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A INFRAESTRUTURA VIÁRIA E SUA RELAÇÃO COM O DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO BRASILEIRO. Um Olhar Histórico ao Planejamento Logístico no Brasil.
Resumo
Este artigo busca analisar historicamente o planejamento dos projetos de infraestrutura viária e logística visando integrar cidades e regiões no Brasil e destacar sua importância ao desenvolvimento econômico do país do século XIX à primeira metade do século XX. Procura-se apresentar o papel do Estado e dos setores privados na condução desse planejamento, assim como as principais características viárias que conformaram a infraestrutura brasileira. Especificamente, o que se propõe é trazer tais características, com foco na escolha da infraestrutura de transportes baseada nos modais ferroviário e rodoviário e na importância da conectividade entre diferentes modais no que se relaciona à possibilidade de maior integração nacional. A análise proposta indica que a despeito da evolução dos planos de integração nacional a nível nacional e sua importância ao desenvolvimento econômico do país a partir do século XIX, o desmantelamento de projetos de transporte conectados e integrados no Brasil favoreceu principalmente integrações regionalizadas.
Palavras chaves: Infraestrutura Viária; Transportes; Brasil; Planejamento; Desenvolvimento Econômico; Integração Nacional; Planos; Conectividade; Governo.
Abstract
This article seeks to analyze historically the planning of road infrastructure projects and logistics to integrate cities and regions in Brazil and highlight its importance to the economic development of the country of the nineteenth century to the first half of the twentieth century. Wanted present the role of the state and private sectors in the conduct of this planning, as well as the main road features that made up the Brazilian infrastructure. Specifically, it is proposed to bring these characteristics, focusing on the choice of transport infrastructure based on railway and road transportation and the importance of connectivity between different modes as it relates to the larger national integration. The proposed analysis indicates that despite the development of national integration plans at national level and its importance to the economic development of the country from the nineteenth century, the dismantling of transportation projects connected and integrated in Brazil favored mainly regionalized integrations.
Keywords: Road Infrastructure; Transportation; Brazil; Planning; Economic Development; National Integration; Plans, Connectivity; Government.
1. Introdução
Segundo arquivo do Grupo de Estudos para Integração da Política de Transportes
(GEIPOT) criado em 19651, o planejamento da infraestrutura dos transportes no país foi
discutido desde o período imperial, com o estabelecimento de planos no século XIX e seu
adensamento maior a partir do século XX:
Em uma apreciação geral, pode-se afirmar que a prática do planejamento de transportes no Brasil não é tão nova assim. Desde o Império, a adoção de planos de viação foi preocupação de muitas personalidades, embora a história tivesse de esperar até o início da República para que o Estado brasileiro tomasse alguma iniciativa com vistas a preparar planos. Após a frustração com relação ao primeiro plano geral, fruto de uma comissão composta em 1890, continuou-se a adotar programas independentes para cada modal, e somente em 1934 o país adotou formalmente um Plano Geral de Viação. (GEIPOT) 2.
Ainda que durante o período colonial, no que tange a infraestrutura dos transportes
no país, o período tenha sido marcado por um grande desinteresse por parte de Portugal na
aplicação de recursos e investimentos ao desenvolvimento da colônia3, caracterizado por
um sistema bastante precário de vias terrestres no país até o início de 1820, é importante
destacar a historiografia do planejamento viário no Brasil e sua importância ao
desenvolvimento econômico do país. Assim, é relevante voltarmos aos projetos viários de
integração a fim de identificar algum planejamento da infraestrutura e integração nacional,
através da condução estatal e os respectivos planos de viação.
São evidenciados planos ambiciosos de integração física no Brasil a partir de
meados do século XIX, onde se destaca a ligação entre o espaço e as atividades
produtivas4. Deste modo, imprensa e estudiosos de diversas áreas, vêm atentando para a
importância da relação entre integração física via transportes, comunicação e
desenvolvimento desde esse período. No Século XIX, por exemplo, no “Almanak
Administrativo, Mercantil e Industrial do Império do Brazil para 1883”, já se destacava a
preocupação com a infraestrutura de transportes no país e sua importância para a atividade
agrícola. No trecho é evidenciada a região de Sergipe e sua produção “assucareira”:
1 O GEIPOT foi criado através do decreto nº 57.003, com o objetivo de coordenar e desenvolver estudos relacionados aos transportes no país. O Grupo era subordinado ao Ministério de Estado dos Transportes. Em 1972, seria transformado na Empresa Brasileira de Planejamento de Transportes através da Lei nº 5.908. Em 2001, o Governo Federal criou o criado o Conselho Nacional de Integração de Política de Transportes Terrestres (CONIT), a partir de uma reestruturação do Ministério dos Transportes. O CONIT sucederia ao GEIPOT através do decreto n° 4.135, de 20 de fevereiro de 2002.2 Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (DNIT), disponível em: http://www.dnit.gov.br/planejamento-e-pesquisa/historico-do-planejamento-de-transportes3 Segundo análise histórica do pesquisador Carlos Seman (DNIT, 2012) os poucos caminhos abertos ao transporte no período eram concentrados e relacionavam-se, de maneira rudimentar, às necessidades dos engenhos de açúcar, ao comércio de gado, à apreensão de indígenas e, posteriormente, na procura por metais e pedras preciosas.4 Segundo Schiffer (1989, p.11), “a produção do espaço está vinculada à produção. O processo de produção do espaço se dá, a princípio, na apropriação e transformação de um espaço natural (território), o qual naquele momento é premissa condicionante da produção. A partir desse instante o espaço passa a ser produzido e recriado sucessivamente segundo as necessidades do processo de produção. E a cada novo momento é condicionante e é condicionado pela produção”.
Para que, porém, a industria de que se trata possa desenvolver-se convenientemente, torna-se necessário remover difficulldades que ainda se notão, (...) o transporte dos productos dos centros productores aos consumidores. O estabelecimento de uma estrada de ferro de Aracajú a Simão Dias, cujos estudos definitivos se estão procedendo, é o mais conveniente, e interessa aos principaes centros agricolas. O estabelecimento desta estrada (...) será um poderoso elemento de progresso para Sergipe. O silvo civilizador da locomotiva tem a propriedade de convterter desertos em verdadeiros centros de actividade5. (Almanak Administrativo, Mercantil e Industrial do Império do Brazil para 1883, p. 730).
Na primeira metade do Século XX, um importante estudioso da geopolítica brasileira
amplia a discussão, com o entendimento acerca da importância da integração entre
diferentes modais no país. Mário Travassos (1942, p.185) 6, atenta para o conceito de “Brasil
longitudinal”, onde um sistema plurimodal de transportes seria o suporte para um plano
maior de comunicações “transversais” e integração nacional, através da articulação de
centros de produção possibilitando a ampliação dos fluxos de bens e pessoas.
Muito se discute na história econômica brasileira sobre os gargalos de infraestrutura
e sua relação direta com o desenvolvimento econômico do país. Assim também se
destacam análises que apontam a falta de planejamento governamental e estudos
pormenorizados, a nível nacional, das demandas e perspectivas para uma maior integração
viária nacional. O que propomos neste ensaio é resgatar tal discussão na historiografia, a
partir do século XIX à primeira metade do século XX, na tentativa de mostrar como ocorreu
o planejamento da infraestrutura dos transportes e sua relação com a economia do país no
período. Assim, destacaremos os avanços e debilidades do processo de integração viária no
Brasil, através da apresentação dos principais pontos da legislação relativa aos transportes
além dos principais planos de viação e integração do país. Ademais, lançaremos mão de um
olhar mais específico, ressaltando a estruturação da malha ferroviária e das estradas de
rodagem no país em conformidade e relação com o movimento político e econômico da
época.
2. Desenvolvimento da Infraestrutura dos Transportes e a Economia Brasileira
2.1 Fragilidades do Sistema de Transportes e a Predileção pelas Ferrovias
A partir de 1808, com a abertura dos portos às nações amigas7, e com a
Independência em 1822, o planejamento dos transportes seria adensado no Brasil. Coimbra
(1974) ressalta que acordos discretos começaram a demonstrar o pensamento e a
5 Grifos meus.6 Em sua obra “Introdução à Geografia das Comunicações Brasileiras” (1942). Outra obra importante do autor é “Projeção Continental do Brasil”, de 1935.7 Através da assinatura da Carta Régia de 1808 pelo Príncipe Regente D. João VI.
execução de obras acerca da questão viária no país, como a Lei de 29 de agosto de 1828,
importante documento que destacara os problemas de comunicações e transportes no
Primeiro Reinado. Esta propunha regular as competências dos Governos Imperial, Provincial
e Municipal de proverem a navegação dos rios, abrirem canais, construírem estradas,
pontes, aquedutos, além de admitir concessões de obras viárias a nacionais e estrangeiros,
(Seman, DNIT, 2012).
Na Regência Una, entre 1835 e 1837, com Padre Antônio Feijó8, a necessidade de
ampliação da integração viária do país levou à cogitação do estabelecimento de estradas de
ferro. As primeiras leis voltadas à criação de ferrovias no país foram a Lei Imperial n.º 101,
de 31 de outubro de 1835, e a Lei Provincial de 1836. Respectivamente, a primeira se
pautou na autorização pela Assembleia Legislativa ao Governo para que esse concedesse
favores a companhias que construíssem e explorassem ferrovias entre as principais regiões
econômicas do período, conforme destaca o Artigo 1° do decreto:
O Governo fica autorizado a conceder a uma ou mais Companhias, que fizerem uma estrada de ferro da Capital do Rio de Janeiro, para as Minas Geraes, Rio Grande do Sul e Bahia, carta de privilégio exclusivo por espaço de 40 annos para o uso de carros para transporte de gêneros e passageiros. (Séries Estatísticas e Retrospectivas, Vol. II, Tomo III. 1986, p.1) 9.
Quanto à Lei Provincial de São Paulo, de 1836, esta propunha a ligação ferroviária
entre a capital (Rio de Janeiro) e o porto de Santos, passando pela cidade de Rio Claro.
Mas seria apenas em meados do século XIX que tentativas de ampliar a infraestrutura do
transporte nacional se fortaleceriam. Com a Lei n° 641, de 26 de junho de 1852, o Governo
concederia privilégios por 90 anos a companhias interessadas em construir estradas que
ligassem o Rio de Janeiro às províncias de Minas Gerais e São Paulo, além de garantir juros
de 5% sobre o capital empregado por essas10. Destaca-se que até a chegada das ferrovias
no Brasil, o transporte terrestre de mercadorias ocorria através do lombo dos burros em
“estradas carroçáveis” (DNIT)11. Debes (1930) destaca a precariedade da infraestrutura dos
transportes no país em meados de 1800 na região paulista:
As vias de transporte no Brasil constituíram, sempre, um dos graves problemas nacionais (...). Precárias eram as veredas pelas quais transitavam as rebeldes e modorrentas tropas de muares, os vagarosos
8 Regente do Império.9 O documento completo se encontra no Censo Industrial do Brasil. “O Brasil. Suas Riquezas Naturaes, Suas Industrias”, de 1909, compilado nas Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986. Entretanto, conforme ressalta Summerhill (2005, p. 74), a expectativa fracassou tendo em vista a falta de incentivos claros acarretando em perspectivas de lucros consideradas insuficientes para a atração de investimentos. Soma-se a isso, conforme é ressaltado pelo documento do IBGE (1986), que o pouco conhecimento sobre o Brasil, sua pequena população e seus recursos escassos, caracterizou o fracasso da primeira tentativa de levantar capitais para as estradas de ferro no país. 10 Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, p. 4.11 Na década de 1830, os portos fluminenses de Parati e Angra dos Reis exportavam cerca de 100 mil sacas de café, provenientes do Vale do Paraíba, em média, por ano. A fim de ilustrar, em São Paulo chegavam ao porto de Santos cerca de 200 mil bestas carregadas com café e outros produtos agrícolas, anualmente. Ressaltamos aqui uma importante relação entre atividade econômica e transportes no período, que mais a frente anunciaria a dependência do setor cafeeiro frente à ampliação viária no país.
carros de bois, e, quando as vias comportavam, as parcas, cansativas e pouco ágeis diligências. Estas consumiam, na ligação São Paulo-Santos, na ida, sete horas, na volta, oito horas e meia (...). Dessa forma, em prejuízo da economia, à precariedade dos caminhos somava-se a lentidão dos meios de transporte (...). Santos era, como sabido, o porto por onde escoava toda a produção agrícola, destacando-se o café, o grande gênero de exportação, e por onde ingressava toda a gama de manufaturados de que se abasteciam São Paulo e as províncias que lhe eram tributárias. (DEBES, 1930, p. 301-303).
Algumas concessões foram realizadas para a construção de trechos ferroviários
entre Recife e Bahia ao São Francisco, em 1852 e 1853, respectivamente. Mas foi somente
em 1854, em 30 de abril, que se inauguraria a primeira estrada de ferro brasileira, a Estrada
de Ferro de Mauá, ligando o Porto de Mauá à Serra de Petrópolis, passando pelas estações
de Inhomerim e Fragoso12. Outras concessões foram realizadas no período, conforme dados
do Repertório Estatístico do Brasil, (IBGE, 1941),13, mas é a partir do último quarto do século
XIX, que a expansão ferroviária se torna mais evidente. Entre 1854 e 1870, a ligação férrea
no país passou de 15 km para mais de 700 km. A partir de meados de 1880, essas
ultrapassariam os 5.000 km avançando continuamente até o primeiro quarto do século
seguinte, quando chegariam a 34.206 km, em 1938. Conforme avançava a construção de
linhas férreas no país, foram sendo estabelecidas novas regras de concessão e execução
das obras de acordo com os objetivos do governo, assim como medidas de segurança e
melhoramentos técnicos14.
No início da década de 1870, com a ampliação dos ramais da Estrada de Ferro D.
Pedro II15, começaram os questionamentos sobre a diferenciação das bitolas utilizadas nas
ferrovias do país, conforme é ressaltado:
Esta linha representa um caso interessante na história de nossas estradas de ferro, pois que ella é o ponto de partida para a construção das estradas de ferro econômicas. Até então a bitola adoptada tinha sido de 1m60 e 1m68 na de Mauá. Desde então a bitola de 1m tornou-se a bitola legal para todas as concessões.”(Censo Industrial do Brasil, 1909) 16.
12 A primeira sessão da linha, abarcaria 14,5 quilômetros (km) e o tempo de percurso passaria de cerca de 4 horas a menos de 30 minutos.13 Dados disponíveis em http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv17983_v1.pdf . 14 Como exemplo, o Governo promulgou o decreto n° 1.930, em 26 de abril de 1857, o qual seria ampliado em abril de 1862. Tal decreto tornava claras novas regras para segurança das ferrovias, assim como ampliava o policiamento no tráfego das vias. Conforme disponibilizado pelo Senado Federal, a ementa do Decreto nº 2.913, de 23 de abril de 1862 dispõe: “Amplia algumas das disposições do regulamento para a fiscalização de segurança, conservação e polícia das estradas de ferro, aprovado pelo decreto número 1.930 de 26 de abril de 1857”. Disponível em: http://legis.senado.gov.br/legislacao/DetalhaDocumento.action?id=7579115 A Estrada D. Pedro II (EFDPII), seria transformada na “Estrada de Ferro Central do Brazil”, cujo traçado partiria da cidade do Rio de Janeiro, transporia a Serra do Mar, e se dirigia em dois ramais: à povoação de Cachoeira, na província de São Paulo e ao Porto Novo do Cunha, nos limites das províncias do Rio de Janeiro e Minas Gerais. Convém destacar que esta linha marcou uma importante tentativa de integração intrarregional brasileira. Maiores informações em Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, p. 3. Importante destacar que na década de 1850, a maior parte do café era produzida no Vale do Paraíba (entre o leste de São Paulo e sul do Rio de Janeiro) e exportada através do porto do Rio de Janeiro. Até então o transporte do café era realizado por tropas de burros, precariamente e em velocidade bastante reduzida. Tal fato demonstra a estratégia da ferrovia (EFDPII) para a economia da região. 16 Disponível em Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, p. 5-6.
Todavia, dois pontos são destacados aqui a fim de evidenciar dificuldades para maior
integração entre as linhas férreas. Primeiramente, porque a mudança de bitolas implicaria
em aumento dos gastos das companhias que precisassem fazer as adaptações, o que
posteriormente provou-se, pela não viabilização financeira. Segundo, o fato de algumas
ferrovias atravessarem províncias diferentes, incorria na necessidade de descentralizar a
organização ferroviária, até então a cargo do Governo Central. Assim era importante
regularizar os poderes das províncias nas concessões das estradas de ferro, definindo a
competência nos dois poderes. Ao final de 1880, com a proclamação da República em 15 de
novembro de 1889, foi concedida autonomia aos Estados federados, implicando em novas
competências e organização do setor ferroviário no país, através da delimitação das
obrigações do Governo Central e Estados.
Em 1890 foi promulgado pelo Governo Provisório o decreto n° 524, de 26 de junho,
estabelecendo as diretrizes de um Plano Geral de Viação Férrea, com a nomeação de uma
comissão de engenheiros. Ademais, foi acordada nesse Plano17 a organização das linhas
férreas junto às fluviais através de respectivas concessões. As linhas abarcariam importante
parte do território nacional, contemplando principalmente as regiões Sudeste, Nordeste e
Norte. Nestas duas últimas, destaca-se o planejamento de ligações ferroviário-fluvial na
tentativa de integração, de Belém (PA) à cidades e Portos do Nordeste. Aqui, podemos
verificar certo planejamento de integração viária a nível nacional, conjuntamente a projetos
de conectividade de transportes intermodal18.
Com a promulgação da Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil em
24 de fevereiro de 1891 e as novas disposições constitucionais, foi revogado o decreto n°
524 pelo de n° 109, de 14 de outubro de 1892. Esse fixaria os casos de competência dos
poderes federal e estaduais na resolução acerca das vias de comunicação, fluvial ou
terrestres, entre a União e os Estados, ou destes entre si. Conforme os artigos do decreto n°
109, destacamos alguns para evidenciar a relação entre as esferas de governo no tocante
ao planejamento da infraestrutura viária do país:
“Art. 1°. É da exclusiva competência dos poderes federaes resolver sobre o estabelecimento:I. Das vias de comunicação fluviais ou terrestres, constantes do plano de viação que fôr
adoptados pelo Governo;II. De todas as outras que futuramente forem, por decreto emanado do Poder
Legislativo, consideradas de utilidade nacional, por satisfazerem a necessidades estratégicas ou corresponderem a elevados interesses de ordem publica ou administrativa.
Art. 2°. Em todos os mais casos aquella competência é dos poderes estadoaes.
17 Segundo decreto n° 862, expedido em 16 de outubro de 1890.18 Os artigos e concessões abrangidos do decreto n° 862 estão disponíveis em Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, p. 8-10. Em resumo, a todas as linhas (férreas e fluviais) foram concedidos privilégios por 60 anos e garantia de juros de 6% ao ano, durante 30 anos sobre o capital empregado para execução das obras.
Art. 4°. Além das vias de comunicação de que trata o art. 1°, poderá a União estabelecer ou auxiliar o estabelecimento de outras, precedendo neste caso acordo com os poderes competentes dos Estados, ou do Estado, a que possam ellas interessar.”19
Aqui, salientamos tal planejamento, tendo em vista os objetivos estratégicos
governamentais de integração nacional visando o desenvolvimento econômico presente e
futuro do país, o que pode ser verificado pelos artigos acima, e os interesses privados locais
e regionais que influenciaram na execução e conformação dos transportes no Brasil,
destacando a proposta central deste ensaio.
A partir da segunda metade do século XIX, a produção cafeeira do Vale do Paraíba
entraria em declínio, e o café passaria a ser produzido posteriormente na região do Oeste
Paulista. Tal mudança imprimiria dificuldades para o escoamento do produto, até o porto do
Rio de Janeiro, devido ao aumento da distância, indicando a necessidade de mudança do
porto de exportação. Nesse contexto, a demanda por uma infraestrutura de transporte mais
rápida para conservação do produto, levou ao deslocamento das exportações para o porto
de Santos em meados de 1860, fato que imprimiria maior desenvolvimento da infraestrutura
viária no Estado de São Paulo. A construção das ferrovias em conexão à atividade
econômica do café parecia clara20.
Conforme ressalta Lamounier (2008, p. 22), a partir de 1870, “uma grande onda de
construção das linhas, extensões e ramais em várias regiões do país, especialmente nas
regiões cafeeiras” foi desencadeada no país. A autora ressalta a construção das ferrovias
favorecendo interesses locais, os cafeicultores do Sudeste21, principalmente, em
contraposição aos esforços de maior integração do Nordeste brasileiro. Outro ponto de
destaque é que a construção de ferrovias na Região Sudeste favorecia também o
deslocamento da população local e de imigrantes, os quais vinham trabalhar nas plantações
de café, além de engenheiros e mão de obra mais qualificada para a execução das obras.
Tendo em vista que a construção ferroviária abarcara mais fortemente a Região
Sudeste, principalmente entre as províncias do Rio de Janeiro, Minas Gerais e São Paulo,
fica evidente a estreita relação entre esse meio de transporte e a agricultura de exportação,
na época o setor de maior dinamismo econômico do país. Afora o grande destaque do café,
ressaltam-se as produções de açúcar, algodão e fumo. Grande parte dos agricultores
19 Decreto completo disponível em Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, p. 10-11.20 Segundo Pessoa (2008, p. 6), o grupo cafeicultor, predominante, “foi propulsor direto do desenvolvimento ferroviário, pois passou a fazer pressão sobre o governo por uma legislação pertinente por subsídios favoráveis à sua implantação. O governo empenhou-se na viabilização desta infraestrutura regional voltada ao escoamento da, ainda, principal produção de exportação da época. Tratou-se de um claro exemplo da classe dominante determinando os caminhos do desenvolvimento”.21 Outros autores destacariam a forte relação entre a expansão ferroviária, o crescimento da produção e exportação de café e a concentração populacional no Sudeste. Saes (1981), focando seu estudo no estado de São Paulo, defende que a ampliação da malha ferroviária, principalmente no Sudeste, foi determinante para a expansão da fronteira agrícola e, mais ainda, das exportações de café a partir de meados década de 1870 (p.35-40). Já Costa (1982, p. 159-160) traz ao debate a importância da ferrovia para a economia cafeeira, no sentido de operacionalizar o cultivo da planta em áreas mais distantes dos portos de embarque, através da melhoria das comunicações internas. Também ressalta o fato de que a possibilidade de as empresas de café economizar com fretes (o que foi verificado somente na região Sudeste), devido à maior capacidade de transporte dos vagões beneficiaria a colocação do café no mercado internacional a melhores preços.
vislumbravam nas ferrovias, o melhor meio de transporte para atender o comércio de
exportação, assim como as demandas internas, na região onde se situava a maior parte da
população brasileira. Também se vislumbrava a possibilidade desses empresários arcarem
com menores custos de transporte e fretes, comparativamente ao gasto com os comboios,
até então.
Lamounier (2008) salienta a relação entre os interesses de22 grande proprietários e o
governo no estabelecimento de ferrovias como prioridade da integração viária daquela
Região. A relação entre produção cafeeira e a construção de ferrovias pode ser visualizada
através do Gráfico 1 e Tabela 1 a seguir:
Gráfico 1 e Tabela 1: Relação da Ampliação da Rede Ferroviária e Economia Cafeeira
Segundo dados extraídos das Séries Estatísticas Retrospectivas, Vol, II, Tomo II
(Indústria Agrícola- IBGE, 1986) o Brasil despontava na virada para o século XX, como o
grande produtor mundial de café, com sua produção e exportações aumentando
substancialmente no período, tendo os estados de São Paulo e Minas Gerais, os maiores
produtores23. A relação do café com a necessidade de melhoramento logístico e o
desenvolvimento econômico do país é destacada a seguir:
Os transportes das fazendas para as estações de embarque são para a produção agrícola mais onerosos do que geralmente se supõe24. (...)Pretender, como querem alguns, que a indústria de transportes sacrifique a renda de seu capital em proveito de outras industrias, não é simplesmente substituir uma injustiça por outra, mas principalmente tirar os estímulos, afugentar mesmo do paiz, que d’elles carece, porque não os possue, os capitaes necessários á exploração deste gênero de empresas que estão intimamente ligados ao desenvolvimento e o progresso
22 Outro autor que destaca a participação de interesses privados na condução das políticas públicas relacionadas ao transportes, é Accorsi (1996): “(...) não só por apresentar talvez a primeira ação organizada do Estado, e de segmentos de sua burocracia, na definição concreta de uma determinada política pública voltada a resolver os gargalos da infra-estrutura, contando com a participação ativa de um emergente setor do empresariado privado nacional – as empreiteiras de obras públicas (...), preservando-se fundamentalmente os interesses daqueles agentes mais diretamente envolvidos em sua implementação, seja na área estatal seja na área privada.” (ACCORSI, 1996, p. 20)23 Explicitando, a produção nacional do fruto passaria de 2.423.640 sacas de 60 kg em 1852 para 20.409.180 em 1907, com grande impulso a partir de 1880 (p. 99), representando cerca de 70% da produção mundial na virada do século.24 Tendo em vista principalmente a forte influência dos fretes ferroviários nos custos de produção dos gêneros agrícolas, conforme é ressaltado no mesmo documento. Também se destaca a influência da importação de combustíveis para o funcionamento dos transportes, o que tornava a economia brasileira dependente das variações cambiais. Assim, no caso de desvalorização da moeda nacional, os combustíveis tinham seus preços aumentos, assim como ocorria com os custos dos produtores agrícolas.
Fontes: Gráfico - Biblioteca IBGE, disponível em: http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv17983_v1.pdf e Tabela - SAES, 1996, p. 177-196.
Anos Rede Ferroviária (km)
Exportações de Café(via Porto de Santos - sacas 60 kg)
1870 139 543.425
1875 655 740.603
1880 1.212 1.204.328
1885 1.640 1.657.176
1890 2.425 3.048.327
1895 2.962 3.135.196
1900 3.373 7.821.541
econômico do Brasil.(Séries Estatísticas Retrospectivas, Vol, II, Tomo 2. Indústria Agrícola. IBGE, 1986, p.95-98).
Findando essa parte, é interessante sublinhar, nesse contexto, certo planejamento
frente à conectividade entre diferentes modais de transporte, conforme ressalta Lamounier
(2008):
(...) a expansão e modernização do setor eram pensadas a partir do que chamavam “melhoramentos materiais” ou investimentos em obras de infra-estrutura. Os chamados “melhoramentos materiais” (...) incluíam portos25, serviços urbanos, imigração estrangeira, estradas e, principalmente, ferrovias, o meio de transporte mais moderno da época. (LAMOUNIER, 2008, p. 25).
2.2 Integração Viária Nacional no Século XIX
A conformação econômica brasileira demandava ampliação e melhoramento dos
sistemas de transporte no país, tanto para abastecimento das empresas, que dependiam de
materiais e produtos importados, quanto para as vendas dos nossos ao mercado
internacional. Também a integração interna dependia de maior conectividade entre os
modais, assim como sua ampliação, tendo em vista o crescimento do mercado interno com
o aumento populacional, principalmente nas regiões Sul-Sudeste. Assim, convém destacar
que outro modal de transporte foi, aos poucos, se estabelecendo no país, o que evidenciava
uma preocupação com novas formas de transporte, como as estradas e sua importância
intrarregional, assim como ligações a portos fluviais e marítimos. A seguir, na Tabela 2 se
destaca a construção de quatro estradas de rodagem, assim como suas principais
características, durante o Segundo Reinado, período entre 1840 e 1889:
Tabela 2: Estradas de Rodagem Construídas durante o Segundo Reinado
NOME DA ESTRADA ANO26 LIGAÇÃO ESTADOS CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS
Santa Clara - Filadélfia 1857
Filadélfia (atualmente, a
cidade de Teófilo Otoni) e Santa
Clara.
MG
A obra possui 170 km e foi realizada pela Companhia Comércio e Navegação do Mucuri, empresa de capital privado, de Teófilo Benedito Ottoni. Possibilitou ao Estado um porto fluvial através do Rio Mucuri que se tornava navegável a partir de Santa Clara, até a sua foz no litoral.
União e Indústria 1861 Petrópolis e Juiz
de Fora RJ e MG
Foi a primeira rodovia macadamizada27 da América Latina, com extensão de 144 km. A empresa responsável pela construção da obra foi a Companhia União e Indústria, através de concessão privada, com garantia de juros (MATOS, 1995; NETTO, 1974). A estrada transformou a cidade de Juiz de Fora em uma importante rota comercial entre estados do Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Dona Francisca
1867 Joinville e São Bento
SC Obra de extensão de 146 km para ligação da cidade de Joinville ao litoral de Santa Catarina e ao planalto
25 Grifos meus.26 Ano de Inauguração da Estrada de Rodagem.27 Tipo de pavimento para estradas desenvolvido pelo engenheiro escocês John Loudon McAdam, em1820.
de Curitiba. A rodovia foi construída no contexto de expansão do processo de colonização da região além de objetivar maior escoamento da produção do complexo ervateiro. O governo imperial financiou a construção da rodovia (GOULARTI FILHO, 2007).
Graciosa 1885Vila Portuária de
Antonina e Curitiba
PR
Rodovia macadamizada, com 94 km, ligando o planalto de Curitiba ao litoral, descendo a Serra do Mar. O objetivo era escoar a produção de erva-mate, sendo a obra considerada como principal eixo integrador do complexo mateiro paranaense até a implementação da ferrovia (MOREIRA, 1975). Também caracterizou importante rota de escoamento da produção agrícola (café, erva-mate e madeira) do Paraná rumo ao Porto de Paranaguá e ao Porto de Antonina.
Fontes: Censo Industrial do Brasil. “O Brasil. Suas Riquezas Naturaes, Suas Industrias”, de 1909, compilado nas Séries Estatísticas e Retrospectivas do IBGE, Vol. II, Tomo III, 1986, Relatórios do DNIT e outros autores destacados.
Sobre a questão da interligação de modais passamos a uma breve análise do
planejamento da integração viária a nível nacional no século XIX. Durante grande parte
desse século, engenheiros brasileiros e autoridades internacionais apresentavam ao
Imperador Dom Pedro II planos e programas com o objetivo de organizar a estrutura viária
nacional. Porém, sem maior detalhamento dos projetos aliado à dificuldade de recursos,
nenhum deles seria levado adiante, segundo consta em estudo do Ministérios dos
Transportes sobre a evolução histórica dos planos de viação nacional28. Os principais Planos
de Integração Nacional são paresentados na Tabela 3:
Tabela 3: Principais Planos de Integração Nacional do Século XIX29
PLANOS ANO CARACTERÍSTICAS PRINCIPAIS
REBELO 1838
Primeira tentativa de planejamento visando uma política viária de integração nacional, porém de grande ambição para a época. O projeto objetivava a construção de três grandes estradas reais ligando a Corte a todas as províncias do Império. Passando por São Paulo, Curitiba, São Leopoldo, Porto Alegre, Barbacena, Vila Boa, Vila Bela da Santíssima Trindade, Niterói, Serra da Borborema, Santo Amaro, Belém, dentre outras localidades.
MORAES 1869Esboço de rede geral de vias navegáveis, numa tentativa ambiciosa visando estabelecer uma ampla rede de comunicação fluvial ligando os portos mais distantes do país.
QUEIROZ 1874/1882
O primeiro plano mais realista para a época. Visava a partir de um maior aproveitamento do Rio São Francisco, a organização de redes de comunicação ferroviárias. Em 1882, com seu aprimoramento projetou-se o estabelecimento de uma artéria central Leste-Oeste.
28 Informações disponíveis em: http://www.transportes.gov.br/conteudo/6092429 No Anexo 1 desse estudo se encontram todos os Mapas dos Planos anunciados na Tabela 3. A especificação e principais características dos Planos estão disponíveis em relatório do DNIT: http://www.dnit.gov.br/planejamento-e-pesquisa/historico-do-planejamento-de-transportes
REBOUÇAS 1874Considerava o país de maneira triangular, tendo como base o Rio Amazonas, e os vértices, o litoral e a fronteira. Caracterizava-se por linhas ferroviárias transversais paralelas à base, também na direção Leste-Oeste.
BICALHO 1881
Ênfase na integração modal entre os segmentos de transporte ferroviários e a navegação fluvial. As linhas ferroviárias vislumbravam ligações dos principais portos do Nordeste e Sudeste ao interior do país, além de importantes ligações da Região Sul à fronteira brasileira com a América do Sul. E ambos se conectariam à bacia do Rio Amazonas, no Norte do País, através de projetos hidroviários – fluviais.
BULHÕES 1882
Assim como anterior, priorizaria a integração entre os modais fluvial e ferroviário, mas focalizado na ligação interna do país, no sentido Norte-Sul. Por exemplo, linhas ferroviárias que integrariam Belém à Goiás e Guaíra, na fronteira, e o Rio de Janeiro a Porto Alegre.
PLANO GERAL DE
VIAÇÃO1886
Apresentado pelo Ministro Rodrigo Augusto da Silva, propunha a construção de novas ferrovias a fim de ampliar o acesso ao interior do país através da integração dos modais fluvial e ferroviário.
Fonte: DNIT
Em suma, segundo Creso Coimbra (1974), em seu estudo “Visão Histórica e Análise
Conceitual dos Transportes no Brasil”, a falta de especificações técnicas mais apuradas,
análise pormenorizada de demandas e os altos custos dos projetos de integração nacional
explicam o não avanço dos Planos apresentados. Ademais, a falta de especificidades nas
perspectivas futuras sobre a economia brasileira evidencia o abandono desses planos.
Entretanto, é importante ressaltar a ambição de tais planos ao período em que foram
planejados e todas as dificuldades técnicas para conhecimento territorial e análise de
demandas naquele momento.
2.3 Planejamento dos Transportes no Século XX e a Preferência pelo Modal Rodoviário
A partir de 1920, a política viária nacional privilegiaria o modal rodoviário e nesse
período a organização de agências do Estado para o planejamento dos transportes é
ampliado no país. Apesar do reconhecimento do transporte ferroviário como modal de
grande capacidade de carga, a escolha pela ampliação rodoviária se daria em meio ao
estabelecimento de linhas de montagem do setor automobilístico no Brasil, conformando o
planejamento viário ao contexto econômico nas primeiras décadas do novo século. PAULA
(2000) ressalta a criação do único órgão central de planejamento dos transportes em nível
nacional, datado de 1911, a Inspetoria Federal de Estradas –IFE. A IFE tinha como objetivo
fiscalizar os serviços de exploração e construção de ferrovias e rodovias no país (PAULA,
2000, p.124) 30.
30 Em 1921, a IFE incorpora funções ligadas ao planejamento da viação terrestre. Dentre elas, a superintendência das administrações federais das estradas de ferro de propriedade da União e a fiscalização das empresas arrendadas ou concedidas pelo Governo Federal.
Após a rápida expansão das ferrovias no Brasil, onde foram implantados 9.321 km
de linhas de 1854 a 1889, distribuídas entre dezenas de empresas independentes, conforme
sublinha Harvey (2006), o modal entraria em desvantagem no planejamento viário do país.
Um dos motivos seria a utilização de diferentes bitolas de trilhos implementadas por essas
empresas independentes, sem rigorosos padrões a seres estabelecidos31. Outro motivo, se
justificaria pela própria evolução do sistema capitalista no mundo, segundo Harvey (2006). O
autor assinala que o motivo principal do declínio do modal ferroviário no Brasil era devido ao
“capitalismo moderno”, de ocupação territorial ao estilo anglo-saxão, que exigia maiores
investimentos em estradas, portos, energia e infraestrutura urbana, caracterizando a busca
de modais de transporte mais eficientes. Ou seja, o trem se tornaria grande demais e menos
eficiente (economicamente) para o transporte urbano e entre localidades do interior do
país32.
Assim, foi durante o Governo de Washington Luís, entre 1926 e 1930, que o
desenvolvimento do modal rodoviário foi impulsionado no país. Através do Plano Catramby,
de 1927/1927 as bases da Rede Rodoviária do Brasil foram estabelecidas e seriam
adensadas nas décadas seguintes33. Pela primeira vez o segmento rodoviário estaria sendo
planejado a nível nacional com um nível maior de detalhamento frente tentativas anteriores.
Outros dois planos marcaram o Governo de Washington Luís, conforme destacam PEREIRA
& LESSA (2011) 34:
(...) o “Plano Luiz Schnoor” (1927), que propôs a construção da rede rodoviária, considerando a capital federal no planalto central; e o “Plano da Comissão de Estradas de Rodagem Federal” (1927), que propôs a construção da rede rodoviária, passando pelo planalto central, mas centrada no centro-sul e no nordeste do Brasil. Esses três planos apresentados propunham a construção dos grandes eixos rodoviários no Brasil, mas não foram planos oficiais e serviram de base para a elaboração dos planos nacionais de viação, nas décadas seguintes. (PEREIRA & LESSA, 2011, p. 28).
PAULA (2000) destaca que é deste período a construção de antigos projetos de
ligações rodoviárias, como as estradas Rio-São Paulo e Rio-Petrópolis, ambas inauguradas
em agosto de 1928 e de grande importância à dinamização econômica da região Sudeste35.
Segundo a autora, para este presidente era necessário “construir estradas para todas as
31 Lamounier (2008, p. 79) ressalta que: “O planejamento inadequado da rota da ferrovia e as diferentes bitolas aumentavam os custos de operação e as tarifas: os produtos tinham de ser transportados até estações situadas em locais inadequados e carregadores tinham de transportar as cargas dos carros de boi, barcos e outros até a estação terminal ou transportar de um vagão para o outro quando havia mudança de bitola.”32 Para ilustrar o declínio da expansão ferroviária no Brasil e São Paulo, verificar Anexo 2.33 O “Plano Catramby” (1926/27), segundo Pereira & Lessa (2011, p. 28), propôs a construção de rodovias superpostas aos traçados ferroviário. A saber, no Plano foram categorizadas duas classes de rodovias: Estradas Federais ou troncais de penetração, em número de 17, e, Estradas Estaduais ou de união dos estados, em número de 12.34 Também em 1927, foi criado o Fundo Especial para a Construção e Conservação de Estradas de Rodagem, caracterizando um imposto adicional sobre os combustíveis e veículos importados.35 A saber, a Rio-Petrópolis representou um marco da engenharia nacional, constituindo a primeira rodovia asfaltada do país. Já a Rio-São Paulo reduziu drasticamente o tempo de viagem terrestre rodoviária entre as duas cidades, passando de cerca de 33 dias para cerca de 14 horas.
horas do dia e para todos os dias do ano”. Nesse momento se acreditava na possibilidade
de integração entre os modais rodoviário e ferroviário, segundo ressalta Oliveira (1986):
As estradas de ferro de penetração são os primeiros pioneiros da civilização, mas a sua ação é lenta ou incompleta, se ela não se continuar pelas estradas de rodagem. A estrada de ferro não é mais hoje o único meio rápido de comunicação e não corresponde a todas as necessidades [...] precisa da colaboração rodoviária. Para isto devemos fazer estradas de rodagem interligando as estradas de ferro. (OLIVEIRA, 1986, p. 76).
Em 1930, inicia-se o governo de Getúlio Vargas (1930-1937) que, dentre outros
aspectos no plano relativo à integração nacional, fortaleceu o debate da importância da
interligação modal dos transportes, visando ampliação das conexões internas e externas. A
Constituição da República, de 16 de julho de 1934 destacava a navegação, e prescrevia o
estabelecimento de um plano nacional ferroviário e de estradas de rodagem, além de propor
regulamentar o tráfego rodoviário interestadual, à competência do Governo Federal36.
Em 1934, foi criado o Plano Geral Nacional de Viação (PGNV) de 1934,
caracterizando o primeiro projeto nacional para os transportes aprovado oficialmente, apesar
de grande influência dos predecessores. O Plano seria de natureza multimodal voltado à
maior conexão interna no país, ampliando as possibilidades comerciais, além dos fluxos de
pessoas. Nesse Plano foram designados troncos e ligações principalmente entre os modais
ferroviários e rodoviários existentes e programados. Segundo informações do DNIT (2012),
alguns foram os Objetivos Gerais do Plano Geral Nacional de Viação (1934), como: ligar a
capital federal a uma ou mais capitais dos diferentes Estados; ligar dois ou mais troncos de
interesse geral, com o objetivo de estabelecer, por caminho mais curto e menor tempo de
percorrido, comunicações entre duas ou mais unidades da federação e constituir vias de
transporte ao longo da fronteira.
Galvão (1996, p.196) ressalta que apesar do Plano envolver ligações entre diferentes
modais, no início da década de 1930 a prioridade ainda era ao transporte ferroviário:
Vale registrar que, embora as deficiências estruturais que afligiam o setor ferroviário já fossem amplamente reconhecidas, tornando praticamente inevitável a busca por modos alternativos de transportes de longa distância, o Brasil não entrou, ainda nos anos 30, no que se poderia chamar de era rodoviária. Com efeito, quando, em 1934, um plano geral de viação nacional foi finalmente aprovado pelo governo, comtemplando todas as modalidades de transporte, precedência ainda era conferida à cabotagem e à navegação fluvial sobre as rodovias, e prioridade total era dada às ferrovias, estas últimas vistas pela comissão encarregada da elaboração do plano como a única modalidade de transporte que "poderia satisfazer como solução definitiva no estabelecimento dos grandes troncos da viação nacional." (GALVÃO,1996, p. 196).
36 Tais pontos são apresentados já nas disposições preliminares, objetivando maior controle e ampliação logística no país. No Capítulo 1 da Constituição, no Artigo 5°, das normas que competem à União, incisos de números IX, X e XI, são apresentados alguns dispositivos importantes à infraestrutura viária do país: Inciso IX - estabelecer o plano nacional de viação férrea e o de estradas de rodagem, e regulamentar o tráfego rodoviário interestadual; Inciso X - criar e manter alfândegas e entrepostos; Inciso XI - prover aos serviços da polícia marítima e portuária, sem prejuízo dos serviços policiais dos Estados.
Em 1937, com a ampliação da frota de automóveis, foi criado o Departamento
Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), órgão dentro da estrutura do Ministério de
Viação e Obras Públicas para tratar especificamente das rodovias, que nesse mesmo ano
apresentou, sem sucesso inicial, um plano de viação com foco rodoviário, em detrimento ao
ferroviário37.
Ao final da década de 1930, com o desenvolvimento da estrutura econômica
brasileira através do processo de industrialização, a infraestrutura até então, baseada na
ferrovia, passaria a se tornar inconsistente frente à nova realidade, acarretando em uma
dificuldade à expansão do mercado interno. Isso porque, diferentemente da época da
produção cafeeira, voltada ao mercado externo, com a circulação das mercadorias
buscando principalmente os portos, com a industrialização, as mercadorias passariam a ser
distribuídas internamente e para diferentes regiões do país. Assim, tornava-se necessário a
construção de novas ligações entre as cidades a fim de melhor viabilizar a distribuição das
mercadorias.
Segundo Saes (1981, p.181), essa distribuição “por opção do Estado coube à
rodovia, ou seja, foi ela que difundiu o mercado e que participou, a partir dessa época da
produção e da transformação do espaço” 38. Ao final do período do “Estado Novo”, com o
objetivo de Vargas em ampliar os segmentos industriais no país, o segmento rodoviário vai
obtendo destaque enquanto foco da política nacional de viação39. Em 1944 foi aprovado o
Plano Rodoviário Nacional40, que previa a ampliação da malha rodoviária brasileira. Em
suma, o investimento em infraestrutura rodoviária imprimiria um impulso para a consolidação
do mercado nacional através de ligações da região Sudeste a outras regiões do país, essas
que passariam a fornecer mão-de-obra e consumidores dos produtos manufaturados da
primeira.
Entretanto, contrariamente ao previsto pelo Plano Rodoviário Nacional, de 1944, a
construção e ampliação das estradas de rodagem no país foram intensificadas sem maior
37 Tal plano não receberia aprovação do Governo Federal (Brasil. Ministério dos Transportes, 1974, p. 141). Entretanto, merece destaque, dentre outros aspectos, pelo estabelecimento dos conceitos básicos de categorias de estradas e pela definição das atribuições de cada um dos escalões governamentais intervenientes na construção e conservação de rodovias. Tais medidas beneficiariam anos depois a organização do setor rodoviário no país, assim como sua ampliação.38 Outro importante autor que trata dessa nova fase do capitalismo industrial relacionando-o à importância da infraestrutura foi Déak (1991, p. 30-38). 39 Lima (1976, p. 344) destaca a opção pela rodovia e sua relação ao desenvolvimento de um indústria de base nesse período: “Iniciava-se aí então a era rodoviária, que iria posteriormente desenvolver-se em detrimento das ferrovias e da navegação, apesar de não possuirmos petróleo, nem de fabricarmos automóveis. Tudo era importado: as máquinas e equipamento para abertura de estradas, os veículos e suas peças, o combustível e lubrificantes. Essa circunstância é importante, porque representa um grande fator no sentido de provocar o aparecimento e desenvolvimento de uma indústria de base no país, capaz de iniciar aqui mesmo a elaboração da matéria-prima e a produção do material semi-acabado e mesmo maquinaria às diferentes indústrias”. 40 As propostas previam 27 diretrizes principais distribuídas em seis rodovias longitudinais, 15 transversais e seis ligações, totalizando cerca de 35.574 km. Também foram estabelecidos critérios para que as estradas de rodagem a serem construídas evitassem a "concorrência e a superposição das rodovias com os principais troncos ferroviários existentes ou a concluir". Para maiores informações do Decreto Instituinte do Plano Rodoviário Nacional e seus objetivos consultar: http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decret/1940-1949/decreto-15093-20-marco-1944-460172-publicacaooriginal-1-pe.html .
planejamento de aproveitamento logístico. Assim, muitas delas seriam implementadas
paralelamente aos traçados ferroviários, acarretando em diversas críticas devido à falta de
conectividade entre os modais. Nesse contexto, muitos autores iniciaram debates sobre a
ineficiência desse paralelismo entre modais, pois ao contrário de estímulo à integração viária
do país, viam um aumento da competição entre os diferentes modais, principalmente entre
os sistemas ferroviário e rodoviário. Dentre os menos otimistas, destaca-se o engenheiro
Arthur P. de Castilhos, defendendo que a construção desordenada de rodovias acarretou
em impedimento de uma integração dos transportes, prejudicando, de imediato, a ferrovia. O
autor diz:
(...) veio o depauperamento do imenso patrimônio nacional ferroviário e o problema dos transportes terrestres, no Brasil ficou insolúvel, porque a rodovia não substitui a ferrovia, pela falta duma construção adequada, pela ausência da organização do tráfego regular rodoviário e pela natureza do próprio transporte que não pode levar a preço razoável as mercadorias pesadas a longa distância. (CASTILHOS, 1937, p. 72 apud FERRARI, op. cit., p. 160).
Por outro lado, outros estudiosos alteraram os prognósticos ao analisar a perspectiva
de competição entre rodovia e ferrovia. Em entrevista de Célio Debes, realizada em 1981
por Mivaldo Messias Ferrari, o primeiro ressaltou que as rodovias, inicialmente, seriam
implementadas de forma a “alimentar” as ferrovias. Ferrari retoma o debate citando o
depoimento do engenheiro Álvaro de Souza Lima41, onde defendia que os déficits do setor
ferroviário no Brasil seriam decorrentes não da concorrência com os transportes rodoviários
nas primeiras décadas do século XX, e, sim fruto direto da depressão econômica
ocasionada a partir de 1929, afetando diretamente as receitas das companhias. Segundo
Paula (2010, p.148), Souza Lima via de forma otimista o aumento do transporte de cargas
através de rodovias, de forma a gerar complementaridades, acreditando em um equilíbrio
entre os diferentes modais.
A partir da deposição de Vargas em 1945, importantes modificações na área de
transportes seriam adensadas. Por exemplo, em 1946, o Engenheiro Maurício Joppert da
Silva, então Ministro da Viação e Obras Públicas, formaria uma Comissão com o objetivo de
revisar o Plano Geral Nacional de Viação, de 1934. Conforme ressalta Paula (2010, p. 150)
o principal intuito final da Comissão seria a elaboração de um novo plano, com prioridade a
uma abordagem multimodal. Entretanto, a escolha dos modais para ampliar os fluxos de
comércio e pessoas existentes até então e integrar os principais territórios e regiões ainda
41 Então Diretor Geral do DER do Estado de São Paulo, tendo sua entrevista concedida no VI Congresso Nacional de Estradas de Rodagem, em novembro de 1936, disponível nas Memórias do Correio da Manhã em: http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=089842_04&pagfis=35009&pesq=&esrc=s&url=http://memoria.bn.br/docreader
não conectados, já estava feita: as rodovias e, posteriormente, as aerovias, os meios de
transporte mais caros e menos competitivos em grandes escalas42.
Para ilustrar a decadência dos modais ferroviários e fluvial (principalmente) no
transporte de mercadorias no comércio interestadual no Brasil, em contraposição ao
aumento da participação do modal rodoviário entre os anos de 1940 e 1950, destaca-se a
participação desse último no total desse comércio em todo o país, passando de 25% em
1948, para cerca de 50% em 1953. Enquanto isso, o modal ferroviário passava de cerca de
30% em 1948, para 16% em 1953. Na mesma base comparativa, o transporte interestadual
de mercadorias realizado através de vias fluviais e marítimas no país passava de 47% para
36%43.
Finalizando nossa proposta de análise historiográfica da infraestrutura dos
transportes no Brasil, do século XIX à primeira metade do século XX, é possível destacar
que o modal rodoviário caracterizou a efetivação da integração viária em nível nacional,
ficando os modais ferroviários e hidroviários em segundo plano. É somente na atualidade, a
partir dos anos 2000 que os governos voltam a pensar na importância desses dois modais.
A importância da ferrovia se dá pela maior capacidade de transporte de grandes cargas e
maior eficiência comparado ao transporte rodoviário. Já o hidroviário se destaca pelos
menores custos envolvidos, caracterizando um modal a ser amplamente aproveitado pelo
país, tendo em vista sua própria geografia, com rios caudalosos em regiões de difícil
acesso44.
3. Considerações Finais e Conclusão
Este trabalho procurou apresentar e analisar a questão do planejamento da
infraestrutura de transportes e sua relação com as principais características do
desenvolvimento econômico no Brasil, no período compreendido entre o século XIX à
primeira metade do século XX. Adicionalmente, buscou-se evidenciar que no período
proposto, planos ambiciosos de integração nacional foram discutidos e apresentados,
obstante as debilidades econômicas e falta de critérios mais específicos, privilegiando dois
42 Pela revisão do Plano de 1934, o objetivo estratégico da viação e logística nacional saíra das ferrovias e passara às rodovias, prioritariamente. Na década de 1950, principalmente durante o Governo de Juscelino Kubitschek , foi que o transporte rodoviário tornou-se a principal via de locomoção no país. Lembramos aqui que em 1957 se implantaria a primeira indústria automobilística nacional que, conjuntamente, à decisão de construção a nova capital no interior do país, impulsionaria e justificaria o desenvolvimento rodoviário do Brasil. Convém destacar também o aumento dos incentivos ao modal aeroviário no país no início do século XX. Segundo dados do Repertório Estatístico do Brasil, do IBGE (1939-40), o número de empresas aéreas passou de 2 no início de 1920 para 9 em meados da década seguinte. O número de vôos também evidenciava expansão desse modal (tanto para passageiros, como para embarcação de mercadorias), tendo esse passado de 158 realizados em 1927, para 7.939 em 1939. (op. cit, 1940, p. 51)43 Os dados foram extraídos de “LIMA. H. F. A indústria automobilística apud FONSECA, E.G. Proálcool, energia e transportes. São Paulo: Pioneira: FIPE. 1981, p. 113.44 Segundo VITTE (2009, p.12), no comparativo de carga, enquanto um caminhão transporta cerca 27 toneladas,um vagão de trem carrega 100 toneladas e uma barcaça até cerca de 1.500 toneladas. Quanto aos custos, o transporte aquático tem o menor custo logístico quando comparados os fretes dos diferentes tipos de tranporte. Em seu trabalho, a autora evidencia que considerando por km rodado em US$/tonelada, o frete hidroviário custa em média 40% do frete ferroviário e 30% do rodoviário, em média.
importantes modais de transporte, o ferroviário e, posteriormente, o rodoviário. Assim, a
questão que orientou este trabalho foi compreender a importância dos setores políticos e
econômicos na condução dos projetos viários e o consequente processo de integração do
país.
A partir da exposição bibliográfica conjuntamente às legislações, planos e dados
relativos ao comércio e transportes no período, este artigo procurou trazer à luz importantes
aspectos do planejamento logístico no país, que ajudam a compreender as raízes de muitos
gargalos da infraestrutura nacional nos dias atuais. Conjuntamente, a análise deste ensaio
indica que a despeito da evolução dos planos de integração, a nível nacional, e sua
importância ao desenvolvimento econômico do país apresentados, o desmantelamento de
projetos de transporte com conexão e integração dos diferentes modais no Brasil esbarrou
na perspectiva de maior integração nacional em favor de aproximações regionais e com o
exterior no século XIX45.
Aqui, destaque ao papel da economia cafeeira para a transformação do espaço
territorial e do desenvolvimento da economia brasileira e a integração interna do país,
inicialmente de forma regionalizada. É na virada para o século XX, onde o café se torna o
principal produto da economia brasileira e se destaca no mercado internacional, que a
integração viária interna do país se torna mais fundamental e significativa. Isso porque,
conforme ressalta o autor:
A economia cafeeira gerou uma massa de capital monetário passível de
transformar-se em capital produtivo industrial, transformou a própria força de
trabalho em mercadoria e promoveu, a partir do crescimento demográfico, a
criação de um mercado interno unificado de proporções consideráveis.
(CATANI, 1998, p. 85-86).
Evidencia-se, então, a importância do modal rodoviário para ampliação da integração
interna naquele contexto. As ferrovias não mais corresponderiam às necessidades dos
transportes, levando em consideração a necessidade de passarem por remodelação para se
tornarem economicamente eficientes no transporte interior, com altos custos de implantação
e modernização.
É forte a relação entre a infraestrutura e a economia tendo em vista que para se
estabelecer infraestrutura de transportes em uma região e no país são necessárias
atividades econômicas, população e comércio que a demandem. E a partir de uma melhor
estruturação e integração viária, as atividades econômicas e os mercados ganham impulso
para se ampliar, e com o tempo essas demandam cada vez mais uma infraestrutura
sofisticada e conectada, interna e externamente.
45 Conforme ressalta Catani (1998, p. 81-94), até o final do século XIX, era baixo o volume de comércio entre as áreas internas do país, período com forte atuação da economia agrícola voltada ao comércio externo, não justificando o estabelecimento de rotas de ligação modernas no interior do país.
No Brasil, a estruturação da integração viária se deu pela conjunção do planejamento
e atuação estatal à conformação econômica e sua respectiva demanda. No período
ferroviário se tornaria mais explícito o papel do Governo, enquanto principal idealizador dos
planos de integração, enquanto a partir da escolha pelo modal rodoviário verificou-se uma
forte atuação de grupos econômicos, principalmente o empresariado ligado à construção
das estradas de rodagem46. Em síntese, pode-se afirmar que na história do país, em
conformidade ao assentamento populacional e à dinâmica da economia, as redes de
transporte foram surgindo a fim de possibilitar o escoamento da produção dos bens, assim
como, também, facilitar a mobilidade das pessoas. Assim, a ocupação do território, a
produção e transformação do espaço, relacionam-se à evolução da economia e da
infraestrutura de transportes.
4. Fontes e Bibliografia
4.1 Fontes
ALMANAK ADMINISTRATIVO, MERCANTIL E INDUSTRIAL DO IMPÉRIO DO BRAZIL PARA 1883. Por Arthur Sauer, 40° Anno, 3° Volume. Casas dos Editores, Rua do Ouvidor, 66. Rio de Janeiro, 1883.
GEIPOT - Grupo Executivo de Integração da Política de Transportes. Disponível em: http://www.geipot.gov.br/. Acesso em: 10 de novembro, 2013.
BRASIL. Presidência da República. Casa Civil. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (de 16 de julho de 1934). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constitui%C3%A7ao34.htm. . Câmara dos Deputados. Plano Rodoviário Nacional. Decreto nº 15.093, de 20 de Março de 1944. Disponível em: http://www2.camara.gov.br/legin/fed/decret/1940-1949/decreto-15093-20-marco-1944-460172-publicacaooriginal-1-pe.html
BRASIL. Ministério dos Transportes. (MT) Plano Nacional de Viação. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT, 2012. Disponível em: http://dnit.gov.br/plano-nacional-de-viacao/snv-2012. Acesso em: 15 de novembro, 2013. . Histórico Sobre a Evolução do Planejamento Nacional de Transportes. Departamento Nacional de Infra-Estrutura de Transportes – DNIT. Disponível em: http://www.dnit.gov.br/planejamento-e-pesquisa/historico-do-planejamento-de-transportes . Acesso em: 19 de novembro, 2013. . Histórico. Disponível em: http://www.transportes.gov.br/conteudo/60924 . Acesso em: 18 de dezembro, 2013 . Planos de viação: Evolução histórica 1808 – 1973. Rio de Janeiro: Conselho Nacional de Transportes, 1974.
IBGE. Repertório Estatístico do Brasil. Rio de Janeiro, 1941. Disponível em:
46 Para maiores informações da relação entre o Estado e os grupos econômicos durante o período do “rodoviarismo”, consultar Carlos Antonio Accorsi em seu estudo “Estado e grupos econômicos. A política de expansão rodoviária no Brasil a partir de 1930”, de 1996.
http://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv17983_v1.pdf. Acesso em: 02 de dezembro, 2013.______Séries Estatísticas Retrospectivas. Vol. II. O Brasil, Suas Riquezas Naturais, Suas Indústrias. Edição fac-similar do original “Censo Industrial do Brasil, publicado em 1909. Tomo II - Indústria Agrícola e Tomo III - Indústrias de Transportes, Indústria Fabril. Rio de Janeiro, 1986._____ Estatísticas Históricas do Brasil. Séries demográficas e sociais, de 1550 a 1985. Rio de Janeiro: IBGE, 1987.
Entrevista com Célio Debes realizada no dia 8 de outubro de 1981, por Mivaldo Messias Ferrari. FERRARI, op. cit., p. 206.
Memórias do Correio da Manhã. De 29 de Julho de 1936. Disponível em: http://memoria.bn.br/DocReader/Hotpage/HotpageBN.aspx?bib=089842_04&pagfis=35009&pesq=&esrc=s&url=http://memoria.bn.br/docreader
4.2 Bibliografia
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Anexos
1. Mapas dos Planos de Integração Nacional do Século XIX:
Plano Rebelo Plano Bicalho
Plano Moraes Plano Bulhões
Plano Queiroz Plano Geral de Viação
Plano Rebouças
Fonte: DNIT. Elaboração própria.
2. Expansão e Declínio das Ferrovias no Brasil – 1850 a 1945
Quilometragem de Ferrovias ConstruídasPeríodo Total Brasil (km) São Paulo (km) Participação SP no Brasil (%)
1850-1870 744 139 18,68%1871-1890 9.972 2.286 22,92%1891-1910 11.352 2.779 24,48%1911-1930 11.152 1.897 17,01%1931-1945 2.515 439 17,46%
Fonte: KATINSKY, 1994, p. 59; SAES, 1981, p. 24.