VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES UM ESTUDO DE CASO NO CONSELHO TUTELAR
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VIOLÊNCIA DOMÉSTICA CONTRA CRIANÇAS E ADOLESCENTES
METODOLOGIA DE ATENDIMENTO SOCIAL DE CASOS
ESTUDO DE CASO NO CONSELHO TUTELAR
COMO ENTENDER E ENCAMINHAR UM CASO PRÁTICO NO ATUAL CONTEXTO DE
FUNCIONAMENTO DOS CONSELHOS TUTELARES.
Marco Aurelio Romar1
O Conselho Tutelar, que é um órgão permanente, não jurisdicional, independente e
autônomo, integrante do Sistema de Garantias e Direitos da Criança e do Adolescente, e que
no cumprimento de suas atribuições legais, trabalha diretamente com pessoas que, na
maioria das vezes, vão ao Conselho Tutelar ou que recebem sua visita em situações de crises
e dificuldades – histórias de vidas complexas, confusas, diversificadas e vítimas das mais
complexas expressões das questões sociais contemporâneas.
É ÓRGÃO PERMANENTE Não depende de autorização de ninguém - nem do prefeito, nem do juiz, nem do Promotor
de Justiça, para o exercício das atribuições legais que lhe foram conferidas pelo Estatuto da
Criança e do Adolescente: artigos 95, 101e 194.
É um órgão público municipal, que tem sua origem na lei, integrando-se ao conjunto das
instituições nacionais (estaduais e municipais) e subordinando-se ao ordenamento jurídico
brasileiro. Criado por lei municipal e efetivamente implantado passa a integrar de forma
definitiva o quadro das instituições municipais. Desenvolve uma ação contínua e ininterrupta.
Sua ação não deve sofrer solução de continuidade, sob qualquer pretexto. Uma vez criado e
implantado, não desaparece; apenas renovam-se os seus membros.
É NÃO JURISDICIONAL
Pois não integra o Poder Judiciário. Exerce funções de caráter administrativo, vinculado,
portanto, ao Poder Executivo Municipal. Não pode exercer o papel e as funções do Poder
Judiciário na apreciação e julgamento dos conflitos de interesse. Apesar de ser não
jurisdicional O Conselho Tutelar pode e deve:
Fiscalizar as entidades de atendimento;
Iniciar os procedimentos de apuração de irregularidades em entidades de
atendimento, através de representação (art. 191 do Estatuto da Criança e do
Adolescente);
Iniciar os procedimentos de apuração de infração administrativa às normas de
proteção à criança e ao adolescente (art. 194 do Estatuto da Criança e do
Adolescente).
É INDEPENDENTE E AUTÔNOMO
Em matéria técnica de sua competência, delibera e age aplicando as medidas práticas
pertinentes, sem interferência externa. Exerce suas funções com independência, Inclusive
para relatar e corrigir distorções existentes na própria administração municipal relativas ao
atendimento a crianças e adolescentes.
1 Assistente Social, formado pela Universidade Federal do Tocantins - TO, Pós-Graduado em Violência Doméstica Contra Crianças e
Adolescentes pela Faculdade de Educação da Serra - FASE – ES, Estatutário do DEGASE, Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Estado do Rio de Janeiro, onde atua na execução de Medidas Socioeducativas desde 1998, Extensionista da UERJ – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, do Curso “Violência Contra Crianças e Adolescentes – Teoria e Prática” – 2011. Endereço Eletrônico: [email protected] – Tels: 55 21 9743.1871 / 55 21 8430.2595.
Suas decisões só podem ser revistas pelo juiz da Infância e da Juventude, a partir de
requerimento daquele que se sentir prejudicado (art. 137 da Lei nº 8.069/90).
ATENÇÃO!
Ser autônomo e independente não significa ser solto no mundo, desgarrado de tudo e de
todos.
Autonomia não pode significar uma ação arrogante, sem bom senso e sem limites. Os
conselheiros tutelares devem desenvolver habilidades de relacionamento com as pessoas,
organizações e comunidades.
Devem agir com rigor no cumprimento de suas atribuições e com equilíbrio e, ainda, buscar
articular esforços e ações.
É vital, para a realização de um trabalho social eficaz (fazer mudanças concretas) e efetivo
(garantir a consolidação dos resultados positivos), que o conselheiro tutelar saiba ouvir e
compreender os casos (situações individuais específicas) que chegam ao Conselho Tutelar,
ou por ele identificado.
Cada caso é um caso e tem direito a um atendimento personalizado, que leve em conta suas
particularidades e procure encaminhar soluções adequadas às suas reais necessidades e que
necessariamente em resposta, garanta a devida proteção e garantia a esses direitos.
Vale sempre destacar: o Conselho Tutelar, assim como o Juiz, Pode Aplicar Medidas
Protetivas aos casos que atende, mas não executa essas medidas. As medidas de
proteção aplicadas pelo Conselho Tutelar são para que outros (poder público, famílias e a
sociedade em geral) as executem. O atendimento do conselho é de primeira linha, tem o
sentido de garantir e promover direitos.
E a quem são destinadas as medidas que podem ser aplicadas pelo Conselho Tutelar no
âmbito de sua atuação?
Às crianças e aos adolescentes; Aos pais ou responsáveis; Às entidades de atendimento; Ao Poder Executivo
O Conselheiro Tutelar deve ainda:
Zelar pelo cumprimento de diretos; Garantir absoluta prioridade na efetivação de direitos; Orientar a construção da política municipal de atendimento.
Em resumo estas são as principais características mínimas e funções de um Conselho Tutelar, e para dar conta desse trabalho, que é a rotina diária de um Conselho Tutelar, o conselheiro precisa conhecer e saber aplicar uma metodologia de atendimento social de casos. Para um melhor entendimento da metodologia de atendimento social de casos, suas
principais etapas serão detalhadas a seguir, com ênfase na postura que o conselheiro tutelar
e sua equipe devem assumir no processo acolhimento/atendimento.
É importante ainda ressaltar, que para uma atuação ótima do Conselho Tutelar, o
Conselheiro Tutelar deve agir com extremo zelo no que pertine a trabalhar sempre em
equipe. As decisões do Conselho Tutelar devem ser sempre coletivas:
Saber acolher, ouvir, compreender e discernir é habilidade imprescindível para o
trabalho de receber, acolher, confirmar, estudar, encaminhar e acompanhar
casos
Elas devem ser discutidas, analisadas e referendadas pelo conjunto dos conselheiros,
atender a todos com atenção, registrando todas as informações relativas a cada caso,
fazendo reuniões de estudo de casos, aplicando as medidas pertinentes a cada caso e
acompanhando sistematicamente o andamento dos mesmos.
Deve, também, evitar a arrogância e desrespeito com crianças, adolescentes, pais,
responsáveis, autoridades ou qualquer outro cidadão, nunca extrapolando suas atribuições
legais, e nunca ter uma postura de descaso e desmazelo no atendimento.
O Conselho Tutelar começa a agir sempre que os direitos de crianças e adolescentes forem
ameaçados ou violados pela própria sociedade, pelo Estado, pelos pais, responsável ou em
razão de sua própria conduta, sempre que receber uma denúncia ou fazendo uma
constatação da real ameaça ou violação de seus direitos.
Na maioria dos casos, o conselho tutelar vai ser provocado, chamado a agir, por meio de
uma denúncia. Outras vezes, o conselho, sintonizado com os problemas da comunidade onde
atua, vai se antecipar à denúncia – o que faz uma enorme diferença para as crianças e
adolescentes.
O conselho Tutelar deve agir sempre com assertividade, rapidez e agilidade:
Quando na ameaça de violação de direitos preventivamente;
Quando a ameaça já se concretizou corretivamente;
A forma de ação, e a maneira de considerar uma situação ou problema existente, do
Conselho Tutelar, compartilhada com a sociedade e o poder público, será sempre a de
corrigir os desvios dos que, devendo prestar certo serviço ou cumprir certa obrigação não o
fazem por despreparo, desleixo, desatenção, falta ou omissão.
DENÚNCIA
O QUE É? COMO FAZER?
A denúncia é o relato ao Conselho Tutelar de fatos que configurem ameaça ou violação de direitos de crianças e adolescentes e poderá
ser feita das seguintes formas?
Por escrito; Por telefone; Pessoalmente; Ou de alguma forma possível.
Não há necessidade de identificação do denunciante que poderá permanecer
anônimo. No entanto, para que a denúncia tenha consistência e consequência, é
importante que dela constem:
Qual a ameaça ou violação de direitos denunciada;
Nome da criança ou adolescente vítima de ameaça ou violação de direitos;
Ou, pelo menos, alguma referência que permita a apuração da denúncia.
Apuração da Denúncia
A apuração da veridicidade da denúncia deverá ser feita no local da ocorrência da violência,
ameaça ou violação de direitos (domicílio, escola, hospital, entidade de atendimento, etc.) ou
em qualquer outro lugar onde se dê a mesma.
Depois de noticiada e recepcionada a denúncia, o Conselho Tutelar deve apurá-la sem a
mínima demora e consecutivamente a mesma, se possível destacando dois conselheiros
tutelares para o serviço, além dos técnicos disponíveis no Conselho Tutelar: isso evita ou
pelo menos diminui a ocorrência de incidentes, bem como o entendimento distorcido ou
parcial da situação social que está sendo apurada.
A apuração da denúncia é feita por meio de visita técnica de atendimento, que deverá ter
as seguintes características e envolver os seguintes cuidados:
A visita não precisa ser marcada com antecedência, mas, sempre que necessário deve
ser;
O conselheiro tutelar não faz perícias técnicas, não sendo, portanto, primordial para o
seu trabalho o “fator surpresa” ou a “preservação da cena do crime”;
O conselheiro tutelar apura fatos por meio de relatos e fatos. Por isso, deve ficar
atento às falas, aos discursos, aos comportamentos, buscando, com o diálogo, elucidar suas
dúvidas e detectar contradições;
A entrada no local da visita deve ser feita com a permissão dos proprietários e/ou
responsáveis, a menos que se constate flagrante delito, onde a força policial deverá
obrigatoriamente ser requisitada;
A visita deve ser iniciada com a apresentação do (s) conselheiro (s) – nome e
identificação – e o esclarecimento do motivo da mesma;
Se necessário (nos casos mais complexos) e se possível (quando há o profissional
requerido), o conselheiro tutelar deve fazer a visita com a assessoria de um técnico
(assistente social, psicólogo, médico, etc.), que poderá ser solicitado junto aos órgãos
municipais de atenção à criança e ao adolescente.
A visita deve ser feita com o respeito indispensável a quem está entrando em um
domicílio particular, repartição pública ou entidade particular. O conselheiro tutelar é um
agente do zelo municipal e não da arrogância.
Todos os cuidados elencados nos itens acima não podem descaracterizar a autoridade
do Conselho Tutelar no cumprimento de suas atribuições legais, mas, no entanto, reforçá-la.
Frisamos que se necessário, o conselheiro deverá usar de firmeza para realizar uma visita
técnica domiciliar e apurar uma denúncia. Em casos extremos, como no caso de violência
doméstica contra crianças e adolescentes, poderá e deverá requisitar força policial, para
garantir sua integridade física, a da criança ou do adolescente e a de outras pessoas, assim
como as condições para apuração de uma denúncia e o imediato socorro à criança ou
adolescente em questão.
Constatada ser real a denúncia, após visita de atendimento, e sendo ela totalmente ou
parcialmente procedente, o Conselho Tutelar tem em suas mãos um caso, para acolhimento,
estudo, encaminhamento e acompanhamento.
VOCÊ SABIA ?? O Conselho Tutelar pode, conforme a gravidade do caso que está sendo atendido,
aplicar uma MEDIDA EMERGENCIAL, tratar o problema, situação etc. analiticamente, dispondo seus
elementos de modo a poder operá-los na direção de uma solução rápida para os problemas
encontrados. É uma forma de fazer cessar de imediato uma situação de ameaça ou violação de
direitos de crianças e adolescentes.
Como, normalmente, a medida emergencial não soluciona o caso em toda sua complexidade e
extensão, o atendimento social prossegue com o estudo mais detalhado do caso e a aplicação das
demais medidas protetivas pertinentes.
O estudo de casos é um trabalho minucioso. Os itens e as perguntas que iremos apresentar
em nosso pequeno elenco de questionamentos, utilizados nos relatórios ou informes
técnicos, são o esboço de um roteiro de preocupações que devem guiar a ação de cada
Profissional envolvido. Certamente, outras indagações e preocupações irão surgir diante de
cada caso, que é sempre único, e particularmente específico.
Para melhor estudo e compreensão de um caso, onde quer que ele se nos apresente, muitas
vezes será necessária a atuação de um profissional habilitado para trabalhos técnicos
especializados:
Psicólogos – estudo e parecer psicológico;
Pedagogos – estudo e parecer pedagógico;
Assistentes Sociais – estudo e parecer social;
Médicos – atendimento e avaliações médicas;
Autoridades Policiais – Registros de Ocorrência, exames de corpo de delito, entre
outras providências a elas incumbidas, pelo Código Penal e pelo Estatuto da Criança
e do Adolescente – Lei 8.069/90, além de outras medidas cabíveis e pertinentes ao
caso.
O profissional Conselheiro Tutelar, para completar suas observações e análises e
fundamentar suas decisões, deverá requisitar os serviços especializados dos
profissionais citados e de outros que julgar necessários. O importante é um estudo
preciso e completo do caso que precisa de atendimento, acolhimento, encaminhamento e
solução.
Encaminhar um caso é aplicar uma ou mais medidas protetivas que atuem nos focos
desencadeadores de ameaça ou violação dos direitos da criança ou do adolescente, devendo
o Conselho Tutelar requisitar, sempre que necessário, os serviços públicos nas áreas de
Saúde, Educação, Serviço Social, Previdência, Trabalho e Segurança Pública, indispensáveis
ao correto encaminhamento de soluções para cada caso. Encaminhar um caso pode significar
também à aplicação de medidas pertinentes aos pais ou responsável pela criança ou
adolescente, o que, muitas vezes, torna-se vital para o completo atendimento da criança ou
adolescente.
Acompanhar o caso é garantir o cumprimento das medidas protetivas aplicadas e zelar pela
efetividade do atendimento prestado, evitando que qualquer uma das partes envolvidas
(família, escola, hospital, entidade assistencial e outras) deixe de cumprir suas obrigações,
fazendo romper a rede de ações que sustentam o bom andamento de cada caso específico. O
bom acompanhamento de caso, feito em parceria com outros atores comunitários e o poder
público, dá ao Conselho Tutelar condições de verificar o resultado do atendimento e, se
necessário, aplicar novas medidas que o caso requisitar.
O Conselho Tutelar não precisa especializar-se em acompanhamento de casos, podendo
fazer este trabalho por meio de associações comunitárias, igrejas, entidades de atendimento
e órgãos públicos de atenção à criança – aos quais requisitará, periodicamente, relatórios
sobre o desenvolvimento dos casos.
Saber manejar a Metodologia de Atendimento Social de Casos é, no entanto, fundamental
para o trabalho do Conselho Tutelar: receber, acolher, constatar, estudar, encaminhar, e
acompanhar casos, buscando superar as situações de ameaças ou violações dos direitos de
crianças e adolescentes, com a aplicação das medidas adequadas.
Caso é a expressão individual e personalizada de questões sociais complexas e abrangentes.
Uma criança ou adolescente vivendo, uma situação de ameaça ou violação de direitos será,
sempre, um caso de configuração única, com identidade própria, mesmo que as ameaças ou
violações observadas sejam comuns na sociedade. Por isso, vale reafirmar: cada caso é um
caso único e requer um atendimento personalizado, sem os vícios das padronizações e
automatismos.
Estudar um caso é mergulhar na sua complexidade e inteireza, buscando desvendar a teia
de relações, os meandros e os labirintos que o constitui. O conselheiro tutelar, com sua
capacidade de observação, interlocução e discernimento, deverá, com diálogo, colher o
maior número possível de informações que o ajudem a compreender e encaminhar soluções
adequadas a cada caso que atende.
Nesse trabalho, é importante a coleta e o registro de informações que possibilitem o
conhecimento detalhado das seguintes variáveis:
Situação Denunciada
O que realmente acontece? A denúncia é procedente?
Quem são os envolvidos por ação ou omissão?
Qual a gravidade da situação?
È necessária a aplicação de uma medida emergencial?
Registrar, por escrito, a situação encontrada, nomes dos envolvidos e de
testemunhas, endereços, como localizá-los.
Situação Escolar da Criança ou do adolescente
Está matriculada (o) e frequenta à escola?
Tem condições adequadas para frequência à escola e estudo em casa?
E necessário, visitar a escola da criança/adolescente e colher informações detalhadas
e precisas sobre sua vida escolar.
Situação de saúde da criança ou do adolescente
Apresenta problemas de saúde?
Se apresenta, tem atendimento médico adequado?
Faz uso de medicamentos?
Se faz, tem acesso aos medicamentos e os usa corretamente?
Apresenta sinais de maus-tratos, de agressões?
Se necessário, requisitar socorro ou atendimento médico especializado, com
urgência.
Situação Familiar da criança ou do adolescente
Vive com a família?
Como é a composição da família? Qual o número de integrantes? Quem compõe a
família: pai, mãe, irmão, tio, avós, outros parentes, outros agregados? – aqui é
importante se conhecer todas as novas conformações familiares tais como família
estendida, afetiva, ampliada, etc, e descrevê-las.
Quem trabalha e contribui para a manutenção da família?
Está se relacionando bem no contexto familiar?
Se não está, quais os problemas que acontecem?
Deve permanecer na família? Ou existe alguma situação grave que recomende sua
saída do contexto familiar?
Situação de Trabalho da Criança ou do adolescente
Trabalha?
Em que condições?
As condições são compatíveis com o que preconiza e determina o ECA no seu
capítulo V – Do Direito à Profissionalização e à Proteção no Trabalho?
Se necessário, visitar o seu local de trabalho e colher informações detalhadas e
precisas sobre a situação.
Histórico institucional da Criança ou do adolescente
Frequenta entidade de atendimento?
Vive em entidade de atendimento?
Se vive, como vive? Deve permanecer na unidade?
Já passou por entidade de atendimento?
Se já passou, como se deu o seu desligamento?
Qual sua história de vida em entidade (s) de atendimento.
Se necessário, visitar a (s) entidade (s) para colher informações, detalhadas e
precisas sobre sua trajetória.
Na verdade, a violência doméstica é muitas vezes tratada como assunto privado e acaba
sendo tolerada pela sociedade e pelo poder público. Daí a importância dos Conselhos
Tutelares, criados como instrumentos para que o ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
seja aplicado. Estes órgãos exercem um papel fundamental ao oferecer uma porta de
entrada para denúncias, mesmo que anônimas, mas que possibilitam o diagnóstico dos casos
de violência contra crianças e adolescentes.
Para médicos, professores e outros profissionais que trabalham com crianças e adolescentes,
a denúncia é obrigatória, sob pena de serem responsabilizados por crime de omissão.
Com certeza, os Conselhos Tutelares carecem de equipamentos, de capacitação, de redes de
apoio, etc. Mas, os Conselhos Tutelares, para os padrões brasileiros, até que funcionam
bem; estando, constantemente, buscando treinamentos e capacitação para melhorar o
atendimento.
Fazendo uma pesquisa entre os Conselhos Tutelares Brasileiros verificamos, no entanto, que
estas carências são bastante evidentes e muitas vezes causadas até mesmo pela falta de
apoio do próprio governo, que carece de políticas de saúde pública eficientes. O Conselho
Municipal, que agrega os Conselhos Tutelares de cada região da cidade, sofre, por exemplo,
com o descontinuismo de suas administrações. Sequer é possível saber quantas denúncias
foram registradas, por ano, nos municípios brasileiros, principalmente no interior.
Entre os Conselhos mais procurados, nas grandes metrópoles brasileiras, descobrimos que
em 1999 foram atendidos e registrados em média 2.037 casos, dos quais cerca de 60%
foram denúncias de maus tratos, nas quais se inclui a pressão psicológica, a violência física,
a exclusão social e mesmo o abuso sexual. De acordo com os Conselhos Tutelares,
nacionalmente falando, a maior parte das denúncias provém de familiares e vizinhos,
seguidas de denúncias das escolas e de médicos.
Após uma denúncia, o ideal é que seja feita a convocação dos responsáveis pela criança;
uma investigação das suas rotinas; uma conversa com a própria criança; uma consulta à
escola que a criança freqüenta; uma visita técnica domiciliar; e, então, colocam-se os pais a
par dos direitos de que a criança deve usufruir, segundo o ECA, e encaminha-se a família
toda para atendimento psicológico. Depois disso, deve ser feito um acompanhamento
constante, com marcação de retorno ao próprio Conselho Tutelar, além de obrigatoriamente
serem aplicadas as medidas protetivas pertinentes que são:
1. Encaminhamento aos pais ou responsável, mediante o termo de responsabilidade; 2. Orientação, apoio e acompanhamentos temporários;
3. Matrícula e freqüência obrigatórias a estabelecimento oficial de ensino fundamental; 4. Inclusão em programas comunitários ou oficiais de auxílio à família, à criança e ao
adolescente; 5. Requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar
ou ambulatorial; 6. Inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento de
alcoólatras e toxicômanos; 7. Abrigo em entidade.
Quem aplica a medida de abrigo é o Conselho Tutelar (arts. 136 e 101, VII do ECA), mas,
garantida a presunção de inocência e a ampla defesa dos acusados, quem transfere a guarda
do pai, da mãe ou do responsável para o dirigente do programa de abrigo é o juiz (arts. 33,
155, 148, par. único, alínea “b”, do ECA).
Deve-se usar como roteiro básico as questões já elencadas para a coleta e o registro de
informações que possibilitem o conhecimento detalhado das variáveis envolvidas.
É claro que a partir desta discussão social e de uma cobrança maior das autoridades alguma
coisa deve mudar no aprimoramento do funcionamento dos Conselhos Tutelares. Esta
esperança, no entanto, fica bastante prejudicada quando se percebe que o Estado não provê
a estas crianças sequer as políticas básicas de saúde, de educação, de condições mínimas de
vida. O ECA é uma proposta de sociedade, de direito, mas que ainda está longe de estar
sendo cumprido.
REFERÊNCIAS
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Tutelar, 1ª Edição, São Paulo, Editora Annablume, 2005.
2. CURY, Munir, Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado – Comentários jurídicos e sociais, 7ª Edição, São Paulo, Editora Malheiros, 2005.
3. GOMES DA COSTA, Antônio Carlos, Trabalhando o social no dia-a-dia, Belo Horizonte, Cids/Asfas, 1995.
4. ISHIDA, Válter Kenji, Estatuto da Criança e do Adolescente – Doutrina e Jurisprudência, 7ª Edição, São Paulo, Editora Atlas, 2006.
5. KOKOL, Anelis, Conselhos Legais - Estatuto da Criança e do Adolescente, 1ª Edição, São Paulo, Editora Adonis, 2005.
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7. MACHADO, Martha de Toledo, A Proteção Constitucional de Crianças e Adolescentes e os Direitos Humanos, 1ª Edição, São Paulo, Editora Manole, 2003.
8. PESTANA, Denis, Manual do Conselheiro Tutelar – Da Teoria à Prática, 1ª Edição, Paraná, Editora Juruá, 2007.
9. SÊDA, Edson, ABC do Conselho Tutelar - Providências para mudança de usos, hábitos, e costumes da família, sociedade e Estado, quanto a crianças e adolescentes, São Paulo, APMI/CCIA, 1992.
10. ________, Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente e Conselho Tutelar, Orientações para Criação e Funcionamento, Pró-Conselho do Brasil, Conanda, 2007.
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