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UNESCO 2003 Edição publicada pela Representação da UNESCO no Brasil

As autoras são responsáveis pela escolha e pela apresentação dos fatos contidos nesta publi-cação e pelas opiniões aqui expressas, que não são necessariamente as da UNESCO e nãocomprometem a Organização. As designações empregadas e a apresentação do material nãoimplicam a expressão de qualquer opinião que seja, por parte da UNESCO, no que dizrespeito ao status legal de qualquer país, território, cidade ou área, ou de suas autoridades, ouno que diz respeito à delimitação de suas fronteiras ou de seus limites.

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Abramovay, MiriamViolências nas escolas/MiriamAbramovay et alii. � Brasília : UNESCOBrasil, REDE

PITÁGORAS, Coordenação DST/AIDS do Ministério da Saúde, a Secretaria de EstadodosDireitos Humanos doMinistério da Justiça, CNPq, Instituto Ayrton Senna, UNAIDS,BancoMundial, USAID, Fundação Ford, CONSED, UNDIME, 2002.

88p.

1. Problemas Sociais-Brasil 2. Violência 3. Juventude 4.EducaçãoI. Abramovay, Miriam II. UNESCO III. Título.

CDD362

edições UNESCO BRASIL

Conselho EditorialJorge WertheinCecilia BraslavskyJuan Carlos TedescoAdama OuaneCélio da Cunha

Comitê para a Área de Ciências Sociais e Desenvolvimento SocialJulio Jacobo WaiselfishCarlos Alberto VieiraMarlova Jovchelovitch NoletoEdna Roland

Revisão: DPE StudioAssistente Editorial: Rachel Gontijo de AráujoDiagramação: Fernando BrandãoProjeto Gráfico: Edson Fogaça

UNESCO 2003

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a CulturaRepresentação no BrasilSAS, Quadra 5 Bloco H, Lote 6,Ed. CNPq/IBICT/UNESCO, 9º andar.70070-914 – Brasília – DF – BrasilTel.: (55 61) 2106-3500Fax: (55 61) 322-4261E-mail: [email protected]

BR/2003/PI/H/8

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EQUIPE RESPONSÁVEL:Miriam Abramovay, Coordenadora (Consultora Banco Mundial)Maria das Graças Rua, Coordenadora (Consultora UNESCO)

COLABORAÇÃO ESPECIAL:Mary Garcia Castro, Pesquisadora UNESCO

ASSISTENTES DE COORDENAÇÃO:Diana Teixeira BarbosaLorena Vilarins dos SantosSoraya Campos de Almeida

ASSISTENTES DE PESQUISA:Cláudia Beatriz Silva e SouzaCláudia Tereza Signori FrancoDanielle Oliveira ValverdeFabiano de Sousa Lima

Joani Silvana Capiberibe de LyraLeonardo de Castro PinheiroLena Tatiana Dias Tosta

Rodrigo Padua Rodrigues ChavesViviene Duarte Rocha

AMOSTRA QUANTITATIVA:David Duarte Lima

APOIO ESTATÍSTICO:Maria Inez M.T. Walter

CRÍTICA E EXPANSÃO DA AMOSTRA:Milton Mattos Souza

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NOTA SOBREASAUTORAS

MIRIAM ABRAMOVAY é professora da Universidade Católica deBrasília, vice-coordenadora do Observatório de Violência nas Escolas

e avaliações nos temas: juventude, violência e gênero. Formou-se emSociologia e Ciências da Educação pela Universidade de Paris, França(Paris VII � Vincennes), possui mestrado em Educação pela PontifíciaUniversidade Católica de São Paulo e é doutoranda e na Universidadede Bordeaux Victor Segalen, França. Coordenou e publicou váriasavaliações de programas sociais, entre eles do Programa Abrindo Espaços.É co-autora de livros sobre juventude, violência e cidadania, bem comode vários artigos publicados em revistas, científicas e especializadas notema violência nas escolas.

MARIA DAS GRAÇAS RUA é professora da Universidade de Brasíliae consultora da UNESCO em pesquisas e avaliações, principalmentepara questões de gênero, juventude e violência. Bacharel em CiênciasSociais, fez pós-graduação em Ciência Política no Instituto Universitáriode Pesquisas do Rio de Janeiro, Brasil. Entre muitos trabalhos, destaca-se sua tese de doutorado: �Políticos e Burocratas no Processo de Policy-Making: A Política de Terras no Brasil, 1945-1984�. Foi coordenadorado Grupo de Trabalho de Políticas Públicas da Associação Nacional dePós-Graduação e Pesquisa em Ciências Sociais (ANPOCS).

no Brasil e consultora de vários organismos internacionais em pesquisas

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SUMÁRIO

Apresentação ..................................................................................................... 11

Introdução .......................................................................................................... 13

Metodologia ....................................................................................................... 171. Caracterização do estudo realizado.......................................................... 17Pesquisa compreensiva .............................................................................. 17Pesquisa extensiva ...................................................................................... 17Desenho amostral ........................................................................................ 19Critérios e limites de generalização .......................................................... 19

CAPÍTULO 1Violências nas escolas: revisitando a literatura ........................................... 211.1 Os tipos de violências nas escolas ......................................................... 231.2 Variáveis endógenas e exógenas ............................................................. 241.3 A literatura nacional � ecos, especificidades e silêncios .................... 261.4 Perspectivas deste estudo ....................................................................... 26

CAPÍTULO 2O ambiente da escola ...................................................................................... 292.1 O entorno das escolas .............................................................................. 292.2 O ambiente escolar .................................................................................. 31

CAPÍTULO 3A escola: funcionamento e relações sociais ................................................. 333.1 Funcionamento da escola ........................................................................ 34

3.1.1 Transgressões e punições .............................................................. 343.2 Percepções sobre a escola ....................................................................... 36

3.2.1 Relações entre alunos e professores ........................................... 383.2.2 Relações entre alunos, diretores e outros atores da escola ..... 40

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RESUMO: Violências nas escolas

CAPÍTULO 4Escola, exclusão social e racismo .................................................................. 414.1 Significados da escola ............................................................................... 424.2 A escola como espaço de exclusão social ............................................. 43

4.2.1 Padrões de exclusão e discriminação social ............................... 444.3 Auto-identificação racial e noções de racismo .................................... 46

CAPÍTULO 5As violências nas escolas: ocorrências, praticantes e vítimas ................... 495.1 Tipos de violência: a violência contra a pessoa ................................... 50

5.1.1 Ameaças ........................................................................................... 505.1.2 Brigas ................................................................................................ 515.1.3 Violência sexual .............................................................................. 535.1.4 O uso de armas ............................................................................... 54

5.2 Violência contra a propriedade ............................................................... 585.2.1 Roubos e furtos ............................................................................... 58

5.3 Violência contra o patrimônio ................................................................ 605.4 Praticantes e vítimas de violência .......................................................... 62

CAPÍTULO 6Repercussões das violências e soluções alternativas .................................. 656.1 Repercussões das violências .................................................................... 656.2 Medidas contra as violências nas escolas: sugestões dos

protagonistas .............................................................................................. 686.3 Por que uma escola torna-se violenta? .................................................. 716.4 Recomendações para políticas, estrategias e medidas contra

violências nas escolas ............................................................................... 736.5 Recomendações ......................................................................................... 75

Conclusões ......................................................................................................... 79

Lista de tabelas ................................................................................................. 83Lista de quadros ................................................................................................ 85Bibliografia ........................................................................................................ 87

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APRESENTAÇÃO

Esta publicação consiste em um resumo do livro �Violências dasEscolas�, lançado pela Representação da Organização das NaçõesUnidas para a Educação, a Cultura e a Ciência (UNESCO) no Brasil.Desde que veio a público, o livro tornou-se uma referência no debatesobre o enfrentamento da violência escolar. Isso ocorre, de um lado, porcausa do ineditismo da obra no que diz respeito à extensão domapeamento e da análise sobre o fenômeno � o livro contém resultadosobtidos em 13 Unidades da Federação e no Distrito Federal, algo nuncafeito no país. De outro, porque �Violências nas Escolas� tornou-se ummarco dentro da atuação da UNESCO no Brasil, na medida que chamoua atenção de pesquisadores, acadêmicos e formuladores de políticaspúblicas para uma problemática que, quando presente nas escolas,prejudica seu funcionamento, impedindo que ela cumpra sua funçãoinstitucional, ensinar crianças e jovens.

Paralelamente, os resultados apresentados em �Violências nasEscolas� serviram de estímulo à mobilização em vários segmentos dasociedade � governo, organizações não-governamentais, pesquisadores eeducadores �, possibilitando a formatação de diversas ações visando aoenfrentamento da violência escolar, entre as quais destaca-se a criaçãodo Observatório de Violências na Escola � Brasil, iniciativa conjunta daUNESCO e da Universidade Católica de Brasília. De modo geral, a tônicadessas ações tem sido buscar compreender o fenômeno, por meio deestudos e pesquisas, bem como desenvolver propostas de ação que mudemo quadro de degradação das relações humanas e sociais predominante emalguns colégios. O objetivo maior é disseminar uma cultura de paz,construída por meio de estratégias como a mediação, a qual tem comopropósito prevenir e estimular uma convivência harmoniosa. No caso dasescolas, a mediação visa promover a mudança do clima dosestabelecimentos de ensino a partir do diálogo e da superação de conflitospor meio de soluções apresentadas pelos atores envolvidos.

O presente resumo também é um dos resultados da mobilizaçãogerada pelo livro �Violências nas Escolas�, levando a UNESCO-Brasil e

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RESUMO: Violências nas escolas

o Rede Pitágoras a se unirem para trazer a professores, diretores e demaismembros da equipe escolar e alunos este material. Trata-se de uma obra quepretende fomentar a discussão, estimular a reflexão e, por que não, respaldarestratégias inovadoras para de lidar e superar a violência escolar.

Neste resumo são apresentadas as principais linhas teóricas quenorteiam o debate contemporâneo sobre as violências na escola e osprincipais resultados obtidos na pesquisa, permitindo que o educadorcompreenda a problemática em sua complexidade. Desse modo, abordatanto a violência engendrada na sociedade, fora dos muros escolares, masque prejudica alunos, professores e demais membros da equipe pedagógica� como é o caso da ação dos grupos ligados ao tráfico de drogas �, quantotrata de dinâmicas específicas do cotidiano dos estabelecimentos escolares,as quais também podem se constituir emmodalidades de violência simbólicae/ou institucional.

Ao trazer essas informações e esses resultados aos educadores, aUNESCO e o Rede Pitágoras acreditam que estão cumprindo um papelrelevante no sentido de instrumentalizá-los para lidar com um tema quecertamente faz parte de seu dia-a-dia, gerando sentimentos de perplexidade,insegurança e, até, impotência. O objetivo maior é dar aos atores queintegram a comunidade escolar condições para que sejam superadas assituações de violência, altamente prejudiciais ao desenvolvimento plenode milhões de crianças e jovens que, todos os dias, freqüentam os bancosescolares. Afinal, a sociologia nos ensina que um ambiente pedagógicopacífico e estimulante é condição prévia para a aprendizagem e o processoeducativo como um todo. Por isso mesmo, superar as violências nas escolasé um investimento de seguro retorno em favor do padrão de qualidade.

É necessário que cada instituição escolar brasileira enfrente as violênciasescolares com firmeza e altivez pedagógica. A paz se constrói tão cedo quantopossível porque � não é demais repetir a Constituição da UNESCO � se aguerra nasce nas mentes dos homens, também nelas se pode e deve construira paz. Em outras palavras, é por intermédio de uma educação de qualidadeque consiga mobilizar o potencial criativo de crianças e jovens e assegurar odesenvolvimento pleno de sua auto-estima, é que haveremos de formarmentesvoltadas para a construção de uma cultura de paz.

Jorge WertheinRepresentante da UNESCO

no Brasil

Cristovam BuarqueRede Pitágoras

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Em todo o mundo ocidental moderno, a ocorrência de violênciasnas escolas não é um fenômeno recente. Este, além de constituir umimportante objeto de reflexão, tornou-se, antes de tudo, um graveproblema social.

Desde os primeiros estudos realizados sobre o assunto, nosEstados Unidos, na década de 1950, diversas das dimensões dessefenômeno passaram por mudanças e os problemas decorrentesassumiram maior gravidade. Algumas dessas notáveis transformaçõesforam: o surgimento de armas nas escolas, inclusive armas de fogo, adisseminação do uso de drogas e a expansão do fenômeno das gangues,influenciando a rotina das escolas eventualmente associadas aonarcotráfico. Outra grande mudança resulta do fato de que as escolase suas imediações deixaram de ser áreas protegidas ou preservadas etornaram-se, por assim dizer, incorporadas à violência cotidiana doespaço urbano. Ademais, as escolas deixaram, de certa forma, derepresentar um local de amparo, seguro e protegido para os alunos eperderam grande parte dos seus vínculos com a comunidade.

Como não poderia deixar de ser, mudou também o foco de análisedo fenômeno em comparação aos primeiros estudos. Inicialmente, aviolência na escola era tratada como uma simples questão de disciplina.Mais tarde, passou a ser analisada como manifestação de delinqüênciajuvenil, expressão de comportamento anti-social. Hoje, é percebidade maneira muito mais ampla, sob perspectivas que expressamfenômenos como a globalização e a exclusão social, os quais requeremanálises que não se restrinjam às transgressões praticadas por jovensestudantes ou às violências das relações sociais entre eles.

A sociedade brasileira, por sua vez, vem-se deparando com umaumento das violências nas escolas, sendo diversos os episódiosenvolvendo agressões verbais, físicas e simbólicas aos atores dacomunidade escolar, fato que despertou as atenções das diversas

INTRODUÇÃO

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RESUMO: Violências nas escolas

instâncias governamentais, dos organismos internacionais e dasociedade civil1 .

Desde 1997, a UNESCO no Brasil iniciou uma série de pesquisascentradas nos temas de Juventude, Violência e Cidadania, apresentandopropostas concretas de políticas públicas, a fim de contribuir na buscade solução para os problemas que afetam a juventude, destacando sualigação com questões tais como: exclusão social, mercado de trabalho,família, educação, participação social, protagonismo juvenil, entre outros.

No âmbito dessas preocupações e correspondentes esforços situa-se esta pesquisa, cujos objetivos podem ser descritos em sentido amplocomo identificar e analisar as percepções de alunos, do corpo técnico-pedagógico e dos pais sobre as violências nas escolas e suas causas;descrever a freqüência e a gravidade dos incidentes; avaliar seu impactosobre a aprendizagem; e identificar os mecanismos adotados e/ourecomendáveis � de prevenção, redução e erradicação do problema.

Para a realização deste estudo adotou-se uma concepçãoabrangente de violência, que incorpora não só a idéia de sevícia, deutilização da força ou intimidação, mas também compreende asdimensões socioculturais e simbólicas do fenômeno em tela. Há de seenfatizar, no entanto, que a violência na escola não deve ser vistasimplesmente como uma modalidade de violência juvenil, pois suaocorrência expressa a intersecção de três conjuntos de variáveisindependentes: o institucional (escola e família), o social (sexo, cor,emprego, origem socioespacial, religião, escolaridade dos pais, statussocioeconômico) e o comportamental (informação, sociabilidade,atitudes e opiniões).

1 Em 1999 o governo federal criou uma comissão de especialistas, coordenada pelo InstitutoLatino-Americano para a Prevenção do Delito e Tratamento de Delinqüentes � Ilanud, como objetivo de elaborar diretrizes para enfrentar o problema. Do mesmo modo, o MEC, juntocom outros órgãos, organizou uma campanha nacional de Educação para a Paz. A sociedadecivil, por seu turno, mobilizou-se na forma de campanhas e projetos como: Se Liga, Galera,Paz, Construa seu Grêmio, campanha Sou da Paz, entre outros. A UNESCO, com o programaAbrindo Espaços � Educação e Cultura para a Paz, advoga a estratégia de um programa nacionalque promova a abertura das �escolas nos finais de semana�, com a construção de espaços decidadania que possam vir a reverter o quadro de violência.

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Exatamente a fim de se referir à pluralidade das dimensõesenvolvidas, este trabalho adotou a expressão �violências nas escolas�,que tem a vantagem adicional de situar o fenômeno não em um sistemainstitucional , genericamente considerado, mas contemplar aespecificidade espacial e temporal de cada uma das suas unidades. Assim,se é possível pensar em múltiplas manifestações que justificam falar de�violências� é também admissível supor que estas tenham lugar emestabelecimentos onde podem variar em intensidade, magnitude,permanência e gravidade.

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1. CARACTERIZAÇÃO DO ESTUDO REALIZADO

Este estudo possui dois tipos de abordagem: a extensiva e acompreensiva. A abordagem extensiva recorre a técnicas quantitativas,baseando-se na representatividade e na capacidade inferencial dos dadose é característica das pesquisas do tipo survey. Já a abordagem compreensivautiliza técnicas qualitativas, trabalhando o conteúdo de manifestações davida social, enfatizando as percepções do sujeito sobre o vivido.

Pesquisa compreensivaNeste estudo foram utilizadas as seguintes técnicas: grupos focais;

entrevistas individuais com diretores de escolas, demais membros docorpo técnico-pedagógico, policiais, agentes de segurança, vigilantes einspetores/coordenadores de disciplina; e observação in loco das escolas.Nas três técnicas utilizou-se roteiros que cobriam diversos aspectos dosfenômenos estudados.

Pesquisa extensivaForam aplicados questionários estruturados a alunos, professores

e pais de alunos em treze capitais brasileiras (Manaus, Belém, Fortaleza,Recife,Maceió, Salvador, Goiânia, Cuiabá, Vitória, Rio de Janeiro, SãoPaulo, Porto Alegre e Florianópolis) e no Distrito Federal (Tabela 1).

METODOLOGIA

TABELA 1 � Questionários respondidos por alunos, professores e paisnas capitais das Unidades da Federação (números absolutos)

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Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.

TABELA 1 � (continuação)

Esta etapa abrangeu tanto estabelecimentos públicos comoprivados (Tabela 2), dedicados ao ensino fundamental e médio, nosturnos diurno e noturno.

TABELA 2 � Distribuição amostral das escolas, por capitais dasUnidades da Federação, segundo a dependência administrativa(números absolutos)

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Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.

TABELA 2 � (continuação)

Desenho amostralA base de dados para a seleção dessa amostra foi o cadastro

construído a partir do Censo Escolar de 1998, realizado pelo Inep-MEC.A coleta de dados se estendeu de abril a dezembro de 2000. Adotou-se oprocedimento de amostragem estratificada com seleção através deconglomerados em duas etapas. Nesta pesquisa, as escolas correspondemàs unidades de seleção, pois elas é que são amostradas. As unidadessecundárias ou unidades de observação são as séries/turmas. Finalmente,as unidades terminais são constituídas pelos alunos, distribuídos segundoos estratos, nas unidades de ensino públicas e privadas, nos níveisfundamental (a partir da 5ª série) e médio dos turnos diurno e noturno,nas capitais das Unidades da Federação escolhidas para compor este estudo.

Critérios e limites de generalizaçãoConsiderando o desenho e a crítica da amostra no caso dos alunos,

pode-se sustentar que a pesquisa tem total validade, sendo perfeitamentelegítima a generalização no período para os municípios-sede das capitaispesquisadas. Já as informações coletadas por meio de questionários junto apais e professores devem ser tratadas de forma diferente do caso dos alunos,não se podendo generalizar para essas populações, pois se dependeu doarbítrio de cada pai e professor devolver o questionário preenchido.

No que se refere aos dados coletados pelos roteiros deobservação é necessário ter em mente que, por agregarem informaçõessobre as escolas selecionadas probabilisticamente, não admiteminferência estatística.

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RESUMO: Violências nas escolas

Como regra, somente foram submetidas à análise as respostasválidas, ou seja, a não ser nos casos em que poderiam assumir significadosubstantivo, não foram incluídas as �não-respostas�.

O termo �membros do corpo técnico-pedagógico� mencionadonas tabelas compreende professores, diretores, coordenadores esupervisores de ensino e orientadores educacionais. Contudo, como osprofessores representam a maioria desse grupo, no texto, geralmente, asrespostas são a eles referidas.

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A percepção da violência no meio escolar muda de acordo com oolhar pelo qual esse meio é abordado. No passado, as análises recaíamsobre a violência do sistema escolar, especialmente por parte dosprofessores contra os alunos (punições e castigos corporais). Na literaturacontemporânea, sociólogos, antropólogos, psicólogos e outros especialistasprivilegiam a análise da violência praticada entre alunos ou de alunoscontra a propriedade (vandalismo, por exemplo) e, em menor proporção,de alunos contra professores e de professores contra alunos.

A ênfase de cada estudo depende daquilo que é definido comoviolência. Charlot e Émin (1997) referem-se à dificuldade em definirviolência escolar, não somente porque esta remete aos �fenômenosheterogêneos, difíceis de delimitar e ordenar�, mas, também, porque eladesestrutura representações sociais que têm valor fundador, por exemplo,a idéia de infância (associada à idéia de inocência) e a de escola(compreendida como refúgio de paz).

Outro fator que dificulta a apreensão e a análise da violência � emparticular da violência escolar � é o fato de que não existe consensosobre o significado de violência. O que é caracterizado como violênciavaria em função do estabelecimento escolar, do status de quem fala(professores, diretores, alunos, etc), da idade e, provavelmente, do sexo.

Charlot amplia o conceito de violência escolar, classificando-a emtrês níveis:

a. Violência: golpes, ferimentos, violência sexual, roubos, crimes,vandalismos;

b. Incivilidades: humilhações, palavras grosseiras, falta de respeito;c. Violência simbólica ou institucional: compreendida como a faltade sentido de permanecer na escola por tantos anos; o ensino

1. VIOLÊNCIAS NAS ESCOLAS:REVISITANDOA LITERATURA

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RESUMO: Violências nas escolas

como um desprazer, que obriga o jovem a aprender matérias econteúdos alheios aos seus interesses; as imposições de umasociedade que não sabe acolher os seus jovens no mercado detrabalho; a violência das relações de poder entre professores ealunos. Também o é a negação da identidade e da satisfaçãoprofissional aos professores, a obrigação de suportar oabsenteísmo e a indiferença dos alunos.

Portanto, quando se estuda violência escolar, segundo Debarbieux(1996: 42), deve-se considerar:

1. os crimes e delitos tais como furtos, roubos, assaltos, extorsões,tráfico e consumo de drogas etc., conforme qualificados peloCódigo Penal;

2. as incivilidades, sobretudo, conforme definidas pelos atores sociais;3. sentimento de insegurança ou, sobretudo, o que aquidenominamos �sentimento de violência� resultante dos doiscomponentes precedentes, mas, também, oriundo de umsentimento mais geral nos diversos meios sociais de referência.

Por isso, em diversas partes no mundo e no Brasil, pesquisadorestêm procurado refinar o conceito de violência considerando a população-alvo, os jovens e o lugar da escola como instituição. Nesse sentido, aliteratura nacional contempla não apenas a violência física, mas acentuaa ética, a política e a preocupação em dar visibilidade a �violênciassimbólicas�. Por exemplo, Sposito, como Hannah Arendt (1961),encontra nexo entre a violência e a quebra de diálogo, da capacidade denegociação � que, de alguma forma, é a matéria-prima do conhecimento/educação. Assim, para a autora, �violência é todo ato que implica aruptura de um nexo social pelo uso da força. Nega-se, assim, apossibilidade da relação social que se instala pela comunicação, pelouso da palavra, pelo diálogo e pelo conflito� (Sposito, 1998: 60).

Os termos para indicar a violência também variam de um paíspara outro. Nos Estados Unidos, diversas pesquisas recorrem ao termodelinqüência juvenil. Na Inglaterra, alguns autores defendem que o termoviolência na escola só deve ser empregado no caso de conflito entreestudantes e professores ou em relação a atividades que causemsuspensão, atos disciplinares e prisão.

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Também é importante atentar para a mudança do tipo de violênciaque ocorre nas escolas, tendência que vem sendo observada no Brasil eem outros países. No caso do Brasil, Codo e Vasques-Menezes (2001)observam, nas brigas, uma tendência de se passar das palavras e punhospara as armas, especialmente as de fogo, o que provocaria o aumentodos casos com desfecho fatal.

Apesar das diferenças entre países e de conceituação, reforça-se aexistência de um consenso quanto ao fato de que não só a violênciafísica merece atenção, pois outros tipos de violência podem sertraumáticos e graves.

1.1 OS TIPOS DE VIOLÊNCIAS NAS ESCOLAS

São muitos os tipos de violências analisados e consideradoscomuns. Em especial na literatura norte-americana, o olhar recai sobregangues, xenofobia e bullying1 .

Na Europa, especialmente na França, os pesquisadores têm-sededicado ao estudo das incivilidades no meio escolar. Compreende-semelhor o que são as incivilidades por meio da descrição empírica.Dûpaquier (1999) refere-se a:

• delitos contra objetos e propriedades (quebra de portas evidraças, danificação de instalações etc.);

• intimidações físicas (empurrões, escarros) e verbais (injúrias,xingamentos e ameaças);

• descuido com o asseio das áreas coletivas (banheiros, por exemplo);• ostentação de símbolos de violência;

1 Bullying é definido por Nancy Day (1996: 44-45) como abuso físico ou psicológico contra alguémque não é capaz de se defender. Ela comenta que quatro fatores contribuem para odesenvolvimento de um comportamento de bullying: 1) uma atitude negativa pelos pais ou porquem cuida da criança ou do adolescente; 2) uma atitude tolerante ou permissiva quanto aocomportamento agressivo da criança ou do adolescente; 3) um estilo de paternidade que utilizao poder e a violência para controlar a criança ou o adolescente; e 4) uma tendência natural dacriança ou do adolescente a ser arrogante. Diz ainda que a maioria dos bullies são meninos, masas meninas também o podem ser. As meninas que são bullies utilizam, às vezes, métodos indiretos,como fofocas, a manipulação de amigos, mentiras e a exclusão de outros de um grupo.

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RESUMO: Violências nas escolas

• adoção de atitudes destinadas a provocar medo (poder de armas,posturas sexistas);

• alguns atos ilícitos, como o porte e consumo de drogas.Debarbieux (1998) considera que as incivilidades, classificadas

por ele como violências anti-sociais e antiescolares, podem sertraumáticas, sobretudo quando se dão de forma banalizada e sãosilenciadas, visando a proteger a escola. Segundo Bourdieu (2001), elasseriam possibilitadas por um poder que não se nomeia, que se deixaassumir como conivente e autoritário. Assim, professores não vêem,não reclamam e as vítimas não são identificadas como tais. Um exemploseriam as manifestações de racismo, em que seria comum a cumplicidadenão assumida entre jovens, adultos, alunos e professores.

Embora alguns autores não considerem as incivilidades umamodalidade de violência, sendo associadas à agressividade ou a padrõesde comportamento contrários às normas de convivência e respeito paracom o outro, existe um consenso sobre a necessidade de se prestaratenção à ocorrência de atos de incivilidades no ambiente escolar, poiselas podem tornar o ambiente hostil (Dûpaquier, 1999).

1.2 VARIÁVEIS ENDÓGENAS E EXÓGENAS

Para compreender e explicar o fenômeno das diversas violênciasnas escolas convém recorrer a aspectos tanto relativos ao interior quantoao exterior das escolas, como características das vítimas e dos agressoresassim como as diferentes instituições e ambientes pelos quais osestudantes circulam.

Entre os aspectos externos (chamados pelos especialistas devariáveis exógenas), é preciso levar em conta, por exemplo:

• questões de gênero (masculinidade/feminilidade);• relações raciais (racismo, xenofobia);• situações familiares (características sociais das famílias);• influência dos meios de comunicação (rádio, TV, revistas,jornais etc.);

• espaço social das escolas (o bairro, a sociedade).

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Entre os aspectos internos (chamados de variáveis endógenas), deve-se levar em consideração:

• a idade e a série ou nível de escolaridade dos estudantes;• as regras e a disciplina dos projetos pedagógicos das escolas, assimcomo o impacto do sistema de punições;

• o comportamento dos professores em relação aos alunos e à práticaeducacional em geral.

Para identificar variáveis ou fatores comumente inter-relacionadoscom as violências nas escolas, percorrem-se diversas outras relações eprocessos sociais. A tendência é não isolar um único fator como possívelcausa ou antecedente que as potencializaria. Prefere-se, em lugar disso,identificar conjuntos ou ambientes favoráveis à violência. Por isso, além deenfoques multidimensionais, vários autores defendem a importância deabordagem transdisciplinar, com a contribuição da sociologia, da ciênciapolítica, da psicologia, das ciências da educação e da justiça criminal.

É consensual o reconhecimento da vulnerabilidade negativa (riscos eobstáculos) da escola diante de distintos processos contemporâneos, emparticular as exclusões sociais, a atitude do poder público para com aeducação e a perda de prestígio e de poder aquisitivo pelos professores.

A vulnerabilidade da escola a várias violências, macrossociais, viriaaumentando também sua perda de legitimidade como lugar de produção etransmissão de saberes, quando contraposta ao alcance social, ampliaçãodo escopo e do acesso de novos meios de formação.

Segundo alguns autores, como Debarbieux, a escola está maisvulnerável a fatores e problemas externos (como o desemprego e aprecariedade da vida das famílias nos bairros pobres). Ele menciona, também,o impacto da massificação do acesso à escola, a qual passa a receber jovensnegativamente afetados por experiências de exclusão e pertencimento agangues, o que implica conseqüências para todos osmembros da comunidadeescolar: alunos, pais e professores (Debarbieux, 1998: 39). Esses fatoresexternos de vulnerabilidade se somam àqueles decorrentes do aumento dascondutas delinqüentes e de incivilidades na escola.

Embora os fatores externos tenham impacto e influência sobre aviolência escolar, é preciso tomar cuidado com o fato de que, dentro daprópria escola, existem possibilidades de lidar com as diferentes modalidadesde violência e de construir culturas alternativas pela paz, adotandoestratégias e capital da própria escola.

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RESUMO: Violências nas escolas

1.3 A LITERATURA NACIONAL � ECOS,ESPECIFICIDADES E SILÊNCIOS

Entre os trabalhos realizados no Brasil, a partir da década de 1980,sobre o tema violências nas escolas, destacam-se várias pesquisasdesenvolvidas por instituições públicas da educação, associações de classee, em menor grau, por instituições privadas de pesquisa, assim como deacadêmicos e equipes de investigação ligadas a universidades. Nesseperíodo, o tema foi abordado com maior ênfase pelos profissionais dasCiências Sociais que por especialistas em Educação, cujo interesse foidespertado tardiamente em conseqüência das linhas de pesquisa existentes.

Embora esses estudos ainda sejam incipientes, por focarem, emgrande maioria, situações regionais ou localizadas, os resultados obtidosapontam os principais tipos de violência: ações contra o patrimônio(depredações, pichações etc.), na década de 1980, bem como as formasde agressão interpessoal, principalmente entre os próprios alunos, nadécada de 1990.

No Brasil, durante a década de 1990, diferentemente da tendênciade anos anteriores, aumenta a preocupação com a violência nas escolasnão somente como fenômeno de origem exterior às instituições de ensino(causas exógenas), ainda que se dê ênfase, em especial, ao problema donarcotráfico, à exclusão social e às ações de gangues.

1.4 PERSPECTIVAS DESTE ESTUDO

Mesmo que a violência nas escolas não se expresse em grandesnúmeros e apesar de não ser no ambiente escolar que aconteçam oseventos mais violentos da sociedade, ainda assim, trata-se de umfenômeno preocupante. Preocupa porque afeta diretamente agressores,vítimas e testemunhas dessa violência e, principalmente, contribui pararomper com a idéia da escola como lugar de conhecimento, de formaçãodo ser, de educação, como veículo, por excelência, do exercício eaprendizagem, da ética e da comunicação por diálogo e, portanto, antíteseda violência.

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Nos últimos anos, chama a atenção o aumento ou registro de atosdelituosos e de pequenas e grandes �incivilidades� nas escolas, o quejustifica o sentimento de insegurança dos que a freqüentam. A escolanão seria mais representada como lugar seguro de integração social, desocialização. Não é mais espaço resguardado. Ao contrário, tornou-secenário de ocorrências violentas.

Assim, além de enfrentar problemas internos de gestão eprecariedades variadas, que afetam o desempenho pedagógico, a escolapassa por um período no qual a ideologia que a sustentou durante muitosanos é contestada. A escola é questionada por não preparar para omercado de trabalho, por perda de qualidade e centralidade como fontede conhecimento sobre humanidades e transmissora do acervo culturalcivilizatório e por não corresponder à expectativa de abrir possibilidadespara um futuro seguro aos jovens.

Exatamente nesse ponto de confluência de processossociopolíticos, econômicos e culturais situa-se o grande desafio do temaaqui explorado. Tratar de violências nas escolas significa lidar com umaintersecção de objetos e seus significados. Isto é, uma perspectiva sobredeterminada ordem e não simplesmente a superposição ou o somatóriodos objetos: escola e violência.

A fim de incorporar vários dos eixos de reflexão e matrizes teóricas,entende-se violência, neste trabalho, primeiramente como a intervençãofísica de um indivíduo ou grupo contra a integridade de outro(s) grupo(s)e também contra si mesmo � abrangendo desde os suicídios,espancamentos de vários tipos, roubos, assaltos e homicídios até aviolência no trânsito, disfarçada sob a denominação de �acidentes�, alémdas diversas formas de violência verbal, simbólica e institucional.

É justamente por sua complexidade e multiplicidade de facetasque a compreensão do fenômeno das violências nas escolas impõe odesafio de uma ótica transdisciplinar, multidimensional e pluricausal.

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2. OAMBIENTE DA ESCOLA

Conforme visto no capítulo anterior, o debate sobre os fatoresexógenos e endógenos associados à violência no ambiente escolar ébastante controvertido e delicado, pois a maior tendência é enfatizar osfatores externos à escola, o que amenizaria a responsabilidade do sistemaescolar, tanto diante do próprio fenômeno quanto do seu combate. Assim,a análise recorreu a enfoques multidimensionais, nos quais se apontaum conjunto de fatores como prováveis causas da violência, sejam elesinternos ou externos à escola.

Neste capítulo, o foco é o ambiente das escolas, que envolve desdeseu entorno, o bairro no qual estão localizadas, até as formas desegurança no trânsito � faixas de travessia de pedestres, condições dasruas, guardas de trânsito etc.

Para que se compreenda melhor as diversas manifestações que aviolência assume nas escolas, compara-se e descreve-se, também, aestrutura física dos estabelecimentos escolares. Examina-se, ainda, ocontrole da entrada e saída dos alunos e a disposição e qualidade dasinstalações físicas, que torna mais ou menos vulnerável o acesso aointerior das escolas.

2.1 O ENTORNO DAS ESCOLAS

As cercanias da escola (rua em frente, entorno, ponto de ônibus ecaminho até o ponto de ônibus) consistem no espaço em que maisocorrem violências, segundo alunos e membros do corpo técnico-pedagógico que participaram da pesquisa. Ambos, também, apontam avizinhança como um dos cinco principais problemas da escola.

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RESUMO: Violências nas escolas

Apesar disso, não é desprezível a proporção de alunos e membrosdo corpo docente que afirmam que as dependências da escola são maisviolentas do que o entorno: 1/5 dos alunos e 1/4 dos membros do corpotécnico-pedagógico. Esse fato descaracteriza o ambiente escolar comoespaço seguro e protegido.

Entre os problemas apontados no entorno, destacam-se:Precariedade da sinalização e insegurança no trânsito � A

falta de equipamentos de segurança nas vias de trânsito que dão acessoàs escolas explica o significativo número de atropelamentos dos membrosda comunidade escolar. Em muitas das vias onde estão situadas asescolas, não há semáforo, passarela, faixa de travessia para pedestresnem guarda controlando o trânsito de pedestres e veículos. Além disso,no turno da noite, em alguns bairros, a segurança das escolas ficacomprometida devido à iluminação deficiente.

Acesso a bebidas alcoólicas � Nota-se a existência deestabelecimentos comerciais no entorno da escola, entre os quais seincluem bares ou botequins. Em 63% das escolas observadas verificou-se que os alunos freqüentam esses estabelecimentos, algumas vezesdesviando do seu trajeto e, assim, faltando às aulas. Especificamenteno que diz respeito aos bares próximos às escolas, são freqüentados poralunos em grupos ou turmas que, quando consomem bebidas alcoólicas,podem se envolver com práticas violentas.

Segurança e policiamento � Não existe consenso acerca daconveniência da vigilância policial no ambiente da escola. Para muitos, apresença da polícia seria não somente inútil como prejudicial. É importanteatentar para o fato de que as opiniões variam conforme a imagempredominante dos policiais. Assim, alguns entrevistados (inspetores)defendem a presença da polícia para conter a marginalidade no entorno.Outros (alunos) afirmam que a escola deve resolver seus problemasrelacionados à violência sem contar com a polícia. Para os alunos, a polícianão é merecedora de confiança. A relação entre alunos e policiais édelicada, principalmente porque alguns alunos dizem temer os policiais.Alguns policiais, por sua vez, dizem que os alunos os respeitam.

Gangues e traficantes � Segundo estudantes e corpo técnico-pedagógico, um dos maiores problemas, em muitas escolas, são as ganguese/ou o tráfico de drogas no espaço escolar ou no entorno, levando ao

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extremo o clima de insegurança. Em conseqüência disso, a autoridadedos responsáveis pela ordem na escola torna-se mais frágil. As direçõesdos estabelecimentos de ensino receiam tomar atitudes para combater asgangues e os traficantes no ambiente escolar. Evitam punir para não sofrermaiores danos. Em vários depoimentos desta pesquisa, ressalta-se apresença do tráfico. Em muitos casos, os traficantes utilizam vendedoresambulantes e até alunos para a venda e distribuição de drogas (os chamados�aviões�). As gangues, por sua vez, interferem na vida da escola de váriasformas: ameaças a alunos, demarcação de territórios onde uns podementrar e outros não, atos de vingança, clima de tensão etc.

2.2 O AMBIENTE ESCOLAR

Sobre o ambiente escolar, a pesquisa revelou aspectos quemerecem destaque, tais como:

Estrutura física das escolas � A estrutura física das escolastambém afeta o ambiente escolar. Em geral, as escolas estão separadasdo entorno por muros, cercas e grades. Significativa parcela dos alunoscritica a qualidade do ambiente físico, principalmente as salas de aula,corredores e pátios, embora eles afirmem gostar da escola em queestudam. Os locais que os alunos preferem nas escolas são as cantinasou lanchonetes, bibliotecas, centros de informática, ginásios de esportes,laboratórios e pavilhões de artes (os quatro últimos são menos freqüentesnas escolas observadas).

Disciplina dos estudantes � A observação local direta efetuadapelos pesquisadores mostra que aproximadamente 1/3 dos alunos exibecomportamento indisciplinado. Quando se trata de gazetear ou �mataraulas�, os percentuais são bastante significativos.

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Para Mariano F. Enguita, �a educação é um fenômeno social euniversal, sendo uma atividade humana necessária à existência efuncionamento de todas as sociedades� (Enguita, 1989). A formaçãodos indivíduos deve ser integral, auxiliando-os no desenvolvimento desuas capacidades físicas, morais e espirituais. Por meio da ação educativa,o meio social exerce influência sobre os indivíduos, que se tornamcapazes de estabelecer uma relação ativa e transformadora. Essainfluência manifesta-se por meio de conhecimentos, experiências,valores, crenças, modos de agir, técnicas e costumes acumulados,transmitidos e recriados de uma geração a outra.

A escola e seus profissionais formam um universo capaz de propiciaro desenvolvimento do aluno, bem como de criar condições para queocorram aprendizagens significativas e interações entre alunos, professores,diretores e demais membros da equipe técnica que favorecem ou não osprocessos informativos e de comunicação na escola. Nesse ambiente dediversidade, no entanto, também ocorrem brigas, atos de agressividade ede violência, e as medidas tomadas para solucionar os conflitos em geralcabem à direção da escola. Os procedimentos adotados são, em suamaioria, advertências, suspensões, transferências e expulsões, conformea gravidade do caso analisado pela escola.

Considerando-se tais aspectos, o presente capítulo aborda,inicialmente, as regras e punições, pois são elas que normatizam aconvivência na escola. Em seguida, explora as percepções e motivaçõesdos atores e, finalmente, o foco desloca-se para as interações na escola,mediadas por amizades, conflitos e consensos diversos, identificandoas maneiras pelas quais o contexto escolar pode influenciar as relaçõesentre eles, seja de maneira positiva ou negativa.

3. A ESCOLA: FUNCIONAMENTO ERELAÇÕES SOCIAIS

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RESUMO: Violências nas escolas

3.1 FUNCIONAMENTO DA ESCOLA

Nas escolas, existem regras aplicadas ao cotidiano, sobretudo aosalunos. Entre as regras internas, as que mais suscitam reações variadassão as que se relacionam com a observância do horário das aulas, o usodo uniforme, a identificação e as práticas permitidas ou proibidas noespaço escolar. Na maioria das escolas, existem regras referentes a essesaspectos, não existindo consenso entre os diversos atores que convivemna comunidade escolar em relação a elas. Um exemplo é a permissão parafumar. Como regra geral nas escolas, principalmente as diurnas, fumar éproibido aos alunos. Porém, o diretor, o professor e demais funcionáriosnão sofrem a mesma restrição. Os alunos se queixam de que eles próprios[os adultos da escola] quebram as regras: �É porque eu sou diretora. Eu possofumar�. Aí ela vai e acende o cigarro dela, [mas] eu não posso.

Algumas escolas são mais flexíveis do que outras, encontrando-se, também, casos que podem ser considerados de manifestação deviolência institucional, ou seja, abuso de poder por parte da instituiçãoque impõe suas regras sem margens de defesa e contra-argumentaçãopor parte dos que são submetidos a ela.

Em síntese, os vários informantes concordam que as regras sãoindispensáveis para a ordem escolar, mas chamam a atenção para o tipode coerção a que são submetidos para alcançar tal fim. SegundoDebarbieux (1998), dos problemas que se colocam hoje, entre osdocentes e o corpo escolar em geral, emergem, prioritariamente, as formasde contestação da própria ordem escolar, que se manifestam comoincivi l idades, como uma violência mais evidenciada ou comocomportamento de rejeição.

3.1.1 Transgressões e puniçõesNas escolas, como em qualquer outro espaço institucional, existem

comportamentos que são negativamente sancionados, mediante puniçõesespecíficas, conforme as transgressões disciplinares.

Na medida em que as punições são, na maioria das vezes,estipuladas de forma arbitrária, a escola pode ser um lócus privilegiadodo exercício da violência simbólica. A violência, nesse caso, seria

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exercida pelo uso de símbolos de poder que não necessitam do recursoda força física, nem de armas, nem do grito, mas que silenciam protestos.E no ambiente escolar, com alta probabilidade, seria exercida nãosomente entre alunos, mas nas relações entre eles e os professores.

Nas transgressões mais graves, como pichações/vandalismo, oaluno tanto pode ser transferido/expulso como pode ser levado àdelegacia, acompanhado pelos pais. Essas medidas drásticas sãodefendidas, por exemplo, pelos inspetores, que acreditam que medidasextremas devem ser tomadas para manter a ordem na escola. Entretanto,os alunos não concordam de todo com tal opinião e, ao mesmo tempo,tecem duas críticas às punições. A primeira refere-se ao tratamentodiferenciado que é dispensado a alguns, porque o menino pode detonar aescola, mas se é queridinho da diretora, ele só leva uma bronca. A segunda dizrespeito ao exagero das ameaças de punir, que levam ao descrédito. Nessesentido, cabe um contraponto: em algumas ocasiões, quando a direçãoameaça punir, o resultado pode ser tão ou mais eficiente que a aplicaçãoda própria punição. Ocorre, ainda, que as punições podem se tornar tãobanalizadas que deixam de ser tidas como sanções.

Há escolas que adotam castigos alternativos, que podem ser tãoou mais severos que os habitualmente utilizados, pois podem levar asituações de humilhação e constrangimento. Vários alunos reclamam dafalta de critérios e de abusos de poder por parte da escola na imposiçãode punições:

(....) Foi um fato que eu achei um tanto errado [sobre] as regras daqui docolégio. Um rapaz e uma moça que estavam se beijando aqui (....). No casosó se adverte. [Mas] tomaram uma suspensão de uma semana. Ao contráriode uns que usam drogas, lança-perfume, e tomaram uma punição de doisdias. (Grupo focal com alunos, escola pública, Maceió)

Há, também, os casos de não-aplicação das punições previstasnas normas escolares. Segundo membros do corpo discente, tal situaçãopode ocorrer por diversas razões, como a inoperância e a omissão dadireção da escola. Mas consideram que não-raramente a pressão dospais está por trás da impunidade.

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RESUMO: Violências nas escolas

3.2 PERCEPÇÕES SOBRE A ESCOLA

A partir das regras que normatizam os comportamentos e asrelações entre os atores escolares, desenvolvem-se sentimentos, atitudese percepções variadas acerca da escola e dos envolvidos no processo deescolarização. Assim, se torna relevante identificar os fatores que levamos alunos e membros do corpo técnico-pedagógico a apreciarem ou nãoa escola onde estudam ou trabalham.

Indagados sobre como se sentiam em relação à escola onde estudavamnomomento da pesquisa, aproximadamente de 4/5 dos alunos responderamque gostam damesma. Apesar disso, eles apontam vários aspectos específicosdos quais não gostam. O espaço físico é o item que os alunosmenos apreciamnas suas escolas. Em média, nas capitais pesquisadas, 4 em cada 10 alunoscriticam o espaço físico da escola (salas de aula, corredores etc.). Um segundoitem que desagrada os alunos é a secretaria e a direção. Eles também dizemnão gostar �da maioria dos alunos� � com variação de 24%, em Belém, a42%, em Maceió �, �das aulas� e �da maioria dos professores� (Tabela 3).

TABELA 3 � Proporção de alunos*, por indicação do que não gostam naescola, segundo capitais das Unidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos alunos: �Marque o que você não gosta na sua escola�. Os percentuais referem-se apenas às respostas

afirmativas.* Dados expandidos

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Chama a atenção que os alunos digam que não gostam �da maioriados alunos�, pois esse resultado leva ao questionamento da percepção daescola como um espaço de convívio social prazeroso entre jovens.

O fato de não gostarem de seus colegas generaliza uma situação dedesconforto e desconfiança entre todos, fazendo com que os laços afetivosentre os membros da classe se fragilizem. Quanto às relações com os colegas,os alunos alegam desunião e falta de solidariedade, observando que é comumque entre eles não haja coleguismo nem diálogo. Essa ausência de empatia esolidariedade entre os estudantes acaba se estendendo a outras relações (entreprofessores e alunos, por exemplo). Com isso, formam-se grupos fechados,chamados panelinhas, que impedem a aproximação de outros colegas.

Finalmente, fica claro que as relações entre os alunos influenciam asua permanência na escola, porque ali eles desfrutam de convivência sociale se ligam afetivamente uns aos outros.

Já os professores são apontados como objeto de desgosto por ummáximo de 29% dos alunos, em Florianópolis, ficando o mínimo em 20%(Belém e Rio de Janeiro) (Tabela 3). Entre os motivos para os estudantesnão gostarem �da maioria dos professores�, está o fato de que os docentescriam, segundo os alunos, várias formas de estigmatizá-los: A pessoa queconversa ela é rotulada. Eles realmente têm um certo modo de excluir assim, inclusive,se for pedir alguma orientação, ela recebe um tratamento diferenciado. Com isso, osalunos sentem-se discriminados e incomodados pelo fato de outrosreceberem tratamento diferenciado e privilegiado.

Esses dados levantam uma pergunta crucial: que escolas são essasem que parcelas significativas dos alunos não gostam de seus colegas? Pistasbastante úteis para responder a essa indagação encontram-se nos dadosobtidos a partir da consulta, a alunos e membros do corpo técnico-pedagógico, sobre os principais problemas da escola.

De sua parte, os alunos apontam como osmaiores problemas da escola:�alunos desinteressados e indisciplinados�, �carências materiais e humanas�e �professores incompetentes e faltosos�. Já a equipe técnico-pedagógicada escola aponta, como os três principais problemas, as �carências materiaise humanas�, os �alunos desinteressados/indisciplinados� e os �paisdesinteressados�. Chama a atenção que os �alunos desinteressados/indisciplinados� tenham sido mencionados como um problema na escolapelos próprios estudantes e pelos membros da equipe técnica.

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Uma possível explicação para o desinteresse dos alunos transparecequando debatem o conteúdo programático das aulas. Há alunos quedemonstram desconhecimento sobre a utilidade de um conteúdoprogramático ou que o avaliam de acordo com o que consideraminstrumental para o seu futuro:

Geografia é uma parada (....) que não bate. Pra mim, tem gente que queraprender geografia no colégio (....) quem vai ser professor, mais nada. Meu paimesmo fala que matemática, algumas coisas, você vai usar. Agora, raizquadrada, não sei o que mais, só se for professor de matemática (....) Dependendoda profissão, você não vai usar matemática em nada. (Grupo focal comalunos, escola privada, Rio de Janeiro)

Os jovens consideram que estão sobrecarregados com tantas matérias,sendo que outros temas e cursos que lhes interessam não são oferecidospela escola. Reclamam das aulas que consideram monótonas e cansativas.

Ressalta-se que os dados apontados pelos alunos trazem à tona adiscussão sobre a atribuição de culpas e responsabilidades no processoeducacional, chamando a atenção o fato de que, enquanto eles se reconhecemsem interesse e como causadores de problemas disciplinares, os professores,por sua vez, não se sentem responsabilizados pelo fracasso escolar,atribuindo a culpa aos alunos e a suas famílias, bem como às precáriascondições de trabalho.

Alguns membros do corpo pedagógico afirmam que o maior problemada escola é a indisciplina, falta de respeito, falta de responsabilidade, falta de educação,[pois] os alunos vêm de casa totalmente deseducados. Alguns professores nãoapontam os responsáveis por essa situação, mas dizem que a indisciplina écausada pela falta de limites que hoje existe! Em contrapartida, alguns paisentrevistados julgam que a indisciplina resulta do fato de que é uma escolaenfadonha, [em que] os professores não se preparam, não estão interessados em daraula, [querem] mais é se livrar das aulas e os programas estão todos caducos.

3.2.1 Relações entre alunos e professoresDadas às características das atitudes e percepções de alunos e

professores uns sobre os outros e sobre a escola, cabe indagar sobre comoeles se relacionam no ambiente escolar. Tratando-se dos estudantes, depois

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dos seus colegas, o professor é o principal interlocutor, sejam suas relaçõescordiais ou não.

Muitos alunos informam manter relações agradáveis e satisfatóriascom os professores. Os alunos valorizam professores que os incentivam acontinuar os estudos, mostrando-se interessados neles, preocupando-se comseu desempenho, dando conselhos, dialogando e sendo amigos.

A atenção e o diálogo são ressaltados pelos alunos, criando momentosde descontração nas aulas, facilitando a aproximação entre eles. Dialogar,para os alunos, significa tratar os assuntos que despertam o interesse deles,conversar, trocar opiniões sobre as principais decisões a serem tomadasnas escolas.

No que diz respeito à maneira como os professores tratam os alunos,a maioria dos estudantes assinala que os professores os orientam e conversamcom eles � entre 57%, no Distrito Federal, e 75%, em Maceió.

Eu acho que está errado desse jeito sabe? É humilhar muito os alunos também. Ela[a diretora] humilha muito os alunos. E, muitas vezes, gera até violência no colégiopor causa disso. (Grupo focal com alunos, escola pública, Distrito Federal)

A falta de comunicação entre professores e alunos causa, nosestudantes, muita revolta, independentemente da idade ou da série em quese encontram. É possível que essa atitude afete a auto-estima dos estudantes,que não aceitam ser ignorados. Há uma forte crítica aos professores cujapreocupação se restringe ao repasse de conteúdo, sem interesse em interagircom a turma: Ele dá aula (....) não tem nenhuma conversa. Não pára a aula praperguntar alguma coisa, se o aluno está com dúvida.

A situação dos professores na sala de aula também é desconfortável,pois muitos sentem que os alunos lhe faltam com o respeito. Essa situaçãoagrava-se nas escolas da rede privada, porque há alunos que acham que, pelofato de pagarem o estudo, têm o direito de enfrentar os professores efuncionários.

Eles se impõem até financeiramente em relação aos professores. Muitas vezes, elesnos tratam como empregados deles (....) Nós temos casos aqui de professores que,simplesmente, não conseguem dar aula. (Grupo focal com professores, escolaprivada, Fortaleza)

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Os alunos, em alguns casos, comportam-se de maneira autoritária,humilhando ou insultando o professor ou, em casos extremos, utilizando-se do poder ou prestígio dos pais para forçar a demissão daquele de quemnão gosta. Segundo um inspetor: Eles não respeitam, aqui, ninguém. Os alunosfazem o que querem, o que entendem, até os professores têm medo de agir.

3.2.2 Relações entre alunos, diretores e outros atores da escolaOs diretores são elogiados pelos alunos quando oportunizam o diálogo,

dão conselhos e se envolvem comos alunos por diferentesmotivos, tais como:• comunicabilidade;• quando atendem às reivindicações dos alunos;• maleabilidade para lidar com as situações.Na opinião de alguns pais, o diretor deve ser reconhecido por atitudes

que demonstrem sua preocupação com os estudantes. Também foramdestacados talentos e habilidades intelectuais do diretor, sua capacidade dese impor, dentro e fora da escola.

Existem reclamações de alunos em relação aos diretores. Entre asqueixas mais freqüentes que apresentam alunos em relação a diretores,destacam-se:

• não visitarem as salas de aula;• não se reunirem com representantes de turma;• estarem ausentes da rotina escolar;• agirem de forma autoritária;• darem um tratamento diferenciado aos alunos, tratando-os bemquando acompanhados dos pais.

A despeito das dificuldades em algumas relações estabelecidas entreos vários atores sociais envolvidos, a escola surge como espaço desocialização para os jovens. É o lugar onde ocorrem aprendizagenssignificativas, já que o modo de vida dos sujeitos em interação no cenárioescolar propicia trocas materiais e simbólicas.

Sob essa perspectiva, pode-se verificar que as escolas que se organizamà base de princípios democráticos e constroem as regras a serem seguidasjuntamente com os alunos conseguemmaior comprometimento no que tangea sua observância. Nesse caso, o aluno se sente bem menos encorajado atestar os limites da conduta aceitável pelos adultos, pois, como foi a maioriaque as definiu, ele também será cobrado pelos mesmos.

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Este capítulo focaliza dimensões do imaginário sobre os significadosda escola na vida dos alunos, contemplando sua importância estratégicapara o futuro dos jovens e as avaliações dos diversos atores quanto àqualidade do ensino e ao desempenho escolar. A partir da perspectiva daexclusão e da discriminação social � com especial ênfase no racismo � sãoabordadas percepções e atitudes dos membros da comunidade escolar,inscritas no debate sobre violências simbólicas e institucionais.

A escola, embora seja vista como chave de oportunidades para umavida melhor, pode ser, também, local de exclusão social. Ou seja, podediscriminar e estigmatizar, marginalizando o indivíduo formal ouinformalmente, nos seus direitos de cidadania e no seu acesso àsoportunidades de estudo, profissionalização, trabalho, cultura, lazer, entreoutros bens e serviços do acervo de uma civilização. Assim, com a finalidadede contribuir para a construção de uma cultura contra violências, faz sentidolidar com discriminações, intolerâncias e exclusões no espaço escolar, aindaque essas não deságüem em ameaças, brigas e mortes, ou seja, não seconsubstanciando em violência física propriamente dita.

Insiste-se, aqui, na construção conceitual que vem-se apresentandoem trabalhos promovidos pela UNESCO, em que se estende a exclusãosocial como a falta ou a insuficiência da incorporação de parte da populaçãoà comunidade política e social (Abramovay et al., 1999). Ou seja, ao situarsujeitos à margem do contato social, nega-se, formal ou informalmente,seus direitos de cidadania, como a igualdade perante a lei e as instituiçõespúblicas, a proteção do Estado e seu acesso às oportunidades diversas,quais sejam, de estudo, profissionalização, trabalho, cultura, lazer, entreoutros bens e serviços do acervo de uma civilização.

4. ESCOLA,EXCLUSÃO SOCIAL E RACISMO

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Nesta pesquisa, exclusão social é entendida comomais que desigualdadeeconômica. Engloba dimensões e processos culturais e institucionais, pormeio dos quais numerosas parcelas da sociedade brasileira tornam-se epermanecem alheias ao contrato social, privados do exercício da cidadania,desassistidas pelas instituições públicas, desamparadas pelo Estado.

Uma das vertentes socioculturais da exclusão diz respeito à questãoracial, aqui tratada em termos de percepções, assim como exemplos dediscriminações. De fato, o racismo é uma forma de exclusão social encravadana sociedade brasileira em geral e no sistema educacional em particular eaparece, algumas vezes, de forma explícita e, outras, por meio de atitudesde pseudocordialidade, como se documenta nesta pesquisa.

4.1 SIGNIFICADOS DA ESCOLA

A escola, para os estudantes, pode ser vista como uma via de acessoao exercício da cidadania ou, ao contrário, como ummecanismo de exclusãosocial. Na primeira perspectiva, a escola, a educação e o processo de ensino-aprendizagem funcionam como uma espécie de salvo-conduto moral, umpassaporte para a entrada na sociedade.

Além disso, nas sociedades modernas, o estudo é cada vez mais umrequisito para o acesso às oportunidades de trabalho e, este último, semdúvida, é condição essencial à sobrevivência humana. Porém, é nesse pontode intersecção entre o estudo e o trabalho que se situa um dos mais gravesproblemas da exclusão social, no qual o ensino de boa qualidade abre asoportunidades e o de má qualidade, ao contrário, acentua a exclusão.

Chama a atenção, nesse sentido, o fato de que a maioria dos alunosdemonstra visão positiva da escola. Metade ou mais acredita que a escolarealmente lhes ensina alguma coisa, variando os percentuais entre o mínimoem Salvador (50%) e o máximo em Cuiabá (68%). Porém, não é possívelignorar o outro lado desses dados: a alta porcentagem dos que afirmam quea escola ensina pouco ou nada: em Salvador, 50%; no Distrito Federal,49%; e em São Paulo, 47%, sendo também alta, nas demais capitais (cercade 40%), a parcela que expressa percepção negativa quanto à insuficiênciado ensino que lhe é oferecido.

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Os membros do corpo técnico-pedagógico que mais sustentam que aescola ensina muito/bastante se encontram em Vitória (75%) e Manaus(70%). Registra-se em Recife (48%), Florianópolis (47%) e Salvador (43%)visão mais negativa sobre a suficiência do ensino oferecido pela escola.

Embora haja uma percepção crítica sobre a escola como espaço deaprendizagem, esta também sobressai no imaginário dos alunos como lugarapreciado por outros atributos. De fato, na opinião desses e de outros atores,a escola aparece, também, como local privilegiado de socialização, formaçãode atitudes e opiniões e desenvolvimento pessoal.

Grupo focal com alunos, escola pública, Recife; escola privada,Salvador

Eu quero estudar e poder trabalhar, um emprego justo, que eu possa ajudarminha família, e minha mãe principalmente, dá um futuro melhor para o meufilho, que futuramente eu pretendo ter (....)

(....) Eu quero arranjar um emprego, fazer alguma coisa para ajudar emcasa, ajudar meus pais, ajudar meus avós, dar uma boa condição à minhafamília, não é só para comprar coisas para mim.

QUADRO 1 � Futuro melhor

Essa expectativa de uma �vida melhor� para os jovens manifesta-se,também, entre alguns diretores, professores e pais de alunos, de ambas asredes de ensino, que destacam, sobretudo, o acesso a funções socialmentevalorizadas.

Outros dados mostram que mais de 4/5 dos alunos acreditam que aescola lhes ensina coisas úteis para a sua vida e o seu futuro.

4.2 A ESCOLA COMO ESPAÇO DE EXCLUSÃO SOCIAL

As classes menos favorecidas economicamente vivenciam a exclusãocomo fenômeno cultural, social e institucional. Nem sempre o acesso à

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RESUMO: Violências nas escolas

Grupo focal com professores, escola privada, Distrito Federal

Eu vejo assim, que nossos alunos, aqui do (....), com um pouquinho de esforço,se não passar no primeiro vestibular, com certeza, passará no segundo. Têmum poder aquisitivo muito bom, em que o pai pode pagar a faculdade. Então,de um modo geral, são alunos que eu creio que terão um futuro muito bom, oque é diferente de um aluno carente, que tem que trabalhar o dia inteiro parapagar a faculdade à noite.

QUADRO 2 � Vestibular

escola garante trabalho e melhores salários. Quando estudantes verificamessa realidade, podem perder o interesse nos estudos.Um amigo meu já terminouos estudos todinhos. Já tem vários cursos, mas ele não está trabalhando.... Tambémquando se referem aos salários dos professores:Aprender para quê? Para ganharo que o senhor ganha? Não, não preciso.

Ainda assim, a ascensão social é percebida como viável graças àformação escolar, já que os empregos que exigem baixo nível de instruçãotêm remuneração muito baixa e as posições mais ambicionadas exigemdiploma de nível superior. Por isso, muitos alunos acham que o vestibularseria a meta principal e, nessa discussão, acham que é melhor estudar naescola privada do que na pública. (Se) a gente for enfrentar uma faculdade, aí ficaum pouco mais complicado, pelo fato de ter estudado na escola pública. É bem maisatrasado o ensino, é uma coisa mais devagar. Os professores também concordamque, para os alunos das escolas privadas, o futuro é mais promissor, devidoao poder aquisitivo dos pais e à disponibilidade de tempo para estudar.

A universidade fica mais distante para os alunos da rede pública,especialmente quando se trata de cursos mais requisitados e das profissõesmais valorizadas. Segundo alunos de uma escola pública em Fortaleza: ovestibular, quando é para medicina, só tem alunos de colégio particular.

4.2.1 Padrões de exclusão e discriminação socialAlém das desigualdades no que se refere à qualidade de ensino, à

possibilidade de estudar em escolas de bom nível e à disponibilidade de

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tempo e material escolar adequado, a discriminação e a exclusão socialmanifestam-se nas atitudes quanto à própria escola e às relações entre osalunos. Nesse sentido, é possível distinguir três padrões de exclusão/discriminação social na escola.

O primeiro diz respeito à visão sobre a escola pública e seus alunos.Muitos são vistos como �marginais�, despreparados, mal-educados e,portanto, nocivos à sociedade.

Eles se sentem rejeitados por essa sociedade quando estudam em escola públicacom condições tal e qual é a nossa: péssima. Então, do ponto de vista de preconceitocom relação à escola, eu acredito que alguns tenham não só quanto à estrutura,mas ao ensino, desde o primário até o ensino médio. Eu acho que isso é um certopreconceito com relação à escola pública. (Grupo focal com professores,escola pública, Goiânia)

O segundo refere-se às relações entre os alunos de uma mesma redede ensino � seja pública ou privada � cujas condições econômicas sãodesiguais. Há indicações de que os alunos que sofrem discriminação reagemtanto com retraimento como com agressividade.

Grupo focal com alunos, escola pública, Vitória

A gente vê é que quem discrimina mais é quem tem mais dinheiro. E quem nãotem, para não ser discriminado pela pessoa que tem mais, fica ali no cantinhodele. Alguns ficam dentro da sala, não saem. Não ficam muito perto de quemestá comendo alguma coisa para não se sentir mal, né? Para não dizerem queestá filando dos outros. Realmente, essas pessoas assim sentem-se excluídasum pouco, na hora do recreio elas não ficam perto das pessoas que têm maiscondições, que vão lá na cantina. Sempre elas se excluem um pouco.

QUADRO 3 � Filando dos outros

O terceiro padrão tem lugar nas escolas privadas com aqueles demenorpoder aquisitivo, como os que têm bolsas de estudo e os filhos defuncionários ou de professores.

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RESUMO: Violências nas escolas

4.3 AUTO-IDENTIFICAÇÃO RACIAL E NOÇÕES DERACISMO

Embora institucionalmente silenciada, a violência relacionada apráticas discriminatórias resultantes de preconcepções quanto à raça mostra-se evidente na comunidade escolar. Muitos, principalmente alunos, relatamcasos de discriminações. Depoimento colhido em grupo focal de pais mostraque se considera a existência de preconceito na escola até mesmo contraestudante branca, que se percebe discriminada pelos colegas negros.

A minha filha sofre preconceito na escola, mas é o inverso. A maioria de escolapública realmente é freqüentada por negros, e a minha filha é branca. Aí, por serbranca, ela é completamente discriminada na escola. Já ameaçaram até cortar ocabelo dela, que ela tem o cabelo liso, comprido, loiro, �o que essa loira brancaaguada está fazendo aqui dentro?�. (Grupo focal com pais, escola pública,Florianópolis).

Além do acesso diferenciado segundo a dependência administrativadas escolas, brancos e não-brancos também se distinguem pelos turnos deestudo, ocorrendo os maiores percentuais de não-brancos no turno da noite:no mínimo 23%, em Florianópolis, e no máximo 82%, em Salvador.

De fato, existe, por parte de vários alunos, demembros do corpo técnico-pedagógico e de pais, o reconhecimento de que há preconceito racial na escola.Isso frisado, principalmente, pelos que foram vitimizados, aos quais sãodirigidas expressões como negona, molambo, fedorenta e cabelo de bombril.

Diretores e professores de estabelecimentos privados sustentam quenão ocorre preconceito nas escolas onde trabalham por ser muito reduzidoo número de pessoas negras no ambiente escolar: É menor o preconceito aquidentro, quase não tem (....) Você tem poucos alunos de cor negra. Tal fato pode seruma expressão de racismo estrutural, pelo acesso diferenciado de brancos enegros em escolas da rede pública e da privada.

Não resta dúvida de que existe hostilidade racial, que pode prejudicar atrajetória escolar ao estigmatizar e marginalizar a vítima do preconceito. Nota-se, em muitos depoimentos de alunos e professores, que predominam entreeles a ideologia pela qual se associam padrões de beleza a características debrancos � o belo sendo visto como branco, alto, louro.

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Na literatura sobre o tema no Brasil, é comum destacar-se o fato deque o racismo é realizado por formas complexas, não sendo, mesmo, admitidopela maioria da população (Guimarães et al., 2000). Na escola, num primeiromomento, também não é fácil detectar práticas ou comportamentos que secaracterizem por padrões racistas. Ao contrário, o comum é negar-se qualquertipo de discriminação.

Alunos relatam que o preconceito racial no ambiente escolar partedesde a direção da escola e de professores contra alunos e professores comose manifesta entre os próprios colegas. Raros entrevistados assumem ser,eles próprios, racistas. Negros culpam brancos, loiros delatam escuros,professores apontam para os alunos, alunos falam da direção e filhos indicampais. Conclusão: é sempre o outro que tem preconceito.

Na literatura brasileira sobre racismo, é comum falar sobre a suabanalização, quando posturas racistas são disfarçadas por umapseudocordialidade ou �racismo cordial� (Guimarães,1999).

Muitos alunos afirmam que não existem preconceitos, mas brincadeiras.No entanto, apelidos como �picolé de asfalto�, �picolé de breu�, �Nescau�,�chocolate�, situam-se na linha limítrofe entre brincadeira e agressividade.

Grupo focal com pais, escola privada, Goiânia

Eu não posso falar muita coisa ainda, porque o meu filho está aqui há um mês.Antes de nós chegarmos aqui em Goiânia, eu já havia escolhido outra escola, masessa outra escola, eu suspeito que teve um certo preconceito, não sei se pela cor, mashouve. Eu havia deixado os documentos para que o diretor ou coordenador pedagógicoprovidenciasse a matrícula, eles ficaram uma semana com esses documentos. Elesme chamaram e falaram que estava muito complicado arrumar vaga (sendo queantes, eles falaram que tinha vaga) e que eu teria que ir para outro colégio. No diaem que eu levei os documentos, eu não estava muito arrumada porque eu tinhachegado de fora e estava arrumando tudo e, por ser negra, ficou difícil. Me falaramdo colégio (....), eu fui muito bem recebida pelo diretor pedagógico, que é um japonês.Ele me atendeu muito bem, me orientou muito bem, foi muito bom. Então asaparências contam muito e tem muito preconceito quando se é negro, estádesarrumado. Meu filho sofreu preconceito sim, de não ser aceito na outra escola.

QUADRO 4 � Preconceito quando se é negro

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RESUMO: Violências nas escolas

Pais e algunsmembros do corpo técnico-pedagógico, em grupos focais,também observaram que adjetivos disfarçados de brincadeiras podem serexercício de legitimidade de preconceitos raciais.

O meu caso é o da minha filha que ainda passa por isso [discriminação]. Elatem cabelo crespo, aí os alunos que não têm, chama ela de cabelo de bombril.(Grupo focal com pais, escola pública, Florianópolis)

Alguns professores ressaltaram que ainda que o preconceito racialocorra muito com pessoas negras, também é relevante falar na discriminaçãodentro do ambiente escolar contra pessoas de origem indígena, japonesa emesmo contra brancos.

A comunidade escolar expôs variadas opiniões sobre a presença deracismo em seu meio. As formas pelas quais suas percepções foramcolocadas, seja qual for o posicionamento do ator social, revelaramelementos de afirmação ou, até mesmo, uma naturalização do racismo noambiente escolar.

Grupo focal com alunos, escola pública, São Paulo

Eu não gosto de preto mesmo não. Mas, agora, falando sério, a cor da minharaça eu não gosto, não. Não gosto de ficar, catar ou namorar com preta. Nãodá para encarar aquela coisa preta na sua frente. Uma coisinha mais branca,dá para andar de mão dada, dá para ir no shopping. Agora eu quero vervocê ter moral de levar uma preta num shopping. É que shopping é paraandar com patricinha. Porque eles [os amigos] acham que eu vou no shoppingpara mostrar a minha namorada. Tem que andar com uma menina presença,não vai dizer que não é, porque é. Para o shopping ou para qualquer lugar,na roda dos amigos. Ó, eu acho assim, que eles vão para roda dos amigos efalam �ó, minha namorada é mó gostosa, é branca, tem olho azul�. Agora,vai mostrar uma morena, negra, do cabelo ruim, lá na roda dos amigos?

QUADRO 5 � Uma coisinha mais branca dá para andar de mão dada

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A violência nas escolas pode ser associada a três dimensões, segundoDebarbieux (1999):

1. a grande dificuldade de gestão nas escolas resultando em estruturasdeficientes;

2. ao contexto, ou seja, uma violência que se origina de fora paradentro das escolas, que as torna sitiadas e que se manifesta pormeio da penetração das gangues, do tráfico de drogas e davisibilidade crescente da exclusão social na comunidade escolar;

3. as componentes internas das escolas, específicas de cadaestabelecimento. É possível observar escolas seguras em bairrosreconhecidamente violentos e vice-versa.

A pesquisa leva em conta a violência de maneira ampla, não buscandoum sentido universal, senão a partir do conhecimento do seu significadopara os distintos atores � grupos que compõem a escola em um conjunto decapitais brasileiras. Este capítulo prioriza o enfoque sobre a violência física,os pequenos roubos, vandalismos, ofensas verbais, grosserias diversas,empurrões, interpelações e humilhações que compõem a fase mais visíveldo fenômeno. A violência simbólica e a institucional foram tratadas noscapítulos anteriores.

Nesta pesquisa, são documentados diversos tipos de violências,segundo os atores pesquisados � alunos, professores, outros membros dacomunidade escolar e pais. Para melhor compreender o fenômeno noambiente escolar, as situações foram categorizadas da seguinte maneira:

1. a violência contra a pessoa, que pode ser expressa verbal oufisicamente e que pode tomar a forma de ameaças, brigas, violênciasexual, coerção mediante o uso de armas;

5. AS VIOLÊNCIAS NAS ESCOLAS:OCORRÊNCIAS,PRATICANTES EVÍTIMAS

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RESUMO: Violências nas escolas

2. a violência contra a propriedade, que se traduz em furtos, roubose assaltos;

3. a violência contra o patrimônio, que resulta em vandalismo edepredação das instalações escolares.

5.1 TIPOS DE VIOLÊNCIA � A VIOLÊNCIA CONTRA APESSOA

5.1.1 AmeaçasA primeira modalidade de violência contra a pessoa consiste em

ameaças, ou seja, promessas explícitas de provocar danos ou de violar aintegridade física ou moral, a liberdade e/ou bens de outrem. As ameaçaspodem ocorrer entre os alunos e entre os membros do corpo técnico-pedagógico, como, também, podem ser dirigidas a pais e funcionários.

As ameaças são mais freqüentemente mencionadas pelos estudantesde São Paulo e do Distrito Federal (40%) e menos pelos de Belém (21%).Com exceção do Distrito Federal, em todas as capitais, os percentuais demembros do corpo técnico-pedagógico que relatam ameaças sãosistematicamente superiores aos de alunos. Isso não significa que asameaças sejam necessariamente dirigidas a eles, embora, muitas vezes,isso ocorra.

A maioria das ameaças aos professores pelos alunos é ocasionadapor notas e pelas falhas disciplinares nas salas de aula: O professor, se elenão for um pouco bonzinho (....) acaba se machucando; se o professor for exigente emtudo, ele se machuca. As ameaças aos diretores geralmente acontecem quandoestes recorrem a punições mais severas, como suspensões e expulsões.Os agentes de disciplina e inspetores de disciplina seriam ameaçados poraplicarem advertências e sanções por falhas disciplinares eimpontualidades. Essa ameaça também atinge os policiais de batalhõesescolares: Falam vão me catar, vão me dar tiro, mas você sente que é para apavorar.

Sem verbalizar diretamente, os estudantes reagem, de maneiraagressiva, a rotinas adotadas pelos professores e consideradas violentase, em geral, à imposição do poder da instituição escolar, como a disciplina,as exigências e as regras de aferição do conhecimento. Mas dificilmente

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comunicam os motivos ou por quais parâmetros entendem tais rituaisdo mundo escolar como violações a serem rebatidas por ameaças.

As ameaças podem ou não se concretizar em violências físicas,o que gera um clima de tensões cotidianas. Relatos indicam que algumasdelas efetivamente passam a agressões físicas por parte dos alunos,quando são colocados para fora da sala de aula, ou são suspensos e/ou proibidos de entrar por terem chegado atrasados.

Devido ao clima de intimidação na escola é freqüente queprofessores/diretores e outros membros do corpo pedagógico expressemsentimentos de insegurança.

Entre as ameaças que atingem a comunidade escolar estão aquelasrelacionadas a bombas, na maioria falsas, no intuito de transtornar arotina escolar.

5.1.2 BrigasAs brigas representam uma das modalidades de violência mais

freqüentes nas escolas, abrangendo desde formas de sociabilidadejuvenil até condutas brutais. Esse tipo de agressão entre alunosmanifesta-se, inicialmente, por ataques verbais proferidos pelosmesmos. É quando se torna difícil estabelecer demarcações precisasentre tipos de violência, como brigas e ameaças. O mais comum nasescolas parece ser situações-limite entre os bate-bocas e discussões.

As brigas são consideradas acontecimentos corriqueiros,sugerindo a banalização da violência e sua legit imação comomecanismo de resolução de conflitos. Muitas vezes, as brigas ocorremcomo continuidade de brincadeiras entre alunos, podendo ter ou nãoconseqüências mais graves. Entretanto, verifica-se que há brincadeirascuja própria natureza envolve a violência que começam na brincadeira eacabam na pancadaria.

Briga-se por futebol, lanche, notas, por causa de apelidos etomada de objetos uns dos outros. O olhar direto, �encarar�, é vistocomo desrespeitoso e desafiador e pode levar a confrontos. Tambémesbarrar no outro, mesmo sem querer, pode ser interpretado comoatitude pouco cuidadosa e de provocação, podendo ocasionar brigasviolentas.

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RESUMO: Violências nas escolas

Os dados indicam que parece prevalecer, entre os alunos, um padrãode comportamento que descarta o recurso à autoridade policial ou à ajudafamiliar para resolver os conflitos em favor da violência, praticada em grupo,o que pode estimular novos confrontos. Esse padrão de reação a agressõesparece ser um importante componente da cultura que incorpora a própriaviolência ao universo dos alunos. Assim, partem para brigas e acertos decontas. Há, também, rivalidades entre alunos de séries diferentes: Eu acho quesó porque são do terceiro, pensam que podem mandar na escola.

Também quando estudam em outros turnos: Olha... à noite, não... mas eujá estudei aqui à tarde. Já vi o cara trazendo �três-oitão�. Não é só à noite que tempessoas mal influenciadas aqui não. De dia também tem.

Muitas vezes, os alunos do período noturno denunciam acentuadaestigmatização por parte do diurno, confirmada pelos entrevistados do corpotécnico-pedagógico. Alegam que, por serem mais velhos, já haveria a suspeitade mexerem com drogas ou terem relação com assaltantes: (....)Aí um [aluno]puxou uma brincadeira um pouco mais pesada, o outro se ofendeu e já partiu logo protapa. Esses são alunos do noturno. (....) durante o dia nós não presenciamos nenhumtipo [de confronto] a não ser de crianças que brigam todo dia.

Há, também, rivalidade entre estudantes de diferentes escolas e dedistintos bairros. Existe, ainda, demarcação de lugares apropriados como�nossos� e os dos �outros�. Essa delimitação leva a rivalidades e brigas entrediversos grupos: A gente mora aqui (....) a gente não pode passar para o outro lado,(....) os de fora não podem entrar.

A presença de estranhos no ambiente escolar é percebida como umaruptura dos seus limites físicos, do seu espaço. Não é querendo criticar, mas sãoalunos que vêm de outras escolas que fazem isso. Esses aspectos realçam a dicotomiaentre aluno de dentro versus aluno de fora. Há, também, a �solidariedade� que

Grupo focal com alunos, escola pública, São Paulo

É o cara que se você esbarrar nele, você pode jurar que já está morto. Olha,mas morto mesmo! Teve uma �treta� [confusão] aqui que cataram a pessoa eesfregaram a cara dele ali no muro, desses de pedra sabe? Esfregaram erasgaram a cara dele todinha. Jogaram ele nos espinhos.

QUADRO 6 � Você pode jurar que já está morto

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impele alunos da mesma escola a brigarem com alunos de outra em defesados colegas ameaçados.

5.1.3 Violência sexualOassédio sexual pode ter graves conseqüências sobre os jovens, criando

uma cultura permissiva, em que atos desse tipo não são vistos como sérios epassíveis de punição. Neste trabalho, o assédio sexual é entendido de maneiramais ampla, incluindo diversas formas de intimidação sexual � olhares, gestos,piadas, comentários obscenos, exibições � e de abusos � como propostas,insinuações e contatos físicos aparentemente não-intencionais � além defofocas, frases, desenhos nos banheiros etc.

Vale destacar que o assédio sexual é uma das formas mais comuns deviolência de professores contra alunos, principalmente contra mulheres, aindaque possa ocorrer entre os jovens ou envolver outros autores nas escolas.Inclui desde �brincadeiras� até estupros. As �brincadeiras� ou comentáriosjocosos podem ser dirigidos pelos alunos aos professores e vice-versa.Geralmente geram constrangimentos àqueles aos quais são dirigidos: Não sãobrincadeiras inocentes. São grosserias que não têm cabimento (....) mas que, muitasvezes, fazem a pessoa calar e fingir que você não ta nem aí. Às vezes, é banalizada,considerada �normal� o que colabora inclusive para sua repetição: Isso aí énormal. Tanto de coisa que falam!

Um depoimento na pesquisa evidenciou a proposta de um professorpara �programas� sexuais envolvendo idas a motéis com pagamento pelos�serviços prestados�, estimulando assim o envolvimento com a prostituição:

Aconteceu também no meu colégio e realmente tinha assédio mesmo. Eu ficavaconversando com o professor de (....) no colégio. Eu estava desempregado, procurandoemprego, doido para arrumar dinheiro. Aí falou para mim: �Eu sei um jeito fácilde você arrumar dinheiro.� Aí deixei para lá, pensei que ele estava brincando.Depois eu falei assim: �Professor, que tipo de trabalho é esse?� �Ah, é que temuns colegas meus que saem assim: É um dinheiro fácil.� Eu falei: �Então explica,professor, que eu estou precisando de trabalhar (....) Ele falou para mim que eraprograma com homossexuais, sabe? (....) Aí parei tudo. Não falei nada comninguém, mas falei que se isso acontecesse novamente eu ia arrumar um problemacom ele, eu ia falar com a diretora (....). (Grupo focal com alunos, escolapública, Vitória)

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RESUMO: Violências nas escolas

Muitos comentários transferem a culpa da violência para as meninas,por provocarem os rapazes, por usarem um tipo de roupa �diferente�,�insinuante� � �com shortinhos, saínhas. As mulheres não têm mais nem blusa...�.Tentando controlar o tipo de roupa usada pelas meninas, a diretoria dealgumas escolas supervisiona o vestuário das alunas.

Em muitos relatos, o assédio dos professores está associado aprovidências mais rigorosas, com processos judiciais encaminhados pelasvítimas. Às vezes, fica-se só na ameaça de denunciar à polícia, mas não sevai adiante por temor de represálias.

Acontecem, também, estupros nas imediações das escolas, tendocomo conseqüências o medo e o abandono da escola. Embora as meninassejam as maiores vítimas, estupros ocorrem também com os meninos.

5.1.4 O uso de armasO recurso às armas em brigas e conflitos, nesses tempos do

agravamento da violência na sociedade, chega em grande medida à escola.Alguns estudantes justificam o porte de armas como necessidade de imporrespeito, proteger e defender-se.

Mas a disponibilidade de uma arma aumenta o perigo de confrontos ehomicídios, como ressalta a literatura nacional e internacional sobre o tema.

No Brasil, os dados da pesquisa indicam que armas de fogorepresentam pequena porção das armas encontradas nas escolas. Entre elas,encontram-se as chamadas �armas brancas� e outras como correntes,cacetes, porretes: Algumas vezes, as pessoas pensam que arma é só um revólver,mas tem vários tipos de armas. Muitos mencionam que uma faca, tesoura, pode seruma arma também. Tem muitos alunos que vão para escola com facas, estiletes, canivetes.Isso sempre teve. Segundo um professor: Tinha um aluno, na nossa sala de aula,que todo dia ele vinha com uma faquinha.

Os diretores e o corpo técnico-pedagógico relatam que é habitualencontrar essas armas com os alunos. Para alguns pais, é normal que osjovens portem armas brancas para se defender.

Os alunos afirmam que é muito fácil comprar armas de fogo, porintermédio de amigos e conhecidos. Eles demonstram familiaridade com acompra: (....) depois, você paga ela. Você vai pagando pouco a pouco com todas asfacilidades de pagamento.

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Em muitos locais, não é exigida a autorização para compra de armas.A própria polícia aparece como fornecedora, na fala de atores investigados.Segundo a diretoria, muitos alunos vão à escola com armas de brinquedopara poder intimidar. O recurso aos brinquedos indica a importância dasarmas no imaginário dos alunos.

Como mostra a Tabela 4, uma parcela que varia entre 9% e 18% dosestudantes informou ter visto alunos, pais ou professores portando armade fogo no ambiente escolar. Já entre os membros do corpo técnico-pedagógico, os percentuais são muito menores, variando entre 2% e 8%, esugerindo que, em muitos casos, o seu porte não é notado, nem noticiado.

TABELA 4 � Proporção de alunos* e membros do corpo técnico-pedagógico, por testemunho de porte de armas por alunos, professoresou pais no ambiente da escola, segundo capitais das Unidades daFederação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos informantes: �Marque se você já viu nesta escola: Alunos, pais, professores ou funcionários com arma

de fogo (revólver etc.)? Alunos, pais, professores ou funcionários com outro tipo de arma (faca, porrete, estilete etc.)?� Ospercentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.

* Dados expandidos

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RESUMO: Violências nas escolas

A presença de qualquer tipo de armamento sinaliza não somenteviolências efetivas e explícitas, mas, também, cenários que banalizamviolências, já que as armas, mesmo quando não acionadas, tornam-seconstituintes do próprio cenário escolar. Testemunhar o porte de armas defogo e de outras significa ser parte de um campo que pode passar a ser debatalha a qualquer momento.

A Tabela 5 demonstra que o uso de armas nas escolas reflete,aparentemente, sua socialização no ambiente doméstico. Também nos gruposfocais, vários jovens afirmam que têm acesso a armas de fogo em suascasas, armas pertencentes a seus pais ou a outros familiares, permanecendoescondidas ou guardadas.

Grupo focal com alunos, escola pública, Rio de Janeiro e Goiânia

Eu sempre brincava de briguinha com um moleque aqui no colégio. Aí teve umdia que eu brinquei com ele e bati forte mesmo. Aí ele chegou e disse: �eu voutrazer o meu tio pra te pegar�. No dia seguinte (....) �aí moleque, tu bateu nomeu sobrinho, agora tu vai sofrer as conseqüências�. Aí foi assim e puxou aarma. Aí eu falei: �eu sempre brinco com o seu sobrinho, agora eu dei um maisforte nele, mas quando ele dá forte em mim eu aceito. Não foi porque eu deiforte agora nele que ele vai aceitar. Aí aconteceu isso�. Aí chamou o sobrinhodele e perguntou, �foi isso mesmo?� �Foi�. �Agora tu passa, a próxima veznão passa mais�.

Porque eu não esperei ele para vir para escola, [porque] ele disse que tinhaido em outro lugar, e quando eu cheguei aqui ele me encostou na parede lá nasala, e puxou um estilete pra mim (....) Eu disse para ele cortar, �corta, cortaque tu leva o teu�. Ele deixou, colocou aqui na minha cara, aí foram avisarna secretária (....). Ele fazia sempre assim, na brincadeira, mas o erro delepoderia cortar alguém.

QUADRO 7 � Assim ele puxou a arma

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TABELA 5 � Proporção de alunos*, por forma de contato com armas defogo, segundo capitais das Unidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos alunos: �Marque o que for verdadeiro:� (Categorias de respostas apresentadas na tabela). Os

percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.* Dados expandidos

A cultura da violência se sustenta, também, pela coerção e pelacumplicidade ativa ou passiva de muitos. Existe acobertamento entre osalunos que sabem quem vende armas, quem entra armado e como fazerpara entrar armado na escola. Vigora a lei do silêncio pela qual se calamsobre tais acontecimentos.

No bojo de uma cultura de violência, em que se amplia o uso dasarmas, quebram-se as clivagens sexuais quanto à violência. Assim, osmembros da comunidade escolar, ouvidos na pesquisa, consideram queestaria aumentando o número de meninas flagradas com armas brancas,principalmente quando se envolvem em brigas:

Canivetinho, facas. Aí assim, sem querer, você pega no banheiro, né? Porqueelas colocam na barriga. Aí uma vez eu peguei, aí eu falei: �Vai furar quempara estar armada?� E ela: �(....) na sala de aula eu furo o bucho dela.� Aíeu falei: �Menina, para que essa violência?� E ela: �É só brincar comigo queeu furo�. (Grupo focal com alunos, escola pública, Curitiba)

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RESUMO: Violências nas escolas

Entre alunos, há queixas de que não existem medidas eficazes parainibir a entrada de armas nas escolas. Pode-se perceber, em algumasescolas públicas e privadas, certa preocupação dos estudantes em quehaja efetivo controle de entrada de pessoas armadas. Anteriormente,ocorriam as chamadas revistas nas entradas das escolas, quando erampegos alunos com armas, mas essas medidas não acontecem mais: Tinhaaté época que, para entrar na escola, a diretora estava fazendo busca de arma emhomem e mulher. Encontraram uma pistola, uma 38 e vários estiletes.

Algumas opiniões de professores de escolas públicas demonstraramas suas limitações ao se tentar coibir a entrada de alunos armados. Elescomentaram que o Conselho Tutelar proíbe que as escolas tomemqualquer atitude quando deparam com um aluno armado. O máximoque se pode fazer é passar esse problema para o Conselho avaliar etomar as devidas providências.

5.2 VIOLÊNCIA CONTRA A PROPRIEDADE

5.2.1 Roubos e furtosOs roubos e furtos aparecem como naturais nos relatos. Ambos

consistem na subtração de bens, embora o furto ocorra sem que a vítimaperceba. No entanto, na maioria dos relatos, o termo roubo costuma serusado nas duas acepções.

Registram-se informes dos alunos e do corpo técnico-pedagógicosobre roubos de carros e objetos pessoais no ambiente da escola,conforme apresentado nas Tabela 6, entre os alunos, varia de 38%, emPorto Alegre e Florianópolis, a 20%, em Belém. Entre os membros docorpo técnico, os percentuais são mais elevados, situando-se entre PortoAlegre (62%) e Maceió (30%).

Os informantes consideram que os pequenos furtos são praticados,em grande parte, por pessoas de dentro do espaço escolar, permitindo aaceitação desses atos como natural, o que leva alunos, coordenadores ediretores a diminuírem sua gravidade e, em alguns casos, desconsiderara natureza do ato em si: Tem roubinhos assim na sala de aula, nada de muitovalor. Tem aqueles roubos bobos, de pegar objetos na sala de aula, mesmo sendo

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de estudo. Algumas vezes, valores baixos de R$1,00. Omite-se, assim, odesrespeito ao outro e a idéia de violência que possam ter roubos e furtospara as vítimas ou por se tratar de violação de princípios éticos.Características de comportamento da juventude foram apresentadas comojustificativas de pequenos furtos, considerados atos normais da idade. Coisade adolescente. Às vezes, o adolescente gosta de ousar e ele tem de ser diferente...

TABELA 6 � Proporção de alunos* e membros do corpotécnico-pedagógico, por relatos de roubos de carrosou objetos pessoais no ambiente da escola, segundocapitais das Unidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos informantes: �Marque com um X se você sabe que já aconteceu nesta

escola: Roubos ou furtos, de carros, toca-fitas, tênis, livros etc.?� Os percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.

* Dados expandidos

Entre os informantes, as opiniões divergem quanto ao grau efreqüência de roubos e furtos nas escolas, mas a maioria concorda que asocorrências mais graves são cometidas por pessoas externas à comunidadeescolar, que ali penetram na noite, nos fins-de-semana e ou nas férias. Dessaforma, constrói-se uma dicotomia entre o espaço realmente violento da ruae o espaço relativamente menos inseguro da escola.

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RESUMO: Violências nas escolas

Quando os alunos são vistos como praticantes de roubos e furtos, osjovens sentem-se inseguros em deixar os pertences fora de seu controle: elestêm que ir ao recreio com a mochila, porque há alunos na sala de uma turma que estáem educação física e fazem uma faxina geral nos objetos, nos pertences e valores que oscolegas trazem para a escola.

Na pesquisa, entre as ocorrências, foram mais identificados ospequenos furtos como os de material escolar � caneta, borracha e estojo,pequena quantidade de dinheiro, celulares e bolsas.

5.3 VIOLÊNCIA CONTRA O PATRIMÔNIO

A dilapidação do espaço e do equipamento escolar, sem o furto de bens,surge como ato de reação social contra a escola. Pesquisas norte-americanasdemonstram que o vandalismo tem sido associado a administrações escolaresautoritárias ou, alternativamente, indiferentes e omissas; bem como a diretorese professores que não são receptivos aos alunos, à alta rotatividade do corpodocente e, finalmente, a punições. Assim, é necessário tentar desvendar asmensagens escondidas nos atos de violência contra o patrimônio das escolas,que podem ter vários significados: a necessidade de chamar atenção, de exibir-se para os colegas, expressar revolta ou, segundo Day (1996), querer deixar suamarca no mundo, uma vez que os que os fazem estão botando para fora a rebeldiadeles contra o governo ou contra os pais, contra a sociedade, contra a escola. Fazem apichação deles ali para botar para fora a sua vontade, o seu desejo.

Atos de pichação, depredação de muros, janelas, paredes e destruiçãode equipamentos, acompanhados de furtos, apresentam-se como formasde vandalismo mais comuns apontadas nas diversas categorias deentrevistados. Como pode ser verificado na Tabela 7, de fato, os atos dedepredação, nas suas diversas formas, são muito freqüentes.

A pichação ocorre dentro das escolas públicas e privadas,principalmente nos banheiros, com frases de amor, declarações, mensagenssobre legalização da maconha � �fumo sim legalize�; �chapado da maconha� � e,em menor quantidade, protestos contra o governo. Há, ainda, pichações denomes, referências a gangues, palavrões e frases pornográficas, dirigidas adeterminadas pessoas. Nos banheiros femininos, encontram-se frases dessetipo e declarações de amor.

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A explosão de bombas nos banheiros é retratada, evidenciando acumplicidade dos colegas ao não denunciar o responsável pelo ato.

TABELA 7 � Proporção de alunos* e membros do corpo técnico-pedagógico, por relatos de depredação da escola, segundo capitaisdas Unidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos informantes: �Marque com um X se você sabe que já aconteceu nesta escola: Depredação

da escola?� Os percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.* Dados expandidos

Grupo focal com alunos, escola pública, Vitória

Jogaram uma bomba no ano passado. (....) A gente juntou um monte mesmo ecolocou um cigarro e botou no banheiro. Aí, na hora que acendeu o pavio, lá,deu aquele estouro horrível. Aí chamaram a polícia [que] chegou, investigou enada. A galera lá na sala até que sabia. A gente não vai dedurar. E omenino ficou muito tempo. Aquele caso de quem estourou a bomba. Aí estavapegando para um outro garoto que não tinha feito nada. Então ficou aqueledilema, mas depois que descobriu que foi o menino, aí ele foi expulso.

QUADRO 8 � Quem estourou a bomba?

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RESUMO: Violências nas escolas

Além dos episódios de depredação dentro da escola, pais eprofessores relatam que tiveram seus carros riscados pelos alunos.

Os depoimentos contribuem com a hipótese de que não existe ocuidado com o bem coletivo: carteiras, portas, salas etc., demonstrandoque a escola ainda se encontra muito distante do aluno e da comunidade.

Mas como bem alerta um professor, o ambiente escolar dever sercuidado, considerando não só que inclusive influencia no moral e sentidode pertencimento à escola, mas porque pelo cuidado se pode interromperum círculo de vandalismos, uma cultura de violências: Quando o negócioestá bonito, eu conservo. Com o negócio feio, todo mundo dá mais uma pisadinha. Seo banco do ônibus estiver furado, começam a arrancar, cada um tira um pedacinho.

5.4 PRATICANTES E VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA

Segundo relatos dos atores, independentemente do tipo de violência,os praticantes são predominantemente os alunos e os membros de gangues,divididos entre alunos e não-alunos. Os policiais aparecem mais comopraticantes do que como vítimas de violência. Finalmente, professores,funcionários e adultos ligados à escola são muito menos mencionados,em qualquer uma das duas condições, ou seja, quer como vítimas, quercomo praticantes de violência.

Observa-se, ainda, que os alunos são as vítimas mais constantes.Seguem-se os professores e os funcionários/diretores. As vítimas menoscitadas são os policiais, em todas as capitais pesquisadas.

A violência física foi a que mais atingiu todos os grupos de vítimas,seguindo-se a violência contra a propriedade. Por último, veio a violênciaverbal, a qual, na maioria das vezes, passa despercebida como forma deviolência.

Este capítulo preocupou-se em fornecer uma síntese das noções eênfases que acompanham os relatos sobre as violências sofridas eprotagonizadas pelos agentes e beneficiários do sistema escolar brasileiro.Foi possível verificar, por meio dos dados quantitativos e qualitativosapresentados, que a escola vem vivendo situações em que as transgressões,os atos agressivos e as ocorrências de diferentes níveis de gravidadetornam-se cada vez mais presentes.

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Verificou-se que muitos jovens são vítimas ou agentes da violência,entretanto, mesmo os que não se envolveram diretamente, relataraminúmeros casos dos quais tomaram conhecimento ou presenciaram noespaço escolar. Essa proximidade contribui para banalizar ocomportamento violento, tornando trivial a ocorrência de furtos, roubos,assaltos, estupros, agressões físicas, vinganças, homicídios, depredações,entre outros. A gratuidade da violência para eles é uma realidade, e omedo é comum em suas falas.

A violência física é a face mais visível do fenômeno, nas escolas.O confronto corporal ou armado mobiliza parte considerável dasdiscussões, aparecendo como referência para que os informantesdiscursem sobre o tema e o ampliem para incluir outros tipos deviolência. Em algumas situações, justifica-se o recurso à violência físicacomo uma forma de defesa pessoal ou como atitude de proteção aosamigos, os mais fracos, ou como uma resposta à ação de um sujeitomais forte. Em outras, aparece como uma atitude impensada diante deuma provocação. Independentemente da justificativa, a violência é umaforma de negociação que exclui o diálogo, ainda que seja impulsionadapor múltiplas circunstâncias e se revista de uma conotação moral � comoa defesa dos amigos.

Tratar de violência na escola significa lidar com uma intersecção deelementos, isto é, um fenômeno de uma nova ordem e não simplesmenteo somatório dos objetos �escola� e �violência�. É um fenômeno singular,pois envolve práticas sociais que, para serem compreendidas, requer umolhar que não as reduza a meras extensões de práticas violentas ou escolares.

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O objetivo deste capítulo é mapear e identificar as múltiplasrepercussões das violências nas escolas. No princípio, busca-secompreender as causas e processos pelos quais as escolas se tornamcenário de violências ou deixam de sê-lo. Em seguida, tem-se acesso àvisão da comunidade escolar como um todo quanto ao que fazer contraas violências nas escolas. Finalmente, apresentam-se propostasembasadas nos resultados desta pesquisa, na literatura especializada eno acervo da própria UNESCO.

6.1 REPERCUSSÕES DAS VIOLÊNCIAS

As situações de violência comprometem o que deveria ser aidentidade da escola � lugar de sociabilidade positiva, de aprendizagemde valores éticos e de formação de espíritos críticos, pautados nodiálogo, no reconhecimento da diversidade e na herança civilizatóriado conhecimento acumulado. Essas situações repercutem sobre aaprendizagem e a qualidade de ensino tanto para alunos quanto paraprofessores.

Segundo a Tabela 8, quase metade dos alunos sustenta que asviolências no ambiente escolar fazem com que não consigam seconcentrar nos estudos. Ainda segundo a tabela, entre 28% (Rio deJaneiro e Belém) e 39% (Cuiabá) afirmam ficar nervosos, revoltadoscom as situações de violência que enfrentam em suas escolas. A terceiraconseqüência da violência escolar mais citada pelos alunos é a perdada vontade de ir à escola, expressa em valores que variam do mínimo

6. REPERCURSÕES DASVIOLÊNCIAS ESOLUÇÕESALTERNATIVAS

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RESUMO: Violências nas escolas

de 27%, no Rio de Janeiro e Recife, ao máximo de 34%, em Goiânia,Cuiabá, Manaus e Fortaleza.

TABELA 8 � Proporção de alunos*, por percepção das conseqüências daviolência na escola sobre o seu desempenho escolar, segundo capitais dasUnidades da Federação 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Notas: Foi perguntado aos alunos: �Como você acha que a violência afeta seus estudos: (Marque todas que forem verdadeiras)�. Os

percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.* Dados expandidos

A Tabela 9 revela as proporções de alunos emembros do corpo técnico-pedagógico que não comparecem às aulas por causa das violências noambiente escolar. Os alunos são os que mais sofrem como conseqüências afalta às aulas. A Tabela 10 revela a percepção dos alunos em relação aoimpacto da violência sobre a qualidade do ensino. Foi perguntado a eles:�Como você acha que a violência afeta seus estudos? O ambiente da escolafica pesado? Sente que a qualidade das aulas piora?�.

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TABELA 9 � Proporção de alunos* e membros do corpo técnico-pedagógico, por declaração de não comparecimento às aulasdevido à violência na escola, segundo capitais das Unidades daFederação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado aos informantes: �No último ano (12 meses) você faltou às aulas por causa de problemas

de violência na escola?�. Os percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.* Dados expandidos

TABELA 10 � Proporção de alunos*, por percepção do impactoda violência sobre a qualidade do ensino, segundo capitais dasUnidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Notas: Foi perguntado aos alunos: �Como você acha que a violência afeta seus estudos: O ambiente da escola fica pesado; Sente

que a qualidade das aulas diminui (Marque todas as que forem verdadeiras)�. Os percentuais referem-se apenasàs respostas afirmativas.

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RESUMO: Violências nas escolas

No que se refere aos membros do corpo técnico-pedagógico, comomostra a Tabela 11, a primeira conseqüência é a perda de estímulo para otrabalho. Em segundo lugar, vem o sentimento de revolta e, em terceiro, adificuldade de concentração nas aulas.

Os professores preferem transferir-se para ambientes escolares maisseguros, ocasionando, portanto, uma defasagem de professores em escolasonde ocorrem mais violências.

6.2 MEDIDAS CONTRA AS VIOLÊNCIAS NAS ESCOLAS� SUGESTÕES DOS PROTAGONISTAS

Apresentou-se um questionário aos entrevistados com um leque demedidas para contenção das violências nas escolas. A proposta de aumentar avigilância policial nas escolas e imediações obteve maior proporção de adesões.

TABELA 11 � Proporção de membros do corpo técnico-pedagógico, porpercepção das conseqüências da violência na escola sobre o seu desempenhoprofissional, segundo capitais das Unidades da Federação, 2000

Fonte: Pesquisa Nacional Violência, Aids e Drogas nas Escolas, UNESCO, 2001.Nota: Foi perguntado ao corpo técnico-pedagógico: �Como você acha que a violência afeta seu trabalho na escola: (Marque todas

que forem verdadeiras)�. Os percentuais referem-se apenas às respostas afirmativas.

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Também se destaca a proposição �diálogo entre alunos, professores ediretoria� e �parceria entre escola e comunidade�, esta principalmente entreprofessores. Os dados apresentados indicam que 66% dos alunos e 65% docorpo técnico-pedagógico apontaram o diálogo entre alunos, pais, professorese diretoria como medida apropriada para o combate à violência nas escolas.

Nos grupos focais, os alunos priorizam a presença policial na escola eem suas imediações, mas exibem também postura crítica em relação ao tipode polícia existente e a forma de segurança oficial feita nas imediações enas escolas. Do mesmo modo como vários alunos chamam pelopoliciamento, também muitos sublinham o seu descrédito: Hoje em dia, se opolicial pegasse esse cara, só ia enfiar ele dentro do carro e soltar. Para fazer a minhaprópria segurança, se depender dele, estou morto, né?

O diálogo foi qualificado nos grupos focais com estudantes comorelações diretas entre professora, diretoria e alunos: (....) Eles estão sentindo oque a gente está fazendo aqui agora: conversar sobre o assunto. Porque conversando apessoa deixa de pensar besteira, deixa de querer fazer justiça com as próprias mãos. Écompartilhar os problemas.

Os alunos, pais e professores insistem nas medidas baseadas naintegração da escola com a comunidade, para conter a violência nosestabelecimentos de ensino. Destaca-se, como um indicador positivo, avontade desses atores apostarem medidas de resolução compartilhada doproblema, tendo em vista a indicação do diálogo entre alunos, pais,professores e diretoria, e a parceria entre escola e comunidade, comodispositivos importantes para conter as violências nas escolas.

Os estudantes insistem em medidas preventivas de participaçãoampliada, baseadas na interação da família, com a escola: Melhorar mais aeducação, tanto no colégio como familiar (....) Acho que o diálogo também é umaforma. A escola é vista, aparentemente, como elemento de mediação entreo aluno e a família, cabendo-lhe trabalhar os significados da violência dentroe fora de seus limites a fim de combatê-la, abordando aspectos importantesna vida do estudante que extrapolam os muros da escola e o período letivo.

Tanto pais como alunos e corpo técnico-pedagógico advogamdisciplina mais dura para os alunos que cometem atos irregulares como, porexemplo, a expulsão. Também citam, como medida de segurança, murosaltos ou grades de proteção nas escolas. Dentro do contexto das discussões,

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RESUMO: Violências nas escolas

chamou-se atenção para entrada de armas de fogo no ambiente escolar eque deveria ser feita revista na entrada do colégio para coibir a violência.

Chama a atenção o fato de que, entre outras medidas, tem sidobastante utilizado o apoio de psicólogos nas escolas, focalizando a violênciasob uma perspectiva psicológica e não social. Outro papel de relevânciacabe à cultura e à educação, levando ao resgate da auto-estima, a umaconscientização dos problemas e das desigualdades, possibilitando superá-los e gerar solidariedade. O fortalecimento da auto-estima dos alunos servepara combater os preconceitos.

Eu gosto muito de trabalhar a auto-estima. Porque quando a pessoa sabe quetem valor, que ela é importante, que é capaz, ela abre mais o leque para lutar,ultrapassar as barreiras. (Entrevista com diretor, escola privada, DistritoFederal)

Nas estratégias adotadas a fim de combater as violências, duas têmapresentado bons resultados. Uma delas é a melhoria da relação da escolacom a comunidade, e a outra é a abertura de canais de expressão dos alunos:Devia ter mais atenção para os alunos porque (....), a gente passa a maioria do nossotempo na escola. Deposita-se na escola, portanto, uma responsabilidade notratamento da violência, mediante a criação de um ambiente mais amistosoe de cooperação, em que todas as partes � alunos, professores, pais etc. �estariam envolvidas (Avancini, 2001).

A expectativa de a escola ser uma agência privilegiada para o combatedas violências e das culturas de violência viria, por outro lado, encontrandoressonância em experiências que destacam profissionais que combinam asfunções formais de docentes com as de articuladores entre a escola e afamília, ou na postura dialógica nas relações com os alunos. Também osalunos sugerem ter importância uma grade curricular mais flexível, comapelo a linguagens da arte e outras, em que lições de vida sejam enfatizadas.

Vale assinalar, ainda, os relatos de redução dos atos de vandalismoem conseqüência da mudança física do ambiente escolar, realizada porintermédio do envolvimento e participação direta dos alunos e dacomunidade, o que permite que valorizem e mantenham o patrimônio daescola, o qual passa a ser visto como um bem coletivo.

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6.3 POR QUE UMA ESCOLA TORNA-SE VIOLENTA?

Algumas escolas são historicamente mais violentas do que outras,que passam momentaneamente por essa situação. Há, portanto, violênciaspermanentes e ocasionais, dependendo das condições internas como externasdas escolas.

Encontram-se escolas seguras em locais extremamente perigosos,como uma escola pública na periferia do Rio de Janeiro, consideradaprivilegiada entre as demais. A justificativa dada por professores e alunos éser ela uma escola com as dependências sempre conservadas como novas ecom professores unidos em prol do ensino. Os alunos têm ambiente de amizadee respeito, por isso, ajudam na conservação do colégio. A segurança daescola é de ótima qualidade, como enfatizam os alunos. Nessa escola, háum grêmio organizado, e cada turma possui um representante e um suplente,além de um professor conciliador da turma que representa o colégio nareunião de pais. Esses têm participação freqüente nas atividades escolares.A direção tem discurso democrático enfatizando o diálogo como forma deinteração do aluno. Os professores, também, manifestam esse sentimentoincorporando seus próprios filhos na comunidade escolar.

Outro exemplo é uma escola na periferia de Cuiabá, com vizinhançaconsiderada perigosa, mas relativamente segura. Os alunos que a freqüentamsãomoradores do bairro, assim como a direção da escola.Os alunos percebemque o colégio é um espaço de socialização onde as relações de afetividadesão construídas e vividas entre professores e alunos, direção e coordenação.A direção garante controle rígido de entrada de pessoas estranhas noestabelecimento.

Há, também, momentos em que o estabelecimento de vínculos com acomunidade traz implicações, como a necessidade de lidar com os traficantesde drogas e as gangues. A diretora de uma escola da periferia do Rio de Janeirorecorre à �política da boa vizinhança� com os traficantes, incluindo-se váriosex-alunos da escola. Os alunos afirmam que, apesar da rigidez em relação àsregras de disciplina, os jovens se referem à direção com apreço.

Sobre a mudança de tipologia da escola de mais violenta para menosviolenta, considera-se a atuação do diretor. Há o exemplo de uma escola deSão Paulo, localizada em um bairro operário. Segundo o diretor chamado

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RESUMO: Violências nas escolas

para trabalhar na escola considerada �o circo dos horrores�, acaboupermanecendo e mudando a sua imagem. Relatavam os alunos que a direçãoanterior não permanecia na escola, portanto não acompanhava odesenvolvimento dos alunos, muito menos cuidava do aspecto físico doestabelecimento. O diretor conta que seu principal segredo foi trabalhar emequipe com amesma filosofia, respeitando as regras estabelecidas pela escola,bem como valorizando os alunos, resgatando a auto-estima por meio doestímulo ao diálogo. Incluiu na sua prática a conservação da estrutura física,fez-se mais presente, combinando respeito e liberdade. Hoje, a escola éuma das mais procuradas do bairro e tida como modelo.

Afirmar que as violências nas escolas representam um estado e nãouma característica de uma ou de outra, ou do sistema escolar, significaassumir que essa condição muda de acordo com os processos pelos quaiscada estabelecimento de ensino passa, em especial as mudanças naadministração e das relações com diretores e professores. Os dados apontamque alterações feitas pela administração produziram mudanças no perfil daescola em relação à violência: o estreitamento da tolerância em relação àsregras, a democratização do ambiente escolar; e melhoria e conservação daestrutura física.

A percepção do fenômeno das violências nas escolas resulta dashistórias vividas e recolhidas pelos diversos atores que convivem noambiente escolar e das relações que estabelecem entre si. Nessa medida, asviolências são percebidas como um fenômeno corriqueiro no cotidianodaqueles que já vivenciaram situações ligadas a roubos, ameaças, assalto,discriminação, vandalismo, atitudes autoritárias, brigas etc. Para evitar acontinuidade dessa situação, é indiscutível a necessidade de se identificaremmedidas para que os estabelecimentos de ensino se apresentem como espaçoseguro para seus integrantes, uma vez que a violência afeta a integridadefísica, emocional e psicológica de alunos, professores, funcionários e pais.

Diante desse contexto, as especificidades nacionais devem serconsideradas para o desenho de políticas públicas, as quais devem serfirmadas nas ações de preservação da violência e não se basearem emmedidas repressivas. Em relação à escola, deve-se ter proposta pedagógicamais atraente à linguagem juvenil, considerando os jovens comoprotagonistas das políticas públicas.

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6.4 RECOMENDAÇÕES PARA POLÍTICAS,ESTRATÉGIAS E MEDIDAS CONTRA VIOLÊNCIASNAS ESCOLAS

Considerando a literatura sobre a violência nas escolas, o acervodos ensaios e pesquisas promovidos pela UNESCO e o conteúdo destapesquisa, é possível sistematizar um conjunto de recomendações a seremacionadas pelo poder público nas instâncias federal, estadual e municipal.

As medidas contra as violências nas escolas partem de três premissasgerais: realizar diagnósticos e pesquisas para conhecer o fenômeno emsua concretude, legitimação pelos atores/sujeitos envolvidos (o quepressupõe a participação da comunidade escolar) e fazer ummonitoramento permanente das ações nas escolas.

Tem-se, também, como premissa que, cada vez mais, a prevenção eerradicação das violências nas escolas exigem relacionar conhecimentosensível, ético, valorização do jovem, criação de um clima agradável eparticipativo, com conhecimento especializado e transdisciplinar, bemcomo análises sobre segurança pública, segurança escolar.

Deve-se assumir a importância da construção de uma Cultura dePaz, �uma cultura baseada na tolerância, solidariedade e compartilhamentoem base cotidiana, uma cultura que respeita todos os direitos individuais� o princípio de pluralismo, que assegura e sustenta a liberdade de opinião� e que se empenha em prevenir conflitos resolvendo-os em suas fontes,que englobam novas ameaças não-militares para a segurança, comoexclusão, pobreza extrema e degradação ambiental. A cultura de pazprocura resolver os problemas através do diálogo, da negociação e damediação, de forma a tornar a guerra e a violência inviáveis�. (Wertheinin Noleto, 2001: 6)

A Cultura de Paz pressupõe o combate às desigualdades e exclusõessociais e o respeito aos direitos de cidadania. A escola pode ser umlocal privilegiado de combate à violência, mas, para isso, necessita deprofissionais respeitados, com conhecimento de pedagogia, cabendo aopoder público investir na formação e reciclagem destes profissionais,como, também, adotar estratégias para fazer prevalecer o direito e osdeveres do professor.

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RESUMO: Violências nas escolas

Características da escola para combate à violência:1. Lugar de encontro de diversidade cultural e habilitado paraformas criativas de solidariedade.

2. Potencial estratégico para tecer relações com a comunidade,especialmente a família, tendo os pais como parceiros paratal fim.

3. Possibilidade de experimentar medidas de prevenção e deacompanhar tanto a população-foco como as experiênciasimplementadas de políticas públicas.

4. Formação de valores e transmissão de conhecimentos, o quetem prosseguimento nos processos de interação não somenteentre professores e alunos, mas também entre os própriosestudantes.

Diversos projetos voltados ao combate à violência nas escolas têmsido implementados em diversos países. Por exemplo, o projeto Sevilha(Sevilha Ante Violência Escolar � SAVE), iniciado em 1995. O modeloparte do ponto de vista psico-educativo e da escola como um lugar devida em comum entre os jovens, onde todos os membros da comunidade� famílias, professores e alunos � devem estar representados.

Atualmente, o SAVE atua em 28 estados norte-americanos e noCanadá, promovendo grupos de discussão nos quais voluntários orientamos estudantes a discutir e desenvolver alternativas para a resolução deconflitos e a aplicar o que aprendem em projetos de combate à violênciano ambiente escolar e comunitário.

No Brasil, o programa Abrindo Espaços: Educação e Cultura para aPaz, criado pela UNESCO, é resultado de várias pesquisas sobreviolências envolvendo os jovens no Brasil, quer como vítimas, quercomo agentes diretos. Um exemplo desse trabalho é o Projeto Escola dePaz, iniciativa conjunta da UNESCO e do Estado do Rio de Janeiro, emque 250 escolas públicas abrem suas portas aos fins de semana,aproveitando os talentos e a produção cultural da própria comunidadeem áreas de maior vulnerabilidade social. Esse mesmo projeto está sendorealizado em outros Estados do Brasil: na Bahia, com o nome de AbrindoEspaços: Educação e Cultura para Paz; no Mato Grosso, Abrindo Espaços, eem Pernambuco com o nome de Escola Aberta.

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6.5 RECOMENDAÇÕES

As recomendações que se seguem relacionam-se com aimplementação de políticas públicas que focalizam a violência nas escolase requerem o apoio dos governos federal, estaduais e municipais e dasociedade civil. No âmbito das escolas, é necessário o envolvimento detodo o corpo docente, alunos, pais, funcionários, mídia, polícia etc.

As secretarias estaduais e municipais de educação devemacompanhar o processo de implementação de medidas contra a violêncianas escolas, contribuindo com a preparação de pessoal e de materialpara treinamento de funcionários, além de discutir políticas de gestão esegurança com autoridades escolares e com a comunidade.

Cuidados com o entorno ou vizinhança da escola � zonasseguras• Colocar semáforos, passarelas, faixas de pedestre;• cuidar do bom estado da iluminação;• controlar venda de bebidas alcoólicas em locais próximos;• proibir a existência de estabelecimentos de jogos de azar;• coibir a circulação de drogas ilícitas.

Lazer � abertura do espaço escolar• Implementar programas para abertura das escolas no final dasemana com propostas de envolvimento da comunidade, dafamília e dos alunos em atividades culturais, artísticas eesportivas e de lazer, com a tônica em educação para a cidadaniae na construção de uma Cultura de Paz;

• promover atividades (artes, esportes etc.) que envolvam osalunos da escola, a comunidade e a família.

Interação de escola, família e comunidade• Promover a socialização das famílias e da comunidade em quese situa a escola, para a redução da violência.

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RESUMO: Violências nas escolas

Atividades de cunho transdisciplinar• Conscientização dos alunos quanto às conseqüências do usode armas, de drogas, roubos e assaltos, preconceitos contrahomossexuais e atitudes discriminatórias quanto às diferençasétnicas e de gênero;

• campanhas de combate à violência com apoio dos meios decomunicação de massa e outras instituições de mobilização.

Clima da escola• Cuidar do estado físico e da limpeza da escola. Criar ambientesagradáveis, boa ventilação e iluminação, mobiliário em bomestado e espaço adequado para as atividades escolares de lazer;

• desenvolver sentido de pertencimento à escola com aparticipação de todos os seus integrantes em diversasatividades;

• contar com espaços para laboratórios químicos, de informáticae para o desenvolvimento de atividades artísticas e esportivas;

• incentivar cursos de grafite e restauração, estimulando osentido de pertencimento à escola e combatendo o vandalismoe a pichação do patrimônio escolar.

Normas• Ter regras claras de disciplina e de expectativa quanto aocomportamento e ao desempenho dos alunos, professores efuncionários;

• regras claras sobre medidas punitivas como: suspensão,transferências e expulsão, em casos extremos;

• ter normas de punição para violência de professores efuncionários contra alunos e vice-versa;

• ter normas sobre deveres de professores e demais funcionáriospara com o corpo discente, como a obrigação da assiduidadee pontualidade, e de ministrar aulas de qualidade, evitando-se o abuso de poder dos professores e funcionários � como osda área de segurança � contra os alunos.

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Sensibilização• Sensibilizar o corpo docente a respeito das questões relacionadasà violência, seja entre alunos, seja entre esses e os professorese funcionários;

• reforçar programas relacionados a culturas juvenis, sexualidadee drogas entre outros, para o corpo técnico-pedagógico da escolae demais envolvidos no ambiente escolar.

Segurança• Contar com eficiente policiamento;• apreender armas na escola, combinando medidas preventivascom punitivas;

• dar segurança aos alunos e membros da comunidade, nãosomente na escola, mas, também, em seu entorno;

• cuidar da sensibilização da polícia sobre os direitos humanos,para evitar autoritarismo e abuso de poder;

• dar prioridade à segurança e à vigilância nos horários de entrada,saída e no recreio;

• ter regras explícitas sobre o uso do uniforme, visando àidentificação dos alunos.

Mídia• Promover debates e encontros com jornalistas e outrosprofissionais da mídia, para divulgação de casos bem-sucedidosde Cultura de Paz e outros problemas enfrentados pela escola.

Valorização e organização dos jovens• Valorizar os jovens, respeitando sua autonomia e os casos deconflito, discutindo diretamente com os envolvidos;

• estimular a criação de grêmios ou de entidades de formatopróprio;

• discutir com os jovens sobre o tema da violência embasada naexperiência e linguagem deles;

• estimular o uso do mural organizado pelos alunos.

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RESUMO: Violências nas escolas

Articulação• Articular as escolas com as Secretarias de Educação, osConselhos Tutelares e, quando não existirem, com o MinistérioPúblico, para elaborar as medidas de proteção e prevençãocontra a violência.

Apoio especializado ao processo de implantação das medidas• Discutir com os pais, a comunidade em que se situa a escola, ocorpo técnico-pedagógico, alunos e funcionários as medidas aserem implementadas na escola;

• promover linha de pesquisa sobre violência na escola peloEstado, com a colaboração de distintos especialistas e entidades;

• conhecer as experiências de outras escolas que realizam trabalhocontra a violência;

• avaliar a situação de violência nas escolas por meio de relatóriosentre professores, diretores, alunos, pais e funcionários, assimcomo entre membros da comunidade; coleta de dados sobre asatividades cotidianas no ambiente escolar e com as instituiçõespoliciais;

• elaborar material didático escrito e audiovisual para colaborarcom os professores, diretores, funcionários e grupos de arteque desejarem atuar nos estabelecimentos escolares, emparticular de jovens que tenham propostas nesse sentido.

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O tema básico desta pesquisa é a violência considerando-a comodanos físicos ou simbólicos, impostos a indivíduos ou grupos. Em um planomais macro, a violência geralmente é associada à pobreza, desigualdadesocial e falhas de comunicação. É também contrária ao uso da razão,consentimento e diálogo, relacionando-se ao abuso de poderes em diversostipos de relações sociais, assim como, em muitos casos, ao recurso do poderpelas armas, pelo medo, pela intimidação e pelo desrespeito ao outro(Arendt, 1994). Há portanto diversos tipos de ambiências violentas, não sepodendo reduzir a violência a um único fator. Nesta pesquisa, registra-seque além de violência, há que se referir a diversos tipos de violência, ouseja, a violências nas escolas.

Nas escolas, a violência física é caracterizada por brigas, agressões,invasões, depredações, ferimentos, e até mortes, e os conflitos se registramentre vários atores: alunos e professores, alunos e funcionários etc.

A violência simbólica é mais difícil de ser percebida. É exercida muitasvezes de forma sutil, sem necessariamente ser vista como violência porquem a sofre, ou seja, quando a vítima não se dá conta de sua impotênciafrente a poderes, nem exerce seu capacidade de crítica em relação a taldinâmica. Por exemplo, a violência simbólica é exercida pela sociedade, porfalta de encaminhamento dos jovens ao mercado de trabalho, por vedar asoportunidades para que desenvolvam sua criatividade e atividades de lazer.Acontece também quando as escolas impõem conteúdos destituídos deinteresse ou quando os professores não se esforçam pela qualidade de suasaulas e não respeitam seus alunos, desvalorizando-os com palavras e atitudesde desmerecimento. Refere-se também à violência sofrida por professoresquando são agredidos em seu trabalho e em sua identidade profissional,pelo desinteresse e indiferença dos alunos.

Manifestas de várias formas, as violências na escola envolvem osintegrantes desta tanto como agressores quanto como vítimas. A violênciafísica é a face mais explícita desse fenômeno, com destaque para as ameaças,principalmente as feitas pelos alunos, com promessas de retaliações depois

CONCLUSÕES

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RESUMO: Violências nas escolas

do horário escolar. As brigas são corriqueiras e banalizadas e, muitas vezes,incentivadas pelos colegas.

As violências com armas de fogo ou o porte de armas são sustentadaspor alunos que as trazem de casa, na maioria das vezes, ou as conseguiramcom facilidade � até mesmo pagando a prestações. O abuso sexual foidenunciado como praticado tanto por alunos como por membros do corpodocente. Os furtos e roubos no ambiente escolar, caracterizados comoviolência conta o patrimônio, ocorrem de forma constante.

Ocorrem também atos de vandalismo nas escolas de ambas as redes,mas em maior proporção entre escolas públicas, sendo que, muitas vezes,tais fatos estão associados a uma má administração, como diretores ausentes,autoritários e omissos e, da parte dos alunos, à falta de pertencimento/compartilhamento daquilo que é público.

Em geral, as escolas lidam com brigas, atos de agressividade e diversostipos de violências por meio de normas. Entre os diversos procedimentos,destacam-se as advertências, suspensões, transferências/expulsões, quedependem da gravidade da questão. A disciplina, enquanto responsabilidadee compromisso, é apresentada como condição básica para manter a ordem,sendo que as regras muitas vezes são questionadas entre o corpo técnicopedagógico e os alunos, como uso de uniforme e horário, entre outras.

Mesmo com críticas, principalmente às regras, a tendência entre osalunos é gostar da escola em que estudam. Os alunos reclamamprincipalmente do desinteresse e da indisciplina dos próprios colegas, doaspecto e das condições físicas da escola, da carência de recursos humanose materiais e da falta da assiduidade e da competência dos professores. Sãolevantados outros temas como abuso de poder e autoritarismo, puniçõesarbitrárias etc.

A escola se destaca como locus de violência simbólica, que se manifestapor meio de diversos atos. Pressionar a partir do poder de conferir notas,ignorar os alunos com seus problemas, tratá-los mal, recorrer a agressõesverbais e expô-los ao ridículo quando não compreendem algum conteúdosão algumas violências que aparecem de forma recorrente na fala dosestudantes. Os professores também sofrem quando são agredidos em seutrabalho e em sua identidade profissional pelo desinteresse e indiferençados alunos, criando um ambiente de tensão cotidiana. Muitos deles

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sustentam que não gostam das aulas, da carga horária, das condições detrabalho e da remuneração, e muitos também são críticos dos alunos, porsua indisciplina ou por sua falta de interesse e dedicação aos estudos.

Os alunos demonstram em seus depoimentos que não estão segurosde que o ensino lhes garanta melhor qualificação para o mercado de trabalho.Evidencia-se que os jovens de baixa renda vêem a escola como canal demobilidade social. Alguns acreditam que a escola lhes ensina coisas úteispara a vida e para o futuro.

Destacam-se as discriminações como formas de violência. O racismopode se realizar por comportamentos disfarçados de �brincadeiras e piadas�ou uma pseudocordialidade, sendo que muitos dos que têm tais práticasnão lhes atribuem intenção racista, mas muitas vezes são sentidos como talpor quem é alvo. Existem alunos, porém, que afirmam ter preconceito raciale declaram que diversas brigas são motivadas pelo racismo.

Os resultados da pesquisa trazem importantes pistas para a compreensãode como os jovens lidam com a violência, destacando-se que a noção deviolência não é monolítica: para alguns, as violências se apresentam comunse banalizadas, para outros como conseqüência da discriminação racial e daexclusão social. São vários os que só identificam como violências as quecausam danos físicos, mas há os que reconhecem como tal aquelas queprovocam dor, medo, tristeza, baixa auto-estima, desvalorização e não-reconhecimento da dignidade como que todos merecem ser tratados.

Os alunos afirmam que a violência nas escolas é uma das causas dodesinteresse, da falta de concentração nos estudos, da perda de dias letivos eda vontade de assistir as aulas, por ficarem nervosos, revoltados, com medoe inseguros, trazendo prejuízo para o desenvolvimento acadêmico e pessoal.

Entre os professores o absenteísmo é uma das conseqüências diretasdas violências e da falta de reconhecimento pelo mérito de seu trabalho.Outros resultantes são a perda de estímulo para o trabalho, o sentimento derevolta e a dificuldade de se concentrar nas aulas.

O esforço empreendido neste trabalho, ao trazer uma visão ampla sobresituações de violências em diversas escolas, pretende ajudar na reflexão e nabusca de medidas estratégicas para a superação das violências nas escolas.

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1 � Questionários respondidos por alunos, professorese pais nas capitais das Unidades da Federação (números absolutos) ...... 17

Tabela 2 � Distribuição amostral das escolas, por capitais dasUnidades da Federação, segundo a dependência administrativa(números absolutos) ......................................................................................... 18

Tabela 3 � Proporção de alunos, por indicação do que não gostamna escola, segundo capitais das Unidades da Federação, 2000 ................ 36

Tabela 4 � Proporção de alunos e membros do corpotécnico-pedagógico, por testemunho de porte de armaspor alunos, professores ou pais no ambiente da escola, segundocapitais das Unidades da Federação, 2000 ................................................... 55

Tabela 5 � Proporção de alunos, por forma de contato com armasde fogo, segundo capitais das Unidades da Federação, 2000 .................... 57

Tabela 6 � Proporção de alunos e membros do corpotécnico-pedagógico, por relatos de roubos de carros ou objetospessoais no ambiente da escola, segundo capitais das Unidadesda Federação, 2000........................................................................................... 59

Tabela 7 � Proporção de alunos e membros do corpotécnico-pedagógico, por relatos de depredação da escola,segundo capitais das Unidades da Federação, 2000 ................................... 61

Tabela 8 � Proporção de alunos, por percepção das conseqüênciasda violência na escola sobre o seu desempenho escolar, segundocapitais das Unidades da Federação 2000 .................................................... 66

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RESUMO: Violências nas escolas

Tabela 9 � Proporção de alunos e membros do corpotécnico-pedagógico, por declaração de não comparecimentoàs aulas devido à violência na escola, segundo capitais dasUnidades da Federação, 2000 ......................................................................... 67

Tabela 10 � Proporção de alunos, por percepção do impacto daviolência sobre a qualidade do ensino, segundo capitais dasUnidades da Federação, 2000 ......................................................................... 67

Tabela 11 � Proporção de membros do corpo técnico-pedagógico,por percepção das conseqüências da violência na escolasobre o seu desempenho profissional, segundo capitais dasUnidades da Federação, 2000 ......................................................................... 68

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1 � Futuro melhor ........................................................................... 43

Quadro 2 � Vestibular .................................................................................. 44

Quadro 3 � Filando dos outros .................................................................. 45

Quadro 4 � Preconceito quando se é negro ............................................ 47

Quadro 5 � Uma coisinha mais branca dá para andar de mão dada....... 48

Quadro 6 � Você pode jurar que já está morto ...................................... 52

Quadro 7 � Assim ele puxou a arma......................................................... 56

Quadro 8 � Quem estourou a bomba?...................................................... 61

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