendo suas relações com práticas que

podem anunciar e assegurar a necessidade de recriar o modo de ser e fazer a escola.

4.2 A percepção da escola para seus agentes

Ultrapassando as percepções sobre a violência, os agentes da escola revelam

características que definem a escola. Com suporte nos relatos, buscamos compreender os

sentidos que estes agentes atribuem ao seu cotidiano escolar, o modo como interpretam suas

experiências e como percebem suas interações. Consideramos aqui os depoimentos que

narram as impressões e significados da escola para seus agentes. A seguir, vêm os quadros

que sintetizam os principais aspectos mais evidentes nas falas dos sujeitos, respectivamente.

QUADRO 1 – PRINCIPAIS ASPECTOS INDICADOS PELOS ESTUDANTES

SUJEITOS DO QUE GOSTA NA ESCOLA DO QUE NÃO GOSTA NA ESCOLA

ESTU

DA

NTE

S Aprendizagem Professores Oportunidades Atividades (exercícios) Programa Mais Educação

Desrespeito Violência Brigas Apelidos

Fonte: Pesquisa Direta, 2014.

É importante perceber que, embora os professores revelem que os estudantes não

gostam de realizar as atividades de sala, como exercícios, leituras, provas etc., as narrativas

denotam que 64% dos estudantes entrevistados se identificam com as atividades de sala,

contrapondo as ideias dos educadores. Ressaltam, entretanto, que: “eu gosto quando o

professor explica bem, ai eu sei responder o exercício” (Estudante A); “quando a aula é boa a

gente não tem preguiça e dá pra fazer os deveres de casa” (Estudante B); “eu gosto muito das

aulas de português, mas as de matemática é muito chata eu não sei de nada” (Estudante C).

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Além disso, eles chamam a atenção para as atividades extraclasse e/ou do contraturno, como

as oficinas do Programa Mais Educação30, que promovem integração social e a produção de

conhecimento diferenciado.

Os agentes escolares consideram os atos violentos, apelidos, brigas e o desrespeito

como elementos que interferem nas relações e em sala de aula: “ele fica o tempo todo

insultando com a minha amiga, isso é errado, a tia chama atenção dele, mas ele continua e

ainda atrapalha a aula” (Estudante D); “eu odeio quando me chama de quatro olho, às vezes

dá confusão” (Estudante E); “a tia manda ele sentar mais ele nem liga e continua arengando”

(Estudante F); “às vezes não dá nem pra gente aprender com tanta bagunça” (Estudante G).

Muito embora estes comportamentos sejam considerados como tais, notamos que muitos

educadores não sabem lidar com estes acontecimentos: “eu já fiz de tudo, mas ele não muda”

(Professor A); “acredita que já tentei de todo jeito [...] dei carinho, atenção e até ignorei, mas

eles não têm jeito, acho que é alguma coisa de família” (Professor B).

Observamos o seguinte depoimento de um estudante: “eu não gosto de estudar, a

minha mãe manda eu vim pra cá, eu só venho porque agente joga bola [...], minha mãe disse

que aqui é para eu estudar e aprender, [...] eu já sei ler um pouco, não precisa mais (risos) [...]

uma coisa que gosto é as aulas de educação física, acho que só isso mesmo”. Percebemos a

indiferença deste aluno para com a escola. De acordo com este relato, o ensino e a

aprendizagem não têm sentido; para este estudante, a linguagem da escola é diferente da sua.

O que interessa para o estudante são as atividades esportivas e recreativas. Já as atividades de

sala de aula e os conteúdos escolares não fazem sentido, o que demonstra ter uma percepção

pouco positiva da escola.

Neste sentido, para o estudante, a escola é apenas um lugar de conhecimentos

acadêmicos, ela não cria espaço de socialização onde as interações sociais se estabeleçam, o

que dificulta as interações do estudante com o saber.

O relato de uma estudante, no entanto, contrapõe o relato do estudante anterior: “eu

gosto dos meus professores, aqui a gente aprende e é muito importante para nossa vida [...]

preciso estudar, quero ser médica, acho muito bonito [...] a escola é boa aqui a gente brinca,

tem bons professores e aprende coisas boas”. A aluna associa a escola como lugar de

possibilidades, e também reconhece a importância da aprendizagem para sua vida e seus

30 O Programa Mais Educação, instituído pela Portaria Interministerial nº 17/2007 e regulamentado pelo Decreto 7.083/10, constitui-se como estratégia do Ministério da Educação para induzir a ampliação da jornada escolar e a organização curricular na perspectiva da Educação Integral nas escolas públicos do Brasil. Ele se desenvolve mediante atividades nos macrocampos de acompanhamento pedagógico; educação ambiental; esporte e lazer; cultura e artes; cultura digital; comunicação e uso de mídias, etc. (Fonte: Portal do MEC).

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planos futuros (ser médica); demonstra gostar de estudar. A escola ocupa lugar de destaque na

sua fala, e o significado positivo percebido pela estudante em relação à escola está

relacionado à vontade de ser médica.

A escola, para alguns estudantes, lhes pode oferecer condições para conquistar um

espaço no mercado de trabalho, enquanto para outros, ela está distante do seu cotidiano, da

sua linguagem. À vista dos depoimentos, podemos evidenciar que o significado da escola

passa pela indiferença ou recusa ao ensino, mas, também, pelo reconhecimento da escola

como lugar de aprendizagem.

QUADRO 2 – PRINCIPAIS ASPECTOS INDICADOS PELOS PROFESSORES

SUJEITOS DO QUE GOSTA NA ESCOLA DO QUE NÃO GOSTA NA ESCOLA

PRO

FESS

OR

ES Os estudantes interessados e

estudiosos. A relação com os estudantes,

colegas e funcionários. Ensinar adolescentes A convivência com os

adolescentes

Estudantes desmotivados e indisciplinados

Grosserias Falta de respeito Individualismo de alguns

profissionais da escola Material pedagógico insuficiente

Fonte: Pesquisa Direta, 2014.

Quanto aos professores entrevistados, ficou claro que 91% consideram o magistério

atividade prazerosa. De modo geral, os professores revelam gostar da sua profissão e do lugar

de trabalho, a escola. Vejamos alguns relatos dos educadores: “eu gosto de ensinar, acho que

nasci pra isso” (Professor D); “mesmo tendo alguns probleminhas em sala de aula mais eu

adoro minha profissão” (Professor E); “é muito gratificante quando o aluno aprende, quando

ele é interessado e estudioso” (Professor F); “poder contribuir para eles aprenderem e com

isso ajudá-los futuramente faz a gente gostar da nossa profissão” (Professor G).

As falas espontâneas dos educadores sobre suas motivações e sua visão sobre a

escola traduz um idealismo: a possibilidade de formar os alunos para o futuro e o “amor” à

profissão que motiva a ensinar; além de indicarem a convivência com os alguns adolescentes,

a forma como estes interagem em sala e o interesse deles pela sua aprendizagem, como

elementos que fortalecem o ensino.

Quando instados a falarem sobre diversos aspectos referentes à escola e ao exercício

profissional, revelaram os aspectos percebidos como negativos ao ensino-aprendizagem: “o

que eu considero como negativo são aqueles estudantes desmotivados e indisciplinados, isso

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atrapalha muito a aprendizagem deles” (Professor A); “quando eles agem com desrespeito,

grosserias e apelidos desestrutura a sala de aula, fica difícil a gente ensinar” (Professor B), “o

que muitas vezes atrapalha e deixa a escola a desejar é quando falta material pedagógico”

(Professor C). As principais deficiências estruturais da escola são atribuídas aos

comportamentos tidos como indisciplinados. A indisciplina de modo geral é concebida pelos

educadores como atos desrespeitosos como “eu não vou fazer a atividade”; “faço o que eu

quero” “eu já vou pra casa você não manda em mim”; “eu não em calo você não é minha

mãe”, ou seja, são as atitudes que questionam e violam as regras e normas escolares.

Vale lembrar que, em geral, os professores são satisfeitos com o relacionamento com

a diretora da escola e o coordenador pedagógico. “Eu gosto muito do jeito que a gestão daqui

trata a gente” (Professor D); “a diretora é muito organizada, depois que ela entrou mudou

muita coisa” (Professor E); “eu vejo que a gestão se preocupa com o aprendizado dos

estudantes e ajuda no nosso trabalho” (Professor F).

Essas opiniões refletem o modo como os professores veem a escola, com suas falhas

e qualidades. Embora a infraestrutura e recursos didáticos sejam alvos de críticas dos

professores, de maneira geral, a escola é avaliada de forma positiva. Na visão dos professores,

o que mais interfere negativamente no aprendizado dos estudantes são os maus

comportamentos. Eles não falam de suas práticas pedagógicas se estas são suficientes ou não.

O exercício de ensinar é percebido como vocação, e o aprendizado dos estudantes e

o respeito nas relações entre professores e estudantes são considerados como recompensa e

satisfação profissional. Por outro lado, entretanto, quando estes relatam sobre a violência,

expressam sentimentos contrários à ideia de escola como lugar prazeroso. Enfim, as falas

revelaram que os professores se identificam com o seu ofício e com a escola, embora sintam

dificuldades para lidar com atos violentos, com o desrespeito e a indisciplina.

QUADRO 3 – PRINCIPAIS ASPECTOS INDICADOS PELOS GESTORES

SUJEITOS DO QUE GOSTA NA ESCOLA DO QUE NÃO GOSTA NA ESCOLA

GES

TOR

ES Intervenções pedagógicas

As aulas e atividades extraclasses que contribuem para formação integral dos estudantes.

Ausência dos familiares na escola Desinteresse dos estudantes Pouco espaço físico da escola Burocracias escolares As brigas, os desrespeitos

Fonte: Pesquisa Direta, 2014.

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Segundo os gestores, as atividades e as intervenções realizadas pelos professores,

bem como as oficinas dos programas e projetos desenvolvidos na escola, que contribuem para

o pleno desenvolvimento dos educandos, são aspectos por eles indicados como positivos e

necessários para a qualidade da educação.

A gestão acredita que a participação dos membros familiares é fundamental para o

aprendizado dos estudantes e atribui alguns resultados insatisfatórios à participação

insuficiente dos pais na escola. “Eles só veem quando a gente convoca para uma reunião”

(Gestor A); “os pais que mais precisam vir para as reuniões são os que mais faltam” (Gestor

B); “geralmente os pais daqueles estudantes mais problemáticos e que tiram notas baixas são

os pais mais ausentes” (Gestor A); “você pode vê, os estudantes que tem bons resultados são

os filhos que os pais participam da vida escolar” (Gestor A); “sempre estamos aqui

disponíveis para os pais” (gestor B). Na visão dos gestores, o aparente desinteresse dos pais

pelo aprendizado dos filhos implica a formação escolar dos estudantes. Esta visão pode

contribuir para uma atitude menos crítica em relação à escola, no sentido de que outros

aspectos socioculturais e econômicos estão vinculados ao ensino e à maneira como a escola

funciona.

Assim como os professores, os gestores indicaram o desinteresse dos estudantes

(desmotivação) e a infraestrutura da escola como aspectos negativos para a escola.

Acrescentaram, porém, mais uma prática do cotidiano escolar, as burocracias, consideradas

como desnecessárias em alguns momentos: “a gente às vezes perde muito tempo nas

discussões das reuniões que participamos [...], coisa que poderia ser mais rápida e logo

voltarmos para a escola” (Gestor B); “os inúmeros encontros fora do município, que acabam

tirando o tempo pedagógico [...] chegamos de um já temos que ir para outro” (Gestor A). Vale

lembrar, entretanto, eles terem assinalado que os cursos da gestão colaboram muito para

melhoria do trabalho na escola.

Percebemos com as visitas na escola que, no dia a dia do trabalho da diretora, cuidar

da infraestrutura é uma das principais atividades. A escola mantém-se limpa e com seu

patrimônio preservado. Este trabalho é realizado por meio das visitas às salas de aula, das

reuniões com pais e das punições para os estudantes que praticam alguma ação contra o

espaço físico da escola. A diretora nos revela que “é importante mantermos uma escola onde

o estudante entra e vê um lugar bem organizado [...], ele vai se sentir bem e isso vai contribuir

para a aprendizagem dele [...] eu gosto da minha escola, a gente trabalha para melhorar cada

vez mais [...], existem os problemas, mas em todo local tem [...] sempre buscamos a parceria

dos pais nas reuniões, colocando a escola disponível para o que eles precisarem”.

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A diretora também relatou que “às vezes fico preocupada, pois quando cuido das

questões administrativas [...] esta parte mais burocrática [...] deixo um pouco de lado as

atividades pedagógicas, mas vou tentando cuidar dos dois”. Isto mostra que o tempo

despendido para as questões burocráticas e de orçamento compromete o cuidado com as

questões pedagógicas.

Ao questionarmos os gestores sobre violência escolar, eles compreendem as brigas

como atos violentos que prejudicam o trabalho dos professores e o aprendizado dos

estudantes: “tem dias que a gente precisa estar o tempo todo tirando alunos de sala por conta

de uma confusão” (Gestor A); “se eles se respeitassem mais tinha menos problema pra gente

resolver” (Gestor B); “aqueles que mais se envolvem com brigas são os que menos

aprendem” (Gestor A).

Conforme os depoimentos dos nossos estudantes entrevistados, a característica

principal da escola é a aprendizagem, enquanto para os professores é o espaço de convivência

e, para os gestores, a escola é uma entidade que possibilita mudança.

É um lugar de ensino que os professores ensinam aos alunos para ter um bom convívio na sociedade e na vida profissional. (Estudante A). É o lugar que a gente aprende, eu gosto da escola. (Estudante B). É a minha segunda casa, é onde eu aprendo e ensino. (Professor A). É um espaço de convivências em que se aprende e se ensina, e se ensina os conteúdos sistematizados, e se discute a realidade de forma equilibrada, se respeitando as opiniões particulares. (Professor B). É um espaço privilegiado para transmissão dos saberes, à medida que a gente transmite a gente também aprende. É a questão da práxis, a teoria com a prática vivenciada nesse espaço. (Gestor A). É uma entidade que oferece escolaridade, ela não educa. Ela possibilidade a mudança de nível social. (Gestor B).

As entrevistas revelaram que os agentes escolares têm uma visão otimista sobre a

escola, haja vista a valorização do espaço escolar. Embora os gestores critiquem a atitude dos

pais no que diz respeito à participação deles na escola, trabalham para maior integração da

família com a escola. Evidenciamos, de modo geral, uma visão positiva sobre a escola.

Observamos que os professores e estudantes compreendem a escola como um lugar de ensino

e aprendizagem e de elaboração de valores. Assim, evidencia-se uma aproximação das

percepções entre estudantes e professores no que se refere ao conceito de escola,

especialmente quando ambos afirmam o elo afetivo para com ela.

Na visão de Mahoney (2002), a escola pode ser concebida como um conjunto

diversificado de desenvolvimento e aprendizagem, sendo um espaço que agrupa distintos

conhecimentos, atividades, regras e valores permeados por conflitos, problemas e diferenças.

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É nesse espaço físico e sociocultural que as pessoas se relacionam e aprimoram seus

conhecimentos, mediante as atividades planejadas dentro e fora da escola (REGO, 2003).

O sistema escolar, além de envolver uma gama de sujeitos, com características

diversas, inclui um número significativo de interações complexas, em função dos estágios de

desenvolvimento do aluno. Desse modo, a escola é um ambiente multicultural que abrange

também o estabelecimento de laços afetivos (OLIVEIRA, 2000).

No que tange aos aspectos negativos indicados pelos estudantes, professores e

gestores, podemos verificar uma consonância nas falas, principalmente quando assinalam o

desrespeito entre agentes escolares (apelidos, grosserias, violência) e a indisciplina como

elementos que causam prejuízo ao desenvolvimento do ensino e da aprendizagem.

Na perspectiva de Garcia (2006), as práticas de indisciplina escolar se tornaram

atitudes do cotidiano escolar sob as quais os professores padecem, talvez por não adquirirem

uma formação adequada que proporcione recursos para lidar com os desafios em sala de aula.

As escolas, de modo geral, não dispõem de dispositivos que auxiliam no trabalho escolar ante

estas práticas de socialização que desenham um cenário indesejado pelos educadores.

Para a escola pesquisada, são tidos como faltas graves os atos considerados como

agressões físicas dentro e nas proximidades da escola; ingerir bebidas alcoólicas ou fumar nas

dependências da escola; causar danos ao patrimônio da escola; ausentar-se da escola durante o

período de aula; brincadeiras agressivas para com os colegas e desrespeitar a integridade

física e também moral dos componentes da comunidade escolar. Estas práticas são concebidas

como indisciplina e, quando cometidas, em alguns casos, são aplicadas as penalidades31

reveladas no Regimento Escolar.

Neste âmbito, percebemos que a escola adota a ideia de “correção” perante as

práticas tidas como indisciplina, por meio das punições previamente estabelecidas no

Regimento Escolar ou, quando não descritas nesse documento, são determinadas

aleatoriamente pelos professores como “vá para fora de sala de aula” (Professor A); “volte

aqui só na presença dos seus pais” (Professor B); “saia e vá conversar com a diretora na

diretoria” (Professor C), dentre outros.

As bagunças, as grosserias, a falta de respeito e os xingamentos compreendidos pelos

agentes da escola como atos violentos são vistos como incivilidades por Bernard Charlot

31 O artigo 123º do Regimento Escolar diz que, em caso de indisciplina grave, poderá ser aplicada ao aluno as seguintes sansões: advertência verbal; advertência por escrito; suspensão por três dias; transferência compulsória. Já o artigo 124 estabelece que todas as penalidades previstas neste Regimento deverão ser registradas em ata própria, comunicadas aos pais ou responsáveis, por escrito.

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(2002). Segundo o autor, as incivilidades se referem a comportamentos, como humilhações,

palavras grosseiras e falta de respeito.

Na escola, os atos violentos percebidos como condutas desafiadoras para os gestores

e professores violam as regras e normas da instituição. Vale lembrar que a “falta de respeito”

também é percebida como tal, tendo sido mencionados por 55% dos professores

entrevistados. Para Garcia (2006, p. 125), antes que as incivilidades violem os princípios e

esquemas pedagógicos, elas “rompem com expectativas do que pode estar sendo tacitamente

esperado como boa conduta social”.

Deste modo, ao percebermos a “falta de respeito” como uma das questões principais

dos docentes, não se trata de apenas buscar assegurar, no ambiente escolar, o respeito mútuo

entre os sujeitos, mas, também, é importante que os diálogos pedagógicos privilegiem a

questão do respeito. Nesta perspectiva, a escola poderá refletir com as contribuições de Sennet

(2004, p. 71) sobre o respeito, quando nos provoca a “tratar com respeito a necessidade

percebida em outro”.

Ainda sobre a categoria RESPEITO, na perspectiva de direito e dever dos agentes

escolares, de acordo com suas falas, percebemos os seguintes sentidos:

Eu entendo por respeito que é uma coisa que os estudantes têm que respeitar uns aos outros e a gente com eles. (Estudante A). Para mim respeito é quando a pessoa tem que respeitar os mais velhos, os adultos e quando um estiver no meio, não dizer sai do meio, e sim com licença... (Estudante B). Respeitar para me é você respeitar o limite de cada um. (Professor A). Entendo por respeito, a não violência, não ultrapassar os meus direitos. (Professor B). Entendendo por respeito como manter a harmonia entre as pessoas e os valores, aquilo que constrói a minha personalidade e o caráter das pessoas. Valores como: compreensão, solidariedade e respeito à diversidade. (Gestor A).

Deste modo, o respeito é entendido como valor constituído socialmente. Segundos as

narrativas dos agentes escolares, a “falta de respeito” é experimentada da seguinte forma: “às

vezes quando a gente é desrespeitada dar vontade de chorar... os alunos já foram agressivos

comigo, eles falam coisas que não gostariam de dizer, me tratam como parceiros deles”;

declara a professora, “a minha professora esta lendo o livro cinco minutos de valores humanos

e era sobre o respeito [...] aí no meio da aula, o menino chamou o outro de palavrão”; diz a

estudante, “eu não fiz o dever, fiquei o dia todinho se danando, xinguei os alunos de fela da

puta”, acentua o estudante.

Consoante o pensamento de Antônio Giddens (2005, p. 43), o comportamento

humano é influenciado pelos cenários culturais onde cada um se encontra, porém, isso não

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quer dizer que os seres humanos não tenham individualidade e livre-arbítrio. “No decorrer da

socialização, cada um de nós desenvolvemos um sentido de identidade e a capacidade para o

pensamento e a ação independentes”.

Em um mundo globalizado, marcado por mudanças no campo das ideias e formas de

produção de bens materiais e simbólicos, sobretudo na velocidade das informações, não seria

extraordinário deparar valores culturais em conflito. Ao falar de cultura, Giddnes (IDEM, p.

38) a conceitua como “as formas de vida dos membros de uma sociedade ou de grupos dentro

de uma sociedade”. Para ele, normas podem ser compreendidas como regras sociais que

refletem ou ligam os valores de uma dada cultura. Os valores e normas de uma sociedade

caminham juntos, variam de acordo com a cultura local e mudam à proporção do tempo.

Conforme a cultura local e as narrativas dos interlocutores da pesquisa, a violência é

compreendida como as práticas de sociabilidades violentas (atos violentos, xingamentos,

palavrões, agressões físicas e verbais, confusões) que, dependendo do ponto de vista do

sujeito, são concebidas ou não como violência. Ao longo das ideias dos autores que discorrem

sobre esta temática, discutidas no capítulo anterior, percebemos sua característica polifônica e

ambígua. Nesta perspectiva, ela também se revelou na escola com várias facetas, como

expressão e linguagem dos agentes escolares.

Sob as vozes e os silêncios no cotidiano escolar, práticas de sociabilidade violentas

são traduzidas como desafios escolares; contudo, os desafios não param por aqui, podemos

lançar nova provocação, a de aguçarmos a nossa escuta na escola para que novas vozes e

silêncios sejam ouvidos e compreendidos.

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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Pesquisar sobre questões relacionadas ao fenômeno da violência é como pisar em

solo desconhecido, é adentrar o mundo ainda não compreendido em sua totalidade. É,

também, compreender que, em razão da ambivalência e polissemia, não nos foi ainda possível

decifrar seu “código”, ou seja, as facetas e as mensagens escondidas ou emparedadas nos atos

violentos.

Os conflitos são elementos estruturantes da sociedade que, por sua vez, fazem parte

do cenário escolar. Já os atos violentos são práticas de sociabilidades que podem ser mediadas

com a participação dos estudantes e da família. Conflito e violência não se confundem, pois

possuem conceitos distintos. O conflito é inerente à vida social. Na escola, universo complexo

constituído por valores diferentes e múltiplas percepções. O conflito é inevitável, manifesto

por variadas formas, e é motivado por diversas razões. Violência pode representar meios pelos

quais os agentes escolares usam no momento das tensões ou dos conflitos, não significando

isso dizer que o conflito é sinônimo de violência.

O ato classificado por um aluno como violência, não necessariamente, é considerado

assim pelo outro. Nas falas, há várias compreensões a respeito do fenômeno da violência.

Nesta perspectiva, verificamos que, para a maioria dos interlocutores desta pesquisa, a

violência é ação social que agride física e verbalmente o outro e, sobretudo, atitudes que

desrespeitam o outro, como os palavrões, as ameaças, os xingamentos etc. As práticas de

sociabilidades violentas e os conflitos são, na maioria das vezes, relacionados a sentimentos

negativos, deixando os sujeitos apáticos, constrangidos e revoltados perante a situação

vivenciada.

Segundo narrativas dos estudantes, pudemos compreender que algumas práticas tidas

como violentas são, na maioria das vezes, relacionadas à ideia de “fazer justiça com as

próprias mãos”, mostrar força e vigor, “brincar” de brigar etc. e, assim, muitas percepções são

atribuídas à violência escolar. Com suporte nestas visões multifacetadas, as práticas de

sociabilidades na escola são percebidas ou não como violência e os agentes escolares são

rotulados ou não como violentos.

Na maioria das vezes, os estudantes não percebem que os seus atos outrora

compreendidos por outros sujeitos como violência ferem a integridade e a autoestima do

outro, como os palavrões e as ameaças usadas no cotidiano escolar: “rapariga”, “viado”,

“cabelo de bucha”, “vou te pegar lá fora”. Estas práticas parecem ser entendidas por uns como

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naturais – “é apenas uma brincadeira” – e percebida por outros como “brincadeira de mau

gosto”, falta de respeito e ato violento.

As análises indicaram que, de acordo com as concepções de violência, os discursos

escolares divergem. Muitos a percebem, mas não sabem lidar com ela e passam a utilizar as

normas e regras da escola como “fórmula” disciplinadora; outros procuram enfrentá-la com

ações coletivas por meio dos projetos e já outros acentuam que combater a violência não é

tarefa da escola.

O respeito é considerado pelos agentes escolares como um dispositivo importante na

resolução de conflitos. Eles acreditam que, se há respeito nas relações sociais, as violências e

tensões serão reduzidas. Assim, o respeito é um valor muito pronunciado e reconhecido pelos

interlocutores da pesquisa, porém pouco praticado e com vários sentidos e significados que

divergem de acordo com o contexto nos discursos apreendidos em campo. Para os gestores, o

respeito está associado ao cumprimento das regras e normas institucionais; para os

professores, é entendido como valor moral constituído no seio familiar; já sob os olhares dos

estudantes, vincula-se ao direito da liberdade de expressão.

Em razão das divergências e variados prismas de compreensão, ideia de respeito e as

múltiplas concepções do que é violento ou não, o diálogo na escola surge como via de

negociação e mediação ante as manifestações violentas. Assim, o diálogo e o respeito

possibilitam o reconhecimento mútuo e a solidariedade na escola, estabelecendo espaços de

autonomia e protagonismo.

Na escola pesquisada, a indisciplina é associada ao modo como os estudantes

interagem e ao relacionamento professor e estudante. Atitudes como não realizar as atividades

escolares, desobedecer às normas da escola e às ordens do professor, xingar o colega etc. são

classificadas como atos indisciplinados. Deste modo, a disciplina é percebida como atitudes e

comportamentos que facilitam o ensino em sala de aula. Já os atos de indisciplina, na visão

dos educadores, levam a atos violentos e conflitos.

A escola e sua dinâmica interna são afetadas pelas dinâmicas sociais externas (mais

amplas) atualmente marcadas por sociabilidades violentas. A questão que nos parece

relevante é o fato de a escola e o conjunto de suas relações, ao se encontrarem cada vez mais

impactadas por conflitos cujos valores e disputas nem sempre são próprios de sua dinâmica,

revelam complexidades que tanto a instituição, quanto seus agentes, embora impelidos a agir,

atualmente não possuem dispositivos capazes de controlar ou prevenir o fenômeno da

violência.

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É importante escutar as falas, decifrar as práticas de sociabilidades classificadas

como violentas e ir além, compreendendo os silêncios que revelam o não dito ou narrado por

meio dos diálogos e dos acordos mediados e negociados na escola, pautados no respeito às

diferenças. Deste modo, a pesquisa indicou que, nas relações sociais, quando não possíveis a

palavra e o respeito às diferenças, cria-se um campo fértil para os atos violentos. Neste

sentido, a violência é instrumento de expressão e resgate da palavra e de reivindicações

pessoais ou coletivas.

A realização deste estudo possibilitou reflexão teórica que refletirá em nossa prática

profissional e acadêmica. Com arrimo neste ensaio, estabelecemos relações entre a teoria

investigada e as percepções narradas pelos agentes escolares. Desta forma, o experimento

contribuiu para uma compreensão mais ampla dos sentidos atribuídos à violência pelos

agentes da escola. Portanto, as ideias aqui expostas nos desafiam cada vez mais a investigar a

temática e buscar nas linguagens dos sujeitos implicados na realidade social o código que

decifra a violência.

É importante registrar o fato de que, encerrada a pesquisa, já podemos lançar outros

questionamentos: com suporte nas concepções de violência, quais estratégias são possíveis no

enfrentamento da violência? Portanto, surge a possibilidade de trabalhos futuros, decerto, na

tese de doutorado, com novas discussões e aportes teóricos, pois o conhecimento é vasto e

inacabado. Tencionamos que esta pesquisa contribua com outros estudos, com vistas ao

aprimoramento dos pontos aqui desenvolvidos e que apontaram aos mencionados resultados.

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REFERÊNCIAS

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APÊNDICES

APÊNDICE 1 – Entrevista com estudantes

APÊNDICE 2 – Entrevista com professores

APÊNDICE 3 – Entrevista com gestores

APÊNDICE 4 – Autorização das famílias para publicação dos dados da pesquisa

APÊNDICE 5 – Autorização dos professores para publicação dos dados da pesquisa

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APÊNDICE 1

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ-UECE MESTRADO EM POLÍTICA PÚBLICA E SOCIDADE-MAPPS PESQUISA DO MESTRANDO – HARLEY GOMES DE SOUSA TEMÁTICA: VIOLÊNCIA ESCOLAR

ENTREVISTA COM OS ESTUDANTES

ROTEIRO GUIA

I. DADOS PESSOAIS

II. VISÃO DA ESCOLA A visão que se tem da escola. Definição do que é a escola.

III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA Conhecimento sobre direitos e deveres.

IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS Conceitos de violência e não violência na escola Atitudes comportamentais caracterizadas como violentas ou não violentas

I. DADOS PESSOAIS Nome do Aprendiz:__________________________________________________________ Sexo: F ( ) M ( ) Idade: ____ anos Série/ano:_____ ano Entrevistado em: ____ / ____/ ______ II. VISÃO DA ESCOLA 1. Fale sobre as coisas que fazem você gostar da escola e as que as que não fazem. Cite até cinco. 2. O que é a Escola para você? III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA 3. Você acha que o aluno tem direito e deveres na escola? Quais? 4. Já ouve situações que seus direitos não foram respeitados? Como foi?

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5. E você cumpre com seus deveres? Já houve alguma situação em que você não cumpriu com sues deveres? Como foi? IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS 6. Como você vê o relacionamento entre as pessoas na escola? 7. O que pode ser confusão na escola para você? 8. Você acha que existe confusão dentro da escola? Você já se envolveu em alguma situação considerada como uma confusão? 9. Como a escola agiu? 10. Como você avalia o procedimento da escola? 11. Você considera alguma atitude na escola como violenta? Quais? 12. Como você define o termo violência? Ela existe na escola? Como?

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APÊNDICE 2

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ-UECE MESTRADO EM POLÍTICA PÚBLICA E SOCIDADE-MAPPS PESQUISA DO MESTRANDO – HARLEY GOMES DE SOUSA TEMÁTICA: VIOLÊNCIA ESCOLAR

ENTREVISTA COM OS PROFESSORES

ROTEIRO GUIA

I. DADOS PESSOAIS

II. VISÃO DA ESCOLA A visão que se tem da escola. Definição do que é a escola.

III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA Conhecimento sobre direitos e deveres.

IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS Conceitos de violência e não violência na escola Atitudes comportamentais caracterizadas como violentas ou não violentas

I. DADOS PESSOAIS Nome:_______________________________________________________ Idade:____ anos Sexo: F( ) M ( ) Série/ano que leciona: _______________ Tempo de Docência:___ anos Disciplina (s):_______________________________________________________________ Instrução: _________________________________ Entrevistado em: ____ / ____/ ______ II. VISÃO DA ESCOLA 1. Fale sobre as coisas que fazem você gostar da escola e as que as que não fazem. Cite até cinco. 2. O que é a Escola para você? III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA 3. Você acha que o professor tem direito e deveres na escola? Quais? 4. Já ouve situações que seus direitos não foram respeitados? Como foi?

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5. E você cumpre com seus deveres? Já houve alguma situação em que você não cumpriu com sues deveres? Como foi? IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS 6. Como você vê o relacionamento entre as pessoas na escola? 7. O que pode ser confusão na escola para você? 8. Você acha que existe confusão dentro da escola? Você já se envolveu em alguma situação considerada como uma confusão? 9. Como a escola agiu? 10. Como você avalia o procedimento da escola? 11. Você considera alguma atitude na escola como violenta? Quais? 12. Como você define o termo violência? Ela existe na escola? Como?

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APÊNDICE 3

UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ-UECE MESTRADO EM POLÍTICA PÚBLICA E SOCIDADE-MAPPS PESQUISA DO MESTRANDO – HARLEY GOMES DE SOUSA TEMÁTICA: VIOLÊNCIA ESCOLAR

ENTREVISTA COM OS GESTORES

ROTEIRO GUIA

I. DADOS PESSOAIS

II. VISÃO DA ESCOLA A visão que se tem da escola. Definição do que é a escola.

III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA Conhecimento sobre direitos e deveres.

IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS Conceitos de violência e não violência na escola Atitudes comportamentais caracterizadas como violentas ou não violentas

I. DADOS PESSOAIS Nome:_______________________________________________________ Idade:____ anos Sexo: F( ) M ( ) Tempo de Gestão:___ anos Gestão por Mérito: ( ) sim ( ) não Instrução: _________________________________ Entrevistado em: ____ / ____/ ______ II. VISÃO DA ESCOLA 1. Fale sobre as coisas que fazem você gostar da escola e as que as que não fazem. Cite até cinco. 2. O que é a Escola para você? III. INTERAÇÃO ESCOLA E CIDADANIA 3. Você acha que o gestor tem direito e deveres na escola? Quais? 4. Já ouve situações que seus direitos não foram respeitados? Como foi?

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5. E você cumpre com seus deveres? Já houve alguma situação em que você não cumpriu com sues deveres? Como foi? IV. PRÁTICAS TIDAS COMO VIOLENTAS 6. Como você vê o relacionamento entre as pessoas na escola? 7. O que pode ser confusão na escola para você? 8. Você acha que existe confusão dentro da escola? Você já se envolveu em alguma situação considerada como uma confusão? 9. Como a escola agiu? 10. Como você avalia o procedimento da escola? 11. Você considera alguma atitude na escola como violenta? Quais? 12. Como você define o termo violência? Ela existe na escola? Como?

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APÊNDICE 4

AUTORIZAÇÃO DAS FAMÍLIAS PARA PUBLICAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA

Eu,__________________________________________________________________,

portador do RG nº __________________________, residente e domiciliado na

__________________________________________________________________ nº ______,

bairro________________________ no Município de General Sampaio-CE; ( ) pai ( ) mãe do

(a) estudante _______________________________________________________ , ____

idade, do ______ ano do Ensino Fundamental , turno ( ) M ( ) T, da EMEF José Bezerra

Filho , autorizo a publicação dos dados na pesquisa do mestrando Harley Gomes de Sousa,

do Mestrado Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do

Ceará, especialmente o uso de imagens ou a transcrição do áudio da entrevista,

correspondente ao meu (minha) filho (a).

Esta pesquisa busca compreender como são percebidas as práticas de sociabilidade

classificadas como “violência” no espaço escolar pelos estudantes, professores e gestores. O

(a) estudante acima descrito (a), além de fornecer dados na entrevista ele (ela) estará sendo

observado (a) nas visitas do pesquisador, o qual utilizará o diário de campo para fazer os

registros dos relatos, ou atitudes/comportamentos observados.

Além dessas estratégias, coletaremos os seguintes dados:

a) investigar quais as práticas de sociabilidades são classificadas pelos estudantes,

professores e gestores como “violência”;

b) identificar a visão de escola para os agentes escolares e seus modelos de

interação social e cidadania.

Ciente de que serão resguardados dados confidenciais que possam comprometer a

ética da pesquisa e a identidade da criança/adolescente e da família, tais como: nome

verdadeiro e endereço, fotos e imagens, autorizo a utilização das informações adquiridas para

fins do citado estudo.

General Sampaio-CE, _____ de ________________ de 2014.

__________________________________

Assinatura do pai/mãe ou responsável

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APÊNDICE 5

AUTORIZAÇÃO DOS PROFESSORES E GESTORES PARA PUBLICAÇÃO DOS DADOS DA PESQUISA

Eu, ______________________________________________________________ ( )

professor ( ) gestor, da EMEF José Bezerra Filho, portador do RG nº __________________,

residente e domiciliado na _______________________________________________

nº______, bairro____________________ no Município de General Sampaio-CE; autorizo a

publicação dos dados na pesquisa do mestrando Harley Gomes de Sousa, do Mestrado

Acadêmico em Políticas Públicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceará,

especialmente o uso de minha imagem ou a transcrição do áudio da minha entrevista.

Esta pesquisa busca compreender como são percebidas as práticas de sociabilidade

classificadas como “violência” no espaço escolar pelos alunos, professores e gestores. O (a)

professor (a) e ou gestor (a) acima descrito (a), além de fornecer dados na entrevista ele (ela)

estará sendo observado (a) nas visitas do pesquisador, o qual utilizará o diário de campo para

fazer os registros dos relatos, ou atitudes/comportamentos observados.

Além dessas estratégias, coletaremos os seguintes dados:

a) investigar quais as práticas de sociabilidades são classificadas pelos estudantes,

professores e gestores como “violência”;

b) identificar a visão de escola para os agentes escolares e seus modelos de

interação social e cidadania.

Ciente de que serão resguardados dados confidenciais que possam comprometer a

ética da pesquisa e a identidade da criança/adolescente e da família, tais como: nome

verdadeiro e endereço, fotos e imagens, autorizo a utilização das informações adquiridas para

fins do citado estudo.

General Sampaio-CE, _____ de ________________ de 2014.

____________________________________________

Assinatura do Gestor/Professor